Anais do VIII Congresso Brasileiro de Turismo Rural e I Colóquio Internacional de Pesquisa e Práticas em p. 018-023 Turismo no Espaço Rural, Rosana - SP, 10-13 de novembro de 2013. v.1.

A ESPACIALIZAÇÃO DOS ESTUDOS DE CASO NAS SETE PRIMEIRAS EDIÇÕES DO CBTR

THIAGO SEBASTIANO DE MELO DARLENE APARECIDA DE OLIVEIRA FERREIRA

Universidade Estadual Paulista - Unesp Campus de Rosana / Campus Rio Claro [email protected] / [email protected]

RESUMO – O presente trabalho expõe a espacialidade dos estudos de caso presentes nas sete primeiras edições do Congresso Brasileiro de Turismo Rural. Objetiva dar luz ao alcance espacial das pesquisas que vem sendo desenvolvidas no país a respeito desse campo de estudo que se erige continuamente como um importante elemento de entendimento da sociedade contemporânea. Para tanto, realizou-se um levantamento nos anais das sete primeiras edições do referido congresso, buscando mensurar quantos dos trabalhos se conformam como estudos de caso, bem como em quais unidades da federação tais estudos buscaram entender a realidade turística no meio rural. Aponta-se que os resultados obtidos evidenciam uma espacialidade que, por um lado, concentra os estudos de caso nas regiões sudeste e sul, e, por outo, trazem à luz as questões de um numero considerável de estados brasileiros, dando, portanto, importante e interessante material para pesquisas posteriores que se ocupam com a questão.

Palavras chave: Turismo no meio rural, Estudos de caso, CBTR, Anais.

ABSTRACT - This paper exposes the spatiality of the case studies present the first seven editions of the Brazilian Congress of Rural Tourism. Aims to give light to the spatial extent of the research that has been developed in the country about this field of study that builds up continuously as an important element in understanding contemporary society. Therefore, we carried out a survey in the annals of the first seven editions of this congress, seeking to measure how many of the jobs conform as case studies, as well as which units of the federation such studies sought to understand the reality in rural tourism. It is pointed out that the results show a spatiality that, on the one hand, focused case studies in southeastern and south, and, Autumn, bring to light issues of a considerable number of Brazilian states, giving therefore important and interesting material for further research dealing with the issue.

Key words: Tourism in rural areas, case studies, CBTR, Proceedings.

1 INTRODUÇÃO dois anos. Contudo, a sétima edição, que era para ter sido realizada em 2009, efetivou-se em 2010, por motivos O Congresso Brasileiro de Turismo Rural – CBTR foi organizacionais. selecionado como evento a partir do qual nos propomos Da primeira à sexta edição o evento foi realizado em analisar os estudos sobre a atividade turística no meio Piracicaba – SP e organizado pela Fundação de Estudos rural, destacando o turismo em assentamentos de Reforma Agrários Luiz de Queiroz – FEALQ. Na sétima edição o Agrária, por ser um evento nacional de reconhecida evento teve lugar em Presidente Prudente – SP, com relevância a tratar especificamente da atividade turística organização da Universidade Estadual Paulista Júlio de nesse meio (PIMENTEL, 2001; MICHELIN, VICENTE, Mesquita Filho – UNESP, com a proposta de, a partir 2007). desta edição, ser um evento itinerante, tendo sido O CBTR foi realizado pela primeira vez em 1999 e estabelecido na plenária de encerramento que a oitava em seu início era anual. Com essa periodicidade ele teve edição ocorreria em Londrina – PR, pela primeira vez, três edições. A partir de 2003 passou a acontecer a cada então, fora do sudeste. Para manter a periodicidade, esta

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edição deverá se realizar ainda neste ano de 2012. 1º 1999 29 29 Contudo, até o mês de agosto do citado ano, não foi 2º 2000 37 37 divulgada nenhuma circular e/ou informação a respeito. 3º 2001 38 38 É possível dizer que, com o passar dos anos, o evento 4º 2003 67 67 vem ganhando um perfil científico, ainda que mantenha, 5º 2005 67 72 de certa forma, a característica de espaço de diálogo com 6º 2007 41 51 a iniciativa privada e instituições públicas vinculadas à realidade rural. Outra percepção clara é em relação ao 7º 2010 53 53 maior rigor no tocante à normatização dos trabalhos Total - 332 347 apresentados ao longo das edições, o que se nota pelo Organização: Thiago Sebastiano de Melo, 2012 maior número de referências bibliográficas, presença de resumo, abstract, informações sobre os autores, maior Como se pode ver na figura 1, nem todos os trabalhos número de páginas por artigo, ainda que na última edição publicados nos anais foram analisados. Isso decorre do houvesse trabalhos que não apresentavam estas fato de que, em algumas edições, a organização optou por características. publicar também outras experiências, que não apenas as Vale recordar em que cenário surgiu o CBTR. Em científicas. Em todo caso, embora a princípio tenhamos 1999 estávamos no segundo ano do segundo mandato do pensado em deixar todos estes trabalhos de fora da leitura, ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Era o final de optamos por analisar os assim denominados “projetos uma década que foi turbulenta, socioeconomicamente regionais”, por entender que poderiam trazer alguma pensando. Assistimos ao impeachmant do ex-presidente iniciativa interessante do ponto de vista do trabalho com Fernando Collor de Mello, à instauração do Plano Real, turismo, numa perspectiva de construção de outra que trouxe certa estabilidade econômica, à adesão racionalidade. substancial do Estado brasileiro aos ditames neoliberais. Dessa forma, apenas os trabalhos que se encarregam de Foi nesse contexto que ocorreram intensas privatizações, expor receitas culinárias não foram analisados e perfazem fortalecimento do Partido dos Trabalhadores, inserção um total de 15 publicações, sendo cinco na quinta e dez subordinada dos pequenos agricultores no sistema na sexta edição. Embora possamos intuir que, pela financeiro por meio do Programa Nacional de denominação, os projetos regionais buscassem expor Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF. experiências empíricas, nada é dito sobre qual o propósito Deste modo, o CBTR surge no momento em que ganham deste tipo de trabalho nas edições em que eles aparecem força referências teórico-conceituais que se fariam publicados. Importa lembrar ainda que outra modalidade basilares para as conferências e trabalhos apresentados ao de texto presente nos anais diz respeito às conferências longo do evento, como agricultura familiar, apresentadas, tendo estes textos, quase sempre, maior desenvolvimento local, novo rural, entre outros. espaço (leia-se número de páginas) para o Dito isso, nosso objetivo nesse capítulo é, de forma geral, desenvolvimento dos assuntos abordados. apresentar o CBTR como importante espaço de reflexões e socialização de informações acerca do turismo no 3.1 Abrangência Espacial das Pesquisas do CBTR espaço rural brasileiro, e, de forma específica, espacializar os estudos de caso apresentados ao longo do evento, para A primeira edição do CBTR ocorreu em 1999 e, termos dimensão de que regiões têm sido estudadas tendo até sua última realização, ou seja, em 2010, o congresso o turismo no meio rural como diretriz. Também é nosso perfaz uma história de mais de 10 anos. Nesse tempo objetivo problematizar a respeito da criticidade das vemos a ampliação de alguns temas, com destaque para a interpretações propostas nos anais, tendo em vista o questão ambiental. referencial teórico-metodológico exposto no capítulo Ocorre que, pelos textos apresentarem versões anterior, confrontando com o apontamento de Ouriques concisas, alguns com 3 páginas, num contexto em que a (2005) sobre a escassez deste tipo de análise no país. maioria se desenvolve em 5 ou 6 páginas, e apesar dos Partindo disso, optamos por adotar um critério bastante trabalhos buscarem problematizações diversas para nítido para o entendimento dos textos como sendo pensarem o turismo no meio rural, temos que os críticos, uma vez que a crítica em tela, como já dito no principais norteadores dos debates foram as conferências, início deste trabalho, é a crítica marxista radical. Assim ao que retornaremos adiante. Vale dizer que a última sendo, os trabalhos só foram compreendidos como edição do evento trouxe textos que, em sua maioria, têm críticos quando apontaram explicitamente a necessidade mais de dez páginas, o que proporcionou, acreditamos, de superação do sistema/racionalidade capitalista. um maior detalhamento das situações teóricas ou teórico- Desta feita, nas sete edições temos um total de 332 práticas apresentadas. (trezentos e trinta e dois) trabalhos analisados, que se Mesmo sendo textos reduzidos, em sua maioria, subdividem de acordo com a figura 1: algo próximo de resumos expandidos, constata-se a existência de debates profícuos que fazem avançar as Figura 1 – Total de trabalhos por anais do CBTR reflexões acerca de temas relacionados ao turismo no Anais Ano Trabalhos Total de espaço rural, ou ainda do próprio conceito do que vem a Analisados Trabalhos ser o chamado turismo rural. É emblemático desses

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diálogos o texto de Vieira (2003), que retoma o exposto por Furquim e Ishiy (2001), na perspectiva de avançar teoricamente sobre um tema de suma importância para pensar a atividade turística no meio rural, qual seja, as implicações legais. Como veremos, grande parte dos textos são estudos de caso. Não obstante o valor desse tipo de análise, e em consonância com o supracitado a respeito do papel norteador das conferências, nota-se que estas se ocuparam mais de tratar de forma geral os assuntos abordados do que de partir de uma realidade particular. Dito de outro modo, as conferências têm maior peso teórico-conceitual não só porque estão mais detalhadamente apresentadas, como também porque, em sua maioria, versam a respeito de generalizações e/ou perspectivas mais abrangentes (tabela 2).

Figura 2 – Estudos de caso por tipo de texto em cada Como a Figura 3 mostra, apenas 4 estados foram edição do CBTR referência para os estudos de caso apresentados na Estudos de caso por tipo de texto em cada edição do primeira edição do congresso. A discrepância do número CBTR de estudos de caso que pesquisaram a realidade do sudeste em relação às demais macrorregiões do país é 1ª Conferência 0 uma característica que se manteve ao longo de todas as Trabalhos 15 edições, ainda que outros estados/regiões tenham sido 2ª Conferência 1 abordados ao longo do tempo, como veremos. Muito Trabalhos 21 provavelmente isso se dá em decorrência do evento ter 3ª Conferência 2 sido realizado sempre no estado de . Claro que, Trabalhos 16 ainda há outros motivos a serem levados em 4ª Conferência 2 consideração, como o fato do sudeste congregar as Trabalhos 41 maiores universidades do país, exercer um predomínio 5ª Conferência 0 sócio-econômico-cultural evidente nas determinações do Trabalhos 36 país, entre outros. Contudo, isso não quer dizer que a atividade turística no espaço rural esteja restrita às regiões 6ª Conferência 1 Sudeste e Sul, e sim, como dito, que tais regiões Trabalhos 22 concentram as pesquisas sobre tal atividade. 7ª Conferência 1 Outro motivo para o exíguo número de Unidades Trabalhos 38 Federativas representadas nessa primeira edição do evento Total Conferência 7 pode ser encontrado no fato da recente sistematização do Trabalhos 189 turismo nesse meio. O primeiro caso é atribuído ao Organização: Thiago Sebastiano de Melo, 2012 município de Lages – SC, na década de oitenta do século passado, o que se reflete na aglomeração do Cabe, agora, vermos que estados foram estudados desenvolvimento desta modalidade de turismo nas regiões nestas pesquisas. Sul e Sudeste. A primeira, justamente por ser o berço do turismo rural e comportar um patrimônio histórico- Figura 3 – Estudos de caso na primeira edição do CBTR cultural marcado sobremaneira pela imigração européia, e a segunda por também possuir um notável patrimônio histórico-cultural, nesse caso acentuadamente relacionado aos ciclos econômicos do café e da escravidão, e, sobretudo, por comportar o principal polo de emissão de turistas. Ocorre que só o fato do sudeste ser o maior emissor de turistas não explica a maior incidência dos estudos de caso. Acreditamos, e aqui a afirmação vale para todas as edições do evento, que os estudos de caso concentrados nesta região são resultantes da imbricada relação entre o poder aquisitivo dos moradores, a quantidade e visibilidade das pesquisas realizadas, e as políticas e discursos para o campo.

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Figura 4 – Estudos de caso na segunda edição do CBTR Figura 6 – Estudos de caso na quarta edição do CBTR

Na segunda edição nota-se que o estado do Rio Grande do Sul deixa de ser palco de estudos de caso, e Na quarta edição cresce o número de estudos sobre passam a ser referência os estados do Paraná, Espírito o estado de Pernambuco, e, assim, o nordeste brasileiro. Santo e o Distrito Federal. Apesar do volume substancial Voltam a figurar também os estados de Minas Gerais e de estudos sobre o estado do Paraná, grande parte das Espírito Santo. Como na edição anterior, todos os estados pesquisas ainda tem por base o sudeste. da região sul são referência para estudos de caso. Mato Grosso do Sul novamente é representado e o Distrito Figura 5 – Estudos de caso na terceira edição do CBTR Federal não aparece. São Paulo mantém-se como a grande referência para as pesquisas do CBTR.

Figura 7 – Estudos de caso na quinta edição do CBTR

Na terceira edição o estado do Rio Grande do Sul volta a ser estudado, o Paraná e Santa Catarina se mantêm, demonstrando que a tradição da região sul do país como objeto de estudo das pesquisas nacionais é fato O quadro permanece praticamente inalterado na consolidado. Mato Grosso do Sul aparece. O estado de quinta edição. Espírito Santo deixa de constar na lista, e Minas Gerais não é representado, bem como o Espírito Goiás aparece, pela primeira vez. Os trabalhos que Santo. O Distrito Federal se faz presente. E, pela primeira estudaram a realidade do estado de São Paulo novamente vez, um estado do nordeste é base para pesquisa, sendo são os mais numerosos. Pernambuco a representar tal macrorregião. Cabe lembrar que essa edição do CBTR aconteceu no final do primeiro mandato do Governo Lula, quando se criou o Ministério do Turismo e passou a se fortalecer a ideia sobre a importância da regionalização do turismo.

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Figura 8 – Estudos de caso na sexta edição do CBTR estudados. Também pela primeira vez a realidade mato- grossense foi apresentada aos participantes. São Paulo se mantém como principal polo dos estudos nacionais sobre turismo no espaço rural. Vejamos a representação geral dos estudos de caso no CBTR.

Figura 10 – Estudos de caso por Unidade Federativa no CBTR 1999 - 2010

Na sexta edição a região Centro-oeste não aparece estudada. Depois de três edições consecutivas, a região Sul não é totalmente representada nos estudos de caso, ficando de fora o estado do Paraná. Já no nordeste, pela primeira vez outro estado, além de Pernambuco, aparece, a Paraíba. E São Paulo segue sendo o principal foco de estudos de caso nas pesquisas nacionais sobre turismo no espaço rural.

Figura 9 – Estudos de caso na sétima edição do CBTR A ocorrência de concentração dos estudos de caso no sudeste sugere que a centralidade ocupada pelo eixo São Paulo-Rio de Janeiro, em diversas áreas, como cultural e empresarial, se faz presente também na academia. Cabe, ainda, cruzar dados sobre estados estudados com instituições de fomento, recursos disponibilizados para pesquisas em determinadas áreas, existência de cursos específicos ou de linhas de pesquisas/grupos de estudos sobre a temática, para que possamos ligar uma coisa à outra, efetivamente. Como foge da alçada da presente proposta, fica o ensejo para pesquisas futuras. De outro modo, percebemos que após a criação do Ministério do Turismo, em 2003, ano em que ocorreu a quarta edição do CBTR, os estudos de caso se expandiram pelo território nacional. Entendemos que a criação deste Ministério responde ao discurso mundialmente Na última das sete edições realizadas até o generalizado da “capacidade produtiva” do turismo, com momento, o CBTR teve o maior número de Unidades seu propagado baixo custo na geração de postos de Federativas analisadas nos estudos de caso. Foram 9 dos trabalho, e, portanto, vetor estratégico de 27 estados do Brasil. Vale dizer que, desde a primeira desenvolvimento local/regional. Daí o porquê de grande edição, a única vez que o número de UF’s estudadas parte dos estudos buscarem uma justificativa econômica, diminuiu em relação à edição anterior foi na sexta, seja para a própria pesquisa, seja para a implantação da quando foram pesquisadas 6 UF’s, ao passo que na atividade. Em outras palavras, o aspecto econômico é quinta, bem como na quarta, foram estudadas 8. Na evidenciado tanto como forma de justificar os estudos a terceira edição foram 7, na segunda 6 e na primeira 4. respeito da atividade turística, quanto como viés de Ainda no tocante ao quadro da última edição, pela legitimação de sua implantação. Afinal, sendo uma primeira vez, desde que se iniciou no congresso, a atividade com grande impacto socioeconômico, necessita realidade pernambucana não foi exposta. De outro modo, que se (re)conheça a fundo suas implicações. Em verdade, um novo estado do Nordeste serviu para reflexões: o Rio cabe ressaltar, o primeiro e o segundo aspecto, grosso Grande do Norte. E pela primeira vez desde o começo do modo, têm se amalgamado num único escopo, qual seja, o CBTR, Santa Catarina não figurou entre os estados

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de legitimar o desenvolvimento por meio da atividade importante ressaltar que numericamente tais estudos turística. estejam concentrados nas regiões sudeste e sul. Todavia, Posto isso, retomamos o explicitado no capítulo 1. apesar dessa concentração numérica é importante À medida que o Governo Federal aposta no Turismo reconhecer que a abrangência dos estudos ao longo de como instrumento para consolidar o desenvolvimento grande parte do território nacional nos traz um maior econômico do país, alicerçando-se, para tanto, numa conhecimento da realidade turística nacional, nesse caso perspectiva liberal de desenvolvimento territorial, cresce particularmente do turismo no espaço rural; o que é o número de estudos de caso, e por isso acreditamos que extremamente importante para que possamos pensar também de empreendimentos de turismo rural, mesmo melhores formas de gestão destas atividades e termos porque esse posicionamento do governo se materializa em referenciais para elaborações teórico-conceituais sobre o ações como linhas de crédito específicas para turismo assunto. rural, por meio do PRONAF. E essa ligação entre as Ademais, diante disso, o CBTR vem se firmando políticas públicas para o campo, no Governo Lula, e a como importante e imprescindível espaço de formulação e perspectiva liberal mencionada está umbilicalmente socialização de pesquisas e reflexões sobre o turismo, inserida nos trabalhos do CBTR desde antes da eleição tanto nacional quanto internacionalmente, como podemos deste ex-presidente, uma vez que um de seus principais apreender no relatado nessa oportunidade. articuladores responde por uma das conferências apresentadas logo na primeira edição e é um dos autores mais citados ao longo do evento. REFERÊNCIAS A presença Internacional no CBTR FURQUIM, E. de C.; ISHIY, M. As atividades O CBTR também contou com estudos do turismo rural sob a óptica da desproteção internacionais. Isso se deu de dois modos: com estudos de caso de realidades internacionais ou com pesquisas jurídica da legislação agrária e tributária. In: desenvolvidas por pesquisadores vinculados a instituições Anais do III Congresso Brasileiro de Turismo internacionais. Rural. Piracicaba: FEALQ, 2001.

Figura 11 – Trabalhos internacionais no CBTR por MICHELIN, R. L.; VICENTE, T. R. O turismo edição rural como objeto de estudos nas revistas Edição Trabalhos Conferências País 1ª - - científicas nacionais de turismo. In: Anais do 2ª 01 - Espanha VI Congresso Brasileiro de Turismo Rural. 3ª - 01 Espanha Piracicaba: FEALQ, 2007. 4ª 02 - Espanha Portugal PIMENTEL, G. G. de A. Produção bibliográfica 5ª - - dos Congressos Brasileiros de Turismo Rural – 6ª 01 01 Espanha breve revisão. In: Anais do III Congresso Portugal Brasileiro de Turismo Rural. Piracicaba: 7ª 03 - Espanha Israel FEALQ, 2001

Organização: Thiago Sebastiano de Melo, 2012 VIEIRA, E. M. O turismo rural e o ITR: três Como se vê, apenas na primeira e na quinta edição reducionismos. In: Anais do IV Congresso do evento não houve pelo menos um estudo internacional. Brasileiro de Turismo Rural. Piracicaba: E no tocante aos realizados nas demais edições, FEALQ, 2003 sobressaem-se os que foram realizados a partir da Espanha e/ou que estudaram tal realidade. Aventamos se essa relação bilateral Brasil-Espanha responde ao fato de o programa LEADER ser uma referência nos estudos nacionais sobre planejamento do turismo.

4 CONCLUSÕES

A partir do trabalho exposto, entendemos que a espacialização dos estudos de caso no Congresso Brasileiro de Turismo Rural ocorreram, até esse momento, de forma descentralizada, ainda que seja

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O TURISMO NO ESPAÇO RURAL NO MUNICÍPIO DE JAGUARI/RS: ANÁLISE DO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO

FABIANE RAUBER IVO ELESBÃO

Universidade Federal de Santa Maria - UFSM Campus de Silveira Martins Silveira Martins - RS [email protected]; [email protected]

RESUMO - O espaço rural passou por muitas transformações ao longo dos anos, sendo hoje visto não mais como lugar de atraso, mas com capacidade de oferecer melhor qualidade de vida para as pessoas. Objetivou-se neste trabalho analisar o processo de desenvolvimento do turismo no espaço rural na rota turística “Nostra Colônia” do município de Jaguari/RS. A pesquisa qualitativa teve como base um estudo no município pesquisado. Foram aplicadas entrevistas semi-estruturadas com dez empreendimentos de duas comunidades que iniciaram a atividade. Verificou-se que há uma grande necessidade e deficiência em relação ao apoio e recursos provenientes do poder público, o que acarretou o abandono de uma comunidade da rota e uma grande desmotivação dos empreendedores que ainda continuam.

Palavras chave: Turismo Rural, Empreendedores, Desenvolvimento, Agricultores.

ABSTRACT - The rural area has gone through many transformations over the years and today is no longer seen as a place of late, but as a place capable of offering a better quality of life for people. The objective of this work to analyze the process of development of rural tourism in the tourist route "Nostra Colônia" in the city of Jaguari / RS. The qualitative research was based on a study the city studied. We applied semi-structured interviews with ten projects, divided into two communities, who started the tourist route. It was found that there is great need and disability in relation to support and resources from the government, which led over the abandonment of the activity of a community route and a major demotivation of entrepreneurs still.

Key words: Rural Tourism, Entrepreneurs, Development, Farmers.

1 INTRODUÇÃO O turismo no espaço rural vem sendo objeto de estudos e reflexões como elemento potencial para integrar O meio rural passou por grandes transformações estratégias de desenvolvimento local, sendo uma das nas décadas recentes, sendo que os agricultores passaram atividades não agrícolas que mais apresentam potencial de a incorporar novas estratégias de reprodução econômica e crescimento. Souza e Elesbão (2009) colocam que o social. O rural antes visto somente como espaço de turismo no espaço rural pode ser um elemento importante produção de alimentos e sinônimo de atraso passa a ser no sentido de provocar algumas melhorias para as olhado de outra forma. famílias e comunidades que o adotam, como a geração de Nesse contexto se desenvolve o turismo no espaço emprego e renda, contribuindo na elevação do nível de rural, que no Brasil é uma atividade relativamente nova, vida das famílias rurais. comparativamente a outras modalidades de turismo. De Uma das formas de organização que caracterizam acordo com Moletta e Goidanich (1999), o turismo rural o turismo no espaço rural é o roteiro turístico que agrega está correlacionado às atividades agrárias do passado e do vários atrativos em um mesmo produto, havendo presente e é uma atividade que os citadinos buscam para interação sinérgica entre empreendedores e possibilitando resgatar suas origens culturais, suas identidades e ter que os agricultores mantenham outras atividades contato com a natureza e hábitos locais. concomitantes, o que os caracteriza como pluriativos.

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De acordo com Elesbão (2001) os roteiros De acordo com Pedron (2007) o desenvolvimento turísticos no espaço rural podem gerar maiores benefícios do turismo no município teve início através da para as famílias rurais envolvidas, pois esses envolvem participação de Jaguari na Rota “Caminho das Origens”, a contato familiar diferenciado com o público visitante, qual foi idealizada pelo Programa de Desenvolvimento do gerando benefícios tanto para as famílias que se envolvem Turismo Regional criado em 1996 e que abrangia 11 direta e indiretamente com a atividade turística, como municípios. No ano de 1998 através de um diagnóstico para a comunidade como um todo. socioeconômico a atividade turística foi identificada como Para Bahl (2004) o roteiro turístico necessita de elemento potencial de desenvolvimento no município. A planejamento prévio e criativo para que se torne um partir de então foi feito uma parceria entre Prefeitura produto diferenciado, motivador e que atenda o público Municipal e o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e alvo, necessita também que as localidades receptoras Pequenas Empresas (SEBRAE), sendo sensibilizada a estejam preparadas para atender as reais necessidades dos comunidade em geral para despertar interesse em turistas. desenvolver a atividade. Nesse contexto, é indispensável que se conheça o Como o município possuía várias propriedades que espaço rural para que assim se possam formar estratégias produziam uva e cachaça decidiram criar no ano 2000 o bem definidas e ter um maior entendimento das atividades “Roteiro da Cana e da Uva” que, no início, abrangia realizadas neste meio. Nesse sentido, o presente trabalho apenas proprietários da comunidade de Fontana Freda, objetiva analisar o processo de desenvolvimento do que mais tarde abrangeu também a comunidade do turismo no espaço rural no município de Jaguari, Rio Chapadão por possuírem mais empreendedores Grande do Sul. Esta análise tem por base entrevistas interessados na atividade. Com objetivo de maior realizadas com agricultores/empreendedores de duas divulgação do produto ofertado viu-se a necessidade de comunidades onde a atividade turística foi desenvolvida. criar um nome mais atrativo ao roteiro. Como na época existia uma novela que contava a história da imigração 2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS italiana no Rio Grande do Sul, decidiu-se colocar o nome da novela no roteiro passando então a se chamar Rota A pesquisa desenvolvida busca contribuir para o Turística “Nostra Colônia”. entendimento do processo de desenvolvimento do turismo Os empreendedores receberam visitas e no espaço rural do município de Jaguari-RS. Enquadra-se orientações do SEBRAE com a realização de cursos de como uma pesquisa qualitativa, que de acordo com capacitação em diversas modalidades de turismo Dencker (1998, p. 107), “é adequada para se obter um oferecidos gratuitamente aos interessados. Na conhecimento mais profundo de casos específicos, porém comunidade do Chapadão participam os seguintes não permite a generalização em termos de probabilidade empreendimentos: Pesqueiro Chapadão, Mirante Minuzzi, de ocorrência”. Chácara da Família Guerra, Sítio da Vó Úrsula, Granja O município pesquisado pertence à microrregião Santa Tereza, Vinhos Dalla Valle e Vinhos Jaguari. Na de Santa Maria composta pelos seguintes municípios: comunidade da Fontana Freda participavam a Casa das Cacequi, Dilermando de Aguiar, Itaara, Jaguari, Mata, Massas, Alambique da Família Bolzan e as Esculpedras. Nova Esperança do Sul, Santa Maria, São Martinho da Com o propósito de alcançar os objetivos Serra, São Pedro do Sul, São Sepé, São Vicente do Sul, propostos a coleta dos dados foi realizada no mês de Toropi, e Vila Nova do Sul. Como se pode observar na janeiro de 2012. Na comunidade do Chapadão foram Figura 1, a microrregião está localizada no Centro-Oeste entrevistados os responsáveis dos sete empreendimentos do Estado do Rio Grande do Sul. que recebem visitantes: Chácara da Família Guerra, Jaguari tem sua base econômica na agropecuária e Vinhos Dalla Vale, Granja Santa Tereza, Mirante possui, segundo o Censo Demográfico do IBGE (2010), Minuzzi, Reserva Pesqueiro Chapadão, Sítio da Vó uma população total de 11.473 habitantes, sendo 6.531 Úrsula e Vinhos Jaguari. Importante mencionar que o (56,9 %) residentes na zona urbana e 4.942 (43,1 %) empreendimento Vinhos Jaguari é uma cooperativa que residentes na zona rural. faz parte da Rota mas está localizada no perímetro urbano. Já na comunidade de Fontana Freda foram entrevistados os responsáveis pelas três propriedades que não fazem mais parte da Rota, que são a Casa das Massas, o Alambique da Família Bolzan e a Esculpedras. As entrevistas foram gravadas, transcritas e estabelecidas categorias para a análise dos dados. Na análise, as falas dos entrevistados estão identificadas de acordo com o grupo estabelecido: “ECC” para os empreendedores da comunidade do Chapadão e “CFF” Elaboração: Bruno Zacuni Prina para os proprietários da comunidade de Fontana Freda.

Figura 1 – Localização do município de Jaguari. Fonte: http://mapaturistico.jaguari.rs.gov.br

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3 ANÁLISE DOS DADOS houve a necessidade de adequar a propriedade ao produto que se queria oferecer. 3.1 Comunidade do Chapadão No início da atividade os empreendedores relataram terem recebido apoio do SEBRAE e da O início da atividade turística na prefeitura municipal através de cursos de capacitação na comunidade do Chapadão ocorreu entre os anos de 1999 e área turística e na formação pessoal. Em relação às 2000. Dentre os motivos que influenciaram os dificuldades encontradas no início, grande parte dos empreendedores a iniciar na atividade, destacam-se a entrevistados relataram o desconhecimento do turismo por continuação das atividades herdadas de seus parte da comunidade e região, a distância do município de antepassados, complementação na renda familiar e o grandes cidades, a falta de divulgação e problemas incentivo recebido por parte do SEBRAE. internos. Porém, alguns empreendedores relataram não Seis dos sete empreendimentos turísticos que terem sentido dificuldades pelo fato do bom embasamento integram a Comunidade do Chapadão possuem menos de teórico recebido, como identifica um dos 30 ha de área total. Em relação a composição do núcleo empreendedores: “[...] a gente teve sempre cursos, a gente familiar, o mesmo varia de uma a sete pessoas, sendo que tem umas 300, 400 horas de cursos, então a gente foi em três empreendimentos é composto por quatro pessoas. aprendendo né, eu não tive dificuldade nenhuma” A atividade turística pode proporcionar benefícios (ECC4). para a comunidade, dentre eles destaca-se a geração de Na visão dos empreendedores a atividade turística empregos temporários e permanentes. De acordo com na região varia entre precária e boa, possuindo potencial, Barrera (2000, p. 197): “todos os estabelecimentos que mas que este não é bem aproveitado: “Eu vejo que tem começam a operar no turismo rural incorporam mão-de- muito bom produto, tem muita coisa boa pra se mostrar, obra, tanto de forma direta como indireta, e nesse sentido só eu não sei se falta divulgação se falta apoio de quem a atividade tem um importante efeito de enraizamento”. poderia apoiar” (ECC6). Todos os sete empreendimentos contratam mão de Para os entrevistados a atividade turística contribui obra temporária, totalizando 22 postos de trabalho nessa de forma significativa no desenvolvimento da condição, variando de um a um máximo de 10. comunidade através da melhoria do nível de vida, Entretanto, apenas um dos empreendimentos contrata mão financeiramente e na organização dos grupos de obra permanente. comunitários: “[...] contribui na conscientização do A atividade turística no espaço rural surge na pessoal e até mesmo no desenvolvimento, porque mesmo maioria das vezes como atividade complementar as outras quem está fora, quem não faz parte, arrumou sua atividades. De acordo com Elesbão (2009, p. 307), “entre propriedade, estão usufruindo as... aproveitando das os motivos do surgimento das atividades turísticas no oportunidades” (ECC6). espaço rural está à dificuldade enfrentada pelas famílias De acordo com Schneider e Fialho (2000, p. 35) a rurais em suas atividades primárias”. Assim, muitos relação entre empreendedores e a comunidade originada estabelecimentos mantém suas atividades paralelas. pelo consumo de produtos por parte dos visitantes é uma Quatro dos sete estabelecimentos pesquisados possuem potencialidade do turismo no espaço rural, pois cria alguma pessoa exercendo outra atividade fora do “mercado de consumo local para os produtos de origem estabelecimento. agrícola, oferecendo uma alternativa para complementar a Na maioria das propriedades tem-se como renda das famílias rurais”. principal atividade econômica a produção de uva, seguida Em relação ao apoio de órgãos público/privados os da atividade turística e do gado de corte. O turismo surge empreendedores relatam não receber nenhum tipo de como complemento às atividades agropecuárias já apoio, principalmente da prefeitura, mas que também não existentes. Segundo Elesbão (2009, p. 307), “a se é cobrado este apoio: “[...] tá meio parado agora, apoio diversificação das atividades nas propriedades é um até que se teria da prefeitura se fosse lá cobrar teria, mas desafio que se apresenta às famílias rurais, aos não está sendo buscado nada” (ECC2). extensionistas e a todos que desejam e trabalham pelo O produto a ser comercializado necessita que sua desenvolvimento das áreas rurais”. Nos empreendimentos imagem divulgada seja atrativa aos olhos de quem vê. pesquisados destacam-se como atividades secundárias os Para Bignami (2002, p. 13) a imagem de determinado derivados da uva e o turismo. produto turístico pode ser associada a “um conjunto de Nos empreendimentos da comunidade do percepções a respeito de algo, à uma representação de um Chapadão são oferecidos como produtos turísticos os objeto, ou seja, à uma projeção futura, à uma lembrança passeios de reboque, comercialização de produtos ou recordação passada”. Em relação à divulgação da rota, coloniais, camping, atividades culturais e educativas, os empreendedores relataram ser feita por meio de visitação e observação de um mirante (paisagem com jornais, folders, boca-a-boca, pela agência de turismo e vista da cidade). individualmente através de redes sociais na internet. Em relação aos investimentos realizados para Quando confrontados com a questão referente às receber os turistas foram destacadas melhorias em perspectivas de crescimento da rota, os entrevistados estruturas já existentes, sendo que em uma propriedade os mostraram-se desanimados, pois “a rota está numa fase investimentos foram considerados significativos, pois

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meio acomodada, mas acho que deve ter perspectivas de pedra de areia e no Alambique da Família Bolzan eram fluir” (ECC1). oferecidos derivados da cachaça. Dentre os fatores que motivam os demais A atividade turística começou por volta do ano de empreendedores a continuar na rota foram citados o fato 1998 com reuniões promovidas pela prefeitura a estes da atividade ser mais comercial que turística, acreditar e agricultores mostrando-lhes a importância e os benefícios gostar de trabalhar com o turismo: “[...] eu digo assim que que a atividade turística poderia lhes oferecer, sendo este o turista ele vindo aqui querendo conhecer o nosso o principal motivo de iniciarem com a atividade: “O que trabalho já é um motivo muito grande” (ECC7). motivou foi o pessoal da prefeitura que veio aqui falar Os entrevistados afirmaram que a atividade com a gente, participar né e a gente tinha casa que dava, turística propiciou aspectos positivos para a família que tinha estrutura pra isso e a gente começou a ir a através da melhoria da qualidade de vida, nas trocas de reuniões e a gente começou a participar” (CFF3). experiências e como mais uma fonte de renda. Os entrevistados afirmaram terem feito poucos O fato do turismo na comunidade da Fontana investimentos para receber os turistas, tendo apenas Freda não ter dado certo foi apontado como sendo o reformado algumas estruturas já existentes. No início da desânimo dos empreendedores, por serem as duas atividade os entrevistados relataram terem recebido muito comunidades muito distantes, a falta de interesse dos apoio e incentivo da prefeitura municipal e do SEBRAE, empreendedores, falta de incentivos do poder público e a por meio de reuniões e cursos. As principais dificuldades falta de turistas, como pode ser percebido na fala do no início da atividade foram a falta de recursos humanos e empreendedor: “Acho que porque eles ficaram sozinhos o acesso que era muito precário. né, ficou muito longe, distante, aí a agência oferecia os Quando confrontados com a questão da visão do roteiros, aí tu escolhe qual que queria ir, aí o pessoal via a turismo na região os entrevistados relataram que a distância e preferiam ficar numa parte só né” (ECC4). atividade é muito fraca quando comparada com outras Com o abandono da comunidade da Fontana Freda regiões, como identificado: “[...] eu acho que não é aqui o a comunidade do Chapadão ficou desmotivada, embora lugar do turismo não se tem muita coisa pra... até que tem ainda sejam realizadas reuniões periodicamente, poucos a natureza, tem muita coisa, tem as grutas, tem essas empreendedores participam. coisas, mas hoje se tu pega as pessoas e ver elas tão indo tudo pra praia, para o litoral, ninguém fica aqui [...]” 3.2 Comunidade da Fontana Freda (CFF1). Para os entrevistados a atividade turística A comunidade da Fontana Freda encontra-se contribuiu no desenvolvimento da comunidade através da aproximadamente a 10 km da sede do município, seu troca de ideias e culturas, na divulgação enquanto a rota acesso é por uma estrada não pavimentada em estado funcionava, mas para um entrevistado esta contribuição precário. Nesta comunidade encontram-se os três não se refere a melhorias financeiras. estabelecimentos que faziam parte da Rota Turística Quando confrontados com a questão se “a “Nostra Colônia”. Dentre esses estabelecimentos, os atividade turística foi positiva ou negativa” relataram ser empreendedores que deram início as atividades turísticas positiva, no conhecimento adquirido, como pode ser nem todos se encontram ainda no local, um mudou para observado na fala do entrevistado: “sempre é boa, a cidade, outros faleceram, permanecendo em apenas um experiência, sempre aprende alguma coisa né, da pra se empreendimento os mesmos empreendedores, nos demais dizer que foi boa, se conheceu muita gente, divulgou o permanecem familiares dos mesmos, que participavam de trabalho naquele tempo né, embora fosse pouco, mas forma indireta na atividade. As propriedades rurais variam sempre é boa se aprende muito [...]” (CFF1). entre sete a quarenta e cinco hectares. Dentre os motivos que influenciaram os Os estabelecimentos possuem seu núcleo familiar empreendedores a abandonar a Rota, foram citados a falta composto de quatro a seis pessoas. Para Abramovay de incentivos da prefeitura e a falta de recursos humanos (1992) a organização familiar está vinculada a estrutura para gerir a atividade. Para os entrevistados a decisão de da própria família, da capacidade de se adaptar e abandonar a rota foi uma decisão em conjunto com os desenvolver um comportamento adequado perante a demais empreendedores que faziam parte da comunidade, sociedade e ao meio econômico. sendo decidida quando eram realizadas as reuniões do Como atividade principal realizada nas grupo: “ah mais ou menos foi tudo meio em conjunto né, propriedades a agricultura foi citada em dois dos três então começou a meio parar e o pessoal já não tinha mais empreendimentos, sendo em um empreendimento citado o aquele roteiro completo pra fazer, então um pouquinho de artesanato em pedra de areia. As atividades secundárias cada lado” (CFF3). variam entre a criação de gado, criação de chinchila e a Para os entrevistados a experiência turística produção de cachaça. propiciou aspectos positivos em relação à família na troca Os produtores da comunidade da Fontana Freda de ideias e contato com mais pessoas. Em relação ao que ofereciam produtos diferenciados. Na Casa das Massas motiva os empreendedores da comunidade do Chapadão a era oferecido café colonial, nas Esculpedras havia permanecer na rota os entrevistados apontaram o acesso visitação e comercialização de pequenas esculturas em asfaltado, proximidade da rodovia, por ser um grupo

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maior e receberem maior apoio e assistência por parte do efeitos, seu sucesso ou fracasso depende da realidade de poder público. cada localidade e do fluxo de visitantes.

4 CONCLUSÕES REFERÊNCIAS

As mudanças observadas no espaço rural ABRAMOVAY, R. Paradigmas do capitalismo agrário necessitam de políticas estratégicas bem definidas. Entre em questão. São Paulo: Hucitec, 1992. as alternativas está o desenvolvimento da atividade turística que surge como uma estratégia na busca do BAHL, M. Viagens e roteiros turísticos. Curitiba: desenvolvimento local. O turismo no espaço rural se Protexto, 2004. constitui como uma das atividades para as famílias rurais, podendo contribuir na melhoria do nível de vida dessas BARRERA, E. Situação do turismo rural na Argentina. famílias. In: ALMEIDA, J. A.; FROEHLICH, J. M.; RIEDL, M. No município de Jaguari a atividade turística (Org.). Turismo rural e desenvolvimento sustentável. surgiu como aporte ao desenvolvimento das comunidades : Papirus, 2000. p. 181-208. (Turismo). rurais, sendo que os atores envolvidos apostavam em uma atividade que complementasse a renda e divulgasse as BIGNAMI, R. A imagem do Brasil no Turismo: comunidades, porém ela é vista como deficiente em toda a construção, desafios e vantagens competitivas. São Paulo: região. Aleph, 2002. A falta de apoio e incentivos por parte principalmente do poder público teve reflexos DENCKER, A. F. M. Método e técnicas de pesquisa em significativos na manutenção da atividade turística, o que turismo. São Paulo: Futura, 1998. acarretou o abandono de uma comunidade da Rota. Há necessidades de políticas municipais voltadas a atividade ELESBÃO, I. Os efeitos do turismo no espaço rural na turística, para que as trocas de governos não afetem a geração de renda e emprego: o caso de São Martinho atividade. Apesar disso, a atividade turística contribui no (SC). Organizações Rurais & Agroindustriais, Lavras, desenvolvimento da comunidade, na melhoria na v.11, n.2, p. 305-318, 2009. qualidade de vida e na organização. Para que a atividade turística desencadeie todo seu ______. Turismo rural em São Martinho (SC): uma efeito multiplicador é necessário haver fluxo de turistas, o abordagem do desenvolvimento em nível municipal. que não estava mais acontecendo com as duas 2001. Dissertação (Mestrado em Extensão Rural) – comunidades que se apresentam muito distantes uma da Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria. outra. Enquanto uma comunidade possibilitava o acesso pela via asfaltada, a outra possuía acesso não IBGE - INSTITUTO BRASILEIRO DE PESQUISAS E pavimentado em estado precário. ESTATÍSTICA, 2010. IBGE cidades@Jaguari – Censo Há motivos que levaram empreendedores a Demográfico, 2010. abandonar a atividade turística, dentre eles se destacam principalmente a falta de incentivos públicos, a MOLETTA, V. F., GOIDANICH, K. L. Turismo Rural. dificuldade de acesso e a falta de visitantes. De outro Porto Alegre: SEBRAE/RS, 1999. lado, existem fatores que influenciam os empreendedores a continuar na atividade, como a geração de empregos PEDRON, F. de A. Planejamento do Turismo em Áreas temporários e permanentes, complemento na renda Rurais: Estudo do Roteiro Nostra Colônia - Jaguari-RS, familiar e o gostar de trabalhar com a atividade turística. 2007. Dissertação (Mestrado em Extensão Rural) – A organização de um produto turístico deve levar Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria. em conta todo o processo de planejamento inicial, para atingir determinado público. O que se pode concluir é que SCHNEIDER, S.; FIALHO, M. A. V. Atividades não a Rota “Nostra Colônia” não teve foco em determinado agrícolas e turismo rural no Rio Grande do Sul. In: público e não houve pesquisa de demanda. Assim, se ALMEIDA, J. A.; RIEDL, M. (Org.). Turismo rural: formaram atrativos em duas comunidades muito distantes ecologia, lazer e desenvolvimento. Bauru: EDUSC, 2000. descaracterizando o produto em si e causando p. 15-50. consequentemente a estagnação da atividade turística. A continuidade das atividades da Rota “Nostra Colônia” vai SOUZA, M., ELESBÃO, I. A introdução de uma depender de esforços dos empreendedores envolvidos e inovação social entre agricultores familiares: o turismo de ações desenvolvidas pelo poder público para que a rural em dois roteiros do estado do Rio Grande do Sul, mesma organize seu produto estabelecendo o que se quer Brasil. In: MORENO, L.; SANCHEZ, M. M.; SIMÕES, oferecer, de que forma e o público alvo. O. (Org.). Cultura, Inovação e Território: o O turismo no espaço rural pode contribuir no Agroalimentar e o Rural. Lisboa: SPER – Sociedade desenvolvimento da comunidade envolvida, mas é Portuguesa de Estudos Rurais, 2009. p. 197-204. indispensável ter cuidado com a magnitude de seus

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DESENVOLVIMENTO LOCAL E TURISMO: REFLEXÕES ACERCA DAS POTENCIALIDADES DO ESPAÇO RURAL DO ASSENTAMENTO GLEBA XV DE NOVEMBRO

OLIVIA ALVES DE ALMEIDA¹ PATRÍCIA ALVES RAMIRO²

Universidade Estadual Paulista - Unesp Campus de Rosana ¹ Graduada em Turismo – Unesp Rosana [email protected] ² Docente do Curso de Turismo - Unesp Rosana [email protected]

RESUMO - O presente artigo traz os resultados da pesquisa que se propôs a identificar e analisar as alternativas não agrícolas de geração de renda adotadas pelos assentados rurais da Gleba XV de Novembro, assentamento localizado no município de Rosana/SP, no do Paranapanema, região marcada por questões fundiárias. Considerando as mudanças que vêm ocorrendo no meio rural, as atividades não agrícolas surgem como uma oportunidade de renda complementar. Utilizamos como metodologia a aplicação de questionários e entrevistas baseadas em técnicas de história oral. Destacam-se as ações solidárias para produção e comercialização dos produtos não agrícolas, bem como as práticas que agregam valor material e simbólico à vida dos assentados. As principais atividades identificadas foram: produção e venda de pães e biscoitos; comércios como bares e mercearias; e prestação de serviços como borracharias. As alternativas não agrícolas demonstram potenciais não apenas no aspecto econômico, mas sociocultural, pois promovem a cooperação nas associações identificadas, colaboram para o fortalecimento da mulher na sociedade e incentivam a busca por melhorias na situação cotidiana dos assentamentos rurais. Além disso, surgem como potencial para inserção na proposta de desenvolvimento turístico do município de Rosana/SP.

Palavras chave: Assentamentos Rurais, Alternativas Não Agrícolas, Geração de renda, Turismo.

ABSTRACT - This article presents the results of research that proposed to identify and analyze non agricultural alternatives for income generation adopted by rural settlers of Gleba XV de Novembro, settlement located in the city of Rosana/SP, in Pontal do Paranapanema, region marked by land issues. Considering the changes taking place in rural areas, non agricultural activities arise as an opportunity to supplement income. We use in the methodology questionnaires and interviews based on oral history techniques. Stand out solidarity actions for the production and marketing of non agricultural products and practices that add value to the symbolic and material life of the settlers. The main activities identified are: production and sale of bread and biscuits; businesses like bars and grocery stores, and service like tire repair. The non agricultural alternatives show potential not only in the economic but sociocultural as promote cooperation in the identified associations, collaborating for women empowerment in society and encourage the search for improvements in the everyday situation of rural settlements. Furthermore, emerge as potential for inserting in the proposal for tourism development in the city of Rosana/SP.

Key words: Rural Settlements, Non Agricultural Alternatives, Income Generation, Tourism.

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1 INTRODUÇÃO Dentre tantas observações identificadas neste novo panorama, pode-se evidenciar a insuficiência da Após o rápido crescimento turístico global, a atividade agrícola como única provedora de renda para os percepção de impactos negativos, tanto do ponto de vista assentados. Assim, visto que geração de renda é item ambiental, como também sociocultural, tem gerado novas indispensável para a manutenção das pessoas no campo, mentalidades que aparecem em busca de soluções para as atividades não agrícolas surgem como uma redução destes efeitos. Podemos afirmar que alguns possibilidade de complementar os rendimentos empreendedores da área, representantes de órgãos provenientes das atividades agropecuárias. (GRAZIANO públicos, sociedade civil e turistas começam a repensar o DA SILVA, 1999). turismo como um setor capaz de atuar através dos O ponto principal do trabalho1 realizado foi a preceitos da sustentabilidade e da responsabilidade social. identificação e análise das alternativas não agrícolas de Neste trabalho pretendemos dar enfoque a uma geração de renda adotadas pelos assentados rurais do destas questões. Trata-se do envolvimento, direto ou assentamento Gleba XV de Novembro, localizado no indireto, da comunidade receptora, visando uma município de Rosana/SP. Demos destaque à adoção das distribuição mais equitativa dos recursos gerados a nível alternativas não agrícolas compreendidas como forma de local e capaz de valorizar o meio ambiente e a cultura garantia de manutenção destes espaços como local de local. Envolvimento que não se restringe apenas a moradia e trabalho. consultar os habitantes, mas sim, na busca de uma Sendo assim, no contexto da pluriatividade participação efetiva quer junto ao processo de privilegiamos aquelas que são praticadas no espaço rural inventariação do patrimônio imaterial e material, quer na do assentamento, mais precisamente dentro dos lotes. tomada de decisões referentes às estratégias turísticas a Neste artigo, traremos também com maior ênfase da serem valorizadas no município. participação da mulher nestas atividades. Para realizarmos essa discussão partimos de Para tal, adotamos como metodologia de pesquisa empírica realizada no assentamento Gleba XV pesquisa, além da pesquisa bibliográfica, a pesquisa de de Novembro. Assentamento mais antigo da região do campo. Para isso foram utilizadas técnicas quantitativas - Pontal do Paranapanema, oeste do Estado de São Paulo, representadas pelo questionário, com o intuito de município de Rosana. identificar o perfil sociocultural das famílias - e Rosana é uma pequena cidade de pouco mais de qualitativas - representadas pela realização de entrevistas 20.000 habitantes, tendo no encontro dos rios Paraná e baseadas em técnicas da história oral. Neste contexto da Paranapanema certo potencial turístico, além de conter o questão de terras na região do Pontal do Paranapanema, Distrito de Primavera, local pré-planejado pela temos a Gleba XV de Novembro como grande destaque Companhia Energética de São Paulo (CESP) para no que se refere aos assentamentos rurais, principalmente construção das Usinas Hidrelétrica de Rosana e por ser este o primeiro assentamento da reforma agrária Engenheiro Sérgio Motta. na região. Tendo atraído muitos trabalhadores para o local O movimento social que resultaria no na década 1970, ao fim das obras, muitos desempregados, assentamento Gleba XV de Novembro iniciou-se em sabendo da existência de terras devolutas em situação 1983, quando se uniram pequenos arrendatários, judicial, decidem organizar o que, anos depois, seria posseiros, ribeirinhos e desempregados da Destilaria somado à chegada do Movimento dos Trabalhadores Alcídia e das hidroelétricas da região para dar início à luta Rurais Sem Terra (MST) ao Estado de São Paulo. pela terra. Partimos da hipótese inicial que, no município Neste mesmo ano foram ocupadas as fazendas Rosana, a Gleba XV de Novembro, deva ser considerada Rosanela e Tucano, no município vizinho, Euclides da ao se pensar o desenvolvimento da atividade turística, Cunha Paulista2, no dia 15 de novembro, marco para os afinal carrega grande parte da história da construção participantes. Já no dia 23, as famílias foram expulsas social local e possui saberes que devem ser valorizados. dessas terras, e formaram os acampamentos XV e XVI de Previamente, é possível destacar como potenciais novembro, às margens da rodovia SP-613. Apenas em dos assentamentos rurais os produtos agrícolas e não março de 1984 uma área foi desapropriada, assentando agrícolas, a beleza cênica rural, a identidade, história e modo de vida dos assentados. Portanto, para pensar a 1 O presente artigo é derivado da pesquisa científica inclusão de pessoas e espaços na atividade turística, é “Estratégias não-agrícolas de geração de renda nos importante considerar uma série de fatores, dentre eles o assentamentos rurais de Rosana-SP”, aprovada e financiada panorama das questões referentes às transformações no pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – mundo rural brasileiro. FAPESP (Processo Nº 2011/20477-0) realizada por Olívia Alves Deste modo, no que se refere às discussões de Almeida. Pesquisa inserida em projeto mais amplo, acerca dos assentamentos rurais, temos como ponto-chave Estratégias rurais não agrícolas em assentamentos rurais na a questão das mudanças que vem ocorrendo no meio região de fronteira entre MS e SP, financiado pelo CNPq, coordenado por Patrícia Alves Ramiro. rural, o que se tem chamado de “nova ruralidade” (cf.

GRAZIANO DA SILVA, 1999). 2 Naquela época tanto Rosana quanto Euclides da Cunha Paulista faziam parte da comarca de Teodoro Sampaio.

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446 famílias dos acampamentos XV e XVI de novembro, aumentando o envolvimento das comunidades pelo então chamado “Projeto de valorização do Pontal anfitriãs com o turismo, com a preocupação premente de beneficiar o local; gleba XV de Novembro”. desenvolvendo exemplos de gestão turística Em 1986, a Companhia Energética do Estado de comunitária no planejamento, e nas tomadas São Paulo (CESP) realizou o Reassentamento Rosana, de decisões sobre o turismo no lugar, como medida de ressarcimento dos impactos das considerando as necessidades locais, as expectativas dos residentes e dos visitantes. barragens, mas na realidade se preocupando em equilibrar o conflito no assentamento gleba XV de Novembro, É preciso lembrar que, ainda que a presente devido ao fato de a área desapropriada não ter sido pesquisa se baseie nas questões relativas ao não agrícola, suficiente para as famílias que lutavam naquele contexto ao se pensar no turismo local é extremamente importante (BORGES, 2010). buscar a inserção dos produtos agrícolas existentes no Assim, mostra-se importante a proposta de município, e no caso de Rosana, os assentamentos rurais trabalhar a história oral no contexto do assentamento são muito representativos neste quesito. Gleba XV de Novembro para que, além das informações Esta inclusão é necessária especialmente se sobre as alternativas não agrícolas de geração de renda, se considerarmos a ideia de arranjos produtivos locais, que conheça a história e a situação atual das pessoas segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e envolvidas, até mesmo como uma forma de recuperar as Comércio Exterior (2012, s/p): memórias, visto que “além da questão identitária, a recuperação da memória leva ao conhecimento do [...] são aglomerações de empresas, patrimônio e este, à sua valorização por parte dos próprios localizadas em um mesmo território, que habitantes do local” (BARRETTO, 2000, p. 47). apresentam especialização produtiva e Além da valorização do patrimônio, detectamos mantêm vínculos de articulação, interação, cooperação e aprendizagem entre si e com a valorização simbólica do papel feminino, especialmente outros atores locais, tais como: governo, em relação à sua participação nas atividades não agrícolas associações empresariais, instituições de de geração de renda e em outros contextos do âmbito crédito, ensino e pesquisa. público, antes permeado em maior parte pelos homens. Assim, é importante identificar todas as 2 ASSENTAMENTOS RURAIS, PRODUÇÃO E atividades e atores sociais que possam colaborar para o TURISMO bom funcionamento deste arranjo. Além disso, temos a preocupação crescente da população com a aquisição de A proposta de conhecer a situação dos produtos alimentos que, além de qualidade, higiene e outras não agrícolas encontrados na Gleba XV de Novembro exigências já existentes, passou a valorizar produtos de surge também no momento em que se pensa o procedência segura, que venham de processos desenvolvimento do turismo no município de Rosana. responsáveis para com as pessoas e o meio ambiente. É o 3 Assim, para se pensar a inclusão de pessoas e produtos na que se tem chamado de “Slow Food” , seguindo a atividade turística de um local, é de suma importância que filosofia do “bom, limpo e justo”. se considere uma série de fatores, e um deles é o Neste sentido, consideramos a proposta de patrimônio. Assim: pesquisa extremamente importante quando se deseja planejar e promover um turismo diferenciado, que preze pela responsabilidade social e pela sustentabilidade em Cabe ao planejador de turismo a intervenção consciente e profissional para que o todos os sentidos. Aderimos às seguintes considerações patrimônio, as tradições – o legado cultural acerca do desenvolvimento sustentável: todo – possam ser transformados séria e conscientemente num produto turístico de O desenvolvimento sustentável de uma qualidade, bom para ser usufruído também localidade requer crescimento econômico, pela comunidade local (BARRETTO, 2000, acompanhado de uma distribuição equilibrada p. 75). da renda e da devida proteção dos recursos naturais – base das suas potencialidades –, Em contraponto à economia globalizada e às com vistas a assegurar uma qualidade de vida adequada tanto para as atuais como para as formas de turismo derivadas desta concepção (formas que futuras gerações. Esse processo se viabiliza geralmente são excludentes e pouco preocupadas com o com a participação efetiva da sociedade tanto social, privilegiando o aspecto econômico) surgem novas nas atividades de planejamento como nas de lógicas para o desenvolvimento da atividade turística. Segundo Coriolano (2006, p. 47): 3 O Slow Food é uma associação internacional sem fins [...] emerge um novo conceito de lucrativos, fundada em 1989 como resposta aos efeitos administração turística, e de comunidade padronizantes do fast food; ao ritmo frenético da vida atual; ao turística, reelaboradas na concepção do desaparecimento das tradições culinárias regionais; ao conceito de desenvolvimento social, decrescente interesse das pessoas na sua alimentação, na procurando inclusão positiva dos moradores procedência e sabor dos alimentos e em como nossa escolha locais em todo processo de produção, alimentar pode afetar o mundo (SLOW FOOD BRASIL, 2012).

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gestão das atividades para o desenvolvimento processo, especialmente quando se almeja desenvolver o (BARRETTO, 2005, p. 56). turismo de forma planejada e organizada. No processo de inventariação “deve-se proceder No que se refere ao turismo não é diferente: tudo ao registro de recursos naturais e culturais, instalações deve ser devidamente planejado seguindo estes preceitos. turísticas, meios de hospedagem, rede de alimentação, Portanto, a busca da promoção do chamado “turismo rede de diversão e outras, e analisar seu estado.” responsável” exige que seja feito um planejamento (BARRETTO, 2005, p. 74). Dentro desta proposta de responsável. Conforme nos mostra Barretto (2005), o inventário, acreditamos que a Gleba XV de Novembro e planejamento responsável deve atentar-se para o aumento suas atividades não agrícolas tenham muito a oferecer, do índice de desenvolvimento humano e da qualidade de principalmente no que se refere a recursos culturais, vida da comunidade receptora e ao mesmo tempo atender alimentação e lazer. às expectativas dos turistas com ética. Para que isso seja Considerando a importância do envolvimento da possível: comunidade e a inserção de produtos locais na atividade turística, acreditamos que a pesquisa em questão possa [...] os membros da sociedade receptora devem ser não apenas consultados, mas colaborar por meio deste levantamento, para fornecer um comprometidos com o projeto, para trabalhar panorama da situação das atividades não agrícolas no junto com os planejadores e usufruir assentamento Gleba XV de Novembro - o maior plenamente dos benefícios, assumindo suas assentamento rural de Rosana e da região - para que se responsabilidades. (BARRETTO, 2005, p. 93). pensem, considerando a realidade observada, formas de inserir a população rural e, especialmente, seus produtos Deve-se sempre considerar também as não agrícolas em propostas para o desenvolvimento particularidades de cada local em que se pretende turístico do município, buscando sempre aliar os aspectos implantar o turismo, já que seus impactos são muito econômico, social, cultural e ambiental, para que se possa variáveis: de fato promover um turismo responsável, que se converta em benefícios para todos os envolvidos. Estudos recentes mostram que o turismo apresenta efeitos econômicos, sociais, 3 ALTERNATIVAS NÃO AGRÍCOLAS NA GLEBA culturais e ambientais múltiplos, e que não XV DE NOVEMBRO devemos assumir que seus resultados sejam equivalentes em todas as partes e igualmente para todas as pessoas envolvidas. É evidente Foram identificadas, com o apoio dos técnicos que ocorrem implicações de desigualdade em agrários de campo da Fundação Instituto de Terras do termos de distribuição de benefícios e de Estado de São Paulo (ITESP), 18 (dezoito) famílias que custos, apesar de toda grandiosidade que a atividade propicia. Agentes, estudiosos e desenvolvem atividades não agrícolas de geração de profissionais do turismo de hoje devem estar renda, sendo que, destas, 10 (dez) estão articuladas conscientes para cada um dos principais através de associações formais de mulheres. impactos positivos ou negativos que a Destacam-se as atividades relacionadas à indústria do turismo pode gerar (LAGE; MILONE, 2000, p. 117-118). produção e venda de pães e similares (biscoitos doces e salgados), comércios, como bares e mercearias e Deste modo, destaca-se novamente a importância prestação de serviços, como borracharia e salão de beleza. do profissional de turismo para o planejamento turístico Importante ressaltar que a opção por uma ou voltado para a promoção de uma atividade que gere outras das alternativas apresenta forte relação com a benefícios em diversos outros sentidos além do questão de gênero, quando são produtos alimentares que econômico. são comercializados, e também são determinadas pela No sentido prático, é preciso pensar que para posição geográfica do lote de quem a pratica. Ou seja, no qualquer análise de viabilidade turística (e nesse caso, a caso de comércio e/ou prestação de serviços estes proposta de um turismo responsável, que inclua a apareceram como uma oportunidade para aqueles que comunidade e promova o desenvolvimento local), é possuem seus lotes à beira da estrada. necessário fazer a inventariação dos potenciais atrativos. Cabe destacar que o assentamento encontra-se na É uma parte disso que pretendemos apresentar rodovia que segue em direção à fronteira do Estado de como resultado de nossa pesquisa de campo, mostrando o São Paulo com o Mato Grosso do Sul e o Paraná, que os assentamentos rurais têm a oferecer além dos ampliando assim, a possível clientela para além do espaço produtos agrícolas, normalmente mais lembrados. social da Gleba XV de Novembro. Segundo Barretto (2005), há diversos modelos de Observamos também a relevância de ações inventariação turística, sendo que o de Boullón é um dos solidárias para produção e comercialização de alguns mais conhecidos. Os trabalhos de Braga (2007), de produtos. Tais práticas demonstram agregar valor material Stigliano e Cézar (2005) e de Salles (2003) também e simbólico à vida dos assentados e a descoberta de novas trazem aspectos importantes no que se refere ao opções de geração de renda não agrícola. planejamento turístico e a importância do inventário neste Doravante, a pesquisa proporcionou o levantamento e análise não só das alternativas não

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agrícolas em si, mas da questão do surgimento destas atividades dentre as famílias pesquisadas. Pudemos, portanto, observar que a maioria das famílias passou a adotar estas estratégias como forma de complementar a renda proveniente da agricultura. Isso caracteriza-se, conforme Schneider (2004; 2009; 2011), como pluriatividade, já que são executadas atividades agrícolas e não agrícolas. Entretanto, há casos em que a família optou por ter apenas a outra atividade, desistindo do trabalho agrícola. Como exemplo de família pluriativa, temos a família de Vanda e Valdir. Ele possui uma oficina de solda no lote e ela participa de uma associação, mas continuam desenvolvendo a agricultura e principalmente a pecuária. Segundo seu depoimento, a oficina aparece como complementar e importante para a continuidade da pecuária. Grande parte do lucro de Valdir com a oficina é Figura 2 - Bar e Mercearia de Seu Geraldo no setor 1. investido na produção leiteira do lote. Quanto às ações solidárias temos o exemplo da Organização das Mulheres Unidas do Setor II (OMUS II), que reúne um grupo de mulheres que veem a cooperação como forma de beneficiar a todos. Isso aparece nos depoimentos de Maria José, sobre o início da organização, e de Nice, sobre os benefícios de trabalhar em grupo:

Bom, esse negócio, a história da OMUS ali foi uma luta, a gente tava lutando por, por uma vida melhor, por uma vida mais justa, é... começou logo no início quando nós chegamos aqui, era, a gente num tinha um centro de saúde aqui [...] então a gente tinha que se deslocar daqui, com criança pequena às vezes né, pra pegar o leite, pra consultar, pra tomar vacina [...] aí começou a luta, por coisa melhor pra nóis porque era uma barbaridade né, ninguém tinha direito a nada Maria José, assentada da Gleba XV, 64 [...] ( 4 anos, casada, 2012). Figura 1 - Atividade não agrícola desenvolvida por Valdir no setor 1 - oficina de solda. Eu acho assim quando você passa... você tem sua necessidade, cê sozinha pra conseguir Houve casos também em que a família alguma coisa é difícil, mas quando junta né, aí... é mais fácil pra conquistar então eu acho praticamente abandonou a agricultura e passou a ocupar- assim, a vantagem de ser associado e se somente com a atividade não agrícola, sendo estes participar é a união, lutar pra pra conquistar casos mais comuns entre pessoas idosas, que já não alguma coisa, hoje a pessoa sozinha pra possuem a força e saúde necessárias para o trabalho na conquistar alguma coisa é muito difícil (Nice, assentada da Gleba XV, 52 anos, casada, terra. 2012). Neste caso, dentre as famílias que não mais fariam parte do grupo dos pluriativos, por terem deixado a Em entrevista cedida em 2006 à orientadora da atividade agrícola, temos Seu Geraldo e sua esposa, pesquisa, Profª. Drª. Patrícia Alves Ramiro, D. Nice moradores do setor 1. Atualmente, a principal atividade (assentada da Gleba XV, 52 anos, casada), precursora da do lote consiste num bar e mercearia. associação e hoje presidente da OMUS II, contou um pouco sobre o início da associação:

Nice: O grupo surgiu porque no início a gente tinha muita necessidade e precisava organizar, se unir, pra conquistar as coisas... foi aí que surgiu o grupo da OMUS. [...] Nice: É... no começo tinha muita dificuldade aí saía chamando as companheiras pra ir pra 4 luta. Todas as fotos presentes no trabalho foram tiradas pelas Patrícia: Que dificuldades eram essas? pesquisadoras durante a pesquisa de campo.

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N: Água, saúde... era as maiores dificuldades O foco da produção não agrícola da OMUS II hoje no começo. é a panificação, destinada à comercialização junto à P: Quantas mulheres conseguiu juntar? Onde foi essa primeira reunião? CONAB e à Prefeitura Municipal de Rosana através do N: 37, debaixo de um pé de manga. Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) do Governo [...] Federal. Mas o foco, de modo geral, ainda é a produção P: 37 mulheres? Aí o que você falou pra elas? agrícola, tanto individual (vendem em conjunto para ter Tenta lembrar o que você falava... N: No inicio era mais da água, a gente tava maior representatividade) quanto coletiva, já que estão com pobrema de água, aí a gente ia, corria dando início a uma horta no lote da associação. atrás dos prefeito pra pode ter a água. O grupo também proporciona facilidades para o [...] acesso a diversos cursos, tanto voltados para agricultura e N: Conseguimo... conseguimo a água, conseguimo o posto de saúde que não pecuária quanto para atividades não agrícolas, como funcionava. Então na época o prefeito falava confeitaria, compotas e conservas, derivados de leite, assim que ia centralizar, e nós fizemo uma sabão, entre outros. Estes cursos são oferecidos guerra que era aqui na Santa Marina, que era principalmente pela Fundação ITESP, mas também por metade da greba, aí foi ponhado o posto de saúde aqui... aí... depois tivemo a luta pela... outras instituições como o SEBRAE, por exemplo. o barracão... o barracão não...pela escola, pelo muro da escola que... tava quase igual agora... aí conseguimo. Depois chegou a assistência social que queria trabaiá com a gente daí a gente começou a pensar mais alto, aí veio a ideia de forma a OMUS, a organização das muié.

Segundo D. Nice, as primeiras movimentações ocorreram em 1985, com a luta pela água, mas apenas em 1987, com a chegada da assistência social é que começou a se pensar numa associação mais organizada. A associação foi registrada em 1990, mas apenas em 2000 obtiveram o CNPJ. No meio deste processo, a OMUS II conseguiu um lote para a associação, onde atualmente desenvolvem a atividade não agrícola detectada. Maria José, que também participa da luta e da associação desde o início, contou um pouco sobre o processo para conseguir este lote: Figura 3 - Mulheres da OMUS II com seus produtos não agrícolas – pães doces e salgados. [...] descobrimos que o lote tava desocupado, o dono do lote era um membro do MST, tava aí pelo mundo afora aí né, a família também Outra associação encontrada na Gleba XV foi a tava pra lá com ele, tá abandonado o lote, aí Associação União Feminina Querer é Poder, que reúne Nice falou pra nóis “mulheres, o lote tá mulheres do setor 1. Segundo a presidente atual, Vanda, a desocupado lá, vamo ocupar”, vamo, aí fomo Associação surgiu em 2009. umas quatro ou foi cinco e fomo lá, quando o camarada soube da notícia lá onde ele estava A principal atividade realizada por esta associação ele baixou aqui, chegou aqui falou “ai mas é uma Cavalgada que ocorre anualmente e atrai comitivas cês num...” não, nós invadimos porque, de toda a região. Porém, esta não se caracteriza como segundo o que nós sabemos cê tava querendo alternativa não agrícola de geração de renda, pois não visa vender pra outras pessoas né, que não tinha o direito de de ficar aqui na terra então nóis o lucro. Ainda assim é importante destacá-la como uma como já moramo aqui, já lutamo pra ter então forma de agregar valor simbólico à vida dos assentados, nós vamo ficar com esse lote. Ah, aí num vai pois mantém uma tradição da comunidade rural, além da num vai, vai lá e vem cá, veio ITESP, veio... valorização da mulher, conforme aparece no depoimento num me lembro se veio polícia, mas acho que não, veio só ITESP, combinemos ali né, mas de Vanda: num ficou de mão beijada, aquilo nóis pagamo por ele, num sei quanto né, parece Porque teve a primeira cavalgada das que um mil e quinhentos cruzeiro na época MULHER, do Pontal, que foi organizada parece que era, [...] num me lembro, eu sei pelas MULHER, e foi também assim, que a que nóis pagamos o valor do um mil e cavalgada foi através do meu cunhado, do quinhentos reais ou cruzeiro num sei, pra Valdecir, que chegou ne mim, porque sabia benfeitoria [...] ah e tamo lá até hoje, num sei que eu fazia parte da Associação e começo: o que que vai dar daqui pra frente (Maria “Cês tem que mexê com o turismo, né? Cês José, assentada da Gleba XV, 64 anos, tem um grupo de mulher aí e a coisa mais casada, 2012). interessante é isso, mulher, porque a mulher ela é danada, né? O povo respeita muito e num sei o quê” (Vanda, assentada da Gleba XV, 35 anos, casada, 2012).

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Do próprio assentamento (Vanda, assentada Além da valorização da mulher, pudemos da Gleba XV, 35 anos, casada, 2012). identificar na fala de Vanda, a importância da organização da Cavalgada como algo que venha a valorizar o assentamento e os assentados de modo geral:

Então, essa cavalgada nossa, é a quarta cavalgada, a primeira nos iniciemo no aniversario da Gleba né... E aí agora nóis tamo tentano agita o pessoal, tanto aqui da Gleba XV como o pessoal do Porto Maria. O porquê de fazer essa cavalgada lá: é por causa que lá tem a paisagem do Rio, é um centro, fazê que nem ôtro, bem turístico mesmo, e nóis aqui em cima por tê a Associação, as mulher organizada, que já, que já vai ser a quarta, então resolvemo se ajunta com o pessoal lá de baixo, para que nós possa fazer uma coisa bonita e que o pessoal enxergue melhor os assentado. Porque dentro do assentamento existe muita coisa boa, que dá pra fazê muita coisa, fazê que nem ôtra, o turismo, é... dia de campo, porque tem um lote aí, fazê que nem ôtra, tem muita coisa, a mostrar pro pessoal, e acho que daí também o assentado se sente mais valorizado (Vanda, assentada da Gleba XV, 35 anos, casada, 2012). Figura 4 - Mulheres da Associação União Feminina Assim, foi a participação nesta associação que uniu Querer é Poder produzindo biscoitos. cinco mulheres (Vanda, Cristina, Cida, Maria Josefa e Daniela) num grupo específico que passou, Tanto no sentido da união do grupo quanto dos posteriormente, a desenvolver uma atividade não agrícola cursos, podemos relacionar a situação das associações de geração de renda: a produção de bolachas para encontrada na Gleba XV de Novembro com as comercialização. Vanda nos contou um pouco do início considerações de Menegat (2009), que estudou do grupo e de como elas se organizam para a produção: assentamentos no Mato Grosso do Sul e também pôde observar que: Aí foi aonde eu tirei do curso do derivado de mandioca que a gente teve, aí foi onde nóis [...] o que motiva as mulheres para uma nova começo a fazê os biscoitinho de polvilho organização de grupo, com trabalhos azedo, comecemo aqui na minha cozinha né, coletivos [...], são as dificuldades econômicas num espaço pequeno, as mulher se trombava, que cada uma vivencia no lote. São, muitas vez, fazê que nem ôtra, tinha que sai lá inicialmente, as dificuldades que vivenciam pra fora algumas pra otras fica aqui dentro, que as têm impulsionado a buscarem, né? E aí comecemo num grupinho maior, só novamente, alternativas outras para a que daí, todas ficaro assim, porque, na superação. Nesse sentido, a formação de verdade fica uma coisa esquisita, por mais grupos coletivos, numa maneira ideal para a que eu tô cedeno a cozinha, aí as menina vêm, soma dos esforços, e que envolvem parcerias fazê que nem ôtra, porque não é um ambiente com instituições diversas, dentre elas o próprio pra isso, assim como elas pensa que SEBRAE, as Secretarias das prefeituras e as eu tô incomodada, eu também sinto que elas Universidades (MENEGAT, 2009, p. 226). fica incomodada. Porque é ruim, porque nóis é uma Associação, mas fazê que nem ôtra, nóis não tem o NOSSO lugar, né? E... aí Por outro lado, temos o destaque das iniciativas acabou que desse grupinho, fazê que nem individuais (ou familiares, mas não em associações), ôtra, fomo tentano, tentano, e até aí paro de principalmente no que se refere ao comércio e prestação fazê os biscoito em grupo, ai só fico a de serviços. Foram identificadas 8 (oito) famílias que Cristina fazendo, mas por conta dela mesmo, possuem comércio ou prestam serviços em seus lotes, esse de sal. Aí foi a Angela, conversano com o Itesp, e o Itesp foi deu outro curso pra gente sendo que 5 (cinco) delas têm lotes localizados às que foi das bolachinha. Aí nos fizemo o curso margens da rodovia SP-613. Considerando apenas estes de bolachinha, aí eu falei assim: “Esse nóis últimos, podemos afirmar que todos possuem bares, com num vai dá moleza, nem que tenha que fica duas pessoa, mas que vai, vai!”. E assim nóis intuito principal de venda de bebidas, salgados e outros fizêmo, comecemo com oito mulher e hoje produtos industrializados. Alguns dos depoimentos nóis tá em cinco mulher, aí todas quarta-feira demonstraram que os bares não têm oferecido um nóis faz o biscoitinho de polvilho azedo e faz complemento de renda significativo, como observamos na as bolachinha também que nóis aprendeu fazê. Aí dia de quarta-feira nóis faz os primeira fala, de Santina, e também na segunda fala, de biscoito, dia de quinta-feira é a venda, né? Maria Arlete:

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de renda, como um salão de cabeleireiro no setor 3. Além [...] a renda tava muito pouca, aí eu abri o do benefício para a família, com a geração de renda, barzinho pra pode da uma melhorada, e deu, vemos a atividade como benéfica para a própria no começo deu, agora não, tá fraco né, que agora tem muito bar aberto, então fracasso, e comunidade, que pode ter acesso aos serviços e produtos a turma foi quase tudo embora, os jovem oferecidos por Cláudia. mesmo foi tudo embora trabalhar pra fora, aí fracasso, mas foi muito bom quando abriu (Santina, assentada da Gleba XV, 60 anos, casada, 2012).

[...] eu achava que aqui ia ser um ponto bom pra gente tirar uma boa renda daqui pra ajudar em casa, mas infelizmente até agora já tô com um ano, com ele aberto aí e... e num gira assim não... a coisa... o que eu investi acho que leva muitos ano pra mim tirá (Maria Arlete, assentada da Gleba XV, 49 anos, casada, 2012).

Em alguns destes locais também são oferecidas refeições. No caso de Maria do Carmo, moradora do setor 1, o preparo de refeições é por encomenda, e não há estrutura para as refeições no local. Já Anastácia possui um restaurante, Restaurante Cordeiro, e diariamente oferece refeições (prato feito, marmitex e self-service).

Figura 6 - Nova opção de renda não agrícola - Salão da cabeleireira Cláudia no setor 3.

Tanto nas iniciativas coletivas (associações) quanto nas ações individuais e familiares para geração de renda não agrícola, temos como destaque a participação das mulheres. O gênero enquanto categoria de análise historiográfica é recente, e busca compreensões teóricas acerca de questões que surgem principalmente nas práticas que permeiam alguns movimentos sociais, sobretudo o feminista, que traz a tona debates sobre posturas que muitas vezes são colocadas como “naturais”, mas que denotam discriminação e práticas de dominação Figura 5 - Restaurante Cordeiro, localizado na rodovia e submissão (TEDESCHI, 2009). SP-613, administrado por Anastácia. Especialmente no campo, a questão de gênero

pode ser avaliada como reprodução de uma prática Ainda no lote de Anastácia existem mais dois cultural, ou seja, uma representação, onde homens e estabelecimentos: um bar, gerenciado por seu filho mulheres desempenham seus papéis sociais. De acordo Evandro e uma borracharia, gerenciada por seu filho com Tedeschi (2009): Giovani. Segundo ela, cada um é responsável por seu estabelecimento, ficando com o lucro gerado por ele. As identidades e papéis sociais no mundo Anastácia nos contou também que pretende, em breve, camponês, e também em outros espaços, construir uma pousada, pois o público principal do ocorrem em um contexto de relações de restaurante são caminhoneiros que muitas vezes já ficam poder, de negociações culturais entre os vários atores sociais com expectativas e parados num espaço próximo ao restaurante. identidades diferentes, reproduzindo práticas Quanto à prestação de serviços, foi identificada culturais baseadas em princípios de também no setor 1, na parte interna do assentamento uma desigualdade de gênero (TEDESCHI, 2009, p. oficina de solda, localizada no lote de Valdir, marido de 165) Vanda (presidente da Associação Feminina Querer é Poder). No entanto, podemos observar que o aumento da Na Gleba XV, além dos produtos e serviços já participação feminina em setores antes dominados pelo conhecidos, pudemos identificar novas opções de geração homem tem se mostrado crescente. Especialmente no

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meio rural, vemos que esta participação vem como uma em circulação, é necessário pensar em formas de melhorar grande conquista: as condições atuais, investindo em capacitação voltada para qualidade dos produtos e serviços, para o [...] as conquistas das mulheres do campo atendimento ao cliente, pensando em formas de melhorar foram além de questões relativas à terra, ao as condições dos locais (infraestrutura, organização, salário e à produção, uma vez que em suas discussões incorporaram a categoria gênero, higiene), em formas de indicar adequadamente os locais que passou a compor suas discussões e que (placas), entre outras demandas que possam surgir. propiciou novos elementos de percepção e de questionamentos em relação aos espaços 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS produtivos, sociais, culturais e simbólicos existentes entre homens e mulheres (MENEGAT, 2009, p. 225) Ao pensar a pesquisa de modo geral, podemos destacar a importância da renda não agrícola para diversas Na Gleba XV de Novembro, a participação das famílias assentadas. Mostram-se, na prática cotidiana, as mulheres em associações abre portas para a participação características deste novo rural brasileiro, no qual a da mulher na esfera pública, pois é ela que se relaciona agricultura tem perdido espaço para outras atividades, diretamente com os técnicos agrícolas, é ela que faz as mas ainda se mantém como atividade principal, muitas negociações de venda dos produtos, e também se articula vezes servindo de base para o desenvolvimento de para conquista de direitos sociais como o direito à saúde e atividades não agrícolas dentro dos lotes. a educação junto à esfera pública. Além disso, tanto nas Assim, destacamos as atividades não agrícolas associações, quanto nas produções individuais, muitas enquanto alternativa complementar à renda proveniente conquistam certa independência financeira, mesmo que da agricultura, mostrando-se até, em alguns casos, alguns maridos achem “uma mixaria”. Mas é válido indispensável para o sustento da família, ou até mesmo observar que os esforços têm sido feitos, muitas vezes sendo a principal atividade realizada no lote. agrupados, e ganham força para que a mulher do campo Estas atividades apresentaram também vantagens conquiste seu espaço em diversos âmbitos e de diversas que vão além do aspecto econômico, passando a trazer formas. Concordamos com Menegat quando afirma que: também benefícios socioculturais, uma vez que, em muitos casos, proporciona relações de cooperação, As mulheres assentadas buscam, na prática fortalecendo a união entre os assentados e recuperando cotidiana, de avanços e recuos, de abrir, valores muitas vezes trazidos desde a época do fechar e reabrir portas, as condições para se construírem enquanto mulheres e mulheres acampamento. Também colabora no que se refere ao assentadas e, assim, transformar relações, gênero feminino, pois com essas atividades algumas especialmente aquelas entre homens e mulheres alcançaram independência financeira, passaram mulheres. Questionam papéis na relação com a se destacar em setores antes dominados pelos homens e os homens e com elas mesmas, transformando o que parece impossível, em possível mostraram sua capacidade em diversos sentidos, lutando (MENEGAT, 2009, p. 229) por suas demandas e alcançando seus objetivos. Além disso, observamos que, principalmente no Assim sendo, podemos observar que praticamente caso das associações, há um fortalecimento da luta por todas as atividades não agrícolas detectadas são práticas melhorias na situação geral dos assentamentos rurais. que agregam valor material e/ou simbólico à vida dos Muitas vezes as reuniões com objetivo de fazer os assentados. Em alguns casos prevalece a parte financeira, produtos não agrícolas trazem à tona discussões que vão em outros, de fato, temos atividades que além do além da vontade de ter uma renda melhor para a família, benefício econômico, proporcionam a manutenção ou mas pensam o que poderia ser feito para uma melhora no retomada de práticas simbólicas, de um saber-fazer assentamento, na qualidade de vida dos moradores, entre tipicamente rural, promovendo a (re)definição de outros. identidades sociais, muitas vezes perdidas após a Confirma-se, portanto, a pluriatividade como uma expropriação do campo e situação de pobreza vivida na das possibilidades encontradas pelas famílias para cidade conforme observado por Ramiro (2008), Farias manterem-se no campo, e essas alternativas cotidianas em (2008), entre outros. alguns casos promovem a (re)definição de identidades Portanto, faz-se relevante a observação e discussão sociais. Identidades que se fortalecem por meio da luta das alternativas não agrícolas de geração de renda, não pela terra, da qual muitos assentados participaram juntos, apenas sob o aspecto financeiro, mas como possibilidade pelas lembranças que se tem do passado e projeções de para abertura de novas portas e descoberta de caminhos a futuro, que incluem o desejo de permanência dos filhos no serem percorridos, especialmente para as mulheres que lote, entre outros. cada vez mais lutam pela igualdade de gênero em No que tange à atividade turística, e diversos segmentos. considerando que o espaço rural é extremamente Além disso, é importante atentar para a situação significativo quando pensamos o inventário turístico de dos produtos e serviços que estão sendo oferecidos por Rosana, é importante destacar também as atividades não assentados da Gleba XV de Novembro. De modo geral, agrícolas, e, principalmente, os produtos derivados dela, podemos afirmar que, ainda que muitos destes já estejam como potenciais para inclusão no turismo do município.

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Além do não agrícola, foco da pesquisa, sabe-se de justiça social, de desenvolvimento econômico e de do grande potencial agrícola e cultural dos assentamentos valorização cultural. rurais, o que pode, se planejado e organizado Assim como temos a noção de adequadamente, fazer parte do desenvolvimento turístico, multifuncionalidade da agricultura, podemos pensar a por exemplo, levando ao comércio local produtos multifuncionalidade dos assentamentos rurais, pois tradicionalmente rurais, que transparecem uma identidade mesmo que não sejam completamente pautados em fortemente presente no município sobretudo por conta dos atividades agrícolas, podem (e devem) colaborar com a assentamentos rurais. Assim, o visitante emerge de fato na conservação dos recursos naturais, do patrimônio natural cultura do local que visita, podendo, a partir daí, se e cultural e com a qualidade dos alimentos produzidos e interessar por diversos outros atrativos que o município consumidos. possa oferecer. Esperamos que estas considerações sobre as Importante frisar que não defendemos a alternativas não agrícolas de geração de renda no “turistificação” de todos os espaços, mas sim, a assentamento rural Gleba XV de Novembro possam servir valorização da produção local com seus saberes de alguma forma para que outras pesquisas e até mesmo tradicionais, ainda que seja uma forma de melhorar as para que projetos e ações governamentais possam ofertas gastronômicas no mercado turístico da parte trabalhar dentro das temáticas apresentadas avançando e urbana do município. atentando a questões como, por exemplo, o planejamento Todavia, apesar dos benefícios identificados, de formas de inserção destas famílias e seus produtos observamos que as estratégias não agrícolas ainda não são (agrícolas e não agrícolas) no comércio e turismo do amplamente utilizadas no assentamento Gleba XV de município de Rosana. É relevante também reforçar a Novembro, considerando também sua ampla extensão. importância de analisar e buscar melhorias quanto à Sabemos que não são poucas as dificuldades situação dos produtos (por exemplo: verificando normas encontradas para o desenvolvimento destas e de outras de vigilância sanitária, apresentação dos produtos, entre atividades. Muitas vezes, empecilhos burocráticos, de outros) e analisar as potencialidades para o tempo, de distância, entre diversos outros, atrapalham ou desenvolvimento do turismo dentro dos assentamentos, até mesmo barram quem decide fazer algo diferenciado afinal, é preciso considerar que os assentamentos rurais para tentar melhorar a situação em que se encontra. são parte da dinâmica municipal e que suas histórias, Mas o que temos visto, é que tanto para as cultura e modos de vida devem ser respeitados e atividades não agrícolas, quanto para as agrícolas, ainda valorizados. há certa desatenção para com os assentamentos rurais. Há uma série de dificuldades existentes que não são AGRADECIMENTOS colocadas pelas pessoas, mas pelo próprio ambiente, como a qualidade do solo e a falta de chuvas que tem feito Aos assentados rurais da Gleba XV de Novembro, com que muitas famílias não consigam seguir na que nos abriram suas casas, suas vidas e suas histórias. agricultura. Isso demanda subsídios governamentais, que À orientadora Patrícia pelos direcionamentos e muitas vezes não chegam de maneira adequada. É ensinamentos. importante lembrar que, pode haver também falta de Ao amigo Gabriel Marchioli pela companhia e interesse da própria população assentada, o que dificulta o colaboração nas pesquisas de campo e na vida. surgimento de ações que busquem colaborar positivamente. REFERÊNCIAS Assim, devemos ressaltar que para o desenvolvimento de um espaço e de uma comunidade, BARRETTO, Margarita. Turismo e legado cultural: as não basta vontade e esforços de mão única, são possibilidades do planejamento. 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AGROTURISMO, AGRICULTURA FAMILIAR E PLURIATIVIDADE: UM ESTUDO DE CASO SOBRE AS REGIÕES TURÍSTICAS DAS MONTANHAS CAPIXABAS E DOS IMIGRANTES NO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

MARIANA RODRIGUES PIRES

Secretaria de Estado do Turismo do Espírito Santo – SETUR/ES Gerência de Estudos e Negócios Turísticos – GENTUR [email protected]

RESUMO - Assiste-se, a partir da década de 1990, há uma proliferação de estudos sobre a agricultura familiar, a qual passou a ser vista como um campo de ação de uma agricultura alternativa ao padrão moderno vigente e de desenvolvimento rural. Mais recentemente, destacam-se ainda as potencialidades de se “alavancar” o desenvolvimento rural por meio da prestação de serviços, ressaltando-se o agroturismo, uma vez que a grande diversidade social do rural brasileiro que se associa a sua singularidade natural representaria um imenso potencial para o seu desenvolvimento. Destarte, o objetivo desse artigo é o de discutir o agroturismo, a partir do fenômeno da pluriatividade na agricultura familiar. Buscando compreender como esta atividade se realiza e sua influência no espaço rural, a reflexão centra-se a partir do território espírito-santense, em especial, das regiões turísticas das Montanhas Capixabas e dos Imigrantes, localizadas na região serrana do Estado.

Palavras chave: Agroturismo – Agricultura Familiar – Pluratividade – Espírito Santo

ABSTRACT - From the 1990s, it has been observed an increase in number of studies on family farming, which began to be seen as an alternative to the "current modern standards" of farming and rural development. More recently, several potentialities to "leverage" rural development through the provision of services stand out, among which we highlight the agrotourism, since the great social diversity of Brazilian rural areas, associated with its natural diversity, would represent a huge potential for development. Thus, the aim of this article is to discuss the agritourism, through the phenomenon of pluriactivity in family farming. Trying to understand how this activity takes place and its influence in rural areas, the reflection is situated within the territory of the state of Espírito Santo, specifically in the tourist areas of the Capixabas and the Immigrants Mountains, both located at Região Serrana.

Key words: Agroturism – Familiar Agriculture – Pluriactivity – Espírito Santo

1 INTRODUÇÃO totalidade) dos trabalhos. Como salienta Anjos e Caldas (2012), reconhece-se sua especificidade como forma de Assiste-se, a partir da década de 1990, há uma produção social, que se orienta sob uma lógica de proliferação de estudos sobre a agricultura familiar, a qual funcionamento que visa garantir a reprodução social da passou a ser vista como um campo de ação de uma família e satisfazer as necessidades de consumo de seus agricultura alternativa ao padrão moderno vigente e de membros. desenvolvimento rural. Sua ascensão como ator social Mais recentemente, destacam-se ainda os estudos surge como resultado direto da pressão política exercida que sugerem que o desenvolvimento rural pode ser por movimentos sociais no campo e a intensificação de estimulado pela prestação de serviços, ressaltando-se o suas lutas. agroturismo, uma vez que a grande diversidade social do Analisado enquanto um conceito genérico e que rural brasileiro que se associa ao seu patrimônio natural envolve uma ampla gama de agricultores, a agricultura representaria um imenso potencial para o seu familiar baseia-se na relação entre propriedade, trabalho e desenvolvimento. família que, ao mesmo tempo em que é proprietária dos Nesse sentido, o agroturismo é tido como uma meios de produção, também realiza a maior parte (ou a importante ferramenta para a promoção do

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desenvolvimento rural sustentável e como alternativa para neste contexto diz respeito ao debate em torno do rural, a melhoria da qualidade de vida dos pequenos uma vez que o espaço rural tem passado por notáveis agricultores, inclusive, das áreas rurais marginalizadas, transformações decorrentes de crescentes interações com assumido como requisito fundamental para diminuir o a dinâmica global e com o meio técnico-científico- êxodo rural a partir da geração de emprego e renda. Dá informacional (SANTOS, 1996; CANDIOTTO, 2009). corpo a este empenho, a crescente multiplicação de ações Como ressalta Bergamim (2004), a constituição do de diversas instâncias governamentais de fomento e latifúndio permeou o processo histórico de formação investimento ao advento do agroturismo nas pequenas sócio-espacial brasileiro, em contrapartida, a formação da propriedades familiares. pequena propriedade esbarrou nos limites impostos à sua O incentivo público e privado ao agroturismo e as constituição pela hegemonia do latifúndio. O projeto de novas possibilidades de acumulação desta atividade por desenvolvimento rural adotado ao longo de décadas no meio da transformação dos produtos, paisagens, país teve como objetivo principal a expansão e manifestações culturais, modo de vida e de produção consolidação do agronegócio, tendo alcançado resultados rural, e elementos naturais em mercadorias, levou à positivos, sobretudo, em relação ao aumento da implantação dos mais variados empreendimentos públicos produtividade e à geração de dividas via exportação, mas e privados de turismo no espaço rural. Por conseguinte, os que tem implicado em custos sociais e ambientais novos empreendimentos de turismo no espaço rural vêm crescentes (exclusão social, degradação ambiental, contribuindo para a transformação e densificação técnica dependência tecnológica, êxodo rural, etc.) (MARQUES, do meio rural e, consequentemente, para a 2002). complexificação de objetos, atores e ações no rural Nas décadas de 1970 e 1980, as políticas agrícolas brasileiro (CANDIOTTO, 2011). brasileiras de crédito rural destinavam-se para a produção Diante do exposto, este artigo tem por objetivo de exportação, contemplando os médios e grandes principal discutir o agroturismo a partir do fenômeno produtores, relegando a segundo plano a agricultura pluriatividade na agricultura familiar. Buscando familiar. A principal consequência dessa política foi a compreender como esta atividade se realiza e sua exclusão social e econômica de grande número de influência no espaço rural, a reflexão está centrada a partir agricultores, a pauperização do campo e elevado êxodo do território espírito-santense, em especial, das regiões rural (ALMEIDA; RIEDL, 2000; EMMENDOERFER, turísticas das Montanhas Capixabas e dos Imigrantes. 2006; PHILERENO; SOUZA, 2009). Tomou-se, como base para este estudo, a revisão da É importante considerar que as medidas literatura, bem como a análise das políticas públicas modernizadoras da agricultura, pautadas no padrão de estaduais de turismo. produção (e de vida) urbano-industrial, não atingem com Percebe-se que investimentos em agroturismo é a mesma intensidade e proporção as diferentes categorias uma realidade no Espírito Santo, principalmente, nas de produtores. Os próprios limites do modelo de produção regiões turísticas das Montanhas Capixabas e dos urbano, a partir de década de 1980, têm engendrado Imigrantes, nas quais pequenos proprietários rurais, formas alternativas de reprodução social no campo artesões e demais empreendimentos se organizam por (CARNEIRO, 1998). meio de um circuito turístico e implementam o chamado As dificuldades de sobrevivência exclusivamente “agroturismo” em suas propriedades, a partir do da agricultura, em contraste com a maior distribuição crescimento do turismo receptivo no Estado. espacial das indústrias e outros setores produtivos fora das Entretanto, para se entender a relação entre a cidades, intensificaram o deslocamento e a diversificação agricultura familiar e o agroturismo, é necessário das atividades desempenhadas pelos membros de famílias compreender que esta leitura ultrapassa o mero sentido de de agricultores, tendo como consequência, a ampliação da crescimento econômico para as áreas rurais, a partir a pluriatividade (CANDIOTTO, 2007). Desse modo, o geração de emprego e renda. Isto significa que os fatores espaço rural não se define mais exclusivamente pela explicativos (causas e consequências) desta relação estão, atividade agrícola. de uma forma mais profunda, embasados sobre a De fato, a heterogeneidade das relações sociais no complexificação de objetos, atores e ações no rural campo não pode ser relacionada unicamente à diversidade espírito-santense que trazem consigo consequências das relações sociais agrícolas, logo, a visão de que a área sócio-espaciais que ainda são negligenciadas pelos rural é muito mais que o locus agrícola é uma condição planejadores/promotores do turismo estadual. importante para a definição do rural brasileiro (NOGUEIRA, 2004). Assim, três aspectos são observados 2 O DEBATE SOBRE A AGRICULTURA no espaço rural: a redução de pessoas ocupadas na FAMILIAR E A PLURATIVIDADE agricultura; aumento de residentes do campo exercendo atividades não agrícolas rurais e/ou urbanas e o A dinâmica do espaço geográfico vem tornando-se aparecimento de uma camada relevante de pequenos cada vez mais complexa e mutável, de modo que surgem agricultores que combinam a agricultura com outras novos elementos decorrentes da técnica e da fontes de rendimento. intensificação das relações capitalistas (CANDIOTTO, Esse contexto do rural contemporâneo vem 2007). Um dos aspectos relevantes a ser considerado diversificando ocupações e rendas da população rural,

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levando a implicações socioeconômicas e a mudanças Alentejano (1999) ressalta que quando a espaciais manifestadas nos lugares (unidades familiares, diversificação de atividades no campo surgiu era para outros estabelecimentos rurais, comunidades rurais e atender as necessidades de subsistência das famílias pequenos municípios). O crescimento das atividades e das rurais. Hoje, contudo, isso também acontece, porém tal ocupações não agrícolas no meio rural vem modificando diversificação está vinculada ao mercado e, portanto, aos diversas unidades de produção e vida familiares (UPVF’s) interesses dos agentes hegemônicos do capitalismo e, consequentemente, a dinâmica do espaço rural, por global. O desenvolvimento da pluriatividade, para o autor, meio de novas atividades produtivas e econômicas, significa uma forma de acentuação da exploração relações sociais e de trabalho, bem como de circulação de capitalista que aponta para uma reestruturação produtiva, pessoas e de mercadorias (CANDIOTTO, 2007; 2009). tendo como efeito o aumento da exploração do trabalho e Esse fenômeno, a pluriatividade, ainda que antigo, a ampliação da margem de lucro dos capitalistas. assume novos contornos no campo brasileiro, o que Machado e Casalinho (2010) consideram que o chama a atenção para a possibilidade de novas formas de termo pluriatividade foi forjado no bojo das teorias organização de a produção vir a se desenvolver no meio neoliberais que determinaram a hegemonia das relações rural ou antigas práticas assumirem novos significados. econômicas nos países europeus. A pluriatividade seria Carneiro (1998) salienta que está se presenciando um uma estratégia do capital, em seu processo de movimento de reorientação da capacidade produtiva da acumulação, caso se considere que o espaço rural não tem população rural que se expressa em novas formas de mais a principal função de produzir alimentos por parte organização da atividade agrícola como uma alternativa do segmento da agricultura familiar. A pluriatividade ao êxodo rural, ao desemprego e ao padrão de separaria a produção da reprodução e aproxima a família desenvolvimento agrícola dominante. Assim, a rural, cada vez mais, da proletarização, cuja tendência é a pluriatividade deve ser entendida como uma alternativa de sua própria destruição enquanto unidade. exploração da agricultura e, consequentemente, como Froehlich (2000) salienta que ao lado da uma possibilidade de reelaboração de identidades sociais. pluralidade de referências para as práticas e Como ressaltam Anjos e Caldas (2012, p.18), a comportamentos que se pode encontrar hoje no rural, pluriatividade, em suas distintas concepções, pode ser também se pode ver imposições exógenas que obrigam os vista como uma das “chaves analíticas ativadas para agricultores familiares a se posicionarem e se adaptarem a decifrar a tenacidade e a plasticidade de uma agricultura novas posições sociais que nem sempre lhe são favoráveis familiar que persiste em meio a um contexto nos jogos de forças sociais. O autor ressalta que muitos permanentemente instável” e, por vezes, adverso. agricultores podem ver tais demandas ou exigências de De forma geral, a pluriatividade encontra-se readaptação como algo que lhes é imposto por associada à agricultura familiar. Apesar de as famílias representações sociais e relações de força exógenas, que rurais trabalharem para a subsistência e de terem certa os tem coagidos a relegar uma história de relação com a autonomia em relação aos mercados, não se pode aceitar a terra. “falsa ideia de que, nesse mundo globalizado, os Na crítica a pluriatividade, Alentejano (1999), agricultores familiares não são influenciados por técnicas, Machado e Casalinho (2010) e Froehlich (2000) normas, objetivos e ações externas” (CANDIOTTO, ressaltam, principalmente, a perda da autonomia dos 2007, p.199). De mesma opinião, Schneider (2003, p. 97) agricultores e de uma dependência dos mercados ressalta que: externos, o que levaria a uma perda de identidade enquanto categoria social e, por consequente, à [...] seria um equívoco imaginar que proletarização. os agricultores familiares sejam Faz-se importante que, no estudo da pluriatividade meros coadjuvantes [...] e que não contribuam para afirmação e na agricultura familiar, não se enxergue o agricultor como significação da pluriatividade [...]. uma categoria social estática e universal, incapaz de Para entender a complexidade das absorver e de acompanhar a dinâmica da sociedade em relações sociais que são engendradas que se insere. Lamarque (1998) ressalta que a agricultura nesse processo, é preciso estudar a pluriatividade a partir do modo como familiar caracteriza-se por apresentar elevada capacidade é exercida pelos próprios agricultores de adaptação às transformações do contexto social e familiares. econômico em que se insere, fato que contribui para a sua permanência e predominância nas relações de trabalho no No debate sobre a pluriatividade, segundo campo. Candiotto (2007), dois pontos de vista são aceitos: têm-se Carneiro (1998) salienta que o agricultor familiar aqueles autores que a defendem como estratégia de pode se adaptar às novas estruturas sociais e econômicas, sobrevivência e reprodução para a agricultura familiar e o que não provoca, necessariamente, a descaracterização aqueles que questionam as benesses das novas atividades de valores, visão de mundo e formas de organização não agrícolas, sobretudo no que tange a maior social definidas em contextos sócio-históricos específicos. dependência aos mercados e a consequente perda de Apesar das imposições externas, registra-se, no entanto, autonomia dos pequenos agricultores. que ainda cabe à família agricultora a decisão de aceitar e

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incorporar a pluriatividade em suas estratégias de reprodução familiar, e na constituição e difusão da sobrevivência (CANDIOTTO, 2007). pequena propriedade rural. Guanziroli (2001) atribui às elites brasileiras A dinâmica da reprodução da agricultura familiar (incluindo os intelectuais) a exacerbação do vínculo entre relacionava-se estreitamente com a subsistência da as atividades não agrícolas e o desenvolvimento rural. unidade familiar, reproduzindo-se de forma bastante Como é de praxe na história do Brasil, os modelos de precária e dependente da produção do café até a década de desenvolvimento são copiados e implantados, sem 1960, sem, contudo, se desdobrar em outras atividades maiores reflexões e adequações à realidade nacional. O econômicas. Naquela década, a crise cafeeira autor não se opõe a pluriatividade, porém ressalta a desestruturou fortemente a reprodução da agricultura necessidade de se apreender as suas particularidades e não familiar, acentuando o êxodo rural, a pauperização do simplesmente adotar teorias prontas para todas as campo e a concentração fundiária. realidades do rural brasileiro. Assim, a redução das Nas décadas subsequentes, inicia-se o processo de desigualdades sociais no campo deve ser combatida por modernização da agropecuária capixaba, cujos impactos meio de uma política de desenvolvimento rural apoiada na culminam na crise da agricultura familiar. Como reflexos produção familiar, o que envolveria o fortalecimento da têm-se a expropriação do trabalhador rural, a redução do agricultura e a adoção de atividades não agrícolas. emprego do trabalho familiar e a expansão da utilização Entre os autores que defendem a pluriatividade, da mão-de-obra assalariada (MARAFON, 1998; citam-se Marsden (1989), Silva (1998) e Schneider BERGAMIM, 2004). Tais reflexos decorrem de múltiplos (2003). Marsden (1989) considera que a pluriatividade fatores, entre os quais se destaca o limitado acesso à tende a se generalizar nas áreas agrícolas, nas quais o educação formal a que tem sido submetida historicamente Estado vem estimulando o desenvolvimento de outras a população rural brasileira e a forma impositiva como atividades, como o turismo e o artesanato. O autor são inseridas as tecnologias no campo, as representações acredita que esse processo conduzirá a revalorização do sociais, as relações de força e as intervenções produzidas espaço rural, em especial, pelo crescimento do em contextos sociais exógenos (FROEHLICH, 2000; movimento ambientalista e dos processos de MARQUES, 2002). descentralização industrial. A estrutura fundiária é uma das expressões dos Silva (1998) toma o agricultor em tempo parcial processos de formação sócio-espacial que, no caso do como o elemento fundamental da nova base social da Espírito Santo, deu origem, em seu quadro agrário, às agricultura familiar moderna, cuja principal característica diferentes regiões. Na região serrana, historicamente, é a pluriatividade, tanto nos ramos urbano-industriais, constituiu-se, difundiu-se e reproduziu-se a pequena como nas novas atividades que se estabelecem no meio propriedade. As regiões extremo norte, litoral norte e sul rural, como o lazer, o turismo, a residência e a são caracterizadas pela grande propriedade e níveis mais conservação da natureza. acentuados de concentração, uma vez que nestas regiões Schneider (2003) também entende a pluriatividade são desenvolvidas as principais atividades como benéfica para os pequenos agricultores familiares desencadeadoras do movimento de concentração frente às novas dinâmicas do espaço rural. A fundiária: cana de açúcar, pecuária e eucalipto pluriatividade é vista, pelo autor, como uma forma de (BERGAMIM, 2004). Tal fato pode explicar, em parte, o “acomodar a mudança, de se adaptar a realidade da surgimento e o desenvolvimento do agroturismo na região agricultura, minimizando riscos, maximizando serrana, haja vista o elevado número de pequenas oportunidades [...] e permanecendo na terra” (op. cit., propriedades e a necessária de desenvolvimento de outras p.97). atividades econômicas não agrícolas para a No sentido de adaptação às oportunidades que o complementação da renda familiar. capitalismo engendra no campo, a pluriatividade se Segundo estudo do INCAPER (2007), 77% dos constitui em um fenômeno importante e inevitável, pois estabelecimentos rurais do Estado são familiares, além de diversificar as atividades e as rendas nas abrangendo 40% da área rural total e ocupando, em 2007, pequenas propriedades familiares, amplia suas relações 220 mil agricultores. A agricultura familiar responde capitalistas, inserindo-os em novos mercados e novas ainda por 61% da produção de olerícolas; 56% da relações sociais (CANDIOTTO, 2007). Não se trata, produção de cereais; 43% da produção de frutas; 42% da portanto, de uma descaracterização dos núcleos rurais, produção de leite e 41% da produção cafeeira estadual. mas de sua reestruturação a partir da incorporação de Os dados relativos à estrutura fundiária estadual novos componentes econômicos, sociais, culturais e mostram que 92% das propriedades rurais possuem até ambientais à diversificação da renda familiar. 100 hectares, sendo que cerca de 80% têm dimensão menor que 50 hectares, conforme Tabela 1. Estes dados 3 A AGRICULTURA FAMILIAR NO ESPÍRITO revelam uma importante característica da economia SANTO capixaba: a desconcentração da propriedade rural e a presença de uma agricultura familiar expressiva e Um dos principais reflexos da imigração europeia dinâmica. no Espírito Santo projetou-se nas transformações nas relações de trabalho que se pautaram no trabalho e na

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Tabela 1 – Distribuição Fundiária no Estado do Espírito São muitas as causas, fatores e circunstâncias que Santo poderiam ser elencados para entender a recente Extrato de área (ha) Imóveis redescoberta dos espaços rurais por parte dos agentes Nº % econômicos, da administração pública e da sociedade em Menos de 5 12.389 12,82% geral (ANJOS; CALDAS, 2012). Neste sentido, utilizar- De 5 a menos de 10 16.267 16,83% se-ão as colocações de Carneiro (1998) e Marques (2002). De 10 a menos de 50 49.579 51,30% Novos valores sustentam a procura da proximidade De 50 a menos de 100 10.907 11,29% com a natureza e o campo. A sociedade fundada na De 100 a menos de 500 6.785 7,02% aceleração do ritmo da industrialização passa a ser De 500 a menos de 1.000 522 0,54% questionada pela degradação das condições de vida dos De 1.000 a menos de 5.000 193 0,20% grandes centros. Marques (2002) salienta que a divisão e a De 5.000 a menos de 5 0,005% oposição entre o campo e a cidade, a indústria e a 10.000 agricultura, em suas formas modernas, correspondem à culminação do processo de divisão e especialização do De 10.000 a 50.000 3 0,003% trabalho que, com o capitalismo, foi desenvolvimento a Total 96.650 100% um grau extraordinário. A imagem idealizada do campo Fonte: INCAPER, 2007. corresponderia, assim, a uma reação crítica à forma

alienada das relações sociais dominantes. Os dados sobre distribuição fundiária mostram O contato com a natureza é valorizado por um que, nas últimas décadas, houve uma fragmentação dos sistema de valores alternativos, neoruralista e estabelecimentos menores que 100 hectares, antiprodutivista, idealizando o passado e valorizando o principalmente, por sucessão hereditária, o que tem “tradicional”. O ar puro, a simplicidade da vida e a inviabilizado muitos pequenos produtores devido ao natureza são vistos como elementos “purificadores” do reduzido espaço para a produção e propiciado a corpo e do espírito poluídos pela sociedade industrial. A introdução de atividades não agrícolas nessas imagem do rural como próximo à natureza passa a propriedades (INCAPER, 2007), entre as quais se destaca desempenhar um papel cada vez mais importante nas o agroturismo. representações da sociedade moderna, opondo-se ao Como ressalta Portuguez (1999) o agroturismo, no artificialismo da vida nas cidades (CARNEIRO, 1998). Espírito Santo, foi eleito como uma das principais A autora ressalta que o campo passa a ser atividades a serem fomentadas pelo poder público como reconhecido como espaço de lazer e, entre os principais oportunidade de promoção do desenvolvimento do efeitos desse fenômeno, destacam-se a ampliação das campo, de modo a complementar as atividades oportunidades de trabalho para a população rural, até agropecuárias tradicionais e como alternativa de geração então dedicada quase exclusivamente à agricultura, e a de renda, principalmente, na região serrana do Estado. maior aproximação e integração entre sistemas culturais

distintos. Essa busca pela natureza e o desejo dos 4. O AGROTURISMO NO ESPÍRITO SANTO: citadinos em transformá-la em mais um bem de consumo, ASPECTOS HISTÓRICOS E CONCEITUAIS altera o ritmo de vida local: o campo, enquanto categoria genérica, passa a ser visto como um lugar de vida, mais A partir do início da década de 1990, cresce o que um espaço de produção agrícola. fenômeno da pluriatividade no espaço rural brasileiro, Essa recontextualização do passado e da tradição pois, além da maior diversidade das atividades agrícolas, apontaria, portanto, para respostas concretas e viáveis são adicionadas novas atividades não agrícolas e para a crise da modernização agrícola no Espírito Santo, intensificadas variadas atividades artesanais e que se refletiu diretamente na agricultura familiar, paraagrícolas que agregam valor aos produtos e in natura sobretudo, na região serrana. Neste contexto, o processados. Esse contexto do “novo rural” brasileiro vem agroturismo no Estado surge a partir da recriação de um diversificando as ocupações e a renda da população rural, conjunto diversificado de formas alternativas de e levando a implicações socioeconômicas e mudanças no reprodução social voltado para uma nova realidade, a uso e na ocupação do espaço rural (CANDIOTTO, 2009). partir da diversificação dos produtos agrícolas, sendo A pluriatividade é vista, comumente, como a baseado em princípios como o associativismo, cooperação oportunidade que se coloca para a complementação da e solidariedade, e da recuperação de um saber-fazer renda familiar, a partir do aproveitamento e da expansão tradicional que teria sido negado ou “esquecido” pelo de novas funções e atividades não agrícolas no campo, processo de mecanização da agricultura. integrando e envolvendo as famílias rurais com o poder Como ressalta Portuguez (1999), as áreas de público e a iniciativa privada. E esse fenômeno associa- imigração italiana e alemã se mostraram atrativas para o se, no Espírito Santo, às áreas de imigração europeia, fomento do turismo nas áreas serranas, fato que motivou o ressaltando-se as regiões turísticas das Montanhas governo a criar um novo circuito turístico nas localidades Capixabas e dos Imigrantes, onde o fluxo de turistas em próximas à Vitória. Foi nesta perspectiva que, em meados direção ao espaço rural tem sido mais intenso a partir da da década de 1980, surgiu a região turística conhecida por revalorização do rural e da natureza pelos citadinos. "Triângulo das Montanhas", formada pelos municípios de

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Domingos Martins, Santa Leopoldina e Santa Teresa. Neste país, as propriedades rurais dedicadas à produção Como ressalta o autor, foram as belezas paisagísticas das de queijos e/ou vinhos ofereciam alojamentos e permitiam serras que projetaram esses municípios para o cenário ao turista participar de fases do processo produtivo. turístico capixaba, quando se começou a divulgar o Por fatores como a grande presença de contraste climático existente entre a faixa litorânea e a descendentes de imigrantes italianos em Venda Nova do área de ocorrência das serras. Imigrante e por ser acreditar em uma similaridade O agroturismo começou a ser explorado no econômica e social entre as duas regiões, o modelo Espírito Santo no final de década de 1980, em uma italiano foi adotado, a princípio, com poucas propriedade no município de Venda Nova do Imigrante, modificações para o contexto brasileiro. Assim, concorda- como forma de diversificar as atividades produtivas, se com Guanziroli (2001), pois os modelos de associando a prática agrícola à atividade turística. A desenvolvimento rural são copiados dos espaços centrais princípio, acreditava-se, como ressalta Portuguez (1999), e implantados no campo brasileiro sem maiores reflexões que alguns problemas do campo como o êxodo rural, a e adequações à realidade nacional, estadual e local. perda do excedente da produção, a desmotivação dos Alguns autores tentam explicar o desenvolvimento produtores mais jovens, as oscilações dos preços dos do agroturismo na região centro-serrana. Alves (2006) produtos, dentre outros, poderiam se resolvidos, em parte, destaca a elevada capacidade associativa da população, a pelo associativismo e cooperação. Como resultado, várias organização em pequenas propriedades rurais e a forte outras propriedades do município passaram a se dedicar tradição de trabalho em grupo e voluntário. Pereira e também a esta atividade, denominada, mais tarde, de Ribeiro (2011) ressaltam que, na trajetória de agroturismo. implementação do projeto agroturístico, questões como Aliás, é na necessidade de diminuir o êxodo rural senso de pertencimento, cooperação, respeito mútuo, que tem afetado a generalidade do meio rural brasileiro ao produção flexível e organização foram verificadas, longo das últimas décadas que reside o empenho dos possibilitando aos envolvidos acesso aos fatores de organismos governamentais e os comunitários em prol do produção e o conhecimento para a boa manutenção do turismo como componente de diversificação da economia processo produtivo. rural, a partir da valorização dos recursos e Em 1994, um grupo de dez produtores rurais potencialidades endógenas e da exploração das fundou o Centro Regional do Agroturismo, o qual passou singularidades e das diferenças regionais e locais. a ser responsável pela organização e gerenciamento do Em âmbito estadual, em 1993, o poder público, por agroturismo na região, oficializando o desenvolvimento meio das Secretarias Estaduais do Desenvolvimento da atividade no Estado atrelado à região serrana. Como a Econômico (SEDES) e da Agricultura (SEAG) e em sua sede foi instalada no município de Venda Nova do parceria com o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Imigrante, este centro passou a não servir mais de Empresas (SEBRAE), implanta o “Programa do referência para os novos produtores interessados em Agroturismo”, com a finalidade de incentivar o aderir ao programa, pois dirigiu sua atenção apenas para o desenvolvimento regional sustentável. Foi elaborado um município que o sediava. projeto piloto contemplando, a princípio, 11 municípios Dessa forma, desvirtuou-se de seus objetivos da região serrana que se caracteriza pelo clima ameno, iniciais, permitindo que qualquer interessado possa atuar topografia favorável e pluralidade étnica, além da no agroturismo, fato que resultou da descaracterização proximidade à capital, Vitória. dos objetivos iniciais do programa. Ainda, outra função O programa surgiu da necessidade de se que era atribuída a este centro era pôr em prática o complementar a renda e melhorar a qualidade de vida do conjunto de preposições do programa, o que foi homem do campo. O objetivo principal do programa, implementado pelo SEBRAE e EMATER (atualmente, como ressalta Portuguez (1999), era gerar possibilidades INCAPER), substituindo, em parte, suas atribuições. para que as famílias rurais aprendessem a utilizar a Atualmente, este antigo centro regional recebe o nome de produção agropecuária, as paisagens serranas, a cultura Associação do Agroturismo de Venda Nova do Imigrante local, a hospitalidade do povo interiorano e a (AGROTUR) e congrega apenas empreendimentos do diversificada culinária regional como atrativos turísticos. município. O modelo de agroturismo adotado no Espírito A princípio, o programa incentivava unicamente a Santo segue o modelo italiano, especificamente, da região visitação aos atrativos turísticos da região serrana do Vêneto, uma vez que foram feitas visitas por políticos elencados no inventário turístico elaborado pela SEDES e e proprietários rurais de Venda Nova do Imigrante e SEAG. Somente a partir da estruturação de um novo Domingos Martins à Itália durante a fase de pré- inventário e da elaboração de um Plano de Proposições, é implantação da proposta-piloto, de modo a conhecerem o que se passou a divulgar uma imagem do produto Programa Italiano de Agriturismo. “agroturismo” fundamentado também nas propriedades Na Itália, como ressalta Portuguez (1999), o rurais. espaço rural é definido como as zonas com pequenos Percebe-se que os órgãos governamentais tiveram, núcleos de população, onde se verifica certa tendência de na fase inicial do Programa, uma intervenção mais contraposição entre o espaço rural e o urbano, e inclusão a decisiva, nomeadamente, na formulação de um plano de das áreas de montanhas como partes do ambiente rural. proposições e no levantamento mais ou menos exaustivo

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do potencial do que poderia constituir o universo da oferta agroturística do Estado, em especial, da região serrana. Destaca-se ainda, como ressalta Zandonadi (2010), o papel da mídia enquanto incentivador da atividade que, por meio de reportagens sobre Venda Nova do Imigrante, nas quais mostrava as propriedades e seus produtos, dava visibilidade aos produtores, aumentando assim o interesse das pessoas em conhecer o lugar e encorajando novos agricultores a se associarem à atividade. Diante do exposto, o Programa do Agroturismo se propunha, na teoria, a correção das assimetrias regionais no campo e dos desequilíbrios territoriais de desenvolvimento a partir do fomento às atividades não agrícolas, como o turismo, na composição da renda familiar. O agroturismo surge, portanto, como uma alternativa ao turismo de sol e praia e como uma proposta de interiorização do desenvolvimento turístico. Observa- se também que o incentivo ao turismo ecológico, na tentativa de promover a conservação do meio rural e da cultural regional, se insere na proposta de agroturismo no Espírito Santo. Dessa forma, no Estado, as práticas de agroturismo estão associadas, principalmente, ao clima frio e à cultura da imigração italiana, salvo poucas exceções, seguindo a risca os modelos europeus. Este é motivo pelo qual o agroturismo se insere como uma proposta de desenvolvimento do turismo para a região serrana. Esse fato deve-se, em parte, como ressalta Dadalto (200-), à Figura1: Mapa das Regiões Turísticas do Espírito Santo. apresentação social que se tem dos imigrantes europeus Fonte: Espírito Santo, SETUR, 2010. como grupo forte, assimilado e aculturado do Espírito Santo, que mantêm suas tradições arraigadas, fator de Três aspectos principais caracterizam as regiões fortalecimento da história do Estado. A partir desta turísticas das Montanhas Capixabas e dos Imigrantes, premissa, italianos, alemães e pomeranos manteriam ambas localizadas na região serrana do Estado: a “intactos” seus valores na culinária, na música, nas danças agricultura, enquanto principal atividade econômica; a e no trato com a terra. Deste modo, para além da geração grande presença de descendentes de imigrantes europeus, de renda e emprego não agrícola, o agroturismo funda-se em especial, italianos, alemães e pomeranos; e uma na valorização de determinados aspectos da cultura ítalo- estrutura fundiária composta, em sua quase totalidade, por germânica – gastronomia, manifestações populares, etc., pequenas propriedades de base familiar. associado à diversidade natural da região serrana do A Região das Montanhas Capixabas é formada por Estado. nove municípios – Afonso Cláudio, Brejetuba, Castelo, Conceição do Castelo, Domingos Martins, Laranja da 5 O AGROTURISMO E SUA RELAÇÃO COM Terra, Marechal Floriano, Vargem Alta e Venda Nova do AGRICULTURA FAMILIAR NAS REGIÕES Imigrante. Os aspectos culturais dos imigrantes refletidos TURÍSTICAS DAS MONTANHAS CAPIXABAS E na arquitetura, na gastronomia e nas manifestações DOS IMIGRANTES populares, e os atrativos naturais, como o Parque Estadual de Pedra Azul, constituem-se nos principais atrativos 5.1 Caracterização da área de estudo turísticos da região. A Região dos Imigrantes é formada por seis Atualmente, a partir da implementação do municípios – Itaguaçu, Itarana, Santa Leopoldina, Santa Programa de Regionalização do Turismo, o Espírito Santo Maria de Jetibá, Santa Teresa e São Roque do Canaã, e encontra-se dividido em dez regiões turísticas, as quais também se destaca pela grande presença de descendentes envolvem todos os municípios do Estado. São elas: de imigrantes europeus, em especial, italianos, pomeranos Região Metropolitana; da Costa e da Imigração; Doces e tiroleses. Do ponto de vista turístico, apresenta Pontões Capixabas; Doce Terra Morena; das Pedras, Pão similaridades com a Região das Montanhas Capixabas: os e Mel; do Caparaó; do Verde e das Águas; dos Vales e do aspectos culturais dos imigrantes refletidos na arquitetura, Café; dos Imigrantes e das Montanhas Capixabas, sendo na gastronomia e nas manifestações populares, e os as duas últimas, objeto de estudo em questão (Figura 1). atrativos naturais, como a Pedra dos Cinco Pontões, o Vale do Canaã e do Caravaggio e o Museu de Biologia

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Mello Leitão, constituem-se nos principais atrativos competitividade, melhorar a arrecadação municipal e turísticos da região. diminuir a sazonalidade (ESPÍRITO SANTO, 2010). Observa-que a identidade rural dos municípios Neste plano, para a Região dos Imigrantes, o pertencentes às regiões turísticas das Montanhas agroturismo é caracterizado por um segmento existente, Capixabas e dos Imigrantes foi (e ainda é) construída em porém que necessita melhorar a sua competitividade com função das características das práticas sociais, dos respeito à concorrência, em especial, na qualificação de costumes e simbolismos de grande parte de sua sua estrutura física e humana, na melhor captação de população, que está associada com a origem europeia, demanda e na oxigenação de seus atrativos (ESPÍRITO bem como camponesa de seus antepassados. “Ela aparece SANTO, 2010). na representação do próprio grupo social enquanto rural, e De fato, a partir da análise do discurso pela atribuição de ruralidade, dada ao grupo, por pessoas institucional, a implantação do agroturismo geralmente é de fora” (NOGUEIRA, 2004, p.4). feita a partir de uma lógica de desenvolvimento turístico De fato, como ressaltam Tiradentes, Santos e que é determinada por atores vinculados ao trade turístico, Almeida (2009, p.7): de modo que diversos valores mercadológicos, como competição, crescimento constante, capacitação e gestão As pessoas do lugar foram fixando empresariais passam a ser disseminados como inevitáveis suas culturas, aproveitando aquilo para o “sucesso” do segmento (CANDIOTTO, 2011). que os lugares tinham a oferecer, criando e recriando técnicas de Entende-se, portanto, que o agroturismo não passa de produção, suas relações familiares, mais um nicho de mercado a ser explorado como os encontros comunitários, as festas, atividade complementar ao turismo de sol e praia. a religiosidade, a gastronomia e o Assim, para desenvolver o agroturismo no Estado, lazer. As famílias dos produtores rurais foram-se estabelecendo nesses sobretudo, nas regiões turísticas das Montanhas lugares, entendendo que os recursos Capixabas e dos Imigrantes, além dos atrativos naturais e naturais os favoreciam e, por meio culturais existentes, é preciso dotar o espaço rural de do trabalho, foram satisfazendo suas infraestrutura, equipamentos turísticos, capacitação necessidades familiares e da produção agropecuária, resultando profissional, visão empreendedora, entre outros fatores de nos saberes, nos seus modos de vida, cunho mercadológico que tendem a transformar e nas suas habilidades, dentre outros. coisificar as áreas rurais. Segundo Candiotto (2011), o espaço rural torna-se Assim, as comunidades rurais dessas regiões não um receptáculo dos equipamentos e atividades turísticas, produziram apenas produtos agrícolas, mas também sendo que as diversas peculiaridades e particularidades do humanidades. Os lugares contam uma vasta riqueza rural são ignoradas na gestão do turismo no meio rural, cultural e nesta cultura estão as festas, os simbolismos, os sobretudo quando o pequeno agricultor familiar é hábitos, os costumes e as tradições (TIRADENTES; envolvido no processo. “A lógica do mercado turístico SANTOS; ALMEIDA, 2009). penetra no meio rural com um único objetivo que é o lucro, modificando paisagens, territórios e a 5.2 Análise das políticas estaduais de turismo e da territorialidade dos agricultores familiares” (op. cit., atuação do Estado no tocante ao agroturismo p.568). Segundo a lógica economicista vigente, os No Espírito Santo, do ponto de vista político- agricultores familiares precisam se adaptar à estrutura institucional, os termos “turismo rural” e “agroturismo” mercadológica, tornando-se empreendedores. A são utilizados como sinônimos, sendo usualmente integração dos agricultores ao trade turístico é inevitável, utilizado o termo “agroturismo” para designar o conjunto necessária e imprescindível para o desenvolvimento do de atividades não agrícolas, geradora de trabalho e renda, agroturismo nas regiões das Montanhas Capixabas e dos que impulsiona o desenvolvimento da agroindústria Imigrantes. Dessa forma, surge o empresário rural, agora, artesanal, do artesanato regional e da produção idealizado pelas ações governamentais, que corresponde, agroecológica, alicerçada em princípios como a segundo Anjos e Caldas (2012), àquele capaz de conciliar valorização da gastronomia local, da preservação do meio a produção agropecuária com outras atividades não ambiente e das tradições culturais dos pequenos agrícolas, sobretudo aquelas geradoras de novos produtos agricultores (SEBRAE; BANDES, 2007). que a sociedade demanda, como a preservação da O agroturismo na Região das Montanhas biodiversidade, do patrimônio natural e paisagístico, dos Capixabas, a partir de uma análise do Plano de saberes tradicionais e dos artigos singulares. Desenvolvimento Sustentável do Turismo no Estado do Observa-se ainda que no Plano de Espírito Santo 2025 – principal plano de turismo estadual Desenvolvimento Sustentável do Turismo os projetos – é tido como o produtor indutor de crescimento, uma vez orientam-se unicamente para a atração de investimentos que o setor está estruturado, possui atrativo significativo e para o fomento à implantação da agroindústria e do já recebe fluxo de visitantes. A sua expansão necessita de artesanato no interior e ao apoio aos arranjos produtivos organização e investimentos imediatos para aumentar a locais de turismo, sobretudo no estímulo à cultura da

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cooperação, sem, contudo, apresentar as ações a serem “determinadas intencionalidades irão se sobressair sobre desenvolvidas. outras no jogo determinado pelas relações de poder”. Assim, no âmbito do turismo, após o Programa do Sobre a atuação das entidades no apoio e fomento Agroturismo, não foi implantada nenhuma outra política ao agroturismo nas regiões turísticas das Montanhas e/ou programa direcionado ao pequeno agricultor familiar Capixabas e dos Imigrantes, Alves (2006, p.13), em que aborde, inclusive, a multifuncionalidade da estudo sobre o papel e as relações desempenhadas pelos propriedade rural e a pluriatividade, a partir das atividades agentes, instituições e organizações presentes no território turísticas. As poucas ações e investimentos públicos, uma do agroturismo na região centro-serrana, assinala que: vez que não há no Espírito Santo uma política clara e concisa de desenvolvimento do agroturismo, destinam-se Segundo os entrevistados, atualmente ao apoio a eventos e às feiras regionais de agroturismo, existe a dificuldade de desenvolver a atividade de forma cooperativa entre bem como na promoção de alguns cursos de capacitação eles e os agentes de outros setores profissional. pelo fato de existirem diferenças Sobre a promoção e comercialização feita pela entre interesses e ritmo de trabalho, SETUR/ES, após uma análise do material promocional tais como: a prefeitura municipal é uma parceira, mas tem dificuldade divulgado em feiras e eventos nacionais e internacionais, em apoiar e é lenta na tomada de o agroturismo, enquanto produto turístico, ainda é restrito decisões, faltam recursos humanos e ao município de Venda Nova do Imigrante e ao distrito de apoio técnico, e quando muda a Pedra Azul, no município de Domingos Martins. Para os política muda tudo. [...] “existem pessoas de instituições e não demais municípios das regiões das Montanhas Capixabas instituições” [grifos do autor]. e dos Imigrantes, as lideranças municipais e estaduais apostam no clima frio e na cultura dos descendentes dos O autor ressalta que o desenvolvimento da colonos europeus como os grandes potenciais do turismo atividade na região serrana foi facilitado pela presença do local. Embora Portuguez (1999) ressalte que esses capital social, evidenciado nos aspectos de confiança e mesmos atrativos sejam apenas motivadores coadjuvantes reciprocidade, associativismo, cooperação e participação. das viagens para aquela área, o agroturismo ainda não faz Dessa forma, o agroturismo consolida-se paralelamente a parte dos planos estaduais para os demais municípios atuação do Estado no setor turístico, na qual a união, serranos. integração, cooperação e parceria entre os pequenos Mesmo a partir da elaboração do Plano de agricultores e demais setores comunitários ligados ao Marketing Turístico do Espírito Santo 2025 – Destino ES, agroturismo foram os fatores decisivos. o turismo rural/agroturismo (no plano, os termos são sinônimos) é entendido enquanto produto âncora 5.3 Análise do agroturismo a partir da pluriatividade complementar ao turismo de sol e praia, de negócios e na agricultura familiar nas regiões das Montanhas eventos, náutico e de pesca, inserido no escopo do Capixabas e dos Imigrantes turismo cultural. Assim, o agroturismo é entendido enquanto uma subcategoria dentro do turismo cultural, O agroturismo, no Espírito Santo, insere-se em negligenciando todo o processo sociocultural de uma perspectiva de geração de renda e empregos rurais construção do escopo da atividade nas primeiras não agrícolas a partir da refuncionalização da propriedade propriedades rurais, em Venda Nova do Imigrante. rural e da pluriatividade. De fato, a queda do número de A partir desse plano, os principais “produtos” a pessoas ocupadas em atividades agropecuárias e o serem trabalhados pela SETUR/ES são: o Circuito do aumento das pessoas ocupadas nos domicílios rurais em Agroturismo, em Venda Nova do Imigrante; Circuito dos atividades não agrícolas intensificaram-se a partir da Orgânicos e Naturais, em Domingos Martins; Circuito segunda metade da década de 1980. A redução do Vale do Verde, em Marechal Floriano; Circuito Terras trabalho no campo obrigou os pequenos produtores e seus Pomeranas, em Santa Maria de Jetibá e a Festa da familiares, principalmente, nas antigas áreas de Polenta, em Venda Nova do Imigrante. O fator de escolha exploração cafeeira do Estado, a buscarem atividades não desses circuitos deve-se, em sua totalidade, a pressões agrícolas urbanas e/ou rurais. Essa redução do trabalho políticas e econômicas de grupos de interesse daquelas agrícola tem dois motivos principais: a redução da área localidades. Como bem salienta Ribeiro (2000), esse tipo cultivada e o avanço tecnológico na mecanização das de “risco” faz-se obviamente tanto maior quanto maiores principais culturas. se forem os efeitos econômicos, reais e previstos, do A agricultura concentra hoje os mais baixos níveis agroturismo. Por certo pode levar, inevitavelmente, ao de renda e salários. No Espírito Santo, segundo dados do aumento das pressões políticas e comerciais para fazê-lo PNAD, em 2011, a renda média domiciliar per capita nos crescer segundo uma lógica de maximização de domicílios rurais foi de R$580,38, enquanto que nas áreas resultados. urbanas, esse valor foi de R$817,22, o que representa um De fato, mesmo havendo condições institucionais aumento de 40% na renda familiar (IBGE, 2011). Com para a participação dos agentes locais na construção do relação aos salários pagos na agricultura, a remuneração plano, como salienta Candiotto (2011, p.561) média do trabalhador foi de R$798,50, sendo a mais baixa

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dentre as praticadas no mercado de trabalho formal trabalhos não somente menos remunerados, mas os de (BRASIL, 2011). Entretanto, conforme dados do PNAD, menos status social. Santana (2002) aponta como nos últimos onze anos, houve um aumento significativo consequência do turismo rural a modificação na estrutura do número de pessoas ocupadas na área rural em social e econômica das populações rurais, com inserção atividades não agrícolas (IBGE, 2011), o que ressalta a de novos atores e atividades laborais para o turismo e importância que vem assumindo as atividades agrícolas aumento da participação de mulheres nas atividades. em tempo parcial e o advento da atividade resultantes da Direta ou indiretamente vinculadas ao agroturismo, pluriatividade, em especial, o agroturismo no Espírito vem se reproduzindo, no meio rural, novas atividades Santo. altamente intensivas e de pequena escala, propiciando Na configuração do agroturismo na região serrana, outras oportunidades para um conjunto de pequenos a atividade envolvia a prática do turismo dentro das produtores capixabas, que quase nada tem a ver com as propriedades rurais, de modo que o turista possa entrar em atividades agrícolas tradicionalmente desenvolvidas no contato com a atmosfera da vida na propriedade, Estado. Algumas atividades possuem ainda uma evidente integrando-se, de alguma forma, aos hábitos locais. Essa base agrícola, outras, porém não. definição trazia em sua essência a noção de que a Citam-se como as principais atividades que atratividade das propriedades rurais está na oportunidade possuem interfaces com o agroturismo no Espírito Santo, de o turista acompanhar a produção agroindustrial e/ou que, por vezes, se mesclam como a própria atividade, vivenciar o dia-a-dia da vida rural, por meio do plantio, integrando circuitos e roteiros agroturísticos nas regiões coleta, manejo de animais, etc. Insere-se ainda nesse das Montanhas Capixabas e dos Imigrantes: conceito, a comercialização de produtos de origem animal  Atividades de lazer e entretenimento, sem e vegetal fora das propriedades rurais, em lojas próprias qualquer associação com as atividades ou de terceiros nas áreas urbanas. agropecuárias: visitas a atrativos naturais A esse conceito, mais tarde, foram incluídos o (cachoeiras, lagos, vales, etc.); trilhas ecológicas; artesanato regional, a produção agroecológica, a pescaria (em pesque-pague, por exemplo); gastronomia local, a preservação do meio ambiente e das cavalgadas; caminhadas; tradições culturais dos agricultores. Como ressalta  Ecoturismo e turismo de aventura; educação Nogueira (2004), o agroturismo no Espírito Santo ambiental; prática de atividades de aventura ao envolveria quatro definições básicas. Numa primeira “ar livre” (voo livre, rapel, rafting); concepção, o agroturismo é tido como uma atividade contemplação de paisagens (mirantes); turística na qual os pequenos agricultores disponibilizam  Hospedagem: pousadas; domicílio do produtor seus sítios ou fazendas para visitas de turistas, de modo a (Cama & Café); conheceram o processo produtivo, a vida do homem do  Alimentação: restaurantes rurais; casas de chá; campo e os aspectos naturais da propriedade. Dentro de café colonial; centros de degustação; uma segunda definição, o agroturismo é representado  Manifestações culturais: festas e feiras como uma associação que tem por objetivo servir de regionais; músicas e danças típicas; gastronomia; entreposto comercial para a venda dos produtos casas de cultura e museus; provenientes da agricultura familiar.  Sítios de aluguel; Numa terceira acepção, a atividade é vista como  Artesanato. uma forma de auferir lucro para o trabalho doméstico. Por Dessa forma, a questão da ruralidade, no contexto fim, numa quarta e última concepção, destaca-se a turístico, é tratada sob três vieses no Espírito Santo, sob o geração de lucro para as famílias envolvidas. “Na prisma da pluriatividade: da produção agrícola, do definição de agroturismo [...], considero muito mais artesanato e da disseminação de empreendimentos importante o que a população local [...] faz e pensa a turísticos, com ou sem quaisquer vinculações com as respeito, ou seja, o uso dessa definição” êmico práticas agrícolas das regiões das Montanhas Capixabas e (NOGUEIRA, 2004, p.11). dos Imigrantes. Como salienta a autora, embora representada como Sobre o artesanato, convém estabelecer algumas uma atividade familiar, verifica-se o predomínio de reflexões primordiais sobre o desenvolvimento desta mulheres na atividade de agroturismo, principalmente, na atividade no meio rural espírito-santense, uma vez que é produção de gêneros alimentícios, cabendo ainda ao considerada uma das principais atividades não agrícolas homem, o trabalho agrícola. A grande parte do trabalho nas regiões de estudo. No Estado, foram cadastrados de produção de gêneros alimentícios e artesanais nas 6.800 artesões no meio rural e urbano que produzem em regiões turísticas das Montanhas Capixabas e dos torno de três mil produtos (INCAPER, 2010). Embora nos Imigrantes é realizada na própria casa da família, seja no últimos anos assista-se a um crescimento do artesanato no campo ou na cidade, como uma extensão do trabalho meio rural, a grande maioria dos artesões continua a doméstico. Assim, essas atividades são consideradas trabalhar de maneira isolada, à margem dos circuitos de como complementares ao trabalho agrícola e outras apoio e comercialização. Esta situação deriva da atividades urbanas exercidas pela família rural. dificuldade de acesso ao sistema de reconhecimento, da O agroturismo, segundo Nogueira (2004), é uma insuficiência das estruturas de apoio, de informações atividade preferencialmente feminina, cabendo os

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relativas ao número de artesãos e da estereotipação do (2000) e Campanhola e Silva (2000) também abordam artesanato. como impactos negativos do agroturismo o abandono, Torna-se importante pensar o artesanato no meio ainda que não completo, das atividades agropecuárias rural sob a perspectiva da multifuncionalidade e sua existentes nessas áreas. contribuição para o desenvolvimento local, a partir de Com relação aos empreendimentos não rurais, dois fatores econômicos, sociais, culturais e ambientais no aspectos devem ser ressaltados. Primeiramente, observa- conjunto de setores existentes em determinado nível se, nas regiões turísticas das Montanhas Capixabas e dos territorial, o que leva a considerar outras funções do Imigrantes, a disseminação de hotéis e pousadas que artesanato: social, cultural, ambiental, recreativa e podem ser entendidos, antes de tudo, como pedagógica, estética e decorativa e utilitária. estabelecimentos similares aos outros, com a Sobre os sítios de recreio, convém também uma particularidade de estarem localizados na zona rural. análise de sua configuração socioespacial no território das Assim, esses estabelecimentos são associados, regiões turísticas das Montanhas Capixabas e dos unicamente, aos aspectos naturais da região, sendo uma Imigrantes, uma vez que se constitui em uma modalidade área de turismo alternativo ao turismo de sol e praia. de “hospedagem agroturística” em crescimento nas Ademais, também se destaca a dispersão de regiões de estudo. Embora uma parte significativa seja condomínios fechados e domicílios secundários, exclusivamente para o lazer, é comum também encontrar principalmente, nos municípios de Domingos Martins, unidades que combinam as atividades turísticas com Venda Nova do Imigrante e Vargem Alta, tendo por alguma atividade produtiva agrícola – floricultura, consequências: a especulação imobiliária; impactos aquicultura, olericultura, entre outras – e/ou não agrícola, ambientais graves; a criação de enclaves (“não lugares”) como a produção de doces, massas, bebidas, etc. Em que marginalizam as áreas rurais mais pobres; o geral, esses sítios oferecem alguns equipamentos como fracionamento da terra; a expulsão das atividades piscina, campos esportivos, churrasqueiras, áreas cobertas agropecuárias para a criação de loteamentos e para eventos, auditórios, entre outros. condomínios; e a atração de investidores e capitais Silva, Vilarinho e Dale (2001) e Philereno e Souza exógenos. (2009) destacam que esses sítios são importantes na Embora nessa área ocorra uma intensa produção geração de emprego local, principalmente, a partir de agrícola em base familiar, o rural é visto apenas como empregos domésticos (“caseiros”, cozinheiras, espaço natural, do qual se deve tirar vantagem, jardineiros, etc.). Entretanto Teixeira, citado por transformando-o em objeto de consumo, totalmente Alentejano (1999), observa um crescimento no número de desvinculado de suas particularidades sociais inerentes. camponeses que preferem vender suas terras e, Deve-se atentar ao fato de não se transformar a paisagem imediatamente, empregar-se como caseiros nas suas rural em objeto de consumo e da valorização das antigas propriedades, em virtude da especulação identidades rurais apenas para fins mercadológicos, o que imobiliária existente na região. Esse trabalhador, ex- levaria a passagem do campo ligado à produção, à proprietário da terra, não possui segurança a respeito da atividade agrícola para a imagem-consumo. “É importante manutenção em sua nova ocupação. que não se confunda campo com natureza” (MARQUES, Deve-se ressaltar ainda que os sítios de lazer 2002, p.103). podem intensificar aspectos como a sonegação fiscal, o Neste sentido, segundo Ribeiro (2000), os não cumprimento das leis trabalhistas por parte dos benefícios econômicos do turismo podem desencadear proprietários (contratações irregulares e ilegais, pressões políticas e econômicas visando sua expansão nas pagamento abaixo do piso salarial, longas jornadas de áreas rurais. O relativo sucesso econômico de uma região trabalho, etc.) e o desvio de créditos rurais. pode atrair investidores externos, limitando as Pode-se verificar, portanto, a predominância das oportunidades e os benefícios para a população local e atividades não agrícolas, sem quaisquer vinculações com subvertendo o conceito de desenvolvimento rural. Santana a prática agropecuária das propriedades (hotéis, pousadas, (2002, p.31) salienta que: restaurantes, por exemplo), em relação às atividades agrícolas na prática do agroturismo no Estado. Tal [...] modificações no valor de uso dos situação demonstra como as atividades não agrícolas têm recursos podem desestabilizar socialmente a população, penetrado no meio rural como importante fonte de renda, favorecendo poucos (a maioria de a ponto de serem mais relevantes que a própria investidores / empreendedores lucratividade proveniente da produção agrícola, o que externos ao local) e prejudicando a caracterizaria a nova realidade do espaço rural espírito- população local, fato comum em qualquer desenvolvimento turístico. santense. Calatrava, citado por Baidal (2000), aponta como Como é possível observar os benefícios um dos principais impactos negativos do agroturismo, a econômico-financeiros foram e continuam sendo, direta redução e até o desaparecimento das atividades agrárias, ou indiretamente, apontados pelos órgãos oficiais de pois ao obter lucros maiores com um esforço menor, é turismo estadual, regional e municipal como o fator de comum ver agricultores familiares abandonando as maior peso nas respectivas tomadas de decisão de adesão práticas agropecuárias. Labat e Perez (1994), Ribeiro

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à exploração do agroturismo nas pequenas propriedades e não em estudos empíricos aprofundados. Assim, é familiares. preciso considerar que o agroturismo poder agravar os Pereira e Ribeiro (2011) ressaltam o crescimento problemas sociais dos agricultores familiares, em do PIB/pm de Venda Nova do Imigrante entre os anos de especial, dos periféricos. 1999 e 2008, sugerindo que a introdução do agroturismo Ademais, alguns autores, em estudos sobre o possibilitou um salto evolutivo na economia local desse agroturismo na região serrana, não conseguiram observar município. Segundo os autores, o modelo de organização considerável geração de emprego nas propriedades rurais, produtiva relacionado ao projeto agroturístico tem um pelo fato de o agroturismo utilizar, basicamente, mão de papel fundamental na dinâmica econômica local e deverá obra familiar no atendimento aos turistas e nas atividades gerar importantes externalidades positivas em toda a da propriedade (PORTUGUEZ, 1999; NOGUEIRA, região serrana. Tal mudança pode ser relacionada a uma 2004; ZANDONADI, 2010) Percebe-se, portanto, a melhor qualificação no sistema produtivo, confirmando o dificuldade em se criar postos de trabalho para terceiros. esforço do processo de diversificação e agregação de Ainda conforme Portuguez (1999) e Nogueira valor aos produtos tradicionais. (2004), no setor agrícola do Espírito Santo, ainda é muito Philereno e Souza (2009), em estudo sobre o comum encontrar o chamado “contrato de parceria”, turismo rural em propriedades de agricultura familiar nos também conhecido por “trabalho meeiro”, em que o dono municípios de Taquara e Rolante, no estado do Rio das terras cede uma parcela do terreiro para os meeiros Grande do Sul, também destacam o crescimento da renda cultivarem seus produtos, para que os repartam na per capita nas propriedades pesquisadas, que se encontra colheita, conforme contrato pré-estabelecido entre as bem acima da renda do município, bem como do Estado. partes. Assim, é mais frequente o emprego de mão de Como ressalta Silva (1998), a criação de empregos obra de meeiro ou do parceiro rural do que a do não agrícolas nas zonas rurais seria a única estratégia trabalhador rural assalariado. capaz de, simultaneamente, reter a população rural pobre Vieira, Almeida e Souza (2006) questionam o nos seus locais atuais de moradia e ao mesmo tempo, impacto do turismo para a geração de renda não agrícola elevar o seu nível de renda. O desenvolvimento rural seria nas áreas rurais, uma vez que o número de empregos impulsionado, portanto, por um conjunto de ações que gerados é baixo, a maioria dos empregos é temporária e gerem novas ocupações (não necessariamente empregos) exige baixa qualificação e Candiotto (2011) ressalta que a e que propiciem maior nível de renda às pessoas maior parte da população acaba trabalhando como residentes no meio rural. Neste sentido, Kageyama e empregados, enquanto predominam empreendedores Rehder (1993) demonstram que as melhores condições de exógenos e sem qualquer identidade com o lugar, fato vida da população rural não estão associadas a maiores observável nas regiões turísticas de estudo. índices de modernização agrícola, mas pelo “grau de Entende-se, portanto, que um projeto de urbanização do interior”. Assim, naquelas regiões desenvolvimento rural deve contemplar a inclusão social próximas aos grandes centros e seu entorno, o processo de a partir da melhoria geral das condições de vida e da urbanização, por mínimo que seja, estendeu-se ao interior, realização de novas atividades no campo que se baseiem beneficiando também as áreas rurais circunvizinhas e, no processo de descentralização política e de valorização como consequência, estas regiões apresentariam um nível dos saberes locais (MARQUES, 2002). Cavaco (1996) de desenvolvimento (econômico) maior. salienta que, antes do crescimento econômico, as Segundo Portuguez (1999), a possibilidade de propostas de desenvolvimento rural devem envolver o gerar empregos sempre foi um elemento motivador dos desenvolvimento, que é simultaneamente econômico e programas de fomento à atividade turística, tratando-se de social, e também territorial, e que engloba processos de um ponto fundamental para o incremento dos discursos mudança estrutural, produção social significativa, dos setores público e privado. Neste sentido, Almeida e redistribuição mais equilibrada da riqueza e melhoria dos Riedl (2000) e Emmendoerfer (2006) sugerem que o rendimentos, das condições de vida e das expectativas, turismo rural deve ser visto como a alternativa adicional sobretudo, dos grupos sociais menos favorecidos. mais promissora de geração de ocupações não agrícolas a As politicas rurais, contudo, continuam a ser curto e médio prazo, devido à diversidade de atividades direcionadas basicamente para reduzir o isolamento das ligadas à atividade. Assim, o turismo rural apresenta a populações rurais e de qualificação (ensino básico e possibilidade de gerar empregos num curto espaço de técnico). Marsden (1989) ressalta que o campo já tempo e a um custo similar aos padrões urbanos pressiona por novos modelos de regulação por parte do (ALMEIDA; RIEDL, 2000). Estado, que incluam políticas ambientais e de Entretanto, como bem indagam Froelich e planejamento do uso do solo e da água, de bem estar Rodrigues (2000) e Froelich (2000), para além da geração social e desenvolvimento rural. de renda e emprego, o turismo conseguirá distribuir renda Labat e Perez (1994) citam alguns problemas e diminuir as desigualdades socioeconômicas em um país resultantes da massificação do turismo rural, que em que sabidamente ocupa uma das primeiras posições no maior ou menor grau de intensidade, já começam a ser ranking da desigualdade mundial? Para os autores, a observados no contexto do agroturismo nas regiões afirmação de que o turismo dinamiza áreas rurais turísticas das Montanhas Capixabas e dos Imigrantes. São marginalizadas é baseada em expectativas e proposições, eles:

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a) Localização extremamente pontual, protegidos, as paisagens que gerações sucessivas de privilegiando, principalmente, os municípios de camponeses construíram, aperfeiçoaram e conservaram na Venda Nova do Imigrante, Domingos Martins e sua luta pela sobrevivência constituem de longe, os mais Santa Teresa, não permitindo o desenvolvimento poderosos fatores de atração turística (RIBEIRO, 2000). de grandes áreas rurais, principalmente, as mais Contudo, deve-se ressaltar que, para além da periféricas, como os municípios de Itarana, atratividade das áreas rurais, o planejamento do turismo Itaguaçu, São Roque do Canãa, Laranja da Terra, de base local se faz necessário, tantos nas áreas com Brejetuba, entre outros; alguma organização, como por exemplo, nos municípios b) Impactos ambientais graves decorrentes de de Domingos Martins, Venda Nova do Imigrante, Santa alterações ambientais e paisagísticas, e da Teresa e Marechal Floriano, que já recebem turistas, massificação do agroturismo. Segundo como nos demais municípios, onde existe oferta em Portuguez (1999), faltam estudos sobre o potencial, atrativos naturais e culturais, porém a atividade impacto ambiental do agroturismo, bem como ocorre de forma incipiente e/ou desorganizada. ações que estimulem a preservação dos recursos A melhoria da qualidade de vida, a educação, a naturais; formação profissional, o saneamento ambiental, a c) Excessiva terceirização da atividade econômica e conservação e a proteção ambiental devem ser metas do grande dependência da atividade turística, sem planejamento e da gestão do agroturismo, e não que se desenvolvam atividades alternativas para manifestações de um discurso político-fictício. Senão, os pequenos produtores. O turismo torna-se, estar-se-á criando, conscientemente, belas utopias e falsas portanto, a “salvação da lavoura”, importante ilusões de futuro (SANTANA, 2002). fator para o desenvolvimento rural a curto e médio prazo, capaz de gerar renda e emprego 6 CONCLUSÕES para as famílias residentes no campo, principalmente, das áreas decadentes; Pode-se considerar o agroturismo nas regiões das d) Desenvolvimento de um “turismo exógeno ao Montanhas Capixabas e dos Imigrantes como um meio rural”, realizado por agentes externos, com processo complexo e heterogêneo, bem como são as poucos benefícios para a população local, como pessoas que lhe dão corpo: produtores rurais, órgãos é o caso do turismo de inverno praticado nos públicos e turistas. Como todos os processos e práticas municípios de Domingos Martins e Santa Teresa. sociais, o agroturismo trata-se de uma atividade em Ademais, convém destacar outros aspectos como: construção. a dificuldade de enquadramento do pessoal ocupado – Percebe-se que os custos do agroturismo aos trabalhador rural ou de serviço; presença, em certos casos, residentes, como a degradação ambiental, as de enclaves similares aos do turismo de sol e praia, transformações culturais e sociais e os impactos deixando à margem o meio rural, principalmente, as áreas econômicos, são ignorados no planejamento e não são mais pobres e suas necessidades; falta de planejamento e divulgados para a comunidade, em especial, para os gestão governamental; e dificuldades em se desenvolver agricultores familiares. Assim, interessa divulgar o que é planos participativos e, principalmente, meios de se positivo (geração de emprego e renda não agrícola) e aplicar estes planos a partir de uma gestão democrática e esconder os problemas, fato fundamental para a criação participativa. do imaginário do agroturismo como atividade inclusiva e Assim, entende-se que qualquer atividade e/ou sustentável. empreendimento que se realize no meio rural pode ser Torna-se importante a elaboração (e efetivação) de considerada agroturístico, tendo ou não vinculação com a uma política integrada de planejamento e de complementariedade de renda nas propriedades rurais e investimentos para o desenvolvimento do turismo em geração de emprego não agrícola, por meio da zonas rurais contextualizada em uma política de pluriatividade e da multifuncionalidade da agricultura desenvolvimento rural. A fragilidade genérica do meio familiar. Ademais, o espaço rural tem pouco significado rural, muito em especial dos seus recursos naturais, em termos de turismo estadual, mais por desinteresse paisagísticos, histórico-culturais e sociais envolve, governamental que por falta de iniciativa e vontade dos primordialmente, o planejamento adequado e a gestão pequenos agricultores familiares em implantar o controlada da atividade turística. É importante que se agroturismo em suas propriedades. atente ao fato de que o rural, redesenhado no discurso da Todavia, não se pode deixar de sublinhar que o que multifuncionalidade e da pluriatividade, não se torne um hoje em dia aparece como os grandes “trunfos” das verdadeiro simulacro ou pastiche, de modo a satisfazer a principais potencialidades dessas regiões para atrair curiosidade dos citadinos pelo exótico e singular. turistas, e por aí lograrem sua revitalização econômica e Há que se reiterar que o agroturismo não pode, por social, deve-se, curiosa e um tanto ironicamente, à si só, ser tomado como solução para as questões relativas marginalização e ao ostracismo a que foram relegadas ao desenvolvimento rural, às quais, por sua complexidade pela generalidade dos modelos e processos de e diversidade, muito dificilmente responderão de forma desenvolvimento econômico adotados e implementados eficaz às práticas de intervenção e gestão unissetoriais. O ao longo do século passado. Os espaços naturais turismo exige, antes, abordagens multisetoriais que

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CONFLITOS NO ENTORNO DO PARQUE NACIONAL DA SERRA DA CANASTRA – PERSPECTIVAS DA PLURIATIVIDADE PARA O DESENVOLVIMENTO NO ESPAÇO RURAL

LUANA SOARES NOGUEIRA

Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG Campus Pampulha Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia, Belo Horizonte - MG [email protected]

RESUMO - O objetivo do artigo é colocar em evidencia a questão dos conflitos em ordem geral e específica na região da Serra da Canastra. Será discutido o conceito de espaço rural para compreender a dicotomia entre rural e urbano e como o desenvolvimento rural se estabelece vinculado à territorialidade. Nesse caminho, levantamos as estratégias de desenvolvimento rural possíveis para os pequenos produtores rurais da Serra da Canastra a partir da pluratividade. A viabilidade econômica para a exploração diamantífera desafia, na prática, o cenário paradigmático de desenvolvimento sustentável no campo. O conflito territorial, porém, pode motivar a mobilização dos atores locais em defesa da apropriação dos recursos naturais e culturais necessários para a reprodução social de uma determinada comunidade.

Palavras chave: Conflito, Serra da Canastra, Espaço Rural, Pluriatividade, Desenvolvimento.

ABSTRACT - The objective of this paper is to put in evidence the issue of conflicts in general and specifically in the region of Serra da Canasta. Discussed the concept of rural areas to understand the dichotomy between rural and urban as rural development is established linked to territoriality. In this way, we raise rural development strategies possible for small farmers in the Sierra Canasta from pluratividade. The economic viability for diamond exploration challenges in practice, the paradigmatic scenario of sustainable development in the field. The territorial conflict, however, can motivate the mobilization of local actors in defense of the appropriation of natural and cultural resources necessary for social reproduction of a particular community.

Key words: Conflict, Serra da Canastra, Space Rural, Pluriactivity, Development.

1 INTRODUÇÃO desenvolvimento rural menos verticalizado, apesar das contradições históricas que ainda persistem intactas no Este trabalho não visa focar a explicação da tempo e territórios agrários. origem e a situação do conflito instaurado na região da Na primeira sessão procuramos conceituar conflito Serra da Canastra, mas exemplificar a partir das disputas e conflitualidade, em seguida expomos o conflito do decorrentes no distrito de São José do Barreiro, município entorno do Parque Nacional da Serra da Canastra; na de São Roque de Minas, possíveis estratégias de segunda parte trabalhamos o conceito de espaço rural na superação para um conflito explícito em um dado perspectiva dicotômica para compreendermos as território, os caminhos que nos levarão para este objetivo peculiaridades e possibilidades de desenvolvimento nesse partirá da própria valorização do espaço rural e da espaço, na terceira sessão introduziremos a noção de participação integrada do poder público e atores sociais desenvolvimento rural e discutiremos a pluriatividade locais para concretizar o projeto de desenvolvimento local enquanto tendência no campo e o capital social enquanto e não o abandono do mesmo para a confirmação de outra elemento de desenvolvimento. No último tópico escala de desenvolvimento externa à realidade do lugar. procuramos relacionar a realidade de conflito no território Os autores aqui presentes nos mostram que o espaço rural Canastra ao atual paradigma de desenvolvimento vive um paradigma mais próximo do capitalismo, mas sustentável no campo. que não interrompe as relações sociais essencialmente rurais e antigas parcerias estabelecidos entre os atores 1.1 A questão dos conflitos locais, o que pressupõe iniciativas em curso por um

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Os conflitos são embates, disputas, lutas ou mesmo denominarmos de conflitos sociais, ao invés de conflitos oposição assumida por indivíduos e/ou grupos sociais ambientais, caracterizado anteriormente, na tentativa de diante de um fato, comportamento ou situação que ampliar a perspectiva teórica nessa área. Barbanti (s/d) potencialize a deflagração de conflitos entre as partes ainda defende a interdisciplinaridade para analisar envolvidas. Em um sentido mais amplo, os conflitos conflitos, especialmente, os de ordem ambiental referente constituem embates: “envolvendo grupos sociais com às formas de desenvolvimento sustentável, o autor recorda modos diferenciados de apropriação uso e significado do a insuficiência teórica da questão que neste caso não território” e despontam com a iminência de uma ameaça discorre as dimensões da sustentabilidade de um conflito proveniente de “impactos indesejáveis – transmitidos pelo (social). solo, água, ar ou sistemas vivos – decorrentes do Notado a lacuna teórica do conceito conflito exercício das práticas de outros grupos” (ACSELRAD, retornamos às contribuições iniciais sobre conflito e 2004, p.26). Ainda afirmamos, segundo Zhouri; território. Parte-se do pressuposto que os conflitos são um Laschefski (2010, p. 04) que os conflitos ambientais fato social que envolve dois ou mais grupos sociais ou surgem das distintas práticas de apropriação técnica, indivíduos com interesses distintos e numa determinada social e cultural do mundo material e que a base cognitiva “negociação” ocorre simultaneamente a disputa material e para os discursos e as ações dos sujeitos neles envolvidos ideológica onde as relações sociopolíticas estabelecidas configura-se de acordo com suas visões sobre a utilização reagem concorrencialmente entre as partes. Um conflito do espaço. pode ser “esmagado” ou pode ser resolvido, entretanto a Os conflitos, portanto, eclodem em um conflitualidade não (FERNANDES, 2004). O autor determinado território quando os recursos naturais ou diferencia conflito de conflitualidade esta permanece técnicas culturais são projetados para a utilidade fixada na estrutura da sociedade, em diferentes espaços, mercadológica externa à comunidade local, dado as aguardando o tempo de volta, das condições políticas de racionalidades distintas de uso e produção pelos atores manifestação dos direitos (FERNANDES, 2004). Ou seja, sociais internos e externos ao território em disputa. O a conflitualidade é marcada pela hierarquia social conceito de conflitos ambientais abrange a dimensão contínua, não localizada e historicamente construída, mas socioambiental, se trata da relação homem e meio. Ainda vulnerável pelas mudanças sociopolíticas em decurso. à relação do homem e meio no conceito de espaço A conflitualidade é o processo de enfretamento atribuído por Lefebvre (1991) que o diferencia em: perene que explicita o paradoxo das contradições e as concebido, vivido e abstrato, os conflitos ambientais desigualdades do sistema capitalista, evidenciando a acontece a partir da subordinação do espaço vivido pelo necessidade do debate a respeito do controle político e de espaço concebido ou pelo abstrato que se dá, por modelos de desenvolvimento (FERNANDES, 2004, exemplo, através de um projeto Estatal de p.05). Compreende-se a conflitualidade enquanto desenvolvimento planejado sob um viés ideológico de processo social que perpassa no tempo envolvendo cunho nacionalista nas comunidades atingidas que, tentativas de participação democrática, negociação e geralmente, resistem em meio aos riscos de perda com o acordos em busca da inserção. A conflitualidade e o avanço do abstrato sobre o espaço vivido. desenvolvimento acontecem simultâneos e Para nossa discussão sobre conflitos no espaço consequentemente, promovendo a transformação de rural não deixamos de considerar a questão agrária territórios, reeditando permanentemente o mapa da convergente à territorial-ambiental. A questão agrária geografia agrária, reelaborado por diferentes modelos de compreende as dimensões econômica, social, ambiental, desenvolvimento (FERNANDES, 2004, p.06). cultural e política. A questão agrária é antes de tudo uma questão territorial (FERNANDES, 2004, p.27). O autor 1.2 Conflitos no entorno do Parque Nacional da Serra funde a questão agrária à territorial, a primeira não condiz da Canastra somente ao valor econômico e poder político da terra, mas ao significado cultural e ambiental desta para o seu A área de conflito do entorno do Parque Nacional, proprietário. Em meio às disputas territoriais o valor aqui citado, situa-se na micro-região da Serra da Canastra, simbólico emerge como prerrogativa capaz de associar os especificamente o distrito de São José do Barreiro, atores locais, de modo que relutem em comunidade frente município de São Roque de Minas - sudoeste do Estado ao discurso hegemônico de desenvolvimento e às de Minas Gerais. Essa localidade está estrategicamente transformações socioespaciais em curso. Os territórios localizada entre a capital mineira e as cidades de Ribeirão não são apenas espaços físicos, são também espaços Preto, e São José do Rio Preto entre outras do sociais, espaços culturais, onde se manifestam as relações interior e São Paulo, que constituem um dos principais e as idéias transformando em território até mesmo as destinos para comercialização do queijo canastra1. O palavras (FERNANDES, 2004, p.27).

Barbanti (s/d) conclui após retomar alguns 1 estudiosos sobre conflito que o recorte analítico de No ano de 2006, sob a égide do Instituto de Patrimônio Histórico Artístico Nacional (IPHAN), foi registrado no livro de conflitos ambientais ou socioambientais não contempla a saberes as peculiaridades sobre o modo artesanal de fazer o interpretação dimensões essenciais de um conflito, queijo Minas em quatro micro-regiões produtoras, entre elas a evitando assim, o avanço teórico. O autor propõe da Serra da Canastra.

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distrito de São José do Barreiro pertencente ao município naturais com a implementação do Parque Nacional, o de São Roque de Minas desenvolve atividades modo artesanal de fazer o queijo Minas e o escoamento essencialmente agrícolas. Ao longo de todo o século XIX desse produto persiste entre as 4.813 propriedades rurais e nas primeiras décadas do século XXI seu sistema da Serra da Canastra, ainda como principal atividade produtivo esteve baseado na pecuária leiteira de baixa econômica e expressão cultural desse território escala tornando-se o sustentáculo da economia local genuinamente agrário. O queijo também é associado ao (BARBOSA, 2007, p. 58). O garimpo como atividade fortalecimento de laços de sociabilidade, não só entre econômica desenvolvia-se no início da década de XX a vizinhos, mas também entre pessoas de outras regiões partir da descoberta de jazidas de diamantes na região da (SANTOS et al., 2012). O valor simbólico do território Serra da Canastra, precisamente nas cabeceiras do Rio Canastra é marcado pela produção do queijo artesanal São Francisco, o Kimberlito Canastra ___ 1 primeira transmitido por gerações e é responsável pela fonte economicamente viável para exploração no país permanência de agricultores familiares e camponeses em (CHAVES et al., 2008, p. 300)2. suas terras, geralmente, conflituosa dado as condições Segundo Barbosa (2007) o conflito nesta área “pouco incentivadoras” de reprodução no campo. ressurge com a proposta de ampliação do Parque Nacional Podemos resumir que os conflitos inerentes ao da Serra da Canastra em 2005. Este Parque foi criado em espaço rural do entorno do Parque Nacional da Serra da 1972 com o objetivo de proteger as nascentes do Rio São Canastra vincula-se às pressões por apropriação pelos Francisco. Inicialmente estava previsto para sua órgãos de proteção ambiental em contrapartida da implementação uma área de aproximadamente 200 mil desapropriação de propriedades rurais circunscritos nos hectares, localizados nos Chapadões da Canastra e da limites do Parque. Essa situação conflituosa provoca Babilônia, no entanto, foi regulamentado e demarcado na represálias como queimadas criminosas por parte dos década de 1970 somente 71.525 hectares, ocupando três proprietários rurais ameaçados em ceder suas terras para o municípios: São Roque de Minas, Sacramento e plano de regularização dos 130 mil hectares da área do Delfinópolis. A revisão do Plano de Manejo do Parque foi Parque. Outro conflito que concorre a um possível projeto publicada pelo IBAMA no início de 2005, confirmando a de desenvolvimento rural é a viabilidade para exploração possibilidade de desapropriação dos cerca de 130 mil de diamante, como já discutido poderá acarretar impactos hectares em processo de regularização pela União, o que negativos nas dimensões física, cultural e sociopolítica na acentua os conflitos fundiários entre os proprietários região. O avanço do espaço abstrato sobre o espaço vivido rurais e órgãos de preservação ambiental na região para mediado pela projeção moderna de desenvolvimento apropriação dos limites institucionalmente delimitados implica diretamente na produção artesanal do queijo pela Unidade de Conservação Federal. Minas, visto que os produtores, concentrados na micro Além do conflito fundiário mencionado, a região região da Serra da Canastra, área limítrofe do Parque, são constantemente é especulada para regulamentar a pressionados a se adequar às novas regras da vigilância exploração de diamante. Empresas estrangeiras, já sanitária por meio da reforma das queijarias, muitos instaladas na localidade, confirmam a viabilidade destes produtores estão desprovidos de recurso para econômica para as atividades exploratórias desse mineral modernizar os meios de produção que lhe provê a que inclusive, corresponde parte da área circunscrita do reprodução social naquele espaço rural. Parque. No entanto, a mineração trata-se de uma atividade altamente impactante no espaço. Para o espaço rural da 2 O ESPAÇO RURAL Serra da Canastra os impactos provocados pela exploração diamantífera não podem ser considerados Neste tópico introduziremos o conceito de espaço pontuais no território, mas abrangente na própria rural para distanciarmos da concepção de urbanização do territorialidade desse espaço. A população imediatamente rural / rural-urbano ao tratarmos da área deste ensaio o atingida pelo projeto de exploração dos recursos minerais entorno do Parque Nacional da Serra da Canastra, daquela região seriam os camponeses e agricultores precisamente, o distrito de São José do Barreiro, familiares dependentes da terra para trabalho. município de São Roque de Minas por considerarmos a Apesar das mudanças socioespaciais atribuídos construção histórica cultural de base agrária desta pelo interesse econômico da exploração mineral e do localidade e a hipótese, embasado em estudos anteriores turismo ecológico através da apropriação das belezas na região, de haver resistência por parte dos camponeses e agricultores familiares ao permanecerem em suas terras 2 O Kimberlito Canastra – 1 está localizado na parte externa, diante das transformações socioespaciais previstos no próxima ao grande escarpamento da Serra da Canastra, região território Canastra. A especificação do que seria o espaço do Alto Rio São Francisco, cerca de 7 Km a oeste do vilarejo de rural permitirá, mesmo que superficialmente, adentrarmos São José do Barreiro, município de São Roque de Minas. O no mundo rural e tornar mais flexível a ideia de acesso à área é feito, desde Belo Horizonte, pelas rodovias MG- desenvolvimento no espaço rural e de modo que não 050 até Piumhí (260 Km), daí em direção a Vargem Bonita (57 simplificamos a produção do espaço urbano aparte do Km) e, depois, por estradas de terra atingindo São José do rural como princípio único de desenvolvimento. Barreiro (17, 5 Km) e por fim, a intrusão (~12km) (CHAVES et al. 2008, p. 358). Marques (2002) nos traz um estudo sobre o conceito de espaço rural e ruralidade e inicia apresentando

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dois caminhos para se pensar o rural e o urbano: a se trata de ver o rural como sinônimo de atraso, de dicotômica e a de continuum. A primeira como meios agrícola, de natural (ALENTEJANO, 2000, p.102). Assim sociais distintos explicitados no campo e na cidade e a as diversidades locais que se manifestam entre espaços segunda defende que o processo de urbanização é devem ser compreendidos a partir das diferenças responsável pelas mudanças na sociedade em geral, de territoriais atribuídas pelo espaço vivido em contraponto modo que a realidade rural se aproxime da realidade ao abstrato. O espaço rural não é mera representação urbana e se torna uma interpretação homogênea da espacial, mas um espaço ainda constituído por relações realidade entre espaços. Para o significado da ruralidade sociais e um modo de vida paralelo à lógica urbana, parte-se da análise da relação cidade-campo ao longo do portanto, capaz de estabelecer autonomia para tempo no ocidente por meio da periodização histórica organização social e política no rural. proposta por Lefébvre, que identifica três eras: a era Alentejano (2000) nos alerta para o reordenamento agrária, a era industrial e a era urbana individualismo territorial no campo, conhecido por “novo rural (MARQUES, 2002, p.105). Este estudo, citado por brasileiro” o qual deverá ser percebido enquanto condutor Marques (2002) mostra o espaço rural envolvido pelo de desenvolvimento do rural. O autor aponta importantes tecido urbano, desestruturando a análise sobre a elementos indicativos de um novo modelo de ruralidade. A autora, porém, mostra prevalecer a desenvolvimento no campo brasileiro como a valorização dicotomia rural / urbano ao afirmar que: da agricultura familiar e o avanço da pluriatividade, embora a concentração fundiária e o êxodo rural O espaço rural persistam como questões agrárias de difícil solução. corresponde a um meio Pautada na revisão sobre o tema realizada por Araújo específico, de características (2009) para superarmos a classificação rural/urbana mais naturais do que o limitada às circunscrições territoriais, insistimos em urbano, que é produzido a analisar as relações entre os sujeitos dessas espacialidades partir de uma multiplicidade e então compreender a ressignificação que surge do rural de usos nos quais a terra ou o pelos próprios atores locais. Devemos pensar o espaço “espaço natural” aparecem rural não apenas a partir de sua funcionalidade econômica como um fator primordial, o à sociedade urbana hoje estruturada, mas a partir de um que tem resultado muitas esforço no sentido de identificar a contribuição que um vezes na criação e recriação “novo” rural possa dar para a transformação de nossa de formas sociais de forte sociedade (MARQUES, 2002, p.110). inscrição local, ou seja, de territorialidade intensa 2.1 Desenvolvimento no espaço rural (MARQUES, 2002, p.109).

Como vimos anteriormente a concepção de espaço Prosseguindo com Marques (2002), a autora busca rural transcende o uso de critérios meramente argumentos que propõe uma análise da não ruralidade demográficos e sugere uma descrição mais próxima da vinculada à historicidade e ao continuum rural-urbano e realidade por meio do conhecimento das relações sociais sim, uma definição sobre o rural como forma específica ou sociabilidade característico em cada espaço. Portanto, de relação da sociedade com o espaço que apresenta um se faz necessário identificar novas formas de organização caráter dominante: a sua inscrição local (MARQUES, social no campo que refletirá na produção agrícola 2002, p.102), ou seja, prevê que uma abordagem frequentemente arraigada à territorialidade. Um projeto de associada à relação homem e meio se diferencia no desenvolvimento rural que vise a inclusão social a partir ambiente rural ou urbano, como se os espaços pré da melhoria geral das condições de vida e da realização de determinassem as relações humanas, neste caso, tais novas atividades no campo deve se basear no processo de relações concebidas no espaço vivido sob influência do descentralização política e de valorização de saberes meio rural ou urbano dicotomicamente entendidos. O locais (MARQUES, 2002, p.110). A autora nos mostra urbano representaria relações mais globais, mais que a exequibilidade para o desenvolvimento rural parte descoladas do território, enquanto o rural refletiria uma da mobilização dos atores locais, dentre estes agricultores vinculação local mais intensa (MARQUES, 2002, p.99). familiares e camponeses, geralmente, excluídos dos Um dos expoentes dos estudos agrários, processos “ditos” de emancipação social no campo que Alentejano (2000) concorda com a existência de contraditoriamente visa um desenvolvimento rural mudanças sociais, econômicas, culturais e espaciais participativo. motivados pela expansão urbana na cidade, inclusive no A noção de desenvolvimento rural surge campo, no entanto, o autor não compartilha com o posteriormente àquela de desenvolvimento agrícola determinismo que coaduna para o e a fim do rural (condições de produção relativas à atividade econômica afirmação da urbanização totalitária do espaço. Apesar específica) e àquela de desenvolvimento agrário das inferências socioespacias resultantes do (condições de produção na sociedade inerentes ao desenvolvimento do fenômeno urbano, o rural não deixará processo histórico e estrutural mais amplo) (CHALITA, de existir, apenas está tendo seu significado alterado, não

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2005, p. 98). A definição do que seja “desenvolvimento pluriatividade, ela condiz à uma estratégia de reprodução rural” segundo Navarro (2001) é influenciada por social tomada, principalmente, por agricultores familiares variáveis externas da economia e sociedade, que orientam e camponeses. Segundo Schneider (2003) a pluriatividade às famílias rurais mecanismos de desenvolvimento, enquanto estratégia de fomento à produção no espaço mesmo que voláteis no tempo, o objetivo comum de rural surge nos países desenvolvidos na era pós-fordista alcançar melhores condições de vida da população rural onde as propriedades rurais agregam às tradicionais no campo. funções agrícolas e alimentares da terra novas atividades Pode-se considerar o desenvolvimento um ideal produtivas e ocupacionais. Tais usos são atribuídos ao abstrato, configurado por uma imposição externa, uma papel do consumo de bens materiais e simbólicos (por proposta previamente elaborada pelo Estado de mudança exemplo, propriedades, festas, folclore e gastronomia) e social, às vezes equivocadamente implantada numa dada serviços (ecoturismo, atividades ligadas à preservação realidade. O Estado funda-se para tanto em uma ambiental etc.), indicando, assim, uma ressignificação das estratégia pré-estabelecida, metas definidas, metodologias atividades no espaço rural a partir do pós-fordismo. de implementação, lógica operacional e as demais No tempo presente, a pluratividade aparece como características específicas de projetos e ações uma das alternativas de dinamização do “novo rural” governamentais que têm como norte o desenvolvimento ligadas à prática do turismo rural, como hotéis-fazenda, rural (NAVARRO, 2001, p.88). Cabe ao Estado articular pesque pague, pousadas, casas de segunda residência, com as bases comunitárias e adequar ao local o projeto de dentre outras. “São características que já eram pertinentes desenvolvimento, de modo que as mudanças resultantes às práticas rurais, mas que assumiram uma nova dimensão se estabeleçam progressivamente no ambiente. analítica acerca das atividades rurais” (ARAÚJO, 2009, p. De acordo com Marques (2002) o projeto de 212). O comentário da autora se deve à relação campo- desenvolvimento rural apostado no país nos últimos anos cidade condicionado pelas especificidades de cada espaço focado na expansão do agronegócio trouxe aumento de a qual contribui para a consolidação desse novo rural produtividade e balança comercial favorável para a mediado por atividades pluriativas como o turismo. (...) economia no geral, em contrapartida, o acréscimo dos “O mundo rural ganhou novas imagens e novos sentidos, custos sociais e ambientais com o incentivo à já que há uma revalorização desse espaço, integrado à monocultura. Navarro (2001) nos mostra ainda haver uma revalorização da natureza por parte dos citadinos” tendência para conciliar desenvolvimento rural e meio (ARAÚJO, 2009, p. 212). ambiente. Nota-se que a palavra sustentável já acompanha A nova configuração do espaço rural marcada pela o termo desenvolvimento rural em programas mercantilização de bens e serviços expressa o atual governamentais, por exemplo. paradigma capitalista agrário. Nesse contexto, as unidades Retornando a gênese da discussão sobre familiares agrícolas tornam-se pluriativas, garantindo, desenvolvimento rural e as formas de organização no condições razoáveis de sobrevivência (SCHNEIDER, espaço rural destaca-se a necessidade de politização no 2003). O fenômeno da pluratividade atinge os níveis de campo para concretizar qualitativamente o projeto de pequena, média e grande escala produtiva nas desenvolvimento movido pelo poder publico. A recente propriedades rurais, frequentemente, experienciado em condensação de demandas sociais centradas em torno da unidades menores de produção, visto a necessidade noção de “agricultura familiar” igualmente tem reforçado imediata dos pequenos produtores para reprodução social esta tendência de reivindicar novos padrões de e econômica no campo, dificuldades que podem ser desenvolvimento rural que incluam mecanismos de associados às condições climáticas desfavoráveis, falta de repercussão local (NAVARRO, 2001, p.90). Na prática incentivo e recursos financeiros, desvalorização do os agricultores familiares e camponeses limitam-se às trabalho no campo, etc. O que poderia ser uma estratégia dificuldades operacionais para se organizarem e reprodutiva torna-se inviável por tais circunstancias. formularem diretrizes de desenvolvimento que vá ao Apesar da problemática apresentada, os “atores encontro de interesses vinculados ao aprimoramento de locais” estão mais flexíveis com o rearranjo produtivo técnicas de produção familiar e melhoria de vida a inerente ao novo paradigma rural brasileiro, como observa garantir a permanência desses atores no campo. Navarro Chalita (2005). (2001) reitera que para construir uma estratégia de A noção de desenvolvimento rural é necessário a priori analisar o "ruralidade" como "modo de desenvolvimento agrícola e então interpretar o vida constitutivo de um desenvolvimento agrário de determinada localidade, na determinado ambiente", tentativa de conceber o desenvolvimento através da mesmo em realidades de alta descentralização e horizontalização política. integração com o mercado, indica fenômenos de usos múltiplos do espaço 2.2 Pluratividade geográfico, pluriatividade,

demanda por educação e Uma das práticas de produção, cada vez mais qualidade de vida, acesso a recorrente, no campo brasileiro é o fenômeno da técnicas, circuitos de

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produção e inserção cultural capacidade de trabalhar em rede, demonstrados pelos no mundo urbano e redes de atores sociais de uma determinada localidade. Esse sociabilidade diversas que indicador corresponde ao fenômeno de proximidade envolvem os agentes social que permite uma forma de coordenação entre os econômicos da produção atores capaz de valorizar o conjunto do ambiente em que agrícola (CHALITA, 2005, p. atuam e, portanto, de convertê-lo em base para 98). empreendimentos inovadores (ABRAMOVAY, 2000, p. 02). Para o contexto do desenvolvimento no espaço rural Schneider (2003) complementa ao dizer que a as condições territoriais de ordem física e cultural devem pluratividade não se trata de um fenômeno decorrente de ser percebidas para serem apropriadas comumente entre processos sociais e econômicos externos às unidades os atores locais com vistas a uma revalorização espacial familiares. Segundo o autor, esses sujeitos exercem um baseada no capital social de um dado território. Além da papel importante para a afirmação da pluratividade de percepção conjunta, reafirmarmos a importância de atividades rurais, considerando que a reprodução social, politização entre os atores locais para promoção dessa econômica, cultural e simbólica das formas familiares proximidade social. dependerá da capacidade de organização e relação com o Para Coleman (1990) e Putnam (1993) o capital espaço onde essas unidades familiares estão inseridas. social é um conjunto de recursos, incluindo os simbólicos, Schneider (2003) ainda nos revela sob um olhar cuja apropriação influencia o destino de uma comunidade. sociológico que os agricultores familiares adeptos à Trata-se de um bem público (PUTNAM, 1993), um pluratividade, mesmo induzidos à dinâmica capitalista de instrumento comunitário em potencial de defesa contra os produção, preservam formas sociais e estabelecem interesses privados alheios a um território. Assim, Putnam relações sociais não capitalistas. (1993) enfatiza que a acumulação de capital social é um A pluriatividade, mesmo não eficientemente processo de aquisição de poder e de mudança no plano planejada, é executada por agricultores familiares e local. Lançamos a suposição, que o capital social se camponeses como única maneira de produzir e obter estimulado e auto gerido garantirá o desenvolvimento autonomia na gestão da própria terra e aos médios e territorial através da racionalidade endógena dos recursos grandes proprietários que alargam as oportunidades de pelas comunidades e propiciará a elas capacidade de negócio através da diversificação da produção não resistência às imposições externas de desenvolvimento agrícola, exemplificado por Schneider (2003) como inverso ao espaço vivido. “consumo não-produtivo” referente à paisagem rural, o clima, o ambiente natural etc. Tal dinâmica propicia ao 3 CONFLITO E POTENCIALIDADES NO espaço rural maior aproximação com o mundo urbano, o ENTORNO DO PARQUE NACIONAL DA SERRA que não é sinônimo de urbanização como discutimos. Os DA CANASTRA modos de uso variam e ampliam, os atores sociais também se multiplicam, no entanto, os modos de vida que A “comunidade” mobiliza-se em situações de dão sentido ao espaço rural tendem a persistir. Como conflito, para a defesa de seu território ou para a define Vargas (2010), nesse contexto, ao ser reconhecidos construção de projetos comuns (PEREIRA, s/d). Essa como depositórios principais da biodiversidade, de um premissa se justifica ao interesse mutuo de uma dada rico patrimônio paisagístico e de formas de vidas comunidade em permanecer no território a partir do crescentemente valorizadas nos dias de hoje, os espaços capital social nele existente. Em um conflito o sentido de rurais ganham dimensões promissoras para o processo de comunidade é colocado em evidencia, as estruturas desenvolvimento sociais, a cultura, valores simbólicos e outros atributos da

territorialidade são automaticamente compartilhados logo 2.3 Capital Social (elemento para o desenvolvimento) são formados estratégias de defesa pelos membros

coletivamente na expectativa de proteger cada patrimônio Para viabilizar nossa discussão sobre individualmente. O capital social contribui para o êxito desenvolvimento no espaço rural, sob interferência de das ações coletivas direcionadas ao combate ou à conflito, apresentamos o conceito de capital social, e negociação de um conflito. posteriormente, o relacionaremos à capacidade pluriativa Na Serra da Canastra, os camponeses detêm todos de produção e mitigadora de conflitos para o território os meios de produção e a força de trabalho é Canastra. Nessa sessão, vejamos as contribuições de predominantemente familiar (BARBOSA, 2006, p. 113). Abramovay (2000) que recorreu a dois dos importantes Segundo estudos de Barbosa (2006) após vir à tona a autores (COLEMAN, 1990; PUTNAM, 1993) para questão da regulamentação dos 130 mil hectares restantes retratar a noção de capital social essencial para o e o estabelecimento de uma faixa de amortecimento de dinamismo no espaço rural e consequentemente o seu dez quilômetros no entorno do Parque Nacional da Serra desenvolvimento, componente este mais ativo em certas da Canastra, moradores do município de São Roque de comunidades do que noutras. Minas, representado por empresários do turismo, O capital social depende diretamente dos vínculos comerciários e políticos locais, além de lideranças rurais sociais estabelecidos de cooperação, confiança, além da

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vinculados aos sindicatos e associações comunitárias, O presente ensaio conceitual nos confirma que rapidamente se mobilizaram e formaram a Frente Popular para haver o desenvolvimento rural como meio de em Defesa da Canastra que propôs a criação de uma área resistência aos conflitos territoriais é imprescindível a de proteção ambiental (APA) para permitir o uso participação conjunta e inclusiva dos atores locais sustentável dos recursos naturais existente na área de envolvidos em um conflito. A politização dos disputa. No entanto, essa medida não garantirá o fim da camponeses, agricultores familiares responsáveis pela ameaça à extração do diamante e à retirada forçada de manutenção dos modos de vida e relações sociais centena de pequenos proprietários rurais inscritos nos vinculados à ruralidade e o reconhecimento da limites do Parque. Nesse embate político-ideológico os acumulação de capital social e da reprodução física e sujeitos sociais mais lesados são os camponeses econômica através das atividades pluriativas pelas (BARBOSA, 2006, p.121). propriedades rurais contribuem para a preservação da O grupo dos pequenos proprietários rurais paisagem natural e do patrimônio cultural. Observa-se que apresentam certa fragilização de organização política e o o turismo, nesse contexto, emerge como atividade capital social pertencente à comunidade dos produtores do propulsora de novas ruralidades e funções no espaço tradicional queijo Minas da Serra da Canastra não está rural. sendo utilizado a favor da sustentabilidade reprodutiva, mas com vistas à apropriação dos atrativos naturais e REFERÊNCIAS culturais pelo capital propriamente dito, o que de fato dispersa os atores locais para a afirmação de sua ABRAMOVAY, Ricardo. O Capital Social dos territorialidade. As novas relações de produção, agrícolas Territórios: Repensando o Desenvolvimento Rural. e não-agrícolas, envolvem interesses difusos e ambíguos, Revista Economia Aplicada – volume 4, n° 2, abril/junho ligando indivíduos, empresas, comunidades e espaços em 2000. um movimento contraditório de aproximação e afastamento, identificação e estranhamento (BARBOSA, ACAMPORA, Teresa; FONTE, María Y. Productos 2006, p. 114). Típicos, Estrategias de Desarrollo Rural y As possibilidades de desenvolvimento do espaço Conocimiento Local. Revista Opera, nº 07, p. 191-212, rural na Serra da Canastra convergem para a pluratividade s/d. ligado ao turismo rural, sobretudo, através do “consumo não produtivo” da paisagem, uso recreativo dos recursos ACSELRAD, Henri (orgs.). Conflitos Ambientais no naturais, como cachoeiras, atividades de observação de Brasil. Rio de Janeiro: Relume Dumará: Fundação aves e mamíferos. A apropriação do capital social que Heinrich Böll, 2004. legitimamente pertence à comunidade camponesa e da agricultura familiar produtora do queijo artesanal da ALENTEJANO, Paulo Roberto R. O que há de novo no Canastra, além favorecer a ação conjunta desses atores rural brasileiro? Revista Terra Livre: São Paulo, nº15, diante dos conflitos territoriais aqui expostos, estimulará a p.87-112, 2000. comercialização e ampliação do mercado do queijo, um dos meios para esse fim seria a certificação desse produto ARAÚJO, Flávia Aparecida Vieira de. et al. Relação típico da Serra da Canastra, tal medida fortaleceria a Cidade-Campo: Desafios e Perspectivas. Campo- relação entre comunidade e território e reafirmaria, ainda, Território: Revista de Geografia Agrária, v.4, n.7, p.201- o poder do capital social para o desenvolvimento do 229, fev. 2009. espaço rural. Los efectos territoriales resultan de los más variados: económicos (crecimiento de sus actividades BARBANTI Jr., Olympio. Conflitos Socioambientais: productivas), socioculturales (aumento de la cohesión Teorias e Práticas. s/d. social por una mayor percepción de las raíces culturales comunes) (ACAMPORA; FONTE, p.195). BARBOSA, Cristiano. Tem Gente no Parque: As relações entre Agricultura Camponesa e Espaços Territoriais Especialmente Protegidos – O Parque Nacional da Serra 4 CONCLUSÃO da Canastra, Minas Gerais. In.: Relatório Final de

Pesquisa Projeto Tempos e Espaços nas Comunidades Uma mudança em Rurais no Alto e Médio São Francisco, Minas Gerais: direção a práticas Uma Pesquisa Interdisciplinar sobre Permanências e sustentáveis, com uma visão Mudanças de Modos de Vida em Comunidades Rurais e de interesse comum, difuso, e Ribeirinhas. – Laboratório de Geografia Agrária/UFU, de atendimento às Uberlândia, Minas Gerais, 2006. necessidades futuras, seria

inevitável (BARBANTI, s/d, BARBOSA, Cristiano. Territórios de Vida e Trabalho p. 03). dos Pequenos Produtores de Queijo da Serra da

Canastra: Um Estudo Sobre a Relação entre Produção Camponesa e Espaços Naturais Protegidos nas Nascentes

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Anais do VIII Congresso Brasileiro de Turismo Rural e I Colóquio Internacional de Pesquisa e Práticas em p. 063-072 Turismo no Espaço Rural, Rosana - SP, 10-13 de novembro de 2013. v.1.

ROTEIRO TURÍSTICO RURAL NO MUNICÍPIO DE ROSANA/SP: POSSIBILIDADES DE INCLUSÃO

CLEDIANE NASCIMENTO SANTOS ROSANGELA CUSTODIO CORTEZ THOMAZ

Universidade Estadual Paulista - Unesp Mestranda do Programa de Pós Graduação em Geografia da UNESP, Presidente Prudente – SP Docente do curso de Turismo, Rosana- SP {[email protected]; [email protected]}

RESUMO - A abordagem sobre turismo e cultura popular no espaço rural de Rosana/SP, consiste em considerar a cultura como campo de possibilidade para o desenvolvimento turístico do município em questão. Propõe - se a compreender o turismo por meio de um estudo de caso, de natureza descritiva e exploratória, com estudo da literatura pertinente e mediante o uso de entrevistas semi-estruturadas, com roteiro elaborado previamente e com questões em aberto, pois este tipo de entrevista possibilita mais flexibilidade à pesquisadora em inserir alguma questão sobre algum aspecto importante surgida no ato da entrevista, e que não tenha sido contemplada no roteiro. Os atores são a Prefeitura, a Usina Hidrelétrica Engenheiro Sérgio Motta, o Museu de Memória Regional e os organizadores das manifestações culturais dos assentamentos rurais. Os dados coletados foram interpretados seguindo a bibliografia pesquisada. Constatou que os entrevistados consideram a cultura como relevante para o desenvolvimento do turismo no espaço rural.

Palavras chave: Assentamentos Rurais, Cultura, Roteiro Turístico, Turismo no Espaço Rural.

ABSTRACT - The approach to tourism and popular culture in rural Rosana/ SP is to consider culture as a field of opportunity for the tourism development of the municipality in question. Propose to understand tourism through a case study, a descriptive and exploratory, with the study of literature and by using semi-structured interviews with script prepared and open issues, because this type of interview allows more flexibility for the researcher to insert a question on some important aspect that emerged during the interview, and that has not been contemplated in the script. The actors are the City council, the Engineer Sérgio Motta Hydroelectric, the Museu de Memória Regional and organizers of cultural events of rural settlements. The data collected were interpreted by following the bibliography searched. It was found that the interviewees consider culture as relevant to the development of rural tourism.

Key words: Rural Settlements, Cultura, Tourist Itinerary, Tourism at Rural Areas.

1 INTRODUÇÃO fenômeno e o contexto não estão claramente definidos” (YIN, 2005, p. 32). Este trabalho tem o propósito de analisar a Além disso, “parte do principio de que o estudo potencialidade das manifestações culturais dos aprofundado de um caso pode ser representativo em assentamentos Gleba XV de Novembro e Nova do Pontal muitos outros, ou mesmo em casos semelhantes”, isso é o como possibilidade de criação de roteiros turísticos. Dessa que induziria a escolha do objeto de estudo. (GIL, 2008, forma, este artigo é um estudo de caso de natureza p. 18). descritiva e exploratória. A natureza descritiva da pesquisa tem como O estudo de caso é uma “investigação empírica características: observar, registrar, analisar e correlacionar que investiga um fenômeno contemporâneo dentro de um fatos. Este tipo de pesquisa é utilizado principalmente nas contexto da vida real, especialmente quando o limite entre ciências humanas, especialmente para obtenção de dados que não consta em documentos. Dessa forma, a pesquisa

C.N. Santos; R. C. C. Thomaz ISSN 2176-9052

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descritiva, em suas diversas formas, trabalha sobre dados Assim, em 15/11/1983 aproximadamente 800 ou fatos colhidos da própria realidade (CERVO E trabalhadores vindos dos municípios de Rosana, Euclides BERVIAN; 2002). da Cunha, Teodoro Sampaio, e Do mesmo modo, a pesquisa exploratória é outras localidades, ocuparam as terras da ex-fazenda importante, porque tem como “finalidade desenvolver, Tucano e Rosanela, ambas em Teodoro Sampaio. A esclarecer e modificar conceitos e idéias, tendo em vista a ocupação terminou por meio de um pedido de formulação de problemas mais precisos ou hipóteses desapropriação feito pelos proprietários e foram pesquisáveis para estudos posteriores”. Este tipo de despejados e fizeram um acampamento na Rodovia pesquisa se caracteriza como aquela que exige pouco Arlindo Bétio, SP 613 (IOKOI et al., 2005). rigor no planejamento e envolvem levantamento Após um tempo foram para uma área provisória bibliográfico e documental e aplicação de entrevistas não cedida pela CESP. Com o agravamento da questão padronizadas, no qual está muito presente nos estudos de agrária, o governo paulista em 1984, desapropriou uma casos. (GIL, 2008, p.27). área equivalente a 15 mil hectares (há) para a implantação A coleta de dados se deu por meio da pesquisa do projeto de assentamento, que hoje é conhecido como bibliográfica, documental e entrevista semi-estruturada, Gleba XV de Novembro. (SANTOS, 2009). com roteiro elaborado previamente e com questões em Este assentamento, por ser o mais antigo do Pontal aberto, pois este tipo de entrevista possibilita mais do Paranapanema, sua história evoca aos bastidores da flexibilidade à pesquisadora em inserir alguma questão luta pela terra nesta região, protagonizados pelas famílias sobre algum aspecto importante surgida no ato da que conquistaram o direito de ter o seu lugar, o seu entrevista, e que não tenha sido contemplada no roteiro. pedaço de chão. Neste trabalho será ocultado o nome dos Ele é palco de muitos embates internos que faz entrevistados, apesar do consentimento das entrevistas e deste assentamento um caso típico, no qual a luta dos nomes para identificação dos mesmos, optou – se por ideológica dos movimentos sociais pela terra se faz preservar a identidade dos entrevistados nos quais serão presente. Este fato caracteriza este assentamento no substituídos pela palavra entrevistado que representam município de Rosana como enigmático para se desvendar aleatoriamente a Usina Hidrelétrica Eng. Sérgio Motta, o o histórico da luta pela terra e para compreender a atuação Museu de Memória Regional, a Folia de Reis e a Roda de dos movimentos sociais que lutam pela reforma agrária. Viola. Ele possui algumas festividades popular tais como: As manifestações com potencialidade para a Folias de Reis, festa de Aniversário da Gleba XV de criação do roteiro turístico são: Folias de Reis e a Roda de Novembro, Festa da Mandioca, Roda de Viola e as festas Viola. Elas foram escolhidas dentro do contexto cultural, dos padroeiros, como Nossa Senhora Aparecida, Sagrado por estar mais associada com o espaço rural e trazem as Coração de Jesus, Santa Luzia. características da ruralidade, tais como: a musicalidade da Este assentamento é o mais indicado para uma viola, a transmissão do saber por meio da oralidade e da proposta de Turismo no Espaço Rural - TER que valorize tradição da Folia de Reis “Estrela Guia”. os aspectos culturais, representados pelas festas Para entender o ambiente que essas manifestações populares, especialmente a Roda de Viola e a Folia de estão inseridas, vale uma breve contextualização histórica Reis, para as questões de reforma agrária e assim como os dos dois assentamentos: Gleba XV de Novembro e Nova aspectos produtivos das propriedades por meio da do Pontal dos quais são os selecionados para a realização vivência com as famílias assentadas em sua lida diária deste estudo. com a produção. O assentamento Gleba XV de Novembro está Já o assentamento Nova do Pontal, originalmente, localizado em dois municípios, com lotes distribuídos em era composta por 122 famílias, abrangendo uma área de vários setores, nos quais, o setor I, II, III localizados em 2.786 hectares de terra localizando-se nas margens direita Rosana/SP e os setores IV, V VI em Euclides da Cunha e esquerda da rodovia que liga distrito de Primavera ao Paulista. Originalmente, foram criados 571 lotes, dos Paraná, via Diamante do Norte. (CRUZ, 2008). Possui em quais 438 estão em Rosana/SP. (IOKOI et al., 2005). sua área grande capacidade hídrica por estar próxima a O inicio deste assentamento está relacionado às margem do rio Paranapanema e do reservatório da Usina demissões da Companhia Energética do Estado de São Hidrelétrica de Rosana. Paulo - CESP, das empreiteiras e da Destilaria Alcídia. O Sua fundação está atrelada a concessão da Fazenda desemprego massivo de milhares de pessoas deixaram Timboril Agropecuária Ltda, para o Estado, em 1998. O muitas famílias sem ter para onde ir e nem opção de Instituto de Terras do Estado de São Paulo “José Gomes emprego na redondeza, logo que não havia outras da Silva”- ITESP realizou assembleia com 122 famílias empesas que pudesse acolher todo o contingente selecionadas para ocupar as terras. Este assentamento foi dispensado. Aliado a isso, outro agravante que surgiu foi um caso especifico já que foi formado por quatro grupos à enchente no rio Paranapanema, no ano de 1983 que diferentes: o MST, o MAST, ex-funcionários das desabrigou muitas famílias ribeirinhas. Estas famílias se fazendas e os sindicatos de Porto Primavera. Cada qual juntaram em um grande acampamento no trevo de ficou com uma área do assentamento. (CARNEIRO, Euclides da Cunha Paulista e organizaram um movimento 2007). que tinha como objetivo a luta pela terra. (SOUZA, 2007).

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Segundo pesquisa de Carneiro (2007) as famílias Segundo Dias (2006) o turismo tem a virtude de iniciais deste assentamento enfrentaram algumas expor a diversidade cultural, com ênfase na valorização e dificuldades, pois não havia infraestrutura no local, tais afirmação da identidade, dos valores, tradição, e dos como: estradas, água canalizada, energia elétrica, meios elementos paisagísticos locais. Da mesma forma, que de transporte, escolas. Somado a isso a falta de recurso também a atividade do turismo tem o poder de expropriar para investir na terra fizeram com as famílias buscassem as comunidades quando não planejado e quando tem em ajuda na gestão municipal da época para sua produção, e vista apenas o aspecto econômico em detrimento dos para perfurar poços. Do Estado conseguiram ajuda para aspectos sociais e culturais. O turismo deverá ser pautado construir estradas e escola. Dessa forma com o apoio no compromisso de contribuir para a valorização do conquistado e com o esforço das famílias as dificuldades espaço rural e a salvaguarda do seu patrimônio cultural. foram superadas. Entretanto a busca pelo turismo no espaço rural Atualmente este assentamento é visto com grande encontrou na transformação da estrutura da produção potencialidade para o desenvolvimento do turismo. agropecuária um campo favorável, pois propiciou ao Constitui-se, portanto, num assentamento de grande delineamento de um novo modelo produtivo rural, no qual beleza cênica pela proximidade com o rio Paranapanema o turismo é uma alternativa como provedor de recurso e em virtude de seu formato ficou conhecido com econômico em virtude de sua fácil adaptação dos recursos “tuiuiú”. (CARNEIRO, 2007). Este assentamento foi rurais em oferta turística. Assim, em meio à dificuldade diagnosticado como propício para o projeto piloto de enfrentada pelo agricultor familiar em manter-se no meio desenvolvimento do Turismo Rural – TR, mas também rural, o turismo surge como saída que poderá agregar como possibilidade para o TER. valor ao que é produzido. (THOMAZ, 2010). Portuguez (2005, p. 578) refletindo sobre os 2. TURISMO NO ESPAÇO RURAL – TER conceitos de turismo rural brasileiro, verificou que a razão para as dificuldades existentes em torno da conceituação O turismo, dentre todas as suas características, está no amplo conjunto de aspectos que caracterizam essa pode-se afirmar que tem como elemento substancial para modalidade de turismo no país. As diferentes paisagens sua efetivação, as peculiaridades de cada local, a existentes no rural brasileiro comportam diferentes identidade e a cultura. Assim, os assentamentos rurais de tipologias de turismo. Rosana/SP, é um diferencial para o desenvolvimento da atividade turística. Dessa forma, é necessário o Em cada configuração espacial, um arranjo de entrelaçamento dessa singularidade, que leve em paisagens dará origem a distintos entendimentos consideração a vida dos trabalhadores assentados, a da ruralidade, e desse modo, o turismo que lá for geração de renda, emprego, autoestima, valoração da praticado terá aspectos próprios de acordo com a organização histórica, cultural e geográfica de identidade e do modo de vida do pequeno agricultor, pois cada lugar. (PORTUGUEZ, 2005, p. 578). a relação entre turismo e cultura é riquíssima. Há uma forte tendência para a visitação nos Apesar das dificuldades em se estabelecer destinos de sol e de praia em virtude da concentração de conceitos sobre o Turismo no Espaço Rural – TER e infraestrutura para o turismo no litoral, com a presença de Turismo Rural – TR, no Brasil, nota-se que o Turismo empreendimentos estrangeiros, mas, percebe-se que os Rural – TR é uma expressão genérica tanto para o bens patrimoniais podem colaborar para inverter essa Turismo no Espaço Rural quanto para o Turismo Rural – lógica, contribuindo para disseminar o turismo em outros TR, mas neste trabalho adotamos o TER, por ser mais espaços, como por exemplo, o espaço rural. abrangente, no qual adequa-se melhor a esta pesquisa, pois o TER é uma atividade que não se limita a própria A exploração turística dos recursos patrimoniais modalidade, podendo abranger outros tipos de turismo permite inverter a forte tendência de concentração da oferta turística junto ao litoral, como, por exemplo, o turismo cultural, turismo de dispersando o turismo para o interior, para as aventura, dentre outros, sendo que estas não se excluem, pequenas cidades, com uma distribuição mais mas se complementam. equitativa dos seus benefícios, funcionando Joaquim (2001, p. 35) em seus estudos europeus assim como fator de criação de emprego e de sobre o turismo no espaço rural – TER, o conceitua como revitalização das economias locais. Representa, “um conjunto diversificado de atividades turísticas”, também, benefícios evidentes no que concerne apresentando profundos contrates, com diferentes aos custos de preservação do patrimônio que, conceitos de rural e as várias formas que o TER assume, muitas vezes, não podem ser assegurados pelos no qual o “traço comum, no âmbito de situações tão poderes locais. Por outro lado, com frequência se reclama a utilização do patrimônio para fins contrastadas, é o espaço rural”. turísticos para se fazer em face de um turismo Os modelos de implantação e desenvolvimento do massificado que ameaça as identidades locais. turismo rural brasileiro apresenta dissemelhança entre (THOMAZ, 2010, p. 39). Brasil e Portugal, a iniciar pelo conceito de turismo rural - TR, que no Brasil, tem um sentido mais abrangente, abarcando a “fruição de recursos rurais e atividades

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esportivas e ecológicas, bem como a dimensão além disso. O turismo não se limita apenas a espelhar os relativamente intangível da cultura e modo de vida das fatores econômicos como aspecto primordial, pois pode comunidades rurais e/ou de montanha”. Nesse sentido, o contemplara a afirmação do modo de vida dos turismo rural - TR brasileiro é por muitas vezes assentamentos e também a inversão para uma imagem confundido com TER, ou seja, é utilizada a mesma positiva em detrimento da identidade posta pela mídia no tipologia como sinônimas. No caso português e de outros qual o assentamento é o lugar de pessoas desocupadas. países europeus, a segmentação da oferta turística rural Outra questão fortemente atrelada ao turismo é sua está mais evoluída com tipologias e classificação mais associação como símbolo de degradação do espaço rigorosas, com delimitações entre TER e TR. (SIRGADO, natural e dos aspectos sociais e culturais. Partindo dessa 2001, p. 79). idéia, o TER de base local é aquele que é planejado em Para o Ministério do Turismo - MTur (BRASIL, conjunto com a comunidade. A comunidade que 2008), a conceituação de turismo no espaço rural engloba determinará o quer no seu território, quais as suas as diversas atividades desenvolvidas no meio rural, necessidades prioritárias. Isso poderá minimizar os independente de suas especificidades, tais como: o impactos do turismo, pois assim como toda atividade turismo rural, o agroturismo e o turismo rural na econômica, a inserção do turismo acarretará agricultura familiar. É o conjunto de atividades inevitavelmente, transformações no espaço no qual está comprometidas com as atividades agropecuárias e com a inserido. valorização do patrimônio cultural e natural como feições Isso nos leva a refletir em como se dá a construção da oferta turística no meio rural. e a inserção da atividade turística para que ela seja a Para Rodrigues (2001, p. 103), o Turismo Rural zeladora dos aspectos culturais e da identidade de uma estaria relacionado “a atividades agrárias passadas e comunidade. Isso partindo da premissa que a experiência presentes, que conferem à paisagem sua fisionomia é aquilo que aprendemos por meio da vivência, que nitidamente rural”. Diferenciando-se das áreas naturais, segundo Tuan (1983), expressa o sentimento, o cuja característica predominante é a natureza. pensamento, a realidade e a magnitude das relações Para o Ministério do Turismo (BRASIL, 2003, p. sociais. 11) o Turismo Rural no Brasil é Sem ter o que experimentar não haverá o turismo, pois as pessoas procuram novas vivências quando [...] é o conjunto de atividades turísticas investem em viagens turísticas. Por outro lado, os desenvolvidas no meio rural, comprometidas assentamentos rurais em questão devem proporcionar com a produção agropecuária, agregando valor a isso, da mesma forma, que deverá ter o mínimo de produtos e serviços, resgatando e promovendo o infraestrutura para que isso se torne realidade. patrimônio cultural e natural da comunidade. Assim, o planejamento torna-se uma ferramenta

importante na organização e utilização desse espaço rural. O espaço rural pode ser um lugar natural ou Nesse contexto, o planejamento deve ser uma ferramenta modificado pela presença humana, representando uma sempre presente no desenvolvimento da atividade síntese dos fatores naturais e dos resultados da ação turística, desde os gestores públicos, abrangendo humana, especializando-as, com usos de técnicas e empresas privadas e líderes comunitários. aproveitamento dos recursos existentes. Pode ser um De uma forma geral, o ato de planejar ajuda a espaço com uso recreativo ou de ócio em razão da distribuir as tarefas e responsabilidades referentes aos necessidade humana ou natural. Assim, a “paisagem, os atores envolvidos: comunidade, empresa privada e modos de vida da sociedade rural, são fatores de atração governo. É uma forma para estabelecer parâmetros sobre por si só, pois constituem cenários diferentes do cotidiano o que é ponderável ao desenvolvimento da atividade que e ritmos de vida diferente para o homem urbano”. possa atender as necessidades reais da localidade. (THOMAZ, 2010, p. 38). O espaço rural necessita também de planejamento, Por meio do TER é possível a junção de diversas pois em muitos casos, o espaço rural denota pobreza, em atividades tais como o turismo ecológico, pedagógico e o detrimento da política de desenvolvimento territorial que cultural e sua relação direta com o patrimônio e a há muito tempo tem comprometido a sobrevivência dos identidade local. Desde apresentações culturais, folclore, pequenos agricultores, especialmente pela ausência de: modo de vida, a experiência do homem camponês, assistência médica, educação, habitação, saneamento, hábitos, costumes, tradições, entre outros, que são cultura, etc. (YÁZIGI, 2009). Dessa forma, antes de diferenciais para o turismo. Nesse contexto, o visitante, qualquer ação na tentativa de desenvolver a atividade tende a visitar os lugares que se diferem do seu, com o turística seria de suma importância o melhoramento desse desejo de conhecer as particularidades inerentes ao lugar espaço e da qualidade de vida dessa população e (AVILA, 2009). No caso, os assentamentos muito se igualmente os valores e identidades construídas nesse distinguem do turismo do litoral e do urbano. território. Percebe-se que o desenvolvimento do TER O turismo poderá ser um divisor de águas que nas alcançou seu auge muito mais por questões econômicas, mãos certas poderiam contribuir para a requalificação do muitas vezes como sinônimo de geração de divisa, de espaço com todas as suas nuances e melhorar o que tem lucro, de bom investimento. Contudo, a atividade, vai, que ser melhorado (YÁZIGI, 2009).

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O planejamento trabalha com todas as variáveis Este lugar, chamado Rosana/SP, no qual neste possíveis que possam colaborar e atrapalhar no plano. trabalho estuda a possibilidade de inserção do turismo no Abordando pontos fracos, pontos fortes, oportunidades e espaço rural, há tempos, desde o período que José Ferrari ameaças, tentando extrair qualquer intempérie que possa Leite estudou a ocupação do Pontal do Paranapanema, prejudicar o andamento da atividade. que fora percebido e identificado o seu o potencial e sua Quando não há o planejamento os impactos vocação para o turismo, no seguinte dizer: negativos tendem a prevalecer. Por isso salientam Lohmann; Panosso Neto (2012, p.219): Nesta estação, a vila de Rosana fica envolvida pelas águas excedentes dos dois rios em Outro exemplo de impacto negativo é a perda de enchentes colossais. Assim, envolvida pelas autenticidade de pequenas comunidades, devido águas, Rosana revela toda a beleza de sua ao fluxo de turistas. Essa perda ocorre geografia selvagem em que o sol vermelho da geralmente pela constante troca cultural que tarde mostra milhares de garças e patos- existe no contato entre turistas e residentes, não selvagens voando no horizonte avermelhado em são estes últimos que mais sofrem seus efeitos. direção ao ocidente. A visão levou um geógrafo Muitas vezes, para satisfazer as necessidades ou a sonhar com um polo turístico paulista com a curiosidade dos turistas, os anfitriões elaboram base em Rosana, por sua semelhança com o pseudofestas e modos de viver que não existem Pantanal. (LEITE, 1998, p. 20-21). de fato, transformando o turismo e a sua cultura local em fenômenos inautênticos. O turismo depende de muitos fatores para sua concretização, para este conjunto de fatores constitui o Planejar é uma ação importante, pois é sabido que chamado sistema turístico, que há certas particularidades não há um planejamento que sirva para todas as cidades para seu funcionamento, tais como: demanda, oferta, ou destinos turísticos. O planejamento é único e produto, potencialidade, o empreendimento turístico, os direcionado para uma determinada área em que se está atrativos, a infraestrutura. Por este motivo, por depender estudando. Isso minimizaria os impactos previstos por de inúmeros fatores se faz necessário o seu planejamento, Lohmann e Panosso Neto (2012) descritos anteriormente. para que seja uma atividade responsável. Uma das formas de gerenciar o planejamento Assim, o turismo responsável é aquele que atrai as turístico é por meio de um estudo aprimorado da demanda pessoas para conhecer o lugar e desfrutar de sua cultura, e mercado turístico, bem como um levantamento dos da beleza natural, assim como, o turista deve ser atrativos existentes e em potenciais para a confecção de respeitado e acolhido com qualidade, segurança e oferta produtos com base na potencialidade identificada. de bons serviços. Dessa forma a infraestrutura é Em uma visão mais mercadológica, o indispensável para que o acolhimento aconteça. planejamento da atividade, seria uma tentativa de (CORIOLANO, 1997). conhecer as dificuldades internas e externas do ambiente, Diante da possibilidade de se transformar um inclusive, elaborando estratégia para a comercialização. recurso ou um bem patrimonial em atrativo turístico Na mesma proporção, o planejamento turístico surgiu a proposta de criação de roteiros que leve em serviria como ferramenta para proteção das comunidades, consideração o espaço rural por meio do aproveitamento tais como as comunidades rurais, quilombolas ou do fluxo de visitante da Usina Hidrelétrica Eng. Sérgio indígenas. Dessa forma, o planejamento garantiria a Motta e do Museu de Memória Regional. existência de identidades ao longo do tempo e do espaço. Usina Hidrelétrica Engenheiro Sérgio Motta – Contudo, o cenário das políticas culturais também deve UHE Eng. Sérgio Motta, anteriormente foi chamada de culminar para a preservação cultural, principalmente com Usina Hidrelétrica Porto Primavera está localizada no Rio a criação de políticas que incentive a produção cultural Paraná, a 28 km a montante da confluência com o Rio nos assentamentos, valorizando, dessa forma, a cultura Paranapanema. popular. A barragem dessa Usina é a mais extensa do Assim, quanto mais acolhedor for o território para Brasil, tem 11.380 m de comprimento. A seleção pelo os assentados, para o residente, com acesso a município de Rosana se deu devido às condições infraestrutura básica mais estimulada a comunidades se geográficas do lugar. sentirá na preservação do ambiente. E mais motivado para Segundo Entrevistado, a usina foi projetada para elaborar outras ações culturais que valorize o modo de ter dezoito turbinas, mas só 14 estão operando, no qual vida rural, os costumes, as estórias, entre outros. Isso seria todas podem gerar 1.980 megawatts. A primeira etapa do um elemento importante para o turismo, logo que a enchimento do reservatório, na cota 253,00 m, foi comunidade manifesta interesse pela atividade do turismo concluída em dezembro de 1998 e a segunda etapa, na como complemento a sua produção agropecuária. cota 257,00 m, em março de 2001. Em Outubro de 2003, entrou em operação a unidade geradora 14, totalizando 3. PROPOSTA DE ROTEIRO TURÍSTICO PARA assim, 1.540 MW de potência instalada. Devido ao pouco OS ASSENTAMENTOS RURAIS: GLEBA XV DE declive do local, o tamanho da área a ser inundada para a NOVEMBRO E NOVA DO PONTAL criação da barragem da usina foi gigantesco – o maior lago artificial do Brasil e um dos maiores do mundo, com

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2.250 Km², ou 225 mil hectares, com uma capacidade de Usina, segundo o Entrevistado relata, foi desde o 20 bilhões de m³ de água o que aumentou em nove vezes princípio da construção da Usina se tomamos por base o o leito do rio Paraná. inicio no ano de 1982, já são mais de 30 anos que a Usina Todo o impacto gerado pela construção dessa recebe visitantes. usina leva a questionamentos sobre a sua capacidade de Sobre a sistema de vista na Usina foi informado produção energética e colocando muitas vezes em xeque pelo Entrevistado que há um roteiro no qual inclui três todo o discurso defendido pela CESP em relação ao custo locais: usina, viveiro de mudas e museu. Geralmente há – beneficio, atrelado a essa Usina. uma recepção que é feita no auditório, e dependendo da Os municípios mais afetados do lado de Mato sugestão do responsável é feita a visita a usina, o viveiro Grosso do Sul, foram: Anaurilândia, Bataguassu, de mudas e o museu, não tendo uma ordem definida. Pode Brasilândia, Santa Rita do Pardo e Três Lagoas, que fica a ser que um local não dê tempo de ser visitado, o que vai montante da barragem. Já os municípios do estado de São depender também da disponibilidade do visitante e do Paulo foram: Rosana, Teodoro Sampaio, Presidente objetivo da visita, mas geralmente ocorrem as visitações Epitácio, Panorama, Paulicéia, Castilho, Caiuá, Nova nos três locais. Guataporanga, Nova Independência, Presidente Em relação aos pontos de visitação da Usina foram Venceslau, Ouro Verde. No total foram dezesseis elencados pelo Entrevistado os seguintes: elevador e municípios que conseguiram indenização da CESP. escada para peixes, a eclusa e a própria estrutura da UHE A região inundada pelo lago, em sua maior parte são os principais motivos para sua visitação, já no que diz no estado de Mato Grosso do Sul, especialmente tratava- respeito ao viveiro todas as técnicas e o processo de se da maior reserva de argila, no qual havia sítio produção de mudas para o reflorestamento tanto dos arqueológico e abrigava famílias ribeirinhas e indígenas locais afetados pela construção da Usina quanto do do grupo Ofayé-Xavante. (SCARPINELLA, 1999). município de Rosana são tidas como atrativos. Também se tratava de um dos ecossistemas rico Em média o tempo de permanência é de em biodiversidade com características semelhantes às do aproximadamente 7 horas, com o intervalo de uma ou Pantanal, abrigando dezenas de espécies animais alguns duas horas de almoço, neste tempo o grupo pode ou não espécies em extinção como o tamanduá - bandeira, onça ter trazido um lanche, quando não utilizam os restaurantes pintada, onça parda, jacaré de-papo-amarelo, jaguatirica, e mercados de Primavera. Outras vezes a visita é feita em tatu - canastra, lobo-guará, ariranha, macuco e bicudo que meio período, parte da manhã ou da tarde, ou seja, há uma são espécies raras; e espécies vegetais. A grande perda flexibilidade de horários para atender a demanda dos ambiental foi significativa na parte do Mato Grosso do grupos. Sul. (SCARPINELLA, 1999). De acordo com o Entrevistado o número de visitas Na parte sul-mato-grossense também foi mais ao ano é de aproximadamente de oito mil pessoas, com impactada no ambiente antrópico, no qual foram atingidos uma média de 650 visitas ao mês, tendo nos meses de olarias, indústrias de cerâmicas, no qual havia uma férias escolares uma queda na média de visitas já que as reserva natural de argila as margens do rio Paraná de visitas são em grande parte de grupos de estudantes. O aproximadamente meio bilhão de m³, o que seria gráfico 01 ilustra a visitação por ano na Usina. suficiente para atender a demanda por longo prazo. (SCARPINELLA, 1999). Gráfico 01 – Visitas da Usina. Fonte: CESP, 2013. Org.: Além disso, foram afetados os pescadores, Autora. agricultores, e toda a cultura local, presentes nos sítios arqueológicos, e do patrimônio histórico e cultural que foram perdidos a partir do momento que as famílias foram realocadas para outro lugar. Por esses e outros motivos, várias ações judiciais passaram a ser movidas contra a CESP para que houvesse um reparo por essas perdas, não que o valor indenizatório recuperasse o que foi perdido, mesmo com o EIA – RIMA, nem todos os animais conseguiriam ser resgatados e consequentemente serem salvos. Igualmente a perda imaterial representada pelo patrimônio histórico cultural foi irreparável.

Vale alertar que tanto o viveiro de mudas quanto o O público visitante da Usina são geralmente museu são obras de compensação da CESP, que de acordo grupos de estudantes, caracterizando uma visita técnica com um estudo de impactos realizado precisariam ser criados para fins de “minimizar” os impactos causados pedagógica, provenientes dos estados de São Paulo, com a construção da Usina. Paraná e Mato Grosso do Sul, e outros estados que Conhecendo um pouco sobre o histórico da Usina, aparecem esporadicamente. O perfil dos visitantes são em sua maioria entende se o porquê foi necessário indenizar os constituídos por grupos de estudantes, técnicos, outros e municípios que foram impactados pela sua construção, no estrangeiros, sendo respectivamente: 71,12%; 16,25%; qual estão retratados no Museu. O inicio das visitações na

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12,25%; e 0,38%, este último quase não aparece no entre dois importantes rios. Também poderia ser gráfico, apresentando apenas uma linha da cor roxa, relacionado ao assentamento, o que não excluiria o conforme gráfico 02. elemento rio, pois há dois assentamentos as margens dos rios. Gráfico 02: Perfil dos visitantes. Fonte: CESP, 2013. Segundo o Entrevistado o turismo poderá Org.: Autora. aproveitar ainda a eclusa que está parada, o aeroporto, e também alguns elementos que estão em construção, como a ferrovia norte-sul sobre a usina formando a rodoferroviária e o porto intermodal, que são recursos que poderão contribuir para o desenvolvimento do turismo. Partindo de uma leitura deste Entrevistado sobre a visitação na Usina, percebe-se que há um potencial grande da Usina que permite o entrecruzamento da proposta de Turismo no Espaço Rural – TER nos assentamentos rurais por meio de roteiro de visitação. Também foram entrevistados a Roda de Viola e a Folia de Reis, que, relataram o desejo de ver essas manifestações culturais como atrativo turístico, de receber visitantes, pois seria uma maneira de valorizar o que cada

um faz. A partir das informações obtidas nessa entrevista Tendo o conhecimento do perfil dos visitantes da com a Usina, percebe-se que há uma potencialidade Usina, bem como a disposição de tempo de alguns grupos turística, representada pelos aspectos naturais e propõe-se a elaboração de dois tipos de roteiros, no qual tecnológicos do município, contudo sua fragilidade englobam os visitantes de meio período e período integral consiste na questão do fomento, pois segundo o conforme o quadro 01 e quadro 02. entrevistado da CESP é o que falta para desenvolver o turismo local. Quadro 01: Roteiro 1. Fonte: Autora. Há uma procura dos visitantes da Usina por Roteiro 1 – Usina no contexto ambiental e cultural artesanato o que cria uma perspectiva de desenvolvimento Meio Período Atividade de um produto que traga as características do local, o que A combinar Recepção no Auditório pode trazer tanto uma referência dos rios, da paisagem 1h00 minutos Vista a Usina: enfatizar sobre a natural ou do espaço rural. Isso é outra possibilidade para construção da Usina e a produção de trabalhar o turismo local. Energia. O município indiretamente, por meio da Usina faz 00h40minutos Visita ao Viveiro de Produção de parte do Circuito Oeste Rios, que é um roteiro regional, Mudas: enfatizar sobre os impactos com o objetivo de dinamizar o turismo regional. Este ambientais. roteiro poderia ser integrado com a proposta de roteiros - visitar o banco ativo de que se fará nesse trabalho. O roteiro do Circuito Oeste germoplasma; Rios poderá ser aprimorado no sentido de contribuir - Trilha até o Auditório ao Ar Livre. significativamente para o turismo local. 00h40minutos Auditório ao ar Livre: falar dos Na percepção do entrevistado, é possível aspectos culturais da relação homem aproveitar o fluxo de visitantes da Usina para outros com a natureza atrativos do município, inclusive para os assentamentos. - apresentação de Violeiros da Roda Uma pratica que é extremamente organizada, como de Viola ou do grupo de Folias de acontece na Usina poderá ser um ponto central para Reis. iniciar um processo de turistificação nos demais atrativos 00h40 minutos Finalizar a Visita ou potencialidades do município. No caso dos - Retornar ao Auditório interno. assentamentos é possível a concretização de um roteiro - Café no local com alimentos que venha a incorpora-lo dentro das visitações da Usina, caseiros dos assentamentos rurais: como meio para se conhecer as formas de produção, a queijos, doces, compotas, leite, café, cultura, tais como, o modo de vida, a culinária, entre sucos, etc. outros. Este último seria essencial logo que o perfil do - Despedida do grupo. público visitante da Usina, em sua maioria, permanece o dia todo e sendo assim, necessitam de serviços de No primeiro roteiro podem ser contemplados os alimentação. E tendo um prato típico da localidade este aspectos ambientais e técnicos como a escolha do local poderá ser apreciado pelos visitantes. para a construção da Usina; os benefícios e os malefícios Como sugere este Entrevistado, esse prato típico da geração de energia por meio de Usina hidrelétrica; os poderia ser relacionado ao rio, logo que o município está impactos na fauna e flora com destaque para as espécies

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em extinção, bem como os reflorestamentos, unidades de Quadro 02: Roteiro 2. Fonte: Autora. conservação, manejo da fauna silvestre; e o Roteiro 2 – UHE Eng. Sérgio Motta e o espaço rural remanejamento populacional com a criação dos Período Integral Atividade reassentamentos e os impactos que isso ocasionou. Dos aspectos culturais poderiam ser mencionados A combinar Recepção no Auditório os espaços ao ar livre que as famílias utilizavam como 1h00 minutos Vista a Usina: enfatizar sobre a forma de lazer com os piqueniques, entre outras, e fazer construção da Usina e a produção essa contextualização ao espaço que eles estão que é o de Energia Auditório ao ar livre. Mencionar o modo de vida das famílias assentadas e sua relação com o meio ambiente 00h40minutos Visita ao Viveiro de Produção de natural, logo que a maioria das famílias realocadas de Mudas: enfatizar sobre os impactos suas residências em virtude da construção da Usina ambientais dependia do meio ambiente para sobreviver, dessa forma - visitar o banco ativo de poderia ser abordada a questão dos ribeirinhos e sua germoplasma: enfatizar a questão relação com o rio Paraná, os agricultores e sua relação dos impactos da construção da com a terra, e os oleiros que retiravam a argila em uma Usina das áreas que foram inundadas para construção do lago; Trilha até o Auditório ao Ar Livre: além dos aspectos de alimentação, trabalho, os meios de - área de reflorestamento. transporte. Nos meios de transporte pode haver uma breve 01h00minutos Visita ao Museu de Memória contextualização com o transporte do inicio do Regional: falar dos aspectos povoamento da região com os que são utilizados pelos culturais da região. assentados na atualidade, falando de sua importância para - Povoamento; quem vive no campo. - Cotidiano e Lazer (Painel Este roteiro poderá ser alterado para se adequar a Cotidiano e Energia) ressaltar as necessidade do grupo que está visitando, com a inserção brincadeiras, atividades do de outras atividades ou temáticas que seja mais pertinente cotidiano, atividades esportivas e de ao grupo visitante. lazer como os bailes, a Para o segundo roteiro foi Entrevistado o Museu musicalidade, entre outras. de Memória Regional. Na entrevista com o Museu de 1h45 minutos Deslocamento para o assentamento Memória Regional, quando foi questionado sobre a - almoço no assentamento criação do roteiro que integrasse o museu, a usina e os - apresentação do grupo de Folias assentamentos rurais, o entrevistado foi favorável, de Reis ou Violeiros da Roda de apontando que esse caminho é possível. Viola. Dessa forma, quando indagada sobre as atividades 01h00 - visita a algumas propriedades que poderiam integrar o turismo local, além de pesca, foi próximas ao rio Paranapanema ou mencionado o turismo de aventura aproveitando os rios, a Paraná. prática de canoagem, de remo, caminhada, cicloturismo, 01h00 minutos - Apresentação do grupo de Folias arvorismo, turismo rural, entre outros. de Reis ou Violeiros da Roda de Como já mencionado, há interesse da Folia de Reis Viola. e da Roda de Viola, em ser um atrativo turístico e um - Café da tarde no local com anseio dos organizadores para que haja um alimentos caseiros dos reconhecimento por parte do poder público local sobre a assentamentos rurais: queijos, importância dessas manifestações para a cultural doces, compotas, leite, café, sucos, municipal, conforme entrevistas realizadas. etc. Estas duas manifestações foram selecionadas por - Despedida do grupo. serem aquelas que permitem um deslocamento para a cidade para apresentações e em virtude das características Na visita ao Viveiro de Produção de Mudas já mencionadas nesse texto. poderiam ser exemplificados com as principais ações que Neste segundo roteiro é dada ênfase para aspectos a CESP desenvolve para minimizar os impactos causados técnicos da Usina, como já é de costume se fazer, mas pela construção da Usina; a questão das sementes e o igualmente os aspectos culturais e a visita nos banco ativo de germoplasma, relatando sobre as principais assentamentos. Dessa forma, este roteiro tem como espécies de flora que foram retiradas para a construção do objetivo enfatizar sobre o processo de construção da lago; assim como na parte da trilha os visitantes podem Usina, com dados técnicos e essenciais para se ver os exemplos dessas espécies cultivadas como meio compreender o porquê que a Usina foi instalada no para garantir sua existência; mencionar a fauna que foi município, bem como a questão da produção de energia, a remanejada. escada para peixes e a eclusa.

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Nos aspectos culturais mencionar na visita ao BRASIL. Ministério do Turismo. Diretrizes para o Museu de Memória Regional sobre o modo de vida das desenvolvimento do turismo rural no Brasil. Brasília, famílias que residiam nos municípios impactados, falar 2003. Disponível em: http://institucional.turismo.gov.br. sobre as formas de lazer, as brincadeiras, os bailes, a Acesso em: 18 abr. 2008. musicalidade, que podem ser contextualizadas com a viola e o grupo de Folias de Reis. BRASIL. Ministério do Turismo - MTur. Turismo rural: Nos assentamentos ficaria a parte da alimentação, orientações básicas. Brasília, 2008. Disponível em: < o contato com os aspectos culturais, com o modo de vida http://www.turismo.gov.br/export/sites/default/turismo/o_ e produtivo dos assentados. ministerio/publicacoes/downloads_publicacoes/Turismo_ Rural_Versxo_Final_IMPRESSxO_.pdf>. Acesso em 20 3. CONCLUSÕES jan. 2013.

A elaboração de roteiro que integre a visita da CARNEIRO, L. P. M. Proposta de implantação de dois Usina com os assentamentos é um recurso que poderá roteiros turísticos no assentamento Nova Pontal, em contribuir para o desenvolvimento do turismo no espaço Rosana, SP: análise das limitações e possíveis soluções. rural. 2007. 115 f. Monografia (apresentada ao final do curso de Estes roteiros serão eficazes se tiverem a graduação em Turismo) – Universidade Estadual Paulista participação da comunidade assentada e o poder público “Júlio de Mesquita Filho”, Campus Experimental de local. Para isso a utilização do planejamento é de suma Rosana, Rosana. Disponível em: importância para pensar em toda a infraestrutura . Acesso em: 25 abr. 2009. Neste contexto, a vivência dos assentados articulado com a atividade turística é uma possibilidade CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A. Metodologia que permitirá a esses pequenos agricultores se manterem científica. 5 ed. São Paulo: Perason Prentice Hall, 2002. em seus lotes ao mesmo tempo em que seu poderá ter a valorização da sua produção, seu saber - fazer, suas CORIOLANO, L. N. M. T. Da sedução do turismo ao músicas, suas tradições, suas religiosidades, entre outros turismo da sedução. In: RODRIGUES, Adyr B. (Org.). aspectos. Turismo, modernidade e globalização. São Paulo: O aproveitamento do fluxo de visitação que Hucitec, 1997. P. 119-135. ocorrem na usina hidrelétrica, para trabalhar em conjunto com as comunidades rurais é um caminho que abre portas CRUZ, P. M.. Restauração e agroecologia: é possível? para outras atividades, como por exemplo, feira de Estudo de viabilidade no assentamento Nova do Pontal artesanato com doces caseiros produzidos nos com base na permacultura. 2008. 105 f. Monografia assentamentos, oferta de produtos diversos que podem ser (apresentada ao final do curso de graduação em Turismo) desenvolvidos no município. A oferta de roteiro pode – Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita favorecer para que outros roteiros sejam elaborados no Filho”, Campus Experimental de Rosana, Rosana. município e outras atividades de lazer e atrelados a pratica Disponível em: < http://biblioteca.rosana.unesp.br/int_con do turismo sejam criadas. teudo_sem_img.php?conteudo=258>. Acesso em: 20 jun. Entretanto, mais uma vez se faz necessário o 2013. planejamento para que o turismo seja desenvolvido de acordo com o desejo da comunidade, para que esta DIAS, R. Turismo e patrimônio cultural: recursos que atividade não seja priorizada em detrimento de elementos acompanham o crescimento das cidades. São Paulo: que são substanciais para o cotidiano da comunidade Saraiva, 2006. como: a educação, saúde, transporte, saneamento básico, lazer, entre outros. GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Por isso é de suma importância pensar na Paulo: Atlas, 2008. responsabilidade que todos tem sobre o turismo, desde o poder público local, a sociedade civil e as associações. A IOKOI, Z. M. G. et al (Org.). Vozes da terra: história de atuação em conjunto para pensar o turismo fará com que vida dos assentados rurais de São Paulo. São Paulo: este seja um sucesso ou não. Fundação Itesp, 2005.

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O PATRIMÔNIO CULTURAL E AS NOVAS TERRITORIALIDADES CULTURAIS: UMA REALIDADE EMERGENTE NO SÍTIO ARQUEOLÓGICO LAGOA SÃO PAULO – 02 / MUNICÍPIO DE PRESIDENTE EPITÁCIO – SP

JEAN ÍTALO DE ARAÚJO CABRERA RUTH KÜNZLI

Universidade Estadual Paulista - Unesp Campus de Presidente Prudente – SP

[email protected] [email protected]

RESUMO - O propósito deste trabalho é o da contribuição que uma pesquisa arqueológica pode oferecer à compreensão da utilização do espaço geográfico e suas transformações pelo homem primitivo; também procura entender como estes vestígios podem representar o meio de resgate e, de valorização cultural como atrativo turístico. Visa ainda compreender o modo de vida através das técnicas de manufatura que permitem reescrever o cotidiano destes grupos e sua relação com o espaço ocupado. Para tanto, busca estimular a recomposição de cenários de ocupação humana no local e nas proximidades de escavação, evocando uma das mais tradicionais formas de transmissão da cultura, o turismo e a inclusão do patrimônio arqueológico no elenco das potencialidades de uso turístico pelo munícipio que, para tanto, deverá ser precedida de legislação específica que discrimine, inclusive, as garantias quanto à sua proteção e preservação. Isso porque a herança arqueológica indígena é até de Patrimônio Nacional, de interesse de todos, superando os interesses locais circunscritos aos limites de um único município. Além da caracterização do uso do espaço local quanto às suas potencialidades para o turismo arqueológico, por meio da análise espaço-temporal do meio antropizado, tendo por base a pesquisa do Sítio Arqueológico Lagoa São Paulo – 02.

Palavras chave: Arqueologia; Patrimônio; Turismo Cultural.

ABSTRACT - The purpose of this work is the contribution that an archaeological survey can provide the understanding of the use of geographical space and its transformations by primitive man; also seeks to understand how these traces can represent the ransom, and cultural appreciation as a tourist attraction. It also aims to understand the way of life through the manufacturing techniques which allow to rewrite the routine of these groups and their relationship to the space occupied. It seeks to stimulate the recovery of scenarios of human occupation on site and nearby excavation, evoking one of the most traditional forms of transmission of culture, tourism and the inclusion of the archaeological heritage in the list of potential uses for tourist municipality that for both, should be preceded by specific legislation that discriminates, including safeguards for their protection and preservation. This is because the archaeological heritage is indigenous to National Heritage, the interest of all, overcoming local interests confined to the limits of a single municipality. Besides the characterization of the use of the local area as to their potential for archeological tourism, through the spatio-temporal analysis of anthropogenic means, based on the research of Archaeological Lagoa São Paulo - 02.

Key words: Archaeology, Heritage, Cultural Tourism.

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1 INTRODUÇÃO Motta”, segundo exigências do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e do Instituto Qualquer economia, seja de mercado ou de Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais planejamento centralizado, se fundamenta na interação Renováveis (IBAMA), por estar inserido na área social e na interação espacial/cultural. Nenhuma diretamente impactada pela formação do lago desta usina. economia pode existir sem que haja relações entre os Com base nas recentes idas a campo, no seres humanos, relações essas que ocorrem em um dado decorrer da Etapa II do “Projeto de Salvamento espaço geográfico, influenciando esse espaço e sendo por Arqueológico de Porto Primavera – SP”, e análise ele influenciadas. Os atributos [do espaço] influenciam o laboratorial do material arqueológico realizadas, homem nos seus comportamentos, percepções e escolhas constatou-se, por meio dos resultados preliminares, que o e este age sobre o espaço para modificá-lo. Tendo em Sítio Lagoa São Paulo – 02 é remanescente da cultura conta as restrições que lhe são impostas pelo espaço Guarani, caracterizada por traços culturais, como: tipo de geográfico ele se organiza para satisfazer as suas antiplástico, decoração, formas e técnicas de manufatura necessidades econômicas, culturais e sociais. do material cerâmico, além de apresentar elementos de O propósito desta pesquisa é o de influência jesuítica, como a presença da decoração desenvolver, no processo de planejamento do turismo da plástica escovada; o período de ocupação aferido pela região, a caracterização do espaço local quanto às suas profundidade de deposição atual e da influência jesuítica, potencialidades, tendo por base a pesquisa do Sítio indica ser um sítio com aproximadamente 400 a 500 anos Arqueológico Lagoa São Paulo – 02 e assim inseri-lo a. P., tendo sido estes lavradores seminômades, talvez como atrativo turístico. Para tanto, estimular a sucessivamente, construindo cabanas e formando aldeias. recomposição de cenários de ocupações humanas nos No que concerne aos artefatos e fragmentos locais ou nas proximidades de escavação, evocando uma líticos encontrados no sítio, a uma profundidade de 1,20 das mais tradicionais formas de transmissão da cultura. m a 3,5 m, pode-se afirmar que se trata de uma ocupação O Sítio Arqueológico Lagoa São Paulo – 02 distinta da anteriormente descrita, tanto devido à está localizado no município de Presidente Epitácio – SP, profundidade, quanto às características de lascamento, na margem esquerda do Rio Paraná, local onde, em 1995, seleção e utilização de matéria-prima (seixos de arenito foram encontradas duas urnas cerâmicas, com ossos silicificado, quartzo, sílex), sendo possível identificá-la humanos no interior de uma delas. Este material como de tradição Umbu, relativa a povos caçadores e arqueológico foi retirado do barranco por uma empresa coletores nômades. ceramista, quando fazia extração do pacote sedimentar para ampliação da área para depositar argila retirada do 3 A GEOGRAFIA, O TURISMO E A rio. Esse achado passou então a ser investigado pelos ARQUEOLOGIA pesquisadores da equipe multidisciplinar de arqueologia da Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT – UNESP), Desde os mais remotos tempos da Campus de Presidente Prudente e através de intervenções história do mundo é sabido que o homem teve sempre a sucessivas, o sítio foi delimitado e denominado Lagoa necessidade da ocupação e construção de seu espaço São Paulo – 02. social. Temos estudos que comprovam que, de diversas Do Sítio Lagoa São Paulo – 02 foram maneiras, o homem sempre esteve disposto a conquistar resgatadas em campanhas sucessivas, além das urnas, espaços cada vez mais longínquos do globo terrestre. A peças líticas lascadas, polidas, fragmentos e vasilhas ciência geográfica se faz presente para registrar esses cerâmicos, material malacológico e ósseo; este último estudos e compondo um leque de várias áreas de atuação resultou, até o momento, em 10 esqueletos humanos de outras ciências que a auxiliam a fazer tal análise. identificados, sepultados em urnas e fora delas, A Arqueologia surgiu no cenário científico associados ou não a restos de fogueira, sendo que uma a partir da necessidade dos estudiosos de conseguirem destas contendo restos alimentares. De posse desses capturar o máximo de dados possíveis do contexto materiais, realizou-se uma triagem no Centro de geográfico onde o homem ou a cultura de épocas muito Museologia, Antropologia e Arqueologia (CEMAARQ) antigas estavam inseridos, incluindo restos faunísticos e da FCT – UNESP, compreendendo limpeza, cadastro e florísticos, localizados em sítios arqueológicos ou em armazenamento, composição de reserva técnica, exceto o suas proximidades, de imensa importância para se material ósseo assim como algumas urnas funerárias. decifrar o cenário paleoambiental no qual cada sítio está inserido, bem como das matérias primas utilizadas para a 2 O SÍTIO LAGOA SÃO PAULO - 02 elaboração dos artefatos líticos e cerâmicos. Segundo Ross (1996), o entendimento da O Sítio Arqueológico Lagoa São Paulo – 02 verdadeira dimensão e importância do homem como ser faz parte do rol dos sítios que foram escavados pelo vivo e social passa obrigatoriamente pela compreensão “Projeto de Salvamento Arqueológico de Porto Primavera das limitações que a rigidez da natureza impõe à sua – SP / Etapa I”, financiado pela Companhia Energética de existência: São Paulo (CESP) em 1998 / 2002 e em função da “É objeto de preocupação da construção da Usina Hidrelétrica “Engenheiro Sergio Geografia conhecer cada dia mais o

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ambiente natural de sobrevivência do justificam? E, sobretudo, por que o homem, bem como entender o conjunto de técnicas de produção comportamento das sociedades (técnicas de exploração da natureza, humanas, suas relações com a técnicas de subsistência, técnicas da natureza e suas relações matéria) e de enquadramento (técnicas socioeconômicas e culturais. Aprender das relações entre os homens, técnicas como cada sociedade humana se de organização do espaço): a existência estrutura e organiza o espaço físico- do menor grupo exige regras do jogo, territorial em face das imposições do técnicas de enquadramento. Essa soma meio natural, de um lado, e da de ligações e de técnicas é a civilização. capacidade técnica, do poder Em suma, todo grupo humano é econômico e dos valores sustentado por técnicas que fazem de socioculturais, de outro. Os grupos seus membros seres ‘civilizados’. E não sociais, por mais autossuficientes e existem ‘selvagens’”. (GOROU. 1974, p simples que sejam não conseguem 43). sobreviver de forma absolutamente isolada e estabelecem uma teia Para SORRE, 1948, p 76, a noção de complexa de relações socioculturais e técnica estende-se a tudo o que pertence à indústria e à econômicas”. (ROSS, 1996, p.16.) arte, em todos os domínios da atividade humana. Assim, é importante tentar entender e É nesse ponto que a ciência arqueológica compreender que essas técnicas são a peça chave para pode auxiliar o homem contemporâneo a compreender o saber quais eram os hábitos e costumes dos povos pré- passado humano, principalmente através de um conjunto históricos, pois através dessas técnicas é que podemos de evidências materiais que foram deixados e saber quais eram seu modo de vida e sua relação com o sobreviveram ao longo do tempo. (ROBRAHN- espaço ocupado. GONZÁLEZ , 1999). Segundo SANTOS, 1996, p 123 as Quando não havia nada além do meio transformações impostas às coisas naturais já eram natural, o homem escolhia da natureza suas partes ou técnicas, entre as quais a domesticação de plantas e aspectos considerados fundamentais para o exercício da animais aparece como um momento marcante: o homem vida, valorizando, diferentemente, segundo os lugares e as mudando a Natureza, impondo-lhe leis. A isso também se culturas, essas condições naturais que constituíam a base chama técnica. material da existência do grupo. Ainda segundo este autor, as motivações de Segundo Santos (1996), “é por demais uso eram, sobretudo, locais, ainda que o papel do sabido que a principal forma de relação entre o homem e intercâmbio nas determinações sociais pudesse ser a natureza, ou melhor, entre o homem e o meio, é dada crescente. Assim a sociedade local era, ao mesmo tempo, pela técnica”. As técnicas constituem um conjunto de criadora das técnicas utilizadas, comandante dos tempos meios instrumentais e sociais, com os quais o homem sociais e dos limites da sua utilização. realiza sua vida, produz e, ao mesmo tempo, cria espaço. A harmonia socioespacial assim Essa forma de ver a técnica não é, todavia, estabelecida era, desse modo, respeitosa com relação à completamente explorada. natureza herdada e ao processo de criação de uma nova Friedmann (1966) diz que “a partir do natureza. Produzindo-a, a sociedade territorial produzia, Paleolítico médio e superior, os trabalhos do homem para também, uma série de comportamentos, cuja razão é a defender-se, alimentar-se, alojar-se, vestir-se, decorar preservação e a continuidade do meio de vida. Exemplo seus abrigos ou seus lugares de culto implicam técnicas já disso é, entre outros, a rotação das terras e a agricultura complexas (...)” (FRIEDMANN, 1966). itinerante, que constituem, ao mesmo tempo, regras Tanto para a Geografia quanto para a sociais e regras territoriais, tendentes a conciliar o uso e a Arqueologia é fundamental o estudo das técnicas, pois é “conservação” da natureza, para que ela possa ser, outra através delas que o homem pode medir seu nível cultural. vez, utilizada. Esta preocupação já deve ter ocorrido Segundo Gourou (1974), o nível da civilização seria desde tempos pré-históricos e é verificada atualmente. medido pelo nível das técnicas. Segundo FERREIRA (2002), a grande “Sendo uma civilização uma combinação de técnicas de variabilidade e multifuncionalidade dos objetos líticos, produção e de enquadramento, uma escala dos níveis de utilização de diferentes técnicas na debitagem de lascas, eficácia deve levar em consideração essas duas ordens morfologia diversa, induz o investigador a considerar que técnicas”. diferentes culturas habitaram a mesma área (Alto Paraná- “[...] Em todos os casos, trata-se SP) em épocas distantes ou correlatas. O mesmo, segundo efetivamente de analisar, de localizar, Estevam (2003), pode-se dizer em relação à cerâmica. de explicar, de responder a uma No caso de se tratar de um contato, parte-se pergunta que é sempre a mesma: Como da suposição de que tanto os objetos altamente os fatos humanos do espaço estudado se trabalhados, quanto os menos, em alguns sítios desta

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mesma região, foram encontrados em camadas Estudar as incidências espaciais da estratigráficas comuns a eles; além da incidência de atividade turística e dar um tratamento geográfico às material cerâmico encontrado juntamente com material mesmas é de fundamental importância para que se lítico em outros sítios da região, porém em número minimize o uso massivo do espaço; se maximize seu uso menor. construtivo e que o turismo possa efetivamente contribuir George (1974) diz que se a cultura é para o desenvolvimento local e regional, valorizando o nacional ou regional, a técnica é universal. Essa é uma patrimônio natural e cultural. afirmação válida, pois povos de diversas partes do mundo Ao se fazer uma relação da Geografia com produziam artefatos com técnicas semelhantes e com o Turismo, numa perspectiva espacial, ressalta-se a datas muito díspares umas das outras. compreensão dos fatores de ordem física, social, política e Como vimos FERREIRA (2002) lança a econômica em toda a sua variedade e complexidade. Ao hipótese de que os povos pré-históricos regionais tenham tratar de Geografia e Turismo, na perspectiva espacial, tido contato com outras culturas e por isto poderia já não procura-se identificar conceitos e categorias do espaço ser somente caçadores, mas também lavradores, pois há geográfico apoiando-se em autores que se dedicam ao indícios de que estes confeccionavam artefatos de pedra estudo do espaço geográfico, do território, da região e do lascada, porém de maneira bem mais tosca, além da lugar, bem como da paisagem, destacando a relevância da polida, uma vez que os povos exclusivamente caçadores Geografia para o Turismo, considerando o caráter lascavam a pedra de maneira bem mais aprimorada, com transformador que essa atividade promove no espaço retoques e artefatos bifaciais. geográfico (TELES, 2009, p 23). Fica comprovado que a região do Alto Diante dessa grande expressividade do Paraná foi uma área de atração populacional pré-histórica, turismo, a Geografia não poderia furtar-se de realizar a pela facilidade em obter a matéria-prima (rocha e argila) análise e interpretação das mudanças espaciais causadas para confecção dos objetos líticos e cerâmicos, pela pela atividade turística, buscando a compreensão da vegetação que abrigava grande diversidade de fauna e até estrutura e dos processos que deram causas a essas megafauna, pela presença de cursos d´água de grande transformações. Isso porque a Geografia é uma ciência porte, que era fonte de fauna aquática e, portanto, também que propõe pensar o mundo além das aparências, tentando de alimento, de rios de menor porte que propiciavam água superar as dicotomias (homem/meio; trabalho manual/ para beber, cozinhar e tomar banho, enfim, todo o intelectual; teoria/prática; todo/parte) empenhando-se em ecossistema, por consideração da influência climática, compreender as relações entre sociedade e espaço para a além da possibilidade de paleoilhas e paleolagos, que são realização da transformação social. O estudo do turismo discutidos atualmente. no enfoque geográfico é de fundamental importância, pois Assim, pela importância ressaltada sobre a a Geografia, por tradição, lida com as relações tecnologia como meio de expressão de uma sociedade e sociedade/natureza. Aliás, é a única ciência que desde a pela escassez de dados sobre as populações pré-históricas sua formação se propôs a estudar a relação entre o homem na região e mesmo outros dados mais antigos (paleoilhas, e o meio natural – o meio atualmente em voga é paleoclima, etc.), este trabalho terá relevância no propalado na perspectiva que engloba o meio natural e conhecimento da relação homem/meio, apropriação e social (MENDONÇA, 1993, p 54). transformação do espaço geográfico dessa região. Sobre o tema do turismo dentro da Geografia, encontramo-nos em um momento de pensar Atualmente o Turismo, entendido como um como tratar o assunto conforme seu peso na reordenação fenômeno econômico, social, político e cultural do mundo do espaço geográfico no início do século XXI. Não contemporâneo, instala-se com alta voracidade e devemos encarar a atividade como uma panacéia para tecnologia até mesmo em locais inacessíveis, causando áreas degradadas, nem como atividade totalmente total revolução no lugar, transformando as paisagens e as perversa quanto ao dinamismo entre seus agentes, e sim comunidades envolvidas. O turismo contemporâneo se caminhar para o exercício de encará-la como atividade caracteriza como um grande consumidor da natureza. intercultural ou ainda intersubjetiva, o que não A relação do turismo com o espaço (meio) impossibilita considerá-la em seu âmbito econômico e tem se dado, de modo geral, através da apreciação da socioambiental. paisagem na qual se materializam os elementos do espaço turístico: a oferta, a demanda, os serviços, os transportes, 4 CONCLUSÕES a infraestrutura, o poder de decisão, os sistemas de informação, promoção e comercialização (NOGUEIRA, Neste aspecto, a pesquisa “O Patrimônio 2006, p 12). Cultural e as Novas Territorialidades Culturais: Uma A oferta, traduzida pela distribuição Realidade Emergente no Sítio Arqueológico Lagoa São geográfica do patrimônio (valores produzidos pela Paulo – 02 Município de Presidente Epitácio / SP” tem diversidade da natureza e pelos remanescentes da por objetivo compreender as formas de apropriação do memória do passado) constitui-se na maior riqueza para a espaço geográfico pelo homem primitivo, por meio da dinamização turística das comunidades. análise do material arqueológico encontrado durante escavações, bem como a coleta de novos dados em

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campo, quando necessário, procurando identificar, através Identificando e atestando estes dados, não dos sítios compreendidos na região de Presidente apenas estaremos descobrindo uma parte de nossa própria Epitácio, para coleta de informações complementares, história regional, mas avançando na compreensão da quais as técnicas utilizadas pelos povos pré-históricos que evolução do homem enquanto agente transformador do habitaram a região, bem como compreender a forma com espaço que habitava e interagia com o meio, bem como a qual eles se relacionavam com o meio natural para a propiciando o conhecimento, a valorização e divulgação construção do espaço geográfico no qual habitaram e as deste patrimônio cultural, até agora adormecido, por meio transformações ocorridas (paisagem pretérita) e deixadas da atividade turística. (paisagem atual). Além do fato de que o patrimônio cultural O estudo destes aspectos culturais é de tem de fazer sentido para a população e não só para o grande relevância, uma vez que, segundo ANDRADE, olhar do turista, que é um olhar transitório e efêmero. 2002, p. 34, pode se considerar como Patrimônio Cultural Hoje, temos políticas públicas preocupadas com o todo o conjunto de bens materiais ou não, mas que seja desenvolvimento local, além de uma maior preocupação representativo da história de uma determinada sociedade e na preservação do patrimônio e na estruturação urbana que a ela confere identidade, que, no caso, coloca em para essas populações. destaque o patrimônio cultural arqueológico pré-colonial, O passado é cada vez mais tema da a fim de apreendermos a identidade regional. atualidade. Os vestígios que são disponibilizados ao Por meio da análise tecnotipológica será público são cada vez mais atrativos, sendo que as viagens possível identificar os costumes que tais povos e as visitas caracterizam um dos contextos mais habituais mantinham, pois, segundo ANDRADE (2002), a de acesso ao passado e seus restos materiais. E, também, classificação de um objeto como patrimônio cultural o turismo é uma atividade que, em menos de um século, requer como causa a busca da própria identidade do se transformou bastante, necessitando cada vez mais de grupo. Identidade esta que, na sua ligação intrínseca com atrações que permitam suprir o tempo do ócio; neste o lugar, foi e é passível de mudança ao longo do tempo. contexto, o patrimônio arqueológico é uma delas. Assim, não se colocará como causa para mudanças Os fatores que alimentam o identitárias o tempo como sujeito da mudança, mas a desenvolvimento dos novos modelos turísticos (turismo própria criatividade humana, que implica na rural e cultural em geral) são os que promovem a transformação dos lugares seguindo princípios que os aproximação do público ao passado e à arqueologia. O tornem apropriados para o desenvolvimento de uma vida patrimônio arqueológico e cultural de uma região serve social aceita pelos seus habitantes. como recurso para instrumentalizar o desenvolvimento Objetiva-se, também, fazer uma análise do comunitário, pois, a partir dele, pode fomentar-se a ambiente passado, pois foram evidenciados materiais autovaloração e coesão da comunidade (de suas tradições arqueológicos em diferentes níveis de deposição, ou seja, e valores) que por sua vez serve como desenvolvimento distintas ocupações: uma “mais recente” contendo econômico através de sua utilização como atrativo material cerâmico entre 40/60 cm de profundidade e com turístico. decoração plástica escovada, comum entre os sítios de A exemplo do que ocorre em vários contato com jesuítas, que nos leva a deduzir uma datação países da América Latina, o Brasil é herdeiro de uma prévia de 400 a 500 anos a.P.; um segundo nível de imensa diversidade cultural, intimamente associada a deposição entre 1,00/1,40 metros de profundidade com uma riqueza ambiental extraordinária que lhe dá suporte. material lítico, sendo a possível segunda ocupação e Uma diversidade patrimonial que abrange desde o legado material lítico ainda mais profundo entre 1,80/2,60 das antigas culturas pré-históricas (patrimônio metros, sendo esta possivelmente a primeira ocupação, arqueológico), que é um representativo da distribuição no provando que este sítio possui uma gama riquíssima de território das mais significativas manifestações humanas artefatos arqueológicos, além de urnas funerárias do passado em suas diferentes formas de expressão, até contendo esqueletos e artefatos líticos rituais e de as migrações contemporâneas (portugueses, espanhóis, trabalho. alemães, italianos e japoneses), representativo da Outro fator que deve ser ressaltado é o diversidade. Apesar de possuir toda essa diversidade contexto da área de enterramento, pois foram cultural, no Brasil a integração dos setores da cultura e do evidenciados três tipos de sepultamentos humanos; o turismo, bem como o envolvimento das comunidades e a primeiro deles foi com o corpo depositado dentro de integração de suas dinâmicas e seus processos culturais, urnas, que continham vasilhas cerâmicas menores e para desenvolver o turismo, é ainda muito recente. artefatos rituais como tembetás de quartzo e machadinhas Neste sentido, as estratégias ligadas ao polidas; o segundo tipo de sepultamento era realizado uso do patrimônio arqueológico no Oeste do Estado de diretamente no solo com material ritual associado; e um São Paulo para fins turísticos despontam como excelente terceiro tipo no qual o sepultamento era composto dos laboratório para esta pesquisa. dois tipos de vasos anteriormente citados. Dado relevante A oportunidade para viabilizar essa a ser salientado neste contexto e que destoa do investigação pode ser referenciada aos componentes da corriqueiro, é que, além da disposição dos enterramentos, nossa trajetória nas pesquisas arqueológicas, estes fazem parte da área interna da aldeia. acompanhando as dificuldades que existem em

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compartilhar e preservar os patrimônios arqueológicos GEORGE, P. O Homem na Terra. Trad. de José Gama, brasileiros, principalmente aqueles que estão inseridos em Lisboa: Edições 70 Ltda., 1974, in CONTI, J.S. A áreas ameaçadas por empreendimentos de grande porte, geografia física e as relações sociedade-natureza no como no caso da Usina Hidrelétrica “Engenheiro Sérgio mundo tropical, Novos caminhos da geografia, Editora Motta”, em cuja área de ação está inserido o Sítio Contexto, São Paulo, 2001. Arqueológico Lagoa São Paulo – 02, bem como daqueles MENDONÇA, F. Geografia e Meio Ambiente. São dos quais o material resgatado é depositado em Paulo: Contexto. 1993. laboratórios e museus sem contextualização, ou mesmo MORAIS, J. L. A. A Propósito da Interdisciplinaridade daqueles inúmeros sítios arqueológicos de arte rupestre, em Arqueologia. Revista do Museu Paulista, Editora da por exemplo, que são reconhecidos como Patrimônio da Universidade de São Paulo, São Paulo, v. XXXI, p. 03, Humanidade pela UNESCO, mas que, por falta de 1986. incentivos estão ameaçados de abandono no Parque na ______A Arqueologia e o Turismo. Turismo e Serra da Capivara - Piauí. Patrimônio Cultural, Editora Contexto, São Paulo, SP, É fundamental esta pesquisa para o 2002. enriquecimento da discussão teórica, embasando a MURTA, S.M. e ALBANO, C. (Org.) Interpretar o questão da preservação do patrimônio cultural por meio Patrimônio. Editora UFMG, Belo Horizonte, 2005. do desenvolvimento do turismo arqueológico no Brasil, NOGUEIRA, C. R. D. Geografia do Turismo. Ed. utilizando como estudo de caso, o Sítio Lagoa São Paulo URISAN, Rio Grande do Sul, 2006. – 02. PALLESTRINI, L. e MORAIS, J. L. Arqueologia pré- Por esses e outros fatores, está sendo de histórica brasileira. Universidade de São Paulo, Fundo suma importância a realização desta pesquisa para de Pesquisas, São Paulo, 1982. aprofundarmos a discussão, ainda mais quando sabemos PINSKY, J. Turismo e Patrimônio Cultural, Editora que tudo está por se construir diante da inconstância do Contexto, São Paulo, 2002. debate da inclusão do patrimônio arqueológico no elenco PORTUGUEZ, A. P. Consumo e Espaço: Turismo, das potencialidades de uso turístico no Brasil. Lazer e Outros Temas. Editora ROCA, São Paulo, 2001. PROUS, A. Arqueologia brasileira. Brasília: UNB, REFERÊNCIAS 1992. REIS, F. J. G. (Org.) Turismo: Uma Perspectiva ANDRADE, S.M. O Patrimônio histórico e Regional. Editora Cabral, São Paulo, 2003. arqueológico da Serra da Mesa: A construção de uma ROBRAHN-GONZÁLEZ, E. M. São Paulo, terra de nova paisagem. 2002. Tese (Doutorado em Geografia) fronteiras: a ocupação de grupos ceramistas pré- Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. coloniais. São Paulo: MAE, 1999. Universidade de São Paulo. São Paulo. RODRIGUES, I. da S. Desenvolvimento do Turismo e BERTRAND, G. & C. 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ANIMAÇÃO TURÍSTICA EM UM PEQUENO MUNICÍPIO BRASILEIRO: CULTURA E TRADIÇÕES DO MUNDO RURAL EM SÃO JOÃO DO POLÊSINE, RS, BRASIL

MICHELE LINDNER¹ MARCELINO DE SOUZA²

Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS ¹ Bolsista PDJ – CNPq – NEAG/UFRGS E-mail: [email protected] ² Professor do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). E-mail: [email protected]

RESUMO - As heranças culturais representam elementos de fundamental importância para a construção da identidade de comunidades. Muitas vezes a cultura influência diretamente no cotidiano de diversos locais, condicionando os modos de vida de suas populações. Concomitante a isto se percebe cada vez mais a exploração turística das tradições e da cultura rural em pequenos municípios brasileiros. Nesse contexto o presente artigo vem demonstrar a influência da cultura de um povo rural na construção identitária de uma comunidade e de que forma a identidade local vem sendo utilizada como produto turístico em um pequeno município no interior do Brasil.

Palavras chave: cultura, tradições, identidade, turismo rural, pequenos municípios.

ABSTRACT - Cultural heritages represent elements of fundamental importance for the construction of communities’ identity. Often, culture directly influences the everyday life of several places, conducting the life of their population. Concomitant to this, it is noticed an increasingly tourist exploration of rural culture and traditions in small Brazilian towns. In this context, this article shows the influence of rural people culture in the construction of a community identity and how the local identity has been used as a tourist product in a small town in the countryside of .

Key words: culture, traditions, identity, rural tourism, small towns.

1 INTRODUÇÃO grupos sociais, ou manifestarem-se em momentos específicos, porém em ambos os casos elas se mostram As heranças culturais podem ser consideradas as repletas de simbologias. maiores riquezas para o conjunto de uma sociedade. A Enquanto estruturas simbólicas as tradições cultura em seu sentido social pode ser referenciada de expressam identidade. A estrutura simbólica manifesta-se duas formas: como um conhecimento adquirido, aquele tanto em elementos materiais quanto em elementos que se refere a uma pessoa culta, sinônimo de uma pessoa imateriais de uma sociedade. Assim, o simbólico de um com estudos, bem informada e de bom gosto (erudição), lugar, manifestado na paisagem e no cotidiano local, ou então como um conhecimento acumulado, o qual influencia diretamente na sua produção e organização envolve crenças, regras, manifestações artísticas, espacial. Costa (2008), ao estudar o simbólico dos ensinamentos e tradições. lugares, propôs a discussão da identidade da paisagem, a As tradições referem-se aos conhecimentos e qual se mantém através das práticas culturais que definem costumes produzidos e transmitidos no interior de uma um conjunto de símbolos e revelam também a memória sociedade ao longo de gerações. Dessa forma, as tradições do lugar. estão relacionadas a heranças sociais, oriundas da história A paisagem é estática e móvel, conta histórias e de determinadas sociedades. Essas heranças sociais revela o momento vivido em determinado local. Ela é podem estar presentes no dia-a-dia de determinados moldada pela cultura e pelas tradições dos povos que nela

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habitam e por vezes desperta o interesse de pessoas São João do Polêsine podemos considerar a área urbana, externas ao local. ou vila do distrito de Vale Vêneto, como a detentora da Ao despertar o interesse de visitantes a paisagem maior quantidade de elementos da memória do lugar, transforma-se em potencial turístico, que aliado a materializada na paisagem, através da igreja de Corpus animação promovida por eventos festivos pode gerar Christi (Figura 2 - A), da Casa de Retiros Nossa Senhora ocupação e renda para determinadas comunidades. E é de Lourdes (Figura 2 - B), dos símbolos homenageando nesse sentido, que buscamos demonstrar a força que a os imigrantes italianos, o “Nono e a Nona” (Figura 2 - C), cultura e as tradições assumem na construção da símbolos da Semana Cultural Italiana de Vale Vêneto e identidade do município de São João do Polêsine, RS, e Festival Internacional de Inverno da UFSM2, ou então, como estas características têm contribuído para animação pelas casas coloniais (Figura 2 - D), e pelo monumento turística local. que faz parte da Praça da Polenta (Figura 2 - E), As análises que seguem, são frutos de estudos homenageando uma das comidas mais tradicionais dos realizados ao longo de anos de pesquisas no município imigrantes italianos que colonizaram o local. analisado. As informações apresentadas foram obtidas através de coletas de dados em materiais bibliográficos, documentos, folders turísticos, e diversas visitas ao local de estudo nas quais foram realizadas observações, fotografias, conversas informais e entrevistas com sujeitos locais como membros da administração publica, religiosos, moradores atuantes na vida comunitária, organizadores de festividades e sujeitos externos ao local, como estudiosos e visitantes.

CULTURA E TRADIÇÕES DO MUNDO RURAL NO MUNICÍPIO DE SÃO JOÃO DO POLÊSINE

O pequeno município localizado na porção central do Rio Grande do Sul, Brasil, (Figura 1) foi colonizado no século XIX por imigrantes e descendentes de imigrantes italianos, oriundos de uma “Europa rural”. Figura 2 – Símbolos das tradições na paisagem de Vale Herdeiros culturais de um povo rural, os habitantes do Vêneto município de São João do Polêsine, ainda mantém vivas no cotidiano da população residente no local, diversas Além desses e de diversos outros elementos tradições e costumes trazidos pelos imigrantes italianos impressos na paisagem do distrito de Vale Vêneto, a que colonizaram a região da Quarta Colônia1, a qual o memória do lugar também se materializa em um Museu, município faz parte. que tem por objetivo a preservação de objetos dos imigrantes que colonizaram o local. O Museu do Imigrante Italiano Padre João Iop, conta com um acervo de mais de três mil peças, entre peças trazidas pelos imigrantes da Itália e peças confeccionadas por eles nos primeiros anos de ocupação do local. Trata-se de um acervo variado, que reflete a rusticidade dos “primeiros tempos” na antiga Colônia de Silveira Martins3 (que englobava a área do atual município de São João do Polêsine). Entre as peças do acervo chamam a atenção os utensílios agrícolas (Figura 3 – A), fotografias e documentos (Figura 3 – B), instrumentos musicais (Figura 3 – C), sapatos de madeira (Figura 3 – D) utilizados para ir às missas nos domingos, um quarto colonial (Figura 3 – E), além de uma sala Figura 1 – Localização do município de São João do destinada exclusivamente para peças religiosas. Polêsine em relação ao estado do RS, Brasil. A memória de um lugar, impressa na paisagem, se dá através de diversos elementos simbólicos que expressam a história e os modos de vida. No município de 2 Universidade Federal de Santa Maria – Santa Maria, Rio 1 Quarto núcleo de colonização italiana no Estado Rio Grande Grande do Sul, Brasil. do Sul, Brasil, formado por um conjunto de sete pequenos 3 Quarta Colônia de Imigração Italiana do Estado do Rio Grande municípios localizados na porção central deste Estado. do Sul, Brasil.

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“gringos”, também estão presentes no imaginário dos sujeitos externos ao Município. Essas expressões representam significações que pessoas externas ao local fazem dos habitantes de São João do Polêsine, as quais estão relacionadas a história e principalmente a diversos elementos presentes atualmente no cotidiano dessas pessoas e que se referem a permanências das tradições no local. Essa identidade ligada as tradições dos imigrantes italianos também é reconhecida por Righi, Bisognin e Torri (2001). Esses autores chamam a atenção para as manifestações das permanências das tradições dos Figura 3 – Acervo do Museu do Imigrante Italiano Padre antepassados nas cerimônias religiosas, onde muitas vezes João Iop a língua italiana substitui a portuguesa, não só nas preces como também nos cânticos. O mesmo também ocorre nas Esses objetos que fazem parte do acervo do reuniões sociais com canções cujas letras foram trazidas Museu estão relacionados a história do lugar, e também pelos imigrantes. Essas canções atravessaram gerações, representam símbolos ainda muito presentes no cotidiano passadas de pais para filhos, representando dessa forma, dos habitantes do município de São João do Polêsine, a parte do patrimônio cultural imaterial desse lugar. religiosidade da população, sua economia voltada para a agricultura e o apreço pela música. O Museu, que recebe ANIMAÇÃO TURÍSTICA NO MUNICÍPIO DE SÃO visitantes que queiram conhecer o local mediante JOÃO DO POLÊSINE agendamento prévio, atualmente encontra-se sob a responsabilidade de membros da comunidade local, que De acordo com Figueiredo (2003, p 76), “o trabalham como voluntários e se revezam no recebimento turismo reforça a recriação da ruralidade, através da dos visitantes. transformação das características (reais ou idealizadas) As tradições e costumes dos imigrantes italianos tradicionais das áreas rurais em amenidades, em bens que colonizaram a região a qual pertence o município de comercializáveis e em produtos consumíveis”. São João do Polêsine refletem a identidade dos povos dos Nesse contexto, ao pensar no local de estudo sete municípios da chamada Região da Quarta Colônia de reporta-se a Vendruscolo (2009), que percebe as Imigração Italiana. Segundo Righi, Bisognin e Torri festividades como espaços privilegiados para a construção (2001) são os hábitos diferenciados introduzidos pelos e consolidação de símbolos identitários na medida em que imigrantes em toda essa região que ainda hoje constituem espaços privilegiados para a invenção das caracterizam essas comunidades fortemente estruturadas tradições. na “cultura italiana”. As festividades locais representam um momento A consciência de identidade e identificação com onde a comunidade busca externalizar suas tradições os hábitos e costumes dos antepassados trazidos de uma através de encenações e cenários preparados para receber Europa rural do século XIX é perceptível no discurso de os visitantes. Como manifestações simbólicas das um morador do local entrevistado. tradições, as festividades representam um papel de fundamental importância em São João do Polêsine, pois - “A região da quarta colônia de imigração são elas que reforçam os elementos da cultura de seu italiana a qual Polêsine faz parte é uma região que se povo. originou de uma colônia italiana e como tal ainda No município, a preparação das festividades mantém uma serie de traços culturais trazidos da Europa envolve uma série de elementos, que vão desde as rural [...]. Desta forma ainda temos uma serie de programações religiosas, culturais, gastronômicas, até a tradições que se mantém vivas, como os filós4, as festas preparação do cenário da festa. O cenário busca de interior, a gastronomia típica, o artesanato, o modo de representar a cultura local e as motivações festivas, como vida, o casório em estilo colonial, tudo isso colabora no caso do Festival de Internacional de Inverno da UFSM para que a região tenha sua identidade, um diferencial” e Semana Cultural Italiana de Vale Vêneto (Figura 4), que (Vereador e professor, 29 anos). mesclam motivações da cultura Italiana com elementos da música erudita, ou então a Festa Regional do Arroz A ligação das heranças coloniais a identidade da (Figura 5), que além das tradições italianas, tem como sociedade polesinense atual, percebida através de motivação o produto que da o nome a festa, o arroz. expressões como “os italianos de Polêsine” ou os

4 Os Filós eram encontros entre as famílias na casa de alguém da comunidade. Nestes encontros o objetivo era rezar, dialogar, jogar, fazer trabalhos manuais, contar casos, cantar e relembrar a terra natal, a Itália.

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imateriais, pois são muitas vezes motivadas pela fé. Portanto, trata-se de um município habitado por um povo católico praticante, no qual as festividades geralmente estão ligadas a motivações religiosas e do mundo rural, visto que, algumas delas são realizadas com o objetivo de agradecimento as colheitas. A gastronomia tradicional italiana é outro elemento importante nessas festividades e representa um grande símbolo da cultura local. O vinho, a sopa de anholini5, o salame, o queijo, a fortaia6, o grostoli7, a polenta brustulada (torrada), o radici e o cren (tempero de raiz forte), são preparados e servidos pelos moradores locais nesses eventos. Assim, marcante em todos os eventos, a tradição gastronômica é colocada como um dos grandes atrativos das festividades e de toda a Região da

Figura 4 – Imagens do desfile da Semana Cultural Italiana Quarta Colônia, como é percebido no enunciado do folder (2006) e Folder da XXV Semana Cultural Italiana de Vale de divulgação turística sobre Gastronomia, do Consórcio Vêneto e Festival Internacional de Inverno de Desenvolvimento Sustentável da Quarta Colônia (CONDESUS):

Há muitas formas de conhecer um povo e sua cultura. Entre as mais prazerosas e marcantes, encontra-se a gastronomia. A Quarta Colônia é rica em sua culinária com pratos típicos que assumem formas de relíquias herdadas de gerações.

Contudo, as festividades estão repletas do simbólico da cultura local, manifestado nos diversos elementos que as compõe. A forma de organização dessas festividades é comentada por um sujeito entrevistado, o Vereador e professor (29 anos), explica que as festividades normalmente acontecem no salão paroquial e são organizadas pelo Conselho Paroquial, fatores estes que já demonstram a ligação destas com a religião.

Figura 5 – Imagens do desfile tradicional e Folder da 55ª Mesmo o Festival de Internacional de Inverno da UFSM Festa Regional do Arroz que ocorre concomitante a Semana Cultural Italiana de Vale Vêneto possui seu caráter religiosos, pois o evento Vendruscolo (2009) ao se referir as festividades conta com missas e cerimônias religiosas e seus almoços da Região da Quarta Colônia de Imigração Italiana, e jantares são organizados pelos membros do Conselho ressalta que cada festa é ornamentada de acordo com sua Paroquial de forma voluntária. O trabalho voluntário na temática e que as decorações ficam a cargo da imagem organização das festividades e o papel da igreja, também para o sentimento de aconchego e afirmação dos são percebidos na fala de um morador do local símbolos. entrevistado:

O cenário de festa, portanto, apresenta-se - “Sempre são puxadas todas pela religião, eles como um atrativo na medida em que a tem incentivo da prefeitura também, mas é puxada pela comunidade local organiza-se para igreja. O pessoal colabora como voluntários, as festas aquele momento, um momento para daqui ninguém paga nada, todo mundo trabalha como receber os visitantes e servi-los, um voluntário. O pessoal da cidade que participa, a diretoria ritual de ‘vestir o local’, fazer o cenário onde será realizada a ‘encenação festiva’ (VENDRUSCOLO, 2009, p. 114). 5Comida de origem italiana, também conhecido pelo nome de capeleti, consiste em uma massa recheada com carne, frango ou Outra característica das festividades de São João queijo, com as pontas unidas. do Polêsine, assim como de muitas da Quarta Colônia, é a 6 Ovos mexidos com queijo, salame temperos a gosto. religiosidade, a qual também esta presente no simbólico 7 Doce de origem italiana, que consiste em uma massa caseira desses eventos. Suas manifestações são materiais, através cortada em tiras, no centro é feito um corte onde uma das pontas dos almoços e jantares nos salões paroquiais e das da massa é transpassada, essa massa é frita e posteriormente procissões e missas que normalmente abrem os eventos, e adoçada, sua versão salgada também é conhecida como cueca virada.

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da igreja, tem um grupo da igreja, o pessoal da igreja Portanto, as heranças culturais podem ser que escala o pessoal que trabalha e todo mundo ai consideradas as maiores riquezas para o conjunto de uma colabora. Todas as festas que tem aqui são feitas pelo sociedade. Herdeiros culturais de um povo rural, os pessoal do lugar. Pra vim na festa pra participa ai sim habitantes do município de São João do Polêsine, ainda vem de todos municípios, o pessoal da Quarta Colônia e mantém vivas no cotidiano da população residente no o pessoal de Santa Maria8 é o que mantém as festas aqui, local, diversas tradições e costumes trazidos pelos eles gostam muito de sai pro interior” (Comerciário e imigrantes italianos que colonizaram a região da Quarta agricultor aposentado, 77 anos). Colônia, a qual o Município faz parte. As tradições referem-se aos conhecimentos e Outra informante, a Guia de turismo (50 anos), costumes produzidos e transmitidos no interior de uma também explica que as programações das festividades sociedade ao longo de gerações. Dessa forma, as tradições geralmente são sempre as mesmas, que é “aquele tipo de estão relacionadas a heranças sociais, oriundas da história festividade bem tradicional”, começa com uma missa e de determinadas sociedades. Essas heranças sociais depois tem um almoço e que o papel da comissão é mais podem estar presentes no dia-a-dia de determinados de modificar datas, horários e decidir sobre os cardápios. grupos sociais, ou manifestarem-se em momentos Segundo ela a Comissão elege nomes e na missa são específicos, porém em ambos os casos elas se mostram divulgados os nomes dos membros da comunidade repletas de simbologias. convidados e por vezes parentes destes que também Contudo, as tradições expressas em eventos que ajudam na organização. A comunidade participa das atraem visitantes ao local, como nas festividades festividades na organização, nos afazeres e na elaboração apresentadas no decorrer do artigo, representam um dos alimentos. Existe também uma clara diferenciação no potencial de animação turística para o local. É nesse papel dos homens e das mulheres, os homens trabalham contexto, que o município de São João do Polêsine, tem na parte das carnes, assando o churrasco e nas bebidas e tentado explorar suas áreas turisticamente, valendo-se de as mulheres na preparação dos outros alimentos e na características locais, manifestações culturais que já limpeza. faziam parte do cotidiano e dos costumes de sua Contudo, as tradições expressas nessas comunidade, que tornam-se cada vez mais atrativas para festividades representam atrativos turísticos para pessoas pessoas externas a esta realidade. de municípios maiores. E dessa forma, percebe-se a importância dessas tradições, que fazem parte do REFERÊNCIAS cotidiano desse povo e também são externalizadas como forma de homenagear os antepassados que colonizaram o CONSÓRCIO DE DESENVOLVIMENTO local mostrando sua identidade cultural. Nesse município SUSTENTÁVEL DA QUARTA COLÔNIA. de vocação agrícola, o grande diferencial e atrativo Gastronomia. Quarta Colônia, Rio Grande do Sul, [200- turístico é esse fator cultural, que dá a sua identidade e o ]. 1 folder. faz pertencer a Quarta Colônia de Imigração Italiana do Rio Grande do Sul. COSTA, Otávio. MEMÓRIA E PAISAGEM: em busca do simbólico dos lugares. In: Espaço e cultura. – Edição CONSIDERAÇÕES FINAIS Comemorativa – (1993-2008) – Rio de Janeiro: UERJ, NEPEC, 2008. p. 149-156. A organização do espaço ocorre através da interação de todos os elementos nele contidos. Nesse FIGUEIREDO, Elisabete. <> Algumas reflexões a do artigo, percebe-se a importância dos elementos propósito do turismo como instrumento de culturais e das tradições preservadas. desenvolvimento local no meio rural. In: SIMÕES, Esses elementos são responsáveis pela Orlando; CRISTOVÃO, Artur (Org.). TERN: Turismo construção identitária desse povo, assim como pelas em Espaços Rurais e Naturais. Coimbra: Edições atitudes deste para com o lugar. Nesse sentido, a IPC/Inovar para Crescer – Instituto Politécnico de exploração da cultura e das tradições como um produto Coimbra, 2003. turístico, não só nessa localidade como também em outras que guardam peculiaridades semelhantes, tem se tornado LINDNER, Michele. A organização do espaço sob o cada vez mais comum. Trata-se do resgate da cultura dos olhar das ruralidades: estudo da paisagem e do lugar no povos rurais que passa a se tornar atrativo para pessoas município de São João do Polêsine, Rio Grande do Sul. que moram em grandes e médias cidades, e vão em busca 2011. 208 f. Tese (Doutorado em Geografia) – Programa de contato com a natureza, com animais, comidas de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Estadual caseiras, culturas diferenciadas. Paulista – UNESP - Rio Claro, 2011.

RIGHI, José Vicente; BISOGNIN, Edir Lucia; TORRI, 8 Município de porte médio localizado próximo a São João do Valmor. Povoadores da Quarta Colônia: Contribuições Polêsine. do imigrante italiano na Quarta Colônia Imperial de

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ESTRATÉGIAS DE COMERCIALIZAÇÃO E CONSTITUIÇÃO DO ARTESANATO RURAL ENQUANTO PRODUTO TURÍSTICO EM PELOTAS, PEDRAS ALTAS E JAGUARÃO, RS

1 ALINE MORAES CUNHA 2 MARCELINO DE SOUZA 1. Turismóloga, professora do Curso de Turismo do Instituto Metodista (IPA). E-mail: [email protected] 2. Professor dos Programas de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural e de Agronegócios da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). E-mail: [email protected]

RESUMO - O presente artigo objetiva analisar a comercialização do artesanato rural como produto vinculado ao turismo predominantemente na agricultura familiar através de um olhar aproximado junto a dois grupos produtivos: o grupo “Ladrilã”, integrado por artesãs dos municípios de Pelotas, Pedras Altas e Jaguarão; e o grupo “Redeiras”, integrado por artesãs da Colônia de Pescadores Z3, localizada no município de Pelotas. Metodologicamente, foi realizada uma pesquisa qualitativa e descritiva com o uso de dados levantados por meio de pesquisa de campo a partir da efetivação de estudo de caso com dois grupos de artesãos, realizando-se 23 entrevistas semiestruturadas com artesãos, coordenadores e entidades parceiras dos grupos. Os resultados permitem tecer considerações quanto à realidade dos grupos, que apesar de distintas, também compartilham similaridades, em especial, quanto aos problemas e dificuldades, que constituem os desafios ao seu desenvolvimento e sustentabilidade. Conclui-se que a falta de autonomia para a gestão dos grupos, ocasionada pela dependência do parceiro SEBRAE, constitui-se no maior desafio ao seu desenvolvimento.

Palavras chave: Artesanato; turismo rural; agricultura familiar; desenvolvimento rural.

ABSTRACT - The aim of this research is to analyze the commerce of rural handcraft as a product that is related to tourism predominantly in family agriculture through a close sight at two productive groups: “Ladrilã”, with handicrafts women from the towns of Pelotas, Pedras Altas and Jaguarão; and “Redeiras”, with handicraftswomen from the Fisherman Guild Z3, located at the second district of Pelotas. This study holds a basic quantitative and qualitative method in exploratory research with the use of primary and secondary data collected in bibliographical, documental and field sources from the study case of two groups of handicraftsmen through 23 semi-structured interviews with handicraftsmen, coordinators and organizations that support the groups. The results allow us to consider the handicraft produced by group Ladrilã as a real touristic product of Rio Grande do Sul, but the same cannot be said in relation to the Redeira’s handicraft. They show that the reality of the groups, besides their differences, also share similarities, especially in which concerns their problems and difficulties. In conclusion, the lack of an autonomic management due to their dependence on the partner SEBRAE is the main challenge to the development and sustainability of the groups.

Key words: Handicraft; rural tourism; family farming, rural development.

1 INTRODUÇÃO artigo, buscamos compartilhar os principais resultados alcançados nesta pesquisa. O presente artigo resulta da dissertação de De forma inicial, passamos a refletir quanto à mestrado intitulada “O Artesanato, suas Estratégias de atratividade gerada pelo rural, seja para fins produtivos, Comercialização e Constituição enquanto Produto de lazer, ou de moradia, estimulada pelo estabelecimento Turístico da Agricultura Familiar em Pelotas, Pedras de relações complementares ao meio urbano, pela Altas e Jaguarão - RS: Os Casos do Ladrilã e das modernização do meio rural, e melhorias de acesso e Redeiras”, defendida em 2012 no Programa de Pós- comunicação, como alguns dos fatores apontados por Graduação em Desenvolvimento Rural da Universidade Wanderley (2000), que evidenciam a “emergência de uma Federal do Rio Grande do Sul – PGDR/UFRGS. Neste nova ruralidade”, que traz em si novas funcionalidades

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para o meio rural, bem como novos papeis assumidos também no esclarecimento trazido por Fonseca (2002), pelos agricultores da atualidade. que diz: Em especial, na agricultura familiar, buscam-se formas de adaptação a este novo contexto do “rural”, de A pesquisa quantitativa se centra na objetividade. forma a possibilitar novas alternativas para a sua Influenciada pelo positivismo, considera que a permanência e reprodução social, de forma sustentável. realidade só pode ser compreendida com base na Assim, a pluriatividade como prática social decorrente análise de dados brutos, recolhidos com o auxílio desta busca, se caracteriza como uma estratégia de de instrumentos padronizados e neutros. A diversificação das oportunidades e meios de fixação do pesquisa quantitativa recorre à linguagem homem no campo. matemática para descrever as causas de um Desta forma, diante das transformações vividas, fenômeno, as relações entre variáveis, etc. A evidencia-se na agricultura familiar, a busca por utilização conjunta da pesquisa qualitativa e estratégias de geração e agregação de valor que permitam quantitativa permite recolher mais informações do a adaptação, mas acima de tudo, desenvolver novas que se poderia conseguir isoladamente. estratégias, mais próximas das suas realidades produtivas, (FONSECA, 2002, p.20) que apontem alternativas competitivas frente ao mercado convencional. Estas estratégias têm se consolidado, por Dentro dessa perspectiva e definição quanto às meio da inserção de atividades não agrícolas como o abordagens de pesquisa, passamos a considerar a artesanato e o turismo, a organização de agroindústrias, adequação ao formato de pesquisa conhecida por estudo certificações e outras formas de arranjos coletivos, e de caso, já que a unidade de análise escolhida foi o estudo também do ordenamento para o acesso a novos e de grupos de artesãos. Desta forma, buscamos os especializados mercados. apontamentos de Gil (2007, p.54), que define: Assim, diante do atual cenário turístico e rural brasileiro, levanta-se o questionamento quanto à junção Um estudo de caso pode ser caracterizado como entre turismo, artesanato e agricultura familiar, no um estudo de uma entidade bem definida, como incremento de produtos turísticos e promoção do um programa, uma instituição um sistema desenvolvimento rural no estado do Rio Grande do Sul. educativo, uma pessoa ou uma unidade social. Com este intuito, o estudo aqui apresentado se Visa conhecer em profundidade o como e o porquê desenvolveu com o objetivo de analisar a constituição e a de uma determinada situação que se supõe ser comercialização do artesanato rural como produto única em muitos aspectos, procurando descobrir o vinculado ao turismo, predominantemente na agricultura que há nela de mais essencial e característico. O familiar. pesquisador não pretende intervir sobre o objeto a ser estudado, mas revelá-lo tal como ele o percebe. 2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Conforme Alves-Mazzotti e Gewandsznajder Com a finalidade de alcance dos objetivos (1999), esse tipo de formato é adequado para estudos de apontados, o estudo, se vale da abordagem metodológica caráter qualitativo, os atores a serem pesquisados são qualitativa e quantitativa, através de realização de selecionados de forma proposital, em função de algum pesquisa descritiva, com o uso de dados primários, atributo especial de interesse para a pesquisa, a qual busca levantados por meio de pesquisa bibliográfica, investigar diferenças internas e comportamentos documental e de campo. particulares. A abordagem qualitativa apresentou-se interessante, pois: “percebe a relação inseparável entre o 2.1 Seleção dos atores a serem pesquisados mundo natural e social; entre pensamento e base material; entre objeto e suas questões; a ação do homem como Para a seleção dos atores a serem pesquisados sujeito histórico e as determinações que a condicionam” que atendessem ao objetivo da pesquisa, buscamos por (MINAYO, 2000, p.12). experiências, que nos apresentassem a vinculação da Em um estudo qualitativo, são considerados os produção de artesanato e comercialização em roteiros aspectos da realidade cotidiana vivida, isto é, motivações, turísticos, com a participação da agricultura familiar. atitudes e valores dos indivíduos (GOLDENBERG, 2000; Desta forma tomamos conhecimento Projeto Artesanato MINAYO, 2000). do Mar de Dentro, desenvolvido no Território da Porém, também consideramos conforme Baquero Cidadania - Zona Sul do Estado, na área de abrangência (2009), que assim como todos os dados qualitativos da chamada “Costa Doce”. podem ser descritos numericamente, todos os dados O Projeto Artesanato no Mar de Dentro, quantitativos estão baseado em julgamentos qualitativos, coordenado pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e evidenciando a relação direta e consecutiva entre eles. Pequenas Empresas do Rio Grande do Sul Desta forma, passamos a conceber a realização (SEBRAE/RS), abrange 25 municípios e envolve cerca de de um estudo misto “quali-quantitativo”, embasados 370 artesãos, tendo como público alvo os grupos da zona rural, da periferia urbana e de colônias de pescadores.

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Tendo como objetivo o fortalecimento dos núcleos de fechadas de respostas dicotômicas e também de múltipla artesanato, promoção do associativismo e cooperativismo, escolha, facilitou a aplicação pela pesquisadora. Os três e a busca da sustentabilidade financeira dos artesãos, formulários foram desenvolvidos com o intuito de através do apoio à criação, produção e venda de produtos levantar as questões pertinentes para o alcance dos diferenciados, com “forte identidade regional”. O projeto objetivos propostos neste estudo, bem como promover a integra três “Coleções”, divididas em grupos de artesãos, sua integração com o referencial teórico abordado. sendo o “Bichos do Mar de Dentro”, com a temática Destacamos que foi realizado pré-teste dos ambiental, de representação da fauna regional; o formulários com uma integrante de cada grupo e estes “Redeiras”, também com a temática ambiental; e o foram descartados, não compondo o resultado final. “Ladrilã” com a temática cultural. Também uma das integrantes do grupo Redeiras, não Considerando a possibilidade de pesquisa com pode receber a pesquisadora e conceder a entrevista, por mais de um grupo, para proceder a escolha, delimitamos estar fora da Colônia Z3, acompanhando uma das filhas dois critérios centrais: a) estar sediado, ou comercializar em tratamento médico em Porto Alegre, em todas as datas seus produtos em município que oferte roteiro ou fluxo de agendamento de visitas com as demais integrantes do turístico efetivo da região; b) ser integrado por artesãs grupo. Desta forma optou-se por não insistir no predominantemente com vínculo rural. agendamento, visto o momento delicado da família. A partir destes critérios, levantou-se que os Assim totalizamos 18 entrevistados, sendo 10 do grupo integrantes do grupo “Bichos do Mar de Dentro”, eram Ladrilã e 8 do grupo Redeiras. Porém estas mesmas predominantemente urbanos, e seus integrantes rurais artesãs que participaram do pré-teste foram entrevistadas localizavam-se em municípios de pouca referência posteriormente como representantes do grupo. Sendo turística. No grupo Redeiras, verificou-se que todas as 10 assim, todas as artesãs envolvidas foram ouvidas e integrantes, têm vinculo direto com a pesca. E no grupo consideradas neste estudo de alguma forma. Ladrilã, dos 35 integrantes, 11 tinham vínculo direto com Para a complementação das informações, o tipo a agropecuária, sendo os demais, artesãos urbanos. Desta de observação adotada foi a não participante, buscando forma, definimos pela realização de estudo de casos registrar o máximo de fatos e ocorrências, os quais não múltiplos com grupos Ladrilã, integrado por artesãs dos poderiam ser obtidos somente por meio de formulários e municípios de Pelotas, Pedras e Jaguarão e o grupo entrevistas realizadas. Conforme Richardson, (1999, “Redeiras”, formado por artesãs da Colônia de Pescadores p.260). Z3, localizada no 2º distrito do município de Pelotas. Além dos artesãos, os levantamentos Nesse tipo de observação o investigador não preliminares apontaram a necessidade de abordagem com toma parte nos conhecimentos objeto de estudo mais duas categorias de sujeitos, sendo os coordenadores como se fosse membro do grupo observado, mas das entidades parceiras e os responsáveis/coordenadores apenas atua como espectador atento. Baseado dos grupos de artesãos. nos objetivos da pesquisa, e por meio de seu roteiro de observação, ele procura ver e registrar 2.2 Instrumentos e técnicas de pesquisa o máximo de ocorrências que interessa ao seu trabalho [...] A observação não participante é Para a realização do levantamento dos dados de uma técnica indicada para estudos exploratórios, campo, optou-se pela realização de entrevistas considerando que ela pode sugerir diferentes semiestruturadas, que de acordo com Triviños (1987 p. metodologias de trabalho, bem como levantar 146): novos problemas ou indicar determinados objetivos para a pesquisa. [...] é aquela que parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e Considerando o que afirma Almeida (1989, hipóteses, que interessam à pesquisa e que, em p.100), para os registros desta observação foi adotado o seguida, oferecem amplo campo de uso de diário de campo, que conforme o autor consiste em interrogativas, junto de novas hipóteses que uma “técnica complementar e secundária”. vão surgindo à medida que recebem as Para auxiliar na tipificação das peças respostas do informante. Desta maneira o confeccionadas pelos grupos e categorização do informante, seguindo espontaneamente a linha artesanato produzido e comercializado, utilizamos além de seu pensamento e de suas experiências da abordagem nas entrevistas, e observação, também dentro do foco principal colocado pelo registros fotográficos das peças, materiais e ferramentas investigador, começa a participar na elaboração utilizadas, bem como a identificação dos espaços de do conteúdo da pesquisa. produção.

A realização destas entrevistas foi apoiada pelo 3.3. Estratégia de aproximação e coleta dos dados uso de formulário de pesquisa específico para cada um dos três sujeitos a serem pesquisados que através de A pesquisadora deu inicio a aproximação com os roteiro semiestruturado, contendo perguntas abertas e grupos em junho de 2010, quando da participação no II

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Seminário de Artesanato do Mar de Dentro, promovido SENAR/RS, facilitou o acesso, pois ampliou a relação de pelo SEBRAE/RS, em parceria com as Secretarias confiança com o grupo. municipais de Turismo da região da Costa Doce, durante A partir de então o acesso também às pescadoras a 18ª FENADOCE – Festa Nacional do Doce em Pelotas. do Grupo Redeiras, foi facilitado pelo SEBRAE, que Este seminário tinha como temática o artesanato como disponibilizou a articuladora local de Pelotas, para levar a fator de desenvolvimento territorial. O mesmo reuniu pesquisadora até a Colônia Z3, onde vivem as artesãs, e a cerca de 300 artesãos que compõem o Projeto Artesanato apresentou à coordenadora do grupo, que por sua vez do Mar de Dentro articulado pelo SEBRAE/RS. Neste ligou para todas as integrantes agendando com elas a evento a pesquisadora pôde coletar material promocional visita da pesquisadora, para aquele dia e nos próximos e conhecer as novas coleções de artesanato dias. Várias delas já sabiam da realização da pesquisa e comercializadas por cada grupo. todas manifestaram satisfação em serem pesquisadas. No ano de 2011, foi realizado pelo Instituto Desta forma foram realizadas 18 entrevistas com Latino Americano de Pesquisas e Desenvolvimento artesãos, 2 com representantes dos grupos, e 3 com (ITELAP), o Seminário Artesanato Gaúcho Associado ao entidades parceiras, totalizando 23 entrevistas. Turismo: Um Novo Cenário Mercadológico, que ocorreu Ressaltamos que o formulário de cada entrevistado foi em porto Alegre de 25 a 27 de julho de 2011. Neste numerado para caso sua fala fosse citada na análise dos seminário foi apresentado o Diagnóstico do Artesanato resultados, este não pudesse ser identificado pelos Gaúcho realizado em 32 municípios do estado. Este leitores. material, posteriormente foi gentilmente cedido pelo ITELAP e se constituiu em importante registro 2.4 Análise e quantificação dos dados documental, servindo de base para o fortalecimento dos questionamentos iniciais, motivadores deste estudo e para A análise qualitativa dos dados ocorreu por meio a consolidação das definições quanto a área e grupos de da análise de conteúdo das respostas, com a descrição do estudo. que foi respondido, somado ao que foi registrado nas Neste mesmo evento, a pesquisadora teve acesso observações da pesquisadora, e referenciando estes à base à Gestora de Projetos de Turismo da Região Sul do teórica utilizada. SEBRAE/RS e Coordenadora do Projeto de Artesanato no Os dados quantitativos foram trabalhados com o Mar de Dentro manifestou seu interesse em ter os dois auxílio do programa Excel Microsoft Office 2003, através grupos Ladrilã e Redeiras, como estudos de caso de sua do uso de ferramentas de estatística descritiva, como a pesquisa, para dissertação de mestrado. A mesma média aritmética simples e a frequência em percentual. demonstrou interesse na pesquisa, indicou a consulta aos Ferramentas estas que foram utilizadas tanto para a sites para levantamento de mais dados sobre os grupos e análise e interpretação dos dados coletados junto aos se colocou a disposição para maiores esclarecimentos. Na grupos, como dos dados secundários. Os gráficos e área de exposição do Artesanato Gaúcho, Foi possível tabelas foram elaborados com base nas planilhas fazer o registro fotográfico das peças de artesãos de todo elaboradas pela análise estatística dos dados. o RS e em especial das coleções do Ladrilã e Redeiras. Com estas considerações, referentes aos Após contatos por telefone com a Coordenadora procedimentos metodológicos apontados é que se almejou do Projeto de Artesanato no Mar de Dentro, e também o responder o problema de pesquisa levantado de forma a envio de solicitação formal via e-mail, e encontro colaborar na construção do conhecimento científico e a presencial em visita a Pelotas, se ultrapassou a etapa de relevância de sua prática para os processos de conhecimento, aprovação e interesse da coordenadora desenvolvimento rural nas comunidades estudadas. pela realização da pesquisa. Assim procedeu com a disponibilização dos contatos das responsáveis pelos dois 4 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA grupos e da articuladora do SEBRAE de Pelotas, que acompanharia a pesquisadora nas primeiras visitas e Com a revisão bibliográfica adotada se buscou aproximação com as artesãs. Desta forma a realização das elucidar os aspectos relevantes dos aspectos estudados, entrevistas se iniciou em dezembro de 2011 e foi tecendo a reflexão quanto ao turismo; as estratégias concluída em janeiro de 2012. adotadas pela agricultura familiar para a sua reprodução No primeiro encontro realizado com o Grupo social e a busca por novos mercados; a produção Ladrilã, no dia 7 de dezembro de 2011, durante um associada ao turismo, como produto turístico do meio encontro de produção e de fechamento das ações do ano e rural; e o artesanato, sua origem, tipologias e ferramentas também do projeto do SEBRAE/RS, que dava suporte a de comercialização. elas, estavam presentes todas as artesãs do grupo. Elas ainda não tinham conhecimento quanto à realização da 4.1 A “nova ruralidade”, e a pluriatividade como pesquisa, que lhes foi apresentada e então manifestaram estratégia para o meio rural satisfação por serem escolhidas e disponibilidade de colaboração no que fosse necessário. Consideramos que o Tratando da diversificação do meio rural nas fato das integrantes do município de Pedras Altas, já sociedades modernas, e da “emergência de uma nova terem sido alunas da pesquisadora em uma ação do ruralidade”, Wanderley (2000; 2009), considera as

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transformações mais recentes do meio rural, como sendo reprodução social, comum a ambos os atores aqui resultantes de fatores “externos” e “internos”. Entre os trabalhados sendo pescadores e agricultores familiares, externos, destaca os efeitos das “novas relações apontam também novos mercados emergentes para a econômicas e políticas”, destacando a globalização da agricultura familiar no Brasil e a pertinência da adesão a economia, a presença de instâncias internacionais e estes, como estratégias de desenvolvimento rural. macrorregionais na regulação da produção e comércio agrícola, a profunda crise do emprego, que atingiu 4.2 Novos mercados para a agricultura familiar diversos setores e as transformações pós-fordistas das relações de trabalho e suas novas formas de regulação. Para Sepulcri e Trento (2010, p.1), o acesso ao Como fatores internos, a autora destaca o mercado e a comercialização, se constituem o maior processo de diversificação social do meio rural, o desafio para a agricultura familiar, e consideram que: estabelecimento de relações de complementaridade do rural com o urbano (rompendo a visão de antagonismo), o A escolha do mecanismo de comercialização crescimento demográfico, a “modernização” rural, a envolve ações que se adaptem à pequena escala, valorização dos patrimônios natural e cultural das ao tipo de qualificação do trabalho, ao localidades e os “novos papeis” assumidos pelos relacionamento com fornecedores, clientes e agricultores. Estes fatores contradizem as visões que prestadores de serviços e a existência de apontavam o “fim do rural”. Desta forma, para Wanderley estratégias competitivas. (2009, p.212): Deve-se considerar que o processo de Nas sociedades modernas, o desenvolvimento comercialização tem início com a produção, mas irá dos espaços rurais dependerá, não apenas do atender também os estágios de beneficiamento, dinamismo do setor agrícola, porém, cada vez embalagem, compra, venda e atividades de logística. Para mais, da sua capacidade de atrair outras a permanência no mercado e manutenção desta dinâmica atividades econômicas e outros interesses sociais na produção, produtores deverão ter volume, qualidade, e de realizar uma profunda “ressignificação” de diversidade e regularidade na oferta de produtos. Assim, suas próprias funções sociais. para atender esta diversidade, a produção da agricultura familiar deve buscar produtos diferenciados e adequados Buscando autores que tratam da nova “vitalidade ao consumidor. (SEPULCRI; TRENTO, 2010) social” do meio rural, a autora aponta conflitos entre Nesse contexto, outro desafio que se coloca aos diferentes visões do rural. Neste trabalho, damos agricultores familiares é entender como estão estruturadas destaque, à visão que associa o meio rural à qualidade de as cadeias produtivas de seus negócios, e identificar o vida, para o conjunto da sociedade. Assim, o meio rural, mercado apropriado, os canais de comercialização, e as passaria de espaço de produção a ser também um “espaço estratégias apropriadas para cada grupo de produtos. de consumo”, voltado às atividades de lazer com Assim, no quadro 1 apresentamos as especificidades “diversas formas de turismo rural”, e às atividades de destes novos mercados. residência permanente e também secundária. Assim, se Diante deste cenário, Wilkinson (2008) também tornaria um “patrimônio da sociedade, acessível a todos.” ressalta a valorização dos mercados locais e regionais ou (WANDERLEY, 2009, p. 216). de proximidade, visto que pela baixa densidade de Esta mudança na percepção da população rural, consumo, não desperta interesse das modernas redes de que passa a ver o seu espaço como possibilidade de distribuição e também pela facilidade de acesso direto ao desenvolvimento e a valoriza também o seu patrimônio consumidor. Da mesma forma, o autor reconhece estes natural e cultural, é outro elemento crucial desta “nova novos mercados como portadores de práticas distintas de ruralidade”, que traz consigo também os novos papeis desenvolvimento rural. assumidos pelos agricultores, onde estes deverão Diante destes novos mercados e suas contribuir para a preservação da paisagem e das tradições especificidades o que evidenciamos é que a partir do culturais, tornando-se pluriativos, através da expansão de reconhecimento do mercado que melhor atende à sua suas atividades profissionais para além da produção realidade, capacidade produtiva e especificidade de agrícola (WANDERLEY, 2000). produto, o agricultor ao optar pelo direcionamento a um Tratando das transformações da agricultura e da destes e às suas adaptações, está definindo uma estratégia ampliação das atividades não agrícolas entre os de desenvolvimento rural. agricultores, Schneider (2004, p.64), assinala a Schneider, Ye e Ploeg (2011, p.4), consideram emergência de atividades como o turismo rural, o que os novos mercados emergentes, constituem um artesanato, a prestação de serviços, o comércio, o aspecto importante dos processos de desenvolvimento ambientalismo e o lazer, como atividades econômicas a rural, visto que trazem um processo de “auto compor o que chamou de “espaço polissêmico”. fortalecimento”, ampliando a autonomia dos setores Conforme apresentado pelos autores consultados agrícolas envolvidos e criando novos espaços de encontro a diversidade de alternativas de funções e usos do espaço e interação, entre cidades e meio rural, produtores e e recursos disponíveis no meio rural, como estratégias de consumidores.

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Quadro 1 - Novos mercados para agricultura familiar O artesanato, objeto deste estudo, vem se enquadrando em especial nos mercados de Mercado Perfil /desafios 1 “especialidades” e “solidário”, e encontra-se como Commodities Velhos e novos mercados locais e à distância. produto central na associação ao turismo, em diversas A manutenção neste mercado implica o alcance de níveis de qualidade e escala de comunidades e destinos turísticos, por este motivo ocupa produção, e adaptação à legislação e espaço destacado quando se fala em produção associada padronização, o que demanda inovações ao turismo. organizacionais e incorporação de novas tecnologias e práticas agrícolas. 4.3 Produção Associada ao Turismo Especialidades Associação com localidade, tradição e qualidade. Possuem maior nível de Considerando que a segmentação da oferta permite diferenciação e são produzidos em pequena o direcionamento de produtos turísticos a públicos escala, voltados para mercados segmentados, específicos e também proporciona o acesso a novos e dos quais se espera que obtenham preços e mercados. Por isso, passamos a abordar a produção margens de lucro relativamente altos. Orgânicos Grau de associação à saúde ou a um modelo associada e a sua constituição enquanto produto turístico, específico de produção. Nasceram como como forma de acesso a novos mercados e atendimento às 4 circuitos curtos entre produtores e demandas dos turistas de diferentes segmentos , por meio consumidores, porém, ao ser associado à também dos produtos e serviços atrelados à cadeia saúde e bem estar, dissociou-se desta origem produtiva5 do turismo. e consequentemente da agricultura familiar. No âmbito do programa de Regionalização do Artesanais Denominação de origem ou não. Produtos Turismo, o Ministério do Turismo - MTUR, Brasil (2004, “coloniais”, ou “sertanejos”. Insere-se no 2 p.17), passou-se a definir produto turístico, como “o comércio justo . Passa pela noção de conjunto de atrativos, equipamentos e serviços turísticos valorização dos territórios3 e demandam por acrescidos de facilidades, localizados em um ou mais qualidade competitiva, acompanhada por inovações organizacionais de ação coletiva e municípios, ofertado de forma organizada por um adequação às normas técnicas associadas à determinado preço”. preservação da autenticidade. Também a comercialização de produtos originários Solidários Identificação ou não com a agricultura da produção rural e ofertados diretamente ao turista em familiar, mercados de alta e baixa renda. visita à propriedade, ou mesmo em meio urbano, em Insere-se no comércio justo e solidário feiras e mercados, podem ser um importante fator de demanda inovações organizacionais de ação promoção do turismo, em especial o Turismo Rural, visto coletiva, maior capacidade produtiva, que estes produtos de origem rural despertam a atenção e qualidade e diversificação de produtos. o interesse por estes destinos. Institucionais Licitações para atender mercados públicos locais, em especial merenda escolar. Também Desta forma, reconhecendo a importância de oferta para varejo. Demanda maior agregar valor às atividades e produtos turísticos por meio capacidade produtiva, qualidade e da qualificação e valorização de produtos, promoção diversificação. preservação e perpetuação dos saberes e fazeres locais é que se passou a trabalhar a chamada Produção Associada Fonte: Elaboração pela autora, baseado em Wilkinson ao Turismo (PA), entendendo esta como: (2008). Qualquer produção artesanal, industrial ou agropecuária que detenha atributos naturais 1 Commodities: “São produtos padronizáveis, que podem e/ou culturais de uma determinada localidade ser estocados e transacionados internacionalmente. As ou região, capazes de agregar valor ao produto principais commodities são os grãos (milho, soja e trigo), turístico. São as riquezas, os valores e os o álcool, o algodão e carnes (meia carcaça e cortes sabores brasileiros. É o design, estilismo, a congelados)”. (WAQUIL; MIELE; SCHULTZ, 2010, tecnologia: o moderno e o tradicional. É p.12) 4 2 Comércio justo: visa redistribuir valor à montante na Para aprofundar as conceituações adotadas e cadeia produtiva para os produtores rurais. A direcionamentos apontados, consultar: BRASIL, reivindicação, neste caso não é o status de qualidade Ministério do Turismo. Segmentação do Turismo: especial, mas a justiça ao gerar renda suficiente para Marcos Conceituais. Brasília: MTUR, 2006. cobrir os custos de produção permitindo a reprodução em 5 Cadeia produtiva: é definida como sendo o conjunto de condições de cidadania. (WILKINSON, 2008). componentes interativos, incluindo os sistemas 3 “Um território representa uma trama de relações com produtivos, fornecedores de insumos e serviços, raízes históricas, configurações políticas e identidades que industriais de processamento e transformação, agentes de desempenham um papel ainda pouco conhecido no distribuição e comercialização, além de consumidores próprio desenvolvimento econômico.” (ABRAMOVAY, finais (CASTRO, 2001, p. 33). 2009, p.385)

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ressaltar o diferencial do produto turístico, para e demais autores trabalhados em seu texto quanto ao incrementar sua competitividade. (BRASIL, artesanato e suas relações. Porém estes fazem suas 2011, p.18) abordagens e constroem suas definições através da relação com a cultura e o “design”. Abordando em Partindo deste conceito, se torna possível a especial suas características de preservação e identificação dos produtos e processos, tangíveis e revalorização cultural, e geração de renda, aspectos que os intangíveis existentes nas comunidades que possam ser leva também à conexão com o turismo. Neste sentido, qualificados e ou aprimorados, tornando-se componentes para Lima (2005, p.2): de atratividade para os destinos, e diversificando a oferta de produtos turísticos locais. (BRASIL, 2011). No mundo contemporâneo, existe uma Desta forma a inserção de elementos da “produção enorme gama de objetos que podemos definir associada”, como artesanato, produtos agropecuários e como artesanato. São produtos do fazer manifestações culturais em roteiros e empreendimentos humano em que o emprego de equipamentos turísticos, vem agregar valor e torná-los mais atrativos e e máquinas, quando e se ocorre, é subsidiário competitivos, visando aumentar a permanência do turista à vontade de seu criador que, para fazê-lo, e ampliar seus gastos, fomentando a economia local, utiliza basicamente as mãos. fortalecendo a produção e a cultura e agindo como meio de inclusão social. A partir desta definição, Lima (2005), destaca que o objeto artesanal é definido por duas condições, sendo a 4.4 Artesanato primeira o fato de seu processo de produção ser essencialmente manual, e a segunda, a liberdade do Compreender primeiramente, o que seja artesanato artesão, que é quem define o ritmo da produção, as é essencial para que possamos fazer as considerações e matérias primas e tecnologia a serem utilizadas, tornando ligações pertinentes, para a exposição, da constituição o objeto produto de sua criação, saber e cultura. deste enquanto um produto turístico no estado do Rio Barroso (2002, p.02), referencia que o termo Grande do Sul – RS. Desta forma, iniciando nossa busca artesanato tem tido desde seu aparecimento em fins do pela literatura internacional, tratando justamente da século XIX, significado ambíguo, “englobando o relação entre artesanato e turismo, especificamente como conjunto das atividades manuais não agrícolas sem se referem em seu país, “O artesanato empresarial e a conseguir distinguir o artesão do artista”. Considera o indústria do turismo”, encontramos o autor inglês, Ian artesanato como um trabalho “essencialmente Fillis (2009) que, em seu texto faz uma revisão quanto às individual”, porém se diferencia dos autores considerações de vários autores sobre o artesanato, internacionais, ao considerar que a confecção de alguns trabalhando inicialmente a diferença entre este e a arte. objetos pode demandar a intervenção de várias pessoas. Citando Greenhalgh (1997, apud FILLIS, 2009), Também destaca que a esta atividade deve apresentar destaca que por volta de metade do século XIX, as destreza e habilidade ímpar de quem a produz, de forma palavras, artesanal e artesanato, estavam em uso popular, que diferencie estas de uma simples atividade manual. devido à discussão quanto às artes visuais, recorrentes na Sendo assim ressalta a diferenciação entre época. Metcalf (1997, p.6, apud FILLIS, 2009), aponta artesanato e atividade manual: que: Uma atividade manual é em geral uma Afirmar que artesanato é arte, pressupõe que os ocupação secundária, utilizando-se o tempo dois são comparáveis, e implica que as disponível ou ocioso com o objetivo ferramentas conceituais e de vocabulário das principal de complementar a renda familiar, artes plásticas pode ser aplicado a qualquer enquanto o artesanato é a atividade objeto de arte, e vice-versa... ambos, artesanato principal de quem o produz. (BARROSO, e arte, são visuais e portanto sujeitas a uma 2002, p.04) análise visual formal. No entanto um exame limitado aos aspectos formais do artesanato e Com estas bases, Barroso (2002, p.02), referencia de como são construídos e utilizados, resulta o conceito de artesanato adotado pelo Conselho Mundial em uma visão altamente distorcida. de Artesanato - WCC6 (1996), como sendo: “Toda a atividade produtiva de objeto e artefatos, realizados Coopers & Lybrand (1994, apud FILLIS, 2009), manualmente, ou com a utilização de meios tradicionais destaca que a produção do artesanato, deve envolver uma ou rudimentares, com habilidade, destreza, apuro técnico, única pessoa em todo o processo, desde a conceituação engenho e arte”. até a fabricação. Também deve ser de “design individual” e conter um alto grau de habilidade manual em sua produção. 6 Para conhecer o histórico e atuação do WCC, acesse: No Brasil autores como Lima (2005), Barroso http://www.worldcraftscouncil.org (2002), e Borges (2010) vêm ao encontro de Fillis (2009)

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No Brasil, além das conceituações abordadas Quadro 2 - Perfil da empresa artesanal e artesão inglês anteriormente, os trabalhos de Barroso (2002), SEBRAE (2004), e Mascêne e Tedeschi (2010), citados em diversos LIFESTYLER EMPREENDEDOR estudos e artigos consultados, bem como utilizados por instituições de fomento, trazem as categorias, Está no setor por uma Um tomador de riscos (em classificação e tipologias dos trabalhos artesanais escolha de estilo de termos de realização existentes no país, com base na realidade brasileira, suas vida; negócios e com o produto características físicas, modos de trabalho e expressão A expansão dos artesanal em si); cultural. negócios não é Pode ou não aderir à De forma quase consensual, estas nomenclaturas e importante; exportação; conceituações, alinham-se com a legislação vigente, Disposto a assumir É proativo; instituída pela Secretaria de Comércio e Serviços do muitos riscos; Mais provável para abraçar Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio O que importa é a negócios com filosofia de Exterior – SCS/MDIC, através da Portaria nº29 de 05 de qualidade de vida; mercado em longo prazo; outubro de 2010, publicada no Diário Oficial da União Pode ou não exportar; Tem compreensão da (D.O.U.) em 06 de outubro de 2010. Desta forma, o Geralmente apresenta importância do Programa do Artesanato Brasileiro - PAB/MDIC ação reativa; relacionamento com os (BRASIL, 2010, p.12), nos apontam o seguinte conceito Dispostos a seguir o clientes e da construção de para o artesanato brasileiro: negócio e a adotar uma redes. postura de mercado que Artesanato compreende toda a produção desenvolva habilidades. resultante da transformação de matérias- DESENVOLVEDOR primas, com predominância manual, por IDEALISTA TARDIO indivíduo que detenha o domínio integral de uma ou mais técnicas, aliando criatividade, É um artista, que vê seu Tende a vir de fundo não habilidade e valor cultural (possui valor ofício como uma peça criativo; simbólico e identidade cultural), podendo no criativa e não como um Menos motivado para processo de sua atividade ocorrer o auxílio produto; expandir limitado de máquinas, ferramentas, artefatos e Tomador de risco negócios; utensílios. (somente com a criação Menos propenso a do produto artesanal); exportação; Assim, as considerações e conceituação acima Tende a não considerar Resistente a aceitar novas apontadas, iniciam o processo de entendimento quanto ao a demanda do cliente; ideias; artesanato, sua origem e princípios básicos, norteadores Pode ou não exportar; Acredita na valorização da deste estudo. Dá importância à própria experiência de construção de negócios e na vida; 4.4.1 Perfil da empresa artesanal e artesãos relacionamentos e Capaz de trazer geração de reputação; conhecimentos externos Considerando então a relevância econômica do Vê a si mesmo como para o negócio; setor, sua expansão e a postura adotada por “empresas artista independente, e Pode encontrar problemas artesanais”, entendendo estas como grupos de trabalho não como artesão. com acesso às redes já coletivo e associações, e também o “novo artesão” ou, o existentes. “artesão moderno”, que integra iniciativas de trabalho Fonte: Elaborado pela autora, baseado em Fillis (2009). artesanal coletivo, Fillis (2009) buscou identificar o perfil dos artesãos que compõem as “empresas artesanais”. 5. RESULTADOS DO ESTUDO Desta forma, apresenta-se no quadro 2 as quatro tipologias identificadas por este autor. 5.1 Caracterização dos Grupos e Área de Estudo Fillis (2009) destaca que o apontamento destes 4 Quanto aos grupos de artesãs, o grupo de artesãs tipos de “artesãos/ “empresários artesanais” e suas denominado Ladrilã, iniciou seu trabalho coletivo em características, evidencia que apesar de diferentes, nem 2008, apontando como principal motivação para a sempre são “exclusivos”, pois algumas características formação do grupo a busca por alternativas de trabalho e podem ser encontradas em mais de um grupo, mesmo que renda na região, através da valorização dos seus saberes e com interpretações variadas, como por exemplo o fazeres artesanais, já amplamente baseados no uso da lã, empreendedor e o idealista, ambos estão preparados para visto ser esta uma matéria-prima de uso tradicional na assumir riscos. No entanto, a natureza do risco é Região Sul do estado. inerentemente diferente. O primeiro é preparado para Quanto à caracterização do trabalho artesão assumir riscos no negócio em geral, enquanto o último coletivo, o grupo é formado por 35 artesãos, residentes realmente só se preocupa com o risco artístico do em 3 municípios, sendo Pelotas, Pedras Altas e Jaguarão, desenvolvimento das peças. tendo sido unidos pelo projeto de artesanato do SEBRAE,

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que os agrupou devido ao domínio do uso da lã, matéria (2002), que dividem estes enquanto “Artesão”, “Artista prima que faz a relação identitária entre os municípios. popular” e “Trabalhador manual”, quanto ao artesanato e Com a disponibilidade de matéria-prima e o domínio de artesão gaúcho identificam-se quatro tipos. Este todo o processo de confecção do artesanato e também de cruzamento entre de dados, conceitos e experiências, em diversas técnicas artesanais, a partir do apoio institucional alguns aspectos se apresentaram semelhantes, e em outros via projetos do SEBRAE7, as peças do Ladrilã, se diferenciaram bastante, assim arriscamos identificar precisavam de uma temática que integrasse uma estratégia como tipologias do artesão gaúcho, o “Artista Idealista”, o de comercialização, então com a assessoria especializada “Artesão Idealista”, o “Empreendedor” e o “Trabalhador de uma designer, chegaram ao conceito do “Ladrilã”, que Manual”, conforme apresentado no quadro 3. buscou representar a cultura dos “Ladrilhos hidráulicos8”, em lã. Quadro 3 - Tipologia de artesãos no Rio Grande do Sul O grupo Redeiras, também objeto do estudo ARTISTA/IDEALISTA EMPREENDEDOR realizado, iniciou seu trabalho em 2008, tendo como principal motivação para a formação do grupo, a busca por geração de renda complementar à pesca, de forma  É um artista;  É um tomador de mais organizada. Visto que, já confeccionavam artesanato  Escolha por um estilo de riscos; vida;  Se preocupa com a com base no uso de matérias-primas provenientes dos resíduos da pesca, como a escama, o couro de peixe e as  Apreço por trabalhos administração criativos; empresarial do grupo; redes de pescar camarão.  Sem compromissos  Valoriza a Quanto à caracterização do trabalho artesão empresariais ou com o formalização; coletivo, o grupo é formado por 10 artesãs, todas mercado;  Busca maiores e residentes na Colônia de Pescadores São Pedro - Z3 e  Não se importa com a melhores mercados; vinculadas à pesca, principal critério para fazer parte do formalização;  Pretende exportar, por grupo. Com a disponibilidade de matéria-prima e o  Pode ou não exportar; status social; domínio de diversas técnicas do processo de confecção do  Disposto a assumir riscos  Proativo; vinculados à criação;  Se adapta às demandas artesanato, a partir do apoio institucional via projetos do SEBRAE, as peças passaram a contar com uma nova  Domina todas as etapas de do mercado; confecção das peças;  Prioriza o atendimento identidade visual, passando a priorizar a temática da  Prioriza a qualidade das à demanda; preservação ambiental e sustentabilidade com o uso peças;  Tem facilidades para racional dos recursos naturais.  Se importa com a estabelecer redes de construção de sua imagem Networking; 5.1 O perfil profissional dos artesãos pesquisados no pessoal e reputação  Se importa com a Rio Grande do Sul social; construção da imagem Quanto ao perfil dos grupos artesanais e dos  Não se preocupa em e reputação da marca; artesãos individuais, com base nos conceitos estudados e estabelecer redes –  Participa das ações de Networking; comercialização e apresentados no referencial teórico, e nos dados  Participa das qualificações; levantados através das entrevistas, iniciou-se a tarefa de qualificações;  Possui habilidade fazer além do descritivo de seu perfil pessoal, realizar  Não se importa com os manual, mas não também a identificação de seu perfil profissional. ganhos financeiros. criativa; Desta forma, tomando por base o exemplo  Não domina todas as trazido por Fillis (2009), quanto à caracterização do perfil etapas de confecção profissional do artesão inglês, que tipificou estes em das peças; quatro tipos, sendo estes: o “Lifestyle”; o “Idealista”; o  Preocupa-se com os “Empreendedor”; e o “Desenvolvedor tardio”. Somado às ganhos individuais e com a gestão características do artesão brasileiro apresentadas por financeira do grupo. Mascêni e Tedeschi (2010), SEBRAE (2004) e Barroso ARTESÃO/IDEALISTA TRABALHADOR MANUAL 7Além do SEBRAE/RS, outros apoiadores e parceiros envolvidos na execução do projeto e consolidação das coleções de artesanato são o SEBRAE/NA - SEBRAE  É um artesão;  Possui habilidade

Nacional, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF, AD  Apreço por trabalhos manual, mas não COSTA DOCE - Agência de Desenvolvimento da Costa criativos e manuais; criativa;

Doce, FIBRIA, SENAR, EMATER, e as Prefeituras dos  Disposto a assumir  Não domina todas as Municípios de Pelotas, Pedras Altas e Jaguarão. riscos vinculados à etapas de confecção 8 Os “Ladrilhos hidráulicos”, pisos decorativos inspirados criação; das peças; nos mosaicos “bizantinos”, importados para o Brasil de  Prioriza a identidade e  Não se preocupa Portugal, França e Bélgica, para a decoração de casas e qualidade das peças; com a expansão do estâncias, posteriormente, já no final do século XIX, se  Sem compromissos negócio; tornaram forte produto de Pelotas (WEIMER, 1987). empresariais ou com o  Não se importa com

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mercado; a formalização; horizontalizado no grupo Ladrilã e verticalizado no grupo  Não se importa com a  Pode ou não Redeiras. formalização; exportar; Conforme apresentado na figura 1, no canal de  Pretende exportar, por  Resistente a novas distribuição do grupo Ladrilã, pode-se observar a status social; ideias; presença do chamado ‘nível zero’, com a venda direta ao  Orgulha-se de suas  Não busca trazer consumidor final, apontado por elas como turistas e criações e habilidades; novos moradores locais, do nível um, com a venda para os  Domina todas as etapas conhecimentos para lojistas, com a existência também do ‘nível dois’, onde de confecção das o grupo; consideramos a presença do intermediário, que aqui peças;  Dificuldade para estamos considerando como uma pessoa externa ao grupo,  Importa-se com a estabelecer redes – no caso uma gestora de projetos do SEBRAE, responsável construção de sua Networking; por esta tarefa de intermediação entre o grupo e o imagem pessoal e  Participa das ações mercado, que no caso das Redeiras, faz a intermediação reputação social; de comercialização; para o acesso do grupo a eventos diversos também a  Resistente a novas  Importa-se com os venda pela internet para lojistas, até chegar ao ideias; ganhos financeiros. consumidor final.  Dificuldade para estabelecer redes – Figura 1 - Canais de distribuição do grupo Ladrilã Networking;  Participa das ações de comercialização e qualificações;  Importa-se com os ganhos financeiros. Fonte: dados da pesquisa (2011).

Os dados do quadro evidenciam as diferenças de perfil profissional existente entre os artesãos dos grupos, e a partir destas podemos compreender a composição dos grupos e assim elucidar um pouco mais a situação atual de cada um, e assim refletir sobre os problemas e dificuldades relatados quanto à sua gestão.

5.2 Produção e canais de comercialização

Quanto à produção e estratégias de comercialização, podemos afirmar que as peças desenvolvidas e confeccionadas por ambos os grupos, podem ser classificadas enquanto Artesanato de Referência Cultural, predominantemente de caráter Decorativos (Ladrilã) e de Adornos e Acessórios (Redeiras), buscando diferenciação no mercado através da agregação de valor, sendo o Ladrilã, através do apelo cultural e o Redeiras através do apelo ambiental. Fonte: Dados da pesquisa (2011). Os dados levantados pela pesquisa, evidenciam que uma das primeiras estratégias adotadas pelos dois A figura 2 evidencia o sistema de distribuição grupos, se deu quanto à definição do produto. Pois além verticalizado do grupo Redeiras, sem a existência do da definição de uma temática e agregação de valor, canal de “nível zero”, visto que o grupo não tem um optaram pela diversificação de tipos e modelos de espaço para a venda direta, e somente através da figura do produtos, de forma a conseguir oferecer diferentes opções intermediário, é que o grupo acessa os canais de nível aos compradores e assim ampliar as chances de venda. dois e três, onde também enquadramos a participação em Por exemplo, o grupo Ladrilã, possui a “Coleção Lã em eventos diversos e a venda via internet. Casa”, porém nesta coleção incluíram produtos A identificação dos canais de distribuição decorativos, lúdicos, de adornos e acessórios, distintos. evidencia a falta de autonomia para a gestão dos grupos, Diversificação esta que destacamos como um diferencial ocasionada pela dependência do parceiro SEBRAE, o que competitivo diante de outros grupos de artesanato. alertamos aqui, ser o maior desafio ao desenvolvimento e Quanto à distribuição, houve uma diferença entre sustentabilidade dos grupos. os dois grupos, de total relevância, com a existência de um sistema de distribuição/comercialização

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Figura 2 - Canais de distribuição do grupo Redeiras sua constituição enquanto produto turístico, através de um olhar aproximado junto a dois grupos de artesãs, sendo o grupo “Ladrilã”, integrado por artesãs dos municípios de Pelotas, Pedras Altas e Jaguarão e o grupo “Redeiras”, formado por artesãs da Colônia de Pescadores Z3, localizada no 2º distrito do município de Pelotas. Com este foco procurou-se desenvolver três eixos de investigação. Em primeiro lugar identificar, descrever e tipificar o perfil dos grupos artesanais e dos artesãos individuais envolvidos. Como segundo eixo, averiguar a produção e as estratégias de comercialização do artesanato rural vinculado ao turismo. E, finalmente, identificar as parcerias envolvidas e suas respectivas atuações visando à comercialização do artesanato enquanto produto turístico local. Destacamos inicialmente a importância da constituição do perfil das artesãs, tanto em seus aspectos pessoais como profissionais e coletivos. A identificação deste, complementado pelas informações quanto à sua produção, motivações, formas organizativas, problemas e dificuldades, em uma quantidade de dados levantados, Fonte: Dados da pesquisa (2011). que em certo momento nos pareceu desnecessário, ao

tentar identificá-las ou unificá-las em uma tipologia, 5.3 A constituição enquanto produto turístico longe de homogeneizá-las fortaleceram a visualização de

sua diversidade. Assim, com o cruzamento entre os dados, Um aspecto importante a destacar como resultado conceitos e experiências analisados identificamos quatro do presente estudo, diz respeito à constituição do tipologias do artesão gaúcho, sendo o “Artista Idealista”, artesanato produzido pelos grupos enquanto produto o “Artesão Idealista”, o “Empreendedor” e o turístico representativo da agricultura familiar do Rio “Trabalhador Manual”. Sendo que nos grupos de estudo Grande do Sul. A análise dos dados coletados nos permite se identificou a predominância do perfil “Artista apontar que o artesanato produzido pelo grupo Ladrilã, idealista” (Ladrilã) e do perfil “Empreendedor” hoje se caracteriza enquanto produto turístico visto sua (Redeiras), resultados que por si só, permitiriam outro relação direta com o turismo, em suas duas lojas, estudo. comercializando prioritariamente em mercado local e Quanto à produção e estratégias de regional, através de eventos de cunho rural e turístico, e comercialização, podemos afirmar que as peças em lojas especializadas em receptivo turístico no Rio desenvolvidas e confeccionadas por ambos os grupos, Grande do Sul. podem ser classificadas enquanto Artesanato de Já em relação ao artesanato confeccionado pelo Referência Cultural, predominantemente de caráter grupo Redeiras, os dados coletados na pesquisa, nos Decorativos (Ladrilã) e de Adornos e Acessórios permitem afirmar que este acaba por não se constituir (Redeiras), buscando diferenciação no mercado através da como um produto turístico representativo da agricultura agregação de valor, sendo o Ladrilã, através do apelo familiar do Rio Grande do Sul. Não por falta de qualidade cultural e o Redeiras através do apelo ambiental. e representação cultural, mas pelos canais de As integrantes do Ladrilã, que mesmo agregando comercialização e direcionamentos de mercado adotados, artesãs de três municípios e atuando em grupos de visto que priorizam o mercado nacional e internacional trabalho coletivo paralelos, mantém através da lã, em detrimento do comércio local e turístico do estado. matéria-prima unificadora que passou a ser também Destacamos, que mesmo que o turista apareça como identitária, a confecção de peças referenciais, e de alto consumidor final em todos os canais de comercialização valor cultural, tendo incorporado elementos da do grupo, a comercialização local/regional, se faz arquitetura, patrimônio nacional de total relevância na necessária para a constituição de vínculos e para a região, à criação de peças contemporâneas, que valorização identitária entre o “visitante e seu visitado”, ampliaram a gama de possibilidades e diversidade de e/ou ainda o “turista e seu artesão”. produtos, para além das peças de vestimenta,

tradicionalmente usadas pelos moradores locais, 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS preservadas pela habilidade técnica, perpassada de

geração em geração, o que é manifestado orgulhosamente O presente trabalho de pesquisa realizou-se tendo por todas. como objetivo analisar a comercialização do artesanato As “Redeiras” através do aproveitamento de rural como produto vinculado ao turismo resíduos da pesca, como a escama de peixe, o couro de predominantemente na agricultura familiar, bem como a peixe, e os fios de rede, que mesmo agregados a outros

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materiais industrializados e compondo peças mais e representação cultural, pois apesar de algumas elaboradas, pela intervenção que receberam dos alterações, seu artesanato também é carregado de designers, preservam características culturais identidade quanto ao seu território e grupo social representativas de suas origens. E através da agregação de originário, mas pelos canais de comercialização e valor ambiental às suas biojóias, adornos e acessórios direcionamentos de mercado adotados, visto que diversos, buscam disseminar seus saberes e fazeres, de priorizam o mercado nacional e internacional em forma sustentável. detrimento do comércio local e turístico do estado. Os dados levantados pela pesquisa evidenciaram Destacamos, que mesmo que o turista apareça como que uma das primeiras estratégias adotadas pelos dois consumidor final em todos os canais de comercialização grupos, foi quanto à definição do produto. Pois além da do grupo, a comercialização local/regional, se faz definição de uma temática e agregação de valor, optaram necessária para a constituição de vínculos e para a pela diversificação de tipos e modelos de produtos, de valorização identitária entre o “visitante e seu visitado”, forma a conseguir oferecer diferentes opções aos e/ou ainda o “turista e seu artesão”. compradores e assim ampliar as chances de venda. Por exemplo, o grupo Ladrilã, possui a “Coleção Lã em REFERÊNCIAS Casa”, porém nesta coleção incluíram produtos decorativos, lúdico, de adornos e acessórios, distintos. ABRAMOVAY. R. O Capital Social dos Territórios: Diversificação esta que destacamos como um diferencial repensando o desenvolvimento rural. In: O Futuro das competitivo diante de outros grupos de artesanato. Regiões Rurais. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009. Da mesma forma, a identificação dos canais de p. 85-102. distribuição dos grupos, também é de total relevância, pois evidencia a forma de gestão atual e fortalece ALMEIDA, J. A. Pesquisa em Extensão Rural: um demandas como o apontamento feito pelas artesãs do manual de metodologia. Brasília: ASSOCIAÇÃO grupo Redeiras, por maior autonomia, alegando BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO AGRÍCOLA justamente que “não sabem vender”, e se questionam SUPERIOR/MEC, 1989. como irão acessar estes mercados sem a figura do intermediário. Após o término do projeto, a questão que ALVES-MAZZOTTI, A. J.; GEWANDSZNAJDER, F. O fica em evidencia é a falta de autonomia para a gestão dos Método nas Ciências Naturais e Sociais: pesquisa grupos, ocasionada pela dependência do parceiro quantitativa e qualitativa. São Paulo: Pioneira, 1999. SEBRAE, e que alertamos aqui, ser o maior desafio ao desenvolvimento e sustentabilidade dos grupos. BAQUERO, M. A Pesquisa Quantitativa nas Ciências Um aspecto importante a destacar como Sociais. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009. resultado do presente estudo diz respeito à constituição do artesanato produzido pelos grupos enquanto produto BARROSO, E. Design, Identidade Cultural e turístico representativo da agricultura familiar do Rio Artesanato. Fortaleza: SEBRAE/FIEC, 2002. Grande do Sul. A análise dos dados coletados nos permite apontar que o artesanato produzido pelo grupo Ladrilã, BORGES, A. Design Não é Personal Trainer: e outros hoje se caracteriza enquanto produto turístico visto sua escritos. São Paulo: Rosari, 2010. relação direta com o turismo, em suas duas lojas, comercializando prioritariamente em mercado local e BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Indústria e regional, e através de eventos de cunho rural e turístico, e Comércio Exterior. Portaria nº29 de 05 de outubro de em lojas especializadas em receptivo turístico no Rio 2010. Estabelece a base conceitual do artesanato Grande do Sul. brasileiro, para padronizar e estabelecer os parâmetros do Consideramos importante a realização de dois PAB – Programa do Artesanato Brasileiro. Secretaria de apontamentos: o primeiro quanto ao potencial de Comércio e Serviços. MDIC. Diário Oficial, da União, ampliação de sua participação no mercado turístico Brasília, nº 192, 06 de outubro de 2010a. Seção 1. estadual, demandando para tanto de reconhecimento, Disponível em: tanto pelas próprias artesãs, como pelo poder público . Acesso segundo, quanto à adequação da qualidade de confecção e em: 30 abr. 2012. imagem das peças de artesanato do grupo, bem como dos espaços de venda, ao atendimento de forma integral às ______. Ministério do Turismo. Conceitos Básicos e demandas apontadas como características do chamado Apoio à Comercialização de Produtos Segmentados. “novo turista”. Brasília: MTUR; Florianópolis: SEAD/UFSC, 2009. Já em relação ao artesanato confeccionado pelo grupo Redeiras, os dados coletados na pesquisa, nos ______. Ministério do Turismo. Programa de permitem afirmar que este acaba por não se constituir Regionalização do Turismo – roteiros do Brasil: como um produto turístico representativo da agricultura diretrizes políticas. Brasília: MTUR, 2004. familiar do Rio Grande do Sul. Não por falta de qualidade

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Patrimônio Rural Paulista: as ações realizadas pelo Grupo de Estudos e Pesquisa do Turismo no Espaço Rural – GEPTER

ÉLIDA CRISTINA ZUCHINI MARTINS ROSANGELA CUSTODIO CORTEZ THOMAZ

Universidade Estadual Paulista - Unesp Campus de Rosana Grupo de Estudos e Pesquisa do Turismo no Espaço Rural - GEPTER [email protected] ; [email protected]

RESUMO - O Estado de São Paulo retrata as transformações do espaço rural brasileiro por meio de seus patrimônios históricos e culturais que permitem compreender as fases de ocupação e de desenvolvimento desse território. Buscando valorizar e preservar esses espaços e memórias desenvolveu-se o Projeto de Politicas Públicas: Patrimônio Cultural Rural Paulista: “espaço privilegiado para o ensino, a pesquisa e o turismo”, financiado pela Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) (2008/2012). O projeto dividido em quatro frentes de trabalho teve como objetivo geral gerar um diagnóstico do patrimônio cultural rural com base em um conjunto de fazendas históricas do Estado e a construção e disponibilização de instrumentos e metodologias de gestão, preservação e difusão aos proprietários das fazendas. O presente estudo tem como objetivo apresentar as ações e pesquisas realizadas pelo Grupo de Estudos e Pesquisa do Turismo no Espaço Rural (GEPTER) membro desde 2010 do núcleo “Educação Patrimonial e Turismo Cultural”.

Palavras chave: Turismo Rural, Fazendas Históricas, Patrimônio Rural Paulista, Pesquisa.

ABSTRACT - The State of São Paulo portrays the transformation of rural Brazil through its historical and cultural heritage that allow us to understand the phases of occupation and development of the territory. Seeking to enhance and preserve these spaces and memories developed the Paulista Rural Cultural Heritage Project: "privileged space for teaching, research and tourism", funded by the Research Foundation of the State of São Paulo (FAPESP) (2008/2012). The project is divided into four work fronts aimed to generate a diagnosis of rural cultural heritage based on a set of historic farms and state building and provision of tools and methodologies for managing, preserving and disseminating to the ranch owners. The present study aims to present the activities and research carried out by the Group of Studies and Research of Rural Tourism (GEPTER) member since 2010 core "Heritage Education and Cultural Tourism".

Key words: Rural Tourism, Stories Farms, Paulista Rural Heritage, Research.

1 INTRODUÇÃO turismo”, estando na coordenação geral o Professor Dr. Marcos Tognon da Universidade Estadual de Campinas. O Estado de São Paulo guarda muitas marcas das No projeto também estão envolvidas varias transformações do espaço rural brasileiro. O patrimônio universidades, entre elas a Universidade Estadual Paulista cultural rural paulista possibilita compreender todas as (UNESP), a Universidade de São Paulo (USP), a fases de ocupação desse território. As fazendas históricas Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e membros são como retratos desses períodos. Suas construções e de órgãos governamentais como EMBRAPA e de suas memórias retratam o desenvolvimento do Estado e, preservação (como o Condephaat e o IPHAN). também do Brasil. O projeto tem como objetivo “gerar um Reconhecendo a importância dessas fazendas, foi diagnóstico do patrimônio cultural rural [...], seguido pela criado em 2008, com o financiamento da FAPESP, o construção e disponibilização de instrumentos e projeto de Politicas Publicas “Patrimônio Cultural Rural metodologias de gestão, conservação e difusão aos Paulista: Espaço privilegiado para o ensino, a pesquisa e o

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responsáveis pelo patrimônio cultural rural paulista” Porém existem vários impasses registrados para a (PELLICCIOTTA, 2010, p. 2). conservação do patrimônio cultural rural como a ausência No ano de 2010, os membros do Grupo de Estudos de politicas publicas e mecanismos especiais de incentivo e Pesquisa do Turismo no Espaço Rural (GEPTER) ou de investimento, o auto custo de investimento na formado por pesquisadores, docentes e discentes preservação e o impacto nas atividades agrícolas das vinculados ao Curso de Turismo da UNESP e fazendas. Coordenado pela Professora Doutora Rosângela Custodio O turismo cultural rural é uma iniciativa que Cortez Thomaz, foram convidados a participar das favorece a preservação do patrimônio rural paulista, pois pesquisas desenvolvidas pelo projeto, atuando dentro do é uma atividade econômica que gera renda para a Núcleo “Educação Patrimonial e Turismo Cultural”, propriedade por meio da organização de roteiros e ações coordenado pela Profa. Dr. Olga Rodrigues de Moraes educativas no local. Von Simson (CMU-UNICAMP) tendo como objetivo Nas fazendas estão contidos aspectos que promover a articulação de ações educativas com as favorecem a atividade turística e que possibilitam praticas do turismo, a fim de valorizar o patrimônio compreender a paisagem do lugar, os patrimônios cultural rural paulista. materiais e os valores e formas de vida tradicionais. Desde então o GEPTER passou a desenvolver Assim, juntos criam um elo de preservações entre as estudos que pudessem contribuir com o objetivo geral do comunidades, visitantes e patrimônios culturais, onde a grupo e principalmente com o do Núcleo em que estava educação fomenta a criação de um laço de identidade com inserido. Tendo o presente estudo o objetivo de apresentar a nação e transforma-se em mediador entre o passado e o as ações, as metodologias e os resultados obtidos pelo presente, promovendo a continuação da história e dos grupo de pesquisa durante a sua participação do projeto. aspectos locais (BARRETO, 2000). Partindo desse pressuposto, foi criado o Projeto de 2 PROJETO PATRIMÔNIO CULTURAL RURAL Politicas Publicas “Patrimônio Cultural Rural Paulista: espaço privilegiado para o ensino, pesquisa e turismo”, PAULISTA aprovado de 2008 a 2012 pela FAPESP1. Ele foi construído a partir de discussões sobre experiências de preservação e de difusão do patrimônio rural que foram O Estado de São Paulo tem muitos espaços e travadas na Fazenda Pinhal, no município de São Carlos, memorias preservadas no meio rural como as casas em 2006. As principais universidades envolvidas nesse senhoriais, as igrejas, os moinhos de cana de açúcar, as projeto foram a UNICAMP, USP, UNESP e UFSCAR, tulhas de café, as senzalas, as fotos antigas e os com o apoio do IPHAN e do CONDEPHAAT, tendo descendentes desse período que possibilitam reviver como coordenador geral do projeto o Professor Dr. períodos do passado. Marcos Tognon, da Universidade Estadual de Campinas. Esses aspectos aguçam a motivação já existente na (PELLICIOTA, 2010). sociedade de retorno ao campo que desencadeia a Um parceiro importante foi a Associação das atividade turística no meio rural. Uma atividade de lazer Fazendas Históricas Paulistas, que participou e contribuiu em que o homem urbano procura as propriedades rurais durante todo o projeto. Foram pesquisadas ao todo com o objetivo de resgatar suas origens culturais e estar dezesseis propriedades divididas em seis núcleos em contato com a natureza. São atraídos pela regionais: São Carlos e Araraquara; Mococa e Água oportunidade de interação e integração com o meio rural Branca; Itu; Campinas e Amparo; Limeira e Rio Claro; e produtivo, sendo uma nova forma de usufruir as férias ou Vale do Paraíba. aproveitar o tempo livre (MOLETTA, 2004). Entre os principais objetivos do projeto ressalta-se O turismo no espaço rural paulista não está a geração de um diagnóstico do patrimônio cultural rural necessariamente vinculado às atividades produtivas. com base em um conjunto de fazendas históricas do Observa-se por meio de Bovo (2005) que 79,8% das Estado e a construção e disponibilização de instrumentos propriedades voltadas para essa atividade econômica e metodologias de gestão, preservação e difusão aos possuem como principal atrativo seus aspectos culturais. proprietários das fazendas (PELLICIOTA, 2010). A busca pelo contato com a cultura rural se Para sua execução o projeto foi dividido em justifica por ser um espaço que guarda a memória tanto quatro frentes de trabalho. A primeira, coordenada pelo das classes mais abastadas como das menos favorecidas, o Prof. Dr. José Carlos Maldonado (ICMC-USP-São que gera um comum interesse da sociedade em conhecer Carlos) é o grupo “Memória Virtual Rural”, que teve esses locais (BARRETO, 2000). como objetivo criar um software livre para o banco de As fazendas históricas guardam essas memórias dados dos inventários das fazendas para ser utilizado comuns. São retratos do processo de colonização e de desenvolvimento do Brasil. Elas guardam resquícios de 1 uma época heroica, de desbravamento, de riquezas, de As informações sobre o projeto estão contidas nos transformações, adaptações e das decadências. Onde não Relatórios de Pesquisa do Projeto de Politicas Publicas se preserva apenas um momento histórico, mas sim um “Patrimônio Cultural Rural Paulista: Espaço privilegiado processo cheio de vida (MANCUSO & COSTA, 2010). para pesquisa, educação e turismo”. Processo FAPESP n. 07/55999-1.

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pelos pesquisadores e pelos proprietários. Ficando esse O material produzido encontra-se disponibilizado em grupo responsável pelos assuntos referentes à informática dois sites, um sobre o Patrimônio Cultural Rural Paulista, e ao georeferenciamento. com a documentação do projeto e o dossiê fotográfico2 e O segundo grupo “Inventário e Catalogação”, o segundo é o WEB-GIS das Fazendas Históricas coordenado pela Profa. Dra. Luzia Sigoli Fernandes Costa Paulistas, com layers temáticos do Google Eartth e fotos (CECH-UFSCar) teve como atribuição elaborar o Plano de alta definição adquiridas pelo projeto3. de Descrição do Inventário dos bens culturais, dos Há também um documentário audiovisual sobre a documentos de referencia conceituais e bibliográficas Fazenda Santa Maria do Monjolinho em São Carlos e um para catalogação. dossiê fotográfico realizado pelo fotografo Haroldo Palo À frente coordenada pelas Professoras Dra. Maria Jr. inicialmente exposto na UFSCAR campus de São Ângela Pereira de Castro e Silva Bortolucci (EESC-USP) Carlos, que tem como objetivo percorrer todo o Estado. intitulada “Preservação e Patrimônio Cultural Material” Muitos pesquisadores e gestores participaram no objetivou definir procedimentos para a manutenção e decorrer do projeto o que fomentou a criação de parcerias conservação preventiva dos bens culturais materiais. e diversas pesquisas acadêmicas. Considera-se alcançados O núcleo intitulado “Educação Patrimonial e os resultados pretendidos pelo projeto desde 2008. Onde a Turismo Cultural” ficou sob a coordenação da Profa. Dr. disponibilização de todo o material garante uma maior Olga Rodrigues de Moraes Von Simson (CMU- densidade das questões relativas à preservação do UNICAMP). Esse grupo ficou responsável por: Patrimônio Cultural Rural e busca fomentar novas 1. Avaliar os procedimentos, estratégias e resultados discussões sobre as politicas publicas governamentais no de experiências turísticas no âmbito rural Estado e em todo o país. brasileiro; 2. Construir um quadro de referencias conceitual, 3 AS AÇÕES REALIZADAS PELO GEPTER econômicas e politicas tomando como base as ações do Poder Público local, regional e O Grupo de Estudos e Pesquisa do Turismo no nacional; Espaço Rural (GEPTER), formado por pesquisadores, 3. Levantar as estratégias de desenvolvimento e docentes e discentes com sede institucional no Curso de organização do turismo implementado pelas Turismo da UNESP Campus de Rosana e Coordenado fazendas históricas; pela Professora Doutora Rosângela Custodio Cortez 4. Diagnosticar os processos educativos formais e Thomaz, desde 2010 participa do Projeto, inserido no não formais realizados nas propriedades; quarto grupo de trabalho, citado acima. 5. Promover o estudo sobre metodologias e elaborar O objetivo geral do GEPTER no projeto foi atividades de educação patrimonial articuladas estabelecer práticas e rotinas que valorizem o Patrimônio com as práticas de turismo e valorização do Cultural Rural para as atividades de Turismo e Educação patrimônio cultural; Patrimonial nas Fazendas Históricas Paulistas, por meio 6. Elaborar cartilhas que contribuam no processo de da elaboração de material de apoio ao proprietário rural. gestão turística e preservação do patrimônio. Buscando contextualizar o turismo cultural rural, fornecer Dentre os resultados podemos destacar a subsídios para o planejamento e a gestão de roteiros  Coletânea de cartilhas: cinco cartilhas sobre o turísticos, a realização do inventário cultural rural, turismo cultural rural, três sobre o meio ambiente orientar ações que promovam a acessibilidade no meio rural, três sobre o patrimônio edificado rural e rural respeitando o patrimônio histórico e produzir um seis sobre patrimônio iconográfico, móvel e material de apoio para a formulação de um plano de documental. negócio e de marketing turístico.  Dois manuais: Manual de implementação do Para isso foram realizadas pesquisas relacionadas Padrão de Descrição de Informação – PDI: bens ao turismo e a educação patrimonial buscando contribuir bibliográficos e arquivísticos; e Noções para a com os objetivos de 1 a 5 e algumas visitas técnicas, elaboração de projetos de captação de recursos como a Fazenda Capoava e Chácara do Rosário em Itu e a para a conservação do patrimônio cultural rural. Fazenda Pinhal em São Carlos.  Três roteiros metodológicos: Memória, Cultura e Durante as visitas in loco constatou-se que parte Poder no Espaço Rural; Educação Patrimonial e delas já se encontrava abertas ao público e desenvolvendo Turismo Cultural; e Casa do Patrimônio Rural ações educativas durante sua visitação, principalmente Paulista. com estudantes. Essa vivencia, nos despertou o interesse Além do material a ser publicado, foram realizadas de entender como essas visitas estavam sendo realizadas e diversas oficinas buscando promover a capacitação dos qual o impacto delas nesse grupo, desenvolvendo assim o gestores rurais. Foram treze oficinas que abrangeram trabalho de conclusão de curso intitulado “Educação diversos temas, como planejamento e organização turística, compostagem em áreas naturais e 2http://web.me.com/flaviodecarvalho/Patrimonio_Cultural principalmente voltados a preservação do patrimônio _Rural_Paulista/Patrimonio_Cultural_Rural_Paulista.html cultural material e imaterial. 3http://geoserver.cnpm.embrapa.br/fazendas/fazendas.htm l

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Patrimonial e Turismo: um Estudo de Caso na Fazenda agrega muitos aspectos positivos. Dentre eles podemos Pinhal em São Carlos/SP”, onde concluímos que as ações citar o investimento em obras de infraestrutura e de educativas contribuem para minimizar os impactos aperfeiçoamento dos serviços básicos, como estradas, negativos gerados pela atividade turística e essa por sua hospitais e telecomunicação. A criação de mercado vez, possibilita divulgar o meio rural e contribuir para sua consumidor para os produtos produzidos na propriedade, preservação e valorização. sendo um complemento da renda da família, Periodicamente foram feitas reuniões especificas possibilitando o aumento da sua qualidade de vida. E a das áreas e iniciaram-se os trabalhos em consonância com valorização do ambiente rural e das culturas tradicionais as demandas apontadas pelas reuniões com a coordenação possibilita difundir a história do local e a divulgação do geral do projeto. Foram realizadas discussões patrimonio, contribuindo para a conservação do bibliográficas de referencias sobre as temáticas apontadas patrimônio histórico, cultural e natural e o aumento da e a partir do material produzido foram confeccionadas autoestima do homem do campo. cartilhas temáticas que farão parte da coletânea que será Para os turistas agrega mais valor tanto a visitação publicada pelo projeto. como no processo de aprendizagem, pois a educação Foram elaboradas cinco cartilhas que tem como experiencial permirte o contato direto com elementos objetivo informar e orientar os proprietários sobre o históricos e ambientais e a possibilita realizar ações turismo cultural rural e os processos de gestão turística. educativas praticas. O visitante também cria um laço de  Cartilha 1 – Turismo Cultural e Rural – identidade com a localidade, o que fortalece o seu vinculo Conceito e Contextualização; com o destino e com a comunidade, passando a respeita-  Cartilha 2 – Turismo Cultural Rural – la, aumentando o seu tempo de permanência no local e a Inventário Turístico e Roteirização Rural; probabilidade de retorno, alavancando o desenvolvimento  Cartilha 3 – Turismo Cultural e Rural – do turismo e promovendo a harmonia entre autóctones e Acessibilidade; visitantes.  Cartilha 4 – Turismo Cultural e Rural – Cabe ressaltar que essa pesquisa tem o intuito de Planejamento Estratégico; divulgar as ações desenvolvidas pelo GEPTER e pelo  Cartilha 5– Turismo Cultural e Rural – Projeto de Politicas Publicas: Patrimônio Rural Paulista, Marketing Turístico. como meio de fomentar a discussão do tema e possibilitar que ela não se esgote. 4 CONCLUSÕES REFERÊNCIAS Nas primeiras reuniões realizadas pelo Grupo sobre o Projeto foi discutido o desenvolvimento de ações BARRETO, Margarita. Turismo e legado cultural: as que promovessem o turismo nas propriedades. Porém, possibilidades do planejamento. Campinas: Papirus, 2000. durante as visitas e as pesquisas realizadas sobre in loco as fazendas históricas paulistas, aliados aos encaminhamentos dados pelo núcleo de trabalho do BOVO, Carlos Eduardo Oliveira. Turismo rural no Projeto, especialmente da frente “Educação Patrimonial e Estado de São Paulo: uma semente que floresce. Santa Turismo Cultural” constatamos que grande parte dos Maria: Facos, 2005. proprietários já havia adotado o turismo como fonte de renda e estratégia de preservação do patrimônio rural. Observamos então que a vontade de desenvolver a MANCUSO, Maria Inês Rauter; COSTA, Luzia Sigole atividade turística já havia sido abraçada pelos Fernandes. Fazendas Históricas: lições aprendidas sobre proprietários e que, então, as ações deveriam estar cotidiano, gestão, preservação e sustentabilidade. In: voltadas para a capacitação da gestão e do CONGRESSO BRASILEIRO DE TURISMO RURAL, desenvolvimento do turismo nas fazendas. VII., 2010, Presidente Prudente. Anais ... Presidente Outra importante analise foi à relação desses Prudente: Unesp, 2010. CD-ROM. patrimônios com a comunidade local e com os turistas, onde a metodologia da educação patrimonial apresentou- se como um instrumento de educação cultural que MOLETTA, Vânia B. F. Turismo rural. 4. Ed. Porto possibilita ao individuo compreender o universo cultural e Alegre: SEBRAE/RS, 2004. a trajetória histórica e cultural em que está envolvido. Levando os sujeitos sociais envolvidos a um processo ativo individual e coletivo de conhecimento, enriquecimento, apropriação e valorização da herança PELLICIOTA, Mirza. Patrimônio Rural Paulista. In: cultural. CONGRESSO BRASILEIRO DE TURISMO RURAL, Em geral, concluímos que o turismo quando VII., 2010, Presidente Prudente. Anais ... Presidente planejado para as propriedades e para a comunidade é Prudente: Unesp, 2010. CD-ROM. uma importante estratégia de desenvolvimento local, pois

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TURISMO NO ESPAÇO RURAL E AS POSSIBILIDADES DE CONSERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO GT 2 – Cultura e Turismo no Espaço Rural ODALEIA TELLES MARCONDES MACHADO QUEIROZ

Agência financiadora: FAPESP

Universidade de São Paulo - USP Campus de Piracicaba Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz [email protected]/ [email protected]

RESUMO - O objetivo da pesquisa foi analisar o turismo no espaço rural e as possibilidades de conservação do patrimônio socioambiental analisando os solares portugueses, sua revitalização e refuncionalização. A pesquisa foi descritiva, exploratória e qualitativa, iniciando-se com levantamento e revisão de literatura, posteriormente desenvolvendo pesquisa de campo com entrevistas semiestruturadas com os proprietários dos Solares Portugueses, localizados em área rural. Houve investigação sobre seu histórico, infraestrutura e principais características dessas casas apalaçadas. A Teoria do Espaço de Milton Santos (1996) oferece a sustentação para interpretação do processo de construção do espaço turístico. A revitalização dos Solares Portugueses abriu outras possibilidades socioeconômicas para as populações locais as quais foram beneficiadas. Os Solares têm relevante identidade territorial, a sua valorização como patrimônio é uma estratégia de desenvolvimento local; foram construídos em pequenas propriedades, geralmente, voltadas para produção de uva e vinhos, entraram em período de decadência e, recentemente, estão reconquistando posição de destaque. Evidencia-se neste quadro que a atividade turística em espaço rural foi uma estratégia de desenvolvimento local definida como alternativa econômica para reerguer territórios deprimidos, isto é, Solares Portugueses construídos em quintas do interior de Portugal.

Palavras-chave: Turismo; espaço rural; patrimônio; conservação; socioambiental.

ABSTRACT – The objective of the research was to analyze the rural tourism and the possibilities of heritage conservation environmental analyzing the solar Portugueses, revitalization and refunctionalization. The research was descriptive, exploratory and qualitative, starting with survey and literature review, later developing field research with semi-structured interviews with owners of Portuguese Solar, located in the rural area. There has been research on its history, infrastructure and main characteristics of these palatial homes. The Space Theory Milton Santos (1996) provides support for the interpretation of the construction of space tourism. The revitalization of the Solar Portuguese socioeconomic opened other possibilities for local populations which have benefited. Solares have relevant territorial identity, its value as heritage is a local development strategy; were built on small farms, usually aimed at the production of grapes and wine, came in a period of decadence and, recently, they are regaining position. Evidence of this framework that tourism in rural areas was a strategy of local development defined as economic alternative to rebuild depressed areas, ie Solar Portuguese built on farms in the interior of Portugal.

Key words: Rural Tourism, heritage, conservation, environmental.

1 INTRODUÇÃO apalaçadas localizadas no campo. Objetivou-se avaliar os caminhos de desenvolvimento e as escolhas O principal propósito desta pesquisa foi de governança territorial em locais de solares realizar um estudo sobre turismo no espaço rural e as portugueses procurando entender a importância do possibilidades de conservação do patrimônio, patrimônio cultural (material e imaterial) na especificamente, averiguando o desenrolar da revitalização destes espaços. revitalização dos Solares Portugueses, casas

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A pesquisa foi descritiva, exploratória e transformam, novos fluxos são criados ou renovados, havendo qualitativa, iniciando-se com levantamento e revisão uma redefinição deste lugar. de literatura, posteriormente desenvolvendo trabalho Dessa maneira, podemos observar e explicar o que vem de campo com entrevistas semiestruturadas com os ocorrendo no espaço onde se inserem os Solares Portugueses, propriedades que foram erguidas graças às ações de uma proprietários dos solares portugueses, localizados em sociedade eminentemente rural, principalmente, entre os séculos área rural. Houve investigação sobre seu histórico, XVII e XVIII, que criaram tais objetos com características infraestrutura e principais características dessas casas arquitetônicas marcantes. apalaçadas. “O espaço é acumulação desigual de tempos” As hipóteses levantadas: (SANTOS, 1978, p. 5), isto é, espaço é algo real, presente e - O fortalecimento dos Solares Portugueses como passado, também herança, no sentido da coexistência de patrimônios culturais com a atividade turística instituiu tempos diferentes. novas possibilidades socioeconômicas para as pessoas Santos (1992) afirma que o espaço é formado pelas relacionadas, havendo acréscimos. coisas e objetos geográficos naturais e artificiais da paisagem, e também pela sociedade. Foi a sociedade rural lusitana - A relação entre a viabilidade econômica dos portuguesa que, por meio de suas ações, traçou o perfil do lugar Solares Portugueses enquanto empreendimentos turísticos – Solar Português, construindo-os de acordo com os seus e a preservação do patrimônio cultural do território paradigmas, certos recursos locais e outros oriundos de suas acontece em consonância. colônias. Para o autor, os elementos do espaço são: os homens – - Os Solares Portugueses possuem uma forte distribuídos em grupos ou classes; as firmas – cuja função identidade territorial e o processo de sua valorização essencial é a produção de bens, serviços e ideias; as instituições como patrimônio é uma estratégia de desenvolvimento – que produzem normas, ordens e legitimações; as local. infraestruturas e o meio ecológico. A atividade turística implementada nos Solares Os produtos agrícolas e agroalimentares típicos ou baseia-se no aproveitamento dos patrimônios culturais e tradicionais, outrora esquecidos por investigadores, ambientais, realizando revitalização gradativa produzindo técnicos e decisores políticos, estão hoje no centro das um rearranjo nos seus antigos usos, lhe oferecendo novas atenções enquanto instrumentos de desenvolvimento funções, agora, ligadas ao lazer, oportunizando agrícola e rural ... CRISTÓVÃO; TIBÉRIO e ABREU, empregos e geração de renda. 2008. p.282). Muitas pesquisas têm sido elaboradas sobre o TER, turismo no espaço rural (ELESBÃO, 2008; A atividade turística se apropria desse processo e PORTUGUEZ, 2002; CAVACO, 2001; RIBEIRO, destes produtos e passa a oferecê-los como atrativos aos 2001;TALAVERA, 2001; SCHNEIDER, S. e FIALHO, visitantes ávidos em consumir algo diverso daquilo que é 2000; RODRIGUÉZ, 1997 etc), compilando dados da cidade, adquirir artigos que representam a imagem de direcionados, notadamente, para a atividade como opção algo que simboliza ruralidade. de desenvolvimento para área rural. Os produtos mais tradicionais das quintas onde Todavia, sobre turismo que é ocorre nos solares ficam os Solares Portugueses, notadamente, aqueles da portugueses, verificando a infraestrutura e prestação de região norte do país, relacionam-se aos vinhedos e serviços das propriedades, muito ainda pode ser feito, fabricação de vinhos, muito apreciados pelos turistas. motivo que nos levou ao tema, utilizando uma abordagem Essa foi uma forma encontrada pelas comunidades locais sistêmica. de potencializar seus produtos típicos, configurando-se Os resultados obtidos por meio do estudo e análise como uma estratégia de permanência da população no dos territórios dos Solares Portugueses podem ser campo. considerados como um aporte importante para que ocorra uma compreensão mais aprofundada sobre o processo de 1.1.2 Desenvolvimento sustentável desenvolvimento do turismo em espaços rurais como alternativa para o desenvolvimento local. Além de uma actividade economicamente poderosa o turismo é, também, um factor importante de desenvolvimento sustentável, na medida em que tem o 1.1 Embasamento teórico poder para aprimorar o meio ambiente, prover fundos para a sua conservação e protecção e defender a cultura A Teoria do Espaço de Milton Santos (1996) e a história (DUARTE e ABRANJA, 2009. p.1) proporciona os subsídios para uma compreensão adequada do processo de construção do espaço turístico, notadamente, aquele A realidade dos Solares Portugueses e sua ligado aos Solares Portugueses. Santos (1978) define espaço geográfico como uma refuncionalização direcionada para o turismo também união indissociável de sistemas de objetos e sistemas de ações e deve atender aos preceitos do desenvolvimento suas formas híbridas, apresentando-se como um conjunto de sustentável que é “aquele que atende às necessidades do fluxos e fixos. Fluxos resultam de ações que passam e/ou se presente sem comprometer a possibilidade de as gerações instalam nos fixos, mudando o seu significado e valor. Os futuras atenderem a suas próprias necessidades” elementos fixos de cada lugar permitem ações que o (CMAD, 1988, p.48). O rearranjo dos Solares, sua revitalização e seu uso turístico deve caminhar em direção

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dos parâmetros de sustentabilidade para que possa ter um O conceito de sustentabilidade é considerado futuro promissor, com conservação dos recursos materiais uma espécie de síntese do novo modelo que emerge neste e imateriais do lugar, respeitando-se sempre a sua século XXI, baseando-se na construção de um novo capacidade de suporte. projeto socioambiental, propondo-se a resolver o impasse da predação dos ecossistemas em geral e melhorando a As dimensões de sustentabilidade, segundo qualidade de vida da sociedade como um todo. Sachs (1994) são:

1.1.3 Turismo no espaço rural É dentro desse contexto de reformulação geral e de reorganização da economia em tempos de globalização, que o turismo, notadamente, o TER vem sendo encarado como uma das principais formas de desenvolvimento para as áreas rurais. Mas enquadrá-lo no conjunto de alternativas de desenvolvimento sustentável, gerenciadas sob condições de sustentabilidade, baseando- se na eficiência econômica, na equidade social e na prudência ecológica, considerando as especificidades de cada lugar em que acontecerá e a capacidade de suporte do mesmo, é ainda uma questão difícil de ser equacionada. O turismo é um fenômeno histórico, nascido da Fig.1 Dimensões de sustentabilidade extensão do tempo livre pela redução do tempo de Fonte: Sachs (1994) trabalho (assim como o lazer), do estabelecimento de férias e finais de semana remunerados; do desenvolvimento dos transportes e do aumento dos - a sustentabilidade social, objetiva construir uma sociedade com maior eqüidade na distribuição de salários, criando um novo modo de vida na sociedade renda, reduzindo-se as desigualdades entre os moderna. “Os três fatores fundamentais para o padrões de vida dos ricos e dos pobres; desenvolvimento do turismo em um país ou região são: - a sustentabilidade econômica, com uma alocação estabilidade política, social e econômica” (TRIGO, 2007, e gestão mais eficientes dos recursos naturais p.9). com um fluxo constante de investimentos Atualmente, o turismo tem papel de destaque, as públicos e privados; previsões são otimistas e indicam que, com o aumento - a sustentabilidade ecológica, respeitando-se a crescente das horas livres, a redução do tamanho médio capacidade de carga do planeta, com uso das famílias e do envelhecimento demográfico, haverá controlado dos recursos dos ecossistemas, com um mínimo de danos aos sistemas de sustentação um desenvolvimento significativo das atividades turísticas da vida, limitando-se o consumo de recursos no mundo todo. Assim sendo, observa-se que tais esgotáveis ou poluentes, substituindo-se por atividades já estão despontando como importantes agentes recursos renováveis ou abundantes. reorganizados dos espaços, impondo movimentos e - a sustentabilidade espacial, orientada para a análise de um processo que tem, certamente, repercussões obtenção de um arranjo espacial urbano-rural consideráveis. mais equilibrado e com distribuição territorial A atualidade evidencia mudanças na forma de mais justa dos assentamentos humanos e das apropriação dos recursos existentes. Há uma necessidade atividades econômicas, enfatizando: de maior conhecimento a respeito dos espaços e uma - a redução da concentração nas áreas metropolitanas; revalorização das próprias atividades antrópicas. Neste - o incentivo à agricultura e exploração florestal contexto, cresce a importância do turismo como agente por meio de técnicas modernas, regenerativas, reorganizador do espaço. propiciando o estabelecimento de pequenas O fenômeno turístico é considerado um dos propriedades com linhas de crédito especiais e principais responsáveis por inúmeras reorganizações das acesso a mercados; funções entre as diferentes partes do território onde se - o reforço os movimentos de descentralização desenvolve. É fundamental dizer que a atividade turística industrial acoplada à nova geração de é contraditória, podendo maximizar o uso e os tecnologias, com referência especial às indústrias benefícios dos recursos e espaços, promover novas de biomassa, criando-se assim, empregos não- agrícolas nas áreas rurais; relações entre culturas, mas também, pelo contrário, - a criação de redes de reservas naturais tornar-se predadora cultural, ambiental e econômica. O objetivando a proteção da biodiversidade; turismo pode gerar benefícios e malefícios. - o respeito ao conjunto de soluções específicas Ruschmann (1997) ressalta que os danos ambientais para o local, o ecossistema, a cultura e a área. provocados pelo desenvolvimento descontrolado do turismo podem causar os seguintes impactos:

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a) poluição: reconhecimento da culturas, . do ar- provocada pelos motores, pela produção e pelo riqueza da troca hostilidades por consumo de energia; com o outro dificuldade de . hídrica ( oceanos, lagos, represas, rios e cachoeiras) – pelo comunicação lançamento de esgotos urbanos (que pode ser multiplicada por Política e Desenvolvimento Planejamento cem em certos locais, em épocas de maior afluxo de turistas) e Administração local integrado equivocado, de veículos de recreio (barcos que expelem gases, óleos e graxa, segregação por exemplo); socioespacial . de locais de piquenique - pela ineficiência ou falta de coleta de lixo e pela falta de orientação dos próprios turistas; Meio Ambiente Novas infra- Degradação . sonora - causada pelos motores de veículos de recreio e pelos estruturas, ambiental, poluição, ruídos dos próprios turistas e entretenimentos para eles criados; conservação de alteração de hábitos b) destruição da paisagem natural e áreas agropastoris, uma vez algumas áreas, alimentares, que o crescimento do turismo acarreta a construção de casas de estratégias de produção excessiva veraneio, equipamentos e infra-estrutura para os turistas que gestão sustentável e sazonal de podem alterar ou, até mesmo, destruir ambientes naturais; resíduos sólidos c) destruição da fauna e flora, provocada pela poluição das Fig. 2 Impactos do turismo águas, do ar e os ruídos dos turistas, assim como o pisoteio da Fonte: Droulers e Milani, 2002. vegetação, coleta de frutas, plantas e flores, vandalismo chegando a incêndios casuais ou mesmo criminosos; Enfim, d) degradação da paisagem, de sítios históricos e de Como toda ação humana no território, o turismo também monumentos provocada pela instalação de modernos provoca transformações e conseqüentes impactos equipamentos, de dependências e de infra-estrutura para os positivos e negativos. Por isso, o planejamento e a turistas, cujo estilo e arquitetura podem não observar as gestão do turismo devem visar à sustentabilidade da construções tradicionais, trazendo desarmonia ao ambiente; atividade, ou seja, perseguir a maximização dos e) congestionamentos pela concentração de turistas que impactos positivos e minimizar os impactos negativos. O congestionam os pólos receptores, principalmente as estradas e desenvolvimento do turismo pode trazer benefícios e praias, impondo uma sobrecarga aos serviços de infra-estrutura e custos para a comunidade local. São inegáveis os de entretenimento – o que intensifica a poluição. benefícios relacionados à criação de empregos, geração Resumidamente, o quadro a seguir evidencia as de renda, divisas geradas pelo turismo internacional e conseqüências positivas e negativas do turismo. aumento da arrecadação de impostos em razão dos gastos dos turistas na localidade. No entanto, a distribuição dos benefícios nem sempre é igualitária. O turismo pode propiciar à população residente o acesso aos serviços relacionados ao saneamento, comunicação, Área Impactos potenciais Impactos potenciais segurança, limpeza, melhoria de estradas, aeroportos, positivos negativos novos hotéis, museus, variedade de restaurantes e de atividades de lazer. [...] Economia Receitas, empregos, Inflação local, É muito grande a capacidade de geração de empregos no melhoria qualidade especulação turismo. Milhões de pessoas atualmente trabalham de vida, atração de imobiliária, envolvidas na direção e funcionamento do turismo e nos investimentos concentração dos serviços dele originados, como transporte, agricultura, investimentos e bancos, etc., além dos empregos indiretos. Nas perda de economias desenvolvidas, o resultado é mais positivo do investimentos que em países pobres. Nestes últimos, por exemplo, alternativos, custos verifica-se o aumento da demanda de empregos no em termos de infra- período de construção da infra-estrutura turística, o que estruturas encoraja o abandono das atividades tradicionais necessárias (lavoura, pecuária, pesca). Concluída essa fase, tal mão- Turismo e Reconhecimento da Preços mais de-obra não é absorvida pelo mercado ou, então, devido Comércio região, novas elevados, à falta de qualificação, tem baixa remuneração. Isto sem infra-estruturas, desenvolvimento falar no caráter de sazonalidade do trabalho, que é maior descontrolado do regulado pela alta e baixa temporadas. acessibilidade comércio local Do ponto de vista social e cultural há, também, Sociedade e Maior empenho dos Comercialização benefícios e custos. Se o encontro de culturas de Cultura residentes na sazonal de diferentes partes do mundo pode provocar compreensão promoção dos atividades privadas, e tolerância, também pode provocar alterações nos eventos locais, alteração dos padrões culturais de uma sociedade. Tal é o caso da reforço dos valores costumes em função banalização da arte folclórica nativa pela intensa e tradições do turismo, exposição; da ameaça de mudança de valores culturais locais custos sociais dos jovens que tentam imitar hábitos, linguagens, roupas (prostituição, abuso dos visitantes, sem falar no consumo de drogas, de drogas e álcool) prostituição e aumento de violência. Psicologia Orgulho quanto aos Atitudes defensivas Quando o produto turístico é baseado em atrações de costumes locais, face a outras áreas naturais (vida selvagem, monumentos

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arqueológicos e históricos, preservação de sítios), exige de hospedagem não se distribui de maneira homogênea ainda mais cuidados e respeito para com a capacidade de pelo território português, concentrando-se na região norte carga, para que as qualidades do destino turístico não do país. O governo central tem incentivado o setor, sejam irremediavelmente perdidas (TRIGO, 2007, p.23). principalmente, regulamentando a atividade e dando incentivos financeiros, havendo também apoio de 2. OS SOLARES PORTUGUESES iniciativas comunitárias como o Programa LEADER. Este

permitiu desenvolver o mundo rural respeitando as O turismo enquanto atividade econômica, tem se singularidades locais. As comunidades rurais colocaram diversificado nas últimas décadas, observando-se grande em prática, a partir de 1991, as suas próprias estratégias expansão do mercado e o surgimento de outros de inserção numa perspectiva de futuro sem, mas não segmentos. Assim, são necessárias a estruturação, renunciaram ao seu património natural e cultural promoção e comercialização apropriadas às (SILVA, 2007). características particulares de cada segmento e região Os Solares são exemplos da diversidade turística. patrimonial do país, hospedando, principalmente, turistas

O turismo é reconhecido oficialmente pelas suas estrangeiros. São divididos em três categorias conforme potencialidades como fator de desenvolvimento, em suas características (relativas às suas dimensões, várias escalas, da local à nacional. São, com efeito, paisagem do entorno, jardins, decoração e valor múltiplos e de grande visibilidade os seus impactos, histórico): Casas Antigas, Quintas e Herdades e Casas diretos, indiretos e induzidos. Atividade transversal, Rústicas. global, de fronteiras fluidas, interfere nos tecidos As Casas Antigas caracterizam-se pela sua econômicos e sociais, nas dinâmicas demográficas e do arquitetura, muitas delas construídas entre os séculos emprego, no patrimônio natural e cultural, nos XVII e XVIII. Nas Quintas e Herdades, a atividade comportamentos das populações e na ocupação, agrícola é uma das atrações para o visitante que pode ordenamento e funcionamento dos territórios. Anima o mercado dos produtos e serviços locais, viabilizando conhecer o cotidiano da vida rural. As Casas Rústicas têm microempresas de ramos diversos (da produção pequenas dimensões e são mais simples, construídas de alimentar e artesanal à prestação de serviços de lazer). acordo com os atributos e materiais locais. Não surpreende [...] que seja [...] integrado nos programas de desenvolvimento territorial, 3 RESULTADOS DA PESQUISA nomeadamente nos espaços rurais. Cabe-lhe então um papel também significativo na conservação e gestão da De acordo com o Turismo de Portugal (2009), diversidade das paisagens – naturais, históricas e funcionavam, no ano de 2008, no país, 1.047 unidades de culturais, com suas aldeias e lugares – e do patrimônio turismo de habitação e turismo no espaço rural [...]. As edificado, com seus traços arquitetônicos próprios que modalidades de turismo rural e turismo de habitação são [...] motivos de atração turística [...]. concentraram 56,8% das camas existentes no país. Do turismo esperam contribuições importantes na O mercado alemão liderou, com 25% do total, as revitalização econômica e social, na valorização dos dormidas de estrangeiros. As regiões do Norte, Alentejo e patrimônios e dos produtos locais de qualidade, fonte de Centro concentraram 75% do total de dormidas estimadas para o receitas, na manutenção de serviços básicos e de país, e as modalidades de turismo rural, turismo de habitação, condições suficientes de acessibilidade [...].Trata-se de casa de campo e hotel rural abrangeram 86% do total de fazer dispersar pelo espaço rural uma procura por novos dormidas espaços turísticos, fragmentada, apoiada na mobilidade [...]. Os residentes em Portugal que representaram 56% individual e na diversificação das motivações dos do total, [...] os estrangeiros 44% do total. deslocamentos, com relevo para o ambiente [...] A taxa de ocupação-cama foi de 14,8% [...]. Ao nível (CAVACO, 2001, p.26-27). regional, a Madeira (23,7%), Lisboa (22,0%) e o Algarve (21,1%) atingiram as taxas médias de ocupação O TER em Portugal também é uma opção de mais altas. retomada do desenvolvimento. De acordo com Silva (2007), a área rural deste país, atualmente, apresenta duas Fig. 2 Distribuição do Turismo de Habitação em tendências marcantes, uma grande diminuição da Portugal em 2001 população residente e, por outro lado, uma busca dos Regiões % moradores das cidades pelos recursos ali existentes com Norte 43,8 finalidades recreativas. Assim, o chamado turismo de Centro 21,8 (Lisboa:3; Alentejo:15,8; habitação surgiu para combater o êxodo rural e também, Algarve:3) ao mesmo tempo, receber os visitantes urbanos. Região autônoma da 4,8 O turismo de habitação oferece estadia em casa Madeira senhorial e contato com elites. O agroturismo relaciona-se Região autônoma dos 8 ao cotidiano rural, lavoura e pecuária. Casas de campo e Açores turismo de aldeia proporcionam hospedagem em casas Outras 11,6 típicas. O turismo de habitação foi criado em 1978 em Fonte: TURISMO DE PORTUGAL ( 2001) Portugal, em expansão desde então. Tal oferta de meios Org. QUEIROZ (2012)

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aqueles que querem fugir dos centros urbanos e buscam Fig. 3 Distribuição do Turismo de Habitação em vivências no cotidiano rural (TURISMO DE Portugal em 2011 PORTUGAL, 2009). Regiões % A presente pesquisa fez um recorte neste amplo Norte 50,62 universo dos Solares Portugueses (TH e TER) Centro 16,06 (Lisboa:4,95; catalogados pela TURIHAB, aprofundando os estudos na Alentejo:9,46; Algarve:1,65) categoria definida como Casas Antigas. Região autônoma da 4,11 Há 45 Casas Antigas associadas à TURIHAB, Madeira destas foram contactadas 11 (entre agosto e novembro de Região autônoma dos 5,34 2012), isto é, cerca de 20% do total, configurando-se Açores assim a amostra de investigação (aquelas destacadas em Outras 23,87 negrito foram contactadas e visitadas; aquelas em azul Fonte: TURISMO DE PORTUGAL ( 2011) foram apenas contatactadas). Org. QUEIROZ (2012) Por meio da visitação às Casas Antigas citadas, informações gerais sobre estes Solares foram obtidas, observando-se características comuns entre elas: estilo barroco com a presença marcante de pedras e escadarias, jardins bem cuidados e áreas de lazer com piscinas e Analisando as figuras acima, constata-se que a quadras esportivas. região Norte de Portugal concentra a maior oferta de Estes alojamentos de TH simbolizam parte da estabelecimentos de TH, em especial, na região do Minho-Lima. história de Portugal, guardam em seus diferentes aspectos Nota-se também um aumento de quase 7% destes entre 2001 e arquitetônicos eruditos a memória de uma sociedade dos 2011, número digno de nota. Este fato, certamente, significa que séculos passados, incluindo obras de arte que mostram as o TH vem, cada vez mais, vem se consolidando enquanto tradições locais. A implementação do TH é uma inovação segmento turístico na região norte do país, provocando contemporânea, ou seja, as Casas Antigas passaram a ter reorganização dos espaços geográficos, marcando o território. E foi nessa região que a presente pesquisa mais concentrou outra função, isto é, a de acolher visitantes que buscam esforços para visitar os Solares e entrevistar seus responsáveis e hospitalidade e tranquilidade. proprietários objetivando analisar essa realidade. Muitas das chamadas casas apalaçadas que estão As ações dos atores sociais envolvidos com o turismo classificadas como Casas Antigas foram construídas entre na região do Minho promovem mudanças nos objetos existentes os séculos XVI, XVII e XVIII, observando-se uma certa no local, aproveitando o patrimônio arquitetônico e histórico concentração de tais edificações nos dois últimos, das casas apalaçadas que vêm sendo, gradativamente, coincidentemente em pleno ciclo do ouro brasileiro. restauradas, revitalizando-se para receber visitantes em ambiente Salienta-se este importante período da mineração de TH. Em outras palavras, houve uma renovação de uso dos no Brasil (apogeu entre 1750 e 1770), pois, justamente, Solares de Portugal, evidenciando que no presente período histórico atualizou-se a função dos mesmos, unindo cultura e nesta época, Portugal estava passando por severas turismo de maneira quase simbiótica. dificuldades econômicas e essa riqueza da Colônia Lembrando aqui a fala do conde Francisco de Calheiros configurou-se como a grande alternativa de trabalho e (em entrevista concedida em 9 de agosto de 2012) nova fonte de renda. Havia cobrança de taxas e impostos As casas apalaçadas é o turismo de habitação, o que e assim, aquele que extraísse o ouro no Brasil deveria definimos como turismo de habitação. Nós agora temos pagar à Coroa Portuguesa por isso. Muitos portugueses duas... está classificado em dois tipos, uma está migraram para o Brasil em busca de enriquecimento nesse classificado como turismo de habitação e turismo no período e tiveram êxito (FONSECA e PRADO FILHO, espaço rural, o que cria uma confusão porque a maioria 2006). do turismo de habitação é em espaço rural, mas a definição está feita assim, né, turismo de habitação e A distribuição das Casas Antigas por regiões turismo no espaço rural, é que está dividido em várias portuguesas é irregular, percebendo-se que há uma nítida categorias não é, o agroturismo, as casas de campo. aglutinação no vale do Minho, região norte, área “berço” da criação do Solares Portugueses, principalmente no A distribuição dos Solares é irregular pelo entorno da vila de Ponte de Lima, onde fica a sede da território lusitano, como já foi mencionado. A rede TURIHAB. espalha-se por todo país, com significativa concentração Em função da maior aglomeração de Solares na no entorno de Ponte Lima, na região norte de Portugal, região do Minho, apresenta-se um esboço geral sobre este onde fica a sede da TURIHAB, Associação do Turismo espaço geográfico de ocupação muito antiga, sendo hoje de Habitação. Esta foi fundada em 1983, sem fins um território inserido na região do Norte/Noroeste. lucrativos, e tem abrangência nacional. É importante Divide-se em subregiões Minho-Lima e do Cávado e salientar que tal associação criou a marca Solares de parcialmente pelas subregiões do Ave (concelhos de Fafe, Portugal em 1993, dez anos após seu início. Em 2009 Guimarães, Póvoa de Lanhoso, Vieira do Minho, Vila criou também a marca Casas no Campo ou Agroturismo, Nova de Famalicão e Vizela) e Tâmega, abrangendo os para constituir uma rede de Turismo no Espaço Rural. distritos de Viana do Castelo e Braga. A região do Minho Este segmento turístico incrementa atividades para é banhada pelos principais rios Minho, Cávado, Ave e

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Lima, tem como fronteira ao norte a Espanha (Galiza), a Por outro lado, o mesmo estudioso, Oliveira oeste o oceano Atlântico, a leste/nordeste Trás-os-Montes (2010) aponta como principais forças da área: a produção (INFOPÉDIA, 2013). de conhecimento científico e tecnológico resultante das Universidades existentes, principalmente, da Universidade do Minho; boas infra-estruturas de comunicação, como auto-estradas, aeroportos e portos marítimos, infra-estruturas digitais, como fibra óptica; setor têxtil é forte pela permanência na região em termos de tecnologia; aspectos culturais e etnográficos, como a gastronomia. A este último aspecto pode-se também incluir a existência dos Solares oferecendo TH como grande potencialidade da sub-região Minho-Lima, passando por diversificação de demanda por meio de uma divulgação adequada. A organização de eventos e congressos científicos também pode ser otimizada, bem como o turismo de saúde e o religioso, enfim, medidas que direcionem a visualização da região relacionada à qualidade de vida com belas paisagens e vasto patrimônio cultural a serem visitados.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS O objetivo inicial desta pesquisa foi desenvolver uma investigação sobre o aproveitamento turístico dos

patrimônios cultural e natural e seus impactos

socioeconômicos e ambientais em espaço rural: o caso

dos solares portugueses. A pesquisa configurou-se como

exploratória, qualitativa e descritiva, usando,

basicamente, dados bibliográficos e realizando pesquisa Fig. 4 Região Norte/Noroeste de Portugal e suas de campo, com entrevistas com os responsáveis pelos subregiões. Solares Portugueses. Fonte: Cartográfica do Instituto Geográfico do Exército Em síntese pode-se dizer que as famílias (IGeoE)/ NUT (Nomenclatura Comum das Unidades envolvidas com TH nos Solares Portugueses receberam as Territoriais Estatísticas). propriedades como herança, apenas uma das entrevistadas

adquiriu o imóvel mais recentemente. Tais propriedades Os Solares Portugueses, notadamente aqueles herdadas de antepassados nobres que tiveram papel importante localizados na sub-região Minho-Lima se apresentam no desenvolvimento do meio rural do país, principalmente, com personalidade, principalmente no que se refere aos ligados à produção de vinho na região norte, Minho e Douro. seus atributos simbólicos, ou seja, guardam em suas Provavelmente este fato contribuiu para o bom dependências as experiências vividas por aqueles que ali encaminhamento das restaurações dos Solares por meio moraram em outros tempos, evidenciadas aos visitantes da ajuda financeira do governo português e UE. que podem interpretá-las de acordo com seus conjuntos de Os atuais proprietários dos Solares possuem valores e significados. tradição em relação ao cultivo da terra, ou seja, estão A existência de um conjunto de potencialidades ligados à agricultura, de maneira geral e foram, naturais e culturais, faz com que a região supra citada gradativamente, adquirindo experiência prática em TH, tenha todas as condições de desenvolver um turismo de sem formação específica. Foi observado também que as qualidade e sustentável, apesar da existência de certas mulheres têm assumido, constantemente, a fragilidades apontadas por Oliveira (2010), a saber: baixa responsabilidade da direção dos estabelecimentos. Dos capacidade de atuar em redes de cooperação e partilha de seis Solares visitados, quatro têm a gestão feita por informação, principalmente a transfronteiriça com a mulheres. Este fato nos lembra Cavaco quando afirma Galiza; pouca articulação entre o empresariado e agentes Cabe sempre às mulheres um papel importante nos econômicos locais; estrutura econômica regional débil; funcionamento das unidades de turismo rural, no baixo nível de qualificação dos recursos humanos e forte acolhimento dos turistas, quando não também na gestão presença do estado na economia regional. O autor sugere e nos contatos institucionais, particularmente quando para região a possibilidade do estabelecimento de domésticas. O seu nível de instrução, formação e cultura sinergias entre os meios científico e empresarial, facilita o desempenho das tarefas e a Assumpção de tais responsabilidades e favorece a atracção de clientelas de estimulando-se as parcerias público-privadas entre as elevado nível de exigência quanto a tratamento e universidades e as empresas locais. convívio (CAVACO, 1999, p.299)

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. Diretrizes para o A taxa de ocupação em TH, de acordo com os Desenvolvimento do Turismo rural no Brasil. Brasília: entrevistados, é baixa, concentrada mais nos meses de 2003. primavera e verão. Durante os meses de outono e inverno CALHEIROS, Francisco de. Solares de Portugal: um as Casas Antigas fecham suas portas, pois não há procura conceito único. Ponte de Lima: Center, 2011. por causa das baixas temperaturas. Somente abrem em http://translate.google.com.br/translate?hl=pt- casos especiais e para grupos. BR&sl=en&u=http://www.center.pt/EN/&prev=/search% De maneira geral, a oferta de leitos em TH, por 3Fq%3Dcenter%2Bportugal%26hl%3Dpt- estabelecimento, é pequena, não ultrapassando doze UHs, BR%26tbo%3Dd%26biw%3D1366%26bih%3D673&sa= algumas Casas oferecem apenas duas. Entretanto, X&ei=x4f8UKibNoSi8QSKk4DQCg&ved=0CD0Q7gEw possuem características requintadas e destinadas à AQ hóspedes habituados com serviços diferenciados. CAVACO, Carminda (Org.). Desenvolvimento rural Observou-se também que os turistas estrangeiros são os desafio e utopia. Estudos para o planejamento rural e principais hóspedes dos Solares Portugueses, o cidadão do urbano. N. 50. Lisboa: UL/ CEG, 1999. próprio país parece não frequentar muito TH, CAVACO, Carminda. O mundo rural português: provavelmente, por razões relacionadas ao alto custo e desafios e futuros? In: RODRIGUES, Adyr B. (org.). pouca valorização deste segmento. Turismo rural. São Paulo: Contexto, 2001. Todos os Solares visitados aderiram aos CENSO 2005 programas de certificação adotado pela TURIHAB, (www.ine.pt).http://censos.ine.pt/xpor embora pareçam não saber bem os encaminhamentos das tal/xmain?xpid=CENSOS&xpgid=censos_quadros questões ambientais mais atuais. Como a certificação CRISTÓVÃO, Artur; TIBÉRIO, Luís e ABREU, Sónia. ambiental é recente em TH nos Solares de Portugal, a Restauração, Turismo e Valorização de Produtos adesão ainda é pequena, mas irreversível. Agro-alimentares Locais: o Caso do Espaço O aproveitamento do patrimônio arquitetônico e Transfronteiriço do Douro-Duero. PASOS. Revista de cultural das Casas Antigas pelo TER e pelo TH em Turismo y Patrimonio Cultural. ISSN 1695-7121Vol. 6 Portugal foi excelente em todos os estabelecimentos Nº 2 págs. 281-290. 2008. Special Issue – Número visitados. Houve também concordância, entre os Especial. entrevistados, de que o turismo gera divisas e trabalho, DROULERS, Martine e MILANI, Carlos R. S. porém não acarreta grandes dividendos, sempre funciona Desenvolvimento local e turismo em Tarrafal, Cabo como um complemento dentro das propriedades que Verde. Paris: UNESCO, 2002. desenvolvem outras atividades econômicas relacionadas DUARTE, Isabel D. e ABRANJA, Nuno A. Turismo e ao cultivo da terra que configuram-se como as principais. Sustentabilidade. Cogitur : Journal of Tourism Studies nº Pode-se, então, dizer que o turismo é um vetor de 02 (2009). In: desenvolvimento local e se incrementado dentro dos http://recil.grupolusofona.pt/bitstream/handle/10437/1874 parâmetros da sustentabilidade provoca melhorias, /506-1760-1-PB.pdf?sequence=1 incentiva o aparecimento de outras atividades. O TH e o ELESBÃO, Ivo. A percepção dos empreendedores em TER são consideradas atividades secundárias nas relação aos resultados do turismo no espaço rural. propriedades visitadas, mas podem ser ampliadas, Comunicação apresentada no VII CIER – Colóquio dependendo muito das ações de divulgação e Ibérico de Estudos Rurais (Cultura, Inovação e planejamento nos níveis municipal e regional. Em outras Território). Coimbra, Portugal, 2008. palavras, o turismo acarreta mudanças no modo de vida http://www.sper.pt/actas7cier/PFD/Tema%20II/2_8.pdf rearranjos para se adaptar às novas necessidades, às suas FONSECA, Alberto F. C. E PRADO FILHO, José F. Um novas funções voltadas para o lazer. Importante Episódio na História da Gestão dos Recursos Hídricos no Brasil: O Controle da Coroa Portuguesa Sobre o Uso da Água nas Minas de Ouro REFERÊNCIAS CITADAS E CONSULTADAS Coloniais. RBRH – Revista Brasileira de Recursos Hídricos. Porto Alegre, RS, Volume 11 n.3 Jul/Set 2006, ABRATURR (Associação Brasileira de Turismo 5-14. Rural). Definição de turismo rural. 2002. Disponível: Guia de Portugal V Trás-os-Montes e Alto Douro II - http://www.etur.com.br/conteudocompleto.asp?IDConteu Lamego, Bragança e Miranda Trás - Os - Montes e Alto do=122 Douro I I: Lamego, Bragança e Mirandade Vários. ANUÁRIO ESTATÍSTICO DA REGIÃO NORTE Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1995. 2005 (www.ine.pt de Segmentação. Turismo rural: orientações básicas. MINISTÉRIO DO TURISMO. Anuário Estatístico. Brasília: Ministério do Turismo, 2008. Brasília, 2008.

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A PAISAGEM RURAL COMO UM ATRATIVO PARA O TURISMO RURAL: ESTUDO DE CASO NA ESTRADA DOS PIONEIROS – REGIÃO METROPOLITANA DE LONDRINA-PR

TATIANA COLASANTE

Universidade Estadual Paulista - Unesp Campus de Presidente Prudente [email protected]

RESUMO - O presente artigo discute as novas funcionalidades do meio rural brasileiro, sobretudo, a partir da década de 1980, com o início do Turismo Rural no país. Esta atividade vem contribuindo para dinamizar a economia rural, especialmente, na agricultura familiar. O estado do Paraná passou por diversos ciclos de exploração econômica que contribuíram para a sua ocupação territorial. Na década de 1990, assim como já vinha acontecendo em outras regiões do país, ocorre a inserção da atividade turística no meio rural, mais especificamente, na região norte do estado. Dentre muitos elementos de atratividade que o meio rural fornece, o destaque da pesquisa recai sobre a paisagem rural que por intermédio das modificações naturais e antrópicas, torna-se elemento singular para o turismo rural. Utilizando metodologias de análise para averiguar o grau de potencialidade das paisagens rurais, o recorte espacial da pesquisa é a Estrada dos Pioneiros, localizada na Região Metropolitana de Londrina, norte do Paraná.

Palavras chave: Turismo rural, paisagem rural, norte do Paraná, Região Metropolitana de Londrina, Estrada dos Pioneiros.

ABSTRACT - This article discusses the new features of the Brazilian countryside, especially from the 1980s, with the onset of Rural Tourism in the country. This activity has contributed to boost the rural economy, especially in family farming. The state of Paraná has undergone several cycles of economic exploitation that contributed to its territorial occupation. In the 1990s, as already happened in other regions of the country, occurs the inclusion of tourism in rural areas, more specifically, in the northern region of the state. Among many elements of attractiveness to the countryside provides the highlight of the research is on the rural landscape through the natural and anthropogenic changes, become singular elements for rural tourism. Using analysis methodologies to ascertain the degree of potentiality of rural landscapes, the spatial area of research is the Estrada dos Pioneiros, located in the Metropolitan Region of Londrina, Paraná northern.

Key words: Rural Tourism, rural landscape, northern Parana, Metropolitan Region of Londrina, Estrada dos Pioneiros.

1 INTRODUÇÃO alternativas de sobrevivência frente às novas formas de organização do trabalho no campo. Nas últimas décadas, o meio rural vem passando Ao mesmo tempo, este novo cenário que o meio por diversas transformações que resultaram, dentre outros rural brasileiro apresenta, sobretudo, a partir da década de aspectos, em alterações nas relações de produção e 1980, com a inserção efetiva da atividade turística no trabalho, decorrentes de múltiplos processos, como a campo, vem oferecendo uma nova dinamização na modernização na agricultura e a globalização. Nessa economiza dos pequenos produtores, além de conferir perspectiva, as atividades agropecuárias, especialmente, a experiências diferenciadas para o turista, que vem buscar agricultura familiar, acabaram enfrentando problemas que no campo, muitos elementos que o meio urbano não contribuíram para que os pequenos produtores buscassem oferece, como o contato com a natureza.

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Neste quadro, torna-se necessário que os atrativos reduções pelos bandeirantes paulistas, no final do século rurais sejam explorados mediante os princípios da XVI, novos conflitos fizeram com que a demarcação do sustentabilidade para garantir que este produto turístico território paranaense ficasse comprometida (FAJARDO, não seja efêmero, mas que seja aproveitado, inclusive, a 2008). médio e longo prazo. Ressalta-se, assim, que a paisagem rural como elemento fundamental na composição do cenário turístico rural seja conservada nos seus aspectos físicos, naturais e culturais, de modo a conferir a singularidade buscada pelos turistas. Enquanto espaço visível, a paisagem é formada por um conjunto de elementos morfológicos e que muitas vezes, em virtude de processos históricos acaba sendo modificada pela ação humana. Se, por um lado, essa descaracterização pode acarretar em impactos ambientais graves, por outro, a inserção de elementos culturais pode reforçar a identidade do lugar, de onde se destaca a dimensão simbólica da paisagem rural. Sendo assim, além de possuir uma dinâmica própria, que nem sempre se detecta de imediato, a paisagem apresenta também uma vertente cultural, na qual o homem é o principal agente modificador. Para se analisar o potencial turístico de uma paisagem rural, faz-se necessária a utilização de uma metodologia, assim como ocorre com outros atrativos turísticos. Especificamente, neste trabalho, a discussão foi feita a partir de duas metodologias específicas: os seis elementos de análise da paisagem cênica discutidos no guia The Roadscape Guide e as onze características da paisagem rural descritas nas normas NRB-30 (U.S. Department.of the Interior, National Park Service). Como recorte espacial deste trabalho, foi escolhida a Estrada dos Pioneiros, localizada na Região Metropolitana de Londrina (RML), especificamente o trecho que engloba a área periurbana de Londrina, pois, esta área vem sofrendo intervenções urbanas recentes, que Figura 1: Localização do estado do Paraná com relação à podem comprometer ainda mais a integridade do trecho. América do Sul. Fonte: Ipardes (2013) Embora, não seja turística comercialmente, a Estrada dos Pioneiros possui uma importância histórica e cultural para Historicamente, o estado passou por diversos tipos a região, que pode vir a ser aproveitado como elemento de de ciclos de exploração e que podem ser relacionados atração para o turismo rural. com a formação e evolução das regiões. Para auxiliar neste entendimento, Konzen e Zaparolli (1990) elencaram 2 A GÊNESE HISTÓRICA E ECONÔMICA DO os seis principais ciclos de exploração que contribuíram ESTADO DO PARANÁ para o processo de ocupação: A) Escravo-indígena: esta fase de ocupação tem O estado do Paraná (Figura 1), localizado na início com o estabelecimento de reduções jesuíticas região sul do Brasil, possui uma população aproximada de espanholas no século XVI, especialmente, na região onde 10.500.000 habitantes (IBGE, 2010). Uma das hoje estão localizadas as cidades de Paranaguá e Curitiba, características da ocupação territorial do estado é seu com objetivo de catequização dos índios. processo desigual e descontínuo entre as diferentes B) Mineração: a partir do século XVI, tem-se uma regiões. O início do povoamento remete ao período busca constante pelo ouro, que segue até o início do colonial, através de disputas territoriais entre Portugal e século XX e, com isso, o surgimento dos primeiros Espanha. A maior parte do atual território paranaense povoados de origem portuguesa no litoral do Paraná. pertencia à Espanha. Em função disso, durante o século C) Tropeirismo: no início do século XVII, as XVI, houve a instalação de vários povoados e reduções tropas vinham do Rio Grande do Sul em direção à jesuíticas espanholas. Grande parte do território para comercialização de animais. À medida que paranaense pertencia à Província del Guayrá, que tinha faziam paradas para descanso, tem-se o surgimento de uma população indígena de milhares de pessoas, na qual importantes núcleos populacionais. desenvolviam o plantio de milho, mandioca, criação de D) Erva-mate: durante praticamente todo o século gado e extração de erva mate. Com a destruição das XIX, a erva-mate – planta originária do Paraná – foi a

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principal atividade econômica do estado e, a partir dela A estrutura montada na colonização dirigida tem-se um desenvolvimento técnico, especialmente, do permitia que se formasse no norte paranaense um entorno de Curitiba, com a construção de estradas e a impressionante arranjo territorial em que núcleos instalação de indústrias. urbanos bem próximos uns aos outros, estavam interligados por estradas e ferrovias que davam E) Madeira: no período entre o final do século XIX acesso à região. Com pleno desenvolvimento da e início do século XX, a madeira passou a fazer parte das cafeicultura, uma série de armazéns e unidades de exportações paranaenses, resultando na instalação de beneficiamento consolida essa rede de escoamento várias madeireiras, sobretudo na região norte. da produção cafeeira construída. O fator econômico F) Café: a partir da crise na exploração da erva- mostra-se mais uma vez, na associação entre os mate e o avanço da exploração da madeira, o café passou esforços públicos de ocupar a região com os projetos a ganhar importância na produção do estado. A imobiliários privados, como grande definidor cafeicultura foi predominante no norte do Paraná, onde territorial. era quase uma extensão das lavouras paulistas. Ainda com relação ao norte do Paraná, Muller A partir da década de 1970, especificamente, em (2007, p. 34) afirma que somente a partir do século XIX 1975, quando as plantações de café são dizimadas pela a colonização foi feita de forma efetiva, com a fundação geada, a produção cafeeira entra em crise. A maioria dos da Colônia Militar de Jataí em 1855, que tinha por agricultores era composta por pequenos proprietários que objetivo a proteção da área ameaçada pelos paraguaios e a adquiriram suas terras das companhias colonizadoras e, fundação dos aldeamentos de São Pedro de Alcântara e de para superar este momento crítico, muitas cooperativas São Jerônimo da Serra, constituindo assim, pequenos agrícolas começaram a mudar sua estratégia de atuação, centros de povoamento. atendendo aos interesses do Estado em desestimular a A partir de 1862, com o desenvolvimento da produção cafeeira em detrimento das lavouras cafeicultura, o norte do Paraná passa por uma nova fase “modernas”, destacando-se soja e trigo, segundo Serra de ocupação. Hauresko e Moteka (2008) explicam que (2008). Neste entendimento, destaca-se que o norte vinham ocupar as terras, principalmente, mineiros e paranaense foi ocupado, essencialmente, em função dos paulistas, em virtude da decadência das antigas zonas interesses da expansão agrícola, aproveitando-se de zonas produtoras (no Estado de São Paulo e Minas Gerais). Este ainda desocupadas. Como resultado, o norte do estado período marcado pela intensa imigração para o norte do passa a ser caracterizado pelo seu forte perfil baseado, Paraná, conhecido como a “marcha para oeste do café” principalmente, na agroindústria. fez com que surgissem vários núcleos habitacionais: Para reiterar essas profundas mudanças na Colônia Mineira (1862), Santo Antônio da Platina (1866), estrutura agrária paranaense, verifica-se nos estudos de Venceslau Brás e São José da Boa Vista (1867), conforme Tsukamoto (2011) realizados sobre o norte do Paraná, Bragueto (2007). Acrescenta-se neste período também a uma indicação de que a industrialização do campo presença do migrante nordestino vindo, sobretudo, da resultou em uma significativa alteração tanto na Bahia, que ficavam na zona rural, onde trabalhavam como distribuição fundiária quanto nas relações sociais de posseiros ou peões, segundo Wachowicz (1987). produção. Dessa forma, o Censo Agropecuário de 1970 Durante este período próspero da lavoura cafeeira, demonstra que o café predominava em 66% da área que contribuiu para que o Paraná se tornasse o maior cultivada, enquanto no Censo de 1995/96, o café é produtor do Brasil, houve um verdadeiro fenômeno representado por apenas 9%, sendo substituído pela soja populacional, com rápida ocupação territorial. Após o ano com 61% do total. de 1929, a colonização no norte do Paraná é caracterizada por aquilo que Bragueto (2007) denomina de 2.1 As transformações no meio rural paranaense e sua “colonização nos moldes capitalistas”, empreendida pela interface com o turismo Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP), de capital inglês e que, posteriormente, viria a ser chamada de Para Santana e Souza (2013), frente à importância Companhia Melhoramentos Norte do Paraná (CMNP), da agricultura familiar para o cenário brasileiro, é quando esta foi vendida a empresários brasileiros. Padis fundamental “[...] criar ou adaptar alternativas de (1981) destaca também a ocupação de terras na região sustentabilidade, visto que os centros urbanos se pelas companhias Bratac e a Nambei Tochikubushiri, encontram repletos de moradores e trabalhadores, sendo ambas de capital japonês e que resultou no surgimento de relevante evitar o crescente êxodo rural”. Nesse sentido, o duas cidades: Assaí e Uraí, constituídas, essencialmente, turismo rural torna-se um forte aliado, pois, pode de imigrantes japoneses. Tem-se assim, um período contribuir para o incremento da renda familiar. Além decisivo para o norte do estado, que passa a ser disso, o turismo rural pode trazer outras séries de incorporado na economia de mercado e, com isso, surge benefícios, como valorização cultural, resgate de uma série de mudanças do ponto de vista socioespacial tradições, conservação do meio rural, auto-estima da nesta região, conferindo-lhe certas especificidades população de baixa renda, maior envolvimento territoriais, conforme relata Fajardo (2006, p. 106): comunitário e associativismo. Como pioneiro do turismo rural no Brasil, Cury (2012) explica que foi o município de Lages, em Santa

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Catarina, na década de 1980, período em que começaram As reuniões da ADETUNORP são mensais e a ser discutidas questões relacionadas às leis ambientais itinerantes, nos municípios que demonstram interesse no para áreas protegidas e crescia o interesse do público por desenvolvimento do turismo. Com o apoio do Serviço de atividades de lazer em áreas rurais. Essa valorização da Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e da cultura no campo possibilitou uma maior fonte de renda Secretaria de Estado e Turismo do Paraná (Setu), para os proprietários rurais, especialmente os produtores algumas Rotas já foram elaboradas e estão aptas para a familiares. comercialização, como a Rota do Rosário, que abrange os A partir da década de 1990, o meio rural municípios de Bandeirantes, Siqueira Campos, paranaense passou a ser articulado com a atividade Jacarezinho, Tomazina, Ribeirão Claro e Carlópolis. turística, que já se consolidava em outras regiões do país. Além deste, a Rota da Águas em Carlópolis e Ribeirão Para Hespanhol e Souza (2012, p. 181), no “[...] espaço Claro cujo potencial é focado na pesca e lazer rural multifuncional, o turismo passa a ser reconhecido (ADETUNORP, 2013). Para o Ministério do Turismo, o pelo governo, em suas distintas escalas [...], como turismo em áreas rurais pode ser compreendido como: atividade econômica que pode gerar renda, aumentar o número de empregos diretos e indiretos, [...] estimular o Todas as atividades praticadas no meio não urbano, desenvolvimento local”. Dessa forma, o meio rural passa que consiste de atividades de lazer no meio rural em a ser um elemento de atração para o turismo, trazendo várias modalidades definidas com base na oferta: Turismo Rural, Turismo Ecológico ou Ecoturismo, novas configurações territoriais para o campo. Turismo de Aventura, Turismo de Negócios e No Paraná, destaca-se o município de Colombo, na Eventos, Turismo de Saúde, Turismo Cultural, Região Metropolitana de Curitiba (RMC) como pioneiro Turismo Esportivo, atividades estas que se nas atividades do turismo rural, através da criação do complementam ou não. (BRASIL, 2010, p. 17) roteiro Circuito Italiano de Turismo Rural, em 1999. Este Circuito possui cerca de 30 quilômetros de extensão e Tendo em vista a diversidade de atividades que passa por sete comunidades. Tem como objetivo mostrar podem ser realizadas pelos turistas em áreas rurais, é aos turistas, alguns costumes e tradições dos imigrantes importante ressaltar a importância das paisagens que italianos que se reterritorializaram na região (PAIXÃO compõe o meio rural, pois, fazem parte destes cenários et.al., 2000). turísticos e contribuem para criar uma atmosfera de Essas territorialidades que são resultantes da harmonia com a natureza. Nesse sentido, reitera-se a apropriação simbólica do território, também se tornam um relevância de se conservar as paisagens rurais enquanto elemento de atratividade, pois, no Brasil, a partir deste patrimônio cultural, que expressam territorialidades processo, são elaborados roteiros temáticos, levando em particulares do meio rural e que devem ser compreendidas consideração aspectos de formação territorial, como o como elementos históricos fundamentais no processo de Caminho dos Tropeiros; os antigos engenhos de cana de evolução das configurações territoriais. açúcar no Nordeste; o Ciclo do Ouro em Minas Gerais, entre outros. Assim, não é somente o fator locacional que 2.2 As paisagens rurais como atrativo turístico deve ser visto como diferencial do turismo rural em relação a outros tipos de turismo, mas outros aspectos Historicamente, os indivíduos sempre necessitaram como, processo histórico de ocupação territorial e estabelecer um contato com a natureza, seja como forma características paisagísticas regionais (CURY, 2012). de apropriação ou apenas para contemplação e lazer. Ao Porém, segundo informações da Secretaria de longo da evolução das sociedades, esta relação foi se Estado e Turismo do Paraná (2013), no norte do Paraná, modificando, passando de uma condição de foi a Pousada das Alamandas, no município de Rolândia, endeusamento para os povos primitivos, que não sabiam em 1992, que deu início ao turismo rural nesta região. O como explicar os fenômenos da natureza e, por isso, local era uma antiga fazenda de café, que foi reestruturada atribuíam os acontecimentos aos deuses, até os dias de para receber turistas. Com esta experiência positiva, foi hoje, quando a concepção da natureza relaciona-a com criada, em 2006, a Agência de Desenvolvimento Turístico uma simples mercadoria para o sistema capitalista, no do Norte do Paraná (ADETUNORP). Essa agência de qual a natureza é intensamente explorada até se esgotarem fomento do turismo é iniciativa de um grupo de todos os seus recursos. empresários e pessoas interessadas na atividade turística e Para Bertrand (1971, p. 2), a paisagem pode ser tem como objetivo principal desenvolver e integrar o entendida como “[...] o resultado da combinação turismo regional no norte do Paraná. A intenção é integrar dinâmica, portanto instável, de elementos físicos, os seus 92 municípios, implantando e ampliando a biológicos e antrópicos que, reagindo dialeticamente uns atividade turística, de forma que isso resulte em sobre os outros, fazem da paisagem um conjunto único e otimização do uso dos recursos materiais, financeiros e indissociável, em perpétua evolução”. Dessa forma, a humanos; melhoria na qualidade de vida da população; paisagem é uma combinação de elementos físicos, aumento da renda per capita, da oferta de emprego e da biológicos e antrópicos e que devem ser compreendidos agregação de valores à produção regional como um sistema dinâmico que sofre alterações (ADETUNORP, 2013). constantes e, por isso, não pode ser analisada apenas sob um único aspecto.

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Segundo Santos (1996), a paisagem se assemelha a [...] partes específicas, topograficamente delimitadas uma fotografia, na qual as formas exprimem as heranças da paisagem, formadas por várias combinações de das sucessivas relações entre homem e natureza. Já agenciamentos naturais e humanos, que ilustram a Salgueiro (2001, p. 37) comenta que: “A paisagem surge evolução da sociedade humana, seu estabelecimento e seu caráter através do tempo e do espaço e quanto na pintura em conseqüência da ruptura com a visão de valores reconhecidos têm adquirido social e teológica medieval”, o que desperta um novo interesse culturalmente em diferentes níveis territoriais, pela natureza, valorizando o “[...] território como graças à presença de remanescentes físicos que espetáculo estético”. Schier (2003) chama a atenção para refletem o uso e as atividades desenvolvidas na terra a diferenciação entre paisagem natural e a paisagem no passado, experiências ou tradições particulares, cultural. Para ele, a paisagem natural diz respeito aos ou representação em obras literárias ou artísticas, ou elementos naturais, enquanto a paisagem cultural é uma pelo fato de ali haverem ocorrido fatos históricos. construção do homem como ser cultural que cria e recria (IPHAN, 1995, p. 3). espaços. No Brasil, em 2007, foi realizado o Seminário Verifica-se, portanto, que a paisagem não é Semana do Patrimônio – Cultura e Memória na Fronteira, imutável, muito menos passiva. Ela tem dinâmica, natural no município de Bagé – RS, que resultou na elaboração e/ou induzida pelo homem e, por isso, é heterogênea e da chamada Carta de Bagé ou Carta da Paisagem, cujo possui tempos e usos diferenciados. A paisagem enquanto objetivo principal é defender as paisagens culturais em herança de tempos pretéritos ainda comporta elementos geral e, mais especificamente, do território dos Pampas e da contemporaneidade, possibilitando assim, a das paisagens culturais de fronteira (ICOMOS, 2007). coexistência de tempos diferenciados. Santos (1988) Neste documento, recomenda-se que “[...] o tombamento explica que as mudanças nas paisagens podem ser de não é o instrumento adequado para a preservação da ordem estrutural ou funcional. Dessa forma, nota-se que Paisagem Cultural, uma vez que é limitado e em geral não em determinadas paisagens, os ritmos variados que se dá diretrizes de uso e gestão” (BALDI et. al. 2012, p. 3). processam ao longo do dia, trazem novas funções, como Conforme a Carta de Bagé ou Carta da Paisagem Cultural, por exemplo, as alternações entre dia e noite em uma área de 2007, no seu Artigo 2, fica estabelecido que: rural, quando as atividades agrícolas são intensas do nascer até o por do sol e à noite, com o cessar das A paisagem cultural é o meio natural ao qual o ser atividades, só existe o silêncio e o repouso. Por outro humano imprimiu as marcas de suas ações e formas lado, as mudanças na paisagem podem ser de natureza de expressão, resultando em uma soma de todos os estrutural, quando existe uma intervenção nas formas, testemunhos resultantes da interação do homem com como, por exemplo, a construção de hotéis-fazenda, a natureza e, reciprocamente, da natureza com alterando assim, a paisagem rural. Para Almeida (2006, p. homem, passíveis de leituras espaciais e temporais. (ICOMOS, 2007, p. 2) 32):

Uma paisagem é sempre o resultado de um fluir de Em 2009, o Instituto do Patrimônio Histórico e acontecimentos sobre um determinado espaço. Esses acontecimentos são tanto de origem natural como Artístico Nacional (IPHAN) instituiu a Chancela da [...] de origem humana. Significa que na paisagem Paisagem Cultural, que esta inscrita de modo indelével a marca das acçôes das comunidades humanas que aí estiveram ou [...] não é um instrumento de proteção em si, mas viveram. sim uma outorga de valor que deve ter como base um plano geral onde poderão ser orquestrados Por toda essa conotação simbólica que a paisagem diversos instrumentos, como o próprio tombamento, possui, Rodrigues (1999, p. 47) afirma que “[...] ler a o registro, planos de desenvolvimento, a legislação ambiental e instrumentos urbanísticos (BALDI et. al, paisagem é muito mais complexo do que o ver e perceber 2012, p. 4) a paisagem. Envolve uma visão de mundo, consciente e inconsciente, sempre subjetiva e permeada pelo Verificando a importância da paisagem enquanto imaginário”. Talvez, devido a esta complexidade que formação natural e cultural, o elemento rural também se envolve o conceito de paisagem e sua interpretação, só torna essencial na análise, tendo em vista que abrange recentemente discutiu-se a necessidade de preservação elementos naturais e também culturais, através de das paisagens enquanto patrimônio histórico e cultural. atividades agrícolas, rebanhos, benfeitorias e outros Internacionalmente, esse debate teve início a partir atributos típicos do meio rural. Por ser uma atividade de 1990, com a inclusão da categoria paisagem cultural econômica que se apropria e consome espaços, o turismo pelo Comitê do Patrimônio Mundial da Organização das também se apropria do meio rural. Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura Como já mencionado, o turismo rural é um (UNESCO), em 1992 e a Recomendação Nº R (95) 9, do importante segmento da atividade e que vem se Comitê dos Ministros do Conselho da Europa em 1995, expandindo no Brasil. Por esta razão, a paisagem rural como explicam Baldi et. al. (2012). Segundo essa também pode ser compreendida como um recurso para a Recomendação, a Paisagem Cultural pode ser atividade turística, pois, é ela que confere os aspectos compreendida como: cênicos que compõe o produto turístico rural.

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Conceitualmente, a paisagem rural pode ser concebida turismo. A harmonia, o contato com a natureza e a como sensação de paz, podem se transformar em agressões ao [...] o ponto de encontro entre dois tipos de eixos, ou meio ambiente, descaracterização da cultura local, entre duas dimensões, que se desenrolam a vários níveis outros aspectos. Assim, a paisagem rural se torna algo ligados entre si: 1) uma composta pela integração artificializado e sua beleza cênica pode ser comprometida. entre a base física e biológica e a influência e Por isso, ressalta-se a importância de um planejamento construção humanas, ao longo do tempo, resultando turístico para o meio rural, que consiga proteger algumas na materialidade da paisagem, com as suas potencialidades e limitações, assim como no seu especificidades que a paisagem rural comporta, de carácter, ou identidade; 2) e uma outra composta preferência, com a colaboração das comunidades pela cadeia de relações socioeconómicas e condições inseridas no processo para que haja maiores esforços para culturais que determinam as decisões sobre a a proteção da história e modos de vida dessas localidades. paisagem; este eixo contempla aspectos que vão desde a economia global e a procura social em geral, 3 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO até às politicas e instrumentos de gestão, o contexto local e o perfil individual de quem toma decisões no Historicamente, quando chegaram à região norte quotidiano sobre a gestão ou sobre o uso da do Paraná, em 1929, o grupo de funcionários da CTNP se paisagem (PINTO-CORREIA, 2007, p. 69). estabeleceu, inicialmente, na Colônia Militar de Jatay

Porém, nem toda paisagem rural tem (atual município de Jataizinho, localizado a cerca de 80 potencialidade turística. É necessário levar em quilômetros de Londrina). Em frente à Colônia, na consideração alguns aspectos como beleza cênica, margem esquerda do rio Tibagi, ficava o Aldeamento acessibilidade, peculiaridade, historicidade etc. Por ser Indígena de São Pedro de Alcântara, coordenado pelo de subjetiva, a escolha dos elementos que irão compor uma Frei Timotheo de Castelnuovo, onde estavam os índios paisagem rural para fins turísticos, deve ser realizada e cayuás. Como explica Stier (2004), a ex- através de metodologias específicas, aliadas ao olhar Colônia Jatahy já estava instalada desde 1851 na região. crítico do profissional de turismo para identificar os O grupo da CTNP, ali comprou uma tropa de burros de melhores locais a serem visitados. carga e montaria e prosseguiram até as terras adquiridas Almeida (2006) explica que em meados do século pela Companhia, situadas a 22 quilômetros além da XX teve início um movimento de análise da paisagem que margem esquerda do rio Tibagi. se preocupava corn a sua avaliação qualitativa, ou seja, A antiga Colônia Militar de Jatay era a última procurava limitar ao máximo os componentes subjetivos localidade alcançada pela estrada, pois, do rio em diante, dessa percepção através de indicadores objetivos era necessária a abertura de picada no meio da floresta. correspondentes a variáveis quantitativas. Um dos Para servir de guia, o grupo contratou um índio e, no dia principais estudiosos dessa temática, Kevin Lynch, na 21 de agosto, os desbravadores deixaram a antiga colônia década de 1950, nos Estados Unidos, introduziu processos de Jatay e começaram a atravessar o rio, como detalha de descrição fisionômica das paisagens urbanas. Em Cavazotti (2007, s.p.):. 1968, na Grã Bretanha, K. D. Fines, propôs um método Na ausência de ponte ou balsa, os animais vão a valorativo da paisagem em que esta era avaliada como um nado, um por um. Os homens seguem de canoa: todo e a partir daí, tinha-se uma nota global, que podia enquanto uns remam, outros seguram os cabestros indicar paisagens exuberantes ou paisagens feias. dos burros. Após várias - e perigosas - travessias, os Na década de 1980, Kevin Lynch retoma os desbravadores, seus animais e mantimentos chegam estudos e propõe outra perspectiva de análise da na outra margem. A partir dali, começa a dura paisagem, dessa vez, através de pares de fotografias, caminhada até o local denominado Patrimônio Três tiradas em trechos previamente escolhidos. Seguindo essa Bocas, atual Londrina onde começavam os 515 mil mesma linha de qualificação da paisagem, A. Bailly, na alqueires comprados pela companhia - sendo 450 mil junto ao governo do Paraná, por 8.712 contos de mesma década, buscou identificar as ligações entre as réis. A viagem foi feita com grande sacrifício, em imagens mentais que os indivíduos tinham de um marcha lenta, por um caminho escuro, barrento e determinado espaço e as respectivas estruturas espaciais. cheio de tocos e buracos. Ressalta-se que em todos os casos, a subjetividade do observador também pode influenciar nas preferências Dessa forma, verifica-se que durante o trajeto entre paisagísticas, que varia de acordo com a faixa etária e o Jataizinho e Londrina, os pioneiros enfrentaram diversas grau de escolaridade, por exemplo. Até os próprios adversidades, como a fuga de animais. Cavazotti (2007) animais possuem preferências por determinados trechos explica que o caminho percorrido entre o rio Tibagi e o de paisagem (ALMEIDA, 2006). primeiro acampamento da CTNP ficou conhecido como Todo esse diferencial que a paisagem rural possui ‘‘Estrada dos Pioneiros’’(Figura 2). O local onde os em comparação às paisagens urbanas, quase como se pioneiros acamparam quando chegaram a Londrina é o fossem opostas, possibilita, portanto, que a paisagem rural atual ‘‘Marco Zero’’ da cidade que, infelizmente, também se torne um atrativo turístico. Porém, a apropriação desse se encontra em estado de má conservação na paisagem elemento pelo turismo, pode trazer alguns pontos urbana atual. negativos, assim como ocorre em outros segmentos do

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O norte do Paraná, devido ao seu processo de de possuir uma importância fundamental no processo de ocupação mais recente do que as demais regiões do ocupação de Londrina. estado, ainda é carente em ações que envolvam proteção Para isso, foram selecionados alguns pontos ao patrimônio histórico e cultural. Isso porque no Brasil, relevantes da paisagem que pudessem identificar os ainda se privilegiam ações preservacionistas para cidades elementos significativos da estrada, no sentido de consideradas “históricas”, ou seja, aquelas mais antigas e desvendar qual a sua característica mais marcante. A que fizeram parte da história nacional. Assim, os bens análise se concentrou no trecho de Londrina (Figura 3), patrimoniais de valor, estão concentrados, sobretudo, na que historicamente foi o percurso feito na chegada dos RMC, onde se localizam municípios mais antigos, como pioneiros no município antes de buscar um local efetivo apontam Colasante e Calvente (2012). de ocupação. Entretanto, levando em consideração que a região Nesse aspecto, foram feitas algumas discussões a norte do Paraná foi a pioneira no desenvolvimento do respeito de quais elementos seriam interessantes turismo rural do estado, será proposto o aproveitamento conservar para que pudesse ser considerada uma da Estrada dos Pioneiros enquanto atrativo turístico, por paisagem cênica e, eventualmente, servir para a possuir características peculiares da paisagem rural, além contemplação de observadores ou turistas, por exemplo.

Figura 2: Localização da Estrada dos Pioneiros, sentido Jataizinho-Londrina. Fonte: Google Earth (2013). Adaptado por: Colasante (2013)

Figura 3: Localização do trecho analisado, na área periurbana de Londrina, zona leste da cidade. Fonte: Google Earth (2013). Adaptado por: Colasante (2013)

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4 METODOLOGIA e. Redes de circulação: dizem respeito ao transporte de pessoas, mercadorias e matérias-primas a Como metodologia para análise da paisagem rural partir de um ponto para outro, como trilhas de gado e da Estrada dos Pioneiros, utilizou-se duas referências trilhas, estradas, canais, estradas principais, e até pistas de bibliográficas que contém diretrizes específicas para esta pouso. atividade: A) o guia The Roadscape Guid: Tools to f. Demarcações de Fronteira: delineiam as áreas Preserve Scenic Road Corridors, elaborado pela de posse e uso da terra, como uma fazenda inteira ou um Champlain Valley Greenbelt Alliance (CVGA), que intervalo aberto. Eles também separam áreas menores auxilia comunidades a conservar áreas que têm potencial com funções especiais, como um campo cercado ou curral cênico e; B) normas NRB-30, elaboradas pelo U.S. fechado. Cercas, muros, linhas de árvores, cercas, valas Department.of the Interior, National Park Service. de irrigação ou drenagem, estradas, riachos, rios e Ambos os documentos são publicados originalmente nos comumente marcado limites históricos. Estados Unidos. g. Vegetação do uso do solo: os vários tipos de Na primeira referência, The Roadscape Guide, a vegetação têm uma relação direta com os padrões análise dos elementos da paisagem foi feita levando-se em estabelecidos ao longo do uso da terra. A vegetação inclui consideração seis elementos os quais são atribuídos uma não só as culturas, árvores ou arbustos plantados para fins pontuação - de 1 a 3 -, onde o 1 indica aspectos agrícolas e ornamentais, mas também as árvores que desfavoráveis e/ou menos relevantes, até chegar no cresceram ao longo de estradas ou em campos número 3, que indica a cotação máxima na qualidade abandonados. cênica da paisagem. Os seis elementos de análise são: h. Edifícios, estruturas e objetos: elementos das I. Contraste: elementos claramente discerníveis e atividades humanas relacionados com a ocupação e uso da diferentes que coexistem na paisagem. terra. Sua função, materiais, data, condição de métodos de II. Ordem: recursos naturais e culturais que formam construção e localização, refletem o histórico de padrões de organização na paisagem. atividades, costumes, gostos e habilidades das pessoas III. Camada: sucessão de elementos da paisagem que que os construíram e usaram. proporcionam uma sensação de profundidade à paisagem. i. Agrupamento: conjunto de construções, cercas IV. Ponto focal: ponto para o qual o olho é e outras características que podem ser vistas em uma direcionado inevitavelmente para algum elemento que fazenda, rancho, ou complexo de mineração, resultado da domina a paisagem. função, tradição social, clima, ou outras influências, V. Singularidade: características que são únicas ou cultural ou natural. simbólicas da região j. Sítios Arqueológicos: locais de atividades pré- VI. Integridade: atributos naturais ou culturais que histórica ou histórica, resultantes em fundações, ruínas, permanecem praticamente inalterados ao longo do tempo. mudanças na vegetação etc. Eles podem fornecer A segunda referência metodológica utilizada que informações valiosas sobre os caminhos que a terra tem são as normas NRB-30, dize respeito às características sido utilizada, os padrões da história social, ou os das estradas rurais, baseadas em uma classificação de métodos e extensão das atividades, tais como transporte, onze elementos que contribuem para a análise da moagem, serração de madeira, ou extração. paisagem rural, bem como das forças naturais e culturais k. Elementos de pequeno porte: como uma ponte que a moldaram: rústica ou placas na estrada que contribuem para a a. Usos e atividade: os diferentes usos da terra, configuração histórica da paisagem rural. tais como agricultura, mineração, pecuária, lazer, eventos sociais, comércio ou indústria, que deixam uma marca na 5 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS OBTIDOS paisagem. b. Padrões e organização espacial: a organização Percorrendo a Estrada dos Pioneiros no trecho de da terra em grande escala depende da relação entre os Londrina, vários elementos chamam atenção com relação principais componentes físicos, relevo predominante e os à paisagem. Em primeiro lugar, a forte expansão urbana recursos naturais existentes. A organização é refletida nos na zona leste de Londrina a partir da construção da sistemas rodoviários, os padrões de campo, a distância Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), a entre fazendas, a proximidade a fontes de água e área se tornou valorizada e sofreu uma série de orientação das estruturas ao sol e ao vento. intervenções urbanas, como construção de vias de acesso c. Resposta ao Ambiente Natural: principais e de condomínios residenciais. Dessa forma, quando se características naturais, como montanhas, pradarias, rios, inicia o trajeto, o observador/turista se depara com o lagos, florestas e pastagens, que influenciam na loteamento de uma área para a construção de um localização e organização das comunidades rurais. condomínio fechado, o Parque Tauá Paysage. d. Tradições culturais: afetam a maneira com que Esse processo demandou o asfaltamento do trecho a terra é utilizada. As crenças religiosas, costumes sociais, paralelo à Estrada dos Pioneiros, o que resulta em uma identidade étnica e ofícios e habilidades podem ser hoje paisagem que comporta dois caminhos: um de terra evidentes em ambas as características físicas e usos da batida, que remete à história e aos elementos naturais e terra. outro que reflete a modernidade e o surgimento de

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elementos urbanos no espaço rural (ver figuras 4 e 5). Ironicamente, em uma das frases do slogan do empreendimento, consegue-se ler: “Faça sua história aqui”.

Figura 5: Plantão de vendas de lotes do condomínio Parque Tauá Paysage, logo no início da Estrada dos Pioneiros. Fonte: Colasante (2013)

Essa parte da paisagem também denota os Figura 4: Pavimentação de um trecho paralelo à Estrada atributos de usos e atividade, já que evidencia os dos Pioneiros, em Londrina, contrastando com a estrada diferentes usos da terra, no caso, a agricultura. Trata-se, de terra, que remonta o percurso feito pelos pioneiros. portanto, de uma paisagem utilitária, com a utilização do Fonte: Colasante (2013) solo para o plantio de cultura, onde a diversidade de cores interagindo na paisagem acaba sendo agradável aos olhos, Continuando o trajeto, o observador/turista se mesmo com a exploração da terra. Este percurso, depara com elementos de contraste, marcados pelo tom inclusive, é utilizado por ciclistas que buscam um pouco amarelado do trigo e do chão de terra vermelha e o céu de aventura na região (Figura 7) e também poderia, azul. A sinuosidade da estrada remete a um caminho futuramente, ser uma atividade oferecida aos turistas que interminável, com sensação de um labirinto de elementos realizam a Rota do Café, que contempla o Turismo Rural rurais e que nos remete a tempos pretéritos, quando os nas antigas fazendas de café da região. pioneiros tiveram que atravessar grandes percursos de difícil acesso (Figura 6).

Figura 6: Elementos de contraste na sinuosidade de uma curva na Estrada dos Pioneiros. Fonte: Colasante (2013).

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elementos de ordem e também as camadas, evidenciando os diferentes tipos de vegetação que compõe a paisagem. Os diferentes tons de verde da paisagem acabam por marcar as diferentes camadas existentes na paisagem, trazendo um contraste entre as mesmas, ao mesmo tempo em que evidenciam um ordenamento dos diversos planos de observação (Figura 9).

Figura 7: Casal de ciclistas se aventura por um dos trechos da Estrada. Fonte: Colasante (2013)

Em outro trecho da Estrada, tem-se uma ampla vista da cidade de Londrina (Figura 8). Em meio a este campo aberto, observa-se um pequeno resquício de vegetação, na qual se localiza uma fazenda, que pode ser considerada uma divisão de propriedade, conforme as características da paisagem rural estabelecidas pela norma Figura 9: Corredor de árvores, denotando atributo de NRB-30. A visão da cidade sofre uma interferência ordem na paisagem. As diferentes cores que compõe o devido às instalações da UTFPR, que contrastam com visual são elementos de contraste. Fonte: Colasante outras edificações pela sua cor em tom laranja. Com (2013) relação aos elementos de análise da paisagem, propostos no The Roadscape Guide, pode-se notar elementos de Ao longo do trajeto, observa-se uma árvore, contraste, devido à presença de elementos distintos; contrastando com a uniformidade da paisagem (Figura ordem, caracterizada por diversas camadas, refletidas nos 10). A presença desse único exemplar pode ser diferentes planos de observação: plantio de trigo, considerado um elemento de raridade/singularidade, pois, fragmento florestal e verticalização da cidade e; e é próprio dessa parte da estrada e também um ponto focal, singularidade, devido às características únicas dessa vista, pois leva o observador/turista a voltar sua visão para a que não se encontra em nenhum outro ponto da Estrada. árvore, conforme o The Roadscape Guide. Segundo Nasser (apud ALMEIDA, 2006), existe uma tendência genérica entre os observadores de paisagens a serem atraídos por elementos naturais, como a visualização de copas de árvores. Assim, este é um dos elementos que, possivelmente, poderá atrair a atenção de um público amplo.

Figura 8: Neste ponto, é possível observar o contraste da paisagem rural, que ainda apresenta resquícios de fragmento florestal, com a paisagem urbana, marcada pela intensa verticalização, ao fundo. Fonte: Colasante (2013)

No ponto seguinte, o observador/turista se depara com uma seqüência de árvores, contrastando com a Figura 10: A presença de uma única árvore nesse ponto uniformidade do primeiro plano. Pela presença das do trajeto evoca um atributo de singularidade e também árvores de forma ordenada, consideram-se relevantes os um ponto focal. Fonte: Colasante (2013)

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O próximo ponto analisado é uma curva da Ao final do trecho da Estrada dos Pioneiros na área Estrada, na qual se pode observar interferência da ação periurbana de Londrina, observa-se a linha férrea que humana, através da construção de postes da rede elétrica e passa por Ibiporã (Figura 12), município limítrofe de do uso e atividade do solo, com a plantação de trigo Londrina. Segundo as normas NRB-30, pode ser (Figura 11). A presença de diferentes elementos em um classificado com uma paisagem com presença de redes de único ponto e que leva a uma curva no fim da estrada, circulação (no caso, a linha férrea), que remetem ao leva o observador/turista a instigar sua imaginação, transporte de pessoas, mercadorias e matérias-primas a tentando desvendar o que pode ser encontrado mais partir de um ponto para outro, além de apresentar adiante do trajeto. elementos singulares (próprios da região). Com a realização desse trajeto breve focado no trecho de Londrina, o observador/turista consegue fazer uma volta à história, através do processo de colonização de Londrina confrontando com a paisagem dos dias atuais. Verifica-se que, em vários trechos, a Estrada dos Pioneiros desaparece em virtude da expansão urbana e a terra vermelha, característica do norte do Paraná, cede lugar ao asfalto. Justamente para mostrar o resquício do que ainda pode ser considerado como paisagem rural, foi escolhido o trecho que contempla a área rural de Londrina. Entretanto, alterações urbanas recentes, como a construção de um condomínio fechado na região, poderão comprometer a preservação da estrada neste trecho específico. Embora Londrina não seja, em termos funcionais, voltada para a atividade turística, recentemente, este Figura 11: Neste trecho, a paisagem rural sofre a potencial tem sido discutido e culminou com a interferência de atividades antrópicas, marcada pelo uso consolidação da Rota do Café, cuja temática envolve o agrícola e pela instalação de postes de energia elétrica. patrimônio histórico deixado por antigas fazendas de café Fonte: Colasante (2013) na região.

Figura 12: O final do trajeto analisado é marcado por uma rede de circulação. Fonte: Colasante (2013)

Pela ênfase no caráter rural que está sendo município de Rolândia, a Estrada de Coroados, na zona colocada em discussão para o desenvolvimento do Sul de Londrina e a própria Estrada dos Pioneiros que, turismo nesta região, poderiam ser aproveitadas algumas mesmo contendo uma importância histórica, vem sendo paisagens rurais que contribuíssem para o fomento desse destruída através de impactos ambientais, como produto turístico, como a Estrada de São Rafael, no devastações e lixo acumulado ao longo do trajeto.

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Com a presença de várias fazendas na região, históricos, seja pelo fluxo de veículos, pavimentação, poderiam ser realizadas parcerias com a Rota do Café verticalização e/ ou desmatamento. Por isso, seria para que esse percurso fosse contemplado e, com isso, interessante um planejamento que contemplasse as rotas poderiam ser realizadas ações efetivas de planejamento históricas da região, não só visando seu aproveitamento turístico para a conservação da Estrada dos Pioneiros, já turístico, mas, principalmente como forma de conservar a que não é somente no trecho de Londrina que vem identidade cultural da população local. ocorrendo a omissão, mas em vários trechos, a Estrada Pensar na conservação das paisagens culturais que, na essência, era rural, se tornou urbana, com a envolve uma série de discussões, especialmente, quando descaracterização total desse importante elemento da se tem o desenvolvimento econômico como prioridade. A história da região. manutenção das estradas rurais e seus elementos singulares contribuem para a proteção da memória e do 6 CONCLUSÕES patrimônio histórico-cultural. Importante destacar que muitos outros atributos da O artigo demonstrou, através de discussões paisagem rural na Estrada dos Pioneiros podem ser teóricas, a importância da paisagem rural como atrativo utilizados como elementos de atratividade para o turismo turístico. Ao compreender o processo de ocupação rural, ou seja, a potencialidade não se esgota apenas com territorial do Paraná e, posteriormente, o norte do Paraná, os pontos selecionados nessa pesquisa, que se concentrou possibilita relacionar os vários ciclos econômicos com a no trecho de Londrina, a fim de ressaltar a importância e a ocupação dos municípios. Os recentes processos urgência em se efetivar ações que visem à sua integridade, estruturais que o meio rural brasileiros vem passando, no sentido de manter viva a memória do trajeto que os contribuiu para a emergência de novas atividades pioneiros fizeram quando chegaram para ocupar o econômicas que pudessem dinamizar a economiza rural, município na década de 1920. especialmente, dos agricultores familiar. Nos pontos analisados, o que mais se notou a No bojo dessas transformações, destaca-se o ausência foi o elemento de integridade, caracterizado pela turismo rural que, inicialmente, desenvolvido em Santa presença de atributos naturais ou culturais que Catarina, se disseminou por todo o país, gerando fonte de permanecem praticamente inalterados ao longo do tempo, renda e emprego para as famílias no campo. Dentre os segundo orientação do The Road Scape Guide. Pelo fato vários atrativos que o meio rural oferece, destacou-se a de ser uma estrada que remonta às origens de colonização paisagem rural, pois, ela fornece os elementos necessários do município de Londrina, é importante destacar que em para a composição da história e das características nenhum ponto percorrido, existe a conservação de peculiares do meio rural. elementos históricos, pelo contrário. Excetuando a estrada Essa paisagem rural comporta as várias fases de de terra, os demais elementos da paisagem estão desenvolvimento do meio rural, conservando partes do descaracterizados. meio natural e do meio cultural e que, por isso, devem ser Como já se discutiu, a interpretação da paisagem é concebidas como um patrimônio histórico e cultural. subjetiva e mesmo levando em consideração Nesse entendimento, a paisagem como simples metodologias específicas, cabe ao planejador de turismo instrumento de contemplação, torna-se um bem ter o discernimento de escolher os elementos principais patrimonial de grande valor para a comunidade local e que podem contribuir para a contemplação do turista, também para os turistas. sendo, portanto, esta análise, apenas uma contribuição ao Como acumulação de tempos e de diferentes usos, estudo da paisagem rural. Dessa forma, a importância a paisagem acaba portando um sentido cultural muito histórica desse percurso não se reflete na atualidade, forte, como a paisagem rural da Estrada dos Pioneiros, marcada pelo descaso, inclusive, com a falta de objeto de estudo da pesquisa. Entretanto, cabe enfatizar sinalizações indicando os principais pontos da estrada e que muitos elementos históricos na região não são da falta de projetos que visem à proteção da Estrada valorizados nem como uma questão educacional para a enquanto patrimônio histórico da região população (que até desconhece a importância da Estrada dos Pioneiros), muito menos como recurso turístico. REFERÊNCIAS Na verdade, essa destinação da paisagem à utilização de atividades agrícolas é uma constante no país ADETUNORP. Turismo Rural. 2013. Disponível em: e seu uso enquanto contemplação cênica ainda é recente. . Acesso região, a Estrada dos Pioneiros deveria, pelo menos conter em: 29 ago. 2013. algumas placas interpretativas que indicassem o caminho e ressaltassem alguns aspetos importantes para o ALMEIDA, Campar António. Paisagens: um património observador, como o possível local de travessia que os e um recurso. O Interior Raiano do Centro de pioneiros utilizaram para cruzar o Tibagi ou do Portugal: outras fronteiras, novos intercâmbios, Aldeamento de São Pedro de Alcântara. Iberografias, 8. C:E.I., Guarda. 31 - 42. Conforme ocorre a expansão urbana, muitos desses pontos acabam perdendo seus valores cênicos e também

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O FORTALECIMENTO NA ESTRUTURA DA AGRICULTURA FAMILIAR ATRAVÉS DA DIVERSIFICAÇÃO DE CULTURAS AGRONÔMICAS: UMA ANÁLISE PARA O ESTADO DE MS

FABIANO GRETER MOREIRA ERLAINE BINOTTO CLANDIO FAVARINI RUVIARO

Universidade Federal da Grande Dourados - UFGD Faculdade de Administração, Ciências Contábeis e Economia - FACE Programa de Pós-Graduação em Agronegócios – Dourados - MS [email protected] /{ErlaineBinotto, ClandioRuviaro}@ufgd.edu.br

RESUMO - O fortalecimento na estrutura da Agricultura Familiar, por meio da diversificação de culturas agronômicas no campo, propicia formas diversificadas de produção e receitas contínuas, haja vista que, esse cenário apresenta potencialidades econômicas e sociais impactantes na geração de renda e comercialização de alimentos no país, se apresentando de suma importância para o desenvolvimento local e/ou regional dessa prática. Dessa forma, esta pesquisa sugere-se medidas de diversificação de culturas enquanto estratégias para o desenvolvimento e o fortalecimento da Agricultura Familiar no Estado de Mato Grosso do Sul. Apresenta como método de pesquisa o estudo bibliográfico de caráter exploratório. Os principais resultados e discussões apontam a importância da diversificação de culturas agronômicas para o fortalecimento da Agricultura Familiar, empreendendo novas técnicas e formas de produção, gerando renda e participação no agronegócio local e/ou regional tanto para os produtores quanto para o contexto sócio espacial em que estão inseridos.

Palavras-chave: Desenvolvimento Local, Geração de Renda, Produção de Alimentos.

ABSTRACT - Strengthening Family Agriculture in the structure , through diversification of agronomic crops in the field , provides diversified forms of production and continuous revenue , given that this scenario presents potential economic and social impacting on income generation and marketing of food in the country , performing of paramount importance for local development and / or regional this practice . Thus , this research suggests are measures of crop diversification as strategies for the development and strengthening of family farming in the state of Mato Grosso do Sul presents as a research method to study literature and exploratory . The main results and discussions show the importance of diversification of agronomic crops to strengthen family agriculture , undertaking new techniques and forms of production , generating income and participation in local agribusiness and / or regional level both for producers and for the socio spatial that are inserted.

Key-words: Local Development, Income Generation, Food Production.

1 INTRODUÇÃO produções, viabilizando ainda mais a propriedade rural e a diversificação de renda de suas famílias. Este trabalho tem por objetivo apresentar aos Desse modo, objetiva-se sugerir novas técnicas e atores da Agricultura Familiar as potencialidades na práticas de diversificação de culturas agronômicas diversificação de culturas para o fortalecimento da voltadas ao fortalecimento na estrutura da Agricultura estrutura no campo, onde produtores e produtoras tenham Familiar, contribuindo para o desenvolvimento local e/ou condições de renda de forma diversificada e contínua, regional no Estado de Mato Grosso do Sul - MS. Para possibilitando as suas permanências na propriedade, de tanto, o trabalho estrutura-se em uma breve introdução, forma a contribuir para o desenvolvimento local de suas seguido da revisão teórica com o intuito de demonstrar,

F. G. MOREIRA; E. BINOTTO; C. F. RUVIARO ISSN 2176-9052

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primeiramente, importantes aspectos que denotam a originada dessas atividades; e o estabelecimento ou Agricultura Familiar e, em seguida, algumas formas de empreendimento deverá ser dirigido pela família. culturas e maneiras de diversificação de produção no De acordo com o Instituto Nacional de campo, tais como: produção orgânica e agroecológica, Colonização e Reforma Agrária – INCRA (2011), a integração lavoura-pecuária-floresta – ILPF, rotação de Reforma Agrária é o conjunto de medidas para promover culturas e mercados e agregação de valores na a melhor distribuição da terra, mediante modificações no comercialização de produtos, utilizando o método de regime de posse e uso, a fim de atender aos princípios de estudo bibliográfico em caráter exploratório. justiça social, desenvolvimento rural sustentável e Como resultados e discussão apresentam-se, à aumento de produção. Essa concepção é estabelecida pelo Agricultura Familiar, algumas alternativas em termos de Estatuto da Terra (Lei nº 4504/64). Na prática, a Reforma diversificação de culturas agronômicas, as quais Agrária proporciona, dentre outras coisas, uma possibilitam capitalizar e empreender novas técnicas e democratização da estrutura fundiária, melhoria na renda formas de produção, gerando renda e participação no das famílias, redução da migração e promoção da agronegócio local, desenvolvendo a permanência do cidadania. homem/mulher no campo, bem como a produção de O que se busca com a Reforma Agrária, alimentos para a sociedade. atualmente desenvolvida no país, é a implantação de um novo modelo de assentamento, baseado na viabilidade econômica, na sustentabilidade ambiental e no 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA desenvolvimento territorial; a adoção de instrumentos fundiários adequados a cada público e a cada região; a adequação institucional e normativa a uma intervenção Diante do cenário da Agricultura Familiar rápida e eficiente dos instrumentos agrários; o forte conciliado às atividades agrícolas, os recursos naturais e à envolvimento dos governos estaduais e das prefeituras; a permanência do homem ao campo, sugerem-se a garantia do reassentamento dos ocupantes não-índios de diversificação de culturas agronômicas na geração de áreas indígenas; a promoção da igualdade de gênero na novas fontes de renda, a qual se torne atraente à estadia Reforma Agrária, além do direito à educação, à cultura e à dos produtores, contribuindo para o desenvolvimento seguridade social nas áreas reformadas (INCRA, 2011). local e participação econômica e social no meio em que Segundo Wanderley (1999), para se caracterizar estão inseridos. Nessa perspectiva, esta revisão sob o ponto de vista da Agricultura Familiar, a família, bibliográfica abarca uma análise dos aspectos além de ser proprietária dos meios de produção, deverá concernentes à Reforma Agrária e á Agricultura Familiar, assumir também o trabalho no estabelecimento produtivo. que envolvem a produção orgânica, a integração lavoura- Esta concepção incorpora desde o campesinato tradicional pecuária-floresta, a rotação de culturas e a agregação de até a ideia de produtor familiar moderno. De acordo com valores em comercialização de produtos, com especial Guanziroli et al. (2001), a Agricultura Familiar não deve destaque para o Estado de Mato Grosso do Sul – MS. ser definida a partir do tamanho do estabelecimento. Estes autores partem de um conceito mais geral, em que algumas condições precisam ser simultaneamente 2.1 Reforma Agrária e Agricultura Familiar atendidas, como: a direção dos trabalhos que deve ser exercida pelo produtor e o trabalho da família deve ser A Reforma Agrária em um país como o Brasil superiores ao trabalho contratado (terceiros). Percebe-se apresenta-se, segundo Martins (2003), como um processo que, mesmo aqueles que não são proprietários da terra, de distribuição e redistribuição de terras e de correção como os arrendatários, os parceiros e os posseiros, podem cíclica da estrutura fundiária concentracionista, centrado ser caracterizados como agricultores familiares. num projeto político e social de fortalecimento e expansão De maneira análoga ao modelo proposto pelo da Agricultura Familiar, fator que ampliará sua Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura viabilidade, diversificando e multiplicando os Familiar - PRONAF, Altmann (2002) preconiza o mecanismos de acesso a terra. conceito de Agricultura Familiar de forma mais detalhada, O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - em que: IBGE (2006) apresentou, pela primeira vez, informações sobre a atividade econômica realizada pela agricultura e Agricultor familiar é aquele que explora pelos empreendimentos familiares rurais no país, assim parcela da terra na condição de proprietário, considerados os que atendem, simultaneamente, aos assentado, posseiro, arrendatário ou critérios definidos pela Lei n° 11.326, de 24 de julho de parceiro, e atende simultaneamente aos 2006, dentre os quais: a área do estabelecimento ou seguintes quesitos: utiliza o trabalho direto, empreendimento rural que não deve exceder quatro seu e de sua família, podendo ter, em módulos fiscais; a mão de obra utilizada nas atividades caráter complementar, até dois empregados econômicas desenvolvidas é predominantemente da permanentes e contar com ajuda de própria família; a renda familiar deve ser exclusivamente terceiros, quando a natureza sazonal da atividade agropecuária o exigir; não

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detenha, a qualquer título, área superior a contrário, só existe mediante contextos gerados como quatro módulos fiscais, quantificados articulação de um conjunto de elementos que permitem a segundo a legislação em vigor; tenha, no permanência dos mecanismos de reprodução social e mínimo, 80% da renda familiar bruta anual ecológica de um ambiente. originada da exploração agropecuária, Para Altieri (1989), a Agroecologia é a ciência pesqueira e/ou extrativa; resida na ou a disciplina científica que apresenta uma série de propriedade ou em aglomerado rural ou princípios, conceitos e metodologias para estudar, urbano próximo (ALTMANN, 2002, p. 07). analisar, dirigir, desenhar e avaliar os agroecossistemas, com o propósito de permitir a implantação e o O agricultor familiar utiliza do seu trabalho e de desenvolvimento de estilos de agricultura com maiores sua família na produção de alimentos e/ou criação de níveis de sustentabilidade, proporcionando bases animas, podendo residir na propriedade ou próximo a ela, científicas para apoiar o processo de transição para uma de acordo com a dimensão de quatro módulos ficais. agricultura sustentável nas mais diversas denominações. De acordo com a Organização das Nações Sintetiza Guzmán, através de Melão (2010), que Unidas para a Alimentação e a Agricultura - FAO e o a Agroecologia é uma ciência para o desenvolvimento INCRA (1994), o modelo familiar teria como rural, constituindo o campo de conhecimento que características peculiares a relação íntima entre trabalho e promove o manejo ecológico dos recursos naturais, gestão, a direção do processo produtivo conduzido pelos através de formas de ação social coletiva que apresentam proprietários, a ênfase na diversificação produtiva, na alternativas à atual crise da modernidade, mediante durabilidade dos recursos e na qualidade de vida, a propostas de desenvolvimento participativo desde os utilização do trabalho assalariado em caráter âmbitos da produção e da circulação alternativa de seus complementar e a tomada de decisões imediatas, ligadas produtos, pretendendo estabelecer formas de produção e ao alto grau de imprevisibilidade do processo produtivo. de consumo que contribuam para encarar a crise ecológica A Agricultura Familiar no Estado de Mato e social e, deste modo, restaurar o curso alterado da co- Grosso do Sul representa cerca de 0,9410% dos evolução social e ecológica. Sua estratégia tem uma estabelecimentos no Brasil e cerca de 1,48% da área de natureza sistêmica em torno à dimensão local, onde se Agricultura Familiar comparada a média do país, dados encontram os sistemas de conhecimento portadores do que potencializam a importância da Agricultura Familiar potencial endógeno e sociocultural. no desenvolvimento local (IBGE, 2006). Ao descrever a Para Padovam (2006), o termo agroecologia Reforma Agrária e a Agricultura Familiar, a seguir serão deixa de ser compreendido apenas como uma disciplina apresentadas algumas das diversas formas de científica que estuda os agroecossistemas, como diversificação de culturas agronômicas para o defendido por alguns estudiosos do assunto. Trata-se mais fortalecimento na estrutura da produção no campo. de uma prática agrícola propriamente dita, abrigando alguns dos componentes de cada corrente alternativa, sem 2.2 Produção Orgânica e Agroecológica cunho religioso e espiritual, envolvendo os componentes sociais, ecológicos, econômicos e culturais no processo Na década de 80 surgiu a Agroecologia, que se produtivo, garantindo a sustentabilidade do sistema pode dizer que se trata de uma ciência multidisciplinar, produtivo e a manutenção da família na propriedade rural. orientada nas práticas de atividades agrícolas e criações Melão (2010) cita que a agricultura orgânica tem, de animais diversificados, que tem por finalidade buscar a em sua fundamentação teórica a partir de seu criador Sir harmonia com os recursos naturais, privilegiar a Albert Howard (HOWARD, 1947), a concepção de que o biodiversidade nos ambientes agrícolas, promover a solo é o elemento fundamental para o crescimento das inclusão social, resgatar valores culturais das famílias e plantas e que, portanto, a conservação da fertilidade buscar a viabilidade econômica da propriedade. assume importância para o desenvolvimento de uma Segundo Caporal (2001), o modo industrial de agricultura permanente. Conhecê-lo, em todos os seus uso de recursos naturais foi substituindo as formas de aspectos, inclusive a forma como ocorre o manejo da manejo (camponesas) tradicionais, vinculadas às culturas fertilidade do solo na natureza para poder intervir locais, de maneira que o contexto social, tecnológico e minimamente nesse meio através de uma atividade administrativo, como nova forma de gestão, atuou como agrícola, é o grande desafio para quem se inicia na mecanismo homogeneizador que programou, de forma produção de produtos orgânicos. paulatina, um modo de vida moderno, hostil e dissolvente De acordo com Altieri e Nicholls (2003), a das formas de relação comunitária existentes nas Agricultura Orgânica refere-se a um sistema de produção, comunidades rurais, onde os valores de uso sempre cujo objetivo é manter a produtividade agrícola, evitando prevaleciam sobre os valores de troca. ou reduzindo significativamente o uso de fertilizantes Gliesmann (2000) afirma que as relações entre sintéticos e pesticidas. A filosofia original que guiou este sustentabilidade e desenvolvimento rural sustentável se tipo de agricultura enfatizava o uso de recursos fazem importante, ao precisar as conceituações do ponto disponíveis ou próximos da propriedade agrícola, de de vista agroecológico. Assinala ainda que a recursos internos e com participação de energia solar e sustentabilidade não é um conceito absoluto, mas, ao eólica, controle biológico de pragas, fixação biológica de

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nitrogênio e outros nutrientes liberados pela formas consistentes de proteção do solo e de ciclagem de decomposição da matéria orgânica ou oriunda da reserva nutrientes, os quais contribuem para a fertilidade da terra, mineral do solo e de aspectos de controle biológico de para o combate à degradação de pastagens, e para a pragas, plantas daninhas e doenças. interrupção da biodiversidade de pragas e doenças no Em seguida é apresentado o sistema de campo. integração ILPF, que compreende a exploração simultânea de criações de animais, cultivos agrícolas e 2.4 Rotação de Culturas espécies arbóreas, na mesma propriedade rural, integrada à produção agroecológica e orgânica. A rotação de culturas é uma maneira de manejo do solo, que auxilia na ciclagem de nutrientes, na oferta 2.3 Integração Lavoura, Pecuária e Floresta – ILPF permanente de materiais orgânicos, na proteção do solo, na maior produção de palhada e no acúmulo mais elevado A integração lavoura-pecuária-floresta caracteriza de umidade, promovendo a interrupção da biodiversidade formas de uso da terra e exploração de plantas combinada de pragas e doenças e proporcionando um equilíbrio intencionalmente de espécies de árvores e arbustos nutricional e biológico das áreas cultivadas. (frutíferas, madeireiras, oleaginosas) com cultivos De acordo com Silveira e Stone (2003), cultivos agrícolas e/ou criações de animais de forma simultânea ou contínuos das mesmas espécies, como acontecem nas ao longo do tempo. monoculturas convencionais, podem ocasionar, com o Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e passar dos anos, a queda na produtividade no campo. Tal Abastecimento – MAPA (2009), a integração lavoura- fato ocorre porque se alteram as características do solo e pecuária-floresta - ILPF permeia diferentes sistemas as condições do ambiente se tornam propícias à produtivos de grãos, fibras, madeira, carne, leite e multiplicação de pragas e doenças. A maneira para se agroenergia implantados na mesma área, em consórcio, solucionar ou atenuar esses problemas é a prática de em rotação ou em sucessão. Essa integração envolve o rotação de culturas, a qual, pela inclusão de espécies com plantio de árvores, de grãos e de forragens para a sistema radicular vigoroso e pelos aportes diferenciados recuperação de pastagens. O plantio de lavouras em áreas de matéria seca, pode alterar as propriedades físicas e de pastagens degradadas é uma fórmula usada há muitas químicas do solo. A intensidade da alteração depende do décadas pelos produtores rurais para recuperar a período e do número de cultivos por ano e das espécies a capacidade produtiva dos pastos e dos solos. Com o serem cultivadas. avanço da tecnologia no campo, essa prática se Segundo Calegari (Embrapa, 2001), os diversos modernizou e vem sendo executada com a adoção de sistemas agroecológicos contingenciados em termos de técnicas combinadas que geram altas produtividades. clima e de solo em diferentes regiões brasileiras têm Uma dessas técnicas é o plantio direto, que proporciona o mostrado que o uso de plantas de cobertura nem sempre é desenvolvimento de uma agricultura conservacionista, em efetuado de forma compatível com adequadas sequências especial para as regiões tropicais. de culturas. Na maioria das vezes isso é devido, em parte, Os pesquisadores Trecenti et al do MAPA pela falta de informações e experiências regionais (2009) comentam ainda que a ILPF, aliada às práticas comprovadas – nas regiões dos Cerrados e outras áreas conservacionistas como o Sistema Plantio Direto – SPD, é mais recentes de exploração agrícola, normalmente isso uma alternativa econômica e sustentável para recuperar tende a ocorrer com mais frequência. Além disso, o autor áreas de pastagens degradadas. Em paralelo a isso, explicita ainda que o próprio desconhecimento por parte estudos técnico-científicos e experiências de produtores dos produtores das melhores opções de rotação ou, em mostram que a implantação da ILPF resulta em muitos casos, pela não disponibilidade de sementes de importantes benefícios econômicos, ambientais e sociais. plantas de cobertura (adubos verdes) de origem idônea Na Integração ILPF estabelece-se o cultivo da podem contribuir para o agravamento desse processo. espécie florestal com espaçamento ampliado em Outro importante aspecto considerado como entrelinhas, possibilitando a implantação de uma cultura limitante ao uso da rotação de culturas diz respeito ao de interesse comercial na região, como soja, milho, feijão, pensamento do produtor rural de avaliar somente os sorgo, girassol, mandioca, dentre outros, por dois a três resultados de uma safra isolada e não o sistema como um anos. Conciliar o meio ambiente com a valorização do todo, além da não observação detalhada dos efeitos homem, aumento da produção e viabilidade econômica da favoráveis da rotação de culturas no solo e, atividade agropecuária, é uma proposta da Integração principalmente, ao longo do tempo na racionalização do Lavoura-Pecuária-Floresta, uma estratégia de produção uso dos insumos. agropecuária sustentável, consistindo na diversificação e Assim, nos estudos de Calegari (2001), integração dos diferentes sistemas produtivos, agrícolas, realizaram-se levantamentos de sistemas de rotação de pecuários e florestais, dentro de uma mesma área, em culturas no Estado de Mato Grosso do Sul, os quais cultivo consorciado, em sucessão ou rotação, de forma indicam algumas culturas, dentre elas: nabo que haja benefícios para todas as atividades. forrageiro/milho, aveia preta/soja, trigo/soja. Comenta Diante da integração ILPF e do manejo integrado ainda que, para áreas onde ocorram nematóides de cisto, de culturas e criações será compreendido a seguir uma das sugerem-se: aveia ou milheto/algodão, aveia ou

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milheto/soja (tolerante ao nematóide), milheto/soja, aveia Além disso, as pastagens favorecem o aumento ou milheto/algodão, aveia ou milheto/soja (tolerante ao da matéria orgânica do solo e ajudam no controle da nematóide), nabo forrageiro/milho, que melhor adaptam erosão, devido à cobertura e proteção que proporcionam as condições ambientais. ao solo. Com possibilidades de boas práticas ao uso do Para Altmann (2001), o imediatismo da solo, podendo gerar maiores ganhos de produção, isso agricultura brasileira, fruto da precária política agrícola remete à comercialização de produtos, bem como aos aliado à insistência no preparo convencional do solo com mercados potenciais e agregação de valor, de acordo com gradagens, tem contribuído sensivelmente para a caótica as necessidades locais de cada região, as quais situação financeira em que se encontram muitos possibilitam maior rentabilidade no campo. produtores brasileiros. Comenta ainda que existem muitos produtores que sempre se preocuparam com a 2.5 Mercados e Agregação de Valor na continuidade do processo produtivo, através da rotação de Comercialização de Produtos culturas com culturas não hospedeiras ou resistentes e com um manejo adequado do solo. Logo, segundo o A busca por alimentos frescos, presumivelmente autor, o esquema de rotação pode ser assim composto: cultivados sem ou com uso menos intensivo de defensivos pastagem/soja/milho safrinha ou aveia- agrícolas e preços mais acessíveis, são os atrativos que preta/soja/braquiária, a aveia pode ser pastejada uma ou levam muitos consumidores a preferirem as feiras livres e duas vezes. Também poderá ocorrer da pastagem retornar os mercados tradicionais, atestam os estudos de Rocha et logo após a colheita da soja ou mesmo pouco antes desta, al (2010). Além disso, as feiras que normalmente ocorrem podendo então ser pastejada durante o período de outono- em áreas abertas são os locais onde os produtores, inverno. Se o objetivo é manter altos níveis de lotação geralmente pequenos agricultores, comercializam animal, um ano e meio poderá ser o suficiente para o principalmente frutas e hortaliças. Contudo, o elevado e o retorno do cultivo da soja. crescente volume de hortifrutigranjeiros1 ofertados à Em contraponto, Salton, Fabrício e Hernan população mostram que as quantidades consumidas ainda (Embrapa, 2001) ressaltam que, na Região Centro-Oeste, são insuficientes para atender às necessidades do corpo, a principal espécie de pastagem perene utilizada na representando menos da metade das necessidades rotação com lavoura é a Brachiaria Decumbens, devido à nutricionais diárias. facilidade de dessecação e semeadura direta. Também Para Maluf (2004), o caminho mais adequado, podem ser utilizadas outras espécies como a Brachiaria embora não o único, são as iniciativas autônomas dos Brizantha e o Panicum Maximum cv. Tanzânia. Na produtores de elaborar ou de processar a matéria-prima sucessão às culturas de verão são indicadas espécies agrícola, de forma individual ou associativa. Nos projetos anuais, tais como: aveia, sorgo forrageiro e milheto, que associativos, coloca-se a importância de preservar fornecem forragem para o período outono/inverno. Os vínculos estreitos entre a produção da matéria-prima autores supracitados comentam ainda que os benefícios da agrícola e a atividade de agregação de valor à mesma, integração para o produtor são o aumento da pois o maior ganho gerado pela última pode dar origem a produtividade e do lucro da atividade, com maior processos de diferenciação econômica entre os estabilidade de renda devido à produção diversificada, agricultores envolvidos. O mesmo autor afirma ainda que que reduz a vulnerabilidade provinda dos efeitos do a valorização de produtos com atributos diferenciados de clima. qualidade cria novas oportunidades de mercado, muitas Para a pastagem com a utilização de fertilizantes das quais acessíveis aos agricultores de pequeno e médio e corretivos nas atividades agrícolas, resíduos dos portes. As novas oportunidades incluem desde a inserção elementos utilizados poderão permanecer no solo desses agricultores em mercados de nicho nacionais e contribuindo para o aumento da fertilidade, e no sentido internacionais, como se verifica nos produtos artesanais, da sucessão a culturas anuais (principalmente com em nichos com denominação de origem e orgânicos, até o leguminosas), as pastagens permitem ganhos de peso aprimoramento dos circuitos regionais de produção, vivo/hectare superiores a 500 kg/ano. Sendo realizada a distribuição e consumo de alimentos. adubação de manutenção e adequações no manejo da No que se refere aos fatores dentro da porteira, as pastagem, a produtividade poderá manter-se próxima opções de estratégia de inserção nos distintos mercados àquele nível. dependem da disponibilidade de recursos e implicam as A lavoura recebe vários benefícios, devido o distintas combinações dos recursos produtivos disponíveis sistema radicular das gramíneas ser bastante desenvolvido, atingindo maiores profundidades e por 1 Pequeno, médio ou grande produtor/agricultor que explorar um volume maior de solo que as culturas de trabalha ou produz em propriedades rurais espécies de grãos, ocorrendo maior reciclagem de nutrientes, origem vegetal como as hortaliças e legumes, frutas das favorecendo o aumento da atividade biológica e o mais variadas espécies como laranja, limão, banana, melhoramento das características físicas do solo. abacaxi, etc. Poderá ainda pode ter criação de alguns Ademais, o uso de pastagens intercaladas com lavouras animais como frangos, porcos, etc. ou mesmo a também reduz a incidência de pragas e a ocorrência de apicultura. Disponível em: doenças. http://www.dicionarioinformal.com.br/hortifrutigranjeiro/.

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no interior das unidades familiares, com predominância O mesmo autor comenta ainda que, para a de combinação entre o cultivo de grãos e criação animal Agricultura Familiar, os mercados, se bem gerenciados, (carnes e leite), com variações regionais que se representam alternativas interessantes de acrescentam os hortícolas (verduras e legumes) e as desenvolvimento, como unidades de produção agrícola frutas, que, em alguns casos, podem integrar o núcleo familiar, que podem explorar melhores nichos baseados principal dos cultivos comerciais. O desenvolvimento dos em apelos na produção de produtos mais naturais e projetos de agregação de valor as matérias-primas saudáveis e ecologicamente corretos. No entanto, como agrícolas e as novas formas de inserção nos mercados em qualquer processo de diferenciação de produtos, é fazem-se, em geral, de forma gradativa, sem romper, necessário que o produtor seja capaz de garantir, via imediatamente, as relações comerciais preexistentes, normas e procedimentos preestabelecidos, que esta principalmente àquelas tradicionalmente mantidas com as produção mantenha os atributos de qualidade vendidos ao cadeias integradas através do cultivo comercial de grãos e consumidor. da pecuária leiteira presentes na maioria das unidades O atendimento aos mercados e a agregação de familiares, segundo bem afirmou Maluf (2004). valor aos produtos do campo, parte da premissa que, o De acordo com Araújo (2010), o Brasil ainda é agricultor possua acesso a ferramentas de gestão da um país exportador de matéria-prima e de bens qualidade, planejamento e controle da produção, logística intermediários ou não acabados, possibilitando maior de distribuição, controle de custos, marketing e agregação de valores fora do país, altamente competente relacionamento com os consumidores, lhe garantindo na produção dentro da porteira. No entanto, deixa de condições de análise de produção no campo e mercado ganhar mais, por não agregar valor aos produtos. consumidor. Entretanto, autores ainda se posicionam de maneira que o ponto de convergência está na organização e conhecimento. 3 METODOLOGIA Segundo Wilkinson (2011), os processos de reconversão espontânea que ainda existem para que os agricultores utilizem seus atuais conhecimentos O método utilizado nessa pesquisa refere-se ao tecnológicos e organizacionais reorganizam a sua estudo bibliográfico de caráter exploratório. Sendo assim, estrutura produtiva para alcançar uma integração efetiva busca-se, com o estudo bibliográfico, levantar dados com os mercados dinâmicos no contexto brasileiro. O relevantes sobre a temática abordada nesse estudo, autor salienta que o Brasil ainda está em uma fase de mediante a contemplação de artigos, livros, autores, transição para uma dieta proteica e, grande parte da pauta dissertações/teses, periódicos especializados, acervos de produtiva sobre a qual a produção familiar tem domínio bibliotecas e bases de dados de ordem acadêmica e de tecnológico e conhecimento acumulado, constitui organizações governamentais e não governamentais mercados ainda muito dinâmicos no Brasil numa vinculados diretas e/ou indiretamente à temática abordada conjuntura de crescimento. Para uma parte importante da nessa pesquisa. produção familiar, a renda gerada na produção de leite Os levantamentos de informações e de dados tem funcionado como a âncora do orçamento, mantendo a atualizados visam apresentar alternativas para o viabilidade dessa produção. fortalecimento na estrutura da Agricultura Familiar, Os mercados para Batalha et al (2004) são um através da diversificação de culturas agronômicas no desafio importante para os agricultores familiares, uma Estado de Mato Grosso do Sul, com o objetivo de sugerir vez que a estabilização de padrões de qualidade exigida novas técnicas e práticas de produção, contribuindo para a pelos mercados relevantes pressupõe a adoção de geração de renda e permanência do homem ao campo. tecnologias e procedimentos que, em muitos casos, não são compatíveis, pelo menos em curto prazo, com as condições gerais dos agricultores familiares. Desta 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO maneira, para os agricultores familiares, trata-se de adotar tecnologias de produto, bem como o processo e gestão que reconheçam esta variabilidade e a valorizem da São apresentados como resultados do trabalho, as melhor forma possível no mercado. Ferramentas diversas formas e possibilidades de diversificação de apropriadas de gestão da qualidade e de planejamento e culturas agronômicas, que podem acrescentar na geração controle da produção, que padronizem normas e de renda aos produtores de maneira sustentável, criando procedimentos internos e externos das propriedades de condições atrativas no campo, contribuindo para o uma dada rede de produção e que abram canais de fortalecimento na estrutura da Agricultura Familiar e para comunicação com os clientes e fornecedores são o desenvolvimento rural de uma região, em especial do fundamentais para diminuir a variabilidade da quantidade Estado de Mato Grosso do Sul. e da qualidade da produção. Neste campo, a informação é Os tópicos a serem analisados são condições de um insumo essencial e escasso no meio onde se produção mais tendenciosas ao manejo adequado do solo, desenvolvem os agricultores familiares. o respeito ao meio ambiente, e acima de tudo, apresentar as diversas formas de produção agronômicas no campo.

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Assim, serão analisados a Integração Lavoura-Pecuária- (descanso ou repouso) cede lugar à pastagem que Floresta – ILPF, Produção Agroecológica e Orgânica, permanece na gleba de terra até uma próxima safra de Rotação de Culturas e Mercados e Agregação de Valores grãos ou forragem. O sinergismo entre lavouras e na Comercialização de Produtos, direcionados a forrageiras (capins para pasto) modifica o ambiente físico, Agricultura Familiar, no que concerne o Estado de Mato químico e biológico do solo com benefícios para ambas. Grosso do Sul. Na figura 1 são apresentadas as unidades de referência tecnológicas de ILPF no Estado de Mato Grosso do Sul, de acordo com a EMBRAPA (2010). A 4.1 Integração Lavoura-Pecuária-Floresta - ILPF imagem demonstra a grande expansão desses sistemas de diversificação, gerando renda e melhorias nas condições De acordo com Balbino & Barcellos (2010), a de manejo do solo. Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) refere-se a uma estratégia de produção sustentável, que integra atividades agrícolas, pecuárias e florestais, realizadas na mesma área, em cultivo consorciado e em sucessão e/ou rotacionado. Ademais, busca efeitos sinérgicos entre os componentes do agroecossistema, contemplando a adequação ambiental, a valorização do homem e a viabilidade econômica. Segundo os autores supracitados, a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta - ILPF tem como grande objetivo a mudança dos sistemas de uso da terra, fundamentada na integração dos componentes dos sistemas produtivos, para atingir patamares cada vez mais elevados de qualidade do produto, qualidade ambiental e competitividades. Sendo assim, essa estratégia visa contemplar quatro modalidades de sistemas, assim Figura 1: Unidades de Referência Tecnológica – ILPF, caracterizados: de acordo com EMBRAPA (2010). Fonte: http://www.cnpgl.embrapa.br/nova/silpf/app.images/mapa a) integração Lavoura-Pecuária ou s/ms.jpg Agropastoril: sistema que integra os componentes: lavoura e pecuária, em Na Figura 1 podem-se observar as várias rotação, consórcio ou sucessão, na mesma Unidades de Referência Tecnológica de Integração área, em um mesmo ano agrícola ou por Lavoura-Pecuária-Floresta – ILPF presentes no Estado de múltiplos anos; b) integração Lavoura- Mato Grosso do Sul, distribuídas nos Municípios de Pecuária-Floresta ou Agrossilvipastoril: Campo Grande, Selvíria, Três Lagoas, Brasilândia, sistema que integra os componentes: Dourados e Ponta Porã, de acordo com a EMBRAPA lavoura, pecuária e floresta, em rotação, (2010), instância que proporciona tais informações aos consórcio ou sucessão, na mesma área, produtores rurais. sendo que a lavoura pode ser utilizada na A integração de culturas em que a sintonia de fase inicial de implantação do componente uma beneficia a outra realizando um manejo adequado, florestal ou em ciclos durante o melhora a eficiência e diversifica as receitas da desenvolvimento do sistema; c) integração propriedade, espaço onde o pequeno produtor distribui Pecuária-Floresta ou Silvipastoril: sistema melhor suas aptidões agricultáveis e, ao mesmo tempo, que integra os componentes: pecuária e passa a fortalecer o solo, criando melhores condições no floresta em consórcio e; d) integração ecossistema de sua propriedade. Lavoura-Floresta ou Silviagrícola: sistema que integra os componentes: floresta e 4.2 Produção Agroecológica e Orgânica lavoura, pela consorciação de espécies arbóreas com cultivos agrícolas (anuais e De acordo com Assis (2006), a Agroecologia, na perenes) (Balbino & Barcellos, 2010, p. medida em que possui como premissa básica uma 02). produção agrícola que não agrida o meio ambiente, resgata a lógica da complexidade presente nas sociedades Para Caldato e Hugo (2012), os sistemas camponesas tradicionais, integrando propostas integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) são mais agroecológicas com outras ações voltadas ao benéficos, principalmente em regiões tropicais que desenvolvimento da Agricultura Familiar, a qual, em agregam diversificação, intensificação no uso da terra e função da escala, favorece a conciliação entre a sustentabilidade, além de aumentar a biodiversidade, complexidade desejada e a supervisão e o controle do onde, na sucessão à lavoura, o período de pousio processo de trabalho necessário.

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Essa integração reforça a proposta de ação local substâncias que coloquem em risco a saúde humana e o como alternativa para o desenvolvimento sustentável, meio ambiente. Além disso, não são utilizados pois, tendo em vista que os agricultores familiares fertilizantes sintéticos solúveis, bem como agrotóxicos e possuem um envolvimento local, viabilizam-se os transgênicos. O Brasil, em função de possuir diferentes mercados locais a partir de uma aproximação e tipos de solo e clima e uma biodiversidade intensa aliada orquestramento de interesses entre produtores, a uma grande diversidade cultural, é sem dúvida um dos comerciantes e consumidores locais. países com maior potencial para o crescimento da O autor ressalta que isso é relevante na medida produção orgânica. Para ser considerado orgânico, o em que o processo de adoção de sistemas agroecológicos produto tem que ser produzido em um ambiente de de produção não pode ser considerado como dependente produção orgânica, onde se utiliza como base do processo exclusivamente da decisão do agricultor, devendo ser produtivo os princípios agroecológicos que contemplam o levado em consideração o contexto sócio-político em que uso responsável do solo, da água, do ar e dos demais esse processo ocorre. Assim, a aproximação entre recursos naturais, respeitando as relações sociais e produtores, comerciantes e consumidores locais, ao culturais. revelar interesses comuns, amplia o espectro de pessoas Na atualidade, o consumo de produtos orgânicos envolvidas e comprometidas com a proposta de tem se caracterizado como um segmento diferenciado de desenvolvimento sustentável. mercado, e conforme Santos (2013), a segurança Sob outro prisma, Salamoni e Gerardi (2001) alimentar, aliada ao não uso de agrotóxicos, constitui um enfatizam que o sistema agroecológico poderá orientar o fator importante que influencia na decisão do consumidor, desenvolvimento na agricultura de forma mais quando da opção de consumo de forma que se vem harmoniosa, permitindo a incorporação das crescendo a conscientização da sociedade em relação à complexidades da eficiência econômica e tecnológica, da importância dos produtos oriundos da Agricultora equidade social (qualidade de vida) e da preservação Orgânica. A partir de setembro de 1994, o MAPA ambiental, assegurando a qualidade dos recursos naturais instituiu o Comitê Nacional de Produtos Orgânicos, e dos produtos. responsável por propor as estratégias para a certificação Ademais, deve-se promover a diversificação da de produtos. produção, incorporando padrões de qualidade aos Assim, no Brasil, seguindo uma tendência produtos, visto que a viabilidade econômica não está mundial, grandes redes de supermercados têm mostrado baseada somente em um produto, mas em vários, e, se um interesse crescente na comercialização destes possível, esta deve atender a um mercado mais exigente. produtos, apresentando-se para muitos agricultores Além disso, se deve incentivar o emprego de sistemas de orgânicos como importante alternativa para sua produção que exijam uso intensivo de mão-de-obra, o comercialização. No entanto, nos últimos anos, seguindo qual pode ajudar a fixar o homem no campo, evitando um uma tendência natural, esse mercado vem se expandindo aumento da população urbana. Ressaltam também a por todo o território brasileiro, onde atualmente, entre os importância de haver políticas de incentivos e/ou principais produtos orgânicos do Brasil, estão o açúcar subsídios para atender os produtores que adotam este mascavo, o café, o caju, os cereais (milho, arroz, trigo), o modelo de produção na agricultura, a fim de que estes dendê, a erva-mate, as frutas (banana, citros), as possam ter garantida a sua manutenção na atividade hortaliças, as leguminosas (feijão, amendoim), as plantas agrícola, enquanto espera seus sistemas produtivos medicinais e a soja. Diante deste mercado de produtos gerarem os ganhos garantidos pelo modelo agroecológico orgânicos e agroecológicos, a Agricultura Familiar, com de desenvolvimento. seu cuidado direto na produção e nas suas aptidões Para Assis e Romeiro (2011), a estratégia de agricultáveis, se vê mais próxima do mercado Agroecologia é viabilizada com o desenho de sistema consumidor, o qual almeja, cada vez mais, produtos produtivo complexo e diversificado que pressupõe a saudáveis. manutenção de policultivos anuais e perenes associados a criações. Com a diversificação, estes sistemas tornam-se 4.3 Rotação de Culturas mais estáveis por aumentarem a capacidade de absorver as perturbações inerentes ao processo produtivo da Segundo Leal et al (2010), o sistema de plantio agricultura, sobretudo as flutuações mercadológicas e direto (SPD) é uma das tecnologias que contribui para a climáticas, aumentando assim sua capacidade de auto- promoção de cobertura no solo. A palha e a rotação de reprodução, apontando ainda para uma alternativa culturas têm sido referidas como a base de sua crescentemente reconhecida em nível mundial por sustentação, sendo que as dificuldades em mantê-las são diversos segmentos sociais (agricultores, pesquisadores, decorrentes, em grande parte, da ausência ou pequena extensionistas, planejadores políticos) como uma opção quantidade de cobertura morta na superfície do solo. para promoção do desenvolvimento rural e agrícola Assim, muitas são as dúvidas e as indagações sustentável. sobre o manejo da palha e do sistema de rotação a ser De acordo com o Ministério da Agricultura, empregado, principalmente em regiões onde predominam Pecuária e Abastecimento – MAPA (2013), na Agricultura Orgânica não é permitido o uso de

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os cerrados, em que as condições edafoclimáticas2 e de adaptar sistemas de produção tradicionais às acarretam alta decomposição da palha, ameaçando a exigências do mercado superam, de longe, tanto o sustentabilidade dessa tecnologia. Os principais conhecimento como o tempo de aprendizado autônomo benefícios da utilização de adubos verdes são o dos agricultores. Nessa perspectiva, Buainain (2003) suprimento de material orgânico, a reciclagem de assinala que a assistência técnica, a extensão, os serviços nutrientes residuais e o controle de nematóides no solo. O de meteorologia e a comercialização são fundamentais preço e o custo da produção e a adequação dentro do para a viabilidade dos sistemas mais avançados. Em sistema agrícola são fatores essenciais levados em contraponto, a sua ausência e/ou deficiência restringe o consideração pelos agricultores para a adoção dessa desenvolvimento e consolidação de sistemas produtivos, prática. nos quais os agricultores familiares poderiam ser Enívar e Lovato (2006) comentam, de maneira competitivos e viáveis. mais técnica, que dependendo do manejo aplicado sobre Cabe mencionar ainda que, historicamente, a as pastagens de inverno e da cultura de verão utilizada, Agricultura Familiar enfrentou um quadro pode-se alcançar cobertura de palha no solo mesmo em macroeconômico adverso, caracterizado pela instabilidade áreas de Integração Lavoura-Pecuária - ILP, considerando monetária e inflação elevada. Na realidade, ao invés de o sistema de plantio direto - SPD, onde com a utilização promover o desenvolvimento rural e local, o conjunto de da cultura do milho, durante o verão, facilmente atinge e políticas públicas promoveu o esvaziamento do campo e até supera esta necessidade de aporte de palhada ao solo, inibiu o desenvolvimento local em favor das grandes já que esta cultura produz grande quantidade de metrópoles e cidades de porte médio. fitomassa. No entanto, o monocultivo de soja exige um Nas unidades familiares de produção, segundo melhor manejo das pastagens de inverno para que se assinalaram Sghneider e Nierdele (2008), o sistema satisfaça esta exigência. produtivo em geral se assenta no trabalho da terra, Ademais, o aumento da intensidade de utilização realizado por uma família e na produção primária, das pastagens de inverno traz reflexos também sobre a destinada prioritariamente à satisfação das necessidades produção de fitomassa das culturas de verão, ao diminuir internas da propriedade e do grupo doméstico. Nessa a sua produção de matéria seca na parte área vegetal. forma de organização do trabalho e da produção, as Apesar disso, uma alternativa para a utilização da soja em atividades agrícolas quase sempre coexistem e se áreas com utilização mais intensiva das pastagens de complementam com outras atividades não agrícolas, inverno seria a rotação de culturas de verão, com o milho, como o artesanato e o comércio, tornando as unidades segundo bem afirmaram Enívar e Lovato (2006). pluriativas, afetando também aspectos da cultura e da Ao rotacionar as culturas agronômicas na sociabilidade, transformando o próprio modo de vida. pequena propriedade, o produtor ganha maior Como resultado, reduz-se consideravelmente a sua produtividade e enriquece o solo, pois, a fonte de renda da autonomia, já que passam a depender da compra de Agricultura Familiar se intensifica, em sua maioria, em insumos e ferramentas para produzir e da venda da solos produtivos e alternativas variáveis de ganhos e/ou produção para arrecadar dinheiro que lhes permita receitas. reiniciar e reproduzir o ciclo.

4.4 Mercados e Agregação de Valores na Comercialização de Produtos 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como acontece em qualquer sistema de produção agroindustrial, um ponto fundamental para o sucesso do Ao longo desse estudo compreendeu-se a empreendimento rural familiar está no acesso aos contextualização da diversificação de culturas mercados, tradicionais e/ou potenciais. Um grande agronômicas, que são apresentadas como possibilidades entrave à sustentabilidade deste segmento está na para o fortalecimento na estrutura no âmbito da comercialização de seus produtos e/ou serviços. O acesso Agricultura Familiar, as quais podem contribuir para ao crédito rural e o suporte da assistência técnica não novas fontes de geração de renda para os produtores garantem sozinhos a sobrevivência de um determinado rurais, sobretudo para os do Estado de Mato Grosso do agronegócio. Além disso, a concretização do valor Sul. adicionado pelo aporte tecnológico e o adequado O desenvolvimento da Agricultura Familiar, a gerenciamento do empreendimento rural só podem partir de manejos adequados de culturas apropriadas a acontecer se a comercialização do produto/serviço for região para o acesso à informação e para a assistência realizada de modo que permita a sustentabilidade do técnica de extensão rural local, cria condições de empreendimento rural, conforme atestam os estudos de permanência do produtor na terra, tornando atrativo o Lorenzani e Batalha (2004). campo e a sua produção. Sendo assim, a partir do O ritmo das mudanças técnicas e tecnológicas, momento que se busca aproveitar melhor o seu espaço, assim como a necessidade de introduzir novas atividades este produtor cria condições de acordo com suas qualidades de produção e consumo local e inicia uma 2 A relação planta-solo-clima para plantio.

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nova jornada de atividades culturais, gerando renda e tornando a propriedade rural uma organização CAPORAL, F. R. Uma estratégia de Sustentabilidade a promissora, promovendo a profissionalização do seu partir da Agroecologia. Agroecologia e Desenvolvimento trabalho e dos futuros sucessores, em especial daqueles de Rural Sustentável, Porto Alegre: Emater/RS, v.2, n.1, cunho local. jan./mar. 2001. Portanto, atribuir novas culturas agronômicas no fortalecimento na estrutura da Agricultura Familiar, de CARNEIRO, R. G. et al. Reação de Milho, Sorgo e acordo com as aptidões dos produtores, potencializando a Milheto a Meloidogyne Incognita. Nematologia produção de alimentos, bem como a geração de renda, Brasileira, v. 31, n. 2, 2007. melhor capacitação nos trabalhos e dos recursos disponíveis, condicionam futuros cálculos estatísticos de Distribuição Geográfica dos Sistemas ILPF. desenvolvimento, da implantação de inovações produtivas EMBRAPA, Brasília: 2005-2007. Disponível em: e/ou culturais na propriedade, ficando expresso que as . Ultima atualização 26/10/2010. Acesso: 08 necessidade da localidade e do produtor. julho 2013.

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A ATIVIDADE TURÍSTICA VINCULADA À PRODUÇÃO AGROPECUÁRIA DE BASE FAMILIAR EM MUNICÍPIO CAPIXABA: UM EXEMPLO DE SUCESSO

1 BERNADETE DA CONCEIÇÃO CARVALHO GOMES PEDREIRA 2 ELUAN ALAN LEMOS POCIDONIO

1 Embrapa Solos Rio de Janeiro - RJ [email protected]

2 Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ Rio de Janeiro – RJ [email protected]

RESUMO - Situado em região de grande beleza natural, bem como desenvolvendo expressiva atividade produtiva rural proveniente do trabalho campesino de base familiar; além de exibir potencial de atratividade turística de cunho rural e ecológico, o município de Venda Nova do Imigrante no Estado do Espírito Santo, é o alvo deste estudo focado no agroturismo. O presente trabalho visa retratar as principais características desse município em relação à prática do turismo rural associado às atividades agropecuárias desenvolvidas por pequenos produtores rurais da agricultura familiar. Dessa forma, apresenta um conjunto de informações sobre aspectos da atividade agroturística desenvolvida com sucesso nesse município, como comprova o título de “Capital Nacional do Agroturismo” em 2006 concedido pelo Ministério do Turismo. O levantamento de dados foi feito junto às instituições públicas locais ligadas à agricultura e ao turismo e também, por meio de visitas aos empreendimentos agroturísticos, além de consulta bibliográfica. O conjunto de dados, informações e observações locais apontaram um potencial altamente favorável ao desenvolvimento da atividade agroturística.

Palavras chave: Turismo Rural, Pequeno Produtor, Agricultura, Empreendimento Rural.

ABSTRACT - Situated in a region of great natural beauty, as well as developing significant agricultural production from the rural work of family basis, in addition to showing potential of rural and ecological tourist, the Venda Nova do Imigrante city in the Espírito Santo State is the target of this study focused in agritourism. The present work aims to delineate the main characteristics of this city regarding the practice of rural tourism associated with agricultural activities carried out by agricultural family-based small farmers. Thus, it presents a set of information about aspects of the agritourism successfully developed in this city, as evidenced by the title of "National Capital of Agritourism" in 2006 awarded by the Ministry of Tourism. The data collection was done in local public institutions related to agriculture and tourism and also through visits entrerprises of agritourism, as well as literature. The data set, information and local observations indicated a potentially highly favorable to the development of agritourism activity.

Key words: Rural Tourism, Small Farmer, Agriculture, Rural Enterprise.

1 INTRODUÇÃO produtivas, atualmente, muitos membros das famílias rurais ocupam-se, além das lidas do campo com outras Na atualidade, o turismo rural é uma atividade formas de atividades econômicas produtivas, tais como a plenamente inserida no contexto regional do Sudeste prestação de serviços turísticos e o processamento de brasileiro, e ao mesmo tempo se relaciona, intimamente, matéria-prima proveniente da produção rural por meio das com as comunidades rurais locais. O espaço rural da agroindústrias locais. Essas novas atividades promovem a região Sudeste do Brasil constitui-se em importante pólo geração de renda extra que impulsiona o desenvolvimento agroprodutor nacional, e mesmo apresentando um local com grande alcance social e valorizando a cotidiano voltado mais para as atividades agropecuárias

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simplicidade natural e a diversidade de atrativos Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão campesinos, Roque (2004). Rural / Escritório Local de Desenvolvimento Rural, Sob esse contexto, o turismo rural ligado às (INCAPER/ELDR, 2010), o município compõe-se de dois atividades agropecuárias desenvolvidas pelos pequenos distritos e cerca de 19 comunidades rurais principais produtores rurais no município de Venda Nova do distribuídas por duas zonas naturais mapeadas no Imigrante, ES é o foco deste estudo. município: uma zona de terras frias, acidentadas e Conforme descrito por um dos produtores rurais chuvosas ocupando uma extensão de aproximadamente capixabas pioneiros nessa atividade, Leandro Carnielli: 80% do território municipal, onde estão concentradas as “O agroturismo é uma modalidade do turismo rural que pequenas propriedades que exploram a olericultura e uma tem características próprias e bem definidas, nasceu com outra zona de terras de temperaturas amenas, acidentadas uma particularidade, a espontaneidade. Não imitou e chuvosas, que ocupam os restantes 20% do território, formas e fórmulas já existentes. Nasceu numa onde estão as propriedades familiares que exploram o comunidade agrícola, com fortes traços culturais e um cultivo do café arábica. meio ambiente propício. Criou mais uma opção, um novo O município é cercado por uma paisagem nicho de mercado. É uma atividade que veio para a montanhosa e bela, onde ainda se pode apreciar a família rural como renda extra e complementar. Atendeu vegetação de Mata Atlântica. As características a uma parcela da sociedade que busca a tranquilidade do edafoclimáticas comumente referenciadas nas publicações campo, sua vida simples, suas tradições e culinária”, disponíveis são o aspecto montanhoso e escarpado do (Carnielli, s.d). relevo que alcança uma altitude de até 1500 m e o clima É consenso entre os estudiosos do turismo que um agradável (mesotérmico de inverno seco), que apresenta dos principais fatores que exerce atratividade ao turismo uma temperatura média anual de 19ºC, mas no inverno vinculado ao ambiente rural em suas diferentes categorias podem ocorrer até geadas leves. Os meses mais frios é o próprio cenário natural composto pelo relevo, coincidem também com o período parcialmente seco, em vegetação, recursos hídricos (rios encachoeirados) e pelas geral, apresentando um pico de estiagem em agosto, condições climáticas favoráveis. Além disso, é desejável enquanto as chuvas se concentram de outubro a abril. que a região de entorno de uma localidade turística ofereça também potencial de atratividade. Tais requisitos estão presentes em Venda Nova do Imigrante favorecendo o sucesso de iniciativas de desenvolvimento do agroturismo local.

2 OBJETIVO GERAL

Ambientado na temática do agroturismo, o presente artigo visa retratar as principais características do município de Venda Nova do Imigrante em relação à prática do turismo rural, associado às atividades agropecuárias desenvolvidas por pequenos empreendedores rurais envolvidos com a agricultura familiar. Cabe destacar, entretanto, que os dados levantados neste trabalho servirão de referência para a realização de um estudo posterior sobre a viabilidade do agroturismo de base familiar no município fluminense de Cachoeiras de Macacu.

3 METODOLOGIA

3.1 Descrição da área de estudo

O município de Venda Nova do Imigrante está Figura1 - Localização do município de Venda Nova do situado na Região Central Serrana do Espírito Santo, na Imigrante/ES. Fonte: Ilustração elaborada a partir de região turística das “Montanhas Capixabas”, como mostra modificações dos mapas de localização constantes no a Figura 1. Segundo dados da Secretaria Municipal de Mapa Turístico das Montanhas Capixabas e no Turismo, Esporte e Lazer, fica a uma distância de 103 km Calendário de eventos do município, disponibilizados de Vitória/ES e ocupa uma extensão em área de 188,9 pela Prefeitura local. km². Conforme consta em diagnóstico referente ao Programa de Assistência Técnica e Extensão Rural 3.2 Procedimento metodológico (PROATER 2011-2013) elaborado pelo Instituto

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O levantamento de dados e informações sobre Venda Nova do Imigrante, “esse município que aspectos naturais, socioeconômicos e histórico-culturais tem na produção cafeeira seu alicerce econômico, é de Venda Nova do Imigrante foi feito junto às instituições possível vivenciar uma forma de turismo rural públicas locais ligadas à agricultura e ao turismo reconhecida como agroturismo, que associa a vivência do (Secretaria Municipal de Turismo, Esporte e Lazer, cotidiano agrícola ao lazer, à visitação e à valorização Secretaria Municipal de Agricultura, Instituto Capixaba do meio”, Roque (2004). De acordo com matéria de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural / publicada na Revista Turismo em sua página eletrônica: INCAPER, Serviço de Apoio às Micro e Pequenas http://www.revistaturismo.com.br/Dicasdeviagem/vendan Empresas Espírito Santo / SEBRAE – ES), e também, por ova.htm>, o município de Venda Nova do Imigrante meio de visitas a alguns dos empreendimentos destaca-se como pioneiro no agroturismo com várias agroturísticos locais, além de consulta bibliográfica. propriedades rurais abertas aos turistas oferecendo uma Conforme sugerido em Pedreira et al. (2009, grande variedade de produtos típicos artesanais como 2013), há, pelo menos, três grupos de indicadores que queijos, embutidos (socol, linguiças), massas, doces, podem apontar áreas mais adequadas para o geléias, licores, cachaças, biscoitos, antepastos, café e a desenvolvimento do agroturismo: potencialidade tradicional polenta. Os proprietários rurais recebem agropecuária, qualidade do meio natural e qualidade de turistas mostrando as riquezas naturais e culturais locais, atributos turísticos, os quais devem responder também, seus produtos e a forma de produção. As belas sobre as possibilidades de exploração dos recursos propriedades rurais e a oferta aos turistas de produtos naturais existentes sem prejuízos da sua conservação. caseiros, com selo de qualidade e autenticidade, nos locais Desta forma, procurou-se direcionar o onde são fabricados, com acompanhamento de todo o levantamento de dados e informações sobre a atividade processo de produção, garantem o sucesso do turismo agroturística no município considerando-se tais grupos de rural na região, conforme consta na página eletrônica: indicadores. . Segundo Roque (2004): “O bem receber da família 4.1 Características de Venda Nova do Imigrante rural transformou-se em um dos maiores atrativos favoráveis ao turismo de cunho rural locais”. O circuito agroturístico de Venda Nova do Imigrante se irradiou para outras cidades vizinhas. Tanto em Venda Nova do Imigrante como na O município tem em torno de 20.468 habitantes região ao seu redor existem atributos ambientais naturais conforme Censo IBGE (2010), sendo grande parte da muito atrativos ao turismo ecológico (parques, trilhas, população formada por descendentes provenientes da cachoeiras, fauna, flora e outros), além de infraestrutura imigração italiana. Aproximadamente, 40% dessa turística (opções de hospedagem e lazer, restaurantes, população vivem no ambiente rural. Uma característica gastronomia típica, condições favoráveis de acesso, forte da população local é o seu caráter solidário, a sua acolhida receptiva dada aos visitantes pela população boa disposição para trabalhos voluntários comunitários. local que tem fortes traços da cultura italiana e na região Sempre que necessário, todos se ajudam mutuamente e de entorno há também núcleos expressivos de existe uma forte parceria entre os pequenos produtores descendência alemã). Por outro lado, além da beleza rurais, o chamado “capital social”, como expresso pelo cênica, os municípios que compõem a região possuem produtor familiar Leandro Carnielli, (Carnielli, s.d). economia baseada na produção agropecuária de caráter O trabalho voluntário é o grande “patrimônio” de familiar, desenvolvida em pequenas propriedades com Venda Nova do Imigrante, como apontam diferentes extensão variando entre 20 ha e 30 ha, mantendo um fontes de informações (publicações, atores e instituições perfil genuíno de ruralidade, valorizando as raízes locais). histórico-culturais locais herdadas pelas colonizações pioneiras. Esses fatores em conjunto ampliam as chances 4.2 Instituições, órgãos públicos, instrumentos de de sucesso para as iniciativas agroturísticas locais e na gestão atuantes no suporte ao turismo rural de Venda região. Nova do Imigrante Conforme apontado em “O Guia Turístico Oficial Montanhas Capixabas” disponível na página eletrônica: Em relação ao apoio às iniciativas de agroturismo , o município de Venda Nova do reflexos favoráveis para Venda Nova do Imigrante, Imigrante é rico em festivais e festas folclóricas e tem podem ser apontadas, por exemplo, a colaboração do muitos talentos na elaboração de iguarias culinárias e na Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA), produção artesanal, assim como toda a região. A beleza instituindo o Selo de Identificação da Participação da natural da região aliada às tradições da cultura dos Agricultura Familiar (SIPAF) em 2009, e a colaboração imigrantes europeus, principalmente italianos e alemães, do Ministério da Agricultura, Abastecimento, Pecuária, foram fatores primordiais no desenvolvimento do Aquicultura e Pesca (MAPA), por meio da criação do agroturismo. Sistema Brasileiro de Inspeção de Produtos de Origem

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Animal (SISBI-POA) permitindo assim, a melhoria da qualidade de vida das famílias rurais comercialização dos produtos inspecionados em todos os (INCAPER/ELDR, 2010). Estados brasileiros, Barbosa (2012). Secretaria Municipal de Agricultura Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência A Secretaria de Agricultura juntamente com o Técnica e Extensão Rural / INCAPER INCAPER e o Sindicato dos Trabalhadores e Conforme informações coletadas junto ao Trabalhadoras Rurais de Venda Nova do Imigrante de INCAPER em Venda Nova do Imigrante, (Escritório forma compartilhada, organizam e fazem a gestão da Local de Desenvolvimento Rural) uma de suas funções é Feira de Agricultura Familiar no município, que conta agregar os produtores rurais, incentivar a inclusão dos com aproximadamente, 30 barracas de pequenos produtores independentes que atuam de forma produtores familiares. A realização da Feira de individualizada a um grupo produtivo principal, Agricultura Familiar é uma forma de motivar os pequenos organizado sob a forma de associativismo, uma vez que as produtores através da garantia da comercialização de seus políticas públicas são elaboradas visando beneficiar a produtos. coletividade e não aos interesses individuais e/ou iniciativas isoladas. A adesão dos produtores às Secretaria Municipal de Turismo, Esporte e Lazer associações já estabelecidas, em geral, se dá Essa Secretaria é bastante atuante no município no voluntariamente, sendo eventualmente motivados pela que se refere ao turismo rural e agroturismo. Entre as divulgação feita pelo INCAPER e outros órgãos oficiais diversas atividades está o trabalho de divulgação, ligados ao desenvolvimento rural sobre a importância promoção e estímulo do turismo local e dos demais dessa prática. Entretanto, o INCAPER presta assistência municípios vizinhos que formam a região das “Montanhas técnica a todos os produtores do município, Capixabas” (rota do Mar e Montanhas), através da indistintamente, atuando na busca da melhoria de participação em eventos (exposições, feiras) tais como: processos e das atividades desenvolvidas nas propriedades Salão do Turismo em São Paulo (Expotur), Salão do rurais. Atua, também, auxiliando na elaboração de Turismo em Vitória. A Secretaria Municipal do Turismo, produtos, realizando cursos, visitas, oficinas para juntamente com a Instância de Governança local eventualmente corrigir algum processo ou atividade que estabelecem e atualizam os roteiros de visitação e não esteja dando bons resultados, entre outros. atualmente, estão empenhadas também em atualizar o As ações do INCAPER, segundo consta em sua mapa turístico da região das montanhas capixabas. página eletrônica: , também objetivam estimular iniciativas para impulsionar o turismo Instância de Governança (Montanhas Capixabas rural no Espírito Santo, e em relação ao segmento do Convention & Visitors Bureau) agroturismo visam incentivar as prefeituras a A Prefeitura de Venda Nova do Imigrante apoia o estabelecerem políticas públicas voltadas para a turismo local e regional e conta com a Instância de preservação das paisagens rurais, resgatar o potencial Governança, ligada à Secretaria Municipal de Turismo, paisagístico local, estimular os agricultores a valorizarem Esporte e Lazer, responsável pela organização e a aparência de suas propriedades e as características do planejamento dos circuitos turísticos e agroturísticos tanto campo. local como da região, e também pela sua divulgação e promoção. Programa de Assistência Técnica e Extensão Rural/PROATER 2011 a 2013 Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas O PROATER para o período 2011-2013 Espírito Santo / SEBRAE-ES. (instrumento norteador das ações de Assistência Técnica e Entre os objetivos do SEBRAE estão a promoção Extensão Rural/ATER que serão desenvolvidas junto aos da competitividade, a sustentabilidade dos micro e agricultores familiares), elaborado pelo INCAPER pequenos negócios e o estímulo a processos locais de (Escritório Local de Desenvolvimento Rural de Venda desenvolvimento, de acordo com os conceitos de arranjos Nova do Imigrante) prevê uma programação de ações produtivos, SEBRAE (2005). baseada na realização de diagnósticos, e posterior Conforme expresso pela sua Diretoria “mais do planejamento, ambos realizados em caráter participativo, que oferecer uma alternativa de ocupação e renda, o isto é, com a colaboração de agricultores, lideranças, agroturismo exigiu por si só investimento em gestores públicos e técnicos locais. Além do levantamento qualificação, tecnologia e gestão das propriedades, de demandas conjuntamente com os agricultores, o permitindo a oferta de produtos não só em maior PROATER também está baseado nos programas do quantidade, mas também em melhor qualidade e respeito governo capixaba, coordenados pelo INCAPER e pela ao meio ambiente, o que se tornou possível com a Secretaria de Agricultura, Abastecimento, Aquicultura e atuação do SEBRAE e dos diversos parceiros como a Pesca. Cabe salientar que o PROATER, além de ser um Secretaria de Estado da Agricultura (SEAG), o instrumento de gestão, tem como desafio contribuir com o INCAPER, as prefeituras municipais...”, SEBRAE desenvolvimento sustentável da agricultura familiar. O (2005). foco dos agentes de ATER envolvidos no processo é a

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Em Venda Nova do Imigrante as atividades do município. Entretanto, nem todas estão integradas à SEBRAE priorizam o incentivo ao associativismo, AGROTUR. cooperativismo, fortalecimento da identidade dos Além das instituições voltadas para o planejamento circuitos agroturísticos, tematização do turismo em e assistência à atividade do agroturismo, desde 1993 até função do público-alvo, ampliação do mercado para recentemente, funcionava a Loja do Agroturismo que era comercialização dos produtos de agroturismo disponíveis, organizada pelos produtores locais para dar informações melhoria da gastronomia, busca de simplificação das sobre os roteiros de visitas e vendas dos produtos da exigências legais para a questão dos produtos de origem região. Atualmente, encontra-se desativada e o espaço que animal, conciliando a segurança do consumidor com a ocupava está sendo utilizado para exposição do artesanato cultura do produtor rural e a ampliação do número de local. produtos qualificados para a obtenção do Selo da De acordo com o produtor Carnielli, o Agricultura Familiar (SIPAF). associativismo foi fundamental no sucesso do agroturismo O SEBRAE tem um projeto de desenvolvimento em Venda Nova do Imigrante. Os produtores passaram a para a região. Já somam aproximadamente, 170 encarar essa atividade como um negócio, e dessa forma, a empreendimentos em torno de 20 circuitos agroturísticos criação da Associação ajudou a profissionalizar o trabalho nos municípios da região envolvendo os pequenos comunitário e voluntário. produtores de base familiar. Em Venda Nova do Imigrante, a própria Como entraves para o desenvolvimento do agricultura é o atrativo principal para o agroturismo e agroturismo o SEBRAE-ES aponta, entre outros: como as pequenas propriedades predominam, prioriza-se problemas referentes à legislação envolvendo diferentes o bom aproveitamento da terra, o plantio de cultivares de questões, entre as quais, a venda dos produtos de alta produtividade, o uso de tecnologia e a diversidade de agroturismo para fora do Estado do Espírito Santo, a cultivos e/ou atividades produtivas, criando oferta higiene e sanidade ambiental para os produtos de origem diversificada de alternativas de atratividade agroturística. animal, legislação sanitária e ambiental referente às Parte da produção é transformada por meio da pequenas agroindústrias, a legislação sobre a produção e manipulação artesanal e consequente agregação de valor à comercialização de palmito; dificuldades quanto à adesão matéria-prima, além do processamento realizado nas ao Sistema Brasileiro de Inspeção de Produtos de Origem agroindústrias, evitando-se muito desperdício. Além Animal (SISBI-POA); descaracterização da condição de disso, todo esse processo de transformação, também tem agricultor de acordo com o tipo de prestação de serviço valor turístico para os visitantes. (principalmente, com relação à hospedagem); dificuldades na inter-relação com o poder público: em relação ao Cooperativa de Cafeicultores das Montanhas do fornecimento de energia e comunicação no meio rural, Espírito Santo (PRONOVA) deficiências na sinalização turística, necessidade de Em Venda Nova do Imigrante, a PRONOVA foi melhoria dos acessos (estradas, caminhos) na região como criada visando organizar o trabalho coletivo dos um todo; problemas com relação aos financiados cedidos produtores de café da região, ajudando a produzir ”cafés pelo Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar especiais sustentáveis” com qualidade reconhecida. (PRONAF); e a existência de alguns empreendimentos Segundo o SEBRAE (2005), café especial ou Gourmet é o comerciais que se fazem passar por agroturismo, apenas que possui características, tais como aroma, acidez, por interesse do proprietário, causando impactos doçura, corpo e outras que se destacam de maneira a negativos e descaracterizando a atividade. diferenciá-los dentre os cafés já considerados bons. A atuação da cooperativa envolve o emprego de 4.3 Entidades representativas dos produtores rurais tecnologias específicas, treinamentos, auditorias e familiares de Venda Nova do Imigrante envolvimento em todas as etapas do processo de plantio, colheita, beneficiamento e qualificação dos produtores, Associação do Agroturismo (AGROTUR) de além de integrar processos sustentáveis de produção. Ou Venda Nova do Imigrante seja, o produtor é orientado a utilizar boas práticas na A AGROTUR foi criada em 1993 sendo composta condução dos plantios, a conservar o solo, usar a água de por pequenos produtores familiares de 7 municípios da forma racional cuidando da preservação das nascentes, a região das Montanhas Capixabas, visando com isso usar os defensivos de forma adequada, a respeitar ganhar legitimidade de associação estadual, (Barbosa, condições de trabalho, incentivando o desenvolvimento 2012), não tendo vínculo com a Prefeitura local. da comunidade rural (apelo à sustentabilidade social). A AGROTUR conta com aproximadamente, 50 Atualmente, há em torno de 234 produtores rurais associados sediados em Venda Nova do Imigrante, em cooperados voltados para o desenvolvimento da cadeia sua maioria composta por famílias de procedência italiana produtiva do café na região. e que desenvolvem em conjunto atividades de comercialização e divulgação dos produtos da Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais agroindústria, agroturismo e artesanato de Venda Nova do Imigrante (INCAPER/ELDR, 2010). Segundo Barbosa (2012), cerca Contando com, aproximadamente, 1000 sócios, de 60 propriedades rurais trabalham com agroturismo no esse Sindicato é atuante no município, principalmente

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apoiando a organização dos agricultores familiares de sendo um dos produtos comercializados no agroturismo Venda Nova do Imigrante. Também promove o incentivo local. à comercialização da produção local sendo, por exemplo, Entre as olerícolas, o tomate é a cultura mais co-responsável pela organização e funcionamento da expressiva, sendo exportado para outros estados como RJ Feira Livre da Agricultura Familiar juntamente com o e BA. Em proporção bem menor há o cultivo de milho INCAPER e a Secretaria Municipal da Agricultura. que é bastante aproveitado como produto para o agroturismo. (É possível aos visitantes acompanharem o Sindicato Rural processo de plantio e de colheita do milho e participarem Também o Sindicato Rural tem sua contribuição da Festa da Polenta, evento muito tradicional e apreciado na capacitação de agricultores através do Serviço no município). Nacional de Aprendizagem Rural do Espírito Santo Na fruticultura se destacam o morango e a (SENAR/ES), uma entidade privada administrada pela tangerina ponkan como importantes fontes de renda para Confederação Nacional da Agricultura. São realizados os pequenos agricultores, embora haja cultivo de outras treinamentos tanto no setor agrícola como nas atividades frutas, como abacate, por exemplo. rurais não-agrícolas em parceria com o Escritório Local Em termos de pecuária, a avicultura (criação de de Desenvolvimento Rural de Venda Nova do Imigrante. galinhas e codornas) destinada à postura é a atividade Um fato que é constatado no município é a principal e a que traz maior retorno econômico. mobilização solidária que existe entre os moradores, o Além da avicultura, há criação de gado bovino que é comprovado pelas muitas ações voluntárias leiteiro em regime de confinamento e o aproveitamento realizadas com diferentes objetivos: promoção de festas, do leite produzido é feito principalmente, pelas organização de eventos, ajuda assistencial, reconstrução agroindústrias que o transformam em outros produtos, de edificações danificadas, entre tantos outros. Nessas agregando valor à produção. Cada uma dessas atividades, iniciativas de trabalho voluntário sobressai a colaboração ou seja, a lida diária de tratamento confinado do gado, a das mulheres. fabricação de queijos e outros derivados lácteos, além do próprio manejo agrícola são atrativos aproveitados no 4.4 Atividades econômicas associadas ao agroturismo agroturismo. em Venda Nova do Imigrante Entretanto, segundo dados obtidos junto ao INCAPER, a pecuária leiteira tem pouca expressão, sendo Conforme consta no Programa de Assistência uma atividade de caráter complementar. Atualmente, há Técnica e Extensão Rural 2011-2013, INCAPER/ELDR aproximadamente de 15 a 20 propriedades rurais (2010), a agropecuária é a principal base de sustentação explorando comercialmente esta atividade agropecuária. econômica do município, sendo que as atividades em sua O gado confinado se destina à produção de leite maioria se desenvolvem em propriedades de base familiar tecnificada, o que não tem sido isso uma boa alternativa, (máximo de 4 módulos rurais que para o município de pelas dificuldades de se manter os custos e demandas Venda Nova do Imigrante resulta em 72 ha). Não existem desse sistema, face à pequena produção. assentamentos rurais. Apenas um imóvel rural do Gado de corte tem pouco e não existe abatedouro município é classificado como grande propriedade. no município. Não há espaço para desenvolver a pecuária Além da agricultura, as atividades rurais não- extensiva. agrícolas também se destacam em Venda Nova do Existe também criação de abelhas para a produção Imigrante pela importância como fonte agregadora de de mel, apesar de pouco expressiva. valor para a agricultura familiar local. Como atividades A silvicultura vem se expandindo pouco a pouco econômicas complementares, também contribuem para a em área plantada no município, sendo voltada para a geração de emprego e renda, o comércio e as atividades exploração de eucalipto. rurais não agrícolas ligadas ao turismo ecológico e rural Por outro lado, a pesca e a aqüicultura servem integrado à agricultura (principalmente, a agroindústria e apenas para consumo familiar e turismo, ainda não o agroturismo). constituem atividade econômica significativa. Conforme salientado por Barbosa (2012) no Também é desenvolvido o artesanato utilizando Estado do Espírito Santo, para efeitos de formulação de como matéria-prima, a palha de café, atividade que políticas públicas de fomento ao turismo, a agroindústria envolve principalmente o trabalho feminino. caseira é considerada um atrativo turístico. A floricultura é incipiente tendo em torno de 12 Em conjunto, as atividades agropecuárias e o agricultores envolvidos com a atividade. O cultivo de agronegócio respondem por uma parcela expressiva do orquídeas é predominante. Produto Interno Bruto (PIB) municipal. O agroturismo técnico ainda não tem sido Em Venda Nova do Imigrante, os Latossolos, praticado em Venda Nova do Imigrante. Argissolos e Cambissolos são os tipos predominantes de solo que servem de substrato para o cultivo de sua A Figura 2 sintetiza a distribuição percentual do produção agrícola em que se destaca o café que é a uso e ocupação da terra no município. principal atividade econômica, INCAPER/ELDR (2010),

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agroindústrias artesanais ou caseiras são considerados ícones, imprimindo destaque à sua origem. 35,00% agropecuária Como bem expresso pelo produtor Leandro 30,00% Matas nativas Carnielli, “um atrativo só, por melhor que seja, não é 25,00% suficiente para trazer turista”, (Carnielli, s.d.). Assim, em 20,00% reflorestamento geral, cada propriedade procura se especializar em 15,00% produtos e serviços diferentes, gerando um caráter de 10,00% áreas aproveitáveis complementariedade entre elas. Além disso, os atrativos e não exploradas 5,00% naturais locais também somam (trilhas, matas, mirantes, áreas cachoeiras, paisagens e outros) assim como a oferta de 0,00% inaproveitáveis esportes de aventura. Tudo ajuda agregar atratividade à região e a partir daí, a conquistar o interesse do visitante em conhecer também os atrativos peculiares locais. Para Figura 2. Gráfico do uso e ocupação da terra atual em tanto, é importante a oferta de uma infraestrutura Venda Nova do Imigrante, ES, elaborado a partir dos compatível, aliando a rusticidade e simplicidade do dados constantes no PROATER 2011-2013. campo ao conforto, higiene, segurança e bem-estar (hospedagem, restaurantes, facilidade de acesso, Alguns pequenos produtores se beneficiam de comunicação e outros). financiamentos do Programa de Fortalecimento da Em Venda Nova do Imigrante estão presentes Agricultura Familiar (PRONAF), uma política pública todos esses aspectos favoráveis, que associados à forte brasileira que se destina ao apoio financeiro das expressão da atividade agropecuária de caráter familiar, atividades agropecuárias e não agropecuárias exploradas criam um cenário muito propício à prática do mediante emprego direto da força de trabalho do produtor agroturismo, gerando oportunidades de trabalho para as rural e de sua família. Entende-se por atividades não comunidades locais para atender a uma demanda contínua agropecuárias, por exemplo, o turismo rural, a produção de visitação, movimentando a economia. de artesanato e outras prestações de serviços que sejam Conforme SEBRAE (2005), no Espírito Santo, em compatíveis com o melhor emprego da mão-de-obra se tratando de turismo, o agroturismo, as agroindústrias e familiar no meio rural, segundo consta em página a produção de alimentos orgânicos demandam o consumo eletrônica do Banco Central do Brasil: da produção local, fortalecendo a economia e gerando . oportunidades de trabalho e renda extra nas propriedades. A Prefeitura de Venda Nova do Imigrante A relação da fruticultura com o setor de turismo é ainda disponibiliza um calendário de eventos anual contendo mais forte, uma vez que promove a integração entre informações sobre todas as opções de diversos agentes da cadeia produtiva, como a hotelaria e lazer/turismo/entretenimentos que acontecem mês a mês os restaurantes. no município, além de informações sobre locais de O patrimônio histórico-cultural, por sua vez, hospedagem e para alimentação. Todos os meses são também é considerado fator fundamental na consolidação oferecidas diferentes alternativas de atração (festas, de fluxos turísticos sustentáveis. competições, torneios, festivais e outros). Esse calendário ajuda a divulgar todo o conjunto de alternativas de 4.5 Empreendimentos agroturísticos em Venda Nova atrativos turísticos do município (de todos os tipos, do Imigrante inclusive os que têm ligação mais direta com o agroturismo) e favorece a vinda e participação dos turistas Atualmente, estão em funcionamento no município nos eventos locais, uma vez que possibilita a eles para visitação e venda de produtos provenientes de planejarem o consumo dos produtos turísticos que o agricultura de base familiar (pequenos produtores município tem a oferecer, de acordo com seus interesses. associados à AGROTUR), em torno de 50 No município, pelo menos 20 propriedades rurais empreendimentos, pertencentes às famílias da envolvidas com o agroturismo formam um “circuito de comunidade local, em sua maioria compostas por agroturismo” que os visitantes (agroturistas) têm descendentes de imigrantes italianos. possibilidade de percorrer e conhecer. Durante as visitas Em Venda Nova do Imigrante os empreendimentos também podem acompanhar o processo de produção e a dedicados ao agroturismo estão organizados sob a forma transformação dos produtos, muitas vezes realizada por de um circuito de visitação, de forma que os agroturistas meio das agroindústrias caseiras. De acordo com podem percorrer vários locais e encontrar em cada um SEBRAE (2005), a presença da agroindústria familiar em deles diferentes especialidades de produtos manipulados associação ao desenvolvimento de atividades turísticas no artesanalmente e de boa qualidade e muitos deles, espaço rural ou até em áreas urbanas de cidades genuínos da cultura local, como é o caso do socol interioranas auxilia a consolidar as rotas turísticas. A (embutido produzido com carne de lombo de porco, agroindústria aumenta as vendas e complementa a renda semelhante ao salame, por meio de um processo bastante das famílias que têm nessa atividade uma forma de artesanal e atrativo para os turistas). Alguns desses ocupação. Além disso, em geral, os produtos oriundos das empreendimentos além da mão-de-obra familiar, também

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empregam funcionários, principalmente, nas pequenas aspectos em Venda Nova do Imigrante, conforme agroindústrias caseiras. Os produtos são variados e de boa SEBRAE (2005). qualidade. São exemplos de produtos do agroturismo local: o 4.6 O comprometimento do poder público com o próprio café “especial”, queijos (inclusive sem lactose) e agroturismo em Venda Nova do Imigrante outros produtos lácteos (iogurte, ricota...), embutidos, doces, geléias, mel, biscoitos, pães, suco de uva, vinho, Na prática do agroturismo, a interação entre os vinagre e licores produzidos à base de frutas, antepastos, pequenos produtores familiares e a gestão pública é colorau, massas, fubá, polenta, além de produção de fundamental e o seu planejamento deve ser feito de forma verduras sem agrotóxicos, entre outros. A produção de democrática e participativa. produtos alimentícios tem o acompanhamento do serviço Apesar das potencialidades existentes no de vigilância sanitária municipal. Os produtos são bem município, o autor Barbosa (2012), atuante no SEBRAE apresentados com embalagens apropriadas e bem local, salienta que as iniciativas públicas e privadas não arrumadas. têm sido ainda eficientes em promover o desenvolvimento Além dos produtos comestíveis, há oferta de do agroturismo no município. Há ainda diferentes outros produtos turísticos como o artesanato feito a partir limitações e falta de orientação aos atores envolvidos com de fibras/troncos dos cafeeiros, além de taquara, sisal e de o agroturismo para que possam conduzir a atividade outras matérias-primas, inclusive produtos de higiene, adequadamente. como sabonetes feitos a partir de leite de cabra e essências Diante da perspectiva de expansão crescente do herbais. Também há produção e comércio de flores agroturismo em Venda Nova do Imigrante e região de (orquídeas) e mudas de plantas. entorno e do risco de se desenvolver de forma irregular, Alguns empreendimentos oferecem opções de Barbosa (2012) apresenta considerações sobre ações e hospedagem (pousadas rurais e o chamado projeto “Cama projetos públicos que poderão ser aplicados para o e Café”, em que o visitante pode se hospedar em fortalecimento do agroturismo em Venda Nova do residências particulares que ofertam o pernoite e o café da Imigrante, entre os quais: em âmbito municipal, a manhã, sendo que em algumas delas é possível vivenciar legislação para incentivo ao turismo rural e à agricultura as atividades do cotidiano rural). Também há opções de familiar; adesão ao sistema brasileiro de inspeção de lazer como os pesque-pagues e alimentação (restaurantes, produtos de origem animal; legislação de incentivo à cafés e outros). Os produtores rurais familiares envolvidos prestação de serviços no meio rural; autorização adquirida com o agroturismo procuram divulgar conjuntamente os em 2011 para o uso do Selo de Identificação da seus produtos, todos fazem “propaganda” de todos e Participação da Agricultura Familiar (SIPAF) obtida por valorizam mutuamente o trabalho realizado em cada parte da Prefeitura de Venda Nova do Imigrante para empreendimento. Ou seja, por exemplo, num alguns produtos comercializados no agroturismo local. empreendimento que faz parte do circuito agroturístico e Ainda, segundo Barbosa (2012), ao aderir ao SIPAF, a que produz especialmente socol, também se encontram à Prefeitura local colabora com a identificação dos produtos venda, geléias, mel e biscoitos produzidos em outro finais comercializados, cujas matérias primas principais empreendimento local. utilizadas em sua composição sejam provenientes da Como salientado em SEBRAE (2005), os próprios agricultura familiar. Além disso, favorece a visibilidade produtores rurais resgatam e fortalecem a prática do das empresas e dos empreendimentos da agricultura trabalho associativo [...] assim, o que divulgam não é familiar que promovem a inclusão econômica e social dos apenas o que lhes é próprio individualmente, mas o que agricultores, gerando mais empregos e renda no campo. era de todos, porque compreendem que o fenômeno do Em âmbito estadual, tem-se em vista a formatação turismo na região capixaba não é motivado somente por de um Plano de Desenvolvimento Preliminar do arranjo aquilo que uma propriedade oferece, mas pela soma das produtivo de agroturismo nas montanhas capixabas. Para alternativas que todas elas ofertam. tanto, será formado um grupo técnico que irá compilar e Quanto à demanda por visitação, em Venda Nova validar as sugestões referentes a cada circuito, com a do Imigrante, o mês de julho é o mais movimentado na Secretaria de Estado de Turismo (SETUR), com a cidade em termos de visitantes à procura de “consumir” o Associação de Agroturismo do Estado do Espírito Santo turismo rural e ecológico e, ao longo do ano, nos finais de (AGROTURES) e com o Serviço Brasileiro de Apoio às semana há sempre muitos turistas. Também na época em Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE). A partir de que há festividades há muita visitação, como acontece então, o documento estará pronto para nortear as ações com a Festa da Polenta, evento anual que atrai turistas de dos municípios e dos empreendedores, colaborando para a todo o Brasil e até estrangeiros. Esse evento é realizado interiorização do desenvolvimento no Espírito Santo. pela Associação Festa da Polenta /Afepol e todo o rendimento arrecadado é revertido para entidades que 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS visam manter a cultura local e o bem-estar da população. O agroturismo ajuda a manter as tradições culturais de sua O município de Venda Nova do Imigrante população e a gastronomia está muito ligada a esses apresenta expressiva área recoberta com vegetação natural e rica em biodiversidade, além de áreas de relevo

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acidentado que requerem cuidados especiais de CARNIELLI, L. Agroturismo. Os primeiros passos de conservação ambiental. Desta forma, a exploração de uma comunidade rural da montanha capixaba. Venda atividades agropecuárias e de cunho não-agrícola devem Nova do Imigrante, ES. s.d. (livreto escrito pelo ser conduzidas de maneira a preservar a qualidade dos produtor rural) recursos naturais locais, principalmente, solo e água, ou seja, deste modo, também as atividades agroturísticas ECOVIAGEM. Missão piauiense conhece modelo devem ser conduzidas sob condições de sustentabilidade. capixaba de agroturismo. Disponível em: Além disso, possui também boa oferta de alternativas de . Acesso: 30 agosto 2012. aventura, que criam a possibilidade de interação com as cidades da região por meio da implantação de circuitos de IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. turismo rural, o que favorece indiretamente, as iniciativas Censo Populacional 2010. Disponível em: de agroturismo). Essa variedade de alternativas de . Acesso: 11 dezembro 2010. atratividade turística possibilita que até mesmo em um curto período de estadia, o turista possa percorrer os INCAPER. Programa de Desenvolvimento Rural circuitos agroturísticos, desfrutar a beleza dos ambientes Sustentável. Disponível em: . rurais naturais, praticar atividades de turismo ecológico e Acesso em: 12/06/2012. até esportes de aventura, otimizando seu tempo livre para aproveitar integralmente a diversidade de atrativos INCAPER/ELDR. PROATER - Programa de disponíveis. Assistência Técnica e Extensão Rural 2011-2013. Em síntese, o município apresenta elevada Secretaria da Agricultura, Abastecimento, potencialidade para o desenvolvimento do turismo rural e, Aquicultura e Pesca. Venda Nova do Imigrante, ES, especificamente, para o agroturismo, o que pode ser 2010. Disponível em: . constatado efetivamente, uma vez que essa atividade já Acesso: 07 agosto 2012. está plenamente consolidada localmente, atraindo grande número de turistas que a visitam em todas as épocas do MONTANHAS CAPIXABAS CONVENTION & ano. Em se tratando de agroturismo no Brasil, Venda VISITORS BUREAU. Guia Turístico Oficial Nova do Imigrante pode ser considerada como referência Montanhas Capixabas. 90p. Disponível em: para a implantação da atividade em outras localidades . Acesso: 08 agosto 2013.

AGRADECIMENTOS PEDREIRA, B. C. C. G.; SANTOS, R. F.; ROCHA, J. V. Planejamento agroturístico de propriedade rural sob a Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento perspectiva da conservação ambiental. Revista Brasileira Científico e Tecnológico / CNPq – Brasil pelo apoio de Engenharia Agrícola e Ambiental. V.13, n.6, p.742– financeiro concedido ao projeto: “Estudo de viabilidade 750, 2009. do agroturismo de base familiar em Cachoeiras de Macacu, RJ”, ao qual está vinculado o presente artigo. PEDREIRA, B. C. C. G.; SANTOS, R. F; POCIDONIO, Aos pequenos produtores rurais e instituições E.A.L. Indicadores para selecionar áreas agroturísticas: o públicas de Venda Nova do Imigrante/ ES pelas desempenho dos atributos agropecuários, turísticos e de informações fornecidas. conservação ambiental. Revista Brasileira de Ecoturismo. V.6, n.2, p.400-413, mai/jul 2013. mai/jul REFERÊNCIAS 2013.

BARBOSA, R. B. Agroturismo – Uma alternativa de REVISTA TURISMO. Dicas de Viagem – Venda Nova geração de emprego, renda e permanência do homem do Imigrante, ES. Disponível em: no campo- um estudo sobre a realidade e o potencial . Acesso: 24 julho 2012. (Trabalho de conclusão de curso de especialização em Gestão Pública Municipal) CEAD-IFES-ES, Venda Nova ROQUE, A. Turismo Rural Brasileiro: Região Sudeste. do Imigrante, 2012. São Paulo: Editora Turismo de Campo, 2004.

BCB. FAQ-PRONAF - Programa de Fortalecimento SEBRAE. Impactos sobre o turismo no Espírito Santo. da Agricultura Familiar. Disponível em: Vitória: SEBRAE/ES, 2005. 121p. Acesso: 21 agosto 2012.

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POLÍTICAS PÚBLICAS DO TURISMO NO ESPAÇO RURAL BRASILEIRO: UMA BREVE DISCUSSÃO TEORICA

ANNA KARENINA CHAVES DELGADO

Instituto Federal de Pernambuco - IFPE Campus Barreiros Professora do curso Técnico em Hospedagem [email protected]

RESUMO - Este artigo objetiva discutir as políticas públicas. Primeiro enfatizando o seu conceito e forma de análise, baseado principalmente nos trabalhos de Meny e Thoenig (1989), Dye (2003), Parsons (2007), Dunn (2008) e Subirats (1993). O trabalho em questão também discute a importância das políticas públicas, destacando a visão das falhas de mercado como principais razões de desequilíbrio que levam a criação de um instrumento de controle via Estado. Dentro deste panorama a atividade turística surge, a princípio de forma pouco estruturada, mas logo em seguida é apropriada pelo discurso de que sua expansão consiste numa política redistributiva sendo portanto essencial para o desenvolvimento de localidades pouco favorecidas. Assim, o espaço rural que inicialmente foi totalmente excluído do processo de ‘desenvolvimento’ turístico passa a ser de forma ainda tímida incorporado em políticas públicas de turismo. Neste artigo pretende-se tecer breves considerações sobre o Programa Nacional da Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), Programa Nacional de Turismo Rural na Agricultura Familiar (PNTRAF) e o Macroprograma de Regionalização do Turismo (PRT) – Roteiros do Brasil, criado pelo Ministério do Turismo.

Palavras chave: Políticas Públicas, Avaliação, Turismo Rural, PRT, PRONAF.

ABSTRACT - This article aims to discuss public policies. First emphasizing the concept and method of analysis based primarily on the studies of Meny and Thoenig (1989), Dye (2003), Parsons (2007), Dunn (2008) Subirats (1993). This article also discusses the importance of public policies, emphasizing the view of market failures as the main reasons of public policies creation. Within this panorama tourist activity arises, the principle of loosely structured, but then the speech is appropriate that its expansion is a redistributive policy is therefore essential for the development of less-favored locations. Thus, the rural area that was initially completely excluded from the process of 'development' tour becomes an even shy incorporated into public policies on tourism. In this article we intend to make considerations about the Programa Nacional da Agricultura Familiar (PRONAF), Programa Nacional de Turismo Rural na Agricultura Familiar (PNTRAF) and Macroprograma de Regionalização do Turismo (PRT) – Roteiros do Brasil, created by the Ministry of Tourism.

Key words: Public Policies, Evaluation, Rural Tourism, PRT, PRONAF.

1 INTRODUÇÃO Independente da análise de casos particulares, a necessidade das políticas públicas é reconhecida até As políticas públicas englobam um leque variado mesmo por aqueles que acreditam na presença de um de ações que conforme o seu escopo podem ser Estado mínimo, já que são essas ações dos órgãos consideradas extremamente necessárias, a exemplo das públicos que garantem a ordem social. leis que se propõem a garantir o direito a vida ou Utilizando-se de uma bibliografia composta igualdade de qualquer cidadão até aquelas consideradas principalmente por Meny e Thoenig (1989), Dye (2004), por muitos desnecessárias ou até mesmo injustas, a Parsons (2007), Dunn (2008) e Subirats (1993) são exemplo de algumas políticas redistributivas do Governo tecidas considerações sobre diversos aspectos de criação e que concedem bolsas a determinadas parcelas da avaliação das políticas públicas, enfatizando os diversos população brasileira. modelos de estudo adotados pelos autores em questão.

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Entender a lógica de funcionamento das políticas turismo no espaço rural, turismo rural e agroturismo, públicas é fundamental. Os muitos mecanismos que surgem (em diferentes períodos e contextos) com o intuito influenciam na elaboração das políticas públicas com de suprir a necessidade de fuga do ser humano do espaço questionamentos acerca das razões que fazem certos urbano. O ser humano constantemente agredido no espaço temas entrarem na agenda política e outros serem urbano busca em paisagens não urbanizadas o equilíbrio totalmente ignorados contribuem para um melhor que não vivencia no cenário caótico das cidades. entendimento sobre o funcionamento de determinados Os conceitos relativos a turismo rural e setores, a exemplo do turismo. agroturismo são comumente confundidos. Rodrigues A elaboração de políticas públicas de turismo é um (2001), afirma que o turismo rural é aquele associado a fenômeno relativamente recente, o que leva a um atividades agrárias que modificam nitidamente a questionamento sobre por que as entidades públicas por fisionomia da paisagem, diferenciando-a das áreas cuja tanto tempo desconsideraram o setor. Os marcos iniciais marca persistente é o seu grau de naturalidade. A das políticas públicas se preocupavam exclusivamente atividade agrária pode estar ou não em curso, o que define com a criação de estruturas regulatórias para o setor, após o turismo rural na visão da autora é a modificação da esse período nota-se uma grande centralização do paisagem em decorrência do processo de transformação planejamento turístico nas mãos do Estado, passando-a do espaço causada pela atividade agrária. Rodrigues para o âmbito estatual e depois municipal. (2001), Portuguez (1998), Roscoche e Carvalho (2006) As políticas públicas estruturantes do setor que ainda diferenciam o turismo rural do agroturismo. Na encontravam-se centradas nas regiões litorâneas e nas visão destes autores o agroturismo envolveria a capitais dos estados começam a tomar uma nova direção participação efetiva dos turistas nas atividades ‘forçadas’, rumo ao espaço rural. ou seja, implica em atividades agrárias em curso com a Esse artigo pretende tecer breves considerações participação efetiva do turista nas chamadas ‘lidas’ sobre as políticas de turismo enfatizando como presentes nas atividades agrárias. determinados tipos de turismo são amplamente A discussão do turismo rural e agroturismo privilegiados por ações do Governo enquanto outros são envolve também a compreensão do espaço em que essas quase que esquecidos. Mostrando também, que apesar da atividades estão inseridas. Traçar uma linha que separe o ênfase dada ao litoral pelas políticas públicas já existem espaço urbano do espaço rural não é uma tarefa fácil, já ações como o PNTRAF que visam incentivar novas que a própria compreensão do rural x urbano não é formas de turismo. simples, o rural é muitas vezes confundido com o urbano O artigo é de natureza exploratória utilizando de e vice versa. um método de pesquisa bibliográfica para discutir as Veiga (2003) coloca que o Brasil é bem mais rural políticas públicas de turismo. do que se imagina, na sua concepção a definição de O estudo se encontra estruturado da seguinte urbano utilizada no Brasil é equivocada, isso porque forma: a primeira parte compreende discussões gerais durante o Estado Novo (1938) várias localidades alçaram sobre as políticas públicas enfatizando seu processo de a categoria de cidades sem possuir nem uma característica criação e a necessidade das mesmas, posteriormente são (de ordem funcional ou estrutural) que as pudesse feitas considerações sobre a evolução das políticas caracterizar como tal. Além dos métodos para a definição públicas de turismo e o ‘surgimento’ da atividade turística do urbano x rural serem obsoletos conforme afirma Veiga no ambiente rural, por fim, são feitas breves (2003), a imagem negativa associada a ruralidade que considerações sobre o PRT-Roteiros do Brasil, PRONAF permeava a mente da sociedade durante os anos 60 e 701 e PNTRAF. também pode ter contribuído para a definição de localidades rurais como urbanas. Além do, mas, segundo 2 TURISMO RURAL E AGROTURISMO Tulik (2003), atualmente existem várias áreas intermediárias que misturam características urbanas e O fenômeno de segmentação do turismo inicia-se, rurais, que tornam ainda mais complexa a definição destas principalmente, na década de 80 quando se percebe que localidades como zonas urbanas ou rurais. apenas o turismo de massa, não conseguia responder as Roscoche e Carvalho (2006) apontam uma necessidades do contingente cada vez maior de turistas. possível solução para a definição de locais que misturam Ansarah (1999) acredita que foram três as principais características urbanas e rurais, na visão dos autores deve- razões para a segmentação do setor turístico. A primeira se pensar numa nova forma de associação entre o par razão foi o posicionamento de marketing que mudou, aparentemente dialético (rural x urbano), a esta estando este ainda mais voltado para a criação de conciliação Gilberto Freyre denomina rurbanização. produtos voltados para o encantamento do cliente e não O espaço das cidades parece transbordar para o simplesmente para a sua venda, a segunda foi a espaço rural, fazendo com que os espaços rurais pós- modificação do próprio cliente que passa a exigir mais das empresas e por fim, a recessão econômica dos anos 80 1 A imagem negativa está associada ao período de exigindo uma maior criatividade por parte do produtor. industrialização do Brasil. As indústrias e a urbanidade eram Desta forma, segmentos turísticos como o vistos como sinônimos do progresso enquanto a ruralidade era ecoturismo, turismo de natureza, turismo de aventura, associada ao subdesenvolvimento.

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modernos apresentem especificidades não percebidas em também foi fortemente influenciada pela teoria da períodos anteriores, seja devido a modernização dos administração científica de Frederic Taylor comumente processos agrícolas, a presença de indústrias ou até conhecido por Taylorismo, assim como, nos estudos de mesmo devido a presença de atividades produtivas pós- Fayol, na teoria clássica da administração. modernas como o turismo. O espaço rural, especialmente Na França, Meny e Thoenig (1989) também aquele próximo a regiões economicamente dinâmicas ou analisam a produção de conhecimentos em políticas grandes aglomerados urbanos, vem cada vez mais públicas. Segundo afirmam os autores, os estudos misturando características próprias dos núcleos urbanos relacionados a área na década de 60 envolviam com uma paisagem rural. predominantemente três correntes, a saber: a ciência O desenvolvimento do turismo nesses espaços no administrativa (ou public administration theory); a Brasil ocorre primeiramente na região sul do país sociologia dos grupos de pressão (percebe que as conforme afirma Rodrigues (2001), o município de Lages autoridades públicas são influenciadas por um jogo de em Santa Catarina é pioneiro nesse segmento de turismo. interesses obscuros que comprometem a eficiência das Outros estados da região sul começam a desenvolver essa decisões administrativas) e o determinismo dos grandes modalidade de turismo na década de 80. sistemas (nessa visão as políticas públicas não explicam De acordo com Rodrigues (2001), as primeiras nada, já que a atuação do Governo são influenciadas por atividades de lazer no ambiente rural surgem como uma uma série de outras variáveis, como as lutas de classes). resposta a crise que assolava o setor produtivo, assim é Nenhuma das correntes na visão dos autores dão resposta criado o ‘dia de campo’ na Fazenda Pedras Brancas onde a complexidade da área. o visitante era recepcionado pela manhã permanecendo Cabe, no entanto, enfatizar que o estudo das até o anoitecer, participando de atividades relacionadas políticas públicas deve ser iniciado pelo entendimento de aos trabalhos agrícolas, a exemplo da colheita, plantio, seu conceito. Dye (2004) acredita que política pública é tosa de animais, ordenha de vacas, etc. Rapidamente a tudo aquilo que o Governo decide fazer ou deixar de ideia é copiada por fazendas vizinhas que passam a fazer. Meny e Thoenig (1989, p.130) veem as políticas oferecer além das atividades lúdicas o pernoite públicas como “atos e não atos engajados por uma (hospedagem), criando assim, as primeiras fazendas-hotel. autoridade pública face a um problema ou um setor de sua A princípio o turismo rural se expande na Região competência”. Parsons (2007), primeiramente faz uma Sul e Sudeste do país, destacando nesta última, as análise sobre os conceitos por vezes contraditórios do que iniciativas que surgiram nos estados de Minas Gerais, São caracteriza o público e privado, entendendo a chamada Paulo e Espírito Santo, que acabam por consolidar de vez empresa pública como aquela que tem finalidade externa, o setor no país. com sua gestão e eficiências subordinadas a satisfação de problemas ou metas externas após essa análise Parsons 3 POLÍTICAS PÚBLICAS (2007) afirma que “uma política pública representa a intenção de definir e estruturar uma base racional para Os estudos sobre políticas públicas iniciam-se na atuar ou não atuar”. Nessa perspectiva as políticas França e nos Estados Unidos. Aqueles realizados nos públicas podem ser entendidas inclusive como as Estados Unidos têm uma obra inicial de destaque, que é o omissões dos Governos, ou seja, quando o poder público livro “O estudo da Administração” de 1887, escrito por decide não criar políticas para determinado setor, essa Woodrow Wilson. No livro, o autor tece considerações ‘ação’ já é considerada uma política pública. A questão da acerca da ineficiência existente no país gerada inserção, exclusão ou omissão de um tema da agenda principalmente pela corrupção, propondo que a política é um processo que deve ser estudado. administração governamental deveria se tornar mais Dye (2004) entende que o estudo da política similar a forma de administração dos negócios privados. pública deve se basear no estudo das ações tomadas pelo De acordo com Benh (1998), o novo paradigma Governo (ações e omissões), por que o Governo toma desenvolvido por Woodrow Wilson traz evoluções com essas decisões e quais diferenças (impactos) suas ações relação ao combate a corrupção, já que tinha por base causam na sociedade. O último elemento enfatizado por separar a implementação das políticas públicas das Dye (2003), implica num questionamento feito sobre as decisões políticas que as criam, protegendo assim, as políticas públicas como instrumento de mudança. Será políticas públicas do favoritismo e do ganho individual, que as políticas públicas realmente causam mudanças na ou seja, promove-se uma separação entre o ato de sociedade ou as políticas públicas se limitam apenas a administrar e a política em si. acompanhar as mudanças na sociedade? Na visão de Wilson, a administração se encontra A resposta para esses questionamentos é fora da esfera própria da política. Questões complexa. Como mensurar se as políticas públicas são administrativas não são questões políticas. Embora a uma resposta do Governo a sociedade ou se o Governo é política determine as tarefas para a administração, não se o real elemento de mudança? deve tolerar que ela manipule seus cargos. A percepção Chevalier (2005) coloca que o Estado pode ser um que Wilson tinha sobre as políticas públicas influenciou agente transformador ou apenas dar resposta as na evolução do estudo das políticas públicas no país inquietações sociais, no último caso, o Estado teria uma criando a chamada public administration theory que visão incremental da política. É importante ressaltar que o

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Estado não necessita seguir exclusivamente uma linha de entende-la. Assim vários são os autores que discorrem atuação, ou seja, tanto pode ter uma visão incremental sobre a análise de políticas públicas tendo em vista o seguindo as mudanças sociais como propor mudanças por entendimento da posição do governo com relação a conta própria. Esse atuação [misturando as duas determinado tema, setor ou área de interesse. abordagens] é a ideal para a atuação das políticas Dunn (2008) afirma que o processo de análise da públicas. política pública é baseado numa combinação de As mudanças na sociedade influenciam conhecimentos comuns e métodos especiais científicos de sobremaneira a elaboração de políticas públicas, em questionamento da prática social, do planejamento e da especial, nos países democráticos. A autoridade administração. governamental constitui, em geral, o ator central do A análise de políticas públicas é em parte processo e do conteúdo das políticas públicas, no entanto, descritiva porque depende da ciência social para justificar há uma gama de outros atores (stakeholders) que também as causas e consequências das políticas. Mas também é podem estar engajados. Por vezes, a atuação desses outros normativa. Para avaliar a utilidade esperada e o valor atores, na forma de manifestações populares ou pressões moral da política, ele baseia-se em estudos econômicos e diversas podem desencadear uma atuação incremental da análise de decisão, bem como na ética e em outros ramos política. da filosofia social e política. (DUNN, 2008). O chamado processo das políticas públicas passa Discussões sobre análise de políticas públicas por um conjunto de ações composto por cinco fases, também são comuns nos estudos de Meny e Thoenig conforme mostra a Figura 1 a seguir. Por outro lado, cabe (1989), Parsons (2007), Dye (2004) e Subiratis (1993). destacar que antes mesmo da primeira fase (identificação Meny e Thoenig (1989) enfatizam a necessidade do problema) deve-se mencionar a questão da inclusão da de uma análise neutra combinada com uma postura área/ setor/ tema na agenda de discursão política, porque comprometida. As perguntas iniciais para essa fase são: só a partir dessa inserção é que pode ocorrer a Quais são as alternativas de ação que podem ser identificação do problema. politicamente estudadas, que o ator público pode considerar de onde se encontra? Como e por que essa 1º) IDENTIFICAÇÃO alternativa e não outra aparece na cena política? DO PROBLEMA Os autores supracitados ainda afirmam que existem quatro posturas para a análise das políticas, a postura chamada descritiva realiza um inventário exaustivo de uma ação pública; a clínica destaca 2º) FORMULAÇÃO parâmetros que correspondem aos objetivos fixados, DE SOLUÇÕES fazendo um diagnóstico; a normativa julga a política com base em valores escolhidos; enquanto que a experimental tenta descobrir as relações de causalidade entre o conteúdo de uma política e um conjunto de efeitos. 3º) TOMADA DE Subirats (1993) coloca que existem três tipos de DECISÃO avaliação de políticas públicas, o primeiro seria aquela avaliação para a determinação das necessidades do programa (relacionada especificamente a questionamentos sobre o planejamento), a segunda avaliação é a formativa 4º) IMPLEMENTAÇÃO ou corretora (relacionada a problemas de implementação das ações procurando entender o funcionamento real do programa), e por fim, a avaliação de balanço ou conclusiva (busca informações sobre os resultados finais 5º) TÉRMINO DA da política). AÇÃO Dye (2003), ao invés de considerar apenas três formas de avaliação como Subirats (1993), afirma que existem oito modelos de avaliação. A criação do modelo Figura 1 – Processo das políticas públicas como instrumento de avaliação é justificada pelo autor Fonte: Elaboração própria (2013). devido a simplificação que este atribui. Assim os modelos citados por Dye (2003) são: O processo das políticas públicas ainda pode - Modelo institucional: devido a grande relação passar por uma fase de avaliação com o intuito de existente entre as políticas públicas e as instituições entender quais foram as possíveis falhas se estas foram governamentais, o modelo prevê o entendimento das relacionadas ao planejamento ou a implementação das instituições para que se entenda as políticas propostas por ações, ou mesmo para saber quais foram os resultados estas instituições; alcançados. A análise da política pública consiste num - Modelo de processo: aborda a política a partir de processo multidisciplinar que além de melhorar as ações um conjunto de fases que compreende a identificação do estabelecidas pela política também tem como objetivo

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problema, entrada na agenda, formulação, legitimação, de coerção que é próprio de todas as ações do Governo, já implementação e avaliação; que este possui o poder de impor para a coletividade as - Modelo racional: a visão racional específica que suas decisões e por fim, a competência social ou público a melhor política é aquela que traz o ganho social atingido, todos aqueles indivíduos cuja situação é afetada máximo. É importante ressaltar que esse modelo pela ação pública (de forma direta ou indireta). considera a visão racional como aquela que envolve o A respeito da aplicação de modelos para definir cálculo de todos os valores sociais, políticos e qual linha deve ser tomada para analisar as políticas econômicos sacrificados ou alcançados pela política, não públicas, Dunn (2008) traz a definição do passo a passo só aqueles que podem ser mensurados em moeda para a sua aplicação ilustrado na figura 2 a seguir. - Modelo incremental: são políticas que se limitam a dar continuidade a ações passadas, esse modelo enfatiza que por vezes o Governo não possui tempo, Performance da política informação ou dinheiro para investigar outras alternativas Avaliação Predição recorrendo assim ao incremento de políticas já existentes. Além de que os atores políticos já tem uma boa noção das consequências/ resultados que pode obter ao contrário do Resultados Est. Resultados que ocorre ao implementar uma política nova; Observados Pro. esperados - Teoria dos grupos: essa corrente tem como b. fundamento a proposição de que a interação entre os grupos é o fator central da política, sendo assim, as Problemas Est. mudanças de equilíbrio entre os relacionamentos dos Est. de política Pro. grupos é que definem as mudanças na política, desta Pro. b. forma, deve-se estudar essas interações para melhor b. analisar as políticas públicas; Monitorar Est. Rec. - Teoria da elite: as políticas públicas também Pro. podem ser vistas como as preferências e valores da elite. b. Devido a apatia e desinformação das massas a elite acaba tomando a frente e influenciando a opinião da massa nas Políticas questões políticas e ‘negociando’ com os administradores Preferidas públicos para que as políticas públicas privilegiem as demandas da elite; - Teoria da escolha pública: assume que todos os Est. Pro. = Estruturação do Problema; atores visam maximizar os benefícios pessoais sem pensar Rec. = Recomendação. nas ações que são mais eficientes para a coletividade, mas sim nas ações mais eficientes a nível individual. Assim, Figura 2 – Processo de análise de política integrado os estudos baseiam-se em entender a que nível as Fonte: Dunn (2008, p.4) demandas individuais influenciam na criação das políticas públicas que são por natureza coletivas; O modelo de processo de análise integrado de - Teoria dos jogos: no processo de tomada de Dunn (2008) é baseado em cinco campos, tendo como decisão dois ou mais participantes fazem escolhas centro o problema de política, ao seja qual é o problema racionais, mas a melhor alternativa depende da escolha que a política quer resolver? A resposta para este dos outros participantes ou da expectativa das alternativas questionamento requer o levantamento dos antecedentes por eles escolhidas. históricos do problema, informações sobre os fins Deve-se também enfatizar que a política pública esperados e quais ações/ realizações que podem levar a apresenta características específicas que também solução do problema. influenciam no seu processo de análise. O segundo campo, resultados esperados tem como Meny e Thoenig (1989) estudam essas questionamento principal qual curso de ação deve ser características. Toda política deve ter um conteúdo, ou escolhido para resolver o problema? Nessa etapa o seja, a política envolve a mobilização de recursos que analista de políticas deve ser criativo e se preocupar com geram determinados produtos (outcomes), estes por sua resultados das políticas esperados que não são dados por vez são os que se investigam como um problema de uma situação existente. investigação da ação. A política também envolve um A política preferida se refere a solução potencial programa, que seriam os atos articulados em torno de para o problema se baseando nos estudos e avaliações eixos de ação específicos, esses eixos de ação podem feitas nas outras fases, juntamente com o levantamento de dizer muito sobre as reais intenções da política. A dados sobre os possíveis impactos da adoção da política orientação normativa está presente na política pública, os preferida, assim como, o julgamento do valor da utilidade atos da política estão (intencionalmente ou não) das ações desencadeadas pela sua adoção. relacionados a certos valores que também devem ser O quarto campo, resultados observados são as ‘texturizados’ pelo analista de políticas públicas. O fator consequência que a política pública causa no passado ou

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ainda está causando no presente. Algumas consequências indivíduo no mercado. Tratando especificamente do das políticas públicas não conseguem ser mensuradas modelo de gestão brasileiro a principal solução antes de sua implementação (ex ante), mas apenas depois encontrada foi a elaboração de políticas redistributivas de sua devida implementação (ex post). que concedem bolsas de auxílio as populações mais Por fim, a performance (ou desempenho) da carentes, baseando-se no princípio de que a igualdade não política se refere ao grau em que um resultado da política consiste em tratar todos os indivíduos da mesma forma, pública contribui ou não para gerar oportunidades para a mas sim tratar com diferença aqueles que são diferentes. resolução do problema encontrado na fase inicial.

3.1 A criação de políticas públicas é necessária? 3.2 Políticas públicas de turismo

A discussão sobre a real necessidade das políticas Cruz (2002) divide as políticas de turismo em três públicas requer um questionamento sobre o escopo das fases, a primeira delas é a chamada pré-história do políticas, será que todas as políticas públicas são iguais ou turismo (1938 - 1966), que compreende a criação das cada política é criada visando uma ‘estratégia’ de atuação primeiras políticas de turismo que tratam de discorrer diferenciada? sobre as atribuições de algumas empresas turistas a Comumente as políticas públicas podem ser exemplo das agências (de viagem, de turismo), entendidas a partir de uma classificação baseada em operadoras, e empresas de transporte turístico. quatro tipos: Posteriormente, no período de 1966 a 1991 surgem as - Política distributiva: consiste em um conjunto de primeiras políticas de ordenação da atividade que concessões que podem ser dadas a particulares, a exemplo estipulam a criação do Sistema Nacional de Turismo de licença para dirigir ou construir; formado pela Empresa Brasileira de Turismo - Política redistributiva: são entendidas como (EMBRATUR) e pelo Conselho Nacional de Turismo aquelas que beneficiam a classe de indivíduos (CNTUR), que devem se encarregar da criação de uma necessitados, que a rigor estaria orientada para a política pública de estruturação do turismo, no entanto, redistribuição de renda e benefícios, a exemplo da esse período não apresenta numa produção concreta em reforma agrária; termos da implementação do Plano Nacional de Turismo, - Política regulamentar: compreende a definição de há apenas a sua criação, e há também a criação e regras e procedimentos que regulam o comportamento implementação dos megaprojetos hoteleiros no litoral do dos atores sociais para atender aos interesses gerais da Nordeste brasileiro, sendo, implementado nesse período sociedade, a exemplo das políticas tributárias; apenas no Rio Grande do Norte; a fase seguinte, de 1991 - Política constitutiva: a ação pública é aquela que a 1999 marca um período em que são criados e define as regras a serem seguidas. implementados várias políticas públicas de turismo, as As políticas públicas regulamentadoras, duas principais políticas desse período são o Programa de constitutivas e distributivas são quase que um consenso Desenvolvimento do Turismo no Nordeste sobre sua importância para a sociedade, no entanto, deve- (PRODETUR/NE) e o Programa de Municipalização do se primeiramente entender que o alicerce para justificar a Turismo (PNMT). existência das políticas públicas está na ineficiência da O PNMT representa um marco nas políticas escolha individual, ou seja, em muitos casos aquilo que é públicas de turismo por ser o primeiro instrumento a bom para alguns indivíduos isoladamente (e que por discorrer sobre uma descentralização no planejamento consequência seriam as escolhas adotadas por eles) pode turístico, enfatizando o papel dos municípios na gestão da não ser bom para a sociedade como um todo, desta forma, atividade, com base no PNMT foi criada a principal torna-se necessária a presença de um ente que garanta o política pública de turismo da atualidade, o PRT – interesse da coletividade, e não de apenas alguns grupos Roteiros do Brasil. Ao analisar os resultados e a própria particulares que podem comprometer o todo. lógica de criação do PNMT percebe-se que os municípios Assim, os economistas enfatizam a existência das de forma isolada não conseguiam dar resposta as chamadas falhas de mercado para ilustrar esse problema. demandas turísticas necessárias para desenvolver os Stiglitz e Walsh (2003) citam como principais falhas de núcleos turísticos. mercado: a) ineficiente provisão de bens públicos; b) os O PRODETUR/NE surge como um mecanismo comportamentos não competitivos das empresas; c) as para subsidiar a política dos megaprojetos que neste externalidades negativas e positivas; d) as informações período, na década de 90, não existia apenas no Rio assimétricas; e) os mercados incompletos. Grande do Norte, já havia se expandido para a Paraíba, Além das falhas de mercado, muitos estudiosos Bahia, Pernambuco e Alagoas. defendem a intervenção estatal a partir inclusive das Beni (2006) ainda inclui uma nova fase nas políticas redistributivas pela exclusão de indivíduos do políticas públicas de turismo, esta fase tem início com a mercado. Segundo esta visão aquele indivíduo que não criação do Ministério do Turismo (Mtur) em 2003 e com possui fatores de produção (terra, capital ou força de uma nova estruturação do papel da EMBRATUR que trabalho) encontra-se excluído do mercado, dessa forma, passa a ser denominado como Instituto Brasileiro de compete ao Governo criar uma forma de inclusão desse Turismo e modifica sua linha atuação, deixando de estar

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relacionado a criação de políticas públicas para a nos destinos turísticos produções relacionadas, por promoção do turismo no exterior. O papel de criação e exemplo, a produção de peças artesanais. Uma das ações implementação do Plano Nacional de Turismo (PNT) propostas pelo programa é o apoio a diversificação da passa a ser da alçada do Mtur. oferta turística por meio da produção associada, ou seja, A partir da elaboração do PNT (2007 - 2010), a agregar valor aos roteiros turísticos com os elementos política pública de turismo mais enfatizada é o típicos locais; macroprograma de regionalização do turismo, este é - Programa de apoio ao desenvolvimento regional: composto pelos programas de planejamento e gestão da que nada mais é do que o PRODETUR/ NE em escala regionalização; programa de estruturação dos segmentos nacional. turísticos; programa de estruturação da produção Quando o programa foi lançado em 2008, vários associada ao turismo e programa de apoio ao estudiosos se mostraram satisfeitos com a iniciativa do desenvolvimento regional (o PRODETUR nacional). Mtur em criar um programa de planejamento turístico que O fundamento do PRT é a elaboração de realmente leva-se em consideração as potencialidades roteiros turísticos agrupando o potencial dos municípios locais de uma forma sinérgica, baseando nos princípios de de uma determinada região. Diferente do PNMT que estudo do espaço turístico desenvolvidos por Boullón. No trabalhava apenas com os atrativos turísticos e entanto, a implementação do macroprograma trouxe uma equipamentos de um determinado município o PRT série de questionamentos. pretende elaborar roteiros que a partir da sinergia entre Beni (2006), antes mesmo da implementação do atrativos e infraestrutura de diferentes municípios possa programa já tece considerações sobre a regionalização proporcionar qualidade e descentralizar os fluxos poder levar a um processo de clusterização turística que turísticos no país, valorizando a criação de roteiros no envolve o estabelecimento de parcerias entre destinação já interior dos Estados. existentes e consolidadas como núcleos. O autor ainda chama atenção para o aparecimento de uma roteirização 3.3 PRT – Roteiros do Brasil regionalizada em vez de regionalização sustentável do turismo, com ausência de planos e projetos. O macroprograma PRT – Roteiros do Brasil é No caso específico do PRT – Roteiros do Brasil estruturado conforme a figura 3, por quatro programas como foi observado, existem projetos, no entanto, a sua estruturantes. implementação não ocorre como planejado. Estudos, a exemplo do Virginio (2011) mostram que um grande entrave para a implementação do programa é a falta de conhecimento sobre o macroprograma e sobre o PNT como um todo. Na pesquisa realizada por Virginio (2011) no Polo Costa das Dunas poucos foram os gestores públicos que afirmaram conhecer o funcionamento do PRT, poucos também participaram dos cursos de

Figura 3 – Composição do PRT – Roteiros do Brasil educação a distância promovido pelo Mtur, em especial, aquele curso que visava a qualificação profissional para o Fonte: Mtur (2009) PRT – Roteiros do Brasil.

Apesar do PRT discorrer sobre uma - Programa de planejamento e gestão da descentralização e empoderamento local percebe-se regionalização: consiste num conjunto de ações e projetos voltados a todas as unidades da federal com o objetivo de claramente que o modelo é imposto em âmbito regional, ou seja, as regiões não tem nenhum poder para modificar promover a articulação, sensibilização e mobilização, a estrutura do programa ou de propor diferentes formas de assim como a elaboração e a implementação dos planos participação da população. estratégicos no âmbito das instâncias regionais de O programa está associado aos conselhos de turismo, que são responsáveis pelo planejamento das turismo que a rigor são também compostos pela sociedade regiões turísticas. Dentre as principais ações realizadas por este programa estão o inventário da oferta turística e a civil organizada, por outro lado, na prática, como mostrou o estudo de Virginio (2011), poucos são os integrantes da estruturação/ gestão dos 65 destinos indutores; sociedade civil organizada que participam do conselho, - Programa de estruturação dos segmentos assim, o planejamento do turismo fica mais uma vez nas turísticos: esse é o programa que se encarrega de criar mãos do poder público e de alguns representantes do ações para ampliar o consumo do turismo e descentralizar a atividade a partir da criação e implementação de outras trade turístico. formas de turismo, que fuja do turismo de sol e mar. Uma Por fim, outra crítica diz respeito a própria composição dos polos. É possível notar claramente que os das principais ações efetivadas pelo programa foi a polos mais dinâmicos e estruturados são aqueles apresentação dos destinos de referência em segmentos localizados nas regiões litorâneas, que mostram ações turísticos, além dos cursos de educação a distância; mais consistentes. Ainda são poucos os polos existentes - Programa de estruturação da produção associada ao turismo: apoiar a produção de elementos diversificados no interior dos estados, e mesmo naqueles casos em que existe um polo no interior as ações em relação aos polos

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localizados no litoral são evidentes. A ênfase dada ao auxilio de Organizações não-governamentais (ONG’s) ou turismo de sol e mar em detrimento do turismo rural/ da Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER). agroturismo é claramente percebida. No entanto, será que O PRONAF se divide em diversos tipos, a saber: essa é uma escolha dos planejadores do turismo, ou será a) custeio; b) mais alimentos; c) investimento; d) que é fruto da própria lógica de funcionamento do agroindústria; e) agroecologia; f) floresta; g) semiárido; h) mercado, na figura do capital que parece ser atraído para mulher; i) jovem; j) custeio e comercialização de as regiões que são economicamente mais dinâmicas agroindústrias familiares; k) cota-parte; e l) microcrédito contribuindo para a sustentação do perverso modelo rural. capitalista atual. De acordo com os dados do Safra 2013/ 2014 as possibilidades de crédito na finalidade Investimento para 3.4 PRONAF atividades agropecuárias, turismo rural, artesanato e outras atividades no meio rural (grifo nosso) podem ser O PRONAF, programa de autoria do Ministério do observadas na tabela 1 a seguir. Desenvolvimento Agrário (MDA), surge com o objetivo de auxiliar o pequeno agricultor (agricultor familiar) a Linha Público Crédito Juros desenvolver projetos individuais ou em forma de Mulher Mulheres agricultoras Grupos A, 0,5% cooperativa. O auxilio se dá na forma de financiamento. A/C e B: R$ a. a. A despeito dos grandes avanços tecnológicos no 2,5 mil setor agropecuário e da ênfase em termos de políticas Jovem Filhos de agricultores. R$ 15 mil 1% públicas que tem-se dado a agricultura patronal, ainda são Faixa etária: 16 a 29 (uma única a.a. os agricultores familiares que respondem pelo maior operação) percentual de produção de alimentos no Brasil. O próprio Tabela 1 – Linhas de crédito 2013/ 2014 relacionadas ao MDA (2011), afirma que os pequenos agricultores são turismo rural responsáveis por 70% da produção dos alimentos no país. Fonte: Plano Safra 2013/2014 O programa foi criado em 1996, segundo Mattei (2005) dois fatores foram fundamentais para a elaboração A classificação feita na coluna crédito com as do programa, as reivindicações dos proprietários rurais e letras A e A/C se refere a grupos específicos de mulheres os estudos realizados pelo Instituto Nacional de que podem ser beneficiadas. Grupo A são as mulheres Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e pela Food and integrantes de unidades familiares assentadas de reforma Agriculture Organization (FAO). agrária ou beneficiárias do crédito fundiário e o Grupo A temática da agricultura familiar só entra A/C são aquelas egressas do Grupo A ou do Programa de definitivamente na agenda política quando as massas Crédito Especial para a Reforma Agrária (PROCERA). (neste caso os agricultores familiares) começam a se Ao analisar as concessões de crédito do PRONAF organizar formando as jornadas nacionais de luta. E referente ao período de 2013/ 2014 percebe-se que são também a partir do momento em que o setor é pauta de poucas as possibilidades de crédito (apenas duas) na pesquisa de órgãos de grande importância em âmbito finalidade turismo rural. A maior parte das concessões de nacional e internacional. crédito (e com valores mais elevados) dizem respeito a Para a concessão de financiamento primeiramente projetos na área de agroecologia, enfatizando o setor deve-se provar que se trata de um produtor rural (figura também de recuperação e conservação ambiental. física, jurídica ou mesmo cooperativas), os parâmetros O MDA possui, além do PRONAF, um programa estabelecidos para a concessão incluem: denominado de diversificação da economia, este possui - Uma renda bruta anual não maior do que 360 mil dois projetos que envolvem a atividade turística no meio reais (onde no mínimo 50% desta renda deve ser gerada rural, são eles: turismo e artesanato; e roteiros turísticos por atividade agrícola ou não agrícola realizada no da agricultura familiar. O último projeto atua em estabelecimento); associação com o MTur e com o Ministério do Meio - O agricultor deve residir na localidade onde se Ambiente, além de ONG’s, técnicos e representantes encontra a propriedade; diversos da sociedade civil organizada formando a - O produtor pode possuir empregados, mas estes chamada rede de Turismo Rural na Agricultura Familiar devem ser em menor número do que o número de pessoas (TRAF), gestora do Programa Nacional de Turismo Rural da família ocupadas com o estabelecimento; na Agricultura Familiar (PNTRAF). - Pequena propriedade (tamanho máximo de seis Atualmente o PNTRAF é o programa que tem módulos fiscais2). apresentado resultados mais expressivos com relação a Além das exigências acima o programa só concede prática do associativismo e da descentralização do financiamento para aqueles agricultores que apresentarem turismo. O programa envolve além da concessão de um projeto, o MDA sugere que os agricultores procurem crédito, um projeto para a qualificação da mão de obra. No entanto, esse é um programa recente, criado em 2004. A primeira discussão sobre a efetivação de uma ‘política’ 2 O tamanho do módulo fiscal em hectares vai variar de acordo relacionadas ao setor do turismo rural surgem apenas em com a região e sub-região aonde a propriedade está inserida. 2003 com o documento das diretrizes para o

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desenvolvimento do turismo rural no Brasil, elaborado Também se torna necessário um estudo mais pelo MTur no último PNT. aprofundado sobre todas as ações realizadas pelo programa, já que em decorrência de este envolver uma 4 CONCLUSÕES ampla quantidade de atores torna-se difícil a mensuração de todas as suas atividades. Apenas a partir do O presente estudo ressalta a importância das levantamento desses dados é possível analisar de forma políticas públicas como um elemento que promove uma ampla em que medida o PNTRAF tem impactado o maior organização da sociedade, organização esta que cenário turístico brasileiro. exclusivamente a partir do mercado não seria possível. Apesar das benesses relativas as ações ou omissões do poder público frente a sociedade deve-se destacar que REFERÊNCIAS diversos devem ser os questionamentos relativos as políticas públicas, dentre eles o questionamento básico de ANSARAH, M. Turismo: segmentação de mercado. São o que faz determinada pauta entrar na agenda política? Paulo: Futura, 1999. Vários são os modelos e formas de análise usadas para tentar responder a essa pergunta, autores como BEHN, R. O novo paradigma da gestão pública e a busca Parsons (2007), Subirats (1993), Meny e Thoenig (1989), de accountability democrático. Revista serviço público, n Dunn () e Dye (2004) se debruçam sobre essas e tantas 49/4, Brasília, ENAP, 1998. outras questões relacionadas as políticas públicas. A atividade turística que a princípio, nas décadas BENI, M. C. Política e Planejamento de Turismo no de 30 a 60 é quase que totalmente ignorada em termos de Brasil. São Paulo: Aleph, 2006 - (Série turismo). políticas públicas estruturantes do setor, passa a entrar na agenda política por meio de uma política denominada CHEVALIER, Jacques. Politiques Publiques et megaprojetos (cuja extensão se limitava a alguns estados changement social, in Revue Française d'administration do Nordeste brasileiro). O primeiro megaprojeto realizado publique. École Nationale d'administration, n. 115, 2005. foi no Rio Grande do Norte, o Costa das Dunas, este sofreu diversas críticas devido ao grande impacto CRUZ, R. de C. Política de turismo e território. 3. ed. ambiental e a exclusão social que causou. O projeto São Paulo: contexto, 2002. concedia uma série de vantagens aos grandes grupos internacionais que se interessassem em construir seus DYE, T. R. Understanding public policy. 11.ed. New resorts no litoral do Rio Grande do Norte. Jersey: Prentice Hall, 2004. Dando prosseguimento a política dos megaprojetos tem-se o PRODETUR/NE que atuou como um DUNN, W. N. Public policy analysis: an introduction. 4 mecanismo estruturador das destinações turísticas ed. New Jersey: Pearson, 2008. litorâneas para a chegada de ‘investimentos’ estrangeiros em estruturas hoteleiros. MATTEI, L. F. Impactos do PRONAF: análise de Desta forma, percebe-se claramente que as indicadores. Brasil: NEAD, 2005. políticas públicas de turismo privilegiavam o turismo de sol e mar, as principais políticas públicas brasileiras MENY, I.; THOENIG, J-C. Las políticas públicas. atuavam dentro desse segmento e em grande medida Barcelona: Ariel S.A, 1989. ainda atuam, basta observar os resultados do PRT – Roteiros do Brasil fazendo uma leitura mais crítica dos Ministério do Turismo. Programa de regionalização do mesmos. turismo: 5 anos de regionalização como política de O turismo no espaço rural surge no Brasil na desenvolvimento do turismo nacional. Brasília, 2009. década de 80 e só passa a ser fruto de uma política pública de turismo um pouco mais consistente a partir de 2004, PARSONS, W. Políticas públicas: una introducción a la com o PNTRAF. teoría y la práctica del análisis de políticas públicas. Apesar da iniciativa da rede TRAF ser benéfica Mexico: FLACSO, 2007. para a descentralização do turismo não se pode deixar de enfatizar que, muitos projetos se utilizam da nomenclatura PORTUGUEZ, A. P. Agroturismo e desenvolvimento de TRAF sem, no entanto, apresentarem características regional. São Paulo: Hucitec, 1998. próprias de agricultura familiar, talvez ainda falte ao programa um conjunto de regras mais consistente a RODRIGUES, A. B. (org.). Turismo rural. São Paulo: exemplo do que acontece com o PRONAF3. Contexto, 2001.

3 O PRONAF inclusive já apresentou uma linha de crédito voltado exclusivamente para o turismo, o PRONAF – turismo, necessário, já que pelo PNTRAF também é possível para o mas com o surgimento do PNTRAF acabou por deixar de ser tão produtor rural obter crédito.

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ROSCOCHE, L.; CARVALHO, R. Os conceitos de turismo no meio rural e as diferentes realidades regionais do Brasil: um estudo comparativo preliminar entre Pernambuco e Paraná. PORTUGUEZ, A. P.; TAMANINI, E.; SANTIL, J.; CORRÊA, M. C.; FERRETTI, O.; NIEHUES, V. Turismo no espaço rural: enfoques e perspectivas. São Paulo: Roca, 2006.

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A GESTÃO COMO DESENVOLVIMENTO LOCAL NA AGRICULTURA FAMILIAR E NOS ASSENTAMENTOS RURAIS: UMA ANÁLISE PARA NOVA ANDRADINA - MS

FABIANO GRETER MOREIRA MADALENA MARIA SCHLINDWEIN

Universidade Federal da Grande Dourados - UFGD Faculdade de Administração, Ciências Contábeis e Economia - FACE Programa de Pós-Graduação em Agronegócios – Dourados - MS [email protected] / [email protected]

RESUMO - A Agricultura Familiar, no contexto da gestão como desenvolvimento local – o envolvimento de políticas governamentais ou não governamentais no seu desenvolvimento, em função de sua importância no país, nos estados e nos municípios – passou a contemplar novas significações, ao propor um tratamento mais analítico de sua terminologia e significativo impulso para o desenvolvimento local, haja vista que esse cenário apresenta potencialidades econômicas e sociais impactantes na geração de renda e comercialização de alimentos no país. Dessa forma, esta pesquisa objetiva evidenciar os aspectos referentes à gestão como desenvolvimento local na Agricultura Familiar e nos Assentamentos Rurais no Município de Nova Andradina – MS. Apresenta como método de pesquisa, o estudo bibliográfico de caráter exploratório. Os principais resultados apontam a importância da gestão como desenvolvimento local na Agricultura Familiar e nos Assentamentos Rurais, evidenciando a sua dimensão e expressividade perante o agronegócio, comparados ao Estado de Mato de Grosso do Sul e Brasil.

Palavras chave: Agricultura Familiar, Desenvolvimento Local, Gestão, Nova Andradina.

ABSTRACT - The Family Farming in the context of management and local development - the involvement of non-governmental or government policies in their development, due to its importance in the country, in states and municipalities - now includes new meanings, to propose a more analytical of its terminology and significant boost to local development, given that this scenario presents potential economic and social impacting on income generation and marketing of food in the country. Thus, this research aims at identifying aspects relating to management and local development in Family Agriculture and Rural Settlements in the City of Nova Andradina - MS. Presents as a research method, the bibliographical study exploratory. The main results show the importance of management and local development in family farming and rural settlements, showing their size and expressiveness to the agribusiness, compared to the state of Mato Grosso do Sul and Brazil.

Key words: Family Farming, Local Development, Management, Nova Andradina.

1 INTRODUÇÃO do agronegócio brasileiro. Seu desenvolvimento é entendido como uma das pré-condições para uma A relevância desse trabalho está em demonstrar a sociedade economicamente mais eficiente e socialmente importância do resgate do papel do homem e da mulher mais justa. Para tanto, existe, segundo o autor, uma série do campo como atores sociais influentes ao longo da de fatores que afetam significativamente o desempenho história da produção agrícola do país. dos empreendimentos rurais, muitos dos quais fogem do Nessa perspectiva, faz-se importante destacar controle da unidade de produção, enquanto outros, como a segundo Lourenzani (2008), que o segmento da gestão da produção, estão mais diretamente vinculadas ao Agricultura Familiar tem assumido, ao longo do tempo, seu controle. um papel socioeconômico de grande relevância no âmbito

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A Agricultura Familiar não é um termo novo. Contudo, mais recentemente, ela passou a contemplar Ao longo dos anos, os assentamentos se novas significações ao propor um tratamento mais constituíram em um tipo de consagração da luta – a analítico de sua terminologia, o que possibilitou sua conquista da terra – que logo se desdobraram em novas ampliação nas discussões acadêmicas, nas políticas de perspectivas: de produção, de renda, de moradia e de Estado e no âmbito dos movimentos sociais. Assim, a condições dignas de vida, promovendo, portanto, novas disponibilização de técnicas gerenciais apropriadas para a frentes, que podem ser resumidas na busca por crédito, Agricultura Familiar visa contribuir para a promoção da assistência técnica, infraestrutura física, econômica e sustentabilidade econômica desses empreendimentos. social. Nesse contexto, a gestão como desenvolvimento local, Para Silva (2011), as políticas públicas aplicadas dentro dos Projetos de Assentamento, torna importante o à orientação dos sistemas produtivos dos assentamentos gerenciamento de melhores formas de organização, bem rurais devem ser direcionadas e sustentadas nos seguintes como de diversificações de produção, e acima de tudo, de eixos: fomento, extensão rural qualificada e em estabilização das famílias na região em que estão quantidade suficiente, investimento/logística e segurança inseridas. alimentar. Dessa forma, podem conduzir a um processo A saída dos produtores rurais do campo para de desenvolvimento econômico-democrático, com a tentar uma vida nova na cidade muitas vezes é frustrante, participação dos assentados e das suas organizações. pois ocorre que, além da falta de qualificação para os De acordo com Santos (2011), os desafios são trabalhos urbanos, em muitos casos, eles não atendem às grandes, embora, em termos tecnológicos/produtivos, já reais necessidades do mercado de trabalho local. Para exista bastante acúmulo para o desenvolvimento de tanto, é de alta relevância o estudo dos aspectos inerentes tecnologias apropriadas à Agricultura Familiar no Brasil. às deficiências da gestão dentro da Agricultura Familiar O maior desafio reside no processo de capacitação e no contexto supracitado, uma vez que nesse cenário formação dos agricultores e agricultoras. Por isso, a também se encontram presentes os aspectos culturais, gestão como desenvolvimento local precisa ganhar políticos e econômicos, os quais se tornam necessários amplitude de cobertura das necessidades e deficiências para uma importante demarcação de uma forte cadeia nos assentamentos rurais, exigindo métodos adequados produtiva na região. para cada região e/ou localidade, traçando medidas de Assim, o objetivo desta pesquisa se refere à permanência do homem no campo, como empresário rural contemplação dos aspectos relativos à gestão como e não apenas como assentado. desenvolvimento local, caracterizando a Agricultura Diante do contexto da Política Nacional de Familiar e os Assentamentos Rurais no município de Assistência Técnica e Extensão Rural - Pnater, foi Nova Andradina. construída, em parceria com as organizações Para tanto, o trabalho estrutura-se em quatro governamentais e não-governamentais de Assistencia partes, além desta breve introdução. No segundo item Técnica e Extensão Rural - Ater e a sociedade civil apresenta-se a revisão bibliográfica com o intuito de organizada e instituída pelo Governo Federal, em 2003, evidenciar a importância da gestão como através do Programa Nacional de Assistência Técnica e desenvolvimento no âmbito da Agricultura Familiar local. Extensão Rural - Pronater, princípios de desenvolvimento A seguir coloca-se a utilização do método de estudo sustentável, os quais incluem a diversidade de categorias bibliográfico em caráter exploratório, buscando e atividades da Agricultura Familiar e consideram demonstrar a participação dos Projetos de Assentamentos elementos como gêneros, gerações e raças/etnias e o papel (PAs) no contexto destacado. Com os resultados e das organizações governamentais e não-governamentais discussões fica evidente que a Agricultura Familiar (MDA, 2003). corresponde a participação expressiva no agronegócio Neste sentido, Sangalli (2013) evidencia que a local, desenvolvendo a permanência do homem/mulher no Nova Política de Assistência Técnica e Extensão Rural - campo, bem como, a produção de alimentos para a ATER prioriza ações educativas, as quais devem ser sociedade. desenvolvidas de forma participativa e direcionadas para os agricultores familiares tradicionais ou de 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA assentamentos rurais e, ainda, que é papel dos técnicos a socialização de tecnologias apropriadas, especialmente Esta revisão bibliográfica refere-se a uma análise em associações, cooperativas ou grupos informais, que dos aspectos que envolvem a temática deste artigo, são mediadores na busca de melhorias tecnológicas, dividindo-se em: Gestão e Assentamentos Rurais, gerenciais ou de outra natureza. Os produtores rurais princípios da política nacional de Ater1, Reforma Agrária podem participar de um sistema de cooperativismo, e Agricultura Familiar, o Papel da Organização e o composto de cooperativas locais, vinculadas à Desenvolvimento Local e Agricultura Familiar. Organização das Cooperativas de cada Estado – OCE, esta afiliada à Organização das Cooperativas do Brasil – 2.1 Gestão e Assentamentos Rurais OCB e também às associações locais ou setoriais, representadas por Federações Estaduais ou mesmo 1 Ater – Assistência Técnica e Extensão Rural. Nacionais, segundo bem salientou Araújo (2010).

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Conforme descrição de Tsukamoto e Asari (2003), o tecnológico baseado nos princípios da INCRA afirma que a característica principal do programa Agroecologia; de assentamento é a criação de novas pequenas d) Estabelecer um modo de gestão capaz de propriedades em terras que, na maioria das vezes, se democratizar as decisões, contribuir para a encontram totalmente ociosas ou com baixa utilização na construção da cidadania e facilitar o produção agrícola. O assentamento significa, portanto, a processo de controle social no incorporação de novas terras ao processo produtivo do planejamento, monitoramento e avaliação país, com a consequente criação de empregos e das atividades, de maneira a permitir a distribuição de renda, beneficiando a camada de pequenos análise e melhoria no andamento das ações; agricultores que formam a clientela típica da Reforma e) Desenvolver processos educativos Agrária e do INCRA, ou seja, é um processo muito permanentes e continuados, visando a importante no contexto de desenvolvimento do país. formação de competências, mudanças de Para Bergamasco e Norder (1996), o assentamento atitudes e procedimentos dos atores sociais, rural é uma das formas objetivas de se fazer reforma que potencializem os objetivos de melhoria agrária, acreditando que, de maneira genérica, os da qualidade de vida e de promoção do assentamentos rurais podem ser definidos como a criação desenvolvimento rural sustentável de novas unidades de produção agrícola, por meio de (MDA/SAF, 2004, p. 02). políticas governamentais visando à equalização do uso da terra em benefício de trabalhadores rurais sem- terra ou A proposta é de que a política atue decisivamente com pouca terra. nas iniciativas de desenvolvimento rural sustentável, que envolvam atividades agrícolas ou não agrícolas, 2.2 Princípios da Política Nacional de Assistência pesqueiras, de extrativismo e outras afins, tendo como Técnica e Extensão Rural – Ater foco o fortalecimento da Agricultura Familiar, visando à melhoria da qualidade de vida e fundamentos em Através do Ministério do Desenvolvimento princípios agroecológicos. A questão que fica é se esses Agrário – MDA e da Secretaria da Agricultura Familiar – princípios estabelecidos são efetivamente aplicados. SAF, foi sancionada a Lei 12.188 de janeiro de 2010, que institui a Política Nacional de Assistência Técnica e 2.3 Reforma Agrária e Agricultura Familiar Extensão Rural para a Agricultura Familiar e Reforma Agrária – PNATER e o Programa Nacional de Assistência A Reforma Agrária num país como o Brasil Técnica e Extensão Rural para a Agricultura Familiar e apresenta-se, segundo Martins (2003), como um processo Reforma Agrária – PRONATER. Elas devem promover de distribuição e redistribuição de terras e de correção processos de gestão, produção, beneficiamentos e cíclica da estrutura fundiária concentracionista, centrado comercialização das atividades agropecuárias ou não num projeto político e social de fortalecimento e expansão agropecuárias, inclusive das atividades agroextrativistas, da Agricultura Familiar. Fator esse que ampliará sua florestais e artesanais de suma importância para a viabilidade, diversificando e multiplicando os educação de caráter continuado no meio rural mecanismos de acesso a terra. (MDA/SAF, 2004). O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - Dentre os princípios estabelecidos pela Política IBGE (2006) apresentou, pela primeira vez, informações Nacional de Ater, estão: sobre a atividade econômica realizada pela agricultura e pelos empreendimentos familiares rurais no país, assim a) Assegurar, com exclusividade aos considerados os que atendem, simultaneamente, aos agricultores familiares, assentados por critérios definidos pela Lei n° 11.326, de 24 de julho de programas de reforma agrária, o acesso a 2006. Dentre os quais destacam-se: a área do serviço de assistência técnica e extensão estabelecimento ou empreendimento rural que não deve rural pública, gratuita, de qualidade e em exceder quatro módulos fiscais; a mão de obra utilizada quantidade suficiente, visando o nas atividades econômicas desenvolvidas deve ser fortalecimento da agricultura familiar; predominantemente da própria família; a renda familiar b) Contribuir para a promoção do deve ser exclusivamente originada dessas atividades; e o desenvolvimento rural sustentável, com estabelecimento ou empreendimento deverá ser dirigido ênfase em processos de desenvolvimento pela família. endógeno, apoiando os agricultores De acordo com o Instituto Nacional de familiares na potencialização do uso Colonização e Reforma Agrária – INCRA (2011), a sustentável dos recursos naturais; Reforma Agrária é o conjunto de medidas para promover c) Adotar uma abordagem multidisciplinar a melhor distribuição da terra, mediante modificações no e interdisciplinar, estimulando a adoção de regime de posse e uso, a fim de atender aos princípios de novos enfoques metodológicos justiça social, desenvolvimento rural sustentável e participativos e de um paradigma aumento de produção. Essa concepção é estabelecida pelo Estatuto da Terra (Lei nº 4504/64). Na prática, a Reforma

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Agrária proporciona, dentre outras coisas, uma terceiros, quando a natureza sazonal da democratização da estrutura fundiária, melhoria na renda atividade agropecuária o exigir; não das famílias, redução da migração e promoção da detenha, a qualquer título, área superior a cidadania. quatro módulos fiscais, quantificados De forma diferenciada, Buarque (2002) comenta segundo a legislação em vigor; tenha, no que, cada vez mais, o local está sendo intensamente mínimo, 80% da renda familiar bruta anual influenciado e impactado por processos globais de originada da exploração agropecuária, mudança econômica, tecnológica e institucional, que pesqueira e/ou extrativa; resida na determinam seu futuro, suas dificuldades, mas também propriedade ou em aglomerado rural ou suas oportunidades. Assim, entender a localidade no urbano próximo (ALTMANN, 2002, p.07). desenho da economia mundial é uma forma de redução das distâncias físicas e de quebra de fronteiras, buscando De acordo com a Organização das Nações o que preconiza o desenvolvimento local que interage e Unidas para a Alimentação e a Agricultura – FAO e o recebe influências, dependendo das próprias capacidades INCRA (1994), o modelo familiar teria como dos atores locais e das suas potencialidades. características peculiares a relação íntima entre trabalho e O que se busca com a Reforma Agrária, gestão, a direção do processo produtivo conduzido pelos atualmente desenvolvida no país, é a implantação de um proprietários, a ênfase na diversificação produtiva, na novo modelo de assentamento, baseado na viabilidade durabilidade dos recursos e na qualidade de vida, a econômica, na sustentabilidade ambiental e no utilização do trabalho assalariado em caráter desenvolvimento territorial. Para tanto faz-se necessária a complementar e a tomada de decisões imediatas, ligadas adoção de instrumentos fundiários adequados a cada ao alto grau de imprevisibilidade do processo produtivo. público e a cada região; a adequação institucional e De acordo com o INCRA (2011), a normativa a uma intervenção rápida e eficiente dos redemocratização, em 1984, trouxe de volta o tema da instrumentos agrários; o forte envolvimento dos governos Reforma Agrária. O Decreto nº 97.766, de 10 de outubro estaduais e das prefeituras; a garantia do reassentamento de 1985, instituiu o novo Plano Nacional de Reforma dos ocupantes não-índios de áreas indígenas; a promoção Agrária, com a meta utópica de destinar 43 milhões de da igualdade de gênero na Reforma Agrária, além do hectares para o assentamento de 1,4 milhão de famílias direito à educação, à cultura e à seguridade social nas até 1989. Criou-se, para isso, o Ministério Extraordinário áreas reformadas (INCRA, 2011). para o Desenvolvimento e a Reforma Agrária (Mirad), Segundo Wanderley (1999), para se caracterizar mas, quatro anos depois, os números alcançados eram sob o ponto de vista da Agricultura Familiar, a família, modestos perante a meta: 82.689 famílias assentadas em além de ser proprietária dos meios de produção, deverá pouco menos de 4,5 milhões de hectares. assumir também o trabalho no estabelecimento produtivo. Esta concepção incorpora desde o campesinato tradicional 2.4 O Papel de Organização até a ideia de produtor familiar moderno. De acordo com Guanziroli et al. (2001), a Agricultura Familiar não deve As unidades de produção em que são exercidas ser definida a partir do tamanho do estabelecimento. Estes atividades que dizem respeito a culturas agrícolas, a autores partem de um conceito mais geral, em que criações de animais ou culturas florestais, com a algumas condições precisam ser simultaneamente finalidade de obtenção de renda são organismos atendidas, como: a direção dos trabalhos que deve ser econômicos e sociais, que reunindo os fatores de exercida pelo produtor e o trabalho da família devem ser produção e direção, se propõem a produzir bens ou superiores ao trabalho contratado (terceiros). Percebe-se serviços na expectativa de lucros. Nessa perspectiva, a que, mesmo aqueles que não são proprietários da terra, administração rural pode ser entendida como um conjunto como os arrendatários, os parceiros e os posseiros, podem de atividades que facilita aos produtores rurais a tomada ser caracterizados como agricultores familiares. de decisões em nível de produção e de gerenciamento da De maneira análoga ao modelo proposto pelo propriedade rural, com o fim de obter melhor resultado Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura econômico e manter a produtividade da terra, sem Familiar - PRONAF, Altmann (2002) preconiza o comprometer o sustento das futuras gerações. conceito de Agricultura Familiar de forma mais detalhada, De acordo com Hoffmann (1987) e Andrade em que: (1988), a administração rural pode ser entendida como o estudo que considera a organização e a operação de uma Agricultor familiar é aquele que explora empresa agrícola visando o uso mais eficiente dos parcela da terra na condição de proprietário, recursos para obter resultados compensadores e assentado, posseiro, arrendatário ou contínuos, conscientemente dirigidos, que os agentes parceiro, e atende simultaneamente aos produtivos e serviços busquem almejar uma produção que seguintes quesitos: utiliza o trabalho direto, se enquadre nos princípios econômicos, visando obter um seu e de sua família, podendo ter, em maior rendimento e, consequentemente, um maior lucro. caráter complementar, até dois empregados A discussão do papel organizacional nas permanentes e contar com ajuda de propriedades rurais no âmbito da Agricultura Familiar

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envolve todas as capacidades e limitações dos produtores A organização dos produtores rurais dentro da rurais em torno de sua gestão, caracterizado por suas porteira, conforme salienta Araújo (2010), tem como base localidades geográficas e força de vontade em transformar os sindicatos locais, denominados, respectivamente, de e melhorar suas condições de vida, através de novos Sindicato dos Trabalhadores Rurais e Sindicatos Rurais, processos e tecnologias e diante de um cenário calcado na com sede nos Municípios. Em termos de Estados, os falta de conhecimento e/ou interesse na busca de sindicatos unem-se na respectiva federação: Federação ferramentas de assistência ao seu negócio. dos Trabalhadores na Agricultura – FETAG, Federação Para Maximiano (2000), administrar é o processo dos Trabalhadores da Agricultura Familiar – FETAF e a de tomar, realizar e alcançar ações que utilizam recursos Federação da Agricultura do Estado – FAE, com sede na para atingir determinados objetivos. Embora seja capital de cada estado. As federações em âmbito nacional importante em qualquer escala de aplicação de recursos, a estão representadas pela Confederação Nacional dos principal razão para o estudo da administração é o seu Trabalhadores na Agricultura – CONTAG e a impacto sobre o desempenho das organizações. É a forma Confederação Nacional da Agricultura – CNA, com sede como são administradas que tornam as organizações mais em Brasília. ou menos capazes de utilizar corretamente seus recursos Vilpoux e Oliveira (2011) retratam que a para atingir os objetivos corretos. cooperação na Agricultura Familiar, mediante os arranjos Ainda segundo o autor, uma organização é uma com as interações nos mercados, objetiva trabalhar as combinação de recursos que procura deliberadamente relações de dependências destes com os intermediários. realizar algum tipo de objetivo ou conjunto deles. As Para os autores, uma das dificuldades para tal organizações são muito diversificadas quanto ao tamanho, concretização refere-se à atenuada participação das à forma, aos produtos, os recursos e as áreas de atuação. associações e das cooperativas nesse processo, fazendo A administração é uma tecnologia que permite às com que o fornecedor procure pontos de referências, onde organizações serem capazes de cumprirem suas lhes são atribuídos valores mais elevados, substituindo a finalidades. Trata-se de um sistema complexo e compra direta aos produtores, seja no campo formal ou organizado, formado de partes ou elementos que informal do capital social. interagem para realizar um objetivo explícito. Para Lourenzani (2006), o desempenho da Assim, a disponibilização de técnicas gerenciais Agricultura Familiar é determinado por um conjunto apropriadas para a Agricultura Familiar visa contribuir grande de variáveis, seja decorrente das políticas públicas para a promoção da sustentabilidade econômica desses e da conjuntura macroeconômica ou de especificidades empreendimentos. Nesse contexto, a gestão do locais e regionais. O mesmo autor ainda explica que a agronegócio faz com que as futuras gerações sejam elaboração de projetos agrícolas para a solicitação de motivadas a dar continuidade na atividade, pois, quando crédito, a tomada de decisão sobre o que produzir, a acontece o contrário, em muitos casos, o arrendamento escolha da tecnologia a ser adquirida, o processo de e/ou venda da mesma passa a ser a única saída. compra de insumos e venda de produtos, o acesso aos Desenvolver uma gestão organizada e fortalecer a cadeia mercados e a complexidade de funções, produtiva, com novas técnicas e assistências apropriadas, concomitantemente, exige capacitações gerenciais, agregando mais conhecimento e atendendo às ausentes na maioria dos produtores rurais. necessidades dos produtores rurais, contribui para se Tal deficiência provoca impactos negativos no tornar atrativo e viável o desenvolvimento rural, e diante desenvolvimento desse segmento e, consequentemente, na desta integração das atividades rurais, Araújo (2010, p. sua integração aos mercados mais dinâmicos. Assim, é 121) cita que: possível encontrar produtores familiares em áreas bastante desenvolvidas do país, onde existe amplo mercado, A coordenação de uma cadeia produtiva, disponibilidade de crédito, fornecedores, agroindústrias, também denominada de estrutura de mas com projetos produtivos fracassados. Não é raro governança, refere-se à estrutura dominante encontrar projetos de investimento e custeio destinados à dentro dessa cadeia, que orienta e interfere Agricultura Familiar apoiados por organizações em todo o processo produtivo comercial, de governamentais, com crédito e assistência técnica forma mais ou menos frágil ou, subsidiados, mas com baixo desempenho. intensamente, determinando até o modo de produção e de comercialização dos 2.5 Desenvolvimento Local e Agricultura Familiar produtos. Para Lourenzani (2003), os agricultores Outro elemento comum está relacionado ao familiares são os que mais geram empregos e fortalecem suporte técnico. Embora a assistência técnica no Brasil o desenvolvimento local, pois distribuem melhor a renda, esteja disponível para grande parte dos produtores rurais, além de serem os responsáveis por uma parte significativa ela mostra-se incapaz de atender plenamente às reais da produção nacional, respeitando mais o meio ambiente necessidades de muitos trabalhadores, conforme e, principalmente potencializando a economia dos evidenciam os estudos de Batalha (2007). municípios onde vivem.

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È relevante ressaltar a importância do dinamismo pode-se, portanto, definir a pesquisa social como o da economia para o desenvolvimento local. Em regiões e processo que, utilizando a metodologia científica, permite municípios pobres, deve-se perseguir, com rigor, o a obtenção de novos conhecimentos no campo da aumento de renda e da riqueza local por meio de realidade social. atividades econômicas viáveis e competitivas, com Ainda segundo o mesmo o autor, as pesquisas capacidade de concorrer nos mercados locais, regionais e, exploratórias têm como principal finalidade desenvolver, no limite, nos mercados globais. Assim, com economia esclarecer e modificar conceitos e ideias, tendo em vista a eficiente e competitiva gerando riqueza local sustentável, formulação de problemas mais precisos ou hipóteses pode-se falar efetivamente em desenvolvimento local, pesquisáveis para estudos posteriores. De todos os tipos segundo bem salientou Buarque (2002). de pesquisa, estas são as que apresentam menor rigidez no De acordo com Santos (2005), o planejamento. Habitualmente envolvem o levantamento desenvolvimento local pode ocorrer em áreas e setores bibliográfico e documental, as entrevistas não que seguramente apresentam vantagens competitivas a ser padronizadas e os estudos de caso. Em suma, pesquisas desenvolvidas ou exploradas com base em suas exploratórias são desenvolvidas com o objetivo de potencialidades, desde que sejam criadas externalidades proporcionar uma visão geral, de tipo aproximativo, sobre adequadas. Entretanto, é preciso destacar que os setores e determinado fato. Este tipo de pesquisa é realizado as atividades econômicas mais simples e atualmente não especialmente quando o tema escolhido é pouco competitivas devem ser estimulados a alcançar a explorado e quando se torna difícil formular hipóteses produtividade e a qualidade, de forma a tornarem sobre ele mais precisas e operacionalizáveis. competitivas em médio e longo prazo. A construção da Muitas vezes as pesquisas exploratórias competitividade nos espaços locais aumenta a importância constituem a primeira etapa de uma investigação mais e a necessidade do Estado como organizador dos ampla. Quando o tema escolhido é bastante genérico, investimentos que visam às externalidades, com destaque tornam-se necessários o seu esclarecimento e a sua especial para a educação. delimitação, o que exige a revisão da literatura, a Assim, nos últimos anos têm-se evidenciado discussão com especialistas e outros procedimentos. O importantes discussões acadêmicas, suscitadas no âmbito produto final deste processo passa a ser um problema dos empreendimentos rurais, presentes nos mais diversos mais esclarecido e passível de investigação, mediante estágios de evolução no país. O IBGE, através do censo procedimentos mais sistematizados. agropecuário de 2006, revelou que o Estado de Mato A principal característica da pesquisa Grosso do Sul possui 64.862 estabelecimentos rurais, bibliográfica reside no fato de permitir ao investigador a destes, a grande maioria, aproximadamente 63%, pertence cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla à Agricultura Familiar. O Município de Nova Andradina - do que aquela que ele poderia pesquisar diretamente. Essa MS possui 3.426 estabelecimentos caracterizados como vantagem torna-se particularmente importante quando o Agricultura Familiar, de acordo com a Lei nº 11.326, com problema de pesquisa requer dados muito dispersos pelo uma área de 94.959 hectares, e outros 1.272 espaço e tempo. A pesquisa bibliográfica também é estabelecimentos não familiar, com uma extensão indispensável nos estudos históricos. Em muitas territorial de 1.002.570 hectares. situações, não há outra maneira de conhecer os fatos Conforme Navarro et al. (2010), a primeira passados, se não com base em dados bibliográficos, expressão de Agricultura Familiar ocorreu no ano de segundo bem salientou Gil (2002). 1993, em um seminário sobre políticas agrícolas, realizado em Belo Horizonte pela Confederação Nacional 3.2 Fonte de Dados dos Trabalhadores da Agricultura - CONTAG, que deveria designar aquele conjunto de produtores. Ademais, Busca-se, com este estudo, levantar dados os autores evidenciam ainda que, com a criação do relevantes sobre a temática abordada, mediante a Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura contemplação de artigos, livros, autores, Familiar - Pronaf, em julho de 1995, a expressão dissertações/teses, periódicos especializados, acervos de Agricultura Familiar definitivamente se consagrou, bibliotecas e bases de dados de ordem acadêmica e de institucionalizando tal noção e delimitando, por sua vez, organizações governamentais e não governamentais. objetivamente o grupo de produtores sob sua definição. O levantamento de informações e de dados atualizados visam problematizar a importância da gestão 3 METODOLOGIA como desenvolvimento local no âmbito da Agricultura Familiar no Estado de Mato Grosso do Sul, em especial 3.1 Tipo de pesquisa na área que circunscreve o Município de Nova Andradina, local onde se concentra a proposta deste estudo. O método utilizado nessa pesquisa refere-se ao estudo bibliográfico de caráter exploratório. Segundo Gil 3.3 Área de Estudo (2008), o objetivo fundamental desse tipo de pesquisa é descobrir respostas para problemas, mediante o emprego O Município de Nova Andradina está localizado de procedimentos científicos. A partir dessa conceituação, nos limites físicos das fronteiras dos Estados de São Paulo

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e Paraná. Conta com um número populacional de 45.585 4.1 Dados do Censo Agropecuário comparando a habitantes (IBGE, 2010), com uma área territorial de Agricultura Familiar e a Não-Familiar em nível de 4.776 km2, estabelecido no bioma de cerrado e mata Brasil, Estado de Mato Grosso do Sul e o Município de atlântica. Passou a ser reconhecido como um importante Nova Andradina. polo de exportação pecuária da região Centro-Oeste e para alguns países árabes. O Município possui 04 Projetos Em uma análise sobre a Agricultura Familiar e de Assentamentos, e mais de 63% dos estabelecimentos Não-Familiar, verifica-se de acordo com a Tabela 1, que rurais, são caracterizados como Agricultura Familiar em Nova Andradina possui em torno de 8,33% dos comparação com a Não Familiar. estabelecimentos da Agricultura Familiar e cerca de 5,35% da Agricultura Não-Familiar do Estado de Mato 4 RESULTADOS E DISCUSSÕES Grosso do Sul, dados que potencializam a importância da Agricultura Familiar no desenvolvimento local. Os resultados seguem fazendo uma descrição dos Comparando as áreas de Agricultura Familiar de Nova projetos de assentamentos – PAs no Município de Nova Andradina com a média do Brasil, o Município representa Andradina, apresentando os estabelecimentos com suas 0,11% do território do país e 7,97% do Estado, o que dimensões e localidades, seguido de tabelas de representa uma presença expressiva no agronegócio do levantamentos da Agricultura Familiar no Brasil, Estado país e principalmente de Mato Grosso do Sul. As áreas de de Mato Grosso do Sul e município de Nova Andradina, Agricultura Não-Familiar correspondem a 0,40% do discorrendo suas representatividades e potencialidades território nacional e 3,47% estadual, evidenciando a dentro da Agricultura Familiar e Não Familiar. A seguir, importância do Município de Nova Andradina como polo segue as descrições dos Projetos de Assentamentos – PAs. produtivo no âmbito estadual e nacional.

Agricultura familiar - Lei nº 11.326 Não familiar Município, Área Área Estado e País Estabelecimentos Estabelecimentos (ha) (ha)

Nova Andradina 3 426 94 959 1 272 1 002 570

Mato Grosso do Sul 41.104 1.190.206 23.758 28.866.741

Brasil 4.367.902 80.250.453 807.587 249.690.940

Tabela 1. Total de estabelecimentos e área da Agricultura Familiar e Não Familiar, no município de Nova Andradina. Fonte: Elaboração própria a partir de IBGE (2006).

No Município de Nova Andradina se evidencia assentadas, de acordo com os dados do INCRA (2011). mais de 63% dos estabelecimentos rurais pertencentes à Sendo localizado na antiga Fazenda Teijin, às margens da Agricultura Familiar, fator este de relevância para estudos Rodovia MS-134, próximo à Nova Casa Verde, sendo acadêmicos locais. mais conhecido como “Assentamento 17 de abril”. O Projeto de Assentamento São João foi o terceiro, criado 4.2 Projetos de Assentamentos - PAs de Nova em abril de 2004, com uma área de 4.011.9000 hectares, e Andradina - MS. com 179 famílias assentadas, de acordo com o INCRA (2011). Está localizado na Rodovia BR 267 no km 173 Atualmente estão implantados no Município de s/n. Nova Andradina quatro Projetos de Assentamentos – O Projeto de Assentamento Santa Olga foi o PAs, de acordo com o INCRA (2011), sendo último a ser criado no Município. Teve suas origens com estabelecidos da seguinte forma: o Projeto de a desapropriação por parte do Instituto Nacional de Assentamento- PA Casa Verde foi o primeiro a ser criado, Colonização e Reforma Agrária – INCRA. Foi instituído em dezembro de 1987, com uma área de 29.859.9889 em junho de 2004, num total de 171 lotes, e uma área de hectares, com 448 famílias assentadas, sendo localizado 1.448,30 hectares, estando localizado na Rodovia MS no trevo das rodovias MS-134 e BR-267. Em 2011, 276, KM 167 que liga Nova Andradina à cidade de recebeu do INCRA a escritura de doação da área, Ivinhema. Ademais, destaca-se que 90% dos assentados tornando-a propriedade municipal nomeado de “Distrito residentes no PA Santa Olga estão ligados ao Movimento de Nova Casa Verde”. Sindical, à Federação dos Trabalhadores na Agricultura e O Projeto de Assentamento Teijin foi o segundo à Pastoral da Terra - FETAGRI/MS. A área anterior foi a ser implantado no Município, em julho de 2002, com desapropriada; sua antiga origem era a Fazenda Santa uma área de 28.497.8194 hectares, e com 1.063 famílias

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Olga, de propriedade de José Lemes Soares. Atualmente, município, conforme reconhecimento do INCRA e do tem concentrado em seus limites físicos 114 lotes. Governo Estadual. Nessa perspectiva, a Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão Rural - AGRAER, 4.3 – Projetos de Assentamentos e Famílias Assentadas bem como o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA traçam um mapa dos atuais A seguir analisa-se a dimensão dos assentamentos rurais criados pelo estado de Mato Grosso Assentamentos Rurais no Estado de Mato Grosso do Sul, do Sul, conforme pode ser observado na Figura 1. com ênfase no Município de Nova Andradina, que compreende os maiores assentamentos do Estado e do país. Eles são localizados em um ponto geograficamente estratégico, apresentando forte expressão econômica na região do Vale do Ivinhema, com participação ativa na Agricultura Familiar e em sua cadeia produtiva local. A Tabela 2 mostra que o Município de Nova Andradina se destaca em número de Assentamentos, sendo (04) quatro. Com uma área de 63.862,2104 hectares (em torno de 9,15% de participação e a maior área de projetos de assentamento do Estado de Mato Grosso do Figura 1: Assentamentos Rurais de Mato Grosso do Sul Sul), e com 6,50% das famílias assentadas do total do criados pelo INCRA e/ou pelo Governo Estadual (1980- Estado. Se comparado com a média nacional, representa 2009). Fonte: Mapa elaborado pelo INCRA, a partir de 0,19% das famílias assentadas no país. Em termos de Helfenstein (2010). extensão o Munícipio representa 0,0729% do total de Projetos de Assentamentos no país. Na Figura 1 pode-se observar os vários Projetos de Assentamento – PAs do Estado de Mato Grosso do Sul, delimitando as regiões municipais e a quantidade de projetos criados pelo INCRA e pelo Governo Estadual. Verifica-se que os projetos estão distribuídos em várias regiões do estado, de acordo com a quantidade em cada PA nº. de Projetos Área (há) nº. de Famílias Brasil 8.865 87.559.858,9476 931.730 Mato Grosso do Sul 203 697.687.9305 28.578 Nova Andradina 04 63.862,2104 1.859 Tabela 2. Total de projetos, área, capacidades e famílias assentadas no Brasil, em Mato Grosso do Sul e Nova Andradina. Fonte: Elaboração própria a partir de dados do INCRA (2011).

A Tabela 3 apresenta dados sobre os projetos de Município, e com lotes em torno de 60 a 70 ha, e o menor reforma agrária no Município de Nova Andradina. Os é o Santa Olga com 2,33% de área e em torno de 8 ha dados mostram que o Município possui uma grande cada lote. Um questionamento que fica a partir desses extensão de projetos de assentamentos, sendo 04 (quatro), dados é se a capacidade de desenvolvimento dos lotes é com capacidade de número de famílias assentadas de proporcional ao tamanho dos mesmos, dado que há uma 1.948, sendo que deste número somente em torno de diferença significativa na extensão dos lotes entre os 95,43% estão efetivamente assentados. Destaca-se a assentamentos. extensão de áreas desapropriadas, em torno de 63.862.2104 ha. O Projeto de Assentamento com maior área é o Casa Verde com 46,75% do total de PAs do (PA) AREA (há) N. de Família Famílias Ano de Data (Capacidade) Assentadas Criação (desapropriação) Casa Verde 29.859,9889 471 448 22/12/1987 27/07/1986 Teijin 28.497,8194 1.126 1.063 26/07/2002 08/10/2001 São João 4.011,9000 180 179 23/04/2004 18/09/2002 Santa Olga 1.492,5021 171 169 28/06/2004 18/09/2002

Total ===> 63.862,2104 1.948 1.859 Tabela 3. Total de projetos, área, capacidades e famílias assentadas de forma analítica no município de Nova Andradina. Fonte: Elaboração própria a partir de dados do INCRA (2011).

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Analisando os Projetos de Assentamentos – PAs ARAÚJO, M. J. Fundamentos de Agronegócios. - 3 ed.- em nível de Brasil, Mato Grosso do Sul e de Nova revista ampliada e atual. São Paulo: Atlas, 2010. Andradina, nota-se a representatividade da Agricultura Familiar no desenvolvimento local, evidenciando a BATALHA, M. O. GEPAI: Grupo de Estudos e Pesquisas potencialidade do segmento para a economia em geral. Industriais. Gestão Agroindustrial. São Paulo: Atlas, Os resultados mostram que a Reforma Agrária 2007. brasileira está diretamente relacionada ao avanço e à importância adquirida pela Agricultura Familiar, cuja BERGAMASCO, S. M. P. P; NORDER, L. A. C. O que representatividade foi significativa no último Censo são Assentamentos Rurais? São Paulo: Brasiliense, Agropecuário, realizado em 2006, em termos de 1996. estabelecimentos e pessoal ocupado, tanto para o Brasil quanto para o Estado de Mato Grosso do Sul, e mais BUARQUE, S. C.. Construindo o Desenvolvimento precisamente no Município de Nova Andradina. Contudo, Local Sustentável. Rio de Janeiro: Garamond, 2002. as áreas ocupadas pelos estabelecimentos familiares ainda continuam em proporção inferior, se comparada à FILHO, P. S. A, TEIXEIRA, J. C.. A Agricultura Agricultura Não-Familiar. Familiar na Merenda Escolar da Rede Municipal de Nova Andradina/MS. Trabalho apresentado no XXI 5 CONCLUSÕES Encontro Nacional de Geografia Agrária em Uberlândia/MG, nos dias 15 a 19 de outubro de 2012. Ao longo desse estudo, compreendeu-se a contextualização dos Assentamentos Rurais e a GIL, A. C.. Como Elaborar Projetos de Pesquisa. São Agricultura Familiar no Município de Nova Andradina, Paulo: Atlas, 2002. em comparação com a média do Estado de Mato Grosso do Sul e do Brasil, ficou evidenciado a sua importância de ______. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São participação no agronegócio local, diante da Agricultura Paulo: Atlas, 2008. Não-Familiar. Os Projetos de Assentamentos como Reforma GUANZIROLI, C.; ROMEIRO, A.; BUAINAIN, A. M.; Agrária desenvolvem a Agricultura Familiar, propiciando SABBATO, A. D.; BITTENCOURT, G. Agricultura o desenvolvimento local, conduzindo à gestão da Familiar e Reforma Agrária no Século XXI. Rio de propriedade, através de assistências técnicas de extensão Janeiro: Garamond, 2001. rural governamental e não governamentais. A necessidade de desenvolver capacitações e a HELFENSTEIN, A. M. O Programa Luz para Todos organização dos produtores rurais, de acordo com as como Política Pública de Desenvolvimento Econômico necessidades locais e/ou regionais, permite o seu e Social nos Assentamentos Rurais de Mato Grosso do desenvolvimento local, de maneira que, a permanência do Sul. Dissertação para obtenção do título de Mestre em produtor no campo seja validada e o potencial de sua Geografia. UFGD, Dourados/MS. 2010. importância para a economia da região, no meio social e político, e consequentemente, toda a cadeia produtiva do Histórico da Reforma Agrária. Disponível em: agronegócio seja enaltecida também no âmbito regional. . Acesso: desenvolvimento local traduz melhores alternativas para o 17 junho 2013. processo decisório, troca de informação e novas ideias, melhores métodos de trabalho e inovação, atendendo de Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. forma adequada e preferencial os pontos fortes e fracos de Disponível em: cada propriedade rural e as necessidades de seus . Acesso em: 23 maio 2013.

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O ASSOCIATIVISMO NO TURISMO RURAL DA COMUNIDADE AUTÔNOMA DA GALÍCIA (ESPANHA)

CARNEIRO, LUCIANA PEREIRA DE MOURA

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo Campus de Avaré [email protected]

RESUMO - Este texto apresenta parte dos resultados da pesquisa de mestrado intitulada “Experiência galega em turismo rural e as possibilidades de adaptação ao Pontal do Paranapanema (São Paulo/Brasil)” desenvolvida com apoio do Programa Alban (Programa de Alto Nível da União Europeia para Alunos Latino-americanos) na Universidad de Santiago de Compostela (Espanha) entre 2007 e 2009. O principal objetivo é identificar o perfil do associativismo no segmento do turismo rural na Comunidade Autônoma da Galícia. Para isso, faz-se um breve recorrido do histórico do desenvolvimento turístico rural galego, explica-se a metodologia da pesquisa e apresentam-se os resultados referentes ao aspecto delimitado acima (associativismo no turismo rural galego). Ao final, conclui-se que o associativismo no turismo rural galego está atualmente bem estruturado visto que foi totalmente incentivo pelas administrações públicas, entretanto falta maior participação dos associados nas decisões.

Palavras chave: Turismo Rural, Associativismo, Galícia, Espanha.

ABSTRACT - This paper presents part of the results master's research entitled " Galician experience in rural tourism and the possibilities of adaptation to the Pontal do Paranapanema (São Paulo / Brazil)" developed with the support of the Alban Program (High Level Program from EU for Latin Americans Students) at the Santiago de Compostela University (Spain) during the years of 2007 until 2009. The main objective is identifying the profile of the association in the rural tourism at the Galicia Autonomous Community. For this, it will be introduced a brief history of the Galician rural tourism development, explaining the research methodology and presenting the results referent the aspect delimited above (association in the Galician rural tourism). At the end, it is concluded that association in the Galician rural tourism is currently well structured, based on it was totally encouraged by the government, however there is a lack of participation from the members in decision-making.

Key words: Rural Tourism, Associations, Galicia, Spain.

1 INTRODUÇÃO pequena empresa, grandes espaços, contato com a natureza, patrimônio, sociedades e práticas tradicionais; O Turismo Rural (TR) é, segundo a Organização praticar-se a escala intermediária e local; ter um Mundial do Turismo - OMT (2002), um produto que tem crescimento lento e estritamente ligado às famílias da como componente chave a cultura da população rural. O localidade, ou seja, desenvolver-se sob o controle da turista que vai ao meio rural passar suas férias busca um comunidade local; ajudar a manter o caráter rural da contato personalizado com esse ambiente. região, fazer uso viável a longo prazo dos recursos Henche (2006) entende que o princípio básico do naturais locais e ser adequado à diversidade do entorno. TR é a harmonia entre turismo, meio ambiente e Para Juan e Solsona (apud SPARRER, 2005, p. 35) comunidade local. Vera et al. (1997) identifica alguns os principais objetivos do TR são melhorar as condições elementos que devem ter o TR para ser assim de vida da população local, reativar economicamente as considerado. São eles: estar na zona rural; estar zonas desfavorecidas, gerar renda complementar, fundamentado nas particularidades do mundo rural como incorporar a mulher ao trabalho remunerado, estabilizar

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demograficamente a população local, manter a atividade para revalorizar el patrimonio, generar agropecuária e artesanal, manter e/ou recuperar o alternativas de empleo y contribuir al patrimônio arquitetônico tradicional, conservar o meio mantenimiento de las áreas rurales. […] De ahí físico e, por fim, enriquecer culturalmente a população que surjan disfunciones y no pocos conflictos ya que este nuevo enfoque rompe con patrones de local. definición de lo rural (INSTITUTO GEOGRÁFICO NACIONAL - IGN, 2008, p. 13).

2 TURISMO RURAL NA ESPANHA Segundo Valiente e Pérez (2000) desde princípios do século XX até a década de 70 em toda Europa o que Callejo et al. (2005) e Fernández et al. (2008) mais se oferecia com relação ao TR era simplesmente o relatam que o fenômeno da segunda residência, tão alojamento. Foi a partir desta década que os produtores presente na cultura espanhola, vem de uma tradição de rurais começaram a diversificar sua oferta a fim de atrair passar as férias nas casas familiares localizadas no meio um cliente diverso e exigente e fidelizá-lo. A partir daí rural, casas estas abandonadas na década de 70 quando não mais se restringiram ao alojamento e à oferta houve uma grande emigração do campo para a cidade. A gastronômica, mas também às atividades equestres, de Espanha teve um processo de urbanização muito rápido e, pesca e caça, terapias e cursos, recolhida de frutas e venda desta forma, a população continuou ligada as suas de artesanatos. Nesta linha a Espanha ainda está um origens, por isso o fato de sempre retornarem para passar pouco atrasada. Somente nas Comunidades Autônomas as férias na casa do campo. que começaram a desenvolver o TR há mais tempo, Em 1950 a porcentagem da população vivendo em dentre elas Aragão, Catalunha e Astúrias, existem ofertas áreas urbanas era de 51,9%, sendo que 10 anos mais tarde neste sentido. passou a 56,6% e em 1975 estava em quase 70%. Cabe Segundo Henche (2006) a UE incentivou e destacar que os espanhóis, diferentemente dos europeus continua incentivando através de seus projetos que a de países vizinhos, até pouco tempo não tinham o população rural permaneça no campo e, neste âmbito costume de viajar para o exterior; enquanto os turistas comunitário, foi também nos anos 90 que o TR começou estrangeiros vinham para a Espanha em busca, a ser tratado com maior firmeza e continuidade. Martínez essencialmente, das praias, o turista espanhol buscava o Roget (2004) acrescenta que sobre o turismo em geral foi interior; “en 1982, la tercera parte del turismo nacional na década de 80 que a Comunidade Europeia começou a tiene como destino provincias del interior” (CALLEJO et discutir. Ou seja, são, ambos, assuntos bastante recentes al., 2005, p. 156). Atualmente isto está mudando e os na pauta dos organismos internacionais europeus. espanhóis estão passando a viajar mais ao exterior e ao próprio litoral do país. Así, frente a la consideración única y limitada Na Espanha o TR compõe um dos instrumentos da de las actividades tradicionales (agricultura, política de desenvolvimento das comarcas do interior e ganadería, explotación forestal), son numerosas refere-se a qualquer atividade desenvolvida no âmbito las áreas rurales de montañas y espacios rural, podendo englobar Agroturismo, Turismo Verde, desfavorecidos que, en virtud del impulso Turismo Ecológico, Turismo Ativo, etc. (SPARRER, exógeno vinculado a la demanda urbana de 2006, p. 40-41). Para Fernández (2008) foi na década de recreo y ocio, aprovechan la mejora de la accesibilidad y los incentivos económicos que 80 do século passado que, com o truncamento da Política derivan de fondos públicos (Leader, Proder) Agrária Comunitária devido aos processos de para promover y configurar un sistema de oferta globalização, a produção agrícola se acumula e surgem basado en nuevos conceptos turísticos. Un dificuldades de exportação como consequência da falta de proceso en el que se han puesto grandes competitividade. Esses fatos afetam diretamente o meio expectativas desde los años ochenta y, sobre rural espanhol (e europeu) e começa a surgir a todo, a partir de los noventa (IGN, 2008, p. 13). necessidade de outro tipo de desenvolvimento a fim de alcançar equilíbrios mais justos entre rural e urbano, isto Para Fernández (2008) os dois principais é, diversificação econômica. documentos comunitários centrados no TR são as Segundo alguns autores atualmente o TR não tem “Medidas comunitárias para el fomento del Turismo como único objetivo complementar renda e desenvolver o Rural”, da Comissão, de 29 de outubro de 1990, que meio rural, mas trata-se também de uma estratégia para consistiam em apoio econômico à investimentos e manter a população nesta área sem que isso implique uma medidas de fomento, promoção e organização e o maior produção agrária; portanto, busca-se a criação de “Dictamen sobre una política de desarrollo del Turismo novas alternativas de emprego, recuperação do patrimônio Rural en las regiones de la Unión Europea”, do Comitê arquitetônico, revalorização das tradições, preservação do das Regiões, de 2 de fevereiro de 1995. meio ambiente e redistribuição dos benefícios gerados A UE incentiva, segundo Henche (2006), a criação pelo mercado turístico. de produtos turísticos rurais integrados (e não somente alojamento), a organização dos proprietários rurais em Y, sobre todo, es relevante el modo en que las associações e a necessidade de definição de critérios e actividades de ocio y turismo se están utilizando símbolos de qualidade a nível europeu para os diferentes

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produtos de TR. Para isso, um dos instrumentos utilizados inovadora, inclusive com relação ao turismo (BIGNÉ, são os Fondos Estructurales. AULET e SIMÓ, 2000, p. 478). No “Marco Comunitario de Apoyo 1994-1999” Los fondos son los instrumentos financieros de também foi destinada uma verba ao TR com o objetivo de la política estructural de la Unión Europea, con minimizar as desigualdades y preparar as regiões para o cargo a los cuales esta otorga ayuda económica mercado único (HENCHE, 2006, p. 86). Em 1995 o a los Estados con la finalidad de compensar las Comitê das Regiões propõe criar observatórios desigualdades existentes entre las diferentes econômicos de turismo, centros de recursos com o regiones de Europa y paliar el retraso entre las regiones o islas menos favorecidas (BIGNÉ, objetivo de salvaguardar o patrimônio cultural, natural e AULET e SIMÓ, 2000, p. 476). tradicional e reabilitar as construções inutilizadas e as tradições locais, considerar os problemas dos serviços O Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional públicos e privados da localidade, melhorar as (Feder), Fundo Europeu de Orientação y Garantia possibilidades de acesso aos locais de cultura, natureza e Agrícola (Feoga) e o Fundo Social Europeu (FSE) são lazer, facilitar a leitura europeia do TR através da alguns dos fundos da UE que se relacionam com o TR e definição da simbologia e logotipos de cada tipo de estão dentro do “Marco Comunitario de Apoyo 1989- estabelecimento, criar projetos turísticos locais, promover 1993”. Tais fundos são aplicados em programas que marcos de gestão de estratégias de desenvolvimento local, seguem um Plano de Desenvolvimento Regional (PDR). criar centros de assessoramento das empresas e dos Um dos programas relacionados ao turismo e ao responsáveis dos projetos a fim de fomentar a geração de desenvolvimento rural é o Liaison entre actions de empregos, a formação profissional, apoiar programas de développement de l`economie rurale (Leader). desenvolvimento de novas tecnologias e criar uma O Leader (1991/1994) tinha como metodologia a política rural harmonizando os marcos de gestão do formação de redes de grupos locais em favor do turismo neste espaço (MARTÍNEZ ROGET, 2004, p. 20- desenvolvimento rural; era dirigido a povoações 21). pequenas, de cinco a cem mil habitantes e antes de se Na Espanha, diferente de outros países europeus iniciarem as ações foram realizadas medidas de fomento, como Grã Bretanha, Irlanda, França, Alemanha, Áustria e assistência técnica e formação. Cada grupo deveria Itália, as primeiras experiências de fomento ao TR datam elaborar uma estratégia de desenvolvimento adaptada às somente de finais da década de 60 do século passado. características do seu próprio território. Esta estratégia Segundo Henche (2006), em 1967 foram editados Guias geraria um Plano de desenvolvimento que viria a ser um Casas de Labranza, um pequeno esforço para promover contrato entre o grupo local e os gestores do programa. as casas rurais; tais guias foram publicados pela última Por fim, formou-se uma rede europeia Leader com todos vez em 1986. os grupos participantes a fim de facilitar a troca de Na mesma época o Ministério do Turismo informações e experiências. Este projeto foi financiado concedia ajudas econômicas às associações e empresas pelos países e pela UE. Incentivou-se a criação de pólos que ofereciam alojamento ou atividades de animação no turísticos rurais sem deixar de lado o incentivo ao turismo meio rural. Uma delas foi o Programa Vacaciones en descentralizado e apoiado em investimentos individuais Casas de Labranza, na qual concederam subvenciones (MARTÍNEZ ROGET, 2004, p. 26-27). para reabilitação e melhora das casas rurais. Para Sparrer Posteriormente implantou-se o Leader II que tinha (2005) esta foi a primeira iniciativa de TR espanhola, como objetivos garantir a continuidade do primeiro, entretanto segundo Candela (apud SPARRER, 2005, p. apoiar os projetos exemplares, manter a troca de 36) este programa somente propunha solicitações de informações e apoiar projetos de cooperação crédito para a reforma e acondicionamento das moradias transnacional; de 2000 a 2006 este programa foi chamado do meio rural a fim de adaptá-las como alojamento Leader Plus e deixa de lado os projetos de TR centrando- turístico, ou seja, infra-estrutura básica. se em outras questões, como o desenvolvimento de novas A partir de 1984 o governo espanhol oferece tecnologias para o campo, projetos de cooperação, entre ajudas a fundos perdidos (um máximo de 50% do outras (MARTÍNEZ ROGET, 2004, p. 30). investimento) para projetos desenvolvidos por Cabe destacar que além dos fundos estruturais, já associações, cooperativas ou outras agrupações e que comentados, existem também as iniciativas comunitárias. integrassem oferta de alojamento, animação e oferta A diferença entre ambos é que estas últimas têm seu complementar. No seu primeiro ano de funcionamento, âmbito geral de atuação e os princípios gerais para sua foram desenvolvidos três projetos-piloto: Bajo aplicação definidos em instâncias comunitárias. As quatro Maestrazgo, em Aragón; Veratur, em Cáceres e iniciativas comunitárias no ano de 2000 eram Leader Taramundi, em Asturias. O caso de Taramundi, em Plus, Interreg, Equal e Urban. Em todas elas foram Asturias, é, até os dias atuais, reconhecido como um dos desenvolvidos projetos turísticos. Por último, as ações núcleos de TR mais importantes da Espanha, baseado em locais são outra forma de intervenção desde a UE que uma reabilitação do patrimônio arquitetônico e gestão incentivam projetos pilotos de natureza alternativa e executada pelos próprios habitantes da área (Cals, Capellà e Vaqué, 1995, p. 52-53).

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Segundo Martínez Roget (2004), a Espanha criou o Programa Operativo de Desenvolvimento e Diversificação Econômica de Zonas Rurais (Proder) com o objetivo de aplicar, com o enfoque do Leader, as mesmas ações nas regiões que não foram atingidas pelo projeto da UE. Este programa teve duas edições, cada uma de seis anos, finalizando no ano de 2006. Para Gutiérrez (2005) é um programa que reforça a escala local, a valorização da comarca, impulsiona a cooperação intercomarcal e promove a diversificação econômica das áreas rurais. Entretanto, para este autor, foi com o Plan Futures, aplicado de 1996 a 1999, que o TR ganhou atenção na política turística espanhola (MARTÍNEZ Figura 01. Mapa da Galícia na Espanha ROGET, 2004, p. 40-41). Atualmente todas as Comunidades Autônomas tem suas próprias A Comunidade Autônoma da Galícia (Figura 01), regulamentações das atividades de TR praticadas em seus também conhecida como “país de los mil ríos”, está territórios. Além da regulamentação, existem ações de localizada a noroeste da Península Ibérica. Sua área total é fomento, promoção e desenvolvimento de experiências de 29.574 quilômetros quadrados, o que representa 5,84% piloto (FERNÁNDEZ, 2008, p. 104-109). Cabe destacar do território espanhol, e sua população é composta por que tal diversidade de regulamentações e ações pode gerar 2.783.100 milhões de habitantes. Geograficamente, diversos problemas como a ausência de uma padronização limita-se ao norte com o mar Cantábrico, ao sul com dos conceitos, critérios para classificação, sinalização Portugal, a oeste com o oceano Atlântico e a leste com o turística, entre outros. Principado de Asturias e Castilla y León. Tem um relevo O TR tem sido entendido como um segmento ondulado com montes e montanhas e seus idiomas oficiais bastante promissor na Espanha. Existem 11.559 são o castelhano e o galego. alojamentos rurais, dos quais 40% são associados à Ao todo são 315 municípios divididos Asociación Nacional de Turismo Rural (Asetur). Em politicamente em quatro províncias (A Coruña, Lugo, 2007 houve quase oito milhões de pernoites nestes Ourense e Pontevedra) pelas quais a população encontra- estabelecimentos; vale destacar o caráter prioritariamente se espalhada com uma densidade de 93,6 habitantes por nacional deste tipo de turismo, já que, segundo dados do quilômetro quadrado, cifra ligeiramente superior à média INE (2007), 6.658.467 pernoites são de pessoas residentes espanhola. Santiago de Compostela é a capital cultural e na Espanha. política desta Comunidade Autônoma. Segundo o Instituto Geográfico Nacional – IGE A Galícia, até a década de setenta do século (2008) o crescimento tanto do número de passado, era considerada uma Comunidade Autônoma estabelecimentos como do número de leitos oferecidos tradicionalmente rural já que 70% da população era rural- pelos alojamentos rurais traduzem a eclosão de tais agrícola; atualmente, dois terços da população galega modalidades na segunda metade dos anos 90 e primeiros vivem em centros urbanos sendo que as áreas litorais anos do presente século, o aumento da demanda contam com forte urbanização e o interior segue sendo (principalmente nacional) e os resultados dos programas marcadamente rural. Este último tem uma organização de comunitários e estatais de desenvolvimento das áreas caráter comarcal no qual há uma pequena cidade que rurais através do turismo. Entretanto, tal êxito gerou concentra as empresas e os serviços públicos dentro de situações de sobreoferta, notável sazonalidade e baixos uma área de influência, gerando dependência funcional. índices de ocupação em determinadas épocas do ano. Devido ao grande número de aposentados, existem muitas áreas rurais na Galícia que são espaços economicamente subsidiados (GONZÁLEZ, 2006, p. 136). 3 TURISMO RURAL NA GALÍCIA Neste âmbito, o principal marco de transformação dentro do período estudado foi há quatro décadas com mudanças na economia e sociedade galegas, passagem de um estado de atraso para um relativo desenvolvimento, êxodo rural, crescimento econômico, aumento do consumo, maior disponibilidade de novos insumos industriais e inovações tecnológicas, entre outros (GARCÍA, 2006, p. 41).

Despois dun período de crise e de axustes que se prolongou ata mediados dos oitenta, entrase nunha fase de crecemento moderado que transcorre ata actualidade, que só foi

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interrompida por um curto período de crise a ao significativo crescimento da população espanhola. comezos dos noventa (GARCÍA, 2006, p. 41). Além desse estancamento ou ligeira caída da população galega, o meio rural sofre um despovoamento cada vez Trata-se de uma época na qual a população rural maior, como já discutido acima. segue reduzindo e envelhecendo e a produção agrária Na década de noventa se percebe o passa a ser fornecedora de matéria prima, a qual é prosseguimento na regressão demográfica do meio rural e transformada agora pela indústria numa maior gama de que os municípios que mais dependiam do emprego produtos e distribuída por grandes empresas com agrário foram os que mais sofreram com uma alta estratégias de caráter global. diminuição da população. Além disso, os empregos Além disso, é importante destacar algumas criados em outros setores da economia não foram mudanças institucionais pelas quais a Galícia passou suficientes para absorver os perdidos na agricultura desde meados do século passado. Primeiramente, a (IGLESIAS, 2006, p. 94-97). transição da ditadura para a democracia na década de Para Iglesias (2006) a solução para os meios rurais setenta, o novo marco autonômico com eleições em 1981 passa por incidir sobre a base econômica consolidando os e a integração na Comunidade Econômica Europeia na empregos agrários, tanto os ligados às atividades década de oitenta. Esta última teve grande influência no produtivas como às novas funções (proteção da paisagem, mundo rural galego já que a política comunitária agrária conservação do patrimônio natural e cultural, etc), além era a que mais estava desenvolvida, com muitos do desenvolvimento de atividades industriais e terciárias. intercâmbios comerciais de produtos agrários e fundos González (2006) concorda e acrescenta que “cada vez é estruturais de financiamento (GARCÍA, 2006, p. 42). máis importante a difusión de empregos non-agrarios nas Segundo este autor areas rurais, sobre todo nas zonas próximas aos núcleos urbanos”. nas últimas catro décadas o complexo Como já discutido anteriormente, existem diversos agroindustrial perdeu unha parte importante do programas em âmbito comunitário, nacional e autonômico seu peso relativo na economia galega, tanto no com o objetivo de dinamizar socioeconomicamente as valor xerado como no emprego, debido a un maior crecemento dos restantes sectores áreas rurais, principalmente aquelas menos desenvolvidas. productivos e os baixos resultados do próprio No campo galego incidiram programas como Leader, sector agrário. Leader II, Leader +, Proder, Proder II, subvenções a projetos dinamizadores das áreas rurais galegas Para ele a diferença entre a Galícia e outras regiões concedidas anualmente pela Agência Galega de dentro da UE é que na Galícia essa desagrarização foi Desenvolvimento Rural (Agader) visando “a atrasada e abrupta já que em países como a Itália, por diversificación cara a actividades non agrarias, a exemplo, esse processo teve início em princípios do creación e desenvolvemento de microempresas, o fomento século XX. Ou seja, na Galícia tudo ocorreu em um curto das actividades turísticas, a promoción dos servizos período e a indústria de transformação tinha um limitado básicos para a economía e a poboación rural e a desenvolvimento. protección e modernización do patrimonio rural” Vale ressaltar que em finais da década de (AGADER, 2008). cinquenta a produção agrícola e pecuária na Galícia tinha Com relação ao turismo, um dos programas um peso similar (45% da produção cada uma); hoje, europeus que mais incentivou esta atividade como entretanto, a pecuária é a base produtiva (62%) e a alternativa econômica para o campo foi o Leader, que produção agrícola compõe somente 22%. teve três edições desde 1991 até 2006. Na última edição O tamanho das propriedades rurais galegas segue centrou-se em outras questões que não o turismo, como as sendo muito pequeno mesmo tendo crescido devido à novas tecnologias para o campo, projetos de cooperação, diminuição no número de propriedades. Entre 1962 e etc. (MARTÍNEZ ROGET, 2004, p. 30). 1999 desapareceram 41% daquelas propriedades com Atualmente está sendo implantado o “Programa menos de dez hectares. Vale ressaltar que dentre estas Leader de Galiza 2007-2013” que segue a mesma propriedades aquelas com menos de dois hectares não metodologia dos programas anteriores (estratexia definida diminuíram tanto como as que tinham entre dois e dez. Já a nivel comarcal; partenariados entre axentes públicos e as que tinham entre vinte e cem hectares aumentaram sua privados; enfoque abaixo-arriba; deseño e aplicación quantidade em 82% neste mesmo período (GARCÍA, multisectorial; innovación; traballo en rede; cooperación 2006, p. 57). con outros territorios rurais) e conta com um orçamento Para este autor atualmente o meio rural galego de 148,8 milhões de euros que será gestionado pela vivencia três problemas importantes que são a deficiente Agader (AGADER, 2008). gestão das terras, a débil integração econômica das De 1996 a 2006 existiram duas edições do Proder. cadeias produtivas e a crise demográfica e econômica do Como dito anteriormente, este programa espanhol seguia meio rural. o mesmo enfoque do programa Leader, porém em áreas Sobre esta última dificuldade vale ressaltar que, que não foram contempladas pelo programa europeu. Na segundo Iglesias (2006), a população galega permaneceu Galícia, segundo Gutiérrez (2005), o Proder II teve 11 a mesma durante a segunda metade do século XX frente

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grupos atingindo 69 municípios numa área de 4.468 km2 e social corporativa e no desenvolvimento rural sustentável uma população de 1.181.086 indivíduos. entendido de forma integral, isto é, desenvolvimento Além dessas, existem outras iniciativas econômico, social e ambiental. comunitárias de integração e desenvolvimento como o Em finais da década de 80 e começo de 90 do Interreg III que tem como objetivo principal “que las século passado os gestores do turismo espanhol fronteras nacionales no sean un obstáculo para el perceberam que o país perdia quota de mercado no desarrollo equilibrado y la integración del territorio segmento “sol e praia” e começava a existir maior europeo”. demanda por novos produtos turísticos. Assim, houve Na Galícia, Pontevedra e Ourense foram zonas uma união de esforços entre as administrações estatal e subvenciondas pelo Interreg III como áreas de fronteira autonômicas para a criação de alternativas aos segmentos com Portugal. Com relação ao desenvolvimento rural convencionais. Um dos segmentos que passou a ser através do turismo algumas das linhas de atuação foram a incentivado foi o TR. “diversificación de las actividades para incrementar las Na Galícia, segundo Romero (2003), foi em 1992 oportunidades de nuevos empleos o generar ingresos que o TR passou a formar parte de um dos quatro planos adicionales para la población rural”, do “Programa de desarrollo turístico da Galicia”. Foi a partir de 1990, com a criação da Secretaria Xeral para o desarrollo rural transfronterizo, principalmente Turismo, que se impulsionou o apoio à recuperação e mediante la comercialización y promoción de reabilitação de construções rurais galegas para a atividade productos de calidad, el fomento de las turística. Assim, classificaram-se os estabelecimentos actividades turísticas y artesanales, la mejora de rurais em cinco grupos (pazos-hospedería, pazos- las condiciones de vida, la renovación y residencia, casas de aldea-hospedería, casas de aldea- desarrollo de los pueblos y la conservación del patrimonio rural, desarrollo y mantenimiento de residencia e casas de labranza) e, posteriormente, em determinadas zonas transfronterizas protegidas 1995, se reformulou tal classificação passando à que (com (DIÁRIO OFICIAL UE, 2004, p. 15). algumas modificações) vigorava até pouco tempo atrás. Segundo esta autora, com base em dados do Desarrollo de un turismo de calidad compatible Registro de Empresas e Atividades Turísticas da Xunta de con el medio ambiente (incluido el turismo Galicia (REAT), em 1993 não havia nenhum rural) mediante proyectos de inversión, diseño e estabelecimento de TR regulado, chegando a 314 introducción de nuevos productos turísticos estabelecimentos em 2001 e, atualmente, 474 (INE, (turismo cultural y ecológico) que den lugar a la 2007). creación de empleos sostenibles. Medidas promocionales, estudios de mercado y creación Segundo Lois e Solla (2004) os principais de sistemas de reserva compartidos (DIÁRIO objetivos das iniciativas públicas com o incentivo ao TR OFICIAL UE, 2004, p. 15). foram diversificação econômica com melhoria do nível de vida, conservação da população no campo, dinamização Este projeto foi desenvolvido no sul da Galícia e das sociedades rurais, incentivo ao surgimento de líderes norte de Portugal entre 2006 e 2007. Casal e Souto (2007) locais e trabalho em rede com outros territórios. Para publicaram um artigo no qual apresentam uma proposta Solla (2007/2008), entretanto, a implantação do turismo metodológica dos grupos de trabalho do projeto a fim de não cumpriu como deveria seu papel de dinamizador do impulsionar socioeconomicamente esta área, baseando-se meio rural galego. nos princípios do cooperativismo. Muitas propostas não foram aplicadas da forma Para eles o diagnóstico da situação atual consiste adequada na prática já que, dentre outros problemas, os em deterioro econômico e social, elevada ruralidade, nível projetos eram impostos (de cima para baixo) e a maioria de renda inferior à média comunitária, deficientes dos beneficiados não eram os agricultores menos estruturas de comunicação, relevo montanhoso, qualidade favorecidos, mas pessoas com capacidade econômica e da oferta hoteleira questionável, envelhecimento e perda acesso às fontes de informação e poder. Para Solla da população e baixo nível de estudos. Na área galega a (2007/2008) o TR foi implantado num meio rural em crise porcentagem de pessoas menores de 19 anos é de 13% e com uma população envelhecida (conservadores e sem enquanto que de maiores de 65 anos é de quase 34%. Há disposição para novos empreendimentos). menos concentração populacional nas zonas de maior ruralidade, grande deterioro das atividades rurais, é comum que o dono da propriedade tenha idade avançada 4 METODOLOGIA DA PESQUISA e o tecido empresarial é débil nestas áreas. Para minimizar estes problemas e dinamizar a Para o desenvolvimento da pesquisa foram região foram propostos quatro eixos básicos: potenciação utilizados materiais bibliográficos como livros, teses, de atividades agrícolas, pecuárias e florestais; ordenação dissertações, artigos científicos e estudos governamentais do setor turístico; desenvolvimento de serviços básicos; desenvolvidos por técnicos e autores galegos ou de outras expansão da atividade empresarial. Cabe destacar que o partes da Espanha que analisaram a questão do TR nesta modelo proposto está baseado em sociedades cooperativas Comunidade Autônoma a partir de diversos âmbitos, e nos fundamentos da economia social, responsabilidade como econômico (MARTÍNEZ ROGET, 2004),

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geográfico (SOLLA, 2007/2008; LOIS, 2007), de marketing (HENCHE, 2006), político (LOIS, 2007; Para Canterle (2004 apud MANÇANO, 2008, p. BACARIZA, 2007), entre outros. Cabe destacar a 25) o associativismo, por sua vez, pode ser definido como utilização de dois documentos publicados pela Xunta de uma forma de união de interesses comuns, onde a Galícia através da Turgalicia: “Guia de Turismo Rural da sociedade se organiza através de ajuda mútua para Galicia 2009” e “Enquisa Turismo Rural 2005-2006”. resolver diversos problemas relacionados ao seu dia-a-dia. Para complementar as informações colhidas foram Na Espanha, segundo Tudel (2007), as associações realizadas entrevistas em profundidade com dois dos de TR são entidades sem ânimo de lucro e formadas por principais agentes envolvidos nesta atividade. São eles: proprietários de alojamentos rurais, sendo que em Santiago Bacariza Cortiñas, chefe da área de TR e de algumas também participam proprietários de outras Interior da Turgalicia e Marisol Lorenzo, presidente da empresas relacionadas ao TR ou ao artesanato. Algumas Federação Galega de Turismo Rural. administrações públicas obrigam que as casas rurais Para completar a análise, foram aplicados estejam associadas para receberem subvenções e/ou questionários a 65 proprietários de casas rurais galegas a participarem de programas de desenvolvimento rural. fim de conhecer suas opiniões e posicionamentos com O movimento associativo nasceu na Espanha na relação a uma série de aspectos desta atividade econômica década de 80, com a criação de uma associação catalana. na Galícia. Atualmente, caracteriza-se por sua “abundancia y variedad en cuanto a número de asociaciones y de asociados” (TUDEL, 2007, p. 109). Com relação às 5 ASSOCIATIVISMO NO TURISMO RURAL associações de TR, especificamente, segundo Fernández e GALEGO: RESULTADOS Puig (2002 apud JIMÉNEZ et al., 2006, p. 73)

O conceito de associativismo está estritamente la actividad del turismo tiene un importante relacionado ao conceito de desenvolvimento local ou papel en el desarrollo local de comarcas de endógeno. Iniciaremos este apartado fazendo uma breve interior con potencial de futuro, complemento de revisão bibliográfica sobre estes termos a fim de embasar las rentas agrarias y vía de creación de empleo en zonas desfavorecidas, siendo la filosofía de a análise do associativismo no meio rural da Galícia com la forma cooperativa agraria la idónea para la relação à atividade turística. puesta en marcha de estas actividades. Con O desenvolvimento local ou endógeno, para estas actividades complementarias se consigue Rodrigues (1997 apud MELLO, 2007, p. 22), não pode evitar el despoblamiento de las zonas de interior ser confundido com crescimento econômico; assim como y el mantenimiento y mejora de la calidad de não basta que haja desenvolvimento econômico para que vida de las familias rurales. [grifo nosso] seja configurado um desenvolvimento local propriamente dito já que este inclui também as esferas sociais, culturais Percebe-se, portanto, que o associativismo consiste e ambientais. em um instrumento útil para a organização de Para Prévost (2005 apud MANÇANO, 2008, p. determinadas comunidades a fim de lutarem por seus 08) o desenvolvimento local somente é possível quando objetivos de maneira coletiva. Na Galícia existem os agentes locais são o centro do desenvolvimento, ou algumas associações compostas somente por empresas seja, todas as forças indutoras do desenvolvimento turísticas em âmbito rural e outras que, pelo reduzido deverão estar focadas na valorização dos potenciais número, estão compostas por empresas turísticas de todos locais. Desta forma, as iniciativas econômicas locais são os tipos. dinamizadas e estimuladas através da coerência entre os A Federación Gallega de Turismo Rural (Fegatur) atores envolvidos e da capacidade destes em associar, de possui 11 associações filiadas e foi formada em julho de modo harmônico, um conjunto de processos e elementos 2003 pela iniciativa de membros de várias associações que sejam comuns a todos. com o objetivo de promover o desenvolvimento do setor Para o meio rural é comum a utilização do termo turístico rural na Galícia. Faz parte da Asetur que, por sua “desenvolvimento rural” que, para Marques (2002 apud vez, pertence à EuroGites, onde estão representados 26 ANGUITA et al., 2006, p. 41), refere-se ao países europeus que ofertam produtos de TR.

proceso de crecimiento económico y cambio O funcionamento da Federación Galega de estructural para mejorar las condiciones de vida Turismo Rural desenvólvese dun xeito de la población local que habita un espacio e piramidal, coa representación dunha xunta identifica tres dimensiones del mismo: la directiva que é portavoz das decisións que se económica, la sociocultural y la política toman en asembleas e reunións cos administrativa. Mediante este proceso se representantes das asociacións membros. Desta pretende una mejora de las condiciones de vida forma, os propietarios participan a través das y trabajo que lleve consigo la creación de súas asociacións e os representantes destas fan empleo y riqueza, compatible con la chegar á federación toda a información a través preservación del medio y el uso sostenible de los das xuntanzas que se celebran periodicamente recursos naturales. (FEGATUR, 2008).

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- Campo e Mar: está associada à Fegatur e Asetur, A entidade tem sua sede no município de Santiago conta com catorze casas associadas, todas situadas de Compostela, província de A Coruña. Os serviços na região Norte das Rias Baixas. Possui uma página prestados são: a compra de um contrato de apólice de web própria e dispõe da possibilidade de fazer seguro coletivo de responsabilidade civil, contrato de um reservas offline, enviando um formulário de seguro de multirrisco empresarial (opcional), serviços de solicitação de disponibilidade. desinfecção e desratização feita por uma empresa - Tureume: está associada à Fegatur e Asetur, está terceirizada com certificado de tratamento, participação composta por nove associações de TR e tem uma na central de promoção e reservas da Fegatur, página web própria. participação nas feiras mais importantes do país, acordos - Lugo Sur: foi criada em 2004 e atualmente conta de colaboração promocional assinados com a Turgalicia com vinte e cinco casas de TR. Está associada à anualmente, representação frente à Turgalicia e a Fegatur e Asetur e tem uma página web própria. Dirección Xeral de Turismo da Galícia, materiais de - Mar de Compostela: conta com vinte e seis casas de promoção elaborados conjuntamente com a Asetur TR, sendo duas do Grupo A, vinte e três do Grupo (folhetos, cartão de visita, calendários, etc.), participação B, uma do Grupo C e nenhuma do Grupo D. Todas em projetos de comercialização e promoção, estão situadas na Comarca de Tabeirós e Terra de assessoramento em temas relacionados ao TR nas Montes. Está associada à Fegatur e Asetur, possui propriedades, boletim informativo com notícias de uma Central de Reservas e uma página web própria. interesse e cursos de formação. - Terras do Avia: está associada à Fegatur e Asetur e Segundo Lorenzo, presidente da Fegatur, está composta por sete casas de TR situadas nas atualmente as principais ações da Federação tem sido as comarcas de O Carballiño e O Ribeiro. Não possui relações institucionais, os programas de promoção, a uma página web própria. captação de novos sócios, criação de uma nova página - Trevihost: está associada à Fegatur e Asetur, conta web e melhoria do posicionamento. com onze casas de TR situadas em Trevinca e possui Segundo Cánoves et al. (2004), em geral, as uma página web própria. associações costumam se encarregar da promoção das - Turisacra: está associada à Fegatur e Asetur, possui casas, assessoramento jurídico, promoção do intercâmbio sete casas associadas da Ribeira Sacra e não possui de ideias entre os sócios, compra de produtos de uso página web própria. comum, além do fomento e dinamização do TR. - Grupo Mixto: formado por quatro casas de TR que A Fegatur é financiada por seus próprios sócios, não pertencem à nenhuma associação em específico; que pagam um euro por leito, e, além disso, existe um isto é, estão em regiões diferentes da Galícia. Estão convênio com a Turgalicia em que certas ações são co- associados à Fegatur e Asetur e não possuem página financiadas por esta entidade pública. Os objetivos da web própria. Federação consistem em promover o desenvolvimento do - Além destas, existem algumas associações que não TR na Galícia, ter uma representação sólida ante a estão filiadas à FEGATUR, como Agarimo, Agatur administração e organismos públicos, profissionalizar o e Pazos de Galicia. setor, realizar promoções conjuntas e negociar - Agarimo: foi criada em 1997, tem oitenta e duas coletivamente, dentre outras coisas (LORENZO, 2009). propriedades associadas e sua sede localiza-se no Os meios de comunicação utilizados entre município de Ponteareas, na província de Federação e associados são principalmente email, Pontevedra. Todas as propriedades pertencem à telefone, correio postal e fax. Existem reuniões sempre metade sul desta província, mais concretamente nas que é necessário, porém como mínimo se realizam quatro comarcas de Vigo, Pontevedra, O Morrazo, Baixo por ano. Segundo Lorenzo (2009), geralmente há Miño, A Paradanta e O Condado. A Associação tem participação dos associados; entretanto, percebe-se que a um convênio com a prefeitura de Ponteareas para maioria das casas busca benefícios imediatos, porém, em gerirem juntos a “Oficina de Turismo” da cidade. seguida, compreendem que é preciso participar e Agarimo é uma das Associações que possui uma colaborar. Cerca de 30% dos associados são os realmente Central de Reservas própria e gratuita a fim de mais ativos. “agilizar y facilitar la búsqueda del alojamiento Seguem abaixo alguns dados sobre as entidades deseado” (AGARIMO, 2008) que funciona de que compõem tal Federação a fim de basear uma posterior segunda a sexta-feira, das 9:00 às 14:00 e das 16:00 discussão sobre os pontos positivos e negativos da Galícia às 19:00, e de sábado das 10:00 às 14:00 horas. no quesito associativismo. Além disso, possui uma página web e email para - AHT de Allariz: está associada à Fegatur e Asetur, contato. foi criada em 2000 e tem cinco casas rurais - Agatur: está associada a nível nacional à associadas, todas situadas no município de Allariz. Asociación para la Calidad del TR. Conta com A Associação não possui uma página web própria. trezentos e doze casas rurais associadas espalhadas - Costa da Morte: está associada à Fegatur e Asetur, por toda a Galícia sendo, segundo a antiga possui dezoito casas associadas e também não possui legislação, cinqüenta e duas do Grupo A, duzentas e página web própria. vinte e sete do Grupo B, trinta e três do Grupo C e

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nenhuma do Grupo D. Possui uma página web Alguns apontaram benefícios que poderiam própria. receber das associações e não estão recebendo. Os mais - Pazos de Galicia: trata-se de uma associação que citados foram descontos comuns, maior luta por melhores agrupa somente estabelecimentos do Grupo A. conexões à internet, mais formação e mais centrada nos Dirigem sua promoção a um segmento bastante interesses dos proprietários rurais, maior pressão nos meio específico: poder aquisitivo médio-alto e nível políticos e de comunicação, vantagens fiscais, cultural alto, oferecendo também um alto nível de profissionalização na elaboração de pacotes turísticos e na qualidade. comercialização dos mesmos, gestão comum de serviços Santiago Bacariza afirma (em entrevista) que uma de manutenção e produtos, desenvolvimento de novos das estratégias previstas por Turgalicia para melhorar o projetos e mais promoção. TR na Comunidade Autônoma é justamente a Acreditam que é importante estar associados pela “vertebración asociativa”, ou seja, o apoio aos projetos aprendizagem e ajuda mútua; ajuda em questões práticas que sejam iniciativas das associações e federação, como o seguro de responsabilidade civil e as promoções; impulsionando para que sejam os proprietários rurais os representação nos diálogos com a administração pública; protagonistas, através de seus representantes nas minimização dos custos; desenvolvimento de projetos em associações. Para isso, Turgalicia tem firmado convênios comum nas zonas; formação; acesso conjunto aos TTOO com Fegatur, Agatur e Pazos de Galicia. e AAVV; entre outros. Na entrevista realizada com as casas rurais galegas, mais de 90% está filiado a alguma associação, 8% não está filiado e 1% não respondeu à pergunta 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS (Gráfico 01). O Turismo Rural galego começou a ser incentivado, como visto anteriormente, devido à busca por atividades econômicas complementares à agricultura visando dinamizar um território rural envelhecido e em crise e, além disso, diversificar a oferta turística galega criando alternativas ao Turismo Sol e Praia. Ou seja, na Galícia o Turismo Rural começou não por iniciativa dos pequenos agricultores para dinamizar suas economias, mas como uma política imposta de cima para baixo (do governo para a população). Os Governos (comunitário, espanhol e galego) criaram todas as condições para o desenvolvimento desta atividade, em alguns aspectos de

Gráfico 01. Filiados à associação maneira desarticulada e não gradativa. Este fato foi, sem Elaboração própria sombra de dúvida, a origem de diversos problemas vividos pelos proprietários rurais até os dias de hoje. Desta amostra, 63,7% respondeu positivamente Programas como Leader, Proder, Interreg e outros com relação à satisfação em estar associado, o que reflete como os do Agader tiveram adequadas intenções, uma situação relativamente confortável já que tal tema geralmente passando pela dinamização socioeconômica costuma ser tão polêmico (Gráfico 02). das áreas menos desenvolvidas de seus territórios de atuação. Entretanto, a maneira como os programas foram colocados em prática criaram problemas como a dependência de financiamento e a cultura do peixe (dar o peixe, mas não ensinar a pescar). Muitas áreas na Galícia receberam grandes quantidades de dinheiro para o desenvolvimento de projetos turísticos, e alguns não conseguiram tornarem-se rentáveis; ou seja, não se desenvolveram como deveriam porque não tiveram um planejamento adequado, com planos de negócios, formação, orientação ao mercado, fiscalização, etc. Na Espanha algumas administrações públicas exigem que as propriedades rurais estejam associadas para receberem ajudas financeiras ou poderem participar em projetos de desenvolvimento. Esta medida pode ser positiva porque obriga que, de alguma forma, os Gráfico 02. Satisfação em estar associado proprietários estejam cientes de acontecimentos Elaboração própria importantes, porém, por outro lado, causa problemas na

gestão das associações já que muitas vezes se convocam assembleias e se apresentam poucos membros, além de

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serem sempre os mesmos. Esta questão trava diversos GUTIÉRREZ, J. I. P. Desarrollo y diversificación en las processos pela ausência de muitos associados. zonas rurales de España: el programa PRODER. Boletín Acredita-se que deve haver um trabalho prévio de de la AGE, Madrid, v. 39, p. 399-422, 2005. conscientização dos empresários turísticos existentes e potenciais sobre a importância de participarem ativamente HENCHE, B. G. Marketing del Turismo Rural. 2. ed. nas decisões com relação ao Turismo em seus territórios e Madrid: Editora Pirámide, 2006. os benefícios gerados por esta atitude. Ou seja, a colaboração público-privada deve ser intensa desde o IGLESIAS, E. L. Axuste agrario e despoboamento rural início do planejamento das atividades. Assim, a en Galicia. Análise das tendencias recentes e reflexións participação de todos deve ser algo firmemente cara ó futuro. In: CONGRESO TÉCNICO-CIENTÍFICO incentivado pela administração pública. SOBRE DESAGRARIZACIÓN E SOSTIBILIDADE RURAL NA EURO-REXIÓN GALICIA/NORTE DE PORTUGAL, 2006. Lugo: Foro Rural Galego, 2006. p. AGRADECIMENTOS 89-102.

A autora deste artigo agradece ao Programa Alban INSTITUTO GEOGRÁFICO NACIONAL. Atlas (Programa de Alto Nível na União Europeia para Alunos Nacional de España: Turismo en espacios rurales y Latino-americanos) que financiou seus estudos entre 2007 naturales. Madrid: Centro Nacional de Información e 2009 e ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Geográfica, 2008. Tecnologia de São Paulo pelo afastamento para qualificação em nível de doutorado concedido entre os JIMÉNEZ, M. C. R. et al. Estado actual de la anos de 2013 e 2015. investigación sobre sociedades cooperativas agrarias en España. Revista de economía pública, social y cooperativa, Jaén, nº 56, p. 65-86, 2006. REFERÊNCIAS LOIS, R.; SANTOS SOLLA, X. M. Planificación y ANGUITA, P. M. Desarrollo Rural Sostenible. Madrid: espontaneidad en el desarrollo rural. In: GONZÁLEZ, R. McGraw Hill, 2006. R. E CORREA, E. P. (Org.). Espacios y desarrollos rurales. Gijón: Trea, 2004. BACARIZA, S. Turismo Rural na Galícia. [jan. 2009]. Entrevistadora: Luciana Pereira de Moura Carneiro. MARTÍNEZ ROGET, F. Axuda á Decisión: Unha Santiago de Compostela: USC, 2009. aplicación ó Turismo Rural Galego. Santiago de Compostela: Unidixital, 2004. BIGNÉ, E. A.; AULET, X. F.; SIMÓ, L. A. Marketing de destinos turísticos: análisis y estrategias de desarrollo. MARTÍNEZ ROGET, F. Turismo Rural en Galícia: Madrid: ESIC, 2000. Contribuiciones al desarrollo sostenible. Xunta de Galícia. Santiago de Compostela: Dirección Xeral de CALLEJO, J.; GUTIÉRREZ, J.; VIEDMA, A. O proceso Turismo, 2004. de constitución de España en una sociedad turística. Política y Sociedad, Madrid, v. 42, n. 1, p. 151-168, 2005. MANÇANO, R. V. O associativismo como fator de desenvolvimento econômico local: estudo de caso da CASAL, M. J. C.; SOUTO, B F-F. Sustentabilidad y Associação dos Produtores Rurais de Corumbataí do Sul. cooperativismo: una propuesta metodológica basada en un 2008. 74 f. Dissertação de Mestrado em Desenvolvimento proyecto real. REVESCO, v. 92, p. 72-106, 2007. Econômico, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2008. FERNÁNDEZ, J. I. P. El turismo rural. Madrid: Síntesis, 2008. MELLO, L. A. Turismo de base local como alternativa ao desenvolvimento: bases para os municípios de União da GARCÍA, R. F. El turismo en España: especial referencia Vitória/PR e Porto União/SC. 2007. 121 f. Dissertação de al análisis de la demanda. Madrid: Instituto de Estudios Mestrado em Geografia, Universidade Federal do Paraná, Turísticos, 1995. Curitiba, 2007.

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Anais do VIII Congresso Brasileiro de Turismo Rural e I Colóquio Internacional de Pesquisa e Práticas em p. 178-186 Turismo no Espaço Rural, Rosana - SP, 10-13 de novembro de 2013. v.1.

MOTIVAÇÃO DE TURISTAS PARA O CONSUMO DE ALIMENTOS LOCAIS NO ROTEIRO CAMINHOS DE PEDRA, BENTO GONÇALVES, RS.

CLARICE BASTARZ NATÁLIA SALVATE BRASIL MARCELINO DE SOUZA

Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS Faculdade de Ciências Econômicas Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural {[email protected], [email protected], [email protected]}

RESUMO – A partir da reflexão a respeito da globalização e da valorização da cultura na sociedade pós- moderna, o turismo emerge como um elo capaz de ligar produtores rurais e consumidores. Desta forma, este estudo propõe analisar a motivação dos turistas para o consumo de alimentos locais, tendo como discussão empírica o Roteiro Caminhos de Pedra, em Bento Gonçalves, Rio Grande do Sul. A literatura neste campo de estudo é considerada nova e incipiente e traz adaptações da teoria das motivações para o consumo de alimentos no turismo. As motivações adotadas para o artigo foram: física, cultural, interpessoal e de prestígio e status. Através de entrevista padronizada, foram entrevistados 60 turistas. Estes revelaram que as motivações para o turismo rural e para o consumo de alimentos locais se concentram na motivação física. No caso da motivação para o turismo rural, parte dos turistas buscam o descanso, tranquilidade e fuga da rotina. No caso da motivação para o consumo de alimentos locais, os turistas buscam experiências sensoriais, principalmente através do paladar. Os resultados demostraram que as categorias de motivação da literatura devem ser amadurecidas no sentido de adequar ao estudo do turismo rural.

Palavras chave: Turismo Rural, Teoria das Motivações, Consumo, Alimentos Locais.

ABSTRACT – From the reflection about globalization and the appreciation of culture on the postmodern society, tourism emerges as a link capable of connecting farmers and consumers. Thus, this study aims to analyze the tourists motivation to local food consumption, with the empirical discussion Roadmap Caminhos de Pedra, Bento Gonçalves, Rio Grande do Sul. The literature in this field is considered new and incipient and brings adaptations of the theory of motivation for tourism food consumption. The adopted motivations for the article were: physical, cultural, interpersonal and prestige and status. Through standardized interview, 60 tourists participated. The results show that motivations for rural tourism and for local food consumption were concentrated on physical motivation. In the case of the motivation for rural tourism, the tourists seek rest, tranquility and escape from the routine. In the case of the motivation for the consumption of local foods, tourists seek sensory experiences, primarily taste. The results show that the categories of motivation on the literature must be matured in order to adapt to the study of rural tourism.

Key words: Rural Tourism, Motivation Theory, Consumption, Local Foods.

1 INTRODUÇÃO tolerância à diversidade proporcionada pela globalização (e também pelo turismo, em certa medida), a qual gera a De acordo com Morin (2003), a reflexividade dos um maior conhecimento sobre si próprio, tendo em vista a indivíduos é tida como uma das principais características possibilidade de contato com outros indivíduos e culturas. da pós-modernidade, percebida ainda em outros Por sua vez, Giddens afirma que a reflexividade da elementos da atualidade, tais como a insegurança no vida social consiste no fato de que “as práticas sociais são futuro gerada pela modernidade, a noção de pluralidade, a constantemente examinadas e reformadas à luz de

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informação renovada sobre estas próprias práticas, para além do comportamento do consumidor, buscando alterando assim constitutivamente seu caráter” (1991, p compreender seu engajamento ideológico ou não com o 45). A noção de que o homem busca atualmente melhor novo paradigma de desenvolvimento rural (VEIGA, 2000; conhecer-se, voltando para si próprio as atenções e PLOEG et al, 2000; KAGEYAMA, 2004). tornando-se a si próprio objeto de estudo é confirmada Desta forma, no sentido de compreender o ainda por Connor, que afirma que a característica comportamento do consumidor no turismo rural, este marcante da pós-modernidade é a autoconsciência (1996, artigo objetiva analisar as motivações de turistas para o p 13). consumo de alimentos locais no Roteiro Caminhos de A reflexividade também está associada à Pedra em Bento Gonçalves, Rio Grande do Sul. identidade cultural, um fator de autoconhecimento em comparação ao outro, em que a diferença atual como um 2 CONSUMO DE ALIMENTOS LOCAIS NO espelho, na definição de si próprio. O conhecimento de si TURISMO RURAL próprio tem sido cada vez mais associado à noção de que proporciona maior tolerância, ocasionando o O consumo de alimentos no turismo, um tipo reconhecimento do outro como ser digno de seus próprios fundamental de consumo turístico, tem sido ideais, valores e princípios, trazendo-nos a reflexão sobre negligenciado, segundo Mak et al (2012), na literatura de os nossos próprios. turismo e hospitalidade. Esta negligência, afirmam os Pode-se afirmar que o pensamento reflexivo do autores, se deve à tradicional noção dos alimentos como homem contemporâneo, possibilitaria uma valorização ou “suporte” às atividades de turismo. Embora o consumo de mesmo um resgate da singularidade cultural, legitimado alimentos afete significativamente a economia dos também pela cultura como fator de consumo – ponto em destinos – Telfer e Wall (2000) apontam que um terço dos que os atuais caminhos do desenvolvimento rural e da gastos de turistas durante as viagens refere-se ao consumo atividade turística possuem estreita relação. de alimentos – a convencional visão de que o ato de No sentido da promoção do desenvolvimento rural comer durante viagens é uma experiência de apoio ao e do turismo, a cultura tem se mostrado uma característica turista, sendo apenas uma extensão de sua rotina diária, fundamental promovida pela pós-modernidade contribui para esta lacuna nos estudos de consumo dos (GIDDENS, 1991), em que comunidades buscam o alimentos no turismo (QUAN e WANG, 2004). resgate e a promoção de suas singularidades. Entretanto, nos últimos anos surgiram pesquisas As características da pós-modernidade incidem interessadas no consumo de alimentos no turismo, principalmente na (re)valorização dos produtos da abrangendo áreas como os serviços de alimentação, agricultura familiar, que por sua vez estão imbuídos da experiências gastronômicas no turismo, preferências e ideia de tradição, cultura e preservação ambiental. Os escolha de alimentos pelos turistas e consumo de agricultores familiares buscam a mercantilização, como alimentos locais (KIM et al, 2009; RYU e JANG, 2006; e estratégia de reprodução social, otimizando seus recursos TORRES, 2002). De acordo com Mak et al (2012), este escassos. A mercantilização pode proporcionar o interesse crescente é incentivado pelo aumento do número fortalecimento da autonomia destes atores sociais frente de destinos que passaram a utilizar sua culinária para ao avanço do capitalismo no campo. A ideia não é negar promoverem-se e diferenciarem-se de outros destinos aos mercados e sim criar mercados alternativos (algumas turísticos. Mas, os autores ponderam que os estudos deste vezes não-capitalistas) como forma de resistência, para campo encontram-se em fase inicial e seus princípios continuarem sobrevivendo como agricultores familiares ainda estão sendo estabelecidos. (GUIDDENS, 1991). Os estudos sobre consumo de alimentos no turismo Assim como no turismo, a padronização e se preocupam principalmente em compreender os massificação do sistema agroalimentar, típica da diversos determinantes relacionados ao comportamento modernidade é estimulada pelo peso considerável e do consumidor, geralmente incluindo análises de gosto, crescente da oferta global. As inovações de produto e preferência, escolha e ingestão. processo associadas aos alimentos tem flexibilizado a Apesar de muitos estudos utilizarem os termos padronização dos hábitos de consumo em nível mundial e gosto e preferência como sinônimos, Mak et al (2012) facilitado a orientação da produção pela demanda, mais defendem que existem diferenças sutis em seus personalizada e consciente com o crescimento da significados. Gosto seria o “sabor ou prazer obtido a partir educação da população. Assim, novos padrões de da degustação de um determinado alimento”, enquanto consumo estão crescentemente universalizados, mas que a preferência “pressupõe a disponibilidade de pelo segmentados em nichos de especialidades, sendo que à menos dois produtos diferentes, e refere a escolha de um massificação contrapõem-se novos valores de consumo, ao invés do outro”. Embora a maioria das pessoas prefira como aqueles que privilegiam a preservação ambiental, a alimentos que gostam mais, esta é apenas um dos fatores estética, a saúde e a individualidade. A revalorização dos que dão conta da preferência. atributos de qualidade dos alimentos, intrínsecos ou não, Outros fatores como disponibilidade, valor enquadra-se num novo perfil do consumo. percebido para a saúde, conveniência e economia devem Neste contexto, os estudos sobre o consumo no ser considerados. A escolha dos alimentos refere-se a “um turismo rural devem ser estimulados para compreender conjunto consciente e inconsciente de decisões efetuadas

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por uma pessoa no momento da compra” (HERNE, 1995). socioculturais, psicológicos e fisiológicos exercem direta De uma forma agregada, a escolha dos alimentos pelo ou indiretamente efeitos sobre o consumo. consumidor cria uma demanda por abastecimento no Mak et al (2012) fizeram o esforço teórico de sistema alimentar que produzem, processam e distribuem adaptar estas três categorias para os estudos de turismo, os alimentos. Em síntese, gosto, preferência, escolha e estabelecendo: turistas, alimentos no destino turístico e consumo se sobrepõem, mas não precisamente são ambiente do destino turístico (Figura 1). conceitos equivalentes e associados com o Os alimentos no destino apresentam atributos comportamento do consumidor de alimentos. Em outras sensoriais, assim como o ambiente do destino turístico palavras, gosto é um dos principais determinantes da contribui com fatores como a imagem gastronômica, preferência; e preferência é um dos principais identidade, marketing, comunicações, serviço, que se determinantes do consumo, mas muitas outras variáveis constituem num cenário de consumo. Indiscutivelmente, podem intervir no comportamento do consumidor. estes fatores podem ser mais complexos do que o Mak et al (2012) afirmam que estas “variáveis consumo de alimentos em ambientes domésticos, pois há intervenientes” podem ser agrupadas em três grandes uma mudança significativa tanto nos componentes dos categorias: o indivíduo, o alimento e o ambiente. A alimentos, como no ambiente (MAK et al, 2012). Além tomada de decisão para o consumo de alimentos é disso, o comportamento do indivíduo para a alimentação reconhecido como um processo complexo, compreendido pode mudar durante as viagens, ou seja, um conjunto de por fatores culturais, sociais, psicológicos e sensoriais. diferentes motivações pode influenciar suas preferências e Neste sentido, o comportamento do consumidor é escolhas de alimentos. Embora sejam diversos fatores que influenciado pelo alimento em si, pois este possui podem influenciar o consumo de alimentos no turismo, atributos sensoriais como sabor, aroma, textura e neste estudo, a análise se concentrará nos fatores aparência. Também se considera que o ambiente motivacionais de turistas que influem no comportamento apresenta influências físicas, sociais, culturais e do consumo de alimentos locais num destino de turismo econômicas. E, quanto ao indivíduo, fatores rural.

Consumo Alimentar no Turismo

Turista Alimentação no destino Ambiente do destino:  Influencias culturais e religiosas  Atributos sensoriais (sabor,  Imagem/identidade (experiência cultural, crenças aroma, textura, aparência) gastronômica (imagem religiosas)  Conteúdo do alimento gastronômica do destino)  Fatores sociodemográficos (status (ingredientes, condimentos,  Marketing (internet, guias, socioeconômico e demográfico) temperos) programas de tv)

 Traços de personalidade  Métodos de preparação e  Influências do contexto (ocasião,

relacionados aos alimentos cozimento lugar, com quem)

(neofobia alimentar, tendência de  Tipo de alimento/cozinha  Encontro de serviço (qualidade busca de variedade) (cozinha nacional/regional/local, no serviço esperada)  Efeito da exposição e experiência tradições/significados relacionados)  Servicescape (elementos físicos passada  Disponibilidade de alimentos no cenário de consumo criam um  Fatores motivacionais (tipos disponíveis, variedades, ambiente)  Fatores fisiológicos (fome, sede, alternativas)  Sazonalidade (estação, saciedade)  Preço, valor e qualidade temperatura no destino)

Figura 1 – Diagrama de Fatores Influentes no Consumo de Alimentos no Turismo. Fonte: Mak et al, 2012.

3 MOTIVAÇÕES PARA O CONSUMO DE alimentos em si podem ser a principal, ou uma das ALIMENTOS LOCAIS principais motivações para a viagem ao destino escolhido (HJALAGER e RICHARDS, 2002). Um significativo corpo de estudo tem A motivação turística é reconhecida como uma demonstrado, segundo Mak et al (2012), que fatores importante abordagem para entender o comportamento e motivacionais podem afetar o consumo de alimentos no escolhas dos turistas (CROMPTON e McKAY, 1997). turismo. Alguns destes estudos exploram como os Pode ser definida, segundo Pearce et al (1998), como uma

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rede integradora de forças biológicas e culturais que Por fim, a motivação de status e prestígio se refere atribui valor e direção às escolhas, comportamento e à construção de conhecimentos sobre a culinária e local e experiências de viagem (tradução livre). Desta forma, como os habitantes visitados se alimentam, no sentido de pode-se dizer que a motivação turística possui diversas mostrar este conhecimento a amigos e familiares que não facetas psicológicas, fisiológicas e culturais, pois uma o conhecem (MAK et al, 2012). Esta motivação está viagem deve atender a diferentes expectativas dos relacionada a autoestima, reconhecimento e desejo de indivíduos. chamar a atenção dos outros (McINTOSH et al, 1995). Mak et al (2012) citam o estudo de Fields (2002) Assim, se alimentar possui significado que distinguem que, adotando a tipologia para motivação de turistas de uma pessoa de outra em termos de status e posição social. McIntosh (1995), elaborou uma ligação entre consumo de Crompton e Mckay (1997) afirmam que o status e alimentos e turismo. As quatro motivações de MacIntosh prestígio são desejos que levam a ter uma posição (1995) são: física, cultural, interpessoal e status e superior aos olhos das pessoas que o rodeiam. De acordo prestígio. com Kim e Eves (2012), as pessoas normalmente se A motivação física envolve o ato de comer através utilizam do ato de comer certos tipos de alimentos para se de percepções sensoriais e nutrição. Dialogando com Mak diferenciar de outras e isto está diretamente ligado a obter et al (2012), Kim e Eves (2012) acrescentam que a prestígio e status. motivação física se refere ao “refresco” da mente e corpo O estudo das motivações para o consumo de do indivíduo, ao desejo de recreação, ao descanso, à alimentos locais no turismo são multi-dimensionais e escapada da rotina e à participação em atividades de lazer. estão em fase inicial de construção de conhecimento, Para estes autores, a preocupação com a saúde, apelos conforme afirmam os autores mais recentes estudados. sensoriais e experiências excitantes estão incluídas nesta Kim e Eves (2012) afirmam que, embora os estudos motivação. Kim e Eves (2012) afirmam que a motivação tenham trazido avanços recentes com relação a teoria da física está associada à busca de diminuição da tensão do motivação no turismo, as pesquisas carecem de corpo e procura por um ambiente revigorante e novo. empirismo e aplicação dos conceitos. Assim, o presente Fields (2002), afirma que o ato de provar e experimentar artigo busca contribuir para o preenchimento desta lacuna. alimentos locais está ligado à motivação física, pois entrar em contato com alimentos diferentes do usual 4 METODOLOGIA proporciona percepções sensoriais excitantes. A motivação cultural é dada quando os turistas 4.1 Roteiro Caminhos de Pedra experimentam a culinária local, caracterizando-se numa experiência cultural. Esta motivação está relacionada à Localizado no Distrito de São Pedro, em Bento necessidade de não apenas experimentar diferentes Gonçalves (RS), o Roteiro Caminhos de Pedra possui o culturas, mas também em ganhar conhecimento sobre objetivo de preservar e resgatar a cultura da imigração outros países ou regiões visitadas (McINTOSH et al, italiana na Serra Gaúcha, que ocorreu a partir de 1875. 1995). Relacionada aos alimentos, Fields (2002) afirma Em 1987, se iniciou a concepção do roteiro a partir da que os alimentos podem se constituir em motivação existência de um acervo de casas antigas construídas em cultural quando experimentar alimentos locais significa pedra e madeira com acesso fácil pela Linha Palmeiro e também experimentar culturas locais. A motivação parte da Linha São Pedro. Apresentando a cultura cultural, na literatura, está basicamente relacionada ao arquitetônica preservada somada à produção de uva e desejo de ganhar conhecimento e experiências autênticas, derivados, embutidos e demais alimentos locais através do consumo de especialidades locais, conforme produzidos pelas famílias de descendentes de imigrantes, pontuam Kim e Eves (2012). a região foi diagnosticada como potencial para a O desejo de conhecer novas pessoas, passar tempo implantação de turismo rural (ASSOCIAÇÃO com família e amigos, visitar amigos e parentes ou, ainda, CAMINHOS DE PEDRA, 2013). Além disso, na época, o escapar de relações sociais de rotina são características da Distrito se encontrava em situação de decadência motivação interpessoal (McINTOSH et al, 1995). Fields econômica, advinda da mudança do traçado da rodovia (2002) acrescenta que uma refeição durante uma viagem que ligava Porto Alegre ao norte do Estado, que antes pode estar envolta em significados de reprodução social. passava ali. A motivação interpessoal está relacionada à importância Com recursos privados, as primeiras quatro casas social que as refeições possuem, construindo-se novas foram restauradas e abertas para visitação. O primeiro relações sociais e estreitando os laços (MAK et al, 2012). grupo de turistas foi recebido em 30 de maio de 1992, Kim e Eves (2012) sugerem que uma função chave do através da Operadora CVC, e foi proveniente de São turismo é reforçar laços familiares entre seus membros. Paulo. Em 1997, os estabelecimentos do roteiro formaram McKay (1997) aponta que existe diferença na análise a Associação Caminhos de Pedra e elaboraram projeto entre o desejo de conhecer novas pessoas e reforçar a que comtemplou o resgate do patrimônio cultural (língua, unidade entre familiares e amigos durante uma viagem, folclore, arquitetura, arte, artesanato, etc.). Em 2009, a mas ambos podem se constituir num desejo de estabelecer Lei Estadual 13.177/09, declarou o roteiro Patrimônio relações interpessoais. Histórico do Rio Grande do Sul e, de acordo com a Associação (2013), atualmente são mais de uma centena

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de associados ao roteiro, formado por 15 pontos de idade entre os entrevistados é de 42,2 anos, tendo como o visitação e 56 pontos de observação externa, recebendo mínimo 15 e o máximo 85 anos. A média interna é de 60 mil visitações de turistas por ano, em média. 41,2 anos, portanto a amplitude entre as idades mínima e máxima não interferiram estatisticamente na análise. Os dados sobre o nível de escolaridade demonstram que 53% dos entrevistados possuem 4.2 Procedimentos de Coleta de Dados graduação completa e pós-graduação, apresentando um Após a definição do local de estudo, se estabeleceu elevado grau de instrução. Com relação ao local de que os turistas a serem entrevistados o Roteiro Caminhos residência, apenas sete pessoas são procedentes de Porto de Pedra deveriam ser amostrados de maneira não- Alegre, mas 60% são procedentes do interior do Rio intencional probabilística. Os turistas foram abordados Grande do Sul e 28% de outros estados. Não foram nos estabelecimentos do Roteiro Caminhos de Pedra, entrevistados turistas de outros países. Com relação à entre os dias 14 a 22 de junho de 2013. companhia na viagem, 73% estavam acompanhados do Para atender ao objetivo do estudo, a pesquisa teve cônjuge ou familiares e 20% estavam participando de caráter qualitativo e o instrumento de coleta de dados foi excursão. Quando perguntados se já haviam visitado o elaborado com perguntas abertas, para que o entrevistado roteiro em oportunidades anteriores, 75% dos usufruísse de espontaneidade e ficasse livre para entrevistados afirmaram estar visitando o roteiro pela responder com suas próprias palavras. A entrevista com primeira vez. os turistas foi padronizada e realizada oralmente, Com relação às motivações para visita a um roteiro utilizando gravador. Para Almeida (1989), a entrevista de turismo rural, lembrando que os entrevistados padronizada, com perguntas previamente formuladas, poderiam citar mais de uma motivação, 21 respostas se pode garantir maior precisão nas respostas e abrangência referiram à motivação física, ou seja, aquelas em que os em relação aos termos e comparações nas respostas, apelos sensoriais, preocupações com a saúde, descanso, quantificação dos dados e fidedignidade dos resultados. fuga da rotina e experiência excitantes são contemplados. As perguntas formuladas foram simples, para que o São exemplos de trechos de entrevistas com relação à entrevistado não precisasse de muito tempo para motivação física: responder. Assim, além de dados socioeconômicos, as perguntas formuladas aos turistas foram: Eu busco o lazer mesmo. Não gosto muito da a) O que o senhor(a) busca ao visitar um roteiro de cidade. Busco mais tranquilidade e segurança e turismo rural? menos stress (homem, 62, administrador). b) O(a) senhor(a) comprou ou consumiu algum alimento local durante sua visita ao Caminho de Pedra? Quais? Busco um pouco fugir da cidade, apesar de eu c) Quais os fatores o(a) senhor(a) considera que o trabalhar no campo e conviver com agricultores. motivou a comprar ou consumir estes alimentos Eu sou de origem italiana, minha família é toda de locais? Santa Catarina e isso que estamos vendo aqui eu já vi em vários outros lugares. Então eu não busco 4.3 Procedimentos de Análise dos Dados conhecer essa cultura, pois já conheço. Quero mesmo é fugir da cidade (homem, agrônomo, 31). Para analisar as entrevistas, foram tabulados os dados socioeconômicos dos entrevistados bem como as Eu busco degustar comidas diferentes. Sempre respostas, utilizando recursos do Excel. As respostas das viajo para o rural. (mulher, 56, do lar). perguntas abertas foram analisadas após sua transcrição em seu conteúdo através de leitura sistemática. A motivação cultural, que diz respeito à busca de Quanto às perguntas “a” e “c”, as motivações experiências culturais foram citadas em 36 respostas, citadas pelos entrevistados foram classificadas de acordo sendo a categoria de motivação para o turismo rural mais com as categorias apresentadas na literatura, sendo elas: citada pelos entrevistados. São exemplos de falas física, cultural, interpessoal e status e prestígio. Nas referindo-se à motivação cultural: respostas para a pergunta “b” foi analisado se o turista consumiu alimentos locais e que tipo de alimentos foi Busco conhecer a história das pessoas que vivem consumido. nos locais. (mulher, 22, gerente de loja).

5 RESULTADOS E DISCUSSÕES Eu busco tentar entender as minhas raízes. Tentar entender de onde vem nosso povo, porque nosso Foram entrevistados 64 turistas, entretanto foram povo age desta forma. Questão de cultura. (home, analisadas 60 entrevistas válidas. Quatro entrevistas 37, bombeiro). foram desconsideradas, pois não apresentaram dados suficientes que permitissem a análise de acordo com o Busco isto que eles apresentam aqui. A cultura, a objetivo da pesquisa. Destes, 42 pessoas pertencem ao história dos imigrantes e da população, a história gênero feminino e 18 do gênero masculino. A média de de vida e a bagagem cultural que as pessoas têm

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aqui, que infelizmente as autoridades nem tomam Wang (2004) e de Mak et al (2012), os alimentos são conhecimento e não dão o devido valor. (mulher, fundamentais para a oferta turística e se destacam na 71, empresária) promoção e marketing turístico como um elemento que diferencia e contribui para a competitividade de destinos Considerou-se que as motivações interpessoal e de turísticos. Assim como referenciado na seguinte citação: status e prestígio não foram relevantes para esta análise sobrea a motivação para o turismo rural, pois foram A arquitetura das casas antigas me motivou muito, referenciadas em apenas 4 respostas, sendo que estavam a parte histórica em geral. Também conhecer os sempre associadas a outras motivações, tais como o vinhos e os produtos coloniais (mulher, 40, exemplo abaixo: professora).

Busco ver as construções antigas, conviver com o Com relação à motivação para o consumo de pessoal, adquirir algum produto colonial e passar alimentos locais, conforme a Tabela 1, a motivação física tempo. (homem, 73, aposentado) foi a mais citada (45), seguida pela motivação cultural (18), status e prestígio (4) e interpessoais (3). As Busco conhecimento sobre a história, para poder características socioeconômicas e perfil de turista dos conversar com meus amigos e passar para meus entrevistados como o nível de escolaridade, local de alunos (mulher, 44, professora). residência, companhia para a viagem e visitas anteriores ao roteiro apresentaram grande variabilidade, quando Embora as categorias abordadas sejam consenso na separadas por categoria de motivação. Isto demonstra que literatura a respeito das motivações no turismo, houve o perfil socioeconômico do entrevistado não determinou citações que não se enquadraram nas categorias. Quatro as categorias de motivação para o consumo de alimentos entrevistas se referiram a relembrar memórias do passado locais referenciadas na pesquisa. Embora diversos estudos ou da infância, de quando aquelas pessoas residiram no apontem para a importância do perfil socioeconômico rural e vivenciaram a cultura e paisagem rural. É exemplo como um fator que exerce influencia na motivação para o desta fala: consumo de alimentos no turismo (HELDKE, 2003; CHANG et al, 2010; MAK et al, 2012), no presente Eu busco voltar ao passado, porque nasci neste estudo estas características não foram relevantes para a meio. Então, quero reviver e conhecer novos análise. lugares. Praticamente, para voltar às origens pois A respeito da motivação física, os entrevistados se nasci num lugar parecido com esse, no interior. referiram exclusivamente a ela em 29 respostas. Nas (homem, 57, autônomo). outras 14 respostas os entrevistados associaram a motivação física à motivação cultural (7), motivação de Além das memórias do passado, outra referencia status e prestígio (4) e motivação interpessoal (3). Esta esteve presente em quatro respostas: a paisagem ou motivação ficou equilibrada entre homens e mulheres e a natureza. Quando perguntados sobre o que buscam no média de idade é equivalente à média dos entrevistados turismo rural, estes entrevistados afirmaram buscar a em geral. O resultado das referências à motivação física natureza, a beleza das paisagens ou a paisagem rural. É citada pelos entrevistados se apresenta de maneira exemplo: robusta, sendo esta a motivação relacionada principalmente aos apelos sensoriais percebidos no Busco o verde e a paisagem (mulher, 24, consumo de alimentos locais. O paladar foi o sentido mais enfermeira). citado pelos entrevistados, sendo as palavras “sabor”, “gostoso” e “bom” foram alguns dos adjetivos atribuídos Mak et al (2012) e Kim e Eves (2012) afirmam aos alimentos locais. As transcrições abaixo que os estudos no campo da motivação ainda são exemplificam: incipientes e estudos empíricos estão sendo desenvolvidos no sentido de aprimorar estas categorias. Acredita-se que A vontade de provar e degustar alimentos para os estudos sobre motivação para o turismo rural, diferentes mesmo. Até porque o passeio inclui as estas duas referências, memórias do passado e paisagem, degustações. Você sabe que tem um diferencial e devam ser levadas em consideração. Pesquisas neste um sabor especial. Não é como comer num sentido devem amadurecer para estabelecer ligações ou restaurante da cidade que você sabe que é tudo adaptações teóricas aprofundadas sobre a motivação para industrializado, nunca é igual. (mulher, 54, o turismo rural. cuidadora). É importante destacar neste estudo que todos os 60 entrevistados consumiram alimentos locais durante sua Eu gosto. O sabor destes produtos daqui da serra é visita ao Roteiro Caminhos de Pedra. Isto indica que os diferenciado, é mais gostoso. (homem, 58, alimentos locais contribuem robustamente para a oferta aposentado). turística do roteiro e viabiliza economicamente os seus estabelecimentos. Assim como nos estudos de Quan e

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Outra característica da motivação física presente que os alimentos locais são feitos de maneira artesanal e na literatura é a preocupação com a saúde. A ausência de sem o acréscimo de elementos químicos, embora em elementos químicos nos alimentos locais é uma característica citada pelos entrevistados. Estes acreditam Tabela 1 – Motivação para o consumo de alimentos locais Motivação Número de Referencias Gênero Média exclusivas associadas total Masculino Feminino de idade Física 29 14 45 30 30 42 Cultural 9 9 18 7 11 44 Interpessoal - 3 3 2 1 50 Status e Prestígio 2 2 4 1 3 27 não é aquela industrialização de fazer mil pães por alguns alimentos, seja necessária a adição de ingredientes dia (mulher, 15, estudante). industrializados. Assim como: É importante destacar que as motivações culturais Por serem produtos daqui e serem diferenciados. O incluem a vontade de adquirir conhecimento através do gosto é muito diferente do que temos na cidade, lá não temos acesso. O sabor é outro e você sente que contato com a cultura do destino turístico e seus atrativos. vai te fazer bem (homem, 32, bancário). Os alimentos locais, do ponto de vista da cultura, pode ser considerado um atrativo turístico capaz de refletir o modo O sabor e por ser sem conservantes, mais naturais. de vida dos anfitriões. Por exemplo: (mulher, 34, turismóloga). A vontade de provar e degustar alimentos Por ser uma coisa natural e parecer ser bastante diferentes mesmo. Até porque o passeio inclui as saudável (homem, 36, advogado). degustações. Você sabe que tem um diferencial e um sabor especial. Não é como comer num Em algumas respostas se evidencia que os restaurante da cidade que você sabe que é tudo entrevistados idealizam e romantizam os alimentos locais industrializado, nunca é igual. (mulher, 54, como fruto de sentimentos afetivos ou modo de produção cuidadora). rudimentar, por exemplo: No caso do Roteiro Caminhos de Pedra, os O sabor é diferente, você vê que não é feito numa alimentos locais possuem estreita ligação com o legado indústria. Parece que é feito com carinho e com cultural dos imigrantes. A preocupação com a amor. As pessoas te atendem muito bem e parece conservação dos costumes e tradições é evidenciada nesta que conversar com você através do alimento. É fala: muita coisa de família e tem história, os alimentos são feitos por eles mesmos (homem, 31, Primeiro, para ajudar a população local, para eles agrônomo). permanecerem nesta atividade. Segundo, porque são muito mais apetitosos, gostosos. Não tem tanto conservante. (mulher, 57, nutricionista). Pois é feito de tudo que se colhe aqui. A gente sabe que as coisas aqui são feitas de modo bem De acordo com Kim e Eves (2012), a motivação colonial. (mulher, 53, aposentada) cultural podem ser caracterizadas pela curiosidade dos turistas em provar os alimentos locais. Neste sentido, os Quanto à motivação cultural, que pressupõe entrar alimentos estão associados a conhecer alimentos em contato com a cultura através dos alimentos locais diferentes dos encontrados em seu local de residência e, (FIELDS, 2002), os resultados demonstram que esta por isso, é considerado parte de uma experiência cultural. motivação foi referenciada em 18 respostas. Em nove Neste sentido: respostas a motivação cultural aparece de maneira exclusiva, ou seja, somente esta é citada e, em outras Curiosidade em provar e saber que gosto tinha, se nove, ela aparece acompanhada de outra motivação, era diferente do que os alimentos estou sendo física (7), interpessoal (1) e status (1). Como acostumada a consumir (mulher, 56, auxiliar de exemplo: enfermagem).

São produtos coloniais, não são iguais aqueles da A motivação interpessoal se apresentou muito cidade. O pão, por exemplo, não é o mesmo pão, pouco expressiva neste estudo, tendo apenas três não foi feito do mesmo jeito, aqui é mais caseiro, referencias quanto à busca por relações sociais através do consumo de alimentos locais. Interpretou-se como

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tentativa de estreitamento de laços sociais o consumo de de captar as particularidades destas motivações no alimentos locais para presentar familiares. Mesmo assim, turismo rural. as respostas que referenciam esta motivação apresentam Além disso, as categorias de motivações adotadas também outras motivações, sendo elas física (2) e cultural na pesquisa não foram capazes de abranger todas as (1). citações dos entrevistados na análise das motivações para Por fim, com relação à motivação de status e o turismo rural. Foi referenciado em oito entrevistas, a prestígio, os resultados demostram quatro referências, motivação de conhecer ou usufruir a paisagem (4) ou sendo duas com exclusividade e outras duas associadas à relembrar memórias do passado ou da infância. motivação física. É exemplo de referência à motivação de A literatura estudada e os resultados desta pesquisa status e prestígio: evidenciam o incipiente conhecimento a respeito da teoria das motivações adaptadas ao estudo do consumo de Porque é próprio do local. Acho mais interessante alimentos no turismo. Os artigos encontrados a este comprar vinho aqui do que em Porto Alegre. Às respeito datam de meados de 2010 e, portanto, encontram- vezes, as mesmas marcas que tem aqui podem ter se em fase inicial de estudos. Ainda não existem no mercado lá, mas comprando aqui eu vejo a arcabouços teóricos e muito menos estudos empíricos que produção. É estimulante você abrir uma garrafa e contribuam para uma discussão aprofundada sobre o dizer “eu vi como e onde foi produzido”. (homem, tema. É premente a necessidade e de estudos nesta área, 37, empresário). configurando-se em oportunidade aos pesquisadores interessados. Embora demonstrem pouca relevância, Desta forma, é possível concluir que os turistas comparadas às motivações física e cultural, são entrevistados não possuem engajamento ideológico com o necessários estudos mais aprofundados a respeito das desenvolvimento rural, pois suas motivações não possuem motivações interpessoal e de status e prestígio. Conforme características políticas e sim, pessoais ou hedônicas, elas foram referenciadas pelos turistas entrevistados, conforme afirma Douglas (2009). As motivações talvez estas categorias devam ser melhor adaptadas ou constatadas pelo presente estudo revelam que os descritas para sua utilização no turismo rural. entrevistados consomem os alimentos locais para saciar um desejo pessoal de prazer, experiência cultural, status e 6 CONCLUSÕES social, nesta ordem.

O presente artigo apresenta resultados que AGRADECIMENTOS demostram que a motivação para o turismo rural, assim como a motivação para o consumo de alimentos locais no Os autores agradecem aos empreendimentos do Roteiro Caminhos de Pedra se concentram na motivação Roteiro Caminhos de Pedra, que gentilmente cederam seu física. No caso da motivação física para o turismo rural, a espaço para os pesquisadores. Agradecem também a busca pela tranquilidade, descanso do corpo e mental cordial participação de todos os entrevistados. foram os principais fatores motivacionais. Com relação à motivação física para o consumo de alimentos as REFERÊNCIAS experiências sensoriais e a preocupação com a saúde foram os fatores que levaram a maioria dos entrevistados ALMEIDA, J.A. Pesquisa em Extensão Rural: um a consumir os alimentos locais. manual de metodologia. Brasília: MEC/ABEAS, 1989. A motivação cultural, no caso da motivação para o turismo rural se concentrou em compreender a história, ASSOCIAÇÃO CAMINHOS DE PEDRA. Histórico. costumes e tradições do Roteiro. No mesmo sentido, a Disponível em < motivação cultural para o consumo de alimentos locais, http://www.caminhosdepedra.org.br/pt/?pg=historico> embora em menor número do que a motivação física, Acesso em: 20/08/2013. demonstra ser fundamental para a experiência turística do entrevistado. É através dos alimentos que turistas têm a CHANG, R.C.Y.; KIVELA, J.; MAK, A.H.N. Attributes oportunidade de experimentar a cultura do local. Neste that influence the evaluation of travel dining sentido, os alimentos locais são parte importante da oferta experience: when East meets West. Tourism turística, configurando-se em atrativos turísticos. Isto se Management, N. 32, V. 2, 2011, p. 307-316. evidencia de forma substancial, dada a constatação que todos os entrevistados, sem exceção, consumiram algum CHANG, R.C.Y.; KIVELA, J.; MAK, A.H.N.; Food tipo de alimentos local. preferences of Chinese tourists. Annals of tourism As motivações interpessoal e de status e prestígio Research, N. 37, V. 4, 2010, p. 989-1011. foram pouco referenciadas pelos entrevistados, tanto para motivação ao turismo rural, quanto ao consumo de CONNOR, S. Cultura pós-moderna: Introdução alimentos locais no Roteiro. Embora demonstrem pouca Teorias do Contemporâneo. São Paulo: Ed. Loyola, relevância comparadas às motivações física e cultural, são 1996. necessários estudos mais aprofundados que sejam capazes

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LOGOTIPOS INSTITUCIONAIS DE TURISMO RURAL: UMA ANALISE PERCEPTUAL DE MUNICIPIOS BRASILEIROS NOS ATRIBUTOS ATRATIVIDADE E REPRESENTATIVIDADE.

VAGNER SÉRGIO CUSTÓDIO MARIA FERNANDA SANCHEZ MATURANA FABIO LUCIANO VIOLIN

Universidade Estadual Paulista - Unesp Campus de Rosana Coordenadoria de Curso de Turismo, Rosana - SP [email protected]

RESUMO – O objetivo desse estudo foi o de realizar uma analise perceptual de logotipos institucionais de municípios brasileiros que desenvolvem turismo rural. Para isso foram realizados testes perceptuais de ranking e magnitude nos atributos atratividade e representatividade. Esses testes foram aplicados em 30 pessoas sendo 10 professores e 20 alunos sendo ambas as categorias integrantes do curso de bacharelado em Turismo. Os logotipos foram extraídos por meio de uma pesquisa no website “google imagens” utilizando para busca a expressão “turismo rural logotipos” sendo que esgotou-se até a ultima pagina de pesquisa, e considerando todos os resultados apresentados conseguiu-se 10 logotipos (Holambra/SP; Guarapari/ES; Campo Magro/PR; Socorro/SP; Campo Novo do Parecis/MT; Itá/SC; Vera Cruz/RN; Ribeirão Preto/SP; Campo Grande/MS; Itapira/SP). Os resultados apontam no atributo atratividade Campo Grande no teste de categoria na primeira posição em ambos os grupos com média de 4,55 entre os estudantes e 3,6 nos professores e na magnitude também campo grande se destaca com média de 17,8 nos estudantes e 19 entre os professores. No atributo representatividade Socorro ocupa a primeira posição entre os alunos com 3,66 de média e Campo Magro para com os professores com média de 2,4 e na magnitude, ocorre a mesma situação com média de 19,4 entre os estudantes e 25 no grupo docente. Esses resultados podem auxiliar profissionais do turismo, do marketing e do design gráfico que trabalhem em instituições fomentadoras de turismo rural, na elaboração de novos logotipos seguindo as tendências apontadas nesse estudo.

Palavras chave: Logotipos, Turismo Rural, Percepção.

ABSTRACT - The aim of this study was to conduct an analysis of perceptual logos institutional municipalities to develop rural tourism. For this perceptual tests were performed on the magnitude and ranking attributes attractiveness and representativeness. These tests were applied to 30 people with 10 teachers and 20 students are members of both categories of the Bachelor in Tourism. The logos were extracted by means of a survey on the website "google images" to search using the term "rural tourism logos" that being sold out to the last search page, and considering all the results achieved are 10 logos (Holambra / SP; Guarapari / ES, Campo Magro / PR; Socorro / SP; Campo Novo do Parecis / MT; Ita / SC; Vera Cruz / RN; Ribeirão Preto / SP, Campo Grande / MS; Itapira / SP). The results indicate the attribute attractiveness Campo Grande in test category in the first position in both groups with a mean of 4.55 between students and teachers and 3.6 in magnitude too large field stands with an average of 17.8 students in and 19 among teachers. In attribute representation Socorro ranks first among students with average 3.66 and Campo Magro towards teachers with an average of 2.4 and magnitude, the same situation occurs with an average of between 19.4 and 25 students in teaching group. These results may help tourism professionals, marketing and graphic design working in institutions for rural tourism, the development of new logos follow the trends identified in this study.

Words keys: Logos, Rural Tourism, Perception.

Anais do VIII Congresso Brasileiro de Turismo Rural e I Colóquio Internacional de Pesquisa e Práticas em Turismo no Espaço Rural, Rosana - SP, 10-13 de novembro de 2013. v.1.

1 INTRODUÇÃO

O turismo rural no Brasil, pode ser uma atividade comercial viável em municípios que possuem considerável potencial para sua implementação. Esse tipo de visitação remete a atividades experienciais em pessoas geralmente que residem em ambiente urbano principalmente em grandes cidades e que sentem prazer em vivenciar atividades laborais e de lazer típicas de zonas rurais. Para fomentar esse segmento, algumas prefeituras, empresas e entidades do terceiro setor (associações) têm criado iniciativas de desenvolvimento, tanto a nível organizacional, quanto publicitário para atrair visitantes para a localidade. Algumas dessas ações utilizam de marcas visuais para a divulgação e marketing, que podem ser utilizadas em diversos canais de comunicação como, por exemplo, imagens, cartões postais, folders, cartazes e websites e em comum a todos estes canais, pode agregar-se um logotipo que segundo Lúcio e Villani (2010) são a forma particular como o nome da marca é representada graficamente. A utilização de logotipos no turismo, muitas vezes tem também o objetivo de fornecer uma identidade ao destino e para que essa identidade traga resultados positivos se faz necessário que o logotipo seja visualmente atraente e que de certa forma represente a localidade fornecendo características próprias que deem significado à destinação. Esse significado promove uma imagem mental do destino que segundo Barbosa (2001) é uma transposição do real ao imaginário criando um mundo metafórico. Muitas vezes os logotipos turísticos, são desenvolvidos por profissionais do marketing ou do design gráfico que utilizam informações previamente selecionadas da localidade para a criação artística da impressão visual. Segundo Gândara (2008) a imagem de um destino turístico é a soma do produto global que se oferece, mais o conjunto das informações e das ações comunicativas. Mas o problema é que geralmente os logotipos turísticos não são submetidos a testes perceptuais no publico alvo antes de serem divulgados. Isso ocorre devido à maioria dos profissionais envolvidos no processo criativo não dominarem as técnicas metodológicas de análise de percepção. A falta de aplicação desses testes faz com que se corra o risco de alguns logotipos não conseguirem atrair visitantes e também serem figuras não representativas aos atributos e equipamentos de lazer do turismo rural local, e isso pode se tornar um problema, pois o logotipo deve ser nas ações de marketing o elemento gráfico principal do destino. Tendo como base essa argumentação supracitada surge a seguinte pergunta: Será que os logotipos elaborados para fomentar o turismo rural em municípios brasileiros são atrativos e representativos? Para responder essa pergunta utilizou-se nesse estudo como metodologia a psicologia experimental, mas especificamente a psicofísica escalar embasada em Stevens (1975) que elaborou testes perceptuais para diagnosticar as percepções subjetivas e que podem ser aplicadas em diversas situações dentre elas o turismo, que apesar de comercializar percepções subjetivas utiliza muito pouco esse método. Para atender os objetivos desse estudo, dentre os inúmeros testes possíveis foi escolhido o teste de categoria que é feito por meio de uma escala ordinal, que possibilita a categorização e classificação dos objetos, no caso os logotipos institucionais divulgados na internet, bem como ordená-los de acordo com o atributo avaliado. Ferraz (2005) ressalta que este tipo de escala não apenas diferencia subjetivamente os objetos, mas também informa se o objeto tem mais ou menos qualidade em um determinado atributo. Outro teste utilizado nesse estudo foi o de estimação de magnitude que segundo Ferraz (2005) é um processo de julgamento, em que os observadores emparelham números a diferentes níveis de sua própria impressão perceptiva, e dessa forma expressam uma razão a sensação atribuída. Dessa forma essa pesquisa, pretende contribuir para melhoria na criação visual das marcas de turismo rural, e pode ser uma proposta metodológica viável em diversas situações na qual necessite analisar a percepção visual nas ações e atividades turísticas.

2 METODOLOGIA

Para esse estudo, realizou-se uma pesquisa eletrônica prévia por meio do website “google” na categoria imagens e digitando na área de pesquisa os termos “turismo rural logotipos”. A partir das imagens encontradas foram observados quais eram logotipos de turismo rural que representavam municípios. Tendo como critério que deveriam ser desenhos, ou seja, sem a utilização de imagens reais, e estivessem sendo utilizados em ações ligadas ao turismo rural da localidade.

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Nesse contexto para essa pesquisa, foram utilizados todos os resultados apresentados no site de busca que se enquadravam nos critérios de seleção, sendo esgotada até a última pagina do website, sendo encontrados 10 logotipos que serão apresentados abaixo seguindo a sequencia de ocorrência no site de pesquisa:

Figura 1 – Logotipo institucional de Holambra – SP

Figura 2 – Logotipo institucional de Guarapari –ES

Figura 3 – Logotipo institucional de Campo Magro –PR

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Figura 4 – Logotipo institucional de Socorro – SP

Figura 5 – Logotipo institucional de Campo Novo do Parecis – MT

Figura 6 – Logotipo institucional de Itá – SC

Figura 7 – Logotipo institucional de Vera Cruz – RN

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Figura 8 – Logotipo institucional de Ribeirão Preto – SP

Figura 9 – Logotipo institucional de Campo Grande – MS

Figura 10 – Logotipo institucional de Itapira – SP

A partir dessa seleção foi selecionado o publico alvo para aplicação dos testes e foi escolhido pessoas que profissionalmente ou academicamente estivessem envolvidas com o turismo. Essa escolha ocorreu devido a esses individuos poderem ser uma amostra mais fidedigna para o julgamento dos atributos, pois pressupõe-se que possuam informações sobre o turismo rural que podem ser identificadas nos desenhos dos logotipos. Nessa perspectiva decidimos utilizar professores e alunos do curso de bacharelado em Turismo pertencentes a UNESP – Câmpus Experimental de Rosana. A escolha especifica desse curso ocorreu devido a conveniência de serem as pessoas qualificaveis mais proximas aos pesquisadores, o que gerou a viabilidade do estudo. Nesse publico optou-se por utilizar uma amostragem aleatória de sujeitos, sendo que foi convencionado pelos pesquisadores com sendo uma amostra relevante 20 alunos num universo de 169 e 10 professores num universo de 14. Todos os participantes foram voluntarios não pagos e concentiram verbalmente a se submeter aos testes. Os pesquisadores unanimamente concordaram que essa pesquisa não teria a necessidade de ser submetida a um Comite de Ética, devido a não contemplar nenhuma das situações preconizadas pelas normas vigentes para execução de experimentos com seres humanos no Brasil.

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2.1 Procedimentos

Para aplicação dos testes foi desenvolvido uma ficha auto informativa para facilitar a coleta de informações, essa ficha vinha acompanhada de duas folhas com as impressões coloridas dos logotipos, sendo que para facilitar a posterior analise dos dados cada logotipo foi representado por um numéro da seguinte forma: 1- Holambra –SP 2- Guarapari – ES 3- Campo Magro –PR 4- Socorro –SP 5- Campo Novo do Parecis – MT 6- Itá – SC 7- Vera Cruz – RN 8- Ribeirão Preto – SP 9- Campo Grande – MS 10- Itapira – SP

A ficha de aplicação dos testes também constava o nome do sujeito para o controle dos pesquisadores, a idade para a caracterização da faixa etária da amostra e a profissão para diferenciar quem era estudante e quem era professor. Nesse cenário a média de idade da amostra foi de 20.2 anos para o grupo de estudantes e 41.3 para o grupo de professores. Na ficha também constou uma tabela que deveria ser preenchida pelo sujeito da seguinte forma: Com as imagens dos 10 logotipos lateralmente dispostos sobre uma mesa e a ficha de aplicação abaixo das imagens, foi perguntado ao sujeito qual dos logotipos era o mais atraente, após o apontamento do primeiro se perguntou quem era o segundo mais atrativo, a assim por diante até chegar á décima posição. Essa situação supracitada configura o teste de categoria que ranqueou todos os logotipos conforme a sua atratividade. Após os sujeitos categorizarem foi perguntado o seguinte: Quanto que o primeiro que você apontou é mais atrativo que o segundo? Respondido isso se perguntou quanto é mais atrativo o segundo do terceiro? E assim por diante até se chegar do nono para o décimo, sendo que a esse ultimo foi designada a o valor 0. Essas perguntas configuram o teste de magnitude e visou quantificar subjetivamente a intensidade da percepção de atratividade entre os logotipos. Após essa aplicação o mesmo procedimento foi realizado mas agora perguntando sobre a representatividade, ou seja qual é mais representativo e o quanto é mais representativo. Essas perguntas estão no modelo de ficha utilizado disposto abaixo.

Figura 11 – Ficha de aplicação dos testes 2.2 Análise das informações

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Após a aplicação dos testes nos sujeitos participantes todas as informações numéricas foram repassadas para o software excel for Windows da seguinte forma: Nas colunas horizontais foram inseridos em cada coluna os sujeitos sendo as células B a U para o grupo de estudantes e B a K para o grupo dos professores. Cada sujeito foi representado por um numero sendo 1 a 20 para alunos e 1 a 10 para professores. Nas linhas verticais foram inseridos os logotipos sendo que cada logotipo ocupou uma linha utilizando a sequencia de células 3 a 12. E os logotipos foram representados pelos mesmos números utilizados na aplicação dos testes descritos acima. No teste de categorias onde ocorreu um ranqueamento foram dispostos a posição de cada logotipo apontada pelo sujeito, por exemplo, o logotipo 1 foi ranqueado em 3 lugar pelo sujeito 5 então na linha referente ao logotipo 1 e na coluna referente ao sujeito 5 foi atribuído o numero 3 que equivale a terceira posição no ranque. Após esse procedimento ter sido realizado foram selecionados todas as posições dispostas horizontalmente de cada logo e utilizou a ferramenta média para se calcular a média de posição de cada logo e se chegar ao resultado de qual logo foi considerado mais atraente e mais representativo pelos grupos sendo que os logotipos que obtiveram o menor valor na média, foram considerados os melhores ranqueados. Para melhor analisar os resultados também utilizamos a fermenta DESVPAD do Excel para calcular o desvio padrão de cada logotipo. Já no teste de estimação de magnitude, primeiramente somou-se todos os valores atribuídos do ultimo colocado até o primeiro, chegando a um valor total, após essa soma foram subtraindo partindo do valor os apontamentos subsequentes e segundo valor para o terceiro até chegar-se ao ultimo logotipo que possuía o valor zero. Na magnitude calculou-se a somados valores de todos os sujeitos do grupo, a média dos apontamentos de todos participantes bem como a posição no ranking de magnitude e o desvio padrão. Os dados foram qualitativamente relacionados chegando-se as considerações finais.

3 RESULTADOS

Após inseridos todos os dados no software excel e feito os cálculos descritos acima na metodologia, foram confeccionadas tabelas no Microsoft Word conforme as normas de publicação do CBTR 2013. Nessa perspectiva as tabelas apresentadas abaixo contem os dados referentes aos testes descritos na legenda. Que são os seguintes:

Tabela 1 - Teste de categorias (ranque) de atratividade dos logotipos institucionais de Turismo Rural pelo grupo de estudantes.

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Nesse teste realizado por 20 estudantes, o logotipo de Campo Grande - MS foi considerado como sendo o mais atrativo, isso pode ter ocorrido devido o logotipo possuir formas subliminares ambíguas que remetem a diversos cenários, como uma folha e o sol ou como um sol atrás de uma montanha com um rio descendo. Dessa forma esse logo, libera o imaginário das pessoas e com isso perceptualmente atrai os olhares e pode chamar a atenção positivamente para a visitação no destino. Em segundo lugar e com pouca diferença nos valores das categorias esta Holambra que tem um logotipo que remete as flores e a colonização holandesa por meio dos tamancos utilizados no casal que foi desenhado com traços infantilizados, que é um recurso que atrai a atenção das pessoas ao logotipo. Em ultimo lugar no ranque ficou o logotipo de Ribeirão Preto que utiliza o nome da associação maior do que o desenho do galo amarelo estilizado contendo uma casa e arvores rabiscadas. Essa ultima categorização pode dever-se ao logotipo ser mais informativo do que atrativo, visto que se preocupa mais em informar a abreviatura da associação do que atrair pessoas para visitação, sendo um logotipo mais direcionado aos empreendedores rurais do que ao potencial turista. Isso talvez justifique a falta de atratividade diagnosticada no teste.

Tabela 2 - Teste de categorias (ranque) de representatividade dos logotipos institucionais de Turismo Rural pelo grupo de estudantes.

No atributo representatividade realizado pelos estudantes de turismo Socorro - SP foi considerado como sendo o logotipo mais representativo. Essa situação pode dever-se a utilização do carro de boi como sendo desenho principal, pois o mesmo se tornou um ícone internacional do turismo rural, além disso, utiliza curvas que denotam as montanhas representam a localidade situada na serra da Mantiqueira. Em segundo lugar ficou Itá – SC que utiliza vários elementos rurais como a lavoura, folhas, estrada de chão, cerca, casa rural e o sol. A casa possui chaminé e denota ao clima frio da localidade, e traz uma ideia de conforto e aconchego e as folhas assemelham-se a plantação de tabaco que é uma cultura típica de Santa Catarina.

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Numa linha parecida de criação e em terceiro lugar aparece Campo Magro – PR, que também utiliza vários componentes rurais, dando ênfase a uma uma casa de madeira típica do Paraná e na cor vermelha que é a cor da bandeira da Polônia, o que remete a colonização polonesa da localidade. Na ultima colocação ficou Itapira-SP que é um logotipo preto dando ênfase a palavra Rural em verde e a palavra Itapira na cor branca em tamanho menor e abaixo da palavra rural e somente com um pequeno desenho abstrato que remete a arvores e folhas. Essa subunção da palavra Itapira as outras pode ter influenciado na percepção dos participantes como sendo pouco representativo.

Tabela 3 - Teste de categorias (ranque) de atratividade dos logotipos institucionais de Turismo Rural pelo grupo de Professores.

No grupo dos professores, no atributo atratividade Campo Grande - MS aparece como sendo o logotipo mais atrativo. Esse julgamento foi igual ao do grupo de alunos, o que afirma que os mesmos componentes foram atrativos para ambos os grupos e remete a uma correlação positiva nas percepções e de certa forma mostra uma tendência mais perceptiva do que cognitiva na categorização dos logotipos. Itá- SC foi julgado pelos professores como sendo o segundo mais atrativo. Essa situação pode ser explicada por utilizar o sol como sendo o elemento que ocupa maior espaço no desenho, assim como Campo Grande. Isso talvez justifique a proximidade das categorizações. Assim como no grupo dos estudantes, os professores também classificaram Ribeirão Preto como sendo o logotipo menos atrativo, creio que isso também se deva a rusticidade do desenho foram rabiscados o que de certa forma transmite a ideia de mal acabado ou tosco que são atributos considerados negativos e não atraentes.

Tabela 4 - Teste de categorias (ranque) de representatividade dos logotipos institucionais de Turismo Rural pelo grupo de Professores.

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O grupo de professores julgou Campo Magro – PR com a casinha vermelha e as palavras turismo rural em vermelho com linhas brancas, como sendo o mais representativo, pois se preocupou em transmitir por meio das cores, elementos da colônia polonesa que habita a localidade. Essa diferença com o julgamento dos estudantes pode ser explicado pelos professores talvez possuírem mais conhecimento do local para identificarem essas características típicas fazendo com que o teste tivesse uma influência mais cognitiva do que perceptual, diferente dos alunos que utilizaram mais a percepção visual para realizar a categorização. Campo Novo do Parecis – MT, foi escolhido pelos docentes como sendo o segundo mais representativo. Esse logotipo utiliza muitos elementos do ambiente rural como trator enxada cata-vento, uma mulher semeando a terra, dentre outros, e utilizou desenhos parodiando a técnica do artista Plástico Romero Brito o que transmite a ideia nas pessoas, de já ter visto esse desenho anteriormente. Assim como no grupo dos estudantes Itapira-SP foi classificada em ultimo lugar, talvez pelas mesmas características citadas na avaliação dos alunos.

Tabela 5 - Teste de Magnitude de atratividade dos logotipos institucionais de Turismo Rural pelo grupo de estudantes.

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No teste de magnitude onde se objetiva identificar a intensidade da percepção mostra Campo Grande como sendo a mais atrativa mas muito próxima de Holambra pode se dizer que tecnicamente empatada tendo uma diferença de somente 1x na soma geral e 0,5 na média do grupo e Holambra teve um desvio padrão maior que campo grande o que afirma que o grupo julgou o logotipo de Holambra de forma menos homogênea. Campo magro aparece em terceiro lugar na magnitude, o que é diferente do teste de categoria que coloca socorro na segunda colocação. Essa diferença se deve aos valores atribuídos a Campo Magro serem mais significantes que os atribuídos a Socorro, o que de certa maneira mostra uma incoerência nos julgamentos, mas a percepção humana é subjetiva e o sujeito 16 atribuiu uma magnitude 62 a Campo Magro, o que modificou a classificação do ranqueamento alterando a média e o desvio padrão.

Tabela 6 - Teste de Magnitude de representatividade dos logotipos institucionais de Turismo Rural pelo grupo de estudantes.

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No teste de magnitude Socorro - SP também foi considerado o mais representativo pelos estudantes, mas houve na segunda posição uma inversão das posições entre Campo Magro- PR e Itá - SC isso se deveu aos sujeitos 9 e 16 atribuírem a magnitude 50 e 52 respectivamente a Campo Magro – PR, o que alterou o Desvio Padrão, e fez com que ocorresse a diferença em ambos os testes. Itapira aparece na ultima colocação tanto na categoria quanto na magnitude, o que mostra uma coerência nos julgamentos dos sujeitos.

Tabela 7 - Teste de Magnitude de atratividade dos logotipos institucionais de Turismo Rural pelo grupo de professores.

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No julgamento de magnitude os professores também consideraram Campo Grande - MS, como sendo o mais atrativo, mas nas outras posições ocorre diferenças significativas. Na segunda posição aparece Guarapari- ES, que utilizou desenhos em formato de curva e caracol para simbolizar o sol, as montanhas e as cachoeiras da localidade. E que teve um julgamento na magnitude diferente da categorização. Na ultima posição em ambos os testes aparece Ribeirão Preto, o que demonstra uma coerência nos apontamentos.

Tabela 8 - Teste de Magnitude de representatividade dos logotipos institucionais de Turismo Rural pelo grupo de professores.

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Os dados apresentados pelos professores mostram coerência entre os testes de categorias e magnitude, apontando as 10 posições semelhantes em ambos os testes Pode se destacar Vera Cruz – RN que com um desenho de carro de boi com vários compartimentos e em cada um deles com componentes do turismo rural se mostrou muito criativo e representativo, e acredita-se não tenha tido uma melhor classificação em ambos os testes e em ambos os grupos devido os desenhos estarem em tamanho muito pequeno, e serem de difícil interpretação sendo que somente o boi de um dos compartimentos centrais é mais explicito, sendo os outros desenhos confusos para percepção visual.

4 CONCLUSÕES

Os testes perceptuais aplicados, podem concluir que houve uma discrepância grande nas percepções. Isso pode ser observado pelo alto índice no desvio padrão dos testes. Qualitativamente pode se afirmar que nenhum logotipo foi positivamente discrepante dos a outros tanto no atributo atratividade quanto no atributo representatividade, o que possa se chegar a duas visões: A primeira que nenhum logotipo elaborado fosse considerado muito representativo e atrativo. E a segunda que a maioria dos logotipos foram percentualmente medianos. Isso reforça a necessidade de se realizar testes perceptuais antes da divulgação de estratégias visuais de marketing no turismo. Pois se essa situação fosse realizada acredita-se que logotipo como, por exemplo, de Itapira – SP e Ribeirão Preto – SP fossem repensados e logos como o de Vera Cruz-RN fossem melhor desenhados para explorar melhor a percepção das pessoas.

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Nessa perspectiva esse trabalho surge como uma proposta metodológica, que pode ser utilizada na criação não somente de logotipos, mas de diversos materiais de criação visual e não somente para o turismo rural, mas também para outros segmentos que podem se beneficiar com produtos mais atraentes, mais representativos e consequentemente mais eficazes.

AGRADECIMENTOS

Os autores deste estudo agradecem aos sujeitos participantes que voluntariamente se submeteram aos testes.

REFERÊNCIAS

BARBOSA, Y. M. O despertar do turismo – um olhar crítico sobre os não lugares. São Paulo: Aleph, 2001.

FERRAZ, M. A. A preferência pela prática de atividades físicas e esportivas: uma abordagem psicofísica. Tese de doutorada, apresentada à Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto – USP, 2005.

GÂNDARA, J. M. G. A imagem dos destinos turísticos urbanos. Revista Eletrônica de Turismo Cultural, número especial –, ISSN 1981-5646, São Paulo, 2008

LUCIO, J. ; VILLANI, V. Identicação de Logos em Imagens, 2010. Disponível em . Acesso: 04 setembro 2013.

STEVENS, S. S. Psychophysic, New York: Wiley, 1975.

Anais do VIII Congresso Brasileiro de Turismo Rural e I Colóquio Internacional de Pesquisa e Práticas em p. 202-210 Turismo no Espaço Rural, Rosana - SP, 10-13 de novembro de 2013. v.1.

A IMPORTÂNCIA DO ESTUDO DO LUGAR: UMA PROPOSTA DA CONTRIBUIÇÃO DO ENSINO DE GEOGRAFIA NA SENSIBILIZAÇÃO E PERCEPÇÃO TURÍSTICA NO DISTRITO DE GARDÊNIA, MUNICÍPIO DE RANCHARIA - SP

SUELI APARECIDA DE SOUZA

Universidade Estadual Paulista - Unesp Campus de Presidente Prudente – SP [email protected]

ROSANGELA CUSTÓDIO CORTEZ THOMAZ Universidade Estadual Paulista Campus de Rosana- SP [email protected]

RESUMO – O presente artigo visa elucidar alguns processos de transformações no uso e na apropriação do espaço, no Distrito de Gardênia, Município de Rancharia – SP, em especial, pelo turismo, aos quais foram retratados em pesquisa a priori1, e suas implicações nas praticas espaciais da população local. Considerando-se então, as análises realizadas no Distrito, constatou-se que há uma série de elementos que interferem diretamente na dimensão socioespacial (envelhecimento e decréscimo populacional, êxodo rural, trabalho informal, desemprego, diferenciação socioespacial, etc.) que, são contrários à proposta inicial de inserção da população e desenvolvimento local por meio da atividade turística. Desta forma, busca-se desdobrar o estudo para o âmbito educacional, no tocante ao ensino de geografia, numa perspectiva interdisciplinar, a fim de traçar proposições a partir do resgate do estudo do lugar com os alunos do 9º ano do Ensino Fundamental (ciclo II) da Escola Municipal de Ensino Fundamental e Educação Infantil (EMEFEI) “Carlos Bueno de Toledo”. Enfim, a pesquisa2 tem o intuito de sensibilizar os sujeitos em questão, a perceberem e compreenderem o turismo como uma atividade econômica, e, sobretudo, conscientizá-los da importância da participação ativa na elaboração de projetos relacionados a essa atividade, visando amenizar seus efeitos nocivos e criar novas estratégias que possam realmente garantir a inserção da população e o desenvolvimento local.

Palavras chave: Turismo, Sensibilização, Percepção, Ensino de Geografia, O Estudo do Lugar, Interdisciplinaridade.

ABSTRACT – This article aims to clarify some processes of transformations in the use and appropriation of space, in the District of Gardenia, city of Rancharia - SP, in special, by tourism, which were portrayed in research a priori. Considering then, the analyzes a priori in the District, it was found that there are a number of elements that directly affect the socio-dimension (aging and declining population, rural exodus, informal work, unemployment, socio-spatial differentiation, etc..)that are contrary to the initial proposal of integration of the population local and development place by middle the tourist activity. Thus, we seek to unfold the study for the educational scope, in relation to the teaching of

1 Trata-se da pesquisa para a obtenção do Grau em Bacharela em Geografia: SOUZA, Sueli Ap. de. Transformações socioespaciais no Distrito de Gardênia, Município de Rancharia –SP.2012.116 f. Monografia (Bacharelado em Geografia) – UNESP, Presidente Prudente, 2012 (não publicado). 2 Projeto de pesquisa intitulado: A PERCEPÇÃO DO LUGAR NO ENSINO DE GEOGRAFIA: UMA PROPOSTA DE CONTRIBUIÇÃO PARA A SENSIBILIZAÇÃO TURÍSTICA NO DISTRITO DE GARDÊNIA – MUNICÍPIO DE RANCHARIA/SP (no prelo)

R. C. C. Thomaz; S. A. souza. ISSN 2176-9052

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geography in order to trace prepositions from the redemption of the study of place with the students in the 9th grade of elementary school (cycle II) tourism, Municipal Elementary School Elementary and Early Childhood Education (EMEFEI) "Carlos Bueno de Toledo".Finally, the research aims to sensitize the subject in question, to perceive and understand tourism as an economic activity, and, above all, make them aware of the importance of active participation in the development of projects related to this activity, aiming to mitigate its effects harmful and create new strategies that can really ensure the integration of population and development place.

Key words: tourism, Awareness, Perception, Teaching Geography, The Study of Place, Interdisciplinary.

1 INTRODUÇÃO nosso objeto de estudo, que é o turismo. Pois como afirma CALLAI (1995, p.2) Conforme já explicitado, o presente artigo foi suscitado de pesquisa a priori, e ainda por inquietações que se afloraram diante do quadro observado. Retrata a geografia entendida como de forma breve que a reestruturação produtiva perpassa uma ciência social, que estuda todas as escalas geográficas, e esse fenômeno faz com o espaço construído pelo continuamente o espaço modifique seus papéis. homem, a partir das relações que ele mantém entre si e a O caráter fugaz das relações produtivas e natureza [...] é por excelência econômicas contribui no entendimento dessa dinâmica, uma disciplina formativa, pois a cada momento, a cada estagnação de um ciclo capaz de instrumentalizar o econômico, um novo ciclo se instala. aluno a que exerça de fato sua Portanto, perante o quadro observado, mesmo cidadania. [...] um cidadão o Distrito de Gardênia constituindo-se de um pequeno que reconheça o mundo em Aglomerado Urbano, com relações urbanas simples que vive, que compreenda - se que suprem apenas as necessidades básicas da como indivíduo social capaz população, em seu território estão se materializando de construir a sua história, a sua sociedade, o seu espaço, e relações complexas. que consiga ter os Desta forma, considerando que as implicações mecanismos e os das transformações no uso e na apropriação do espaço instrumentos para tanto. refletiram diretamente e simultaneamente nas relações e práticas socioespaciais no Distrito, sobretudo com a introdução da monocultura da cana-de-açúcar, e o Segundo Callai (1995) o mundo está em turismo de pesca (SOUZA, 2012), é imprescindível processo contínuo de mudança, assim, nesse contexto buscar alternativas para resgate do estudo do lugar com faz se necessário modificar a escola e o ensino que se os sujeitos ali inseridos para a melhor compreensão dos realiza nela. Complementa a autora (1995), que em fenômenos que ali ocorreu e que ocorre atualmente. especial sobre o ensino de geografia que é o nosso Assim, nessa perspectiva, reitera Souza (2012, p.14) foco, tem que estar adequado a nova realidade do que mundo em que vivemos. Nesse âmbito, é também fundamental para uma melhor refletirmos sobre as diversas maneiras de se ensinar, compreensão de tais principalmente por estarmos inseridos transformações e seus desdobramentos faz se num mundo em que a necessário considerar a informação passa para o história do lugar como ponto primeiro plano, [...] de partida, analisando-se instalando um período de assim, as relações sociais que crise no ensino, numa se estabeleciam anteriormente sociedade em que a e as que se estabelecem no informação se confunde com presente. a formação (CARLOS, 1999, P.7). Nesse contexto, é que nos instiga a desvelar a relevância e o papel da geografia como mediadora do

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O artigo está constituído, além desta breve introdução, de três itens subsequentes, da conclusão e das referências bibliográficas. O primeiro item retrata de forma concisa a caracterização da área de estudo (Distrito de Gardênia), sua história, economia; o segundo traz algumas considerações acerca das refuncionalizações no meio urbano e rural com o turismo e suas implicações na dimensão socioespacial; no terceiro expõe de forma prepositiva, a relevância de se desdobrar a pesquisa para a educação, numa perspectiva interdisciplinar que tem como ponto de partida o ensino de geografia como estratégia de desenvolvimento da percepção e sensibilização do turismo no Distrito por meio do estudo do lugar, intermediado com metodologia da pesquisa-ação, afim de que os sujeitos envolvidos (alunos, professores, pesquisadores) na comunidade escolar construam conteúdos significativos na prática escolar com o desenvolvimento da pesquisa; e por fim, nas considerações finais reiteramos a relevância da Figura 1- localização do Município de Rancharia e Distritos. sensibilização e percepção turística para o desenvolvimento dessa atividade com menos impacto possível e como garantia de desenvolvimento Sua área territorial (figura 2) de 116, 2 km² socioespacial. limita-se ao norte com o Distrito de Agissê, a leste com o Município de Paraguaçu Paulista, ao sul com o 2 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO Município de Maracaí e a oeste com o Município de Iepê (SEADE, 2011 apud SOUZA, 2012). 2.1 O Distrito de Gardênia: localização e conceituação

O Distrito de Gardênia (figura 1), recorte espacial da pesquisa, localiza-se geograficamente no Município de Rancharia - SP, na região que abrange o Vale do Paranapanema. Possui um conjunto de bacias hidrográficas variadas, composta pelos rios: Capivara, Capivari, Ribeirão Bonito e o Paranapanema, além de outros rios e córregos de menores dimensões (Emubra, 2011 apud SOUZA, 2012).

Figura 2- Croqui da área territorial do Distrito de Gardênia. Fonte: Secretaria Municipal da Educação, (SEDUC), 2010.

Souza (2012) conceituou o Distrito de Núcleo Urbano ( anterior Povoado) , tomando por base alguns autores que retratam pequenas cidades Spósito (1982 e 2009), Roma (2008), Endlich (2009) Santos (1982), etc) e o Instituto Geográfico Cartográfico do Estado de São Paulo (IGC, 1995), além da análise de sua dimensão qualitativa e quantitativa (funções) de serviços coletivos e privados. Destarte, complementa Souza (2012) que dentre os requisitos para a definição

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de Núcleo Urbano, os serviços coletivos e privados, Porém, afirma Bernardelli (2006 apud suprem apenas as necessidades básicas da população, SOUZA, 2012, p.34) que esse dinamismo começou a demonstrando “que o nível das suas funções está no ser comprometido, já que limite inferior da complexidade urbana” (ROMA, 2008, p.16 apud SOUZA,p.22). vários períodos de dificuldades e decadência No entanto, admitimos as ponderações de passaram os agricultores do Coutinho (2011, p. 8 apud SOUZA, 2012, p.23) em Distrito, a começar já no limiar da década de 1960, relação aos cuidados na busca de critérios para a quando o governo, com o definição de pequenas cidades, apontando que intuito de aumentar a produção agrícola, lançou mais relevante do que tentar uma política visando à estipular interregnos [...] para implementação de insumos o termo utilizado, torna-se modernos, com máquinas e necessário buscar entender equipamentos agrícolas, seu contexto atual e em que envolvendo tanto mudança na condições históricas vieram a base técnica quanto se constituir [...]. transformações substanciais nas relações de trabalho, inclusive, promovendo 2.2 História e economia diminuição do contingente de mão de obra necessária a O Distrito de Gardênia foi fundado, segundo produção. fontes orais em 1916 relacionado a frente pioneira de colonização da região do Paranapanema e a construção Destarte, o reflexo dessa política associada a da Ferrovia da Alta Sorocabana. Foi oficialmente uma desaceleração econômica, reverteu em bruscas anexado ao Município de Rancharia pela Lei Estadual quedas do preço do algodão, aumento no custo n° 233 de 24/12/1948, modificando-se sua despendido na manutenção desse setor, pelas nomenclatura de Povoado para Distrito. De acordo exigências de padrão de qualidade e rigor das leis com Souza (2012) considerando o recorte temporal, trabalhistas. Esse fato, refletiu no maciço abandono da 1950, todo o Município de Rancharia teve um intenso produção agrícola de exploração familiar e rudimentar dinamismo econômico agrícola proporcionado com a no Distrito. cultura do algodão. Esse elemento foi um vetor de Portanto, foi constatado que com a grande atratividade populacional no Distrito de modernização da agricultura, por motivos já expostos, Gardênia, a fertilidade de seu solo (latossolo roxo) implicou numa progressiva perda populacional no propiciou grande produtividade, e contribuiu em Distrito, sobretudo no meio rural (tabela 1), conceder ao Município de Rancharia o título de Capital interferindo nas dimensões sociais, espaciais e do Algodão (figura 3). econômicas.

Tabela 1: Município de Rancharia e Distritos, dados populacionais. Fonte: IBGE, censos demográficos, 2011. Org.SOUZA, 2011.

Figura 3: Distrito de Gardênia safra de algodão (1950). Assim, Endlich (2009 apud SOUZA, 2012), Fonte: arquivo pessoal da família Knust, 2011. afirma que as bruscas transformações que ocorrem no espaço vem corroborar seu caráter instável e notadamente suas consequências para a sociedade. Salienta ainda a autora (2009), que,

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predominantemente esta instabilidade é reflexo de Nesse âmbito, compreende-se que o campo já decisões exteriores a região, pois majoritariamente as não resume mais apenas como um conjunto de ações de maior peso na definição das transformações atividades agropecuárias e industriais, pois foram-lhe são exógenas. acrescentadas outras funções (GRAZIANO DA Desse modo, considerando o recorte temporal, SILVA, 1999). observou-se que a partir da década de 1950 iniciou-se Essas novas relações foram impulsionadas por uma profunda transformação socioespacial no Distrito mudanças nos campos políticos, econômicos e sociais, de Gardênia, com a modernização da agricultura, o principalmente nos setores de comunicações e represamento do Rio Capivari pela construção da transportes (GRAZIANO DA SILVA, 1999). Usina Capivara (1977) e, sobretudo pelo turismo a Essa nova reestruturação, conforme já partir de 1996. verificado (SOUZA, 2012), atinge todas as escalas Nesse âmbito, baseando-nos em Souza (2012) geográficas, desmistificando a ideia de que “pacatos consideramos relevante destacar que, a reestruturação Núcleos Urbanos” estão ilesos aos processos e produtiva com seus aparatos modernos (máquinas, dinâmicas em questão. insumos, etc.) iniciada na década de 1950 e Nesse ínterim, em virtude do quadro de consolidada a partir da década de 1980, coincidiu com fragilidade socioeconômico observado no Distrito, o a política do Programa Nacional do Álcool poder público municipal juntamente com o Serviço (PROÁLCOOL). Consequentemente, em vista da Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas viu demanda inicial por terras para o cultivo da cana-de- na atividade turística uma alternativa de alavancar a açúcar muitos produtores endividados viram no economia local. arrendamento de suas terras uma alternativa de se Assim, no tocante a atividade turística Braun sustentar e saldar suas dívidas (SOUZA, 2012). (2011) corrobora ser um elemento capaz fomentar a Conforme constatado por Souza (2012), economia de uma região e garantir a melhoria na atualmente no Distrito de Gardênia as culturas que qualidade de vida. Todavia, a autora (2011) ressalta a majoritariamente se destacam são a cana- de- açúcar relevância da conscientização da população local no (47, 4%) e o binômio soja/milho (34, 42%), que concerne ao planejamento participativo como diferentemente de outros períodos que tinha a fundamentais para o êxito dessa atividade. policultura como principal sistema de exploração do Foi verificado por Souza (2012) que a uso do solo. princípio (1995), as primeiras iniciativas relacionadas a Desta forma, podemos compreender que a implementação do turismo no Distrito foi aceita pelos cada momento o espaço passa a ser produzido e moradores com entusiasmo. Houve levantamento das modificado a fim de atender a demanda do processo potencialidades pelos mediadores do SEBRAE e por produtivo dependendo de cada momento histórico. funcionários da prefeitura municipal no Distrito. Essa dinâmica ocorre em todas as escalas Ocorreram também, oficinas e palestras a fim geográficas, a cada momento um novo ciclo econômico de informar e sensibilizar os interessados acerca dessa se instala e dão outras nuances e funções muitas vezes nova atividade econômica, culminando num evento distinta daquela anterior. demonstrativo de artesanatos, gastronomia e registros fotográficos da paisagem (SOUZA, 2012). 3. O TURISMO NO DISTRITO DE GARDÊNIA: Com a contínua evolução e aprimoramento, o NOVAS FUNÇÕES NO MEIO RURAL E MEIO SEBRAE por intermédio do Governo Federal, URBANO passa a atender territórios Segundo Graziano da Silva (1999, p.1) formados por conjuntos de municípios [...] um deles agrupava os municípios às pode-se dizer que o rural hoje margens do rio Paraná e o só pode ser entendido como outro, municípios no entorno um continuum do urbano, do de Presidente Prudente ponto de vista espacial; e do (SEBRAE, 2010, p.10). ponto de vista da organização da atividade econômica, as Nesse contexto foi criado o projeto Circuito cidades não podem mais ser Turístico Oeste Rios, com foco no turismo, cultura e identificadas apenas com a lazer, agrupando os municípios que circundam os rios atividade industrial, nem os Paraná e Paranapanema (SEBRAE, 2010), inserindo-se campos com a agricultura e a assim o Município de Rancharia - SP. Desta forma, por pecuária. possuir um conjunto paisagístico e cultural em

potencial (figura 4) (represa, rios, matas, festas

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tradicionais religiosas) todos os eventos foram Desse modo, em consonância com Graziano inseridos no calendário do Município e no Catálogo do da Silva (1999), Luchiari (1998, p.15 apud SILVA, Circuito Turístico. 2012, p.56) corrobora que, De acordo com Souza (2012) a partir de 1996 deu início a implementação dos primeiros condomínios o turismo reinventa e cria de segunda residência, tanto no espaço intra urbano novas funções, recupera como nas áreas periubanas que antes era ocupada por antigas práticas e bens atividades agropecuárias. culturais por meio do folclore e monta atrações turísticas para a região.

O SEBRAE (2010, p.11) salienta que

planejada e organizada adequadamente para atingir resultados positivos a atividade turística é uma das principais fontes de geração de renda e emprego na atualidade. Para tanto deve ser baseada nos princípios da sustentabilidade: priorizar a inclusão social, o crescimento econômico e a preservação ambiental e cultural para que as próximas gerações possam usufruir dos destinos turísticos e Figura 4: Distrito de Gardênia, vista parcial. Fonte: de seus atrativos. aeroimagem, União da Vitória - PR, 2007.

Souza (2012, p.53-54) constatou que na Lei Além dos condomínios e chácaras, foram-se Orçamentária de 1997 em seu artigo 6º já estavam progressivamente figurando outros elementos como, previstas ações que “consistiam em formular projeto de pesqueiros, pousadas, ranchos e áreas de campings aproveitamento de potencialidades turísticas, dando destinados a atender turistas que vêm em busca da ênfase ao Balneário Municipal e ao lago da Usina atividade de pesca na Represa Capivara. Capivara no Distrito de Gardênia, com vistas á atração O represamento do Rio Capivari em 1977, de investimentos e geração de empregos”. Porém, pela construção da Usina Capivara, situada entre os mesmo com a criação de uma Secretaria do Turismo, Municípios de Porecatu (PR) e Taciba (SP), foi Esporte e cultura (SECTEL) em 2005, não garantiu que também outro elemento motivador de drásticas a atividade turística, no Distrito de Gardênia, em mudanças e impactos socioespaciais no Distrito. especifico, tivesse um efetivo gerenciamento técnico. Dentre os impactos se destacam o assoreamento, a Consequentemente, essa atividade que viria realocação da população ribeirinha, o alagamento de a ser uma estratégia atual de reter a população áreas de plantio, etc. No entanto, apesar das rural e concomitantemente, aumentar sua renda lembranças negativas por parte da população realocada, (GRAZIANO DA SILVA, 2012), se desdobrou houve relatos de alguns proprietários de pesqueiros de em outros problemas. que a Represa foi um mal necessário à própria Há um processo de diferenciação sobrevivência do Distrito, já que é a fonte de socioespacial (mapa 1) que se materializa entre os atratividade atualmente (SOUZA, 2012). moradores locais e entre os turistas das segundas Esse fato vem corroborar com as afirmações residências. de Graziano da Silva (1999) de que o meio rural assumiu outras funções além das atividades agrárias, pois há atualmente o acréscimo de novos elementos como a prestação de serviços por outros atores (turistas, microempresas, etc). Entretanto, ressalta o autor (1999, p. 28) que para sanar problemas oriundos de outros períodos “a realização dessas oportunidades requer incentivos econômicos e culturais e políticas inovadoras, que busquem novas formas de gestão política e pública”.

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público precisam atuar de maneira mais incisiva na fiscalização da ocupação urbana e rural que vem acontecendo no local.

Essas constatações necessitam de urgente intervenção do poder público, pois o uso destrutivo do território é contraditório com o consumo do espaço que é sugerido pela atividade turística (Rodrigues, 2002 apud SOUZA, 2012).

Por conseguinte, considerando o que foi Mapa 1: Distrito de Gardênia- evolução da malha viária observado, propomos desdobrar a pesquisa para o urbana ( org. SOUZA, 2012) âmbito educacional. Nossa hipótese é que através do estudo do lugar, por meio da abordagem Conforme podemos observar (figura 5) geográfica do turismo, contribuirá no predominam-se na “área nobre”, a oeste da desenvolvimento da sensibilização e percepção Represa, os empreendimentos imobiliários a fim dessa atividade no Distrito, sobretudo na de atender a demanda dos turistas. Enquanto que apreensão das modificações e suas implicações no tocante aos empreendimentos de loteamentos nas dimensões socioespaciais em cada período populares, estes seguem em direção leste, distante histórico. da represa, com pouca arborização e fora da área de especulação imobiliária (SOUZA, 2012). 4 O ESTUDO DO LUGAR: UMA PROPOSTA PEDAGÓGICA DE SENSIBILIZAÇÃO E PERCEPÇÃO DO TURISMO NO DISTRITO DE GARDÊNIA, MUNICÍPIO DE RANCHARIA -SP

Para Carlos (1995, p.35) a geografia como ciência

que estuda o espaço construído nas suas dimensões social e natural, buscando compreender o processo de formação, as relações que acontecem no momento e as marcas deixadas pelas relações passadas, é a que sim impõe atualmente. O entendimento da realidade Figura 5: Distrito de Gardênia, Condomínio Sossego. Fonte: social, historicamente Pesquisa de campo, SOUZA, 2012. situada – territorializada é o que cabe à geografia.

Além de diferenciação, há outros agravantes, como ocupação irregular, poluição Nessa esfera, Silva (2012) ratifica que ambiental, emprego informal, etc, opostos a dentre as ciências sociais, a geografia tem se proposta inicial de desenvolvimento local. mostrado com maior abertura a discussões Sobre esses problemas Braun (2011 apud acadêmicas acerca de temas contemporâneos, SOUZA, 2012, p.63) ressalta que como o turismo. O autor (2012, p.48) complementa destacando que “o principal fator a expansão de áreas de para o crescimento dos estudos geográficos, é o condomínios no Distrito de caráter espacial dessa atividade”. Gardênia está ocorrendo de No tocante ao estudo do lugar, Ferreira maneira desorganizada, sem o planejamento que a (2000, p. 1) destaca que atividade exige. Os engenheiros e técnicos considerado por muito responsáveis pelo poder tempo como um dos

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mais problemáticos da amparada na interdisciplinaridade. Essa concepção geografia tem-se segundo Japiassu (1976, p.45 apud PERETTI, 2002, destacado, p.45) recentemente, como uma das chaves para a caracteriza-se pela compreensão das intensidade das trocas entre os tensões do mundo especialistas e pelo grau de contemporâneo. integração real entre as

disciplinas no interior de um Assim, baseando-se nessas afirmações, mesmo projeto de pesquisa. sustentamos a nossa premissa, que o estudo do lugar, resgatando sua história local envolvendo os Essa reflexão é coerente e reflete numa nova alunos do 9° ano do ensino fundamental, através forma de pensar o ensino no tocante as suas mais da construção de metodologias apropriadas, como 3 diversas dimensões (currículo, objetivos do ensino a história oral , é uma proposta coerente para a /aprendizagem, etc.), essas novas atitudes contemplam compreensão dos fenômenos e dinâmicas que ainda os novos padrões apresentados pela chamada pós ocorreram e que ocorrem em sua realidade - modernidade, aos quais estamos sensibilizados. A vivenciada. A partir dessa compreensão, os alunos vista disso, Siqueira (2003, s/p.) destaca que terão ferramentas para apreender essas mudanças em outras escalas (CALLAI, 2003). o mundo pós-moderno [...] é Justificamos que os sujeitos da nossa um mundo em rede, e a pesquisa serão os alunos do 9° ano, porque, nessa compreensão de suas etapa em específico, consta o eixo turismo na problemáticas e seus riscos e Proposta Curricular de Geografia, além de que de tudo o que nele acontece (e que repercute em todas as arenas da vida) passa pela exigência de uma formação a 8ª série do Ensino interdisciplinar. Fundamental é um momento

muito importante na vida do Assim, partindo dessas afirmações, inferimos aluno, pois representa o término de uma etapa, que a proposta envolverá além dos pesquisadores e carregadas de significados e alunos, outros sujeitos, como os respectivos simbologias. Ele iniciou o professores, coordenado, diretor e os entrevistados que Ensino Fundamental na colaborarão na construção de informações através da infância e nele entrou na história oral. adolescência. Agora, Portanto, a metodologia de pesquisa adotada é vislumbra outros caminhos e a pesquisa ação e foi pensada considerando o novas possibilidades ao envolvimento de todos os sujeitos em busca de novas terminar mais uma etapa de ações para a resolução dos problemas em questão e se sua formação para, possivelmente, ingressar no pensar em novos encaminhamentos, pois, Ensino Médio ou em algum Curso Técnico. O conteúdo é um tipo de pesquisa social de geografia nesta série abre com base empírica que é os horizontes do aluno para concebida e realizada em que desvende a realidade em estreita associação com uma que vive, uma realidade plena ação ou com uma resolução de novas informações e que de um problema coletivo e no vai bem além da dimensão do qual os pesquisadores e os seu lugar, da sua região. participantes representativos (SECRETARIA DA da situação ou do problema EDUCAÇÃO, 2009, p. 08) estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo (THIOLLENT, 1988, p.14). Salientamos ainda, que apesar da pesquisa se referir ao ensino de geografia, a proposta é ser Dessa forma, reiteramos que, considerando as constatações acerca do “desenrolar” dos empreendimentos do turismo no Distrito de Gardênia, é 3 Segundo Meihy (2002) a história oral se fundamenta na fundamental que se cogite em estratégias de formação memória dos sujeitos estudados expressa por meio da para a conscientização acerca da importância do oralidade, nos diálogos e entrevistas.

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envolvimento de todos os sujeitos locais na coordenação de área, Paulo Miceli. – 1 ed. atual. São implementação dos projetos relacionados a essa Paulo: SE, 2011. P. 74-104. atividade para que aconteça um turismo de qualidade e com menos impactos possível. FERREIRA, Felipe Ferreira. Acepções recentes do 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS conceito de lugar e sua importância para o mundo contemporâneo. Revista território, Rio de Janeiro, ano Perante o cenário de adversidades observado V, nº9, PP. 65-83, jul./dez. 2000. Disponível em: no que concerne à introdução do turismo no Distrito de http://www.periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/RB Gardênia, reiteramos que a asserção da relevância da AFS/article/view/992. Acesso em: 23/07/2013. formação dos sujeitos locais acerca dessa atividade se faz necessária e se justifica porque nossa premissa é de GRAZIANO DA SILVA, José. O novo rural que, somente através de uma formação calcada na brasileiro. 2. Ed. ver. Campinas, SP: Unicamp, 1999. conscientização e na percepção dessa atividade no local é que se poderá garantir um turismo com qualidade de MEIHY, J. C. S. B. Manual de história oral. 4ª vida e desenvolvimento socioespacial. Acreditamos ed. São Paulo: Loyola, 2002. 246 p. ainda, que através da interação de todos os sujeitos envolvidos na busca por ferramentas que medeiam o PERETTI, Glaúcia Aparecida Rosa Cintra. Proposta processo de ensino/aprendizagem no desenvolvimento de conscientização turística na EE 18 de Junho de da pesquisa, serão mecanismos eficientes para se Presidente Epitácio – SP: uma experiência de como pensar e criar novos conteúdos a acerca do objeto trabalhar o tema turismo nas escolas de ensino (turismo). fundamental. (M estrado em Geografia) – FCT/UNESP, Presidente Prudente, 2002. 121p. REFERÊNCIAS SEBRAE. Circuito Turístico Oeste Rios. Sebrae, São CALLAI, Helena Copetti. Geografia um certo Paulo, 2010. espaço, uma certa aprendizagem. (Mestrado em Geografia) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências SILVA, Carlos Henrique Costa. O Turismo e a Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, Produção do Espaço: Perfil Geográfico de uma 1995.280 p. Prática Sócioespacial. Geografia Ensino & Pesquisa, v. 16, n.2.p. 47 – 63, maio/ago. 2012. ______.O ensino de geografia: recortes espaciais para análise.IN: CASTROGIOVANNI, SIQUEIRA, Holgonsi Soares Gonçalves. Formação Antonio Carlos et al (org). Geografia em sala de aula: interdisciplinar: exigência sociopolítica para um práticas e reflexões.4 ed. – Porto Alegre: UFRGS, mundo em rede. 2003. Disponível 2003. em:http://www.angelfire.com/sk/holgonsi/mundorede.h tml. Acesso em : 28/07/2013. CARLOS, Ana Fani Alexandri (Org.). A geografia na sala de aula. São Paulo: contexto, 1999. SOUZA, Sueli Aparecida de Souza. Transformações socioespaciais no Distrito de Gardênia, Município CURRÍCULO DO ESTADO DE SÃO PAULO: de Rancharia- SP. (Monografia de Bacharelado em Ciências Humanas e suas Tecnologias/Secretaria da Geografia). Presidente Prudente: FCT/Unesp, 2012. Educação; coordenação geral, Maria Inêz Fini;

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PLANEJAMENTO DO TURISMO RURAL PEDAGÓGICO: O CASO DO PROJETO VIVA CIRANDA, JOINVILLE, SC

ANGELA LUCIANE KLEIN1 MARIELEN ALINE COSTA DA SILVA2 MARCELINO DE SOUZA3

1. Professora da Prefeitura Municipal de Florianópolis, SC. E-mail: [email protected] 2. Estudante de Mestrado da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural. E-mail: [email protected] 3. Professor dos Programas de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural e de Agronegócios da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). E-mail: [email protected]

RESUMO - O presente artigo tem como propósito realizar uma análise sobre o processo de planejamento e gestão do turismo no projeto ‘Viva Ciranda’, desenvolvido no município de Joinville, Estado de Santa Catarina. Metodologicamente, utilizou-se como fonte de análise a pesquisa bibliográfica a cerca da temática estudada, a observação sistemática não participante das atividades propostas e a realização de entrevistas semiestruturadas, com cinco proprietários rurais, donos dos empreendimentos que integram o projeto Viva Ciranda e 14 professoras, responsáveis pelas turmas de alunos que visitaram estas propriedades entre os meses de setembro a novembro de 2011. Os resultados evidenciam que a questão do planejamento figurou como um dos pilares do projeto, podendo ser identificado não apenas nos objetivos estabelecidos pela equipe responsável, mas também, nas etapas a serem cumpridas, na orientação aos proprietários, no monitoramento das atividades realizadas, na presença de uma pedagoga para auxiliar no processo, na realização de cursos de capacitação e encontros para discutir os pontos a serem melhorados e na avaliação das atividades. Conclui-se assim, que o planejamento é essencial para o desenvolvimento do turismo rural pedagógico, devendo ser de caráter permanente e abrangente, visando benefícios sociais, ambientais e econômicos para a comunidade local.

Palavras- chave: planejamento, turismo rural pedagógico, projeto Viva Ciranda, desenvolvimento rural.

ABSTRACT - The article aims to carry out an analysis of the process of planning and management of tourism in the “Viva Ciranda” project developed in the city of Joinville, Santa Catarina. Methodologically, the bibliographical research, systematic non-participant observation of the proposed activities and semi-structured interviews with five landowners, owners of enterprises that integrate the project and 14 teachers who are responsible for groups of students that visited those properties between the months of September and November, 2011 were used the source of analysis. The results show that the planning featured as one of the pillars of the project, and it could be identified not only in the goals set by the responsible team, but also, in steps to be met, in guidance given to the owners, in monitoring the activities carried out in the presence of a pedagogue to assist in the process, in training courses and meetings to discuss the points to be improved as well as in the evaluation of the activities. It is concluded that the planning is essential for the development of rural tourism. It should be permanent and comprehensive, aiming at social, environmental and economic benefits to the local community.

Keywords: Planning, educational rural tourism, Viva Ciranda project, rural development.

1 INTRODUÇÃO diversidade de ocupações, serviços e novas funções não A partir da década de 1980, em decorrência das exclusivamente produtivas e que antes existiam apenas no mudanças no campo social, político, econômico, meio urbano. ambiental e cultural, uma nova realidade começa a Nesse cenário de revalorização das áreas rurais, o despontar no meio rural, caracterizada por uma grande meio rural, que até pouco tempo era ocupado

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exclusivamente para a produção agropecuária, torna-se planejada, os benefícios poderão ser diversos, não apenas também um espaço para o lazer e o turismo, atraindo cada para as famílias envolvidas na atividade, mas para toda a vez mais a população urbana que vê nesses lugares, uma comunidade. possibilidade de descansar e estar em contato com a Partindo dessa premissa, buscou-se neste artigo natureza, com os modos de vida e com as tradições e os realizar uma análise sobre o processo de planejamento e costumes do mundo rural (ELESBÃO, 2010). gestão do turismo no projeto Viva Ciranda, desenvolvido Diante dessa conjuntura, a atividade de turismo no município de Joinville, Estado de Santa Catarina, no espaço rural passa a adquirir uma importância cada vez buscando destacar as ações mais importantes que maior no contexto do desenvolvimento local, sobretudo, favoreceram o andamento da proposta e os benefícios que por constituir-se em uma alternativa econômica viável, a atividade turística planejada pode trazer para a complementar à atividade agrícola e que possibilita a comunidade envolvida, em termos sociais, econômicos e geração de emprego e renda para as famílias rurais, além ambientais. A iniciativa compreende uma proposta de contribuir para o desenvolvimento cognitivo, social e inovadora de turismo rural pedagógico que teve início no emocional das pessoas. ano de 2010, envolvendo proprietários rurais e escolas da Autores como Sznajder, Przezbórska e rede municipal de ensino. Scrimgeour (2009) vêm estudando essa questão há algum Por abranger um tema interessante e tempo, evidenciando um conjunto de características que diferenciado, o projeto foi foco de um estudo científico1, demonstram a importância e relevância dessa atividade no cujo objetivo consistiu em descrever e analisar as contexto atual. De acordo com estes autores, o turismo atividades que caracterizam o turismo rural pedagógico, rural possibilita a satisfação das necessidades humanas, na tendo como enfoque a sua adequação enquanto prática medida em que oportuniza a participação dos turistas no educativa a ser desenvolvida em complemento ao ensino processo de produção de alimentos, na vida de uma escolar. Para além dos objetivos propostos, a referida família tipicamente rural /ou comunidade rural. Ao pesquisa também evidenciou aspectos relacionados ao mesmo tempo, também pode possibilitar a satisfação das modo como as duas experiências, em especial, o projeto necessidades cognitivas ou etnográficas dentro da Viva Ciranda, vem sendo planejada e desenvolvida. produção agrícola, uma vez que oportuniza aos visitantes Nesse sentido, inicialmente busca-se explanar a chance de aprender sobre a vida das pessoas rurais, sua alguns elementos acerca do turismo rural pedagógico, cultura e seus costumes. E por último, encontram-se as enquanto uma prática realizada no âmbito da propriedade possibilidades de satisfação das necessidades emocionais, rural, que utiliza como recurso didático as atividades a partir do contato direto com animais domésticos, agrícolas, a produção agropecuária e os recursos naturais plantas, produtos de processamento, o contato com a e culturais ali existentes, favorecendo aos estudantes atmosfera de rusticidade, silêncio, sons ou mesmo cheiros experiências diversificadas em contato direto com a do rural e da exploração agrícola. cultura local e com um ambiente que vai muito além da Entretanto, como toda a atividade econômica, o sala de aula. Posteriormente, discutem-se alguns conceitos turismo rural é composto de pontos positivos e também e definições sobre o planejamento do turismo, destacando negativos, isto é, acarreta impactos que podem beneficiar nessa análise, o modelo proposto por Nuckolls e Long as comunidades ou então, causar danos, dependendo da (2009). Após essa discussão teórica inicial, apresentamos forma como esta atividade for desenvolvida. Tais efeitos o projeto Viva Ciranda, evidenciando um conjunto de podem ser constatados em diferentes dimensões, como questões relacionadas ao processo de planejamento ambiental, econômica, social e cultural (RUSCHMANN, presente e os resultados decorrentes dessas ações. 1997). Na análise de Elesbão (2010), esses impactos 2 TURISMO RURAL PEDAGÓGICO E A FUNÇÃO gerados pelo turismo terão a sua intensidade determinada EDUCATIVA DAS PROPRIEDADES RURAIS pela relação estabelecida entre as pessoas residentes em determinada comunidade e os seus visitantes que por ali Inicialmente, torna-se relevante entender o que passarem. Desse modo, o afluxo de pessoas visitando se compreende por turismo rural pedagógico e qual a essas comunidades pode trazer implicações positivas importância dessa prática no contexto atual. De acordo como a geração de emprego, a expansão da atividade com estudos realizados, o turismo rural pedagógico comercial e a melhoria dos serviços, mas também, pode caracteriza-se como um conjunto de atividades educativas ocasionar alguns danos, como o aumento dos preços das realizadas em propriedades rurais, utilizando como propriedades e dos produtos, poluição, entre outras eventuais alterações. Diante disso, Schneider e Fialho (2000), chamam a atenção para um aspecto de suma importância 1 A pesquisa resultou na Dissertação de Mestrado intitulada relacionado ao desenvolvimento da atividade turística, “Turismo rural pedagógico e a função educativa das qual seja a importância de um planejamento apropriado e propriedades rurais: uma análise a partir do roteiro Caminhos Rurais de Porto Alegre, RS e do Projeto Viva Ciranda, Joinville, devidamente ordenado para minimizar ou contornar esses SC”, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em possíveis impactos negativos e ao mesmo tempo, Desenvolvimento Rural da Universidade Federal do Rio Grande maximizar os impactos positivos. Se a atividade for bem do Sul – PGDR/UFRGS, no ano de 2012.

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recurso didático as atividades agrícolas e pecuárias e escolas e propriedades rurais, as quais passam a ser também, os recursos naturais e culturais ali existentes. vislumbradas como ambientes pedagógicos valorosos que Trata-se de uma nova alternativa socioeconômica possibilitam a realização de uma gama de atividades de caráter inovador que, sob o viés da educativas, favorecendo a aprendizagem e multifuncionalidade da agricultura2, pode favorecer tanto desenvolvimento das crianças e adolescentes. os agricultores rurais, na medida em que gera rendas Vários estudos realizados em países como a complementares e a valorização de seus conhecimentos e França (CAFFARELLI et al., 2010), Itália, (NAPOLI, saberes práticos, quanto os alunos, no sentido de 2006), Noruega (JOLLY et al., 2004), Finlândia (RISKU- possibilitar um aprendizado diferenciado e experiências NORJA; KORPELA, 2009), Estados Unidos (HINRICHS diversas em contato com diferentes elementos da et al., 2008) e Japão (OHE, 2009), evidenciam a presença natureza. Segundo Ohe (2007), essa função educativa da de inúmeras propriedades rurais pedagógicas no meio agricultura desempenha um papel cada vez mais rural, as quais têm se revelado como uma atividade de importante na sociedade atual, possibilitando aos caráter exemplar no quadro de um desenvolvimento citadinos aliviar o stress da vida urbana e permitindo aos sustentável, favorecendo a educacão ambiental, alimentar estudantes a oportunidade de aprender temas relacionados e valorização da agricultura e do meio rural. à alimentação e ao patrimônio rural. Para Gurrieri (2008), as propriedades rurais que Na análise de Klein, Troian e Souza (2011), o desenvolvem atividades educativas representam locais turismo rural pedagógico emerge como uma alternativa de que favorecem uma conexão direta entre a cidade e o desenvolvimento que, além de contribuir para a ampliação campo, entre o produtor e o cidadão, entre o agricultor e o do universo de conhecimento de crianças e adolescentes, consumidor, caracterizando-se em uma importante incentiva o cuidado e a preservação dos recursos naturais ferramenta, capaz de impedir a dispersão do patrimônio e a valorização do meio rural. Por conseguinte, acaba sócio-cultural existente no meio rural, relativo à produção propiciando “o encontro de pessoas do meio urbano com de alimentos, à terra, à natureza e ao meio ambiente. a natureza, com as atividades agrícolas e, é claro, com Ainda, segundo Campos (2010), as propriedades outras pessoas, e por si só já se constitui em um ato rurais pedagógicas compreendem estruturas que podem pedagógico” (TEIXEIRA; WANDSCHEER; SOUZA, contribuir para a formação e desenvolvimento das 2005, p. 137). Do mesmo modo, favorece a valorização crianças, favorecendo a divulgação de valores do meio dos costumes e tradições das famílias rurais, a rural através de um conjunto diversificado de práticas conservação da paisagem rural e promoção da educação agrícolas, pecuárias e artesanais, tendo como base o ambiental, evidenciando assim, contribuições de caráter sistema de ensino educativo de caráter não-formal que educativo, social, cultural, ambiental e econômico. incentive a participação e a aprendizagem, possibilitando, No Brasil, a prática do turismo rural pedagógico ao mesmo tempo, uma aproximação do homem com a ainda é recente, não existindo muitas experiências em natureza. desenvolvimento e também, estudos científicos Analisada por esse ângulo, a propriedade rural relacionados a esta temática que possibilitem um pedagógica torna-se um lugar de observação e exploração entendimento mais aprofundado acerca das suas concreta, favorecendo a experiência pessoal e características e implicações para o desenvolvimento rural experimental e estimulando o desenvolvimento de e para a educação. No cenário internacional, no entanto, diferentes habilidades, contemplado um universo repleto verifica-se o surgimento e a expansão de um conjunto de possibilidades e valores educacionais que são significativo de experiências de turismo rural pedagógico. oferecidos às escolas como banco de dados a ser utilizado São os denominados projetos de cooperação3 envolvendo na plataforma curricular (BERTACCI, 2005). D’Agostinho (2008) expõe que um dos objetivos 2 Compreendida como “todos os produtos, equipamentos e das atividades desenvolvidas na propriedade rural é serviços criados por atividades agrícolas em benefício da proporcionar às crianças e aos jovens maneiras de viver economia e da sociedade em geral” (LOSCH, 2004, p. 340), a em harmonia com o meio ambiente, por meio de situações noção de multifuncionalidade da agricultura tem se constituído concretas e não somente proporcionar um conhecimento em uma importante estratégia de desenvolvimento local, proveniente do mundo virtual, obtido por meio da internet possibilitando o reconhecimento de outras potencialidades do meio rural e da atividade agrícola que até recentemente não e da televisão. A partir dessas experiências, as crianças eram valorizadas pela sociedade. têm a oportunidade de vivenciar e perceber um mundo 3 As características evidenciadas nesses projetos são muito que nem sempre é mostrado em sala de aula e tampouco similares ao conceito de Turismo rural pedagógico, embora não na televisão, podendo descobrir novas sensações e se utilize este termo para designar a prática de tal atividade. emoções que acabam despertando um sentimento de Conforme pesquisas realizadas, na França utiliza-se a palavra pertencimento, de conexão, de inter-relação com o seu fermes pédagogiques; na Itália, fattorie didattiche; em Portugal, ambiente (KLEIN; TROIAN; SOUZA, 2011). quintas pedagógicas; e no Chile, granjas educativas. Na Nesses termos, Tibiletti (2002) ressalta que para Noruega, o termo green care tem se difundido de modo se tornar uma propriedade rural pedagógica, a mesma não significativo nos últimos anos, assim como a expressão the farm as a pedagogical resource. Nos Estados Unidos e no Japão, precisa fazer muito além do que já fazem, basta continuar utilizam-se as expressões farms-to-school e/ou farms educational.

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a desempenhar as suas atividades habituais, tais como de um diagnóstico do território, a 2ª compreendendo a adubação, plantio, capina, irrigação, colheita de frutas e identificação dos recursos existentes, a 3ª referente à ordenha. Do mesmo modo, os interessados em inserir-se definição do formato do projeto pedagógico, a 4ª etapa nesse ramo não precisam necessariamente ter uma associada à realização de um diagnóstico local e a última licenciatura em educação, mas certamente deverão ter etapa, com a definição de um primeiro projeto, uma “sabedoria antiga” e comunicável e a capacidade de contemplando a identificação e priorização de metas. explicar, de argumentar, de abordar os diferentes públicos de ouvintes. Quadro 1: Proposta para elaborar um projeto de turismo O sucesso da propriedade, nesse sentido, está rural pedagógico em propriedades rurais diretamente ligado a dois aspectos: o primeiro, relacionado ao aspecto pedagógico, com a preparação do Etapa Características Questões a serem percurso didático, o contato com os professores das contempladas turmas antes da visita, o uso de materiais estruturados e 1ª Definir um primeiro - Por que diversificar minha documentação apropriada; a realização de atividades que etapa projeto: identificação atividade agrícola para uma abranjam metodologias experienciais e envolventes e a e priorização de atividade pedagógica? metas - Por quê/Para que criar uma presença do agricultor enquanto uma “testemunha propriedade rural pedagógica? privilegiada”, devendo este apresentar boa capacidade de - Meu projeto atende às comunicação para lidar com o público e habilidade para necessidades locais? transmitir ideias e emocões, conhecimentos e - Qual é o público potencial? experiências. Já o segundo aspecto diz respeito à - Há qualquer possibilidade de organização e segurança da propriedade, com a presença concorrência ou de parceria? de áreas equipadas para recepção dos grupos, degustação - Existem parceiros locais de produtos, ajuste de acordo com as leis vigentes, e técnicos ou financeiros para o outras precauções necessárias para garantir a segurança e meu projeto? 2ª Identificar os - Que competências e que bem estar dos visitantes (D’AGOSTINHO, 2008). etapa recursos disponibilidade são Para além desses aspectos, Napoli (2006) ressalta necessárias? a importância da presença de áreas de recreação e das - Qual deve ser a capacidade instalações cobertas para a realização de atividades de investimento financeiro? educativas em dias chuvosos, assim como o uso de 3ª Realizar um - Identificar o público sistemas produtivos de baixo impacto ambiental, etapa diagnóstico do potencial; integrados a uma agricultura biológica. Ainda, segundo o território - Identificar a distribuição autor, cada propriedade rural é em si um lugar onde há geográfica dos públicos; muito que aprender, desde questões relacionadas à - Identificar a hospedagem da redescoberta da cultura camponesa e reflexões sobre a região; - Conhecer as políticas paisagem agrícola até problemas ecológicos e tendências públicas implantadas; do mercado. Desse modo, a pessoa responsável pelas - Localizar a estrutura em seu atividades educativas em cada propriedade rural ambiente físico. pedagógica deve encontrar seu próprio método de 4ª Realizar um - A abordagem de paisagem; apresentar o mundo rural, não devendo simplesmente etapa diagnóstico do local - O estudo da situação de repetir o que as crianças já estudaram em sala de aula. acessibilidade; A implantação de uma propriedade rural - Inventário das construções e pedagógica, nesse sentido, requer poucos investimentos se terrenos; comparado com as atividades de turismo rural que - As características de necessitam de investimento em meios de hospedagem. produções. 5ª Definir o formato do - Definir as finalidades e as Por esse motivo, uma propriedade rural pedagógica torna- etapa projeto pedagógico metas; se relativamente mais fácil de ser implementada pelos - Estabelecer os objetivos; agricultores (OHE, 2007). - Selecionar os meios/recursos Contudo, apesar de não ser uma atividade que a serem utilizados (da apresente custos financeiros elevados, o que favorece em agricultura, da pecuária, etc.); parte a sua criação, a implementação de uma propriedade - Selecionar os métodos e rural pedagógica requer planejamento, organização e abordagens pedagógicas (a envolvimento. Pensando nessas questões, Caffarelli et al. maneira como a atividade será (2010) apresentam uma proposta de projeto interessante, realizada para atingir os resultados estabelecidos); contando com orientações estruturadas em etapas que - Buscar parcerias e permitem ao proprietário rural/agricultor ter uma visão apoiadores; mais ampla do todo, desde a sua idealização até a sua - Promover a divulgação do concretização. projeto; A mesma encontra-se estruturada em cinco - O papel do pedagogo. etapas distintas, sendo a 1ª delas relacionada à realização Fonte: Caffarelli et al. (2010), adaptado por Klein.

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Nesses termos, o planejamento do turismo Conforme é possível observar, a proposta de emerge como um processo racional cujo objetivo Caffarelli et al. (2010) exige uma postura empreendedora principal consiste em garantir o desenvolvimento e dinâmica por parte dos interessados em investir nesse turístico. Tal processo requer a vinculação de um ramo de atividades. Ao mesmo tempo, evidencia-se que a conjunto de aspectos relacionados com a oferta e a prática do turismo rural pedagógico, assim como qualquer demanda e, ainda, todos os subsistemas turísticos, em outra atividade, requer um bom planejamento por meio da coerência com as orientações dos demais setores do país elaboração de um projeto que possa servir como base (MOLINA, 2005). Assim, de acordo com Pedron (2007, orientadora, favorecendo assim o sucesso do p. 11), quando existe a pretensão de que o processo de empreendimento. planejamento aconteça de fato, zela-se para que alguns O planejamento, desse modo, passa a configurar aspectos sejam levados em conta, dentre eles, “a como um dos principais elementos no sentido de aceitabilidade” da comunidade, a concordância dos atores maximizar os efeitos positivos que podem ser gerados em relação à situação que se deseja alcançar, a pela atividade turística e do mesmo modo, evitando participação efetiva dos órgãos envolvidos e a presença impactos negativos. A compreensão do que se entende permanente de motivação, já que o processo na maioria por planejamento, no entanto, não é tão simples, das vezes traz resultados somente em longo prazo. requerendo um corpo de conhecimento e uma abordagem Loch e Walkowski (2009) ressaltam também que técnica sistemática, o que, por conseguinte, exige a o processo de planejamento, por possuir um caráter análise de processos e teorias distintas. amplo, requer a adoção de estratégias que possibilitem o Em face disso, o próximo item destina-se a desenvolvimento das potencialidades de um local, discutir alguns conceitos relacionados a este tema, tendo tornando-se assim, um instrumento eficaz de como suporte teórico vários autores evidenciando desenvolvimento sustentável. Para tanto, torna-se diferentes abordagens. Tal análise nos permite vislumbrar necessário evidenciar desde a primeira etapa a efetiva com maior clareza a importância do planejamento no participação de todos os interessados no desenvolvimento turismo e as contribuições decorrentes dessa linha de ação da atividade turística, desde o poder público e privado, até em experiências como o projeto Viva Ciranda, a comunidade em geral. Ainda, segundo Beni (1998), desenvolvido no município de Joinville, Estado de Santa pode-se definir o planejamento do turismo como um Catarina. processo dinâmico, com caráter contínuo e permanente. “É ele que mantém o sistema de turismo ativo 3 O PLANEJAMENTO DO TURISMO RURAL continuamente por que conta com uma perene realimentação, pois a atividade revela enorme O ato de planejar sempre compreendeu uma interdependência e interação dos elementos que a ferramenta fundamental no desenvolvimento de projetos e compõem” (BENI, 1998, p.110). organizações. Trata-se de um processo de reflexão Outra definição interessante e que evidencia intimamente relacionado à ação, em busca de propósitos, características especificas do processo de planejamento do metas, fins. Neste contexto, o planejamento evidencia-se turismo é sugerida por Braga (2007). De acordo com a nas diferentes esferas e setores da sociedade, enquanto um autora: processo que exige conhecimentos diversos, sistematização e racionalização. “Planejamento turístico é o processo de avaliação do A compreensão do que se entende por núcleo receptor (comunidade, oferta turística e planejamento, desse modo, expressa complexidade, demanda real) da demanda potencial e de destinos necessitando de uma análise mais aprofundada acerca dos turísticos concorrentes, com o intuito de ordenar ações seus conceitos e definições. Na perspectiva de Dias de gestão pública direcionadas ao desenvolvimento (2003), o planejamento, enquanto instrumento de sustentável e, conseqüentemente, fornecer desenvolvimento, constitui elemento que interfere na vida direcionamento à gestão privada para que ela estruture empreendimentos turísticos lucrativos com base na das pessoas, à medida que orienta para um futuro responsabilidade socioambiental (BRAGA, 2007, p. determinado, que esteja previamente definido. Para 8)”. Ruschmann (1997, p.83) trata-se de “uma atividade que envolve a intenção de estabelecer condições favoráveis Diante desse conjunto de definições, verifica-se para alcançar objetivos propostos”. Do mesmo modo, que o pensar planejamento não é tarefa fácil, exigindo Barreto (2002, p.12) evidencia a dinamicidade dessa ação, conhecimento em diversas disciplinas e a aplicação de visto que não é algo estático, engessado, mas sim “um diferentes estratégias. Trata-se de um processo complexo devir, um acontecer de muitos fatores concomitantes, que que envolve vários atores locais e profissionais de áreas têm de ser coordenado para se alcançar um objetivo que distintas, além de uma metodologia estruturada em etapas está em outro tempo. Sendo um processo dinâmico, é que deverão servir como fontes orientadoras para atingir lícita a permanente revisão, a correção de rumos, pois, metas estabelecidas. exige um repensar constante, mesmo após a concretização Nesse sentido, torna-se necessário entender que dos objetivos”. não existe um único modelo de planejamento. Petrocchi

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(1998) apresenta dois tipos de planejamentos que, em número de objetivos para cada meta poderá variar, geral, são os mais utilizados: o estratégico, que engloba a dependendo do estágio de desenvolvimento do grupo e da organização como um todo, sendo de longo prazo; e o disponibilidade de recursos humanos, físicos e tático, cuja abrangência compreende um departamento ou financeiros. Ressalva-se que, em virtude de problemas setor, sendo de médio prazo e caráter operacional. Beni imprevisíveis ou oportunidades, os objetivos estão (1998) ressalta ainda que o planejamento estratégico sujeitos a uma redefinição e refinamento contínuo. compreende um conjunto de decisões que são tomadas 8) delinear ações e consolidar as estratégias: pelas autoridades do setor do turismo, formulando este passo envolve a definição de estratégias e táticas objetivos e políticas e prevendo a utilização dos recursos. específicas as quais delineiam como cada objetivo será Já, o planejamento tático utiliza os recursos disponíveis e realizado, incluindo tarefas detalhadas para serem os aplica na concretização dos objetivos de caráter realizadas pelos membros do grupo. imediato, resultantes das decisões estratégicas. 9) avaliar o progresso: compreende a realização Dentro dessa perspectiva, Nuckolls e Long de uma revisão periódica das atividades de planejamento (2009), apresentam uma interessante proposta de para determinar a efetividade dos esforços dos grupos e planejamento estratégico envolvendo desde fatores prover informação para patrocinadores, financiadores, organizacionais e físicos até planejamento de marketing, participantes e o público. que estão incorporados em 10 atividades de planejamento 10) atualizar e modificar o plano: o último passo as quais incluem: proposto deve partir das informações obtidas na etapa 1) reunir informações: neste primeiro momento, anterior e envolve a revisão geral do plano, em relação ao realiza-se uma avaliação da composição do grupo desenvolvimento organizacional, envolvimento da existente, identificando representantes potenciais que comunidade e no plano para o marketing turístico. possam ser envolvidos no processo e também, os A proposta de Nuckolls e Long (2009) interesses turísticos e não-turísticos que possam vir a ser evidencia a complexidade que permeia o planejamento do afetados pelo desenvolvimento do turismo. Concomitante turismo, independente das metas estabelecidas e dos a estas ações, traçar um perfil dos mercados existentes em atores envolvidos. Trata-se de um processo dinâmico e termos de origem geográfica, demográfica, ciclo de vida adaptável, dirigido para guiar decisões e ações futuras, das famílias, padrões de gastos, necessidades e interesses. que requer sistematização e envolvimento dos 2) identificar valores das comunidades: O organizadores, bem como, da comunidade em questão. segundo passo é averiguar junto à comunidade o que No caso específico do turismo rural realmente é importante em termos de qualidade de vida pedagógico, o planejamento assume papel fundamental no para os seus habitantes e quais características físicas, sentido de garantir com que os objetivos propostos sejam sociais e econômicas consideradas essenciais para atingidos e que os resultados almejados contemplem preservar, proteger, ou melhorar a desejada qualidade de aspectos não apenas econômicos, mas também, sociais, vida. ambientais e culturais, favorecendo a melhoria da 3) desenvolver uma visão: Compreende criar qualidade de vida da comunidade, bem como, as relações uma imagem de como a comunidade deveria procurar estabelecidas entre escola e sociedade e o resgate da sentir, e ser, no presente e no futuro. cultura rural. 4) identificar preocupações e oportunidades Nesse sentido, com o propósito de críticas: Listar as preocupações e oportunidades que os averiguar a importância do processo de planejamento no membros das organizações de turismo podem estar desenvolvimento do turismo rural pedagógico e a enfrentando. Este passo possibilita o grupo ver o quadro e viabilidade das ideias expressas tanto por Nuckolls e o contexto amplo dentro do qual o desenvolvimento do Long (2009) quanto por Caffarelli et al. (2010), turismo existe apresentamos a seguir a experiência do projeto 'Viva 5) formular uma missão: Nesta etapa, define-se Ciranda', desenvolvida no município de Joinville, SC, as missão do grupo que, junto com os valores, visão, discutindo questões desde a elaboração da proposta inicial preocupações e oportunidades ajudam a guiar o esforço de até a efetivação do projeto e os resultados decorrentes desenvolvimento do turismo. Tal aspecto é importante dessas ações. para reconhecer não somente o visitante, mas também as necessidades da comunidade durante a atividade turística. 4 METODOLOGIA 6) desenvolver metas: Refere-se à elaboração de metas relativas a estrutura e administração da O estudo apresentado compreende um recorte da organização, educação e envolvimento da comunidade pesquisa científica realizada em nível de mestrado, sendo nos esforços de desenvolvimento do turismo e ainda, esta de caráter descritivo e uma abordagem qualitativa. O metas voltadas para o desenvolvimento físico e/ou universo empírico da referida pesquisa envolveu duas melhoria dos os recursos do turismo, serviços de viagem e experiências localizadas no sul do Brasil: o projeto Viva infra-estrutura. Ciranda, desenvolvido no município de Joinville/SC e o 7) desenvolver objetivos: Nesta fase, objetivos Roteiro Caminhos Rurais de Porto Alegre, no Rio Grande são definidos como estabelecimento de ações orientadas do Sul. Para além dos objetivos propostos, a pesquisa que propõe, em termos gerais, como realizar as metas.O também evidenciou outros aspectos importantes

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envolvendo a prática do turismo rural pedagógico. Dentre conhecimento aprofundado das áreas rurais do município eles, está a forma como cada experiência, em especial, o de Joinville, foi diretamente às propriedades que projeto desenvolvido em Santa Catarina, vem sendo apresentavam potenciais ou que já tinham alguma planejada e desenvolvida e a relação dessas ações com os experiência de turismo rural pedagógico que não resultados alcançados. precisariam de investimentos suntuosos e cujos Nesse sentido, para realizar uma análise coerente proprietários tivessem interesse em inserir-se no projeto. e relevante acerca do processo de planejamento e gestão Nesse sentido, visando elaborar um roteiro que não do turismo no projeto ‘Viva Ciranda’, utilizou-se como suscitasse competitividade, e no qual cada um tivesse seu procedimentos metodológicos a pesquisa bibliográfica foco, mapearam-se tais propriedades, buscando elencar sobre o tema em questão, bem como, a os resultados da diferentes atividades. observação sistemática não participante envolvendo as A segunda etapa compreendeu a realização do atividades propostas em cada propriedade e das diagnóstico das propriedades, objetivando conhecer as entrevistas semiestruturadas4, realizadas com os cinco características físicas e estruturais das mesmas e o perfil proprietários rurais, donos dos empreendimentos que dos proprietários. Pretendeu-se ainda, apresentar e integram o projeto Viva Ciranda e também, com 14 explicar o projeto para estas famílias, buscando despertar professoras, responsáveis pelas turmas de alunos que o interesse e motivá-las a participar de um teste-piloto. visitaram estas propriedades entre os meses de setembro a Algumas aceitaram o desafio, outras por não novembro de 2011. apresentarem uma estrutura segura e adequada no Com o intuito de conhecer com maior momento, acabaram sendo suprimidas e permanecendo profundidade aspectos relacionados ao projeto/roteiro e para uma inserção em longo prazo, com a ampliação do que não puderam ser contemplados nas pesquisas projeto. Assim, a partir desse grupo de interessados e com bibliográfica e documental, utilizou-se ainda, informações potencial e estruturas adequadas, formou-se um roteiro obtidas a partir das entrevistas não estruturadas realizadas com seis propriedades, divididas em temas-chave: água e com dois técnicos responsáveis pela elaboração e meio ambiente, flores, pequenos animais, cavalos, desenvolvimento do ‘projeto e com a pedagoga produção de mel e melado. responsável. Na terceira etapa, uma pedagoga foi contratada para assessorar os proprietários. Para isso, a profissional 5 O PROJETO VIVA CIRANDA visitou as propriedades, conversou com os agricultores e, a partir dos recursos identificados em cada uma delas, Oficialmente inaugurado em março de 2011, o preparou entre duas e três atividades para serem projeto 'Viva Ciranda' compreende uma proposta de desenvolvidas nesses locais. Feito isso, conseguiu-se turismo pedagógico que está sendo desenvolvido no então estabelecer uma parceria com a Secretaria da município de Joinville, situado na região nordeste do Educação do município, que disponibilizou um ônibus e Estado de Santa Catarina, ao sul do Brasil. O projeto selecionou uma escola para a realização do teste-piloto no começou a ser idealizado ainda em 2010 por uma equipe segundo semestre de 2010. de profissionais da Fundação de Promoção e Com esse teste, foram geradas fotos e materiais Planejamento Turístico de Joinville - PROMOTUR que, para a elaboração de uma cartilha, visando a elaboração percebendo o cenário favorável existente na região, não de uma proposta maior, a qual foi apresentada ao somente em relação aos atrativos naturais e culturais, mas, Ministério do Turismo em Brasília, mais precisamente em sobretudo, pelo público potencial presente5 decidiu dezembro de 2010, e cuja aprovação ocorreu no mesmo investir e elaborar uma proposta envolvendo propriedades mês. O referido órgão governamental disponibilizou 168 rurais e escolas. mil reais para a execução do projeto, o que permitiu A primeira etapa da proposta consistiu na seleção subsidiar 55 visitas as propriedades, bem como a das propriedades. Como a referida equipe já possuía um confecção do material de divulgação e o oferecimento de treinamentos. Os cursos de capacitação foram

estruturados em quatro oficinas: uma direcionada para a 4 Para a pesquisa de mestrado, as entrevistas foram aplicadas a 11 proprietários rurais, donos dos empreendimentos que oferecem organização da propriedade, duas com enfoque nos atividades educativas para grupos escolares, sendo 5 do projeto Viva recursos naturais e meio ambiente e a última direcionada Ciranda e 6 que fazem parte do Roteiro Caminhos Rurais de Porto às atividades lúdicas e pedagógicas a serem desenvolvidas Alegre. Também foram entrevistadas 22 professoras, responsáveis pelas na propriedade. turmas de alunos que visitaram estas propriedades entre os meses de setembro a novembro de 2011, sendo 14 de Joinville e 8 de Porto Nas capacitações propostas, foram realizadas Alegre. ainda duas visitas técnicas, sendo uma para a cidade de 5 De acordo com os dados do Censo Escolar de 2011, o município de Urubici, localizada na Serra Catarinense, onde o grupo Joinville possui 20.357 crianças matriculadas na Educação Infantil, teve a oportunidade de conhecer um conjunto de sendo 10.908 em escolas municipais e 9.449 em escolas particulares. No ensino fundamental da 1 ª a 4ª série, existem 36.844 alunos propriedades de turismo rural, estruturadas e organizadas matriculados (7.279 em escolas estaduais, 25.068 em escolas municipais de forma adequada. A segunda visita técnica e 4.497 em escolas particulares). Já nas séries finais do ensino compreendeu uma viagem para a França com o objetivo fundamental, da 5ª a 8ª série, há 32.024 alunos matriculados (7.649 em de fazer que os agricultores tivessem uma vivência fora escolas estaduais, 20.611 em escolas municipais e 3.794 em escolas particulares) (INEP, 2011). do seu ambiente habitual, buscando com isso motivá-los

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e, também, apresentar experiências bem sucedidas de Outra questão que favoreceu o desenvolvimento turismo rural pedagógico. Assim, dos seis proprietários, do projeto e assegurou a qualidade da proposta refere-se três foram contemplados com a viagem (senhor Acácio, às iniciativas desenvolvidas pela PROMOTUR com o senhor Ango e Dona Ilse), em virtude de serem os únicos intuito de integrar diferentes esferas sociais do município. que possuíam a Declaração de Aptidão ao PRONAF6, Uma dessas iniciativas compreende a parceria uma das exigências do Ministério do Turismo para ser estabelecida com o curso de Pedagogia da Universidade contemplado. da Região de Joinville- UNIVILLE, envolvendo as alunas Todas as atividades desenvolvidas passaram a ser da disciplina de “Estágio Curricular em Espaços acompanhadas por uma pedagoga efetiva, que foi cedida Escolares e Não Escolares”. A proposta compreende a pela Secretaria da Educação para trabalhar realização de observações nas propriedades rurais exclusivamente no projeto. Suas funções envolvem: inseridas no Projeto Viva Ciranda, com a elaboração de 1) Auxiliar na realização do diagnóstico das relatórios das visitações, contempladas ao final com propriedades rurais, analisando as possibilidades de sugestões de atividades pedagógicas para os locais atividades pedagógicas que poderiam ser desenvolvidas visitados. no local durante a visitação dos grupos de escolares; A segunda iniciativa da PROMOTUR refere-se à 2) Orientar e motivar a equipe de docentes das realização de um curso de formação para condutores escolas, assumindo o papel de mediadora entre as escolas locais sobre o turismo rural, em parceria com o Ministério e os proprietários rurais, oportunizando aos professores e do Desenvolvimento Agrário (MDA) e a Fundação 25 de aos agricultores, orientações didáticas e pedagógicas; Julho, voltado para jovens, mais precisamente filhos de 3) acompanhar as visitas nas propriedades, dando agricultores residentes nas comunidades rurais de suporte às ações do professor e do proprietário, vindo a Joinville. Ressalte-se que o projeto iniciou em junho de complementar as explicações apresentadas aos alunos 2011, com carga horária de 80 horas e teve como objetivo com o intuito de enriquecer o aprendizado dos mesmos; capacitar 20 jovens para atuar no setor do turismo rural do 4) elaborar atividades pedagógicas para os município, buscando, além disso, estimular os mesmos a proprietários rurais aplicarem com os grupos de alunos permanecerem no campo, favorecendo-lhes uma fonte de visitantes; renda complementar e maiores oportunidades para sua 5) visitar as escolas e acompanhar o inserção no mercado de trabalho. Cita-se ainda, a desenvolvimento das atividades concernentes aos temas realização do Seminário de Turismo Pedagógico de Base abordados durante as visitas; Comunitária, ação que fazia parte da proposta aprovada 6) divulgar as ações do Projeto junto às demais pelo Ministério do Turismo em dezembro de 2010 e que escolas, sejam elas municipais, estaduais ou privadas; foi realizado no mês de outubro de 2011. 7) Elaborar relatório das visitas, visando detectar No ano em que a pesquisa foi realizada, faziam os pontos positivos e negativos, buscando aprimorar os parte do projeto seis propriedades rurais, que apresentam aspectos e pontos necessários para o bom andamento do características distintas em termos de infraestrutura projeto. (extensão, espaços identificados e recursos naturais e 8) participar de cursos de capacitação voltados culturais presentes), tipos de atividades produtivas para área rural (condutor rural, educação ambiental, desenvolvidas e roteiros pedagógicos desenvolvidos com dinâmicas de grupo) objetivando ampliar e aprofundar os os alunos. As metodologias adotadas pelos proprietários conhecimentos acerca de tais temas na realização das atividades também se mostrou variável, 8) Conhecer e visitar propriedades rurais, que evidenciando características distintas, relacionadas ao dispõe de atendimento pedagógico, em outras cidades e perfil do proprietário. estados, em busca de troca de idéias e experiências. No quadro 2, apresentamos uma breve descrição Referente às visitas subsidiadas, 48 contemplava de cada propriedade, destacando a temática abordada e as as seis propriedades do projeto e sete seriam realizadas atividades propostas. nas “novas” propriedades que serão inseridas na proposta O sucesso obtido em 2011 possibilitou a no ano de 2012. Para tal, foram selecionadas quatro ampliação do projeto que, em 2012 passou a contar com escolas municipais7 localizadas em regiões com menor mais 7 empreendimentos enfocando diferentes temáticas: IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do município Racho Alegre, enfocando o contato com pequenos de Joinville. Cada escola foi contemplada com doze animais; aves exóticas, pomar e horta; Recanto das visitas, que foram realizadas durante o ano de 2011 nas Arrozoeiras, com plantação de arroz, o processo de seis propriedades inseridas no projeto, com turmas do 1º plantação dos grãos e equipamentos agrícolas antigos; ao 5º ano do ensino fundamental. Família Roos, voltada para a produção de pães e geleias e o processo de panificação; Sítio da Vó Bi, com a realização de :atividades ao ar livre, em contato com a 6 Instrumento que identifica os agricultores aptos a realizarem operações natureza; Recanto dos Araribás, com ênfase nas ervas de crédito rural ao amparo do Programa Nacional de Fortalecimento da aromáticas e fitoterápicas; Anturioville/ Holz: cujo foco Agricultura Familiar – Pronaf. são as estufas de antúrio; e Família Jacobi, que dedica-se, 7 Escola Municipal Nilson Bender, Escola Municipal Professor Sylvio sobretudo, à produção de flores e plantas ornamentais. Sniecikovski, Escola Municipal Nelson de Miranda Coutinho e Escola Municipal Hans Dieter.

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A ampliação do projeto com novas propriedades, Ciranda e os resultados decorrentes da prática do turismo o crescimento da demanda, a elaboração de novas rural pedagógico no contexto escolar. A proposta também atividades, a melhoria dos espaços educativos em cada despertou o interesse do meio acadêmico e científico, propriedade compreendem alguns dos muitos elementos tornando-se foco de estudo de diferentes áreas e setores. que evidenciam o sucesso do projeto Viva Ciranda.

Quadro 2: propriedades rurais do projeto Viva Ciranda no 5 A EFICIÊNCIA DO PLANEJAMENTO NO ano de 2011. PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DO Propriedade Temática abordada Atividades educativas PROJETO VIVA CIRANDA propostas Agrícola da - Cultivo de flores e 1) Visitação ao jardim dos De acordo com o estudo realizado, o Projeto Ilha plantas ornamentais Hemerocallis. Viva Ciranda compreende uma iniciativa criada com o (hemerocallis). 2) Visitação ao jardim dos sentidos (pedra sussurrante. intuito de fomentar o turismo rural de base comunitária, labirinto dos sons, pedra das tendo como carro-chefe o turismo rural pedagógico. A cores, pedra d’água). proposta envolve diferentes entidades, desde a Secretaria 3) Lago dos peixes Municipal do Turismo e Secretaria da Educação até ornamentais. 4) Trilha ecológica. proprietários rurais, escolas e estudantes do curso de pedagogia da Universidade de Joinville (UNIVILLE). Propriedade - Produção 1) Visitação à horta orgânica; Os resultados evidenciam que a questão do da Família agroecológica de ao pomar e jardim. Schroeder hortifrutigranjeiros. 2) Atividades de interação planejamento figurou como um dos pilares do projeto, - Criação de pequenos com pequenos animais. podendo ser identificado não apenas nos objetivos animais. segurar os coelhos, patinhos e estabelecidos pela equipe responsável, mas também, nas pintinhos; alimentar o porco, etapas a serem cumpridas, na orientação aos proprietários, as galinhas, o cabritinho; tirar leite da cabra. no monitoramento das atividades realizadas, na presença de uma pedagoga para auxiliar no processo, na realização Sítio Vale das - Educação ambiental. 1) Atividade lúdica: de cursos de capacitação e encontros para discutir os Nascentes - Ciclo da água. identificação dos sons de diferentes pássaros pontos a serem melhorados e na avaliação das atividades. produzidos por apitos. Esta articulação impulsionou o projeto, na medida em que 2) Visita à casa de pedra. envolveu ações planejadas e a participação de pessoas de 3) Observação dos animais ali diferentes esferas, motivando-as a participar, o que pode existentes; oportunidade de alimentar as aves domésticas e ser observado tanto nas entrevistas com os proprietários peixes. rurais, como também, com os professores. Ambos 4) Visita às nascentes. evidenciaram um desejo expressivo de dar continuidade Propriedade - Produção de cana- 1) Passeio de trator pela ao projeto, de envolver as crianças, as comunidades, do Senhor de-açúcar e melado. propriedade. ressaltando a importância do papel desempenhado pelas Ango Kersten - Museu rural. 2) Observação do sistema de Secretarias nesse processo que desde o início, vem sendo tratamento de água feito com raízes de junco. considerado bem sucedido. 3) Visitação ao museu rural. Para além desses aspectos, o planejamento 4) Visita aos pequenos presente de modo contínuo no Projeto Viva Ciranda animais e aves que vivem na influenciou outros elementos considerados essenciais para propriedade. o desenvolvimento de uma proposta voltada para a prática Apiário - Produção de mel. 1) Apresentação do mundo do turismo rural pedagógico. O primeiro deles está PFAU - Mundo das abelhas. das abelhas. associado à infraestrutura das propriedades e ao adequado 2) Atividades de identificação das colméias e das abelhas. aproveitamento dos espaços existentes. Das seis 3) Caminhada até o Rio da propriedades analisadas em Joinville, apenas uma delas Prata. evidenciou necessidade de melhorias e ampliação em CTG - Criação de cavalos. 1) Apresentação do cavalo relação aos espaços para recepção dos grupos escolar. As Chaparrral crioulo, suas características, demais apresentavam um quadro diferenciado de espaços hábitos e comportamentos. educativos e instalações consideradas adequadas para a 2) Atividade de laço e montaria. recepção e desenvolvimento de atividades com grupos 3) Passeio de charrete pela escolares. propriedade. As entrevistas realizadas com os professores que Org.: KLEIN, A. L., 2012. estiveram visitando as propriedades juntamente com seus Fonte: pesquisa de campo (2011). alunos fortaleceram essa constatação. Quando questionados a respeito das adequações necessárias nos A repercussão emergiu em nível nacional, espaços existentes nas propriedades, praticamente todos sobretudo, por meio da imprensa local e dos meios os entrevistados consideraram os locais visitados midiáticos, que têm divulgado o sucesso do projeto Viva

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adequados e seguros para as crianças, não necessitando de planejamento, quando desenvolvido na prática, deve levar grandes modificações na parte da infraestrutura. em conta as peculiaridades locais, as características O segundo elemento compreende o conjunto de culturais, naturais e sociais da realidade estudada, atividades educativas propostas em cada propriedade. Os tornando-se flexível e modificável nesta transposição. roteiros desenvolvidos contemplam atividades cujos A proposta de planejamento adotada no projeto objetivos enfocam desde a questão da alimentação Viva Ciranda, evidencia um conjunto de elementos que saudável e produção agroecológica até o resgate da destacam a importância dessa estratégia para o sucesso da cultura rural e contato direto com animais e plantas. atividade turística, envolvendo elementos destacados Percebe-se, através da postura e desenvoltura dos pelos modelos teóricos apresentados e outros, que proprietários durante a realização das atividades com as emergiram a partir das características locais. Por meio crianças que os mesmos tiveram a orientação e formação dessas ações planejadas e orientadas pela equipe da adequadas para desenvolver uma proposta educativa PROMOTUR, em parceria com outros setores, a exemplo coerente. Tal característica também foi evidenciada pelos da secretaria da educação do município de Joinville, o professores entrevistados que declararam estar surpresos turismo rural pedagógico tornou-se uma prática frente ao preparo dos proprietários, atribuindo esse economicamente rentável para os proprietários rurais, aspecto às orientações constantes dos responsáveis pelo uma estratégia metodológica de grande eficácia para os projeto. professores do ensino fundamental e uma experiência Ao analisarmos este último elemento, descamos diferenciada e rica para os estudantes que visitaram as o papel desempenhado pela pedagoga do projeto Viva propriedades. Do mesmo modo, verificamos uma Ciranda. A atuação constante de um profissional da área melhoria nas ações voltadas para as questões ambientais. da educação junto aos proprietários inseridos na proposta As preocupações com a qualidade do solo, da água e dos permitiu não apenas a qualidade das atividades educativas alimentos puderam ser identificadas em vários momentos propostas, mas também, a utilização adequada dos nas falas dos proprietários durante as entrevistas e nas recursos naturais e culturais existentes em cada atividades desenvolvidas com os grupos escolares. empreendimento e o estabelecimeno de uma relação de Em face disso, destaca-se dentro do proximidade entre os professores e alunos e os planejamento, a importância da realização de cursos de proprietários rurais. A partir desse envolvimento capacitações para os proprietários rurais, voltados para a permanente da pedagoga, os proprietários passaram a prática do turismo rural pedagógico e de orientações no demonstrar maior segurança em relação aos desenvolvimento das atividades propostas. conhecimentos e informações apresentadas aos alunos e Respectivamente, reforça-se a necessidade do ao modo de agir com cada grupo, considerando a faixa estabelecimento de parcerias com o poder público e etária/ano escolar. Tais questões foram ressaltadas tanto privado, envolvendo escolas particulares e públicas em pelos professores quanto pelos próprios proprietários âmbito local e regional e, por conseguinte, a durante as entrevistas, evidenciando assim, a importância implementação de leis que regulamentem e supervisionem desse profissional no desenvolvimento de um projeto de as atividades educativas propostas nas propriedades turismo rural pedagógico, sobretudo, a pedagoga do rurais. projeto. Cabe ressaltar que, embora o projeto Viva 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ciranda tenha atingido resultados bastante positivos, as fases identificadas no seu desenvolvimento seguem uma O Projeto Viva Ciranda compreende uma seqüência um pouco distinta das propostas teóricas de proposta inovadora de turismo rural pedagógico, um Nuckolls e Long (2009). De acordo com a análise exemplo concreto de que a atividade turística, quando realizada, os responsáveis pelo projeto Viva Ciranda, por bem planejada e articulada, pode gerar ganhos para a já conhecerem as potencialidades das propriedades locais, comunidade envolvida, em termos sociais, econômicos, acabaram suprimindo aspectos que, na análise dos culturais e ambientais. Desde o primeiro momento, as referidos autores, são considerados fatores de suma ações propostas foram pensadas e estruturadas, sendo importância para o desenvolvimento do projeto. Tal desenvolvidas em etapas. aspecto também é observado na proposta apresentada por A participação da secretaria da Educação, a Caffarelli et al. (2010). As etapas na experiência de presença de uma pedagoga para orientar as atividades Joinville não contemplam uma ordem, tal como foi desenvolvidas em cada propriedade, as parcerias com as proposta pelos autores, apesar de, em vários momentos escolas do município, as capacitações promovidas no apresentar pontos em comum com a análise teórica sentido de melhorar o atendimento aos grupos, a abordada. elaboração do projeto inicial enviado para o Ministério do Nesse sentido, observa-se que as teorias sobre Turismo e posteriormente aprovado, o interesse e planejamento do turismo apresentam propostas motivação dos proprietários, todos estes elementos, de um interessantes e bem elaboradas, com aspectos que modo ou de outro, estão articulados a um modelo de favorecem o sucesso do projeto proposto e, planejamento participativo, voltado para o conseqüentemente, o desenvolvimento local. Contudo, desenvolvimento local. como bem argumenta Pedron (2007), o modelo de

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Não há como afirmar que a ausência de um f. Dissertação (Mestrado em Engenharia do Ambiente) – desses elementos interferiria no sucesso decorrente do Departamento de Ambiente e Ordenamento, Universidade projeto, contudo, é evidente a importância do de Aveiro, Aveiro, 2010. Disponível em: planejamento no turismo rural pedagógico. A partir de . ações projetadas, torna-se possível conjeturar obstáculos e Acesso em: 15 mar. 2012 elaborar estratégias para superá-los ou ainda, reestruturar os objetivos propostos e prever novas metas. COSTA, H. Análise das relações de rede e do perfil da No caso do projeto Viva Ciranda, a ação competitividade turística: estudo comparativo entre planejada favoreceu também um melhor aproveitamento São Francisco do Sul e Laguna-SC. Dissertação de dos espaços existentes nas propriedades, a elaboração de mestrado, Balneário Camboriú, 2005. roteiros pedagógicos coerentes com os conteúdos desenvolvidos em sala de aula, a estruturação de D’AGOSTINHO, L. Il profilo e le caratteristiche di una atividades educativas voltadas para diferentes faixas Fattoria Didattica. In: La rete delle Aziende e delle etárias e a valorização, por parte dos proprietários, de seus Fattorie Didattiche in Sicilia. La documentazione conhecimentos práticos, os quais passam a figurar como dell’esperienza, Regione Sicilia/Arpa, v. 2, 2008. principais elementos durante as visitações com grupos Disponível em: escolares. Acesso em: 30 jul. 2011. configurou-se como um suporte orientador no projeto Viva Ciranda, sendo este de caráter permanente e DIAS, R. Planejamento do turismo: política e abrangente, favorecendo benefícios sociais, ambientais e desenvolvimento do turismo no Brasil. São Paulo: Atlas, econômicos para a comunidade local, sobretudo, para os 2003. proprietários envolvidos na proposta e ainda, além de contribuir positivamente para os estudantes que visitaram ELESBÃO. I. Impactos socioeconômicos do turismo no as propriedades, em termos sociais e educativos. Assim, espaço rural. In: SANTOS, E.O; SOUZA, M. (Orgs.). embora nem todos os aspectos contemplados nas teorias Teoria e prática no turismo no espaço rural. Barureri, dos modelos de planejamento puderam ser identificados SP: Manole, 2010. nas etapas de planejamento desenvolvidas na experiência catarinense, concluímos que o modelo proposto mostrou- GURRIERI C. Scuola in Fattoria: dal produttore al se eficaz e bem articulado, evidenciando questões que consumatore verso un consumo consapevole. In: La rete expressam a importância desse elemento em toda e delle Aziende e delle Fattorie Didattiche in Sicilia. La qualquer atividade turística. documentazione dell’esperienza, Regione Sicilia/Arpa, v. 2, 2008. Disponível em: . Acesso em: 24 jul. 2011.

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APORTE DAS ESTRATÉGIAS MERCADOLÓGICAS NA PROMOÇÃO DE EVENTOS EM ORGANIZAÇÕES PREMIADAS COM O PRÊMIO CAIO

FÁBIO LUCIANO VIOLIN CAROLINE CRISTINA VAZ JOSÉ FLÁVIO ROSA JUNIOR

Universidade Estadual Paulista - Unesp Campus de Rosana [email protected]

RESUMO - O presente trabalho traz a conceituação e os elementos do composto de marketing ligados e sua contribuição e importância nas organizações turísticas vinculadas a eventos. Foram pesquisadas 25 empresas através de questionários fechados aplicados em empresas vencedoras de uma premiação apontada como referência. Os principais pontos levantados relacionam a vinculação direta das estratégias mercadológicas aos resultados das organizações e o apontamento que apesar de serem do mesmo ramo de atividade cada empresa enfrenta em seu setor específicos desafios peculiares que influenciam o peso e o direcionamento das ações.

Palavras Chaves: Marketing, Composto de Marketing, empresas de eventos.

ABSTRACT - This paper presents the concepts and elements of the marketing mix and linked their contribution and importance in organizations linked to tourist events. Twenty-five companies were surveyed through questionnaires applied in closed companies winning a prize indicated as reference. The main points raised relate to the direct link to the results of marketing strategies and the organizations note that despite being in the same branch of activity each company in your industry faces unique challenges that influence specific weight and directing actions.

Key-words: Marketing, Marketing Mix, event companies.

1 INTRODUÇÃO permanência efetiva e real cuja função maior é a de servir a seus objetivos aliados a sua contribuição para com a Em um mundo cada vez mais competitivo em que sociedade e a economia de um país, região ou local elementos como a tecnologia, comportamento do específico. A perpetuação de uma organização é tarefa consumidor, leis e regulamentações, fatores ambientais e básica que cabe ao espírito empreendedor e atingir tal alterações socioeconômicas e educacionais alteram-se a intento é o teste definitivo da capacidade de administração uma velocidade e intensidade impar surge a emergência de de seus gestores (DRUCKER, 2002). análise pormenorizada dos fatores que auxiliam ou Os elementos ligados ao composto de Marketing - dificultam o alcance dos objetivos organizacionais, produto, preço, promoção (comunicação) e praça especialmente no setor turístico pela natureza de suas (logística) - se apresentam como parâmetros interessantes ofertas ao mercado. no auxílio da execução do processo de planejamento de Este contexto de competitividade aliada a mudanças ações necessárias para a efetiva aliança entre os esforços estruturais rápidas e constantes faz emergir nas de uma organização e os resultados obtidos no mercado organizações a necessidade de se atingir objetivos de curto (YUDELSON, 1999). (metas), médio e longo prazo e para tanto se torna vital a Torna-se vital levantar para a área de turismo os montagem de estratégias refinadas para a prospecção, elementos considerados relevantes no que tange a captação e manutenção de uma carteira de clientes (turistas sobrevivência, crescimento e perpetuação das atividades ou usuários) que permita a obtenção de resultados empresariais através das práticas consideradas essenciais almejados dentro de um determinado período. no contexto atual. A tarefa de obter e manter resultados positivos traz Como atividade econômica as empresas ligadas de em seu cerne a dificuldade de resultados permanentes visto forma direta ou indireta ao turismo têm enfrentado cenários que as organizações são criações humanas desprovidas de cada dia mais turbulentos, competitivos e com ganhos

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consideráveis em termos de profissionalização do setor. interesse e sendo assim pode ser considerado um produto Dentro desse contexto e especialmente considerando que qualquer oferta que venha ao encontro de uma necessidade todas as organizações necessitam obter resultados ou desejo e que permita troca. satisfatórios, a função do marketing estratégico passa a Tanto o crescimento quanto a sobrevivência das auxiliar as organizações na identificação dos usuários ou organizações estão diretamente atrelados as suas ações de turistas potenciais, interpretar suas necessidades e desejos busca, atendimento e manutenção de clientes através da além de permitir a correta segmentação e posicionamento criação de algum tipo de vantagem competitiva dentro do frente ao público-alvo desejado. ambiente em que operam através da oferta de produtos, A Organização Mundial do Turismo (OMT) serviços, imagem, lugares, informações ou mesmo idéias estimou que o crescimento anual do setor turístico é de (DICKSON, FARRIS E VERBEKE, 2001). aproximadamente 6% no Brasil o qual resulta em uma nova Para Mintzerber e Quinn (2001) elaborar, tendência global, aonde o turista não mais deseja ser um contextualizar e operacionalizar estratégias parte do simples expectador de sua viagem, mas sim, o pressuposto do atendimento das necessidades que uma protagonista, que efetivamente vivencia a cultura e a empresa tem no gerenciamento de suas ações considerando experiência nos novos destinos visitados (OMT, 2001). determinado(s) ponto(s) ou objetivo(s) a ser (em) No Brasil, o IDESTUR (2010) – Instituto de atingido(s) ao longo de um período de tempo. Pesquisa do Turismo Rural observou um percentual muito Oliveira et.al. (2011) discorrem a respeito da maior de crescimento, tanto no número de necessidade das organizações se apresentarem de forma empreendimentos quanto ao de consumidores, e também competitiva em razão da pressão de diversos fatores tanto prevê um grande número de produtos ofertados aos internos quanto externos o que por conseqüência gera turistas. visibilidade para os instrumentos e técnicas de gestão Considerando a dificuldade de estabelecer relações empresarial destacando a importância de sua utilização de claras e racionais entre uma necessidade humana e os forma contundente. Ainda segundo os autores: benefícios almejados por um usuário dos serviços ou “setores econômicos que estão em franco produtos do turismo o composto de marketing surge como desenvolvimento, como é o caso do turismo, muitas vezes elemento básico na interpretação, montagem de propostas, perdem o timing correto acerca dessa prática, justamente inserção de estímulos e crucialmente com capacidade – se em virtude de as preocupações voltarem-se ao atendimento bem realizado - de influenciar fluxos de demanda reais ou da demanda e à resolução de problemas internos das potenciais. organizações, desconsiderando, ao menos em parte, a busca pela eficácia dos processos e a definição de uma 2. Considerações sobre Marketing estratégia competitiva clara e que permita o As ações de Marketing visam fundamentalmente a desenvolvimento e a sustentação de vantagens no longo geração de elementos que de forma específica se propõem prazo.” (OLIVEIRA et al. 2011) a gerar satisfação na relação entre uma organização e seus À medida que os níveis competitivos aumentam clientes, sejam reais ou potenciais. Kotler e Keller (2006) as organizações turísticas rurais necessitam adequar-se as especificam que Marketing é “(...) um processo social por exigências do mercado ou como agente ativa – propulsora meio dos quais pessoas e grupos de pessoas obtêm aquilo das mudanças - ou como agente passiva – reagindo as de que necessitam e o que desejam com a criação, oferta e mudanças na busca por crescimento ou pelo menos livre negociação de produtos e serviços de valor (...)”. sobrevivência. A ausência de ações consolidadas pode Marketing é apontado pela literatura como sendo comprometer no longo prazo a atração e manutenção de capaz de agregar valor a produtos e serviços com foco na clientes reais e potenciais (COBRA, 2005). atração, estímulo e gestão da demanda tendo como base a Nesse cenário de busca por adequação as ações identificação de necessidades e desejos dos clientes ou ligadas ao Marketing são fundamentais para a adequação consumidores dentro de um ou mais segmentos de ou análise de re-adequação de ações dentro do contexto mercado. (TAVARES, 2000; COBRA, 2005; KOTLER e competitivo e de busca por participação de mercado em um KELLER, 2006). mercado em franco crescimento, contudo com sérios O Marketing na concepção de Kotler (2000) é a gargalos a serem resolvidos. atividade humana direcionada a satisfação das necessidades e desejos realizável através dos processos de 2.1. Composto de Marketing troca. De forma simples as necessidades são comuns a todos os seres humanos tais como respirar, ter sede, fome, O conceito inicial a respeito do Composto de precisar de abrigo, higiene pessoal entre outros pontos. Já Marketing foi introduzido por Neil Borden em 1953 tendo os desejos representam algo específico para saciar uma como base o trabalho de James Culliton que havia necessidade humana. Ter fome é uma necessidade, realizado a descrição do executivo de negócios como um consumir algum tipo específico de alimento é um desejo. profissional que realizava a combinação de “diferentes As organizações rurais – assim como as demais - ingredientes”. A partir de então, a expressão Marketing ofertam produtos (bens físicos, serviços, idéias, lugares, Mix ou Composto de Marketing passou a ter a conotação pessoas ou informações) para atender as demandas de “Mistura” ou mesmo “Composição” de ingredientes específicas de segmentos ou nichos de mercado de seu com a finalidade de se obter respostas vinculadas ao

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mercado de atuação das empresas (CHURCHILL e 3. Setor Turístico PETER, 2000). Os conceitos então associados ao Composto de O setor de turismo no país tem caminhado a Marketing foram explicados por diversos autores através passos largos nos últimos anos tanto em ações como em de uma lista de variáveis ou ferramentas e suas atividades materiais que proporcionam conhecimento e ampliação inerentes. O conceito ganhou estrutura e popularização dos conceitos ligados a área. Uma afinada concepção é através dos estudos de McCarthy na década de 60. O autor apresentada por Melgar (2001) ao discorrer que Turismo: defendeu que o Composto de Marketing compreende as “(...) é o conjunto de atividades realizadas por uma decisões que uma organização precisa realizar a respeito pessoa em um lugar diferente daquele onde possui sua destas variáveis controláveis. A idéia de que as variáveis residência habitual, quando motivado por razões surgidas eram controláveis baseava-se no pressuposto que os livremente e quando não sejam exercidas ações elementos vinculados ao composto de Marketing eram profissionais remuneradas diretamente por setores elementos vitais para as tomadas de decisão nas econômicos do lugar visitado” organizações (BOONE e KURTZ, 2001). Segundo Beni (2003) a atividade turística dentro de McCarthy (1960) então reuniu tais variáveis uma perspectiva empresarial e econômica foi conceituada controláveis de Marketing e as categorizou em quatro pela primeira vez em 1910 por Herman von Schullern na partes: Produto, Preço, Promoção (Comunicação) e Praça qual o turismo era “(...) a soma das operações, (Logística). KOTLER (2000) defende que o especialmente as de natureza econômica, diretamente Composto de Marketing forma um dos alicerces relacionadas com a entrada, permanência e deslocamento fundamentais na atualidade e o defini como um conjunto de estrangeiros para dentro e para fora de um país, cidade de ferramentas mercadológicas que uma organização se ou região”. vale para perseguir seus objetivos de Marketing dentro do A visão talvez fosse adequada para a época, mercado-alvo de interesse. O autor ainda defende a ideia contudo, o formato que se prega no que concerne ao de que o composto traz em si o conceito de um conjunto turismo é que o mesmo aparenta estar em constante estado organizado de instrumentos que dão suporte ou parâmetro de transformação e que apresenta-se como uma atividade para que as decisões sejam tomadas de forma coerente e complexa e com fortes relações de interdependência e eficaz. subordinações às condições de mercado e também aos SHETH (1998) aponta que o Composto de elementos internos de funcionamento (SWARBROOKE e Marketing conforme foi concebido por McCarthy advém HORNER, 2002). da corrente de pensamento em Marketing intitulada Escola Com o advento das alterações mundiais sofridas nos Funcional a qual direcionava sua atenção e esforço a diversos setores da economia entre eles o setor de Turismo funcionalidade das atividades ligadas ao mercado. juntamente com as artes, o esporte, a cultura aliados a A literatura especializada tem apontado através de importância cada vez maior dada pelas pessoas no que diz estudos e casos que existe um grande risco associado ao se respeito a qualidade de vida trazem a noção de que a abordar cada função do composto de Marketing de forma atividade turística a cada ano ganha mais espaço na mídia, isolada. Segundo diversos autores existe uma relação de nos meios sociais e não relações de consumo de forma interdependência dinâmica associada aos elementos e que ativa, mutável e multifacetada (ENGEL et. al, 2000; decisões isoladas podem ao invés de beneficiar uma LICKORISH e JENKINS, 2002). organização vir a comprometer seus resultados pela O setor de turismo apresenta-se como um fenômeno ausência de aderência entre as ações e as necessidades e de ordem social além de potencialmente gerador de desejos dos clientes (Shapiro, 1988; Cook et. al., 1989; progresso tanto regional quanto nacional tanto nos campos Lambin, 2000; Kotler e Keller, 2006). sociais, culturais, políticos quanto nos campos econômicos Salienta-se que um programa de Marketing em e educacionais (BENI, 2003). organizações rurais consistente, integrado e com capacidade de alavancagem mesmo estando em 3.1 Turismo Rural consonância com os requisitos exigidos pelo mercado pode não ser suficiente para gerar os objetivos almejados pois, Dentre as diversas segmentações do turismo, dentro do processo existem as variáveis incontroláveis pela encontra-se o Turismo Rural. organização que podem afetar de forma direta ou indireta Endente-se por turismo rural, segundo a os resultados ( AAKER e JOACHIMSTHALER, 2000; EMBRATUR (1994) et al Marafon (2006,p.26) “[...] todas NASCIMENTO e LAUTERBORN, 2007). as atividades – alternativas, domésticas, agroturismo, Por fim, é preciso ressaltar que nem sempre os turismo – organizado para e pelos habitantes do país [...]” programas mercadológicos se ajustam de forma impar ao Mendonça et al (2002) et al Marafon, (2006, p.26 ) paradigma “produto, comunicação, logística e preço” e que ainda afirma “toda maneira turística de visitar e conhecer o portanto analisar de forma pormenorizada a contribuição ambiente rural, enquanto se resgata e valoriza a cultura de cada elemento dentro da realizada da organização rural regional” se torna ponto pacífico de atuação. Ainda, segundo o Ministério do Turismo em Amorim (2011, p.2), turismo rural caracteriza-se pelo “conjunto de atividades desenvolvidas no meio rural,

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comprometido com a produção agropecuária, agregando influenciam a forma de trabalhar das empresas e alteram valor a produtos e serviços, resgatando e promovendo o constantemente as “regras do jogo”. patrimônio cultural e natural da comunidade” A alta competitividade que envolve a grande Cada vez mais o homem vem buscando o campo, ou maioria dos setores inclusive o de turismo traz a a natureza como forma de lazer e de fuga das cidades consequente concorrência entre destinos, empresas, industrializadas, o qual pode ser observada considerando: conceitos, espaços e idéias. Neste sentido a busca por A revalorização do rural contida nas práticas de diferenciação das ofertas a serem apresentadas aos excursões ao campo, os veraneios e as atividades de lazer consumidores - que tem se tornado cada vez mais exigentes nele, bem como outras diversas formas de sua utilização e - é uma forma de obter participação de mercado e consumo, tem se fundado na grande expressão planetária manutenção de segmentos e nichos. (LOVELOCK e que tomou o ambientalismo nas últimas décadas. As WRIGHT, 2001). apelações de reencontro com a natureza, a harmonia, a A Embratur (1992) define o Marketing turístico qualidade de vida e o respeito como o meio-ambiente, que como sendo “um conjunto de técnicas estatísticas, se apresentam nos discursos ressignificadores do rural, têm econômicas, sociológicas e psicológicas, utilizada para evidenciado a crise da idé ia de progresso contínuo e sem estudar e conquistar o mercado, mediante lançamento limites que acalentou o projeto modernizador via planejado dos produtos”. industrialismo e urbanização dos últimos duzentos anos. O primeiro autor a definir Marketing Turístico foi (FROEHLICH, 2000, p.3) Krippendorf (1989) o qual apontou que o marketing Ainda segundo Marafon (2006, p.26) “O voltado ao turismo representa uma adaptação sistemática e desenvolvimento de atividades turísticas no espaço rural, coordenada da política das empresas de turismo, tanto [...] está associado ao processo de urbanização que ocorre privadas como do estado objetivando a satisfação de forma na sociedade e no transbordamento do espaço urbano para plena das necessidades de determinados grupos de o espaço rural. consumidores, e obtendo com isso, um lucro apropriado. Com isso, o turismo rural, e os outros diversos Na concepção de Cobra (2005) “o Turismo é uma setores do turismo que envolvem o ambiente natural, tem importante fonte de receita e a compreensão das ganhado, cada vez mais destaque na sociedade oportunidades de mercado permite direcionar as estratégias contemporânea, como afirma Froehlich, 2000, p.4) “a de marketing”. O Marketing Turístico então se apresenta representação urbana do espaço rural não só como um como uma ferramenta indispensável para o funcionamento espaço de produção (de alimentos,de produtos primários), e gerenciamento efetivo das organizações, especialmente mas também como um espaço de biodiversidade, de lazer no que concerne a diferenciação das ofertas aos segmentos e serviços (turismo [...]), tem acarretado em novas de interesse (MONTEJANO, 2001). ‘funções’ para este espaço.” O composto de Marketing aplicado ao turismo Com esse aumento da popularização do turismo não deve ser interpretado como uma mistura de elementos rural, os empreendimentos ligados ao setor, tendem a se e sim como a combinação de forma esquematizada e expandir e a adquirir novos meios de marketing e estruturada de ações entre as variáveis (BALANZÁ e estratégias de negócios. De forma mais específica as NADAL, 2003). Dentro deste contexto uma associação atividades relacionadas ao turismo necessitam cada vez interessante é realizada por Middleton (2002) ao expressar mais de estruturação e direcionamento, especialmente se que os conceitos do composto de Marketing podem ser for considerado que, segundo Cobra (2005) e Jain (2000) interpretados como um conjunto coordenado de alavancas as estratégias de marketing turístico tornaram-se operadas com o objetivo de se chegar a um determinado fundamentais para o setor na solidificação das tomadas de ponto. De forma ilustrativa o autor compara as variáveis decisão envolvidas no processo de gerenciamento das controláveis com um automóvel que possui acelerador, ações de estímulo ou resposta ao mercado consumidor de freio, volante e câmbio. O movimento desses controles turismo, em especial nas organizações turísticas vinculadas deve ser utilizado em consonância com as condições a rural, isso posto considerando a necessidade de enfrentadas em uma estrada em constante mudança e em adequação ou adaptação do empreendimento rural a lógica conjunto conforme a necessidade mais ampla ou pontual. de funcionamento do ambiente em que opera. Beni (2003) defende que o marketing turístico representa um processo administrativo pelo qual as 3.2. Marketing Turístico organizações vinculadas ao turismo identificação seus clientes tanto reais quanto potenciais. Malhotra (2001) Já a alguns anos a atividade turística tem se reforça tal posição ao salientar que o estabelecimento de apresentado como um dos setores econômicos mais comunicação com esses segmentos ou nichos com o promissores, expressivos e potencialmente geradores de objetivo de conhecer e influenciar suas necessidades e resultados no mercado mundial. Contudo maior desejos é algo vital as organizações. Ao passo que Melgar potencialidade do setor de turismo rural traz consigo maior (2001) aponta que estas ações têm como objetivo a volume de ofertas decorrentes do aumento da formulação e adaptação de produtos e serviços para a competitividade além de alterações ambientais – entre elas obtenção de indicadores positivos de satisfação dos as características do comportamento do consumidor- que usuários ou turistas.

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De forma sintética as definições apresentadas selecionou-se 25 empresas vencedoras de 2009 até 2012 de evidenciam que o papel do marketing turístico é o de forma aleatória configurando assim a amostragem como analisar, compreender e propor ações que beneficiem de sistemática. Tais organizações foram contatadas e as que um lado o cliente através da satisfação de suas sinalizaram de forma positiva para a pesquisa receberam necessidades e desejos e de outro a empresa através do acesso a um questionário online que continha questões de cumprimento de seus objetivos estabelecidos previamente natureza fechada e semi-aberta. AMARO et. al. (2005) (PELIZZER, 2005). afirmam que o "questionário do tipo fechado tem na sua Segundo a OMT (2001) por sua natureza os construção questões de resposta fechada, permitindo obter serviços turísticos representam elementos constitutivos respostas que possibilitam a comparação com outros vitais no composto da oferta aos usuários possibilitando a instrumentos de recolha de dados". (AMARO, et. al., experimentação, o uso e a consequente experiência de 2005, p.6). Já as perguntas semi-abertas ou mistas são consumo. definidas pelas autoras como questionários que apresentam Middleton (2002) reforça que um dos elementos questões de diferentes tipos: resposta aberta e resposta ou características a serem observados é o fato da fechada. heterogeneidade da demanda por parte dos usuários a qual Das 50 organizações contatadas 27 retornaram gera diferenças em termos de expectativa e interpretação respostas e dessas apenas 25 devolveram dados válidos e da oferta de maneira tão diversificada que tornam seu nesse sentido a análise dos dados deu-se através da análise julgamento de adequação ou inadequação sujeito a do conteúdo dos questionários respondidos, os quais foram diferentes interpretações e avaliações, informações categorizados e disponibilizados de modo a buscar a corroboradas por outros autores tais como Aaker, 2001; compreensão dos fenômenos pertinentes a temática de Kuazaqui, 2001; Melgar,2001 e Ignarra, 2003. estudo. De forma sintética o produto turístico entendido A pesquisa então assumiu natureza qualitativa a como toda oferta dispensada aos consumidores é composta qual é conceituada por RODRIGUES (2007) como aquela tanto de elementos tangíveis tais como equipamentos, que traduz em números as opiniões e informações que infraestrutura, bens físicos e recursos diversos como serão classificadas e analisadas, utilizando-se de técnicas também intangíveis ao projetar serviços, propostas de estatísticas. preço, elementos ligados a imagem e ao gerenciamento da atividade que de forma sistêmica atuam em conjunto na 5. Análise dos Dados busca da satisfação de necessidades e desejos reais ou potenciais dos consumidores sejam eles turistas ou Dentro do universo de pesquisa o principal intento usuários do empreendimento rural (MONTEJANO, 2001; foi o de levantar a relação entre as estratégias DIAS e CASSAR, 2005). mercadológicas e sua contribuição ao modo de operação de Por fim, trabalhar o composto de Marketing empresas reconhecidas como representantes da categoria Turístico considerando as variáveis controláveis do através do filtro de um prêmio de cunho nacional. Marketing - preço, promoção (comunicação) praça Uma primeira informações relevante diz respeito a (logística ou distribuição) e das características do produto necessidade de adaptação das ferramentas de marketing - se mostra viável ao proporcionar a possibilidade de aos desafios específicos de cada área, já que todas as aperfeiçoar os processos de tomada de decisão e também empresas pesquisadas concordaram com a premissa de que ao facilitar o planejamento estratégico de ações o ajuste das estratégias mercadológicas depende de modo coordenadas dentro de objetivos definidos ao longo de um substancial da observância dos elementos vinculados aos período de tempo pelas organizações. desafios específicos pertinentes a cada área. Segundo 92% dos entrevistados os fatores de 4. Metodologia tração de cada um dos elementos do composto de marketing tem relação direta com o planejamento das ações O primeiro procedimento metodológico ocorreu vinculadas as solicitações dos contratantes, contudo, sua através da pesquisa de cunho bibliográfico, ou seja, o forma de venda quase que invariavelmente está focada em contato direto do pesquisador com o que foi escrito sobre um ou no máximo dois requisitos ofertados pelo elemento determinado assunto, permitindo-o reforço de suas análises do composto, por exemplo, em um determinado ramo o na pesquisa ou a manipulação de suas informações. Foram Composto de Produto apresenta-se como o elemento levantadas informações de fontes diversas referentes ao central de contratação através da montagem de algum tipo contexto de organizações vinculadas a evento. de produto específico. Posteriormente foi realizada observação direta Em empresas cujo foco está relacionada a extensiva com a aplicação de questionário, a fim de se personalização dos serviços o produto é o principal coletar dados em série através de perguntas fechadas. elemento constante no planejamento, segundo 96% dos O universo de interesse deste estudo versou sobre entrevistados. organizações privadas ganhadoras do prêmio Caio no Em todas as organizações a comunicação se estado de São Paulo, tendo como público alvo os apresentou como elemento vital, porém em nenhuma delas responsáveis pela organização de eventos, contudo, considerando-se a dificuldade de acesso as organizações

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esse elemento do composto foi preponderante no 7) Pré-disposição dos consumidores a experimentar novas planejamento. marcas, produtos, serviços e ideias, entre outras O composto de preço apareceu como importante constatações. em todas as empresas, porém em nenhuma delas as O tema relacionado ao Composto de Marketing organizações apontaram o preço como diferencial aplicado ao turismo não é necessariamente novo, contudo, estratégico único, contudo, ressaltaram que esse elemento ainda apresenta espaço para ampliação especialmente da do composto é vital para o conjunto das estratégias. experiência nacional no setor de eventos para com o uso Considerando o último elemento que é a Logística destas ferramentas como balizadoras e auxiliares no (praça) 92% das empresas apontaram que esse elemento se processo de planejamento e tomada de decisão. apresenta como vital na execução das atividades, porém, Desta forma, ampliar o campo de estudo e trazer 84% das empresas apontam a existência de dificuldades na experiências bem sucedidas de empresas consideradas estruturação desse elemento no sentido de evitar falhas. referência auxiliará outras organizações do ramo a se De forma geral, todas as empresas participantes espelharem nas práticas que tem atualmente gerado apontaram serem tracionadas mais fortemente por um dos resultados positivos e permitir o avanço deste campo de elementos do composto de Marketing. estudo.

6. Considerações Finais 7. Referências

Houve uma época em que as atividades AAKER, D. A. Marketing Research. New York: John organizacionais – particularmente as relacionadas ao Wiley & Sons, 1997. turismo vinculado a eventos- eram realizadas de tal forma ______. Administração estratégica de mercado. que grande parte das decisões eram tomadas e os resultados Porto Alegre: Bookman, 2001. – bons ou ruins - eram obtidos através de tentativa e erro. ______. e JOACHIMSTHALER, E. Brand Essa época era menos complexa e competitiva do que os Leadership, London: Free Press, 2000. tempos atuais. ______. Marcas: Brand Equity: gerenciando o Conforme o mercado foi se tornando mais valor da marca. São Paulo: Negócio, 1998. complexo e apresentando múltiplas variáveis que AMARO, A.; PÓVOA, A.; MACEDO, L. Metodologias influenciavam de forma cada vez mais acirrada a disputa de Investigação em Educação. Faculdade de Ciências da por espaço na preferência dos consumidores as Universidade do Porto, 2005. organizações de todos os setores - em especial as de BALANZÁ, I. M. , NADAL, M. C. Marketing e serviços- precisaram desenvolver mecanismos para comercialização de produtos turísticos. São Paulo: levantamento, análise e uso de dados e informações Pioneira Thomson Learning, 2003. advindas de concorrentes, governo, consumidores, BENI, M. C. Análise estrutural do turismo. São Paulo: fornecedores entre outros para ajustar sua oferta ao seu SENAC, 2003. segmento de clientes. BIBLIOTECA SEBRAE. Disponível em Nesse sentido as estratégias de marketing foram se www.biblioteca.sebrae.com.br. Acessado em 13 de tornando mais refinadas e com capacidade de contribuir Agosto de 2011. com os objetivos e metas traçados pelas empresas na busca BOONE, L. E. e KURTZ, D. L. Contemporary por participação de mercado, consolidação da imagem, Marketing. 10º ed. Orlando: Harcourt College Publishers, diminuição dos indicadores de insatisfaciência dos 2001. consumidores entre diversos outros pontos. CASTELLI, G. Turismo de marketing: uma abordagem Alguns elementos justificam o estudo da relação hoteleira. Porto Alegre: Sulina, 1984. entre as estratégias ligadas ao Composto de Marketing e os CHIAVENATO, I. Empreendedorismo: Dando asas ao resultados obtidos por organizações vinculadas a eventos espírito empreendedor. 2º edição. São Paulo: Saraiva , dentre elas, segundo Violin e Sobrinho (2013) destaca-se: 2008. 1) Menor probabilidade de aceitação do erro por parte dos CHURCHILL G. A. e PETER, J. P. Marketing: Criando consumidores de produtos e serviços turísticos; valor para os clientes. 2º edição São Paulo: Saraiva, 2003. 2) Avanços tecnológicos mais constantes e ocorrendo em COBRA, M. Marketing de Turismo: Turismo, Lazer e menor espaço de tempo com alterações substanciais na Negócios. São Paulo: Cobra, 2005. forma de execução de processos e procedimentos; COOK Jr, V. J. , LARRECHÉ, J. e STRONG, E. Readings 3) Elevação nos índices de profissionalização das pessoas; in Marketing Strategy. 2º edition California: The 4) Consumidores com maior acesso a informação e com Scientific Press, 1989. maior capacidade de utilização da mesma em suas decisões DIAS, R. e CASSAR, M. Fundamentos do Marketing de aquisição e uso; Turístico. São Paulo: Prentice Hall, 2005. 5) Diminuição média da lucratividade e riscos inerentes DICKSON, P.; FARRIS, P. W. ; VERBEKE, W. J. M. I. associados a má gestão de custos; Dynamic strategic thinking. Journal of the 6) Índice de mortalidade de novos produtos e serviços em Academy of Marketing Science, vol. 29, nº 3, p. 216 - patamares elevados; e 237, 2001.

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POSSIBILIDADES PARA A PRÁTICA DE TURISMO PEDAGÓGICO RURAL EM SERGIPE: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA A PARTIR DO CICLO DE VIAGENS.

WELLISSON DE OLIVEIRA SANTANA¹ LUCAS OSÓRIO DUARTE TENÓRIO² LILLIAN MARIA DE MESQUITA ALEXANDRE³

Universidade Federal de Sergipe - UFS Campus de São Cristóvão Graduando do Curso de Turismo bacharelado¹ Graduando do Curso de Turismo bacharelado² Professora do Curso de Turismo bacharelado³

RESUMO O turismo é um fator de desenvolvimento econômico e de bem estar social. Sua importância como O Turismo Pedagógico tem sido alvo de estudos, por ser instrumento de aceleração econômica e de incremento na apontado como uma prática inovadora, um instrumento área sociocultural da coletividade é indiscutível. O frequente em várias instituições de ensino. É considerado turismo no Brasil incentiva o investimento de capital por vários autores como um instrumento facilitador no estrangeiro, contribui na arrecadação de impostos e gera processo ensino aprendizagem, uma vez que faz com que empregos. o aluno vivencie o que é dado em sala de aula. Pensando Por ser uma região com um imenso potencial no turismo rural como um viés possível para essa prática, turístico, o Nordeste Brasileiro, e por consequência o o presente estudo relatou uma atividade desenvolvida com Estado de Sergipe, participa de todo o ciclo produtivo de o intuito de mostrar a teoria e a prática nessa segmentação negócios para o desenvolvimento do país, encarando o em alguns locais de Sergipe com o recorte para o turismo turismo como uma alternativa de desenvolvimento. rural pedagógico. É com entusiasmo que se vê o turismo como a Palavras-chave: Turismo Rural, Turismo Pedagógico, engrenagem que proporciona a viabilidade de Sergipe, Ensino. desenvolvimento de muitas localidades, inclusive de forma exclusiva para algumas, detentoras de melhor ABSTRACT infraestrutura e potencialidades turísticas competitivas. A capacitação de obter êxito nas ações propostas e The Pedagogical Tourism has been studied to be o futuro da atividade dependerá das metas, da qualidade appointed as an innovative practice and a common dos serviços prestados e da capacidade dos instrument in different educational institutions. It is empreendedores em conduzir os seus negócios considered by many authors as a facilitator in the learning considerando, entre vários outros aspectos, a capacitação process, as it makes the student to experience what occurs e o treinamento próprios e das suas equipes. in the classroom. Thinking about rural tourism as a A necessidade de envolver o profissional com as possible metodoly to practice, this article reported an tendências de mercado se fazem necessário tendo em vista activity developed in Sergipe, in order to demonstrate that a capacidade que ele deve ter sobre a ótica da diversidade the theory and practice of the tourism segmentation in existente na área de turismo, levando em consideração Sergipe with the perfil for rural tourism education. neste momento, os aspectos globalizados e a percepção de necessidades, não apenas teórico-prático, mas também Key words: Rural Tourism, Pedagogical Tourism, sensitivas e criativas. Sergipe, Learning process. As viagens de estudo ocorrem desde o século XVIII, inicialmente praticadas por jovens aristocratas ingleses às principais cidades europeias, na ocasião 1 INTRODUÇÃO intitulada ‘grand tour’. Hoje denominado como turismo pedagógico ou turismo educativo, vem sendo apontado

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como um importante mecanismo facilitador do processo ganha vida e a experiência de aprendizado do aluno ensino aprendizagem. tornam-se algo real, com o qual ele pode interagir. Embasado nesses relatos, o presente trabalho teve Dessa forma, os educadores devem pensar em por objetivo mostrar a importância do Turismo diversos quesitos que podem ser abordados nas Pedagógico no meio rural, tendo como perspectiva as viagens/visitas técnicas, quais os locais onde se pode ter atividades desenvolvidas no Ciclo de Viagens fomentadas contato direto com determinadas situações e, pelo Grupo de pesquisa “Culturas, identidades e principalmente, a relação destes com os assuntos que já religiosidades”. Como base metodológica, foi utilizada a foram ou serão tratados em sala de aula, tendo em vista o pesquisa bibliográfica documental, valendo-se do método crescimento pessoal e profissional dos indivíduos descritivo qualitativo, com a observação direta feita pelos envolvidos através da motivação e mudança de atitudes. alunos que acompanharam a atividade na prática do ciclo Consequentemente, pode-se obter uma mudança de estudos “Engenhos de Sergipe”, aonde os alunos significativa no modo de educar, fazendo com que entraram em contato com a realidade dos engenhos professores deixem suas zonas de conforto, ao somente relacionados ao longo do estudo, patrimônio edificado. transmitirem informações, passando a ser um elemento O trabalho foi executado utilizando transporte facilitador da construção do conhecimento e, por sua vez, rodoviário contendo ar condicionado, frigobar, banheiro, alunos deixam a inércia e comodidade, para tecnologia de áudio e vídeo como aparelho de dvd e problematizarem o cenário apresentado. Assim, observa- televisor. se o turismo pedagógico como um recurso necessário ao Para o registro das informações descritas neste processo de ensino-aprendizagem. documento, foi utilizada câmera fotográfica digital cyber- Nos períodos que seriam de baixa estação estaria shot da Sony modelo DSC-S650 para registrar fotos e ocorrendo o turismo pedagógico (período letivo), dessa filmar alguns momentos, além disso, foi utilizado caderno forma os setores turísticos formais e informais não teriam para anotação das informações e caneta esferográfica na prejuízos. cor azul. 1.2. Turismo pedagógico e turismo rural: uma prática 1.1. Prática do turismo pedagógico enquanto possível. ferramenta no processo ensino aprendizagem A atividade denominada Turismo Rural deve É conceituado por vários autores como uma abranger, em sua conceituação, aspectos referentes ao viagem de conhecimento; ou viagem de estudo ao meio; turismo no meio rural, ao resgate e valorização da cultura ou ainda aulas-passeio, com o objetivo de transportar o local, à função de atividade econômica de base familiar e conhecimento teórico, assimilado em sala de aula, para complementar às tradicionais, ou com estas realidade concreta, oferecendo momentos de descontração comprometidas, com o mínimo impacto ambiental e lazer. possível, objetivando a sustentabilidade. Por esse motivo, o turismo pedagógico não pode Em vista dos aspectos anteriores e para fins de ser considerado uma mera excursão. Isso porque as implementação de Diretrizes Nacionais para o atividades envolvem o aprendizado e têm horizontes bem Desenvolvimento do Turismo Rural, conceitua-se o mais amplos que uma simples saída cultural para um Turismo Rural como: museu ou parque, já que sua proposta é integrar uma ação O conjunto de atividades turísticas desenvolvidas fora dos muros da escola ao currículo, reforçando, assim, no meio rural, comprometido com a produção conteúdos vistos em classe. agropecuária, agregando valor a produtos e serviços, Faz-se necessário que esses roteiros sejam restando e promovendo o patrimônio cultural e natural da dinâmicos e interdisciplinares, para que os alunos não se comunidade. (BRASIL, 1999) dispersem. Neste contexto veem surgindo várias Atualmente existe no mercado uma série de modalidades na prática da atividade turística e uma delas empresas e agências de turismo (que se diversificaram seu é o Turismo Rural, que, juntamente com o Ecoturismo, mercado em função desse novo nicho) especializadas na vem buscando uma maior aproximação do homem com organização desse tipo de atividade; contudo, não é suas raízes, e principalmente, o meio ambiente. necessariamente preciso contratar seus serviços. Os O Turismo rural vem ganhando força, pois faz próprios professores, diretores e administradores podem com que o homem passe a gerar possibilidades de montar os programas para seus alunos. crescimento neste meio, diminuindo assim, o êxodo rural Através das aulas-passeio os alunos passam a e os inchaços das cidades. Também a busca de um maior assumir a condição temporária de turista, deslocando-se contato com a terra, o processo de colheita e plantação e a do seu lugar de origem em busca de algo novo. Há então, tranquilidade do meio rural, promovem ao homem esse numa aula, o elemento dinâmico (a viagem) e o sujeito do retorno às origens, pois o stress do dia a dia nas grandes turismo (o turista). cidades favorece a procura do homem por locais mais Assim, uma vez que o olhar do aluno é calmos, onde possam descansar deste desgaste rotineiro. convertido em olhar de turista, torna-se mais fácil a O presente trabalho pretende objetivar os ciclos transmissão de algum conhecimento, visto que a aula de produção açucareira presente nos séculos XVIII e XIX

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no estado de Sergipe contribuindo para o existem vestígios das chaminés do antigo engenho e nem desenvolvimento econômico e local. das senzalas. Os ciclos dos engenhos em Sergipe se deu devido ao estado possuir terras de massapê se comparado À tarde do mesmo dia por volta dás 16h30minh a outros estados, por isso, estes ciclos despontaram com encontramos na Casa de Dona Baby com o grupo e uma grande importância para o estado, pois ajudava no também com o Professor que estavam chegando da desenvolvimento econômico local e para a colônia já que visitação nos engenhos da Região do Vaza-Barris. A Casa o açúcar era um produto caríssimo para a época. fica localizada na margem direita da BR 101 no sentido Aracaju/Laranjeiras antes da entrada principal da Cidade 2 RELATO DE EXPERIÊNCIA de Laranjeiras mais precisamente em frente ao “Motel Lá Hoje”. Já dentro da residência, foi falado sobre os No primeiro dia do mês de março do ano de dois móveis, estes pertenciam ao Engenho Pedras e alguns ao mil e treze, por volta dás 09h00min, visitamos a Fazenda engenho Oiteirinhos localizado em Japaratuba. A casa Pedras no município de Maruim com o intuito de buscar o contém dois pavimentos, e a mobília: a grande mesa, as contato do gerente para poder autorizar a visitação dos estantes e cristaleiras, os quadros e as peças de participantes do ciclo de viagens. Saindo de Rosário do ornamentação são resquícios do período colonial. No Catete dista 30 quilômetros da capital em sentido primeiro pavimento os alunos ficaram impressionados norte/sul adentramos na estrada que dá acesso à fazenda com a grande mesa e no segundo pavimento com a que está localizada à margem direita da BR 101 entre o quantidade de camas e com uma pequena biblioteca. trevo de acesso a Rosário do Catete e a fábrica de Encerramos as atividades logo em seguida, Fertilizantes Heringer. Da rodovia à sede da fazenda retornando para a Universidade Federal de Sergipe ao fim percorremos uma distância de aproximadamente três do dia. quilômetros de estrada por entre canaviais. Ao entrar na Fazenda nos deparamos com a casa grande em estado de 3 CONCLUSÕES abandono, sem possuir o telhado e algumas paredes por cair, as paredes da frente do casarão mostram uma Durante a visita aos engenhos, nos deparamos arquitetura típica colonial que Orlando Dantas em seu com histórias de diversas atrocidades cometidas por livro “A vida Patriarcal de Sergipe” explicara que se senhores de engenho na busca pelo poder principalmente tratava de uma réplica do palácio Olímpio Campos. econômico, disputas por lotes de terra e até mesmo, a Devido orientações do Professor Lindivaldo não tivemos precariedade em que os escravos da época se submetiam, oportunidade de fotografar o prédio. senzalas que não ofereciam suporte algum para uma vida Aos nove dias do mês de março de 2013 no turno descente dos escravos. ao mesmo tempo que nos remete a da manhã, com o intuito de reconhecer o local, fizemos grandes casas imponentes por sua estrutura arquitetônica uma pré visita na Fazenda Recurso para acertar os últimos cultura preservada em alguns engenhos enquanto outras passos para conclusão das visitações dos engenhos do se perderam com o passar do tempo. Dessa forma Sergipe Cotinguiba, o engenho fica localizado as margens da preserva e reescreve a sua história com memórias rodovia estadual que liga Capela ao povoado Pirunga, a preservadas nos ciclos dos engenhos estrada de acesso se encontra à margem esquerda logo É importante ressaltar que o turismo pedagógico após a entrada principal do Povoado Igrejinha no sentido busca acima de tudo reverter essa imagem estereotipada Capela/Pirunga. Após a entrada, o visitante irá percorrer das excursões escolares, uma vez que seu objetivo é cerca de cinco quilômetros. Antes do Engenho Recurso é tornar a viagem o elemento motivador para observar em encontrada a Lagoa do Sabão às margens direita da determinados lugares, os diversos conteúdos expostos em estrada, logo após as oito palmeiras imperiais da Fazenda sala de aula, de maneira interdisciplinar e assim, Lavagem do lado esquerdo, e logo após na margem direita contribuir para a formação do pensamento crítico dos se encontra a porteira da Fazenda Recurso. alunos. Logo que chegamos, notamos o casarão com sua O Ciclo de Viagens, assim como a aventura de imponência, e conversamos com o proprietário, o Senhor conhecer os engenhos do Cotinguiba foi crucial para Jorge Souza, que abriu as portas para a nossa visitação. O conhecer de forma empírica a localidade em que casarão foi construído com o material chamado “adobro” residimos, mas a melhor experiência que nós alunos e está modificado apenas por um banheiro que foi podemos extrair dessas aulas é que o conhecimento que construído recentemente dentro da casa. No interior da antes era absorvido apenas através de livros e dentro de casa-grande, que possui um enorme espaço, notamos a sala de aula se une ao processo de conhecimento físico, grandeza dos quartos, na cozinha o piso é de madeira que onde o aprendizado se torna mais natural. O conhecer e o esconde um porão que Orlando Dantas conta em seu livro tocar dentro dessas pequenas expedições desperta dentro “A Vida Patriarcal de Sergipe” que servia para guardar os do alunado, futuros pesquisadores e professores, o desejo alimentos. Dentro da casa, ficamos impressionados pela de conhecer e buscar a resposta para muitas perguntas que presença de um altar. Do lado de fora se encontra um ainda teimam em continuar na obscuridade, e que com açude situado no lado direito da varanda frontal, e não muito esforço sabemos que poderemos elucidar e transformá-las em conhecimentos.

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MARKETING PARA O TURISMO RURAL: UM ESTUDO NO ROTEIRO CAMINHOS DE PEDRA, EM BENTO GONÇALVES – RS.

1 NATÁLIA SALVATE BRASIL 2 MARCELINO DE SOUZA

Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS Programa de Pós Graduação em Desenvolvimento Rural Centro de Estudos e Pesquisas Econômicas [email protected] [email protected]

RESUMO – No contexto de grandes modificações no espaço rural, o turismo tem sido uma atividade alternativa interessante para suas populações, podendo trazer benefícios em diferentes dimensões. Aponta-se para a importância de se profissionalizar a atividade, a partir do planejamento e gestão adequados de pequenos empreendimentos, destacando o marketing como importante ferramenta. Entretanto, faz-se necessário destacar o desafio dos gestores de marketing na aplicação de seus conceitos e ferramentas administrativas para um destino turístico rural, visto todas as especificidades e fragilidades que envolvem este espaço. Desta forma e a partir de novas abordagens do marketing que incorporam outras dimensões, como sociais, culturais e ambientais, este trabalho se propõem a analisar as ações de marketing desenvolvidas no Roteiro Caminhos de Pedra, em Bento Gonçalves (RS), no que tange ao apoio organizacional de suas operações, suas características e desafios. Os resultados permitem inferir que há um esforço no trabalho da Associação Caminhos de Pedra na direção de unir os empreendedores membros do destino e definir ações conjuntas de marketing turístico. Entretanto, ressalta-se certa carência na inclusão das dimensões sociais e ambientais nos objetivos destas estratégias, visando evitar impactos negativos, superar dificuldades e seguir na direção de uma abordagem de marketing mais sustentável.

Palavras chave: Turismo Rural, Marketing, Desenvolvimento Rural.

ABSTRACT - In the context of big changes in rural areas, tourism has been an important alternative activity for the population, which can generate benefit in different dimensions. Points to the importance of professionalizing the activity, from planning and appropriate management of small businesses, highlighting marketing as an important tool. However, it is necessary to highlight the challenge of marketing managers in the application of its concepts and administrative tools for rural tourism destination with all the specifics and weaknesses involving this space. Thus and from new marketing approaches that incorporate other dimensions such as social, cultural and environmental, this work aims to analyze the marketing activities undertaken in the Roteiro Caminhos de Pedra in Bento Gonçalves (RS), regarding the organizational support of its operations, its characteristics and challenges. The results may imply that there is an effort in the work of the Association “Caminhos de Pedra” toward uniting entrepreneurs members of the destiny and define joint actions in tourism marketing. However, it’s important to emphasize certain lack of inclusion of social and environmental dimensions in the objectives of these strategies, in order to avoid negative impacts, overcome difficulties and move towards a more sustainable marketing approach.

Key words: Rural Tourism, Marketing, Rural Development.

1 INTRODUÇÃO produção e suas estruturas sociais. Os processos de urbanização e modernização da agricultura contribuíram Ao longo do tempo, o espaço rural vem passando incisivamente nestas mudanças e trouxeram alguns por intensas modificações que alteraram sua forma de impactos às populações rurais. Neste contexto, a busca

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por atividades alternativas capazes de gerar renda a marketing para o turismo rural e suas novas abordagens. pequenos produtores se configura como estratégia cada Posteriormente, serão expostos os procedimentos vez mais comum neste espaço, especialmente um metodológicos da pesquisa e, por fim, os resultados e conjunto de atividades não agrícolas de serviços. discussões levantados a partir dos dados empíricos A crescente inserção destas atividades não coletados no roteiro. agrícolas no âmbito do processo de diversificação de atividades dos produtores rurais tem afirmado novas 2 DESENVOLVIMENTO RURAL E TURISMO concepções de ruralidade, onde é possível pensar o espaço rural não somente com a função exclusivamente agrícola As transformações ocorridas no meio rural, através produtiva, mas também como espaço de integração social, da inserção do capital em suas estruturas, revelou uma cultural e ambiental. Assim, o rural passa a ser nova dinâmica socioeconômica neste ambiente. De multifuncional e pode ser discutido em diferentes acordo com Wanderley (2000), o “sucesso, inegável, da dimensões (econômica, social, ambiental). modernização da agricultura gerou, paralelamente, suas Neste sentido, a atividade turística vem sendo cada próprias crises”, a partir dos anos 80 (WANDERLEY, vez mais incorporada por agricultores que buscam novas 2000, p.91). fontes de diversificação de renda e de reprodução social. É importante ressaltar que as transformações e O turismo rural, a partir da oferta de produtos e serviços impactos sofridos no meio rural não foram somente de lazer no meio rural, pode ser considerado um dos econômicos, mas também de ordem social, cultural, exemplos de atividade não agrícola das mais importantes ambiental. Wanderley (2000) afirma que no campo desenvolvidas por agricultores familiares frente às econômico, as formas de produção do campesinato instabilidades da renda agrícola nas áreas rurais. Ressalta- tradicional foram intensamente modificadas, resultando se que, se planejado adequadamente e levando em na “[...] progressiva modernização do processo de consideração suas características sociais, culturais e produção na agricultura, uma maior integração deste setor ambientais, o turismo rural pode contribuir para a geração aos mercados, inclusive e, sobretudo os mercados não de emprego e renda, preservação ambiental, resgate da locais” (WANDERLEY, 2000, p.90). cultura local, melhoria da qualidade de vida, entre outros Num outro âmbito, alterações na vida social local benefícios. decorreram destes processos, culminando com o êxodo Entretanto, aponta-se para a necessidade de se rural (resultante da liberação da mão de obra ocupada em profissionalizar a atividade turística no meio rural, a partir atividades agrícolas), a sobreposição da cultura urbana do planejamento e gestão adequados dos pequenos perante a rural (através da facilidade de contato com a empreendimentos, com vistas a garantir benefícios através cidade) e a modificação do modo de vida tradicional no do uso de seus recursos. O marketing tem sido campo (WANDERLEY, 2000, p.90). Numa dimensão considerado por muitos autores como uma importante ambiental, Wanderley cita o estímulo ao uso crescente e ferramenta de planejamento do turismo rural, uma vez indiscriminado de insumos químicos pelo modelo que permite conhecer o seu produto ou serviço, produtivista, trazendo sérios riscos ao meio ambiente e à determinar o valor a ser cobrado por ele, identificar um saúde de consumidores. (WANDERLEY, 2000, p.91). mercado-alvo favorável e promover ações de divulgação A partir destas transformações e seus efeitos em com o objetivo de atrair seu público. Assim, a aplicação diferentes dimensões no meio rural, Wanderley afirma de estratégias adequadas de marketing poderá contribuir que, nas sociedades modernas, o desenvolvimento destes para a otimização dos benefícios e o controle dos espaços dependerá da “[...] sua capacidade de atrair outras possíveis impactos negativos da atividade sobre os atividades econômicas e outros interesses sociais e de destinos. realizar uma profunda ‘ressignificação’ de suas próprias Contudo, o principal desafio de gestores do funções sociais”. (WANDERLEY, 2000, p.92). Ou seja, o marketing está na aplicação de seus conceitos e rural deixa de ser espaço restrito a produção agrícola, ferramentas administrativas, com foco na satisfação do cumprindo somente suas funções agroalimentares, e passa consumidor, para um destino turístico rural, com todas as a incorporar um conjunto de funções e a realizar especificidades e fragilidades que o envolvem. Desta diferentes atividades não agrícolas, se tornando espaço forma, novas abordagens sobre marketing turístico multifuncional. É neste contexto que a atividade turística voltadas para as áreas rurais ou pequenas comunidades no meio rural pode ser entendida. têm surgido na literatura científica, visando à Apesar da importância do turismo no meio rural, incorporação de outras dimensões de análise, tanto existe certa falta de homogeneidade no que diz respeito a econômicas, quanto sociais, culturais e ambientais. conceitos e características, o que gera alguma confusão no Desta forma, este trabalho se propõe a analisar as entendimento conceitual. Primeiro devido à dificuldade ações de marketing desenvolvidas no Roteiro “Caminhos em delimitar as fronteiras entre rural e urbano, segundo, de Pedra”, no município de Bento Gonçalves (RS), no que pelo surgimento de diversas modalidades de turismo nas tange ao apoio organizacional das operações, suas áreas rurais, como agroturismo, ecoturismo, turismo de características, desafios e limites. Para tanto, nas seções aventura, turismo rural, turismo ecológico, turismo de que seguem, serão apresentados os pressupostos teóricos saúde, turismo cultural, entre outras. que versam sobre desenvolvimento rural e turismo,

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Portanto, no intuito de facilitar a compreensão dos que facilitaram o acesso, diminuindo o tempo de termos, será adotada neste trabalho a definição de Olga locomoção entre o meio urbano e rural. Tulik para Turismo no Espaço Rural, que “abrange todas Desta forma, todo o contexto supracitado foi as manifestações de turismo nesse espaço” e de Turismo favorável ao desenvolvimento da atividade turística no Rural, propriamente dito, sendo aquele que está espaço rural e, mesmo que esta não deva ser encarada estreitamente relacionado ao ambiente rural (TULIK, como uma panaceia, poderá se constituir numa estratégia 2010, p.13). Para a autora, se a ideia é trazer benefícios ao importante de desenvolvimento rural, especialmente pequeno produtor, evitar o êxodo e promover o naquelas localidades de predomínio da agricultura desenvolvimento local, esta atividade deve ser familiar. conceituada de forma que considere os “[...] atributos do Sobre a definição de desenvolvimento rural, que é, de fato, rural” (TULIK, 2003, p. 86-87). observam-se diferentes abordagens que buscam Retornando à conjuntura de grandes modificações conceituar o termo ou compreendê-lo a partir de estruturais nas áreas rurais, na qual se destaca o determinada visão. Algumas perspectivas, como a das crescimento da prática de atividades não agrícolas, alguns capacitações de Amartya Sen, do desenvolvimento fatores favoreceram o interesse crescente da população territorial e sustentável, o estudo das transições e a urbana pelo meio rural e, consequentemente, também abordagem da diversificação dos meios de vida, impulsionaram o desenvolvimento de atividades de contribuem para a compreensão das transformações do turismo neste ambiente. rural e a formulação de aproximações de um conceito de Schneider (2006, p. 4) afirma que “emerge uma desenvolvimento rural. nova concepção da ruralidade, que passa a ser um espaço Para tanto e, devido a inexistência de um conceito em que o homem e o ambiente se integram através de geral de desenvolvimento rural amplamente aceito na múltiplos usos que são de caráter produtivo, social, academia, será utilizado neste trabalho a visão de lúdico, ambiental etc.” e, neste sentido, o turismo rural se Kageyama (2008) para desenvolvimento rural. A autora caracteriza como uma estratégia de desenvolvimento rural conceitua o termo como para os agricultores familiares. As mudanças nos padrões de consumo, que [...] a passagem, de determinado espaço segundo Schneider (2006, p. 3) “voltam-se territorial, do isolamento à integração com crescentemente às amenidades e aos bens não tangíveis”, o urbano e com os demais setores da também contribuiu para um maior interesse turístico pelo economia e da especialização à rural. Campanhola e Graziano da Silva (2001) afirmam diversificação econômica e social que, embora o processo de globalização tenda a (KAGEYAMA, 2008, p.9). homogeneizar produtos, padrões de consumo, costumes, entre outros, ele acaba reforçando o local no sentido de Observa-se, no conceito proposto por Kageyama que “estimula a organização comunitária para que um (2008) um contexto dinâmico, de constantes mudanças, lugar específico não seja excluído do processo de onde o rural em “desenvolvimento” deixa de ser isolado desenvolvimento e para que encontre o seu caminho de para se integrar com as esferas urbanas; e deixa de ser sustentabilidade” (Campanhola e Graziano da Silva, 2001, especializado e visto somente como produtor agrícola, p.150). Desta forma, pode-se observar uma maior busca para diversificar suas atividades tanto econômicas quanto pelo contato com o meio ambiente e culturas tradicionais, sociais. pelo local e pelo singular. A autora ainda explica que os fatores que Nesta mesma linha de raciocínio, Schneider e permitem esta “passagem” estão baseados na redução da Fialho (2001) afirmam que o estresse e o crescente custo desigualdade no acesso a terra e à educação; na de vida urbana decorrentes do crescimento intenso e diversificação da agricultura; na presença de um conjunto desordenado das cidades fazem com que a população de atividades que se conectem com a rede urbana; e na procure ambientes mais saudáveis e que, em busca desta existência de instituições adequadas e articuladas qualidade de vida, de conforto e segurança, há uma (KAGEYAMA, 2008). Desta forma, no contexto de expansão das residências secundárias e sítios de lazer, o diversificação das atividades econômicas e sociais que favoreceu a associação do ambiente rural com proposto pela autora, o turismo pode ser visto como uma qualidade de vida. alternativa na busca do desenvolvimento rural. Segundo Elesbão (2010), essa “valorização do Desta forma, e atentando para a importância do rural é motivada pela renovação do olhar dos citadinos planejamento para o desenvolvimento de atividades sobre o campo, desencadeada pelo turbulento processo de turísticas no meio rural, as próximas seções discutem urbanização e pelas mazelas daí geradas” (ELESBÃO, alguns conceitos e possibilidades de aplicação do 2010, p. 153). Ou seja, passa-se a idealizar um espaço marketing no turismo rural, de forma que possa trazer rural romântico, onde as experiências e vivências através maiores benefícios à população local e minimizar os da atividade turística são cada vez mais demandadas. possíveis impactos negativos que a atividade venha a Schneider e Fialho (2001, p.31) citam ainda, como gerar. outros fatores que favoreceram as práticas do turismo rural, a melhoria das estradas e dos meios de comunicação

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3 MARKETING PARA O TURISMO RURAL não tenha sido vendido, não é possível recuperar seu valor. Dolli e Pinfold (1997) ressaltam a importância Segundo Kotler (2000) o marketing pode ser desta particularidade para o marketing do turismo rural, definido como um processo social no qual os indivíduos e visto que fatores como tempo e condições econômicas grupos de pessoas obtêm aquilo que carecem e anseiam a geram grandes variações na demanda. partir da criação, oferta e livre negociação de produtos e Todas estas características influem diretamente no serviços. Envolve “a identificação e a satisfação das processo de tomada de decisão no planejamento de necessidades humanas e sociais” (KOTLER; KELLER, marketing, uma vez que seus impactos negativos podem 2007, p. 4). Assim, centrando seus esforços no ser amenizados ou controlados através do uso de consumidor e na satisfação do mesmo, o marketing se estratégias de marketing adequadas. Assim, Dolli e posiciona como um processo fundamental em qualquer Pinfold (1997) sugerem que a formulação de um plano de empresa ou negócio. marketing seja importante para organizações de turismo Segundo Dias e Cassar (2005) o marketing permite rural frente a um razoável nível de competição e a um a sobrevivência e o sucesso de novos produtos através da ambiente de negócios volátil. possibilidade da promoção da inovação, bem como Gilbert (1989) afirma que a gestão do marketing oferece ao consumidor maior exposição de informações está diretamente pautada na ideia de que as necessidades sobre o produto (DIAS; CASSAR, 2005). Além disso, o dos consumidores devem ser estudadas e compreendidas a marketing é o responsável direto pela criação de valor fim de se analisar quais oportunidades de produtos através de ações sociais e ambientais, sendo capaz de existem para aquele mercado. O autor cita a existência de elevar o status tanto da empresa, quanto do consumidor uma demanda potencial para tipos alternativos de lazer e a que adquire o produto, determinando um padrão de vida emergência de novas necessidades dos consumidores que aos consumidores (DIAS; CASSAR, 2005). estão diretamente ligadas ao turismo rural (GILBERT, Na tentativa de traduzir os princípios do marketing 1989). São elas: administrativo para a atividade turística no meio rural, - Novos objetivos: os turistas estão demandando faz-se necessário, primeiramente, compreender algumas mais experiências com outros tipos de vida e situações; especificidades do produto turístico. Estas são - Abordagem individual: há uma preferência por características específicas que podem gerar alguns formas individuais de turismo, diferente daquelas de desafios para a gestão de um empreendimento, quais massa que dispõem de fornecimentos padronizados; sejam: - Acomodações mais simples: há uma disposição - Intangibilidade: O principal componente da do público em aceitar padrões inferiores de acomodação atividade turística é a prestação de serviços, o que dos que estão acostumados, desde que estejam impossibilita que o consumidor o experimente ou teste higienizados; antes de adquiri-lo. Ou seja, os serviços são intangíveis e - Hedonismo: o prazer para o próprio bem é um planejadores de marketing necessitam de evidências valor emergente e a ideia de que os indivíduos merecem tangíveis aos seus produtos (DOLLI; PINFOLD, 1997), a prazer e atividades lúdicas como direito direcionará fim de permitir aos possíveis consumidores uma melhor esforços para mais atividades deste cunho; visualização destes. - Atividades de feriados/férias: há uma tendência - Inseparabilidade: A produção e o consumo de um por parte dos jovens de usufruírem de feriados e férias serviço são fatos simultâneos e inseparáveis. Os ofertantes personalizadas envolvendo atividades de turismo; e consumidores interagem, permitindo uma forte presença - Incremento com gastos no turismo: membros de de pessoal em qualquer transação (BEETON, 2006). De gerações pós anos 50 estão mais dispostos a despender tal modo, o treinamento de pessoal se torna uma mais dinheiro em turismo do que em posses; importante questão para o sucesso do marketing nesta - Materialismo reduzido: Há um desejo maior por área (DOLLI; PINFOLD, 1997). valores espirituais e comunhão com a natureza, o que - Variabilidade: Cada interação na prestação de levou a busca de uma série de atividades como serviços irá produzir um resultado (DOLLI; PINFOLD, caminhadas e camping (GILBERT, 1989). 1997) e sua qualidade dependerá dos indivíduos que o Desta forma, observa-se que emerge um novo prestam, do seu humor e do estado de espírito do perfil de turista mais preocupado com questões sociais e consumidor naquele momento, fazendo de cada prestação ambientais, disposto a interagir com comunidades locais e de serviço uma nova e diferente transação (BEETON, novos modos de vida e buscando, cada vez mais, 2006). Desta forma, Dolli e Pinfold (1997) sugerem que a atividades no meio rural. padronização e a manutenção da qualidade do serviço são Segundo Henche (2006), na Europa dos anos 80, primordiais para evitar estas variações ou minimizar a com uma nova estrutura social, as consequências do insatisfação do consumidor diante de situações que não turismo de massa e as questões sobre o meio ambiente em podem ser contornadas. constante ascensão, criou-se um contexto favorável ao - Perecibilidade: Outra característica extremamente surgimento de formas alternativas de turismo, mais importante na prestação de serviços turísticos é a individualizadas, especializadas e respeitosas com a impossibilidade de armazenagem para consumo posterior natureza. A autora cita, ainda, que estes fatores também (BEETON, 2006). Uma vez que um pernoite num hotel influíram no surgimento de uma demanda turística que

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busca o equilíbrio em ocupar seus momentos de ócio sem envolvidos no processo de oferta e consumo de serviços interferir na ordem ecológica natural (HENCHE, 2006). turísticos sejam beneficiados (KASTENHOLZ, 2006a). Assim, observam-se, atualmente, inúmeros tipos e Gilbert (1989) explica que, muitas vezes, gestores denominações de turismo, como alternativo, verde, de marketing empreendem ações com o objetivo de sustentável, natural, ecoturismo, entre os quais o turismo modificar os padrões de demanda, para educar e melhorar rural se destaca com uma grande demanda, interessada em as atitudes e o entendimento dos turistas sobre o destino. conhecer ou reviver sua realidade, seus valores e seus O autor ressalta que, devido às áreas rurais serem modos de vida, trabalho e produção. Portanto, conhecer o suscetíveis às pressões que podem lhes trazer impactos, o público que se deseja atingir, ou seja, identificar o perfil e marketing deve buscar a conscientização dos visitantes motivação deste turista alvo é um dos primeiros passos diante das comunidades receptoras ou as mudanças nos para o planejamento das atividades de marketing de um hábitos desta demanda (GILBERT, 1989). É o caso de destino turístico rural. campanhas muitas vezes observadas em Unidades de Kastenholz (2006a) ressalta a importância de uma Conservação brasileiras que incentivam os turistas a não gestão e planejamento integrados que compreendam todos levarem nada além de fotos e não deixarem nada além de os elementos que compõem os produtos, serviços, pegadas. ambientes e atrações que formam um destino turístico. Já Desta forma, o desafio principal de gestores de para o turismo rural, Dolli e Pinfold (1997) afirmam que o planejamento do marketing para o turismo rural é a marketing é um processo lógico que inclui pesquisa, conciliação entre a satisfação das necessidades do avaliação de necessidades, análise, planejamento e consumidor e a preservação (tanto em termos ambientais, utilização de ferramentas do mix de marketing e destaca a quanto socioculturais) do produto que está sendo vendido. grande relevância para o setor no sentido de levar em Segundo Dolli e Pinfold (1997) é preciso haver um consideração a natureza frágil do produto que será balanceamento entre os objetivos do marketing comercializado: o rural. contemporâneo e os objetivos que são importantes no Sobre o assunto, Kastenholz (2006a) afirma que, contexto do turismo rural, considerando suas principalmente em destinos rurais de pequena escala, com especificidades. grande poder de atração e algumas fragilidades Para tanto, novas abordagens do marketing ambientais e socioculturais, é preciso destacar ainda mais voltadas a pequenas comunidades e levando em a relevância do planejamento e gestão adequada dos consideração outras dimensões, que não somente recursos, a fim de permitir o benefício mútuo entre econômicas, estão sendo desenvolvidas por alguns turistas e receptores e minimizar os possíveis impactos autores, no intuito de possibilitar a inserção do negativos que a atividade possa acarretar. planejamento de marketing nas dinâmicas atuais. Dolli e Pinfold (1997) lembram que a satisfação Uma das primeiras incursões acadêmicas na das necessidades dos consumidores, no caso do turismo evolução do conceito de marketing, que visa agregar rural, deverá ser pautada na satisfação das necessidades outras questões que não somente a satisfação única e total da região que os recebem. Ou seja, há uma mudança de do cliente, mas também dimensões sociais como olhar sobre o marketing administrativo, voltado responsabilidade pelos impactos que o consumo poderia inteiramente para as necessidades do consumidor, causar na sociedade pode ser observada através do permitindo adequar produtos e serviços a seu gosto; para Marketing Societal (Kotler, 1978). De acordo com o um marketing preocupado com as necessidades das autor, o Marketing Societal é “[...] uma orientação para as populações locais, que leve em consideração os possíveis necessidades dos consumidores [...] objetivando gerar impactos sociais, ambientais e culturais da atividade. satisfação e o bem-estar dos consumidores em longo Neste sentido, Kastenholz (2006a) afirma que o prazo, como meio para se atingir os objetivos “produto destino não pode ser constantemente organizacionais” (KOTLER, 1978, p.62). Ao longo do modificado, a sabor dos gostos do mercado, já que tempo, este conceito foi incorporando novas dimensões existem componentes fixos e recursos únicos que devem com viés sustentável, considerando aspectos ambientais, ser preservados” (2006a, p.139). Portanto, para a sociais e éticos. aplicação do marketing no caso do turismo rural, a A partir desta nova abordagem e no que se refere satisfação total e única dos consumidores não será ao turismo rural e suas especificidades já descritas, premissa de sucesso, caso não sejam observados aspectos observa-se, na academia, o delineamento de outras relevantes de quem oferta os produtos ou serviços. abordagens mais consistentes que também levam em Assim, a autora sugere que o marketing, deve consideração outros aspectos do marketing, além dos contribuir para uma eficaz “gestão da procura”, de forma econômicos. que possa atrair turistas que valorizem o que o destino Neste sentido, Kastenholz (2006b) propõe o tem a oferecer, buscando trazer maiores benefícios, tanto conceito de “Marketing integrado e sustentável do em termos financeiros, quanto considerando impactos destino”, no qual as empresas que integram o destino sociais, culturais e ambientais resultantes da atividade devem desenvolver estratégias de marketing, através das turística (KASTENHOLZ, 2006a). Propõe, portanto, uma ferramentas do marketing comum, mas “orientadas no abordagem visando o resultado “win-win”, onde todos os sentido de apoiar o desenvolvimento sustentável do destino e integradas, devido à complexidade do produto e

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da experiência turística vivida no destino” (ROBERTS; HALL, 2004). Ou seja, permite um foco (KASTENHOLZ, 2011). maior nas necessidades do indivíduo para satisfazer as A autora ainda sugere que o marketing do destino necessidades de um grupo maior. deve ser planejado de forma que possa atrair um fluxo de Roberts e Hall (2004) contrapõem o turistas interessado no destino, que valorizem mais o que marketing de nicho com a segmentação, afirmando esta este tem a oferecer, buscando trazer o maior benefício ser uma abordagem caracterizada por ações “de cima para econômico, mas considerando os custos e impactos baixo”, que quebra mercados de massa em porções resultantes deste fluxo (KASTENHOLZ, 2006b). Assim, supostamente gerenciáveis. Ou seja, parte de uma maior o marketing deve contribuir para uma melhor “gestão da dimensão para pequenos grupos com necessidades procura” de forma que permita o resultado “win-win”, compatíveis sobre os quais serão desenvolvidas satisfazendo todos os envolvidos, estando preocupado estratégias de marketing específicas. Sugerem, portanto, ainda com um “bem-estar mais abrangente de longo que a abordagem do marketing de nichos se adéqua prazo, da comunidade residente [...] e de todos os melhor ao caso do turismo rural, por caracterizar-se por stakeholders interessados no destino, englobando tanto uma demanda menor do que outros segmentos da aspectos econômicos, como sociais, culturais e atividade turística de massa (ROBERTS; HALL, 2004). ambientais” (KASTENHOLZ, 2006b, p.35). O quadro analítico de Roberts e Hall (2004), Kastenholz (2011) destaca a importância desta apresentado na figura 3, foi apresentado para indicar a abordagem para destinos turísticos rurais, uma vez que importância do campo na motivação da viagem e na são áreas de grande fragilidade em seus recursos satisfação do turista. Ou seja, o quanto as características primários naturais e culturais, carentes de recursos do rural influem na decisão dos visitantes em buscarem financeiros e humanos e que devem, ainda mais, gerir sua este segmento do turismo. Tal modelo consiste num oferta e recursos turísticos de modo bastante cauteloso. continuum para medir a importância do espaço rural no Beeton (2006) destaca uma abordagem de consumo do turismo e, segundo os autores, pode ser útil marketing baseado em comunidades, “community based no direcionamento de políticas a nas tomadas de decisões marketing”. Considerando todas as especificidades de um de gestão (ROBERTS; HALL, 2004). destino turístico e sua complexidade, a autora também O modelo analítico sugere que atividades mais propõe a necessidade de um planejamento de marketing associadas a valores rurais, como turismo baseado na que leve em consideração outros aspectos, como culturais, natureza, agricultura e conservação, são aquelas que mais sociais e ambientais (BEETON, 2006). se aproximam da definição de “mercado de nicho” e, Beeton (2006) considera que, em muitos casos, a consequentemente, estão mais ligadas ao conceito de gestão do marketing de um destino tem sido vista sempre turismo rural, também adotado neste trabalho. Já as como um processo de cima para baixo, ou seja, de atividades de turismo nas áreas rurais, como turismo de grandes organizações para pequenas particularidades aventura e passeios gerais, menos ligadas às locais. Entretanto, afirma que há oportunidades para características do rural, ou seja, aquelas em que o campo comunidades individuais se envolverem neste possui pouca importância na motivação do turista são as planejamento, ainda que seja um desafio para estes com menos chances de se identificar com um nicho. pequenos empreendedores compreenderem a necessidade de trabalharem em conjunto, para atrair visitantes as Importância do campo para a motivação da destinações turísticas (BEETON, 2006). viagem e satisfação do turista Baixa Alta Neste sentido, a abordagem citada por Beeton (2006) revela a importância da união entre ofertantes de Turismo em áreas rurais Turismo rural turismo de pequenas comunidades que, ao invés de Passeios competirem, possam se promover cooperativamente gerais Turismo de criando uma imagem forte do destino e se desenvolver em aventura Montanhismo direção aos seus objetivos, levando em consideração seus Observação de Turismo reais desejos. pássaros baseado na Outra importante abordagem é apontada por natureza Roberts e Hall (2003) e denomina-se niche marketing, ou, “marketing de nicho”. Os autores ressaltam que o turismo rural, em particular, representa um contexto que desafia a Feriados e atividades de tradicional abordagem do marketing administrativo Turismo conservação baseado na (ROBERTS; HALL, 2003). Partindo da proposição de Mountain agricultura que o turismo rural constitui um mercado de nicho (ou um Bike “Dirigir fora Passeios de número de nichos), propõem o termo “marketing de da estrada” bicicleta nicho” para caracterizar uma abordagem “de baixo para cima” pela qual os gestores de marketing partem por Baixa Possibilidade de identificar um Alta identificar as necessidades de alguns poucos indivíduos e mercado de nicho constroem suas estratégias em cima dela para satisfazer os anseios de um grupo com demandas similares

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Figura 1 - Medindo a importância relativa do campo no arquitetônico e cultural realizado no interior do município consumo do turismo nas áreas rurais. Fonte: ROBERTS; de Bento Gonçalves, no estado do Rio Grande do Sul. HALL, 2004, p. 258. (TRADUÇÃO LIVRE). Idealizado pelo Engenheiro Tarcísio Vasco Michelon e pelo Arquiteto Júlio Posenato, o levantamento constatou De acordo com Roberts e Hall (2004), quando o um grande acervo de casas antigas (de pedra, madeira e foco do consumidor é pautado na satisfação de uma alvenaria), com fácil acesso e interessante potencial necessidade pessoal ou social, e esta é adquirida por turístico, mas que passava por um processo de degradação inúmeros caminhos diferentes e sem ligação com o devido à falta de manutenção ao longo do tempo contexto rural, se torna cada vez mais difícil identificar (Associação Caminhos de Pedra, 2013) um nicho no qual este produto (turismo) se encaixe. Desta forma, ações direcionadas à restauração e Assim, ele perde sua distinção, adquire mais substitutos e reformas deste acervo foram desenvolvidas no sentido de demonstra certa homogeneidade, ao contrário da distinção preservar a cultura e história dos imigrantes italianos na exigida por um estabelecimento de “mercado de nicho”. serra gaúcha. Em 30 de maio de 1992, um primeiro grupo Dreyer e Müller (2011) através de um estudo sobre de turistas provenientes de São Paulo foi recebido no o turismo e a vinicultura na região Alemã de Saale- local e o sucesso do roteiro permitiu a fundação da Unstrut, também introduzem uma abordagem alternativa Associação Caminhos de Pedra, em 1997, com apoio do para o marketing, denominada “marketing cooperativo”. SEBRAE (Associação Caminhos de Pedra, 2013). Segundo os autores, neste caso as ações de marketing A associação, que reúne empreendedores locais e devem ser centralizadas e controladas por uma simpatizantes do turismo, busca contemplar o patrimônio organização e de um determinado local, a fim de fazer cultural dos imigrantes italianos que se instalaram na melhor uso das sinergias (DREYER; MÜLLER, 2011). região a partir de 1875, tanto no que tange às construções Desta forma, a promoção e a organização para gestão do como ao patrimônio imaterial composto pelos dialetos, turismo no destino devem estar unificadas em uma única artes, modos de fazer, folclore, dentre outros. O projeto, organização. por ter sido aprovado pelo Conselho Estadual de Cultura Os autores citam como principais vantagens desta em 1998, capta recursos de empresas locais através da Lei organização em um único ambiente físico, como melhorar de Incentivo à Cultura do Estado do Rio Grande do Sul a comunicação e minimizar a perda de informação, (LIC). aumentando a eficiência na administração e na promoção O roteiro é considerado Patrimônio Histórico do de atividades (DREYER; MÜLLER, 2011). Alguns RS, pela Lei Estadual 13.177/09, e abrange duas linhas exemplos destas atividades são citados por Dreyer e (Palmeiro e Pedro Salgado), que estão localizadas nos Müller (2011): a não duplicação de publicidade em municípios de Bento Gonçalves e Farroupilha. folhetos; uma agenda comum para marketing direto; um Atualmente, conta com 18 Pontos para Visitação e 56 site na internet comum para a região; novas ideias para Pontos para Observação Externa. publicidade conjunta. Desta forma, os autores ressaltam Os chamados pontos para visitação são que medidas de promoção baseadas na cooperação podem empreendimentos particulares de descendentes de desenvolver todo o potencial do marketing de uma região, imigrantes que atendem turistas oferecendo algum tipo de no estudo de caso, uma região de vinícolas na Alemanha produto ou serviço, como alimentação, visitas guiadas, (DREYER; MÜLLER, 2011). degustação, venda de produtos e artesanatos, entre outros. Desta forma, observa-se o delineamento de Em alguns destes estabelecimentos é cobrada uma taxa de diferentes e novas abordagens para o marketing que, entrada por visitante, enquanto outros cobram somente o baseadas em dimensões não somente comerciais e que for consumido. Já os pontos para observação externa econômicas, mas também sociais, culturais e ambientais, estão dispersos em todo o roteiro para apreciação da vem dar suporte ao desenvolvimento da atividade turística paisagem rural e arquitetônica, e não é cobrada entrada. no meio rural. Casas, capelas, monumentos e antigas ferrarias e moinhos fazem parte destes pontos de observação. 4 ASPECTOS METODOLÓGICOS A escolha do objeto de pesquisa se justifica por ser um roteiro já consolidado no estado de Rio Grande do Para alcançar o objetivo proposto por este trabalho Sul, com um grande fluxo de visitantes, e por já utilizar foi necessário seguir alguns procedimentos metodológicos ferramentas de marketing no seu planejamento, como definidos nesta seção. Portanto, esta seção apresenta o pode ser observado inicialmente através da própria percurso metodológico utilizado nesta pesquisa, formatação do roteiro e da página de divulgação na abordando seus métodos e seus procedimentos de coleta internet (www.caminhosdepedra.org.br). de dados, análise e interpretação, além de informações sobre o objeto de pesquisa. 4.2 Sobre a pesquisa

4.1 Sobre o objeto de pesquisa A pesquisa possui o caráter qualitativo, descritivo e se constitui num estudo de caso, uma vez que O Roteiro Caminhos de Pedras foi concebido no caracteriza-se pelo “[...] estudo profundo e exaustivo de ano de 1987, a partir de um levantamento do acervo um ou de poucos objetos, de maneira a permitir o seu

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conhecimento amplo e detalhado [...]” (GIL, 1999, p.72- 5 RESULTADOS E DISCUSSÕES 73). Para a coleta dos dados necessários neste estudo, Como primeiros resultados deste trabalho, será foi utilizada como técnica de pesquisa a entrevista discutida e analisada a entrevista aplicada ao semiestruturada e aberta. Esta opção justifica-se pela representante da Associação Caminhos de Pedra, possibilidade de maior liberdade de manifestação ao responsável por integrar todas as propriedades informante e a compreensão de “dimensões subjetivas da participantes do roteiro e divulgá-las como um todo. ação humana” (BRUMER et al., 2008, p.137) pelo Posteriormente, serão expostas as análises das entrevistas pesquisador, através da menor rigidez em comparação dos 9 empreendimentos selecionados como amostra. com questionários padronizados. Portanto, foram elaborados dois instrumentos de 5.1 O papel da Associação na integração do marketing coleta de dados para serem aplicados a uma amostra de local empreendedores rurais e ao representante da Associação Caminhos de Pedra. Criada em 1997, com o objetivo de unir os Foram estabelecidos três critérios de seleção da empreendedores de turismo rural do Roteiro Caminhos de amostra de empreendedores, de forma compatível aos Pedra, almejando maior organização e apoio financeiro, objetivos propostos pela pesquisa. Ou seja, optou-se por de acordo com o entrevistado, a Associação Caminhos de utilizar uma amostragem não-probabilística intencional, Pedra cumpre um importante papel no planejamento do uma vez que os elementos da amostra serão julgados turismo local. Assim como citado por Dreyer e Müller como adequados com base em critérios pré-determinados. (2011), sobre o “marketing cooperativo”, a Associação Desta forma, foram selecionados somente os concentra em uma única organização e espaço físico, as estabelecimentos com as características abaixo: ações de marketing desenvolvidas para o roteiro como um - Tempo de existência mínimo de 5 anos; todo, facilitando a comunicação, a administração e a - Produção agrícola vinculada à atividade turística; promoção de atividades. - Propriedades que envolvam o maior número de Segundo informações do representante da atividades de forma que a amostra possa representar Associação entrevistado, antes da criação desta, a melhor o todo. divulgação do roteiro era feita pela iniciativa privada, Assim, a partir de um universo de 18 mais especificamente pelo Hotel Dall’Onder, responsável estabelecimentos, ou seja, pontos de visitação do Roteiro pela criação do roteiro. Portanto, a criação da Associação Caminhos de Pedra, foram selecionados 9 por se foi de extrema importância para aqueles pequenos adequarem aos critérios definidos previamente. Desta proprietários que estavam deixando sua atividade agrícola forma, a amostra caracteriza exatamente 50% da para receber turistas, ou seja, de agricultores passaram a totalidade. prestadores de serviços de lazer. No início, o papel A coleta de dados em campo foi realizada durante principal da associação era organizar os empreendimentos o período de 14 a 22 de junho de 2013 e todas as para receber visitantes, realizar o agendamento de grupos, entrevistas foram gravadas, por se constituírem de fazer alguma divulgação do roteiro e buscar recursos questões abertas, de forma que a análise dos dados foi junto à iniciativa pública. facilitada. Atualmente, a Associação já possui funcionário Para fase de análise, os dados coletados em campo específico para desenvolver as ações de marketing foram organizados. Como primeiro passo, as entrevistas promocional do roteiro, que são: confecção e distribuição semiestruturadas e gravadas foram transcritas e de mapas (que contém breves informações sobre o roteiro transferidas para o software de análise qualitativa e sobre as propriedades componentes), participação em WebQDA. Além disso, foram criadas categorias para eventos (feiras, congressos e festivais; regionais e organização das entrevistas, uma vez que, sendo nacionais), participação na mídia local e nacional compostas por questões abertas, as respostas tendem a ser (programas de televisão, revistas, jornais, filmes, novelas) as mais variadas (GIL, 1999). e atualização da página na internet. De acordo com o Sobre as categorias de análise, elas foram ser pré- entrevistado, a principal finalidade destas ações é elaboradas anteriormente à pesquisa de campo e com o balancear o número de turistas nas temporadas, uma vez auxílio de uma pesquisa exploratória realizada no dia 9 de que no inverno e na época de colheita da uva maio de 2013. Assim, as categorias foram predefinidas, a (fevereiro/março) a procura é muito superior; e nas partir da suposição de respostas possíveis a cada pergunta, diferentes propriedades, visto que algumas casas recebem e ajustadas conforme as respostas obtidas após a coleta de muito mais turistas que outras, devido à presença ou não dados. do patrimônio histórico edificado. Verifica-se, portanto, a Por fim, todas as entrevistas foram categorizadas e, tentativa de superar uma das características da atividade posteriormente, interpretadas, dando origem ao presente turística citada por Beeton (2006), a perecibilidade, e trabalho. comentada por Dolli e Pindolf (1997) como fator a ser considerado na gestão do marketing de empreendimentos rurais, devido à sazonalidade da demanda.

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Outra característica importante a ser destacada, é a no caso do roteiro aqui estudado, suas características participação das propriedades na elaboração do material culturais e seu patrimônio histórico edificado. Entretanto, promocional do roteiro, o mapa informativo. Segundo o ao ser questionado se a associação desenvolve alguma entrevistado, são realizadas consultadas nas “Reuniões de estratégia de comunicação no sentido de orientar o Estabelecimento”, quando os participantes podem comportamento do turista, tendo em vista a fragilidade do expressar suas opiniões e apresentar as informações de espaço rural, o representante entrevistado afirma que não suas propriedades que desejam que sejam expressas no há campanhas deste cunho uma vez que ainda não houve mapa. Posteriormente, o material é levado a uma gráfica e necessidade para tal, pois os casos de poluição, um exemplar piloto é preparado para que possam ser depredação e desrespeito com a cultura local são isolados. realizadas correções e alterações. Além disso, cada Afirma, ainda, que o público que demanda o Roteiro empreendimento pode disponibilizar sua folheteria Caminhos de Pedra geralmente é mais conscientizado individual (caso a tenha) para que a Associação distribua sobre estas questões. nos eventos que participar, fazendo uma ponte entre os Quanto ao apoio organizacional para a promoção proprietários e os turistas potenciais. Portanto, assim do roteiro, o representante da Associação afirma receber como no “marketing cooperativo” sugerido por Dreyer e ajuda a Secretaria de Turismo do Município de Bento Müller (2011), observa-se que Associação Caminhos de Gonçalves, tanto financeira (em determinados casos) Pedra permite o desenvolvimento destas ações conjuntas quanto na realização de contatos e divulgação. Além entre as propriedades, como uma folheteria única, uma disso, afirma ter o Sebrae como parceiro desde o início da agenda comum para eventos, um site em comum na formatação do Roteiro com a realização de cursos internet e novas ideias para publicidade. São medidas que profissionalizantes para proprietários e funcionários. facilitam o acesso destes pequenos empreendedores às Quanto às principais dificuldades encontradas para ferramentas de marketing promocional. O discurso do realizações de ações de marketing do destino, o representante entrevistado abaixo ilustra bem esta entrevistado cita, principalmente, a escassez de recursos importância da união dos estabelecimentos na financeiros, uma vez que a arrecadação da Associação é Associação: baixa e não há recursos públicos disponíveis exclusivamente para promoção. Desta forma, buscam Quanto mais unidos nós estivermos, organizar e gerir os gastos da organização da melhor conseguimos fazer um trabalho melhor. São maneira possível e buscar recursos através de projetos a mais pessoas tentando chegar num objetivo nível federal. comum. Em várias ideias sempre surge uma Portanto, ressalta-se a questão do capital financeiro que tem uma maior aceitação. Então a como um dos principais desafios da Associação participação de todos é muito importante. Caminhos de Pedra para o desenvolvimento de ações (Representante da Associação Caminhos de promocionais. Como pode ser encontrado na literatura Pedra) supracitada, o planejamento e a gestão eficaz de marketing fazem-se extremamente necessários, de Este viés pode ser observado na abordagem maneira que estes recursos financeiros e outros sugerida por Beeton (2006), do marketing com base em disponíveis, como naturais, culturais e humanos, muitas comunidades, em que ressalta a oportunidade de pequenas vezes fragilizados, possam ser aproveitados de modo que comunidades se envolverem no planejamento do beneficie as comunidades receptoras do turismo. Desta marketing local, de forma que este não seja uma forma, a Associação, como centralizadora das ações de imposição de grandes organizações. Desta forma, é marketing do roteiro como um todo, deve buscar o melhor possível que as ações de marketing desenvolvidas tenham uso destes recursos disponíveis para promover o destino objetivos propostos, de fato, por membros da comunidade Caminhos de Pedra. de empreendedores rurais do roteiro. Entretanto, cabe Entretanto, cabe ressaltar que este fato não isenta a ressaltar que, nesta pesquisa, não foram entrevistados necessidade da maioria dos empreendimentos outros moradores da comunidade de São Pedro, onde o desenvolverem estratégias de marketing promocional roteiro está localizado, e não se sabe a participação destes individualmente, o que poderá ser inferido a partir da no planejamento do destino turístico, uma vez que, análise das entrevistas com estes proprietários. Ou seja, mesmo não ofertando atividades de turismo, podem ser mesmo havendo divulgação do roteiro através do trabalho afetados por todos seus aspectos positivos e negativos. da associação, muitas das casas que oferecem atividades Portanto, outras pesquisas seriam necessárias para de turismo estão desenvolvendo suas próprias ações averiguar o envolvimento de outros membros da individuais. comunidade no marketing local. Outro aspecto importante a ser levado em 5.1 A visão dos pequenos empreendedores consideração na gestão do marketing em destinos turísticos rurais e levantado por Kastenholz (2006b) em Buscando caracterizar as ações de marketing sua abordagem do “Marketing integrado e sustentável do realizadas pelas nove propriedades selecionadas no destino”, é a gestão da procura, ou seja, buscar atrair Roteiro Caminhos de Pedra como amostra deste estudo, turistas que valorizem o que a comunidade tem a oferecer, observa-se, na Tabela 1, a preferência dos entrevistados

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em desenvolver folheteria promocional participar de preocupação relevante para os entrevistados, o que pode eventos e estar presente na internet, seja através de site ou indicar que, como discorrido pelo representante da redes sociais. Outra categoria bastante citada refere-se à Associação, o perfil do turista do roteiro ainda não traz divulgação boca a boca, onde os próprios turistas passam grandes incômodos de ordem cultural, social e ambiental as informações do local posteriormente à sua visita. Daí a à comunidade local. necessidade de bem recebê-los para o retorno da divulgação. Tabela 3 – Finalidade pela qual desenvolve estratégias de marketing promocional nas propriedades Tabela 1 – Estratégias de marketing promocional Finalidade Referências desenvolvidas nas propriedades Aumento do fluxo de turistas/vendas 9 Estratégia Marketing Promocional Referências Divulgar o roteiro como um todo 2 Folheteria promocional 7 Melhora na qualidade do visitante 1 Participação em eventos 6 Divulgar a cultura local 3 Bem receber e demonstração de 5 Explicitar o que o empreendimento produtos para divulgação boca a boca 4 oferece Inovação de produtos 1 Fonte: Pesquisa de campo, 2013. Página na internet / Redes sociais 6 Criação de marca 1 Observa-se na Tabela 4 que o público alvo pelo Participação gratuita na mídia 3 qual os empreendimentos destinam suas ações de Fonte: Pesquisa de campo, 2013. marketing individuais é bastante variado, de acordo com as especificidades de cada propriedade e os serviços e Além disso, inovação de produtos, criação de produtos que oferecem. Entretanto, o público particular, marca e participação gratuita na mídia também foram composto por famílias, casais ou pequenos grupos; e o ações de marketing promocional citadas por alguns dos público infantil foram as categorias mais citadas devido, entrevistados, mesmo que em pequena dimensão. principalmente, ao poder de compra e o tempo disponível Quanto à necessidade de desenvolver estratégias para aproveitar a estrutura turística local, podendo de marketing promocional individualmente, a categoria usufruir de suas qualidades e, posteriormente, divulgar a mais citada (Tabela 2) diz respeito à modificação ou outros possíveis turistas potenciais. fortalecimento da imagem do empreendimento perante os consumidores, devido a mudanças nos tipos ou na Tabela 4 – Público alvo das ações de marketing dos qualidade dos serviços oferecidos. Outra categoria empreendimentos entrevistados bastante citada faz referência à impossibilidade da Público alvo Referências Associação divulgar cada propriedade individualmente, Público infantil 3 portanto a necessidade de despenderem recursos próprios Público feminino 1 para tal. Não busca atingir um público 3 Tabela 2 – Necessidade de desenvolver estratégias de específico Público que busque adquirir produtos marketing promocional nas propriedades individualmente 2 Necessidade Marketing diferenciados Referências Público particular - Famílias, casais e Promocional 4 pequenos grupos Impossibilidade da Associação 3 divulgá-los individualmente Terceira idade 1 Fonte: Pesquisa de campo, 2013. Modificar/Ressaltar a imagem do 4 empreendimento Quanto à distribuição dos materiais de promoção individuais, grande parte dos entrevistados citou os Exigência do consumidor atual 1 centros de informação turística e os hotéis e agências do Ser referência no setor 1 município e da região como praças principais. Somente Fonte: Pesquisa de campo, 2013. duas referências à grande Porto Alegre foram identificadas nas entrevistas, podendo caracterizar um Quando questionados sobre a finalidade pela qual foco no turismo regional. desenvolvem ações de marketing em suas propriedades, os entrevistados foram unânimes em citar, além de outras, o aumento do fluxo de turistas e vendas. Poucos citaram, por exemplo, a melhora na qualidade do turista que o visita. Observa-se, que, no momento, esta não foi uma

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Tabela 5 – Distribuição dos materiais de promoção citadas envolvem a Prefeitura Municipal de Bento Distribuição dos materiais de Gonçalves, através das Secretarias de Turismo e Referências promoção Agricultura, e a Associação Caminhos de Pedra, a qual foi Centros de informação turística do referência unânime entre os empreendedores, como pode 6 município e região ser observado na Tabela 7. Destaca-se, portanto, entre a Hoteis e/ou agências do município e opinião dos entrevistados, a importância da Associação 7 da região como apoio para a realização das ações de marketing das propriedades do roteiro. Junto ao produto comercializado 2 Esta importância pode ser mais bem especificada Eventos 3 nas respostas da questão sobre a importância da Outras propriedades do Roteiro 4 Associação para os empreendimentos do roteiro, onde Na Grande Porto Alegre 2 cada entrevistado ressaltou as características mais Fonte: Pesquisa de campo, 2013. relevantes de estarem unidos nesta organização (Tabela 8). As categorias que fazem referência à cooperação entre Ao serem questionados sobre como fazem uso do os estabelecimentos e o fato do turista buscar mais de uma patrimônio histórico cultural (como a gastronomia, as propriedade para visitar, foram citadas como principal casas de pedra e os costumes locais) na divulgação de importância da associação para o marketing local. Os suas propriedades grande parte dos entrevistados afirmou trechos das entrevistas abaixo ilustram perfeitamente estas fazer referência a estes recursos na folheteria categorias: promocional, com imagens e/ou textos (Tabela 6) Acho que ter um produto bom é ótimo, Tabela 6 – Uso do patrimônio histórico/cultural na mas, se tivermos dez produtos ótimos divulgação da propriedade juntos, é melhor ainda. Claro que numa Uso do patrimônio histórico/cultural associação o trabalho é difícil de realizar Referências na divulgação em conjunto, muitas vezes nem tudo que se quer acontece. Mas só pelo fato de estarmos Destaque da cultura/história no 6 juntos num roteiro já contribui para a material promocional divulgação (Entrevistado 6). Referência ao Roteiro Caminhos de Pedra como destino que visa preservar 1 Por causa da nossa união é que estamos tão a cultura local fortes em turismo aqui na região. O nosso Demonstração/participação do turista roteiro já é diferenciado, pois cada no modo de vida no local e cultura 5 estabelecimento tem um produto próprio, para posterior divulgação boca a boca então a gente indica o outro sem problema Fonte: Pesquisa de campo, 2013. nenhum. Não somos concorrentes, cada um tem seu produto (Entrevistado 3) Além disso, muitos reforçaram a importância de demonstrar sua cultura e tradição junto às atividades Observa-se na literatura, principalmente em turísticas e, até mesmo, envolver o turista nestas Beeton (2006), a importância da união destes pequenos atividades, de forma que o estimule a divulgar a estabelecimentos que ofertam serviços de turismo no propriedade posteriormente. O trecho da entrevista abaixo meio rural que, ao invés de competirem, podem se ilustra muito bem esta categoria: promover conjuntamente, criando uma imagem forte do destino, o que também foi citado por dois dos Acho que o boca a boca é a melhor forma entrevistados em relação à formatação do roteiro e a de divulgação e o que as pessoas falam é o associação dos empreendimentos a ele (Tabela 8). que elas veem. Então, eles vêm aqui e veem Entretanto, apesar de muitos entrevistados citarem a a gente trabalhando, fazendo o sapeco da cooperação entre os estabelecimentos como grande erva, a estuda cheia de erva mate secando, importância da Associação, cabe ressaltar a opinião de como o fogo é feito, na hora de socar e três empreendedores de que há a necessidade de fortalecer embalar. Os turistas mesmo pedem para o elo entre seus integrantes, o que pode indicar a alguma embalar o seu pacote de erva mate. Eles disparidade entre eles. querem interagir com a gente e passam para outras pessoas tudo o que fazem e veem. Então mostrando a nossa cultura contribuímos para a divulgação de nossa casa (Entrevistado 3).

Quanto ao apoio institucional ou público na organização das ações de marketing, as categorias mais

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Tabela 7 – Apoio institucional/público nas ações de Tabela 10 – Dificuldades na divulgação individual as marketing propriedades Apoio Institucional/Público Referências Dificuldades na divulgação Referências Prefeitura Municipal de Bento Altos custos 5 Gonçalves / Secretaria de 6 Falta de pessoal/tempo para participar 2 Turismo/Agricultura de eventos Associação Caminhos de Pedra 9 Dificuldade em participar de eventos a 1 Bento Convention Bureau 2 nível nacional Mídia privada 1 Questões burocráticas 2 Fonte: Pesquisa de campo, 2013. Infraestrutura pública - telefone, 3 Tabela 8 – Importância da Associação para os internet, sinalização empreendedores Não há dificuldades 1 Importância da Associação Referências Fonte: Pesquisa de campo, 2013.

O turista não se desloca para visitar 4 Portanto, pode ser necessário rever o somente uma casa aproveitamento destes recursos direcionados ao A formatação do Roteiro e a desenvolvimento de estratégias promocionais individuais, associação dos nomes 2 visto que são considerados escassos tanto pela Associação estabelecimentos a ele facilita a quanto pelos empreendedores. No contexto do marketing divulgação cooperativo citado por Dreyer e Müller, por exemplo, Cooperação entre os estabelecimentos 5 seria interessante uma reorientação dos recursos visando Redução nos custos de divulgação 1 reforçar os trabalhos da associação, permitindo uma Necessidade de fortalecer a união 3 gestão eficaz do marketing no Roteiro Caminhos de Pedra Fonte: Pesquisa de campo, 2013. como um todo. Todavia, é importante ressaltar que cabe aos empreendedores locais decidirem qual a melhor

Quanto à participação das propriedades na alocação de seus recursos. elaboração dos materiais de promoção da Associação Além do fator financeiro, a escassez ou ressalta-se que existem reuniões periódicas onde todos os precariedade da infraestrutura pública, como associados são convidados a participar, para discutir disponibilidade de telefone e internet e a sinalização do diferentes questões a respeito do roteiro, inclusive ações roteiro, foi considerada um desafio relevante pelos promocionais. entrevistados. Ressalta-se que estas questões estão, muitas vezes, associadas a burocracias, que também foram Observa-se na Tabela 9 que quase todos os citadas por alguns dos empreendedores locais como entrevistados afirmaram participar com opiniões e ideias dificuldade na divulgação. sobre os materiais promocionais desenvolvidos pela Associação Caminhos de Pedra. Alguns poucos citaram a necessidade a eventual participação financeira e o fato de Tabela 11 – Estratégias para superar as dificuldades na haver pouca participação geral. divulgação individual das propriedades Estratégias para superar Referências Tabela 9 – Participação das propriedades dificuldades Participação na elaboração dos Buscar apoio da prefeitura e outras Referências 2 materiais da Associação entidades Focar na qualidade dos produtos e Opiniões/ideias/aceitação/não 2 8 serviços aceitação sobre os materiais Reforçar a união dos estabelecimentos 3 Participação financeira 2 Contratação de empresas 1 Poderia haver maior participação 1 especializadas Fonte: Pesquisa de campo, 2013. Não desenvolve estratégias 3 Fonte: Pesquisa de campo, 2013. Quando questionados a respeito das dificuldades encontradas para divulgar seus empreendimentos Por fim, é interessante observar na Tabela 11, uma individualmente, a categoria referente aos altos custos foi das estratégias citadas como relevante por três dos a mais citada entre os entrevistados. Desta forma, assim entrevistados foi de reforçar a união dos estabelecimentos, como para a Associação, a falta de recursos financeiros destacando-se, mais uma vez, a importante função da para divulgação também é um desafio encontrado pelos Associação Caminhos de Pedra de unir os empreendedores nas suas ações de marketing individuais. empreendedores a fim de solucionar os desafios em conjunto.

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AGRADECIMENTOS 6 CONCLUSÕES Os autores agradecem a todos os empreendedores A análise e interpretação dos dados coletados e ao representante da Associação Caminhos de Pedra pela através das entrevistas com empreendedores locais e o disponibilidade em responder às questões propostas pelas representante da Associação Caminhos de Pedra permitiu entrevistas deste trabalho. Agradecem, ainda, a família delinear as principais características, desafios e discussões Strapazzon pela acolhida e apoio em todo o período de a respeito do planejamento do marketing no Roteiro coleta de dados da pesquisa. estudado. Observa-se que muitos esforços são aplicados REFERÊNCIAS como o objetivo de tornar o roteiro mais conhecido e, consequentemente, aumentar o fluxo de turistas e as ALMEIDA, J. A; SOUZA, M. (orgs). Turismo rural: vendas de produtos locais. Por um lado, estas ações de Patrimônio, cultura e legislação. Santa Maria: FACOS – marketing trazem benefícios aos empreendedores, UFSM, 2006. principalmente em relação à renda e o fazem, no momento, também em relação à valorização sociocultural. BEETON, S. Community development through Entretanto, não foram identificadas ações de marketing tourism. Melbourne: Landlinks Press, 2006. visando à qualidade do turista e, como observado na literatura, a massificação desta atividade pode vir a trazer BRUMER, A; ROSENFIELD, C. L; HOLZMANN, L; problemas de ordem cultural e ambiental nestas DOS SANTOS, T. S. A elaboração de projeto de pesquisa comunidades. Desta forma, cabe reforçar a importância em Ciências Sociais. In: PINTO, C. R. J; GUAZZELLI, do planejamento do marketing estar de acordo com as C. A. B. (orgs). Ciências Humanas: pesquisa e método. verdadeiras necessidades das comunidades locais e levar Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008. em consideração não somente seus aspectos econômicos, mas de ordem social, cultural e ambiental, de forma que o CAMPANHOLA, C; DA SILVA, J. G. O agroturismo turismo possa ser uma atividade vantajosa para o rural, como nova fonte de renda para o pequeno agricultor tanto para os que ofertam estes serviços como para toda a brasileiro. In: Turismo rural: Ecologia, lazer e população. desenvolvimento. Bauru: EDUSC, 2001. Destaca-se o papel da Associação Caminhos de Pedra na união dos estabelecimentos e na divulgação do DIAS, R; CASSAR, M. Fundamentos do Marketing roteiro como um todo. Como observado nas análises, Turístico. São Paulo: Prentice Hall, 2005. apesar das dificuldades de integração e de algumas disparidades entre os empreendedores, a Associação está DOLLI, N; PINFOLD, J. F. Managing rural tourism sempre presente no discurso destes como um elo do business: financing, development and marketing issues. roteiro. Entretanto, cabe salientar que, apesar do papel de In: PAGE, S.J; GETZ, D. The business of rural divulgação do roteiro desempenhado por esta tourism: International perspectives. Oxford: Thomson organização, todos os estabelecimentos desenvolvem suas Business Press, 1997. próprias estratégias de marketing individuais, sejam elas mais elaboradas ou mais simples. DREYER, A; MÜLLER, J. Opportunities of cooperative Em relação às dificuldades no desenvolvimento do marketing using the example of the wine region Saale- marketing, observa-se que, para ambos os tipos de Unstrut. In: SIDALI, K. L; SPILLER, A; SCHULZE, B. entrevistados, o desafio principal é a falta de recursos a Food, Agri-Culture and Tourism: Linking local serem destinados à promoção do destino e das gastronomy and rural tourism: interdisciplinary propriedades. Assim, visando uma abordagem de Perspectives. Berlin: Springer, 2011. marketing mais sustentável, seria interessante a realocação dos recursos financeiros tanto da Associação ELESBÃO, I. Impactos socioeconômicos do turismo no quanto dos empreendedores, visando à superação desta espaço rural. In: SOUZA, M; SANTOS, E.O. (Orgs). dificuldade e a melhor definição das estratégias de Teoria e prática do turismo no espaço rural. Barueri: marketing local. Manole, 2010, p.150-166. Por fim, observa-se que há um esforço no trabalho da Associação Caminhos de Pedra na direção de unir os GIL, A. C. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. 5.ed. empreendedores membros do destino e definir ações São Paulo: Atlas, 1999. conjuntas de marketing turístico. Entretanto, ressalta-se a necessidade de incluir outras dimensões nos objetivos GILBERT, D. Rural tourism and marketing: Synthesis destas estratégias, como culturais, sociais e ambientais, and new ways of working. Tourism Management, mar., visando evitar impactos negativos e seguir na direção de 1989. uma abordagem de marketing mais sustentável. HENCHE, B.G. Marketing del turismo rural. Madrid: Piramide, 2006.

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LEVANTAMENTO DAS ESTRATÉGIAS LIGADAS AO COMPOSTO DE MARKETING PRATICADAS POR EMPRESAS VINCULADAS AO TURISMO: ESTUDO MULTICASO

FÁBIO LUCIANO VIOLIN LETÍCIA S BORGES GRAZIELA A. SILVA

Universidade Estadual Paulista - Unesp Campus de Rosana [email protected]

RESUMO - O presente estudo analisou cinco casos de empresas vinculadas ao turismo especificamente na parte concernente a eventos ou estruturas a eles relacionados, e assim realizar um levantamento das estratégias ligadas ao Composto de Marketing por elas praticada na execução de produtos e serviços. O elemento de seleção teve como foco prioritário empresas contempladas com o prêmio Caio, por considerar que já existe um padrão de análise que justifique ações acertadas e profissionalizadas. Através da revisão da literatura, análise de dados primários e secundários bem como o alinhamento de um instrumento adequado de averiguação da realidade, foi possível apontar que as estratégias mercadológicas utilizadas seguem padrões diferentes conforme o ramo de eventos de cada empresa e que possivelmente ações que são adequadas em uma empresa do ramo de turismo vinculado a eventos não servirá a outra do mesmo ramo contudo com vertente diferente.

Palavras chave: Turismo; Composto de Marketing, Eventos.

ABSTRACT - This study examined five cases of companies related to tourism specifically on the concerning events or structures related to them, and so survey the strategies linked to the Marketing Mix practiced by them in the performance of products and services. The element selection priority focused companies awarded the prize Caio, considering that there is already a standard analysis justifying agreed actions and professionalized. Through literature review, analysis of primary and secondary data as well as the alignment of a suitable tool of investigation of reality, it was possible to point out that the marketing strategies used follow different patterns according to the business of each company events and actions that are possibly appropriate in a branch company of tourism linked to events will not serve another branch of the same but with different side.

Key Words: Tourism, Marketing Mix, Events.

1 INTRODUÇÃO constantes fez - se necessário criar estratégias refinadas para a prospecção, captação e manutenção que permita a Em um mundo cada vez mais competitivo em que obtenção de resultados almejados dentro de um elementos como a tecnologia, o comportamento do determinado período, tendo a tarefa de obter e manter consumidor e até mesmo fatores ambientais, vem sendo resultados positivos que nem sempre acaba sendo alterados rapidamente, surge à emergência de análise dos permanente. fatores que auxiliam ou dificultam o alcance as decisões na Os elementos ligados ao composto de Marketing busca de resultados no campo de atuação. Este contexto de (produto, preço, promoção e praça) se apresentam como competitividade aliada a mudanças estruturais rápidas e parâmetros interessantes no auxílio da execução do

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processo de planejamento de ações necessárias para a realizar inferências a respeito das semelhanças percebidas efetiva aliança entre os esforços de uma organização e os dentro do grupo que compõem o público alvo. resultados obtidos no mercado (YUDELSON, 1999). Foram entrevistados cinco organizações através de seleção Torna-se vital levantar para a área de turismo aleatória tendo uma amostra por conveniência, que é elementos considerados relevantes para a sobrevivência, o aquela segundo Triviños (1997) é aquela em que o crescimento e a perpetuação das atividades empresariais pesquisador seleciona os membros da população mais através das práticas consideradas essenciais no contexto acessíveis ao estudo. Dessa forma foram contatadas e atual. As empresas ligadas de forma direta ou indireta ao acionadas cinco organizações ganhadoras do referido turismo têm enfrentado cenários mais competitivos e prêmio, contudo em edições diferentes, sendo elas das profissionalizados, necessitando de resultados seguintes áreas: satisfatórios, desta forma a função do marketing estratégico é o de identificar os usuários ou turistas a) A primeira trabalha com a Captação de eventos; potenciais, interpretar suas necessidades e desejos além de b) A segunda que promove a organização de congresso; permitir a correta segmentação e posicionamento frente ao c) A terceira organização promove sob demanda seu público-alvo. convenções; Interpretar os sinais advindos do mercado e d) A quarta promove viagens de incentivo; e transformá-los em ações coerentes exige conhecimento, e) A quinta e última organização promove sob demanda preparo e deliberados estímulos sendo aspectos de simples seminários e fóruns. escolha ou de diversos elementos. E ao considerar a dificuldade de estabelecer relações claras e racionais entre Cada uma das categorias está relacionada dentro do uma necessidade humana e os benefícios almejados por um contexto do prêmio e os respondentes (público alvo) da usuário dos serviços ou produtos do turismo, o composto coleta de dados foram os responsáveis pela organização. de marketing surge como elemento básico na interpretação, Tais organizações foram contatadas e as que sinalizaram montagem de propostas, inserção de estímulos e de forma positiva para a pesquisa receberam acesso a um crucialmente a capacidade de influenciar fluxos de questionário online que continha questões de natureza demanda reais ou potenciais. fechada e semi-aberta. AMARO et. al. (2005) afirmam que Dessa forma o objetivo do estudo foi o de levantar o "questionário do tipo fechado tem na sua construção as principais estratégias ligadas ao Composto de Marketing questões de resposta fechada, permitindo obter respostas praticadas por empresas vinculadas de forma direta ao setor que possibilitam a comparação com outros instrumentos de eventos. de recolha de dados". (AMARO, et. al., 2005, p.6). Já as perguntas semi-abertas ou mistas são definidas pelas 2. METODOLOGIA autoras como questionários que apresentam questões de diferentes tipos: resposta aberta e resposta fechada. Esse estudo foi considerado como tendo cunho O problema de pesquisa evidenciado nessa investigação exploratório, pois apesar do assunto “composto de baseia-se na hipótese de que existe disparidade e pesos Marketing”, possuir na literatura farta quantidade de diferentes no uso das ferramentas de cada elemento do material, o foco deste material se concentra composto de Marketing, sendo assim conceitua-se fundamentalmente na análise da sua relação com o setor de pesquisa qualitativa, como aquela cujo “pesquisador eventos que constitui tema pouco explorado pela literatura deverá definir os procedimentos adequados ao caso que se O universo de interesse deste estudo versou sobre pretende estudar de modo especifico, podendo ter que organizações privadas ganhadoras ou que concorreram ao mudar a conduta quando estiver realizando a pesquisa de prêmio Caio. Tal prêmio é ofertado as organizações que se campo se a situação exigir” (DENKER, 2007). apresentam como referência em suas respectivas categorias Esse estudo realizou-se por meio de método dedutivo, que e são consideradas referência no setor de eventos. Seltiz et. tem por objetivo explicar o conteúdo de premissas maiores al. (1987), salientam que uma população é um agregado de partindo do geral ao particular, segundo Rodrigues, uma todos os casos que se adequam a algum conjunto de vez que parte do conhecimento gerado será fundamentado especificações pré-definidas e também o universo sobre o na teoria existente referente ao tema composto de qual os pesquisadores desejam generalizar os resultados Marketing e organizações vinculadas a eventos. encontrados na pesquisa. A pesquisa por sua natureza qualitativa servirá de base para a ampliação em futuros estudos dentro do mesmo campo 3. COMPOSTO DE MARKETING de análise ao se valer do estudo multicaso cuja definição é dada por Trivinos (1997) salientando que tal tipo de estudo A fundamentação teórica desse capítulo divide-se em três permite a análise de dois ou mais casos sem partes, na primeira são apontados os aspectos iniciais que necessariamente comparar os resultados obtidos em cada dão suporte a segunda parte que trata dos componentes um deles. Mesmo que haja semelhanças entre os casos o básicos do Composto de Marketing finalizando com objeto de análise concentra-se nos casos em particular e aspectos relacionados ao Marketing Turístico. que tem valor em si próprio. Posteriormente pode-se 3.1 Aspectos Iniciais

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Composto de Marketing (SHAPIRO, 1985, McCARTHY, As ações de Marketing visam fundamentalmente à geração 1960; CHURCHILL e PETER, 2000). de elementos que de forma específica se propõem a gerar Hax e Majluf (1996) ampliam a ideia de estratégia ao satisfação na relação entre uma organização e seus clientes, pregarem que estratégia é o conjunto de decisões coerentes, sejam reais ou potenciais. Ao considerar taxas de unificadoras e integradoras que determina e revela a mortalidade de empresas em especial as iniciantes, pode-se vontade da organização em termos de objetivos de longo observar que são elevadas, devido à necessidade de busca prazo, programa de ações e prioridade na alocação de por adequação das organizações e de seus profissionais em recursos. termos de qualidade na tomada de decisão, muitas vezes Os conceitos então associados ao Composto de Marketing por causa de inexperiência, venda insuficientes, despesas foram explicados por diversos autores através de uma lista excessivas e fatores econômicos (McCARTHY, 1960; de variáveis ou ferramentas e suas atividades inerentes. O MINTZBERG e QUINN, 2001). conceito ganhou estrutura e popularização através dos O Marketing é apontado como capaz de agregar valor a estudos de McCarthy na década de 60. O autor defendeu produtos e serviços com foco na atração, estímulo e gestão que o Composto de Marketing compreende as decisões que da demanda tendo como base a identificação de uma organização precisa realizar a respeito destas variáveis necessidades e desejos dos consumidores dentro dos controláveis. A ideia de que as variáveis eram controláveis segmentos de mercado. As organizações ofertam produtos baseava-se no pressuposto que os elementos vinculados ao como bens físicos, serviços, ideias, lugares, pessoas ou composto de Marketing eram elementos vitais para as informações para atender as demandas específicas, tomadas de decisão nas organizações (BOONE e KURTZ, podendo ser considerado um produto de qualquer oferta 2001). que venha ao encontro de uma necessidade ou desejo McCarthy (1960) então reuniu tais variáveis (KOTLER, 2000). controláveis de Marketing e as categorizou em quatro À medida que os níveis competitivos aumentam, as partes: Produto, Preço, Promoção (Comunicação) e Praça organizações precisam se adequar as exigências do (Logística). Conforme a figura a seguir: mercado, reagindo às mudanças na busca por crescimento e até mesmo por sobrevivência.

3.2 Componentes do Composto de Marketing

O conceito inicial a respeito do Composto de Marketing foi introduzido em 1953, tendo como base um profissional que realizava a combinação de “diferentes ingredientes”. A partir de então, a expressão Composto de Marketing passou a ter a conotação de “Mistura” com a finalidade de se obter respostas vinculadas ao mercado de atuação das empresas (CHURCHILL e PETER, 2000), compreendendo as decisões que uma organização precisa realizar a respeito destas variáveis controláveis. Então McCarthy (1960) Figura 1: Elementos do Composto de Marketing reuniu tais variáveis controláveis de Marketing e as Fonte: Adaptado de Kotler e Keller, 2006 e McCarthy, categorizou em quatro partes: Produto, Preço, Promoção 1996 (Comunicação) e Praça (Logística). KOTLER (2000) defende que o Composto forma um dos Kotler (2000) defende que o Composto de alicerces fundamentais na atualidade e o defini como um Marketing forma um dos alicerces fundamentais na conjunto de ferramentas mercadológicas que uma atualidade e o defini como um conjunto de ferramentas organização se vale para perseguir seus objetivos de mercadológicas que uma organização se vale para Marketing dentro do mercado-alvo de interesse. Existe um perseguir seus objetivos de Marketing dentro do mercado- grande risco associado ao se abordar cada função do alvo de interesse. O autor ainda defende a idéia de que o composto de Marketing de forma isolada, pois existe uma composto traz em si a idéia de um conjunto organizado de relação de interdependência dinâmica associada aos instrumentos que dão suporte ou parâmetro para que as elementos e que decisões isoladas podem ao invés de decisões sejam tomadas de forma coerente e eficaz. beneficiar uma organização vir a comprometer seus Aaker (2001) aponta que o Composto de resultados. (COOK et al., 1989; SHAPIRO, 1988, Marketing conforme foi concebido por McCarthy advém KOTLER e KELLER, 2006; LAMBIN, 2000). da corrente de pensamento em Marketing intitulada Escola A partir da popularização dos 4 P’s surgiram outras Funcional a qual direcionava sua atenção e esforço a abordagens como a dos 4A’s (Análise, Adaptação, funcionalidade das atividades ligadas ao mercado. Ativação e Avaliação) e os 4C’s (Cliente, Custo, A literatura especializada tem apontado através de estudos Conveniência e Comunicação), contudo, nenhuma das e casos que existe um grande risco associado ao se abordar duas abordagens representa exclusivamente decisões cada função do composto de Marketing de forma isolada. relacionadas às variáveis controláveis propostas pelo

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Segundo diversos autores existe uma relação de coordenadas dentro de objetivos definidos ao longo de um interdependência dinâmica associada aos elementos e que período de tempo pelas organizações. decisões isoladas podem ao invés de beneficiar uma organização vir a comprometer seus resultados pela ausência de aderência entre as ações e as necessidades e 4 EVENTOS desejos dos clientes (Cook et al., 1989; Shapiro, 1988; Lambin, 2000; Kotler e Keller, 2006). O ser humano sempre foi ávido por viver situações de Por fim salienta-se que um programa de Marketing descobertas e de grandes acontecimentos. Isso pode ser consistente, integrado e com capacidade de alavancagem evidenciados através dos relatos das experiências de mesmo estando em consonância com os requisitos exigidos civilizações antigas, nas quais foram encontrados registros pelo mercado pode não ser suficiente para gerar os de deslocamentos de pessoas de uma localidade a outra que objetivos almejados, pois dentro do processo existem as se reuniam para tratar de assuntos de interesse de grupos variáveis incontroláveis pela organização que podem afetar ou da coletividade (MATIAS, 2007) de forma direta ou indireta os resultados (AAKER e De acordo com Ignarra (2003) era também econômica a JOACHIMSTHALER, 2000; NASCIMENTO e motivação por viagens exploratórias dos povos antigos os LAUTERBORN, 2007), sendo preciso ressaltar que nem quais buscavam conhecer novas terras para sua ocupação e sempre os programas mercadológicos se ajustam de forma posterior exploração. Com isso, pode-se perceber, que o impar ao paradigma “produto, comunicação, logística e hábito por viajar e conhecer novos lugares se deu por preço” e que, portanto analisar de forma pormenorizada a numerosos motivos constituindo-se como um fenômeno ao contribuição de cada elemento se torna ponto pacífico de longo da história da humanidade. atuação. Segundo Giacaglia (2006) a cada ano os eventos crescem em número, proporção e grau de sofisticação, assumindo 3.3 Conceito de Marketing Turístico em diversas situações o papel de propagador da imagem de empresas, locais, ideias, produtos e serviços constituindo- Já a alguns anos a atividade turística tem se apresentado se ainda como importante elemento para a realização de como um dos setores econômicos mais promissores, negócios. expressivos e potencialmente geradores de resultados no Segundo diversos autores os eventos podem configurar-se mercado mundial. Contudo maior potencialidade do setor como poderosa ferramenta de comunicação estratégica traz consigo maior volume de ofertas decorrentes do com os mais diversos públicos - alvos desejados; além de aumento da competitividade além de alterações um importante difusor da marca de uma empresa com ambientais, entre elas as características do comportamento poder para - se bem realizado - promover produtos, do consumidor que influenciam a forma de trabalhar das serviços e ideias, além de potencializar vendas e contribuir empresas e alteram constantemente as “regras do jogo”. para a expansão e a conquista de novos mercados A alta competitividade que envolve a grande maioria dos (MIDDLETON e CLARKE, 2002; OLIVEIRA, 2005). setores inclusive o de turismo traz a consequente Os eventos têm o poder de mobilizar a opinião pública, concorrência entre destinos, empresas, conceitos, espaços polemizar, gerar dados e informações, tendo o poder de e ideias. Neste sentido a busca por diferenciação das ofertas despertar ações e reações nas pessoas podendo figurar a serem apresentadas aos consumidores, é uma forma de como agentes transformadores no bojo da sociedade obter participação de mercado e manutenção de segmentos (MARTINS, 2010). e nichos. (LOVELOCK e WRIGHT, 2001). Assim, a contextualização do panorama do setor turístico A Embratur (1992) define o Marketing turístico como aponta que os retornos gerados pelos eventos transcendem sendo “um conjunto de técnicas estatísticas, econômicas, a realização dos objetivos diretos ampliando-se em sua sociológicas e psicológicas, utilizada para estudar e base para atender de forma dinâmica elementos como a conquistar o mercado, mediante lançamento planejado dos infraestrutura de equipamentos (salões, hotéis entre produtos”. O Marketing Turístico se apresenta como uma diversos outros) além de serviços receptivos, ferramenta indispensável para o funcionamento e configurando-se como uma atividade que vai além das gerenciamento efetivo das organizações, especialmente no festividades e das comemorações, tendo a função de gerar que concerne a diferenciação das ofertas aos segmentos de lucros - ou não - para seus idealizadores ou participantes, interesse (MONTEJANO, 2001). ganhos em termos de imagem ou ainda fixação do senso de De forma sintética as definições apresentadas evidenciam pertencimento tendo a capacidade de promover de ideias, que o papel do marketing turístico é o de analisar, produtos, serviços, pessoas ou ainda locais através dos compreender e propor ações que beneficiem de um lado o mais diversos canais de comunicação. cliente através da satisfação de suas necessidades e desejos e de outro a empresa através do cumprimento de seus 5.ANÁLISE DOS DADOS objetivos estabelecidos previamente (PELIZZER, 2005). Por fim, trabalhar o composto de Marketing Turístico se Os dados foram coletados pautando o material de mostra viável ao proporcionar a possibilidade de análise na adaptação da figura apresentada por Kotler e aperfeiçoar os processos de tomada de decisão e também Keller(2006) e também por McCarthy (19960. Tal escolha ao facilitar o planejamento estratégico de ações seu deu pelo fato dos primeiros autores serem referência

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mundial no assunto e o segundo autor além de ser O prazo de pagamento e as condições de financiamento referência mundial foi o criador do conceito. foram considerados itens estratégicos dentro da proposta A cinco empresas selecionadas responderam em de estratégias de preços. cada uma das dimensões qual o peso de 0-10 em relação a cada elemento da composição da oferta de um produto ou serviço, e o dados obtidos foram os seguintes:

Quadro 3: Composto de Comunicação (Promoção)

É importante observar que esse elemento do composto traz Quadro 1: Características dos produtos em si a ideia do esforço e promoção de vendas como ponto central de apenas uma das organizações, as demais não É importante observar conforme destacado no quadro que enxergaram esse elemento como essencial, em elementos como qualidade, as características dos produtos contrapartida a propaganda foi unanimidade como e serviços, o nome da marca e os serviços agregados elemento vital da estratégia de comunicação. representam unanimidade entre os fatores preponderantes Os demais elementos variaram conforme a natureza da a serem observados durante a execução de uma proposta ao empresa e de suas peculiaridades, observando por exemplo mercado consumidor direto ou indireto. que o Marketing de incentivo é vital para empresas de Os itens em descompasso de percepção indicam que cada viagem de incentivo e para Congressos, contudo as mesma área possui pesos diferentes possivelmente considerando empresa vinculada a promoção de Congressos tem a figura suas peculiaridades ou mesmo as nuances de cada mercado do Relações Públicas como importante ao passo que a de modo distinto. empresa de Viagem de incentivo não enxerga sua importância no mesmo patamar.

Quadro 4: Composto de Logística (Praça) Quadro 2: Composto Preço No composto de Logística aparecem as informações mais O preço de lista é um dos componentes dos similares contudo, mais preocupantes. Todas as empresas fundamentos de ajustar um preço, ele representa o valor sinalizaram a importância desse elemento para a execução inicial oferecido aos consumidores em perspectiva, sejam adequada de qualquer atividade e pontuaram sua eles mais elevados no caso de um produto ou serviço que importância nos patamares mais elevados. seja um lançamento ou mesmo mais baixo quando se tem O ponto central de análise aqui versa sobre – segundo os como estratégia penetrar de modo mais rápido no mercado entrevistados – na dificuldade de realizar na prática ações através de custos menos ao consumidor, nesse sentido as coerentes e precisas quanto a definição dos canais a serem organizações respondentes apontaram que apesar de uma utilizados, a variedade de possibilidades de uso e acesso pequena margem de manobra, elas não estão dispostas a aos locais e atividades propostas, a cobertura, cuja reduzirem o preço pois, consideram, sem exceção que a capacidade de permitir que todos os interessados possam qualidade e as garantias tem um custo mais elevado e que ter acesso aos locais ou atividades entre outros ao baixarem preço podem incorrer em resultados apontamentos esbarram no velho gargalo brasileiro ligado indesejados em termos de qualidade, segurança e outros ao deslocamento e alocação de pessoas e recursos a custos itens. financeiros e de tempo coerentes. As concessões de troca ou de concessões promocionais não são estratégias utilizadas pelas organizações, tais 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS concessões representariam redução de preço ao permitirem alterações nas características dos produtos ou serviços e as As entrevistas realizadas apontaram para a existência de empresas consideraram essa estratégia inadequada. forte relação entre as estratégias mercadológicas e o ambiente específico de operação da organização. De modo

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sistemático as empresas ganhadoras ou concorrente ao HAX, A. C. e MAJLUF, N. S. The Strategy Concept and prêmio Caio apresentaram diferentes pontos de tração. Process, A Pragmatic Approach. Upper Saddle River, NJ: Os principais apontamentos em relação as entrevista Prentice Hall, 1996. realizadas referem a importância dos elementos do IGNARRA, L. R. Fundamentos do Turismo. 2ª ed. São composto de Marketing na análise ambiental e também no Paulo: Pioneira Thompson Learning, 2003. planejamento e execução de atividades com valor KOTLER P. e KELLER, Kevin Lane. Administração de estratégico, esse ponto foi notório em todos os momentos Marketing: A Bíblia do Marketing. 12a edição. Prentice de contato com as organizações. Hall Brasil, 2006. Dentro dos elementos do composto de Marketing existiram KOTLER P. Marketing para o século XXI: como criar, elementos que são comuns dentro da estratégias das conquistar e dominar mercados. São Paulo: Futura, 2000. organizações e que acabam servindo como indutores das LAMBIN, J. J. Marketing Estratégico. Lisboa: McGraw- ações, tais como qualidade, cobertura, prazos de Hill, 2000. pagamento entre outros. Tais elementos por serem comuns LOVELOCK, C. e WRIGHT, L. Serviços: marketing e recebem mais atenção no sentido de serem entendidos gestão. São Paulo: Saraiva, 2001. como indispensáveis no momento de definir uma proposta MARTINS, Á. L. M. O Impacto do Anúncio de ao mercado. Terceirização em Tecnologia de Informação no Valor De outro lado as particularidades de cada setor mudam o de Mercado das Empresas: um Estudo de Eventos. São centro de poder de cada item, ou seja, em algumas os Paulo: Fundação Getúlio Vargas, 2010. esforços de Marketing Direto não precisam ser refinados MATIAS, M. Organização de Eventos: procedimentos e ou mesmo utilizados de modo amplo e sistemático ao passo técnicas. 4º ed. Barueri, SP: Manole, 2007. que para outra organização de um campo similar o uso MCCARTHY, J. Basic Marketing – A Global dessa ferramenta é o fiel da balança. Managerial Approach. Richard Irwin, 1996. Por fim, observa-se a forte relação entre os elementos do ______. Basic Marketing Approach. Homework, composto de Marketing e os direcionamentos estratégicos IL, Irwin, 1960. dessa organizações. A intimidade entre tais elementos – MIDDLETON, V. e CLARKE, J. Marketing de Turismo: composto e decisões estratégicas – é tão elevado que todas Teoria e Prática. Rio de Janeiro: Campus, 2002. as empresas quando tem algum problema recorrem a uma MINTZBERG, H.; QUINN, J. B. O Processo da análise para saber qual dos elementos falhou ou precisa ser Estratégia. Porto Alegre: Bookman, 2001. corrigido para evitar ou amenizar problemas e que também MONTANEJANO, J. M. Estrutura do Mercado no que tange aos resultados positivos as organizações Turístico. 2º edição São Paulo: Roca, 2001. empreendem esforços condizentes com a necessidade de NASCIMENTO, A.; LAUTERBORN, R. Os 4 Es de gerar percepção de adequação nos consumidores. marketing e branding: evolução de conceitos e contextos até a era da marca como ativo intangível. Rio 7. REFERÊNCIAS de Janeiro: Elsevier, 2007. OLIVEIRA, A. P. Turismo e Desenvolvimento: AAKER, D. A. Administração estratégica de mercado. planejamento e organização. São Paulo: Atlas, 2005. Porto Alegre: Bookman, 2001. PELIZZER, H. A. Turismo de Negócios – Qualidade na AAKER, D. A. Marketing Research. New York: John Gestão de Viagens Empresariais. São Paulo: Edição Wiley & Sons, 1997. Thomson, 2005. ______. e JOACHIMSTHALER, E. Brand RODRIGUES, W. C. Metodologia Científica. Paracambi: Leadership, London: Free Press, 2000. Faetec/IST, 2007. AMARO, A.; PÓVOA, A.; MACEDO, L. Metodologias SELTIZ, C.; WRIGHTSMAN, L.S.; COOK, S.W. de Investigação em Educação. Faculdade de Ciências da Métodos de pesquisa nas relações sociais. 2º ed. São Paulo: Universidade do Porto, 2005. EPU, 1987. BOONE, L. E. e KURTZ, D. L. Contemporary SHAPIRO, B. P. What the hell is market oriented? Marketing. 10º ed. Orlando: Harcourt College Publishers, Harvard Business Review, Nov./Dec. , p.119-125, 1988. 2001. TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em ciências CHURCHILL G. A. e PETER, J. P. Marketing: Criando sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: valor para os clientes. 2º edição São Paulo: Saraiva, 2003. Atlas, 1997. COOK Jr, V. J. , LARRECHÉ, J. e STRONG, E. YUDELSON, J. Adapting McCarthy’s Four P’s for the Readings in Marketing Strategy. 2º edition California: Twenty-First Century. In: Journal of Marketing Education, The Scientific Press, 1989. vol. 21, nº 1, p.60-67, abr. 1999. DENCKER, A. de F. M. Pesquisa em Turismo: planejamento, métodos e técnicas. São Paulo: Futura, 2007. EMBRATUR -Decreto 448 de 14 de fevereiro de 1992. GIACAGLIA, M. C. Organização de eventos: teoria e prática. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2006.

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ANÁLISE DOS IMPACTOS SOCIAIS ORIUNDOS DA INSTALAÇÃO DO HOTEL TRANSAMÉRICA DA ILHA DE COMANDATUBA, AOS MORADORES DO DISTRITO DE COMANDATUBA – BA.

ALISSON PERANTONI GUIGEN

ROBERSON DA ROCHA BUSCIOLI

Universidade Estadual Paulista - Unesp Campus de Rosana

RESUMO - Identificar e analisar os impactos oriundos da atividade turística em uma determinada localidade é uma importante tarefa que compete aos órgãos públicos e à comunidade acadêmica, uma vez que o turismo pode apresentar conotações de status, na visão da demanda, em determinadas situações. Diante disso, observa-se a busca por parte da iniciativa privada à lugares exóticos. Nesse contexto, essa pesquisa tem como objetivo identificar e compreender as principais alterações socioeconômicas ocorridas no espaço a partir da instalação do Hotel Transamérica da Ilha de Comandatuba aos moradores do Distrito de Comandatuba, na Bahia. A partir da pesquisa bibliográfica e pesquisa in loco na qual foram aplicados questionários com questões abertas e fechadas, pôde-se perceber alterações em hábitos culturais da população; expansão e ordenamento do distrito em decorrência do aumento da atividade turística; e a consequente dependência de todo o trade turístico existente no distrito para com o resort.

Palavras chave: Turismo, impactos socioeconômicos, produção do espaço.

ABSTRACT - Identify and analyze the impacts from tourism in a certain locality is an important task for the public organs and the academic community, since tourism can have connotations of status, in view of the demand in certain situations. Therefore, there is a private initiative looking for exotic places. In this context, this research aims to identify and understand the main socioeconomic changes occurring in space as from the installation of the Hotel Transamerica Ilha de Commandatuba to the residents of the District of Commandatuba in Bahia. From the literature review and in loco research where questionnaires were administered with open and closed questions, it could be noticed changes in cultural habits of the population, and spatial expansion of the district as a result of increased tourism, and the consequent dependence of all the existing tourist trade in the district to the resort.

Key words: Tourism, socioeconomic impacts, the production of space..

1 INTRODUÇÃO beleza paisagística, para construir empreendimentos (muitas das vezes elitistas) que atrairão turistas O Turismo no século XX representa a encantados com a excentricidade do local. possibilidade de desenvolvimento econômico para No final da década de 80, observou-se a instalação diversos países no mundo, uma vez que os avanços do Hotel Transamérica da Ilha de Comandatuba, tecnológicos nos setores de transporte e comunicação; localizado no município de Una, no estado brasileiro da aliadas à concepção de que todo ser humano deve buscar Bahia. Sendo um dos principais produtos turísticos de meios de lazer a fim de reparar o psicológico abalado pela grandes agências de viagens, tal empreendimento está rotina estressante dos ambientes de trabalho, o fazem ser instalado na ilha que dá acesso ao litoral, impedindo, uma das atividades de maior destaque na economia deste modo, o acesso à praia por parte dos moradores do global. Distrito de Comandatuba. Aproveitando-se dessa nova necessidade do Diante desta problemática, o objetivo geral desta homem contemporâneo, empresários e governantes pesquisa compete no levantamento e na análise dos iniciaram uma busca por lugares desconhecidos, de rica

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impactos sociais advindos aos moradores do Distrito de Escola de Berlim: “[...] Década de 30 Comandatuba após a instalação do resort. Vencimento do espaço por pessoas (Escola de Especificamente buscou-se: i) compreender o que vão para local no qual não têm Berlim) processo de formação da Vila, e consequentemente da residência fixa.” (GLÜKSMANN) ocupação da Ilha por empreendimentos que “turista é a pessoa que entra num posteriormente resultariam no HTIC; ii) identificar os país [...] e que gasta [...] o dinheiro 1936 principais impactos sociais oriundos da instalação do que ganhou em outro lugar”. empreendimento e do fluxo dos turistas hospedados no (NORWALL) mesmo; iii) e por último, observar o grau de intercâmbio “É o estudo do homem longe de cultural entre os moradores da vila e os turistas do hotel, seu local de residência, da pois as opções de lazer oferecidas pelo HTIC são, na indústria que satisfaz suas grande maioria, elitistas e oferecidas dentro do próprio necessidades, e dos impactos que Década de 40 estabelecimento, como campo de golfe, parque aquático, ambos, ele e a indústria, geram windcar, minibuggy, quadras poliesportivas entre outros. sobre os ambientes físico, Os procedimentos metodológicos adotados foram econômico e sociocultural da área divididos em quatro etapas: revisão de literatura, pois receptora.” (JAFARI). foi através dela que pudemos traçar um quadro teórico e “[...] fenômeno social que consiste elaborar a estruturação conceitual que deu sustentação ao no deslocamento voluntário e desenvolvimento do estudo (SILVA, 2001); o estudo temporário de indivíduos, [...] por documental, que auxiliou para que houvesse maior motivos de recreação, descanso, 1992 conhecimento sobre a região da Vila e da Ilha de cultura ou saúde, [...] gerando Comandatuba; e, finalmente, após todos esses dados múltiplas inter-relações de levantados e analisados junto a publicações bibliográficas, importância social, econômica e foi realizada a saída a campo para obtenção de dados cultural.” (DE LA TORRE) qualitativos e quantitativos, com aplicação de “O turismo compreende as questionários com questões abertas e fechadas aos atividades que realizam as pessoas comerciantes e prestadores de serviços locais; que durante suas viagens e estadas em juntamente com a coleta de relatos de história oral, lugares diferentes ao seu entorno 1994 ajudarão a levantar e compreender os impactos gerados habitual, por um período após a instalação do Resort. consecutivo inferior a um ano, com finalidade de lazer, negócios ou outras.” (OMT) 2 DESENVOLVIMENTO Percebe-se, portanto, que apesar de todas as Ao longo do percurso histórico do turismo, dos conceituações e definições citadas concordarem que o estudos e observações de diversos autores quanto a turismo é o deslocamento voluntário de pessoas para outra definição do turismo e suas vertentes de interferência na localidade que não a de sua residência, seja a lazer, atividade produtiva, ou mesmo na influência que causa a negócios; cultura; religião; eventos; esportes; dentre destinos pessoas sob o aspecto mercadológico e cultural, outros; onde, nesta localidade, a atividade turística tem-se uma compilação de conceitos nas diversas áreas da impacta positiva ou negativamente em âmbitos ciência (que iniciaram as pesquisas sobre o turismo) e que econômicos, sociais e culturais; a discussão da academia podem ser melhores visualizadas a partir de uma ordem sobre a atividade turística ainda é bastante calorosa e cronológica descrita na tabela 1. Essa compilação encontra-se em constante processo evolutivo. representa o embasamento teórico a ser seguido nessa O crescente interesse dos diversos setores para pesquisa. com a atividade turística tem possibilitado aos estudiosos da área avanços nas discussões a respeito dos impactos Tabela 1 – Conceitos de Turismo gerados, ou seja, dos benefícios e prejuízos que a Org. GUIGEN, 2012. atividade turística é capaz de gerar à localidade e seu Fonte: Autores Apud BARRETO, 2003. entorno, além de buscar novos métodos de se planejar um Ano Conceito turismo mais responsável e menos impactante. Os 1910: “[...] todos os processos, empresários veem no turismo um mercado ainda em especialmente econômicos, que se desenvolvimento, capaz de gerar lucros exorbitantes. Para manifestam na chegada, 1910: os turistas, o desenvolvimento da atividade e o aumento permanência e saída do turista de da oferta, que gera a consequente concorrência entre as um determinado município, país empresas de turismo, resultam na facilidade da demanda ou estado”. (SCHATTENHOFEN)

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em viajar e conhecer novos lugares, diferente dos possibilitarem a instalação de diversos hotéis e resorts, ambientes com que estão acostumados. sobretudo, no litoral nordestino. Os meios de comunicação massivos impõem à Cronologicamente falando, os fatores que sociedade a noção do cotidiano sendo encarado sempre possibilitaram a construção do Hotel Transamérica da Ilha com conotações negativas, de modo que nos desperte o de Comandatuba iniciam-se no ano de 1984, quando a interesse para os ambientes naturais e menos estressantes, Companhia Real de Hotéis Nordeste adquiriu o alvará de impossíveis de se alcançar no cotidiano monótono das construção do resort. Construído na região da antiga cidades de trabalho (KRIPPENDORF, 2003), sendo a fazenda Verona, “[...] ex-propriedade do cel. Manuel prática das viagens a turismo a válvula de escape Pereira de Almeida” (SOUSA, 2004, p. 68), a propriedade necessária a todo ser humano: possui uma área total de 24.234,30m² (SANTOS, 2011, p. Complementando a ideia, as viagens a lazer “[...] 8). O Hotel Transamérica da Ilha de Comandatuba foi devem reconstituir, recriar o homem, curar e sustentar o inaugurado em março de 1989, transformando corpo e a alma, proporcionar uma fonte de forças vitais e drasticamente a vida dos moradores locais. trazer um sentido à vida” (KRIPPENDORF, 2003). O resort conta ainda com uma pista de pouso capaz Porém, entende-se que a simples adequação dos centros de receber aviões de grandes portes, para assim gerar mais urbanos e rurais, de um modo que acesso ao lazer seja comodidade aos hóspedes que, antes tinham que possível por parte de todos os habitantes, sem exceção, desembarcar no município de Ilhéus. A figura 1 ajuda-nos amenizaria essa necessidade do ser humano em preencher a entender claramente a composição geográfica da região, seu período de ócio com atividades de lazer que, na sendo apresentada à esquerda a pista de pouso; ao centro realidade, mais servem como um “[...] reparador das o Distrito de Comandatuba; e à direita, após o Canal de deteriorações físicas e nervosas provocadas pelas tensões Comandatuba, encontra-se o Hotel Transamérica, na Ilha resultantes das obrigações cotidianas e, particularmente, de Comandatuba: do trabalho” (DUMAZEDIER, 2004, p. 32). O movimento da contracultura, que se opunha ao modelo de vida consumista das sociedades mais ricas, aliado às conquistas trabalhistas sociais ao longo dos anos, como as férias remuneradas, o décimo terceiro salário, a diminuição expressiva da jornada de trabalho, as folgas semanais remuneradas, dentre outras, engatilharam o mercado no investimento do consumismo do imaterial: “quase todos os estudos feitos sobre a modificação da escala de valores em nossa sociedade têm um ponto em comum: o tempo livre está nos centros das preocupações da vida” (OPASCHOWSKI Apud KRIPPENDORF, 2003, p. 116). Desta maneira, a classe proletária é capaz de gerar capital até mesmo em seus momentos de ócio, oriundos das conquistas trabalhistas citadas. Inicia-se, portanto, uma busca por parte dos empresários a lugares inóspitos e Figura 1 - Distrito de Comandatuba e o Hotel de natureza exuberante, sem grandes alterações causadas Transamérica. pelo homem, para assim poder criar novos empreendimentos que atrairão turistas encantados com a beleza paisagística da região, “a natureza passa a ser encarada como objeto a ser comercializado e não Esse estudo busca complementar a extensa usufruído” (FONTELES, 2004). discussão crítica à cerca da atividade turística mais Desde a época da colonização, no século XVI, a sustentável, visando à diminuição dos impactos gerados, costa litorânea brasileira vem passando por um longo como citados por Fonteles (2004): processo de ocupação. Com grande potencial para o turismo, verifica-se que a partir do século XIX, grande O turismo não ecológico tem efeitos destruidores sobre a parte desta ocupação foi destinada ao veraneio, “[...] para natureza por meio de um o turismo de férias de amplos contingentes sociais, processo de consumo da abarcando os segmentos mais ricos da população atividade turística que visa a brasileira (da crescente classe média às elites)” maximização dos lucros acima (MACEDO In: YÁZIGI , 2003, p. 181). Surgiram nessa de qualquer outra coisa. Nesse época, portanto, diversas casas utilizadas como segundas sentido, desrespeita os modos de residências, além de estímulos governamentais vida das populações receptoras e

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desequilibra os ecossistemas que os hóspedes do próprio deixavam de consumir no locais. hotel para consumir na Ilha da Fantasia. Portanto, em medos da década de 2010, “[...] o Hotel interessou, A Corrente Crítica das pesquisas em turismo interessou, até que comprou e é dele!” (ADONEL, 2012). compete a uma linha que “[...] questiona o caráter Desta maneira, o HTIC fechou o acesso à Ilha da intrinsecamente benéfico do desenvolvimento turístico, Fantasia, e consequentemente impediu os turistas e, discutindo as transformações que ocorrem na principalmente, os moradores locais de terem acesso livre (re)produção da vida das comunidade receptoras e as à praia e também de terem contatos com os hóspedes do condições de trabalho nas atividades turísticas.” resort. A proibição pôde ser retratada nos seguintes (OURIQUES, 2005, p. 83). No caso do objeto de estudo, relatos: essas transformações ocorridas na reprodução da vida dos moradores do Distrito de Comandatuba são apresentadas [...] eu sou contra o Hotel ou no seguinte relato de um morador local: qualquer um que não deixar ir pra praia. Eles não podem Adonel :Quem pescava, pescava; proibir, a marinha mesmo quem tinha roça, trabalhava na quando o Hotel queria impedir roça; outros tinham farinheiro, aqui, ela pediu o Hotel pra ele plantavam mandioca; outros deixar uns 100 metros pro povo, tinham farinha de coco; outros por causa do pessoal que mora tinham de piaçaba. E por aí... na beira da praia (ADONEL, outros tinham um gadinho, e aí 2012). ia vivendo, NE Pesquisador: Ahã. Mas agora [...] aqui não tem praia. Em com o Hotel, a maioria agora Ilhéus é público, você passou no trabalha pro Hotel? meio, tem praia. Então acho que Adonel: É, a maioria trabalha o turismo lá tá maior do que pro Hotel, não trabalha lá quem aqui, e aqui não tem mais nada. não quer [...] (ADONEL, 2012). (CARLOS, 2012).

No contexto de construção do Hotel Mesmo se alguém se sujeitar a alugar um barco e Transamérica, a construtora responsável, com intuito de tentar usufruir da praia próxima ao HTIC e à antiga Ilha alojar os trabalhadores, criou uma infraestrutura que da Fantasia, não será possível, pois “[...] a área deles é posteriormente viria a se tornar um famoso toda cercada” (ADONEL, 2012). Essa prática atinge a empreendimento turístico da região de Comandatuba, legalidade, pois o Artigo 10 da Lei Federal nº 7.661, de Una, Canavieiras e Ilhéus: a Ilha da Fantasia. Após a 16 de maio de 1988, prevê que: construção do Hotel Transamérica, e consequentemente da desativação do alojamento dos trabalhadores da As praias são bens públicos de uso comum construtora, empresários locais puderam comprar partes do povo, sendo assegurado, sempre, livre e da infraestrutura construída com a Ilha da Fantasia, para franco acesso a elas e ao mar, em qualquer direção e sentido, ressalvados os trechos assim criarem empreendimentos turísticos. Surgiram considerados de interesse de segurança então alguns bares, restaurantes e áreas de lazer, que nacional ou incluídos em áreas protegidas possibilitavam o acesso à praia pelo público que não fosse por legislação específica. (BRASIL, 1988) necessariamente hóspede do Hotel. Esse fator foi o principal responsável pelo Restou então, como alternativa aos turistas e aos estímulo da atividade turística em Comandatuba, pois moradores locais, terem de se deslocar até o lado sul da gerava o deslocamento de turistas de toda a região: “[...] ilha caso queiram ter acesso à praia, pois, naquela região, vinha muito hóspede de excursão, [...] ficava o dia todo e ainda hoje há um conjunto de estruturas turísticas que ia embora. Mas usava o serviço de restaurante [...]” acabou herdando o mesmo nome: Ilha da Fantasia, e que (GILDA, 2012). Além dos turistas de excursão, Ilha da conta com infraestruturas de bares e restaurantes para Fantasia era frequentada até mesmo por hóspedes do serem arrendados, assim como foi constatado com o HTIC: “[...] a Ilha [da Fantasia] vendia mais barato, o seguinte relato: “[...] o cara alí com dinheiro é só Hotel vendia mais caro, e os caras iam beber na Ilha, arrendar e vai ganhar dinheiro!” (ADONEL, 2012). num bar que tinha na Ilha” (ADONEL, 2012). Evidencia- Porém, a distância até para se deslocar até o lado se, neste caso, que a Ilha da Fantasia proporcionava, de sul da ilha é muito maior em relação ao lado norte, e isso algum modo, a relação cultural entre hóspedes e faz aumentar tanto o tempo da viagem, quanto o preço do moradores da região de Una. barqueiro que conduz os turistas até lá, assim como foi O HTIC tinha dificuldades, portanto, em obter o relatado por um senhor que surgiu durante a entrevista lucro integral que era gerado com o turismo na Ilha, já com o Adonel, e acabou contribuindo para a pesquisa:

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“[...] acho que é vinte e cinco [reais] pra ir e voltar” que todo o distrito se desenvolveu em decorrência do (ALFREDO, 2012). Já o preço para ir à antiga Ilha da turismo. Fantasia, no lado norte, era mais barato: “[...] daquela O consumo e produção do espaço acabam ilha era mais barato! Mais barato, rapaz” (ADONEL, impedindo os moradores locais de se identificarem com a 2012). própria região que residem, pois as regiões tendem a se Nessa configuração, cada vez que os moradores assemelharem esteticamente com cada vez mais do DC ou os turistas tiverem vontade de ir à praia, devem intensidade, assim como defende Mendonça (In: LEMOS, desembolsar algo em torno de R$25,00, e realizar uma 2001, p. 20), que critica a mercantilização dos locais onde travessia bastante demorada: “Você gasta uma hora e o turismo está inserido: “para cada local onde a evolução meia [...] pra ir, e uma hora e meia pra voltar” do turismo se tornou difícil devido à degradação (CARLOS, 2012) Por esse motivo, o fluxo de turistas na socioambiental, cria-se outro, com características nova Ilha da Fantasia em nada se assemelha ao da antiga. semelhantes, ainda que mais modernas e aparentemente Sendo assim, não há procura para arrendar os bares e diferentes”, processo observado na produção do espaço restaurantes do local, e a região permanece sem essa pelo HTIC. infraestrutura em funcionamento. Na região estudada observa-se que o resort Nos dias atuais, os turistas, e até mesmo os impede algumas manifestações culturais, contribuindo moradores locais, preferem se locomover até o município assim para a perda da identidade local, como foi relatado: de Canavieiras para aproveitar a praia, pois lá não há a necessidade de realizar travessias de barco: [...] você ouviu o barulho que tava tendo lá do outro lado? Porque a praia [de Do lado de lá? [...] Se você Canavieiras] você chegou, pôr aqui eles mandam baixar encostou o carro e tá dentro na hora [...], quer dizer então d’água, né?! Nem que o que a gente pode ouvir o carro apodreça de um dia barulho deles, mas eles não pro outro, o cara prefere podem ouvir o nosso, não perder o carro do que fazer a (CARLOS, 2012). travessia. Muito longa, né? E a questão também não é isso, O próprio fato dos moradores tratarem a Ilha você chega lá [na nova Ilha como “o lado de lá”, apresenta uma característica de da Fantasia] e não tem nada perda da identidade desses moradores locais com a parte mais. Você não tem recepção, litorânea do DC, que se dá através da Ilha. Se formos você não tem um bar [...] considerar o que eles tinham total acesso àquela região há (CARLOS, 2012). pouco menos de dez anos, e que hoje possuem tamanho estranhamento com o local, podemos confirmar os Este mesmo morador relatou que os empresários conflitos territoriais existentes. do HTIC “[...] partiram pra cima, evitaram o contato Mendonça lembra que “o turismo dá também [dos moradores] com o pessoal do Hotel [...]” início ao processo de especulação imobiliária [...]” (CARLOS, 2012). Fonteles (2004, p. 91) afirma que as (MENDONÇA In: LEMOS, p. 22), valorizando alterações ocorridas nas regiões receptoras em proporcionalmente à demanda turística os imóveis e decorrência do turismo são feitas “[...] a partir de terrenos das regiões receptoras. Em Comandatuba, o que interesses, levando-se em conta as tendências do se pôde constatar foi que a especulação imobiliária após a mercado”. Nesse contexto mercadológico, o turismo instalação do HTIC, ocorreu de maneira gradativa até o assume valores “[...] de uma mercadoria cuja marca é o momento em que o Hotel adquiriu o espaço onde era consumo do espaço.” (RODRIGUES In: YÁZIGI et al, possível a população ter acesso à praia, assim como relata 2002, p. 57). Carlos (2012): “Pesquisador: Os preços dos terrenos O confinamento dos hóspedes no próprio HTIC também aumentaram bastante [...]? Carlos: Não, hoje tá impede que estes movimentem a economia do DC, não caindo. Porque hoje isso daqui não tá tendo movimento”. consumindo os serviços ofertados pelo próprio comércio Perceptivelmente a atividade turística é grande do local. Segundo comerciantes locais, dos hóspedes do geradora de empregos nas mais diversas áreas que resort, “é bem pouquinho que saem de lá pra cá” compõem o trade, porém a sazonalidade, juntamente com (GILDA, 2012). As relações econômicas possíveis em a dependência da região para com a atividade, força os decorrência do turismo no DC já não representam a empresários do setor a fazer contratos temporários possibilidade de autonomia econômica propriamente dita, durante a alta temporada. Foi possível comprovar, pois como já foi apresentado, gerou-se uma relação de segundo relatos, que essa é a política adotada pelo HTIC, dependência dos moradores para com o HTIC, uma vez que gera inúmeros empregos na região: “[...] tem uma

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média de uns quinhentos funcionários, quase seiscentos” da pesca de subsistência, e que, sendo assim, propiciava (GILDA, 2012), porém muitos com contrato temporário. um estilo de vida mais simples e sereno. Adonel (2012) nos relatou que quando um funcionário é A atual situação de dependência que se dá por contratado, já sabe desde o começo que “[...] vai ficar até parte dos moradores e prestadores de serviço do DC, que terminar, quando terminar o contrato dele, ele vai têm suas rendas oriundas quase que totalmente dos embora, também”. eventos organizados HTIC, pôde ser comprovada que foi Diante dessa nova configuração, as seis pousadas gerada após a compra da Ilha da Fantasia. Entretanto, existentes no distrito (lado do continente) dependem também é importante frisar a necessidade dos direitos diretamente dos eventos realizados no HTIC, como dessas pessoas serem defendidos por órgãos relataram todos os donos de pousadas na aplicação da governamentais locais, que tem esta competência pesquisa in loco, uma vez que 100% dos seus hóspedes atribuída no processo democrático do voto. são staffs dos eventos organizados pelo hotel. Mais uma Sendo assim, acredita-se que a reativação da vez, evidencia-se uma interdependência entre os infraestrutura existente na antiga Ilha da Fantasia, tal empreendimentos locais e o resort. como o cumprimento das leis federais que garantem o Todavia, essa interdependência deve ser pensada livre acesso à praia e o direito ao lazer a toda população, numa relação de forças desiguais, uma vez que as auxiliaria no desenvolvimento local, melhorando a pousadas menores são extremamente dependentes desses qualidade de vida dessas pessoas. Ao julgar que o DC já eventos. Tal relação pode ser comprovada no relato de possui uma infraestrutura turística, que esta se deu através Gilda (2012), que quando questionada dos benefícios da da instalação do HTIC, e do consequente estimulo reabertura da praia, e da relação que se estabelece com o turístico na região, é preciso acabar com a situação de resort, a mesma aponta que era muito melhor quando não dependência, possibilitando mais liberdade aos demais dependiam totalmente do HTIC: “[...] porque quando tem empresários locais. evento tudo bem, mas e quando não tem?! Como teve Considera-se necessária, então, maior atuação do época aí que passou quatro meses sem evento, dois ou poder público, a fim de minimizar essa dependência três eventos no ano”. gerada, estimulando o setor de serviços locais, de tal modo que o DC continue tendo no turismo sua principal fonte de geração de renda, uma vez que este foi 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS constituído em decorrência da atividade, sem ordenamento espacial planejado. Essa pesquisa ajuda-nos a compreender que em alguns casos, “[...] o processo de turistificação 4 – REFERÊNCIAS (transformação em lugar turístico) dá-se ao sabor do mercado, dos empreendedores isolados, quase sempre ADONEL, Adonel: depoimento [set. 2012]. sem planejamento” (BANUCCI JR., BARRETO, 2001, p. Entrevistador: Alisson Perantoni Guigen. Bahia, 2012. 18), pois além de se exigir um investimento financeiro Entrevista concedida para a realização do Trabalho de para que aconteça, o planejamento turístico, que auxilia Conclusão de Curso. na minimização dos impactos, representa uma gama de atividades distintas onde os resultados financeiros levam ALFREDO, Alfredo: depoimento [set. 2012]. um tempo maior para se evidenciarem. Entrevistador: Alisson Perantoni Guigen. Bahia, 2012. Constatou-se, porém, que apesar das possíveis Entrevista concedida para a realização do Trabalho de relações de intercâmbio cultural que são obtidas com a Conclusão de Curso. atividade, e do número de vagas de empregos que esta demanda, há no Distrito de Comandatuba o dever do BANDUCCI JR, A. BARRETO, M. (Orgs). Turismo e poder público em agir em prol de um melhor identidade local: Uma visão antropológica. SP: Papirus, funcionamento do turismo, pois a política adotada pelo 2001. resort em não promover e não divulgar a cultura local, evitando o contato dos hóspedes com os moradores, BARRETO, Margarita. Manual de iniciação ao estudo impedem o desenvolvimento econômico o distrito. do turismo. 13ª ed. SP: Papirus, 2003. Os objetivos apresentados na introdução puderam, então, ser alcançados com auxílio da pesquisa in CARLOS, Carlos: depoimento [set. 2012]. Entrevistador: loco, realizada no final de setembro de 2012. Através dos Alisson Perantoni Guigen. Bahia, 2012. Entrevista relatos coletados e dos questionários aplicados a concedida para a realização do Trabalho de Conclusão de comerciantes locais, tornou-se evidente o fato da criação Curso. do resort ter alterado o estilo de vida da população local, que até àquele momento girava em torno da agricultura e DUMAZEDIER, Joffre. Lazer e cultura popular. SP: Perspectiva, 2001.

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2011, a partir da atuação do Resort Hotel FONTELES, José Osmar. Turismo e impactos Transamérica Ilha de Comandatuba. 2011. 33f. socioambientais. SP: Aleph, 2004. Dissertação (Graduação) – Uesc, Ilhéus, 2011.

GILDA, Gilda: depoimento [set. 2012]. Entrevistador: SANTOS, Milton. Metamorfoses do espaço habitado: Alisson Perantoni Guigen. Bahia, 2012. Entrevista fundamentos teórico e metodológico da geografia. SP: concedida para a realização do Trabalho de Conclusão de Hucitec, 1988. Curso. SILVA, Edna Lúcia da. Metodologia da pesquisa e KRIPPENDORF, Jost. Sociologia do turismo: para uma elaboração de dissertação – 3. ed. rev. atual. – nova compreensão do lazer e das viagens. Tradução Florianópolis: Laboratório de Ensino a Distância da Contexto Traduções. SP: Aleph, 2003. UFSC, 2001.

OURIQUES, Helton Ricardo. A produção do turismo: SOUSA, Antônio Pereira. Cadernos do CEDOC: poder feitichismo e dependência. SP: Alínea, 2005. rural. BA: Editus, 2004.

SANTOS, Jeroaldo de Souza. As transformações YÁZIGI. Eduardo. Turismo, uma esperança socioeconômicas, culturais e ambientais no distrito de condicional. 3ª ed. SP: Global, 2003. Comandatuba, em Una-BA, no período de 1987 a

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FAZENDA LYRA E SEU PONTECIAL PARA O TURISMO RURAL: ESTUDO DE CASO

LILLIAN MARIA DE MESQUITA ALEXANDRE¹ LUCAS OSÓRIO DUARTE TENÓRIO²

Universidade Federal de Sergipe - UFS Núcleo de Turismo

Professora do Curso de Turismo¹ [email protected]¹ Graduando do Curso de Turismo² [email protected]²

RESUMO –

As atividades relacionadas à gestão de recursos naturais, bem como a valorização da identidade cultural local têm se demonstrado excepcionalmente relevante neste mundo globalizado. Essa situação propicia a revalorização do modo de vida e o surgimento de novas funções socioeconômicas e ambientais no espaço rural. Neste contexto vem surgindo várias modalidades na atividade turística e uma delas é o Turismo Rural, que busca uma maior aproximação do homem com o meio ambiente. Este trabalho possuiu como metodologia a pesquisa de gabinete e a visita participativa no objeto pesquisado, a fazenda Lyra, que está localizada no vale do Cotinguiba, na cidade de Riachuelo, distante 25 km da capital sergipana. O gestor mostrou-se aberto à inclusão do turismo pedagógico rural, que é feito na propriedade com alunos do Instituto Federal de Sergipe, uma vez que, é professor desse mesmo instituto. É possível inserir a educação ambiental na área da reserva florestal. Conclui-se que o turismo rural é uma prática possível de gerar o desenvolvimento local, sendo bem planejado. Aliado com a existência de sítios históricos, a fazenda, possui um grande potencial a ser trabalhado pelos empreendedores locais, por possíveis investidores e pesquisadores do ramo turístico.

Palavras chave: Turismo Rural, Fazenda Lyra, Gestão, Potencialidade turística.

ABSTRACT –

The activities related to natural resource management and the recognition of local cultural identity have proved exceptionally important in this globalized world. This, encourages the appreciation of the oldway of life and the rise of new socio-economic functions and environmental conditions in rural areas. In this context, various modalities are emerging in tourism and one of them is rural tourism, seeking closer ties between man and the environment. This article was written as documentary research and participatory visits of the investigated object as methodology, Lyra’s farm, located in the valley of Cotinguiba in Riachuelo City, 25 km from the capital of Sergipe. The director was open to the inclusion of rural tourism, he has actually done on the property, some field research with students from the Federal Institute from Sergipe, because he is a professor at the institute. It can also be taught environmental education in the forest reserve. We conclude that rural tourism is a practice that can generate local development, if well planned. Along with the existence of historical attractions, the property has great potential to be worked by local entrepreneurs, potential investors and researchers in the field of tourism.

Key words: Rural Tourism, Lyra’s Farm, Management, Tourism potential.

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1. INTRODUÇÃO Para Brasil/MTUR (2003) [...] “o agricultor, aos poucos, deixa de ser somente um produtor de matéria-prima e descobre a possibilidade de As atividades e os esforços relacionados à gestão desenvolvimento de atividades não agrícolas, de sustentável de recursos naturais, bem como a modo a garantir sua permanência no campo”. valorização e preservação da identidade cultural de populações das localidades têm se demonstrado como Exatamente em razão de seu caráter dinâmico, assuntos de excepcional relevância neste mundo somado as necessidades atuais de promoção do desenvolvimentista e globalizado. desenvolvimento com sustentabilidade, novos segmentos surgem no turismo, dentre os quais País de dimensões continentais, situação desponta, de forma promissora e com incontestável geográfica privilegiada e detentor de riquezas potencial em nosso país, o Turismo Rural. naturais e culturais inestimáveis, o Brasil tem o dever de se fazer presente e atuante neste contexto, nas Como já ocorre em outros países, o Turismo mesmas proporções de sua grandeza, enfrentando Rural pode criar novas fontes de trabalho, além de com políticas precisas e eficientes o desafio de resultar em complemento econômico das atividades promover mudanças em favor do desenvolvimento agrozootécnicas e artesanais desenvolvidas pela socioeconômico nacional, ao mesmo tempo em que produção rural. Pode, ainda, favorecer a integração mantém clara a necessidade de educação e da população urbana no meio rural com vistas ao conservação ambiental, bem como o respeito à enriquecimento humano, à medida que aumenta os cultura e modos de ser e agir dos diferentes grupos intercâmbios e contatos socioculturais em geral. humanos. Serve como instrumento de manutenção, revitalização e valorização do patrimônio Ao encontro destas perspectivas e necessidades, arquitetônico, contribuindo para o respeito e a observa-se o desenvolvimento dinâmico da atividade proteção do patrimônio natural e cultural. turística, dentre as maiores catalisadoras mundiais na geração de empregos e movimentação de recursos, ao A atividade denominada Turismo Rural deve mesmo tempo em que se fortalece como importante abranger, em sua conceituação, aspectos referentes ao aliado na gestão sustentável dos patrimônios natural e turismo no meio rural, ao resgate e valorização da cultural, dependente que é, destes patrimônios, como cultura local, à função de atividade econômica de elementos formadores do produto turístico e, base familiar e complementar às tradicionais, ou com consequentemente, mantenedores de sua própria estas comprometidas, com o mínimo impacto sobrevivência. ambiental possível, objetivando a sustentabilidade. Durante muitos anos o desenvolvimento rural foi Em vista dos aspectos anteriores e para fins de identificado com o setor agrícola, mantendo estreita implementação de Diretrizes Nacionais para o relação com a difusão do progresso técnico e com a Desenvolvimento do Turismo Rural, conceitua-se o eficiência dos sistemas de produção. Contudo, essas Turismo Rural como: relações de produção e trabalho no meio rural passam O conjunto de atividades turísticas desenvolvidas por transformações, como a intensificação da no meio rural, comprometido com a produção globalização e modernização da agricultura, agropecuária, agregando valor a produtos e serviços, inviabilizando técnica e economicamente muitas das restando e promovendo o patrimônio cultural e pequenas propriedades rurais (CAVACO, 2001). natural da comunidade. (BRASIL, 1999) Nesse processo, as atividades agropecuárias vêm enfrentando problemas, como a desagregação das A atividade turística é hoje uma realidade formas tradicionais de articulação da produção e uma existente em nosso país. É visível também todo o desvalorização gradativa em relação a outras potencial em nossa região, bem como é sabido que a atividades, levando à busca de novas fontes de renda mesma gera emprego e renda, favorecendo ao que gerem a dinamização econômica dos territórios desaparecimento do desemprego nas regiões onde a rurais. utilizam como principal atividade. Esse novo cenário produtivo no meio rural vem De acordo com Tulik (2004), três critérios para gerando motivação para investimentos privados e apoios governamentais, despertando grande interesse definir o rural e urbano podem ser citados, tomando por parte dos empreendedores do campo; como base as experiências de vários países. São eles:

descobrindo a importância ambiental, principalmente, · O critério oposição entre rural e urbano: considera no que se refere à conservação dos recursos naturais, as atividades e funções urbanas e as rurais, existindo entre eles, os hídricos, florestais, de solo e fauna, e, uma oposição com limites bem rígidos e um espaço realizando a manutenção da paisagem rural para a própria vida do planeta (SALVATI, 2003). intermediário onde os dois se misturam. · Tamanho e características demográficas: considera Essa situação tem propiciado a revalorização do o tamanho e a população, inclusive o volume total, a modo de vida e o surgimento de novas funções densidade demográfica, a PEA (população econômicas, sociais e ambientais no espaço rural. Anais do VIII Congresso Brasileiro de Turismo Rural e I Colóquio Internacional de Pesquisa e Práticas em Turismo no Espaço (p. 000-000) Rural, Rosana - SP, 10-13 de novembro de 2013. v.1.

economicamente Ativa), e a atividade dos residentes provenientes das atividades agropecuárias dos residentes. tradicionais. · Delimitação do Perímetro Urbano: Caracteriza-se A interiorização territorial do fenômeno turístico, por ser um critério político-administrativo. que em alguns países, como no Brasil, iniciou-se pelo Neste contexto veem surgindo várias litoral, recebe diferentes denominações: turismo modalidades na prática da atividade turística e uma rural, turismo alternativo, turismo verde, ecoturismo, delas é o Turismo Rural, que, juntamente com o agroturismo, turismo cultural, turismo de aventura, Ecoturismo, vem buscando uma maior aproximação turismo ambiental, etc. Independente da terminologia do homem com suas raízes, e principalmente, o meio adotada parte-se da constatação de que o turismo ambiente. pode ser um recurso para os espaços rurais, que procuram uma nova alternativa de desenvolvimento O Turismo rural vem ganhando força, pois faz local e, ao mesmo tempo, uma oportunidade de com que o homem passe a gerar possibilidades de valorizar seu patrimônio, suas paisagens e sua crescimento neste meio, diminuindo assim, o êxodo cultura. (NOVAES, 1999, p.139) rural e os inchaços das cidades. Segundo Ruschmann (2000), o turismo rural, na Também a busca de um maior contato com a sua forma mais original e “pura”, deve estar terra, o processo de colheita e plantação e a constituído em estruturas eminentemente rurais, de tranquilidade do meio rural, promovem ao homem pequena escala, ao ar livre, proporcionando ao esse retorno às origens, pois o stress do dia a dia nas visitante o contato com a natureza, com a herança grandes cidades favorece a procura do homem por cultural das comunidades do campo e as chamadas locais mais calmos, onde possam descansar deste sociedades e práticas “tradicionais”. desgaste rotineiro.

2.1. Importância do turismo no espaço rural 2. SEGMENTAÇÃO DO TURISMO

Atividade econômica dinâmica por excelência, o É necessário conhecer e valorizar as práticas de turismo sofre mudanças e inovações constantes, em Turismo no Espaço Rural, pois, enquanto função de novas exigências da demanda e da pluriatividade - atividade não agrícola no espaço rural contínua e acirrada competitividade dos mercados. - pode ser um importante meio para complementar a renda da população rural. Além do mais, o Turismo Em virtude desta realidade, as empresas que têm praticado em Espaços Rurais se preocupado em seus ramos de atividade relacionados ao setor vêm valorizar o modo de vida rural logo servirá para adotando, de forma crescente, tendências de valorizar os e bens materiais imateriais do meio rural. especialização no que diz respeito à oferta de seus Pois, conforme a MTur, meio rural pode ser bem produtos, de forma a torná-los cada vez mais aproveitado para o turismo. Não só as propriedades, segmentados, com a finalidade de atender as como também os atrativos e produtos existentes no necessidades de uma demanda cada vez mais campo (bebidas, alimentos artesanatos, músicas, específica. danças etc.). Um dos pontos importantes a considerar na As formas de Turismo no Espaço Rural (TER) perspectiva do desenvolvimento local refere-se ao mencionadas neste artigo e as não mencionadas se aproveitamento das especificidades de cada desenvolvidas de maneira adequada podem servir localidade ou território e ao pleno aproveitamento das para ajudar a criar uma consciência de preservação e suas potencialidades e oportunidades. manutenção do patrimônio cultural e natural dos (CAMPANHOLA e SILVA, 2000, p. 151). habitantes rurais. Portanto, o turismo pode Deve-se, assim, explorar o específico, os proporcionar uma elevação da autoestima de um chamados “nichos”, diferentemente do que é grupo, dinamizar a economia local e ainda cumprir preconizado no turismo de massa, que tende a sua finalidade que é proporcionar lazer e descanso as homogeneizar os produtos e a concentrar-se em pessoas que o procuram. determinados locais. O turismo no meio rural deve ser uma atividade essencialmente difusa, diretamente relacionada com aspectos ambientais e com especificidades inerentes a cada local. 2.2.1. Efeitos do turismo rural Segundo Silva (et al, 2000), o turismo em áreas

rurais tem sido pensado mais recentemente no Brasil como uma fonte adicional de geração de emprego e Como em toda atividade, o turismo no meio rural de renda para famílias residentes no campo, á medida também possui aspectos positivos e negativos. Ele que vêm decaindo a ocupação e as rendas proporciona benefícios, mas também pode causar Anais do VIII Congresso Brasileiro de Turismo Rural e I Colóquio Internacional de Pesquisa e Práticas em Turismo no Espaço (p. 000-000) Rural, Rosana - SP, 10-13 de novembro de 2013. v.1.

consequências que trazem problemas para a Tabela 1 - Dos Impactos positivos e negativos população local, que será melhor visualizado na do turismo rural na localidade : tabela 1 abaixo:

IMPACTOS POSITIVOS NEGATIVOS • Valorização do ambiente, devido a sua capacidade de destacar • Aumento do fluxo de turistas, causando a cultura e a diversidade natural de uma região; danos ao meio ambiente; • Conservação e manutenção do patrimônio histórico, cultural e • Descaracterização da cultura local devido natural; à modificação dos padrões de sociabilidade tradicionais decorrentes da intensificação das relações mercantis; • Reorganização social e econômica local; • Aumento do tráfego de pessoas e pela ampliação da mobilidade populacional; • Criação de mercado de consumo local para complementar a • Por ser seletiva, a atividade pode conduzir renda das famílias rurais; à depressão e à crise, acentuando os desequilíbrios regionais; • Aproximação, quase direta, entre o consumidor desses • Aumento da violência e do uso de drogas, alimentos e o agricultor; típico de situações sociais de intensificação das relações humanas; • Realização de obras de melhoria da infraestrutura e pela • Especulação imobiliária; criação ou aperfeiçoamento dos serviços oferecidos como o saneamento básico, a pavimentação de estradas, o acesso às telecomunicações, a recuperação de áreas degradadas, a conservação de parques e reservas florestais;

Fonte: Adequação de Schneider e Fialho (2000)

Importante ressaltar que o desenvolvimento turismo rural, com o objetivo de produzir os efeitos desordenado da atividade pode sobrecarregar a positivos esperados, como: diversificação da estrutura rural, por meio de um número elevado de economia regional, pelo estabelecimento de micro e visitantes, ou tráfego excessivo de veículos. Tal pequenos negócios; geração de novas oportunidades situação pode, ainda, comprometer o meio ambiente de trabalho; melhoramento da infraestrutura de através das alterações na paisagem e utilização transporte, comunicação, saneamento; criação de demasiada ou indevida dos recursos naturais. Por fim, alternativas de receitas que valorizam as atividades pode modificar os costumes e cultura local, gerando rurais; diminuição do impacto sobre o patrimônio descontentamentos ou dificuldades no modo de vida natural e cultural; redução do impacto no plano da população. estético paisagístico; melhoria dos equipamentos e dos bens imóveis; integração do campo com a cidade; Por outro lado, os efeitos positivos estão agregação de valor ao produto primário por meio da relacionados a benefícios socioeconômicos, verticalização da produção; redução de custos por valorização cultural e conservação ambiental, em técnicas de manejo integrado; promoção da imagem e níveis regional e nacional. revigoramento do interior; redução do êxodo rural e Além desse benefício direto, o turismo rural pode melhoria da qualidade de vida da população rural; ser visto como importante instrumento para a integração das propriedades rurais e comunidade; interiorização do turismo, difusão de conhecimentos valorização das práticas rurais, tanto sociais quanto e técnicas das ciências agrárias, diversificação dos de trabalho e resgate da autoestima do campesino. pólos turísticos, diminuição do êxodo rural, No turismo rural integram-se frequentemente os promoção de intercâmbio cultural, sensibilização espaços protegidos ainda agrícolas, ou já sem para a importância da conservação dos recursos qualquer cultivo e apenas algum pastoreio e naturais e para promover o reencontro dos cidadãos exploração florestal, espaços com capacidade de com suas origens. carga reduzida, espaços tradicionais e áreas pobres, Portanto, o planejamento faz-se necessário, que são também marginalizadas e as mais baseado no desenvolvimento de ações estratégicas vulneráveis, física e socialmente. (SILVA, 2000, p. eficientes, a fim de amenizar, ou mesmo eliminar, se 29). possível, a ocorrência de impactos provocados pelo Anais do VIII Congresso Brasileiro de Turismo Rural e I Colóquio Internacional de Pesquisa e Práticas em Turismo no Espaço (p. 000-000) Rural, Rosana - SP, 10-13 de novembro de 2013. v.1.

3. UM BREVE RELATO SOBRE A HISTÓRIA para o interior. Assim, o cultivo da cana e a produção DA CANA DE AÇÚCAR E DOS do açúcar se impõem como atividades em torno dos ENGENHOS NA REGIÃO quais vai girar a vida econômica da província e que fornecem as bases para importantes mudanças na Até o início do século XVIII as terras da sociedade sergipana (FRANÇA & CRUZ, 2007). província sergipana eram dedicadas à criação de Como cita Almeida, gado, como anteriormente nos referimos. Também a Para Sergipe parecia [...] que na cana-de-açúcar agricultura de subsistência e o fumo faziam parte residia sua vocação agrícola por excelência, única dessa economia. Há uma produção insignificante de capaz de lhe assegurar uma posição privilegiada açúcar desde o início da colonização, após a no sistema econômico brasileiro” (1984, p.108). conquista de Cristóvão de Barros. Essa produção aumenta no final do século XVIII. Mas é somente no Os registros históricos mostram que no início do início do século XIX, no vale do Vaza-Barris e, século XIX já existiam em Sergipe, cerca 150 (cento principalmente, na microrregião da Cotinguiba que e cinquenta) engenhos, 70 deles concentrados na ocorre um grande surto de produção. região do Cotinguiba, dobrando esse número em A cana-de-açúcar foi o primeiro cultivo pouco mais de 16 anos, quando em 1823 o Estado industrial a ser introduzido em Sergipe, desde 1602. passou a ter 347 engenhos. Para tal, contou-se com as boas condições geográficas e ambientais “que muito contribuíram para o desenvolvimento da monocultura canavieira e 3.1. Fazenda Lyra e sua vocação para o turismo a produção do açúcar, em sua maior parte destinada à rural exportação para a Europa e para outros pontos do país” (FRANÇA & CRUZ, 2007, p.161). O município de Riachuelo está localizado no Ainda na perspectiva de Almeida, centro-leste do Estado de Sergipe, limitando-se a [...] As terras que margeiam os rios Cotinguiba e norte com os municípios de Divina Pastora e Santa Sergipe são das mais férteis e propícias à cultura Rosa de Lima, a oeste com Areia Branca e Malhador, açucareira. Em fins do século XVIII a cana-de- a sul com Laranjeiras e a leste com Maruim. A área açúcar e o algodão foram ganhando terreno sobre municipal ocupa 78,6km2, contidos na folha SC.24- os cereais, exigindo um mecanismo garantidor de Z-B-IV (Aracaju), escala 1:100.000, editada pelo sua exportação. A importância econômica da MINTER/SUDENE em 1974. região viria então a tornar a navegabilidade da Os limites do município, podem ser observados barra a maior preocupação das lideranças. A no Mapa Rodoviário do Estado de Sergipe, escala maior produção que por ela tinha de se escoar estava sempre a exigir uma maior atuação dos 1:400.000 (DER-SE, 2001). A sede municipal tem governantes na busca de soluções que a uma altitude de 30 metros e coordenadas geográficas tornassem apta ao desempenho econômico que a de 10o43’50” de latitude sul e 37o11’15” de região lhe reservava (ALMEIDA, 1984, p.31). longitude oeste. O acesso a partir de Aracaju é feito pelas No século XIX, a lavoura açucareira passou a se rodovias pavimentadas BR-235, BR-101 e SE- 210, espalhar pelas bacias dos rios que cortam o território num percurso total de 29 km (Figura 1). sergipano, enquanto que o gado foi sendo empurrado

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Figura 1 – Percurso rodoviário da capital à Riachuelo. Fonte: BOMFIM, 2002

A fazenda Lyra está localizada no vale do vegetação de transição (umbaúba, jenipapeiros, Cotinguiba, na cidade de Riachuelo, que dista 25 km jurema etc..). de Aracaju, com 2470000 ha, conta com área de preservação permanente de 51.4581 ha, distribuídas em três áreas de Reserva Florestal ao entorno, incluindo os limites com a usina Pinheiro, que possui 13.0348 ha de Área de Preservação Permanente - APP. A divulgação da existência desta localidade a nível nacional é de vital importância, por exemplo, há alguns registros interessantes sobre a região, como é o caso da série de reportagens sobre o patrimônio histórico edificado, feito pelo Jornal da Cidade 1, com o qual poderia funcionar como atração turística, ou mesmo fazer parte de um roteiro de turismo pensado para o segmento histórico ou cultural. Atualmente, a fazenda Lyra tem como atividade principal a produção de cana-de- açúcar para fornecer a Usina São José do Pinheiro, localizada no município de Laranjeiras. Tem uma produção de 3000 toneladas de cana/safra e possui um alambique artesanal dentro dos padrões de Minas Gerais, envelhecida em tuneis de Jequitibá Rosa e Carvalho. O alambique tem o SIF do Ministério da Agricultura (Indústria Comercio e Exportação de Cachaça Vale do Cotinguiba LTDA) e apresenta o nome de fantasia "Cachaça Engenho Lyra" com uma produção de 10.000 litros / safra. A propriedade tem uma área de 247 ha e apresenta uma área de reserva legal permanente de 51,44 ha. Sendo essa área de Mata Atlântica e

1 Jornal da Cidade é um jornal à nível estadual em Sergipe, que aborda os mais variados temas, dentre eles o turismo. Anais do VIII Congresso Brasileiro de Turismo Rural e I Colóquio Internacional de Pesquisa e Práticas em Turismo no Espaço (p. 000-000) Rural, Rosana - SP, 10-13 de novembro de 2013. v.1.

Figura 2 – Foto da Fazenda Lyra. Fonte: ALEXANDRE, Lillian Maria de Mesquita, 2013.

A fazenda é da época dos engenhos e tem como aonde é feita a produção de cachaça (figura 5), com principais características uma casa grande, com alambique artesanal, com um estoque de cachaça quatro quartos (com forro), sendo um com banheiro envelhecida há dois anos, totalizando 10 mil litros em interno; grande, aonde é possível alocar 10 pessoas; dois grandes barris de pinho (figura 6), sendo que a Uma cozinha com antessala, uma lateral com capacidade de produção diária é de 200 litros nos cadeiras já preparadas para receber um número bom período de 120 dias em que a produção acontece, ou de pessoas; uma mobiliária antiga, assim como sua seja, nos meses de novembro a fevereiro, época de estrutura rústica. Existe um riacho chamado colheita da cana de açúcar que é plantada na própria Sangradouro da bacia de Japaratuba, a 50m da sede. fazenda com esse intuito. Fazem parte das características locais: onde outrora era a senzala, transformou-se no alambique,

Figuras 5 e 6 – Alambique tradicional e Barris de Pinho. Fonte: ALEXANDRE, Lillian Maria de Mesquita, 2013.

São quatro áreas ao entorno da sede da fazenda produção é vendido para a Usina Pinheiro (figura 3 e voltada para a produção da cachaça. O restante da 4). Anais do VIII Congresso Brasileiro de Turismo Rural e I Colóquio Internacional de Pesquisa e Práticas em Turismo no Espaço (p. 000-000) Rural, Rosana - SP, 10-13 de novembro de 2013. v.1.

Figuras 3 e 4 – Produção com intuito da comercialização junto à Usina. Fonte: ALEXANDRE, Lillian Maria de Mesquita, 2013

Além da produção de cachaça, carro chefe da engenho, tombada pelo IPHAN, conforme Cadastro fazenda, a mesma tem produção de mel, com uma Nacional CSNA Se00136, incluindo um sítio casa de mel, Apiário com produção de ovos de histórico – estruturas de engenho a vapor, delimitado galinha de capoeira, piscicultura, com 2 mil tilápias, pelo mesmo, isso faz com que a fazenda tenha um pecuária de corte e está sendo preparada uma aspecto importante para a história da região. estrutura para a criação de pecuária de leite, com o O gestor se mostrou muito aberto à inclusão do intuito do aproveitamento do mesmo para o feitio de turismo rural e atividades correlatas a ele, como o doce do queijo e o uso do leite como insumo para a agroturismo, o turismo pedagógico rural, que já é culinária rural. Há ainda a suinocultura e o espaço feito na propriedade com alunos do Instituto Federal para matriz de cunicultura, o que agregam valor a de Sergipe, aonde os alunos utilizam o espaço da produção local. Desenvolve como atividade fazenda para a prática, uma vez que o gestor também secundária: A minhocultura e a avicultura colonial ou é professor desse mesmo instituto. Além desses, é capoeira. possível inserir a educação ambiental na área da A produção de cachaça é o que mais chama a reserva florestal, o turismo religioso associado a atenção, pois é um processo sustentável uma vez que Divina Pastora, município que tem possui uma além da produção ser local, há o envolvimento da peregrinação muito grande no mês de setembro, comunidade local em todo o processo, do plantio a favorecendo a criação de um roteiro integrado. alimentação do moedor, no processo de separação da Do ponto de vista de atividades de lazer, é cana. O bagaço é utilizado para fazer alimento para o possível o passeio de charrete (existe uma no local), boi. Ainda não é utilizado para o artesanato, mas o de cavalo, trilhas a pé, de bicicleta, pesque pague, gestor tem interesse em aprimorar essa área. além da visitação em todas as áreas de produção da A fazenda fica no alto, aonde é possível ver toda mesma. (figura 7). a área de reserva florestal, incluindo a igreja da cidade, pois o limite é mínimo, ficando a cidade ainda mais perto e como outro fator importante para agregar valor ao produto, como também há na

entrada da fazenda uma chaminé remanescente do

Figura 7 – Foto de uma charrete de cavalo. Fonte: ALEXANDRE, Lillian Mesquita, 2013. Anais do VIII Congresso Brasileiro de Turismo Rural e I Colóquio Internacional de Pesquisa e Práticas em Turismo no Espaço (p. 000-000) Rural, Rosana - SP, 10-13 de novembro de 2013. v.1.

3.2. Perspectiva do visitante na localidade nível municipal, quanto na esfera federal, uma vez que falta a consolidação da Política Nacional de Com intuito de conhecer o objeto de estudo, foi Turismo Rural que servirá para orientar as ações feito uma visita técnica a partir da região do Vale do voltadas a esta segmentação. Norteando assim, Cotinguiba. A primeira parada foi no município de possíveis atividades voltadas para esse segmento que Laranjeiras. Passando pelo povoado Mussuca e vem demonstrando um cenário promissor no decorrer avançando aproximadamente três quilômetros de do tempo. ‘estrada de chão’ até encontrar as ruínas da Capela de Aliado com a existência de sítios históricos e a Nossa Senhora da Conceição, do antigo Engenho fábrica artesanal de cachaça, a fazenda Lyra e todo Lyra. seu espaço circunvizinho, possuem um grande Provavelmente erguida no início do século XIX, potencial a ser trabalhado tanto pelos segundo o pesquisador Jenilton Ferreira, que se empreendedores locais, quanto por possíveis debruçou sobre a história do Engenho Ilha, desde seu investidores e pesquisadores do ramo turístico. apogeu à sua decadência. Quanto ao aspecto físico, o que restou do engenho está numa elevação, circundado por uma vegetação que envolve inclusive as estruturas da capela. De uma beleza desconcertante, a região faz parte do Cadastro REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA Nacional de Sítios Arqueológicos – do IPHAN, e é considerado de alta relevância na categoria sitio ALMEIDA, Maria da Glória Santana de. Sergipe: histórico (assim como o Santa Bárbara, em Rosário fundamentos de uma economia dependente, do Catete, e o Lyra, em Riachuelo). Petrópolis: Vozes, 1984. (VASCONSELOS, 2013) Por fim, chega-se ao antigo Engenho Lyra, em ______, Maria da Glória Santana de. Nordeste Riachuelo. A beleza e a simplicidade da sede da açucareiro (1840-1875): desafios num processo do fazenda são de impressionar. A construção singela vir-a-ser capitalista, Aracaju: FS/SEPLAN/BANESE, está situada em uma elevação do terreno e 1993. aparentemente guarda muito de suas características originais, a exemplo de suas paredes BOMFIM, Luiz Fernando Costa. Projeto Cadastro predominantemente de taipa. Mais adiante está a da Infra-Estrutura Hídrica do chaminé, um dos elementos remanescentes do Nordeste: Estado de Sergipe. Diagnóstico do engenho a vapor. Município de Riachuelo. Luiz Fernando Costa Afastado da residência, um mausoléu que se Bomfim, Ivanaldo Vieira Gomes da Costa e Sara constitui de uma pequena capela azulada, que abriga, Maria Pinotti Benvenuti. – Aracaju: CPRM, 2002. segundo os moradores, os corpos dos primeiros donos do Engenho. Hoje, a fazenda também investe FRANÇA, Vera Lúcia Alves; CRUZ, Mª Tereza na produção de destilado de cana-de-açúcar, e possui Sousa (org.). Atlas escolar Sergipe: espaço geo- um alambique anexo à sede. histórico e cultural. João Pessoa: Grafset, 2007.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS GUIMARÃES, Danielle Virginie Santos. Engenhos enriquecem o Vale do Cotinguiba: Região faz parte do Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos do IPHAN. Disponível em: É possível concluir que o turismo rural é uma pesquisado em 19 planejado e articulado. de agosto de 2013. A importância dada ao turismo rural é grande, uma vez que a valorização do espaço rural por sua IPHAN. Cadastro Nacional de Sítios própria comunidade, favorecendo a sua permanência Arqueológicos. Disponível em: nestas áreas é imprescindível para diminuição dos pesquisado em 19 de agosto de 2013. gerados com os inchaços das cidades em decorrência do êxodo rural. IPHAN . Sistema de Gerenciamento do Patrimônio Arqueológico. Disponível em Em Sergipe existem inúmeras possibilidades pesquisado em 19 de agosto de 2013. orientação tanto para os produtores, os gestores em Anais do VIII Congresso Brasileiro de Turismo Rural e I Colóquio Internacional de Pesquisa e Práticas em Turismo no Espaço (p. 000-000) Rural, Rosana - SP, 10-13 de novembro de 2013. v.1.

SANTOS, Wesley Alves dos. Ocupação e Dinâmica Socioambiental da Sub-bacia Hídrográfica do Rio Cotinguiba-SE . Programa Regional de Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA. Universidade Federal de Sergipe – UFS. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente), São Cristovão, 2012.

VASCONCELOS, Jairo Vila Nova de Souza. O Engenho no Vale da Cotinguiba (Seminário). Disponível em: pesquisado em 19 de agosto de 2013.

Anais do VIII Congresso Brasileiro de Turismo Rural e I Colóquio Internacional de Pesquisa e Práticas em p. 272-283 Turismo no Espaço Rural, Rosana - SP, 10-13 de novembro de 2013. v.1.

TURISMO RURAL PEDAGÓGICO: UMA FUNÇÃO ALTERNATIVA PARA O ESPAÇO RURAL

DANIELE LIMA GELBCKE ROSANI LIDIA FINGER

Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC Programa de Pós Graduação em Geografia [email protected] [email protected]

RESUMO - O turismo rural ou Turismo Rural na Agricultura Familiar cresce nos últimos anos tanto em decorrência das transformações do mercado turístico, como da crise do rural, em função das quais novas perspectivas se configuram. A necessidade de repensar o desenvolvimento rural, principalmente nas médias e pequenas propriedades, levou as alternativas no sentido de aproveitar as potencialidades do rural enquanto espaço social e econômico, de diversificar as atividades, gerar emprego e renda, e valorizar os recursos naturais, legitimando formas de agricultura diferentes daquelas do modelo dominante. Novas atividades e usos dos espaços rurais se delineiam, como os de lazer, turismo, moradia e produção de produtos agroecológicos. Neste contexto sócio espacial, a Associação de Agroturismo Acolhida na Colônia localizada no Estado de Santa Catarina – BRA se constitui como experiência e oportunidade estratégica de desenvolvimento rural e construção social, permeada pela relação rural/urbano. No âmbito do turismo em propriedades rurais, o turismo rural pedagógico se constituiu em uma estratégia de conscientização e fortalecimento da agricultura familiar, e ao mesmo tempo se mostra como uma metodologia alternativa para a educação básica por trabalhar conceitos e conteúdos, através de atividades interdisciplinares e o tema transversal meio ambiente. Destaca-se a observação, leitura e interpretação das paisagens para a compreensão do espaço geográfico.

Palavras chave: Agroturismo; Turismo Rural Pedagógico; Acolhida na Colônia; Desenvolvimento Rural.

ABSTRACT - The rural tourism or Rural Tourism in Family Agriculture is growing in recent years due to changes in the tourism market and the crisis of rural market, thus setting up new perspectives. The need about rethinking the rural development, especially in medium and small properties, led to seek alternatives in order to take advantage of the potential of the rural market as a social and economic space, diversify activities, generate employment and income, and enhance natural resources, legitimating agriculture forms, different from the dominant model. New activities and uses of rural areas are delineated, such as leisure, tourism, habitation and the production of agroecological products. In this socio-spatial context, the Agritourism Association “Welcomed in the Colony” in the State of Santa Catarina – Brazil, constitutes an experience and strategic opportunity for rural development and social construction, permeated by the relations rural / urban. In the context of tourism in rural properties, pedagogical rural tourism has become strategy awareness and strengthening of family agriculture, and at the same time shows itself as an alternative methodology for basic education, by working concepts and content through interdisciplinary activities and the environment transversal theme. It is emphasized the observation, reading and interpretation of landscapes for understanding the geographic space.

Keywords: Agritourism, Pedagogic Rural Tourism; Welcomed in the Colony; Rural Development.

D.L. Gelbcke; R.L. Finger ISSN 2176-9052

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1 INTRODUÇÃO na agricultura sob a forma de pacote tecnológico (motomecanização, uso de insumos químicos, utilização de sementes melhoradas, etc.), pela integração às O turismo em espaços rurais enquanto atividade indústrias, a especialização da produção agrícola, entre econômica é relativamente recente, e se deve a dois outros (GELBCKE, 2006). motivos principais: às transformações do mercado Segundo diferentes condicionantes, a integração turístico, que entre outros, buscou expandir a atividade dos territórios e dos agricultores à modernização se deu para vários espaços e diversificar a oferta e, à crise do de forma mais ou menos intensa. “À margem do processo rural, em função da qual a atividade turística surge como ficaram as pequenas e médias empresas e as unidades estratégia de desenvolvimento. artesanais de produção de bens e serviços, dispersas Hoje consolidado e em expansão, o turismo nos territorialmente; as regiões menos dotadas em fatores de espaços rurais diversifica suas ofertas e motivações, produção, menos centrais e menos acessíveis e equipadas, criando um conjunto de novas modalidades, das quais, acentuando-se consequentemente as desigualdades e as destacaremos o agroturismo ou TRAF (Turismo Rural na oportunidades territoriais, os desequilíbrios espaciais, o Agricultura Familiar). No Brasil, assim como em outros abandono de recursos locais, a desertificação humana, os países, esta atividade vem sendo difundida entre os problemas de preservação ambiental e paisagística e o agricultores como alternativa de renda e estratégia de sentido de incerteza quanto ao futuro destes espaços e das valorização da agricultura familiar. suas populações, na ausência de perspectivas de desenvolvimento a curto e médio prazo” (CAVACO, Das experiências brasileiras, o artigo se propõe a 1996, p. 95). discutir a experiência da “Associação de Agroturismo Acolhida na Colônia”, inserida na rede internacional Seja nos países desenvolvidos ou no Brasil, “Accueil Paysan”, presente hoje em mais de 30 países do independente da escala de modernização, os impactos mundo. negativos foram importantes tanto no campo econômico como no social, espacial e ambiental, despertando nas Dentre os diversos trabalhos que a Acolhida na sociedades, em geral, a necessidade de repensar o Colônia vem desenvolvendo para dinamizar o turismo nas desenvolvimento rural. As consequências do processo propriedades rurais, destacaremos o turismo pedagógico, despertaram discussões à cerca de quais alternativas que aproxima os objetivos da associação àqueles das poderiam ser pensadas e desenvolvidas no sentido de escolas. Através de saídas de campo, alunos e professores aproveitar as potencialidades do rural enquanto espaço vivenciam a realidade das propriedades rurais, utilizando- social e econômico, legitimando formas de agricultura se destas vivências como ferramenta do processo ensino- que não se enquadram no modelo dominante, mas que aprendizagem. Vale ressaltar que o espaço rural é um através de diferentes estratégias, lutam para superar campo riquíssimo, pois confronta os alunos com uma dificuldades e se reproduzir (GELBCKE, 2006). realidade diferente daquela encontrada nos centros urbanos, realidade esta percebida e analisada através da Para a autora, surge daí um novo modo de pensar o paisagem rural. desenvolvimento rural, alicerçado em: mobilização de recursos disponíveis e endógenos; envolvimento de atores O presente artigo tem por objetivo, analisar o papel locais na busca de soluções para as necessidades das do turismo rural no processo ensino-aprendizagem, comunidades; diversificação de atividades; valorização do através da superação da tradição didática de sala de aula, saber-fazer e das riquezas socioculturais das regiões; que trabalha a memorização de conteúdos em detrimento valorização e preservação dos recursos naturais; criação da construção coletiva do conhecimento, e também, o de emprego e renda, entre outros. significado que esta aproximação com as escolas representa para a agricultura familiar e o espaço rural. Desta forma, desde a década de 1970, sobretudo na Europa, as políticas públicas voltadas aos espaços rurais passaram a focar não apenas no setor agropecuário, mas 2. TURISMO E DESENVOLVIMENTO na integração com outros segmentos produtivos. Neste RURAL sentido, Silva (2001, p.62-63) coloca que “as novas iniciativas se destinam a estimular modificações nos sistemas produtivos e na estrutura dos mercados, apoiar a Os espaços rurais por muito tempo tiveram suas urbanização para primeira e segunda residência, fomentar atividades econômicas voltadas basicamente para a a industrialização em zonas rurais - vinculadas aos produção agrícola e pecuária, entretanto, o rural está em complexos agroindustriais ou à economia agroalimentar - constante transformação e acompanha as mudanças e a incentivar o turismo rural em todas as suas expressões socioeconômicas do global ao local, sendo o processo de (agroturismo, turismo ambiental, turismo de aventura, modernização da agricultura o melhor exemplo. esportes radicais, esportes de inverno, etc.)”. É assim que Este processo a que foram submetidas as surge o incentivo ao turismo rural enquanto dinamizador atividades agrícolas, se caracterizou, apesar das dos espaços rurais, gerador de emprego e renda para as peculiaridades de cada lugar, pelo uso intensivo de capital populações locais, e que acabou inspirando outros países, entre eles o Brasil. D.L. Gelbcke; R.L. Finger ISSN

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As ações em prol do desenvolvimento rural vieram como parte integrante do TER, mas que se diferencia pela associadas a uma dinâmica própria dos espaços rurais ligação mais estreita com a agricultura, sobretudo a de onde, a pluriatividadei dos agricultores e a base familiar. multifuncionalidadeii vêm ao encontro das novas Mesmo não havendo um conceito único de demandas da sociedade, principalmente as de origem agroturismo, noções e princípios norteiam as experiências urbana. Diante deste contexto, se percebe o aparecimento em diversos países. A título de exemplo, o agroturismo na de uma série de novas atividades e usos dos espaços Itália, França e Alemanha é uma modalidade restrita às rurais, entre eles, os de lazer, turismo e moradia. propriedades agrícolas familiares e produtivas, já nos É importante ressaltar que estas demandas também EUA, pode ser desenvolvido em qualquer são consequência de uma mudança no padrão de empreendimento rural. Essas noções são causa e efeito de consumo. O modelo de massificação do turismo inspirado políticas e programas de apoio ao TER, e estão na produção industrial, que gerou produtos padronizados, diretamente relacionadas ao modelo de desenvolvimento simplificados, concentrados em polos turísticos, econômico adotado em cada país, tendo consequências acessíveis a um grande número de pessoas, mas pouco importantes sobre a interação do turismo com a individualizados, passou a ser criticado por uma parcela agricultura e com as comunidades locais. da população. No Brasil, a discussão sobre os rumos do turismo rural se inicia em 1998 durante o CITURDS (Congresso O novo comportamento, focado na Internacional de Turismo Rural e Desenvolvimento sustentabilidade ambiental e social dos destinos turísticos, Sustentável), realizado em Santa Maria – RS. A discussão resulta em estratégias diferenciadas do setor, cujo se estende através de encontros e reuniões entre entidades discurso volta-se para o atendimento personalizado, o fornecimento de equipamentos e serviços especializados, públicas, privadas e setores organizados até 2003, quando a proposta de espaços diferenciados e o comprometimento é finalmente elaborado o documento “Diretrizes para o Desenvolvimento do Turismo Rural no Brasil”, com a sustentabilidade ambiental. Este discurso reforça a incorporado na Política Nacional de Turismo. Este procura por espaços onde a natureza encontra-se menos documento define as diretrizes e estratégias para o modificada, entre eles, o rural. desenvolvimento da atividade no país. Neste cenário, cabe ressaltar que o turismo rural foge em parte aos padrões da hotelaria, oferecendo um Embora tenha incorporado o turismo rural na clima de informalidade e familiaridade. De acordo com Política Nacional de Turismo, o Ministério do Turismo o Cavaco, (1996, p. 111), “o contato com a natureza e a faz de forma bem abrangente quanto ao público cultura local funciona como uma fuga para os turistas, que beneficiado, ficando explícito que as diretrizes desejam sair de suas realidades estressantes da vida contemplarão tanto o Turismo Rural como o Agroturismo. cotidiana urbana, motivados por uma opção de lazer, Quem acaba diferenciando o publico beneficiário é o proporcionando a interação com o modus vivendi rural, Ministério do Desenvolvimento Agrário que cria o termo incorporando elementos carregados da simplicidade “TRAF” – Turismo Rural na Agricultura Familiar e o peculiar deste meio inseridos em um contexto de define como “a atividade turística que ocorre no âmbito paisagem cênica, remetendo o indivíduo a exercer um da propriedade dos agricultores familiares que mantém as olhar contemplativo”. atividades econômicas típicas da agricultura familiar, Segundo Gelbcke (2006), o desenvolvimento do dispostos a valorizar, respeitar e compartilhar seu modo turismo em espaços rurais é facilitado por uma relação já de vida, o patrimônio cultural e natural, ofertando existente entre o rural e o urbano, mantida por uma produtos e serviços de qualidade e proporcionando bem população de origem rural que habita os centros urbanos estar aos envolvidos” (MDA 2006, p.4). e, reforçada pela urbanização das grandes cidades e as Desta forma, o agroturismo no Brasil é consequências dela advindas, tais como: poluição (visual, conceituado como Turismo Rural na Agricultura Familiar sonora e atmosférica), insegurança, trânsito, tensões e para distingui-lo de qualquer outra modalidade de turismo principalmente uma crescente impessoalidade. desenvolvida no espaço rural e, garantir que os beneficiários das políticas públicas voltadas ao setor sejam os agricultores familiares. 2.1 Turismo nos espaços rurais e agroturismo 2.2 Da crise na agricultura à Associação de Apesar das diversas experiências, interesses e Agroturismo Acolhida na Colônia contextos em que estão inseridas as experiências de Turismo no Espaço Rural (TER), existe um discurso generalizado sobre o desenvolvimento de um turismo A Acolhida na Colônia é uma organização sustentável e de base local, que venha ao encontro das de agricultores familiares do Estado de Santa Catarina, estratégias de desenvolvimento rural através da sua que assim como em outras experiências de agroturismo, valorização. Neste contexto surge o termo agroturismo surge como oportunidade e estratégia de desenvolvimento

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rural, e deve ser compreendida como parte do processo de Assim, a primeira proposta efetiva foi apresentada construção social do espaço rural em que está inserida. por um supermercadista de Florianópolis (natural de Esta construção social é em parte, reflexo das mudanças Santa Rosa de Lima), que após uma viagem à Europa e ocorridas na agricultura brasileira e, mais recentemente, Estados Unidos, viu na produção de base ecológica uma do surgimento da AGRECO - Associação dos nova oportunidade de mercado. Mobilizando um pequeno Agricultores Agroecológicos das Encostas da Serra Geral, número de agricultores no início, os esforços centraram-se cuja intervenção é permeada por uma forte relação rural- na produção de verduras sem o uso de agrotóxicos e urbano. adubos químicos. A adesão de outras famílias se deu de forma tímida, entretanto, o objetivo era ampliar esse O território onde surge esta experiência está quadro e trabalhar com uma proposta que possibilitasse o localizado no sul do Estado de Santa Catarina – Brasil. desenvolvimento não apenas do município, mas de toda a Conhecido como Encostas da Serra Geral, é considerado região. um corredor ecológico por estar situado entre o Parque Estadual da Serra do Tabuleiro e o Parque Nacional de A partir do envolvimento efetivo de doze famílias, São Joaquim. A agricultura de subsistência, que atendeu foi fundada em 1996, a Associação dos Agricultores as necessidades de reprodução familiar através do Agroecológicos das Encostas da Serra Geral (AGRECO). consumo e venda de excedentes foi a base da economia da O número de associados foi se ampliando, a associação região até a década de 1960. Após esse período, as foi ganhando visibilidade e conquistando novos mudanças decorrentes do processo de modernização da municípios da região, assim como, estabelecendo novos agricultura que atingiu o Brasil, também tiveram reflexos apoios. Assim, se em 1998 a AGRECO contava com mais na agricultura e no modo de vida tradicional da região. de duzentos associados, este número de elevou para Um processo de crise se instaurou, motivado aproximadamente quinhentos em dezembro de 1999, principalmente pela redução do mercado e do preço do envolvendo mais de 200 famílias de agricultores porco Macau, principal produto comercializável nesta pertencentes a vários municípios da região. É importante época (MULLER, 2001). ressaltar, entretanto, que, “o crescimento numérico e espacial foi condicionado à implementação do Projeto A primeira alternativa frente à crise do porco foi a Intermunicipal de Agroindústrias Modulares em Rede, comercialização do excedente da produção (vegetal e com financiamento do Programa Nacional de animal), sendo que algumas culturas antes produzidas Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF)” apenas para subsistência como a mandioca, o feijão e o (SCHMIDT et al, 2002 p.86). leite, passam a ser intensificadas para fins comerciais. Mas é na produção de carvão e principalmente na A AGRECO passou por conflitos e desafios que fumicultura, através da integração às agroindústrias não cabe a este artigo analisar, mas apresentá-los é fumageiras, que os agricultores encontraram uma “saída” fundamental para contextualizar sua importância nas para a crise. discussões e ações em prol do desenvolvimento daquele território e sua relação com o agroturismo. Foi em função Esta alternativa, que se tornou a principal fonte de da visibilidade do trabalho efetuado pela AGRECO e renda da maioria das famílias, promoveu mudanças parceiros, que a região passou a ser constantemente importantes tanto na base técnica e produtiva, como na visitada por consumidores dos produtos orgânicos, forma de organizar o trabalho. “A grande exigência em agricultores, técnicos e estudantes que buscavam mão de obra na cultura do fumo levou muitos agricultores conhecer a experiência. Não tendo onde se hospedar em a abandonarem suas hortas, pomares e lavouras de função da pequena infraestrutura hoteleira dos subsistências, criando uma dependência do mercado, municípios, os visitantes eram recebidos nas casas dos quanto aos produtos de subsistência” (GELBCKE, 2006). agricultores. Em meados dos anos 1990, o sistema começa Como a discussão entre os atores envolvidos já novamente a expressar sinais de estagnação e crise. A focava no fomento de atividades agrícolas e não agrícolas produção crescente de fumo e a maior exigência na que pudessem contribuir para o desenvolvimento classificação do mesmo levaram a uma queda no preço do sustentável do território, o turismo surge como uma produto. A perda da renda e do poder aquisitivo dos oportunidade. Através de uma parceria com o Centro de agricultores familiares levou-os ao dilema de Apoio à Agricultura Familiar em Grupo de Santa Catarina abandonarem a terra ou de encontrarem alternativas de (Cepagro), os agricultores da região tomaram reprodução econômica. Surge a partir daí um novo conhecimento de uma experiência iniciada na França pela período de mudanças, principalmente no município de Associação Accueil Paysan, cujo foco é valorizar e Santa Rosa de Lima, onde nasce a primeira iniciativa. É viabilizar a agricultura familiar através do agroturismo. A importante ressaltar que esta já surge a partir de uma experiência francesa se mostrou condizente com o que relação entre o meio rural e urbano, ou seja, entre pessoas vinha sendo proposto nas encostas da Serra Geral e uma do lugar e outras naturais da região que moravam em parceria foi estabelecida para auxiliar no desenvolvimento centros urbanos maiores. da atividade.

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A Associação Acolhida na Colônia foi então utilizando-se os recursos da internet. Entretanto, o fundada em 1999, como a primeira parceira na América professor e seu saber continuam no centro do processo. Latina a fazer parte da rede internacional Accueil Paysan. Este fato é acentuado pela prática da memorização, que No início, com 30 famílias distribuídas em cinco leva ao esvaziamento da construção de significados, municípios da região das Encostas, a rede catarinense se provocando a falta de interesse dos alunos. estendeu para outras regiões do estado, estando presente O grande desafio de todo professor ao concluir a hoje em 26 municípios e contemplando aproximadamente formação acadêmica é a articulação entre o conhecimento 180 famílias de agricultores. adquirido na graduação e as necessidades dos alunos da educação básica. A dificuldade da transposição didática Pelo seu histórico, a Acolhida na Colônia nasceu do conhecimento acadêmico para o cotidiano escolar é um com um perfil pedagógico amplo, pois os sujeitos ativos gargalo da educação. A formação profissional deve ser do processo, os agricultores, passaram também a ser os contínua, exigindo constante atualização. Neste processo fomentadores e atores ao dialogar e explicar sobre seus de profissionalidade, de construção de saberes saberes práticos. pedagógicos e metodológicos, sobre como transpor Com o passar dos anos, o número e o perfil de conhecimentos para a sala de aula, são vivenciadas e visitantes se ampliou. A (re) estruturação e adequação das experimentadas metodologias de ensino que possam propriedades contribuíram para redimensionar o projeto contribuir para a prática docente diferenciada. que também criou visibilidade, passando a atrair mais A construção de conceitos e significados de forma pessoas, sobretudo, famílias interessadas em usufruir de autônoma por parte dos alunos é fundamental para que os lugares tranquilos, meios de hospedagem autênticos e mesmos compreendam e estabeleçam relações entre a alimentação saudável. Mesmo com a ampliação e sociedade e a natureza. Para alcançar tal objetivo é mudança do público consumidor, a troca de preciso aproximar os conteúdos trabalhados em sala de conhecimentos continuou sendo um grande atrativo, aula, com informações e significados dos espaços vividos principalmente em função da experiência em torno da dos alunos, reduzindo o distanciamento da realidade com produção orgânica de alimentos. os conteúdos trabalhados no ambiente escolar Cientes da importância do seu conhecimento para (FIGUEIREDO, 2012). a formação/conscientização de pessoas, e visualizando Trabalho de campo, viagens de estudo e/ou o nisso uma oportunidade, os agricultores da Acolhida na turismo pedagógico são ferramentas importantes para Colônia assumiram o desafio de desenvolver uma alcançar tais objetivos, pois confrontam os alunos com a proposta de turismo pedagógico para trabalhar com as realidade, embora “nem sempre a realidade visível escolas. esclarece completamente o que de fato acontece no

espaço” (SERPA apud Figueiredo, 2012, p 16). Desta 3. A FUNÇÃO PEDAGÓGICA DO forma, o trabalho de campo precisa ser previamente AGROTURISMO planejado, levando em consideração a teoria que lhe

servirá de base. Quando as primeiras experiências de turismo nas O turismo rural pedagógico vem se mostrando uma propriedades rurais aconteceram, a dimensão pedagógica ferramenta importante e uma opção de atividade já estava presente, principalmente numa perspectiva de curricular e extracurricular em expansão neste início do educação não formal, envolvendo os agricultores e século XXI, tanto nas escolas da educação básica, como visitantes. Ao justificar, argumentar e explicar as práticas nas universidades. Segundo a ABRATURR/ECA (2005, de agricultura orgânica, sustentabilidade e suas p.5) “o turismo rural pedagógico se caracteriza como o implicações econômicas, sociais e ambientais, os conjunto de atividades turísticas desenvolvidas no meio agricultores, com auxílio de uma equipe técnica, se rural, comprometido com o meio ambiente e a produção prepararam para inserir e desenvolver esta dimensão agropecuária e/ou com os valores históricos de produção pedagógica em suas atividades. A análise do conjunto do no universo rural, agregando valor a produtos e serviços, rural, estabelecendo unidades de estudos, partindo do resgatando e promovendo o patrimônio cultural e natural empírico, utilizando categorias de análise têm se da comunidade que fundamentalmente tem um constituído como ferramenta na educação formal, acompanhamento didático pedagógico com o objetivo de complementando estudos e atividades da educação básica aquisição de conhecimento”. e pesquisas de universidades. Para Klein et al. (2011), o turismo rural

pedagógico é bastante abrangente, mas contempla 3.1 Desafios do processo ensino-aprendizagem diferentes funções, dentre as quais, a função educativa e a

função ambiental. No primeiro caso, o aprendizado é A construção pedagógica do saber por muito proveniente de vivências práticas nas propriedades rurais, tempo esteve e ainda está centrada no discurso oral de favorecendo a ampliação do universo cultural e a aulas expositivas, ou em leitura de textos de livros aquisição de novas habilidades e novos conhecimentos. didáticos. Com a incorporação dos recursos midiáticos no No segundo, está associado à preservação e ao cuidado fazer pedagógico, pouca coisa mudou, do quadro negro com o ambiente, viabilizado pelo contato direto com os passou-se para o quadro branco ou para a lousa digital, elementos da natureza.

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É na paisagem que se observa em primeira professor para direcionar o olhar das crianças de forma instância este processo de relação entre a natureza e a científica e pedagógica. sociedade, sendo sem dúvida a paisagem um verdadeiro laboratório. Para Milton Santos (1996) a paisagem é mais do que um conjunto de elementos, ela compreende e 3.2 A proposta de turismo rural pedagógico da expressa todas as relações que se desenvolvem no espaço Acolhida na Colônia geográfico, exprimindo as heranças que representam as sucessivas relações existentes entre o homem e a O objetivo principal da proposta pedagógica da natureza, possuindo dinamicidade. Assim o trabalho de Acolhida na Colônia é contribuir para a construção do campo, através do turismo rural pedagógico, é capaz de conhecimento das crianças - futuras formadoras de aguçar o olhar para a paisagem, permitindo ao aluno opinião - a partir do real, fazendo relações do contexto comparar, identificar semelhanças, diferenças e formular vivido na agricultura familiar com a preservação dos análises do espaço visitado. recursos naturais, a manutenção das paisagens, a A paisagem é tudo o que se vê, o que a vista promoção da segurança alimentar e nutricional. A alcança, mas esta visão depende da localização do articulação dos alunos com a realidade rural possibilita observador (CALLAI, 2000). Neste sentido, cada ser sua inserção enquanto sujeitos na sociedade, promovendo humano possui maneiras diferentes de perceber o mundo uma reflexão sobre sua prática social. à sua volta, utilizando os sentidos da visão, audição, Na construção da proposta pedagógica da Acolhida olfato, paladar e tato. Na observação e estudo das na Colônia, dois elementos metodológicos foram levados paisagens a visão é o sentido mais utilizado, sendo que em consideração: a observação, a partir da qual os alunos cada espectador poderá observar e descrever elementos estabelecem as relações entre o ser humano e seu entorno; diferentes, explicar a paisagem de acordo com um olhar e, a interação entre alunos e agricultores, que através dos particular sobre a mesma, identificando elementos com os seus saberes garantem a troca de conhecimentos e a quais se identifica. autenticidade da proposta. É através desta relação que os Os elementos que constituem esta paisagem são alunos superam a ação puramente contemplativa da um universo de objetos com vários signos, e a visão, paisagem, interagindo com o seu objeto de estudo. quase na sua totalidade consegue decifrar seus As experiências oferecidas nas propriedades rurais significados e funções (NASCIMENTO, 2009). Assim, à são as mais diversas: plantio na horta, trato dos animais, medida que se processa o desenvolvimento mental, as adestramento racional de cavalos, recolhimento de ovos, informações recebidas pela percepção e pela imagem trilhas em meio à mata, banho de rio e cachoeira, até a mental servem de subsídios às operações mentais, as observação das construções como as rodas d’água, os quais, por conseguinte influenciam direta ou engenhos, moinhos, atafonas... Estas permitem confrontar indiretamente a percepção. A imagem por sua vez é o os alunos com espaços e elementos geográficos símbolo do objeto e pode ser formada como uma imitação diferentes, que por sua vez, através das percepções interiorizada dele. cognitivas, motoras, afetivas e cênicas, percebem que o De acordo com Cavalcanti (2008), uma som é outro, o ar é outro, o sabor é outro, assim como os característica importante quando se trabalha com a lugares e construções são outros, identificando assim categoria de paisagem é sua dinâmica, pois as paisagens elementos que constituem aquela paisagem em sua revelam como a sociedade desenvolve suas atividades, complexidade, totalidade e interdependência. suas relações de produção, ou seja, o que as pessoas estão O que caracteriza a paisagem rural das Encostas da fazendo em determinado momento e como se relacionam Serra Geral é a presença da Mata Atlântica, topografia entre si e com a natureza no lugar onde vivem. acidentada formando vales, hidrografia extremamente Nos espaços rurais onde a natureza não está tão rica, com nascentes de rios importantes da região como os artificializada, o ser humano dotado de sentidos, capta as rios Cubatão, Capivari, Tijucas, Braço do Norte e Itajaí do informações usando sensores além da visão. O aluno, Sul e a presença de águas termo minerais. A paisagem numa prática de turismo rural pedagógico, pode ver, humanizada é percebida através da arquitetura típica, dos cheirar, tocar, ouvir e degustar. utensílios utilizados, da culinária, da língua, da pequena e Nesta metodologia de ensino que é o turismo pouco adensada população demográfica, e também, das pedagógico, não existe ou , mas sim a certo errado atividades econômicas como a agricultura baseada na oportunidade de trabalhar sobre o que é o modo de vida diversificação de cultivos, queima de carvão, pequenas urbano e rural, representado nas suas paisagens e na indústrias de processamento e o reflorestamento com relação com os atores que vivem e constroem estes espécies exóticas como pinus e eucalipto. A paisagem é espaços. Para isso, professores e alunos precisam ter então observada através da interação entre os elementos objetivos claros, evitando determinados rótulos e natureza, economia, população e cultura. estereótipos. Boligian (2004) explica que a percepção de Entre observação e atividades, vários temas podem uma paisagem depende da intenção do observador, ou ser trabalhados nas propriedades rurais. Das atividades seja, varia conforme seu objetivo e sua relação com o realizadas com maior frequência, destacam-se as trilhas lugar observado. Será, portanto, função da postura do em meio à mata e as caminhadas para conhecer a

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produção agropecuária. Nas trilhas (figura 1) os agricultores mostram e falam da diversidade de espécies de plantas e animais que caracterizam a mata atlântica, a importância de tais espécies, seu uso, época de floração, etc. Através de uma linguagem simples, conduzem os alunos a observar as árvores, o solo, os rios, permitindo várias reflexões sobre o papel deste ecossistema. Temas como a qualidade do ar, a permeabilidade do solo e sua relação com as enchentes, a importância da mata ciliar para a manutenção dos rios, são abordados.

Figura 2 – Crianças em atividade pedagógica. Fonte: Acolhida na Colônia.

Dando continuidade à visão interdisciplinar e transversal das temáticas trabalhadas nas propriedades, outro exemplo de atividade desenvolvida é a de plantio de hortaliças (Figura 3). Enquanto as crianças colocam às mãos na terra, o agricultor que conduz a atividade leva os alunos a refletirem sobre as diferenças entre produção convencional e orgânica dos alimentos, desde o preparo do solo, adubos e produtos utilizados, até os cuidados com as plantas e a qualidade do que é produzido. Discutem sobre a produção familiar, relacionando-a e comparando-a a produção convencional, uniformizada e Figura 1 - Atividade de turismo rural pedagógico em em grande escala, voltada às commoditiesiii, como por trilha. exemplo, soja, milho, trigo. Além das diferenças na forma Fonte: Acolhida na Colônia de produzir, os alunos são levados a refletir sobre as diferenças do ponto de vista ambiental, social e de A compreensão da realidade não se dá apenas pela segurança alimentar e nutricional destas duas formas de observação do ambiente e pelas informações recebidas, fazer agricultura. mas através dos mais diversos sentidos, quando os alunos são incitados a sentir o frescor, a umidade do ar, os odores, aromas e texturas. Estimulados pelos professores, que devem ser os mediadores do processo, os alunos vão confrontando a realidade rural com aquela vivenciada nos centros urbanos, estabelecendo - através de indagações e curiosidades - as conexões entre a teoria e a experiência vivenciada, num processo de construção do conhecimento. É importante ressaltar o papel do professor neste processo, já que ao agricultor cabe desenvolver os temas através do seu saber fazer e conhecimento empíricos. Portanto, é do professor a tarefa de problematizar para que os alunos possam transformar Figura 3 – Atividade de plantio. Fonte: Acolhida as observações em conhecimento científico. na Colônia. Para complementar as observações realizadas durante a caminhada, alguns agricultores optam por A dimensão ambiental é observada através da desenvolver atividades com apoio de materiais produção diversificada desenvolvida nas propriedades pedagógicos, geralmente jogos e brincadeiras elaboradas familiares, que resulta num maior equilíbrio do nas propriedades, trabalhando determinados temas de ecossistema (ALTIERI, 1999), se comparada à paisagem forma lúdica e divertidas (Figura 2). de reflorestamento com espécies exóticas, que coexiste de forma bastante proeminente na região das Encostas da Serra Geral. A produção orgânica e a sustentabilidade, enquanto diferenciais e princípios da Acolhida na Colônia, são temas abordados com frequência nas atividades pedagógicas propostas. Do ponto de vista do processo ensino- aprendizagem, o turismo pedagógico através das vivências nas propriedades agrícolas permite aos alunos

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estabelecer as relações entre as realidades rural e urbana. O turismo pedagógico, assim como o próprio As reflexões propostas pelos associados da Acolhida na agroturismo, são ferramentas através das quais esta Colônia buscam trabalhar o reconhecimento da multifuncionalidade se concretiza na região. Entretanto, é agricultura familiar, não apenas na produção de alimentos importante ressaltar que funções como preservação e em si, mas na garantia de produtos de qualidade e valorização dos recursos naturais, formação do olhar comprometidos com o meio ambiente, assim como, o bem interpretativo da paisagem, produção agroecológica e estar de quem consome e de quem produz. espaço de vida e lazer, afetam direta e indiretamente Sobre a amplitude do aprendizado, cabe ressaltar outras funções, disputando o uso do espaço. que o mesmo vai além dos temas abordados. A Esse fenômeno não ocorre sem conflitos, no caso importância destes atores que vivem e constroem a das Encostas da Serra Geral. Por exemplo, os agricultores história da região é percebida na forma de acolhimento, vinculados à Acolhida na Colônia e AGRECO, que têm conforme o depoimento de uma professora que participou um trabalho focado na sustentabilidade e no da ação de divulgação do turismo pedagógico, realizado desenvolvimento, não compartilham da visão de pela Acolhida na Colônia, através de um famtouriv, e no crescimento econômico de outros atores igualmente qual ela diz: “Houve acolhimento, afeto no que faziam e o presentes e influentes. que aprendi foi muito mais do que sobre cavalos ou culinária orgânica tradicional. Aprendi que encontramos Assim, a possibilidade de vivenciar o que é em nós meios de transformar o que não está bom e realizado nas propriedades da Acolhida na Colônia tem devolver ao mundo algo bem melhor” (Professora 1). como resultado significativo, a conscientização de turistas Com relação à percepção dos alunos sobre o e alunos. O caráter pedagógico incorporado naturalmente espaço rural em si, outra professora acompanhando seus pelos associados transforma o agroturismo em uma alunos fez a seguinte avaliação: “A vivência no meio ferramenta de divulgação e difusão das ideologias rural foi fundamental para realizarmos uma reflexão pautadas na agricultura orgânica e familiar. sobre os esteriótipos acerca do homem do campo, bem Outro resultado do turismo pedagógico é a como para a aprendizagem do valor de suas atividades possibilidade de melhoria de renda das famílias. Além de na vida de cada criança” (Professora 2). Cabe, portanto, oferecer a alimentação e a hospedagem, os agricultores destacar que a proposta de trabalho da Acolhida na também são remunerados pelas atividades pedagógicas Colônia promove a reflexão dos alunos sobre sua prática realizadas, expandindo os serviços oferecidos. Sob este social, enquanto sujeitos da sociedade. ponto de vista, o turismo pedagógico também foi proposto

para ampliar a taxa de ocupação das propriedades, pois as 3.3 O turismo pedagógico sobre o ponto de vista escolas usufruem destas estruturas durante a semana, do espaço rural período pouco procurado pelos turistas.

O turismo pedagógico desenvolvido nas Para finalizar, o turismo pedagógico também vem propriedades agrícolas familiares, como é o caso da se mostrando responsável por envolver alguns jovens Acolhida na Colônia, vem ao encontro de uma abordagem agricultores, tornado-se uma alternativa a mais de mantê- bastante difundida na atualidade, que é a los no campo. Este é um resultado, que embora tímido, é multifuncionalidade da agricultura. Esta abordagem surge importante já que o envelhecimento, assim como, a para repensar o papel da agricultura e a sua relação com masculinização no campo tem sido um problema outros componentes da sociedade, examinando o aspecto recorrente nas zonas rurais. multidimensional das atividades humanas e o que elas trazem para o desenvolvimento social e econômico. Sobre o assunto, Stropasola (2011 p. 27) coloca Partindo desta premissa, a agricultura deixa de ser que, “as renovadas funções demandadas pela sociedade às compreendida apenas como produtora de bens famílias rurais – entre as quais a produção de alimentos de agropecuários e assume outras funções como a qualidade; a preservação dos recursos ambientais e do conservação dos recursos naturais (água, solo, patrimônio histórico e cultural rural; a biodiversidade, etc.), do patrimônio cultural e natural agroindustrialização em unidades familiares; o turismo (paisagens) e da qualidade dos alimentos. rural, etc – podem se constituir em alicerces para o fortalecimento das comunidades, contrapondo-se à A discussão sobre multifuncionalidade da tendência de masculinização e envelhecimento da agricultura deve, entretanto, incorporar a complexidade população rural verificada em muitas localidades”, sendo do espaço rural, formado por diversas formas de fazer estas, escolhas sociais para definir o sentido do agricultura, pela diversificação de atividades e de atores desenvolvimento destas localidades. onde a relação rural/urbano, a expansão das oportunidades de trabalho para além da agricultura, a preservação O desenvolvimento de atividades que despertem o ambiental e a valorização do rural como espaço de vida e interesse dos jovens, como o caso do turismo pedagógico, de lazer são elementos fundamentais (CAZELLA e faz parte das estratégias para manter os jovens ocupados, MATTEI, 2002). remunerados, valorizados e interessados pelas atividades desenvolvidas no meio rural, ajudando a fortalecer a

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agricultura familiar, por meio da consolidação desses agricultores e jovens no campo. Alunos Conhecimento 56 21 sociocultural 4. ANÁLISE DE RESULTADOS transmitido Refeições 65 11 1

Tabela 01: Avaliação dos Profissionais A Acolhida na Colônia a partir do momento que Fonte: Relatório do Projeto "Desenvolvimento de planejou atividades pedagógicas nas propriedades rurais, Conteúdos Pedagógicos para as Propriedades Rurais da preparando e instrumentalizando os agricultores para esta Acolhida na Colônia". Convênio 736532/2010 com atividade, sentiu a necessidade de realizar um teste piloto Ministério do Turismo, 2011. para avaliar e divulgar as possibilidades de integração entre o turismo rural e a prática docente. Quando os profissionais responderam aos Através do Projeto "Desenvolvimento de questionários (por escrito), foram unânimes em afirmar a Conteúdos Pedagógicos para as Propriedades Rurais da importância das atividades pedagógicas e lúdico- Acolhida na Colônia", Convênio 736532/2010 firmado pedagógicas para a qualidade das vivências. Através de entre a Associação e o Ministério do Turismo, foi uma questão aberta, justificaram esta afirmação, realizado durante o ano de 2011 uma fase experimental elencando diversos motivos que se repetiram com maior da proposta. Desta forma alunos, professores, ou menor freqüência na opinião dos entrevistados coordenadores pedagógicos, diretores e nutricionistas de (repetições colocadas entre parênteses), entre elas: a escolas públicas dos municípios Santa Rosa de Lima, oportunidade de trabalhar com a realidade das crianças, Anitápolis e Urubici foram convidados para visitarem as despertando interesse e curiosidade (3); a interação das propriedades envolvidas no projeto pedagógico, e crianças com o meio rural e com o agricultor (13); a vivenciarem algumas experiências e atividades. oportunidade de vivenciar (15); o modo de vida rural e a Participaram desta ação 63 turmas de primeira à quinta preocupação com o meio ambiente (9); a produção série do ensino básico de 11 escolas públicas. As escolas orgânico como elemento diferenciador (7); a foram escolhidas pela proximidade dos roteiros metodologia e as estratégias utilizadas pelos agricultores municipais da Acolhida na Colônia, já que a proposta auxiliam nas atividades em sala; a possibilidade de visava que as crianças passassem apenas o dia nas mostrar na prática o que acontece na natureza (11); propriedades rurais. permite diálogo sobre o conhecimento (8); permite a No total foram 609 alunos e 77 profissionais de construção do conhecimento através da experiência ensino a visitarem as propriedades rurais, onde foram vivenciada no rural (4); contato com a natureza (5); recebidos pelas famílias agricultoras que lhes ofereceram permite a interação com os animais (3); respeito aos refeições com produtos cultivados e preparados na animais; permite conhecer a história (13). propriedade, assim como, com as atividades pedagógicas. Percebe-se que na opinião e parecer dos Caminhadas, trilhas, atividades de plantio e com os profissionais de ensino, os indicadores foram avaliados animais foram as formas escolhidas para mostrar e positivamente, dando-se destaque para o atendimento e abordar assuntos a cerca da produção agrícola e de sua didática dos agricultores. Neste sentido, é possível relação com a preservação ambiental. A presença de afirmar que a proposta pedagógica da Acolhida na nutricionistas em alguns grupos ajudou a reforçar as Colônia alcança o objetivo proposto de, através do explicações abordadas pelos agricultores sobre segurança diálogo, da transmissão do conhecimento empírico e das alimentar e nutricional, aproximando os assuntos interações socioculturais contribuir para o processo abordados na saída de campo com aqueles de sala de aula. ensino e aprendizagem.. Após a realização das atividades, alunos e Os alunos também fizeram avaliação da profissionais do ensino responderam um questionário de experiência nas propriedades rurais, respondendo avaliação através de alguns indicadores, cujos resultados oralmente, aos seguintes indicadores: atendimento; quantitativos estão apresentados na tabela 1 e 2. A tabela atividades pedagógicas; inter-relação entre 1 reflete a percepção dos profissionais de ensino, agricultores/alunos; refeições. Os resultados enquanto a tabela 2 a percepção dos alunos. quantitativos encontram-se na tabela 2.

Indicadores Ótimo Bom Regular Ruim Indicadores Ótim Bom Regul Ruim Não Atendimento 69 8 o ar res Infraestrutura 48 28 1 Atendimento 562 47 Material de 45 31 1 Material de 417 82 110 apoio lúdico- apoio lúdico pedagógico pedagógico Didática do (a) 57 20 Inter-relação 527 72 10 agricultor (a) agricultores/ Inter-relação 65 12 alunos D.L. Gelbcke; R.L. Finger ISSN 2176-9052

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Refeições 554 41 14 para aprendizagem, pode ser utilizada numa situação Tabela 02: Avaliação dos alunos pedagógica, porque é nas interações sociais que se Fonte: Relatório do Projeto "Desenvolvimento de processa a construção do conhecimento. Conteúdos Pedagógicos para as Propriedades Rurais da Neste sentido, a observação ocupa lugar de Acolhida na Colônia". Convênio 736532/2010 com destaque, segundo Cavalcanti (1998) “ligada a funções Ministério do Turismo, 2011. psíquicas de um plano mais sensorial, a observação é fundamental para produzir motivações, com base na problematização do real observado e, consequentemente, Quando questionados sobre o que gostaram durante possibilitar a construção do conhecimento”. o dia na “Acolhida na Colônia”, os alunos responderam Vindo ao encontro desta prática alternativa de entre outros: as atividades de plantio na horta; explicação ensino que é o trabalho de campo, a proposta de turismo sobre polinização; explicações sobre os animais e contato rural pedagógico se destaca pela autenticidade na com os mesmos; visualização/observação do engenho; disseminação do conhecimento, garantida através: a) do passeio de trator. Entretanto, dentre os pontos fortes das atendimento familiar personalizado e informal que está atividades propostas, as respostas que apareceram com imbuído de uma valorização social que o qualifica; b) do maior frequência incluíram: o contato com os animais, comprometimento dos agricultores com os recursos explicações sobre a preservação da natureza; naturais da região; c) da valorização dos recursos técnicos brincadeiras (na verdade eram atividades lúdico- e patrimoniais que abrangem desde os processos e pedagógicas); produção orgânica; visita à cachoeira; e instrumentos de trabalho alocados no sistema de produção por fim a própria saída da sala de aula e a realização de orgânica, na adequação das estruturas existentes uma atividade/aula diferente. (aproveitamento de antigas estufas e paióis), valorização de rodas d’água, engenhos e costumes (culinária, língua, etc.). 5. CONCLUSÕES Do ponto de vista da paisagem e do território, o turismo pedagógico se propõe a contribuir para a conscientização dos alunos com relação ao que vem sendo As crises que se sucederam em torno da produção construído pelos associados e seus parceiros regionais. O agrícola e pecuária tiveram muitas consequências objetivo é que este conhecimento seja discutido em sala negativas do ponto de vista ambiental e social. A de aula e disseminado pelos alunos, já que o trabalho de necessidade de repensar o desenvolvimento rural, somada campo deve servir como um motivador e um às demandas provenientes do mundo urbano, suscitaram complemento aos assuntos abordados pelos professores novas perspectivas, resultando em uma tendência inversa nas escolas. e um crescente interesse de retorno ao rural. Além da conscientização, vale ressaltar que a Dentre as atividades propostas no sentido de manutenção desta agricultura familiar viva, comprometida revitalização e uso diferenciado dos espaços rurais, surge com o ambiente e com a qualidade dos alimentos, passa o turismo. Das modalidades de turismo no espaço rural, o também pela melhoria das condições de vida, que podem agroturismo é aquela que se apresenta como estratégia de ser garantidas em parte pela renda do agroturismo e do complementação da renda, procurando não comprometer turismo pedagógico, assim como, do envolvimento dos as atividades produtivas tradicionais, mas procurando jovens. valorizá-las e promovê-las. Os desafios deste tipo de iniciativa não são poucos. Além do envolvimento dos agricultores, é preciso difundir O turismo pedagógico surge no sentido de a proposta entre as escolas, romper com resistências e aumentar o valor agregado a esta proposta, e no caso da preconceitos de professores e alunos com relação ao Acolhida na Colônia, atende a dois interesses, o das espaço rural e, sobretudo, é preciso contar com o apoio de escolas e aqueles próprios do território. Do pondo de vista políticas públicas e planejamento prévio, para garantir que das escolas, esta experiência visa oferecer à comunidade estas alternativas produtivas resultem na manutenção do escolar a possibilidade de realizar projetos de ensino- homem no campo, com uma qualidade de vida que aprendizagem que possibilitem integrar de forma justifique sua permanência. interdisciplinar e multidisciplinar um conjunto de conceitos e/ou conteúdos. Como pontua Braun (2005), a proposta procura romper com o caráter descritivo do Referências trabalho de campo e enfatiza a presença de objetivos sociais nessa prática educativa. ABRATURR/ECA J. Roteiro do Turismo Rural Pedagógico do Estado de SP. 2005. In: A saída da sala da aula, através do contato com a http://www.idestur.org.br/download/F_ROTEIRO_PEDA área rural e acolhimento nas propriedades, proporciona GOGICO_TURISMO_RURAL.pdf aos alunos a experiência de viajar, entrar em relação com um espaço diferente daquele do cotidiano. Leva-se em consideração o princípio de que qualquer modalidade de interação social, quando integrada num contexto voltado

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KLEIN, A.L.; TROIAN; A. SOUZA, M. de. O Turismo Rural Pedagógico e a Educação Ambiental: As Ações i Pluriatividade refere-se à unidade produtiva Pedagógicas Desenvolvidas na Fazenda da Quinta da multidimensional, onde se pratica a agricultura e outras Estância Grande – Viamão (RS). Revista Eletrônica do atividades, tanto dentro como fora da propriedade, pelas Mestrado em Educação Ambiental. FURG/RS. v. 27, p. quais são recebidos diferentes tipos de remuneração e 107-121, 2011. receitas como rendimentos, rendas em espécie e transferências (SCHNEIDER, 2003).

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ii Multifuncionalidade é uma noção recente e visa ampliar o campo das funções sociais atribuídas à agricultura, que deixa de ser entendida apenas como produtora de bens agropecuários e assume funções como a conservação dos recursos naturais (água, solo, biodiversidade, etc.), do patrimônio cultural e natural (paisagens), e da qualidade dos alimentos (GELBCKE, 2006). iii Commoditie: significa mercadoria em inglês, sendo representada, sobretudo por minérios e gêneros agrícolas, que são produzidos em larga escala e comercializados em nível mundial. iv A palavra famtour, deriva da expressão em inglês “familiarization tour” e significa passeio de familização. O termo é constantemente utilizado pelos profissionais de turismo para denominar os tours feitos por grupos de agentes de viagens e outros interessados para conhecer cidades e seus maiores atrativos.

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Anais do VIII Congresso Brasileiro de Turismo Rural e I Colóquio Internacional de Pesquisa e Práticas em p. 284-288 Turismo no Espaço Rural, Rosana - SP, 10-13 de novembro de 2013. v.1.

OFERTA E DEMANDA DO TURISMO NO ESPAÇO RURAL EM VALE VÊNETO, DISTRITO DE SÃO JOÃO DO POLÊSINE, RS

ANNA PAULA RUVIARO WEBER IVO ELESBÃO

Universidade Federal de Santa Maria - UFSM Campus de Silveira Martins [email protected]; [email protected]

RESUMO - As pequenas propriedades rurais sofreram influência das transformações tecnológicas ocorridas na agricultura. Diante dessa realidade as famílias buscam desenvolver alternativas para complementar a renda. Surge então o turismo no espaço rural, uma atividade não agrícola que ganha importância pelo potencial de dinamização da economia local, valorizando as atividades típicas do campo, bem como todos os aspectos ambientais, culturais e sociais em que se insere. Nesse contexto, objetivou-se neste trabalho analisar a oferta e a demanda do turismo no espaço rural no Distrito de Vale Vêneto, São João do Polêsine/RS. Foram pesquisados os responsáveis pelas cinco propriedades que desenvolvem o turismo no espaço rural e os visitantes da localidade. Verificou-se que as atividades realizadas são de interesse da maioria dos visitantes e que os empreendedores precisam planejar adequadamente para que a atividade se desenvolva de fato. Identificou-se que é importante que os empreendedores verifiquem aspectos relacionados à divulgação, atratividade e comercialização para que ocorra maior demanda por seus produtos e serviços.

Palavras chave: Turismo Rural, Oferta, Demanda, Agricultores.

ABSTRACT - The small farms were influenced by technological changes which resulted in problems for agricultural production. Faced with this reality the families sought to establish the properties of complementary activities income. Then comes the rural tourism, an activity is not agricultural potential gains importance by boosting the local economy, valuing the typical activities of the field as well as all aspects of environmental, cultural and social in which it operates. In this context, this study aimed to analyze supply and demand of rural tourism in the district of Vale Veneto, São João do Polêsine / RS. We examined five properties responsible for developer the rural tourism and visitors to the town. It was found that the activities that are of interest in the properties of most visitors and entrepreneurs need to plan appropriately for the activity to develop in fact. It was found that it is important that tourism entrepreneurs in rural areas to check aspects of the disclosure, attractiveness and market their products and services for the occurrence of increased demand for their products and services.

Key words: Rural Tourism, Offer, Demand, Farmers.

1 INTRODUÇÃO vivenciasse uma rápida urbanização, que na maioria das vezes ocorreu de forma desordenada. Na medida em que a O cenário agrícola de algumas propriedades de população se urbanizou e os problemas desse processo pequeno porte vem sofrendo com problemas que os foram surgindo, passou a haver associação entre espaço agricultores enfrentam principalmente em relação aos rural e natureza à qualidade de vida. efeitos causados pelas oscilações climáticas na Para Graziano da Silva (1997) o espaço rural produtividade e a pouca valorização dos produtos brasileiro não pode mais ser pensado exclusivamente agrícolas. pelas atividades agropecuárias, pois há um conjunto de O processo de modernização da agropecuária atividades não agrícolas que cada vez mais respondem brasileira contribuiu para que a população brasileira pela dinâmica populacional. Nesse contexto, o lazer vem

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se tornando cada vez mais importante, manifestando-se Swarbrooke e Horner (2002) colocam que as em formas variadas de turismo no espaço rural. motivações mudam com o tempo, devido a muitos fatores, Conforme Tulik (2010), vários fatores como por exemplo, ter filhos, aumento ou diminuição da contribuíram para o desenvolvimento do turismo no renda, condições de saúde e expectativas e mudanças espaço rural, sendo que as primeiras experiências relacionadas à condição de turista. Outro aspecto iniciaram em áreas com crise na agropecuária. Em alguns importante apresentado pelos autores e talvez o mais casos a redução do fluxo do turismo internacional e a significativo dependendo dos quesitos analisados, são as saturação do turismo de sol e praia estimularam a procura mudanças naturais que ocorrem nas diferentes faixa por regiões do interior. Atualmente pode-se dizer que esta etárias, estas influenciam direta e indiretamente sobre as atividade está presente em todas as Unidades da motivações. Federação, todavia se apresentando de modo irregular, Atualmente o turismo no espaço rural não se difuso e pontual. resume as atividades bucólicas e rústicas do campo, sendo O turismo é um setor econômico segmentado e um setor emergente que necessita profissionalismo e seus mais diversos tipos atendem a uma fatia de público capacitação de todos os envolvidos na atividade. interessado pelos serviços e produtos que a atividade Independente dos fatores que motivam o visitante a abrange. A segmentação consiste na divisão do mercado procurar o local, a hospitalidade é fator essencial e deve em conjuntos de consumidores com características atender as necessidades e desejos dos consumidores dos semelhantes, o que pode alavancar o mercado-alvo e produtos e serviços ofertados, gerando assim a satisfação melhorar a relação custo/benefício na promoção do dos mesmos. produto (KOTLER, 2000). O turismo, além de ser uma atividade prazerosa O turismo no espaço rural é uma segmentação do para os consumidores, também proporciona benefícios turismo e não se restringe apenas as ações do marketing, para os empreendedores, pois muitas famílias que têm na envolvendo a relação com as razões que levam as pessoas atividade turística um importante complemento de a comprarem um determinado produto, as motivações rendimentos. A procura por “coisas da roça” possibilita para a escolha do destino e as razões dos deslocamentos aos agricultores uma oportunidade de elevar sua renda, para fora do lugar de residência habitual (TULIK, 2006). gera empregos, reduz o êxodo rural, permite a Conforme Dias (2008), o turismo enquanto uma redescoberta e a valorização do meio ambiente e cultura atividade a ser integrada no modelo de desenvolvimento local, incrementa o consumo de produtos orgânicos, etc. local apresenta características específicas. Uma das mais Nesse contexto, o turismo no espaço rural vem importantes e que o diferencia de outras atividades ganhando destaque nos últimos tempos. Sua demanda é econômicas é que a matéria-prima que o sustenta deve ser formada principalmente por citadinos que procuram o consumida no local. rural para lazer, descanso, interesse em conhecer o que é Para Trigueiro (1999, p. 15), o produto turístico desenvolvido no campo e, principalmente, fugir um pouco não é fácil de ser padronizado “e a sua qualidade, muitas dos problemas ocasionados pelo estresse do trabalho e da vezes, é difícil de prever; nenhum produto turístico é vida na cidade. exatamente igual a outro, não pode ser armazenado, e tem Nesse sentido, este trabalho tem como objetivo uma sazonalidade que influencia a decisão de sua analisar a oferta turística, bem como as motivações dos procura”. visitantes nas propriedades rurais do distrito de Vale Ruschmann e Toledo (2004) colocam que a Vêneto, município de São João do Polêsine, Região qualidade não surge de uma ação isolada. Ela pertence a Central do estado do Rio Grande do Sul. um grande ciclo de produção e consumo que exige desempenho de todos os envolvidos, bem como a 2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS percepção do cliente em relação ao produto como um todo. Este trabalho objetiva analisar a oferta e a Pelo lado da demanda, é fundamental conhecer as demanda por produtos e serviços relacionados à atividade vontades, desejos e motivações de potenciais visitantes, turística no espaço rural. Com o propósito de alcançar os identificando o público alvo. Desta maneira, o surgimento objetivos propostos utilizou-se uma metodologia de várias estratégias ligadas à demanda pelo turismo rural composta por duas fases: a primeira formada pela coleta deve ser trabalhado de forma integral. A motivação pode de dados secundários e pela pesquisa bibliográfica; e a ser entendida, conforme Bock et. al. (2002, p. 121), como segunda fase, dividida em duas etapas, com a realização sendo “um processo que relaciona necessidade, ambiente de entrevistas com os proprietários e aplicação de e objeto, e que predispõe o organismo para a ação em questionários com visitantes. busca da satisfação da necessidade”. O local da pesquisa foi o distrito de Vale Vêneto, Para Andrade (1992) o fluxo de demanda turística município de São João do Polêsine, que está localizado na ocorre em períodos favoráveis aos visitantes, onde levam Região Central do Rio Grande do Sul. Esta comunidade, em consideração as questões climáticas, feriados e fins de apesar de conter uma pequena área considerada urbana, semana. As épocas agradáveis são fortes influências na possui sua principal característica voltada às atividades do qualidade da demanda turística porque muitas regiões campo, ou seja, constituindo-se em um local tipicamente sofrem a sazonalidade devido a este fator. rural. Entre vales e montanhas que lembram a região norte

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da Itália, residem famílias na maioria descendentes de aposentadas, idosos e filhos que retornaram dos centros italianos. É conhecido por ser um local turístico e urbanos para cuidar da saúde de seus pais. religioso devido aos recursos naturais e a presença A composição familiar é pequena e varia de duas a marcante de espaços religiosos. quatro pessoas, sendo que o número de trabalhadores A primeira etapa consistiu na realização de ativos oscila entre uma e três pessoas. Todos os entrevistas semi-estruturadas com os proprietários dos empreendimentos são familiares, sendo quatro deles estabelecimentos que desenvolvem turismo no espaço chefiados pelo casal e um por um rapaz solteiro. Apenas a rural e teve por objetivo identificar o que os propriedade que realiza o café colonial contrata mão de empreendedores oferecem aos visitantes. Na segunda obra temporária e as demais contam com o auxílio de etapa foi aplicado um questionário com os visitantes de familiares na realização das atividades agrícolas e Vale Vêneto, visando entender as motivações que os turísticas do espaço. levaram a escolher o local para visitar e verificar quais Duas propriedades rurais têm como atividade eram as possibilidades de desenvolver outras atividades principal a produção e comercialização de produtos turísticas rurais nos empreendimentos. As entrevistas coloniais, uma trabalha com fruticultura, uma com foram realizadas no mês de fevereiro de 2012 quando comércio de gado e a outra com o plantio de soja. As foram entrevistados os responsáveis pelos cinco atividades agrícolas, como o plantio de milho e feijão são estabelecimentos agropecuários que desenvolvem turismo apenas para a subsistência da família. no espaço rural: um café colonial com venda de produtos As atividades agrícolas e as atividades turísticas no coloniais (propriedade A); um alambique movido a roda espaço rural andam lado a lado nas propriedades d’água com venda de destilados e produtos coloniais pesquisadas, pois, o desenvolvimento de uma depende do (propriedade B); um balneário particular (propriedade C); desenvolvimento da outra, ou seja, muitos produtos e uma propriedade com fabricação e comercialização de serviços que são produzidos no local são utilizados para o artesanato e licores (propriedade D); e uma chácara que turismo. Para exemplificar, as propriedades que produzem comercializa produtos da fruticultura (propriedade E). destilados reaproveitam as sobras da moagem de cana de Na segunda etapa foram aplicados 46 questionários açúcar para alimentar os bovinos, que por sua vez de maneira aleatória com visitantes do distrito de Vale fornecem o leite para fabricação do queijo que é vendido Vêneto. Para tal, procurou-se aproveitar algumas datas ao visitante, ou ainda, a criação de galinhas e porcos comemorativas como o carnaval e a Paixão de Cristo, e fornece os ovos e a carne para produção de petiscos nas propriedades que apresentavam maior fluxo de ofertados no café colonial. visitantes. O período de aplicação do questionário foi de A propriedade A oferece aos visitantes o café janeiro a abril de 2012. colonial e o comércio de produtos coloniais e tem como atrativos a natureza, cultura italiana, gastronomia, trilha 3 OFERTA E DEMANDA DE PRODUTOS E em meio à mata nativa, arquitetura e utensílios antigos. A SERVIÇOS NO ESPAÇO RURAL DE VALE atividade turística é recente, data de novembro de 2011 e VÊNETO surgiu através de incentivos públicos por meio da oferta de um curso sobre turismo rural que teve por objetivo a 3.1 Características da oferta formação e capacitação de novos empreendedores, fato que veio de encontro ao gosto da proprietária, que A realidade do pequeno produtor rural tem sido esporadicamente já vinha desenvolvendo a atividade no alterada nos últimos tempos por uma série de fatores que local. refletem diretamente no desenvolvimento da atividade O trabalho realizado na propriedade B é uma agrícola desempenhada na propriedade. Este fato herança familiar e o início da produção de destilados foi pressionou os agricultores a buscarem novas alternativas em 1951. O alambique movido à roda d’água é original e de renda, mantendo a atividade que até então era a hoje motivo de muita curiosidade e admiração dos principal, como um meio de subsistência e sobrevivência visitantes, pois é uma raridade preservada. No local o de uma área tipicamente rural. visitante pode adquirir produtos coloniais e destilados, Essa realidade é também vivenciada pelos além de apreciar uma natureza ímpar incrustada em meio proprietários rurais de Vale Vêneto. As dificuldades a montanhas mescladas com mata nativa e rochas. enfrentadas na agricultura vão desde a qualidade do solo, Apesar de não ser a atividade principal de renda da fatores externos e internos, até a carência de mão de obra. família, a propriedade C oferece aos visitantes o que estes Tal fato foi observado durante a entrevista nos locais, mais procuram nas comunidades interioranas: natureza e cujos proprietários lamentam a degradação da atividade descanso. Em uma área preservada o visitante pode que até pouco tempo era o grande sustento da família. O encontrar: rio com local para banho, quadra de vôlei e preço alto dos insumos necessários para a produção, as futebol, canchas de bocha, churrasqueiras e área para exigências legais e o pouco retorno financeiro fizeram camping. com que os produtores rurais buscassem suprir suas Mais uma vez o gosto de manter viva uma herança necessidades básicas através de atividades não agrícolas. familiar que teve início em 1918 impera em uma As propriedades são familiares e constituídas por pessoas propriedade com agricultura de subsistência. A propriedade D tem no turismo a atividade principal. Junto

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com o comércio de artesanato em bucha vegetal Os atrativos naturais são os que despertam maior (atividade que iniciou quinze anos atrás por meio da interesse nos visitantes, com 44,0 % de respostas. Os curiosidade e criatividade da artesã) e produtos coloniais atrativos religiosos foram citados por 27,0 % dos (licores de vários sabores, vinhos e grapa) vem o ato do respondentes, 14,0 % tem interesse pelos atrativos bem receber. Junto à hospitalidade do casal de culturais, 12,0 % pela gastronomia e 2,0 % pelos atrativos empreendedores os visitantes podem observar e conhecer rurais. Destaca-se para um dos respondentes que amigos utensílios antigos e a natureza. são o que mais lhe interessa/atrai ao local. Na propriedade E resolveram trabalhar com o Em relação a avaliação geral por parte dos turismo porque os antepassados da família sempre visitantes da infraestrutura dos locais que visitaram, a tiveram o gosto de receber bem os familiares e amigos em maioria (81,0 %) considerou como boa ou muito boa a sua moradia. A principal atividade é a fruticultura, depois situação dos locais, sendo que 11,0 % considerou razoável vem o comércio de licores e ovos. Esporadicamente os e 8,0 % ruim. proprietários organizam um filó a moda antiga. No local A divulgação de um destino turístico deve ser bem pode-se apreciar a arquitetura colonial com presença planejada para que os empreendedores possam atingir seu marcante de objetos antigos. A ideia de organizar um público alvo e alcançar o sucesso desejado. As ponto de venda de produtos coloniais surgiu através de informações passadas aos turistas podem orientar as um curso de turismo rural ofertado pela prefeitura estratégias de ação dos empreendedores no sentido da municipal em parceria com a EMATER–RS. diferenciação de seu produto. A divulgação foi considerada boa por 57,0 % dos pesquisados e razoável 3.2 Características da demanda por 33,0 %. Questionaram-se os visitantes de Vale Vêneto se No que se refere ao gênero, do total de 46 estes se interessavam pela atividade e se sabiam da visitantes pesquisados, 50 % são mulheres e 50% são existência das propriedades. A maioria dos respondentes homens. A maior concentração é de pessoas com idade (86,0 %) disse ter interesse por atividades turísticas no acima de 56 anos e esse grupo representa 29,0 % dos espaço rural e apenas 14,0 % não manifestaram interesse. visitantes entrevistados. Os respondentes com idade entre A propriedade C foi a mais lembrada (79,0 %) das 26 e 35 anos representam 24,0 % e os 16 e 25 anos propriedades. Os outros visitantes (21,0 %) citaram as totalizam 20,0 %. As demais faixas etárias somadas outras propriedades. perfazem 27,0 % dos respondentes. Os produtos coloniais foram os atrativos mais Em relação à origem dos visitantes, a maioria é lembrados pelos respondentes. De acordo com os oriunda da própria região onde o distrito está localizado, a mesmos, o interesse pelo que é produzido na colônia Quarta Colônia de Imigração Italiana, totalizando 43,0 % ocorre devido à qualidade e o sabor que os produtos têm. dos entrevistados. A localidade também recebeu 34,0 % Em segundo, têm-se as cavalgadas e em terceiro de visitantes vindos do município de Santa Maria, 18,0 % pousada/hotel fazenda. Os demais atrativos citados pelos vindos de outras regiões do Estado, e 5,0 % de outros respondentes foram: cascatas, alimentos naturais, ordenha Estados. de vacas, coleta de ovos, qualidade, bom preço, trilhas de Quanto ao nível de escolaridade dos visitantes de moto, esportes radicais, comércio de flores, bingo, jogos Vale Vêneto, a pesquisa demonstrou que a 59,0 % dos de carta e bocha, natureza, hospitalidade, redes para visitantes possuem ensino básico e 41,0 % ensino descanso, churrasqueiras, pracinha para crianças, limpeza, superior. A renda familiar dos respondentes está jogo de sinuca, comida regional, café colonial, corrida de distribuída entre 39,0 % que apresentam até dois salários tchá tchá tchá (espécie de trator adaptado), tobogã, shows mínimos, 32,0% com dois a quatro salários mínimos e ao vivo, posto de informações, acesso a deficientes, 29,0 % com quatro a dez salários mínimos. acesso adequado (estradas) e camping. A divulgação do local é muito importante para um Através dos atrativos mais citados pode-se destino turístico. Com relação à forma como tomaram perceber que o distrito apresenta demanda por atrativos conhecimento do distrito de Vale Vêneto, 95,0 % dos relacionados à gastronomia (produtos coloniais, respondentes disseram conhecer a localidade através da restaurantes, lancheria), a hospedagem (pousada/hotel indicação de amigos/parentes. Apenas 5,0 % responderam fazenda), a cultura (artesanato) e ao lazer/entretenimento terem obtido informações através de folhetos/folders. O (cavalgadas, rios, trilhas, campo de futebol/vôlei, pesque principal motivo de visitar o local são os parente e amigos e pague, balneário). Em relação ao setor alimentício, (29,8 %), aparecendo em segundo lugar o descanso e o durante a pesquisa, verificou-se uma carência de lazer com 26,1 %. estabelecimentos com funcionamento diário. Isto acaba Os motivos da procura pelos espaços rurais é que deixando a comunidade menos atrativa e não permite ao determinam o período de estadia do visitante no local, visitante permanecer no local por mais tempo, então este, porque este permanece no mesmo, apenas o tempo acaba procurando em outras cidades algo para suprir essa necessário para fazer o que pretendia, sendo que 53,0 % necessidade. dos respondentes afirmaram precisar de apenas um dia O visitante quando vem a Vale Vêneto é motivado para realizar o turismo pretendido. por algo em especial, porém, ele sabe que determinados produtos e serviços são atrativos pelo seu conjunto, ou

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seja, por tudo o que aquele momento pode oferecer para o através de projetos voltados ao turismo, acompanhamento seu bem estar. profissional no planejamento e participação dos De acordo com os aspectos abordados ao longo da empreendedores em feiras regionais com o intuito de pesquisa percebe-se que os agricultores/empreendedores divulgar as atividades para a comunidade em geral. estão realizando atividades de interesse do turista, mesmo que haja algo motivador não relacionado à atividade REFERÊNCIAS especificamente. Cabe aos idealizadores do turismo no espaço rural verificar os aspectos de divulgação, ANDRADE, J, V, de. Turismo: fundamentos e atratividade e comercialização de seus produtos e serviços dimensões. São Paulo: Ática, 1992. para que ocorra maior demanda pelo que é ofertado. DIAS, R. Planejamento do turismo: política e 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS desenvolvimento do turismo no Brasil. São Paulo: Atlas, 2008. A atividade turística que está sendo desenvolvida surgiu da necessidade familiar de complementar a renda GRAZIANO DA SILVA, J. O novo rural brasileiro. In: com atividades não agrícolas, pois a crise na agricultura SHIKI, S.; GRAZIANO DA SILVA, J.; ORTEGA, A. C. afetou o sistema de produção dos pequenos produtores, (Org.). Agricultura, meio ambiente e sustentabilidade com a baixa produtividade e a desvalorização dos no cerrado brasileiro. Uberlândia, 1997. p. 75-100. produtos produzidos. Aproveitando os atrativos inerentes nas propriedades, tais como a natureza e herança cultural KOTLER, F. Marketing. São Paulo: Atlas. 2000. familiar, os agricultores buscaram através de recursos próprios já existentes no local desenvolverem atividades RUSCHMANN, D.; TOLEDO, K. Turismo: uma visão de turismo no espaço rural. empresarial. São Paulo: Manole, 2004. Devido à situação etária dos envolvidos e a falta de mão de obra para o desenvolvimento das atividades SWARBROOKE, J.; HORNER, S. O comportamento agrícolas ocorreu uma refuncionalização no processo do consumidor no turismo. São Paulo: Aleph, 2002. produtivo local. As atividades relacionadas ao turismo passaram a ter maior importância, embora as atividades TRIGUEIRO, C. M. Marketing e Turismo: como agropecuárias ainda continuem sendo realizadas nas planejar e administrar o marketing turístico para uma propriedades. localidade. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1999. Foram observados dois aspectos importantes. O primeiro está relacionado à participação em cursos de TULIK, O. Turismo no espaço rural: segmentação e capacitação voltados ao turismo rural que foram ofertados tipologia. In: ALMEIDA, J, A. SOUZA, M, (Org.). pelo setor público e o segundo refere-se à hospitalidade, Turismo rural: patrimônio, cultura e legislação. Santa ao acolhimento do visitante na propriedade. Embora esses Maria: FACOS–UFSM. 2006. p. 107-119. aspectos sejam significativos, de maneira geral, percebe- se a precariedade da infraestrutura e a falta de profissionalização dos envolvidos na atividade. Há necessidade de incentivo e apoio para capacitação para que estes empreendedores possam desenvolver suas atividades de maneira legal e possam investir em uma oferta mais atrativa aproveitando melhor os recursos existentes nas propriedades e assim ofertar produtos e serviços com qualidade para uma demanda crescente. Verificou-se também através da pesquisa que a maioria dos visitantes do distrito possui interesse no turismo no espaço rural. Estes demandam por produtos e serviços relacionados à hospedagem, gastronomia, cultura e lazer/entretenimento. Os agricultores/empreendedores necessitam elaborar um plano adequado voltado ao turismo desenvolvido nas propriedades, pois os visitantes desconhecem a maioria das propriedades que desenvolvem turismo no espaço rural, salientando que quatro delas encontram-se próximas. As propriedades possuem atrativos suficientes para desenvolver com sucesso o turismo, porém, poderiam melhorar seu funcionamento se os empreendedores pudessem contar com o apoio do setor público local

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POLÍTICAS DE RECURSOS HUMANOS NAS FAZENDAS HISTÓRICAS PAULSITAS

FÁBIO LUCIANO VIOLIN THAIS RODRIGUES MONTEIRO PEDRO HENRIQUE BOTELHO DE SOUZA

Universidade Estadual Paulista - Unesp Campus de Rosana [email protected]

RESUMO - São Paulo possui - segundo dados do Idestur - 47 fazendas histórias espalhadas por diversas regiões do estado. Já a alguns anos tem aumentado a procura por esse tipo de turismo especialmente pelas vivências com a natureza, isolamento de centros urbanos, tranquilidade, contato com as tradições e cultural rural, praticar esportes de aventura, entre outras possibilidades dentro do contexto do espaço rural. No entanto, paralelo a este crescimento, há o aumento da exigência do consumidor referente aos serviços e produtos que são ofertados. Nesse sentido foram realizadas entrevistas e a aplicação de questionários junto a 16 fazendas históricas para o levantamento de dados de natureza qualitativa os quais indicaram a inexistência de forma sistematizada de políticas de recursos humanos além da emergência de planejamento estratégico vinculado a satisfação do tripé: clientes, pessoas e objetivos organizacionais.

Palavras chave: Fazendas Históricas, Recursos Humanos, Empreendedorismo.

RESUMEN - São Paulo tiene - según datos de Idestur - 47 historias fincas distribuidas en varias regiones del estado. Ya hace unos años se ha incrementado la demanda de este tipo de turismo, especialmente a través de experiencias con la naturaleza, el aislamiento urbano, la tranquilidad, el contacto con las tradiciones y rurales, deportes de aventura culturales, entre otras posibilidades dentro del contexto de las áreas rurales. Sin embargo, paralelamente a este crecimiento, existe una creciente demanda de los servicios y productos que se ofrecen. En consecuencia, se realizaron entrevistas y cuestionarios con 16 fincas históricas para estudiar los datos cualitativos que indican la ausencia de una política sistemática de los recursos humanos más allá de la aparición de la planificación estratégica relacionada con trípode satisfacción: los clientes, los y los objetivos de la organización.

Palabras clave: Fincas Históricas, Recursos Humanos, Emprendimiento.

1 INTRODUÇÃO observada nas ações empreendedoras das fazendas históricas no Estado de São Paulo, pois constituem A noção do patrimônio entendido como um recurso importantes conjuntos de elementos arquitetônicos e para o desenvolvimento é recente, e mostra-se associado à culturais. Elas oferecem serviços e atividades como uma ideia da especificidade de um determinado lugar, que alternativa de geração de renda e de melhoria das difere de outros transformando-o em uma atração turística condições de vida. combinando em si uma série de elementos como Assim, o Turismo rural no Brasil por ser um dos arquitetura, artesanato, gastronomia, festas, crenças e setores que atualmente vem crescendo de maneira modos de vida tradicionais além dos elementos significativa, detendo o quarto lugar no ranking mundial compreendidos como bens não materiais que estão em 2011 e com perspectiva de crescimento também associados a experiência da descoberta, o exotismo, auto elevado até 2014 segundo o Idestur (2010) aponta para a realização e evasão do cotidiano (FONSECA, 2003). emergência de entender como se estruturam esses A questão desse tipo de apropriação do patrimônio empreendimentos para melhor atender ao turista ou para a realização da atividade do turismo pode ser usuário, para que haja adequação de sua oferta ao mercado.

F.L. VIOLIN; T.R. MONTEIRO; P.H.B SOUZA ISSN 2176-9052

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Deve-se entender também que os serviços ofertados pelo O turismo rural como estratégia para o setor turístico possuem as seguintes características: desenvolvimento surgiu no norte e centro europeu, na intangibilidade, perecibilidade, heterogeneidade e década dos anos 50, já na década de 70 expandiu-se para variabilidade, simultaneidade ou inseparabilidade, além da os países do sul europeu e dos Estados Unidos; nos anos 80 participação do cliente no processo. na América Latina e partir de 1990, em países da África, Diante desses apontamentos, este estudo entende Oceania e Japão (IDESTUR, 2010). como importante a análise de como é estruturado o setor de No Brasil, sua organização e posterior expansão Recursos Humanos nesses empreendimentos e o seu iniciou-se a partir da região Sul e posteriormente na região funcionamento. Busca-se também, verificar se existe Sudeste. No entanto, atualmente o segmento está presente algum tipo de política de Recursos Humanos que direcione em muitos Estados brasileiros. Estudos revelam um suas ações e se nela estão inseridos métodos diferenciados inventário com mais de 800 empreendimentos e/ou estruturados para recrutar, selecionar e/ou treinar. classificados entre as modalidades dessa atividade ao longo de todo território nacional (GUIA DE TURISMO RURAL DE SÃO PAULO, 2012). 2. METODOLOGIA Ainda segundo o Idestur (2010) o turismo rural O primeiro procedimento metodológico ocorreu representa um segmentos em franca ascensão já que a através da pesquisa de cunho bibliográfico, ou seja, o atividade cresce cerca de 6% ao ano em nosso país, contato direto do pesquisador com o que foi escrito sobre correspondendo a uma nova tendência mundial, na qual o determinado assunto, permitindo-o reforço de suas análises turista ou usuário não é apenas um expectador, mas na pesquisa ou a manipulação de suas informações protagonista de sua viagem/estadia, buscando vivenciar a (MARCONI; LAKATOS, 2008). Foram levantadas cultura e as experiências a ela associadas. informações de fontes diversas referentes ao contexto das Em termos conceituais, o turismo no espaço rural fazendas históricas paulistas e a importância dos Recursos pode ser entendido como aquele que tem como cenário o Humanos nas organizações. espaço rural para a realização de atividades de lazer, Posteriormente foi realizada observação direta fruição em contato com a natureza e com as populações extensiva com a aplicação de questionário, a fim de se locais e suas práticas culturais (ARAÚJO, 2010). coletar dados em série através de perguntas fechadas. Wandscheer e Teixeira (2010) apontam a realidade Paralelamente a esse método foram realizadas entrevistas atual do ambiente rural, pela reordenação dos valores, que pessoais in loco junto a 3 organizações rurais turísticas a o mesmo se apresenta o fenômeno da valorização desses qual conceitua-se como sendo a investigação social, que espaços, muitas vezes pela busca dos hábitos e costumes auxilia na coleta de dados e diagnóstico ou no tratamento que contemplam uma vida diferenciada daquelas dos de algum problema social. grandes centros urbanos. O caráter deste procedimento foi padronizado, com O espaço rural especialmente dentro do contexto de perguntas predeterminadas num formulário, a fim de “repaginação” das fazendas históricas tem tido diversas permitir que “elas sejam comparadas com o mesmo vertentes em sua utilização entre elas, por exemplo, seu uso conjunto de perguntas, e que as diferenças devem refletir com caráter pedagógico, e nesse aspecto “a produção diferenças entre os respondentes e não diferenças nas agropecuária, a cultura e a própria natureza podem perguntas” (LODI, 1974 apud MARCONI, LAKATOS, constituir-se em um instrumento de mediação no ato de 2008, p. 82). Tal procedimento foi adotado considerando ensinar, na transmissão de conhecimentos” que tais entrevistas ocorreram durante à realização de visita (WANDSCHEER; TEIXEIRA, 2010, p. 55). técnica realizada junto a tais organizações. O turismo realizando no meio rural no Estado de Paralelamente questionários foram disponibilizados São Paulo apresenta-se com uma oferta bastante eletronicamente para um grupo constituído por trinta das diversificada. Um projeto denominado Patrimônio Rural quarenta e sete fazendas históricas escolhidas Paulista, desenvolvido pelo Instituto de Desenvolvimento aleatoriamente, dessas treze fazendas responderam por do Turismo Rural apontou em sua coleta de dados meio eletrônico ou por telefone (em uma segunda e terceira informações da atividade turística em meio rural, etapas). Dessa forma o público alvo foi constituído por 16 reconhecendo múltiplas ações, desde a visitação em organizações turísticas no espaço rural no estado de São antigas fazendas cafeeiras, até as propriedades de Paulo denominadas fazendas históricas, cujos dados foram agricultura familiar no litoral do Estado (IDESTUR, 2010). levantados no período de Junho a Agosto de 2013. Esse projeto contou com a participação não somente de A análise dos dados deu-se através da análise do proprietários rurais, mas também empreendedores, conteúdo das entrevistas e dos questionários respondidos, representantes de organizações e outros profissionais os quais foram categorizados e disponibilizados de modo a cadastrados, a partir da coleta de informações com buscar a compreensão dos fenômenos pertinentes a pesquisas de campo e preenchimento de cadastro online temática de estudo. com propósito de entender a realidade do universo rural brasileiro. 3. TURISMO RURAL NO ESTADO DE SÃO PAULO A mesma pesquisa levantou alguns indicadores referentes às modalidades existente no Estado, sendo elas: agroturismo e agroindústria artesanal, área rural de lazer,

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armazém rural, campings, cavalgadas, eventos, hotel A políticas de recursos humanos são todas as ações fazenda, pousada rural, pesque-pague, hotel rural de lazer, implantadas por esse setor para melhor dirigir uma restaurante rural e turismo rural pedagógico. Quanto aos organização. Entre essas ações pode-se destacar, como públicos variam desde famílias, jovens, grupos escolares e exemplo, o recrutamento, seleção, treinamento e avaliação até mesmo terceira idade. de desempenho. Este setor se modifica constantemente, Uma maior atenção da academia tem sido atribuída evolui conforme as necessidades que se apresentam no aos espaços rurais históricos deste mesmo estado, o qual ambiente em que a empresa opera. apresenta: Com a evolução dos conceitos relacionados aos [...] uma diversidade de acervos de inestimável Recursos Humanos e suas práticas, as empresas atuais valor histórico e cultural, constituídos por diferentes estão evoluindo conforme as exigências e complexidade do suportes, preservados pelas instituições como mercado. Para se entender a principal diferença inserida museus, bibliotecas, arquivos, e centros de neste contexto, quando comprado o período industrial ao memória, públicos e privados. No Brasil, podemos da era do conhecimento, o primeiro imprimia o foco em considerar o universo das fazendas históricas, obter lucro a qualquer custo, e considerava o funcionário surgidas nos séculos XVIII e XIX no interior como instrumento de produção, já o segundo (atual), paulista, como locais que devem dialogar com essas manifesta ênfase maior nas pessoas, que são de fato o instituições. Pois, essas fazendas constituem-se em principal elemento para a produtividade e o bom inesgotáveis fontes para estudos e pesquisas diante funcionamento empresarial. Dessa forma, a era do da descoberta da grande diversidade de bens conhecimento aborda assuntos como satisfação pessoal, preciosos e raros de natureza material, imaterial e ambiente de trabalho, liderança, trabalho em equipe, paisagístico (NAKAGAWA et. al., 2010, p. 37). interação de setores, compartilhamento de ideias, liberdade de expressão, entre outros. (FRANCO, 2008). Além de envolvimento com pesquisas, algumas Segundo Gil (2011) as pessoas devem ser dessas propriedades desenvolvem ações empreendedoras entendidas como parceiras, pois suas decisões e ações no sentido de dinamizar a gestão e enxergarem a racionais entrelaçadas aos objetivos dão um rumo certeiro propriedade como uma organização que tem fins e com bons resultados a organização. De modo lucrativos. No entanto, é possível observar através das concomitante as novas e constantes alterações do ambiente entrevistas e visitas realizadas que os níveis de preparação de negócios levam as fazem emergir a necessidade de e são diversos entre si em termos de capacidade de pessoas com capacidade não somente técnicas mas também planejamento e gestão de negócios nas fazendas. de relacionamento interpessoal, ou seja, o sujeito passa de Nestes últimos tempos marcados pelas profundas simples mão-de-obra compreendido como agente passivo alterações no trabalho e produção que também atingem o para parceiro do negócio entendido como agente ativo no meio rural, são importantes as iniciativas que visam criar processo de construção do planejamento organizacional mercados, dinamizar as economias locais e gerar emprego (VIOLIN e SOBRINHO, 2013). e renda para as populações, por meio do incentivo a setores Diversas organizações afirmam que as pessoas como o turismo, porém sem esquecer-se dos impactos constituem seu maior patrimônio entendendo como negativos ocasionados e da adoção do planejamento recursos estratégicos os grupos que apresentam em maior (SILVEIRA, 2003). nível a especialização de atividades, habilidades humanas Os empreendedores rurais brasileiros enfrentam e capacidade técnica sendo portanto, capazes de gerar uma grande dificuldade quanto aos investimentos nas suas diferencial competitivo no mercado. (PASCHOAL, 2006). propriedades. Ainda segundo o mesmo autor, só Portanto, ao entender a importância das pessoas recentemente o governo federal tem dado atenção, pois até para o desenvolvimento empresarial, consequentemente então, o desenvolvimento dependia muito mais das da boa entenderá a função e objetivo do setor de Recursos vontade das pessoas juntamente com seus espíritos Humanos/ Gestão de Pessoas, pois este “permite a empreendedores. colaboração eficaz das pessoas para alcançar os objetivos As fazendas históricas paulistas possuem um organizacionais e individuais” (CHIAVENATO, 2006, p. valioso patrimônio cultural e arquitetônico referentes aos 10). ciclos da cana-de-açúcar e café, nos séculos XVIII e XIX. Assim, a administração de recursos humanos pode Estes locais podem tanto serem usados para fins de estudos, contribuir com a organização através de procedimentos tais como turismo. No entanto para que ocorra é essencial uma como a criação de meios de alcançar os objetivos e cumprir boa gestão de recursos físicos, recursos financeiros e a proposta de missão; fomentar a competitividade recursos humanos. saudável; treinar e motivar colaboradores; aumentar os indicadores de satisfação no trabalho; desenvolver e manter qualidade de vida; manter políticas éticas e comportamento socialmente responsável (CHIAVENATO, 2006; VIOLIN e SOBRINHO, 2013). 4. RECURSOS HUMANOS Nesse sentido, salienta-se que: Empresas bem-sucedidas são feitas de pessoas bem- sucedidas e pessoas assim desenvolvem qualidades de

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vencedoras: persistência, determinação, entusiasmo, visão clara de objetivo, etc. A empresa vencedora é a que consegue criar uma cultura de vencedores, escolhendo POSSUI POLÍTICAS DE RECURSOS HUMANOS (%) pessoas abertas a esse aprendizado e levando-as a desenvolver essas qualidades (PASCHOAL, 2006, p. 33). 62,5 Resumidamente, a Administração de Recursos Humanos refere-se às políticas e práticas necessárias para administrar o trabalho das pessoas, recrutar e selecionar candidatos; admitir; demitir; incentivar, treinar; avaliar 25 desempenho; entre outras concepções para o bom 12,5 aproveitamento dos colaboradores (GIL, 2011). Segundo Oliveri e Rizzo (2005) quase todos os turistas são consumidores indecisos, as empresas e Sim Não Parcialmente agências de turismo exercem, através de seus funcionários, um poder de influência mais relevante que qualquer outro Figura 01: Existência de Política de Recursos Humanos setor. Nesse âmbito é inquestionavelmente a necessidade de se aliar os resultados da atividade turística ao De modo geral os dados e as entrevistas in loco desempenho dos profissionais. levam ao apontamento de que a política de Recursos Os profissionais de turismo por trabalharem em Humanos não é um conceito difundido nem mesmo essência – porém não exclusivamente – com serviços praticado de modo sistematizado nas organizações, precisam atentar-se a necessidade de desenvoltura, havendo inclusive confusão por parte de alguns conhecimento técnico, e habilidades no trato com os empreendedores na resposta a algumas das perguntas turistas ou usuários, ou seja: referentes as ações da própria empresa. [...] em determinado momento o profissional de As figuras 02 e 03 apresentam informações turismo passa a representar, de forma imagética, todo o vinculadas a forma de recrutamento: benefício que está oferecendo, o que o obriga a um preparo realmente especial em nível de conhecimento técnico, REALIZA PROCESSO DE apresentação pessoal e, sobretudo, no seu marketing RECRUTAMENTO(%): pessoal (OLIVERI, RIZZO, 2005, p. 32). Para Pimenta (2006), a qualificação por meio da 43,75 educação, pode transformar um simples atendimento em uma ótima recordação para o cliente. E esta educação ainda 25 pode promover o respeito pelo patrimônio histórico- 18,75 cultural, bem como boas atitudes para a preservação do 12,5 ambiente. Por fim, investir em colaboradores, pode ser uma excelente estratégia para se alcançar os objetivos Interno Externo Misto Não existe empresariais o que pode permitir conquista de espaço além Figura 02: Realização de recrutamento de ganhos em termos de competitividade no mercado de atuação. Dando sequência a observação das figuras relacionadas ao recrutamento, apresenta-se para 5.ANÁLISE DOS DADOS contextualização os principais meios de comunicação utilizados no processo: A coleta de dados ocorreu no primeiro semestre do ano de 2013 junto a 16 fazendas históricas paulistas Meios de comunicação utilizados no inseridas em diversas regiões do estado. O primeiro ponto recrutamento (%) de destaque refere-se a diferença entre uma e outra organização, apesar de algumas possuírem mais e outras Outros Jornal 0% 6% menos recursos financeiros, estruturalmente chamou mais Internet atenção o entrosamento ou não entre os gestores e a equipe 19% do que a estrutura física em si. Pode-se perceber nas visitas Site do local in loco que a forma de atenção ao turista ou usuário está Indicação 0% mais pautada na capacidade das pessoas em criarem uma 44% Agência atmosfera acolhedora do que necessariamente na estrutura 19% Cartaz física como um todo, ou seja, a percepção da adequação 0% dos serviços está intimamente relacionada a capacidade do Parceria grupo de colaboradores. 12%

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Figura 03: Meios de Comunicação utilizados no recrutamento Principais métodos utilizados na avaliação de desempenho

A figura de número quatro fecha o ciclo envolvendo Escala Escolha Forçada Gráfica 0% recrutamento e seleção como pode ser observado a seguir: Avaliação 360º Outros 12% 0% 19% Pesquisa de Campo Principais métodos utilização na seleção de pessoas (%) 19% Prova Tradicional Testes psicológico Avaliação por Incidentes 0% 0% objetivos críticos 38% Lista de Combinação Prova 0% Testes de verificação de métodos Objetiva personalidade 12% 19% 12% 0% Simulação 6% Dinâmica Figura 06: Métodos utilizados na avaliação de 0% desempenho Entrevista 63% Pelo menos metade das organizações responderam que realizam avaliações de desempenho, contudo esses indicadores sinalizam para possíveis problemas Figura 04: Principais métodos utilizados na seleção de organizacionais ao indicarem 25% das organizações não pessoas possuem nenhum tipo de avaliação de desempenho. Em contrapartida a figura de número 06 traz uma Decorre da análise das figuras anteriores que tratam diversidade de ferramentas de avaliações utilizadas entre do recrutamento e seleção de pessoas que o processo não as empresas que se valem de forma total ou parcial de se apresenta como sendo refinado, especialmente ao se avaliações. Em especial aponta-se que tal informação considerar que de cada 5 fazendas uma delas não possui demonstra de um lado que existe conhecimento a respeito processo estruturado de inserção de colaboradores das técnicas e ferramentas, contudo não há um alinhamento especialmente ao se observar que mais de 60% dos casos de ferramentas ou técnicas o que apresentem uma linha de de contratação usam apenas a entrevista pessoal como análise organizacional. parâmetro. Um ponto interessante foi a ferramenta outros que Na sequência são apresentadas duas figuras que contou com 19% das respostas e representam a utilização tratam da avaliação de desempenho, a primeira aponta para de métodos mesclados ou métodos próprios montados a existência ou não de um programa ou processo de pelos responsáveis pelo setor, ou seja, representam um avaliação de desempenho (figura 05) e na sequência (figura modo próprio das organizações avaliarem seus 06) apresenta-se os principais métodos utilizados pelas colaboradores o que pode ser interessante do ponto de vista empresas que realizam a avaliação da adaptação a realidade de cada empreendimento mas, também pode ser preocupante ao não apresentar bases que comprovem minimamente sua eficácia enquanto ferramenta de avaliação. Realização de Avaliação de Desempenho (%) A próxima figura apresenta os dados referentes as formas de recompensa utilizadas pelas organizações: Não respondeu 6,25

Parcialmente 18,75 Trabalha com recompensas financeiras e/ou Não 25 psicológicas (%) 56,25 Sim 50 31,25 0 10 20 30 40 50 60 12,5 0 Figura 05: Realização de Avaliação de Desempenho Sim Não Depende do Depende do Dando sequência a análise do conjunto de quadros cargo desafio referentes a avaliação de desempenho a próxima figura Figura 07: Recompensas financeiras e ou psicológicas apresenta os principais métodos utilizados:

Nenhuma das empresas pesquisadas trabalha pautada em desafios e a maioria das recompensas são de ordem psicológica, apenas 3 das 16 empresas incluem

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recompensa financeira em seu processo organizacional. De modo amplo é possível perceber novamente a discrepância Treinamentos são considerados (%): em termos de resultados dentro dos requisitos mínimos, considerando o público alvo pesquisado pode-se pontuar 56,25 que as mesmas empresas que possuem um processo 37,5 profissionalizado apresenta certa harmonia ao longo dos elementos vinculados aos recursos humanos. 6,25 O próximo conjunto de aferições pautou-se na temática referente ao treinamento de pessoal, cujos dados Satisfatório Insatisfatório Não respondeu estão inseridos nas figuras 8 e 9: Figura 10: Avaliação dos treinamentos

Possui programa de treinamento (%) O que se pode inferir é que apesar de existir um número substancial de organizações que afirmam treinar é Parcialmente 12,5 preocupante os índices de satisfação, ou seja, pouco mais de 50% das organizações estão satisfeitas com os treinamentos realizados. Não 25 Os dados apresentados sinalizam em linhas gerais a dificuldade das organizações pesquisadas – na média – em organizar-se dentro de um contexto profissionalizado e Sim 62,5 com atividades estruturadas dentro de uma política de recursos humanos, aqui entendida como um modo de organizar as atividades e o crescimento dos profissionais Figura 08: Programa de Treinamento dentro de um período determinado de tempo. Após levantados os dados preliminares advindos A segunda figura vinculada ao treinamento refere- das entrevistas pessoais e também da aplicação de se a frequência com o qual os treinamentos ocorrem que questionários foi possível perceber que a relação entre segue conforme apontado pelos entrevistados: eficiência organizacional atrelada as políticas de Recursos

Humanos é algo latente. As organizações que apresentaram maior teor de refinamento em termos de políticas também Frequência de treinamentos (%) apresentaram os melhores indicadores nos demais itens 37,5 relacionados ao trato com as pessoas que compõem a 25 organização. 18,75 6,25 6,25 6,25 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

É notório o crescimento de empreendimentos em vias de profissionalização no meio rural nos últimos anos no Brasil, isso pode ser comprovado via levantamentos como os disponibilizados pelo Idestur (2010) que apontam a existência de 47 fazendas históricas tendo esse estudo Figura 09: Frequência dos treinamentos atingido 16 dessas unidades as quais apesar de buscarem a estruturação ainda apresentam um bom percurso em termos O que se pode inferir em relação ao treinamento é a de profissionalização a ser percorrido, ou seja, a estrutura observação que 25% das empresas não possui nenhum tipo desses empreendimentos em sua maioria apresentam de treinamento, e boa parte dos que tem algum tipo de deficiências em relação ao planejamento e gestão de programa de treinamento o aplicam em elementos técnicos negócios. exclusivamente. Os indicadores apontam a ausência de estrutura De modo sistematizado foi possível observar que profissionalizada na maioria dos empreendimentos no que dentro do grupo que afirma ter treinamento o mesmo não diz respeito à sustentação do tripé consumidor, objetivos apresenta-se de modo constante, ou seja, os treinamentos organizacionais e os profissionais que integram o grupo de são condicionados a necessidades pontuais. trabalho de uma organização. É possível inferir que boa A última figura apresenta os níveis de satisfação parte das organizações são familiares, contudo isso não com os treinamentos realizados do ponto de vista dos indica maior ou menor capacidade técnica, o que foi gestores, considerando aqueles que disseram ter algum tipo possível observar através dos dados é que existe de certa de treinamento: forma o reconhecimento da importância dos colaboradores no processo organizacional, contudo, tal reconhecimento não se traduz necessariamente em atividades práticas organizacionais vinculadas ao ganho de competitividade

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ou percepção de qualidade junto aos turistas ou usuários do FONSECA, M. L. Patrimônio, turismo e desenvolvimento empreendimento. local. In: RODRIGUES, A. B. (org.). Turismo Rural: A base da oferta no setor turístico vinculados as práticas e perspectivas. 2º ed. São Paulo: Contexto, 2003. fazendas históricas pauta-se na disponibilização de produtos em sua maioria artesanais além de serviços. FRANCO, José de Oliveira. Recursos Humanos: Dentro desse contexto mais de 90% da oferta – segundo as fundamentos e processos. Curitiba: IESDE Brasil S.A, informações constantes nos sites das organizações - é 2008. vinculada a serviços o que torna mais difícil estabelecer manter padrões de qualidade que atendam de forma GIL, Antônio Carlos. Gestão de Pessoas: enfoque nos específica os usuários ou turísticas já que não existe um papéis profissionais. 11º ed. São Paulo: Atlas, 2011. processo profissionalizado para recrutar, selecionar e treinar pessoas na maioria das organizações. MARCONI, M. A.; LAKATOS, E. M. Técnicas de Os dados apontaram claramente a necessidade de Pesquisa: planejamento e execução de pesquisas, profissionalizar os procedimentos dentro de um amostragens e técnicas, elaboração, análise e interpretação planejamento de médio e longo no sentido de potencializar de dados. 7º ed. São Paulo: Atlas, 2008. os serviços ofertados por esses empreendimentos, ou seja, os responsáveis pelas fazendas pesquisadas devem rever ou OLIVIERI, Maria de Fátima Abud; RIZZO, Claudio. mesmo implantar políticas de recursos humanos no sentido Gestão de pessoas em turismo: nova visão de recursos de poderem estabelecer padrões qualitativos e humanos aos profissionais da área. São Paulo: C&C quantitativos de aferição do andamento dos aspectos Editora, 2005. relacionados à percepção de qualidade ou mesmo atingimento das metas e objetivos organizacionais PASCHOAL, Luiz. Gestão de pessoas: as micros, estabelecidos. pequenas e médias empresas: para empresários e Estabelecer políticas de Recursos Humanos dirigentes. Rio de Janeiro: Qualitymak, 2006. auxiliam e norteiam o desenvolvimento empresarial de modo ordenado e minimamente direcionado. Isso PIMENTA, Maria Alzira. Gestão de pessoas em turismo: influenciará diretamente no fluxo de visitantes, na renda sustentabilidade, qualidade e comunicação. Campinas, SP: obtida pelo estabelecimento e consequentemente nos Editora Alínea, 2006. 2º edição. demais benefícios proporcionados pela exploração consciente e profissionalizada do turismo em toda sua IDESTUR - Instituto de Desenvolvimento do Turismo. plenitude. Turismo rural brasileiro será o maior destino mundial, Por fim, pode-se inferir que com base na amostra 2010 Disponível em: pesquisa existe relação direta entre as políticas de Recursos . Acesso em: julho de 2013. tal afirmação é pautada nos indicadores relacionados a satisfação com os resultados dos treinamentos, processos GUIA DE TURISMO RURAL DE SÃO PAULO. que envolvem a avaliação de desempenho bem como os Indicadores do Turismo Rural Paulista, 2010. Disponível indicadores positivos em relação a tal ação em: < http://www.idestur.org.br >. Acesso em: julho de De forma sintética não é possível afirmar que a 2013. relação entre as políticas e as ações empreendedoras exista em todo o setor, contudo ficou explícita a diferença entre SILVEIRA, M. A. T. da. Política de turismo: as organizações que possuem minimamente estrutura de oportunidades ao desenvolvimento local. In: recursos humanos apoiadas por políticas de médio e longo RODRIGUES, A. B. (org.). Turismo Rural: práticas e prazo e as que não possuem, a impressão de perspectivas. 2º ed. São Paulo: Contexto, 2003. profissionalismo e adequação é substancialmente maior na primeira do que na segunda forma de organização. VIOLIN, F. L. e SOBRINHO, M. S. Perfil dos Agentes de Viagens e sua relação com os Fatores Ambientais 7. REFERÊNCIAS Mercadológicos. Partes (São Paulo), Disponível em http://www.partes.com.br/2013/02/20/perfil-dos-agentes- ARAÚJO, J. G. F. Potencialidades do turismo no espaço de-viagens/. Acesso em 02 de Agosto de 2013. rural: desenvolvimento, conceitos e tipologia. In: SANTOS, E. O.; SOUZA, M. (Orgs). Teoria e prática do WANDSCHEER, E. A. R.; TEIXEIRA, A. R. Novas turismo no espaço rural. Barueri: Manole, 2010. Ruralidades: demandas e potencialidades da sociedade contemporânea. In: SANTOS, E. O.; SOUZA, M. (Orgs). CHIAVENATO, Idalberto. Recursos Humanos: o capital Teoria e prática do turismo no espaço rural. Barueri: humano das organizações. 8º ed. 3º reimpressão. São Manole, 2010. Paulo: Atlas, 2006.

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