The Resentment of Electors from the Brazilian City of Natal in the 2018 Presidential Election
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O ressentimento do eleitor natalense nas eleições presidenciais de 2018 The resentment of electors from the Brazilian city of Natal in the 2018 presidential election Lindijane Bento Almeida [I] Terezinha Albuquerque Barros [II] Jaylan Ferreira Macedo [III] Resumo Abstract O ressentimento político impulsionou, nos últimos Political resentment has driven the rise of leaders anos, a ascensão de lideranças e de movimentos and movements with far-right profiles in recent com perfis de extrema-direita. No Brasil, esse ce- years. In Brazil, this scenario worsened after the nário ganha outras proporções depois das eleições 2018 presidential election. In view of this context, presidenciais de 2018. Diante disso, o presente tra- the present work aims to understand the profile balho tem como objetivo compreender o perfil do of voters who are resentful of Brazilian politics eleitor ressentido com a política brasileira na cida- in the city of Natal, State of Rio Grande do Norte. de do Natal/RN. Este artigo analisa os resultados do The article analyzes the results of the last election, último pleito eleitoral, relacionando-os com alguns relating them to some aspects of social reality, aspectos da realidade social, visando a compreen- in order to comprehend the votes in light of the der o voto à luz da teoria do ressentimento político. theory of political resentment. We used maps for Optamos pelo uso do recurso de mapas para uma a spatial immersion in this phenomenon in the imersão espacial nesse fenômeno nos bairros, o city’s neighborhoods, which enabled us to read the que permitiu uma leitura das características gerais general characteristics of the electorate, indicating do eleitorado, indicando que o ressentimento não that resentment is not located only in the excluded se localiza apenas nos lugares excluídos da cidade. places of the city. Palavras-chave: democracia; ressentimento Keywords: democracy; political resentment; político; eleições presidenciais; polarização; presidential election; polarization; Natal/State of Natal /RN . Rio Grande do Norte. Cad. Metrop., São Paulo, v. 23, n. 51, pp. 445-468, maio/ago 2021 Artigo publicado em Open Acess http://dx.doi.org/10.1590/2236-9996.2021-5101 Creative Commons Atribution Lindijane Bento Almeida, Terezinha Albuquerque Barros, Jaylan Ferreira Macedo Introdução O “mito”, como é chamado por seus apoiadores mais fiéis, introduz na política do Os últimos anos foram marcados pela ascen- País um discurso público totalmente distinto são de lideranças políticas e de movimentos do que era visto nas últimas eleições presi- sociais com um perfil político de extrema- denciais. Com manifestações pró-militarismo, -direita, como evidencia o aumento da quan- pró-armamentista, ataque às minorias, anti- tidade de votos arrecadados por partidos -estabelishment, além de ser simpático aos va- com esse mesmo direcionamento ideológico lores moralmente cristãos (a favor da família, em diversos continentes, como na Europa, na contra o aborto, contra a agenda da população América do Norte e, mais recentemente, na LGBTQI+) e defensor de uma agenda de com- América do Sul; como vivenciou o Brasil nas bate à corrupção, mesmo tendo em seu núcleo últimas eleições presidenciais realizadas em familiar e partidário pessoas envolvidas em 2018. Novos movimentos com um caráter xe- casos de desvirtuação com o dinheiro público, nófobo, anti-estabelishment e supremacista Jair Bolsonaro torna-se um protagonista, princi- ganham corpo em países como Alemanha, palmente quando oferece soluções fáceis para França, Estados Unidos e Hungria. O populis- problemas complexos na sociedade brasileira. mo político (Zakaria, 1997; Weffort, 2003) rea- Para entender melhor esse cenário, cende, e figuras como Viktor Orbán (Hungria), buscamos responder quais seriam os motivos Donald Trump (Estados Unidos), Marine Le Pen que levaram esse perfil de candidato, com (França) e Jair Bolsonaro (Brasil) passam a ser discursos públicos de glorificação a regimes símbolos desse grupo de ressentidos e descon- autoritários, a ascender como liderança re- tentes que veem de maneira desesperançosa o presentativa, alicerçada com apoio popular, futuro do país e da própria democracia. em uma democracia que parecia caminhar No Brasil, mais especificamente, mo- cada vez mais para sua consolidação, como vimentos com caráter reivindicatório da ga- no caso brasileiro. O que oportuniza o deba- rantia dos direitos sociais dão espaço a ma- te antigo na ciência política de que somente nifestações contra a corrupção, fazendo-se eleições livres e justas não são elementos su- consagrar a grande agenda eleitoral de 2018, ficientes para enquadrar regimes como demo- o antipetismo, que se torna mais intenso de- cráticos ou não democráticos, contrariando pois do impeachment da então presidente, Schumpeter (1942) e Przeworski (1999), cujas Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores clássicas visões processuais de democracia (PT),1 que rompe com a trajetória de aprova- referem-se a uma eleição competitiva com ção dos anos anteriores e dá início aos altos condições iguais de vitória. Przeworski (1999) índices de desaprovação popular no período ainda acredita na racionalidade dos eleitores, logo após a sua reeleição, em 2014. Assim quando estes escolherem os seus represen- como os avanços da operação de combate à tantes baseados em um projeto socialmente corrupção, Lava-Jato2 que enfraqueceram di- benéfico. Não desconsiderando a eleição co- versos partidos políticos, principalmente o PT, mo elemento essencial, mas apontando-a co- oportunizando a ascensão do candidato Jair mo não suficiente, existe uma série de autores Bolsonaro (PSL).3 (Dahl, 1996; Zakaria, 1997; Mainwaring, 446 Cad. Metrop., São Paulo, v. 23, n. 51, pp. 445-468, maio/ago 2021 O ressentimento do eleitor natalense nas eleições presidenciais de 2018 Brinks e Pérez-Linã, 2001; Castells, 2018) que novo cenário a ser contraposto, e os pilares amplia a visão de democracia quando reitera liberais de garantia de direitos ficam em plano que a existência de uma categoria mínima de secundá rio na democracia iliberal, como deno- direitos sociais, políticos e civis é fundamental mina Zakaria (1997) e Mounk (2018). para classificar um regime democrático. Considerando esse contexto, o presen- Até porque, discordando de Przeworski te trabalho tem como objetivo compreender (1999), não só o ressentimento pode tornar as o perfil do eleitor ressentido com a política pessoas em pobres juízes de suas escolhas. As- brasileira, destacando que, quando se trata do sim como nem sempre os líderes que são elei- Brasil e de suas dimensões territoriais, a aná- tos pelo voto popular irão alicerçar suas ações, lise aqui proposta se torna complexa. Visando respeitando as formas e as regras da democra- a explorar esse fenômeno político, optamos cia que o fizeram eleito; uma vez que discursos por imergir para o caso particular de uma ca- que enfraquecem publicamente as normas pital do País, a escolhida foi a do Rio Grande constitucionais e institucionais de seus países do Norte, Natal, localizada na região Nordeste. vêm fazendo parte desses governos, de forma Nessa região, a responsável por concentrar a que suas lideranças passam a ganhar mais po- maior parcela do eleitorado do PT no País, três der de influência e representatividade política. capitais (Natal, João Pessoa e Maceió), nas úl- Mounk (2018) analisa, ainda, que o perfil timas eleições, canalizaram a maioria dos seus dessas lideranças tem características similares: votos para Jair Bolsonaro. colocam-se como vendedores de fáceis solu- Como procedimento metodológico, o ções para os problemas e se apresentam como artigo analisa os resultados de votação das úl- defensores de uma “limpeza” na política. De timas eleições presidenciais de 2018 no muni- face populista, eles convencem aos que não cípio de Natal, relacionando-os com aspectos querem admitir que o mundo real pode ser da realidade social local, visando a mapear e complicado e que, inebriando-se de ilusões, compreender o voto à luz da teoria do res- buscam alguém para culpar pelo suposto fra- sentimento político (Ferrão, 2019; Rodríguez- casso na resolução desses problemas. -Pose, 2018). Para melhor apresentar os acha- Esse novo populismo que surge no dos da pesquisa, optamos pelo recurso de século XXI adquire uma nova face do que já mapas, pois ele permitiu uma imersão espacial foi visto nas décadas anteriores em continen- do fenômeno político nos bairros da cidade. tes como a América Latina: o surgimento de Os modelos selecionados foram os mapas de líderes que, mesmo não usando de sua simpa- distribuição por superfície de tendência, os tia, movimentam massas em defesa de medi- quais demonstraram a distribuição média dos das antidemocráticas. O que fortaleceu o elo votos dos candidatos Jair Bolsonaro, Fernando com uma população ressentida em relação Haddad, além dos brancos/nulos na cidade, ao desempenho dos seus representantes. Es- permitindo identificar as características gerais ses novos líderes passam a se considerar co- do eleitorado. O segundo modelo foi os coro- mo os fiéis representantes de uma “maioria” pléticos, que nos permitiu analisar a proporção heterossexual, branca, cristã e conservado- de votos em cada bairro. A base de dados da ra. Assim, o pluralismo político passa, nesse pesquisa está ancorada no Tribunal Superior Cad. Metrop., São Paulo, v. 23, n. 51, pp. 445-468, maio/ago 2021 447 Lindijane Bento Almeida, Terezinha Albuquerque Barros, Jaylan Ferreira Macedo Eleitoral (TSE), e as dimensões socioeconômi- A geografia