UNIVERSIDADE FEDERAL DO FACULDADE DE LETRAS

OS PROCESSOS ANAFÓRICOS NO GÊNERO RELATO ESPORTIVO

MARGARETH ANDRADE MORAIS

RIO DE JANEIRO JULHO DE 2012

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OS PROCESSOS ANAFÓRICOS NO GÊNERO RELATO ESPORTIVO

MARGARETH ANDRADE MORAIS

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras (Letras Vernáculas), Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas, na Área de Concentração Língua Portuguesa.

Orientador: Profa. Dra. Leonor Werneck dos Santos.

Rio de Janeiro Julho de 2012.

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OS PROCESSOS ANAFÓRICOS NO GÊNERO RELATO ESPORTIVO

MARGARETH ANDRADE MORAIS

Orientador: Profa. Dra. Leonor Werneck dos Santos

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras (Letras Vernáculas), Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas, na Área de Concentração Língua Portuguesa.

Examinada por:

______Profa. Dra. Leonor Werneck dos Santos (presidente)

______Profa. Dra. Mônica Magalhães Cavalcante (UFC)

______Profa. Dra. Maria Eduarda Giering (UNISINOS)

______Profa Dra. Deise Santos (UFRJ – Suplente)

______Profa. Dra. Regina de Souza Gomes (UFRJ – Suplente)

Rio de Janeiro Julho de 2012

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MORAIS, Margareth Andrade.

Os processos anafóricos no gênero relato esportivo / Margareth Andrade Morais – Rio de Janeiro: UFRJ / FL, 2012. V, 144f. Orientador: Leonor Werneck dos Santos. Dissertação (mestrado) – UFRJ / Faculdade de Letras / Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas / Língua Portuguesa, 2012. Referências Bibliográficas: f.109-113. 1. Referenciação. 2.Gênero. 3.Linguística Textual. I. SANTOS, Leonor Werneck. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Letras, Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas. III. Os processos anafóricos no gênero relato esportivo.

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AGRADECIMENTOS

Antes de tudo, agradeço a Deus pela força que me fez seguir em frente em todos os momentos da minha vida. Ao meu pai (in memoriam), exemplo pra toda minha vida, que, mesmo na ausência se fez presença. Ao Sr. José Carlos Morais (e minha mãe, é claro) devo tudo o que sou hoje. A minha mãe, por ser essa pessoa de extrema generosidade, coisa que nunca vi igual. Com seu constante sorriso e colo acolhedor, faz com que tudo pareça muito mais fácil do que é. A minha querida irmã, Marcia, minha melhor amiga desde sempre, colega de mestrado, de profissão e de tudo mais! Obrigado pelo estímulo e por estar do meu lado sempre. Aos meus amigos pela alegria de sempre: Alane, Provietti, Sinézio, Nilze e todos os outros. Ao Thiago, meu cunhado querido, pois sem ele eu nunca saberia que o Fágner é lateral-direito. Aos meus amigos Elma e Carlos Iberê, pelo apoio e toda força que dispensaram a mim nessa caminhada. Aos meus alunos que estão na torcida, por serem um dos motivos pelos quais me aventuro ainda mais na busca pelo conhecimento. À Leonor Werneck, minha querida orientadora: esta dissertação é apenas a parte visível de tudo o que fez por mim. Exemplo de professora, foi com ela que aprendi o que é ser professora de Língua Portuguesa. Obrigada! Ao meu marido, Leandro, companheiro de toda uma vida, pela paciência infinita, por entender o meu cansaço e a minha ausência nos momentos mais tensos e por todo seu amor que torna a minha vida completa. Ao meu sogro, Alberto, pelas conversas agradáveis sobre futebol! Agradeço também à profa. Mônica Cavalcante pela generosidade nas sugestões dadas a este trabalho.

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Tudo é teu, que enuncias. Toda forma nasce uma segunda vez e torna infinitamente a nascer. O pó das coisas ainda é um nascer em que bailam mésons. E a palavra, um ser esquecido de quem o criou; flutua, reparte-se em signos — Pedro, Minas Gerais, beneditino — para incluir-se no semblante do mundo. O nome é bem mais do que o nome: o além da-coisa, coisa livre de coisa, circulando. E a terra, palavra espacial, tatuada de sonhos, cálculos.

Carlos Drummond de Andrade

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SINOPSE

Análise do fenômeno da referenciação em relatos esportivos sob a ótica da Linguística de Texto.

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RESUMO

OS PROCESSOS ANAFÓRICOS NO GÊNERO RELATO ESPORTIVO

Margareth Andrade Morais Orientador: Leonor Werneck dos Santos

Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas, Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa).

O presente trabalho trata da referenciação em relatos esportivos, analisando-os a partir do aparato teórico da Linguística de Texto. Os objetivos deste trabalho consistem em verificar os processos de referenciação mais frequentes nesse gênero e em que medida esses processos podem ser orientados por um gênero textual específico. Tendo em vista tais objetivos, será priorizada uma abordagem que integre os processos de referenciação ao estudo dos gêneros, observando como as formas de referenciação são importantes para a progressão temática dos textos, indicando como enunciador e co- enunciador trabalham juntos para obter o sucesso no processo de comunicação. Pretendemos demonstrar ainda como o relato esportivo depende, para sua interpretação, do conhecimento de mundo compartilhado, o que pode ser percebido através das marcas de referenciação. Para isso, foram analisados 40 relatos esportivos retirados dos jornais Lance! e Marca e, a partir dessa análise, foram sistematizados os recursos mais frequentes e sua possível relação com o gênero relato esportivo. .

Palavras-chave: Referenciação, gênero textual, relato esportivo, conhecimento de mundo.

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ABSTRACT

ANAPHORIC PROCESSES IN THE GENRE SPORTS REPORTING Margareth Andrade Morais

Advisor: Leonor Werneck dos Santos

Abstract of Master’s Thesis presented to Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas, Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, as a partial fulfillment of the requirements for the degree of Master of Portuguese.

The present work deals with referenciation resources for sports reports, analyzing them from the theoretical apparatus of Textual Linguistics. The objectives of this research is to verify the referenciation processes frequently this genre and to what extent these processes can be guided by a specific genre. We tried to investigate, then, if this genre requires certain forms of identification. In view of these objectives will be prioritized an approach that integrates the processes of referenciation to the study of genres, observing the forms of referencing are important to the thematic progression of texts, showing how co-enunciator enunciator and work together to succeed in the communication process. For this, we analyzed 40 reports taken from newspapers Lance sports! and Marca, and from this analysis, the resources were systematically more frequent and their possible relationship to gender sports reporting.

Keywords: genres, shared knowledge, referenciation, reporting sports.

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SUMÁRIO

Introdução ...... 13

1. TEXTO E REFERENCIAÇÃO...... 18

1. 1 O texto como lugar de interação ...... 18

1.2 Noções sobre referenciação ...... 23 1.2.1 A relação entre as palavras e o mundo ...... 24 1.2. 2 Referenciação e objetos de discurso ...... 25 1.2.3 A recategorização dos referentes ...... 28 1.2.4 As formas de construção dos objetos de discurso e sua implicação para progressão referencial ...... 32 1.2.5 Classificação dos processos referenciais...... 33

2. GÊNEROS TEXTUAIS: CONCEITUAÇÃO E ESPECIFICIDADES ...... 44 2.1 O que entendemos por gênero...... 44 2.2 Gênero Relato esportivo ...... 50

3. O JORNALISMO ESPORTIVO ...... 57

3.1 Um pouco sobre o jornalismo esportivo...... 57 3.2 O estilo dos jornais e a linguagem da imprensa esportiva...... 59

4. O RELATO ESPORTIVO EM ANÁLISE ...... 62

4.1 Anáforas diretas recategorizadoras ...... 66 4.1.1 Epítetos: um caso especial de anáfora direta ...... 75 4.1.2 Expressões metafóricas ...... 80 4.1.3 Anáforas prospectivas ...... 84

4.2 Anáforas indiretas propriamente ditas...... 87

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4.3 Anáforas encapsuladoras ...... 91

4.4 Aprofundando a discussão ...... 95

4.5 A referenciação no relato esportivo: cruzando dados ...... 102

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...... 106

BIBLIOGRAFIA ...... 109

ANEXOS ...... 114

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INTRODUÇÃO

Acompanhando os avanços da Linguística Textual acerca dos processos de refe- renciação e sua importância para a textualidade, pretendemos, nesta pesquisa, analisar os processos referenciais anafóricos tendo em vista seu uso em determinado gênero: o relato esportivo. A motivação para esse trabalho nasceu do interesse em estudar a referenciação devido a sua importância para os estudos do texto, analisando as transformações e mudanças pelas quais passam os referentes e sua contribuição para os propósitos comunicativos dos textos. Esses mecanismos são importantes para a progressão temática, recuperação e construção dos sentidos, uma vez que os processos referenciais colaboram para a compreensão e mostram como os enunciadores trabalham juntos para obter sucesso no processo de comunicação, além de apresentarem uma série de funções discursivas de grande relevância para a construção do texto. Acreditamos em uma concepção de referenciação que vai além da simples rotulação de elementos presentes no mundo (cf. CAVALCANTE, 2011), por isso defendemos nesta pesquisa que os processos de referenciação são construídos na interação, tendo como base atividades cognitivas, sociais e o próprio entorno discursivo em que os falantes se encontram. Para nós, todos esses aspectos, incluindo as marcas linguísticas, apresentam igual importância dentro do processo de referenciação. Há muitos estudos sobre os processos de referenciação, tema a que têm se dedicado muitos estudiosos, porém ainda são poucos os estudos que procuram relacionar as formas de referenciação ao gênero no qual tais processos ocorrem. Os gêneros, uma vez que emergem e estabilizam determinadas práticas sociais, utilizam formas linguísticas na sua construção. Por isso, procuraremos também relacionar ao gênero relato esportivo os processos referenciais. Assim, para a presente pesquisa, cujos objetivos são verificar os mecanismos referenciais em relatos esportivos e descrever de que forma o gênero pode orientar a escolha dessas formas de referenciação, inicialmente, foram detectados os seguintes problemas: (1) de que forma ocorre a referenciação em relatos esportivos? (2) De que maneira tal gênero pressupõe certas formas de referenciação? A fim de responder a esses questionamentos, levantamos as seguintes hipóteses:

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 O gênero relato esportivo tem a sua interpretação bastante atrelada ao contexto sociocognitivo, sendo um fator importante para a compreensão desse gênero;  Há, nesse gênero, uma preferência para o uso de anáforas diretas recategorizadoras em relação às outras formas de referenciação, apelando fortemente ao entorno cognitivo dos enunciadores;

Para tentar elucidar as questões acima, o alicerce teórico em relação à referenciação tem como base Mondada e Dubois (2003) que estudam a referenciação como um processo colaborativo de construção que emerge da negociação dos sujeitos, posição corroborada no Brasil por Marcuschi (2008), Koch (2002, 2005 e 2006) e Cavalcante (2011), dentre outros. Concordamos com tais autores quando afirmam que a noção de referência não se restringe à equivalência das palavras aos elementos do mundo, mas abrange o fenômeno de uma construção conjunta de objetos cognitivos e discursivos, sempre tendo em vista as intenções dos sujeitos presentes na interação e seu contexto sócio-histórico. As entidades nomeadas, portanto, são vistas como objetos de discurso e não como objetos de mundo; desse modo os objetos são dinâmicos e não estáticos, podendo ser construídos, reconstruídos, recategorizados, contribuindo, assim, para o desenvolvimento e progressão dos textos. Adotamos também o posicionamento de Cavalcante (2011), para quem os processos de referenciação não podem ser analisados somente pelo prisma da manifestação de expressões referenciais para serem introduzidos no universo do discurso; concordamos com a autora quando ela defende que o objeto de discurso vai sofrendo transformações a partir da ação dos interlocutores sobre ele, podendo já estar disponível no entorno discursivo. Isso poderá ser verificado no corpus analisado, pois, ao pensarmos em futebol, todo um contexto cognitivo é ativado trazendo possíveis referentes à memória discursiva dos leitores. Também são pressupostos básicos desta pesquisa os estudos de Koch sobre o conceito de que todo texto contém marcas deflagradoras de pistas que orientam o leitor no seu percurso de construção de sentido. Portanto, a noção de texto aqui empreendida levará em conta que a construção de sentidos no texto não ocorre apenas pela sua materialidade linguística, como simples resultado de escolhas lexicais ou sintáticas, mas como marcas enunciativas, como ações dos sujeitos na sua relação com e sobre o

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mundo. Deste modo, o texto não é um produto acabado, mas contém pistas que permitirão ao leitor percorrer caminhos na construção dos sentidos no texto. Outro pilar de sustentação desta pesquisa funda-se no estudo dos gêneros textuais. Baseamos esse conceito nos estudos de Bakhtin (2003[1929]), tendo em vista a sua definição de gênero como tipos relativamente estáveis de enunciado, compostos por uma estrutura composicional, estilo e conteúdo temático, assim como adotamos as contribuições de Marcuschi (2008) e Bhatia (2009). A fim de concretizar tais ideias, foram escolhidos como corpus vinte relatos esportivos extraídos do Jornal Lance!, durante a realização da Copa do Mundo de Futebol, em junho/julho de 2010, e vinte relatos do jornal Marca, referentes ao de 2011. Embora tenham sido recolhidos 40 relatos de jogos da Copa do Mundo e 56 do Campeonato Carioca e separamos como amostra de análise vinte relatos de cada jornal, que se encontram numerados de 1 a 20, tendo como referência a letra inicial do nome do Jornal do qual foram retirados, por exemplo, L1 significa que se trata do relato número 1, do jornal Lance!. Esses relatos estarão ao final da dissertação como anexos. O tratamento qualitativo dos dados observará a forma como as estratégias referenciais se inserem no relato e quais são seus papéis textuais-discursivos, mas também quantificaremos as ocorrências para verificar que tipo de recurso foi mais empregado, tentando justificar esse possível predomínio. No primeiro capítulo, faremos um breve panorama sobre as bases teóricas desta pesquisa, como a noção de texto e de referenciação, partindo, resumidamente, dos seus estudos iniciais, que defendiam uma estabilidade entre o nome e seu referente no mundo, para chegarmos ao que se entende por referenciação hoje: uma atividade que, como já dissemos, não consiste em colocar etiquetas sobre os elementos presentes no mundo, mas reconstruí-los através do discurso. Ainda nesse capítulo, trataremos da noção de texto e progressão textual e abordaremos a questão da construção conjunta dos referentes com um exemplo de trecho retirado de um relato esportivo. No segundo capítulo, consideraremos os estudos sobre os gêneros e trataremos do relato esportivo, caracterizado como um gênero do domínio do relatar, de acordo com Dolz e Schneuwly (2004). Demonstraremos também sua composição e a forma como aparecem nos jornais. Após esse breve panorama, teceremos alguns comentários

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sobre o jornalismo esportivo, já que tal gênero pertence a essa categoria, e discorreremos sobre o estilo dos dois jornais, bem como sobre a linguagem esportiva. As reflexões propostas no terceiro capítulo, além de estabelecerem o que entendemos por gêneros textuais, propõem-se a apresentar o gênero relato esportivo, a forma como aparece nos jornais, e a contextualizar ainda o histórico do tratamento dos esportes dentro dos jornais, uma vez que tais publicações destinam-se a um público específico e podem não ser conhecidas por todos. Já o quarto capítulo inicia a análise propriamente dita, começando com apontamentos sobre as estratégias metodológicas adotadas e apresentando a quantificação de cada subtipo de anáfora verificado no corpus. Após essa sistematização inicial, começaremos a análise pelos casos de anáfora direta, explicitando os subtipos que propusemos para a análise, bem como os conhecimentos envolvidos na construção dos referentes. Dentro desse capítulo, discutiremos ainda um caso especial verificado no corpus, envolvendo alguns casos de anáforas diretas que, de tão estabilizadas culturalmente na memória dos falantes, passam a atuar como equivalentes, dentro do contexto, de seus referentes: os epítetos de clubes. Discutiremos ainda sobre alguns casos de anáforas diretas que envolvem processos metafóricos para nomeação dos referentes. Cabe ressaltar que não esperávamos encontrar casos desse tipo, que, embora estejam em uma quantidade pequena, merecem ser destacados, pois suscitam discussões interessantes. Após as anáforas diretas, trataremos dos exemplos de anáforas indiretas e encapsuladoras, mostrando como atuam na construção do texto e que conhecimentos mobilizam para sua interpretação. Por fim, apresentaremos exemplos que motivam questionamentos relevantes sobre a necessidade de inferências para a interpretação de determinadas anáforas diretas, no item “aprofundando a discussão”. Após a análise do corpus, ainda no capítulo quarto, procuraremos estabelecer de que forma os processos de referenciação verificados se relacionam ao gênero relato esportivo, se é possível afirmar que alguns processos, como as anáforas diretas, são recorrentes nesse gênero, que particularidades ele abriga. Nas considerações finais, organizaremos os resultados e os discutiremos, verificando a pertinência das hipóteses e objetivos postulados. Vale ressaltar que esta

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pesquisa pretende colaborar para um melhor entendimento dos casos de anáfora, contribuindo, assim, para os estudos de referenciação. Acreditamos que esta dissertação representa um importante movimento no sentido de expandir os estudos sobre referenciação e apresentar uma tentativa de associar esses estudos ao campo dos gêneros textuais, fomentando não só outras pesquisas na área, como o ensino de língua materna hoje com foco nos processos de leitura e produção textual.

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1. TEXTO E REFERENCIAÇÃO

1. 1. O texto como lugar de interação

Como a proposta deste trabalho integra aspectos cognitivos, sociais e linguísticos na construção de sentidos do texto, não podemos analisar a materialidade linguística como simples resultado de escolhas lexicais ou sintáticas, mas como marcas enunciativas, ações dos sujeitos na sua relação com e sobre o mundo. Deste modo, o texto pode ser visto, conforme Koch (2006a, p.65), como um “mapa da mina”, o que permitirá ao leitor percorrer caminhos que o aproximem da ideia do produtor ou o desviem dela, por meio do levantamento de hipóteses de sentido, embora seja impossível garantir a captação da intenção de um locutor/produtor de um texto. Com essa abordagem atual dos estudos linguísticos, é possível deslocar o interesse atribuído, prioritariamente, à forma linguística para o funcionamento da língua em distintos contextos e, consequentemente, para a análise linguística de textos e/ou discursos, isto é, da língua em uso, no seu funcionamento entre os sujeitos, deixando a análise de enunciados isolados. Para Marcuschi (2008, p. 67), “a função mais importante da língua não é a informacional e sim a de inserir os indivíduos em contextos sócio-históricos e permitir que se entendam”, assim, entendemos que a língua é, de fato, um produto social: por meio dela, o conhecimento cultural e as relações interpessoais se estabelecem e nos inserimos no mundo. Desse modo, todos esses fatores atuam na produção linguística das pessoas. Não há, então, como falar em uso significativo da língua fora das interrelações pessoais e sociais. Essa nova concepção abre a possibilidade para que seja considerada a ação conjunta de autor/leitor, já que a leitura de um texto não é mais vista como codificação de estruturas linguísticas. Desse modo, a partir disso não podemos mais imaginar um leitor passivo, que apenas receba informações já prontas. Os estudos linguísticos, portanto, passaram a entender o leitor como coautor do texto, alguém que investe seus conhecimentos no ato da leitura, sendo sua participação parte do procedimento de interpretação dos textos.

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O sentido não está no leitor, no texto, nem no autor, mas resulta do efeito das relações entre eles. Dentro dessa perspectiva, os textos não são estáveis, pelo contrário, apresentam um alto grau de instabilidade devido à complexa rede de relações que se estabelecem na atividade enunciativa. Os textos, então, têm por característica a instabilidade, e sua estabilidade é sempre relativa ao objetivo dos interlocutores e ao contexto sociocognitivo que os cerca, visto que os textos guardam marcas históricas. Tudo isso repercute diretamente sobre a organização do material linguístico presente neles e nas condições de processamento deles. A noção de que a compreensão do texto não se pauta, somente, pela superficialidade do escrito, no âmbito mais formal da língua, mas também se orienta pelas ligações que se estabelecem no funcionamento global da linguagem, institui uma nova acepção de texto. Nesta acepção, o texto passa a ser considerado uma atividade entendida a partir do processo de enunciação, que acontece de forma consciente e organizada, compreende processos e estratégias cognitivas inerentes à mente humana, colocados em prática na interação social. Ainda, seguindo essa ótica, de acordo com Marcuschi (2008, p.72):

O texto é o resultado de uma ação linguística cujas fronteiras são, em geral, definidas por seus vínculos com o mundo no qual ele surge e funciona. Esse fenômeno não é apenas uma extensão da frase, mas uma entidade teoricamente nova.

A afirmativa acima corrobora a ideia de que a leitura depende de uma determinada focalização para a qual confluem os aspectos da materialidade linguística e as estratégias de processamento cognitivo, suscetíveis a variações a cada nova interação. Assim, o efeito de sentido surge de acordo com a percepção e experiência de cada novo interlocutor. Portanto, entende-se aqui que a construção dos sentidos ocorre por meio de uma interação entre texto e leitor. Tal atividade não é somente uma forma de reprodução de sentidos já expostos no texto nem apenas a decodificação de estruturas linguísticas, mas um processo ativo de construção e reconstrução de sentidos que envolve aspectos linguísticos, cognitivos e sociais. Por meio dos textos, são concretizados os elementos do mundo que cercam os interlocutores. Isso significa dizer que a língua estabiliza valores, ideias, crenças,

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manifestando o mundo que interpretamos à nossa volta. Desta forma, a língua, para os estudos da Linguística do Texto hoje, é uma construção social, lugar de interação, assim como o texto. É na interação que os sentidos do texto se estabelecem, não cabendo, portanto, pensarmos em um leitor passivo que não condiz com a atividade de leitura. A produção de sentidos, então, decorre de acontecimentos sociais, visto que o ser humano se relaciona através de acontecimentos interativos, pois os enunciados são concretizados em situações contextualizadas e não isoladas. Conforme Marcuschi (2008, p. 90), “falamos de texto como um evento que atualiza sentidos e não como uma entidade que porta sentidos na independência de seus leitores”. Assim, o procedimento de leitura dos textos envolve, segundo Koch (2006b), uma interação entre autor-texto-leitor, na qual se faz necessário tanto o conhecimento da materialidade linguística, como os conhecimentos do leitor para o estabelecimento do jogo interacional, conforme mostra a autora:

O sentido de um texto é, portanto, construído na interação texto-sujeitos (ou texto-coenunciadores) e não algo que preexista a essa interação. Também a coerência deixa de ser vista como mera propriedade ou qualidade do texto, passando a dizer respeito ao modo como os elementos presentes na superfície textual, aliados a todos os elementos do contexto sociocognitivo mobilizados na interlocução, vêm a constituir, em virtude de uma construção de interlocutores, uma configuração veiculadora de sentidos (KOCH, 2006b p. 17).

Por essa razão, não se fala em um sentido para o texto, uma vez que valores culturais atuam na interpretação deste. Portanto, considerar o leitor e perceber que os conhecimentos podem variar de um leitor para outro acarreta aceitar múltiplas leituras e sentidos oriundos de um mesmo texto, o que não significa dizer que se possa admitir qualquer interpretação, mas pensar o texto a partir das pistas que ele fornece tendo em vista a interação autor-texto-leitor e todos os outros conhecimentos envolvidos nesse processo. O processo de leitura não é único, pois os conhecimentos utilizados pelos diferentes leitores são acompanhados de diferentes fatores como diferenças sociais e linguísticas, por exemplo, que podem originar diversos sentidos durante a leitura. Sendo assim, os sentidos produzidos em distintas situações, ainda que de um mesmo texto,

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podem diferenciar-se devido à interferência do contexto sociocognitivo que abrange o espaço e o tempo em que o leitor se encontra. Podemos dizer, então, que o processamento textual, seja para a produção de um texto ou para a sua leitura, depende da interação entre os interlocutores que atuam em conjunto, mobilizando uma série de conhecimentos – de ordem cognitiva, interacional, cultural e textual – para produzirem sentido. Esse processamento envolve um movimento por parte do leitor para estabelecer pontes entre informações novas e outras já fornecidas dentro do texto. Cabe ressaltar que essa relação não é simples nem explícita: exige inferências, interpretação de expressões referenciais e de outros mecanismos linguísticos. De acordo com Koch (2002, p. 30):

O sentido de um texto, qualquer que seja a situação comunicativa, não depende tão somente da estrutura textual em si mesma. Os objetos de discurso a que o texto faz referência são apresentados em grande parte de forma lacunar, permanecendo muita coisa implícita. O produtor do texto pressupõe da parte do leitor/ouvinte conhecimentos textuais, situacionais e enciclopédicos e, orientando-se pelo Princípio da Economia, não explicita as informações consideradas redundantes. Ou seja, visto que não existem textos totalmente explícitos, o produtor de um texto necessita proceder ao “balanceamento” do que necessita ser explicitado textualmente e do que pode permanecer implícito, por ser recuperável via inferenciação.

Percebemos que a atividade de leitura pressupõe acionar mecanismos linguísticos que farão parte da composição do texto, a partir de um contexto sociocognitivo, e organizá-los de acordo com os propósitos comunicativos do autor, que conta com a participação do leitor para compor as lacunas que ele, intencionalmente, instaurou na composição do texto. Deste modo, a atividade de produção de sentidos abrange o trabalho do autor e do leitor, que, segundo Koch (2002) são “estrategistas” da atividade de linguagem e mobilizam uma série de fatores para a produção de sentidos. Por isso, podemos dizer que o texto é um processo e não um produto. Conforme Koch e Elias (2006) e Koch (2002), na atividade de leitura e produção de sentido, colocamos em ação várias estratégias sociocognitivas, que atuam no processamento textual e mobilizam tipos de conhecimento armazenados na memória. As autoras asseveram que, para o processamento textual, utilizamos três grandes sistemas de conhecimento: linguístico, enciclopédico e interacional. O conhecimento linguístico abrange o conhecimento gramatical e lexical, que permite aos falantes

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compreender a seleção lexical, a organização dos elementos linguísticos na superfície textual e os mecanismos que atuam na coesão/coerência textual. Já o conhecimento enciclopédico ou de mundo refere-se às experiências vividas, eventos temporalmente situados; seriam esquemas cognitivos adquiridos ao longo do tempo e de acordo com cada experiência individual. Por fim, o conhecimento interacional leva em consideração aspectos sobre as ações verbais e sobre as formas de interação por meio da linguagem. Koch e Elias (2006) dividem ainda o conhecimento interacional entre: conhecimento ilocucional, referente ao reconhecimento dos objetivos propostos pela situação comunicativa; comunicacional, relacionado à variante linguística e ao gênero textual adequados à situação bem como à quantidade de informações necessárias; metacomunicativo, que permite ao leitor assegurar a compreensão do texto; e, por fim, conhecimento superestrutural, que diz respeito ao reconhecimento de exemplares de diversos gêneros textuais. Essas estratégias são responsáveis por articular os conhecimentos armazenados na memória e garantir a interpretação de um texto, pois, à medida que avançamos na atividade de leitura, vamos elaborando e descartando hipóteses que atuam na construção dos sentidos. Cabe ressaltar que, como vimos, são diversos os conhecimentos utilizados na articulação de sentidos dentro de um texto, imbricados em uma relação estreita, por isso é difícil falar em conhecimentos linguísticos e extralinguísticos; já que não se pode distinguir quais conhecimentos estariam dentro e quais estariam fora do texto, visto que todos eles atuam em igual medida na construção de sentidos. Marcuschi (2008, p. 95), ao refletir sobre a questão, já nos mostra essa direção quando assegura que “não se pode imaginar o texto como se tivesse um dentro (cotextualidade) e um fora (contextualidade)”, o autor explica ainda que, se os textos são vistos como atrelados aos aspectos interacionais, tanto em situação de produção quanto de recepção, não é possível separar o que seria cotexto e contexto dentro dessa perspectiva de observação. Por fim, cabe acrescentar aqui que adotamos a posição de Cavalcante (2011), na esteira do que já nos apontou Koch (2002 e 2006a), de que o texto é algo que se abstrai da relação entre texto-autor-leitor dentro de um contexto sociocultural específico. Dessa forma, o texto não pode ser entendido como uma materialidade que leva ao discurso.

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Pelo contrário, se é resultado de uma situação discursiva, o texto é indissociável do discurso. Segundo Marcuschi (2008, p.58), a distinção entre texto e discurso, além de complexa, não se mostra interessante, já que hoje as duas noções podem ser vistas como intercambiáveis, nas palavras do autor:

A tendência é ver o texto no plano das formas linguísticas e de sua organização, ao passo que o discurso seria o plano do funcionamento enunciativo, o plano da enunciação e efeitos de sentido na sua circulação sociointerativa e discursiva envolvendo outros aspectos. Texto e discurso não distinguem fala e escrita como querem alguns nem distinguem de maneira dicotômica duas abordagens. São muito mais duas maneiras complementares de enfocar a produção linguística em funcionamento.

Como vimos, entendemos o texto como um processo e não um produto, que só adquire significação dentro da situação comunicativa. Portanto, mesmo que se adote a ideia de que o texto é a materialização do discurso, seria difícil separar discurso e texto ou entender os dois conceitos de modo isolado, o que não seria produtivo. De acordo com Marcuschi, a tendência atual é ver um contínuo entre ambos, tendo em vista um condicionamento recíproco entre eles, pois o discurso ocorreria no plano de dizer e o texto no plano da esquematização e, portanto, observável. Marcuschi afirma ainda que, visto dessa forma, reitera-se a articulação entre plano discursivo e textual, considerando o texto como “objeto de figura”, que pressupõe uma configuração, e o discurso como “objeto de dizer”. Essa relação é de suma importância e permite integrar três conceitos bastante relevantes à Linguística do Texto: texto, discurso e gênero. O gênero seria a ponte entre o discurso e o texto, pois, sendo resultado de uma prática social e textual discursiva, apresenta uma composição observável que corresponde a formas sociais que cercaram a situação de sua produção. O conceito de gênero e a caracterização do gênero que compõe o corpus serão observados no capítulo 2.

1.2. Noções sobre referenciação

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Esclarecidos os pressupostos sobre a noção de texto e discurso desta pesquisa, discorreremos agora sobre outro tema relevante: o conceito de referenciação e seus processos.

1.2.1. A relação entre as palavras e o mundo

A trajetória do pensamento sobre a questão da referência é acompanhada por dicotomias, pois, a priori, o entendimento geral era de que a referência se constituía por atividades objetivas, tendo em vista uma relação concreta entre a língua e a realidade, de forma que qualquer referente pudesse corresponder a um estado de coisas no mundo de modo estável. No entanto, outros pensadores já percebiam a dificuldade de estabelecer tal relação concreta entre a linguagem e o mundo e começaram a pensar a referência de modo mais subjetivo, enfocando a ligação entre linguagem e pensamento sem negar a existência de uma realidade fora das mentes, mas afirmando a necessidade de uma visão não somente realista sobre o fenômeno da referência. De fato, é bastante complicado pensar a estabilidade/instabilidade dos referentes, já que a própria natureza da atividade de nomeação aproxima os nomes da realidade e não se pode descartar esse aspecto. Entretanto, é importante perceber que as categorias usadas para descrever o mundo são plurais e passíveis de mudança porque não se trata de uma rotulação real e objetiva, mas de conceber que a relação entre a linguagem e o mundo é construída pelos falantes, podendo ser modificada a todo instante. O cérebro humano não opera somente de forma a refletir exemplarmente a realidade, isto é, o modo como dizemos o real é reelaborado dentro de nossas mentes e essa reestruturação ocorre no discurso, não de forma individual e isolada, mas obedecendo a condições culturais, sociais, históricas e linguísticas, conforme apontam Koch e Marcuschi (1998). Isso implica dizer que os objetos, sejam eles sociais ou físicos, são construídos, interativa e discursivamente, pelos participantes da atividade linguística; tais objetos não são, portanto, representações fiéis aos objetos do mundo, eles não pré-existem ao discurso, são constituídos dentro da atividade discursiva. O ato de referir, então, não pode ser interpretado como rotulação da realidade.

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Dentro dessa nova perspectiva, porém, não se refuta a relação entre as palavras e as coisas do mundo, mas se destaca que a questão da referência vai muito além disso. Conforme Marcuschi (2004, p.263), “o problema da significação não é resolver se às palavras corresponde algo no mundo externo, e sim o que fazemos do ponto de vista semântico quando usamos as palavras para dizer algo”. O problema da referenciação, para a Linguística do Texto, é o como fazemos, do ponto de vista semântico, pragmático e social, quando nos referimos a algo. A relação entre a linguagem e o mundo deve incluir a subjetividade de quem diz, seus propósitos comunicativos, experiências de vida dentro de uma dada cultura e de um determinado momento histórico. Dessa forma, as coisas não estão no mundo da maneira pela qual nós as dizemos, mas são construídas através de nossa atividade linguística, das práticas discursivas dos locutores, tendo a língua como instrumento de ação sobre o mundo, instrumento esse que se apoia em nossos conhecimentos culturais, sociais, cognitivos. Essa visão se alinha hoje com o que é concebido como referente pela Linguística do Texto. Tal mudança de foco está centrada na dimensão discursiva, deixando claro que o referente é construído e modificado pelo falante ao referi-lo.

1.2. 2. Referenciação e objetos de discurso

Conforme já afirmamos, atualmente focaliza-se a dimensão discursiva e cognitiva dos fenômenos referenciais e, nesta pesquisa, será adotada a perspectiva de que a referência funciona em cooperação com os parceiros da interação, sendo, portanto, construída no discurso, como uma atividade linguístico-cognitiva, ligada à interação. Toda essa concepção foi baseada em uma noção de língua heterogênea, histórica, variável e socialmente construída. A partir desses pressupostos, a Linguística do Texto apresenta o termo “referenciação” em lugar de “referência”, uma vez que aquela remete à noção de processo, atividade, ao passo que “referência” denota certa estaticidade/estabilidade que não condiz com o que se entende atualmente pela atividade de referir. Mondada (2005, p.12), ao tratar da questão, confirma o uso do termo “referenciação” e propõe também o uso de “objeto de discurso” no lugar de “referentes”, como diz a autora:

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Nessa perspectiva, são as práticas referenciais manifestadas na interação que são objetos de análise- práticas linguageiras, mas também práticas gestuais, movimentos no espaço, orientação do olhar; “os referentes” visados por estas práticas não são tratados como preexistindo a elas, mas como instaurados na realização e no desenrolar da atividade referencial, pela maneira mesmo como esta é reconhecidamente organizada. (...) Tornando, assim, um pertinente, visível e presente um referente que é tratado não como um objeto de mundo, mas como um objeto-de-discurso.

Tal como postulam Mondada e Dubois (2003), a noção de representação do mundo é discutida, passando ao conceito de discursivização do mundo. Dentro dessa perspectiva, postula-se a construção de objetos cognitivos e discursivos na intersubjetividade das negociações linguísticas, que podem ser transformadas, modificadas e serem alvo de reavaliações dos interlocutores. Para Mondada e Dubois (2003, p. 20), os objetos referidos pelo discurso são “objetos constitutivamente discursivos”, criados na enunciação; isto é, eles são gerados em uma dinâmica discursiva e não fazem uma simples remissão linguística. Essas novas conclusões se devem ao fato de não se usar mais a noção de referência, como dissemos anteriormente, pois não se trata de uma designação especular de um elemento tal qual ele é, mas de uma construção conjunta desse elemento. De acordo com os autores (2003, p. 20):

(...) passando da referência à referenciação, vamos questionar os processos de discretização e de estabilização. Esta abordagem implica uma visão dinâmica que leva em conta não somente o sujeito “encarnado”, mas ainda um sujeito sociocognitivo mediante uma relação indireta entre os discursos e o mundo. Este sujeito constrói o mundo ao curso do cumprimento de suas atividades sociais e o torna estável graças às categorias – notadamente às categorias manifestadas no discurso.

Defendemos o enfoque discursivo no processo de referenciação, uma vez que esse processo é visto como uma atividade de construção de “objetos de discurso”, que não se confundem com a realidade extralinguística, mas (re) constroem-na no processo de interação. Desse modo, referir é, sobretudo, elaborar uma discursivização ou textualização do mundo, a qual se funda em escolhas do sujeito em função de um querer-dizer. Segundo Koch e Elias (2006, p. 123), “eles (os referentes) são construídos e reconstruídos, de acordo com nossa percepção”. Ou seja, não há uma perfeita equivalência entre as palavras e as coisas. Ao serem reconstruídas no interior do

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discurso, as entidades se tornam novos objetos de discurso, revestidos de nossas crenças, atitudes e intenções comunicativas. Tal noção parece mais abrangente do que a noção comum de referente. O processo de referenciação, então, não é a simples substituição de um termo por outro equivalente, mas uma prática discursiva, já que pressupõe uma interação entre os sujeitos do discurso e estes procedem a escolhas significativas para representar as coisas de acordo com a sua proposta de sentido. Em resumo, entende-se por referenciação as diversas formas de introdução, em um texto, de novos referentes ou entidades. Já quando tais referentes são retomados mais adiante ou servem de base para a introdução de novos referentes, há o que se chama de progressão referencial (cf. KOCH & ELIAS, 2006 e 2009). A categorização dessas entidades, conforme apontam Koch e Elias (2006) pode ocorrer de acordo com a multiplicidade de pontos de vista dos sujeitos e não dependendo somente de restrições semânticas determinadas pelas categorias linguísticas empregadas no ato de referir. Ainda de acordo com a autora, mudanças no contexto comunicativo, no ponto de vista ou nos propósitos comunicativos dos sujeitos envolvidos podem resultar na recategorização de um objeto dentro do texto. Para Mondada e Dubois (2003, p. 24):

A variação e a concorrência categorial emergem notadamente quando uma cena é vista de diferentes perspectivas, que implicam diferentes categorizações da situação, dos atores, dos fatos. A ‘mesma’ cena pode, mais geralmente, ser tematizada diferentemente e pode evoluir – no tempo discursivo e narrativo – focalizando diferentes partes ou aspectos.

O próprio entorno discursivo pode alterar a percepção do objeto de discurso, sendo responsável também por sua identificação, uma vez que, nas atividades discursivas, a instabilidade categorial manifesta-se em todos os níveis da organização linguística, de forma que a recategorização seja uma evolução natural do referente dentro do discurso. É na prática social de linguagem que se constroem os referentes e construímos a realidade a partir das estruturas linguísticas; assim, a instabilidade dos referentes é inerente ao discurso. Portanto, a escolha de determinadas categorias textuais está intimamente relacionada às representações sociais, aos papéis sociais, aos propósitos comunicativos dos enunciadores e ao próprio sentido que se deseja atribuir ao texto.

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1.2.3. A recategorização dos referentes

A partir do momento em que ocorre a categorização de um determinado objeto discursivo, são instauradas possibilidades de que esse mesmo objeto possa ser transformado no decorrer do discurso. Dessa forma, um mesmo objeto pode ser renomeado e sofrer constantes alterações no ato enunciativo. Tal possibilidade opera mudanças tanto nas formas linguísticas como nos processos cognitivos envolvidos na construção/reconstrução desses objetos que pode apresentar significativas alterações do referente. Essa operação tem sido classificada pelos estudiosos em geral como um caso de continuidade referencial, um subtipo das anáforas diretas, como será exposto mais adiante. Como dissemos no final do item anterior, a instabilidade dos objetos é inerente aos processos de referenciação, pois ocorre no interior de uma situação comunicativa. Desse modo, a transformação dos objetos acontece sempre tendo em vista os propósitos comunicativos dos enunciadores. Segundo Koch (2005), as formas nominais, com função de categorização ou de recategorização de referentes, são resultados de escolhas frente a uma diversidade de formas de caracterizar o referente, de acordo com os sentidos pretendidos pelo produtor do texto. Essas formas ativam conhecimentos partilhados, como informações culturais, valores e crenças sobre características dos referentes, que podem levar o interlocutor a reconstruir a imagem do objeto de discurso. Koch (2002) assevera que a recategorização, além de trabalhar na referência, auxilia a interpretação dos sentidos realizada pelo receptor do texto, como no exemplo abaixo:

Hoje, Laerte desperta ódio e perplexidade. Friamente, confessou 11 assassinatos de crianças, entre quatro e dez anos. Duas outras mortes foram confessadas informalmente à polícia, até quinta-feira, 27. O Monstro de Rio Claro, como passou a ser conhecido, gostava de registrar num caderno o dia e a cidade onde passava (...). O andarilho da morte fez questão de dizer que tem profissão: é engraxador de portas de estabelecimentos (...) (Isto É, 02/02/00) (Koch, 2002, p.106)

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Ao objeto de discurso Laerte vão sendo incorporadas novas designações (monstro de Rio Claro e o andarilho da morte) que contribuem para a progressão do texto. Além de formarem uma cadeia coesiva, elas trazem para a situação discursiva outros sentidos, complexificando o processo de interpretação, visto que outras significações, como monstro, por exemplo, são acrescentadas ao texto. Segundo a autora, essas transformações só são possíveis porque essas novas categorias se formam durante a enunciação. Esses fenômenos também foram verificados no nosso corpus, conforme podemos observar adiante:

(1) (...)A Austrália só assustou no começo, quando Garcia teve a chance de abrir o – Lahm evitou o gol. Mas logo a Alemanha passou a se impor, trocando passes com objetividade, e fez 1 a 0 aos oito minutos, num chute forte de Podolski. Daí em diante, ao seu melhor estilo, com ótima movimentação, o time dirigido por Joachim Löw pôs os australianos na roda e passou a criar um punhado de oportunidades. Aos 26, Klose ampliou, de cabeça, após cruzamento de Lahm. No intervalo, o técnico holandês da seleção da Oceania, Pim Verbeek, trocou Grella por Holman, e a equipe saiu em busca de reação. Inútil... (L2).

No exemplo (1), retirado do relato da partida entre Austrália e Alemanha, os objetos de discurso são apresentados no começo do texto, depois recebem uma nova configuração, pois são recategorizados pelas expressões sublinhadas, a primeira faz referência ao técnico alemão e a segunda, à localização geográfica da seleção da Austrália. Tal estratégia não é usada ocasionalmente, mas de forma proposital para fornecer ao co-enunciador outras informações. Como afirma Cavalcante (2011), “são situações de anáfora correferencial em que o mesmo referente vai sendo alterado em proporções variadas.” Koch (2005) também alerta que, para interpretação mais adequada dessas recategorizações, são necessários conhecimentos prévios, pois a reativação dos referentes se manifesta acrescida de novas significações. A autora acrescenta ainda que esse recurso constitui uma importante forma de construção textual que pode contribuir, inclusive, para atribuir valores argumentativos ao texto:

O emprego de uma descrição nominal, com função de categorização ou recategorização de referentes, implica sempre uma multiplicidade de formas

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de caracterizar o referente(...). Trata-se, em geral, da ativação, dentre os conhecimentos culturalmente pressupostos como compartilhados, de características ou traços do referente que devem levar o interlocutor a construir dele determinada imagem(...) uma de suas funções textual- interativas específicas é a de imprimir aos enunciados em que se inserem, bem como ao texto como um todo, orientações argumentativas conformes à proposta enunciativa do seu interlocutor. (KOCH, 2005, p. 35)

O emprego dessas expressões nominais anafóricas opera a recategorização dos objetos de discurso, reconstruindo-os de acordo com intenções comunicativas do interlocutor. Acreditamos, portanto, que a recategorização é um processo textual que revela as transformações de um referente, o que pode acarretar mudança de significação, podendo indicar a orientação argumentativa do texto. Como vimos, para a construção da referenciação, são necessários conhecimentos textuais e extratextuais. Entretanto, a mente humana não é apenas um processador de informações, mas outro participante da ação, de modo que o processamento das informações ocorre por meio de estratégias de ordem sociocognitiva, as quais consideram os conjuntos de conhecimentos socioculturalmente determinados e adquiridos em (con)vivência, passíveis de complementação e/ou de reformulação. Desta forma, os processos de referenciação são vistos de modo dinâmico, como uma atividade, e a construção de sentidos como um processo que acontece dentro e fora da mente, requerendo constante negociação. Nesta perspectiva teórica, os signos linguísticos, então, funcionam como pistas deflagradoras de sentidos, as quais, junto com outras pistas, confluem para a construção de um sentido situado, emergente do contexto, da prática discursiva. O contexto, de acordo com essa ótica, segundo Carvalho (2005, p.33)

é mais do que o entorno físico, social ou cultural. É, acima de tudo, uma noção cognitivamente construída. O conjunto dessas representações se encontra interiorizado nos interlocutores e é mobilizado, sempre que necessário, no ato da enunciação. Ele engloba, portanto, não só o lugar e o momento da enunciação, mas também os participantes, os meios de interação de que se utilizam, os recursos extralingüísticos – gestos, olhares, etc. –, o texto em realização, os conhecimentos de mundo compartilhados entre os usuários e o entorno sociocultural, que ultrapassa a enunciação. Enfim, a noção de contexto se amplia e abarca os aspectos cognitivos em funcionamento na interação.

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As formas de construir o real no mundo não são oriundas de sistemas de significação com correspondência semântica para cada entidade; os modos de construção dos referentes são gerados criativamente pelos interlocutores. Podemos afirmar que eles dizem “criativamente”, de forma que a significação não é algo dado a priori, mas fornecido pelo contexto interacional. Tendo em vista essa perspectiva sócio- interacionista, a construção de uma dada realidade é feita a partir da experiência dos indivíduos que convivem e interagem em uma determinada cultura ou sociedade. Veremos, no exemplo abaixo, como todas essas circunstâncias são primordiais para a emergência dos sentidos no texto retirado do jornal O Lance!, no qual se fala sobre um jogo do clube São Paulo pelo campeonato brasileiro:

(2) A quinta vítima! São Paulo Jason vence quinto jogo seguido, entra no G4 e diferença para o líder cai

Barueri, Grêmio, Vitória, Botafogo e Goiás. O tricolor Jason despachou mais um, completou cinco vitórias seguidas, sete jogos sem perder e entrou pela primeira vez no G4. A diferença para o líder Palmeiras, com um jogo a menos, caiu para cinco pontos. A vítima da vez foi a melhor colocada na tabela entre as já feitas pelo Sampa. E entrou em território tricolor com seis vitórias seguidas.(...) Ontem, o Jason demorou a entrar em cena. A vítima de Goiânia até ofereceu resistência. Só no início. O São Paulo, protagonista do filme, não conseguiu impor a marcação pressão que gosta no começo. (...) O primeiro grande golpe do Jason foi com . O travessão salvou a vítima verde.(...) (NÚCLEO DE FUTEBOL. A quinta vítima. Jornal Lance).

O exemplo 2 relata a vitória do São Paulo sobre o Goiás. O jornalista se valeu do nome Jason (personagem de filme de terror que sempre reaparecia após ser considerado morto) para fazer referência ao clube paulista. Tal associação foi feita pelo fato de o São Paulo realizar uma campanha ruim no campeonato, distante da zona de classificação para disputar a Taça Libertadores da América (G4) e distante também da luta pelo título de campeão brasileiro. No entanto, o time emplacou uma sequência de cinco vitórias seguidas, conseguindo, assim, entrar no G4. Devido a essa melhora, Jason passou a ser o símbolo da reação do São Paulo no campeonato, conforme pode ser percebido através dos sintagmas o tricolor Jason, o primeiro grande golpe do Jason, que retomam o clube São Paulo bem como através das expressões a vítima da vez e a vítima de Goiânia, que retomam o referente Goiás, pois o uso do substantivo vítima faz parte do campo semântico da associação realizada.

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Essa associação estava sendo feita pela torcida e foi aproveitada pelos meios jornalísticos, mostrando o que foi discutido acima sobre a construção conjunta dos referentes. O nome Jason pode ativar diversos significados, mas, dentro do contexto histórico e sociocognitivo compartilhado pelos interlocutores, um deles é ativado. Além disso, é possível perceber o que foi dito anteriormente sobre a referenciação se estabelecer no processo de comunicação, pois a associação do clube paulista com o personagem do cinema só foi possível pelo momento que o time vivia no campeonato; não se trata de uma associação posta, isto é, já pronta, mas forjada de acordo com a campanha do time na referida competição.

1.2.4. As formas de construção dos objetos de discurso e sua implicação para progressão referencial

A referenciação, como vimos, constitui uma atividade discursiva promovida pelos sujeitos sociais atuantes em uma situação de interação verbal que realizam escolhas significativas, tendo em vista seu projeto de dizer. Nesse sentido, concordamos com Koch (2006b) quando a autora afirma que, para a interpretação de uma expressão referencial anafórica, é mais importante ativar algum tipo de informação na memória discursiva do que somente localizar alguma palavra ou expressão na superfície textual, o que pode ser verificado no último exemplo (2). Para localizar tais informações na memória, o falante, segundo a autora, utiliza estratégias por meio das quais é possível construir os objetos de discurso, mantê-los ativados ou desfocalizados na plurilinearidade do texto. Portanto, toda atividade de escrita pressupõe (KOCH, 2006b, p. 62):

1. Construção/ativação - pela qual um referente textual até então não mencionado é introduzido, passando a preencher um nódulo ("endereço" cognitivo, locação) na rede conceptual do modelo de mundo textual: a expressão linguística que o "representa" permanece em foco na memória de curto termo, de tal forma que o referente fica saliente no modelo; 2. Reconstrução/reativação - um nódulo já introduzido é novamente ativado na memória de curto termo, por meio de uma forma referencial, de modo que o referente textual permanece saliente (o nódulo continua em foco); 3. Desfocalização/desativação: ocorre quando um novo objeto-de-discurso é introduzido, passando a ocupar a posição focal. Embora fora de foco, porém, este continua a ter um endereço cognitivo (locação) no modelo textual, podendo a qualquer momento ser novamente ativado, ou seja, ele continua

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disponível na memória dos interlocutores. Seu estatuto no modelo textual é de inferível.

Por meio dessas estratégias, os referentes instaurados no texto podem ser, em qualquer momento, expandidos ou modificados. Desse modo, durante o processo de compreensão, a memória do interlocutor vai criando uma representação complexa, que ocorre pela soma sucessiva de categorizações, recategorizações e/ou novas avaliações sobre os referentes. Em um texto, todas essas estratégias estão presentes, à medida que atuam instaurando novos referentes, mantendo-os em foco ou até mesmo desativando esses referentes na arquitetura textual, formando a memória discursiva dos interlocutores, permitindo que novas informações sejam assimiladas sem causar estranhamento. Então, os procedimentos denotados acima, ao mesmo tempo, contribuem para a estabilidade do modelo textual e auxiliam para que ele possa ser continuamente modificado e reelaborado por meio de novas referenciações e, assim, auxiliam na construção da progressão referencial.

1.2.5. Classificação dos processos referenciais

Trataremos agora da classificação proposta por Cavalcante (2011) para os processos referenciais, tendo em vista a perspectiva sociointeracionista, que considera a realidade uma experiência criada em conjunto a partir da interação de um determinado grupo, inserido em uma dada cultura. Há diferentes tipos de processos referenciais que ajudam os participantes da interação a construírem os sentidos e a coerência dos textos que recebem ou produzem. Entendemos aqui, baseados em Cavalcante (2011), que todo processo referencial é constituído por um dispositivo remissivo, uma propriedade de apontar para um objeto reconhecível a partir de pistas diversas. A partir dessas noções, Cavalcante (2011, p.86) aponta para duas possibilidades dos processos referenciais: a introdução referencial, equivalente à ativação de novos referentes, e a anáfora ou continuidade referencial, equivalente à reativação, dentro da perspectiva do que a autora chama de “processos atrelados à menção no cotexto”.

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A fim de ilustrar e exemplificar essa concepção, segue-se o quadro abaixo retirado de Cavalcante (2011, p.86):

Processos referenciais atrelados à menção Introdução Referencial Anáfora direta (continuidade referencial) Anáforas diretas Anáforas indiretas (Correferenciais) (Não-correferenciais)

AI (propriamente Anáforas ditas) encapsuladoras

O quadro acima aponta para a divisão dos mecanismos de referenciação em introdução de referentes e continuidade referencial. Pode-se dizer, portanto, que há duas grandes funções das expressões referenciais, de acordo com Cavalcante (2011, p. 86):

1) Introduzir formalmente um novo referente no universo discursivo 2) Promover, por meio de expressões referenciais, a continuidade de referentes estabelecidos no universo discursivo

Desse modo, podemos separar dois tipos de processo: as introduções e as anáforas. As introduções são ocorrências novas, formalmente apresentadas no texto pela primeira vez. Em contrapartida, as anáforas devem estar ancoradas em pistas do cotexto. Isto é, devem estar baseadas em algum elemento do cotexto que possa servir de âncora para as anáforas, sendo necessário que as expressões referenciais possam ser associadas a alguma indicação presente no cotexto. A introdução referencial consiste na inserção de referentes novos sem estarem apoiados em nenhum outro elemento do texto, ou seja, as entidades estão sendo introduzidas no texto pela primeira vez. Vejamos o exemplo retirado de um relato esportivo publicado no jornal Lance! em 10/03/2011:

(3) Em ritmo de ressaca do Carnaval, o Botafogo mais uma vez venceu, mas não convenceu: 1 a 0 sobre o Nova Iguaçu, em Volta Redonda, com gol de Everton, novo camisa 10 do time depois da saída de Renato Cajá. A trégua entre e a torcida acabou e ele voltou a ser vaiado.(...).(M20)

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As expressões “Botafogo” e “Nova Iguaçu” introduzem novos referentes no texto, já que foram citados pela primeira vez, sendo chamadas de introdução referencial por não haver nada que remeta a esses nomes anteriormente. Já as anáforas são divididas em subgrupos de acordo com a forma de menção de expressões referenciais. Havendo correferencialidade, há anáforas diretas; por outro lado, se houver menção a âncoras do contexto e, simultaneamente, a elementos do conhecimento compartilhado e/ou da situação extralinguística, temos as anáforas indiretas. Além dessas características, as expressões referenciais também podem fazer uma remissão prospectiva, isto é, uma remissão catafórica de forma a antecipar o referente, uma vez que as expressões referenciais anafóricas podem levar o leitor para o que foi dito no texto, o que ainda vai ser dito ou para os dois. Vejamos exemplos do corpus: a) Anáforas diretas (correferenciais):

(4)A Inglaterra impôs a sua flagrante superioridade desde o início, dominando o meio de campo, mantendo os eslovenos recuados. Aos 23 minutos, Milner cruzou, Defoe se antecipou a Suler e desviou de Handanovic, abrindo o placar. O adversário não esboçou a reação. A Inglaterra ainda esteve perto de ampliar, aos 29, numa bola rasteira colocada por Gerrard no canto esquerdo, que obrigou o goleiro a um grande esforço para defender.(...) (L7)

A expressão sublinhada é uma anáfora direta1 correferencial, já que recupera a mesma entidade previamente mencionada por meio de uma repetição lexical. Além da propriedade de remeter a um antecedente no texto. As anáforas diretas também podem operar sucessivas recategorizações nos referentes, podendo exercer, no fluxo do discurso, alterações a partir das quais novas referências podem ser feitas, como no exemplo a seguir:

(5)Até mesmo o Soccer city pareceu torcer para a Holanda em sua estreia na Copa da África. Pintados de laranja, os assentos do maior estádio do Mundial se confundiam com os inúmeros torcedores de uma das seleções favoritas ao título. Uma coincidência, claro. Mas a Laranja Mecânica jogou o suficiente para derrubar sem dificuldades a Dinamarca por 2 a 0 e o tolo blefe de seu técnico. (L5)

1 Marcamos em negrito as introduções referenciais e sublinhamos as anáforas .

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No exemplo acima, o referente Holanda passa por duas recategorizações ao ser nomeado como uma das seleções favoritas ao título e a laranja mecânica; ambas as expressões acrescentam novas informações ao objeto de discurso. Por isso, costumamos dizer que as anáforas diretas podem marcar a presença de outras vozes no texto ou até mesmo atribuir conteúdos avaliativos aos objetos de discurso. Conforme aponta Koch (2005), as formas nominais podem funcionar como elementos avaliativos ou argumentativos, uma vez que a escolha lexical feita pelos enunciadores visa a ressaltar os sentidos de determinados vocábulos tendo em vista seus propósitos comunicativos. Já no exemplo (6), a seguir, a recategorização ocorre de maneira prospectiva:

(6) Azurra, que surra! Com pouca inspiração e escalação errada no primeiro tempo, Itália só acorda no fim e não evita derrota que a elimina da Copa. (L10).

Assim, a expressão sublinhada azurra faz uma remissão prospectiva, catafórica, antecipando o referente Itália. b) Anáforas indiretas (não-correferenciais): (7)Deu sono! Em jogo muito ruim, Uruguai e França pouco criam e não saem do zero. Nem parecia que havia três títulos mundiais em campo. (L19)

A progressão referencial, no entanto, não se articula apenas por meio de estratégias de correferencialidade, pois nem toda continuidade implica a manutenção do mesmo referente. A continuidade anafórica também pode ocorrer pela menção de expressões ligadas a âncoras linguísticas do cotexto, ou seja, uma referência indireta que também é anafórica. Nesse caso, a progressão referencial ocorre por associação e inferências articuladas pelos participantes da interação, configurando as anáforas indiretas (não correferenciais). No exemplo acima, há uma anáfora indireta, pois a expressão sublinhada instaura um novo referente no discurso, tendo em vista alguma pista formal do texto que funciona como apoio para inferência das relações estabelecidas no texto. As anáforas indiretas são caracterizadas pelo fato de não haver correferencialidade. A sua interpretação é ativada por uma pista no texto que vai acionar outros conhecimentos necessários à reconstrução do referente.

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O sintagma nominal três títulos mundiais faz referência às copas conquistadas pelas seleções do Uruguai e da França: esta com um título mundial e aquela com dois títulos mundiais. Essa informação não está presente no texto, mas, por meio dos nomes das seleções (pistas presentes no cotexto) e do conhecimento sobre sua história no futebol (informações ativadas a partir das pistas), podemos chegar a essa interpretação. Cavalcante (2011) cita autores que propõem uma divisão das anáforas indiretas em diferentes subtipos (associativas, inferenciais, meronímicas, etc). Entretanto, a autora não as subdivide, tendo em vista que toda anáfora indireta se constrói por meio de uma diversificada associação de ideias, não sendo produtivo, portanto, subclassificá- las. Neste trabalho, adotamos a mesma posição de Cavalcante, por acreditarmos que subdividir esse tipo de anáfora seria apenas encontrar diferentes maneiras de nomear o mesmo fenômeno. Em relação à subdivisão entre anáforas diretas e indiretas, destacamos os estudos de Ciulla e Silva (2008) e Cavalcante (2011), os quais mostram que essa subdivisão não abrange satisfatoriamente a complexidade do uso dessas anáforas. As autoras chamam atenção sobre a definição de anáfora correferencial, como aquela que remete a um único antecedente no cotexto, apontando como tal definição pode ser questionada, se levarmos em consideração que há diversas pistas disponíveis para a elaboração da referência. Em outras palavras, o que as autoras demonstram é o comportamento semelhante entre esses dois subtipos de anáforas, pois, em ambos os casos, há o apelo à memória discursiva e os procedimentos de recuperação dos referentes podem englobar pistas no cotexto. De modo mais específico, as autoras provam que, mesmo no caso das chamadas anáforas diretas, pode não haver um antecedente expresso recuperado através de substituição de termos, mas um referente reformulado através de informações inferenciais, assim como ocorre nos casos tratados como anáforas indiretas. Nas palavras de Ciulla e Silva (2008, p. 52):

nos dois casos [anáforas diretas e indiretas] o comportamento pode ser o de amálgama cognitivo, isto é, as anáforas, tanto chamadas diretas como indiretas, podem ser núcleos a partir dos quais diversas referências podem ser feitas, em procedimentos de recuperação, de reformulação ou de homologação de novos referentes.

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Concordamos com a posição de Ciulla e Silva (2008), para quem todo processo anafórico implica inferência e outros processos cognitivos realizados a partir de diferentes graus de inferência e com diversas pistas concorrentes para interpretação dos elementos referenciais. Como dissemos, os objetos de discurso podem sofrer transformações e recategorizações ao longo do discurso, tendo por base processos inferenciais e o apelo à memória cognitiva compartilhada pelos interlocutores. As anáforas, de qualquer subtipo, promovem essa reformulação dos objetos de discurso, envolvendo tais mecanismos inferenciais e o uso da memória cognitiva em diferentes graus, ou seja, determinadas construções anafóricas podem apelar mais ou menos para a memória compartilhada. Portanto, corroboramos a tese de Ciulla e Silva (2008) de que a interpretação de qualquer processo anafórico está diretamente relacionada a cálculos inferenciais e outros processos cognitivos. A autora rejeita qualquer definição que dissocie léxico e cognição, descartando inclusive a subclassificação entre anáforas diretas e indiretas, pois sempre há a dependência de algum processamento cognitivo para interpretação de quaisquer tipos de anáforas sejam elas tradicionalmente chamadas de diretas, indiretas ou encapsuladoras. Esse comportamento pode ser observado em alguns exemplos do corpus em que os sintagmas nominais recategorizadores revelam uma evolução dos objetos designados:

(8) (...)Aos 2 minutos, fez um carnaval, deu caneta e Botinelli bateu para fora. Três minutos depois, porém, Felipe falhou em chute de Renam Silva e soltou a bola nos pés de Danilo, que abriu o placar. Para o samba não atravessar, Ronaldinho passou a ditar o ritmo da equipe. O camisa 10 trouxe um pouco de fantasia ao jogo aos 14, quando tentou marcar de bicicleta. O Flamengo só igualou o placar aos 46: Botinelli chutou mal, mas Thiago Neves, bem posicionado, completou para o gol: 1 a 1. Thiago Neves e Ronaldinho começaram o segundo tempo com nota 10 no quesito harmonia. O capitão recebeu do camisa 7 na cara do gol e fez 2 a 1, com categoria. (...)(M16)

No exemplo acima, o referente Ronaldinho é retomado por duas expressões nominais recategorizadoras: camisa 10 e capitão. Nesses exemplos, as formas nominais trazem informações novas que se somam à primeira referência – fazendo com que o referente evolua no curso do discurso – e que, vale ressaltar, talvez soassem estranhas para quem não dispusesse de tais conhecimentos sobre o jogador.

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Um outro uso interessante nesse texto pode ser percebido através das expressões capitão e camisa 7, que se referem, respectivamente, a Ronaldinho Gaúcho e a Thiago Neves. Percebemos que a interpretação desses sintagmas nominais se apoia muito em conhecimentos culturais sobre o futebol, pois os objetos foram retomados por sintagmas que representam as posições desses jogadores em campo, informações que podem não estar acessíveis a qualquer leitor. Esse exemplo comprova o que dissemos acima sobre o fato de os processos anafóricos estarem sempre apoiados em processos cognitivos. Tais sintagmas são tratados como anáforas diretas recategorizadoras, tipos de anáforas que pressupõem a manutenção de um mesmo referente no discurso e são correferenciais. Entretanto, a interpretação dessas anáforas não constitui uma simples operação pontual de troca de termos e depende diretamente da associação de informações culturais acerca das posições dos jogadores. c) Anáforas encapsuladoras

Ainda sobre as anáforas indiretas (não-correferenciais), destaca-se a possibilidade de, por vezes, funcionarem como encapsuladoras no discurso. Como afirma Cavalcante (2011), as anáforas encapsuladoras podem ser entendidas como indiretas por fazerem menção a um referente novo no discurso, apresentado como se ele já fosse conhecido. Tais anáforas resumem conteúdos textuais (explícitos ou implícitos) em partes cotextuais anteriores ou posteriores e não estão atreladas a nenhum objeto de discurso citado formalmente no texto, mas a definições, conteúdos presentes no contexto. Esse tipo de anáfora, além de apresentar um importante papel coesivo e organizar os tópicos dentro do discurso, pode, a partir de informações já mencionadas no texto, implementar um objeto quase novo para discurso, remetendo a informações não explicitadas no cotexto, como pressupostos, subentendidos e outros conteúdos presentes na memória discursiva dos participantes da interação. Segundo Cavalcante (2011, p. 73) A diferença crucial entre estes encapsuladores e os anafóricos indiretos propriamente ditos, (...) é que resumem, “encapsulam”, conteúdos proposicionais inteiros, precedentes e/ou consequentes. Além disso, os

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encapsuladores não remeteriam a âncoras bem pontuais, bem específicas, do cotexto, mas a informações ali dispersas.

Vejamos um exemplo:

(9)“Rafa Marquez também mostrou seu talento. O camisa 4 deu a assistência para Hernandez, que explorou a velocidade e marcou o primeiro gol. A jogada, sem dúvida, foi irregular, mas o árbitro não marcou. No entanto, foi uma compensação ao domínio imposto”. (L12).

No exemplo (9), o sintagma nominal a jogada resume as duas primeiras frases do texto, nas quais são descritas as ações que culminaram no gol da seleção mexicana, resumindo uma parte do cotexto precedente, ou seja, informações já mencionadas. Ao mesmo tempo, esse sintagma traz um novo objeto para o discurso, tomando como base as informações que já foram expostas, estabelecendo, portanto, um novo referente no discurso, já que o encapsulador jogada agrupa os lances descritos anteriormente e introduz um tópico praticamente novo de discussão na sequência do texto. Para Conte (2003, p.186) a anáfora encapsuladora “funciona simultaneamente como um recurso coesivo e como um princípio organizador, e pode ser um poderoso meio de manipulação do leitor”, pois o fato de o produtor do texto rotular um conteúdo contribui para a força argumentativa de um texto. O grau de argumentatividade vai variar de um rótulo para outro, contudo, mesmo aqueles com aparente neutralidade, não são esvaziados de carga argumentativa, já que sua escolha constitui sempre uma opção do produtor do texto. Koch (2006b) comenta que as anáforas encapsuladoras ajudam na organização macrotextual, visto que, além de apontarem o fechamento de uma porção do texto, podem funcionar como “sinalizadores argumentativos”, levando o coenunciador para o próximo tópico do texto. Assim, essas anáforas se mostram como um recurso importante para a introdução, mudança ou desvio de tópico, bem como podem servir de ligação entre os tópicos do texto, constituindo, assim, um mecanismo linguístico de estruturação tópica. Esse tipo de elaboração referencial pode atribuir uma hierarquia nos argumentos listados em um texto e até mesmo funcionar como um elemento de avaliação por parte do autor, pois, ao sumarizar uma parte do texto, ele pode destacar ou enfatizar alguma parte desse conteúdo, como também atesta Koch (2005).

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Vale destacar a importância dos dados do entorno sociocultural e situacional dos enunciadores, não só a importância das fontes presentes no texto, mas a forma como todos esses critérios vão auxiliar na representação mental do objeto de discurso. O processamento das relações requer uma complexa ativação de processos cognitivos que mobilizam conhecimentos na memória discursiva dos participantes da interação, pois, para entender as relações postas no texto, os falantes vão elaborando representações mentais no universo do discurso e gerando cadeias referenciais. Todo esse entrelaçamento de elos referenciais não se coaduna somente com o que está explícito no cotexto, mas também com o que está na memória discursiva e que é ativado por meio de inferências, como podemos ver no exemplo (10):

(10) “(...) A Suíça, ao melhor estilo Ottmar Hitzfield, praticou o antifutebol. A Espanha dominou a partida inteira. Trocou uma infinidade de passes. Foi um autêntico jogo de ataque contra defesa. Mas o time dirigido por Vicente Del Bosque, na realidade, criou poucas oportunidades daquelas de se lamentar. Na etapa inicial, aos 23, Piqué chutou e Benaglio agarrou. Virou 0 a 0. E a Espanha tomou o gol. O treinador da Fúria tentou mudanças. Lançou Fernando Torres e Jesus Navas. Depois Pedro. A ideia era tornar o time ainda mais ofensivo. Nenhum deles fez milagre. Aos 24, Xavi Alonso acertou o travessão. Aos 35, Navas bateu forte de fora da área, e como diziam os antigos, a bola passou raspando à trave direita(...)”.(L4)

As expressões sublinhadas no exemplo (10) podem ser entendidas como anafóricas diretas. A primeira expressão retoma o referente Espanha, já a segunda expressão refere-se ao treinador e à seleção conhecida como Fúria, ambas as expressões acrescentam novas informações aos termos a que se referem, recategorizando-os. Ao primeiro termo grifado (o time dirigido por Vicente Del Bosque), acrescenta-se que a seleção espanhola é dirigida pelo treinador Vicente Del Bosque e, no segundo, é utilizado o apelido que os espanhóis colocaram na sua seleção, Fúria. Essas duas informações são inseridas no texto como se fossem conhecidas pelo leitor. Por isso, concordamos com Cavalcante (2011), quando a autora propõe um avanço no tratamento aos processos anafóricos, indicando que se deve alargar o critério de menção no cotexto, ou seja, a manifestação formal das expressões referenciais não pode ser o único fator de descrição das expressões referenciais, mas devemos considerar os aspectos relacionados ao contexto sociocognitivo compartilhado pelos enunciadores.

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Ao considerarmos desse modo, instaura-se uma discussão interessante entre contexto linguístico e extralinguístico, pois os objetos de discurso têm a sua interpretação acionada a partir do entorno sociocultural e cognitivo. Esse fato mostra que o componente situacional não está fora do linguístico, ou seja, a atividade linguística não ocorre isolada da situação em que os interlocutores se encontram, mas dentro dela. No exemplo acima, a referência ao treinador da seleção da Espanha é perfeitamente aceitável no texto, pois sabemos que os times de futebol têm um treinador e, por conta dessa informação compartilhada, não soa estranho o nome Vicente Del Bosque como treinador, mesmo para aqueles que, por ventura, não soubessem que ele desempenhava essa função. Toda essa rede de associações foi ativada por elementos do texto, mas utilizou um saber compartilhado, mostrando que o contexto linguístico e extralinguístico estão imbricados e sua separação não parece produtiva, pois o falante interpreta o texto tendo em vista seu conhecimento, sua memória e o mundo à sua volta, como bem aponta Ciulla e Silva (2008, p. 48):

É reforçada a ideia de que o que é linguístico é também “situacional”, ou seja, a atividade linguística não acontece de modo exterior ou paralelo à situação, mas é uma atividade que é desempenhada na situação: ao falar e interpretar o que o outro diz, os falantes estão, ao mesmo tempo, percebendo um ao outro e as coisas à sua volta e agem de acordo com essa percepção, levando-se em conta, é claro, o seu estado de atenção, sua intenção, sua habilidade, seu conhecimento e sua memória. Um texto sempre depende de quem lê ou ouve e de coisas que podem ser inferidas a partir dele.

Tendo em vista essas reflexões, adotamos aqui o ponto de vista de que todo processo anafórico implica inferências, com diversos tipos de pistas que atuam na interpretação dos referentes. Por isso, pode haver diferentes graus de inferência e formas que apelam mais ou menos à memória compartilhada, conforme aponta Costa (2007, p.96):

Não há como separar o “dito” do “não-dito”, o linguístico do cognitivo; não há como distinguir um grau “zero” de inferência, porque o uso da linguagem não pode ser reduzido à manipulação de um código. As palavras não portam, individualmente, o sentido; apenas contribuem, de forma indicial, para a tessitura dessa rede de relações complexas, contingentes, que emerge continuamente das trocas entre os falantes.

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Com essas reflexões, podemos concluir que todos os processos anafóricos estão atrelados a inferências e a outros processos sociocognitivos, dependendo mais ou menos desses processos, de acordo com os propósitos comunicativos do texto e de seus interlocutores. No próximo capítulo, trataremos da noção de gênero a ser adotada neste trabalho e também apresentaremos as características do gênero relato esportivo.

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2. GÊNEROS TEXTUAIS: CONCEITUAÇÃO E ESPECIFICIDADES

2.1. O que entendemos por gênero

Os gêneros textuais têm sido um tema recorrente nas discussões linguísticas atualmente, principalmente quando se trata do ensino de língua materna. Além disso, as pesquisas sobre gêneros avançaram muito e hoje podem ser verificadas outras correntes teóricas, como, por exemplo, os estudos de Bazerman, Fairclough, Fowller, entre outros. Desse modo, o presente capítulo apresenta um breve apanhado da teoria dos gêneros textuais e, por último, será feita uma descrição do gênero relato esportivo. Os pressupostos teóricos de Bakhtin ainda hoje dão suporte a toda pesquisa acerca da conceituação dos gêneros textuais, pois seus estudos ampliam a noção aristotélica de gêneros e estabelecem bases para um melhor entendimento de como funciona a comunicação humana. Seu ponto de partida é o vínculo existente entre o uso da linguagem e a atividade humana, sendo a língua a mediadora da relação entre o homem e o mundo. Um primeiro conceito importante para a compreensão do gênero para Bakhtin é a noção de língua que norteia seus trabalhos, pois, para Bakhtin, a língua está além do código uma vez que o processo de comunicação resulta diretamente da relação entre os interlocutores. Partindo da relação significante/ significado, o autor russo percebe e destaca a mutabilidade do signo, sua pluriacentuação, afirmando que a relação de significação ocorre no encontro entre as trajetórias dos interlocutores, sujeitos sociais e psicológicos: “os signos só podem emergir em território interindividual” (BAKHTIN, (2003) [1929], p.30). A língua, portanto, é um lugar de interação, é na interação verbal que a língua se reveste de significado e revela as marcas do sujeito – encontra-se aqui a noção de sujeito ativo socialmente no processo interacional, uma vez que participa ativamente das situações comunicativas. Toda essa dinâmica linguística se concretiza na forma de diálogo entre os interlocutores, pois, conforme se afirmou anteriormente, os sentidos concretos dos signos linguísticos só são apreendidos por meio da indissociável relação entre os interlocutores. Segundo Marcuschi (2008, p. 61), “a língua é um conjunto de

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práticas sociais e cognitivas historicamente situadas”, desse modo, o foco não está mais sobre o código, mas no funcionamento linguístico. Pode-se afirmar que sem a língua não saberíamos produzir nem distribuir o conhecimento do mundo. Conforme Koch (2002, p.44):

a língua não existe fora dos sujeitos sociais que a falam e fora dos eventos discursivos nos quais eles intervêm e nos quais mobilizam seus saberes quer de ordem linguística, quer de ordem sociocognitiva, ou seja, seus modelos de mundo.

Assim, o papel da língua é mais do que mediar o conhecimento: é constituir o nosso conhecimento. Dessa visão deriva o conceito de dialogismo, propriedade básica e inerente da linguagem, que implica a presença de parceiros, de modo que todo enunciado pressupõe um interlocutor ativo, não alguém que receba passivamente o enunciado. O dialogismo pode ser interpretado como marcas históricas e sociais, resultantes da interação entre os falantes, presentes nos enunciados, afirmando, assim, a presença de uma multiplicidade de vozes nos discursos que reproduzem os discursos de uma dada sociedade. Cabe ressaltar que não se entende aqui a historicidade como marca temporal ou curiosidades sobre o autor do texto, por exemplo. A historicidade dos enunciados pode ser percebida na relação com o discurso do outro, no momento em que os enunciados são produzidos. Na perspectiva dialógica da linguagem, a análise histórica dos enunciados não é somente a descrição de uma época ou a narrativa da trajetória de vida de um autor, mas uma análise semântica de polêmicas contidas nos enunciados, aprovações ou recusas a valores sociais em circulação naquele contexto. Um objeto qualquer do mundo interior ou exterior se mostra sempre carregado por ideias, pontos de vista. Não há nenhum objeto que não apareça envolvido em discursos. Por isso, um objeto não está voltado só para a realidade, mas para os discursos que o envolvem. Nessa perspectiva, ganha relevo a noção de enunciado como a unidade real da comunicação verbal, realizada pelos interlocutores numa estrutura dialógica que inclui as condições sociais e o contexto cultural nos quais os enunciados são produzidos. Seguindo a perspectiva dialógica da linguagem, nenhum discurso é novo, mas reflete valores e crenças de outros discursos. Isso quer dizer que, para constituir um discurso, o enunciador necessariamente elabora o seu discurso a partir de outros, há, portanto, uma

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dialogização interna no discurso. Para Bakhtin (2003[1929]), os enunciados estão em constante fluxo e disponíveis a novas significações pelos sujeitos que se encontram no processo de interação. Tal autor chama atenção ainda para o caráter responsivo dos enunciados, destacando que o falante sempre é um contestador, sua fala está sempre em resposta a enunciados já em circulação, sendo os enunciados sempre dirigidos a um destinatário que influencia e determina as escolhas necessárias para sua produção. A partir dos conceitos acima discutidos, Bakhtin afirma que a linguagem penetra na vida por meio dos enunciados concretos, os gêneros, e, da mesma forma, pelos enunciados a vida se introduz na linguagem. Marcuschi (2008) retoma essa questão ao afirmar que, ao dominarmos um gênero textual, não estamos dominando uma forma linguística, mas uma forma de realizar, linguisticamente, nossos propósitos comunicativos em uma situação social particular. Cada enunciado é único, é um acontecimento abstrato em um tipo específico de situação comunicativa que se insere em uma formulação genérica e compartilha características comuns aos outros enunciados da mesma situação de interação. Desta forma, cada atividade, cada forma de utilização da língua elabora tipos relativamente estáveis de enunciados, tendo em vista a natureza dialógica da linguagem, que são construídos por três elementos: conteúdo temático, estilo verbal e a construção composicional. Para Marcuschi (2008, p.155):

os gêneros textuais são os textos que encontramos em nossa vida diária e que apresentam padrões sociocomunicativos característicos definidos por composições funcionais, objetivos enunciativos e estilos concretamente realizados na integração de forças históricas, sociais, institucionais e técnicas.

Com essa posição teórica, chegamos à conclusão de que o gênero é indissociável do envolvimento social; não podemos, então, tratar dos gêneros fora da sua relação com as atividades humanas. Além disso, todo gênero apresenta, em sua composição, forma, estilo e conteúdo. O conteúdo temático refere-se não só ao assunto específico de um texto, mas também ao domínio de sentido de que se ocupa o gênero. De algum modo, cada enunciado carrega em si concepções sobre o mundo, sobre a esfera em que determinado gênero circula. Por exemplo, o gênero receita culinária apresenta como conteúdo

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temático o domínio de técnicas culinárias de alimentos e cardápios conhecidos e apreciados em determinada cultura. O conteúdo temático de um gênero abrange ainda o objeto e a finalidade discursiva, informando sua orientação de sentido para os participantes da interação. Já o estilo refere-se à seleção dos recursos lexicais, gramaticais e fraseológicos da língua em razão da imagem do interlocutor e de como se presume a sua compreensão ativa do enunciado. Pensando na receita culinária, na linguagem empregada nesse gênero, nota-se que há emprego de uma linguagem mais cotidiana, sem termos técnicos. Já em um texto científico, por exemplo, é licenciado o uso de termos técnicos, jargões, uma vez que se pressupõe que o interlocutor desse texto compartilhe desse vocabulário. O estilo de um enunciado está relacionado também à natureza genérica e às suas condições de produção. Uma poesia, por exemplo, que pertence ao domínio literário, tem o estilo individual como um dos seus objetivos, pois a individualidade faz parte das funções de uma comunicação artística. Já os gêneros mais padronizados, como fichas de inscrição e documentos oficiais, não permitem o uso de um estilo individual, uma vez que já estão bastante institucionalizados e atendem a outros propósitos comunicativos. O terceiro elemento constitutivo dos gêneros, a construção composicional, caracteriza-se por ser o modo de organizar o texto, de estruturá-lo. Em uma receita culinária, a estrutura apresenta duas partes: a lista de ingredientes e o modo de preparo. De acordo com essa organização, qualquer indivíduo que queira produzir uma receita deve seguir essa estrutura, e quem lê uma receita também já espera encontrar tal organização lógica. Do reconhecimento dessa relativa estabilidade na estrutura dos gêneros, decorre a noção das esferas de comunicação, pois cada esfera da atividade humana produz seus tipos específicos de enunciados, isso faz com que cada gênero textual traga marcas da esfera na qual está inserido. Essa é uma ideia muito interessante da teoria de Bakhtin, pois, se fosse necessário criar uma nova forma de enunciado a cada nova situação de comunicação, esta seria caótica. Cada esfera de uso da língua estipula suas formas de enunciados, seus gêneros, desde uma situação familiar, por exemplo, até as esferas mais complexas do mundo dos serviços. O mesmo acontece com os textos da mídia em que a criatividade, principalmente nos jornais esportivos, é uma característica buscada pelos jornalistas, fazendo com que sejam modificados e/ ou criados gêneros para atender à

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necessidade de um novo campeonato, por exemplo, como acontecem com os jogos olímpicos. Bhatia (2009), assim como Bazerman (2005), na esteira do que já apontara Bakhtin, corroboram a ideia de que os gêneros são resultados das práticas discursivas convencionadas de comunidades discursivas específicas e mostra ainda que o conhecimento dos aspectos constitutivos dos gêneros é uma ferramenta importante, pois permite o reconhecimento dos gêneros. Contudo, esses estudiosos destacam a dinamicidade do gênero e a possibilidade de inovação, demonstrando que, embora os gêneros sejam uma prática socialmente convencionada, isso não significa que eles não possam se modificar para atender novos propósitos comunicativos. Tendo em vista essa possibilidade, os gêneros podem se misturar para constituir novos gêneros e abarcar novas formas de comunicação social. Desse modo, acentua-se mais o caráter relativamente estável dos gêneros do que a sua estabilidade, pois é essa relação instável que permite a constante modificação dos gêneros. Assim, de acordo com sua esfera de atividade e circulação, teríamos gêneros mais rígidos, como fichas de inscrições e documentos, por exemplo, e gêneros mais flexíveis, como os pertencentes à esfera da publicidade e da mídia em geral. A partir das ideias de Bakhtin, outros teóricos vêm discutindo o conceito de gênero textual, originando outras correntes teóricas, como Bazerman, Fairclough e Fowller, por exemplo. Muitos dos estudos desses teóricos têm analisado especificamente textos da mídia. Os estudos de Bazermam caracterizam-se por uma abordagem sociorretórica, na qual os gêneros são vistos como ações sociais. Seguindo esse caminho, Bazerman sugere que concebamos a noção de gêneros como fenômenos de reconhecimento social, ou seja, como resultados de um processo comunicativo, no qual os interlocutores garantam os seus propósitos comunicativos. Para Bazerman (2005, p. 31), os gêneros “são parte de como os seres humanos dão forma às atividades sociais”. Isso significa dizer que os gêneros não são somente tipos de enunciado reconhecidos, mas indica que os gêneros emergem nos processos sociais em que os indivíduos se comunicam e articulam suas atividades com vistas a seus interesses práticos. Assim, o foco está no texto como artefato social e não no seu aspecto linguístico.

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Já Fairclough e Fowler trazem para o estudo dos gêneros uma abordagem sociosemiótica, utilizando-se da análise crítica do discurso e da teoria textual. No campo das pesquisas em linguagem, seus estudos tentam desvendar os efeitos ideológicos do discurso. Desse modo, nessa concepção, todo texto acumula ideologias. Fowler (apud MEURER, et al. 2008), no tratamento dispensado à linguagem do jornal, amplia a visão defendida por estudiosos da mídia de que o jornal deve ser estudado em termos semióticos e sociais, dando maior destaque à língua. Assim, o principal ponto teórico na análise de Fowler é defender que qualquer tópico da estrutura linguística carrega alguma marca ideológica. Desse modo, a seleção vocabular e a estrutura sintática, por exemplo, não são escolhas aleatórias, mas escolhas conscientes que abrigam conteúdos ideológicos, favorecendo a relação entre a estrutura linguística e os valores sociais. Fairclough (apud MEURER, et al. 2008) defende que o estudo de questões linguístico-discursivas pode desvendar aspectos importantes da vida social. Assim sendo, ao analisar os textos criticamente, Fairclough os toma como ponto de partida para analisar questões sociais que incluem maneiras de representar as relações de poder e a própria realidade do mundo contemporâneo, avançando, assim, em relação a Fowler, que privilegiava a observação explícita do texto. Para Fairclough (apud MEURER, et al. 2008, p.81), o termo gênero denota um conjunto de convenções altamente estável associado a um tipo de atividade social. Dessa forma, o gênero não é um texto em si, mas “processos de produção, distribuição e consumo de textos”. Cabe ressaltar que Fairclough não se dedica a produzir uma teoria de gêneros, seu interesse é fomentar o estudo de textos como forma de ação e representação social, destacando as relações de poder e as rotinas sociais estabelecidas pelo discurso. Assim, os estudos sobre o gênero tornam-se de natureza mais retórica e histórico-cultural, indo além do caráter linguístico. As novas teorias enfatizam a análise das situações retóricas e sociais, analisando os textos sob uma perspectiva dialógica, sendo o gênero um artefato social, histórico e sempre em mudança. Desse modo, nesta pesquisa, o gênero será entendido como um instrumento social, que se estabelece de acordo com a sua função na esfera de comunicação em que circula, sempre tendo em vista os objetivos dos interlocutores.

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2.2. Gênero Relato esportivo

A importância do trabalho com gêneros jornalísticos é consensual entre pesquisadores da área do ensino de línguas. No entanto, há poucos estudos sobre mecanismos e estratégias linguísticas que os caracterizam. Além disso, os gêneros que compõem o jornal são bastante híbridos e, portanto, torna-se difícil delimitá-los. Há uma relação de intergenericidade, que varia de acordo com o caderno que se investiga, dentro do mesmo jornal. Essa lacuna foi um ponto considerado na escolha do gênero relato esportivo para o levantamento dos processos de referenciação mais utilizados nesse gênero, nesta pesquisa. Bonini (2003) constatou que, na literatura da área de Comunicação, a noção de gênero não é bem definida. Segundo o autor, a literatura do campo jornalístico, ainda com base aristotélica, pouco pode ajudar para uma pesquisa dos gêneros do jornal, tendo em vista sua relação com as práticas sociais, conforme postulado por Bakhtin. Em seu levantamento sobre os gêneros evidenciados em exemplares do Jornal do Brasil, Bonini (2008) aponta para o caráter instável da existência desses gêneros. Essa característica se deve à criatividade para criar ou excluir gêneros no jornal e à dificuldade de estabelecer padrões organizacionais de textualidade. Como exemplo, Bonini cita a lista e argumenta não poder definir esse gênero, pois ele apresenta muitas formas, como lista de telefone e de endereço, por exemplo, além de ter a sua estrutura composicional frequentemente modificada. Toda essa questão se aprofunda quando observamos gêneros de jornais esportivos, já que tais materiais são mais livres do que os jornais tradicionais em termos de organização. Assim, esses materiais gozam de maior criatividade, podendo criar ou excluir gêneros de acordo com a necessidade do jornal ou com a cobertura que se deseja realizar acerca de determinada competição esportiva. Na Copa do Mundo de 2010, por exemplo, foram criadas tabelas especiais no jornal Lance! para informar os grupos de seleções e seus respectivos jogos, que, após o término da competição, se modificaram ou foram suprimidas. Diante desses obstáculos, concordamos com Bonini (2003) quando o autor afirma que, para determinar um gênero de modo efetivo e torná-lo uma unidade de análise, é necessário verificar se ele corresponde a uma unidade materializável na forma

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de texto e se é reconhecido e praticado na comunidade de origem como uma unidade textual. Isso posto, verificamos em alguns jornais a produtividade do relato esportivo e observamos que sua utilização é recorrente em diversos jornais esportivos e jornais comuns, sempre com a finalidade de noticiar os principais lances da partida. O gênero relato esportivo é bastante utilizado nos jornais como o espaço para descrever como foi o jogo, isto é, narrar os momentos mais importantes, que resultaram na definição do placar da partida. O léxico é bem marcado com termos utilizados dentro do meio futebolístico e chamam atenção as formas da referenciação, pois são muito criativas as soluções encontradas para fazer referência aos times e jogadores. Destaca-se também que há um esforço para evitar a repetição de termos como nomes de times, jogadores, lances, que são muito utilizados nesse gênero. No Manual de Redação e Estilo do Jornal Lance! (2008, p.39) aparece a seguinte orientação: “deve-se evitar repetição de palavras no mesmo parágrafo. Isso é regra básica da boa escrita”. Soma-se a isso a prescrição frequente em livros de redação para evitar a repetição de palavras. O relato de jogo é bem marcado quanto ao tempo, pois deve ser publicado no jornal, no máximo, um dia após a partida. O universo dos esportes é bastante dinâmico e ocorrem jogos de diferentes campeonatos simultaneamente, por isso há rapidez na divulgação, em edições expressas ou nas versões online dos jornais. Cabe ressaltar também que o gênero em questão é bastante marcado em relação ao contexto em que é produzido, pois os referentes, como nome de jogadores e técnicos, vão se modificando durante cada temporada de campeonato e há uma grande rotatividade de jogadores e técnicos no futebol. Vejamos um exemplo:

(11) Renato e Egídio se desdobravam para conter os avanços de Mariano, Conca e Emerson, mas não estava nos planos do Flamengo uma furada de Welinton, aos 19 minutos. Emerson ficou com a bola, chutou cruzado e Felipe defendeu. (...) De volta para o segundo tempo, o destino do Fluminense mais uma vez esteve na ponta dos dedos de Ricardo Berna. Aos 9 minutos, Thiago Neves chutou forte de fora da área, e o goleiro fez excelente defesa (...).(M21).

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No exemplo acima, quase todos os jogadores referidos saíram dos clubes. Por exemplo, o jogador Thiago Neves nesse campeonato, em 2011, jogava pelo Flamengo e, em 2012, passou a jogar pelo Fluminense. Assim, esse texto perde um pouco da sua função, uma vez que seu conteúdo não é mais atual. Além disso, pode não existir mais interesse, por parte do público leitor, em saber o que aconteceu em um jogo isolado de um campeonato que já acabou. Isso nos leva a afirmar que a finalidade desse gênero está diretamente ligada à sua temporalidade, uma vez que esse gênero textual tem seu discurso bastante atrelado aos parâmetros do contexto e da situação material de produção. Além disso, a cadeia referencial fica prejudicada, já que algumas associações, como nomes de jogadores, por exemplo, não podem mais ser feitas. Outra característica do relato esportivo é que ele se aproxima da notícia, por sua estreita ligação com a temporalidade, mas, ao contrário desta, não tem preocupação em “informar um fato novo”. Os leitores de relatos esportivos, provavelmente, já sabem o resultado das partidas (a maior parte dos jogos é televisionada, os resultados são anunciados em telejornais, fora a possibilidade de acesso a esses resultados pela internet). O interesse desses leitores é saber mais sobre os lances da partida, obter detalhes, pois o futebol é tópico frequente nas discussões cotidianas no Brasil. Quanto à forma, o gênero relato esportivo, nos jornais verificados, apresenta uma estrutura fixa, com título, às vezes uma foto, e o texto organizado em parágrafos, acompanhado por um outro gênero, a ficha técnica, na qual há informações sobre público pagante, estádio, árbitros e placar da partida bem como a escalação dos dois times. Barbeiro e Rangel (2006) afirmam que, nas revistas especializadas, é comum o uso de outros gêneros acompanhando os relatos, como forma de aprofundar as informações trazidas, relacionado-as ao campeonato em questão, como tabela de classificação, artilharia do campeonato, entre outros textos. Nos materiais esportivos, segundo tais autores, há uma necessidade de diversificar as informações veiculadas, diferenciando, assim, essas publicações dos jornais comuns. Já em relação ao estilo, o gênero é bastante livre, criativo, o que pode ser visto nas escolhas referenciais utilizadas. A seguir, dois exemplos desse gênero, retirados dos jornais Lance! e do jornal Marca:

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Fig. 1: exemplo de relato esportivo do Jornal Lance!, em 25/06/2010.

Fig.2: Exemplo de relato esportivo do Jornal Marca, em14 /03/2011.

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Em relação à tipologia textual, seguindo a classificação de Dolz e Schneuwly (2004), o gênero em foco neste trabalho pertence ao agrupamento da ordem do relatar, cujo domínio social reúne os gêneros cujas capacidades de linguagem abrangem a memorização, a documentação de fatos históricos, situados no tempo, de acordo com a classificação proposta por Dolz e Schneuwly (2004). Os autores propõem um agrupamento dos gêneros conforme suas tipologias, uma vez que as tipologias existem em número bem menor do que os gêneros. Assim, os autores chegam a cinco agrupamentos: narrar, relatar, argumentar, expor e descrever ações. Segundo Dolz e Schneuwly (2004), relatar é descrever, por meio do discurso, ações e experiências vividas situadas no tempo, e é diferente de narrar, uma vez que, de acordo com esses autores, o que caracteriza o mundo do narrar é a existência da intriga, enquanto o mundo do relatar estaria mais relacionado à representação de memória e documentação. Portanto, podemos afirmar que o gênero relato esportivo pertence ao domínio do relatar. É necessário destacar, entretanto, que, embora o relato seja pertencente ao domínio do relatar, não raro percebemos um teor argumentativo no texto devido a certas expressões utilizadas. Isso reitera a noção de que qualquer interação social realizada por meio da língua caracteriza-se por uma argumentatividade, visto que o ser humano é dotado de razão e capaz de julgar e avaliar o mundo a sua volta. É por meio do discurso que influenciamos o outro a compartilhar das nossas opiniões, conforme Koch (2002, pg.19): “o ato de argumentar, isto é, de orientar o discurso no sentido de determinadas conclusões, constitui o ato linguístico fundamental, pois a todo e qualquer discurso subjaz uma ideologia, na acepção mais ampla do termo”. Esse ponto a que chega a autora é de suma importância para a descrição do gênero relato esportivo, pois, embora pertença ao domínio do relatar, como vimos na análise, por diversas vezes o jornalista, ao descrever um jogo, escolhe um ponto de vista e tenta orientar o leitor a partilhar da sua opinião. Assim, muitos grupos nominais, formados por um nome e um determinante, atuaram de forma a conduzir o leitor para determinados pontos de vista, contribuindo para que o leitor assegurasse o fio condutor do texto. Como foi dito e pode ser visto em alguns exemplos, o jornalista escolhe o ponto de vista de uma equipe, geralmente o time de maior expressão, para descrever a partida, ainda que o relato não seja um texto prototípico da tipologia argumentativa.

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A presença desse teor argumentativo em alguns relatos instaura uma dúvida a respeito da caracterização desse gênero. Poderíamos pensar que se trata de uma crônica, gênero textual muito comum em jornais, inclusive os esportivos, cujo objetivo principal é estabelecer uma crítica sobre um time ou alguma situação de destaque no cenário esportivo. Entretanto, o exame desses jornais mostrou que a crônica é um gênero separado nesses cadernos, geralmente é publicada uma vez por semana, sempre assinada e pode comentar situações extracampo, o que não acontece no gênero analisado. A crônica, nesses jornais, não se prende a um determinado jogo: o jornalista pode escolher um tema ou uma partida importante que está para acontecer como motivo da sua crônica. Não descartamos, porém, a possibilidade de esse gênero possuir uma forma híbrida. Conforme Bonini (2003) já apontou, os gêneros do jornal são bastante maleáveis e suscetíveis a variações de acordo com os propósitos comunicativos. Marcuschi (2008) também corrobora essa possibilidade ao afirmar que os gêneros – em sua gênese – são dinâmicos e diz ainda que é comum os órgãos da imprensa misturarem alguns gêneros como forma de chamar atenção do leitor. Sobre esse aspecto, destacamos Bathia (2009, p.172), para quem, a criatividade é uma propriedade essencial dos gêneros:

Os gêneros muito dificilmente servem a propósitos únicos; eles apresentam um conjunto de propósitos, mas esse conjunto muito frequentemente se torna um misto de propósitos complementares. (...) Os gêneros, nesse sentido, possuem uma tendência natural à imbricação e à mistura, pelo fato de que a maioria dos gêneros apresenta mais de um valor genérico.

Portanto, admitimos a possibilidade de imbricação entre o relato esportivo e a crônica, tendo em vista a característica extremamente maleável dos gêneros – especialmente os jornalísticos – para se adequar aos propósitos de seus produtores. No caso do relato esportivo, percebemos uma flexibilidade maior em relação a outros gêneros, podendo variar inclusive de um jornal para outro. Porém, mantivemos a classificação dos textos do corpus como relatos esportivos por ser este o nome dado pelos jornalistas. Embora na literatura da área não haja a preocupação em nomear os gêneros, encontramos nos jornais verificados a referência a esses textos como relatos.

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No próximo capítulo, abordaremos questões sobre o jornalismo esportivo, seu início e consolidação dentro da mídia geral, falaremos um pouco sobre a linguagem esportiva e o perfil dos dois jornais escolhidos.

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3. O JORNALISMO ESPORTIVO

3.1. Um pouco sobre o jornalismo esportivo

Segundo Melo (2003), durante muito tempo os esportes e a editoria esportiva foram considerados assuntos menores dentro dos jornais, pois não se julgava conveniente, por exemplo, estampar a capa de um jornal com manchetes referentes a esses assuntos. No entanto, com o crescimento da importância dos esportes e da prática esportiva em nosso cotidiano, essa temática foi ganhando espaço nos jornais e nas práticas sociais rotineiras. De acordo com especialistas no tema, como Coelho (2009) e Mello (2003), os assuntos esportivos foram gradativamente ocupando espaço nos grandes jornais até ganharem publicações especializadas, como Lance, Marca, Vencer, Olé, entre outros. Conforme aponta Mello (2003, p. 112), o esporte e a mídia passaram a se relacionar de modo mais estreito quando os esportes assumiram um caráter coletivo, deixando de ser um lazer individual ou de um grupo para se tornar o lazer das massas. Assim, a imprensa esportiva teve seu início em 1910 com o jornal Fanfulha, de São Paulo, que, sendo muito apreciado pelos italianos que viviam na cidade à época, influenciou a criação do clube de futebol Palmeiras. Cabe ressaltar que, de acordo com Coelho (2009), não havia um jornalismo esportivo, como o que há hoje: a cobertura jornalística da época era constituída por breves relatos dos principais acontecimentos que envolviam os famosos clubes de futebol brasileiros e informações sobre resultados e os próximos jogos. Com o passar do tempo, na década de 30, surge, no Rio de Janeiro, o Jornal dos Sports, primeiro periódico destinado exclusivamente aos assuntos esportivos. Em uma de suas primeiras edições, a linha editorial afirmava que o jornal buscava, por meio do futebol, alcançar uma identidade nacional, uma tentativa de afirmação do Brasil através desse esporte. O Jornal dos Sports, ainda com um grande uso de palavras em inglês (football, match, record), foi o principal veículo da cobertura da Copa do Mundo de Futebol de 1938. Contudo, segundo o Mello (2003), embora estivesse ganhando maior destaque, poucos acreditavam que os esportes pudessem figurar na capa de jornais como O Globo ou Folha de São Paulo. Com a realização de importantes eventos esportivos

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aqui no Brasil, como a Copa do Mundo de 1950, a inauguração do Maracanã e a vitória do Brasil em 1958, na Suécia, o preconceito contra os esportes foi diminuindo, mas só no fim da década de 1960 os cadernos esportivos ganharam mais força como o Caderno de Esportes, de São Paulo, que originou o Jornal da Tarde – importante caderno esportivo que influenciou a chegada de outros semelhantes. Vale ressaltar que, embora estivesse crescendo a quantidade de publicações especializadas, elas surgiam e desapareciam muito rápido, pois havia muitos obstáculos, como a falta de profissionais qualificados que separassem a paixão pelo esporte para narrar o fato esportivo e a crença de que o público leitor desses jornais seria de menor poder aquisitivo, o que impedia maiores investimentos no setor pelo temor de prejuízos. A partir da década de 50, esse panorama foi mudando, os esportes foram evoluindo, principalmente o futebol, incentivando a criação de inúmeros cadernos esportivos não só no eixo Rio-São Paulo, mas em todo o país, conforme destaca Coelho (2009). A fim de explicar a importância do esporte dentro da cultura de uma sociedade e dentro da própria imprensa, Melo (2003) levanta as funções do esporte dentro da comunicação de massa: persuadir, informar, instruir e divertir. Na sua função informativa, o esporte é visto como notícia e ocupa um grande espaço nos meios de comunicação como rádio, jornais, Internet, sendo um ramo importante dentro do jornalismo, fomentando cada vez mais a criação de jornais e revistas especializados no assunto e até programas específicos em canais de TV e Internet. Como forma de persuasão, o esporte pode ser utilizado como propaganda, com mensagens publicitárias dos eventos esportivos ou de marcas e produtos associados às práticas dos mais diversos esportes, esse papel é importante, pois gera recursos para a manutenção e expansão dos esportes e de seus agentes. Já na função instrutiva, o esporte incentiva a prática de exercícios físicos e hábitos saudáveis para diferentes faixas populacionais. Por fim, como atividade de lazer, o mundo dos esportes hoje pode proporcionar diversão tanto a quem comparece aos estádios e demais locais onde ocorrem eventos esportivos, quanto para aqueles que preferem acompanhar de dentro de suas casas em programas de TV, o que também traz lucros a essas empresas de comunicação e seus patrocinadores, incentivando ainda mais esse segmento jornalístico e o próprio esporte. O investimento e a infraestrutura são imensos quando se trata de futebol, esporte mais conhecido e divulgado no Brasil, com campeonatos regionais anuais, competições

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nacionais, sulamericanas e internacionais. Atualmente, temos mais de oitocentos clubes profissionais e o futebol chega a movimentar R$ 16 bilhões de reais por ano, sendo o esporte mais praticado em território nacional, segundo pesquisa realizada pela Fundação Getúlio Vargas e publicada no Jornal do Brasil em 2008, o que justifica sua ampla divulgação na mídia hoje.

3.2. O estilo dos jornais e a linguagem da imprensa esportiva

O Jornal Lance!, conforme o Manual de Redação e Estilo Lance! (2008), surgiu em outubro de 1997 com a proposta de ser um diário esportivo para ser vendido em bancas, mais do que por assinatura. A empresa Lance! pretendia que sua publicação fosse bastante abrangente, por isso não quis restringir seu público-alvo, faixa etária e extrato social, embora pesquisas realizadas pelo jornal mostrassem que os jornais esportivos atingiam, em maior número, jovens e pessoas pertencentes a classes de menor poder aquisitivo. A estratégia do jornal de não concentrar seu foco em uma classe de leitor específica, para não correr o risco de excluir este ou aquele público, deu resultado, e o Lance! conseguiu se afirmar no cenário nacional. Ainda como forma de agradar o maior número possível de leitores, o projeto editorial seguiu a linha de dois diários esportivos de bastante sucesso: o espanhol Marca e o argentino Olé!. No formato de um tablóide (jornal em um tamanho menor do que os jornais tradicionais, com muitas ilustrações), o Lance! inovou por ser colorido, com muitas fotos dramáticas relacionadas às reportagens, como imagem de jogadores chorando e imagens de torcedores tristes ou com fantasias inusitadas. Em relação à linguagem empregada, no Manual de Redação e Estilo Lance!, há, diversas vezes, a recomendação para que todo texto seja claro, conciso e objetivo e recomenda-se o uso de frases curtas, uma linguagem simples, sem regionalismos, sob a alegação de que o jornal circula nacionalmente e o uso de regionalismos poderia dificultar a compreensão de determinados leitores. Já o jornal Marca é mais recente aqui no Brasil. Foi lançado em 2009 no Rio de Janeiro com o nome de Campeão e, em 2010, acertou uma parceria com o jornal Marca espanhol, um dos veículos esportivos de maior reconhecimento no mundo para tentar ocupar um lugar de destaque na cobertura esportiva do país, concorrendo diretamente

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com o Lance!. A proposta do Marca é aproveitar o conteúdo da edição espanhola e também parte do conteúdo da Gazetta dello Sport, jornal italiano muito reconhecido, cobrindo, assim, a pauta internacional, acrescentando ainda a cobertura do esporte nacional. No formato tablóide, o jornal apresenta um design gráfico moderno, todo em cores, com a presença de infográficos, muitas tabelas e fotos. O Marca, veiculado no estado do Rio de Janeiro e no estado de São Paulo, faz parte de um grande grupo de jornalismo que também tem publicações tradicionais como os jornais cariocas O Dia, Meia Hora, entre outras publicações do grupo EJESA S/A. Quanto à linguagem empregada, também há a preocupação com uma linguagem simples, clara e concisa (cf. site do grupo EJESA). A seguir, são disponibilizadas as capas desses jornais como exemplo:

Capas dos jornais Lance! e Marca (Recolhidas no dia 27/03/2012).

De acordo com Barbeiro e Rangel (2006), a linguagem jornalística do esporte nunca teve uma escola definida. No início das transmissões no rádio, em 1932, a linguagem era de pura emoção sem uma preparação ou sem seguir regras previamente estabelecidas. Com a evolução do futebol e sua expansão a partir da década de 90,

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passou a haver uma maior preocupação com o tratamento que deveria ser dispensado às notícias esportivas. Segundo os autores, alguns veículos optaram por integrar o esporte ao jornalismo e outros optaram por deixar o departamento de esporte separado, como um departamento isolado, com regras próprias. Barbeiro e Rangel (2006) também destacam que o texto esportivo, de modo geral, detém maior liberdade no tratamento da matéria. Segundo os autores, na editoria de esportes, é perceptível humor e leveza, e o vocabulário, muitas vezes, consagra expressões populares, sendo mais criativo. Os autores afirmam ainda que os jornais e revistas esportivos adotam a descrição em detalhes dos jogos, os bastidores e uma preocupação em passar ao leitor/telespectador a emoção proporcionada pelos esportes. Além disso, os autores chamam atenção para o fato de que os esportes apresentam uma linguagem muito particular, com gírias e metáforas para lances dos jogos, como, por exemplo, “drible da vaca”, “caneta”, “lençol”, que o editor esportivo não pode desconsiderar. Curiosamente, em vários manuais esportivos, há uma espécie de glossário com nomes de lances, jogadores e clubes não só de futebol como de outros esportes, como arqueiro, lateral direito, fominha armador, frango, entre outros que, inclusive, aparecem no corpus. Cabe ressaltar que o uso dessas expressões e de metáforas são características discursivas escolhidas para justificar a adesão do interlocutor, servindo também para emocionar os leitores, contribuindo ainda para a argumentação verificada nos relatos. Por fim, percebemos que essas escolhas lexicais constituem um jargão específico que demandam um conhecimento profundo para a reconstrução dos sentidos por um público específico.

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4. O RELATO ESPORTIVO EM ANÁLISE

Iniciamos nossa coleta de dados em junho de 2010, durante a Copa do Mundo de Seleções FIFA 2010, com relatos de jogos de futebol retirados do jornal O Lance!, e a completamos em maio de 2011, com o fim do Campeonato Estadual do Rio de Janeiro, mais conhecido como Campeonato Carioca, coletando relatos do jornal carioca Marca. Inicialmente, a ideia era trabalhar somente com relatos referentes à competição mundial, porém mostrou-se mais produtivo ampliar o corpus com relatos de outra competição a fim de percebermos fenômenos gerais e não resultantes do estilo e intencionalidade de um determinado jornal. Além disso, decidimos avaliar dois jornais diferentes para deixar claro que as ocorrências não se tratavam de opções de estilo. Foram, então, analisados quarenta relatos: vinte do jornal Lance!, numerados de 1 a 20, identificados pela letra L; e vinte do jornal Marca, numerados de 1 a 20, identificados pela letra M. No decorrer da análise, a seguir, há exemplos retirados dos relatos e alguns textos na íntegra, pois, em alguns casos, é necessário observar toda a estrutura textual para identificar e compreender os processos referenciais. Em relação à metodologia, focalizamos os processos referenciais relacionados aos times/seleções, aos jogadores e aos aspectos do jogo, como jogadas, gols, público, referências a árbitros etc., observando a construção textual. Como os textos versam sobre o futebol nacional e internacional e contêm informações bastante específicas, recorremos a outros periódicos esportivos, como jornais de outros países, programas esportivos televisivos e sites de clubes e seleções, para entendermos melhor ou, em alguns casos, descobrir que associações estavam sendo feitas, quais as posições de jogadores dentro de suas equipes, dentre outras informações que se fizeram necessárias para uma melhor interpretação dos textos. Essa necessidade de buscar em outras fontes informações complementares já parece apontar para a complexidade de alguns recursos coesivos utilizados no corpus. Embora nossa análise seja qualitativa, tendo em vista o uso dos processos anafóricos e os sentidos construídos nos textos, fizemos uma quantificação para observarmos a diferença de ocorrência e de produtividade dos recursos referenciais. Percebemos, portanto, que as anáforas diretas – relacionadas aos nomes das equipes, aos

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nomes de jogadores – constituem maioria dentro do corpus, por isso será dado maior destaque a elas. Também encontramos anáforas indiretas e encapsuladoras. Uma vez que as anáforas diretas constituem a maior parte do corpus, optamos por subdividi-las em quatro grupos para facilitar a análise: prospectivas, recategorizadoras, epítetos de clubes e de seleções e expressões metafóricas. Cabe ressaltar que todos esses grupos são casos de anáforas recategorizadoras e não estamos propondo uma classificação especial tendo em vista diferenças entre elas. A nomenclatura utilizada tem como objetivo explicitar a função e o uso dessas anáforas diretas na construção dos relatos, bem como ressaltar exemplos interessantes e discussões que resultam do uso dessas anáforas nos textos. Os outros recursos verificados, como a pronominalização e a repetição, apresentam um importante papel na construção dos objetos de discurso, mantidos ou desfocalizados no fluxo das informações dentro de um texto, contribuindo, assim para a progressão textual e para a manutenção da coesão/coerência. Contudo, embora reconheçamos a importância desses recursos, apenas os quantificamos, pois nosso maior interesse está nos grupos nominais recategorizadores, que constituem os casos mais relevantes do corpus. Iniciaremos a análise, portanto, informando o quadro geral de dados encontrados e tecendo breves comentários; posteriormente, analisaremos as anáforas diretas recategorizadoras, os epítetos, as anáforas prospectivas, os casos metafóricos e, finalmente, as anáforas indiretas e os encapsulamentos. Ao final, examinaremos alguns exemplos de anáforas diretas que apontam para aspectos interessantes verificados no corpus. Do total de 40 relatos analisados, extraímos 814 exemplos que se dividem entre anáforas diretas (incluindo as prospectivas), indiretas e encapsuladoras. As anáforas diretas constituem maioria, já as anáforas indiretas propriamente ditas e as encapsuladoras aparecem em quantidades semelhantes, como observamos no gráfico 1:

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Gráfico 1: Total de anáforas no corpus.

Gráfico 2: Total de anáforas diretas

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O grande número de anáforas diretas expressas por meio de repetição lexical (53%) decorre da necessidade de manter os objetos de discurso nomes de times/ seleções e jogadores constantemente em foco nos relatos, principalmente quando se trata dos nomes dos clubes mais famosos e de alguns jogadores mais importantes. Como podemos ver no Gráfico 2, tais referentes são trazidos para dentro do discurso e mantidos em saliência, principalmente, por meio das estratégias de repetição lexical e de expressões nominais recategorizadoras, muitas vezes realçando a necessidade de alguma informação compartilhada pelo contexto sociocognitivo de produção e recepção do gênero. Em geral, as formas pronominais mais utilizadas foram os pronomes relativos que e o pessoal ele – em alguns casos, com prejuízo para a compreensão textual, devido a possíveis ambiguidades geradas pela indefinição do antecedente, uma vez que há diversos nomes em foco, como jogadores, por exemplo, dificultando a associação por parte do leitor, como no exemplo que se segue:

(12) O Chile foi derrotado por 2 a 1 pela Espanha. Perdeu a liderança do Grupo H para o rival, mas foi beneficiado pelo empate da Suíça em Honduras. Avançou em segundo lugar e será o rival da Seleção Brasileira nas oitavas de final da Copa do Mundo. Resta saber qual a estratégia que os Locos de Bielsa terão contra os brasileiros. Afinal, eles são capazes de tudo. Nas duas primeiras rodadas se lançaram ao ataque e venceram sem discussão Honduras e Suíça. Ontem, encarando uma Espanha, que pela primeira vez teve seus quatro ases desde o início (Xavi, Iniesta, Villa e Torres), trataram de sufocar o rival, mesmo só precisando do empate para avançar sem tomar conhecimento do jogo suíço. (L3)

O uso do pronome eles pode causar dúvidas, pois, a princípio, há duas possibilidades para interpretação desse pronome: os locos de Bielsa e Brasileiros. As categorias gramaticais de número e gênero são iguais, portanto, a ambiguidade não se resolve gramaticalmente, sendo dissipada pelos próprios sentidos que se constroem no decorrer da leitura, através de indícios cotextuais. É importante destacar que o pronome não implica uma relação óbvia ou simples de correferência, mas uma relação, nesse caso, estabelecida tendo como base o próprio sentido a que se quer chegar. Em relação às anáforas que funcionam como epítetos dos times/seleções, vale destacar que esse recurso, geralmente, é empregado para a referência a equipes conhecidas, de certa expressão no futebol, e constitui um caso muito interessante de

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análise, assim como as anáforas diretas que envolvem metáforas em relação a nomes de times e jogadores, que não contávamos encontrar nesses relatos. Antes de começarmos a análise, vale ressaltar que as introduções referenciais não foram contadas, pois mantivemos nosso foco nos casos de anáfora. Entretanto, não trabalhamos com o critério de que, para haver uma introdução referencial, seja necessário haver uma expressão formal no cotexto: acreditamos que as fotos dos jogadores, por exemplo, podem servir como forma de deixar esses referentes salientes no universo do discurso. De qualquer modo, consideramos as expressões que antecipavam um jogador ou um time como uma anáfora prospectiva e não uma introdução referencial, uma vez que as fotos, o título e subtítulo dos relatos já deixam salientes dentro do universo discursivo esses elementos.

4.1. Anáforas diretas recategorizadoras

Como vimos, os processos anafóricos, diretos ou indiretos, constroem-se apoiados em pistas presentes no contexto sociocognitivo, dependendo mais ou menos de inferências; diferenciá-los, portanto, somente pelo critério de menção no cotexto não abrange a complexidade envolvida nesses processos, conforme aponta Cavalcante (2011). Essa imbricação entre esses dois processos referenciais pode ser observada nos exemplos do relato esportivo, uma vez que esse gênero textual tem a sua compreensão bastante vinculada ao contexto. Por isso, os exemplos de anáforas diretas que serão descritos agora exigem um alto grau de conhecimento compartilhado. Em geral, a definição de anáfora direta tem em vista uma relação de correferência entre o elemento anafórico e seu antecedente, como se tais anáforas operassem uma substituição do elemento por elas retomado e ativassem referentes prévios. No entanto, as anáforas diretas que vamos examinar operam mais do que uma simples substituição de termos e são um recurso bastante utilizado para reapresentar um objeto de discurso, que vai sofrendo reformulações ao longo do texto. No primeiro exemplo a ser discutido, é descrita a partida entre Vasco da Gama e Duque de Caxias, pelo Campeonato Carioca de 2011:

(12) Bernardo faz três e decide para o Vascão

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Com gols do garoto e de Felipe Bastos, time derrota o Madureira por 4 a 2. Defesa pisa na bola e preocupa.(...) Como aconteceu contra o Duque de Caxias, o Vasco começou criando chances e até marcou cedo, quando Felipe passou para Elton que teria feito 1a 0 se o árbitro não tivesse apontado, equivocadamente, o impedimento. Apesar de manter a posse de bola, o time de Ricardo Gomes passou a ter dificuldades de ameaçar o Tricolor suburbano, que começou a assustar graças a uma falha de Ramon, que dominou mal a bola e permitiu a perigosa finalização de Adriano Magrão. Pouco depois, aos 36, Michel driblou Cesinha, entrou na área e só não fez porque chutou mal. Até que Bernardo apareceu: tabelou com Felipe e chutou cruzado para fazer 1 a 0, aos 39. Na segunda etapa, o Tricolor suburbano assustou primeiro com o lateral Valdir. (...) (M6)

A expressão o time de Ricardo Gomes retoma o objeto de discurso já introduzido Vasco, assim como o sintagma nominal Tricolor suburbano retoma o clube Madureira. É interessante destacar que essas anáforas, uma vez introduzidas no discurso, vão reformulando o referente, trazendo novas informações sem alterar o fluxo de informações do tópico principal tratado no texto, como afirma Koch (2005). Isso também ocorre em outros exemplos:

(13) (...) Depois de uma semana complicada, o Fluminense entrou em campo pressionado contra o Americano, ontem, no Moacyrzão. Para piorar, ainda saiu atrás no placar. Porém, do jeito que a torcida gosta, o Tricolor esbanjou garra, conseguiu bela virada e goleou a equipe campista por 5 a 1, assumindo a liderança do Grupo B da Taça Rio, com 14 pontos.(M7)

(14) (...) O primeiro tempo começou frio e terminou muito quente. Até os 20 minutos, os times demonstravam disposição, mas pouca inspiração. As emoções começaram aos 23 minutos, quando Renato Cajá cobrou falta com perfeição, no ângulo direito de Diego Cavalieri, e fez 1 a 0. E o jogador com sobrenome de fruta exótica foi o destaque do Botafogo. Aos 36, Cajá novamente finalizou com perigo. Aos 41, Valencia, que já tinha cartão amarelo, fez falta em Herrera. Loco Abreu fez pressão no árbitro, foi punido, mas viu sua reclamação surtir efeito: Gutemberg de Paula expulsou o tricolor, para desespero de Fred, que reclamou da pressão do atacante uruguaio. Aos 43, novamente Cajá arriscou de longe e acertou o travessão. A bola quicou, dando a impressão de que entrara. (M10)

Em (13), são acrescentadas aos referentes outras informações através das anáforas diretas sublinhadas, a equipe campista aponta para o fato de que o Americano é da cidade de Campos. Já em (14), as expressões jogador com sobrenome de fruta exótica e atacante uruguaio somam novos conteúdos aos nomes dos jogadores Renato Cajá e Loco Abreu, demonstrando ainda a criatividade dos jornalistas. Outra forma de referenciação amplamente empregada é o uso das posições dos jogadores e dos números de suas camisas, como podemos ver nos exemplos que se seguem:

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(15) O ritmo do time vascaíno não caiu. Aos 15, Jeferson, sempre buscando jogo deixou Felipe na cara do gol, mas, depois de limpar o zagueiro, o camisa 6 acertou o pé da trave. Após a jogada, o meia falou palavrões para si mesmo e olhou para o céu, incrédulo.(...)(M11)

(16) O gol de empate do Boavista nasceu de uma falha grosseira de Welinton. O zagueiro errou passe para Jean, dando a bola de presente para Frontini, aos 33 minutos. Da intermediária, o atacante do Boavista marcou o seu sexto gol na Taça Guanabara (...) (M12)

(17) Mas criou poucas chances de golo, limitando-se aos remates de longa distância, ambos com Daniel Alves, facilmente interceptado por Eduardo. Chance, de verdade, a equipa de teve duas. Aos 29, Nilmar obrigou o guarda-redes a uma bela intervenção – a bola ainda bateu na barra. Aos 38, Maicon levantou e Luis Fabiano cabeceou para fora. Nada além. (...)(L7)

(18) (...) Aos 51 do segundo tempo, o juiz inglês Howard Webb apita o fim do jogo mais dramático da Copa, desses que entram para a história. O italiano Quagliarella desaba em campo, chorando. O camisa 18, que entrou na etapa final e fez o jogo da sua vida, queria não acreditar: a derrota de 3 a 2 para a Eslováquia eliminou a atual campeã do mundo e colocou o rival nas oitavas em segundo lugar de um grupo louco. Lippi corrigiu o erro ao voltar do intervalo com Quagliarella na vaga de Gattuso, e o cartão de visita do reserva foi um arremate que Skrtel salvou em cima da linha de joelho (estava dentro do gol?), Mas , ao inverter Zambrotta de posição, Lippi abriu um buraco pela esquerda. E, numa falha de cobertura pelo setor, Hamsik cruzou para Vittek fazer 2 a 0(...)(L10)

Em (15), o número da camisa e a posição dentro do campo são utilizadas, em sequência, para fazer referência ao jogador Felipe, do Vasco. Em (16) e (17) são usadas as posições zagueiro, atacante e guarda-redes para designar os jogadores Welinton, Frontini e Eduardo, respectivamente. Em (17), é interessante mostrar a expressão lusitana guarda-redes para designar o que, no Brasil, chamamos de goleiro. Já em (18), mais uma vez aparece o número da camisa (o camisa 18), apontando para o jogador Quagliarella e, posteriormente, a sua condição de reserva dentro da equipe. Tais informações constituem um indício de que o relato esportivo pressupõe um leitor especializado no assunto, pois são específicas, bastante variáveis e dependem da experiência e do conhecimento individual dos leitores para homologar esses referentes, como afirma Ciulla e Silva (2008). A atividade de referenciação, nesses relatos, parte, geralmente, de uma categoria conhecida – no caso, os nomes dos clubes de futebol – sobre os quais vão sendo realizadas mudanças que expandem o seu domínio semântico. Mondada & Dubois (2003, p. 32) afirmam que os processos de categorização consideram primeiro uma categoria prototípica “como a base mais disponível e compartilhável para a

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comunicação” e, em seguida, são operadas modificações que podem passar de um ponto central a um periférico ou operar uma “recategorização radical”. Esses exemplos comprovam ainda que a referenciação é, de fato, uma atividade situada no curso da própria atividade de linguagem, tendo os seus sentidos emergidos na situação comunicativa. Por isso, algumas dessas expressões referenciais têm a sua interpretação dependente do contexto de produção do relato, como é o caso da expressão time de Ricardo Gomes usada para retomar o objeto de discurso Vasco no exemplo (12). Como o relato foi extraído do Campeonato Carioca de 2011, Ricardo Gomes era treinador do Vasco – em 2012, quem assumiu o comando da equipe foi Cristóvão Borges. Além disso, nos relatos esportivos analisados, é bastante comum o uso de expressões para fazer referência a clubes ou jogadores que estejam em voga naquele momento e à época em que foram produzidos. Vejamos exemplos do Campeonato Carioca de 2011:

(19)(...)Entre chuvas, apagões, pênaltis e trovoadas, o Flamengo renasceu ontem na Taça Rio. Empatou em 1 a 1 com o Fluminense – gols de Rafael Moura e Thiago Neves - ,e, na disputa por pênaltis, o goleiro Felipe, com duas defesas, pode ter deixado o Rubro-Negro a 90 minutos do título estadual. A não ser que o Vasco derrube o invicto time de , domingo, na final da Taça Rio.(...).(M3)

(20) Jefferson é um goleiraço, o camisa 1 que todo time queria ter, mas não pode salvar sempre o Botafogo. Essa foi a lição de ontem do empate do Alvinegro com o Bangu por 1 a 0, ontem no Estádio da Cidadania. Graças ao goleiro, que defendeu um pênalti, o time de Joel Santana não saiu derrotado às vésperas do clássico contra o Fluminense, no domingo, no Engenhão. Se vencer o Duque de Caxias hoje, o tricolor vai tirar a liderança do Glorioso, que ficou com 13 pontos no Grupo B. O Botafogo não mostrou forças para buscar a vitória, que ficou sempre mais próxima dos banguenses. No fim, Everton até fez uma boa jogada, quando tentou cruzar e quase marcou. Mas foi pouco para o atual campeão carioca, que, dessa vez, jogou mal e não conseguiu vencer. Hora de Joel trabalhar mais. E Jefferson menos. (M17)

No exemplo (19), a expressão destacada: o invicto time de Vanderlei Luxemburgo retoma o objeto de discurso Flamengo. Essa recategorização leva em conta que o Flamengo, à época, era dirigido por Vanderlei Luxemburgo, com uma sequência de jogos sem derrota. Da mesma forma, no exemplo (20), as referências usadas para retomar o objeto de discurso Botafogo são baseadas em informações da época em que Joel Santana era técnico e o time era campeão carioca. Ambas as características mudaram com o tempo e, em 2012, essas expressões referenciais não contariam com a

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adesão do seu interlocutor, por estarem desatualizadas. O processo de produção dessas expressões nominais ocorre em tempo real e se estende até o momento da enunciação, devido à finalidade desse gênero textual. Desse modo, o fato de o jornalista optar pela expressão que mais se adequa ao discurso tem em vista um contexto comunicativo imediato, e não uma relação de equivalência entre essas expressões e os objetos que se propõem a designar. Esses exemplos deixam clara a negociação entre autor/leitor na reconstrução desses referentes, pois a escolha feita pelo jornalista durante um campeonato não se repetiria posteriormente. Isso comprova que a relação entre os elementos do mundo e as categorias da língua não está posta, mas está pronta para ser negociada e, assim, construída, como aponta Koch (2005, p. 33): “a realidade é construída, mantida e alterada não apenas pela forma como nomeamos o mundo, mas acima de tudo, pela forma como, sociocognitivamente, interagimos com ele”. A seguir são arrolados alguns exemplos referentes aos jogos da Copa:

(21) Alívio britânico Inglaterra joga bem melhor, pressiona, vence apenas por 1 a 0 e se classifica. Mas em segundo lugar. Nas oitavas, pegará a Alemanha. God Save the Queen! A Inglaterra precisou apenas apresentar maior objetividade – e sacar o fraquíssimo Heskey do time – para derrotar a medrosa Eslovênia por 1 a 0 e garantir a vaga nas oitavas (pega a Alemanha). Defoe, que o substituiu, marcou o gol da vitória. No entanto, parece difícil que os súditos de Her Majesty possam brigar pelo título jogando o futebol de ontem. De qualquer forma, não seria um exagero afirmar que a seleção do Leste europeu se apequenou diante da necessidade de resultado do English team. (L7)

(22)A Alemanha precisou apenas repetir o futebol pragmático e de algum talento que pratica faz décadas para derrotar uma Austrália paupérrima sob o aspecto técnico por 4 a 0 na estréia das duas seleções na Copa. Na realidade, com um pouco mais de capricho nos passes e nas conclusões o resultado poderia ser bem maior. A Austrália só assustou no começo, quando Garcia teve a chance de abrir o placar – Lahm evitou o gol. Mas logo a Alemanha passou a se impor, trocando passes com objetividade, e fez 1 a 0 aos oito minutos, num chute forte de Podolski. Daí em diante, ao seu melhor estilo, com ótima movimentação, o time dirigido por Joachim Löw pôs os australianos na roda e passou a criar um punhado de oportunidades. Aos 26, Klose ampliou, de cabeça, após cruzamento de Lahm. No intervalo, o técnico holandês da seleção da Oceania, Pim Verbeek, trocou Grella por Holman, e a equipe saiu em busca de reação. Inútil (L2)

As expressões sublinhadas em (21), embora sejam consideradas anáforas diretas recategorizadoras, uma vez que seus antecedentes já foram mencionados formalmente

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no cotexto, são bastante ancoradas em conhecimentos enciclopédicos sobre a cultura e organização política da Inglaterra, como no caso do sintagma nominal os súditos de Her Majesty, e informações geográficas, como no exemplo a seleção do leste europeu, além do apelido do time, English team. Desta forma, para uma leitura eficiente, é necessário algum nível de inferência, tendo em vista também a memória compartilhada. Em (22), o sintagma a seleção da oceania também é construído tendo em vista a localização geográfica da Austrália. Já a expressão o time dirigido por Joaquim Löw apela para o conhecimento do leitor sobre futebol, ao empregar o nome do técnico para caracterizar o objeto de discurso Alemanha. Como a Copa do Mundo é um evento mundial, diversas vezes os jornalistas fazem alusão a elementos das culturas dos países envolvidos na competição como forma de se referir às seleções e seus jogadores. Em decorrência dessa estratégia, muitos exemplos precisam desse conhecimento compartilhado para o seu entendimento, como nos exemplos abaixo:

(23)Um breve registro apenas para uma situação absolutamente patética, em se tratando de mundial: aos 44, Dunga foi obrigado a substituir Felipe Melo, bastante descontrolado, e às turras com o alagoano Pepe, por um burocrático Josué. O que teria dito o treinador ao ex-rubro- negro no balneário? Aliás, quem disse que seria um jogo amigável? Foram sete advertências em 45 minutos. trocou defensores por médios e avançados e passou a ser mais, digamos, eficaz. No entanto, também não criou ameaças. Após 20 minutos, colonizador e colonizado fizeram as pazes. Um futebol entediante. Faltaram as coxinhas do gajo da Madeira e de . Não foi à toa que os adeptos vaiaram. (L6)

(24)Apito muy amigo Argentina elimina México e pega Alemanha nas quartas. Apesar de merecer a vitória, hermanos foram ajudados por erro da arbitragem (L8)

Em (23), as formas treinador e ex- rubro-negro apontam para os referentes Dunga e Felipe Melo, respectivamente. A primeira refere-se à função de Dunga na seleção brasileira e a segunda, ao clube que revelou o jogador – informação bastante específica sobre o início da carreira de Felipe Melo, que está há muitos anos fora do Brasil. Outro recurso presente em (23) foi o emprego de episódios da história dos dois países nos sintagmas colonizador e colonizado, em relação a Portugal e ao Brasil, que requer especial atenção do leitor (e conhecimento prévio da história desses dois países) para ativação desses conhecimentos culturais, bem como o sintagma nominal as

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coxinhas do gajo da madeira que faz referência ao jogador português Cristiano Ronaldo. Já em (24), é curioso como a forma hermanos, para nós brasileiros, está diretamente atrelada aos argentinos e, no caso, à sua seleção. Os dois times, México e Argentina, são países de língua espanhola, entretanto, no Brasil, é bastante comum o uso da expressão hermanos como referência aos argentinos. Além dos casos já citados, o próximo exemplo reitera a importância dos conhecimentos compartilhados sobre esporte na leitura do texto:

(25) O Chile foi derrotado por 2 a 1 pela Espanha. Perdeu a liderança do Grupo H para o rival, mas foi beneficiado pelo empate da Suíça em Honduras. Avançou em segundo lugar e será o rival da Seleção Brasileira nas oitavas de final da Copa do Mundo. Resta saber qual a estratégia que os Locos de Bielsa terão contra os brasileiros. Afinal, eles são capazes de tudo. Nas duas primeiras rodadas se lançaram ao ataque e venceram sem discussão Honduras e Suíça. Ontem, encarando uma Espanha, que pela primeira vez teve seus quatro ases desde o início (Xavi, Iniesta, Villa e Torres), trataram de sufocar o rival, mesmo só precisando do empate para avançar sem tomar conhecimento do jogo suíço. Mas apesar de toda sua estratégia ousada – desta vez cinco jogadores focados no ataque –, o Chile mostrou deficiências que foram fatais e que devem ser bem observadas por Dunga e pela comissão da Seleção. Uma delas: a marcação é muito viril e isso ocasiona um caminhão de cartões. Tanto que o time tinha oito pendurados ontem. E antes dos vinte minutos, Medel, Ponce e Estrada estavam amarelados. Aliás, o Chile foi a única seleção que fez 20 ou mais faltas em todos os seus jogos. Mais: o frenético toque de bola gera erros de passes que geram contra-ataques. Foi assim aos 24. Valdívia errou, a Fúria ligou o contra-ataque para Fernando Torres pela esquerda, com apenas um na marcação. Isso fez o goleiro Bravo sair atabalhoadamente para a dividida que sobrou para Villa chutar da intermediária, de primeira, num lance de beleza e precisão. Atrás pela primeira vez nesta Copa, o Chile se desnorteou. E os erros de passe aumentaram. Num deles, Iniesta recuperou a bola e depois concluiu para o gol. 2 a 0. A partir daí, a Espanha administrou. Até porque o Chile teve um expulso (Estrada) no lance do gol e precisou se resguardar lá atrás. Na etapa final, o time de Bielsa voltou mais cauteloso. Chegou a diminuir com Millar. Mas quem sempre esteve perto de fazer gols foi a Espanha, quase sempre após erros de passe do Chile. Nos quinze minutos finais não teve jogo. O Chile ficou bem fechadinho (estaria se preparando para jogar assim contra o Brasil?) e a Espanha foi tocando bola. Agora, a Fúria pega a Portugal. Jogão! O Chile encara o Brasil sem dois de seus zagueiros titulares Medel e Ponce. E aí, Bielsa, vai se lançar ao ataque contra a Seleção? Olha bem o que a Espanha fez. (L3)

Nesse relato, referente à Copa do Mundo, o sintagma Locos de Bielsa, utilizado para se referir à equipe chilena, é formado pelo modo como o técnico da seleção chilena é conhecido pela mídia esportiva em geral (El Loco Bielsa), numa espécie de relação metonímica entre a equipe e seu técnico. Bielsa ficou conhecido desse modo por adotar estratégias audazes nas partidas, o que pode ser comprovado através das expressões

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estratégia ousada e eles são capazes de tudo, por exemplo, uma vez que são resultados do comportamento da seleção chilena em campo. O adjetivo ousada e a oração eles são capazes de tudo, reiteram essa característica de Bielsa, ampliando-a para toda a seleção do Chile. Os elementos anafóricos empregados revelam a intencionalidade do jornalista em descrever a seleção Espanhola como superior à chilena, como pode ser percebido pelo epíteto Fúria, a expressão quatro ases (em referência aos jogadores espanhóis) entre outras. Nos parágrafos que se seguem, são exploradas pelo autor as consequências do modelo de jogo chileno, como o frenético toque de bola, a forte marcação e os erros da seleção chilena, antecipadas pelo nome deficiências. Ou seja, a escolha de ação ousada de Bielsa permeou toda a construção do relato, que se baseou na estratégia de jogo da seleção chilena para justificar a superioridade da seleção espanhola no jogo, o que pode ser percebido através das escolhas lexicais utilizadas para caracterizar as jogadas mais importantes. Ao final, a pergunta do repórter E aí, Bielsa, vai se lançar ao ataque contra a Seleção? deixa implícita uma provocação, pois seria mais uma “loucura” do Loco Bielsa jogar dessa forma contra o Brasil, retomado através de seu epíteto: Seleção. No primeiro parágrafo, também destacamos a repetição lexical de rival, que se reveste de novos significados a cada emprego. No primeiro registro, designa a seleção espanhola, o segundo uso indica a seleção chilena e o terceiro, novamente, refere-se à seleção espanhola. Esse recurso exige atenção do leitor para recuperar os referentes, uma vez que há diversos nomes de times dentro do mesmo parágrafo, como candidatos a referentes. Isto é, na recuperação dessas anáforas diretas, há várias âncoras e pistas que concorrem para a elaboração da referência, portanto, exige-se do leitor um esforço para resolver os encadeamentos textuais e, pelo contexto, descobrir os referentes de rival. Podemos dizer, então, com a repetição de rival, comprova-se como os objetos de discurso podem sofrer transformações ainda que se mantenha a mesma palavra. Outro aspecto de destaque no corpus é a possibilidade de os núcleos nominais e seus modificadores indicarem a orientação argumentativa do texto e poderem mostrar determinados pontos de vista instaurados no texto, como no exemplo abaixo:

(26)Vai sofrer, Azurra! Itália consegue empatar com um dos piores times da Copa e terá de resolver a sua vida na última rodada, contra a Eslováquia.

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O italiano adora um drama. Talvez por causa do sangue latino que carregam nas veias, sem emoção não há graça. E a Azurra é um retrato fiel do seu povo. Até um jogo tranquilo se complica. Foi o que aconteceu ontem, diante da Nova Zelândia, no empate em 1 a 1. Ninguém imaginava que a atual campeã do mundo fosse ter dificuldades para bater uma das seleções mais fracas da Copa. Mas teve. O gol da Nova Zelândia saiu após uma bola levantada na área. Reid fez falta em Gilardino, a redonda desviou em Cannavaro e sobrou para Smeltz abrir o placar. O árbitro – é preciso elogiá-lo – viu pênalti de Smith em De Rossi. Iaquinta teve um lampejo de categoria, cobrando sem dar a chance a Paston. E para aflorar mais os sentimentos dos italianos, a tristeza dava o tom da seleção tetracampeã. O ex-zagueiro Roberto Rosato, que participou da Copa de 70, faleceu no sábado. Os jogadores da Azurra entraram em campo com uma fita preta na manga de suas camisas. Por mais que os italianos criassem, o gol que descarregaria a tensão não saía. O tempo passou e nada. Se não era a ansiedade na hora do chute, era Paston fazendo grandes defesas. E a Itália conseguiu. Empatou com a baba do grupo, que arriscou apenas três chutes nos 90 minutos. Terá de resolver sua vida na última rodada. E o pior: tudo indica que a Azurra será a segunda do grupo F e irá encarar a Holanda. Que drama! (L9)

As expressões nominais sublinhadas são anáforas diretas empregadas em referência aos objetos de discurso Itália e Nova Zelândia. A seleção italiana é caracterizada tendo em vista sua supremacia no futebol, ao passo que a Nova Zelândia é exatamente o oposto, descrita por sua pouca expressão nesse esporte. De acordo com essa dicotomia, tais objetos de discurso vão sendo recategorizados: a Itália é lembrada por ser a atual campeã, a seleção tetracampeã, e a Nova Zelândia, como uma das seleções mais fracas da Copa, a baba do grupo. Essas escolhas contribuem para a direção argumentativa desse relato, que destaca a diferença entre as duas seleções e reitera a surpreendente dificuldade da seleção italiana para vencer a Nova Zelândia. No relato do jogo entre Coreia do Sul e Grécia, a mesma estratégia foi utilizada:

(27) Passeio sul-coreano. Coreia do Sul vence com maior volume de jogo e poderia ter goleado a frágil Grécia. A Coreia do Sul começou bem a campanha na Copa do Mundo da África do Sul. Os semifinalistas do Mundial de 2002 derrotaram a fraca Grécia por 2 a 0 e já deram um passo importante para a classificação para as oitavas de final, já que a disputa pela vaga é com os gregos e a Nigéria – a Argentina é favorita para terminar em primeiro.(...) (L17)

No exemplo (27), a Coreia é descrita como superior a Grécia, esta é sempre retomada por meios de sintagmas com modificadores que a qualificam como inferior, ao passo que aquela é retomada logo no início como uma seleção que já foi semifinalista de um Mundial. O próprio título (Passeio-sul coreano) já aponta para esse contraponto entre as seleções.

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Essas expressões nominais, geralmente construídas por um nome e um determinante, conforme aponta Koch (2005) operam uma seleção entre as diversas propriedades do referente, destacando aquela que melhor se coaduna com o projeto de dizer do produtor do texto. Portanto, além de demonstrarem um papel importante para a elaboração do ponto de vista, essas formas configuram-se como um recurso coesivo de extrema produtividade. Assim, constatamos nesses relatos a presença de defesa de um ponto de vista, por meio de certas estratégias que conduzem a orientação argumentativa desses textos.

4.1.1. Epítetos: um caso especial de anáfora direta

Ainda em relação às anáforas diretas, vamos destacar agora casos que mostram um alto grau de estabilidade do referente dentro do discurso. De acordo com Mondada e Dubois (2003, p.43), as unidades lexicais podem contribuir para estabilizar determinados usos e categorias do mundo. Essa propriedade acontece, no corpus, com o uso dos epítetos, que fazem com que essa denominação dos clubes e seleções sejam constantemente ativados quando esses objetos são nomeados. Conforme os estudos atuais sobre referenciação, sabemos que a construção dos objetos de discurso não preexiste a ele, mas se constitui uma atividade colaborativa de construção e reconstrução, utilizando as categorias linguísticas que melhor se adequem aos propósitos comunicativos dos interlocutores. Dessa forma, o modo como as coisas vão sendo nomeadas reflete valores, crenças e aspectos culturais compartilhados por determinados sujeitos no momento da interação. As formas nominais que funcionam como epítetos de clubes/seleções têm em vista essa construção compartilhada, pois se baseiam em uma memória comum. Chamamos de epítetos, pois a principal função desses nomes é atuar com um apelido ou como um outro nome dos clubes e seleções de futebol. Muitos desses epítetos parecem ter surgido a partir de metáforas ou metonímias que, com o passar do tempo, tiveram suas associações de sentido enfraquecidas, passando a funcionar como sinônimos desses clubes. A linguagem figurada é muito comum dentro do futebol, o que pode ser percebido na forma como a mídia nacional e internacional trata assuntos referentes a

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esse esporte. Essa leveza e o tom de brincadeira aliados à linguagem figurada utilizada pelos comentaristas e jornalistas esportivos resulta em apelidos, por vezes curiosos, para os clubes e para os próprios jogadores, como aconteceu com Gigante da Colina (epíteto do Vasco), Fenômeno (Ronaldo Nazário) e Zizou (Zinedine Zidane, jogador francês). Começaremos com os exemplos do Campeonato Carioca, que trazem epítetos de times conhecidos nacionalmente, como os clubes cariocas Flamengo e Botafogo:

(28) (...) Numa noite brilhante de Thiago Neves, que marcou os dois gols da partida, o Flamengo saiu ontem do Engenhão com uma vitória por 2 a 0 sobre o Botafogo e a vaga antecipada para as semifinais da Taça Rio. Foi o 21º jogo de invencibilidade do Rubro-Negro, que ultrapassou a última grande série invicta do clube, em 1999. O time da gávea – que ocupa o segundo lugar do grupo A, com 15 pontos, menos do que o Vasco – pegará na última rodada o Macaé, domingo, em busca da liderança na chave. Já o Alvinegro ficou em situação difícil, ocupando o terceiro lugar no Grupo B, com 11 pontos, três a menos que Fluminense e Olaria. O próximo duelo será contra o rebaixado América, domingo.(...) (M1)

No exemplo acima, o clube carioca Flamengo é retomado pela expressão Rubro- Negro que alude às cores representativas do time, que fazem parte de sua bandeira. Tal expressão é bastante popular, mesmo para quem não acompanha futebol. O mesmo acontece com Botafogo, retomado como Alvinegro, também em referência às cores símbolo do time. No entanto, nesse caso, convém lembrar que o clube carioca Vasco da Gama também utiliza as cores preto e branco em seu uniforme, mas somente o Botafogo é conhecido no Rio de Janeiro como alvinegro. Não se ouve nem se lê essa referência sendo usada em relação ao Vasco, conhecido, como veremos mais adiante, como Gigante da Colina. Esse exemplo é interessante, pois deixa evidências de como os objetos de discurso são, de fato, construídos conjuntamente, tendo em vista os valores culturais compartilhados entre os sujeitos. É um acordo tácito no qual os sujeitos históricos constroem, através de processos de categorização, processos lexicais que emergem a partir das crenças e valores culturais partilhados por tais sujeitos. Os outros times cariocas, mesmo os menos famosos que não disputam torneios nacionais, também têm seus apelidos, como podemos ver nos exemplos abaixo:

(29) Vascão já garantiu o seu lugar na decisão

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Com um golaço de Eder Luis, Gigante da Colina bate o surpreendente Olaria por 1 a 0 e aguarda o vencedor do Fla-Flu na final da Taça Rio. (M5)

(30) Aos 5, Everton quase marcou seu segundo gol após jogada semelhante à do primeiro, mas bateu para fora. A partir daí, só deu a Laranja da Baixada, sempre pela esquerda com Bruno Côrtes. Aos 12, veio a melhor chance do empate: o lateral cruzou para Maycon, que, na pequena área, desviou no travessão. (M20)

(31) He-Man deixa, teoricamente, o caminho mais fácil para o Flu. Rafael Moura decide jogo com o Madureira e Tricolor, beneficiado por empate do Bota, pega Boavista. (M14)

(32) Apesar de manter a posse de bola, o time de Ricardo Gomes passou a ter dificuldades de ameaçar o Tricolor suburbano, que começou a assustar graças a uma falha de Ramon, que dominou mal a bola e permitiu a perigosa finalização de Adriano Magrão.(M6)

Em (29), gigante da colina é o epíteto do Vasco da Gama, que passou a ser utilizado depois que o Vasco se mudou para São Cristóvão e seu estádio foi construído perto de uma pedra2. Em (30), Laranja da Baixada é a expressão utilizada para se referir ao Nova Iguaçu: laranja refere-se à cor do uniforme, e Baixada corresponde à localização geográfica do município de Nova Iguaçu. Já em (31), o epíteto tricolor faz alusão às cores do Fluminense (verde, vermelho e branco) e, em (32), Tricolor suburbano faz referência ao clube do subúrbio carioca, Madureira, cujas cores representativas são amarelo, azul e grená. Os epítetos listados acima são muito frequentes, utilizados em quaisquer jornais esportivos e, inclusive, nas narrações radiofônicas e televisivas das partidas. Contudo, há ainda outros apelidos menos usuais para os clubes, como urubu em relação ao Flamengo, estrela solitária/glorioso em relação ao Botafogo, pó de arroz em relação ao Fluminense, por exemplo. Passaremos agora a tratar dos exemplos verificados nos relatos referentes às partidas da Copa do Mundo de 2010 para analisar os apelidos das seleções. Alguns desses apelidos são mais conhecidos por se associarem a equipes de prestígio internacional, mas isso não impede que equipes sem tradição no futebol também tenham suas alcunhas:

(33) “(...)Na metade do segundo tempo, dadas as circunstâncias, os técnicos começaram a promover substituições, numa esperança de mudança. Inútil. A França seguiu esbarrando na

2 Informação retirada do site do http :www.vasco.com. br. Acessado em 02/03/2012.

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muralha adversária, e a Celeste se apequenando cada vez mais, sugerindo que vestiu definitivamente a pele de zebra em Copas do Mundo. Nos acréscimos, Les Bleus – ontem jogando de branco – ainda tiveram uma oportunidade de tirar o zero do placar, numa falta de Lugano em Diaby. Mas Henry cobrou na direção de Loco Abreu, que subiu e tirou de cabeça. Pelo que se viu, a pobre Jabulani, tão criticada antes de o torneio começar, será maltratada nesse grupo(...)”.(L19)

As expressões sublinhadas, a Celeste e Les Bleus, são apelidos, respectivamente, de Uruguai e França já estabilizados, pois tais seleções são muito conhecidas. Ambas as associações são relacionadas à cor dos uniformes das duas seleções. As seleções da Espanha, Itália, Brasil, Inglaterra e Holanda são conhecidas como Fúria, Azurra, Seleção, English team e Laranja Mecânica, respectivamente, conforme descrito nos exemplos a seguir. As seleções da Itália e Holanda receberam esse apelido pela cor do seu uniforme. Já no caso da seleção holandesa, além da cor, há a referência, à seleção histórica de 1974 e, no caso da seleção espanhola, houve uma associação com da seleção de futebol à valentia dos toureiros frente aos animais. A seleção brasileira também é conhecida como Seleção canarinho devido à cor amarela do seu uniforme ou apenas Seleção, com letra maiúscula, em oposição às demais, que se grafam com minúscula, o que, inclusive, é uma recomendação contida no Manual de Redação e Estilo Lance!. Esses epítetos são recorrentes nos relatos, mostrando que são um recurso produtivo de referenciação, visto que a maioria desses apelidos é bastante antiga.

(34)Na etapa inicial, aos 23, Piqué chutou e Benaglio agarrou. Virou 0 a 0. E a Espanha tomou o gol. O treinador da Fúria tentou mudanças. Lançou Fernando Torres e Jesus Navas. Depois Pedro. A ideia era tornar o time ainda mais ofensivo. Nenhum deles fez milagre. Aos 24, Xavi Alonso acertou o travessão. Aos 35, Navas bateu forte de fora da área, e como diziam os antigos, a bola passou raspando à trave direita.(L4)

(35) Até mesmo o Soccer city pareceu torcer para a Holanda em sua estreia na Copa da África. Pintados de laranja, os assentos do maior estádio do Mundial se confundiam com os inúmeros torcedores de uma das seleções favoritas ao título. Uma coincidência, claro. Mas a Laranja Mecânica jogou o suficiente para derrubar sem dificuldades a Dinamarca por 2 a 0 e o tolo blefe de seu técnico. (L5)

(36)Ó pá, cadê o talento? Sem Kaká e Robinho, Seleção sente falta de talento e fica no empate. Agora, é a vez do Chile.

No entanto, parece difícil que os súditos de Her Majesty possam brigar pelo título jogando o futebol de ontem. De qualquer forma, não seria um exagero afirmar que a seleção do Leste europeu se apequenou diante da necessidade de resultado do English team. (L7)

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(37)Vai sofrer, Azurra! Itália consegue empatar com um dos piores times da Copa e terá de resolver a sua vida na última rodada, contra a Eslováquia.(L9)

Outros apelidos curiosos pertencentes a seleções de menor prestígio mundial também se destacaram, como em (38) e (39):

(38) “(...)No intervalo, o técnico holandês da seleção da Oceania, Pim Verbeek, trocou Grella por Holman, e a equipe saiu em busca de reação. Inútil. (...) Ficou por aí. Embora tenha demonstrado capacidade, a Alemanha não chegou a ser testada de fato. Os “socceroos”, francamente, são bem fraquinhos.”(L2)

(39) “(...)O Brasil não fez uma partida fantástica. Mas jogou o suficiente para mostrar a sua indiscutível superioridade sobre a equipe africana. E garantir a vaga na próxima fase. Aliás, a valorização dada aos Elefantes foi ótima porque eles passaram a acreditar que poderiam vencer, jogando de igual para igual, deixando os espaços que a Seleção Brasileira aproveitou para ir metendo os seus gols...”(L13)

Em (38), o epíteto socceroos, referente à seleção da Austrália, vem de uma combinação da palavra soccer com o nome do animal mais famoso no país, os kanguroos. Em (39), os elefantes são os animais também famosos na Costa do Marfim, por isso, o apelido de sua seleção. Todos esses apelidos apoiam-se em informações históricas e culturais dos países que representam. Alguns são mais diretos e têm em vista cores da bandeira ou do próprio uniforme, como Les Bleus, Azurra, Celeste, etc.; outros baseiam-se mais em detalhes culturais dos países como Elefantes e Socceroos. Cabe ressaltar, ainda em relação a esses epítetos, tanto no jornal Marca quanto no Lance!, a presença da letra maiúscula. Em quase todas as ocorrências, houve o uso desse recurso da escrita, o que confere a esses apelidos um status de substantivo próprio. A recategorização dos nomes de clubes e seleções por meio desses itens lexicais revela toda uma gama de estereótipos culturais, envolvendo uma base comum e conhecimentos históricos que permeiam a construção discursiva e são essenciais para a compreensão do discurso. Os interlocutores operam uma escolha dentre essas características culturais e, conjuntamente, articulam a designação desses referentes,

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manifestando ainda um valor persuasivo dos epítetos. Essas escolhas lexicais criam e mantêm os objetos dentro do mundo construídos pelo discurso. Vale ainda destacar, finalmente, que os objetos de discurso nomeados por esses epítetos são mantidos em foco nos relatos. Ao contrário de outros gêneros, nos quais há uma progressão tópica mais variada, nos relatos, os nomes dos times e seleções se mantêm como tópico central dos textos. Por isso, permitem a estabilização desses nomes no jogo de referência.

4.1.2. Expressões metafóricas

Nesta seção, apresentaremos alguns exemplos verificados no corpus, que se configuram como expressões metafóricas, ou seja, alguns referentes foram renomeados através de formulações metafóricas. Esses exemplos, que não esperávamos encontrar, ocorreram em pouca quantidade (1%), mas constituem um subgrupo de anáforas diretas muito instigante pela criatividade dos jornalistas no emprego dessas expressões. Atualmente, de acordo com novos estudos da Linguística Cognitiva, o termo “metáfora” não se refere só a frases ou certas expressões, mas remete a um processo cognitivo que permite projetar e operar com esquemas aprendidos diretamente pelo corpo humano na sua interação com o mundo físico que o cerca. De acordo com Capinussú (1988), o jornalista esportivo usa os sentidos conotativos como forma de chamar atenção, imprimir maior emoção ao seu texto ou a sua narração. Muitas vezes, os locutores, por exemplo, buscam uma marca pessoal através da linguagem, além disso, incorporam no seu vocabulário expressões conotativas que permeiam o universo do futebol. Nos exemplos abaixo, há o uso de expressões metafóricas, que parecem criadas para aquele momento da enunciação, tendo em vista o contexto comunicativo de sua produção, conforme pode ser visto nos relatos que tratam do clube Flamengo como o Bonde sem freio:

(40)Ninguém freia o Bonde do Fla Mengão derrota o Vasco nos pênaltis e ganha o carioca de forma invicta pela quinta vez. E ninguém parou mesmo o Bonde do Mengão. Com o Vasco pela frente na final da Taça Rio, o Flamengo garantiu ontem o seu 32º título estadual de forma antecipada ao frear o Trem-bala da Colina com mais uma vitória numa decisão por pênaltis, dessa vez por 3 a 1, após

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empate por 0 a 0 no tempo normal, no Engenhão. Foi a quinta conquista invicta do Rubro-Negro na história do Carioca, igualando-se aos próprios vascaínos nesse quesito. (M4)

As expressões destacadas o Bonde do Mengão e o Trem-bala da Colina, referentes a Flamengo e Vasco, respectivamente, surgiram no Campeonato de 2011. A primeira foi a associação entre o Flamengo e um bonde e, após uma série invicta de jogos, nasceu a expressão “Bonde sem freio”. A torcida do Vasco, para responder aos flamenguistas, criou a expressão “Trem-bala da Colina”.3 Vejamos mais um exemplo:

(41) Vitória libera o bonde para curtir a folia Com dificuldades, Mengão derrota o Olaria por 3 a 2, em Volta Redonda, e agora vai se esbaldar no Carnaval. O Carnaval do Flamengo começou com alegria. Ronaldinho e Thiago Neves fizeram os gols da vitória sobre o Olaria por 3 a 2, ontem, em Volta Redonda. O resultado abre alas para o Bonde do Mengão sem freio brigar pelo título da Taça Rio e, consequentemente, do Estadual. Quinta-feira, na ressaca da folia, o time enfrenta o Bangu. Antes, porém, a escola rubro-negra cai no samba. E que ninguém leve a mal. Afinal, hoje é Carnaval. Liberados, os jogadores do Flamengo vão curtir a festa mais popular do Rio, tanto na Avenida como no “Samba, Amor e Paixão”, fundado por Ronaldinho. O show de samba, anunciado pela letra do bloco, está garantido. Mas o de bola, também citado na música, quase desafinou. Aos 2 minutos, Ronaldinho fez um carnaval, deu caneta e Botinelli bateu para fora. Três minutos depois, porém, Felipe falhou em chute de Renam Silva e soltou a bola nos pés de Danilo, que abriu o placar. Para o samba não atravessar, Ronaldinho passou a ditar o ritmo da equipe. O camisa 10 trouxe um pouco de fantasia ao jogo aos 14, quando tentou marcar de bicicleta. O Flamengo só igualou o placar aos 46: Botinelli chutou mal, mas Thiago Neves, bem posicionado, completou para o gol: 1 a 1. Thiago Neves e Ronaldinho começaram o segundo tempo com nota 10 no quesito harmonia. O capitão recebeu do camisa 7 na cara do gol e fez 2 a 1, com categoria. Vanderlei Luxemburgo mexeu na ala dos estrangeiros e trocou Botinelli por Fierro. Aos 25 minutos, o chileno recebeu bom passe de Leonardo Moura e seu cruzamento encontrou Thiago Neves, que marcou por cobertura. A expulsão de David fez com que Luxemburgo colocasse Negueba na vaga de Renato e Jean no lugar de Thiago Neves. Com disposição, Negueba chamou a marcação para dançar e levantou a plateia. O Olaria diminuiu aos 41, com Rafael de cabeça, mas a décima vitória no ano em 11 jogos do invicto Flamengo estava garantida. Pelo menos até quinta-feira, como diz a letra do bloco de Ronaldinho, o “rubro-negro pode se orgulhar, só tem motivos para comemorar”.(M16)

O relato acima foi construído com base em associações entre o Carnaval e o jogo, que aconteceu no sábado de Carnaval. Logo no título, há a introdução referencial

3 A expressão “Trem-bala da Colina” ainda se mantém em 2012, ao contrário do “Bonde sem freio”, que desapareceu.

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do objeto Flamengo feita pela expressão o bonde e retomada mais abaixo pela expressão Bonde sem freio. A seguir, todo o relato é permeado de expressões que associam lances do jogo a expressões relacionadas à festa do carnaval, como “o camisa 10 trouxe um pouco de fantasia”, “Vanderlei Luxemburgo mexeu na ala dos estrangeiros” e “levantou a plateia”. Essas expressões mostram ainda como esse gênero aproveita os acontecimentos externos ao futebol para criar referentes textuais, sendo mais um indício da sua dependência do contexto sociocognitivo que cerca os jogos. Essas construções metafóricas também aparecem no jornal Lance!, com exemplos nos quais foram feitas associações criativas, em alguns textos, como em (42) e (43):

(42)Sabedoria de judô

Japão usa tática das artes marciais para derrotar a Dinamarca e avançar às oitavas

Com dois wazari em menos de meia hora, o Japão praticamente liquidou a Dinamarca ainda no primeiro tempo. No fim, 3 a 1. O time escandinavo precisava da vitória. E pisou o tatame do Royal Bafoteng indo para o ataque, para anular a vantagem do adversário que jogava pelo empate. Mas as conclusões foram ruins. Logo, bastaram 17 minutos para o Japão pôr em prática o princípio da máxima eficiência com o mínimo esforço. Honda cobrou falta no canto direito, e a Jabulani fez uma curva interessante, um autêntico golpe para Sorensen. A Dinamarca sentiu. E passou a deixar evidente, apesar da cor do seu uniforme, que jamais chegaria à faixa vermelha. Errava passes em sequência e abria espaços. Aos 30, Endo também surpreendeu o goleiro, em outra infração, dessa vez, no lado esquerdo. A luta pareceu irremediavelmente perdida para os dinamarqueses. Pois é. No judô seria assim... Mas os escandinavos tentaram reagir, trocando defensores por atacantes, esforçando-se para superar suas muitas limitações. Sem qualquer imaginação, jogavam bolas na área japonesa que não davam em nada. Aos 36 do segundo tempo, enfim, Hasebe empurrou Agger. Tomasson cobrou o pênalti. Kawashima defendeu, mas o dinamarquês apanhou a sobra e diminuiu. Sem opção, o time de Morten Olsen tentou seguir no ataque, deixando a retaguarda desguarnecida. O ippon veio aos 42. Honda deu um belo drible no zagueiro e rolou para Okazaki bater livre: 3 a1. O Japão mostrou que não é só aplicação tática. Sobrou jogo de cintura, talvez a influência direta de mais de 20 anos de técnicos e jogadores brasileiros no País do Sol Nascente. Que venha o Paraguai!(L1)

No exemplo acima, os lances do futebol são associados ao Judô, esporte de origem japonesa. Logo no subtítulo, a expressão “dois wazari em menos de meia hora” refere-se aos gols feitos pelo Japão; mais adiante há a expressão “o tatame do Royal Bafoteng” refere-se ao campo de jogo. No decorrer do relato, seguem-se mais

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expressões que fazem essa associação, como “ippon”, que, no Judô, significa o golpe que põe fim ao jogo – no caso, diz respeito ao terceiro gol feito pela seleção japonesa, eliminando qualquer chance da Dinamarca. O exemplo (43) descreve o jogo entre Alemanha e Espanha e é repleto de metáforas na sua construção:

(43) Seleção de Vicente Del Bosque vence pessimistas, derruba as expectativas, passa pela Alemanha e, enfim, está na final da Copa.

E a Torre de Babel construída pela Alemanha acabou sendo derrubada por uma Espanha divina, que ontem venceu por 1 a o para seguir derrubando as expectativas pessimistas de analistas e da opinião pública – e que sempre cercam a sua seleção em Copa do Mundo – para chegar muito próxima de um inédito título mundial. É isso. A partida de Durban contrariou a narrativa bíblica do Gênesis. Pois quem está chegando ao céu é a Fúria, que tomou desde o começo a iniciativa de atacar, pressionando o adversário, impedindo com eficiência o seu contra-ataque, que havia sido mortal em duelos anteriores. Os muitos quase estrangeiros da Alemanha – Boateng, Khedira, Özil, Podolski, Klose – e os germânicos natos não conseguiram dar sequência à edificação que começou a ser levantada com a goleada de 4 a 0 sobre a Austrália, ainda na fase de grupos. A Espanha foi impondo o seu toque refinado – o time não dá chutão e raramente rifa a bola -, derrubando tijolo por tijolo da Torre, mostrando uma paciência impressionante para chegar ao gol que a pôs na decisão. A Copa terá o primeiro campeão inédito desde 1998. Na realidade com um pouco mais de capricho a Fúria já poderia ter marcado na etapa inicial, quando desperdiçou boas oportunidades, a mais evidente numa cabeçada de Puyol, que saiu por cima. É provável que Joachim Löw tenha tentado mudar o destino da história no intervalo, invocando os brios de seus meios turcos, africanos, poloneses e até brasileiro. Mas a Espanha retornou com o mesmo pique – com Iniesta, Xavi e Alonso distribuindo as cartas -, criando, mas deixando de aproveitar outras chances. Até que aos 27 minutos, Xavi cobrou escanteio e Puyol, agora sim, cabeceou sem defesa para Neuer. No fim, a Fúria recuou e a Alemanha, sem opção, arriscou. Mas os tijolinhos já estavam esparramados pelo chão da Terra. A Espanha ficou perto do cume da Copa. (L15)

Nesse relato, a equipe da Alemanha e seus jogadores foram associados à narrativa bíblica da Torre de Babel. Como a seleção alemã é composta por jogadores de diferentes nacionalidades, essa associação passou a ser usada como uma anáfora direta que designa a Alemanha, como na expressão “derrubando tijolo por tijolo da Torre”. No final do relato, como a Alemanha perdeu, o jornalista fecha o texto com a frase “os tijolinhos já estavam esparramadas pelo chão da Terra”, enfatizando a derrota com um certo drama. Essas metáforas trazem para o texto imagens grandiosas ao comparar a partida da semifinal da Copa do Mundo à narrativa bíblica, valorizando ainda mais a seleção

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espanhola. O uso de expressões como “Espanha divina” e a sua retomada pelo epíteto “Fúria” também ajudam a valorizar a seleção espanhola, uma vez que atribuem a ela o destaque de uma equipe que estava caminhando para uma grande final da copa da qual seria campeã. A metáfora, como um processo de associação entre dois domínios cognitivos, permite ao jornalista realizar associações entre elementos de campos semânticos diferentes, fazendo com que o leitor possa ativar imagens, reforçando a intenção do jornalista ao empregar tais recursos. Segundo Teixeira (2004), que analisou editoriais, “as expressões metafóricas podem ajudar a reforçar a intenção dos jornalistas”. Nos exemplos verificados, as metáforas foram úteis para construir imagens dos clubes/seleções, tornando os textos mais criativos e interessantes para o leitor e parecem ser um recurso utilizado criativamente em textos da mídia.

4.1.3. Anáforas prospectivas

Os casos de anáfora prospectiva, embora tenham sido poucos (2%), foram encontrados nas amostras dos dois jornais geralmente com o objetivo de antecipar e dar destaque a alguma característica positiva ou negativa de um time ou de um jogador, contribuindo para a avaliação do leitor sobre o jogo, como podemos ver no exemplo (44) retirado da partida entre Espanha e Paraguai:

(44) “(...)O jogo parecia indicar prorrogação apesar de os times buscarem o ataque. Aí, aos 38, Iniesta fez grande jogada e tocou para o garoto Pedro chutar na trave. O gol estava encantado. Mas a Espanha tem o cara iluminado da Copa. A bola sobrou para ele. Villa. Ele chutou, a bola bateu nas duas traves e...entrou. Villa correu para receber os abraços. Com cinco gols assumiu a artilharia do torneio. Ele já é o maior goleador espanhol em Copas (oito, somando os três que fez em 2006)...”(L14)

No exemplo acima, as expressões sublinhadas destacam o jogador Villa, um dos melhores jogadores da seleção espanhola, que ajudou a equipe diversas vezes, sendo elogiado em vários jornais. As anáforas prospectivas do exemplo acima preparam o leitor, enfatizando e atribuindo uma avaliação positiva ao jogador, criando um efeito de suspense e curiosidade, contribuindo para o destaque dado ao jogador dentro do texto.

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A seguir, no exemplo (45), os destaques trazidos pelos anafóricos prospectivos também contribuem para destacar a seleção da Itália em detrimento da seleção da Nova Zelândia, descrita no texto como tecnicamente mais fraca.

(45) Vai sofrer, Azurra! ( Catáfora) Itália consegue empatar com um dos piores times da Copa e terá de resolver a sua vida na última rodada, contra a Eslováquia. O italiano adora um drama. Talvez por causa do sangue latino que carregam (nas veias, sem emoção não há graça. E a Azurra é um retrato fiel do seu povo. Até um jogo tranquilo se complica. Foi o que aconteceu ontem, diante da Nova Zelândia, no empate em 1 a 1. (L9)

No exemplo (45), vocábulo Azurra antecipa o objeto de discurso Itália. Como foi visto, esses apelidos constituem formas estabilizadas de referência aos times e seleções. Já a expressão um dos piores times da Copa faz referência à seleção da Nova Zelândia e, ao mesmo tempo, destaca um julgamento negativo feito pelo autor acerca dessa seleção. Todo o relato é construído no sentido de mostrar a superioridade da seleção italiana em oposição à inferioridade da seleção da Nova Zelândia. Uma das estratégias que o autor utiliza é caracterizar o referente Nova Zelândia como fraco, contrapondo-o ao time italiano, que vai ser caracterizado mais adiante positivamente. No exemplo (46), a expressão sublinhada antecipa o objeto de discurso França, destacando a sua expressão no futebol, o que realça a vitória do México, por ser uma equipe de menor expressão. É interessante notar que esses destaques são escolhidos de modo a orientar o leitor para a superioridade da equipe francesa, destacando ainda mais a vitória do México.

(46) Olé México derrota um dos grandes do futebol pela primeira vez na História das Copas do Mundo. França foi a vítima de Blanco & Cia.(L12)

Vejamos agora dois exemplos do jornal Marca:

(47)He-Man deixa, teoricamente, o caminho mais fácil para o Flu. Rafael Moura decide jogo com o Madureira e Tricolor, beneficiado por empate do Bota, pega Boavista.

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As estrelas do Fluminense são muitas: Fred, Conca, Araújo, Emerson, Deco...Mas quem tem feito a alegria dos tricolores é Rafael Moura, o He-Man. Mais uma vez, foi ele quem salvou o Fluminense, ao marcar o gol da vitória por 1 a 0 sobre o Madureira, ontem, no Estádio Raulino de Oliveira, em Volta Redonda. Com isso, o tricolor recuperou o primeiro lugar no Grupo B e, beneficiado pelo tropeço do Botafogo diante do Macaé, enfrentará o Boavista – e não o Flamengo – sábado, na primeira semifinal da Taça GB. (M14)

(48) Novo maquinista conduz a vitória do trem-bala

Com belo gol de Diego Souza, Vascão derrota o Botafogo por 2 a 0, no Engenhão e assume a ponta do grupo A da Taça Rio. Com direito a gol do estreante Diego Souza, o Trem-Bala do Vasco segue muito bem nos trilhos, depois da vitória sobre o Botafogo por 2 a O, ontem à noite, no Engenhão, pela quarta rodada da Taça Rio. Eder Luis também deixou sua marca. O resultado colocou os vascaínos na liderança do Grupo A . O time soma nove pontos, assim, como o Boavista, mas leva vantagem no número de gols pró. Já os alvinegros, mesmo com a derrota, estão na ponta do Grupo B, com nove pontos.(M2)

Em (47), o apelido He-man faz uma remissão prospectiva ao jogador Rafael Moura, cuja associação se estabelece pela semelhança entre ele o personagem de desenho animado, logo no título do relato, enfatizando a boa atuação desse jovem jogador em relação aos outros jogadores mais famosos que compõem a equipe do Fluminense. O mesmo recurso foi empregado em (48) no destaque dado ao jogador Diego Souza e ao time do Vasco, com as expressões metafóricas: novo maquinista e trem bala. O primeiro faz uma referência ao estreante Diego Souza, tendo em vista sua boa atuação na partida, e o segundo já antecipa o vencedor da partida. Ambas as formas auxiliam a leitura no sentido de destacar o bom desempenho da equipe vascaína e do jogador estreante, Diego Souza, além de funcionarem como marcas da orientação argumentativa que o jornalista atribuiu ao texto. O próximo exemplo promove o destaque do time do Fluminense por meio da forma como esse time ficou conhecido pela torcida em 2009 quando escapou do rebaixamento: guerreiros.

(49) Guerreiros viram e ficam perto das semifinais. Após susto no início, Tricolor retoma a tranquilidade, goleia o Americano por 5 a 1 e assume a ponta do Grupo B da Taça Rio (...)(M7)

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O apelido dado ao time por sua força de vontade em reverter situações adversas, como o possível rebaixamento em 2009, ganhou força e é constantemente lembrado quando a equipe passa por alguma dificuldade, como no jogo do relato acima em que o Fluminense começou perdendo. Vale destacar, por fim, que o emprego desses elementos prospectivos objetiva realçar alguma característica, auxiliando também o interlocutor a ativar determinados sentidos dentro do texto. Nos exemplos acima, havia sempre uma linha argumentativa que o autor escolhia para descrever o jogo e as formas como os referentes são designados apontam para essa linha, como nos exemplos analisados.

4.2. Anáforas indiretas propriamente ditas

Os casos de anáfora podem também instaurar novos referentes no discurso, acionados por inferências de ordem sociocognitiva. Sendo assim, enquanto as anáforas diretas estabelecem uma relação de correferencialidade, as anáforas indiretas ativariam novos referentes no discurso, tendo como âncora alguma fonte citada no cotexto. No corpus analisado, as anáforas indiretas foram um recurso pouco utilizado, mas discutiremos aqui alguns dos casos encontrados em ambos os jornais. O exemplo abaixo, retirado do jornal Lance!, relata o jogo entre a França e o Paraguai pela Copa do Mundo de 2010:

(50) “Deu sono! Em jogo muito ruim, Uruguai e França pouco criam e não saem do zero. Nem parecia que havia três títulos mundiais em campo. França e Uruguai fizeram um espetáculo pobre de ideias e, é claro, de gols. A outrora temida Celeste jogou praticamente todo o tempo como time pequeno, tentando sem sucesso explorar os contra-ataques, enquanto os franceses giravam a bola de um lado para o outro, sem conseguirem encontrar uma solução para superar a retranca do adversário. Logo o 0 a 0, caiu como uma luva, pois, na prática, foram criadas só quatro oportunidades em toda a partida. (...) Faltou ao time europeu, no entanto, um mínimo de criatividade para fabricar uma brecha na retaguarda celeste. Mas o Uruguai conseguiu ser pior, errando passes em excesso, em especial quando buscava a ligação direta entre ataque e defesa. Na metade do segundo tempo, dadas as circunstâncias, os técnicos começaram a promover substituições, numa esperança de mudança. Inútil. A França seguiu esbarrando na muralha adversária, e a Celeste se apequenando cada vez mais, sugerindo que vestiu definitivamente a pele de zebra em Copas do Mundo. Nos acréscimos, Les Bleus – ontem jogando de branco – ainda tiveram uma oportunidade de tirar o zero do placar, numa falta de Lugano em Diaby. Mas Henry cobrou na

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direção de Loco Abreu, que subiu e tirou de cabeça. Pelo que se viu, a pobre Jabulani, tão criticada antes de o torneio começar, será maltratada nesse grupo”. (L19)

Logo no subtítulo do relato, a expressão três títulos mundiais, constitui uma anáfora indireta com forte apelo ao conhecimento compartilhado sobre o esporte. Pelo entorno discursivo, podemos inferir que os títulos mundiais pertencem às seleções da França e do Uruguai, mas a quantidade de títulos dessas duas seleções é uma informação não disponível no cotexto. Não há uma pista ou fonte no texto que auxilie nessa interpretação, sendo somente através de um conhecimento prévio sobre o esporte que descobrimos que a França possui um título mundial e a seleção uruguaia é bicampeã. Vale destacar que essa se expressão encontra no início do texto, funcionando como uma forma de enfatizar como o jogo foi ruim: são duas seleções com certo prestígio no futebol mundial, uma vez que já foram campeãs mundiais, mas o que o autor vai relatar é como o jogo foi fraco e pobre de oportunidades. Como já dissemos na fundamentação teórica desse trabalho, os jornais dos quais extraímos o corpus desta pesquisa são especializados e dirigidos a um público específico, portanto, certamente, o jornalista tem em mente que tais informações serão reconstruídas pelos leitores. Cumpre ressaltar que, talvez, para determinados leitores, o esforço para reconstruir o objeto discursivo possa ser maior e para outros, menor, já que depende do conhecimento cultural compartilhado, indo além de pistas presentes no cotexto. Entretanto, assumimos nessa pesquisa, concordando com Cavalcante (2011), o ponto de vista de que “toda entidade referida é construída sob a pressuposição de que de algum modo vai tornar-se acessível na interação”, portanto não se pode pensar que o autor do texto não tenha levado em conta seu interlocutor, pelo contrário, ele conta com a participação do destinatário na construção dos sentidos do texto. Esses recursos são importantes elos coesivos e, além disso, segundo Koch (2005), as formas nominais podem realizar uma seleção dentre as propriedades discursivas dos referentes, de acordo com a intenção do locutor em atender seus propósitos comunicativos, como acontece com a escolha do substantivo muralha como forma de referência à defesa uruguaia. Encontramos exemplos de anáforas indiretas também no corpus extraído do Jornal Marca:

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(50) (...)Aos 34, o Nova Iguaçu teve outra chance, mas graças a linda defesa de Jefferson, após chute de Dieguinho, o Botafogo saiu com os três pontos.(...) (M20)

A expressão destacada os três pontos permite aos leitores deduzir que o Botafogo ganhou a partida, uma vez que três pontos é o que ganha o time a cada partida que vence, sendo tal pontuação diferente para situações de empate ou derrota. Mais uma vez, notamos que tal expressão não tem uma âncora formalmente mencionada no cotexto, mas se faz entender pelo apelo cognitivo ao conhecimento do interlocutor. Para aqueles que acompanham o esporte, trata-se de uma informação bastante óbvia, que não causaria dificuldade de interpretação, visto que, inclusive, tal sistema de pontuação é comum a diversos campeonatos de futebol no Brasil e no mundo. Essa expressão foi empregada outras vezes, como pode ser visto no próximo exemplo:

(51) Bonde do Fla continua sem freio Com gol aos 50 minutos do segundo tempo, Diego Maurício garante os três pontos diante do Bangu: 2 a 1.(M8)

Nesse exemplo, ainda que o placar da partida (2 a 1) esteja escrito, a informação de que só a vitória garante os três pontos e o conhecimento cultural sobre o sistema de pontuação do campeonato colaboram para a coerência do texto. Os próximos exemplos apresentam anáforas indiretas cuja construção se destaca porque são baseadas em um apelo fortíssimo ao conhecimento compartilhado:

(52)Enderson Moreira desarrumou o Fluminense ao trocar Rafael Moura por Tartá, aos 18 minutos. Tanto que, quando Thiago Neves fez de cabeça o gol de empate, aos 21, numa bola levantada por Willians, o Flamengo já tinha mesmo equilibrado as forças. Marquinhos ainda isolou, sozinho, a chance de levar o Fluminense à final da Taça Rio, aos 36 minutos. (M3)

No exemplo (52), a chance de levar o Fluminense à final da Taça Rio funciona como complemento do verbo isolar, muito usado na linguagem do futebol com o sentido de chutar a bola para bem longe do gol. Assim, primeiro entendemos que o jogador Marquinhos perdeu uma chance de gol e, tendo em vista que o jogo era uma semifinal na qual só a vitória importava, entendemos que o gol perdido tirou a chance

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do Fluminense chegar à final do Campeonato. Nesse caso, não há uma única âncora no cotexto, mas, de modo geral, todo o texto auxilia, em conjunto com conhecimentos enciclopédicos, na ativação desses sentidos. Vejamos mais alguns exemplos:

(53) O técnico Vanderlei Luxemburgo voltou a mexer no time, tirando Bottinelli para a entrada de Wanderley. E Ronaldinho fez outra boa jogada, mas o chute rasteiro parou na defesa de Thiago Leal. Do outro lado, o goleiro Felipe voltou a ter trabalho, fazendo outra boa defesa num chute forte de André Barreto. O Flamengo ainda teve a chance de garantir a vitória numa bomba de Welington que o goleiro Thiago Leal defendeu. (M8)

(54) Debaixo de muita chuva, Elton teve a chance de ampliar aos 18, mas a zaga do Duque de Caxias apareceu para fazer o desvio e mandar para fora. Do outro lado, Fernando Prass só teve trabalho aos 30, quando Geovane Maranhão recebeu na entrada da área e chutou para boa defesa do goleiro. (M19)

(55) Xará do camisa 1 rival, o meia vascaíno Jeferson organizava as jogadas de ataque do time. Fagner chegava com facilidade no apoio e quase marcou em duas oportunidades. A primeira em cobrança de falta, que o goleiro desviou para escanteio, e depois aos 33, quando Eder Luis rolou para trás, e o lateral chutou rente à trave. Dois minutos depois, pelo lado oposto, Ramon conseguiu se livrar do marcador e cruzar a medida para Marcel, livre na área, cabecear e abrir o placar para o Cruzmaltino. (M11)

Nos exemplos acima, há a repetição de uma estratégia para a referência aos times em campo. Em (53), pelo entorno discursivo, inferimos que a expressão sublinhada trata de uma jogada do time do Bangu. O mesmo acontece no exemplo (54), pois está sendo descrita uma jogada do Vasco e, ao utilizar a expressão Do outro lado, o jornalista desloca o foco de atenção do leitor para o outro time que ataca do lado inverso do campo, no caso, o Duque de Caxias. O último exemplo (55) depende bastante da ativação de conhecimentos específicos sobre a posição dos jogadores em campo para sua interpretação. Nesse exemplo, a expressão pelo lado oposto não faz referência ao time rival, como nos exemplos anteriores em que estavam sendo descritas jogadas de um time e o jornalista mudava o foco para o time rival. No parágrafo anterior do exemplo (55), são detalhadas jogadas do Vasco operadas em um lado do campo até que o sintagma preposicional pelo lado oposto e o entorno discursivo nos indicam que o mesmo time agora inverteu as suas opções de jogo para o outro lado. Examinando o nome dos jogadores, em especial Fágner, lateral- direito do Vasco, inferimos que as jogadas estão ocorrendo pelo lado direito e, a partir

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dessa informação, deduzimos que a expressão destacada faz referência ao lado esquerdo do campo. Essa conclusão também se apoia no conhecimento de que o jogador Ramon, citado no cotexto, atua como lateral-esquerdo para a equipe do Vasco. O exemplo verificado em (56), portanto, é extremamente dependente do contexto sociocognitivo para sua interpretação, pois as informações necessárias ao seu entendimento podem ser desconhecidas até por torcedores do time; somente um leitor especializado nesses assuntos realiza uma construção adequada desses referentes.

4.3. Anáforas encapsuladoras

As anáforas encapsuladoras também se apresentam como uma escolha estratégica, com a capacidade de sumarizar informações presentes no cotexto e, ao mesmo tempo, transformá-las em novo objeto de discurso. Foram verificados alguns casos de anáforas encapsuladoras no corpus que mostram essa dupla funcionalidade da anáfora encapsuladora, incorporando, inclusive, certo teor avaliativo ao texto, como pode ser observado no exemplo abaixo da Copa do Mundo em relação à partida entre Itália e Eslováquia:

(56)“Azurra, que surra! Com pouca inspiração e escalação errada no primeiro tempo, Itália só acorda no fim e não evita derrota que a elimina da Copa. Aos 51 do segundo tempo, o juiz inglês Howard Webb apita o fim do jogo mais dramático da Copa, desses que entram para a história. O italiano Quagliarella desaba em campo, chorando. O camisa 18, que entrou na etapa final e fez o jogo da sua vida, queria não acreditar: a derrota de 3 a 2 para a Eslováquia eliminou a atual campeã do mundo e colocou o rival nas oitavas em segundo lugar de um grupo louco. Afinal, se fizesse o gol do empate, a Azurra estaria lá. Com a derrota, conseguiu ficar na lanterna de uma chave que tinha a Nova Zelândia. A eliminação teve como cena final um lance nos acréscimos, aos 50, quando, após lateral cobrado para dentro da área, o meia Pepe furou o arremate e perdeu o gol que salvaria a Itália do vexame. No primeiro tempo, a Itália não funcionou. A estratégia de pôr Gattuso na vaga de Marchisio não deu certo. Sem criatividade e com três volantes, a Itália nada fez. E ainda deu um gol de presente para a Eslováquia, quando De Rossi errou um passe que parou nos pés de Hamsik e este passou para Vittek marcar. Lippi corrigiu o erro ao voltar do intervalo com Quagliarella na vaga de Gattuso, e o cartão de visita do reserva foi um arremate que Skrtel salvou em cima da linha de joelho (estava dentro do gol?), Mas, ao inverter Zambrotta de posição, Lippi abriu um buraco pela esquerda. E, numa falha de cobertura pelo setor, Hamsik cruzou para Vittek fazer 2 a 0. A Itália estava quase morta. Pirlo, que havia entrado antes do segundo gol eslovaco, estava sem ritmo. Só que uma brilhante jogada de Quagliarella resultou num rebote que Di Natale

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empurrou para o gol. A Itália pressionava, Quagliarella escorou cruzamento e fez, mas estava impedido. O drama aumentava. Aos 41, o técnico eslovaco sacou Strba e pôs Kopunek. Aos 43, após lateral cobrado pelo setor de Zambrotta, Kopunek aproveitou que Cannavaro e Chelini estavam distraídos e fez 3 a 1. Itália morta? Ainda não. Quagliarella, sempre ele – tinha de ter entrado antes! – fez golaço aos 47. E teve o lance de Pepe, aos 50...”(L10)

No exemplo (56), o primeiro encapsulamento ocorre com o sintagma nominal o erro, que resume o parágrafo anterior, no qual é descrita uma substituição que não funcionou adequadamente na seleção italiana. Além disso, tal sintagma atribui uma avaliação negativa à estratégia adotada pelo técnico da seleção italiana, o que aumentou a dificuldade encontrada por essa seleção durante a partida. O outro encapsulador presente no exemplo (57) resume tudo o que tinha sido descrito anteriormente. O sintagma nominal o drama abarca todos os obstáculos enfrentados pela seleção italiana até aquele momento e já aponta, ao mesmo tempo, para um fechamento inesperado, que é a eliminação precoce da seleção que era a atual campeã do mundo diante de um time considerado fraco e sem expressão no futebol. Tal uso está relacionado ao modo como o enunciador escolhe ordenar as informações no cotexto, pois, após ter descrito todos os percalços pelos quais passou a equipe italiana, o nome drama não poderia ser mais comovente para já apresentar ao leitor a situação em que se encontrava a seleção e a eliminação da competição, que já se desenhava. Esses encapsulamentos desempenham papel importante para a coesão textual, organizando informações já mencionadas no texto e, ao mesmo tempo, apontando para novas informações, mantendo em estado de ativação determinado objeto de discurso, transformando-o, indicando o estágio seguinte, funcionando também como elo entre os tópicos. Convém frisar que, para compreender os encapsulamentos, algum esforço cognitivo se faz necessário, devido ao processo de organização mental dessas informações. Além disso, se não nos apoiarmos estritamente na noção de menção no cotexto, poderemos afirmar que tais anáforas podem operar um tipo de correferencialidade, como afirma Cavalcante (2011), uma vez que, mesmo não presente formalmente no cotexto, certas informações novas podem estar espalhadas pelo cotexto, como no exemplo abaixo:

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(57) Marquinhos cobrou falta aos 21 minutos, Gum desviou de cabeça e Rafael Moura, impedido, completou de cabeça. O erro do árbitro acabou fazendo justiça a um Fluminense mais organizado e objetivo, quase arrasador. (M3)

(58) O gol irregular de Tevez aos 26 do primeiro tempo desestabilizou o time do México e desmontou todo o esquema de Javier Aguirre para anular a Argentina, coisa que estava conseguindo até aquele momento. Como os hermanos não têm nada com isso, eles aproveitaram a situação e construíram, com méritos, a vitória por 3 a 1. Assim, estão nas quartas de final da Copa. Encararão a Alemanha num clássico que se desenha espetacular. O México entrou mudado com Bautista, Guardado e Hernandez entre os titulares e Juárez na lateral direita. Com marcação sufocante, não deixou os espaços para que as criações de Messi e Tevez. E mostrou eficácia ofensiva. Tanto que Salcido (na trave) e Guardado quase marcaram. A situação não estava fácil para a Argentina. Mas aí veio o erro. Após sobra de bola dentro da área, La Pulga chutou e Tevez, impedido, cabeceou para o gol. O bandeirinha validou. Para piorar, o telão do Soccer city mostrou o lance. E aí? O juiz confirma o gol voltando atrás? Bem, o italiano Rosseti achou melhor ratificar o erro crasso a deixar entendido que voltou atrás por causa das imagens, o que é proibido pela FIFA. (L8)

A expressão o erro, em (57) resume a informação anterior sobre o lance que culminou no gol de Rafael Moura e faz uma avaliação negativa, mostrando que validar o gol foi um erro do árbitro. Embora não esteja dito anteriormente que o árbitro errou, a informação de que o jogador estava impedido já aponta para essa possibilidade, pois sabemos, pelos conhecimentos das regras do futebol, que Rafael Moura estava infringindo uma dessas regras. Em (58), o mesmo recurso é utilizado, pois o sintagma nominal o erro antecipa o que será discutido adiante no texto sobre o gol irregular da Argentina e traz um novo referente ao discurso. Essa expressão é recategorizada mais adiante como a anáfora direta o erro crasso, no qual há uma avaliação negativa por parte do jornalista sobre o episódio. As anáforas encapsuladoras podem atuar como um importante mecanismo de garantia da progressão textual, operando movimentos ora de recuo ora de adiantamento de informações que fazem parte do universo textual. Passaremos agora a analisar exemplos interessantes que realizam um movimento prospectivo, precedendo o objeto de discurso ao qual se referem:

(59)Xará do camisa 1 rival, o meia vascaíno Jeferson organizava as jogadas de ataque do time. Fagner chegava com facilidade no apoio e quase marcou em duas oportunidades. A primeira em

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cobrança de falta, que o goleiro desviou para escanteio, e depois aos 33, quando Eder Luis rolou para trás, e o lateral chutou rente à trave. (M11)

Em (59), a utilização do sintagma duas oportunidades autoriza o leitor a esperar a explicação sobre quais seriam essas oportunidades (a cobrança de falta e o chute na trave). Essa expressão, ao mesmo tempo em que anuncia uma nova informação, já opera o seu resumo. Nos próximos exemplos, os elementos encapsuladores proporcionam uma avaliação dos eventos tratados no texto:

(60)Sob o olhar do técnico da seleção, , Ronaldinho Gaúcho recuperado de dores no joelho esquerdo, reforçou o time rubro-negro. O Flamengo começou criando as melhores chances: aos 22, Ronaldinho cobrou falta na área, e Thiago Neves, livre, cabeceou para fora. Outra boa jogada do Rubro-Negro veio aos 26, quando Thiago Neves tocou para Ronaldinho servir . O atacante achou Botinelli livre e tocou para o argentino chutar forte, para bela defesa de Fernando (M4)

(61) O ímpeto ofensivo do time de Joel acabou por aí. O Nova Iguaçu começou a controlar o jogo e aos 14 deu o primeiro susto: Dieguinho chutou forte para defesa de Jefferson. Depois dessa jogada, a partida se tornou monótona: um tranco de Herrera derrubando o bandeirinha acabou sendo o lance que mais chamou a atenção até o fim da primeira etapa. O segundo tempo começou mais movimentado. Logo aos 20 segundos, o Nova Iguaçu quase empatou com Maycon, que recebeu cruzamento rasteiro e chutou por cima. Aos 5, Everton quase marcou seu segundo gol após jogada semelhante à do primeiro, mas bateu para fora. A partir daí, só deu a Laranja da Baixada, sempre pela esquerda com Bruno Côrtes. Aos 12, veio a melhor chance do empate: o lateral cruzou para Maycon, que, na pequena área, desviou no travessão. (M20)

(62) O Resende quase empatou aos 26: Elias soltou uma bomba de longe, Ricardo Berna espalmou e a bola acertou a trave. Fábio pegou o rebote e bateu par outra defesa de Berna. No fim do jogo, o Fluminense passou a levar um enorme sufoco: aos 38 minutos, o Resende perdeu outra grande chance, com Fábio chutando para fora com o gol vazio. (M18)

Nesses exemplos, percebemos que, ao utilizar essas expressões encapsuladoras para introduzir um novo tópico no texto, os enunciadores objetivam não só ligar tópicos, mas direcionar a atenção do leitor para a nova sequência que se seguirá. Desse modo, podemos confirmar a importância dessas anáforas como mais um instrumento que viabiliza avaliações e que pode conduzir a linha argumentativa do texto. Todas as expressões em destaque são compostas de um núcleo nominal e um modificador, que atribuem ao segmento encapsulado a opinião do jornalista sobre determinado lance no jogo e conduzem a opinião do leitor, como pode ser visto nas

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expressões a melhor chance, um enorme sufoco, o primeiro susto, outra boa jogada, etc. Para Conte (2003), o encapsulamento anafórico opera como um recurso coesivo e como princípio organizador, tornando-se um interessante meio de manipulação do leitor, que, por sua vez, recorre a complexos processos de inferência. Nos exemplos vistos, os encapsuladores prospectivos e retrospectivos, além de contribuírem para a progressão textual e a organização tópica, orientam o leitor para as próximas sequências dentro do texto.

4.4. Aprofundando a discussão

Passaremos agora à análise de alguns exemplos do corpus nos quais a inferência necessária à interpretação dos referentes instaurados no discurso é muito grande, mostrando que anáforas diretas também envolvem uma complexa rede de informações compartilhadas na sua interpretação. Concordamos com Ciulla e Silva (2008) quando a autora afirma que a diferenciação entre anáforas diretas e indiretas pelo critério de haver um antecedente presente no cotexto e pelo critério referente à produção de inferências para compreensão das anáforas indiretas não são abrangentes o suficiente para a descrição dessas anáforas. No exemplo abaixo, embora os antecedentes estejam formalmente expressos no cotexto, é o conhecimento dos interlocutores sobre a posição dos jogadores em campo que conduz a interpretação do enunciado:

(63) “(...) Na segunda etapa, o Tricolor suburbano assustou primeiro com o lateral Valdir. O jogo era bom e Fágner iniciou linda jogada, que terminou em mais um gol perdido por Éder Luís. Pouco depois, o lateral vascaíno cortou chute de Valdir, que levou vantagem de novo sobre Ramon. E o castigo veio com um golaço de Rodrigo. O meia do Madura colocou no ângulo e fez lindo gol, empatando o jogo. Sorte do time de Ricardo Gomes que Felipe e Bernardo estavam inspirados. O veterano driblou e passou para o garoto que, com tranquilidade, colocou no ângulo. Em vantagem de novo, tudo indicava fim de jogo tranquilo, quando o lateral Valdir cruzou e Adriano Magrão cabeceou nas costas de Cesinha para empatar.(...)”.(M6)

A expressão o lateral vascaíno, a princípio, parece estar se referindo ao jogador Éder Luís, pois é o antecedente mais próximo dentro do cotexto, como ocorre com a outra expressão sublinhada o meia do madura, que retoma um antecedente mais

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próximo. No entanto, Éder Luis ocupa a posição de meia atacante; Fágner é o lateral direito do time do Vasco, sendo, portanto, o antecedente do sintagma nominal em destaque. Como podemos perceber, o fator preponderante para a interpretação desse enunciado não é uma questão simples ou pontual de substituição de termos, ainda que o antecedente esteja no texto, mas o conhecimento sobre o esporte. Ainda no mesmo relato, os sintagmas nominais o garoto e o veterano também requerem um conhecimento prévio sobre os jogadores, uma vez que o termo veterano pressupõe alguém mais velho, mais experiente, e o jogador com essas características é Felipe, enquanto Bernardo foi uma jovem revelação do clube carioca do início do ano de 2011. Tais informações, embora possam ser óbvias para quem acompanha o esporte e os periódicos esportivos, podem não estar ao alcance de todos e prejudicar, assim, a compreensão de determinados elementos do texto. Para realizar as recategorizações sugeridas pela situação discursiva, parece-nos que o papel de antecedente se esvazia, de forma que esse termo passa a funcionar como uma pista, ativando os conhecimentos armazenados na memória. De acordo com Ciulla e Silva (2008), o traço básico do elemento anafórico é a sua característica de nem sempre recuperar um antecedente, mas orientar-se por pistas no cotexto que funcionem como fonte, como acontece com os exemplos discutidos acima. No exemplo (64), que descreve a partida entre Flamengo e Olaria, pelo Campeonato Carioca, são utilizadas como expressões referenciais a função de capitão, o número da camisa do jogador e a nacionalidade:

(64) “(...)Thiago Neves e Ronaldinho começaram o segundo tempo com nota 10 no quesito harmonia. O capitão recebeu do camisa 7 na cara do gol e fez 2 a 1, com categoria. Vanderlei Luxemburgo mexeu na ala dos estrangeiros e trocou Botinelli por Fierro. Aos 25 minutos, o chileno recebeu bom passe de Leonardo Moura e seu cruzamento encontrou Thiago Neves, que marcou por cobertura.(...)”(M16)

Tais anáforas diretas não são interpretadas apenas pela presença de fontes no texto, mas a partir dessas fontes, uma vez que, para saber quem é o capitão e quem é o camisa 7, o leitor deve compartilhar dessas informações, sabendo que Ronaldinho utiliza a braçadeira de capitão em campo e o meia Thiago Neves joga com a camisa de número 7.

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No parágrafo seguinte, os jogadores Botinelli e Fierro, ambos estrangeiros, são mencionados, mas Fierro é retomado por meio da sua nacionalidade: chileno. Embora tal interpretação esteja mais acessível no texto do que o exemplo anterior devido ao entorno discursivo, em alguma medida também são necessárias informações extratextuais para acionar tal interpretação. Tais exemplos corroboram com o pressuposto básico de que a referenciação não é dada, posta, mas negociada entre os sujeitos participantes da situação comunicativa. Nos exemplos comentados, o autor conta com a participação do leitor: essas “lacunas” não constituem falhas, mas indícios dessa negociação entre os sujeitos presentes nessa interação – como também pode ser observado em (65):

(65) Com golaço de Ronaldinho de falta, Rubro-Negro derrota o Boavista e conquista invicto a Taça GB Sem freio, o bonde do Flamengo não saiu dos trilhos. Atropelou todos os seus adversários e assim, invicto, conquistou ontem a Taça Guanabara, ao vencer o Boavista por 1 a 0, no Engenhão, com gol de seu badalado condutor Ronaldinho Gaúcho. Quando Edu Pina derrubou Thiago Neves próximo à área, o camisa 10 assumiu o papel que em outros tempos fora de e Petkovic. Na cobrança de falta aos 26 minutos do segundo tempo, Ronaldinho Gaúcho faz a bola passar por cima da barreira, sem chance para o bom goleiro Thiago.(M9)

O sintagma nominal o camisa 10 retoma Ronaldinho Gaúcho, que está expresso no parágrafo anterior, ou seja, distante da expressão anafórica, o que poderia causar alguma dificuldade de leitura. Além disso, há outro jogador do Flamengo citado depois e que poderia funcionar como antecedente. Desse modo, conhecer o número da camisa, nesse caso, é uma informação importante para o reconhecimento da expressão anafórica. Esses exemplos nos mostram que, como bem aponta Ciulla e Silva (2008), a definição de anáfora correferencial que prioriza uma relação de retomada de um antecedente no cotexto pode ser questionada, pois pode haver mais de uma fonte ou outras pistas concorrentes para a construção da referência, assim como acontece com as anáforas indiretas. Em outras palavras, podemos dizer que a correferência não deve ser vista somente como uma forma de recuperação de expressões no cotexto, mas como um dos recursos que permitem recuperar e reformular o referente, acrescentando uma nova significação ao objeto retomado.

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Assim, podemos dizer que as anáforas diretas não se configuram somente por uma operação linguística de localização de referentes. Essas anáforas envolvem também todo um processo cognitivo realizado pelos interlocutores, que o levam além do reconhecimento de antecedentes, conduzindo-os à compreensão das informações acrescentadas a esse referente. O próximo exemplo também apela bastante para essa memória compartilhada, necessitando de um grande cálculo inferencial:

(66) “Apito muy amigo Argentina elimina México e pega Alemanha nas quartas. Apesar de merecer a vitória, hermanos foram ajudados por erro da arbitragem. O gol irregular de Tevez aos 26 do primeiro tempo desestabilizou o time do México e desmontou todo o esquema de Javier Aguirre para anular a Argentina, coisa que estava conseguindo até aquele momento. Como os hermanos não têm nada com isso, eles aproveitaram a situação e construíram, com méritos, a vitória por 3 a 1. Assim, estão nas quartas de final da Copa. Encararão a Alemanha num clássico que se desenha espetacular. O México entrou mudado com Bautista, Guardado e Hernandez entre os titulares e Juárez na lateral direita. Com marcação sufocante, não deixou os espaços para que as criações de Messi e Tevez. E mostrou eficácia ofensiva. Tanto que Salcido (na trave) e Guardado quase marcaram. A situação não estava fácil para a Argentina. Mas aí veio o erro. Após sobra de bola dentro da área, La Pulga chutou e Tevez, impedido, cabeceou para o gol. O bandeirinha validou. Para piorar, o telão do Soccer city mostrou o lance. E aí? O juiz confirma o gol voltando atrás? Bem, o italiano Rosseti achou melhor ratificar o erro crasso a deixar entendido que voltou atrás por causa das imagens, o que é proibido pela FIFA...(L8)

O objeto de discurso Messi, já introduzido no discurso, é retomado pela expressão La Pulga, uma anáfora direta recategorizadora, que retoma o objeto, transformando-o, acrescentando-lhe uma nova informação. Entretanto, não é uma tarefa simples estabelecer a relação entre essa anáfora e seu antecedente, inclusive pelo fato de haver outros nomes de jogadores que poderiam ocupar o papel de antecedente. Embora Lionel Messi seja um jogador mundialmente famoso, eleito três vezes melhor jogador do mundo e atleta de um clube bastante conhecido, o Barcelona, torna- se complexo recuperar tal associação, uma vez que esse apelido é mais usual na Argentina, seu país de origem. A partir de uma pesquisa em outros periódicos, inclusive argentinos, como o Olé! argentino e o Marca espanhol, descobrimos que tal associação é feita pela característica do jogador de correr muito rápido sempre com a bola rente a

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seus pés. Essa característica foi associada à pulga, resultando dessa associação seu apelido. Esse exemplo reforça o que foi dito acima sobre a possibilidade de os antecedentes terem o seu papel esvaziado e atuarem mais como pistas deflagradoras das associações necessárias à construção desses referentes. Mesmo solicitando um antecedente no cotexto, essas anáforas não operam correferencialmente e dependem de processos cognitivos, reforçando nosso ponto de vista de que todo processo anafórico está atrelado a mecanismos inferenciais. Percebemos também casos curiosos no corpus em relação aos relatos dos jogos da seleção holandesa, pois as referências, na maioria das vezes, remetiam à histórica seleção holandesa de 1974, havendo necessidade desse conhecimento para a compreensão de alguns trechos, conforme vemos em (68) e (69):

(67) Arrancada laranja No colorido Estádio Soccer City, Holanda ignora blefe de técnico dinamarquês, vence com autoridade e prova seu favoritismo Até mesmo o Soccer city pareceu torcer para a Holanda em sua estreia na Copa da África. Pintados de laranja, os assentos do maior estádio do Mundial se confundiam com os inúmeros torcedores de uma das seleções favoritas ao título. Uma coincidência, claro. Mas a Laranja Mecânica jogou o suficiente para derrubar sem dificuldades a Dinamarca por 2 a 0 e o tolo blefe de seu técnico. (L5)

(68) Eficiência mecânica Holanda bate o Uruguai por 3 a 2, chega à terceira final de Copa de sua história e agora espera por vencedor de Alemanha x Espanha Os estilos são diferentes. Mas a Holanda de 2010, a exemplo de suas antecessoras de 1974 e 1978, também chegou à decisão. Não há a magia dos tempos de Cruyff. Mas não seria exagero dizer que a Laranja de agora parece até mais eficiente. E, embora não tenha craques do nível daquele mago, e de Krol, Neskens, Rep e dos irmãos Van der Kerkhof, a equipe de Sneijder e Robben mostrou frieza e autoridade suficientes para vencer o Uruguai por 3 a 2, para tentar superar a trajetória do velho carrossel. Interessante como a história se repete. Como a Laranja dos anos 70, a de 2010 começou impondo a sua mais valia. E a exemplo do que o grande Arie Haan fazia com frequência, Van Bronckhorst acertou um chute espetacular da intermediária no ângulo esquerdo de Muslera para abrir o placar(...). (L20)

O sintagma nominal a laranja mecânica, como anáfora direta que retoma o termo Holanda, faz alusão à seleção holandesa de 1974 que, embora não tenha vencido a Copa daquele ano, foi a grande sensação desse mundial por apresentar uma configuração tática totalmente nova, conhecida e famosa até os dias atuais. A expressão,

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formada por um nome e um modificador, aponta para a cor do uniforme (laranja) e o modificador remete à eficiência desse time que ganhou praticamente todos os jogos que disputou, perdendo somente para a Alemanha Ocidental no final do Campeonato. Além disso, faz alusão ao filme de ficção cientifica “Laranja Mecânica”, famoso à época. Ainda que não dependa de um alto grau de inferência, a intencionalidade presente nessa expressão corrobora com o viés do discurso de superioridade da seleção holandesa sobre a dinamarquesa. Essa linha argumentativa pode ser compreendida pelas expressões nominais usadas para designar a seleção holandesa e outras que aparecem no decorrer do relato. Além disso, esse sintagma (a Laranja Mecânica) reafirma a tradição holandesa no futebol que, mesmo que não seja campeã mundial, sempre contou com grandes seleções e belas exibições nas Copas. O relato (68) também apresenta alguns recursos bastante interessantes, a começar pela introdução referencial feita pela expressão eficiência mecânica, no qual o modificador mecânica é fundamental para que ativemos, na memória discursiva, o objeto de discurso Holanda. Relembrando Cavalcante (2011), sabemos que o referente não necessariamente é introduzido no discurso somente quando é exposto por meio de uma expressão referencial, de forma explícita. Sendo assim, a expressão eficiência mecânica, de alguma forma, já introduz o objeto de discurso seleção holandesa, apelando para o contexto sociocognitivo dos interlocutores. A partir dessa introdução, já no título, com “Eficiência Mecânica”, esse objeto será retomado e recategorizado algumas vezes no texto, pois o relato vai estabelecendo uma comparação entre as seleções holandesas que chegaram a uma final de Copa do Mundo, as de 1974 e 1978, utilizando elementos dêiticos, como a Laranja de agora, Laranja de 2010 para diferenciá-la das seleções de 1974 e 1978. Porém, no lugar da expressão mais usual Laranja mecânica, tal expressão foi dividida, o modificador foi usado no título, e a expressão Laranja (que representa a Holanda) passou a ser acompanhada de alguma informação que especificasse o tempo, como o ano de 2010 ou o advérbio agora. Toda essa comparação tem como finalidade enfatizar a qualidade técnica do time de 2010 que, segundo o relato, embora não tenha a beleza de seus antecessores mais famosos, é bastante eficiente em campo e, por isso, chegou à final do Mundial.

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É interessante notar ainda que foram citados nomes de jogadores da seleção de 1974, como Cruyff e os irmãos Van der Kerkhof, em comparação a jogadores atuais, mostrando que os jovens não apresentam a mesma categoria e talento de seus predecessores. Porém, outra anáfora bastante curiosa é realizada pela expressão velho carrossel, usada para recategorizar a seleção de 1974, uma vez que esse time ficou conhecido como carrossel por sua estratégia utilizada em campo de os jogadores atuarem o tempo todo em posições diferentes, movendo-se constantemente e movimentando a bola, fazendo parecer um círculo, para surpreender os adversários. Todos esses conhecimentos históricos sobre a seleção holandesa, presentes nas anáforas e nos nomes dos jogadores, constituem pistas deixadas no texto para que o leitor perceba as nuances da comparação que vai se construindo ao longo de todo o relato. Isso nos chama a atenção para o que já destacamos sobre a dificuldade de separar conhecimentos linguísticos e extralinguísticos, já que ambos atuam na compreensão do texto. Assim, parece difícil estabelecer adequadamente o que seria uma informação textual e o que seria uma informação extratextual, pois ambas convergem para o mesmo objetivo: auxiliar na reconstrução de sentidos dentro do texto. Portanto, corroboramos a tese de Ciulla e Silva (2008, p.48):

a atividade linguística não acontece de modo exterior ou paralelo à situação, mas é uma atividade que é desempenhada na situação: ao falar e interpretar o que o outro diz os falantes estão, ao mesmo tempo, percebendo um ao outro e as coisas à sua volta e agem de acordo com essa percepção, levando-se em conta, é claro, o seu estado de atenção, sua habilidade e sua memória. Um texto sempre depende de quem o lê ou ouve e de coisas que podem ser inferidas a partir dele (...) consideramos que texto e discurso se relacionam de maneira interdependente e imbricada, então não podemos desvincular o contexto linguístico da situação.

Assim, segundo Ciulla e Silva (2008), todo processo anafórico implica inferências, tendo em vista o contexto sociocognitivo, e essa característica vai permitir a negociação dos referentes dentro da situação discursiva. Portanto, como foi possível perceber com os exemplos do corpus, há diversos graus de inferências e diferentes pistas que concorrem para elaboração dos objetos de discurso.

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4.5. A referenciação no relato esportivo: cruzando dados

No estudo aqui desenvolvido, buscamos verificar a relação entre o gênero relato esportivo e os processos referenciais nele verificados, pois acreditamos que os gêneros, como ferramentas sociocomunicativas, podem promover uma relativa estabilidade de estratégias de referenciação, ou seja, podem orientar a atividade referencial dos interlocutores de modo a se ajustar a finalidades discursivas. É provável que certas escolhas gramaticais utilizadas para possibilitar a referenciação resultem da própria composição do gênero, que atende a determinados propósitos comunicativos. Por exemplo, uma bula de remédio tende a ser bastante objetiva, então é possível que as escolhas linguísticas empregadas para promover a referenciação se repitam em outros exemplares do mesmo gênero. Já o gênero editorial pode querer manter em foco vários objetos de discurso, suscitando certas polêmicas ou figurativizando certos pontos de vista e, por isso, pode empregar outras formas referenciais. De acordo com Marcuschi (2008, p.154), “quando utilizamos um gênero textual, estamos usando uma maneira de realizar linguisticamente objetivos específicos em situações sociais particulares”. Assim, as dimensões indissociáveis, estilo, tema e composição, são definidas, considerando o uso da linguagem em determinados contextos comunicativos. Citando, por exemplo, a pesquisa de Zamponi (2005, p. 172), vemos a relação entre a referenciação e o gênero “popularização da ciência”, definido pela autora não em termos estruturais, mas pela presença de uma relação assimétrica entre, “de um lado, aquele que sabe, e, de outro, aquele que não sabe”. Na análise, a autora mostra que os processos de reformulação são decorrentes do tipo de específico de interação estabelecida no gênero popularização da ciência, entre especialistas e não especialistas. O produtor do texto, no papel aceito socialmente de especialista, antecipa possíveis dificuldades do seu interlocutor, atitude da qual depende o sucesso da construção referencial. A autora percebeu que, nesse gênero, são recorrentes construções apositivas, anáforas definicionais e didáticas em sua análise inicial. Numa perspectiva semelhante, Souza (2005) investiga a relação entre anáforas e sequências textuais no gênero anúncio, com o objetivo principal de verificar a relação entre a referenciação anafórica e as sequências textuais descritiva e argumentativa nos

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anúncios. A autora percebeu uma correlação entre anáforas correferenciais e sequência argumentativa e entre anáforas indiretas e sequência descritiva. Souza ressalta que, embora não tenha feito o estudo com outros gêneros, é possível apontar a relação descrita acima como um traço marcante do gênero textual anúncio, pela forma como os processos se repetem nos textos. Esse resultado, embora inicial, funciona como um indício entre a correlação dos processos de referenciação e a construção dos gêneros textuais, indicando que, de alguma forma, o gênero pode selecionar estratégias de referenciação que melhor se associem aos seus propósitos comunicativos. De acordo com as nossas premissas inicias sobre a referenciação, sabemos que não há relações fixas, isto é, não podemos afirmar que existe um modelo referencial restrito a um gênero específico. No entanto, acreditamos que seja possível apontar usos característicos do gênero relato esportivo em relação a outros gêneros. Pretendemos demonstrar que referir é uma ação social e não individual, coorientada pelos gêneros textuais, uma vez que estes, situados em contextos comunicativos específicos, assumem valores sociais, já que todo gênero configura um padrão de leitor ao mesmo tempo em que é configurado por ele. Dentro dessa perspectiva, insere-se o fenômeno da referenciação, como um processo interativo em situações específicas de comunicação, funcionando como uma atividade de construção colaborativa e não uma operação linguística pontual de troca ou substituição de um termo por outro. Assim como os gêneros, a referenciação ocorre de maneira situada, dentro do tempo, do espaço e de uma interação, envolvendo uma operação colaborativa dos parceiros da enunciação, que constroem os referentes no e pelo discurso. Marcuschi (2008) demonstra que, para haver interação, é necessário que haja conhecimentos comuns compartilhados, como cultura, crença, língua e outros aspectos referentes ao contexto situacional para que a atividade de construção de sentidos seja realizada. Essa noção é importante para o nosso trabalho, já que estamos diante de um gênero bastante atrelado ao contexto cognitivo e preso ao contexto sócio-histórico em que é produzido. Portanto, a ativação desses referentes torna-se difícil se feita em um momento posterior àquele em que o texto foi escrito. Além disso, verificamos, em exemplos do corpus, que muitos referentes tinham a sua interpretação bastante apoiada em conhecimentos compartilhados pelos interlocutores, que dependiam de inferências para sua interpretação. Desse modo,

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podemos dizer que o gênero seleciona o leitor, da mesma forma em que é selecionado por ele, conforme já apontava Bakhtin (2003). O produtor do texto, então, pode idealizar seu público-alvo, pressupondo que esse público disponha de determinada competência linguística e conhecimentos enciclopédicos para atuar na compreensão do texto. O leitor, nesse caso, é visto como alguém que conhece a temática do futebol e suas especificidades. O jornalista esportivo, então, dentro desse gênero, não está no papel de quem sabe mais sobre o assunto, mas na posição de um mediador entre os fatos ocorridos nos jogos e o leitor. Assim, a recorrência de termos como apelidos de jogadores, números de camisa e nomes de suas funções em campo, por exemplo, soa como um recurso natural desse gênero, uma vez que pressupõe um leitor especializado, que compartilha dessas informações. Os mecanismos mais regulares de referenciação encontrados nesse gênero foram as anáforas diretas, em sua maioria expressas pela repetição lexical e recategorização de referentes. Essa alta ocorrência pode ser explicada pela manutenção dos mesmos objetos de discurso durante os textos, ou seja, um relato de jogo entre Flamengo e Vasco, por exemplo, terá esses objetos em foco durante todo o texto, bem como o nome dos jogadores principais dessas equipes. Cabe ressaltar, porém, que a recategorização desses objetos é extremamente baseada em conhecimentos enciclopédicos, como vimos na análise. A manutenção desses referentes promove uma estabilização dos objetos de discurso, originando certas formas de referenciação que chamamos de epítetos – apelidos dos clubes –, que, de tão cristalizados, remetem constantemente aos mesmos referentes, sendo uma forma bastante conhecida por torcedores e amplamente empregada nos textos. Cabe ainda destacar que a presença de determinados apelidos e expressões metafóricas criadas no momento das partidas, aproveitando associações que estão sendo feitas pela torcida ou até mesmo datas comemorativas, como o Carnaval, por exemplo, é mais um indício do atrelamento do gênero relato ao contexto sociocongitivo. As formas de referenciação nele verificadas evidenciam esse entrelaçamento. As expressões metafóricas, os apelidos, presenças de gírias e expressões do universo do futebol compõem o estilo do gênero relato. Como vimos, as seleções

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lexicais e gramaticais são feitas tendo em vista a imagem do interlocutor e a sua compreensão. Assim, todas essas escolhas são justificadas pela imagem do público-alvo dos jornais esportivos. Além disso, a presença da linguagem figurada e nomes populares de jogadas do futebol, por exemplo, confirmam a maior liberdade desse gênero em relação a outros gêneros do jornal, conforme apontam especialistas da área de Comunicação, como Barbeiro e Rangel (2006) e Coelho (2009). Esses autores destacam que a linguagem esportiva, além da aproximação com o leitor, tentar recriar a emoção das partidas. As características listadas comprovam a tese de que os gêneros resultam de práticas discursivas convencionadas por comunidades discursivas específicas, como bem apontam Bhatia (2009) e Bazerman (2005). Desse modo, os gêneros são fatos sociais que emergem em situações típicas de comunicação reconhecidas e reconhecíveis por seus usuários. Quanto à composição do gênero, é frequente o emprego de fotos, infográficos e fichas técnicas contendo informações como público pagante, número de cartões, jogadores expulsos, por exemplo, uma vez que há a necessidade de apresentar o texto com informações mais aprofundadas. Como se trata de um jornal especializado em esportes, o leitor espera encontrar essas informações, que nem sempre aparecem nos jornais comuns, de acordo com o que apontam Barbeiro e Rangel (2006). Em síntese, podemos concluir que as anáforas diretas constituem o recurso de referenciação mais empregado no relato esportivo, tendo em vista a estabilidade alta alguns referentes. Além disso, algumas anáforas diretas, como vimos na análise, têm a sua interpretação imbricada com o contexto sociocognitivo, característica marcante desse gênero. Por isso, talvez, tenham sido verificados exemplos que, embora fossem de anáforas diretas, tiveram o conhecimento de mundo compartilhado como fator preponderante para sua interpretação.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nossa pesquisa pretendeu analisar os processos anafóricos tendo em vista o seu uso em um gênero específico, o relato esportivo. Abordamos alguns aspectos de referenciação e sua relação com o gênero textual, objetivando integrar esses dois temas tão importantes dentro da Linguística Textual. Comprovamos nossa hipótese inicial de que esse gênero é bastante atrelado ao contexto sociocognitivo, por isso as formas de referenciação nele verificadas dependem extremamente de conhecimentos compartilhados para sua interpretação. Assim, podemos entender a grande necessidade de inferências necessárias para a reelaboração dos objetos de discurso, o que pode ser claramente observado nos casos de anáforas diretas recategorizadoras. Por se tratar de jornais especializados no esporte, as informações veiculadas são bastante específicas, selecionando um público que compartilhe as referências empregadas como apelidos de jogadores, nomes de posições e números de camisas, por exemplo. Dessa forma, a especificidade do suporte seleciona leitores que disponham desses conhecimentos sobre o futebol. Em relação aos processos referenciais empregados, as anáforas diretas constituem a maioria dos casos verificados no corpus. Observamos que as anáforas diretas expressas por repetição lexical aparecem em número maior (53%), seguidas das anáforas diretas recategorizadoras expressas por grupos nominais (20%). Não esperávamos encontrar um número tão alto de casos de repetição lexical, inicialmente, esperávamos verificar um número maior de anáforas diretas recategorizadoras. Todavia, esse alto índice pode ser explicado pelo fato de referentes como nomes de times e jogadores, por exemplo, estarem constantemente em foco nos textos. Os outros casos verificados foram as anáforas diretas expressas por pronominalização (12%), anáforas diretas que chamamos de epítetos (12%), as anáforas diretas prospectivas (2%), anáforas diretas expressas por meio de metáforas (1%), anáforas indiretas propriamente ditas (2%) e anáforas indiretas encapsuladoras (2%). Em relação às anáforas diretas recategorizadoras verificadas, destacamos a dependência dessas anáforas de conhecimentos prévios e compartilhados. Dessa forma, esses exemplos corroboram a tese de Ciulla e Silva (2008) quando a autora afirma que

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as anáforas diretas bem como as indiretas constituem-se como amálgamas cognitivos, visto que, de alguma forma, dependem de inferências e operam reapresentações do referente, ainda que pequenas, mas que permitem a realização de novas referências. Nas palavras da autora: “as anáforas, tanto as chamadas de diretas quanto indiretas, podem ser núcleos, a partir dos quais diversas referências podem ser feitas, em procedimentos de recuperação, de reformulação ou de homologação de novos referentes”. Podemos, então, afirmar que os processos de referenciação envolvem, em igual medida, conhecimentos linguísticos e extralinguísticos na construção dos objetos de discurso. Vale destacar que a ocorrência dos exemplos que analisamos está diretamente ligada ao gênero textual em questão que, como já dissemos, tem por característica uma profunda dependência do contexto cognitivo, já que a própria finalidade do gênero tem em vista esse contexto. Assim, o leitor que dispõe dessas informações realiza um esforço menor na construção dos referentes. Em contrapartida, o leitor que desconhece o assunto tem de empregar sua competência para realizar os encadeamentos textuais necessários à reconstrução dos sentidos do texto, fazendo um esforço maior que, muitas vezes, pode não ser suficiente. Essa característica do gênero relato justifica ainda a presença de expressões metafóricas, muitas vezes amparadas no contexto imediato de produção do relato, apresentando marcas linguísticas que advêm de associações feitas à época dos jogos. Certamente, esses casos, que não foram amplamente explorados no corpus, pois foram encontrados em pouca quantidade, poderiam ser objeto de estudos futuros. O emprego desses elementos anafóricos mostrou ainda que, por meio deles, é possível perceber a orientação argumentativa dos textos. Como vimos, mesmo sendo um relato, o jornalista escolhe um ponto de vista para descrever as ações; geralmente, escolhe privilegiar os clubes/seleções de maior prestígio dentro do futebol. Desse modo, o emprego de anafóricos como “a seleção tetracampeã” ou “a baba do grupo”, por exemplo, indica ao leitor a opinião dos jornalistas sobre os jogos. É claro que a argumentatividade de um texto não se faz perceber somente pelos processos referenciais, mas, como foi possível perceber no trabalho, a percepção da orientação argumentativa dos textos, passa, inevitavelmente, pelas formas de referenciação, o que constitui um importante aspecto a ser observado.

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Além disso, esse trabalho proporcionou que as formas de referenciação fossem estudadas tendo em vista a leitura, mostrando como elas revelam o projeto de dizer do interlocutor. Geralmente, as formas de referenciação são mais associadas à produção de texto do que a leitura. Entretanto, a associação entre referenciação e leitura é um caminho de pesquisa muito profícuo e importante para o ensino. Sabemos que a leitura depende, conforme apontam Koch e Elias (2006) da nossa bagagem cultural, do nosso conhecimento linguístico e do conhecimento sobre as coisas do mundo. Assim, identificar e compreender as formas de referenciação empregadas é descobrir os sentidos do texto, a sua orientação argumentativa e a intencionalidade do autor ao empregar tais formas. Conforme apontam Cavalcante e Santos (no prelo), “penetrar o sentido de um texto implica, necessariamente, engendrar diversos processos referenciais”. As autoras mostram que não se pode deixar de avaliar os processos de referenciação na construção de sentidos no texto, uma vez que estes são fundamentais para sua interpretação. Seria interessante, como desdobramento deste trabalho, relacionar as estratégias de referenciação ao ensino, pensando em atividades de leitura com os relatos esportivos, gênero que é apreciado pelos adolescentes em geral que gostam de esportes. Outro aspecto que também poderia ser desenvolvido em uma pesquisa futura é a comparação entre esse gênero com uma crônica argumentativa. Vimos que o gênero relato possui um certo teor argumentativo e concordamos que pode estar imbricado com o gênero crônica. Dentro dessa questão, cabe ainda a discussão, que não foi levantada neste trabalho, sobre o jornal esportivo como um suporte para esses gêneros. Enfim, são muitos os desdobramentos possíveis a partir desta nossa pesquisa, que, se não pretendeu esgotar o assunto, mostrou como ainda há o que estudar sobre a relação entre a referenciação e os gêneros, principalmente se associarmos tais temas ao ensino. Para concluir, ressaltamos que os processos de referenciação são cruciais para a construção de sentidos dentro do texto, pois sua interpretação requer a articulação entre conhecimentos culturais, contextuais e linguísticos bem como o conhecimento da estrutura textual dos relatos. Esperamos ter avançado na tentativa de estudar os processos de referenciação tendo em vista o gênero em que ocorrem. Esse estudo é um ponto de partida para um aprofundamento posterior dessas duas áreas.

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ANEXOS Relatos do Jornal Marca M1 Condutor do bonde é Thiago Neves Apoiador marca os gols da vitória do Mengão sobre o Botafogo por 2 a 0. Rubro-Negro está classificado.

Numa noite brilhante de Thiago Neves, que marcou os dois gols da partida, o Flamengo saiu ontem do Engenhão com uma vitória por 2 a 0 sobre o Botafogo e a vaga antecipada para as semifinais da Taça Rio. Foi o 21º jogo de invencibilidade do Rubro- Negro, que ultrapassou a última grande série invicta do clube, em 1999. O time da gávea – que ocupa o segundo lugar do grupo A, com 15 pontos, menos do que o Vasco – pegará na última rodada o Macaé, domingo, em busca da liderança na chave. Já o alvinegro ficou em situação difícil, ocupando o terceiro lugar no Grupo B, com 11 pontos, três a menos que Fluminense e Olaria. O próximo duelo será contra o rebaixado América, domingo. Antes de a bola rolar, os dois times fizeram homenagens para as vítimas da tragédia na escola de Realengo. Os alvinegros entraram em campo com camisas pretas em sinal de luto, enquanto o time rubro-negro estendeu uma faixa escrita: “Alô, alô, Realengo! Aquele abraço solidário do Flamengo”. E foi respeitado um minuto de silêncio antes do jogo. A partida começou morna, e o Flamengo só levou perigo aos 14 minutos, quando Rodrigo Alvim cruzou na cabeça de Ronaldinho Gaúcho e o camisa 10 desperdiçou boa chance mandando por cima do gol. O Botafogo respondeu com uma cabeçada de Loco Abreu, aos 20. também arriscou uma bomba de longe, logo em seguida, mas mandou por cima do gol. O Rubro-Negro acabou abrindo o placar. Aos 35, Renato Abreu recebeu de Rodrigo Alvim e cruzou. A bola passou pela defesa do Botafogo e Thiago Neves, livre, completou para o gol. O Botafogo voltou para o segundo tempo com uma alteração: Lucas no lugar do Bruno Tiago. Não demorou muito e o técnico Caio Júnior fez a outra mudança, tirando Somália para a entrada de Guilherme. No Flamengo, quem saiu logo no início da etapa foi Deivid, para a entrada de Diego Maurício. O Botafogo até poderia ter empatado num chute de Marcelo Mattos, aos 30, mas a bola saiu à direita do gol de Felipe. E o Flamengo ampliou aos 43, novamente com Thiago Neves. O camisa 7 recebeu belo passe Léo Moura e bateu na saída do goleiro Jefferson, fazendo 2 a 0 no Engenhão, com direito até a comemoração do “Bonde sem freio”.

(GOMES, Ana Carla. Condutor do bonde é Thiago Neves. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 11 de abr.2011, p. 2.)

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M2 Novo maquinista conduz a vitória do trem-bala Com belo gol de Diego Souza, Vascão derrota o Botafogo por 2 a 2, no Engenhão e assume a ponta do grupo A da Taça Rio.

Com direito a gol do estreante Diego Souza, o Trem-Bala do Vasco segue muito bem nos trilhos, depois da vitória sobre o Botafogo por 2 a O, ontem à noite, no Engenhão, pela quarta rodada da Taça Rio. Eder Luis também deixou sua marca. O resultado colocou os vascaínos na liderança do Grupo A. O time soma nove pontos, as- sim, como o Boavista, mas leva vantagem no número de gols pró. Já os alvinegros, mesmo com a derrota, estão na ponta do Grupo B, com nove pontos. O Vasco iniciou o jogo assustando: após cobrança de falta de Felipe, Jefferson saiu mal e Eder Luis cabeceou com perigo. Os vascaínos continuaram no ataque, mas pararam no goleiro alvinegro. Aos 10, Eder Luis recebeu belo passe de Bernardo e ficou livre na área, mas Jefferson salvou o Botafogo. Do outro lado, Arévalo levou perigo ao arriscar um chute de longe, à esquerda do gol de Fernando Prass. O Vasco seguiu atacando, e Diego Souza quase deixou sua marca aos 22, ao se esticar todo para completar um chute rasteiro de Eduardo Costa. Jefferson, então, voltou a fazer grande defesa, mais uma vez num chute de Eder Luis, que recebeu de Ramon, aos 34. No lance seguinte, outra boa defesa do goleiro alvinegro: após cobrança de escanteio, Anderson Martins cabeceou forte e Jefferson defendeu. O Alvinegro chegou a comemorar um gol de Herrera, aos 37, mas a arbitragem anulou, marcando impedimento. O primeiro gol saiu no início do segundo tempo: aos 13 minutos, Diego Souza recebeu lançamento de Allan, passou pela marcação de João Filipe, que falhou na jogada, e completou para as redes. Joel Santana, então, tirou os laterais Márcio Azevedo e Lucas para a entrada de Marcelo Mattos e Caio. Somália foi deslocado para a lateral esquerda. Mas não adiantou e o Vasco marcou o segundo aos 25: após cobrança de escanteio de Bernardo, Dedé desviou de cabeça e Eder Luis completou para as redes com um voleio. Joel mudou novamente o time alvinegro, tirando Everton, para a entrada de Alex, e teve de ouvir gritos de 'burro'. Mas o meia alvinegro havia pedido para sair. Para completar, o técnico alvinegro ainda foi expulso, ao reclamar da arbitragem. A noite, ontem, no Engenhão, era mesmo do Vasco.

(GOMES, Ana Carla. Novo maquinista conduz vitória do trem-bala. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 21 de mar. 2011, p.3.)

M 3

Sem freio e com a mão na taça Flamengo passa pelo Fluminense nos pênaltis e será campeão estadual invicto se vencer o Vasco domingo

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Entre chuvas, apagões, pênaltis e trovoadas, o Flamengo renasceu ontem na Taça Rio. Empatou em 1 a 1 com o Fluminense – gols de Rafael Moura e Thiago Neves - ,e, na disputa por pênaltis, o goleiro Felipe, com duas defesas, pode ter deixado o Rubro-Negro a 90 minutos do título estadual. A não ser que o Vasco derrube o invicto time de Vanderlei Luxemburgo, domingo, na final da Taça Rio. Tudo conspirava contra o Flamengo no Engenhão. A começar por Ronaldinho Gaúcho, com torção no joelho, vetado antes do jogo e substituído por Diego Maurício. Aos 11 minutos, o Flamengo perdia outro titular: Léo Moura, que sofreu uma pancada no joelho direito numa disputa de bola com Conca. A entrada de Galhardo no lugar do lateral acabou com o que seria uma arma ofensiva pela direita. O Fluminense dominava e somente seria parado pelo apito do árbitro, aos 12 minutos, por falta de luz. Quando o jogo foi reiniciado, após a paralisação de 11 minutos, o goleiro Felipe alegou que não enxergava a bola e solicitou nova interrupção. Somou-se a isso a parada técnica, e, retomado o jogo, o Flamengo sofreria outro golpe: um gol de Rafael Moura, em posição ilegal. Marquinhos cobrou falta aos 21 minutos, Gum desviou de cabeça e Rafael Moura, impedido, completou de cabeça. O erro do árbitro acabou fazendo justiça a um Fluminense mais organizado e objetivo, quase arrasador. Foi com esse ímpeto que o Tricolor voltou para o segundo tempo, mas o goleiro Felipe cresceria na mesma medida. Logo aos dois minutos, espalmou uma falta cobrada por Fred, e de novo evitaria o gol ao defender o rebote de Mariano. Enderson Moreira desarrumou o Fluminense ao trocar Rafael Moura por Tartá, aos 18 minutos. Tanto que, quando Thiago Neves fez de cabeça o gol de empate, aos 21, numa bola levantada por Willians, o Flamengo já tinha mesmo equilibrado as forças. Marquinhos ainda isolou, sozinho, a chance de levar o Fluminense à final da Taça Rio, aos 36 minutos. Na cobrança de pênaltis, Fred, Edinho, Conca e Gum marcaram pelo Fluminense. Souza chutou para fora, enquanto Araújo e Tartá esbarraram no reflexo de Felipe. Pelo Flamengo, Renato e Thiago Neves perderam suas cobranças para Ricardo Berna. Mas, depois de Deivid, Galhardo, Bottinelli e David Braz acertarem seus chutes, coube a Diego Maurício fechar a conta: 5 a 4, entre chuvas e trovoadas.

(MARTINS, Marluci. Sem freio e com a mão na taça. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 25 de abr. 2011. p.2)

M4 Ninguém freia o Bonde do Fla Mengão derrota o Vasco nos pênaltis e ganha o carioca de forma invicta pela quinta vez.

E ninguém parou mesmo o Bonde do Mengão. Com o Vasco pela frente na final da Taça Rio, o Flamengo garantiu ontem o seu 32º título estadual de forma antecipada ao frear o Trem-bala da Colina com mais uma vitória numa decisão por pênaltis, dessa vez por 3 a 1, após empate por 0 a 0 no tempo normal, no Engenhão. Foi a quinta conquista invicta do Rubro-Negro na história do Carioca, igualando-se aos próprios vascaínos nesse quesito. Coube a Thiago Neves, que havia desperdiçado a cobrança na semifinal contra o Fluminense, marcar o pênalti que deu a taça ao Rubro-Negro. O Vasco, por sua vez, segue com seu jejum de oito anos sem títulos na elite: o último foi o estadual de 2003.

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Sob o olhar do técnico da seleção, Mano Menezes, Ronaldinho Gaúcho recuperado de dores no joelho esquerdo, reforçou o time rubro-negro. O Flamengo começou criando as melhores chances: aos 22, Ronaldinho cobrou falta na área, e Thiago Neves, livre, cabeceou para fora. Outra boa jogada do Rubro-Negro veio aos 26, quando Thiago Neves tocou para Ronaldinho servir Deivid. O atacante achou Botinelli livre e tocou para o argentino chutar forte, para bela defesa de Fernando Prass. O Vasco, então, respondeu. E foi com Felipe, aos 29, mandando à esquerda do seu xará, o goleiro rubro-negro. Do outro lado, Ronaldinho também com perigo, mandando à direita do gol de Prass. No Flamengo, Felipe assustou a torcida ao se chocar com e ser atendido pelos médicos. Mas o goleiro voltou a campo e defendeu uma cabeçada de Diego Souza, antes do intervalo. O Rubro-Negro voltou para o segundo tempo com tudo: logo aos três minutos, Ronaldinho levou perigo numa cobrança de falta e Prass espalmou. Os técnicos passaram a mexer nas equipes: Vanderlei Luxemburgo tirou Botinelli para a entrada de Fierro, e Ricardo Gomes colocou Bernardo na vaga de Diego Souza. Mal entrou, Bernardo já chegou com perigo, mas parou na defesa de Felipe. Já no finzinho, Thiago Neves quase marcou ao pegar uma sobra de primeira e mandar à direita de Prass. O clima ainda esquentou, quando Willians e Allan se desentenderam e foram expulsos. A decisão foi mesmo para os pênaltis. Alecsandro foi o único a converter para o Vasco. Bernardo, e Elton mandaram para fora. Pelo Flamengo, Fierro desperdiçou, mas Renato Abreu, Fernando e, por último, Thiago Neves, deram a vitória ao Rubro-Negro, coroando uma campanha invicta. Na comemoração, gritos de “É campeão”, seguidos por outros de provocação ao Vasco: “Vice de novo”.

(GOMES, Ana Carla. Ninguém freia o bonde do Fla. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 2 de maio. 2011. p.1)

M 5

Vascão já garantiu o seu lugar na decisão Com um golaço de Eder Luis, Gigante da Colina bate o surpreendente Olaria por 1 a 0 e aguarda o vencedor do Fla-Flu na final da Taça Rio

O Olaria criou dificuldades e o Vasco saiu ontem à noite do Engenhão com uma vitória magra. Mas foi o suficiente para o Trem-Bala da Colina dar a volta por cima após o fraco desempenho no primeiro turno e avançar à final da Taça Rio, ao derrotar o time da Rua Bariri por 1 a 0, com gol de Eder Luis. Bernardo ainda perdeu um pênalti no segundo tempo. Agora, os vascaínos aguardam o resultado da semifinal de hoje entre Flamengo e Fluminense para conhecer o rival na decisão do segundo turno do Campeonato Estadual, no dia 1º de maio. Apesar de controlar o jogo desde o início, o Vasco pouco finalizou nos primeiros minutos. A torcida até chegou a festejar um gol de Diego Souza, que aproveitou chute de Ramon, aos 18 minutos. Mas o juiz anulou, marcando impedimento no lance.

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O Olaria, então, começou a assustar: aos 34, o time da Rua Bariri pediu pênalti de Dedé em Waldir, mas o juiz mandou seguir. E, um minuto depois, acertou uma bola no travessão, com uma bomba de longe de Felipe. Mas o Vasco abriu o placar: aos 37, Eder Luis recebeu belo lançamento de Felipe Bastos, driblou o goleiro Henrique e completou para o gol, fazendo 1 a 0 no Engenhão. E o segundo gol por pouco não saiu logo na volta do intervalo, quando Alecsandro desviou cruzamento e a bola explodiu no peito do goleiro Henrique. Dois minutos depois, Alecsandro teve outra chance numa cabeçada, mas Henrique defendeu. Felipe, do Olaria, continuava tentando deixar a sua marca: aos 16, ele mandou uma bomba de fora da área e Fernando Prass fez a defesa. A torcida vascaína começou a pedir Bernardo. E Ricardo Gomes atendeu, aos 24. Mas o técnico ouviu gritos de “burro” ao tirar Eder Luis. No entanto, o atacante estava gripado. E foi Bernardo quem perdeu a chance de ampliar, aos 31, depois de sofrer pênalti do goleiro Henrique. Ele mesmo cobrou, mas mandou no travessão. Mesmo assim, a torcida vascaína teve motivos para comemorar ao fim do jogo, com a vaga na final.

(GOMES, Ana Carla. Vascão já garantiu o seu lugar na decisão. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 24 de abr. 2011, p.12)

M 6

Bernardo faz três e decide para o Vascão Com gols do garoto e de Felipe Bastos, time derrota o Madureira por 4 a 2. Defesa pisa na bola e preocupa.

Um festival de gols perdidos e uma zaga que voltou a causar calafrios quase anularam uma grande partida da dupla Felipe e Bernardo. O garoto arrebentou de vez. Marcou três gols e salvou o time, que venceu a segunda seguida por 4 a 2. A vitória sobre o Madureira deixou o Vasco com 6 pontos, na segunda posição no grupo A da Taça Rio, atrás do Flamengo com sete. O próximo desafio será o clássico com o Botafogo, domingo. Como aconteceu contra o Duque de Caxias, o Vasco começou criando chances e até marcou cedo, quando Felipe passou para Elton que teria feito 1a 0 se o árbitro não tivesse apontado, equivocadamente, o impedimento. Apesar de manter a posse de bola, o time de Ricardo Gomes passou a ter dificuldades de ameaçar o Tricolor suburbano, que começou a assustar graças a uma falha de Ramon, que dominou mal a bola e permitiu a perigosa finalização de Adriano Magrão. Pouco depois, aos 36, Michel driblou Cesinha, entrou na área e só não fez porque chutou mal. Até que Bernardo apareceu: tabelou com Felipe e chutou cruzado para fazer 1 a 0, aos 39. Na segunda etapa, o Tricolor suburbano assustou primeiro com o lateral Valdir. O jogo era bom e Fágner iniciou linda jogada, que terminou em mais um gol perdido por Eder Luis. Pouco depois, o lateral vascaíno cortou chute de Valdir, que levou vantagem de novo sobre Ramon. E o castigo veio com um golaço de Rodrigo. O meia do Madura colocou no ângulo e fez lindo gol, empatando o jogo.

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Sorte do time de Ricardo Gomes que Felipe e Bernardo estavam inspirados. O veterano driblou e passou para o garoto que, com tranquilidade, colocou no ângulo. Em vantagem de novo, tudo indicava fim de jogo tranquilo, quando o lateral Valdir cruzou e Adriano Magrão cabeceou nas costas de Cesinha para empatar. Mas as emoções em Volta Redonda não acabaram. Jefferson cobrou falta da intermediária, Rômulo desviou e Bernardo marcou o terceiro dele, aos 42. No fim, Felipe Bastos ainda conseguiu fazer mais um. Nova vitória que, no entanto, não escondeu os graves defeitos do time do Vasco.

(ZARKO, Raphael. Bernardo faz três e decide para o Vascão. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 14 de mar. 2011. p.14)

M 7

Guerreiros viram e ficam perto das semifinais. Após susto no início, Tricolor retoma a tranquilidade, goleia o Americano por 5 a 1 e assume a ponta do Grupo B da Taça Rio.

Depois de uma semana complicada, o Fluminense entrou em campo pressionado contra o Americano, ontem, no Moacyrzão. Para piorar, ainda saiu atrás no placar. Porém, do jeito que a torcida gosta, o Tricolor esbanjou garra, conseguiu bela virada e goleou a equipe campista por 5 a 1, assumindo a liderança do Grupo B da Taça Rio, com 14 pontos. Ao fim da partida, os poucos torcedores presentes nas arquibancadas, soltaram o grito de “eu acredito”, em referência à difícil missão na Libertadores, na qual a equipe precisa de um milagre para avançar às oitavas de final. O canto mostra ao grupo que a torcida ainda acredita na conquista dos dois títulos no primeiro semestre. O jogo começou ruim para o Fluminense, que foi pressionado pelo Americano. Com jogadores velozes, o time de Campos encontrou boas chances, aproveitando-se das falhas do sistema defensivo tricolor. Aos 20 minutos, veio o castigo que podia ter comprometido a vida do Fluminense na Taça Rio. Carlos Alberto recebeu boa bola pelo lado esquerdo, passou fácil por Mariano e cruzou com perfeição na cabeça de Gustavinho, que abriu o placar em Macaé. Quem conhece a história recente do Tricolor sabia que nada estava perdido. Em dois minutos, o time conseguiu virar o jogo. Aos 34 minutos, Conca sofreu falta perto da área e cobrou com a velha categoria, a mesma que ajudou o Fluminense a conquistar o Brasileirão de 2010 e parecia esquecida em 2011. Um minuto depois, veio o segundo gol. Conca, de novo, deu um passe na medida para Júlio Cesar, que enxergou Araújo e cruzou rasteiro para o atacante marcar o segundo gol. No segundo gol, o Tricolor mostrou ainda mais motivação e continuou jogando para o ataque. Logo aos cinco minutos, foi premiado com o terceiro gol, quando Marquinho recebeu de Fred e cruzou para Mariano, que soltou uma bomba de fora da área. O quarto gol saiu aos 10 minutos, quando Conca enfiou uma bela bola para Araújo, que se livrou do marcador e mandou no cantinho. O quinto foi marcado por Marquinho, que, aos 42, aproveitou a saída ruim do goleiro Jefferson e, em uma bola que parecia perdida por Tartá, cabeceou para o fundo das redes.

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(NÚCLEO DE FUTEBOL. Guerreiros viram e ficam perto das semifinais. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 11de abr. 2011. p.10)

M 8

Bonde do Fla continua sem freio Com gol aos 50 minutos do segundo tempo, Diego Maurício garante os três pontos diante do Bangu: 2 a 1

Depois da folia carnavalesca, o Flamengo voltou a ganhar ontem no Estadual, graças a Diego Maurício, que garantiu a vitória sobre o Bangu, por 2 a 1, no Estádio Moacyrzão, com gol de cabeça aos 50 minutos do segundo tempo. Ronaldinho Gaúcho, de pênalti, abriu o placar, e Pipico, também de pênalti, empatou ainda no primeiro tempo. Líder do grupo A da Taça Rio, com seis pontos, o Rubro-Negro volta a jogar diante do Fluminense, domingo, no Engenhão. O Flamengo começou o jogo pressionando. Logo aos dois minutos, após cobrança de escanteio, o goleiro Thiago Leal tirou de soco, e Thiago Neves quase marcou um golaço ao pegar o rebote, mandando por cima do gol. Um minuto depois, Thiago Neves recebeu de Ronaldinho Gaúcho e soltou uma bomba. A zaga desviou e mandou para fora. O Bangu equilibrou a partida, e o goleiro Felipe apareceu bem para fazer boa defesa num chute de longe de Pipico. O Flamengo abriu o placar depois que o árbitro Djalma Beltrami marcou pênalti de Fabiano Silva em Léo Moura. Ronaldinho Gaúcho bateu e fez 1 a 0 para o Flamengo. Mas, logo em seguida, o juiz deu pênalti de Welington em Pipico. O próprio Pipico cobrou e deixou tudo igual, aos 26. O Rubro-Negro voltou para o segundo tempo com duas alterações: saíram Léo Moura e Willians, que já tinham cartão amarelo, e entraram Fierro e Diego Maurício. Subindo de produção, Ronaldinho fez bela jogada aos 10, quando achou Thiago Neves livre na área. O camisa 7 matou no peito e chutou para acertar a trave. O técnico Vanderlei Luxemburgo voltou a mexer no time, tirando Bottinelli para a entrada de Wanderley. E Ronaldinho fez outra boa jogada, mas o chute rasteiro parou na defesa de Thiago Leal. Do outro lado, o goleiro Felipe voltou a ter trabalho, fazendo outra boa defesa num chute forte de André Barreto. O Flamengo ainda teve a chance de garantir a vitória numa bomba de Welington que o goleiro Thiago Leal defendeu. Até que Diego Maurício, de cabeça, após cobrança de escanteio, deu a vitória ao Flamengo, aos 50, quarenta segundos depois do fim do tempo de acréscimo indicado pelo árbitro.

(MACHADO, Vítor. Bonde do Fla continua sem freio. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 11 de mar. p.11)

M 9

No embalo do bonde do Mengão Com golaço de Ronaldinho de falta, Rubro-Negro derrota o Boavista e conquista invicto a Taça GB

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Sem freio, o bonde do Flamengo não saiu dos trilhos. Atropelou todos os seus adversários e assim, invicto, conquistou ontem a Taça Guanabara, ao vencer o Boavista por 1 a 0, no Engenhão, com gol de seu badalado condutor Ronaldinho Gaúcho. Quando Edu Pina derrubou Thiago Neves próximo à área, o camisa 10 assumiu o papel que em outros tempos fora de Zico e Petkovic. Na cobrança de falta aos 26 minutos do segundo tempo, Ronaldinho Gaúcho faz a bola passar por cima da barreira, sem chance para o bom goleiro Thiago. O gol foi uma perfeição que teve, à sua altura, uma alegre coreografia puxada pelo herói e dono da festa Ronaldinho: o “Bonde do Mengão sem freio”, com ele à frente, braços para cima e o inconfundível sorriso. Antes de o bonde passar pelo Engenhão, o Flamengo já dominava o jogo. Vanderlei Luxemburgo levou a campo um meio-campo congestionado. Deixou Ronaldinho Gaúcho no ataque, na intenção de ser abastecido por Bottinelli, Thiago Neves e Renato. Não estava dando certo. O Flamengo dominava, mas o Boavista não vacilava atrás, abdicado do ataque para proteger a defesa. Somente uma vez o goleiro Felipe foi ameaçado: Maldonado escorregou e Leandro Chaves chutou forte, aos 42 minutos. Felipe rebateu. Na volta para o segundo tempo, Vanderlei Luxemburgo atendeu aos apelos da torcida: lançou o elétrico Negueba no lugar de Bottinelli. E, aos 16 minutos, ainda trocaria Egídio – por sinal, muito vaiado – por Diego Maurício. Era hora de acelerar o bonde e fazê-lo descer sem freio rumo ao gol do Boavista. A honraria coube a Ronaldinho Gaúcho e, aos 10 minutos após o gol, quem começou a descarrilar foi o Boavista. Renato voou afoito numa bola e bateu com o joelho no peito de Frontini, que perdeu a cabeça, revidou e foi expulso. Com um homem a menos, a possibilidade de reação transformou-se em desespero no Boavista. Com boa atuação dos seus zagueiros, o Flamengo manteve o controle do bonde e da alegria no Engenhão. Jogo encerrado, um emocionado Ronaldinho Gaúcho, cercado por seguranças em quantidade exagerada, levantou sua primeira taça pelo clube com o qual vive uma paixão. O camisa 10 ainda está devendo em futebol, mas já começou a pagar a conta de sua contratação. É exagero chamá-lo hoje de avião, mas Ronaldinho Gaúcho já é bem mais do que um bonde sem freio.

(MARTINS, Marluci. No embalo do bonde do mengão. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 28 de fev. 2011. p.2)

M 10

Fogão vira pra cima do Fluzão em clássico de muita emoção Alvinegro faz 3 a 2, volta a liderança do Grupo B da Taça GB e deve evitar o Flamengo na semifinal.

Ele não veste camisa 10 nem faz gol, mas foi o nome do jogo. Em um clássico eletrizante marcado pela confusa arbitragem de Gutemberg de Paula e por viradas no placar, pênaltis e expulsões, o Botafogo, com belas atuações de Renato Cajá e Jefferson, venceu o Fluminense por 3 a 2, ontem, no Engenhão, e assumiu a liderança do Grupo B, com 16 pontos, um a mais do que o Tricolor.

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O primeiro tempo começou frio e terminou muito quente. Até os 20 minutos, os times demonstravam disposição, mas pouca inspiração. As emoções começaram aos 23 minutos, quando Renato Cajá cobrou falta com perfeição, no ângulo direito de Diego Cavalieri, e fez 1 a 0. E o jogador com sobrenome de fruta exótica foi o destaque do Botafogo. Aos 25, Loco Abreu rolou e Cajá acertou o travessão. Sem entrar em desespero, o Fluminense se lançou ao ataque. Aos 28, depois de tabelar com Fred, Mariano bateu cruzado e Jefferson salvou com o pé. Dois minutos depois, o empate. Mariano cobrou escanteio, Loco Abreu não acompanhou Rafael Moura que desviou de cabeça e deixou tudo igual. Aos 36, Cajá novamente finalizou com perigo. Aos 41, Valencia, que já tinha cartão amarelo, fez falta em Herrera. Loco Abreu fez pressão no árbitro, foi punido, mas viu sua reclamação surtir efeito: Gutemberg de Paula expulsou o tricolor, para desespero de Fred, que reclamou da pressão do atacante uruguaio. Aos 43, novamente Cajá arriscou de longe e acertou o travessão. A bola quicou, dando a impressão de que entrara. E tinha mais. Aos 44, Souza cobrou falta de longe, Fred fez o corta-luz na frente de Jefferson, que não teve como segurar. Rafael Moura empurrou para decretar a virada: 2 a 1. Já nos acréscimos, Marcelo Mattos fez falta em Conca e, mesmo sem ter amarelo, foi expulso, num gesto que pareceu compensação do árbitro. No segundo tempo, mais polêmica. Aos 6, o juiz marcou pênalti de Rafael Moura em Loco Abreu. O atacante cobrou com cavadinha, fraco, no meio do gol e Cavalieri pegou. Aos 9, Gutemberg enxergou empurrão de Edinho em Bruno Tiago dentro da área e marcou pênalti questionável. Loco pegou a bola e deu nova cavadinha, dessa vez com sucesso: 2 a 2. E o alvinegro virou. Renato Cajá deu excelente passe para Herrera fazer 3 a 2. Na sequência, Jefferson garantiu a vitória com grandes defesas e a torcida vibrou com grandes defesas e a torcida vibrou ao ritmo do “Créu”.

(JUNIOR, Janir. Fogão vira pra cima do Fluzão em clássico de muita emoção. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 7 de fev. 2011. p. 2)

M 11

Vascão dá o primeiro passo para afastar a crise Na estreia do técnico Ricardo Gomes, time finalmente vence um jogo no Carioca: 3 a 0 sobre o Americano.

A chegada de Ricardo Gomes parece ter levado bons ventos a São Januário. Na estreia do treinador, a caravela vascaína conseguiu, enfim, navegar em mares mais calmos até a primeira vitória no Cariocão. Comandado por Jeferson, o Gigante da Colina derrotou o fraco Americano por 3 a 0, com direito a pênalti defendido por Fernando Prass, novo capitão da tripulação vascaína, que deixou a zona de rebaixamento. Logo nos primeiros minutos, ficou claro que os vascaínos envolviam facilmente o time de Campos. Tanto que, aos 3 minutos, já veio a primeira chance. Eder Luís recebeu bom passe de Caíque, mas, na cara do gol, chutou em cima do goleiro Jeferson.

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Xará do camisa 1 rival, o meia vascaíno Jeferson organizava as jogadas de ataque do time. Fagner chegava com facilidade no apoio e quase marcou em duas oportunidades. A primeira em cobrança de falta, que o goleiro desviou para escanteio, e depois aos 33, quando Eder Luis rolou para trás, e o lateral chutou rente à trave. Dois minutos depois, pelo lado oposto, Ramon conseguiu se livrar do marcador e cruzar a medida para Marcel, livre na área, cabecear e abrir o placar para o Cruzmaltino. Na volta para o segundo tempo, Ricardo Gomes colocou Felipe no lugar de Caíque, e o Vasco continuou dominando a partida, com ainda mais chances de gol. Aos 8, Jeferson cobrou escanteio, e Dedé subiu mais do que a zaga do Americano para testar firme e ampliar: 2 a 0. O ritmo do time vascaíno não caiu. Aos 15, Jeferson, sempre buscando jogo deixou Felipe na cara do gol, mas, depois de limpar o zagueiro, o camisa 6 acertou o pé da trave. Após a jogada, o meia falou palavrões para si mesmo e olhou para o céu, incrédulo. A única ameaça do Americano aconteceu aos 25, quando o juiz marcou pênalti duvidoso de Eduardo Costa em Diego. Felipe cobrou no meio do gol, e Fernando Prass defendeu com os pés. A premiação pela boa atuação de Jeferson veio aos 34 minutos. Ele chutou cruzado, enquanto seu xará do Americano apenas olhou a bola balançar a rede: 3 a 0, e o primeiro passo para fugir da crise.

(FALCÃO, Fábio. Vascão dá o primeiro passo para afastar a crise. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 7 de fev. 2011. p. 10)

M 12

Com a marca de Ronaldinho Gaúcho Craque marca de pênalti na vitória sobre o Boavista por 3 a 2, que garantiu o primeiro lugar do Grupo A. Mas o salvador foi Negueba.

Ronaldinho Gaúcho seguiu direitinho o roteiro para um final feliz em seu segundo jogo pelo Flamengo. Pela primeira vez, marcou um gol com a camisa rubro- negra, deu socos no ar e uma sambadinha. Mas foi Negueba quem roubou a festa. O jovem fez o terceiro gol da vitória de 3 a 2 sobre o Boavista, no Moacyrzão, garantindo ao Flamengo o primeiro lugar do Grupo A e a classificação à semifinal da Taça GB. Muito marcado, Ronaldinho fez as pazes com as redes numa cobrança de pênalti aos 23 minutos. Tudo começou num lançamento perfeito de Thiago Neves para Deivid que, bem colocado, foi derrubado pelo goleiro Thiago. Até o fim do primeiro tempo, o Flamengo esteve tímido, mas dominou o jogo, sem correr riscos. O início do segundo parecia arrasador. Logo aos 4 minutos, Léo Moura fez bela jogada pela direita: passou pelo marcador e caprichou no cruzamento da linha de fundo. Na pequena área, Deivid completou de cabeça, aumentando a vantagem rubro-negra. Se o ataque funcionava, a defesa passou a mostrar sua fragilidade. E Frontini roubaria por alguns minutos a festa preparada para Ronaldinho, ao marcar dois gols, equilibrando a partida. Aos 6 minutos, Joílson cruzou da direita, André Luís desviou e Frontini, de primeira diminuiu a vantagem.

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O gol de empate do Boavista nasceu de uma falha grosseira de Welinton. O zagueiro errou passe para Jean, dando a bola de presente para Frontini, aos 33 minutos. Da intermediária, o atacante do Boavista marcou o seu sexto gol na Taça Guanabara. O empate revelava a incompetência da defesa rubro-negra, mas o ataque do Boavista se acomodou. O Flamengo, ao contrário, correu atrás do prejuízo e chegou à vitória graças a Negueba, que entrara em campo aos 32 minutos, no lugar de Deivid. Ronaldinho Gaúcho deu passe pela esquerda para Willians, que passou por Joílson e fez ótimo cruzamento para Negueba completar com personalidade, aos 38 minutos. O Boavista ainda teria uma última chance: Tony acertou o travessão ao cobrar falta aos 47 minutos. Susto merecido para um Flamengo de muita festa, mas sem nenhum talento na retaguarda.

(MARTINS, Marluci. Com a marca de Ronaldinho Gaúcho. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 7 de fev. 2011. p. 14)

M 13

Mengão 100% Uma festa de Ronaldinho e Wanderley Na estreia do craque, Rubro-Negro joga mal, mas atacante reserva entra e faz o gol da vitória por 1 a 0

Ronaldinho Gaúcho entrou em campo saltitante. Logo que viu o mosaico com a inscrição “Bem-vindo R10” agradeceu e bateu continência para os 42.108 torcedores presentes no Engenhão. O sorriso com os dentões expostos logo apareceu. Depois, ele recebeu a faixa de capitão das mãos de Léo Moura, seu antigo dono. Ronaldinho rezou, a bola rolou, mas quem colocou a cereja do bolo da festa do camisa 10 foi Wanderley, que entrou depois do intervalo e garantiu, aos 40 minutos do segundo tempo, a vitória do Flamengo sobre o Nova Iguaçu por 1 a 0, mantendo os 100% de aproveitamento. A festa para Ronaldinho e o Engenhão lotado não intimidaram o Nova Iguaçu, que logo assustou numa cabeçada de Maycon. Aos 2 minutos, Ronaldinho tocou na bola pela primeira vez, causou alvoroço na torcida, mas o passe saiu errado. Aos 9 minutos, num contra-ataque, o Nova Iguaçu chegou com três jogadores contra um rubro-negro. Depois da bola rolada, Alex Faria perdeu um gol incrível, na pequena área. O Flamengo ainda buscava a melhor forma de jogar com Ronaldinho. Pela esquerda, Renato demonstrava cansaço e precisava da cobertura de Willians. O Nova Iguaçu esbanjava fôlego e entrosamento. Em boa jogada aos 19 minutos, Léo Moura rolou para Vander bater fraco. Dois minutos depois, Ronaldinho Gaúcho tocou de calcanhar para Deivid, que devolveu. O camisa 10 rolou para Renato finalizar torto. O jogo seguiu equilibrado. Ronaldinho cobrou falta e obrigou o goleiro Diogo a fazer bela defesa. Aos 40, Leonardo quase faz contra. Ronaldinho voltou para o segundo tempo e logo deu bom passe para Deivid, que não chegou a tempo. O jogo ficou sem grandes emoções, e foi preciso o camisa 10, com gritos e gestos, para pedir para a torcida cantar. Com o apoio da arquibancada, o time acordou e teve outra boa chance com Léo Moura.

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Aos 40, Egídio rolou para Thiago Neves, que chutou. O goleiro soltou, e Wanderley, que substituíra Deivid, empurrou para garantir a festa. No fim, sozinho no gramado, Ronaldinho foi ovacionado pela torcida, se curvou para agradecer e parecia não acreditar no que estava vendo. Foi apenas o primeiro capítulo.

(NÚCLEO DE FUTEBOL. Mengão 100%. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 14 de fev. 2011. p. 3)

M 14

He-Man deixa, teoricamente, o caminho mais fácil para o Flu. Rafael Moura decide jogo com o Madureira e Tricolor, beneficiado por empate do Bota, pega Boavista. As estrelas do Fluminense são muitas: Fred, Conca, Araújo, Emerson, Deco...Mas quem tem feito a alegria dos tricolores é Rafael Moura, o He-Man. Mais uma vez, foi ele quem salvou o Fluminense, ao marcar o gol da vitória por 1 a 0 sobre o Madureira, ontem, no Estádio Raulino de Oliveira, em Volta Redonda. Com isso, o tricolor recuperou o primeiro lugar no Grupo B e, beneficiado pelo tropeço do Botafogo diante do Macaé, enfrentará o Boavista – e não o Flamengo – sábado, na primeira semifinal da Taça GB. O Fluminense começou o jogo como nas últimas partidas. Só que, desta vez, a falta de boas jogadas pode ser creditada ao desentrosamento do time misto armado por , que agradou à torcida que pedia a entrada de Ricardo Berna no gol e Digão na zaga. Foram poucos lances de perigo. Um cruzamento de Souza que quase surpreendeu o goleiro Cléber aqui, uma tabela com toques de efeito entre Mariano e Rafael Moura ali... Mas nada que levantasse o ânimo dos torcedores. Os gritos só vieram mesmo quando o placar eletrônico mostrou o gol do Macaé sobre o Botafogo, no Engenhão. Empolgados, os jogadores do Fluminense tentaram abrir o placar e criaram duas boas chances que esbarraram no goleiro Cléber. Uma com Conca, após driblar três marcadores, e outra em cabeçada de Digão. No segundo tempo, o Fluminense voltou mais ligado, mas a bola insistia em não entrar. O primeiro grande lance foi um chute de Souza. Cléber salvou. Em seguida, o goleiro do Madureira fez um novo milagre após cabeçada de Gum. A pressão continuou, mas desta vez quem salvou foi o travessão, após cabeçada de Rafael Moura. Mas, assim como nos últimos jogos, o He-Man estava disposto a mostrar sua força e salvar o Flu. Em novo cruzamento de Conca, Rafael Moura desviou e fez seu quinto gol em três jogos neste retorno ao Tricolor. O gol alertou o Madureira, que criou duas boas chances. Em uma, Ricardo Berna fez grande defesa. Na outra, o Fluminense foi salvo pelo travessão e, agora, vai ter a semana para se preparar com afinco para a semifinal da Taça Guanabara.

(NÚCLEO DE FUTEBOL. He-Man deixa, teoricamente, o caminho mais fácil para o Flu. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 14 de fev. 2011. p. 8)

M 15

Fogão dá mole e perde liderança dentro de casa

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Alvinegro fica no empate em 1 a 1 com o Macaé e, como castigo, vai ter que encarar Ronaldinho Gaúcho na semifinal. O Botafogo terá pela frente, no próximo domingo, nas semifinais da Taça Guanabara, o Flamengo de Ronaldinho Gaúcho. O alvinegro perdeu a liderança do Grupo B ao sair ontem do Engenhão apenas com um empate em 1 a 1 diante do Macaé. Robson abriu o placar para o time do Norte Fluminense e Renato Cajá deixou tudo igual. Com o resultado, a equipe do técnico Joel Santana somou 17 pontos, ficando em segundo lugar na chave, atrás do Fluminense. O jogo começou lento, com poucas chances de gol, até que o Botafogo passou a pressionar. Aos 13 minutos, Alex – escalado na vaga do uruguaio Loco Abreu – recebeu de Renato Cajá, girou na frente do zagueiro e quase acertou o ângulo. Outra boa chance veio aos 18, quando Bruno Tiago recebeu de Renato Cajá e rolou para Alessandro. O lateral dividiu com e a torcida pediu pênalti no lance, mas o juiz mandou seguir. Um minuto depois, Márcio Azevedo lançou Antônio Carlos, que chutou para boa defesa de Lugão. O Macaé voltou melhor após a parada técnica. Mas o Botafogo ainda assustou com Alex, que bateu para outra defesa de Lugão. O Macaé abriu o placar aos 38: Luis Mário passou por Márcio Rozário e cruzou para Robson, que se antecipou a João Filipe e tocou para o gol. O Botafogo saiu do campo no intervalo sob vaias da torcida e Joel mexeu no time, abrindo mão do zagueiro Márcio Rozário para a entrada de Caio. Logo no início do segundo tempo, Alessandro sofreu falta. Coube a Renato Cajá fazer uma bela cobrança e deixar tudo igual, aos três minutos. O Alvinegro voltou a ter outra boa chance aos 10, quando Alessandro cruzou para Herrera cabecear com perigo. Cajá também fez boa jogada aos 19, mas parou na defesa de Lugão. Joel mexeu no time novamente: primeiro, tirou Arévalo para a entrada de Everton e, depois colocou Lucas no lugar de Alessandro. O Alvinegro não conseguia o gol da virada. Alex teve a chance, aos 40, mas pegou mal na bola de frente para o gol. Já no fim, Renato Cajá fez outra boa jogada, mas mandou à direita de Lugão. E o Alvinegro novamente sofreu com as vaias no fim do jogo.

(GOMES, Ana Carla. Fogão dá mole e perde a liderança dentro de casa. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 14 de fev.2011. p. 14)

M 16

Vitória libera o bonde para curtir a folia Com dificuldades, Mengão derrota o Olaria por 3 a 2, em Volta Redonda, e agora vai se esbaldar no Carnaval. O Carnaval do Flamengo começou com alegria. Ronaldinho e Thiago Neves fizeram os gols da vitória sobre o Olaria por 3 a 2, ontem, em Volta Redonda. O resultado abre alas para o Bonde do Mengão sem freio brigar pelo título da Taça Rio e, consequentemente, do Estadual. Quinta-feira, na ressaca da folia, o time enfrenta o Bangu. Antes, porém, a escola rubro-negra cai no samba. E que ninguém leve a mal. Afinal, hoje é Carnaval. Liberados, os jogadores do Flamengo vão curtir a festa mais popular do Rio, tanto na Avenida como no “Samba, Amor e Paixão”, fundado por Ronaldinho. O show

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de samba, anunciado pela letra do bloco, está garantido. Mas o de bola, também citado na música, quase desafinou. Aos 2 minutos, Ronaldinho fez um carnaval, deu caneta e Botinelli bateu para fora. Três minutos depois, porém, Felipe falhou em chute de Renam Silva e soltou a bola nos pés de Danilo, que abriu o placar. Para o samba não atravessar, Ronaldinho passou a ditar o ritmo da equipe. O camisa 10 trouxe um pouco de fantasia ao jogo aos 14, quando tentou marcar de bicicleta. O Flamengo só igualou o placar aos 46: Botinelli chutou mal, mas Thiago Neves, bem posicionado, completou para o gol: 1 a 1. Thiago Neves e Ronaldinho começaram o segundo tempo com nota 10 no quesito harmonia. O capitão recebeu do camisa 7 na cara do gol e fez 2 a 1, com categoria. Vanderlei Luxemburgo mexeu na ala dos estrangeiros e trocou Botinelli por Fierro. Aos 25 minutos, o chileno recebeu bom passe de Leonardo Moura e seu cruzamento encontrou Thiago Neves, que marcou por cobertura. A expulsão de David fez com que Luxemburgo colocasse Negueba na vaga de Renato e Jean no lugar de Thiago Neves. Com disposição, Negueba chamou a marcação para dançar e levantou a plateia. O Olaria diminuiu aos 41, com Rafael de cabeça, mas a décima vitória no ano em 11 jogos do invicto Flamengo estava garantida. Pelo menos até quinta-feira, como diz a letra do bloco de Ronaldinho, o “rubro-negro pode se orgulhar, só tem motivos para comemorar”.

(NÚCLEO DE FUTEBOL. Vitória libera o bonde pra curtir a folia. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 6 de mar. 2011. p.2)

M 17

Não é mais 100% Só Jefferson se salva no empate alvinegro Goleiro faz milagres e defende até pênalti, mas Botafogo joga mal, fica no 1 a 1 com o Bangu e pode perder hoje a primeira posição no Grupo B. Jefferson é um goleiraço, o camisa 1 que todo time queria ter, mas não pode salvar sempre o Botafogo. Essa foi a lição de ontem do empate do Alvinegro com o Bangu por 1 a 0, ontem no Estádio da Cidadania. Graças ao goleiro, que defendeu um pênalti, o time de Joel Santana não saiu derrotado às vésperas do clássico contra o Fluminense, no domingo, no Engenhão. Se vencer o Duque de Caxias hoje, o tricolor vai tirar a liderança do Glorioso, que ficou com 13 pontos no Grupo B. O início do primeiro tempo já mostrava as dificuldades que o Botafogo teria. Logo aos 3 minutos, Pipico recebeu bola rasteira dentro da área, mas se enrolou e não concluiu para o gol vazio. A resposta alvinegra só vinha com uma ou outra arrancada do empolgado estreante Márcio Azevedo. Era pouco. Aos 16 e aos 20 minutos, Leandro Costa, Thiago Galhardo e China tentaram balançar a rede de Jefferson. E foi justamente no momento em que o Botafogo passava sufoco que uma mãozinha, literalmente, ajudou o time. Logo após o tempo técnico, Loco Abreu e Diego Padilha se empurraram no cruzamento de Márcio Azevedo, e o zagueiro colocou a mão na bola. Pênalti, mais uma vez, bem convertido pelo uruguaio:

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1 a 0 para o Botafogo, o quinto gol do camisa 13. Ainda antes do intervalo, o meia Ricardinho por muito pouco não empatou a partida. Joel ainda lançou Caio, Everton (outro estreante, assim como Arévalo e Márcio Azevedo) e o jovem Alecsander, mas o Bangu continuou mandando no jogo. Aos 17, Fahel derrubou Fabiano Silva na área. Na cobrança, só para variar, Jefferson defendeu o chute de Pipico. Quando parecia que a bola não entraria no gol alvinegro, Pipico chutou, Jefferson defendeu, e Abílio marcou na sobra. O Botafogo não mostrou forças para buscar a vitória, que ficou sempre mais próxima dos banguenses. No fim, Everton até fez uma boa jogada, quando tentou cruzar e quase marcou. Mas foi pouco para o atual campeão carioca, que, dessa vez, jogou mal e não conseguiu vencer. Hora de Joel trabalhar mais. E Jefferson menos.

(NAPOLITANO, Ricardo. Mesmo sem nota máxima, Fogão soma os três pontos.Rio de janeiro, 6 de mar. 2011. 10)

M 18 Valeu pelos três pontos Fluzão passa sufoco, mas vence na estreia. O Fluminense passou sufoco, mas conseguiu estrear ontem com vitória na Taça Rio, derrotando o Resende por 2 a 1, gols de Araújo e Leandro Euzébio, em São Januário. Kim descontou. Na quarta-feira, o Tricolor vai encarar o América, no Engenhão. Jogando pela primeira vez com o escudo de campeão brasileiro no uniforme, o Fluminense começou a partida com um time misto. E logo atacou: aos três minutos, Souza cruzou da direita para a pequena área e pegou de voleio, obrigando o goleiro Eduardo a fazer boa defesa no lance. O Tricolor seguiu dominando a partida e Eduardo fez outra bela defesa aos 11, dessa vez numa cabeçada de Araújo. Um minuto depois, Souza teve grande chance de abrir o placar, ao receber passe de Fernando Bob, na cara do gol, mas mandou para fora. Outra grande oportunidade apareceu aos 20, quando Rafael Moura acertou a trave, após cruzamento de Marquinho. O Resende só foi assustar aos 33 minutos, num chute de Léo, que parou em boa defesa de Ricardo Berna. Antes de o Fluminense abrir o placar, os dois times perderam gols incríveis. Primeiro, aos 38, Rafael Moura recebeu de Souza, dominou na área e mandou para fora. Logo depois, foi a vez de Alexandro desperdiçar grande chance ao ficar na cara do gol após um bate-rebate na área. Mas o gol do Tricolor saiu ainda no primeiro tempo: aos 40, Mariano avançou pela direita e cruzou para Araújo completar para as redes. Antes do intervalo, o Fluminense ficou com um jogador a menos, já que Fernando bob levou o segundo cartão amarelo e foi expulso, numa decisão polêmica do árbitro Rodrigo Nunes Sá. Com uma alteração no time – Fábio no lugar de Rogério – o Resende arrancou o empate logo no início do segundo tempo: aos dois minutos, a zaga tricolor não conseguiu afastar o perigo e a bola sobrou par Kim deixar tudo igual. O técnico Muricy Ramalho não demorou para mexer no time, tirando Souza e Rafael Moura para a entrada de Emerson – que não jogava desde dezembro – e de

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Diogo, respectivamente. E o Fluminense marcou o segundo logo aos sete minutos, depois que Marquinho cruzou e Leandro Euzébio completou de cabeça. O Resende quase empatou aos 26: Elias soltou uma bomba de longe, Ricardo Berna espalmou e a bola acertou a trave. Fábio pegou o rebote e bateu par outra defesa de Berna. No fim do jogo, o Fluminense passou a levar um enorme sufoco: aos 38 minutos, o Resende perdeu outra grande chance, com Fábio chutando para fora com o gol vazio.

(NÚCLEO DE FUTEBOL. Valeu pelos três pontos. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 6 de mar. 2011. p.3)

M 19

Vascão vence e faz as pazes com a torcida. Com o apoio maciço das arquibancadas, time ganha a primeira na Taça Rio: 4 a 2 sobre o Duque de Caxias. O Vasco deixou para trás a derrota para o Macaé e conquistou ontem a sua primeira vitória na Taça Rio, derrotando o Duque de Caxias por 4 a 2 em São Januário. Felipe, Anderson Martins, Bernardo e Dedé marcaram os gols do Clube da Colina, que abriu 3 a 0 no primeiro tempo e quase se complicou na segunda etapa, quando ficou com um homem a menos e viu Somália e Ari descontarem para o time da Baixada. O Vasco volta a jogar no domingo, contra o Madureira, em Volta Redonda. Precisando da vitória, o Vasco entrou em campo com mudanças: Eduardo Costa no lugar de Felipe Bastos, Bernardo na posição de Jeferson e Elton na vaga de Marcel. Márcio também entrou no time, substituindo, que havia sido expulso contra o Macaé. Modificado, o Vasco dominou o primeiro tempo: logo aos nove minutos, Felipe dividiu a bola na área e chutou de direita para abrir o placar. Debaixo de muita chuva, Elton teve a chance de ampliar aos 18, mas a zaga do Duque de Caxias apareceu para fazer o desvio e mandar para fora. Do outro lado, Fernando Prass só teve trabalho aos 30, quando Geovane Maranhão recebeu na entrada da área e chutou para boa defesa do goleiro. Mas foi só um susto. Aos 36, Anderson Martins aproveitou cruzamento na área de Bernardo para fazer o segundo gol em São Januário. Antes mesmo do intervalo, o Vasco ampliou, depois que o goleiro Fernando fez pênalti em Bernardo. O próprio apoiador cobrou e aumentou a vantagem para 3 a 0. O Vasco voltou para o segundo tempo com Caíque no lugar de Bernardo, que não se sentia bem. E o Duque de Caxias descontou aos cinco minutos: após cobrança de falta, Somália aproveitou o desvio e completou de cabeça para o gol. A torcida vascaína ficou ainda mais apreensiva quando Anderson Martins recebeu o segundo cartão amarelo e foi expulso, aos 22. O técnico Ricardo Gomes promoveu a estreia de Leandro, no lugar de Eder Luis, e ainda colocou Cesinha na vaga de Elton. A situação se complicou quando o Caxias marcou o segundo gol, aos 28: Ari recebeu belo passe de Gilcimar e tocou no canto de Fernando Prass. Mas Dedé, numa cobrança de falta, fez o quarto gol do Vasco, aos 33, decretando a vitória e o alívio em São Januário.

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(NÚCLEO DE FUTEBOL. Vascão vence e faz as pazes com a torcida. Jornal Marca.10 de mar. 2011. p.8)

M 20

Fogão vence por 1 a 0, mas torcida chia Vitória sobre o Nova Iguaçu, com o primeiro gol de Everton pelo Glorioso, não entusiasma alvinegros

Em ritmo de ressaca do Carnaval, o Botafogo mais uma vez venceu, mas não convenceu: 1 a 0 sobre o Nova Iguaçu, em Volta Redonda, com gol de Everton, novo camisa 10 do time depois da saída de Renato Cajá. A trégua entre Joel Santana e a torcida acabou e ele voltou a ser vaiado. Quando o juiz deu o apito inicial, parecia que o Alvinegro estava com um espírito diferente, mais contundente em razão do retorno de Loco Abreu, que ficou dois jogos afastado por lesão. Logo aos 8 minutos, o uruguaio marcou presença na área, desviou de cabeça e Herrera perdeu um gol incrível. No lance seguinte, o Botafogo conseguiu abrir o placar. Lucas escapou pela direita, cruzou mal, mas o zagueiro Leonardo rebateu a bola para a entrada da área e Everton chutou firme para marcar seu primeiro gol desde que vestiu a camisa alvinegra. O ímpeto ofensivo do time de Joel acabou por aí. O Nova Iguaçu começou a controlar o jogo e aos 14 deu o primeiro susto: Dieguinho chutou forte para defesa de Jefferson. Depois dessa jogada, a partida se tornou monótona: um tranco de Herrera derrubando o bandeirinha acabou sendo o lance que mais chamou a atenção até o fim da primeira etapa. O segundo tempo começou mais movimentado. Logo aos 20 segundos, o Nova Iguaçu quase empatou com Maycon, que recebeu cruzamento rasteiro e chutou por cima. Aos 5, Everton quase marcou seu segundo gol após jogada semelhante à do primeiro, mas bateu para fora. A partir daí, só deu a Laranja da Baixada, sempre pela esquerda com Bruno Côrtes. Aos 12, veio a melhor chance do empate: o lateral cruzou para Maycon, que, na pequena área, desviou no travessão. Vaiado pelos torcedores, Joel colocou Caio, Alessandro e Guilherme, mas não deu certo. Bruno Tiago sentiu a coxa e deixou o Alvinegro com um a menos, mas logo depois o zagueiro Alex foi expulso e as duas equipes ficaram com 10. Aos 34, o Nova Iguaçu teve outra chance, mas graças a linda defesa de Jefferson, após chute de Dieguinho, o Botafogo saiu com os três pontos.

(VIEIRA, Márcia. Fogão vence, mas torcida chia. Jornal Marca. Rio de Janeiro, 10 de mar. 2011. p. 12)

Relatos do Jornal Lance! L1 Sabedoria de judô Japão usa tática das artes marciais para derrotar a Dinamarca e avançar às oitavas

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Com dois wazari em menos de meia hora, o Japão praticamente liquidou a Dinamarca ainda no primeiro tempo. No fim, 3 a 1. O time escandinavo precisava da vitória. E pisou o tatame do Royal Bafoteng indo para o ataque, para anular a vantagem do adversário que jogava pelo empate. Mas as conclusões foram ruins. Logo, bastaram 17 minutos para o Japão pôr em prática o princípio da máxima eficiência com o mínimo esforço. Honda cobrou falta no canto direito, e a Jabulani fez uma curva interessante, um autêntico golpe para Sorensen. A Dinamarca sentiu. E passou a deixar evidente, apesar da cor do seu uniforme, que jamais chegaria à faixa vermelha. Errava passes em sequência e abria espaços. Aos 30, Endo também surpreendeu o goleiro, em outra infração, dessa vez, no lado esquerdo. A luta pareceu irremediavelmente perdida para os dinamarqueses. Pois é. No judô seria assim... Mas os escandinavos tentaram reagir, trocando defensores por atacantes, esforçando-se para superar suas muitas limitações. Sem qualquer imaginação, jogavam bolas na área japonesa que não davam em nada. Aos 36 do segundo tempo, enfim, Hasebe empurrou Agger. Tomasson cobrou o pênalti. Kawashima defendeu, mas o dinamarquês apanhou a sobra e diminuiu. Sem opção, o time de Morten Olsen tentou seguir no ataque, deixando a retaguarda desguarnecida. O ippon veio aos 42. Honda deu um belo drible no zagueiro e rolou para Okazaki bater livre: 3 a1. O Japão mostrou que não é só aplicação tática. Sobrou jogo de cintura, talvez a influência direta de mais de 20 anos de técnicos e jogadores brasileiros no País do Sol Nascente. Que venha o Paraguai!

(ASSAF, Roberto. Sabedoria de judô. Jornal Lance! Rio de Janeiro, 25 de jun. 2010, p.24)

L2 Passeio Atacantes mostram eficiência na estréia alemã. Podolski inicia o show, Klose chega ao gol 11 em copas, Cacau entra e deixa o dele.

A Alemanha precisou apenas repetir o futebol pragmático e de algum talento que pratica faz décadas para derrotar uma Austrália paupérrima sob o aspecto técnico por 4 a 0 na estréia das duas seleções na Copa. Na realidade, com um pouco mais de capricho nos passes e nas conclusões o resultado poderia ser bem maior. A Austrália só assustou no começo, quando Garcia teve a chance de abrir o placar – Lahm evitou o gol. Mas logo a Alemanha passou a se impor, trocando passes com objetividade, e fez 1 a 0 aos oito minutos, num chute forte de Podolski. Daí em diante, ao seu melhor estilo, com ótima movimentação, o time dirigido por Joachim Löw pôs os australianos na roda e passou a criar um punhado de oportunidades. Aos 26, Klose ampliou, de cabeça, após cruzamento de Lahm. No intervalo, o técnico holandês da seleção da Oceania, Pim Verbeek, trocou Grella por Holman, e a equipe saiu em busca de reação. Inútil. A Alemanha neutralizou a tentativa sem trabalho, diante da falta de imaginação do adversário, e tratou de ir marcando gols, principalmente depois que Cahill atingiu as canelas de Schweinsteiger e

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ganhou o cartão vermelho. Aos 22, Muller apanhou a bola na área, limpou e bateu no canto direito: 3 a 0. Aos 24, o brasileiro Cacau - que havia acabado de substituir Klose - recebeu de Özil e meteu 4 a 0. Ficou por aí. Embora tenha demonstrado capacidade, a Alemanha não chegou a ser testada de fato. Os “socceroos”, francamente, são bem fraquinhos.

(ASSAF, Roberto. Passeio. Jornal Lance! Rio de Janeiro, 14 de jun. 2010, p.20)

L 3

Passaram os dois Chile perde para a Espanha, termina em segundo e será o rival do Brasil. Time de Bielsa foi ousado, mas apresentou erros fatais. O Chile foi derrotado por 2 a 1 pela Espanha. Perdeu a liderança do Grupo H para o rival, mas foi beneficiado pelo empate da Suíça em Honduras. Avançou em segundo lugar e será o rival da Seleção Brasileira nas oitavas de final da Copa do Mundo. Resta saber qual a estratégia que os Locos de Bielsa terão contra os brasileiros. Afinal, eles são capazes de tudo. Nas duas primeiras rodadas se lançaram ao ataque e venceram sem discussão Honduras e Suíça. Ontem, encarando uma Espanha, que pela primeira vez teve seus quatro ases desde o início (Xavi, Iniesta, Villa e Torres), trataram de sufocar o rival, mesmo só precisando do empate para avançar sem tomar conhecimento do jogo suíço. Mas apesar de toda sua estratégia ousada – desta vez cinco jogadores focados no ataque –, o Chile mostrou deficiências que foram fatais e que devem ser bem observadas por Dunga e pela comissão da Seleção. Uma delas: a marcação é muito viril e isso ocasiona um caminhão de cartões. Tanto que o time tinha oito pendurados ontem. E antes dos vinte minutos, Medel, Ponce e Estrada estavam amarelados. Aliás, o Chile foi a única seleção que fez 20 ou mais faltas em todos os seus jogos. Mais: o frenético toque de bola gera erros de passes que geram contra-ataques. Foi assim aos 24. Valdívia errou, a Fúria ligou o contra-ataque para Fernando Torres pela esquerda, com apenas um na marcação. Isso fez o goleiro Bravo sair atabalhoadamente para a dividida que sobrou para Villa chutar da intermediária, de primeira, num lance de beleza e precisão. Atrás pela primeira vez nesta Copa, o Chile se desnorteou. E os erros de passe aumentaram. Num deles, Iniesta recuperou a bola e depois concluiu para o gol. 2 a 0. A partir daí, a Espanha administrou. Até porque o Chile teve um expulso (Estrada) no lance do gol e precisou se resguardar lá atrás. Na etapa final, o time de Bielsa voltou mais cauteloso. Chegou a diminuir com Millar. Mas quem sempre esteve perto de fazer gols foi a Espanha, quase sempre após erros de passe do Chile. Nos quinze minutos finais não teve jogo. O Chile ficou bem fechadinho (estaria se preparando para jogar assim contra o Brasil?) e a Espanha foi tocando bola. Agora, a Fúria pega a Portugal. Jogão! O Chile encara o Brasil sem dois de seus zagueiros titulares Medel e Ponce. E aí, Bielsa, vai se lançar ao ataque contra a Seleção? Olha bem o que a Espanha fez.

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(VIEIRA, Carlos Alberto. Passaram os dois. Jornal Lance! Rio de Janeiro, 26 de jun. 2010, p.20)

L 4

Uma Zebra justa! Em uma partida de ataque contra a defesa, melhor para a Suíça, que joga com o time todo atrás e surpreende a seleção da Espanha. A Espanha fez o seu habitual em Copa do Mundo: jogou de vermelho e amarelou. A Suíça também cumpriu o de sempre: pôs 11 homens da intermediária para trás e apostou em dois ou três contra-ataques para surpreender o adversário. Um deles foi fatal. Aos sete minutos do segundo tempo. Derdiyok dividiu com o Casillas e a bola sobrou para Fernandes marcar o gol da vitória: 1 a 0. A Suíça, ao melhor estilo Ottmar Hitzfield, praticou o antifutebol. A Espanha dominou a partida inteira. Trocou uma infinidade de passes. Foi um autêntico jogo de ataque contra defesa. Mas o time dirigido por Vicente Del Bosque, na realidade, criou poucas oportunidades daquelas de se lamentar. Na etapa inicial, aos 23, Piqué chutou e Benaglio agarrou. Virou 0 a 0. E a Espanha tomou o gol. O treinador da Fúria tentou mudanças. Lançou Fernando Torres e Jesus Navas. Depois Pedro. A ideia era tornar o time ainda mais ofensivo. Nenhum deles fez milagre. Aos 24, Xabi Alonso acertou o travessão. Aos 35, Navas bateu forte de fora da área, e como diziam os antigos, a bola passou raspando à trave direita. Mas, na realidade, quem teve melhor chance foi a Suíça. Num outro raro contra- ataque, Derdiyok entrou trombando e chutou sutilmente na trave direita de Casillas. E tudo continuou como antes. A Espanha trocando passes, jogando a bola na área, e os zagueiros adversários rebatendo para todos os lados. O árbitro inglês Howard Webb, quem sabe disposto a confrontar a zebra, deu cinco minutos de acréscimo. A Espanha esqueceu qualquer preocupação com o estilo e a técnica e foi inteirinha para dentro. Hakan Yakin meteu a mão na bola pertinho da área. Xabi Alonso chutou em cima da zaga. Cinquenta minutos. Escanteio. A muralha afasta. Fim de papo. A Espanha não soube, em nenhum momento, superar a retranca. Logo, apesar do antifutebol, uma zebra justa.

(ASSAF, Roberto. Uma Zebra justa!. Jornal Lance! Rio de Janeiro, 23 de jun. 2010, p.15)

L 5

Arrancada laranja No colorido Estádio Soccer City, Holanda ignora blefe de técnico dinamarquês, vence com autoridade e prova seu favoritismo Até mesmo o Soccer city pareceu torcer para a Holanda em sua estreia na Copa da África. Pintados de laranja, os assentos do maior estádio do Mundial se confundiam com os inúmeros torcedores de uma das seleções favoritas ao título. Uma coincidência, claro. Mas a Laranja Mecânica jogou o suficiente para derrubar sem dificuldades a Dinamarca por 2 a 0 e o tolo blefe de seu técnico.

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Sim, pois de nada adiantou ao dinamarquês Morten Olsen descartar o atacante Bendtner na véspera do jogo por suposta lesão e escalá-lo como surpresa. Olsen deve ter ficado laranja de vergonha do mesmo modo que esteve seu lateral-esquerdo, Simon Poulsen: ele cabeceou a bola que bateu nas costas do companheiro Agger no gol contra que deixou a Holanda em vantagem logo no primeiro minuto do segundo tempo (a FIFA deu o gol contra para Agger). Até então, o jogo era dominado pela Holanda, mas sem chances reais. O bonito toque de bola estava lá, de um lado para o outro com Sneijder regendo a orquestra . Craques do passado, Zidane, Platini e Cruyff, símbolo do Carrossel de 74, assistiam dos camarotes à partida. Talvez soubessem que faltava ainda mais ousadia para furar uma Dinamarca tão retrancada e pobre. De tão acuada, contava com apenas boas tabelas de Rommedahl e Bendtner na frente. Muito pouco diante se uma seleção holandesa que estava invicta há 19 partidas consecutivas. O gol contra tornou o jogo mais atrativo para os holandeses que coloriam o Soccer city. A Laranja Mecânica de Bert Van Marwijik resolveu atacar sem parar. A entrada do ligeiro Elia pelo lado esquerdo na vaga de Van der Vaart, conseguiu levantar várias bandeiras holandesas no estádio e tornar rostos laranjas de felicidade. Numa das escapadas do atacante pela esquerda, ele bateu na saída do goleiro. Após o rebote da trave, Kuyt fez o segundo gol e definiu a alegria holandesa no mais do que laranja Soccer city.

(ASSAF, Roberto. Arrancada laranja. Jornal Lance! Rio de Janeiro, 30 de jun. 2010, p.20)

L 6

Ó pá, cadê o talento? Sem Kaká e Robinho, Seleção sente falta de talento e fica no empate. Agora, é a vez do Chile A festa não foi bonita, ó pá! E ficou mais uma vez evidente no 0 a 0 que nas ausências de Kaká e Robinho falta ao Brasil sobretudo talento, ou seja, aquele craque capaz de decidir numa finta, no improviso, numa jogada de exceção. A equipa de Dunga só jogou para os lados. Pior: pareceu, ó Jesus, absolutamente conformado com o empate. Foi assim: Portugal pisou o relvado disposto a jogar recuado, arriscando um ou outro contra-golpe, mantendo apenas Cristiano Ronaldo como avançado. Logo, pelo menos durante a primeira etapa, o Brasil teve efetivamente o controle do duelo. Mas criou poucas chances de golo, limitando-se aos remates de longa distância, ambos com Daniel Alves, facilmente interceptado por Eduardo. Chance, de verdade, a equipa de Dunga teve duas. Aos 29, Nilmar obrigou o guarda-redes a uma bela intervenção – a bola ainda bateu na barra. Aos 38, Maicon levantou e Luis Fabiano cabeceou para fora. Nada além. Um breve registro apenas para uma situação absolutamente patética, em se tratando de mundial: aos 44, Dunga foi obrigado a substituir Felipe Melo, bastante descontrolado, e às turras com o alagoano Pepe, por um burocrático Josué. O que teria dito o treinador ao ex-rubro-negro no balneário? Aliás, quem disse que seria um jogo amigável? Foram sete advertências em 45 minutos.

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Veio o tempo final, e não seria absurdo afirmar que o Brasil se viu surpreendido com a postura mais ofensiva de Portugal. Aos 14, Cristiano Ronaldo invadiu a área, e Lúcio, na tentativa de impedir o remate, acabou esticando a Raul Meireles, que pôs fora, desperdiçando chance de ouro. Carlos Queiroz trocou defensores por médios e avançados e passou a ser mais, digamos, eficaz. No entanto, também não criou ameaças. Após 20 minutos, colonizador e colonizado fizeram as pazes. Um futebol entediante. Faltaram as coxinhas do gajo da Madeira e de Robinho. Não foi à toa que os adeptos vaiaram.

(ASSAF, Roberto. Ó pá, cadê o talento?. Jornal Lance! Rio de Janeiro, 25 de jun. 2010, p.4)

L 7

Alívio britânico Inglaterra joga bem melhor, pressiona, vence apenas por 1 a 0 e se classifica. Mas em segundo lugar. Nas oitavas, pegará a Alemanha. God Save the Queen! A Inglaterra precisou apenas apresentar maior objetividade – e sacar o fraquíssimo Heskey do time – para derrotar a medrosa Eslovênia por 1 a 0 e garantir a vaga nas oitavas (pega a Alemanha). Defoe, que o substituiu, marcou o gol da vitória. No entanto, parece difícil que os súditos de Her Majesty possam brigar pelo título jogando o futebol de ontem. De qualquer forma, não seria um exagero afirmar que a seleção do Leste europeu se apequenou diante da necessidade de resultado do English team. A Inglaterra impôs a sua flagrante superioridade desde o início, dominando o meio de campo, mantendo os eslovenos recuados. Aos 23 minutos, Milner cruzou, Defoe se antecipou a Suler e desviou de Handanovic, abrindo o placar. O adversário não esboçou a reação. A Inglaterra ainda esteve perto de ampliar, aos 29, numa bola rasteira colocada por Gerrard no canto esquerdo, que obrigou o goleiro a um grande esforço para defender. Era de se esperar que a Eslovênia voltasse para o segundo tempo praticando um futebol mais ofensivo, pois, com a derrota, dependeria do resultado de EUA x Argélia. Mas não foi isso o que ocorreu. Os ingleses seguiram controlando o jogo. Defoe desperdiçou boa chance com um minuto; aos 11, Terry meteu de cabeça no cantinho direito e Handanovic pôs para escanteio; aos 12, Rooney mandou uma bola na trave... A Eslovênia precisou de 67 minutos para ameaçar. Birsa e Dedic perderam oportunidades num mesmo lance. De todo jeito, parecia conformada. No fim, diante das circunstâncias, o time do Leste resolveu arriscar um pouco mais. Aos 44 Upson tirou o pão da boca de Dedic. A Inglaterra levou a bola para o ataque e amarrou o jogo. Parecia interminável. Até que o jogo chegou ao fim. Mas os EUA meteram 1 a 0, gol de Donovam, e a derrota dos eslovenos, na realidade, acabou sendo um autêntico castigo para a sua autêntica covardia.

(ASSAF, Roberto. Alívio britânico. Jornal Lance! Rio de Janeiro, 24 de jun. 2010, p.18)

L 8

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Apito muy amigo Argentina elimina México e pega Alemanha nas quartas. Apesar de merecer a vitória, hermanos foram ajudados por erro da arbitragem. O gol irregular de Tevez aos 26 do primeiro tempo desestabilizou o time do México e desmontou todo o esquema de Javier Aguirre para anular a Argentina, coisa que estava conseguindo até aquele momento. Como os hermanos não têm nada com isso, eles aproveitaram a situação e construíram, com méritos, a vitória por 3 a 1. Assim, estão nas quartas de final da Copa. Encararão a Alemanha num clássico que se desenha espetacular. O México entrou mudado com Bautista, Guardado e Hernandez entre os titulares e Juárez na lateral direita. Com marcação sufocante, não deixou os espaços para que as criações de Messi e Tevez. E mostrou eficácia ofensiva. Tanto que Salcido (na trave) e Guardado quase marcaram. A situação não estava fácil para a Argentina. Mas aí veio o erro. Após sobra de bola dentro da área, La Pulga chutou e Tevez, impedido, cabeceou para o gol. O bandeirinha validou. Para piorar, o telão do Soccer city mostrou o lance. E aí? O juiz confirma o gol voltando atrás? Bem, o italiano Rosseti achou melhor ratificar o erro crasso a deixar entendido que voltou atrás por causa das imagens, o que é proibido pela FIFA. Só que a Argentina não é culpada por ter sorte nos lances duvidosos interpretados por arbitragens ruins (foi assim em todos os jogos e o Brasil também teve essa sorte contra a costa do Marfim). Porém, no calor da partida, é difícil o time rival pensar nisso. O gol desnorteou o México, que começou a dar pancada nos argentinos. E a vacilar nos passes. Seis minutos após levar o gol irregular, Osorio não dominou a bola na entrada da área. Sobrou para Higuaín e ...2 a 0. No segundo tempo, a Argentina veio com a clara estratégia de deixar o tempo passar. Ainda assim, ampliou num maravilhoso chute de Tevez. E deixou a sensação de que poderia fazer mais se Messi estivesse tão inspirado quanto nos jogos anteriores – o craque só apareceu numa jogadaça aos 46 que não morreu no gol porque Pérez defendeu. O México não arrefeceu e diminuiu com Hernandez. Mas ficou nisso e, assim como em 2006, caiu para a Argentina nas oitavas. Assim, Argentina e Alemanha – final das copas de 86 e 90 – se pegam na bela Cidade do Cabo, no espetacular Green Point. Cenário maravilhoso para duas seleções que mostram o melhor futebol no Mundial à sul-americana.

(VIEIRA, Carlos Alberto. Apito muy amigo. Jornal Lance! Rio de janeiro, 28 de jun. 210, p.18)

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Vai sofrer, Azurra! Itália consegue empatar com um dos piores times da Copa e terá de resolver a sua vida na última rodada, contra a Eslováquia.

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O italiano adora um drama. Talvez por causa do sangue latino que carregam nas veias, sem emoção não há graça. E a Azurra é um retrato fiel do seu povo. Até um jogo tranquilo se complica. Foi o que aconteceu ontem, diante da Nova Zelândia, no empate em 1 a 1. Ninguém imaginava que a atual campeã do mundo fosse ter dificuldades para bater uma das seleções mais fracas da Copa. Mas teve. O gol da Nova Zelândia saiu após uma bola levantada na área. Reid fez falta em Gilardino, a redonda desviou em Cannavaro e sobrou para Smeltz abrir o placar. O árbitro – é preciso elogiá-lo – viu pênalti de Smith em De Rossi. Iaquinta teve um lampejo de categoria, cobrando sem dar a chance a Paston. E para aflorar mais os sentimentos dos italianos, a tristeza dava o tom da seleção tetracampeã. O ex-zagueiro Roberto Rosato, que participou da Copa de 70, faleceu no sábado. Os jogadores da Azurra entraram em campo com uma fita preta na manga de suas camisas. Por mais que os italianos criassem, o gol que descarregaria a tensão não saía. O tempo passou e nada. Se não era a ansiedade na hora do chute, era Paston fazendo grandes defesas. E a Itália conseguiu. Empatou com a baba do grupo, que arriscou apenas três chutes nos 90 minutos. Terá de resolver sua vida na última rodada. E o pior: tudo indica que a Azurra será a segunda do grupo F e irá encarar a Holanda. Que drama!

(BOKEL, Thiago. Vai sofrer, Azzura. Jornal Lance! Rio de janeiro, 21 de jun. 210, p.30) L 10

Azurra, que surra! Com pouca inspiração e escalação errada no primeiro tempo, Itália só acorda no fim e não evita derrota que a elimina da Copa. Aos 51 do segundo tempo, o juiz inglês Howard Webb apita o fim do jogo mais dramático da Copa, desses que entram para a história. O italiano Quagliarella desaba em campo, chorando. O camisa 18, que entrou na etapa final e fez o jogo da sua vida, queria não acreditar: a derrota de 3 a 2 para a Eslováquia eliminou a atual campeã do mundo e colocou o rival nas oitavas em segundo lugar de um grupo louco. Afinal, se fizesse o gol do empate, a Azurra estaria lá. Com a derrota, conseguiu ficar na lanterna de uma chave que tinha a Nova Zelândia. A eliminação teve como cena final um lance nos acréscimos, aos 50, quando, após lateral cobrado para dentro da área, o meia Pepe furou o arremate e perdeu o gol que salvaria a Itália do vexame. No primeiro tempo, a Itália não funcionou. A estratégia de pôr Gattuso na vaga de Marchisio não deu certo. Sem criatividade e com três volantes, a Itália nada fez. E ainda deu um gol de presente para a Eslováquia, quando De Rossi errou um passe que parou nos pés de Hamsik e este passou para Vittek marcar. Lippi corrigiu o erro ao voltar do intervalo com Quagliarella na vaga de Gattuso, e o cartão de visita do reserva foi um arremate que Skrtel salvou em cima da linha de joelho (estava dentro do gol?). Mas, ao inverter Zambrotta de posição, Lippi abriu um buraco pela esquerda. E, numa falha de cobertura pelo setor, Hamsik cruzou para Vittek fazer 2 a 0. A Itália estava quase morta. Pirlo, que havia entrado antes do segundo gol eslovaco, estava sem ritmo. Só que uma brilhante jogada de Quagliarella resultou num

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rebote que Di Natale empurrou para o gol. A Itália pressionava, Quagliarella escorou cruzamento e fez, mas estava impedido. O drama aumentava. Aos 41, o técnico eslovaco sacou Strba e pôs Kopunek. Aos 43, após lateral cobrado pelo setor de Zambrotta, Kopunek aproveitou que Cannavaro e Chelini estavam distraídos e fez 3 a 1. Itália morta? Ainda não. Quagliarella, sempre ele – tinha de ter entrado antes! – fez golaço aos 47. E teve o lance de Pepe, aos 50. Em 2006, a Itália tinha defesa de ouro e ataque meia-boca. Em 2010, ataque ruim e defesa que cansou de falhar, como nos gols eslovacos hoje. A Itália de Lippi, que ao apito do juiz correu para o vestiário, não foi páreo para a raçuda Eslováquia. O campeão caiu na primeira fase. Mamma mia!

(VIEIRA, Carlos Alberto.Azzurra, que surra!. Jornal Lance! Rio de janeiro, 25 de jun. 2010, p.18)

L 11

Paraguai garante a liderança

O Paraguai empatou sem gols com a Nova Zelândia e terminou a primeira fase da Copa do Mundo da África do Sul liderando o grupo F. Além de garantir a vaga nas oitavas de final, a seleção sul-americana entrou para a História ao vencer um grupo pela primeira vez. Desde o início do jogo, o Paraguai se mostrou protagonista diante de uma aguerrida Nova Zelândia. A primeira tentativa foi de Morel Rodríguez, mas o goleiro Paston defendeu. Os neozelandeses desenvolveram em seguida com Smeltz. A seleção da Oceania fechava os espaços marcando no campo de defesa, com a intenção de usar o contra- ataque baseado na velocidade de seus volantes. O Paraguai começava a se movimentar com a inteligência, sem lançamentos longos e apostando na troca de passes precisos. E voltou a chegar em seguida, exercendo pressão sobre o adversário. Os sul-americanos dominavam o jogo, mas a boa marcação não deixava que chegassem com maior perigo. No ataque, no entanto, os neozelandeses não conseguiam assustar o goleiro Villar. Na segunda etapa, a Nova Zelândia se animou, pois bastava vencer para conseguir a vaga. O time voltou mais disposto e quase abriu o placar com Elliot, mas logo Benítez e Roque Santa Cruz evitaram o gol. A Nova Zelândia abandonou a marcação no fim e começou a buscar o gol desesperadamente. A defesa paraguaia, contudo, se mostrou firme. No fim, o Paraguai alcançou uma classificação histórica às oitavas de final da Copa.

(NÚCLEO FUTEBOL INTERNACIONAL. Paraguai garante a liderança. Jornal Lance! Rio de janeiro, 25 de jun. 2010, p.22)

L 12

Olé

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México derrota um dos grandes do futebol pela primeira vez na História das Copas do Mundo. França foi a vítima de Blanco & Cia. Sim, Hernandez estava impedido. Se a mão de Thierry Henry que classificou a França para a Copa do Mundo é controversa, o 2 a 0 é claro e contundente. O México obteve uma vitória histórica ao derrotar o time francês, uma caricatura do poder real que costumavam ser, e colocou seu nome na história. Com uma atitude de não ficar na retranca, o México se deu conta de que o favoritismo francês era só teórico. Ontem, em Polokwane, ficou claro, que, como os treinadores dizem: “são onze contra onze”. Mesmo assim, o sucesso não pode disfarçar que fazer gol continua sendo um problema ainda pendente. Ambos os tempos foram de domínio total do México , que superou a marcação do adversário e procurou incansavelmente o gol pelas mãos do técnico Javier Aguirre, que soube ler o jogo. A lesão de Vela permitiu a entrada do talentoso Barrera, que provocou o pênalti, convertido por Blanco, que deixou o México perto da segunda fase do Mundial. Aguilar deu lugar a Osorio. Já no meio do campo, pôs Hector Moreno. Desde o início, o México levava perigo chegando pelo centro e pelas alas. Giovani dos Santos foi, mais uma vez, o motor do ataque. A individualidade da França permaneceu após o intervalo. Raymond Domenech não se moveu um único instante, talvez resignado ao saber que a noite era mexicana. Rafa Marquez também mostrou seu talento. O camisa 4 deu a assistência para Hernandez, que explorou a velocidade e marcou o primeiro gol. A jogada sem dúvida, foi irregular, mas o árbitro não marcou. No entanto, foi uma compensação ao domínio imposto. A França mostrou uma cara diferente de outros Mundiais. Não foi um adversário que impôs resistência, até que Barrera foi freado por Abidal, que fez pênalti. Blanco sepultou as aspirações francesas e, agora, só resta o jogo contra o Uruguai, que vai definir o adversário do México, em caso de classificação. (ASSAF, Roberto. Olé. Jornal Lance! Rio de Janeiro, 11 de jul. 2010, p.28)

L 13

Seleção mantém tradição de vitórias contra africanos e faz o suficiente para ir às oitavas

A Costa do Marfim foi campeã africana em 1992. Quando promoveu o torneio continental, em 1984, caiu na primeira fase. Nada além. Mas acabou sendo importante superestimá-la, como a mídia e a própria Seleção fizeram ao longo da semana, em comentários e entrevistas, pois só assim o time de Dunga tratou de encarar o adversário com o devido respeito, para construir uma vitória por 3 a 1. O Brasil não fez uma partida fantástica. Mas jogou o suficiente para mostrar a sua indiscutível superioridade sobre a equipe africana. E garantir a vaga na próxima fase. Aliás, a valorização dada aos Elefantes foi ótima porque eles passaram a acreditar que poderiam vencer, jogando de igual para igual, deixando os espaços que a Seleção Brasileira aproveitou para ir metendo os seus gols. E, afinal, o que houve de melhor na partida de ontem, além da seriedade? O fato de Luis Fabiano ter voltado a marcar – não fazia um golzinho sequer havia seis jogos.

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Depois, a lenta e gradual recuperação de Kaká. Ele está na Copa. Ah, e as boas defesas de Julio Cesar. Só como registro: Luis Fabiano fez 2 a 0 aos 24 e 50 minutos. Elano, 3 a 0, aos 62. E Drogba, aos 78. E o que teve de pior? A arbitragem de Monsieur Cegô, que deixou barato as entradas criminosas de Tioté em Elano, aos 65 minutos, e de Keita em Michel Bastos, aos 74. Como batem os caras, hein! Além disso, num paradoxo, também teve de ruim o preciosismo – que começou após o 3 a 0 – e a conseqüente desatenção que permitiu aos marfinenses marcarem o seu golzinho, com Drogba, aos 78. A propósito, a pancadaria dos Elefantes – que chegou a paralisar o jogo – custou a expulsão de Kaká, que, irritado, com tantas faltas, acabou reagindo. Voltando à vaca fria, com um pouco mais de aplicação o Brasil teria enfiado um ou dois gols no adversário. Aliás, não incomodem mais com o “poderio” das seleções africanas, pelo menos nessa Copa. Resta saber agora o que será da Seleção Brasileira sem Kaká contra Portugal.

(VIEIRA, Carlos Alberto. Seleção mantém tradição de vitórias contra africanos e faz o suficiente para ir às oitavas. Jornal Lance! Rio de janeiro, 22 de jun. 2010, p.14)

L 14

Chorado demais

Cardozo e Xabi perdem pênaltis. Goleiros Casillas e Villar fazem milagres. Em duelo tão equilibrado, iluminado Villa põe Fúria nas semis. Chora, Paraguai. No fim do jogo ontem no Ellis Park, o paraguaio Cardozo caiu em prantos. O goleador do Campeonato Português pelo Benfica e futebolista do ano no Paraguai perdeu um pênalti que poderia ter mudado o panorama do jogaço contra a Espanha quando ainda estava no 0 a 0. E não se conteve quando viu a festa da Fúria. E do artilheiro Villa. Ontem, mais uma vez o espanhol descobriu um jeito de furar a retranca e num gol choradíssimo em jogo dramático (mais um) garantiu o 1 a 0 que colocou a Espanha no Top 4 pela primeira vez desde 1950. O Paraguai está de parabéns. Entrou com esquema cauteloso e várias mudanças,com quatro bons marcadores no meio e adiantando a marcação. Matou o ataque da Espanha no primeiro tempo. E não deixou de buscar a vitória. Teve até um gol bem anulado de Haedo Valdez. No segundo tempo o jogo pegou fogo. E teve o seu momento para ser eternizado na História das Copas entre os 13 e 16 minutos. Tudo começou quando Cardozo cavou pênalti. Ele e Piqué se agarraram, mas o juiz só viu a falta do espanhol. Cardozo cobrou e Casillas defendeu. No contra-golpe da Fúria, Villa foi derrubado por Alcaráz. Pênalti. Xabi Alonso cobrou e marcou. Mas os espanhóis invadiram a área. Repetição. Xabi cobrou e Villar defendeu e no rebote fez pênalti não marcado em Sérgio Ramos. Incrível. O jogo parecia indicar prorrogação apesar de os times buscarem o ataque. Aí, aos 38, Iniesta fez grande jogada e tocou para o garoto Pedro chutar na trave. O gol estava encantado. Mas a Espanha tem o cara iluminado da Copa. A bola sobrou para ele . Villa. Ele chutou, a bola bateu nas duas traves e...entrou. Villa correu para receber os abraços. Com cinco gols assumiu a artilharia do torneio. Ele já é o maior goleador espanhol em Copas (oito, somando os três que fez em 2006).

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O Paraguai foi para o desespero e quase empatou aos 43 em arremates de Barrios e Santa Cruz, defendidos por Casillas. No apito do juiz restou o choro incontrolável de Cardozo...A história poderia ter outro final. E alegria de Villa, o iluminado que venceu um duelo que foi chorado demais.

(ASSAF, Roberto. Chorado demais. Jornal Lance! Rio de Janeiro, 28 de jun. 2010, p.26)

L 15

Seleção de Vicente Del Bosque vence pessimistas, derruba as expectativas, passa pela Alemanha e, enfim, está na final da Copa.

E a Torre de Babel construída pela Alemanha acabou sendo derrubada por uma Espanha divina, que ontem venceu por 1 a o para seguir derrubando as expectativas pessimistas de analistas e da opinião pública – e que sempre cercam a sua seleção em Copa do Mundo – para chegar muito próxima de um inédito título mundial. É isso. A partida de Durban contrariou a narrativa bíblica do Gênesis. Pois quem está chegando ao céu é a Fúria, que tomou desde o começo a iniciativa de atacar, pressionando o adversário, impedindo com eficiência o seu contra-ataque, que havia sido mortal em duelos anteriores. Os muitos quase estrangeiros da Alemanha - Boateng, Khedira, Özil, Podolski, Klose – e os germânicos natos não conseguiram dar sequência à edificação que começou a ser levantada com a goleada de 4 a 0 sobre a Austrália, ainda na fase de grupos. A Espanha foi impondo o seu toque refinado – o time não dá chutão e raramente rifa a bola -, derrubando tijolo por tijolo da Torre, mostrando uma paciência impressionante para chegar ao gol que a pôs na decisão. A Copa terá o primeiro campeão inédito desde 1998. Na realidade com um pouco mais de capricho a Fúria já poderia ter marcado na etapa inicial, quando desperdiçou boas oportunidades, a mais evidente numa cabeçada de Puyol, que saiu por cima. É provável que Joachim Löw tenha tentado mudar o destino da história no intervalo, invocando os brios de seus meios turcos, africanos, poloneses e até brasileiro. Mas a Espanha retornou com o mesmo pique – com Iniesta, Xavi e Alonso distribuindo as cartas -, criando, mas deixando de aproveitar outras chances. Até que aos 27 minutos, Xavi cobrou escanteio e Puyol, agora sim, cabeceou sem defesa para Neuer. No fim, a Fúria recuou e a Alemanha, sem opção, arriscou. Mas os tijolinhos já estavam esparramados pelo chão da Terra. A Espanha ficou perto do cume da Copa.

(ASSAF, Roberto. Seleção de Vicente Del Bosque vence pessimistas, derruba as expectativas, passa pela Alemanha e, enfim, está na final da Copa. Jornal Lance! Rio de Janeiro, 8 de jul. 2010, p.20)

L 16

Diante de Honduras, um adversário muito fraco, Espanha vence com facilidade, mas deixa escapar a possibilidade de uma goleada.

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Digamos que Honduras foi uma Suíça piorada. Também praticou o antifutebol. No entanto, deixou mais buracos na retranca e mostrou ainda menos jeito para atacar, nas raras ocasiões em que tentou fazê-lo. É também mais inexperiente. Malícia zero. Daí a vitória da Espanha, 2 a 0, com tranquilidade. A Fúria começou encurralando o adversário, que pareceu conformado com a situação, e precisou de apenas 16 minutos para abrir o placar, em jogada individual de David Villa, depois de desperdiçar pelo menos três ótimas oportunidades. A seleção europeia seguiu controlando o jogo e criando chances. Só Fernando Torres perdeu duas de frente para Valladares. A saída de bola de Honduras morria invariavelmente em seu próprio campo. No intervalo, o técnico colombiano de Honduras, Reinaldo Rueda, trocou o volante Espinoza pelo atacante Welcome, sugerindo que partiria para frente. Tentou fazê-lo, mas foi como se dissesse “bem- vindo” ao meu campo aos espanhóis. Aos quatro minutos, Villa recebeu de Navas e chutou. A bola desviou em Chavez, traindo o goleiro: 2 a 0. Aos 15, Izaguirre deu uma rasteira em Navas na área. Villa pôs o pênalti para fora. Aos 20, Fábregas, que acabara de entrar, driblou Valladares e Chavez tirou na linha. É um jogo de ataque contra defesa. Honduras não consegue segurar a bola. As oportunidades desperdiçadas se multiplicam. Figueroa tirou o pão da boca de Villa. Mendoza evita a conclusão de Villa na pequena área. A Espanha diminui o ritmo. Poderia ter repetido Portugal. Ou ido além. Mas ficou nisso. De qualquer forma, a Fúria terá que vencer o Chile para assegurar a vaga. O saldo facilitaria. O time de Vicente Del Bosque transformou o gramado do Ellis Park num parque de diversões. No entanto...como perde gols! Como Honduras é ruinzinho! A propósito: o que faz a seleção de Concacaf na copa do Mundo da África do Sul?

(ASSAF, Roberto. Diante de Honduras, um adversário muito fraco, Espanha vence com facilidade, mas deixa escapar a possibilidade de uma goleada. Jornal Lance! Rio de Janeiro, 22 de jun. 2010, p.16)

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Passeio sul-coreano.

Coreia do Sul vence com maior volume de jogo e poderia ter goleado a frágil Grécia. A Coreia do Sul começou bem a campanha na Copa do Mundo da África do Sul. Os semifinalistas do Mundial de 2002 derrotaram a fraca Grécia por 2 a 0 e já deram um passo importante para a classificação para as oitavas de final, já que a disputa pela vaga é com os gregos e a Nigéria – a Argentina é favorita para terminar em primeiro. No primeiro tempo, a Grécia, que nunca marcou um gol em Copas, mostrou que pode continuar sem balançar as redes adversárias neste mundial. As principais oportunidades de abrir o placar foram dos coreanos, mas a falta de pontaria impediu uma goleada. O primeiro gol do jogo, porém, saiu cedo, aos sete minutos. Ki Sung-Yueng cobrou falta perto da bandeira de escanteio e Lee Jung-Soo completou, sozinho, dentro da área. O craque do time, Park Ji Sung, não apareceu muito no começo e criou apenas uma oportunidade de gol.

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A Coreia do Sul mostrou que tem um time arrumado, porém, que não sabe concluir o gol. Foram muitos chutes sem direção que nem chegaram a assustar o goleiro Tzorvas. Além de um ataque terrível, a Grécia mostrou que a defesa também não é grande coisa. Os jogadores erravam várias vezes e deixaram os sul-coreanos livres para marcar mais vezes. Os asiáticos, no entanto, acabaram desperdiçando algumas chances de matar o jogo. O segundo tempo não foi diferente. Domínio total da Coreia e os gregos chegando apenas nas jogadas de bola parada. Por incrível que pareça, também aos sete minutos, os coreanos ampliaram a vantagem. Park Ji Sung roubou bola na defesa da Grécia, avançou sozinho e concluiu já dentro da área: 2 a 0. Depois os gregos bem que quiseram engrossar o caldo, mas o time sul-coreano, bem postado, rechaçou as investidas. Com a vitória, os coreanos ficam em situação confortável no grupo B. Na segunda rodada, os asiáticos enfrentam a Argentina, que também venceu na rodada (1 a 0 sobre a Nigéria). A partida acontece no dia 17 em Johannesburgo. Já a Grécia mede forças com os nigerianos.

(NÙCLEO FUTEBOL INTERNACIONAL. Passeio sul-coreano. Jornal Lance! Rio de Janeiro, 13 de jun. 2010, p.26)

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Passaporte carimbado Uruguai mostra que defesa está encaixada, bate o também classificado México e pega a Coreia do Sul. Infalível na defesa e com um ataque que passa confiança. Assim é o Uruguai nesta Copa. Ontem, ao vencer por 1 a 0 o México, gol de Suárez, a Celeste confirmou a ponta do grupo A. Apesar da derrota, os mexicanos ficaram em segundo e avançaram, pois a África do Sul, mesmo vencendo a França, não tirou o saldo negativo. Nas oitavas, o Uruguai pega a Coreia do Sul. O México pega a Argentina. Existia a expectativa de ocorrer jogo de compadres, já que o empate era bom para os dois. Mas não foi assim. O México com uma formação para aumentar o toque de bola: Blanco no lugar do lesionado Vela e o meia Guardado assumindo a posição do volante Juárez (suspenso). O Uruguai, no 4-3-3, com Victorino na vaga de Godin na defesa, e mantendo o estilo de deixar o rival tomar a iniciativa e jogar nos contra- ataques. O jogo começou bom. Suárez quase colocou o Uruguai na frente. Para o México, Guardado acertou o travessão. Com o tempo, Forlán centralizou as jogadas e a Celeste passou a ser mais perigosa. Já no México, o veterano Blanco não estava bem e o garoto Giovani, pouco inspirado. Quando a primeira etapa indicava 0 a 0, Cavani, pela direita, mudou o panorama. O camisa 7 cruzou e achou Suárez livre: 1 a 0. O México acendeu o alerta. Naquele momento e com o placar de 2 a 0 para a África do Sul sobre a França, a classificação corria riscos. Se perdesse por 2 a 0 e os anfitriões fizessem 3 a 0, adeus vaga. Por isso, o time voltou nervoso para a etapa final. Quase levou o segundo numa cabeçada de Lugano em que Pérez salvou. Mas depois dos 20 minutos o Uruguai freou.

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Sabia que já tinha a ponta do grupo assegurada. Assim, o México passou a tocar e deixar o tempo passar. O que importava era a vaga. E ela veio.

(VIEIRA, Carlos Alberto. Passaporte carimbado. Jornal Lance! Rio de Janeiro, 23 de jun. 2010, p.16)

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Deu sono!

Em jogo muito ruim, Uruguai e França pouco criam e não saem do zero. Nem parecia que havia três títulos mundiais em campo. França e Uruguai fizeram um espetáculo pobre de ideias e, é claro, de gols. A outrora temida Celeste jogou praticamente todo o tempo como time pequeno, tentando sem sucesso explorar os contra-ataques, enquanto os franceses giravam a bola de um lado para o outro, sem conseguirem encontrar uma solução para superar a retranca do adversário. Logo o 0 a 0, caiu como uma luva, pois, na prática, foram criadas só quatro oportunidades em toda a partida. Três delas foram no primeiro tempo. Aos seis minutos, Govou escorou para fora da pequena área, após cruzamento de Ribéry. Aos 16, Fórlan chutou forte para boa defesa de Lloris. Aos 17, Gourcuff cobrou falta pela esquerda para intervenção de Muslera. E ainda teve uma outra chance na etapa final, em nova conclusão de Fórlan, rente à trave. A França teve a bola em seus pés por todo o tempo, principalmente após a expulsão de Lodeiro – o uruguaio entrou aos 17 do segundo tempo, recebeu um cartão amarelo aos 21 e o vermelho aos 36, por um sarrafo em Sagna. Faltou ao time europeu, no entanto, um mínimo de criatividade para fabricar uma brecha na retaguarda celeste. Mas o Uruguai conseguiu ser pior, errando passes em excesso, em especial quando buscava a ligação direta entre ataque e defesa. Na metade do segundo tempo, dadas as circunstâncias, os técnicos começaram a promover substituições, numa esperança de mudança. Inútil. A França seguiu esbarrando na muralha adversária, e a Celeste se apequenando cada vez mais, sugerindo que vestiu definitivamente a pele de zebra em Copas do Mundo. Nos acréscimos, Les Bleus – ontem jogando de branco – ainda tiveram uma oportunidade de tirar o zero da placar, numa falta de Lugano em Diaby. Mas Henry cobrou na direção de Loco Abreu, que subiu e tirou de cabeça. Pelo que se viu, a pobre Jabulani, tão criticada antes de o torneio começar, será maltratada nesse grupo.

(ASSAF, Roberto. Deu sono! Jornal Lance! Rio de Janeiro, 12 de jun. 2010, p.18)

L 20

Eficiência mecânica

Holanda bate o Uruguai por 3 a 2, chega à terceira final de Copa de sua história e agora espera por vencedor de Alemanha x Espanha Os estilos são diferentes. Mas a Holanda de 2010, a exemplo de suas antecessoras de 1974 e 1978, também chegou à decisão. Não há a magia dos tempos de

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Cruyff. Mas não seria exagero dizer que a Laranja de agora parece até mais eficiente. E, embora não tenha craques do nível daquele mago, e de Krol, Neskens, Rep e dos irmãos Van der Kerkhof, a equipe de Sneijder e Robben mostrou frieza e autoridade suficientes para vencer o Uruguai por 3 a 2, para tentar superar a trajetória do velho carrossel. Interessante como a história se repete. Como a Laranja dos anos 70, a de 2010 começou impondo a sua mais valia. E a exemplo do que o grande Arie Haan fazia com frequência, Van Bronckhorst acertou um chute espetacular da intermediária no ângulo esquerdo de Muslera para abrir o placar. A Celeste não se entregou. Brigou por cada palmo do gramado e foi premiada com o empate, num também petardo incrível de Forlán. No intervalo, Van Marwijk trocou De Zeeuw – que destoava – por Van der Vaart. O time sul-americano voltou com a mesma disposição. Mas faltava qualidade. Daí o recuo, para buscar a vitória num contra-ataque. A Laranja bloqueou tal intenção e passou a pressionar. Aos 24, Sneijder bateu cruzado no canto esquerdo de Muslera. Van Persie, que participou da jogada, estava em posição ilegal, mas o gol valeu: 2 a 1. Fominha, como em outros tempos, a Holanda seguiu envolvendo a Celeste e ampliou – Kuyt, como se fosse o Van Hanegem dos 70, levantou na área, e Robben, com a tranquilidade de um Resenbrink, meteu de cabeça à direita:3 a 1. O Uruguai ainda descontou, num chute cruzado de Maxi Pereira, e buscou, na valentia, mas sem sucesso, o empate até o fim. Agora, está nas mãos de Van Marwijk, e nos pés do trio Kuyt/Sneijder/ Robben – e de seus coadjuvantes – a chance de ser maior que a lendária turma de Cruyff e Rimus Michels. Aliás, seria interessante para a Holanda, nesse aspecto, que a história não repetisse a dos anos 70.

(ASSAF, Roberto. Eficiência mecânica. Jornal Lance! Rio de Janeiro, 7 de jul. 2010, p.2)