Ecologia da Floresta Amazônica 2012

Livro do curso

Foto: Lucas Navarro Paolucci

Coordenadores e monitores

Thiago G. Kloss Paulo Enrique José Luis C. C. Peixoto Marcos C. Vieira Paulo Estefano D. Camargo Bobrowiec

Logística Cozinheiros Ary Jorge Correa Ferreira Maria Eduarda da Costa Benício Raimundo José Maria de Souza Apoio logístico Maria Rosely Cavalcante Hipólito Motoristas Jéssica Iara Corísco da Silva Luiz Raimundo de Queiroz Alexandra Maria Ferreira Silveira Antônio José Moraes Pereira Ayezha Oliveira Hidalgo

2

3

4

Índice

Floresta fragmentada - Dimona

Projetos orientados

A abundância e riqueza de plântulas e sementes abaixo de abrigos utilizados por morcegos frugívoros é maior?

Joselândio Corrêa Santos, Ana Carolina Vieira Pires, José Hidasi Neto, Sarah Freitas Magalhães Silva...... 13

A cobertura foliar por liquens e briófitas produz custos para Duguetia cf. flagellaris

(Annonaceae)?

Daniel Passos, Bianca Silva, Cibele Paiva & Vidal Carrascosa...... 22

A riqueza de plantas aumenta a riqueza de herbívoros, mas não dos predadores

Renata Pimentel Rocha, Caroline Marques Dracxler, Leonardo Oliveira, Bruno Travassos de Britto...... 28

Espécies de animais aquáticos e semiaquáticos se distribuem entre poças temporárias independentemente da qualidade do habitat

Mariana Velasque, Ana Claudia Rorato, Ludmila Rattis, Randolpho Gonçalves Dias Terceiro...... 35

O tamanho da domácia foliar determina sua ocupação por ácaros?

Tatiane Gomes Calaça Menezes, Daniela Pinto Coelho, Lorena Costa Pinto e Artur Alcantara Madeira...... ,...... 43

Projetos livres

Alocação diferencial de recurso em Vismia guianensis (Clusiaceae) associada a condições de luminosidade

Randolpho Gonçalves Dias Terceiro, José Hidasi Neto, Sarah Freitas, Lorena Costa Pinto...... 49

5

Distribuição espacial em Selaginella amazonica (Selaginellaceae) em função da umidade

Leonardo Queiroz de Oliveira, Bianca Ferreira da Silva, Mariana Velasque & Joselândio Corrêa Santos...... 51

O investimento em reprodução não diminui o investimento em defesa em Miconia dispar (Melastomataceae)

Daniela Coelho, Ludmila Rattis, Tatiane Menezes & Cibele Paiva...... 52

Por que o hemíptero Jalisus ossae (Reduviidae) não desencadeia resposta defensiva da formiga Pheidole minutula em Maieta poeppigii (Melastomataceae)?

Ana Carolina Vieira Pires, Ana Claudia Rorato Vitor, Caroline Marques Dracxler e Daniel Passos...... 53

Recrutamento de formigas na mirmecófita Hirtella sp.: estudo em plantas com diferentes níveis de estresse

Bruno Travassos, Artur Madeira, Vidal Carrascosa, Renata Rocha...... 55

Várzea

Projetos orientados

A seleção de habitats por cupins em áreas alagadas não visa redução dos custos de deslocamento até o solo

Sarah Freitas Magalhães, Caroline Marques Dracxler, Renata Pimentel Rocha e Randolpho Dias Terceiro...... 56

O crescimento vertical da macrófita Eichhornia crassipes (Pontederiaceae) é maior em ambientes com menor disponibilidade de água

José Hidasi, Artur Madeira, Cibele Paiva e Daniel Passos...... 62

6

Ocorrência de grupos funcionais de peixes em dois rios Amazônicos com diferentes transparências de água

Lorena Pinto, Ludmila Rattis, Tatiane Calaça e Bruno Travassos...... 67

Plantas não sincronizam a produção de frutos de acordo com a vazante em uma comunidade de várzea no Rio Solimões

Ana Claudia Rorato Vitor, Leonardo Oliveira, Vidal Carrascosa, Mariana Velasque...... 75

Respostas comportamentais em presas de ninfas de Odonata (Subordem: Anisoptera)

Bianca Silva, Joselândio Santos, Ana Carolina Vieira & Daniela Coelho...... 82

Projetos livres

A herbivoria em Eichhornia crassipes (Pontederiaceae) não depende do estresse hídrico

Cibele Paiva, Lorena Pinto, Mariana Velasque, Ana Carolina Vieira Pires, Leonardo Oliveira...... 88

A transparência da água como filtro ambiental para a pigmentação de espécies de peixes em rios amazônicos

Ludmila Rattis, Daniel Passos, Daniela Coelho, Joselândio Santos e Renata Rocha...... 89

Complexidade estrutural do habitat influenciando o padrão de frequência relativa de espécies em comunidades de formigas

Vidal Carrascosa, Randolpho Dias Terceiro, Bruno Travassos, José Hidasi & Bianca Ferreira...... 90

Plantas sujeitas ao alagamento sazonal possuem menor variação no tamanho das folhas

Caroline Marques Dracxler, Artur Alcântara Madeira, Tatiane Gomes Calaça Menezes, Sarah Freitas Magalhães e Ana Claúdia

Rorato...... 92

7

Igapó – Anavilhanas

Projetos orientados

A coloração alar é um indicativo da qualidade dos machos em Diastatops sp. (Odonata:

Libelullidae)

Daniela P. Coelho, Leonardo Oliveira, José Hidasi e Joselândio C. Santos...... 93

A escolha do local de oviposição de um lepidóptero é influenciada pela disponibilidade de recurso

Vidal Carrascosa, Sarah Freitas Magalhães, Renata Pimentel Rocha e Tatiane Gomes Calaça Menezes...... 101

Diferentes períodos de inundação influenciam resistência de folhas em plantas no igapó

Bruno Travassos, Ana Claudia Rorato, Mariana Velasque e Ana Carolina Vieira Pires...... 107

Formigas que planam, nadam? Relação entre queda direcional e capacidade de natação em três espécies de formigas de uma área alagável na Amazônia Central

Lorena Pinto, Caroline Marques Dracxler, Randolpho Dias Terceiro & Cibele Paiva...... 114

O tempo de submersão de plântulas de Dalbergia sp. gera um investimento diferencial entre os sistemas aéreo e radicular?

Artur Madeira, Bianca Silva, Daniel Passos, Ludmila Rattis...... 122

Projetos livres

A borboleta Glutophrissa drusilla (Pieridae) prefere cruzar rios mais largos entre as manchas florestais

Mariana Velasque, Ana Carolina Vieira Pires, Tatiane G. C. Menezes, Renata Pimentel Rocha e Ludmila Rattis...... 128

8

O tamanho das pernas de formigas em áreas alagáveis influencia sua capacidade de deslocamento na água?

Caroline Marques Dracxler, Lorena Costa Pinto, Vidal Carrascosa, Daniela Pinto Coelho e Sarah Freitas Magalhães...... 130

Pernas para que te quero? Função das pernas na natação da formiga Camponotus sp.

(Formicidae)

Randolpho Dias-Terceiro, Artur Madeira, Daniel Passos, Cibele Paiva & Leonardo Oliveira...... 131

Variação da capacidade de armazenamento de água na planta Psychotria sp. mediada por filtro ambiental

Ana Claudia Rorato, Joselândio Santos, Bianca Ferreira, José Hidasi Neto & Bruno Travassos...... 132

Floresta contínua – Km41

Projetos orientados

A aranha Faiditus subflavus (Theridiidae) selecionam indivíduos de Maieta guianensis

(Melastomataceae) com menor dano foliar?

Leonardo Oliveira, Renata Rocha, José Hidasi e Ana Carolina Vieira Pires...... 134

Importância relativa do espaço e do ambiente na explicação da diversidade beta: um teste da Teoria do Nicho x Teoria Neutra em pequena escala

Daniela Coelho, Bruno Travassos, Randolpho Dias-Terceiro e Cibele Paiva...... 140

Interação formiga-planta: a abundância da planta não afeta o número de formigas mutualistas com que ela interage

Sarah Freitas Magalhães Silva, Ana Claudia Rorato, Artur Alcântara Madeira e Mariana Velasque...... 147

9

Onde os similares também têm vez: árvores com morfologia foliar semelhante coexistem em uma floresta secundária

Caroline Marques Dracxler, Joselândio Corrêa Santos, Ludmila Rattis e Bianca Ferreira da Silva...... 153

Plantas com folhas menores impedem o estabelecimento de minas e galhas

Daniel Passos, Tatiane Calaça, Lorena Pinto & Vidal Carrascosa...... 159

Projetos individuais

Diferença no comportamento de forrageio de formigas associadas a nectários extraflorais e exsudato de afídeos

Ana Carolina Vieira Pires...... 165

Convergência de características funcionais foliares entre uma floresta em regeneração e uma floresta primária na Amazônia Central

Ana Claudia Rorato...... 177

Distribuição de galhas em folhas de Vismia japurensis (Clusiaceae): existe uma seleção do local de oviposição?

Artur Alcantara Madeira...... 189

Quando uma ajuda é bem-vinda: briófitas facilitam o estabelecimento de plantas sobre troncos caídos

Bianca Ferreira da Silva...... 197

As formigas não utilizam sinal químico de formigas outros territórios para melhorar sua eficiência de forrageio

Bruno Travassos...... 205 10

Agregação de palmeiras não aumenta o consumo por herbívoros em plântulas de Attalea sp.

Caroline Marques Dracxler...... 213

Interação mutualista entre afídeos e formigas não altera a eficácia de defesa da mirmecófita Tococa sp. por formigas

Cibele Paiva...... 223

Pequenos camuflados e grandes esquivos? O tamanho corpóreo não atua na seleção de habitat em peixes de riachos amazônicos

Daniel Passos...... 230

A herbivoria em mirmecófitas afetando a resposta da colônia de formigas

Daniela Pinto Coelho...... 239

Habitats com maior luminosidade não representam melhores territórios de acasalamento para machos da libélula Chalcopteryx scintilans (Odonata: Polythoridae)

José Hidasi Neto...... 248

Mutualismo de defesa entre plantas mirmecófitas e formigas reduz o investimento em defesas estruturais em espécies de Melastomataceae

Joselândio Corrêa Santos...... 257

A condição alimentar das larvas de formigas-leão influencia no tamanho e no tempo de construção do funil de areia?

Leonardo Queiroz de Oliveira...... 267

11

Relação entre tamanho corporal, respostas de defesa e posição na teia de indivíduos de uma espécie de aranha (Pholcidae) que vive em agregações na Amazônia Central

Lorena Costa Pinto...... 275

A influência da agregação espacial de Maieta guianensis (Melastomataceae) sobre a intensidade da herbivoria

Ludmila Rattis...... 287

Tricomas foliares auxiliam formigas na detecção de herbívoros em plantas mirmecófita?

Mariana Velasque...... 298

Folha consumida é menos querida? Seleção de habitat de Aranhas Faiditus subflavus

(Theridiidae) por folhas de Maieta guianensis (Melastomataceae)

Randolpho Gonçalves Dias Terceiro...... 306

Quanto menor o guerreiro, maior a armadura: defesa estrutural em plantas com diferentes tamanhos foliares

Renata Pimentel Rocha...... 313

A resposta de captura em uma aranha orbitela aumenta com a redução do valor da presa

Sarah Freitas Magalhães Silva...... 320

Árvores grandes limitam o tamanho de suas vizinhas?

Tatiane Gomes Calaça Menezes...... 327

Qual é a influência da qualidade do macho da espécie Chalcopteryx scintilans (Odonata:

Polythoridae) no tempo de luta por um território?

Vidal C. Carrascosa...... 336 12

Dimona – projetos orientados

A abundância e riqueza de plântulas e sementes abaixo de abrigos utilizados por

morcegos frugívoros é maior?

Joselândio Corrêa Santos, Ana Carolina Vieira Pires, José Hidasi Neto, Sarah Freitas

Magalhães Silva

Introdução

A dispersão de sementes promove o aumento e manutenção da diversidade de plantas, aumentando a chance de colonização de novos ambientes e a ampliação da distribuição das espécies. Assim, o processo de dispersão de sementes está relacionado com o padrão de distribuição das espécies vegetais.

As plantas de ambientes tropicais possuem uma clara associação com grupos de dispersores animais (Jordano 2000). Em muitos casos, as plantas que alocam nutrientes de alto valor em seus frutos atraem potenciais animais dispersores. Além disso, o tamanho do fruto está associado com a quantidade de reservas ou tecidos nutritivos que ele contém, ou seja, frutos maiores possuem potencialmente mais reservas que frutos pequenos. Consequentemente, isso estaria determinando a escolha dos frutos por animais, que escolheriam frutos tão grandes quanto pudessem manipular.

Nos trópicos, os principais dispersores dos propágulos das plantas são os vertebrados, em especial aves e morcegos (Galindo-Gonzalez 2000; Mendellin & Gaona

1999). Esses animais são conhecidos por manipular e ingerir pequenos frutos e liberar as sementes em suas fezes (Galindo-Gonzalez 1998). Em geral, o consumo dos frutos é feito ainda na planta em frutificação, entretanto algumas espécies possuem locais

13

preferenciais para a manipulação do alimento, que podem ser considerados como sítios de alimentação ou poleiros. Assim, haverá locais onde a deposição de sementes e, consequentemente, também de plântulas, serão diferenciadas de locais relativamente próximos, devido a chuvas de sementes adicionais provenientes dos restos da alimentação e das fezes dos animais (Melo 2009).

Algumas espécies frugívoras de morcegos, como as do gênero Carolia, constroem tendas em copas de árvores e arbustos do sub-bosque das florestas (Melo

2009). Essas tendas são confeccionadas a partir da modificação da disposição da lâmina foliar por mordidas dos morcegos no pecíolo ou nas regiões próximas à nervura foliar, conforme o tipo de folha (Stoner 2000). Pouco se sabe sobre o objetivo da construção dessas estruturas, mas acredita-se que sejam locais de descanso, acasalamento, paradas estratégicas para manipulação de frutos durante o forrageio ou mesmo abrigos para situações adversas, tais como chuvas, risco eminente de predação, entre outros. A única certeza que se tem é que são bastante recorrentes nas florestas tropicais úmidas e que são ativamente construídas por morcegos.

Considerando que os morcegos frugívoros constroem abrigos para utilizar como locais para alimentação, o objetivo desse trabalho foi conhecer qual o papel dos morcegos construtores de abrigo sobre a dispersão de sementes e plântulas em uma floresta tropical úmida. Nossa previsão é que existe um aumento no número de indivíduos e morfoespécies de sementes e plântulas em locais abaixo dos abrigos, quando comparado aos locais sem o abrigo, pois os morcegos que utilizam o abrigo devem promover um incremento na chuva de sementes.

14

Material e Métodos

Área de estudo

Nosso estudo foi realizado na Fazenda Dimona (2º 20’S; 60º 06’O), uma das áreas do

Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF), situada a 80 km da cidade de Manaus, Brasil. A área é caracterizada por fragmentos florestais de terra firme de tamanhos diferentes, circundados por uma área de floresta secundária, com aproximadamente 30 anos de sucessão. As áreas de florestas secundárias são originadas a partir das áreas desmatadas para o estabelecimento de pastagens, que após alguns anos de uso foram abandonadas.

Busca por abrigos, riqueza e abundância de sementes e plântulas

Nós percorremos uma trilha de 2,6 km fazendo uma varredura de três metros para cada lado a partir do ponto central, cobrindo uma área de 1,56 ha. Durante o nosso deslocamento fizemos uma busca ativa pelos abrigos de morcegos. Esses abrigos são conspícuos no ambiente devido a sua aparência peculiar, um aglomerado de folhas sobrepostas, com forma cônica. Em geral eles são formados por folhas simples e grandes em árvores com alturas de 0,4 a 4 m. Classificamos as plantas usadas como abrigo em morfotipos. Abaixo de cada abrigo colocamos uma parcela de 1 m², tomando como ponto central o caule da planta com o abrigo. A dois metros desta primeira parcela foi estabelecida uma parcela controle, sempre em direção oposta à inclinação do terreno, para evitar amostrar sementes que pudessem ter rolado da área abaixo do abrigo.

Dentro de cada parcela coletamos todas as plântulas com altura máxima de 50 cm e todas as sementes encontradas. Em seguida, levamos essas amostras ao laboratório e classificamos em morfotipos, baseados nas características morfológicas.

15

Análises estatísticas

Para testarmos se a dispersão feita por morcegos sob os abrigos aumentou a riqueza e a abundância de plântulas e sementes, realizamos testes-t pareados considerando o número de indivíduos e de morfoespécies das plântulas e sementes como variáveis dependentes, e os locais, abrigo e controle, como as variáveis explicativas.

Resultados

Nós encontramos 10 plantas usadas como abrigo por morcegos que pertenciam à pelo menos quatro morfoespécies. Os abrigos estavam em alturas que variaram entre 1,5 e

3,8 m e se encontravam em três hábitats distintos: dois indivíduos na capoeira, um indivíduo na borda entre o fragmento florestal e a matriz de capoeira e sete indivíduos no interior do fragmento florestal. Encontramos nove morfoespécies de sementes e 50 de plântulas. O número total de morfotipos encontrados para sementes e plântulas foi de

14 e 131, respectivamente (Tabela 1). Para plântulas, 47% (n=50) das espécies foram exclusivas dos locais com abrigos. De modo geral, encontramos um pequeno número de sementes em ambos os ambientes, sendo que somente 35% (n=7) das parcelas tiveram pelo menos uma semente.

16

Tabela 1: Número de morfoespécies (média ± desvio padrão) e de indivíduos (média ± desvio padrão) para sementes e plântulas localizadas abaixo e fora dos abrigos usados por morcegos em uma área da Amazônia Central.

Nº de espécies Nº de indivíduos

Abrigo 4 (0,7 ± 1,23) 6 (0,55 ± 1,5)

Sementes Controle 6 (0,42 ±1,72) 8 (0,73 ± 1,1)

Total 9 (0,81 ± 1,94) 14 (1,2 ± 1,95)

Abrigo 35 (4,2 ± 2,28) 61 (7 ± 6,54)

Plântulas Controle 29 (5,9 ± 2,43) 70 (4,8 ± 1,67)

Total 50 (7.81 ± 3,55) 131 (11,9 ± 8,35)

O número de indivíduos de plântulas não diferiu entre os locais abaixo e fora do abrigo (t=0,83; gl=9; p=0,42), o mesmo foi observado para o número de morfoespécies

(t=0,62; gl=9; p=0,54).

17

écies de plântulas écies

morfoesp

de de Nº Nº

Tratamentos

Figura 1. Riqueza de morfoespécies de plântulas em locais abaixo e fora dos abrigos usados por morcegos. As linhas indicam as amostras pareadas de cada tratamento

por parcela por Nº de indivíduos de Nº

Tratamentos

Figura 2. Abundância de plântulas em parcelas abaixo e fora dos abrigos usados por morcegos. As linhas indicam as amostras pareadas de cada tratamento.

18

Discussão

Apesar de morcegos agirem como dispersores de sementes (Mendellín & Gaona 1999), nós não encontramos evidências de que os abrigos podem aumentar a riqueza e abundância de plântulas. Portanto, morcegos não atuam como uma espécie capaz de aumentar a diversidade de plantas abaixo dos locais em que eles se abrigam. Como morcegos carregam alimento para o abrigo e defecam nesses locais (Galindo-Gonzalez

1998), eventualmente as sementes liberadas pelos morcegos são predadas ou sofrem dispersão secundária. Por outro lado, o fato de 47% das plântulas terem ocorrido exclusivamente abaixo dos abrigos, indica que apesar dos morcegos não aumentarem a diversidade local, eles trazem espécies oriundas de outras áreas.

A dispersão secundária das sementes poderia ser efetuada por espécies de besouros. Muitas espécies de coleópteros da família Scarabaeidae são conhecidas por utilizar fezes de mamíferos como sítios de oviposição (Andersen 2001, Andersen 2002).

Um comportamento comum desses besouros é deslocar porções de fezes para longe dos locais originais de deposição. Nesse sentido, é possível que existam besouros associados as fezes abaixo do abrigo que sejam responsáveis pela remoção das sementes. Além dos besouros, formigas também podem estar associadas à dispersão secundária. As formigas podem levar as sementes para longe ou, ainda, podem predar sementes provenientes da dispersão realizada por vertebrados (Passos & Oliveira, 2002). Em ambos os casos, não haveria uma acumulação de sementes e plântulas sob locais usados como abrigos por morcegos.

Embora a maioria dos estudos tem dado destaque à dispersão realizada por morcegos, aparentemente essa importância está associada à regeneração de florestas em sucessão (Melo 2009). Como nosso estudo foi realizado predominantemente em uma floresta madura, pode ser que o efeito da dispersão secundária seja maior que a

19

dispersão realizada por morcegos. Assim, o aumento na diversidade de plantas decorrente do uso de abrigos por morcegos pode ser dependente da idade da floresta.

Agradecimentos

Agradecemos aos professores orientadores, Leão do Norte (Felipe Melo) e Paulo Mau

Estefano, ao Thiago Xexéu Kloss pelas revisões e ao professor Paulo Rainbow Master

Enrique pelo auxílio na morfotipagem das plântulas. Aos professores, colegas e monitores pelas observações relevantes levantadas nas discussões. Aos colaboradores do curso EFA, D. Eduarda, Sr. Jorge e Sr. Léo.

Referências

Andersen, E. 2001. Effects of dung presence, dung amount and secondary dispersal by

dung beetles on the fate of Micropholis guyanensis (Sapotaceae) seeds in Central

Amazonia. Journal of Tropical Ecology, 17:61-78.

Andersen, E. 2002. Dung beetles in a Central Amazonian rainforest and their ecological

role as secondary seed dispersers. Ecological Entomology, 27:257-270.

Galindo-Gonzalez, J. 1998. Dispersion de semillas por murciélagos: su importancia en

la conservacion y regeneracion del bosque tropical. Acta Zoologica Mexicana,

73:57-74.

Galindo-Gonzalez, J., S. Guevara & V. J. Sosa, V. J. 2000. Bat and bird- generated seed

rains at isolated trees in pastures in a tropical rainforest. Conservation Biology,

14:1693-1703.

Hampe, A., J.L. García-Castaño, E.W. Schupp & P. Jordano. 2008. Spatio-temporal

dynamics and local hotspots of initial recruitment in vertebrate-dispersed trees.

Journal of Ecology, 96:668-678.

20

Jordano, P. 2000. Fruits and frugivory. pp. 125-165. In: Seeds: The Ecology of

Regeneration in Plants Community.

Medellin, R. & O. Gaona. 1999. Seed dispersal by bats and birds in forest and disturbed

habitats of Chiapas, México. Biotropica, 31:478-485.

Melo, F.P.L., B. Rodriguez-Herrera, R. Chazdon, R. Medellin & G. Ceballos. 2009.

Small tent-roosting bats promote dispersal of large-seeded plants in a

Neotropical forest. Biotropica, 41:737-743.

Passos, L. & P.S. Oliveira. 2002. Ants affect the distribution and performance of

seedlings of Clusia criuva, a primarily bird-dispersed rain forest tree. Journal of

Ecology, 90:517-528.

Stoner, K. 2000. Leaf selection by the tent-making bat Artibeus watsoni in Asterogyne

martiana palms in southwestern Costa Rica. Journal of Tropical Ecology,

16:151-157.

21

A cobertura foliar por liquens e briófitas produz custos para Duguetia cf.

flagellaris (Annonaceae)?

Daniel Passos, Bianca Silva, Cibele Paiva & Vidal Carrascosa

Introdução

Nos sub-bosques florestais, a disponibilidade de luz representa um recurso limitante para o crescimento e desenvolvimento das plantas (Schulze et al. 2002). Por isso, mesmo pequenas reduções na incidência luminosa podem diminuir a taxa fotossintética e, consequentemente prejudicar o desenvolvimento das plantas.

Em florestas tropicais úmidas ocorre o fenômeno da epifilia, um tipo de interação na qual briófitas, algas, fungos e liquens crescem sobre a superfície das folhas de angiospermas (também chamadas de forófitos), podendo cobri-las total ou parcialmente (Richards 1996; Gentil & Menezes 2011). Essa cobertura pode reduzir a

área de captação de luz, e consequentemente, a taxa fotossintética, gerando custos para a planta.

Sob uma condição estressante gerada por uma baixa taxa fotossintética, a planta pode diminuir a quantidade de recursos investidos em defesa, tornando-se mais suscetível a herbivoria (Schulze et al. 2002). Além disso, se a produção de carbono é menor, a massa foliar específica da planta também será reduzida (Larcher 1986). Então,

é possível que a planta fragilizada, devido à menor taxa fotossintética, possua maiores chances de ser consumida por herbívoros.

Uma vez que as epifilas são comuns em sub-bosques de florestas tropicais pluviais (Zartman & Ilkou-Borges 2007), o entedimento dos seus efeitos sobre as plantas onde elas se desenvolvem pode revelar aspectos importantes acerca da dinâmica das plantas de sub-bosque (Jordan et al. 1980). Sendo assim, a pergunta que direcionou

22

esta pesquisa foi: como a epifilia se relaciona com alocação de carbono e consumo foliar no forófito? Nossa hipótese foi que um incremento da epifilia diminui a taxa fotossintética e a defesa da planta contra herbivoria. Nossa expectativa é que quanto maior a proporção da área de cobertura por epífilas na folha, menor será a massa foliar específica e maior será a proporção de área foliar consumida.

Métodos

Conduzimos o estudo em um fragmento de floresta de terra firme de 100 ha, na Fazenda

Dimona, Manaus, Brasil. Usamos como modelo de estudo 10 indivíduos de Duguetia cf. flagellaris (Anonnaceae), uma espécie típica de sub-bosque, abundante no interior do fragmento (Ribeiro et al. 1999). Para cada individuo, coletamos aleatoriamente cinco folhas, nas quais medimos as seguintes variáveis: massa foliar específica, proporção da cobertura foliar por epífilas na face adaxial e a proporção da área foliar consumida.

Medimos a proporção da cobertura por epífilas nas folhas e a proporção da área de consumo foliar utilizando uma malha de pontos distantes 5 mm entre si.

Confeccionamos a malha em uma folha plástica transparente e a colocamos sobre a superfície de cada folha. Em seguida, contamos os pontos que sobrepunham a área foliar consumida e a área ocupada por epífilas. Dividimos estas estimativas pelo numero total de pontos sobrepostos na superfície total da folha (incluindo as áreas perdidas por consumo) para obter as proporções relativas da área foliar consumida e da área de cobertura por epífilas. Para medir a massa específica foliar, removemos todas as epífilas presentes na folha. Em seguida, desidratamos um fragmento foliar (2 x 2 cm) em forno médio, por 1 h e pesamos o material desidratado em uma balança de 1 mg de precisão.

Calculamos a massa foliar específica ao dividir o peso seco pela área foliar desidratada.

Posteriormente, calculamos a média de cada atributo das cinco folhas, para obter os

23

valores médios de proporção de área de cobertura por epifilas, proporção área de consumo foliar e massa foliar específica para cada indivíduo.

Para testar a previsão de que a proporção de área de cobertura por epífilas se relaciona negativamente com a massa foliar específica em cada indivíduo, fizemos uma regressão linear simples. Consideramos a massa foliar específica média como variável resposta e a média da proporção da área de cobertura por epífilas como variável preditora. Para testar a previsão de que plantas com maior proporção da área de cobertura foliar por epífilas apresentam maior proporção de área com consumo foliar, fizemos uma correlação de Spearman.

Resultados

Não houve relação entre a média da proporção da área de cobertura por epífilas e a

2 media da massa foliar específica (R = 0,31; F(1,9) = 3,99; p = 0,08; Figura 1). Também não houve associação entre a média da proporção de consumo foliar e a média da proporção da área de cobertura por epifilas em cada indivíduo (N=10, Rs = 0,55; p =

0,10; Figura 2).

24

10 y = 6,4879 + 5,094*x

)

2 9

8

7

6

Massa Foliar Específica MassaMédia(mg/cm Foliar

5 0,12 0,14 0,16 0,18 0,20 0,22 0,24 0,26 0,28 0,30 0,32 0,34 0,36 0,38 Proporção Média de Área Coberta por Epífilas

Figura 1. Relação entre a massa foliar específica média (mg/cm2) e a proporção média da área de cobertura por epífilas em indivíduos da planta Duguetia cf. flagellaris localizados num fragmento florestal na Fazenda Dimona, Manaus, Brasil.

0,18

0,16

0,14

0,12

0,10

0,08

0,06

0,04

0,02

ProporçãoMédia dede ConsumoÁrea Foliar 0,00 0,12 0,14 0,16 0,18 0,20 0,22 0,24 0,26 0,28 0,30 0,32 0,34 0,36 0,38 Proporção Média de Área Coberta por Epífilas

Figura 2. Relação entre a proporção média de área com consumo foliar e proporção média da área de cobertura por epífilas em indivíduos da planta Duguetia cf. flagellaris localizados num fragmento florestal na Fazenda Dimona, Manaus, Brasil.

25

Discussão

O aumento da cobertura por epífilas não apresentou relação com a massa foliar específica, evidenciando que sombreamento foliar causado pelas epífilas não afeta a eficiência fotossintética das folhas do forófito. Além disso, maiores proporções de cobertura por epífilas não afetaram o consumo foliar, demonstrando que o sombreamento não torna as folhas mais suscetíveis a herbivoria.

Em florestas, a pouca quantidade de luz que atravessa o dossel constitui um fator limitante para o desenvolvimento de muitas plantas (Raven 1992). Assim, é possível que D. cf. flagellaris, por ser típica de sub-bosque, apresente adaptações a ambientes com essas restrições, como folhas grandes, taxa reduzida de troca foliar e ponto de compensação luminosa baixo (Schulze et al. 2002). Nessa situação, o sombreamento foliar causado pelas epífilas pode não ser suficiente para prejudicar as plantas.

Muito do que se conhece sobre a redução de luz no sub-bosque de floretas

úmidas está associado à captação de luz pelas plantas no dossel (Schulze et al. 2002).

No entanto, como a epifilia é comum no sub-bosque de florestas pluviais tropicais

(Zartman & Ilkou-Borges 2007), é possível que a ocorrência destes organismos sobre as folhas de plantas do sub-bosque constitua um componente historicamente relacionado à adaptação dessas plantas a baixa disponibilidade de luz. Consequentemente, a presença desses organismos sobre as folhas não afetaria negativamente seu metabolismo.

Agradecimentos

Agradecemos ao professor Márcio Zikán pela orientação ao longo de todo o projeto, ao

Sr. Leonardo por nos guiar em campo e encontrar os indivíduos de Duguetia cf. flagellaris, ao prof. Michael Hopkins por confirmar a identificação do objeto de estudo e, ao prof. Paulo Cardoso pelas valiosas contribuições na versão final deste manuscrito.

26

Referências

Berrie, G.K. & J.M.O. Eze. 1975. The relationship between an epiphyllous liverwort

and host leaves. Annals of Botany, 39:955-963.

Gentil, K.C.S. & C.R. Menezes. 2011. Levantamento de briófitas bioindicadoras de

perturbação ambiental do campus Marco Zero do Equador da UNIFAP. Biota

Amazônia, 1:63-73.

Jordan, C., F. Golley, & J. Hall. 1980. Nutrient scavenging of rainfall by the canopy of

the Amazonian rain forest. Biotropica, 12:61-66.

Larcher, W. 1986. Ecofisiologia vegetal. São Paulo: Editora Pedagógica Universitária.

Raven, P.H., R.F. Evert & S.E. Eichhorn. 1992. Biologia vegetal. Rio de Janeiro:

Guanabara Koogan.

Ribeiro, J.E.L.S, M.J.G. Hopkins, A. Vicentini, C.A. Sothers, M.A.S. Costa, J.M. Brito,

M.A.D. Souza, L.H.P. Martins, L.G. Lohmam, P.A.C.L. Assunção, E.C. Pereira,

C.F. Silva, M.R. Mesquita & L.C. Procópio. 1999. Flora da reserva Ducke: Guia

de identificação das plantas vasculares de uma floresta de terra firme na

Amazônia Central. Manaus: INPA.

Richards, P.W. 1996. The tropical rain forests. Cambridge: Cambridge University Press.

Schulze, E., E. Beck, K. Müller-Hohenstein. 2002. Plant ecology. Bayreuth: Springer.

Zartman, C.E. & A.L. Ilkou-Borges. 2007. Guia para as briófitas epífilas da Amazônia

Central. Manaus: INPA.

27

A riqueza de plantas aumenta a riqueza de herbívoros, mas não dos predadores

Renata Pimentel Rocha, Caroline Marques Dracxler, Leonardo Oliveira, Bruno

Travassos de Britto

Introdução

A riqueza de plantas é apontada como um importante determinante da diversidade (Langellotto & Denno 2004). O aumento no número de espécies de plantas pode contribuir para uma paisagem mais diversificada, com estruturas morfológicas variáveis para abrigar artrópodes e mais recursos alimentares para artrópodes herbívoros (Tews et al. 2004).

Para evitar o ataque por artrópodes herbívoros, as plantas utilizam mecanismos de defesa física ou química (Godfray et al. 1999, Novotny & Basset 2005). Tais mecanismos representam uma barreira contra herbivoria que irá selecionar somente os herbívoros capazes de se alimentar dessas plantas. Essa relação gera maior especialização tanto por parte das plantas quanto dos herbívoros (Jaenike 1990), o que leva a uma relação entre riqueza de plantas e dos herbívoros (Dinnage et al. 2006).

Artrópodes predadores, por sua vez, não se alimentam de plantas e por isso não são diretamente afetados pelo tipo de defesa das plantas. Esses artrópodes usam as plantas como abrigo, local para forrageio, oviposição e proteção. Esses tipos de uso estão relacionados com aspectos da arquitetura da planta, como quantidade e formato dos ramos e das folhas. Dessa forma, o aumento da riqueza de plantas pode ter efeito menos acentuado sobre os predadores, pois sua relação com as plantas não está ligada ao número de espécies e sim com a arquitetura da planta (Robinson, 1981).

Como riqueza de espécies de plantas pode estar associada de forma diferente com artrópodes herbívoros e predadores, nós investigamos se o aumento na riqueza de

28

plantas afeta de maneira distinta a riqueza de herbívoros e predadores. Esperamos que o aumento no número de plantas resulte em aumento na riqueza de artrópodes herbívoros com mais intensidade do que na riqueza de artrópodes predadores.

Métodos

Área de Estudo

Nós realizamos o estudo na fazenda Dimona, uma ARIE gerenciada pelo Projeto de

Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF), em conjunto com o ICMBio. A

área é localizada a 80 km a norte de Manaus, na Amazônia Central, Brasil (02°20’ N,

60°05’ O). A paisagem é composta por uma matriz de vegetação secundária contendo fragmentos de floresta do tipo tropical pluvial. A pluviosidade anual varia de 1900 a

2300 mm, com temperatura média de 26°C (Marques & Filho 1981).

Coleta de plantas e artrópodes

Coletamos os dados em dois ambientes distintos (interior de mata e capoeira) para aumentar variação na diversidade de plantas. Em cada ambiente, amostramos sete pontos, distantes 15 m entre si, ao longo de um transecto. Em cada ponto, amostramos sete arbustos com altura entre um e dois metros. Para selecionar os arbustos, sorteamos números de um a oito em um dado, correspondentes a oito direções distribuídas igualmente em 360°. O número sorteado corresponde à direção para escolha da primeira planta a ser amostrada. Os arbustos seguintes foram escolhidos por meio de novos sorteios da direção. Ensacamos e coletamos dois galhos de cada planta selecionada, nos quais realizamos 10 batimentos para coletar os artrópodes. Após a coleta dos insetos, as plantas foram identificadas ao nível de família por especialistas e em seguidas foram

29

morfotipadas. Em laboratório separamos artrópodes herbívoros e predadores através de características estruturais do aparato bucal e distinguimos os morfotipos.

Análise de Dados

Para testar o efeito da riqueza de plantas sobre a riqueza de herbívoros e predadores, usamos uma Análise de Variância (ANOVA). A variável dependente riqueza de predadores e herbívoros foi transformada para escala logarítmica para se ajustar à distribuição normal.

Resultados

Nós amostramos um total de 69 plantas distribuídas em 24 famílias, das quais

Violaceae, Annonaceae e Melastomataceae foram as mais representativas. A quantidade de morfoespécies de plantas variou entre 5 e 7 (Média = 6 ± 0,89) em cada ponto de amostragem. A riqueza de plantas aumentou com a riqueza de herbívoros (F(2, 7)= 11,22; p= 0,01; Figura 1), mas não com a riqueza dos predadores (F(2, 7)= 1,38; p= 0,31; Figura

2).

A intensidade da relação entre plantas e herbívoros foi diferente do que o observado entre plantas e predadores. O aumento no número de herbívoros em função da riqueza de plantas foi em média 0,45. Os predadores, por sua vez, tiveram aumento médio de 0,15 espécies à medida que a riqueza de plantas aumentou.

30

Figura 1. Relação entre a riqueza (morfotipos) de plantas e a riqueza de morfotipos de herbívoros em uma área na Amazônia Central. Quadrados representam médias e barras o desvio padrão.

Figura 2. Relação entre a riqueza (morfotipos) de plantas e a riqueza de morfotipos de predadores em uma área na Fazenda Dimona (80 km a norte de Manaus) - Amazônia

Central. Quadrados representam médias e barras o desvio padrão.

31

Discussão

Os resultados mostraram que o aumento da riqueza dos herbívoros foi relacionado com a riqueza das plantas. Isso indica uma especialização alimentar nos herbívoros, o que resulta em vínculo direto entre riqueza de plantas e herbívoros. A diversidade de predadores, por outro lado, não teve relação com a diversidade de plantas, o que indica que variações estruturais nas plantas e até mesmo a riqueza de herbívoros não afetaram a presença dos predadores nesses locais (Greenquist & Rovner 1976).

O aumento da riqueza na comunidade de plantas está relacionado com aumento da heterogeneidade de recursos alimentares, defesas químicas e físicas (Dinnage et al.

2012). Essa heterogeneidade leva ao aumento da riqueza de herbívoros, pois esses artrópodes tendem a se especializar no consumo de determinadas plantas (Jaenike

1990). A especialização dos herbívoros ocorre principalmente em resposta a defesas químicas da planta, uma vez que contornar essa proteção demanda grande especialização fisiológica para lidar com compostos químicos específicos (Mello &

Silva-Filho 2002). As estratégias contra defesas físicas, por outro lado, podem ser menos específicas, pois uma característica do herbívoro, como a presença de mandíbula forte para consumir uma folha, pode ser usada em diferentes espécies de plantas

(Crawley 1997).

A relação entre plantas e predadores se baseia, sobretudo, em características estruturais da planta. Diferentes espécies de plantas podem apresentar arquitetura semelhante e essa complexidade estrutural pode variar pouco entre espécies, principalmente entre plantas do mesmo gênero. Por isso as adaptações morfológicas dos artrópodes predadores podem ser menos especializadas e a capacidade de uso de recurso

é independente da riqueza de plantas.

32

Além disso, a diversidade de predadores pode ser mais relacionada com a riqueza dos herbívoros do que diretamente com a riqueza de plantas. Como predadores são generalistas, a quantidade de alimento disponível deve ser mais relevante do que a diversificação desse alimento. Dessa forma, é possível que o aumento na riqueza de herbívoros também aumente sua abundância, o que poderia levar a um aumento na abundância de predadores. Essa relação da quantidade de herbívoros com a dos predadores pode ser mais comum em ambientes com alta diversidade de plantas, onde a riqueza de plantas e, consequentemente, dos herbívoros é alta.

Referências

Balvanera P. & E. Aguirre. 2006. Tree diversity, environmental heterogeneity, and

productivity in a Mexican tropical dry forest. Biotropica, 38:479-491

Crawley, M.J. 1997. Plant ecology. Oxford: Blackwell publishing

Dinnage, R., M.W. Cadotte, N.M. Haddad, G.M. Crutsinger & D. Tilman. 2012.

Diversity of plant evolutionary lineages promotes diversity. Ecology

Letters, 15:1308-1317.

Downes, B. J., P. S. Lake, E. S. G. Schreiber & A. Glaister. 1998. Habitat structure and

regulation of local species diversity in a stony, upland stream. Ecological

Monographs, 68:237-257.

Godfray, H.C.J., O. T. Lewis & J. Memmott. 2005. Studying insect diversity in the

tropics. Philosophical Transaction of Royal Society of London B, 354:1811-1824.

Halaj, J., D. W. Ross & A. R. Moldenke. 2000. Importance of habitat structure to the

arthropod food-web in Douglas-Fir Canopies. Oikos, 90:139-152.

Jaenike, J. 1990. Host specialization in phytophagous insects. Annual Review of

Ecology, Evolution and Systematics, 21:243-273

33

Langellotto, G.A. & R.F. Denno. 2004. Responses of invertebrate natural enemies to

complex-structured habitats: a meta-analytical synthesis. Oecologia, 139:1-10.

Marques-Filho, A. O., Ribeiro, M. N. G., Santos, H. M., Santos J. M. (1981) Estudos

climatológicos da Reserva Florestal Ducke – Manaus-AM. Acta

Amazonica,11:759-768.

Mello, M.O. & M.C. Silva-Filho. 2002. Plant-insect interactions: an evolutionary arms

race between two distinct defense mechanisms. Brazilian Journal of Plant

Physiology, 14:71-81.

Novotny V. & Y. Basset. 2005. Host specificity of insect herbivores in tropical forests.

Proceedings of The Royal Society B, 272:1083-1090

Ødegaard, F., O.H. Diserud & K. Østbye. 2005. The importance of plant relatedness for

host utilization among phytophagous insects. Ecology Letters, 8:612-617.

Robinson, J. V. 1981. The effect of architectural variation in habitat on a

community: an experimental field study. Ecology, 63: 73-80

Romero, G.Q. & J. Vasconcellos-Neto. 2005. The effects of plant structure on the

spatial and microspatial distribution of a bromeliad-living jumping spider

(Salticidae). Journal of Animal Ecology, 74:12-21.

Scherber, C., N. Eisenhauer, W.W. Weisser, B. Schmid, W. Voigt & M. Fischer. 2010.

Bottom-up effects of plant diversity on multitrophic interactions in a biodiversity

experiment. Nature, 468:553-556.

Tews, J., U. Brose, V. Grimm, K. Tielbörger, M.C. Wichmann, M. Schwager & F.

Jeltsch. 2004. Animal species diversity driven by habitat heterogeneity/diversity: the

importance of keystone structures. Journal of Biogeography, 31:79-92.

Weiblen, G.D., C.O. Webb, V. Novotny, Y. Basset, & S.E. Miller. 2006. Phylogenetic

dispersion of host use in a tropical insect herbivore community. Ecology, 87:62-75.

34

Espécies de animais aquáticos e semiaquáticos se distribuem entre poças

temporárias independentemente da qualidade do habitat

Mariana Velasque, Ana Claudia Rorato, Ludmila Rattis, Randolpho Gonçalves Dias

Terceiro

Introdução

A qualidade do habitat pode ser entendida como a soma das condições ambientais

(bióticas e abióticas) e dos recursos que estão disponíveis para os organismos que vivem em um determinado local (Begon et al. 2006). Perturbações naturais ou de origem antrópica podem promover a deterioração dessas condições e recursos, tornando o habitat menos favorável para algumas espécies. Como resultado, espécies menos tolerantes poderão ser as primeiras a ser extintas localmente (Atmar & Patterson 1993;

Duffy 2003). Assim, habitats de menor qualidade devem comportar número menor de espécies, que correspondem a um subconjunto previsível de espécies altamente tolerantes que também são encontradas em habitats de maior qualidade (Patterson &

Atmar 1986; Ulrich & Gotelli 2007; Jacquemyn et al. 2007). Essa perda ordenada de espécies em comunidades, associada à deterioração da qualidade do habitat, produz um padrão conhecido como aninhamento (Atmar & Patterson 1993; Lomolino 1996).

Poças temporárias formadas pelo acúmulo de água no interior de florestas tropicais podem ser exemplos de habitats que sofrem deterioração gradual de qualidade

(Espírito-Santo et al. 2009). A formação dessas poças ocorre devido ao alagamento de

áreas adjacentes ao leito de riachos em decorrência da alta pluviosidade. Ao cessar o alagamento, formam-se poças temporárias em pontos do solo com concavidade acentuada, que são ocupadas por uma série de organismos aquáticos e semi-aquáticos

(Rodríguez & Lewis 1997). O volume de água nas poças pode ser interpretado como um

35

indicador da qualidade do habitat, pois determina as condições e recursos disponíveis para os organismos que as habitam (Ceotto et al. 2001). Poças com volume menor provavelmente possuem condições abióticas mais instáveis, com propriedades físicas e químicas alterando-se mais rapidamente que poças com volume maior. Adicionalmente, poças menores podem apresentar menor quantidade de recursos como a própria água, matéria orgânica particulada e alterações nas condições como oxigênio dissolvido, aumento temperatura e redução do pH.

Na floresta amazônica é comum a formação de poças temporárias próximas a riachos de primeira ordem conhecidos localmente como igarapés. Essas poças são ocupadas por uma série de espécies com diferentes graus de dependência da água

(Espírito-Santo et al. 2009). Portanto, elas constituem um sistema ideal para investigar o padrão de composição de espécies em diferentes condições de qualidade de habitat.

Nossa hipótese é que as espécies de animais encontradas nas poças de menor qualidade constituem subconjuntos das espécies de animais presentes em poças de maior qualidade.

Métodos

Área de estudo

Realizamos o estudo ao longo de um riacho de cerca de 3 m de largura que cruza uma

área de capoeira presente na Fazenda Dimona (ARIE Projeto Dinâmica Biológica de

Fragmentos Florestais), localizada a cerca de 80 km ao norte de Manaus, Amazonas,

Brasil (2°25’ S, 59°50’ O). Durante chuvas intensas, o nível de água do riacho sobe e as pequenas depressões do entorno são alagadas. Logo após a chuva, o nível do riacho abaixa e a água retida nessas depressões dá origem a pequenas poças temporárias que

36

contém organismos aquáticos e semiaquáticos, tais como pequenos peixes, anuros e pequenos artrópodes.

Estimativa da qualidade do habitat

Usamos o volume de água presente nas poças como um indicador de qualidade de habitat. Porém, escolhemos poças estruturalmente semelhantes em área para controlarmos o efeito do tamanho sobre a riqueza de espécies. Em cada poça, medimos o comprimento e a largura como os pontos mais distantes nas bordas ao longo dos eixos longitudinal e transversal. Calculamos a profundidade média a partir de cinco medidas tomadas em pontos arbitrários ao longo da poça. Multiplicamos as medidas das três dimensões para estimar o volume (Figura 1).

Figura 1. Método de mensuração das dimensões das poças temporárias ao redor de um riacho na floresta amazônica. As setas contínuas apontam os pontos mais distantes ao longo dos eixos transversal e longitudinal. As setas pontilhadas representam locais hipotéticos de medida de profundidade da poça com os quais se obteve a profundidade média.

37

Riqueza e composição das comunidades animais

Coletamos indivíduos macroscópicos de espécies aquáticas e semiaquáticas por toda a coluna d’água até a camada mais superficial do sedimento com o uso de uma peneira de malha de 3 mm2. Triamos folhas, galhos, sedimentos e organismos em laboratório e, em seguida, separamos os indivíduos encontrados em morfoespécies. Utilizamos o número de morfoespécies presente nas poças temporárias como medida de riqueza.

Análise dos dados

Para testar se as espécies nas poças com menor volume de água compunham subconjuntos das espécies em poças com maior volume, construímos uma matriz de presença/ausência de espécies (linhas) por poças (colunas) arranjadas em ordem decrescente de volume. Calculamos o grau de aninhamento observado a partir da matriz de presença/ausência de morfoespécies por poça usando a métrica NODF (um acrônimo para Nestedness metric based on Overlap and Decreasing Fill; Almeida-Neto et al

2008). Fizemos as análises no programa Aninhado versão 3.0 Bangu (Guimarães &

Guimarães 2006).

Resultados

Identificamos 18 morfoespécies distribuídas em 13 ordens, sendo Coleoptera a ordem mais abundante (Figura 2). O volume das poças variou de 0,084 m3 a 0,549 m3, com média ± DP de 0,306 ± 0,169 m3. A composição de morfoespécies não foi influenciada pelo volume das poças, pois poças de menor volume de água não representaram um subconjunto das espécies das poças de maior volume (NODF = 13,14; p = 0,117).

38

Espécies

Peixe 1 Peixe 2

Blatodea

Crustaceo 1 Crustaceo 2 Crustaceo 3

Coleoptera 1 Coleoptera 2 Coleoptera 3 Coleoptera 4 Coleoptera 5 Coleoptera 6

Pipa carvalhoi

Chironomidae

Larva de 1 inseto Larva de 2 inseto Larva de 3 inseto Larva de 4 inseto

1 (0,549 m³) 2 (0,446 m³)

Poças 3 (0,430 m³) 4 (0,363 m³) 5 (0,271 m³) 6 (0,205 m³) 7 (0,100 m³) 8 (0,084 m³)

Figura 2. Matriz de presença-ausência de animais macroscópicos em poças temporárias ao longo de um igarapé na Amazônia Central. As linhas representam as poças, dispostas em ordem decrescente de volume e as colunas representam as espécies. Células marcadas de preto representam presença das espécies nas poças, células em branco a ausência. Marcações em negrito indicam as morfoespécies estritamente aquáticas.

Discussão

O padrão de composição das espécies encontrado não indica uma perda ordenada de espécies entre as poças em função do volume de água. Consequentemente, é possível que as mudanças nas características físico-químicas associadas à degradação das poças não afetem grupos específicos de espécies que abandonariam gradualmente os locais com condições mais adversas.

Dois terços das morfoespécies encontradas possui capacidade de deslocamento entre poças. Consequentemente, é possível que eles transitem recorrentemente entre as poças, evitando que um padrão aninhado seja formado. Vieira (2010) demonstrou que

39

uma espécie de peixe que ocorre nesse sistema abandona as poças em função da presença de predadores. Nesse sentido, é possível que os organismos transitem entre as poças em função de interações bióticas como predação ou competição.

Em um estudo conduzido no mesmo local, Souza et al. (2005) encontraram um padrão aninhado entre as comunidades das poças localizadas a diferentes distancias do riacho. Uma vez que a distancia pode determinar o acesso dos organismos a área fonte de espécies, talvez a comunidade responda mais a esse fator do que a variações de qualidade. De fato, em outro trabalho envolvendo o efeito de degradação de poças em sistemas inundáveis, nenhum padrão de aninhamento foi encontrado (Zatz et al. 2008).

Por fim, ainda é possível que o efeito da degradação varie de acordo com o grupo de organismos. Souza et al. (2005) encontraram principalmente espécies de vertebrados, enquanto nós encontramos predominância de insetos. Eventualmente, por apresentarem um ciclo de vida mais curto, os insetos podem ser menos dependentes da degradação das poças quando comparados aos vertebrados que podem depender da qualidade local durante toda a vida.

Agradecimentos

Gostaríamos de agradecer à Esther Sebastián e ao monitor barbudo Marcos Costa Vieira pela orientação e ajuda em campo. Aos coordenadores Paulo Estefano e Paulo Enrique pela ajuda na triagem e orientação, ao Leo Marajó pela ajuda em campo, ao Glauco por revisar esse trabalho 23 vezes e ao Paulo Enrique, por tirar leite de pedra.

40

Referências

Almeida M.N., P. Guimarães, P.R. Guimarães, R.D. Loyola & W. Ulrich. 2008. A

consistent metric for nestedness analysis in ecological systems: reconciling

concept and measurement. Oikos, 117:1227-1239.

Atmar, W. & B.D. Patterson. 1993. The measure of order and disorder in the

distribution of species in fragmented habitat. Oecologia, 96:373-382.

Begon, M.; C.R. Townsend & J.L. Harper. 2006. Ecology: From Individuals to

ecosystems. Blackwell Publishing: Oxford.

Ceotto, P.C.; A.M.F. Pacheco; L.M. Scoss; M. Camargo & P.S. Pinheiro. 2001. Efeito

do isolamento em poças sobre a estrutura da comunidade de macroinvertebrados

bentônicos no arquipélago das Anavilhanas, AM. Em: Livro do curso de campo

“Ecologia da Floresta Amazônica” (E. Venticinque & J. Zuanon, eds.).

PDBFF/INPA, Manaus.

Duffy, J.E. 2003. Biodiversity loss, trophic skew and ecosystem functioning. Ecology

Letters, 6:680–687.

Guimarães, P.R. & P. Guimarães. 2006. Improving the analyses of nestedness for large

sets of matrices. Environmental Modelling and Software, 21:1512-1513.

Espírito-Santo, H. M. V.; Magnusson, W. E.; Zuanon, J.; F. P. Mendonça & V. Lemes

2009. Seasonal variation in the composition of fish assemblages in small

Amazonian forest streams: evidence for predictable changes. Freshwater

Biology, 54:536–548.

Jacquemyn, H., O. Honnay & T. Pailler. 2007. Range size variation, nestedness and

species turnover of orchid species along an altitudinal gradient on Reunion

Island: implications for conservation. Biological Conservation, 136:388-397.

41

Lomolino, M.V. 1996. Investigating causality of nested-ness of insular communities:

selective immigrations or extinctions? Journal of Biogeography, 23:699–703.

Patterson, B.D. & W. Atmar 1986. Nested subsets and the structure of insular

mammalian faunas and archipelagos. Biological Journal of the Linnean Society,

28:65-82.

Rodríguez, M.A. & W.M. Jr Lewis. 1997. Structure of fish assemblages along

environmental gradients in floodplain lakes of the Orinoco River. Ecological

Monographs, 67:109–128.

Souza, A.C., D.P. Lima-Junior, G. Schussler, V.T.Cardoso, W.R. Almeida. 2005. Existe

uma sequência na perda de espécies em poças temporárias? In: Livro do curso de

campo “Ecologia da Floresta Amazônica” (Machado G. & H.Nascimento EDS)

PDBFF/INP:Manaus

Ulrich, W. & N.J. Gotelli. 2007a. Null model analysis of species nestedness patterns.

Ecology, 88:1824-1831.

Vieira, C. Sinais químicos de predadoresinterferem na permanência de R. compressus

(Cyprindontiformes: Rivulidae) em poças. In: Livro do curso de campo

“Ecologia da Floresta Amazônica” (Peixoto, P.E.C. & P.E.D. Bobrowiec EDS)

PDBFF/INP:Manaus

Zatz, C., A. Miranda, B. Azambuja, C. Cordeiro & G. Sinimbu. 2008. A estrutura física

de poças marginais influencia a estrutura da comunidade de macroinvertebrados

aquáticos? In: Livro do curso de campo “Ecologia da Floresta Amazônica”

(Machado, G. & J.L.C. Camargo EDS.) PDBFF/INP:Manaus

42

O tamanho da domácia foliar determina sua ocupação por ácaros?

Tatiane Gomes Calaça Menezes, Daniela Pinto Coelho, Lorena Costa Pinto e Artur

Alcantara Madeira

Introdução

Seleção de habitat é uma escolha feita pelos organismos por características específicas do ambiente (Morris 1992). Tem como objetivo minimizar efeitos prejudiciais e/ou maximizar ganhos para os indivíduos (Morin 2011). Em geral, os ganhos são determinados pela disponibilidade de alimento e de parceiros reprodutivos, enquanto os efeitos negativos estão relacionados ao risco de predação enquanto forrageiam (Sih

1980, Morin 2011).

Os organismos podem usar diferentes tipos de informações para selecionar um habitat. Por exemplo, a rã Hyla chrysoscelis deposita diferentes quantidades de ovos no substrato, de acordo a presença de predadores e competidores que habitam o local

(Resetarits & Wilbur, 1989). Já os crustáceos anfípodes selecionam as macroalgas marinhas que habitam através de características como, por exemplo, a coloração da alga que lhe permita ser críptico, diminuindo o risco de predação (Hacker & Steneck 1990).

Um problema inerente a estudos de seleção de habitat em sistemas naturais é o excesso de correlações entre os fatores que podem determinar a escolha de habitats. Tais correlações dificultam a identificação da característica que de fato é selecionada pelo organismo (e.g. Resetarits & Wilbur, 1989). Por exemplo, no estudo com H. chrysoscelis várias espécies de predadores e competidores podem estar ocorrendo no mesmo ambiente, tornando difícil separar o efeito de cada espécie sobre a escolha do local de oviposição pela rã. Nesse sentido, a busca por abordagens in situ que sofram pouco efeito de confundimento entre variáveis podem ser esclarecedoras.

43

Plantas com domácias foliares habitadas por ácaros representam um sistema natural particularmente interessante para remover efeitos de correlações espúrias entre características do ambiente e a seleção de habitat por animais. Domácias são estruturas localizadas nas axilas das nervuras das folhas formadas por uma cavidade ou tufo de pelos que servem como local de refúgio e reprodução para ácaros (Norton et al. 2000).

Nesse contexto, em uma mesma folha o tamanho da domácia é um dos poucos atributos que varia consideravelmente ao longo do substrato relativamente uniforme da folha.

Portanto, folhas podem representar um sistema que permite avaliar com mais clareza como uma característica específica pode determinar a seleção de habitat em um sistema natural.

O tamanho da domácia pode determinar sua qualidade para os ácaros. Domácias maiores apresentam maior número e adensamento de pelos, o que pode aumentar a segurança do refúgio. Nesse trabalho objetivamos responder qual o efeito do tamanho da domácia na ocupação por ácaros. Nossa hipótese é que o tamanho da domácia é positivamente relacionado à sua probabilidade de ocupação por ácaros. Desse modo, esperamos que domácias de maior área sejam mais ocupadas por ácaros em relação às domácias de menor área.

Métodos

Área de estudo

Realizamos o estudo em uma floresta secundária localizada na fazenda Dimona (02° 20’

S – 60º 06’ O), a aproximadamente 90 Km ao norte da cidade de Manaus, Brasil

(Bierregaard & Gascon 2001). Usamos como modelo de estudo a planta Buchenavia tomentosa (Combretaceae), que apresenta domácias formadas por tufos de tricomas,

44

localizados na interseção da venação principal com as veias secundárias da face abaxial das folhas (Ribeiro et al. 1999).

Coleta e análise dos dados

Coletamos 10 folhas de diferentes ramos de dois indivíduos de B. tomentosa. No laboratório, fotografamos as domácias situadas no lado esquerdo da venação principal da folha, utilizando uma régua como escala métrica. A partir dessas fotografias, calculamos a área de cada domácia utilizando o programa Image Tool.

Após fotografar as folhas, usamos uma lupa para vistoriar todas as domácias a procura de ácaros ou indícios de sua ocupação (ovos ou detritos). Classificamos os

ácaros encontrados em morfo-espécies de acordo com o formato e coloração de seus corpos. Para testar a relação entre a área da domácia e a presença de ácaros, utilizamos uma regressão logística. Consideramos a área da domácia como variável preditora e a presença de ácaros como variável resposta.

Resultados

Encontramos 83 domácias, com média de 8,3 ± 0,48 (média ± desvio padrão) domácias por folha. Registramos ácaros ou indícios de sua ocupação em 49 domácias (59%).

Identificamos quatro morfo-espécies de ácaros, sendo que todas tinham tamanhos visualmente similares entre si. Duas ou três morfo-espécies co-ocorreram em 25% das folhas. No entanto, a ocupação por ácaros não esteve associada à área foliar (χ2 = 0,725; gl = 1; p = 0,394, Figura 1).

45

Figura 1. Ocorrência de ácaros em relação à área das domácias foliares de Buchenavia tomentosa na Amazônia Central, Brasil. O valor 0 representa a ausência e o valor 1 indica presença de ácaros na domácia.

Discussão

O tamanho da domácia não foi utilizado como critério de seleção do habitat pelos

ácaros. Uma vez que diferentes morfo-espécies foram encontradas nas domácias, esse efeito pode ser geral ou pode ser diferente entre as espécies e quando se analisa todo o conjunto de espécies o padrão pode não ser detectado. Consequentemente, considerando a comunidade de ácaros é provável que domácias maiores não confiram maior proteção.

Ácaros fitófagos e predadores co-ocorrem em folhas de plantas com domácias

(Walter & O’dowd 1992). Como todas as morfo-espécies ocuparam as domácias independente do seu tamanho, a escolha das domácias pelos ácaros pode depender da dinâmica entre predador e presa estabelecida no âmbito da folha. Nesse contexto, ácaros fitófagos eventualmente evitam domácias ocupadas por seus predadores, enquanto os

ácaros predadores podem selecionar locais onde suas presas ocorram. Por outro lado, se

46

não existe uma relação com os ácaros predadores, o mesmo não pode ser dito para seus ovos. Sabe-se que os ovos dos ácaros predadores são mais sensíveis à dessecação que

ácaros fitófagos (Agrawal 1997). Esses ovos podem ser em parte beneficiados pelo microclima no interior da domácia. Logo uma associação entre deposição dos ovos e tamanho da domácia poderia ser encontrada. O adulto por sua vez, não ocorreria preferencialmente associado a domácias grandes por não sofrer esse efeito da dessecação como ocorre nos ovos.

Se o tamanho da domácia não está associado a nenhum benefício específico para os ácaros e as demais características da folha são relativamente homogêneas, os ácaros podem se distribuir homogeneamente pela folha, proporcionando o mesmo nível de defesa ao longo de todo o limbo foliar. Logo, a variação do tamanho da domácia não deve ser resultado de benefícios associados à atração dos ácaros para regiões específicas da folha, mas deve ser um padrão resultante do acaso.

Agradecimentos

Ao Michael Hopkins pela orientação e vivência do tema e ao Paulo Enrique pela valiosa contribuição no desenho experimental, coleta e análise dos dados.

Referências

Agrawal, A.A. 1997. Do leaf domatia mediate a plant-mite mutualism? An experimental

test of the efects on predators and herbivores. Ecological entomology, 22:371-376.

Bierregaard, R.O. & C. Gascon. 2001. The Biological Dynamics of Forest Fragments

Project: overview and history of a long-term conservation project, pp. 5–12. In:

Lessons from Amazonia: the ecology and conservation of a fragmented forest

47

(Bierregaard, R.O., T. Gascon, T.E. Lovejoy & R. Mesquita, eds). New Haven: Yale

University Press.

Hacker, S.D. & R.S. Steneck. 1990. Habitat architecture and the abundance and body-

size-dependent habitat selection of a phytal amphipod. Ecology, 71:2269-2285.

Morin, P. 2011. Community ecology. 2ª ed. West Sussex: Wiley-Blackwell.

Morris, D.W. 1992. The role of habitat selection in landscape ecology. Evolutionary

Ecology, 6:357-359.

Norton A.P., G. English-Loeb, D. Gadoury & R.C. Seem. 2000. Mycophagous mites

and foliar pathogens: leaf domatia mediate tritrophic interactions in grapes. Ecology,

81:490–499.

Resetarits, W.J. & H.M, Wilbur. 1989. Choice of oviposition site by Hyla chrysoscelis:

role of predators and competitors. Ecology, 70:220-228.

Ribeiro, J.E.L.S. & N. Marquete. 1999. Combretaceae, pp.459-461. In: Flora da

Reserva Ducke: guia de identificação das plantas vasculares de uma floresta de terra

firme na Amazônia Central (Ribeiro, J.E.L., M.J.G. Hopkins, A.Vincentini,

C.A.Sothers, M.A. da S. Costa, J.M. de Brito, M.A.D. de Souza, L.H.P. Martins,

L.G. Lohmann, P.A.C.L. Assunção, E.C. Pereira, C.F. da Silva, M.R. Mesquita &

L.C. Procópio, eds.). Manaus: INPA.

Rosenzweig, M.L. 1981. A theory of habitat selection. Ecology, 62:327-335.

Sih, A. 1980. Optimal behavior: can foragers balance two confliting demands? Science,

210:1041-1043.

Walter, D.E. & D.J. O’Dowd. 1992. Leaf morphology and predators: effect of leaf

domatia on the abundance of predatory mites (Acari: Phytoseiidae). Environmental

Entomology, 21:478-484.

48

Dimona – projetos livres

Alocação diferencial de recurso em Vismia guianensis (Clusiaceae) associada a

condições de luminosidade

Randolpho Gonçalves Dias Terceiro, José Hidasi Neto, Sarah Freitas, Lorena Costa

Pinto

A teoria da proporção de recursos prediz que diferentes condições de luminosidade determinam uma alocação diferencial de recursos em espécies vegetais. Em florestas tropicais, as bordas florestais têm incidência luminosa maior que no interior do sub- bosque. Assim, investigamos a existência de alocação diferencial de recursos nesses dois ambientes por uma planta pioneira. Nossa hipótese é que, em ambientes sombreados, uma espécie pioneira investe em folhas de menor qualidade, porém mais eficientes na captação de luz, enquanto, em ambientes abertos, o investimento é em folhas de maior qualidade. Para isso, comparamos a massa foliar específica (MFE) de

20 indivíduos de Vismia guianensis, sendo 10 indivíduos em uma borda de fragmento florestal e 10 no sub-bosque de uma floresta secundária. A MFE foi 63% maior em indivíduos em áreas abertas (média=0,019±0,004 g/cm2) que em indivíduos em áreas fechadas (média=0,011±0,003 g/cm2 ) (F=1,586; p<0,001; gl=18). Nossos resultados corroboram a hipótese que a planta é capaz de investir recursos de forma diferenciada dependendo das condições de luminosidade. Em ambientes sombreados, o recurso é limitado e a planta parece investir preferencialmente em folhas mais eficientes para a captação de luz, o que poderia resultar em um aumento no crescimento vertical. Em contrapartida, o alto investimento em folhas de maior qualidade em plantas da área de

49

borda, possivelmente, está relacionado a estratégias contra a perda de água, uma vez que, na borda, a água é um recurso mais limitante que luz.

50

Distribuição espacial em Selaginella amazonica (Selaginellaceae) em função da

umidade

Leonardo Queiroz de Oliveira, Bianca Ferreira da Silva, Mariana Velasque &

Joselândio Corrêa Santos

Indivíduos que ocupam locais com alta disponibilidade de recursos podem investir menos em dispersão a longas distâncias, pois já ocupam locais com boas condições de desenvolvimento. Em plantas com capacidade de reprodução clonal, como pteridófitas, a redução do investimento em dispersão por propágulos pode possibilitar o aumento na reprodução vegetativa, gerando uma agregação de plantas ao redor da planta mãe. Na

Amazônia Central, pteridófitas ocorrem em áreas de baixio e platô. Essas áreas apresentam diferenças de umidade, com áreas de baixio sendo mais úmida que áreas de platô. Dessa forma, nossa hipótese e que o padrão de distribuição espacial da pteridófita

Selaginella amazonica será mais agregado em áreas mais úmidas. Em cada área construímos cinco parcelas de 10 m entre si. Em cada parcela, medimos a distância de cada planta ao seu vizinho mais próximo de S. amazonica. Se a nossa hipótese for verdadeira, esperamos que a distância média entre os indivíduos de S. amazonica seja menor nos baixios e maior em áreas de platô. O padrão de distribuição de S. amazonica foi similar entre as áreas (t = 1,61; gl = 8; p = 0,14). Isso indica que a planta investe nas duas formas de reprodução em qualquer local. Talvez isso funcione como uma estratégia de espalhamento de risco que assegure prole com alta chance de sobrevivência próxima da planta mãe, mas que garanta descendentes em áreas distantes que não sofreriam efeitos prejudiciais imprevisíveis próximos das agregações de onde eles partiram.

51

O investimento em reprodução não diminui o investimento em defesa em Miconia

dispar (Melastomataceae)

Daniela Coelho, Ludmila Rattis, Tatiane Menezes & Cibele Paiva

Os organismos dispõem de quantidade limitada de energia de modo que, aumentar o investimento em uma atividade requer a diminuição do investimento em outra. O deslocamento de recursos para uma atividade onerosa como a reprodução poderia levar a uma demanda conflitante entre reprodução e defesa em plantas, o que implicaria em maior susceptibilidade aos herbívoros. Observamos indivíduos da planta Miconia dispar com ramos reprodutivos e vegetativos que exibiam sinais de herbivoria e nos perguntamos se haveria uma demanda conflitante entre defesa e reprodução. Nossa hipótese é de que ramos reprodutivos seriam mais suscetíveis à herbivoria que ramos vegetativos. Para avaliá-la coletamos dois ramos adjacentes com e sem infrutescência de

17 indivíduos. Previmos que a intensidade de herbivoria seria maior nos ramos reprodutivos. Em cada ramo, estimamos a intensidade de herbivoria das folhas usando um índice de seis categorias: 0%; 1 – 6%; 6 -12%; 12 – 25%; 25 – 50% e 50 – 100% de dano foliar. A intensidade de herbivoria entre ramos reprodutivos (média ± dp:

1,9±0,70) e vegetativos (1,6±0,65) foi semelhante (t=1,50; gl=16 p=0,15). Isso indica que o investimento em reprodução não leva a uma diminuição do investimento em defesa. A estratégia de vida de uma espécie pioneira como Miconia dispar implica em investimento preferencial em reprodução e crescimento, dado que seu ciclo de vida é curto. Consequentemente, investir em defesa pode não ser muito importante. Nesse caso, a demanda conflitante não deveria ocorrer.

52

Por que o hemíptero Jalisus ossae (Reduviidae) não desencadeia resposta defensiva

da formiga Pheidole minutula em Maieta poeppigii (Melastomataceae)?

Ana Carolina Vieira Pires, Ana Claudia Rorato Vitor, Caroline Marques Dracxler e

Daniel Passos

A planta mirmecófita Maieta poeppigii apresenta mutualismo com formigas Pheidole minutula. As formigas nidificam nas domáceas foliares e atacam diversos organismos em resposta ao estímulo mecânico provocado pelo pouso deles sobre a planta. Contudo, indivíduos do hemíptero Jalisus ossae que habitam essas plantas não são atacados pelas formigas. Para entender esse fato, propomos a hipótese de que o hemíptero não provoca estímulo mecânico suficiente para desencadear resposta defensiva. Simulamos pousos de organismos de diferentes tamanhos sobre a folha de 16 indivíduos de M. poeppigii, utilizando objetos de mesma densidade com 3, 5, 10 e 15 mm de comprimento, além dos próprios hemípteros. Contamos as formigas sobre a folha e trinta segundos após a soltura dos objetos, contabilizamos o recrutamento adicional, esperando que houvesse aumento na mobilização das formigas com o aumento do tamanho do objeto.

Analisamos as diferenças no recrutamento entre os tratamentos usando GLM com distribuição de erros Poisson e análise de contraste, considerando cada planta como bloco. A quantidade de formigas mobilizadas foi afetada pelo comprimento do objeto

2 (χ (4,60)=97,31; p=0,013), indicando maior recrutamento de formigas em estímulos mecânicos maiores. Os tratamentos com hemípteros e objetos de 3 e 5 mm

2 desencadearam respostas defensivas menores que 10 e 15 mm (χ (1,78)=103,42; p=0,011). Isso indica que existe um limiar entre 6 e 9 mm que desperta maior recrutamento de formigas. Por desencadear resposta similar aos objetos de 3 e 5 mm,

53

sugerimos que o impacto do pouso do hemíptero não é suficiente para ser detectado pelas formigas em M. poeppigii.

54

Recrutamento de formigas na mirmecófita Hirtella sp.: estudo em plantas com

diferentes níveis de estresse

Bruno Travassos, Artur Madeira, Vidal Carrascosa, Renata Rocha

Interações de formigas com plantas mirmecófitas é um mutualismo em que os insetos beneficiam-se do abrigo e área de forrageio, enquanto a planta é protegida contra herbívoros. Nesse sistema, plantas debilitadas atraem menos herbívoros, que representa menos alimento para a colônia de formigas. Dessa forma, pode haver recrutamento mais intenso de formigas diante da presença de um herbívoro, fazendo com que plantas sob maior estresse sejam, indiretamente, mais protegidas pelas formigas. Nosso objetivo foi avaliar se a resposta anti-herbivoria das formigas em Hirtella sp. (Chrysobalanaceae) aumenta em relação ao nível de estresse da planta. Acreditamos que mais formigas serão recrutadas em plantas mais debilitadas (menor Massa Foliar Específica-MFE).

Selecionamos 17 plantas na fazenda Dimona, ARIE PDBFF, Amazônia Central. Em cada planta escolhemos uma folha com pelo menos uma formiga para que ela recrutasse mais formigas após dano foliar. Para medir intensidade de reação das formigas, contamos o número de formigas recrutadas quatro minutos após cortarmos um pedaço da folha. Medimos MFE para indicar estresse das plantas. A quantidade de formigas recrutadas após o dano variou entre 0 e 25 (Média ±DP=9,8±7) e não foi associada à

2 MFE (F(1,15)=3,05, p=0,1), que variou entre 3,4 e 9 mg/cm (Média±DP=5,6±1,4).

Estudos indicam que herbivoria mais intensa causa maior recrutamento de formigas para defender a planta. Como nossa simulação de herbivoria teve intensidade igual, a resposta das formigas não diferiu. O recrutamento de formigas provavelmente evoluiu em resposta à intensidade do dano causado por herbívoros e não pela condição ou qualidade da planta hospedeira.

55

Várzea – projetos orientados

A seleção de habitats por cupins em áreas alagadas não visa redução dos custos de

deslocamento até o solo

Sarah Freitas Magalhães, Caroline Marques Dracxler, Renata Pimentel Rocha e

Randolpho Dias Terceiro

Introdução

As estratégias para obtenção de alimento envolvem custos para os animais em termos de tempo e energia. Segundo a teoria de forrageamento ótimo, como diferentes espécies têm habilidades distintas na captação de recursos, a seleção natural deveria favorecer estratégias que maximizem o ganho energético e reduzam os custos associados à sua obtenção (MacArthur & Pianka 1966). Assim, reduzir o tempo de busca pelo alimento e concentrar esforços em recursos de maior qualidade eleva o lucro energético

(MacArthur & Pianka 1966).

Os fatores que determinam os lucros e os custos para o organismo, em geral dependem da sua estratégia de forrageio. Forrageadores de área central, por exemplo, possuem um local fixo como refúgio, de onde saem para buscar alimento e para onde retornam depois do forrageio (Chase 1998). Sendo assim, quanto maior a distância do local de forrageio até o refúgio central, maior deve ser a exposição a predadores e o gasto energético associado ao deslocamento (Chase 1998).

Cupins são um exemplo de organismos que forrageiam a partir de uma área central, pois constroem seus ninhos como refúgio e usam túneis para acessar o recurso nas proximidades (Araújo et al. 2011). Nas áreas alagáveis da Floresta Amazônica

56

existem diversos cupins arborícolas que constroem seus ninhos em troncos próximos ao dossel e descem para forragear na serapilheira. Como essas áreas são periodicamente inundáveis, os ninhos de cupins ficam sujeitos ao risco de submersão. Assim, selecionar

áreas de construção do ninho acima do nível atingido pela inundação pode ser vital para a sobrevivência da colônia. Porém, se os ninhos forem construídos muito acima do nível máximo de inundação, o gasto energético para forragear no solo após a vazante também deverá ser grande.

Dentro das regiões alagadas é comum que existam áreas com diferentes elevações em relação ao nível da água. Como as áreas topograficamente mais altas possuem menor altura do nível da água em relação ao solo, os cupins que estabelecerem suas colônias nesses locais, poderiam minimizar a distância do ninho até a serapilheira.

Portanto, nossa hipótese é de que os cupins constroem seus ninhos em árvores de forma a reduzir o risco de inundação e, ao mesmo tempo, minimizar o gasto energético para obtenção de alimento. Se a nossa hipótese for verdadeira, esperamos que o número de ninhos seja maior em locais mais elevados em relação à altura máxima de inundação.

Métodos

Área de estudo

Conduzimos o estudo em uma área de floresta periodicamente inundável, sob influência dos rios Negro e Solimões, localizada próxima à cidade de Manaus, Brasil. Nessa área há um ciclo anual de secas e cheias. Durante o período de cheia, que corresponde a aproximadamente 160 dias, a cota máxima de inundação pode atingir 28 m, enquanto a cota mínima durante a seca varia de 17 a 19 m (Bittencourt & Amadio 2007).

57

Coleta dos dados

Estabelecemos quatro blocos contendo três parcelas de 20 x 10 m em cada um, totalizando 12 parcelas. Distribuimos os blocos em diferentes níveis topográficos, paralelamente a um lago. A distância entre cada bloco e cada parcela foi de 20 e 10 m, respectivamente. Em cada parcela, medimos a altura máxima alcançada pela inundação observando marcas presentes nas árvores. Adicionalmente, contamos o número de ninhos de cupim e registramos a distância de cada cupinzeiro em relação ao nível da inundação. A fim de controlar uma possível influência da quantidade de troncos sobre o número de ninhos, contamos o número de troncos que estavam acima do último nível de inundação.

Para avaliar se o número de ninhos de cupins está associado à elevação topográfica, realizamos uma análise de covariância (ANCOVA). Consideramos o número de ninhos como variável resposta, a altura da parcela em relação ao nivel maximo da água como variável preditora, o número de troncos e os blocos como co- variáveis.

Resultados

Encontramos 27 ninhos de cupins. A altura máxima da inundação variou entre 4,3 e 6,4 m e o número de árvores entre 7 e 32. O número de ninhos de cupim não esteve associado à altura do nível de inundação (Tabela 1; Figura 1).

58

Tabela 1. Análise de covariância do número de ninhos de cupins em relação à altura da parcela removendo os efeitos dos blocos e do número de troncos em uma área alagável próxima a Manaus, Brasil.

Efeito gl F p Bloco 3 0,14 0,93 Tronco 1 0,16 0,70 Altura 1 0,05 0,84 Resíduo 6

Figura 1. Relação entre o número de ninhos de cupins localizados em uma floresta alagável próxima à cidade de Manaus, Brasil (representado pelos resíduos de um modelo linear entre o número de ninhos de cupins em relação aos blocos e ao número de troncos) e a altura da inundação (m).

Discussão

A ausência de relação entre o número de ninhos e a altura da inundação indica que os cupins não ajustam a construção dos ninhos de forma a minimizar o gasto energético para obtenção de alimento. Em um ambiente periodicamente inundável, estocar alimento pode ser mais importante para os cupins do que a proximidade com o recurso. 59

Nesse sentido, as reservas provenientes do estoque podem garantir que os cupins resistam a um longo tempo de cheia, mesmo quando os ninhos se encontram a grandes distâncias do solo. Visto que a altura máxima da inundação varia anualmente

(Bittencourt & Amadio 2007) e que cupins são forrageadores de área central, perder ou realocar a área central pode ser mais custoso que construir túneis mais extensos para chegar até a serapilheira. Assim, a construção dos ninhos acima da altura máxima pode assegurar a persistência das colônias, evitando a sua submersão, ainda que isso gere um custo maior para obtenção de alimento.

Interações entre cupins ou com seus predadores parecem afetar fortemente as características das colônias (Araújo et al. 2007). Portanto, é possível que o estabelecimento das colônias seja mais dependente dessas interações. De fato, em outras espécies de animais, a pressão de predação impede que estratégias de forrageio que maximizem o ganho de energia sejam adotadas (Verdolin 2006).

Agradecimentos

Agradecemos ao Cassiano Rosa pela orientação e aos professores Jack Sparrow

(Fabrício), Paulinho Bom e Monitor Barbudo (Marcos) pela revisão e comentários.

Referências

Araújo, A.P.A., C. Galbiati & O. De Souza. 2007. Neotropical termite species (Isoptera)

richness declining as resource amount rises: food or enemy-free space

constraints? Sociobiology, 49:1-14.

Araújo, A.P.A., F.S. Araújo & O. De Souza. 2011. Resource suitability affecting

foraging area extension in termites (Insecta, Isoptera). Sociobiology, 57:1-14.

60

Bittencourt, M.M & S.A. Amadio. 2007. Proposta para identificação rápida dos

períodos hidrológicos em áreas de várzea do rio Solimões-Amazonas nas

proximidades de Manaus. Acta Amazonica, 37:303-308.

Chase, J.M. 1998. Central-place forager effects on food web dynamics and spatial

pattern in northern California meadows. Ecology, 79:1236-1245.

MacArthur, R.H. & E.R. Pianka. 1966. On optimal use of a patchy environment.

American Naturalist, 100:603-609.

Verdolin, J.L. 2006. Meta-analysis of foraging and predation risk trade-offs in terrestrial

systems. Behavioural Ecology and Sociobiology, 60:457-464.

61

O crescimento vertical da macrófita Eichhornia crassipes (Pontederiaceae) é maior

em ambientes com menor disponibilidade de água

José Hidasi, Artur Madeira, Cibele Paiva e Daniel Passos

Introdução

Plasticidade fenotípica é a variação que existe em determinadas características morfológicas, anatômicas ou fisiológicas em resposta a variações nas condições ambientais (Justo et al. 2005). Ela possibilita que organismos se estabeleçam em ambientes com condições ambientais variáveis (Kemp & Jones 2001). Nesses casos, é de se esperar que a mudança nos atributos confira maior chance de sobrevivência quando ocorrem modificações ambientais.

Na região amazônica ocorrem pulsos de inundação que consistem em variações sazonais no nível da água (Junk 1997). Durante os períodos em que esse nível está mais baixo ocorre a formação de lagos, onde macrófitas aquáticas ficam isoladas. Nesses sistemas, os lagos perdem água gradativamente durante toda a fase de vazante. Portanto, macrófitas que apresentam estratégias para contornar as condições hídricas adversas podem ser favorecidas, resistindo até o próximo período de inundação.

Uma macrófita comum na Amazônia é a Eichhornia crassipes, que possui tecidos especializados em seus pecíolos, responsáveis por sua flutuabilidade (Lopes et al. 2009). As folhas dessa planta são arredondadas na parte basal que fica em contato direto com a água e afilam gradativamente ao longo do pecíolo no sentido vertical.

Porém, existe uma variação entre indivíduos dessa espécie quanto a essa característica morfológica nos pecíolos de suas folhas. Alguns indivíduos apresentam pecíolos estreitos e longos enquanto outros são largos e curtos. Pecíolos largos e curtos podem estar relacionados com a maior flutuabilidade por aumentarem a área de contato da

62

folha com a água. Por outro lado, pecíolos estreitos e longos podem apresentar maior

área fotossinteticamente ativa devido à maior superfície em contato com raios luminosos.

Como as condições hídricas de um lago podem variar ao longo do tempo, é possível que as variações morfológicas nas folhas de E. crassipes representem o ajuste da planta em resposta à disponibilidade de água. Portanto, nossa hipótese é que E. crassipes apresenta maior crescimento vertical em regiões menos alagadas. Esperamos que os indivíduos tenham pecíolos mais estreitos e longos quando encostados à margem do lago (que representa um ambiente com menor disponibilidade de água), e mais largos e curtos no centro do lago (onde a disponibilidade de água não é restritiva).

Métodos

Realizamos o estudo em um lago, localizado em uma área de várzea, próxima ao encontro dos rios Negro e Solimões (3° 09’ S-59° 54’ O), Manaus, AM - Brasil.

Utilizamos como modelo de estudo a macrófita Eichhornia crassipes (Pontederiaceae).

Os indivíduos analisados se encontravam em dois locais distintos: na superfície da água próximos ao centro do lago ou apoiados no solo da margem.

Coletamos 19 indivíduos de E. crassipes, 10 no centro e nove na margem do lago. Em cada indivíduo, medimos o comprimento e o diâmetro de três pecíolos por indivíduo. Posteriormente, calculamos um índice peciolar ao dividir o comprimento médio pelo diâmetro médio dos três pecíolos coletados. Sendo assim, um maior índice peciolar representa uma planta com pecíolos estreitos e compridos, e um menor índice representa uma planta com pecíolos largos e curtos. Para testar se o índice peciolar está relacionado com diferentes condições de alagamento utilizamos um teste de Mann-

Whitney.

63

Resultados

O índice peciolar das plantas no centro do lago foi de 3,99 ± 1,05 (média ± desvio padrão), enquanto o das plantas na margem foi de 11,66 ± 8,86 (U = 13,5; p < 0,01;

Figura 1). A variabilidade do índice peciolar para plantas localizadas às margens do lago foi cerca de oito vezes maior que a encontrada para as plantas que estavam flutuando na região central do lago.

16

14

12

10

8

Índice peciolar Índice 6

4

2 Centro Margem Localização no lago

Figura 1. Índice peciolar de Eichhornia crassipes no centro e na margem de um lago na várzea do Rio Negro, Manaus, Brasil. Pontos representam as medianas e as barras representam os quartis de 25% e 75%.

Discussão

A conformação estrutural dos pecíolos de E. crassipes foi distinta nas diferentes condições de alagamento. O fato de indivíduos de E. crassipes encontrados na margem terem apresentado pecíolos mais estreitos e longos em relação a indivíduos no centro do lago, indica um maior investimento dos indivíduos na margem em crescimento vertical.

64

Sendo assim, a variação morfológica do pecíolo pode constituir uma resposta à ambientes com condições hídricas distintas.

A plasticidade fenotípica na forma do pecíolo pode refletir um investimento diferencial em capacidade de flutuação ou área fotossinteticamente ativa. Uma vez que investir na flutuabilidade não traz vantagens a indivíduos localizados nas margens dos lagos, a estratégia neste caso pode ser mais direcionada para o crescimento dos pecíolos e aumento da fotossíntese. Durante os períodos de seca, o aumento da área fotossinteticamente ativa da planta possibilitaria um maior acúmulo de reservas que podem permitir a sobrevivência da planta até que o nível de água suba novamente.

Eichhornia crassipes apresenta ampla ocorrência nas regiões tropicais alagáveis

(Sculthorpe 1985). Isso pode ser um reflexo de seu sucesso em se estabelecer em locais com condições ambientais variáveis (Junk & Piedade 1997; Sculthorpe 1985). Sendo assim, caso a plasticidade na morfologia da planta seja uma adaptação a ambientes que secam periodicamente, esperamos que não ocorra essa variação morfológica em regiões com corpos d’água perenes.

Agradecimentos

Agradecemos aos professores Aline e Paulo Enrique pelas discussões e ideias. Além disso, agradecemos ao monitor Thiago pela orientação e ajuda no campo.

Referências

Hu C., L. Zhang, D. Hamilton, W. Zhou, T. Yang & D. Zhu. 2007. Physiological

responses induced by copper bioaccumulation in Eichhornia crassipes (Mart.).

Hydrobiologia, 579:211-218.

65

Junk, W.J. 1997. General aspects of floodplain ecology with special reference to

Amazonian floodplain: Ecology of a pulsing system, pp. 3-20. In: The Central

Amazon Floodplain (W.J. Junk). Berlin: Springer.

Junk, W.J. & M.T. Piedade. 1997. Plant life in the floodplain with special reference to

herbaceous plants, pp. 147-181. In: The Central Amazon Floodplain (W.J. Junk).

New York: Springer-Verlag.

Justo, C.F., A.M. Soares, M.L. Gavilanes & E.M. Castro. 2005. Leaf anatomical

plasticity of Xylopia brasiliensis Sprengel (Annonaceae). Acta Botanica

Brasilica, 19:112-123.

Kemp, D. & R.E. Jones. 2001. Phenotypic plasticity in field populations of the tropical

butterfly Hypolimnas bolina (L.). Biological Journal of the Linnean Society,

72:33-45.

Lopes, A., S.M. Rosa-Osman & M.T.F. Piedade. 2009. Effects of crude oil on survival,

morphology, and anatomy of two aquatic macrophytes from the Amazon

floodplains. Hydrobiologia, 636:295-305.

Sculthorpe, C.D. 1985. The biology of aquatic vascular plants. Konigstein: Koeltz

Scientific Books.

66

Ocorrência de grupos funcionais de peixes em dois rios Amazônicos com diferentes

transparências de água

Lorena Pinto, Ludmila Rattis, Tatiane Calaça & Bruno Travassos

Introdução

As espécies podem ser agrupadas conforme características funcionais compatíveis com condições ambientais específicas. Essas condições, ou filtros ambientais, selecionam espécies que ocorrerão no ambiente local, a partir de um conjunto regional de espécies

(Wiescher et al. 2012). Com isso, os filtros operam selecionando as espécies com características adequadas ao ambiente, de modo que o conjunto de espécies em uma localidade é o resultado dessa seleção (Keddy 1992).

Por causa das restrições impostas pelos filtros ambientais, algumas características tornam-se mais comuns nas espécies que compõem a comunidade. Essas características ou atributos funcionais podem ser morfológicos, fisiológicos e comportamentais e atuam no aumento do desempenho do indivíduo, com efeitos sobre o crescimento, reprodução e sobrevivência (Violle et al. 2007). Quando diferentes espécies compartilham mais de um desses atributos formam-se grupos funcionais

(Keddy 1992).

Em ambientes aquáticos, características físicas e químicas da água, como temperatura, condutividade, acidez, nutrientes dissolvidos e transparência, podem agir como filtros ambientais (Bronmark & Hansson 2005, Rodriguez & Leweis1997).

Dentre essas características, a diferença de transparência da água pode selecionar organismos com características sensoriais que favoreçam sua orientação nesse ambiente.

Nos peixes, por exemplo, os olhos são responsáveis pela capacidade de orientação visual em águas transparentes e órgãos receptores como o aparelho labirinto, barbilhões

67

e a linha lateral são os principais órgãos quimio e tatorreceptores, que auxiliam na orientação não visual em águas de baixa transparência (Pough et al. 2008). Esses tipos de orientações sensoriais podem influenciar nas relações interespecíficas, como predação e competição, afetando assim, a sobrevivência e o sucesso reprodutivo das populações nos ambientes com transparências distintas.

Na Amazônia Central, os rios são agrupados com base nas características físico- químicas que determinam a transparência da água. Os rios de águas pretas, como o rio

Negro, apresentam águas mais transparentes devido à baixa quantidade de material em suspensão, enquanto que rios de água branca, como o rio Solimões, são mais turvos devido ao excesso de sedimentos (Junk & Furch 1985).

A variação na transparência dos rios pode representar um importante filtro selecionador de espécies, contribuindo para a estruturação da comunidade de peixes.

Neste estudo, nós analisamos a influência da transparência da água dos rios Negro e

Solimões sobre a ocorrência de grupos funcionais de peixes, de acordo com o tipo de orientação no ambiente. Nossa hipótese é que espécies de peixes com orientação visual serão favorecidas no rio de maior transparência, enquanto as espécies do grupo funcional sem orientação visual serão favorecidas no rio com a água mais turva.

Esperamos encontrar maior riqueza de espécies visuais no rio Negro (rio com maior transparência) e maior riqueza de espécies não visuais no rio Solimões (rio com menor transparência).

Métodos

Nós realizamos esse estudo durante o período de seca, na região da confluência entre os rios Negro e Solimões, próximo a Manaus, Brasil. Escolhemos oito pontos de coleta nas margens dos rios, sendo quatro no Negro e quatro no Solimões. Em um mesmo rio, os

68

pontos estavam 500 m distantes entre si, com exceção de um dos pontos no rio Negro, que estava a 1.388 m do ponto mais próximo. Entre os rios a menor distância foi de

1.000 metros.

Em cada ponto, coletamos os peixes com uma passada de rede de arrasto de 10 m de comprimento e malha de 5 mm. Contabilizamos todos os indivíduos coletados e os identificamos no nível de espécie. Com o auxílio de um especialista, classificamos em visualmente orientados (ou visuais) os peixes com olhos bem desenvolvidos, e como não orientados pela visão (não visuais), os peixes que apresentavam barbilhão, olhos pequenos e sistema de linha lateral desenvolvido.

Para testar o efeito da transparência da água sobre a riqueza de peixes dos dois grupos funcionais, nós realizamos uma Análise de Variância (ANOVA) hierárquica.

Consideramos os grupos funcionais (visual e não visual) e os rios (Negro e Solimões) como variáveis preditoras e o número de espécies de peixes como resposta. Os oito pontos de coleta foram aninhados de acordo com o rio, sendo quatro no Rio Negro (alta transparência) e quatro no Rio Solimões (baixa transparência).

Resultados

Nós capturamos 293 indivíduos, sendo 254 no rio Solimões e 39 no rio Negro. Os indivíduos pertenciam a 32 espécies, sendo que destas 23 foram encontradas no rio

Solimões (15 exclusivas), 16 no rio Negro (sete exclusivas). Do total das espécies, nove

(28,1%) foram compartilhadas entre os dois rios. A maioria dos indivíduos coletados

(64,5%, n= 189) pertencia a apenas três espécies que ocorreram em ambos os rios:

Pimelodus blochii (Pimelodidae), Hemidoras stenopeltis e Plagioscion squamosissimus.

Outras 10 espécie somaram 29,4% (n=86) dos indivíduos amostrados (Figura 1).

69

Figura 1. Abundância relativa das 13 espécies de peixes mais abundantes, separadas pelo tipo de orientação (visual e não visual), coletadas em oito pontos nos rios Negro e

Solimões, Amazonas, Brasil.

Classificamos 21 espécies como visuais e 12 como não visuais. No rio Solimões, encontramos 14 espécies visuais (41,7% dos indivíduos coletados) e nove não visuais e no rio Negro, 11 espécies foram visuais (56,4% dos indivíduos) e cinco não visuais. O número de espécies orientadas e não orientadas pela visão não foi diferente entre os dois rios (F1, 7 = 0,52; p = 0,49; Figura 2).

70

Figura 2. Riqueza de espécies de peixes com orientação visual e não visual nos Rio

Negro e Solimões, próximo a Manaus, Brasil. Os círculos representam as médias de riqueza dos peixes orientados visualmente e os quadrados representam as médias dos peixes não orientados visualmente para os dois rios. As barras verticais mostram o intervalo de confiança de 95%. A linha tracejada indica a tendência de mudança na riqueza para os peixes visualmente orientados e a linha contínua a tendência para os peixes orientados não visualmente.

Discussão

A transparência da água não foi um filtro ambiental para os grupos funcionais de peixes visuais e não visuais, uma vez que as espécies desses dois grupos ocorreram em ambos os rios. É possível, que outros aspectos morfológicos, como o sistema de linha lateral ou fisiológicos, como tolerância a diferentes valores de pH, temperatura e condutividade

(McFall-Ngai 1990), possibilitem o fluxo dos organismos dos dois grupos funcionais entre os rios.

71

Independente das diferenças nas características da água, estratégias morfo- fisiológicas podem ser favorecidas para o uso de ambos os tipos de rios. Por exemplo, espécies com orientação não visual capturadas nos dois rios, como Pimelodus blochii

(Família Pimelodidae) e Hemidoras stenopeltis, apresentavam, além dos barbilhões, olhos bem desenvolvidos indicando que essas espécies podem usar o tipo de orientação mais adequada para o nível de transparência do rio. Assim, uma espécie de peixe poderia usar os barbilhões para a percepção química e tátil em rios com pouca transparência e a percepção visual em ambientes com maior entrada de luz.

A priori, seria razoável esperar que peixes visualmente orientados fossem favorecidos em águas transparentes, característica considerada vantajosa tanto para fugir de predadores como para aproximação às presas (McFall-Ngai 1990; Zuanon et al.

2006). Já os peixes com orientação química e tátil não seriam favorecidos nas águas transparentes devido à competição com predadores adaptados à transparência, que seriam potenciais competidores dominantes (Zuanon et al. 2006). No entanto, independente da orientação sensorial, a riqueza de espécies aumentou no rio Solimões, ambiente de maior produtividade por causa da alta quantidade de sedimentos em suspensão (Junk & Furch 1985). Durante o período de seca, peixes de rios de água preta perdem gordura corporal devido à escassez de alimento (Junk 1985). Dessa forma, a escolha de um ambiente mais produtivo nessa época pode ser crucial para a sobrevivência e o sucesso reprodutivo na próxima estação. Peixes que possuem maior tolerância às diferentes características dos rios, devido a atributos morfo-fisiológicos, podem migrar para ambientes mais favoráveis, seja para sua proteção contra predadores ou para obter mais alimento.

72

Agradecimentos

Agradecemos a todos os professores e colegas que colaboraram de alguma forma para o desenvolvimento desse trabalho. No entanto, nosso muito obrigado mais que especial é dedicado ao Dr. Jansen Zuanon, que com todo carinho e dedicação, nos levou para o mundo mágico dos peixes e fez nosso dia ser extremamente divertido!

Referências

Brönmark, C. & L.A. Hansson. 2005. The biology of lakes and pounds. New

York: Oxford University Press.

Junk, W.J. & K. Furch. 1985. The physical and chemical properties of Amazonian

waters and their relationship with the biota, pp.3-17. In: Amazonia: key

environments (G.T. Prance & T. Lovejoy, eds). Oxford: Pergamon Press.

Junk, W.J. 1985. Temporary fat storage, an adaptation of some fish species to the water

level fluctuations and related environmental changes of the Amazon system.

Amazoniana, 9: 315-351.

Keddy, P.A. 1992. Assembly and response rules: two goals for predictive community

ecology. Journal of Vegetation Science, 3: 157-164.

McFall-Ngai, M.J. 1990. Crypsis in the pelagic environment. American Zoology,

30: 175-188.

Pough, F.H., C.M. Janis & J.B. Heiser. 2008. A vida dos vertebrados. 4a ed. São

Paulo: Atheneu Editora.

Rodríguez, M.A. & W.M. Lewis. 1997. Structure of fish assemblages along

environmental gradients in floodplain lakes of the Orinoco River. Ecological

Monographs, 67:109-128.

73

Violle, C., M.L. Navas., D.Vile., E. Kazakou., C. Fortunel., I. Hummel & E. Garnier.

2007. Let the concept of trait be functional! Oikos, 116: 882-892.

Wiescher, P.T., J.M.C. Pearce-Duvet & D.H. Feener. 2012. Assembling an ant

community: species functional traits reflect environmental filtering. Oecologia,

169: 1063-1074.

Zuanon, J., F.A., Bockmann & I. Sazima. 2006. A remarkable sand-dwelling fish

assemblage from central Amazonia, with comments on the evolution of

psammophily in South American freshwater fishes. Neotropical Ichthyology, 4:107-

118.

74

Plantas não sincronizam a produção de frutos de acordo com a vazante em uma

comunidade de várzea no Rio Solimões

Ana Claudia Rorato Vitor, Leonardo Oliveira, Vidal Carrascosa, Mariana Velasque

Introdução

A dispersão é o movimento pelo qual os organismos se distribuem no ambiente. Em plantas, a dispersão possibilita um distanciamento entre os indivíduos podendo minimizar a competição intra-específica (Odum & Barret 2007), principalmente entre a prole e o indivíduo parental (Connell 1971; Janzen 1970). Dependendo do vetor responsável pela dispersão das sementes, ela pode ser categorizada como zoocórica

(feita por animais), anemocórica (feita pelo vento) ou hidrocórica (quando a semente é transportada pela água).

Em áreas sujeitas a regimes de inundações periódicas é comum encontrar estratégias de dispersão de sementes associadas aos pulsos de inundação. Esses pulsos são resultantes do aumento do nível de grandes rios que alagam a floresta adjacente

(Ferreira 1991). Em função disso, é comum a ocorrência de estratégias de resistência ao período de cheia na flora local (Junk 1989). Em particular, a fenologia das plantas normalmente é sincronizada com os eventos de inundação a fim de otimizar a dispersão das sementes pela água (Adalardo de Oliveira & Daly 2001).

Apesar da sincronização da frutificação com o pico da cheia favorecer a chance de um propágulo atingir as cotas mais elevadas, isso não seria necessariamente benéfico para todas as espécies de plantas. Durante a vazante, as cotas mais altas são expostas primeiro, além de sofrer menor deposição de sedimentos que as cotas mais baixas. Isso resulta em um gradiente de variação direcional nas condições e recursos das cotas mais altas para as mais baixas. Como diferentes espécies de plantas possuem necessidades

75

distintas para se desenvolverem adequadamente (Ferreira 1997), para uma planta que se desenvolve melhor em cotas mais baixas, a liberação de suas sementes no pico da cheia aumentaria a chance da deposição ocorrer numa cota de inundação mais elevada. Por outro lado, se a planta ajusta a sua frutificação de acordo com o nível do rio durante a vazante, a chance de sua semente atingir uma área mais baixa e mais adequada para o seu estabelecimento seria maior.

As áreas de várzea na bacia Amazônica são um exemplo de um sistema que sofre a influência do regime sazonal de inundação. Os pulsos de inundação são determinantes na composição das espécies de plantas, gerando uma sincronização na produção dos frutos (Kubitzki & Ziburski 1994). Nesse sentido, nos propomos a avaliar a hipótese de que existe uma sincronia da frutificação das plantas com a redução gradual do nível das águas. O que resultaria em uma distribuição espacial estratificada das sementes em diferentes níveis topográficos, pois, a liberação sequencial dos frutos levaria a uma troca de espécies ao longo dos diferentes níveis topográficos de acordo com a cota de inundação, mas não levaria a uma troca de espécies dentro de um mesmo nível. Sendo assim, esperamos encontrar maior similaridade de morfoespécies de sementes dentro do mesmo nível topográfico, porém em níveis topográficos diferentes esperamos encontrar baixa similaridade das morfoespécies de sementes.

Métodos

Coleta de dados

Desenvolvemos o estudo em uma praia arenosa na várzea do Rio Solimões, Manaus,

Brasil. Estabelecemos cinco transectos de 200 m paralelos à margem do rio, representando cinco níveis topográficos distintos. O primeiro transecto estava adjacente ao nível da água, e o último distante a aproximadamente 50 m acima. Este espaçamento

76

garantia um aumento gradual da altitude dos transectos em relação ao nível da água. Em cada transecto instalamos 10 parcelas de 10x2 m, com uma distância de 10 m entre si

(Figura 1). Em cada parcela realizamos uma busca ativa de sementes na superfície do solo. Coletamos as sementes encontradas, e posteriormente as classificamos em morfoespécies usando características morfológicas externas, como forma, rugosidade, coloração e presença e disposição de nervuras.

Análises

Para avaliar a similaridade das morfoespécies de sementes entre parcelas e entre níveis topográficos utilizamos o índice de similaridade de Jaccard, que calcula a porcentagem de espécies compartilhadas em diferentes locais. Calculamos dois índices de similaridade: um (βp) representa a média dos índices entre pares de parcelas vizinhas dentro do mesmo nível topográfico, enquanto o outro (βn) representa a média dos índices entre pares de parcelas vizinhas entre níveis topográficos diferentes. Este cálculo gerou quatro valores médios de βn e nove valores médios de βp. Posteriormente, calculamos a média dos quatro valores de βn (βnmédio) e a média dos nove valores de βp (βpmédio) para então calcular a razão de similaridade βpmédio / βnmédio. Essa razão representa quantas vezes, em média, a similaridade de espécies dentro de uma cota é maior que a similaridade média de espécies entre as cotas distintas. Para testar se a razão de similaridade observada é diferente de uma razão esperada ao acaso, geramos uma distribuição nula da razão de similaridade usando de 10000 aleatorizações das matrizes de presença e ausência das espécies nas parcelas.

77

βn

βp

Figura 1. Esquema da distribuição das parcelas em relação ao rio Solimões, Manaus,

Brasil, (a linha 1 se refere às parcelas mais próximas ao rio). βp representa a

similaridade de espécies entre pares de parcelas imediatamente vizinhas dentro do

mesmo nível topográfico e βn representa a similaridade de espécies entre pares de

parcelas imediatamente vizinhas entre os diferentes níveis.

Resultados

Identificamos 83 morfoespécies distribuídas ao longo das cinco níveis topográficos de

inundação. O índice de similaridade de Jaccard indicou um compartilhamento de 13%

das espécies entre as parcelas de um mesmo nível topográfico (dp = 15%), e um

compartilhamento de 8% das espécies entre níveis topográficos diferentes (dp = 10%).

O valor da razão entre os índices médios de similaridade (βpmédio/ βnmédio) foi de 1,614.

De acordo com o modelo nulo, não encontramos evidências de que a similaridade de

morfoespécies de sementes entre os diferentes níveis topográficos seja menor do que a

similaridade entre as amostras do mesmo nível topográfico (p=0,29).

78

Discussão

A composição das espécies de sementes depositadas ao longo do gradiente de inundação não apresentou um padrão regular de troca de morfoespécies entre as diferentes cotas de inundação. Isso indica que as plantas não apresentaram sincronia de frutificação com a redução gradual do nível da água. Provavelmente todas as plantas frutificam no pico da cheia, o que produziria o mesmo padrão de troca de sementes ao longo do gradiente altitudinal (Kubitzki & Ziburski 1994).

Os rios amazônicos possuem uma vazante acelerada, podendo reduzir rapidamente o nível de água em curtos intervalos de tempo (Junk 1997). Isso implica em uma diferença curta de tempo em que as plantas ficam submersas nas diferentes cotas topográficas (Adalardo de Oliveira & Daly 2001). Como o intervalo de descida da

água é curto, eventualmente mesmo pequenos desvios no tempo de frutificação das plantas que exibissem sincronização poderiam ser suficientes para a maioria das sementes ser depositada em um local inadequado. Nesse contexto, a liberação das sementes desde o pico da cheia poderia assegurar que parte delas fosse depositada nas cotas adequadas independentemente de variações imprevisíveis na taxa de redução do nível da água.

Na várzea, a composição de plantas adultas varia ao longo das cotas topográficas de inundação (Junk 1989). Uma vez que os nossos resultados indicam que as sementes se distribuem ao acaso ao longo do gradiente topográfico, é provável então que o padrão de troca de espécies existentes para a comunidade de plantas adultas seja gerado por um processo que atua após a chegada das sementes. Eventualmente, as sementes depositadas em cotas inadequadas não se desenvolvem ou as plântulas não persistem.

79

Agradecimentos

Gostaríamos de agradecer ao professor Felipe pela orientação, ajuda em campo e na triagem das morfoespécies. Ao professor Paulo Enrique pela ajuda nas análises. Ao monitor Marcos pela ajuda e discussão. E ao motorista do barco que nos levou à campo.

Referências

Adalardo de Oliveira, A. & D.C. Daly. 2001. Florestas do Rio Negro. São Paulo:

Schwarcz.

Connell, J.H. 1971. The role of natural enemies in prevent competitive exclusion in

some marine and rainforest trees, pp. 298-312. In: Dynamics of

populations (P.J. den Boer & G.R. Gradwell, eds.) Wageningen: Pudoc.

Ferreira, L.V. 1991. O efeito do período de inundação na zonação de comunidades,

fenologia e regeneração em uma floresta de igapó na Amazônia Central.

Dissertação de mestrado, Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia, Manaus.

Ferreira, L.V. 1997. Effects of the duration of flooding on species richness and floristic

composition in three hectares in the Jaú National Park in floodplain forests in

central Amazonia. Biodiversity Conservation, 6:1353–1363.

Junk, W.J. 1989. Flood tolerance and tree distribution in central Amazonian floodplains,

pp. 47–64. In: Tropical forests: botanical dynamics, speciation and diversity

(Holm- Nielsen LB, Nielsen IC & Balslev H, eds). New York: Academic Press.

Junk, W.J. 1997. General aspects of floodplain ecology with special reference to

Amazonian floodplains, pp. 3-17. In: The central Amazon floodplain ecology of

pulsing system (W.J. Junk, ed.). Berlin: Springer.

Janzen, D.H. 1970. Herbivores and the number of tree species in tropical forest. The

American Naturalist, 104:501-528.

80

Kubitzki, K. & A. Ziburski. 1994. Seed dispersal in flood plain forests of Amazonia.

Biotropica, 2:30-43.

Odum, E.P. & G.W. Barrett. 2007. Fundamentos da ecologia. São Paulo: Cengage

Learning.

81

Respostas comportamentais em presas de ninfas de Odonata (Subordem:

Anisoptera)

Bianca Silva, Joselândio Santos, Ana Carolina Vieira & Daniela Coelho

Introdução

A predação é uma força seletiva que pode moldar a morfologia, o comportamento e a distribuição das presas no ambiente (Verdolin 2006). A simples presença do predador pode afetar as atividades da presa causando modificações comportamentais, tais como o incremento de vigilância e/ou redução de atividade de forrageio da presa (Rypstra et al.

2007; Thaler et al. 2012). Assim, a percepção do risco de predação pela presa pode induzir respostas antipredatórias que diminuem a probabilidade de ataque do predador

(Bednekoff 2007; Tollrian & Harvell 1999). Estudos com aranhas e visitantes florais, por exemplo, mostram que as espécies de visitantes reconhecem e evitam flores com presença das aranhas (Golçalves-Souza et al. 2008).

A resposta comportamental da presa depende da orientação sensorial do predador (Schmidt & Amézquita 2001). Para predadores orientados visualmente, a movimentação da presa é importante para o sucesso de captura. Assim, na presença de um predador orientado visualmente, as presas deveriam reduzir sua movimentação de modo a reduzir o risco de serem percebidas pelo predador.

Em lagos, ninfas de Odonata são predadores generalistas abundantes e orientados visualmente, que promovem o aumento do risco de predação nesses sistemas

(Bednekoff 2007). Diante disso, o objetivo do nosso trabalho foi avaliar a influência do risco de predação sobre o comportamento de presas de ninfas de Odonata em uma comunidade aquática. Esperamos que em locais onde os predadores estejam presentes as presas reduzam a movimentação.

82

Métodos

Para avaliar o efeito do predador sobre o comportamento das presas, montamos um experimento com grupos experimentais, nos quais variamos a presença do predador da seguinte forma: (1) controle, sem o predador: destinado a avaliar como as presas se comportam naturalmente na ausência do predador; (2) tratamento, com predador: destinado a avaliar como a presença do predador influencia o comportamento das presas.

Como sistema de estudo, utilizamos ninfas de Odonata (Anisoptera) (n=20 indivíduos) como predadores. Como presas, utilizamos larvas de Ephemeroptera (n=10 indivíduos) e peixes, de aproximadamente 10 mm, do gênero Triportheus (n=10 indivíduos). Essas espécies eram abundantes e com menor porte que as ninfas de

Odonata. Sendo assim, essas espécies possuem alta probabilidade de servirem como recurso para as ninfas. Coletamos os organismos utilizados neste estudo com puçás e peneiras no lago da Comunidade Catalão, cidade de Careiro, Amazonas, Brasil.

Para cada tipo de presa, montamos um experimento independente com cinco réplicas em cada grupo experimental. Utilizamos bandejas com dimensões de 20 x 30 x

10 cm e nelas despejamos 900 ml de água proveniente do lago onde os indivíduos foram coletados. Liberamos a ninfa de Odonata e esperamos 2 min até sua aclimatação. Após este período, liberamos a presa na mesma bandeja e aguardamos 1 min para a sua aclimatação. Em seguida, iniciamos as observações da movimentação das presas por um período de 2 min. Consideramos cada movimento realizado pela presa intercalado por uma pequena pausa como um deslocamento. Quantificamos a movimentação das presas usando o número de deslocamentos. Para cada espécie de presa, utilizamos um teste t-

Student para avaliar possíveis diferenças entre as médias do número deslocamentos nos dois grupos experimentais.

83

Resultados

Não houve diferença entre a média do número de deslocamentos por indivíduos de

Ephemeroptera na presença e na ausência do predador (t = -0,88; gl = 8; p = 0,40;

Figura 1).

Figura 1: Número de deslocamentos das ninfas de Ephemeroptera em grupos experimentais com e sem ninfas de Odonata. Os pontos representam o número médio de deslocamentos, e as barras representam o desvio padrão.

Para indivíduos de Triportheus sp., a média do número de deslocamentos por indivíduos na presença e na ausência do predador foi semelhante. (t = -0,21; gl = 8; p =

0,84; Figura 2).

84

Figura 2: Número de deslocamento dos indivíduos de Triportheus sp. em grupos experimentais com e sem ninfas de Odonata. Os pontos representam o número médio de deslocamentos, e as barras representam o desvio padrão.

Discussão

Encontramos que as presas não manifestaram diferenças comportamentais diante da presença das ninfas de Odonata. No meio aquático, presas podem ser guiadas por estímulos químicos emitidos pelos predadores (Schmidt & Amézquita 2001). Em situações em que tais sinais encontram-se muito diluídos no meio, a presa pode não perceber a presença do predador, não alterando, portanto, seu comportamento. Dessa forma, é possível que as larvas de Ephemeroptera, orientadas quimicamente, tenham sido incapazes de perceber a presença das ninfas de Odonata. Em presas visualmente orientadas, o reconhecimento do predador pode ocorrer com base em características conspícuas do predador (Gonçalves-Souza et al. 2008). A ausência de tais características pode dificultar o reconhecimento do predador pela presa. Assim, é

85

possível que os indivíduos de Triportheus sp. tenham sido incapazes de perceber as ninfas de Odonata, já que elas apresentam padrão de coloração críptico (Oliveira 2007).

Uma vez que a percepção de risco pela presa é crucial para a manifestação da sua resposta antipredatória, sugerimos estudos com tratamentos que variem a abundância de predadores no meio e considerem também sinais químicos de coespecíficos mortos. Esses fatores podem influenciar a percepção do risco pelas presas e afetar sua resposta comportamental (Schmidt & Amézquita 2001). Dessa forma, estudos que considerem esses fatores poderão ajudar na compreensão da intensidade mínima do sinal de predação necessária para que as presas apresentem uma resposta comportamental à presença de predadores.

Agradecimentos

Agradecemos aos professores Tiago Souza e Paulo Estefano que nos orientaram na escolha e desenvolvimento do projeto e as revisões do professor Glauco, sabendo que sem a discussão que proporcionaram não teria sido possível a construção do trabalho.

Referências

Bednekoff , P.A. 2007. Foraging in the face of danger, pp 305-329. In: Foraging:

behavior and ecology (Stephens D.W., J.S. Brown, R.C. Ydenberg, eds.).

Chicago: The University of Chicago Press.

Gonçalves-Souza, T., P.M. Omena, J.C. Souza & G.Q. Romero. 2009. Trait-mediated

effects on flowers: artificial deceiver pollinators and decrease plant

fitness. Ecology, 89:240-243.

Oliveira, D.E. 2007. Existe uma demanda conflitante entre a melanina alocada para o

sistema imune e para a camuflagem em larvas da libélula Micrathyria catenata

86

(Odonata: Libellulidae)? In: Livro da Ecologia da Floresta Amazônica (G.

Machado & J.L.C. Camargo, eds). Manaus: PDBFF / INPA.

Rypstra, A.L., J.M. Schmidt, B.D. Reif, J. DeVito & M.H. Persons. 2007. Tradeoffs

involved in site selection and foraging in a wolf spider: effects of substrate

structure and predation risk. Oikos, 116:853-863.

Schmidt, B.R. & A. Amézquita. 2001. Predator-induced behavioural responses: tadpoles

of the neotropical frog Phyllomedusa tarsius do not respond to all predators.

Herpetological Journal, 11:9-15.

Thaler, J.S., S.H. McArt & I. Kaplan. 2012. Compensatory mechanisms for

ameliorating the fundamental trade-off between predator avoidance and

foraging. PNAS, 109:12075-12080.

Tollrian, R. & C.D. Harvell (eds). 1999. The ecology and evolution of inducible

defenses. Princeton: Princeton University Press.

Verdolin, J.L. 2006. Meta-analysis of foraging and predation risk trade-offs in terrestrial

systems. Behavioral Ecology Sociobiology, 60:457-464.

87

Várzea – projetos livres

A herbivoria em Eichhornia crassipes (Pontederiaceae) não depende do estresse

hídrico

Cibele Paiva, Lorena Pinto, Mariana Velasque, Ana Carolina Vieira Pires, Leonardo

Oliveira

Em condições favoráveis plantas podem investir em produção de compostos de defesa, mas em condições adversas, a produção desses compostos é limitada. Avaliamos se macrófitas em condições de estresse hídrico são mais atacadas por herbívoros.

Esperamos que a quantidade de água nos tecidos da folha seja inversamente relacionada com a área foliar perdida por herbivoria. Realizamos esse estudo em um lago do Rio

Solimões, próximo a Manaus. Amostramos três folhas de 16 indivíduos localizados na borda e no interior do lago. Calculamos a área foliar perdida pela proporção entre área total da folha e área removida. A área foliar perdida em plantas da borda do lago foi maior (27,6 ± 21,3 cm) comparada às plantas do interior (9,5 ± 6,44) (t = 2,6; gl = 14; p= 0,02). A localização das macrófitas foi considerada como indicativo de estresse hídrico, pois indivíduos da borda do lago tiveram 30,45% menos água no tecido foliar comparado as do interior. Amostramos uma área de 2,4 cm2 das folhas e quantificamos a água presente nos tecidos através da diferença do peso úmido e seco da amostra. A quantidade de água nas folhas não teve relação com a área foliar perdida por herbivoria

(F = 0,41; gl = 14; p = 0,21; r2 = 0,06). Isso indica que os herbívoros não selecionaram os indivíduos de macrófita pelo nível de estresse hídrico da folha. Possivelmente a localização da macrófita próximo a borda do lago facilitou o acesso dos herbívoros aumentando a quantidade de folha predada. 88

A transparência da água como filtro ambiental para a pigmentação de espécies de

peixes em rios amazônicos

Ludmila Rattis, Daniel Passos, Daniela Coelho, Joselândio Santos e Renata Rocha

Características ambientais selecionam a ocorrência de espécies de acordo com o grau de tolerância dos indivíduos gerando um efeito de filtragem ambiental. Em rios de águas transparentes, peixes de tegumento opaco podem ser desfavorecidos por serem mais facilmente detectados e consumidos por predadores visualmente orientados. Portanto, esperamos que a riqueza de espécies de peixes opacos seja menor em rios com águas transparentes quando comparada à de rios de águas turvas. Amostramos a ictiofauna próximo à confluência dos rios Negro (mais transparente) e Solimões (turvas) em

Manaus. Selecionamos sete pontos de coleta nas margens de cada rio, distanciados 500 m entre si, onde coletamos peixes com rede de arrasto de 10 m de comprimento e malha de 5 mm. Colocamos os peixes sobre uma folha branca com pontos pretos e consideramos translúcidos aqueles que permitiam a visualização dos pontos através de seu tegumento. Comparamos a riqueza de peixes translúcidos e opacos entre os dois rios com uma ANOVA em blocos, considerando as amostras de cada rio como um bloco.

Como esperado, a riqueza de espécies de peixes opacos foi menor no rio Negro (18 espécies) do que no rio Solimões (25 espécies) (F(1,12)=14,7; p=0,002). Portanto, o padrão encontrado condiz com o processo de filtragem por predação mais intensa sobre peixes opacos em águas translúcidas. Para testar o processo em si, sugerimos a realização de experimentos comparando a eficiência de captura de presas opacas e translúcidas por predadores visualmente orientados ora em aquários contendo água do rio Negro ora do rio Solimões.

89

Complexidade estrutural do habitat influenciando o padrão de frequência relativa

de espécies em comunidades de formigas

Vidal Carrascosa, Randolpho Dias Terceiro, Bruno Travassos, José Hidasi & Bianca

Ferreira

Habitats estruturalmente mais complexos proporcionam maior variedade de nichos, permitindo a coexistência de um número maior de espécies com abundâncias mais similares. Em ambientes alagáveis da Amazônia, a inundação promove uma diferença de estrutura da vegetação entre áreas que permanecem alagadas por diferentes períodos, o que pode influenciar as comunidades de formigas. Nossa hipótese é que existirá menor equidade na abundância relativa de espécies de formigas em áreas com menor complexidade estrutural. Conduzimos o estudo em duas áreas adjacentes que permanecem alagadas por diferentes períodos: uma por mais tempo, que possui vegetação herbácea, e outra por menos tempo, com estrutura arbórea. Em cada área, instalamos um transecto de 100 m e a cada 10 m depositamos dois tipos de iscas

(sardinha e goiabada) para atrair formigas. Coletamos e morfotipamos as formigas e calculamos a frequência de registro de cada morfoespécie nas armadilhas. Encontramos oito morfoespécies, duas no ambiente herbáceo e seis no arbóreo. Nenhuma das espécies ocorreu nas duas áreas. A frequência de registro diferiu entre as morfoespécies no ambiente herbáceo, havendo uma morfoespécie sete vezes mais frequente que a outra. No ambiente arbóreo as frequências relativas de ocorrência foram mais similares.

A presença de poucas espécies encontradas exclusivamente no ambiente herbáceo indica que esse local pode ser mais restritivo e que eventualmente a espécie mais abundante è especializada a esse tipo de ambiente. Sendo assim, as poucas espécies de

90

formigas capazes de colonizar esse local podem apresentar alta abundância devido à baixa competição com outras espécies nesse local.

91

Plantas sujeitas ao alagamento sazonal possuem menor variação no tamanho das

folhas

Caroline Marques Dracxler, Artur Alcântara Madeira, Tatiane Gomes Calaça Menezes,

Sarah Freitas Magalhães e Ana Claúdia Rorato

Estratégias como investimento em área foliar para otimizar a captação de energia podem auxiliar as plantas a ocupar e persistir em ambientes sazonais. Em florestas tropicais, plantas podem apresentar plasticidade fenotípica na morfologia foliar em resposta a diferentes características ambientais. Em plantas sujeitas ao alagamento sazonal, folhas no topo da planta são as últimas a submergir e as primeiras a emergir durante o ciclo hidrológico. Assim, seria esperado que a área foliar dos ramos mais altos de uma planta de área alagável seja maior que a dos ramos mais baixos, de modo a maximizar a fotossíntese durante a vazante. Nós usamos uma espécie de Myrtaceae como modelo de estudo em uma área de várzea próxima à Manaus, Amazonas, para avaliar se existe variação no tamanho da folha em diferentes estratos da planta. Coletamos cinco ramos de 19 indivíduos adultos em duas alturas da planta (1,5-2,0 m e 3,5-4,0 m) e mensuramos a área foliar média a partir de 10 folhas de cada estrato. A média da área foliar no estrato inferior da planta foi de 3,73±0,82 cm² (Média±DP) e de 3,72±1,01cm² no estrato superior. Não houve relação entre a área foliar e sua posição na planta (t=-

0,03; gl=18; p=0,97). Os resultados indicam que a morfologia foliar não representa uma vantagem para resistir à inundação sazonal. Independente da forma e do tamanho da folha, a atividade metabólica das plantas é reduzida devido à hipóxia ou anóxia no entorno das raízes durante o período da cheia, o que impossibilita a fotossíntese.

92

Anavilhanas – projetos orientados

A coloração alar é um indicativo da qualidade dos machos em Diastatops sp.

(Odonata: Libelullidae)

Daniela P. Coelho, Leonardo Oliveira, José Hidasi e Joselândio C. Santos

Introdução

Muitas espécies de animais possuem machos com características exageradas que, em princípio, conferem uma menor chance de sobrevivência, pois os expõe a maiores riscos de predação. Supostamente tais características foram selecionadas por aumentarem a chance do macho ser escolhido pelas fêmeas. No entanto, isso gera uma questão sobre por que fêmeas escolheriam machos com características que confeririam menor sobrevivência. Nesse sentido, foi proposta a hipótese de indicação de qualidade que postula que para as fêmeas, características chamativas expressas nos machos seriam um indicativo de maior habilidade de sobrevivência e escape a predação e, portanto, um indicativo de parceiros de maior qualidade. Desde que a qualidade seja geneticamente determinada, os benefícios dessa escolha serão herdados pela prole (Contreras-Garduño et al. 2006; Contreras-Garduño et al. 2008; Schultz & Fincke 2009).

Os atributos indicativos de qualidade do indivíduo podem variar entre as espécies, tais como chifres de queratina em escarabeídeos, chifres córneos em alguns mamíferos, patas posteriores superdesenvolvidas em alguns crustáceos e, ainda, a pigmentação expressa nas asas em alguns grupos de artrópodes (Emlen 2008). Em particular, o padrão conspícuo de cores nas asas pode indicar melhor saúde e estado nutricional do macho (e.g. Contreras-Garduño et al. 2006; Contreras-Garduño et al.

2008). Dessa forma, machos mais conspícuos exibem características que indicam 93

indiretamente maiores reservas energéticas, melhor resposta imunológica ou maior massa muscular (Andersson 2006; Schultz & Fincke 2009).

Libélulas da espécie Diastatops sp. (Anisoptera: Libelullidae) presentes no arquipélago de Anavilhanas possuem dimorfismo sexual com relação à coloração das asas. Machos exibem coloração alar avermelhada, enquanto às fêmeas apresentam uma coloração predominantemente marrom. Esse dimorfismo sexual indica que existe algum tipo de pressão de seleção sexual nos machos. Uma possibilidade para isso é que as fêmeas avaliem os parceiros sexuais com base na coloração alar. Nesse sentido, nossa hipótese é de que machos mais conspícuos possuem melhor qualidade.

Métodos

Coleta de dados

Realizamos o estudo no arquipélago de Anavilhanas, próximo à base do lago do Prato,

Amazonas, Brasil. Coletamos 14 machos da libélula Diastatops sp. localizados em manchas de sol no sub-bosque de uma área de mata entre as 8:30 h e 10:45 h.

Dissecamos cada macho para a retirada de suas asas posteriores, tórax e abdômen.

Fizemos fotografias das asas dos indivíduos amostrados e usamos o programa Adobe

Photoshop para calcular a proporção de cor vermelha na asa como a razão entre o número de pixels vermelhos e o número total de pixels na asa.

Avaliamos a qualidade dos machos em relação a três variáveis: (1) atividade do sistema imunológico, (2) quantidade relativa de gordura e músculo no tórax e (3) quantidade relativa de gordura e músculo no abdômen. Imediatamente após a captura de cada macho, inserimos um implante feito com um fio de náilon (1 cm de comprimento) na região abdominal para estimar a habilidade imunológica. Este implante permaneceu durante um período de 2,5 h. Após a remoção do implante, colocamos o fio de náilon

94

sobre um papel milimetrado e utilizamos os 5 mm finais para a quantificação da proporção de área do fio coberta por melanina. Para esse calculo, consideramos que cada milímetro do implante correspondia a uma unidade. Para cada unidade, atribuímos um valor que poderia variar de zero a dois: zero correspondia à ausência de depósitos de melanina, um correspondia à presença de depósito de melanina em apenas um dos lados do fio de náilon e dois correspondia a depósitos de melanina em ambos os lados (Figura

1). Caso houvesse deposição de melanina na ponta do implante, adicionávamos um ao somatório. A medida de intensidade de deposição de melanina era o somatório do número de unidades dividido por 11, que era o número máximo de unidades potencialmente cobertas por melanina. Como a resposta imunológica em libélulas é manifestada pela deposição de melanina na superfície do implante (Contreras-Garduño et al. 2006), esperávamos que machos com maior proporção de cor vermelha na asa apresentassem maior porcentagem de área coberta por melanina no implante.

Figura 1. Desenho esquemático da medida de deposição de melanina em um implante, que representa a resposta imunológica de libélulas da espécie Diastatops sp. Das 11 quadrículas totais, seis apresentam pontos melanizados, o que corresponde a 54,5% de melanização no implante.

Para estimar a quantidade de gordura relativa acumulada no tórax, calculamos a sua densidade. Para esse cálculo, medimos a massa torácica em uma balança semi-

95

analítica (precisão de 1 mg) e dividimos o valor obtido pelo seu volume. Para o cálculo do volume, consideramos que o tórax possui a forma de um paralelepípedo. Assim, estimamos o seu volume pela fórmula: volume do tórax = altura x largura x comprimento do tórax. Já para abdômen, consideramos que ele possui forma cilíndrica e estimamos o volume pela fórmula: volume do abdômen = comprimento x raio x valor de . Como uma maior massa de lipídeos diminui a densidade, indivíduos com alta quantidade de gordura terão valores mais baixos de densidade.

Análise dos dados

Nossa variável preditora foi proporção de cor vermelha na asa e nossas variáveis respostas foram densidade do tórax, densidade do abdômen e proporção de área melanizada do implante feito no abdômen das libélulas. Com isso, fizemos três regressões simples, relacionando a proporção de cor vermelha com cada variável resposta.

Resultados

A porcentagem média (± desvio padrão) de cor vermelha nas asas dos machos de

Diastatops sp. foi de 31,7 ± 8,8 %. A proporção de área melanizada do implante foi de

0,41 ± 0,25 %. A densidade média do tórax foi de 0,0006 ± 0,0008 g/mm³ e do abdômen foi de 0,0002 ± 0,00004 g/mm³.

A proporção de vermelho na asa não esteve associada à proporção de área coberta por melanina do implante (F = 0,048; P < 0,829; R² = 0,004) ou à densidade do tórax (F = 3,637; P < 0,081; R² = 0,232). Por outro lado, a proporção de vermelho na asa esteve positivamente relacionada com a densidade do abdômen (F = 27,523; p <

0,001; R² = 0,697; Figura 2). 96

(A)

(B)

(C) 97

Figura 2. Relação entre a proporção de vermelho nas asas de machos da libélula

Diastatops sp. e a porcentagem de área melanizada (A), densidade do tórax (B) e densidade do abdômen (C).

Discussão

A ausência de relação entre proporção de área vermelha nas asas e a proporção de cobertura por melanina indica que a conspicuidade alar de machos de Diastatops sp. não

é uma pista da intensidade da resposta imune. Em relação à densidade do tórax e a proporção de vermelho nas asas, o direcionamento dessa relação se deu de acordo com a tendência esperada pelas nossas previsões. No entanto, uma vez que a relação não aparentou ser muito acentuada, é possível que o investimento em gordura dos machos também não seja sinalizado pela conspicuidade das asas. Por outro lado, a relação positiva entre densidade do abdômen e a proporção de vermelho nas asas indica que a conspicuidade é um indicativo de um maior investimento em musculatura abdominal.

A resposta imunológica em libélulas é mediada por melanina, que é produzida a partir dos estoques de gordura do macho (Siva-Jothy 2000). Porém, é possível que esses atributos variem de acordo com a idade ou com o estado nutricional do adulto (e.g.

Peixoto & Benson 2008). Uma vez que a asa possui um padrão de coloração fixo, se essas características de qualidade variarem nos adultos, a asa não seria um indicativo confiável desses atributos. Consequentemente, a escolha dos machos com asas conspícuas pelas fêmeas de forma a selecionar indivíduos com maior resistência imune ou investimento em gordura no tórax não deveria ser favorecida.

A musculatura das libélulas, por sua vez, é primariamente determinada pelas condições de desenvolvimento da larva e, portanto, não deve variar ao longo da vida de um macho adulto (Córdoba-Aguilar 2008). Consequentemente, como o abdômen não

98

tem a função de acúmulo de gordura, a sua densidade deve variar pouco com a senescência. Dessa forma, a informação sobre o investimento muscular no abdómen fornecida pela conspicuidade das asas seria um indicativo confiável da sua qualidade.

Machos com maior musculatura abdominal eventualmente podem se aquecer mais rapidamente durante o voo. Isso pode permitir maior sucesso durante confrontos territoriais e consequentemente, possibilitar o aumento do sucesso reprodutivo (e.g.

Schultz & Fincke 2009).

Em geral, as características sexuais secundárias dos machos de libélulas indicam qualidade associada a reservas energéticas e resposta imune (Contreras-Garduño et al.

2006). Nossos resultados mostraram que outros traços de qualidade podem ser sinalizados. Talvez a expressão dos atributos de qualidade sinalizados pelas características sexuais secundárias ocorra principalmente em características determinadas pelas larvas e que se mantenham constantes ao longo da vida do adulto, desde que elas confiram maior sucesso reprodutivo ao indivíduo.

Agradecimentos

Agradecemos à orientação do Glauco Machado, por todo seu conhecimento e paciência em nos ensinar a contar esta história. Agradecemos também ao Paulinho Bom pelo auxílio em campo e revisão do manuscrito

Referências

Andersson, M. 2006. Condition-dependent indicators in sexual selection: development

of theory and tests, pp. 255-270. In: Essays in Animal behaviour (J.R. Lucas &

L.W. Simmons, eds.). California: Elsevier Academic Press.

99

Bateman, A.J. 1948. Intra-sexual selection in Drosophylla. Heredity, 2:349-368.

Contreras-Garduño, J., J. Canales-Lazcano & A. Cordoba-Aguilar. 2006. Wing

pigmentation, immune ability, fat reserves and territorial status in males of the

rubyspot damselfly, Hetaerina americana. Journal of Ethololy, 24:165–173.

Contreras-Gardunño, J., B.A. Buzatto, M.A. Serrano-Meneses, K. Nájera-Cordero & A.

Córdoba-Aguilar. 2008. The size of the red wing spot of the American rubyspot

as a heightened condition-dependent ornament. Behavioral Ecology, 26:724-

732.

Córdoda-Aguilar. A.2008. Dragonflies & Damselflies. Oxford: Oxford Biology.

Emlen, D. J. 2008. The Evolution of Animal Weapons. Annual Review of Ecology,

Evolution and Systematics, 39:387–413.

Peixoto, P.E.C. & W.W. Benson. 2008. Body mass and not wing length predicts

territorial success in a tropical satyrine butterfly. Ethology, 114:1069–1077.

Schultz, T.D. & O.M. Fincke. 2009. Structural colours create a flashing cue for sexual

recognition and male quality in a Neotropical giant damselfly. Functional

Ecology, 23:724–732.

100

A escolha do local de oviposição de um lepidóptero é influenciada pela

disponibilidade de recurso

Vidal Carrascosa, Sarah Freitas Magalhães, Renata Pimentel Rocha e Tatiane Gomes

Calaça Menezes

Introdução

Habitats distintos podem oferecer diferentes quantidades de alimento e apresentar diferenças quanto ao risco de predação. Assim, o crescimento, a reprodução e a sobrevivência dos indivíduos dependem do habitat em que eles vivem. Em muitos animais, a seleção natural favoreceu a capacidade de avaliar diferentes habitats e selecionar aqueles mais vantajosos. Dessa forma, a seleção de habitat por um individuo

é um importante fator que determina o seu sucesso reprodutivo (Sih 1980, Doak 2006).

Um componente importante da seleção de habitat é determinar o local adequado para o desenvolvimento da progênie. A prole se beneficia da escolha de habitats com alta qualidade, tais como aqueles com grande quantidade de abrigos contra a predação ou grande quantidade de alimento disponível.

Em alguns grupos de animais, a seleção de habitat deve ser mais criteriosa, como aqueles cuja progênie apresenta baixa capacidade de locomoção. Um exemplo de animais com mobilidade reduzida são os lepidópteros. Durante a fase imatura, as lagartas tendem a permanecer próximas ao local de nascimento. Assim, as plantas onde os parentais ovipositam representam o primeiro recurso para a prole (Heisswolf et al.

2005) . Desse modo, para garantir o desenvolvimento da progênie, podemos inferir que o sítio de oviposição deve apresentar alimento abundante para permitir o desenvolvimento das lagartas até a fase de pupa (Kemp 1998).

101

Nas áreas sob a influência do rio Negro, existem diversas praias com gramíneas que são utilizadas como alimento por lepidópteros. Essas plantas ocorrem em diferentes padrões de distribuição, com densidades distintas. Nós questionamos se a disponibilidade de recurso é um fator de seleção do local de oviposição em uma espécie de lepidóptero. Nossa hipótese é que o lepidóptero deve ovipositar preferencialmente em locais onde há uma alta disponibilidade de alimento para sua prole. Assim, prevemos encontrar lagartas preferencialmente em locais onde as plantas são maiores e mais adensadas.

Métodos

Conduzimos o estudo no Parque Nacional de Anavilhanas, Amazonas, Brasil. Em uma praia onde observamos lagartas consumindo gramíneas, estabelecemos uma parcela de

50 x 8 m. A cada 5 m estabelecemos duas subparcelas de 30 x 30 cm, distantes 7 m entre si, totalizando 20 parcelas. Em cada subparcela, registramos a presença ou ausência de lagartas e medimos a densidade (nº de plantas por cm2) e a altura das plantas. Consideramos a presença de lagartas como um indicativo do local de oviposição, pois uma vez que a capacidade de locomoção das lagartas é limitada, o local onde eclodem não deveria diferir muito de onde foram encontradas.

Para testar se a presença de lagartas estava associada com a densidade e a altura das plantas, fizemos uma regressão logística para cada variável, utilizando a densidade e altura média das plantas como variáveis preditoras e a presença/ausência de lagartas como variável resposta.

102

Resultados

Registramos lagartas em 10 parcelas, sendo que o número máximo de lagartas numa mesma parcela foi cinco. A quantidade média (± DP) de plantas nas subparcelas com lagartas foi de 53,9 ± 26,9 e a altura média de 22,1 ± 2,6 cm. Nas parcelas sem lagartas, a quantidade média de plantas foi 20,1 ± 21,7 e altura média foi 18,9 ± 3,2 cm. A presença de lagartas foi mais frequente em locais com maior densidade de plantas (χ² =

7,12; gl = 1; p < 0,01; Figura 1) e com plantas mais altas (χ² = 5,30; gl = 1; p = 0,02;

Figura 2).

Figura 1. Relação entre a presença/ausência de lagartas e a densidade de gramíneas em uma praia do arquipélago de Anavilhanas, Brasil. Os números 0 e 1 indicam ausência e presença de lagartas, respectivamente.

103

Figura 2. Relação entre a presença/ausência de lagartas e a altura de gramíneas em uma praia do arquipélago de Anavilhanas, Brasil. Os números 0 e 1 indicam ausência e presença de lagartas, respectivamente.

Discussão

As fêmeas do lepidóptero selecionam locais de oviposição de acordo com a maior disponibilidade de recursos. Além disso, a seleção de sítios com maior densidade de plantas pode estar associada com a diminuição do risco de predação e parasitismo

(Nomikou et al. 2003, Freitas & Oliveira 1996, Medhat et al. 2010). Uma vegetação mais adensada poderia proporcionar maior proteção (Medhat et al. 2010) e menor tempo de deslocamento entre plantas, nas situações em que a lagarta esgota o alimento em uma planta e precisa se deslocar para outra.

A pequena variação no número de lagartas por parcela, pode sugerir que a escolha do local de oviposição pode levar em conta, além da qualidade do ambiente, a agregação dos ovos. Se muitas lagartas forrageiam em uma pequena área, a competição pode resultar em escassez de alimento. Assim, evitar sítios onde outros ovos já foram

104

depositados pode conferir vantagens ao minimizar a competição por recursos entre as lagartas (Janz 2002).

Nossa abordagem de seleção de habitat em um ambiente dominado por uma

única espécie difere da maioria dos trabalhos sobre o tema, que são executados em locais com maior heterogeneidade ambiental. Constatamos que lepidópteros são capazes de selecionar o ambiente favorável para o desenvolvimento da prole mesmo um ambiente com pouca variação estrutural da vegetação. Isso evidencia a refinada capacidade de seleção do local de oviposição que esses organismos possuem.

Agradecimentos

Agradecemos a Marcos Vieira, Thiago Kloss e Paulo Estefano pela orientação, ajuda e correções durante o desenvolvimento deste projeto.

Referências

Doak, P., P. Kareiva & J. Kingsolver. 2006. Fitness consequences of choosy oviposition

for a time-limited butterfly. Ecology, 87:395-408.

Freitas, A.V.L. & P.S. Oliveira. 1996. Ants as Selective Agents on Herbivore Biology:

Effects on the Behaviour of a Non-Myrmecophilous Butterfly. Journal of Animal

Ecology, 65:205-228.

Heisswolf, A., E. Obermaier & H.J. Poethke. 2005. Selection of large host plants for

oviposition by a monophagous leaf beetle: nutritional quality or enemy-free space?

Ecological Entomology, 30:299-306.

Janz, N. 2002. Evolutionary ecology of oviposition strategies, pp. 349-376. In:

Chemoecology of insect eggs and egg deposition (M. Hilker & T. Meiners, eds.).

Berlin:Blackwell.

105

Kemp, D.J. 1998. Oviposition behaviour of post-diapause Hypolimnas bolina (L.)

(Lepidoptera : Nymphalidae) in tropical Australia. Australian Journal of Zoology,

46:451-459.

Medhat, M.S., B.S. Hanssond & P. Anderson. 2010. Does risk of egg parasitism affect

choice of oviposition sites by a moth? A field and laboratory study. Basic and

Applied Ecology, 11:135–143.

Nomikou, M., A. Janssen, M.W. Sabelis. 2003. Herbivore host plant selection: whitefly

learns to avoid host plants that harbour predators of her offspring. Behavioural

Ecology,136:484-488.

Sih, Andrew. 1980. Optimal behavior: Can foragers balance two conflicting demands?

Science, 20:1041-1043.

106

Diferentes períodos de inundação influenciam resistência de folhas em

plantas no igapó

Bruno Travassos, Ana Claudia Rorato, Mariana Velasque e Ana Carolina Vieira Pires

Introdução

Os padrões locais de riqueza e abundância dos organismos são determinados por fatores bióticos e abióticos, que favorecem a ocorrência das espécies mais tolerantes às condições locais, e excluindo as espécies não tolerantes (Townsend et al. 2006). Filtro ambiental é o processo através do qual condições bióticas e/ou abióticas locais, restringem a sobrevivência de determinado grupo de organismos, fazendo com que o número de espécies de um local seja menor do que o número de espécies presente na região. De maneira geral, um filtro seleciona apenas organismos que possuam atributos que lhes permitem sobreviver sob certas condições restritivas de um local.

Os organismos selecionados em um determinado local terão atributos morfo- fisiológicos comuns que favorecem a sobrevivência desses organismos (Lebrija-Trejos et al. 2010). Esses atributos são chamados de atributos funcionais (Cornelissen et al.

2003, Cianciaruso et al. 2009, Violle et al. 2007). A limitação da variação do estado dos atributos funcionais pode ser ocasionada por distúrbios que modificam condições ambientais periodicamente funcionando como filtros ambientais.

As florestas de igapó no baixo Rio Negro estão sujeitas a pulsos de inundação sazonais. Esses pulsos têm amplitude média de 10 m e podem durar até sete meses

(Goulding et al. 1988). Os longos períodos de inundação podem restringir a ocorrência de certas espécies, selecionando aquelas que possuem atributos funcionais que conferem tolerância à inundação (Shongart et al. 2002). Às margens do rio, a comunidade de plantas presentes em áreas de menor altitude estão sujeitas a um maior período de

107

inundação. Já nas áreas de maior altitude, o período de inundação é mais curto e as

árvores mais altas podem não ser totalmente recobertas pela água. Como as plantas submersas ficam mais expostas à abrasão e ao apodrecimento dos seus tecidos (Parolin

2009), o ambiente que passa mais tempo submerso é mais restritivo que o ambiente que passa menos tempo submerso.

Resistência mecânica das folhas pode ser considerada um atributo funcional vantajoso para plantas que passam longo período de submersão (Junk et al. 1989, Junk

1997). Portanto, plantas com folhas mais resistentes seriam selecionadas positivamente nas áreas mais baixas, que ficam mais tempo inundadas. Assim, a variação total dos atributos funcionais encontrados na comunidade regional deve estar mais bem representada nas áreas mais altas do que nas áreas mais baixas. O objetivo do nosso estudo foi investigar se em áreas inundadas há seleção de plantas com folhas mais resistentes. Nossas previsões são: (i) a força necessária para a ruptura das folhas será maior em áreas sujeitas a maior tempo de inundação; (ii) a variação da força de ruptura das folhas será maior em áreas com menor tempo de inundação.

Métodos

Área de estudo

Conduzimos nosso estudo no Parque Nacional do Arquipélago de Anavilhanas, localizado no baixo Rio Negro, na Amazônia brasileira (02º47’ S - 60º48’ O). Essa bacia está sujeita a inundações semestrais que podem durar até 270 dias (Junk 2000).

Devido à elevada amplitude de variação no nível da água, as árvores localizadas próximo à margem do rio ficam total ou parcialmente submersas durante o período da cheia.

108

Coleta de dados

Selecionamos duas áreas de floresta, uma em cada margem do rio. As duas áreas tem regimes de inundação distintos: uma das áreas é mais elevada e, portanto, fica menos tempo inundada que a outra área. Em cada área demarcamos uma parcela de 200 m2, dentro da qual coletamos um ramo de todos os indivíduos arbóreos com altura mínima de 1 m. Posteriormente, morfotipamos as plantas através de atributos morfológicos das folhas e selecionamos uma folha madura de cada morfotipo para medir a resistência das folhas. Para isso confeccionamos um instrumento para medir a força necessária para rasgar a folha. Esse aparelho consistiu em um dinamômetro com um Erlenmeyer acoplado na extremidade inferior. Recortamos uma tira de tamanho padronizado (5 cm x 1 cm) do limbo de cada folha e fixamos uma extremidade superior da tira a um ponto fixo. Penduramos o dinamômetro com Erlenmeyer na parte inferior da folha. Em seguida despejamos a água no recipiente, com velocidade constante até que a folha se rompesse e registramos o volume de água necessário para essa ruptura. O volume de

água foi convertido em força, sendo que um litro de água equivale a 10000 N.

Análise dos dados

Utilizamos o teste-t para analisar a diferença entre a média da força de fratura das folhas provindas das áreas com diferentes cotas de inundações. Para testar a diferença das variâncias da força de fratura nas duas áreas usamos o teste de Levene.

Resultados

A força de fratura das folhas foi maior para as folhas provindas da área mais baixa do que as folhas da área mais alta e com menor tempo de inundação (t=1,62; gl=58; p=0,03). A força média necessária para a ruptura das folhas na área de maior altitude foi

109

4143,3 ± 1222,3 N e na área mais alta foi 3396,7 ± 1443,2 N. A variação da força de ruptura das folhas não foi diferente entre as duas áreas (F(1,58)=2,59; p=0,11; Figura 1).

8000

6000

4000

Força fratura de (N) 2000

0

Alta Baixa Elevação do terreno

Figura 1. Força necessária para fraturar folhas de plantas provindas de terrenos de diferentes elevações no Arquipélago de Anavilhanas. Cada ponto representa uma folha de cada morfotipo. As médias da força necessária para fratura de folha em cada área estão representadas pelas barras horizontais.

Discussão

Plantas que passam mais tempo submersas apresentaram folhas mais resistentes do que aquelas que ficam submersas por períodos mais curtos. Isso pode indicar uma resposta a diferentes pressões entre os dois ambientes. Assim, plantas que investem muito em resistência foliar, de maneira geral têm um crescimento mais lento (Coley et al. 1986).

Portanto, sacrificar a taxa de crescimento em uma área onde a resistência foliar não é vital pode ser uma desvantagem. Em plantas que se encontram submersas por menos tempo, o investimento em folhas mais resistentes pode reduzir o investimento em outras

110

características, como crescimento rápido. Para plantas, o crescimento rápido implica em um aumento na capacidade de competição por luz (Hubbel et al. 1999) e no caso das plantas em áreas alagadas, a altura da planta pode significar escapar da submersão.

Desta forma, a produção de folhas menos resistentes em plantas que ficam menos tempo submersas seria favorecida, permitindo alocação de recursos para outras funções.

Enquanto nas áreas baixas, o regime de inundação favorece plantas que investem mais em folhas resistentes, pois durante os eventos de cheia, as folhas poderiam ser danificadas ou até mesmo perdidas, comprometendo a aquisição de energia na época em que ficam emersas.

Comunidades vegetais que estão presentes em locais que sofrem diferentes intensidades de inundação podem estar submetidas a restrições semelhantes, mas que selecionam atributos em sentidos opostos. Em áreas que ficam muito tempo inundadas, o pulso de inundação funciona como filtro selecionando plantas com folhas resistentes.

Já em áreas que ficam pouco tempo inundadas, é provável que a competição por luz esteja funcionando como filtro, restringindo a variação na resistência das folhas em outro sentido. Nesse caso o filtro estaria atuando na seleção de plantas com crescimento rápido, que são melhores competidoras por luz, mas consequentemente têm folhas menos resistentes.

Nossos resultados levantam a questão de como se distribuem as espécies no

Igapó. As duas cotas de inundação podem conter conjuntos de espécies distintos cujas espécies possuem folhas com diferentes níveis de resistência. Assim, em áreas com estresse hídrico maior, espécies com folhas mais resistentes estariam sendo selecionadas. A segunda hipótese é que as duas cotas de inundação possuem o mesmo conjunto de espécies, porém os indivíduos dessas espécies são plásticos o suficiente

111

para expressarem diferentes resistências de folhas conforme a exposição ao estresse hídrico diferentes (Metamoros & Moreno 2001).

Agradecimentos

Gostaríamos de agradecer a Catá pela orientação, ajuda em campo e na triagem das morfoespécies. À pesola quebrada, à Dona Eduarda por ceder nosso “Erlenmeyer” e ao

Baby pelas 43 correções impressas do nosso trabalho.

Referências

Belyea, L.R. & J. Lancaster. 1999. Assembly rules within a contingent ecology. Oikos,

86:402-416.

Cianciaruso, M.V., I.A. Silva & M.A. Batalha. 2009. Diversidades filogenética e

funcional: novas abordagens para a ecologia de comunidades. Biota Neotropica,

9:93-103.

Coley, P.D., J.P. Bryant & F. S. Chapin III. 1985. Resource availability and plant

antiherbivory defense. Science, 230:895-899

Cornelissen, J.H., C. Lavorel, E. Garnier, S. Díaz, N. Buchmann, D.E. Gurvich, P.B.

Reich, H. ter Steege, H.D. Morgan, M.G.A. van der Heijden, J.G. Pausas, & H.

Poorter. 2003. Handbook of protocols for standardised and easy measurement of

plant functional traits worldwide. Australian Journal of Botany, 51:335-380.

Goulding, M., M.L. Carvalho & E.G. Ferreira. 1988. Rio Negro, Rich Life in Poor

Water. Netherlands: SPB Academic Publishing.

Hubbell, S. P., R.B. Foster, S.T.O’Brien, K.E. Harms, R. Condit, B. Wechsler, S.J.

Wright & S. Loo de Lao. 1999. Light-gap disturbances, recruitment limitation,

and tree diversity in a neotropical forest. Science, 286:554.

112

Junk, W.J., P.B. Bayley & R.E. Sparks. 1989. The flood pulse concept in river-

floodplain systems. Special Publications of the Canadian Journal of Fisheries

and Aquatic Sciences, 106:110-127.

Lavorel, S., S. McIntyre, J. Landsberg & D. Forbes. 1997. Plant functional

classifications: from general groups to specific groups based on response to

disturbance. Trends in Ecology and Evolution, 12:474-478.

Lavorel, S. & E. Garnier. 2002. Predicting changes in community composition and

ecosystem functioning from plant traits: revisiting the Holy Grail. Functional

Ecology, 16:545-556.

Lawton, J.H. 1983. Plant architecture and the diversity of phytophagous insects. Annual

Review of Entomology, 28:23-39.

Lebrija-Trejos, E., E.A. Pérez-García, J.A. Meave, F. Bongers & L. Poorter. 2010.

Functional traits and environmental filtering drive community assembly in a

species-rich tropical system. Ecology, 91:386-398.

Metamoros, R. & M. Moreno. 2001. La plasticidad de las plantas. Elementos, 41:39-43.

Parolin, P. 2009. Submerged in darkness: adaptations to prolonged submergence by

woody species of the Amazonian floodplains. Annals of Botany, 103:359-376.

Schongart, J., M.T. Piedade, S. Ludwighausen, V. Honans & M. Worbes. 2002.

Phenology and stem growth periodicity of tree species in Amazonian floodplain

forests. Journal of Tropical Ecology, 18:581–597.

Townsend, C.R., M. Begon & J.L. Harper. 2006. Fundamentos em ecologia. Porto

Alegre: Artmed.

Violle, C., M.L. Navas, D. Vile, E. Kazakou, C. Fortunel, I. Hummel & E. Garnier.

2007. Let the concept of trait be functional! Oikos, 116:882-892.

113

Formigas que planam, nadam? Relação entre queda direcional e capacidade de

natação em três espécies de formigas de uma área alagável na Amazônia Central

Lorena Pinto, Caroline Marques Dracxler, Randolpho Dias Terceiro & Cibele Paiva

Introdução

O pulso de inundação favorece a ocorrência e a distribuição de plantas e animais adaptados a ambientes sazonalmente alagados (Junk et al.1989). Em animais, algumas estratégias morfológicas (desenvolvimento de órgãos respiratórios), fisiológicas (maior habilidade de flutuação) e comportamentais (queda direcional) permitem o sucesso de alguns grupos nesses ambientes (Adis & Junk 2002, Yanoviak et al. 2005 ). Entre os invertebrados de solo, as estratégias comportamentais podem envolver uma migração vertical, para substratos mais elevados, ou migração horizontal, que é o deslocamento para porções de terra firme não inundáveis. Tais movimentos sazonais favorecem o restabelecimento das populações após o período de inundação (Adis & Junk 2002).

Espécies arborícolas apresentam estratégias que impedem ou diminuem o contato com as áreas alagadas. Algumas formigas que nidificam e forrageiam em

árvores conseguem realizar queda direcional. Esse comportamento consiste em um redirecionamento corporal para a árvore durante uma queda, possibilitando o retorno ao ninho e reduzindo a chance de predação na superfície da água (Yanoviak et al. 2011).

Essa estratégia aparenta ter diferentes origens evolutivas, mas fortes evidências sugerem que a origem da queda direcional está principalmente relacionada com florestas alagadas, como uma estratégia para diminuir a pressão de predação nesse ambiente e sobreviver à inundação (Yanoviak et al. 2005).

Por outro lado, as espécies associadas ao solo, à serapilheira e a moitas de vegetação estão entre as espécies mais afetadas pela inundação (Philpott et al. 2010).

114

Assim, formigas de solo que ocorrem em áreas inundadas desenvolveram formas de lidar com as alterações sazonais desse ambiente. Alguns mecanismos de sobrevivência incluem evacuar os ninhos para áreas mais altas ou para as árvores (Adis 2001,

Ballinger et al. 2007, Lude et al. 1999), ou formar aglomerados compostos pela rainha, soldados e prole para serem carregados pela corrente d’água até uma área seca. Ainda que a capacidade de nado não seja um comportamento comum em formigas, algumas espécies desenvolveram formas de se deslocar sobre a água no período de inundação.

Isso favorece a continuação do forrageamento mesmo quando seu habitat é inundado

(Adis 1982).

Como formigas arborícolas têm menor contato com a água no período de inundação quando comparado as formigas de solo, nós avaliamos a capacidade de nado em formigas arborícolas que direcionam a queda. Nós esperamos que espécies arborícolas com queda direcional comprovada, tenham uma capacidade de natação menos desenvolvida. Dessa forma, essas espécies demorariam mais tempo para sair da

água quando comparadas as formigas de solo.

Métodos

Área de estudo

Realizamos esse estudo no Parque Nacional de Anavilhanas (PNA), no município de

Novo Airão, Amazônia Central. A área, banhada pelo Rio Negro, é caracterizada por diversas ilhas de florestas de igapó periodicamente inundadas.

Espécies estudadas

Nós selecionamos três espécies de formiga como modelo de estudo, de acordo com a disponibilidade e com o hábito de nidificação. Cephalotes atratus (Myrmicinae) é uma

115

formiga de dossel, que constrói ninhos no topo das árvores e forrageia frequentemente nos galhos em busca de pólen, néctar e exsudato de homópteros (Yanoviak et al. 2005).

Camponotus sp. (Formicinae) é uma espécie que forrageia na vegetação, com ninhos polidômicos (ninhos fragmentados em diversos domos), próximos ao nível do solo. Já foi descrito que a espécie C. atratus e que algumas espécies do gênero Camponotus apresentam capacidade de direcionar a queda e retornar ao tronco após cair de um ramo no dossel (Yanoviak et al. 2005). Formigas do gênero Atta (Myrmicinae) constroem grandes ninhos no solo e forrageiam nas árvores em busca de folhas. Essas formigas dificilmente mudam seus ninhos de lugar, mantendo-se fixas por grande parte do tempo.

Além disso, forrageiam na vegetação e não apresentam capacidade de queda direcional.

Coleta das formigas e realização do experimento

Realizamos busca ativa por formigas em uma ilha do PNA. Como os ninhos de C. atratus são construídos no dossel, coletamos indivíduos que estavam forrageando na vegetação. Indivíduos de Atta sp. e Camponotus sp. foram coletados diretamente dos ninhos, encontrados em troncos caídos ou no solo.

Após a coleta das formigas em campo, conduzimos um experimento em laboratório para testar a capacidade de nado das diferentes espécies. Para isso, estabelecemos um círculo de 10,6 cm de diâmetro no centro de uma bandeja de 15 x 10 cm² com água. O experimento consistiu em quantificar o tempo que cada formiga levou para se deslocar para fora do círculo. Realizamos o experimento com 20 formigas de cada espécie.

116

Análises estatísticas

Nós comparamos o tempo de deslocamento para saída do circulo entre as três espécies usando uma Análise de Variância (ANOVA). Em seguida, fizemos comparações planejadas para buscar diferenças no tempo de deslocamento para fora do círculo entre os pares de espécies.

Resultados

O tempo médio que as formigas levaram para sair do círculo de 10,6 cm de diâmetro foi de 44,1 ± 25,87 s em C. atratus, 31,2 ± 28,9 s em Atta sp. e 3,6 ± 7,6 s em Camponotus sp. O tempo de deslocamento para fora do círculo do experimento diferiu entre as três espécies (F(2,57) =16,58; p<0,01; Figura 1). O tempo foi similar entre C. atratus e Atta sp. (t=1,8; gl=1; p=0,08) e foi cerca de oito vezes maior em Atta sp. quando comparado com Camponotus sp. (t=3,84; gl=1; p<0,01).

Figura 1. Tempo de deslocamento (em segundos) das formigas Cephalotes atratus, Atta sp. e Camponotus sp. para fora do círculo de 10,6 cm de diâmetro utilizado no experimento que avaliou a capacidade de natação das formigas. As barras representam médias e as linhas verticais o desvio padrão. 117

Discussão

As espécies que apresentam queda direcional, C. atratus e Camponotus sp., tiveram respostas opostas quanto a capacidade de natação, quando comparadas com a espécie

Atta sp. Dessa forma, a queda direcional não determinou a capacidade de nado dessas duas espécies. Outros fatores como hábito de nidificação, características de forrageio e estratégias de sobrevivência à inundação sejam importantes na diferenciação da capacidade de nado entre formigas.

As espécie C. atratus e Atta sp. não apresentaram capacidade de nado, ou foi pouco desenvolvida. O comportamento de queda direcional e a construção de ninhos e forrageio no dossel diminuem as chances de contato com o solo e a água durante a cheia. Isso pode justificar a baixa capacidade de nado dessa espécie. Já as formigas Atta sp. constroem ninhos únicos no solo, estando sujeitas a inundação. Nesse período, elas ficam em contato direto com a água e a única maneira da colônia sobreviver é abandonar o ninho e colonizar novas áreas secas (Lude et al. 1999). Dentre as estratégias para escapar do alagamento pode ocorrer a formação de uma aglomerado de indivíduos, com a rainha e a prole no centro, que flutuam até uma área longe da inundação, ou um possível investimento em indivíduos alados para iniciar uma nova colônia em outro local. Essas estratégias não incluem o nado, de modo que os indivíduos que não migram, podem morrer afogados ou predados por peixes na lâmina d’água.

Embora Camponotus sp. realize queda direcional sua capacidade de nado foi superior a Atta sp., contrariando nossa hipótese. Os indivíduos de Camponotus sp. acessam o dossel para forragear e seus ninhos são polidômicos, com domos de uma mesma colônia distribuído em diferentes regiões de uma mesma árvore ou distribuído em várias árvores próximas ao solo. A princípio, a construção desse tipo de ninho é uma

118

estratégia de forrageamento, pois aumenta a área ocupada pela colônia e o território para exploração dos recursos (Peeters & Molet 2010). É possível, que esse tipo de estratégia tenha favorecido a capacidade de nado nessa espécie, pois possibilita o acesso dos indivíduos aos domos da colônia que estão acima do nível da água em uma mesma

árvore ou nas árvores próximas.

Assim, a diferença na resposta de natação entre as três espécies pode ter ocorrido devido a um conjunto de fatores e não apenas pela capacidade de queda direcional das duas espécies arborícolas. As diferentes estratégias de sobrevivência, como deslocamento na água para acessar o ninho ou deslocar indivíduos para fora do alagamento, além de hábitos distintos de forrageamento e nidificação, podem ser determinantes no comportamento de nado de cada espécie.

Agradecimentos

Agradecemos ao Jack Sparrow (Fabrício Baccaro) por todo o aprendizado e pela viagem ao mundo das formigas e ao nosso barqueiro Carlos pela ajuda nas coletas.

Referências

Adis J. 2001. Amazonian (terrestrial). Pages:.249–260. In: Encyclopedia of

Biodiversity (S.A. Levin, ed), Vol. 1, San Diego: Academic Press.

Adis, J. & W.J. Junk. 2002.Terrestrial invertebrates inhabiting lowland river floodplains

of Central Amazonia and Central Europe: a review. Freshwater Biology, 47:711–

731.

Ballinger, A., P.S. Lake & R. Mac Nally. 2007. Do terrestrial invertebrates experience

floodplains as landscape mosaics? Immediate and longer-term effects of flooding

on ant assemblages in a floodplain forest. Oecologia, 152:227–38.

119

Bush, G.L. 1994. Sympatric speciation in animals: new wine in old bottles. Trends in

Ecology & Evolution, 9:285–288.

Holt, R.D., R. Gomulkiewicz & M. Barfield. 2003. The phenomenology of niche

evolution via quantitative traits in a ‘black-hole’ sink. Proceedings of the Royal

Society London B, 270:215–224.

Junk, W., P.B. Bayley & R.E. Sparks. 1989. The flood pulse concept in river-

floodplain-systems. Canadian Special Publications for Fisheries and Aquatic

Sciences, 106:110–127.

Junk, W.J. 1997. General aspects of floodplain ecology with special reference to

Amazonian floodplains. pages 3-20. In: The central Amazon floodplain – ecology

of a pulsing systems (W.J. Junk, ed). Springer-Verlag.

Krivan, V. 2003. Ideal free distributions when resources undergo population dynamics.

Theoretical Population Biology, 64:25–38.

Lude, A., M. Reich, & H. Plachter. 1999. Life strategies of ants in unpredictable

floodplain habitats of Alpine rivers (Hymenoptera: Formicidae). Entomologia

Generalis, 24:75–91.

Peeters, C. & M. Molet. 2010. Colonial reproduction and life histories, pp.159-162. In:

Ant ecology (L. Lori, C.L. Parr & K.L. Abbott, eds). Oxford: Oxford University

Press.

Philpott, S.M., I.Perfecto, I. Armbrecht & C.L. Parr. 2010. Ant Diversity and Function

in Disturbed and Changing Habitats, pp.137-142. In: Ant ecology (L. Lori, C.L.

Parr & K.L. Abbott, eds). Oxford: Oxford University Press.

Yanoviak S.P., R. Dudley & M. Kaspari. 2005. Directed aerial descent in canopy ants.

Nature, 433:624–626.

120

Yanoviak, S.P, Y. Munk & R. Dudley. 2011. Evolution and ecology of directed aerial

descent in arboreal ants. Integrative and Comparative Biology, 51:944–956.

121

O tempo de submersão de plântulas de Dalbergia sp. gera um investimento

diferencial entre os sistemas aéreo e radicular?

Artur Madeira, Bianca Silva, Daniel Passos, Ludmila Rattis

Introdução

O pulso de inundação é uma elevação periódica no nível da água em regiões alagáveis que separa o ambiente em dois períodos bastante distintos: o período da cheia e o período da seca (Junk et al. 2010). Essa divisão resulta em mudanças que geram uma pressão seletiva sobre os organismos daquele ambiente, por exemplo, por alterar a disponibilidade de oxigênio no solo durante o período de cheia. Solos inundados se tornam anóxicos ou hipóxicos dentro de horas, como resultado do consumo do oxigênio por raízes e microorganismos, e pela baixa difusão de oxigênio na água (Parolin et al.

2004). Essas condições contrastantes favoreceram a evolução de adaptações e estratégias que permitiram o estabelecimento de espécies nesses ambientes (Junk et al.

2010).

Uma adaptação comum de espécies de plantas em ambientes alagáveis é a sincronia da produção e liberação de frutos na época em que o período de cheia está no auge, favorecendo estratégias de dispersão como a hidrocoria (Wittmann et al. 2007).

As sementes são então liberadas ao mesmo tempo na água, sendo depositadas no solo à medida que o nível da água começa a baixar. Assim, uma semente depositada em um local mais baixo permanece mais tempo na água e isto pode afetar o investimento diferencial em partes da planta.

Ao germinar, o embrião começa a se desenvolver utilizando reservas de energia e nutrientes armazenados no cotilédone até que ele produza folhas e comece a fazer fotossíntese (Malavasi & Malavasi 2001, Parolin 2002). Em resposta à pressão causada

122

por uma possível submersão no próximo período de cheia, as plântulas desenvolveram duas estratégias principais que não são mutuamente exclusivas, evitar ou tolerar a submersão total (Parolin 2002).

Durante a cheia, locais mais baixos serão os primeiros a serem cobertos e os

últimos a serem descobertos pela água, estando sujeitos a um maior tempo de submersão, enquanto locais mais altos ficarão submersos por menos tempo. Assim, o maior investimento no sistema aéreo permitirá que a plântula fique o mais alta possível antes que o próximo período de cheia comece, mantendo suas folhas acima do nível da

água por mais tempo (Parolin 2002). Por outro lado, o maior investimento no sistema radicular permitirá que a plântula se fixe mais firmemente, evitando sua remoção durante o período de submersão, e que ela absorva água e nutrientes do solo com maior eficiência.

Nas margens do Rio Negro sujeitas à inundaçào (igapó), plântulas de Dalbergia sp. podem ser encontradas tanto em locais mais altos como em locais mais baixos. As plântulas das regiões mais baixas ficarão mais tempo submersas e por isso seria vantajoso para elas investir mais no sistema aéreo. Nestas regiões baixas, plântulas mais altas demorariam mais para serem totalmente submersas e, quando o nível da água começasse a baixar novamente, elas seriam descobertas pela água mais cedo do que plântulas mais baixas. Por outro lado, plântulas de regiões mais altas ficariam submersas por menos tempo pois já se encontram em um local menos sujeito à inundação e, por isso, deveriam investir mais no sistema radicular, melhorando sua fixação e absorção de água e nutrientes do solo.

Nosso objetivo foi avaliar se existe investimento diferencial em crescimento aéreo e radicular dependente do tempo de inundação ao qual a plântula será submetida.

123

Esperamos que plântulas localizadas em locais mais altos investirão mais no sistema radicular e plântulas localizadas em locais mais baixos investirão mais no sistema aéreo.

Métodos

Realizamos o trabalho no arquipélago de Anavilhanas, localizado no Rio Negro,

Amazonas, Brasil. Selecionamos dois locais, um mais baixo e sujeito a um maior tempo de inundação (cota baixa), e outro mais alto, que passa menos tempo sujeito à inundação

(cota alta). A diferença de altitude entre as duas cotas foi aproximadamente 2 m.

Em cada cota coletamos 33 plântulas de Dalbergia sp. (Leguminosae). Medimos o comprimento do epicótilo e o comprimento da radícula de cada indivíduo. Para medir o comprimento do epicótilo, consideramos a distância da parte aérea desde o ponto de saída do cotilédone até a primeira folha formada. Consideramos o tamanho da radícula como o comprimento da raiz principal. Então, calculamos a razão entre o comprimento do epicótilo e o comprimento da radícula (razão epicótilo-radícula). Realizamos um teste t unicaudal para avaliar se a razão epicótilo-radícula (variável resposta) varia entre as cotas de inundação alta e baixa (variável preditora). Especificamente, testamos a previsão de que a razão epicótilo-radícula é maior na cota baixa.

Resultados

Nossa análise demonstrou que a razão epicótilo-radícula das cota de inundação mais alta não foi menor do que a razão da cota baixa (t = 1,30; gl = 64; p = 0,10; Figura 1).

124

4,5

4,0

3,5

3,0

2,5

2,0

Razão Epicótilo/Radícula Razão

1,5

1,0 Baixa Alta Cota de Inundação

Figura 1. Razão epicótilo-radícula entre cotas de inundação (baixa e alta) em plântulas de Dalbergia sp. de uma floresta de igapó no arquipélogo de Anavilhanas, Manaus,

Brasil. Pontos e barras representam média ± desvio padrão.

Discussão

Não houve efeito do tempo de submersão das plântulas sobre o investimento nos sistemas aéreo e radicular em Dalbegia sp.. Isso indica que o investimento das reservas do cotilédone em fixação e crescimento se dá de forma semelhante, independente do local de estabelecimento.

Plântulas estão sujeitas à submersão mesmo nos locais mais altos. Assim, é provável que as plântulas de Dalbergia sp., independente da cota, invistam mais em estratégias de tolerância à submersão. Por outro lado, as plântulas também podem investir em crescimento rápido, independente do local em que se encontram, de forma a reduzir ao máximo o tempo de submersão de suas folhas no próximo período de inundação (Parolin 2002). Portanto, mesmo que as plântulas invistam mais em estratégias de crescimento, elas o fazem de maneira similar em ambas as cotas.

125

Se as plântulas não respondem ao tempo de inundação de formas diferentes em cotas altas e baixas, os indivíduos de cotas baixas serão afetados pela inundação antes e permanecerão assim por mais tempo do que indivíduos de cotas altas. Isso acarretará em um menor tempo para crescimento nas cotas baixas. Assim, a estratégia de tolerância deve ser mais importante para as plântulas, enquanto que a estratégia de escape do efeito prolongado de inundação pode ser mais importante no estágio adulto, quando ocorre a produção de sementes. Considerando que a cota em que a semente será depositada depende do nível da água, é mais vantajoso liberar os frutos no auge do período de cheia aumentando as chances da semente ser depositada em uma cota mais alta.

Concluímos que não houve investimento diferencial nos sistemas aéreo e radicular em Dalbergia sp. entre cotas com uma diferença de até 2 m de altura. Porém esse resultado não invalida a possibilidade de que o efeito exista entre cotas com maiores diferenças de altura.

Referências

Junk, W.J., M.T.F. Piedade, F. Wittmann, J. Schongart & P. Parolin (eds). 2010.

Amazonian Floodplain Forests: Ecophysiology, Biodiversity and Sustainable

Management. New York: Springer.

Malavasi, U.C. & M.M. Malavasi. 2001. Influência de tamanho e do peso da semente na

germinação e no estabelecimento de espécies de diferentes estágios da sucessão

vegetal. Floresta e Ambiente, 8:211-215.

Parolin, P. 2002. Submergence tolerance vs. escape from submergence: two strategies

of seedling establishment in Amazonian flood plains. Environmental and

Experimental Botany, 48:177-186.

126

Parolin, P., O. De Simone, K. Haase, D. Waldhoff, S. Rottenberger, U. Kuhn, J.

Kesselmeier, B. Kleiss, W. Schmidt, M.T.F. Piedade & W.J. Junk. 2004. Central

Amazonian floodplain forests: tree adaptations in a pulsing system. The Botanical

Review, 70:357-380.

Wittmann, A.O., M.T.F. Piedade, P. Parolin & F. Wittmann. 2007. Germination in four

low-várzea tree species of Central Amazonia. Aquatic Botany, 86:197-203.

127

Anavilhanas – projetos livres

A borboleta Glutophrissa drusilla (Pieridae) prefere cruzar rios mais largos entre

as manchas florestais

Mariana Velasque, Ana Carolina Vieira Pires, Tatiane G. C. Menezes, Renata Pimentel

Rocha e Ludmila Rattis

A migração é um padrão de movimentação direcional de grande número de indivíduos de uma mesma espécie. Durante esse trajeto, o deslocamento por áreas com poucos refúgios pode ser prejudicial para os organismos, devido ao aumento na exposição a predadores. Assim, organismos que têm o comportamento de selecionar rotas de migração que minimizem o risco de predação deveriam ser favorecidos. No

Arquipélago de Anavilhanas, observamos indivíduos da borboleta Glutophrissa drusilla atravessando braços do rio Negro de diferentes larguras entre fragmentos de mata, em voo direcionado ao sul, o que indica um comportamento migratório. Uma vez que braços mais largos do rio aumentam a exposição da borboleta a possíveis predadores, propomos a hipótese de que elas preferem cruzar braços mais estreitos. Para isso, realizamos observações a cada 30 min , entre 9 h e 12 h, em um braço mais largo do rio

(533 m) e outro mais estreito (80 m). Registramos em média 1,5 vezes mais borboletas cruzando o braço largo do rio (F(1,5)=35,7; p=0,002). Observamos quatro ataques de aves apenas no braço mais longo, todos sem captura. A maior frequência de borboletas sobrevoando o leito largo indica que há um direcionamento da rota de forma a atravessar áreas abertas mais extensas entre fragmentos de mata. Dessa forma, sugerimos que essas áreas abertas poderiam proporcionar maior visibilidade, possibilitando o escape de ataques de predadores. Porém ,ainda que rios largos 128

permitam maior visibilidade, a utilização dos fragmentos de floresta entre os braços de rio poderia servir como pontos de descanso.

129

O tamanho das pernas de formigas em áreas alagáveis influencia sua capacidade

de deslocamento na água?

Caroline Marques Dracxler, Lorena Costa Pinto, Vidal Carrascosa, Daniela Pinto

Coelho e Sarah Freitas Magalhães

Em ambientes alagáveis, formigas de solo entram periodicamente em contato com a

água e precisam se deslocar para reestabelecer seus ninhos. No entanto, a capacidade de deslocamento na água varia entre diferentes espécies de formigas. De forma geral, quanto maior o tamanho do tórax das formigas, proporcionalmente maior é o tamanho de suas pernas, o que pode facilitar o deslocamento na água durante o período de inundação. Assim, esperamos que formigas com menor relação entre perna e tórax apresentarão menor velocidade de deslocamento sobre a lâmina d’água. Testamos a capacidade de deslocamento de oito espécies (seis gêneros) de formigas de solo coletadas em uma área de igapó no Parque Nacional de Anavilhanas.

Experimentalmente, estabelecemos um círculo de 22,5 cm de diâmetro em uma bacia com água e registramos a velocidade de deslocamento para fora do círculo de três indivíduos de cada espécie. Calculamos a proporção perna/tórax de cada indivíduo e obtivemos as médias para cada espécie. A velocidade mínima e máxima registrada foi

0,22 cm/s e 8,25 cm/s, respectivamente, e a proporção perna/tórax variou de 1,73 a 3,24.

Não houve relação entre a proporção perna/tórax das formigas e a velocidade de deslocamento (F(1,6)=0,26; p=0,63). Apesar dessas espécies viverem em áreas inundáveis, o tamanho das pernas parece não fornece vantagem no deslocamento sobre a superfície da água. No entanto, é possível que certas características morfológicas, como cerdas maiores ou presença de cera na superfície do tegumento favoreçam maior flutuação e maior eficiência de deslocamento na água.

130

Pernas para que te quero? Função das pernas na natação da formiga Camponotus

sp. (Formicidae)

Randolpho Dias-Terceiro, Artur Madeira, Daniel Passos, Cibele Paiva & Leonardo

Oliveira

Formigas de ambientes periodicamente alagáveis ocasionalmente podem entrar em contato com a água e, portanto, indivíduos capazes de nadar podem aumentar sua sobrevivência em relação àqueles destituídos da capacidade natatória. Operárias de formigas do gênero Camponotus são capazes de nadar movimentando as pernas anteriores e mantendo as posteriores estáticas e paralelas à superfície d’água. Nossa hipótese é de que as pernas anteriores são responsáveis pela propulsão enquanto as posteriores exercem função de direcionamento do nado. Portanto, com a remoção das pernas anteriores o nado será mais lento e linear, enquanto que com a remoção das pernas posteriores o nado será rápido, porém sem direção. Coletamos indivíduos de

Camponotus sp. e aplicamos três tratamentos: remoção das antenas (controle), das pernas posteriores e das anteriores. Medimos a velocidade (cm/s) e a linearidade do nado de 15 formigas por tratamento. Indivíduos do grupo controle apresentaram maior velocidade (F(2,42) = 21,15; p < 0,01) e linearidade (F(2,42) = 3,51; p = 0,04) no nado quando comparado aos indivíduos dos demais tratamentos. Entretanto, os tratamentos de remoção das pernas anteriores e posteriores não diferiram entre si quanto à velocidade ou linearidade do nado. Tanto a remoção das pernas anteriores quanto posteriores implicou em menor eficiência natatória, sugerindo que as funções de propulsão e direcionamento do nado não são realizadas independentemente por um par de pernas em particular.

131

Variação da capacidade de armazenamento de água na planta Psychotria sp.

mediada por filtro ambiental

Ana Claudia Rorato, Joselândio Santos, Bianca Ferreira, José Hidasi Neto & Bruno

Travassos

Filtros ambientais podem gerar mortalidade diferencial em indivíduos com características de tolerância distintas. Em um determinado conjunto de condições, sobrevivem indivíduos que são funcionalmente semelhantes (convergência). Bordas florestais apresentam maior incidência luminosa, favorecendo maior dessecação, em comparação ao interior florestal. Investigamos o efeito da borda no armazenamento hídrico em Psychotria sp. (Rubiaceae). Nossa hipótese é que a borda leva a uma convergência na capacidade de armazenamento hídrico. Coletamos 40 indivíduos, 20 na borda e 20 no interior florestal. Para cada indivíduo, calculamos a diferença entre a massa foliar túrgida e a massa seca (DMF) para quatro folhas. Previmos que, na borda,

Psychotria sp. apresentaria maior média, porém menor variabilidade em DMF.

Comparamos as médias de DMF entre as áreas e os desvios padrões observados de

DMF com o desvio esperado em um modelo nulo. As médias de DMF foram semelhantes (F=38,31; p=0,48; gl=38). Entretanto, o desvio de DMF foi menor que o esperado na borda (p < 0,01), mas não no interior (p = 0,89). Assim, as condições na borda atuam como filtros na convergência de armazenamento hídrico em Psychotria sp., porém esse armazenamento não foi maior nesse ambiente. Isso indica que indivíduos com potenciais de armazenamento muito baixos ou muito elevados são eliminados na borda. Indivíduos com baixo armazenamento hídrico seriam desfavorecidos devido à alta taxa de dessecação. Por outro lado, potenciais de armazenamento muito elevados

132

podem estar associados a folhas pouco esclerificadas e mais susceptíveis à herbivoria, que seriam desfavorecidas na borda.

133

Km 41 – projetos orientados

A aranha Faiditus subflavus (Theridiidae) selecionam indivíduos de Maieta

guianensis (Melastomataceae) com menor dano foliar?

Leonardo Oliveira, Renata Rocha, José Hidasi e Ana Carolina Vieira Pires

Introdução

A seleção de habitat pode ser definida como a escolha que os indivíduos fazem por locais que favorecem sua sobrevivência e reprodução (Orians 1991). Essa relação pode ocorrer de acordo com diversos fatores, como menor risco de predação e parasitismo.

Em locais com elevada pressão de predação, os indivíduos podem selecionar habitats específicos (Ricklefs & Schluter 1993) que apresentam componentes capazes de reduzir o risco de predação para o adulto e/ou a prole. Assim, o processo de escolha do habitat é um fator que pode determinar o sucesso reprodutivo do indivíduo (Sih 1980).

Diversas aranhas maximizam o sucesso reprodutivo por meio da escolha de habitats de melhor qualidade, que podem ser compreendidos como sítios mais seguros, com maior disponibilidade de recursos ou que apresentam estruturas para a fixação da teia (Allan 1995). O processo de escolha do habitat pode envolver sentidos visuais, táteis ou olfativos. Por exemplo, a aranha Misumena vatia (Thomisidae) utiliza pistas visuais e táteis para selecionar melhores sítios de forrageio, o que aumenta o sucesso reprodutivo dos indivíduos dessa espécie (Fritz & Morse 1985, Greco & Kevan 1994).

Além disso, alguns grupos de aranhas como as que vivem em plantas, podem usar indicativos indiretos de qualidade do habitat, como o dano físico provocado por herbívoros. Isso pode indicar a existência de intensa atividade de insetos na planta, que

134

podem servir tanto para alimentação como para a proteção das aranhas (Romero &

Vasconselos-Neto 2007).

Essas pistas indiretas podem ser particularmente importantes para aranhas que habitam plantas mirmecófitas. Nesse sistema, as plantas possuem estruturas que abrigam formigas, as quais patrulham a planta em busca de herbívoros (Vasconcelos

1991). Dessa forma, danos físicos provocados por herbivoria podem indicar baixa capacidade de proteção da planta pelas formigas.

No ambiente amazônico, a aranha Faiditus subflavus (Theridiidae) apresenta uma relação íntima com a mirmecófita Maieta guianenses (Melastomataceae). As formigas da espécie Pheidole minutula (Myrmicinae), que residem nessa planta oferecem proteção para a aranha adulta e para a prole por meio do patrulhamento da superfície, no qual ela afasta possíveis predadores (Santos 2007) e parasitas das aranhas.

Indivíduos de M. guianensis são encontrados exibindo diferentes níveis de dano foliar por herbivoria. Assumindo que folhas com menos herbivoria podem indicar para as aranhas que as formigas oferecem boa defesa, avaliamos se as aranhas se estabelecem preferencialmente em plantas mais protegidas por formigas e consequentemente com menos herbivoria. Esperamos que a presença de aranhas seja maior nas plantas com menor número de folhas consumidas.

Métodos

Área de estudo

Realizamos a coleta de dados em uma área de floresta contínua na Reserva do Km 41 próxima ao município Rio Preto da Eva, na Amazônia Central, Brasil. O local é classificado como uma ARIE (Área de Relevante Interesse Ecológico), gerido pelo

ICMbio e pelo Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF).

135

Coleta de dados

Selecionamos 20 indivíduos de M. guianensis próximo a um igarapé, sendo 10 indivíduos com aranhas e 10 indivíduos sem aranhas. Restringimos nossa coleta para amostrar apenas plantas que continham entre 10 e 20 domáceas, pois abaixo de 10 domáceas as plantas são muito pequenas e acima de 20 existe alta taxa de ocorrência de

F. subflavus (Santos 2007). Para obter o dano foliar, contamos em cada planta o número total de folhas e a quantidade de folhas com dano.

Análise dos dados

Testamos a previsão de que a presença de aranhas é maior nas plantas com menor número de folhas consumidas. Para isso, comparamos a diferença de ajuste entre um modelo saturado e reduzido. O modelo saturado conteve a ocorrência de aranhas como variável dependente e as variáveis número total de folhas e número de folhas consumidas como variáveis independentes. O modelo reduzido foi obtido por meio da remoção da variável número de folhas consumidas do modelo saturado.

Resultados

Encontramos uma grande variação no número de folhas danificadas. As plantas que continham aranhas apresentavam entre 5 e 19 folhas consumidas, com o número total de folhas variando de 23 a 49. As plantas sem aranhas tiveram de 3 a 17 folhas consumidas, com o número total de folhas variando entre 16 e 33. O número de folhas consumidas não explicou a presença e ausência de aranhas na planta (χ²= 0,57; gl= 1; p=

0,45; Figura 1).

136

Figura 1. Presença e ausência de aranhas F. subflavus em função da quantidade de folhas consumidas da planta M. guianensis em uma floresta contínua, Amazônia central,

Manaus, Brasil. O “0” no eixo vertical indica ausência e “1” indica presença.

Discussão

Ao contrário do esperado, as fêmeas de F. subflavus não selecionaram plantas com menor herbivoria para construir sua teia, indicando que a herbivoria não é um indicativo de segurança. A herbivoria modifica a arquitetura da planta no momento em que o herbívoro remove a biomassa vegetal das folhas. Assim é possível inferir que a herbivoria reduza o substrato utilizado pela aranha para ancoragem da teia, o que implica em ausência da aranha na planta. Entretanto, a aranha F. subflavus utiliza a base das folhas para a construção da teia (Kasper 2006). No nosso estudo, a base das folhas permaneceu intacta, pois os danos foliares se concentraram na parte anterior da folha, sugerindo que, nesse caso, a herbivoria não reduz o substrato necessário para a aranha se estabelecer. Assim, sugerimos que o padrão de herbivoria observado não é suficiente para impedir o estabelecimento das teias de F. subflavus.

137

O tamanho da planta por outro lado é apontado como uma das principais características que influenciam positivamente as comunidades de artrópodes (Kuppers

1989). No caso específico do estudo, sabemos que a altura da planta está relacionada com a quantidade de formigas (Santos 2007). Como as formigas protegem a aranha, podemos sugerir que o tamanho da planta pode indicar para a aranha a quantidade de formigas nas plantas, o que indica maior proteção. Além disso, podemos esperar que quanto maior a planta maior a possibilidade de encontrar sítios para ancoragem da teia.

De forma geral, podemos concluir que a herbivoria não é indicativo de qualidade de habitat para F. subflavus e que outros fatores, como o tamanho da planta, pode influenciar na seleção do habitat.

Agradecimentos

Agradecemos a Thiago Kloss e Paulo Bobrowiek pelo auxílio em campo e orientações na redação do manuscrito.

Referências

Allan, J.D. 1995. Stream ecology. Structure and function of running waters. London:

Chapman & Hall.

Fritz, R.S. & D.H. Morse. 1985. Reproductive success and foraging of the crab spider

Misumena vatia. Oecologia, 65:194-200.

Greco, C.F. & P.G. Kevan. 1994. Contrasting patch choosing by anthophilous ambush

predators: vegetation and floral cues for decision by a crab spider (Misumena

vatia) and males and females of an ambush bug (Phymata americana). Canadian

Journal of Zoology, 72:1583-1588.

138

Kasper, D. 2006. Fatores ambientais que influenciam a ocorrência e abundância de

aranhas Faiditus subflavus (Theridiidae) em plantas do gênero Maieta

(Melastomataceae). In: Curso de campo ecologia da floresta amazônica (G.

Machado & J.L. Camargo, eds.). INPA/PDBFF, Manaus.

Kuppers, M. 1989. Ecological significance of above-ground architectural patterns in

woodplants: a question of cost-benefit relationship. Trend in ecology & Evolution,

4: 375-379.

Orians, G.H. 1991. Preface. The American Naturalist, 137:S1-S4.

Ricklefs, R.E. & D. Schluter. 1993. Species diversity in ecological communities.

Chicago: University of Chicago.

Romero, G.Q. & J. Vasconselos-Neto. 2007. Aranhas sobre plantas: dos

comportamentos de forrageamento às associações específicas, pp.67-88. In:

Ecologia e comportamento de aranhas (M.O. Gonzaga, A.J. santos & H.F.

Japyassú, eds.). Rio de janeiro: Interciência.

Sih, A. 1980. Optimal behavior: can foragers balance two conflicting demands?

Science, 210:1041-1043.

Santos, G.R. 2007. Babás ou guarda-costas: a formiga Pheidole minutula (Myrmicinae)

protege os filhotes ou as fêmeas da aranha Faiditus subflavus (Theridiidae)? In:

Curso de campo ecologia da floresta amazônica (G. Machado & J.L. Camargo,

eds.). INPA/PDBFF, Manaus.

Vasconcelos, H.L. 1991. Mutualism between Maieta guianensis Abul. A

myrmecophytic melastome, and one of its ant inhabitants: and protection against

insect herbivores. Oecologia, 87:295-298.

139

Importância relativa do espaço e do ambiente na explicação da diversidade beta:

um teste da Teoria do Nicho x Teoria Neutra em pequena escala

Daniela Coelho, Bruno Travassos, Randolpho Dias-Terceiro e Cibele Paiva

Introdução

A distribuição das espécies no espaço vem sendo discutida desde o século XIX, com os trabalhos de Humboldt e outros geógrafos. Eles estabeleceram os fundamentos da biogeografia moderna e basearam seus trabalhos nos diferentes padrões de distribuição das espécies e comunidades (McIntosh 1991) que hoje é estudado pela ecologia de comunidades (Gravel et al. 2006). Existem duas correntes teóricas que explicam a distribuição das espécies de forma distintas, a teoria de nicho e a teoria neutra.

A teoria de nicho assume que os ambientes são heterogêneos, e possuem recursos e condições distribuídos de maneira diferenciada no espaço. Ainda, esta teoria assume que as espécies possuem diferentes necessidades e habilidades para a obtenção desses recursos. Portanto, espécies somente devem ocorrer em locais onde existam condições adequadas e recursos suficientes para sua sobrevivência. De acordo com essa teoria, quanto mais diferentes forem dois hábitats em condições ambientais, mais dissimilares suas comunidades devem ser, ou seja, maior a diversidade-β entre eles

(MacArthur & MacArthur 1961).

A teoria neutra assume que as espécies são ecologicamente equivalentes e possuem igual probabilidade de ocupar um local no espaço (Hubbell 2001). Nessa situação, o que explicaria a ocorrência das espécies seriam processos de contingência histórica, extinções estocásticas e habilidade de dispersão dos organismos (Whitfield

2002). Uma vez que a habilidade de dispersão é limitada, a probabilidade de uma espécie se dispersar para outro lugar reduz quanto mais distante for esse lugar

140

(MacArthur & Wilson 1967). Dessa forma, uma decorrência lógica dessa teoria é que quanto mais distantes as comunidades estão no espaço, mais dissimilares elas devem ser, ou seja, apresentarão maior diversidade-β.

Alguns autores argumentam que essas duas teorias não são precisamente antagônicas, mas sim complementares (Gravel et al. 2006). É provável que a escala espacial tenha um papel importante no poder de previsão dessas duas teorias (Levin

1992). Os modelos derivados da teoria neutra parecem ter melhor aceitação em escalas regionais (e. g. MacArthur & Wilson 1967; Kadmon & Allouche 2007). Entretanto, em escalas mais restritas, o modelo neutro pode não ser muito eficaz para explicar mudanças na composição de espécies. Por outro lado, as previsões da teoria de nicho parecem robustas mesmo em escalas finas.

Avaliamos os efeitos do espaço e do ambiente sobre a diversidade-β.

Especificamente, hipotetizamos que a diversidade-β varia com a diferença entre ambientes. Prevemos que, mesmo em pequena escala, ambientes distintos possuam maior dissimilaridade do que ambientes semelhantes. Por outro lado, a diversidade beta não deve variar em pequenas distâncias, pois a dispersão seria suficiente para homogeneizar a composição de espécies dentro de escalas pequenas.

Métodos

Realizamos o estudo na reserva florestal do Km 41, na área do Projeto de Dinâmica

Biológica de Fragmentos Florestais, a cerca de 80 km ao norte de Manaus. Escolhemos uma área de mata fechada cortada por uma estrada, que possui dois ambientes com características distintas, borda e mata fechada. Estabelecemos quatro blocos onde os dois ambientes estavam contidos. Estes blocos eram distantes 80 m.

141

Em cada bloco fizemos cinco pontos de amostragem ativa de plantas

pertencentes a três famílias (Arecaceae, Melastomataceae e Polypodiaceae) durante 1,5

min. Para cada bloco consideramos o primeiro ponto amostral realizado na borda como

ponto focal. A partir desse ponto, definimos quatro pontos em distâncias diferentes na

borda e no interior da mata, dois deles a 20 m (pontos 1 e 3) e os outros dois a 60 m

(pontos 2 e 4) do ponto focal (Figura 1). As plantas coletadas em cada ponto foram

levadas ao laboratório e morfotipadas.

Figura 2. Delineamento amostral dentro de cada bloco. O ponto focal está indicado pela letra ‘F’. Os dois pontos de distância diferentes na borda estão indicados pelos números

1 e 2. Os pontos amostrais na mata estão indicados pelos números 3 e 4.

Análise dos dados

Para cada bloco calculamos a diversidade-β do ponto focal em relação aos outros quatro

pontos amostrais, obtendo quatro valores de diversidade-β. Fizemos a comparação entre

os pontos através do índice de dissimilaridade de Jaccard. Realizamos uma Análise de

Variância (ANOVA) de dois fatores em blocos para testar o efeito dos tipos de ambiente

142

(borda, mata) e da distância (perto [20 m], longe [60 m]) sobre a diversidade-β (variável resposta).

Resultados

No levantamento foram registradas 29 morfoespécies de plantas, sendo 17 morfoespécies de Melastomataceae, seis de Arecaceae e seis de Polypodiaceae. As espécies de Melastomataceae tiveram maior ocorrência nos pontos estabelecidos nas bordas. Por outro lado, as espécies de Arecaceae e Polypodiaceae foram mais abundantes no interior da mata.

A ANOVA indicou que não houve efeito da interação entre ambiente e distância sobre a diversidade-β (r²=0,02; F(1,11) = 0,97; p = 0.34; Figura 2). A diversidade-β foi maior entre locais de ambientes distintos do que entre locais de mesmo ambiente (r2 =

0,68; F(1,11) = 27,63; p < 0,001). No entanto, a dissimilaridade entre locais do mesmo

2 ambiente em função da distância não diferiu (r = 0,02; F(1,11) = 1,14; p = 0,31) (Figura

2).

143

Figura 2. Efeitos do ambiente e espaço sobre a dissimilaridade de espécies de plantas

(famílias Melastomataceae, Arecaceae e Polypodiaceae) entre sítios na borda e dentro da mata. Os círculos preenchidos indicam a média da dissimilaridade entre os pontos focais (borda) e os pontos na mata. Os círculos vazios indicam a média da dissimilaridade entre os pontos focais (borda) e os pontos na borda. As barras verticais indicam o erro padrão.

Discussão

A variação do tipo de ambiente explicou a variação na diversidade β em pequena escala.

Em contrapartida, a diversidade-β não apresentou variação em relação ao mesmo ambiente em distâncias distintas. Este resultado indica que variações ambientais foram mais importantes que a distância espacial na determinação da ocorrência de espécies, como previsto pela teoria do nicho.

Como ambientes de borda diferem quanto ao microclima em relação ao interior de mata, variações na disponibilidade de recursos, como luz e nutrientes, e condições, como umidade e modificação do regime dos ventos, podem afetar o estabelecimento das

144

espécies de plantas (Murcia 1995; Primack & Rodrigues 2001). Estudos prévios indicam que grupos diferentes de espécies vegetais são adaptados a viverem em condições distintas, como aquelas de borda e interior (Murcia 1995).

Apesar da variação na diversidade-β não ter sido explicada pela distância, conforme previsto pela teoria neutra, é possível que ela seja capaz de explicar padrões de distribuição de espécies em escalas maiores. Em escalas menores, como a utilizada neste estudo, a capacidade de dispersão das espécies não representa um fator limitante para a colonização. Ou seja, as espécies são capazes de dispersar seus diásporos por toda a área de estudo, fazendo com que a composição de espécies seja homogênea.

A intensidade relativa de variação ambiental e espacial deve ser determinante sobre qual processo (filtro ambiental, dispersão) é mais importante na determinação do padrão de diversidade beta. Sendo assim, se o gradiente de variação ambiental for maior que o gradiente espacial, como o observado no presente estudo, processos associados ao nicho devem prevalecer. Por outro lado, se a variação espacial for maior que a variação ambiental, os padrões de dispersão podem se tornar mais importantes para determinar a troca de espécies.

Referências

Gravel, D., C.D. Canham, M. Beaudet & C. Messier. 2006. Reconciling niche and

neutrality: the continuum hypothesis. Ecology Letters, 9:399-409.

Hubbell, S.P. 2001.The Unified Neutral Theory of Biodiversity and Biogeography.

Niche Theory. The American Naturalist, 170:443-454Levin, S.A. 1992. The problem of

pattern and scale in ecology. Ecology, 73:1943-1967.

MacArthur, R. H. & J. W. MacArthur. 1961. On bird species diversity. Ecology,

42:594-598.

145

MacArthur, R.H. & E.O. Wilson. 1967. The Theory of Island Biogeography. Princeton

University Press, Princeton.

McIntosh, R.P. 1991. Concept and terminology if homogeneity and heterogeneity in

ecology. Ecological Studies, 86:24-46.

Murcia, C. 1995. Edge effects in fragmented forest: implications for conservation.

Trends in Ecology and Evolution, 10:58-62.

Primack, R.B. & E. Rodrigues. 2001. Biologia da Conservação. Londrina: E. Rodrigues.

Princeton University Press, Princeton, NJ.

Whitfield, J. 2002. Neutrality versus the niche. Nature, 417:480-481.

146

Interação formiga-planta: a abundância da planta não afeta o número de formigas

mutualistas com que ela interage

Sarah Freitas Magalhães Silva, Ana Claudia Rorato, Artur Alcântara Madeira e Mariana

Velasque

Introdução

As interações interespecíficas são uma das principais forças estruturadoras das comunidades, influenciando a distribuição e abundância das espécies (Jones et al.

1994). Essas interações podem ocorrer de forma específica ou difusa. Interações específicas ocorrem quando pares de espécies interagem exclusivamente entre si. Já as interações difusas ocorrem quando uma espécie pode interagir com várias outras (Morin

2011).

Em sistemas de interações difusas, diferentes espécies têm diferentes números de interações. Dois mecanismos foram propostos para explicar o número de interações realizadas por uma espécie. É possível que espécies com determinados atributos sejam capazes de atrair um grande número de espécies que podem interagir com elas. Por outro lado, se a preferência por determinados atributos não existir, as espécies mais abundantes seriam aquelas que apresentam um maior número de associações com outras espécies (Vázquez & Aizen 2003).

Insetos e plantas interagem de formas espécífica e difusa. Plantas que apresentam nectários extraflorais (NEF) oferecem substâncias nutritivas às formigas, que forrageiam sobre suas folhas e em troca atuam na defesa contra herbívoros (Becerra

&Venable 1989). Em alguns casos, a interação formiga-planta é mediada por afídeos que sugam a seiva da planta, secretam uma solução açucarada que atrai formigas para as plantas (Engel et al. 2001). Em regiões tropicais, essas interações entre formigas e

147

plantas raramente são específicas, ocorrendo de forma facultativa e/ou oportunista, e portanto difusa (Rico-Gray & Oliveira 2007).

Observando formigas associadas a NEFs ou afídeos, nos questionamos sobre o que determina a quantidade de formigas com as quais uma planta dotada de NEFs ou afídeos pode interagir. Nossa hipótese é de que, quanto mais abundante for uma espécie de planta, maior é o número de espécies de formigas com as quais ela interage. Assim, esperamos que quanto maior o número de indivíduos de uma determinada espécie de planta, maior o número de espécies de formigas observadas em associação com ela.

Métodos

Área de estudo

Conduzimos o estudo na área de borda de uma floresta contínua de terra firme localizada na Reserva do Km 41 (02° 24’S e 59° 44’O) administrada pelo Projeto

Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF), localizada a cerca de 80 km ao norte de Manaus, Brasil.

Coleta dos dados

Para descrever as interações entre formigas e plantas, coletamos ao longo de um transecto de cerca de 100 m, 20 plantas que apresentavam interação com formigas, via nectários extraflorais ou afídeos. Consideramos que uma formiga estava interagindo com a planta quando ela estava forrageando próxima ao nectário ou ao afídeo. Por apresentarem uma interação com alta especialização, plantas mimercófitas e suas formigas associadas foram desconsideradas. Para reduzir a probabilidade de amostrar plantas visitadas pela mesma colônia de formigas e inflar os resultados das associações, coletamos indivíduos a cada 5 m no transecto. Uma vez que ao buscar quantificar as

148

associações, coletar em plantas próximas poderia alterar o resultado das interações, pois as relações poderiam ser em função da colônia e não pela abundância da espécie da formiga.

Para quantificar a abundância de plantas, delimitamos 20 parcelas de 25m², que distavam 5 m entre si. Em cada parcela coletamos todas as plantas que apresentavam nectários extraflorais ou afídeos. Posteriormente, classificamos as plantas e as formigas em morfoespécies, identificamos o gênero de algumas formigas quando possível. Se uma planta ocorreu nas amostragens de interação formiga-planta, mas não estava presente na amostragem de abundância, consideramos sua abundância como zero e incluímos esse valor na análise. Para avaliar se a abundância de uma espécie de planta determina o número das associações com as formigas, realizamos uma regressão linear entre a abundância de cada espécie de planta e o número de formigas observadas em associação com cada planta.

Resultados

Amostramos 20 plantas, sendo 13 de espécies diferentes. Dentre as formigas, encontramos 13 espécies diferentes, sendo que as mais abundantes foram

Crematogaster sp (quatro ocorrências), Azteca sp (três ocorrências) e uma formiga não identificada (três ocorrências). Não houve relação entre a abundância das plantas e o

2 número de espécies de formigas que interagiram com elas (F(1,11)=2,9, p=0,12, R =0,21).

149

Figura1. Número de morfoespécies de formigas que interagiram com cada espécie de planta em relação à abundância de cada planta.

Discussão

A interação entre formigas e plantas com nectários ou afídeos não é determinada pela abundância dessas plantas no ambiente. Esse resultado contraria conclusões anteriores de estudos realizados com redes de interações (Vázquez & Aizen 2003). É possível que a explicação para essa diferença esteja no fato de que a maioria desses estudos estimam a abundância a partir dos dados de interação, podendo causar um viés nessas estimativas. Nesse estudo, por outro lado, estimamos a abundância utilizando dados coletados de forma independente daqueles utilizados para avaliar as interações formiga- planta.

A ausência de relação entre a abundância de plantas e o número de interações que elas têm com as espécies de formigas sugere que exista uma preferência por parte das formigas em relação a plantas com determinados atributos. Por exemplo, espécies

150

de plantas com maior volume e qualidade do nectar podem atrair maior número de espécies de formigas (Elias 1983).

Uma explicação alternativa para a ausência de relação entre a abundância e o número de interações está relacionada com a proteção contra a herbivoria que as formigas conferem às plantas. Assim, se as plantas dependem dessa defesa (Guimarães

Jr. et al. 2006), é possível que aquelas menos abundantes invistam em mecanismos que as tornem mais atrativas para as formigas, compensando assim, o efeito da abundância.

Agradecimentos

Agradecemos ao Marcos Vieira e ao Paulo Enrique pela orientação do projeto e ajuda para fazer o manuscrito.

Referências

Becerra, J.X.I. & D.L. Venable. 1989. Extrafloral nectaries - a defense against ant-

homoptera mutualisms. Oikos, 55:276-280.

Elias, T.S. 1983. Extrafloral nectarines: their structure and distribution. Pp. 174-203. In:

Bentley, B. & Elias, T. (Ed.). The Biology of Nectaries. Columbia University

Press, New York.

Engel, V., M.K. Fischer, F.L. Wackers & W. Volkl. 2001. Interactions between

extrafloral nectaries, aphids and ants: are there competition effects between plant

and homopteran sugar sources? Oecologia, 129:577-584.

Guimarães Jr. P.R., V, Rico-Gray, S.F. Reis & J.N Thompson. 2006. Asymmetries in

specialization in ant–plant mutualistic networks. Proceedings of the Royal

Society B, 273:2041-2047.

151

Jones, C.G.; J.H. Lawton, & M. Shackak. 1994. Organisms as ecosystem engineers.

Oikos, 69: 373-386.

Morin, P. J. 2011. Community Ecology. New Jersey: Blackwell Publishing.

Rico-Gray, V & P.S. Oliveira. 2007. The ecology and evolution of ant-plant

interactions. Chicago: The University of Chicago Press.

Vázquez, D.P. & M.A. Aizen. 2003. Null model analyses of specialization in plant

pollinator interactions. Ecology, 84:2493–-2501.

152

Onde os similares também têm vez: árvores com morfologia foliar semelhante

coexistem em uma floresta secundária

Caroline Marques Dracxler, Joselândio Corrêa Santos, Ludmila Rattis e Bianca Ferreira da Silva

Introdução

A exclusão competitiva é um processo pelo qual espécies mais competitivas excluem outras espécies que adquirem de forma menos eficiente o mesmo recurso (Gause 1934).

Processos de segregação de nicho fazem com que algumas espécies coexistam por meio de mecanismos que reduzem ao máximo a sobreposição do uso do recurso (Abrams

1975, MacArthur & Levins 1967). Nesse sentido, se duas espécies muito similares ocupassem o mesmo local, a espécie menos competitiva seria excluída pela espécie mais competitiva. Mas se a espécie menos competitiva fosse suficientemente diferente em relação à espécie mais competitiva, ambas seriam mantidas no sistema. Assim, mecanismos de seleção podem limitar a similaridade entre os indivíduos que ocorrem em uma comunidade, favorecendo a coexistência de espécies ecologicamente distintas.

A segregação de nicho entre espécies pode ser ainda mais limitada em plantas, pois elas utilizam os mesmos recursos básicos, como dióxido de carbono, água, luz e nutrientes, gerando sobreposição no uso de recursos. Esses recursos podem ocorrer de forma especialmente limitada em florestas tropicais que ocorrem em solos pobres em nutrientes, como as florestas de terra firme na Amazônia Central (Chauvel 1983). Em florestas secundárias na Amazônia, a disponibilidade de recursos como água e nutrientes pode ser ainda mais restrita (Mesquita 2000), intensificando as relações competitivas entre as plantas. Dessa forma, modificações nas estratégias de obtenção e captação dos recursos permitiriam que um maior número de espécies coexistisse.

153

Algumas características das plantas, como a morfologia foliar, refletem as estratégias de captação e uso de recursos. A arquitetura das folhas e o seu posicionamento nas plantas, por exemplo, indicam como a planta capta luz e retém calor. Folhas grandes são capazes de reter mais calor e, consequentemente, transpiram mais do que folhas menores. Isso leva à maior perda de água pela planta e, consequentemente, à maior absorção de água e nutrientes no solo.

Como a limitação por similaridade permitiria que plantas que utilizam os mesmos recursos básicos coexistissem, avaliamos se plantas em uma mesma comunidade utilizam os recursos de forma diferencial. Assim, esperamos que duas plantas vizinhas apresentem morfologias foliares distintas.

Métodos

Realizamos o estudo em uma floresta secundária de terra firme próxima à Reserva do

Km 41, na Amazônia Central, situada a 80 km ao norte de Manaus. Selecionamos uma

área de capoeira em uma fazenda abandonada há cerca de 30 anos, localizada às margens da estrada ZF3.

Amostramos 16 pares de árvores ao longo de três transectos de 50 m paralelos à estrada. A cada 10 m ao longo dos transectos, selecionamos um indivíduo focal e seu vizinho mais próximo, ambos com circunferência à altura do peito (CAP) maior que 10 cm. Buscamos pares de árvores de modo a maximizar a variação da distância entre vizinhos e então medimos a distância entre as árvores de cada par. Além disso, somente selecionamos pares de indivíduos que possuíam ramos à altura máxima aproximada de

5 m. Em seguida, amostramos três ramos de cada indivíduo com o auxílio de um podão, e selecionamos duas folhas no meio de cada ramo, totalizando seis folhas por indivíduo.

Descartamos as folhas com marcas de herbivoria nas margens das folhas. Medimos o

154

comprimento e a largura de cada folha, a fim de obter a média do índice de forma

(índice de forma = comprimento / largura) e a área da folha (área da folha = π * comprimento * largura) por indivíduo. Em seguida, os dois índices foram padronizados, gerando valores entre zero e um, representando os menores e maiores valores, respectivamente.

Através dos valores padronizados de atributo, calculamos a distância euclidiana entre os vizinhos gerando assim um índice de dissimilaridade para cada par. Os valores do índice de dissimilaridade e a distância entre os vizinhos também foram padronizados entre 0 e 1, a partir dos quais realizamos um teste de canto vazio. Esse teste demarca um limite mínimo esperado para a observação dos pontos na análise, delimitando uma área vazia no canto inferior esquerdo do gráfico. Assim, esperamos que o valor do índice de dissimilaridade mínima diminua com o aumento da distância entre os vizinhos.

Resultados

A distância média entre os vizinhos foi de 1,44 m (DP=±0,89). Ao contrário do esperado, plantas mais próximas umas das outras não apresentaram maior índice de dissimilaridade (p=0,29; Figura 1).

155

1,0

0,8

0,6

0,4

Dissimilaridade

0,2 0

0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0

Distância do vizinho mais próximo

Figura 1. Relação entre o índice de dissimilaridade e a distância do vizinho mais próximo. De acordo com a hipótese de limitação por similaridade, os pontos deveriam estar acima da linha pontilhada.

Discussão

Os resultados sugerem que indivíduos localizados próximos uns aos outros podem ter modos similares de obtenção de recurso, logo, não houve limitação por similaridade.

Considerando que há um tipo ótimo de folha que maximiza a competitividade das plantas em um dado ambiente, plantas com folhas parecidas ao tipo ótimo seriam fortes competidoras, ao passo que plantas com folhas diferentes do tipo ótimo seriam menos competitivas. Diferentes cenários de capacidade competitiva das espécies podem explicar como plantas pouco dissimilares coexistiriam.

Em um primeiro cenário, quando dois indivíduos com o tipo de folha ótimo ocorrem próximos, um não consegue excluir o outro por serem competidores equivalentes. Em um segundo cenário, indivíduos com folhas diferentes do tipo ótimo

156

ocorrendo próximos também não conseguiriam se excluir, por estabelecerem uma relação competitiva equivalente entre si.

As relações competitivas entre indivíduos também são dependentes das condições ambientais e da disponibilidade de recursos. Em ambientes dinâmicos, como florestas em regeneração (Mesquita 2000), essas relações de competição poderiam ser alteradas. Desse modo, a estocasticidade ambiental poderia levar a uma alternância entre a hierarquia competitiva das espécies, ora favorecendo as espécies competidoras mais fortes, ora as mais fracas. Assim, a longo prazo, as capacidades competitivas das plantas equivaler-se-iam, permitindo sua coexistência (Wright 2002).

Nesse sentido, quando duas plantas com capacidades competitivas diferentes se estabelecem próximas, seria esperado que a melhor competidora excluiria a competidora mais fraca, por não serem competitivamente equivalentes. Assim, é possível que exista um limite de dissimilaridade ou um intervalo de similaridade entre organismos que coexistem.

Agradecimentos

Agradecemos ao Marcel Baby pela orientação e ajuda na construção das ideias e ao professor Adriano Melo pela ajuda com as análises estatísticas.

Referências

Abrams, P. 1975. Limiting similarity and the form of the competition coefficient.

Theoretical Population Biology, 8:356-375.

Chauvel, A. 1983. Os latossolos amarelos, álicos e argilosos dentro dos ecossistemas

das bacias experimentais do INPA e da região vizinha. Acta Amazonica, 12:47-60.

157

Gause, G.F. 1934. The struggle for existence. Williams & Wilkins, Baltimore. New

York: Halfner.

MacArthur, R. H. & R. Levins. 1967. The limiting similarity, convergence, and

divergence of coexisting species. The American Naturalist, 101:377-385.

Mesquita, R.C.G. 2000. Management of advanced regeneration in secondary forests of

the Brazilian Amazon. Forest Ecology and Management, 130:131-140.

Wright, S.J. 2002. Plant diversity in tropical forests: a review of mechanisms of species

coexistence. Oecologia, 130:1-14.

158

Plantas com folhas menores impedem o estabelecimento de minas e galhas

Daniel Passos, Tatiane Calaça, Lorena Pinto e Vidal Carrascosa

Introdução

O consumo de plantas por outros organismos é uma das relações bióticas mais freqüentes em ambientes terrestres (Schoonhoven et al. 2005). Estas interações ecológicas estão associadas a processos co-evolutivos, nos quais os herbívoros desenvolvem estratégias de ataque, enquanto as plantas desenvolvem defesas para combatê-los (Carmona et al. 2011). A relação dos herbívoros com as plantas pode ocorrer por duas vias principais: predação, que acarreta na morte de um indivíduo vegetal, ou parasitismo, quando apenas parte do organismo vegetal é consumido

(Millard & Way 2011).

Entre os organismos que se alimentam de plantas, existem parasitas que se estabelecem no interior dos tecidos vegetais, denominados endofíticos (Ribeiro et al.

1999). Estes parasitas são classificados em dois grupos: os minadores e os galhadores.

Minadores são insetos que se estabelecem entre as epidermes das folhas, consumindo o mesófilo foliar. Já os galhadores, que podem ser representados por bactérias, fungos e insetos, causam alterações anatômicas na folha, induzindo tumores e drenando recursos floemáticos da planta (Schoonhoven et al. 2005).

As plantas apresentam diversas estratégias para combater a herbivoria (Carmona et al. 2011). Estas estratégias podem atuar isoladamente ou em conjunto para impedir a infecção de parasitas ou reduzir os danos causados por eles aos tecidos vegetais (Millard

& Way 2011). Entre estas formas de defesa, existem mecanismos físicos, como o espessamento da cutícula, químicos, como a produção de metabólitos secundários, e fisiológicos como a abscisão da folha infectada por parasitas (Silva & Batalha 2011).

159

A abscisão foliar constitui uma estratégia fisiológica para a eliminação de folhas danificadas (Raven et al. 1992). Na perspectiva da planta, os custos para eliminação de uma folha podem variar de acordo com a quantidade de recursos investidos na mesma.

A perda de folhas pequenas, produzidas com menor investimento de recursos, seria menos custosa do que a perda de folhas grandes. Já na perspectiva do parasita, a infecção de uma folha pequena pode ser menos favorável, pois a quantidade de tecidos consumidos pelos minadores e de nutrientes drenados pelos galhadores também seria menor, prejudicando seu desenvolvimento (Schoonhoven et al. 2005). O tempo de suscetibilidade à infecção também pode afetar a ocorrência de parasitas. Este período coincide com a duração do crescimento da folha (Aide 1992). Folhas maiores demoram mais para se desenvolver e podem ser mais vulneráveis ao parasitismo.

O tamanho foliar acarreta custos distintos para a planta e para o parasita. Nesse estudo, analisamos se o tamanho da folha influencia a ocorrência de parasitas endofíticos. Propomos a hipótese de que espécies com folhas maiores têm maior probabilidade de serem parasitadas. Dessa forma, esperamos maior ocorrência de parasitas endofíticos com o aumento do tamanho da área foliar.

Métodos

Nós desenvolvemos este estudo em uma floresta tropical de terra firme, inserida na Área de Relevante Interesse Ecológico do PDBFF reserva km 41, localizada a 80 km ao norte de Manaus - AM, Brasil. Coletamos folhas de todos os indivíduos de espécies lenhosas ao longo de um transecto de 400 m na borda de uma estrada. Posteriormente, morfotipamos as plantas e inspecionamos as folhas à procura de galhas e minas.

Consideramos a ausência de parasitas em um morfotipo quando pelo menos cinco indivíduos não apresentaram evidências de parasitismo. Os morfotipos com pelo menos

160

um indivíduo com galhas ou minas foram consideradas parasitadas. Calculamos a área foliar média para cada espécie e para este cálculo, usando a menor unidade destacável da planta (folha, folíolo ou foliólulo). Para testar se o tamanho da área foliar influencia a ocorrência de galhas ou minadores na folha, fizemos regressões logísticas utilizando como variável preditora o logaritmo neperiano da área foliar e como variável resposta a presença ou ausência de galhas e de minas.

Resultados

Nós coletamos ramos de 261 indivíduos classificados em 45 morfo-espécies de plantas.

Dessas, 27 apresentaram galhas, 14 apresentaram minas e 11 morfo-espécies apresentaram ambos os tipos de parasitas endofitícos. A amplitude de área foliar variou de 0,01 a 718,87 cm2.

A presença dos galhadores teve uma relação positiva com a área foliar (χ2 =

14,35, g.l. = 1, p < 0,01, Figura 1) e o tamanho foliar mínimo para a ocorrência desses parasitas foi de 2,14 cm2. Um padrão similar foi encontrado para parasitas minadores (χ2

= 10,68, g.l. = 1, p < 0,01, Figura 2), entretanto, o tamanho foliar mínimo para o seu estabelecimento foi de 24 cm2.

161

Figura 1. Relação entre o tamanho da área foliar e a ocorrência de galhadores em uma floresta de terra firme na Amazônia Central, Brasil. Os números 0 e 1 representam ausência e presença de galhas, respectivamente.

Figura 2. Relação entre o tamanho da área foliar e a ocorrência de minadores numa floresta de terra firme na Amazônia Central, Brasil. Os números 0 e 1 representam ausência e presença de galhas, respectivamente.

162

Discussão

A ocorrência de parasitismo por minadores e galhadores foi positivamente associada com o tamanho da folha. Folhas são mais vulneráveis ao ataque de parasitas durante o período de crescimento (Aide 1992). Por isso, folhas maiores seriam mais suscetíveis à infecção, por terem um tempo de desenvolvimento maior.

O tamanho foliar mínimo pode ter sido selecionado para ocorrência de parasitas endofíticos. Os galhadores se estabeleceram em folhas a partir de 2,14 cm² de área foliar, enquanto os minadores ocorreram em folhas 11 vezes maior. O tipo de recurso explorado difere entre os parasitas, enquanto os galhadores drenam os nutrientes dos vasos floemáticos, os minadores consomem os tecidos estruturais da folha, dependendo assim de uma área foliar maior.

A ausência de galhadores e minadores em folhas pequenas poderia ser resultante da rápida abscisão das folhas pequenas logo após a infecção por parasitas, devido ao baixo custo de sua perda. Neste caso, o parasitismo ocorre, mas o parasita não se desenvolve até a fase adulta por causa da abscisão foliar. Uma forma de demonstrar isso seria monitorar o desenvolvimento de folhas pequenas para evidenciar se a abscisão foliar ocorre como resposta a infecção por parasitas. Por outro lado, a exclusão de parasitas de folhas menores pode ter ocorrido ao longo do tempo evolutivo. Nas linhagens de plantas parasitadas que tiveram diminuição do tamanho da folha, seus parasitas podem não ter tolerado esta redução do tamanho da folha e se extinguiram.

O estabelecimento em folhas menores parece não ser vantajoso para parasitas endofíticos. Entretanto, o processo que gerou esta estratégia anti-predatória nas plantas ainda não foi explicado. A redução da área foliar pode ter se desenvolvido como uma adaptação contra o parasitismo foliar, entretanto, pode também ser devido a um

163

processo de exaptação, em que essa redução foliar se deu em resposta a outras pressões seletivas, mas que confere vantagem em relação ao parasitismo.

Referências

Aide, M.T. 1992. Dry season leaf production: an escape from herbivory. Biotropica

24:532-537.

Carmona, D., Lajeunesse, M.J. & Johnson, T.J. 2011. Plant traits that predict resistence

to herbivores. Functional Ecology, 25:358-367.

Millard, P. & Way, D.A. 2011. Tree competition and defense against herbivores:

currency matters when counting the cost. Tree Physiology, 31:579-581.

Raven, P.H., R.F. Evert & S.E. Eichhorn. 1992. Biologia vegetal. Rio de Janeiro:

Guanabara Koogan.

Ribeiro, J.E.L.S, M.J.G. Hopkins, A. Vicentini, C.A. Sothers, M.A.S. Costa, J.M. Brito,

M.A.D. Souza, L.H.P. Martins, L.G. Lohmam, P.A.C.L. Assunção, E.C. Pereira,

C.F. Silva, M.R. Mesquita & L.C. Procópio. 1999. Flora da reserva Ducke: Guia

de identificação das plantas vasculares de uma floresta de terra firme na

Amazônia Central. Manaus: INPA.

Schoonhoven, L.M., Van Loon, J.J.A., Dicke, M. 2005. Insect-plant biology.New York:

Oxford University Press.

Silva, D.M. & Batalha, M.A. 2010. Defense syndromes against herbivory in a cerrado

plant community. Plant Ecology, 212:181-193.

164

Km 41 – projetos individuais

Diferença no comportamento de forrageio de formigas associadas a nectários

extraflorais e exsudato de afídeos

Ana Carolina Vieira Pires

Introdução

O mutualismo é uma interação reciprocamente benéfica entre duas espécies, na qual os ganhos para cada parceiro são quantificados em termos de sobrevivência e sucesso reprodutivo (Bronstein 2009). Essa interação pode ser obrigatória, na qual as espécies estão vitalmente associadas, ou facultativa, em que as espécies sobrevivem mesmo sem estarem associadas. No mutualismo facultativo a interação pode acontecer sempre entre as mesmas espécies ou pode haver variação nas espécies associadas (mutualismo difuso).

A associação entre plantas mirmecófilas e formigas representa um exemplo de mutualismo difuso. Nesse mutualismo as plantas oferecem uma recompensa não especializada para atrair formigas, através de nectários extraflorais (NEFs) (Del-Claro

2004, Rosumek et al. 2009). Essas estruturas são glândulas secretoras de néctar localizadas em órgãos que não estão envolvidos diretamente na polinização (Bronstein et al. 2006). As formigas associadas a plantas com NEFs exibem um comportamento agressivo em relação aos herbívoros, afetando positivamente a aptidão da planta, ao diminuir os danos causados por fitófagos em órgãos vegetativos e reprodutivos (Del-

Claro et al. 1996).

165

Uma associação semelhante à de plantas com NEFs e formigas ocorre quando algumas plantas estão associadas a hemípteros que se alimentam da seiva do floema e liberam um exsudato composto por uma mistura de açúcar, aminoácidos, amidos e proteínas (Auclair 1963 apud Del-Claro & Oliveira 1999). Algumas formigas se alimentam desse exsudato liberado pelos hemípteros e os defendem contra predadores e parasitoides e, portanto, acabam atuando indiretamente na vigilância das plantas

(Moreira & Del-Claro 2005). O patrulhamento de formigas tanto em plantas com NEFs quanto em plantas com hemípteros diminui a herbivoria, aumenta a aptidão da planta e aumenta a sobrevivência de hemípteros (Moreira & Del-Claro 2005, Styrsky & Eubanks

2010).

Ainda que as plantas sejam um recurso abundante e atrativo, a quantidade de nitrogênio nos tecidos vegetais é baixa e a obtenção desse nutriente parece ser um problema para os insetos herbívoros (Schowalter 2006, Speight et al. 2008). Nesse sentido, é possível que o comportamento de formigas que defendem as plantas com

NEFs ou com hemípteros secretores de exsudato contra o ataque de outros insetos, dependa da qualidade do recurso defendido e da demanda nutricional das formigas.

Como esses recursos podem ter concentrações distintas de nitrogênio, o ataque de formigas a esses insetos pode representar um ganho extra do nutriente limitante.

Portanto, formigas submetidas a uma maior limitação de nitrogênio devem investir mais na predação sobre herbívoros, devido ao seu maior teor de nitrogênio.

Embora as formigas possam mudar sua dieta em resposta a déficits nutricionais

(Wilder & Eubanks 2010), esse comportamento nunca foi investigado em sistemas naturais. Uma vez que o exsudato de hemípteros contém mais nitrogênio que o néctar de

NEFs (P. E. Peixoto, com. pess.), avalio a hipótese de que formigas que se alimentam do recurso vegetal de menor conteúdo nitrogenado predem mais prontamente outros

166

insetos presentes na planta. Assim, espero que as formigas associadas a NEFs demorem menos tempo para remover os herbívoros do que aquelas que se alimentam de exsudato, bem como recrutarão maior quantidade de indivíduos para removê-lo.

Métodos

Área de estudo

Realizei esse estudo na borda de uma floresta criada por uma estrada ao longo da reserva do Km 41, localizada a 80 km ao norte de Manaus, na Amazônia Central, Brasil.

O local está inserido em uma ARIE (Área de Relevante Interesse Ecológico), gerida pelo ICMBio e pelo Projeto de Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF).

Coleta dos dados

Selecionei 20 indivíduos de diferentes espécies de plantas que possuíam nectários extraflorais e não possuíam hemípteros e 20 indivíduos com hemípteros secretando exsudato açucarado e sem NEFs. Em metade dos indivíduos amostrados com NEFs e metade dos com exsudato havia presença de formigas do gênero Crematogaster, enquanto na outra metade das plantas de cada grupo havia formigas do gênero Azteca.

Em nenhuma das plantas amostradas havia a presença simultânea dos dois gêneros de formigas. As formigas de ambos os gêneros são dominantes, agressivas e recrutam operárias para defender o recurso vegetal do qual se alimentam (Holldobler & Wilson

1990).

Para simular a presença de um herbívoro, coloquei um cupim na folha mais próxima ao recurso (NEF ou exsudato) onde não havia presença de formiga. Essa folha distava aproximadamente 5 cm do recurso. Após depositar a isca, cronometrei o tempo da chegada da formiga até o cupim, o tempo que a formiga levou para remover o cupim

167

após encontrá-lo e o número de formigas que removeram o cupim. O tempo máximo estipulado para a observação foi de 5 min. Para as formigas que não removeram o cupim, mas permaneceram sobre ele em processo de remoção durante o tempo de observação, considerei como tempo máximo de 300 s. Excluí das análises, as amostras nas quais as formigas não responderam à presença do cupim.

Análises dos dados

Para avaliar a diferença na resposta de formigas quanto ao recurso patrulhado (nectários extraflorais ou hemípteros) utilizei análise de variância (ANOVA) de dois fatores.

Minhas variáveis respostas foram o tempo de chegada das formigas ao cupim, o tempo de remoção do cupim da folha, o tempo total entre a deposição do cupim até a sua remoção e a quantidade de formigas que atuaram na remoção. Considerei as seguintes variáveis como preditoras: tipo de recurso oferecido (nectários extraflorais e exsudado) e o gênero da formiga (Crematogaster e Azteca). Transformei os dados de tempo de chegada e de quantidade de formigas que removeram o cupim com logaritmo para homogeneizar as variâncias.

Resultados

Das 20 plantas com NEFs, em três não houve resposta de Crematogaster sp. e em uma não houve resposta de Azteca sp., apesar de ambas permanecerem patrulhando os ramos durante as observações. Em relação às plantas que possuíam hemípteros e eram patrulhadas por Crematogaster sp., apenas em duas as formigas não chegaram até o cupim. Todas as demais formigas responderam à presença do cupim durante as observações.

168

De forma geral, as formigas do gênero Crematogaster demoravam mais de 5 min para a remoção completa do cupim da folha. Isso ocorreu em cinco plantas com

NEFs e nas 10 plantas que tinham hemípteros. Por outro lado, apenas em uma planta com NEFs e em uma planta com hemípteros que era patrulhada por Azteca sp. a resposta foi superior a 5 min para a remoção completa do cupim.

Formigas despenderam tempos similares para chegar até o cupim em plantas com NEFs ou com hemípteros (F(1,34)=2,94; p=0,23; Figura 1). Porém, o tempo de chegada foi diferente entre os gêneros de formigas (F(1,34)=4,47; p=0,04). A resposta de formigas do gênero Azteca sp. foi 3,5 vezes mais rápida que as de Crematogaster sp. em plantas com NEFs e 1,8 vezes mais rápida em plantas com hemípteros. Não houve interação entre os dois fatores (gênero da formiga e tipo de recurso defendido) em relação ao tempo de chegada (F(1,34)=3,31; p=0,08).

Figura 1. Tempo de chegada de formigas dos gêneros Crematogaster (●) e Azteca (■) até o cupim em plantas com os recursos: NEF = nectários extraflorais; HEM=hemíptero na reserva do km 41, Manaus, Brasil. Os símbolos representam as médias do tempo de resposta e as barras verticais representam o intervalo de 95% de confiança.

169

O tempo que a formiga despendeu até a remoção completa do cupim da folha foi diferente dependendo da combinação entre os recursos e entre os gêneros das formigas

(F(1,34)=6,65; p=0,01; Figura 2). Formigas do gênero Crematogaster demoram mais tempo para remover o cupim quando estavam em plantas com hemípteros do que quando estavam em plantas com NEFs. Já as formigas do gênero Azteca apresentaram o mesmo tempo de remoção para ambos os tipos de recurso e esse tempo foi menor do que o despendido por Crematogaster sp. apenas em plantas que possuíam hemípteros.

Figura 2. Tempo despendido para remoção do cupim por formigas dos gêneros

Crematogaster (●) e Azteca (■) em ambos os recursos: NEF = nectários extraflorais;

HEM=hemíptero na reserva do km 41, Manaus, Brasil. Os símbolos representam as médias do tempo de remoção e as barras verticais representam o intervalo de 95% de confiança.

Considerando o tempo que durou toda a ação, desde que coloquei o cupim sobre a folha até sua remoção completa pelas formigas, não houve diferença no tempo de

170

resposta das formigas entre os recursos defendidos (F(1,34)=0,01; p=0,94). Porém, formigas do gênero Crematogaster eram mais lentas para executar toda a ação quando comparadas às do gênero Azteca (F(1,34)=40,11; p<0,001; Figura 3). Não houve interação entre o gênero de formigas e o tipo de recurso com relação ao tempo total de ação

(F(1,34)=2,40; p=0,13).

Figura 3. Tempo total da ação de formigas dos gêneros Crematogaster (●) e Azteca (■) em ambos os recursos: NEF = nectários extraflorais; HEM=hemíptero na reserva do km

41, Manaus, Brasil. Os símbolos representam as médias do tempo total e as barras verticais representam o intervalo de 95% de confiança.

A quantidade de indivíduos de formigas dos dois gêneros mobilizados para a remoção do cupim foi semelhante (F(1,34)=1,90; p=0,18; Figura 4). A mobilização de formigas entre os dois tipos de recursos defendidos também foi similar (F(1,34)=3,43; p=0,07). Não houve interação entre esses dois fatores (F(1,34)=1,15; p=0,29).

171

Figura 4. Número de formigas dos gêneros Crematogaster (●) e Azteca (■) mobilizadas na remoção do cupim em ambos os recursos: NEF = nectários extraflorais;

HEM=hemíptero na reserva do km 41, Manaus, Brasil. Os símbolos representam as médias do número de formigas e as barras verticais representam o intervalo de 95% de confiança.

Discussão

As formigas que patrulhavam nectários extraflorais e exsudato de hemípteros apresentaram respostas similares quanto ao tempo de chegada até o cupim, tempo total da ação e número de formigas mobilizadas. Dessa forma, diferentes tipos de recursos não determinam a intensidade da resposta das formigas. A única exceção ocorreu em relação ao tempo despendido para a remoção completa do cupim, na qual

Crematogaster sp. foi mais lenta quando estava patrulhando hemípteros. Eventualmente essas formigas que se alimentam de exsudato podem ter sua preferência por herbívoros reduzida. Assim, as formigas podem realizar uma avaliação da qualidade nutricional da presa depois de encontrá-la e demorar mais para removê-la.

172

O folhiço de florestas tropicais é úmido e rico em nitrogênio que encontra-se homogeneamente distribuído (Yanoviak & Kaspari 2000). Como espécies de

Crematogaster e Azteca forrageiam tanto na planta quanto no solo (Holldobler &

Wilson 1990), elas podem procurar por alimentos que complementem sua dieta. Assim, independente da qualidade do recurso explorado nas plantas (NEFs ou exsudato), as formigas podem apresentar condições nutricionais semelhantes, gerando respostas similares com relação à presença de herbívoros.

Wilder & Eubanks (2010), ao desenvolverem um experimento em laboratório, mostraram que a diferença na preferência da presa por formigas é mediada pela sua demanda nutricional. Com base nisso, esses autores sugeriram que as plantas poderiam manipular as formigas quanto ao herbívoro que as ataca. Os resultados encontrados nesse estudo não corroboraram essa hipótese, indicando que em ambientes naturais, recursos de qualidade nutricional distintos, como NEFs e exsudato de hemípteros, não afetam o comportamento de forrageio das formigas. Como nesses sistemas naturais, formigas dispõem de uma variedade de fontes alternativas de alimento, é possível que elas adaptem suas estratégias de forrageio para compensar eventuais defasagens nutricionais oriundas do forrageio nos NEFs ou no exsudato de hemípteros.

Agradecimentos

Após trinta anos de convivência, isolados na Amazônia, chega a ser difícil saber como agradecer a cada um que fez parte da turma do EFA 2012. Começando por Paulinho

Bom (Rainbow Master) e Paulinho Mau (Batman) pela incrível oportunidade de participar do curso e por todo apoio durante esses dias. Encarar trinta dias com essa galera e acordar de bom humor não é para qualquer um. Ao Seu Jorge e Dona Eduarda

173

pela paciência e pela preocupação em fazer a soja nossa de cada dia. O curso não seria o mesmo sem o vasto cardápio de todo dia (dá-lhe suco de caju!).

A todos os professores que fizeram a diferença nesses dias: Felipe, Thiago

Toyoyo, Richard, Mike, Esther, Cassiano, Glauco, Catá, Dé, Jack Sparrow, Marcel

Baby, Jansen e Aline. O conhecimento que vocês me passaram será para toda a vida! E aquele abraço especial aos monitores Thiago Gloss Xexéu e Marcos Barbudinho. Valeu pela ajuda em todos os momentos de necessidades. Mais do que monitores, vocês são parte da turma.

E o que falar das pessoas dessa turma? Depois de trinta anos de convivência é difícil pensar em passar um dia sem escutar as fofocas no café da manhã, saber quem dormiu torto na rede e quem está devendo relatório. Cada um de vocês acrescentou um pouquinho em mim. Primeiro agradeço ao Daniel Lagartão pelo carinho, atenção e ajuda em todos os momentos. Obrigada pelos momentos felizes que compartilhamos.

Agradeço à Alanis (isso, aham) e Carol da Silva pela parceria, amizade e conversas de confessionário. Aos mineiros Renatinha Pocket (e os segredos divididos), Sarah

Baranga, Joseph, Léo Mr. Bigodinho, Mari Exú (e seu jeitinho de mãe professora) e

Ludmilla Miss-Kessy (e os comentários sem noção de cada dia). Valeu por fazerem me sentir mais perto de casa. À Dani Atoladinha, que com toda sua maturidade e criatividade cativou a todos. Ao Vidal e Tatu, um estrangeiro e um tradutor (para hablar español basta colocar la língua na ponta de los dientes e hablar con fuerza, certo?). Aos nobres Conde Harry Potter e Condessa de Hogwartts (também conhecida por Lorrhayne

Xaiene Vanessão). Visitarei vocês na Hungria. À Lore Pole Dance e sua risada contagiante. Você tem futuro, gata! À Tati (e suas árvres) e seu jeito carinhoso de chamar todas as meninas de vadia. Ao Bruno Baba Pau que curtia minhas músicas mais do que eu mesma. À Bia Bis-kate e Randolpho Hobbit pelos bons momentos.

174

A vocês, todo o amor que houver nessa vida!

Referências

Bronstein. J.L., R. Alarcón & M. Geber. 2006. The evolution of plant–insect

mutualisms. New Phytologist, 172:412-428.

Bronstein, J.L. 2009. The evolution of facilitation and mutualism. Journal of Ecology,

97:1160-1170.

Del-Claro, K., V. Berto & W. Réu. 1996. Herbivore deterrence by visiting ants

increases fruit-set in an extrafloral nectary plant Qualea multiflora

(Vochysiaceae) in cerrado vegetation. Journal of Tropical Ecology, 12:887-

892.

Del-Claro, K. & P.S. Oliveira. 1999. Ant-homoptera interactions in a neotropical

savanna: the honeydew-producing treehopper, Guayaquila xiphias

(Membracidae), and its associated ant fauna on Didymopanax vinosum

(Araliaceae). Biotropica, 31:135-144.

Del-Claro, K. 2004. Multitrophic relationships, conditional mutualisms, and the study of

interaction biodiversity in tropical savannas. Neotropical Entomology, 33:665-

672.

Holldobler, B. & E.O. Wilson. 1990. The ants. Harvard University Express: Harvard.

Moreira, V.S.S. & K. Del-Claro. 2005. The outcomes of an ant-treehopper association

on Solanum lycocarpum St. Hill: increased membracid fecundity and reduced

damage by chewing herbivores. Neotropical Entomology, 34:881-887.

Rosumek, F.B., F.A.O Silveira, F.S. Neves, N.P.U. Barbosa, L. Diniz, Y. Oki, F.

Pezzini, G.W. Fernandes & T. Cornelissen. 2009. Ants on plants: a meta-

analysis of the role of ants as plant biotic defenses. Oecologia, 160:537-549.

175

Schowalter, T.D. 2006. Insect ecology, an ecosystem approach. Elsevier: London.

Speight, M.R., M.D. Hunter & A.D. Watt. 2008. Ecology of insects, concepts and

applications. Blackwell Publishing: Oxford.

Styrsky, J.D. & M.D. Eubanks. 2010. A facultative mutualism between aphids and an

invasive ant increases plant reproduction. Ecological Entomology, 35:190-199.

Yanoviak, S.P. & M. Kaspari. 2000. Community structure and the habitat templet: ants

in the tropical forest canopy and litter. Oikos, 89:259-266.

Wilder, S.M. & M.D. Eubanks. 2010. Extrafloral nectar content alters foraging

preferences of a predatory ant. Biology Letters, 6:177-179.

176

Convergência de características funcionais foliares entre uma floresta em

regeneração e uma floresta primária na Amazônia Central

Ana Claudia Rorato

Introdução

A floresta Amazônica tem sido alvo de elevadas taxas de desmatamento, principalmente para a formação de áreas de campos de cultivo ou de pastagens. No entanto, essas áreas são geralmente abandonadas após um período de cinco a dez anos de uso devido ao declínio na produtividade (Mesquita 2001). Isso resulta em um mosaico de áreas florestais em processo de regeneração (Quesada et al. 2009). As florestas em regeneração diferem dos remanescentes de floresta primária em relação à estrutura vertical, às condições ambientais e à composição de espécies (Laurence 1998, Mesquita

2001). A floresta em regeneração apresenta estrutura vertical composta por um dossel mais baixo e menos denso e um sub-bosque mais aberto, quando comparada à floresta primária. Essa diferença permite maior penetração de luz, o que acarreta na elevação da temperatura do ar e do solo (Benitez-Malvido 1998, Casenave et al. 1995, Kapos et.al

1997).

O aumento da temperatura resulta na diminuição da umidade relativa do ar e do solo, acompanhada de uma diminuição da disponibilidade de água. Embora nas florestas em regeneração a maior entrada de luz favoreça a fotossíntese, o ambiente relativamente mais seco é mais propício à perda de água (Casenave et al.1995). Em contrapartida, nas florestas primárias as plantas estão sujeitas a uma menor incidência de luz direta no solo e por isso não sofrem tanto com a diminuição da umidade relativa. (Casenave et al.1995, Kapos et al. 1997). A estruturação das comunidades vegetais é influenciada pelo conjunto de condições abióticas (temperatura, umidade e disponibilidade de

177

recursos) e bióticas (competição, predação, mutualismo) que selecionam quais grupos de espécies são capazes de crescer e se reproduzir num local (Diamond 1975, Lavorel

& Garnier 2002).

As diferenças abióticas existentes entre as florestas em regeneração e as florestas primárias favorecem grupos de plantas com estratégias ecológicas distintas. Áreas desmatadas ou em estádios iniciais de sucessão são colonizadas por espécies que são favorecidas pela elevada incidência luminosa. Com o avanço da sucessão nas florestas em regeneração, espécies tardias podem se estabelecer, resultando em uma sobreposição de espécies de estádios sucessionais iniciais e tardios (Mesquita 2001).

A regulação entre a taxa de assimilação de CO2 e a perda de água nas plantas pode ser feita através de mecanismos morfológicos e/ou fisiológicos ligados às estratégias de captação de luz e armazenamento de água das plantas. Dessa forma, características foliares das plantas variam em resposta a diferentes condições do ambiente e disponibilidade de recursos (Tyree 2007). Dentre as características relacionadas às funções foliares destacam-se a área foliar, a forma foliar, o número de folhas por ramo, a massa foliar e a capacidade de acúmulo de água (Cianciaruso et al.

2009, Cornelissen et al. 2003).

Plantas com área foliar maior possuem maior taxa de transpiração, e consequentemente maior taxa fotossintética e perda de água. O mesmo ocorre para a forma das folhas. Folhas mais arredondadas aumentam a taxa de perda de água quando comparadas a folhas mais alongadas. Portanto, a redução da área foliar e a produção de folhas mais alongadas pode ser considerada como uma estratégia contra a perda de

água. Por outro lado, folhas mais espessas podem conter o mesmo número de células e de cloroplastos e, assim, manter a taxa fotossintética elevada, com uma menor superfície de transpiração. A capacidade de armazenamento de água nas folhas permite

178

que plantas resistam à baixa disponibilidade de água (Pimentel 1998, Taiz & Zeiger

2002). Desse modo, a diferença na disponibilidade de água e quantidade de luz que chega no sub-bosque devem levar a combinações particulares de características funcionais foliares relacionadas à captação de luz e armazenamento de água.

O objetivo desse estudo foi entender de que maneira a diversidade funcional de características foliares relacionadas ao armazenamento de água e a captação de luz em espécies arbóreas varia entre uma floresta em regeneração e uma floresta primária.

Assim, proponho duas hipóteses: (1) na floresta em regeneração os indivíduos arbóreos juvenis do sub-bosque possuem maior capacidade de armazenamento de água nas folhas; (2) na floresta primária os indivíduos juvenis otimizam a captação de luz através da forma e tamanho das folhas. As minhas previsões foram: (i) os indivíduos juvenis na floresta em regeneração podem armazenar mais água nas folhas do que os indivíduos da floresta primária; (ii) na floresta em regeneração as folhas são menores e mais alongadas, enquanto na floresta primária as folhas são maiores e mais arredondadas;

(iii) a variação das características funcionais foliares (área foliar, forma foliar e quantidade de água armazenada) entre os indivíduos é maior na floresta em regeneração do que na floresta primária.

Métodos

Área de estudo

Esse estudo foi desenvolvido na AIRE PDBFF sítio Km 41 (2°24’S, 59°43’O), co- gerida pelo Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF) e ICMBIO.

A reserva está situada a 80 km ao norte de Manaus e abrange uma área de aproximadamente 10.000 ha de floresta contínua de terra firme.

179

Os dados para esse estudo foram coletados em dois tipos de floresta. A primeira foi uma floresta primária contínua, enquanto a segunda foi uma floresta em regeneração que possui por volta de 30 anos. Essa floresta em regeneração é resultado da conversão de uma área de floresta primária em pastagem que após alguns anos de uso foi abandonada.

Características funcionais das folhas

Para comparar as características funcionais foliares (área foliar, forma foliar e DMF

(diferença entre massa túrgida e massa seca) nas duas florestas, coletei folhas de indivíduos arbóreos juvenis. Em cada tipo de floresta amostrei seis pontos distantes 20 m entre si ao longo de um transecto. Para cada ponto amostrei 15 indivíduos de espécies diferentes, e coletei três folhas para a mensuração das características funcionais foliares. As folhas foram coletadas nos dois ramos mais altos para diminuir variações devido à idade da folha. A altura dos indivíduos também foi padronizada entre 0,5 m e

1,5 m para diminuir variações em relação a idade dos indivíduos. Cada indivíduo foi considerado uma amostra e cada ponto uma réplica. Para cada indivíduo os valores das características das folhas foram somados e a média entre eles foi assumida para o indivíduo.

A partir das folhas coletadas medi as três características foliares: DMF

(diferença entre a massa túrgida foliar e a massa seca), área foliar e forma foliar. O

DMF foi usado como medida da capacidade de acúmulo de água nas folhas e foi obtido através da diferença entre a massa túrgida foliar e a massa seca. A massa túrgida foliar média de cada indivíduo foi inferida pesando um pedaço de 4 cm2 de cada folha que ficou imerso em água por volta de duas horas. Após imersão em água, esses pedaços de folhas foram secos em um forno e pesados novamente para obtenção da massa seca

180

média de cada indivíduo. A área da folha foi calculada através da fórmula da elipse (π x raio maior x raio menor / 4). A forma foliar foi obtida através da razão comprimentomédio

/ larguramédia das três folhas coletadas para cada planta. Se o valor dessa razão é próximo de 1 a forma foliar é arredondada, o que aumenta a captação de luz e consequentemente a perda de água. Por outro lado, quanto maior o valor dessa razão mais alongada é a folha, fazendo com que a transpiração e a perda de água sejam menores.

Análises

Para avaliar a diferença nas características funcionais foliares entre a floresta em regeneração e a floresta primária realizei um teste t para cada variável medida. Para testar se a variação das características funcionais foliares entre os indivíduos da mesma floresta foi maior na floresta em regeneração realizei o teste de homogeneidade de variâncias de Levene.

Resultados

Os resultados indicam que não existe diferença entre a área foliar dos indivíduos da floresta em regeneração e da floresta primária (t = 0,84; gl = 180; p = 0,40 Figura 1). A média da área foliar foi de 87,52 ± 81,84 cm2 (média ± dp) para a floresta em regeneração e 78,30 ± 64,25 cm2 para a floresta primária. Do mesmo modo, o DMF não diferiu entre a floresta em regeneração e a floresta primária (t = 0,080; gl = 174; p =

0,93 Figura 2). A média do DMF para a floresta em regeneração e para a floresta primária foi de 0,121 g e 0,122 g, respectivamente. A forma foliar também não apresentou diferença entre as duas florestas (t = 0,29; gl = 183; p = 0,77 Figura 3), com média de 2,92 para as folhas da floresta em regeneração e 2,89 para folhas da floresta primária. Isso indica que as folhas são em geral mais alongadas, pois o comprimento foi

181

em média três vezes maior do que a largura. Para o teste de homogeneidade das variâncias também não houve diferenças para as características área foliar (F = 0,01; p =

0,92), DMFmédio (F = 0,80; p = 0,37) e forma foliar (F = 0,90; p = 0,34) entre a floresta em regeneração e a floresta primária.

180 160 140

) 120

2 100 80 60

Área foliar (cm Área foliar 40 20 0 -20 Floresta primária Floresta em regeneração

Tipo de floresta

Figura 1. Área foliar média de indivíduos arbóreos juvenis de uma floresta em regeneração e uma floresta primária localizadas na Amazônia Central, Brasil. As barras verticais representam o desvio padrão da área foliar.

182

0,20

0,18

0,16

0,14

0,12

DMF(g) 0,10

0,08

0,06

0,04 Floresta primária Floresta em regeneração Tipo de floresta

Figura 2. DMF médio (diferença entre a massa foliar túrgida e a massa seca) dos indivíduos arbóreos juvenis de uma floresta em regeneração e uma floresta primária localizadas na Amazônia Central, Brasil. As barras verticais representam o desvio padrão do DMF.

3,8 3,6 3,4 3,2 3,0 2,8 2,6

Forma foliar (cm) Forma 2,4 2,2 2,0 1,8 Floresta em regeneração Floresta primária Tipo de floresta

Figura 3. Forma foliar média calculada através da razão comprimento médio / largura média para os indivíduos arbóreos juvenis em uma floresta em regeneração e uma floresta primária na Amazônia Central, Brasil. As barras verticais representam o desvio padrão. 183

Discussão

Os resultados indicam que não existem diferenças relacionadas às características funcionais área foliar, DMF e forma foliar entre a floresta em regeneração e a floresta primária. Desse modo, é possível inferir que os indivíduos recrutados nas duas florestas apresentam estratégias funcionais semelhantes relacionadas à captação de luz e armazenamento de água nas folhas. Mesmo em diferentes condições de disponibilidade de água e incidência de luz, que são recursos essenciais às plantas, não houve divergência nessas características funcionais foliares entre as duas florestas.

O crescimento e a reprodução das plantas dependem essencialmente da disponibilidade de água e de luz. No entanto, a transpiração é um processo inevitável, pois a absorção do CO2 pelos estômatos para a fotossíntese permite também a perda de

água (Pimentel 2004, Tyree 2007). Para regular o balanço entre taxa fotossintética e perda de água, mecanismos fisiológicos que atuam nos estômatos garantem a eficiência no uso da água. Mecanismos como a abertura e fechamento dos estômatos podem atuar de maneira diferencial nas plantas dependendo das condições ambientais. Esse mecanismo funciona como um ajuste para diminuir a perda de água das folhas, mesmo com um aumento na área foliar (Tyree 2007). O controle da abertura estomática garante que a folha alcance uma taxa fotossintética suficiente para sua demanda, evitando a perda excessiva de água (Taiz & Zeiger 2002, Tyree 2007). Essa regulação pode manter os estômatos abertos durante um período mais curto do dia em ambientes com temperaturas elevadas, como nas florestas em regeneração (Taiz & Zeiger 2002). Essa capacidade de ajuste explica o fato de que as plantas da floresta em regeneração são capazes de manter folhas com área, forma e capacidade de armazenamento de água semelhante às folhas encontradas na floresta primária.

184

Características morfológicas foliares que permitem atingir altas taxas fotossintéticas aparentemente tem maior valor para a sobrevivência das plantas, quando comparadas as características morfológicas relacionadas à conservação de água

(Pimentel 2004). Desse modo, a manutenção das características foliares que aumentam a capacidade de captação de luz, como o aumento da área foliar, é favorecida mesmo levando a uma maior perda de água. Assim, compensações fisiológicas podem levar a uma convergência nas características funcionais morfológicas foliares entre florestas com condições ambientais distintas.

Agradecimentos

Primeiramente gostaria de agradecer aos coordenadores Paulo Estefano D. Bobrowiec e

Paulo Enrique Cardoso Peixoto que são as pessoas responsáveis pela realização desse curso. Incrível a dedicação e paciência de vocês com essa cambada de gonorantes.

Quando eu disse na carta de intenção que ficaria muito feliz em participar desse curso, não imaginava que seria tanto! Sou grata pela forma com que vocês mudaram e enriqueceram a minha percepção da ciência durante esses 30 dias. Em segundo lugar gostaria de agradecer aos monitores Tiago Gloss e Marcos Barbudo que foram extremamente dedicados e atenciosos em ajudar, e nunca se negaram a discutir qualquer teoria, por mais mirabolante que ela fosse. Vocês foram fundamentais para o curso!

Agradeço também a todos os professores que enriqueceram o curso durante todas as etapas e foram fundamentais para a realização de todos os projetos.

Agradecimentos vão também para todas as pessoas que me ajudaram na realização do meu projeto individual. Entre elas: Paulinho Mau, que me acompanhou no campo durante minha coleta de dados e foi o revisor do relatório, você foi fundamental para levá-lo para o céu. A professora Ana que com toda paciência revisou meu relatório.

185

Ao Paulinho Bom que me ajudou e esclareceu minhas ideias várias vezes, e que mediu

782854649 folhas para mim, mesmo eu sendo uma racha. Ao Marcel que foi fundamental para que eu conseguisse realizar esse projeto, me ajudando em campo, na medição das folhas e na pesagem de 8 mil pedaços de folhas. Além de discutir comigo todas as ideias do projeto. A minhas amigas Tati, da Silva, Carolzinha pé-de-ouro,

Bianca, e ao monitor Marcos que me ajudaram na triagem das 79821961893 folhas.

Especialmente a Tati que foi responsável por arrebanhar a maioria dessas pessoas. Aos monitores Tiago e Marcos que me ajudaram a elaborar essa ideia. E ao Joseph que me acompanhou e me ajudou no campo na primeira coleta!

Um agradecimento em especial vai para a Dona Eduarda e para o Seu Jorge, que carinhosamente preparam nossas refeições!

E por fim, gostaria de agradecer imensamente a todos os amigos de cada canto do Brasil que tive a enorme honra de conhecer. Cada um de vocês, com suas particularidades, personalidades e sotaques me ensinaram “que o ser humano é ridículo”

(Joseph 2012). Queridos, já sinto saudades mesmo ainda estando com vocês! Não citarei nomes em especial, porque acabaria escrevendo o de todos, sem exceção!

Obrigada por compartilharem comigo os momentos felizes, os momentos de agonia durante os PO’s e PL’s, os momentos de alegria durante os PO’s e PL’s, os momentos de conversas construtivas, bem como os de conversas inúteis. O suco de caju e a goiabada, e as festas insanas! Ohhh igarafest!

Referências

Benitez-Malvido, J.1998. Impact of forest fragmentation on seedling abundance in a

tropical rainforest. Conservation Biology, 12: 380-389.

186

Casenave, J.L., J.P. Pelotto & J. Protomastro. 1995. Edge-interior differences in

vegetation structure and composition in a Chaco semi-arid forest, Argentina.

Forest Ecology and Management, 72: 61-69.

Cianciaruso, M.V., I.A. Silva & M.A. Batalha. 2009. Diversidades filogenética e

funcional: novas abordagens para a ecologia de comunidades. Biota Neotropica,

9: 93-103.

Cornelissen, J.H.C., S. Lavorel, E. Garnier, S.Díaz, N.Buchmann, D.E.Gurvich, P.B.

Reich, H. ter Steege, H.D. Morgan, M.G.A.van der Heijden, J.G. Pausas, & H.

Poorter. 2003. Handbook of protocols for standardized and easy measurement of

plant functional traits worldwide. Australian Journal of Botany, 51: 335-380.

Diamond, J.M. 1975. Assembly of species communities, pp. 332-359. In: Ecology and

evolution of communities (M.L. Cody & J.M. Diamond, eds.). Cambridge:

Harvard University Press.

Kapos V., E. Wandelli, J.L. Camargo & G. Ganade. 1997. Edge-related changes in

environment and plant responses due to forest fragmentation in central Amazonia,

pp.33-44. In: Tropical forest remnants: ecology, management, and conservation of

fragmented communities (W.F. Laurance & R.O. Bierregaard, eds.). Chicago: The

University of Chicago Press.

Laurance, W., L.V. Ferreira, J.M. Rankin-de-Merona, S.G.W. Laurance, W.R.

Hutchings, & T.E. Lovejoy. 1998. Effects of forest fragmentation on recruitment

patterns in Amazonian tree communities. Conservation Biology, 12: 460-464.

Lavorel, S., & E. Garnier. 2002. Predicting changes in community composition and

ecosystem functioning from plant traits: revisiting the Holy Grail. Functional

Ecology, 16: 545–556.

187

Mesquita, R.C.M., K. Ickes, G. Ganade, G.B. Williamson. 2001. Alternative sucessional

pathways following deforestation in the Amazon Basin. Journal of Ecology, 89:

528-537.

Pimentel, C. 2004. A relação da água com a planta. Seropédica, RJ: Edur, 191p.

Quesada, M., G.A. Sanchez-Azofeifa, M. Alvarez-Anorve, K.E. Stoner, L. Avila-

Cabadilla, J. Calvo-Alvarado, A. Castillo, M.M. Espirito-Santo, M. Fagundes,

G.W. Fernandes, J. Gamon, M. Lopezaraiza-Mikel, D. Lawrence, L.P.C.

Morellato, J.S. Powers, F.D. Neves, V. Rosas- Guerrero & R. Sayago, G.

Sanchez-Montoya. 2009. Succession and management of tropical dry forests in

the Americas: review and new perspectives. Forest Ecology and Management,

258: 1014–1024.

Tyree, M.T. 2007. Water relation and hydraulic architecture, pp.175-212. In: Functional

plant ecology (F.I. Pugnaire & F. Valladares, eds). Boca Raton: CRC Press.

Taiz, L. & E. Zeiger. 2002. Fisiologia vegetal. Porto Alegre: Artmed.l

Carlos Pimentel

UFRURALRJJA Relação da

Planta

188

Distribuição de galhas em folhas de Vismia japurensis (Clusiaceae): existe uma

seleção do local de oviposição?

Artur Alcantara Madeira

Introdução

A seleção de habitat consiste na escolha ativa dos organismos por características específicas do ambiente (Morris 1992). Essa seleção geralmente tem como objetivo minimizar efeitos negativos ou maximizar os efeitos positivos para os indivíduos

(Morin 2011). Os efeitos negativos podem ser, por exemplo, referentes ao risco de predação e à competição, e os efeitos positivos, podem ser relacionados à alimentação e reprodução (Sih 1980, Morin 2011). Dessa forma, a escolha do habitat tem papel importante para moldar a comunidade, atuando como um dos principais mecanismos que permitem às espécies coexistirem (Rosenzweig 1981). Mesmo assim, para qualquer habitat selecionado, o organismo necessariamente irá interagir com outros organismos daquele local, seja com interações positivas, negativas ou neutras.

Estudos sobre interações inseto-planta consideram que a riqueza de espécies e a abundância de indivíduos em comunidades de insetos herbívoros é influenciada pelas características de suas plantas hospedeiras, como área de distribuição e complexidade estrutural. A qualidade, a quantidade e a disponibilidade de recursos oferecidos pela planta hospedeira também exercem papel fundamental sobre a diversidade de insetos herbívoros (Strong et al. 1984). Por exemplo, os vasos condutores de uma planta transportam, além de água e outras substâncias, a seiva. Então organismos que necessitam dela como alimento podem selecionar locais da planta onde a exploração desses recursos seja mais fácil. Tecidos de maior valor nutricional aumentam o desempenho da prole desses insetos, pois permitem que as larvas se desenvolvam com

189

mais eficiência e rapidez. Dessa forma, a seleção natural deve agir sobre o processo de oviposição de insetos herbívoros, como os insetos galhadores, para otimizar a performance da prole (Fritz et al. 2003).

Quando os insetos galhadores ovipõem nas plantas, eles induzem a formação de galhas. As galhas são estruturas compostas de tecidos vegetais dentro dos quais a larva se alimenta. Galhas se distinguem de outros abrigos criados por insetos, como folhas enroladas, por causarem uma diferenciação e crescimento de tecidos da própria planta.

Além disso, provocam um direcionamento de nutrientes da planta para si, e por isso contêm tecidos que são mais nutritivos do que tecidos sem galhas (Stone & Schonrogge

2003, Motta et al. 2005).

Em Vismia japurensis mais de uma galha pode ocorrer em uma mesma folha, a partir desse fato, verifiquei se: (i) existe uma preferência de oviposição nas regiões de nervuras das folhas ao invés das regiões entre nervuras, (ii) se as galhas foliares que se encontram nas regiões de nervuras são maiores do que galhas encontradas nas regiões entre nervuras, e (iii) se as galhas que se encontram nas partes mais distais das nervuras secundárias, ocorrem apenas se houver uma outra galha na região mais basal da mesma nervura. Minhas hipóteses foram que: (i) os indivíduos parentais devem selecionar locais melhores para ovipor, de forma que existirá um maior número de galhas nas regiões de nervuras do que nas regiões entre nervuras, (ii) as galhas das regiões de nervuras serão maiores por estarem mais próximas da fonte de recurso, e (iii) se houver galhas nas regiões mais distais de uma nervura, esta estará mais distante da nervura central, e portanto mais distante dos recursos, por haver uma ou mais galhas nas regiões mais basais da mesma nervura.

190

Métodos

Realizei o estudo na Reserva do Km 41 (02° 24’S e 59° 44’O), 80 km ao norte de

Manaus, Amazonas, Brasil. A reserva é formada por floresta de terra firme e faz parte da Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE), administrada pelo Projeto Dinâmica

Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF) e pelo Instituto Chico Mendes de

Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Na borda da floresta coletei, por busca ativa, todas as folhas de indivíduos de Vismia japurensis (Clusiaceae) que encontrei com a presença de galhas da mesma espécie, obtendo no total 32 folhas.

Após a coleta, levei as folhas para o laboratório, onde medi o comprimento e a largura de todas as galhas cujas larvas já haviam eclodido. Essas medidas foram utilizadas para calcular a área de cada galha com a fórmula de área de uma elipse

(Comprimento x Largura x π). Em seguida, classifiquei as galhas de acordo com sua posição na folha: região de intersecção de nervuras, região de nervura e região entre nervuras.

Para avaliar se existe uma preferência pelas regiões de nervura, comparei a frequência de galhas encontradas nessas regiões com a frequência esperada se essa distribuição fosse aleatória. Para saber a frequência esperada, determinei a porcentagem da área foliar ocupada por nervuras utilizando o programa ImageTools (versão 3.0,

UTHSCSA, 2002). Obtive a porcentagem média da área foliar ocupada por nervuras, a partir de cinco folhas escolhidas aleatoriamente da amostra.

Utilizei um teste qui-quadrado para avaliar se existe uma seleção pelas regiões de nervura ao invés das regiões entre nervuras. Para relacionar a área da galha com sua posição na folha utilizei uma ANOVA, seguida de um teste – t (posteriori) para entender como as categorias avaliadas se relacionavam. E para analisar se as galhas de

191

regiões mais distais das nervuras secundárias ocorriam sozinhas ou associadas a outra galha na mesma nervura, utilizei novamente o teste qui-quadrado.

Resultados

Encontrei 260 galhas nas folhas de V. japurensis, sendo que destas, 20 estavam localizadas nas regiões de intersecção de nervuras, 131 estavam localizadas nas regiões das nervuras e 109 estavam localizadas nas regiões entre nervuras. As nervuras corresponderam a 9% da área foliar total e foram ocupadas por 151 das 260 galhas

(58%). De acordo com os dados, haviam mais galhas presentes nas regiões de nervura do que o esperado se a distribuição delas na folha fosse ao acaso (χ2 = 781,48; gl = 1; p

< 0,01).

As galhas das três regiões analisadas apresentaram diferenças em relação à sua

área (F(2) = 10,53; p < 0,01) (Figura 1). As galhas das regiões de intersecção de nervuras e das regiões de nervura não diferiram em área (t = -0,50; gl = 1; p = 0,62), porém as galhas das regiões de intersecção de nervuras e das regiões de nervura foram maiores do que as das regiões entre nervuras em relação à área (t = 4,55; gl = 1; p <0,01).

192

Figura 1. Tamanho médio das galhas em relação à região na folha. Pontos representam a média e as barras representam o intervalo de confiança.

Vinte e uma galhas estavam presentes na porção da nervura secundária mais próxima à borda da folha (8,1%). Destas, 14 ocorreram sozinhas e sete estavam acompanhadas por uma outra galha na porção mais próxima à nervura central. As galhas das nervuras secundárias que estavam mais distantes da nervura central não estavam associadas à presença de outras galhas na mesma nervura (χ2 = 2,33; gl = 1; p = 0,13).

Discussão

A distribuição das galhas nas folhas de V. japurensis não foi aleatória. Os indivíduos parentais selecionaram regiões de nervura para oviposição, e as galhas dessas regiões foram maiores do que as galhas localizadas nas regiões entre nervuras. Larvas dentro de galhas podem se alimentar de substâncias foto-assimiladas e nutrientes. Essas substâncias são transportadas dos sítios de produção ou armazenamento (fontes), para os sítios de uso ativo ou crescimento da planta (dreno). Ao se acoplarem no sistema

193

vascular das plantas hospedeiras, as galhas induzem um direcionamento desses recursos para si, criando um tipo de dreno artificial (Larson & Whitham 1997). Outras galhas se alimentam de carboidratos e lipídios das plantas, além de drenar compostos secundários, utilizados nas camadas externas das galhas. Estas camadas conferem uma proteção extra contra parasitas e predadores (Motta et al. 2005). Assim, as regiões de nervura das folhas devem possibilitar um melhor acesso às substâncias utilizadas pelas galhas, permitindo um melhor desenvolvimento larval. Por isso, essas regiões são um local melhor para oviposição e, portanto, são escolhidas com maior frequência (Sih 1980).

As galhas das porções distais das nervuras secundárias não estavam mais distantes da nervura central em decorrência da presença de outras galhas na mesma nervura. A frequência de ocorrência de galhas nas porções distais das nervuras secundárias foi extremamente baixa. É provável que essa região esteja muito distante da nervura central e, assim, longe dos recursos alimentares. Então, os indivíduos parentais escolhem ovipor em lugares melhores (Morin 2011), independente da presença ou ausência de outras galhas na mesma nervura.

Considerando os resultados desse estudo, é possível concluir que existe uma seleção de habitat para o sistema estudado. Indivíduos parentais de insetos galhadores apresentam uma preferência em ovipor nas regiões de nervura das folhas de Vismia japurensis, já que estas são mais próximas aos vasos que transportam a seiva da planta.

Assim, as larvas dessas regiões se alimentam e se desenvolvem melhor, eclodindo com um tamanho maior, o que provavelmente confere a estes indivíduos melhores chances de sobrevivência e maior sucesso reprodutivo.

194

Agradecimentos

Agradeço aos professores Paulo Estefano Dineli Bobrowiec e Paulo Enrique Cardoso

Peixoto, aos monitores Thiago Gechel Kloss e Marcos Costa Vieira e ao colega

Randolfo Gonçalves Dias Terceiro pela ajuda e pelas sugestões no desenvolvimento desse trabalho, bem como durante a triagem das amostras coletadas. Agradeço também a todos os professores e colegas do curso de campo Ecologia da Floresta Amazônica de

2012 e ao “Seu Jorge” e “Dona Eduarda” pelos momentos de descontração, sem os quais tudo teria sido muito mais difícil.

Referências

Fritz, R.S., B.A. Crabb & C.G. Hochwender. 2003. Preference and performance of a

gall-inducing sawfly: plant vigor, sex, gall traits and phenology. Oikos,

102:601-613.

Larson, K.C. & T.G. Whitham. 1997. Competition between gall aphids and natural plant

sinks: plant architecture affects resistance to galling. Oecologia, 109:575-582.

Morin, P. 2011. Community Ecology. West Sussex: Wiley-Blackwell.

Morris, D.W. 1992. The role of habitat selection in landscape ecology. Evolutionary

Ecology, 6:357-359.

Motta, L.B., J.E. Kraus, A. Salatino & M.L.F. Salatino. 2005. Distribution of

metabolites in galled and non-galled foliar tissues of Tibouchina pulchra.

Biochemical Systematics and Ecology, 33:971-981.

Rosenzweig, M.L. 1981. A Theory of Habitat Selection. Ecology, 62:327-335.

Sih, A. 1980. Optimal Behavior: Can foragers balance two confliting demands? Science,

210:1041-1043.

195

Stone, G.N & K. Schönrogge. 2003. The adaptive significance of insect gall

morphology. Trends in Ecology and Evolution, 18:512-522.

Strong, D.R., J.H. Lawton & T.R.E. Southwood. 1984. Insects on plants: community

patterns and mechanisms. Oxford: Blackwell Scientific Publications.

Wilcox, D., B. Dove, D. McDavid & D. Greer. 2002. ImageTools. UTHSCSA. Texas,

EUA.

196

Quando uma ajuda é bem-vinda: briófitas facilitam o estabelecimento de plantas

sobre troncos caídos

Bianca Ferreira da Silva

Introdução

Interações positivas entre plantas encontram-se difundidas em diversas comunidades e interferem fortemente na dinâmica dessas comunidades (Bruno et al. 2003). A facilitação é uma interação positiva em que a presença de determinadas plantas cria condições ambientais que permitem que outros indivíduos se estabeleçam no local

(Callaway 1995). Esse processo ocorre quando condições ambientais impõem fortes restrições para o estabelecimento de plantas (Maestre & Cortina 2004). Na sucessão ecológica, a facilitação ocorre quando as plantas de um estágio sucessional precedente geram condições para o estabelecimento das plantas do próximo estágio (Brooker 2008;

Clements 1916).

Os mecanismos através dos quais uma planta facilita o estabelecimento de outro indivíduo podem ser indiretos ou diretos (Baumeister & Callaway 2006). Os mecanismos indiretos incluem proteção contra herbívoros e o aumento de visitas de polinizadores e dispersores (Acuña-Rodríguez et al. 2006; Callaway 1995). Já os mecanismos diretos são a atenuação das condições abióticas, para espécies menos resistentes. Essa atenuação pode estar associada, por exemplo, à diminuição da exposição à radiação e às altas temperaturas (Holzapfel et al. 2006; Castro et al. 2004), ao aumento da oxigenação do solo (Callaway & King 1996) e ao aumento da quantidade de nutrientes (Gómez-Aparicio et al. 2005).

O processo de facilitação é bastante estudado em ambientes áridos e semi-áridos

(Holzapfel et al. 2006; Flores & Jurado 2003; Castro et al. 2002), onde as condições

197

ambientais são bastante restritivas. Entretanto, florestas tropicais também apresentam limitações à germinação e ao estabelecimento de plantas, como presença de patógenos e baixa fertilidade dos solos (Richards 1996). Nesses ambientes, briófitas geram manchas de ocorrência ao se propagarem assexuadamente (Vanderpoorten & Goffinet 2009).

Essas manchas constituem um substrato que pode reter água e nutrientes (Bates 2009), enquanto outros locais da floresta podem ter esses nutrientes carreados pela chuva.

Assim, essas manchas de briófitas podem ser sítios propícios para o desenvolvimento de outras plantas. Manchas de briófitas são particularmente comuns sobre a superfície de troncos caídos no interior da mata. Sobre um mesmo tronco ocorrem áreas com manchas de briófitas e áreas sem a presença delas. Nesse contexto, investiguei o papel das briófitas no estabelecimento de indivíduos de outras plantas sobre troncos caídos.

Minha hipótese é que briófitas atuam como facilitadoras para o estabelecimento desses indivíduos. Assim, espero que outras plantas além das briófitas ocorram mais frequentemente em áreas do tronco cobertas por briófitas do que nas áreas sem briófitas.

Métodos

Realizei o estudo em um trecho de floresta contínua na Amazônia Central, localizado na

Área de Relevante Interesse Ecológico do Km 41, pertencente ao Projeto Dinâmica

Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF) do Instituto Nacional de Pesquisas na

Amazônia (INPA). Ao longo de um trecho de 1400 m, procurei por troncos caídos e parcialmente cobertos por briófitas. Em cada tronco avaliado delimitei duas parcelas paralelas de 15 cm², sendo uma no centro de uma mancha de briófitas e outra, na área sem briófitas mais próxima ao lado da mancha. Para cada área delimitada verifiquei a presença de outras plantas. Considerei todos os indivíduos de plantas presentes na parcela cujo ponto de enraizamento se encontrasse dentro de um mesmo tratamento –

198

com briófitas ou sem briófitas – na superfície do tronco. A fim de analisar o efeito da presença de briófitas sobre a ocorrência de outras plantas, realizei um teste de qui- quadrado de McNemar.

Resultados

Amostrei um total de 80 troncos. As plantas encontradas eram plântulas, juvenis e alguns adultos de lenhosas, trepadeiras e epífitas. A média do número de espécies nas parcelas com briófitas foi 0,99 ± 0,86, podendo ocorrer até três espécies diferentes. A média do número de indivíduos em parcelas com briófitas foi 1,19 ± 1,17, variando de zero a cinco indivíduos de plantas em cada parcela. Em parcelas sem briófitas, a média do número de espécies de plantas foi 0,33 ± 0,61, variando de zero a duas espécies distintas, e a média do número de indivíduos por parcelas foi 0,36 ± 0,72, com, no máximo, três indivíduos.

Dos 80 pares de parcelas, 55 tinham a presença de outras plantas na parcela com briófitas. Desses 55 pares, apenas 11 tinham plantas na parcela sem briófitas (Figura 1).

Dos 25 pares em que não ocorreram outras plantas na parcela com briófitas, 16 possuíam plantas na parcela sem briófitas (Figura 1). A presença das briófitas afetou positivamente a presença de outras plantas (χ2=21,81; gl=1; p<0,01).

199

Figura 3. Proporção de troncos encontrados para cada uma das combinações possíveis de resultados. Cada tronco contém uma parcela com briófitas e uma parcela sem briófitas. Cada parcela pode ou não conter outras espécies de plantas. “1” indica a presença e “0” indica a ausência de outras espécies de plantas em cada parcela. O asterisco indica a combinação que seria mais frequente caso as briófitas facilitassem o estabelecimento de outras plantas.

Discussão

A presença de briófitas favorece a ocorrência de plantas de outras espécies sobre a superfície de troncos. Essa facilitação pode ocorrer devido à criação de condições ambientais favoráveis para o estabelecimento. Assim, o desenvolvimento desses organismos parece depender das alterações ambientais provocadas pela presença das briófitas, como microclima mais úmido, substrato para fixação das plântulas e retenção e acúmulo de nutrientes. A atenuação das condições ambientais por um grupo de espécies parece ser mesmo um fator determinante para que indivíduos de outras espécies se desenvolvam (Baumeister & Callaway 2006).

200

A facilitação gerada por briófitas em superfícies de troncos pode estar relacionada a mecanismos indiretos, como o estabelecimento em sítios onde a competição é menor. No solo, a elevada abundância de plântulas e a proximidade a adultos aumentam os níveis de competição, dado que os envolvidos retiram de uma mesma área de solo os nutrientes para o próprio desenvolvimento e manutenção (Chen et al. 2010; Connel 1971; Janzen 1970). A competição com indivíduos adultos, que são competitivamente mais fortes, pode resultar em um aumento da taxa de mortalidade das plântulas (Chen et al. 2010). Assim, a presença das briófitas sobre a superfície do tronco pode fornecer às plântulas um sítio mais favorável ao estabelecimento, por apresentar-se distante do solo, livrando-as da intensa competição por recursos ali existente. Após a decomposição do tronco, esses indivíduos podem alcançar o solo com um tamanho em que o risco de mortalidade já seja bastante reduzido.

Os troncos caídos de árvores nos quais as briófitas ocorriam possuíam superfícies com rugosidade diferente. Reentrâncias nos troncos podem facilitar a fixação e o desenvolvimento das plântulas, já que as reentrâncias são locais de acúmulo de solo e serapilheira. Portanto, estudos que considerem o possível efeito sinérgico de fatores como presença das briófitas e a rugosidade dos troncos poderiam esclarecer a importância relativa desses fatores na facilitação da ocorrência de plantas em florestas tropicais.

Agradecimentos

Agradeço aos organizadores do EFA pela oportunidade de participar do curso e aos coordenadores, Paulinhos -Rainbow Master e Mauravilhoso - por todos os puxões de orelha bem dados ao longo desse mês. Aos monitores, Barbudo e Gloss, pelas conversas e orientações. Ao Paulinho (Rainbow Master) por todos os abraços (argh!) nos

201

momentos de desespero. Agradeço a Samara (Tati) pela companhia no campo, pelas dicas para o trabalho e pelos abraços às “ávores”. Agradeço também ao Marcel por escutar minhas dúvidas e discutir o trabalho comigo e pelo enorme carinho e paciência na correção desse trabalho. Ao Marcos (monitor Barbudo chato e [não] favorito) por ser sempre crítico, me fazendo prestar atenção nos detalhes do desenvolvimento do trabalho. Agradeço a todos os amigos do EFA, que durante um mês aguentaram toda a minha variação de humor e ainda me proporcionaram muitos momentos de risos e descontração, dos quais lembrarei sempre. Obrigada à Amazônia, por me mostrar um mundo a ser explorado e discutido em seus processos e por ter aqui descoberto essas pessoas maravilhosas, com as quais percebo que nem tudo é trabalho e que o estresse deve ser deixado de lado para que a vida possa ser realmente vivida.

Referências

Acuña-Rodríguez, I.S., L.A. Cavieres & E. Gianoli. 2006. Nurse effect in seedling

establishment: facilitation and tolerance to damage in the Andes of central Chile.

Revista Chilena de Historia Natural, 79:329-336.

Bates, J.W. 2009. Mineral nutrition and substratum ecology, pp. 299-356. In: Bryophyte

biology (B. Goffinet & A.J. Shaw, eds.). Cambridge: Cambridge University

Press.

Baumeister, D. & R.M. Callaway. 2006. Facilitation by Pinus flexilis during succession:

a hierarchy of mechanisms benefits other plant species. Ecology, 87:1816-1830.

Brooker, R.B., F.T. Maestre, R.M. Callaway, C.L. Lortie, L.A. Cavieres, G. Kunstler, P.

Liancourt, K. Tielbörger, J.M.J. Travis, F. Anthelme, C. Armas, L. Coll, E.

Corcket, S. Delzon, E. Forey, Z. Kikvidze, J. Olofsson, F. Pugnaire, C.L.

Quiroz, P. Saccone, K. Schiffers, M. Seifan, B. Touzard & R. Michalet. 2008.

202

Facilitation in plant communities: the past, the present, and the future. Journal of

Ecology, 96:18-34.

Bruno, J.F., Stachowicz, J. J. & Bertness, M. D. 2003. Inclusion of facilitation into

ecological theory. Trends in Ecology & Evolution, 18:119-125.

Callaway, R.M. 1995. Positive interactions among plants. Botanical Review, 61:306-

349.

Callaway, R.M. & L. King. 1996. Oxygenation of the soil rhizosphere by Typha

latifolia and its facilitative effects on other species. Ecology, 77:1189-1195.

Castro, J., R. Zamora, J.A. Hódar & J.M. Gómez. 2002. Use of Shrubs as Nurse Plants:

A New Technique for Reforestation in Mediterranean Mountains. Restoration

Ecology, 10:297-305.

Castro, J., R. Zamora, J.A. Hódar, J.M. Gómez & L. Gómez-Aparicio. 2004. Benefits of

Using Shrubs as Nurse Plants for Reforestation in Mediterranean Mountains: A

4-Year Study. Restoration Ecology, 12:352-358.

Chen, L., X. Mi, L.S. Comita, L. Zhang, H. Ren & K. Ma. 2010. Community-level

consequences of density dependence and habitat association in a subtropical

broad-leaved forest. Ecology Letters, 13:695-704.

Clements, F.E. 1916. Plant succession: an analysis of the development of vegetation.

Washington: Carnegie Institution of Washington.

Connell, J.H. 1971. On the role of natural enemies in preventing competitive exclusion

in some marine animals and in rain forest trees, pp. 298-312. In: Dynamics of

Populations (P.J. Den Boer & G. Gradwell, eds). Wageningen: Centre for

Agricultural Publishing and Documentation.

Flores, J. & E. Jurado. 2003. Are nurse-protégé interactions more common among

plants from arid environments? Journal of Vegetation Science, 14:911-916.

203

Gómez-Aparicio, L., F. Valladares, R. Zamora & J.L. Quero. 2005. Response of tree

seedlings to the abiotic heterogeneity generated by nurse shrubs: an

experimental approach at different scales. Ecography, 28:757-768.

Holzapfel, C., K. Tielbörger, H.A. Parag, J. Kigel & M. Sternberg. 2006. Annual plant–

shrub interactions along an aridity gradient. Basic and Applied Ecology, 7:268-

279.

Janzen, D.H. 1970. Herbivores and number of tree species in tropical forests. American

Naturalist, 104:501-528.

Maestre, F.T. & J. Cortina. 2004. Do positive interactions increase with abiotic stress?

A test from a semi-arid steppe. Proceedings of the Royal Society London B

(Suppl.) 271:S331–S333.

Richards, P.W. 1996. The tropical rain forest: an ecology study. Cambridge: Cambridge

University Press.

Vanderpoorten, A. & B. Goffinet. 2009. Introduction to Bryophytes. Cambridge:

Cambridge University Press.

204

As formigas não utilizam sinal químico de formigas de outros territórios para

melhorar sua eficiência de forrageio

Bruno Travassos

Introdução

Formigas são organismos que se orientam basicamente por sinais químicos (Wilson

1958). As formigas não usam somente os sinais químicos do ambiente para se orientar, como também produzem seus próprios sinalizadores que as ajudam a coordenar funções no formigueiro (Wilson 1962). Os sinalizadores químicos das formigas estão envolvidos em quase todas as funções vitais do formigueiro. Por exemplo, no forrageio por patrulha e recrutamento das formigas de ninho fixo, algumas formigas têm a função de patrulhar determinada área em busca de alimento. Quando essas formigas encontram algum tipo de alimento, elas marcam o recurso com um sinalizador químico e voltam para o formigueiro. Essa trilha química é utilizada pelo restante das formigas para encontrar esse alimento mais rapidamente (Burkhardt 1983).

Algumas formigas são capazes de reconhecer o sinal químico de formigas de outro formigueiro e até de outra espécie (Mintzer 1980). Isso já foi demonstrado tanto para formigas parasitas sociais que seguem a trilha de suas hospedeiras, quanto em formigas escravas que seguem a trilha das formigas que as dominam (Wilson 1955). Em outros casos, formigas não parasitas já foram reportadas utilizando trilhas de outras espécies (Hölldobler e Wilson 1990). Hölldobler e Wilson (1990) argumentam que quando não existe parasitismo, o comportamento de seguir a trilha de outras formigas talvez não tenha significado adaptativo. Entretanto, para formigas que usam recursos semelhantes, utilizar um sinal químico de outras formigas para acessar esses recursos pode ser muito vantajoso, já que isso pouparia tempo de patrulha.

205

No forrageio por patrulha e recrutamento, o maior investimento de energia é na patrulha (Stephen & Krebs 1986). Patrulhar implica em gasto de energia para o deslocamento além da exposição à predação e a intempéries ambientais. Portanto, qualquer mecanismo que aumente a eficiência de patrulha representa uma economia significativa de energia e, portanto, fornece uma vantagem grande para o formigueiro

(Lighton et al. 1987).

O objetivo deste estudo foi avaliar se formigas utilizam o sinal químico de outras formigas para melhorar a eficiência do forrageio. Minha expectativa é que as formigas de um território encontrem mais rapidamente alimentos que já tenham sido marcados quimicamente por formigas de outros territórios.

Métodos

Área de estudo

Eu realizei o estudo em uma floresta contínua de terra firme localizada na reserva florestal do km 41 (02° 24’S – 59° 44’O), cogerida pelo Projeto Dinâmica Biológica de

Fragmentos Florestais (PDBFF) e pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da

Biodiversidade (ICMBio). Essa área fica localizada a cerca de 80 km a norte de

Manaus, Amazonas, Brasil.

Preparação das iscas

Eu utilizei iscas ricas em proteína e gordura que consistiam de pequenos pedaços de papel (2 x 2 cm) embebidos em óleo de sardinha, sobre os quais depositei pequenos pedaços de sardinha. As iscas foram divididas em dois tipos: iscas sem sinal químico de formigas e iscas com sinal químico de formigas. Para obter as iscas com sinal químico de formigas eu preparei iscas conforme descrito acima e deixei essas iscas sobre o

206

folhiço. As iscas foram visitadas por formigas por pelo menos cinco minutos para garantir que houvesse depósito de sinalizadores químicos (Agosti & Agosti 2002).

Depois desse tempo eu removi todas as formigas que estavam na isca e imediatamente levei a isca para outro território.

Delineamento amostral

Eu coloquei 36 iscas (18 com sinal químico de formigas, 18 sem sinal) intercaladas por tipo e espaçadas pelo menos 10 m ao longo de uma trilha na floresta. O espaçamento de

10 m de distância entre uma isca e outra garantiu que as formigas atraídas por essas iscas fossem de formigueiros diferentes (Alonso & Agosti 2002) e portanto pudessem ser consideradas como unidades amostrais independente.

Para avaliar o tempo que as formigas levaram para acessar a isca, eu registrei o tempo entre a colocação da isca no folhiço até o momento em que cinco formigas dominantes da mesma espécie haviam sido recrutadas. Considerei recrutamento quando uma formiga de determinada espécie encontrava a isca, saía do local e algum tempo depois mais formigas da mesma espécie chegavam à isca. Eu comparei o tempo que as formigas levaram para encontrar essas iscas previamente marcadas com sinal químico de outra formiga com iscas controle sem sinal químico.

Análise dos dados

Para testar a previsão de que iscas previamente marcadas com sinal químico de formigas são detectadas mais rapidamente por formigas de outros territórios eu utilizei uma análise de variância (ANOVA). O tempo necessário para recrutamento foi a variável resposta e o tipo de isca (com sinal químico ou sem sinal químico) foi a

207

variável preditora. Eu desconsiderei unidades amostrais nas quais não houve recrutamento por nenhuma espécie em até 20 minutos.

Resultados

Dentre as 36 iscas colocadas, não houve recrutamento em sete iscas (19%) (cinco em iscas sem sinal químico das formigas, duas em iscas com sinal químico). A média

(±desvio padrão) do tempo de recrutamento de formigas para as iscas sem sinal químico foi de 8,27±3,05 min e a média do tempo de recrutamento para as iscas com sinal químico foi de 6,07±3,2 min. Não houve diferença entre os dois tipos de isca quanto ao tempo de recrutamento de formigas (F1,28 = 3,51; p = 0,07; Figura 1).

Isca sem sinal químico Isca com sinal químico de de outras formigas outras formigas

Figura 1. Tempo de recrutamento de formigas em iscas sem sinal químico e com sinal químico de outras formigas amostradas na reserva florestal do km 41, Manaus –

Amazonas, Brasil.

208

Discussão

A presença do sinal químico de outras formigas no alimento não aumenta a eficiência do forrageamento de formigas. Isso indica que as formigas não utilizam a pista química de outras formigas para encontrar alimento dentro do seu território. É possível que para as formigas encontrem um determinado alimento mais rapidamente, elas dependam não só da sinalização química do próprio alimento, mas também da existência de uma trilha química que as leve até ele. Sem uma trilha química até o alimento, a operária depende da dispersão de voláteis químicos no ar para encontrar o alimento (Stephen & Krebs,

1986). Nessa situação, se o alimento também dispersa voláteis químicos no ar, a operária poderia encontrá-lo com a mesma rapidez independente de ele estar marcado com sinal químico de outra formiga.

Outra possível explicação para o padrão encontrado pode estar associada à especialização no comportamento das castas das formigas. Em muitas espécies de formiga que usam a estratégia de patrulha e recrutamento para forragear, as operárias forrageiras são altamente especializadas em buscar alimento. Para alguns grupos existe um nível de especialização até para tipos diferentes de alimento, por exemplo, algumas operárias somente conseguem detectar alimentos ricos em proteína e outras somente alimentos ricos em açúcar (Oster & Wilson 1978). Essa especialização é um mecanismo que torna a busca por alimento muito mais eficiente (Seeley 1985). É possível que o reconhecimento do sinal químico de outras espécies não represente uma maior eficiência no forrageio e, portanto, esse comportamento não teria sido selecionado. Essa explicação é condizente com o argumento de Hölldobler e Wilson (1990) no qual eles afirmam que o reconhecimento do sinal químico de formigas de outra espécie pode não ter significado adaptativo.

209

Agradecimentos

Agradeço aos brows Tiko Jordão e André Mendonça por terem me incentivado

(praticamente obrigado) a me inscrever no EFA. A minha namorada Camila

Hohlenwerger, por ter me ajudado com toda logística e organização da viagem, por ter apoiado minha vinda incondicionalmente independentemente dos boatos a respeito do

EFA e por ter cedido um lugar quentinho para minha mente se reconfortar nos parcos momentos de descanso. A todos os amigos que fiz durante o curso, em especial (em ordem de aparecimento) a Leonardo por ter me aconselhado com palavras sábias e convincentes sobre qual deveria ser meu real aprendizado no curso; a Randolpho que a despeito das piadas de 8ª série sempre esteve lá pra dizer o quanto ele me acha legal; a

Lorena por ter tomado conta de todos nós e cujo carinho pôde ser percebido até por um cara chato como eu; ao Conde José Hidasi por ter rido de todas as piadas de nerds. A todos os professores que souberam lidar com o gênio desse “aluno feral”, ensinando-lhe a aceitar a possibilidade de erro e, portanto, aprender muito mais.

Referências

Agosti, D., J.D. Majer, L.E. Tennant de Alonso & E. Schultz. 2002. Measuring and

monitoring biological diversity: standard methods for ants. Washington D.C.:

Smithsonian Institution Press.

Burkhardt, J.F. 1983. Foraging strategies in ants: the influence of colony size on the

organization of an ant colony. Tese de mestrado, Duke University.

Davies, N.B. & A.I. Houston. 1984. Territory economics, pp. 148-169. In: Behavioural

ecology: an evolutionary approach, 2nd ed (J.R. Krebs & N.B. Davies, eds.).

Sunderland: Sinauer associates.

210

Hölldobler, B. & E. O. Wilson. 1990. The ants. Berlin: Springer-Verlag Berlin

Heidelberg.

Lighton, J.R.B., G.A. Bartholomew & D.H. Feener. 1987. Energetics of locomotion and

load carriage and a model of the energy cost foraging in the leaf-cutting ant Atta

colombica Guér. Physiological Zoölogy, 60:524-537.

Mintzer, A. 1980. Simultaneous use of foraging trail by two leafcutter ant species in

Sonoran desert. Journal of the New York Entomological Society, 88:102-105.

Oster, G.F. & E.O. Wilson. 1978. Caste and ecology of the social insects. New Jersey:

Princeton University Press.

Seeley, T.D. 1985. Honeybee ecology: a study of adaptation in social life. New Jersey:

Princeton University Press.

Stephens, D.W. & J.R. Krebs. 1986. Foraging theory. New Jersey: Princeton University

Press.

Wehner, R. 1987. Spatial organization of foraging behaviour in individually searching

desert ants, Cataglyphis (Sahara Desert) and Ocymyrmex (Namib Desert), pp. 15-

42. In: From individual to collective behaviour in social insects (Experimentia

Suplement, vol. 54) (Pasteels, J.M. & J.L. Deneubourgs, eds.). Bassel: Birkhäuser

Verlag.

Wilson, E.O. 1955. Division of labor in a nest of slave-making ant Fomica wheeleri

Creighton. Psyche, 60:130-133.

Wilson, E.O. 1958. A chemical releaser of alarm and dig behaviour in the ant

Pogonomyrmex badius (Latreille). Psyche, 65:41-51.

Wilson, E.O. 1962. Chemical communication among workers of the fire ant Solenopsis

saevissima (Fr. Smith), 1: The organization of mass-foraging; 2: An information

211

analysis of the odour trail; 3: The experimental induction of social responses.

Animal Behaviour, 10:134-164.

212

Agregação de palmeiras não aumenta o consumo por herbívoros

em plântulas de Attalea sp.

Caroline Marques Dracxler

Introdução

A herbivoria exerce um papel potencialmente regulador das comunidades vegetais

(MacDougall 2008). A magnitude dos efeitos dos herbívoros sobre as plantas pode variar de acordo com as partes consumidas, com a fase de desenvolvimento da planta e com as espécies de herbívoros envolvidos (Harper 1977). A herbivoria em folhas, por exemplo, pode reduzir a capacidade fotossintética da planta, levando a alterações na aptidão e a possíveis consequências demográficas para as plantas (García & Ehrlén

2009). Além disso, o porte dos herbívoros pode determinar o impacto sobre a planta, que pode variar desde pequenos danos às folhas até o consumo do indivíduo inteiro.

As plantas representam um recurso altamente diverso e variável no espaço para os herbívoros (Marques et al. 2000, Pimentel 1961). Os padrões de abundância e distribuição espacial das plantas podem influenciar a herbivoria, e seus efeitos devem variar de acordo com o grau de especialização dos herbívoros. Os efeitos negativos da herbivoria sobre as plantas podem ser maiores em estádios ontogenéticos mais jovens, o que pode reduzir o estabelecimento de novos indivíduos e limitar o crescimento populacional (Harper 1977, Medina 2007). A hipótese de concentração de recursos postula que herbívoros espécie-específicos são mais propensos a encontrar, permanecer e consumir a planta hospedeira localizada em manchas de indivíduos coespecíficos do que em indivíduos isolados (Root 1973). De fato, diversos estudos demonstram que plantas hospedeiras altamente adensadas sofrem maiores níveis de herbivoria por

213

animais especialistas, tornando-se mais suscetíveis (Frederickson & Gordon 2007,

Pimentel 1961, Tahvanainen & Root 1972).

Embora a especialização de herbívoros seja um tema central em interações herbívoros-plantas, estudos recentes mostram que herbívoros são raramente monófagos e apresentam dietas que incluem plantas filogeneticamente próximas, as quais dividem características nutricionais e pistas de alimentação similares (Novotny et al. 2002,

Novotny & Basset 2005, Ødegaard et al. 2005, Weiblen et al. 2006). Nesse sentido, a chance de um mesmo herbívoro consumir duas espécies diferentes de plantas aumenta com a proximidade filogenética entre elas (Novotny & Basset 2005). Portanto, assim como previsto pela hipótese de agregação de coespecíficos, a agregação de plantas do mesmo gênero ou da mesma família pode aumentar a chance de uma planta ser consumida.

Palmeiras (Arecaceae) são um grupo monofilético abundante que representam um recurso importante para herbívoros. Em florestas tropicais, as palmeiras estão entre as plantas dominantes e são um importante componente estrutural das florestas (Scariot

1999). Como diversas espécies de palmeiras co-ocorrem, essas plantas podem ser particularmente suscetíveis ao efeito da agregação de indivíduos aparentados sobre a intensidade de herbivoria. Minha hipótese é que a intensidade de herbivoria não é influenciada exclusivamente pela densidade de indivíduos coespecíficos, e deve aumentar também com a concentração de palmeiras de outras espécies. Assim, ao considerar plântulas de Attalea sp., espero que quanto maior o número de vizinhos da mesma família, tanto coespecíficos quanto interespecíficos, maior será a área total consumida por herbívoros.

214

Métodos

Realizei o estudo em uma floresta de terra firme na reserva do Km 41 (2°24’ S–59°43’

O), localizada a 80 km ao norte de Manaus, Brasil. A reserva faz parte da Área de

Relevante Interesse Ecológico, cogerida pelo Projeto Dinâmica Biológica de

Fragmentos Florestais (PDBFF) e abrange cerca de 10.000 ha de mata contínua.

Para avaliar a influência da agregação de indivíduos da mesma espécie e de indivíduos filogeneticamente próximos sobre a intensidade de herbivoria, selecionei 25 plântulas focais de Attalea sp. com até 1 m de altura e com folíolos ainda unidos. A fim de contabilizar as plântulas de Attalea sp. e de outras espécies de palmeiras localizadas no entorno dos indivíduos selecionados, estabeleci um raio de 3 m a partir de cada indivíduo focal, totalizando uma área de 28,26 m². Dentro da circunferência, busquei por plântulas e juvenis da família Arecaceae e registrei a quantidade de indivíduos de

Attalea sp. (espécie focal) e das outras espécies de palmeiras.

Calculei a intensidade de herbivoria nas plântulas focais de Attalea sp. registrando a área consumida em cada folha da plântula com o auxílio de um plástico milimetrado. Somei a área consumida de todas as folhas para obter a área total consumida por plântula. Identifiquei a herbivoria a partir de marcas características deixadas pelos herbívoros, desde pequenos furos até a remoção parcial das folhas. Para controlar os efeitos do tamanho das folhas sobre a área foliar consumida, medi o comprimento e largura de todas as folhas de cada plântula. A partir dessas medidas, calculei a área (área da folha=π*comprimento*largura/4) de cada folha, obtendo assim a

área foliar total de cada plântula. Para avaliar a influência do número de indivíduos de

Attalea sp., de outras espécies de palmeiras e da área foliar total das plântulas sobre a intensidade de herbivoria na plântula focal de Attalea sp., realizei uma regressão múltipla.

215

Resultados

A área foliar média consumida das plântulas focais foi 99,97 ± 104,75 cm² (média ± desvio padrão), o que correspondeu a 7% da área foliar média das plântulas, a qual foi de 1504,52 ± 1552,27 cm². O número médio de plântulas e juvenis coespecíficos vizinhos ao indivíduo focal de Attalea sp. foi de 2,44 ± 2,08 e o de outras espécies da família Arecaceae foi de 19,04 ± 4,92. A área foliar consumida por plântula foi positivamente relacionada apenas com a área foliar total das plântulas de Attalea sp.

(F(1,22)=83,66; p<0,001; R²=0,58), mas não foi afetada pelo número de vizinhos coespecíficos (F(1,22) =1,20; p = 0,28; R²=0,04; Figura 1) nem pelo número de vizinhos de outras espécies de palmeiras (F(1,22) = 0,11; p = 0,74; R²=0,005; Figura 2).

100

80

60

40

20

sp. 0

Attalea -20

-40

-60

-80

consumida por herbívoros, o número de vizinhosnúmeropor herbívoros,ode consumida

interespecíficos e a área foliar total de plântulas de de foliarplântulas área de total a e interespecíficos Resíduos de uma regressão múltipla entre a área total área múltipla a entre regressão uma de Resíduos -100 -2 0 2 4 6 8 10 Número de vizinhos coespecíficos

Figura 1. Relação entre a área total consumida por herbívoros de Attalea sp. e o número de vizinhos coespecíficos em uma floresta de terra firme na Amazônia Central, Brasil.

A área total consumida por herbívoros é representada pelos resíduos da regressão múltipla entre a área total consumida por herbívoros, o número de vizinhos interespecíficos e a área foliar total de plântulas de Attalea sp..

216

100

80

60

40

20

sp. 0

Attalea -20

-40

-60

-80

consumida por herbívoros, o número de vizinhosnúmeropor herbívoros,ode consumida

interespecíficos e a área foliar total de plântulas de de foliarplântulas área de total a e interespecíficos Resíduos de uma regressão múltipla entre a área total área múltipla a entre regressão uma de Resíduos -100 -2 0 2 4 6 8 10 Número de vizinhos coespecíficos

Figura 2. Relação entre a área total consumida por herbívoros de Attalea sp. e o número de vizinhos de outras espécies de palmeiras (Arecaceae) em uma floresta de terra firme na Amazônia Central, Brasil. A área total consumida por herbívoros é representada pelos resíduos da regressão entre a área consumida por herbívoros, o número de vizinhos coespecíficos e a área foliar total de plântulas de Attalea sp..

Discussão

A intensidade de herbivoria em plântulas de Attalea sp. não foi dependente da densidade de indivíduos de palmeiras. Por outro lado, a área foliar representa um recurso disponível para os herbívoros e quanto maior a folha, maior foi a intensidade de herbivoria. Embora todas as plântulas focais apresentassem sinais de herbivoria, a área consumida por herbívoros foi relativamente baixa, mantendo-se em torno de 7% da área foliar.

A abundância dos indivíduos de Attalea sp. não afetou a herbivoria sobre as plântulas focais. Como a densidade de Attalea sp. foi baixa (0,08 palmeiras/m²) em relação à densidade total de palmeiras no sub-bosque (0,8 palmeiras/m²), é possível que

217

indivíduos de Attalea sp. não formem manchas de coespecíficos suficientemente grandes para atrair mais herbívoros. Tendo em vista que a maioria dos herbívoros é considerada generalista (Novotny et al. 2002, Novotny & Basset 2005, Ødegaard et al.

2005, Weiblen et al. 2006), eles não devem responder à densidade de uma única espécie, o que ajuda a explicar a ausência de resposta ao adensamento da Attalea sp..

A presença de indivíduos de outras espécies de palmeiras também não influenciou a intensidade de herbivoria em plântulas de Attalea sp. A aglomeração do recurso está ligada à capacidade dos herbívoros de se deslocar e de encontrar o recurso

(Baraza et al. 2007). Alguns estudos demonstram que insetos herbívoros, como borboletas, têm elevada capacidade de voo e podem alcançar até 200 m de distância

(Hanski et al. 2006, Merckx & Dyck 2007). Assim, é possível que a elevada densidade de palmeiras no sub-bosque (0,7 palmeiras/m²) não represente agrupamentos isolados, especialmente para herbívoros com boa capacidade de deslocamento. Como plântulas e juvenis de outras espécies de palmeiras foram muito frequentes, os herbívoros têm igual acesso a diferentes espécies de palmeiras hospedeiras por todo o sub-bosque. Isso dilui possíveis efeitos da aglomeração de indivíduos aparentados sobre a herbivoria em

Attalea sp. De fato, a baixa herbivoria indicada pela proporção de área foliar consumida das plântulas, fortalece a ideia que a herbivoria é diluída entre os diferentes indivíduos de palmeiras. Assim, é possível que padrões diferentes de herbivoria sejam observados somente para plantas raras e associadas a herbívoros especialistas, os quais devem responder fortemente à aglomeração de recurso.

Agradecimentos

“O leito dos rios fartou-se e inundou de água doce a amargura do mar. Numa enchente amazônica, numa explosão atlântica!” (MC Chicão). Quero agradecer imensamente,

218

com todo o coração, a oportunidade de participar do EFA 2012! A cada uma das pessoinhas que eu conheci, agradeço muito! Ao Felipe, moranguinho do nordeste, e ao

Toyoyo pelos bilhetinhos das primeiras semanas e pela companhia no contrabando de bebida nas madrugadas (Ops, falei ou pensei?). À Esther pela companhia, foi ótimo te ver de novo! Ao Richard Gere e ao Mike por seus sonhos. Às lembranças que a festinha sensacional da Dimonia vai deixar (beber água é a solução!). À Atoladinha (Dani) pelo dia seguinte, que recolheu minhas coisas! Ao Jansen, à Aline e ao Cassiano por encarar o calor com a gente na Várzea. Ao Jack Sparrow (Fabrício), companheiro de balde, ao

Dé e à Catá pela excelente companhia na fase mais bonita do curso! Sentirei falta de vocês três! Aos promoters da festa do barco em pleno Rio Negro, nunca vou esquecer essa festa! Ao Baby (Marcel), pela companhia, ajuda e por fazer toda e qualquer frase ter duplo sentido! Ao Adriano, Glauco, à Ana e ao Jorge pelos aprendizados. À Manô pela chegada no finzinho do curso e pela simpatia! Às meninas, minhas amigas tão queridas, que me fizeram companhia. À Lore Pole Dance, pelas cervejas escondidas, pelos banhos de balde, por tudo! Você é um doce de menina e vai fazer uma falta que dá dó! À Tati das Áveres (somo nozes) pelas loucuras e por me ensinar que xingamentos são amor! Ai, que saudade que eu já tô! À Aninha Alanis Maria Bethânia pela companhia e fofocas desde o início, minha vizinha oficial de rede! Você é um amor, sentirei muitas saudades! (sss)Sarah Baranga, você é uma calhooorda! Que será de mim sem você, sem as risadas e os quase-choros?! Daaaani, pra bom entendedor uma letra basta! Obrigada pela companhia, loucura, e seus quase-infartos nos Igarafests!! À

Pezinho de Ouro (Carol Brabuleta) pelas conversas e companhia! Já te conhecia e não sabia! À Shay (Condessa de Hogwarts) por ser única! Menina, sorte do Painha ter você por perto! Vidal querido, meu espanhol favorito, obrigada pela companhia em todas as festinhas piratas e também nas oficiais! Ao Tatu (Vidal Pocket) por ser sempre tão feliz

219

e “cotête”, por nunca negar uma cerveja e por me ajudar no campo! Ao JosEFA pelas caretas e por ser tão engraçado, inclusive quando fica de mau humor! A todos as outras pessoas por tudo, de verdade, vocês são sensacionais! Aos monitores tão queridos,

Beluguinha e Marcos, por nos aturar! Marcos, por estar sempre presente nas festinhas piratas! Beluguinha Pomerano (Thiago Xexéu), além de monitor, você foi uma fonte de diversão esse mês! Que bom que veio e ainda trouxe a Sarinha Baranga! E como não poderia deixar de ser, um obrigada especial aos Paulinhos, que seguraram a barra o mês todo, sempre de bom humor e preparados para ouvir nossas besteiras, os relatórios dignos de asco e os fiascos das apresentações. Mas vocês nunca desistiram, e sempre muito pacientes, elogiavam todo e qualquer avanço, o que nesse mundo paralelo é um estímulo imeeeenso! E como se não bastasse serem exemplos e pessoas absolutamente sensacionais, vocês ainda fizeram de TUDO pra gente ter a melhor experiência das nossas vidas, com as festas mais incríveis de todas, vídeos hilários que acabavam com a tensão, piadas e recadinhos, banhos de sol e a cerveja nossa de todo dia! Paulinho

Morcegão “Mauravilhoso”, muito obrigada por tudo, pela companhia nas festas e pelo estímulo sempre! Rainbow Master (Paulinho Bom), não sei nem o que dizer (será se?)!

Obrigada pela companhia, conversas, revelações, fofocas, por conseguir ficar em silêncio (ou não) alguns segundos enquanto eu tentava medir a herbivoria nas palmeirinhas, e por ser tão Paulinho Rainbow Master! Adooooro! Obrigada por tudo, sempre!!!!!!!!!

Referências

Baraza, E., R. Zamora, J.A. Hódar & J.M. Gómez. 2007. Plant–herbivore interaction:

beyond a binary vision, pp. 481–514. In: Functional plant ecology (F.I. Pugnaire

& F. Valladares, eds.). Florida: CRC Press.

220

Coley, P.D. & J.A. Barone. 1996. Herbivory and plant defenses in tropical forests.

Annual Review of Ecology and Systematics, 27:305–335.

Dinnage, R., M.W. Cadotte, N.M. Haddad, G.M. Crutsinger & D. Tilman. 2012.

Diversity of plant evolutionary lineages promotes arthropod diversity. Ecology

Letters, 15:1308–1317.

Frederickson, M.E. & D.M. Gordon. 2007. The devil to pay: a cost of mutualism with

Myrmelachista schumanni ants in ‘devil’s gardens’ is increased herbivory on

Duroia hirsuta trees. Proceedings of the Royal Society of London B, 274:1117–

1123.

García, M.B. & J. Ehrlén. 2009. Evaluación de los efectos demográficos y evolutivos de

las interacciones planta-animal mediante modelos matriciales, pp. 95–111. In:

Ecología y evolución de interacciones planta-animal: conceptos y aplicaciones

(R. Medel, M.A. Aizen & R. Zamora, eds.). Santiago de Chile: Editorial

Universitaria.

Harper, J.L. 1977. Population biology of plants. London: Academic Press.

MacDougall, A.S. 2008. Herbivory, hunting, and long-term vegetation change in

degraded savanna. Biological conservation, 141:2174–2183.

Marques, E.S.A., P.W. Price, & N.S. Cobb. 2000. Resource abundance and insect

herbivore diversity on woody fabaceous desert plants. Environment Entomology,

29:696–703.

Medina, E. 2007. Tropical forests: diversity and function of dominant life-forms,

pp.313–350. In: Functional plant ecology (F.I. Pugnaire & F. Valladares, eds.).

Florida: CRC Press.

221

Novotny, V., Y. Basset, S.E. Miller, G.D. Weiblen, B. Bremer, L. Cizek, & P. Drozd.

2002. Low host specificity of herbivorous insects in a tropical forest. Nature,

416:841–844.

Novotny, V. & Y. Basset. 2005. Host specificity of insect herbivores in tropical forests.

Proceedings of the Royal Society of London B, 272:1083–1090.

Ødegaard, F., O.H. Diserud & K. Østbye. 2005. The importance of plant relatedness for

host utilization among phytophagous insects. Ecology Letters, 8:612–617.

Pimentel, D. 1961. The influence of plant spatial patterns on insect population. Annals

of the Entomological Society of America, 54:61–69.

Root, R.B. 1973. Organization of a plant-arthropod association in simple and diverse

habitats: the fauna of collards (Brassica oleracea). Ecological Monographs,

43:95–124.

Scariot, A. 1999. Forest fragmentation effects on palm diversity in central Amazonia.

Journal of Ecology, 87:66–76.

Tahvanainen, J.O. & R.B. Root. 1972. The influence of vegetational diversity on the

population ecology of a specialized herbivore, Phyllotreta cruciferae

(Coleoptera: Chrysomelidae). Oecologia, 10:321–342.

Weiblen, G.D., C.O. Webb, V. Novotny, Y. Basset, & S.E. Miller. 2006. Phylogenetic

dispersion of host use in a tropical insect herbivore community. Ecology, 87:62–75.

222

Interação mutualista entre afídeos e formigas não altera a eficácia de defesa da

mirmecófita Tococa sp. por formigas

Cibele Paiva

Introdução

O mutualismo é uma associação em que espécies diferentes convivem para obter benefícios mútuos (Vasconcelos 1991). Este tipo de interação é muito comum entre insetos e plantas, em especial nas plantas mirmecófitas, que são plantas que interagem com formigas (Benson 1985). As mirmecófitas possuem estruturas denominadas domáceas que são usadas como abrigo por colônias de formigas e outros insetos. Já as formigas conferem proteção às plantas consumindo fungos patógenos e herbívoros

(Fonseca 1994).

O forrageio das formigas em mirmecófitas reduz a taxa de herbivoria

(Vasconcelos 1991), de modo que, sem essa interação, as mirmecófitas não chegariam à maturidade reprodutiva (Fonseca & Ganade 1996). Essas formigas exibem um comportamento de recrutamento em massa para atacar os herbívoros que consomem a planta (Vasconcelos 2001).

As formigas que ocorrem em mirmecófitas também podem exibir interações mutualistas com outros insetos. Isso ocorre, por exemplo, com afídeos, que ao consumir a seiva da planta secretam uma substância açucarada rica em carboidratos (Schurch

2000). As formigas consomem esse composto, podendo inclusive, se alimentar do próprio afídeo (Flatt & Weisser 2000). Em troca as formigas oferecem proteção aos afídeos contra inimigos naturais (Vasconcelos 1991). Essa relação entre afídeo e formiga é obrigatória e o afídeo é levado à domácea pelas formigas (Wimp & Whitham

2001).

223

As formigas que interagem com afídeos adquirem uma alta quantidade de exudato. Isso pode diminuir a procura por alimento, acarretando em menor forrageio das formigas nas plantas e menor defesa contra herbívoros. Sendo assim, avaliei se a quantidade de afídeos na domácea influencia a eficácia de defesa das plantas pelas formigas. Espero que o aumento no número de afídeos nas domáceas diminua a quantidade de formigas que patrulham a folha e consequentemente aumente a área das folhas consumida por herbívoros.

Métodos

Realizei o presente estudo em uma área de floresta de terra firme na reserva florestal do km 41, localizada 80 km ao norte de Manaus, Brasil. Esta reserva é uma Área de

Relevante Interesse Ecológico (ARIE) co-gerida pelo Projeto Dinâmica Biológica de

Fragmentos Florestais (PDBFF) e pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da

Biodiversidade (ICMBio).

Em 18 plantas de Tococa sp. selecionei quatro folhas que apresentavam diferentes graus de herbivoria. Em cada folha, quantifiquei durante 30 segundos o número de indivíduos da formiga Azteca sp. que patrulhavam a folha. Após a contagem das formigas, coletei as folhas e abri as domáceas para quantificar o número de formigas e afídeos presentes em seu interior. Para calcular a proporção da folha consumida por herbívoros, coloquei a folha sobre um papel milimetrado e quantifiquei a

área do limbo que havia sido removida. Posteriormente, medi o comprimento e a largura da folha e calculei a área da folha utilizando a fórmula de área da elipse. A proporção de

área consumida foi a razão entre a área do limbo removida e a área da total da folha.

Para testar a previsão de que o aumento no número de pulgões nas domáceas diminui o forrageio pelas formigas e aumenta a herbivoria, fiz duas análises de covariância

224

utilizando a planta, a quantidade de afídeos e a quantidade de formigas na domácea como variáveis preditoras e a porcentagem da folha consumida por herbívoros e o número de formigas patrulhando as folhas como variáveis resposta.

Resultados

Em cada domácea o número médio (± desvio padrão) de formigas foi de 48,6 ± 40,3 com variação de uma a 233 formigas por domácea. Em cada folha observei em média

6,6 ± 6,4 formigas patrulhando, variando de uma a 29 formigas em cada folha. Em cada domácea encontrei em média 5,7 ± 11,2 afídeos com variação de um a 76 afídeos por domácea. A porcentagem média da área da folha consumida por herbívoros foi de 6,4%

± 7,5, variando entre um a 31,2%. Não houve relação entre a quantidade de afídeos presentes nas domáceas e o número de formigas patrulhando as folhas (F(1,64)= 0,95; p =

0,33; Figura 1), e nem entre a quantidade de afídeos nas domáceas e a porcentagem das folhas consumidas por herbívoros (F(1,64)= 0,95; p = 0,33; Figura 2).

225

Figura 1. Relação entre os resíduos da análise de covariância entre o número de formigas patrulhando a folha, o número de formigas na domácea e a planta e o número de afídeos por domácea.

Figura 2. Relação entre os resíduos de uma análise de covariância entre a porcentagem da folha consumida por herbívoros, o número de operárias na domácea e a planta e número de afídeos por domáceas.

226

Discussão

O número de afídeos presentes nas domáceas não influenciou o patrulhamento da folha pelas formigas nem a área das folhas consumidas por herbívoros. Isso indica que a interação mutualista entre formigas e afídeos não interfere na eficácia de defesa da mirmecófita pelas formigas associadas a ela. É possível que a presença de afídeos nas domáceas não represente uma quantidade significativa de recurso alimentar para que as formigas diminuam a capacidade de forrageio. O tipo de recurso oferecido pelos afídeos

é diferente do tipo do recurso obtido pelo forrageio em busca de herbívoros. Os afídeos fornecem carboidrato para as formigas enquanto os herbívoros constituem proteína para a colônia (Morim 2011). Assim, mesmo que haja mais afídeos, as formigas continuam dependendo do patrulhamento para captura de herbívoros a fim de garantir alimento suficiente para a colônia.

A associação mutualista entre formigas e mirmecófitas é bastante estreita, o que

é evidenciado pela presença de estruturas vegetais especificas para essa interação

(domáceas), por comportamentos específicos das formigas (e.g patrulhamento e defesa contra herbívoros) e pelo fato das formigas dependerem dessa interação para atingir a maturidade reprodutiva (Fonseca & Ganade 1996). É possível, portanto, que o comportamento de patrulha e defesa desempenhado pelas formigas seja fixado evolutivamente e ocorra independentemente da necessidade de obtenção de outros recursos pelas formigas.

Agradecimentos

Agradeço imensamente a Deus por permitir viver essa experiência única que levarei por toda a minha vida!!! A minha família pelo apoio e por acreditarem no meu sonho,

227

minhas irmãs Cintia Paiva e Simara Fernanda, minha mãe e minha sobrinha Sophia amo muito vocês e obrigada por entenderem minha ausência.

A Universidade Estadual de Feira de Santana pelo apoio e, ao PDBFF/INPA por oferecer um curso tão maravilhoso e enriquecedor;

A todos que fizeram parte do Curso de Ecologia da Floresta Amazônica em 2012, mas de uma forma muito especial aos Paulinhos “Painha” (pessoa mais fantástica não conheço) e ao “Malravilhoso” por todas as sugestões e ajuda durante o curso;

Ao André Junqueira que além de excelente revisor ainda é um artista nato, obrigadãooo!!

A Mariana Velasque, amiga e parceira de todas as horas, nossa amizade se estende as

“arvres” da floresta amazônica (risos) obrigada por tudo!!

A Sarinha por todos os momentos compartilhados (isso incluiu Xexeu) risos;

A rainha dos“bilhetim” Dany Zoo, pessoa especial e talentosa

A José Hidasi , por tanto carinho e timidez adorável;

A todas as meninas da coletividade feminina (Taty pernambucana arretada e prestativa,

Lory a manauara mais doce que conheci, a Carol Draxler carioca sangue bom,

Carolzinha pé de ouro, Bianca, Renatinha, Claudinha).

Aos colegas Daniel, Bruno, Leo, Tatu, Randolfo, Vidal, Joselandio por tanta animação!

Aos monitores Marcus e Thiago Kloss por sempre estarem prontos para ajudar!!!!

Referências

Benson, W.W. 1985. Amazon antplants, pp. 239-266. In: Amazonia (G.T. Prance &

T.E.C.P. Lovejoy, eds). New York: Pergamon Press.

Flatt, T. & W. Weisser. 2000. The effects of mutualistic ants on aphid life history traits.

Ecology, 81:3522-3529.

228

Fonseca, C.R. 1994. Herbivory and the long‐lived leaves of an Amazonian ant‐tree.

Journal of Ecology, 82: 833‐ 842.

Izzo, T.J. 2005. Recolonização de capoeiras com diferentes histórias de uso por plantas

mirmecófitas e suas formigas associadas. Tese de doutorado. Instituto Nacional de

Pesquisas da Amazônia, Manaus.

Morim, P.J. 2011. Community Ecology. Blackwell Science. New Jersey.

Schurch, S., M. Pfunder & B. A. Roy 2000. Effects of ants on the reproductive success

of Euphorbia cyparissias and associated pathogenic rust fungi. Oikos 88: 6-12.

Vasconcelos, H.L. 1991. Mutualism between Maieta guianensis Aubl., a

myrmecophytic melastome, and one of its ant inhabitants: ant protection against

insect herbivores. Oecologia, 87: 295‐298.

Vasconcelos, H.L. & D.W. Davidson, 2000. Relationship between plant size and ant

associates in two amazonian ant-plants. Biotropica, 32: 100-111.

Wimp. G. & T.Whitham. 2001. Biodiversity consequences of predation and host plant

hybridization on an aphid–ant mutualism. Ecological Society of America, 440-

452.

229

Pequenos camuflados e grandes esquivos? O tamanho corpóreo não atua na

seleção de habitat em peixes de riachos amazônicos

Daniel Passos

Introdução

A seleção de habitat é a escolha de um ambiente adequado à sobrevivência e reprodução por um organismo (Morris 2003). Para que esse processo ocorra, é necessário que indivíduos sejam capazes de perceber a heterogeneidade do ambiente em que vivem e selecionar áreas de melhor qualidade (MacArthur & Pianka 1966). A escolha destes locais específicos pode ser influenciada por diversos fatores, como as condições abióticas do ambiente, a disponibilidade de recursos e as relações interespecíficas, como a competição e a predação (Allan 1995).

A predação, em particular, pode atuar como pressão seletiva sobre o comportamento das presas, induzindo mudanças na escolha do habitat por elas (Endler

1991, Lima 1998). Nestes casos, as presas podem reduzir o risco de serem predadas ao escolher habitats nos quais o acesso de predadores é dificultado (Wooster & Sih 1995) ou se tornando crípticas em resposta ao principal sentido sensorial do predador

(Edmunds 1974). Especificamente para presas suscetíveis a predadores visualmente orientados, a seleção de substratos com coloração similar a sua pode aumentar sua camuflagem e reduzir a chance de serem detectadas.

Além da camuflagem visual, o tamanho do corpo da presa também pode afetar a sua chance de detecção pelo predador (e.g. Ware 1973). Maiores dimensões corpóreas podem aumentar o contraste visual entre a presa e o substrato e, consequentemente, influenciar sua detecção por predadores visualmente orientados (Edmunds 1974). Neste sentido, indivíduos maiores podem ser mais facilmente percebidos que os menores e,

230

portanto, devem selecionar ambientes com coloração mais similar à de seu tegumento para reduzir a chance de serem predados.

A ictiofauna de ambientes aquáticos de pequeno porte, como os riachos amazônicos, sofre forte influência da pressão predatória (Lowe-McConnell 1975,

Mendonça et al. 2005). Nestes sistemas, os peixes usam uma grande variedade de substratos (Mortatti 2004) e isto pode estar relacionado à busca por ambientes nos quais as presas se tornem menos visíveis para os predadores. Nesse sentido, visto que peixes maiores podem ser mais facilmente detectados por predadores externos ao riacho, proponho a hipótese de que peixes maiores são mais seletivos quanto à escolha do habitat do que peixes menores. Se essa hipótese for verdadeira, espero que o tamanho da

área dorsal do peixe esteja positivamente relacionado à similaridade de coloração entre o seu tegumento e o substrato em que ele se encontra. Além disso, espero que, em um dado morfotipo, o tamanho da área dorsal do indivíduo esteja positivamente relacionado

à similaridade de coloração entre o seu tegumento e o substrato em que ele se encontra.

Métodos

Área de estudo

Realizei este estudo em um riacho de segunda ordem, localmente chamado de igarapé, com águas claras e rasas, em uma floresta de terra firme na Amazônia brasileira. A área específica de estudo (2° 25´ S, 59° 45´ O) está inserida na reserva do Km 41, localizada a 80 km ao norte de Manaus - AM, Brasil, pertencente a uma Área de Relevante

Interesse Ecológico (ARIE) co-gerida pelo Projeto Dinâmica Biologica de Fragmentos

Florestais (PDBFF) e pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade

(ICMBio). . O clima da região é tropical úmido, com temperatura média anual de 26,7

ºC e pluviosidade superior a 2000 mm por ano (Lovejoy & Bierregaard 1990).

231

Coleta de dados

Realizei buscas ativas noturnas à procura de peixes ao longo de um trecho de 50 m no igarapé, vasculhando os bancos de areia branca, os aglomerados de folhiço do leito, bem como suas poças adjacentes. Os peixes do igarapé, em sua maioria diurnos, não alteram o uso do habitat entre dia e noite (observação pessoal). Portanto, realizei coletas à noite pela maior facilidade em capturar indivíduos inativos. Registrei fotograficamente, em vista dorsal e a 25 cm da superfície da água, cada peixe encontrado e seu substrato adjacente. Em seguida, coletei cada indivíduo com uso de um rapiché de 50 cm² e malha de 1 mm². Posteriormente, classifiquei os peixes em morfotipos e medi o comprimento

(mm) e a largura (mm) de cada indivíduo capturado.

Para estimar a área dorsal dos peixes, utilizei a fórmula da área da elipse (Ap=

π*C/2*L/2), onde “Ap” é a área dorsal do peixe (mm²), “C” é o comprimento (mm) e

“L” é a largura (mm). Para estimar a similaridade de coloração entre os peixes e os substratos adjacentes, calculei a quantidade média de pixels vermelhos, verdes e azuis

(RGB) na superfície dorsal dos peixes e em seis amostras de substrato (1 cm² cada).

Distribuí sistematicamente as amostras de substrato ao redor do peixe, a uma distância fixa equivalente a largura do indivíduo (Figura 1). Posteriormente, calculei o módulo da diferença de RGB entre a média das seis amostras de substrato e a média da superfície dorsal do peixe. Desta forma, quanto menor a diferença em RGB, maior a similaridade de coloração entre o peixe e o substrato.

232

1 cm²

Figura 1. Esquema do método de cálculo da similaridade de coloração entre os peixes e os substratos adjacentes. Círculos cinzas representam amostras de substrato de 1 cm².

Barras pretas representam a largura do peixe, bem como a distância aproximada entre as amostras de substrato e o peixe.

Análises estatísticas

Para avaliar a similaridade de coloração entre os peixes e o substrato adjacente, fiz uma correlação de Pearson. Para testar a relação entre área dorsal e a similaridade de coloração entre peixe e substrato, fiz duas regressões lineares simples. Na primeira, utilizei a área dorsal média de cada morfotipo como variável preditora e a diferença média de RGB entre peixe e substrato como variável resposta. Na segunda, utilizei a

área dorsal dos indivíduos do morfotipo mais abundante como variável preditora e a diferença média de RGB entre cada indivíduo e seu respectivo substrato como variável resposta.

233

Resultados

Coletei 41 indivíduos classificados em nove morfotipos. A coloração dos morfotipos foi correlacionada com a coloração do ambiente (r = 0,84; p < 0.01). Não houve relação entre a área dorsal média dos morfotipos e as diferenças médias de RGB entre os peixes e seus respectivos substratos (R² = 0,02; F(1,7) = 0,17; p = 0,69; Figura 2). Também não houve relação entre a área dorsal média e as diferenças médias de RGB entre os peixes e seus respectivos substratos, quando removi os morfotipos representados por apenas um indivíduo (R² = 0,01; F(1,4) = 0,04; p = 0,86).

Figura 2. Relação entre área dorsal média e a diferença média de RGB entre os morfotipos de peixes e seus substratos adjacentes, em um igarapé na reserva do Km 41,

Amazonas, Brasil. Os números sobre os pontos representam o número de indivíduos de cada morfotipo.

O morfotipo mais abundante (N = 10) apresentou área dorsal média de 275,14 ±

117,94 mm² (média ± desvio padrão). Não houve relação entre a área dorsal dos

234

indivíduos do morfotipo mais abundante e as diferenças médias de RGB entre os peixes e os respectivos substratos (R² = 0,04; F(1,8) = 0,40; p = 0,54; Figura 3).

Figura 3. Relação entre área dorsal média e a diferença média de RGB entre os peixes e seus substratos adjacentes, em indivíduos do morfotipo de peixe mais abundante de um igarapé na reserva do Km 41, Amazonas, Brasil.

Discussão

O tamanho corpóreo não apresentou relação com a similaridade de coloração entre o organismo e o substrato, evidenciando que morfotipos de peixes maiores não foram mais seletivos quanto à escolha de habitats. Em um dado morfotipo, indivíduos maiores também não selecionaram habitats de coloração mais similar à de seu tegumento.

Assim, o tamanho corporal aparentemente não afeta a seleção de habitats em peixes

ósseos de igarapés.

As características físicas dos igarapés amazônicos, com águas rasas e transparentes, podem facilitar a detecção das presas por predadores visualmente

235

orientados, como aves piscívoras da família Alcedinidae (Sick 1997). Se a chance de detecção for constantemente alta nesses ambientes, os peixes podem apresentar intensa seletividade de habitat, independente do seu tamanho corpóreo. Por outro lado, os peixes maiores podem apresentar estratégias alternativas para reduzir os riscos da predação. Neste sentido, uma vez que a movimentação da presa pode contribuir para o escape de predadores (Ware 1973), é possível que peixes maiores apresentem maior capacidade de deslocamento que peixes menores e, portanto, sejam aptos a fugir mais eficientemente do ataque de predadores.

A intensa seletividade de habitat pelas presas e o uso de estratégias defensivas alternativas por presas maiores podem ter implicações sobre a dinâmica dos peixes em níveis de organizações maiores. Se peixes de maior tamanho de fato usam o deslocamento como principal estratégia de escape da predação, então isso deve refletir em mudanças ontogenéticas no padrão de uso do espaço em uma dada espécie, como também em uma maior substituição de espécies de grande porte entre habitats com diferentes tipos de substratos.

Agradecimentos

À coordenação do “Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais” (PDBFF) e do curso “Ecologia da Floresta Amazônica” (EFA), pela oportunidade de participar desta experiência inesquecível e pela enorme contribuição à minha formação profissional e cultural. Aos coordenadores, professores, monitores, funcionários e colegas do EFA 2012 pelo surpreendentemente agradável convívio durante a realidade paralela que é esta imersão social no coração da Amazônia. Em particular, aos professores Mike Hopkins, Jansen Zuanon e Glauco Machado pelo enorme exemplo de excelentes profissionais e pelas imensuráveis contribuições à minha formação

236

intelectual. Principalmente, ao estimado prof. Paulo Enrique Peixoto por toda a competência, dedicação e por todos os ensinamentos transmitidos ao longo do curso, que tornaram esta experiência de vida indubitavelmente mais engrandecedora (VÔCE se garante “Libélula”). Aos colegas de curso, pelo respeito, atenção e companheirismo durante todas as fases do EFA 2012, tornando a vivência cotidiana cordialmente tolerável nestes intensos 30 dias. Em especial aos mais próximos, Ana Carolina Vieira,

Daniela Coelho, Ana Cláudia Rorato, Vidal Carrascosa, José Hidasi e Arthur Madeira, pela competência, organização e responsabilidade, que tornaram nossa convivência fácil e afetuosa durante a execução dos projetos.

Especificamente quanto a este projeto, agradeço ao prof. Jansen Zuanon, pela orientação sobre a fascinante ictiofauna amazônica e por me instigar a trabalhar com os peixes de igarapés no projeto individual. Aos profs. Paulo Enrique Peixoto, André

Junqueira, Paulo Bobrowiec e Marcel Vaz e aos monitores Marcos Vieira e Thiago

Kloss pelas sugestões e críticas à atual versão deste trabalho. Em especial, à Carol Pires, pela prazerosa companhia durante as pescarias, pela dedicação na realização das coletas e principalmente por toda a atenção nos momentos adversos.

Referências

Allan, J.D. 1995. Stream ecology: Structure and function of running waters.

London:Chapman & Hall.

Edmunds, M. 1974. Why are there good and poor mimics? Biological Journal of the

Linnean Society, 70:459-466.

Endler, J.A. 1991. Variation in the appearance of guppy color patterns to guppies and

their predators under different visual conditions. Vision Research, 31:587-608.

237

Lima, S.L. 1998. Nonlethal effects in the ecology of predator-prey interactions.

Bioscience, 48:25-34.

Lovejoy, T.E. & R.O. Bierregaard. 1990. Central amazonian forests and the minimal

critical size of ecosystems project, pp. 60‐71. In: Four neotropical rainforests

(A.H. Gentry, ed.). London: Yale University Press.

Lowe-McConnell, R.H. 1975. Fish communities in tropical freshwaters: their

distribution, ecology and evolution. London: Longman.

MacArthur, R.H. & E.R. Pianka. 1966. On optimal use of a patchy environment.

American Naturalist, 100:603-609.

Mendonça, F.P., W.E. Magnusson & J. Zuanon. 2005. Relationships between habitat

characteristics and fish assemblages in small streams of central Amazonia.

Copeia, 2005:751-764.

Morris, D.W. 2003. Toward an ecological synthesis: a case for habitat selection.

Oecologia, 136:1-13.

Mortatti, A.F. 2004. Colonização por peixes no folhiço submerso: implicações das

mudanças na cobertura florestal sobre a dinâmica da ictiofauna de igarapé de

terra firme, na Amazônia Central. Dissertação de Mestrado, INPA/UA, Manaus.

Reis, R.E., S.O. Kullander, J. Ferraris & J. Carl. 2003. Check list of the freshwater

fishes of south and central America. Porto Alegre: EDIPUCRS.

Sick, H. 1997. Ornitologia brasileira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira.

Ware, D.M. 1973. Risk of epibenthic prey to predation by rainbow trout (Salmo

gairdneri). Journal of Fish Research Board, 30:787-797.

Wooster, D. & A. Sih. 1995. A review of the drift and activity responses of stream prey

to predator presence. Oikos, 73:3-8.

238

A herbivoria em mirmecófitas afetando a resposta da colônia de formigas

Daniela Pinto Coelho

Introdução

O comportamento exibido por animais diante do risco de serem predados é uma resposta condicionada a pressão exercida pelo predador (Kemp & Jones 2001). Diante de uma ameaça, os organismos tendem a avaliar os custos do investimento energético em fugir e abandonar o recurso ou em ficar e defendê-lo (Lima 1998, Sansom et al.

2009). Reações de formigas que têm suas colônias ameaçadas, por exemplo, irão depender de alguns fatores. Dentre eles, a frequência e a intensidade do distúrbio, além da capacidade de investimentos de recursos da colônia na geração de uma nova colônia ou na produção de novos indivíduos para incrementar sua defesa (Lima 1998, Philpott et al. 2010).

Colônias de formigas podem interagir de forma mutualística com determinadas espécies de plantas, conhecidas como mirmecófitas. Nesta relação, as formigas conferem proteção para planta contra ação de insetos fitófagos e, em troca, a planta oferece abrigo e locais de oviposição para as formigas (Janzen 1966, Christianini &

Machado 2004). Estes abrigos, chamados de domáceas, são estruturas infladas e com orifícios que podem se situar em diferentes partes da planta (Frederickson 2005).

A ocupação da planta mirmecófita pelas formigas ocorre em um indivíduo ainda jovem. As formigas aladas ocupam uma das domáceas e ovipositam, dando início à colônia, com posterior ocupação das demais domáceas existentes (Janzen 1966). A colônia consiste basicamente de três castas: rainhas, operárias e soldados. As rainhas são as maiores formigas da colônia, sendo aladas e responsáveis pela geração de novos indivíduos. As operárias são formigas menores, mais abundantes e responsáveis pelo

239

patrulhamento da planta e pela liberação de feromônio de alarme contra herbívoros. Os soldados são indivíduos maiores que as operárias, com grandes mandíbulas e que respondem à liberação do feromônio das operárias sendo responsáveis pelo ataque aos invasores. A relação entre soldados e operárias é bastante estreita, já que é o patrulhamento eficiente das operárias implicará no sucesso de resposta dos soldados à herbivoria. Vale ressaltar, que o investimento na produção de soldados pode ser bastante custoso para colônia, já que eles são recrutados apenas quando há a ação de herbívoros

(Hölldobler & Wilson 1990).

Folhas mais jovens (que neste trabalho serão chamadas de apicais, por situarem- se na região mais apical do ramo), oferecem maior contribuição para a produtividade da planta por meio de seus tecidos fotossintéticos mais eficientes. Porém, estas folhas tendem a ser mais atrativas para herbívoros o que faz com que a ocupação das domáceas e as ações de defesa da colônia de formigas sejam mais intensas em folhas apicais do que em folhas mais antigas (denominadas neste trabalho de folhas basais, por situarem- se em posições mais basais no ramo). Logo, se o sucesso da colônia está diretamente relacionado com a qualidade da planta, os esforços em melhorar o patrulhamento e as ações de defesa podem ocorrer de forma mais eficiente em folhas apicais. Dessa forma, folhas basais ficam mais suscetíveis à predação do que folhas apicais (Christianini &

Machado 2004).

Sendo a herbivoria uma força que afeta a integridade da colônia de formigas em mirmecófitas e levando-se em consideração o sistema de proteção por formigas descrito anteriormente, este trabalho pretende estudar se a proporção de formigas soldados e operárias de Pheidole minutula em folhas apicais de Maieta guianensis está relacionado

à herbivoria em folhas basais. Acredita-se que o investimento na geração de soldados pela colônia em folhas apicais é positivamente relacionado à herbivoria em folhas

240

basais. Sendo assim, quanto maior a área de herbivoria em folhas basais, maior será a quantidade de soldados presentes nas domáceas de folhas apicais.

Métodos

Área de estudo

O estudo foi realizado na Fazenda Esteio (Km 41), localizada a cerca de 80 km ao norte de Manaus, Amazonas, Amazônia Central, Brasil. A reserva esta inserida na Área de

Relevante Interesse Ecológico (ARIE) sendo co-gerenciada pelo Projeto Dinâmica

Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF) e pelo Instituto Chico Mendes (ICMBio).

A vegetação é formada por floresta ombrófila densa. O clima é do tipo tropical úmido de acordo com a classificação de Köppen (Peel et al. 2007) com temperatura média anual de 26,7˚C e pluviosidade anual variando entre 1900 e 2500 mm (Lovejoy &

Bierregaard 1990).

Coleta de dados

Foram amostrados 37 indivíduos de Maieta guianensis ao longo das margens de um Igarapé. De cada indivíduo foi retirado um ramo inteiro da porção superior da planta. Em cada ramo, foram retiradas as duas folhas apicais e as folhas basais. As amostras apicais e basais de cada indivíduo foram acondicionadas separadamente em sacos de papel para que não houvesse a migração de formigas de uma amostra para outra. Posteriormente, o material foi processado em laboratório.

Para mensuração dos indivíduos de Pheydole minutula em suas respectivas castas, as domáceas das folhas apicais foram abertas e os indivíduos quantificados. A mensuração da área foliar de folhas basais de M. guianensis foi realizada através do cálculo da área média foliar por meio da fórmula da elipse [(R x r x π) / 4], onde R é o raio maior e r o raio menor. Para o cálculo da área média de herbivoria em folhas basais,

241

foi utilizada uma malha transparente preenchida com quadrículas de 0,25 cm2. A malha era colocada sobre a folha e a estimativa da quantidade de dano foliar era contabilizada somando-se da área das quadrículas correspondentes.

Análises estatísticas

Para avaliar se a herbivoria nas folhas basais era positivamente relacionada à quantidade de formigas soldados nas folhas apicais foi feita uma regressão linear múltipla utilizando a quantidade de formigas operárias como covariável. Essa medida foi tomada com o objetivo de controlar o efeito da quantidade de formigas operárias na quantidade de formigas soldados.

Resultados

Dos 37 ramos coletados de Maieta guianensis, um não apresentou ocupação por formigas, sendo, portanto, excluído das análises. Foi analisado um total de 72 domáceas em folhas apicais e 123 folhas basais. A porcentagem média de herbivoria nos ramos com folhas basais foi de 15,52% (mínimo = 1,41%; máximo = 52,85%). A quantidade total de formigas operárias encontradas em todas as domáceas de folhas apicais analisadas foi de 1.135 (mínimo = 10; máximo = 86) e a de formigas soldados foi de

241 (mínimo = 1; máximo = 23).

Em todas as domáceas analisadas, com exceção de dois ramos (que serão denominados de discrepantes), havia a presença de formigas operárias, soldados e ovos.

Estes ramos discrepantes apresentaram apenas formigas operárias. Vale ressaltar, que as folhas basais destes ramos discrepantes apresentaram elevado tamanho de área foliar

(22,13 cm2 e 25,08 cm2, respectivamente; média do total de indivíduos = 22,14 cm2).

Um deles também apresentou a segunda maior taxa de herbivoria encontrada (52,8%).

242

Por haver esta discrepância de ocupação em relação ao padrão observado, foram feitas duas análises. Uma contendo a presença destes dois ramos discrepantes e outra os excluindo. Na análise com a presença dos ramos discrepantes, a quantidade de formigas soldados presentes nas domáceas de ramos apicais não foi explicada pela porcentagem de herbivoria nos ramos basais (F(1,33) = 2,809; p = 0,103). Porém, com a retirada destes da análise, foi encontrada uma relação positiva entre a porcentagem de herbivoria nos ramos basais e a quantidade de formigas soldados nas domáceas de ramos apicais (F(1,31)

= 10,843; p = 0,002), como previsto no estudo (Figura 1).

Figura 1: Relação positiva entre a área de herbivoria (cm2) em folhas basais e o resíduo de uma regressão linear entre a quantidade de operárias pela quantidade de soldados da formiga Pheidole minutula presentes em domáceas de folhas apicais da planta mirmercófita Maieta guianensis.

Discussão

Na presença dos ramos discrepantes, a resposta da colônia diante da herbivoria em folhas basais não se manifesta através do investimento na produção de soldados. Como

243

a resposta da colônia é condicionada à pressão de herbivoria, esta ausência de relação mostra que a herbivoria não seria uma pressão suficientemente forte para que a colônia desloque recursos no investimento em soldados (Hölldobler & Wilson 1990). Porém, estes dois ramos discrepantes apresentaram um padrão diferenciado dos demais ramos coletados. Ambos tinham elevado tamanho de área foliar, o que pode estar associado à idade mais avançada destas plantas. Além disso, um destes ramos também apresentou a segunda maior taxa de herbivoria, mostrando que a colônia de formigas poderia não mais estar defendendo a planta de forma eficiente (Izzo 2005). Sendo assim, acredita-se que estas colônias poderiam estar em processo de evasão das duas plantas coletadas.

Por outro lado, sem considerar os ramos discrepantes, a relação positiva entre a herbivoria em folhas basais e a proporção de soldados e operárias em folhas apicais mostra que a ação anterior da herbivoria pode ser o fator preponderante para o investimento posterior da colônia na geração de soldados. Dessa forma, a evasão da(s) rainha(s) para fundar uma nova colônia, torna-se uma estratégia mais custosa do que investir na produção de soldados. Esta questão pode ser corroborada pelo fato de que, das 37 plantas examinadas neste trabalho apenas uma não apresentou ocupação por P. minutula. Isso pode indicar que existe uma pequena disponibilidade de sítios vazios para fundação de uma nova colônia, o que aumentaria a vantagem na produção de soldados.

Como evidências prévias indicam uma forte co-dependência do sistema

Pheydole – Maieta, o impacto negativo do abandono da planta pela colônia pode refletir em uma redução do sucesso reprodutivo da planta. Isso mostra que o resultado encontrado pela análise sem os ramos discrepantes faz mais sentido, pois estes dois ramos discrepantes destoaram do padrão encontrado e já descrito pela literatura

(Vasconcelos 1999). Para evitar o abandono pela colônia de formigas, a planta pode

244

investir na produção de folhas com domáceas novas para que ocorra um aumento do tamanho da colônia que ocupa aquele indivíduo e, por conseguinte, aumento da proteção da planta contra herbivoria (Janzen 1966, Christianini & Machado 2004).

Dessa forma, sendo a herbivoria um fator que afeta a integridade da colônia de formigas, o investimento na produção de soldados para minimizar a ação de herbívoros nas novas folhas produzidas é a estratégia de investimento mais vantajosa da colônia de

P. minutula.

Agradecimentos

Agradecimentos eternos ao INPA e ao PDBFF pela chance única e inesquecível de participar deste curso sensacional!!! A intensidade de tudo que vivi aqui não será refletida apenas em minha vida profissional, isso é fato!!! Hipotetizo (falo do jeito que eu quiser, o relatório é meu!) que Rainbow master jamais se esquecerá de mim! E agora, quem irá me arrasar 25 horas por dia? Paulinho, não te largarei jamais, vou ser que nem mucuim “ni” você! Feira de Santana que me aguarde!!! Só um detalhe, “sou brasileira e não desisto nunca”! Venha cá, o que seriam dos meus dias sem as mega risadas provocadas pelas frases delicadas (só que ao contrário) e hiper criativas do Paulinho

“Mau”ravilhoso? Paulinhos, vocês preencheram o meu “eu” de alegria! Vocês são o “+” de minha vidinha “+ ou -”! A todos os meus queridos novos amigos, que há um mês eu nem fazia ideia que existiam, não consigo imaginar minha vida sem vocês! Comunidade feminina, nossa força não pode morrer, nossa pegada agora vai ser bilhetinho virtual!!!

Em especial, à condessa Lohaynne Chayenne Vanessão (a musa inspiradora dos meus cordéis), Morceguete da Silva, vulgo “Miss Balde” (minha cuidadeira pós festas, companheira de rede, escrevedora de bilhetinhos e parceira da linguagem das letras),

Lori “Polidance” (irmã de alma), Tati “arvéres” (não resisti”), Sarah Baranga

245

(mooooorro de amor) e Mari Exú, já tô morrendo de saudade meninas!!! Comunidade cueca, vocês são as fofuras de minha vida! Em especial, meu querido e agora pra sempre novo amigo Daan, Joseph, meu ursinho pimpão (só vintchi), Vidal (meu estrangeiro preferido) e Harry (não aguentava mais reclamar de suas roupas mal lavadas e mal estendidas), por vocês, foi identificação à primeira vista! A todos os professores, em especial Felipe e Toyoyo! Aos monitores Barbudinho (Nhéééun) e Beluga (meu potinho de ninho solei, Ass: Cachorrona), vocês são meu máximo denominador comum!!! Como tenho juízo, Manô foférrima, mal te conheci mas a baianidade tá no sangue!!! Hahahaha... sou foda e você também! O EFA também não seria o mesmo sem as comidas “deliça” da Dona Eduarda e, óóóóbeveo, sem Seu Jorge, afinal, quem me ajudaria a acordar Morceguete da Silva na pegada da escrotidão, além de gelar nossa cerveja pro Igarafest, fazer suco de caju todo dia e cuidar da gente com tanta fofura e delicadeza (comigo ele foi fofo, se não foi com você, deita na BR)!!! Por fim, jamaaaais esqueceria da pessoa que se tornou a mais importante na minha vida acadêmica neste

último ano. Você fez uma diferença absurda! Tô “Glauco-dependente”! Por fim, quero ir pro CÉU e dar “mortal de cuestas” caraaaai!!!

Referências

Christianini, A.V. & G. Machado. 2004. Induced biotic responses to herbivory and

associated cues in the Amazonian ant-plant Maieta poeppigii. Entomologia

Experimentalis et Applicata, 112:81– 88.

Frederickson, M.E. 2005. Ant species confer different partner benefits on two

neotropical myrmecophytes. Oecologia, 143:387–395.

Hölldobler, B. & E.O. Wilson. 1990. The ants. London: Harward University Press.

246

Izzo, T.J. 2005. Recolonização de capoeiras com diferentes histórias de uso por plantas

mirmecófitas e suas formigas associadas. Tese de doutorado, Instituto Nacional

de Pesquisas da Amazônia, Manaus.

Janzen, D.H. 1966. Coevolution of mutualism between ants and acacias in Central

America. Internation Journal of Organic Evolution, 20:249-275.

Kemp, D.J. & R.E. Jones. 2001. Phenotypic plasticity in field populations of the tropical

butterfly Hypolimnas bolina (L.) (Nymphalidae). Biological Journal of the

Linnean Society, 72:33–45.

Lima, S.L. 1998. Nonlethal Effects in Ecology of Predator-Prey Interaction. Bioscience,

48:25-34.

Lovejoy T.E. & R.O. Bierregaard. 1990. Central Amazonian forests and the minimum

critical size of ecosystem project, pp. 60-71. In: Four neotropical rainforest

(Gentry, A.H., ed.). New Haven: Yale University Press.

Peel, M.C., B.L. Finlayson & T.A. McMahon. 2007. Updated world map of the

Köppen-Geiger climate classification. Hydrology and Earth System Sciences,

11:1633–1642.

Philpott, S.M., I. Perfecto, I. Armbrecht & C.L. Parr. 2010. Ant diversity and function

in disturbed and changing habitats, pp. 137-156. In: Ant Ecology (L. Lach, C.L.

Parr & K.L. Abbott eds.). Oxford University Press.

Sansom, A., J. Lind & W. Cresswell. 2009. Individual behavior and survival: the roles

of predator avoidance, foraging success, and vigilance. Behavioral Ecology,

20:1168–1174.

Vasconcelos, H.L. 1999. Effects of forest disturbance on the structure of ground-

foraging ant communities in central Amazonia. Biodiversity and Conservation,

8:409-420.

247

Habitats com maior luminosidade não representam melhores territórios de

acasalamento para machos da libélula Chalcopteryx scintilans (Odonata:

Polythoridae)

José Hidasi Neto

Introdução

Uma parte representativa dos animais possui o comportamento de brigar por territórios que apresentam condições e recursos que possam aumentar sua sobrevivência (Adams

2001). Algumas espécies também utilizam territórios como locais de exibição e acasalamento, atraindo indivíduos do sexo oposto para que possam copular (Contreras-

Garduño et al. 2006). Ainda, é sabido que os locais defendidos apresentam variações em sua qualidade (Arnott & Elwood 2008). Sendo assim, como os territórios de maior qualidade são mais disputados, é de se esperar que eles sejam ocupados por indivíduos mais fortes.

Diversas características de um habitat podem determinar sua qualidade como um território. Um fator que normalmente determina a escolha de um sítio de defesa são as condições abióticas do local (Arnott & Elwood 2008). Em ambientes florestais, por exemplo, habitats com maior incidência luminosa, como as clareiras, podem ser bons territórios para o estabelecimento de espécies ectotérmicas (Velde et al. 2011). Além disso, no caso de animais visualmente orientados, a alta luminosidade nas clareiras poderia facilitar a detecção de parceiros de alta qualidade (e.g. Bergman & Wiklund

2009).

As libélulas (Odonata) constituem um grupo em que diversas espécies apresentam comportamento territorial. Esses insetos são comumente encontrados em locais ensolarados, pois dependem dos raios solares para termoregulação. Além disso,

248

as libélulas são organismos orientados primariamente pela visão (Córdoda-Aguilar

2008). Portanto, é possível que ambientes com maior incidência luminosa representem territórios de maior qualidade para as libélulas, especialmente em ecossistemas com o predomínio de áreas sombreadas, por facilitar a termorregulação e aumentar a chance de detecção de parceiros sexuais.

Uma espécie de libélula comum no sub-bosque de florestas na Amazônia é

Chalcopteryx scintilans (Odonata: Polythoridae). Os machos dessa espécie possuem uma coloração avermelhada conspícua em suas asas anteriores que provavelmente está associada a um indicativo de qualidade do macho (Fitztephens & Getty 2000). Esse indicativo pode servir como um aviso contra possíveis competidores e como uma pista de qualidade para fêmeas, por estar relacionado a traços que determinam a saúde dos machos (e.g. Contreras-Garduño et al. 2006). Outro indicativo de qualidade dos machos

é a sua densidade corporal, uma vez que esta é inversamente proporcional à quantidade de reserva energética e, portanto, à capacidade de briga e de defesa do território

(Marden & Waage 1990; Contreras-Garduño et al. 2006). Portanto, machos de maior qualidade em C. scintilans, devem ser aqueles que apresentam coloração mais conspícua nas asas e que possuem menor densidade corporal.

Machos de C. scintilans são comumente encontrados próximos a manchas de sol criadas por pequenas aberturas no dossel ao longo de riachos. É possível que machos com melhor capacidade de briga se estabeleçam e protejam territórios com maior incidência luminosa, pois estes permitiriam maior estabilidade em sua termorregulação e maior facilidade de detecção de fêmeas, o que poderia aumentar o seu sucesso reprodutivo (Bergman & Wiklund 2009). Portanto, minha hipótese é que áreas com maior disponibilidade de luz representam territórios de melhor qualidade para machos de libélula da espécie C. scintilans. Se essa hipótese for verdadeira, espero que machos

249

de C. scintilans encontrados em áreas com maior abertura do dossel apresentem asas com maior intensidade de vermelho e menor densidade corporal.

Métodos

Realizei o estudo em um riacho localizado em uma área de floresta de terra firme próximo ao acampamento do km 41 (02º 24’ S - 59º 44’ O), localizado em uma Área de

Relevante Interesse Ecológico (ARIE) cogerida pelo Projeto Dinâmica Biológica de

Fragmentos Florestais (PDBFF) e pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da

Biodiversidade (ICMBio), a cerca de 80 km ao norte de Manaus, Brasil. Busquei ativamente por machos de C. scintilans em machas de sol ao longo do riacho durante dois dias entre as 10 h e as 14 h, o que aparentemente é o horário de maior atividade da espécie. Coletei 14 indivíduos e fotografei o dossel do local onde cada indivíduo foi encontrado. Duas clareiras apresentavam mais de um indivíduo. Nesses locais, coletei uma única libélula e a considerei como uma amostra.

Posteriormente, utilizei as fotos do dossel para estimar a incidência luminosa dos locais onde coletei as libélulas. Para isso, transformei as colorações das fotos em preto e branco e calculei a abertura do dossel como a razão entre a quantidade de pixels brancos e a quantidade total de pixels na imagem. Sendo assim, valores mais altos da proporção de pixels brancos representam áreas com maior incidência luminosa.

Após a coleta, dissequei cada indivíduo para a retirada de suas asas, tórax e abdômen. Em seguida, fotografei a asa anterior esquerda dos indivíduos e as usei para calcular a média de vermelho na asa. Para isso, calculei a média de pixels vermelhos ao longo das asas, visto que ela representa uma medida indireta da qualidade do macho

(quanto mais vermelha a asa, maior a sua qualidade). Realizei os cálculos da abertura do dossel e da média de vermelho nas asas usando o programa ‘Image J’.

250

Para estimar a quantidade relativa de gordura acumulada nos indivíduos, calculei a densidade corporal dos mesmos. Para esse cálculo, medi a massa torácica e abdominal em uma balança semi-analítica (precisão de 1 mg) e dividi a soma dos valores obtidos pela soma dos volumes do tórax e do abdômen. Para o cálculo dos volumes, considerei que o tórax possuía a forma de um paralelepípedo e que o abdômen possuía a forma de um cilindro. Dessa forma, estimei o volume do tórax pela fórmula “volume = altura x largura x comprimento do tórax”, e o volume do abdômen pela fórmula “volume = comprimento x raio x ”. Para testar se manchas de sol maiores têm maior qualidade para machos de C. scintilans, realizei duas regressões lineares utilizando a abertura do dossel como variável independente, e a média de vermelho nas asas e a densidade corporal como variáveis dependentes.

Resultados

A proporção média de abertura do dossel foi de 16,03 ± 5,93% (média ± desvio padrão), enquanto a média de vermelho nas asas de C. scintilans foi de 141,24 ± 27,04 pixels e de densidade corporal média foi de 0,0004 ± 0,0001g/mm³. Não houve relação entre a abertura do dossel e a média de vermelho na asa (F(1,12) = 0,128; p = 0,726; R² = 0,011;

Figura 1), nem entre a abertura do dossel e a densidade corporal (F(1,12) = 0,08; p = 0,78;

R² = 0,007; Figura 2).

251

190 y = 133,718+0,469*x 180 170 160 150 140 130 120 110

Médiade vermelho (pixels) 100 90 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28

Abertura do dossel (%)

Figura 1. Relação entre a abertura do dossel e a média de intensidade de vermelho na asa anterior esquerda de machos da libélula C. scintilans em um riacho na reserva florestal do km 41, Manaus, Brasil.

Figura 2. Relação entre a abertura do dossel e a densidade corporal de machos da libélula C. scintilans em um riacho na reserva florestal do km 41, Manaus, Brasil.

252

Discussão

A ausência de relação entre a abertura do dossel e a média de vermelho nas asas e a densidade do tórax indica que o tamanho da clareira não é um indicativo de um bom território para C. scintilans. Sendo assim, machos de maior qualidade para brigas e acasalamento, que possuem maior reserva energética (Contreras-Garduño et al. 2006) e coloração mais conspícua nas asas (Schultz & Fincke 2009), não preferem clareiras maiores.

O fato do tamanho da mancha de sol não estar associado à qualidade do macho que a ocupa indica que territórios com maior intensidade luminosa não são melhores para o encontro com fêmeas. Já foi observado que a presença de troncos caídos pode explicar a distribuição dos machos na floresta, uma vez que esses troncos são sítios de oviposição para as fêmeas e, provavelmente, são territórios defendidos pelos machos

(Resende 2002). Talvez, os machos de C. scintilans sejam capazes de entrar em atividade sob menores temperaturas corporais e sejam capazes de manter a temperatura corpórea ideal ao usar as pequenas faixas de sol que penetram nos territórios. O investimento preferencial pode ser voltado para a proteção de territórios que representem bons sítios de oviposição para fêmeas.

Vários animais determinam como melhores territórios aqueles que apresentam uma maior quantidade de recursos disponíveis (Adams 2001). Nesse contexto, como encontrei que a luminosidade não é um bom preditor de qualidade de território para machos de C. scintilans, é possível que outros recursos, como sítios de oviposição, sejam mais importantes para explicar a distribuição de machos na floresta (Arnott &

Elwood 2008). Dessa forma, é possível que a qualidade de territórios dessa espécie seja determinada principalmente pela presença de sítios que apresentem condições

253

favoráveis para o desenvolvimento de suas larvas, mesmo que elas não sejam ideais para os adultos.

Agradecimentos

De uma forma geral, agradeço ao José Luís, aos Paulinhos Mãe e Pai, aos monitores

Gloss e Barbudo, aos professores convidados e aos amigos do EFA 2012 por uma das melhores experiências da minha vida, que não se limitou ao aperfeiçoamento do raciocínio e escrita científica, mas também desencadeou uma mudança em minha postura crítica no meio científico e social. Além disso, poucos tiveram ou terão a chance de conhecer, estudar e pesquisar uma região com tamanha biodiversidade e beleza como

é a floresta amazônica.

Vou agradecer a algumas pessoas específicas (não que sejam mais especiais que as outras). Dani, muito obrigado pela ajuda com quase tudo nesse curso. Isso vale para a escrita de relatório, as minhas roupas que você lavou ou me ajudou por pena de mim e

às críticas negativas sobre as minhas habilidades para tarefas caseiras. ‘Anjo’ (quem quer que você seja), muito obrigado pela bermuda, foi uma ótima ajuda. Mari, Renata e

Vidal, não me esquecerei da visita ao teatro e do açaí horrível que a gente tomou.

Paulinho e Cheyene, vocês se merecem. Seu Jorge e Dona Eduarda, valeu por tudo. Vou sentir falta do café, almoço e jantar, e do suco de caju e goiabada. Agradeço também ao professor convidado André por motivos burocráticos e ao meu orientador Marcus

Cianciaruso por ter me incentivado a me inscrever no EFA 2012.

Gostaria de terminar os agradecimentos com algumas besteiras que nós falamos durante o curso: “Mhiau!” (to rindo agora dessa coisa ridícula), “Áveres”, “Vocês querem Partoba?!”, “Isso aí ta ó... uma B%$!a!”, “Tinha dois pinguins” e “Pô, Idásio, pega a sua cueca!”. Tenho certeza que nos encontraremos nos congressos da vida e

254

usaremos essas expressões novamente em conjunto. Um grande abraço para todos vocês.

Referências

Adams, E.S. 2001. Approaches to the study of territory size and shape. Annual Review

of Ecology and Systematics, 32:277-303.

Arnott, G. & R.W. Elwood. 2008. Information gathering and decision making about

resource value in animal contests. Animal Behaviour, 76:529-542.

Bergman, M. & C. Wiklund. 2009. Visual mate detection and mate flight pursuit in

relation to sunspot size in a woodland territorial butterfly. Animal Behaviour,

78:17-23.

Contreras-Garduño, J., J. Canales-Lazcano & A. Córdoba-Aguilar. 2006. Wing

pigmentation, immune ability, fat reserves and territorial status in males of the

rubyspot damselfly, Hetaerina americana. Journal of Ethology, 24:165–173.

Córdoba-Aguilar, A. 2008. Dragonflies & damselflies: model organisms for ecological

and evolutionary research. Oxford: Oxford Biology.

Fitztephens, D.M. & T. Getty. 2000. Colour, fat and social status in male damselfly

Calopteryx maculate. Animal Behaviour, 60:451-455.

Marden, J.H. & J.K. Waage. 1990. Escalated damselfly territorial contests are energetic

wars of attrition. Animal Behaviour, 39:954-959.

Resende, D.C. 2002. Comportamento territorial de Chalcopteryx scintilans

(Odonata:Polythoridae). In: Curso de campo ecologia da floresta amazônica

(Zuanon, J. & E. Venticinque, eds.). Manaus: INPA/PDBFF.

255

Schultz, T.D. & O.M. Fincke. 2009. Structural colours create a flashing cue for sexual

recognition and male quality in a Neotropical giant damselfly. Functional

Ecology, 23:724-732.

Velde, L.V., C. Turlure & H.V. Dyck. 2011. Body temperature and territory selection

by males of the speckled wood butterfly (Pararge aegeria): what makes a forest

sunlit patch a rendezvous site? Ecological Entomology, 36:161-169.

256

Mutualismo de defesa entre plantas mirmecófitas e formigas reduz o investimento

em defesas estruturais em espécies de Melastomataceae

Joselândio Corrêa Santos

Introdução

A principal causa de perda de área foliar em plantas de ambientes tropicais é a herbivoria por insetos (Coley & Barone 1996). Estima-se que esses artrópodes são responsáveis por cerca de 70% da área foliar consumida anualmente, ocasionando um forte impacto no sucesso reprodutivo e influenciando o padrão de alocação de recursos em plantas (Herms & Mattson 1992). Desse modo, há uma constante pressão seletiva sobre as plantas em favor de mecanismos que minimizem a herbivoria nas folhas.

Basicamente, as plantas utilizam três tipos de defesas contra herbívoros, as químicas, as estruturais e as biológicas, que podem ocorrer simultaneamente em um mesmo indivíduo (Coley & Barone 1996). As plantas defendidas quimicamente utilizam subprodutos do seu metabolismo como substâncias deterrentes, inibidoras ou tóxicas aos herbívoros, tornando o tecido foliar impalatável ou de baixa qualidade para consumo. Já as defesas estruturais são aquelas em que ocorre a produção ou enrijecimento de estruturas já existentes nas folhas, por meio do espessamento das paredes celulares, do aumento da quantidade de fibras ou do acúmulo de cristais minerais (e.g. oxalatos de cálcio) em tecido das folhas, aumentando assim a dureza foliar (Johnson 2011). Os mecanismos de defesa biológica envolvem associações da planta com outros organismos, tais como formigas, que ocasionam um impacto negativo sobre as populações de herbívoros, e assim reduzem o dano causado por eles.

Dentro das defesas biológicas, a mais bem estudada é a interação tri-trófica entre planta, herbívoro e formigas (Cornelissen & Fernandes 2001). Em muitas espécies de

257

plantas, existem estruturas que são utilizadas por formigas como sítios de forrageio e abrigo (Fáveri et al. 2008). Plantas que estabelecem este tipo de associação são chamadas de mirmecófitas (Ribeiro et al. 1999). A presença constante de formigas sobre a planta diminui o consumo de suas estruturas pelos herbívoros, uma vez que eles são utilizados como alimento pelas formigas (Fáveri et al. 2008).

A produção de defesas pelas plantas demanda recursos que poderiam ser utilizados para outras funções, tais como a reprodução e crescimento (Herms & Mattson

1992). Entretanto, o risco de consumo constante pelos herbívoros a que as plantas estão sujeitas torna necessário o investimento em defesas mesmo sem a presença do herbívoro. Em situações que as plantas são protegidas por outros organismos de maneira efetiva, como nas interações entre os predadores de herbívoros e as plantas, estas deveriam diminuir o investimento em defesas químicas e estruturais e direcionar esses recursos para outras funções (Cornelissen & Fernandes 2001).

Os gêneros Maieta e Tococa, ambos pertencentes à família Melastomataceae, são exemplos de mirmecófitas que ocorrem na Amazônia Central (Ribeiro et al. 1999).

Além desses dois gêneros, a família Melastomataceae está representada na Amazônia

Central por outros dez gêneros, dos quais somente mais um (Cliedemia) possui domácias, colonizadas por formigas, na base de suas folhas (Ribeiro et al. 1999).

Associações entre plantas e formigas apresentam diferenças no grau de proteção conferida pelas formigas. Espécies de plantas que abrigam formigas do gênero Pheidole

(e.g. espécies do gênero Maieta) são mais bem protegidas que plantas defendidas por outros gêneros de formigas. Isso ocorre porque o tempo de resposta de Pheidole à presença do herbívoro é inferior ao tempo de resposta de espécies de outros gêneros.

Dessa forma, o objetivo desse estudo foi determinar se plantas com diferentes níveis de proteção por formigas investem diferencialmente em outras defesas contra herbívoros.

258

Minha hipótese é que o investimento em defesas físicas deveria diminuir com o aumento da eficiência da defesa biológica.

Métodos

Área de estudo

Realizei o estudo na Área de Relevante Interesse Ecológico Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (ARIE PDBFF), no sítio Km-41 que está localizado a 80 km de Manaus – AM. A vegetação é caracterizada como floresta tropical úmida de terra- firme e a região possui precipitação média anual de 2200 mm e temperatura média anual de 26,7ºC, com duas estações bem definidas: de dezembro a junho (estação chuvosa) e de julho a novembro (estação seca) (Radam-Brasil 1978).

Espécies focais

Para o estudo, utilizei quatro espécies pertencentes à família Melastomataceae: Maieta sp. (n=10), Tococa sp. (n=10), Miconia sp. (n=10) e Henriettella sp. (n=10). Maieta sp. possui domácias que são geralmente ocupadas por formigas do gênero Pheidole. Em

Tococa sp., a colonização das domácias é feita por formigas dos gêneros Azteca spp. e

Crematogaster spp. As plantas das espécies Miconia sp. e Henriettella sp. não possuem domácias em suas folhas e também não há nenhuma evidência de que elas possuam associação com formigas.

As espécies foram ordenadas quanto à presença ou ausência de defesa biológica e quanto à eficiência dessa defesa. A eficiência da defesa biológica foi determinada por meio de ensaios experimentais realizados em campo. Neste ensaio, utilizei cupins sobre as folhas das plantas como forma de simular a presença de um herbívoro. Determinei se o tempo necessário para acumular cinco formigas junto ao cupim diferia entre as

259

mirmecófitas. Repeti o ensaio nos 20 os indivíduos de mirmecófitas por três vezes, sempre em ramos diferentes. Em Maieta sp. o tempo médio de resposta foi 67±16 s

(média ± desvio padrão), já em Tococa sp. o menor tempo foi 107 s. Somente em dois indivíduos de Tococa sp. presenciei o ataque ao cupim durante os 3 min. de observação.

Massa específica e dureza foliar

Em cada planta, coletei três folhas, preferencialmente de ramos diferentes e com idades semelhantes. Padronizei a idade das folhas amostrando sempre as que estavam no terceiro nó mais recente do ramo. Todas as plantas se encontravam no sub-bosque de uma floresta madura.

A constituição das folhas pode variar quanto à quantidade de cada substância utilizada para a sua constituição (lignina, celulose, hemicelulose e fibra). A maneira como estes compostos estão distribuídos nos tecidos foliares (parênquimas, nervuras, epiderme) também pode variar e isso pode refletir no grau de dureza foliar. Dessa forma, medidas da quantidade desses compostos alocados na folha fornecem estimativas do investimento em defesas estruturais. Segundo Cornelissen et al. (2003), a massa foliar específica (MFE) e a resistência à perfuração (FPF) estão associadas ao investimento em defesa estrutural nas plantas.

Estimei a força necessária para perfurar o limbo foliar utilizando um

Perfurômetro. Esse aparelho consiste em uma haste de madeira que, em uma de suas extremidades, possui um arame com 1,5 mm de diâmetro e na outra, um funil de papel, sendo ambos fixados por fita adesiva. Para estimar a força necessária para romper a folha, posicionei a extremidade com o arame do Perfurômetro sobre a folha mantendo o

ângulo reto entre eles. Depois, adicionei areia ao funil até o momento em que a extremidade que estava sobre a folha atravessou o limbo foliar. Em seguida, pesei a

260

areia acumulada no funil em uma balança semianalítica e, ao valor da massa da areia no funil, adicionei o valor da massa do Perfurômetro. Multipliquei o resultado dessa soma pelo valor da aceleração da gravidade no local (aproximadamente 10m/s2). Desse modo, obtive uma estimativa da força (em N) necessária para perfurar cada folha. Fiz três repetições por folha e obtive uma média de FPF por planta.

Para o cálculo de Massa Foliar Específica (MFE), cortei um fragmento foliar com 4 cm2 de área de cada folha e em seguida os desidratei até a estabilizar a massa.

Com uma balança semianalítica, obtive a massa dos fragmentos foliares. Calculei a

MFE dividindo a massa do fragmento foliar por sua área, obtendo assim o valor de massa acumulada por unidade de área.

Análise estatística

Para avaliar se o os atributos foliares, MFE e FPF, diminuem com o aumento da eficiência da defesa biológica, utilizei análise de variância de um fator (ANOVA-One

Way). Previ que as plantas sem domácias, Miconia sp. e Henriettella sp., teriam uma maior MFE e FPF que Tococa sp., que por sua vez deveria ter maior MFE e FPF que

Maieta sp.

Resultados

A força necessária para perfurar a lâmina foliar foi maior nas espécies sem associação com formigas do que nas plantas mirmecófitas (F=33,16; gl=3; p<0,001; Figura 1).

Entretanto, não houve diferença entre as espécies mirmecófitas.

261

Figura 4. Valores médios da força necessária para perfurar as folhas de espécies com diferentes níveis de proteção por formigas. As espécies Miconia sp. e Henrietella sp. não apresentam associação com formigas e Tococa sp. e Maieta sp. são mirmecófitas.

As barras representam o desvio padrão. F=33,16; gl=3; p<0,001; n=10.

A massa foliar específica diferiu entre as mirmecófitas e as espécies sem associação com formigas (F=33,16; gl=3; p<0,001; Figura 2). As mirmecófitas tiveram menor massa por unidade de área. Porém, assim como ocorreu com a FPF, a MFE não diferiu entre as espécies desse grupo.

262

Figura 5: Valores médios de massa foliar específica de espécies com diferentes níveis de proteção por formigas. As espécies Miconia sp. e Henrietella sp. não apresentam associação com formigas e Tococa sp. e Maieta sp. são mirmecófitas. As barras representam o desvio padrão. F=58,25; gl=3; p<0,001; n=10.

Discussão

A associação com formigas por parte das mirmecófitas resultou em um menor investimento em defesas estruturais. Essa redução de investimento em defesas estruturais pode permitir que as plantas invistam mais recursos em crescimento e reprodução (Herms & Mattson 1992).

Ao contrário do esperado, mirmecófitas com níveis diferentes de proteção por formigas não diferiram quanto ao investimento em defesas estruturais. Em algumas espécies de plantas, existem diferenças de coloração entre folhas jovens, que são avermelhadas, e as maduras, que são verdes. Dominy et al. (2002) sugere que a coloração avermelhada em folhas jovens seja devida ao acúmulo de substâncias tóxicas aos animais. As folhas da espécie de Tococa analisada apresentam na superfície abaxial

263

uma coloração arroxeada, o que pode sinalizar a presença desses compostos. Investir em defesas químicas em vez de defesas físicas pode ser vantajoso, uma vez que os compostos químicos podem ser recuperados das folhas durante o processo de abscisão foliar (Cornelissen & Fernandes 2001). Compostos associados a defesa estrutural, por outro lado, uma vez depositados não podem ser realocados para outro fim. Assim, é possível que, em vez de investir em defesas estruturais, as plantas de Tococa sp. invistam em defesas químicas contra herbívoros.

As plantas defendidas por formigas investem menos em defesas estruturais contra os herbívoros. Em situações que a colonização das domácias por formigas não ocorre, estas plantas estariam mais susceptíveis a um aumento no consumo pelos herbívoros, o que poderia afetar diretamente a sua sobrevivência, crescimento e reprodução. Logo, quanto maior eficiência em defesa biológica maior grau dependência em relação proteção à das formigas.

Agradecimentos

Agradeço a equipe de organização do Curso de Ecologia da Floresta Amazônica – 2012

(EFA-2012), Paulo Mau, Paulo Rainbow, Thiago Beluga, Marcos Barbixa e ao Zé Luís, pela grande oportunidade proporcionada por meio deste curso. Aos colegas, pelos bons momentos e discussões que compartilhamos e por mostrar, que apesar das diferenças, é possível ser uma turma e não somente uma “cambada”. Agradeço ainda a todos aqueles que contribuíram e se empenharam de alguma forma em prol do nosso aprendizado, aos professores temporários, D. Eduarda e o Sr. Jorge, motoristas e barqueiros. Ainda sou muito grato ao PPG-ECO INPA e aos meus orientadores que me incentivaram a participar do EFA-2012, Beto Vicentini, Zé Luís e Robyn Burnham. Agradeço aos

264

revisores anônimos (Marcos Barbixa e Ana Andrade) pelas sugestões, que com certeza ajudaram-me a escrever com clareza e qualidade.

Referências

Coley, P.D., & J.A. Barone. 1996. Herbivory and plant defenses in tropical forests.

Annual Review of Ecology, Evolution and Systematics, 27:305–335.

Cornelissen, T.G., & G.W. Fernandes. 2001. Induced defences in the neotropical tree

Bauhinia brevipes (Vog.) to herbivory: effects of damage-induced changes on leaf

quality and insect attack. Trees, 15:236–241.

Cornelissen, J.H.C., S. Lavorel, E. Garnier, S. Díaz, N. Buchmann, D.E. Gurvich, P.B.

Reich, et al. 2003. A handbook of protocols for standardised and easy

measurement of plant functional traits worldwide. Australian Journal of Botany,

51:335-380.

Cornelissen, T.G., & Fernandes, G.W. 2001. Defence, growth and nutrient allocation in

the tropical shrub Bauhinia brevipes (Leguminosae). Austral Ecology, 26:246–253.

Dominy, N.J., P.W. Lucas, L.W. Ramsden, P. Riba-Hernandez, K.E. Stoner & I.M.

Turner. 2002. Why are young leaves red? Oikos, 98:63–176.

Fáveri, S.B., H.L. Vasconcelos & R. Dirzo. 2008. Effects of Amazonian forest

fragmentation on the interaction between plants, insect herbivores, and their natural

enemies. Journal of Tropical Ecology, 24:57–64.

Herms, D.A., & W.J. Mattson. 1992. The dilemma of the plants: to grow or defend. The

quarterly review of biology, 67:283–335.

Johnson, M.T.J. 2011. Evolutionary ecology of plant defences against herbivores.

Functional Ecology, 35:305–311.

265

Radam-Brasil.1978. Programa Nacional: Levantamento de Recursos Naturais (18th

ed.). Rio de Janeiro, Brasil: Ministério de Minas e Energia, Departamento Nacional

de Produção Mineral.

Ribeiro, J. E. L., M.J.G. Hopkins, A. Vicentini, C.A. Sothers, M.A.S. Costa, J.M. Brito,

M.A.D Souza. 1999. Flora da Reserva Ducke - guia de identificação das plantas

vasculares de uma floresta de terra-firme na Amazônia Central (1 ed). Manaus-

AM: Editora INPA. p. 816.

266

A condição alimentar das larvas de formigas-leão influencia no tamanho e no

tempo de construção do funil de areia?

Leonardo Queiroz de Oliveira

Introdução

Os organismos utilizam os recursos alimentares para realizarem funções vitais e comportamentais, como a manutenção do metabolismo, crescimento, forrageio, construção de abrigos e armadilhas (Reynolds 1990). Cada uma dessas funções possuem diferentes níveis de investimento energético, que estão relacionados com a quantidade de recursos alimentares que o indivíduo consome (Reynolds et al. 1985).

Por exemplo, a quantidade de energia utilizada para a manutenção do metabolismo em atividade é pequena quando comparado com a quantidade de energia utilizada para o crescimento do indivíduo e da prole.

Nas populações é comum que existam indivíduos com diferentes condições nutricionais, onde os mais alimentados serão provavelmente maiores e irão reproduzir com maior frequência (Gribbin & Thompson 1990). Esses indivíduos provavelmente terão mais energia para se deslocar no ambiente e procurar sítios com maior disponibilidade de recursos.

Predadores que utilizam armadilhas para captura de presas normalmente investem muita energia na construção e manutenção das estruturas da armadilha (Lucas

1985). Assim, é provável que indivíduos em melhores condições nutricionais invistam mais energia na construção de armadilhas maiores, podendo aumentar a eficiência na captura de presas.

As larvas das formigas-leão Myrmeleon brasiliensis (Neuroptera:

Myrmeleontidae) são predadoras que permanecem enterradas no fundo de funis cônicos

267

de areia a espera de pequenos insetos de solo que eventualmente caem na armadilha

(Penny & Arias 1982). Considerando que as larvas de formigas-leão investem energia na construção dos funis, o objetivo desse trabalho foi avaliar se indivíduos de M. brasiliensis sobre diferentes condições alimentares constroem funis de tamanhos distintos e em velocidades diferentes. Espero que larvas com melhores condições alimentares façam funis de maior diâmetro e demorem mais tempo para iniciar a construção do funil, dado que possuem energia extra para buscar sítios mais adequados para o estabelecimento dos funis e para construir armadilhas maiores.

Métodos

Realizei o estudo na Área de Relevante Interesse Ecológico do Projeto Dinâmica

Biológica de Fragmentos Florestais (ARIE PDBFF) no sítio km 41, localizado a 80 km ao norte de Manaus, AM - Brasil. No acampamento da reserva selecionei 40 indivíduos de formigas-leão onde se encontra uma alta concentração de larvas, principalmente nos terrenos secos e arenosos. Ainda no solo, dividi as larvas selecionadas em dois tratamentos, cada tratamento contendo 20 indivíduos. No primeiro tratamento alimentei as larvas com dois cupins. A primeira alimentação aconteceu na noite anterior ao experimento e a segunda alimentação aconteceu uma hora antes do início do experimento. No segundo tratamento não alimentei as larvas selecionadas por um período de 6 horas antes do início do tratamento.

No dia seguinte coletei do solo a porção de areia de cada funil selecionado juntamente com sua respectiva larva. A porção de areia foi peneirada e a larva de formiga leão coletada e separada de acordo com o tratamento que cada larva recebeu.

Preparei quatro bandejas com areia seca e peneirada, sendo duas bandejas para o tratamento alimentado e as outras duas bandejas para o tratamento sem alimentação.

268

Assim, para cada tratamento havia duas bandejas com 10 indivíduos em cada.

Fotografei as bandejas de areia em intervalos de 30 min para verificar o início de formação dos funis das formigas-leão. Numerei os funis em ordem crescente à medida que se formavam para determinar em qual tempo aquele indivíduo iniciou a construção do funil de areia. O experimento se estendeu por 07:00 h até que não houvesse mais mudanças de posição ou expansão da área do funil o que indicava que a construção dos funis estava concluída.

Para quantificar os parâmetros de interesse (tamanho e tempo de construção do funil), medi o diâmetro dos funis com um paquímetro e removi as larvas do experimento. Para realizar as medidas de tamanho das larvas, fotografei cada indivíduo e medi a distância entre os olhos com o auxílio do software Image J. Utilizei a distância entre os olhos como medida de tamanho porque o comprimento do abdômen dos animais alimentados estava maior devido à alimentação extra que receberam. Para determinar se existiu diferença entre os tratamentos (alimentados e não alimentados) para cada variável dependente (tamanho do funil e tempo de formação do funil) utilizei uma ANCOVA, considerando a distância entre os olhos como covariável.

Resultados

O diâmetro dos funis variou de 1,0 a 5,7 cm, enquanto o tempo de formação dos funis variou de 90 a 300 min. As formigas-leão com alimentação extra e sem alimentação não construíram funis de tamanhos diferentes (F(1, 34) = 0,24; p = 0,62; Figura 1). Da mesma forma, o tempo de formação dos funis não foi diferente entre os tratamentos testados

(F(1, 34) = 2,34; p = 0,13; Figura 2).

269

Figura 1. Tamanho médio do funil feito por formigas-leão nos tratamentos alimentado e não alimentado. As barras representam os intervalos de confiança de 0,95.

Figura 2. Tempo médio de formação do funil feito por formigas-leão nos tratamentos alimentado e não alimentado. As barras representam os intervalos de confiança de 0,95.

Discussão

As larvas de formigas-leão com alimentação extra não construíram funis de areia maiores e não demoraram mais tempo na construção da armadilha. Dessa forma, os resultados sugerem que a quantidade extra de alimento fornecida para as larvas de formigas-leão não foi convertida em energia extra para a construção de funis maiores ou para o deslocamento a procura de locais mais favoráveis, indicando que essa energia provavelmente foi acumulada.

Evolutivamente, a divisão do ciclo de vida em diferentes estágios de desenvolvimento, passando por ovo, larva e adulto está relacionado com o maior acúmulo de reservas energéticas nos estágios larvais, que irão refletir em adultos mais vigorosos (Werner 1986). A construção do funil de fato requer um alto investimento energético das formigas-leão (Lucas 1985). Portanto, é provável que as larvas não gastem mais energia aumentando o tamanho da armadilha, uma vez que o objetivo é acumular reservas energéticas para o estágio adulto (Werner 1986). Além disso, a construção de funis de areia muito grandes podem resultar na captura de animais maiores, como formigas solitárias, que ao invés de servirem de alimento para as larvas, podem atacá-las (observação pessoal). Da mesma forma, animais grandes podem danificar a estrutura do funil o que resulta em mais gasto energético para a reconstrução.

É provável que exista um tamanho ótimo para o funil de areia, proporcional ao tamanho da larva, onde os custos energéticos relacionados com a construção não superem os ganhos relacionados com a alimentação (Kramer 2001). Assim, indivíduos em melhores condições alimentares provavelmente manterão os funis no tamanho

ótimo, mas gastarão proporcionalmente menos energia na construção do funil, resultando em maior acúmulo de reservas. Por outro lado, os indivíduos que estão com déficit alimentar provavelmente vão alocar proporcionalmente mais energia para a manutenção do tamanho ótimo do funil. Entretanto, a energia resultante para o acúmulo de reservas será menor do que naquelas larvas em melhores condições alimentares.

271 O fato das larvas de formigas-leão que receberam alimentação extra não investirem mais tempo a procura de locais para construção de suas armadilhas, pode indicar que não é vantajoso aumentar o tempo de deslocamento. Considerando que a

única maneira das larvas acessarem os recursos alimentares é por meio da construção dos funis de areia (Crowley & Linton 1999) o aumento no tempo para iniciar a construção do funil pode implicar em redução da captura de alimento. Além disso, o aumento do tempo para iniciar a construção, está relacionado com maior tempo de deslocamento. Esse fato pode aumentar o risco do indivíduo ser canibalizado (Lucas

1989; Matsura & Takano 1989), ou de ser detectado por outros predadores (Best &

Gennaro 1985). Dessa forma, é provável que as larvas não invistam muita energia para o deslocamento, pois o risco de predação e a redução no acúmulo de reservas podem comprometer o desenvolvimento e sobrevivência dos indivíduos.

Agradecimentos

Agradeço ao professor Paulo Bobrowiek e Paulo Enrique Cardoso Peixoto pelo auxílio durante todas as fases do projeto. Agradeço ao Raimundo de Souza (Seu Jorge), a

Eduarda Costa pelo auxílio durante a preparação do experimento e aos demais colegas pelas sugestões construtivas durante o decorrer do trabalho.

Referências

Best, T.L & A.L. Gennaro. 1985. Food habits of the western whiptail lizard

(Cnemidophorus tigris) in south-eastern New Mexico. Great Basin Naturalist,

45:527-534.

Craig, C.L. 1987. The ecological and evolutionary interdependence between web

architecture and web silk spun by orb web weaving spider. Biological Journal

272 of the Linnean Society, 30:135-162.

Crowley, P.H. & M.C. Linton. 1999. Antlion foraging: tracking prey across space and

time. Ecology, 80:2271-2282

Gribbin, S. D. & Thompson, D. J. 1990. Asymmetric intraspecific competition among

larvae of the damselfly Ischnura elegans (Zygoptera: Coenagrionidae).

Ecological Entomology, 15:37-42.

Kramer, D. L. 2001. Foragin behavior, pp. 232-246. In: Evolutionary Ecology Concepts

and Case Studies (C. W. Fox, D. A. Roff, D. J. Fairbairn, eds.). Oxford: Oxford

University Press.

Lucas, J. R. 1985. Metabolic rates and pit-construction costs of two antlion species.

Journal of Animal Ecology, 54:295-309.

Lucas, J. R. 1989. Differences in habitat use between two pit building antlion species:

causes and consequences. American Midland Naturalist, 121:84-98.

Matsura, T & H. Takano. 1989. Pitt-relocation of antlion larvae in relation to their

density. Researches on population Ecology, 31:225-234.

Reynolds, S.E., S.F. Nottingham & A.E. Stephens. 1985. Food and water economy and

Its relation to growth in fifth-instar larvae of the tobacco hornworm, Manduca

sexta. Journal of Insect Physiology, 31:119-127.

Reynolds, S.E. 1990. Feeding in caterpillars: maximizing or optimizing food

acquisition?, pp106-118. In: Animal Nutrition and Transport Processes (J.

Mellinger, eds.). Basel: Karger.

Penny, N. D. & J. Arias. 1982. Insects of an Amazon forest. Columbia University Press,

New York.

Werner, E. E & J. F. Gilliam. 1984. The ontogenetic niche and species interactions in

size-structured populations. Annual Review of Ecology and Systematics, 15:393-

273 425.

Werner, E. E. 1986. Amphibian metamorphosis, growth rate, predation risk and the

optimal size at transformation. American Naturalist, 128:319-341.

274 Relação entre tamanho corporal, respostas de defesa e posição na teia de

indivíduos de uma espécie de aranha (Pholcidae) que vive em agregações na

Amazônia Central

Lorena Costa Pinto

Introdução

Em várias populações naturais os indivíduos interagem recorrentemente com seus co- específicos, especialmente indivíduos vizinhos ou parentais, no tempo e no espaço, formando grupos sociais (Mazer & Damuth 2001). O comportamento social dentro desses grupos pode variar desde cooperação e altruísmo até competição e disputa por recursos entre os organismos (Stevenson 2006). Da mesma forma, existem diferentes níveis de organização, como os sistemas eussociais, que consistem na associação de organismos aparentados que convivem em cooperação e possuem divisões de tarefas

(Wilson & Holldobler 2005) ou sistemas de agregados de organismos não aparentados, que geralmente não apresentam divisões de tarefas e nos quais os indivíduos podem competir intensamente por espaço e recursos.

Uma das principais explicações para a ocorrência de agregações em organismos não aparentados é a busca por proteção contra inimigos naturais. A teoria do rebanho egoísta, proposta por Hamilton (1971), postula que os animais em grupos sociais podem diminuir o risco individual de predação ao ocorrerem em agregados. No entanto, dentro dos grupos os indivíduos que se estabelecerem no centro do grupo, deslocando seus co- específicos para periferia, podem reduzir ainda mais o risco de predação. Dessa forma, os indivíduos centrais, em geral os mais fortes, são mais beneficiados pela proteção conferida pelo grupo quando comparado aos indivíduos da periferia (Gross &

MacMillan 1981).

275 Em aranhas construtoras de teias, o comportamento de agregação entre co- específicos não aparentados pode ser uma estratégia selecionada para minimizar os riscos individuais de predação ou parasitismo (Gonzaga 2007). No entanto, mesmo agregadas, essas aranhas podem adotar estratégias adicionais de defesa. Dentre elas, existe o abandono da teia, que consiste em atirar-se no solo ou na vegetação em situações de risco (Blackledge & Pickett 2000) e o comportamento de vibrar o corpo por alguns minutos ou até por alguns dias (restrito às famílias Pholcidae e Araneidae), o que dificulta a identificação e captura da aranha na teia pelo predador (Jackson et al.

1993, Heuts et al. 2001). O comportamento de vibrar o corpo, em particular, pode ser utilizado como uma resposta rápida de defesa, mas como essa estratégia não envolve saída da teia, os riscos de predação e parasitismo do indivíduo podem ser altos. Já a fuga da teia pode gerar custos distintos para os indivíduos, dependendo de sua posição no grupo. Nas aranhas que ocupam o centro da teia, o abandono poderia acarretar na perda do local seguro contra a predação, que poderia ser ocupado por outro indivíduo.

Já para as aranhas da periferia, a saída da teia seria a resposta mais esperada, pois esses indivíduos não possuem posições fixas no grupo e podem retornar facilmente para a teia após a ameaça.

Em uma espécie de aranha pertencente à família Pholcidae, que ocorre na

Amazônia central, os indivíduos podem ocorrer em agregações com co-específicos em uma mesma teia ou em teias conectadas. As teias dessa espécie têm formato tridimensional, com superfície arredondada, convexa e com o centro da teia localizado entre os fios de sustentação. Devido a essas características, o centro da teia pode ser o local mais seguro contra predadores e parasitas, de modo que os indivíduos maiores podem se comportar de acordo com o postulado pela teoria do rebanho egoísta

(Hamilton 1971), dominando essa região e deslocando os menores para a periferia da

276 teia. Uma vez que os indivíduos da periferia estariam mais suscetíveis aos riscos de predação e parasitismo, é possível que as estratégias de defesa adotadas por esses indivíduos incluam respostas rápidas e diferentes das apresentadas pelos indivíduos do centro da teia. Assim, meu objetivo foi avaliar se o tamanho dos indivíduos determina sua posição espacial na teia e se elas respondem de forma diferenciada a um estímulo de predação/parasitismo de acordo com sua posição. Minhas hipóteses são que (a) os indivíduos localizados no centro da teia serão maiores, (b) os indivíduos localizados na periferia da teia vão responder mais rapidamente ao estímulo de predação quando comparado ao indivíduo central e (c) aranhas localizadas na periferia da teia terão maior propensão a abandoná-la quando comparadas às aranhas do centro. Para essas hipóteses minhas previsões são que (a) aranhas do centro da teia apresentarão maior largura do cefalotórax que seus pares na periferia, (b) aranhas centrais precisarão de uma maior quantidade de estímulos que as periféricas para apresentar alguma resposta de defesa e

(c) aranhas localizadas na periferia da teia apresentarão maior frequência de abandono, enquanto aranhas do centro apresentarão maior freqüência do comportamento de vibrar o corpo sem abandonar a teia.

Métodos

Área e objeto de estudo

Realizei o estudo ao longo de três riachos (localmente conhecidos como igarapés) na reserva do km 41, localizada a 80 km ao norte de Manaus, Brasil (02°25′ S - 59°43′ O).

Essa reserva é composta por uma floresta tropical de terra firme e faz parte de uma Área de Relevante Interesse Ecológico – ARIE, sob co-gestão do Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais – PDBFF (Gascon & Bierregaard 2001).

277 Nos igarapés procurei por 30 teias com agregações de uma espécie de aranha

(Pholcidae), com cefalotórax e abdômen vermelhos e pernas pretas com marcas vermelhas. Os indivíduos dessa espécie podem ocorrer solitários ou em agregados que podem variar de dois a nove indivíduos (obs. pess.).

Simulação de predação/parasitismo e medidas de tamanho corporal

No intuito de obter as respostas de defesa apresentada pelos indivíduos em diferentes posições na teia, realizei simulações de estímulos de predação ou parasitismo em duas aranhas de cada teia. Para isso, identifiquei o indivíduo mais próximo e mais distante do centro da teia e simulei a presença de um predador/parasita tocando cada indivíduo na superfície dorsal, como um espeto de 24 cm de comprimento e 3 mm de largura por baixo da teia. Para minimizar o efeito da ordem de manipulação da teia nas respostas dos indivíduos, eu alternei as simulações entre os indivíduos do centro e da periferia entre as teias. Em seguida, contabilizei o número de toques necessários para cada aranha apresentar uma resposta de defesa. Considerei como respostas o abandono da teia ou a vibração corporal.

Para verificar se havia diferença de tamanho entre os indivíduos do centro e da periferia da teia, coletei os dois indivíduos testados após a simulação, para a medição do cefalotórax em laboratório. Para isso, fotografei cada indivíduo e calculei a largura do cefalotórax com o programa Image Tool (Versão 3.0, UTHSCSA).

Análises

Utilizei um teste t pareado para analisar se existia diferença na largura do cefalotórax entre aranhas do centro e da periferia da teia. Para testar se a quantidade de estímulos necessários para uma resposta de defesa era diferente entre aranhas do centro e da

278 periferia da teia, usei um modelo linear generalizado com dispersão de erros de Poisson.

Para isso, usei a posição na teia (centro ou periferia) como variável preditora, número de estímulos (toques) como variável resposta e cada teia como bloco. Como o tamanho pode influenciar nas taxas de predação e parasitismo (Rayor & Uetz 1993) e, consequentemente, nas respostas apresentadas pelas aranhas, utilizei a largura do cefalotórax como co-variável para controlar esse efeito. Para testar se aranhas da periferia e do centro da teia apresentavam respostas de defesa diferentes (vibração do corpo ou fuga da teia) utilizei um teste qui-quadrado de McNemar, que considera o pareamento entre as aranhas da periferia e do centro de cada teia.

Resultados

As aranhas localizadas no centro das teias eram maiores que os indivíduos da periferia, com cefalotórax 20% mais largo (t = 2,66; gl = 29; p < 0,01; Figura1). A largura média do cefalotórax dos indivíduos do centro da teia foi de 2,1 mm (DP = 0,40 mm), enquanto a largura média do cefalotórax dos indivíduos da periferia foi de 1,84 mm

(DP=0,39 mm).

279

Figura 1. Relação entre a largura do cefalotórax e a posição dos indivíduos na teia de uma espécie de aranha (Pholcidae), na reserva do Km 41-PDBFF, Amazonas, Brasil.

Cada linha conecta o valor de largura do cefalotórax do indivíduo do centro e seu par da periferia de uma mesma teia.

As aranhas do centro e da periferia da teia apresentaram diferenças quanto ao número de toques necessários para responder a simulação do predador/parasita

(χ2=14,4; gl=1; p<0,01; Figura 2). A diferença entre as médias de estímulos entre as aranhas do centro e da periferia foi de 1,83 toques. As aranhas do centro responderam em média com 4,5 toques (DP=5,3) e as aranhas periféricas com 2,6 toques (DP=2,1).

280

Figura 2. Relação entre o número de estímulos necessários para exibição de resposta de defesa (fuga da teia ou vibração corporal) e a posição dos indivíduos na teia de uma espécie de aranha (Pholcidae), na reserva do Km 41-PDBFF, Amazonas, Brasil. Cada linha conecta o valor do número de estímulos do indivíduo do centro e da periferia de uma mesma teia.

As aranhas do centro e da periferia da teia apresentaram frequências similares no tipo de resposta de defesa frente ao estímulo de predação/parasitismo (χ2=1,23; gl=1; p=0,27). O comportamento de vibrar o corpo foi mais comum tanto em aranhas do centro da teia (76,7% das simulações), quanto nas aranhas da periferia (60% das simulações).

Discussão

Conforme o esperado, houve diferença entre os tamanhos das aranhas centrais e periféricas, indicando que quando agregadas, as aranhas apresentam segregação espacial, com os indivíduos maiores localizados no centro da teia. Além disso, a quantidade de estímulos de predação necessários para incitar uma resposta também

281 diferiu de acordo com a posição na teia. O menor número de estímulos necessários para desencadear uma resposta de defesa nas aranhas da periferia pode ter ocorrido devido à maior vulnerabilidade desses indivíduos à predação e ao parasitismo. No entanto, o tipo de resposta de defesa dos indivíduos foi semelhante. A preferência pelo comportamento de vibrar o corpo pode indicar que o abandono da teia é arriscado para todas as aranhas, independente de sua posição na agregação.

A diferença no tamanho das aranhas de acordo com a posição na teia indica uma relação de dominância entre esses indivíduos (e.g. Rayor & Uetz 1990). Permanecer na parte central do grupo pode ser uma vantagem devido ao menor risco de predação (e.g.

Alves-Costa & Gonzaga 2001). Eventualmente, o indivíduo dominante pode defender o centro da teia contra indivíduos vizinhos e deslocar os menores e mais fracos para a periferia. Alternativamente, é possível que indivíduos da periferia sejam aranhas que se estabeleceram depois que a primeira fundou sua teia. No entanto, uma vez que mesmo aranhas grandes podem ser predadas na periferia (Rayor & Uetz 1993), é provável que as grandes optem por se localizar nas áreas centrais.

A posição da aranha na teia também teve influência na quantidade de estímulos necessários para as aranhas apresentarem uma resposta de defesa. A maior propensão dos indivíduos da periferia a responder aos estímulos pode ocorrer pelo fato dessa área ser mais suscetível aos ataques de predadores e parasitas. Se esses indivíduos estão constantemente em contato com diferentes situações de risco, uma resposta rápida para minimizar os danos causados pelos inimigos naturais seria favorecida (Rayor & Uetz

1993). Em contrapartida, as aranhas centrais por serem menos suscetíveis a predação ou parasitismo podem desencadear respostas apenas sob estímulos mais intensos.

Ao contrário do esperado, tanto as aranhas centrais quanto as aranhas periféricas apresentaram preferencialmente o comportamento de vibrar o corpo como primeira

282 resposta de defesa. Por mais que essa estratégia demande um alto custo energético, pois só é eficiente se o indivíduo conservar a vibração corporal até eliminar o estímulo responsável pela resposta (Heuts 2001), o abandono da teia pode ocasionar maiores riscos de predação (Gonzaga 2007). Assim, é possível que o comportamento de abandono da teia seja utilizado apenas como uma última resposta, quando as outras estratégias, como vibração corporal, não forem suficientes para afastar os predadores e parasitas.

A diferença de tamanho, associada com a posição da aranha na teia, sugere que a teoria do rebanho egoísta (Hamilton 1971) se aplica a essa espécie. O beneficio obtido pela posição central na teia deve ocasionar disputas entre os indivíduos do grupo, de modo que o indivíduo central é mais favorecido. No entanto, a ocorrência de um grande número de agregados indica que os indivíduos da periferia também são beneficiados de alguma forma. Talvez mesmo na periferia o risco de predação seria ainda menor quando comparado com indivíduos solitários. Por fim, se o risco de predação/parasitismo de fato afeta a propensão de uma aranha emitir uma resposta de defesa, é possível que os indivíduos dessa espécie, quando estão solitários na teia, respondam a predação de maneira semelhante aos indivíduos da periferia do agregado, pois estão frequentemente mais sujeitos a situações de risco.

Agradecimentos

Agradeço aos predadores, Tatu e Hobbit, pela ajuda imprescindível nas coletas! Sem vocês eu ficaria mais uns três dias andando sozinha por aí!! E ao Harry Potter, que com sua mágica resolveu todos os problemas relativos às análises deste trabalho! Agradeço também aos revisores Marcel (Baby) e Paulinho Rainbow por toda a paciência e pelo direcionamento neste trabalho! Com relação ao EFA ... nossa é difícil escrever em

283 poucas palavras como essa experiência foi importante na minha vida profissional e pessoal. Agradeço de coração a todos os organizadores e professores que passaram por esse curso, especialmente ao Paulinho Morcego e Paulinho Rainbow pela oportunidade de vivenciar o mundo paralelo do EFA. (obs: Você é incrível dona bicha! Obrigada por ser essa luz de alegria nesse curso!). A dona Eduarda e seu Jorge, que com sua comida com gostinho de casa da mamãe, fizeram nossa vida mais feliz! E a todos os colegas do curso, especialmente a Carol (Da SILVA), parceira dos tráficos de cerveja e farra de todos os dias, Dani (ATOLADINHA) que com seus projetos artísticos deixou o clima do curso sempre descontraído, Tati (Árveres) que com seu jeito arretado de pernambucana deixava sempre as discussões mais quentes e divertidas e a Cibele

(Lohaynne, Shayenne, Vanessão, Condessa ...) que toda atrapalhada e falante alegrou o ambiente de uma forma incomparável. Aos que eu não detalhei, fica aqui meu carinho e saudades por tudo que nós vivenciamos nesse um mês de casamento forçado! Obrigada por fazerem desse mês o período mais incrível da minha vida! Valeu galera! Amo vocês! Ôpa ... eu falei ou pensei!

Referências

Alves-Costa, C.P. & M.O. Gonzaga, 2001. Prey capture and spatial distribution of

Philoponella vittata (Araneae, Uloboridae) in host webs. Ethology, Ecology and

Evolution, 13:239-246.

Blackledge, T.A. & K.M. Pickett. 2000. Predatory interactions between mud-dauber

wasps (Hymenoptera, Sphecidae) and Argiope (Aranae, Araneidae) in captivity.

Journal of Arachnology, 28:211-216.

Gascon, C. & R.O. Bierregaard. 2001. The biological dynamics of forest fragments

project, pp. 31–42. In: Lessons from Amazonia, the ecology and conservation of a

284 fragmented forest (R. O. Bierregaard, C. Gascon, T.E. Lovejoy & R.C.G.

Mesquita, eds.). Yale University Press: New Haven.

Gonzaga, O.G. 2007. Inimigos naturais e defesas contra predação e parasitismo em

aranhas, pp. 209-237. In: Ecologia e comportamento de aranhas (O.G. Gonzaga,

A.J. Santos & H.F. Japyassú, Eds.). Rio de Janeiro: Interciência.

Gross, M.R. & A.M. MacMillan. 1981. Predation and the evolution of colonial nesting

in bluegill sunfish (Lepomis macrochirus). Behavioral Ecology and Sociobiology,

8:163-174.

Hamilton, W.D. 1971. Geometry for the selfish herd. Journal of Theory Biology,

31:295-311.

Heuts, B.A., M. Witteveldt, L.M. Dionisio Pires & F. van Wageningen. 2001. Long-

duration whirling of Pholcus phalangioides (Aranae, Pholcidae) is specifically

elicited by salticid spiders. Behavioral Proceedings, 55:27-34.

Jackson, R.R., E.M. Jakob, M.B. Willey, G.E. Campbell. 1993. Anti-predator defence

of a web-building spider Holocnemus pluchei (Aranae, Pholcidae). Journal of

Zoology, 229: 347-352.

Mazer, S.J. & J. Damuth. 2001. Evolutionary significance of variation, pp.16-26. In:

Evolutionary ecology: concepts and case studies (C.W. Fox, D.A. Roff & D.J.

Fairbairn, eds.). Oxford: Oxford University Press.

Rayor, L.S. & G.W. Uetz. 1990. Trade-offs in foraging success and predation risk with

spatial position in colonial spiders. Behavioral Ecology and Sociobiology, 27:77-

85.

Rayor, L.S. & G.W. Uetz. 1993. Ontogenetic shifts within the selfish herd: predation

risk and foraging trade-offs change with age in colonial web-building spiders.

Oecologia, 95:1- 8.

285 Stevenson, R.L. 2006. Doing adaptive things, pp. 75-85. In: Discovering evolutionary

ecology: bringing together ecology and evolution (P.J. Mayhew, ed.). Oxford:

Oxford University Press.

Wilson, E.O. & B.H. Holldobler. 2005. Eusociality: origin and consequences. PNAS,

20:13367–13371.

286 A influência da agregação espacial de Maieta guianensis (Melastomataceae) sobre

a intensidade da herbivoria

Ludmila Rattis

Introdução

Os padrões de distribuição espacial dos indivíduos podem ser decorrentes de diversos processos que afetam a reprodução, a sobrevivência e a movimentação. Existem três principais padrões de distribuição: aleatório, quando a probabilidade de um organismo ocupar qualquer ponto no espaço é igual; uniforme, quando os organismos se distribuem de modo a estabelecer intervalos regulares entre si, e o padrão agregado, quando os indivíduos tendem a ocorrer em grupos (Begon et al. 2006). Existe uma variação no nível de isolamento dos indivíduos, tanto na distribuição aleatória quanto na distribuição agregada.

O nível de isolamento entre os indivíduos pode trazer consequências positivas e negativas como resultado de interações intra e interespecíficas. A competição por recursos pode ser maior quando os indivíduos ocorrem em agrupamentos, principalmente para organismos sésseis, em que a interferência direta entre indivíduos é mais provável (Begon et al. 2006). Para algumas espécies, o agrupamento pode resultar em menor pressão por predação, pela diluição do efeito entre indivíduos (Hamilton

1971), como ocorre em agrupamentos de ungulados ou de algumas aves florestais (Holt

2006). Existem também consequências do nível de isolamento mediadas por interações mutualísticas. Plantas e seus polinizadores e dispersores podem se beneficiar quando as plantas se estabelecem agrupadas. Nessa situação, polinizadores e dispersores gastariam menos energia se deslocando entre as plantas (Schoonhoven et al. 2005). Presumindo que os polinizadores e dispersores sejam capazes de optar por forrageamento

287 preferencial, plantas ocorrendo em agrupamentos deveriam se beneficiar de serviços de polinização e dispersão mais eficientes que plantas ocorrendo isoladas. Por outro lado, é possível que as consequências do nível de isolamento sejam mediadas por outros tipos de interações mutualísticas.

Mutualismos de defesa contra herbivoria em plantas, geralmente envolvem a associação entre a planta e o predador capaz de se alimentar dos herbívoros (Schaller

2008). A interação entre a planta Maieta guianensis (Melastomataceae) e a formiga

Pheidole minutula (Hymenoptera: Formicidae) configura um exemplo de mutualismo de defesa. A formiga se alimenta principalmente de insetos capturados sobre as folhas de M. guianensis e da seiva do floema liberada por coccídeos mantidos no interior de estruturas especializadas, denominadas domáceas. As domáceas são estruturas localizadas nas bases das folhas de M. guianensis e são usadas para o estabelecimento de colônias das formigas (Vasconcelos 1991; Agrawal & Rutter 1998). A formiga P. minutula por sua vez, oferece um sistema de defesa para a planta, através de defesa induzida contra herbívoros. Quando a planta sofre herbivoria, compostos secundários voláteis são liberados pela planta. Esses compostos são percebidos pelas formigas, que se deslocam para o local para atacar o possível herbívoro (Capurucho, 2010). Em situações em que os indivíduos ocorrem em agrupamentos, os compostos liberados pelo dano causado a uma planta deveriam produzir respostas de defesa por parte das formigas associadas a indivíduos vizinhos.

Nesse estudo, investiguei a hipótese de que indivíduos de P. minutula associadas a indivíduos de M. guianensis são capazes de responder ao dano provocado por herbívoros em indivíduos vizinhos de M. guianensis. Se a hipótese for verdadeira, espero que 1) aumente o número de formigas ocorrendo em determinada folha, quando a folha de uma planta vizinha sofrer o dano; 2) que a probabilidade de recrutamento

288 diminua com o aumento da distância entre folhas e 3) que plantas estabelecidas a menos de 1 m de outra tenham menor porcentagem de área foliar consumida que plantas estabelecidas a mais de 1 m.

Métodos

Área de estudo

Realizei este estudo na Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) do Km 41 (2°24’

S-59°44’ O) pertencente ao Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais

(PDBFF-INPA). Essa área está localizada no município de Rio Preto da Eva, a cerca de

80 km ao norte de Manaus, AM, Brasil (Dobrovolski, 2010).

Sistema de estudo

Na área de estudo, ocorrem indivíduos de M. guianensis próximo ao riacho do interior da floresta. Considerei agrupados os indivíduos estabelecidos a menos de 1 m de distância de outro indivíduo de M. guianensis. Descartei observações feitas em folhas cujas domáceas estavam colonizadas por formigas da espécie Crematogaster sp. que apresentam comportamento distinto de P. minutula.

Recrutamento na planta vizinha e distância de resposta

Para avaliar se as formigas respondiam ao dano provocado na folha da planta vizinha, fiz um experimento utilizando pares de indivíduos agrupados de M. guianensis.

Registrei o número de formigas P. minutula sobre uma folha de um dos indivíduos

(folha focal). Após observá-la durante um minuto cortei a porção distal da folha de um vizinho mais próximo com uma tesoura e registrei o número de indivíduos presentes na folha durante um minuto. Observei um par por agrupamento em 29 agrupamentos distintos. Para avaliar se havia diferença no número de formigas sobre a folha focal

289 antes e depois da aplicação do dano na folha vizinha, utilizei um teste t pareado. Para avaliar se havia relação entre a probabilidade de recrutamento das formigas e a distância entre as folhas do par, utilizei uma regressão logística entre a ocorrência de recrutamento (variável resposta) e a distância entre as folhas (variável preditora).

Nível de isolamento e área foliar consumida

Para avaliar se havia diferenças no ataque de herbívoros entre as plantas agrupadas e não agrupadas contei o número total de folhas de 11 indivíduos agrupados e 11 indivíduos não agrupados. Em cada indivíduo, coletei todas as folhas que apresentavam dano. Em laboratório, calculei a área foliar baseando-me na área da elipse ((R * r * π) /

4), em que R é o raio maior (metade do comprimento da folha) e r é o raio menor

(metade da largura da folha).

Estimei a proporção de área foliar consumida com o auxílio de papel milimetrado: com a folha sobre o papel milimetrado, contei quantos quadrados com 25 mm2 de área coincidiam sobre buracos na folha. Calculei a proporção de área foliar consumida para cada folha dividindo a área foliar consumida pela área total da folha.

Para cada indivíduo, calculei a proporção média de área foliar consumida como a média das proporções consumidas de cada folha. Utilizei um teste t para avaliar se havia diferença na proporção média de área foliar consumida entre indivíduos agrupados e não agrupados.

Resultados

Recrutamento na planta vizinha

O número de formigas presentes sobre a folha focal aumentou após a aplicação do dano na folha vizinha (N=29; Média ± dp= 0,59±1,27; p=0,019; Figura 1).

290

Figura 1. Número de formigas Pheidole minutula presente sobre folhas de Maieta guianensis antes e depois da aplicação de dano a uma folha vizinha (N=29).

Distância de resposta

A probabilidade de recrutamento de formigas P. minutula aumentou com a distância entre as folhas de indivíduos de Maieta guianensis (χ2= 5,36; gl=1; p= 0,020; Figura 2).

291

Figura 2. Relação entre a probabilidade de recrutamento por Pheidole minutula em folhas não danificadas próximas a folhas danificadas em um experimento envolvendo indivíduos de Maieta guianensis estabelecidos a diferentes distâncias (N=29).

Nível de isolamento e área foliar consumida

A proporção de área foliar consumida nas plantas não agrupadas (N=11; Média ± dp:

11,4 ± 10,4) foi maior que a proporção de dano nas folhas das plantas agrupadas (N=11;

Média ± dp: 8,1 ± 5,4; F(1,20) = 3,7; p=0,049; Figura 3).

292

Figura 3. Proporção média de área foliar consumida em indivíduos de Maieta guianensis espacialmente agrupados e não agrupados (N=22).

Discussão

As formigas P. minutula respondem ao dano foliar em plantas vizinhas àquela que ocupam. Além disso, indivíduos de M. guianensis sofrem menor intensidade de herbivoria quando ocorrem próximos a outros indivíduos da mesma espécie.

Provavelmente essa redução na intensidade de herbivoria está associada ao recrutamento que ocorre nas folhas vizinhas àquela que sofreu o dano. A presença de um herbívoro em uma folha é percebida pelas formigas que habitam as folhas vizinhas de maneira que estas se mobilizem para a defesa. Essa resposta pode afastar eventuais herbívoros das plantas vizinhas àquela onde ocorreu o dano. Assim, nas agregações de

M. guianensis, o ataque parece gerar uma reação sinérgica entre as formigas, o que pode resultar na diminuição do risco de predação entre indivíduos que ocorrem próximos uns aos outros.

Assim como demonstrei para o sistema M. guianensis/Pheidole minutula,

Agrawal (1998) demonstrou que formigas do gênero Azteca presentes em folhas da

293 planta Cecropia obtusifolia respondem a estímulos causados pela liberação de compostos voláteis em folhas danificadas de plantas vizinhas. Os dois casos mostram que a interação entre estratégias de defesa direta (quando a planta produz defesa física e/ou química) e indireta (quando a planta estabelece interações de defesa com organismos de outras espécies) (Schaller 2008) pode aumentar a eficiência da defesa em plantas agrupadas.

Observei, durante o experimento, que o número de formigas recrutado na folha focal era menor que o número recrutado na folha danificada (obs. pessoal). Isso pode indicar que a resposta ao estímulo químico começa com poucas formigas percorrendo a folha em busca da causa da liberação do volátil. Ao percorrer a folha e não encontrar dano ou herbívoro, não há a mesma mobilização massiva que é vista na folha danificada. Talvez os compostos liberados estimulem o patrulhamento inicial, mas para que mais formigas sejam recrutadas é preciso que as primeiras encontrem o substrato danificado, ou o herbívoro.

Curiosamente, a probabilidade de o dano ocorrido em uma folha vizinha resultar em recrutamento em uma folha que não foi atacada diminui em função da distância entre as folhas. Peixoto (2005) também não observou resposta das formigas P. minutula ao dano em folhas vizinhas em M. guianensis, em um experimento em que considerou apenas distâncias curtas. Uma explicação para esse fenômeno se baseia no efeito diferenciado provocado pelos compostos voláteis sobre as colônias de formigas de plantas vizinhas localizadas a diferentes distâncias. Pressupondo que exista uma variação individual na composição dos voláteis, as formigas poderiam reconhecer compostos vindos das plantas mais próximas e não responder a eles. Tal fenômeno se baseia na familiaridade entre vizinhos (Temeles, 1994), que resulta do contato frequente das colônias com os voláteis de plantas muito próximas. A partir de certa distância, as

294 formigas não teriam essa familiaridade com os compostos voláteis emitidos e não o reconheceriam como pertencente à planta que ocupam (Temeles, 1994). Essa percepção diferencial de voláteis por formigas de plantas vizinhas pode favorecer um nível mínimo de isolamento, dado que plantas muito próximas não seriam beneficiadas pela defesa promovida pelas formigas de colônias vizinhas. Tal defesa adicional ocorreria apenas a partir de certa distância entre as plantas. Apesar da resposta contra o ataque de herbívoros ser mais eficiente em agrupamentos, um mecanismo favorecendo um nível mínimo de isolamento garantiria menor pressão competitiva intraespecífica em agrupamentos de plantas (Coley & Barone, 1996). É possível testar se, de fato, há mecanismos de reconhecimento entre vizinhos muito próximos. Para testar qual a distância mínima e máxima de percepção de compostos voláteis por P. minutula, pode- se alocar extrato foliar de M. guianensis embebido em algodão a diferentes distâncias das folhas e observar a quais distâncias há recrutamento. Se o nível de isolamento implica em competição intraespecífica acentuada (Flügge et al. 2012), mas em aumento da defesa contra predadores, o nível de isolamento na escala da população deveria depender da importância relativa desses dois fatores.

Agradecimentos

Agradeço aos colegas que ajudaram na coleta de dados: Marcos, o monitor predileto,

Dani Coelho, Joseph-EFA, Tatu, Tati, Lorena e Paulinho Bom. Agradeço ao Paulinho

Bom e ao Paulinho Mau-ravilhoso por todas as vezes que olharam para trás quando eu os gritava com o computador nas mãos: “você pode tirar uma dúvida? É pequenininha!”

Obrigada por não me afogar no Igarapé.

Agradeço também à Catá e ao Marcos por revisar meu relatório 32 vezes. Só consegui conceber, executar e escrever meu projeto individual graças ao apoio da plebe

295 efana, coordenadores, professores e monitores. Nem de longe eu poderia imaginar o quanto um curso de campo poderia mudar minha vida profissional e pessoal. Caramba!

Não acredito até agora!

Agradeço especialmente aos pacientes professores que corrigiram meus projetos e responderam minhas perguntas esquisitas.

Algumas pessoas foram especialmente importantes, sem as quais eu teria ficado doida com tantas mudanças: Marcos, Renatinha, Sr. Jorge, Paulinho’s, Glauco, Daniel,

Xexéu, Felipe, André, Catá, Marcel, meu Anjo, Leo Marajó e o bem-humorado tripulante do barco Regional, Sr. Antônio. Valeu, valeu muito e ainda vai valer por muito tempo. Fingers crossed!

Referências

Agrawal, A.A. 1998. Leaf damage and associated cues induce aggressive ant

recruitment in a neotropical ant-plant. Ecology 79:2100-2112.

Agrawal, A.A. & M.T. Rutter. 1998. Dynamic anti-herbivore defense in ant-plants: the

role of induced reponses. Oikos 83:227-236

Begon, M., C.R. Townsend & J.L. Harper. 2006. Ecology: from individuals to

ecosystems. Oxford: Blackwell Publishing.

Capurucho, J.M.G. 2010. Pheidole minutula (Hymenoptera: Formicinae) captura presas

usando compostos voláteis liberados por Maieta guianensis (Melastomataceae)

como pista da presença de herbívoros. Em: Livro do curso de campo “Ecologia

da Floresta Amazônica” (Peixoto, P.E.C. & Bobrowiec, P.E.D. eds.).

PDBFF/INPA, Manaus.

Coley, P.D. & J.A. Barone. 1996. Herbivory and plant defenses in tropical forests.

Annu. Rev. Ecol. Syst 27:305–35

296 Dobrovolski, R. 2010. Ausência de efeito de borda sobre a demografia e a diversidade

funcional do banco de plântulas emuma área contínua de floresta amazônica.

Em: Livro do curso de campo “Ecologia da Floresta Amazônica” (Peixoto,

P.E.C. & Bobrowiec, P.E.D. eds.). PDBFF/INPA, Manaus.

Flügge, A.J., S.C. Olhede & D.J. Murrel. 2012. The memory of spatial patterns: changes

in local abundance and aggregation in a tropical forest. Ecology 93(7):1540–

1549

Hamilton, W.D. 1971. Geometry for the selfish herd. Journal of Theoretical Biology

31:295–311

Holt, R. D. 2009. Predation and Community Organization. In: Levin, S.A. The

Princeton guide to Ecology. Princeton University Press, New Jersey.

Peixoto, P.E.C. 2005. Respostas comportamentais da formiga Pheidole minutula

(Hymenoptera: Formicidae) a estímulos químicos e biológicos: compostos

voláteis são identificados pelas formigas? Em: Livro do curso de campo

“Ecologia da Floresta Amazônica” (Machado, G. & Nascimento, H. eds.).

PDBFF/INPA, Manaus.

Schaller, A. 2008. Induced plant resitence to herbivory. Berlim: Springer.

Schoonhoven, L.M., L.L.A. van Loon & M. Dicke. 2005. Insects and flowers:

mutualism per excellence. In: Insect plant biology. 2nd. Oxford: New York.

Vasconcelos, H.L. 1991. Mutualism between Maieta guianensis Aubl., a

myrmecophytic melastome, and one of its ant inhabitants: ant protection against

insect herbivores. Oecologia 87:295-298

297 Tricomas foliares auxiliam formigas na detecção de herbívoros em plantas

mirmecófita?

Mariana Velasque

Introdução

Formigas e plantas geralmente interagem, mas raramente formam relações mutualísticas

(Schurch et al. 2000). Entretanto, algumas plantas desenvolveram estruturas atrativas para estes insetos, otimizando assim o sistema de defesa anti-herbivoria (Bronstein

1994). Neste sistema, as formigas patrulham a planta em busca de recompensas como alimentos ou abrigos, removendo os herbívoros e potenciais competidores de recursos.

Essa relação é chamada de mirmecofilia e é um exemplo extremo de interação mutualística, uma vez que os organismos envolvidos desenvolveram relações obrigatórias e simbióticas (Beattie 1985, Benson 1985, Davidson & McKey 1993).

Nestas plantas, ocorreu o desenvolvimento de estruturas complexas e especializadas, conhecidas como domáceas, onde as formigas estabelecem e abrigam suas colônias

(Beattie 1985, Benson 1985, Vasconcelos 1991). Em contrapartida, as formigas removem os herbívoros da planta hospedeira durante a patrulha, conferindo proteção à planta (Vasconcelos 1991).

O custo energético para manter a colônia patrulhando pode ser alto. Por isso a patrulha é exercida por poucos indivíduos. Esta limitação no número de patrulheiras pode reduzir a eficiência para encontrar os herbívoros, já que estes ocorrem em baixa densidade e de forma imprevisível (Brouat et al., 2000). Isso pode resultar na seleção de sistemas mais rápidos e eficientes de sinalização da presença de herbívoros para as formigas. Isso auxilia a resposta defensiva e leva as formigas ao local de atividade do herbívoro (Brouat et al., 2000). Como formigas apresentam um elaborado sistema de

298 recepção química (Hölldobler & Wilson 1990), é possível que compostos químicos voláteis emitidos pelas partes danificadas nas folhas seja uma importante forma de recrutar mais formigas (Agrawal 1998, Brouat et al., 2000). De forma semelhante, distúrbios mecânicos causados por herbívoros também podem intensificar a atividade anti-herbivoria da colônia (Vasconcelos & Casimiro 1997).

Distúrbios mecânicos podem ser amplificados quando a planta possui estruturas como tricomas. Na Amazônia Central é comum encontrar plantas mirmecófitas que possuem tricomas nas folhas (Hölldobler & Wilson 1990). Estas estruturas estão associadas à resistência da planta contra a herbivoria e a redução da perda de água pela transpiração (Ehrlinger 1984, Choinski & Wise 1999, Benz & Martin 2006). Como várias espécies de plantas com tricomas ocorrerem no interior das florestas, a disponibilidade de água parece não ser um recurso limitante o que justifique a utilidade dos tricomas para evitar a perda de água. Da mesma forma, esta estrutura parece não estar ligada à defesa física da planta à herbivoria, visto que estas plantas são intensamente patrulhadas por formigas (Vasconcelos 1991). Estes fatos sugerem que a presença de tricomas em plantas mirmecófitas pode não estar associada às funções usuais do tricoma, mas relacionados à outra função como aumento da sensibilidade da formiga ao herbívoro.

Neste sentido, o presente estudo teve como objetivo avaliar se tricomas foliares presentes em Tococa sp. amplificam os estímulos mecânicos gerados pelos herbívoros, otimizando a detecção destes pelas formigas. Realizei um experimento de retirada dos tricomas para avaliar se na ausência desta estrutura, o tempo de encontro da formiga com o objeto que causa o estímulo mecânico aumenta.

299 Métodos

Eu realizei o estudo em uma floresta tropical úmida de terra firme, localizada na

Reserva do Km 41(2°26´S, 59°45´O), situada 80 km ao norte de Manaus, AM, Brasil. O local é considerado uma Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE), co-gerida pelo

Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF). Segundo a classificação de Köppen (Peel et al. 2007), a região apresenta o clima tropical úmido, com temperatura média anual de 26,7 °C e com precipitação anual variando entre 1900 e 2300 mm (Bierregaard et al. 2001).

Mirmecófitas do gênero Tococa (Melastomataceae) apresentam domáceas localizadas entre a folha e o pecíolo que são frequentemente ocupadas por formigas, além de tricomas em toda face adaxial da folha. Marquei 12 indivíduos de Tococa sp. presentes no interior e na borda da reserva. Em cada planta, selecionei uma folha com a menor área predada por herbívoros. Em um dos lados da folha (separados a partir da nervura central), removi todos os tricomas, raspando cuidadosamente com uma lâmina de barbear. Após a raspagem, mantive a planta sem estímulos induzidos por 24h, a fim de reduzir o estresse imposto às colônias de formigas e diminuir a liberação de compostos voláteis pela planta. Ao término deste período estimulei a saída de formigas das domáceas para patrulhar sobre as folhas manipuladas, dando leves batidas sobre as folhas. Quando o número de formigas sobre a folha era maior do que dois, passei uma pinça com ritmo constante sobre um dos lados das folhas, de forma a simular um pequeno herbívoro caminhando sobre a planta. O movimento foi mantido até que as formigas encontrassem a pinça. O tempo de encontro da formiga com a pinça foi cronometrado. Este procedimento foi realizado em ambos os lados da superfície adaxial da mesma folha. Para avaliar a diferença no tempo de resposta das formigas em relação ao estímulo simulado nos lados com e sem tricoma da folha, utilizei um teste t pareado.

300 Resultados

Na ausência do tricoma, o tempo de encontro da formiga com o objeto foi em média (±

DP) 12,5 ± 14,57 segundos, enquanto na presença do tricoma, o tempo médio de resposta foi de 5,5 ± 4,21 segundos. O tempo mínimo de encontro nos dois tratamentos foi de um segundo. Nas áreas sem tricomas, o tempo máximo de encontro da formiga com o herbívoro foi de 51 segundos, enquanto na presença de tricomas, as formigas respondiam no máximo em 13 segundos. A retirada dos tricomas nas folhas não alterou o tempo de encontro das formigas à origem do estímulo mecânico (t = 1,86; gl = 11; p =

0,09; Figura 1).

60

40

20

Tempode encontro do estímulo (s) 0

Sem tricoma Com tricoma

Parte da folha

Figura 1. Tempo de encontro das formigas presentes em Tococa sp. com o local do causador do estímulo mecânico, nas folhas com e sem tricomas. As linhas conectam os dados dos tratamentos, com e sem tricomas de uma mesma folha.

301 Discussão

Diferente do esperado, a presença do tricoma não auxiliou a detecção da formiga, podendo não estar associado à amplificação dos estímulos mecânicos causados por herbívoros. Nas florestas, estímulos mecânicos como vento e galhos que caem de estratos superiores são frequentes. Desta forma, as formigas seriam estimuladas constantemente e teriam um grande gasto energético, inviabilizando a detecção de herbívoros por estímulos mecânicos. Assim, as formigas possivelmente possuem mecanismos que identificam estímulos mecânico específico do herbívoro para incitar a ação de defesa.

Insetos, em especial formigas, apresentam um reconhecimento químico muito desenvolvido (Holldobler & Wilson 1990). Estímulos mecânicos nem sempre são facilmente identificáveis quanto à origem do dano, quando comparados aos químicos.

Neste caso, a liberação de um composto volátil pela planta após sofrer danos, pode ser um estímulo mais intenso para as formigas do que estímulos mecânicos. A combinação destes dois estímulos (mecânico e químico) é mais eficiente no mecanismo de defesa anti-herbivoria.

Em interações mirmecófita, podem existir formigas parasitas no sistema, que levam a uma variação na qualidade da defesa anti-herbivoria em função da espécie da formiga hospedeira (Suarez et al. 1998, Gaume & McKey 1999, Bruna et al. 2004).

Desta forma, é possível que nestas plantas, existam tipos de defesas anti-herbivoria complementares às formigas mirmecófilas. Nesta situação os tricomas podem atuar juntamente com dureza e arquitetura foliar na defesa estrutural da planta, atuando como uma barreira física contra a herbivoria. Isso reduz o consumo das folhas pelos herbívoros (Coley & Barone 1996).

302 Agradecimentos

Gostaria de agradecer ao INPA e ao PDBFF pela oportunidade de realizar este curso.

Ao Programa de Pós-graduação em Ecologia e Conservação de Recursos Naturais da

Universidade Federal de Uberlândia por custear minhas despesas com passagens aéreas e alimentação. Ao Paulinho Mauravilhoso pelas horas de conversas e puxões de orelha.

Ao Paulinho rainbow máster por carinhosamente me lembrar que tenho relatórios para entregar (seus capetas, demônios!!!) e nas correções o quanto eu sou gonorrrrrante!!! A minha mais nova grande amiga Lorrhaynie Shayennie Vanessão por ser minha vizinha de rede, confidente e por tocar horas de terror no campo comigo.

Aos monitores Xexeu e Barbudinho por criarem novas categorias de vômitos nos relatórios e mostrarem que existe vida após os geradores. Ao Seu Jorge (porra!!!) e a

Dona Eduarda pela disposição e pelos bolos. As pessoas (não lembro quem) que me cederam o barbeador para depilar a Amazônia. A minha vizinha de rede Sarahhh que dava colo toda vez que eu precisava. A Tati-quebra-Ávres por me animar com um carinhoso abraço.

Ao Vidal, Vidalzinho (Tatu), Bruno, Carol, Aninha, Ludimila, Bianca, Conde,

Joseph, Lore, Renatinha, Leo e Randolfo, por me aturarem durante esse mês. Jamais imagina que naquele dia no micro-ônibus, nos tornaríamos tão próximos. Obrigada por compartilharem comigo essa loucura que foi o EFA.

Referências

Agrawal A.A. 1998. Leaf damage and associated cues induce aggressive ant recruitment

in a neotropical ant-plant. Ecology 79:2100–12

Beattie, A.J. 1985. The evolutionary ecology of ant-plant mutualisms. Cambridge:

Cambridge University Press.

303 Benson, W.W. 1985. Amazon ant-plants. In: Amazonia (T.E. Lovejoy ed.). Oxford:

Pergamon Press.

Benz, B.W., C.E. Martin. 2006. Foliar trichomes, boundary layers, and gas exchange in

the species of epiphytic Tillandsia (Bromeliaceae). J Plant Physiol, 163:648–656.

Bierregaard, R.O., C. Gascon, T.E. Lovejoy & R.C.G. Mesquita. 2001. Lessons from

Amazonia: the ecology and conservation of a fragmented forest. London: Yale

University press.

Bronstein, J.L. 1994. Our current understanding of mutualism. The Quarterly Review of

Biology, 69:31-51.

Brouat C., D. McKey, J.M. Bessiere, L. Pascal & M. Hossaert-McKey. 2000. Leaf

volatile compounds and the distribution of ant patrolling in an ant-plant protection

mutualism: preliminary results on Leonardoxa (Fabaceae: Caesalpinioideae) and

Petalomyrmex (Formicidae: Formicinae). Acta Oecol, 21:349–357.

Bruna, E.M., D.M. Lapola & H.L. Vasconcelos. 2004. Interspecific variation in the

defensive responses of obligate plant-ants: experimental tests and consequences

for herbivory. Oecologia, 138:558–565.

Choinski, J.S. & R.R. Wise. 1999. Leaf growth and development in relation to gas

exchange in Quercus marilandica Muenchh. J Plant Physiol,154:302–309.

Coley, P.D.& J.A. Barone. 1996. Herbivory and plant defenses in tropical forests.

Annual Review of Ecology in Systematics 27:305-335

Davidson D.W. & D. McKey. 1993. The evolutionary ecology of antplant relationships.

J Hymenopt Res, 2:13–83

Ehrlinger, J. 1984. Ecology and physiology of leaf pubescence in North American

desert plants. In: Biology and chemistry of plant trichomes (Rodriguez, E., P.L.

Healey & I. Mehta eds). New York: Plenum Press.

304 Gaume, L. & D. McKey. 1999. An ant-plant mutualism and its hostspecific parasite:

activity rhythms, young leaf patrolling, and effects on herbivores of two specialist

plant-ants inhabiting the same myrmecophyte. Oikos, 83:130–140

Hölldobler, B. & E.O. Wilson. 1990. The Ants. Massachusetts: Belknap Press.

Peel, M.C., B.L. Finlayson & T.A. Mcmahon. 2007. Updated world map of the Koppen-

Geiger climate classification. Hydrology and Earth System Sciences, 11:1633–

1644.

Schurch, S., M. Pfunder & B. A. Roy. 2000. Effects of ants on the reproductive success

of Euphorbia cyparissias and associated pathogenic rust fungi. Oikos, 88:6-12

Suarez, A.V., C. de Moraes & A. Ippolito. 1998. Defense of Acacia collinsii by an

obligate and nonobligate ant species: the significance of encroaching vegetation.

Biotropica, 30:480–482

Vasconcelos, H.L. 1991. Mutualism between Maieta guianensis Aubl. a myrmecophytic

meslatome, and one of its ant inhabitants: ant protection against insect herbivores.

Oecologia, 87:295–298

Vasconcelos, H.L. & A.B.Casimiro. 1997. Influence of Azteca alfari Ants on the

Exploitation of Cecropia Trees by a Leaf-Cutting Ant. Biotropica, 29:84-92.

305 Folha consumida é menos querida? Seleção de habitat de Aranhas Faiditus

subflavus (Theridiidae) por folhas de Maieta guianensis (Melastomataceae)

Randolpho Gonçalves Dias Terceiro

Introdução

A teoria de seleção de habitat assume que a seleção por tipos de habitat ocorre quando há uma maximização da aptidão individual (Revilla et al. 2000). Sendo assim, indivíduos que selecionem melhor o habitat aumentarão sua chance de sobrevivência e consequentemente sua reprodução (Orians 1991).

A decisão de indivíduos quanto à seleção de habitats disponíveis, pode ser influenciada por interações e pela disponibilidade de recursos (Revilla et al. 2000), como alimento e abrigo. Ambientes com maior quantidade de recursos, como maior diversidade de alimento e mais sítios para construção de abrigo devem ser favorecidos na escolha de habitat, pois ele aumenta o sucesso reprodutivo dos indivíduos.

Em aranhas, a disponibilidade de presas e sítios favoráveis para sua instalação, são fatores determinantes para a seleção do habitat (Souza 2007). Dentre os sítios favoráveis utilizados por estas espécies, destacam-se a serrapilheira e as plantas, que são usadas para instalação de suas teias. Nas plantas, a arquitetura pode proporcionar locais que são usados como abrigo para evitar predadores, locais de forrageamento, encontro de parceiros sexuais, acasalamento e oviposição, além de oferecer proteção contra dessecação e condições extremas de temperatura (Kuppers 1989). As aranhas selecionam as plantas através de informações visuais, táteis e olfativas (Romero &

Vasconselos-Neto 2007). Sendo assim, danos físicos nas folhas (visualmente perceptíveis) provocados por herbívoros podem ser indicativos indiretos de qualidade do habitat, pois podem sugerir a existência de intensa atividade de herbívoros na planta.

306 Na Amazônia Central, a aranha Faiditus subflavus é associada com plantas mirmecófitas do gênero Maieta guianensis (Kasper 2006). Estas plantas possuem estruturas denominadas domáceas que podem servir de abrigo e sítios para o estabelecimento de formigas que, em troca, defendem a planta contra ataque de herbívoros (Romero & Izzo 2004). Duas espécies de formiga são encontradas associadas a plantas do gênero Maieta, a Pheidole minutula e a Crematogaster laevis

(Vasconcelos 1993). As aranhas Faiditus subflavus costumam habitar a face abaxial das folhas de Maieta guianensis, próximo às entradas das domáceas (Kasper 2006), sendo também protegidas pelas formigas contra possíveis predadores e parasitas (Santos

2007). Sendo assim, a seleção de folhas para o estabelecimento de Faiditus subflavus, deve levar em consideração os danos físicos provocados por herbivoria, pois eles podem indicar uma baixa eficiência de proteção da planta pelas formigas, o que resulta em prejuízos para a aranha.

Baseado no fato de que aranhas Faiditus subflavus se estabelecem em Maieta guianensis, e que as formigas presentes nestas plantas protegem as ootecas e os indivíduos de F. subflavus, proponho a hipótese de que Faiditus subflavus irão selecionar folhas sem a presença de herbivoria. Assim, espero que a frequência de permanência de indivíduos de Faiditus subflavus será maior em folhas intactas do que em folhas danificadas.

Métodos

Área de estudo

Conduzi o estudo em uma área de floresta contínua na Reserva do Km 41, localizada 80 km ao Norte de Manaus, na Amazônia Central, Brasil. O local é classificado como uma

Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE). A ARIE é administrada pelo Instituto

307 Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e pelo Projeto de Dinâmica

Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF). A vegetação local é predominantemente de florestas de terra firme.

Delineamento amostral

Coletei 38 indivíduos adultos de Faiditus subflavus em indivíduos de Maieta guianensis. Cada indivíduo de F. subflavus foi inserido em diferentes indivíduos de M. guianensis distribuídos aleatoriamente no ambiente. Antes de instalar o experimento removi os outros indivíduos de F. subflavus que estavam naturalmente presentes na

Maieta guianensis. Do total de F. subflavus, inseri 19 indivíduos em folhas com evidência de herbivoria e 19 em folhas intactas. Para o experimento foram utilizadas folhas apicais dos indivíduos de M. guianensis. Marquei as folhas em que coloquei os indivíduos de F. subflavus com esmalte amarelo, e etiquetei os indivíduos de M. guianensis para posterior identificação. Após 24 h verifiquei o estabelecimento dos indivíduos de F. subflavus nas folhas em que foram inseridos. Contabilizei o número de indivíduos que permaneceram nas folhas intactas e danificadas.

Análise dos dados

Comparei a seleção de F. subflavus por folhas intactas e danificadas com um teste de

Qui-quadrado. Para tanto, utilizei a frequência de permanência de F. subflavus (variável resposta) nas folhas consumidas e não consumidas (variável preditora).

Resultados

Do total de 19 indivíduos inseridos em folhas intactas, nove permaneceram na folha

(47,37%) e 10 não permaneceram (52,63%). Nas folhas consumidas, 15 indivíduos

308 (78,95%) não permaneceram, e quatro indivíduos (21,05%) permaneceram nas folhas. A diferença entre as frequências de seleção de F. subflavus para permanência em folhas intactas e consumidas não foi significativa (χ2 = 2,92; gl = 1; p = 0,08; Figura 1).

Figura 1. Frequência de permanência da aranha Faiditus subflavus em folhas

consumidas e intactas de Maieta guianensis.

Discussão

Os resultados indicam que F. subflavus não seleciona as folhas em relação ao dano foliar. Como a formiga oferece proteção para as ootecas das aranhas contra predadores

(Santos 2007), a simples ocorrência das formigas pode sinalizar a qualidade do habitat para as aranhas. Sendo assim, a presença de formigas parece ser mais importante que o dano foliar, no processo de seleção de habitat por F. subflavus. Ainda, o padrão de distribuição de F. subflavus ocorre preferencialmente em plantas com uma alta quantidade de domáceas (Kasper, 2006). Esse fato pode estar associado à quantidade de formigas estabelecidas na planta hospedeira (Santos 2007).

309 Além disso, a aranha F. subflavus utiliza a base das folhas para a construção da teia (Kasper 2006). Sendo assim, provavelmente o dano foliar observado na região anterior da folha, não modifica o local para fixação das teias de F. subflavus (Oliveira et al. 2012). Esse fato reforça que a seleção de habitat não possui relação com o dano foliar, pois independente da área foliar consumida a aranha possui espaço para fixar a teia. Por fim, é possível que a seleção de habitat para o estabelecimento de Faiditus subflavus em Maieta guianensis se deva a presença de domáceas com formigas, sendo o aspecto de herbivoria na folha um fator irrelevante.

Agradecimentos

Gostaria de agradecer a todos os colegas que participaram do curso do EFA 2012! Em especial às pessoas que me ajudaram neste trabalho: Artur (Tatu ou Vidalzinho) pela ajuda em campo, escrita do texto e titulo do trabalho (VLW BROTHER); Leonardo

(Bigode de novela das seis) por me ajudar a coletar as aranhas; Lorena (Lore) por me ajudar a encontrar as Maietas e pela companhia na trilha “M”, a trilha mais punk do

KM-41; e aos monitores Manoela (Manu) e Tiago (Xexeu) pela paciência em corrigir este manuscrito e ideias!! Obrigado galera!

Referências

Kasper, D. 2006. Fatores ambientais que influenciam a ocorrência e abundância de

aranhas Faiditus subflavus (Theridiidae) em plantas do gênero Maieta

(Melastomataceae). In: Curso de campo ecologia da floresta amazônica (G.

Machado & J.L. Camargo, eds.). INPA/PDBFF, Manaus.

310 Kuppers, M. 1989. Ecological significance of above-ground architectural patterns in

Woody plants: a question of cost-benefit relationships. Trends in Ecology &

Evolution, 4:375:379.

Oliveira, L., R. Rocha, J. Hidasi & A. C. V. Pires. 2012. A aranha Faiditus subflavus

(Theridiidae) selecionam indivíduos de Maieta guianensis (Melastomataceae)

com menor dano foliar? In: Curso de campo ecologia da floresta amazônica (G.

Machado & J.L. Camargo, eds.). INPA/PDBFF, Manaus.

Orians, G.H. 1991. Preface. The American Naturalist, 137:1-4.

Revilla, E., F. Palomares & M. Delibes. 2000. Defining key habitats for low density

populations of Eurasian badgers in Mediterranean environments. Biological

Conservation, 95:269-277

Romero, G.Q. & T. J. Izzo. 2004. Leaf damage induces ant recruitment in the

Amazonian ant-plant Hirtella myrmecophila. Journal of Tropical Ecology,

20:675–682.

Romero, G.Q. & J. Vasconselos-Neto. 2007. Aranhas sobre plantas: dos

comportamentos de forrageamento às associações específicas, pp.67-88. In:

Ecologia e comportamento de aranhas (M.O. Gonzaga, A.J. santos & H.F.

Japyassú, eds.). Rio de janeiro: Interciência.

Santos, G.R. 2007. Babás ou guarda-costas: a formiga Pheidole minutula (Myrmicinae)

protege os filhotes ou as fêmeas da aranha Faiditus subflavus (Theridiidae)? In:

Curso de campo ecologia da floresta amazônica (G. Machado & J.L. Camargo,

eds.). INPA/PDBFF, Manaus.

Souza, A.L.T. 2007. Influência de estrutura do habitat na abundância e diversidade de

aranhas. pp.29-43. In: Ecologia e comportamento de aranhas (M.O. Gonzaga, A.J.

Santos & H.F. Japyassú, eds.). Rio de janeiro: Interciência.

311 Vasconcelos, H.L. 1993. Ant colonization of Maieta guianensis seedlings, an Amazon

ant plant. Oecologia, 95:439-443.

312 Quanto menor o guerreiro, maior a armadura: defesa estrutural em plantas com

diferentes tamanhos foliares

Renata Pimentel Rocha

Introdução

Plantas e insetos herbívoros representam grande parte da diversidade terrestre conhecida

(Farrel et al. 1992). A interação entre esses grupos de organismos é marcada por processos co-evolutivos, nos quais os herbívoros desenvolvem estratégias de ataque, enquanto as plantas desenvolvem defesas para combatê-los (Carmona et al. 2011).

As estratégias de defesa das plantas se baseiam em mecanismos que afetam negativamente a performance ou preferência do herbívoro por determinada planta

(Schaller 2008). Essas estratégias compreendem características morfológicas para defesa física da planta, como espinhos, tricomas, ceras, rigidez da epiderme, além de compostos de defesa química, como metabólitos secundários e proteínas que reduzem a digestibilidade (Schaller 2008). Esses mecanismos de defesa podem ser constitutivos ou induzidos mediante a ação do herbívoro (Schaller 2008).

Diante da diversidade de estratégias de proteção das plantas, herbívoros especialistas são mais eficientes em contornar as defesas das plantas e obter alimento, o que os torna capazes de crescer e se reproduzir mais rapidamente (Coley & Barone

1996). Um grupo de herbívoros altamente especializado é o dos parasitas endofíticos

(Schoonhoven et al. 2005). Esses insetos ovipõem nas folhas e suas larvas se estabelecem e desenvolvem no interior do tecido foliar. Os insetos minadores se alimentam consumindo o mesófilo foliar. Os galhadores induzem a formação de tumores que fornecem nutrientes, alimento e abrigo para os insetos (Schoonhoven et al.

2005).

313 O tamanho da folha é uma das características da planta que podem afetar o ataque de parasitas. Folhas maiores são mais frequentemente atacadas por parasitas endofíticos do que folhas menores (Passos et al. 2012). Folhas menores oferecem menos alimento para o inseto, o que pode limitar seu crescimento, desenvolvimento e reprodução, uma vez que esses insetos não podem migrar para outras folhas. Dessa forma, é possível que insetos que colonizassem folhas muito pequenas tenham sido selecionados negativamente e que, por isso, haja um tamanho foliar mínimo a partir do qual os insetos conseguem se estabelecer (Passos et al. 2012).

Plantas com folhas pequenas, por terem menor tendência a serem parasitadas, deveriam investir menos em mecanismos de defesa, de modo a alocar maior volume de recursos em crescimento e reprodução. Já plantas com folhas maiores, que sofreriam maior pressão de parasitismo, deveriam investir mais em mecanismos de defesa. Tendo em vista que as defesas estruturais da planta conferem à folha maior massa por unidade de área (Cornelissen 2003), espero que a massa foliar por área seja menor em plantas com folhas pequenas do que em plantas com folhas grandes.

Métodos

Desenvolvi este estudo em uma floresta tropical de terra firme, na borda da estrada ZF-

3, próxima à reserva do Km 41(02°40' S - 59°44' O), a 80 km ao norte de Manaus,

Brasil. Essa reserva está inserida na Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) do

Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos florestais (PDBFF).

Coletei ramos de todos os arbustos e árvores com até 2 m de altura, ao longo de um transecto de 500 m de comprimento, na borda da estrada ZF3. Classifiquei os ramos em morfotipos e calculei a área foliar da menor unidade destacável de cada planta

(folha, folíolo ou foliólulo). Na unidade foliar selecionada, medi o comprimento (c) e a

314 maior largura (l) com uma régua e com esses valores calculei a área (A) usando a fórmula da área de uma elipse (A = π * c/2 * l/2). Em seguida, selecionei uma folha ou conjunto de folíolos ou foliólulos de cada morfotipo, tendo como critério aquele que apresentasse o mínimo de área foliar danificada ou predada. Extraí três amostras de 4 cm2 de cada folha selecionada, evitando a nervura central. Em folhas pequenas, nas quais o procedimento não foi possível, utilizei a folha inteira. Sequei as amostras em um forno convencional, por 15 minutos e, em seguida, pesei com o auxílio de uma balança de alta precisão. Para obter a massa foliar por área (MFA) dividi o valor da massa seca obtida pela área da amostra pesada. Classifiquei as plantas amostradas em duas categorias, plantas com folhas pequenas (abaixo de 24 cm2) e plantas com folhas grandes (acima de 24 cm2). Para testar se a MFA de folhas pequenas é menor que a de folhas grandes, usei o teste de Mann-Whitney.

Resultados

Coletei 50 morfotipos de plantas, dos quais 21 pertenciam à categoria de folhas pequenas e 30 à categoria de folhas grandes. A área foliar média (±DP) foi de 6,92 ±

5,56 cm2 para as plantas com folhas pequenas e 201,89 ± 221,43 para as plantas com folhas grandes. A MFA média (±DP) para as plantas com folhas pequenas foi 0,0176 ±

0,0183 g/cm2 e 0,0059 ± 0,0015 g/cm2 para as plantas com folhas grandes. Os valores de

MFA diferem entre plantas com folhas pequenas e plantas com folhas grandes (U=197;

Z=-2,26; p=0,02). Ao contrário do esperado, folhas pequenas apresentaram MFA maior que folhas grandes (Figura 1).

315

Figura 1. Massa foliar por área unidade de área (MFA) de plantas com unidades foliares pequenas (área < 24 cm2) e grandes (área > 24 cm2). O quadrado pequeno representa a mediana, o grande abrange desde o primeiro ao terceiro quartil e as barras representam os valores mínimos e máximos para cada categoria.

Discussão

Plantas com folhas pequenas apresentaram maior MFA do que plantas com folhas grandes. Esse padrão indica que plantas com folhas pequenas alocam, em média, mais recursos para defesas estruturais do que plantas com folhas grandes. (Cornelissen et al.

2003). As plantas com folhas grandes, por sua vez, apresentaram baixo investimento em defesa estrutural, apesar da alta incidência de parasitismo (Passos et al. 2012). A maior parte dos danos por herbivoria ocorre em folhas jovens, nas quais os mecanismos de defesa estrutural ainda não estão completamente desenvolvidos (Aide 1992). Em folhas grandes, essa fase de vulnerabilidade deve ser mais longa do que em folhas pequenas, o que pode deixá-las mais susceptíveis a colonização por parasitas. Dessa forma, é possível que o investimento em defesa estrutural não seja uma estratégia eficiente para

316 plantas com folhas grandes. Além disso, quanto mais reforçada for a estrutura da folha, maior é seu peso e, consequentemente, maior o custo para sua sustentação. Nesse caso,

é provável que plantas com folhas grandes invistam preferencialmente em mecanismos de defesa induzida diante de ataques por parasitas.

A tendência de maior MFA nas plantas com folhas pequenas indica que o menor parasitismo nelas (Passos et al. 2012) deve ocorrer devido a seu investimento em defesa estrutural. Por outro lado, a variação nos valores de MFA para esse grupo pode indicar o emprego de diferentes estratégias diante do ataque de parasitas. As plantas com maior

MFA são aquelas que investem muito defesas estruturais, enquanto as que apresentam menor MFA são aquelas em que esse investimento é pequeno. Folhas pouco protegidas em geral têm vida útil curta e uma capacidade fotossintética alta (Wright et al. 2002).

Sendo assim, não é vantajoso para a planta investir em defesa estrutural em folhas com vida útil curta, mas sim em obtenção de energia e crescimento.

Agradecimentos

Ao Paulinho Peixoto (Rainbow master) pela idéia do projeto e orientação no delineamento amostral. Ao Paulinho Bobrowiec (Batman) pelas explicações e discussões ao longo do desenvolvimento do projeto. Aos dois Paulinhos pela oportunidade de participar do curso, pela atenção e apoio constantes, orientação, e ensinamentos. Ao Marcell Caritavas (Baby) pela ajuda constante ao longo do projeto, desde a identificação dos morfotipos, discussão das idéias e resultados, correções afiadas, além de todas as piadinhas e implicâncias. Ao Vidal Carrascosa pela eficiente ajuda durante a coleta, apoio constante nos momentos complicados e alto astral garantido em todos os momentos. Ao Daniel Passos (Lagartão) pelas excelentes contribuições para o trabalho com discussões e conselhos, além da animação

317 contagiante. A Tatiane Menezes (Samara), Joselândio Santos (Joseph), José Hidasi

(Harry Potter) e Artur Madeira (Tatu) pela ajuda ao longo do projeto. Aos monitores,

Thiago Kloss (Beluga Xexéu Gloss) e Marcos Vieira (Barbudo) pela presença constante, apoio, ensinamentos, críticas incisivas, correções maldosas, além dos ótimos momentos de convivência. A todos colegas alunos, monitores e professores do EFA

2012 pelos momentos únicos e inesquecíveis.

Referências

Aide, M.T. 1992. Dry season leaf production: an escape from herbivory. Biotropica,

24:532-537.

Carmona, D., M.J. Lajeunesse & M.T.J. Johnson. 2011. Plant traits that predict

resistance to herbivores. Functional Ecology, 25:358–367

Coley, P.D. & J. A. Barone. 1996. Herbivory And Plant Defenses In Tropical Forests.

Annual Review of Ecology Evolution and Systematics, 27:305-35.

Cornelissen, J.H.C., S. Lavorel, E. Garnier, S. Díaz, N. Buchmann, D.E. Gurvich, P.B.

Reich, H. ter Steege, H.D. Morgan, M.G.A. van de Heijden, J.G. Pausas & H.

Poorter. 2003. A handbook of protocols for standardised and easy measurement of

plant functional traits worldwide. Australian Journal of Botany, 51:335-380.

Farrell, B.D., C. Mitter & D.J. Futuyma. 1992. Diversification at the insect-plant

interface. BioScience, 42:34-42.

Passos, D.. T. Calaça, L. Pinto & V. Carrascosa. 2012. Plantas com folhas menores

impedem o estabelecimento de minas e galhas In: Curso de campo ecologia da

floresta amazônica (Peixoto, P.E.C & B.E.D Bobrowiec, eds.). INPA/PDBFF,

Manaus.

Schaller, A. 2008. Induced plant resitence to herbivory. Berlim: Springer.

318 Schoonhoven, L.M., Van Loon, J.J.A., Dicke, M. 2005. Insect-plant biology.New York:

Oxford University Press.

Wright, I.J., M. Westoby & P.B. Reich. 2002. Convergence towards higher leaf mass

per area in dry and nutrient-poor habitats has different consequences for leaf life

span. Journal of Ecology, 90: 534–543.

319 A resposta de captura em uma aranha orbitela aumenta com a redução do valor

da presa

Sarah Freitas Magalhães Silva

Introdução

A obtenção de alimento envolve gastos de tempo e energia para os animais. A teoria do forrageamento ótimo (MacArthur & Pianka 1966) afirma que estratégias que otimizem o balanço entre os custos e benefícios do forrageio devem ser favorecidas pela seleção natural. A minimização de custos pode estar associada a uma redução no tempo de busca e manipulação da presa, enquanto a maximização dos benefícios pode estar associada a um aumento na qualidade nutricional da presa (MacArthur & Pianka 1966).

Uma das estratégias possíveis de forrageio que minimiza o tempo de busca por presas é a do tipo senta-e-espera, caracterizada por um baixo gasto energético (Huey &

Pianka 1981). Além de minimizar o gasto energético do forrageio, animais que adotam essa estratégia têm uma redução no risco de predação, já que ficam menos expostos aos predadores. Por outro lado, a obtenção diária de energia é baixa, quando comparada à de forrageadores que buscam ativamente por suas presas (Pough et al. 1999).

Em aranhas, o forrageio senta-e-espera está associado à produção de teias, que permitem que elas detectem e subjuguem suas presas sem a necessidade de se deslocarem em busca delas (Vieira et al. 2007). Aranhas têm a capacidade de conhecer características da presa, como a massa ou o grau de atividade (Suter 1978), com base na vibração provocada em suas teias (Vieira et al. 2007). Por serem capazes de distinguir suas presas, as aranhas podem ajustar as formas de captura de acordo com o tipo de presa (Vieira et al. 2007).

320 O uso de teias para obter alimento é bastante disseminado entre vários grupos de aranhas, e a estrutura das teias apresenta uma ampla variação (Vieira et al. 2007).

Algumas espécies de aranha da família Araneidae constróem teias orbiculares dotadas de abrigos que as protegem de possíveis predadores (Gonzaga 2007). Observei uma espécie de aranha da família Araneidae que constrói um abrigo na parte superior da teia, feito por fio de seda e detritos de matéria orgânica. Assumindo que essas aranhas têm a capacidade de discriminar suas presas, avaliei se o comportamento de forrageio de uma espécie de aranha dessa família pode ser mediado pelo valor da presa. O valor de uma presa é dado pela razão entre o tamanho da aranha e o tamanho da presa. Assim, quanto maior o valor da presa, maior deveria ser a probabilidade de as aranhas deixarem o abrigo para capturar a presa. Desse modo, testei a previsão de que diante de uma presa de tamanho fixo no centro da teia, aranhas menores saem do abrigo para obter o recurso com mais frequência que aranhas maiores.

Métodos

Conduzi o estudo em uma floresta contínua de terra firme localizada na Reserva do Km

41 (02°24’ S – 59°44’ O) administrada pelo Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos

Florestais (PDBFF), localizada a cerca de 80 km ao norte de Manaus, Amazônia

Central, Brasil. A vegetação é do tipo floresta ombrófila úmida. A temperatura média anual é de 26,7 ºC, com precipitação média anual de 2.186 mm, sendo julho a setembro o período mais seco, com precipitação de aproximadamente 100 mm/mês (Lovejoy &

Bierregaard 1990).

Na área de estudo, busquei ativamente por teias de uma espécie de aranha da família Araneidae. As teias são caracterizadas por um abrigo construído na parte superior da teia. Para testar a minha previsão, forneci cupins, de um mesmo ninho e de

321 comprimentos semelhantes, como presas para as aranhas. Escolhi cupins como presas porque tinham tamanho semelhante ao das aranhas menores, de modo que mesmo as aranhas menores deveriam ser capazes de manipular a presa. Em 23 teias, coloquei um cupim no ponto mais central de cada teia e observei, por 10 minutos, a resposta das aranhas na presença da presa. Esse experimento foi realizado no período noturno. Após o experimento em campo, coletei todos os indivíduos de aranha para medir o comprimento total (da cabeça até o final do abdómen) com o auxílio de um paquímetro, usei essa medida, devivo ao diminuto tamanho dos indivíduos. Para avaliar se a probabilidade de deixar o abrigo diminui conforme aumenta o tamanho da aranha, realizei uma regressão logística, sendo o comprimento das aranhas a variável preditora e a saída ou não do abrigo em direção à presa, a variável resposta.

Resultados

O comprimento das aranhas variou de 1,16 a 6,61 mm. A partir da distribuição dos dados, considerei duas categorias de tamanho: menores, com comprimento variando entre 1,16 a 2,84 mm e maiores, com comprimento de 5,1 a 6,61 mm. A probabilidade de a aranha sair do abrigo aumenta à medida que aumenta o comprimento do cafalotórax da aranha (χ²=15,909; gl=1; p<0,01; Figura 1). Embora não tenham deixado o abrigo para capturar a presa, as aranhas menores tentaram pescar as presas de dentro do abrigo, através dos fios de seda, sem obter sucesso.

322

Figura 1. Regressão logística da resposta das aranhas à presença de uma presa (cupim) na teia em função do comprimento das aranhas. 1 corresponde à saída do abrigo e 0 à permanência no abrigo.

Discussão

A probabilidade de a aranha sair do abrigo aumentou conforme diminuiu o valor da presa. De acordo com MacArthur & Pianka (1966), o ganho líquido de um item alimentar se dá pela razão entre o conteúdo energético e o tempo de manipulação.

Assim, embora as presas utilizadas no experimento representem um conteúdo altamente energético para aranhas pequenas, elas podem representar um custo de manipulação maior para aranhas menores do que para aranhas maiores.

Uma explicação alternativa está relacionada ao fato de que estratégias de forrageio podem sofrer mudanças decorrentes da pressão de predação (Krebs & Davies

1993). Gonzaga & Sobczak (2007) demonstraram que aranhas maiores podem ser mais efetivas em se defender de predadores. Uma vez que deixar o abrigo significa se expor a potenciais predadores, isso pode explicar o fato de as aranhas maiores terem deixado o abrigo em busca da presa com mais frequência do que as aranhas menores.

323 Meus resultados mostraram que aranhas maiores, provavelmente mais velhas, capturaram presas com mais frequência que aranhas menores, provavelmente mais jovens. Assim, é possível que aranhas mais jovens tenham outras estratégias de forrageio, como se alimentarem de presas que caiam mais próximas ao abrigo ou que sejam menores e menos custosas para manipular.

Agradecimentos

Agradeço ao PDBFF/INPA por oferecer um curso de alta qualidade e extremamente importante para a formação de um pesquisador. Aos Paulinhos, que parecem enxergar nesse curso uma missão e por isso compartilham tanto conhecimento conosco! Ao

Rainbow Master- mamis de coração- obrigada por ensinar com tanta diversão, por puxar a orelha com tanto carinho, tornando o processo um pouco mais fácil. Por sempre nos lembrar de que tudo que foi vivido aqui não irá se repetir, nos fazendo tentar aproveitar cada momento, como treinar a sensualidade da reconquista, dançar funk na mesa e deixar a dignidade na rede! Ao Paulinho Batman- papis de coração- obrigada por conseguir disfarçar todo o stress e ainda conseguir conversar coisas da vida e falar besteira também! Ao Thiago namorado, que me incentivou a me inscrever para o curso e não deixou que eu desistisse! Ao Thiago amigo, que suportou todas as minhas crises de enxaqueca e existenciais! Ao Thiago monitor, que me acompanhou pacientemente no campo durante esse PI, que foi executado durante a noite! Aos amigos Joseph e

Leozinho, que facilitaram muito a minha vida durante esse tempo por aqui... Juntos conseguimos mudar o critério de seleção do EFA: tem que ser de Montes Claros!

À dupla dinâmica Shayenne Lohrraynny e Mari Exu, vizinhas de rede e companheiras de uma relação poligâmica... Muito obrigada por cada risada que dei com vocês! À Tati (Ávres), pelas brincadeiras e conversas sobre saudade. À Carol (Da Silva)

324 pelas conversas de besteira e de coisa séria também! À Dani Atoladinha por cada bilhetinho do amor e cada verso de cordel, que nos desestressaram tanto nos momentos de desespero! À Renatinha Pocket, por sempre me deixar com a auto-estima elevada, dizendo que sempre estou cheirosa, até mesmo no 40 e úmido! À Loris, organizadora das festas, por ser um doce de pessoa e pela risadinha que faz a gente dar risada! À todos os colegas de turma do EFA 2012 que foram minha família durante esses 30 anos, obrigada por tornarem esse tempo tão feliz e inesquecível! Ao monitor barbudo e bipolar que, apesar de não ser meu monitor favorito, teve muita paciência comigo (ou pelo menos fingiu ter) e me ensinou muito! Ao Marcel (Baby) pelas correções no manuscrito! Ao Moranguinho do Nordeste, que nos ensinou muito com muita diversão!

Aos professores orientadores de POs: Felipe Melo, Cassiano Rosa, Thiago Kloss e

Marcos Vieira. Aos demais professores que acrescentaram novos conhecimentos das mais diversas áreas: Toyoyo, Cassiano, Dé, Catá, Jack Sparrow, Marcel, Glauco,

Jansen, Manu, Ana, Aline, Ester, Mike, Márcio e Adriano. À Dona Eduarda pelo olhar carinhoso de vó e por garantir a nossa energia a cada dia! Ao Seu Jorge pela

“delicadeza” e pelo suco de caju gelado de todo santo dia! Por último, mas jamais menos importante, agradeço aos amigos Alline Mendes, Maria Luiza e Thiago Silva, que estão cuidando da minha vida lá fora enquanto estou aqui vivendo nesse universo paralelo!

Referências

Gonzaga, M.O. 2007. Inimigos naturais e defesas contra predação e parasitismo em

aranhas, pp. 209-237. In: Ecologia e comportamento de aranhas (M.O. Gonzaga,

A.J. Santos & H.F. Japyassú, eds.). Rio de Janeiro: Editora Interciência.

325 Gonzaga, M.O. & J.F. Sobczak. 2007. Parasitoid-induced mortality of Araneus

omnicolor (Araneae, Araneidae) by Hymenoepimecis sp. (Hymenoptera,

Ichneumonidae) in southeastern Brazil. Naturwissenschaften, 94:223-227.

Huey, R.B & E.R. Pianka. 1981. Ecological consequences of foraging mode. Ecological

Society of America, 62:991-999.

Krebs, J.R. & N.B. Davies. 1993. An introduction to behavioural ecology. Oxford:

Blackwell Publishing.

Lovejoy, T.E. & R.O. Bierregaard. 1990. Central Amazonian forests and the minimal

critical size of ecosystems project, pp. 60‐71. In: Four Neotropical Rainforests

(A.H. Gentry, ed.). London: Yale University Press.

MacArthur, R.H. & E.R. Pianka. 1966. On optimal use of a patchy environment.

American Naturalist, 100:603-609.

Pough, F.H, C.M. Janis & J.B. Heiser. 1999. A vida dos vertebrados (2ª edição).

Atheneu: São Paulo.

Suter, R.B. 1978. Cyclosa turbinate (Araneae: Araneidae): prey discrimination via web-

borne vibration. Behavioral Ecology and Sociobiology, 3:283-296.

Vieira, C., H.F. Japyassú, A.J. Santos & M.O. Gonzaga. 2007. Teias e forrageamento,

pp. 45-65. In: Ecologia e comportamento de aranhas (M.O. Gonzaga, A.J.

Santos & H.F. Japyassú, eds.). Rio de Janeiro: Editora Interciência.

326 Árvores grandes limitam o tamanho de suas vizinhas?

Tatiane Gomes Calaça Menezes

Introdução

Interações entre plantas tem um papel importante no estabelecimento, crescimento e desenvolvimento das espécies vegetais. Essas interações podem ser positivas ou negativas e atuam em diferentes fases do ciclo de vida (Ewel & Hiremath 2005).

Interações positivas são aquelas em que pelo menos uma das espécies que interage é beneficiada, sem prejuízos à outra. Exemplo disso é a facilitação, que ocorre quando a presença de uma espécie altera as condições físicas do ambiente, como o microclima, proporcionando um sítio favorável ao estabelecimento de outra espécie (Ricklefs 2003).

Já as interações negativas são aquelas em que uma das espécies envolvida na interação é prejudicada. Por exemplo, a competição por recursos comuns, onde uma espécie ou indivíduo limita ou impede o crescimento de uma planta vizinha já estabelecida (Ewel

& Hiremath 2005).

O crescimento e desenvolvimento das plantas são influenciados por fatores ambientais como disponibilidade de luz, água e nutrientes (Poorter 2005). Esses fatores agem em conjunto, e a intensidade da influência de cada um deles sobre as espécies varia entre os diferentes tipos de ambiente. Em ambientes onde os recursos são sazonais, como as florestas secas, a disponibilidade de água pode representar o maior fator limitante ao crescimento e desenvolvimento das plantas quando comparado a outros recursos. Porém, em ambientes sem mudanças sazonais marcantes, como nas florestas tropicais úmidas, recursos como água e luz deixam de ser limitantes ao estabelecimento das espécies e as interações entre espécies passam a ter maior

327 importância na determinação de quais espécies conseguem se desenvolver (Lieberman

& Lieberman 2007).

Em florestas tropicais, muitas interações planta-planta resultam em impactos negativos para pelo menos uma das espécies, pois elas competem por recursos comuns

(Ewel & Hiremath 2005). Nestas florestas altamente diversas, interações entre plantas são bastante frequentes e sua coexistência depende basicamente da disponibilidade de espaço físico (Lieberman & Lieberman 2007). Nestes ambientes, a influência de uma planta estabelecida sobre suas vizinhas pode ser alta. Entre árvores, a competição por recursos, como a radiação solar, pode resultar em um padrão de variação de tamanho entre espécies próximas espacialmente. Isso se deve a penetração diferencial de luz no interior da floresta que varia em função da abertura do dossel (Brown 1993). A intensa competição por luz gera uma corrida ascendente em direção ao dossel, onde este recurso

é abundante, maximizando o potencial de crescimento das plantas (Westoby 1998).

Dessa forma, árvores maiores diminuem a quantidade de luz que as árvores, logo abaixo da influência de sua copa, recebem, e podem limitar o crescimento destes indivíduos.

Desse modo, é razoável esperar que a influência de uma árvore sobre o crescimento de árvores vizinhas localizadas abaixo da sua copa seja maior com o aumento do tamanho desta árvore. Assim, meu objetivo foi avaliar se a presença de uma

árvore grande tem influência sobre o tamanho das árvores vizinhas, numa floresta tropical onde a radiação solar no sub-bosque é um recurso limitado por espécies maiores. Se a relação de interferência planta – planta é verdadeira, espero que (i) com o aumento da circunferência à altura do peito (CAP) das árvores focais, a variação do

CAP das árvores vizinhas seja menor e que (ii) com o aumento da distância da árvore focal, o CAP das árvores vizinhas seja maior.

328 Métodos

Área de estudo

Realizei o estudo na Área de Relevante Interesse Ecológico do Projeto Dinâmica

Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF), no sítio km 41. A área está localizada na

Amazônia Central à aproximadamente 80 km ao norte da cidade de Manaus, Brasil. O clima da região é tropical úmido de acordo com a classificação de Köppen (Peel et al.

2007), a precipitação média anual é de 2.186 mm e a temperatura média anual é de 26,7

ºC (Lovejoy & Bierregaard 1990). A vegetação da área é caracterizada como floresta tropical úmida de terra firme e pelo relevo podemos identificar três habitats: platô, vertente e baixio. Os platôs ocupam os locais mais altos e planos, com solos argilosos e bem drenados. Os baixios ocupam as áreas de relevo mais baixo, sujeitas a pulsos de inundação. E as vertentes são faixas de transição entre essas áreas de maior e menor altitude (Ribeiro et al. 1999). Para fins de controle da variação de características ambientais, utilizei apenas áreas de platô neste estudo.

Coleta dos dados

Esta reserva possui trilhas a cada 100 m nas direções norte-sul e leste-oeste. Utilizei 3 trilhas como transecto e em cada trilha percorri cerca de 300 metros. A cada 10 m me distanciei pelo menos 7 m da trilha e selecionei o indivíduo de maior CAP como árvore focal. Para cada planta focal, marquei nas direções norte, sul, leste e oeste, a árvore vizinha mais próxima. No total, utilizei 80 conjuntos de árvores, cada um composto por uma árvore focal e quatro árvores vizinhas. Mensurei a circunferência à altura do peito

(CAP) de cada árvore amostrada e medi a distância da árvore focal para cada planta vizinha selecionada. Utilizei como critério de seleção da árvore focal o CAP mínimo de

15 cm e para as vizinhas, a altura mínima de 1,5 e/ou CAP de 3,5 m, com o objetivo de

329 evitar plantas jovens que ainda não se estabeleceram completamente. Utilizei o CAP da

árvore focal e das árvores vizinhas como indicativo do tamanho das plantas, uma vez que esta variável está intimamente relacionada com a altura das árvores.

Análise dos dados

Para testar se o tamanho de uma árvore vizinha era explicado pela distância ou pelo

CAP da árvore focal fiz uma regressão múltipla. Para isso, sorteei apenas uma árvore vizinha por conjunto. Para testar se a árvore focal influencia o tamanho das árvores vizinhas, fiz uma ANCOVA utilizando o CAP da árvore focal como variável preditora e o desvio padrão do CAP de cada conjunto de árvores vizinhas como variável resposta.

Esta variável resposta expressa uma medida da variação de tamanho da amostra de

árvores vizinhas. Para essa análise, usei a distância da árvore focal como co-variável.

Resultados

O CAP das árvores focais variou entre 15 e 290 cm, com média e desvio padrão de

78,83 ± 55,74 cm. As árvores vizinhas apresentaram CAP entre 3,5 e 130 cm com média e desvio padrão de 19,44 ± 19,42 cm. A distância das árvores vizinhas à árvore focal variou entre 0,01 e 6 m. O CAP das árvores focais não influenciou o tamanho de suas vizinhas (F(1,77) = 2,36; p = 0,128), porém o CAP das árvores vizinhas foi maior com o aumento da distância da árvore focal (F(1,77) = 8,78; p = 0,004; Figura 1).

330

Figura 1. Relação entre a distância da árvore focal com os resíduos da regressão entre o

CAP da árvore focal e CAP de sua vizinha direta, em uma floresta de terra firme na

Amazônia Central, Manaus, Brasil.

O desvio padrão do CAP das árvores vizinhas foi maior em árvores focais de maior CAP (F(1,77) = 7,56; p = 0,007; Figura 2).

Figura 2. Relação entre a circunferência à altura do peito (CAP) das árvores focais com o desvio padrão do CAP das árvores vizinhas diretas na Amazônia Central, Manaus,

331 Brasil. Cada ponto refere-se a um bloco formado por uma focal e quatro árvores vizinhas.

Discussão

Árvores maiores não representam um impedimento ao desenvolvimento das plantas vizinhas. Isso foi evidenciado pelo aumento da variação do CAP das árvores vizinhas com o aumento do CAP da árvore focal, contrariando minha previsão. Entretanto,

árvores maiores limitam o crescimento das árvores vizinhas, já que existe uma relação entre o tamanho do CAP das árvores vizinhas e o aumento da distância da árvore focal.

Uma possível explicação para esse padrão é que uma árvore grande pode consumir boa parte da luz e nutrientes disponíveis no ambiente próximo, diminuindo a disponibilidade desses recursos para plantas que estão sob a influência de sua copa. Desse modo,

árvores de diferentes tamanhos e variadas estratégias de crescimento e captação de recursos podem se estabelecer tentando se desenvolver sob a influência espacial dessa

árvore de grande porte.

Diferente do esperado, com o aumento do tamanho da árvore focal, a variação do tamanho das árvores vizinhas também aumentou. À medida que a copa de uma

árvore se eleva, a influência de seu sombreamento parece diminuir. Árvores maiores permitem lacunas por onde a radiação solar pode penetrar. Isso pode explicar a formação de um gradiente vertical de luminosidade (Poorter 2005). Assim, árvores maiores podem abrigar uma maior variação de tamanho entre suas vizinhas próximas, devido a um gradiente de luminosidade decorrente da penetração diferencial de luz na floresta através da sua copa. Esse fenômeno pode levar a um gradiente de tamanho de

árvores.

332 Diante desse gradiente de árvores de diferentes tamanhos pode se estabelecer uma sucessão em pequena escala. Quando a árvore maior perece por queda ou morte provocada por qualquer perturbação, tem início uma corrida pela luz (Lieberman &

Lieberman 2007). A árvore de maior tamanho entre os vizinhos deve ocupar a lacuna aberta, deixando seu nicho, que passa a ser ocupado pela árvore de tamanho inferior a ela. O que se vê então, é uma sucessão oportunista, onde lacunas vão sendo abertas e preenchidas de acordo com o gradiente de tamanho das árvores. Portanto, embora uma

árvore grande não represente um obstáculo ao desenvolvimento de suas vizinhas menores, ela controla o processo de sucessão em pequena escala das árvores sob sua influência direta.

Agradecimentos

Agradeço aos coordenadores do EFA 2012 (Paulo Enrique, Paulo Estefano e Zé) pela oportunidade de poder desfrutar dos encantos da Amazônia de uma forma tão intensa e marcante. Com certeza, esta foi uma experiência marcante, construtiva e encantadora jamais vivida antes. Aos monitores Thiago e Marcos, pelas conversas e prontidão a tirar dúvidas sempre. A todos os professores que nos transmitiram o melhor de si nestes 30 dias: Ester, Felipe (Moranguinho do Nordeste), Márcio (Richard Gere), Mike, Tiago

(Toyoyo), Jansen, Aline, Catá, André, Fabrício (Jack Sparrow), Adriano, Marcel e

Glauco. À Dona Eduarda e seu Jorge, pelas comidinhas gostosas e carinho para comigo em todo este período. Em especial, ao Paulinho Rainbow, por todo exemplo de dedicação e amor pelo que faz que pude testemunhar nestes 30 dias. Teu exemplo me inspira profundamente, obrigada por todos os ensinamentos. Ao Paulinho Mau, por toda a paciência e críticas que só contribuíram para minha formação.

333 Aos amigos que fiz. Obrigada por tornarem estes 30 dias tão maravilhosos e incríveis. Vocês tem lugar em meu coração para sempre: À Lorena (Lori), Ana Rorato

(Maria Betânia), Mari (Exú), Sarah, Carol (Missbalde na cerveja quente), Cibele

(Condessa Lorraynie), Ana Carol (Pezinho de ouro), Renatinha (Pockett), ao Joselândio

(Joseph). Obrigada pelas conversas, pelas brincadeiras, resenhas, risadas, pelo carinho e atenção, amo todos vocês. A todos os colegas do EFA 2012 com quem convivi este mês: Daniel (Lagartão), Artur (Tatu), Dani (Atoladinha), Bianca, Ludmilla, Bruno,

Vidal, Hidasi (Harry Potter), Léo (Mr. Bigodinho) e Randolpho (Hobbit). Ao meu anjo(a), pelos presentinhos e bilhetinhos que me alegraram no decorrer destes dias.

Agradeço a todos que me ajudaram na elaboração e execução deste projeto, assim como nas análises e discussões. Aos professores, Adriano Melo, Marcel Bebê,

Paulinho Rainbow e Paulinho Mau e aos monitores Marcos (monitor Barbudo) e Thiago

(Xexéu) pela ajuda na concepção da ideia. À Bianca, pela ajuda no trabalho de campo, à

Missbalde no Igarapé e Rainbow Master, por ajudar a planilhar os dados. Ao Paulinho

Rainbow, pela análise dos dados. Ao Marcel, Carol (Missbalde nos mícuins) e Paulinho

Mau pelas discussões. Aos corretores Ana (alto clero) e Xexéu, pelas preciosas intervenções.

Referências

Brown, N. 1993. The implications of climate and gap microclimate for seedling growth

conditions in a Bornean lowland rain forest. Journal of Tropical Ecology,

9:153–168.

Ewel, J.J. & A.J. Hiremath. 2005. Plant-plant interactions in tropical forests. In: Biotic

interactions in the tropics: Their role in the maintenance of species diversity

334 (Burslem, D., M. Pinard & S. Hartley, eds.), Ecological Reviews. New York:

Cambrindge University Press.

Lieberman, M. & D. Lieberman. 2007. Nearest-neighbor tree species combinations in

tropical forest: the role of chance, and some consequences of high diversity.

Oikos, 116:377-386.

Lovejoy, T.E. & R.O. Bierregaard. 1990. Central Amazonian forests and the minimal

critical size of ecosystems project, pp. 60‐71. In: Four Neotropical Rainforests

(A.H. Gentry, ed.). London: Yale University Press.

Peel, M.C., B.L. Finlayson & T.A. Mcmahon. 2007. Updated work map of the Köppen

–Geiger climate classification. Hydrology and Earth System Sciences, 11:1633-

1644.

Poorter, L. 2005. Resource capture and use by tropical forest tree seedlings and their

consequences for competition. In: Biotic Interations in the tropics: Their role in

the maintenance of species diversity (Burslem, D., M. Pinard & S. Hartley,

eds.), Ecological Reviews. New York: Cambrindge University Press.

Ribeiro, J.E.L.S., M.J.G. Hopkins, A. Vicentini,C.A. Sothers, M.A. Costa, J.M. Brito,

M.A.D. Souza, L.H.P. Martins, L.G. Lohmann, P.A.C.L. Assunção, E.C.

Pereira, C.F.D. Silva, M.R. Mesquita & L.C. Procópio. 1999. Flora da Reserva

Ducke: guia de identificação das plantas vasculares de uma floresta de terra-

firma na Amazônia Central. Manaus: INPA.

Ricklefs, R.E. 2003. A economia da natureza. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan.

Westoby, M. 1998. A leaf-height-seed (LHS) plant ecology strategy scheme. Plant and

Soil, 199:213-227.

335 Qual é a influência da qualidade do macho da espécie Chalcopteryx scintilans

(Odonata: Polythoridae) no tempo de luta por um território?

Vidal C. Carrascosa

“Não é a espécie mais forte que sobrevive, nem a mais inteligente, mas sim a que

melhor responde às mudanças.” (Charles Darwin)

Introdução

Machos de muitas espécies animais frequentemente brigam pela posse de territórios de acasalamento (Arnott & Elwood 2008). Nessas brigas, os machos vencedores normalmente são aqueles com melhor capacidade de luta (Mesterton-Gibbons et al.

1996). Portanto, possuir um território é um indicativo de maior qualidade do macho, já que ele foi capaz de vencer o dono anterior do território (Mardem & Cobb 2004,

Plaistow & Siva-Jothy 1996).

A capacidade de luta do macho pode ser determinada por vários fatores como tamanho corporal (Mesterton-Gibbons et al. 1996), quantidade de gordura estocada

(Mesterton-Gibbons et al. 1996, Plaistow & Siva-Jothy 1996), qualidade do sistema imunológico (Mardem & Cobb 2004) ou quantidade de confrontos vencidos (Keil &

Watson 2010). Porém, a característica determinante da capacidade de luta pode depender dos comportamentos empregados durante os confrontos. Em combates com contato físico, por exemplo, traços determinantes de força devem ter um grande peso na definição do vencedor. Por exemplo, aranhas que possuem mais de 15% de massa em relação aos seus oponentes normalmente são as vencedoras dos confrontos com contato físico (Keil & Watson 2010). Por outro lado, em brigas sem contato físico, a persistência na luta pode se tornar mais importante que a força para determinar a vitória.

336 Assim traços como a quantidade de gordura estocada podem determinar o vencedor

(e.g. Plaistow & Siva-Jothy 1996).

Em algumas espécies, existem características que, apesar de não determinarem a capacidade de luta, podem estar correlacionadas com os traços que determinam a chance de vitória do macho, podendo atuar como pistas indiretas da qualidade do oponente. A pigmentação, em particular, é uma característica muito conspícua em machos de diversas espécies (Contreras-Garduño et al. 2006, Schultz & Fincke 2009).

Nas libélulas, por exemplo, a quantidade de pigmento das asas está correlacionada com a qualidade dos machos bem como sua capacidade de ganhar brigas (Contreras-Garduño et al. 2006). Assim, em confrontos sem contato físico, a pigmentação de um macho pode ser uma característica que indique a sua quantidade de reserva energética, caso as brigas sejam decididas com base na capacidade de persistência.

Machos de libélula geralmente apresentam colorações conspícuas e usam a visão como principal sentido sensorial (Córdoba-Aguilar 2008). Em muitas espécies os machos defendem um território de acasalamento, sendo que os indivíduos com sistema imunológico mais eficiente (Contreras-Garduño et al. 2006) e com maior quantidade de gordura estocada (Plaistow & Siva-Jothy 1996) tendem a vencer os confrontos. Um sistema imunológico mais eficiente indica uma maior resistência ao ataque por patógenos e assegura maior eficiência no embate (Mardem & Cobb 2004). O estoque de gordura, por sua vez, proporciona ao indivíduo uma maior quantidade de energia, que garante uma maior persistência na luta (Fitzstephens & Getty 2000). Uma característica perceptível pelo coespecífico, correlacionada com a gordura e imunologia, é a cor do indivíduo (Fitzstephens & Getty 2000). Produzir pigmentos acarreta um custo energético alto. Consequentemente, a quantidade de pigmentos produzidos por um

337 indivíduo tende a ser um estimador confiável da sua capacidade de luta (Fitzstephens &

Getty 2000).

A espécie Chalcopteryx scintilans é comum em riachos da floresta amazônica.

Os machos apresentam cor acobreada nas asas, que reflete vermelho quando a luz incide nela, enquanto fêmeas apresentam cor preta nas asas. Machos desta espécie frequentemente brigam pela posse de territórios de acasalamento ao longo dos riachos.

Porém, não se sabe qual característica determina a vitória. Nesse sentido, minha hipótese é que a quantidade de gordura estocada nos machos determina a capacidade de luta. Dessa forma, dado que a quantidade de pigmento na asa indica qualidade, espero que machos de C. scintilans com maior intensidade de vermelho nas asas invistam mais tempo na luta pelo território.

Métodos

Área de estudo

Realizei o estudo em um riacho de pequena ordem (localmente conhecido como igarapé) na reserva do Km 41, inserida na área de relevante interesse ecológico (ARIE) cogerida pelo Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF) e localizada a aproximadamente 80 km ao norte de Manaus, Brasil. A vegetação é formada por floresta ombrófila densa de terra firme (Ribeiro et al. 1999).

Organismo de estudo

Indivíduos da espécie C. scintilans são frequentemente encontrados em igarapés de floresta contínua, entre 10:00 h e 14:00 h. Os territórios defendidos pelos machos geralmente estão localizados em uma pequena mancha de sol associada a uma árvore caída sobre o curso d´água. O comportamento de briga desta espécie consistente em

338 uma série de manobras aéreas (Resende 2002). A briga começa quando um macho se posiciona na frente do outro e flexiona as asas posteriores para baixo, exibindo a coloração interna fortemente acobreada. Um macho permanece tentando deslocar o outro para trás gerando um movimento de vai-e-vem e mudando o ritmo do bater das asas, embora os embates tenham pouco o nenhum contato físico (Resende 2002).

Avaliação do investimento nas brigas

Realizei o experimento entre os dias 1 e 2 de novembro de 2012. Para testar o comportamento do macho ante a invasão do território por outro macho, fixei um macho recentemente morto na ponta de um galho com cola branca, cuidando para que suas asas ficassem estendidas e visíveis. Após um período de uso, o indivíduo modelo começava a se degradar (ex. a asa quebrava). Por isso, substituí o indivíduo modelo três vezes para manter a aparência mais similar à encontrada na natureza.

Após preparar a haste com o modelo morto, busquei ativamente por machos de

C. scintilans ao longo do igarapé. Ao encontrar um indivíduo, eu aproximava o modelo morto ao macho de libélula. Com a aproximação, o macho territorial normalmente alçava voo e se aproximava do modelo, batendo as asas de forma mais rápida e às vezes investindo fisicamente contra o modelo. Considerei essa mudança comportamental como início da briga e medi o tempo que cada indivíduo permaneceu efetuando esse padrão de voo. Como o modelo não era removido do território, o fim da disputa ocorria quando o macho vivo atingia seu limite de investimento. Como controle, aproximei um galho sem nenhum individuo na frente de três machos, não obtendo resposta em nenhum dos casos.

Após medir o tempo, capturei o indivíduo com um puçá entomológico e transportei-o até o laboratório para medir a intensidade de vermelho nas asas anteriores.

339 No laboratório dissequei os indivíduos e fotografei as asas anteriores de cada um nas mesmas condições de luminosidade. Calculei a quantidade de vermelho da asa anterior esquerda de cada macho usando o programa Corel PHOTO-PAINT X5 2010, que fornecia a quantidade média de vermelho. Posteriormente, usei um modelo linear geral para testar se o tempo investido na luta pelos machos (variável resposta) estava associado à quantidade de vermelho nas asas (variável preditora). Usei cada modelo de macho como covariável categórica para controlar os possíveis efeitos do modelo sobre o comportamento de briga dos machos.

Resultados

Estimulei o combate de 18 machos localizados em um total de 15 territórios. O tempo médio (±DP) de briga foi de 10,37±9,32 s e a quantidade média de vermelho (±DP) das asas foi de 135,3±24,6 pixels. Não encontrei relação entre o tempo de briga e a quantidade de vermelho das asas (F(1,14)=0,66; p=0,43; Figura 1). Os modelos também não afetaram diferencialmente as respostas dos machos (F(2,14)=1,98; p=0,17).

340

20

15

10

5

0

-5

-10

Residuos do modelo linear geral entre tempo da disputa

em relação aos modelos de machos usados no experimento-15 90 100 110 120 130 140 150 160 170 180 190 Quantidade de vermelho (pixels)

Figura 1. Relação entre o resíduo de um modelo linear geral entre tempo de luta e modelos de machos usados no experimento e quantidade de vermelho das asas em machos da espécie de libélula C. scintilans em um igarapé da na ARIE PDBFF,

Amazônia Central, Brasil.

Discussão

Indivíduos da espécie C. scintilans de maior qualidade (maior pigmentação nas asas) não investiram mais tempo na luta pelo território. Considerando que os modelos utilizados representam rivais que nunca desistem da luta, é possível que a quantidade de energia não determine a chance de vitória, e consequentemente não seja representada pela coloração da asa. Se a quantidade de reservas energéticas fosse um importante determinante da qualidade dos machos, indivíduos com maior pigmentação deveriam ter brigado por mais tempo (e.g. Contreras-Garduño et al 2006, Fitzstephens & Getty

2000).

Se a gordura não determina a persistência na luta, outras características como tamanho (Mesterton-Gibbons et al. 1996), qualidade do sistema imune (Mardem &

Cobb 2004) ou quantidade de músculo (Keil & Watson 2010), podem determinar a

341 chance de vitória. Estas características não estão relacionadas com uma maior duração da disputa já que não representam estoques de energia utilizados durante o confronto.

Além disso, o fato de existir contato físico com o modelo, mesmo que esporádico, pode indicar que o tamanho do indivíduo eventualmente determina a chance de vitória. Um indivíduo de maior tamanho poderia causar injurias maiores no oponente ou resistir mais ao recebimento de golpes.

Alguns modelos que tratam das regras de resolução de brigas sugerem que o confronto se divide em várias fases ao longo da disputa pelo território, o que implica na mudança de comportamento dos machos durante o confronto (Arnott & Elwood 2008).

Possivelmente a coloração da asa é um fator importante no início da briga, quando os machos podem se avaliar. Logo, se a gordura fosse uma característica importante deveria haver, mesmo que nessa fase inicial, uma relação entre coloração das asas e duração da disputa. Porém, como o comportamento do modelo não mudou, eventualmente, o macho rival não deu seguimento às fases seguintes da luta.

Eventualmente, mudanças comportamentais em confrontos escalonados possam indicar quais características, que não a gordura, seriam mais prováveis para determinar a chance de vitória.

Agradecimentos

Bom, gostaria começar agradecer as pessoas que permitiram a realização deste trabalho, a principal Paulinho Rainbow pela sugestão de trabalho, apoio e correção, além de ser fonte de admiração e inspiração de como ser legal e eficiente numa mesma pessoa, em grande parte desencadeador da minha transformação como pesquisador no decorrer deste mês. A Catá, por alem de revisar o trabalho me proporcionar um exemplo de profissionalidade difícil de esquecer. A Hidasi por a companhia no campo, a ajuda nas

342 análises e o compartilhamento de experiências que tivemos ao longo do curso. Aos meus revisores extraoficiais Sarah, Draxler e Léo, que se ofereceram para ajudar ao gringo escrever um manuscrito com menos vomito, a Lorena e Renatinha por ajudar na localização dos bichos alem de amenizar minha passagem por aqui. A o alto clero,

Paulinho Vampiro, pela troca de ensinamentos e a paciência tida. Aos monitores

Marcos e Thiago, por se dispor a ajudar com um sorriso sempre que precisei. Ao resto do alto clero que me motivou e inspirou durante este curso, dentre eles Glauco, Marcel,

André, Fabrício, Felipe, Marcio, Jansen, Ester, Adriano... por demonstrar alegria e disposição ao vir para o curso, transmitindo além de conhecimentos experiências e inspirações tanto laborais como pessoais na troca de aparentemente nada. A aquela pessoa que faz 21 anos teve a ideia, vontade e sacrifico de começar este curso de campo que tantas vidas mudaram.

Por ultimo, a todos aqueles desconhecidos que ao longo do mês virarem amigos, família, parceiros e até confidentes, gostei de compartilhar o leite condensado com vocês. Ao Tatu, Randolpho, Daniel, Cibele, Mari, Tati, Joseph, Ana, Lud, Danizoo,

Bianca, Bruno, Ana Carol (os que já citei não repito!)... Cada uno de vosotros ya ocupa un lugar en mi vida.

Terminando gostaria citar um refrão da música que acho apropriada para este momento chamada “A hora do adeus” do Luis Gonzaga, com o que me identifico:

“...eu agradeço, ao povo brasileiro, norte, centro e sul inteiro onde reina o baião...”

Obrigado galera!

343 Referências

Arnott, G. & R.W. Elwood. 2008. Information gathering and decision making about

resource value in animal contests. Animal behavior, 76:529-542.

Briffa, M. & R.W. Elwood. 2001. Motivational change during shell fights in the hermit

crab Pagurus bernhardus. Animal Behavior, 62:505-510.

Contreras-Garduño, J., J. Canales-Lazcano & A. Córdoba-Aguiar. 2006. Wing

pigmentation, immune ability, fat reserves and territorial status in males of the

rubyspot damselfly, Hetaerina americana. Journal of Ethology, 24:165-173.

Córdoba-Aguilar, A. 2008. Dragonflies and Damselflies: model organisms for

ecological and evolutionary research. Oxford:Oxford University Press.

Fitzstephens, D.M. & T. Getty. 2000. Colour, fat and social status in male damselflies,

Calopteryx maculata. Animal Behavior, 60:851-855.

Keil, L.P. & P.J. Watson. 2010. Assessment of self, opponent and resource during male-

emale contests in the sierra dome spider, litigiosa: . Animal

Behavior, 80:809-820.

Mardem, J.H. & J.R. Cobb. 2004. Territorial and mating success of dragonflies that

vary in muscle power output and presence of gregarine gut parasites. Animal

behavior, 68:857-865.

Mesterton-Gibbons, M.; J.H. Marden & L.A. Dugatkin. 1996. On wars of attrition

without assessment. Journal of Theoretical Biology, 181:65-83.

Plaistow, S. & M.T. Siva-Jothy. 1996. Energetic constraints and male mate-securing

tactics in the damselfly Calopteryx splendens xanthostoma (Charpentier).

Proceedings of The Royal Society of London B, 263:1233-1239.

344 Resende, C.D. 2002. Comportamento territorial de Chalcopteryx scintilans (Odonata:

Polythoridae). In: Livro do Curso de Campo “Ecologia da Floresta Amazônica”

(Zuanon, J. & E. Venticinque, eds.).Manaus: INPA.

Ribeiro, J.E.L.S., M.J.G. Hopkins, A. Vicentini, C.A. Sothers, M.A. Costa, J.M. Brito,

M.A.D. Souza, L.H.P. Martins, L.G. Lohmann, P.A.C.L. Assuncao, E.C. Pereira,

C.F.D. Silva, M.R. Mesquita & L.C. Procopio. 1999. Flora da Reserva Ducke:

guia de identificação das plantas vasculares de uma floresta de terra-firma na

Amazônia Central. Manaus: INPA.

Schultz, T.D. & O.M. Fincke. 2009. Structural colors create a flashing cue for sexual

recognition and male quality in a Neotropical giant damselfly. Functional

Ecology, 23:724-732.

345