REGIONALIZAÇÃO DA VAZÃO MÉDIA DE LONGO TERMO DA BACIA DO Pedro Igor Austregésilo Corrêa Cesar 1* & Mônica de Aquino Galeano Massera da Hora 2& José Paulo Soares de Azevedo³

Resumo - Tendo em vista a recente crise hídrica no Brasil, que quase culminou com o desabastecimento de água nas principais cidades brasileiras, faz-se necessário entender o comportamento hidrológico dos principais mananciais e rios do país. Nesse contexto, é de grande importância ter a disposição dados de vazões e outros parâmetros de uma bacia hidrográfica. Como essa disponibilidade de dados é aquém do desejável, foi necessário desenvolver técnicas que maximizem a utilização dos dados existentes. A Regionalização de Vazão é uma ferramenta que permite estimar o comportamento hidrológico de um rio mesmo que nele não existam dados disponíveis, tal estimativa é possível graças à transferência de dados existentes em outra localidade dentro de uma mesma bacia. Nesse artigo será calculada a vazão média de longo termo, utilizando o software Hidro 1.2, assim como a regionalização dela, utilizando uma regressão estatística entre as vazões calculadas e as áreas de drenagem dos postos fluviométricos.

PALAVRAS-CHAVE: Regionalização; vazão média de longo termo; bacia do rio Pomba.

REGIONALIZATION OF THE LONG TERM AVERAGE FLOW OF THE POMBA RIVER BASIN

Abstract - Given the recent water crisis in Brazil, which almost culminated in the shortage of water in major Brazilian cities, it becomes necessary understand the hydrological behavior of the main springs and rivers of the country. In this context, it is of high importance to have the disposition data flow and other parameters a river basin. As this data availability is much to be desired, it was necessary to develop techniques that maximize the use of existing data. The Flow Regionalization is a tool to estimate the hydrological behavior of a river even though it no data are available, such an estimate is made possible by the transfer of existing data in another location within the same basin. In this paper, the average long-term flow rate will be calculated using the Hidro 1.2 software, as well as the regionalization of it, using a statistical regression between the calculated flows and the drainage areas of the fluviometric stations.

KEYWORDS: Regionalization, average long-term flow, river basin Pomba.

1 Engenheiro Ambiental, mestrando em Engenharia Civil – Recursos Hídricos – COPPE/UFRJ, [email protected]. 2 Professora Adjunta do Departamento de Engenharia Agrícola e Meio Ambiente – UFF, [email protected]. 3 Professor Associado do Departamento de Recursos Hídricos e Meio Ambiente - UFRJ, [email protected].

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1. Introdução

O Brasil enfrentou recentemente uma crise hídrica grave, provocada por um regime de chuvas abaixo na média nos últimos anos e pela falta de gestão adequada dos recursos hídricos e seus usos múltiplos. Bacia hidrográfica pode ser compreendida como uma área com um conjunto de vertentes e de uma rede de drenagem, onde todos os cursos d’águas e precipitação iram escoar até atingir um único ponto de saída, seu exutório (TUCCI, 2007). Portanto, conhecer o comportamento hidrológico de uma bacia hidrográfica é essencial para fazer uma boa gestão de recursos hídricos. Para isso é necessário dispor das suas características físicas e climáticas, possibilitando a realização de estudos. O hidrólogo buscou otimizar ao máximo as informações existes e com isso desenvolveu técnicas para transferir informações de uma localidade para outra dentro de uma bacia: Regionalização de Vazão (TUCCI, 2007). É uma ferramenta relevante para a gestão de recursos hídricos no país, devido à escassez de dados em grande parte das bacias hidrográficas do país. Em 2003, o Serviço Geológico do Brasil - CPRM realizou a regionalização de vazão da bacia do rio Paraíba do Sul, entretanto, por ser uma bacia hidrográfica grande, o estudo não abordou a regionalização de vazão separadamente dos principais afluentes, mas por regiões homogêneas, determinadas por afinidade estatística e hidroclimatológica (CPRM, 2003). Nesse contexto, esse artigo irá realizar a regionalização de vazão exclusivamente da bacia do rio Pomba.

1.1 Objetivo geral

O presente trabalho tem como objetivo calcular a vazão média de longo termo da bacia do rio Pomba, determinar a curva de regionalização de vazões e a equação regional correspondente.

2. Materiais e Métodos

A área de estudo desse trabalho é a bacia hidrográfica do rio Pomba. O rio Pomba é um rio federal que tem sua nascente localizada em , na serra da Mantiqueira, , a 1.100 metros de altitude e sua foz no rio Paraíba do Sul, apresentando declividade relevante ao longo dos seus 265 km. O rio Pomba é o principal afluente do rio Paraíba do Sul, um dos mais importantes da região sudeste do Brasil (Figura 1).

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Figura 1: Localização da bacia do rio Pomba. Fonte: GUEDES et al., 2009.

A bacia do rio Pomba tem uma área de drenagem de 8.616 km², sendo os principais afluentes os rios Novo, Xopotó, Formoso e Pardo. A bacia abrange 35 municípios mineiros e 3 municípios fluminenses, com uma população aproximada de 450.000 habitantes. Esse artigo foi realizado graças às informações contidas no banco de dados da Agência Nacional de Águas - ANA, o que é uma obrigação legal da mesma disponibilizar gratuitamente a toda sociedade, segundo o sexto instrumento da lei federal nº 9433 (BRASIL, 1997). A ANA utiliza o portal Hidroweb para satisfazer o instrumento do Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos, nele são consolidados todos os dados disponíveis. Foi possível obter 89 postos pertencentes à bacia do rio Pomba, entretanto, somente 12 apresentavam histórico de medições de vazão maior que 10 anos, impossibilitando a utilização do restante. Todavia, 2 postos foram realocados de posição, logo representam a mesma área de drenagem dos postos desativados, por isso também foram excluídos da análise.

2.1 Cálculo da QMLT

Com os 10 postos fluviométricos com mais de 10 anos de observação foram identificado as vazões médias de longo termo deles num software disponibilizado pela ANA, o Hidro 1.2. Ele permite a leitura dos dados, visualizar gráficos, medições diárias, médias mensais, calcular vazões características e outras funções.

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A vazão media de longo termo (MLT) pode ser entendida como a vazão média das vazões mensais médias, ou seja, é uma média de uma média, representando a disponibilidade hídrica média de uma bacia, e é a máxima vazão que pode ser regularizada (TUCCI, 2007).

A Tabela 1 apresenta a Q MLT de cada posto fluviométrico.

Tabela 1: QMLT dos postos fluviométricos.

Área de Código Nome Rio Drenagem Latitude Longitude Município MLT (m³/s) (km²) Usina Rio 17,6 58710000 784 -21,305 -43,199 Rio Pomba Itueré Pomba Rio 8,25 58720000 Tabuleiro 322 -21,384 -43,235 Tabuleiro Formoso Fazenda Rio 8,51 58725000 387 -21,350 -43,200 Rio Pomba Ferraz Formoso Rio 32,7 58730001 Guarani 1650 -21,356 -43,05 Guarani Pomba Astolfo Rio Astolfo 42,4 58735000 2350 -21,307 -42,862 Dutra Pomba Dutra 58750000 Piau Rio Piau 490 -21,497 -43,317 Piau 13,1 Rio 17,4 58755000 Rio Novo 835 -21,474 -43,129 Rio Novo Novo Usina Rio Itamarati 30,5 58765001 1770 -21,471 -42,830 Maurício Novo de Minas Rio 100 58770000 5880 -21,389 -42,702 Cataguases Pomba Santo Santo 131 Rio 58790000 Antônio de 8210 -21,542 -42,181 Antônio de Pomba Pádua Pádua Fonte: Elaborado pelos Autores.

2.1.1 Análise de continuidade de vazões

A análise de continuidade de vazões é uma ferramenta para verificar uma premissa da Hidrologia, pois é esperado que a vazão característica de uma seção de um rio aumente conforme o aumento da área drenagem, ou seja, um posto de jusante deverá ter, necessariamente, uma vazão maior que um posto de montante. Após estudar a hidrografia da bacia, disponível no portal eletrônico da ANA, foi possível estabelecer uma relação de vazão entre os postos. A partir da topologia, foi possível estabelecer as seguintes relações de continuidade de vazões características: • Fazenda Ferraz ≥ Tabuleiro • Guarani ≥ Usina Itueré + Fazenda Ferraz • Astolfo Dutra ≥ Guarani

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• Rio Novo ≥ Piau • Cataguases ≥ Usina Maurício + Astolfo Dutra • Santo Antônio de Pádua ≥ Cataguases

Tabela 2: Análise de continuidade da vazão média de longo termo. MLT (m³/s) Posto Q Posto Q Relação Fazenda Ferraz 8,51 ≥ Tabuleiro 8,25 Ok Guarani 32,7 ≥ Fazenda Ferraz + 26,11 Ok Usina Itueré Astolfo Dutra 42,4 ≥ Guarani 32,7 Ok Rio Novo 17,4 ≥ Piau 13,1 Ok Cataguases 100 ≥ Rio Novo + Astolfo 59,6 Ok Dutra Santo Antônio de Pádua 131 ≥ Cataguases 100 Ok Fonte: Elaborado pelos Autores.

Conforme as Tabela 2 todas as relações ficaram dentro do esperado, ou seja, os postos de jusante apresentaram vazões superiores aos de montante.

2.2 Regionalização de vazão da bacia do rio Pomba

Devido à dificuldade de se obter dados em estudos hidrológicos faz-se necessário buscar formas de transferências de informações dentro de uma bacia, com isso, visando estimar variáveis hidrológicas em locais sem dados ou dados insuficientes, a regionalização de vazão surge como uma ferramenta importante que explora ao máximo as informações existentes dentro de uma bacia (TUCCI, 2007). A regionalização de vazão pode usar vários parâmetros que explicam o comportamento físico e meteorológico da bacia, como área de drenagem, declividade, comprimento do talvegue, precipitação, entre outros. Nesse estudo optou-se por uma regionalização utilizando unicamente a área de drenagem como variável por ser um dado com relativa facilidade de obtenção. O tratamento estatístico foi feito através da relação da área de drenagem com a Qmlt, realizando uma regressão potencial. As Figuras 2 apresentam a curva de regionalização da Qmlt e a Tabela 7 sua equação regional, com respectivo coeficiente de determinação R², onde A é área de drenagem em km².

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Qmlt (m³/s) 140 120 100 80 60 40 20 A (Km²) 0 0 2000 4000 6000 8000 10000

Figura 2: Curva de regionalização Qmlt. . Fonte: Elaborado pelos Autores.

Tabela 3: Equações regionais e coeficientes de determinação. Equação R² MLT 0,0576A0,8571 0,9962 Fonte: Elaborado pelos Autores.

3. Resultado e Discussões

Analisando a curva gerada é possível afirmar que a linha de tendência está bem aderida aos postos, bem relacionada com a área de drenagem, e o coeficiente de determinação R² foi de 0,9962, dando maior confiabilidade ao presente estudo. Assim sendo, pode-se utilizar a equação regional gerada na bacia do rio Pomba em localidades desprovidas de dados hidrológicos para diversos fins, como outorga de uso de recursos hídricos, abastecimento de água, aproveitamento hidrelétrico, navegação fluvial, entre outros. A regionalização da bacia do rio Pomba utilizou postos fluviométricos com áreas de drenagem variando entre 322 e 8210 km², com isso, não é aconselhável o uso da equação regional para áreas de drenagens fora desse intervalo.

4. Conclusões e recomendações

A regionalização de vazão mostrou ser uma ferramenta útil e importante, pois pode ser usada para definir as vazões características de um curso d’água onde não há registro de vazões e, consequentemente, a vazão passível de ser outorgada pelos órgãos gestores de recursos hídricos do e Minas Gerais e pela ANA. Apesar de o rio Pomba ser o principal afluente do Rio Paraíba do Sul e apresentar uma área de drenagem de 8.616 km², só possui 10 postos fluviométricos capazes de explicar o comportamento

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hidrológico de sua bacia. É recomendável a ampliação da rede de monitoramento, principalmente nos rios Novo e Xopotó. Nesse trabalho foi importante dispor de premissas da hidrologia para realizar um refinamento dos dados de entrada, para dar maior confiabilidade nos resultados, assim como identificar sutilezas nos dados disponíveis, como realocação de postos fluviométricos. Logo, esse tipo de estudo necessita de grande atenção do hidrólogo responsável. É aconselhado em trabalhos futuros comparar o uso dessa equação regional com outras equações utilizadas, como as do CPRM e avaliar com dados fluviométricos existentes, para analisar o erro de cada equação, determinando qual é mais adequada.

REFERÊNCIAS AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS. Shape Files de Hidrografia e Ottobacias em Escala 1:250.000 para a Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul. Brasília, 2013.

AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS. Sistema Hidroweb. Disponível em: . Acesso em: 10 jun. 2017.

ASSOCIAÇÃO PRÓ-GESTÃO DAS ÁGUAS DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO PARAÍBA DO SUL. Relatório Técnico - Bacia do Rio Paraíba do Sul - Subsídios às Ações de Melhoria da Gestão. Resende, 2011. 256 p.

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COMITÊ PARA INTEGRAÇÃO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO PARAÍBA DO SUL (CEIVAP). Plano de Recursos Hídricos da Bacia do Rio Paraíba do Sul – Resumo - Caderno de Ações Bacia do Rio Pomba. Rio de Janeiro, 2006. 113 p.

GUEDES, Alexandre S.; et al. Estudo da Capacidade de Autodepuração do Rio Pomba Utilizando o Modelo QUAL2KW. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE RECURSOS HÍDRICOS, 18., 2009, Campo Grande. Disponível em: . Acesso em: 20 jun. 2015.

SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL. Relatório-síntese do trabalho de Regionalização de Vazões da Sub-bacia 58. Rio de Janeiro, 2003. 73 p.

TUCCI, Carlos E. M;, et al. Hidrologia: Ciência e Aplicação. 4. ed. Porto Alegre: UFRGS, 2007. 943p.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO. Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós- Graduação e Pesquisa de Engenharia. Plano de Controle de Inundação na bacia do Rio Paraíba do Sul. Rio de Janeiro, 2002. 175 p.

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