UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

TONIMAR FRADA

REFLEXÕES ACERCA DA CORRUPÇAO NO ESTADO BRASILEIRO E ANÁLISE DA LEI DA FICHA LIMPA- LC Nº135/2010

Ijuí (RS) 2020 1

TONIMAR FRADA

REFLEXÕES ACERCA DA CORRUPÇÃO NO ESTADO BRASILEIRO E ANÁLISE DA LEI DA FICHA LIMPA- LC Nº135/2010

Trabalho de Conclusão de Curso de graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Conclusão de Curso. UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul DCJS - Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientadora: MSc. Eloisa Nair de Andrade Argerich

Ijuí (RS) 2020 2

Dedico este trabalho a todos aqueles que, assim como eu, odeiam injustiças e almejam ver um Brasil mais justo e com respeito às instituições e às leis que nos regem. 3

AGRADECIMENTOS

Agradecer é necessário pois foi longo o trajeto até este momento de finalização de um curso tão sonhado.

A chegada a esta fase final me obriga a olhar pra trás e ser grato a todos que possibilitaram essa conquista, nos quais minha família aparece como grande alicerce e fortaleza, especialmente minha mãe – guerreira, justa e que sempre me incentivou a seguir adiante, acreditando na minha formação e nas minhas buscas acadêmicas e profissionais.

Um grande abraço e agradecimento especial à minha professora orientadora, Eloísa Argerich, que sempre se dispôs a ajudar, corrigir e me fazer pensar sobre os caminhos e descaminhos do Direito e a refletir sobre o que acabou sendo o objeto central dessa monografia.

Agradeço também aos meus colegas do CFC Pizutti pela parceria e solidariedade, revezando por vezes a minha ausência quando precisei estar no Escritório-Modelo e em outras tarefas da faculdade, meu muito obrigado!

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LISTA DE ABREVIATURAS

AP – Ação Penal

CF/88 – Constituição Federal de 1988

CSMPF – Conselho Superior do Ministério Público Federal

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

INQ – Inquérito

JBS – José Batista Sobrinho

LC – Lei Complementar

LGBTs – Sigla de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros.

MCCE – Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral

MPE – Ministério Público Estadual

MPF – Ministério Público Federal

ONU – Organização das Nações Unidas

PCO – Partido da Causa Operária

PDT – Partido Democrático Trabalhista

PRR4 – Procuradoria Regional da República da 4ª Região (PRR4)

STJ – Superior Tribunal de Justiça

STF – Supremo Tribunal Federal

TCE – Tribunal de Contas do Estado

TCU – Tribunal de Contas da União

TRF – Tribunal Regional Federal

TSE – Tribunal Superior Eleitoral

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RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso tem como objeto central fazer algumas reflexões acerca da corrupção no Estado Democrático Brasileiro. Por meio de pesquisa bibliográfica, legislativa e jurisprudencial, a pesquisa investiga inicialmente, no capítulo primeiro, as origens históricas da corrupção no Brasil, e verifica a corrupção como um obstáculo frontal à concretização de importantes princípios constitucionais. No capítulo segundo, faz-se breve retrospecto até a edição da Lei Complementar n. 135 (LC n. 135/2010), conhecida como “Lei da Ficha Limpa”, instrumento jurídico inovador que nasce sob iniciativa popular. Para tanto, são tecidas considerações sobre o sistema político-eleitoral brasileiro, das modalidades de investidura em cargos públicos, e de alguns desafios à democracia, ante à existência de ambientes favoráveis à manutenção de práticas ilícitas e corruptivas, com custos elevados para as campanhas eleitorais, com uma certa permissividade social além da sub-representação das minorias na política brasileira. O propósito do capítulo final é trazer a força da jurisprudência somada às inovações legislativas nascidas nos últimos anos no Brasil. Assim, faz-se uma análise de julgamentos efetuados por alguns TREs, pelo TSE e pelo STF tendo como base a aplicabilidade da Lei da Ficha Limpa. Para tanto, parte-se de investigações sobre a Ação Penal n. 470 e sobre a Operação Lava Jato, e de importantes considerações sobre a inelegibilidade, que alcançou alguns candidatos a governo de estado e Presidência da República nas eleições de 2018.

Palavras-chave: Corrupção. Inelegibilidade. Lei da Ficha Limpa.

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ABSTRACT

The following final examination has as central goal elaborate reflections on the corruption of the Brazilian Democratic State. By bibliographic, legislative and jurisprudential research, it investigates initially, on the first chapter, the historical birth of corruption in , and verifies it as a major obstacle to important constitutional principles. On the second chapter, a brief review until the issuing of the Complementary Law 135, in 2010, known as “Lei da Ficha Limpa” – Law of Clean Record -, an innovating juridical instrument that emerges by popular demand. For this purpose, considerations about the Electoral-politic system are made, the models of public offices, some democracy challenges, also on the existence of encouraging environments to illicit and corruptible practices, with elevated costs to election campaigns, added to a social permissiveness above the under-representation of the minorities in Brazilian politics. The goal of the final chapter is to bring the strength of the jurisprudence added with the innovations in the legislation field that emerged the past years. An analysis is made on the judgments made by some Regional Electoral Courts, the Supreme Electoral Court and the Federal Supreme Court, having as basis the applicability of the Ficha Limpa Law. In order to do so, it stars with investigations about the Penal Action 470 and the “Operação Lava Jato”- -, with important considerations on the ineligibility, which attained some candidates to State Governments and Presidency on the 2018 elections.

Keywords: Corruptions. Ineligibility. Law of Ficha Limpa

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SUMÁRIO

LISTA DE ABREVIATURAS ...... 04

INTRODUÇÃO ...... 08

1 REFLEXÕES ACERCA DA CORRUPÇAO NO ESTADO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO ...... 10 1.1 Origens históricas e evolução da corrupção no Brasil ...... 10 1.2 A corrupção como obstáculo à concretização dos princípios constitucionais ...... 13 1.2.1 Princípio da supremacia do interesse público sobre o privado ...... 14 1.2.2 Princípio da moralidade ...... 14 1.2.3 Princípio da impessoalidade ...... 15 1.2.4 Principio da não violação da finalidade publica ...... 16 1.2.5 Princípio da publicidade ...... 17 1.3 Instrumentos de combate à corrupção ...... 17

2 RELEITURA DA LEI DE FICHA LIMPA E OS FATORES DE FACILITAÇAO À CORRUPÇAO ...... 24 2.1 História e contemporaneidade da Lei Complementar nº 135/2010 ...... 24 2.2 O sistema político-eleitoral brasileiro: desafios e perspectivas como ambiente propicio à corrupção ...... 31 2.2.1 Custos elevados das campanhas eleitorais ...... 34 2.2.2 Modalidades de investidura em cargos públicos ...... 37 2.2.3 Sub-representação das minorias na política brasileira ...... 39 2.2.4 Permissividade social ...... 42

3 ANÁLISE DE JULGAMENTOS EFETUADOS PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL E A APLICABILIDADE DA LEI DA FICHA LIMPA NAS ELEIÇÕES DE 2018 ...... 44 3.1 Ação Penal n. 470 ...... 44 3.2 Operação Lava Jato ...... 50 3.3 A elegibilidade e o emblemático caso “Luiz Inácio Lula da Silva” ...... 53 3.3.1 Sobre as condições de (in)elegibilidade ...... 55 3.4 Estudo de casos: candidatos ao governo de Estado que foram atingidos pela Lei da Ficha Limpa ...... 67 3.4.1 Caso de Ângelo Castro (PCO) ...... 67 3.4.2 Caso de Acir Gurgacz (PDT) ...... 68 3.4.3 Caso de Marcelo Candido (PDT)...... 69

CONCLUSÃO ...... 70

REFERÊNCIAS ...... 76

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INTRODUÇÃO

A presente pesquisa circula entre o ramo do Direito Público, especialmente em uma tríade entre o Direito Constitucional, o Direito Administrativo e o Direito Eleitoral. Tem como foco fazer uma breve análise da Lei Complementar n. 135/2010, que ficou conhecida como “Lei da Ficha Limpa”, promulgada em 2010 e que passou a produzir efeitos no Brasil a partir de 2012. A referida Lei trouxe significativas inovações, dentre elas, alterou critérios de inelegibilidade de candidatos para as instâncias de poder do país, além de estabelecer maior tempo de afastamento da vida política em caso de condenação.

Como base fundamental para a realização deste trabalho foram efetuadas pesquisas doutrinárias, legislativas e jurisprudenciais, pautadas em buscas bibliográficas, em meio eletrônico - sobretudo em páginas e links de instituições e órgãos oficiais, a fim de buscar uma fonte fidedigna para as comprovações que se almejavam alcançar. Também analisou-se as mais recentes inovações legislativas e decisões jurisprudências conectadas ao tema, a fim de melhor fundamentar e deixar devidamente atualizadas até a presente data as questões relacionadas à temática central da pesquisa.

Este trabalho de conclusão de curso foi pensado a fim de atingir os objetivos propostos traçados no projeto de pesquisa, e, para tanto, foi subdividido em três partes principais. A primeira intenta refletir acerca da corrupção no Estado Democrático de Direito, buscando fazer uma retrospectiva sobre as origens históricas da corrupção e o entrave que os atos corruptivos apresentam para a concretização dos princípios constitucionais no país. Também são abordados alguns princípios que regem a Administração Pública, a exemplo da supremacia do interesse público sobre o privado, o princípio da moralidade, da impessoalidade e o da não violação da finalidade pública.

A segunda parte da pesquisa traz um breve retrospecto até a edição da Lei Complementar n. 135 (LC n. 135/2010), conhecida como “Lei da Ficha Limpa”, instrumento jurídico inovador que nasce sob iniciativa popular. Para tanto, são tecidas considerações sobre o sistema político-eleitoral brasileiro, e de alguns desafios à concretização de um Estado Democrático de Direito, ante à existência de ambientes favoráveis à manutenção de práticas ilícitas e corruptivas, com custos elevados para as campanhas eleitorais, com uma certa permissividade social além da sub-representação das minorias na política brasileira. 9

O propósito do capítulo final é trazer a força da jurisprudência somada às inovações legislativas nascidas nos últimos anos no Brasil. Assim, faz-se uma análise de julgamentos efetuados por alguns TREs, pelo TSE e pelo STF tendo como base a aplicabilidade da Lei da Ficha Limpa, em especial nas eleições do ano de 2018. Para tanto, parte-se de investigações sobre a Ação Penal n. 470, também sobre a Operação Lava Jato, e de importantes considerações sobre a inelegibilidade, que alcançou alguns candidatos a governo de estado e Presidência da República, como o emblemático caso do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, impedido de candidatar-se nas eleições pretéritas.

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1 REFLEXÕES ACERCA DA CORRUPÇAO NO ESTADO DEMOCRATICO BRASILEIRO

Refletir acerca da corrupção no Estado Democrático de Direito para compreender os motivos que geram a corrupção é algo que exige uma abordagem inicial sobre as origens históricas e a evolução de tal fenômeno que desde a Colonização do Brasil já se fazia presente na sociedade da época.

Um ponto essencial a ser estudado, diz respeito à prática da corrupção que está disseminada em todas as áreas da sociedade e que abala as conquistas democráticas constitucionais, afrontando o desenvolvimento do Estado Democrático de Direito. Além de que, traz incertezas à população, por isso, há a necessidade de se fazer uma reflexão mais pontual sobre esse fenômeno que tanto desgasta a classe política brasileira.

Desse modo, pretende-se enfrentar o tema da corrupção apresentando-a como um obstáculo à concretização dos princípios constitucionais explícitos e dos princípios do direito administrativo.

Destaca-se que todos os princípios que serão abordados tem uma função no contexto das relações da Administração Pública, podendo-se afirmar que nenhum seja hierarquicamente superior a outro, mas que alguns gozam de primazia quando se trata do interesse público.

Para melhor compreensão do tema, desenvolve-se o estudo sobre os instrumentos de combate à corrupção, destacando-se a Lei Complementar nº 135/2010 (Lei da Ficha Limpa), Ação Penal nº 470 e Operação Lava Jato para demonstrar que esses mecanismos podem contribuir para diminuir os casos de corrupção no Brasil.

1.1 Origens históricas e evolução da corrupção no Brasil

Abordar aspectos referentes à corrupção no Estado Democrático Brasileiro requer que se estude sobre a história do Brasil desde o início da sua colonização, visando compreender 11

por quais motivos a corrupção tem sido um obstáculo à concretização dos princípios constitucionais da Administração Pública.

A corrupção é um tema que faz parte da agenda política, jurídica e social, no entanto, é de uma complexidade ímpar, uma vez que envolve pessoas, dinheiro público e falta de caráter ética e moralidade daqueles que atuam na administração pública e no parlamento brasileiro.

Definir a corrupção e sua origem não é uma tarefa fácil. No entendimento de Medeiros (2019, p.1, grifo do autor), etimologicamente “a palavra corrupção vem do latim, corruptio, e referia-se ao cerne deteriorado de um fruto e, por analogia, retrata a podridão moral em uma determinada sociedade”. Ainda refere que o termo também pode ser “[...] originário da palavra rumpere, equivalente a romper ou dividir, de onde deriva corrumpere, também com o sentido de deterioração ou depravação e alteração”.

A maioria dos estudiosos compreende a corrupção como um fenômeno estritamente relacionado à atuação de agentes públicos; outra vertente ressalta a natureza econômica da corrupção enquanto a terceira abordagem compreende este fenômeno como contrário à concepção de interesse público, conforme o entendimento de Bonifácio e Ribeiro (2016, p. 16). Os autores afirmam, ainda, que:

A corrupção é apreendida sob três óticas distintas: 1) como ato infracional, que se opõe ou que transcende as leis e normas oficiais; 2) como um comportamento calculado, que beneficia o corruptor, dada as oportunidades específicas do contexto em que a ação se insere; e 3) como intimamente ligada ao sistema normativo vigente em cada sociedade, respectivamente.

De acordo com Brei (1996), que busca conceituar a corrupção sob vários ângulos, a corrupção se define como um padrão de comportamento que se afasta das normas e padrões que predominam em um determinado contexto social, gerando ganho para um lado (o corruptor) e perda para o outro lado (a população ou o interesse público, de modo geral).

As condutas corruptivas no Brasil, conforme dito anteriormente, confundem-se com a própria história do país. Carvalho (2002) explica que não é fácil dizer quando a corrupção tomou conta do poder político, mas explica que desde a vinda da Família Real para o Brasil iniciaram-se negociatas que a favorecia, pois houve total ausência de nexo moral e ético nas práticas de ocupação das terras brasileiras. 12

Como exemplo, Bomfim (2013, p. 22) ressalta que:

[...] o modelo de ocupação das terras brasileiras adotado por Portugal, que favorecia a ocorrência de conflitos de interesse, pois a Coroa Portuguesa permitia, devido à baixa remuneração dos cargos públicos, que aqueles que os ocupavam complementassem sua renda com ganhos relacionados às suas atividades, estabelecendo quase sempre um conflito de interesses e uma confusão entre o público e o privado.

Do mesmo modo, para Cordeiro (2017, p. 69), a corrupção não é uma preocupação da modernidade, tendo se desenvolvido junto com a humanidade, “[...] porque a luta pelo poder, pelas formas de dominação do homem sobre o próprio homem, dificilmente se desenvolve sem a existência, por trás do cenário decisório, de atos de corrupção”.

Conforme o entendimento de Bonifácio e Ribeiro (2016), a corrupção se manifesta de maneira constante e ininterrupta, atingindo os mais diversos contextos institucionais e culturais. Corroborando o exposto, manifesta-se Gesta Leal (2014, p 181), ao assinalar que “A corrupção no Brasil e no mundo toma proporções estratosféricas hoje, causando danos em diversas áreas e segmentos sociais [...]”.

Importante se faz realizar algumas considerações sobre a relação entre a corrupção e a própria democracia. Segundo Piovesan e Gonzaga (2016), a partir de 1988, com a promulgação da atual Carta Magna, houve uma retomada do compromisso com a efetiva democracia na República brasileira, principalmente através da concepção de princípios constitucionais, norteadores da democracia e da ação oriunda da Administração Pública brasileira.

As autoras referidas destacam o artigo 1º da referida Carta, onde o enunciado de seu parágrafo único demonstra que a titularidade do poder é do povo; porém, seu exercício se dá através de representantes escolhidos pela população.

Neste sentido, destaca-se que os interesses destes representantes devem estar de acordo com o interesse da coletividade e, caso não estiverem, é direito do povo reaver este poder e desconstituir a legitimidade para seu exercício em relação a estes representantes.

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1.2 A corrupção como obstáculo à concretização dos princípios constitucionais

A prática da corrupção abala as conquistas democráticas constitucionais e afronta o desenvolvimento do Estado Democrático de Direito e traz incertezas à sociedade, por isso, há a necessidade de se fazer uma reflexão mais pontual sobre esse fenômeno que tanto desgasta a classe política. A reação da impulsionou mudanças importantes de atitude que alcançaram as instituições, a legislação e a jurisprudência.

Importante se faz realizar algumas considerações sobre a relação entre a corrupção e a própria democracia. Segundo Piovesan e Gonzaga (2016), a partir de 1988, com a promulgação da atual Carta Magna, houve uma retomada do compromisso com a efetiva democracia na República brasileira, principalmente através da concepção de princípios constitucionais, norteadores da democracia e da ação oriunda da Administração Pública brasileira.

As autoras destacam o artigo 1º da referida Carta, onde o enunciado de seu parágrafo único demonstra que a titularidade do poder é do povo; porém, seu exercício se dá através de representantes escolhidos pela população. Neste sentido, destaca-se que os interesses destes representantes devem estar de acordo com o interesse da coletividade e, caso não estiverem, é direito do povo reaver este poder e desconstituir a legitimidade para seu exercício em relação a estes representantes. Neste sentido, destaca-se o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado.

Este princípio compõe a base do ordenamento jurídico administrativo, ao lado do princípio da legalidade, explícito na legislação constitucional. Conforme os autores, a doutrina italiana divide o interesse público em primário e secundário.

O interesse público primário conforme Trindade e Scatolino (2016, p. 76), diz respeito à verdade tutela jurídica, aos quais se destinam as ações da Administração Pública; já os interesses secundários representar o interesse do próprio Estado enquanto sujeito de direitos, cujos interesses devem "coincidir com o interesse público primário, pois, do contrário, a conduta da Administração Pública será ilegítima".

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1.2.1 Princípio da supremacia do interesse público sobre o privado

Interessante se faz mencionar de acordo com Vicente Paulo (2012, p. 186), este é uma característica do regime de direito publico sendo um dos dois pilares do chamado regime jurídico-administrativo, fundamentado todas as prerrogativas especiais de que dispõe a administração como instrumento para a consecução dos fins que a constituição e as leis lhe impõem. Decorre deste que, existindo conflito entre o interesse publico e o particular, devera prevalecer o primeiro, tutelado pelo Estado, respeitados, os direitos e garantias individuais expressos na constituição, ou dela decorrentes.

Este princípio compõe, conforme Trindade e Scatolino (2016, p 76) a base do ordenamento jurídico administrativo, ao lado do princípio da legalidade, explícito na legislação constitucional. Conforme os autores, a doutrina italiana divide o interesse público em primário e secundário. O interesse público primário diz respeito à verdade tutela jurídica, aos quais se destinam as ações da Administração Pública; já os interesses secundários representar o interesse do próprio Estado enquanto sujeito de direitos, cujos interesses devem "coincidir com o interesse público primário, pois, do contrário, a conduta da Administração Pública será ilegítima".

Ainda, para Di Pietro (2017), a supremacia do interesse público determina que a Administração Pública deva observar que o interesse coletivo é superior aos interesses individuais, vinculando toda a sua atuação. Quando ocorrem práticas de corrupção, o interesse coletivo é atingido, uma vez que há a observância dos interesses particulares, seja de um indivíduo, uma empresa ou um grupo de pessoas em detrimento do interesse público.

1.2.2 Princípio da moralidade

Observa-se, neste diapasão, que a conduta pública deve estar pautada, portanto, na moralidade, outro princípio que merece destaque no presente estudo. Conforme Trindade e Scatolino (2016, p. 63), “a moralidade exige que a conduta praticada pelo administrador seja pautada de acordo com a ética, bom o bom senso, bons costumes e, principalmente, com a honestidade”.

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Ao agir em conformidade com a moralidade, o gestor público age em acordo com o interesse público, manifestado através da observância do ordenamento jurídico e, sobretudo, da honestidade. Do mesmo modo, ao agir com imoralidade, o agente público fere o interesse coletivo, beneficiando apenas uma parcela ínfima da população. Em muitas situações, para a prática de tais atos, o agente público é corrompido através da oferta de auxílios, tanto em dinheiro quanto em facilidades diversas.

Ainda, de acordo com Vicente Paulo (2012, p 194), tal princípio torna jurídica a existência de atuação ética dos agentes da administração publica denominada moral administrativa que difere da moral comum, justamente por ser jurídica e pela possibilidade de invalidação dos atos administrativos que sejam praticados com inobservância a estes princípios. Sendo importante destacar que embora a constituição haver a moral administrativa como princípio jurídico expresso permite afirmar que ela e um requisito de validade do ato administrativo e não se aspecto atinente ao mérito. Vale dizer que o ato contrário a moral administrativa não está sujeito a uma analise de oportunidade e conveniência mas sim de uma análise de legitimidade.

1.2.3 Princípio da impessoalidade

Nesta linha, o princípio da impessoalidade, descrito no Art. 37 da Constituição Federal (CF), pode ser concebido sob dois sentidos, em conformidade com a doutrina de Di Pietro (2017): em relação aos administrados e em relação à própria Administração Pública. No primeiro sentido, significa compreender que a atividade administrativa deve possuir finalidade pública, ou seja, não pode beneficiar ou prejudicar indivíduos ou grupos específicos; já no segundo sentido, a impessoalidade revela que os atos administrativos não podem ser personificados, pois as ações são da Administração Pública e não do agente público.

Conforme se pode perceber, o princípio da impessoalidade é objetivo ao abranger a não possibilidade de haver benefício a apenas alguns indivíduos ou grupos de pessoas, corroborando com a supremacia do interesse público sobre o privado. De fato, as condutas corruptivas ocorrem no sentido de promover benesses a determinadas pessoas, físicas ou jurídicas e, ainda, em benefício do próprio agente público, violando de maneira significativa a impessoalidade necessária à Administração Pública. 16

Não há como abordar este rol de princípios (o qual não é taxativo) sem evidenciar a relevância do princípio da não violação da finalidade pública. A Administração Pública realiza atos administrativos com uma finalidade, que deve ser sempre pública. Nas lições de Di Pietro (2017), o resultado do ato praticado pela Administração só pode ser do interesse público, em virtude da aplicação implícita ou explícita da lei.

Apesar desta vinculação, o que se percebe na conduta governamental, em muitos casos, é a ausência de observância deste princípio. Por diversas situações os atos administrativos são eivados de vícios que comprometem a sua natureza pública, beneficiando alguns em detrimento da coletividade.

Segundo Vicente Paulo (2012), a finalidade da atuação da administração pode ser expressa ou implícita na lei. Havendo sempre uma finalidade geral, que e a satisfação do interesse público, e uma finalidade especifica, que e o fim direto ou imediato que a lei pretende atingir.

1.2.4 Princípio da não violação da finalidade publica

Não há como abordar este rol de princípios (o qual não é taxativo) sem evidenciar a relevância do princípio da não violação da finalidade pública. A Administração Pública realiza atos administrativos com uma finalidade, que deve ser sempre pública. Nas lições de Di Pietro (2017), o resultado do ato praticado pela Administração só pode ser do interesse público, em virtude da aplicação implícita ou explícita da lei.

Apesar desta vinculação, o que se percebe na conduta governamental, em muitos casos, é a ausência de observância deste princípio. Por diversas situações os atos administrativos são eivados de vícios que comprometem a sua natureza pública, beneficiando alguns em detrimento da coletividade.

1.2.5 Princípio da publicidade

Observa-se que não menos relevante, ressalta-se a abordagem do princípio da publicidade, compreendido como a necessidade de ser conferir ampla divulgação aos atos 17

administrativos e, como bem coloca Di Pietro (2017), resguardam-se desse princípio apenas algumas hipóteses legais, onde o sigilo é necessário.

Entretanto, Trindade e o Scatolino (2016, p. 67) ressalvam que a publicidade não deve se confundir com a publicação dos atos na imprensa oficial, por exemplo. Trata-se de um conceito mais amplo de divulgação do ato administrativo, visando o conhecimento do público e "[...] para o início da produção de seus efeitos (eficácia), bem como permitir o acesso às condutas administrativas".

A publicidade das ações administrativas no setor público é uma premissa, pois, quando os atos não possuem nenhum tipo de vício, não há motivos para que os mesmos não possam ser amplamente divulgados ou para que a conduta administrativa não possa ser totalmente transparente. Entretanto, a corrupção leva a condutas suspeitas, ao “jeitinho” de fraudar licitações, ao “toma-lá-dá-cá”, entre outras situações que ferem o princípio da publicidade.

Dessa forma, segundo Vicente Paulo (2012, p. 198), é evidente, em um estado de direito, e inconcebível a existência de atos sigilosos ou confidenciais que pretendam incidir sobre a esfera jurídica dos administrados, criando, restringindo ou extinguindo direitos, ou que onerem o patrimônio público.

1.3 Instrumentos de combate à corrupção

A corrupção está entranhada em todos os setores da vida pública e privada. Acentua Leal (2014, p. 181) que, tendo em vista os níveis elevados de organização e inteligência dos protagonistas das ações de corrupção, estes “muitas vezes logram êxito em suas ações, restando impunes em face dos déficits de ação preventiva e curativa dos poderes instituídos do Estado”.

Observa-se assim que a corrupção é algo negativo, presente no ambiente político e público e, ante as condutas que lesam o patrimônio público, nota-se a falta de ética, de honestidade e probidade de seus agentes. Para corroborar o exposto, explica Emerson Garcia (2003, p. 3) que “a corrupção está associada à fragilidade dos padrões éticos de determinada sociedade, os quais se refletem sobre a ética do agente público”. Para o autor supracitado, o agente público: 18

[...] normalmente é um mero "exemplar" do meio em que vive e se desenvolve, um contexto social em que a obtenção de vantagens indevidas é vista como prática comum pelos cidadãos, em geral, certamente fará com que idêntica concepção seja mantida pelo agente nas relações que venha a estabelecer com o Poder Público. Um povo que preza a honestidade terá governantes honestos. Um povo que, em seu cotidiano, tolera a desonestidade e, não raras vezes, a enaltece, por certo terá governantes com pensamento similar.

Em verdade, quando há desvio de comportamento do gestor público, do agente político ou agentes públicos, que agem em seu próprio benefício, o interesse público é relegado a um segundo plano e o persiste e se sobrepõe é o interesse particular. A isso se denomina corrupção. Denota-se, portanto, que não se pode generalizar, pois a maioria dos agentes públicos é honesta, possuem valores éticos exigidos pelos padrões normais, não participam da corrupção e agem com boa-fé.

Interessante quando Nucci (2015, p. 135) traz uma hipótese de como se caracteriza a corrupção no cenário atual que pode contribuir para o entendimento do tema:

A corrupção caracteriza-se, nitidamente, pela negociata, pelo pacto escuso, pelo acordo ilícito, pela depravação moral de uma pessoa, gerando, muitas vezes, imensos estragos ao Estado. Mas a corrupção não se limita às fronteiras da Administração Pública, pois corre solta no ambiente privado, em particular, no cenário de empresas particulares. As maiores do mundo, que se autointitulam honestas, são surpreendidas, de tempos em tempos, imersas na podridão dos negócios mal vistos e ilegais.

Os atos corruptivos que permeiam a área pública estão cada vez mais aprimorados e os atores que participam das ações que envolvem desvio de verbas públicas, superfaturamento de obras, troca de favores, entre outras formas, agem sob o manto da impunidade, pois desacreditam na justiça. Sempre há dois polos: o corruptor e o corrupto.

Neste sentido, Carlos Henrique Abrão (2013, p. 38), Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ/SP), declara que “o processo lesivo ao erário conta com o corruptor e o corrupto, uma verdadeira parceria público-privada, na qual o dinheiro é dilapidado e os cofres se ressentem dos ilícitos, no entanto, demoram a constatar as irregularidades”.

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Na mesma direção caminham as lições de Nucci (2015, p. 140) “ao caracterizar a corrupção no cenário nacional como um pacto negativo, atos ilícitos que geram inúmeros problemas à sociedade brasileira, pois o cidadão deixa de receber do estado as prestações materiais que lhe são devidas, tais como: saúde, educação, habitação, entre outros bens necessários para uma sobrevivência digna”.

No entendimento de Carvalho (2002), é incontestável que as condutas antiéticas, que fogem aos padrões morais mínimos que fazem parte do caráter de uma pessoa que tem respeito pelos seus pares e que agem sem escrúpulos, nada mais é do que a chamada corrupção que não é um fenômeno atual, mas remonta ao século passado quando nesse País aportou a Família Real vinda de Portugal, como já mencionado anteriormente.

Verifica-se assim, que tais condutas, contrárias ao interesse público, caminham na direção oposta ao Estado Democrático de Direito, ferindo princípios constitucionais e prejudicando de maneira significativa a eficiência da Administração Pública enquanto gestora do interesse da coletividade. Piovesan e Gonzaga (2016) elencam alguns fatores que contribuem significativamente para a prática da corrupção no Brasil: custos elevados das campanhas eleitorais; modalidades de investidura em cargos públicos e, ainda, a sub- representação política das minorias.

Quanto ao alto custo das campanhas eleitorais, vislumbra-se que a necessidade de recursos e fontes de financiamentos acarreta o surgimento de esquemas para repasse de verbas privadas para os candidatos, em troca de favores posteriores, por exemplo. Do mesmo modo, as autoras mencionam as modalidades de investidura em cargos públicos, sendo possível a nomeação de servidores para as denominadas "funções de confiança", criando espaços propícios para a retribuição de favores, o patrimonialismo, a indicação de pessoas baseada apenas em relações políticas e não na competência, entre outras situações corriqueiras, vivenciadas cotidianamente na Administração Pública brasileira.

Quanto ao terceiro fator, percebe-se que a participação social e política de toda a população, apesar de garantida constitucionalmente, não ocorre de maneira satisfatória. Não há uma efetiva participação social das mulheres, dos negros e dos índios, por exemplo. A juventude, por sua vez, também não encontra um espaço adequado para a manifestação de seus pensamentos. 20

Para além dos fatores elencados por Piovesan e Gonzaga (2016), acredita-se ser relevante indicar ao menos mais um: a permissividade à corrupção, abordada por Bonifácio e Ribeiro (2016, p. 27):

A ideia de permissividade à corrupção remete a diversas atitudes favoráveis ou, pelo menos, não contrárias à manifestação de atos corruptos na sociedade. Como exemplo, podemos citar as considerações sobre o “rouba, mas faz” e sobre a compra de votos, o posicionamento em situações hipotéticas de pequenas corrupções, a tolerância ao pagamento de propina, entre outros.

Conforme se pode perceber, o enraizamento da corrupção na sociedade brasileira se deve às práticas ativas e passivas, uma vez que a tolerância e a permissividade contribuem de maneira significativa para que tais práticas ocorram cotidianamente.

Por conseguinte, Cordeiro (2017, p. 76) concebe a corrupção como uma conduta derivada de normas socioculturais enraizadas nas práticas sociais, destacando-se o personalismo e o nepotismo. Para o autor, a corrupção “surge, justamente, em face da ausência de consciência coletiva que leva os indivíduos a se colocarem acima da coletividade”.

Neste contexto, alerta-se para o fato de que diversos instrumentos de combate à corrupção foram sendo colocados em prática ao longo da história brasileira mais recente.

Destaca-se, inicialmente, a Lei Federal nº 4.717/1965, que passou a regular a ação popular, ou seja, a legitimidade dos cidadãos em pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio público. Percebe-se que o legislador entendeu ser necessário enfatizar o poder e a legitimidade do povo (exercido através dos agentes públicos) em casos lesivos ao patrimônio coletivo.

Segundo este dispositivo legal, os atos lesivos poderiam ser declarados nulos no caso de incompetência, vício de forma, ilegalidade do objeto, inexistência de motivo ou desfio de finalidade. Tais situações poderiam configurar contratos e execuções de serviços fraudulentos, vantagens indevidas conferidas a indivíduos ou empresas, práticas de valores superiores ou inferiores ao de mercado etc. 21

A Lei Federal nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa), dispôs sobre a aplicabilidade de sanções aos agentes públicos, em casos de comprovado enriquecimento ilícito a partir do exercício de funções na Administração Pública. Ressalta-se, entretanto, o disposto no artigo 3º da referida Lei, afirmando que a mesma é aplicável “àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta”.

Os atos de improbidade administrativa referenciados por esta Lei podem ser dos seguintes tipos: atos quem importam enriquecimento ilícito, atos que causem prejuízo ao erário, atos que atentem contra os princípios da Administração Pública e atos decorrentes com concessão ou aplicação indevida de benefício (financeiro ou tributário). As sanções previstas para a prática de tais atos de improbidade administrativa consistem em perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e proibição de contratar com a Administração Pública, aplicáveis conforme cada caso.

Em 1993, por sua vez, um importante instrumento foi promulgado: a Lei Federal nº 8.666, conhecida como Lei das Licitações. Este diploma legal foi um marco no ordenamento jurídico brasileiro, pois instituiu normas gerais sobre licitações e contratos administrativos na Administração Pública, dispondo as modalidades possíveis de licitação, requisitos para habilitação das empresas interessadas, entre outras disposições, inclusive concernentes aos contratos administrativos, firmados a partir da realização de certames licitatórios.

No entanto, conforme bem colocam Moreira Neto e Freitas (2014), esta legislação, apesar de ter em sua essência a intenção de precaver a corrupção nos procedimentos licitatórios, o seu excesso de formalismo provocou um efeito contrário: o engessamento das contratações públicas criou um ambiente favorável à prática de subornos e demais ações visando o beneficiamento de algumas empresas em detrimento de outras.

Em seguida, destaca-se a Lei Federal nº 12.846, promulgada em 1º de agosto de 2013, conhecida como Lei Anticorrupção. A referida lei dispõe sobre a responsabilização na esfera administrativa e civil de pessoas jurídicas, em virtude da prática de atos contra a administração pública, tanto nacional quanto estrangeira. Para Moreira Neto e Freitas (2014), esta Lei acompanha a tendência nacional de responsabilização civil e administrativa em 22

virtude da prática de atos de corrupção por prepostos ou responsáveis legais das pessoas jurídicas envolvidas.

Segundo este diploma legal, a responsabilização da empresa não exclui a responsabilidade individual de seus gestores ou de qualquer outra pessoa que participe do ato ilícito, entendido como qualquer ato que seja contra o patrimônio público nacional ou estrangeiro, contra princípios da administração pública ou contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil.

Por fim, e com maior destaque, tendo em vista o objetivo geral do presente projeto, tem-se a Lei Complementar nº 135, de 4 de junho de 2010, conhecida popularmente como “Lei da Ficha Limpa”, visando proteger a probidade administrativa e a moralidade no exercício de mandatos eletivos. Conforme Souza (2012, p. 79), este dispositivo obteve sua aprovação em virtude da mobilização popular no combate à corrupção, tornando-se “um marco fundamental para a democracia e para a luta contra a corrupção e a impunidade no país”.

Neste mesmo sentido se manifesta Alexandre Guimarães Gavião Pinto (2012, p. 22):

O Brasil clama por políticos que dignifiquem o voto de seu povo e encontrem na ética a fórmula correta de se fazer política, e foi justamente esse anseio popular que tornou possível a edição e posterior declaração de constitucionalidade da popularmente conhecida “Lei da Ficha Limpa”.

A referida Lei alterou alguns dispositivos da Lei Complementar nº 64/1990, a qual já estabelecia casos de inelegibilidade e prazos de cessação em conformidade com o art. 14, § 9º da Constituição Federal, incorporando hipóteses de inelegibilidade a partir da Lei de Improbidade Administrativa. Enquanto a Lei Federal nº 12.846/13 está voltada para pessoas jurídicas, a Lei Complementar nº 135/10 abrange apenas pessoas físicas. No entendimento de Daniela Barbosa Assumpção de Souza (2012, p. 79):

Trata-se de um vigoroso instrumento legal que visa à garantia de que os mandatos eletivos, executivos ou legislativos, serão exercidos por representantes do povo qualificados para a função, resguardando-se a probidade administrativa e prevenindo-se eventuais desvios de conduta dos mandatários eleitos.

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Notadamente, se faz importante ressaltar a lição de Alexandre Guimarães Gavião Pinto (2012), o qual afirma que este dispositivo legal veio ao encontro do real significado da representatividade política, visto que os representantes eleitos pelo povo devem observar tão somente o interesse coletivo, em detrimento de eventuais benefícios individuais que possam ser ofertados. A exigência de determinados requisitos para a elegibilidade não representa, segundo o autor, uma punição ao possível candidato e sim a observância do interesse público, em tornar elegível apenas os indivíduos que possam, de fato, representar as demandas sociais.

De maneira geral, o que se percebe é que o ordenamento jurídico brasileiro dispõe de diversos elementos implícitos e explícitos, visando proporcionar a supremacia do interesse público sobre o privado, ou seja, impedindo que interesses particulares se sobreponham ao bem comum. Entretanto, inúmeros são os casos em que estes princípios não são observados, havendo o desrespeito ao interesse da coletividade face às regalias e aos favores direcionados ao setor privado, culminando em práticas de corrupção enraizadas na Administração Pública brasileira.

A seguir faremos uma releitura da LC n. 135/2010, a Lei da Ficha Limpa, e faremos algumas considerações acerca desse importante e inovador instrumento legislativo.

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2 RELEITURA DA LEI DE FICHA LIMPA E OS FATORES DE FACILITAÇAO À CORRUPÇAO

Como abordado no capítulo inicial da pesquisa, a trajetória nacional é permeada de acontecimentos fora dos padrões mínimos de moralidade e desde o início do povoamento e colonização o Brasil foi uma grande porta para exploração de variados capitais e minérios, inclusive de especulação, troca de favores e de corrupção.

A par disso, mesmo que desde 1891, esteja vigente a forma republicana e hoje esteja consolidado o Estado Democrático de Direito com uma Constituição moderna e progressista, e possuindo a gestão pública e as pessoas à frente do poder certos parâmetros e limites para sua atuação, a exemplo dos princípios da moralidade e da supremacia do poder público, citados anteriormente, ainda assim, esses suportes teóricos e balizas do Direito Constitucional e Administrativo precisam de suportes específicos para a realização das inúmeras possibilidades que a atuação humana quando está no poder é capaz de fazer acontecer.

2.1 História e contemporaneidade da Lei Complementar nº 135/2010

Ao longo dos anos e no transcurso do processo democrático que se deu após o período ditatorial, especialmente com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil, em 05 de outubro de 1988, considerada “Constituição Cidadã1”, Brasil veio ano pós ano, eleição pós eleição, se aperfeiçoando no jogo democrático e criando a cada pleito eleitoral novas exigências tanto para os eleitores como para os que se pretendem eleger-se por meio das campanhas eleitorais

A exemplo do que enfatiza Whitaker, participante da Comissão Brasileira Justiça e Paz, Brasília, Distrito Federal, Brasil, em artigo público sobre a história da Ficha Limpa, em 2016, que em uma democracia

[...] é sempre possível fazer mudanças nas leis e normas com que funcionam as instituições políticas e a economia de um país, a partir dos problemas e possibilidades que vão surgindo. Essas mudanças se tornam às vezes muito necessárias para tornar a vida do país mais democrática” (2016, p. 231).

1 Constituição Cidadãs segundo Ulysses Guimarães era “O documento da liberdade, da dignidade, da democracia, da justiça social do Brasil.” O deputado Ulysses Guimarães denominou a Carta de cidadã fazendo referência ao fato de que houve intensa participação popular na elaboração do texto porque quem quis se 25

Ocorre que a legislação específica vigente até então, sobre questões de elegibilidade era contemporânea à promulgação da Carta Constitucional, remontando ao início da década de 90. Essa Lei de Inelegibilidades – Lei Complementar n. 64/1990, já apresentava alguns critérios para que alguém fosse candidato a cargos eletivos no país. Previa, por exemplo, condições para barrar candidaturas, sendo vetado analfabetos, aqueles que tivessem condenações aplicadas pela Justiça Eleitoral por processos de abuso de poder econômico ou político e aqueles que fossem condenados por alguns crimes específicos e que estas condenações já tivessem transitado em julgado, ou seja, não houvesse mais possibilidade de nenhum recurso. (BRASIL, 1990).

Nessa linha de exposição, Whitaker salienta que a Lei da Ficha Limpa se inscreve numa longa caminhada de cidadania no Brasil:

Ela resultou de uma inovação da nossa Constituição de 1988, nela introduzida pela participação popular na sua elaboração: os cidadãos e cidadãs passaram a poder submeter Projetos de Lei diretamente ao Legislativo, desde que subscritos por pelo menos 1% do eleitorado, distribuído em pelo menos cinco estados. A Iniciativa Popular de Lei deu assim, juntamente com o Referendo e o Plebiscito, igualmente previstos na Constituição, um pequeno toque de democracia semidireta ao nosso sistema de governo, ao se estabelecer que todo o poder emana do povo e será por ele exercido por representantes eleitos e por meio desses instrumentos. Foi essa afirmativa que, juntamente com a intensa pressão social que acompanhou a elaboração e aprovação da nova Constituição, levou a que fosse chamada de Constituição Cidadã. (WHITAKER, 2016, p. 233).

É inegável que nos anos que antecederam a promulgação da Constituição da República foram fundamentais para a reconstrução da democracia e inclusão do cidadão como legitimado a proposição de projetos de leis, consolidando a participação popular. Inclusive, cabe registrar que em 1992 foi encaminhado o primeiro projeto de lei de iniciativa popular que versava sobre o a criação de um Fundo Nacional de Habitação, não sendo aprovado pelo Congresso Nacional. Com efeito, “[...] A primeira Iniciativa Popular de Lei só foi, no entanto, aprovada pelo Congresso em 1994. Ela tipificava os crimes hediondos, e foi proposta depois do assassinato, que comovera a nação, de uma atriz filha de uma escritora de telenovelas. (WHITAKER, 2016, p. 231, grifo nosso) Como sinaliza Lilian Venturini (2018), participar da vida política nacional né um direito assegurado pela Constituição Federal, o que implica não apenas no direito de votar e 26

de ser votado, mas também, a iniciativa popular, plebiscito e referendo, conforme art. 14 e incisos da CF/88. Ocorre que mesmo que a Constituição de 1988 pontuasse esse direito, sinalizava igualmente que ele não é ilimitado e que uma lei específica deveria regulamentar e estabelecer determinadas condições para a inelegibilidade. Surge o caminho legal para o que convencionou-se chamar de “Lei da Ficha Limpa” – Lei Complementar n. 135/2010.

Esta lei, nascia por vias de lei complementar igualmente, alterando a Lei de Inelegibilidade de 1990, para definir novos critérios para que alguém fosse candidato a cargos eletivos no país. Como salienta Ladeira, o propósito da Lei Complementar nº 135 foi o de alterar a Lei Complementar nº 64, de 1990, atendendo ao disposto no art. 14, § 9º, da Constituição Federal, que “autoriza o legislador infraconstitucional a estabelecer novas hipóteses de inelegibilidade, visando proteger a probidade administrativa e a moralidade para exercício de mandato, considerada a vida pregressa do candidato.” (LADEIRA, 2015, p. 23).

A respeito dessa expressão que surge, “vida pregressa”, o TSE2 (Tribunal Superior Eleitoral) salienta que, na atualidade, em tema de eleições, vida pregressa restringe-se à existência ou não de inelegibilidade. Nessa linha de pensamento, Pinto (2012, p. 12) esclarece ser a expressão “vida pregressa” aquela existência “avaliada a partir das ações positivas e negativas praticadas por alguém ao longo do seu existir [...]”.

Importante também salientar que a Lei da Ficha Limpa surgiu de uma iniciativa popular, com campanha organizada pelo MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral), iniciada em abril de 2008. Salienta Venturini (2018, grifo nosso) que os idealizadores da proposta defendiam que a vida pregressa dos políticos deveria ser levada em conta e entendiam que as regras existentes eram insuficientes.

Para a proposta avançar na Câmara, os idealizadores precisavam reunir assinaturas equivalentes a de 1% do eleitorado brasileiro, exigência para projetos de lei de iniciativa popular. O movimento promoveu mobilizações em diversos estados e em seis meses tinha o apoio de 500 mil signatários.

2 A biblioteca do Tribunal Superior Eleitoral, dando continuidade ao Programa de Disseminação da Informação, elaborou por oportuno a Bibliografia selecionada intitulada Ficha Limpa, e na pesquisa foram utilizados os seguintes termos: ficha limpa, ficha suja, vida pregressa, presunção da inocência, Lei Complementar nº 64/1990 e Lei Complementar nº 135/2010. O produto tem por objetivo possibilitar o aprofundamento em estudos específicos de interesse dos magistrados e servidores do Judiciário, bem como dos especialistas e pesquisadores da área.

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1.604.815 foi o número de assinaturas coletadas pelo MCCE em apoio ao projeto da Ficha Limpa (VENTURINI, 2018).

Uma peculiaridade sobre a história da referida Lei residiu na dificuldade em coletar um número tão elevado de assinaturas. Mas na prática a dificuldade transformou-se em ganho, numa perspectiva democrática, como acentua Whitaker:

O sem número de apresentações, debates, campanhas que se fazem, ao longo de muito tempo, para convencer os eleitores a assinarem a Iniciativa, termina por esclarecer e interessar um número crescente de pessoas nos objetivos do Projeto de Lei. E isso se faz com maior facilidade – embora em tempo sempre longo – se ele responde a um anseio da sociedade, como foi o caso da Lei da Ficha Limpa, criando alguma esperança de que o problema que enfrenta seja superado. Essa é, aliás, uma importante dimensão pedagógica desse instrumento, numa perspectiva de educação política dos cidadãos, por meio da difusão de frases na divulgação das campanhas de assinaturas. A usada na Lei contra a compra de votos – “voto não tem preço, tem consequências” – foi uma excelente forma de elevar a consciência da importância do voto numa democracia. E a ideia de que representantes do povo tem que ter uma “Ficha Limpa”, para cumprir essa função, penetrou tanto nas consciências que as próprias organizações que compõem o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, que a levou ao Congresso, decidiram aplicar os mesmos critérios da Lei nas eleições de seus dirigentes. (WHITAKER, 2016, p. 236, grifo nosso).

Salienta ainda Venturini (2018) que a versão final da Lei era mais branda que o projeto inicial, e sugeria, por exemplo, que políticos com condenações já em primeira instância deveriam ser temporariamente barrados de eleições. Em pouco tempo, a campanha recebeu apoio de outras entidades e de parte da sociedade civil. Em 29 de setembro de 2009, os organizadores protocolaram o projeto na Câmara.

O projeto e as assinaturas foram recebidas à época pelo então presidente da Câmara, Michel Temer (MDB), que sinalizou que o processo teria alterações. “Deixar na mão de um único juiz é problemático”, afirmou sobre o principal ponto da proposta. A regra foi flexibilizada, passando a valer o entendimento de que seria necessária a condenação em segunda instância. A despeito de tentativas de parlamentares de abrandar a lei, o projeto avançou e em 11 de maio de 2010 a Câmara concluiu a votação. Oito dias depois, o texto teve o aval do Senado e em 4 de junho de 2010 o então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, sancionou a nova lei. (VENTURINI, 2018).

A Lei da Ficha Limpa visou, nas palavras de Ladeira (2015) estabelecer novas hipóteses de inelegibilidade, com o objetivo de barrar a candidatura a cargos eletivos de candidatos que, segundo os critérios dispostos no novo diploma legal, “não tivessem os requisitos morais necessários ao exercício do mandato político, em face de suas condutas 28

pregressas desabonadoras e que, por isso, representariam um risco ao sistema representativo se não fossem afastados da disputa eleitoral.” (LADEIRA, 2015, p. 24).

Como síntese das principais inovações trazidas pela Lei Complementar nº 135, de 2010, pode-se citar: 1. Aumento no rol dos crimes elencados no art. 1º, I, e; 2. No que se refere à rejeição das contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas, a exigência de que a ação do agente seja dolosa, bem como a necessidade de anulação ou suspensão da decisão pelo Poder Judiciário, e não apenas do ajuizamento da ação judicial; 3. Inclusão da imposição da inelegibilidade para os que forem condenados por captação ilícita de sufrágio; 4. Previsão da inelegibilidade para os que forem excluídos do exercício da profissão, por decisão sancionatória do órgão profissional competente, em virtude de infração ético- profissional, dos que forem demitidos do serviço público em decorrência de processo administrativo ou judicial e para os magistrados e membros do Ministério Público que forem aposentados compulsoriamente; 5. Aplicação da inelegibilidade aos condenados por terem simulado a cessação do vínculo conjugal ou da união estável, para evitar a inelegibilidade em razão de parentesco; 6. Exclusão da incidência da lei que estabelece casos de inelegibilidade sobre os crimes culposos, os de menor potencial ofensivo, os de ação penal privada e a renúncia para fins de desincompatibilização; 7. Abolição da exigência do trânsito em julgado da decisão judicial para fins de inelegibilidade, bastando a existência de decisão proferida por órgão judicial colegiado a partir da edição da nova lei; 8. Estabelecimento da prioridade na tramitação dos processos que versarem sobre desvio ou sobre abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, vedada a alegação de acúmulo de serviço; 9. Possibilidade de suspensão cautelar da inelegibilidade por decisão emanada do órgão colegiado competente; 10. Aumento do prazo das inelegibilidades para oito anos.

Até a aprovação da Lei da Ficha Limpa eram impedidos de concorrer os condenados sem direito a mais recursos judiciais. No entanto, isso gerava um entrave político - poderia 29

levar décadas para ter o caso transitado em julgado, até que os tribunais superiores dessem resolução ao processo. Convém admitir que, na prática, isso muito raramente acontecia. Geralmente os casos prescreviam e ninguém era barrado, bastando ter bons advogados para protelar ao máximo a decisão final do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal. Sob esse aspecto, portanto, para muitos a LC n. 135/2010 representou uma resposta à morosidade da Justiça brasileira.

A partir da Lei da Ficha Limpa pessoas condenadas em segunda instância por órgão colegiado já podem ter a candidatura barrada, mesmo que ainda tenha direito a recursos em tribunais superiores, de modo que um candidato pode ser proibido de disputar as eleições se for condenado pelos seguintes crimes, como salienta Venturini (2018):- contra a economia popular, a fé pública, a administração pública (como corrupção) e o patrimônio público; - contra o patrimônio privado, o sistema financeiro, o mercado de capitais; - contra o meio ambiente e a saúde pública; - eleitorais, para os quais a lei preveja pena privativa de liberdade; entre outros. (VENTURINI, 2018, s.p).

Outro ponto muito relevante e que trouxe mais rigor diz respeito a ampliação de três para oito anos o veto a candidaturas de governadores e de prefeitos que perderam os cargos eletivos por violação à Constituição Estadual e à Lei Orgânica do Município. Também estabeleceu mais critérios – a partir dela são barrados igualmente políticos condenados pela Justiça Eleitoral, sem chances de recursos, por práticas como compra de votos ou uso de doações ilegais. Atos de improbidade administrativa também configuram condições de inelegibilidade. A lei inclui ainda políticos que renunciam aos mandatos para evitar processos de cassação..(LC n. 135/2010)

Além disso, a Lei da Ficha limpa teve um significativo alcance, de modo a impor sanção de 8 (oito) anos a

[...] servidores públicos, magistrados e integrantes do Ministério Público por causa de processos administrativos ou que tenham sido punidos com perda de cargo. Igual período é aplicado a profissionais que tenham sido excluídos do exercício de suas profissões em razão de infrações ético-profissionais. (VENTURINI, 2018).

Cumpre ainda informar que essa questão já vem sendo discutida e apreciada, de forma exaustiva, em definitivo pelo STF - Supremo Tribunal Federal, que se posicionou pela 30

constitucionalidade da norma, no entanto, ainda há na ordem jurídica atual muita controvérsia acerca de sua constitucionalidade.

Destaca-se que existe uma corrente doutrinária que, apoiada no princípio da presunção de inocência, sustenta a inconstitucionalidade da Lei Complementar nº 135, de 2010, “porque considera que a inelegibilidade assume caráter sancionatório e que a ausência de previsão do trânsito em julgado da decisão constitui uma violação a direitos fundamentais.” (LADEIRA, 2015, p. 25).

Dessa forma, apesar de considerada a importância da garantia da presunção de inocência e que essa é uma conquista que não pode ser habitualmente flexibilizada, deve-se seguir o entendimento da Suprema Corte brasileira, que decidiu pela constitucionalidade da Lei Complementar nº 135, de 2010. Ademais, a presunção de inocência não é considerada uma garantia absoluta nem mesmo na seara penal, que permite a legitimidade das prisões provisórias. (LADEIRA, 2015, p. 26).

Segundo Alexandre de Moraes, a Constituição Federal estabelece que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória,

[...] consagrando a presunção de inocência, um dos princípios basilares do Estado de direito como garantia processual penal, visando à tutela da liberdade pessoal. Dessa forma, há a necessidade de o Estado comprovar a culpabilidade do indivíduo, que é constitucionalmente presumido inocente, sob pena de voltarmos ao total arbítrio estatal. (MORAES, 2012, p. 124).

Acentua-se que o debate em nível acadêmico e doutrinário ainda segue com muitas reflexões a respeito dessas questões que estão no cerne da temática da ficha limpa. Mas a pesquisa não pode se alongar em detalhes e é preciso adentrar na sequência em especificidades sobre o sistema político-eleitoral brasileiro e compreender seus desafios e perspectivas com relação à corrupção que está enraizada na classe política brasileira.

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2.2 O sistema político-eleitoral brasileiro: desafios e perspectivas como ambiente propicio à corrupção

Vale a pena relembrar que o sistema político-eleitoral eleitoral brasileiro remete, sem sombra de dúvidas, ao que normalmente os doutrinadores constitucionalistas, entre eles, José Afonso da Silva, Paulo Bonavides e outros, designam como o conjunto de sistemas eleitorais utilizados no Brasil para eleger representantes e governantes e definidos na CF/88 e Código Eleitoral- Lei 4.737/195 e regulado pelo Tribunal Superior Eleitoral.

Neste sentido, o Tribunal Superior Eleitoral, utilizando-se das palavras de Gomes (2011, p. 105) explica que:

Os sistemas eleitorais têm como função a organização das eleições e a conversão de votos em mandatos políticos, visando proporcionar uma captação eficiente, segura e imparcial da vontade popular democraticamente manifestada, de forma que os mandatos eletivos sejam exercidos com legitimidade. Também é função dos sistemas eleitorais o estabelecimento dos meios para que os diversos grupos sociais sejam representados e as relações entre representantes e representados se fortaleçam

Examinando o que o autor supracitado menciona, é imprescindível entender que mesmo que para o Direito Eleitoral existam os sistemas eleitorais o majoritário, o proporcional e o distrital misto, aborda-se apenas os sistemas que são utilizados em nosso país e contemplados pela CF/88, quais sejam os sistemas majoritário e proporcional, sem no entanto exaurir o assunto, pois o que interessa para essa pesquisa é verificar quais os fatores que devido a sua consistência interferem no processo eleitoral e provocam a corrupção, objeto desse estudo.

Não obstante o Direito Eleitoral ter três sistemas tradicionais - o majoritário, o proporcional e o misto (este é formado pela combinação de elementos daqueles), cabe neste trabalho debruçar-se sobre os dois primeiros. Nesta pesquisa é necessário definir os sistemas eleitorais majoritário e proporcional, antes de adentar nas especificidades apresentadas pela CF/88, Arts. 46 e 77, §, §2º, quanto à aplicabilidade do sistema majoritário, e nos Arts. 45, 27 §1º e 29 e quanto ao sistema proporcional que é utilizado exclusivamente para eleições de deputados e vereadores. 32

Na Constituição do Brasil estão consagrados os sistemas majoritário e proporcional. O sistema majoritário funda-se no princípio da representação “da maioria” em cada circunscrição. Como explica Gomes (2017, p. 150), por meio dele,

[...] cada circunscrição eleitoral (União, Estado, Distrito Federal e Município) equivale a um distrito. O candidato que receber a maioria – absoluta ou relativa – dos votos válidos do distrito (ou circunscrição) é considerado vencedor do certame. Por maioria absoluta compreende-se a metade dos votos dos integrantes do corpo eleitoral mais um voto. Todavia, se o total de votantes encerrar um número ímpar, a metade será uma fração. Nesse caso, deve-se compreender por maioria absoluta o primeiro número inteiro acima da fração. A exigência de maioria absoluta prende-se à ideia de ampliar a representatividade do eleito, robustecendo sua legitimidade. Já a maioria relativa ou simples não leva em conta a totalidade dos votantes, considerando-se eleito o candidato que alcançar o maior número de votos em relação a seus concorrentes.

O uso do sistema majoritário foi adotado nas eleições nacionais para a chefia do Poder Executivo (Presidente da República, Governador, Prefeito e respectivos vices) e Senador (e suplentes), conforme previsão dos Arts. 28, caput, 29, II, 32 §2º, 46 e 77, §2º da Constituição Federal. Esse sistema compreende, nas palavras de Gomes, duas espécie:

Pela primeira – denominada simples ou de turno único –, considera-se eleito o candidato que conquistar o maior número de votos entre os participantes do certame. Não importa se a maioria alcançada é relativa ou absoluta. É isso que ocorre nas eleições para Senador, bem como nas eleições para Prefeito em municípios com menos de 200.000 eleitores, nos termos do artigo 29, II, da Lei Maior. Já no chamado sistema majoritário de dois turnos, o candidato só é considerado eleito no primeiro turno se obtiver a maioria absoluta de votos, não computados os em branco e os nulos. Caso contrário, faz-se nova eleição. Esta deve ser realizada no último domingo de outubro, somente podendo concorrer os dois candidatos mais votados. Considera-se eleito o que obtiver a maioria dos votos válidos (CF, art. 77, §3º). Tal se dá nas eleições para Presidente da República, Governador, Prefeito e seus respectivos vices em municípios com mais de 200.000 eleitores. (GOMES, 2017, p. 150).

Já o sistema proporcional implica, em linhas gerais, no sistema de representação como meio pelo qual é assegurado aos partidos um número de cadeiras no Parlamento na proporção exata dos votos que recebidos nas respectivas eleições. Alexandre de Moraes (2005) preceitua que o sistema proporcional adota duas formas para definir quais candidatos serão eleitos: o escrutínio de lista (aberta e fechada) e o voto de legenda, no sistema aberto não há ordem de precedência entre os candidatos apresentados pelo partido, sendo eleitos os que forem mais votados, enquanto na lista fechada o partido confecciona uma lista partidária e estabelece uma 33

ordem de prioridade entre os seus candidatos, em decorrência disso são eleitos os candidatos que estiverem colocados nas primeiras posições da referida lista.

Do exposto pode-se fazer o seguinte organograma a respeito dos dois sistemas adotados pelo Brasil:

Sistema proporcional Sistema majoritário Sistema Majoritário de lista aberta: simples: em dois turnos: • Eleições para • Eleições para • Presidente da Deputado Federal, Senadores (Art. 46, República (Art. 77, Deputado Estadual e CF), Prefeitos de CF), Governador Vereador (CF, Arts. Municípios com até Estado ou do DF 45, 27, §1º e 29) duzentos mil (Art. 28, CF), eleitores (Art. 29, II, Prefeitos de CF) Municípios com mais de duzentos mil eleitores (Art. 29, CF)

Algumas recentes alterações advindas da importante fonte do direito e que tem ganho cada vez mais proeminência no âmbito jurídico, qual seja, a jurisprudência, veio a desenhar um cenário a nosso entender mais isonômico para os pleitos eleitorais. Trata-se do olhar do STF sobre o percentual do quoficiente eleitoral.

Sobre tal questão salienta Vital (2020) salienta ser constitucional a regra do artigo 4º da Lei 13.165/2015 que exige que, para que o candidato seja eleito a cargo legislativo, tenha obtido individualmente a marca de 10% do quociente eleitoral. E o entendimento da Suprema Corte é de que o “regramento corrige distorções na eleição proporcional, reforça a manifestação da vontade pessoal do eleitor e coíbe o puxador de votos.” (grifo nosso)

A lei, contestada por ação direta de inconstitucionalidade, alterou o artigo 108 do Código Eleitoral. Até sua entrada em vigor, pela mini reforma eleitoral, o voto proporcional em lista aberta era definido calculando-se o quociente eleitoral (divisão dos votos válidos pelo número de cadeiras parlamentares). Em seguida calculava-se o quociente partidário (divisão do número de votos do partido pelo quociente eleitoral). O que ocorria até então era que candidatos que tivessem votação muito expressiva conseguiam elevar o quociente partidário, aumentando o número de cadeiras do partido e elegendo candidatos de menor expressão. O artigo 4º da Lei 13.165/2015 34

definiu que, para assumir o cargo, o candidato precisa de votação nominal de pelo menos 10% do quociente eleitoral.

Convém ainda salientar que nas duas eleições pretéritas já se deu as novas regras em vigor e só no pleito último, de 2018, a exigência de 10% do quociente eleitoral impediu a posse de oito candidatos – sete por São Paulo e um por Minas Gerais. Juntos, eles somaram 171 mil votos. Já os candidatos que se beneficiaram da nova regra reuniram 609 mil votos, quase seis vezes mais. (VITAL, 2020).

Na sequência da pesquisa, abordado será a questão dos elevados custos das campanhas e suas implicações nos pleitos eleitorais.

2.2.1 Custos elevados das campanhas eleitorais

Contemporaneamente, alia-se diretamente o sucesso eleitoral de determinado partido ou candidato aos “números” por trás do processo eleitoral. De regra, o sucesso nas eleições depende, em grande medida, da realização de campanhas que tendem a envolver um custo econômico elevado, de modo que a maior parte creditar que as maiores chances de êxito dos candidatos nos pleitos eleitorais estão geralmente condicionadas à divulgação do seu nome e imagem entre o eleitorado, o que envolve geralmente, no esclarecimento de Souza Neto e Sarmento (2014, p. 13), “gastos expressivos com a produção de material de propaganda, aquisição de espaço na mídia, contratação de cabos eleitorais, realização de eventos públicos e aluguel de imóveis e veículos, dentre inúmeras despesas.”

Toda essa dinâmica torna a política extremamente dependente de um poder paralelo de grande força - o poder econômico, o que, nas palavras de Souza Neto e Sarmento (2014, p. 13), “se afigura nefasto para o funcionamento da democracia”. Ainda segundo os mesmos autores,

Com efeito, a excessiva infiltração do poder econômico nas eleições gera graves distorções. Em primeiro lugar, ela engendra desigualdade política, na medida em que aumenta exponencialmente a influência dos mais ricos sobre o resultado dos pleitos eleitorais, e, consequentemente, sobre a atuação do próprio Estado. Ela, por outro lado, prejudica a capacidade de sucesso eleitoral dos candidatos que não possuam patrimônio expressivo para suportar a própria campanha e tenham menos acesso aos financiadores privados, detentores do poder econômico. Nesta última perspectiva, tal fenômeno gera, inclusive, o afastamento da política de pessoas que 35

desistem de se candidatar, por não contarem com os recursos necessários para uma campanha bem sucedida ou com os “contatos” que propiciem a obtenção destes recursos. Além disso, dita infiltração cria perniciosas vinculações entre os doadores de campanha e os políticos, que acabam sendo fonte de favorecimentos e de corrupção após a eleição. (SOUZA NETO e SARMENTO, 2014, p. 13-14, grifo nosso).

É um debate que envolve diversos atores e perspectivas. É de se duvidar se um grande empresário que investia milhões em campanhas, o fazia por mera convicção política, de modo a retribuir socialmente por esse investimento, ainda que tenha retornos tributários para tal. E é nesse contexto que surge o debate sobre outras modalidades de financiamento para as campanhas eleitorais, chegando-se à ideia de um fundo público para essa finalidade.

O tema do financiamento eleitoral é bastante polêmico, pois de um lado tem os partidos tradicionais querem apenas a manutenção do poder e do outro os partidos que não conseguem arrecadar elevadas quantias de dinheiro para adentrar na vida política e pleiteiam meios mais equitativos de financiamento, formas mais igualitárias de redistribuição de valores para as campanhas de seus candidatos e de seus fundos partidários. (SOUZA NETO et.al., 2014)

Nessa linha de exposição apresentam-se novamente Souza Neto e Sarmento (2014, p. 19):

Em um sistema democrático, vigora o princípio da igualdade política; todos devem ter iguais possibilidades de participar do processo político e de influenciar na formação da vontade coletiva. Quando a desigualdade econômica produz desigualdade política, estamos diante de um sistema patológico, incompatível com os princípios que integram o núcleo básico da democracia constitucional.

Recentemente, nasceu em meio a todo esse debate a Lei n. 13.165 de 29 de setembro de 2015. Pode-se dizer, sem exageros, que essa nova legislação eleitoral trouxe muitas mudanças na forma de fazer política no cenário nacional. Pelos regramentos anteriores inexistia limites máximos para gastos financeiros com campanha, detalhando o que cada candidato poderia gastar para pleitear um cargo numa eleição, nem uma forma rígida de prestação de contas do candidato, partido ou coligação para com o TSE - havia apenas apresentação de uma documentação comprobatória de gastos com a campanha eleitoral, sem maiores detalhamentos sobre a maneira como tais recursos foram aplicados.

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Era permitido, ainda, o financiamento privado de campanha, através de empresas que aplicavam seu dinheiro em determinado candidato, coligação ou partido político em troca de “favores futuros”. Dessa maneira, a Lei n. 13165/15, ao ser promulgada, foi aplicada já nas eleições de 2016 e mais soberanamente nas de 2018, e trouxeram, por certo, uma forma mais igualitária e justa de fazer política no Brasil.

Em se tratando especificamente da aplicação do fundo partidário, a lei determina que os recursos oriundos do Fundo Partidário sejam assim aplicados: a) na manutenção das sedes e serviços do partido, permitido o pagamento de pessoal, a qualquer título, este último até o limite máximo de vinte por cento do total recebido; b) na propaganda doutrinária e política; c) no alistamento e campanhas eleitorais; d) na criação e manutenção de instituto ou fundação de pesquisa e de doutrinação e educação política, sendo esta aplicação de, no mínimo, vinte por cento do total recebido.

Nos termos do Art. 37-A da Lei nº 9.096/95, incluído pela reforma eleitoral, “a falta de prestação de contas implicará a suspensão de novas cotas do Fundo Partidário enquanto perdurar a inadimplência e sujeitará os responsáveis às penas da lei”. Assim, enquanto o partido político não prestar constas à Justiça Eleitoral ficará ele impedido de receber Fundo Partidário.

Especialmente no que diz respeito aos gastos de campanha e aos limites para isso, de acordo com a Lei anterior, esclarecem Chaves e Severo (2015, p. 90-91) que,

[...] os partidos estabeleciam na convenção os valores máximos de gastos para cada cargo eletivo, em cada eleição que concorriam, comunicando o teor da deliberação à Justiça Eleitoral no pedido de registro das candidaturas. Com a nova disciplina, essa sistemática deixa de existir, pois houve revogação expressa do art. 17-A e do art. 18, §1º, da Lei nº 9.504/97 (conforme art. 15 da Lei nº 13.165/2015), e o art. 18, caput, da Lei Eleitoral passou a ter a seguinte redação: “os limites de gastos de campanha, em cada eleição, são os definidos pelo Tribunal Superior Eleitoral com base nos parâmetros definidos em lei”. Como se observa, a reforma atribui ao Tribunal Superior Eleitoral a competência para definir o valor nominal limite para os gastos de campanha, em cada eleição e para cada cargo disputado, com base nos parâmetros legais.

A reforma também deu nova redação ao §3º do art. 39 da Lei dos Partidos Políticos, dispondo de forma mais ampla sobre os meios que podem ser utilizados para se promover a 37

doação de recursos para a agremiação. A redação anterior somente mencionava que as doações poderiam ser “efetuadas por cheque cruzado em nome do partido político ou por depósito bancário diretamente na conta do partido político”.

Com a nova disposição sobre a matéria, as doações de recursos financeiros poderão ser efetuadas na conta do partido político por meio de: cheques cruzados e nominais ou transferência eletrônica de depósitos; depósitos em espécie devidamente identificados; ou mecanismo disponível em sítio do partido na internet que permita inclusive o uso de cartão de crédito ou de débito e que atenda aos requisitos de identificação do doador e emissão obrigatória de recibo eleitoral para cada doação realizada.

2.2.2 Modalidades de investidura em cargos públicos

Existem distintas maneiras de ascender a um cargo dito “público”. De forma geral, o que comumente se sabe é da necessidade de realização prévia de processo seletivo denominado concurso público, mas não é apenas esta a maneira por excelência de se conseguir esse “status”. A respeito de cargos e funções públicas, convém salientar que as disposições legais reguladoras das relações jurídicas entre os servidores públicos estatutários e a administração pública federal encontram-se na Lei n. 8112/1990 e que esta ainda é utilizada subsidiariamente por estados e até mesmo municípios em determinadas situações para suprir determinada lacuna legal ou servir de orientação.

No Art. 39 da CF/88 está o dispositivo que determina à União, Estados, Distrito Federal e Municípios a instituição de regime jurídico único para seus servidores integrantes das respectivas administrações diretas, autarquias e fundações públicas. Consoante o disposto no Art. 3º da Lei n. 8112/90, cargo público é o

[...] conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na estrutura organizacional da administração que devem ser cometidas a um servidor. Os cargos públicos são criados por lei, com denominação própria e vencimento pago pelos cofres públicos, para provimento em caráter efetivo ou em comissão. Vê-se que todo cargo, por representar um conjunto de atribuições, obrigatoriamente está relacionado a uma função pública. É possível haver agentes públicos com função pública e sem cargo, mas não o inverso. (ALEXANDRINO e PAULO, 2012, p. 356).

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No entanto, a discussão específica do trabalho nos leva a trazer a terminologia acerca dos servidores públicos, mas especialmente a daqueles que, de forma diferenciada, se tornam agentes públicos devido a questões circunstanciais e na maioria das vezes temporária. Trata-se dos “agentes políticos”, que, nas palavras de Maria Sylvia Zanella Di Pietro são, portanto, agentes políticos, no direito brasileiro, os que

[...] exercem típicas atividades de governo e exercem mandato, para o qual são eleitos, apenas os Chefes dos Poderes Executivos federal, estadual e municipal, os Ministros e Secretários de Estado, além de Senadores, Deputados e Vereadores. A forma de investidura é a eleição, salvo para Ministros e Secretários, que são de livre escolha do Chefe do Executivo e providos em cargos públicos, mediante nomeação. (DI PIETRO, 2012, p. 583, grifos da autora).

Dentro desse nicho dos “agentes políticos”, portanto, que se enquadram aqueles que devido ao exercício da democracia representativa que reina em nosso país, são eleitos e ficam encarregados por um tempo determinado a trabalhar em prol do bem público e de toda nação. Dessa maneira são eleitos os vereadores e prefeitos em nível municipal, a cada intervalo de 4 (quatro) anos. Dois anos após as eleições municipais, ocorrem em nível nacional as eleições em nível nacional, para a escolha de deputados estaduais e federais, bem como a escolha de senadores da República, dos governadores dos estados e igualmente para a Presidência do Brasil.

Via de regra, caso não peçam afastamento para fins eleitorais ou particulares e não sofram impeachment, o mandato é cumprido pelo período de 4 (quatro) anos consecutivos e na verdade, os eleitos são representantes do povo.

Neste ponto, surge uma questão que se refere à participação das pessoas que fazem parte das minorias no cenário político, como por exemplo, comunidades quilombolas, os indígenas, portadores de deficiência, grupo LGBTs3, entre outros na política brasileira, assunto que se desenvolverá a seguir.

3 LGBTs - sigla de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros. 39

2.2.3 Sub-representação das minorias na política brasileira

A história das teorias e das instituições da representação política é um trajeto constituído por diversas tentativas de compreender a temática das maiorias versus minorias, como explica o estudo de Maria Leticia Juliano Diniz Brito. Nas palavras da autora, essa procura pelas variáveis explicativas de como está estruturada a representação política nos governos democráticos está associada aos temores suscitados pela busca de uma maior igualdade política, de modo que

[...] ao analisar a questão da minoria, a maior parte da literatura, iria buscar meios de evitar ou de pelo menos amenizar os efeitos da tirania da maioria. Diante desse debate, diversos mecanismos foram sugeridos, como o proporcional, o voto incompleto e o limitado. (BRITO, 2016, p. 21).

Por outro lado, Nascimento explica que o sistema representativo atual, mostra com clareza que grupos ou pessoas os que dispõem de recursos financeiros e compõem a dinâmica burguesa não estão preocupados em promover a inserção das minorias.

Nessas circunstâncias, aduz o referido autor que:

A compreensão tradicional de participação política é a liberal, que se limita à participação eleitoral e ao sistema representativo, elementos característicos, por sua vez, de uma dinâmica burguesa, que dificulta o acesso dos grupos historicamente marginalizados e desprovidos de força econômica ao aparato estatal. É notória a visão conservadora da participação política tradicional, inviabilizando a integração das minorias. (NASCIMENTO, 2006, p. 68-69).

Ainda sobre a participação política das minorias, ressalta-se que é uma das questões centrais de uma democracia, consolidada e, nas palavras do autor referido acima, apenas os regimes democráticos privilegiam a participação dos vários setores sociais podem ser, efetivamente, considerados democráticos, pois

Modelos políticos em que há um padrão cultural hegemônico, imposto aos demais estratos sociais, têm matriz autoritária, sendo responsáveis por várias atrocidades na história da humanidade. Destarte, a participação política das minorias é um bom critério para se aferir o nível de democracia num dado sistema político. (NASCIMENTO, 2006, p. 58)

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Observa-se que os dilemas vivenciados pelas minorias, geralmente possuem como causa, a exclusão do modo de vida ou a exclusão da participação política, nas palavras de Nascimento:

A primeira forma de exclusão está relacionada com a sonegação social que a cultura de uma dada minoria enfrenta, ou seja, os costumes e as tradições de determinado grupo são ignorados, desrespeitados e, por vezes, criminalizados pela cultura socialmente dominante. Já a exclusão da participação política implica na impossibilidade, formal ou material, de acesso das minorias ao processo de tomada de decisões do Estado. (NASCIMENTO, 2006, p. 61).

São bastante frequentes as queixas no sentido de evidenciar o caráter excludente das normas de representação. As pessoas muitas vezes reclamam que os grupos sociais dos quais fazem parte ou com os quais têm afinidade não são devidamente representados nos organismos influentes de discussões e tomadas de decisão, bem como nos meandros do poder, em distintos níveis – local, regional e nacional, e nas diferentes áreas de diálogo e gestão, a exemplo dos poderes legislativo, executivo e judiciário.

Levantamento feito por um site jurídico - Justificando, com base em dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e da Câmara dos Deputados, identifica que as minorias que mais sofrem com a atuação parlamentar não fazem parte do Congresso, ou fazem em número ínfimo e muito menor ao que seria se houvesse uma distribuição proporcional das cadeiras, tomando por base a população brasileira.

Tomando como base dados do TSE, verifica-se que minorias compostas por indígenas, negros, idosos, grupos LGBTs, portadores de deficiência, por exemplo, ainda sofrem discriminação social e não conseguem ser incluídos como cidadãos com o direito de votar e ser votado.

Neste sentido, a Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou a Declaração Universal dos Direitos Humanos em que relaciona garantias que valem para todos, abrangendo direitos civis, sociais, políticos e econômicos. No documento, a ONU ressalta que todas as pessoas têm direito de opinião e de liberdade para se associar com fins políticos, podendo participar do governo com o direito de votar e ser votado, consoante Arts. 20 e 21 da referida Declaração. (TSE, 2013). 41

No ano de 1975, a ONU estabeleceu a Declaração sobre os Direitos das Pessoas com Deficiências, que marcou o início de uma luta histórica pela defesa da cidadania e do bem- estar destas pessoas. Dessa forma, estabeleceu que deficientes, independentemente da origem, natureza e gravidade de suas incapacidades, têm os mesmos direitos que os outros cidadãos, o que implica o direito de uma vida tão normal quanto possível.

No entanto, é importante lembrar que, além dos direitos relativos a todos, as pessoas com deficiência precisam ter direitos específicos, que compensem, na medida do possível, as limitações ou impossibilidades a que estão sujeitas. Por essa razão, as pessoas com deficiência apresentam necessidades especiais, que exigem um tratamento diferenciado para que possam realmente ser consideradas cidadãs. (TSE, 2013)

E nesse sentido nasceu o Decreto nº 6.949/2009, que trata dos direitos da pessoa com deficiência, e especificou tais direitos. No tocante à participação na vida política e pública, o Decreto determina no Art. 29 que os Estados partes da Federação devem garantir às pessoas com deficiência direitos políticos e oportunidade de exercê-los em condições de igualdade com as demais pessoas. Assim, elas têm o direito de participar efetivamente da vida política, diretamente ou por meio de representantes livremente escolhidos, incluindo o direito de votar e serem votadas. (TSE, 2013).

Na busca de atender tais critérios, o TSE já adota medidas que visam garantir a inclusão dessas pessoas. Em 2012 foi instituído o Programa de Acessibilidade da Justiça Eleitoral, voltado para atender às demandas dos eleitores com deficiência ou mobilidade reduzida. Com isso a Justiça Eleitoral busca eliminar obstáculos dentro das seções eleitorais que impeçam ou dificultem o acesso dessas pessoas ao local de votação. (TSE, 2013).

Por fim, é importante salientar que a sub-representação política não é apenas um problema das minorias, mas está presente também em grupos majoritários, como mulheres e negros, de modo que ano passado, em abril de 2019, a Comissão de Direitos Humanos do Senado debateu os desafios para uma melhor e maior representatividade política no Brasil.

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2.2.4 Permissividade social

De todo o exposto até então, especialmente sobre os princípios, e também no início capitular dessa segunda parte da pesquisa, fica evidente que há certos limites para a atuação de quem pretende se lançar a uma candidatura. No entanto, mesmo com a existência e obrigatoriedade da aplicação do princípio da moralidade não consegue fazer barreira a quem se acha acima da lei e obtêm vozes silenciosas a seu favor.

Dito de outra maneira, o que é um tanto corriqueiro no Brasil é, mesmo após a edição da Lei Complementar n. 135/2010 que veio a dar nova roupagem e mais seriedade a cargos eletivos públicos, ainda vivemos situações onde parece que a letra da lei é morta ou sem eficácia. Está certo que não são todos os políticos que ela conseguiu alcançar, mas o anseio que ela carregava dentro de si precisa dizer muito. Parecia gritar – chega de corrupção, de usurpar o dinheiro público, de roubar e desviar o dinheiro do povo!

Com essa introdução, quer-se fazer alusão à significativa permissividade social diante de muitos fatos – por vezes até notórios que se tem notícia em jornais, meios de comunicação em geral, e também dentro dos tribunais de primeira, segunda e terceira instância do país. Não são poucos os casos em que o cidadão é reconhecidamente mal pagador, desonesto ou tem uma vida familiar e pregressa péssima e ainda assim consegue bem se eleger. Mas o foco aqui são aqueles que inclusive já obtém reconhecimento social notório de sua má gestão e mesmo assim são reeleitos.

Há que se evidenciar que tais práticas encontram fatores facilitadores para que ocorram constantemente na sociedade brasileira, tendo em vista as heranças históricas patrimonialistas e o famoso “jeitinho brasileiro”. Desta forma, a realização de um estudo que se propõe a compreender a corrupção no Brasil e a eficiência da Lei da Ficha Limpa torna-se de significativa relevância, buscando conceber os aspectos históricos da corrupção e, ainda, analisando casos consolidados onde, no ambiente político, foi possível evitar que alguns candidatos fossem adiante no seu pleito eleitoral.

Casos como esses podem ser citados com variedade. Para não se alongar em demasia, cita-se o caso de , que geram indagações dos motivos pelos quais os brasileiros abominam os políticos corruptos mas não raramente os reelegem? E Fernando Collor de 43

Mello então ex-Presidente da nação e retirado do poder notoriamente por corrupção no passado, volta à arena pública com muitos votos e para não nada menos que Senador da República!

Talvez o que se tenha discutido na fase inicial desse trabalho, deva ser repensado. Questiona-se: existem dois polos no nível da corrupção, quais sejam, o corruptor e o corrupto? Ou um terceiro e significativo ator entra na arena pública para auxiliar a jogar esse jogo ou ao menos para manter o status quo de outro interessado? Aquele que muitas vezes não quer discutir política alegando de nada adiantar mas que vê sob seus olhos acontecimentos desprezíveis na seara pública sem esboçar reação alguma, ou aqueles que diante mesmo da notoriedade de um caso concreto ainda assim se apegam a valores distintos, a máscaras partidárias ou a argumentos sem base sólida para seguir engrossando a massa dos que consentem com o andamento das coisas como estão.

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3 ANÁLISE DE JULGAMENTOS EFETUADOS PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL E A APLICABILIDADE DA LEI DA FICHA LIMPA NAS ELEIÇÕES DE 2018

A pesquisa encaminha-se para o desfecho final e objetiva comprovar o quanto a Lei da Ficha Limpa tem sido uma aliada da sociedade e do processo democrático.

A democracia apresenta como requisitos essenciais a existência de eleições livres e idôneas, o direito e igualdade do voto e a elegibilidade para cargos políticos, que são basilares para uma democracia sustentada sob possibilidades e dimensões de contestação pública e inclusividade, de seus cidadãos, conforme aduz Abreu e Silva (2015, p.13-14).

Portanto, pretende-se abordar objetivamente a aplicabilidade da Lei da ficha limpa a partir da análise de julgamentos efetuados pelos Supremo Tribunal Federal e Tribunal Superior Eleitoral no que tange à Ação Penal 470 - AP 470; a Operação Lava-jato, bem como estuda-se o caso “Luiz Inácio Lula da Silva”, com o intuito de demonstrar que há uma tendência em barrar candidatos envolvidos em casos de corrupção, imoralidade, e desse modo, inelegíveis.

Em sequência, analisa-se alguns casos que envolvem candidatos ao governo estadual, como os cases que envolvem Ângelo Castro (PCO), Acir Gurgacz (PDT) e Marcelo Candido (PDT), dos Estados de Santa Catarina, Rondônia e São Paulo, respectivamente .

Este capítulo quer demonstrar que ações julgadas pelo STF e TSE fazem parte de um contexto político e social, no qual as pessoas esperam ansiosamente que as mudanças normativas que acarretaram na criação da Lei da ficha limpa, desmistifiquem a impunidade e que está presente no meio político e que aponte os verdadeiros envolvidos e às entidades ligadas à corrupção, pois o seu conteúdo tem um viés moralizantes

3.1 Ação Penal n. 470

Como visto no capítulo inicial da pesquisa, a trajetória nacional é permeada de acontecimentos não tão enraizados em moralidade e desde o início do povoamento e 45

colonização o Brasil foi uma grande porta para exploração de variados capitais e minerais, inclusive de especulação e de corrupção. O tal “jeitinho brasileiro4” está presente em todas as esferas, e no âmbito da política não é diferente. Decorrido mais de 10 anos, o Estado brasileiro vivenciou um grande julgamento que envolveu múltiplas pessoas, sobretudo políticos de grande popularidade social e de notícias na mídia nacional. A Ação Penal n. 470, uma das mais complexas e longa da história do STF envolvia acusados de participar do esquema de compras de votos que ficou conhecido como “Mensalão”.

Mas como isso tudo começou? A seguir uma síntese do início do processo que se arrastou por longos anos e ganhou os holofotes inclusive da mídia internacional:

O caso ocorreu durante o governo do então ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e foi divulgada ao público em 14 de maio de 2005 através de uma gravação na qual o ex-chefe do DECAM/ECT, Mauricio Marinho, pedia e recebia vantagem para beneficiar, de forma ilícita, um empresário, na verdade o “empresário” era o advogado Joel Santos Filho que realizou a gravação com a intenção de denunciar o crime. Em 06 de junho de 2005, o ex-deputado federal Roberto Jefferson deu detalhes a respeito de um esquema de corrupção de parlamentares que recebiam quantias em dinheiro em troca de apoio político ao Governo e ao Partido dos Trabalhadores com a finalidade de garantir o poder adquirido em 2002 e custear futuras campanhas eleitorais. (OLIVEIRA e SILVEIRA, 2015).

Verifica-se, assim, que o pagamento e recebimento de propinas para obtenção de apoio político dos parlamentares para custear futuras campanhas eleitorais e manter-se no poder por mais tempo.

Desse modo, para melhor compreensão da tramitação da referida ação, abaixo colaciona-se uma cronologia dos acontecimentos que antecederam à Ação Penal n. 470 que culminaram na aprovação final pelo STF, com os principais fatos desde a fase de investigação para apresentação da denúncia, que foi recebida pelos ministros da Corte no Inquérito n. 2245:

4 Um dos grandes estudiosos acerca do jeitinho brasileiro e sua importância dentro da sociedade brasileira é o antropólogo Roberto DaMatta, autor de obras significativas no Brasil como Carnavais, malandros e heróis: para uma sociologia do dilema brasileiro, O que faz do Brasil, Brasil? O jeitinho brasileiro é uma prática tida como histórica no Brasil, além de ser considerada parte do cotidiano da sociedade brasileira, sendo um conceito pensado muitas vezes no senso comum e amplamente aceito no país,[...]” ( PRADO, 2020).

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Inquérito (INQ n. 2245)

26 de julho de 2005 Inquérito é autuado no STF O Inquérito 2245 é autuado no STF após ser remetido pela Justiça Federal de Minas Gerais em razão da presença de investigados que gozam de foro por prerrogativa de função. Os autos chegaram ao STF como PET 3469, em 20 de julho de 2005. 30 de março de 2006 PGR apresenta denúncia O então procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, denuncia 40 pessoas que, segundo ele, se beneficiaram do esquema. 11 de abril de 2006 Supremo revoga segredo de STF revoga segredo de justiça imposto ao justiça Inquérito 2245 desde sua autuação. Porém, informações obtidas por meio de quebra de sigilos bancário, fiscal e telefônico continuam sob segredo (acessíveis somente aos advogados das partes). Ministro relator determina a notificação dos 40 acusados para responderem à denúncia em 15 dias. 11 a 26 de maio de 2006 Inquérito é digitalizado Em iniciativa inédita, as então 14 mil páginas do inquérito começam a ser digitalizadas para dar mais celeridade ao processo. No dia 26, termina a digitalização do inquérito, já com 40 mil páginas. Continuam bloqueados dados sigilosos e solicitações de diligências do Ministério Público Federal. 31 de maio de 2006 Advogados recebem senha de acesso Em julgamento de questão de ordem, Plenário autoriza advogados dos acusados a acessar autos do inquérito por meio de senha. 4 de setembro de 2006 Inquérito muda de fase Inquérito entra em nova etapa (início da elaboração do voto), após fim da fase das notificações finais e defesas prévias. 6 de dezembro de 2006 Plenário decide julgar todos os Por maioria de votos, Plenário decide, em questão acusados de ordem, não desmembrar o inquérito e julgar os 40 denunciados 26 de julho de 2007 Definida data para julgamento da STF marca data para julgar o inquérito: dias 22, 23 denúncia e 24 de agosto 2 de agosto de 2007 1º dia de julgamento é destinado à No primeiro dia de julgamento – que foi realizado defesa dos réus com 10 ministros, em razão da aposentadoria do ministro Sepúlveda Pertence, em 16 de agosto –, o ministro lê seu relatório e informa que os acusados estão divididos em três núcleos: central ou político-partidário, publicitário e financeiro. O procurador-geral defende o recebimento da denúncia. 23 de agosto de 2007 Plenário aceita denúncia contra Concluídas as defesas. Ao final da sessão, três diretores do Banco Rural ministros já haviam votado para receber denúncia contra quatro dirigentes do Banco Rural: Kátia Rabello, José Roberto Salgado), Ayanna Tenório e Vinicius Samarane são acusados de gestão fraudulenta de instituição financeira. 24 de agosto de 2007 Plenário aceita denúncia contra 19 No terceiro dia de julgamento, ministros decidem, acusados por unanimidade, receber denúncia de lavagem de dinheiro contra integrantes do núcleo publicitário e do núcleo financeiro. Ao final do dia, 19 acusados já são réus no processo. Inicialmente previsto para durar três dias, o julgamento exige a convocação de mais duas sessões. 28 de agosto de 2007 Denúncia é recebida contra os 40 Após 5 sessões de julgamento, Plenário recebe acusados parcialmente a denúncia contra todos os acusados. STF expede cartas de ordem para que as diversas instâncias da Justiça Federal tenham ciência da decisão e cumpram mandados de citação decorrentes da ação penal que passa a tramitar no STF. Os acusados têm conhecimento oficial e podem preparar defesas. 47

Ação Penal n. 470 (AP 470)

12 de novembro de Ação Penal 470 é Após a publicação do acórdão no 2007 instaurada Diário da Justiça, o Inquérito 2245 é convertido na Ação Penal 470. Relator dá início aos atos instrutórios necessários. 6 de dezembro 2007 STF mantém atuação de Por unanimidade, os ministros juízes federais decidem manter interrogatórios dos réus sob a responsabilidade de juízes federais. Decisão é tomada na análise de petições apresentadas por nove réus que pretendiam ser interrogados pelo ministro-relator. 24 de janeiro de Sílvio Pereira faz acordo e 2ª Vara Federal Criminal de SP 2008 deixa de ser réu homologa acordo feito entre o acusado Sílvio Pereira e o MPF para suspender processo por 3 anos, com base na Lei 9.099/95 (crimes de menor poder ofensivo). Ele respondia somente pelo crime de formação de quadrilha, cuja pena mínima é de 1 ano. Acordo entra em vigor nessa data e Ação Penal 470 passa a ter 39 réus. 19 de dezembro de Encerrada oitiva de Ministro Joaquim Barbosa conclui 2008 testemunhas de acusação fase de inquirição das testemunhas de acusação e determina expedição de cartas de ordem para que sejam ouvidas testemunhas de defesa. 12 de agosto de 2010 Encerrada oitiva de Ministro Joaquim Barbosa comunica testemunhas de defesa ao Plenário que está encerrada fase de oitiva das testemunhas de defesa. 16 de setembro de Morre o réu José Janene Plenário declara extinção do 2010 processo contra o ex-deputado federal José Janene, devido ao seu falecimento. O Código Penal prevê, como uma das causas de extinção da punibilidade, a morte do agente (artigo 107, inciso I), o que não se estende a coautores e partícipes. Ação Penal passa a ter 38 réus. 3 de fevereiro de STF adota medidas contra Ao rejeitar agravos apresentados 2011 manobras protelatórias pela defesa de Roberto Jefferson, o Plenário entende que tais recursos são “nítida manobra para retardar o andamento do processo”. Para evitá- la, todos os recursos interpostos contra decisões do relator passam a 48

ser levados resumidamente ao Plenário e, se os argumentos são repetitivos, são rejeitados. 9 de junho de 2011 Encerrada fase de instrução Relator encerra fase de instrução do processo e abre prazo para acusação e defesa apresentarem alegações finais. Procurador-geral da República tem 30 dias de prazo e, em seguida, o mesmo prazo é dado à defesa de cada um dos 38 réus. Só depois das alegações finais, o relator inicia a preparação de seu voto. 20 de dezembro de Relator conclui relatório e Ministro Joaquim Barbosa divulga 2011 encaminha processo ao relatório da Ação Penal 470 e revisor encaminha processo ao revisor, ministro . O relatório tem 122 páginas e contém informações sobre o que ocorreu no processo desde o oferecimento da denúncia em 2006.

26 de junho de 2012 Ministro revisor libera AP Nesta data, o ministro revisor 470 para Julgamento Ricardo Lewandowski liberou a Ação Penal 470, viabilizando a sua inclusão em pauta de julgamento. O julgamento da ação penal é marcado para o dia 2 de agosto. 2 de agosto de 2012 Início do julgamento Iniciou-se o julgamento pelo pleno do STF.

17 de dezembro de Julgamento da Ação Penal Em sua última sessão, a 53ª sessão, o 2012 470 chega ao fim STF concluiu o julgamento da Ação Penal 470, conhecida como Mensalão. No último dia de julgamento, o plenário decidiu, por maioria, pela perda automática do mandato dos parlamentares condenados. Com a decisão do STF, os deputados federais João Paulo Cunha, Valdemar da Costa Neto e Pedro Henry estão sujeitos à perda dos mandatos parlamentares assim que a condenação estiver transitada em julgado. Com o fim do julgamento, o STF publicará ainda um acórdão para que as penas sejam aplicadas. Após a publicação, os réus poderão apresentar recursos ao plenário do STF e, somente depois do 49

julgamento dos recursos, as condenações serão consideradas definitivas e as penas, executadas. 22 de abril de 2013 STF publica a íntegra do O Supremo Tribunal Federal acórdão do Mensalão publicou em 22/04/2013 a íntegra do acórdão da Ação Penal 470, o processo do mensalão. São 8.405 páginas com os votos de todos os ministros e os debates travados nas 53 sessões que levaram à condenação de 25 réus e à absolvição de outros 12 denunciados. O documento resume as decisões tomadas no julgamento e as votações.

Figura 1 AP 470 - Cronologia da tramitação do processo.

Fonte: . Acesso em: 09 maio 2020.

Observa-se que a cronologia acima mostra que somente no ano de 2013 há a publicação do acórdão do Mensalão, não deixando dúvidas de que a complexidade das denúncias e o “poder” dos envolvidos serviram de obstáculos para o julgamento.

Importante salientar que as provas evidenciam os crimes de quadrilha, peculato, lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta, corrupção e evasão de divisas e que dos 40 nomes aceitos inicialmente como réus, um faleceu no transcurso do processo e outro fez acordo e deixou de ser réu. Assim, o julgamento teve início com 38 réus, “entre estes estavam parlamentares, empresários e bancários. Os principais nomes da denúncia são Marcos Valério, Jose Genoíno Neto, José Dirceu, Silvio Pereira e Delúbio Soares.” (OLIVEIRA E SILVEIRA, 2015).

O julgamento da AP 470 foi o mais longo da história do Supremo Tribunal Federal (STF). Foram necessárias 53 sessões plenárias para julgar o processo contra 38 réus. Quando começou a ser julgada, a ação contava com 234 volumes e 495 apensos, que perfaziam um total de 50.199 páginas. Dos 38 réus, 25 foram condenados e 12 foram absolvidos. Em relação ao réu Carlos Alberto Quaglia, o STF decretou a nulidade do processo, desde a defesa prévia, determinando a baixa dos autos para a justiça de primeiro grau. (STF, 2013).

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Durante anos, a contar do inquérito até o julgamento final pela instância máxima do nosso país, o Supremo Tribunal Federal (órgão imperativo diante das pessoas envolvidas nas denúncias, o conhecido “foro por prerrogativa de função”, ainda que nem todos fossem políticos), o julgamento passou a ser a grande expectativa para aqueles que buscavam maior lisura nos trâmites políticos e mais “justiça” caso comprovadas as denúncias de corrupção que se alardearam.

E ainda hoje há quem diga que foi o maior processo sobre corrupção que o Brasil teve até então, mas também quem refute a ideia de que o Mensalão tenha alterado significativamente as mentes de eleitores e candidatos, de modo a se instaurar um novo e mais honesto Brasil.

Independente da divergência de opiniões, certamente deixou um significativo aprendizado a todos os brasileiros que idealizam um país melhor, bem como aos juristas da área do direito público, e foi um precedente importante para outra e mais grandiosa operação de apuração de irregularidades no âmbito político que viria anos depois e que será tratada nas laudas sequenciais da pesquisa.

3.2 Operação Lava Jato

Passados apenas 7 (sete) anos do julgamento do Mensalão, isto é, decorrido alguns anos após o encerramento do episódio mencionado anteriormente, a população brasileira se depara com mais um escândalo envolvendo parlamentares, governantes, empresários, doleiros e empreiteiras e surge mais um caso de corrupção que ficou mundialmente conhecido como “Operação Lava Jato”.

No site do Ministério Público Federal5 é possível ter acesso a todo o retrospecto das ações que motivaram o surgimento de mais esse ato de combate à corrupção no país.

55 De forma bem didática e esclarecedora, todo jurista que quiser pesquisar a respeito encontra no sítio do MPF muitos subsídios, e foi de lá que se colheu a maior parte das informações para as páginas que se seguem. (BRASIL, MPF, 2020)

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Ela supera a operação do Mensalão – a Lava Jato é a maior investigação sobre corrupção conduzida até hoje no Brasil. Iniciou no Estado do Paraná, em 17 de março de 2014, unificando quatro ações que apuravam redes operadas por doleiros que praticavam crimes financeiros com recursos públicos. O nome Lava Jato era uma dessas frentes iniciais e fazia referência a uma rede de postos de combustíveis e lava a jato de veículos, em Brasília, usada para movimentação de dinheiro ilícito de uma das organizações investigadas inicialmente.

Desde seu início, a operação descobriu a existência de um vasto esquema de corrupção na Petrobras, envolvendo políticos de vários partidos e algumas das maiores empresas públicas e privadas do país, principalmente empreiteiras. Os desdobramentos não ficaram restritos à estatal e às construtoras. As delações recentes da JBS e braços da operação espalhados pelo Brasil e exterior são exemplos das novas dimensões que a investigação ainda pode atingir. A duração permanece imprevisível.

As investigações sobre a Petrobras, maior estatal do Brasil, ocorrem no âmbito da Justiça Federal do Paraná, estado onde surgiram as primeiras suspeitas. Diante de um potencial esquema de corrupção sem precedentes, integrantes do Ministério Público Federal e da Polícia Federal que atuam em Curitiba criaram forças-tarefas especiais.

Um dos delatores da Lava Jato e ex-presidente da Transpetro, uma empresa subsidiária da Petrobras, Sérgio Machado, resumiu desta forma o esquema que, segundo ele, funciona no país há décadas:

1 Políticos indicam nomes de sua confiança para cargos no governo (pode ser num ministério ou numa estatal) 2 As empresas contratadas pelo governo têm interesse em melhorar as condições de seus contratos 3 Dessa forma, são combinados superfaturamentos. Parte do lucro extra vai parar nas mãos dos políticos (BRASIL, MPF, 2020)

Em um primeiro momento, foram investigadas e processadas quatro organizações criminosas lideradas por doleiros, dentre os quais Youssef, que são operadores do mercado paralelo de câmbio. Depois, o Ministério Público Federal recolheu provas de um imenso esquema criminoso de corrupção envolvendo a Petrobras.

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Interessante a passagem de Wladimir Netto a respeito desses episódios:

A prisão de Youssef trouxe à tona suas ligações perigosas com o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa. Puxando o fio da meada, os investigadores revelaram um gigantesco esquema de corrupção na Petrobras envolvendo dirigentes da estatal, grandes empreiteiras e políticos da base do governo. A Lava Jato detonou a mais eletrizante sucessão de eventos da história recente do país. Houve vários momentos dramáticos, como o dia, em março de 2015, em que a lista do procurador-geral da República Rodrigo Janot foi aceita pelo Supremo Tribunal Federal, abrindo investigação contra 49 pessoas, dentre elas 47 políticos. Ou o dia em que a Polícia Federal bateu à porta do quarto de um hotel de Brasília, onde se hospedava o então senador e líder do governo Delcídio do Amaral. Ao ouvir a voz de prisão, ele perguntou: “Isso pode ser feito com um senador no exercício do mandato?” Nunca havia acontecido antes. A operação foi marcada por uma sucessão de acontecimentos surpreendentes. Rompeu todas as barreiras, derrubou mitos e tradições e mostrou que é possível mudar o que precisa ser mudado. (NETTO, 2016, p. 10).

Nesse esquema, grandes empreiteiras organizadas em cartel pagavam propina para altos executivos da estatal e outros agentes públicos. O valor da propina variava de 1% a 5% do montante total de contratos bilionários superfaturados. Esse suborno era distribuído por meio de operadores financeiros do esquema, incluindo doleiros investigados na primeira etapa.

Paralelamente à operação iniciada no Paraná, com o objetivo de dar mais celeridade aos processos envolvendo investigados com foro especial, foi criado, em janeiro de 2015, um grupo de trabalho formado por membros do MPF e do MPDF para auxiliar a Procuradoria- Geral da República na análise dos processos em trâmite no Supremo Tribunal Federal. Em março de 2015, instituiu-se uma força-tarefa na Procuradoria Regional da República da 4ª Região (PRR4) para atuar junto ao TRF4. E em dezembro do mesmo ano, o Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF) criou uma força-tarefa para atuar na Lava Jato perante o Superior Tribunal de Justiça (STJ).

O Ministério Público Federal e a Polícia Federal trabalharam de modo integrado. Ambos foram e são essenciais para o sucesso do caso. As medidas solicitadas à Justiça e operacionalizadas pela Polícia foram feitas com o aval e concordância do Ministério Público, e as atividades dos procuradores da República contaram com a concordância e o apoio da PF. O caso é um exemplo de união de esforços para lutar contra a corrupção, a impunidade e o crime organizado. 53

Ainda é grande a repercussão que teve a Lava-Jato, tanto que extrapolou, inclusive, os limites geográficos do país. Ainda há se de ouvir e ver muitos episódios acerca dessa operação que, malgrado as contradições e opiniões diversas, representa mais uma tentativa de averiguar esquemas de corrupção no Brasil e impedir que a impunidade siga manchando a justiça e a vontade daqueles que acreditam num país mais digno, decente e justo para todos.

3.3 A elegibilidade e o emblemático caso “Luiz Inácio Lula da Silva”

Não há como desenvolver aspectos da Operação Lava-Jato, sem mencionar a caso do ex- presidente da República - Luiz Inácio Lula da Silva (Lula), representante do povo, líder de uma sociedade desigual e injusta que elegeu-se duas vezes em razão de seu potencial político- social e desenvolvimento de políticas públicas inclusivas voltadas às classe menos favorecidas.

No entanto, mesmo possuindo grande popularidade e liderança, Lula envolveu-se em situações que o tornaram inelegível, questões essas relacionadas a impedimento do exercício do direito de ser votado e também restrições dos direitos políticos.

Os trabalhos da já citada Operação Lava Jato alcançaram o ex-Presidente Lula. Das apurações da Lava Jato resultaram em 12 processos contra Lula, inclusive o do chamado "tríplex do Guarujá", que culminou na prisão do ex-presidente, preso em abril de 2018, devidamente esclarecido abaixo:

Neste último processo, o líder petista é acusado de receber da empreiteira OAS reformas em um apartamento de três andares no balneário do Guarujá, no litoral de São Paulo. O imóvel nunca pertenceu formalmente a Lula, mas o Ministério Público alega que as negociações só foram interrompidas quando o caso veio a público. As reformas no apartamento seriam uma retribuição a Lula pelo suposto favorecimento à empresa em três licitações da Petrobras. (SHALDERS, 2019).

Mesmo nessa condição, de estar preso em Curitiba há meses, Lula teve força partidária para almejar a candidatura à Presidência da República no ano de 2018. Contudo, a já mencionada no capítulo anterior Lei da Ficha Limpa acabou por ser o subsídio legal e minar essa possibilidade, e com 6 votos a 1 o TSE - Tribunal Superior Eleitoral acabou por votar pelo indeferimento do pedido de candidatura do então ex-Presidente da República. 54

O Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) indeferiu, por maioria de votos (6 a 1), o registro de candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para disputar as eleições à Presidência da República em outubro. A decisão seguiu o entendimento do relator do pedido na Corte, ministro Luís Roberto Barroso, que declarou a inelegibilidade de Lula com base na Lei da Ficha Limpa. (TSE, 2018).

Mas e o que gerou toda essa situação e como chegou ao ponto de um ex-Presidente da República vir a ter sua candidatura questionada e mesmo impedida: Esclarece o TSE que o pedido de registro de Lula foi questionado no respectivo Tribunal por várias notícias de inelegibilidade e ações de impugnação de mandato, num total de 17 processos:

As demandas foram apresentadas pelo Ministério Público Eleitoral (MPE), por candidatos e partidos adversários, entidades e até eleitores. Todas essas contestações continham, essencialmente, o mesmo fundamento: Lula é inelegível em razão da incidência do artigo 1º, inciso I, alínea ‘e’, itens 1 e 6, da Lei Complementar nº 64/90 (com a redação dada pela Lei Complementar n° 135/2010, a Lei da Ficha Limpa), que dispõe que são inelegíveis aqueles que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, desde a condenação até o transcurso do prazo de oito anos após o cumprimento da pena, pelos crimes contra a economia popular, a fé pública, a administração pública e o patrimônio público (item 1) e de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores. (TSE, 2018, grifo nosso).

Segundo o entendimento da maioria da corte, Lula era inelegível pela Lei da Ficha Limpa, por ter sido condenado criminalmente em segunda instância judicial no famoso “caso tríplex”, da Operação Lava Jato. O ex-presidente havia sido registrado pelo PT em 15 de agosto como candidato, mesmo cumprindo pena de prisão em Curitiba e diante do provável veto à sua participação na corrida presidencial. A condenação pela segunda instância do então ex-Presidente se deu no caso do tríplex do Guarujá a uma pena de 12 anos e 1 mês por corrupção e lavagem de dinheiro.

Cumpre informar ainda que, devido a uma recente decisão do STF, Lula foi recentemente solto depois de 580 dias sem liberdade. O caso mais avançado contra o petista, o do tríplex do Guarujá, ainda tem recursos pendentes. Isto é, ainda não transitou em julgado. Liberado pelo juiz titular da 12ª Vara de Execuções Penais do Paraná, Danilo Pereira Junior, a soltura do ex-Presidente se deu após longa discussão no plenário do STF, sobre a execução provisória da pena, onde estava sendo discutida a validade das prisões antes de esgotadas todas as possibilidades recursais. 55

Votaram a favor da prisão apenas depois do trânsito em julgado os ministros Marco Aurélio Mello, relator do caso, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, , Celso de Mello e Dias Toffoli, presidente do STF. Já a tese derrotada — a favor da prisão em segunda instância — foi defendida pelos ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, e Cármen Lúcia. O julgamento estava empatado em 5 a 5 até o voto de Dias Toffoli, que decidiu na prática a questão.

O motivo pelo qual Dias Tóffoli teria decidido a questão é em razão de ser o Presidente do STF. Em seu voto, ele destacou que o julgamento foi o primeiro no qual o STF analisou, de forma abstrata, se o art. 283 do Código de Processo Penal (CPP) está de acordo com a Constituição. O referido dispositivo aduz que “ninguém poderá ser preso senão [...] em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado", princípio que está em conformidade com o texto constitucional.

Na sequência, estuda-se casos que envolvem candidatos ao governo de Estado que não tiveram suas candidaturas homologadas, uma vez que houve a aplicabilidade da Lei da Ficha limpa.

3.3.1 Sobre as condições de (in)elegibilidade

Como se eleger e quais as condições para tanto? Após refletir sobre essa questão, constata -se que dois princípios estão alinhados ao objeto central dessa pesquisa e que se relacionam com a questão da elegibilidade, isto é, os princípios da vedação de restrição de direitos políticos e da democracia. Princípios que, na esteira de Chalita, “[...] são verdadeiros alicerces do ordenamento jurídico, servindo como inspiração à elaboração e interpretação das normas [...] a noção de mandamento nuclear de um sistema” (2020, p. 29).

Preliminarmente, ao tratar do princípio da vedação de restrição de direitos políticos, Chalita tem uma conceituação similar ao do conhecido in dubio pro reo, amplamente abordado no Direito Processual Penal e no estudo do Direito Constitucional, “[...]uma vez que traz a ideia de que não poderá o intérprete da lei estender sua aplicação além do que efetivamente se presta”, de modo a agravar restrição de direitos políticos do indivíduo – tanto 56

do candidato como do eleitor. Caso existir dúvida, Chalita ainda salienta que “[...] deverá o intérprete ou julgador (juiz ou tribunal) prezar pela não restrição de direitos políticos, aplicando-se a norma restritivamente” (CHALITA, 2020, p. 31).

Com relação ao princípio da democracia, as palavras de Chalita são fundamentais para compreender acerca das elegibilidades, pois este não se trata “tão somente de um princípio, mas um verdadeiro fundamento e valor essencial das sociedades ocidentais”. Ainda em suas palavras, o “princípio da democracia estaria associado a esta verdadeira premissa da sociedade, vez que a partir dele é que se desenvolverá diversos institutos e objetos de estudo que são comportados pelo Direito Eleitoral.” (CHALITA, 2020, p. 30).

Nessa linha de pensamento, e examinando a essência dessa “palavra mágica”, Gomes pontua que os valores liberdade e igualdade necessariamente participam da essência da democracia. Em suas palavras, enquanto a liberdade denota o amadurecimento de um povo, a igualdade significa “que a todos é dado participar do governo, sem que se imponham diferenças artificiais e injustificáveis como a origem social, a cor, o grau de instrução, a fortuna ou o nível intelectual” (GOMES, 2017, p. 68).

O respeito à dignidade da pessoa humana encontra-se na base de qualquer regime que se pretenda democrático. Há que se elevar a consciência ética. Impõe-se, notadamente às classes dirigentes (naturais formadoras de opinião), o agir ético e responsável. Com efeito, é necessário que se forme na comunidade um autêntico espírito de honestidade, de solidariedade e de cooperação, de modo que o bem comum seja sempre priorizado. A democracia autêntica requer o estabelecimento de debate público permanente acerca dos problemas relevantes para a vida social. (GOMES, 2017, p. 68).

Assevera ainda que o regime político em apreço não será atingível sem que seja implantado um “sistema eleitoral confiável”,

[...] dotado de técnicas seguras e instrumentos eficazes, aptos a captar com imparcialidade a vontade popular, de maneira a conferir segurança e legitimidade às eleições, aos mandatos e, pois, ao exercício da autoridade estatal. Hodiernamente, predomina a concepção segundo a qual todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos, ou, em certos casos, diretamente. Isso exige liberdade, igualdade e efetiva participação popular. Pressupõe também a existência de partidos políticos. (GOMES, 2017, p. 69).

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Ante a larga extensão semântica que lhe abarca, a perspectiva de não se restringe aos direitos políticos, ou seja, não mira apenas a pontuar a participação popular no governo ou a detenção do poder soberano pelo povo. Ou seja,

[...] não se limita a definir uma forma de governo na qual é assegurada a participação do povo, seja para constituí-lo, seja para indicar os rumos a serem seguidos pela nação. Para além disso, abarca também os direitos civis, individuais, sociais e econômicos. Assim, a democracia é compreendida nos planos político (participação na formação da vontade estatal), social (acesso a benefícios sociais e políticas públicas) e econômico (participação nos frutos da riqueza nacional, com acesso a bens e produtos); além disso, dá ensejo à organização de um sistema protetivo de direitos humanos e fundamentais. Na base desse regime encontra-se uma exigência ética da maior relevância, que é o respeito à dignidade da pessoa humana. Isso implica promover a cidadania em seu sentido mais amplo, assegurando a vida digna, a liberdade, a igualdade, a solidariedade, o devido processo legal, os direitos individuais, sociais, econômicos, coletivos, os direitos políticos, entre outros[...] A participação popular no governo é condição sine qua non da democracia (GOMES, 2017, p. 69, grifo nosso)

A parir dessas considerações é imprescindível identificar os critérios/requisitos para ser eleito e exercer a cidadania política, uma vez que para o exercício de mandato eletivo, há a necessidade de ter capacidade eleitoral passiva.

Na explicação de Gomes (2017, p. 180), a elegibilidade integra o status político- eleitoral do cidadão. Em suas palavras,

O substantivo feminino elegibilidade retrata as ideias de cidadania passiva e capacidade eleitoral passiva. Conforme o sufixo da palavra indica, é a aptidão de ser eleito ou elegido. Elegível é o cidadão apto a receber votos em um certame, que pode ser escolhido para ocupar cargos político-eletivos. Exercer a capacidade eleitoral passiva significa candidatar-se a tais cargos. Para isso, devem ser atendidas algumas condições previstas na Constituição Federal, denominadas condições de elegibilidade. Em suma, é o direito público subjetivo atribuído ao cidadão de disputar cargos público-eletivos.

Pondera ainda o autor supra mencionado que o termo “condição” traz importantes questões a serem observadas e que devem ser bem compreendidas. Nessa linha de pensamento, do ponto de vista lógico,

[...] trata-se de requisito necessário para que algo exista validamente, em conformidade com o ordenamento jurídico. Assim, as condições de elegibilidade são exigências ou requisitos positivos que devem, necessariamente, ser preenchidos por quem queira registrar candidatura e receber votos validamente. Em outras palavras, são requisitos essenciais para que se possa ser candidato e, pois, exercer a cidadania passiva. (GOMES, 2017, p. 181). 58

Aqui então apresenta-se a questão de que, a quem pretende ser eleito um dia – cidadania passiva6, deve ter necessariamente favoráveis condições de elegibilidade – e tais circunstâncias representam os requisitos essenciais que todos aqueles que pretendem ser candidatos devem cumprir – e estão devidamente preceituados na nossa Constituição, no artigo 14, §3º, que assim dispõe:

Art. 14 [...] § 3º São condições de elegibilidade, na forma da lei: I - a nacionalidade brasileira; II - o pleno exercício dos direitos políticos; III - o alistamento eleitoral; IV - o domicílio eleitoral na circunscrição; V - a filiação partidária; VI - a idade mínima de: a) trinta e cinco anos para Presidente e Vice-Presidente da República e Senador; b) trinta anos para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal; c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de paz; d) dezoito anos para Vereador

Ainda importante mencionar que só poderão concorrer a cargos eletivos brasileiros natos e naturalizados, sendo vedado ao estrangeiro a participação política como candidato, a única exceção a esta regra é o português equiparado. Estabelece, contudo, a nossa carta maior um rol de cargos que só poderá ser ocupado por brasileiros natos, consoante Art. 12, §3º CF/88:

Art. 12 [...] § 3º São privativos de brasileiro nato os cargos: I - de Presidente e Vice-Presidente da República; II - de Presidente da Câmara dos Deputados; III - de Presidente do Senado Federal; IV - de Ministro do Supremo Tribunal Federal; V - da carreira diplomática; VI - de oficial das Forças Armadas;

6 Sobre a diferenciação entre direitos políticos ativos e passivos, furtamos de Chalita as seguintes considerações: “Os ativos são aqueles que, regra geral, atingem a todos os cidadãos, pois se trata de um direito obrigação em alistar-se (título de eleitor) e votar (eleições, plebiscito e referendo), salvo algumas situações (facultatividade por idade, militares conscritos, analfabetos). Incluem-se aqui casos especiais como os portugueses (Tratado da Amizade entre Portugal e Brasil, regido pelo princípio da reciprocidade). [...] Direitos políticos passivos constituem aqueles casos em que o cidadão submete-se à escolha daqueles outros cidadãos que exercem seus Direitos Políticos Ativos (como classificamos brevemente acima). Trata-se de direitos-prerrogativas, pois o cidadão pode ou não exercê-los. É o caso dos candidatos. O ato de candidatar-se constitui verdadeiro exemplo de direitos políticos passivos (ou negativos), devendo ser obedecidas as condições de elegibilidade”. (CHALITA, 2014, p. 41-42). 59

VII - de Ministro de Estado da Defesa

Além disso, convém salientar que o pleno exercício dos direitos políticos impede a candidatura de quem esteja privado dos direitos políticos ou esteja sofrendo suspensão dos mesmos. Essa diretriz, em consequência, gera, também, a obrigatoriedade do alistamento eleitoral. O domicílio eleitoral na circunscrição deve ser analisado conforme o cargo em disputa. A par dessa regra, o prefeito, vice-prefeito e vereador devem ser eleitores do referido município; o governador, vice-governador, deputado estadual, deputado distrital, deputado federal e senadores devem ser eleitores do respectivo estado ou do Distrito Federal; já os que pretendem o cargo de Presidente ou vice-presidente, devem ser eleitores de qualquer localidade no âmbito nacional, circunscrito geograficamente no Brasil. Também faz-se imperativa a filiação partidária, uma vez que o regime eleitoral brasileiro veda a existência de candidaturas avulsas, ou seja, candidatos que não estejam filiados a partidos políticos. A ideia é reforçada pela Lei das Eleições, a Lei n.9504/1997:

Art. 11 [...] §14. É vedado o registro de candidatura avulsa, ainda que o requerente tenha filiação partidária.

Por fim a derradeira condição de elegibilidade é a idade mínima. Aqui fica notório que o legislador preocupou-se em definir um patamar mínimo de maturidade para os indivíduos que pretendem pleitear a representação popular, e mais uma vez a lei n. 9504/1997 estabelece os parâmetros para aferição da idade:

Art. 11 [...] §2º A idade mínima constitucionalmente estabelecida como condição de elegibilidade é verificada tendo por referência a data da posse, salvo quando fixada em dezoito anos, hipótese em que será aferida na data-limite para o pedido de registro.

Muito mais se teria a dizer sobre esses requisitos, mas sumariamente acredita-se que conseguiu-se apresentá-los. O foco maior da presente pesquisa encontra-se no oposto de tais condições. Em outras palavras, a “inelegibilidade” corre sentido contrário ao que foi exposto – representam limitações ao direito de elegibilidade que possuem previsão constitucional e infraconstitucional, podendo ser absolutas (quando disserem respeito a todos os cargos e eleições) ou relativas (quando se referirem a determinado cargo ou eleição).

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Nessa linha de exposição, salienta Gomes que,

[...] para que alguém seja candidato e receba validamente votos, não basta o preenchimento das condições de elegibilidade – não é suficiente que seja elegível –, porque também é preciso que não compareçam fatores negativos denominados causas de inelegibilidade. Além disso, há mister que sejam atendidos outros requisitos, como a escolha na convenção do partido e o deferimento do pedido de registro da candidatura pela Justiça Eleitoral. (GOMES, 2017, p. 180).

Ainda segundo o mesmo autor, denomina-se inelegibilidade,

[...] ou ilegibilidade o impedimento ao exercício da cidadania passiva, de maneira que o cidadão fica impossibilitado de ser escolhido para ocupar cargo político-eletivo. Em outros termos, trata-se de fator negativo cuja presença obstrui ou subtrai a capacidade eleitoral passiva do nacional, tornando-o inapto para receber votos e, pois, exercer mandato representativo. Tal impedimento é provocado pela ocorrência de determinados fatos previstos na Constituição ou em lei complementar. (GOMES, 2017, p. 194, grifo nosso).

A mesma questão é igualmente tratada por Chalita, que assim traça a definição de inelegibilidade:

Podemos compreender inelegibilidade como a impossibilidade de o cidadão exercer seus direitos políticos passivos ou negativos (exercer cargo público eletivo) em razão de circunstâncias impeditivas elencadas na Constituição Federal e também pela Lei Complementar 64/1990, com as alterações acertadas da Lei Complementar 135/2010 (Lei da Ficha Limpa). Deste modo, já podemos dizer que as hipóteses de inelegibilidades serão divididas entre hipóteses constitucionais e hipóteses infraconstitucionais. (CHALITA, 2020, p. 30, grifo do autor).

As causas de inelegibilidade são expressamente previstas na Constituição Federal e em Lei Complementar. As constitucionais encontram-se no Art. 14, §§ 4º o a 7º, CF. Quanto às infraconstitucionais, estão dispostas no Art. 14, §9º da CF, que dispõe que “Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade[...]”. Logo, somente lei complementar pode prevê-las, o que é feito pela LC n. 64/1990, a seguir explicadas por Chalita:

As hipóteses de inelegibilidade previstas na LC 64/1990 visam proteger a probidade administrativa, a moralidade no exercício do mandato, considerando a vida pregressa do candidato e a normalidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função ou emprego na administração direta ou indireta (art. 14, § 9º, da CF). Podem ser absolutas ou relativas: 61

a) Absolutas: impedimento eleitoral para qualquer cargo eletivo, independentemente da circunscrição em que ocorra a eleição (inalistáveis, analfabetos, por exemplo); b) Relativas: obstáculo à elegibilidade apenas para alguns cargos ou ante a presença de determinadas circunstâncias (cônjuge de chefe do executivo municipal, inelegível a cargos eletivos municipais, por exemplo). (CHALITA, 2020, p. 38).

Já as inelegibilidades constitucionais estão previstas no Art. 14, §§ 4º ao 7º, CF/88: Art. 14 [...] § 4º São inelegíveis os inalistáveis e os analfabetos.

A esse respeito, assevera Carvalho que não poderão concorrer a nenhum cargo eletivo os conscritos e estrangeiros, pois são inalistáveis, bem como os analfabetos (artigo 14, §4º, CF/88):

Acerca dos analfabetos vale anotar que a jurisprudência do TSE tem relativizado a possibilidade de realização de testes de alfabetização, só podendo ocorrer se não houver constrangimento para o candidato, sendo realizados individualmente e na presença apenas do Juiz Eleitoral, representante do MPE ou servidor da Justiça Eleitoral. A vedação do terceiro mandato seguido visa proibir a perpetuação no poder de um mesmo indivíduo e refere-se apenas aos cargos do Executivo. Assim, prefeitos, governadores e presidentes poderão concorrer a uma única reeleição e não necessitarão afastar-se do cargo, podendo conciliar a condição de gestor e candidato. (CARVALHO, 2020).

Os chefes do Executivo podem ser eleitos para 3 mandatos seguidos, poderão exercer dois mandatos e intercalar um período e eleger-se novamente. A jurisprudência do TSE afirma que os vices podem exercer o cargo por dois mandatos e, posteriormente, concorrer ao cargo de chefia e exercê-lo por até 2 mandatos. Nas palavras de Chalita (2020, p. 55), fixa-se hipótese de inelegibilidade aos chefes de Executivo para um terceiro mandato sucessivo, relativamente ao mesmo cargo.

Dispõe o Art. 14, § 5º, da CF: “O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subsequente”.

Prevê ainda o art. 14, § 6º, da CF: “Para concorrerem a outros cargos, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal e os Prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito.”

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Interessante ponderação dado à lacuna legal é trazida por Chalita:

Os chefes do Executivo, concorrendo à reeleição (mesmo cargo), não precisam renunciar aos seus mandatos por falta de previsão legal, muito embora seja incoerência lógica se tutelar a lisura das eleições, uma vez que a previsão de desincompatibilização até 6 meses anteriores ao pleito intenta evitar o abuso do poder em razão de função frente à chefia do executivo. (CHALITA, 2020, p. 56).

Abaixo os organogramas visam melhor elucidar o que foi exposto sobre a questão da (in)elegibilidade, especialmente a por motivos funcionais, na tentativa de melhor evidenciar as exceções contidas na lei. O primeiro traz a situação quando o candidato for a Prefeito(a):

Figura 2 Análise da elegibilidade do Prefeito. Fonte: (CARVALHO, 2020, p. 32)

O segundo organograma traz a elucidação de como fica a situação em se tratando de reeleição de vice-prefeito(a):

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Figura 3 Análise da elegibilidade do vice-Prefeito. Fonte: (CARVALHO, 2020, p. 32)

Os chefes do Executivo que pretendem candidatar-se a cargo diverso do que ocupam, seja porque estão impedidos de concorrer à reeleição, seja por desejarem concorrer a outro cargo, devem, obrigatoriamente desincompatibilizar-se do cargo, ou seja renunciar ao mandato, 6 meses antes do pleito (artigo 14, § 6º). A inelegibilidade reflexa por parentesco está prevista no Art. 14, §7º:

Art. 14 [...] §7º São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição.

Ante o exposto, algumas conclusões são possíveis: a inelegibilidade alcança: cônjuge, companheiro, parentes consanguíneos e afins até o 2º grau (irmãos, pais, filhos netos, avós, cunhados, sogros) e adotados; o parentesco deve estar relacionado com um ocupante de cargo de chefe do Executivo; a inelegibilidade está adstrita à circunscrição: parentes do Prefeito são inelegíveis no município; parentes do Governador, no estado e em todos os municípios; parentes do Presidente em todo o país, conforme buscamos melhor elucidar na sequência do trabalho. 64

No gráfico apresentado na lauda seguinte, saliente-se que os parentes do prefeito grifados em letras maiúsculas e fonte vermelha são inelegíveis e os demais, em fonte azul, são elegíveis, como fica bem demonstrado a seguir:

Avós

SOBRINHOS Pais

Netos TIOS

PREFEITO

Cunhados Cônjuges

Genro/nora Companheiros

Filhos Irmãos

Figura 3 No gráfico acima os parentes do prefeito grifados em letras maiúsculas e fonte vermelha são inelegíveis e os demais são elegíveis. Fonte: (CARVALHO, 2020, p. 33)

O legislador constituinte abriu a possibilidade de criação de um rol7 de inelegibilidades fundadas na moralidade, probidade administrativa e na normalidade das disputas eleitorais. Tal programa foi efetivamente concretizado com a edição da Lei Complementar nº 64/90, a Lei das Inelegibilidades, com as alterações posteriores que lhes foram acrescidas pela Lei da Ficha Limpa.

7 O rol a seguir é apresentado tomando por base o trabalho de Carvalho (2020, p. 34-38), que bem sintetizou as hipóteses de inelegibilidades fundadas na moralidade, probidade administrativa e nas questões afetas às disputas eleitorais. 65

As principais causas de inelegibilidade anotadas na lei são:

a) Condenação definitiva ou por órgão colegiado por abuso de poder em eleições - A previsão de ilícitos eleitorais embasados no abuso de poder econômico e político têm por escopo garantir o caráter isonômico das disputas eleitorais, coibindo as vantagens competitivas desleais de qualquer dos postulantes. Assim,

Os que tenham contra sua pessoa representação julgada procedente pela Justiça Eleitoral, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado, em processo de apuração de abuso do poder econômico ou político, para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes. (CARVALHO, 2020).

b) Condenação criminal definitiva ou por órgão colegiado (a lei define um rol de crimes)

Está discriminada na Lei Complementar nº 64/1990, com redação dada pela Lei Complementar n. 135/2010, a seguir discriminado:

Art. 1º São inelegíveis: I - para qualquer cargo: [...] e) os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, desde a condenação até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da pena, pelos crimes: 1. contra a economia popular, a fé pública, a administração pública e o patrimônio público; 2. contra o patrimônio privado, o sistema financeiro, o mercado de capitais e os previstos na lei que regula a falência; 3. contra o meio ambiente e a saúde pública; 4. eleitorais, para os quais a lei comine pena privativa de liberdade; 5. de abuso de autoridade, nos casos em que houver condenação à perda do cargo ou à inabilitação para o exercício de função pública; 6. de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores; 7. de tráfico de entorpecentes e drogas afins, racismo, tortura, terrorismo e hediondos; 8. de redução à condição análoga à de escravo; 9. contra a vida e a dignidade sexual; e 10. praticados por organização criminosa, quadrilha ou bando.

A Lei da Ficha Limpa estabeleceu um novo regime em que: - a inelegibilidade passou a ser decorrente da atuação jurisdicional de órgãos colegiados e não do trânsito em julgado; - o marco temporal para o transcurso do prazo de 8 anos de inelegibilidade será o da extinção da pena; - nem todos os crimes tem aptidão para gerar a inelegibilidade, o rol é exclusivo; - a regra não se aplica aos crimes culposos, de menor potencial ofensivo e nem aos crimes de ação penal privada. 66

C) Desaprovação de contas de gestão O art. 1º, I, g, da Lei Complementar nº 64/1990 estabelece a inelegibilidade decorrente de desaprovação de contas de gestão mas exige, para a sua configuração, a presença dos seguintes requisitos cumulativamente: - exercício de cargo ou função pública; - rejeição das contas pelo órgão competente; - insanabilidade da irregularidade verificada; - ato doloso de improbidade administrativa; - irrecorribilidade do pronunciamento de desaprovação das contas; - inexistência de suspensão ou anulação judicial do aresto de rejeição das contas. D) Condenação definitiva ou por órgão colegiado por ato doloso de improbidade administrativa que gere dano ao erário e enriquecimento ilícito

O art. 1º, I, l, da LC nº 64/1990 estabelece a inelegibilidade decorrente de condenação por ato doloso de improbidade administrativa e exige, para a sua configuração, a presença dos seguintes requisitos cumulativamente: - condenação à suspensão dos direitos políticos; - decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado; - ato doloso de improbidade administrativa que tenha causado, concomitantemente, lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito.

Ainda com relação à condenação criminal é importante diferenciar a hipótese de suspensão dos direitos políticos dos casos de inelegibilidade, devidamente comparadas no organograma a seguir:

SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS INELEGIBILIDADE Condenação criminal com trânsito em julgado Condenação por órgão colegiado ou com trânsito em julgado Qualquer crime ou contravenção penal Apenas os crimes definidos na lei das inelegibilidades Prazo: enquanto durarem os efeitos da Prazo: período da pena acrescido de 8 (oito) condenação anos Figura 4 (Fonte: CARVALHO, 2020, p. 41) 67

Por fim, cabe ainda mencionar a hipótese final de suspensão dos direitos políticos, que é a condenação com trânsito em julgado devido a atos de improbidade administrativa, cabendo igualmente a devida diferenciação comparativamente com a causa de inelegibilidade, apresentada no quadro abaixo:

SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS INELEGIBILIDADE Condenação com trânsito em julgado Condenação por órgão colegiado ou com trânsito em julgado Qualquer ato de improbidade administrativa Ato de improbidade que resulte em prejuízo ao erário e enriquecimento ilícito Prazos variáveis conforme a hipótese, partindo de Prazo de 8 (oito) anos a contar da condenação um mínimo de 3 anos até o máximo de 10 anos Figura 5 (Fonte: CARVALHO, 2020, p. 42)

Após ter especificado as questões referentes às elegibilidades e inelegibilidades, sem no entanto esgotar o assunto, adentra-se no caso emblemático do ex- presidente da República- Lula.

3.4 Estudo de casos: candidatos ao governo de Estado que foram atingidos pela Lei da Ficha Limpa

Além do caso acima exposto, relacionado ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que ficou fora da corrida ao Palácio do Planalto por decisão do TSE no pleito de 2018 para Presidência, outros três concorrentes ao poder Executivo foram igualmente enquadrados pela Justiça nos casos previstos na Lei da Ficha Limpa, são eles: Acir Gurgacz (PDT-RO), Ângelo Castro (PCO-SC) e Marcelo Cândido (PDT-SP), e que serão, caso a caso, apresentados na sequência da pesquisa.

3.4.1 Caso de Ângelo Castro (PCO-SC)

O Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina (TRE-SC) indeferiu em setembro de 2018, muito próximo ao pleito eleitoral para executivo estadual, o registro de candidatura a governador de Ângelo Castro, do Partido da Causa Operária – PCO. A respeito da inelegibilidade do candidato, esclarece-se que: 68

Ângelo, que é funcionário público na Dataprev, segundo o Ministério Público, teria usado nota fiscal de um hotel em SC em que se hospedava em viagens a trabalho, preenchida com valores superiores aos efetivamente pagos. O objetivo seria obter vantagem indevida quando havia o ressarcimento das despesas feitas. (SILVA, 2018).

O processo foi julgado pelo Pleno do órgão, onde os sete integrantes votaram por unanimidade por negarem o pedido do candidato. Ele também foi proibido de fazer campanha e o seu nome não pôde constar na urna eletrônica. A impugnação foi assinada pelo procurador federal Marcelo da Mota com base em uma condenação penal transitada em julgado contra o candidato por crimes "contra a fé pública". Diante disso, ele se enquadraria na Lei da Ficha Limpa. Também de acordo com os anexos incluídos pelo MPE, a condenação foi por falsidade ideológica, datando de 2014.

3.4.2 Caso de Acir Marcos Gurgacz (PDT-RO)

Outro caso ocorrido em 2018 e que esteve diretamente ligado à Lei da Ficha Limpa envolveu uma instância superior do TSE. O ministro do Tribunal Superior Eleitoral à época, Jorge Mussi, confirmou há três dias antecedendo as eleições, a inelegibilidade do senador Acir Gurgacz do Partido Democrático Trabalhista (PDT-RO), ao negar recurso contra a decisão do Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia que indeferiu o registro da candidatura dele ao governo do Estado de Rondônia nas leições de 2018.

Ao contrário do caso anterior de Ângelo Castro, o crime atribuído a Acir Gurgacz era bem mais recente. Em fevereiro de 2018 ele foi condenado pela 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal por crime contra o sistema financeiro a 4 anos e 6 meses de prisão em regime semiaberto.

Por quatro votos a dois o TRE-RO negou o registro da candidatura de Acir, com base na Lei da Ficha Limpa. No TSE, Mussi rejeitou as alegações dos advogados do parlamentar, entre as quais a de que teria havido cerceamento de defesa. Mussi destacou também o fato de o STF ter julgado os embargos interpostos pela defesa do senador na tentativa de reformar a decisão que o condenou por crime contra o sistema financeiro, determinando o cumprimento imediato da pena. (POMPEU, 2018).

O recurso ordinário interposto por Acir Marcos Gurgacz restou impugnado o registro de candidatura do recorrente com base na inelegibilidade do art. 1º, I, e, 2, da LC 64/90, 69

apontando, em suma, que ele foi condenado pelo STF pela prática de crime previsto no art. 20 da Lei 7.492/86 (que define os crimes contra o sistema financeiro nacional).

Abaixo transcreve-se parte do acórdão da referida decisão:

MÉRITO. SUSPENSÃO. INELEGIBILIDADE. EMBARGOS INFRINGENTES. FUNGIBILIDADE. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. NÃO CONHECIMENTO. MANUTENÇÃO. CONDENAÇÃO. SÚMULA 41/TSE. 5. É incontroverso que o recorrente foi condenado pela Primeira Turma do c. Supremo Tribunal Federal, na AP 935/AM, por crime contra o sistema financeiro nacional (art. 20 da Lei 7.492/86), o que atrai a inelegibilidade do art. 1º, I, e, 2, da LC 64/90.

Ao final da decisão, o Relator Mussi ainda foi taxativo em vedar a prática de atos de campanha, devendo o partido responsável pelo registro da presente candidatura se abster de novos repasses de recursos. E isso tudo há pouquíssimos dias das eleições...

3.4.3 Caso de Marcelo Candido (PDT-SP)

E mais um caso que teve como base a Lei da Ficha Limpa envolveu agora um candidato a governador nas eleições passados do estado de São Paulo. O TRE(SP) negou em 17 de setembro de 2018 o registro de candidatura de Marcelo Candido do Partido Democrático Trabalhista (PDT-SP) ao governo do estado de São Paulo.

Em agosto de 2018 o MPE (Ministério Público Estadual) abriu ação de impugnação contra a candidatura de Marcelo Candido motivada por problemas com certidões apresentadas ao TSE e também pela condenação pretérita à suspensão dos direitos políticos por improbidade administrativa, lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito de terceiros. (PASQUINI, 2018).

O pedido de impugnação de candidatura foi feito pela Procuradoria Regional Eleitoral (PRE). Na decisão, o órgão viu que o fato de Candido ser “condenado à suspensão dos direitos políticos, em decisão transitada em julgado, em razão de ato doloso de improbidade administrativa que importou lesão ao patrimônio público”. (PONTES, 2018).

Marcelo foi Prefeito de Suzano e ocupou o cargo de 2005 a 2012 e foi com relação a esse período que as acusações e condenações recaíram. 70

CONCLUSÃO

Com o presente trabalho de conclusão chega-se ao final de uma etapa importante da vida de todos aqueles que acreditam no estudo e que almejam ter a formação acadêmica em um curso superior. Especialmente o Bacharel em Direito precisa pensar muito no tema a ser escolhido, pois ele traz convicções que são construídas em toda uma vida e aprimoradas durante os longos anos que se passam na Universidade. Na finalização desta etapa, tem-se a sensação de dever cumprido sobretudo por ter conseguido objetivar nas leituras para a pesquisa a grande relevância jurídica e social do tema da corrupção e da inovação que a Lei da Ficha Limpa representam no cenário brasileiro.

Essa sensação nasce a partir das múltiplas obras e legislações que foram lidas para o trabalho, e das reflexões que subdividiram o trabalho em três partes principais. Para tanto, elaborou-se no capítulo inicial reflexões acerca da corrupção no Estado Democrático de Direito, buscando fazer uma retrospectiva sobre as origens históricas da corrupção e o entrave que os atos corruptivos apresentam para a concretização de uma cidadania efetiva, do mais eficaz funcionamento da máquina pública, do respeito aos direitos fundamentais e da concretização dos princípios constitucionais no país.

Na linha do que explicou José Murilo de Carvalho (2002), foi – e ainda é – longo o caminho para efetivar-se no país o livramento de todo um legado equivocado que se tem e que remonta mais de 520 anos. As condutas corruptivas no Brasil, conforme salientadas por ele, confundem-se com a própria história do país. Não é possível precisar quando a corrupção tomou conta do poder político, mas desde a vinda da Família Real para o Brasil iniciaram-se negociatas que favoreciam uns em detrimento de tantos outros, com total ausência de nexo moral e ético – e de justiça – nas práticas de ocupação das terras nacionais. E isso se espalhou para várias instituições e invadiu a mentalidade de muitos brasileiros

Ao abordar alguns princípios que regem a Administração Pública, a exemplo da supremacia do interesse público sobre o privado, o princípio da moralidade, da impessoalidade e o da não violação da finalidade pública, percebe-se a suma importância dos mesmos, ao tempo que também é forçoso admitir, usando mais uma vez a expressão de Carvalho, que também é “longo o caminho” para que todos sejam observados 71

simultaneamente e a todo o tempo por todas as pessoas e instituições encarregadas de reger a vida pública em nosso por vezes frágil Estado Democrático de Direito.

De maneira geral, percebeu-se que, apesar do ordenamento jurídico brasileiro dispor de diversos elementos implícitos e explícitos, visando proporcionar a supremacia do interesse público sobre o privado, ou seja, impedindo que interesses particulares se sobreponham ao bem comum, inúmeros são os casos em que estes princípios não são observados, havendo o desrespeito ao interesse da coletividade face às regalias e aos favores direcionados ao setor privado, culminando em práticas de corrupção enraizadas na Administração Pública brasileira. Por essa razão que o trabalho do legislativo e por vezes a força da jurisprudência tem que fazer valer as lacunas ou fazer frente a esse desrespeito enraizado nas entranhas da nação brasileira.

Nessa linha de pensamento foi pensado o propósito do segundo capítulo – contextualizar historicamente a “lei da Ficha Limpa” no Brasil. Para tanto, a segunda parte da pesquisa traçou breve retrospecto até a edição da Lei Complementar n. 135 (LC n. 135/2010), instrumento jurídico inovador que nasce sob iniciativa popular. Para tanto, são tecidas considerações sobre o sistema político-eleitoral brasileiro, e de alguns desafios à concretização de um Estado Democrático de Direito, ante à existência de ambientes favoráveis à manutenção de práticas ilícitas e corruptivas, com custos elevados para as campanhas eleitorais, com uma certa permissividade social além da sub-representação das minorias na política brasileira.

Tomando como base dados do TSE (2013), verificou-se que minorias compostas por indígenas, negros, idosos, grupos LGBTs, portadores de deficiência, por exemplo, ainda sofrem discriminação social e não conseguem ser incluídos como cidadãos com o direito de votar e ser votado. Mas especialmente aos portadores de deficiência, a edição do Decreto nº 6.949/2009, melhor especificou os direitos dessas pessoas de tal modo que, no tocante à participação na vida política e pública, o Art. 29 do referido Decreto determina que os Estados partes da Federação garantam às pessoas com deficiência direitos políticos e oportunidade de exercê-los em condições de igualdade com as demais pessoas.

A respeito especificamente de um momento mais recente na vida política do país, pode-se concluir que a Lei da Ficha Limpa nasceu sob uma forma diferenciada, com a 72

participação de múltiplos órgãos e membros da sociedade civil, e a massiva participação da população. A legislação vigente até então, sobre questões de elegibilidade era contemporânea à promulgação da Carta Constitucional, remontando ao início da década de 90. Essa Lei de Inelegibilidades – Lei Complementar n. 64/1990, já apresentava alguns critérios para que alguém fosse candidato a cargos eletivos no país. Previa, por exemplo, condições para barrar candidaturas, sendo vetado analfabetos, aqueles que tivessem condenações aplicadas pela Justiça Eleitoral por processos de abuso de poder econômico ou político e aqueles que fossem condenados por alguns crimes específicos e que estas condenações já tivessem transitado em julgado, ou seja, não houvesse mais possibilidade de nenhum recurso.

Mas concluiu-se com a pesquisa que os diferenciais da Lei Complementar n. 135/2010 foram muitos. Em síntese, observou-se que ela alterou alguns dispositivos da anterior Lei Complementar nº 64/1990, a qual já estabelecia casos de inelegibilidade e prazos de cessação em conformidade com o art. 14, § 9º da Constituição Federal, incorporando hipóteses de inelegibilidade a partir da Lei de Improbidade Administrativa. Enquanto a Lei Federal nº 12.846/13 voltou-se para pessoas jurídicas, a Lei Complementar nº 135/10 alcançou as pessoas físicas.

Dos estudos o que mais se evidenciou a partir do retrospecto em torno da edição da Lei da Ficha Limpa, é que até sua aprovação eram impedidos de concorrer os condenados sem direito a mais recursos judiciais. No entanto, isso gerava um entrave político – poderia levar décadas para ter o caso transitado em julgado, até que os tribunais superiores dessem resolução ao processo. Convém admitir que, na prática, isso muito raramente acontecia. Geralmente os casos prescreviam e ninguém era barrado, bastando ter bons advogados para protelar ao máximo a decisão final do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal. Sob esse aspecto, portanto, para muitos a LC n. 135/2010 representou uma resposta à morosidade da Justiça brasileira.

Um pontual avanço que mereceu nossa observação é que a partir da Lei da Ficha Limpa pessoas condenadas em segunda instância por órgão colegiado já podem ter a candidatura barrada, mesmo que ainda tenha direito a recursos em tribunais superiores, de modo que um candidato pode ser proibido de disputar as eleições se for condenado por um rol variado de crimes, a exemplo de crimes contra a economia popular, contra a fé pública, a 73

administração pública (como corrupção) e o patrimônio público, contra o sistema financeiro, o mercado de capitais e também contra o meio ambiente e a saúde pública, por exemplo.

Outro ponto muito relevante e que trouxe mais rigor diz respeito a ampliação de três para oito anos o veto a candidaturas de governadores e de prefeitos que perderam os cargos eletivos por violação à Constituição Estadual e à Lei Orgânica do Município. Também estabeleceu mais critérios – a partir dela são barrados igualmente políticos condenados pela Justiça Eleitoral, sem chances de recursos, por práticas como compra de votos ou uso de doações ilegais. Atos de improbidade administrativa também configuram condições de inelegibilidade. A lei inclui ainda políticos que renunciam aos mandatos para evitar processos de cassação. Sob esse aspecto, portanto, é válido afirmar para muitos a LC n. 135/2010 representou uma resposta às múltiplas injustiças da Justiça Eleitoral e um repensar sobre as práticas quotidianas de quem pretende se lançar à candidatura aos pleitos eleitorais.

Não obstante o Direito Eleitoral ter três sistemas tradicionais - o majoritário, o proporcional e o misto, coube neste trabalho debruçar-se sobre os dois primeiros, mas especialmente refletir sobre o sistema político-eleitoral brasileiro e os desafios do mesmo. Esse debate trouxe à tona vários atores e perspectivas. Afinal, não raras vezes ficava a dúvida se massivos investimentos do capital privado de certos empresários se davam por conta de mera convicção partidária ou afinidade com determinado político. E é nesse contexto que a pesquisa revelou outras modalidades de financiamento para as campanhas eleitorais, chegando-se a ideia de um fundo público para essa finalidade, com a recente edição da Lei n. 13.165/2015.

Somado a esse outro instrumento legislativo, conclui-se que esse conjunto de novas legislações no âmbito eleitoral trouxeram muitas mudanças na forma de fazer política no cenário nacional. Pelos regramentos anteriores inexistia limites máximos para gastos financeiros com campanha, detalhando o que cada candidato poderia gastar para pleitear um cargo numa eleição, tampouco rigidez na contraprestação de contas do candidato, partido ou coligação para com o TSE – havia apenas apresentação de uma documentação comprobatória de gastos com a campanha eleitoral, sem maiores detalhamentos sobre a maneira como tais recursos foram aplicados.

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E com isso encaminha-se à parte final do trabalho. O propósito do capítulo terceiro foi trazer a força da jurisprudência somada às inovações legislativas nascidas nos últimos anos no Brasil. Assim, fez-se uma análise de julgamentos efetuados por alguns TREs, pelo TSE e pelo STF, tendo como base a aplicabilidade da Lei da Ficha Limpa, em especial nas eleições do ano de 2018.

Para tanto, buscou-se detalhar as investigações sobre o famoso “Mensalão”, com arrazoados sobre o histórico que forjou a Ação Penal n. 470, nascida embrionariamente por meio do Inquérito n. 2245, em 26 de julho de 2005, quando o inquérito foi autuado no STF após ser remetido pela Justiça Federal de Minas Gerais em razão do foro privilegiado de alguns investigados. Já em 30 de março de 2006 a PGR apresentou denúncia, contra nada mais nada menos que 40 pessoas, que se beneficiavam de um forte esquema de corrupção. E isso então transformou-se em Ação Penal em 12 de novembro de 2007, mas apenas em 17 de dezembro de 2012 o Julgamento da referida Ação Penal chegou ao fim, culminando na perda automática de mandatos de vários parlamentares envolvidos. Foi um momento épico e que sinalizou que a velha política tinha alguns freios dentro do próprio sistema brasileiro – ainda que viessem de outro dos poderes – o judiciário.

Passados alguns anos, evidenciou-se outra operação de ainda maior relevo contra a corrupção, conhecida como “Operação Lava Jato”. Iniciou no Estado do Paraná, em 17 de março de 2014, unificando quatro ações que apuravam redes operadas por doleiros que praticavam crimes financeiros com recursos públicos, revelando a existência de vasto esquema de corrupção na Petrobras, envolvendo políticos de vários partidos e algumas das maiores empresas públicas e privadas do país, principalmente empreiteiras. Constatou-se que os desdobramentos não ficaram restritos à estatal e às construtoras e ainda haverão de ser sentidos por mais pessoas além das fronteiras nacionais.

Interessante foi notar nessa operação o quanto o Ministério Público Federal e a Polícia Federal trabalharam de modo integrado. Ambos foram e são essenciais para o sucesso do caso – e essenciais à justiça brasileira. As medidas solicitadas à Justiça e operacionalizadas pela Polícia foram feitas com o aval e concordância do Ministério Público, e as atividades dos procuradores da República contaram com a concordância e o apoio da Polícia Federal. O caso é um exemplo de união de esforços para lutar contra a corrupção, a impunidade e o crime 75

organizado, e o quanto as instituições devem somar esforços, e não confrontar-se umas contra as outras.

Verificou-se igualmente que em meio a todas as questões evidenciadas em mais esse gigantesco esquema corruptivo, surgiram as eleições de 2018 e a perspectiva do então ex- Presidente Lula vir a candidatar-se novamente. Isso não restou possível, talvez por um conjunto de questões que somadas constroem a totalidade desta pesquisa. Impedido de candidatar-se nas eleições pretéritas, Lula, que outrora representou um “avatar” de moralidade e de luta pela dignidade dos trabalhadores, era alcançado por denúncias várias e impedido de dar seguimento à vida pública. Isso por conta de uma maior consciência político-cidadã dos brasileiros, mas também pela comprovada eficácia desse novo instrumento normativo que contempla uma década e, embora incapaz isoladamente de frear todos os atos corruptivos, representa significativo instrumento para repensar muita coisa, sobretudo no âmbito das questões político-econômico-sociais.

Certo é que o nascimento da LC n. 135/2010 representou uma das construções legislativas mais “democráticas” e “populares” dos últimos tempos, com a participação tanto de autoridades de diversas instâncias como também o forte apelo popular, com a premissa de combate à corrupção sendo o leme dessa grande inovação. Os rumos ainda não são claros. Mas é certo que a Lei da Ficha Limpa já “limpou” algumas vias e impediu várias candidaturas. Também modificou e fez repensar muitos rumos de pleitos eleitorais e pretensões à carreira política pública.

Por fim, cabe dizer de maneira humilde, que finalizar uma pesquisa é ter a sensação de que ela não está conclusa. Mas constata-se que o este novo instrumento jurídico emoldurado na Lei Complementar n. 135/2010 representa inequívoca importância e inovação legislativa no cenário político eleitoral nacional. Além disso, forçou igualmente grande reflexão acerca do papel de instituições e também dos demais membros da sociedade brasileira não apenas durante os pleitos eleitorais – mas no transcorrer de todos os períodos, inclusive os que antecedem as eleições e os que as sucedem. Vivamos para ver cenários mais positivos, menos corruptivos e com mais respeito ao dinheiro público – eis o desejo final.

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REFERÊNCIAS

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