Revista Brasileira de Ciências Sociais ISSN: 0102-6909 [email protected] Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais Brasil

Loureiro, Maria Rita; Abrucio, Fernando Luis Politics and bureaucracy in the Brazilian presidential system: the role of the Ministry of Finance in Fernando Henrique Cardoso's first term Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 14, núm. 41, octubre, 1999 Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais São Paulo, Brasil

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Como citar este artigo Número completo Sistema de Informação Científica Mais artigos Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal Home da revista no Redalyc Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto POLÍTICA E BUROCRACIA NO PRESIDENCIALISMO BRASILEIRO 69 POLÍTICA E BUROCRACIA NO PRESIDENCIALISMO BRASILEIRO: o papel do Ministério da Fazenda no primeiro governo Fernando Henrique Cardoso*

Maria Rita Loureiro Fernando Luiz Abrucio

Introdução que estudaram a relação entre política e burocracia no Brasil.1 A grande maioria dos estudos, ao invés O presente trabalho procura entender a lógi- de entender como ocorre o equilíbrio dos ditames ca de nomeação para os altos cargos governamen- da burocracia com os da política, geralmente busca tais em nossa recente experiência democrática. estabelecer uma divisão entre o comportamento Examinando os vínculos entre política e burocracia técnico do corpo burocrático — o padrão merito- no sistema presidencialista brasileiro, enfoca-se es- crático — e a forma meramente clientelista de pecificamente o primeiro governo Fernando Henri- atuação dos parlamentares. Disto resultam, muitas que Cardoso e, dentro dele, o caso do Ministério da vezes, análises que abraçam como ideal a total Fazenda, considerado predominantemente técnico despolitização da burocracia, como se esta apenas e “imune” às interferências políticas. produzisse decisões “técnicas” visando à defesa do Este estudo justifica-se por três razões. Em “interesse público”, não necessitando de controle primeiro lugar, a relação entre política e burocracia político. é fundamental na definição do processo de gover- Como contraponto a esta visão, deve-se con- no, sobretudo no presidencialismo. De um lado, siderar que as decisões “técnicas” não são neutras. porque o Executivo constitui sua maioria parla- Constituem, na verdade, escolhas entre possíveis mentar em grande medida através da distribuição de cargos. De outro, porque, quanto maior for a politização da burocracia, maior será o problema * Este artigo é uma versão revisada e reduzida de texto do controle da delegação, tanto para o presidente apresentado ao GT Economia e Política, no XXII Encon- tro Anual da Anpocs, 27-31 de outubro de 1998. O apoio como para os parlamentares que participaram da técnico e financeiro do Núcleo de Publicações e Pesqui- indicação dos postos governamentais. Logo, en- sa (NPP) da Fundação Getúlio Vargas foi fundamental tender como funciona o equilíbrio das relações para a realização do trabalho. Agradecemos ainda a entre política e burocracia torna-se fundamental. Carlos Alberto Rosa, pela colaboração no levantamento de dados e na construção de tabelas e quadros, e a A segunda razão deriva exatamente da argu- Argelina Figueiredo, Cláudio Couto, George Avelino mentação desenvolvida pelos poucos trabalhos Filho e Kurt Mettenheim pelos comentários preciosos.

RBCS Vol. 14 no 41 outubro/99 70 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 41 rumos a tomar, com determinados impactos sobre cracia definida por Weber, portanto, torna-se mais a sociedade. Os ocupantes de cargos públicos de complexa. alto escalão são aqueles que, legitimados pelo Uma das análises mais instigantes sobre a processo democrático, devem optar por uma das relação entre os políticos e os burocratas realizada saídas técnicas existentes. Além do mais, o exces- nos últimos anos reforça a posição teórica adotada sivo insulamento da burocracia ante o sistema aqui. Trata-se do estudo comparativo feito por político tende a favorecer determinados grupos de Aberbach, Putnan e Rockman (1981), analisando interesse. Os “anéis burocráticos” criados no regi- sete países — Estados Unidos, Grã-Bretanha, Fran- me militar demonstraram que uma burocracia pro- ça, Alemanha, Itália, Holanda e Suécia. Os autores tegida da influência dos partidos politiza-se por mostram que é errôneo adotar a visão de que o outras vias, sem que haja o devido controle público político governa e o burocrata apenas administra. democrático (Cardoso, 1975).2 Na verdade, o que vem ocorrendo é a burocratiza- A constituição de uma burocracia de mérito e ção da política e a politização da burocracia, com certo grau de autonomia é, sim, essencial no fazendo com que os dois grupos adotem uma Estado moderno, mas suas ações devem ser moni- estratégia híbrida de atuação — políticos baseando toradas pelo sistema representativo, cabendo aos sua atuação cada vez mais no discurso técnico e políticos fazer a ponte entre as decisões burocráti- burocratas reforçando o aspecto político em seu cas e os interesses por eles representados. Não se cálculo de atuação, seja mediando interesses de trata, portanto, de privilegiar um ou outro grupo e/ clientelas específicas, seja norteando-se pelos si- ou lógica de atuação. Como já mostrara Weber, há nais emitidos por políticos. Desta forma, ambos uma “inseparável complementaridade” entre polí- precisarão cada vez mais adotar a posição de ticos e burocratas no mundo moderno, embora policy-makers, com responsabilidade política e suas relações sejam marcadas por permanentes sem ignorar o caráter técnico dos assuntos de tensões (Weber, 1993; Cohn, 1993, p. 16; Beetham, Estado. 1993, pp. 51-63). E aqui entra a terceira razão que justifica As mudanças operadas no mundo moderno, nosso trabalho. A escolha do Ministério da Fazenda ademais, tornam mais difícil a manutenção de uma (MF) brasileiro na experiência democrática recente perspectiva dicotômica no que tange à relação deve-se à sua importância central nas relações entre entre burocracia e política, sobretudo no alto política e burocracia. O MF não é apenas uma escalão governamental. Isto porque, com o au- estrutura insulada, voltada a discussões e decisões mento da cobrança democrática por parte da po- meramente técnicas; ele é fundamental para a pulação e com a necessidade de uma atuação cada consecução de dois objetivos estratégicos aos go- vez mais eficiente por parte do Estado, o limite vernos latino-americanos: para a adoção de deter- entre o que é a tarefa do burocrata e o que cabe ao minada linha de política econômica que garanta político vem-se tornando cada vez mais tênue e, apoio interno e externo ao presidente, sendo por- em alguns casos, há um total “embaralhamento” tanto seu êxito essencial para se obter apoio parla- destas duas funções. Ao ocupar cargos públicos, os mentar, e, ademais, como estrutura utilizada pela políticos precisam responder tecnicamente aos Presidência para controlar a delegação de poderes problemas, e caso não o façam, suas carreiras e responsabilidades na distribuição de cargos públi- podem correr risco. Os burocratas, por sua vez, cos aos aliados. Na verdade, defende-se aqui a tese sobretudo quando ocupam funções do alto esca- de que o Ministério da Fazenda tornou-se o princi- lão, precisam atuar politicamente no sentido de pal núcleo de poder do gabinete presidencial brasi- escolher prioridades e levar em conta interesses e leiro, especialmente no primeiro governo Fernando valores, sejam eles referentes à lógica interna do Henrique Cardoso, constituindo-se, a um só tempo, sistema político, sejam vinculados a determinadas como elemento técnico e político. Seus integrantes, orientações técnicas com maior aceitação na soci- portanto, tornaram-se um dos mais importantes edade. A própria separação entre político e buro- policy-makers do Executivo federal. POLÍTICA E BUROCRACIA NO PRESIDENCIALISMO BRASILEIRO 71

Assim sendo, o objetivo do artigo é analisar econômica, o que evidentemente conferiu maior quais variáveis explicam a importância e o pode- importância ao posto de ministro da Fazenda e a rio adquiridos pelo Ministério da Fazenda no ga- toda a “equipe econômica” que gira em sua volta. binete presidencial no período democrático re- Além disso, no países presidencialistas latino-ame- cente, mais especificamente no primeiro governo ricanos, nos quais a crise fiscal e as reformas Fernando Henrique Cardoso. Para tanto, iremos econômicas estão no centro de suas agendas polí- estudá-lo no seus planos externo e interno. No ticas, a centralidade política dos ministérios da que tange à dimensão externa, as referências bá- Fazenda é evidente quando se observam, por sicas são o papel crescente da área econômica exemplo, os vínculos particularmente estreitos es- nos governos contemporâneos e a crise fiscal do tabelecidos entre os presidentes da Repúblicas e Estado latino-americano, o funcionamento do sis- seus ministros da Fazenda e, sobretudo, a posição tema político brasileiro e a montagem dos gabi- de líderes presidenciáveis destes ministros, como netes presidenciais ao longo da redemocratiza- foram os casos de Fernando Henrique Cardoso, no ção. No âmbito interno, por sua vez, analisare- Brasil, Domingos Cavallo, na Argentina, e Alejan- mos as estruturas de poder formais e informais dro Foxley, no Chile. do MF, as características profissionais do alto es- Além disso, em um estudo centrado nas calão deste Ministério, além de sua articulação relações entre burocracia e política, como o nosso, com o restante do gabinete, sobretudo com a a escolha do Ministério da Fazenda é particular- Presidência. Os fatores externos serão tratados a mente interessante na medida em que se supõe seguir. Depois, concentraremos a discussão nos que, por sua própria natureza institucional, os fatores internos, resumindo as principais conclu- componentes técnicos das suas decisões (ou seja, sões de extensa pesquisa empírica (Loureiro e a lógica do controle de gastos e da distribuição Abrucio, 1998a e 1998c). rígida de recursos dentro das alocações orçamentá- rias) normalmente sobressaem-se em relação aos componentes estritamente vinculados ao jogo po- O papel da área econômica nos lítico (isto é, a lógica das disputas eleitorais, dos governos contemporâneos interesses federativos, das demandas sociais etc.). Na formação do Estado liberal moderno, o Entretanto, se a luta entre a racionalidade técnica Ministério da Fazenda ou das Finanças constituiu- dos burocratas e a racionalidade política manifesta- se, junto com as Forças Armadas e a Justiça, no se aqui como luta entre Ministério da Fazenda, núcleo central das burocracias governamentais. defensor do ajuste fiscal, e outros ministérios “gas- Depois de toda a expansão das áreas sociais ao tadores”, que pressionam para aumentar os gastos longo da construção dos vários modelos de welfare públicos e atender as demandas de suas clientelas, state, hoje novamente o Ministério da Fazenda — por outro lado não se pode esquecer que a política ou correlato — ganha destaque. Isto porque ele se como luta entre interesses e/ou valores divergen- transformou em agência dominante na estrutura tes está também presente no interior do próprio governamental em razão do imperativo fiscal que Ministério, intimamente imbricada com as escolhas guia os governos em praticamente todo o mundo. técnicas que o presidente realiza e, sobretudo, de É uma era, segundo Flynn e Strehl (1996), em que acordo com os resultados das políticas macroeco- a lógica orçamentária da otimização do input nômicas e seus impactos para a legitimação do prevalece sobre a lógica do output, da produção governo. das políticas em si. Nesse sentido, as relações de poder no alto Na América Latina, este imperativo fiscal escalão (entre políticos e burocratas e destes en- ganhou contornos ainda maiores, com a crise da tre si) configuram-se no Ministério da Fazenda de dívida se somando a um forte ciclo inflacionário. forma bastante específica. Tal especificidade de- Na década de 80 e no início da de 90, os países corre da própria natureza de seus burocratas (e/ latino-americanos viveram sob o signo da urgência ou especialistas recrutados fora da burocracia 72 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 41 que tomam decisões) como atores políticos híbri- menta assim a capacidade presidencial de montar dos. Ou seja, são técnicos especializados que e remontar estruturas administrativas vinculadas ao agem politicamente, levando em conta interesses, seu projeto político, bem como o seu poder de orientações teóricas, políticas e mesmo ideológi- nomeação independentemente dos arranjos buro- cas. Portanto, para os fins deste estudo, são con- cráticos mais perenes. O spoil system constitui-se, siderados políticos os membros da alta burocracia desse modo, em uma das características fundamen- que atuam nas diferentes secretarias do Ministério tais da maioria dos presidencialismos. da Fazenda, não só implementando suas políti- Em segundo lugar, o presidente, sobretudo cas, mas igualmente participando do processo na América Latina, possui poderes legislativos que decisório, e para aí aportando recursos políticos tornam o Executivo bastante forte perante o Con- como a articulação de idéias e interesses e o gresso Nacional (Mainwaring e Shugart, 1997; Fi- saber técnico necessários para a formulação des- gueiredo e Limongi, 1997). Se este poder do sas políticas. Executivo for acrescido do enfraquecimento insti- Mas antes de estudar especificamente estes tucional do Legislativo — por exemplo, no proces- policy-makers do Ministério da Fazenda, é funda- so orçamentário —, a carreira da classe política vai mental entender os dois outros fatores externos: o ser direcionada mais para os postos no Executivo. funcionamento do presidencialismo brasileiro e a Este é o caso típico do Brasil, onde a meta principal montagem dos gabinetes ao longo da redemocra- do parlamentar não é a reeleição, mas ocupar tização. cargos no Executivo, de todos os níveis de gover- no, que potencializem sua carreira política (Abru- cio e Samuels, 1997). Presidencialismo e burocracia Se as duas características acima contribuem no Brasil: a formação dos gabinetes mais para o fortalecimento do presidente, há uma ministeriais da redemocratização outra que o enfraquece. Trata-se da necessidade A estrutura da alta burocracia de qualquer de o Executivo obter apoio parlamentar em um país depende, em grande medida, da relação entre sistema em que não há vinculação imediata entre o sistema político e a administração pública. Neste os dois Poderes — ao contrário, o presidencialismo sentido, o sistema de governo, o sistema partidário, é por princípio baseado no governo dividido. a organização político-territorial e a permeabilida- O caso brasileiro possui as três características de política da alta burocracia são variáveis funda- acima apontadas e, historicamente, a montagem mentais. do gabinete presidencial passa pelo convívio de No Brasil, a variável político-institucional características majoritárias e consociativas (Couto, mais relevante é o presidencialismo. Segundo 1997). Dentre as características consociativas, des- Shugart e Carey (1992), o sistema presidencialista tacam-se, primeiro, o grande número de partidos tem as seguintes caracterísiticas: eleição popular relevantes no Congresso, a indisciplina partidária e do chefe do Executivo; mandatos fixos para os as constantes mudanças de legenda, obrigando o poderes Executivo e Legislativo, e não dependen- presidente a montar um gabinete bastante hetero- tes de confiança mútua; chefe do Executivo no- gêneo e difícil de controlar — mesmo no primeiro meia e dirige a composição do governo, além de governo de Fernando Henrique, considerado forte ter poderes legislativos outorgados pela Consti- em comparação ao restante da história republicana tuição. brasileira, o presidente precisou dividir o seu A partir desta caracterização, constatam-se Ministério com cinco partidos, com fidelidade nem três efeitos mais gerais do presidencialismo na sempre garantida. formação da alta burocracia. O primeiro é que o A estrutura federativa, por sua vez, tem um presidente torna-se, de fato, o construtor de seu caráter centrífugo, dando bastante autonomia polí- gabinete, e não o partido majoritário ou a coalizão tica aos estados e tornando-os colégio eleitoral da vencedora, como ocorre no parlamentarismo. Au- eleição nacional, exatamente num contexto de POLÍTICA E BUROCRACIA NO PRESIDENCIALISMO BRASILEIRO 73 fragilidade dos partidos na organização da carreira reiras, tema pouco tratado pela Ciência Política da classe política. Disto resulta, entre outras coisas, brasileira. Na verdade, nossa administração públi- que a lealdade dos parlamentares vincula-se, mui- ca foi montada a partir de cargos e não de carreiras. tas vezes, mais aos seus estados do que aos Deste modo, em geral o topo do organograma partidos ou a uma lógica nacional (Mainwaring, estatal não é preenchido necessariamente por fun- 1999; Abrucio, 1998). Deste modo, o presidente, cionários de carreira do Estado, mas sim por meio para obter maioria, terá de responder não somente de nomeações.4 Há, aparentemente, uma maior às lideranças políticas instaladas em estruturas fragilidade burocrática diante das injunções políti- centralizadas, mas também às bases locais. cas. Tal afirmação esconde um aspecto importante: A estas características consociativas soma-se parte significativa do alto escalão é ocupada por outra de cunho majoritário: o forte poder da determinados grupos que estão sempre em cargos Presidência da República em nosso sistema políti- comissionados, sobretudo porque a forte rotativi- co. Sua explicação está, inicialmente, na dinâmica dade ministerial leva os políticos a escolherem personalista presente na figura do presidente, tan- burocratas com experiência e conhecimento da to no momento eleitoral como no governativo. máquina. Os “bons esplanadeiros”,5 como os defi- Este caráter não diz respeito apenas à cultura niram vários entrevistados, são fundamentais para política; ele já está instalado nas instituições e no o funcionamento do presidencialismo brasileiro e modus operandi do sistema político e do Executi- para a sobrevivência da classe política que o vo, e a criação das medidas provisórias,3 na Cons- sustenta. tituição de 1988, veio reforçar este aspecto. De A argumentação acima poderia ser refutada modo que o presidente será quase sempre a pela constatação de que, na grande maioria das liderança a iniciar o jogo político. Além do mais, vezes, estes burocratas circulam de um ministério para ganhar autonomia ante os compromissos para outro, resultando em baixa estabilidade orga- políticos assumidos num sistema consociativo, o nizacional e, por conseguinte, em descontinuidade presidente cria estruturas paralelas de poder e de políticas. Mas o fato mais relevante aqui é que fortalece determinados nichos de insulamento bu- os burocratas com maiores qualidades técnicas e rocrático. É como se o presidente, por um lado, capacidade de mobilização política permanecem, a distribuísse poder para obter apoio político e, por despeito das mudanças de governo. Embora con- outro, tivesse também que reconcentrar outra par- figurando um padrão informal, tal característica é cela de poder para conseguir de fato reduzir ao crucial para o funcionamento estável do presiden- máximo a dispersão causada pela barganha de cialismo brasileiro. cargos e, assim, “controlar” os aliados e realizar as Este padrão, é bem verdade, estabeleceu-se suas políticas prioritárias. A forma mais utilizada mais claramente e de forma mais continuada no para obter apoio parlamentar, nesse caso, é o Ministério da Fazenda, objeto de nosso estudo. loteamento dos principais postos governamentais, Neste caso, as carreiras têm uma importância maior com seu efeito paradoxal: garante a maioria ao do que nos outros ministérios, mas há um conjunto presidente mas pode reduzir sua capacidade de de técnicos que tem permanecido no MF sem controlar a delegação de funções na montagem de pertencer às carreiras internas. O poder de mobili- seu gabinete. Este é o dilema da governabilidade zação política, o conhecimento da “máquina” e a do presidencialismo brasileiro. Como veremos, adoção de um receituário cada vez mais hegemô- não é um dilema que leva inexoravelmente à nico de soluções para os problemas econômicos ingovernabilidade, como argumenta parte da lite- são as características comuns a este corpo de ratura, mas cuja resolução depende de uma enge- funcionários que tem tido “cadeira cativa” no alto nharia política complexa, envolvendo vários ele- escalão do Ministério da Fazenda. A estes se mentos. somam os que vêm “de fora”, provindos da univer- Uma última característica mais geral do presi- sidade e/ou do setor privado, cujos nomes não se dencialismo brasileiro refere-se à estrutura de car- alteraram tanto como nos outros ministérios. Tais 74 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 41 nomes, entretanto, revezam-se em função de mu- parte da classe política e também a uma parcela danças nas orientações da política econômica e da significativa dos principais núcleos técnicos não- confiança do presidente e do ministro da Fazenda. governamentais, a Nova República significou a Em resumo, nem na área fazendária, uma das oportunidade de acesso a estes postos para os mais insuladas, há uma completa vinculação entre vários grupos políticos. A partir de amplo estudo carreira e cargos do alto escalão como nos países sobre a escolha de todos os ministros e ocupantes parlamentaristas; no entanto, há um número signi- de secretarias vinculadas à Presidência da Repúbli- ficativo de técnicos, do governo federal ou não, ca, desde o governo Sarney até o final de 1997,6 que têm permanecido nestes postos, não ocorren- constatamos, em primeiro lugar, uma grande insta- do aqui um modelo completamente aberto, como bilidade ministerial ao longo da redemocratização o gabinete presidencial brasileiro é caracterizado brasileira, como mostra a Figura 1. Note-se que o pela literatura. Embora as carreiras sejam mais governo Sarney teve a maior taxa de renovação importantes neste ministério do que nos demais, a ministerial, ao passo que o governo Fernando permanência do técnico vai depender, repetindo o Henrique Cardoso obteve a menor taxa,7 por argumento acima, da mobilização política, de ele razões que explicaremos depois. ser um “esplanadeiro” e de atuar conforme um Tais dados tornam-se mais expressivos se receituário técnico que se tornou hegemônico. observarmos que as taxas de rotatividade ministe- Estas três características mostram cabalmente rial no Brasil são muito maiores do que as do como até na Fazenda os técnicos — de fora ou de restante da América Latina e de outros países em dentro do governo — precisam atuar politicamen- desenvolvimento. Segundo Naím (1996), os minis- te, isto é, têm de se tornar técnicos-políticos. tros na América Latina, no período 1988-93, perma- Além destas características mais gerais do neceram no cargo por apenas 14,6 meses em sistema político, temos de entender o provimento média. Se forem excluídos países como México, dos cargos de alto escalão do Ministério da Fazen- Chile e Colômbia, que apresentam ocupações mi- da no contexto da formação dos gabinetes presi- nisteriais mais longas, a média do continente cai denciais da redemocratização do país. O fim do para 11,5 meses. No conjunto desses países, algu- período autoritário levou a um aumento da compe- mas áreas como os ministérios do Trabalho, da tição política pelos cargos de alto escalão. Após Saúde e da Educação têm rotatividade maior do vários anos em que o provimento da alta função que a das pastas econômicas. A Figura 2 expressa pública do governo federal esteve fechado à boa melhor esta situação.

Figura 1 Número de Pessoas que Ocuparam Cargos de Ministros e nos Demais Órgãos da Presidência da República

Taxa de Renovação: FHC FHC = 1,15 Itamar = 1,72 ITAMAR Collor = 1,77 Sarney = 2,34 COLLOR

SARNEY P = n. de Pessoas 0 10203040506070

Obs.: No caso de Fernando Henrique Carsoso, o cálculo da taxa de renovação vai até dezembro de 1997, antes das reformas ministeriais do primeiro semestre de 1998. POLÍTICA E BUROCRACIA NO PRESIDENCIALISMO BRASILEIRO 75

Figura 2 Número Médio de Meses em que Permanecem no Cargo os Ministros dos Países em Desenvolvimento (1988-1993)

Os meses de um ministro no cargo

Cingapura

México

Botsuana

Malásia

Espanha

Chile

Colômbia

Tailândia

América Latina

Venezuela

Coréia

ALC, exceto México

Argentina

Peru

Brasil

0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 Número de Meses

Fonte: Chiefs of state and cabinet members of foreign governments. Periódico do governo norte-americano (1988-1993), apud Naím (1996, p. 251).

No caso do governo Sarney, a explicação do Congresso Nacional. Collor, assim, esqueceu-se para a instabilidade ministerial está, primeiro, na de que no presidencialismo, sobretudo quando heterogeneidade da aliança que dera base à Nova somado a um alto grau de consociativismo, como República, e portanto o número de “pretendentes é o caso brasileiro, não se pode governar sem legítimos” era alto. Além disso, o presidente José lotear a estrutura ministerial, em maior ou menor Sarney precisou recorrentemente afirmar o seu medida. Mais do que isso, como mostrou Octávio poder perante os integrantes da Aliança Democrá- Amorim Neto (1994, p. 25), os presidentes brasilei- tica, elevando o conflito pela disputa dos cargos. ros com maior estabilidade governativa foram Mas a competição política por cargos públi- aqueles que dividiram o governo com o maior cos continuou alta nos outros governos. A explica- partido no Congresso, e na primeira parte de seu ção baseada na fragilidade do governo Sarney não mandato, exatamente a mais longa (um ano e dá conta deste fenômeno. A instabilidade ministe- meio, num período de dois anos e meio), Fernan- rial, como visto na Figura 1, continuou nos gover- do Collor praticamente alijou o PMDB da partilha nos Collor e Itamar. No primeiro, a explicação do poder. conjuntural está no erro de sua estratégia inicial de A instabilidade ministerial do governo Itamar querer governar e montar seu gabinete a despeito explica-se conjunturalmente por dois fatores. O 76 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 41 primeiro e mais importante é o da relação entre o portantes na montagem dos gabinetes presidenci- tipo de coalizão montado inicialmente e as caracte- ais. Dados de nossa pesquisa, analisados mais rísticas peculiares da liderança do presidente Ita- adiante (Figura 3), e os coletados por Rachel Mene- mar. O caráter inicial de coalizão pró-impeachment guello (1998) e Octávio Amorim Neto (1994) de- obrigou o presidente a, num primeiro momento, monstram claramente isto. No entanto, há um dividir a composição do governo com uma ampla contingente de partidos relevantes muito alto no coalizão, maior até do que a da Nova República. Ao Brasil se comparamos a outros países de gabinete longo do governo, o resultado desta ampla coalizão dividido — já chegamos a ter oito no período foi sendo remodelado pelas escolhas de Itamar, que Itamar, alcançando um padrão bem acima do presi- queria imprimir uma feição própria ao gabinete. dencialismo latino-americano e só perdendo para o Aliás, o governo Itamar foi aquele em que as presidencialismo polônes no período de Lech Wa- escolhas pessoais mais pesaram no provimento lessa (Linz e Stepan, 1996). Desse modo, o processo ministerial, como veremos depois, e em que os de divisão do governo é mais fragmentador no caso motivos meramente idiossincráticos mais atuaram brasileiro, dificultando o controle da delegação e, na demissão ou nomeação de um ministro. Só no assim, criando maiores incertezas aos governantes. Ministério da Fazenda, teve mais Diante desta situação, os presidentes muitas vezes ministros do que Sarney (seis contra quatro), sendo têm sido impelidos a fazer sucessivas alterações no que seu governo durou a metade do cumprido pelo organograma estatal ou nos postos ministeriais para primeiro presidente da redemocratização. Além tentar recuperar poder ou aumentar a capacidade deste fator, como Itamar teve o final de seu governo de monitoramento dos cargos distribuídos. marcado pela composição em torno de uma campa- A disputa acirrada por cargos ministeriais, nha presidencial, ele teve de adaptar e readaptar ademais, é impulsionada pelo mote principal da seu Ministério de acordo com as injunções vincula- carreira típica da classe política brasileira: a prefe- das à candidatura de Fernando Henrique Cardoso à rência por obter cargos no Executivo a fortalecer Presidência da República. institucionalmente o Legislativo. Este é um terceiro Estes fatores conjunturais ajudam a explicar fator que favorece a instabilidade ministerial. É mas não respondem por completo o problema da interessante comparar aqui, ainda que brevemente, instabilidade ministerial na redemocratização. De o caso brasileiro com o provimento de cargos modo que quatro outros fatores estruturais devem ministeriais no presidencialismo norte-americano. ser agregados. O primeiro, de cunho mais estrutu- Regras constitucionais que impedem a participação ral, vincula-se à crise do Estado desenvolvimentista, simultânea em mais de um Poder e a predominân- iniciada na década de 80, e à dificuldade de se cia do bipartidarismo fazem com que, nos EUA, o constituir uma nova aliança hegemônica no país posto de secretário, equivalente ao de ministro, não (Sallum Jr., 1996). O fato é que pelo menos os três seja atrativo para os membros do Congresso. Ao primeiros governos do período pós-autoritário (Sar- contrário, ocupar o posto de secretário pode signifi- ney, Collor e Itamar) sofreram muito com esta car, em muitos casos, um declínio na hierarquia de situação, pois tinham menos recursos para distribuir poder e de prestígio. No gabinete, o político estadu- à sua base — o que a tornava mais instável — e nidense será um subordinado ao presidente, ao menor capacidade de organizar a ação coletiva para passo que como congressista poderá estar numa resolver a “urgência econômica” que o país vivia. posição mais simétrica, já que nos EUA efetivamen- Assim, o apoio político-parlamentar foi estreitamen- te há uma separação e equivalência dos Poderes te vinculado aos sucessos momentâneos, sobretudo (Jones, 1995). Isto pode ser constatado no processo os alcançados com os planos de estabilização. orçamentário, no qual o Congresso norte-america- O segundo fator refere-se à necessidade de no tem um grande poder, ao contrário do que repartir o gabinete com um grande número de ocorre no Brasil, onde os parlamentares buscam partidos. Ao contrário do que grande parte da postos executivos para terem, de fato, participação literatura afirma, os partidos são instrumentos im- no manejo dos recursos públicos. Portanto, dados POLÍTICA E BUROCRACIA NO PRESIDENCIALISMO BRASILEIRO 77

Figura 3 Critérios Predominantes de Nomeação de Ministros e Secretários Especiais da Presidência da República nos Governos Sarney, Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso

Totalização de pontos por Critério/Governo 55

45

35

25 Total de Pontos 15

5 Sarney Collor Itamar FHC

Governos Pesquisados

Partidário Federativo Técnico Grupos de Interesse Imagem Pessoal

Fonte: Loureiro e Abrucio (1998c). estes incentivos, são raríssimos os casos nos Estados seis critérios — partidário, federativo, técnico- Unidos em que congressistas deixam seus cargos político, imagem, grupo de interesse e pessoal.9 para ocuparem uma secretaria.8 Os pressupostos básicos são que os critérios não O quarto elemento causador da instabilidade são excludentes entre si e que as indicações envol- ministerial é a necessidade de se conjugar diversos vem uma combinação entre estes mesmos critéri- critérios na indicação dos ministros. Não só o os, o que nos levou a conferir pesos de 1 a 6 critério partidário, mas também o federativo é conforme a importância de tais aspectos em cada fundamental, dada sua importância na lógica da nomeação. Para confeccionarmos um mapa do carreira política. Igualmente, o critério pessoal provimento dos postos ministeriais ou correlatos, ganha relevância como modo de o presidente utilizamo-nos de dados biográficos (participação preencher postos estratégicos do gabinete com em partidos ou entidades da sociedade civil, ori- nomes de sua inteira confiança, a fim de contraba- gem regional etc.), documentos oficiais, de im- lançar os problemas de delegação de nosso siste- prensa, e entrevistamos um amplo leque de pesso- ma. Por fim, o critério técnico é cada vez mais as que ocuparam (ou ainda ocupam) cargos estra- essencial, uma vez que os políticos têm de realizar tégicos, pedindo-lhes que indicassem um peso (de trade-offs entre a conquista de cargos para a 1 a 6) a cada um dos nomeados.10 A Figura 3 revela distribuição de recursos às clientelas e a busca de os resultados. racionalidade e legitimação das políticas junto à A figura acima indica que os critérios prepon- opinião pública — sobretudo porque não há um derantes no governo Sarney, caracterizado por preenchimento imediato dos postos do alto esca- grande instabilidade ministerial, foram o partidário lão por critérios meramente burocráticos. e o federativo. Isto se explica pelo interesse do Traçamos, então, um perfil das escolhas mi- presidente em dividir ao máximo os cargos do alto nisteriais ao longo da redemocratização segundo escalão com as bancadas estaduais e partidárias. O 78 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 41 que, aliás, não lhe garantiu alto grau de governabi- O governo Fernando Henrique, como se lidade. Collor, por sua vez, priorizou inicialmente apreende dos dados acima, tem sido aquele com o critério de imagem, uma vez que fora eleito maior estabilidade ministerial e em que há um contra os políticos (os “marajás”), e tentou, assim, predomínio forte do critério técnico, seguido estabelecer-se como um presidente acima do siste- pelo partidário. Fica a pergunta: por que o perfil ma político. Sua visão cesarista logo foi dissipada, do gabinete do presidente Fernando Henrique pois não poderia governar no presidencialismo Cardoso é diferente daquele dos governos anteri- consociativo brasileiro sem o Congresso Nacional. ores? Em primeiro lugar, porque o presidente Contudo, oito meses depois de incluir em seu Fernando Henrique Cardoso tinha em seu primei- governo os partidos e o jogo federativo, Collor ro mandato uma situação financeira melhor do começou a sofrer as denúncias de corrupção que que a dos demais presidentes do período pós- atingiram os seus cinco últimos meses de governo. autoritário. É fato também que parte desta situa- Neste período, ele novamente apostou no critério ção foi construída na gestão de Fernando Henri- da imagem no provimento ministerial, agora por que no Ministério da Fazenda. E aqui encontra- motivos diferentes: tratava-se de colocar pessoas mos a segunda resposta para entender a peculia- reconhecidas pela sociedade por seu comporta- ridade do atual gabinete ministerial: em grande mento ético, e desta forma contrabalançar as de- medida, o gabinete do presidente Fernando Hen- núncias de corrupção. rique representou uma continuidade de seu man- Itamar priorizou, no início de seu governo, o dato de “primeiro-ministro”. Ou seja, o presidente aspecto partidário, porque precisava do suporte da colocou pessoas de sua confiança e que estavam classe política para lhe assegurar a legitimidade na Fazenda ou participaram de sua gestão no necessária após o impeachment. Com o tempo, o Ministério das Relações Exteriores em vários pos- presidente procurou autonomizar-se e os critérios tos importantes no governo. Isto tem resultado pessoal e técnico ganharam importância, tornando- em uma maior estabilidade ministerial, pois tais se os mais utilizados durante o governo, como pessoas são classificadas no mercado político de mostra a Figura 3. Isto ocorreu por duas razões: cargos como “da cota do Planalto”. primeiro, pelo próprio perfil do presidente, sempre Mais importante ainda, o estrondoso sucesso inseguro quanto ao apoio político e deste modo político do Plano Real fez com que os aliados, chamando seus amigos mais próximos para auxiliá- dependentes do apoio do governo para otimizar lo. Daí surgiu a “República do pão de queijo”, o que suas carreiras políticas, fornecessem uma maior também, por tabela, deu um peso significativo ao independência a Fernando Henrique na monta- critério federativo, mais especificamente a Minas gem do gabinete. Deste modo, os excelentes resul- Gerais. Mas é a segunda razão a essencial. Entre tados econômicos sustentados pelo Ministério da 1993 e 1994, o perfil técnico do governo se acen- Fazenda propiciaram à Presidência, a um só tem- tuou, fenômeno causado e reforçado, sucessiva- po, o aumento da capacidade de negociação junto mente, pela escolha de Fernando Henrique para o ao Congresso e do controle sobre a montagem dos Ministério da Fazenda, pelo sucesso de seu plano ministérios. de estabilização econômica e por sua conseqüente O presidente contou também, em seu primei- transformação em candidato do establishment e dos ro mandato, com uma boa dose de virtù na grandes partidos, vacinados pelo episódio Collor e estratégia de montagem do gabinete. Ao contrário contrários à candidatura Lula. Na verdade, Fernan- da estratégia Collor, Fernando Henrique estrutu- do Henrique atuou no final do mandato de Itamar rou, sim, seu governo com base na distribuição de como um verdadeiro primeiro-ministro, e toda a cargos importantes aos partidos e, em menor me- política governamental ficou atrelada ao êxito de dida, aos governadores aliados, inclusive loteando sua gestão no Ministério da Fazenda. O aumento do os cargos de segundo e terceiro escalões nos componente técnico neste governo foi, em grande estados — e aqui conta mais a variável federativa medida, uma conseqüência disso. —, porém, colocando em postos estratégicos pes- POLÍTICA E BUROCRACIA NO PRESIDENCIALISMO BRASILEIRO 79 soas de estrita confiança e que possuíam grande alguns países, como o Japão e a França, mudam-se conhecimento da máquina. Com isso, garantiu apenas algumas dezenas de pessoas a cada gover- maior capacidade de monitoramento sobre os no, em países presidencialistas como os Estados cargos distribuídos segundo a lógica da obtenção Unidos e o Brasil esse número se eleva substanci- de maioria parlamentar. Entram aqui sobretudo os almente (Schneider, 1995). secretários executivos, cargo equivalente ao vice- Assim, existem poucas carreiras estruturadas ministro, grupo cujo perfil era composto, em sua em nosso setor público, tais como a militar (Coe- maioria, da combinação de duas caracterísiticas: lho, 1976), a diplomática (Cheibub, 1990), a do são pessoas que obtiveram a confiança do presi- magistério de ensino superior, algumas dentro do dente ou de auxiliares próximos a ele durante o Ministério da Fazenda, como a de auditor da período de governo de Itamar Franco e que, ao Receita Federal e a de analista de finanças e mesmo tempo, eram “esplanadeiras”.11 controle etc. Estudo anterior indicou que, em 1993, A chave para obter o controle da distribuição quase a metade (47,3%) dos funcionários públicos de cargos, por fim, foi obtida alçando um ministé- brasileiros estava agrupada em uma categoria sem rio em particular a um status não só acima dos especificação precisa, denominada PCC (Plano de demais, como também responsável pela fiscaliza- Cargos e Carreira), e menos de 15% dos servidores ção de todos os outros ministérios a partir do encontravam-se em uma carreira estruturada ângulo financeiro. Trata-se do Ministério da Fazen- (Abrucio, 1993). Não há nenhuma indicação de da. Além de este governo estar intrinsecamente que esta situação se tenha alterado. Diferentemen- ligado à lógica financeira, como quase todos na te de outros países, especialmente europeus, as América Latina, o MF constituía, basicamente, a carreiras públicas no Brasil limitam-se a apenas um “casa” dos técnicos que participaram da gestão cargo. Nesse sentido, nossa administração pública, bem-sucedida do Plano Real, sob o comando do como já mencionado antes, está mais próxima do então ministro Fernando Henrique. modelo americano, em que o cargo e não a carreira A grande estabilidade de Pedro Malan no estrutura o avanço profissional. Isso terá reflexos cargo é a maior prova do caráter estratégico adqui- no provimento do alto escalão governamental. rido pelo Ministério da Fazenda. Enquanto, nos Pode-se afirmar que o provimento dos cargos outros governos da Nova República, houve trocas do alto escalão é bastante aberto à nomeação constantes de ministro, Malan permaneceu no política, dadas as características do sistema presi- cargo por todo o primeiro governo Fernando dencialista e a ausência de carreiras aí estruturadas. Henrique Cardoso e por lá se manteve no gabinete Distribuindo o conjunto dos ministérios em função inicial do segundo mandato. do seu grau de abertura à nomeação política É neste contexto político-institucional que (entendida aqui como distinta da nomeação buro- estudaremos a lógica de provimento do alto esca- crática), pode-se indicar o seguinte continuum: lão do Ministério da Fazenda e o funcionamento da estrutura de poder no seu interior. Ministérios Ô Itamaraty Ô MF Ô Demais militares ministérios (mais fechados) (mais abertos) O provimento de cargos do alto escalão: o caso do Ministério Analisaremos aqui como se manifesta a no- da Fazenda meação política para os altos escalões do Ministé- O preenchimento dos cargos da alta burocra- rio da Fazenda (MF). Para os fins dessa análise, cia no sistema presidencialista brasileiro funciona consideramos alto escalão os ocupantes de cargos basicamente através de nomeações políticas. Além de DAS-6, DAS-5 e DAS-412 distribuídos nas suas do ministro e seus assessores mais imediatos, diversas secretarias. Do ponto de vista formal, grande parte da alto escalão é também preenchida todos os ministérios do governo federal estrutu- por meio de diferentes critérios políticos. Se em ram-se em secretarias. No caso do Ministério da 80 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 41

Fazenda, há sete secretarias e duas subsecretarias. Com relação ao provimento dos cargos de Dentre as diversas secretarias, as mais importantes alto escalão do MF, embora as carreiras internas são a do Tesouro Nacional, a da Receita e a de sejam fonte importante de recrutamento, elas não Política Econômica. No Tesouro encontra-se o constituem a única nem tampouco a mais rele- poder de liberar ou segurar as verbas orçamentári- vante forma de acesso a estes postos. O que terá as. O peso da Receita reside em sua função arreca- obviamente efeitos sobre a distribuição do poder dadora. E a Secretaria de Política Econômica, como no Ministério, como se verá a seguir. São três as órgão principal de assessoria do ministro, elabora principais fontes de recrutamento de quadros as orientações gerais para as políticas econômicas para a alta burocracia do MF: (a) funcionários de do governo. outros órgãos da burocracia governamental, tais Selecionando os aspectos mais relevantes do como Banco Central, Banco do Brasil, SERPRO, perfil do alto escalão governamental brasileiro,13 IPEA etc., órgãos considerados fornecedores de pode-se constatar que, no conjunto da União, os mão-de-obra; (b) profissionais externos aos mei- funcionários DAS representam pouco mais de 3%, os governamentais, da universidade ou vindos da ao passo que no MF este percentual é três vezes iniciativa privada; (c) funcionários de carreiras superior, atingindo 9,29% do total de seus funcio- internas do MF. nários. Tal dado ajuda a reforçar a idéia da impor- De acordo com os dados de 1998, a maioria tância estratégica do MF no gabinete presidencial dos ocupantes de cargos de DAS-6 e mais o brasileiro. Além disso, há outros importantes pon- secretário executivo provinham de outros órgãos tos de diferenciação do perfil dos DAS do MF em governamentais, preenchendo dois terços dos pos- relação ao restante da administração pública fede- tos. Também era significativa a participação de ral. O provimento do alto escalão do MF é feito pessoas externas aos meios governamentais (1/3), predominantemente com pessoas do próprio Po- originárias dos meios universitários e empresariais. der Executivo, originárias de diferentes agências No primeiro governo Fernando Henrique, nenhum governamentais. Enquanto, na União, cerca de secretário originou-se das carreiras internas do 40% dos DAS-5 e DAS-4 e mais de 48% dos DAS-6 Ministério, mostrando que, mesmo em uma estru- são recrutados fora das agências governamentais, tura predominantemente técnica como a Fazenda, na Fazenda as nomeações de pessoas externas há um descolamento entre carreira e cargo no alto caem bastante, reduzindo-se para menos de 15% escalão. Este fato agrega mais um indicador para o no nível de DAS-6. Isso significa que, se no MF o nosso argumento de que os cargos do topo do recrutamento do alto escalão se faz sobretudo organograma estatal são essencialmente políticos, entre quadros burocráticos governamentais, na isto é, providos por vínculos de afinidade e confi- União esse recrutamento ocorre principalmente ança política no sentido amplo. conforme critérios partidários e/ou federativos. Tomando como exemplo o caso da Secretaria Outra característica distintiva encontra-se no do Tesouro Nacional, constata-se que o provimen- maior nível de escolaridade dos DAS da Fazenda, to de grande parte dos DAS-5 e DAS-4 dessa comparativamente ao dos demais DAS federais. secretaria foi feito com quadros vindos de outros Por exemplo, apenas 7% dos DAS-5 do Executivo órgãos governamentais, tais como IPEA, Banco federal têm títulos de mestrado e/ou doutorado, ao Central etc. Além disso, examinando alguns exem- passo que essa porcentagem atinge mais de 17% plos de trajetórias de carreira de membros atuais da entre os DAS-5 no MF. No nível de DAS-6 a alta burocracia do MF, destaca-se que estas podem disparidade acentua-se muito mais: somente 8,3% ser diferenciadas em dois tipos principais: trajetória dos ocupantes desse nível têm pós-graduação, ao intragovernamental e trajetória mista, envolvendo passo que no MF mais de 42% do total possuem tal governo e vinculações externas. A trajetória intra- titulação. Esses dados reforçam o perfil predomi- governamental é desenvolvida por membros da nantemente técnico dos cargos de confiança do burocracia pública, originários de diferentes ór- Ministério da Fazenda. gãos da área econômica do governo, que fazem POLÍTICA E BUROCRACIA NO PRESIDENCIALISMO BRASILEIRO 81 sua vida profissional predominantemente dentro especificidade de nomeações políticas que não se do governo; a trajetória mista é realizada por fazem pelos critérios mais comumente utilizados. pessoas que passam transitoriamente pelo gover- Se a participação em uma determinada carrei- no, vindos dos meios universitários e/ou de con- ra é critério para garantir certa exclusividade no sultoria privada, para onde retornam depois da provimento de cargos, havendo inclusive disputas experiência no Executivo. em determinadas secretarias, como a STN, entre Conforme indicado em trabalho anterior profissionais de carreira e os de fora,14 a carreira, (Loureiro e Abrucio, 1998b), o exame de várias em si, não é fonte de poder, nem de acesso à alta trajetórias de carreira mostrou que os titulares das burocracia. No caso da Procuradoria da Fazenda secretarias, tanto quanto o ministro e o secretario Nacional, por exemplo, o escolhido provinha da executivo, mesmo em um ministério técnico assessoria jurídica do Banco Central e não da como o da Fazenda, foram nomeados politica- carreira específica. Isto reforça a natureza política mente. Em outras palavras, se as carreiras inter- dos cargos de alto escalão, tal como temos definido nas do MF detêm praticamente o monopólio de este conceito até agora. cargos em certas áreas, como na Secretaria da A utilização de critérios político-partidários Receita Federal e na Secretaria Federal de Contro- ou federativos ocorre em maior grau nos órgãos le, esse monopólio não atinge os níveis mais federais instalados nos estados, inclusive no Mi- elevados. Nesse sentido, pode-se afirmar que a nistério da Fazenda, o mais imune às pressões carreira não é fonte “natural” de poder, isto é, ela políticas. Em São Paulo, caso que estudamos, o sozinha não dá a seus membros acesso automáti- delegado do Patrimônio da União foi indicação co aos cargos de direção, senão quando associa- do senador Romeu Tuma, do PFL, um dos parti- da a critérios políticos. dos que dá sustentação ao Executivo federal. E o Cabe repetir o que foi classificado antes delegado de Assuntos Administrativos do MF foi como nomeação política. De um lado, procuramos indicação do PMDB paulista, em particular do diferenciá-la da nomeação burocrática e, de outro, deputado federal Michel Temer. É bem verdade procuramos ampliá-la, ultrapassando a noção que que estas indicações políticas foram contrabalan- comumente a identifica apenas a processos nos çadas pela nomeação do superintendente da Re- quais operam pressões de partidos, de bancadas ceita Federal em São Paulo, Flávio Del Comuni, regionais, de grupos de interesses etc. Assim, diretamente escolhido e respaldado pelo ministro considera-se nomeação política, em um primeiro Pedro Malan. Com esta decisão, a delegação de sentido, aquela que não se orienta por critérios funções do Ministério para sua estrutura descen- previamente estabelecidos, de forma expressa ou tralizada foi garantida. tácita, e que restringe a escolha ao preenchimento É preciso analisar agora como se organiza o de certas condições, tais como ser membro de poder no interior de uma agência, como o Ministé- determinada carreira, ter senioridade etc. É o que rio da Fazenda, em que o critério político se ocorre, por exemplo, nas corporações militares ou manifesta predominantemente nos termos acima na diplomacia. Num segundo sentido, e mais indicados e que se orienta pela lógica do sistema importante ainda, classifica-se de nomeação políti- presidencialista. ca, especialmente em áreas técnicas como o Minis- tério da Fazenda, também aquelas orientadas por Estrutura de poder no Ministério da afinidades pessoais, por orientações teóricas ou Fazenda e seus efeitos no gabinete mesmo ideológicas comuns, que ligam o presiden- te ou o ministro a seus auxiliares e determinam a Como em todo sistema presidencialista, o escolha de alguns técnicos ao invés de outros. Em poder no interior do aparato burocrático no Brasil outras palavras, considerando que as escolhas para advém do cargo e esse origina-se, basicamente, do os cargos da alta burocracia são sempre políticas, respaldo do presidente da República. Nos sistemas pretende-se, com essa distinção, dar conta da presidencialistas, em tese, o relacionamento entre 82 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 41 o chefe do Poder Executivo e os ministros é cípio, o monitoramento das ações do Ministério, fortemente hierarquizado. Os ministros são, segun- tentando diminuir as perdas de agenciamento en- do as regras constitucionais, auxiliares do presi- tre presidente e ministros. dente, livremente nomeados e passíveis de demis- De forma sintética, há basicamente três for- são a qualquer momento por vontade do chefe do mas de delegação de poder e funções no Ministério governo. da Fazenda. A primeira é aquela vinculada à Se todo o poder emana do presidente, ele estrutura formal do organograma, com uma linha obviamente repercute hierarquicamente nos níveis hierárquica muito bem definida. A delegação, aqui, imediatamente inferiores dentro dos ministérios: o vai ser definida pelas relações de confiança entre apoio do presidente sustenta o poder do ministro; os mandantes e os escolhidos e por mecanismos o apoio do ministro sustenta o poder do secretários formais de controle de resultados. O organograma do ministério e assim por diante. Todavia, em tem, portanto, de ser construído segundo linhas de alguns casos, o ministro pode não ter sido escolhi- confiança, e por isso os ocupantes dos altos postos do pelo presidente, mas nomeado por força de costumam ter um estreito relacionamento com negociações necessárias à constituição da coalizão seus superiores, relações estas que podem ser governamental. Mesmo no Ministério da Fazenda, formadas em loci distantes do MF, como o meio de modo geral resguardado da barganha parla- acadêmico ou o mercado. Mesmo naqueles casos mentar, houve situações, na Nova República, em em que os laços de lealdade foram formados no que isto aconteceu. Nessas circunstâncias, o poder setor público, nem sempre o foram através das do presidente pode manifestar-se na escolha do carreiras da Fazenda — o que confirma a hipótese secretário executivo e/ou de outros cargos estraté- de que as carreiras são importantes mas definitiva- gicos, os quais aparecem, então, como “homens do mente não são acesso direto aos cargos da alta presidente”. função pública. Quanto aos mecanismos de con- Embora o Poder Executivo esteja, em princí- trole formal da delegação, estes foram pouco pio, todo concentrado na pessoa do presidente, é citados nas entrevistas, e parece-nos que o agenci- impossível que ele sozinho possa dar conta de amento passa muito pouco por este caminho. todas as atividades do cargo. Conseqüentemente, A segunda forma de delegação é feita para os ele delega autoridade aos ministros para resolver integrantes das carreiras internas do Ministério da três problemas cruciais de coordenação das tarefas Fazenda, delegação esta que, conforme um policy- do Executivo: execução das políticas de governo, maker influente, “é importantíssima para fazer integração dos diferentes departamentos adminis- funcionar a engrenagem da máquina do Ministé- trativos do governo e, em muitos casos, obtenção rio”. A centralidade desta delegação deriva não de apoio político no Congresso (Amorim Neto, apenas da existência formal e perene de tais 1994, p. 12). Estas responsabilidades são, em vários carreiras. Este aspecto é importante, porém não é casos, compartilhadas com o secretário executivo e suficiente para explicar o porquê da delegação demais secretários do Ministério. Além disso, os segura de funções às carreiras internas do Ministé- secretários executivos, que funcionam como “ho- rio. Segundo a grande maioria dos entrevistados, mens do presidente” em ministérios cujos titulares os mandantes (ministro e secretários) sabem que, não são de confiança do presidente, mas foram para além da carreira, há um forte espírito de corpo nomeados para obter apoios parlamentares, têm nestes grupos, vinculado ao rigor das práticas outra função importante: eles exercem o controle administrativas fazendárias. Isto ocorre não apenas institucional através do qual o presidente delega porque todos passaram por um concurso público, autoridade como mandante ou principal e verifica mas também em virtude de esses funcionários o cumprimento de suas diretrizes, a fim de evitar terem uma socialização comum que os une. que as ações de tais agentes se desviem dos Além do mais, as diversas mudanças na objetivos do governo. Os secretários executivos de Fazenda, bem como algumas práticas nefastas confiança do presidente garantem assim, em prin- adotadas no período autoritário (como o Orçamen- POLÍTICA E BUROCRACIA NO PRESIDENCIALISMO BRASILEIRO 83 to monetário), também são fatores que agregaram regras — extremamente importantes — mas são os membros destas carreiras em torno do que deve permeadas por relações informais de poder que ser feito no Ministério. Por fim, e não menos perpassam toda a estrutura administrativa (Crozier, importante, a falta de carreiras no restante da 1981, p. 243). Desta análise, derivamos o terceiro administração pública faz com que os integrantes padrão de delegação na Fazenda, estruturado por das carreiras internas do MF valorizem o seu status relações informais, que vão além e cortam diago- funcional e busquem sempre se diferenciar. Como nalmente as carreiras e os organogramas. nos disse um entrevistado, “é ressaltando a diferen- No alto escalão do Ministério da Fazenda, os ça que eles [originários de carreiras internas do policy-makers estão vinculados, portanto, a uma Ministério] aumentam a sua coesão”. dupla estrutura de distribuição de poder e raciona- Mesmo com este espírito de corpo, tais car- lidade: uma formal, que é importante para enten- reiras “dificilmente formam líderes”, conforme nos der os mecanismos consolidados de mando, e afirmou um membro do alto escalão de longa data outra informal, na qual também há importantes no MF. Ao que nós completaríamos, seguindo as “regras” determinando a estrutura de poder. Além observações de várias entrevistas: se o integrante da hierarquia presente no relacionamento entre o de uma carreira torna-se um agente transformador, presidente e o ministro da Fazenda, as relações de isto ocorre por características que vão além do confiança entre eles, por exemplo, vão ser funda- espírito de corpo. Isto é, a capacidade de liderança mentais para definir a força do ministro. Caso o vai depender do desenvolvimento de habilidades presidente não confie integralmente neste minis- políticas e comunicativas que respondam tanto aos tro, ele poderá “pular” a hierarquia formal e obter ditames dos superiores como às demandas daque- informações sobre a economia com outros inte- les que estão nos escalões mais abaixo. grantes do alto escalão da Fazenda. Essas relações nos remetem à estrutura inter- As relações do Ministério da Fazenda com na de poder no interior do MF. É importante autarquias ou outros órgãos vinculados a ele — ressaltar que esta se baseia não só em estruturas como Banco Central, Banco do Brasil etc. — formais, visualizadas nos diversos níveis hierárqui- variam historicamente, dependendo não só de cos mostrados anteriormente nos organogramas condições institucionais, como as já mencionadas do órgão, mas também em relações informais, anteriormente, mas também das afinidades que como ocorre em todas as grandes organizações e ligam o ministro da Fazenda aos presidentes desses certamente nos demais ministérios do governo bancos. Apesar de formalmente escolher tais car- brasileiro. Isso nos remete às análises clássicas de gos, o ministro da Fazenda não controla inteira- Michel Crozier (1981) sobre o tema, que nos mente o Banco do Brasil, que, como indicaram ajudam a entender melhor o caso do MF. Conside- vários entrevistados, ainda é uma burocracia muito rando que o caráter de neutralidade da burocracia, forte. Também com relação ao Banco Central, as tal como Weber a definiu, não a torna imune à relações de seu presidente com o ministro da existência de uma luta interna de poder, Crozier Fazenda variam e nem sempre se processam sem indica que a burocracia não “preenche de raciona- conflito ou divergências, especialmente quando o lidade” toda a estrutura administrativa, havendo presidente do Banco tem relação mais próxima nichos de incerteza em toda e qualquer organiza- com o presidente da República do que com o ção complexa. Nestes nichos de incerteza, ineren- ministro. tes às organizações complexas, o que predomina No período em questão, o Ministério da Fa- são os padrões informais de distribuição de racio- zenda não controlou por completo algumas agênci- nalidade e poder, convivendo este aspecto com a as da área econômica. O Banco do Brasil, embora estrutura formal da organização. Logo, as organiza- vinculado à Fazenda, teve suas decisões fortemente ções não funcionam de forma mecânica, seguindo marcadas pelas decisões políticas do Planalto. É linearmente aos padrões definidos pelos organo- bem verdade que a gestão da Fazenda no primeiro gramas e procedimentos; as organizações possuem governo de Fernando Henrique pôde controlar 84 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 41 mais o Banco do Brasil do que em outros governos, com o risco de errar e perder a legitimidade obtida mas ainda não o fez segundo a lógica econômica através do Real, [o presidente] optou claramente implantada no interior do MF. A Caixa Econômica por assumir o primeiro custo. (Loureiro, Abrucio e Federal e o BNDES, duas das mais importantes Rosa, 1998, p. 76) agências da área econômica, não somente ficaram fora da estrutura formal da Fazenda, como sua A despeito dos conflitos, esta opção foi a que lógica esteve mais próxima da lógica de obtenção mais fortaleceu o poder de controle da delegação de apoio político, não obstante tais agências atua- por parte do presidente, já que toda a aliança rem mais próximas da racionalidade estabelecida política esteve presa, sobretudo com a aprovação pelo MF neste do que nos demais governos da da reeleição, à manutenção da estabilização eco- redemocratização. Mesmo assim, quando os aliados nômica (leia-se: controle da inflação). ficaram descontentes e o Executivo federal precisou Em seus vínculos externos, a Fazenda estabe- de votos, surgiram empréstimos que obviamente lece relações formais e informais de controle. O não se coadunaram com a lógica geral da Fazenda poder formal mais importante é, claramente, o de — bons exemplos disso foram os empréstimos para liberar e contingenciar recursos por intermédio da a Prefeitura de São Paulo, realizados pela Caixa Secretaria do Tesouro. Através deste poder, a Econômica Federal, e aqueles obtidos pelo governo Fazenda não apenas se autonomiza em relação ao do Estado do Rio Grande do Sul, pela via do BNDES restante do gabinete, ganhando um status ministe- e à revelia do Tesouro Nacional. rial diferenciado; ela também se torna um órgão O caso do BNDES é também interessante para crucial para o presidente da República controlar a notar outra engenharia institucional utilizada pelo delegação de funções nos outros ministérios. As- primeiro governo Fernando Henrique Cardoso. O sim, a barganha política necessária para conquistar grupo que dominou o BNDES foi composto, em maioria tem um contrapeso no poder de manipular boa parte, por setores mais desenvolvimentistas da o Orçamento por meio do Ministério da Fazenda. coalizão governamental, os quais não estavam atre- Informalmente, o MF exerceu seu poder no lados e por vezes se contrapunham diretamente à primeiro governo Fernando Henrique Cardoso ao equipe econômica. A estratégia adotada aqui foi a expandir cada vez mais a lógica economicista para de dividir para governar, uma vez que o insulamen- o restante do gabinete, inclusive com a entrada to da Fazenda não poderia se constituir totalmente à cada vez maior de economistas em outros ministé- revelia de setores importantes do governo, e, ao rios. O Cade é um exemplo disso, pois a briga entre mesmo tempo, tal divisão serviu para testar a a visão jurídica e a econômica resultou em vitórias lealdade da cúpula do MF à Presidência. para o setor vinculado às idéias da Fazenda. Mas é Mesmo com tais divisões, o presidente Fer- na força que o ideário da equipe econômica teve nando Henrique Cardoso optou por uma linha de sobre grande maioria dos secretários executivos política econômica, baseada na âncora cambial, que esteve o poder informal mais relevante no que fortaleceu a dupla Pedro Malan (Fazenda)/ período 1995-98. (Banco Central). Como argumen- tamos em outra ocasião, Considerações finais Fernando Henrique ficou preso à armadilha do O texto procurou analisar a formação do sucesso de seu plano de estabilização, vinculado a gabinete presidencial brasileiro do governo Sarney determinado padrão de política econômica, que ao primeiro governo de Fernando Henrique Car- certamente não era o único, e gerou muitos doso. Em linhas gerais, constatou-se, primeiro, a conflitos dentro do próprio governo. Mas entre o grande instabilidade ministerial no Brasil, sobretu- custo de insular e fortalecer o grupo dominante na do quando comparado a outros países. Segundo, Fazenda e no BC [...] e o custo de ter maior essa instabilidade deriva em grande medida da flexibilidade para mudar tal política econômica junção de características consociativas e majoritári- POLÍTICA E BUROCRACIA NO PRESIDENCIALISMO BRASILEIRO 85 as em nosso sistema, criando uma situação de dose de virtù ao presidente, mensurada pela fortalecimento do presidente e enfraquecimento capacidade de combinar bem os critérios de forma- da capacidade governativa do Congresso, ao mes- ção de maioria parlamentar com os de controle da mo tempo que obriga o chefe do Executivo a delegação, no sentido de reforçar o lado técnico do realizar uma complexa teia de negociações para governo sem levá-lo ao rumo completamente garantir a formação de maioria parlamentar e o oposto aos objetivos políticos dos membros da controle da delegação de funções. coalizão governamental. É bem verdade que esta Para montar seu gabinete, o presidente preci- virtù dependerá da fortuna, dos efeitos das políti- sa, então, realizar uma composição partidária, tor- cas sobre a legitimidade presidencial, como frisare- nando os partidos importantes na função governa- mos adiante. tiva mas enfrentando a dificuldade de articular um Foi exatamente isso que ocorreu no primeiro grande número deles para um mesmo objetivo, mandato do presidente Fernando Henrique Cardo- além de precisar estabelecer alianças com os líde- so, no qual houve uma baixa instabilidade ministe- res regionais mais poderosos. Só que tal negocia- rial e obteve-se um alto grau de controle da ção inicial é necessária para obter maioria parla- delegação. O principal instrumento neste sentido mentar, porém insuficiente para garantir o monito- foi alçar o Ministério da Fazenda (MF) a órgão ramento dos cargos distribuídos. Por isso, ganham superior e controlador do gabinete, espalhando também expressão significativa as variáveis pesso- sua lógica de atuação pelos ministérios por meio al e/ou de imagem, capazes de legitimar a atuação de mecanismos formais e informais. Esta engenha- quase que direta do presidente nos ministérios, e a ria, ressalte-se, dependeu do apoio firme e contí- técnica, essencial numa alta burocracia em que os nuo do presidente ao MF — mantendo o ministro postos mais importantes não são preenchidos por por todo o mandato — e do sucesso deste na critérios burocráticos e sim pelo spoil system, de condução do Plano Real. modo que os políticos vão precisar ter ou indicar A despeito de vários entrevistados terem dito alguém com competência especializada para dar que a Fazenda sempre foi e sempre será poderosa, conta da tarefa de responder ao eleitorado com um percebemos claramente que o MF teve maior grau razoável de racionalidade. Ademais, a Presi- poder no primeiro governo Fernando Henrique dência da República tem de cada vez mais zelar Cardoso do que em outros períodos da redemocra- pelo conteúdo técnico de suas políticas perante a tização e o exerceu de forma diferenciada. As opinião pública, o que a faz interferir ou no razões para isso residem nas funções específicas organograma estatal, criando estruturas paralelas cumpridas por este Ministério neste governo. Sua de poder, ou na escolha de determinados postos, centralidade esteve associada, primeiro, a uma a fim de colocar pessoas que possam garantir o situação marcada pela escassez de recursos e a monitoramento das funções distribuídas por crité- necessidade constante de controlar as contas pú- rios de maioria parlamentar. blicas, resultando num predomínio das políticas de Embora sua constituição seja um processo input definidas pela Fazenda sobre a lógica do complexo e intrincado, o gabinete presidencial output, predominante em quase todo o restante brasileiro não está destinado inexoravelmente à dos ministérios; segundo, à importância do plano ingovernabilidade. Decerto que os três primeiros de estabilização para o sucesso político do presi- presidentes da redemocratização tiveram enormes dente; terceiro, aos laços de confiança estabeleci- dificuldades governativas — algumas, ressalte-se, dos entre o presidente e a cúpula do MF, que se de suas próprias lavras —, mas os instrumentos de originam da gestão de Fernando Henrique na poder da Presidência, somados a resultados em Fazenda no governo Itamar; e, por fim, como políticas públicas que aumentem o grau de legiti- afirmamos acima, à importância estratégica que o midade do chefe do Executivo, podem levar a Ministério da Fazenda teve como controlador dos padrões mais efetivos de controle da delegação de outros órgãos cuja distribuição de poder foi feita funções. Mas, para isso acontecer, é necessária boa para garantir maioria parlamentar. 86 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 41

De forma mais explícita, este controle foi por razões internas à sua estrutura. Em primeiro exercido basicamente pelo poder de liberar e con- lugar, por causa do forte caráter técnico presente tingenciar recursos que tem a Secretaria do Tesouro neste Ministério, aferido pela comparação entre o Nacional (STN). É este, ainda, um dos órgãos mais grau de escolaridade presente na administração poderosos do gabinete presidencial, pois o ritmo da pública federal e o existente no MF.15 Em segundo implantação das políticas dos ministérios depende lugar, novamente de forma contrária ao que ocorre fortemente de suas decisões. Obviamente, o poder no restante do Executivo, há na Fazenda importan- de resistir às pressões por recursos depende dos tes carreiras com grande espírito de corpo e autono- laços de confiança entre o presidente e a Fazenda, mia nas políticas, o que incentiva o cumprimento da bem como da legitimidade do presidente junto à delegação nos níveis inferiores — em outras pala- base parlamentar. Verificou-se que quando o presi- vras, o ethos destas carreiras normalmente garante a dente não controlou ou estabeleceu relações muito boa realização do processo de agenciamento para o conflituosas com a equipe econômica, a dinâmica mandante. Por fim, destaca-se o papel de liderança orçamentária não foi um instrumento efetivo de da alta burocracia do MF, que conseguiu criar uma controle da delegação — tal qual ocorrera no ponte entre as decisões políticas e as técnicas. governo Sarney. Quanto ao apoio da base parla- É igualmente interessante ressaltar que, mes- mentar, ele vai estar intrinsecamente ligado ao êxito mo sendo raras, as injunções partidárias-federati- econômico do presidente — novamente colocando vas aconteceram nas delegacias regionais da Fa- a Fazenda em destaque no sistema político. zenda. Tais cargos são estratégicos para a conquis- O Ministério da Fazenda também exerceu o ta de maioria parlamentar em todos os ministérios. seu poder de controle disseminando informalmen- No caso da Delegacia Regional do MF em São te o seu raio de ação ao restante do gabinete, seja Paulo, observou-se que a estratégia de distribuição pelo aumento significativo de profissionais ligados de cargos orientou-se de forma híbrida, mesclando à área econômica em outros ministérios, seja pela as lógicas. Assim, alguns cargos foram distribuídos tentativa de tornar determinados nichos de poder para assegurar votos no Congresso, porém o minis- vinculados à lógica econômica. No entanto, a tro Pedro Malan indicou para o principal posto afinidade que um grande número de secretários alguém de sua inteira confiança, o qual atuou executivos teve com a equipe econômica foi a como fiscalizador e garantidor da delegação de variável mais relevante. É importante frisar que a funções do nível central para o estadual. Conse- força dos secretários executivos se explica, primei- guiu-se, assim, “matar dois coelhos com uma caja- ro, pela habilidade do presidente em conjugar dada só”: o Ministério preencheu suas funções critérios de maioria parlamentar com os técnico- políticas e técnicas. políticos, e, segundo, pela afinidade informal des- Cabe, finalmente, ressaltar que o êxito da tes com o próprio presidente, muitos deles vindos utilização do Ministério da Fazenda como órgão das gestões de Fernando Henrique na Fazenda e estratégico no gabinete presidencial dependeu no Itamaraty, ou mesmo “descobertos” por ele em fortemente do sucesso do Plano Real. E aqui entra seu período de “primeiro-ministro”, ou ainda indi- uma variável fundamental negligenciada pela lite- cados por ministros de inteira confiança do Planal- ratura atual: o efeito das políticas (policies) nos to. Instrumentos como o dos secretários executivos arranjos políticos imediatos e nos incentivos insti- ou a chamada administração paralela de Juscelino tucionais existentes. Assim, em resumo, podemos Kubitschek constituem válvula de escape impor- dizer que o sucesso do primeiro mandato de tante no presidencialismo brasileiro, mas a grande Fernando Henrique derivou da criação de uma maioria dos presidentes não conseguiu implantá- engenharia interna de controle da delegação vin- los. Um pouco por falta de virtù, mas o insucesso culada basicamente à atuação do Ministério da nas políticas é a variável explicativa mais relevante. Fazenda, das características técnicas e de organiza- O presidente Fernando Henrique, além do ção interna — formal e informal — deste Ministério mais, escolheu a Fazenda como órgão estratégico e do seu papel como disseminador de uma lógica POLÍTICA E BUROCRACIA NO PRESIDENCIALISMO BRASILEIRO 87 financeira ao alto escalão governamental, sobretu- cargos). Quanto mais nos afastamos de 1, maior é o do por meio dos secretários executivos. Entretanto, índice de renovação. Como os governos tiveram manda- tos não equivalentes temporalmente, a TR nivelou estas sem a legitimação da política econômica seria diferenças de duração utilizando padrões médios de provavelmente muito mais difícil chegar a este renovação. arranjo bem-sucedido. 8 De modo geral, os secretários norte-americanos são Neste artigo, procuramos mostrar a importân- membros ou simpatizantes do partido do presidente da cia de aspectos ignorados pelo debate a respeito do República, mas são escolhidos mais por sua notoriedade e saber técnico em uma área específica do que por sua sistema de governo, mas igualmente frisamos que a liderança ou influência dentro da máquina partidária. montagem de nosso gabinete presidencial continua Sobre este assunto ver, entre os principais trabalhos, dependendo de um delicado equilíbrio, da combi- Fenno (1959), Cohen (1988) e Jones (1994 e 1995). nação entre a fortuna em relação aos resultados das 9 A definição de cada um dos critérios está em Loureiro e Abrucio (1998c, pp. 7-8). É importante frisar apenas o políticas e a virtù da ação da Presidência da significado de um deles, mais controverso. Trata-se do República. Portanto, mesmo não resultando numa critério técnico-político, que ganha este nome porque ingovernabilidade endêmica, o presidencialismo os cargos do alto escalão brasileiro não são automatica- brasileiro precisa de reformas institucionais que mente preenchidos pela burocracia, mas, sim, por no- meações políticas, configurando um sistema de spoil facilitem mais a vinculação da formação de maioria system. Isso faz com que o técnico seja escolhido parlamentar com o controle ótimo da delegação, politicamente e sua permanência seja garantida não para que a regra não seja a instabilidade ministerial somente por critérios burocráticos de carreira. que marcou a Segunda República e que se repetiu 10 Quando houve dificuldade em revelar claramente o peso de cada critério na indicação de determinado no processo recente de redemocratização. ministro, procurou-se confrontar o máximo de opiniões possível. Nos casos em que critérios eram classificados igualmente como importantes, um mesmo peso foi NOTAS estabelecido. 11 Tais constatações são corroboradas por pesquisas sobre os três primeiros escalões no ministérios da Educação, 1 Ver, entre os principais, Geddes (1994), Gouvea (1994), Fazenda e Transportes (Loureiro e Abrucio, 1998a) e a Schneider (1994) e Nunes (1997). respeito dos secretários executivos, transformados em 2 Edson Nunes (1997) é um dos autores que mais chamou postos estratégicos para monitorar a delegação feita a atenção para a possibilidade de o insulamento buro- pelo presidente (Loureiro e Abrucio, 1998b). crático, em muitos casos, vincular-se a critérios particu- 12 Os DAS (Direção e Assessoramento Superior) são deno- laristas, em vez de obedecer aos ditames do universalis- minações utilizadas para determinar o nível salarial e mo de procedimentos. hierárquico dos ocupantes dos cargos de confiança, 3 Uma análise completa do significado das medidas pro- variando em ordem crescente de 1 a 6. visórias encontra-se em Figueiredo e Limongi (1997). 13 Para analisar o perfil do alto escalão governamental 4 Schneider (1994) foi o primeiro a ressaltar este aspecto. brasileiro, procuramos, no presente artigo, resumir algu- 5 “Bom esplanadeiro”, definiu-nos um entrevistado, “é mas conclusões extensamente trabalhadas em Loureiro aquele que permanece por muitos anos na Esplanada e Abrucio (1998a). Por questão de espaço, preferimos dos Ministérios e tem excelente trânsito em suas diver- não reproduzir e analisar mais pormenorizadamente sas áreas”. aqui as tabelas e gráficos que produzimos no trabalho citado. 6 Analisamos um universo de 194 pessoas para traçar o perfil dos quatro gabinetes presidenciais deste período. 14 Vários membros da Secretaria do Tesouro Nacional têm Para isso, utilizamos material de imprensa, documenta- conflitos com o pessoal da Receita em termos de ção oficial, e entrevistamos pessoas que ocuparam carreira, porque nem todos são recrutados dentro dessa postos governamentais, sobretudo aqueles de cunho carreira. Muitos vêm do meio acadêmico. Conforme estratégico, ou que conheciam a lógica de nomeações. mencionou um entrevistado: “nossa briga aqui é fazer Este levantamento mais geral é fundamental para com- com que o pessoal de carreira assuma a casa”. preendermos o papel recente do Ministério da Fazenda 15 Isto também pode ser notado pela existência, há um no presidencialismo brasileiro. bom tempo e de forma consolidada, de uma excelente 7 A taxa de renovação ministerial (TR) foi obtida pela escola de formação na área fazendária, a Escola Superi- divisão do contingente de pessoas que ocuparam minis- or de Administração Fazendária (ESAF), situação que térios e secretarias da Presidência pelo número de contrasta fortemente com o restante do funcionalismo cargos existentes (fórmula: TR = Pessoas/Número de público federal. 88 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 41

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