31º ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS, DE 22 A 26 DE OUTUBRO DE 2007, CAXAMBU, MG. ST 15 - ECONOMIA POLÍTICA DA CULTURA

E SURGE O – POSSÍVEIS E PROVÁVEIS “ORIGENS” DE UMA EPOPÉIA POPULAR

DMITRI CERBONCINI FERNANDES1

1 Bacharel em Ciências Sociais pela FFLCH – USP, Doutorando do Departamento de Sociologia da FFLCH – USP e Bolsista FAPESP. E-mail: [email protected] I – DESDE QUE O SAMBA É SAMBA As décadas de 1910-30 marcaram o surgimento de diversas instituições e atores que deram força e molde a um domínio até então carente de expressão e reconhecimento legítimos no mundo artístico: o da música popular urbana (MPU2). Estas manifestações musicais eram majoritariamente criadas e reproduzidas por elementos destituídos de posses econômicas e culturais, em sua maioria jovens negros moradores de subúrbios, morros, favelas ou cortiços. Penetrando um pouco mais as peculiaridades dessas décadas, ao frisar os principais processos ocorridos nos períodos em que a formação institucional de um campo da música popular brasileira se fazia presente, a literatura acadêmica3 sublinha na década de vinte as lutas acirradas e os contatos diversos entre membros de distintas segmentações sociais. Estas lutas e contatos teriam assim contribuído para o início da legitimação do domínio das artes populares em instâncias de uma indústria cultural em expansão. Já a década de trinta seria o palco do assentamento de um veículo de comunicação de grande alcance popular (o rádio), do estabelecimento de indústrias fonográficas multinacionais e, na arena política, do câmbio das elites que até então governavam o país. Estas décadas, de fato, servem ao analista como um fértil período para a compreensão das futuras modificações e legitimações que vieram a ocorrer no gosto musical que predominava entre os distintos estratos da população. Em 1940, já era possível vislumbrar a sedimentação do primeiro período do processo de modificação da posição do “popular” no campo das artes do Brasil, que teve como resultado a legitimação do gênero musical popular mais conhecido ainda nos dias de hoje, o chamado “samba”. O processo de legitimação deste gênero e a decorrente autonomização do campo da MPU, nos termos de Bourdieu (cf. BOURDIEU, 1996: 101), que se deu ao longo da história, foi determinado sobremaneira pela ação de agentes geralmente ignorados pela literatura acadêmica, conforme tentarei demonstrar. O imenso processo de alquimia social realizado, uma conversão simbólica coletiva que teria contado com diversas forças e instituições, não poderia ter sido levado a cabo sem a importante contribuição do trabalho destes agentes presentes exclusivamente na cena

2 Este conceito é aproximativo e tem a pretensão de apenas realizar uma assemblage das diversas manifestações musicais executadas no período do final do século XIX e começo do século XX, sobretudo na cidade do , capital de então e principal centro urbano do país. Após um longo processo de disputa simbólica, conforme tento demonstrar no decorrer do artigo, estas manifestações foram reduzidas ao termo genérico “samba”. 3 Penso sobretudo nestes trabalhos: CUNHA (2004); LOPES (1992); FROTA (2003); MORAES (1997 e 2000); VIANNA (2004); REIS (1999); FENERICK (2002); NAPOLITANO (2007) e WISNICK (1983).

1 cultural carioca. A imposição de uma estética musical popular (feito inédito) e que, quase que inacreditavelmente, tornar-se-ia, em muito pouco tempo - levando-se em consideração as disposições estéticas da elite de então - dominante, deve assim muito a estes personagens. A influência que diferentes espécies de trabalhos intelectuais exerceram para a formatação e a posterior legitimação do samba como “identidade nacional” entre diversas frações da sociedade fornece o mote principal da minha análise. II – O SAMBA PEDE PASSAGEM Além dos avanços técnicos na área musical que teriam marcado as décadas de 1920-30 no Brasil, forjando uma grande transformação dos padrões e gostos dominantes relativos à esfera musical, uma cultura musical popular no universo urbano moderno se estabelecia, tendo como principais veículos institucionais de difusão o rádio, o disco, o teatro de revistas e uma parcela da imprensa (jornais diários, periódicos matutinos e vespertinos, revistas especializadas etc). Conseqüentemente, o músico popular podia vislumbrar, já a partir deste período, uma possibilidade de profissionalização através das instâncias que surgiam, ainda que bem poucos obtivessem o êxito e a relativa independência econômica que daí pudessem provir (PEREIRA, 1967). Em 1930, contabilizavam-se exatas quatro estações de rádio na cidade do Rio de Janeiro. Já no final da mesma década, mais oito emissoras de rádio juntaram-se àquelas nesta cidade, e estas eram, dentre as instâncias citadas, os principais meios e locais de concentração do músico popular e de reprodução de sua música (cf. MORAES, 2000, p. 22). Este número de estações duplicaria até a década de cinqüenta, quase atingindo vinte estações. Sem dúvida, neste período, antes do advento da televisão no Brasil, o rádio era o principal veículo de comunicação, possuindo altíssimos índices de audiência, infiltrando-se no grosso da população urbana com seus programas de notícias, humorísticos e o seu veio principal a partir de meados de 1932, a música popular4. A indústria fonográfica beneficiar-se-ia muito deste veículo. Gravando

4 Em 1932, um decreto presidencial de Vargas permite a venda de quotas do tempo de transmissão das rádios para anúncios comerciais, modificando o caráter e a estrutura dos programas transmitidos até então. Passa-se a investir no arrebatamento de um maior número de público ouvinte, através de programas mais “ligeiros” e de feições populares. Aliás, quando do surgimento das transmissões radiofônicas no Brasil (1922-3), palestras, discursos políticos, músicas eruditas e outras atividades “culturais e educativas” representavam a finalidade deste então nobre instrumento de comunicação (CABRAL, 1996, pp. 6-15). Passado este período inicial, com a abertura de novas estações, estas não mais sociedades de mantenedores e amantes do rádio, mas sim estações “semiprofissionais” que visavam o lucro, houve uma modificação profunda nos caracteres dos programas veiculados. Assim, uma programação mais ágil e

2 majoritariamente músicas de teor popular5, as “gravadoras” terão um eficaz meio de divulgação de seus produtos através das rádios, que, em contrapartida, podiam ter seus tempos preenchidos com esta arte-média6 de fácil assimilação já conhecida do grande público, correspondente aos anseios e ao estado de penúria apresentados pelas camadas populares no manejo da cultura então legítima. Simbiose quase perfeita. O público das rádios passava a contar assim, a partir de 1932, com um enorme contingente de desprivilegiados de toda sorte (analfabetos, desempregados, empregadas domésticas, lumpens-proletários etc.), sendo a grande maioria excluída do sistema cultural legítimo. Este público detentor de disposições legitimamente inferiores era o espelho da maioria da população brasileira naquele período7. A existência de uma estrutura objetiva hierarquizante e hierarquizada, que marcava a distância entre as disposições estéticas de camadas distintas da população, permanecia vigente ainda em 1940 entre alguns jornalistas porta-vozes de parcela da elite8. Assim, podemos inferir que o público ouvinte das irradiações da época era constituído por uma maioria desprovida dos capitais culturais legítimos, diferentemente dos primórdios da irradiação no Brasil (1922), em que as já citadas sociedades educativas utilizavam as ondas sonoras para promoverem a música erudita e a “boa” educação popular. Estas camadas

com feições populares reinará quase que absolutamente em todas as estações, aproximando-se do gosto médio da maioria da população urbana do período. 5 Pois, além de outros motivos, os meios de gravação eram extremamente precários e este gênero de música possuía menos dificuldades técnicas para se gravar, tendo em vista o número reduzido de instrumentos e vozes, ao contrário, por exemplo, de uma orquestra de música erudita. Além disso, pululavam compositores e cantores desse gênero nas grandes aglomerações urbanas, o que facilitava a escolha e o preenchimento de repertório. Estes cantores e compositores oriundos das baixas camadas sociais, diga-se de passagem, nada ou quase nada recebiam naquela época da gravadora pelos seus serviços prestados, muito menos pelos inexistentes “direitos autorais”. Ver Tinhorão (TINHORÃO, 1974). 6 A expressão “arte média” é tomada neste trabalho conforme a definição de Bourdieu (in: BOURDIEU, 2001, p. 136): “(...) a arte média, em sua forma típico-ideal destina-se a um público muitas vezes qualificado de “médio” (...) e mesmo quando não se dirige especificamente a uma categoria determinada de não-produtores está em condições de atingir um público socialmente heterogêneo, quer de maneira imediata, quer mediante uma certa defasagem temporal. É lícito falar de cultura média ou arte média para designar os produtos do sistema da indústria cultural pelo fato de que estas obras produzidas para seu público encontram-se inteiramente definidas por ele.” 7 Quando as rádios começaram a montar platéias abertas ao público em seus estúdios (cerca de 1935), a presença constante de mulheres pobres e negras acabou motivando um jornalista a escrever uma crônica em um jornal carioca na década de 1940. Esta crônica chamava a estas pejorativamente de “macacas de auditório”, por causa da cor e do modo “inadequado” pelo qual se portavam, longe do padrão blazé esperado pelo público diferenciado do jornal em questão (cf. PEREIRA, 1967). 8 A aceitação do samba como gênero musical legítimo na década de 1930 por parcela da elite dominante é parte de um processo que foi tomando corpo ao longo de décadas. Não haveria, como alguns autores sugerem (penso em FROTA, 2003), por uma inversão quase que momentânea dos padrões estéticos estruturados na época a legitimação do gênero. O processo foi fruto de muitas lutas ao longo do período visado, envolvendo muitas frações de interessados e diversas instituições, conforme pretendo demonstrar neste capítulo.

3 despossuídas dos capitais legítimos (estéticos e musicais), contudo, manifestavam-se culturalmente, em um primeiro momento, mesmo posicionadas longinquamente das instâncias legítimas de consagração. A configuração existente nas décadas de 1910-30 no domínio das artes no Rio de Janeiro possuía algumas nuances especiais. A começar pelo fato de esta cidade ser a capital da República de então. Diversos atores e instituições no período aí presentes agiram a um só tempo. Contudo, não houve uma orquestração “planejada” no intuito de se legitimar a esfera “popular” de produção artística. Ocorreu sim, aos poucos, através do que Max Weber chamaria de “conseqüências imprevistas9”, a aceitação e a posterior legitimação de formas artísticas não-convencionais, inexistentes na estrutura objetiva e hierarquizada expressada no gosto de parte da elite da época. Fatores externos interfeririam também para que ocorresse a mudança em questão. Ainda que as “altas” artes fossem reinantes nos padrões estéticos da antiga elite da capital da República, a distinta correlação de forças presente no cenário nacional possibilitaria, mais para frente, a imposição em âmbitos estratégicos - político e artístico - de uma visão que legitimaria o “nacional” e o “popular” como expressão real e verdadeira da “alma” da nação, projeto político levado a cabo pelos intelectuais participantes do Estado Novo, principalmente no que toca à música (cf. WISNICK, 1983). Um novo grupo político ascendia ao poder em 1930, coincidindo com a existência anterior de novas idéias estéticas, oriundas de uma parcela já estabelecida de intelectuais-artistas no mesmo período em que o “novo” grupo do poder buscava um “emblema” que melhor representasse suas metas na área das políticas culturais. Houve então um miraculoso encontro entre os interesses governamentais e a cooptação de alguns desses intelectuais-artistas para os seus quadros. A influência de um destes personagens - Heitor Villa-Lobos - para o estabelecimento dos gêneros musicais populares e, dentre estes, o samba - já então com seus contornos semi-acabados e artistas-representantes definidos - nas altas esferas legítimas da música, foi de fundamental importância. Desde 1902 houve a preferência, por parte da gravadora fonográfica pioneira do Brasil localizada nesta cidade, em gravar e comercializar canções de caráter popular. Na década de 1910-20, as opções de diversão pequeno-burguesas contavam com músicas populares oriundas dos negros, tal como as de Sinhô, o “Rei do Samba” da década de

9 (in: WEBER, 2004).

4 1920, que teve diversas de suas canções adaptadas para o teatro de revistas, muito freqüentado por esta camada populacional10. O início da década de 1930 contava com a existência das citadas estações de rádio em pleno funcionamento no Rio de Janeiro, revistas especializadas em música popular11 e uma crítica especialista nas manifestações populares, presente há décadas nos jornais desta cidade. Um gigantesco contingente de desocupados, em sua maioria negros forçados a viver uma paródia brasileira da ociosa “vida de artista12” francesa por intermédio da “invenção da malandragem13”, fornecia o substrato necessário para o grande número de compositores que disputavam entre si a possibilidade de glória e fama na aurora da indústria cultural no Brasil, tanto interiormente às suas comunidades - morros, cortiços, favelas, “boêmia” como bares e agremiações que depois se tornariam escolas de samba - quanto exteriormente, buscando assim um possível lucro econômico, fosse vendendo suas composições para os “cartazes” de então - cantores brancos que possuíam íntimas relações com os meios de reprodução comercial do gênero14 - ou, mais dificilmente, tentando penetrar diretamente o universo das rádios, espetáculos e gravadoras. O elemento artístico popular, ainda que não fosse totalmente reconhecido como detentor de uma legitimidade irrestrita pela hierarquia das artes reproduzida pela elite carioca, já era bem estabelecido em diversos meios e instâncias de consagração musical na década de 1930. E a formatação e ascensão do gênero musical samba carioca, em especial, nada mais é do que o produto de uma das maiores alquimias que envolveu e envolve até hoje agentes e instituições em um moto-perpétuo de engendramento de consagração. Na década de 1910, canais com esta finalidade estavam em formação. É possível neste período identificar alguns dos pilares mais importantes dos primórdios do processo de legitimação do gênero samba, processo este extremamente bem-sucedido dentro das lutas travadas no campo das artes populares, de um modo geral. Mitos locais auxiliares relativos à santificação de personagens e à delimitação do que viria a ser o

10 Não só para teatros de revista, como também nos chamados cafés dançantes e “berrantes” do início do século XX. Em relação à imbricação do nascente gênero popular com esta forma de teatro e a importância de Sinhô para a sedimentação do gênero, ver o trabalho de Cunha (CUNHA, 2004). 11Como a Revista Phono-Arte, existente no período de 1928-31. 12 Tal como a descrita por Bourdieu (cf. BOURDIEU, 1996). 13 Diversos estudos trabalham o tema da malandragem no samba e deste “estilo de vida”. Destaco aqui o de Mattos (MATTOS, 1982) e o clássico de Cândido (CANDIDO, 1970). 14 Como diversas biografias de sambistas da década de trinta mostram, os cantores Mário Reis e Francisco Alves valiam-se do expediente da “compra de ”. Bem posicionados na indústria cultural em vias de estabelecimento, esses “cartazes” compravam composições de sambistas que passavam por situações econômicas difíceis, como citado por em Silva e Oliveira Filho (SILVA E OLIVEIRA FILHO, 2003) e por em Máximo e Didier (MÁXIMO e DIDIER, 1990).

5 gênero foram, no princípio, justamente os produtos simbólicos do surgimento de uma crítica especializada, fixadora primeva do nomos do gênero popular que estava sendo criado e das fronteiras e demarcações internas que nele eram estabelecidas. III - AS ORIGENS DA ORIGEM A capital, na década de 1910, era local de reuniões “informais”, onde negros favelados ou encortiçados reproduziam suas manifestações culturais até então não reconhecidas pelos membros da elite carioca, como Rui Barbosa, que a respeito de uma canção popular de relativo sucesso na época - Corta-Jaca, de autoria de Chiquinha Gonzaga -, proferiu em 1914 do alto de sua cátedra senatorial: “(...)A mais baixa, a mais chula, a mais grosseira de todas as danças selvagens, a irmã gêmea do batuque, do cateretê e do samba.”15 Não obstante a freqüência deste tipo de declarações e comentários réprobos efetuados por parte da citada elite, as reuniões informais que tomavam lugar nas zonas centrais da capital contavam muitas vezes, a partir da década de 1910, com a inusitada presença de ilustres artistas e intelectuais ascendentes na época (Heitor Villa-Lobos, Mário de Andrade, Manuel Bandeira, Jaime Ovalle, Ascenso Ferreira, Raul Bopp), vanguardistas franceses (Darius Milhaud, Blaise Cendrars), políticos (Pinheiro Machado), e jornalistas (Prudente de Morais Neto), dentre outros16. Estas reuniões, datadas desde a chegada de um grande contingente de negros forasteiros atraídos para a capital (século XIX, após a abolição da escravidão) foram alvos de atenção conferida por diversas forças e instâncias na aurora do século XX. É impossível precisar nas décadas anteriores à de 1930 - marco impreciso da consumação do processo de legitimação do gênero popular junto aos meios de comunicação e demais instâncias difusoras -, apenas um ponto de força que tivesse prevalecido sobre os demais para que ocorresse a legitimação do gênero. Entretanto, neste período havia personagens identificáveis, que facilitaram e participaram ativamente da quase que miraculosa escolha do samba como gênero musical principal a ser gravado pelas indústrias fonográficas e executado nas rádios da época17.

15(in: SANDRONI, 2001, p. 89). 16 Vianna (VIANNA, 2004) fornece outros nomes importantes da época que mantinham contatos com os produtores destas manifestações populares. 17 Contabilizava-se entre 1931 e 1940 a gravação efetuada pelas indústrias fonográficas aqui presentes de 6706 novos discos 78 rotações. Dentre estes, 2176 foram registrados como pertencentes ao gênero samba, ou precisamente 32,45% da totalidade de gravações (in: FROTA, 2003, p.44). Nota-se que a prevalência do gênero samba nas gravações de discos somente se dá na década de trinta. Até então, diversos gêneros (que depois seriam “padronizados” no formato samba, processo este que a própria rádio auxilia) eram gravados dentro de um espectro de nomes como “maxixe”, “polca”, “tango brasileiro”, etc. Na década de

6 Polca brasileira, maxixe, choro, tango brasileiro, lundu, batuque, chula, cateretê, macumba, capoeira, jongo, marcha etc, eram algumas de um repertório extenso de classificações que intentavam apreender os ritmos musicais produzidos por estes negros no Rio de Janeiro, antes e na própria década de 1910. A confusão estabelecida nos primórdios da legitimação do gênero em relação à nomenclatura que este teria pode ser percebida em uma entrevista-debate armada por Sérgio Cabral na década de setenta entre dois sambistas “fundadores” do gênero. De um lado estava um membro das reuniões da casa da Tia Ciata, Donga, o compositor do considerado “primeiro” samba. De outro estava , fundador da considerada “primeira” escola de samba, a “Deixa Falar”, que se autodeclarava “inventor do samba”. Ismael dizia que o samba existente na casa da Tia Ciata não era samba, mas sim Maxixe. Já Donga dizia que as composições de Ismael, por sua vez, é que não eram samba, mas sim marcha (in: TINHORÃO, 2004, p. 294). Ainda sobre as confusões terminológicas da época, João da Baiana, outro membro das reuniões da casa de Tia Ciata, declarava que “(...) Antes de falá (sic) samba, a gente falava chula (...) Podia chamá (sic) chula raiada ou samba raiado. Era a mesma coisa. Tudo era samba de partido alto.”18.. Acabou na história vencendo o denotatore “samba”19, arbitrariamente. A justificativa oficial seria a de que um dos membros de um dos locais em que se executavam estes ritmos, freqüentado por intelectuais-boêmios e políticos, registrara por engano uma composição de enorme sucesso posterior no carnaval de 1917 com a denominação “samba” na repartição oficial que cuidava das partituras e dos direitos autorais da época20. Havia, porém, outras canções registradas com a mesma nomenclatura nesta repartição bem antes de 1917, que restaram à margem da história

trinta, estes praticamente desapareceriam (Penso que foram incorporados à nomenclatura “samba”, em um primeiro momento, para depois darem espaço ao formato musical vencedor do “samba”. Porém, é um processo do qual não existem pesquisas a respeito). 18 (in: TINHORÃO, 2004, p. 267). 19 Samba é uma palavra que traz muitas discordâncias em torno de sua origem. Alguns dicionários, como o de Dourado (DOURADO, 2004), trazem-na como oriunda de “(...)semba, que em dialeto africano de Luanda denomina uma dança como a umbigada”, p. 289. Ou seja, seu conteúdo semântico de início designava uma dança, e não um gênero musical, como veio a se tornar. Como um outro dicionário (DICIONÁRIO DE MÚSICA ZAHAR, 1985, p. 333) bem descreve, “Há variantes regionais do samba por todo o Brasil”. Ou seja, para mim, pouco importaria toda a discussão sobre as origens da palavra, do dialeto, etc., travada entre os hierocratas do campo. Antes, desejo apenas demonstrar que há uma inexatidão inexorável que conferiu a uma determinada forma de manifestação popular urbana musical uma nomenclatura qualquer que conveio naquele contexto (como delinearei mais para frente), que aparece muitas vezes na história também como a execução de ritos religiosos, de rodas de capoeira, etc. 20 Mas que na verdade seria um “maxixe”, segundo as palavras de um de seus autores, ou então uma “marcha”, segundo foi anunciada na gravação em disco daquele mesmo ano.

7 (cf. SANDRONI, 2001, p. 118). Ocorreram assim muito mais escolhas arbitrárias por trás dos bastidores do que apenas este pequeno equívoco. A composição era de Donga (Ernesto dos Santos) e Mauro de Almeida, denominada “Pelo Telefone”, vindo à luz no local que ficou sendo considerado a “matriz” do samba nacional, a casa de Tia Ciata21, uma das muitas baianas desse tempo presentes no Rio de Janeiro que promoviam festas religiosas animadas por manifestações musicais abertas a um público relativamente “externo” em sua casa22. Segundo , músico participante destas reuniões, nos aposentos dianteiros, próximos à rua, o estilo de música tocado era algo parecido com o “choro”, gênero centrado na melodiosa combinação de instrumentos de corda e flauta, contando - nem sempre - com apenas um instrumento de percussão (pandeiro), executado de uma maneira mais próxima aos gêneros legítimos da elite carioca de então23. Já no quintal desta casa, concomitantemente à execução do choro na sala dianteira, era comum a “batucada”, manifestação animada por ritmos predominantemente mais ruidosos, que contavam com muitos instrumentos de percussão e letras de feição popular, geralmente com elementos religiosos - do que também viria a ser legitimado como - “afro- brasileiros”. Destaca-se que no Rio de Janeiro da época vários focos desta mesma espécie de manifestação podiam ser encontrados, tanto em morros que concentravam uma população negra favelada quanto em pontos suburbanos da cidade, mais especificamente em bairros e distritos no que depois viria a ser a Zona Norte (cf. LOPES, 1992).

21 Sobre esta figura, diz o dicionário da MPB:“(..)Tia Ciata tirava seu sustento da cozinha típica baiana. Ela vendia quitutes em seu tabuleiro entre as ruas Uruguaiana e Sete de Setembro, e também no Largo da Carioca. Logo se destacou entre as baianas festeiras introdutoras da dança do (sic) sombra no Rio de Janeiro, e passou a promover sessões de samba em sua casa, na qualidade de Babalaô-omin. Realizava igualmente rituais de culto aos seus orixás africanos. Cada vez mais popular, Tia Ciata recebia em sua casa um grande número de políticos, boêmios, músicos e batuqueiros que lá iam saborear seus pratos típicos, principalmente sua moqueca. Foi numa destas reuniões que nasceu o samba "Pelo telefone", de Donga e Mauro de Almeida(...)”(In:http://www.dicionariompb.com.br/verbete.asp?tabela=T_FORM_B&nome=Tia+Ciata). 22 Para reforçar a arbitrariedade da escolha do local único como verdadeiro “berço” do samba, posso citar os nomes de outras “tias” baianas que promoviam festas similares às de Ciata em suas residências próximas à Praça Onze no mesmo período, como Tia Gracinda, Tia Prisciliana de Santo Amaro (mãe de João da Baiana), Tia Amélia (mãe de Donga), Tia Dadá e Tia Maria Adamastor (in: MÁXIMO e DIDIER, 1990, p. 117 e TINHORÃO, 2004, p. 275). 23 Cumpre lembrar ainda que este gênero musical, diferentemente do samba, já havia conseguido um espaço de legitimação junto a uma parcela da elite local já no século XIX, principalmente por ser uma fusão de gêneros “superiores” na escala legítima da época. Poderia constituir-se em mera execução de alguma música erudita ou semi-erudita, tais como valsas de Chopin, com mesclas de instrumentos rebaixados simbolicamente como o violão e o cavaquinho, e a legítima flauta. Seus executantes, em sua maioria, eram constituídos por brancos ou mestiços - músicos de bandas militares, funcionários públicos com conhecimento formal de música e outras parcelas médias da população - sendo muitas vezes executado nos mesmos salões em que se tocavam (cf. VIANNA, 2004 e TINHORÃO, 2004).

8 Entabulando contatos estreitos com os produtores das manifestações musicais desta casa especificamente, alguns personagens do “mundo civilizado” do Rio de Janeiro muito contribuíram para a reprodução de uma “aura” ao longo da história concernente ao local, às figuras e à nomenclatura escolhida para o mito fundador e, principalmente para o meu interesse na pesquisa, a classificação formal-geográfica do gênero que tanto aparecia em gravações e que depois se entronizaria nas rádios. Figuras posteriormente dominantes no mundo do samba e do choro como Pixinguinha, Donga, Sinhô, João da Baiana, Heitor dos Prazeres e tantos outros, faziam parte desse considerado “primeiro grupo de produtores do gênero” (os “pais do samba e das fontes legítimas do próprio”). A busca por serviços mágico-religiosos, comida e música mesclava-se entre os divergentes interesses dos agentes presentes por lá. Dentre os intelectuais, havia dois grupos de aí imiscuídos. Um formado por artistas maiores e políticos, os quais a literatura especializada não se cansa de citar24. Já o grupo de intelectuais-párias presentes não só nesta casa, como em diversos outros recintos de manifestação da cultura popular no Rio de Janeiro no mesmo período, foram esquecidos ou rebaixados a um papel secundário por biógrafos e literatos que trataram do tema. Artífices principais de uma primeira “reportagem” ao mundo dos brancos do que ocorria nestes pontos ermos e distantes da realidade da maioria do público carioca leitor de jornal da época, estes intelectuais menores, que faziam as vezes de “orgânicos”, no linguajar Gramsciano25, passam a valorizar, classificar e delimitar no nível formal as manifestações populares do período, especialmente a dos negros. A presença de tais intelectuais-párias – sobretudo jornalistas participantes da reprodução das manifestações populares - aos poucos foi legitimando, através de espaços que vinham se constituindo como o rádio - caso de Almirante -, periódicos “respeitáveis” - casos de Vagalume, Mauro de Almeida e Orestes Barbosa - e livros hagiográficos da época, o direito de existir do gênero popular, definindo conceitualmente o que era e o que deixava de ser “samba” propriamente dito, estabelecendo assim parâmetros e distinções dentro do gênero que se encontrava quase que delimitado formalmente com a presença, a partir de 1930, de todo o aparato institucional da indústria cultural brasileira e da tomada de poder do Estado Novo. Estes

24 Basta consultar trabalhos como o de Vianna (VIANNA, 2004), Fenerick (FENERICK, 2002) e Cunha (CUNHA, 2004), entre outros. 25 (GRAMSCI, 1978, pp. 3-23).

9 intelectuais menores mantinham estreitos contatos com personagens de camadas sociais inferiores, negros em sua maioria, que figuravam no cenário musical com suas manifestações populares no ambiente urbano. IV – INTELECTUAIS MENORES Destaco neste ponto a existência exclusiva no Rio de Janeiro de boêmios- intelectuais-jornalistas possuidores de estreitos vínculos com os produtores das manifestações populares que então eram reproduzidas, ao melhor estilo João do Rio. Para que o elemento artístico popular passasse a representar simbolicamente o país, foi imperativa a ocorrência de um processo intermediador que tenha “ajustado” de uma maneira ou de outra a discrepância entre as disposições de uma elite em tese não ajustadas de forma automática à celebração desse fato - vide reportagens de teor grosseiro e preconceituoso e declarações como a de Rui Barbosa26. Um trabalho simbólico de classificação e denominação, artífice pioneiro da legitimação do gênero em questão, preparou a recepção e as disposições de uma parcela da elite que posteriormente viria até mesmo a patrocinar a imposição desta nova forma e domínio estético musical. Este processo fornecia seus prolíficos frutos já nas décadas de 1920- 30, através da ação de figuras como jornalistas de segundo escalão - repórteres policiais, cronistas etc -, com formação educacional precária ou técnica na maioria das vezes. Estes freqüentavam os diversos pontos de manifestações culturais dos negros na cidade, possuindo laços de amizade com muitos deles. Não eram necessariamente compositores de samba, mas sim admiradores daquelas já conhecidas manifestações. Há uma relativa escassez de informações a respeito de alguns destes personagens na história27. Falo de figuras como Vagalume (sic) (Francisco Guimarães, carioca, 188?- 1946), negro, capitão honorário da guarda nacional, jornalista e repórter que mantinha

26 Citaria também uma interessante reportagem de um jornal do nordeste que criticava a ida do grupo de Pixinguinha, “Os Oito Batutas”, para uma excursão internacional na França na década de 20. O jornalista retrata o grupo pejorativamente como “a pretalhada”, discorrendo sobre o perigo de sermos conhecidos através do ritmo “selvagem” que eles demonstrariam, rogando às autoridades que não permitissem tamanho vexame internacional. Sobre os mesmo Oito Batutas, um maestro, Julio Reis, declarou, em relação à exibição do grupo nos cinemas da época na capital “(...) ser a música nacional inadequada aos educados ouvidos da aristocrática freqüência dos cinemas”. (in: VIANNA, 2004, p. 115). 27 Escassez esta um pouco remediada no final de 2005, com o lançamento da biografia de Orestes Barbosa (DIDIER, 2005). Quanto à tipologia destes personagens, ressalto o que maior destaque alcançou: João do Rio (1881-1921), cronista, jornalista e repórter especializado na descrição poética dos lugares e costumes da população marginal do Rio de Janeiro do início do século XX. Inspirado nos cronistas parisienses, como Jean Lorrain, Michel-Georges-Milchel, Jules Bois, cronistas de jornais como “Le Figaro” e escritores, João do Rio inaugurou este tipo de crônicas a partir do flanar por locais inóspitos da metrópole nascente. Alcançou prestígio intelectual para a época, tendo ocupado uma das cadeiras da Academia Brasileira de Letras. Orestes Barbosa, um de seus admiradores e seguidores, tentou, ao cabo, obter a vaga de João do Rio na ABL, sem alcançar o resultado. Ver Didier (DIDIER, 2005) e Rodrigues (RODRIGUES, 2000).

10 uma coluna semanal no Jornal do Brasil e n’A Tribuna desde os primeiros anos do século XX, coluna esta que tratava de trazer à tona reportagens variadas e que terminavam por retratar o ambiente musical popular, os locais e os personagens do Distrito Federal em que e por meio das quais estas manifestações tomavam lugar. De origem humilde, teve dificuldades no acesso à escola quando criança. Mesmo assim cursou o Instituto Profissional do Rio de Janeiro. Suas reportagens sobre as manifestações musicais populares seguiam o padrão da época. Demasiadamente opinativas, estabeleceram um ponto de vista exclusivo que veio firmar os parâmetros legítimos do que deveria ser considerado samba ou não. Trabalhou em diversos jornais cariocas durante cerca de 50 anos. Francisco Guimarães “Foi pioneiro ao criar uma coluna sobre notícias carnavalescas no Jornal do Brasil, logo imitada por outros jornais, no qual assinava com o pseudônimo de Vagalume. Publicou "Na roda do samba" (Rio de Janeiro: Tipografia São Benedito) em 1933, no qual contou a história do samba, de seus criadores e intérpretes mais importantes. O livro foi reeditado várias vezes pela Funarte.(...)28” O boêmio autor de “Na roda do samba”, livro pioneiro de 1933, biografia do gênero que surgia e das figuras do meio, era freqüentador e folião, desde priscas eras, dos famosos “ranchos” carnavalescos da época29, no caso, um dos mais famosos, o “Ameno Resedá”, que lhe dedica uma nota biográfica já em 1916, elogiando seus serviços jornalísticos. Por meio destes ranchos, firma contato com vários dos reprodutores destas manifestações populares, dentre eles alguns do grupo da casa de Tia Ciata, como Donga, Sinhô, Heitor dos Prazeres, João da Baiana, Mauro de Almeida etc., passando a freqüentar os mais diversos locais em que as manifestações culturais populares ocorriam. Talvez o primeiro a registrar na escrita uma divisão interna ao gênero, classificando como samba “puro” o do morro, e samba “desvirtuado” o executado nas rádios. Enfim, Vagalume queria definir com precisão o gênero nascente em seu livro30.

28http://www.dicionariompb.com.br/verbete.asp?tabela=T_FORM_B&nome=Vagalume#topo 29 Segundo Dourado (DOURADO, 2004, p. 272), Rancho: agrupamento de carnavalescos que teve origem nos TERNOS e RANCHOS nordestinos das comemorações natalinas do final do séc. XIX. De influência portuguesa e africana, pode ser entendido como os primeiros passos organizados da FOLIA, que culminou, nos anos 1930, com o surgimento das escolas de samba, que praticamente determinaram seu desaparecimento. 30 Conforme as palavras de Napolitano e Wasserman (in: NAPOLITANO e WASSERMAN, 2000, p.170): “Na verdade um dos primeiros impulsos para o debate sobre as origens da música urbana veio da obra de Francisco Guimarães (Vagalume) (...). Na esteira da polêmica entre os sambistas, sobre a divisão rítmica "correta" que deveria caracterizar o samba - a oriunda do maxixe ou da marcha - Vagalume tentou estabelecer certos princípios básicos para definir não só o lugar social do samba, mas seus fundamentos

11 Pode-se assim constatar, já em 1933, uma divisão clara entre um gênero já constituído, com suas regras próprias construídas ao longo das décadas antecedentes por estes mesmos personagens que agora passam a disputar a hegemonia do que seria ou não o gênero “verdadeiro”. Quando da entrada maciça da indústria cultural, organizava- se já no período um sub-gênero existente pretensamente para um consumo restrito, longe das indústrias fonográficas da época, de agentes que ocupavam uma posição simbolicamente superior no campo que se estabelecia, de conaisseurs, conforme podemos depreender desta passagem do livro de Vagalume: “(...) O samba não é o que os literatos pensam. É uma coisa toda especial, com a sua toada própria, com o seu compasso natural (em geral é o binário) e umas tantas exigências, que só os ‘catedráticos’ conhecem (...)”31. Mesmo assim, é notório o intuito classificatório destes agentes, sendo que suas formas são construídas relacionalmente às distinções do gênero em formação com respeito às outras manifestações existentes: “O que os poetas fabricam, são modinhas que estão longe do que, antigamente, escapando à classificação de samba, tinha a denominação de ‘lundu’. O samba, é irmão do batuque e parente muito chegado do cateretê; é primo do fado e compadre do jongo...”32 Eis a “linha evolutiva” do gênero segundo Vagalume, que não perde a ocasião e também elege seus personagens para o panteão que já se formava: “O primitivo samba era o ralado, com aquele som e sotaque sertanejos. Depois, veio o samba corrido, já melhorado e mais harmonioso e com a pronúncia da gente da capital baiana. Apareceu então o samba chulado que é este samba hoje em voga; é o samba rimado, o samba civilizado, o samba desenvolvido, cheio de melodia, exprimindo uma mágoa, um queixume, uma prece, uma invocação, uma expressão de ternura, uma verdadeira canção de amor, uma sátira, uma perfídia, um desafio, um desabafo, ou mesmo um hino! É este samba de hoje, de Caninha, de Donga, [Heitor dos] Prazeres, João da Baiana, Lamartine [Babo], Almirante, Pixinguinha,

estéticos. (...) O livro de Guimarães delimitava um lugar social para o samba que fosse, ao mesmo tempo, garantia de uma marca estética indelével: o "morro" surge como um território mítico, lugar da "roda" onde se praticava o "verdadeiro" samba. As afirmações de Francisco Guimarães tinham um alvo claro: a denúncia da indústria fonográfica, que estaria matando o samba autêntico, ao usar e abusar do rótulo. A imagem da "roda de samba" voltaria à cena musical em vários momentos da história da música brasileira, sempre utilizada como imagem crítica à industrialização e à individualização da criação e audição musicais. A "roda de samba" seria o lugar de uma fala musical coletiva, "pura", "espontânea", onde a criatividade daquele grupo social que estaria na origem do samba, era recolocada, quase como um rito de origem(...)”. 31 (in: GUIMARÃES, 1978, p.51). 32 Idem, p. 29

12 Vidraça, Patrício Teixeira, Salvador Corrêa, muitos outros e que constitui – o reinado do grande mestre, do saudoso, do inolvidável – do imortal Sinhô33. Nesse período, portanto, o samba já contava com uma divisão estrutural interna, correlata à implementação da indústria cultural no país, apontando assim para o estabelecimento de um campo relativamente autônomo de produção artística. De um lado, um gênero que, segundo este “regrador” do samba, estava acossado pelo perigo comercial do rádio, dos grandes tentáculos da indústria fonográfica e dos ladrões de composições alheias, onde ele aproveita para alfinetar o cantor Francisco Alves, o Chico Viola, campeão de vendas de discos da época. Eis esta passagem: “O que hoje há por aí, tem apenas o rótulo, é um arremedo de samba”.34 “Onde morre o samba? (...) Quando ele passa a ser artigo industrial – para satisfazer a ganância dos editores e dos autores de produções dos outros. O Chico Viola, por exemplo, é autor de uma infinidade de sambas e outras produções que agradaram, saídas do bestunto alheio”.35 De outro estava o samba “puro”, dos morros, dos verdadeiros sambistas, que nenhum literati poderia dominar ou conhecer com seus saberes especificamente acadêmicos. “Filho legítimo dos morros, o samba, por mais que queiram – não morrerá, não perderá o seu ritmo. Os sambestros, que são os fazedores de músicas de samba, rivais dos maestros...procuram desviá-lo mas, ainda há gente nos morros que exige, que pugna, que vela, que mantém e fará respeitar a ‘toada’, do samba tão nosso, tão brasileiro, porque o ‘cateretê’, o batuque e o ‘jongo’, não são africanos.”36 Era uma outra espécie de academia que se anunciava, a academia do samba, tendo como um de seus sócio-fundadores o próprio Vagalume. Eis que a imposição do gênero popular se encontrava em um estágio institucional apropriado para o estabelecimento interno de divisões. Ou seja, o campo deste gênero musical popular possuía já neste período uma relativa autonomia. Uma parcela dos participantes desta esfera restava à margem da indústria cultural nascente, transfigurando uma relação despreocupada, da “arte pela arte” de uma maneira abrasileirada. Outra parcela, a dos participantes mais ativos da indústria, incorporava a imagem comercial, interessada, dentro de uma divisão interna à estrutura que se formava do trabalho social artístico. Os pólos opostos de produção artística reproduziam-se, a partir daí, por meio dos

33 Ibidem, p. 28 34 Ibidem, p. 29 35 Ibidem, p. 31 36 Ibidem, p. 30

13 julgamentos que os agentes internos ao campo do popular já estabelecido emitiam. A definição formal do gênero nascente era ponto primordial na discussão realizada pelos intelectuais do campo na época, no caso em 1933, quando a imposição do delineamento “correto” do gênero e dos personagens que depois viriam a figurar no panteão mitológico estavam em disputa, em meio a um rebuliço causado pela repentina massificação que estava sendo levada a cabo pelas novas instâncias: o rádio e a indústria fonográfica pós-192737. Mauro de Almeida (1882-1956) era mais um personagem que transitava entre os mundos “civilizados” e o das manifestações culturais dos negros. Teatrólogo, jornalista e letrista, entrou para a história da Música Popular Brasileira por ter escrito parte da letra da já citada "Pelo Telefone".Começou a carreira de jornalista na redação de A Folha do Dia, como repórter policial e cronista carnavalesco, ramo do jornalismo que o consagraria. Escreveu diversas peças de teatro, dentre as quais: "Presidente antes de nascer", "Adeus", "Não lhe pague", "Amor e modas", "Viúva alegre", "Com a corda no pescoço", "Desarvorada do amor", "Do cruzeiro ao cruzeiro", "Cozinheira granfina", "Decadência", "Sempre chorada", algumas delas feitas em parceria com Luís Rocha e Cardoso de Meneses. Foi sócio fundador da Sociedade Brasileira de Autores Teatrais - SBAT (1917). Publicou uma coletânea de peças curtas, denominada "Ondas teatrais". Manteve uma coluna no jornal A Rua, usando o pseudônimo de "Peru dos Pés Frios", pelo qual era conhecido nos clubes carnavalescos que freqüentava. Em 1918 compôs também com Pixinguinha e Donga o samba "O malhador", gravado por Baiano na Odeon. Personagem que desempenhara função similar, sem embargo ocupando posição oposta no espectro do campo que se formava, seria Orestes Barbosa. Carioca (1893- 1966), branco, jornalista, compositor, poeta e escritor. Candidata-se (sem sucesso) à Academia Brasileira de Letras em 1922. Orestes Barbosa era oriundo de uma família de classe média remediada de Vila Isabel, ao contrário de Vagalume, de ascendência negra e situação econômica precária. Filho de um major, Orestes não freqüentou a escola durante a sua infância, sendo alfabetizado por um vizinho, Clodoaldo de Moraes, pai de Vinícius de Moraes, que também lhe ensinou os primeiros acordes no violão. Freqüentou a partir dos doze anos de idade o Liceu de Artes e Ofícios, onde aprendeu a profissão de revisor. Aos quatorze anos emprega-se no jornal O Século, dirigido por Rui

37 Ano que marca o advento da gravação elétrica no país, o que significou um ganho enorme de qualidade e simplicidade nas tecnologias de gravação de então.

14 Barbosa, com quem entabula relações amistosas. Trabalhou nos jornais A Gazeta de Notícias, A Manhã, O Radical, Opinião, O Mundo, A Hora, O Avante, A Folha, A Noite, O Dia, A Notícia, O Globo, Diretrizes, A Pátria e A Imprensa. Em 1917 estréia com um livro de poesias, o qual o credencia para em 1920 ir a Portugal como correspondente de um jornal entrevistar Teófilo Braga e Guerra Junqueiro. Ativista, foi preso algumas vezes por criticar publicamente associações políticas oficiais. Inaugura na década de 1920 uma coluna no jornal “A Manhã” relativa exclusivamente aos programas radiofônicos da época. Soma ao todo em sua carreira quase vinte publicações em livros, entre prosas, poemas, crônicas, relatos e biografias. Escreve em 1933 um livro denominado “Samba: sua história, seus poetas, seus músicos e seus cantores” sua versão hagio-biográfica do aparecimento do gênero urbano. Diferentemente de Vagalume, Barbosa acreditava que o rádio era um ótimo instrumento para dar a conhecer o verdadeiro ritmo carioca, a identidade mais brasileira de todas38. Orestes Barbosa mantinha relações com um grupo de sambistas diferente do de Vagalume, ocupando uma posição um tanto distinta na sociedade: era um poeta e prosador, enfim, um literato - ainda que menor - reconhecido, não apenas um repórter negro e folião. Inicia suas composições na área da música popular em 1930, após travar contato mais íntimo com Noel Rosa (cf. MÁXIMO e DIDIER, 1990). Como parceiros, teve os grandes “cartazes” do samba, os quais já vendiam muitos discos e eram conhecidos do público mesmo antes da entrada maciça do gênero samba nas rádios: falo de consagrados do porte de Sílvio Caldas, Francisco Alves, Custódio Mesquita, Wilson Batista, entre outros. De acordo com sua posição de classe e sua inserção no cenário musical, Barbosa não efetuaria a divisão do gênero popular entre “autêntico e inautêntico”, tal como o fez Vagalume. Estando desde os primórdios de suas tomadas de posição artísticas no campo da música encalacrado com o universo radiofônico e com o grupo dominante das rádios

38 Conforme Napolitano e Wasserman (in: NAPOLITANO e WASSERMAN, 2000, p.170): “(...) Orestes Barbosa, cronista e compositor, apresentava uma visão diferente à de Guimarães, afirmando que o samba era um patrimônio da cidade do Rio de Janeiro como um todo (e, no limite, a própria síntese da brasilidade). Numa linguagem triunfalista e nacionalista, ela afirmava que o "samba é carioca", embora tenha "nascido no morro". Cada região da cidade do Rio de Janeiro havia "temperado" as marcas desta origem, criando um idioma musical próprio. Este encontro, para Barbosa, era o fundamento do sucesso popular do samba. "No morro vive um lirismo exclusivo, uma filosofia estranha, como que olhando a claridade do urbanismo que, afinal, olha para cima, atraído pelas melodias, e sobe, então, para buscá-las e trazê-las aos salões". Concluindo que o samba era uma "síntese de inteligência", Orestes Barbosa (e neste ponto, surge mais uma diferença em relação a Francisco Guimarães) via no rádio um grande impulso para a afirmação deste novo gênero, entre tangos e foxes, os outros dois gêneros vigorosos da época.

15 de então, defenderia uma outra idéia de “pureza”, a da música popular essencialmente carioca e de seus personagens. “O samba tem no rádio um grande servidor. O rádio é, no momento, um problema descurado por parte do poder. A cidade, que tanto lhe deve, precisa igualmente voltar para ele as suas vistas, prestigiando, colaborando para que ele cumpra as suas finalidades em prol do progresso geral.”39 Em uma espécie de elegia ao conjunto da cidade do Rio de Janeiro, Barbosa amaina os conflitos postos por Vagalume que, ao contrário deste, enxergava apenas uma fonte “pura” do samba: os negros, preferencialmente os originários de “morros”. Barbosa realiza comparações com gêneros já legitimados e consagrados de outros países, colocando o samba no mesmo patamar, não sem antes evocar a característica natural dos cariocas - destituindo assim o negro da posição exclusiva e principal de criador das “origens” do gênero, ao contrário de Vagalume: “O samba é carioca. A emoção da cidade está musical e poeticamente definida no samba”.40 “(...)Das misturas que o Rio tem, vem a sua música própria – o samba, que é tão nosso como a romanza é italiana, o tango é argentino e a cançoneta é de Paris.(...) O carioca, aliás, é originalmente músico, desde as tabas dos seus índios.”41 Em relação à confusão existente na definição “verdadeira” do gênero samba, eis estas passagens esclarecedoras da situação anterior ao lançamento dos livros que passavam a definir e a problematizar o gênero em formação: “Desaparecida a valsa, tomaram lugar saliente os tangos de Ernesto Nazareth. O tango era o samba. Havia medo de dizer o vocábulo, como já bem antes haviam sido polca, lundu e maxixe todos os sambas do tempo do Imperador.”42 “O samba, que não é batucada, nem choro, nem lundu, nem cateretê, nem rumba (que é antilhana e vive também no Rio Grande do Sul), surge característico no carnaval, ao lado das marchas, que são sambas com uma ligeira modificação”.43 Como para Vagalume, a definição do gênero, do local originário, a delimitação do formato e dos personagens principais neste momento era algo primordial a ser realizado, tendo em vista a inserção do gênero em formação nos circuitos de legitimação de larga-escala que ocorria. Interessante também nesta história é que ambos

39 (BARBOSA, 1978, p. 111). 40 Idem, p. 11 41 Ibidem, p. 15 42 Ibidem, p. 18 43 Ibidem, p. 23

16 os livros foram lançados quase que concomitantemente, mostrando assim que a divisão aplicada aos conceitos e classificações efetuadas por estes repórteres-sambistas eram antagonismos incrustados nas estruturas de um campo de produção artística popular que estava em franca formação, e que eles muito colaboraram em sua delimitação simbólica, na demarcação de suas fronteiras e no linguajar específico posterior que expressaria as disputas interiores ao gênero. Em relação à questão das origens, ambos concordavam com a localização primeva nos morros do “nascimento” do gênero. Sem embargo, Barbosa enxergava os morros como apenas mais um dos diversos locais intrínsecos formadores da cidade maravilhosa, enquanto Vagalume enfatizava a diferença existente entre estes locais e os da cidade que se apropriavam comercialmente dos produtos de lá advindos. Vagalume assim, na segunda parte de seu livro, elege alguns morros os quais seriam os “berços” do samba, demonstrando maior entrosamento com paragens que passam a constituir a geografia oficial do samba no Rio do que Barbosa, que os descreve poeticamente e de forma distanciada. Em relação à eleição dos que seriam os “fundadores”, a “velha guarda”, ambos citam praticamente os mesmos nomes daqueles que freqüentavam as festas de Tia Ciata em sua casa na Praça Onze: Sinhô, Donga, Pixinguinha, João da Baiana etc., dando margem para a definição local mais exata que será verificada posteriormente, quando a crítica especializada já constituída confirmaria a eleição da casa da Tia Ciata como o “berço” principal. Há, contudo, uma relevante diferença na ênfase dada à importância de determinados personagens. Enquanto Barbosa prefere ater-se à elegia do grupo ligado a Noel Rosa e à escola de samba Estácio de Sá - Ismael Silva, Brancura, Nilton Bastos etc. -, Vagalume elege os sambistas do estilo “antigo”, ligados à casa da Tia Ciata em detrimento dos “novos” sambistas, - Ismael Silva, Noel Rosa e Alcebíades Barcellos, o Bide -, que são identificados como sambistas industriais dos discos da Victor (in: Sandroni, 2001, p. 135). A diferença aprofunda-se quando estes passam a tratar de alguns personagens de suas atualidades, tal como Francisco Alves. Conforme já visto, enquanto Vagalume tinha ojeriza por esta figura, espezinhando-no em diversas passagens de seu livro, Barbosa simplesmente descreve-o como “(...) O maior cantor do Brasil”44.

44 Ibidem, p. 44

17 Francisco Alves era talvez o cantor de maior sucesso comercial naquele período. Saudado pela potência de sua voz, não possuía grandes dotes para a composição. No entanto, de acordo com o testemunho de diversos agentes da época, comprava o direito de colocar o seu nome como autor em diversas canções. Geralmente, visitava compositores em difícil situação financeira para propor-lhes uma negociata. Muito próximo ao mesmo grupo de Orestes Barbosa, interpretou diversas canções suas. Ambos pertenciam, de um modo geral, a um grupo que detinha grandes conhecimentos e relações com as empresas comerciais da época difusoras dos gêneros populares - indústria fonográfica e rádios, primordialmente. Denominado por Frota (cf. FROTA, 2003) de “Grupo de Noel Rosa”, este era formado em sua maioria por pequenos burgueses brancos de Vila Isabel. Deste grupo, destaca-se o próprio Noel Rosa (1910-1937), autor de diversas composições conjuntas com nomes como Ismael Silva, Cartola e o próprio Orestes Barbosa - com quem compôs um curioso “Samba” do positivismo”. Possuía um estilo de vida “malandro”, boêmio e desregrado para os padrões da época, principalmente levando-se em consideração sua posição na sociedade - estudante de medicina -, bem diferente dos “negros de morros”. Dentre os membros do grupo, possuidores de maiores capitais educacional, cultural e social do que o pessoal do “morro”, exercia a liderança um personagem conhecido como Almirante, Henrique Foréis Domingues (1908-1980), jornalista, escritor, cantor, compositor, radialista, musicólogo, pesquisador e produtor radiofônico. Estudou contabilidade. Em 1929, formou com , Noel Rosa e Henrique Brito o conjunto musical “Bando de Tangarás”, que muito sucesso faria posteriormente. Integrou o quadro de programas da Rádio Nacional como radialista. Inventor de uma nova espécie de arranjo para a gravação da época, levou o chamado “batuque” - instrumentos de percussão tocados em sua maioria por ritmistas de “morros” - para os estúdios em 193045. Gravou com seu “Bando de Tangarás” uma marcha-exaltação à pessoa de Getúlio Vargas em 1931, marcha esta composta por

45 Este grupo possuía estreitos contatos com os compositores da escola de samba Estácio de Sá. Ismael Silva, por exemplo, fundador desta escola, se arrogou o título de inventor do samba, pois foi ele quem criou um formato que depois iria ser consagrado no rádio e nos carnavais: trata-se de uma espécie de samba com uma forte marcação rítmica sincopada, utilizando um instrumento de timbre grave, uma espécie do que hoje seria conhecido como “surdo”. Dizia ele que com a introdução deste instrumento todos os componentes da escola de samba podiam seguir o ritmo durante todo o desfile. Almirante foi extremamente influenciado pelos ritmistas da escola de samba Estácio de Sá ao introduzir a percussão nas gravações em estúdio. Com o tempo, este formato terminou se firmando como dominante do gênero, que se tornou mais percussivo e ligeiro do que o executado na casa de Tia Ciata e em outros locais da época. Para maiores detalhes sobre as relações entre os dois principais estilos de samba nas três primeiras décadas do século XX ver Sandroni (SANDRONI, 2001).

18 Lamartine Babo, denominada Ge-gê. Ocupou diversos postos ao longo da vida em instituições museológicas estatais, como o Museu da Imagem e do Som, criado pelo seu amigo pessoal Carlos Lacerda. Escreveu importantes livros para a consagração do gênero samba, sendo o mais conhecido o “No tempo de Noel Rosa”, de 1963. Este grupo ocupou uma posição dominante a partir de 1932 nas instâncias de difusão e consagração da música popular, auxiliando a definir assim o formato que o gênero viria a ter nas décadas posteriores (cf FROTA, 2003 e SANDRONI, 2001). Orestes Barbosa, muito próximo a este grupo, viria no futuro tomar lugar de destaque como compositor de diversos sucessos na “Era do Rádio” (aproximadamente 1930-50), enquanto Vagalume ficaria confinado no semi-esquecimento da história. Porém, este último, no decorrer do processo de legitimação do samba, talvez tenha expressado com maior claridade, tendo em vista que ocupava uma posição comprometida com a produção “pura” dos negros do morro, as clivagens que emergiam de acordo com o desenvolvimento do aparato comercial que englobava as produções populares. Ou seja, Vagalume, pela primeira vez, distinguiu, dentro do campo de produção da MPU no Brasil, o processo comercial de produção e seus integrantes do processo “descomprometido” de produção musical representado pela parcela dos produtores que não tinham acesso aos grandes meios de comunicação, sendo obrigados muitas vezes a se contentarem com um “dinheiro sujo” - pelo menos sob a ótica de Vagalume - de Francisco Alves pela compra de suas composições. A denegação do interesse propriamente econômico por parte dos agentes comprometidos com as produções artísticas, indício primordial que marca a emergência da autonomia relativa de determinado campo e das polarizações - comercial versus não-comercial - que neste se incrustam, pode a partir dos livros perscrutados (já em 1933) ser percebida. Estes personagens acima visados, sem terem talvez a real dimensão, contribuíram e muito na preparação do terreno do processo de legitimação e escolha do samba como o gênero representante do Brasil que tomava cada vez mais corpo a partir da década de trinta. A pauta do “popular” levantada por eles em suas colunas nos jornais de desde o início do século no Rio de Janeiro conformou uma situação distinta. O trabalho executado por estes intelectuais-párias foi assim de fundamental importância para o estabelecimento de um gênero já parcialmente delimitado, denominado, elogiado e pautado quando da entrada da ampla comercialização e radiodifusão. A forma finalizada da principal música popular que depois seria transformada em expressão profunda das “essências” do país muito deve a estes personagens. Houve assim um

19 fortalecimento progressivo do gênero, de seus agentes e de suas instituições, um acúmulo de energias sociais na história que contou com diversas instâncias. Correndo paralelo aos personagens entrevistos, havia ainda uma outra fonte de força que também muito favoreceu o processo de alquimia simbólica levado a cabo: a entrada de uma nova frente de legitimação, de novos intelectuais-artistas no centro do poder governamental. V – NACIONAL-POPULAR ESTRANGEIRO Getúlio Vargas chega ao poder em 1930 e já em 1933 espertamente inicia um processo de cooptação de sambistas cujas composições passavam a exaltar as benesses do regime trabalhista que ele desejava implementar. Getúlio então utiliza estrategicamente os instrumentos que estavam à sua disposição para aliciar as camadas desprovidas do Rio de Janeiro ao seu plano populista. Através de meios como as canções presentes no cotidiano da população suas idéias poderiam ser mais bem assimiladas por este contingente. A Rádio Nacional, já em 1932, começa pioneiramente a reproduzir o gênero musical popular no “Programa do Cazé”. Em 1940 esta rádio seria encampada pelo governo federal, aumentando o seu já prestigiadíssimo staff de músicos, arranjadores, cantores e produtores de programas de caráter popular que tinham o samba como carro-chefe. Já o carnaval de 1935 passará a ser regulamentado e patrocinado pela prefeitura do Rio de Janeiro, sob os auspícios do interventor do governo federal, sendo que as já existentes escolas de samba seriam obrigadas a criar sambas de exaltação à pátria neste ano. A tais fatores políticos juntaram-se outros interiores ao domínio musical propriamente dito, como a sede inesgotável por gêneros populares de uma indústria fonográfica nacional já instalada há mais de vinte anos naquele tempo. No entanto, estes fatos por si não esclareceriam, do modo pelo qual as explicações históricas tradicionais o querem, nem a escolha do gênero carioca como figura central nos meios de reprodução musical e nem mesmo a de Getúlio. Um processo anterior já havia transformado as disposições de grande parte da população carioca, preparando a recepção e a aceitação de camadas exógenas às manifestações populares, possibilitado assim a emergência e a inserção do gênero musical na reprodução em massa e a cooptação do governo antes mesmo da existência de rádios e programas comerciais. Creio que muito elucidativas seriam as ações travadas por membros de uma elite

20 intelectual vanguardista, no caso os modernistas brasileiros e franceses da arte, na preparação e decorrente consumação ideológica deste processo46. As aspirações programáticas de fundação de uma arte “genuinamente” nacional como a dos políticos-intelectuais-artistas que serviram ao poder no Estado Novo, casos de Mário de Andrade e Heitor Villa-Lobos - este já logo desde seu início, em 1930 -, não interferirão diretamente na produção musical dos sambistas; porém, promoverão a inserção dos eleitos “verdadeiros” gêneros musicais urbanos, no caso o samba e o choro, na cultura e na pauta das discussões legítimas. Estes intelectuais já consagrados do modernismo, assim, participarão de um aparato de Estado atento às manifestações populares, por um lado, e indiretamente à possível cooptação destas camadas inferiores, por meio dos gêneros que iam se legitimando através das relações dos grupos e do processo acima descrito, por outro. Eles participam deste governo delineando políticas culturais, as quais enquadravam o gênero nascente como uma das possíveis “fontes de originalidade” do povo brasileiro, podendo desde aquele momento vir a se tornar (como de fato mais tarde, com o auxílio de outros agentes e instituições se tornou) a “Identidade do Brasil”. Na década de 1910 os intelectuais modernistas europeus voltavam os olhos para as manifestações populares de países como o Brasil. No terreno da música erudita de vanguarda, a Europa vivia uma saturação formal e uma explosão de novas possibilidades estéticas, principalmente a partir do momento em que Arnold Schoenberg, compositor vanguardista austríaco, fez dissolver o sistema tonal, dominante na música ocidental desde séculos47. As perspectivas no campo desta arte foram assim alargadas, e determinados músicos foram à caça de motivos ou materiais que viessem a servir como fontes de inspiração para novas tomadas de posição. Neste período, modernistas franceses, como o poeta Blaise Cendrars e o músico Darius Milhaud, aportavam nas cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, estreitando relações com as elites culturais, políticas e econômicas das cidades da época. Este último, um dos autores do manifesto “Le Coq et l’Arlequin”, redigido pelo “Grupo dos Seis48”, encontra em sua estadia no Brasil elementos para emplacar tal feito. Chegou aqui pela

46 Ao contrário de Naves (NAVES, 1998), não é meu propósito discutir neste artigo as nuances internas que dividiam estética e musicologicamente os grupos de vanguardistas da época, tal como a diferença relatada entre Villa-Lobos jovem, maduro e Darius Milhaud. 47 (SCHORSKE, 1988). Para maiores detalhes sobre o processo de dissolução da música tonal, ver Wisnick (WISNICK, 2004). 48 Conjunto de vanguardistas franceses que desejavam suprimir os elementos remanescentes de Romanismo e Impressionismo na música francesa visando a superação da polaridade da tônica pela superposição de várias tônicas em atrito.

21 primeira vez em 1914, retornando em 1917 como adido cultural do governo francês, passando então a residir no Rio de Janeiro. Milhaud logo entabularia relações com as figuras proeminentes do meio musical do período, mais especificamente com o emergente compositor brasileiro Heitor Villa-Lobos, que logo o carregaria consigo às “rodas” e manifestações musicais populares cariocas. Segundo seus relatos, Milhaud encontraria no Brasil duas formas díspares de disposições estéticas entre as pessoas com quem travara contato na cidade do Rio de Janeiro: primeiro, a da elite carioca afrancesada da época, que conhecia tão bem ou melhor ainda o que se passava na música européia do que ele próprio49. A outra, oriunda das manifestações populares da época. Segundo suas próprias palavras: "Meu contato com o folclore brasileiro foi brutal (...) os ritmos dessa música popular me intrigavam e me fascinavam. Comprei uma porção de maxixes e de tangos, e me esforcei para tocá-los com suas síncopes, que passam de uma mão para a outra. Meus esforços foram recompensados e pude exprimir e analisar esse quase nada tão tipicamente brasileiro".50 O que Milhaud encontrava inusitadamente no Brasil eram respostas às questões colocadas por aqueles músicos franceses em seu programa. Encantava-se pelos “tangos” e “maxixes” cariocas, admirando compositores como Marcelo Tupinambá e Ernesto Nazareth, que mais tarde eram rebaixados por críticos aferrados ao folclore e aos purismos da época, como Mário de Andrade, que os considerava “(...) gente semi-culta, desbancados pelo samba do morro, com maior caráter e verdade popular”51 Na verdade, Milhaud encontrou inspiração para as suas composições não somente através desses “contrabandistas” de elementos europeus nas composições populares cariocas, mas também em compositores populares negros “autênticos” de “samba do morro” - ainda que estes não pertencessem originariamente a estes locais -, como Donga e seu já mencionado “Pelo Telefone”. O que importa, no entanto, é enxergar a relação estabelecida por um músico europeu com o gênero popular ainda carente de legitimidade junto às “afrancesadas” elites cariocas, fosse este uma composição semi-erudita de Nazareth ou um maxixe de Donga. O olhar estrangeiro de Milhaud, distante das disputas e divisões efetuadas posteriormente por Mário de

49 (WISNICK, 1983, p. 40) 50 http://www.dicionariompb.com.br/detalhe.asp?nome=Darius+Milhaud&tabela=T_FORM_A&qdetalhe=a rt, acessado em 15/05/2006. 51 (WISNICK, 1983, p. 43)

22 Andrade e tantos outros entre samba de morro, da cidade, maxixe, lundu etc., depois de seu contato com as diversas manifestações populares cariocas de então, descreverá em uma entrevista o que urgia aos músicos brasileiros - e de quebra, à sua elite afrancesada -, tão ciosos de copiarem os europeus: “Seria desejável que os músicos brasileiros compreendessem a importância dos compositores de tangos, de maxixes, de sambas e de cateretês como Tupinambá ou o genial Nazareth. A riqueza rítmica, a fantasia indefinidamente renovada, a verve, a vivacidade, a invenção melódica de uma imaginação prodigiosa, que se encontram em cada obra desses dois mestres, fazem deles a glória e a preciosidade da arte brasileira".52 Lição muita bem aprendida por Villa-Lobos, que passaria a investir, a partir de meados de 1922, com muito mais intensidade em composições inspiradas em motivos folclóricos, fonte de maior “brasilidade”, fator que Milhaud demandava para as músicas “cultas” do Brasil.53 Ou seja, com uma postura apoiada no manifesto “Le Coq et l’Arlequin”, que clamava por uma maior aproximação com a música popular como uma solução aos problemas postos pela vanguarda européia da época, Milhaud passava a valorizar de lambujem no Brasil a MPU, dando a esta uma chancela praticamente definitiva aos olhos dos músicos e de parcela da elite que ainda desconfiavam da validade estética daquelas manifestações “inferiores”. Uma figura como esta, que possuía uma posição de destaque no mundo legítimo das artes de vanguarda, e ainda por cima européias, cederia ao “cromatismo ingênuo” existente nas composições do semi- erudito Ernesto Nazareth o status de politonalismo54, assinatura legitimadora que elevaria aqueles gêneros executados por estes personagens populares aos olhos da elite da época. Villa-Lobos, um pouco mais tarde, chancelaria da mesma forma as composições de Cartola ao dizer sobre elas: “Está tudo errado, porém é tudo tão bonito...”55 Assim, as manifestações musicais populares passariam a um nível superior ao que se encontravam: o de substrato para novas composições eruditas. A assimilação do folclore pela linguagem culta - conforme Milhaud desejava - marcará a instituição do

52 http://www.dicionariompb.com.br/detalhe.asp?nome=Darius+Milhaud&tabela=T_FORM_A&qdetalhe=a rt, acessado em 14/05/2006. 53 (in: WISNICK, 1983, p. 45). 54 Idem, p. 48. 55 (in: SILVA E OLIVEIRA FILHO, 2003).

23 modernismo musical do país56. Esta assimilação pressupunha, a partir daquele momento, uma demarcação formal do que poderia ser entendido enquanto o verdadeiro folclore, do que deveria ser incorporado e do que haveria de ser rechaçado como falso folclore, gêneros impuros, comerciais ou não representativos da “brasilidade profunda”. Este trabalho de seleção se iniciaria nesta esfera com Villa-Lobos. Em uma outra esfera, já havia sido bem desenvolvido através das críticas daqueles que há muito participavam de e “estudavam” - dentro das possibilidades que permitiam suas trajetórias e capitais - estas manifestações populares: voltemos aqui às figuras menores de Vagalume, Mauro de Almeida e Orestes Barbosa, os “garimpadores”, classificadores, inauguradores da reportagem, do linguajar do campo e da classificação simbólica dos gêneros urbanos cariocas nascentes nos jornais do início do século até por volta da década de 1930. O resultado destes processos paralelos, porém, confluiriam por vias distintas e tortuosas para um só objetivo: a legitimação das manifestações musicais populares presentes no Rio de Janeiro, em um primeiro momento, e a elevação de uma destas manifestações a gênero popular universal brasileiro, o mais legítimo representador da nacionalidade: o samba. As tomadas de posição de Villa-Lobos possuem origens bem distintas daquilo que dava embasamento aos intelectuais-párias, como demonstrado. O compositor erudito, no entanto, teve uma mocidade boêmia muito próxima dos intelectuais participantes da reprodução das manifestações populares. O compositor e maestro carioca Heitor Villa-Lobos (1887-1959), o músico erudito brasileiro mais consagrado internacionalmente, desenvolveu desde tenra idade laços e relações com manifestações populares presentes no Rio de Janeiro daquele período. Filho de um músico amador e neto de um boêmio que possuía ligações com diversos dos músicos populares de sua época, desde seus 16 anos travou contato com músicos executantes de ritmos populares, como Eduardo das Neves57, Ernesto Nazareth58, e Anacleto de Medeiros59, Villa chegou

56 (in: WISNICK, 1983, p. 49). 57 (1874-1919) - Uma das figuras mais populares de artista do início do século e um dos pioneiros a gravar discos no Brasil. Acompanhando-se ao violão em suas gravações, Dudu fazia vozes, sons, sendo o precursor do humor na Música Popular Brasileira. 58 (1863-1934) Deixou obra essencialmente instrumental, particularmente dedicada ao piano. Suas composições, apesar de extremamente pianísticas, por muitas vezes retrataram o ambiente musical das serestas e choros, expressando através do instrumento a musicalidade típica do violão, da flauta e do cavaquinho (instrumental característico do choro). 59 (1866-1907) Quando se formou no conservatório, em 1886, executava vários instrumentos de sopro, preferindo o sax soprano. Fundou a banda da Sociedade Recreio Musical Paquetense com alguns músicos da extinta Banda de Paquetá. Passou a ser mais constante como compositor a partir de 1887, lançando principalmente polcas, valsas e xotes. Foi mestre e organizador de várias bandas

24 a formar um grupo que executava músicas dessa espécie. Tocava violão neste grupo, instrumento até então discriminado por parte da elite. Folião, chega a organizar um cordão carnavalesco, o “Sodade do Cordão”. Freqüentador dos morros em que ocorriam estas manifestações, como o de Mangueira, possuía estreita amizade com compositores “autênticos” daqueles rincões, caso de Cartola. Em 1930, já consagrado internacionalmente, assume o cargo de superintendente de educação musical e artística oferecido por Getúlio Vargas. A “matéria prima” principal utilizada por este compositor na feitura de suas obras passava a ser os gêneros populares60, conforme visto acima, conferindo a estes uma legitimidade desde períodos anteriores à chegada das transmissões radiofônicas no Brasil. Os contatos que este folião-erudito possuía dentre os reprodutores das manifestações populares da época seriam fundamentais para a posterior seleção dos personagens que ficariam marcados na história como “genuinamente brasileiros”, tendo em vista a posição ocupada por Villa-Lobos na hierarquia legítima das artes brasileiras daquele período. Ao ocupar um cargo governamental, Villa-Lobos teve o privilégio de colocar em ação seus planos, conjuntamente com outras figuras centrais que legitimariam por meio dos instrumentos de poder, dentro das possibilidades oferecidas, o projeto nacional-popular tão estudado na academia. Nesta época, o samba carioca já ocupava uma posição de legitimidade frente às outras manifestações populares, que se restringiam assim a meros gêneros regionais, sendo o samba escolhido como o representante universal e oficial do nacional-popular61. Assim, este gênero pôde expressar um processo que se iniciou bem antes do grupo de Vargas chegar ao poder. As forças políticas e ideológicas de uma época, como demonstra Elias62, dependem muitas vezes de fatores provindos de enredamentos anteriores que podem ou não desaguar, a depender das situações conjunturais, em novas configurações, como o nacional-popular neste caso particular representou. Conforme tentei demonstrar, grupos de agentes menores entremesclaram interesses com os de maiores, auxiliando a demarcação das fronteiras e a inauguração da linguagem e dos móveis em jogo para que a formação desse campo se desse, sem um interesse prévio para que isso ocorresse,

60 Não foi à toa que muitas de suas composições posteriores a 1920 possuem nomes próximos às manifestações populares daquele momento, como a célebre série intitulada “choros”, iniciada neste ano. Ver Naves (NAVES, 1998). 61 Nota-se que até nossos dias gêneros como o sertanejo em São Paulo e outros originários do Rio Grande do Sul, Bahia, etc, ficaram legitimados como regionais, enquanto o “nacional” por excelência ficou sendo o samba carioca. 62 (ELIAS, 1997).

25 terminando por legitimar em uma situação posterior o que já vinha se gerando desde tempos. Dentro da esfera visada, a cartada final do governo Vargas, para o samba, viria em 1940, quando seu aparelho governamental encampou uma rádio popularíssima na época, a Nacional, e passou a retransmitir sua programação para todo o país. A já bem delimitada formalmente MPU, seus intérpretes, figuras e compositores ganhavam a partir disso ares universais de fato. Óbvio que a proximidade geográfica da manifestação popular que depois veio a ser elevada ao gênero musical “samba” com o foco do poder governamental central no Rio de Janeiro e com as instituições específicas do domínio musical que se encontravam nesta cidade foi fator de fundamental importância para que ocorresse o processo de legitimação acima relatado. Porém, se relacionasse esta proximidade abstratamente como um simples dado, não perscrutando as relações estabelecidas entre agentes e seus interesses, relações estas que intermediaram a criação de novas configurações, nada explicaria ao final. Preferi ater-me a personagens-chave da cena carioca para iluminar duas das várias vias possíveis que encadearam o processo vislumbrado. Ao menos quatro movimentos interconectados puderam assim ser examinados: i) a inserção e construção do elemento popular na pauta de discussões das artes, tendo sua consumação no Estado Novo; ii) a legitimação do gênero musical popular como referência e substrato das “altas artes”, bem como a sua própria auto-referência formal, institucional e as linguagens que passariam a regulamentar as disputas interiores ao mesmo; iii) a escolha e a universalização de um gênero musical especificamente carioca que foi alçado à categoria de nacional; iv) a elevação deste último e de seus atores como a síntese do popular já legitimado. A seqüência em que estes quatro processos ocorreram cambiaram de acordo com o contexto histórico - político e social - que permitia a ação de personagens tais como os retratados no artigo e a formação de novas instituições consagradas à música popular. Linhas díspares, representadas pelas duas espécies de trabalho intelectual analisados, somaram-se na alquimia final - congregação de todas estas forças de legitimação que vinham correndo ao largo do tempo no Rio de Janeiro com maior intensidade do que em outras regiões do Brasil. A distinta e específica espécie de relação existente entre determinadas facções da elite e uma parcela dos produtores culturais marginais da época pôde assim ser vista como um espaço de novos possíveis artísticos que se abriam logo no início do século XX, transpassando as três primeiras décadas, sobretudo. A

26 dominação simbólica exercida por personagens em posições superiores em relação aos produtores das manifestações culturais propriamente ditos engendrou as situações necessárias para o estabelecimento simbólico de uma verdade tríplice de um gênero musical, verdade esta absoluta e inquestionável: o mito do carioca-nacional-popular, fusão de cores e classes, transubstanciação de morro e cidade, em um só local. VII – BIBLIOGRAFIA ALMIRANTE (1977) – No Tempo de Noel Rosa – Rio de Janeiro, Francisco Alves, 2ª Edição. BARBOSA, O. (1978) – Samba: sua história, seus poetas, seus músicos e seus cantores – Edição Funarte, 2ª ed. BOURDIEU, P. (2001) – A Economia das Trocas Simbólicas – São Paulo, Editora Perspectiva, 5ª ed. ______(1996) – As Regras da Arte – São Paulo, Companhia das Letras. CABRAL, S. (1996) – A MPB na Era do Rádio – São Paulo, Moderna. CANDIDO, A. (1970) - Dialética da Malandragem : caracterização das Memórias de um Sargento de Milícias - São Paulo, IEB - USP. CUNHA, F.L. da (2004) – Da Marginalidade ao Estrelato – o samba na construção da nacionalidade (1917-1945) - São Paulo, Annablume. DICIONÁRIO DE MÚSICA ZAHAR (1985) – Rio de Janeiro, Zahar Editores. DIDIER, C. (2005) – Orestes Barbosa: Repórter Cronista e Poeta – Rio de Janeiro, Editora Agir. DOURADO, H.A. (2004) – Dicionário de Termos e Expressões da Música – São Paulo, Ed. 34. ELIAS, N. (1997) – Os Alemães: a luta pelo poder e a evolução do habitus nos séculos XIX e XX – Rio de Janeiro, Jorge Zahar. FENERICK, J. A. (2002) - Nem do Morro Nem da Cidade: As Transformações do Samba e a Indústria Cultural (1920-1945) – São Paulo, Tese de Doutorado, FFLCH- USP. FRANCESCHI, H. M (2002) – A Casa Edison e seu Tempo – Rio de Janeiro, Sarapuí. FROTA, W.N. (2003) – Auxílio Luxuoso: Samba Símbolo Nacional, Geração Noel Rosa e Indústria Cultural, São Paulo, Annablume. GRAMSCI, A. (1978) – Os Intelectuais e a Organização da Cultura – Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira. GUIMARÃES, F. “VAGALUME” (1978) – Na Roda do Samba – Rio de Janeiro, Ed. Funarte, 2ª ed. LOPES, N. (1992) – O Negro no Rio de Janeiro e sua Tradição Musical - Rio De Janeiro, Pallas. MÁXIMO, J. e DIDIER, C. (1990) – Noel Rosa: Uma Biografia – Brasília, Editora UNB e Linha Gráfica Editora. MATTOS, C. N. (1982) - Acertei no Milhar: Malandragem e Samba no Tempo de Getúlio - Rio de Janeiro, Paz e Terra. MORAES, J.G.V. de (1997) – As Sonoridades Paulistanas – Rio de Janeiro, Funarte & Editora Bienal. ______(2000) – Metrópole em Sinfonia: História Cultura e Música Popular na Cidade de São Paulo dos Anos 30 – São Paulo, Estação Liberdade & Fapesp.

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