Guardados da Memória
Carta de Euclides da Cunha a Assis Brasil
Euclides da Cunha Segundo ocupante da Cadeira 7 na Academia Brasileira de Rio, 23 – 12 – 1906 Letras. Meu ilustre companheiro Dr. Assis Brasil
Demorei esta resposta porque tive de cumprir a penosa formali- dade da recepção na Academia – que foi, como eu desejava, uma so- lenidade incolor, graças à minha voz abafada e à oração infindável do Sílvio. O Sr. já leu o meu discurso e, certamente, viu como ali se mostrou o meu pensamento torturado, sem espontaneidade e preso às convenções e à meia liberdade de tais reuniões. Lamento ainda me sentir em atitude tão pouco afeiçoada ao meu temperamento. Lá fui apenas para não contrariar uma praxe. Creia que nunca me vi mais fora do meu tempo. Ao Sr. – e a ninguém mais – explico a voz imperceptível e a gesticulação tolhida que toda a gente notou: é que me senti numa posição condenada pela própria altitude do pensamento moderno, tão grandioso na serenidade que o alevanta a cavaleiro de todas essas velhas formalidades. E este sen- timento cultiva-me exatamente no momento de tomar a palavra di-
305 Euclides da Cunha ante das figuras mais hieráticas dos imortais e alto funcionalismo. A linha reta, que traçara a minha carreira de escritor, parecia-me acabar, repentinamente, numa curva. O discurso que eu ia ler, tinha-o remendado e dilacerado em to- das as frases, aveludando-o, e ajeitando-o às sensitivas irritáveis das conveniên- cias. Devia repudiá-lo. Não era, realmente, meu. Mas foi um esforço heróico, e li-o, a correr, na ânsia de quem atira fora um fardo insuportável. Discursos de tal molde, só nos dão um prazer, o de terminá-los. Foi o meio que tive, embora o diminuíssem um pouco as palmas convencio- nais do seleto auditório que não me ouvia! Agora, resta-me a esperança de reatar o traçado retilíneo depois daquela curva do caminho. Mostrei ao Domício e ao Graça a sua carta. De acordo com eles, penso que o Sr. tem razão. Considero demasiada a exigência de um outro pedido formal, por exemplo, quando este é incompatível com justificáveis exemplos. Mas, desgraçadamente, não há forças contra o inextensível da rotina. Diante disso, bem a contragosto vejo que não devo persistir no meu primitivo propósito. Quem perde, afinal, é a Academia – porque mais tarde não se compreenderá a exclusão de quem tanto se vinculava a nossa história literária dos melhores tempos, senão pela forma, pela superioridade do pensar e até pela influência amigável exercida numa geração inteira. Seja como for – candidato ou não – o meu voto é seu. E será doravante o meu protetor permanente. Aguardo, entretanto, ainda, a sua resposta, que não deve demorar-se, por- que há um candidato, o Dr. Arthur Orlando, em prol de quem se está traba- lhando ativamente. Não recebi ainda o livro de que me falou. Desculpe-me a alongar-me tanto nesta, e creia sempre na minha estima e consideração do seu
Companheiro, amigo e admirador Euclides da Cunha
Minhas recomendações a todos os seus.
306 PATRONOS, FUNDADORES E MEMBROS EFETIVOS DA ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS (Fundada em 20 de julho de 1897) As sessões preparatórias para a criação da Academia Brasileira de Letras realizaram-se na sala de redação da Revista Brasileira, fase III (1895-1899), sob a direção de José Veríssimo. Na primeira sessão, em 15 de dezembro de 1896, foi aclamado presidente Machado de Assis. Ou- tras sessões realizaram-se na redação da Revista, na Travessa do Ouvidor, n.o 31, Rio de Janeiro. A primeira sessão plenária da Instituição reali- zou-se numa sala do Pedagogium, na Rua do Passeio, em 20 de julho de 1897.
Cadeira Patronos Fundadores Membros Efetivos 01 Adelino Fontoura Luís Murat Ana Maria Machado 02 Álvares de Azevedo Coelho Neto Tarcísio Padilha 03 Artur de Oliveira Filinto de Almeida Carlos Heitor Cony 04 Basílio da Gama Aluísio Azevedo Carlos Nejar 05 Bernardo Guimarães Raimundo Correia José Murilo de Carvalho 06 Casimiro de Abreu Teixeira de Melo Cícero Sandroni 07 Castro Alves Valentim Magalhães Nelson Pereira dos Santos 08 Cláudio Manuel da Costa Alberto de Oliveira Antonio Olinto 09 Domingos Gonçalves de Magalhães Magalhães de Azeredo Alberto da Costa e Silva 10 Evaristo da Veiga Rui Barbosa Lêdo Ivo 11 Fagundes Varela Lúcio de Mendonça Helio Jaguaribe 12 França Júnior Urbano Duarte Alfredo Bosi 13 Francisco Otaviano Visconde de Taunay Sergio Paulo Rouanet 14 Franklin Távora Clóvis Beviláqua Celso Lafer 15 Gonçalves Dias Olavo Bilac Pe. Fernando Bastos de Ávila 16 Gregório de Matos Araripe Júnior Lygia Fagundes Telles 17 Hipólito da Costa Sílvio Romero Affonso Arinos de Mello Franco 18 João Francisco Lisboa José Veríssimo Arnaldo Niskier 19 Joaquim Caetano Alcindo Guanabara Antonio Carlos Secchin 20 Joaquim Manuel de Macedo Salvador de Mendonça Murilo Melo Filho 21 Joaquim Serra José do Patrocínio Paulo Coelho 22 José Bonifácio, o Moço Medeiros e Albuquerque Ivo Pitanguy 23 José de Alencar Machado de Assis Luiz Paulo Horta 24 Júlio Ribeiro Garcia Redondo Sábato Magaldi 25 Junqueira Freire Barão de Loreto Alberto Venancio Filho 26 Laurindo Rabelo Guimarães Passos Marcos Vinicios Vilaça 27 Maciel Monteiro Joaquim Nabuco Eduardo Portella 28 Manuel Antônio de Almeida Inglês de Sousa Domício Proença Filho 29 Martins Pena Artur Azevedo José Mindlin 30 Pardal Mallet Pedro Rabelo Nélida Piñon 31 Pedro Luís Luís Guimarães Júnior Moacyr Scliar 32 Araújo Porto-Alegre Carlos de Laet Ariano Suassuna 33 Raul Pompéia Domício da Gama Evanildo Bechara 34 Sousa Caldas J.M. Pereira da Silva João Ubaldo Ribeiro 35 Tavares Bastos Rodrigo Octavio Candido Mendes de Almeida 36 Teófilo Dias Afonso Celso João de Scantimburgo 37 Tomás Antônio Gonzaga Silva Ramos Ivan Junqueira 38 Tobias Barreto Graça Aranha José Sarney 39 F.A. de Varnhagen Oliveira Lima Marco Maciel 40 Visconde do Rio Branco Eduardo Prado Evaristo de Moraes Filho Petit Trianon – Doado pelo governo francês em 1923. Sede da Academia Brasileira de Letras, Av. Presidente Wilson, 203 Castelo – Rio de Janeiro – RJ Composto em Monotype Centaur 12/16 pt; citações, 10.5/16 pt.