Editora Zahar Tópico: Institucional 11/11/2008 Impacto: Positivo Cm/Col: 0 Globo Online - RJ Editoria: Blog Jam Sessions Pg: Online

Uma temporada no inferno com os Rolling Stones

(Não Assinado)

A era do sexo, drogas e roquenrol iniciada em 1967 teve seu ponto mais alto e crítico no começo dos anos 70, quando tombaram Jimi Hendrix, Janis Joplin e Jim Morrison. A maior banda da época, os Rolling Sones, não sofreram uma baixa fatal por pura sorte ou pela inexplicável constituição física resistente de Keith Richards, que fumava cigarros de nicotina, maconha e haxixe, tomava LSD, bourbon, tequila e vodka, cheirava cocaína e injetava heroína tudo ao mesmo tempo agora. Foi o período em que gravaram os discos "" (1971) e "Exile on Main Street" (1972), o primeiro com uma sonoridade impecável e arranjos polidos, o segundo cru e caótico.

O making of de "Exile" está no livro "" (editora Zahar), de Robert Greenfield, autor também de biografias do guru psicodélico Timothy Leary e do mítico empresário Bill Graham, além de um livro sobre a turnê de 1972 dos Stones "A journey through America with ". Numa entrevista por telefone da Califórnia, Greenfield afirma que os três álbuns anteriores, considerados por muitos os melhores da banda, "", "" e "Sticky Fingers" foram produzidos por Jimmy Miller:

- Jimmy conseguiu dar um polimento a esses álbuns, mas em “Exile” prevalece o caos, a loucura do estilo de vida deles na época. "Exile" é denso, doentio, mal produzido, artisticamente insano e, essencialmente, um álbum de Keith Richards com todos os tipos de música que ele sempre gostou desde que era um garoto apaixonado por música de raiz - diz ele, que passou três semanas com a banda na época. Miller estava lá mas foi jogado para escanteio e se retirou afundado em drogas. A influência country em canções como "" e "" é atribuída à amizade de Keith com Gram Parsons, dos Byrds e dos Burrito Brothers, que fez parte da corte stoniana reunida em torno da mansão Villa Nelcotte, na Riviera francesa, alugada por US$ 25 mil mensais, onde a banda se refugiou no verão de 1971 para fugir dos altos impostos da Inglaterra e para gravar o sucessor de "Sticky Fingers". Parsons foi uma das vítimas da loucura reinante. Ele tentou acompanhar a batida de Keith no consumo de drogas, mas entrou em colapso, o que lhe valeu uma expulsão da casa. O resultado foi depressão, tentativa de suicídio e, um ano depois, morte por overdose. Greenfield comenta que muita gente caiu vítima da tentativa de ser igual aos Stones, isto é, a Mick e Keith, porque Bill Wyman (baixo), Charlie Watts (bateria) e Mick Taylor (guitarra) eram tratados pela dupla como meros coadjuvantes.

A gravação do álbum, supostamente prioritária, ficou em segundo plano diante do consumo desvairado de sexo e drogas. A principal figura feminina que reinava na mansão era Anita Pallenberg, ex-mulher de , fundador da banda, a quem trocou por Keith Richards, mas que também transava com Mick Jagger. Este já não estava mais com Marianne Faithfull, sua mulher de 1966 a 1970, que também transava com Keith. Durante as gravações, Jagger casou com a nicaraguense Bianca Perez de Macias que Marianne dizia ser muito parecida com o vocalista e destilava veneno dizendo que Mick cedera ao seu narcisismo e casara consigo mesmo.

Greenfield diz que Keith tem muita sorte de ter sobrevivido a este período e aos subseqüentes:

- Apesar das condições em que foi feito, "Exile" marcou o fim da era gloriosa da banda. Quando foram para a Jamaica gravar o sucessor de "Exile" (") não havia mais grandes canções.

O brilhante guitarrista Mick Taylor, substituto de Brian Jones, incapacitado pelas drogas e morto em conseqüências misteriosas, foi outra vítima do clima reinante em Nellcote. Ele não foi obrigado a se exilar no Sul da França porque não tinha problemas com o fisco britânico, daí estava lá para gravar e nada acontecia por semanas seguidas. E quando gravava Keith implicava muito com ele. Daí emborcou nas drogas:

- Mick Taylor era um ser humano adorável, a pessoa mais doce que já existiu, um verdadeiro gênio da guitarra mas foi esmagado por Mick e Keith até sair da banda - afirma Greenfield.

Jagger também sofria nas mãos de Keith. Ele ficava esperando horas até que o companheiro descesse de seus aposentos na mansão para trabalhar. Às vezes cansava e saía por uma ou mais semanas ao encontro de Bianca em Paris. Quando Keith descia, gravava alguma coisa e saía com a desculpa de que ia botar o filho Marlon para dormir, o "código" para dizer que ia se drogar. Na única vez em que ousaram subir, encontraram-no apagado na cama com uma seringa ainda enfiada no braço. Numa ocasião, Keith gravou uma linha de guitarra de "" e caiu no sono, no estúdio mesmo, durante horas. O engenheiro Andy Johns, que chegou careta em Nellcote e saiu viciado em heroína, cansou de esperar e foi embora para a casa onde estava com o trompetista Jim Price, a meia-hora de Nellcote. Já em casa toca o telefone: "Cadê você porra?" Era Keith que acordara com a idéia de uma outra guitarra e queria gravar. Lá foi Glyns de volta para gravar às cinco da manhã e se entusiasmou com o que ouviu: "Foi espetacular. Fez a música funcionar. Como um contraritmo. Duas Telecasters, uma em cada lado do estéreo, absolutamente brilhante. Ainda bem que ele me chamou de volta."

A falta de um cronograma certo de gravações, reforçava a piração. O saxofonista , com os Stones desde 1969, estava num apartamento à beira-mar e, um dia, o tédio o levou a invadir o apartamento de baixo, jogar o sofá, algumas cadeiras e uma mesa no mar. Além disso, invadiu a adega e encheu a cara. O dono do lugar o encontrou desmaiado e cercado de garrafas vazias. Keys pagou o prejuízo e foi despejado.

"" é uma leitura indispensável para fãs e interessados em conhecer o que rolou no período mais louco da história do roquenrol. Numa entrevista na turnê que os trouxe ao Brasil em 2006, Jagger diz que a banda hoje toca muito melhor do que nos anos 70 por ser mais constante e consistente.

- Isso pode ser verdade do ponto de vista musical – diz Robert Greenfield – mas os Stones naquela época eram assustadores, tinham uma aura de perigo em torno deles. Quando Jagger cantava “”, encarnava a figura do estrangulador de Boston e aquilo era aterrador.