Ubirajara Ribeiro Martins De Souza (1932‑2015)
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Volume 46(2):41-64, 2015 NECROLÓGIO UBIRAJARA RIBeiro MARTINS DE SOUZA (1932-2015) MARIA HELENA M. GALILEO1 ANTONIO SANTOS-SILVA2 UMA VIDA DEDICADA À CIÊNCIA les” por quase um ano. De regresso ao Brasil, dividiu DA BIODIVERSIDADE seu tempo entre a Fazenda Pau D’Alho em Itu e o estágio no Instituto Biológico. Orgulhava-se do tra- Ubirajara Ribeiro Martins, Bira, como gostava balho de recuperação da fazenda e muitas coletas de de ser chamado, nasceu na cidade de São Paulo, em 8 insetos foram realizadas com os colegas e estudantes. de julho de 1932. Iniciou seus estudos no Colégio São Mais tarde formou a Fazenda Cuiabá, onde passava os Luiz, São Paulo e em 1950 ingressou na Faculdade fins de semana com a família e amigos. de Agronomia, Universidade Federal de Viçosa, Mi- Em 1956, foi recomendado para estagiar no De- nas Gerais. As lembranças do período em que residiu partamento de Zoologia da Secretaria da Agricultura na casa dos estudantes da Universidade eram muitas, de São Paulo, hoje Museu de Zoologia da Universida- principalmente, sobre a convivência com os profes- de de São Paulo, com Frederico Lane, especialista em sores, colegas e as atividades esportivas entre o vôlei, Cerambycidae. basquete e futebol. Em 1959, foi admitido no Museu, quando ini- Nesse período, já mostrava interesse pela ento- ciou sua produtiva, brilhante e sólida carreira como mologia e, ao retornar a São Paulo, estagiou no Ins- pesquisador voltado a Sistemática da família Ceram- tituto Biológico, convivendo com renomados ento- bycidae. Em 1960, viajou para a Europa para exami- mólogos brasileiros por dois anos. Neste ínterim, foi nar as coleções de Cerambycidae do “Muséum Na- contemplado com bolsa da Fundação Rockfeller para tional d’Histoire Naturelle”, Paris e “British Museum estudar no México, na “Oficina de Estudios Especia- of Natural History”, Londres. Em 1965, foi contem- 1. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Departamento de Zoologia, Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal. Avenida Bento Gonçalves, 9.500, Agronomia, CEP 91501-970, Porto Alegre, RS, Brasil. Bolsista do CNPq. E-mail: [email protected] 2. Museu de Zoologia, Universidade de São Paulo. Caixa Postal 42.494, 04218-970, São Paulo, SP, Brasil. E-mail: [email protected] http://dx.doi.org/10.11606/issn.2176-7793.v46i2p41-64 42 Galileo, M.H.M. & Santos-Silva, A.: Ubirajara Ribeiro Martins plado com bolsa de pesquisador associado da “Guge- Dedicou-se à atividade docente desde 1970 e nheim Foundation” junto à Universidade da Califór- ministrou disciplinas em cursos de pós-graduação ou nia, campus de Berkeley, U.S.A., onde trabalhou com especialização, como na Escola Superior de Agricul- J.A. Chemsak e E.G. Linsley renomados especialistas tura, USP, Piracicaba, SP; Faculdade de Saúde Pú- em Cerambycidae. blica, USP, São Paulo, SP; Instituto de Biociências, Em 1975, concluiu o doutorado na Universida- USP, São Paulo, SP; Universidade Federal da Paraíba, de de São Paulo, a tese “Sistemática e evolução da tri- João Pessoa, PB; Universidade Federal de Juiz de Fora, bo Piezocerini (Coleoptera, Cerambycidae)” publica- Juiz de Fora, MG; Universidade Federal de Lavras, da nos Arquivos de Zoologia num fascículo com 370 Lavras, MG; Universidade Federal de Viçosa, Viço- páginas. Antes disso, publicou uma monografia sobre sa, MG; Universidade Estadual Paulista, Campus de a tribo Ibidionini em seis partes num total de 1.341 Rio Claro, SP e Campus de Botucatu, SP; Instituto de páginas e outras 30 páginas com estampas coloridas. Pesquisas da Amazônia, Manaus, AM; Universidade Com esses trabalhos ficou demonstrada sua expertise, Federal do Paraná, Curitiba, PR e no Museu de Zoo- tendo sido reconhecido com elevado conceito nacio- logia, USP, São Paulo, SP. Foi um dos fundadores do nal e mundial. Programa de Pós-Graduação em Sistemática, Taxono- Entre 1961-1963 e 1967-1969 integrou a di- mia Animal e Biodiversidade no Museu de Zoologia, retoria da Sociedade Brasileira de Entomologia, ocu- USP e colaborador importante para a consolidação da pando o cargo de Secretário. Eleito Presidente por Pós-Graduação em Entomologia na Universidade Fe- três mandatos consecutivos de 1976-1986 e Vice- deral de Lavras (MG). -Presidente de 1986-1998. Foi editor da Revista Bra- Orientou vários estudantes de graduação, mes- sileira de Entomologia de 1973-1999. Nesse período trado e doutorado ao longo de sua carreira, sempre trabalhou arduamente na preparação dos artigos, pronto para ensinamentos, trocas de ideias e críticas diagramação e correção de provas, e na busca por re- construtivas. Três orientandas foram laureadas pela cursos financeiros. Sempre atento à manutenção da melhor tese do ano (Sociedade Brasileira de Zoologia) periodicidade, qualidade científica dos artigos e dis- e uma pela melhor tese em Coleoptera naquele ano tribuição da revista. Devido à excelente qualidade da em todo mundo (Coleopterists Society). Participou revista, logo foi eleita pelos entomólogos para a pu- de muitas bancas julgadoras e examinadoras de mes- blicação de seus resultados o que aumentou o fluxo trado, doutorado e outras. Na leitura crítica dos tra- da editoração e projetou a RBE no cenário científico. balhos, gostava de expressar “agora o lápis vai cantar”. Foi um exemplo e grande motivador na formação de A cada final de curso ministrado, retornava ao novos editores. Contou com a colaboração de muitos laboratório muito feliz e otimista com o encaminha- entomólogos na diretoria e na editoração, mantendo mento dos alunos e futuros zoólogos. Também vibra- sempre uma relação de companheirismo e amizade. va com os seus orientandos por ocasião da obtenção Ao término das assíduas reuniões de Diretoria, em fi- dos títulos de Mestre e Doutor. Muitos de seus alu- nais de tarde, fazia questão de agradável e animada nos hoje atuam em diferentes áreas da entomologia, confraternização. lideram grupos de pesquisa e são docentes em várias Foi sócio fundador e membro honorário da So- Universidades. ciedade Brasileira de Zoologia e esteve vinculado com Transmitir conhecimento, motivar os pós-gra- a Sociedade Entomológica do Brasil. duandos para a pesquisa científica, orientar, ajudar a Pesquisador do Conselho Nacional de Desen- resolver problemas era missão que desempenhava com volvimento Científico e Tecnológico, sendo que de muita eficiência e solicitude. A empatia com os alunos 1985 a 1988, integrou o Comitê Assessor na área de trouxe a admiração pelo Mestre que muito prezava. Zoologia. Foi consultor da CAPES, CNPq, FAPESP, Reconhecido internacionalmente pela relevância FAPERGS, FAPDF, FINEP, INPA e outros, imbuído de suas pesquisas na Sistemática da família Ceramby- de ações profícuas e éticas. cidae e domínio do conhecimento da taxonomia do De 1984 a 2000, integrou a “International grupo, era muito solicitado por pesquisadores, cura- Commission of Zoological Nomenclature”, Lon- dores de coleções científicas e coletores. Recebeu acer- dres, tendo emitido parecer de muitas petições de vos de Instituições do país e do estrangeiro para estu- zoólogos de todo mundo sobre problemas nomen- do e identificação, o que fazia com maestria e muita claturais. Sempre disponível e atencioso, quando dedicação. Vibrava quando identificava uma espécie procurado por colegas e estudantes, para discutir que ainda não estava representada na coleção e não suas dúvidas de nomenclatura e chegar à resolução era raro ouvi-lo dizer com satisfação: “hoje o dia está dos problemas. ganho”. Arquivos de Zoologia, 46(2), 2015 43 Participou de expedições de coletas com seus co- prestigiado por muitos zoólogos, estudantes e colegas legas do Museu e, no exterior, com outros entomólo- que estiveram presentes ou enviaram mensagens gra- gos. Tinha muitas lembranças pitorescas que contava vadas ou escritas, que foram expostas em painéis. divertidamente em detalhes. Pelo conhecimento acumulado, profissiona- Trabalhava junto à coleção de Cerambycidae do lismo, dedicação e intensa capacidade de trabalho, Museu de Zoologia e com muito esmero a mantinha publicou 461 artigos em Cerambycidae e dezenas organizada e atualizada, sendo considerada uma das de livros ou capítulos de livros. Também publicou maiores do país, e referência mundial pela sua repre- sobre outras famílias de Coleoptera e sobre assuntos sentatividade em espécies e tipos. A coleção é colorida gerais voltados a Zoologia. Em 1997, iniciou a série por etiquetas com uma bolinha vermelha que destaca “Cerambycidae sul-americanos” com ampla revisão a presença de tipos. Recebeu muitos pesquisadores das tribos, muitas ilustrações e chaves para a identi- inclusive do estrangeiro e estudantes para exame da ficação dos táxons. Convidou quatro colegas ceram- coleção, discussão de problemas taxônomicos e busca bicidólogos do país para participarem na revisão de de ensinamentos sobre Cerambycidae. Amiúde che- algumas tribos. Foram publicados 14 volumes com gavam com uma caixinha com cerambicídeos para 37 capítulos e 4.078 páginas, mais três suplementos serem identificados ou simplesmente para presentear em 375 páginas, elaborados com muita dedicação um espécime recém-coletado. Era frequente identifi- e sabedoria. Atualmente estava preparando o volu- car imediatamente o nome da espécie, autor e ano da me 15. descrição e com domínio do acervo, especificava em Entusiasta do desenvolvimento da Zoologia bra- qual armário e gaveta se encontrava a espécie. sileira, proferiu conferências, palestras, participou em Como atividade correlata mantinha uma signifi- fóruns de discussão e publicou artigos sobre diversos cativa coleção de