DESAFIOS DOS SERVIÇOS DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA E EXTENSÃO RURAL VISANDO O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DE COMUNIDADES RURAIS DO MUNICÍPIO DE – BA

CHALLENGES OF TECHNICAL ASSISTANCE AND RURAL EXTENSION OVERLOOKING THE SUSTAINABLE DEVELOPMENT OF RURAL COMMUNITIES IN CRUZ DAS ALMAS – BA

Jânio da Silva Santana1 Marcelo Batista Teixeira2 Marivalda Figueredo Santa Bárbara3 Antônio Mauth Júnior4 Célia Regina Ferrari Faganello5

Resumo: A agricultura familiar desempenha um importante papel na implantação de modelos mais sustentáveis de produção agrícola, principalmente por se relaci- onar diretamente com as questões de natureza socioambiental. O objetivo desse trabalho foi realizar um estudo de caso em comunidades rurais assistidas pelo

1 Graduando em Agronomia pela Universidade Federal do Recôncavo da , Brasil. 2 Graduando em Agronomia pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Brasil. 3 Graduanda em Agronomia pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Brasil. 4 Graduando em Agronomia pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Brasil. 5 Pós-Doutora em Direito Ambiental pela Université du Sud Toulon-Var. Doutora em Ecologia Aplicada, Mestre em Ciências e Eng. Agronôma pela ESALQ-USP, Bacharela em Direito e Especialista em Direito Ambiental pela Universidade Metodista de Piracicaba. Profa. Adjunta de Direito Ambiental do Centro de Ciências Agrárias, Ambientais e Biológicas e do Mestrado Profissional em Gestão de Políticas Públicas e Segurança Social da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Cruz das Almas. Professora. Foi professora visitante da Université du Sud Toulon-Var (2008/2009). Foi professora orientadora do Programa de Mestrado em Educa- ção da Universidade Lusófona de (2012).

15 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA

Programa Estadual de Assistência Técnica e Extensão Rural para verificar se há utilização adequada dos recursos naturais e preservação do meio ambiente, em atendimento à legislação ambiental. O trabalho foi conduzido no município de Cruz das Almas – BA, em três comunidades rurais de agricultores familiares que estão sendo assistidos pelo serviço de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado da Bahia (ATER). Para se diagnosticar as características de uso e manejo agroambiental das propriedades, foi utilizado um questionário semies- truturado para coleta dos dados. As comunidades apresentaram 79,3%, 61,6% e 66,6% de cultivo agrícola em áreas com declividade entre 5 a 20%, solos em estágio de degradação ou degradados e erosão laminar com avanços para pe- quenas voçorocas, respectivamente. Além disso, observou-se ainda que 66,6% das famílias entrevistadas faz o uso de agroquímicos. Em termos de Áreas Pre- servação Permanente constatou-se que 79,2% das propriedades não apresenta- ram áreas com características para adoção desta prática e não foi constatada a presença de Reserva Legal. Averiguou-se que 95,8% do lixo inorgânico são lan- çados a céu aberto ou queimados gerando poluição ambiental. Concluiu-se que se faz necessária a existência de um serviço de ATER qualificado e atuante para que seja possível a adequação das propriedades a legislação ambiental visando o desenvolvimento rural sustentável. Palavras-chave: Sustentabilidade; Agricultura Familiar; ATER.

Abstract: Family farming plays an important role in the implementation of more sustainable agricultural production, mainly relate directly to socio-environmen- tal issues. The aim of this study was to perform a case study in rural communi- ties assisted by the State Program of Technical Assistance and Rural Extension aiming the utilization of natural resources and environment preservation. The work was conducted in Cruz das Almas – BA in three rural communities of family farmers who are being assisted by the Technical Assistance Service and Rural Extension of the state of Bahia (ATER). To diagnose the characteristics of agrienvironmental use and management of the properties, we used a semi- structured questionnaire for data collection. Communities showed 79.3%, 61.6% and 66.6% of agricultural cultivation in areas with slopes between 5 to 20%, on soil degradation stage or degraded and sheet erosion gullies with small advan- ces, respectively. Furthermore, it was observed that even 66.6% of the families interviewed makes the use of agrochemicals. In terms of Permanent Preservati- on Areas found that 79.2% of the properties showed no areas with characteris- tics for adoption of this practice and was not detected the presence of the Legal Reserve. It was found that 95.8% of the inorganic waste is thrown open or burnt causing environmental pollution. Therefore, it is necessary the existence of a service ATER qualified and active for adequacy of the properties agreeing to environmental legislation and aimed at sustainable rural development.

16 Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA

Key-words: Sustainability; Family Farms, ATER.

Sumário: 1. Introdução e Objetivos; 2. Metodologia; 3. Resultados e Discussão; 4. Conclusão; 5. Referências.

1. INTRODUÇÃO E OBJETIVOS O município de Cruz das Almas tem uma população 58.606 habitan- tes 6. A população urbana representa 75%, proporção bem superior à média da região (58%), em virtude de se tratar de um município de pequena ex- tensão territorial, característico desta região, que concentra boa parte do comércio e serviços no entorno regional7. O PIB municipal de R$ 158 milhões em 2003, e um PIB per capita de R$ 2.830,30. Em 2010, o PIB per capita passou para R$ 7.640,17. Este aumento considerado no PIB per capita se deve, principalmente, a instala- ção em 2005 da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e ampliação do quadro de funcionários da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) unidade Mandioca e Fruticultura Tropical, cujos salários recebidos estão acima da média da região. Na distribuição setorial 15% corresponde à agropecuária, 19% à indústria e 66% ao setor de serviços. O município de Cruz das Almas, no censo agropecuário de 2006, apresentou 1.325 estabelecimentos agropecuários, representando 5.823 ha. A maior parte dessas propriedades pode ser considerada minifúndio, sendo que quase 90% têm área inferior a 10 ha8. Os minifúndios, de acordo com o artigo 4º, inciso IV do Estatuto da Terra (Lei n. 4.504/64), são imóveis rurais de área e possibilidades inferiores às da propriedade familiar. Já as propriedades familiares são imóveis rurais de área e possibilidades técnicas inferiores que não garantem a subsistência e o progresso social e econômico, com área máxima fixada para cada região e tipo de exploração, e eventual- mente trabalho com a ajuda de terceiros (art. 4º, inc. II do Estatuto da Terra).

6 IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. IBGE CIDADES (2010). Disponível em: . Acesso em: 12 mar. 2013. 7 OLALDE, A. R.; SANTOS, I. J.; SANTOS, E. L. O PRONAF e as desigualdades na agricul- tura familiar. Anais... CONGRESSO DA SOBER, 45, Londrina, 2007. 8 Idem, ibidem.

Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 17 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA

O município de Cruz das Almas tem 1.165 unidades familiares que correspondem a 92,4% dos estabelecimentos agropecuários, com quase 80% do valor bruto da produção e ocupam 62% da área. Observa-se que a agri- cultura familiar tem uma contribuição mais relevante na produção no mu- nicípio de Cruz das Almas do que no estado da Bahia e no país. Isto tam- bém revela que as unidades patronais, basicamente de pecuária, fazem uma exploração extensiva dos recursos naturais, contribuindo com apenas 20% do valor bruto da produção, embora possuam 38% da área, o que desmisti- fica a suposta eficiência produtiva da agricultura patronal9. A ocupação das terras com lavouras permanentes corresponde a 33%, enquanto as lavouras temporárias a 18,01%. As pastagens representam 41,64%, destas 19,01% são de formação natural. Da área total de pastagem plantada 17,03% estão degradas. Em termos de economia, as culturas agrí- colas tradicionalmente cultivadas que se destacam são os citros, mandioca e fumo10. O inhame é um produto muito cultivado nos últimos anos, mas, curiosamente, ainda não aparece nas estatísticas. Na pecuária o rebanho bovino era de 12.116 animais, em 2004, enquanto os ovinos correspondi- am a 1.425 cabeças, 586 equinos, 3.591 suínos, 5.168 codornas e mais de 30 mil galinhas11. No quesito áreas de preservação permanente ou reserva legal das matas e/ou florestas naturais, constata-se que apenas 1,4% dos estabeleci- mentos agropecuários, o que representa 19 ha, adotam esta prática. Devido à ação antrópica muitas áreas apresentam sérios problemas ou estágios de degradação visível (erosão, desertificação, salinização, etc.). Estas e outras áreas com certas caraterísticas pedogenéticas, tais como areais e pedreiras se tornam inaproveitáveis para agricultura ou pecuária, sendo que 6,11% dos estabelecimentos agropecuários apresentam alguma dessas caracterís- ticas no município em tela12. Os agricultores familiares desempenham um importante papel na implantação de modelos mais sustentáveis de produção agrícola e na busca de modelos produtivos menos impactantes, principalmente por se relacio-

9 Idem, ibidem. 10 IBGE. Censo Agropecuário 2006. Disponível em: . Acesso em: 10 de abril de 2013. 11 Idem, ibidem. 12 Idem, ibidem.

18 Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA nar diretamente com as questões de natureza socioambiental. Questões re- ferentes à Agricultura Familiar estão previstas na Lei nº 11.326/06 que prioriza condições relacionadas à Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER) e acesso aos serviços públicos que deveriam chegar às comunida- des rurais, tais como: saúde, educação, crédito, infraestrutura, lazer, previ- dência social, dentre outros. A indisponibilidade dos serviços menciona- dos dificulta ou mesmo inviabiliza a permanência do agricultor no meio rural. Nesse sentido, nos últimos anos, os serviços de ATER vêm sendo orientados a atuar de modo a contemplar os objetivos que se direcione para um modelo de desenvolvimento rural sustentável13. Segundo Homma14, o desenvolvimento local e regional exige cons- tante geração de tecnologias, assim como informações científicas. Diferen- te do que ocorre com as tecnologias de natureza mecânica, as pesquisas de natureza agrícola e ambiental possuem especificidades que advêm da reali- dade local, o que exige tecnologias adaptáveis àquele contexto. Seguindo estas reflexões, os serviços de ATER são relevantes no contexto do desen- volvimento regional, pois podem se tornar uma ponte entre as tecnologias desenvolvidas e o principal beneficiário – o agricultor. Os profissionais de ATER possuem desafios a serem superados. Como agentes que constroem conhecimentos científicos e tecnológicos junto aos agricultores, esses profissionais precisam conhecer, aprender a lidar com as especificidades regionais e locais. É primordial saber identificar as potenci- alidades de cada comunidade, seja para desenvolver a economia, preservar os recursos naturais disponíveis, ou mesmo para valorizar a cultura local e os recursos humanos disponíveis15. Os Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural não chegam a todos os agricultores, conforme aponta o censo agropecuário de 200616. A

13 OLIVEIRA, M. N. da S. A formação de técnicos e extensionistas rurais no contexto do desenvolvimen- to rural sustentável e da política nacional de assistência técnica e extensão rural. Brasília: UnB, 2012. 254p. Tese (Doutorado) – Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Sustentável, Uni- versidade de Brasília, Brasília, 2012. 14 HOMMA, A. K. O. Discussão introdutória: provocando mudanças nas trajetórias de desen- volvimento local e regional – o papel da pesquisa agrícola. In: SOUSA, I. S.; CABRAL, J. R. F. Ciência como Instrumento de Inclusão Social. Brasília, 2009. 15 OLIVEIRA, M. N. da S., Op. cit. 16 IBGE. Censo Agropecuário 2006. Disponível em: . Acesso em: 10 de abril de 2013.

Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 19 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA orientação técnica atinge apenas 22% dos estabelecimentos, sendo mais comum entre os médios e grandes produtores, o que quer dizer que grande parte dos agricultores familiares não recebe este tipo de serviço. Outro dado importante revelado pelo censo é que o nível de acesso do produtor aos serviços da ATER tem relação direta com seu grau de instrução. Assim, infere-se que a educação – formal e não formal – é uma ferramenta essenci- al para ampliar esse acesso, influenciando diretamente o desenvolvimento regional sustentável. O Programa de Educação Ambiental da Agricultura Familiar (PEA- AF) elaborado especificamente para o público envolvido com a agricultura familiar tem como foco o desenvolvimento de ações educativas, visando à construção coletiva de estratégias para o enfrentamento da problemática socioambiental rural. Sua implementação se dá por meio do conjunto de instituições governamentais e não-governamentais ligadas à essa temática, com vistas à adoção de práticas sustentáveis na agricultura familiar e no manejo dos territórios rurais 17. Por meio do serviço de ATER, os técnicos poderiam compartilhar conceitos de desenvolvimento sustentável conforme a lei que regulamenta a Política Nacional de Educação Ambiental – Lei nº 9.795/99. O Estado da Bahia também dispõe de uma Política Estadual de Educação Ambiental re- gulamentada pela Lei 12.056/11. Por meio da educação ambiental é possí- vel instrumentalizar a população para que ela exerça sua cidadania ambi- ental e saiba reivindicar seus direitos básicos, como por exemplo, o acesso à água e o meio ambiente equilibrado18. Este último vem consubstanciado no artigo 225 da Constituição Federal Brasileira de 1988. Mas, obviamente, não é só a educação que influencia diretamente o desenvolvimento regional sustentável. O processo de desenvolvimento a partir do local deve considerar as diversas relações que deverão ser criadas com os outros setores da sociedade. Nos últimos anos têm surgido diversas oportunidades de mercado aos pequenos agricultores. Algumas políticas, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacio-

17 BRASIL (2012). Ministério do Meio Ambiente, Secretaria de Articulação Institucional e Ci- dadania Ambiental Departamento de Educação Ambiental. Programa de Educação Ambiental e Agricultura Familiar – PEAAF. Brasília 2012. Disponível em: http://www.mma.gov.br/estru- turas/educamb/_arquivos/programas_dea_2012___peaaf_verso_22_03_12_20.pdf. Acesso em: 22 de abril de 2013. 18 OLIVEIRA, M. N. da S., op. cit.

20 Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA nal de Alimentação Escolar (PNAE) tem garantido aos pequenos agricul- tores a comercialização de seus produtos. A diversificação da produção e agregação de valor aos produtos promovem a ascensão da economia do segmento familiar, nesse aspecto, a ATER de qualidade é indispensável para a consolidação desse processo19. A inserção da agroecologia tem levado em consideração aspectos ambientais, sociais e culturais nos processos produtivos para a garantia de uma agricultura sustentável20. Embora os princípios da agroecologia sejam mais facilmente associados a pequenas propriedades, eles podem e devem ser aplicados em todos os segmentos produtivos. Os sistemas agroecológi- cos capazes de contemplar o desenvolvimento sustentável de uma proprie- dade podem ser instalados segundo cada realidade, tipo de agricultor e sis- tema de produção. O descaso com o meio ambiente caracterizado pela a destruição das reservas florestais; a diminuição da biodiversidade; os sistemas agrícolas de monoculturas contínuas, associadas a uma intensiva mecanização; a ero- são, a salinização dos solos; a poluição atmosférica e o uso crescente de agrotóxicos tem causado desequilíbrios ecológicos, contaminação dos ali- mentos, dos recursos hídricos, dos solos, do homem do campo e das cadei- as alimentares que corresponde a danos ambientais que podem tornar in- sustentáveis os atuais sistemas de produção agrícola, trazendo assim, sérias implicações para a agricultura, para a silvicultura, entre outras atividades econômicas21. A adoção de modelos de produção ambientalmente insustentáveis e socialmente injustos tem levado à exaustão dos recursos naturais disponí- veis e à inviabilização da permanência das famílias no campo. Torna-se necessário, então, equacionar a proteção do meio ambiente, suas múltiplas formas de uso e a garantia de condições dignas de vida no meio rural. A produção em bases agroecológicas é orientadora das transformações alme- jadas. E para que essa transição se torne realidade, é imprescindível o traba- lho articulado entre os órgãos e entidades da administração pública e as organizações da sociedade civil para o fomento de processos educativos

19 Idem, ibidem. 20 Idem, ibidem. 21 BONILLA, J. A. Fundamentos da Agricultura Ecológica: Sobrevivência e qualidade de vida. São Paulo: Nobel, 1992.

Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 21 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA que estimulem “o fortalecimento de uma consciência crítica sobre a proble- mática ambiental e social”, tal como preconiza a Política Nacional de Edu- cação Ambiental (PNEA) e a Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (PNATER)22. No que tange ao uso de agroquímicos, o Censo Agropecuário de 200623 afirma que a maioria dos estabelecimentos que utilizam tais produtos não recebem orientação técnica, o que representa 785 mil ou 56,3% dos estabe- lecimentos. Apenas (21,1% ou 294 mil) recebem-na regularmente. Quanto às embalagens vazias, cerca de 126 mil ou 9,0% dos agricultores declara- ram que as deixam jogadas no campo. Os números apresentados pelo cen- so são preocupantes, pois o Brasil é um dos países que mais utiliza defensi- vos agrícolas em sua produção, muitas vezes ultrapassando os limites esta- belecidos por lei. Considerando os dados acima expostos, infere-se que é preciso debater junto à sociedade, principalmente, junto aos atores do pro- cesso produtivo, como minimizar ou banir o uso de defensivos químicos. Essa mudança passa por várias etapas, necessitando de um trabalho educa- tivo de conscientização dos produtores, dos profissionais de ATER e dos consumidores. Além da conscientização, é preciso que o Estado atue no campo da fiscalização e punição daqueles que infringem a lei24. Levando-se em conta os dados acima expostos, o objetivo desse tra- balho foi realizar um estudo de caso em comunidades rurais assistidas pelo Programa Estadual de Assistência Técnica e Extensão Rural para verificar a utilização adequada dos recursos naturais e preservação do meio ambiente.

2. METODOLOGIA O trabalho foi conduzido no município de Cruz das Almas – BA, com área territorial de 145,742 km², está situado na Região do Recôncavo da Bahia, distando 146 quilômetros da capital do Estado, Salvador. O refe- rido município faz limites com outros: São Felipe, Sapeaçu, Conceição do Almeida, , Cabaceiras do Paraguaçu, e . Está localizado a 12º40’19" de Latitude Sul e 39º06’22"de

22 Idem, ibidem. 23 IBGE. Censo Agropecuário 2006, Op. cit. 24 OLIVEIRA, M. N. da S., Op. cit.

22 Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA

Longitude Oeste de Greenwich. A altitude é de 220 m acima do nível do mar, clima tropical quente e úmido com pluviosidade média anual é de 1.224 mm, com maior incidência de chuvas no período compreendido en- tre março e junho, além disso, a temperatura média anual é de 22,45ºC, umidade relativa do ar de 80% e insolação de 7,5 horas/dia25. Localizado nos tabuleiros costeiros, o solo é classificado como Latossolo Amarelo Coeso26. O estudo foi realizado em comunidades rurais de agricultores famili- ares que estão sendo assistidos pelo serviço de Assistência Técnica e Exten- são Rural (ATER) do Estado da Bahia conforme Chamada Pública ATER SEAGRI/SUAF 001/2012 LOTE 73, executado pelo Movimento de Apoio a Agricultura Familiar – AGROVIDA. Em cada comunidade, nos bairros da zona rural denominados Tape- ra, Umbaubeira e Pumba, foram escolhidas vinte e quatro famílias para serem verificados os desafios para a aplicação da Lei de ATER nº 12.188/ 2010, no que diz respeito à utilização adequada dos recursos naturais e a preservação do meio ambiente nas propriedades dos agricultores familia- res. Para coleta dos dados foi aplicado um questionário semiestruturado. O tempo de aplicação dos questionários foi em média de 30 minutos. Os questionários semiestruturados abordaram os seguintes temas: preparo do solo (aração mecanizada, gradagem mecanizada, manual; tra- ção animal, queimada e outras formas); técnicas de plantio (plantio direto, quebra-vento, plantio diversificado, plantio em nível, cobertura morta e rotação de cultura); preparação de novas áreas (queimadas, manual, roça- gem, mecanizada e outras formas); manejo das culturas agrícolas (utiliza agrotóxico, cultivos sucessivos na mesma área, monocultivo, rotação de áreas e outras formas); técnicas de proteção ambiental (a área não dispõe da aguadas/barreiros/nascente com árvores, proteção de aguadas/barrei- ros/nascente com árvores, controle biológico/natural de pragas e doenças, enterra plástico e/ou embalagens não recicláveis e reflorestamento); mane- jo sustentável da vegetação nativa (não explora, explora e não tem vegeta-

25 ALMEIDA, O. A. Informações Meteorológicas do Centro Nacional de Pesquisa de Mandioca e Fruti- cultura Tropical. Cruz das Almas: EMBRAPA/CNPMF, 1999. 26 SANTOS, H. G. dos; JACOMINE, P. K. T.; ANJOS, L. H. C. dos; OLIVEIRA, V. A. de; OLIVEIRA, J. B. de; COELHO, M. R.; LUMBRERAS, J. F.; CUNHA, T. J. F. (Ed). Sistema Brasileiro de Classificação de Solos. 2. ed. Rio de Janeiro: Embrapa Solos, 2006.

Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 23 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA

ção nativa); forma de manejo da vegetação nativa (raleamento, rebaixa- mento, enriquecimento e não tem vegetação nativa); uso da água (reutiliza- ção da água de banho e de cozinha, água é reutilizada e destinada a rega de fruteiras e a água é reutilizada e destinada aos animais); área de reserva legal (não é exigido e sim, possui); área de preservação permanente (não tem área para APP sim, parcialmente e sim, integralmente); atividades agro- pecuárias em áreas de preservação permanente (sim, parcialmente; sim, integralmente e não tem área para APP); área média das propriedades e outras observações (cultivo em áreas com declividade entre 5 e 20%, solos degradados, erosão laminar).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO De acordo com a vasta informação da literatura, a agricultura é uma atividade impactante ao meio ambiente. No entanto, Ehlers27 considera o segmento da agricultura familiar o mais propício para se desenvolver mo- delos de produção mais sustentáveis, principalmente, pelo fato das proprie- dades serem menores. Contudo, mesmo em propriedades desse segmento, existe o uso intensivo ou inadequado dos recursos naturais, como também, a utilização descontrolada de agroquímicos. Neste sentido e conforme a Tabela 1, observa-se que no manejo das culturas agrícolas, 50% das famílias estudadas realizam cultivos sucessivos na mesma área, deste total 87,5% estão na comunidade da Tapera. Esta prática leva a exaustão do solo, evidenciando sua degradação. Além disso, observa-se ainda que 66,6% das famílias entrevistadas faz o uso de agroquí- micos, sendo que a comunidade da Pumba representa 75% deste total. Para Grisolia28, o uso indiscriminado desses agroquímicos causa efeitos negati- vos a nível local, principalmente: a contaminação de águas superficiais e subterrâneas, eliminação de insetos polinizadores e danos à saúde huma- na, sobretudo dos próprios agricultores tendo em vista seu baixo nível de instrução para manipulação destes produtos.

27 EHLERS, E. Agricultura Sustentável: origens e perspectivas de um novo paradigma. 1. ed. Gua- íba: agropecuária, 1999. 28 GRISOLIA, C. K. Agrotóxicos – mutações, reprodução e câncer. Brasília: UnB, 2005.

24 Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA

Ainda de acordo com a Tabela 1, o uso da mecanização agrícola nas comunidades estudadas, tanto no preparo do solo quanto na preparação de novas áreas representa 58,3%. No entanto, 87,5% das famílias estudadas empregam a força humana (manual) em diversas etapas dos ciclos produti- vos das culturas agrícolas, corroborando com os dados do Censo Agrope- cuário do IBGE de 2006 que apontou (48,86%) do emprego da força huma- na nos estabelecimentos agrícolas de Cruz das Almas. Analisando apenas o sistema convencional de preparo do solo (aração + gradagem) constata- se mais de 50% no uso da mecanização nestas comunidades, o que está em acordo com os dados do IBGE, que nesta ocasião 29,73% dos estabeleci- mentos agropecuários do município adotaram o sistema convencional de preparo do solo. O uso da mecanização nas propriedades agrícolas é vantajoso, desde que seja utilizada com racionalidade, ao contrário, os malefícios ao meio ambiente podem ser evidentes, sobretudo perda de solo por erosão o que pode acarretar assoreamento de rios, lagos ou nascentes. Neste sentido, constata-se que nas comunidades estudadas apenas 4,1% (Tabela 1) das famílias realizam a técnica conservacionista de plantio em nível. Esta práti- ca isolada já consegue diminuir a erosão do solo e o assoreamento dos rios de modo considerável. A proteção dos recursos naturais, principalmente o solo e a água, está regulamentada por diversas leis: a Constituição Federal de 1988 em seu artigo 24 afirma que competem à União, aos Estados e ao Distrito Fe- deral a defesa do solo e água; a Lei n.º 6.938/81 que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente traz a racionalização do uso do solo, do sub- solo, da água e do ar em seu segundo princípio; a Lei n° 6.225/75, que trata da obrigatoriedade dos Planos de proteção ao solo e de combate à erosão para algumas regiões, visando garantir a adoção das práticas de conserva- ção do solo, assim entendidos para a manutenção e o melhoramento de sua capacidade produtiva – a partir dessa Lei criou-se em 1975 o Programa Nacional de Conservação dos Solos (PNCS), atualmente incorporado pelo Programa Nacional de Bacia Hidrográfica e Conservação de Solos na Agri- cultura; a Lei no 9.433/97 denominada Política Nacional de Recursos Hí- dricos que traz princípios como usuário-pagador e poluidor-pagador incor- porados a seus instrumentos jurídicos de proteção, a Lei no 12.651/12 – Novo Código Florestal, que dispõe sobre a proteção da vegetação e, conse- quentemente a proteção das águas e solo ao disciplinar institutos como Áreas

Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 25 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA de Preservação Permanente e Reserva Legal, dentre outras leis presentes no ordenamento jurídico pátrio. Diante de uma base legal tão sólida, questiona-se, de acordo com a tabela 1, a ocorrência, nas comunidades pesquisadas, de 79,3%, 61,6% e 66,6% de cultivo agrícola em áreas com declividade entre 5 a 20%, solos em estágio de degradação ou degradados e erosão laminar com avanços para pequenas voçorocas, respectivamente. Estes dados ratificam os do IBGE de 2006 para o município e nos remetem ao relatado anteriormente: à necessi- dade de efetivação da assistência rural, ao papel fundamental da educação como uma ferramenta de conscientização sobre as questões ambientais e, além disso, à necessidade de se efetivar as leis ambientais. Assim, a consci- entização dos produtores rurais é medida imprescindível. Antes que as exigências e as cobranças cheguem às propriedades agrí- colas, sobretudo as de agricultores familiares é necessário que o produtor entenda os benefícios que a legislação traz, a médio e longo prazo, para isso uma visão holística do sistema produção a que está inserido é indispensá- vel. Neste sentido a execução da Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural é de extrema importância (PNATER)29. O planejamento de utilização dos recursos hídricos e do solo é com- plexo e merecedor de reflexão mais profunda30. Como a agricultura famili- ar do município de Cruz das Almas tem baixa capitalização, adoção de tecnologia, considerada de minifúndio por Olalde e autores31 e Silva32, com 2,35 ha em média (Tabelas 1 e 2) e uma ATER incipiente talvez seja a explicação para utilização inadequada dos recursos ambientais. Avanzi e autores33 consideram as normas jurídicas como ferramentas eficazes na proteção e conservação dos recursos naturais, conduto, relata- ram que sob o ponto de vista do agricultor, o cumprimento da legislação onera o seu sistema de produção.

29 AVANZI, J. C; BORGES, L. A. C.; CARVALHO, R. Proteção legal do solo e dos recursos hídricos no Brasil. Revista em Agronegócios e Meio Ambiente, v.2, n.2, p. 115-128, 2009. 30 Idem, ibidem. 31 OLALDE, A. R.; SANTOS, I. J.; SANTOS, E. L. O PRONAF e as desigualdades na agricul- tura familiar. Anais... CONGRESSO DA SOBER, 45, Londrina, 2007. 32 SILVA, B. C. D. da; COSTA, A. E. D. V. Diagnóstico sócio-produtivo dos agricultores famili- ares cooperados à cooperativa da agricultora familiar do território do recôncavo da Bahia – COOAFATRE. Revista Magistra, Cruz das Almas, v. 24, n. 2, p. 151-159, 2012. 33 AVANZI, J. C; BORGES, L. A. C.; CARVALHO, R., Op. cit.

26 Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA

Apesar de pouca divulgação e adoção deste tipo de cultivo do solo no município, o Sistema Plantio Direto (SPD) já é constatado nas propriedades agrícolas, representando 8,3% nas comunidades estudadas (Tabela 1). De acordo com IBGE (2006) 2,4% dos estabelecimentos rurais do município adotam o SPD e 19,01% utilizam a técnica do cultivo mínimo. Neste caso, a UFRB através do seu Centro de Ciências Agrárias, Ambientais e Biológi- cas realizou sete edições do evento denominado Ato Comemorativo pelo dia Nacional da Conservação do Solo, com a finalidade de sensibilizar a população para o uso sustentável dos recursos naturais nos agroecossiste- mas e destacando o SPD como técnica conservacionista. As técnicas obser- vadas nas comunidades: utilização de quebra vento (4,1%); plantio diversi- ficado (66,6%); plantio em nível (4,2%); uso de cobertura morta (41,6%) e a rotação de cultura (58,3%) quando associado ao SPD contribui com a racionalização dos recursos naturais (Tabela 1). Segundo a Embrapa (2012) o SPD consiste em uma técnica de caráter conservacionista, pois, tem como princípios básicos: revolvimento mínimo do solo, rotação de culturas e pro- teção permanente do solo com cobertura viva ou morta. Autores como Fancelli e Favarin34, Lanças e Assis35 consideram o SPD como eficiente na redução de perdas de solo por erosão e conservação ambiental, tornando- se a base da sustentabilidade agrícola, principalmente para as regiões tropi- cais e subtropicais.

VARIÁVEIS COMUNIDADE TAPERA UMBAUBEIRA PUMBA Preparo do Solo (%) Média (%) Aração mecanizada 87,5 62,5 25,0 58,3 Gradagem mecanizada 75,0 50,0 25,0 50,0 Manual 75,0 87,5 100,0 87,5 Tração animal 12,5 0,0 0,0 4,1 Queimada 12,5 12,5 12,5 12,5 Outras formas 0,0 0,0 0,0 0,0

34 FANCELLI, A. L.; FAVARIN, J. L. Desempenho da cultura do milho em plantio direto e convencional. In: FANCELLI, A.L. (Coord.) Plantio direto no Estado de São Paulo. Piracicaba: FEALQ/ESALQ, 1989. p.174-175. 35 LANÇAS, K. P.; ASSIS, R. L. Efeito do tempo de adoção do sistema plantio direto na densi- dade do solo máxima e umidade ótima de compactação de um Nitossolo Vermelho distrofér- rico. Energia na Agricultura, Botucatu, v.18, n. 2, p. 22-33, 2003.

Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 27 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA

Técnicas de Plantio (%) Plantio direto 25,0 0,0 12,5 8,3 Quebra vento 12,5 0,0 0,0 4,1 Plantio diversificado 87,5 75,0 37,5 66,6 Plantio em nível 12,5 0,0 0,0 4,2 Cobertura morta 12,5 50,0 62,5 41,6 Rotação de cultura 87,5 50,0 37,5 58,3 Preparação de Novas Áreas (%) Queimadas 0,0 37,5 0,0 12,5 Manual 75,0 50,0 50,0 58,3 Roçagem 12,5 25,0 62,5 33,3 Mecanizada 62,5 75,0 37,5 58,3 Outras formas 12,5 12,5 25,0 16,6 Manejo das Culturas Agrícolas (%) Utiliza agrotóxico 62,5 62,5 75,0 66,6 Cultivos sucessivos na mesma área 12,5 62,5 50,0 50,0 Monocultivo 12,5 0,0 0,0 4,1 Rotação de áreas 87,5 37,5 0,0 41,6 Outras formas 0,0 0,0 0,0 0,0 Outras Observações (%) Cultivo em áreas com declividade entre 5 - 20% 80,0 85,0 73,0 79,3 Solos degradados 66,0 71,0 48,0 61,6 Erosão laminar 75,0 44,0 81,0 66,6 Área das propriedades (ha) Média (ha) 2,9 1,9 2,3 2,35 Famílias entrevistadas Total 8,0 8,0 8,0 24,0

Tabela 1 - Características de uso e manejo das propriedades rurais de agricultores familiares estudadas no município de Cruz das Almas, BA.

De acordo com a Tabela 2, as propriedades dos agricultores não dis- põem de área com aguadas/barreiros/nascente com árvores, o que repre- senta 83,3% das propriedades estudadas, contudo, das propriedades que dispõe de áreas com estas características 16, 6% as protegem, principal- mente com o reflorestamento (8,3%). Por outro lado, apenas 20,8% dos agricultores utilizam a técnica do controle biológico/natural de pragas e doenças. Devido à falta de coleta de lixo na zona rural os agricultores op-

28 Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA tam por enterrar plástico e/ou embalagens não recicláveis, porém, observa- se que 4,2 % desta técnica são praticadas pelos agricultores, restando 95,8% do lixo inorgânico que são lançados a céu aberto ou queimados gerando poluição ambiental. Ainda de acordo com a tabela 2, no quesito reutilização de água de banho e de cozinha observa-se que apenas 25% dos agricultores adotam esta prática, que é exclusivamente destinada a rega de pomares. Enquanto 95,8% das propriedades estudadas não fazem e não usam técnica de mane- jo sustentável da vegetação nativa porque as propriedades consideradas minifúndios com área média de 2,35 ha não dispõem de áreas com vegeta- ção nativa.

VARIÁVEIS COMUNIDADE TAPERA UMBAUBEIRA PUMBA Preparo do Solo (%) Média (%) A área não dispõe de aguadas/barreiros/ nascente com árvores 75,0 75,0 100,0 83,3 Proteção de aguadas/barreiros/ nascente com árvores 25,0 25,0 0,0 16,6 Controle biológico/natural de pragas e doenças 37,5 0,0 25,0 20,8 Enterrar plástico e/ou embalagens não recicláveis 0,0 12,5 0,0 4,2 Reflorestamento 25,0 0,0 0,0 8,3 Manejo Sustentável da vegetação nativa (%) Não explora 0,0 0,0 0,0 0,0 Explora 0,0 12,5 0,0 4,2 Não tem vegetação nativa 100,0 87,5 100,0 95,8 Forma de manejo da vegetação nativa (%) Raleamento 0,0 0,0 0,0 0,0 Rebaixamento 0,0 12,5 0,0 4,2 Enriquecimento 0,0 0,0 0,0 0,0 Não tem vegetação nativa 100,0 87,5 100,0 95,8 Uso da água (%) Reutilização de água de banho e de cozinha 0,0 37,5 37,5 25,0 Água é reutilizada e destinada a rega de fruteiras 0,0 37,5 37,5 25,0 A água é reutilizada e destinada aos animais 0,0 0,0 0,0 0,0 Possui área de reserva legal (%) Não é exigido 100,0 100,0 100,0 100,0 Sim 0,0 0,0 0,0 0,0

Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 29 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA

Possui área de preservação permanente (%) Não tem área para APP 75,0 87,5 75,0 79,2 Sim, parcialmente 25,0 12,5 25,0 20,8 Sim, integralmente 0,0 0,0 0,0 0,0 Atividades agropecuárias em áreas de preservação permanente (%) Sim, parcialmente 0,0 0,0 0,0 0,0 Sim, integralmente 25,0 12,5 0,0 12,5 Não tem área para APP 75,0 87,5 100,0 87,5 Área das propriedades (ha) Média (ha) 2,9 1,9 2,26 2,35 Famílias entrevistadas Total 8,0 8,0 8,0 24,0 Tabela 2 - Aspectos agroambientais das propriedades rurais de agricultores familia- res estudadas no município de Cruz das Almas, BA.

De acordo com o artigo 12 do Código Florestal Brasileiro todo imó- vel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação Permanente. Para os pequenos proprietários rurais, ou seja, aqueles que possuem até quatro módulos fiscais, a título de RL, poderá ser mantida a mesma área de vegetação nativa existente em julho de 2008. No entanto, na prática não se observa isso. Nas comunidades rurais estudadas 100% (Tabela 2) das famílias não adotam esta prática de sustentabilidade ambiental. A inexistência de Reserva Legal nestas propriedades, segundo os agricultores, é fundamentada pela característica de maior parte de mini- fúndios presentes na região do Recôncavo da Bahia; com pouca terra para cultivar, os agricultores preferem suprimir toda vegetação, inclusive próxi- mas aos rios, lagos e nascentes para instalação das culturas agrícolas. Ainda de acordo com o Código Florestal Brasileiro o Poder Público Estadual deverá prestar apoio técnico através da Assistência Técnica e Ex- tensão Rural (ATER) para a recomposição da vegetação da Reserva Legal nos imóveis dos agricultores familiares (art. 54, par. Único). Por outro lado, a Política Nacional do Meio Ambiente reforça a necessidade de capacita- ção dos trabalhadores para atividades de gestão ambiental, visando à me- lhoria e controle efetivo sobre as repercussões do processo produtivo no meio ambiente. Neste sentido, para se conseguir a sustentabilidade na agri- cultura familiar as práticas educativas e projetos socioambientais que esti-

30 Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA mulem não apenas a troca de técnicas de produção, mas a transformação do conjunto de relações sociais e produtivas existentes no meio rural deve ser preconizada36. Em termos de Áreas Preservação Permanente (APP) (Tabela 2) cons- tatou-se que 79,2% das famílias não dispõem de área para adoção desta prática, pois, as propriedades não são cortadas por rios, não tem nascente ou áreas que segundo o Código Florestal Brasileiro (2012) tenha as seguin- tes características: as encostas ou partes destas com declividade superior a 45°, equivalente a 100% na linha de maior declive; topo de morros, montes, montanhas e serras, com altura mínima de 100 metros e inclinação média maior que 25°, as áreas delimitadas a partir da curva de nível correspon- dente a 2/3 (dois terços) da altura mínima da elevação sempre em relação à base, sendo esta definida pelo plano horizontal determinado por planície ou espelho d’água adjacente ou, nos relevos ondulados, pela cota do ponto de sela mais próximo da elevação. Ainda de acordo com a Tabela 2, as propriedades que tenham áreas com estas características citadas acima, que deveriam ser APPs, praticam atividades agropecuárias de forma integral e de caráter exaustivo. Lemos37 considera que nos minifúndios do Nordeste há uma intensa utilização dos recursos naturais, o que acaba gerando sobrecarga e consequentemente de- gradação ambiental. De acordo com a Embrapa38 a sustentabilidade na agricultura famili- ar é um processo lento de mudança, gradual, pois cada tipo de agroecossis- tema ou de agricultor vai demandar um saber específico. No entanto, para conseguir esta sustentabilidade a agroecologia pode ser uma forte aliada conforme destaca a PNATER. Para que ocorra o desenvolvimento rural sustentável e um ambiente equilibrado com base nos princípios agroecológicos, destaca-se mais uma vez a responsabilidade de um sistema e profissionais de ATER capacitados e eficientes com formação interdisciplinar que lhes permitam ter uma visão holística sobre os sistemas agrários, capazes de integrar os segmentos eco-

36 OLIVEIRA, M. N. da S., Op. cit. 37 LEMOS, J. J. S. Níveis de degradação no nordeste brasileiro. Revista Econômica do Nordeste, , v. 32, n. 3, p. 406-429, 2001. 38 EMBRAPA. Marco referencial em agroecologia. Brasília, 2006.

Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 31 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA nômico, ambiental e social39. Para tanto, a sociedade como um todo, deve manter atenção permanente à formação de valores, atitudes e habilidades que propiciem a atuação individual e coletiva voltada para a prevenção, a identificação e a solução de problemas ambientais40.

4. CONCLUSÕES Por falta de conhecimento e um serviço de ATER incipiente, a gran- de parte das práticas aplicadas nos agroecossistemas pelos agricultores fa- miliares não atendem a legislação ambiental. Em função do atual estado crítico da maioria dos sistemas de ATER, os agricultores tornaram-se passivos no tocante ao desenvolvimento rural sustentável. A inserção de componentes curriculares ou a formação multidiscipli- nar relacionada à educação ambiental pode contribuir sobremaneira para o entendimento e promoção do desenvolvimento rural sustentável, para me- lhorar a qualidade daqueles que estão diretamente se relacionando com o meio rural e para se evitar que as leis ambientais não sejam nada além do que letra morta.

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39 OLIVEIRA, M. N. da S., Op. cit. 40 EMBRAPA. Marco referencial em agroecologia. Brasília, 2006.

32 Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013 SANTANA, Jânio S. et al. Desafios dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural Visando o Desenvolvimento Sustentável da Comunidades Rurais do Município de Cruz das Almas – BA solo e de combate à erosão e dá outras providências. Disponível em: . Acesso em: 22 abr. 2013. ______. Lei nº 4.504 e 30 de novembro de 1964. Dispõe sobre o Estatuto da Terra e dá outras providências. Disponível em:. Acesso em: 25 jul. 2013. ______. Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providênci- as. Disponível em: . Aces- so em: 22 abr. 2013. ______. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988. Disponível em:. Acesso em: 25 mai. 2013. ______. Lei n. 9795 de 27 de abril de 1999. Dispõe sobre a educação ambiental, institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9795.htm>. Acesso em: 25 jul. 2013. ______. Lei n. 12.188, de 11 de janeiro de 2010. Institui a Política Nacional de Assistên- cia Técnica e Extensão Rural para a Agricultura Familiar e Reforma Agrária – PNA- TER e o Programa Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural na Agricultura Familiar e na Reforma Agrária – PRONATER, altera a Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, e dá outras providência. Disponível em: . Acesso em: 22 abr. 2013. ______. Lei nº 12.727, de 17 de outubro de 2012. Altera a Lei n. 12.651, de 25 de maio de 2012, que dispõe sobre a proteção da vegetação nativa; altera as Leis n. 6.938, de 31 de agosto de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e 11.428, de 22 de dezembro de 2006; e revoga as Leis n. 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, a Medida Provisória n. 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, o item 22 do inciso II do art. 167 da Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973, e o § 2o do art. 4o da Lei no 12.651, de 25 de maio de 2012. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12727.htm.> Acesso em: 24 abr. 2013. EHLERS, E. Agricultura Sustentável: origens e perspectivas de um novo paradigma. 1.ed. Guaíba: Agropecuária, 1999. EMBRAPA. Marco referencial em agroecologia. Brasília, 2006. FANCELLI, A. L.; FAVARIN, J. L. Desempenho da cultura do milho em plantio direto e convencional. In: FANCELLI, A.L. (Coord.) Plantio direto no Estado de São Paulo. Piracicaba: FEALQ/ESALQ, 1989. GRISOLIA, C. K. Agrotóxicos: mutações, reprodução e câncer. Brasília: Ed. UnB, 2005.

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Recebido em: 29 de julho de 2013. Aceito em: 27 de agosto de 2013.

34 Campo Jurídico, vol. 1, n. 2, p. 15-34, outubro de 2013