Anales Arqueologia Cordobesa

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Anales Arqueologia Cordobesa ISSN: 1130-9741 –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– 293 O POVOAMENTO RURAL ISLÂMICO NO AL-ANDALUS – ESTADO DA ANALES INVESTIGAÇÃO. DE ARQUEOLOGÍA THE ISLAMIC RURAL SETTLEMENT IN AL-ANDALUS CORDOBESA - STATE OF RESEARCH. NÚMERO 29 (2018) MARTA ISABEL CAETANO LEITÃO BOLSEIRA DE DOUTORAMENTO NA FUNDAÇÃO PARA A CIÊNCIA E A TECNOLOGIA (SFRH/BD/117606/2016). INSTITUTO DE ARQUEOLOGIA E PALEOCIÊNCIAS DA UNIVER- SIDADE NOVA DE LISBOA ✉✉: [email protected] RESUMO O presente artigo mostra o estado actual da investigação sobre a organização do território, em Período Medieval Muçulmano, no espaço geográfico que abrange grande parte da Península Ibérica. Pretende-se, deste modo, dar a conhecer as várias abordagens existentes dentro da- quela temática, onde se insere as fortificações, os assentamentos rurais e os meios de produção, e fazer uma breve reflecção acerca das várias questões que permanecem pendentes. Palavra(s)-chave✉: Arqueologia Medieval Islâmica, Território, Povoa- mento, Fortificações, Estado da Arte. ABSTRACT This article shows the current state of the research on the organiza- tion of the territory, in the Muslim Medieval Period, in the geographical space that covers much of the Iberian Peninsula. In this way, the aim is to present the various approaches that exist within this theme, including fortifications, rural settlements and the means of production, and to re- flect briefly on the various issues that remain open. Keywords✉: Islamic Medieval Archeology, Territory, Settlement, Forti- fications, State of Art. 1. AS LINHAS DE INVESTIGAÇÃO 1.1 ESPANHA O conhecimento científico que se tem produzido sobre a orga- nização espacial do povoamento rural em Período Medieval Mu- çulmano provém, essencialmente, do actual território espanhol, AAC 29 (2018), 293-318 294 –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– MARTA ISABEL CAETANO LEITÃO nomeadamente da Andaluzia e da Região porta ainda referir os estudos de Josep Torró Valenciana. Foi, contudo, nesta última que (1990; 1998) que estabeleceram uma clara surgiram os primeiros estudos sobre esta te- diferenciação para as fortificações, com uma mática, através de investigações realizadas cronologia entre os séculos VIII-IX, localiza- por André Bazzana, Pierre Guichard e Rafael das na montanha e no litoral, atribuindo as Azuar Ruíz, nas décadas de 70 e 80 do sécu- primeiras à 1º fitna, enquanto as segundas lo XX, passando-se, a partir daquele momen- seriam lugares de concentração de homens to, a conhecer um pouco mais a organização e mercadorias, relacionadas com as explora- do território durante a ocupação islâmica. ções marítimas, considerando que em ambos os casos, não haveria qualquer vinculação Pierre Guichard (1977; 1983) dedicou- daquelas ao poder estatal. se ao estudo do encastelamento na região referida, onde constatou igualmente, através A investigadora Sonia Gutiérrez Lloret do recurso à arqueologia espacial, que ha- realiza, em 1996, um estudo sobre a Cora de viam dispersos pelo território vários aglome- Tudmir onde, mediante a análise da cultura rados rurais ou simples unidades de explora- material, a autora dá a conhecer a história ção (casais agrícolas ou granjas) que se or- de Tudmir (províncias de Alicante, Múrcia, ganizam em redor de husun. Das suas inves- Albacete e Almería) desde a Antiguidade tigações resultaram vários trabalhos, alguns Tardia até ao Período Islâmico, através das deles de colaboração com os investigadores várias formas de implantação daqueles po- André Bazzana e Patrice Cressier (1988), de vos no território, assim como dos processos quem falarei posteriormente. Quanto a André de aculturação e dos sistemas produtivos e Bazzana (1987; 1992) desenvolveu os pri- comerciais (Gutiérrez Lloret, 1996). Importa meiros estudos sobre o povoamento rural is- ainda destacar o seu mais recente trabalho, lâmico relacionado ao encastelamento, agru- por si coordenado, juntamente com Ignasi pando as estruturas identificadas e associan- Mira, onde constam uma série de artigos so- do-as a períodos específicos dentro da cro- bre os espaços domésticos e de uso social nologia medieval muçulmana. Relativamente dos estabelecimentos rurais islâmicos✉: De la a Rafael Azuar Ruíz (1981; 1989a; 1989b; estructura doméstica al espacio social. Lec- 1994) realizou estudos sobre as fortificações turas arqueológicas del uso social del espacio da região de Alicante (Valência), sobretudo (2013). na área do Reino de Taifa de Denia que resul- Por último, queria ainda referir os estu- taram na identificação de várias fases cons- dos efectuados por Pedro López Elum e José trutivas para as distintas fortificações encon- Ramón García Gandía. O primeiro realizou tradas e do povoamento a elas associado. escavações na Torre Bufilla de Bétera (Valen- Thomas Glick (1988; 1995) efectuou, cia) que permitiram conhecer os vários hiatos para esta zona, estudos sobre os sistemas de ocupação (López Elum, 1994). O segundo de regadio das comunidades campesinas, tal realizou trabalhos arqueológicos na Partida como a investigadora Carmen Trillo San José, de l’Almiserà (Villajoyosa, Alicante) duran- de quem falarei adiante, para o Reino Nazarí te os anos de 2002/2003, nomeadamente de Granada. Para a Região Valenciana, im- nos sítios Tossal de l’Almisserá, Foietes de AAC 29 (2018), 293-318 ISSN: 1130-9741 O POVOAMENTO RURAL ISLÂMICO NO AL-ANDALUS... ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– 295 Dalt, Alfarella, Mezquita e Necrópolis de (1988; 1989), juntamente com os estudos l’Almiserà contribuindo, deste modo, para o de Thomas Glick para a zona de Valência, já conhecimento do povoamento rural islâmico enunciados, que terão sido o ponto de parti- no Sharq al-Andalus (Gracía Gandía, 2005). da para os trabalhos desenvolvidos por Car- men Trillo San José. No que respeita à Andaluzia, nomeada- mente na região de Granada são de destacar Integram ainda o grupo referido, Miguel as investigações levadas a cabo por Patrice Jiménez Puertas, José María Martím Civantos Cressier e Antonio Malpica Cuello. O primeiro e José Cristóbal Carvajal López. O primeiro para além dos trabalhos realizados com os realizou um estudo sobre o povoamento de investigadores André Bazzana e Pierre Gui- Loja (Granada), desde a Antiguidade Tardia chard, já referidos anteriormente, dedicou- até à conquista castelhana (séculos V-XV), se, igualmente, nos anos 80 do século XX, ao a partir de prospecções que o mesmo efec- estudo das fortificações Almóadas e Nazarís tuou, com o auxílio da documentação escrita da zona de Alpujarra (província de Granada e e da toponímia que resultaram na sua tese Almería) numa perspectiva espacial e políti- de doutoramento (Jiménez Puertas, 2002a). co-administrativa (Cressier, 1984a; 1984b; O segundo realizou alguns trabalhos sobre 1992a; 1992b). Relativamente a Antonio as técnicas construtivas das fortificações de Malpica Cuello, trata-se dos investigadores Granada, assim como alguns estudos em que que mais tem contribuído para o conheci- aquele relaciona o meio físico e o povoamen- mento do mundo rural islâmico na zona de to rural (Martín Civantos, 2002; 2008). Granada, onde se destaca os estudos sobre Quanto a José Cristóbal Carvajal López o ordenamento do território e os vários mo- efectuou, no âmbito da sua tese de douto- delos de povoamento. É director do grupo de ramento, um estudo sobre o povoamento investigação designado Toponimia, Historia altomedieval, entre os séculos VIII e XI, na y Arqueología del Reino de Granada, surgi- Vega de Granada. Com base na análise das do em 1989, onde se inclui uma série de cerâmicas identificadas nos trabalhos ar- produções científicas da sua autoria (Malpica queológicos, aquele terá constatado que, Cuello, 1996; 2003; 2014). nos inícios dos séculos VIII e primeira me- Alguns dos investigadores que integram tade do IX, foram criados naquela região os este grupo tem contribuído igualmente para primeiros sistemas de regadio associados a o desenvolvimento desta temática, sendo de novos assentamentos muçulmanos, tendo- destacar os trabalhos de Carmen Trillo San se, contudo, mantendo uma continuidade de José (2003a; 2003b; 2004) que se focam ocupação dos povoados de cronologia ante- essencialmente nas técnicas agrícolas e dos rior. A partir de meados do século IX e inícios sistemas de irrigação do mundo Nazarí, con- do X, devido à maior fase de instabilidade tribuindo bastante para o conhecimento das ocasionada pela 1ª fitna, foram construídas várias áreas agricultáveis que seriam domina- novas fortificações rurais e abandonados os das pelas alcarias. Envolvendo esta temática assentamentos anteriores. Já em pleno Pe- económica e social encontra-se também os ríodo Califal o investigador refere que, devido trabalhos desenvolvidos por Miquel Barceló ao crescimento de Madinat Ilbira, o seu en- ISSN: 1130-9741 AAC 29 (2018), 293-318 296 –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– MARTA ISABEL CAETANO LEITÃO torno geográfico teria igualmente conhecido Luengo et alli, 1998), assim como o estudo um grande desenvolvimento e esplendor eco- realizado, por Emilio Martín Córdoba, Fran- nómico, patenteado no desarrolho agrícola e cisco Melero García e Juan Bautista Salado surgimento de novas alcarias (Carvajal López, Escaño, sobre o povoamento da Alta Idade 2008✉: 383-385). Média na Axarquía de Málaga (Martín Córdo- Por fim, importa ainda citar os impor- ba et alli, 2016). tantes estudos de Antonio Gómez Becerra Para Jaén temos as investigações desen- (1998; 2000) sobre as
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