Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica

Adilson Rodrigues Lucas Júnior

Autorrealização no trabalho, obstáculos e possibilidades na visão de executivos brasileiros e sua interface com o processo de individuação

Mestrado em Psicologia Clínica Núcleo de estudos Junguianos

São Paulo 2019

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

Adilson Rodrigues Lucas Júnior

Autorrealização no trabalho, obstáculos e possibilidades na visão de executivos brasileiros e sua interface com o processo de individuação

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Psicologia Clínica, sob a orientação da Profa. Dra. Denise Ramos e do co-orientador Prof. Dr. Sigmar Malvezzi (IP-USP).

São Paulo 2019

Adilson Rodrigues Lucas Júnior

Autorrealização no trabalho, obstáculos e possibilidades na visão de executivos brasileiros e sua interface com o processo de individuação

Banca Examinadora

Recomeça....

Se puderes Sem angústia E sem pressa. E os passos que deres, Nesse caminho duro Do futuro Dá-os em liberdade. Enquanto não alcances Não descanses. De nenhum fruto queiras só metade. E, nunca saciado, Vai colhendo ilusões sucessivas no pomar. Sempre a sonhar e vendo O logro da aventura. És homem, não te esqueças! Só é tua a loucura Onde, com lucidez, te reconheças... Miguel Torga

Eu não sou o que aconteceu comigo, eu sou o que eu escolhi ser. Autor desconhecido

Agradecimentos

Aos meus pais, que nunca mediram esforços para proporcionar meus estudos e sempre acreditaram em mim. Mãe, obrigado por sempre me lembrar com gestos e palavras que sempre estará por mim, onde quer que seja. Pai, muito obrigado por toda liberdade, autonomia e suporte em todas as minhas decisões. Amo vocês !

Ao amor da minha vida, Daniela, que me apresentou com toda paixão à psicologia analítica e suas possibilidades para um não psicólogo. Agradeço-lhe muito por toda a sua paciência, dedicação e amor em todos os meus momentos de ansiedade e falta de tempo neste período.

Aos meus filhos amados que tanto me inspiraram e me deram forças, muitas vezes sem saberem. À minha linda Julia, agradeço por me mostrar que a felicidade e a realização estão em nossos sonhos e não devemos desistir deles nunca. A meu filho Felipe, agradeço por sua autoconfiança e simplicidade em encarar a vida e tudo que nela existe. Obrigado meus filhos pelo amor de vocês!

À minha orientadora, Profª. Dra. Denise Ramos, que me conduziu com maestria em um caminho praticamente desconhecido por mim. Professora Denise, meus mais sinceros agradecimentos por me fazer voltar ao foco quando necessário, por me acolher e me acalmar em meus momentos de ansiedade e por todos os caminhos e possibilidades que me mostrou neste processo.

Ao Prof. Dr. Sigmar Malvezzi, meu co-orientador, que me recebeu de braços abertos e transformou o que poderia ser apenas um simples encontro sobre as teorias de autorrealização, em um processo de aprendizado para a vida acadêmica, pessoal e profissional. Muito obrigado, mestre!

À Profª Dra. Liliana Wahba, meu muito obrigado por todos os ensinamentos e pelo carinho, dedicação e amor em suas aulas, e por toda a contribuição na qualificação.

Ao Prof. Dr. Luciano Sewaybricker, por aceitar participar desta banca e pelos ensinamentos que pude ter ao ler sua tese de doutorado.

Aos professores do Núcleo Junguiano, pelas excelentes aulas, reflexões e por resgatarem o estudante que há dentro de mim – ele não irá mais descansar.

A todos os amigos da PUC, que tanta paciência tiveram com esse não psicólogo, falador e crítico. Ana, Beth, Ezequiel, Fábio, Jefferson, Joaquim, Luna, Marcos e Raul, obrigado pelos anos que caminhamos juntos e pelos momentos de descontração.

Aos executivos participantes das entrevistas, que mesmo com as agendas tão lotadas, encontram um longo espaço para me receber. Muito Obrigado !

LUCAS JÚNIOR, Adilson Rodrigues. Autorrealização no trabalho, obstáculos e possibilidades na visão de executivos brasileiros e sua interface com o processo de individuação. 2019. Dissertação (Mestrado em Psicologia Clínica). São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo / Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica.

RESUMO

A presente pesquisa procura compreender o entendimento da autorrealização no trabalho, seus obstáculos e instrumentos implicados no processo de sua construção e a interface existente entre as teorias de autorrealização de Abraham Maslow e de individuação de Carl Gustav Jung. Para isso, foi utilizada a Metodologia Q em 12 participantes, executivos de grandes empresas brasileiras, com idade entre 40 e 55 anos. O embasamento teórico pauta-se no estudo dos processos de “Individuação” de Jung e de “Autorrealização” de Maslow. O estudo foi realizado, considerando o campo do trabalho como pano de fundo, a fim de compreender a visão dos executivos no atual cenário de globalização, alta competitividade, tecnologia e mudanças constantes. Os resultados encontrados enfatizam e apontam três necessidades ou exigências para se atingir a autorrealização: a autonomia, a adaptabilidade e a relação Eu-Outro. A pesquisa nos mostrou que, sem autonomia para decidir e agir através de suas crenças, não há autorrealização. No mundo atual, no qual a mudança é a grande constante, a adaptabilidade é uma exigência. A relação Eu-Outro apontou diferentes características ou estágios de autorrealização, com formas distintas e divergentes na relação.

Palavras-chave: Autorrealização, Processo de Individuação, Trabalho, Corporação, Empresas, Psicologia Junguiana, Psicologia Humanista, Metodologia Q.

LUCAS JÚNIOR, Adilson Rodrigues. Self actualization at work, obstacles, and possibilities in the vision of Brazilian executives and the interface with the individuation process. 2019. Dissertação (Mestrado em Psicologia Clínica). São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo / Programa de Estudos Pós- Graduados em Psicologia Clínica.

ABSTRACT

This research seeks to understand the comprehension of self-actualization at work, its obstacles and instruments implied in the process of its construction and the existing interface between the theories of “self-actualization” from Abraham Maslow and “individuation” from Carl Gustav Jung. It was used the Q Methodology in 12 participants, executives of large Brazilian companies, aged between 40 and 55 years. The theoretical basis is based on the study of the processes of "individuation" of Jung and "self-realization" of Maslow. The study was carried out considering the field of work as a backdrop, thus seeking to understand the view of executives in the current scenario of globalization, high competitiveness, technology and constant changes. The results emphasize and point out three needs or requirements to achieve self-actualization: autonomy, adaptability and the Self-other relationship. The research showed us that without autonomy to decide and act through their beliefs there is no self-actualization, in the current world, where the change is the great constant, the adaptability is mandatory. The Self-Other relation pointed out different characteristics or stages of self-actualization, through divergence and ways of dealing with the other.

Keywords: Self-Actualization, Self-Fulfillment, Self-Realization, Individuation process, Work, Corporation, Companies, Jungian psychology, Humanistic Psychology, Q Methodology.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1- Pirâmide de Maslow...... 40 Figura 2- Modelo do tabuleiro...... 100 Figura 3 - Organização da Escala Q...... 105 Figura 4 - Representação das afirmações nos dois primeiros componentes principais...... 108

Figura 5 - Representação das afirmações nos dois primeiros componentes principais...... 122

Figura 6 - Representação das afirmações em 3D dos componentes principais 123

Figura 7- Tabuleiro classificado por um participante – Afirmações...... 165

Figura 8 – Tabuleiro classificado por um participante – numeração das afirmações...... 166

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Dos grupos de participantes da pesquisa ...... 104 Tabela 2 - Componentes principais identificados no PCA...... 107 Tabela 3 - Cargas fatoriais e classificação dos indivíduos para o modelo com 3 fatores...... 110

Tabela 4 - Características do modelo fatorial com 3 fatores...... 110 Tabela 5 - Cargas fatoriais e classificação dos indivíduos para o modelo com 4 fatores...... 110

Tabela 6 - Características do modelo fatorial com 4 fatores...... 111 Tabela 7 - Classificação e Z-Scores por fator das afirmações...... 112 Tabela 8 - Afirmações com os maiores e menores Z-Scores por fator...... 115 Tabela 9 - Análise de consenso das afirmações pelos fatores...... 117 Tabela 10 - Cargas fatoriais e classificação dos indivíduos para o modelo com 3 fatores ...... 121

Tabela 11 - Análise de consenso- resumo...... 127 Tabela 12- Fator 1-maiores e menores Z-Scores ...... 129 Tabela 13- Fator 2- maiores e menores Z-Scores...... 134 Tabela 14- Fator 3- maiores e menores Z-Scores ...... 139

SUMÁRIO

1.Introdução...... 13 1.1. Objetivos...... 18 1.1.1. Objetivo geral...... 18 1.1.2. questões...... 18

2. O Caminho de Individuação (Carl Gustav Jung) ...... 20 2.1. O Si mesmo (Self) ...... 26 2.2 Persona ...... 29 2.3 A sombra ...... 30 2.4 As fases da individuação ...... 33 2.4.1. O “desvestimento” das falsas roupagens da persona ...... 33 2.4.2 O encontro com a “Sombra” ...... 34 2.4.3 A confrontação com a Anima ou Animus ...... 34 2.4.4 A integração com o Self ...... 35 2.5 Considerações sobre o capítulo ...... 36

3. O Processo de Autorrealização (Abraham Maslow) ...... 38 3.1. Autorrealização – um caminho, uma jornada de vida ...... 42 3.2. Autorrealização – características ...... 43 3.3. Atualizações sobre Autorrealização ...... 45 3.4 Autorrealização nas teorias de Gestão e Ciências do Trabalho...... 48 3.4.1 A Autorrealização profissional ...... 51 3.5. Considerações do capítulo ...... 53

4. A Intersecção entre Jung e Maslow ...... 55

5. Revisão de pesquisas - Autorrealização e individuação no trabalho...... 61 5.1. As pesquisas sobre “individuação” na Psicologia Social ...... 62 5.2. As pesquisas de Autorrealização ...... 64 5.3. As pesquisas de Individuação ...... 70 5.4 Considerações sobre as pesquisas ...... 72

6. A Dinâmica do trabalho na contemporaneidade e seus desafios para a autorrealização ...... 74 6.1. Uma época de mudanças e a necessidade de adaptabilidade...... 75 6.2. As formas de controle da atualidade e a falta de autonomia ...... 78 6.3. A alta competitividade, o Eu (Ego) e o Outro na organização ...... 82 6.4 Considerações sobre o capítulo ...... 87

7. Método ...... 89 7.1. Construção do Instrumento – Metodologia Q ...... 89 7.2. As afirmações (Q-set) ...... 91 7.3. Participantes ...... 95 7.4. Procedimento Ético ...... 95 7.5. Procedimento ...... 96 7.5.1. Local de realização da pesquisa ...... 96 7.5.2 Seleção dos participantes (P-set) ...... 96 7.5.3 Procedimento de intervenção ...... 98

7.5.4. Procedimento de análise de dados ...... 102

8. Análise dos dados ...... 104 8.1. Aplicação do Instrumento ...... 104 8.2. Análise de Componentes Principais ...... 106 8.3. Análise Fatorial...... 108

9. Análise dos Resultados – Conclusões ...... 121 9.1. Resultados Iniciais – Análise geral ...... 121 9.2 Resultados Iniciais – Análise dos fatores ...... 129 9.2.1 Análise dos Fatores – Fator 1 ...... 129 9.2.2. Análise dos Fatores – Fator 2...... 134 9.2.3. Análise dos Fatores – Fator 3...... 138

10. Conclusões Finais ...... 143

Referências ...... 149

Apêndice A: A Metodologia Q ...... 158 1. As fases da Metodologia Q ...... 161 1.1. Definição do curso da comunicação – Coleta de Afirmações - (Concourse) ...... 161 1.2 Desenvolvimento da amostra Q – Afirmações - (Q-Set) ...... 162 1.3 Seleção do P-Set (definição dos participantes) ...... 163 1.4 Escala-Q (Q-Sorting) – a classificação ...... 164 1.5 Análise e Interpretação ...... 165 2. Exemplo de pesquisa respondida – Tabuleiro ...... 166

Anexos ...... 168 A-. Termo de Compromisso do Pesquisador Responsável...... 168 B- Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ...... 169

1. Introdução

Individuação significa tornar-se um ser único, na medida em que por ‘individualidade’ entendermos nossa singularidade mais íntima, última e incomparável, significando também que nos tornamos o nosso próprio si-mesmo. (JUNG, [1916, 1934], 2011a, grifos do autor).

O que um homem pode ser ele deve ser. A isso podemos chamar de autorrealização” (MASLOW, 1954, p.91).

A individuação é a realização do vir-a ser do homem, cujo objetivo final é a integração de consciência e inconsciente. A individuação não é algo que ocorre passivamente. Exige a colaboração ativa do ego consciente, que deve buscá-la e conquistá-la com empenho, engajamento, paciência e coragem. (GRINBERG, 2003, p. 177).

Desde tempos remotos, o ser humano se questiona sobre o significado da vida, para que existimos, o que estamos fazendo aqui. Na Grécia antiga, Aristóteles discutia sobre a “Eudaimonia”, o “bom gênio”, “Eu” (bom) e “Daimon” (espírito), um conceito que enfatiza a busca pelo significado da vida, a autorrealização, a qualidade dos relacionamentos, a felicidade, o autoconhecimento. Para C. G. Jung, o significado da vida passa pela finalidade da psique, que é de se realizar, de evoluir, de ampliar a consciência, tornar-se um ser único, tornar-se a si mesmo. “A finalidade da evolução psicológica é tal, como na evolução biológica, a autorrealização, ou seja, a individuação” (JUNG, [1939], par. 233, 2011b). Esse realizar-se, tornar-se a si mesmo, nunca teve uma resposta concreta, final e, provavelmente, não terá. Aparentemente, a vida não tem um sentido tão específico e sim muitos sentidos e possibilidades. A frase muitas vezes dita, “Ser quem tu és”, também nos leva a uma gama de possibilidades. Então, podemos ser muitas coisas, correto? Se acreditamos nas potencialidades do cérebro, que se descobrem cada vez maiores, ou nas inúmeras religiões que nos dizem que somos feitos à imagem e semelhança de Deus, do Criador (Gênesis, 1:26,27), talvez sejamos capazes de ser muito do que nos for desejado dentro de nossas limitâncias físicas (após o devido esforço é claro). Devido a essa pluralidade, passamos a procurar sentido em coisas mais específicas, subtemas da vida, como a família, o casamento, os filhos, os relacionamentos e o trabalho.

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A era atual, a chamada pós-modernidade discutida por tantos sociólogos, como Bauman (2001), Sennett (2012) e Touraine (2005), e chamada de hipermodernidade por Lipovetsky (2004; 2005), é um tempo de mudanças constantes, onde o avanço exponencial das tecnologias acelera qualquer processo, ampliando também a criação de novos modelos de trabalho e produção, colocando, muitas vezes, a empresa, o trabalho à frente da família, não permitindo, muitas vezes, ao indivíduo separar a sua identidade do trabalho de sua identidade pessoal. A globalização frenética – onde todos estão conectados, e mensagens e informações são trocadas o tempo todo – traz, cada vez mais, desafios ao indivíduo que procura ser ele mesmo. A necessidade de pertencer a um grupo e atender às demandas do grupo podem inibir ou prejudicar esse processo. Mas, é nesta dicotomia de forças opostas que os processos de autorrealização e a individuação ocorrem. Há a necessidade de encontrar o equilíbrio interno e externo que permita com que essas forças nos deixem seguir o nosso caminho.

O trabalho tomou tanto o espaço da vida que passou a ter quase a mesma importância do significado da vida, na medida em que passou a ocupar a maior parte do seu tempo e que um novo mundo foi criado pelo espaço social necessário para lhe dar suporte (BAXTER, 1982).

Viver uma vida no trabalho e outra fora dele passou a ser mais complexo – não nos desconectamos do trabalho na maior parte do tempo. A busca por propósito e significado nas atividades profissionais, tema hoje recorrente na literatura organizacional, nos faz refletir e buscar os mecanismos que permitam obter maior satisfação nas necessidades humanas no campo do trabalho, associando essa realização a uma possível ampliação das possibilidades de realização nos demais campos da vida. Esta dissertação visa a contribuir com o entendimento do conceito de autorrealização no trabalho, dentro do cenário atual de pós-modernidade e hipermodernidade em que vivemos, por meio da compreensão dos obstáculos, instrumentos e mecanismos, na visão de executivos brasileiros de grandes corporações, que vivem essa realidade em seu dia a dia. A análise pode contribuir, ainda, com os diferentes perfis e visões encontrados de autorrealização, o que nos possibilitou analisar distintos conceitos

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e possíveis estágios de autorrealização dos indivíduos pesquisados e uma análise do processo de individuação dentro dos perfis selecionados. A partir deste trabalho, podemos ampliar as conclusões por meio de novas pesquisas sobre distintos grupos de trabalho, diferentes gêneros e tipos de organização visto o potencial exploratório do tema. Para esta pesquisa, utilizamos das teorias de individuação de C.G. Jung e de autorrealização de Abraham Maslow. A utilização dessas duas teorias distintas que tratam de um caminho de realização e evolução do ser humano se deu por diversos fatores. O desejo de compreender o caminho de individuação de Jung no campo do trabalho se mostrou desafiador. O conceito de individuação e sua subjetividade na obra de C.G. Jung, em especial a falta de referências específicas ao campo do trabalho, nos levou a relacionar as teorias da Psicologia Organizacional e do Trabalho (POT), trazendo seus conceitos e instrumentos, mais especificamente, à teoria de autorrealização de Abraham Maslow, que nos brindou com inúmeras pesquisas sobre o tema trabalho e autorrealização, permitindo-nos, assim, analisar os obstáculos e instrumentos de realização e satisfação no trabalho. Maslow (1954) refere-se a Jung e à teoria de individuação em sua obra. Há uma interface clara entre autorrealização e individuação do indivíduo, o que nos trouxe a provocação de utilizarmos ambas as teorias, ampliarmos os conceitos e, ainda, compreendermos melhor sua interface. Embora a individuação e a autorrealização não sejam exatamente a mesma coisa, muitos autores as tratam como sinônimos. De fato, elas possuem vários pontos de interconexão, e a própria descrição de Jung nos dá esse entendimento:

Individuação significa tornar-se um ser único, na medida em que por “individualidade” entendermos nossa singularidade mais íntima, última e incomparável, significando também que nos tornamos o nosso próprio si-mesmo. Podemos, pois, traduzir “individuação” como “tornar-se si-mesmo” (Verselbstung) ou “o realizar-se do si- mesmo” (Selbstverwirklichung). (JUNG [1916, 1934], 2011a par. 266).

O “realizar-se do si-mesmo”, na tradução brasileira que, em inglês, está descrito como “self-realization”, é o mesmo termo e com uma significância muito próxima, usado por Maslow (1972) em suas definições de autorrealização.

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Para Maslow (1972), a autorrealização é um processo transcendente, de uma consciência superior que ultrapassa o Self, definido pelo autor como um núcleo organizador da psique, ideia essa muito próxima da definição de Self de Jung (2011e). Entretanto, diferentemente de Jung, Maslow entende que o ambiente externo é o grande motivador ou influenciador desse movimento de organização. Além disso, Maslow (1954), em sua teoria da hierarquia das necessidades, define etapas que devem ser preenchidas ou atendidas antes de chegarmos a autorrealização. Para Stein (2012), o processo de individuação de Jung é contínuo, a consciência do indivíduo emerge através da compensação (um processo interno e não externo como a autorrealização) e ocorre tanto na primeira como na segunda metade da vida. Trabalhar com a teoria de autorrealização de Maslow (idem) nos permitiu observar o fenômeno da individuação por um prisma distinto, visto que a autorrealização se dá em diversos campos. O indivíduo pode, assim, se autorrealizar em um campo e, em outro, não. Esse aspecto nos permitiu um melhor recorte nesta pesquisa sobre o campo do trabalho no mercado de empresas privadas. O processo de autorrealização, mesmo com suas utopias e desejos, exige direcionamento, disciplina e organização por parte do indivíduo, delimitando espaços que nos permitem uma maior facilidade do estudo. A escolha por pesquisar executivos de grandes organizações se deve aos desafios e possibilidades que esses indivíduos enfrentam. Segundo Stein (1992), “viver, participar de uma organização é viver o inconsciente, pessoal e coletivo. Um instrumento para a individuação, mas ao mesmo tempo um instrumento de destruição”. As corporações são um vasto campo para a formação da identidade do sujeito, como pessoa e, consequentemente, para a estruturação do seu ego e para viver o inconsciente, como afirma Stein (1992). O foco não é a empresa ou corporação, mas o indivíduo, o executivo do mundo corporativo, entre 40 e 55 anos, por entender que essa faixa etária se encontra em uma fase de desenvolvimento, chamada de “metanoia” por Jung (1930), segundo a qual há uma possível “crise”, uma busca por significado, propósito e realização profissional e pessoal. Este trabalho não tem o propósito de responder se os indivíduos a serem pesquisados estão autorrealizados no trabalho, tarefa essa complexa demais a

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ponto de não termos tempo para tratar outros temas nesta pesquisa, mas procurará responder, da melhor forma possível, as seguintes questões: qual o entendimento atual do indivíduo sobre autorrealização no trabalho? Que obstáculos e meios, na visão do indivíduo, a empresa traz para este processo? Que obstáculos e meios o indivíduo possui ou traz para o ambiente de trabalho? Por fim, entendendo que dois dos mais significativos estudiosos deste tema foram Abraham Maslow e Carl Gustav Jung, de que maneira se estabelece a interface entre o processo de autorrealização de Maslow e o de individuação de Jung? Para responder a essas perguntas, foram entrevistados 12 executivos brasileiros, entre 40 e 55 anos, individualmente, utilizando-se da Metodologia Q, onde os pesquisados classificaram 70 afirmações sobre autorrealização no trabalho. Uma análise estatística definida pela metodologia nos permitiu encontrar fatores e tendências e foi realizada, então, a análise interpretativa com base nas teorias utilizadas. Ao utilizarmos de dois conceitos de evolução da psique, a autorrealização de Maslow e a individuação de Jung, abrimos um campo de estudo mais amplo que nos possibilitou melhor identificar os instrumentos e obstáculos da autorrealização e, por conseguinte, também os da individuação. Há diferenças significativas entre os conceitos, mas também muitas similaridades, que serão exploradas ao longo deste trabalho. Uma das mais importantes é que ambos os autores definem que a vida, a psique têm um fim, um propósito, e esse propósito é, essencialmente, encontrar a si mesmo, realizar tudo aquilo que se pode realizar em vida, seus potenciais e anseios, compreendendo seus limites e erros, aprendendo com eles e, assim, ampliando sua consciência de si mesmo. A busca por algo além do que somos e essa necessidade de nos confrontarmos constantemente conosco são temas comuns a esses autores que entendem que o ser humano evolui mais do que se adapta. Face ao que foi apresentado acima, serão desenvolvidos 4 capítulos teóricos para atingir nossos objetivos de pesquisa e outros 5 capítulos dedicados à revisão de pesquisas, ao método, análise dos dados e conclusões. No capítulo 2, “Caminho de Individuação” e, no capítulo 3, “O Processo de Autorrealização”, são discutidos os conceitos de cada teoria e a necessidade de que o ser humano tem de encontrar um sentido maior para a sua existência. No capítulo 4, “Intersecção”, é realizada

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uma interpretação das diferenças e similaridades desses conceitos. No capítulo 5, faz-se uma revisão de pesquisas sobre as teorias de autorrealização e individuação no campo do trabalho. No capítulo 6, conceitua-se a “Dinâmica do Trabalho” na atualidade e sua relação com a autorrealização no trabalho, principalmente através da leitura de autores da sociologia, filosofia e psicologia social. No capítulo 7, é apresentado o instrumento da pesquisa em detalhes, a Metodologia Q. No capítulo 8, são apresentados os dados coletados na aplicação do instrumento. Por último, nos capítulos 9 e 10, as conclusões finais. O Apêndice traz dados adicionais sobre a metodologia, exemplo do tabuleiro da Metodologia Q preenchida. Nos anexos, têm-se os termos de compromisso e responsabilidade do pesquisador.

1.1 Objetivos

1.1.1 Objetivo Geral

O objetivo desta dissertação é compreender e analisar como os indivíduos, entre 40 e 55 anos, que atuam em posições de liderança, em empresas privadas, entendem a autorrealização no trabalho e quais são os obstáculos e instrumentos implicados nesse processo.

1.1.2 Questões

A partir da metodologia a ser utilizada neste trabalho, “Metodologia Q”, e com base na análise da teoria clássica e contemporânea de “autorrealização” de A. Maslow e de “individuação” de C. G. Jung, serão analisadas as seguintes questões: 1) compreender o entendimento atual da autorrealização no trabalho; 2) identificar os obstáculos, na perspectiva do indivíduo, que a organização e ele próprio possuem para a autorrealização no trabalho; 3) identificar os instrumentos e meios que o indivíduo recebe da organização ou possui, e se utiliza para se autorrealizar no trabalho;

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4) compreender a interface entre processo de autorrealização, segundo A. Maslow e caminho de individuação, segundo C. G. Jung, trazendo a questão epistemológica do conceito de liderança nesta análise.

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2. O Caminho de Individuação (C.J. Jung)

O conceito de arquétipos, de inconsciente coletivo e individuação, são, provavelmente, os principais pontos da teoria junguiana. A individuação é um conceito-chave da contribuição de Jung para as teorias de desenvolvimento da personalidade. Como tal, está entrelaçado a outros conceitos de sua teoria, sobretudo, ao si mesmo (Self), ego, projeção, sombra e arquétipo com a síntese de elementos conscientes e inconscientes. Jung usou o termo individuação para descrever todo processo de desenvolvimento psicológico, definido por ele como tornar-se uma personalidade unificada, ser quem devemos ser, um indivíduo, único, e integrado ao todo. O termo “individuação” foi adotado por Jung através do termo usado por Schopenhauer, porém reporta-se a Gerard Dorn, um alquimista do século XVI. Ambos falam do principium individuationis. Jung utilizou, então, este princípio na psicologia, mais detalhadamente em Tipos Psicológicos, de 1921, embora tenham encontrado esse conceito, em seus textos, desde 1913 (SAMUELS, 1988). A filosofia também trata de temas comuns à individuação há muito tempo através de diferentes conceitos. A “Eudaimonia” de Aristóteles, o “daemon” (bom gênio) que, muitas vezes, é traduzido como felicidade e bem-estar, são de fato virtudes da Eudaimonia para toda uma linha de conceitos éticos e morais, de uma realidade objetiva. Antes ainda de Aristóteles, Píndaro (518 a.C. a 438 a.C.) nos trouxe a reflexão do “tornar-te o que és”. A filosofia ainda nos brinda com a frase descrita na entrada do templo de Apolo em Delphos, “Conhece-te a ti mesmo”. Jung trouxe, então, mais uma vez, algo primitivo e arquetípico para o ser humano e para a psicologia, onde ética, moral e autoconhecimento são partes do que hoje se intitula a definição do processo de individuação de Jung. Samuels (1986) faz um comparativo interessante e simples do processo, em Dicionário Crítico de Análise Junguiana:

enquanto a consciência aumenta com a análise das defesas (por exemplo, projeção da sombra), o processo de individuação é uma “circum-ambulação” do “Self” como o centro da personalidade que, com isso, vai sendo unificada. Em outras palavras, a pessoa se torna consciente no que tange a ela ser tanto um ser humano único

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como, ao mesmo tempo, não mais que um homem ou uma mulher comum.

Jung nos mostra ainda a necessidade do outro no processo:

a individuação, no entanto, significa precisamente a realização melhor e mais completa das qualidades coletivas do ser humano; é a consideração adequada e não o esquecimento das peculiaridades individuais, o fator determinante de um melhor rendimento social. (JUNG [1916, 1934], 2011a, par. 267).

A individuação é um processo de desenvolvimento do indivíduo, de autoconhecimento, de análise de suas defesas e bloqueios e, consequentemente, de ampliação de consciência e de potenciais. É um processo que só existe através do outro; trata-se de ampliar suas potencialidades e peculiaridades individuais, sempre visando ao todo, para si e para o outro, para o rendimento do indivíduo na sociedade e da sociedade como um todo. Individuação é “uma escolha por ser consciente ou de mente plena, significa estar consciente da pessoa que somos capazes de ser em nossa plenitude, ter consciência de nossas fortalezas e limitações.” (McNEELY, 2010, p. 5). Muitos confundem individuação com individualidade, ou ainda, com tornar- se perfeito, um “super-homem”. Individuação não é nem um nem outro. Individualismo é ser egoísta e somente pensar em realizar seus desejos e necessidades sem se importar com o outro. A individuação é algo natural sobre o realizar suas potencialidades e particularidades. A humildade é primordial nesse processo. Ela nos faz lembrar que o importante não é não errar, mas procurar não cometer o mesmo erro. É sempre buscar novas oportunidades e possibilidades e, com isso, possíveis novos erros, para uma ampliação de consciência, aceitando-se e corrigindo-se, não esquecendo que a mudança é sempre provisória e constante.

Individuação significa tornar-se um ser único, na medida em que por ‘individualidade’ entendermos nossa singularidade mais íntima, última e incomparável, significando também que nos tornamos o nosso próprio si mesmo. Podemos, pois, traduzir "individuação" como ‘tornar-se Si mesmo’ ou ‘o realizar-se do si mesmo’. (JUNG, [1921], 2011e, par. 266).

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(...) A individuação leva, pois, a uma valorização natural das normas coletivas; mas se a orientação vital for exclusivamente coletiva, a norma é supérflua, acabando-se a própria moralidade. Quanto maior a regulamentação coletiva do homem, maior sua imoralidade individual. A individuação coincide com o desenvolvimento da consciência que sai de um estado primitivo de identidade (JUNG, [1921], 2011e, par. 857, grifos do autor).

A individuação é, portanto, uma tendência instintiva a realizar plenamente as potencialidades inatas se afastando da influência do coletivo sem abandoná-lo e ignorá-lo. Contudo, a nossa psique é bastante complexa: são intricados de tal modo os componentes em jogo, tão variáveis as intervenções do ego, tantas as vicissitudes que podem ocorrer, que o processo de totalização da personalidade não poderia jamais ser um caminho reto e curto; ao contrário, é um processo longo e difícil, onde o ego luta para manter-se como dono da “própria casa”, rejeitando e se defendendo de todas as tendências opostas trazidas pelo inconsciente. Barreto (2008) descreve a individuação como “um processo em que um organismo se torna singular dentro de sua espécie, ainda que não abandone as características comuns dos demais membros desta”. A principal tarefa do processo de individuação é inerente a todo ser vivo, já que toda espécie possui indivíduos com elementos e particularidades distintas (cor, estrutura) e, inconscientemente, se desenvolvem e se diferem em determinadas características com relação a seus semelhantes, mas somente o ser humano é racional e é capaz de tomar consciência desse processo e de influenciá-lo, podendo, assim, aceitá-lo ou negá-lo, vivendo-o de forma plena, mesmo com suas dores e dificuldades ou simplesmente alienado ao que ocorre e, possivelmente, sofrendo de um vazio interno ou, ainda, as dores físicas e psíquicas do processo negado.

(...) A tarefa do “conhecer-se a si mesmo”, é imposta por uma necessidade interna: não é um simples convite, que possa ser declinado, mas uma intimação, uma convocação que brota do próprio núcleo fundamental da pessoa, exigindo a “realização ou atualização do Si mesmo”. (BARRETO, 2008, p. 206).

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Essa necessidade instintiva, inata, que vem de dentro é uma possibilidade de cura ou uma possibilidade para minimizar as neuroses causadas por nosso desequilíbrio psíquico. Para Silveira (1997), os que não desejam se diferenciar permanecem obscuramente envolvidos numa trama de projeções, confundem-se, fusionam-se com outros e, desse modo, são levados a agir em desacordo consigo e com o plano inato de seu próprio ser. É este “desacordo” consigo mesmo que constitui fundamentalmente o estado “neurótico”.

Consciente e inconsciente não são um todo quando um deles é suprimido e ferido pelo outro...ambos são aspectos da vida. O consciente deve defender suas razões e se proteger, e a vida caótica do inconsciente deve ter sua chance de se expressar também - tão quanto possamos suportar. Isso significa um conflito aberto e colaborativo. Assim deve ser a vida humana. É o velho jogo do martelo e da bigorna, no meio deles o ferro é pacientemente forjado em um todo indestrutível, um "indivíduo". Isto, é mais ou menos, o que eu chamo de processo de individuação. (JUNG, 1969, p. 350-1).

Negar-se a realizar esse caminho e alienar-se a seus próprios desejos e anseios têm trazido uma série de transtornos para o ser humano moderno. Transtornos psiquiátricos somáticos, como a ansiedade e depressão, são hoje os tratamentos primários de saúde que mais afetam a saúde da população comum, segundo uma pesquisa realizada por Maier e Falkai (1999). Ramos (2006) nos brinda com exemplos claros dos efeitos da psique no corpo e sobre o erro cometido por muitas das “ciências” que tentam separar o corpo da mente, afirmando que ambos andam juntos e seu equilíbrio é crucial para nosso bem-estar físico e psíquico. Na abertura de seu livro, ela ainda inclui uma passagem de Jung que já nos afirmava tal fato:

Um funcionamento inadequado da psique pode causar tremendos prejuízos ao corpo, da mesma forma que, inversamente, um sofrimento corporal pode afetar a psique; pois a psique e o corpo não estão separados, mas são animados por uma mesma vida. Assim sendo, é rara a doença corporal que não revele complicações psíquicas, mesmo quando não seja psiquicamente causada (JUNG, 1953, p.194).

A cura da neurose, descrita por Jung, passa, então, pelo processo de individuação, com seu confronto e equilíbrio dos opostos e realização moral, na

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medida em que trabalha a conscientização dos conflitos vividos pelo indivíduo que exigem uma tomada de postura, uma mudança de comportamento e de realização do seu potencial. O processo de individuação é constante, não tem fim; é viver o dia a dia dos conflitos. O seu objetivo máximo é nos tornar mais humanos, mais conscientes de nós mesmos e, consequentemente, do todo. Ao mesmo tempo em que o processo de individuação é inevitável, o seu resultado é incerto e, via de regra, ao aceitar o processo, há um choque de realidade para o ego. Ele (o ego) começa a perceber que não é o “dono de sua própria casa”. Existem outras forças que até então permaneciam ocultas no inconsciente e que são mais fortes do que o ego – os chamados complexos. É nesse momento, no confronto com essas forças, que a máscara da ilusão cai. O ego precisa aceitar sua parte sombria e aceitar que não é o centro da psique. (SAMUELS, 1988, p. 107). O processo de individuação ocorre nesse embate entre consciente e inconsciente (a sombra é inconsciente), defesa e aceitação (da sombra), luta e colaboração, permitindo o amadurecimento e o desenvolvimento da psique no caminho da individuação. Para Samuels (1988), é um processo de circum-ambulação, um movimento de circunvolução, que leva o indivíduo a um novo centro psíquico, que Jung denominou de “Self”, ou “si mesmo”. Podemos dizer que o processo de individuação é um processo de autoconhecimento que visa a permitir a integração de nossas sombras e a melhor adaptação de nossa persona com o todo, através de uma ampliação de consciência que nos possibilite desenvolver e realizar nossos potenciais que já nos são conhecidos, desejados e impulsionados pelo inconsciente, mais especificamente pelo si mesmo. “A meta da individuação não é outra, senão, a de despojar o si mesmo dos invólucros falsos da persona, assim como do poder sugestivo das imagens primordiais.” (JUNG, [1916,1934], 2011a, par. 269). Ao olharmos para o campo do trabalho, objeto desta pesquisa, Stein (1992) declara que, desde sempre, vivemos dentro de diferentes organizações em nossas vidas, nossa família, nossa escola; interagimos com o governo e nossa comunidade. Lidar com uma organização ou corporação é lidar com o inconsciente,

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pessoal e coletivo e, quanto mais intensa for essa relação, mais potencial e frutífera ela pode ser – o inverso também é verdadeiro, ou seja, essa relação pode ser destrutiva. Assim como Stein (1992), Morgan (1996, p. 209) fala da consciência e inconsciência da organização: “muito da vida cotidiana da organização, com tudo aquilo que ela tem de racional e de normal, dá uma forma ‘real’ a inquietações que jazem sob o nível de conhecimento inconsciente”. Se há um consciente e inconsciente na organização, também há sombra e persona, e essas são a face oculta e externa da organização, respectivamente, que se mesclam com a persona e sombra do indivíduo, criando, assim, uma complexidade e uma potencialidade maior para o sujeito em seu processo de individuação. Ziemer (1996) fala da relação com as organizações e da interdependência entre sujeito e ambiente. Para ele, a organização e os indivíduos que nela se encontram se misturam. O indivíduo que participa de uma organização pode vivenciar, dentro dela, os seus símbolos e mitos, desenvolvendo uma persona mais completa dentro do grande coletivo. Ao mesmo tempo, ele também recebe a influência da sombra da organização:

a sombra organizacional é constituída de características inaceitáveis que incluem todos os comportamentos, atitudes, valores, crenças e normas que não se coadunam com a imagem e a identidade que a organização almeja criar de si mesma (ZIEMER, 1996, p. 119).

Viver em uma organização é viver esse consciente e inconsciente pessoal e coletivo da organização, enfrentando, assim, suas sombras e confrontando-as nesse ambiente, através das projeções típicas de um ambiente competitivo, causando reações de inveja, rivalidade e tantos outros sentimentos inferiores, mas também é viver esse potencial, essa “realidade in potentia”:

chamam o inconsciente de um "nada", e, no entanto, ele é uma “realidade in potentia”: o pensamento que pensaremos, ação que a realizaremos e mesmo o destino de que amanhã nos lamentaremos já estão inconscientemente hoje. (JUNG, [1939], 2011f, par. 498).

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Para compreendermos melhor esse complexo conceito e evoluir nesta pesquisa, precisamos destrinchar alguns dos principais conceitos ou atores do processo de individuação que acabamos de mencionar brevemente. Trataremos, então, em mais detalhes, os conceitos de “Si Mesmo”, “Sombra”; “Persona” e as “Fases da Individuação”, a seguir.

2.1. O Si Mesmo (Self)

Podemos entender o si mesmo (Self) como a unidade do sistema consciente e inconsciente que exerce, ao mesmo tempo, a função de centro regulador da totalidade da personalidade. O si mesmo é como um maestro, uma espécie de organizador central que coordena as inúmeras ações psíquicas e a formação da identidade do indivíduo. Ele é o todo do qual o ego faz parte, mesmo sem reconhecê-lo, imaginando ser este, o ego, o dono e coordenador de todo processo psíquico.

O si mesmo é algo irracional e indefinível, em relação ao qual o Eu não se opõe, nem se submete, mas simplesmente se liga, girando por assim dizer em torno dele como a terra em torno do sol – chegamos a meta da individuação... (JUNG, [1916, 1934], 2011a, par. 405).

Ao expressarmos essa totalidade que existe dentro de nós e que é muito maior que o nosso ego e nossa mente consciente (é indefinível), de maneira geral projetamos o si mesmo em corporações (grandes empresas), pessoas de prestígio, presidentes, grandes artistas e esportistas, ou mesmo em figuras mitológicas de deuses. Nos sonhos, o si mesmo aparece em figuras sábias e superiores, como deuses ou deusas, a figura do Velho-Sábio, heróis e outros. Stein (2006) afirma que, “para Jung, o si mesmo é transcendente, o que significa que não é definido pelo domínio psíquico nem está contido nele, mas situa- se, pelo contrário, além dele e, num importante sentido, define-o”. É nesse ponto que a definição de Jung sobre o si mesmo se difere dos demais teóricos do si mesmo, como Kohut (STEIN, 2006). Para Jung, o si mesmo não se refere paradoxalmente a si mesmo. É algo muito maior que a subjetividade do indivíduo,

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e sua essência situa-se além do domínio subjetivo. Para Stein (idem), o si mesmo é a base para que o sujeito exista no mundo como ser onde sujeito e objeto, o ego e o outro juntam-se num campo comum de estrutura e energia. Podemos, assim, entender o si mesmo como origem e centro da vida psíquica e como sua realização como objeto – um conceito que, muitas vezes, foi visto por muitos pesquisadores como uma imagem de Deus e, por isso, o consideravam inaceitável. Nesta dissertação, não iremos debater as possíveis referências e discussões sobre o sentido metafísico e mítico, muitas vezes associado ao conceito do si mesmo, vamos nos ater ao si mesmo como o centro, o maestro, ou orquestrador de todo o processo psíquico, que interage continuamente com todos os processos e ações psíquicas. Para Samuels (1988), a interação permanente entre o ego e o si mesmo, envolvendo um processo contínuo de referência ego-si-mesmo, expressa-se na individualidade da vida de uma pessoa. Essa interação é parte contínua do processo de individuação (SAMUELS, 1988, p. 193). Podemos dizer que, sem o trabalho do si mesmo, não existe qualquer tipo de regulação da psique e, por conseguinte, o processo de individuação. Cabe, assim, ao ego, “o centro da consciência”, responder e intermediar as solicitações do mundo exterior e do si mesmo, sendo responsável pela adaptação. Sem a participação do ego não há conscientização e, por conseguinte, o processo de individuação. O processo de individuação ocorre nesta interação Ego-si-mesmo ou Ego-Self, em um trabalho contínuo de adaptação ao ambiente externo, criação de Personas, e interno, negação das personalidade e desejos que foram excluídos, a Sombra, para posteriormente, realizar a tarefa principal do processo de individuação, o reconhecimento das sombras e sua integração à consciência. É neste momento, quando consciente e inconsciente ordenam-se em torno do si mesmo, que a personalidade se completa, sem nunca parar de se desenvolver. O si mesmo será o centro da personalidade central, como o ego é o centro da consciência.

No processo contínuo a que Jung chama de individuação, a força impulsionadora é o si mesmo, e o mecanismo pelo qual emerge na vida consciente do indivíduo é a compensação. Isto é igualmente verdadeiro tanto na primeira como na segunda metade da vida. (STEIN, 2012, p.158).

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Podemos concluir – e adotar para esta dissertação – que o si mesmo é a força que nos impulsiona a trazer algo novo para a consciência, através do jogo conduzido e orquestrado por ele para que o ego ceda a seus impulsos de forma inconsciente e conscientemente quando a sombra estiver em vias de ser assimilada. Visto pela ótica do processo de individuação vivenciado dentro de uma organização, o si mesmo é responsável por instigar e impulsionar o indivíduo a se desenvolver em seu ambiente de trabalho, modificando e recriando sua persona conforme as exigências do si mesmo. Enquanto o ego deseja que as coisas estejam dentro de seu controle, atendendo a suas normas e regras em comum acordo e aceitação da persona organizacional do indivíduo (identidade organizacional ou do trabalho), o si mesmo é o responsável por trazer os questionamentos, as inquietudes, desejos de mudança e de transformação através da manifestação inconsciente dos opostos, sombra e anima/animus, que requerem mudança e transformação, uma ampliação de consciência a cada manifestação do si mesmo. Dois problemas com relação ao si mesmo devem ser observados, uma vez que afetam tanto o indivíduo como a organização: a identificação com o si mesmo ou o distanciamento. A identificação com o si mesmo leva o indivíduo a sentimentos de onipotência (os maníacos por poder na organização), ou depressão devido a uma sensação de impotência e falta de autoestima, algo típico de se notar em uma corporação, que pode estar atrelado à identificação com o si mesmo ou à sombra, ou a uma persona desequilibrada do indivíduo. A identificação com o si mesmo, muitas vezes, está associada a quadros de narcisismo. O distanciamento, por sua vez, leva os indivíduos a uma posição defensiva, muitas vezes extrema, tornando-os, por vezes, extremamente racionais, onde tudo deve ser mensurável e quantificável. O distanciamento é tão prejudicial ao indivíduo quanto à identificação, porém, para a organização, o distanciamento tem se mostrado um tema mais prejudicial, afetando, de forma mais ampla e, muitas vezes, “velada”, os funcionários. Geralmente, é refletido em falta de criatividade, de espontaneidade e de um volume menor de insights, devido à necessidade de racionalidade, padronização e organização do indivíduo com essa característica,

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acarretando, assim, em perdas mais claras a organização, especialmente nos dias atuais onde a mudança e a necessidade de criatividade são constantes.

2.2. Persona

A persona é, pois, um complexo funcional que surgiu por razões de adaptação ou de necessária comodidade, mas que não é idêntico à individualidade. O complexo funcional da persona diz respeito exclusivamente à relação com os objetos.” (JUNG, [1921], 2011e, par. 755).

Neste mesmo livro, Jung (idem, par. 758) ainda segue: “Denomino persona a atitude externa, o caráter externo; e a atitude interna denomino anima, alma”. A persona é, portanto, a identidade externa, a face, a imagem que o indivíduo usa para confrontar e se adaptar ao mundo. A persona é o oposto da sombra e, segundo Jung, um mediador entre o ego e o mundo externo (SAMUELS, 1986). A persona é a forma com que o indivíduo se mostra, mas não é de fato quem ele é. A persona tem função de mediar o intercâmbio e o relacionamento do ego com os objetos externos e, para isso, é formada com base nos critérios culturais, morais e éticos de uma determinada sociedade. Um indivíduo, então, poderá ter diferentes personas para que possa se adaptar, da melhor forma, aos diferentes ciclos sociais que frequenta, por exemplo, o trabalho, a família, a roda de amigos. A persona é formada pela interação com o inconsciente coletivo que impulsiona o indivíduo a se adaptar a determinados comportamentos do local e da época. Quando o indivíduo consegue trazer a consciência para esse processo de adaptação, ele dá forma a sua persona. Moreno (1993), em sua teoria dos papéis no mundo social, descreve que a autoimagem depende da persona e, quanto mais personas, ou seja, papéis o indivíduo puder desempenhar na vida, mais saudável, equilibrado e adaptável ele será, diminuindo, assim, as defensivas psíquicas que um indivíduo tem quando se sente inseguro em determinado ambiente. Diferentemente da sombra, o ego aceita a persona. Ele não é a persona, mas aceita sua presença, pois ela é sua forma de adaptação ao mundo externo. O processo de individuação exige, inicialmente, o trabalho de despir-se da persona ou das personas que não são de fato o indivíduo em sua essência, que não o tornam autêntico. De acordo com Hopcke (1995), no processo de

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individuação, o indivíduo deve, inicialmente, trabalhar a conscientização de suas personas, identificando como elas trabalham e como não, criando, assim, uma persona mais individual e autêntica a sua natureza e que lhe permita navegar (usar essa persona) tanto no mundo externo como interno. Esse processo de conscientização e reorganização da persona pode parecer simples, mas não o é. A persona não é a identidade do indivíduo, mas faz parte da mesma. A identificação com a persona é um dos grandes problemas do processo de despir-se da persona existente. A identificação diminui sua capacidade de adaptação e de realizar algo novo. Quando há identificação com a persona, não há diferenciação entre ego e si mesmo. Com isso, não há necessidade de mudança; o indivíduo identificado com a persona é o todo poderoso. Na organização, a identificação com a persona corporativa faz com que o indivíduo se comporte, muitas vezes, com as características requeridas pela persona da organização – podemos dizer que ele e o “crachá” estão fundidos. A imagem social projetada da organização é trabalhada em ações de marketing interno e externo, focando no que a organização tem de melhor, o que ela realiza para a sociedade e para os seus colaboradores. Esse mecanismo gera certo conforto para os indivíduos que participam da organização, pois, ao alinhar suas personas com a da organização, passam a se organizar e trabalhar conforme as expectativas da organização. Inflam-se com as conquistas desta, assim como se frustram quando a organização não está bem – porém, isso também os torna alienados e menos conscientes de si-mesmo.

2.3 A Sombra

A “coisa que uma pessoa não tem desejo de ser” (SILVEIRA, 2007). Essa foi talvez a definição mais simples e mais completa de sombra dada por Jung, em um texto de 1945. A sombra é o lado negativo da personalidade do indivíduo, o que ele deseja esconder da sociedade e de si mesmo, seu lado negativo, primitivo, obscuro e mal. Para Jung (2011g), todos temos diversas sombras, partes nossas que negamos consciente ou inconscientemente. Todo ego tem uma sobra e, em seu

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trabalho de enfrentamento e adaptação ao mundo, o ego, involuntariamente, utiliza- se das sombras de forma consciente ou inconsciente (é ajudado), para executar operações desagradáveis para seus conceitos morais.

Infelizmente, não se pode negar que o homem como um todo é menos bom do que ele se imagina ou gostaria de ser. Todo indivíduo é acompanhado por uma sombra, e quanto menos ela estiver incorporada à sua vida consciente, tanto mais escura e espessa ela se tornará. Uma pessoa que toma consciência de sua inferioridade, sempre tem uma possibilidade de corrigi-la. Essa inferioridade se acha em contínuo contato com outros interesses de modo que está sempre sujeita a modificações. Mas quando é recalcada e isolada da consciência, nunca será corrigida. E além disso há o perigo de que, num momento de inadvertência, o elemento recalcado irrompa subitamente. De qualquer modo, constitui um obstáculo inconsciente, que faz fracassar os esforços mais bem-intencionados. (JUNG, [1952], 2011h, par. 131).

A sombra é composta por qualidades e características incompatíveis com o ego consciente do indivíduo. A sombra, assim como a persona, são “figuras” estranhas para o ego, mas, no caso da persona, o ego a identifica e tolera de alguma forma, pois permite que seja aceito em determinados círculos da sociedade. A sombra é o oposto da persona; ela não é identificada pelo ego e, algumas vezes, completamente negada pela inconsciência. Podemos dizer que a “persona” é como a máscara do ator, uma roupagem que colocamos para determinadas situações e lugares, algo que nos permite adaptar-nos e sermos aceitos, por isso o ego, por mais que não se reconheça com todas as personas do indivíduo, identifica-se de alguma maneira. Já a sombra é o oposto, uma subpersonalidade que quer ou faz o contrário do que a persona e o ego não permitem. Mefistófeles, no Fausto de Goethe, é um exemplo clássico, assim como o Dr. Jakyll e sua sombra Mr. Hide. A maioria das pessoas não conhece a sua sombra. As defesas do ego são tão rígidas e bem elaboradas que um trabalho de introspecção, em geral, é insuficiente para que o indivíduo se conscientize por si. Pedir a amigos íntimos e pessoas próximas da família ou trabalho é a forma mais simples de descobrir os pontos sombrios. A partir dessa primeira conscientização, cabe ao indivíduo trabalhar o tema consciente e emocionalmente.

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Abrir-se, assimilar a sombra é parte essencial do processo de individuação, ao mesmo tempo que parece imoral perante o ego rígido; é um passo importante do indivíduo para sua totalidade. É o dilema de Fausto, viver o outro lado da vida, o lado sombrio e de prazeres que antes não lhe eram conhecidos ou negados, através do que lhe permitiu a sua sombra, Mefistófeles. Quando traços da sombra se tornam, de alguma forma, conscientes e integrados, o indivíduo se torna diferente do que ele era e de uma pessoa comum (STEIN, 2012). Para Jung (2011g), esse conflito entre sombra e ego, sombra e persona é que nos permite evoluir; é uma oportunidade de crescer e de nos “integrarmos”. Há uma tensão entre esses dois polos durante o processo de individuação, e é aqui que o inconsciente pode nos oferecer uma solução criativa em forma de símbolos – processo esse que pode ser observado quando o indivíduo passa por terapia e através de suas experiências de vida. A integração da sombra e persona não significa que anulamos o que antes parecia imoral e incorreto – não há luz sem sombra e não há bem sem mal. Mas, quando a psique do indivíduo se harmoniza com esse todo, há uma ampliação de consciência e de potenciais psíquicos. “Não nos tornamos humanos por imaginarmos figuras de luz, mas por nos tornarmos conscientes da escuridão. O segundo procedimento, no entanto, é desagradável e, portanto, impopular.” (JUNG, [1954], 2011i, par. 335). A sombra nunca é experienciada diretamente pelo ego; por ser inconsciente, ela é projetada no outro. Trabalhar a sombra é, então, ter consciência daquilo que há de negativo em nós e que não vemos, não aceitamos. A sombra são as “críticas” e “feedbacks” dos inimigos e amigos, que veem o que, para nós, é um “ponto cego”, rejeitado por nosso ego. Reações excessivas e exageradas para coisas pequenas ou do cotidiano também são um sinal de uma possível sombra, que nos “pega” quando o ego baixa sua guarda. Uma exceção são os “ovelhas negras”, psicóticos e “serial killers”, que desejam, conscientemente, expressar seu lado negativo ao invés de uma persona adaptada ao ambiente. A integração da sombra e persona são a tarefa da individuação. O si mesmo busca a totalidade e, para isso, depende que sombra e persona estejam em equilíbrio. A persona não deve estar distante das necessidades do si mesmo e, ao

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mesmo tempo, deve dar espaço para os conteúdos da sombra que, de maneira geral, não são malignos. É um processo complexo onde o indivíduo passa a tolerar mais as suas falhas e limites, projetando, cada vez menos, no outro, suas desculpas e dificuldades, ampliando sua consciência sobre suas necessidades e potencialidades. Em uma organização, a sombra se manifesta da mesma forma. Ela é formada por tudo aquilo que a organização nega, todo seu lado obscuro e falho. Ao participar de uma organização, o indivíduo se depara também com a sombra da organização e interage com ela de forma inconsciente. O contato com essa sombra, muitas vezes, é o que lhe motiva a entrar nessa organização. (ZIEMER, 1996). O indivíduo, ao entrar para uma organização, geralmente, está projetando sua sombra nela, podendo, assim, repetir velhos padrões dentro da organização. A identificação do indivíduo com a corporação, pode estar relacionado a sua sombra, algo que lhe falta e que ele vê na organização que, incialmente, o conforta e preenche, mas que, ao ser conscientizado, volta a ser um vazio, caso não seja reintegrado pelo ego.

2.4 As Fases da individuação

Silveira (1997), em seu livro Jung, Obra e Vida, fez uma descrição das fases da individuação definidas por Jung:

2.4.1 O “desvestimento” das falsas roupagens da persona

Em sua adaptação e contatos com o mundo exterior, o indivíduo assume uma aparência que não corresponde ao seu modo autêntico de ser. As suas personas o permitem se apresentar como os outros esperam que ele seja. É muito comum o indivíduo se fundir com suas personas, confundindo-se com sua função no mundo, seu cargo, seus títulos, reduzindo-se a essa vestimenta que utiliza para participar do mundo chamada persona. Como a persona foi formada mediante os moldes da psique coletiva, justamente para atender à demanda de adaptação do indivíduo ao coletivo, nesta

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fase do processo de individuação, espera-se que o indivíduo comece a tomar consciência de que ele não é o que representa. É uma fase de questionamentos internos sobre sua função e forma de agir no mundo contra aquilo que ele entende que deve ser – fase esta que pode ser antecedida ou seguida da conscientização de suas falhas e limites. É nesse momento que a máscara cai e, quando isso ocorre, o indivíduo passa a ver em si uma face desconhecida, uma face sombria, percebendo seus erros e defeitos – é o encontro com a sombra.

2.4.2 O encontro com a “Sombra”

Nesse momento do processo de individuação, o indivíduo já tomou conhecimento através de um processo terapêutico, ou por outros, de suas sombras e passou a tomar consciência de seus limites, erros e defeitos, de tudo que ele sempre negou. No momento em que se tem conhecimento e mínima consciência da sombra, as próprias projeções diminuem, ou são mais facilmente percebidas pelo indivíduo.

2.4.3 A confrontação com a Anima ou Animus

O conceito de anima e animus é complexo, mas, para efeitos desta pesquisa, adotaremos o conceito de Hopcke (1995) que resumiu o conceito de anima e animus como sendo o lado oposto inconsciente do homem (anima) e da mulher (animus), sendo a anima o lado brando, caloroso, emocional e espiritual por trás da masculinidade, da força, da necessidade de poder e da racionalidade do homem. O animus é o oposto para a mulher. Anima e animus são, então, os guias para o inconsciente, a forma de acessarmos nosso si mesmo e de obtermos o equilíbrio psíquico e a nossa totalidade. Uma vez entendido o papel da anima e animus, fica simples compreender essa fase do processo de individuação, onde a anima, para o homem, e o animus, para a mulher, são os guias para o si mesmo.

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O acesso ao si mesmo e a possibilidade de integração só se dá através da anima e animus, onde cada um traz, respectivamente, para o homem e para a mulher, o seu contraponto. O homem acessa, então, seu lado feminino, e a mulher, o seu lado masculino. O homem cujo ego integrou conscientemente sua anima adquire o potencial de melhor lidar com seus sentimentos, de melhor se relacionar com a mulher e abre caminho para as vivências do Self. A mulher cujo ego integrou conscientemente seu animus adquire potencial de melhor lidar com sua capacidade reflexiva, de melhor se relacionar com o homem e abre caminho para as vivências do Self. O caminho da individuação faz-se, então, através do equilíbrio da psique masculina assumindo seu lado feminino que lhe permite ser mais brando, emocional e carinhoso e, no caso da mulher, através da determinação, foco e outras características masculinas, sem que haja possessão por parte da anima ou do animus – o que significa um transtorno de personalidade e evidência de características do sexo oposto no indivíduo.

2.4.4 A integração com o Self

A vivência do Self pode ser alcançada mediante essa busca constante e inerente ao ser humano de se desenvolver, e onde, através de seus acertos e erros, ele enfrenta seus desafios psíquicos. O confronto do Ego com o Self surge ao se confrontar a persona, a sombra e a anima ou animus. Quando o ego incorpora conscientemente o Self, integra-se a ele. Não mais o ego, mas o Self consciente passa a ser o “comandante” da psique. A vivência do Self traz algo de numinoso, de sagrado, um sentimento de integração com si mesmo, com os outros, com a natureza e com Deus. A vivência do Self não exclui a vida material e a sexualidade, muito pelo contrário, integram a vida material e sexual à vida espiritual, aspectos extremamente positivos do Self.

O reconhecimento da própria sombra, a dissolução de complexos, a liquidação de projeções, a assimilação de aspectos parciais do psiquismo, a descida ao fundo do abismo, em suma, o confronto entre consciente e inconsciente, produzem um alargamento do

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mundo interior do qual resulta o centro da nova personalidade, construída durante todo esse labor, não mais coincida com o ego. O centro da nova personalidade estabelece-se agora no Self (SILVEIRA, 1997).

A integração, essa nova consciência do indivíduo que passa a ter como centro da personalidade o Self, é a meta final da individuação, que pode não ocorrer para a maioria. Na verdade, parece ser algo intangível para meros mortais, mas deve ser uma busca constante, pois é o que leva o indivíduo a ampliar sua consciência e a seguir seu caminho de individuação. Podemos dizer, assim, que a busca por consciência, a busca do viver o que nos é permitido, como sendo o caminho de integração com o Self é o caminho de individuação.

2.5 Considerações sobre o capítulo

O caminho de individuação de Jung (1921) trata do desenvolvimento psicológico tendo como fim tornar-se uma personalidade unificada, um indivíduo único e integrado ao todo. Esse conceito, sem dúvida, é complexo e, provavelmente, algo que não se pode atingir. Dessa forma, deve ser utilizado como um processo de desenvolvimento, autoconhecimento e de análise de defesas e bloqueios da psique que, uma vez trabalhados, nos permite a ampliação de consciência e de potenciais. Barreto (2008) fala da individuação como uma necessidade instintiva e inata do ser humano, uma imposição interna de todo ser humano. Para Silveira (1997), esse embate interno entre consciente e inconsciente é constante. Quando há um “desacordo”, um desequilíbrio, temos os estados neuróticos, e sua cura passa pelo processo de individuação. Silveira (1997) trata das diversas fases do processo de individuação que pode ser resumido como o confronto entre consciente e inconsciente, através do “desvestimento” das falsas personas, do reconhecimento da própria sombra, da dissolução de complexos e da liquidação das projeções. O confronto do indivíduo entre consciente e inconsciente, coletivo e pessoal, se dá, então, nas diversas organizações em que vive – família, escola e no trabalho. Stein (1992) afirma que lidar com uma corporação de trabalho é lidar com seu

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inconsciente pessoal e coletivo e que essa relação, quanto mais intensa for, mais frutífera ou destruidora do processo de individuação pode ser. Ziemer (1996) declara que enfrentar a sombra organizacional é enfrentar tudo aquilo que é inaceitável – comportamentos, atitudes, valores, crenças e normas – e que a corporação não deseja que esteja associado a sua imagem pública. O indivíduo que vive em uma corporação amplia, então, esse confronto, suas possiblidades de ampliar sua consciência e capacidades, ao mesmo tempo suas possiblidades de falhar no processo. O caminho de individuação é constante, ele não tem fim. Viver o caminho da individuação é aceitar o conflito diário com nossas sombras e as sombras coletivas de nossas organizações (STEIN, 1992) – o que exige do indivíduo uma postura de reconhecimento de seus limites, suas falhas e potenciais, procurando, assim, ampliar sua consciência através da relação com o outro, mudando seus comportamentos e realizando suas competências e potenciais ao máximo, tornando-se mais humano e consciente para si e para o todo.

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3. O processo de autorrealização de Abraham Maslow e Carl Rogers

Autorrealização é um termo que tem sido utilizado em várias teorias dentro da psicologia e em diversas outras áreas – muitas vezes, de forma distinta. O termo foi, originalmente, criado pelo teórico organista Kurt Goldstein (1947) no intuito de expressar a realização do pleno potencial. Isso significa expressar a criatividade plena, a busca de iluminação espiritual, conhecimentos e o desejo de dar e transformar a sociedade. Esses são apenas exemplos do que está por trás do termo autorrealização que, sem dúvida, é amplo e complexo de definir em sua totalidade, devido à subjetividade e amplitude do que pretende expressar. Mas, foram Carl Rogers (1951) e Abraham Maslow (1954) que cunharam, aprofundaram e promoveram o termo e as necessidades psicológicas do processo e autorrealização.

A autorrealização é a força curativa em psicoterapia – tendência do homem para realizar-se, para tornar-se suas potencialidades... para expressar e ativar todas as capacidades do organismo. O organismo tem uma tendência básica e se esforça para se atualizar, se manter e ampliar as experiências do organismo (ROGERS, 1951, p.487).

Rogers (1959) afirma que o ser humano tem uma motivação básica, já se referindo às teorias de Maslow, que é a tendência de se auto atualizar, se autorrealizar, ou seja, atingir seu potencial no mais alto nível da “existência humana”. Como uma flor que cresce até seu potencial máximo dentro das condições perfeitas, mas que limitada pelo ambiente, crescerá até seu potencial máximo de acordo com o quão bom é o ambiente e permitir esse crescimento. Maslow (1954), em seu livro, Motivação e Personalidade, começou uma filosófica revolução a partir do qual cresceu a psicologia humanista. Isso mudou a visão da natureza humana, do ponto de vista negativo de que o homem é um condicionado ou tensão, reduzindo o organismo para uma visão mais positiva, em que o homem é motivado a realizar seu pleno potencial. Essa mudança reflete-se na hierarquia de necessidades e em sua teoria da autorrealização.

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Maslow (1954) define a “autorrealização” como “o pleno uso e a exploração de talentos, capacidades e potencialidades”. Em seu artigo A theory of human motivation, Maslow (2012a) define a autorrealização como “o desejo, a tendência para o indivíduo se tornar atualizado (actualized) no que ele tem potencial. Essa tendência pode ser formulada como o desejo de tornar-se cada vez mais o que é, para se tornar tudo o que um é capaz de se tornar”. Para Maslow (1954), a relação do ser humano com suas potencialidades ocorre por meio da gestão de suas necessidades, hierarquizadas desde a esfera biológica, estimuladas por escassez, rumo a necessidades mais elevadas, energizantes de crescimento, como a autorrealização. Para Maslow (idem), as necessidades básicas motivam o ser humano em uma busca para supri-las, e necessidades superiores como a autorrealização proporcional à realização potencial ao indivíduo. Maslow (1954) define a autorrealização, então, como “o desejo de tornar-se tudo aquilo que se é capaz, o ápice da hierarquia das necessidades humanas”. A autorrealização não é um esforço para a redução das tensões, como sugeriria Freud (1969), mas a utilização dos recursos individuais para o crescimento psicológico através da realização de potencialidades.

A pessoal normal, por outro lado, atualiza-se usando suas habilidades, experiências e conhecimento pessoal para crescer psicologicamente, não apenas para reduzir a tensão, evitando o inesperado, mas para expressar sua “alegria de chegar a um acordo com o mundo. (GOLDSTEIN, 1995, p 112).

Para Rogers (1978), a autorrealização é um processo, um fluxo contínuo da vivência humana, é um direcionamento e não um fim. “Existe em todo organismo, em qualquer nível, um fluxo subjacente de movimento para uma realização construtiva de suas possibilidades intrínsecas. Há no homem uma tendência natural para o desenvolvimento completo”. (ROGERS, 1978, p17). Para Maslow (1954), existe uma “hierarquia das necessidades”, um impulso que nos move para atender as nossas necessidades de acordo com uma ordem específica, onde somente quando a necessidade de mais baixo nível for minimamente atendida (esse grau depende do sujeito), é que o indivíduo passa a

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ter necessidades referentes ao próximo nível. Para Maslow (1954), são quatro os níveis hierárquicos de necessidades humanas: a. necessidades fisiológicas: comida, água; vestimenta, moradia, sono, sexo; b. necessidades de segurança: proteção contra qualquer tipo de abuso do ambiente e da sociedade: segurança física, estabilidade, abrigo, saúde; c. necessidade social /contato; pertencimento (amor): relações íntimas, contato social, afiliação, amizade, família; e, d. necessidade de estima e reconhecimento: reconhecimento dos outros, aprovação, carreira, reputação, confiança.

Figura 1: Pirâmide de Maslow

Fonte: King (2010)

Para Maslow (1954), há um ciclo de atendimento das necessidades. Quando uma necessidade, como a de segurança – onde o indivíduo busca estabilidade, proteção, saúde, que podemos traduzir para os dias de hoje como um bom emprego, uma previdência privada e um bom plano de saúde bom –, é minimamente atendida, de acordo com as expectativas e significado que este indivíduo dá a essa necessidade, uma outra necessidade começa a surgir como

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foco, ou seja, o nível superior – neste exemplo, a necessidade de Contato Social, Pertencimento. A partir do momento em que nossas necessidades básicas estão minimamente atendidas, uma nova necessidade surge, o “Self-Actualization” ou “Autorrealização” – uma necessidade que, assim como a “Eudaimonia” de Aristóteles, e a “Individuação” de C.G. Jung, nos impele a buscar significado, autoconhecimento, autonomia, aumento de consciência e realização. Para Maslow (1954), podemos nos autorrealizar nos diversos campos da vida, por exemplo, o trabalho. As pessoas, no processo de "autorrealização", atingiram uma grande parte de suas necessidades de segurança, pertencimento, autoestima e amor. Não possuem nenhuma neurose ou desvio de personalidade crítico e, de forma geral, estão rondando questões religiosas e sobre a existência humana. Maslow declarou (1954, p. 200): "Eu tenho de concluir que autorrealização da forma como é entendida, não é possível em nossa sociedade para os jovens, pessoas em desenvolvimento", pois o indivíduo jovem que ainda está se estruturando em vida, quer seja estrutura psíquica ou material, tem poucas chances de vivenciar em plenitude o processo de autorrealização, por ele ter muitas necessidades básicas ainda não atendidas. Para os indivíduos mais velhos ou para alguns jovens, segundo Maslow (1954), mesmo que todas as necessidades básicas apresentadas sejam satisfeitas, ainda haverá um descontentamento ou inquietação, ao menos que esses indivíduos estejam realizando e cumprindo seu completo potencial que é a autorrealização. Esses indivíduos que atingiram um alto grau no processo de autorrealização têm uma melhor percepção da realidade e uma forte aceitação de si mesmo, dos outros e do mundo. Exibem uma qualidade de "desconexão" com o mundo, um desejo de privacidade (não como os introvertidos). Particularmente, são autônomos e independentes. Possuem um senso "místico de experiências", um senso de humor não hostil e muita criatividade. Eles se aceitam como são e estão em constante busca de crescimento pessoal e para com o mundo; aceitam o mundo e os outros como eles são e vivem em harmonia com esse ambiente.

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3.1. Autorrealização – Um caminho, uma jornada de vida

Mesmo que todos os desejos tenham sido satisfeitos, nós frequentemente teremos (se não sempre) um novo descontentamento e uma nova inquietação logo aparecerá, a menos que o indivíduo esteja realizando o que ele foi feito para realizar. Um músico deve fazer música, um artista deve pintar, um poeta deve escrever, se ele quer ser finalmente feliz. O que um indivíduo pode ser, ele deve ser. Esta necessidade nós podemos chamar de ‘Self-Actualization’. (MASLOW, 2012a, p. 22).

Com base nas definições de Rogers e Maslow apresentadas anteriormente, podemos definir autorrealização como a “força psíquica curativa, movida pela tendência de realizar-se, explorando seus talentos, capacidades e potencialidades, movido pelo desejo de se desenvolver e se tornar quem é, a fim de realizar tudo o que for capaz no mundo” (MASLOW, 1954). A autorrealização é a necessidade humana de realizar ao máximo as potencialidades do indivíduo, é tornar-se tudo que se é capaz de ser. Para que a autorrealização ocorra, algumas condições devem ser atendidas. Para Maslow (1954), além do trabalho e esforço do indivíduo, o ambiente externo deve ser propício à autorrealização, à liberdade de comunicação, de expressão, de escolhas, de defesa, justiça, honestidade e à ordem social – exemplos de condições prévias para a satisfação básica das necessidades e, por conseguinte, da autorrealização. A autorrealização não é um processo apenas interno do indivíduo, como o caminho de individuação de Jung. Para Maslow (1971), a autorrealização requer ações com o mundo externo, com o ambiente. A autorrealização “não é apenas uma aspiração vindo de dentro. É também um trabalho árduo, que envolve uma convocação para o serviço vinda do mundo exterior” (MASLOW, 2000, p.8). As pessoas autorrealizadas “ouvem sua própria voz, assumem a responsabilidade, são honestas e trabalham duro”. (MASLOW, 1971, p.49). Dessa forma, mesmo que todas as necessidades básicas estejam minimamente satisfeitas, pode haver diversas condições que impeçam ou prejudiquem o desenvolvimento da autorrealização. Para Maslow (1971), os fatores externos podem impedir que o indivíduo se autorrealize; com isso, determinados ambientes podem ser prejudiciais à autorrealização, dependendo das características e necessidades de cada indivíduo. 42

Segundo as teorias de Maslow (idem), o indivíduo ressignifica suas necessidades e desejos ao longo da vida para se adaptar a determinadas condições. Essa ressignificação também é imposta pelo ambiente externo e não somente pelo interno do indivíduo. As mudanças radicais de vida – por exemplo, largar uma carreira de sucesso e começar tudo novamente em determinada fase da vida – fazem parte desse processo.

3.2. Autorrealização – características

A psicanálise freudiana observa a pessoa a partir de seus comportamentos problemáticos; o behaviorismo visualiza as pessoas como seres passivos, ou seja, que não possuem muitas opções para influenciar o ambiente. A visão de Carl Rogers, o humanismo, no entanto, era completamente diferente de ambos, porque considera o ser humano como um indivíduo ativo e dono de sua própria realização. Para Rogers (1951), uma pessoa que presta atenção ao processo de valorização orgânica é uma pessoa plenamente funcional ou autorrealizada. Rogers (1951) enfatiza a liberdade dos indivíduos na hora de decidir o rumo de suas vidas. Segundo ele, a personalidade das pessoas pode ser analisada de acordo com uma escala que se aproxima ou se distancia do comportamento de um indivíduo altamente funcional. Maslow (1954) se utilizou do conceito de indivíduo funcional e desenvolveu o conceito de autorrealização ao estudar indivíduos que ele acreditava serem “saudáveis”, ou seja, livres de grandes neuroses e psíquicos e que ele conhecia e considerava “autorrealizados”, incluindo Abraham Lincoln, Eleanor Roosevelt, Thomas Jefferson e Albert Einstein. O autor procurou identificar características comuns entre eles com o intuito de compreender e definir as características das pessoas autorrealizadas. Para ele, as principais características das pessoas autorrealizadas são: 1) Elas têm uma percepção de realidade mais eficiente: há uma melhor percepção da realidade independente de suas crenças e opiniões. São mais rápidas e precisas que a grande maioria das pessoas nesta avaliação.

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2) Aceitam a si a aos outros – defeitos e virtudes: há uma clara percepção de quem é, e não como deseja ou gostaria de ser. Alto nível de autoestima e aceitação de si e do outro como ele é. 3) São espontâneas: possuem comportamento espontâneo sem desejar parecer o que não são. 4) São centradas no problema: mantêm o foco no problema externo e não se centram em seu ego. Possuem uma missão de vida, um propósito maior a ser cumprido. 5) Apreciam certo nível de isolamento: convivem bem com o isolamento, muitas vezes por sua característica de foco no problema e em tarefas produtivas. Não necessitam ou têm uma menor necessidade do outro para os apoiar em uma decisão. Alto nível de confiança em si. 6) Possuem autonomia sobre o ambiente: sua motivação não vem do ambiente externo, mas de si mesmo. Usualmente, são descritas como pessoas “positivas” ou “humoradas”, pelo baixo impacto que a negatividade do ambiente lhe impacta. 7) Apreciam o simples: admiram as coisas simples e corriqueiras da vida de forma repetida. 8) São interessadas no bem comum: conectadas com a humanidade, se emocionam e se entristecem facilmente com os problemas humanitários e procuram colaborar, de alguma forma, para desenvolver o ser humano. Muitas vezes, são engajadas em causas sociais. 9) Constroem relações profundas: buscam e vivem relações intensas, de amor, aprendizado e desenvolvimento – isso não significa um número elevado de relações, pelo contrário, mas as existentes são intensas e de colaboração. 10) São admiradas: por sua autonomia, adaptabilidade, humor e forma de tratar os outros. São, usualmente, admiradas e seguidas. Influenciadoras. 11) Há ausência de preconceito: possuem um censo democrático, abertas a conhecer pessoas e a auxiliá-las não importando raça, gênero, idade, hierarquia, crenças políticas, religiosas etc. 12) Possuem padrão moral e ético (próprio): buscam fazer o “correto” dentro de um padrão moral e ético próprio, uma mescla entre os valores culturais

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de seu ambiente e seus próprios valores. Decidem e vivem por suas crenças e valores. 13) Reconhecem e possuem um propósito de vida: definem e trabalham para cumprir sua missão de vida, tomam essa tarefa como sua responsabilidade e dever maior. 14) Resistem à massificação/enculturação: não aceitam tudo que é imposto pela sociedade; adotam aquilo que entendem que os desenvolve, mas, ao mesmo tempo, não rejeitam aquilo que não lhes afeta negativamente, e ainda se permitem conectar-se com os outros. 15) São criativas: não se trata de uma criatividade artística, mas conectada a sua espontaneidade e resistência à massificação. 16) Buscam autonomia: buscam seu espaço e forma de agir, mesmo em locais de maior controle. Enxergam-se como parte do grupo e desejam colaborar sempre, mas necessitam agir à sua maneira, em muitas vezes.

3.3. Atualizações sobre autorrealização

Após mais de 45 anos das teorias de Rogers e Maslow sobre autorrealização, ainda existem várias discussões e erros de interpretação sobre o que é, de fato, autorrealização. Distintos escritores produziram várias definições, centenas de trabalhos se inspiraram ou descreveram alguma forma ou conceito de autorrealização. Por ser muito difusa e complexa, é impossível saber, com certeza, até que ponto um indivíduo atualizou seus potenciais inatos até que esses potenciais sejam efetivamente atualizados. Leclerc (1998) pesquisou as mais diversas fontes, de Rogers (1951), Maslow (1954) a Wilson (1991), a fim de encontrar indicadores que definissem autorrealização. Juntamente com um grupo de especialistas no tema, doutores e psicólogos, divididos em 20 especialistas com domínio da língua inglesa e 20 da lingua francesa e de países diversos, como Canadá, Estados Unidos, França e Bélgica, realizaram uma pesquisa entre eles para determinar quais indicadores eram os mais apropriados e que melhor caracterizam a autorrealização.

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A pesquisa gerou 49 indicadores da autorrealização, descrevendo, de forma mais específica, aqueles que permitem a atualização, o desenvolvimento do indivíduo. Alguns descrevem a atualização dos indivíduos como pessoas que vivem em harmonia com eles mesmos, sentem-se responsáveis por suas próprias vidas e estão em bom contato com a realidade, "aceitar a si mesmos como são", "estar conscientes de seus sentimentos", “ter auto-estima”. Esses são alguns dos atributos e indicadores. Outros descrevem as pessoas abertas a relacionamentos interpessoais, capazes de serem verdadeiras para si mesmas, bem como entender os outros e estabelecer relacionamentos calorosos e significativos como "agir de acordo com suas convicções e valores", "sentir-se livre para expressar suas emoções", "pode fazer sem a aprovação dos outros," aceitar os outros como são” dentre outros. Existem, ainda, os que se referem a uma abertura e compromisso com a vida em geral e com preocupações mais amplas, com o meio ambiente e o bem comum, como "dar sentido à vida", "ter um senso de maravilha", "ser capaz de compromisso", "preocupar-se com o bem comum” etc. Temos, então, uma amplitude e complexidade para definir autorrealização que torna praticamente impossível definir o que muitos querem definir como um estado. O que precisamos ver é que a grande maioria dos autores, os pioneiros e os mais recentes, insistem na ideia de que a “autorrealização” é um processo de desenvolvimento e não um estado de ser e um elemento fundamental a ser considerado ao definir “autorrelização”. Este aspecto é claramente enfatizado por Maslow em sua definição de autorrealização: "o pleno uso e a exploração de talentos, capacidades e potencialidades" (ROGERS, 1970, p.150). Isso estabelece a ideia de um desenvolvimento contínuo do potencial do indivíduo como um aspecto central da autorrealização. A mesma ideia de um processo de desenvolvimento está presente na definição de auto-atualização de Rogers (1951) como "a tendência inerente do organismo para desenvolver todas as suas capacidades de forma a servir para manter ou melhorar o organismo". A ideia de um processo contínuo em oposição a um estado de ser é explicitamente mencionada em muitos artigos mais recentes sobre autorrealização (ver BOZART & BRODLEY, 1991; BURWICK & KNAPP, 1991; CHANG & PAGE,

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1991; SELIGMAN, 1998; StARNAUD, 1996; WEISS, 1991; WILSON, 1991) e particularmente, na definição pelo Dicionário enciclopédico da psicologia (HARRE & LAMB, 1983, p.559): "a tendência inerente à autorrealização, à exclusão e à conquista da autonomia das forças externas. É um processo e não um estado final". De acordo com a pequisa, embora os indicadores possam parecer, em primeiro lugar, descrever as qualidades do estado final do indivíduo, na mente daqueles que os formularam, eles, provavelmente, representam as características externas de um processo contínuo de desenvolvimento pessoal. Isso explica a tendência de entender os indivíduos como "indivíduos auto-atualizadores...auto- realizadores” em vez de "indivíduos auto-atualizados...auto-realizados". Para Rogers (1951), isso ocorre por haver dois tipos de conexão que são encontrados nos indivíduos que atualizam seu potencial: uma conexão entre “consciência e experiência” e uma conexão entre “comunicação e conscientização” (FORD, 1991). O primeiro tipo de conexão está presente quando os indivíduos estão plenamente conscientes e em contato com suas experiências de si mesmos, dos outros e do mundo. Esta primeira característica essencial pode ser chamada de “abertura para a experiência”. O segundo tipo de conexão ocorre quando a comunicação dos indivíduos corresponde à sua consciência, ou seja, quando sua fala e comportamento refletem verdadeiramente seus pensamentos, valores e convicções e não depende das demandas e expectativas dos outros. Este segundo traço essencial pode ser designado pela referência a si-mesmo. Esses dois níveis de conexão permitem que a informação decorrente da experiência circule livremente através de todo o organismo (CSIKSZENTMIHALYI, 1990; SEEMAN, 1988), permitindo que a tendência atualizadora se manifeste completamente em um processo contínuo. A existência desses dois traços essenciais pode ser observada através de atributos ou indicadores. Chega-se, então, à conclusão de que a autorrealização é “um processo pelo qual o potencial de alguém é desenvolvido em conexão com a autopercepção e a própria experiência”.Se quebrarmos essa definição em seus componentes, temos:

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“Um processo...”: essa é uma cadeia dinâmica e organizada de fenômenos cronológicos em oposição a um estado de ser. Esse processo, impulsionado por uma tendência fundamental presente em todo ser humano, é universal (não se limita a uma classe ou cultura) e único (cada pessoa tem o seu próprio modo de atualizar). “...pelo qual potencial o potencial de alguém é desenvolvido...” : o objetivo final da tendência fundamental é o crescimento da pessoa completa através da maximização e melhoria (desenvolvimento) do potencial ou recursos da pessoa. “...em conexão ...”: A integração desse desenvolvimento deve resultar em um organismo que funcione harmoniosamente. “...com a autopercepção e a própria experiência.”: esse aspecto refere-se ao primeiro nível de conexão de acordo com Rogers. Esse tipo de conexão implica dicidir e agir de acordo com a auto-imagem e os valores e ser capaz de resistir às pressões sociais. Pode-se dizer, então, que um indivíduo em um grau mais alto do processo de autorrealização precisa ter a “capacidade de ser altamente consciente e ter uma percepção clara do que realmente está acontecendo em sua experiência de si mesmo, dos outros e do mundo”. Através da experiência, se está constantemente em interação consigo mesmo, com os outros e com o meio ambiente. Em resumo, a autorrealização é um processo contínuo, complexo e integrado entre a estrutura psíquica, no qual a ampliação de consciência e as experiências do indivíduo estão totalmente conectados.

3.4 Autorrealização nas teorias de Gestão e Ciências do Trabalho

O termo autorrealização e a teoria de Maslow foram, e ainda são amplamente utilizados pelos pesquisadores das áreas de trabalho e gestão empresarial, porém existem severas críticas sobre a forma redutivista de como esse conceito tão amplo foi utilizado. Na maioria dos casos, foi utilizado para encontrar uma forma de motivação e maior produtividade para a empresa sem levar em conta o principal ponto da autorrealização que é o indivíduo, pois a autorrealização é um processo único de cada um.

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Para Baxter (1982), existe um estranhamento e uma alienação nas organizações com relação à ideia de autorrealização. A busca pela autorrealização tem sido feita de forma incoerente por erros no entendimento do próprio conceito de Maslow (1954), bem como da forma encontrada pelos cientistas sociais e do trabalho. Em essência, o termo autorrealização é um conceito onde o homem, através de suas atividades, procura preencher, completar a si mesmo, crescendo e se desenvolvendo além de suas limitações. Maslow (idem) procurou reestabelecer a união entre o "self" (Eu), como sujeito, e o ambiente, como "Outro" (Other), não reduzindo o eu ao serviço do outro, mas explorando os potenciais humanos no contexto de interação mútua entre o eu e o outro. Maslow (1954) estabeleceu as pré-condições necessárias para que essa condição de autorrealização aconteça, propondo que o indivíduo, primeiramente, satisfaça suas necessidades básicas, antes de satisfazer as mais altas, nas quais a autorrealização é a mais alta de todas. Muitos dos pesquisadores desacreditaram a teoria de Maslow, pois ela não permite uma utilização ou associação direta com motivação da força de trabalho e, consequentemente, maior produção e desempenho. Esses cientistas organizacionais esqueceram, porém, que a autorrealização é relacionada à satisfação e ao crescimento pessoal e não à organização; o foco é o indivíduo e não a empresa. A maior parte dos pesquisadores da área das ciências organizacionais procura, dentro da teoria da autorrealização, encontrar uma forma de aumentar a motivação e, consequentemente, a produtividade dos indivíduos, de forma generalizada e replicável. As necessidades da corporação são exatamente o oposto da visão de autorrealização de Maslow. Mesmo em sua vida privada, o indivíduo é consumido pela pressão psicológica de crescimento, mas, principalmente, pela invasão em seu ciclo pessoal das repressões e imposições das organizações. Ao mesmo tempo, trabalhar em uma corporação, para muitas pessoas, é a experiência mais rica e desafiadora que eles podem experenciar. Absorve todos os aspectos desta pessoa, porque, intencionalmente, procura utilizar as partes não usadas do eu, redefinindo,

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assim, o que não foi usado, dando uma sensação de preenchimento. (GOULDNER, 1970). Responder aos desafios da vida dá ao indivíduo a confiança e a força ontológica para agir e influenciar situações futuras; consequentemente, permite ao indivíduo expressar suas necessidades na complexidade de suas respostas e ações para com o mundo. Mas, segundo Baxter (1982), a interação Eu-Outro (Organização) não é possível em um contexto de trabalho organizado, pois o mesmo é monotemático (orientado a produção). O Outro/Organização não entende e não permite uma relação espiritual, um "Deus Corporativo", não podendo atender às complexas necessidades psicológicas do “eu” para garantir o crescimento ontológico. Baxter (1982) ainda menciona que a religião pode ser um caminho para que o indivíduo suporte as pressões do mundo dos negócios, não somente como uma barreira e suporte ao sistema autônomo da organização do trabalho, mas pelo fato de criar um sentido maior a totalidade de "Ser". Pascoale e Athos (1981) argumentam que as organizações de trabalho necessitam de uma "consciência espiritual" embutida em sua filosofia de gestão com o intuito de reunificar a divisão entre indivíduo e produção, criando uma organização que realize um papel complexo na vida do indivíduo. Essa “consciência espiritual”, “Deus Corporativo” ou qualquer outro símbolo, ou conexão que o indivíduo procura, são necessários para que haja uma significância. Encontrar um significado onde o indivíduo desenvolva seus potenciais é equilibrador. Encontrar um significado pode, muitas vezes, ser mal-entendido como atender às necessidades de autoestima, afirmação, segurança e outras definidas por Maslow. Muitas corporações tentam realizar o que Herzberg (1959) sugeriu, incorporando os aspectos essenciais da autorrealização dentro do sistema fechado das organizações de trabalho, enfatizando que trabalhos que aparentemente permitem ou encorajam a autorrealização, usualmente levam o indivíduo a um aumento de satisfação e de produtividade. Nesse caso, empresas que geram mais oportunidades, delegam, premiam e promovem mais, permitem que seus colaboradores tenham uma sensação de “autorrealização” falsa, pois apenas se tornam dependentes da continuidade desse ciclo. Essa falsa autorrealização só

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acontece através de novas oportunidades, criando uma dependência do indivíduo para com a organização. Para Goldthorpe (1968, p.180), é compreensível que trabalhadores instrumentais entendam que seu trabalho jamais será do tipo marxista ou masloviano, mas simplesmente "trabalho". Esses indivíduos conseguem se desconectar, psicologicamente, das metas e obrigações de uma maneira ampla; eles geram um novo significado ao trabalho, encontrando significado em algo externo, colocando o trabalho em uma condição de meio e não de fim para suas necessidades mais altas. Isso só é possível através de uma força e coragem adquirida sobre muita consciência de suas potencialidades. Essa autoconsciência é necessária para encorajar os indivíduos dentro das organizações. O indivíduo com uma maior consciência dessa relação está aberto para novos desafios e perspectivas e tem a habilidade de ver as metas da organização como elas realmente são: end-states definidos arbitrariamente dando à organização um propósito e uma coerência que ela não tem naturalmente. Parece-nos, então, que é uma meta quase que inatingível a autorrealização no trabalho dentro das possiblidades apresentadas neste capítulo, porém para Baxter (1982), a relação Eu-Outro de reciprocidade e o trabalho não alienado são a chave para a autorrealização neste campo. Segundo Baxter (1988), um trabalho não alienado é um trabalho com significado para o indivíduo, onde se desenvolve a autenticidade juntamente com uma relação profunda Eu-Outro através do trabalho de reciprocidade (comunidade), auto produtivo e não limitado à satisfação instrumental. Para Baxter (idem), só existe autorrealização no trabalho quando existe uma relação de reciprocidade na relação Eu-Outro a ponto de nos permitir realizar a consciência “em si”.

3.4.1 A Autorrealização profissional

A autorrealização profissional é uma da forma significativa de autorrealização, pois o trabalho é fator de identidade do indivíduo. Para Dejours

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(1992), o trabalho é um status social, não é apenas uma forma de ganhar a vida, é formador da identidade do indivíduo. Maslow (2000) amplia esse conceito para os indivíduos evoluídos, autorrealizados, afirmando que “esses indivíduos altamente evoluídos assimilam o seu trabalho como identidade, ou seja, o trabalho se torna parte inerente da definição que eles fazem de si próprios”. Gewirth (1988) nos traz um resumo sobre autorrealização profissional compilando a ideia de diversos autores. Ele, inicialmente, divide a autorrealização profissional de duas formas: • Externa – permite atingir ganhos significativos em vários aspectos da atividade profissional; • Interna - melhora significativa das competências profissionais e desenvolvimento de qualidades importantes em sua profissão ou área de atuação. A partir deste ponto, Gewirth (1988) define 10 atributos para a autorrealização profissional: • Interno: 1. uma necessidade de crescimento profissional; 2. a existência de um projeto para o desenvolvimento profissional próprio; 3. satisfação nas próprias conquistas profissionais; 4. constante estabelecimento de novas metas profissionais; 5. criação de um "Espaço profissional/vida pessoal" próprio; • Externo: 1. atingimento dos objetivos profissionais desejados; 2. reconhecimento das conquistas pela comunidade de profissionais; 3. uso da experiência profissional e conquistas pessoais por outros especialistas; 4. desenvolvimento das habilidades pessoais através de uma profissão escolhida; 5. demonstração de alto nível de criatividade em atividades profissionais. Os atributos encontrados por Gewirth (1988) reforçam a afirmação de Maslow (2000) de que o trabalho é parte inerente da identidade do indivíduo que

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se autorrealiza nesse campo. A autorrealização profissional só é obtida quando há busca e obtenção de autonomia para realizar novos projetos, inclusive o de desenvolvimento próprio, através do constante desenvolvimento de suas capacidades profissionais, atingimento de metas e a colaboração e reconhecimento dos profissionais da comunidade.

3.5 Considerações sobre o capítulo

Maslow (1954) definiu a autorrealização como “o pleno uso e a exploração de talentos, capacidades e potencialidades”. O desejo e a possiblidade de tornar- se tudo o que se é capaz de ser é o ápice da hierarquia das necessidades, só alcançada quando as necessidades básicas forem minimamente atendidas. Diferentemente de ser o que somos, pois não temos como saber exatamente a extensão do que somos, Maslow (1954, 2000) define a autorrealização como um processo contínuo de exploração, aprendizado e desenvolvimento de capacidades. A autorrealização depende da interação e da força do indivíduo com o mundo exterior. Ações e eventos externos, porém, podem inibir ou prejudicar a autorrealização do indivíduo. Para que essa interação ocorra, o indivíduo necessita ter uma melhor percepção da realidade (maior consciência de si e do todo), ter maior aceitação de si e do outro, reconhecer e definir um propósito de vida, construir relações profundas com o outro e buscar autonomia sobre si e sobre o ambiente. Sua motivação vem de si e do significado que dá às coisas e busca seu espaço e age com suas crenças. As corporações, por sua vez, têm se utilizado das teorias de autorrealização para aumentar a motivação e a produtividade, com uma visão exatamente oposta à do indivíduo que é consumido pela pressão psicológica do crescimento e, ao mesmo tempo, tendo seu ciclo pessoal invadido pelas repressões e imposições das corporações. Em muitos casos, há uma sensação de autorrealização “falsa”. Para Herzberg (1959), as corporações incorporaram vários aspectos do conceito de autorrealização ao darem mais oportunidades, delegarem e premiarem mais seus colaboradores, porém isso só os ilude e prende a um ciclo de dependência com a

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organização, não havendo autonomia para que o indivíduo decida através de suas crenças. Gewirth (1988) demonstra que o trabalho é formador de significado e da identidade do indivíduo, ao compilar diferentes publicações sobre autorrealização no trabalho e trazer 10 atributos principais, divididos em externos e internos, dentre os quais destaca-se a necessidade de autonomia e de desenvolvimento constante, através de novos projetos e metas em um espaço próprio e com a colaboração e reconhecimento dos profissionais da comunidade. Buscar sua autonomia, ter uma maior percepção da realidade, criar significado e desenvolver relações profundas com o outro através da reciprocidade, são, para Baxter (1998), os principais pontos para que não haja alienação no trabalho e se encontre a autorrealização nesse campo. Assim, para Maslow (2000) e todos os que o seguiram a autorrealização, independentemente se no campo do trabalho ou fora dele, é um processo contínuo de exploração, autonomia, adaptação, percepção da realidade e desenvolvimento constante de capacidades e ampliação de consciência, através de uma relação de reciprocidade com o outro.

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4. A Intersecção entre Jung e Maslow

Schott (1992) nos traz alguns pontos de intersecção sobre as contribuições de Jung na teoria de Maslow no que se refere à organização, motivação e autorrealização. Para Schott (1992), por mais que a psicologia humanista rejeite, Freud, o behaviorismo e uma terceira força, a psicologia analítica de Jung "reverbera" como um eco através da obra de Maslow. Jung aparece em vários pontos da obra de Maslow, declarados por ele mesmo. Maslow (1954) afirma, em Motivação e personalidade, seu conceito de tendência de crescimento positivo no organismo que leva ao desenvolvimento mais completo, foi consistente com o trabalho de Jung, entre outros (p. 116). Em New Knowledge and Human Values (1959) declara que seu conceito de self- actualization tem um paralelo clínico com a filosofia e os trabalhos de Rogers, Fromm e Jung (p. 125). Já em 1961, em Toward a Psychology of Being, Maslow presta homenagem a Jung sobre sua influência em sua teoria de "crescimento motivacional" e "self-actualization". Motivation and Personality foi o principal livro de Maslow (1954) e trouxe o conceito de hierarquia de necessidades, segundo o qual se determina que um comportamento é altamente influenciado por certas deficiências que devem ser satisfeitas/atingidas antes que se possa progredir para o próximo nível como já foi explicado aqui anteriormente. Para Schott (1992), quando Maslow afirma que a hierarquia das necessidades varia de pessoa a pessoa, mas o ponto maior de busca é sempre a autorrealização, uma consciência superior que ultrapassa o “Self, definido por Maslow (1972) como o núcleo organizador da psique que nos impulsiona para o desejo de ser tudo o que se é capaz de se tornar, ele menciona que Maslow está traçando um paralelo com a teoria de individuação de Jung. Para Maslow (1954), o número de indivíduos que supera as necessidades básicas é bem menor que os que seguem sem atingi-las. Dentro deste grupo de "no-self-actualizers", a maior parte sofre de uma doença não patológica e gasta seu tempo assistindo à TV, jogando golf, fazendo sexo ou simplesmente se divertindo

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ao invés de desenvolver seus talentos, atingir sua excelência e ampliar sua consciência a outros níveis. Para Jung (2011d), a individuação também é um processo para poucos. Assim como Maslow (1954), Jung (2011d) declara: "Eu tenho de concluir que autorrealização da forma como entendido, não é possível em nossa sociedade para os jovens, pessoas em desenvolvimento". Ele também entende que o processo de individuação ocorre a partir da segunda metade da vida, o que ele chamou de metanóia. Para ele, a individuação é um processo de toda a vida, mas seu chamado ocorre principalmente na segunda metade assim como passa a ser a meta de vida desta fase. Os pontos em comum não param por aí. Ao observarmos as definições apresentadas de Maslow (1954) sobre as pessoas "autorrealizadas" ou em "autorrealização", temos características, como necessidade de segurança, pertencimento, autoestima e amor, sem nenhuma neurose ou desvio e personalidade crítico, e de forma geral são pessoas ligadas a questões religiosas e conectadas aos temas da existência humana. Esses indivíduos possuem uma melhor percepção da realidade, uma forte aceitação de si mesmos e dos outros, uma visão mais ampla do mundo e são orientados a resolver problemas. São autônomos e independentes. Possuem um senso "místico de experiências", um senso de humor não hostil e muita criatividade. Essas definições de Maslow podem parecer estranhas para muitos, mas não para os estudantes e conhecedores da teoria de Jung. “Autorrealização” e “Individuação” são processos ou caminhos muito semelhantes em sua essência ou o que poderíamos chamar de estágio “mais evoluído ou avançado”. As diferenças começam a aparecer conforme ambos autores definem o ponto de partida do processo de autorrealização e individuação e alguns de seus pilares centrais. Uma das diferenças é que o processo de autorrealização é totalmente consciente segundo a teoria de Maslow – o inconsciente é o que foi reprimido e exige a necessidade de transformação interna e externa, sendo a influência e relação com o ambiente externo um fator de alta importância. Já o caminho de individuação é consciente e inconsciente, um movimento provocado pelo si-mesmo

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(inconsciente), de autoconhecimento de análise de suas defesas e bloqueios (sombras) e posterior ampliação de consciência e potenciais. O processo de autorrealização depende da satisfação das necessidades básicas, enquanto que o processo de individuação trata de resoluções prévias de conflitos psíquicos, especialmente os relacionados à assimilação do inconsciente. Reis (1984), ao abordar as contribuições de Jung, Maslow e outros psicólogos para as teorias de motivação, fala da diferença entre o conceito de inconsciente de Maslow e Jung. Maslow (1972) usa o conceito de inconsciente da psicanálise, sendo o inconsciente o que foi reprimido, enquanto Jung (2011a) o ampliou para o inconsciente coletivo – autores, como Stein (1992) ampliam para o inconsciente coletivo da empresa etc. Para Maslow (2012a), o processo de autorrealização ocorre na consciência e em uma dinâmica de adaptação e interferência sobre o mundo externo; para Jung (2011a), o processo de individuação é totalmente inconsciente e provocado pelo si- mesmo, cabe ao indivíduo trazer a consciência o que lhe for permitido e possível. Maslow e Jung entendem que tanto a individuação como a autorrealização só podem ocorrer em pessoas psiquicamente saudáveis. No caso de Maslow (1954), sem neuroses e com suas necessidades básicas atendidas; e, no caso de Jung (2011d), as pessoas que estão trabalhando seus conflitos através do enfrentamento de suas sombras. Segundo Maslow (2001), o engajamento no trabalho pode ser um dos canais mais criativos para se desenvolver a autorrealização. Schott (1992) afirma que as pessoas realmente felizes que Maslow encontrou ao longo de seus trabalhos foram as que mais trabalhavam de forma dura em algo que considerava importante e que valia a pena. Para Maslow, o trabalho é fonte de realização e de prazer sempre que realizado dentro daquilo que o indivíduo deseja e entende como sendo parte do que necessita ser e realizar. Maslow era cético com relação a várias teorias de gestão, como as de Peter Drucker, Rensis Likert, Chris Argyris e Douglas Macgregor. Ele entendia que houve uma supervalorização do indivíduo, sem considerar seus problemas patológicos, suas neuroses e outros problemas, o que Maslow chamava de "sujeira geral (general nastiness)".

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Para Maslow (2001), os gestores "saudáveis" devem estender essa possibilidade aos seus comandados, oferecendo uma forma de auxílio para que estes possam também atender suas necessidades de segurança, autoestima etc. Segundo Maslow (2001), pessoas autoritárias não têm suas necessidades básicas atendidas e tendem a galgar posições executivas como uma forma de reduzir sua ansiedade e compensar suas deficiências. A atração a posições de comando é baseada na necessidade de exercer o poder por ele mesmo. Para Maslow (2001), uma pessoa que procura o poder é exatamente a que não deve recebê-lo, devido a sua neurose e compulsividade pelo poder. Ele ainda afirma que gestores que não tiveram suas necessidades básicas atendidas trazem consigo suas neuroses e patologias e irão exercê-las sobre seus liderados. Stein (1992) afirma que o inconsciente coletivo da organização é um aliado e, ao mesmo tempo, uma armadilha para o processo de individuação. Para Stein, as inquietações no nível do inconsciente de uma pessoa narcisista ou com algum tipo de compulsividade por poder tendem a se agravar em uma organização onde essa imagem é reforçada, retirando, assim, o indivíduo de seu caminho de individuação. Para Ziemer (1996), a sombra organizacional possui característica inaceitáveis para muito indivíduos, o que não os permite seguirem em seu caminho de individuação. Podemos, assim, assumir que tanto para Jung como para Maslow, uma pessoa que busca por poder, ou necessita exercê-lo de forma descontrolada, ao se deparar com o inconsciente coletivo e o ambiente de uma organização, terá, no mínimo, muitas dificuldades de seguir ou permanecer em seu caminho de individuação ou autorrealização, necessitando, assim, um trabalho mais amplo e interno para trazer a consciência e ressignificar tudo aquilo que se faz necessário para se beneficiar da organização e não tê-la como um problema para seu desenvolvimento psíquico. Podemos ainda notar que ambos os processos, autorrealização e individuação, falam de desenvolvimento constante e pleno das capacidades e de transcendência. Uma busca interminável por ressignificação, ampliação de consciência e de algo maior que nos dê sentido à vida. Para Malvezzi (2012a), a eliminação das limitações, uma meta impossível, não traz autorrealização, mas sim a potencialização de suas características em

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novas competências e novos estados de espírito que o aproxima de algo transcendente que ele mesmo não consegue definir e que pode ser caracterizado como autorrealização. A autorrealização é, intrinsecamente, vinculada ao potencial transcendente do homem, pois, para alcançarmos os níveis mais elevados de desenvolvimento humano, precisamos transcender os níveis inferiores. No processo de autorrealização, há níveis de integração necessários, sequências e pontos a serem atendidos, representando o movimento perene do potencial de transcendência do ser humano, cuja premissa é ir além e transpor os limites da existência em prol do encontro com a essencialidade da própria existência. O caminho de individuação, por sua vez, também descreve essa necessidade de desenvolvimento através dos impulsos provocados pelo si-mesmo, em um movimento transcendente de necessidade constante de conscientização, através do confronto com a sombra e do desenvolvimento de consciência. Uma última, mas importante diferença que podemos observar entre os dois conceitos é que o processo de autorrealização de Maslow leva à “Ação”, à necessidade de confronto com os obstáculos externos para se realizar suas potencialidades; já sobre o caminho de individuação podemos concluir que é mais interno, um mergulho de autoconhecimento para o reconhecimento das sombras para uma possível conscientização e ampliação das capacidades e potencialidades. Logo, apesar de percorrerem diferentes enfoques, esses autores possuem um ponto em comum que poderíamos chamar de uma intersecção teórica: a clareza de que o ser humano, para se integrar, se individuar e se autorrealizar precisa alcançar níveis de existência vinculados não só ao material, mas, sobretudo, ao espiritual, ao numinoso, uma relação “divina” maior, pessoal, sem mencionar uma religião, mas algo que promova e dê o suporte psicológico necessário para o desenvolvimento do eu, preenchendo as lacunas que permanecem nos níveis de necessidades básicas do desenvolvimento, vivendo, assim, a sua verdadeira natureza e desenvolvendo suas capacidades no dia a dia, quer seja dentro ou fora do trabalho. Falamos, então, de dois conceitos de desenvolvimento que não têm fim, um caminho de vida e para a vida, não havendo reta de chegada nem mesmo um

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caminho único a se percorrer, mas apenas um ponto de partida e o impulso de nos tornarmos seres cada vez mais completos e conscientes de si, para si e para o todo.

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5. Revisão de pesquisas: autorrealização e individuação no trabalho

Esta revisão de pesquisas tem o objetivo de encontrar dados que contribuam para a realização desta dissertação, bem como evitar que temas, ampla e amiudamente discutidos ou abordados, sejam novamente apresentados nesta dissertação. Para a realização desta pesquisa, foram feitas buscas de artigos, periódicos, dissertações, monografias e teses. Foram consultadas as principais publicações junguianas ou relacionadas – Junguiana, Journal of Analytical Psychology, Harverst Journal, Journal of Personality, Journal of Humanistic Psychology – assim como os principais bancos de dados: banco de teses da CAPES, Scielo, PubMed, Biblioteca virtual da UNICAMP, USP e na Biblioteca da PUC. Foram utilizadas as seguintes palavras-chave e suas combinações e idiomas (português e inglês): individuação, autorrealização, satisfação, trabalho (e labor), organização, empresa, corporação. O levantamento realizado encontrou um volume considerável de pesquisas publicadas nos últimos 50 anos, mais próximo ao lançamento dos conceitos de Maslow, sobre autorrealização e sobre individuação, sobretudo nos Estados Unidos. A maior parte das pesquisas está associada à palavra autorrealização e, de forma geral, dentro da psicologia social e do trabalho, assim como na sociologia, havendo pouco ou quase nenhum interesse pelas psicologias profundas (Psicanálise e analítica) sobre o tema de autorrealização ou individuação dentro da área do trabalho (em corporações empresariais). Dejours (1994), em seu texto Desejo ou Motivação, menciona que a psicanálise tem pouco a contribuir para a discussão da motivação (que é um fator da autorrealização), o que corrobora para o baixo interesse por pesquisas de um tema tão subjetivo tendo como objetos a empresa e o indivíduo. No caso de individuação, o volume de pesquisas é bem menor e são raros os casos onde há alguma menção ou aprofundamento sobre o tema de individuação no mundo corporativo, ou seja, no ambiente de trabalho. A maior parte das pesquisas foca em temas, como individuação da mulher, na adolescência, em

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crises amorosas, casos de rompimento e mesmo de luto. O ambiente de trabalho é pouco ou praticamente inexplorado dentro das pesquisas junguianas, exceção a poucas pesquisas relacionadas a instituições de ensino e de saúde. Ainda sobre a individuação, existem diversas pesquisas fora da psicologia analítica, ou seja, com uma outra interpretação de individuação que não a junguiana, mas muito semelhante vindas da psicologia social e da sociologia através de autores, como Alain Touraine, Alvesson, Willmott, Giddens, Horkheimer, Lipovetsky, Alex Honneth, George Simmel, Ulrich Beck e Zygmunt Bauman. Na psicologia social e na sociologia, o termo individuação é, muitas vezes, mencionado com o mesmo significado do termo individualismo, porém este último retrata muito mais a busca por individualidade, por quebra e rompimento de amarras com as normas da sociedade e da cultura vigente e não se assemelha, em muitos casos, com a busca de desenvolvimento de consciência da individuação. Assim, mencionaremos aqui apenas os pontos mais relevantes, quando se tratar de dados mencionando o individualismo para podermos também trazer os dados relevantes à discussão sobre o trabalho aqui proposto.

5.1 As pesquisas sobre “individuação” na Psicologia Social

Como mencionado, o volume de pesquisas sobre o processo de individuação não é tão vasto como os demais temas da psicologia analítica. Esse tema é pouco trabalhado e raramente discutido em relação ao mundo corporativo e do trabalho. Porém, no contexto atual das organizações, a autonomia dos trabalhadores, a necessidade de maior performance e engajamento têm motivado diversas empresas a adotarem sistemas de gestão e modelos de liderança que permitam que o profissional se torne cada vez mais autônomo, tenha maior flexibilidade no trabalho e possa tomar um número maior de decisões por si mesmo, diminuindo, assim, o número de regras e processos ao qual está submetido e, consequentemente, sendo mais livre para atuar e agir a sua maneira. Com isso, a área da psicologia social e do trabalho passou a desenvolver algumas pesquisas sobre individuação.

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Foram encontradas diversas pesquisas neste sentido, sendo a autonomia e a resiliência os principais aspectos abordados. Como a definição de “individuação” adotada pela POT não é a mesma que a de Jung, não nos utilizaremos dessas pesquisas nesta dissertação, porém, cabe aqui esclarecer sobre esse conceito para que não haja qualquer erro de interpretação dentro desta dissertação ou de qualquer outra pesquisa que trate do tema de individuação no trabalho, cabendo sempre ao leitor compreender qual o conceito de “individuação” em uso. Para uma área da POT, a “liberdade”, o “individualismo” do trabalhador têm sido pesquisado em alguns momentos dentro de áreas da psicologia social, como “individuação”, lembrando que não com o contexto definido por Jung, mas algo similar, onde o foco também é tornar-se quem se é. De acordo com Touraine (2009), um sociólogo francês da atualidade que cunhou a expressão “sociedade pós-industrial”, o processo de “individuação” permite ao indivíduo ser o ator, “aquele que modifica o meio ambiente material e sobretudo social no qual está colocado, modificando a divisão do trabalho, as formas de decisão, as relações de dominação ou as orientações culturais” (TOURAINE, 2009, p. 220-1). Difere do processo de individualização, porque não se limita a reconhecer o espaço do indivíduo na sociedade, vai além da transformação do indivíduo em sujeito, isto é, a subjetivação, que nada mais é do que o desejo de individuação. A individuação dentro da psicologia social caracteriza-se, ainda, pela “Autonomização”. Por autonomização, entende-se “uma insubmissão ao que é dado e uma rejeição a alienação. Alienação, por sua vez, refere-se a um processo que coloca o indivíduo na condição de objetos passivos que sofrem a história”. Touraine (1973/1993) diz que esses indivíduos são orientados de modo mecânico por concepções alheias ao seu controle e compreensão. Dessa forma, podemos entender o foco de diversas pesquisas da psicologia social relacionadas ao trabalho, à administração de empresa e à liderança, combinando as definições de “individuação” e “autonomização”. Sendo assim,

o processo pelo qual o indivíduo passa a ser o dono, o responsável por suas ações, modificando o meio ambiente material e sobretudo social no qual está colocado, modificando a divisão do trabalho, as formas de decisão, as relações de dominação e as orientações

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culturais, não se submetendo ao que lhe é imposto, rejeitando a alienação, tornando-se assim mais consciente de seu papel.

5.2 As pesquisas de autorrealização

A ideia de autorrealização, de satisfação plena e de felicidade é uma busca eterna do ser humano. A filosofia grega já falava do “viver bem”; as religiões sempre trataram do tema do “desenvolvimento da criação”, a filosofia através da questão “por que existimos?” também procurou resposta para esse tema, mas, talvez tenha sido a psicologia a área que mais trouxe respostas, em especial no campo do indivíduo e do trabalho. Talvez, por isso, encontramos hoje diversas pesquisas, discutindo as teorias de autorrealização na visão de Rogers, Allport, Neugarten, Buhler, Erikson, Birren, Jahoda, Maslow e Jung. Para todos esses autores, de alguma forma, o sujeito busca significado e propósito para se autorrealizar e, quando entra neste caminho, trava uma luta constante para realizar suas potencialidades. Para a psicologia do trabalho, a autorrealização faz fronteira com a energização e o sentido do trabalho. Motivar o indivíduo no trabalho pela autorrealização é permitir que o sujeito desenvolva suas potencialidades. Uma busca de significado ou propósito na vida é humanamente inerente e integral ao funcionamento psicológico (O'CONNOR & CHAMBERLAIN, 1996). Frankl (1984) sugeriu três maneiras de descobrir o significado:(1) através da criação de um trabalho ou da realização de uma obra; (2) vivenciando algo, como a bondade, a verdade e a beleza ou encontrando a singularidade de outro ser humano; e (3) pela atitude tomada para o sofrimento inevitável. Assim, pode-se postular que o trabalho se torna uma forma concreta em que o significado pode ser encontrado. O trabalho faz parte da identidade do indivíduo e fornece um dos veículos para a realização do sentido ou o propósito na vida. Com base na afirmação de que o trabalho faz parte da identidade do indivíduo, e da aceleração na adoção do modelo de trabalho flexível que, por sua vez, está mudando tanto a identidade do sujeito/trabalhador, como a forma que este encara a autorrealização, através de um trabalho que lhe permita maior liberdade

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para realizar outras atividades, muitas pesquisas vêm sendo conduzidas no sentido de entender esse movimento. Elchardus e Smiths (2008), em pesquisa realizada em 2004 com 4666 jovens bruxelenses entre 19 e 36 anos da Universidade de Bruxelas, com o intuito de entender as ambições, necessidades de autorrealização e flexibilidade de trabalho neste grupo, tiveram como principais conclusões: a) Mais de 40% dos jovens pesquisados querem uma carreira tradicional e esperam passar mais de 20 anos trabalhando pela mesma organização; b) 60% dos jovens se descrevem ambiciosos e, para conseguirem uma promoção ou melhores salários e status, estão dispostos a mudarem de emprego algumas vezes – o que foi associado pelos pesquisadores como uma possibilidade de “trabalho flexível”; c) As pessoas com maior foco em “Autorrealização” entendem que um trabalho flexível é o mais adequado; d) 30% dos participantes consideram a “Autorrealização” no trabalho essencial, sem abrir mão de suas ambições, entendendo que o trabalho flexível é a melhor forma de conseguir esses resultados; e) 30% dos participantes entendem que um trabalho flexível é a única ou uma das melhores chances de participarem do mercado de trabalho atual. Esta pesquisa ainda analisou que uma grande proporção dos jovens desta amostra adere a uma ética de trabalho bastante tradicional, enfatizando o trabalho como um dever (38%), o trabalho como parte do bem-estar (46%), o trabalho como condição para desfrutar o lazer (48%) e como condição para realização (86%). Pode-se observar que essa pesquisa confirma a afirmação de que o trabalho traz identidade e é uma condição para se realizar, mas, ao mesmo tempo, questiona diversos autores que afirmam ser o desejo de um trabalho flexível muito mais forte na atualidade, corroborando a afirmação de Touraine (1999) de que a aceitação da flexibilidade está relacionada ao medo do desemprego. Outra possiblidade é o alto grau de adaptabilidade e necessidade de mudanças que o trabalho flexivel impõe, assim como a falta de relações mais longas e duradouras – fatores muito importantes para a autorrealização.

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Halrynjo (2009), em pesquisa realizada para o governo da Noroega, entrevistou102 homens europeus, de corporações na Espanha, Israel, Alemanha, Áustria, Bulgária e Noruega, de 21 a 64 anos, trabalhando em diferentes organizações de trabalho, cujo objetivo era entender as adaptações reais dos homens para o trabalho e seu foco e forma de autorrealização. Essa pesquisa classificou indivíduos em “Carreiristas” (foco na carreira e na estrutura material vs família e outros), “O Cuidador” (trabalho flexível, tempo parcial, foco na família), “O carrerista e cuidador” (foco menor na carreira, mas com trabalho em tempo integral e cuidados com a família); “O carreira Pathwork” (trabalho flexível ou parcial e foco no seu desenvolvimento e da família). Com isso, concluiu que: a) os “Carreiristas” são os que possuem maior sucesso profissional, mas o pior grau de satisfação e autorrealização. Ao mesmo tempo, não sentem qualquer possibilidade de mudar essa situação antes de sua saída do mercado de trabalho; b) tanto o “Cuidador” como o “Carreirista e Cuidador têm uma preocupação com a segurança financeira e profissional e entendem não conseguir atingir nem as suas necessidades profissionais, nem as de cuidado com a família e autorrealização; c) a pesquisa não consegue ser conclusiva a esse ponto, mas aponta uma tendência de que a “autorrealização” só consegue ser obtida no grupo “Pathwork”, onde o trabalho flexivel é realizado com propósito e alinhado a determinados desejos de vida (se gosta de música trabalha com música) ou mesmo se o trabalho não é levado em consideração como parte da autorrealização, mas apenas uma forma de proporcionar a base para as demais necessidades. d) Essa pesquisa mostrou ainda uma tendência para o “trabalhador zero drag ou arrasto zero”, termo cunhado no Silicon Valley para trabalhadores com foco total na empresa e praticamente zero na família e demais necessidades da vida, apontando que indivíduos com alto grau de dedicação ao trabalho e sem foco em outras áreas da vida, quando obtêm algum sucesso na carreira, se sentem realizados a ponto de definir isso como uma autorrealização na vida.

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Essa pesquisa nos traz dois dados importantes: o primeiro está relacionado ao fato de que o sucesso profissional ou financeiro não é fator de autorrealização; e, o segundo, refere-se à importância de se atribuir significado às ações de vida e aos seus desejos: o trabalho pode ser um fator de autorrealizaçao em si, quando se trabalha com aquilo que se gosta, ou uma forma de proporcionar os objetivos e desejos de vida do indivíduo. Maslow (1971), por sua vez, descreveu este dilema existencial: cada vez mais o indivíduo seria afastado ou impossibilitado de trabalhar com aquilo que gosta ou realmente deseja, havendo, então, uma grande necessidade de adaptação e resignificação de suas necessidades pelo excesso de mudanças que o mundo já passava e que iria ainda passar. Ele previu uma possível aceleração do ritmo de mudanças e fatos devido à tecnologia e seus possíveis impactos no desenvolvimento do indivíduo. Para Maslow (1971, p. 58), "a grande aceleração na taxa de crescimento de fatos, de conhecimento, de técnicas, de invenções, de avanços em tecnologia (...) exige um tipo de ser humano diferente capaz de viver em um mundo que muda perpetuamente, que não fica parado". Nesse mundo, argumentou Maslow (idem), fatos e técnicas rapidamente se tornam obsoletos. Em vez de enfatizar as técnicas, educadores devem tentar criar um novo tipo de ser humano, um indivíduo que "goza de mudança, que é capaz de improvisar, quem é capaz de enfrentar com confiança, força e coragem uma situação do qual ele não tem absolutamente nenhum aviso prévio" (MASLOW, 1971, p. 58). Maslow (idem) tinha claro o problema que estávamos prestes a passar e, pelo visto, não obtivemos sucesso ainda em nos educar a ponto de nos adaptarmos corretamente a essa situação, pois aparentemente, nenhum dos tipos descritos por Halrynjo (2009) se encaixa nas características de indivíduo autorrealizado. O trabalho alinhado com os desejos e anseios do indivíduo e sua relação com a autorrealização, mesmo que em profissões difíceis e aparentemente pouco prazerosas, foram analisados por Rhoader e McFarland (2000), através de pesquisa feita com cuidadoras de pacientes com saúde mental extremamente debilitada, que trabalhavam na casa dessas pessoas na Carolina do Sul, EUA, e que procuraram essa atividade por vontade própria. Os autores utilizaram o método PIL, “Purpose in Life Test” – desenvolvido por Crumbaugh and Maholick (1964) e baseado na obra de Frankel (2015) –, cujo objetivo é medir um vácuo, uma falha

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em dar significado e propósito a vida; e o teste POI “Personal Orientation Inventory”, criado por Shostrom (1964), que visa medir o nível de saúde e de autorrealização de uma pessoa. Participaram 85 cuidadoras desses testes, respondendo aos questionários POI e PIL. As cuidadoras tiveram uma nota PIL maior que a média, atingindo 118 pontos de 138 possíveis, sendo a média menor que 100, evidenciando um maior encontro de propósito e sentido da vida por parte das cuidadoras. Já no teste POI tiveram nota inferior à média, evidenciando uma possível dificuldade em reconhecer suas necessidades pessoais e sentimentos. O teste ainda mostrou que a média PIL foi maior nas cuidadoras acima dos 53 anos, o que contribui para a hipótese de que a busca por significado e por autorrealização é maior no meio da vida, como entendem Jung e Maslow e como também será foco desta pesquisa. Faraci e Cannistraci se utilizaram do índice SISA (Short Index of Self Actualization) para pesquisar 213 pessoas – 17,7% homens e 82.3% mulheres – sem formação universitária, com idade média de 23 anos, variando de 19 a 50 anos. Esta pesquisa concluiu que fatores, como autoestima, eficiência, aceitação das emoções, relações pessoais de confiança e verdadeiras, auto aceitação e responsabilidade pessoal, são fatores-chave para que haja autorrealização em qualquer nível. Essas pesquisas combinadas deixam claro que, para se obter a autorrealização no trabalho, há a necessidade de atribuição de significado – que deve estar conectado a um propósito de vida maior e a relações pessoais fortes e verdadeiras, além de o indivíduo aceitar suas emoções e tomar suas decisões baseado em suas crenças pessoais. Em pesquisa recente, Pellaes (2018), utilizando também do SISA, contou com 4048 participantes, que responderam o questionário eletrônico sobre autorrealização, com 33 perguntas/variáveis dentro de uma escala do tipo Likert, nos trouxe os seguintes dados: o dos 4048 respondentes, apenas 9,7% foram classificados como autorrealizados dentro da escala; o as chances de um indivíduo com Pós-graduação/MBA de ser autorrealizado é de 1,87 vezes maior que com escolaridade de nível médio; já os indivíduos

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com mestrado e doutorado é de 2,48 vezes maior que os com ensino médio completo; o as chances de autorrealização dos indivíduos que indicaram “permanecer na mesma área de trabalho se não precisassem do dinheiro da remuneração” foi de 2,13 vezes maior do que a chance de indivíduos que indicaram “continuar na mesma área, mas mudariam a forma de trabalhar” e de apenas 0,23 vezes maior “quando o indivíduo menciona que mudaria de área e todavia não sabe para onde ir”; o os índices de pessoas autorrealizadas acima de 41 anos foi 3 vezes maior que das pessoas entre 18 e 24 anos; o o índice de autorrealização em organizações de trabalho flexível e moderno foi 1,39 vezes maior que nas tradicionais e hierárquicas; o pessoas com vínculos de trabalho distintos ao modelo CLT obtiveram os maiores índices de autorrealização, voluntário (23%), empresários (22,2%), empreendedores (21,9%) e autônomos (20,7%), totalizando mais de 87% do total; o 88% das pessoas consideradas autorrealizadas dizem compreender seu impacto nos outros trabalhadores contra 70% dos não autorrealizados.

Esta pesquisa contou com um número muito elevado de pessoas com nível superior até doutorado (91,8% da amostra), o que distorceu algumas pesquisas que mostram valores de 2 a 5% da população como sendo autorrealizada (TAORMINA, 2013), mas, ao mesmo tempo nos demonstra que pessoas com elevada qualificação educacional têm uma possibilidade muito maior para a autorrealização. Além disso, as formas de trabalho com maior autonomia e flexibilidade, em especial os profissionais autônomos, empresários e empreendedores, bem como as organizações flexíveis, possuem maior probabilidade de autorrealização. As pesquisas descritas mostram de diversas formas a necessidade e a importância de fatores,, como autonomia, relação profunda e de confiança com o outro, flexibilidade nas organizações, adaptabilidade e desenvolvimento de potenciais (conhecimento e consciência) como fatores essenciais para a autorrealização e variáveis e dependentes da necessidade e significância dada por cada indivíduo ao tema. A ação do e sobre o fator externo, requerimento para

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autorrealização, segundo Maslow, também aparece nestas pesquisas, ao observarmos que uma grande parte das pessoas consideradas autorrealizadas no trabalho alcançou cargos e tem formação acima da média, o que corrobora ainda para outra afirmação de Maslow (1954) que menciona que poucas são as pessoas que conseguem se autorrealizar em suas vidas.

5.3 As pesquisas de Individuação

Existe uma quantidade significativa de pesquisas sobre a teoria de individuação de C. G. Jung, porém, a grande maioria é voltada à interpretação ou análise de mitos e símbolos dentro do processo de individuação, sua relação com a religiosidade, e principalmente na evolução da psique do indivíduo. A maior parte das pesquisas encontradas são teóricas ou qualitativas. Não foram encontradas pesquisas relevantes relacionadas à discussão desta dissertação, porém foram encontrados alguns trabalhos que se utilizam da teoria de individuação de Jung para pesquisar temas, como bem-estar, crise no meio da vida e complexos corporativos. Bowles (1994) estudou os efeitos da massificação da sociedade e seu comportamento nas corporações e seus indivíduos, concluindo que, nas organizações modernas, a estrutura organizacional e suas metas econômicas sufocam o indivíduo e sua possibilidade de expressão. Para Bowles (idem), as organizações modernas são caracterizadas pelas imagens arquetípicas tirânicas e devoradoras. O autor propõe que as organizações devem promover maior liberdade, autonomia e a conexão com múltiplos objetivos que permitam ao indivíduo se conectar com seu propósito, uma vez que o sistema atual não permite o desenvolvimento do indivíduo nele inserido, onde existe moralidade e ordem, mas não há liberdade. A falta de autonomia e de conexão com os objetivos pessoais descrita por Bowles (1994), somada à constatação do alto grau de exigências e metas que as corporações demandam de seus colaboradores, é agravada no meio da vida segundo Lachman (2004). O meio da vida desencadeia crises que prejudicam ou interferem no processo de individuação, em especial as relacionadas com a falta

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de equilíbrio de vida (Work life balance) entre trabalho, família e atividades sociais. A pesquisa realizada pela autora estudou a geração dos “Baby Boomers”, pessoas com 40 a 50 anos na época da pesquisa. Uma das principais conclusões referentes aos problemas da crise da meia idade está relacionada à carreira e ao trabalho onde usualmente se enfrenta uma estagnação da carreira, uma virada de carreira que exige novo impulso do indivíduo no trabalho, a perda do trabalho ou a aposentadoria, havendo de formas distintas, impacto na identidade do sujeito em relação a sua persona corporativa. Dentre os estudos encontrados, diferentemente dos demais que se preocuparam em compreender alguns instrumentos e obstáculos, dois estudos se destacaram por procurarem compreender os complexos corporativos – uma extensão da definição de complexos de Jung para uma organização. Stolz (2006), ao estudar os complexos corporativos, utiliza sua experiência no mercado para aplicar os conceitos em uma operação de serviços de call center, identificando quatro complexos: corporação ideal, defesa social, dependência, pessoa no cargo. O autor descreve o complexo da corporação ideal como aquele no qual o funcionário, a partir de seus complexos pessoais, se funde em fantasia com a cultura e objetivo da empresa. É um complexo narcisista em que a sensação de perfeita harmonia leva à ilusão de estar em um ambiente seguro e perfeito. Stolz (2006) pode observar aqui o que Herzberg (1959) definiu como “falsa autorrealização”, dada pelo sistema fechado da corporação ao permitir que o indivíduo exerça seu poder ou seja constantemente desafiado. No complexo de defesa social, o funcionário emprega a estrutura da corporação ou de elementos do conjunto social como se fossem extensões do seu sistema pessoal de defesas. O complexo de dependência é descrito como aquele no qual a dependência vem das necessidades dos indivíduos que podem ser atendidas pela corporação, como a necessidade de segurança, necessidade de figura de autoridade em substituição aos pais. O complexo da pessoa no cargo consiste em casos nos quais, em um determinado cargo, funcionários agem de forma como jamais agiriam por vontade própria, como um autômato. O autor alerta para a identificação patológica do indivíduo com determinada persona, em detrimento do seu eu verdadeiro, a qual leva a uma possível alienação à realidade. Salienta, no entanto, que os ambientes corporativos podem ser entendidos como

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lugares nos quais os indivíduos se desenvolvem psicologicamente, ou seja, ambientes facilitadores do desenvolvimento. Ferreira (2010) analisa os conceitos de Complexos Corporativos discutido por Stolz (2006) e de Complexos Executivos, proposto por Vries (2007), e sugere que a subjetividade e a leitura simbólica ingressem no mundo dos negócios e no desenvolvimento dos líderes. As pesquisas encontradas reafirmam a necessidade de busca por autonomia do indivíduo dentro de uma corporação, bem como da necessidade de atribuir um significado e conexão com seu propósito de vida para que possa seguir seu caminho de individuação. Realizar o caminho de individuação, se “desvestindo” das falsas personas (SILVEIRA, 1997), é uma ação árdua. Ao nos depararmos com os inúmeros complexos corporativos aqui apresentados e como já mencionado por Stein (1992), o inconsciente coletivo da corporação pode ser tanto benéfico como maléfico para o caminho de individuação, tamanho o seu conteúdo.

5.4 Considerações sobre as pesquisas

Em primeiro lugar, identificou-se uma grande dificuldade em se pesquisar a individuação no campo do trabalho, o que nos permite dizer que, através desta pesquisa, podemos gerar novos estudos para colaborar com o tema. Pelo lado da autorrealização, a dificuldade maior foi filtrar as pesquisas a fim de não nos repetirmos em demasia, ao mesmo tempo trazendo estudos mais recentes que considerem o atual cenário de mudanças constante no trabalhado vividas nas últimas duas décadas. As diversas pesquisas aqui abordadas trouxeram, de diferentes formas, a necessidade de busca de significado e de propósito para se autorrealizar e para que um trabalho seja autorrealizador e não seja um empecilho para o caminho de individuação. Outro ponto importante foi a constatação de que o trabalho flexível é uma vantagem para o processo de autorrealização ao permitir mais tempo com a família, ou para o indivíduo realizar qualquer outra de suas necessidades; mas também pode ser uma desvantagem, quando esse é fator de mudanças constantes que

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podem inibir o indivíduo de ter relações mais profundas com o outro ou uma dificuldade de encontrar significado para esse trabalho. Os complexos corporativos encontrados são, por sua vez, um agravante para o caminho de individuação, pois o indivíduo soma seus complexos aos complexos corporativos quando passa a ter contato com o inconsciente coletivo da organização, com suas sombras. Ziemer (1996) declara que a sombra organizacional é constituída de todas as características inaceitáveis. Ao mesmo tempo, quando assimilados os complexos, a vivência em uma organização pode trazer ao indivíduo uma ampliação de consciência do mesmo tamanho e força de suas sombras

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6. A Dinâmica do trabalho na contemporaneidade e seus desafios para a autorrealização

O trabalho é uma dimensão muito importante na vida dos sujeitos, é um dos elementos mais significativos da vida adulta. A relação que um sujeito mantém com seu trabalho é resultante do significado singular que ele tem para cada um (DEJOURS, LANCMAN & SZNELWAR, 2004). Mas, também é fruto das características que o trabalho assume em determinada época (ANTUNES, 2002). “O trabalho é, antes de tudo, o que é inventado pelos homens para combater o hiato entre a organização prescrita do trabalho e a organização real” (DEJOURS, 2004, p.263). Separar o sujeito de seu trabalho e profissão é tarefa muito complexa e, talvez, quase impossível na atualidade. Passamos cada vez mais tempo trabalhando de forma direta ou indireta, conectados ao trabalho através de todo tipo de dispositivo que a tecnologia nos permite. O trabalho flexível, remoto, a distância, nos mantém ligados, constantemente, a nossa função de trabalho na sociedade. A nossa identidade profissional é cada vez mais acionada e nos separarmos dela se torna complexo e difícil e, quando conseguimos, o espaço de tempo também é curto.

O trabalho tomou tanto o espaço da vida que passou a ter quase a mesma importância do significado da vida, na medida em que passou a ocupar a maior parte do seu tempo e que um novo mundo foi criado pelo espaço social necessário para lhe dar suporte. (BAXTER, 1982).

Conhecer melhor as empresas, sua dinâmica e influência sobre nosso comportamento e estado, passa a ser cada vez mais importante dentro da atual realidade de trabalho flexível, de mundo globalizado e de conexão de tudo com tudo e com todos. As empresas da atualidade estão muito além das existentes na época da revolução industrial; os simples processos, o controle minucioso e a repetição de tarefas cederam lugar a processos de fabricação cada vez mais elaborados que culminaram em modernos sistemas de informação desenvolvidos a partir dos

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avanços da tecnologia. Os mercados se expandiram a números gigantescos, barreiras comerciais foram derrubadas, e a globalização se tornou um padrão. A competitividade está cada vez mais acirrada, uma nova empresa surge a cada instante no universo das “.com”, e seu sucesso ou insucesso pode ser tão rápido como seu surgimento ou desaparecimento. As formas de se trabalhar vêm se adaptando a esses novos cenários da flexibilidade, oferecidos pelas múltiplas plataformas tecnológicas, que permitem ao trabalhador se manter conectado e trabalhando quando, onde e com quem quiser. Esse novo mundo corporativo, de constantes transformações, inovações e exigências tornou-se, no mínimo, complexo, e de difícil entendimento, mas, ao mesmo tempo, repleto de possibilidades e oportunidades de desenvolvimento de competências para quem conseguir se ajustar, interagir e se adaptar, sem a perda de sua autonomia. Procuraremos compreender, dentro dos limites dessa pesquisa, o impacto da dinâmica atual do trabalho, em especial nas corporações, onde o movimento e a mudança através da tecnologia e da adoção de novas formas de trabalho têm sido mais rápidos e, consequentemente, têm causado uma maior necessidade de adaptação do indivíduo. Além disso, procuraremos compreender algumas das forças que agem nessa dinâmica e que possam contribuir de forma positiva ou negativa ao processo de autorrealização e individuação do indivíduo, procurando compreender, assim, seus obstáculos e possíveis soluções e instrumentos.

6.1 Uma época de mudanças e a necessidade de adaptabilidade

A segunda metade do século XX é caracterizada por grandes mudanças no mundo do trabalho a uma velocidade nunca vista. A globalização intensificou a competitividade entre as organizações e os profissionais, obrigando a todos a ampliar sua capacidade de inovação e aumentar a flexibilidade na forma de trabalhar e reagir às mudanças constantes impostas pelo mercado. Essas mudanças tecnológicas, econômicas e organizacionais não produzem apenas reações externas, mas também na atividade psicológica do indivíduo. Autores, como Boltansky e Chiapello (2009) e Lipovetsky (2004; 2005), associam o período inicial da modernidade ao da Revolução Industrial. Há

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controvérsias com relação às datas, mas não às características do período, tais como: sociedade conquistadora, empreendedora, crença no futuro, no progresso, na ciência e na técnica. Os tempos modernos foram marcados pela subordinação do indivíduo às regras coletiva, ao hedonismo, à igualdade, ao pluralismo democrático e à quebra das tradições, mas ainda traziam alguma certeza em termos de ascensão profissional e de classe; havia uma organização vertical das entidades: primeiro a família, depois a empresa e, só então, a política. Acreditava- se que condições de paz, equidade e justiça poderiam ser criadas à medida que a razão prevalecesse no mundo (LIPOVETSKY, 2004). A era atual, a pós-modernidade, de mudanças constantes, onde o avanço exponencial das tecnologias tende a acelerar ainda mais esse processo, amplia também a criação de novos modelos de trabalho e produção, colocando, muitas vezes, a empresa, o trabalho, à frente da família. Quer na modernidade líquida de Bauman (2001), quer na era do vazio de Lipovetsky (2005), quer na decomposição social de Touraine (2005) ou no curto prazo de Sennett (2012a), as mudanças e incertezas são enfatizadas e estão enraizadas nas práticas cotidianas do capitalismo, sem que haja qualquer fato histórico ou desastre iminente. As transformações econômicas ocorridas durante as três últimas décadas alteraram a tradicional imagem do trabalhador. Os indivíduos, afetados pela competição crescente por empregos e cada vez mais inseguros, começaram a adaptar suas condutas psicológicas ao perfil social do “vencedor”. O “vencedor” deve ser flexível, criativo, afirmativo e, sobretudo, superficial nos contatos pessoais e indiferente a projetos de vida duradouros. Para ganhar mobilidade no volátil mundo do emprego, ele deve aprender a não ter elos sólidos com a família, lugares, tradições culturais, antigas habilidades, nem mesmo com o próprio percurso biográfico. Sennett (1999/2001) intitula essa nova identidade como a do indivíduo “desenraizado” e Bauman (2008), em O mal-estar da pós-modernidade, define-a como “turista”. O turista, ou o desenraizado, é o indivíduo que não se fixa em identidades passadas – condição humana habitada de uma infindável construção e vivificação de imagos –, que vê o mundo como um espaço de circulação permanente e jamais projeta o futuro a partir das condições de vida presentes. Esse

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é um dos principais motivos pelos quais o desejo de possuir objetos industriais se acentuou. Os objetos passaram a ser aquilo que o turista pode ter, ao mesmo tempo, de mais estável e mais mutável. De mais estável porque são as únicas coisas que o sujeito transporta consigo onde estiver e para onde for, e de mais mutável por serem coisas facilmente trocáveis se a nova condição social de trabalho assim exigir. A luta contra o tempo passou a ser uma das principais resoluções deste período: os prazos curtos, a necessidade de resultados rápidos, a inovação constante e quase instantânea, tudo a fim de atender às necessidades atuais deste novo mundo e das organizações. Essa pressão por metas e resultados é crescente na sociedade e no mercado de trabalho. Assim, a subjetividade também passa a ser regida pelo imediatismo. O indivíduo se vê às voltas com um imenso volume de informações e exigências que lhe pedem ações e reflexões distintas. Sendo assim, ele passa a representar diferentes personagens (personas) para se adaptar ao máximo a essas mudanças sem ter o tempo devido para conhecer e elaborar esse papel, enfrentando assim uma dissociação identitária (AUBERT, 2004). Touraine (2005) salienta que estamos vivendo uma mudança tão significativa que é preciso adotar um novo paradigma para compreender o mundo de hoje, caracterizado pela decomposição do social. Com relação ao trabalho, o autor define a globalização como “uma forma extrema de capitalismo que não tem contrapeso” (idem, p. 35) e que significa a “separação entre a economia e a sociedade, separação essa que transporta em si mesma a destruição da própria ideia de sociedade” (idem, p. 43). As exigências de adaptação de Aubert (2004) e a decomposição social proferida por Touraine (2005) mostram uma clara dificuldade do indivíduo de vivenciar e experenciar suas crenças, quer seja pela necessidade de adaptação constante, quer seja pela falta de uma ideia clara do modelo de sociedade, do outro, a que ele deve se adaptar. Em tempos de mudanças, a flexibilidade é uma das características marcantes. Sennett (2012a) a discute em termos de organização do tempo laboral, afirmando que, no trabalho na atualidade, “não há longo prazo”. No contexto vigente de curto prazo, o conceito tradicional de carreira, como estrada contínua e linear, fica excluído, cedendo lugar a vários projetos de curta duração ou temporários. Em

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consequência, os trabalhadores ficam impossibilitados de desenvolverem uma narrativa constante de carreira. A experiência em episódios transforma a narrativa linear em uma colagem de fragmentos, deixando o indivíduo à deriva, no tempo. As consequências da flexibilidade, na visão de Sennett (2012a), se estendem, causando ansiedade e corroendo o caráter. O autor emprega o conceito de caráter de modo particular, concebendo-o como “o valor ético que atribuímos aos nossos próprios desejos e às nossas relações com os outros” (idem, p.10). O caráter, para o autor, está relacionado com o longo prazo, com a lealdade e o compromisso mútuo, os quais se desenvolvem no decorrer do tempo. O autor argumenta que uma sociedade impaciente, com foco no curto prazo, não tem parâmetros para decidir o que tem valor de longo prazo e, com isso, o caráter fica corroído. Bauman (2001) reafirma a flexibilidade como palavra de ordem da modernidade líquida que, além de transformar os contratos de trabalho em instrumentos de curto prazo, gera um mundo de incertezas e um cenário de aceleração, no qual o conhecimento envelhece rápido. No mundo acelerado de hoje, as qualificações não são reconhecidas por longos períodos. A experiência acumulada é igualmente pouco valorizada. O conhecimento com prazo de validade requer do trabalhador várias reciclagens ao longo da vida profissional. Apoiado em argumentos similares, Sennett (2012a) observa que um jovem americano, em média, pode esperar mudar sua aptidão básica pelo menos três vezes, durante os quarenta anos de trabalho. E complementa que há um comprometimento da dimensão tempo no trabalho contemporâneo que deixa o indivíduo à deriva. A falta de parâmetros para tomada de decisão exposta por Sennett (2012a) dificulta a tomada de decisão do indivíduo com base em suas crenças. Os curtos contratos de trabalho da modernidade líquida de Bauman (2001) nos trazem um cenário de constante adaptação e mudança que interfere diretamente na baixa ou falta de autonomia do indivíduo.

6.2 As formas de controle da atualidade e a falta de autonomia

Para Lipovetsky (2004), a modernidade não atingiu seus objetivos iniciais de trazer libertação ao indivíduo; ao contrário, trouxe mais controle em forma de

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subjugação, burocracia e disciplina, por meio de regras que visam produzir uma conduta normatizada e padronizada. Para ele, a pós-modernidade apresenta-se no momento em que a sociedade se reorganiza a partir da lógica da sedução, da renovação permanente e da diferenciação marginal, quando se amplia a autonomia subjetiva e desaparece a transcendência dos princípios sociais reguladores. Entretanto, os meios de controle não deixam de existir, apenas adaptam-se, deixando de lado o caráter impositivo e fazendo uso da comunicação, levando os indivíduos a fazerem escolhas e assumirem responsabilidades, na maioria das vezes, fora de suas crenças. Como terceira fase da modernidade, ele descreve a hipermodernidade que é caracterizada por uma cultura do excesso, do sempre mais. Todas as coisas se tornam intensas e urgentes. O movimento é uma constante, e as mudanças ocorrem em um ritmo quase esquizofrênico determinando um tempo marcado pelo efêmero, no qual a flexibilidade e a fluidez aparecem como tentativas de acompanhar essa velocidade. Hipermercado, hiperconsumo, hipertexto, hipercorpo: tudo é elevado à potência do mais, do maior. A hipermodernidade revela o paradoxo da sociedade contemporânea: a cultura do excesso e da moderação. Caracteriza-se, ainda, pela fluidez, flexibilidade e pela indiferença aos princípios estruturais da modernidade. A organização chamada hipermoderna, em contraste com a organização moderna, caracteriza-se, assim, pelo desenvolvimento extraordinário de seus processos de mediação, sua extensão a novas instâncias, sua interconexão cada vez mais ramificada, constituindo sistemas altamente coerentes. Produz-se, dessa forma, um ambiente de trabalho do novo capitalismo – com ênfase em trabalhos de curto prazo, na execução de projetos e na flexibilidade – o qual não permite que as pessoas desenvolvam experiências ou construam uma narrativa coerente para suas vidas; e o mais importante, de acordo com Sennett (2001), é que esta nova forma de trabalho dificulta a formação do caráter. Outro fator marcante da pós-modernidade é a volatilidade do capital nas empresas. A globalização e os avançados sistemas financeiros atuais permitem que o capital se mova de um momento para outro de mercado, segmento e país, a fim de buscar melhor remuneração aos acionistas. A busca por oportunidades de

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lucro rápido é constante, e a mudança nas condições e oportunidades de trabalho segue no mesmo ritmo. Sennett (2012a) empresta o termo “capital impaciente”, do economista Bennett Harrison, para descrever esses tempos atuais de desejo rápido de retorno dos investimentos que é associado pelo mercado à capacidade de gerar rápida mudança institucional. O autor assinala que a ênfase na mudança constante demonstra seus sinais na alta de preço das ações de algumas empresas em processos de reestruturação, mesmo que tais processos nem sempre se justifiquem em termos de ganhos de produtividade, “como se qualquer mudança fosse melhor do que permanecer como antes” (SENNETT, 2012a, p. 58). A mudança é vista tanto por Sennett (2012) como por Lipovetsky (2004) como algo positivo e necessário para o desenvolvimento do indivíduo e do social, porém a velocidade e a frequência imposta, em especial na hipermodernidade de Lipovetsky (2004), impedem, muitas vezes, o indivíduo de exercer sua autonomia ao não decidir por suas crenças, mas com base nas pressões, medos e necessidade de flexibilização e adaptação demandadas pela modernidade. Uma das consequências imediatas do capital impaciente nas empresas é a substituição do modelo de pirâmide para o modelo em rede que, à primeira vista, se mostra mais simples e eficiente, permitindo maior autonomia e flexibilidade. Porém, para Sennett (2012a), qualquer análise menos superficial destaca um sistema complexo e desorientador, uma vez que não tem a clareza de uma pirâmide e está em constante alteração de estrutura e tarefas. A autonomia é confusa e a necessidade de adaptação, constante. Há uma concentração de poder e não de descentralização, como muitos pregam. Para Sennett (idem) o que mudou foi o tipo de controle, que passa a ser estabelecido por metas de produção. Não há mais liberdade e autonomia, as metas são, de maneira geral, de difícil cumprimento, a pressão é constante, há pouco espaço para criação e autonomia de decisão, com as unidades executando planos pré-definidos. As consequências para os trabalhadores das modernas estruturas são amplas e vão desde a desorientação à confusão. Sennett (2012a) define o trabalho na atualidade como ilegível. Outro problema apontado por Sennett (2012a) sobre o trabalho em rede ou o trabalho em equipes é que esse é um sistema de poder sem autoridade ou com falta de responsabilidade. Sennett (2012a) explica que as equipes, definidas para

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atuarem momentaneamente em um projeto específico, competem entre si pelos melhores resultados, gerando espaço para um poder sem autoridade e sem responsabilidade pelos atos cometidos. A autoridade fica diluída entre os próprios membros da equipe, que pressionam, uns aos outros, em uma competição feroz, permitindo que o líder domine seus empregados, negando legitimidade às suas necessidades e desejos. Bauman (2001) também observa o poder do agora, associando-o às técnicas de fuga, astúcia, evitação da manutenção da ordem e da responsabilidade pelas consequências. A descrição dos autores do poder sem autoridade e responsabilidade pelos próprios atos reforça a posição de Jung (2011c) quanto à diluição da responsabilidade individual, na massa. O poder diluído no grupo exime, ilusoriamente, o indivíduo de responsabilidade, comprometendo seu desenvolvimento pessoal. Os novos tempos, de capital impaciente, flexível e competitivo, não aceitam o fracasso, grande tabu da atualidade. O que importa é o sucesso, a qualquer custo. Sennett (2012a) exemplifica os impactos da cultura do sucesso nos indivíduos, citando pessoas demitidas em uma grande reestruturação da IBM, nos anos 1990, que encontraram dificuldades para elaborar uma narrativa de seus fracassos.

O trabalho curativo do criar uma narrativa não limita seu interesse a fazer os fatos saírem da maneira “certa”. Em vez disso, uma boa narrativa reconhece e sonda a realidade de todas as formas erradas que a vida pode produzir e produz. (SENNETT, 2012a, p. 161).

Há uma predisposição ao risco na cultura de sucesso e, consequentemente, da mudança. Sennett (2012a) expõe que as avaliações diárias de sucesso e fracasso fazem do dia a dia um exercício contínuo de vulnerabilidade e de risco, tornando-o comum e normal, principalmente para aqueles que buscam mais dinheiro e melhor posição. Somado à desorientação e à incerteza das estruturas em rede, o risco tende a ser maior, na atualidade, visto que as pessoas não entendem claramente as consequências das mudanças que experimentam. O autor conclui que as pessoas assumem o risco da mudança sem saber o que vai acontecer, porque, na cultura moderna, não se mexer é sinal de fracasso, parecendo a “estabilidade quase uma morte em vida”. O destino, portanto, “conta

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menos que o ato de partir” (SENNETT, 2012a, p.102). Para ele, “ficar firme é ser deixado de fora” (idem, p.103). A mudança, mais uma vez, analisada por Sennett (2012a), é negativa toda vez que não há parâmetros para decisão e que essa é forçada ou tomada sem a real consciência do indivíduo.

6.3 A alta competitividade, o Eu (Ego) e o Outro na organização

A alta competitividade da modernidade está relacionada à inovação constante, à mudança e à flexibilização, por sua vez, a meritocracia atual relaciona o talento à aptidão potencial e tende a descartar os feitos do passado, olhando apenas para o futuro. As aptidões mais valorizadas são todas as relacionadas à capacidade de transitar de um tema a outro e de interpretar conjuntos de informações e de práticas permanentemente em evolução. Valoriza-se muito mais a capacidade de transitar que a profundidade do conhecimento. As características daqueles que realmente estão à vontade com o novo capitalismo são “capacidade de desprender-se do próprio passado e confiança para aceitar a fragmentação” (SENNETT, 2012a, p.73). Além disso, uma série de critérios de julgamento, considerados “qualitativos” da aptidão potencial, são muito mais pessoais do que baseados na análise de desempenho, pois os gestores se pautam, em geral, mais em seus instintos do que nos dados. A individualidade passa a ser o foco, não se observando as circunstâncias sociais e econômicas; a aptidão potencial é devastadora para o indivíduo, assombrando aqueles considerados sem aptidão com a sensação de inutilidade (SENNETT, 2012b). A meritocracia, a alta competitividade e a cultura do sucesso suscitam uma questão ainda mais profunda, da alteridade, pois contribuem para que o senso de cooperação e a relação com o outro fiquem em um segundo plano. Como não se sabe quem continuará na empresa e em que posição se estará no dia seguinte, o conceito de interesse comum perde seu valor. A força individualizadora da época atual é descrita por Sennett (2012a), Bauman (2001), Touraine (2005) e Lipovetsky (2005).

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Para Sennett (2012a), o pronome “nós” foi definido como perigoso, em uma ironia ao capitalismo moderno que desconsidera ou reduz o Outro a pouca relevância. Para o autor, ao celebrarem a independência e a autonomia, as empresas despertaram o senso de vulnerabilidade. A independência das empresas está mais relacionada com ao “eu” que ao “nós”. Confiança, responsabilidade mútua e compromisso estão ligados ao senso de comunidade, ao “eu” inserido no grupo, que exerce sua dependência e independência – a autonomia do indivíduo é dependente do grupo e da interrelação com o outro. O trabalho em equipe não fornece o tempo suficiente para desenvolver qualidades, como lealdade, confiança e compromisso mútuo em relações mais autênticas, pois é necessário tempo para se conhecer as pessoas e saber com quem se pode contar ou não quando aparece uma tarefa mais difícil, por exemplo. Os relacionamentos se tornam dependentes das habilidades sociais dos indivíduos, dando menor espaço para sentimentos mais profundos e autênticos. A ênfase no trabalho em equipe mascara também as estruturas de poder e autoridade da instituição: como não se reconhecem as diferenças de poder, há uma forma fraca de comunidade que pressupõe que todos partilham uma motivação em comum. O resultado é que pessoas dentro da empresa desenvolvem uma máscara de cooperatividade, manipulando aparências e comportamentos com os outros. A motivação deve ser de cada indivíduo que, compreendendo a motivação do outro e as diferenças entre si, colaboram para ideais comuns e desenvolvem colaboração e desenvolvimento através de laços de confiança – mas isso é o que não é propiciado. O tempo é a única forma de desenvolver os laços de confiança. À medida que as pessoas interagem, trocam experiências, aprendem e são testadas umas com as outras é que se passa a confiar. É nos momentos de problema, onde há uma necessidade de ajuda evidente que a confiança se fortalece. No capitalismo da superficialidade, é vergonhoso pedir ajuda. Há uma desconfiança sobre as intenções do outro, sobre tomar o seu lugar ou um simples sentimento de orgulho e vulnerabilidade por necessitar de alguém.

O medo da dependência fala da preocupação com a perda do autocontrole e, em termos mais psicológicos, do sentimento de vergonha por submeter-se aos outros. Uma das grandes ironias do

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modelo da nova economia é que, ao livrar-se da jaula de ferro, ele serviu apenas para reinstituir esses traumas sociais e emocionais numa nova forma institucional. (SENNETT, 2012b, p.49).

Se, no capitalismo antigo, a indiferença estava ligada à classe social, ao material, no moderno, a indiferença é pessoal. As redes, a tecnologia e as equipes enfraquecem o caráter, diminuem a ligação com o mundo e com o outro. “Está faltando o Outro, e assim estamos desligados” (SENNETT, 2012a, p.175). Malvezzi (2013) menciona a importância da relação Eu-Outro como sendo a chave para o sucesso das organizações em rede através de uma liderança que permita que indivíduo faça, se aprimore e otimize os resultados, mas que, todavia, isso vem sendo negligenciado pela maioria devido à burocratização e alta instrumentalização das organizações. A relação com o outro tem sido tratada de forma superficial e, quando pensamos em trabalhos em rede, descartável. Como atribui Bauman (2001, 2008), essas são as características do mundo atual e das relações entre os seres humanos. As relações humanas, a interação e, principalmente, a confiança exigem tempo e cuidado. Eles não se formam se não forem cuidados e deterioram da mesma maneira quando esquecidos. Em outras palavras, “laços e parcerias tendem a ser vistos e tratados como coisas destinadas a serem consumidas, e não produzidas” (BAUMAN, 2001, p.187) – herança de sociedade de consumo que estamos vivendo. Com o triunfo do individualismo, Touraine (2005) defende que a época atual representa a queda do universo social. O autor argumenta que o enfraquecimento do social leva o indivíduo a voltar-se a si mesmo em defesa de sua liberdade. Mas alerta que esse sujeito consciente de si mesmo não representa uma busca interior ou “de procura de si pela eliminação das influências exercidas sobre o ego pelo mundo exterior” (idem, p. 26). No universo individualista, a luta é contra as forças organizadas dos movimentos sociais, políticos e religiosos, que alienam o indivíduo. Lipovetsky (2005) realiza uma leitura mais positiva do hiperindividualismo e do narcisismo. Para o autor, o enfraquecimento da sociedade e dos costumes reflete em um processo de personalização, no qual o indivíduo se volta para a realização do pessoal, da sua individualidade, dos seus desejos e anseios, com um “direito de ser ele mesmo”, em detrimento das relações com o outro e com a

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sociedade e caracterizada, em grande parte, pelo consumismo. Apesar de observar que o processo de personalização gera o “vazio”, ou seja, “a flutuação existencial pela abundância de modelos”, ainda assim, para Lipovetsky (2005), o consumismo representa uma possibilidade de o indivíduo fazer suas escolhas, mesmo que isso leve, em um primeiro momento, ao extremo que se verifica na atualidade. Para Lipovetsky (2005), na era do vazio, estamos menos carregados e mais livres, mais lúcidos e menos dependentes, mais exigentes e menos submissos, mais flexíveis e menos engessados por engrenagens de poder e nome de verdades que se apresentavam como transcendentais ou universais, embora não passassem de formas locais de controle. Em termos de moral, menos é mais. O moralismo caracteriza-se pelo excesso de valores que não podem ser discutidos. A ética, numa sociedade liberada do sacrifício, faz-se, no mínimo, indispensável à coesão social e ao respeito ao outro. O vazio salva do excessivo. Segundo o autor, a hipermodernidade é um tempo em que excesso e vazio enfrentam-se num combate que gera autonomia, novas liberdades, mas também produz, como não poderia deixar de ser, novos problemas, novas angústias e novas expectativas. A relação com o “eu”, o ego, é abordada por Lipovetsky (2005) não somente como um perfil individualista, mas narcísico, que se relaciona, de forma distinta, consigo e com o “capitalismo” que passa a ser cada vez mais permissivo. Longe de derivar de uma “tomada e consciência” desencantada, o narcisismo é o efeito do cruzamento entre uma lógica social individualista hedonista, impulsionada pelo universo dos objetos e dos sinais, e uma lógica terapêutica e psicológica, elaborada desde o século XIX a partir da aproximação psicopatológica. No momento em que a produção é substituída pela informação, o consumo de consciência se torna uma nova bulimia: ioga, psicanálise, expressão corporal, zen, terapia primal, dinâmica de grupo, meditação transcendental. À inflação econômica respondem a inflação psicológica e o formidável impulso narcísico que ela produz. Narciso identificado aqui como o homem “psicologicus”. O narcisismo, nova tecnologia de controle suave e autogerada, socializa dessocializando e coloca os indivíduos de acordo com um social pulverizado, glorificando o reino da expansão do Ego puro. É uma busca interminável de si mesmo. Como o espaço público se esvazia emocionalmente por excesso de

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informações, de solicitações e de estímulos, o Eu perde suas referências e sua unidade por excesso de atenção: o Eu se tornou um conjunto impreciso. De qualquer forma, mesmo o individualismo positivo de Lipovetsky (2005) não demonstra sinais de resolução do problema de identidade, nem tampouco desenvolve a alteridade. Além de tornar os indivíduos instáveis, conduz à indiferença em relação ao Outro. Essa preocupação com a consciência do Eu e a relação e o olhar do Outro é também manifestada por Dejours (2007), quando ele descreve que a atividade do trabalho não produz identidade, mas somente a possibilidade de um encontro entre a identidade e o real. A identidade só pode ser conferida pelo olhar do outro. A crise de identidade dos indivíduos que Lipovetsky (2005) define como o conjunto impreciso do eu, segundo Dejours (2007), permitiu as organizações modernas ampliarem seu papel na sociedade, segundo Freitas (2000). A ênfase na importância da imagem, do consumo, das aparências, da superficialidade leva as empresas a se posicionarem como aquelas que propõem uma vida de sucesso e uma missão nobre a realizar. Essa autoimagem grandiosa que as empresas constroem de si mesmas é repassada não só para os que nela trabalham, mas também para a sociedade como um todo. Elas assumem o papel de fornecer ao indivíduo a identidade, tanto social como individual. Para isso, a empresa busca estabelecer com os indivíduos uma relação de referência total. A organização não pede ao indivíduo para trabalhar apenas por dinheiro; ela o convoca para algo muito mais nobre: ser vencedor, ser o melhor. Em uma sociedade onde a competição é acirrada, a exclusão se tornou comum, e as relações são fracas e, muitas vezes, aparência. O indivíduo identifica-se com a organização como uma fonte para sua busca de identidade. Ele se torna, então, um parceiro da empresa nessa busca de poder, da imagem de sucesso, do controle social, de tudo aquilo que simbolicamente possa vir ao encontro de seu ideal de ego (SIQUEIRA, 2007, p.137).

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6.4 Considerações sobre o capítulo

A dinâmica atual do trabalho é caracterizada pela velocidade das mudanças e sua constância. A mudança passa a ser a única certeza no atual modelo de capitalismo e descritos como os cenários de pós-modernidade por Bauman (2001), Lopovetsky (2005), Touraine (2005) e Sennet (2012a). O trabalho é uma das dimensões mais importantes na identidade e significância da vida do indivíduo. Separar o trabalho do indivíduo é tarefa cada vez mais complexa face a velocidade e ritmo atual imposto pelo capitalismo pós- moderno. A competição crescente no mercado de trabalho e o grau de importância dado criou o perfil do “vencedor”, que deve ser flexível, criativo, afirmativo e, sobretudo, superficial nos contatos pessoais e indiferente a projetos de vida duradouros. O foco é no curto prazo, havendo pouco espaço para as relações mais duradouras. A luta contra o tempo passou a ser uma das principais resoluções desse período. Metas e objetivos têm de ser batidos a todo instante, e o indivíduo se vê exposto a diferentes situações e problemas, volume de informações e dados a serem analisados, a uma velocidade nunca vista – o que o exige representar diferentes personagens (personas) e se adaptar às mudanças sem ter o tempo devido para conhecer e elaborar seu papel. Sennett (2012a) afirma que os trabalhadores ficam impossibilitados de desenvolverem uma narrativa constante de carreira. A experiência atual transforma a narrativa linear em uma colagem de fragmentos, deixando o indivíduo à deriva no tempo. Como consequência adicional, há grande ansiedade e corrosão do caráter do indivíduo, o que causa falta de parâmetros para tomada de decisão com base em suas crenças e valores, levando-o à perda de autonomia. Os modernos instrumentos de gestão da atualidade trazem uma falsa sensação de maior autonomia e flexibilidade ao delegarem mais e distribuírem as atividades e o poder, como no modelo em redes. Mas, o que de fato ocorre é uma concentração de poder e uma estrutura de tarefas confusa que requer adaptação constante.

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Esse mesmo modelo de redes, o alto grau de informatização e volume de informação e tecnologia enfraquecem cada vez mais a relação com o mundo e com o outro. A relação com o outro tem sido tratada como algo descartável, coisas a serem consumidas e não produzidas (BAUMAN, 2001, p.187). Para Lipovetsky (2005), o individualismo positivo da era hipermoderna amplia ainda mais a indiferença em relação ao outro criando uma crise de identidade dos indivíduos. Essa falta de identidade, de necessidade de consumo constante e de aparências, permite às empresas se colocarem em uma posição onde os indivíduos desejem trabalhar para elas, em um modelo de parceria nesta busca de identidade, poder e sucesso.

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7. Método

7.1 Construção do Instrumento – Metodologia Q

Deste o início dos estudos para esta pesquisa, é de desejo do pesquisador e de seus orientadores realizar uma pesquisa com o maior grau de precisão possível, entendendo os limites das metodologias existentes e o tempo disponível dentro de um mestrado, procurando uma Metodologia que atenda as características de uma análise qualitativa e quantitativa e que tenha instrumentos para tratar com temas subjetivos. Partindo da premissa de haver um alto nível de subjetividade nos temas autorrealização e individuação, e ainda, divergências na compreensão pelo sujeito do que vem a ser “autorrealização” e “individuação”, foram analisadas diversas possibilidades de métodos e instrumentos, tais como questionários, grupo focal, discurso do sujeito coletivo (DSC), uso de entrevistas, análises quantitativas e a técnica denominada “Metodologia Q”, sendo optado por esta última, devido a sua capacidade de analisar temas subjetivos através de uma análise qualitativa- quantitativa com um número de sujeitos relativamente baixo e de agregar opiniões e compreensões, o que nos permite atingir os objetivos desta pesquisa no tempo do mestrado. Destaco aqui que não caberá a esta dissertação identificar se os praticantes da pesquisa são autorrealizados no trabalho ou estão em seu caminho de individuação. Esta dissertação se limitará a analisar os objetivos traçados no capítulo 1.2, “Objetivos” e responder as questões listadas, capítulo 1.2.2, nesta dissertação. Vale relembrar o objetivo central que é compreender e analisar, como os indivíduos, entre 40 e 55 anos, que atuam em posições de liderança, em empresas privadas, entendem a autorrealização no trabalho e quais são os obstáculos e instrumentos para sua realização. A Metodologia Q foi criada na década de 30 do século passado por William Stephenson, físico e psicólogo inglês interessado em encontrar recursos para estudar a subjetividade, característica de alguns objetos de estudo presentes em

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diferentes áreas e contextos, incluindo os contextos pessoal e vivencial. Essa metodologia foi, posteriormente, desenvolvida nos EUA por Steven Brown, com um aperfeiçoamento significativo no que diz respeito à investigação empírica nas áreas das ciências sociais e humanas (WATTS & STENNER, 2005a, 2005b). Esta metodologia é utilizada para investigar conceitos, teorias e ideologias por seu poder de revelar significância na força de afirmações para aglutinar sujeitos em torno de si e pela compreensão da subjetividade humana por meio da expressão do ponto de vista individual (MALVEZZI, 2011). Temas, como crenças, ideologias, comportamentos, atitudes, opiniões e tendências estão presentes em estudos, cujo destaque são os estudos dos estilos afetivos e cognitivos (RAYNER & WARNER, 2003; SAMUELS & FETZER, 2008), dos sistemas de crenças (SHINEBOURNE & ADAMS, 2007), dos comportamentos e as emoções (WATTS & STENNER, 2005) e das percepções e atitudes (LAI et al., 2007; SANTOS & SCHOR, 2003). A Metodologia Q é considerada uma metodologia quantitativo-qualitativo que, através de uma escolha forçada de afirmações, chamada “Q-Set” (ou Escala Q), faz com que os indivíduos participantes da pesquisa ordenem as afirmações, decidindo qual a sua importância, criando, assim, uma escala através da comparação da ordenação feita por cada participante da pesquisa. Tendo em vista os inquéritos na população geral, a validade estatística não é a maior preocupação para essa metodologia, uma vez que os resultados de um estudo Q são as diferentes opiniões (subjetivas) sobre o tema em estudo, e não a percentagem da população que adere a cada uma dessas opiniões. A totalidade das escalas fornecidas por cada indivíduo é analisada de forma a gerar fatores e agrupamentos, permitindo, assim, entender quais as afirmações mais “fortes” e as mais “fracas”, entre o grupo de indivíduos participantes, em relação ao tema pesquisado. Podemos dizer que a “Metodologia Q” aglutina pessoas ao redor de uma afirmação e, com base nessas “aglutinações”, podemos analisar o tema em questão. Os resultados encontrados num estudo com a Metodologia Q podem, então, ser usados para descrever uma “população de pontos de vista” e não uma “população de pessoas” (RISDON, ECCLESTON, CROMBEZ, & McCRACKEN, 2003).

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Outra vantagem do método é que ele não requer muitos sujeitos para a sua realização. O entendimento dos autores é de que a informação se repete (BROWN, 1996) após um certo número de sujeitos. Em termos operacionais, os sujeitos participantes da pesquisa são colocados perante um conjunto de afirmações que constituem a amostra designada “Q-set” (afirmações sobre o tema de estudo) e que envolve uma seleção de itens (afirmações) extraídos de um universo especializado de opiniões e de posições possíveis relativamente à questão ou tema em estudo (HURD & BOWN, 2004-5). Essas afirmações são coletadas através da literatura científica ou documental do tema, através de entrevistas, grupos focais e outros métodos de coleta de dados e variáveis. Os participantes que, no seu conjunto, definem o “P- set” (grupo de participantes da pesquisa) deverão ordenar as afirmações de acordo com o seu ponto de vista. A ordenação obtida é, então, sujeita à análise fatorial que, uma vez realizada, representa um grupo de “pontos de vista” individuais com elevada correlação entre si e não correlacionados com os outros. As pessoas que classificam itens, de modo similar, são correlacionadas com cada outra. Com base nos agrupamentos de correlações individuais encontrados, extraem-se agrupamentos de correlações denominados fatores que mostram os pontos de vista compartilhados pelas pessoas. A partir desse ponto, é possível ainda realizar uma análise qualitativa para identificar as possíveis causas e efeitos das correlações encontradas. A integração dos pressupostos e da lógica de investigação qualitativa com a análise quantitativa de dados trazidos pela Metodologia Q permitem trazer os resultados esperados para esta pesquisa. A integração entre procedimentos qualitativos e quantitativos funciona como uma ponte entre as metodologias tradicionais (RHOADS et al., 2004-5), muitas vezes, consideradas antagônicas pelos investigadores mais cépticos.

7.2. As afirmações (Q-set)

As construção das afirmações Q, Q-set, é uma das etapas mais demoradas e complexas desse instrumento, pois requer uma vasta pesquisa sobre o material

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teórico, pesquisas de campo e, muitas vezes, entrevistas de validação e outras ferramentas, com o intuito de coletar o maior volume de informações e afirmações possíveis sobre o tema (ou a serem convertidas para afirmações) e relacionadas com as perguntas ou questões a que se deseja trabalhar com a metodologia. Nesta dissertação, limitamo-nos à literatura, devido à vasta obra teórica sobre autorrealização e individuação, mesclando subtemas, como bem-estar, equilíbrio de vida e significado do trabalho, que são extremamente associados e, muitas vezes, fazem parte das discussões e análises de autorrealização no trabalho. Através da literatura, encontramos um extenso levantamento de definições, frases e afirmações relacionadas com o tema. Obtivemos mais de 130 registros que foram, posteriormente, utilizados como fontes para a formação das afirmações desta pesquisa. Diversas passagens específicas definindo e caracterizando autorrealização e individuação, provenientes dos textos de Jung e Maslow e referenciados nesta dissertação, estão contidas nestes 130 registros, bem como as passagens de diversos outros artigos e textos sobre os temas. Como determina a metodologia, foram realizadas diversas análises para comparar as afirmações entre si e chegar a um número suficiente para a execução do método. Uma das formas foi a definição de domínios, que foi essencial para limitar e escolher as afirmações de maior força e poder de aglutinação. Foram utilizados, inicialmente, os 5 domínios encontrados por Leclerc (1998) e outros 2 domínios encontrados ao longo da análise das afirmações. Os sete domínios definidos são: a) Autonomia; b) Adaptação; c) Abertura para o Eu; d) Abertura para a Vida; e) Abertura para o Outro; f) Ambiente de trabalho, obstáculos e instrumentos; g) Status e Ganhos Financeiros. Os cinco primeiros domínios são provenientes do estudo de Leclerc (1998) e os dois últimos domínios “Ambiente de trabalho, obstáculos e instrumentos” e “Status e Ganhos Financeiros”, foram encontrados com base nos registros obtidos. Dentro dos sete domínios, estão distribuídas as 70 afirmações de forma equilibrada – 10 afirmações por domínio – que foram submetidas ao julgamento e análise dos participantes da pesquisa para sua ordenação, segundo sua visão sobre o assunto.

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Cada uma das afirmações foi descrita em um cartão e entregue aos participantes, conforme descrito no item 7.5 (Procedimento). O participante não teve conhecimento da divisão existente por domínios. As afirmações submetidas aos participantes da pesquisa foram:

A. Afirmações "Autonomia": 1. Decidir e escolher consistentemente com as próprias crenças. 2. Fazer perguntas que permitam ao outro realizar a atividade à sua maneira. 3. Delegar confiando no outro sem se preocupar com os detalhes da execução. 4. Instigar o outro a refletir e opinar. 5. Ouvir o outro para amadurecer e criar possibilidades. 6. Executar as atividades dentro das normas vigentes. 7. Reconhecer o protagonismo de todos. 8. Reconhecer autonomia e individualidade do outro. 9. Otimizar atividades em congruência com a própria compreensão. 10. Agir, otimizando tempo e custos

B. Afirmações "Adaptação": 11. Elaborar as tarefas conforme à disponibilidade de recursos. 12. Identificar acertos e erros independentemente da opinião ou aprovação dos outros. 13. Adaptar-se à diversidade de interesses (da empresa, ou do outro). 14. Tomar decisões equilibradas considerando os potenciais conflitos e crises. 15. Adaptar-se às mudanças, considerando a flexibilidade das atividades e prazos. 16. Mudar suas próprias atitudes sobre a empresa e o outro, sempre que faça sentido. 17. Defender aquilo que é necessário em cada situação. 18. Desempenho de qualidade significa equilíbrio físico e psíquico. 19. Perseverar e persistir enquanto houver espaço para desenvolvimento. 20. Ter consciência dos próprios limites é condição essencial para realizar mudanças.

C. Afirmações "Abertura do Eu": 21. Assumir o controle do próprio desenvolvimento. 22. Intervir em fatores externos que afetam a atividade profissional e pessoal. 23. Decidir consistentemente com seus ideais. 24. Ser transparente nas próprias emoções e crenças. 25. Buscar novos desafios que levem ao próprio desenvolvimento. 26. Evitar o erro controlando ao máximo os riscos. 27. Defender as próprias crenças anulando o medo de contrariar o outro. 28. Reconhecer os próprios feitos independentemente da aceitação por parte do outro. 29. Buscar emancipação. 30. Priorizar o autodesenvolvimento na realização de metas.

D. Afirmações "Abertura para a Vida":

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31. Buscar equilíbrio entre vida pessoal e profissional. 32. Buscar realização profissional para engrandecer a realização pessoal. 33. Persistir no enfrentamento dos desafios do trabalho. 34. Buscar significado no trabalho e em seu produto. 35. Identificar-se com os ganhos de novas potencialidades. 36. Buscar novas possibilidades a partir das metas realizadas. 37. Persistir nos desafios com autoestima, aceitando os erros. 38. Aprofundar os vínculos com o outro. 39. Investir tempo e energia em projetos sociais. 40. Atuar buscando sempre o melhor de si.

E. Afirmações "Abertura para o Outro": 41. Otimizar a interlocução com o outro. 42. Dar e aceitar feedbacks. 43. Ser transparente nas próprias expectativas e emoções. 44. Empenhar-se na realização do outro. 45. Buscar respeito e aceitação por parte do outro. 46. Emancipar-se da dependência do outro nas próprias decisões. 47. Reconhecer e premiar situações de sucesso. 48. Exigir do outro a dar o máximo de si. 49. Identificar e desenvolver as potencialidades do outro. 50. Confiar no outro desenvolvendo potenciais compartilhados.

F. Afirmações "Ambiente de trabalho, Obstáculos e Instrumentos": 51. Explorar as oportunidades de crescimento e prazer no trabalho 52. Priorizar ações criativas mais do que automáticas. 53. Construir competências que ainda não se tem. 54. Buscar resultados confiando nos outros. 55. Ter consciência de que êxitos futuros dependem do sacrifício de hoje. 56. Buscar autorrealização pessoal e profissional na qualidade dos resultados. 57. Identificar e enfrentar as ameaças do ambiente de trabalho. 58. Tolerar os erros fomenta o crescimento. 59. Otimizar a instrumentalidade de gestão para qualidade do desempenho de todos. 60. Buscar o próprio empoderamento com compromisso com a realização de todos.

G. Afirmações "Status e Ganho Financeiro": 61. Buscar reconhecimento profissional junto dos ganhos financeiros. 62. Buscar a realização dos próprios sonhos nos resultados profissionais. 63. Perceber o reconhecimento simbólico como expressão de transcendência. 64. Reconhecer que a trajetória de sucesso independe do reconhecimento. 65. Buscar a superação de metas é fator de excelência e sucesso. 66. Buscar os recursos mínimos para a autorrealização pessoal. 67. Equilibrar vida pessoal e profissional é negociar consigo mesmo e com os outros. 68. Buscar realização profissional através de bens e status. 69. Desenvolver continuamente competências levando à autorrealização profissional.

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70. Buscar autenticidade para chegar à autorrealização.

7.3. Participantes

Esta pesquisa contou com 12 participantes. Foram convidados 15 executivos, dentre os quais 12 tiveram disponibilidade para participar da pesquisa. A idade mínima foi de 43 anos e máxima de 55. Todos atuam em posições de liderança, há mais de 10 anos, em empresas privadas (do que chamamos de “universo corporativo”) com mais de 1000 funcionários no Brasil ou exterior. O foco desta pesquisa é o indivíduo e não a empresa, não havendo comparação entre o resultado de uma empresa ou outra. Os indivíduos participantes foram convidados sem qualquer vínculo com a empresa em que trabalham, uma vez que era a sua opinião o que esta pesquisa desejava capturar. Devido ao baixo número de mulheres em cargos executivos, e por haver problemas em realizar um balanço das opiniões entre os gêneros, esta pesquisa teve, exclusivamente, participantes do gênero masculino.

7.4. Procedimento Ético

O projeto da pesquisa foi submetido à avaliação do Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP, de acordo com a Resolução nº 466/12 e 510/16 do CONEP (Comissão Nacional de Ética em Pesquisa) e Regimentos dos Comitês de Ética em Pesquisa da PUC/SP, sujeito às normas estabelecidas nesta resolução e aprovado através do “Parecer Consubstanciado do CEP” de número 2.991.614. Os participantes foram esclarecidos sobre o assunto e o objetivo da pesquisa no momento do convite para sua colaboração. Foram também informados sobre o tipo de metodologia a ser utilizado, Metodologia Q, bem como sobre o local, tempo necessário a ser dedicado para a entrevista e demais procedimentos descritos item 7.5, “Procedimento”. Os participantes desta pesquisa não representam as

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empresas em que trabalham, e as opiniões expressas nesta pesquisa são do indivíduo participante e não da empresa. O Termo de Consentimento foi entregue e esclarecido verbalmente a cada participante, e as assinaturas dos termos foram coletadas antes do início da pesquisa. O sigilo da identidade dos participantes será garantido pelas cláusulas do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, apresentado logo no primeiro contato individual (Anexo B) com o participante. O cumprimento do Termo de Consentimento, bem como todas as demais normas da Resolução nº 466/12 e 510/16 do CONEP, são ainda reforçados pelo termo de Termo de Compromisso do Pesquisador (Anexo A). A pesquisa pode ser interrompida a qualquer momento em que o pesquisador perceba prejuízos à saúde do participante ou se o mesmo solicite a interrupção. Os participantes foram ainda informados sobre a possibilidade de obterem os resultados da pesquisa, os quais serão disponibilizados, caso desejem.

7.5. Procedimento

7.5.1 Local de realização da pesquisa

As pesquisas foram realizadas em local de escolha dos participantes. De forma geral, a sala privada do próprio participante, na empresa onde trabalha, foi utilizada no momento de resposta da pesquisa. Em outros poucos casos, foi utilizada a sala do pesquisador localizada no bairro de Moema, na cidade de São Paulo.

7.5.2 Seleção dos participantes (P-set)

A seleção dos participantes foi feita através de “Amostragem por conveniência do pesquisador” a fim de atingirmos o grau de conhecimento e vivência requeridos pela metodologia sobre o tema.

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Conforme previsto pela metodologia, o principal foco na seleção dos participantes é que os mesmos possuam conhecimento e vivência do tema para que haja uma amplitude de opiniões. Os participantes da pesquisa (denominados P-Set) devem ser selecionados através de seu conhecimento, vivência e capacidade de desenvolver e responder sobre o tema. A Metodologia Q não permite a escolha aleatória de participantes, exigindo, assim, a escolha de um grupo relativamente homogêneo e representativo dentro de uma determinada população e ao redor do tema a ser pesquisado. Por exemplo, se o objeto de estudo forem as atitudes terapêuticas em diferentes abordagens teóricas, devem ser contatados terapeutas experientes nas abordagens em estudo, acreditados pelas respectivas entidades/sociedades científicas, e distribuídos por características como gênero, idade ou anos de experiência (BLOCK, 1961; SHINEBOURNE & ADAMS, 2007; WATTS & STENNER, 2005a). A idade dos participantes foi definida com base na teoria do meio da vida de C. G. Jung, ou como é chamada, metanóia. O meio da vida corresponde aos anos de início da maturidade. Para alguns, um período de turbulências e crises. Para outros, como uma fase de transição. Um período que envolve mudanças, físicas, pois nosso corpo já está em um processo de envelhecimento, mas que, ao mesmo tempo, não se resume a esse declínio físico, mas em um potencial de desenvolvimento intelectual e psíquico que esta maturidade pode nos dar. Ao descrever os ciclos de vida de um adulto, Jung (2011d) reconheceu a possibilidade de desenvolvimento psicológico que se processa ao longo de toda a vida e que, a despeito de ser um processo contínuo, aponta para uma mudança de valores no meio da vida, período situado tipicamente entre 35 e 50 anos (STEIN, 2007). Esse período caracteriza-se como uma dos mais importantes do processo de individuação, durante o qual, de maneira geral, as necessidades básicas de A. Maslow devem ter sido atendidas para uma parte da população – é quando então se busca ou se pode buscar, de forma mais intensa a autorrealização. Poderá haver mais de um participante proveniente de uma mesma empresa do setor privado, porém, para que exista uma maior variedade de pontos de vista, limitaremos a um máximo de três pessoas da mesma empresa privada.

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7.5.3 Procedimento de intervenção

Todos os participantes foram contatados inicialmente por telefone e, em alguns casos, pessoalmente, após o contato telefônico, para serem convidados para participar da pesquisa, onde foram aclarados sobre o tema e os critérios de inclusão. Uma vez confirmada a possibilidade de participação, foram informados sobre mais detalhes, objetivos e termos éticos, antes da realização da entrevista para execução da Metodologia Q. Durante o contato telefônico ou pessoal, foi definido local, data e hora da entrevista, informando o tempo médio de 60min e máximo previsto de 90min. Cada participante foi informado sobre o “Termo de Consentimento Livre e Esclarecido” e todos decidiram por recebê-lo durante a entrevista (Anexo B). No início da entrevista, cada participante recebeu previamente o “Termo de Consentimento Livre e Esclarecido”, que foi novamente aclarado e foi obtida a assinatura de cada participante, em duas vias, uma para o participante e outra para o pesquisador. Somente após esta explanação final é que o participante foi requisitado a iniciar o procedimento da pesquisa. A partir desse momento, o sujeito participante da pesquisa foi orientado pelo pesquisador da seguinte maneira: 1) O pesquisador descreveu brevemente o tema central (que já foi informado anteriormente durante o convite para participar da pesquisa) e dos pontos a serem pesquisados. Em resumo, o pesquisador pontuou o seguinte: “dentro dos objetivos desta pesquisa, queremos compreender o que você entende por “autorrealização” no trabalho, e quais são os instrumentos e obstáculos que tanto a empresa em que trabalha, quanto você mesmo, colocam a seu favor ou contra para que isso possa ocorrer”. 2) Foi apresentado ao participante o tabuleiro onde ele realizaria o trabalho da pesquisa. Uma foto com um tabuleiro preenchido (final de uma das pesquisas), se encontra no Apêndice deste documento. 3) Um cartão com a frase abaixo foi mostrado e disponibilizado para o participante a fim de ter acesso ao tema/pergunta central o tempo todo.

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Neste cartão estava escrito: “Que atividades e ações no ambiente e no indivíduo constroem a autorrealização?” 4) O pesquisador questionou sobre a possibilidade de alguma dúvida por parte do participante, caso positivo, respondeu sem maiores detalhes. A explicação foi o mais breve e simples possível. Segundo a metodologia, a meta é fazer com que o participante passe a sua visão sobre o tema, a partir da classificação das afirmações existentes nos cartões. Para isso, o pesquisador deve passar o mínimo de informações sobre a teoria em questão, apenas sobre o método. 5) A partir desse momento, o pesquisador mostrou ao participante os demais cartões contendo as 70 afirmações existentes na pesquisa e convidou o participante a ler o material atentamente, de modo a ficar com uma ideia geral da variedade de afirmações sobre o tema pesquisado. Foi informado ainda ao participante que o número impresso em cada cartão é para uso do pesquisador e não se refere a qualquer ordem de classificação. 6) Depois da primeira leitura, o participante foi instruído para ler novamente os cartões, mas, desta vez, à medida que fosse lendo, classificasse os cartões em 3 categorias, sem se preocupar com a quantidade de cartões por categoria. Ao classificar, o participante deveria colocar os cartões nos espaços definidos para cada categoria no tabuleiro (ver foto no Apêndice). As três categorias que os participantes classificaram foram: a. Concordo: as afirmações com as quais tem maior concordância (diretamente ou genericamente); b. Discordo: aquelas com as quais tem menor concordância ou discorda; c. Neutro: as afirmações sobre as quais é neutro (fica indeciso ou que lhe suscitam dúvidas);

“Cartões Concordo” “Cartões Neutro” “Cartões Discordo”

Concordo Neutro Discordo

7) Conforme descrito na metodologia, após esta classificação, o pesquisador faz uma anotação sobre o número de afirmações em cada categoria, para verificar o equilíbrio entre concordância e discordância dentro do Q-set. Em

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100% dos entrevistados, o número de afirmações na categoria concordo era maior que nas demais, sendo que em apenas um caso, houve um pequeno equilíbrio, mesmo assim com mais cartões na classificação concordo. Na categoria discordo, o máximo de cartões colocados por um dos participantes foi de 15 e o mínimo de 6 das 70 afirmações. 8) Com os cartões previamente ordenados e o participante tendo ciência do seu conteúdo, foi explicado ao participante como deveria ser feita a classificação das afirmações no tabuleiro central, que possui 85 cm de comprimento por 65 cm de largura:

Figura 2- Modelo do tabuleiro

"Discordo" "Concordo" -6 -5 -4 -3 -2 -1 0 0 1 2 3 4 5 6

9) O participante foi informado que ele deve classificar agora as 70 afirmações no tabuleiro, de acordo com a pergunta central “condição de instrução” do item 1. 10) O participante foi informado que as colunas do meio, com valor 0 (zero) se referem a toda afirmação da categoria “neutra”, a posição mais à direita, valor 6 (seis), se refere a que ele mais concorda ou de maior relevância e a posição -6 (menos seis), a mais à esquerda, a que discorda totalmente. Foi explicado que a prioridade de classificação está nas colunas, sendo que as linhas na mesma coluna têm o mesmo peso/valor. Exemplo: todas as afirmações colocadas nas 24 posições existentes das colunas com valor 0 (zero) tem valor zero para a pesquisa, que é igual a neutro. 11) Após aclarado o formato de classificação, o participante inicia a classificação das afirmações de acordo com a “condição de instrução” e as definições de classificação acima.

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12) Os participantes mudaram várias vezes a ordem dos cartões durante o processo. Alguns participantes iniciavam com classificação das afirmações neutras, outros com as de discordância, mas independentemente dessa ordem, sempre havia vários cartões na categoria concordo, havendo mais cartões para todos os pesquisados, que os espaços disponíveis. Em 100% dos casos, o maior trabalho dos participantes foi priorizar as afirmações que concordavam e mover afirmações inicialmente classificadas como neutras para as colunas de discordância.

Em 100% das entrevistas, o pesquisador foi questionado sobre algum tipo de dúvida nas afirmações. As respostas sempre se ativeram a explicar o contexto da frase, quando esse era o caso, ou em esclarecer as dúvidas sobre o processo de classificação. O pesquisador, em momento algum, interrompeu os participantes para realizar qualquer pergunta ou fazer algum apontamento. Ao final de cada entrevista, foi ofertado um segundo encontro caso o participante entendesse necessário, assim como o entrevistador informou que, caso houvesse necessidade de um segundo encontro para sanar qualquer dúvida nas respostas, esse seria proposto. Por se tratar de um questionamento sobre sua autorrealização no trabalho, a possibilidade de um segundo encontro permite um suporte ao entrevistado, em virtude de possíveis mobilizações decorrentes do primeiro encontro. Considera-se baixo risco para o participante o procedimento em questão. De maneira geral, os participantes requisitaram ser informados da publicação da dissertação e pediram uma cópia caso isso fosse possível. Os participantes foram informados de que os resultados da pesquisa estariam disponíveis na biblioteca da PUC-SP. O pesquisador também se ofereceu para enviar cópia a cada um dos participantes que assim a desejassem. Após a análise de dados, não houve necessidade de repetir ou contatar os participantes para sanar qualquer dúvida. A metodologia se mostrou extremamente eficiente para o propósito deste trabalho.

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7.5.4 Procedimento de análise de dados

A análise estatística dos dados tem por objetivo analisar os diferentes “Q- sort” (conjunto de respostas) definidos por cada participante que representam as perspectivas individuais dos participantes da pesquisa. Em primeiro lugar, foi calculada a matriz de correlação de todos os Q-sort a fim de identificar as correlações entre as ordenações obtidas. Em seguida, procede- se à análise fatorial para encontrar o número de agrupamentos de Q-sort que corresponde aos fatores. Procuraram-se idênticas visões de um conceito ou variável (BRYMAN & CRAMER, 1993), ou seja, grupos que partilhavam uma descrição similar dessas variáveis (BIGRAS & DESSEN, 2002). O conjunto de fatores encontrado foi, então, rodado para obter o conjunto final de fatores (THOMAS & WATSON, 2002). Cada fator final resultante representa um grupo de pontos de vista individuais com elevada correlação entre si e não correlacionados com os outros. Por último, e tendo em conta as diretrizes mais frequentemente referidas na literatura (BROWN, 1978, 1993; van EXEL & GRAAF, 2005), calculou-se a pontuação dos fatores e a diferença de pontuações – a afirmação que define o fator é aquela que tem a pontuação média ponderada normalizada (Z-score). Com base nas médias ponderadas, podem ainda ser conhecidas as afirmações distintivas e as de consenso. Essa análise é realizada através do uso de um software que recebe todos os dados de cada participante. Inicialmente se prevê o uso do software “PQMethod for DoS”, fornecido e mantido de forma gratuita pela “Q. Methology Org”, pelo site www.qmethod.org. Caso exista algum problema durante a execução dos trabalhos, o software em questão poderá ser trocado por algum outro similar. Em determinados cálculos, foi necessária a realização fora do software mencionado, de forma manual ou através de outro software devido a algumas pequenas limitações do “PQMethod for DoS”. Por definição, uma vez realizada a pesquisa com cada um dos participantes, não houve necessidade de um segundo encontro ou entrevista adicional, sendo possível realizar todos os cálculos e análises descritos sem qualquer contato com os participantes da pesquisa, exceto quando requisitado pelo participante ou

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quando houvesse a necessidade de verificação de algum dado pelo pesquisador. Nesse último caso, só se faria necessário um segundo encontro caso houvesse divergência ou dúvida sobre algum dado coletado, a fim de complementar a análise final da pesquisa. Uma vez concluída toda a parte estatística, cruzamentos e obtenção dos fatores e correlações, foi realizada a análise com base na interface existente entre a teoria de autorrealização de A. Maslow e a de individuação de C. G. Jung para posterior conclusão deste trabalho.

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8. Análise dos dados

Apresentaremos, a seguir, os resultados obtidos com a análise estatística das escalas Q, obtidas na realização da pesquisa em 12 executivos de empresas privadas brasileiras.

8.1. Aplicação do instrumento

Esta pesquisa transcorreu conforme esperado dentro da metodologia. O tempo médio de duração das entrevistas, durante as quais os participantes classificaram as 70 afirmações propostas, foi de aproximadamente 55min, ou seja, dentro da média de 60min esperada na metodologia para este volume de afirmações. Foram convidados 15 executivos, conhecidos do pesquisador, por se enquadrarem no perfil desejado; dentre eles, 12 aceitaram participar da pesquisa nas datas estipuladas para execução. Os executivos participantes têm entre 43 e 55 anos, todos trabalham e residem na cidade de São Paulo, exceto um executivo que divide sua agenda entre São Paulo e . A idade média ficou em 49 anos. Todos possuem cargo de alta diretoria ou vice-presidência e um deles é presidente de uma grande empresa nacional com mais de 2500 funcionários entre Brasil e América Latina. As empresas em que esses executivos trabalham possuem de 500 a +100mil funcionários no mundo. No caso dos executivos de empresas multinacionais pesquisados, o tamanho dos escritórios locais variou de +250 a +4000 mil funcionários.

Tabela 1 – Dos grupos de participantes da pesquisa Empresa Funcionários Cargo Qtd Faixa Etária Nacional + 2.5mil Presidente 01 49 anos Nacional + 3mil CIO 01 47 anos Nacional + 2mil VP Vendas 01 46 anos Nacional +500 VP/Sócio 01 48 anos Multinacional +2mil CM 01 51 anos ...continua

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Empresa Funcionários Cargo Qtd Faixa Etária Multinacional +20mil VP/Sócio 02 43 e 53 anos Multinacional +10mil VP Vendas 01 55 anos Multinacional +20mil VP Vendas 01 53 anos Multinacional +50mil VP Negócios 01 46 anos Multinacional +100mil VP Produtos 01 53 anos Multinacional +100mil Diretor Vendas 01 44 anos

Os participantes classificaram as 70 afirmações sobre a pergunta central: “Que atividades e ações no ambiente e no indivíduo promovem a construção da autorrealização?” Os cálculos estatísticos foram realizados conforme recomendação da Metodologia Q, segundo a qual se analisa o conjunto de classificações de cada participante, “Q-sort”. A escala Q foi dividida em 14 colunas. Cada afirmação poderia ser classificada em concordância (colunas à direita) ou discordância (colunas à esquerda) ao assunto das afirmações. As duas colunas do meio, de valor 0, são consideradas “neutras”. A cada coluna é atribuída uma nota de -6 a 6: os valores negativos são atribuídos à discordância, e os positivos, à concordância. As linhas possuem os mesmos valores de suas colunas. São 70 casas na tabela que garantem a normalidade da distribuição de respostas, obrigando os participantes a classificar todas as afirmações a ele disponibilizadas durante e pesquisa. A figura 3, a seguir, mostra o formato da escala Q proposta a cada participante. Um exemplo de resposta da pesquisa, escala preenchida por participante, pode ser visto no Apêndice deste trabalho.

Figura 3 - Organização da Escala Q

"Discordo" "Concordo" -6 -5 -4 -3 -2 -1 0 0 1 2 3 4 5 6

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Os dados obtidos de cada participante da pesquisa, “Q-sort”, foram submetidos a uma análise em dois estágios: no primeiro, foi realizada uma Análise de Componentes Principais (PCA, do inglês Principal Component Analysis) – uma técnica estatística utilizada para fazer uma redução dimensional dos dados, simplificando-os, através da identificação de componentes principais que explicam a variância do conjunto de dados. Uma vez descobertos os componentes principais, selecionou-se um subgrupo dos componentes que explicasse grande parte da variância dos dados e a fim de realizar as análises a partir desse subgrupo. No segundo estágio, foi realizada uma Análise Fatorial dos dados, cujo objetivo é analisar as correlações entre um conjunto de variáveis observáveis (no caso da Metodologia Q, os Q-sorts de cada sujeito), decompondo essas variáveis e identificando um conjunto de variáveis não-observáveis, os fatores, que podem explicar o comportamento das variáveis originais. Em pesquisas com a Metodologia Q, uma maneira comum de realizar essa análise é aplicar a Análise de Componentes Principais em conjunto com alguma técnica de rotação dos componentes principais, como o Varimax, para melhorar os resultados da análise e montar um modelo fatorial adequado. Por fim, para as análises, foram utilizadas o software PQMethod, que contém os principais cálculos estatísticos utilizados na Metodologia Q e os pacotes qmethod e psych da linguagem R para análises adicionais.

8.2 Análise de Componentes Principais

A técnica de análise de componentes principais (PCA) consiste em encontrar um conjunto de composições lineares, os componentes principais, a partir das variáveis originais (no caso deste trabalho, os Q-sorts). Nessa técnica, cada componente principal não tem correlação com os outros, e cada componente é escolhido de forma que ele represente o máximo de variação possível dos dados. Ao final, o conjunto de componentes principais é ordenado de forma decrescente pela variabilidade que cada componente explica.

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No contexto da Metodologia Q, cada componente principal, por ser uma combinação linear das respostas dos indivíduos, pode ser considerado uma combinação independente das opiniões dos indivíduos entrevistados. Com a identificação dos componentes principais e de quanto cada componente explica de variância nos dados, o PCA pode ser utilizado para uma análise gráfica através da projeção dos dados no novo espaço definido pelos componentes. Para esta análise, utilizaram-se as duas ou três dimensões que representam melhor a variância dos dados. Aplicando PCA na matriz de correlação de dados dos Q-sorts, os seguintes componentes principais foram encontrados:

Tabela 2 - Componentes principais identificados no PCA

Componentes Principais Variância % Variância Explicada % acumulada 1 4,058 33,817 33,817 2 1,523 12,695 46,512 3 1,275 10,627 57,139 4 1,036 8,631 65,770 5 0,909 7,574 73,344 6 0,805 6,708 80,053 7 0,618 5,153 85,206 8 0,547 4,559 89,766 9 0,473 3,940 93,706 10 0,408 3,402 97,108 11 0,260 2,165 99,273 12 0,087 0,727 100,000

Analisando a tabela acima, pode-se observar que poucos componentes podem representar uma grande parcela dos dados, como o caso de dois componentes sozinhos já representarem quase 46,5% da variabilidade dos dados. Essa medida é importante para verificar se é possível fazer uma análise gráfica dos dados e prover informações importantes para uma etapa posterior de Análise Fatorial. Através da representação gráfica, pode-se ter uma ideia da dispersão dos dados (afirmações), i.e., o quanto estão próximos ou distantes um dos outros. A

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proximidade das afirmações indica que elas foram compartilhadas entre os indivíduos. No gráfico abaixo, é possível ver a representação das afirmações nos dois primeiros componentes principais com maior variância. Ele mostra que as afirmações 1, 6, 11, 26, 31, 40, 45, 68, 56 e 70 encontram-se a uma grande distância do centro do gráfico, indicando que as afirmações podem ter posições de concordância e discordância fortes sobre a dúvida central deste trabalho. Já os grupos com afirmações muito próximas, como as afirmações 12, 15 e 59 e as afirmações 23, 42 e 43 indicam que os indivíduos podem partilhar das mesmas opiniões (seja concordância ou discordância) sobre as afirmações.

Figura 4 - Representação das afirmações nos dois primeiros componentes principais

Através da próxima etapa, será possível verificar se essas afirmações irão proceder com a determinação dos fatores e a avaliação dos Q-sorts para esses fatores.

8.3. Análise Fatorial

O objetivo da análise fatorial é identificar um conjunto de fatores que representem a opinião dos indivíduos entrevistados sobre a construção da autorrealização.

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Antes de se aplicar a análise fatorial nos dados, calculamos os índices KMO (Kaiser-Meyer-Olkin) de adequação da amostra, a análise fatorial e o alfa de Cronbach, que mede a consistência interna dos dados. O índice KMO para os dados foi de 0,7, que é bom para os padrões estatísticos de análise fatorial, e o alfa de Cronbach foi de 0,81, considerado também bom. Dentro da Metodologia Q, podemos, ainda, considerar esses fatores ótimos, visto que estão relacionados com a quantidade de participantes – o que a metodologia restringe ou recomenda um número baixo para os padrões destes cálculos. A construção desses fatores é feita através da aplicação da técnica PCA, realizada anteriormente, em conjunto com uma técnica de rotação – no caso deste trabalho, a Varimax. A ideia de utilizar um método de rotação é a de melhorar o modelo, tornando-o matematicamente mais simples e claro para as análises (BROWN, 1980, pg. 235). Um dos desafios iniciais dessa análise é encontrar um número de fatores ideal que represente a variabilidade dos dados e que seja simples de se analisar. Uma estimativa inicial que pode ser utilizada para determinar o número de fatores é verificar a tabela de componentes principais não rotacionadas pela análise anterior (Tabela 2), buscando um menor número de componentes que represente a maior variabilidade possível. Observando o resultado do cálculo PCA, pode-se observar que, com 3 componentes, obteve-se 57,1% de variabilidade e, com 4 componentes, obteve-se 65,7% de variabilidade dos dados. Em um segundo momento, com os modelos fatoriais criados, as cargas fatoriais para cada fator e indivíduo foram calculadas a fim de se descobrir quais indivíduos foram representados melhor por um único fator (ZABALA e PASCUAL, 2016). Tendo-se em vista os modelos com 3 e 4 fatores, os indivíduos foram classificados em ambos os modelos a fim de ser atestar como os sujeitos são classificados em cada um dos fatores dos modelos. Para um sujeito ser classificado em um determinado fator, sua carga fatorial deve ser significantemente alta (ter um p-valor < 0,05) e deve ter uma carga quadrática maior que a soma da carga quadrática de todos os outros fatores (BROWN, 1980). O resultado das classificações pode ser visto nas tabelas a seguir, onde mostramos a carga fatorial para cada indivíduo e fator e um “X” ao lado da carga

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fatorial do fator com o qual o indivíduo mais se identifica. Para reforçar a classificação, também a seguir, são mostradas as tabelas com as estatísticas de confiabilidade de fator e de erro padrão do score fatorial para cada modelo, que indica a força de um fator. Essas métricas são baseadas nos trabalhos de Brown (1980) e Zabala e Pascual (2016).

Tabela 3 - Cargas fatoriais e classificação dos indivíduos para o modelo com 3 fatores F1 F2 F3 Indivíduos Carga Fatorial Carga Fatorial Carga Fatorial

I1 0,584 X 0,073 0,170 I2 0,782 X 0,166 0,085 I3 0,774 X 0,125 0,087 I4 0,256 0,473 X 0,060 I5 0,449 0,635 X -0,036 I6 0,103 0,071 0,946 X I7 0,745 X 0,230 0,204 I8 -0,076 0,780 X 0,261 I9 0,216 0,842 X 0,122 I10 0,423 X 0,130 0,164 I11 0,219 0,113 0,922 X I12 0,179 0,137 0,342 X

Tabela 4 - Características do modelo fatorial com 3 fatores F1 F2 F3

Confiabilidade do fator 0,95 0,94 0,92 Erro padrão dos scores fatoriais 0,22 0,24 0,28

Tabela 5 - Cargas fatoriais e classificação dos indivíduos para o modelo com 4 fatores F1 F2 F3 F4 Indivíduos Carga Fatorial Carga Fatorial Carga Fatorial Carga Fatorial I1 0,688 X 0,114 0,231 -0,268 I2 0,756 X 0,171 0,051 0,210 I3 0,766 X 0,135 0,068 0,141 I4 0,229 0,472 X 0,027 0,134 I5 0,391 0,625 X -0,097 0,257 I6 0,118 0,103 0,945 X 0,098

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F1 F2 F3 F4 Indivíduos Carga Fatorial Carga Fatorial Carga Fatorial Carga Fatorial I7 0,709 X 0,235 0,161 0,256 I8 -0,056 0,794 X 0,256 -0,051 I9 0,211 0,849 X 0,095 0,056 I10 0,264 0,095 0,040 0,650 X I11 0,214 0,140 0,904 X 0,179 I12 -0,012 0,095 0,198 0,756 X

Tabela 6 - Características do modelo fatorial com 4 fatores F1 F2 F3 F4 Confiabilidade do fator 0,94 0,94 0,89 0,89 Erro padrão dos scores fatoriais 0,24 0,24 0,33 0,33

Observando a Tabela 5, com o modelo de 4 fatores, pode-se observar que grande parte dos indivíduos se identifica com os fatores F1 e F2, e apenas dois indivíduos se identificam com F3 e F4, o que pode identificar a interpretação dos fatores. Já o modelo com 3 fatores apresenta uma concentração um pouco maior de indivíduos nos últimos fatores, permitindo um menor viés nas análises. Além disso, esse modelo apresentou um valor de maior confiabilidade e um menor erro padrão nos scores fatoriais para cada fator. Assim, pela confiabilidade estatística apresentada e por opção do pesquisador em reduzir a quantidade de fatores para uma simplificação dos resultados, optou-se por realizar o restante das análises com o modelo de 3 fatores, sacrificando parte da variabilidade em prol da simplicidade das análises. Escolhido o modelo, o cálculo dos Z-Scores foi realizado para cada afirmação e cada fator. Para o cálculo do Z-Score de cada fator e afirmação foram considerados apenas os Q-sorts classificados neste fator. Em termos estatísticos, o Z-Score mostra o quanto uma determinada afirmação está distante da média das afirmações (no caso de trabalho, o quão distante está das afirmações consideradas como neutras). Na tabela, a seguir, é mostrado os Z-Scores calculados para cada uma das afirmações e a posição deste Z-Score em relação a todos os Z-Scores de um determinado fator.

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Tabela 7 - Classificação e Z-Scores por fator das afirmações

Classificação e Z-Scores por fator Afirmação F1 Pos. F2 Pos. F3 Pos. Decidir e escolher consistentemente com 1 1,621 4 1,340 6 0,837 14 suas crenças Fazer perguntas que permitam ao outro 2 0,341 28 -0,085 42 0,854 10 realizar a atividade à sua maneira Delega confiando no outro sem se preocupar 3 -2,247 69 -0,268 49 0,011 28 com os detalhes da execução 4 Instiga o outro a dar a sua opinião 0,463 24 0,160 30 1,270 7 Ouvir o outro para amadurecer e criar 5 0,500 23 0,416 19 0,460 21 possibilidades Executar as atividades dentro das normas 6 -0,857 58 -1,775 67 -1,687 66 vigentes. Protagonismo compartilhado (dividir os 7 0,853 14 0,243 24 0,517 18 prêmios com o outro) Reconhecimento da autonomia e 8 0,347 27 -0,160 44 -0,854 57 individualidade do outro Otimizar a realização das atividades a meu 9 -0,301 43 -2,149 69 -0,011 37 modo Agir rápido, realizando várias atividades e 10 -1,191 64 -1,739 66 -0,011 38 ações, otimizando tempo e custos Adaptar as demandas conforme a 11 disponibilidade de recursos (internos e -1,358 66 -1,391 63 -1,292 64 externos) Identificar acertos e erros 12 independentemente da opinião ou aprovação -0,384 46 -0,622 56 -0,022 42 dos outros Se adapta a diversidade de interesses 13 -0,349 44 -0,196 48 -0,033 45 (empresa e outro) Tomar decisões equilibradas considerando 14 0,768 15 0,561 15 -0,416 48 os potenciais conflitos e crises Se adaptar a mudança levando em conta a 15 -0,945 62 -0,515 53 0,000 31 volatilidade das atividades e prazos Mudar suas atitudes na empresa e com o 16 0,028 32 0,000 40 0,054 26 outro, sempre que faça sentido Defender aquilo que é necessário em cada 17 -0,117 39 -0,601 55 -0,011 39 situação Alta performance é estar equilibrado física 18 (sem somatizações) e psiquicamente (paz de -0,446 49 -0,160 45 0,854 11 espírito) Perseverar e persistir enquanto haja espaço 19 0,453 25 1,002 10 0,000 32 para amadurecimento

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Classificação e Z-Scores por fator Afirmação F1 Pos. F2 Pos. F3 Pos. Ter consciência dos meus limites é essencial 20 1,033 11 -0,650 57 0,000 33 para realizar mudanças 21 Assumir o controle de seu desenvolvimento 1,141 10 0,805 11 0,000 34 Intervir nos fatores externos que afetam o 22 -0,081 37 -1,396 64 -0,876 59 campo profissional e pessoal 23 Decidir consistentemente com seus ideais 0,895 12 1,541 5 -0,011 40 Ser transparente em suas emoções e 24 1,514 6 0,317 22 0,811 15 crenças Buscar novos desafios que levem ao próprio 25 1,703 3 1,103 8 2,135 2 desenvolvimento Evitar o erro controlando ao máximo os 26 -2,048 68 -2,703 70 -0,966 61 riscos A defesa das próprias crenças anula o medo 27 0,018 34 0,110 35 0,427 23 de contrariar o outro O reconhecimento dos próprios feitos 28 independe do reconhecimento por parte do -0,168 40 -1,309 62 0,000 35 outro 29 Buscar emancipação e autodeterminação -0,913 59 0,276 23 -0,462 53 O autodesenvolvimento é prioritário a 30 0,000 35 0,150 32 -0,765 55 realização de metas Buscar equilíbrio entre vida pessoal e 31 0,892 13 2,519 2 -1,281 63 profissional Minha realização pessoal implica na minha 32 -1,296 65 0,232 26 -1,698 67 realização profissional Persistir no enfrentamento dos desafios do 33 0,561 20 0,085 37 -0,865 58 trabalho Buscar significado no trabalho e em seu 34 0,289 30 2,531 1 0,033 27 produto Identificar-se com os risco e ganhos de 35 -0,830 57 0,039 39 0,765 16 novas potencialidades Metas realizadas levam a realização de 36 0,024 33 0,392 21 -0,427 49 novas possibilidades Persistir nos desafios, aceitando os erros 37 1,200 8 0,206 27 -0,427 50 sem abalar a autoestima 38 Aprofundar a relação e vínculos com o outro 0,339 29 -0,317 50 1,719 4

39 Investir e projetos sociais 0,615 18 -1,011 60 -0,887 60 Realizar as atividades buscando o melhor de 40 2,283 1 0,400 20 0,969 9 si Buscar o melhor caminho na interlocução 41 -0,666 52 0,000 41 0,000 36 com o outro Dar e receber feedback e reconhecer os 42 1,581 5 0,171 29 0,011 29 méritos dos outros 43 Ser transparente nas próprias expectativas 2,036 2 0,157 31 0,373 25

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Classificação e Z-Scores por fator Afirmação F1 Pos. F2 Pos. F3 Pos. Fertilizar espontaneamente o crescimento 44 1,150 9 0,195 28 0,471 19 e a realização do outro 45 Ser respeitado e aceito pelo outro -0,255 42 0,525 16 -2,179 69 Emancipar-se da dependência do outro nas 46 -0,191 41 -0,168 47 -0,427 51 próprias decisões Prêmios e reconhecimento são sinais de 47 0,574 19 0,235 25 -0,033 46 sucesso 48 Exigir do outro a dar o máximo de si -0,932 61 -0,835 59 0,854 12 Identificar e desenvolver as potencialidades 49 1,386 7 0,095 36 0,471 20 do outro Confiar no outro e desenvolver 50 -0,048 36 0,122 34 0,011 30 potencialidades em conjunto Explorar as oportunidades de crescimento 51 0,351 26 1,087 9 1,292 6 e reconhecimento no trabalho Sair do modo automatismo para buscar 52 -0,420 47 1,211 7 0,987 8 possibilidades 53 Buscar as competências que ainda faltam 0,668 16 0,627 14 2,135 3

54 Confiar nos outros na busca de resultados -0,926 60 0,049 38 0,427 24 Os sacrifícios de hoje possibilitam um 55 0,504 22 -0,792 58 0,732 17 melhor resultado futuro Realização pessoal e profissional implica 56 -1,140 63 1,896 3 2,584 1 em definir quando, onde e o que realizar Identificar e evitar as ameaças do ambiente 57 -0,081 38 -1,162 61 -0,011 41 de trabalho Tolerar os erros abre a possibilidade de 58 -0,599 51 0,137 33 0,449 22 desenvolvimento O uso correto da instrumentalidade de 59 -0,708 53 -0,598 54 -0,022 43 gestão fomenta a alta performance É responsabilidade social buscar o 60 0,619 17 -0,160 46 -0,427 52 empoderamento Buscar correlação entre reconhecimento 61 -0,720 55 0,794 12 -1,346 65 profissional e ganhos financeiros Os resultados profissionais possibilitam a 62 -1,478 67 -0,122 43 -0,022 44 realização dos demais sonhos Reconhecimento simbólico público e não 63 -0,370 45 -0,512 52 -2,114 68 público fomenta a busca de transcendência O reconhecimento do outro é evidência de 64 -0,714 54 -1,492 65 -0,822 56 uma trajetória de sucesso Cumprir metas e superar metas é fator de 65 -0,820 56 0,695 13 -0,471 54 excelência e sucesso A realização pessoal passa por definir e 66 -0,466 50 -0,488 51 0,854 13 obter os recursos mínimos Equilibrar vida pessoal e trabalho implica 67 uma negociação consigo mesmo e com o 0,530 21 0,452 18 -0,405 47 outro

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Classificação e Z-Scores por fator Afirmação F1 Pos. F2 Pos. F3 Pos. Status profissional e material contribuem 68 -2,953 70 -1,883 68 -2,617 70 para a realização profissional Realização profissional é correlacionado com 69 o contínuo desenvolvimento de -0,434 48 0,503 17 1,719 5 competências 70 Autenticidade identitária é fator de realização 0,171 31 1,882 4 -1,192 62

A tabela de classificação pode ser vista sobre uma outra ótica na Metodologia Q, onde as afirmações com maior Z-Score são as afirmações com o que os fatores mais concordam sobre a pergunta central desta pesquisa e as com menores Z-Scores as que mais discordam sobre a mesma pergunta. Com base nas notas atribuídas na classificação dentro de cada fator, podemos observar o que cada fator mais concorda que constrói a autorrealização (Notas de 6 a 2, da maior para a menor) e o que discordam em relação a construção de autorrealização no trabalho (notas de -2 a -6, menor para maior discordância). Totalizamos aqui 30 afirmações das 70, ou seja, 42% do total de respostas. O Z-Score de notas 0, 1 e - 1 foi desprezado por possuir baixa relevância.

Tabela 8 - Afirmações com os maiores e menores Z-Scores por fator

Maiores e menores Z-Scores por Fator F1 F2 F3 Classif. Afirmação Z-Score Afirmação Z-Score Afirmação Z-Score 6 40 2,283 34 2,531 56 2,584 5 43 2,036 31 2,519 25 2,135 5 25 1,703 56 1,896 53 2,135 4 1 1,621 70 1,882 38 1,719 4 42 1,581 23 1,541 69 1,719 4 24 1,514 1 1,340 51 1,292 3 49 1,386 52 1,211 4 1,270 3 37 1,200 25 1,103 52 0,987 3 44 1,150 51 1,087 40 0,969 3 21 1,141 19 1,002 2 0,854 2 20 1,033 21 0,805 18 0,854 2 23 0,895 61 0,794 48 0,854

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Maiores e menores Z-Scores por Fator F1 F2 F3 Classif. Afirmação Z-Score Afirmação Z-Score Afirmação Z-Score

2 31 0,892 65 0,695 66 0,854 2 7 0,853 53 0,627 1 0,837 2 14 0,768 14 0,561 24 0,811 -2 65 -0,820 12 -0,622 64 -0,822 -2 35 -0,830 20 -0,650 8 -0,854 -2 6 -0,857 55 -0,792 33 -0,865 -2 29 -0,913 48 -0,835 22 -0,876 -2 54 -0,926 39 -1,011 39 -0,887 -3 48 -0,932 57 -1,162 26 -0,966 -3 15 -0,945 28 -1,309 70 -1,192 -3 56 -1,140 11 -1,391 31 -1,281 -3 10 -1,191 22 -1,396 11 -1,292 -4 32 -1,296 64 -1,492 61 -1,346 -4 11 -1,358 10 -1,739 6 -1,687 -4 62 -1,478 6 -1,775 32 -1,698 -5 26 -2,048 68 -1,883 63 -2,114 -5 3 -2,247 9 -2,149 45 -2,179 -6 68 -2,953 26 -2,703 68 -2,617

Por fim, uma vez calculado os Z-Scores, pôde-se calcular a diferença do erro padrão para cada afirmação entre fatores (SED, do inglês Standard Error of Differences). Essas medidas são importantes, pois, se for observado que há uma significância estatística nessas diferenças, pode-se dizer que há uma concordância entre os fatores, ou quando a distância é significativa, se houve uma distinção no julgamento da afirmação em um ou todos os fatores. A tabela, a seguir, mostra essa análise para as 70 afirmações analisadas:

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Tabela 9 - Análise de consenso das afirmações pelos fatores

Análise de consenso das afirmações pelos fatores SED SED SED Afirmação Distinção/Consenso F1 <-> F2 F1 <-> F3 F2 <-> F3 1 Decidir e escolher consistentemente 0,281 0,784 0,503 com suas crenças 2 Fazer perguntas que permitam ao outro realizar a atividade a sua 0,426 -0,513 -0,940 maneira 3 Delegar confiando no outro sem se preocupar com os detalhes da Distinção em F1 -1,978 -2,257 -0,279 execução 4 Instiga o outro a dar a sua opinião Distinção em F3 0,303 -0,808 -1,111 5 Ouvir o outro para amadurecer e Consenso 0,084 0,040 -0,044 criar novas possibilidades 6 Executar as atividades dentro das Distinção em F1 0,919 0,830 -0,089 normas vigentes. 7 Protagonismo compartilhado (dividir Consenso 0,610 0,336 -0,274 os prêmios com o outro) 8 Reconhecimento da autonomia e 0,507 1,201 0,694 individualidade do outro 9 Otimizar a realização das atividades Distinção em F2 1,848 -0,290 -2,138 a meu modo 10 Agir rápido, realizando várias atividades e ações, otimizando Distinção em F3 0,548 -1,180 -1,728 tempo e custos 11 Adaptar as demandas conforme a disponibilidade de recursos (internos Consenso 0,033 -0,066 -0,098 e externos) 12 Identificar acertos e erros independentemente da opinião ou Consenso 0,238 -0,362 -0,600 aprovação dos outros 13 Adaptar-se à diversidade de Consenso -0,152 -0,316 -0,164 interesses (empresa e outro) 14 Tomar decisões equilibradas considerando os potenciais conflitos Distinção em F3 0,207 1,184 0,978 e crises 15 Adaptar-se à mudança, levando em conta a volatilidade das atividades e -0,430 -0,945 -0,515 prazos 16 Mudar suas atitudes na empresa e com o outro, sempre que faça Consenso 0,028 -0,026 -0,054 sentido 17 Defender aquilo que é necessário Consenso 0,484 -0,107 -0,590 em cada situação 18 Alta performance é estar equilibrado física (sem somatizações) e Distinção em F3 -0,287 -1,301 -1,014 psiquicamente (paz de espírito) 19 Perseverar e persistir enquanto haja -0,549 0,453 1,002 espaço para amadurecimento

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Análise de consenso das afirmações pelos fatores SED SED SED Afirmação Distinção/Consenso F1 <-> F2 F1 <-> F3 F2 <-> F3 20 Ter consciência dos meus limites é Distinção em F1 1,683 1,033 -0,650 essencial para realizar mudanças 21 Assumir o controle de seu Distinção em F3 0,336 1,141 0,805 desenvolvimento 22 Intervir nos fatores externos que afetam o campo profissional e Distinção em F1 1,315 0,795 -0,520 pessoal 23 Decidir consistentemente com seus Distinção total -0,646 0,906 1,552 ideais 24 Ser transparente em suas emoções Distinção em F1 1,197 0,703 -0,494 e crenças 25 Buscar novos desafios que levem 0,601 -0,432 -1,033 ao próprio desenvolvimento 26 Evitar o erro controlando ao máximo Distinção total 0,655 -1,083 -1,738 os riscos 27 A defesa das próprias crenças anula Consenso -0,091 -0,409 -0,317 o medo de contrariar o outro 28 O reconhecimento dos próprios feitos independe do reconhecimento Distinção em F2 1,140 -0,168 -1,309 por parte do outro 29 Buscar emancipação e Distinção em F2 -1,189 -0,451 0,738 autodeterminação 30 O autodesenvolvimento é prioritário Distinção em F3 -0,150 0,764 0,915 a realização de metas 31 Administrar o equilíbrio entre vida Distinção total -1,627 2,173 3,800 pessoal e profissional 32 Minha realização pessoal implica na Distinção em F2 -1,528 0,401 1,929 minha realização profissional 33 Persistir no enfrentamento dos Distinção em F3 0,476 1,426 0,950 desafios do trabalho 34 Buscar significado no trabalho e em Distinção em F2 -2,242 0,256 2,498 seu produto 35 Identificar-se com os risco e ganhos Distinção total -0,869 -1,594 -0,725 de novas potencialidades 36 Metas realizadas levam a realização -0,368 0,451 0,819 de novas possibilidades 37 Persistir nos desafios, aceitando os Distinção em F1 0,994 1,627 0,633 erros sem abalar a autoestima 38 Aprofundar a relação com o outro Distinção total 0,656 -1,380 -2,036 39 Investir em projetos sociais Distinção em F1 1,626 1,502 -0,124 40 Realizar as atividades buscando o Distinção em F1 1,883 1,314 -0,570 melhor de si 41 Buscar o melhor caminho na -0,666 -0,666 0,000 interlocução com o outro 42 Dar e receber feedback e Distinção em F1 1,411 1,571 0,160 reconhecer os méritos dos outros 43 Ser transparente nas próprias Distinção em F1 1,878 1,663 -0,216 expectativas 44 Fertilizar espontaneamente o 0,955 0,680 -0,275 crescimento e a realização do outro 45 Ser respeitado e aceito pelo outro Distinção total -0,779 1,924 2,704

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Análise de consenso das afirmações pelos fatores SED SED SED Afirmação Distinção/Consenso F1 <-> F2 F1 <-> F3 F2 <-> F3 46 Emancipar-se da dependência do Consenso -0,023 0,237 0,259 outro nas próprias decisões 47 Prêmios e reconhecimento são Consenso 0,339 0,606 0,267 sinais de sucesso 48 Exigir do outro a dar o máximo de si Distinção em F3 -0,097 -1,786 -1,689 49 Conhecer e desenvolver as Distinção em F1 1,291 0,916 -0,375 potencialidades do outro 50 Confiar no outro e desenvolver Consenso -0,170 -0,059 0,111 potencialidades em conjunto 51 Explorar as oportunidades de crescimento e reconhecimento no Distinção em F1 -0,736 -0,941 -0,205 trabalho 52 Sair do modo automatismo para Distinção em F1 -1,632 -1,407 0,224 buscar possibilidades 53 Buscar as competências que ainda Distinção em F3 0,041 -1,468 -1,508 faltam 54 Confiar nos outros na busca de Distinção em F1 -0,975 -1,353 -0,378 resultados 55 Os sacrifícios de hoje possibilitam Distinção em F2 1,296 -0,229 -1,525 um melhor resultado futuro 56 Realização pessoal e profissional implica em definir quando, onde e o Distinção em F1 -3,036 -3,725 -0,688 que realizar 57 Identificar e evitar as ameaças do Distinção em F2 1,081 -0,070 -1,151 ambiente de trabalho 58 Tolerar os erros abre a possibilidade Distinção em F1 -0,736 -1,048 -0,312 de desenvolvimento 59 O uso correto da instrumentalidade de gestão fomenta a alta Consenso -0,110 -0,686 -0,576 performance 60 É responsabilidade social buscar o Distinção em F1 0,779 1,046 0,267 empoderamento 61 Buscar correlação entre reconhecimento profissional e Distinção em F2 -1,514 0,627 2,141 ganhos financeiros 62 Os resultados profissionais possibilitam a realização dos demais Distinção em F1 -1,356 -1,456 -0,100 sonhos 63 Reconhecimento simbólico público e não público fomenta a busca de Distinção em F3 0,142 1,743 1,601 transcendência 64 O reconhecimento do outro é evidência de uma trajetória de 0,778 0,107 -0,670 sucesso 65 Cumprir metas e superar metas é Distinção em F2 -1,515 -0,350 1,166 fator de excelência e sucesso 66 A realização pessoal passa por Distinção em F3 0,022 -1,320 -1,342 definir e obter os recursos mínimos

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Análise de consenso das afirmações pelos fatores SED SED SED Afirmação Distinção/Consenso F1 <-> F2 F1 <-> F3 F2 <-> F3 Equilibrar vida pessoal e trabalho 67 implica uma negociação consigo Distinção em F3 0,078 0,935 0,858 mesmo e com o outro Status profissional e material 68 contribuem para a realização Distinção em F2 -1,070 -0,336 0,734 profissional Realização profissional é 69 correlacionado com o contínuo Distinção total -0,936 -2,153 -1,217 desenvolvimento de competências Autenticidade identitária é fator de 70 Distinção total -1,711 1,363 3,074 realização

Os resultados desta análise mostra que há poucas afirmações de consenso entre os fatores e, ao mesmo tempo, várias afirmações de distinção entre eles, o que corrobora a constatação inicial da Figura 4 (representação PCA), onde há uma maior concentração nas afirmações em que os indivíduos discordam sobre a construção de autorrealização e uma menor concentração sobre o que concordam em relação ao tema. A interpretação dos dados será feita de forma a concluir uma percepção generalizada dos indivíduos participantes e outra dividida por fator, onde analisaremos a percepção de cada fator sobre autorrealização e sua intersecção com o caminho de individuação.

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9. Análise dos Resultados - Conclusões

9.1. Resultados iniciais – Análise geral

Foi possível aglutinar as intenções de 12 participantes em três fatores (grupos de indivíduos) que, juntos, representam mais de 57% de relevância das respostas – o que, estatisticamente, é positivo conforme explicado no capítulo anterior.

Tabela 10 - Cargas fatoriais e classificação dos indivíduos para o modelo com 3 fatores

F1 F2 F3 Indivíduos Carga Fatorial Carga Fatorial Carga Fatorial

I1 0,584 X 0,073 0,170 I2 0,782 X 0,166 0,085 I3 0,774 X 0,125 0,087 I4 0,256 0,473 X 0,060 I5 0,449 0,635 X -0,036 I6 0,103 0,071 0,946 X I7 0,745 X 0,230 0,204 I8 -0,076 0,780 X 0,261 I9 0,216 0,842 X 0,122 I10 0,423 X 0,130 0,164 I11 0,219 0,113 0,922 X I12 0,179 0,137 0,342 X

Outro dado extremamente importante é o gráfico PCA (Figura 5). Ele nos indica que a amostra de indivíduos se agrupa mais, ou seja, tem mais opiniões similares sobre o que discordam em relação à construção de autorrealização versus o que concordam. O maior volume de discordância encontrado nos permite uma análise individualizada posterior de cada fator.

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Figura 5 - Representação das afirmações nos dois primeiros componentes principais

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Figura 6 - Representação das afirmações em 3D dos componentes principais

Os gráficos nos mostram uma maior concentração dos indivíduos/afirmações no quadrante inferior esquerdo, o que nos dá a informação de quanto eles se aglutinam sobre o que discordam em relação aos construtores de autorrealização. Ao observarmos os detalhes do Z-Score (tabela 8, item. 8.3), podemos analisar as afirmações que os indivíduos atribuem às maiores notas, positivas (concordam) ou negativas (descordam) e, a partir dessa análise, compreender um perfil geral, comum, entre os três fatores em análise.

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Conforme já observado, há uma concentração de pontos/afirmações de discordância, onde encontramos quatro afirmações fortes para os três fatores: a) (68) – “Status e ganho financeiro” – “Status profissional e material contribuem para a realização profissional.” b) (26) – “Abertura para o Eu” – “Evitar o erro controlando ao máximo os riscos” c) (6 )– “Autonomia” – “Executar as atividades dentro das regras da empresa” d) (11) – “Adaptação” – “Adaptar as demandas conforme a disponibilidade de recursos (internos e externos)”

Por se tratar de um grupo de executivos de sucesso entre 42 e 55 anos e por já terem atingido um determinado status e estabilidade financeira – muitas vezes acima de suas intensões iniciais no início de carreira e, em alguns casos, não dependendo mais de nenhum tipo de trabalho para manterem seu atual estilo de vida –, não há surpresa que a afirmação (68) tenha sido a de maior discordância, pois, ao chegarem no estágio de carreira em que se encontram – cargos de alta diretoria, vice-presidência, ou até presidente de uma grande empresa brasileira, como é o caso de um dos participantes – tanto o cargo, o status e a condição financeira e material deixaram de ser um problema ou objetivo. Com base na pirâmide de Maslow (1954) (Figura 1, p. 40), podemos concluir que o nível de segurança está atendido e, provavelmente, o nível de autoestima preenchido em parte devido ao cargo obtido. As afirmações (26) e (6) mostram uma tendência ou necessidade dos entrevistados em ter “Autonomia” com foco no “Eu”. Nota-se que esses indivíduos desejam arriscar mais, sem se preocupar com os possíveis erros e sem se importar com tantas regras da empresa. Ter autonomia é não aceitar o controle ou os resultados externos que não estejam de acordo com suas crenças. Autonomia para executar tarefas a sua maneira e a permissão para testar suas ideias e projetos, sem medo de errar, são fatores apontados como construtores de autorrealização e chaves para um ambiente de alta performance e de times criativos (LECLERC, 1998). A afirmação (11), relacionada à “Adaptação” do indivíduo com as mudanças constantes no mundo corporativo, no qual esse indivíduo é demandado

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a se adaptar, continuamente, ao ambiente externo e suas requisições, não traz autorrealização para os entrevistados. Uma das hipóteses pode ser a perda de “Autonomia” ou foco no “Eu”, sempre presentes como fatores importantes nos dados coletados. Para Aubert (2004), as exigências da adaptação e a decomposição social proferida por Touraine (2005) mostram essa clara dificuldade de adaptação e de vivenciar suas crenças através de sua autonomia. Outra hipótese é a insegurança que a mudança traz. A constante adaptação, requerida no mundo corporativo e na dinâmica atual do trabalho, não permite ao indivíduo realizar uma narrativa de vida constante. Para Sennett (2012a), o indivíduo sem uma narrativa coerente perde ou tem falhas em sua identidade. A velocidade atual das mudanças são, para Lipovetsky (2004), o fator causador desse problema. O processo de autorrealização, assim como o caminho de individuação, requere mudança associada a um aprendizado constante, porém o ritmo dessas mudanças é do indivíduo e não da corporação. Ao correlacionar essas quatro afirmações que os indivíduos discordam sobre autorrealização, podemos concluir que não há autorrealização no trabalho sempre que existe uma necessidade constante de mudanças e adaptações, em um ritmo maior que o do indivíduo em analisar e exercer seu poder de escolha e suas crenças. Fica claro que o excesso de controle e as limitações de recursos, incluindo o tempo exigido por muitas das corporações – e refletido nesta pesquisa como parte dos limitantes de autorrealização –, não permitem ao indivíduo vivenciar e experienciar aquilo que necessita dentro de suas crenças. Voltando ao Z-Score (tabela 8, item. 8.3), observamos que há apenas duas afirmações de alta concordância comuns aos três grupos e uma terceira afirmação que podemos nos utilizar para uma análise mais ampla: a afirmação (53), que é fortemente aceita pelos fatores 1 e 2, e dentro do limite da linha de corte do fator 1. Dessa forma, para termos uma análise mais ampla, utilizaremos essas três afirmações para uma análise geral dos pesquisados: a) (1) – “Autonomia” – “decisões e escolhas consistentes com suas crenças” b) (25) – “Abertura para o Eu” – “Buscar novos desafios que levem ao seu desenvolvimento”.

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c) (53) – “Ambiente de Trabalho – Obstáculos e Instrumentos” – “Buscar as competências que ainda faltam”

A fim de fortalecermos e ampliarmos nossa análise, a tabela 9, análise de consenso e distinção, nos mostra que das 70 afirmações classificadas pelos 12 indivíduos pesquisados, apenas 12 possuem consenso e oito são completamente distintas (a distância estatística é muito grande entre os fatores), ou seja, os grupos têm teorias totalmente divergentes sobre elas. A tabela 11, a seguir, nos mostra esses detalhes. Das 12 afirmações de consenso, apenas três têm valor significativo na classificação “Concordo ou Discordo (=> +-2)” dentro dos fatores. Para as oito afirmações “distintas”, porém, todas possuem peso significativo (classificação diferente de 0, 1 e -1). Podemos observar que há consenso de valor significativo nas afirmações (7), (11) e (12).

a) (7) – “Autonomia” – “Protagonismo compartilhado (dividir o prêmio com o outro)” b) (11) – “Adaptação” – “Adaptar a demanda conforme a necessidade de recursos” c) (12) – “Adaptação” – “Identificar acertos e erros independentemente da opinião ou aprovação do outro”.

O “consenso” sobre a afirmação (11) reforça a conclusão anterior sobre o fato de a autorrealização não ser construída onde há necessidade constante de adaptação e mudanças. As afirmações (7) e (12) trazem novamente o tema de autonomia e adaptação, mas com um olhar para o outro. A afirmação (7), um ponto de concordância comum, nos permite dizer que os indivíduos se realizam sempre que compartilham suas vitórias com os outros. Há, então, uma necessidade de dividir o protagonismo das atividades e das conquistas para se autorrealizar no trabalho. Segundo Gewirth (1988), o reconhecimento das conquistas pela comunidade de profissionais é uma das formas de autorrealização. O compartilhamento, por sua vez, permite, além do reconhecimento das conquistas, uma relação mais profunda e possível aceitação do outro conforme descrito por Maslow (1954).

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A afirmação (12), um ponto de discordância comum, mostra que os participantes discordam que a identificação de acertos e erros os leva à autorrealização, independentemente da aprovação ou opinião do outro. Uma hipótese, com base no que já foi descoberto, é que esses indivíduos entendem que, mais que analisar acertos e erros, o movimento de buscar e realizar coisas novas, ou seja, a busca por novos desafios e possibilidades, é mais importante para a autorrealização. Ao sairmos dos consensos e analisarmos as distinções, encontramos oito distinções relevantes entre os fatores analisados, que reforça a diferença entre os fatores e a necessidade de análise e classificação distinta entre eles.

Tabela 11 - Análise de consenso- resumo Afirmação Com/N/Dis Estado F1 Dist. F2 Dist. F3 Dist. 5 Ouvir o outro para Neutro Cons 0,0843 0,0404 – amadurecer e criar novas 0,0439 possibilidades 7 Protagonismo compartilhado Con/Neutro Cons 0,6102 0,3362 – (dividir os prêmios com o 0,2741 outro) 11 Adaptar as demandas Discorda(+) Cons 0,0325 – – conforme a disponibilidade de 0,0659 0,0985 recursos (internos e externos) 12 Identificar acertos e erros Disc/Neutro Cons 0,2378 – – independentemente da 0,3622 0,6000 opinião ou aprovação dos outros. 13 Adaptar-se à diversidade de Neutro Cons – – – interesses (empresa e outro) 0,1524 0,3161 0,1637 16 Mudar suas atitudes na Neutro Cons 0,0284 – – empresa e com o outro, 0,0260 0,0543 sempre que faça sentido 17 Defender aquilo que é Neutro Cons 0,4839 – – necessário em cada situação. 0,1066 0,5904 27 A defesa das próprias Neutro Cons – – – crenças anula o medo de 0,0914 0,4087 0,3173 contrariar o outro. 46 Emancipar-se da Neutro Cons – 0,2365 0,2591 dependência do outro nas 0,0226 próprias decisões 47 Prêmios e reconhecimento Neutro Cons 0,3394 0,6065 0,2671 são sinais de sucesso 50 Confiar no outro e Neutro Cons – – 0,1109 desenvolver potencialidades 0,1698 0,0589 em conjunto

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Afirmação Com/N/Dis Estado F1 Dist. F2 Dist. F3 Dist. 59 O uso correto da Neutro Cons – – – instrumentalidade de gestão 0,1103 0,6862 0,5759 fomenta a alta performance 23 Decidir consistentemente Neutro/Conc Dist – 0,9057 1,5517 com seus ideais 0,6460 26 Evitar o erro controlando ao Discordo Dist 0,6552 – – máximo os riscos 1,0826 1,7378 31 Administrar o equilíbrio entre Conc/Disc Dist – 2,1733 3,8000 vida pessoal e profissional 1,6266 35 Valorizar o risco e ganhos de Disc/Neutro Dist – – – novas potencialidades 0,8686 1,5941 0,7255 38 Aprofundar a relação com o Conc/Neutro Dist 0,6561 – – outro 1,3802 2,0363 45 Ser respeitado e aceito pelo Neutro/Disc Dist – 1,9244 2,7035 outro 0,7792 69 Realização profissional é Neutro/Conc Dist – – – correlacionado com o 0,9363 2,1528 1,2165 contínuo desenvolvimento de competências 70 Autenticidade identitária é N/Conc/Disc Dist – 1,3626 3,0736 fator de realização 1,7110

Podemos concluir, inicialmente, que, para os indivíduos analisados, a soma dos três fatores encontrados define que a autorrealização é construída quando há autonomia para o indivíduo e sempre que esse toma a ação de decidir e escolher com base nas competências que lhe faltam, os desafios e oportunidades que deseja enfrentar, em um processo de adaptação aos fatores externos e internos dentro de seu tempo, criando um caminho de constante desenvolvimento onde seu prêmio não é material, mas a ampliação de capacidades, competências e de consciência. A definição de autorrealização acima poder ser utilizada como o ponto de intersecção entre os três fatores, não sendo a opinião dos indivíduos representados dentro de cada fator. Essa definição, por assim dizer, está incompleta ou reflete apenas parte do pensamento dos indivíduos participantes desta pesquisa, visto o baixo volume de consenso. Analisaremos, em detalhes, as percepções de cada fator sobre a construção de autorrealização no trabalho para, com isso, ampliarmos o conceito dentro desta pesquisa e de seus participantes.

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9.2. Resultados – análise dos fatores

Faremos aqui a análise individual de cada fator, interpretando a percepção de cada grupo de indivíduos sobre o tema proposto. A análise será feita com base na priorização ou peso dado a cada afirmação dentro do fator. Essa ordem se encontra na tabela 8, item. 8.3, Z-Score. Para facilitar o entendimento e interpretação dos fatores, foram marcadas com sublinhado, as partes da interpretação ou dissertação dos fatores que correspondem à afirmação proposta nesta pesquisa e classificada pelos indivíduos pesquisados. Em negrito estão os números de identificação das afirmações que podem ser verificadas por completo nas tabelas 7 ou 8, e o sinal de “+” (positivo) ou “-“ (negativo) à frente do número de identificação da afirmação representa se a mesma foi classificada como “Discordância” “-“ (negativo) ou “Concordância” “+” (positivo). Exemplo: (-68) significa que a afirmação 68, “Status profissional e material contribuem para a realização profissional”, foi classificada como “discordância” no fator em questão. Além disso, foi incluída uma nova versão da tabela 8 com os dados específicos de cada fator.

9.2.1 Análise dos fatores – Fator 1

No fator 1 – com mais de 25% de significância na representação dos dados amostrados –, foram alocados cinco indivíduos dos 12 pesquisados, que classificaram as afirmações, conforme a tabela Z-Score a seguir.

Tabela 12- Fator 1-maiores e menores Z-Scores

Fator 1 Classif. Afirmação Descrição 6 40 Realizar as atividades buscando o melhor de si 5 43 Ser transparente nas próprias expectativas 5 25 Buscar novos desafios que levem ao seu desenvolvimento 4 1 Decisões e escolhas consistentes com suas crenças 4 42 Dar e receber feedback e reconhecer os méritos dos outros

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Fator 1 Classif. Afirmação Descrição 4 24 Ser transparente em suas emoções e crenças 3 49 Conhecer e desenvolver as potencialidades do outro 3 37 Persistir nos desafios, aceitando os erros sem abalar a autoestima 3 44 Fertilizar espontaneamente o crescimento e a realização do outro 3 21 Assumir o controle de seu desenvolvimento 2 20 Ter consciência dos meus limites é essencial para realizar mudanças 2 23 Decidir consistentemente com seus ideais 2 31 Administrar o equilíbrio entre vida pessoal e profissional 2 7 Protagonismo compartilhado (dividir os prêmios com o outro) Tomar decisões equilibradas considerando os potenciais conflitos e 2 14 crises -2 65 Cumprir metas e superar metas é fator de excelência e sucesso -2 35 Valorizar o risco e ganhos de novas potencialidades -2 6 Executar as atividades dentro das regras da empresa -2 29 Buscar emancipação e autodeterminação -2 54 Confiar nos outros na busca de resultados -3 48 Forçar o outro a dar o máximo de si Se adaptar a mudança levando em conta a volatilidade das atividades e -3 15 prazos -3 56 Realização pessoal e profissional implica em definir quando, onde e o que realizar -3 10 Agir rápido, realizando várias atividades e ações, otimizando tempo e custos -4 32 Minha realização pessoal implica na minha realização profissional -4 11 Adaptar as demandas conforme a disponibilidade de recursos (internos e externos) -4 62 Os resultados profissionais possibilitam a realização dos demais sonhos -5 26 Evitar o erro controlando ao máximo os riscos -5 3 Delega confiando no outro sem se preocupar com os detalhes da execução -6 68 Status profissional e material contribuem para a realização profissional

Ao analisarmos o fator 1, podemos observar que este é o grupo que mais discorda da relação financeira e de status para autorrealização no trabalho, se comparado com os outros fatores (grupos). Os indivíduos do fator 1 discordam veementemente que tanto o status profissional e material (-68), como os resultados profissionais não estão diretamente associados à realização dos demais sonhos da vida (-62), bem como discordam que a realização pessoal está diretamente associada ao profissional (32), podendo ser tratado como um campo em separado. Cumprir e superar metas não trazem realização e não são fatores de excelência e

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sucesso (-65). Para eles, “autonomia” é sim um fator de realização profissional, preferindo realizar tarefas ao seu tempo (-10) dentro da qualidade que entendem ser necessário e flexibilizando as regras da empresa (-6) quando preciso, deixando, sempre que possível, de seguir regras para seguir suas crenças. Para esses indivíduos, “Realizar as atividades buscando o melhor de si” (+40) é seu principal construtor de autorrealização, uma abertura para a vida que é potencializada valorizando em especial seu “Eu”, sua “Autonomia” e a relação com o “Outro”. De acordo com a prioridade dada as afirmações pelos indivíduos do fator 1, podemos notar que eles priorizam sua opinião e necessidades (autonomia e eu), se permitindo errar e arriscar mais (+26), buscando novos desafios que os levem ao desenvolvimento (+25), persistindo e aceitando seus erros sem abalar a autoestima (+37), assumindo o controle de seu desenvolvimento (+21), realizando as coisas da sua forma e tomando suas decisões e escolhas com base em suas crenças (+1) e ideais (+23). Priorizam, ainda, a transparência em suas expectativas para com o outro (+43) e em suas emoções e crenças (+24), onde buscam conhecer e desenvolver, (+49) bem como auxiliar no crescimento e desenvolvimento do outro (+44), dando e recebendo feedback (+42), em uma aparente valorização na troca de conhecimento e de aprendizado compartilhado, valorizando a divisão de protagonismo (+7) sem forçar o outro a dar o máximo de si (-48), porém delegando sem confiar, necessitando verificar os detalhes de execução (-3), uma vez que não têm confiança plena no outro na busca de resultados (-54). Para o fator 1, a “autonomia” e o desejo de realizar o seu Eu, através do desenvolvimento contínuo de seus potenciais, vêm associados a uma priorização da necessidade de “adaptação”, através da consciência dos seus limites para realizar mudanças (+20) e do equilíbrio nas decisões e escolhas considerando os possíveis conflitos e crises (+14). Entretanto, esse grupo discorda que a adaptação exigida constantemente pela empresa, a adaptação das demandas conforme a disponibilidade de recursos (-11) ou mudanças de atividades e prazos pela volatilidade do negócios (-15), sejam fatores positivos para a autorrealização, o que se mostra coerente, pois são fatores que retiram a tão valorizada autonomia deste fator.

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Não há, para eles, uma busca de emancipação (-29). Aparentemente, o trabalho faz parte de seu caminho de autorrealização através do progresso contínuo, com foco em seu desenvolvimento em uma relação clara, franca e aberta com o outro, mesmo com algum egocentrismo, não permitindo ao outro a mesma autonomia que desejam para si, pois delegam sem confiar, necessitando verificar os detalhes de execução (-3) e não tem confiança plena no outro na busca de resultados (-54). Equilibrar a vida pessoal e profissional é essencial para esse grupo, visto que entendem que a realização pessoal interfere diretamente na realização profissional (+32). Podemos dizer que os indivíduos do fator 1 entendem a Autorrealização como uma ação contínua, de protagonismo do indivíduo em constante interação com o outro, de forma transparente e de colaboração mútua. Os indivíduos do fator 1 podem ser considerados mais maduros e abertos ao outro e à vida que os indivíduos dos demais fatores. Sua busca é por desenvolvimento contínuo, sempre de acordo com seus ideais e crenças, buscando dar o melhor de si, sendo transparente consigo e com o outro e procurando desenvolvimento e aprendizado através dessa interação. Podemos concluir que os indivíduos deste grupo veem no campo do trabalho e em sua forma de encará-lo em suas empresas, um meio para auxiliar em seu desenvolvimento, não sendo o trabalho e suas conquistas, nesse campo, seu principal motivador de realização. Para eles, o equilíbrio entre trabalho, vida pessoal e relação com o outro são fatores mais fortes. Nota-se um maior foco no autoconhecimento, em seu desenvolvimento e no reconhecimento da necessidade de participação do outro neste processo. Aqui podemos ver executivos que reconhecem suas conquistas profissionais, mas que não buscam apenas o sucesso profissional e material como autorrealização: entendem que a autorrealização está associada a um constante desenvolvimento nos vários estágios da vida, sempre com um olhar para o outro. Encontramos no entendimento desse grupo sobre autorrealização uma forte concordância em algumas das características de pessoas autorrealizadas descritas por Maslow (1954), como “aceitação de si e dos outros”, “autonomia sobre o

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ambiente (motivação vem de si)” “interesse no bem comum” e em seu “propósito de vida”. Para Baxter (1982), a interação Eu-Outro e o trabalho não alienado são essenciais para a autorrealização. Os indivíduos do fator 1 assim também entendem, ao priorizarem o foco e a colaboração para com o outro, a tomada de decisão através de suas crenças e a constante busca de desenvolvimento para se autorrealizarem. Diferentemente dos demais fatores, o fator 1 parece dar mais liberdade e foco ao outro, ponto determinante para a autorrealização, segundo Schott (1992), que afirma ser necessário estender a possibilidade de autorrealização aos seus comandados para que o indivíduo de fato se autorrealize. Ao analisarmos pelo prisma do caminho de individuação, além de todos os pontos já mencionados sobre autorrealização que são comuns ao caminho de individuação, podemos destacar a priorização dada à afirmação (+42), dar e receber feedback. Por ser um processo de autoconhecimento que só ocorre através dessa relação com o outro, os indivíduos do fator 1 concordam com a necessidade de se abrirem e interagirem com o outro para se desenvolverem e desenvolverem o outro, em um possível processo das melhoras das qualidades coletivas e do rendimento social, conforme entendido por Jung (2011a). Os dados desta pesquisa não nos permitem analisar claramente a sombra dos indivíduos pesquisados, porém podemos tomar como hipótese o medo de errar e de não realizar o melhor de si, seu principal objetivo (+40), pois eles possuem dificuldade de confiar no outro na execução de tarefas e na busca de resultados (- 3) e (-54). Em resumo, o fator 1 define a autorrealização como buscar e dar o melhor de si, sendo transparente consigo e com os outros, aprofundando suas relações através de novos desafios, colaborando e dividindo o protagonismo com o outro, tendo sempre a consciência de seus limites e a necessidade de equilibrar a relação trabalho e vida pessoal.

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9.2.2. Análise dos fatores – Fator 2

No fator 2, foram alocados quatro indivíduos dos 12 pesquisados. Esse fator tem mais de 17% de significância na representação dos dados amostrados. Os indivíduos deste fator classificaram as afirmações, conforme a tabela Z-Score a seguir:

Tabela 13- Fator 2- Maiores e menores Z-Scores

Fator 2 Classif. Afirmação Descrição 6 34 Buscar significado no trabalho e em seu produto 5 31 Administrar o equilíbrio entre vida pessoal e profissional Realização pessoal e profissional implica em definir quando, onde e o que 5 56 realizar 4 70 Autenticidade identitária é fator de realização 4 23 Decidir consistentemente com seus ideais 4 1 Decisões e escolhas consistentes com suas crenças 3 52 Sair do modo automatismo para buscar possibilidades 3 25 Buscar novos desafios que levem ao seu desenvolvimento 3 51 Explorar as oportunidades de crescimento e reconhecimento no trabalho 3 19 Perseverar e persistir enquanto haja espaço para amadurecimento 2 21 Assumir o controle de seu desenvolvimento 2 61 Buscar correlação entre reconhecimento profissional e ganhos financeiros 2 65 Cumprir metas e superar metas é fator de excelência e sucesso 2 53 Buscar as competências que ainda faltam 2 14 Tomar decisões equilibradas considerando os potenciais conflitos e crises

Identificar acertos e erros independentemente da opinião ou aprovação -2 12 dos outros -2 20 Ter consciência dos meus limites é essencial para realizar mudanças -2 55 Os sacrifícios de hoje possibilitam um melhor resultado futuro -2 48 Forçar o outro a dar o máximo de si -2 39 Investir e projetos sociais -3 57 Identificar e evitar as ameaças do ambiente de trabalho O reconhecimento dos próprios feitos independe do reconhecimento por -3 28 parte do outro Adaptar as demandas conforme a disponibilidade de recursos (internos e -3 11 externos) -3 22 Intervir nos fatores externos que afetam o campo profissional e pessoal

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Fator 2 Classif. Afirmação Descrição -4 64 Status profissional e material contribuem para a realização profissional Agir rápido, realizando várias atividades e ações, otimizando tempo e 10 -4 custos -4 6 Executar as atividades dentro das regras da empresa -5 68 Status profissional e material contribuem para a realização profissional -5 9 Otimizar a realização das atividades a meu modo -6 26 Evitar o erro controlando ao máximo os riscos

Os indivíduos do fator 2 também discordam fortemente que status profissional e material (-68) não constroem a autorrealização, porém sua maior discordância está na necessidade de evitar o erro e controlar os riscos (-26), priorizando, assim, a sua maneira de execução (Eu). Os indivíduos do fator 2 dão mais ênfase a uma busca de significado no trabalho e em seu produto final (+34) e no equilíbrio entre vida pessoal e profissional (+31), desejando definir e controlar quando, onde e o que fazer de sua vida profissional e pessoal (+56). Talvez, esse grupo priorize esses fatores por também priorizarem diversos pontos financeiros e de status profissional, privilegiando o cumprimento e a superação de metas (+65) e a correlação entre reconhecimento profissional e ganhos financeiros (+61), o que possivelmente os faz dar importância em uma autenticidade identitária (+70) de status profissional e financeiro. Devido a esses pontos, dentre os três fatores, o fator 2 se mostrou o de maior foco no trabalho e na carreira, mostrando também indivíduos em um possível processo de questionamento dessa escolha, evidenciado pela forte necessidade de encontrar significado no trabalho (+34) e equilíbrio de vida pessoal e profissional (+31). A busca por significado e propósito na vida é integral ao funcionamento psicológico, segundo O´Connor & Chamberlain (1996). Para Frankel (2015), uma das três maneiras de se dar significado na vida é através da criação de um trabalho ou da realização de uma obra como aparentemente procuram fazer os indivíduos do fator 2. Esses indivíduos concordam e priorizam que, para haver autorrealização no trabalho, ele deve tomar as decisões com base em seus ideais (+23) e ter escolhas consistentes com suas crenças (+1), buscando sempre novas possibilidades,

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saindo do automatismo (+52) para algo que os leve ao desenvolvimento (+25) e com uma priorização para explorar, crescer e ser reconhecido no trabalho (+51), perseverando quando há espaço para amadurecimento (+19) e controlando seu desenvolvimento (+21). O foco dado no desenvolvimento para crescimento e reconhecimento no trabalho parece justificar o fato de esse grupo priorizar ações de status e de progresso financeiro, provavelmente procurando buscar as competências que lhe faltam (+53) para atingir os objetivos desejados. Os indivíduos do fator 2 trazem muito do que Gewirth (1988) definiu como os 10 fatores de autorrealização profissional, como a necessidade de crescimento profissional, constante estabelecimento de novas metas e criação de um espaço profissional e de vida próprios. Os indivíduos do fator 2 desejam também “Autonomia”, discordando ou flexibilizando a execução de tarefas dentro das regras da empresa (-6) e não concordando em realizar atividades em excesso para otimizar tempo e custos (-10), estando em linha com sua necessidade de busca de significado e necessidade de definirem o que desejam. A “Adaptação” e a necessidade do “Outro” são pontos de destaque deste grupo. Esses indivíduos não concordam que a adaptação às demandas conforme disponibilidade de recursos (-11) seja necessária e não necessitam realizar as atividades a seu modo (-9), dando maior liberdade ao outro, sem o forçar a dar o máximo de si (-48). Diferentemente do fator 1, o fator 2 afirma permitir maior autonomia ao outro, mas o que pode parecer autonomia e abertura ao outro, pode ser visto como como uma necessidade de afirmação e de insegurança por falta de consciência de seus limites para realizar mudanças (-20) e pela dependência da opinião do outro para identificar acertos e erros (-12), principalmente, da necessidade de o outro reconhecer seus feitos (-28), mesmo reconhecendo que essa evidência não é fator de uma trajetória de sucesso (-64). O fator 2 se caracteriza ainda pelo imediatismo, não concordando que os sacrifícios de hoje podem trazer um melhor resultado no futuro (-55) e discordam, ou não realizam, qualquer tipo de projeto social ou coletivo como forma de realização (-39), o que pode caracterizá-los como mais centrados em seu próprio desenvolvimento, em especial, no campo do trabalho e nas realizações.

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Podemos observar, nesses indivíduos, uma necessidade de serem reconhecidos, tanto profissionalmente e financeiramente (+61) como uma valoração de sua estima e valor, através do cumprimento e superação de metas (+65), além de uma autenticidade identitária, provavelmente, mais associada ao profissional (+70), à persona corporativa de sucesso. Não podemos concluir aqui se há qualquer inflação de ego, ou narcisismos, mas há aparentemente um ego forte e um desejo de maior status profissional e financeiro. Por sua vez, temos neste grupo a sua maior concordância na busca de significado no trabalho (+34) e na administração entre equilíbrio de vida pessoal e profissional, o que pode nos levar a hipótese de que este grupo questiona e tem algum tipo de incômodo com a situação atual, mais voltada ao trabalho e ao Eu, desejando maior equilíbrio e procurando significado para tudo que realizam – um possível questionamento do meio da vida. Ao olharmos o que negam, discordam, novamente encontramos o questionamento e a busca por significado e equilíbrio, visto que o grupo nega que status material e profissional geram autorrealização (-68). Esse grupo nega vários tipos de controle que lhe impedem de ter autonomia sobre si ou que lhe forçam a realizar atividades desnecessárias as suas metas e objetivos, se permitindo a se arriscar e errar mais em busca de realizar as atividades a seu modo (-26), e talvez a se desenvolver Os indivíduos no fator 2 aproximam-se muito do perfil clássico do executivo de sucesso, que atinge suas metas e deseja seguir seu caminho de conquistas, mas possuindo um olhar para o outro, uma evolução em relação ao perfil do executivo controlador e dominador. A priorização pela busca por significado e pelo equilíbrio entre o profissional e pessoal, juntamente com o desenvolvimento contínuo associado ao cumprimento de metas e resultados, nos permite concluir que os indivíduos do fator 2 podem estar vivendo o conflito da sombra organizacional descrito por Ziemmer (1996), onde o indivíduo está se deparando com as imagens inaceitáveis da organização como comportamentos, normas e outros fatores que não o permitem alcançar o equilíbrio desejado, mas devido à identificação do indivíduo com a imagem da organização, ele segue buscando atingir suas metas e viver seus valores.

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Outra possibilidade é que essa busca por significado e, com isso, pela autorrealização, esteja sendo transferida para a produtividade, a realização de metas, como tratado por Herzberg (1959), para quem as empresas que promovem oportunidades constantes permitem a seus colaboradores uma sensação de “autorrealização” falsa. Mesmo buscando significado, o fator 2 não prioriza consciência de seus limites para realizar as mudanças (-20), o que pode nos mostrar uma menor consciência com relação ao processo de autorrealização ou ao caminho de individuação. Para McNeely (2010, p. 5), a individuação é uma “escolha por ser consciente ou de mente plena; significa estar consciente da pessoa que somos capazes de ser em nossa plenitude, ter consciências de nossas fortalezas e limitações”. Mesmo sem dados claros para afirmar, o foco em metas e resultados de curto prazo (+55) e a necessidade de ser validado pelo outro (-28) indicam que sua sombra pode estar na falta de autoestima e insegurança que se mostra ao tentar ser cada vez mais assertivo, melhor e validado pelo outro. Pode-se dizer que o fator 2 entende que a autorrealização no trabalho é, primeiramente, a busca por significado e equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, aliado à autonomia de decidir pelas suas crenças e de se desenvolver constantemente através de novos desafios que lhe permita cumprir e realizar suas metas.

9.2.3. Análise dos fatores – Fator 3

No fator 3, foram alocados três indivíduos dos 12 pesquisados, sendo que este fator tem mais de 13% de significância na representação dos dados amostrados. Os indivíduos desse fator classificaram as afirmações conforme a tabela Z-Score a seguir:

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Tabela 14- Fator 3- maiores e menores Z-Scores

Fator 3 Classif. Afirmação Descrição 56 Realização pessoal e profissional implica definir quando, onde e o que 6 realizar 5 25 Buscar novos desafios que levem ao seu desenvolvimento 5 53 Buscar as competências que ainda faltam 4 38 Aprofundar a relação com o outro 4 69 Realização profissional é correlacionado com o contínuo desenvolvimento de competências 4 51 Explorar as oportunidades de crescimento e reconhecimento no trabalho 3 4 Instiga o outro a dar a sua opinião 3 52 Sair do modo automatismo para buscar possibilidades 3 40 Realizar as atividades buscando o melhor de si 3 2 Decisões e escolhas consistentes com suas crenças 18 Alta performance é estar equilibrado física (sem somatizações) e 2 psiquicamente (paz de espírito) 2 48 Forçar o outro a dar o máximo de si 2 66 A realização pessoal passa por definir e obter os recursos mínimos 2 1 Decisões e escolhas consistentes com suas crenças 2 24 Ser transparente em suas emoções e crenças

-2 64 Status profissional e material contribuem para a realização profissional -2 8 Reconhecimento da autonomia e individualidade do outro -2 33 Persistir no enfrentamento dos desafios do trabalho -2 22 Intervir nos fatores externos que afetam o campo profissional e pessoal -2 39 Investir e projetos sociais -3 26 Evitar o erro controlando ao máximo os riscos -3 70 Autenticidade identitária é fator de realização -3 31 Administrar o equilíbrio entre vida pessoal e profissional -3 11 Adaptar as demandas conforme a disponibilidade de recursos (internos e externos) -4 61 Buscar correlação entre reconhecimento profissional e ganhos financeiros -4 6 Executar as atividades dentro das regras da empresa -4 32 Minha realização pessoal implica minha realização profissional -5 63 Reconhecimento simbólico público e não público fomenta a busca de transcendência -5 45 Ser respeitado e aceito pelo outro -6 68 Status profissional e material contribuem para a realização profissional

Assim como os demais fatores, os indivíduos do fator 3 também negam veemente que o status profissional e material (-68) são construtores de autorrealização, e concordam fortemente que a autorrealização pessoal e

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profissional é construída ao se definir quando, onde e o que realizar (+56), discordando ainda da necessidade de seguir todas as regras da empresa (-6), o que mostra que a Autonomia é fator de extrema para esses indivíduos. O fator 3 busca também as competências que ainda lhe faltam (+53) através de novos desafios pessoais (+25) e correlacionam fortemente a realização profissional com as competências que possuem e o desenvolvimento constante (+69). Busca também as competências que ainda lhe faltam (+53) através de novos desafios pessoais (+25) e correlacionam fortemente a realização profissional com as competências que possuem e o desenvolvimento constante (+69). Possuem uma forte relação com o outro, dando autonomia dentro do que entendem ser correto, pois desejam aprofundar as relações (+38) permitindo a autonomia do outro e o instigando a expressar sua opinião (+4), fazendo perguntas que o permitam realizar as atividades a sua maneira (+2), mas aparentemente procurando obter respostas que lhes agradem e estejam dentro daquilo que os indivíduos do fator 3 entendem como correto, pois força o outro a dar o máximo de si (+48), instigando-o a performar mais e melhor, como aparentemente exigem de si mesmos (+40). Valorizam ainda a busca de oportunidades de crescimento e reconhecimento (+51), buscando sair do automatismo (+52). Esse grupo apresenta um forte senso de realização e uma grande necessidade de realizar as coisas a sua maneira. Ao negar o reconhecimento da autonomia e individualidade do outro como fator de autorrealização (-8), parece- nos que os indivíduos desse fator podem dar uma autonomia falsa ao outro, pois há uma exigência de que este se comporte, responda e execute as tarefas como os indivíduos desse fator. A importância da relação ou dependência do outro e a necessidade de autonomia do fator 3 podem ser observadas pela importância dada à transparência de suas emoções e crenças (+24), o que permite maior clareza ao outro de suas necessidades e na tomada de decisões consistentes com elas (+1), permitindo, assim, priorizar o equilíbrio físico e psíquico como fator de alta performance (+18). A relação com o outro parece ser de extremos; há necessidade de uma relação de proximidade, mas sem dar ao outro a autonomia devida que os indivíduos desse grupo tanto desejam. O fator 3 discorda da necessidade de ser aceito e respeitado pelo outro para se autorrealizar (-45), bem como do

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reconhecimento do outro como evidência de seu sucesso (-64). Discordam também que o reconhecimento simbólico público e não público fomenta a busca por transcendência e realização (-63), o que gera uma possível contradição, ao afirmar que não necessitam do respeito e aceite do outro, mas precisam de um reconhecimento formal e talvez público, menos simbólico, para se autorrealizarem no trabalho. Discordam da necessidade de haver realização profissional para haver realização pessoal (-32) e separam reconhecimento profissional de ganhos financeiros (-61). Para os indivíduos do fator 3, o equilíbrio entre vida pessoal e profissional não é fator de autorrealização (-31), bem como adaptar-se às demandas conforme a disponibilidade de recursos (-11), o que vem a corroborar para o foco deste grupo em seu desenvolvimento constante, assim como do outro, mas a sua maneira, exigindo se o melhor de si e do outro (40).Discordam da necessidade de haver realização profissional para haver realização pessoal (-32) e separam reconhecimento profissional de ganhos financeiros (-61). Para o fator 3, a autonomia também é crítica para a autorrealização, bem como aprendizado e desenvolvimento constante. Nesse fator, o outro aparece como prioridade, sendo necessárias relações profundas com o outro dentro da empresa para se sentir valorizado, diferentemente do fator 2 onde o foco são os resultados e o outro vem para corroborar a validação de suas conquistas. Para o fator 3, a necessidade de autoestima está em ver o outro se desenvolvendo e validando seu valor. Podemos entender ainda que há aqui uma busca de equilíbrio, quando esse grupo prioriza a definição de quando, onde e o que realizar como o principal fator de autorrealização (+56), talvez pela sobrecarga que se coloquem, evidenciada no foco ou desejo de busca de competências (+53) e novos desafios (+25). Sua sombra parece estar no outro e no trabalho, ao negar a necessidade de ser respeitado pelo outro (-45) e (-64) podemos ter aqui o ponto de desequilíbrio entre o que demanda do outro e a falta de autonomia que lhe dá, procurando ser um guia, alguém que procura respeitar, e quer o melhor do outro, mas a sua maneira, buscando acima de tudo ser reconhecido e respeitado, por uma possível falta de auto estima e aceitação, através de seu conhecimento e capacidade, que

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busca ampliar constantemente, como da necessidade de se relacionar profundamente com o outro.

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10. Conclusões Finais

Foi possível, através desta dissertação, realizar um recorte na visão de executivos brasileiros sobre o conceito de autorrealização de Maslow e de individuação de Jung – conceitos subjetivos que assim se provaram novamente nesta pesquisa. O uso da Metodologia Q, com seu processo de classificação de afirmações, construídas a partir da literatura de Maslow, seus contemporâneos, Jung e os pós Junguianos, juntamente com uma análise estatística e qualitativa detalhadas, se mostrou eficiente e nos permitiu identificar distintos entendimentos e possíveis estágios do processo de autorrealização e do caminho de individuação, deixando clara, ainda, a complexidade e a individualidade dos conceitos, tendo por base as distintas opiniões e o grau de discordância sobre o tema entre os fatores classificados. Foi possível observar que, dentre os fatores definidos, o fator 1 pode ser classificado como mais próximo das características de autorrealização definidas por Maslow (1954). Ao vermos uma menor dependência da relação de poder nesse grupo, e de necessidade de realização de metas da empresa, estando mais preocupados com seu desenvolvimento e do outro, os indivíduos agrupados no fator 1 mostram-se, através de sua definição de autorrealização, em um estágio mais avançado conforme a teoria de hierarquia das necessidades de Maslow (1954), se comparados com os indivíduos dos fatores 2 e 3, que se mostraram mais focados no trabalho e na carreira, tendo uma relação menos profunda ou de menor troca com o outro. Segundo Baxter (1982), o processo de autorrealização não tem fim: é contínuo e ininterrupto, havendo sempre uma nova potencialidade a ser desenvolvida. Podemos, assim, assumir que, de uma forma ou de outra, todos os indivíduos pesquisados estão vivenciando esse processo, em diferentes estágios, de acordo com a abertura, experiência e conscientização que cada um obteve até este momento.

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Sobre o objetivo central desta pesquisa, o de compreender a visão dos executivos brasileiros sobre a autorrealização, seus instrumentos e obstáculos nesse processo, foram capturados diversos pontos. Inicialmente, foi possível identificar claramente que “status e recursos financeiros” não são construtores de autorrealização. Maslow (1954), em sua teoria da hierarquia de necessidades, descreve que uma necessidade só é percebida quando a necessidade anterior foi atendida. Para Herzberg (1959), a autorrealização não se reduz a bem-estar, satisfação ou sucesso no trabalho. Os executivos pesquisados já possuem uma vida financeira estável e, possivelmente, já atingiram suas necessidades de segurança, podendo, assim, se preocuparem com temas mais profundos da autorrealização no trabalho. Dentro das afirmações com maior concordância entre os participantes, várias tratam da busca por novos desafios e desenvolvimento de potencialidades e capacidades, tanto para a construção do processo de autorrealização quanto de individuação. Ambos, Maslow e Jung, conferem ao desenvolvimento constante e à ampliação de consciência um papel importante nos processos de autorrealização e individuação.

Self-actualization, Self-fulfillment, Self-expression, é o trabalho sobre sua personalidade, desenvolver as potencialidades, o uso das capacidades, a tendência de ser o melhor de si mesmo. Adicionalmente, o indivíduo tende a desejar e se esforçar para obter todas as condições que permitam essa condição. Ex: liberdade, justiça, ordem, clareza, etc. (MASLOW, 2012a)

Autorrealização pode ser definida como a realização das potencialidades e sua atualização direcionado para uma finalidade última. (BAXTER, 1982).

Individuação é uma escolha por ser consciente ou de mente plena, significa estar consciente da pessoa que somos capazes de ser em nossa plenitude, ter consciência de nossas fortalezas e significado. (McNEELY, 2010, p. 5).

A pesquisa ainda nos mostrou que, embora a percepção dos indivíduos, dentro dos 3 fatores encontrados, apresente diferentes opiniões sobre autorrealização no trabalho, vários pontos são comuns e destacamos três domínios. A necessidade de “Autonomia” foi destaque dentro das afirmações de todos os indivíduos pesquisados; a “Adaptabilidade” foi também presente como

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prioritária para todos, mas, como um problema a ser resolvido nos dias atuais; e, a “Relação com o Outro”. Sobre a “Adaptabilidade”, podemos concluir que a exigência constante dos dias atuais, caracterizados pela modernidade líquida de Bauman (2001), a era do vazio de Lipovetsky (2005) e o curto prazo de Sennett (2012a) geram incertezas que prejudicam a possibilidade de decisão através das crenças do próprio indivíduo, fato esse que fere a sua autonomia que, por sua vez, foi também afirmada pelos pesquisados como sendo o grande construtor de autorrealização para todos. Ivtazan (2013) afirma que, para Maslow, autorrealização pode ser definida como a “busca para ser criativo, para crescer, adquirir novos conhecimentos, e desenvolver novas habilidades. Autorrealização é um caminho único e realizado da forma como o indivíduo define e que oferece recompensas intrínsecas. O autor ainda declara que indivíduos autorrealizados “respeitam a autonomia e a individualidade dos outros e são capazes de expressar uma empatia genuína". Para Baxter (1982), o indivíduo deve ter autoconhecimento das potencialidades, suas fortalezas e fraquezas; ele pode, assim, escolher e definir quais e de que forma irá desenvolvê-las, um sinal de autonomia e autenticidade. Para Jung (2011a), o inconsciente é autônomo e impulsiona o indivíduo para seguir no caminho de individuação, onde o “Eu” exige autonomia para ser. Tanto a “Adaptabilidade” como a “Autonomia” são características que o indivíduo desenvolve internamente, mas que dependem de fatores externos para sua realização. A força dada na classificação das afirmações relacionadas à “Autonomia” nesta pesquisa nos permite concluir que os indivíduos procuram impor ao máximo suas decisões através de suas crenças, excluindo os fatores externos sempre que possível. Porém, quando se trata da “Relação com o Outro”, esta pesquisa pode nos mostrar que a grande diferença encontrada entre os três fatores, está na forma, na maneira como se relacionam com o outro. Enquanto o fator 1 vê no outro alguém que o auxilia a crescer e procura uma relação de troca, mesmo que sem dar a autonomia devida ao outro, pois controla e não confia, o fator 2 necessita do outro para validar seus feitos e o apoiar em suas necessidades de conquistas; o fator 3, por sua vez, busca relações mais profundas, procurando essa validação no apoio e não tanto nas conquistas como o fator 1.

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Ao vermos que a adaptabilidade está mais relacionada ao medo de perda de autonomia, temos, então, na “Autonomia” e na “Relação com o Outro” os grandes temas de autorrealização para os indivíduos pesquisados. Ao analisarmos as respostas fornecidas sobre os obstáculos à construção de autorrealização, podemos concluir que a velocidade e a constante necessidade de adaptação requerida nos dias de hoje são, sem dúvida, um dos principais inibidores de autorrealização no trabalho. Segundo Lipovetsky (2004), essa necessidade de adaptação constante retira a autonomia do indivíduo e lhe impede de tomar suas decisões através de suas crenças. Todo fator que impede o indivíduo de ter autonomia e de se desenvolver constantemente é também obstáculo dentro das organizações e do próprio indivíduo. Na organização, o excesso de controle, metas e processos são os principais obstáculos. No indivíduo, os limites auto impostos e a falta de consciência que o indivíduo tem sobre si, o impedem de crescer e não o permitem, novamente, de realizar suas escolhas através de suas crenças e de seguir seu caminho de desenvolvimento. Além disso, todas as necessidades não atendidas da hierarquia de Maslow (1954) são um obstáculo para a autorrealização. Ao tratarmos a questão dos instrumentos para a construção da autorrealização, as afirmações de maior peso dentro de cada fator – “Buscar o melhor de si (+40)”, “Busca de significado (+34)” e “Realização pessoal e profissional (+56)” – mostram uma busca, uma ação por parte do indivíduo para realizar aquilo que deseja. A ação, o desejo de fazer e realizar são um instrumento- chave para obter “Autonomia” e realizar suas atividades dentro de suas crenças, permitindo, assim, o desenvolvimento da consciência de seus limites e das competências faltantes, para, com isso, buscar o desenvolvimento constante de capacidade, ampliação de competências e de consciência. Sobre os instrumentos, ficaram evidentes as várias formas de relação com o outro (Eu-Outro). Diferentemente da similaridade das afirmações sobre autonomia e adaptação, a relação com o outro e a forma de se ver e de dar significado ao trabalho, foram as grandes diferenças entre os fatores. Há uma necessidade do indivíduo de se compreender melhor, se adaptar melhor ao coletivo e de desenvolver relações mais profundas.

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Para Hopcke (1995), no processo de individuação, o indivíduo deve, inicialmente, trabalhar a conscientização de suas personas, identificando como elas trabalham e como não. O indivíduo deve, então, criar uma persona mais autêntica a sua natureza que lhe permita navegar no ambiente do trabalho e se relacionar com o outro. Segundo Baxter (1988), é possível a transcendência da alienação através da relação de reciprocidade (comunidade), do trabalho auto produtivo e não limitado à satisfação instrumental. Para Baxter (idem), só existe autorrealização no trabalho quando existe uma relação de reciprocidade na relação Eu-Outro a ponto de nos permitir realizar a consciência “em si”. Pode-se concluir que a autorrealização, assim como a individuação, é um processo de ser e não de fazer e, por isso, cria força ontológica. O trabalho como potencial humano cria as condições cruciais para a existência e as transformações necessárias do indivíduo e do mundo. O trabalho, então, permite dar significado e, por conseguinte, motivação para desenvolver as competências e capacidades do indivíduo. A consciência dessa relação com o trabalho e com seu desenvolvimento permitem ao indivíduo desenvolver sua força ontológica e potencializar esses desenvolvimentos através da relação Eu-Outro que o trabalho em comunidade possibilita. A autonomia para ser quem se deseja, tornar-se indivíduo, desenvolvendo- se em uma constante ampliação de consciência, através da relação profunda com o outro, para com ele desenvolver uma relação mútua de desenvolvimento e aprendizado constante, são os pontos determinantes na visão dos executivos pesquisados para se alcançar a autorrealização. Tanto o processo de autorrealização de Maslow como o caminho de individuação de Jung tratam dos temas de autonomia, desenvolvimento contínuo e necessidade da relação profunda com o outro para que possamos ter uma referência, para nos tornarmos melhores dentro do todo e para o todo. A integração com o “Self”, parte do processo de individuação, só é possível através do olhar do outro para que possamos assimilar nossas sombras e ampliar nossa consciência. Não há como nos desenvolvermos sem uma profunda relação Eu-Outro e não há como dividirmos nosso processo de autorrealização e caminho de individuação entre dentro e fora do trabalho. Aprofundar os estudos do

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entendimento da relação Eu-Outro no trabalho e as formas de permitir a tão desejada reciprocidade para realizar a consciência “em si”, apresentada por Baxter (1982), é, sem dúvida, um tema a ser mais explorado. Para finalizarmos, podemos afirmar que a aplicação da Metodologia Q se mostrou eficiente e a ampliação desta pesquisa para um grupo diversificado, com a participação de mulheres, empresas do terceiro setor, governo e outros setores do trabalho, pode acrescentar em muito as conclusões aqui obtidas.

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Referências

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APÊNDICE A- A Metodologia Q

A Metodologia Q possui procedimentos apropriados ao estudo e pesquisa de conceitos subjetivos, como crenças, atitudes, comportamentos e opiniões, cuja eficácia implica uma grande habilidade e rigor por parte do investigador. Os participantes da pesquisa (P-Set) devem ser selecionados através de seu conhecimento, vivência e capacidade de desenvolver e responder sobre o tema. A Metodologia Q não permite a escolha aleatória de participantes, exigindo, assim, a escolha de um grupo relativamente homogêneo ao redor do tema a ser pesquisado. A análise e tratamento de dados é um processo objetivo e quantitativo que auxilia a clarificação de alguns dos conceitos estudados no campo das ciências sociais e do comportamento, ao mesmo tempo que integra as metodologias quantitativa e qualitativa numa relação de complementaridade. A Metodologia Q foi criada na década de 30 do século passado por William Stephenson, físico e psicólogo inglês interessado em encontrar recursos para estudar a subjetividade, característica de alguns objetos de estudo presentes em diferentes áreas e contextos, incluindo os contextos pessoal e vivencial. Essa metodologia foi, posteriormente, desenvolvida nos EUA por Steven Brown, com um aperfeiçoamento significativo no que diz respeito à investigação empírica nas áreas das ciências sociais e humanas (WATTS & STENNER, 2005a, 2005b). De acordo com Stenner (2008/2009), Stephenson estaria, sobretudo, interessado em explorar as fundações empíricas do construtivismo, isto é, em explorar os processos de construção da representação individual da realidade a partir da experiência. Recorreu, assim, à Metodologia Q para investigar a variedade das construções subjetivas da realidade, procurando extrair configurações interindividuais similares (Q sorts) que lhe permitissem definir fatores capazes de categorizar essa diversidade representativa, pelo recurso a análises fatoriais interpessoais (Q factor analyses). A Metodologia Q é considerada por diferentes autores que contribuíram para o seu desenvolvimento e aperfeiçoamento (BROWN, 1993, 1996; STEPHENSON, 1953; Van EXEL & GRAAF, 2005) como, particularmente, apropriada à tradução empírica da diversidade de ideias, perspectivas, crenças e fenômenos de natureza

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subjetiva, que caracterizam o estudo dos estados mentais e das manifestações comportamentais dos sujeitos humanos. A Metodologia Q fornece, mais precisamente, uma base para o estudo de questões com características subjetivas, como os sistemas de crenças, valores e atitudes individuais (BROWN, 1993; MCKEOWN & THOMAS, 1988), expressas pelos pontos de vista e opiniões pessoais. Em termos operacionais, os sujeitos são colocados perante um conjunto de afirmações que constituem a amostra designada Q-set e que envolve uma seleção de itens (afirmações) extraídos de um universo especializado de opiniões e de posições possíveis relativamente à questão ou tema em estudo (HURD & BOWN, 2004/2005). Os participantes que, no seu conjunto, definem o P-set deverão ordenar as afirmações de acordo com o seu ponto de vista. A ordenação obtida é então sujeita a análise fatorial. Stephenson (1935) chegou a apresentar a Metodologia Q como uma inversão da análise fatorial convencional, uma vez que Q correlaciona pessoas em vez de testes. A correlação entre os perfis pessoais (BROWN, 1993) indica, então, semelhantes pontos de vista. Ao correlacionar pessoas, a análise do fator Q fornece semelhanças e/ou diferenças de visões sobre um assunto, e, desse modo, os fatores resultantes representam clusters mais operacionalizáveis da subjetividade de temas como atitudes, valores e crenças (BROWN, 2002). A técnica Q-sort apresenta vários benefícios (THOMAS e WATSON, 2002): 1) é um meio de estudo em profundidade para pequenas amostras; 2) pode ajudar na investigação exploratória; 3) captura a subjetividade com a mínima interferência do investigador; 4) os participantes da amostra não precisam ser selecionados aleatoriamente (devem ser selecionados com base nos conhecimentos do tema); e, 5) pode ser aplicado pela Internet. A maior vantagem deste método com relação ao método tradicional (escala Likert) da atribuição de um valor às questões, é que o método induz os participantes a considerarem o problema como um todo, ao contrário do método tradicional que opera questão a questão. Numa investigação que recorra a esta metodologia, sujeitos e variáveis são invertidos relativamente às metodologias convencionais (WEBLER, DANIELSON,

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& TULER, 2009), dado que os “sujeitos” do estudo são as diferentes afirmações encontradas sobre o assunto em análise e as variáveis são as pessoas (participantes), ou, mais concretamente, as ordenações (Escala Q ou Q-sorts) por eles realizadas de acordo com a sua opinião ou entendimento. Para serem ordenadas, as afirmações compõem um todo e não partes separadas, reconhecendo-se, neste procedimento, que o método recorre também a referências da teoria Gestalt (WATTS & STENNER, 2005a). Uma premissa fundamental da Metodologia Q, conforme já referido, é que a subjetividade é comunicável (STEPHENSON, 1953, apud WATTS & STENNER, 2005a; STEPHENSON, 1963) e pode ser analisada de forma sistemática. O conjunto de itens resultante da análise efetuada é, então, classificado de acordo com o esquema de referências de cada participante, o que maximiza a comunicação das perspectivas individuais (BIGRAS & DESSEN, 2002). Deste modo, é o participante no estudo que decide sobre a importância de cada item pela sua organização/ordenação no conjunto apresentado, sendo esta ordenação comparada com todas as outras. Comentários em aberto (open-ended), muitas vezes, não são necessários, mas podem ser utilizados, caso existam algumas dúvidas em relação às conclusões finais. Entrevistas deste tipo com os sujeitos podem ser realizadas pós- classificação (Escala Q). Tais análises post hoc normalmente investigam: (a) como o participante interpretou os itens dados, especialmente altos ou baixos rankings na Q-Set, e quais as implicações que esses itens têm no contexto de seu ponto de vista global; (b) se há itens adicionais que possam ser incluídos nas suas afirmações (Q- Set) sobre o tema (quais são, por que eles são importantes, e assim por diante); (c) se há outros itens sobre os quais os participantes gostariam de comentar. Tais comentários de final aberto são uma parte vital do procedimento metodológico Q, pois eles ajudarão a interpretação posterior das configurações de classificação (e pontos de vista) capturados por cada um dos fatores emergentes. Fazem parte ainda de uma análise qualitativa de extrema importância para estudos psicológicos.

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Os resultados encontrados num estudo com a Metodologia Q podem, então, ser usados para descrever uma “população de pontos de vista”, e não uma “população de pessoas” (RISDON, ECCLESTON, CROMBEZ, & McCRACKEN, 2003). O método também não requer um grande número de sujeitos (conforme exposto, um número significativo de itens ou afirmações é apresentado a um número reduzido de participantes). O entendimento dos autores é de que a informação se repete (BROWN, 1996, 2009; van EXEL & GRAAF, 2005) após um certo número de sujeitos. Tendo em vista os inquéritos na população geral, a validade estatística não é a maior preocupação para esta metodologia, uma vez que os resultados de um estudo Q são as diferentes opiniões (subjetivas) sobre o tema que está a ser operacionalizado, e não a percentagem da população que adere a cada uma dessas opiniões. Finalmente, dado que a Metodologia Q integra procedimentos qualitativos e quantitativos, acaba por funcionar como uma ponte entre as metodologias tradicionais (RHOADS et al., 2004-5), muitas vezes consideradas antagônicas pelos investigadores mais cépticos; ou seja, significa que as metodologias qualitativa e quantitativa podem ser enriquecidas e se completar mutuamente.

1. As fases da Metodologia Q

1.1 Definição do curso da comunicação – coleta de afirmações - (Concourse)

A "Coleta" (concourse) diz respeito à confluência da comunicação em torno de um tema (o que, em termos de análise da comunicação verbal, é distinto da ordem do discurso). Trata-se da coleta de todas as afirmações que os participantes podem fazer sobre o tema em questão. Essa coleta deverá conter todos os aspectos relevantes de todos os “discursos” e "referências" encontrados sobre o tema, cabendo ao investigador constituir uma amostra representativa dessas afirmações ou depoimentos (BROWN, 1993). A coleta de afirmações pode ser obtida, entre outros procedimentos, através de entrevistas, observação participante, literatura científica ou documental. O material recolhido representa os

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pareceres e opiniões de profissionais, de investigadores ou de outros atores credíveis sobre o tema em apreço e constitui a matéria-prima para a Metodologia Q (BROWN, 1993). No caso deste estudo, a coleta será dada através da literatura existente (artigos e livros) sobre o tema e, caso necessário, serão realizadas entrevistas ou um grupo focal para validar ou ampliar a quantidade de afirmações necessárias para a aplicação da técnica.

1.2. Desenvolvimento da amostra Q – Afirmações - (Q-Set)

A partir da “Coleta” (concourse), é definido um conjunto de afirmações que é apresentado aos participantes – o chamado Q-set (ou Q sample). A seleção dessa amostra é de total importância, sendo tida como uma arte, mais do que uma ciência, de acordo com Brown (1980). O pesquisador usa uma determinada estrutura para selecionar uma amostra representativa de todas as comunicações (concourse), frases e afirmações que coletou sobre o tema. Essa estrutura é determinada, geralmente, pelos pontos principais, questões, variáveis ou temas específicos sobre o assunto da pesquisa, associados a uma análise mais aprofundada das declarações recolhidas, a ponto de permitir com que as questões centrais da pesquisa sejam abordadas e respondidas. Independentemente da estrutura usada, o investigador tem de selecionar uma amostra suficientemente grande e significativa, a ponto de ser representativa e permitir correlação entre determinadas afirmações. Para melhor organização da informação recolhida, podem ainda ser constituídas categorias. Posteriormente, é selecionado um número de afirmações que representa cada uma das categorias. Por exemplo, no caso de oito categorias encontradas, poderão ser selecionadas 4 ou 5 frases para representar cada categoria, o que perfaz um conjunto de 32 a 40 afirmações, constituindo a Q sample (WEBLER, et al., 2009). Fica claro que diferentes investigadores podem chegar a diferentes amostras Q, partindo do mesmo conjunto inicial de afirmações. Cada afirmação destina-se a ser interpretada no contexto de todas as outras, sendo as informações ordenadas no seu conjunto. Como uma referência indireta à

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Psicologia Gestalt, importa aqui a visão do todo, já que o todo ordenado e relacionado entre si não é o mesmo que a soma das partes ou afirmações. Não compete ao pesquisador preocupar-se com essa ordenação, pois ela é o objetivo do trabalho dos respondentes e o foco do estudo. Por último, as afirmações selecionadas são escritas em cartões aos quais é atribuída uma numeração aleatória, a fim de serem ordenadas de acordo com a instrução dada numa fase posterior – o Q-sorting ou Escala Q. De forma geral, os autores descrevem que, em estudos Q, o número de Q- Set (afirmações) deve ser maior que 35 e menor que 100. Malvezzi (2011) menciona que o número de itens pode ser bastante limitado, mas que raramente é inferior a 65.

1.3. Seleção do P-Set (definição dos participantes)

O conjunto de sujeitos ou participantes que irá ordenar as afirmações (fornecer o Q-Set ou Escala Q) é designado por P-Set, ou Sujeitos-Q, sendo que a Metodologia Q não exige muitos participantes (BROWN, 1978, 1980). O que é exigido, outrossim, é que os sujeitos sejam em número suficiente para estabelecer a existência de um fator que possa ser comparado com outros. Importa também que assegure a necessária abrangência, a fim de maximizar a confiança de que os principais fatores da questão foram identificados. De acordo com alguns autores (BROUWER, 1999; BROWN, 1993; WEBLER et al., 2009), o P-Set deve ser menor do que o Q-set. Os Sujeitos-Q são selecionados de forma a serem representativos de uma determinada população, tendo em conta a questão em estudo. Por exemplo, se o objeto de estudo forem as atitudes terapêuticas em diferentes abordagens teóricas, devem ser contatados terapeutas experientes nas abordagens em estudo, acreditados pelas respectivas entidades/sociedades científicas e distribuídos por características como gênero, idade e anos de experiência (BLOCK, 1961; SHINEBOURNE & ADAMS, 2007; WATTS & STENNER, 2005a). A seleção tem por objetivo garantir que os sujeitos informantes representem uma grande amplitude de opiniões, sempre no contexto da população-alvo do estudo, e não a distribuição de opiniões ou crenças na população em geral. Por

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isso, o P-set não é aleatório, mas antes uma amostra estruturada de participantes teoricamente relevantes para a discussão do tema em questão, com opiniões claras e distintas (BROWN, 1978).

1.4. Escala-Q (Q-Sorting) – a classificação

De acordo com o procedimento geral (BROWN, 1993), o Q-set (amostras/afirmações) é apresentado aos participantes sob a forma de um conjunto de cartões numerados aleatoriamente, contendo, em cada um, uma afirmação. Ao respondente é pedido para ordenar os cartões de acordo com uma regra, mais precisamente a condição de instrução (ou critério de instrução) que representa normalmente o ponto de vista/opinião sobre o tema em causa. É ainda fornecida uma folha de pontuação, bem como a instrução para a distribuição da ordenação. Essa folha possui o formato de uma pirâmide invertida e possui o mesmo número de espaços que o de cartões numerados fornecidos ao respondente. A pontuação apresenta-se distribuída num “continuum” cujos extremos são as afirmações “concorda menos” e “concorda mais”. O trabalho de campo tem uma sequência lógica que evolui do seguinte modo: a) é informado ao participante o tema central da pesquisa, caso haja uma pergunta específica essa é feita. O mesmo é orientado pelo pesquisador, ou no caso de a pesquisa estar sendo respondida de forma online, pelo sistema, sobre a necessidade de classificar as afirmações descritas nos cartões conforme o entendimento do respondente na folha de tabulação que é deixada a sua frente. b) Após essa breve explanação, é pedido ao participante que leia cuidadosamente todas as afirmações de modo a ficar com uma ideia geral da variedade de opiniões sobre a questão em causa; c) depois, é instruído para que, à medida que for lendo, comece a elaborar uma primeira ordenação das afirmações, segundo as três categorias (montes de cartões) seguintes: aquelas com que concorda genericamente, aquelas de que discorda e as afirmações relativamente às quais é neutro (fica indeciso ou que lhe suscitam dúvidas);

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d) o número de afirmações em cada categoria é anotado para verificar o equilíbrio entre concordância e discordância dentro do Q-set; e) finalmente, o respondente é convidado a ordenar as afirmações de acordo com a “condição de instrução”, colocando-as na folha de pontuação fornecida. f) o respondente pode mudar a ordem de classificação dos cartões a qualquer momento e somente quando esse informar que terminou, o pesquisador tomará nota do resultado para análise posterior. As instruções metodológicas clássicas recomendam que a administração do Q-set seja realizada de forma presencial. Atualmente, a utilização de recursos informáticos tem sido adotada em boa parte dos estudos (SANTOS & AMARAL, 2004). Reber, Kaufman e Cropp (2000) realizaram dois estudos de validação comparando análises Q, baseados em entrevistas presenciais e outros com recurso suporte informático específico para análise Q online, tendo concluído que não há diferença significativa entre esses dois métodos de administração no que respeita à validade e fiabilidade.

1.5. Análise e Interpretação

A análise estatística é feita sobe o conjunto das diferentes Q-sort (respostas da pesquisa Q) realizadas por cada indivíduo participante da pesquisa, funcionando, assim, como as variáveis qualitativas, representantes das perspectivas individuais dos indivíduos participantes. Primeiramente, é calculada a matriz de correlação entre todos os Q-sort (respostas individuais da pesquisa Q), a fim de identificar as correlações entre as ordenações obtidas. Em seguida, realiza-se a análise fatorial para que se encontre o número de agrupamentos entre os Q-sort e os fatores correspondentes. A partir desse momento, procuram-se visões idênticas, agrupamentos de afirmações, opiniões, por grupos de indivíduos. O conjunto de fatores encontrado é rodado, mais comumente pelo método Varimax, para obter o conjunto final de fatores, onde cada fator final representa um grupo de pontos de vista individuais com elevada correlação entre si e não correlacionados com os outros.

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A partir desse momento, e com base na afirmação de pesquisadores do método (BROWN, 1978, 1993; van EXEL & GRAAF, 2005), pode ser feito o cálculo da pontuação dos fatores e a diferença de pontuações, sendo que a afirmação que define o fator é aquela que tem a pontuação média ponderada normalizada (Z- score). Com base nas médias ponderadas, podem ainda ser conhecidas as afirmações distintivas e as de consenso, obtendo-se, dessa forma, uma série de dados para análise. Dependendo do tipo de detalhe requerido pelo pesquisador, pode-se ainda aplicar outros métodos de estudo, combinando metodologias para se chegar a outras combinações. Mas, na grande maioria dos casos, o uso do Metodologia Q e seus cálculos estatísticos associados são suficientes.

2. Exemplo de pesquisa respondida – Tabuleiro

Figura 7-Tabuleiro classificado por um participante – Afirmações

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Figura 8 – Tabuleiro classificado por um participante – numeração das afirmações

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Anexo A- Termo de Compromisso do Pesquisador Responsável

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

TERMO DE COMPROMISSO DO PESQUISADOR RESPONSÁVEL

Título: “Autorrealização no trabalho, obstáculos e possibilidades na visão de executivos Brasileiros e sua interface com o processo de individuação”

O pesquisador, abaixo assina e se compromete a:

• Respeitar e cumprir a Teoria Principialista que visa salvaguardar a autonomia, beneficência, não maleficência, justiça, privacidade e confidencialidade (Res. nº 466/12 e 510/16 do CONEP/CNS/MS); • Não violar as normas do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido; • Comunicar ao sujeito da pesquisa todas as informações necessárias para um adequado “consentimento livre e esclarecido” e solicitar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, apenas, quando o sujeito da pesquisa tenha conhecimento adequado dos fatos e das consequências de sua participação, e tenha tido oportunidade para considerar livremente se quer participar da pesquisa ou não; • Obter de cada sujeito de pesquisa um documento assinado ou com impressão datiloscópica como evidência do consentimento livre e esclarecido; • Renovar o consentimento livre e esclarecido de cada sujeito se houver alterações nas condições ou procedimentos da pesquisa, informado procedimento ao CEP; • Manter absoluto e total sigilo e confidencialidade em relação à identificação do sujeito da pesquisa e dados constantes em prontuários ou banco de dados., • Respeitar o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e derivados; • Não prejudicar o meio ambiente em sua totalidade (fauna e a flora) para execução da pesquisa. • Cumprir na integralidade todas as resoluções do Conselho Nacional de Saúde CNS/MS, bem como todos os diplomas legais referentes ao tema da ética em pesquisa, dos quais declaramos ter pleno conhecimento. • Desta forma, como pesquisador abaixo subscrito, me comprometo, em caráter irrevogável e irretratável, por prazo indeterminado, a cumprir toda legislação vigente, bem como as disposições deste Termo de Compromisso.

São Paulo, de de 2018.

Nome da Pesquisadora/Aluno:_Adilson Rodrigues Lucas Junior______

Assinatura: ______

Nome da Orientadora:_____Denise Gimenez Ramos______

Assinatura da Orientadora:______

Comitê de Ética em Pesquisa PUC-SP Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP Rua Ministro Godói, 969 – Perdizes –São Paulo – SP – CEP: 05015-001 Edifício Reitor Bandeira de Mello, sala 63-C. Telefones: (11) 3670-8466 E-mail: [email protected]

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Anexo B- Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Título: “Autorrealização no trabalho, obstáculos e possibilidades na visão de executivos Brasileiros e sua interface com o processo de individuação”

Convidamos a participar de uma pesquisa a seguir esclarecida:

OBJETIVO DO ESTUDO: Compreender e analisar, o que os indivíduos, entre 35 e 55 anos, que atuam em posições de liderança, em empresas privadas, entendem como autorrealização no trabalho e suas possibilidades de realização.

ALTERNATIVA PARA PARTICIPAÇÃO NO ESTUDO: Na pesquisa em questão serão coletadas informações dos participantes através das afirmações apresentadas dentro da metodologia e de possíveis declarações verbais expressas pelos entrevistados durante o processo de entrevista com o intuito de alcançar os objetivos deste estudo. Caso aceite participar do estudo, poderá, se o desejar, retirar-se a qualquer momento sem ônus ou consequências. Sua recusa não trará qualquer prejuízo em sua relação com o pesquisador.

PROCEDIMENTO DO ESTUDO: O estudo será realizado por meio de um encontro individual. No encontro você receberá instruções para responder determinadas afirmações sobre o tema em questão e elencá-las de acordo com seu grau de relevância. Se necessário você será solicitado a responder algumas perguntas complementares neste encontro ou em um encontro posterior, a ser acordado entre as partes. O tempo previsto para o encontro é de 60 a 90 minutos. Após o término da pesquisa o pesquisador fornecerá as conclusões, caso seja solicitado. Esta pesquisa será realizada em endereço residencial ou escritório do participante ou do próprio pesquisador.

GRAVAÇÃO EM ÁUDIO: Todas as entrevistas serão gravadas em áudio sempre que o participante permitir e serão transcritas para utilização do material pelo pesquisador caso seja necessário. Os áudios serão utilizados somente para a pesquisa e tão somente na eventual necessidade de complementariedade dos dados obtidos pela análise estatística realizada dentro da metodologia. As gravações serão destruídas após a pesquisa.

Comitê de Ética em Pesquisa PUC-SP Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP Rua Ministro Godói, 969 – Perdizes –São Paulo – SP – CEP: 05015-001 Edifício Reitor Bandeira de Mello, sala 63-C. Telefones: (11) 3670-8466 E-mail: [email protected]

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

RISCOS e DESCONFORTO: A pesquisa é considerada de desconforto mínimo e de baixo risco. Caso não queira responder alguma perguntar, terminar a classificação das afirmações propostas, a pesquisa do participante em questão será invalidada sem qualquer ônus ao mesmo.

FORMAS DE ACOMPANHAMENTO PÓS PESQUISA: em caso de dúvida ou algum desconforto por parte do participante, este poderá requisitar uma nova entrevista ou encontro com o pesquisador. Em caso de o participante necessitar de qualquer auxilio adicional e que exija algum tipo de terapia, o pesquisador se compromete a indicar um profissional habilitado. O pesquisador não terá qualquer responsabilidade financeira sobre os custos de terapia ou qualquer outro tipo de tratamento do participante, que venham a ser atribuídos a essa pesquisa, sendo esse de inteira responsabilidade do participante.

BENEFÍCIOS: Os benefícios de sua participação nesta pesquisa será o de aumentar os conhecimentos científicos para a psicologia clínica e social, não havendo qualquer custo ou compensação financeira ao participante.

CONFIDENCIALIDADE: Nenhuma publicação partindo do material coletado nesta pesquisa revelará os nomes de quaisquer participantes da pesquisa. Sua participação será de caráter sigiloso.

DÚVIDAS: Esta pesquisa possui vínculo com a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo por meio do Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica do qual o aluno Adilson Rodrigues Lucas Junior é o pesquisador principal, sob a orientação da Prof.ª Dra. Denise Gimenez Ramos. O pesquisador estará disponível para responder a qualquer dúvida. Caso necessário, os dados de contato são Adilson Rodrigues Lucas Junior, telefone (11) 96898 6241 ou email: [email protected] ou o Comitê de Ética em Pesquisa, PUC-SP no telefone (11) 3670-8466 ou e-mail [email protected]. Será fornecida cópia deste consentimento.

Comitê de Ética em Pesquisa PUC-SP Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP Rua Ministro Godói, 969 – Perdizes –São Paulo – SP – CEP: 05015-001 Edifício Reitor Bandeira de Mello, sala 63-C. Telefones: (11) 3670-8466 E-mail: [email protected]

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

Eu concordo em participar deste estudo.

Nome (participante): ______

Assinatura: ______

Data: ______

Discuti a proposta da pesquisa com este(a) participante e, em minha opinião, ele(a) compreendeu suas alternativas (incluindo não participar da pesquisa, se assim o desejar) e deu seu livre consentimento em participar deste estudo.

Nome (Pesquisador): ______Assinatura: ______

Data: ______

Comitê de Ética em Pesquisa PUC-SP Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP Rua Ministro Godói, 969 – Perdizes –São Paulo – SP – CEP: 05015-001 Edifício Reitor Bandeira de Mello, sala 63-C. Telefones: (11) 3670-8466 E-mail: [email protected]

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