UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Medicina Veterinária

ESTUDO DA MICROBIOTA LÁCTICA EM LEITES FERMENTADOS ARTESANALMENTE CONSUMIDOS NO SUL DE ANGOLA

DEOLINDA PAULINO CAMARADA EMBALÓ

TESE DE DOUTORAMENTO EM CIÊNCIAS VETERINÁRIAS ESPECIALIDADE SEGURANÇA ALIMENTAR

CONSTITUIÇÃO DO JÚRI PRESIDENTE ORIENTADORA Reitor da Universidade de Lisboa Doutora Maria Gabriela Lopes Veloso

VOGAIS COORIENTADOR Doutor Buenaventura Guamis López Doutor Buenaventura Guamis López Doutor António Salvador Ferreira COORIENTADOR Henriques Barreto Doutor Joaquim Morais Doutor Luís Avelino da Silva Coutinho Patarata Doutora Maria Eduarda Madeira Potes Doutora Maria Gabriela Lopes Veloso Doutora Marília Catarina Leal Fazeres Ferreira

2014

LISBOA À memória de meus Pais

i Agradecimentos Antes de mais a DEUS, pelo dom da vida, pela protecção e por me dar forças em todos os momentos difíceis ao longo da realização deste trabalho. À Professora Doutora Maria Gabriela Veloso, minha orientadora científica, por me ter aceite como sua orientanda, pela disponibilidade, prontidão em me ajudar e apoiar nas diferentes tarefas, pelos seus ensinamentos, por toda a ajuda na escrita da tese, pela paciência e amizade demonstradas. Ao Professor Doutor Buenaventura Guamis Lopes, meu co-orientador científico, pela orien- tação, incentivo, amizade e pelo apoio material e financeiro sem o qual não seria possível a realização desta tese. Ao Professor Doutor Joaquim Morais, meu co-orientador por todo o contributo e dedicação prestados na realização desta tese. À Professora Doutora Monserrat Llagostara, pela simpatia e pela ajuda na realização das aná- lises de biologia molecular. À Professora Doutora Maria Pillar Cortes Garmendia, pela ajuda na realização das análises de biologia molecular. Ao Professor Doutor Jesus Piedrafita pela ajuda no tratamento estatístico dos resultados, por todas as sugestões no que tange a apresentação dos mesmos. À Drª Marta Castel-Branco pela ajuda na interpretação da análise estatística. À equipa de investigação do CERPTA, em particular à Natália e à Sónia pela ajuda prestada aquando da produção dos leites fermentados e na realização da análise sensorial. Ao Dr. Simão Esperança, pela disponibilidade em atender o meu pedido de socorro sempre que necessário. À empresa Águas da Chela no Lubango pela disponibilização do laboratório de Bacteriologia para a realização de algumas análises.

À Direcção Nacional do Instituto de Investigação Veterinária (IIV) pelo acolhimento e dis- ponibilização do Laboratório de Tecnologia de Alimentos no Lubango para a realização das análises. À Direcção Provincial da Agricultura do Lubango pelo apoio prestado aquando das desloca- ções às áreas de colheita. Aos colegas do Laboratório Regional do IIV do Lubango pela amizade e por todo o apoio prestado. À Fundação Calouste Gulbenkian e ao Instituto Nacional de Gestão de Bolsas de Estudo de Angola (INGBEA), pelas bolsas de Doutoramento concedidas.

ii À Direcção da Faculdade de Medicina Veterinária de Angola pela ajuda prestada durante as deslocações à província da Huíla para a realização dos trabalhos. À minha família em especial ao meu filho Erivaldo pelo apoio e incentivo demonstrados ao longo deste percurso. A todos quanto de algum modo contribuiram para a realização deste trabalho. O meu muito obrigado!

iii Resumo Estudo da microbiota láctica em leites fermentados artesanalmente consumidos no sul de Angola O omavele é um leite fermentado artesanalmente produzido pelas populações pastoris do sul e sudoeste de Angola. Os leites fermentados artesanalmente constituem uma parte importante da dieta das populações africanas e, para além de fornecerem nutrientes, têm a vantagem de se conservarem por longos períodos de tempo devido ao baixo pH e à presença de compostos que inibem o desenvolvimento tanto de microrganismos patogénicos como dos de decompo- sição. O processo de fabrico do omavele consiste em colocar o leite de vaca, imediatamente depois da ordenha, numa cabaça contendo ou não raízes ou cascas de plantas para acelerar a sua coagulação e a formação do “ngundi”. A fermentação decorre em cerca de 9 horas à temperatura ambiente. O objetivo do nosso estudo foi caracterizar a microbiota láctica presente no omavele de pro- dução artesanal, para se poderem produzir fermentos que serão utilizados na produção indus- trial do omavele. Analisou-se a composição química e a qualidade higio-sanitária do omavele tradicional. Nas 57 amostras de omavele colhidas em diferentes localidades da província da Huíla os teores médios microbianos foram: Lactobacilos (6,8 log10 ufc/mL), Lactococos (6,24 log10 ufc/mL),

Leveduras (5,82 log10 ufc/mL), Enterococos (4,48 log10 ufc/mL), Micrococos (3,74 log10 ufc/ mL), Enterobactérias (3,26 log10 ufc/mL) e Aeróbios totais a 30ºC (6,31 log10 ufc/mL). A identificação genética de 141 isolados, por técnicas de biologia molecular, revelou que as espécies mais identificadas foram Lb. plantarum/Lb. pentosus (31,20%), Lb. casei/Lb. pa- racasei (7,09%), Lb. plantarum (4,34%), Kazachstania unispora (9,92%), Saccharomyces cerevisiae (8,51%) e Issatchenkia orientalis (8,51%). Foram selecionadas estirpes para se constituírem três fermentos (FO1, FO2 e FO3) que foram usados para a produção industrial de três leites fermentados (O1, O2 e O3), cuja avaliação microbiológica 30 dias pós-produção revelou teores de microrganismos viáveis ≥ 7 log10 ufc/mL, demonstrando uma boa capacidade de sobrevivência ao processamento industrial. Após avaliação sensorial o omavele O1 foi o eleito entre os 3 leites produzidos.

Palavras-Chave: omavele, leite fermentado, Angola, PCR, produção industrial e avaliação sen- sorial.

iv Abstract Study of lactic microbiota in fermented milk consumed in the south of ­Angola The omavele is a fermented milk produced by artisan shepherd populations of the south and southwest Angola. The handmade fermented milks are an important part of the diet of African populations. In addition to providing nutrients they have the advantage of long shelf life due to the low pH and the presence of compounds that inhibit the growth of both pathogenic and spoilage microorganisms. The manufacturing process of omavele involves placing the cow’s milk, immediately after milking, in a gourd containing or not roots or bark of a plant to ac- celerate the coagulation and the formation of “ngundi”. Fermentation takes place in about 9 hours at room temperature. The aim of our study was to characterize the lactic microbiota present in handmade omavele, to be able to produce yeasts that will be used in the industrial production of omavele. We analy- zed the chemical composition and the hygienic quality of traditional handmade omavele. In 57 omavele samples collected in different localities of Huíla province the microbial ave- rage counts were: (6,8 log10 cfu/mL), Lactococci (6,24 log10 cfu/mL), Yeast

(5,82 log10 cfu/mL), Enterococci (4,48 log10 cfu/mL) Micrococci (3,74 log10 cfu/mL), Entero- bacteriaceae (3,26 log10 cfu /mL) and Total Aerobes at 30 ° C (6,31 log10 cfu/mL). The genetic identification of 141 isolates by techniques of molecular biology has shown that most species were Lb. plantarum / Lb. pentosus (31,20%), Lb. casei / Lb. paracasei (7,09%), Lb. plantarum (4,34%), Kazachstania unispora (9,92%), Saccharomyces cerevisiae (8,51%) and Issatchenkia orientalis (8,51%). Strains were selected to constitute three yeasts (FO1, FO2 and FO3) that were used for the industrial production of three fermented milks (O1, O2 and O3), whose microbiological evaluation 30 days after production revealed levels of viable microorganisms ≥ 7 log10 cfu/mL, demonstrating a good ability for industrial processing. After the sensory evaluation omavele O1 has been selected among the 3 milks produced.

Key words: omavele, fermented milk, Angola, PCR, industrial production and sensory evalua- tion.

v Índice Agradecimentos ...... ii Resumo...... iv Abstract...... v Lista de Figuras ...... ix Lista de Tabelas ...... x Lista de Abreviaturas e Siglas...... xi 1. Introdução...... 1 2. Revisão Bibliográfica...... 6 2.1. Leites fermentados...... 6 2.1.1. Definições e generalidades ...... 6 2.1.2. Tipos de leites fermentados ...... 7 2.1.3. Leites artesanalmente fermentados ...... 13 2.2. Produção de leites artesanalmente fermentados em África...... 20 2.2.1. Modo de produção ...... 20 2.2.2. Recipientes ...... 21 2.3. Microbiologia dos leites fermentados ...... 22 2.3.1. Características gerais das bactérias produtoras de ácido láctico ...... 24 2.3.1.1. Taxonomia e morfologia...... 24 2.3.1.2. Lactobacillus ...... 25 2.3.1.3. Lactococcus ...... 26 2.3.1.4. Leuconostoc ...... 27 2.3.1.5. Enterococcus...... 27 2.3.1.6. Pediococcus ...... 28 2.3.2. Leveduras ...... 29 2.3.2.1. Características gerais ...... 29 2.4. Metabolismo das bactérias produtoras do ácido láctico ...... 30 2.5. Composição química dos leites fermentados...... 31 2.6. Fermentos lácticos ...... 32 2.6.1. Definição e classificação...... 32 2.6.2. Função dos fermentos lácticos...... 34 2.6.3. Composição dos fermentos lácticos...... 35 2.6.4. Fermentos naturais...... 35 2.6.5. Fermentos lácticos não tradicionais ...... 37 2.7. Segurança higio-sanitária dos alimentos fermentados...... 37 2.8. Importância nutricional e terapêutica dos leites fermentados...... 39

vi 2.8.1. Importância nutricional dos leites fermentados...... 39 2.8.2. Importância terapêutica dos leites fermentados...... 42 2.8.3. Efeito probiótico ...... 42 2.9. Atividade antimicrobiana de bactérias lácticas em leites fermentados . . . . .47 2.9.1. Produção de compostos antimicrobianos...... 47 2.9.2. Bacteriocinas...... 49 2.10. Importância das bactérias lácticas na indústria de lacticínios...... 51 3. Materiais e Metódos...... 53 3.1. Produção artesanal do omavele ...... 53 3.1.1. Ordenha...... 53 3.1.2. Incubação e batedura ...... 53 3.2. Recolha de amostras...... 55 3.3. Análises fisico-químicas ...... 56 3.4. Análises microbiológicas ...... 57 3.4.1. Contagem de microrganismos Aeróbios Totais a 30ºC...... 57 3.4.2. Contagem de Bactérias lácticas ...... 57 3.4.2.1. Contagem de Lactobacilos...... 57 3.4.2.2. Contagem de Lactococos...... 57 3.4.2.3. Contagem de Enterococos...... 58 3.4.3. Contagem de Bolores e Leveduras...... 58 3.4.4. Contagem de Micrococos...... 58 3.4.5. Contagem de Enterobactérias...... 59 3.5. Isolamento e conservação de microrganismos...... 59 3.6. Identificação genotípica de Bactérias lácticas e Leveduras...... 59 3.6.1. Revivificação dos isolados selecionados ...... 60 3.6.2. Extração de ADN ...... 60 3.6.3. Amplificação do ADN por PCR...... 60 3.7. Seleção de estirpes para uso industrial...... 61 3.8. Produção de omavele na oficina tecnológica...... 63 3.9. Avaliação sensorial das três produções de omavele...... 64 3.10. Avaliação microbiológica das três produções de omavele...... 65 3.11. Análise estatística...... 65 4. Resultados e Discussão ...... 66 4.1. Composição química do omavele...... 66 4.2. Teores de microrganismos isolados de amostras de omavele...... 67

vii 4.3. Espécies identificadas no omavele em cada área de colheita ...... 76 4.4. Produção de leites fermentados tradicionais...... 92 4.5. Composição microbiana dos fermentos...... 93 4.6. Avaliação sensorial das três produções de omavele...... 94 4.7. Avaliação microbiológica dos leites fermentados O1, O2 e O3...... 96 5. Conclusões...... 99 6. Perspetivas ...... 100 Bibliografia...... 101 ANEXOS

viii Lista de Figuras Figura 1. Mapa de Angola e Província da Huíla em destaque...... 3 Figura 2. Leite acidificado omavele de produção industrial – Huíla...... 4 Figura 3. Leite fermentado omaere ou omavele produzido na República da Namíbia.. . . 5 Figura 4. Esquema geral da fermentação da glucose em ácido láctico. Adaptada de Caplice & Fitzgerald (1999)...... 31 Figura 5. Ordenha manual...... 53 Figura 6. Transferência do leite para a cabaça ...... 53 Figura 7. Agitação da cabaça (batedura)...... 54 Figura 8. Omavele ...... 54 Figura 9. Preparação artesanal do omavele...... 55 Figura 10. Mapa da província da Huíla – localidades em estudo...... 56 Figura 11. Teores médios dos diferentes microrganismos isolados em amostras de omavele durante o período em estudo...... 70 Figura 12. Espécies identificadas em isolados de amostras de omavele colhidas na localidade do Toco em 2009 e 2010...... 76 Figura 13. Espécies identificadas em isolados de amostras de omavele colhidas na localidade da Chibia em 2007, 2009 e 2010...... 77 Figura 14. Espécies identificadas em isolados de amostras de omavele colhidas na localidade da Humpata em 2007, 2009 e 2010 ...... 78 Figura 15. Espécies identificadas em isolados de amostras de omavele colhidas na localidade de Rio da Areia em 2007, 2009 e 2010...... 79 Figura 16. Espécies identificadas em isolados de amostras de omavele colhidas na localidade de Mulondo em 2007...... 80 Figura 17. Espécies identificadas em isolados de amostras de omavele colhidas na localidade da Huíla em 2010 ...... 81 Figura 18. Perfil sensorial dos leites fermentados O1, O2 e O3 produzidos com os fermentos FO1, FO2 e FO3...... 95

ix Lista de Tabelas Tabela 1. Principais leites fermentados consumidos nas diferentes regiões do mundo. Adaptada de Chandan (2013)...... 7 Tabela 2. Bactérias lácticas isoladas de produtos lácteos fermentados em África. Adaptada de Narvhus & Gadaga (2003)...... 23 Tabela 3. Composição química dos leites fermentados. Adaptada de Oberman & Libudzisz (1998)...... 32 Tabela 4. Composição química de alguns leites fermentados tradicionais produzidos em África. Adaptada de Bille (2009)...... 32 Tabela 5. Microrganismos utilizados na produção tradicional de leites fermentados. Adaptada de Oberman & Libudzisz (1998) ...... 36 Tabela 6. Oligonucleótidos universais...... 61 Tabela 7. Estirpes utilizadas para a produção do FO1 (TOCO)...... 62 Tabela 8. Estirpes utilizadas para a produção do FO2 (CHIBIA)...... 63 Tabela 9. Estirpes utilizadas para a produção do FO3 (RIO DA AREIA)...... 63

Tabela 10. Concentração de microrganismos (log10 ufc/mL) em 120 mL de cada um dos fermentos – FO1, FO2 e FO3 – na primeira e na segunda produção de omavele. . . .64

Tabela 11. Concentração (log10 ufc/mL) dos 3 grupos de microrganismos nos leites - O1, O2 e O3 – na primeira e na segunda produção de omavele, antes da fermentação...... 64 Tabela 12. Composição química de amostras de omavele...... 66

Tabela 13. Teores médios (log10 ufc/mL) dos diferentes microrganismos presentes no omavele obtidos nos diferentes anos...... 68

Tabela 14. Teores médios (log10 ufc/mL) dos diferentes microganismos presentes no omavele obtidos nas diferentes localidades...... 69 Tabela 15. pH e resultado da avaliação sensorial dos três omaveles (O1, O2 e O3) produzidos na oficina tecnológica do CERPTA...... 95 Tabela 16. Teores de microrganismos viáveis nos leites fermentados O1, O2 e O3

(log10 ufc/mL)...... 97

x Lista de Abreviaturas e Siglas ADN – Ácido Desoxirribonucleico ATP – Adenosina Trifosfato BAL – Bactérias lácticas ou bactérias produtoras de ácido láctico CERPTA – Centro de Investigação de Tecnologia de Alimentos da Faculdade de Veterinária da Universidade Autónoma de Barcelona CLA – Conjugated linoleic acid (Ácido linoleico conjugado) DNA – Deoxyribonucleic acid (Ácido Desoxirribonucleico) dNTP – deoxynucleotide triphosphate (deoxinucleotido trifosfato) EPS – Exopolissacáridos FAO – Food and Agriculture Organization (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação) FO1 – Fermento FO1 FO2 – Fermento FO2 FO3 – Fermento FO3 GRAS – Generally Recognized as Safe (substâncias geralmente reconhecidas como seguras) G+C – guanina+citosina do ADN IgA – Imunoglobulina A KAA – Kanamycin Aesculin Azide Agar (Canamicina Esculina Azida Agar) LPS – Lipopolissacarídeos Lb. – Lactobacillus Lc. – Lactococcus Leuc. – Leuconostoc MSA – Manitol Salt Agar MRS – Man, Rogosa and Sharpe Agar NCBI – National Center for Biotechnology Information (Centro Nacional de Informação para Biotecnologia) NSLAB – Non starter lactic acid bacteria (Bactérias produtoras de ácido láctico não iniciadoras) OMS – Organização Mundial da Saúde PCA – Plate Count Agar

xi PCR – Polymerase Chain Reaction (Reacção em cadeia da polimerase) PFGE – Pulsed-Field Gel Electrophoresis (Electroforese em campo pulsado) RGSA – Rogosa Agar RB – Rose Bengal Chloranfenicol Agar UAB – Universidade Autónoma de Barcelona UFC/mL – Unidades Formadoras de Colónias por mililitro. VRBGA – Violet Red Bile Glucose Agar WHO – World Health Organization (Organização Mundial de Saúde)

xii 1. Introdução A origem dos leites fermentados remonta à antiguidade, há mais de 10.000 anos, e provavel- mente está associada à história da própria civilização e à época em que o modo de vida do Homem foi mudando, quando este começou a domesticar as espécies animais produtoras de leite e a utilizar o seu leite (Tamime, 2002; Narvhus, 2003). Naquela época as tribos nómadas desenvolveram a arte de conservar o leite que produziam mediante o armazenamento em odres e recipientes de cerâmica ou de pele de animais, onde o leite fermentava graças à microbiota láctica acidentalmente adquirida após a ordenha, tornan- do-o num produto mais apetecível, cuja vida útil era mais longa do que a da matéria-prima (Oberman & Libudzisz, 1998; Ordoňez et al., 2005). Existem evidências arqueológicas de que algumas civilizações, como a dos Sumérios e Ba- bilónios na Mesopotâmia, a dos egípcios no tempo dos Faraós no nordeste de África e a dos Indo-Arianos na Ásia, já praticavam uma agricultura e pecuária que lhes permitia domesticar alguns animais produtores de leite como vacas, búfalas, cabras, ovelhas e éguas, em que o leite era destinado a ser consumido fresco ou fermentado. Provavelmente os leites fermentados são originários do Médio Oriente e Balcãs e foram evoluindo através dos tempos devido à criatividade culinária dos habitantes destas regiões (Tamime, 2002). Atualmente existem cerca de 400 nomes genéricos para leites fermentados artesanais e in- dustrializados, e muitos deles são denominações diferentes para o mesmo produto. Duma maneira geral os leites fermentados podem ser classificados de acordo com os microrganismos predominantes, incluindo os seus principais metabolitos, em: leites fermentados por bactérias lácticas mesófilas e termófilas; leites fermentados por leveduras (, ), muito conhe- cidos na Europa Oriental e Rússia; leites fermentados por bolores, dos quais o villi é o mais conhecido e é consumido principalmente na Finlândia (Tamime, 2002). Os produtos lácteos fermentados produzidos a partir de bactérias lácticas mesófilas são mais consumidos nos paí- ses do norte da Europa, enquanto os leites fermentados por leveduras são mais consumidos na Rússia, Mongólia e países da Europa Oriental. A produção dos leites fermentados artesanalmente encontra-se muito difundida na Ásia, Áfri- ca, Médio Oriente, Europa do Norte e Oriental (Savadogo et al., 2004). Em África, onde as temperaturas são elevadas e não existem condições para conservar o leite em ambiente de refrigeração, a fermentação do leite foi o modo de conservação mais corrente e mais seguro. Estes leites fermentados artesanalmente constituem uma parte importante da dieta das populações africanas e, para além de fornecerem nutrientes, têm a vantagem de se conservarem por longos períodos de tempo devido ao baixo pH e à presença de compostos que inibem o desenvolvimento tanto de microrganismos patogénicos como dos de decomposição

1 (Bille, 2009). Normalmente as famílias aproveitam os excedentes de leite para a produção de leites fermentados. Estes produtos possuem valor sociocultural e económico, proporcionando alguma renda às populações rurais, especialmente a mulheres e crianças, melhorando desta forma a segurança alimentar das famílias através da geração de empregos (Beukes, Bester & Mostert, 2001). De acordo com Jespersen (2003) os africanos, em geral, gostam e preferem os produtos lác- teos fermentados de modo artesanal. Segundo Wouters, Ayad, Hugenholtz e Smit (2002) a preferência dos africanos pelos leites artesanalmente fermentados prende-se com o “flavour” típico, o qual é conferido por culturas de arranque artesanais. Por outro lado a sabedoria po- pular, bastante considerada em África, faz referência às suas propriedades, considerando-os alimentos nutritivos, saborosos e de fácil digestão, o que tem sido corroborado por diversos estudos científicos. Os leites artesanalmente fermentados são considerados promotores de saúde uma vez que têm propriedades terapêuticas e por isso são tradicionalmente utilizados em África para o tratamento de algumas doenças e no desmame saudável das crianças. Estão em vantagem em relação a outros alimentos que podem representar um grande perigo por poderem veicular agentes patogénicos causadores de diarreia em crianças com idade inferior a 5 anos (Beukes et al., 2001; Jamaly, Benjouad & Bouksaim, 2011). Para além disso, vários autores referem a sua utilização na prevenção da hipertensão arterial, do cancro e de diarreias, assim como na redução do colesterol e da intolerância à lactose (Shuangqua, Burentegusi, Yu & Miyamoto, 2006; Akabanda, Owusu-Kwarteng, Glover & Tano-Debrah, 2010). Os leites naturalmente fermentados possuem uma grande diversidade de microrganismos, de modo que podem ser uma valiosa fonte de bactérias lácticas autóctones para a elaboração de culturas de arranque comerciais, que são utilizadas para a produção de leites fermentados em todo o mundo. Atualmente, com o grande crescimento do mercado de leites fermentados devido aos grandes benefícios para a saúde humana que lhes são atribuídos, é cada vez maior a pro- cura de estirpes lácticas com características tecnológicas peculiares e capacidade para aumentar o efeito nutricional dos mesmos em benefício da saúde. Os produtos artesanais, devido à sua forma de processamento, particularmente o tipo de recipientes e as condições ambientais, possuem microrganismos específicos que são responsáveis pela riqueza do “flavour”, os quais não podem ser imitados pelas modernas culturas de arranque (Beukes et al., 2001). À semelhança de muitos países Africanos, as populações pastoris de algumas regiões de Ango- la, particularmente do Sul, também produzem artesanalmente um leite fermentado com algu-

2 mas características semelhantes a outros produzidos em África, na Ásia e na América Latina, que toma designações distintas conforme a região. Na província da Huíla, onde o nosso estudo foi realizado, este leite é designado por omavele, mavele ou mayne. A província da Huíla, com uma área de mais de 166 000 Km2, situa-se a Sudoeste de Angola e desenvolve-se desde uma altitude acima de 2.000 m, que vai diminuindo de Norte para Sul e de Oeste para Este. A Noroeste existem montanhas com mais de 2.300 m de altitude que se espraiam por planaltos e planícies imensas, com uma altitude média de 1.100 m (Fig. 1).

Figura 1. Mapa de Angola e Província da Huíla em destaque.

Em termos gerais o clima é tropical, embora nas áreas situadas a maior altitude possa ser con- siderado temperado, como se verifica nas localidades da Humpata e Tchivinguiro. A província é uma potência em termos de produção agrícola e pecuária. As maiores concen- trações de gado encontram-se nas regiões a Sul e a Oeste, que são de menores altitudes, com fraca pluviosidade (< 750 mm) e grandes amplitudes térmicas (0-39ºC), tidas como regiões semiáridas de terras argilosas onde abundam os pastos doces e várias espécies arbustivas, algu-

3 mas de elevado teor proteico e energético para o gado, sendo por isso, uma região privilegiada para a pecuária (Neto & Almeida, 2006). As populações destas zonas, na sua maioria do grupo Nhaneca/Humbe, são pastoris e dedi- cam-se principalmente à criação de gado bovino, caprino e ovino. Vivem em pequenas aldeias familiares “eumbo”, em casas rudimentares construídas com materiais locais. Os currais para o gado bovino localizam-se, geralmente, próximo das habitações. O gado bovino desta região é do grupo Sanga, inserido nos pseudo-zebus de origem Africana, apresentando-se como predominantes os subtipos “Humbe” e “Mucubal”, já muito misturados devido ao comércio de gado autóctone, frequente na região desde longa data (Gomes, 2013). Este gado é dotado de grande rusticidade, pouco exigente do ponto de vista alimentar e de baixa produtividade. O principal propósito é a produção de leite que constitui um elemento importante da dieta da população. A extração diária do leite para consumo humano pode variar entre as estações do ano atingindo um máximo, cerca de dois litros ou mais por dia na estação chuvosa, enquanto na epóca seca a produção baixa para cerca de 0,5 a 1 litro ou mais por dia (Gomes, 2013). Na província da Huíla, mais concretamente na fazenda Jamba que se situa no município do Lubango, produz-se de modo semi-industrial um leite acidificado do tipo do omavele, o qual é fabricado com leite de vaca pasteurizado ao qual é adicionado um fermento lácteo comer- cial designado por “SACCO – SACCO”, importado de Itália. Este leite não tem qualquer semelhança com o omavele, quer no que respeita à tecnologia de produção quer à composição microbiológica (Fig. 2).

Figura 2. Leite acidificado omavele de produção industrial – Huíla.

Em Angola têm sido comercializados vários tipos de leites fermentados importados, entre os quais se pode destacar o omavele ou omarere produzido na vizinha República da Namíbia.

4 Esse leite, produzido à escala semi-industrial ou mesmo industrial, apresenta grandes dife- renças tecnológicas e microbiológicas em relação ao omavele que foi objeto do nosso estudo (Fig. 3).

Figura 3. Leite fermentado omaere ou omavele produzido na República da Namíbia.

O principal objetivo do nosso estudo foi o de caraterizar a microbiota láctica presente no omavele, o leite artesanalmente fermentado consumido no sul de Angola, para depois se po- derem constituir fermentos com microrganismos selecionados e com eles produzir, à escala semi-industrial, leites fermentados. O fermento capaz de produzir o leite fermentado com melhor avaliação sensorial seria escolhido para posterior produção industrial de omavele. O segundo objetivo era avaliar a microbiota láctea do omavele para podermos aferir a sua qua- lidade higio-sanitária. Assim, a primeira fase do nosso estudo foi realizada em Angola, onde acompanhámos a produção local do omavele e recolhemos as amostras que foram submetidas a análises físico-quimicas e microbiológicas para a contagem e isolamento de microrganismos. Na segunda fase os isolados presuntivos de bactérias lácticas e de leveduras foram identifica- dos, através de técnicas de biologia molecular, no laboratório do Centro Especial de Recerca Planta de Tecnologia dels Aliments (CERPTA) da Universidade Autónoma de Barcelona. Na terceira fase do trabalho selecionámos as estirpes, em função de condições definidas, para serem utilizadas na produção industrial do omavele. Na quarta fase produzimos, na oficina tecnológica do CERPTA, leite fermentado à escala semi-industrial com os fermentos cons- tituídos por estirpes de bactérias do ácido láctico (BAL) e de leveduras isoladas do omavele artesanal. Na quinta e última fase foi feita a avaliação sensorial do leite fermentado produzido na oficina tecnológica do CERPTA.

5 2. Revisão Bibliográfica 2.1. Leites fermentados 2.1.1. Definições e generalidades Os leites fermentados são produzidos a partir de leite inteiro, parcial ou totalmente desnatado, concentrado ou reconstituído, total ou parcialmente com leite magro em pó ou com produtos lácteos pasteurizados ou esterilizados, homogeneizados ou não, e fermentados através do uso de microrganismos específicos, que devem ser viáveis, ativos e abundantes no produto final durante o prazo de validade (Khurana & Kanawjia, 2007). O leite naturalmente fermentado apresenta-se como um coágulo branco, com sabor azedo e textura geralmente homogénea, com consistência semifluida a espessa. A composição do leite acidificado varia de acordo com a composição do leite utilizado para o produzir (Narvhus & Gadaga, 2003). Pode ser consumido como uma bebida nutricional refrescante ou utilizado como condimento de alimentos básicos ou ainda como alimento principal. A maioria do leite produzido em várias comunidades rurais africanas é consumido fresco ou fermentado, apenas uma pequena fração do leite produzido entra no setor comercial (Kebede, Viljoen, Gadaga, Narvhus & Lourens-Hattingh, 2007). A fermentação é uma das formas mais antigas de bioconservação dos alimentos praticada pela humanidade, sendo até hoje o modo de transformação mais utilizado em África para conservar os alimentos, prolongando assim a sua vida útil ou prazo de validade (Savadogo, Ouattara, Bassole & Traoré, 2006). Para além desse contributo na conservação dos alimentos, a fermentação tem também um grande impacto sobre a qualidade organolética e nutricional dos mesmos, tornando-os mais fá- ceis de digerir, aumentando os teores em aminoácidos essenciais, vitaminas e proteínas (Leroy & De Vuyst, 2004). No processo de fermentação as BAL são responsáveis pelas características organoléticas dos produtos fermentados, como resultado da degradação da lactose, da acidifi- cação e da produção de compostos aromáticos. Estas mudanças físico-químicas induzidas pelas BAL fermentativas exercem grande influência sobre a macroestrutura e as propriedades sensoriais dos produtos lácteos fermentados (Or- doñez et al., 2005; Samet-Bali, Ayadi & Attia, 2012). Segundo Vlieg e Hugenholtz (2007) a fermentação além de ter uma função importante na pre- servação dos alimentos, tem uma grande influência na sua qualidade organolética, na medida em que modifica as matérias-primas, transformando-as em produtos com novas propriedades sensoriais. A transformação química dos componentes da matéria-prima e a produção de meta- bolitos microbianos contribuem para o “flavour” e para o que se designa “sensação de boca”. Nos produtos lácteos, a lactose, o citrato, a gordura e as proteínas são convertidos numa vasta

6 gama de compostos voláteis e não voláteis responsáveis pelos sabores e aromas agradáveis dos produtos fermentados. De acordo com Abeer, Abdel e Dardir (2009) a fermentação, atualmente, tem sido utilizada não só para impedir o desenvolvimento de algumas bactérias patogénicas e de decomposição, mas também para melhorar a digestibilidade de produtos lácteos fermentados, uma vez que du- rante a fermentação ocorre a degradação e inativação de fatores antinutritivos e de toxinas.

2.1.2. Tipos de leites fermentados Os leites fermentados, quer os artesanais quer os industriais, são produzidos em várias regiões do globo terrestre, especialmente nos países da Europa do Norte e do Mediterrâneo, de África, da Ásia e do Médio Oriente, como se pode observar na Tabela 1.

Tabela 1. Principais leites fermentados consumidos nas diferentes regiões do mundo. Adaptada de Chandan (2013).

Produto Principal País/região Acidophilus milk USA, Rússia Turquia, Azerbeijão, Bulgária, Macedónia, Cazaquistão, Quirguistão Ayrani Chipre Busa Turquistão Turquemenistão Cieddu Itália Cultured USA Dahi/dudhee/dahee Índia Donskaya/varenetes/kurugna/ryzhenka/guslyanka Rússia Dough/ abdoogh/mast Afeganistão, Irão Ergo Etiópia Filmjolk/fillbunke/fillbunk/surmelk/taettemjolk/tettemelk Suécia, Noruega, Escandinávia Gioddu Sardenha Gruzovina Jugoslávia Iogurte Portugal, Brasil Jugurt/eyran/ayran Turquia Katyk Transcaucásia Kefir, Koumiss/Kumys Rússia, Ásia Kissel maleka/naja/yaourt/urgotnic Balcãs Kurunga Ásia Ocidental , , Ghol, Chhas Índia, Bangladesh, Paquistão, Nepal /laban/laban rayeb Líbano, Síria, Jordânia Mazun//matsun/matsoni/madzoon Arménia Mezzoradu Sicília

7 Tabela 1. Principais leites fermentados consumidos nas diferentes regiões do mundo. Adaptada de Chandan (2013). (Continuação)

Produto Principal País/região Pitkapiima Finlândia Roba/rob Iraque Shosim/sho/thara Nepal India, Paquistão Índia Islândia Tan/Tahn Arménia Tarag Mongólia Tarho/taho Hungria Finlândia Japão Yiaourti Grécia Ymer Dinamarca Zabady/zabade Egito, Sudão

Os leites fermentados produzidos em países do Norte da Europa constituem um grupo de produtos diferentes dos produzidos noutros países devido às suas propriedades físicas, carac- terizando-se por serem muito viscosos e filamentosos. Em função da composição microbiana do fermento, os leites fermentados tradicionais classi- ficam-se em leites do tipo I, II, III e IV (Oberman & Libudzisz, 1998). Os leites fermentados produzidos na Escandinávia, Europa Central e Oriental consideram-se do tipo I, uma vez que os fermentos utilizados na sua produção são compostos por estirpes mesófilas de lactococos Lactococcus( lactis subsp. lactis, Lactococcus lactis subsp. cremoris e Lactococcus lactis biovar diacetylactis) coadjuvados com alguma frequência por estirpes de Leuconostoc mesenteroides subsp. cremoris e algumas vezes por Leuconostoc mesenteroides subsp. dextranicum. Alguns leites produzidos na Finlândia e Suécia, denominados viili (vilia ou filia) e langfil, similares ao tettemelk, são exemplo disso. Na produção do viili é usado leite não homogeneizado, inoculado com uma cultura composta por estirpes de Lactococcus lactis subsp. lactis, Lactococcus lactis subsp. cremoris e Lactococcus lactis subsp. lactis biovar dia- cetylactis produtoras de exopolissacáridos (EPS), por estirpes de Leuconostoc mesenteroides subsp. cremoris e por bolores como Geotrichum candidum, que no seu todo contribuem para realçar o sabor (Oberman & Libudzisz, 1998; Roginski, 2002; Kahala et al., 2008). Durante o processo de produção ocorre a formação de uma camada de gordura, que normalmente se encontra coberta por bolores. É caracterizado por um sabor acre agradável, um aroma agradá- vel a diacetilo e uma textura viscosa ou filamentosa devido à presença de exopolissacáridos,

8 principalmente produzidos por Lactococcus presentes nos fermentos durante a fase de cresci- mento (Kahala et al., 2008). Na Suécia produz-se o filmjolk ou kulturmjolk (cultured milk), que é muito popular e seme- lhante aos anteriores. Este leite carateriza-se por ter um sabor suave, elevada viscosidade e um aroma intenso típico devido à formação de diacetilo e dióxido de carbono, sendo con- sumido desde longa data como uma bebida refrescante. O fermento é composto por estirpes de Lactococcus lactis subsp. lactis, Lactococcus lactis subsp. lactis biovar diacetylactis e Leuconostoc mesenteroides subsp. cremoris, as duas últimas além de realçarem o sabor e o aroma são produtoras de exopolissacáridos (Roginski, 2002). Há outras variantes deste leite, que são obtidas ao adicionar estirpes probióticas de lactis e algumas es- tirpes de Lactobacillus acidophilus, Lactobacillus casei e Lactobacillus reuteri. Uma outra variante é obtida quando se adiciona ao leite uma estirpe de Lactococcus lactis subsp. lactis L1A, isolada a partir do leite fermentado tradicional tätte (Fondén, Leporanta & Svensson, 2006). Narvhus (2003) faz referência à produção de tettemelk ou tatmjoek, um leite fermentado tradi- cional produzido no meio rural da Noruega, que se carateriza por ser viscoso e ter um aroma e sabor apetecíveis, podendo ser conservado por longos períodos de tempo. Tradicionalmente o tettemelk é produzido através da adição ao leite de uma porção do produto anterior ou, na falta daquele, através da adição de folhas da planta carnívora Pinguicula vulgaris ao leite ainda não acidificado, estas folhas ajudam a desenvolver a viscosidade. É consumido como um acompanhante de saladas, carnes secas e como sobremesa misturado com marmelada ou açúcar e canela ou misturado com cereais. Considera-se que o tettemelk possui propriedades terapêuticas, pelo que é utilizado para tratar alguns problemas de pele, como eczemas, parasi- toses e para o tratamento de diarreias. Segundo Wang et al. (2011), em Taiwan consomem-se leites fermentados muito saborosos, com consistência firme e cheiro agradável, semelhantes ao viili produzido na Finlândia, cujo fermento é maioritariamente composto por estirpes de Lactococcus lactis subsp. cremoris e de Leuconostoc mesenteroides subsp. mesenteroides e leveduras como Kluyveromyces marxianus, Pichia fermentans e Saccharomyces unisporus. Na América do Norte, concretamente nos Estados Unidos da América, os leites fermentados ou cultured buttermilk são produzidos com leite desnatado ou semidesnatado pasteurizado, ao qual se adicionam bactérias mesófilas produtoras de ácido láctico, como Lactococcus lactis subsp. lactis e Lactococcus lactis subsp. cremoris e bactérias aromatizantes como Leuconos- toc citrovorum e Lactococcus lactis subsp. lactis biovar diacetylactis. Nos Estados Unidos da América produz-se ainda um outro leite fermentado, o acidophilus milk, que é um leite muito

9 ácido, por vezes amargo, com sabor pouco agradável para o consumidor, mas muito recomen- dado para pessoas com transtornos digestivos. Os leites fermentados do tipo II são produzidos com fermentos que apenas contêm estirpes de Lactobacillus e são típicos da Bulgária e de algumas regiões do Azerbeijão. O iogurte búlgaro, o bulgarian milk, é um exemplo deste tipo de leites. Na sua produção é usado leite de vaca ou de cabra fervido, que é inoculado com uma porção de leite fermentado da produção anterior, após o que é posto a fermentar a uma temperatura próxima dos 45ºC. Para a produção indus- trial deste produto utiliza-se um fermento composto por estirpes de Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus, algumas vezes adicionado de estirpes de Streptococcus thermophilus (Ober- man & Libudzisz, 1998). O yakult, comercializado no Japão, é preparado com leite desnatado, ao qual se adiciona gluco- se, extrato de Chlorella e estirpes de Lactobacillus casei var. Shirota. Possui um conteúdo em sólidos totais muito baixo, quando comparado com outros produtos lácteos e tem sido utilizado no tratamento de várias doenças intestinais (Oberman & Libudzisz, 1998). Os leites fermentados do tipo III são, de uma maneira geral, produzidos maioritariamente por estirpes termófilas, selecionadas a partir da microbiota natural do leite, principalmente Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus e Streptococcus thermophilus. Entre os leites fer- mentados produzidos com bactérias lácticas termófilas o mais conhecido é o iogurte, embora existam outros semelhantes produzidos em várias regiões, a nível mundial. O iogurte original é preparado com leite de cabra ou de vaca fervido, arrefecido até à temperatura de 40-45ºC e posteriormente inoculado com uma porção de leite previamente acidificado. A temperatura do recipiente que contém o leite inoculado deverá manter-se constante, para tal o recipiente deverá ser completamente envolvido em peles e colocado num forno onde permanecerá cerca de 8 a 10 horas. O iogurte é viscoso, tem consistência firme e é coeso. Na Islândia produz-se o leite fermentado skyr, feito a partir de leite desnatado e pasteurizado a 90-100ºC, ao qual se adiciona um fermento composto por Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus e por lactobacilos mesófilos Lactobacillus helveticus e Lactobacillus brevis. Um outro modo de obter o skyr é através da adição de 2% de skyr do dia anterior, desde que seja de boa qualidade. Após a fermentação faz-se a remoção do soro por filtração, para se obter um produto mais concentrado. No entanto, existem fermentos comerciais para a produção de skyr à escala industrial, os quais são constituídos por outras espécies de bactérias lácticas, tais como: Streptococcus thermophilus, Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus e Lactobacil- lus casei (Fondén et al., 2006). No Mediterrâneo, mais precisamente nos Balcãs, faz-se referência à produção de mladost, que é um leite fermentado, produzido a partir de leite inteiro ou desnatado pasteurizado a 85 ºC,

10 ao qual se adiciona um fermento composto por estirpes de Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus. O período de incubação é de 10-14 horas e uma vez atingido 1,5-1,8% de ácido láctico o produto é refrigerado e armazenado à temperatura de 10ºC (www. Monografias.com/ trabajos 30/leche-kefir/leche-kefir.shtmL). Ortu et al. (2007) referem o leite fermentado italiano gioddu, que é produzido na Sardenha a partir de leite de ovelha ou de cabra e ao qual se adiciona um fermento constituído, predo- minantemente, por estirpes de Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus e de Lactococcus lactis subsp. lactis. O leite fermentado zabady, muito conhecido na Etiópia e em alguns países do Médio Oriente, é tradicionalmente produzido a partir de leite de búfala ou de vaca ou ainda de uma mistura dos dois tipos de leite. No processo de produção do zabady o leite é parcialmente desnatado e posteriormente fervido e inoculado com uma porção de zabady da produção anterior, a que se segue incubação a 42 ºC. Streptococcus thermophilus e Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus são as espécies isoladas do zabady e com responsabilidade na fermentação do leite (El-Baradei, Delacroix-Buchet & Ogier, 2008). Na Turquia, o leite fermentado ayran é produzido a partir de leite de cabra ou de ovelha e por vezes de leite de vaca. Ao leite é adicionado um fermento composto por Streptococcus ther- mophilus e Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus (El-Baradei et al., 2008). Na Síria produz-se o labneh ou laban, um leite fermentado tradicional muito popular, com uma textura lisa, suave, barrável, ou seja, com uma consistência que permite o seu espalhamento, com um aroma limpo e um sabor acidificado. É produzido a partir de leite de vaca, ovelha, cabra ou búfala. À escala industrial é produzido com leite pasteurizado ao qual se adiciona um fermento composto por estirpes de Streptococcus thermophilus e Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus. Quando se pretende obter um produto com características defenidas utili- zam-se, por vezes, estirpes de Lactococcus lactis subsp. cremoris e diferentes combinações de algumas estirpes de Enterococcus faecalis isoladas a partir do laban rayeb (Chammas, Saliba, Corrieu & Béal, 2006; Sarkar, 2008). Rashid, Togo, Ueda e Miyamoto (2007) referem que na Índia e países vizinhos se produzem, de modo artesanal, diferentes tipos de leites fermentados. Estes leites são produzidos a partir de leite de várias espécies de mamíferos (búfalas, vacas e cabras) ou de uma mistura de leite de búfala e de leite de vaca. Na produção do dahi, que é semelhante ao iogurte, do lassi, do shrikhand e do payodhi, são usados fermentos contendo estirpes termófilas. Chandan (2013) refere que a utilização do fermento certo é essencial para a produção de dahi de boa qualidade. Uma cultura mista contendo estirpes de Lactococcus lactis subsp. lac- tis, Lactococcus lactis subsp. diacetylactis ou espécies de Leuconostoc e Lactococcus lactis

11 subsp. cremoris na proporção de 1: 1: 1 pode ser utilizada. Além disso, podem ser empregues Streptococcus thermophilus, ou uma cultura composta por Lactococcus lactis subsp. lactis e Lactococcus lactis subsp. diacetylactis. Desde tempos remotos que o dahi é um dos leites fermentados mais consumidos na Índia, sendo produzido a partir de leite pasteurizado ou fervido, fermentado naturalmente ou através da utilização de uma cultura da produção anterior contendo bactérias lácticas e outras bacté- rias fermentativas. É um produto semissólido, com consistência firme, aroma agradável e um sabor acidificado. Para a produção de leites fermentados do tipo IV utilizam-se, geralmente, fermentos com- postos por uma mistura de diferentes bactérias lácticas, leveduras e por vezes micrococos e bactérias produtoras de ácido acético como Acetobacter (Oberman & Libudzisz, 1998). Neste grupo encontram-se os leites fermentados kumis e kefir, entre outros. O kumis é um leite fermentado com alguma percentagem de álcool, proveniente do sul da Rússia, da Mongólia, Quirguistão e Sibéria. Tradicionalmente era produzido com leite de égua não pasteurizado e fermentado através da utilização de uma cultura de leveduras e de bactérias lácticas (Wouters et al., 2002; Hao et al., 2010). Atualmente, para a produção in- dustrial do kumis utiliza-se leite de vaca, ao qual se adiciona 2,5% de açúcar e 10 a 30% de um fermento constituído por estirpes de Lactobacillus acidophilus, Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus, Lactobacillus delbrueckii subsp. lactis e Saccharomyces lactis (atualmente chama-se Kluyveromyces lactis). No entanto, podem ser utilizadas outras bactérias como Lac- tococcus lactis subsp. lactis, Lactococcus lactis, Lactobacillus kefiranofaciens, Lactobacillus bulgaricus (atualmente designado por Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus), que têm a função de promover a acidificação do leite, enquanto as leveduras fermentadoras da lactose Kluyveromyces marxianus e Candida kefyr promovem a fermentação alcoólica (Oberman & Libudzisz, 1998; Danova, Petrov, Pavlov & Petrova, 2005). O kefir é outro leite fermentado tradicional, com alguma percentagem de álcool, proveniente da região do Cáucaso. Caracteriza-se por um coalho compacto e uniforme, sabor fresco, li- geiramente ácido e gaseificado, aroma a leveduras e textura cremosa, consumido como uma bebida refrescante (Oberman & Libudzisz, 1998). Quando agitado liberta gás, responsável pela formação de espuma. Para a sua produção utiliza-se leite, que pode ser de cabra, de ovelha ou de vaca, e que é inoculado com grãos de kefir. Os grãos de kefir contêm uma mistura complexa de microrganismos como Kluyveromyces marxianus, Saccharomyces cerevisiae, Torulaspora delbrueckii e Candida kefir. Por vezes encontram-se associados aos grãos de kefir alguns lactococos mesófilos homo e heterofermentativos, lactobacilos termófilos, espécies do género Leuconostoc e leveduras quer fermentadoras de lactose quer não fermentadoras de lactose.

12 Dos grãos de kefir podem ainda fazer parte Acetobacter aceti e Acetobacter rancens, que têm como função manter em simbiose os diferentes microrganismos que fazem parte dos referidos grãos e melhorar a consistência dos mesmos, através do aumento da sua viscosidade. Oberman e Libudzisz (1998) e Wouters et al. (2002) fazem referência ao leite fermentado produzido na Arménia, o matzoon, que tem alguma percentagem de álcool. No Sudão produz-se o gariss, um leite fermentado feito com leite de dromedária. Tradicio- nalmente o leite é posto a fermentar em dois grandes sacos de couro que são atados à sela de montar do dromedário. O fermento usado é constituído não só por lactobacilos (Lactobacillus delbrueckii subsp. lactis e Lactobacillus helveticus) mas também por leveduras pertencentes aos géneros Candida e Kluyveromyces (Abd El-Salam, 2002). Nos países do Leste da Europa, particularmente na Rússia, para além dos leites acima referi- dos existem muitos outros com várias designações. Nuns casos o leite sofre uma fermentação homolática por ação de Lactobacillus acidophilus. Noutros casos, o leite pasteurizado mistu- rado com natas é sujeito à ação de um fermento composto por Streptococcus salivarius subsp. thermophilus e Lactobacillus acidophilus. O é um produto lácteo que, hoje em dia, é mundialmente consumido. É um produto semissólido, obtido a partir da fermentação de leite pasteurizado de vaca ou de outras espécies animais, em que o fermento é constituído por uma mistura simbiótica de Streptococcus thermo­ philus e Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus. Em alguns países considera-se iogurte o produto resultante não só da ação daquelas bactérias mas também de culturas adjuvantes pro- bióticas como: Lactobacillus acidophilus, Bifidobacterium spp., Lactobacillus reuteri, Lacto- bacillus casei, Lactobacillus rhamnosus GG, Lactobacillus gasseri e Lactobacillus johnsonii LA1. Para obter uma consistência cremosa o leite de vaca é geralmente enriquecido com leite em pó desnatado, concentrado de proteínas lácteas ou leite desnatado concentrado (Chandan, 2013). Existe uma grande variedade de iogurtes disponíveis no mercado, desde os naturais, os com sabor de frutas, os batidos, os líquidos, os fumados e os congelados (Robison, Tamime & Wszolek, 2002).

2.1.3. Leites artesanalmente fermentados A fermentação espontânea dos alimentos tem uma longa história em África e no mundo em geral. A produção destes leites baseia-se em conhecimentos adquiridos por transmissão oral pela maioria da população. Os alimentos fermentados têm, em geral, um valor socioeconómico significativo, quer em países em vias de desenvolvimento quer em países desenvolvidos. Os leites fermentados de produção artesanal, desde longa data tradicionalmente consumidos em muitos países, são muito valorizados devido ao seu sabor, ao seu valor nutritivo e às suas

13 propriedades terapêuticas (Beukes et al., 2001; Mathara, Schillinger, Kutima, Mbugua & Hol- zapfel, 2004; Nakasaki, Yanagisawa & Kobayashi, 2008). Os produtos lácteos produzidos artesanalmente constituem uma parte muito importante da dieta diária das comunidades de alguns países em vias de desenvolvimento, sobretudo do con- tinente Africano e Asiático, do Médio Oriente e da América Latina, constituindo também, uma fonte de rendimentos para as mesmas. A natureza destes produtos difere de uma região para a outra, sendo influenciada pela microbiota autóctone local, que por sua vez reflete as condições climáticas da área e depende do tipo de leite utilizado, do pré-tratamento, das condições de fermentação e do tratamento posterior (Savadogo et al., 2006). Apesar dessa diferença, estes produtos têm em comum a fermentação por bactérias lácticas a que são sujeitos (Abd El Ga- wad, Abd El Fatah & Al Rubayyi, 2010). Vários investigadores referem que os leites naturalmente fermentados possuem elevados teores de bactérias lácticas, que são frequentemente utilizados como fermentos na produção industrial de alimentos fermentados, em particular na indústria de lacticínios. Muitas destas bactérias têm capacidade para sintetizar exopolissacáridos que contribuem favoravelmente para a textu- ra e propriedades reológicas dos produtos alimentares, para além de provocarem a sua acidifi- cação, resultante da produção de ácido láctico e ácido acético que são responsáveis pelo sabor e pelo aroma dos produtos (Duboc & Mollet, 2001;Caridi, 2003; Savadogo et al., 2004a). Existem referências sobre a produção, em África, de vários tipos de leites naturalmente fermen- tados, como por exemplo o ergo. Este leite é produzido na Etiópia e resulta da fermentação na- tural do leite durante um determinado período de tempo, em que se vai adicionando diariamente quantidades de leite fresco ao já existente no recipiente, até que se atinja a acidez desejável. É um produto de cor branca, viscoso, de textura uniforme, sabor e aroma agradáveis. A partir do ergo pode-se fazer a manteiga, o kibe, que se conserva por um período de tempo que varia entre 15 e 20 dias (Gonfa, Foster & Holzapfel, 2001; Assefa, Beyene & Santhanam, 2008). A população de pastores do sul da Etiópia, mais precisamente da região de Borena, consome tradicionalmente um leite fermentado denominado ititu, que se caracteriza por ter um sabor próprio a leite fumado, e isto porque fermenta num recipiente (gorfa ou amuyou) previamente defumado com o fumo resultante da combustão de uma planta denominada Acacia nilotica (Food and Agriculture Organization of United Nations [FAO]1990; Assefa et al., 2008). A preparação do ititu é em tudo semelhante à do leite fermentado naturalmente ergo, exceto no que diz respeito ao período de fermentação, que no ititu é mais longo, são cerca de 14 dias. Durante este período vai-se retirando o soro e adicionando leite fresco. O ititu é um produto de cor branca, mais consistente que o ergo, muito semelhante a um queijo branco tradicional, cujo sabor e cheiro são do agrado dos consumidores locais (FAO,1990; Gonfa et al., 2001; Ashenafi, 2006).

14 Algumas tribos do Quénia, como os Massai, os Turkana, os Kalenjins, os Somalis e os Meru produzem de modo tradicional um leite fermentado denominado iria ri mattii, para o que utilizam cabaças, que mais não são do que recipientes feitos a partir do fruto de plantas da família das Cucurbitaceae, que neste caso é a Lagenaria leucantha. Este fruto depois de seco é esvaziado do seu conteúdo e o seu interior é raspado com os talos de uma planta, o mutero (Olea africana), para se obter uma superfície uniforme e lisa. Em seguida o interior da cabaça é defumado com o fumo resultante da combustão do mutero (Kimonye & Robinson, 1991). No Quénia é também produzido o maziwa lala, que significa leite dormido ou maziwa mgan- do leite azedo coagulado, que também é produzido na vizinha Tanzânia. Neste caso, quer se utilize leite cru ou leite aquecido, recorre-se à filtração para uma panela de barro ou para uma cabaça defumada ou não, que é colocada num local quente durante 1 a 5 dias. Diariamente são adicionadas quantidades de leite fresco ao leite já existente nos recipientes, retirando-se por vezes o soro, para aumentar os sólidos totais e/ou a viscosidade, antes do completo en- chimento da cabaça. O mala é um produto comercial semelhante ao maziwa lala, processado industrialmente a partir de culturas de arranque mesófilas (Miyamoto,Gichuru, Akimoto & Nakae, 1989 ). No sul do Quénia e norte da Tanzânia as comunidades Massai produzem o leite fermentado tradicional kule naoto, tido como um alimento indispensável para aquela comunidade, que raramente consome cereais. Este leite fermentado é o resultado da fermentação espontânea do leite de zebu ou de vaca, pasteurizado ou não, adicionado de sangue fresco, colocado numa cabaça obtida a partir do fruto da Lagenaria siceraria, previamente defumada com ramos e folhas de Eucalyptus ou de Euclea divinorum, em que o período de fermentação é de apro- ximadamente cinco dias. O produto tem uma consistência similar à do iogurte comercial ou queijo fresco e tem um sabor agradável (Mathara et al., 2004; Mathara et al., 2008) Na África do Sul os leites fermentados tradicionais dão pelos nomes de maas, amasi, inkomasi e sethemi. Resultam da fermentação do leite à temperatura ambiente (25-30ºC) durante 2 a 3 dias, em cabaças ou panelas de barro que já tenham sido utilizadas. Após o leite ter coagulado retira-se o soro e volta-se a colocar mais leite no recipiente. À medida que se vai removendo o soro obtêm-se um produto viscoso e mais consistente do que o iogurte normal. O leite fer- mentado amasi produzido na África do Sul e no Lesotho é frequentemente consumido com papa de milho como refeição principal ou com sorgo entre as refeições (Gadaga, Mutukumira, Narvhus & Feresu, 1999; Gadaga, Mutukumira & Narvhus, 2000; Todorov, Nyati, Meincken & Dicks, 2007). Duma maneira geral, neste tipo de produtos, é comum ocorrer uma fermenta- ção mista entre bactérias homo e heterofermentativas tais como Lactobacillus, Streptococcus, Leuconostoc e leveduras (FAO, 1990; Beukes et al., 2001; Bille, 2009).

15 O leite fermentado designado por mafi é produzido não só no Lesotho mas também na África do Sul pelos Sotho, sendo preparado em panelas de barro de modo semelhante ao amasi (Beu- kes et al., 2001). O soro do leite é, normalmente, retirado da coalhada do leite e é utilizado como condimento ou consumido acompanhado de sorgo grosso ou papa de farinha de milho (Gadaga, Lehohla & Ntuli, 2013). O mafi é semelhante ao leite fermentado tradicional produzido no Botsuana, o madila. Para a sua produção o leite fresco é filtrado, através de um coador, para um balde de esmalte/metal que é mantido num lugar quente (± 30 ºC) durante 24 horas, para iniciar a fermentação. Du- rante 7 a 8 dias vai-se adicionando, diariamente, leite azedo ao leite fermentado contido num saco, e durante esse período de tempo o leite vai fermentando. O saco é, então, pendurado numa viga por três ou quatro dias, durante os quais o soro se vai escoando. Antes do consumo ou venda o madila é removido do saco e misturado com leite fresco numa proporção de 4:1 (Ohiokpehai & Jagow, 1998). No Zimbabwe os leites naturalmente fermentados são denominados hodzeko, amasi ou muka- ka wakakora. Resultam da fermentação espontânea de leite de vaca não pasteurizado, em pa- nelas de barro ou de alumínio ou em cabaças, durante dois a três dias à temperatura ambiente. Algumas vezes uma pequena quantidade de amasi é adicionada ao leite fresco para acelerar o processo de fermentação (Gadaga et al., 2000; Todorov et al., 2007). Estes leites apresentam uma consistência ligeiramente mais espessa do que o iogurte, um sabor suave e um aroma agradável devido ao ácido láctico e a compostos voláteis produzidos pela mistura de micror- ganismos. O produto depois de agitado apresenta uma consistência líquida e é frequentemente consumido com a tradicional papa de milho sadza ou misturado com outros cereais (Ferusu & Muzondo, 1990; Gadaga et al., 2000). Em Marrocos, na Tunísia e no Líbano é muito popular o leite fermentado tradicional que dá pelos nomes de leben ou lben, consoante o país. Tradicionalmente, para a produção do lben e de outros leites fermentados semelhantes, o leite fermenta espontaneamente (sem a adição de fermento) à temperatura ambiente até que ocorra a sua coagulação, o que pode acontecer em 24 a 72 horas (Benkerroum & Tamime, 2004; Samet-Bali et al., 2012) ou através da ino- culação de uma porção da produção anterior que contém bactérias lácticas e outras bactérias fermentativas em leite semidesnatado, para tornar o processo de fermentação mais expedito. Conserva-se bem por um período de três dias à temperaturade 4ºC. Quando batido pode ser transformado em manteiga (Ouadghiri et al., 2009). Na Nigéria e no Gana os grupos étnicos Hausa e Fulani produzem um leite naturalmente fermentado denominado nono ou nunu, em função da tribo. O leite fresco não pasteurizado é colocado num recipiente, que pode ser ou uma cabaça ou uma panela de barro ou um balde de

16 plástico, e fica a incubar durante dois a três dias. Durante este período ocorre a libertação de uma grande quantidade de soro, havendo por isso a necessidade de agitar o recipiente para que o produto final tenha uma consistência uniforme. O nono ou nunu tem um sabor semelhante ao do iogurte e pode ser consumido ao natural ou com açúcar (Bankole & Okagbue, 1992; Iwuoha & Eke, 1996; Akabanda et al., 2010; Okonkwo, 2011). Obodai e Dodd (2006) referem que no Gana é produzido o leite fermentado nyarmie, que à semelhança de tantos outros também resulta da fermentação espontânea do leite que foi pas- teurizado à temperatura de 65-75 ºC, durante 30-45 minutos. Segundo Ogbonna, David, Waba e Eze (2012) na Nigéria existem ainda duas variantes do nono, uma é o kesham (um nono aguado) e a outra é o kindrimo (um nono semissólido), as- sim designados na língua local da tribo Fulani. O leite destinado à sua produção é submetido a fervura durante 20 minutos, depois é transferido para uma cabaça ou outro recipiente onde ocorre a fermentação durante 12-24 horas. Quando necessário adiciona-se ao leite morno ou frio uma porção da produção anterior. No Mali produz-se o leite fermentado kadam, que é uma bebida tradicional refrescante muito consumida no verão. Durante a sua produção há acumulação residual do leite à medida que vai acidificando. Dependendo da estação do ano a acidificação pode levar horas ou vários dias (FAO, 1990). Wullschleger et al. (2013) referem a produção do fené no Mali, um leite fermentado feito a partir de leite cru aquecido a uma temperatura superior à da pasteurização, em que a fermen- tação é espontânea e ocorre à temperatura ambiente. O fené tem uma textura cremosa e um sabor levemente azedo semelhante ao do iogurte. Num bom fené estes atributos são os mais apreciados pelos consumidores. O leite fermentado rayeb, muito popular no meio rural do Egito, é feito tradicionalmente com leite de búfala, em que a fermentação é espontânea. A sua produção é semelhante à de outros leites fermentados, em que há a intervenção de BAL e de outros microrganismos (Abd El Gawad et al., 2010). No Uganda produzem-se os leites fermentados chekapmkaika e kwerionik. Estes leites são produzidos, principalmente, pelas tribos pastoris, incluindo os Bahima que habitam a zona ocidental do Uganda. Nesta zona do Uganda utiliza-se mais o leite de zebu do que na zona oriental, onde é mais utilizado o leite de vacas da raça “Ankole-Watusi”. A cabaça usada para a fermentação é defumada. O kwerionik é produzido de forma tradicional, em que o leite cru é introduzido numa cabaça defumada e deixado a fermentar à temperatura ambiente durante 3 a 7 dias, sendo consumido durante este período. Quando este leite permanece em fermentação por um período de 28 dias passa a denominar-se por katanik; se o período de

17 fermentação é superior a 29 dias, que se pode prolongar por um ano, então passa a deno- minar-se chekapmkaika . Durante este período vai-se removendo o soro e adicionando leite fresco ou fervido de dois em dois dias ou uma vez por semana, o que está dependente da temperatura ambiente. Para melhorar qualidade do chekapmkaika durante o armazenamento é conveniente remover, antes da adição de leite, a camada superficial que é suscetível de conter fungos (Schutte, 2013). Em algumas áreas rurais do Sudão produz-se de modo tradicional um leite fermentado muito popular denominado rob ou roub, em que o leite é inoculado com uma porção da produção anterior, que contêm bactérias lácticas e outras bactérias fermentativas. Normalmente utiliza- -se o leite de vaca e/ou de ovelha e de cabra (Abdelgadir, Ahmed & Dirar, 1998). O recipiente utilizado para a fermentação do leite pode ser um saco feito com pele de cabra ou então uma cabaça (bukhssa). No entanto, os mesmos autores referem que para a produção de roub com um bom “flavour” o leite é fermentado num recipiente denominado dayyara e batido num ou- tro denominado khashash. Quando fresco e com um pH de 4,5 tem um sabor agradável, sendo nesta altura consumido como uma bebida refrescante (Abdelgadir et al., 1998; Abdelgadir, Hamad, Moller & Jakobsen, 2001). No Sudão produz-se um outro leite fermentado o mish, que é um produto caseiro tradicional obtido através da adição de uma pequena quantidade de soro do leite laben-rayeb ou do mish ao leite previamente aquecido, ao qual se adicionam especia- rias ao 2º ou 3º dia de fermentação, momento em que está pronto para o consumo (Abdalla & Ahmed, 2010). A intensidade das especiarias varia de região para região, de família para família na mesma área, da disponibilidade das especiarias e do gosto da população (El-Mardi, 1988 citado por El-Zubeir et al., 2005). O mish é, normalmente, consumido como um queijo fresco ou em saladas, acompanhado de pão branco. No Egito, o leite fermentado tradicional laban rayeb é produzido artesanalmente, principal- mente, por mulheres. Na sua produção é usado o leite de búfala que é colocado em panelas de barro previamente higienizadas e secas num forno. Essas panelas, onde ocorre a fermentação do leite, são colocadas num local quente até ao dia seguinte. A fermentação ocorre por ação da microbiota natural, que é composta por bactérias lácticas e outros microrganismos fermen- tadores. A gordura superficial é, normalmente, removida para se produzir manteiga. O laban rayeb é também utilizado para o fabrico de queijo ou então para acompanhar saladas (Abd El-Salam, 2002). Saleh (2013) faz referência ao leite fermentado tradicional laban zeer, muito popular no Alto Egito. É produzido a partir de leite de búfala, e às vezes de vaca, cabra, ovelha ou uma mistura de ambos. O leite é colocado num recipiente de couro de cabra curtido designado kerbah, que contém uma certa quantidade de resíduos de leite fermentado do lote anterior, o qual funciona

18 como cultura de arranque. Posteriormente o leite é deixado a fermentar espontaneamente à temperatura ambiente, por períodos de tempo que são determinados pela experiência de quem o produz, o que por sua vez depende da temperatura ambiente. Em seguida é armazenado numa ânfora de barro, o zeer. Durante o armazenamento parte do soro vai-se evaporando através das paredes porosas do recipiente, dando lugar a um produto mais concentrado. Após cada adição de um novo lote de soro de leite azedo, é adicionado sal ao conteúdo de cada zeer. O laban zeer possui um sabor amargo e um aroma específico devido à presença de um teor elevado de bactérias lácticas e de leveduras, o que está associado a baixos valores de pH (3,9) e à adição de sal. De acordo com El-Gendy (1983) e Saleh (2013) o laban zeer é utilizado para o fabrico de kishk (feito de laban zeer e de grãos de trigo cozidos, secos e triturados) e por vezes é também utilizado em saladas ou como bebida depois de diluído com água, adquirindo uma consistência semissólida, sabor ácido e salgado. Na Guiné-Bissau é produzido de modo artesanal um leite fermentado, popularmente conhecido por leite dormido, feito a partir de leite de vaca (Bernardo, Brandão & Mendes, 1994). O leite fermentado dahi é produzido na Índia, principalmente nos estados do Punjab e Haryana, e nos países limítrofes. O dahi é transformado numa bebida refrescante após agi- tação e adição de uma pequena quantidade de água, passando a denominar-se lassi, que é consumido preferencialmente fresco com sal ou açúcar (FAO, 1990). No Bangladesh o dahi é feito com leite de vaca ou de búfala ou com a mistura de ambos, em que se utiliza uma cultura anterior mas de identidade desconhecida. Duma maneira geral é consumido como sobremesa depois das refeições principais. Acredita-se que o dahi é altamente nutritivo e contribui para a melhoria da digestão e cura de distúrbios digestivos (Rashid et al., 2007). Na região dos Himalaias, no Nepal e no Butão consome-se o mahi, que é habitualmente co- nhecido como uma bebida tradicional do Nepal. O mahi, produzido a partir do dahi, é feito com leite fermentado concentrado ou desnatado adicionado de culturas naturais ou culturas lácticas de produção industrial. No Nepal o mahi é consumido como bebida ou ainda como alimento principal (FAO, 1990). Na costa caribenha da Colômbia produz-se o suero costeno, um leite fermentado caseiro, resultante da fermentação espontânea do leite de vaca colocado numa cabaça (fruto seco de Lagenaria vulgaris). Durante a fermentação ocorre a libertação de uma grande quantidade de lactosoro (fase líquida), havendo por isso a necessidade de agitar o recipiente para que o produto final tenha uma consistência uniforme e uma textura cremosa. O período de fermen- tação, necessário para a obtenção deste produto, varia de 1 a 3 dias em função da viscosidade desejada (Cueto, Garcia, Garcés & Cruz, 2007).

19 2.2. Produção de leites artesanalmente fermentados em África 2.2.1. Modo de produção Existem em África diferentes técnicas locais de transformação, que vão desde a simples coagu- lação do leite para consumo imediato ao queijo seco, que se pode conservar por muito tempo (Gret, 1994 ). Os leites artesanalmente fermentados são o resultado duma fermentação espontânea (sem adição de fermento) e não controlada dos componentes do leite cru, em conjunto com os microrganismos oriundos do processo de ordenha, da alimentação, dos utensílios e do meio ambiente, em que se produzem metabolitos que provocam alterações específicas no leite, ou ainda, podem resultar da adição de uma porção do leite da produção anterior (back-sloping), geralmente de identidade microbiana desconhecida (Wouters et al., 2002). Esta técnica (back- -sloping) é usada com sucesso há milhares de anos para perpetuar a fermentação e promover uma rápida produção de ácido láctico (Narvhus e Gadaga, 2003; Bille, 2009). Segundo Ma- thara et al. (2004) a produção destes leites é frequente no meio rural, a nível familiar ou de pequenas empresas. A produção deste tipo de leites fermentados consiste em colocar o leite cru num recipiente (cabaça, balde de plástico, panela de barro, panelas de esmalte, sacos de pele, e outros) pre- viamente defumado ou não, coberto com uma tampa, ao qual pode ou não ser adicionada uma porção de leite fermentado da produção anterior, que atua como fermento. Na maior parte dos casos os restos de leite fermentado que ficam no recipiente contêm bactérias que servem de fermento. Posteriormente o recipiente é colocado num local arejado e geralmente coberto, para o prote- ger do pó, por um período que vai desde algumas horas a alguns dias. O tempo de coagulação varia muito em função da temperatura do local, que por sua vez varia em função do clima da região (FAO, 1990; Gret, 1994). No entanto, fatores como elevados teores microbianos e a falta de meios de refrigeração fazem com que o leite acidifique e coagule entre 12 e 24 horas ou menos. Durante este período há produção de ácido láctico e descida do pH, responsável pela precipitação ácida da caseína e pelo aumento da consistência, o que contribui para a con- servação e estabilidade do produto. É por isso que o leite fermentado pode ser armazenado por mais tempo que o leite fresco, sem que se altere (Narhvus, 2003). As tecnologias de produção têm evoluído dentro das diferentes comunidades, resultando na produção de produtos com variados sabores, cores, texturas, consistências e características típicas de cada região (FAO, 1990). As principais diferenças na produção destes leites artesanalmente fermentados residem: a) no tipo de leite utilizado (vaca, ovelha, cabra, dromedária, búfala ou vaca de raça Zebu)

20 e por vezes nas misturas de leite que se fazem, como por exemplo a mistura do leite de vaca com leite de cabra e/ou de ovelha e de vaca de raça Zebu, ou de leite de vaca com leite de dromedária como acontece na Somália, Mauritânia e nalgumas regiões do Quénia; b) no período de incubação, que pode variar entre algumas horas e aproximadamente 20 dias; c) no tratamento térmico a que o leite é submetido; d) no tipo de recipiente (sacos, cabaças, panelas de barro, jarros de ferro e cestos) que varia de acordo com a região, em que nalguns casos são submetidos a um processo de higienização através do fumo resul- tante da queima de uma grande variedade de plantas, ervas, leguminosas e madeiras duras como a de Olea africana ou a de Acopia busia, para evitar o crescimento de bolores e leveduras; e) na adição ou não de algumas plantas (raízes ou cascas), folhas e/ou extratos vegetais para corar e melhorar o sabor e o aroma, como por exemplo o pó de carvão de uma árvore, que no Quénia é utilizado para melhorar o sabor e as folhas frescas de Ruta chalepensis, que na Etiópia são utilizadas com o objetivo de melhorar o sabor e o aroma (FAO, 1990; Gret, 1994). A defumação tem a vantagem de conferir sabores e aromas especiais aos produtos e de hi- gienizar os recipientes, devido à atividade antimicrobiana do fumo, que reduz a possibilidade de alteração do produto e prolonga o seu prazo de validade à temperatura ambiente. Estudos realizados na Etiópia revelaram que a defumação, para além de impedir o desenvolvimento de microrganismos patogénicos, também retarda o processo fermentativo em si (FAO, 1990; Ashenafi, 1996).

2.2.2. Recipientes Os recipientes mais utilizados pelas populações, em particular do meio rural, para a produção de leites artesanalmente fermentados são muito simples e fabricados por eles próprios a partir de recursos locais. Geralmente utilizam-se sacos feitos de pele de animais, cabaças, panelas de barro e de madeira, jarros de ferro, cestos, bambu fresco, bacias, funis de madeira, entre outros (Ferusu & Muzondo, 1990; FAO, 1990; Beukes et al., 2001; Savadogo et al., 2004; Kebede et al., 2007; Akabanda et al., 2010). A utilização destes utensílios varia de região para região e de acordo com a tradição de cada povo. Os recipientes mais utilizados na Etiópia, Quénia, Sudão, Egito e Namíbia, são as cabaças, panelas de barro e madeira. Na África do Sul utilizam-se com maior frequência as panelas de barro, os jarros de ferro, os cestos, os sacos do leite (milk-sacks) e por último as cabaças (Kebede et al., 2007). No entanto, segundo Gadaga et al. (2013) no Lesotho os potes de cerâmica já não são muito usados como recipientes de fermentação. Aqueles estão a ser substituídos por recipientes de plástico ou de metal. O reci- piente tem grande influência sobre a qualidade do produto fermentado.

21 O tipo de recipiente e as condições ambientais contribuem para a seleção gradual de micror- ganismos específicos, que são responsáveis pelo sabor agradável e especial, que não é passível de imitação com os modernos fermentos selecionados (Beukes et al., 2001). Segundo estes autores, o grupo étnico Sotho da África do Sul tem maior preferência pela panela de barro do que pela cabaça para a produção do leite fermentado amasi, porque a panela de barro confere melhor sabor e aroma. O grau de higienização dos recipientes utilizados para a fermentação do leite varia de acordo com os hábitos de higiene das comunidades de cada região. Segundo os relatos de alguns pro- dutores, em alguns casos os recipientes são lavados com ervas específicas, noutros casos são lavados esporadicamente e apenas com água fria ou morna e areia. No Uganda, os recipientes de madeira usados para a fermentação do leite são lavados com urina de bovino. Contudo, há casos em que os recipientes são difíceis de lavar, como as bol- sas de pele ou as cabaças, o que proporciona uma microbiota residente. Em muitos países africanos os recipientes são higienizados com o fumo obtido da queima de plantas específicas (FAO, 1990).

2.3. Microbiologia dos leites fermentados Os microrganismos presentes em leites naturalmente fermentados têm origem, geralmente, no próprio animal, nos equipamentos ou nos utensílios utilizados, no meio ambiente, na água, nos recipientes de armazenamento, no pessoal, ou ainda, no leite fermentado da produção anterior quando este é utilizado (Franz, Stiles, Schleifer & Holzapfel, 2003; Giraffa, 2003). O leite cru utilizado na produção da grande maioria dos leites artesanalmente fermentados possui uma microbiota abundante e complexa, incluindo bactérias patogénicas e de decomposição. No entanto, as condições ambientais como a temperatura e a origem do leite, as condições de pro- cessamento e as condições sanitárias, podem influenciar de forma significativa a composição microbiana de produtos lácteos fabricados de modo tradicional. Duma maneira geral a microbiota láctica é composta por bactérias mesófilas, incluindo o grupo de bactérias produtoras de ácido láctico ou BAL (Beukes et al., 2001; Mathara et al., 2004), embora bolores, leveduras, micrococos, pediococos e corineformes possam, de igual forma, desempenhar um papel importante (Wouters et al., 2002; Zamfir et al., 2006). Na maioria dos estudos realizados em leites fermentados tradicionais, as bactérias produtoras de ácido láctico mais frequentemente identificadas pertencem aos géneros Lactobacillus, Lacto- coccus, Leuconostoc, Streptococcus e Enterococcus conforme se pode constatar na Tabela 2. Os produtos lácteos fermentados oferecem um nicho ecológico especial para o desenvolvimen- to de leveduras específicas. Estas representam uma parte importante da microbiota de muitos

22 leites fermentados, como por exemplo, o kefir, o laban e o kumis. As leveduras crescem e mul- tiplicam-se em conjunto com as BAL e desempenham um papel ativo, na medida em que são responsáveis por sabores e aromas característicos dos produtos fermentados e pela produção de gás (El-Sharoud, Belloch, Peris & Querol, 2009). No processo de fermentação, as leveduras proporcionam aminoácidos, vitaminas e outros compostos necessários ao crescimento das bactérias fermentadoras da lactose, do que re- sulta aumento da produção de ácido láctico, enquanto os produtos finais do metabolismo bacteriano vão sendo utilizados pelas leveduras como uma fonte de energia, criando deste modo um equilíbrio ou uma estabilidade no produto (Viljoen, 2001; Narvhus & Gadaga, 2003). De acordo com Vasdinyei e Deák (2003) o desenvolvimento atípico de algumas espécies de le- veduras, presentes em determinados produtos lácteos, pode ser responsável pela decomposição dos mesmos. Os defeitos mais comuns causados pelas leveduras são: produção de gás, sabor e cheiro a leveduras e outros maus cheiros e sabores, alterações de cor e textura. É frequente encontrarem-se elevadas concentrações de leveduras no ambiente e nos equipa- mentos utilizados no processamento de produtos lácteos, o que é devido a contaminação por falta de cuidados de higiene (Viljoen, 2001).

Tabela 2. Bactérias lácticas isoladas de produtos lácteos fermentados em África. Adaptada de Narvhus & Gadaga (2003).

Número de estirpes Espécies Beyene, Mutukumira et Abdelgadir Beukes et al., Sserunjogi, 1994 al., 1995 et al., 2001a 2001 1999 LACTOBACILLUS 113 acidophilus 0 1 8,5% 0 biofermentans 2 0 0 brevis 6 0 0 casei subsp. casei 5 1 0 casei subsp. pseudoplantarum 3 0 0 curvatus 13 0 0 fermentum 0 0 34,5% 0 helveticus 0 0 4 plantarum 14 2 43 vaccinostercus 4 0 0 LACTOCOCCUS lactis subsp. lactis 29 3 26,4% 103 5 lactis subsp. lactis 6 0 0 lactis subsp. lactis biovar diacetylactis 3 2 1 lactis subsp. cremoris 8 0 0

23 Tabela 2. Bactérias lácticas isoladas de produtos lácteos fermentados em África. Adaptada de Narvhus & Gadaga (2003). (Continuação)

Número de estirpes Espécies Beyene, Mutukumira et Abdelgadir Beukes et al., Sserunjogi, 1994 al., 1995 et al., 2001a 2001 1999 LEUCONOSTOC 130 citreum 0 0 0 lactis 9 0 4 mesenteroides subsp. mesenteroides 17 2 9 mesenteroides subsp. cremoris 7 0 0 mesenteroides subsp. dextranicum 4 0 0 STREPTOCOCCUS 13 salivarus 30% ENTEROCOCCUS 7 faecium 2

2.3.1. Características gerais das bactérias produtoras de ácido láctico 2.3.1.1. Taxonomia e morfologia Historicamente, com base na classificação de Orla-Jessen (1919), os géneros de bactérias produtoras do ácido láctico ou bactérias lácticas ou BAL mais importantes são: Lactobacillus, Leuconostoc, Pediococcus e Streptococcus. No entanto, as revisões taxonómicas sugerem 16 novos géneros: Aerococcus, Alloiococcus, Carnobacterium, Dolosigranulum, Enterococcus, Globicatella, Lactobacillus, Lactococcus, Lactosphaera, Leuconostoc, Oenococcus, Pediococ- cus, Streptococcus, Tetragenococcus, Vagococcus e Weissella (Axelsson, 1998). Contudo, as BAL mais comuns em fermentos pertencem aos géneros Lactobacillus, Streptococcus, Leuco- nostoc, Weissella e Pediococcus. Estes microrganismos constituem um grupo heterogéneo, embora tenham em comum algumas características como o serem Gram positivos, catalase negativos, não esporulados, imóveis, oxidase negativos e geralmente nitrato-redutase negativos; são microaerófilos ou anaeróbios aerotolerantes, desenvolvendo-se bem à superfície de meios sólidos quando em anaerobiose ou em ambiente com baixa tensão de oxigénio; como são ácido-tolerantes multiplicam-se a valo- res de pH entre 4,0 e 4,5, e há estirpes que podem tolerar e desenvolver-se a um pH acima de 9,0 e abaixo de 3,2, sobrevivem naturalmente em meios onde outras bactérias não suportariam a ação dos ácidos orgânicos. As bactérias produtoras do ácido láctico não são formadoras de esporos e são imóveis (Claesson, van Sinderen & O’ Toole, 2007). A concentração molar de guanina+citosina (G+C) do ADN é geralmente inferior a 54 %. A for- mação de ATP na célula microbiana pode ocorrer através de dois mecanismos diferentes – a fosforilação a nível do substrato e a acoplada ao transporte de eletrões na cadeia citocrómica.

24 Não possuem citocromos, que são proteínas com grupo prostético porfirínico contendo ferro, por isso não sintetizam o ATP por esta via (Hassan & Frank, 2001; Holzapfel, Haberer, Gei- sen, Björkroth & Schillinger, 2001; Limsowtin, Broome & Powell, 2002). Sintetizam o ATP a partir de hidratos de carbono por fosforilação a nível do substrato. São quimiorganotróficos e apenas se desenvolvem em meios de cultura complexos, para o que necessitam de aminoácidos pré-formados, de bases púricas e pirimídicas, e de vitaminas do grupo B (Caplice & Fitzgerald, 1999). Apresentam a forma de cocos ou bastonetes e têm fraca atividade proteolítica e lipolí- tica. Em relação à temperatura de crescimento podem classificar-se em mesófilas e termófilas. Na sua maioria são bactérias mesófilas, mas algumas podem desenvolver-se a temperaturas inferiores a 5ºC e superiores a 45ºC (Caplice & Fitzgerald, 1999; Amenu, 2013). Encontram-se amplamente distribuídos em diferentes ecossistemas, sendo frequentes em ali- mentos ricos em nutrientes contendo açúcares simples ou aminoácidos, vitaminas e com baixa tensão de oxigénio, como os produtos lácteos, carnes, farinhas, vegetais fermentados, pão, silagem, bebidas, assim como em águas residuais, plantas, trato intestinal, aparelho genital e respiratório do Homem e animais, e ainda na microbiota normal do canal da glândula mamária (López-Díaz, Alonso, Román, Garcia-López & Moreno, 2000; Hassan & Frank, 2001; Coeu- ret, Dubernet, Bernardeau, Guéguen & Vernoux, 2003; Savadogo et al., 2006).

2.3.1.2. Lactobacillus É um dos maiores grupos da família Lactobacillaceae, é um género muito heterogéneo, como é atestado pelo conteúdo de G+C do ADN das diferentes espécies, o qual varia entre 33 e 55 mol% e normalmente é inferior a 50 mol% (Tannock, 2004; Bernardeau, Vernoux, Henri- -Dubernet & Guéguen, 2008). Lactobacillus são microrganismos em forma de bacilos ou de cocobacilos frequentemente em cadeia, estritamente fermentativos, aerotolerantes ou anaeróbios, acidúricos ou acidófilos. Têm exigências nutricionais complexas, como aminoácidos, derivados dos ácidos nucleicos, péptidos, vitaminas, sais minerais, ácidos gordos ou ésteres de ácidos gordos e hidratos de carbono fermentescíveis (Giraffa, Chanishvili & Widyastuti, 2010). É um dos grupos de BAL mais importantes, assumindo um papel de destaque na produção de alimentos fermentados, em particular dos produtos lácteos fermentados, devido à ação conservante resultante da acidifica- ção e/ou ao realce do “flavour”, textura e nutrição (Giraffa et al., 2010). Atualmente têm sido alvo de grande interesse na área dos probióticos (Tannock, 2004; Claesson et al., 2007). As suas exigências nutricionais estão refletidas nos seus habitat, que são substratos ricos em hidratos de carbono: vegetais, alimentos fermentados ou alterados, ou em associação com or- ganismos animais. Crescem em condições de anaerobiose ou com reduzida tensão de oxigénio

25 em todos os habitat capazes de fornecer hidratos de carbono, produtos de degradação proteica, ácidos nucleicos e vitaminas, de modo que podem ser encontrados numa grande variedade de nichos ecológicos, como plantas, mucosas dos seres humanos e de animais (cavidade oral, intestino e aparelho reprodutor feminino), no leite cru, esterco e em habitat artificiais como esgotos e alimentos em fase decomposição (Ortu et al., 2007; Giraffa et al., 2010). De acordo com as características fermentativas podem ser divididos em 3 grupos: Grupo I – é constituído por Lactobacillus homofermentativos obrigatórios (Lb. acidophilus, Lb. bulgaricus, Lb. delbrueckii, e outros) que se caracterizam pela capacidade de fermentar hexoses, quase exclusivamente, em ácido lático pela via de Embden-Meyerhof-Parnas. Con- têm aldolase, mas não fosfocetolase e consequentemente não podem fermentar pentoses ou gluconato, fermentam apenas as hexoses exclusivamente pela via glicolítica (homofermenta- tiva). Este grupo inclui todos os lactobacilos termófilos encontrados em culturas de arranque para a produção de queijo, iogurte e probióticos. Grupo II – é constituído por Lactobacillus heterofermentativos facultativos (Lb. casei, Lb. plan- tarum, Lb. sakei, e outros), que fermentam as hexoses quase exclusivamente em ácido láctico pela via de Embden-Meyerhof-Parnas ou fermentam as pentoses em ácido láctico e ácido acético via uma fosfocetolase, que é induzida pelas pentoses. São mesófilas, com exceção de algumas espécies. Encontram-se, sobretudo em vegetais e carnes fermentadas. Grupo III – é constituído por Lactobacillus heterofermentativos obrigatórios (Lb. fermentum, Lb. brevis, Lb. reuteri, e outros) que fermentam as hexoses em ácido láctico, ácido acético, etanol e CO2; fermentam as pentoses em ácido láctico e ácido acético. Em ambas as vias há, geralmente, envolvimento da fosfocetolase. Produzem substâncias voláteis aromáticas. Devido ao seu fraco poder acidificante estas espécies podem desenvolver-se em associação com outras BAL ou outros microrganismos em produtos alimentares fermentados (Stiles & Holzapfel, 1997; Jay, 2000; Limsowtin et al., 2002; Curry & Crow, 2002).

2.3.1.3. Lactococcus O género Lactococcus inclui cinco espécies, Lc. garvieae, Lc. piscium, Lc. plantarum, Lc. raffi- nolactis e Lc. lactis, este com as subespécies Lc. lactis subsp. cremoris, Lc. lactis subsp. lactis, Lc. lactis subsp. hordniae e Lc. lactis subsp lactis biovar diacetylactis. A espécie mais utilizada em tecnologia de lacticínios tem sido Lc. lactis (Limsowtin, et al., 2002; Teuber & Geis, 2006). Lactococcus são cocos homofermentativos, microaerófilos, que crescem a temperaturas de 10ºC, mas não a 45ºC. Fermentam a glucose exclusivamente em ácido láctico L (+). Para o seu crescimento necessitam de proteínas, péptidos, aminoácidos específicos, derivados de áci- dos nucleicos e vitaminas. Não são β-hemolíticas e são fracamente α-hemolíticas. Ubíquos no

26 ambiente e nos alimentos. Normalmente encontram-se em plantas e peles de animais. Lc. plan- tarum tem sido isolado principalmente de plantas; Lc. garvieae de peixes, mamíferos e leite; Lc. piscium de salmão (Williams, Fryer & Collins, 1990; Nagalakshmi, Sumathi, Kanimozhi & Sivakumar, 2013). A presença de lactococos no leite cru deve-se à contaminação do mesmo a partir da forragem, durante a ordenha. As duas espécies mais isoladas no leite cru, queijo e outros produtos lácteos são Lc. lactis subsp. lactis e Lc. lactis subsp. cremoris. Geralmente es- tas duas subespécies atingem, em queijos fabricados com leite cru, teores elevados (>108 ufc/g) logo no primeiro dia depois de fabricados e mantêm-se ao longo do período de maturação.

2.3.1.4. Leuconostoc Este género é composto por 22 espécies e 3 subespécies. As espécies mais associadas aos produtos lácteos são: Leuconostoc mesenteroides subsp. cremoris, Leuconostoc mesenteroides subsp. lactis e Leuconostoc mesenteroides subsp. dextranicum (Tamime, 2002a ). Leuconostoc são bactérias anaeróbias facultativas, apresentando-se em forma de cocos ou de bastonetes ovais, frequentemente em cadeias curtas ou em pares. A maior parte das estirpes apresenta um crescimento ótimo entre 20 e 30 ºC. Diferenciam-se das outras BAL por serem cocos heterofermentativos e produzirem frequentemente o isómero D (-), CO2 e compostos aromáticos, a partir da glucose. A produção do isómero D (-) a partir da glucose distingue Leuconostoc de Lactobacillus heterofermentativos similares, que também produzem isómeros de ácido láctico D (-) e L (+) a partir da glucose e de Lactococcus produtores de L (+) (Fox, Guinee, Cogan & Mcsweeney, 2000). Leuconostoc são utilizados na indústria de lacticínios como culturas de arranque, no entanto en- contram-se muitas vezes disseminados nas salas de ordenha e nas unidades de produção de lac- ticínios. A sua presença em leites fermentados de modo tradicional e de fermentação espontânea é frequente. Apesar da fraca atividade acidificante e proteolítica é utilizado juntamente com Lac- tococcus lactis como microrganismo aromatizante, ou seja, metabolizam o citrato e produzem compostos aromáticos (Hassan & Frank, 2001; Ogier, Cassalta, Farrokh & Saihi, 2008). Algu- mas estirpes são produtoras de EPS, os quais contribuem para realçar as propriedades reológicas (diminuindo a sinérese, melhorando a textura e modificando a estrutura) e a perceção sensorial (firmeza e cremosidade) dos leites fermentados e outros produtos lácteos (Tamime, 2002).

2.3.1.5. Enterococcus O género Enterococcus inclui mais de 52 espécies (http: //www.bacterio.cict.fr/bacdico/ee/ Enterococcus.htmL, 28 de dezembro 2013). As espécies mais frequentemente isoladas em leites e produtos lácteos são E. faecium e E. faecalis; E. durans é menos frequente neste tipo

27 de produtos e E. hirae e E. casseliflavus são ocasionalmente isolados (Franz, Holzapfel & Stiles, 1999). Segundo Suzzi et al. (2000) a presença de E. durans em produtos lácteos é subestimada, quan- do na verdade tem sido isolado, com frequência, destes produtos. As bactérias pertencentes ao género Enterococcus, apresentam-se em forma de cocos que podem aparecer isolados, em pares ou em cadeias curtas, anaeróbias facultativas, com baixa percentagem G+C (< 50%) (Giraffa, 2003; Foulquié Moreno et al., 2006). Embora cresçam a temperaturas entre 10 e 45 ºC a temperatura ótima de crescimento é a 35 ºC; crescem em elevadas concentrações de NaCl (até 6,5%) e numa vasta gama de valores de pH (4,6-9,6). Hidrolisam a esculina na presença de 40% de sais biliares (Franz et al., 2003; Ogier & Serror, 2008). São quimiorganotróficos e produzem ácido láctico (L-) a partir de hexoses por fermen- tação ácido-láctica homofermentativa (Franz et al., 2003). São ubíquos, podendo ser encontrados no solo, na matéria vegetal, na água e em diversos produtos fermentados, embora o seu habitat principal seja o trato gastrintestinal dos seres hu- manos e animais (Giraffa, 2002). E. faecium é mais frequente no trato gastrintestinal do gado leiteiro (Giraffa, 2003). O seu caráter ubíquo é provavelmente resultado da disseminação de fezes e da sua natural tolerância a condições ambientais adversas (Giraffa, 2002). Encontram-se frequentemente em produtos lácteos, particularmente em queijos produzidos nos países europeus do mediterrâneo, onde se usa leite cru (Ogier et al., 2008). A produção de queijo depende da microbiota presente no leite e/ou da que é introduzida durante todo o processo de fabrico, onde se incluem os recipientes de recolha de leite, os utensílios usados no fabrico do queijo e as pessoas intervenientes em todo o processo (Benkerroum, 2013).

2.3.1.6. Pediococcus O género Pediococcus é composto por 15 espécies. Apresentam-se em forma de cocos, aos pares ou em tétradas. São aeróbios facultativos. Produzem isómeros de ácido láctico D (-) e L (+) a partir da glucose. Algumas espécies deste género podem resistir a condições ambientais extremas, como temperaturas e pH altos, e elevadas concentrações de NaCl. Geralmente são isolados de plantas e de vários alimentos fermentados, como couves fermentadas, enchidos fermentados e como microrganismos de decomposição da cerveja. Apesar de não crescer bem no leite, devido à utilização irregular da lactose, P. pentosaceus e P. acidilactici têm sido iso- lados a partir de produtos lácteos (Schutte, 2013). P. acidilactici é utilizado em conjunto com Lactobacillus acidophilus e Bifidobacterium bifi- dum na produção do “Biokys”, um leite fermentado com propriedades terapêuticas, produzido na República Checa (Tamime, 2002a).

28 2.3.2. Leveduras 2.3.2.1. Características gerais As leveduras são organismos unicelulares, eucariotas, aeróbios e/ou anaeróbios facultativos que podem crescer em vários nichos ecológicos como o solo, a água do mar, os frutos, as plantas e as algas, sendo também encontradas no trato gastrintestinal e na pele dos animais (Schutte, 2013). Estes organismos heterotróficos utilizam carbono orgânico para produzir ál- cool e dióxido de carbono e aparecem frequentemente em alimentos processados com algum teor de açúcar (Jakobsen & Narvhus, 1996; Gadaga, Mutukumira & Narvhus, 2001). A intera- ção entre leveduras e bactérias láticas em alimentos fermentados está relacionada com a grande capacidade de se desenvolverem a um pH baixo (Jacques & Casaregola, 2008). De acordo com Viljoen (2001) e Jespersen (2003) as leveduras possuem um potencial metabó- lico diversificado e desempenham um papel importante na fermentação de alguns produtos lác- teos e na maturação de muitas variedades de queijos, na medida em que têm um papel positivo no desenvolvimento das características sensoriais, sendo por isso utilizadas como culturas de arranque. Contudo, podem atuar como microrganismos de decomposição, provocando defei- tos típicos como a produção de gás, maus sabores ou sabor a leveduras (yeasty off-flavours), alteração da textura e aumento da acidez. Algumas leveduras, devido à sua ação contra os fungos responsáveis pela decomposição de alimentos, têm sido utilizadas como agentes de biocontrolo ou bioconservantes, e outras têm sido estudadas para poderem ser usadas como novos organismos probióticos (Fleet, 2007). Normalmente são detetadas em grande quantidade, o que reflete uma boa adaptação ao substra- to rico em proteínas, lípidos, hidratos de carbono e ácidos orgânicos. A sua ampla distribuição é consequência da atividade lipolítica e proteolítica, da capacidade de fermentar/assimilar lactose, de utilizar ácidos orgânicos, da capacidade de crescimento a baixas temperaturas e a baixos valores de atividade da água, e da resistência a altas concentrações de NaCl e a produtos de limpeza e sanificação (Fleet, 1990; Jakobsen & Narvhus, 1996; Viljoen, 2001; Narvhus & Gadaga, 2003; Corbaci, Ucar & Yalcin, 2012). O pH dos leites fermentados proporciona um ambiente seletivo para o crescimento das leve- duras, mas desfavorável para a maioria das bactérias. A deterioração dos produtos fermenta- dos ocorre quando as concentrações de leveduras atingem 105 – 106 células/g (Fleet, 1990). A adição de frutas, açúcar, mel ou nozes a leites fermentados como o iogurte incentiva a de- terioração, uma vez que podem estar contaminados ou fornecer mais carbono orgânico para o crescimento das leveduras (Jakobsen & Narvhus, 1996; Narvhus & Gadaga, 2003). As leveduras mais isoladas em produtos lácteos pertencem aos géneros Kluyveromyces, De- baryomyces, Yarrowia, Candida e Saccharomyces. Nos iogurtes e nos queijos predominam as

29 espécies pertencentes aos géneros Debaryomyces e Kluyveromyces, enquanto as espécies Can- dida lusitaniae e Candida krusei são mais frequentes em iogurtes. As espécies pertencentes ao género Yarrowia são frequentes em queijos, leites e iogurtes, o que pode ser atribuido à sua atividade lipolítica e proteolítica. O iogurte, devido à adição de açucar e/ou fruta, está mais sujeito à ação decompositora de Saccharomyces cerevisiae (Viljoen, 2001).

2.4. Metabolismo das bactérias produtoras do ácido láctico Muitos membros da ordem Lactobacillales produzem ácido láctico como produto único ou principal da fermentação e muitas vezes são referidos como BAL. A este grupo pertencem Streptococcus, Enterococcus, Lactococcus, Lactobacillus e Leuconostoc. O maior género desta ordem é Lactobacillus, com cerca de 100 espécies (Willey, Sherwood & Woolverton, 2008). Todas as BAL produzem ácido láctico a partir de hexoses. A energia não é obtida nem atra- vés da cadeia de transporte de eletrões ou cadeia citocrómica nem do ciclo de Krebs, mas sim através da fosforilação a nível do substrato. O ácido láctico produzido através das várias vias de fermentação tanto pode ter a configuração L (+) ou D (-) ou uma mistura de ambos, dependendo da estereospecificidade da desidrogenase lactato presente nas células (Caplice & Fitzgerald, 1999). De acordo com o seu metabolismo, as BAL classificam-se em homofermen- tativas e heterofermentativas (Carr, Chill & Maida, 2002) (Fig. 4). Algumas BAL, como Lactococcus sp., Streptococcus sp., Pediococcus sp. e algumas espécies de Lactobacillus, são homofermentativas, uma vez que o produto final do seu metabolismo é o ácido láctico, o que lhes confere um grande potencial industrial. O catabolismo da glucose é efetuado pela via Embden-Meyerhof-Parnas, tendo o piruvato como intermediário impor- tante para a formação do ácido láctico, em que são geradas duas moles de lactato por mol de glucose, produzindo aproximadamente duas vezes mais energia por mole de glucose que as heterofermentativas. As bactérias heterofermentativas pertencentes aos géneros Weissella e Leuconostoc e algumas espécies de Lactobacillus não possuem a enzima frutose-1,6-difos- fato-aldolase e por isso usam uma via metabólica alternativa da glicólise que é a via da he- xose-monofosfato ou via das pentoses fosfato, em que se produzem quantidades equimolares de lactato, dióxido de carbono e acetato ou etanol. Os compostos intermediários importantes na via heterofermentativa são o ácido pirúvico e o acetaldeído (Caplice & Fitzgerald, 1999; Giraffa et al., 2010). Segundo Stanley (1998) e Savadogo et al. (2006) a quantidade de ácido láctico produzida pelas BAL homofermentativas é de 1,8 moles por mol de glucose fermentada; enquanto as BAL heterofermentativas produzem aproximadamente 1 mol de ácido láctico por mol de glucose, além de quantidades apreciáveis de produtos secundários.

30 Figura 4. Esquema geral da fermentação da glucose em ácido láctico. Adaptada de Caplice & Fitzgerald (1999).

Glucose

Homofermentativa Heterofermentativa

Glucose-6-fosfato Glucose-6-fosfato

Frutose-6-fosfato 6-fosfogliconato

Frutose-6-fosfato 6-fosfogliconato

Frutose-1,6-difosfato Ribulose-5-fosfato

Gliceraldeído-3-fosfato Dihidroxiacetona-fosfato Xilulose-5-fosfato

H2O 2 Piruvato Gliceraldeído-3-fosfato Acetil-fosfato

2 lactato Piruvato Acetaldeído

Lactato Etanol

2.5. Composição química dos leites fermentados A composição química dos leites fermentados depende do leite original e do metabolismo específico das bactérias que se vão desenvolvendo no mesmo, do local ou da região e do pro- cesso de fabrico (El-Baradei et al., 2008). Algumas práticas de concentração do leite, como a remoção do soro, o período de fermentação, a adição ou remoção da gordura e a adição de água provocam alterações na composição química do leite (Oberman & Libudzisz, 1998). Os leites fermentados ititu, lben e amasi apresentaram elevados teores de sólidos totais após a remoção do soro, cerca de 20,87%, 37,5% e 16,5%, respetivamente. Os valores médios para os principais componentes do lben foram: acidez titulável – 8,2 g de ácido láctico; gordura – 8,9 g/l; proteína total – 25,6 g/l; lactose total – 26,9 g/l; matéria seca – 89 g/l (Tantaoui-Elaraki & El Marrakchi, 1987). Segundo Oberman e Libudzisz (1998), embora os leites fermentados apresentem grande va- riabilidade na sua composição química, há certos valores que são de referência (Tabela 3).

31 Tabela 3. Composição química dos leites fermentados. Adaptada de Oberman & Libudzisz (1998).

Parâmetros Matéria seca ca 14-18% Proteína 4-6% Gordura 0,1-10% Lactose 2-3% Ácido láctico 0,6-1,3% Hidratos de carbono 5-25% pH 3,8-4,6 Álcool Kefir- 0,5-2% Kumis-2-3%

Na Tabela 4 podemos observar, em leites fermentados produzidos em África, diferenças em certos parâmetros como a gordura, as proteínas e os sólidos totais.

Tabela 4. Composição química de alguns leites fermentados tradicionais produzidos em África. Adaptada de Bille (2009).

Produto pH Ácido Gordura Proteina Sólidos Cinza Referências (Nº amostras) láctico (%) (%) (%) totais (%) (%) Ititu 3,65a 1,92a 9,1a 7,17a 20,87a 0,74a Kassaye et al. (20) (3,5-3,9)b (1,5-2,6)b (3,0-5,0)b (5,4-9,2)b (15-27)b (0,6- 0,8)b (1991) Nono 4,3a 0,65a 0,83a 2,55a 6,084a 0,41a Bankole & (100) (4,1-4,3)b (0,5-0,9)b (0,2-1,5)b (1,2-5,7)b (2,8- 13)b (0,2-0,8)b Okagbue (1992) Zabady 3,7a 1,01a 3,62a 4,17a 14,32a 0,65a El-Sadek et al. (50) (3,0-4,4)b (0,6-1,5)b (1,1-6,8)b (3,1-5,6)b (11-19)b (0,4-1,4)b (1972) rayeb lben 4,2a 0.67a 2,22a 16.47b 3,1a 15,8b 10,7a 37,5b 0,54a 1,26b Hamama & Bayi (42) 4,1b 1,041b (1991) Amasi 3,98a 0,97a 5,89a 4,57a 16,53a S/D Mutukumira (10) (3,5-4,3)b (2,6-9,1)b (3,3-7,6)b (13-21)b (1995) a) média b) intervalo S/D – sem dados

2.6. Fermentos lácticos 2.6.1. Definição e classificação O fermento láctico pode ser definido como uma preparação microbiana contendo um elevado número de células de um ou mais géneros e espécies de BAL selecionadas. É muito conhecido o emprego das BAL como fermentos lácticos na produção de produtos lácteos fermentados, principalmente leite acidificado, iogurtes e queijos. A maior parte das culturas de arranque atualmente disponíveis foram obtidas, duma maneira ou de outra, a partir de leites fermentados artesanais com uma composição indefinida (Ferusu & Muzondo, 1990; Garabal, 2007).

32 Apesar das diferenças existentes entre as estirpes bacterianas presentes nos leites fermentados, principalmente no que diz respeito à taxa de crescimento, a indústria de lacticínios tem-se preocupado em mantê-las e reproduzi-las através da técnica de “back-sloping”, o que pode ter sido responsável por alterações que, com o passar do tempo, conduziram ao desaparecimento de algumas estirpes. Segundo Garabal (2007) a utilização de culturas autóctones na produção de produtos lácteos fermentados artesanais pode preservar a diversidade de bactérias associadas a um produto específico e proporcionar a produção de produtos lácteos fermentados com características típicas. A produção de novos produtos lácteos exige a utilização de novas estirpes microbianas com novas propriedades, o que tem levado à procura de novas estirpes para a inovação e diver- sificação de produtos lácteos. Estas novas estirpes podem ser adquiridas pela exploração da biodiversidade natural dos vários nichos ecológicos ou pela modificação genética de estirpes de produções conhecidas (El Soda et al., 2003). Os fermentos podem classificar-se em puros quando compostos por uma só estirpe de BAL; mistos quando compostos por várias estirpes de BAL, que constituem uma cultura dinâmica e complexa; e naturais quando constituídos por uma mistura de BAL indefenidas. Normalmente os fermentos utilizados são mistos, havendo diferenças na rapidez de multiplicação, atividade proteolítica e lipolítica, produção de bacteriocinas, sensibilidade e resistência aos fagos, o que de certa forma exige vigilância no momento da sua utilização (Hassan & Frank, 2001; Morais, 2004). As BAL utilizadas como fermentos na produção de lacticínios podem ser divididas segundo a temperatura ótima de multiplicação, em mesófilas quando aquela temperatura é de 20 – 30ºC e em termófilas quando é de 30 – 45 ºC. Os produtos lácteos fermentados tradicionais oriundos da Europa do Norte e Ocidental contêm BAL mesófilas e os oriundos de países subtropicais contêm, geralmente, BAL termófilas. O tipo de fermentação pretendido condiciona a escolha do fermento. Assim, podem ser uti- lizados fermentos homofermentativos, em que o ácido láctico é o maior produto residual do metabolismo da lactose e como tal contribui para a rápida diminuição do pH; ou fermentos heterofermentativos, em que para além do ácido láctico são produzidos ácido acético, ácido propiónico, etanol, diacetilo e dióxido de carbono, entre outros (Morais, 2004). Os lactobacilos isolados de produtos lácteos têm uma longa história de utilização segura e têm sido muito utilizados como fermentos, tanto na indústria de alimentos para consumo humano (leites fermentados, produtos cárneos, panificação e bebidas alcoólicas) como na indústria de alimentos para animais (silagens) (Carr et al., 2002; WHO/FAO, 2001).

33 2.6.2. Função dos fermentos lácticos A principal função das BAL é a de promover uma rápida acidificação durante o processo fermentativo e assim garantir a segurança do alimento através da descida do pH para valores que inibem o desenvolvimento de microrganismos patogénicos e de decomposição (Giraffa et al., 2010). A rapidez de descida do pH é um fator extremamente importante quer durante a produção quer no produto final (Johnson & Steele, 1997). A quantidade final de ácido láctico, o principal produto resultante da atividade metabólica dos fermentos, e a taxa de acidificação durante a produção do iogurte dependem da estirpe ou da associação de estirpes (Chammas et al., 2006). As variações encontradas na atividade acidificante das diferentes estirpes dependem da aptidão específica para assimilar os compostos nutritivos presentes no substrato. As BAL têm também a finalidade de contribuir para o desenvolvimento das características sen- soriais e nutricionais desejadas no produto, podendo ainda oferecer benefícios à saúde do con- sumidor como as proporcionadas pelos probióticos (Stanley, 1998; Bruno & Carvalho, 2009). Segundo Stanley (1998) as BAL podem contribuir para o desenvolvimento do sabor e do aro- ma através: a) da modificação das condições do meio, para que ocorram reações enzimáticas e não enzimáticas, como por exemplo a acidificação e a alteração do potencial de oxidação- -redução, particularmente em queijos; b) da produção de metabolitos diretamente a partir da lactose e do citrato, que contribuem para o sabor; c) da hidrólise das proteínas e da gordura do leite, do que resultam péptidos, aminoácidos e compostos voláteis que contribuem para o desenvolvimento do sabor e do aroma. Para Giraffa et al. (2010) alguns microrganismos são intencionalmente adicionados aos leites fermentados devido à sua capacidade para produzir compostos aromáticos como o diacetilo e melhorar o aroma, o sabor e a textura dos produtos. Os diferentes sabores que os produtos fermentados apresentam estão associados à utilização de diferentes estirpes de BAL. A textura dos leites fermentados depende essencialmente do ácido láctico produzido pelas BAL, uma vez que durante a sua produção não se acrescentam enzimas coagulantes e a coa- gulação é consequência da descida progressiva do pH até ao ponto isoelétrico da caseína, momento em que se desestabiliza e precipita (Stanley, 1998). As BAL produtoras de EPS têm sido utilizadas para melhorar a textura e/ou a viscosidade dos produtos. As estirpes produtoras de EPS que mais têm sido utilizadas com esta finalidade são Streptococcus thermophilus, Lb. bulgaricus e algumas estirpes de Lactococcus lactis (Stanley, 1998). Segundo Johnson e Steele (1997) o aroma e o sabor desejados dependem diretamente da ati- vidade metabólica do fermento e da microbiota secundária, que é deliberadamente adicionada para produzir aromas e sabores. Por isso a seleção dos fermentos depende muito do aroma e do sabor que se pretende para um dado produto.

34 2.6.3. Composição dos fermentos lácticos Conforme se pode verificar na Tabela 5 os fermentos são compostos por BAL heterofermen- tativas, homofermentativas mesófilas ou termófilas, por leveduras e bolores (Oberman & -Li budzisz, 1998). Lactobacillus heterofermentativos (Lb. brevis, Lb. fermentum e Lb. kefir) fazem parte de uma microbiota variada onde também se incluem várias espécies de leveduras, que são uitilizadas para a produção do kefir e do kumis, leites com algum teor de álcool e de dióxido de carbono (Johnson & Steele, 1997). De acordo com Beresford, Fitzsimons, Brennan e Cogan (2001) os fermentos lácticos podem ainda integrar, para além de BAL iniciadoras, microrganismos secundários que também são de- nominados de culturas adjuvantes. Enquanto as BAL iniciadoras são responsáveis pela produção de ácido durante o processo de fabrico dos produtos lácteos, os microrganismos secundários estão geralmente envolvidos na definição de características sensoriais (Garabal, 2007).

2.6.4. Fermentos naturais Na maior parte das fermentações que ocorrem de forma natural é utilizada a técnica “back- -sloping”, em que uma combinação de microrganismos, normalmente designada de cultura artesanal, existente no produto anterior é inoculada no novo produto (Narvhus, 2003). As culturas de arranque utilizadas na produção artesanal são, normalmente, constituídas por microrganismos presentes no leite, no ar ou à superfície dos recipientes. As mais comuns são constituídas por lactobacilos naturalmente presentes no leite. Outras culturas de arranque podem também conter microrganismos que produzem álcool e dióxido de carbono, como es- treptococos e algumas leveduras, e por isso é que os produtos em que são utilizadas, como o kefir e o airag, têm alguma percentagem de álcool e gás (Zamfir et al., 2006). Apesar da atuação imprevisível dos microrganismos presentes, o soro proveniente do desso- ramento da coalhada é muitas vezes utilizado para a produção de queijos, de que é exemplo o queijo Mozarella do sul de Itália, que é feito com leite de búfala. A quantidade de bactérias lácticas normalmente presente no leite cru é relativamente pequena, o que faz com que a aci- dificação do leite seja lenta (Wouters et al., 2002). Segundo El Soda et al. (2003) a microbiota láctica autóctone representa um depósito natural de culturas microbianas que nunca foi exposto a qualquer seleção industrial. A composição destas culturas artesanais é complexa e variada, podendo incluir estirpes de Lactobacillus del- brueckii subsp. bulgaricus, Lactobacillus helveticus, Lactobacillus plantarum, Lactobacillus rhamnosus, Lactobacillus casei, Lactobacillus paracasei, Lactococcus lactis, Streptococcus thermophilus, Enterococcus faecalis, Enterococcus faecium e Leuconostoc sp.

35 O fermento natural utilizado para a produção do leite fermentado tradicional matsoni, se- melhante ao iogurte produzido no Cáucaso, contém lactobacilos, estreptococos, por vezes lactococos e pequenas quantidades de leveduras (Uchida, Urashima, Chanishvili, Arai & Mo- toshima, 2007). Algumas BAL isoladas do leite fermentado naturalmente, produzido no Zim- babwe, têm sido utilizadas para a produção industrial de produtos lácteos fermentados (Ferusu & Muzondo, 1990).

Tabela 5. Microrganismos utilizados na produção tradicional de leites fermentados. Adaptada de Oberman & Libudzisz (1998).

Género Espécie BACTÉRIAS Lb. delbrueckii Lb. delbrueckii spp. lactis Lb. delbrueckii spp. bulgaricus Lb. helveticus Lactobacillus Lb. acidophilus Lb.casei Lb. fermentum Lb. brevis Lb. kefir Lc. lactis subsp. lactis Lactococcus Lc. lactis subsp. lactis biovar diacetylactis Lc. lactis subsp. cremoris Leuc. mesenteroides Leuc.mesenteroides subsp. dextranicum Leuconostoc Leuc. mesenteroides subsp. cremoris Leuc. lactis Streptococcus S. thermophilus P. pentosaceus Pediococcus P. acidilactici Acetobacter A. aceti LEVEDURAS Kluyveromyces K. marxianus subsp. marxianus K. marxianus subsp. bulgaricus K. lactis Candida C. kefir Saccharomyces S.cerevisiae S. lactis Torulaspora T. delbrueckii BOLORES Geotrichum G. candidum

36 A maioria das indústrias de lacticínios utiliza fermentos comerciais para promover uma rápida acidificação, uma redução do número de estirpes bacterianas no produto e uma certa uniformi- dade nos produtos lácteos fermentados. No entanto, a utilização de fermentos comerciais tem uma desvantagem, uma vez que há perda da microbiota natural presente nos leites. Segundo Wouters et al. (2002) a utilização de fermentos comerciais melhora a qualidade tecnológica dos produtos lácteos até certo ponto, embora limite não só a sua biodiversidade mas também a variabilidade das características organoléticas dos produtos finais.

2.6.5. Fermentos lácticos não tradicionais É importante salientar a presença de um grupo de bactérias que participam na fermentação do leite e que normalmente formam a microbiota secundária dos queijos, designadas em inglês por “non-starter lactic bacteria” (NSLB), ou seja, em tradução livre são “ bactérias lácticas não iniciadoras” ou BAL “não iniciadoras”. Estas não fazem parte dos fermentos tradicionais, mas são essenciais para a produção de sabores e aromas característicos (Wouters et al., 2002). A microbiota NSLB é maioritariamente constituída por lactobacilos mesófilos homofermenta- tivos (Lb. rhamnosus e Lb. curvatus) e por espécies do género Pediococcus (P. acidilactici e P. pentosaceus); podem também estar presentes lactobacilos heterofermentativos obrigatórios (Lb. fermentum e Lb. brevis), porém com menos frequência (Cogan et al., 1997; Beresford et al., 2001). A adição de estirpes de Lb. plantarum como cultura adjuvante em queijos pode ter um efeito positivo na degradação de alguns compostos metabólicos (Todorov & Franco, 2010).

2.7. Segurança higio-sanitária dos alimentos fermentados As diarreias agudas estão entre a maior causa de morte nos países em vias de desenvolvimento e são o fator que mais contribui para a malnutrição das crianças com idade inferior a 5 anos. A maioria das doenças diarreicas é de origem alimentar, sendo a água de consumo e as papas de cereais reconstituídas com água de consumo e utilizadas durante o desmame das crianças, as principais fontes de microrganismos patogénicos. Por outro lado, a falta de higiene no ato de preparação dos alimentos pode ser responsável pela contaminação dos mesmos, o que contri- bui para a elevada taxa de mortalidade infantil devido a enfermidades como a diarreia, a mal absorção de nutrientes e a desnutrição. A nível mundial, particularmente na Ásia e em África, a fermentação tem sido a técnica utiliza- da para tornar os alimentos seguros (Abd El Gawad et al., 2010). Em alguns países Africanos esta tecnologia tem sido aplicada para a preparação de alimentos destinados ao desmame de crianças. No Quénia, Nigéria, Tanzânia e Uganda têm por hábito alimentar as crianças com

37 cereais ou tubérculos fermentados. Nas áreas onde a água de consumo não é de boa qualidade higiénica utiliza-se a fermentação para a produção de bebidas, o que contribui para a redução do risco de surgirem doenças provocadas pelo consumo de água. A fermentação, ao inibir o crescimento de bactérias patogénicas, é uma forma económica de conservação dos alimentos, sobretudo quando a refrigeração ou outros meios de armazenamento seguros não se encontram disponíveis, e ao mesmo tempo reforça a qualidade nutritiva de certos alimentos (Sahlim, 1999). Segundo Mufandaedaza, Viljoen, Ferusu e Gadaga (2006) não são frequentes as doenças de origem alimentar provocadas pelo consumo de leites fermentados, graças à acidez que inibe a maioria dos microrganismos patogénicos, às bacteriocinas produzidas por algumas BAL e ao baixo potencial de oxidação-redução. No entanto, alguns estudos realizados em leites fermentados produzidos em Marrocos, na Nigéria (El-Marrakchi, Hamama & El-Oumami, 1993; Benkerroum & Tamime, 2004; Obi & Ikenebomeh, 2007; Okonkwo, 2011) e no Sudão ­(Abdalla & El-Zubier, 2006; Benkerroum, 2013) referem a presença de bactérias de origem fecal como coliformes, Escherichia coli e Streptococcus do grupo D em concentrações su- periores a 104 ufc/mL e microrganismos patogénicos como Staphylococcus aureus, Listeria monocytogenes, Streptococcus spp., Shigella spp. e Salmonella Enteritidis. De acordo com El-Baradei et al. (2008) e Ouadghiri et al. (2009) a qualidade e a segurança dum produto fermentado dependem de fatores como: a) a qualidade da matéria-prima; b) a contaminação inicial, que por sua vez depende das condições locais; c) a higiene e o modo de higienização dos materiais; d) a qualidade do fermento; e) as condições de fermentação, como por exemplo a temperatura; f) a acidez. No entanto, muitas vezes não é fácil controlar estes parâmetros, particularmente quando o processamento dos produtos é realizado em condições rudimentares. Os leites fermentados naturalmente apresentam, geralmente, elevados teores de microrganis- mos, entre os quais se incluem as BAL, os bolores e as leveduras; por vezes aparecem algumas bactérias patogénicas, uma vez que a produção destes leites tradicionais é normalmente artesa- nal (Abd El Gawad et al., 2010). Estes produtos não oferecem segurança higio-sanitária, o que advém, na maior parte das vezes, da deficiente qualidade higiénica da matéria-prima que está contaminada, da falta de pasteurização, da ausência de controlo do processo de fermentação e de conservação. De acordo com Suleiman e Tsenkova (2007) a qualidade e a segurança do produto final são influenciadas não só pelos elevados teores de BAL e de leveduras, mas também pela sua ca- pacidade de multiplicação e de propiciar uma boa fermentação.

38 2.8. Importância nutricional e terapêutica dos leites fermentados 2.8.1. Importância nutricional dos leites fermentados O leite e os produtos lácteos fermentados têm um papel muito importante na dieta das popula- ções pastoris e agropastoris, fazendo parte da dieta básica das mesmas, juntamente com alguns cereais como o milho e o sorgo. A quantidade de leite consumido no meio rural depende da existência de criadores de gado numa dada comunidade. A composição nutricional do leite fermentado é semelhante à do leite cru, a partir do qual foi produzido. Durante a sua produção não há perda de nutrientes mas sim uma concentração dos mesmos, por isso alguns autores afirmam que os leites fermentados têm maior valor nutritivo do que do leite cru. Por outro lado, as estirpes probióticas utilizadas durante a fermentação podem influenciar diretamente a qualidade nutricional e as características sensoriais do pro- duto final (Mazahreh & Ershidat, 2009; Abd El Gawad et al., 2010). Os produtos lácteos fermentados (queijos e iogurtes) são excelentes fontes de vitaminas e sais minerais, incluindo a riboflavina, o fósforo e o cálcio. As populações pastoris de muitas regiões dos continentes Africano, Asiático e Americano nem sempre conseguem suprir as suas necessidades em nutrientes através do consumo de leite que obtêm dos seus animais, por estes serem de raças autóctones e com um baixo índice de pro- dução, além de que as quantidades de leite disponíveis para o consumo das populações varia de região para região, de acordo com a estação do ano. Um estudo realizado sobre o papel do leite na dieta dos povos que se dedicam à pastorícia no sul do Darfur, no Sudão, demonstrou que apenas 25% das necessidades energéticas eram supridas pelo leite, o que equivalia ao con- sumo de um litro de leite por dia, correspondendo a cerca de 700 kcal/litro. Nas comunidades pastoris do Mali, cuja dieta é à base de leite, o fornecimento energético está aquém das suas necessidades se comparadas com as comunidades agropastoris, cuja dieta é também constituí- da por cereais e outros alimentos (FAO, 1990). Outro estudo realizado numa comunidade Massai, etnia do Quénia que se dedica à pastorícia, demonstrou que o contributo do leite fermentado para as necessidades energéticas de cada Massai era de 51 a 63%, correspondendo ao consumo de cerca de 1,9 a 2,3 litros de leite por dia. Embora este consumo satisfaça as necessidades em proteínas e aminoácidos essenciais, as necessidades em ferro, niacina, vitamina C, vitamina A, tiamina e energéticas nunca são completamente satisfeitas através de uma dieta à base de leite, como a praticada pelos pastores, particularmente na estação das chuvas quando o leite é abundante (FAO, 1990). Uma das justificações para a não satisfação das necessidades vitamínicas prende-se com a di- minuição da estabilidade das vitaminas, devido a alterações de pH e ao aquecimento associado à preparação da matéria-prima antes da fermentação. O tratamento térmico da matéria-prima,

39 neste caso o leite, pode provocar uma redução das quantidades de vitamina B1 e B12 (Walstra, Geurts, Noomen, Jellema & van Bockel, 2001). Em países da América, como a Bolívia, o Peru e o Paraguai a maioria do leite produzido é usado na produção de produtos lácteos tradicionais (FAO, 1990). Durante a fermentação há aumento de aminoácidos e da disponibilidade de aminoácidos essenciais como a lisina, o triptofano, a metio- nina, a histidina e a isoleucina, melhorando desta forma a digestibilidade das proteínas em geral (Sulieman, Dirar, Elkhalifa & Ali, 2009). Os leites fermentados, devido ao processo de fermen- tação, podem sofrer algumas alterações na sua composição. A quantidade de prolina encontrada no iogurte é aproximadamente 45 vezes superior à do leite não fermentado; por outro lado, os teores de arginina, histidina, alanina, valina, metionina e isoleucina podem ser 4 a 9 vezes supe- riores aos do leite original. O iogurte de leite de cabra é mais rico em alguns aminoácidos, como a treonina, a glicina e a serina, que o iogurte de leite de vaca (Bille, 2009). A fermentação pode alterar a composição vitamínica do leite, tanto pela síntese de vitaminas por microrganismos fermentativos, como pela perda de vitaminas através do metabolismo de microrganismos fermentativos e ainda pela perda de vitaminas através de reações químicas não diretamente relacionadas com a fermentação. O equilíbrio depende das bactérias presentes no leite e da diversidade de BAL (Bille, 2009). Na Índia, o leite fermentado dahi e outros produtos semelhantes como o lassi, o e o shrikhand contribuem significativamente para a dieta das populações, sendo frequentemente utilizados para complementar as refeições de cada dia. A adição, complementar, de 250g de dahi às refeições à base de arroz fornecidas às crianças, promove o aumento de ácido pirúvico e láctico (FAO, 1990). De acordo com Adesokan, Odetoyinbo, Ekanola, Avanrenren e Fakarede (2011) e Ogbonna et al. (2012) os leites fermentados consumidos na Nigéria são não só uma importante fonte de proteína, cálcio, fósforo, vitamina A, vitaminas do complexo B, C e E, mas também de ácidos gordos e lactose. Os produtos lácteos tradicionais têm um grande peso na dieta das populações que têm preferência por este tipo de produtos, que lhes satisfazem não só os hábitos de con- sumo mas também as suas necessidades em nutrientes (cálcio e proteínas). Durante o processamento industrial do iogurte ocorre o aumento de algumas vitaminas como a niacina, a piridoxina e o ácido fólico, que são sintetizadas pelos microrganismos utilizados na fermentação – Streptococcus salivarius subsp. thermophilus e Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus (Antoine, 2011). Os leites fermentados são fonte de vitaminas, incluindo as vitaminas B6, B12, riboflavina, niacina, ácido fólico, biotina e ácido pantoténico. O ácido fólico é uma das vitaminas do gru- po B que pode ser sintetizada e produzida por algumas espécies de bactérias lácticas como

40 Streptococcus thermophilus e Bifidobacterium, enquanto outras como Lactobacillus utilizam o ácido fólico existente no meio. Os microrganismos acima referidos, quando utilizados em conjunto durante a fermentação, aumentam seis vezes mais a concentração de ácido fólico no leite (Crittenden, Martinez & Playne, 2003). Segundo Bos, Gaudichon e Tom (2000) o conteúdo de proteína no iogurte é mais elevado do que no leite, devido à adição de leite em pó magro durante a produção. A proteína presente no iogurte é mais facilmente digerida do que a do leite fresco, devido à atividade das peptidases produzidas pelas BAL, o que aumenta a concentração de aminoácidos livres como a prolina e a glicina no produto final. Entre as BAL utilizadas como fermentos na produção de iogurtes, Lactobacillus bulgaricus possui uma atividade proteolítica mais intensa durante a fermentação do leite do que Streptococcus thermophilus. Os iogurtes têm concentrações mais elevadas de conjugated linoleic acid (CLA) do que o leite a partir do qual foram produzidos. O valor ener- gético dos leites fermentados mantém-se, apenas ocorre uma redução insignificante quando se dá a conversão da lactose em ácido láctico. Sahlim (1999) refere que, em função da cultura láctica usada, o kefirproduzido a partir de dife- rentes grãos de kefir apresentou um aumento de piridoxina, cobalamina, ácido fólico e biotina superior a 20% e uma redução de tiamina, riboflavina, ácido nicotínico e ácido pantoténico superior a 20%. Segundo o mesmo autor, o conteúdo em sais minerais não é afetado pela fer- mentação, a menos que alguns sais sejam adicionados aos produtos durante a fermentação ou através da lixiviação, quando a porção líquida é separada dos produtos fermentados. Por vezes, quando a fermentação ocorre num recipiente de metal, alguns minerais são solubilizados atra- vés do produto fermentado, o que pode causar um aumento no conteúdo mineral do produto. Segundo Antoine (2011) o teor em sais minerais não é alterado, mas a acidificação aumenta a porção ionizada de minerais, o que facilita a sua absorção a nível intestinal. Alguns leites fermentados e alguns queijos proporcionam 3-4 vezes mais cálcio do que o que é ingerido através da dieta. O iogurte é rico não só em sais minerais mas também em potás- sio, magnésio, fósforo e zinco. O cálcio presente no iogurte é melhor absorvido porque este produto fermentado é melhor tolerado por pessoas deficientes em lactase. Segundo Mazahreh e Ershidat (2009) o pH dos iogurtes provoca a ionização do cálcio facilitando assim a sua ab- sorção a nível intestinal. A biodisponibilidade do cálcio no iogurte é maior do que em outros produtos lácteos e o iogurte pode aumentar a mineralização óssea, mais do que os produtos lácteos não fermentados. Abd El-Salam, Al-Dekheil, Babkr, Farahna e Mousa (2010) referem que o leite fermentado de égua (kumis) consumido na Mongólia, para além de ser rico em fermentos, possui elevados teores de oligoelementos, antibióticos, vitaminas A, B1, B2, C, D e E, álcool etílico, ácidos láctico e carbónico.

41 2.8.2. Importância terapêutica dos leites fermentados A popularidade das bebidas lácteas fermentadas tem vindo a aumentar não apenas pelo seu gosto atrativo, mas também devido aos seus benefícios para a saúde. Algumas estirpes de BAL têm grande importância em termos de saúde, uma vez que promovem o desenvolvimento de uma microbiota benéfica no trato intestinal (Caplice & Fitzgerald, 1999; Buritti & Saad, 2007). Os produtos lácteos fermentados têm uma importância significativa devido ao seu efeito te- rapêutico. Em África, os leites fermentados amasi, kule naoto, nunu, zabady, leben, ergo e muitos outros têm sido utilizados tradicionalmente no tratamento de diarreias, obstipações e outras situações (Abdelgadir et al., 1998; Ferusu & Muzondo, 1990; Mathara et al., 2004; El-Baradei et al., 2008; Akabanda et al., 2010; Amenu, 2013). Existem também referências sobre a utilização de leites fermentados produzidos em outras regiões do mundo, como o leite fermentado dahi consumido na Índia, o leite fermentado matsoni consumido na Geórgia e muitos outros, os quais têm um efeito benéfico na digestão e no tratamento de enfermidades de índole intestinal (Zamfir et al., 2006; Uchida et al., 2007; Rashid et al., 2007; Sarkar, 2008). De acordo com Dirar (1997) citado por Abdelgadir et al. (1998) o leite fermentado tem sido utilizado com sucesso, sobretudo em países em desenvolvimento, durante o desmame saudável de crianças, como substituto de alimentos que podem representar perigo por poderem veicular microrganismos causadores de diarreias em crianças com idade inferior a 5 anos. O kumis é utilizado pelos Mongóis para fins terapêuticos, como na recuperação de estados de fadiga, na cura de doenças do trato gastrintestinal e da tuberculose (Abd El-Salam et al., 2010).

2.8.3. Efeito probiótico O conceito probiótico “a favor da vida” foi proposto pela primeira vez pelo cientista Russo Elie Metchnikoff, laureado com o prémio Nobel, o qual sugeriu que a longevidade dos camponeses búlgaros resultava do consumo de produtos lácteos fermentados. Este cientista concluiu que os Lactobacillus fermentadores, presentes em produtos lácteos fermentados, influenciavam de forma positiva a microbiota intestinal, diminuindo a atividade microbiana tóxica (Mahasneh & Abbas, 2010). Atualmente a World Health Organization (OMS) e a FAO, definem probióticos como - “mi crorganismos vivos que administrados em quantidades adequadas, conferem benefícios ao hospedeiro” para além do efeito nutritivo básico que lhe é inerente (FAO/ WHO, 2001; Giraffa et al., 2010; Jamaly et al., 2011; Antoine, 2011).

42 Os microrganismos mais utilizados como probióticos pertencem ao grupo das BAL. As espécies pertencentes aos géneros Lactobacillus (Lb. acidophilus, Lb. casei/Lb. paracasei, Lb. planta- rum, Lb. reuteri, Lb. salivarius) (Giraffa et al., 2010), Bifidobacterium (Yateem, Balba, Al-Sur- raya, Al-Mutairi & Al-Daher, 2008) e Enterococcus (Ljungh & Wadstrom, 2006) são as mais utilizadas e mais frequentemente estudadas como probióticas. Há estirpes de Lb. plantarum que foram selecionadas como probióticas, como é o caso de Lb. plantarum 299v e Lp 01 (de Vries, Vaughan, Kleerebezem & de Vos, 2006; Mathara et al., 2008). Patrignani, Lanciotti, Mathara, Guerzoni e Holzapfel (2006) referem que estirpes de Lb. para- casei, Lb. rhamnosus e Lb. plantarum têm sido utilizadas em produtos probióticos e cada vez mais incorporadas em novos tipos de iogurtes. Algumas estirpes de Lb. casei/Lb. paracasei têm também sido utilizadas como probióticas na produção de leites fermentados (Tamime, 2002). Em estudos recentes foram analisadas as propriedades funcionais de lactobacilos mesófilos isolados a partir de alimentos autóctones e concluiu-se que muitos podem sobreviver ao trân- sito gastrintestinal (Ortu et al., 2007), por isso tais alimentos podem ser considerados como potenciais fontes de uma grande variedade de microrganismos probióticos (Anukamk & Reid, 2009). Algumas estirpes probióticas de Lactobacillus têm sido utilizadas, com muita segurança, para a produção industrial de determinados produtos comercializados em todo o mundo como: “Da- nisco” (EUA Madison WI), “Probiomics” (Austrália), “Yakult” (Japão), “Danone” (França) e “ProbiAB” (Suécia) (Carr et al., 2002). De acordo com Buriti e Saad (2007) Lb. casei var. Shirota, utilizada na produção do yakult, é uma das bactérias mais estudadas como probiótico. O consumo regular deste produto tem sido relacionado, direta ou indiretamente, com a prevenção do cancro do cólon e da bexiga (Itsaranuwat, Al-Haddad & Robinson, 2003). De acordo com Saito (2004), Liong e Shah (2005) e Mahasneh e Abbas (2010) a eleição de um microrganismo como probiótico deve obedecer a três critérios: - efeito benéfico para o hospedeiro; - ausência de patogenicidade e toxicidade para o hospedeiro; - capacidade para sobreviver ao trânsito gastrintestinal A atividade das bactérias probióticas consiste na adesão e colonização do intestino do hospe- deiro, na supressão do desenvolvimento das bactérias patogénicas, na produção de substâncias antimicrobianas como as bacteriocinas, na melhoria da função de barreira intestinal e na esti- mulação da imunidade do hospedeiro (Sanders, 2003; Stevenson & Blaauw, 2011).

43 A adesão ao intestino é um critério importante para a seleção de bactérias probióticas. Com efeito, a capacidade do probiótico aderir ao epitélio intestinal é considerada um pré-requisito para colonizar o trato gastrintestinal humano e para exercer efeitos benéficos, tais como a exclusão de bactérias enteropatogénicas (Collado, Gueimonde, Hernandez, Sanz & Salmi- nen, 2005; Michail, 2005; Marco, Pavan & Kleerebezem, 2006) uma vez que na primeira fase das infeções intestinais ocorre a adesão de bactérias patogénicas à superfície da mucosa ­intestinal. Existem vários estudos que comprovam o efeito benéfico dos probióticos sobre a saúde, tais como: a) Melhoria do metabolismo da lactose A intolerância à lactose é comum a muitas pessoas em qualquer parte do mundo e a sua fre- quência varia consideravelmente entre os diferentes povos e grupos étnicos. Esta intolerância resulta da deficiência da enzima β-D-galactosidase responsável pela hidrólise da lactose em glucose e galactose. Quando este processo não é completo, ou seja, quando a lactose não é hidrolisada em componentes mais simples o mal-estar surge após o consumo de leite fresco ou de produtos lácteos, devido à formação de ácidos orgânicos de cadeia curta e de gases como o hidrogénio, o metano e o dióxido de carbono resultante da ação microbiana sobre a lactose não digerida (Drouault & Corthier 2001; Solomons, 2002). A flatulência, os espamos intestinais e as dores adominais são os sintomas da intolerância à lactose (Drouault & Corthier, 2001). As culturas tradicionais utilizadas no fabrico do iogurte produzem quantidades substanciais de β-D-galactosidase, por isso o iogurte normal e os probióticos são bem tolerados, assim como os leites fermentados naturalmente (Beukes et al., 2001). Estirpes de Lb. bulgaricus e S. ther- mophilus podem hidrolizar cerca de 20 a 30% da lactose contida no iogurte o que contribui para uma boa tolerância ao mesmo (Mazahreh & Ershidat, 2009). Segundo Rizkalla et al. (2000) a maior parte dos estudos referem que indivíduos que conso- mem iogurtes contendo culturas vivas absorvem e digerem melhor a lactose, além de terem atenuados os sintomas gastrintestinais. O benefício na absorção da lactose também foi verifi- cado em indivíduos saudáveis sem problemas de digestão da lactose. b) Propriedades anticancerígenas Os produtos fermentados que contêm probióticos têm efeito inibitório sobre o cancro do cólon. As aminas heterocíclicas produzidas durante a cozedura dos alimentos e os elevados teores de creatina, aminoácidos livres e açucares são responsáveis pelo aparecimento do cancro do cólon em animais e humanos (Liong, 2008; Davis & Milner, 2009; Jamaly et al., 2011).

44 O efeito anticancerígeno das bactérias probióticas é devido à remoção das fontes de substân- cias pró-cancerígenas ou de enzimas que lideram a sua produção, melhorando o equilíbrio da microbiota intestinal, normalizando a permeabilidade intestinal, e prevenindo ou retardando a absorção de toxinas. Alguns ácidos gordos de cadeia curta produzidos por Lb. acidophilus, Lb. plantarum, Lb. rhamnosus e Bifidobacterium são inibidores da produção de produtos car- cinogénicos através da redução quantitativa de enzimas como a β-glucuronidase, a azoredutase e a nitroredutase (Cenci, Rossi, Trotta & Caldini, 2002). O’Sullivan, Thornton, O’Sullivan e Collins (1992) referem que os finlandeses são portado- res de numerosos lactobacilos com propriedades anticancerígenas, porque consomem grandes quantidades de iogurte. A supressão de células tumorais pode, também, ser indiretamente mediada através da ativação do sistema imunitário, de modo que todas as células bacterianas e fragmentos da parede ce- lular das BAL podem ativar os macrófagos do hospedeiro. Algumas BAL presentes em leites fermentados podem desempenhar um papel significativo na inibição da carcinogénese, uma vez que ativam os macrófagos e os linfócitos, estimulam o aumento das IgA e reduzem a taxa de enzimas responsáveis pela ativação de alguns pró-carcinogéneos (Drouault & Corthier, 2001; Michail, 2005; Saad, 2006), o que contribui para proteger o hospedeiro de infeções por microrganismos enteropatogénicos e de tumores. Lb. acidophilus, Lb. delbrueckii subsp. bulgaricus e Bifidobacterium influenciam a regulação do γ-interferão, que atua como antiviral e antiproliferativo, podendo ativar as células “killer” na prevenção de cancro do cólon (Pool- -Zobel et al., 1996; Michail, 2005). c) Redução do colesterol A ingestão de leites fermentados que contenham um grande número de bactérias probióticas, aproximadamente 108 a 109 bactérias/g, por um indivíduo com hipercolesterolémia, pode re- sultar na descida do colesterol de 3,0 para 1,5 g/L (Shah, 2007; Ramirez, Ulloa, Gonzalez, Ulloa & Romero, 2011). No entanto, nem todas as espécies e estirpes de bactérias utilizadas na produção de produ- tos lácteos fermentados apresentam um efeito hipocolesterolémico. Estudos realizados por Agerholm-Larsen et al. (2000) referem a redução significativa do nível de colesterol no soro de um voluntário (8,4%), após 8 semanas de ingestão de 450 mL de iogurte dinamarquês da marca Gaio contendo estirpes de Streptococcus thermophilus e Enterococcus faecium. Con- tudo um outro estudo levado a cabo com iogurte contendo estirpes de Streptococcus thermo- philus, Lb. acidophilus e Lb. rhamnosus, revelou que estas três bactérias não apresentavam efeito hipocolesterolémico.

45 O aumento de colesterol no organismo, sobretudo das LDL ou lipoproteinas de baixa densi- dade, constitui um risco, na medida em que aumenta a probabilidade de ocorrência da doença coronária cardíaca. Os indivíduos das etnias Massai e Samburu do Quénia, apesar de ingeri- rem elevadas quantidades de produtos lácteos gordos e carne de bovino, apresentam baixos teores de colesterol e uma reduzida incidência de doença coronária cardíaca, o que despertou o interesse sobre o efeito dos leites fermentados e de outros produtos lácteos na redução do colesterol (Di Rienzo, 2013). d) Tratamento de certas afeções intestinais Algumas BAL são utilizadas tanto na prevenção e tratamento de diarreias de natureza infeciosa e distúrbios digestivos ligados ao tratamento com antibióticos, como no restabelecimento da microbiota intestinal normal durante a terapia com antibióticos (Marteau, de Vrese, Cellier & Schrezenmeir, 2001). Por outro lado, as BAL também exercem uma ação anti-inflamatória em doenças intestinais como a Doença Inflamatória Intestinal (DII) (Danielet al., 2006), a Síndro- me do Cólon Irritável (SCI) (Jonkers & Stockbrügger, 2003; Shah, 2007; Mazahreh & Ershi- dat, 2009) e no controlo de gastrites associadas a Helicobacter pylori (Ouwehand, Salminen & Isolauri, 2002; Sgouras et al., 2004; Saad, 2006; Lesbros-Pantoflickova, Corthésy-Theulaz & Blum, 2007). Heyman (2000) refere que a ingestão de leites fermentados contendo Lb. rhamnosus GG sur- tem bons resultados no tratamento de diarreias por Rotavirus em crianças, uma vez que reforça as defesas imunitárias locais através do aumento específico das IgA e de outras imunoglo- bulinas anti Rotavirus. Algumas bebidas pediátricas que contêm Bifidobacterium animalis, Lb. acidophilus e Lb.reuteri, têm sido usadas com sucesso no tratamento de diarreias, em crianças, provocadas por Rotavirus. De acordo com Mahasneh e Abbas (2010) muitos estudos referem a utilização de Saccharomyces boulardii no tratamento de diarreias associadas ao uso de antibióticos antidiarreicos. Os mecanismos de ação apontados para o tratamento de distúrbios intestinais são: a) produ- ção de substâncias antimicrobianas e bacteriocinas que vão impedir o desenvolvimento de microrganismos patogénicos e importa aqui referir a ação de dois compostos produzidos por Lb. rhamnosus GG; b) modulação do sistema imunitário através da capacidade dos probió- ticos em ativar os macrófagos e linfócitos, aumentando as IgA e a produção do γ-interferão ­(Mattila-Sandholm et al., 2002; Michail, 2005; Saad, 2006; Shah, 2007); c) inibição da adesão de microrganismos patogénicos ao epitélio intestinal. Segundo Drouault e Corthier (2001) a ingestão de leite fermentado contendo Lb. acidophilus La1 aumenta in vivo a atividade fagocitária dos granulócitos no Homem, enquanto a ingestão

46 de uma mistura de Bifidobacterium bifidum e de Lb. acidophilus – o Infloran – proporciona um aumento da percentagem de linfócitos B no sangue. Uma forte adesão das BAL ao epité- lio intestinal interfere com os microrganismos patogénicos, devido à saturação dos locais de fixação. Algumas espécies, como Lb. acidophilus, Lb. casei e Lb. reuteri (Marteau et al., 2001), são adicionadas ao leite para promover o seu efeito probiótico no intestino humano. Lb. reuteri possui um grande potencial para prevenir ou tratar vários tipos de infeções gastrintestinais, por isso pode ser utilizado como um probiótico efetivo. Lb. helveticus proporciona a libertação de alguns aminoácidos no trato intestinal e modifica o perfil de eluição das proteínas digeridas. Para além dos efeitos acima referidos, os probióticos também contribuem para o tratamento de infeções urogenitais (Reid, 2000; Falagas, Betsi, Tokas & Athanasiou, 2006) e de infeções que ocorrem durante a gravidez, e ainda para atenuar a sintomatologia associada às alergias e ao eczema atópico (Marschan et al., 2008), para o alívio dos sintomas de artrite reumatoide (Marteau et al., 2001) e de encefalopatia hepática (Solga, 2003).

2.9. Atividade antimicrobiana de bactérias lácticas em leites fermentados 2.9.1. Produção de compostos antimicrobianos As BAL têm atividade antagónica relativamente a muitos microrganismos, incluindo os mi- crorganismos patogénicos e os de decomposição, uma vez que são produtoras de compostos com ação antimicrobiana, como ácidos orgânicos, peróxido de hidrogénio, dióxido de carbono, diacetilo, reuterina, bacteriocinas ou proteínas bactericidas (Caplice & Fitzgerald, 1999; Khu- rana & Kanawjia, 2007). Também produzem compostos antifúngicos como ácidos gordos ou ácido feniláctico (Franz et al., 1999, Lavermicocca et al., 2000; Savadogo et al., 2006; Rashid et al., 2007; Assefa et al., 2008). Estes compostos além de impedirem o desenvolvimento de microrganismos também prolongam a vida útil do produto e acrescentam valor terapêutico ao mesmo (Khurana & Kanawjia, 2007). O efeito antimicrobiano direto dos ácidos orgânicos, incluindo o ácido láctico, o acético e o propiónico, que são produtos finais da fermentação láctica, tem sido estudado por vários autores. O antagonismo dos ácidos resulta da sua ação sobre a membrana citoplasmática das bactérias, que interfere com a manutenção do potencial de membrana e inibe o transporte ativo, podendo ser mediado tanto por ácidos dissociados como por ácidos não dissociados (Caplice & Fitzgerald, 1999). Cada composto antimicrobiano produzido durante a fermenta- ção constitui um obstáculo adicional para a sobrevivência e/ou proliferação tanto de bactérias patogénicas como de bactérias de decomposição, desde a produção dos géneros alimentícios até ao momento de serem consumidos. Os ácidos orgânicos ao penetrarem no interior das

47 células de algumas bactérias patogénicas inibem algumas funções metabólicas e diminuem o pH intracelular, o que inibe a atividade de enzimas essenciais. A atividade antimicrobiana de cada um dos ácidos não é igual em determinada concentração molar. O ácido acético é mais inibidor do que o ácido láctico e pode inibir bolores, leveduras e bactérias. O ácido propiónico, que inibe o desenvolvimento de alguns fungos e bactérias, encontra-se em alguns produtos comerciais como o MicrogardR e o BioprofitR. O Microgard­ R é um leite desnatado, fermentado com a estirpe Propionobacterium freudenreichii subsp. ­shermanii (Al-Zoresck et al., 1991 citado por Khurana & Kanawjia, 2007) que inibe bolores e bactérias Gram negativas. O BioprofitR, que contém Lb. rhamnosus LC 705 e Propionibacte- rium freudenreichii JS, tem ação inibidora sobre bolores, leveduras e Bacillus sp. em produtos lácteos, silagens e pão (Soumalainen, 1999 citado por Khurana & Kanawjia, 2007). A contri- buição do acetaldeído e do etanol como bioconservadores não é tão grande, uma vez que as quantidades produzidas não são suficientes para ter efeito inibidor sobre os microrganismos. O baixo pH, provocado pelo ácido acético ou láctico produzido por estas bactérias tem um efeito bactericida ou bacteriostático nos intestinos (Caplice & Fitzgerald, 1999; Shah, 2007).

O peróxido de hidrogénio (H2O2) é produzido pelas BAL na presença de oxigénio por ação de oxidases e peroxidases. O seu efeito antimicrobiano pode resultar tanto da oxidação de grupos sulfidrilo, o que vai provocar a desnaturação de diversas enzimas, como da peroxidação de lípidos da membrana, o que vai aumentar a sua permeabilidade, ou pode estar na origem de radicais livres capazes de danificar ácidos nucleicos, proteínas e lípidos (Ouwehand, 1998; Caplice & Fitzgerald, 1999). Adams e Nicolaides (1997) referiram a inibição da multiplicação de S. aureus por ação de

H2O2 produzido pelas bactérias do fermento utilizado na produção de iogurtes. O peróxido de hidrogénio, ao ativar o sistema da lactoperoxidase, inibe um largo espetro de bactérias Gram positivas e Gram negativas. As BAL produzem dióxido de carbono por via heterofermentativa, quer a partir do malato e do citrato, quer por descarboxilação de aminoácidos. O CO2, além de criar condições de anae- robiose que inibem as descarboxilações enzimáticas, é também responsável por alterações na permeabilidade da membrana. O CO2, ao criar um ambiente anaeróbio, torna-se tóxico para alguns microrganismos aeróbios dos alimentos, através da sua ação sobre a membrana celular e da sua capacidade para reduzir o pH interno e externo (Adams & Nicolaides, 1997). O diacetilo, que resulta da fermentação do citrato pelas BAL, é responsável pelo aroma e sabor da manteiga e dos leites fermentados (Cogan & Hill, 1993). A sua atividade antimicrobiana deve-se ao facto de reagir com a proteína de ligação da arginina, afetando a sua utilização. As bactérias Gram negativas, bolores e leveduras são mais sensíveis ao efeito do diacetilo do

48 que as bactérias Gram positivas. A quantidade de diacetilo em alimentos fermentados não é suficiente para exercer, eficazmente, o efeito antimicrobiano (Caplice & Fitzgerald, 1999). A reuterina é produzida durante a fase estacionária de crescimento anaeróbio de Lactobacil- lus reuteri numa mistura de glucose e glicerol ou gliceraldeído. Inibe o desenvolvimento de vírus, fungos, protozoários e bactérias através da inibição da ribonucleótido-redutase (Caplice & Fitzgerald, 1999). É de referir que alguns agentes patogénicos toleram a acidez criada por algumas culturas de arranque. Por conseguinte, os produtos fermentados não devem ser considerados totalmente isentos de microrganismos patogénicos (Leyer, Wang & Johnson, 1995; Gahan, O’Driscoll & Hill, 1996; Benkerroum, 2013).

2.9.2. Bacteriocinas As bacteriocinas, produzidas por algumas BAL, são compostos antimicrobianos que podem ser proteínas simples ou moléculas complexas com porções lipídicas e glucídicas. São pép- tidos extracelulares de síntese ribossomal, com atividade bactericida ou bacteriostática para bactérias geneticamente relacionadas. Têm grande importância porque, devido à sua natureza proteica, são rapidamente digeridas pelas proteases presentes no trato gastrintestinal, ao contrário dos antibióticos correntes (Bromberg, Moreno, Zaganini, Delboni & Oliveira, 2004; Abdelbasset & Djamila, 2008), por isso se con- sideram substâncias geralmente reconhecidas como seguras (Generally Recognized as Safety­ – GRAS) (Khurana & Kanawjia, 2007). A ação das bacteriocinas não afeta a bactéria produtora, que possui um mecanismo específico de auto proteção (Caplice & Fitzgerald, 1999). As bacteriocinas têm como alvo de ação a membrana citoplasmática. Por isso têm, geralmente, maior efeito inibidor sobre as bactérias Gram positivas do que sobre as bactérias Gram ne- gativas, porque estas possuem na membrana externa uma barreira protetora constituída pelos lipopolissacáridos (LPS) (Abee, Krockel & Hill, 1995). As bacteriocinas produzidas pelas BAL classificam-se em quatro grandes classes I, II, III e IV. As das classes I e II são pequenos péptidos, essencialmente hidrofóbicas e termoestáveis. À classe I pertencem os lantibióticos, constituídos por aminoácidos que sofreram modifica- ções pós-traducionais, de que é exemplo a nisina. A nisina é produzida por Lactococcus lactis subsp. lactis e a sua ação inibidora atinge um largo espetro de bactérias Gram positivas, in- cluindo microrganismos patogénicos (Cleveland, Montville, Nes & Chikindas, 2001; Sava- dogo et al., 2006). É uma das bacteriocinas mais bem caracterizada e a mais utilizada como aditivo em alimentos no mundo inteiro. A classe II é constituída por não-lantibióticos. As da classe III são de maiores dimensões e termolábeis. As da classe IV são compostas por uma

49 mistura indefinida de proteínas, lípidos e hidratos de carbono, ou seja, são compostas por uma metade proteica a que se ligam grupos lipídicos ou glucídicos necessários à atividade (Nes & Holo, 2000; Abdelbasset & Djamila, 2008). Entre as várias bacteriocinas produzidas, apenas a plantaricina C e a pediocina PA-1/AcH pro- duzida por Pediococcus spp., são de origem láctea. A plantaricina C pertence às bacteriocinas da classe I ou lantibióticos e a Pediocina PA-1/AcH é a bacteriocina protótipo da classe II (Corsetti & Gobbetti, 2002), normalmente utilizada no fabrico de salsichas e salame italiano por inibir o desenvolvimento de Listeria monocytogenes (Foegeding, Thomas, Pilkington & Klaenhammer, 1992). A ação combinada de um grande número de BAL associada à descida do pH, cria condições desfavoráveis à multiplicação de muitos microrganismos patogénicos, entre os quais Listeria monocytogenes ( Savadogo et al., 2006; Abdelbasset & Djamila, 2008). A utilização de bacteriocinas como bioconservantes naturais de alimentos tem sido amplamen- te estudada (Cleveland et al., 2001). Algumas estirpes de Enterococcus faecium e Enterococ- cus faecalis produzem enterocinas, que são péptidos bactericidas pertencentes às bacteriocinas da classe II. Bifidobacterium e Lb. acidophilus produzem várias substâncias antimicrobianas e bacteriocinas que são comercializadas com os nomes de “Bifidoli”, “Bifilong”, “Lactocidin”, “Acidolin”, “Acidophilin”, “Lactacium-B” e também proteínas inibidoras que no geral inibem o desenvolvimento de várias bactérias patogénicas (Kaktcham, Zambou, Tchouanguep, El-Soda & Choudharyk, 2012). Estas bactérias têm efeito antagónico para Escherichia coli enteropatogé- nica, Salmonella typhimurium, Staphylococcus aureus e Cl. perfringens (Franz et al., 2003). Olasupo, Schillinger e Holzapfel (2001) referem que a estirpe de Lactococcus lactis isolada de um produto lácteo denominado wara, consumido na Nigéria, produzia uma bacteriocina que inibia a multiplicação de Listeria monocytogenes, Listeria innocua, Clostridium butyricum, Clostridium perfringens, Bacillus cereus e Staphylococcus aureus. Por sua vez, Ghrairi, Ma- nai, Berjeaud e Frère (2004) demonstraram a atividade antilisteria das BAL isoladas a partir do queijo tunisino Rigouta. Savadogo, Ouattara, Bassole e Traoré (2004b) verificaram que oito estirpes de BAL pertencen- tes a Lactobacillus fermentum, Pediococcus sp., Leuconostoc mesenteroides subsp. mesente- roides e Lactococcus sp., isoladas de amostras de leite fermentado produzido no Burkina Faso, produziam uma bacteriocina com efeito antimicrobiano em relação a Enterococcus faecalis 1039907 CIP, Bacillus cereus 13569 LMG, Staphylococcus aureus ATCC 25293 e Escherichia coli 105182 CIP. Segundo Abdelbasset e Djamila (2008) entre as bactérias produtoras de bacteriocinas per- tencentes ao género Lactobacillus destaca-se Lb. plantarum, por ter potencial para ser usada

50 como cultura de arranque numa grande variedade de alimentos fermentados. Esta estirpe pro- duz substâncias antimicrobianas como as plantaricinas, que são ativas contra certos microrga- nismos patogénicos Gram positivos (Mathara et al., 2008). Recentemente Todorov e Franco (2010) referem que estirpes de Lb. plantarum isoladas a partir do amasi produzido no Zimba- bwe possuíam capacidade para produzir bacteriocinas. Estudos realizados nos Camarões por Kaktcham et al. (2012) demonstraram que as BAL presentes no leite fermentado kossam produziam ácidos orgânicos, peróxido de hidrogénio e bacteriocinas que contribuíam para a bioconservação do mesmo.

2.10. Importância das bactérias lácticas na indústria de lacticínios Hoje em dia os consumidores são muito exigentes quanto ao sabor, ao aroma e à consistência dos produtos lácteos. É por isso que a indústria de lacticínios está cada vez mais interessada em explorar novas possibilidades que permitam expandir e diversificar a sua gama de produtos. A procura de novas estirpes que tenham efeitos desejáveis sobre as características dos produtos lácteos é enorme, e neste contexto os produtos artesanais são considerados fontes potenciais de muitos microrganismos (Wouters et al., 2002). A produção industrial dos produtos lácteos proporciona ao consumidor um produto com características desejáveis, resultante da atividade metabólica e das propriedades tecnológicas das estirpes durante o seu crescimento no leite, o que leva à padronização da qualidade dos produtos e à reprodutibilidade dos processos com sucesso. As BAL têm um papel importante porque: produzem ácido láctico, que é responsável pela des- cida do pH; produzem substâncias inibidoras responsáveis por interações entre estirpes bacte- rianas; produzem enzimas que intervêm na degradação de proteínas, em especial da caseína, durante a maturação de queijos; são responsáveis pela formação de aromas, a partir do citrato. A capacidade de produzir ácido láctico a partir do metabolismo dos açúcares, em particular da lactose, é a propriedade mais importante destas bactérias na indústria de lacticínios, porque ao acumular-se no leite reduz o seu pH para valores que inibem o desenvolvimento de bactérias patogénicas e de decomposição (Caridi, 2003; Tannok, 2004; Yi et al., 2011), o que contribui para uma melhoria substancial da qualidade higiénica dos produtos, aumento do período de vida útil e estabilidade do produto final. Os lactobacilos são utilizados, como culturas de arranque ou culturas complementares, para a produção de vários produtos fermentados pelo facto de provocarem uma rápida redução do seu pH. Além disto, a atividade proteolítica, a produção de compostos aromáticos, de bacteriocinas e de EPS tornam mais relevante a aplicação deste grupo de BAL em biotecnologia alimentar (Leroy & De Vusyst, 2004).

51 A acidez produzida pelos ácidos láctico e acético é importante, uma vez que promove a coagulação do leite e vai modificar as suas propriedades reológicas (textura) e organoléticas (flavour), contribuindo assim para o desenvolvimento da qualidade gastronómica do produto (Savadogo et al., 2004; Vlieg & Hugenholtz, 2007). Este processo é complementado pela produção e, em alguns casos, pela secreção de enzimas hidrolíticas, principalmente protei- nases e peptidases, e ainda, embora em menor quantidade, de lipases e esterases (Durlu-O- zkaya, Xanthopoulos, Tunail & Litopoulou-Tzanetaki, 2001), ao mesmo tempo que se vai preservando e conservando o alto valor nutritivo dos produtos alimentares fermentados. A presença de bactérias lácticas fermentativas é crucial para o desenvolvimento das pro- priedades intrínsecas dos produtos alimentares fermentados, uma vez que a sua atividade metabólica é responsável pela aceitabilidade dos leites e queijos fermentados, pelo contri- buto que têm no realce do “flavour” e desenvolvimento da textura (Zambou et al., 2007; Adnan & Tan, 2007; Huertas, 2010). A conversão da fração proteica, mais particularmente dos aminoácidos, contribui para o desenvolvimento dos vários componentes do “flavour” (Hugenholtz, 2008). As BAL pertencentes aos géneros não patogénicos e com efeitos benéficos – Lactococcus, Lactobacillus, Leuconostoc, Oenococcus e Streptococcus – têm sido tradicionalmente utiliza- das na indústria alimentar, onde desempenham um papel importante, devido à grande produção e consumo de vários produtos lácteos fermentados, principalmente queijos e leites fermentados acidificados (Garabal, 2007). De acordo com Adnan e Tan (2007) as BAL homofermentativas têm grande potencial para serem utilizadas na indústria, porque produzem maiores quantidades de ácido láctico do que as BAL heterofermentativas, que por produzirem dióxido de carbono e outros tipos de ácidos orgânicos em conjunto com o ácido láctico são consideradas de baixo potencial industrial.

52 3. Materiais e Metódos 3.1. Produção artesanal do omavele 3.1.1. Ordenha A ordenha para a obtenção do leite era feita de manhã muito cedo por elementos do sexo mas- culino. Em algumas localidades o leite era recolhido para um recipiente de madeira semelhante a uma tigela, designado por “eholo”, como mostra a Figura 5. Posteriormente e em alguns casos o leite era filtrado para uma cabaça através de uma rede metálica ou plástica ou ainda através de um pano, com a ajuda de um funil (Fig. 6). Nesta fase por vezes são adicionadas cascas ou raízes de plantas que na região são designadas por “mucopacopa”, “omututu” e “omukwa wopossi” em língua nativa.

Figura 5. Ordenha manual. Figura 6. Transferência do leite para a cabaça.

A cabaça, também vulgarmente conhecida por “echanquelo”, é um recipiente artesanal obtido a partir da Lagenaria siceraria, uma cucurbitácea que é seca ao sol depois de removido o seu conteúdo. Normalmente a cabaça contém uma pequena porção da produção de omavele do dia anterior.

3.1.2. Incubação e batedura O recipiente (cabaça) com o leite era colocado num local arejado, à temperatura ambiente (22-26ºC). Esse local, geralmente era a cozinha, sendo esta um espaço rudimentar construído de pau a pique e coberto de capim, destinado à preparação de alimentos. A partir do meio do dia, quando a temperatura era mais elevada, o recipiente com o leite em fase de coagulação era colocado ao sol e batido durante cerca de 5 minutos com movimentos de vaivém. A batedura ocorria, aproximadamente, de duas em duas horas, para promover a homogeneização e a acumulação de gordura à superfície, como mostra a Figura 7.

53 O procedimento referido demorava cerca de 9 horas, após o que o produto era considerado pronto a ser consumido. É de salientar que na região em estudo, em virtude da fraca produção leiteira, impunha-se a produção diária de omavele (Fig. 8). Na Figura 9 está esquematizado o modo de produção artesanal do omavele.

Figura 7. Agitação da cabaça (batedura). Figura 8. Omavele.

54 Figura 9. Preparação artesanal do omavele.

Leite

Adição de raízes Cabaça ou caules de plantas (opcional)

Incubação à temperatura ambiente, durante 8 a 9 horas

Agitação aproximadamente de duas em duas horas

Remoção da gordura (ngundi) opcional

Omavele

Consumo

3.2. Recolha de amostras As amostras de omavele foram obtidas em 6 localidades rurais na província da Huíla, nomea- damente em Chibia (15º 10. 81 S, 13º 39. 96 E, 1.503 m), Huíla (15º 02. 92 S, 13º. 34. 17 E, 1.729 m), Humpata (14º 55. 30S, 13º 20. 90 E, 2.027 m), Mulondo (15º 38.54 S, 15º 12. 4 E, 1.152 m), Rio da Areia (15º 37. 01 S, 14º 03.34 E, 1.288 m) e Toco (14º.47. 20 S, 13º. 46. 45

55 E, 1.674 m). No mapa representado na Figura 10 estão indicadas as 6 localidades onde foram recolhidas as amostras de omavele que fizeram parte do estudo.

Figura 10. Mapa da província da Huíla – localidades em estudo.

Das 57 amostras de omavele utilizadas no nosso estudo 12 foram colhidas em Chibia, 3 em Huíla, 9 em Humpata, 5 em Mulondo, 13 em Rio da Areia e 15 em Toco. A recolha das amos- tras decorreu na época das chuvas e no início da época seca, durante os meses de fevereiro e março de 2007 e de maio e junho de 2008, 2009 e 2010. Em cada uma das localidades as amostras de omavele foram recolhidas de diferentes produtores. As amostras foram colhidas diretamente das cabaças para frascos de vidro esterilizados de 250 mL, devidamente identificadas, acondicionadas em caixas isotérmicas com acumuladores térmicos e transportadas para o laboratório. Uma vez no laboratório as amostras foram colo- cadas no frigorífico à temperatura de refrigeração (2 – 4 ºC) e foram analisadas em menos de 24 horas após a colheita.

3.3. Análises fisico-químicas A composição química de 15 das amostras obtidas em 2010 foi determinada por testes rápidos, utilizando o aparelho MilkoScan Minor 140H. Nas amostras de omavele determinou-se o pH, o teor de proteínas, de gorduras e de sólidos totais.

56 3.4. Análises microbiológicas 3.4.1. Contagem de microrganismos Aeróbios Totais a 30ºC A contagem de microrganismos Aeróbios Totais a 30º C consistiu na determinação do número total de microrganismos por contagem de colónias desenvolvidas em meio de cultura PCA (Plate Count Agar – Oxoid CM 0325). Semeou-se por incorporação 1mL de cada uma das diluições decimais (10-1 a 10-7), efetuadas em Água peptonada (Oxoid CM 00093), por placa de Petri. A sementeira foi feita em duplicado. A cada placa de Petri foram adicionados cerca de 15 mL de meio de cultura PCA previamente fundido e mantido à temperatura de 45ºC. Após solidificação do meio, as placas de Petri foram incubadas em aerobiose à temperatura de 30ºC durante 72 horas. Procedeu-se à contagem das colónias nas placas de Petri contendo entre 30 e 300 colónias. Os resultados foram expressos em logaritmo do número de unidades formadoras de colónias por mililitro (log10 ufc/mL).

3.4.2. Contagem de Bactérias lácticas A contagem das BAL consistiu na determinação do número total de microrganismos presumi- velmente pertencentes aos géneros Lactobacillus spp., Lactococcus spp. e Enterococcus spp. por colónias desenvolvidas em meios de cultura específicos.

3.4.2.1. Contagem de Lactobacilos Semeou-se por incorporação em dupla camada 1 mL de cada uma das diluições decimais (10-1 a 10-7), efetuadas em Água peptonada (Oxoid CM 00093), por placa de Petri. A sementeira foi feita em duplicado. A cada placa de Petri foram adicionados cerca de 2 x 15 mL de meio de cultura RGSA (Rogosa Agar – Oxoid CM 0627B) previamente fundido e mantido à tempera- tura de 45ºC. Após solidificação do meio, as placas de Petri foram incubadas a 30ºC durante 72 horas. Procedeu-se à contagem das colónias nas placas de Petri contendo entre 30 e 300 colónias. Os resultados foram expressos em logaritmo do número de unidades formadoras de colónias por mililitro (log10 ufc/mL).

3.4.2.2. Contagem de Lactococos Semeou-se por incorporação em dupla camada 1 mL de cada uma das diluições decimais (10-1 a 10-7), efetuadas em Água peptonada (Oxoid CM 00093), por placa de Petri. A sementeira foi feita em duplicado. A cada placa de Petri foram adicionados cerca de 2 x 15 mL de meio de cultura M17

57 Agar (Oxoid CM 0785B) previamente fundido e mantido à temperatura de 45ºC. Após solidifica- ção do meio, as placas de Petri foram incubadas a 30ºC durante 48h horas. Procedeu-se à contagem das colónias nas placas de Petri contendo entre 30 e 300 colónias. Os resultados foram expressos em logaritmo do número de unidades formadoras de colónias por mililitro (log10 ufc/mL).

3.4.2.3. Contagem de Enterococos Semeou-se por incorporação em dupla camada 1 mL de cada uma das diluições decimais (10-1 a 10-7), efetuadas em Água peptonada (Oxoid CM 00093), por placa de Petri. A sementeira foi feita em duplicado. A cada placa de Petri foram adicionados cerca de 2 x 15 mL de meio de cultura KAA (Kanamycin Aesculin Azide Agar – Oxoid CM 591B) previamente fundido e mantido à temperatura de 45ºC. Após solidificação do meio, as placas de Petri foram incubadas a 37ºC durante 48 horas. Procedeu-se à contagem das colónias nas placas de Petri contendo entre 30 e 300 colónias. Os resultados foram expressos em logaritmo do número de unidades formadoras de colónias por mililitro (log10 ufc/mL).

3.4.3. Contagem de Bolores e Leveduras Semeou-se por incorporação em dupla camada 1 mL de cada uma das diluições decimais (10-1 a 10-7), efetuadas em Água peptonada (Oxoid CM 00093), por placa de Petri. A sementeira foi feita em duplicado. A cada placa de Petri foram adicionados cerca de 15 ml de meio de cultura RB (Rose Bengal Chloranfenicol Agar – Oxoid CM0549) previamente fundido e mantido à temperatura de 45ºC. Após solidificação do meio, as placas de Petri foram incubadas a 22ºC durante 5 dias. Procedeu-se à contagem das colónias nas placas de Petri contendo entre 30 e 300 colónias. Os resultados foram expressos em logaritmo do número de unidades formadoras de colónias por mililitro (log10 ufc/mL).

3.4.4. Contagem de Micrococos Semeou-se por incorporação em dupla camada 1 mL de cada uma das diluições decimais (10-1 a 10-7), efetuadas em Água peptonada (Oxoid CM 00093), por placa de Petri. A sementeira foi feita em duplicado. A cada placa de Petri foram adicionados cerca de 2x15 mL de meio de cultura MSA (Manitol Salt Agar – Oxoid CM 0085B) previamente fundido e mantido à temperatura de 45ºC. Após solidificação do meio, as placas de Petri foram incubadas a 30ºC durante 72 h horas.

58 Procedeu-se à contagem das colónias nas placas de Petri contendo entre 30 e 300 colónias. Os resultados foram expressos em logaritmo do número de unidades formadoras de colónias por mililitro (log10 ufc/mL).

3.4.5. Contagem de Enterobactérias Semeou-se por incorporação em dupla camada 1 mL de cada uma das diluições decimais (10-1 a 10-7), efetuadas em Água peptonada (Oxoid CM 00093), por placa de Petri. A sementeira foi feita em duplicado. A cada placa de Petri foram adicionados cerca de 2 x15 mL de meio de cultura VRGBA (Violet Red Glucose Bile Agar – Oxoid CM 0485B) previamente fundido e mantido à temperatura de 45ºC. Após solidificação do meio, as placas de Petri foram incubadas a 37ºC durante 24 h horas. Procedeu-se à contagem das colónias nas placas de Petri contendo entre 30 e 300 colónias. Os resultados foram expressos em logaritmo do número de unidades formadoras de colónias por mililitro (log10ufc/mL).

3.5. Isolamento e conservação de microrganismos Selecionaram-se cinco colónias características em cada um dos meios de cultura utilizados para as bactérias lácticas e para bolores e leveduras. Cada uma das colónias selecionadas foi repicada, com o auxílio de uma ansa, para um tubo de ensaio com o meio de cultura espe- cífico do microrganismo isolado, de modo que a cada tubo correspondia uma determinada colónia de um microrganismo. As temperaturas de incubação foram de acordo com cada um dos microrganismos isolados. Após o período de incubação, os tubos de ensaio com os microrganismos isolados a partir do omavele foram acondicionados e levados, por mão pró- pria, para o Centro de Investigação de Tecnologia de Alimentos (CERPTA) da Faculdade de Veterinária da Universidade Autónoma de Barcelona (UAB). Os isolados obtidos em 2007 foram liofilizados porque na altura havia constrangimentos financeiros que impossibilitaram a realização das análises de biologia molecular. Os isolados obtidos em 2009 e 2010 foram conservados nos respetivos meios de cultura à temperatura de refrigeração (2 – 4ºC), uma vez que nesse ano já não havia constrangimentos à realização das análises de biologia mo- lecular.

3.6. Identificação genotípica de Bactérias lácticas e Leveduras Dos 1.140 isolados presuntivos de bactérias lácticas e leveduras enviados para o CERPTA, obtidos a partir das diferentes amostras de omavele, 141 foram submetidos a identificação genotípica.

59 3.6.1. Revivificação dos isolados selecionados Os isolados presuntivos de Lactobacilos, Lactococos e Enterococos, tanto os liofilizados como os não liofilizados, foram semeados em placas de Petri com o respetivo meio de cultura – Man, Rogosa and Sharpe Agar (MRS) (Oxoid CM 0361), M17 (Oxoid CM 0785B) Kanamycin ­Aesculin Azide Agar (Oxoid CM 591B). As placas semeadas foram incubadas em microaero- filia a 37ºC durante 24 a 48 horas. Os isolados de Leveduras, tanto os liofilizados como os não liofilizados, foram semeados em placas de Petri com Sabouraud Dextrose Agar (Oxoid- CM0041B). As placas semeadas foram incubadas em aerobiose a 25ºC durante 2 a 5 dias.

3.6.2. Extração de ADN Para a extração do ácido desoxirribonucleico (ADN) a partir de cada um dos isolados selecio- nados utilizou-se o kit “DNeasy Blood and Tissue” (QIAGEN, Alemanha) de acordo com o protocolo do fabricante. Segundo este protocolo o concentrado de células, obtido após centri- fugação durante 10 minutos a 5000 x g (7500 rpm), foi suspenso em 180 μl de tampão de lise enzimática. Após um período de incubação de pelo menos 30 minutos a 37ºC, adicionou-se 25 μl de proteinase K e 200 μl de tampão AL, e após ter sido homogeneizado no vortex foi incubado a 56ºC durante 30 minutos. Em seguida adicionou-se 200 μl de etanol e homogenei- zou-se no vortex. A mistura obtida foi pipetada para uma coluna “DNeasy Mini spin” e centri- fugada a ≥ 6000 x g (8000 rpm) durante 1 minuto, após o que se rejeitou o filtrado obtido. Ao concentrado obtido adicionou-se 500 μl de tampão AW1 e centrifugou-se durante 1 minuto a ≥ 6000 x g (8000 rpm), rejeitando-se o filtrado. A seguir adicionou-se 500 μl de tampão AW2 e centrifugou-se a 20.000 x g (14.000 rpm) durante 3 minutos, rejeitando-se o filtrado. Ao con- centrado obtido adicionou-se 200 μl de tampão AE e depois de ter sido incubado à temperatura ambiente durante 1 minuto foi centrifugado a ≥ 6000 x g (8000 rpm) durante 1 minuto. O ADN dos isolados em estudo foi conservado a – 22ºC.

3.6.3. Amplificação do ADN por PCR Depois de comprovada a identidade do ADN e de quantificado através do Nanodrop 2000 UV-Vis Spectrophotometer (Thermo Scientific, USA) procedeu-se à sua amplificação. Para a amplificação do gene 16S rADN das bactérias seguiu-se a técnica descrita por Suzuki, Sasaki, Uramoto, Nakase e Komagata (1996) em que foram utilizados os oligo- nucleótidos universais (primers) 27F e 1492R (Tabela 6). A PCR realizou-se com o “kit” Expand High Fidelity PCR System (Roche Diagnostics) num volume final de 100 µl contendo (MgCl2 1,5 mM, dNTPs 0,2 mM; 0,5 µM de cada primer; 1,4 U de Taq DNA

60 Polimerase; 100 ng de DNA cromossómico). O programa de amplificação utilizado no termociclador 2720 (Applied Biosystems, USA) foi de 30 ciclos de desnaturação, 94ºC durante 60 segundos; hibridação a 55ºC durante 150 segundos; e extensão a 72ºC durante 150 segundos. Para a amplificação do gene 26S rADN das leveduras seguiu-se a técnica descrita por Kurtz- man e Robnett (1997) em que foram utilizados os oligonucleótidos universais (primers) NL-1 e NL-4 (Tabela 6). A PCR realizou-se com o mesmo “kit” que foi usado para as bactérias, em que as concentrações de ADN cromossómico também foram iguais. O programa de am- plificação utilizado no termociclador 2720 (Applied Biosystems, USA) foi de 36 ciclosde desnaturação, 94ºC durante 1 minuto; hibridação a 52ºC durante 1 minuto; e extensão a 72ºC durante 2 minutos. Os produtos de amplificação foram separados por eletroforese em gel de agarose 1% (p/v) no tampão TAE 1X, 100 V durante 30 min (BioRad, USA), após coloração com brometo de etí- deo. A eletroforese realizou-se num sistema de eletroforese horizontal convencional (BioRad, USA). O ADN foi visualizado sob luz ultravioleta e para a captação da imagem foi utilizado o sistema GelDoc XR (BioRad, USA). Para a purificação do ADN utilizou-se o “kit” comer- cial Illustra GFX PCR DNA and Gel Band Purification Kit (GE Healthcare Life Sciences). A sequenciação dos fragmentos purificados foi realizada pela empresa Macrogen. As diferentes sequências foram estudadas com o pacote informático DNASTAR e as sequências finais foram comparadas com as existentes na base de dados NCBI (National Center for Biotechnology Information).

Tabela 6. Oligonucleótidos universais.

Oligonucleótidos Gene Sequências (5’-3’) Dimensão iniciadores

16S 27F AGAGTTTGATCCTGGCTCAG 1465pb

1492R GGTTACCTTGTTACGACTT 1464pb

26S NL1 GCATATCAATAAGCGGAGGAAAAG 579pb

NL4 GGTCCGTGTTTCAAGACGG 579pb

3.7. Seleção de estirpes para uso industrial O objetivo foi o de obter culturas mistas, compostas por estirpes representantes das diferen- tes espécies identificadas em cada uma das localidades de onde se recolheram amostras de omavele. As estirpes foram selecionadas com base na origem, no ano de colheita, no meio de

61 isolamento e na espécie determinada pela sequenciação do gene 16S rADN para bactérias e do gene 26S rADN para leveduras, de forma que cada fermento tivesse como mínimo uma estirpe de lactobacilos, uma de lactococos e uma de leveduras. Uma das condições era a de as estirpes selecionadas terem que ser diferentes, o que foi posteriormente confirmado pelos resultados obtidos através da Eletroforese em Campo Pulsado (PFGE) realizada no laboratório de Microbiologia da Faculdade de Biociências da Universidade Autónoma de Barcelona. De acordo com as condições definidas constituíram-se três tipos de fermentos que foram de- signados por FO1, FO2 e FO3 conforme mostram as tabelas 7, 8 e 9, respetivamente. O fermento FO1 foi constituído por estirpes de Lb. plantarum/Lb. pentosus, Lb. helveticus/ Lb. plantarum, Lb. casei, Lb. lactis, Issatchenkia orientalis, Saccharomyces cerevisiae e Ka- zachstania unispora, isoladas de amostras de omavele recolhidas em 2009 na localidade de Toco, com exceção da estirpe de Lc. lactis. O fermento FO2 foi constituído por estirpes de Lb. plantarum/Lb. pentosus, Lb.casei/Lb.para- casei, Lc. lactis e I. orientalis isoladas de amostras de omavele recolhidas em 2010 na locali- dade de Chibia e por uma estirpe de S. cerevisiae isolada de amostras de omavele recolhidas em 2009 na mesma localidade. O fermento FO3 foi constituído por estirpes de Lb. plantarum/Lb. pentosus, S. cerevisiae, K. unispora, Lc. lactis e I. orientalis isoladas de amostras de omavele recolhidas na localidade de Rio da Areia, as três primeiras em 2009 e as restantes em 2010.

Tabela 7. Estirpes utilizadas para a produção do FO1 (TOCO).

Estirpes Designação

Lb. plantarum/Lb. pentosus 2009 – RGSA 16-4

Lb. helveticus/Lb. plantarum 2009 – KAA 15-1

Lb. casei 2009 – RGSA 7-2

Lc. lactis (Chibia) 2009 – KAAA 21-2

S. cerevisiae 2009- RB-14-5

I. orientalis 2009 – RB 7-5

K. unispora 2009 – RB 15-4

62 Tabela 8. Estirpes utilizadas para a produção do FO2 (CHIBIA).

Estirpes Designação

Lb. plantarum /Lb. pentosus 2010 – KAA 9–1

Lb.casei /Lb.paracasei 2010 – M17 9-3

Lc. lactis 2010 – M17 10-1

I. orientalis 2010 – RB 10-1

S. cerevisiae 2009 – RB 20-4

Tabela 9. Estirpes utilizadas para a produção do FO3 (RIO DA AREIA).

Estirpes Designação

Lb. plantarum/Lb. pentosus 2009 – RGSA 1-1

Lc. lactis 2010 – M17 1-1

S. cerevisiae 2009 – RB 12-1

I. orientalis 2010 – RB 1-1

K. unispora 2009 – RB 9-5

3.8. Produção de omavele na oficina tecnológica A produção de omavele foi realizada no CERPTA. No nosso ensaio usou-se leite de vaca pre- viamente submetido à temperatura de 90ºC durante 90 segundos. Os recipientes usados para a produção de omavele eram de polietileno, os quais foram previamente lavados e desinfetados com ácido peracético a 1% e enxaguados com água esterilizada. Foram feitas 2 produções de cada um dos leites fermentados, com um intervalo de 30 dias entre cada uma delas. A cada 4 litros de leite de vaca adicionou-se 120 mL de leite de vaca esterilizado com cada um dos fermentos em estudo – FO1, FO2 e FO3 – para obtenção do Omavele 1 (O1), do Omavele 2 (O2) e do Omavele 3 (O3), respetivamente.

Na Tabela 10 estão representadas as concentrações dos microrganismos (log10 ufc/mL) em 120 mL de cada um dos fermentos – FO1, FO2 e FO3 – usados tanto na primeira como na segunda produção dos leites fermentados O1, O2 e O3. Cada porção de leite inoculada com o fermento (4 L+120 mL) foi incubada a 30 ºC durante 10-12 h. Após o período de incubação os leites foram batidos durante cerca de 5 minutos.

63 Depois deste procedimento os três leites fermentados (O1, O2 e O3) foram introduzidos numa camara de refrigeração à temperatura de 4 ºC até ao 30º dia. Na tabela 11 são referidas as concentrações dos três grupos de microrganismos – lactobacilos, lactococos e leveduras – nos leites inoculados com os fermentos já referidos, na primeira e na segunda produção dos omaveles O1, O2 e O3.

Tabela 10. Concentração de microrganismos (log10 ufc/mL) em 120 mL de cada um dos fer- mentos – FO1, FO2 e FO3 – na primeira e na segunda produção de omavele.

Lb. plantarum/ Lb . helveticus/ Lb. casei/Lb. Lb. casei Lc. lactis K. unispora I. orientalis S. cerevisiae Lb. pentosus Lb. plantarum paracasei

FO1 1ª P 8,37 8,03 9,21 8,63 8,34 8,25 8,50

2ª P 7,08 7,76 8,32 8,93 8,21 8,31 7,67

FO2 1ª P 8,19 7,46 7,95 8,67 8,46

2ª P 7,22 7,16 7,36 8,59 8,20

FO3 1ª P 8,13 8,95 8,66 8,40 8,61

2ª P 7,37 7,20 8,43 8,47 8,06

P-produção

Tabela 11. Concentração (log10 ufc/mL) dos 3 grupos de microrganismos nos leites - O1, O2 e O3 – na primeira e na segunda produção de omavele, antes da fermentação.

Lactobacillus Lactococcus Leveduras

O1 1ª P 7,77 7,10 7,33

2ª P 6,93 7,40 7,09

O2 1ªP 6,74 6,43 7,36

2ªP 5,97 5,84 7,22

O3 1ªP 6,60 7,44 8,85

2ªP 5,85 5,68 8,75

3.9. Avaliação sensorial das três produções de omavele Os leites fermentados O1, O2 e O3, foram avaliados organoleticamente no dia em que foram produzidos. A avaliação organolética foi feita por um painel de provadores constituído por 10 peritos do CERPTA. Avaliou-se o cheiro (láctico, leveduras e outros), o sabor (ácido, amargo,

64 ácido acético/vinagre e outros) e a textura (granulada, fina). Os resultados foram anotados numa escala de 1 a 7, conforme a ficha de avaliação que consta no Anexo 3.

3.10. Avaliação microbiológica das três produções de omavele Os leites fermentados O1, O2 e O3 foram avaliados em termos microbiológicos através da contagem de Lactobacilus em MRS Agar, de Lactococcus em M17 Agar e de Leveduras em meio Saboraud Agar. As contagens dos microrganismos foram feitas no dia da produção do omavele (dia 1º) e ao 15º e 30º dias pós-produção, com o objetivo de avaliar o comportamento dos microrganismos presentes ao longo dos trinta dias.

3.11. Análise estatística A variável resposta analisada (y) foi o logaritmo de base 10 das contagens bacterianas para cada uma das 7 variáveis (Lactobacilos, Lactococos, Leveduras, Aeróbios Totais a 30ºC, Mi- crococos, Enterococos e Enterobactérias) considerando a totalidade da amostra e dividindo-a por ano e por localidade. Este procedimento permitiu normalizar a variável analisada (Ane- xo 1). Para o factor ano foram considerados 4 níveis (2007, 2008, 2009 e 2010) e para o factor localidade foram considerados 6 níveis (Chibia, Huíla, Humpata, Mulondo, Rio da Areia e Toco). A interação entre ambos os fatores não foi considerada. As diferenças entre as médias foram examinadas através do teste post-hoc HSD de Tukey. A análise de dados foi realizada com recurso ao software estatístico R, versão 2.15.0. Para avaliarmos o efeito dos fatores ano e localidade nas sete variáveis recorreu-se à ANOVA two-way em que o modelo de análise foi y= µ+ano+localidade+erro.

65 4. Resultados e Discussão 4.1. Composição química do omavele A composição química dos leites fermentados depende do próprio leite, do metabolismo es- pecífico das bactérias que se vão desenvolvendo no mesmo, do local ou da região ondeé produzido e do processo de fabrico (El Baradei et al., 2008), além da raça dos animais, da sua alimentação e da frequência da ordenha. Os parâmetros avaliados revelaram valores semelhantes, independentemente da localidade, embora não se tenha feito uma análise estatística (Tabela 12).

Tabela 12. Composição química de amostras de omavele.

Gordura Humidade Proteina Sólidos totais Amostra pH Local (%) (%) (%) (%)

1 4,73 4,53 86,18 4,34 13,82 R. Areia

2 4,43 7,35 83,45 5,93 16,55 R. Areia

3 4,54 6,26 84,74 6,24 15,26 R. Areia

4 4,86 6,83 83,68 6,35 16,32 Toco

5 4,56 4,20 85,98 7,41 14,02 Toco

6 4,72 2,20 88,24 4,64 11,77 Toco

7 4,46 3,08 87,91 4,87 12,09 Toco

8 4,75 6,48 83,15 5,72 16,85 Humpata

9 4,32 4,86 86,02 6,18 13,98 Humpata

10 4,49 5,07 85,28 6,07 14,72 Humpata

11 4,29 4,07 85,41 6,71 14,59 Chibia

12 4,77 5,93 85,55 4,28 14,45 Chibia

13 4,31 4,86 85,74 4,86 14,26 Chibia

14 4,88 6,89 84,90 3,74 15,10 Huíla

15 4,60 4,93 86,29 5,54 13,71 Huíla

66 O valor de pH oscilou entre 4,88 e 4,29, sendo o valor médio de 4,57. Estes valores foram semelhantes aos do leite fermentado amasi produzido na África do Sul e Zimbabwe e supe- riores aos obtidos nos leites fermentados ititu, nono, zabady, rayeb e lben, o que pode ser devido a diferenças no modo de produção artesanal dos mesmos e à composição química do leite (Bille, 2009). Os valores de gordura apesentaram uma grande variabilidade tendo oscilado entre 2,20% e 7,35%, sendo o valor médio de 5,17%, superior ao do leite laban (3,1%) consumido no Bahrain (Golfo Pérsico) (Musaiger, Al-Saad, Al-Hooti & Khunji, 1998), ao do robe (1,9%) (Sulieman et al., 2009), ao do zabady (3,62%) e ao do nono (0,83%) (Bille, 2009) e inferior ao do ititu (9,1%) (Gonfa et al., 2001) e do amasi (5,89%) (Bille, 2009). Os valores da proteína variaram entre 3,74% e 7,41% com uma média de 5, 53%, superior ao dos leites laban (3,5%), robe (3,3%), amasi (4,57%), zabady (4,17%) e nono (2,55%) e infe- rior ao do ititu (7,17%) (Gonfa et al., 2001). Os teores de proteína do omavele são aceitáveis tendo em conta que o leite foi obtido a partir bovinos de raça autóctone, o que representa uma vantagem do ponto de vista nutricional e industrial. Quanto aos sólidos totais, oscilaram entre 11,77% e 16,85% com uma média de 14,50%, valor esse superior ao do robe (7,2%) (Sulieman et al., 2009), ao do laban (11,8%) (Musaiger et al., 1998) e aos valores referidos por Bille (2009) no nono (6,08%) e no zabady (14,32%) e infe- rior ao do amasi (16,53%). Gonfa et al. (2001) referiram no ititu valores superiores (20,87%). O teor de humidade foi inferior ao do laban (88,2%) (Musaiger et al., 1998). Apesar da diversidade de fatores que influenciam a composição química dos leites fermenta- dos verificámos que aquela composição no omavele era semelhante à de outros leites produzi- dos em África, podendo considerar-se mais rico nutricionalmente que o leite nono.

4.2. Teores de microrganismos isolados de amostras de omavele

Em amostras de omavele obtidas nos diferentes anos as contagens médias (log10 ufc/mL) de Lactobacilos revelaram diferenças significativas (p<0,05) entre os anos 2007:2008 e 2007:2009; as de Lactococos revelaram diferenças significativas (p<0,05) entre os anos 2007:2009; as de Leveduras revelaram diferenças significativas (p<0,05) entre os anos 2007: 2010; as de Enterococos revelaram diferenças significativas (p<0,05) entre os anos 2007:2010 e 2009:2010; as de Enterobactérias revelaram diferenças significativas (p<0,05) entre os anos 2008:2010 e 2009:2010. Não se verificaram diferenças significativas (p<0,05) para Micrococos e Aeróbios Totais a 30ºC, nos anos em estudo (Tabela 13) (Anexo 1). As diferenças obtidas entre os anos em estudo para Lactobacilos, Lactococos, Leveduras e Enterococos, podem ser devidas a situações relacionadas com o clima, uma vez que em

67 2007 as amostras foram colhidas durante a estação das chuvas, enquanto em 2008, 2009 e 2010 foram colhidas no fim da estação das chuvas e início da estação seca. No entanto, para o caso de Enterococos e Enterobactérias, verificaram-se diferenças significativas em amostras colhidas na mesma época durante os anos 2009:2010, 2008:2010 e 2009:2010. Neste caso as diferenças registadas podem ser devidas a aspectos relacionados com a qualidade higiénica da matéria-prima e a elaboração do produto.

Tabela 13. Teores médios (log10 ufc/mL) dos diferentes microrganismos presentes no omavele obtidos nos diferentes anos.

Microrganismos Anos

2007 2008 2009 2010

Lactobacilos 7.38a 6.59b 6.46b 6.92a,b

Lactococos 6.77a 6.55a,b 5.90b 6.18a,b

Leveduras 6.39a 6.04a,b 5.70ab 5.52b

Enterococos 4.07b 4.85a,b 4.10b 5.02a

Micrococos 4.07a 3.36a 3.33a 4.03a

Enterobactérias ___ 2.69b 2.91b 4.42a

Aeróbios totais a 30ºC ___ 6.79a 6.29a 6.17a

As médias com os mesmos índices não diferem significativamente (p<0,05).

Em amostras de omavele obtidas nas diferentes localidades as contagens médias de micror- ganismos (log10 ufc/mL) revelaram a existência de diferenças significativas (p<0,05) para: Lactococos entre Humpata e Rio da Areia e Humpata e Toco; Enterococos entre Huíla e Toco, Huíla e Rio da Areia, Humpata e Toco e Humpata e Rio da Areia; Enterobactérias entre Toco e Huíla; e Aeróbios totais a 30 ºC entre Humpata e Rio da Areia e Humpata e Toco. Não se verificaram diferenças significativas (p<0,05) para Lactobacilos, Leveduras e Micrococos (Tabela 14) (Anexo 1). Estas diferenças podem ser devidas a várias situações como: as condições climatéricas ineren- tes a cada localidade; a idade dos recipientes utilizados na preparação do omavele, particular- mente da cabaça, uma vez que quanto mais antigo for o recipiente maior é a quantidade de leite residual acumulada nas paredes, proporcionando assim um ambiente favorável ao desenvolvi- mento de microrganismos; a quantidade de omavele da produção anterior que é usada como cultura de arranque e as condições sanitárias do processo de produção. As cascas ou raízes de

68 várias plantas, que podem ou não ser adicionadas ao leite com o objetivo não só de acelerar a coagulação mas também de conferir odores e sabores diferentes, podem funcionar como fonte de microrganismos e assim contribuir para as diferenças microbianas encontradas.

Tabela 14. Teores médios (log10 ufc/mL) dos diferentes microganismos presentes no omavele obtidos nas diferentes localidades.

Localidades

Microrganismos Rio da Areia Mulondo Chibia Humpata Toco Huíla

Lactobacilos 6.45a 7.23a 6.94a 7.12a 6.58a 7.17a

Lactococos 5.77b 6.70a,b 6.43a,b 7.06a 5.77b 6.56a,b

Leveduras 5.65a 6.42a 5.80a 6.08a 5.64a 5.70a

Enterococos 3.85b 4.17a,b 4.69a,b 5.45a 4.11b 5.83a

Micrococos 3.27a 4.23a 4.12a 3.90a 3.35a 3.84a

Enterobactérias 3.08ab _____ 3.19ab _____ 2.69b 4.60a

Aeróbios totais a 30ºC 6.13b _____ 6.46ab 7.31a 5.83b 6.34a,b

As médias com os mesmos indices não diferem significativamente (p<0,05).

A microbiota láctea presente no omavele encontra-se representada na Figura 11. Verificou-se que não foi registada uma grande variabilidade ao longo dos quatro anos mantendo-se a ten- dência de Lactobacilos > Lactococos > Leveduras > Enterococos > Micrococos > Enterobac- térias, confirmada por estudos realizados por vários autores em produtos lácteos fermentados tradicionais (Beukes et al., 2001; Gonfa et al., 2001; Mathara et al, 2004; Obodai & Dodd, 2006) .

69 Figura 11. Teores médios dos diferentes microrganismos isolados em amostras de omavele durante o período em estudo.

8 6,8 6,24 6,31 7 5,82

6 4,48 Enterobacteriaceae 5 Enterococos 3,74 3,26 Micrococos 4 ufc/ml Aeróbios Totais 10 Leveduras log 3 Lactococos 2 Lactobacilos

1

0

De acordo com Narvhus e Gadaga (2003) os leites naturalmente fermentados produzidos em África apresentam, geralmente, teores de bactérias lácticas e de bactérias aeróbias mesófilas superiores a 9 log10 ufc/g, teores de coliformes de 6-7 log10 ufc/g e de leveduras de 6 log10 ufc/g. Os mesmos autores referem que no leite fermentado amasi, produzido no Zimbabwe, os teores médios de bactérias lácticas, leveduras e de coliformes foram de 8 log10 ufc/mL,

> 6 log10 ufc/mL e 5-6 log10 ufc/mL, respetivamente. Mathara et al. (2004) referem que lactobacilos e lactococos foram as bactérias lácticas mais frequentes em amostras de leite fermentado kule naoto no Kenya, em que os teores médios obtidos foram de 8,0 log10 ufc/mL e de 7,9 log10 ufc/mL, respetivamente. Estes valores foram superiores aos obtidos no omavele (Fig. 11). Estudos realizados no Ghana por Obodai e Dodd (2006) em leite fermentado nyarmie revela- ram que as concentrações de lactococos eram de 108 ufc/mL, as de lactobacilos eram de 1010 ufc/mL e as de bolores e leveduras de 107 ufc/mL, mais elevados que os obtidos no nosso estudo (Fig.11). Segundo Narvhus e Gadaga (2003) o teor de leveduras em produtos lácteos fermentados tra- dicionais pode ser superior a 8 log10 ufc/g. No decorrer do nosso estudo não foram registadas concentrações de bolores e leveduras superiores a 106 ufc/mL. Abdelgadir et al. (2001), em amostras de leite fermentado rob produzido no Sudão, referem teores de lactobacilos de 8,85-8,96 log10 ufc/mL, de lactococos de 8,80-8,89 log10 ufc/mL, de leveduras de 7,19-7,64 log10 ufc/mL e de microrganismos aeróbios mesófilos de 5,53-6,57 log10 ufc/mL, estes resultados foram superiores aos obtidos no nosso estudo, com exceção de 70 microrganismos aeróbios totais a 30ºC em que no omavele os teores médios obtidos variaram entre 5 e 8,01 log10 ufc/mL. Isono, Shingu e Shimizu (1994), em estudos realizados em leites fermentados produzidos no norte da Tanzânia, obtiveram teores médios de leveduras de 6,0-8,0 log10 ufc/mL, valores superiores aos teores médios encontrados no omavele (5,82 log10 ufc/mL) conforme se pode ver na figura 11. Akabanda et al. (2010), em leite fermentado nunu, obtiveram ao fim de 12 horas de fermen- tação teores de bactérias lácticas de 6,43±0,44 log10 ufc/mL, de leveduras de 6,27±0,85 log10 ufc/mL e de aeróbios totais a 30ºC de 6,92±0,77 log10 ufc/mL. Embora os autores não tenham feito distinção entre as contagens médias das diferentes BAL, podemos constatar que os teores médios daquelas bactérias no nunu foram inferiores aos obtidos no omavele (lactobacilos 6,80 log10 ufc/mL, lactococos 6,24 log10 ufc/mL e enterococos 4,48 log10 ufc/mL). O mesmo não aconteceu em relação aos teores médios de leveduras e aeróbios totais, que no nunu foram superiores ao encontrado no omavele (leveduras 5,82 log10 ufc/mL e aeróbios totais a 30 ºC

6,31 log10 ufc/mL) (Fig. 11). Estudos realizados por Gadaga et al. (2000), em amostras de leite acidificado colhidas em algumas residências na África do Sul, referem contagens de leveduras de 103-106 ufc/mL. Os teores médios de bolores e leveduras obtidos em leites fermentados ititu e meomata produzidos na Etiópia foram de 6,18 log10 ufc/mL e de 5,8 log10 ufc/mL, respetivamente. Estes resulta- dos foram semelhantes aos obtidos no omavele e inferiores aos obtidos no leite fermentado nono produzido na Nigéria, no qual os teores de leveduras foram de 1,5x107 ufc/g (Bankole & Okagbue, 1992). No entanto Okonkwo (2011), num outro estudo realizado em amostras de nono consumido na região norte da Nigéria, obteve teores médios de bolores e de leveduras de 1,23 log10 ufc/mL, muito inferiores aos obtidos no nosso estudo. Na Namibia, Bille, Buys e Taylor (2007) obtiveram em leite fermentado em cabaças teores médios de aeróbios totais a 30ºC de 1,58 x 108 ufc/mL, de lactobacilos de 1,53 x108 ufc/mL, de lactococos de 2,1 x 108 ufc/mL, de leveduras de 7,39 x 106 ufc/mL e de enterobactérias de 5,8 x104 ufc/mL, valores superiores aos obtidos no omavele. De acordo com os autores, é presumível que o ambiente ácido favoreça a predominância de bactérias lácticas nos leites estudados. No leite fermentado fulani do Burkina Faso foram detetados teores médios de aeróbios totais a 30ºC de 6,71 x 107 ufc/mL, de lactobacilos mesófilos de 24,44 x 106 ufc/mL, de lactoco- cos 7,75 x 107 ufc/mL, de enterobactérias de 0,98 x 104 ufc/mL e de bolores e leveduras de 2,6 x 104 ufc/mL (Savadogo et al., 2004). Estes resultados foram, em parte, semelhantes aos obtidos no omavele, com exceção dos de leveduras que foram inferiores aos obtidos no omave-

71 le. Os mesmos autores obtiveram concentrações de bactérias lácticas entre 2,4 x 104 ufc/mL e 3,9 x 108 ufc/mL em que as contagens mais altas foram superiores às obtidas no nosso estudo

(lactobacilos 6,80 log10 ufc/mL, lactococos 6,24 log10 ufc/mL e enterococos 4,48 log10 ufc/mL) embora o autor não tenha feito distinção entre as contagens médias das diferentes BAL. As contagens médias de bolores e leveduras observadas em leite fermentado ergo colhido no Sul da Etiópia excederam 8 log10 ufc/mL, muito mais elevados do que o valor aceitável (< 10 ufc/g para o iogurte) (Yilma, 2012). Estudos realizados por Yu et al. (2011), em leites fermentados consumidos na Mongólia, reve- laram teores médios de BAL entre 4,85 e 8,54 log10 ufc/mL em leite de vaca fermentado, em que o teor médio mais elevado foi superior ao obtido no nosso estudo (lactobacilos 6,80 log10 ufc/mL, lactococos 6,24 log10 ufc/mL e enterococos 4,48 log10 ufc/mL), embora o autor não tenha feito distinção entre as contagens médias das diferentes BAL. Por outro lado Watanabe et al. (2008), em leite fermentado de vaca tarag consumido na Mongólia, reportaram teores médios de bactérias lácticas de 8,35 ± 0,62 log10 ufc/mL que são superiores aos obtidos no omavele, enquanto os resultados de bolores e leveduras 5,86 ± 1,29 log10 ufc/mL foram seme- lhantes aos obtidos no nosso estudo. O teor de aeróbios totais a 30ºC é um bom indicador de higiene, porque permite controlar as práticas de higiene durante a produção, colheita e manipulação do leite cru, embora se tenha que ter em consideração que os produtos fermentados naturalmente apresentam contagens elevadas destes microrganismos devido à presença das BAL. Um estudo realizado na Mongólia por Shuangqua et al. (2006), sobre a microbiota presente numa cultura de arranque hurunge utilizada pelos pastores para a produção de leites fermen- tados, revelou concentrações de bactérias lácticas entre 1,8 x 105 e 5,3 x 108 ufc/g e de leve- duras entre 6,1 x 105 e 3,3 x 106 ufc/g, o que não foi diferente dos valores obtidos por Yu et al. (2011). Abd El-Salam (2002) referiu que o teor de bactérias lácticas presentes no leite fermentado zabady variava entre 1 x 108 e 7 x 108 ufc/mL, e que eram semelhantes aos padrões requeridos para o iogurte. Contudo, continha um grande número de bolores e leveduras (5,0 x 104- 6,9 x 105 ufc/mL), o que podia ser atribuído a uma contaminação adicional do leite a partir do meio ambiente onde era colocado, pois normalmente ficava descoberto durante o período de incuba- ção. Os teores de bactérias lácticas acima referidos foram superiores aos obtidos no omavele

(lactobacilos 6,80 log10 ufc/mL, lactococos 6,24 log10 ufc/mL e enterococos 4,48 log10 ufc/mL), embora o autor não tenha feito distinção entre as contagens médias das diferentes BAL; já os teores de leveduras no omavele variaram entre 2,64 e 7,24 log10 ufc/mL.

72 Abd El Gawad et al. (2010) reportaram teores médios de bactérias lácticas entre 106 e 107 ufc/mL e de bolores e leveduras de 102 ufc/mL. Os teores médios de bactérias lácticas foram seme- lhantes aos obtidos no omavele (lactobacilos 6,80 log10 ufc/mL, lactococos 6,24 log10 ufc/mL e enterococos 4,48 log10 ufc/mL), embora o autor não tenha feito distinção entre as contagens médias das diferentes BAL, enquanto os de bolores e leveduras foram inferiores aos obtidos no omavele (5,82 log10 ufc/mL ). Dewan e Tamang (2007) referiram, em leites fermentados artesanais produzidos nos Hima- laias, elevados teores de BAL, os quais variaram entre 7,4 x 107 ufc/g e 8,7 x 108 ufc/g, e teo- res de leveduras de 107 ufc/g, superiores aos encontrados no nosso estudo. Do mesmo modo, estudos realizados por Al-Otaibi (2012) em leite fermentado sameel consumido na região leste da Arábia Saudita, revelaram teores médios de lactobacilos, lactococos, leveduras, enterococos e enterobactérias, de 7,4 log10 ufc/mL, 7,7 log10 ufc/mL, 5,7 log10 ufc/mL, 5,9 log10 ufc/mL,

< 2 log10 ufc/mL, respetivamente. Os teores das BAL foram superiores aos do omavele enquan- to os de leveduras e enterobactérias foram inferiores aos obtidos no nosso estudo. Saleh (2013), ao estudar o leite fermentado laban zeer no Egito, obteve teores médios de BAL de 7,4 ± 0,49 log10 ufc/g e de leveduras de 4,67 log10 ufc/g, semelhantes aos obtidos por Al-O- taibi (2012), mas superiores aos obtidos no nosso estudo com exceção de leveduras. De acordo com o autor o teor de bactérias mesófilas aeróbias foi inferior ao das BAL, à semelhança do que ocorreu no omavele. Yilma e Faye (2006), em amostras de ergo colhidas em diferentes produtores da Etiópia, obtiveram contagens médias de BAL de 7,68 log10 ufc/mL e de aeróbios totais a 30ºC en- tre 7,71 log10 ufc/mL e 10 log10 ufc/mL, superiores às obtidas no nosso estudo (lactobacilos

6,80 log10 ufc/mL, lactococos 6,24 log10 ufc/mL, enterococos 4,48 log10 ufc/mL, aeróbios to- tais a 30ºC 6,31 log10 ufc/mL) embora os autores não tenha feito distinção entre as contagens médias das diferentes BAL.

O teor médio de enterococos obtido no omavele (4,48 log10 ufc/mL) durante o período em estudo foi inferior ao obtido por Mathara et al. (2004) que foi de 5,5 log10 ufc/mL, por

Al-Otaibi (2012) que foi de 5,9 log10 ufc/mL e superior ao obtido por Benkerroum et al. (1984) citado por Benkerroum e Tamime (2004) 1,3 x 103 ufc/mL. Estes autores consideram que de alguma maneira este grupo de microrganismos tem importância na fermentação dos produtos lácteos. Apesar da existência de alguma controvérsia, muitos estudos referem a importância dos en- terococos na maturação de queijos, devido à sua atividade proteolítica e estereolítica e à pro- dução de compostos aromáticos (diacetilo) a partir do citrato (Floquié Moreno et al., 2006). É por esta razão que são utilizados em culturas de arranque, para a produção de queijos,

73 principalmente no Sul da Europa. No entanto, também têm sido isolados com frequência em produtos lácteos do Sul da Europa (Giraffa, 2003). Ao contrário de outras bactérias lácticas os enterococos não são considerados GRAS. Não têm uma importância particular em tecnologia de alimentos, mas apesar disso algumas estirpes de E. faecium e de E. faecalis podem ser utilizadas como probióticos e como inoculantes em silagem (Ogier & Serror, 2008).

No nosso estudo foram obtidos teores médios de enterobactérias de 3,26 log10 ufc/mL, infe- riores aos referidos por Mathara et al. (2004) com teores entre 4,9 e 9,4 log10 ufc/mL, por Savadogo et al. (2004) com teores de 0,98 x104 ufc/mL e por Yilma, Faye e Loiseau (2007) com teores de 4,7±0,42 log10 ufc/mL. Benkerroum e Tamime (2004) referem a presença de elevados teores (104 ufc/mL) de bactérias fecais (coliformes, E. coli e Streptococcus do grupo D) no leite fermentado lben, resultante da má qualidade sanitária do leite utilizado e da falta de condições de higiene na elaboração do produto. Gran, Mutukumira, Wetlesen e Narvhus (2002), em leites fermentados artesanalmente no Zim- babwe, referem teores de coliformes de 9,3 x 104 ufc/mL e de E. coli de 5,7x 104 ufc/mL, o que também reflete a má qualidade sanitária do leite utilizado e a falta de condições de higiene na elaboração dos mesmos. Cueto et al. (2007), ao estudarem o leite fermentado tradicional suero costeno consumido na costa caribenha da Colômbia, obtiveram teores de enterobactérias entre 1 x 101 e 1 x 103 ufc/ mL, semelhantes aos obtidos no nosso estudo, tendo ainda verificado que os mesmos foram decrescendo no final do período de fermentação, à medida que diminuía o pH, à semelhança dos resultados obtidos por Al-Otaibi (2012).

El-Baradei et al. (2008) e Al-Otaibi (2012) obtiveram contagens de enterobactérias < 2,0 log10 ufc/g, enquanto Saleh (2013) não detetou enterobactérias no leite fermentado laban zeer pelo facto de ser um produto com baixo pH (3,7-4,1) e com alguma concentração de sal. Akabanda et al. (2010) obtiveram no leite tradicional fermentado do Gana, após 12 horas de fermentação, teores de enterobactérias de 4,66 ± 0,65 log10 ufc/mL, e constataram que estes teores diminuíam com a redução do pH, não tendo detetado enterobactérias ao fim de 48h. Este facto reflete o efeito inibitório do pH, que contribui para a qualidade e segurança dos produtos lácteos fermentados. Por sua vez, Ferusu e Nyati (1990) e Gran et al. (2002) verificaram que os teores de E. coli e coliformes em dois leites fermentados do Zimbabwe eram elevados no início da fermentação e que posteriormente reduziam. Tem-se observado noutros produtos fermentados a existência

74 de correlação entre a redução dos teores de coliformes e de E. coli e o tempo de fermentação (Simango & Rukure, 1992). Uzeh, Ohenhen e Rojugbokan (2006) obtiveram, em leite fermentado nono da Nigéria, teo- res de aeróbios totais (3,55 x 108 ufc/mL) e de coliformes (4,55 x 107 ufc/mL) que foram superiores aos obtidos no nosso estudo. A elevada contagem de aeróbios totais a 30ºC e de coliformes em ambos os produtos pode ser uma consequência da má higiene durante o pro- cessamento e venda dos produtos. Isso inclui os manipuladores, qualidade da água utilizada e os utensílios. Os teores de enterobactérias obtidos no omavele (Fig. 11) demonstraram tratar-se de um grupo minoritário, à semelhança do que ocorreu no leite fermentado fulani do Burkina- -Faso. Este facto pode ser devido não só ao baixo pH do omavele (pH 4,5) como também à presença de elevados teores de bactérias lácticas, o que não é favorável ao crescimento das enterobactérias. Apesar do período de fermentação do omavele ser de cerca de 9 horas, inferior ao da maioria dos outros leites fermentados artesanalmente referidos na literatura, o pH registado é semelhante ao de outros leites, presumivelmente porque os recipientes uti- lizados (cabaças) reservam no seu interior uma carga bacteriana elevada, que faz com que o processo de fermentação seja célere e se atinjam valores de pH relativamente baixos num curto intervalo de tempo. As enterobactérias são consideradas como microrganismos indicadores da segurança micro- biológica de alimentos. De acordo com Bonfoh et al. (2003) as elevadas contagens de enterobactérias podem estar relacionadas com a temperatura do local, a falta de higiene, a contaminação dos recipientes e a qualidade da água. No entanto, para o caso particular dos leites fermentados artesanalmente, para além dos fatores referidos o grau de contaminação inicial do leite cru tem uma grande influência (Gran et al., 2002). Narvhus e Gadaga (2003) referem que a pouca higiene durante o processamento dos produtos lácteos fermentados artesanalmente e a utilização de leite não pasteurizado, têm como con- sequência a presença de uma grande variedade de microrganismos patogénicos. No entanto, os ácidos orgânicos e os metabolitos produzidos pelas BAL inibem outros microrganismos contaminantes como enterobactérias, constituindo uma vantagem adicional da fermentação (Holzapfel, 2002; Gran et al., 2002; Cueto et al., 2007). Contudo, têm sido detetados ente- robactérias nestes produtos, devido provavelmente ao facto das quantidades dos compostos antimicrobianos serem pequenas e por isso não exercerem o efeito inibitório esperado (Gran et al., 2002).

75 Estudos realizados por Nyatoti, Mtero e Rukure (1997) e por Olasupo, Smith e Akinsinde (2002) revelaram a presença E. coli enteropatogénica em amostras de leite acidificado. Ola- supo et al. (2002) referem ainda a presença de S. aureus e Klebsiela spp. no leite fermentado wara e de Salmonella spp. e Klebsiella spp. no leite fermentado nono. Segundo Akabanda et al. (2010) a adoção de boas práticas de higiene, como por exemplo a limpeza e desinfeção do ubere, são muito importantes na redução da contaminação do leite durante a ordenha.

4.3. Espécies identificadas no omavele em cada área de colheita Os resultados da identificação genotípica dos 141 isolados de amostras de omavele recolhidas nas diferentes localidades são referidos nas figuras 12, 13, 14, 15, 16 e 17. No anexo 2, cons- tam os resultados da identificação feita com base na sequenciação.

Figura 12. Espécies identificadas em isolados de amostras de omavele colhidas na localidade do Toco em 2009 e 2010.

9

8 Saccharomyces cerevisiae

7 Issatchenkia orientalis Kazachstania unispora 6 Enterococcus faecalis

5 Pediococcus pentosaceus Lb. helveticus/Lb. plantarum 4 Lb. casei/Lb.paracasei

3 Lb. casei n.º de espécies identificadas Lb. plantarum 2 Lb.plantaru/Lb. pentosus

1

0

As espécies mais frequentemente identificadas em 25 isolados obtidos a partir de amostras colhidas na localidade do Toco foram Lb. plantarum/Lb. pentosus (8) e Kazachstania unispora (7), seguidas de Issatchenkia orientalis (2) e de Saccharomyces cerevisiae (2 ), enquanto Lb. plantarum (1), Lb. casei (1), Lb. casei/Lb. paracasei (1), Lb. helveticus/Lb. plantarum (1),

76 ­Enterococcus faecalis (1) e Pediococcus pentosaceus (1) foram as espécies menos frequen- temente identificadas. A bactéria láctica predominante foi Lb. plantarum/Lb. pentosus e a levedura foi Kazachstania unispora (Fig. 12).

Figura 13. Espécies identificadas em isolados de amostras de omavele colhidas na localidade da Chibia em 2007, 2009 e 2010.

8

7 Kluyveromyces Issatchenkia orientalis 6 Saccharomyces cerevisiae

5 Weissella confusa/Weissella sp. Enterococcus 4 Enterococcus faecalis Lactococcus lactis 3 Lb. plantarum

n.º de espécies identificadas 2 Lb. plantarum/Lb. pentosus Lb. casei/Lb. paracasei 1

0

Nos 26 isolados de amostras provenientes da localidade da Chibia as espécies mais frequen- temente identificadas foram Lb. casei/Lb. paracasei (7), Lb. plantarum/Lb. pentosus (4), Saccharomyces cerevisiae (4) e Lactococcus lactis (3) seguidas de Lb. plantarum (2), Is- satchenkia orientalis (2), Enterococcus faecalis/sp (2), enquanto Kluyveromyces marxianus/ Kluyveromyces lactis (1), Weissella confusa/Weissella sp. (1) foram as menos frequentemente identificadas (Fig. 13). A bactéria láctica predominante foi Lb. casei/Lb. paracasei, enquanto Saccharomyces cerevi- siae foi a levedura mais frequentemente identificada, o que foi diferente das amostras colhidas na localidade de Toco.

77 Figura 14. Espécies identificadas em isolados de amostras de omavele colhidas na localidade da Humpata em 2007, 2009 e 2010.

6 Rhodotorula mucilaginosa Kazachstania unispora

5 Kazachstania unispora/ /Saccharomyces unisporus Issatchenkia orientalis

4 Enterococcus durans/ /Enterococcus hirae Enterococcus durans 3 Enterococcus durans/ /Enterococcus sp. Leuconostoc pseudomesenteroides 2 Lactococcus lactis

n.º de espécies identificadas Lb. helveticus

1 Lb.casei/Lb. paracasei Lb. rhamnosus Lb. plantarum/Lb. pentosus 0

As espécies predominantes nos 24 isolados de amostras obtidas na localidade de Humpa- ta foram Lb. plantarum/Lb. pentosus (6), Kazachstania unispora (3), Issatchenkia orientalis (3), Enterococcus durans/Enterococcus sp. (2), Enterococcus durans (2), enquanto as menos frequentemente identificadas foram Enterococcus durans/Enterococcus hirae (1), Lb. helveti- cus (1), Lb. rhamnosus (1), Lb. casei/Lb. paracasei (1), Lactococcus lactis (1), Leuconostoc pseudomesenteroides (1), Rhodotorula mucilaginosa (1) e Kazachstania unispora/Saccha- romyces unisporus (1) (Fig. 14). Ao contrário das duas localidades anteriores não foi identifi- cada Saccharomyces­ cerevisiae. Tal como no Toco Kazachstania unispora foi a levedura mais frequentemente identificada.

78 Figura 15. Espécies identificadas em isolados de amostras de omavele colhidas na localidade de Rio da Areia em 2007, 2009 e 2010.

10 Kluyveromyces marxianus/ /Kluyveromyces lactis Kluyveromyces marxianus

Pichia deserticola/ 8 /Candida ethanolica Kazachstania unispora

Kazachstania exigua/K. turicensis

6 Torulaspora delbrueckii

Saccharomyces cerevisiae

Issatchenkia orientalis 4 Pediococcus pentosaceus n.º de espécies identificadas Lactococcus lactis

Enterococcus durans 2 Lb. plantarum

Lb. helveticus/Lb. plantarum

0 Lb. plantarum/Lb. pentosus

Lb. plantarum/Lb. pentosus (9), Issatchenkia orientalis (4) e Lb. plantarum (3) foram as es- pécies mais frequentemente identificadas nos 29 isolados de amostras de omavele obtidas na localidade de Rio da Areia, enquanto Saccharomyces cerevisiae (2), Enterococcus durans (2), Lb. helveticus /Lb. plantarum (1), Lactococcus lactis (1), Pediococcus pentosaceus (1), Kazachstania unispora (1), Kazachstania exigua/Kazachstania turicensis (1), Kluyveromyces marxianus (1), Kluyveromyces marxianus/ Kluyveromyces lactis (1), Torulospora delbrueckii (1) e Pichia deserticola/Candida ethanolica (1) foram as menos frequentemente identificadas (Fig. 15). Em Rio da Areia, ao contrário das localidades do Toco e Chibia, a levedura mais frequentemente identificada foi Issatchenkia orientalis. A bactéria láctica predominante foi Lb. plantarum/Lb. pentosus tal como na localidade de Humpata (Fig. 14).

79 Figura 16. Espécies identificadas em isolados de amostras de omavele colhidas na localidade de Mulondo em 2007.

12

10

Kazachstania unispora / 8 /Saccharomyces unisporus Issatchenkia orientalis Saccharomyces cerevisiae 6 Enterococcus durans/hirae Lb. rhamnosus 4 Lb. plantarum/Lb. pentosus n.º de espécies identificadas

2

0

Lb. plantarum /Lb. pentosus (11) e Saccharomyces cerevisiae (4) foram as espécies predomi- nantes nos 20 isolados de amostras colhidas no Mulondo, seguidas de Enterococcus durans/ Enterococcus hirae (2). As espécies menos frequentemente isoladas foram Lb. rhamnosus (1), Issatchenkia orientalis (1) e Kazachstania unispora/Saccharomyces unisporus (1) (Fig. 16). Tal como na Chibia Saccharomyces cerevisiae foi a levedura predominate.

80 Figura 17. Espécies identificadas em isolados de amostras de omavele colhidas na localidade da Huíla em 2010.

6

5 Kazachstania unispora Kluyveromyces marxianus/ 4 /Kluyveromyces lactis Trichosporon coremiiforme/ /Trichosporon sp. 3 Enterococcus durans/ /Enterococcus sp. Lb. helveticus 2 Lb. casei/Lb. paracasei n.º de espécies identificadas Lb. plantarum/Lb. pentosus 1

0

Em 17 isolados de amostras de omavele colhidas na Huíla Lb. plantarum/Lb. pentosus (6) foram predominates, seguidas de Enterococcus durans/Enterococcus sp. (4) e Kazachsta- nia unispora (3). As menos frequentemente identificadas foram Lb. casei/Lb. paracasei (1), Lb. helveticus (1) Kluyveromyces marxianus/Kluyveromyces lactis (1) e Trichosporon coremii- forme/Trichosporon sp. (1) (Fig. 17).

Lb. plantarum/Lb. pentosus foi predominante, tendo sido identificada em todas as amostras obtidas nas localidades objeto do nosso estudo, com maior frequência em amostras colhidas nas localidades de Mulondo, Toco, Huíla e Rio da Areia. Na localidade da Chibia a espécie mais frequentemente isolada foi Lb. casei/Lb.paracasei. A segunda espécie mais frequentemente isolada foi Lb. casei/Lb. paracasei na localidade da Chibia, seguida de Lb. plantarum, na localidade de Rio da Areia. Foram também identificadas duas estirpes de Lb. rhamnosus em amostras obtidas nas localidades de Mulondo e Humpata, duas de Lb. helveticus em amostras obtidas nas localidades da Huíla e Humpata e uma de Lb. casei em amostras obtidas na localidade do Toco. As amostras de omavele obtidas na localidade do Toco foram as que apresentaram maior diversidade de bactérias lácticas pertencentes ao género Lactobacillus, enquanto as amostras obtidas na localidade de Rio da Areia apresentaram maior diversidade de leveduras.

81 Nos 141 isolados do omavele as espécies mais identificadas foram: 44Lb. plantarum /Lb. pen- tosus (31,20%), 6 Lb. plantarum (4,34%), 10 Lb. casei/Lb. paracasei (7,09%), 2 Lb. helve- ticus (1,41%), 2 Lb. rhamnosus (1,41%), 5 Lc. lactis (3,54%), 14 Kazachstania unispora (9,92%), 12 Saccharomyces cervisiae (8,51%), 12 Issatchenkia orientalis (8,5%), 4 Enterococ- cus durans (2,83%), 3 Enterococcus durans/hirae (2,12%), 3 Enterococcus faecalis (2,12%) e 2 Kluyveromyces marxianus/Kluyveromyces lactis (1,41%). A predominância de espécies de Lb.plantarum/Lb. pentosus, Lb. plantarum e de Lb. casei/ Lb. paracasei nas amostras de omavele demonstra que desempenham um papel importante na fermentação do mesmo. Lactobacillus sp. são das mais importantes bactérias pertencentes ao grupo de bactérias lácti- cas, assumindo um papel de destaque na produção de alimentos fermentados, como vegetais, carnes e particularmente produtos lácteos, por um lado devido à sua ação conservante resul- tante da acidificação que provocam e por outro devido ao realce do “flavour” e da textura. Atualmente têm vindo a ganhar muita relevância na área dos probióticos (Tannock, 2004). Matahara et al. (2004) ao realizarem um estudo sobre o leite fermentado kule naoto, consu- mido no Quénia pelo grupo étnico dos Massai, observaram que os microrganismos perten- centes ao género Lactobacillus eram dominantes, seguidos de Enterococcus, Lactococcus e Leuconostoc. Dentro do grupo Lactobacillus foram identificadas as espécies Lb. plantarum, Lb. fermentum, Lb. paracasei e Lb. acidophilus, com predominância de Lb. plantarum. De acordo com Matahara et al. (2004) o facto do recipiente utilizado (cabaças) para a fer- mentação do leite ter sido obtido a partir de plantas da família das Cucurbitaceae (Lagenaria leucantha ou Lagenaria siceraria) facilita a adaptação de Lb. plantarum, embora nalguns casos haja um tratamento prévio desses recipientes, pois esta espécie de Lactobacillus en- contra-se frequentemente associada a plantas (Stiles & Holzapfel, 1997). Lb. plantarum faz, normalmente, parte das bactérias lácticas não iniciadoras (NSLAB) e é geralmente encontrada em fermentos lácticos artesanais (Curry & Crow, 2002). A elevada frequência de espécies de Lb.plantarum /Lb. pentosus no omavele é um forte indí- cio de que a microbiota láctica presente no omavele era em parte proveniente dos utensílios artesanais (de madeira) utilizados na elaboração do mesmo, da casca ou da raíz de plantas adicionadas opcionalmente ao leite e do recipiente de fermentação (cabaça), o que confirma o já referido por (Mathara et al., 2004). Lb. plantarum é considerado um microrganismo GRAS, ou seja, é geralmente reconhecido como seguro, por tornar seguros os alimentos fermentados (de Vries et al., 2006) sendo a espécie mais importante no processo fermentativo de vários produtos à base de vegetais e de alguns produtos lácteos. Esta bactéria tem um papel importante como probiótico, na medida

82 em que é benéfica para a saúde humana. Estirpes deLb. plantarum 299v e Lp 01 encontram-se disponíveis no mercado como probióticos (Mathara et al., 2008). Matukumira (1996) citado por Mathara et al. (2004), em 21 estirpes isoladas a partir de leite naturalmente fermentado produzido no Zimbabwe, identificou três deLb. plantarum, enquanto na África do Sul, Beukes et al. (2001) em 336 isolados identificaram o mesmo número de estirpes de Lb. plantarum. Isono et al. (1994) na Tanzânia, em 26 estirpes isoladas de leites fermentados apenas identificaram 4 como Lb. plantarum. No nosso estudo foram identifica- das 6 estirpes de Lb. plantarum em 141 isolados, muito inferior ao obtido por Matahara et al. (2004) em leite fermentado tradicional consumido pela etnia Massai, em que nos 339 isolados 130 foram identificados como Lb. plantarum e 6 como Lb. rhamnosus, enquanto no omavele foram identificadas apenas duas estirpes de Lb. rhamnosus. No leite fermentado amasi, produzido na África do Sul e noutros países da África Austral, para além de Lb. plantarum foram também identificadas estirpes de Lactococcus lactis subsp. lac- tis, Leuconostoc lactis, Leuconostoc citreum, Leuconostoc mesenteroides subsp. dextranicum e Lb. delbrueckii subsp. lactis, nenhuma destas espécies foi isolada no omavele com exceção das espécies Leuconostoc mesenteroides e Lb. plantarum. Ferusu e Muzondo (1990) identificaram no leite fermentado tradicional amasi, produzido no norte do Zimbabwe, estirpes de Lb. helveticus, Lb. plantarum, Lb. delbrueckii subsp. lactis, Lb. casei subsp. casei e Lb. casei subsp. pseudoplantarum, das quais Lb. helveticus e Lb. plantarum foram também identificadas no omavele. Lb. plantarum foi também identificada no leite fermentado tradicional maziwa lala no Quénia, para além de Lb. curvatus, e Leuc. mesenteroides subsp. mesenteroides, que não foram iden- tificadas no omavele (Miyamoto, Gichuru, Akimoto & Nakae, 1989). Lb. plantarum tem sido isolada a partir dos leites fermentados kumis e kefir produzidos em alguns países asiáticos (Danova et al., 2005). Por sua vez, Todorov e Franco (2010) referem a presença daquela bactéria em diferentes tipos de queijos, como o Pecorino, o Cheddar, o Stilton, o Gouda, o Kopanisti, o Feta e o Mozzarella, e ainda nos diversos queijos belgas de pasta mole, nos queijos de leite de ovino Alberquila e Manchego, e no queijo fresco branco Marroquino jben. Uchida et al. (2007) referem que no leite fermentado tradicional matsoni, consumido na Georgia, foram identificados microrganismos termófilos como Strepotococcus thermophilus e Lb. delbruekii subsp. bulgaricus, enquanto no omavele apenas foram identificadas as espécies mesófilas. Lb. casei /Lb. paracasei e Lb. rhamnosus possuem elevado valor comercial para a indústria alimentar, devido à sua utilização na produção de leites fermentados e como culturas de arran-

83 que de fermentação no fabrico de outros produtos lácteos. Estas espécies são frequentemente empregues como probióticos em alimentos industrializados. Lb. casei var. Shirota, utilizada na produção do yakult, é uma das bactérias mais estudadas como probiótico e amplamente consumida no Japão. A utilização de Lb. casei em novos tipos de iogurtes tem aumentando progressivamente (Buritti & Saad, 2007). Em iogurtes de leite de vaca e de búfala consumidos em algumas regiões do Azerbeijão (Ka- rabakh, Ganja e Baku) foram isoladas estirpes de Lb. delbruekii subsp. lactis, Lb. delbruekii subsp. bulgaricus, Streptococcus thermophilus e Enterococcus faecium, semelhantes às espé- cies isoladas no leite fermentado matsoni (Terzic-Vidojevic et al., 2009), mas diferentes das encontradas no omavele, com exceção de Enterococcus faecium. Saleh (2013) ao estudar o leite laban zeer identificou não só Leuconostoc mesenteroides subsp. cremoris, Lb. rhamnosus, Lb. plantarum, Lb. paracasei subsp. paracasei, Lb. del- bruekii subsp. bulgaricus, Lb. curvatus subsp. curvatus, Lb. acidophilus mas também as leveduras Saccharomyces cervisiae, Candida kefyr, Candida utilis e Rhodotorula mucila- ginosa. Nesse estudo as espécies mais frequentes foram Leuconostoc mesenteroides subsp. cremoris (37,5%), Lb. rhamnosus (20,8%), Saccharomyces cervisiae (41,9%) e Candida kefyr (29%). Nos 141 isolados do omavele 44 eram Lb. plantarum /Lb. pentosus (31,20%), 14 Kazachstania unispora (9,92%), 12 Saccharomyces cervisiae (8,51%) e 12 Issatchenkia orientalis (8,51%). Estudos realizados por El-Soda et al. (2003) sobre a microbiota do leite fermentado zabady re- velaram a presença de espécies semelhantes às encontradas no omavele, tais como Lb. paraca- sei, Lb. pentosus, Lb. plantarum, Lactococcus lactis subsp. lactis e Enterococcus faecium. Por sua vez Dewan e Tamang (2007) ao estudarem os leites fermentados tradicionais produzidos nos Himalaias identificaram Lb. plantarum, Lb. paracasei, Lactococcus lactis e Enterococcus faecium, espécies semelhantes às identificadas no nosso estudo. Savadogo et al. (2004) isolaram várias espécies de bactérias lácticas em leite fermentado tradi- cional consumido no Burkina-Faso, tais como Lb. fermentum, Lb. acidophilus, Lb. delbruekii, S. thermophilus, Pediococcus spp., Leuconostoc mesenteroides subsp. mesenteroides, que não foram identificadas no omavele, com exceção de Pediococcus spp. e de Leuconostoc mesente- roides, embora não se tenha identificado a subespécie. Lb. plantarum foi, também, isolada de leites fermentados consumidos nos Camarões (Savadogo et al., 2004) e do leite fermentado desnatado lben consumido em Marrocos e outros países Árabes (Ouadghiri et al., 2009). Estudos realizados por Obodai e Dodd (2006) em leite fermentado nyarmie revelaram a pre- sença de Lb. helveticus, Lactococcus lactis e Saccharomyces cerevisiae, tal como se verificou no omavele.

84 Abd El Gawad et al. (2010) ao estudarem o leite tradicionalmente fermentado rayeb, consu- mido no Egito, identificaram as espécies S. thermophilus, Lb. bulgaricus, Lb. helveticus, Lb. acidophilus, Lb. delbuerkii, Lactococcus cremoris, Enterococcus faecium, Streptococcus du- rans, Streptococcus acidominimus e Aerococcus viridans, diferentes das isoladas no omavele com exceção de Enterococccus faecium e Lb. helveticus. Cueto et al. (2007) identificaram no suero costeno consumido na costa caribenha da Colômbia várias estirpes de bactérias lácticas, entre as quais Lb. plantarum, Lb. pentosus, Lb. rhamnosus e Lactococcus lactis, que também foram identificadas no omavele. No estudo realizado por Matahara et al. (2004) em leite fermentado tradicional consumido pe- los Massai foram identificadas 35 estirpes de Lactococcus lactis, enquanto no omavele foram identificadas apenas 5 estirpes em amostras obtidas nas localidades de Chibia (3), Humpata (1) e Rio da Areia (1). Foram identificadas mais estirpes de Lactobacillus do que de Lactococcus, supostamente por estes serem mais sensíveis e por isso não terem suportado as condições de stress a que foram submetidas durante o período ocorrido entre o seu isolamento em Angola e a sua identificação no laboratório do CERPTA na Universidade Autónoma de Barcelona. Lactococcus lactis é uma das principais componentes de muitas culturas de arranque de uso industrial ou artesanal. Essas culturas são utilizadas na produção de uma grande variedade de produtos lácteos fermentados, incluindo leite acidificado, queijos frescos e de pasta mole, por- que contribuem para o desenvolvimento da textura devido à produção de exopolissacáridos e do “flavour” quer através da produção de compostos aromáticos (álcoois, cetonas, aldeídos e éste- res) quer da produção de diacetilo, de citratos, de aminoácidos ou do metabolismo das gorduras (Samaržija, Antunac & Havranek, 2001; Beresford et al., 2001; Ward, Davey & Heap, 2002). Lactococcus lactis subsp. lactis e em menor grau Lactococcus lactis subsp. cremoris são, com fre- quência, usadas como culturas de arranque para a fermentação de diversos produtos lácteos (quei- jos, cremes acidificados, leites fermentados e manteigas). Essas culturas de arranque são consti- tuídas por culturas de estirpes puras ou mistas, associadas ou não a outras bactérias lácticas. Gonfa, Fite, Urga e Abegaz (1999) referem que estirpes de Lactococcus lactis subsp. lactis e de Lactococcus garvieae foram predominantes no leite fermentado ergo produzido na Etiópia. No nosso estudo não foi identificada nenhuma estirpe de Lactococcus garvieae. Narvhus (2003) referiu que no leite fermentado tradicional amasi foi também identificada uma estirpe de Lactococcus lactis subsp. lactis biovar diacetylactis, muito interessante do ponto de vista de produção de leites fermentados tendo em conta que esta bactéria é produtora de exopolissacáridos. No nosso estudo foram também identificadas estirpes deLactococcus lactis em algumas amostras, muito embora não se tenha chegado à identificação da subespécie.

85 Rashid et al. (2007) ao estudarem o leite fermentado tradicional dahi no Bangladesh iden- tificaram várias espécies de bactérias lácticas e leveduras, entre as quais Lactococcus lactis subsp. lactis, Pediococcus pentosaceus e Enterococcus faecium, que também foram isoladas no omavele. A maior parte das espécies identificadas nodahi pertenciam ao género Lactobacil- lus, das quais 28 foram identificadas comoLb. delbrueckii subsp. bulgaricus e 6 como Lb. del- brueckii subsp. lactis. Estas espécies de Lactobacillus foram também identificadas por Ferusu e Muzondo (1990) e Beukes et al. (2001). Lb. delbrueckii subsp. bulgaricus e Lb. delbrueckii subsp. lactis são constituintes importantes das culturas de arranque utilizadas na produção do iogurte, uma vez que aumentam rapidamente a acidez do leite e deste modo têm uma ação preponderante na sua coagulação. Watanabe et al. (2008) referem que estirpes de Enterococcus sp., Lactococcus lactis, Leuco- nostoc e Saccharomyces cerevisiae foram predominantes em leites fermentados tradicionais consumidos na Região Autónoma da Mongólia Interior pertencente à República Popular da China. Yu et al. (2011) identificaram, na Mongólia, algumas espécies bacterianas semelhantes às identificadas no omavele tais como Enterococcus faecalis, Enterococcus durans, Lb. casei e Lb. helveticus. Segundo Benkerroum e Tamime (2004) no leite fermentado lben, produzido em Marrocos, foram identificadas as espécies Enterococcus faecalis, Enterococcus faecium e Enterococcus avium, embora a última espécie bacteriana não tenha sido isolada do omavele. No omavele apenas foi isolada uma estirpe de Leuconostoc pseudomesenteroides, em amostras colhidas na localidade de Humpata, supostamente pelo facto de não terem sobrevivido à com- petição microbiana, devido à grande diversidade de microrganismos que o omavele possuía. De acordo com Mathara et al. (2004), Leuconostoc mostra uma fraca competitividade durante a fermentação do leite, daí que a sua presença em leites fermentados seja, por vezes, devida a contaminações após a preparação do leite. Estudos realizados na Roménia por Zamfir et al. (2006) em produtos lácteos fermentados tradicionais revelaram a presença de Lb. plantarum, Lb. paracasei subsp paracasei, Lb. hel- veticus, Enterococcus durans, Enterococcus faecium e Enterococcus faecalis, o que também se verificou no omavele. Akabanda et al. (2010) ao estudarem o leite fermentado nunu identificaram microrganismos pertencentes aos géneros Lactobacillus, Leuconostoc, Lactococcus, Enterococcus, e bactérias pertencentes à família Enterobacteriaceae à semelhança do que ocorreu no nosso estudo com exceção de Streptococcus. Espécies bacterianas pertencentes a estes géneros, tais como Strep. thermophilus, Strep. acidominus, Enterococcus faecalis var. liquefaciens, Strep. bovis, Strep. mitis, Strep. agalactiae, Lactococcus cremoris, Lactococcus lactis, Lactobacillus xylosus, Leu-

86 conostoc dextranicum e Leuconostoc lactis, foram identificados por Assefa et al. (2008) no leite fermentado ergo. As bactérias do género Weissella são encontradas ocasionalmente no leite cru, embora não seja conhecido o seu papel em tecnologia de produtos lácteos fermentados (Mathara et al., 2004; Yu et al., 2011). No estudo que estes autores realizaram em leites fermentados consumidos em 13 localidades da Mongólia, apenas isolaram Weissella cibaria, diferente da única espécie isolada do omavele na localidade da Chibia (Weissella confusa/Weissela sp.). Várias espécies de leveduras foram isoladas a partir do omavele, em que as mais frequentes foram Kazachstania unispora > Saccharomyces cerevisiae e Issatchenkia orientalis > Kluy- veromyces marxianus. Kazachstania unispora foi mais identificada nos isolados de amostras de omavele obtidos na localidade do Toco; Saccharomyces cerevisiae nos isolados de amostras de omavele obtidas nas localidades da Chibia e Mulondo e Issatchenkia orientalis nos isolados de amostras ob- tidas na localidade de Rio da Areia. A maior diversidade de espécies de leveduras foi obtida em amostras provenientes de Rio da Areia, enquanto a de bactérias lácticas foi em amostras oriundas quer da Humpata quer de Rio da Areia. A diversidade de leveduras nos produtos fer- mentados varia de acordo com a localidade, podendo ser influenciada pela idade das amostras, pelos próprios recipientes e pelos métodos de processamento (Savadogo et al., 2006.) As leveduras estão frequentemente associadas aos produtos lácteos fermentados, o que tem sido reportado em vários estudos (Fleet, 1990; Okagbue & Bankole, 1992; Isono et al., 1994; Roostita & Fleet, 1996; Gadaga et al., 2001; Beukes et al., 2001; Gonfa et al., 2001; Abdel- gadir et al., 2001). A contaminação dos leites por estes microrganismos ocorre, supostamente, a partir do ambiente, dos utensílios, dos produtores e dos recipientes. Kluyveromyces marxianus está entre as leveduras predominantes e importantes presentes no leite cru. A capacidade desta levedura para fermentar a lactose e hidrolizar a gordura do leite e as proteínas, possibilita o seu crescimento nos produtos lácteos (Roostita & Fleet, 1996; Gadaga et al., 2000). No entanto, no omavele esta levedura foi a terceira mais identificada contrariando de certa forma o que foi anteriormente referido. As leveduras são utilizadas como culturas de arranque porque interferem, geralmente, na qualidade dos leites fermentados real- çando-lhes o “flavour” e a textura, devido à ação de substâncias resultantes da sua atividade proteolítica e lipolítica, da utilização do ácido láctico, da fermentação da lactose e da autólise da sua biomassa (Jakobsen & Narvhus, 1996; Fleet, 2007). Segundo Saleh (2013), Saccharomyces cerevisiae e Candida kefir são importantes no desen- volvimento do “flavour” característico do laban zeer produzido na Arábia Saudita, devido à produção de ácido láctico que decorre da co-cultura com BAL.

87 Algumas leveduras foram desenvolvidas como agentes de biocontrolo de bolores deteriorantes de alimentos por apresentarem atividade antagónica relativamente aos bolores, para além disso tem havido um crescente interesse em usar as leveduras como organismos probióticos, apesar de fazerem parte integrante da microbiota de muitos produtos lácteos fermentados. Por outro lado, existem leveduras que, em alimentos fermentados, metabolizam os ácidos orgânicos causando um aumento do pH, o que vai permitir o crescimento de bactérias patogénicas e de deterioração (Fleet, 2007; El-Sharoud et al., 2009). Os produtos fermentados contendo leveduras naturais diferem consideravelmente quanto à composição físico-química e às propriedades microbiológicas daqueles preparados com cultu- ras puras de bactérias lácticas, uma vez que nos primeiros para além de ocorrer a fermentação láctica induzida pelas bactérias lácticas ocorre também uma ligeira fermentação alcoólica. Os mais conhecidos leites fermentados resultantes de uma combinação de leveduras e de bac- térias lácticas são o kefir e o kumis, ambos originários dos países da Europa oriental e Ásia. Kluyveromyces marxianus, Kluyveromyces lactis, Debaryomyces hansenii, Yarrowia lipolitica e Rhdodotorula mucilaginosa têm sido as espécies mais isoladas a partir de produtos lácteos (Gonfa et al., 2001; Narvhus & Gadaga, 2003; Kebede et al., 2007). No entanto, estudos realizados em leites fermentados em África (Gadaga et al., 2000; Abdelgadir et al., 2001; Narvhus e Gadaga, 2003;) referem a presença de várias espécies de leveduras, entre as quais Saccharomyces cerevisiae, Candida kefir e Torulaspora delbrueckii, que também foram iden- tificadas no omavele. Akabanda et al. (2010) identificaram no leite fermentadonunu algumas leveduras semelhantes às encontradas no omavele, embora em quantidades mais elevadas como Saccharomyces cere- visiae (35%), Candida kefyr (33%) e Kluyveromyces marxianus (4%). De acordo com Tamang e Fleet (2007) essas leveduras fazem parte da microbiota normal do kefir. Em amostras de omavele também foi isolada uma estirpe de Rhdodotorula mucilaginosa em amostras colhidas na localidade da Chibia. Gadaga et al. (2000 e 2001a) ao estudarem a microbiota láctica do leite fermentado amasi ou mukaka wa kakara produzido no Zimbabwe isolaram várias leveduras, em que a mais frequen- te foi Saccharomyces cerevisiae, que também foi isolada no omavele. Saccharomyces cerevisiae e Kluyveromyces marxianus foram as espécies de leveduras mais isoladas a partir dos leites fermentados tradicionais makamo consumidos no Uganda, nono consumido na Nigéria, nunu no Gana (Okagbue & Bankole, 1992) e mbanik consumido no Senegal (Akabanda et al., 2010), enquanto no leite fermentado tradicional omavele as le- veduras mais frequentes foram Kazachstania unispora seguida de Issatchenkia orientalis e Saccharomyces cerevisiae.

88 Em leites fermentados produzidos na África do Sul (Narvhus & Gadaga, 2003) Debaryomyces hansenii, Torulaspora delbrueckii e Kluyveromyces marxianus foram as espécies predominan- tes, enquanto no omavele as espécies predominantes foram Kazachstania unispora, Issatchen- kia orientalis e Saccharomyces cerevisiae. De acordo com Gadaga et al. (2000) Saccharomyces cerevisiae, além de ubíqua, tem capacida- de de se desenvolver no leite e por isso contribuir para realçar o “flavour” dos leites fermen- tados através da conversão de hidratos de carbono em álcoois e outros compostos aromáticos, como ésteres de ácidos orgânicos e compostos carbonados. Saccharomyces cerevisiae tem sido predominante em vários produtos lácteos fermentados tais como: rob, nono, mbanike e outros. A nível da indústria de bebidas Saccharomyces cerevisiae tem um grande impacto naquilo que são os aromas dos produtos fermentados (Gadaga et al., 2000; Abdelgadir et al., 2001; Jespersen, 2003). Segundo Jespersen (2003) Saccharomyces cerevisiae estimula o crescimento de outros microrganismos, incluindo bactérias lácticas, porque fornece metabolitos essenciais como piruvato, aminoácidos e vitaminas. Benkerroum e Tamime (2004) identificaram nolben , leite fermentado produzido em Marrocos, Saccharomyces cerevisiae e Kluyveromyces marxianus var. marxianus, que também foram identificadas no omavele. Kluyveromyces marxianus é uma levedura que além de fermentar a lactose tem atividade lipolítica e proteolítica, enquanto Saccharomyces cerevisiae é a única capaz de utilizar a glucose e a galactose (Kebede et al., 2007). Watanabe et al. (2008), para além de Saccharomyces cerevisiae, ainda identificaram no leite fermentado tarag as espécies Issatchenkia orientalis e Kazachstania unispora também identi- ficadas no nosso estudo. Segundo aqueles autores, Saccharomyces unispora (sinónimo senior de Kazachstania unispora) foi predominante no kumis tradicional produzido no Cazaquistão, à semelhança do que ocorreu no omavele. No presente estudo foram identificadas três espécies de Enterococcus, em que Enterococcus durans/Enterococcus sp. foi frequente nas amostras de omavele obtidas nas localidades da Huíla e da Humpata; Enterococcus faecalis nas amostras obtidas nas localidades do Toco e da Chibia; Enterococcus durans/Enterococcus hirae nas amostras obtidas na localidade de Mulondo. A presença de bactérias pertencentes ao género Enterococcus em produtos lácteos foi sempre considerada como indicador de deficientes condições higio-sanitárias durante a produção e o processamento do leite. Contudo, tem sido demonstrado que a presença de Enterococcus faecium e Enterococcus faecalis em muitos produtos alimentares não tem relação direta com a contaminação fecal, sendo consideradas como parte normal da microbiota natural de muitos produtos lácteos, particularmente de alguns queijos mediterrânicos, onde predominam Lacto-

89 bacillus e Lactococcus (Terzic-Vidojovic et al., 2009), desempenhando um papel relevante no desenvolvimento do aroma e do sabor dos queijos (Giraffa, 2003). Enterococcus durans e Enterococcus faecalis foram as espécies mais frequentes no omavele. Segundo Zamfir et al. (2006) a sua presença está, geralmente, relacionada com a utilização de leites não pasteurizados. Segundo Cogan et al. (1997) Enterococcus é um dos microrganismos que mais resiste a con- dições adversas, tais como a presença de sal e a acidez, o que explica a sua predominância em queijos. Apesar de alguma controvérsia, estas bactérias têm contribuído para a maturação e desenvolvimento das características organoléticas não só de alguns queijos, como o Cheddar, o Feta, o Mozarella, o Cebreiro e o Venaco, devido à sua intensa atividade proteolítica e este- reolítica (hidrólise de gorduras por estearases), mas também de outros alimentos fermentados tais como azeitonas, vegetais e linguiças. A sua capacidade de produzir enterocinas justifica a sua utilização em tecnologia de alimentos. Algumas estirpes, principalmente de Enterococcus faecium e de Enterococcus faecalis, podem produzir bacteriocinas que atuam sobre alguns microrganismos patogénicos, como Listeria monocytogenes, Staphylococcus aureus, Clostridium botulinum, Clostridium perfringens e Vi- brio cholerae (Foulquié Moreno et al., 2006). Devido à ação daqueles microrganismos durante a maturação, como o desenvolvimento do “flavour” e a produção de bacteriocinas, tem sido sugerido que estirpes de Enterococcus com características metabólicas e tecnológicas desejáveis sejam incluídas em culturas de arranque utilizadas na produção de vários queijos (Franz et al., 2003). De acordo com Foulquié Moreno et al. (2006) os enterococos, além de poderem exibir ativi- dade probiótica, desempenham um papel importante no desenvolvimento do perfil sensorial de produtos lácteos devido à sua atividade metabólica sobre o citrato e proteínas. Apesar de Enterococcus faecium se encontrar no trato gastrintestinal dos animais tem sido frequentemente isolado a partir de vários produtos lácteos e cárneos autóctones (Klein, 2003). Rashid et al. (2007) referem a presença de Enterococcus faecium no dahi, leite fermentado tradicional produzido na Bangladesh. Aquele microrganismo tem também sido isolado noutros leites fermentados produzidos no centro da Mongólia e na China. Por isso é discutível consi- derar a sua presença como indicador de higiene deficiente (Suzzi et al., 2000). A sua presença em produtos lácteos tradicionais é provavelmente devida à contaminação do leite durante a ordenha. Contudo, como já foi referido, esta espécie é também utilizada em culturas de arran- que para a preservação de alimentos fermentados, incluindo queijos e vegetais. De acordo com Savadogo et al., ( 2006) os produtos resultantes de um processo fermentativo são considerados higienicamente seguros, estáveis e com propriedades sensoriais atrativas.

90 Lavermicocca et al. (2000) e Messens e De Vuyst (2002) referem que compostos como peró- xido de hidrogénio, diacetilo, acetaldeído, ácidos gordos (antifúngicos), ácido fenólico e/ou bacteriocinas, produzidos durante a fermentação protegem os alimentos da ação dos micror- ganismos responsáveis pela decomposição e dos microrganismos patogénicos. A microbiota láctica presente nas amostras de omavele obtidas nas diferentes localidades é diversificada. De acordo com Al-Otaibi (2012), a microbiota láctica presente em produtos lácteos é influenciada pela região geográfica e a sua distribuição depende da natureza dos alimentos fermentados no geral e do leite fermentado em particular. Lb. plantarum foi identificada nas seis localidades em estudo independentemente das diferen- ças climáticas, enquanto Lb. casei/Lb. paracasei e Latococcus lactis foram identificadas com maior frequência na localidade da Chibia. Nesta localidade coexistiram as espécies Lb. casei/ Lb. paracasei, Lactococcus lactis e Saccharomyces cerevisiae e de acordo com as observações no local, pudemos constatar que o omavele possuía características organolépticas (textura e aroma) diferentes das do omavele de outras localidades. A maior diversidade de espécies de leveduras (8) foi obtida na localidade de Rio da Areia devido às características geográficas específicas da região. As diferenças obtidas podem ser devidas às condições climatéricas, à higiene de produção (or- denha, utensílios, recipiente e local), ao estado de saúde dos animais e à qualidade da água no meio rural (Benkerroum, 2013). As cascas ou raízes de várias plantas, que podem ou não ser adicionadas ao leite com o objetivo de acelerar a coagulação e de conferir odores e sabores di- ferentes, podem funcionar como fonte de microrganismos e assim contribuir para as diferenças microbianas encontradas. A região geográfica pode ter sido a principal razão da biodiversidade verificada nas amostras recolhidas nas diferentes localidades, que foram alvo do nosso estudo. Savadogo et al. (2004) referem que os leites fermentados tradicionais produzidos em regiões onde predominam baixas temperaturas ambientais contêm na sua maioria BAL mesófilas, tais como Lactococcus sp. e Leuconostoc sp., enquanto nos produzidos em climas tropicais e subtropicais prevalecem as BAL termófilas, sendo na sua maioria Lactobacillus sp. e Strepto- coccus sp.. No nosso estudo, realizado em regiões de planalto onde a temperatura ambiental ronda os 17-25 ºC, não só foram identificadas estirpes de Lactococcus mas também várias estirpes mesófilas de Lactobacillus. Zamfir et al. (2006) e Dewan e Tamang (2007) referem que os produtos lácteos fermentados tradicionais têm uma microbiota única e diferente, em função da tecnologia de produção, da ecologia e da tradição das localidades onde são produzidos. Para Savadogo et al. (2006) a na- tureza dos leites fermentados tradicionais varia de região para região, em função da microbiota autóctone local, a qual por sua vez reflete as condições climáticas da região.

91 4.4. Produção de leites fermentados tradicionais A produção do omavele além de ser simples é semelhante à produção dos diferentes leites fermentados tradicionais, como o nono da Nigéria (Wouters et al., 2002), o amasi, o inkomasi e o mukaka wakokora da África do Sul e do Zimbabwe, consumidos pelos povos Bantu da África Austral (Ferusu & Muzondo, 1990), o lben de Marrocos (Ouadghiri et al., 2009), o rob do Sudão (Abdelgadir et al., 2001), como os leites fermentados tradicionais da Roménia (Zamfiret al., 2006), o leben da Tunísia, o laban do Líbano e de outros países Árabes. Os leites referidos são produzidos de forma artesanal por fermentação espontânea de leite de vaca, ou através da técnica do “back-sloping” que consiste em adicionar a cada nova produção de leite fermentado uma porção do leite fermentado da produção anterior. A tecnologia de produção do omavele é diferente da do ergo e do ititu da Etiópia, da do ma- ziwa lala do Quénia e da do maziwa mgando da Tanzânia, uma vez que durante a elaboração dos mesmos se vai adicionando ao leite fermentado já existente o leite resultante da ordenha diária, num recipiente previamente defumado. Este processo pode levar cerca de 2 a 4 dias até se atingir a acidez desejada. No caso concreto do ititu o período de fermentação é de cerca 14 dias. Estes produtos geralmente apresentam um cheiro e sabor a fumo. O recipiente utilizado para a elaboração do omavele não era defumado, era apenas lavado com água e esporadicamente. O leite fermentado zabady, produzido no Egito e muito conhecido no Médio Oriente, é carac- terizado por ter um sabor a cozinhado e uma consistência firme como o iogurte. A produção do zabady é diferente da do omavele, na medida em que no primeiro caso o leite de búfala ou de vaca é fervido e depois de arrefecido é inoculado com uma porção da produção anterior de zabady (El-Baradei et al., 2008), enquanto o omavele estudado foi feito com leite de vaca cru. Por outro lado, a produção do nyarmie no Ghana (Obodai & Dodd, 2006), também difere da do omavele, uma vez que o primeiro é feito com leite pasteurizado, que depois é arrefecido para se poder remover a gordura acumulada à superfície e posteriormente é posto a incubar à temperatura de 28-30ºC, durante a noite. Na Georgia, o leite fermentado tradicional matsoni é produzido de forma artesanal com leite de vaca, ao qual se adiciona uma cultura de arranque constituída por bactérias termófilas. O processamento é semelhante ao do omavele, a diferença está no tipo de microrganismos que compõem a cultura de arranque utilizada (Uchida et al., 2007). O matsoni consome-se como bebida de acompanhamento das refeições, principalmente o almoço. Muitas vezes é adiciona- do ao arroz. É frequentemente consumido em datas festivas. A produção do leite fermentado pode variar de local para local, mas o fator mais influente na qualidade do produto fermentado é o recipiente (Kebede et al., 2007). Há referências sobre a

92 influência do recipiente na qualidade do leite fermentado, de que é exemplo oamasi produzido em recipiente de pedra, que é diferente do produzido numa cabaça. O povo Sotho da África do Sul utiliza recipientes de barro e acredita que o produto resultante tem um sabor e um cheiro mais agradáveis (FAO, 1990). Os recipientes são, geralmente, simples e feitos com materiais locais disponíveis como fibras vegetais, pele de animais, cabaças e madeiras ocas (FAO, 1990). As cabaças, panelas de barro e de madeira, são muito utilizadas em várias regiões da Etiópia, Quénia, Sudão e Egito (Ab- delgadir et al, 2001; Bonfoh, et al., 2003). Os leites fermentados em recipientes de barro e cabaças apresentam, geralmente, um número elevado tanto de bolores e leveduras como de bactérias lácticas, o que pode ser devido à frequente dificuldade na higienização destes reci- pientes (Kebede et al., 2007).

4.5. Composição microbiana dos fermentos Para a produção dos três leites fermentados – O1, O2 e O3 – foram utilizados os fermentos FO1 (tabela 7), FO2 (tabela 8) e FO3 (tabela 9) constituídos por estirpes de BAL homo e heterofermentativas e por leveduras, entre as quais Saccharomyces cerevisiae, muito usada na indústria alimentar. O ácido láctico é o principal produto final do metabolismo das BAL homo- fermentativas (Lb. casei, Lb. helveticus e Lactococcus lactis). Algumas estirpes de Lb. plan- tarum são homofermentativas e outras são heterofermentativas facultativas, produzindo estas, durante a fermentação, não só ácido láctico mas também diacetilo, acetoína e 2,3-butanediol a partir do piruvato (Corsetti & Gobetti, 2002). As estirpes de BAL utilizadas para a produção industrial do omavele têm sido identificadas em vários produtos lácteos fermentados em diversas regiões a nível mundial e encontram-se tanto nos fermentos naturais como na microbiota da grande maioria dos queijos durante a fase de maturação. Lb. helveticus tem sido utilizado em associação com outras bactérias termófilas S( . thermo- philus) e com alguns lactobacilos (Lb. delbruecki subsp. bulgaricus, Lb. fermentum, Lb. acido- philus) para a produção do iogurte comercial e de alguns queijos como o Gruyére em França, o Emmental na Suiça e o Grana em Itália (Beresford et al., 2001). Lb. plantarum e Lb. casei/ Lb. paracasei, apesar de não fazerem parte dos fermentos comerciais atuais, encontram-se com frequência em vários leites fermentados de produção artesanal. Durante a fermentação de produtos lácteos, Lactococcus spp. é responsável pela acidificação de- vido à produção de ácido láctico L(+), pelo desenvolvimento de uma boa textura devido à produ- ção de exopolissacáridos e pelo “flavour” devido à produção de compostos aromáticos (álcoois, cetonas e aldeídos) a partir do citrato, dos aminoácidos ou do metabolismo das gorduras (Cool-

93 bear, Crow, Holland, Liu & Reid 2002). Lactococcus lactis faz parte dos fermentos industriais utilizados na produção de muitos produtos lácteos, devido à sua capacidade de produzir ácido lác- tico e de converter a proteína do leite em compostos aromáticos responsáveis pelo “flavour”. As leveduras Saccharomyces cerevisiae e K. marxianus fazem parte da composição do fer- mento utilizado para a produção do kumis e do kefir e estão presentes em vários leites fer- mentados, quer artesanais quer industriais (Jespersen, 2003). Duma maneira geral as leveduras contribuem positivamente para o processo de maturação de muitos tipos de queijos, estando na origem de mudanças que são desejáveis nos produtos lácteos fermentados (Westall & Fil- tenborg, 1998)

4.6. Avaliação sensorial das três produções de omavele Os resultados da avaliação sensorial feita a cada um dos leites fermentados – O1, O2 e O3 – produzidos na oficina tecnológica do CERPTA constam da tabela 15. O resultado da avaliação sensorial do omavele 1 (O1), com pH 4,94, permite-nos verificar que apresentou uma pontuação elevada para os atributos cheiro lácteo (4,5), outros sabores (5) e textura fina (5,7) conforme se pode verificar na tabela 15. Apesar de pouco acentuado, notou-se um sabor levemente ácido. O facto de ter apresentado uma pontuação 5 para outros sabores está provavelmente relacio- nada com os compostos resultantes do metabolismo das bactérias lácticas presentes no fer- mento que, com exceção de Lactococcus lactis, não são frequentes em fermentos comerciais mas fazem parte da microbiota de leites de produção artesanal e da microbiota secundária de muitos queijos em fase de maturação. Segundo Johnson e Steele (1997) o aroma e o sabor dos leites fermentados e de outros produtos lácteos dependem diretamente da atividade metabólica da cultura de arranque e da microbiota secundária que pode ser deliberadamente adicionada para produzir aromas. Lactobacillus plantarum, considerada como integrante da microbiota secundária em queijos, tem também algum efeito sobre a textura e o “flavour”, como resultado da sua atividade metabólica e da produção de enzimas proteolíticas e lipolíticas. O composto principal responsável pelo aroma é o diacetilo, que resulta do metabolismo do citrato presen- te no leite por ação de algumas BAL, entre as quais Lactococcus lactis biovar diacetylactis e lactobacilos heterofermentativos (Stanley, 1998; Lindgren & Dobrogosz, 1990 citado por Caplice & Fitzgerald, 1999). O omavele 1 (O1) apresentou pontuação 4,5 para cheiro à lacteo, semelhante ao de um iogurte natural devido supostamente a presença de estirpes de lactoba- cilos heterofermentativos (Lb. plantarum /Lb. pentosus) e de lactobacilos heterofermentativos facultativos (Lb. casei ) e de Lactococcus lactis.

94 Apesar da presença de estirpes de bactérias lácticas homofermentativas (Lc. lactis), a quanti- dade de acido láctico produzido pelas bactérias não foi suficiente para reduzir o pH a níveis mais baixos, de forma a levar à precipitação da caseína, e consequentemente à coagulação do leite, daí apresentar uma textura mais fina.

Tabela 15. pH e resultado da avaliação sensorial dos três omaveles (O1, O2 e O3) produzidos na oficina tecnológica do CERPTA.

Omavele 1 Omavele 2 Omavele 3

Lácteo 4,5 3,4 3,4

Cheiro Leveduras 3,7 5,3 5,3

Outros 3,2 3,8 3,2

Ácido 2,6 5,4 5,6

Amargo 2,0 3,9 3,9 Sabor Acético/vinagre 1,9 4,5 4,4

Outros 5,0 4,0 6,0

Granulada 1,6 5,4 4,1 Textura Fina 5,7 2,3 3,3

pH 4,94 4,32 4,24

Figura 18. Perfil sensorial dos leites fermentados O1, O2 e O3 produzidos com os fermentos FO1, FO2 e FO3.

Cheiro lácteo 7 Textura fina Cheiro a leveduras 6 5 4 3 2 Textura granulada 1 Outros cheiros

Omavale 3 Outros sabores Ácido Omavale 2

Omavale 1 Acético - Vinagre Amargo

95 O omavele 2 (O2), com pH 4,32, apresentou maior pontuação para os atributos cheiro a levedu- ra (5,3), sabor ácido (5,4) e textura granulada (5,4) conforme se pode verificar na tabela 15. O pH deste leite era mais baixo que o do O1, por isso o sabor ácido devido a uma maior produção de acido lático por parte das bactérias presentes no fermento e textura mais granulada devido à precipitação da caseína que ocorre a um pH de 4,6 que corresponde ao ponto isoelétrico da mesma. Segundo Stanley (1998) a textura dos leites fermentados depende essencialmente do ácido láctico produzido pelas BAL, porque durante o processo de fabrico destes produtos não há adição de enzimas coagulantes e a coagulação resulta da descida progressiva do pH até ao ponto isoelétrico da caseína, momento em que se desestabiliza e precipita. Lactococcus lactis é uma das bactérias utilizadas com a finalidade de melhorar a consistência e/ou a viscosidade dos produtos lácteos uma vez que é produtora de EPS . O omavele 3 (O3) apresentou maior pontuação para o atributo cheiro a levedura (5,3), outros sabores (6) e textura granulada (4,1) conforme se pode ver na tabela 15. Dos três omaveles foi o que apresentou o pH mais baixo o que justifica a pontuação de 5,6 para o atributo sabor ácido, por outro lado apresentou pontuação 6 para outros sabores tendo sido por isso o que menos agradou aos provadores de acordo com a apreciação dos mesmos (Anexo 3). Esta pon- tuação está relacionada com a atividade metabólica dos microrgnismos presentes no fermento (FO3), sendo na sua maioria leveduras. Cinco dos provadores preferiram o omavele O1, 4 o omavele O2 e apenas 2 preferiram o omavele O3. Os omaveles O2 e O3 apresentaram pontuações mais elevadas para o cheiro a levedura do que o omavele O1 porque naqueles a concentração de leveduras foi maior do que no O1 (ta- bela 11). Algumas leveduras produzem proteases, lipases, amilases e pectinases extracelulares que têm impacto no “flavour” e na textura dos produtos (Fleet, 2007). As leveduras não fermentadoras de lactose são determinantes na formação de sabores e cheiros típicos a leveduras. Segundo Forss (1969) citado por Stanley (1998), a atividade proteolítica e lipolítica das leveduras está na origem de numerosos compostos voláteis, péptidos e aminoá- cidos que têm influência no “flavour” dos leites fermentados. O aroma fundamental dos leites fermentados é devido à presença de compostos voláteis como o ácido acético, o acetaldeído e o diacetilo, produzidos por algumas bactérias lácticas.

4.7. Avaliação microbiológica dos leites fermentados O1, O2 e O3. Conforme se pode verificar na tabela 16 as contagens de Lactobacillus no leite O1 mantive- ram-se constantes até ao 30º dia tanto na 1ª produção (1ª P) como na 2ª produção (2ª P), em que os valores obtidos foram de 9 log10 ufc/mL e 8 log10 ufc/mL, respetivamente. No leite O2

96 houve uma redução ao 15º dia tanto na 1ª P como na 2ª P. No leite O3 quer na 1ª P quer na 2ª P houve uma redução ao 15º dia e ao 30º dia.

Tabela 16. Teores de microrganismos viáveis nos leites fermentados O1, O2 e O3 (log10 ufc/mL).

1º D 15º D 30º D Produto Microrganismos 1ªP 2ªP 1ª P 2ªP 1ªP 2ªP

Lactobacillus 9,15 8,04 9,08 8,61 9,06 8,51

O1 Lactococcus 8,98 8,67 9,11 8,49 8,93 8,31

Leveduras 7,59 6,79 7,18 6,93 7,10 6,72

Lactobacillus 9,15 9,05 8,36 8,44 8,10 8,48

O2 Lactococcus 9 9,14 8,47 8,34 8,19 8,29

Leveduras 7,28 7,26 7,20 7,23 7,17 6,91

Lactobacillus 9,18 9,06 8,83 8,15 7,02 6,94

O3 Lactococcus 9,13 8,74 9,05 8,23 7,14 6,74

Leveduras 7,51 7,19 7,40 7,17 7,40 7,02

Quanto à contagem de Lactococcus spp. no leite O1, na 1ª P observou-se um aumento ao 15º dia e depois uma redução ao 30º dia, enquanto que na 2ª P as contagens mantiveram-se constantes (8 log10 ufc/mL) até ao 30º dia. Nas duas produções do leite O2 verificou-se uma redução ao 15º dia. No leite O3 houve redução de 1 ciclo logarítmico entre o 1º e 30º dia na 1ª P e de dois ciclos logaritmicos entre o 1º e 30º dia na 2ª P (tabela 16). As contagens de Lactobacillus e de Lactococcus no leite O3 ao 30º dia, apesar de relativamen- te baixas (6 log10 ufc/mL), encontravam-se dentro do limite mínimo aceitável de BAL viáveis em leites fermentados (tabela 16). Relativamente às leveduras, no leite fermentado O1 as contagens mantiveram-se constantes até ao 30º dia nas duas produções, 7 log10 ufc/mL na 1ª P e 6 log10 ufc/mL na 2ª P. No leite O2 as contagens da 1ª P mantiveram-se constantes até ao 30º dia e na 2ª P só ao 30º dia se observou uma redução. No leite fermentado O3 as contagens de leveduras mantiveram-se constantes

(7 log10 ufc/mL) nas duas produções até ao 30º dia (tabela 16). As diferenças encontradas entre os teores de microrganismos nos três leites fermentados durante as duas produções, apesar de não se ter feito uma análise estatística, não foram relevantes, tendo sido verificada uma esta- bilidade dos mesmos ao longo dos 30 dias. As contagens de BAL e de leveduras nos leites fermentados O1, O2 e O3 mantidos à tempera- tura de refrigeração durante 30 dias foram compatíveis com a norma do Códex Alimentarius,

97 que preconiza para leites fermentados contagens de BAL totais de 107 ufc/g como mínimo e de leveduras de 104 ufc/g como mínimo, no produto final (Códex STAN 243-2003). Para que os leites fermentados tenham efeito terapêutico e potencial probiótico o número viável de células probióticas deve ser superior a 106 ufc/mL até ao momento do consumo (Lourens- Hattingh &Viljoen, 2002). De acordo com Tamime (2002) o fermento deve ser viável, ativo e abundante, com cerca de 107 ufc/g no produto final e assim se deve manter até ao seu consumo. Lourens-Hattingh e Viljoen (2002) verificaram que as concentrações de Debaryomyces han- senii (±7,4 log10 ufc/mL) e de Issatchenkia orientalis (±7,3 log10 ufc/mL) inoculadas em leite UHT se mantinham constantes durante 32 dias, período suficiente para evitar a diminuição excessiva do pH. Nos leites O1, O2 e O3 as concentrações de leveduras (7 log10 ufc/mL) man- tiveram-se constantes durante trinta dias. Os elevados teores de bactérias lácticas e de leveduras em amostras de omavele – O1, O2 e O3 – produzido de modo semi-industrial na oficina tecnológica do CERPTA (tabela 16) foram devi- dos: a) ao tratamento térmico a que o leite foi sujeito antes da produção do omavele industrial, tendo provocado alterações nos componentes do leite de modo a favorecer o crescimento das BAL; b) à estabilidade da temperatura de incubação; c) à elevada concentração do inóculo. As bactérias lácticas e as leveduras presentes no omavele (tabela 16) produzido na oficina tecnológica do CERPTA suportaram bem a temperatura de incubação a que foram sujeitas, o que constitui um bom indicador para a sua utilização na indústria de lacticínios.

98 5. Conclusões A microbiota do omavele é diversificada, tendo-se registado uma predominância de bactérias lácticas e de leveduras sobre outros microrganismos, o que faz com que o produto tenha ca- racterísticas organolépticas específicas. As BAL e leveduras isoladas a partir de amostras de omavele recolhido nas diferentes locali- dades e identificadas através de técnicas de biologia molecular revelaram alguma semelhança, tendo-se verificado predominância da espécie Lb. plantarum/L.pentosus e de Kazachstania unispora. As concentrações de leveduras no omavele de produção artesanal foram elevadas, este facto pode sugerir que sejam parte integrante da microbiota comum dos utensílios e recipientes utilizados. A qualidade higio-sanitária do omavele foi razoável, considerando que os teores de bactérias indicadoras dessa qualidade não foram elevados. O omavele O1 foi o preferido pelo painel de provadores. O omavele poderá ser considerado um produto probiótico, devido à concentração das BAL e às características das estirpes selecionadas, depois de realizados os estudos clínicos corres- pondentes.

99 6. Perspetivas Estudar as características tecnológicas, propriedades probióticas e antimicrobianas das BAL identificadas. Aprofundar o estudo sobre as características sensoriais do produto. Avaliar o efeito das plantas ou raízes adicionadas ao omavele sobre as características organo- lépticas do produto.

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118 ANEXOS Anexo1

Teores médios de microrganismos isolados em amostras de omavele (log10 ufc/mL).

Aeróbios Totais a Amostra Localidades Lactobacilos Lactococos Leveduras 30ºC 1 Rio da Areia 7,98 6,68 6,61 - 2 Rio da Areia 7,16 6,43 6,30 - 3 Rio da Areia 4,97 4,57 4,43 6,34 4 Rio da Areia 6,28 5,23 6,00 6,97 5 Rio da Areia 7,49 6,76 5,91 7,15 6 Rio da Areia 5,57 5,69 5,34 5,85 7 Rio da Areia 6,53 5,59 5,32 5,57 8 Rio da Areia 6,31 6,34 4,98 5,81 9 Rio da Areia 6,34 6,18 5,96 6,23 10 Rio da Areia 5,59 5,41 6,59 6,84 11 Rio da Areia 6,29 5,10 5,21 5,44 12 Rio da Areia 6,54 5,30 5,30 5,74 13 Rio da Areia 6,77 5,72 5,44 5,49 14 Mulondo 6,70 6,53 6,81 - 15 Mulondo 6,95 6,74 6,67 - 16 Mulondo 7,66 6,21 6,12 - 17 Mulondo 7,58 8,00 6,59 - 18 Mulondo 7,27 6,03 5,92 - 19 Chibia 7,22 6,84 5,48 - 20 Chibia 7,20 6,65 6,00 - 21 Chibia 6,57 5,72 6,67 6,26 22 Chibia 5,85 6,65 2,64 6,58 23 Chibia 5,93 6,94 6,82 7,79 24 Chibia 8,19 5,82 6,93 7,74 25 Chibia 7,22 7,30 6,11 6,23 26 Chibia 6,87 6,05 5,95 5,33 27 Chibia 7,26 7,32 5,89 5,97 28 Chibia 6,81 5,58 6,04 7,23 29 Chibia 7,06 6,37 5,54 5,15 30 Chibia 7,09 5,90 5,48 6,33 31 Humpata 7,93 7,18 7,19 - 32 Humpata 7,57 7,15 6,63 - 33 Humpata 6,97 6,23 6,28 7,30 34 Humpata 7,28 7,08 7,24 8,01 35 Humpata 7,36 7,54 5,34 7,65 36 Humpata 6,42 6,38 5,56 6,79 37 Humpata 7,16 8,34 5,43 7,73 38 Humpata 6,64 6,92 5,56 6,90 39 Humpata 6,73 6,72 5,46 6,81 40 Toco 6,02 6,30 5,99 - 41 Toco 6,22 7,32 6,26 6,10 42 Toco 7,39 7,12 6,95 6,26 43 Toco 5,77 4,67 5,73 5,98 44 Toco 5,83 5,06 5,32 5,69 45 Toco 6,88 6,83 6,18 7,08 46 Toco 6,72 5,94 5,23 5,84 47 Toco 6,76 4,74 5,30 5,36 48 Toco 6,72 5,53 5,70 5,94 49 Toco 6,05 5,54 5,28 5,92 50 Toco 6,07 5,54 5,46 5,00 51 Toco 6,71 4,91 5,60 5,65 52 Toco 7,39 5,84 5,04 5,93 53 Toco 7,06 5,94 5,45 5,47 54 Toco 7,12 5,22 5,19 5,39 55 Huíla 7,23 5,15 5,23 7,32 56 Huíla 7,09 7,09 6,48 6,36 57 Huíla 7,19 7,45 5,39 5,34

120 Teores médios de microrganismos isolados em amostras de omavele (log10 ufc/mL).

Amostra Localidades Micrococos Enterococos Enterobactérias 1 Rio da Areia 3,78 3,32 - 2 Rio da Areia 3,93 4,00 - 3 Rio da Areia 3,69 3,97 3,01 4 Rio da Areia 2,48 4,26 3,49 5 Rio da Areia - 3,47 2,74 6 Rio da Areia 2,28 3,98 2,30 7 Rio da Areia 3,92 4,28 2,38 8 Rio da Areia 3,19 3,45 3,57 9 Rio da Areia - 4,40 2,93 10 Rio da Areia 3,68 3,26 3,65 11 Rio da Areia 2,48 4,11 - 12 Rio da Areia - 3,75 3,66 13 Rio da Areia - 3,82 - 14 Mulondo 5,88 4,74 - 15 Mulondo - - - 16 Mulondo 2,08 4,45 - 17 Mulondo 5,56 4,74 - 18 Mulondo 3,38 2,74 - 19 Chibia 4,24 2,78 - 20 Chibia 4,12 3,90 21 Chibia 2,95 3,65 2,88 22 Chibia 3,76 4,26 2,28 23 Chibia - 4,88 3,44 24 Chibia - 6,10 - 25 Chibia 4,81 5,87 2,72 26 Chibia - 4,58 - 27 Chibia 4,91 5,33 4,62 28 Chibia 4,48 5,49 - 29 Chibia 4,69 4,60 - 30 Chibia 3,87 4,85 - 31 Humpata 2,89 3,68 - 32 Humpata 4,85 6,30 - 33 Humpata 2,55 3,53 5,15 34 Humpata - 6,29 - 35 Humpata - 5,65 - 36 Humpata - 6,94 - 37 Humpata - 5,49 - 38 Humpata - 5,97 39 Humpata 4,33 5,20 - 40 Toco - 4,86 2,90 41 Toco - 4,29 1,95 42 Toco - 5,89 - 43 Toco 2,53 3,92 2,34 44 Toco 2,65 3,79 - 45 Toco 3,61 4,73 - 46 Toco 3,89 3,62 2,15 47 Toco - 2,86 3,18 48 Toco 4,08 3,15 2,65 49 Toco - 3,54 3,68 50 Toco - 3,59 - 51 Toco 3,94 52 Toco 5,60 53 Toco 3,93 54 Toco 3,87 55 Huíla 3,42 6,50 6,76 56 Huíla 4,34 6,02 3,28 57 Huíla 3,76 4,97 3,76

121 Análise Estatística A variável resposta analisada (y) foi o logaritmo de base 10 das contagens bacterianas para cada uma das 7 variáveis (Lactobacilos, Lactococos, Leveduras, Aeróbios Totais a 30ºC, Mi- crococos, Enterococos e Enterobactérias) considerando a totalidade da amostra e dividindo-a por ano e por localidade. Este procedimento permitiu normalizar a variável analisada. Para o factor ano foram considerados 4 níveis (2007, 2008, 2009 e 2010) e para o factor locali- dade foram considerados 6 níveis (Chibia, Huíla, Humpata, Mulondo, Rio da Areia e Toco). A interação entre ambos os fatores não foi considerada. As diferenças entre as médias foram examinadas através do teste post-hoc HSD de Tukey. A análise de dados foi realizada com recurso ao software estatístico R, versão 2.15.0. Para avaliarmos o efeito dos fatores ano e localidade nas sete variáveis recorreu-se à ANOVA two-way em que o modelo de análise foi y= µ+ano+localidade+erro. Os calculos foram realizados com o pacote estatístico R, versão 2. 15.0

Variável Lactobacilos

Factor ano significativo (p<0.001).

122 As médias do mesmo grupo não diferem significativamente (p<0.05).

Neste caso todas as médias pertencem ao mesmo grupo.

Condições de aplicabilidade da ANOVA Boxplots

Não se verificam desvios importantes à normalidade dentro dos grupos.

123 Análise de resíduos

De acordo com o gráfico valores ajustados Vs resíduos, a homogeneidade da variância não é violada (os residuos distribuem-se ao acaso acima e abaixo da linha ). O Q-Q plot sugere normalidade, ao ajustarem-se os valores a uma linha reta. No conjunto há condições de apli- cabilidade da análise de variância.

Variável Lactococos

Factor ano significativo (p<0.05) e factor localidade significativo (p<0.01).

124 Médias do mesmo grupo ou com o mesmo superíndice não diferem significativamente (p<0.05).

Médias do mesmo grupo ou com o mesmo superíndice não diferem significativamente (p<0.05)

125 Condições de aplicabilidade da ANOVA Boxplots

Mulondo foi o único nivel que apresentou um certo desvio da normalidade, mas sem qualquer importância se tivermos em consideração o conjunto.

Análise de resíduos

126 Pelas mesmas razões expostas para a variável anterior, confirmam-se as condicições de apli- cabilidade da análise de variância

Variável Leveduras ANOVA com outlier incluido.

Apenas o factor ano é significativo (p<0.05).

Médias do mesmo grupo ou com o mesmo superíndice não diferem significativamente (p<0.05).

127 Médias do mesmo grupo ou com o mesmo superíndice não diferem significativamente (p<0.05).

Condições de aplicabilidade da ANOVA Boxplots

No geral não se verificam desvios importantes à normalidade, se bem que uma observação poderia considerar-se outlier. Após a sua eliminação o boxplot ficou da seguinte maneira :

Mesmo neste caso aparecem alguns outliers, mas não são tão extremos e decidiu-se mantê-los para a análise.

128 Análise de resíduos Após a eliminação da observação extrema, outlier, há condições de aplicabilidade da ANOVA, tal como se pode observar nos gráficos que se seguem.

Estudo realizado após a eliminação do outlier:

129 A variável ano volta a ser significativa (p<0.001), as diferenças entre localidades não são significativas.

Não se verificam diferenças significativas entre os anos 2007 e 2008, mas sim entre os anos 2009 e 2010.

Neste caso existem diferenças, provavelmente devido à maior sensibilidade do teste de Tukey. Não obstante, dado que no teste ANOVA não se verificaram diferenças significativas, conside- ra-se que as médias das diferentes localidades não diferem significativamente.

130 Variável Micrococos

Não se verificam diferenças significativas para a variável micrococos para nenhum dos fato- res.

131 Condições de aplicabilidade do ANOVA Boxplots

Não se verificam desvios importantes à normalidade, se bem que o ano 2008 não apresentou “bigodes”.

Análise de resíduos

132 Pelas mesmas razões expostas para a variável anterior, confirmam-se as condições de aplica- bilidade da ANOVA, se bem que haja alguns resíduos ligeramente desviados a nível do valor ajustado 4,2.

Variável Enterococos

Existem diferenças significativas tanto para o factor ano (p<0.01) como para o factor locali- dade (p<0.001).

Médias do mesmo grupo ou com o mesmo superíndice não diferem significativamente (p<0.05).

133 Médias do mesmo grupo ou com o mesmo superíndice não diferem significativamente (p<0.05).

Condições de aplicabilidade do ANOVA Boxplots

Não se verificam desvios importantes à normalidade, se bem que Mulondo não apresenta um dos “bigodes”.

134 Análise de resíduos

Pelas mesmas razões expostas para as variáveis anteriores, confirmam-se as condições de aplicabilidade da ANOVA.

Variável Enterobactereaceae

Há diferenças significativas entre os anos mas não entre localidades (p<0.01)

135 Há diferenças significativas entre 2010 e os anos 2008 e 2009.

Este resultado é contraditório com o significado global da ANOVA.

Condições de aplicabilidade da ANOVA Boxplots

Verifica-se a falta do “bigode” em 2010 e na Chibia. O que faz supor um certo desvio à nor- malidade.

136 Análise de resíduos

Neste caso observa-se que alguns resíduos são maiores nas observações ajustadas do valor mais alto, o que supõe um desvio à suposta a homogeneidade de variâncias, mas são ligeiras. Os residuos podem considerar-se normais, exceto uma observação. No conjunto não há as condições de aplicabilidade ótimas, mas, dada a robustez do ANOVA, podemos considerar os resultados válidos.

Variável Aeróbios Totais A 30ºc

137 Factor localidade significativo (p<0.001).

Médias do mesmo grupo ou o mesmo superíndice não diferem significativamente para (p<0.05).

Condições de aplicabilidade do ANOVA Boxplots

Não se verificam desvios importantes à normalidade.

138 Análise de resíduos

Em geral não há sinais evidentes de heterogeneidade de variâncias nem tão pouco de distribu- ção anormal dos residuos. Cumprem-se as condições de aplicabilidade.

139 Anexo 2 Amostras de omavele obtidas na localidade do Toco em 2009 e 2010.

Identificação segundo a semelhança da % de Amostras Meio Colónia sequência. semelhança Grupo taxonómico1 RGSA 1 Lb. plantarum/Lb. pentosus 99 M17 4 - 5 RB 5 Kazachstania unispora 99 KAA 2 Lb. plantarum/Lb. pentosus 99 RGSA 2 - 6 M17 - RB 5 Issatchenkia orientalis 100 RGSA 2 Lb. casei /Lb. paracasei 99 M17 1 - 7 RB 5 Issatchenkia orientalis 100 KAA 2 Lb. plantarum 100 RGSA - 13 RB 4 Saccharomyces cerevisiae 99 KAA 1 Pediococcus pentosaceus 99 RGSA 14 RB 5 Saccharomyces cerevisiae 99 KAA 1 RGSA 1 Lb. plantarum/Lb. pentosus 99 M17 5 - 15 RB 4 Kazachstania unispora 98 KAA 1 Lb. helveticus/Lb. plantarum 100 RGSA 4 Lb. plantarum/Lb. pentosus 100 M17 2 - 16 RB 2 Kazachstania unispora 99 KAA 4 Lb. plantarum/Lb. pentosus 99 RGSA 1 - M17 1 - 4 RB 1 Kazachstania unispora 99 KAA 3 Enterococcus faecalis 99 RGSA 1 - M17 1 - 5 RB 3 Kazachstania unispora 98 KAA 1 Lb. plantarum/Lb. pentosus 99 RGSA 1 - M17 1 Lb. plantarum/Lb. pentosus 100 6 RB 1 Kazachstania unispora 99 KAA 1 Lb. plantarum/Lb. pentosus 99 RGSA 1 - M17 1 - 7 RB 1 Kazachstania unispora 99 KAA 1 Lb. casei 93 1 - Géneros ou espécies que apresentam maior semelhança com as sequências de DNA obtidas.

140 Amostras de omavele obtidas na localidade da Chibia em 2007, 2009 e 2010.

Identificação segundo a semelhança da % de Amostras Meio Colónia sequência. semelhança Grupo taxonómico1 RGSA Lb. plantarum/Lb. pentosus M17 Lb. plantarum/Lb. pentosus 11 RB Kazachstania unispora KAA Lb. casei/Lb. paracasei RGSA Lb. plantarum/Lb. pentosus 12 M17 Lb. plantarum/Lb. pentosus RB Saccharomyces cerevisiae RGSA 2 - M17 4 - 20 RB 4 Saccharomyces cerevisiae 99 KAA 3 Weissella confusa/Weissella sp. 99 RGSA 5 Lb.casei/Lb. paracasei 100 M17 1 - 21 RB 4 Saccharomyces cerevisiae 99 KAA 2 Lactococcus lactis 100 RGSA 1 Lb. casei/Lb.paracasei 99 M17 3 Lb. casei/Lb.paracasei 99 9 RB 1 Kluyveromyces marxianus/Kluyveromyces lactis 100 KAA 1 Lb. plantarum 100 RGSA 1 Latococcus lactis 99 M17 1 Latococcus lactis 100 10 RB 1 Issatchenkia orientalis 100 KAA 1 Enterococcus faecalis/Enterococcus sp. 96 RGSA 1 - M17 1 Lb. casei/Lb. casei 100 14 RB 1 Saccharomyces cerevisiae 100 KAA 1 Lb. plantarum 100 RGSA 1 - M17 1 Lb. casei/Lb. casei 99 16 RB 1 Issatchenkia orientalis 100 KAA 1 Lb. casei/Lb. casei 99

1 - Géneros ou espécies que apresentam maior semelhança com as sequências de DNA obtidas.

141 Amostras de omavele obtidas na localidade da Humpata em 2007, 2009 e 2010.

Identificação segundo a semelhança da % de Amostras Meio Colónia sequência. semelhança Grupo taxonómico1 RGSA Lb. plantarum/Lb. pentosus M17 Enterococcus durans/Enterococcus hirae 7 RB Issatchenkia orientalis KAA Lb. rhamnosus RGSA Lb. plantarum/Lb. pentosus M17 Lb. plantarum/Lb. pentosus 8 RB Kazachstania unispora/Saccharomyces unisporus KAA Lb. casei/Lb. paracasei RGSA 2 Lb. helveticus 99 M17 5 17 RB Rhodotorula mucilaginosa 99 KAA RGSA 5 M17 2 Lactococcus lactis 99 18 RB 3 KAA 1 Enterococcus durans 99 RGSA 5 Leuconostoc mesenteroides 100 M17 5 19 RB 4 Issatchenkia orientalis 100 KAA 1 Enterococcus durans 98 RGSA 1 M17 1 8 RB 1 Kazachstania unispora 99 KAA 1 E. durans/Enterococcus sp. 99 RGSA 1 Lb. plantarum/Lb. pentosus M17 1 11 RB 1 Kazachstania unispora 100 KAA 1 Lb.plantarum/Lb. pentosus 99 RGSA 1 M17 1 12 RB 1 Kazachstania unispora 100 KAA 1 E. durans/Enterococcus sp. 99 RGSA 1 M17 1 15 RB 1 Issatchenkia orientalis 100 KAA 1 Lb. plantarum/Lb. pentosus 99 1 - Géneros ou espécies que apresentam maior semelhança com as sequências de DNA obtidas.

142 Amostras de omavele obtidas na localidade de Mulondo em 2007.

Identificação segundo a semelhança da sequência. Amostras Meio Grupo taxonómico1 RGSA Lb. plantarum/Lb. pentosus 1 M17 Lb. plantarum/Lb. pentosus RB Saccharomyces cerevisiae RGSA M17 Lb. plantarum/Lb. pentosus 2 RB Saccharomyces cerevisiae KAA RGSA Lb. plantarum/Lb. pentosus M17 Lb. plantarum/Lb. pentosus 3 RB Saccharomyces cerevisiae KAA Lb. rhamnosus RGSA Lb. plantarum/Lb. pentosus M17 Lb. plantarum/Lb. pentosus 4 RB Issatchenkia orientalis KAA Enterococcus durans/Enterococcus hirae RGSA Lb. plantarum/Lb. pentosus M17 Lb. plantarum/Lb. pentosus 5 RB Kazchastania unispora/Saccharomyces unisporus KAA RGSA Lb. plantarum/Lb. pentosus M17 Lb. plantarum/Lb. pentosus 6 RB Saccharomyces cerevisiae KAA Enterococcus durans/ Enterococcus hirae 1 - Géneros ou espécies que apresentam maior semelhança com as sequências de DNA obtidas.

143 Amostras de omavele obtidas na localidade da Huíla em 2010.

Identificação segundo a semelhança da % de Amostras Meio Colónia sequência. semelhança Grupo taxonómico1 RGSA 1 Lb. helveticus 99 M17 1 Lb.plantarum/Lb. pentosus 99 13 RB 1 KAA 1 Lb. casei/Lb. paracasei 99 RGSA 2 Lb.plantarum/Lb. pentosus 99 M17 1 17 RB 1 Kazachstania unispora 99 KAA 1 RGSA 1 Lb.plantarum/Lb. pentosus M17 1 18 RB 1 Trichosporum coremiiforme/Trichosporon sp. 99 KAA 1 Enterococcus durans/Enterococcus sp. 99 RGSA 1 M17 1 Enterococcus durans/Enterococcus sp. 19 RB 1 Kazachstania unispora KAA 1 Enterococcus durans/Enterococcus sp. RGSA 1 Lb.plantarum/Lb. pentosus 99 M17 1 Lb.plantarum/Lb. pentosus 99 20 RB 1 Kazachstania unispora 95 KAA 1 Lb.plantarum/Lb. pentosus 99 RGSA 1 M17 1 21 RB 1 Kluyveromyces marxianus/Kluyveromyces lactis 99 KAA 1 Enterococcus durans/Enterococcus sp. 99 1 - Géneros ou espécies que apresentam maior semelhança com as sequências de DNA obtidas.

144 Amostras de omavele obtidas na localidade Rio Areia da em 2007, 2009 e 2010.

Identificação segundo a semelhança da % de Amostras Meio Colónia sequência. semelhança Grupo taxonómico1 RGSA - Lb. plantarum/Lb. pentosus - M17 - Lb. plantarum/Lb. pentosus - 9 RB - Kluyveromyces marxianus/Kluyveromyces lactis - KAA - Pediococcus pentasaceus - RGSA - Lb. plantarum/Lb. pentosus - M17 - Lb. plantarum/Lb. pentosus - 10 RB - - KAA -- RGSA 1 Lb. plantarum/Lb. pentosus 99 1 M17 5 - RB 1 Pichia deserticola/Candida ethanolica 97 RGSA 4 Lb. plantarum 99 M17 3 - 2 RB 1 Issatchenkia orientalis 100 KAA 1 - RGSA 2 Lb. plantarum/Lb. pentosus 99 M17 1 3 RB 2 Kluyveromyces marxianus 95 KAA 2 Lb. plantarum/Lb. pentosus 99 RGSA 2 Lb. plantarum 99 M17 4 4 RB 1 Issatchenkia orientalis 100 KAA 3 Enterococcus durans 99 RGSA 4 - M17 4 - 9 RB 5 Kazachstania unispora 99 KAA Lb. plantarum 99 RGSA 1 Lb. plantarum/Lb. pentosus 99 M17 4 10 RB 4 Torulaspora delbrueckii 99 KAA 1 RGSA 5 Lb. plantarum/Lb. pentosus 99 M17 5 11 RB 1 Issatchenkia orientalis 100 KAA 4 Lb. helveticus/Lb. pentosus 100 RGSA 1 12 M17 4 RB 1 Saccharomyces cerevisiae 99 KAA 2 Enterococcus durans 99 RGSA 3 - M17 1 Lactococcus lactis 99 1 RB 1 Issatchenkia orientalis 100 KAA 1 RGSA 1 - M17 1 - 2 RB 1 Kazachstania exígua/ Kazachstania turicensis 98 KAA 2 RGSA 1 - M17 1 - 3 RB 1 Saccharomyces cerevisiae 99 KAA 1 - 1 - Géneros ou espécies que apresentam maior semelhança com as sequências de DNA obtidas.

145 Anexo 3 FICHA DE AVALIAÇÃO SENSORIAL DATA AMOSTRA Nº Provar as amostras e atribuir a classificação de 1 a 7 (de menor a maior intensidade) acada atributo. Caso tenha algum comentário importante a fazer deverá anotá-lo na caixa de observações.

CHEIRO Lácteo

1 2 3 4 5 6 7

Leveduras

1 2 3 4 5 6 7 Outros

1 2 3 4 5 6 7

SABOR Ácido

1 2 3 4 5 6 7

Amargo

1 2 3 4 5 6 7

Acético/vinagre

1 2 3 4 5 6 7

146 Outros

1 2 3 4 5 6 7

TEXTURA Granulada

1 2 3 4 5 6 7

Fina

1 2 3 4 5 6 7

O que te faz recordar o cheiro e o sabor?

______Qual é a amostra que mais te agrada?

______Observações

______

______

______

______

147 OMAVELE 1

CHEIRO SABOR TEXTURA

Provadores Acético/ Lácteo Levadura Outros Ácido Amargo Outros Granulada Fina vinagre 1 6 3 1 2 4 2 1 6

2 6 3 1 2 3 2 1 5

3 5 3 4 2 2 2 7

4 3 7 5 1 1 1 6

5 3 6 1 3 1 1 7

6 6 3 4 1 1 6

7 4 2 7

8 5 3 3 4 2 5 5 2

9 2 5 7 2 1 2 5 1 6

10 4 2 4 2 1 1 2 5

11 6 2 1 1 1 6

Media 4,5 3,7 3,2 2,6 2,0 1,9 5,0 1,6 5,7

SD 1,4 1,7 2,5 1,4 1,1 1,3 1,3 1,4

OMAVELE 2

CHEIRO SABOR TEXTURA

Provadores Acético/ Lácteo Levadura Outros Ácido Amargo Outros Granulada Fina vinagre 1 5 4 5 3 3 6 3

2 3 6 4 6 7 5 3 4

3 2 6 4 6 3 6 4 5

4 2 7 6 3 5 5 2

5 3 6 6 4 5 6 1

6 4 6 5 3 6

7 6 5 5 4

8 6 5 5 6 3 7 7 1

9 2 3 2 6 3 3 4 6 2

10 3 4 3 4 3 2 6 2

11 1 6 5 4 6 6 4 6 1

Media 3,4 5,3 3,8 5,4 3,9 4,5 4,0 5,4 2,3

SD 1,7 1,2 1,2 0,8 1,5 1,6 0,0 1,2 1,4

148 OMAVELE 3

CHEIRO SABOR TEXTURA

Provadores Acético/ Lácteo Levadura Outros Ácido Amargo Outros Granulada Fina vinagre 1 3 6 6 5 3 2 5

2 4 4 2 6 6 5 3 4

3 3 7 7 6 7 5 3

4 2 4 2 1 1 1 7

5 5 7 6 4 6 5 2

6 4 7 7 4 5

7 7 6 7 2 4

8 2 4 4 5 3 5 6 1

9 1 4 5 7 2 4 6 5 3

10 5 3 1 5 5 3 4 3

11 1 6 4 4 5 6 5 2

Media 3,4 5,3 3,2 5,6 3,9 4,4 6,0 4,1 3,3

SD 1,9 1,5 1,6 1,6 1,8 1,8 1,5 1,8

APRECIAÇÃO DOS PROVADORES

Semelhança do cheiro e do Provadores Amostra preferida Observações sabor 1 iogurte O2 O2 - mais equilibrada 2 queijo O3 O3 - mais gosto a láctico O1= kefir; O2= roquefort ou O1- mais suave e mais parecido 3 O1 queijo maduro; O3= cerveja ao leite fermentado O1- textura aguada na boca; O3 mais viscoso ou espesso; O2 4 O1= pão O1 pelo sabor/O3 pela textura demasiado gosto a levedura e vinagre 5 iogurte ácido O3 6 O2 O1 sabor estranho 7 iogurte liquido O2 O1= queijo; O2= vinagre; O3= 8 O1 indefinido O1=leite; O3=muito ácida; O2 9 iogurte natural O2 mais densa agradaria mais ao paladar 10 iogurte, alcóois, doce (O1) O1 combinar e adocicar O2 e O3 fermentos (O1=iogurte; O2 e 11 O1 O1 mais parecido ao iogurte O3=acético) Amostra preferida 5 provadores - O1 4 provadores -O2 2 provadores - O3

149