SABATINA POR GUSTAVO GODINHO

rantos e Ivete Sangalo são minhas musas do século XXI. Cada uma e, como era subversivo ser cabeludo e gostar de rock, eu entrei nessa. tem seu estilo próprio, mas todas me agradam muito. Nessa época, tive boas brigas com João Nogueira, que dizia: “ou você ELE É O CARA! gosta de rock, ou gosta de samba. Desce do muro, Nelsinho” (risos). ÍCONE DA MÚSICA, NELSON MOTTA FALA SOBRE OS DIVERSOS PERÍODOS » Durante muitos anos, você foi amante da noite e das festas, Eu nem dava bola pra ele. Sempre gostei de música boa, independen- onde colecionou muitas histórias. Hoje, está mais low profi- te do estilo musical. Mas, sem dúvida, os anos 70 foram difíceis por DE SUA CARREIRA E DIZ NÃO SABER O QUE É O SERTANEJO UNIVERSITÁRIO le. Por que escolheu ter essa “reclusão”? conta da ditadura. Meu espírito empreendedor já falava alto. Mon- (risos) Acredito que tudo tem o seu tempo. Estou chegando aos 70 tei o Holywood Rock no Rio de Janeiro em 1975 e no ano seguinte migo pessoal do "síndico" , descobridor de e padrinho de casamento de . Só isso já anos e posso afirmar com convicção que passei metade da minha vida fiz o Som, Sol, Surf em Saquarema. Não tive nenhum tipo de retor- bastaria para inscrever o nome de Nelson Motta na história da Música Popular Brasileira. Mas ele é autor de 300 canções indo dormir depois das 7h da manhã. Fui empresário da noite, con- no financeiro, mas valeu pela experiência. (entre as quais hits como Bem que se quis, Dancing days e Como uma onda), produtor de álbuns clássicos de , vivi com todo tipo de gente. Já fui loucão, conheci quase todos os tipos MarisaA Monte e (entre outros) e escritor de sucesso (Noites tropicais, Vale tudo etc). de drogas e vivenciei diversas experiências. Mas essa época passou. » Em meio a tantas histórias de "jabás" e profissionais chapas Na entrevista a seguir, Nelsinho passeia pelos bastidores da boa música produzida no país dos últimos 40 anos. O pro’ ssional já Hoje, por me dedicar efetivamente a escrever textos – sejam roman- brancas, você acha que o jornalismo e, em específico, o jorna- pertenceu a diversas tribos – da bossa nova ao rock and roll, do pop à discoteca. Ainda na seara musical, foi diretor artístico da ces ou roteiros – optei por ter uma vida mais tranquila. A profissão lismo de entretenimento continua relevante? Warner Music, produtor da Polygram e criador de programas de TV como Chico & Caetano (TV Globo, anos 1980). de escritor pede isso. Tenho um apartamento lindo em Ipanema (Rio) Não sei. Ficou bem démodé essa história do jornalismo musical apre- Graças à sua competência, Nelson Motta também se tornou referência em outras áreas do entretenimento. Ele foi o responsável e só saio dele a trabalho – como as raras vezes em que vou ao Projac sentar críticas demolidoras. Nos dias de hoje, isso é totalmente irre- por trazer a primeira edição do Holywood Rock (1975), esteve à frente da saudosa casa noturna carioca Dancing Days, escreveu 14 gravar algo para a Rede Globo. Faço todas as minhas reuniões de levante. Com a chegada da internet e a criação de blogs, um fã de livros e textos dramatúrgicos. “Sempre tive muitos amigos, me interessei por cultura e as coisas foram acontecendo. Às vezes pinta- trabalho em casa e estou tentando ter uma vida saudável. Acordo determinado gênero musical vai procurar um jornalista que somen- va um convite para escrever um texto para o amigo de um amigo meu e as coisas aconteciam”, explica. cedo, caminho pela praia e escrevo bastante. Minha nova profissão te falará bem do que ele gosta de ouvir. Aquele crítico musical que Nelson Motta chega aos 69 anos em uma versão totalmente clean. Longe das drogas e do álcool, se dedica atualmente ao musical pede esse estilo regrado e recluso. Deixei de lado a profissão de produ- escrevia sobre todos os gêneros musicais, acabou. Isso existiu somente Elis – a música, espetáculo sobre a vida de sua amiga Elis Regina. O projeto, que inicialmente seria apenas um longa-metragem, estréia tor musical e, pra falar a verdade, quase não escuto mais nenhum tipo entre as décadas de 80 e 90. Hoje o mundo está segmentado, inclusi- dia 8 de novembro no Teatro Oi Casagrande, no Rio de Janeiro, e conta todas as passagens da vida de Pimentinha. “Mas o ’ lme sobre de música. Cansei disso. ve no jornalismo cultural. ela também irá sair”, adverte. Ele também aproveita sua fase zen para investir em outros textos que, futuramente, darão origem a livros e minisséries. A seguir o multimídia fala de sua carreira e de temas mais atuais, como o êxito do sertanejo universitário. "Fui empresário da noite, convivi com todo tipo de gente. Já fui loucão, conheci quase todos os tipos de drogas e vivenciei diversas experiências. Mas essa época passou. Hoje, por me dedicar a escrever textos, optei por ter uma vida mais tranquila e saudável. Faço todas as minhas reuniões de trabalho em casa. Deixei de lado a profissão de produtor musical e, pra falar a EDITORA OBJETIVA/DIVULGAÇÃO/JC EDITORA verdade, quase não escuto mais nenhum tipo de música. Cansei disso."

» Falando em reclusão, como você avalia o jeito de ser de João » Você é amigo de quase todos os grandes artistas do Brasil, Gilberto? Ele é uma espécie de Syd Barret? mas também atua como crítico musical. Em algum momento Faz tempo que não converso com João. Ele é um bom amigo mas deixou de fazer uma crítica ao trabalho de um amigo para não não falo com ele há mais de cinco anos. Fomos vizinhos durante abalar seu relacionamento com tal artista? muitos anos e antigamente ele me ligava, mas agora nem isso. In- Muitas e muitas vezes. Eu só faço resenhas de discos que eu gosto. O felizmente ele adotou esse estilo de vida e eu espero sinceramente espaço nas minhas colunas é tão precioso que eu não vou perder tem- DEPOIS DO SUCESSO DO ESPETÁCULO SOBRE TIM MAIA, O MULTIMÍDIA AGORA ESTÁ que o mundo, um dia, venha a conhecer as canções inéditas que po dando dicas de discos ruins. É claro que eu discordo de muitos ENVOLVIDO COM A MONTAGEM DEELIS, O MUSICAL, EM CARTAZ NO RIO DE JANEIRO eventualmente ele compõe em sua solidão. trabalhos lançados por amigos e quando eles me pedem uma opinião pessoal e sincera, eu dou. Agora, quando alguém lança um disco que » SUCESSO! – Você estava escrevendo o roteiro sobre o fi lme ao , certo? Em que momento vocês deixaram de ser » Nos anos 90 você falou poucas e boas para o pessoal do ser- não me agrada, escuto algumas vezes para tentar digeri-lo. Se real- de Elis Regina e pintou o convite para participar da elaboração apenas conhecidos para se tornar íntimos? tanejo. E agora veio o sertanejo universitário. Sua opinião mente eu não me convencer de que tem qualidade, finjo que o traba- do musical para teatro. Essa mudança lhe possibilitou maior Nossa história aconteceu de uma forma curiosa. Edu me apresentou continua a mesma? lho não existiu. liberdade de criação? para Elis Regina, mas nossa aproximação só aconteceu um pouco Eu falava mal do sertanejo porque na década de 90 só havia espaço NELSON MOTTA – Sem dúvida. Trabalhar em um fi lme sobre a depois. Sempre fui muito amigo do Ronaldo Bôscoli e passei a ser para esse tipo de música. Em todos os programas de TV e emissoras » Você foi empresário da noite e recentemente tivemos diversas vida de alguém como Elis Regina requer um esforço fenomenal. Por mais próximo de Elis quando eles começaram um relacionamento, em de rádio, independente do horário, só tocava sertanejo. Hoje, sinto polêmicas envolvendo casas de shows e alvarás de funciona- ter uma limitação de tempo, o longa-metragem terá que retratar 1965. A partir de então ela confi ou a produção de seus trabalhos a que a coisa mudou um pouco de figura. Mas pra falar a verdade, não mento. Na sua época era difícil trabalhar sem essas liberações? apenas um período da trajetória de Elis em uma atmosfera de cará- mim, ouvia meus palpites sobre suas músicas e letras. Até hoje, me sei o que é sertanejo universitário, primário ou doutorado (risos). O Claro que não. Infelizmente isso é uma pratica muito comum em ter verídico. No musical, o texto é mais livre e lúdico. Elis – o mu- sinto honrado por ter podido trabalhar com Elis Regina. que eu sei é que nos meios de comunicação há espaço para todos os todo o Brasil. Na época em que fui dono da boate Dancing Days, sical tem quase três horas de duração, 25 canções e uma linguagem tipos de música. E isso é realmente muito bom. nunca tive nenhum tipo de alvará de funcionamento. E também mais fantasiosa e lírica. Mas, embora tenha me envolvido também » O que você acha da atual safra de cantoras na MPB? nunca paguei nenhum tipo de propina. Quando a fiscalização bai- no espetáculo, não deixei de lado o fi lme sobre a história da Pimen- Sem dúvida o Brasil é o país das cantoras. Recentemente tivemos a » Você tem uma história muito forte ligada ao rock. Nos anos xava na casa, eu passava uma conversa e a turma caía. Usando a tinha, previsto para estrear em 2014. Cassia Eller e ainda temos a diva Marisa Monte no auge. Mas o 70, produziu os festivais Holywood Rock e o Som, Sol, Surf gíria na época, a casa funcionou na "cariocada". Mas foi um erro cenário musical conta com outras boas cantoras, que têm tudo para se Saquarema. Fale sobre esse período. muito grande e uma irresponsabilidade sem limites. Hoje eu vejo que » Seu primeiro contato com Elis foi meio sem querer – graças tornar imortais também. Ana Carolina, Maria Gadú, Gaby Ama- Essa foi a época em que eu embarquei no rock and roll. Eu era jovem muita coisa na noite era feita de forma errada.

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