UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS

Reitor Prof. Dr. Pe. Marcelo Fernandes de Aquino, S. J. Vice-Reitor Prof. Dr. Pe. José Ivo Follmann, S. J. Pró-Reitor Acadêmico Prof. Dr. Pe. Pedro Gilberto Gomes, S. J. Pró-Reitor de Administração Prof. Dr. João Zani

CASA LEIRIA Rua do Parque, 470 93020-270 São Leopoldo-RS Brasil IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

Gilberto Antonio Faggion Lucas Henrique da Luz (Organizadores)

CASA LEIRIA São Leopoldo-RS 2016 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

Diagramação Casa Leiria

Colóquio Internacional IHU (4: 2016: São Leopoldo, RS)

4, Anais do Colóquio Internacional IHU; organização de GilbertoPolíticas Antonio públicas, Faggion, financeirização Lucas Henrique e crise da sistêmica Luz; Instituto / Humanitas, Universidade do Vale do Rio dos Sinos. – São Leopoldo: Casa Leiria, 2016. 1 CD ROM. Evento realizado na UNISINOS, em São Leopoldo, de 13 a 14 de setembro de 2016. ISSN 2525-9423 Anual 1. Brasil – Políticas públicas. 2. Políticas públicas – Brasil – Construção e efetivação. 3. Políticas públicas – Brasil – Financeirização. 4. Políticas públicas – Brasil – Crise sistêmica. I. Faggion, Gilberto Antonio (org.). II. Luz, Lucas Henrique da (org.). III. Universidade do Vale do Rio dos Sinos. IV. Instituto Humanitas (IHU). V. Título. CDU 35(81)

Catalogação na Publicação Bibliotecária: Carla Inês Costa dos Santos – CRB 10/973

Está autorizada e liberada a reprodução total ou parcial desta obra por qualquer meio, seja para uso individual ou coletivo e para

objetividade o conteúdo deste livro. Solicita-se que toda reprodução qualquer finalidade que tenha por escopo dar a conhecer com

indique a referência bibliográfica de onde foi retirada. 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

SUMÁRIO

7 APRESENTAÇÃO 8 OBJETIVOS 10 ORGANIZAÇÃO 11 PROGRAMAÇÃO 21 A ACCOUNTABILITY EM SAÚDE PÚBLICA: UMA REVISÃO DE LITERATURA Marcelo de Moura Carvalho Maria Dalva Macedo Ferreira 45 A GOVERNAMENTALIDADE APLICADA AOS EMPREENDIMENTOS ECONÔMICOS NANOTECNOLÓGICOS: A NANOÉTICA Daniela Pellin Wilson Engelmann 79 A REFORMULAÇÃO DA POLÍTICA NACIONAL DE DST/ AIDS NO BRASIL: UM ESTUDO COMPARATIVO ENTRE A PERSPECTIVA DO ESTADO E DO MOVIMENTO SOCIAL DE LUTA CONTRA AIDS DO E PERNAMBUCO Luciane Pinheiro Jardim 105 A TRIBUTAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE REALIZAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL Marciano Buffon Lilian Ramos Jacob 127 BIOPOLÍTICA E FINANCEIRIZAÇÃO DA VIDA Rodrigo Diaz de Vivar y Soler 145 CRISE SISTÊMICA E PROTEÇÃO SOCIAL: UMA ANÁLISE NOS GOVERNOS DE CENTRO-ESQUERDA DE BRASIL E ARGENTINA Luciana Pazini Papi

5 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

SUMÁRIO

183 ENTRE ESTABELECIDOS E OUTSIDERS: A CONSTRUÇÃO DA INFORMAÇÃO SOCIAL NAS RÁDIOS COMUNITÁRIAS PELAS COMUNIDADES RURAIS E QUILOMBOLAS Marco Antônio de Oliveira Tessarotto 197 O CAPITAL NO SÉCULO XXI E SUA APLICABILIDADE À REALIDADE BRASILEIRA Róber Iturriet Avila João Santos Conceição 233 O DESAFIO DA INCLUSÃO PRODUTIVA DE FAMÍLIAS POBRES EM CONTEXTO DE DESIGUALDADE SOCIOECONÔMICA E POLÍTICAS PÚBLICAS FRAGMENTADAS Adriane Vieira Ferrarini Estelamaris de Barros Dihl Jéssica Caroline Wallauer Gustavo Oliveira 251 OS LIMITES FINANCEIROS E ORÇAMENTÁRIOS DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM POLÍTICAS PÚBLICAS DE MEIO AMBIENTE Julia Marta Drebes Dörr Fernanda Dalla Libera Damacena 291 POLÍTICAS CULTURAIS EM MUSEUS: PANORAMA E PERSPECTIVAS DO CENÁRIO BRASILEIRO Mélodi Ferrari 311 PORTO MARAVILHA: ENTRE A FINANCEIRIZAÇÃO, O BIOCAPITALISMO E A FLEXIBILIZAÇÃO DO DIREITO Luiz Felipe Teves de Paiva Sousa 339 PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA EM LONDRINA/PR: CONVERGÊNCIA ENTRE ESTADO E CAPITAL IMOBILIÁRIO Eliane Barbosa Santos Pagani 359 SCHULD: DÍVIDA E CULPA NA GENEALOGIA DA MORAL, DE NIETZSCHE Márcia Junges

6 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

APRESENTAÇÃO

IV Colóquio Internacional IHU Políticas Públicas, Financeirização e Crise Sistêmica

As políticas públicas são relevantes à redução das vulnerabilidades, à erradicação da pobreza, à equali- zação de oportunidades e à desmercantilização do acesso aos direitos fundamentais. Ao mesmo tempo, o conceito político.de política É nesse pública escopo é historicamente que se insere inteligível.o colóquio Deve interna ser- cionalpensado proposto, em seu que contexto visa analisar histórico, transdisciplinarmente social, econômico e a construção e efetivação das políticas públicas no Brasil, - ca, problematizando resultados, limites e possibilidades. Financeirizaçãotendo como referência que gerou a financeirização o capitalismo cognitivo e a crise esistêmi desco-

Ela nos coloca em uma transição epocal, com possibilida- desbriu que a força aumentam produtiva capacidades das interações da sociedade da multidão e, ao humana. mesmo

- nanceirizaçãotempo, complexificam e da crise vários epocal, problemas de forma - a crise fortalecer sistêmica. (no- vas)Faz-se instituições, necessário contra analisar instituições, as políticas movimentos, públicas à luz capazes da fi de dar à financeirização e às políticas públicas um rosto humano, sintonizado com as necessidades do nosso tempo.

7 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

OBJETIVOS

Objetivo Geral:

Analisar transdisciplinarmente a construção e efetivação das políticas públicas no Brasil, tendo como re- apontar e problematizar seus principais resultados, limites eferência possibilidades. a financeirização e a crise sistêmica, de forma a

Objetivos Específicos:

Descrever a genealogia e paradigma(s) das polí- ticas públicas adotadas no Brasil, problematizando seus principais limites e possibilidades. crise sistêmica, analisando seus principais impactos nas lógicas eCompreender perspectivas das os políticas conceitos públicas de financeirização no Brasil. e

Analisar o contexto histórico das políticas públicas- çosno Brasil, e alternativas identificando às políticas os seus públicasprincipais brasileiras, determinantes. tendo Identificar possíveis retrocessos, entraves, avan como pano de fundo a financeirização e a crise sistêmica.

8 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

Promoção

Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS Instituto Humanitas Unisinos – IHU

Apoio

• Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES • Curso de Graduação em Ciências Sociais – UNISINOS • Curso de Graduação em Jornalismo – UNISINOS • Curso de Graduação em Direito – UNISINOS • Curso de Graduação em Administração – UNISINOS • Curso de Graduação em Serviço Social – UNISINOS • Eixo Humanismo Social Cristão da UNISINOS • Programa de Pós–Graduação em Administração – UNISINOS • Programa de Pós-Graduação em Educação – UNISINOS • – UNISINOS Programa de Pós-Graduação em Filosofia

9 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

ORGANIZAÇÃO

Comissão organizadora

Prof. Dr. Inácio Neutzling – UNISINOS Profa. Dra. Cleusa Maria Andreatta – UNISINOS Prof. MS Gilberto Antonio Faggion – UNISINOS MS Jéferson Ferreira Rodrigues – UNISINOS Prof. Dr. Lucas Henrique Luz – UNISINOS Profa. Dra. Marilene Maia – UNISINOS

Profa. Dra. Susana Rocca – UNISINOS Profa. Dra. Maria Aparecida Rocha – UNISINOS

Comissão técnico–científica

Prof. Dr. André Luiz Olivier da Silva – UNISINOS Profa. Dra. Claudia de Salles Stadtlober – UNISINOS Prof. MS Gilberto Antonio Faggion – UNISINOS Profa. Dra. Gisele Spricigo – UNISINOS

Prof. Dr. Inácio Neutzling – UNISINOS Prof. Dr. LucasGuilherme Henrique de Azevedo da Luz – UNISINOS

Profa. Dra. Marilene Maia – UNISINOS Profa.Profa. Dra. MariaDra. Susana Aparecida Rocca Rocha – UNISINOS – UNISINOS

10 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

PROGRAMAÇÃO

13 de setembro de 2016 (Terça–feira) 8h30min – Início do Credenciamento – Sala Ignacio

9h – Abertura Ellacuría e Companheiros – IHU 9h15min às 10h15min COMPREENDENDO A FINANCEIRIZAÇÃO: CONCEITO(S), ORIGENS, IMPACTOS E (IM) POSSIBILIDADES

Conferencista: Prof. Dr. Yann Moulier Boutang –

– França 10h15minUniversité às 10h45min de Technologie – Debate de Compiègne – UTC

11 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

PROGRAMAÇÃO

13 de setembro de 2016 (Terça–feira) 11h às 12h POLÍTICAS PÚBLICAS E POLÍTICAS SOCIAIS NO CONTEXTO DO CAPITALISMO FINANCEIRO

Conferencista: Profa. Dra. Berenice Rojas Couto –

Sul – PUCRS 12h àsPontifícia 12h30min Universidade – Debate Católica do Rio Grande do

12 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

PROGRAMAÇÃO

13 de setembro de 2016 (Terça–feira) 14h às 15h FINANCEIRIZAÇÃO E SUAS ESTRUTURAS: A TRANSIÇÃO ECOLÓGICA PARA UMA SOCIEDADE DOS COMUNS?

Conferencista: Prof. Dr. Gaël Giraud – Centre National de

15h às 15h30min – Debate la Recherche Scientifique – CNRS – França

13 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

PROGRAMAÇÃO

13 de setembro de 2016 (Terça–feira) 15h45min às 16h45min FINANCEIRIZAÇÃO E EFEITOS SOBRE A ESTRUTURA AGRÁRIA BRASILEIRA, A POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A REFORMA AGRÁRIA E POVOS TRADICIONAIS

Conferencista: e Ação Social – CEAS e Universidade Católica do Salvador – UCSalProf. Dr. Joaci Cunha – Centro de Estudos 16h45min às 17h15min – Debate

14 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

PROGRAMAÇÃO

13 de setembro de 2016 (Terça–feira) 17h15min às 18h30min COMUNICAÇÕES E APRESENTAÇÕES DE TRABALHOS CIENTÍFICOS Local: 100 Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros – IHU e B04 19h30min às 21h30min A FINANCEIRIZAÇÃO E SEUS IMPACTOS NA VIDA EM SOCIEDADE: (CO)GESTÃO PÚBLICA, PRIVADA E/OU SOCIAL

Conferencista: Prof. Dr. Yann Moulier Boutang –

– França 21h30minUniversité às 22h de –Technologie Debate de Compiègne – UTC Local: Auditório Sérgio Concli Gomes – C09

15 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

PROGRAMAÇÃO

14 de setembro de 2016 (Quarta–feira) 8h30min – Recepção – Sala Ignacio Ellacuría e

9h àsCompanheiros 10h – IHU POLÍTICAS PÚBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISES. UM OLHAR A PARTIR DE GILLES DELEUZE

Conferencista: Prof. Dr. Giuseppe Cocco – Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ 10h às 10h30min – Debate

16 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

PROGRAMAÇÃO

14 de setembro de 2016 (Quarta–feira) 14h às 15h POLÍTICAS PÚBLICAS, ENDIVIDAMENTO E AJUSTE FISCAL NO BRASIL

Conferencista: Prof. MS Josué Martins – Auditoria Cidadã da Dívida 15h às 15h30min – Debate

17 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

PROGRAMAÇÃO

14 de setembro de 2016 (Quarta–feira) 15h45min às 16h45min POLÍTICAS PÚBLICAS, POLÍTICAS SOCIAIS E A FINANCEIRIZAÇÃO NO BRASIL: DO MODELO ATUAL À NECESSIDADE DE NOVOS MODELOS

Conferencista: Prof. Dr. Evilásio da Silva Salvador – Universidade de Brasília – UnB 16h45min às 17h15min – Debate

18 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

PROGRAMAÇÃO

14 de setembro de 2016 (Quarta–feira) 17h30min às 18h30min COMUNICAÇÕES – APRESENTAÇÕES DE TRABALHOS CIENTÍFICOS Local: 100 Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros – IHU e B04 19h30min às 21h30min O CAPITALISMO VINDOURO E A SUSTENTABILIDADE: OS PAPÉIS DA GESTÃO E DA ECONOMIA

Conferencista: Prof. Dr. Gaël Giraud – Centre National de

21h30min às 22h – Debate la Recherche Scientifique – CNRS – França Local: Auditório Sérgio Concli Gomes – C09

19 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

ARTIGOS

20 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS A ACCOUNTABILITY EM SAÚDE PÚBLICA: UMA REVISÃO DE LITERATURA

Marcelo de Moura Carvalho1 Maria Dalva Macedo Ferreira2

RESUMO: dos últimosOBJETIVO: 5 anos que Esterespondam trabalho como tem é comorealizada objetivo a ac- analisarcountability nas em bases saúde de pública. dados eletrônicas METODOLOGIA: as publicações Trata-se de uma revisão sistemática da literatura. Inicialmente foi publicações sobre a realização da accountability pela ges- definida a questão norteadora da pesquisa que é Quais as Accountability; (b) Saúde Pública e (c) Gestão. Estabelecido comotão na critérios saúde pública? de inclusão e definição dos artigos das palavrasencontrados chaves: com (a) os três descritores citados acima publicados entre os anos de Marcelo de Moura Carvalho e Maria Dalva Macedo Ferreira

LILACS, MEDLINE, SCIELO. RESULTADOS (1) Prestação de 2010 à 2015, utilizou-se das bases de dados eletrônico da- de estudados apresentam problemas similares, como baixa contas: constatou-se que os conselhos municipais de saú- de dos vínculos com suas bases, e pouca autonomia dos representantesrepresentatividade da sociedadedos conselheiros, civil no denotandoprocesso de fragilida tomada

- nacionaisde decisões; sobre (2) oProcesso uso de arranjos de Trabalho; contratuais Ditterich, e incentivos Moyses e Moyses (2012) avaliaram relatórios de organismos inter

1 Discente do Programa de Doutorado em Políticas Públicas da UFPI. profissionaisEnfermeiro nos da Estratégia serviços de de Saúde saúde; da Família (3) Processo de Teresina. de Professor gestão; do

2 Doutora. Docente do programa de doutorado em Políticas Públicas da UFPI.curso Professorade bacharelado titular em da Enfermagem Universidade da Federal UFPI. do Piauí – UFPI. 21 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Bonacim e Araujo (2010) avaliaram os custos do Hospital das Clínicas que possibilitam a avaliação individual dos departamentos, o tipo do serviço prestado, quantidades e custos. CONCLUSAO: Pode-se concluir que o termo accoun- tability saúde, mas existe a necessidade de mais estudos sobre os diversos vem tipos ganhando de accountability importância aplicados nos estudos a este da setor área tão da importante para a vida de nossa população. PALAVRAS-CHAVE: Accountability. Saúde Pública. Gestão.

ABSTRACT:

respond to accountability OBJECTIVE: This study aims to analyze the electronic databases publications of the last five years to- in public health is performed.- METHODOLOGY: This accountability is a systematic for review managing of the public lit erature. the guiding research question is What publica (a)tions Accountability about achieving health initially was defined? and definition of key words: ; (B) Public Health and (c) management. Established inclusion criteria of the articles found with LILACS,the three MEDLINE, aforementioned SCIELO. descriptors RESULTS (1) published Accountability between: it the years 2010 to 2015, we used the electronic databases

was found that the municipal health councils studied have similar problems, such as low representation of directors,- indicating fragility of ties to their bases, and little autonomy (2012)of civil societyevaluated representatives international in organizationsthe decision-making reports pro on cess; (2) Working Process; Ditterich, Moyses and Moyses-

the use of contractual arrangements and professional in centives in health services; (3) management process; Bonacim and Araujo (2010) evaluated the Clinical Hospital costs that enable the evaluation accountabilityof individual departments, is becoming

A accountability em saúde pública: uma revisão de literatura A accountability em saúde pública: uma revisão the type of service, quantities and costs. CONCLUSION: It can be concluded that the term 22 more important in health studies, but there is a need for 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS accountability ap- further studies on the various types of : pliedKEYWORDS to this importantAccountability sector for the life of our population. . Public health. Management. 1 INTRODUÇÃO

Atualmente vivemos no Brasil o impacto da opera- dentro do governo com empresas do setor da construção civilção Lava já consagrada Jato deflagrado como contraa maior um investigação sistema de decorrupção corrup-

Diante de tal realidade, como a sociedade civil podeção da participar história pelo ativamente volume destede recursos momento envolvidos. conturbado da política contribuindo para o fortalecimento da democracia em nosso país? Não só neste setor envolvido na citada ope- - te no setor da saúde? ração comandadaEm outras pela palavras Polícia como Federal, a sociedade mas especificamen civil pode controlar ou monitorar a ação de seus representantes, Marcelo de Moura Carvalho e Maria Dalva Macedo Ferreira principalmente, no setor saúde que constantemente é alvo de reportagens pela mídia relatando as péssimas condi- ções de prestação de serviços ao tempo que se descobrem constantes casos de desvio de conduta de seus gestores formando um círculo vicioso de baixa qualidade dos ser- viços prestados à população associada à falta de recursos no setor. Um termo muito utilizado recentemente nos meios acadêmicos em todo o mundo relacionado à cultu- ra política é o termo accountability palavra em inglês que na integra em outra língua que não seja a inglesa, mas de maneirapossui uma geral gama para de a significadolíngua portuguesa que dificulta pode sersua traduzida tradução como prestação de contas dos governantes/gestores para com a sociedade. 23 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA - ta teórico, accountability, enquanto termo relativamente recente, Deexpressa acordo a com preocupação Schedler (1999)nas discussões do ponto sobre de vis a teoria política moderna de: Como domar o poder político? Atualmente o termo accountability expressa à procura con- tínua de revisão e supervisão, monitoramento e exercício institucional do poder. O termo accountability pode ser dividido em dois - ro refere-se a uma relação de controle que ocorre a partir datipos sociedade básicos: verticalpara com e horizontal, o Estado, oenquanto segundo que diz o respeito primei às relações entre as instituições. Embora, na prática, es- tes dois tipos básicos de accountability são relacionados mutuamente, em termos analíticos convém tratá-los separadamente a fim de esclarecer o que quer dizer cada um (RAMÍREZ et al, 2014). Enrique Peruzzotti e Catalina Smulovitz indicam a existência de um tipo de accountability vertical que não é o eleitoral, denominado de accountability social ou societal, este termo, que designa uma multiplicidade de ações, tais como manifestações de protesto e/ou denúncia através dos meios de comunicação realizados pela sociedade civil, não necessariamente em períodos eleitorais, contra os re- presentantes eleitos do povo no intuito de “reparar, preve- nir e / ou punir ações” destes representantes (RAMÍREZ et al, 2014). Entre os espaços institucionais para a realização do accountability sobre a representação política em ins-

de políticas públicas, com destaque para os do setor saúde quetâncias se multiplicaram participativas, país encontram-se a fora (SIPIONI; os conselhos SILVA, 2015). gestores No entanto, quando da instituição destes conse-

popular através Constituição de 1988, esta iniciativa era encaradalhos gestores de formacomo espaçoscelebratória privilegiados nos meios de participaçãoacadêmicos

A accountability em saúde pública: uma revisão de literatura A accountability em saúde pública: uma revisão como um moderno mecanismo de fortalecimento da de- 24 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS mocracia, atualmente esses conselhos gestores são visto com muita desconfiança por terem perdido fôlego frente (DAGNINO;a uma série TATAGIBA, de empecilhos 2006). que em muitos casos só estão legitimandoDessa velhos forma, costumes de acordo de com nossa André cultura e Ciampone política (2007) o gestor de saúde, seja qual for sua esfera de atua- ção, deve ter uma visão ampliada de saúde, ser capaz de uma priorização adequada dos problemas e necessidades da comunidade, e de executar o modelo de atenção integral e da gestão participativa. - - Partindo-se da premissa de que os conselhos ges- randotores setoriais, a exclusividade como é doso caso representantes dos conselhos tradicionais da saúde, bus em proporcam reduzir estratégias a distância e políticas entre política somente e senso via representação comum, reti eleitoral (BORBA; LÜCHMANN, 2008). Diante deste questionamento procuramos avaliar os artigos publicados nos últimos 5 anos utilizando as pa-

Accountability, Saúde Pública e Gestão, nas Marcelo de Moura Carvalho e Maria Dalva Macedo Ferreira lavras chaves: - bases de dados eletrônico da LILACS, MEDLINE, SciELO,- com a intenção de verificar o que está sendo estudado so bre este tema no setor saúde afim de detectar possíveis la cunas a serem preenchidas em estudos futuros. 2 PERCURSO METODOLÓGICO

Para a realização desta pesquisa bibliográfica- foram definidas seis etapas conforme definem Mendes; Silveira; Galvão (2008) para uma revisão bibliográfica in ategrativa: realização (1º da passo) accountability Inicialmente pela gestão foi definida na saúde a questão públi- norteadora da pesquisa que é Quais as Accountabilitypublicações sobre; (b) Saúde Pública e (c) Gestão. ca? e definição das palavras 25chaves: (a) ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Em seguida (2º passo) foi estabelecido como crité- rios de inclusão dos artigos encontrados com os três des- critores citados acima publicados entre os anos de 2010 à 2015, tanto na língua vernácula como estrangeira e que atendesse a questão norteadora da pesquisa, como crité- rio de exclusão, os artigos publicados anteriores ao ano de 2010 ou que não atendesse a questão norteadora da pes-

da LILACS, MEDLINE, SciELO, selecionando inicialmente 11quisa; estudos para tanto,e conforme utilizou-se os critérios das bases de deinclusão dados eeletrônico exclusão

Nesta etapa (3º passo), foi realizada a extração dasficaram informações apenas 7 estudos.dos referidos estudos e feita sua cate- gorização, com o auxilio de um instrumento de coleta de dados com itens pertinentes ao que se queria extrair dos artigos; (4º passo) a seguir foi realizada uma nova análise

mais criteriosa dos estudos selecionados para definição da gestão;utilização (5º dos passo) mesmos, Nesta onde penúltima foram definidas etapa, foi as realizada categorias a interpretaçãoprestação de contas;dos resultados processo com de trabalhoos resultados e processo e discus de- sões dos referidos artigos e realizado sugestão para futu- ras pesquisas;

resumo das evidencias disponíveis e a construção do texto da presentePor pesquisa.fim, na etapa final (6º passo) foi realizado um

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Para iniciar a discussão dos artigos selecionados com os descritores: Accountability, Saúde Pública e Gestão, optou-se por realizar uma análise das revistas que conti-

Observa-se que o termo accountability vem sendo nha os referidos artigos. - A accountability em saúde pública: uma revisão de literatura A accountability em saúde pública: uma revisão trabalhado em diversas áreas26 do conhecimento com desta que para a área da saúde e administração (Gráfico 1). 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

(PI). 2015. (n=7) Gráfico 1. Revistas de publicação dos estudos selecionados. Teresina

Fonte: Elaborado pelos autores (2015). Com uma publicação por revista conforme meto- dologia utilizada para realização deste estudo, as revistas - ríodo de 2010 à 2015, às da área da administração com 2 publicaçõesda área da saúde apesar possuem de serem 4 voltadastrabalhos para publicados a saúde noe uma pe Marcelo de Moura Carvalho e Maria Dalva Macedo Ferreira publicação de uma revista de ciências sociais, também vol- - prios descritores utilizados. tada para Outro a área ponto específica em comum da saúde, entre em estas virtude publicações dos pró fato de seis delas serem revista do sul e sudeste do país, sendoalém do duas fator revista de trabalharem do Rio de temas Janeiro; relativos uma revista à saúde para é o os estados de São Paulo, Curitiba, Belo Horizonte e Porto

Atualmente a crítica realizada à democracia pos- suiAlegre uma e apenasnova trama uma conceitual,fora do país onde (WASHINGTON, os conceitos USA). de par - - ções e conceitos como accountability e termos correlatos ticipaçãovem se destacando e representação nos estudos vão ganhando sobre democracia novas configura nas di- versas partes do mundo (LAVALLE; VERA, 2011). 27 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Segundo Ramirez et al; (2014) a qualidade da democracia depende tanto do funcionamento dos meca- nismos políticos previsíveis, como da participação da so- ciedade civil através do exercício de sua cidadania, que se ligam sistematicamente, dessa forma, representantes e/ou governantes passem a produzir responsabilização no uso da autoridade pública. Para Lavalle e Vera (2011) a participação dentro de um regime democrático trás consigo os princípios de igualdade e autodeterminação, como também, um caráter pedagógico, controle social, racionalização e legitimidade. O que se observa atualmente é o dever do gestor público de prestar contas, que além de ser uma demanda social, é uma exigência legal, sendo que seu descumpri- mento ou sua inviabilização seria um obstáculo à constru- ção de uma sociedade mais justa e equilibrada (FLEURY et al, 2010). Para facilitar a discussão dos artigos seleciona- dos neste estudo foram formadas três categorias, a saber:

Processo de gestão. (1) PrestaçãoApresentamos de contas; os (2) 7 artigosProcesso encontrados de Trabalho; nas e ba(3)- ses de dados, com respectivos descritores Accountability; Saúde Pública e Gestão de forma resumida conforme expõe a tabela 1: A accountability em saúde pública: uma revisão de literatura A accountability em saúde pública: uma revisão 28 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Tabela 1. Síntese dos estudos selecionados por categoria, autor e objetivo. Teresina (PI). 2015. (n=7).

Categoria Ator (ano) Objetivo

de saúde dos municípios de Lagoa ROCHA, C. V. Analisa dois conselhos municipais- (2011) riência do projeto Centro de Encontro eda Integração Prata e Bom de AçõesDespacho (CEIA), e a desen expe- volvido no município de Betim GONCALVES, R. S.; Analisa numa perspectiva compa- rada os relatórios de prestação de Prestação GONCALVES, A. O.; contas das Secretarias Estaduais de de contas SERRANO,HAYAKAWA, A. R.L. M.I.; (2013) Estaduais de Saúde Saúde encaminhados aos Conselhos Associar a arquitetura teórica da gestão estratégica de recursos (ou de SILVA NETO, J. M.; RIBEIRO, R. P. Família com os vetores de eliminação (2012) dadesempenho) ocorrência dedo variáveisPrograma restritivas Saúde da ao sucesso do programa Apresentar e discutir a utilidade e DITTERICH, R. G.; aplicabilidade de contratos de gestão MOYSES, S. T.; MOYSES, S. J. por resultados no setor público de Marcelo de Moura Carvalho e Maria Dalva Macedo Ferreira (2012) saúde.e incentivos profissionais na gestão Investigar quais são as percepções Processo - sionais da assistência social (Centro de PAIVA, F. S.; dee dinâmicas Referência de da trabalho Assistência dos Social) profis Trabalho FERREIRA, M. L.; e da saúde (Estratégia de Saúde da MARTINS, M. Z. F.; Família), bem como dos líderes co- BARROS, S. L. C. F.; munitários acerca do processo de RONZANI, T. M. reinserção social dos usuários de ál- (2014) cool e outras drogas no contexto da

de Fora Vila Gerônimo, do município de Juiz

29 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

Categoria Ator (ano) Objetivo Analisar os impactos do processo de FLEURY, S.; OUVERNEY, A. L. M.; - KRONEMBERGER, T. S.; cal,descentralização tendo como foco na configuração a democratiza da- ZANI, F. B. çãogovernança da relação no Estado/Sociedade âmbito do poder lono (2010) período compreendido entre 1996 e 2006 no Brasil Processo Analisa a situação do sistema de de Gestão custos do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão BONACIM, C. A. G.; Preto da Universidade de São Paulo ARAUJO, A. M. P. (HCFMRP-USP), bem como avalia a (2010) proposta de mudança de metodolo- gia de custeio: do método absorção para o custeio baseado em atividades (ABC) Fonte: Elaborado pelos autores (2015).

3.1 Prestação de contas Dentro desta categoria foi utilizado três artigos que se aproximaram entre si por versarem sobre a pres- tação de contas no setor da saúde, no entanto de maneiras diferentes. Esta prestação de contas que podemos aqui deno- minar de accountability formas com citado por Lavalle e Vera (2011) que denomina de accountabilities, pode ser classificado de diversas- tal, vertical, corporativa, inversa, retrospectiva, prospecti- va, eleitoral, social e podendo societal. ser classificado em: horizon Goncalves et al; (2013) analisaram os relatórios de prestação de contas elaborados pelas Secretarias Estaduais de Saúde (SES) dos estados da região Sul acrescido do es- tado do Rio de Janeiro e Espírito Santo e submetidos aos - beração e avaliação nos exercícios de 2008 e 2009. respectivosConforme Conselhos os Estaduaisseus resultados de Saúde encontrados (CES) para delipor

A accountability em saúde pública: uma revisão de literatura A accountability em saúde pública: uma revisão Goncalves et al; (2013) que os dividiu em três categorias, a 30 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS - - pla,saber: média (1) Dimensão e restrita materialidade;cada item analisado (2) Dimensão nas respectivas relevân dimensões.cia; e (3) Dimensão confiabilidade, classificando em am Os autores acima descrevem para a dimensão mate- rialidade que o Estado do Paraná destaca-se negativamente, acercapois regrediu dos recursos de uma aplicados informação na saúde classificada o foram comosomente ampla em seu(2008) montante para média total e(2009) não por significando cada ação/programa. que as informações restrita em todos os Estados pesquisados na região Sul im- A dimensão relevância apresentou uma tendência estabelecidaspossibilita a reflexão pela respectiva da sociedade SES diante e conselheiros da programação acerca orçamentáriado acompanhamento do exercício dos vindouro. objetivos, metas e prioridades Por se tratar da prestação de contas das Secretarias - tivos Estados observa-se estes espaços públicos amplia a

Estaduaisnoção de democracia de Saúde aosparticipava Conselhos que de para Saúde Dagnino, dos respec Olvera Marcelo de Moura Carvalho e Maria Dalva Macedo Ferreira - - e Panfichi (2006) deriva do conceito de democracia par ticipativa como sistema articulado de instâncias de inter- venção dos cidadãos nas decisões que lhes concerne e na vigilância do exercício do governo. No entanto, confor asme Secretarias os resultados de Saúde da dimensão prestaram relevância contas. o exercício dos ConselhosE na de ultima Saúde dimensãoforam prejudicados descrita pelos pela autores forma comocons- tatou-se que os Estados pesquisados da região Sudeste apresentaram uma tendência ampla, enquanto que o Paraná e Santa Catarina, uma tendência restrita que impli- de saúde considerados mais relevantes, com custos maio- resca na e demandasfalta de recursos com maior financeiros volatilidade em programas como, por e exemações- plo, o fornecimento de medicamentos. 31 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Por sua vez, Silva Neto e Ribeiro (2012) têm como objeto de estudo os relatórios produzidos pela - lizações realizadas para avaliar a execução dos programas governamentaisControladoria Geral federais da União pelos (CGU), municípios provenientes brasileiros de fisca en- tre os anos de 2005 e 2007. A pesquisa evidenciou a existência de variá- veis restritivas à qualidade da gestão do Programa de Saúde da Família em 91% dos municípios auditados pela Controladoria Geral da União (CGU), sendo que, o tipo de

recursos do programa (SILVA NETO; RIBEIRO, 2012). falha mais Podemos frequente notar refere-se ao analisar à ineficiência estes dois na artigos gestão quedos estamos diante de duas formas de accountability, sendo no primeiro caso um accountability vertical onde a gestão

trata-se do accountability - taspresta entre contas as instituições, aos Conselhos que deneste Saúde caso, e nopor segundo se tratar caso de relatórios da CGU este são horizontal direcionados onde para é prestado a União con no intuito de aprimorar os programas federais e não para os municípios. Dando continuidade aos resultados encontrados por Silva Neto e Ribeiro (2012) os mesmos evidenciaram

variáreisque a restrição restritivas à eficiência relativas correspondeu aos dois anos a 45%posteriores. das falhas Os errosidentificadas mais comuns em 2005, desta passando natureza a e representarevidenciados 55% nos dasre- latórios referiram-se à: a) ausência de infraestrutura ade- quada para o atendimento dos pacientes; b) existência de

filas no atendimento dos usuários; e c) problemas quanto à composição,Uma questão qualificação importante e disponibilidade levantada pelos das equipesautores acimaprofissionais é relativa do aoPSF. controle social por conforme os relató- A accountability em saúde pública: uma revisão de literatura A accountability em saúde pública: uma revisão 32 rios da CGU é a fragilidade quanto à atuação do Conselho 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Municipal de Saúde na avaliação da execução do Programa de Saúde da Família. Para Nogueira (2005) a participação da sociedade civil na gestão pública está associada às exigências da mo- dernidade e da globalização capitalista expressas como in- satisfação social com esta gestão, principalmente, pela má qualidade dos serviços prestados. Mas conforme resultado apontado por Silva Neto e Ribeiro (2012) existe uma fra- gilidade muito grande na visão dos relatórios da CGU dos

- conselhostas demandas municipais ao gestor de local. saúde que deveriam contribuir para a melhoriaO resultado destes apontado serviços atravéspor Silva da solicitaçãoneto e Ribeiro des (2012) sobre a condução do Programa Saúde da Família é preocupante, pois esta se constitui na principal estratégia de atendimento da população brasileira, sendo considera- da a porta de entrada preferencial do usuário do Sistema Único de Saúde (SUS) Lima et al., (2014) descrevem que com o intuito de atender as prerrogativas da Atenção Primária em Saúde (APS) o Ministério da Saúde (MS) adotou a Programa Saúde Marcelo de Moura Carvalho e Maria Dalva Macedo Ferreira da Família, atualmente denominada Equipe de Saúde da Família, amparada na equipe de saúde da família, que pos- sui responsabilidade sanitária de uma determinada popu- lação adscrita em um território, assistindo ao individuo em sua integralidade, considerando-o em seu contexto social e familiar, privilegiando as ações coletivas. Ainda dentro desta categoria o artigo desenvolvi- municipais de saúde dos municípios que apresentam ca- racterísticasdo por Rocha políticas (2011) sobre bem distintasduas experiências e uma relativa de conselhos à expe- riência do projeto Centro de Encontro e Integração de Ações (CEIA) de origem cubana, sendo as três em municípios do Estado de Minas Gerais. municipais de saúde apesar das diferenças ressaltadas, Rocha (2011) constatou que quanto aos conselhos 33 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

aponta a ocorrência de problemas similares, como baixa a avaliação dos conselhos de saúde em ambas as cidades- dade dos vínculos com suas bases, e pouca autonomia dos representantesrepresentatividade da sociedade dos conselheiros, civil no processo denotando de tomada fragili de decisões, especialmente dos representantes dos usuá- -

rios do sistema de saúde, face à hegemonia dos represen carátertantes dos meramente conselheiros informativo governamentais, e consultivo, como e muitotambém, pou a- copercepção deliberativo. dos conselheiros é de que sua atuação tem um Segundo Martins et al, (2008) apesar do avanço

canal de participação popular, entendem que essa partici- paçãoquando ainda da criação “está longe dos conselhos de alcançar de saúdea plenitude como daforma demo de- cracia republicana e pluralista moderna.

mesmo buscou organizar a população de Betim em nú- cleos porQuanto quarteirões, à experiência no sentido cubana, de mobilizá-la do projeto para CEIA, dis o- cutir questões referentes aos serviços públicos, no entanto, como o projeto era organizado pelo gabinete do Prefeito, isso implicou em uma forte centralização das decisões no

Para Dagnino e Tatagiba (2006) ocorreu uma de- chefecepção do como poder os executivo movimentos municipal. sociais que não conseguiram eliminar a prática da cultura política clientelista pelo me- canismo das relações de favor ainda impregnado em nossa cultura política. Simionatto (2010) endossa a análise realizada pe- las autoras acima sobre a perda do caráter celebratório dos movimentos sociais no Brasil, para a autora:

Os movimentos sociais anteriormente vincula- dos a valores, idéias e propostas éticas e políticas entre as décadas de 70 e 80 passaram a espaço a

A accountability em saúde pública: uma revisão de literatura A accountability em saúde pública: uma revisão associações de ordem diversa, voluntariado, coo- 34 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS perativas e ONGs, proclamados como sujeitos po- líticos plenamente capazes de dar “voz e vez” às classes subalternas, em um processo que podería- mos denominar “repolitização da política às aves- sas” (Simionatto, 2010, p. 38).

3.2 Processo de Trabalho Para esta segunda categoria foram selecionados dois artigos que descreve o processo de prestação de con- tas tendo em vista a melhoria da qualidade do processo de trabalho. internacionaisDitterich, sobre Moyses o uso e de Moyses arranjos (2012) contratuais realizaram e incen uma- revisão bibliográfica de artigos e relatórios de organismos gestãotivos profissionais por resultados nos sistemastem sido etema serviços discutido de saúde. como um Dentre seus achados podemos destacar que a - casprocesso públicas. importante Nessa lógica, pela busca os contratos por eficácia, de gestão efetividade surgem e Marcelo de Moura Carvalho e Maria Dalva Macedo Ferreira comoeficiência instrumentos na gestão dosde implantação serviços e na de construção uma administração de políti por objetivos e busca inexorável por resultados no setor organizações (DITTERICH; MOYSES; MOYSES, 2012). público, Diantevisando das à qualidade novas exigências de serviços nos serviços e à eficiência de saúde, das - de de implantação de novos mecanismos gerenciais no se- Ditterich,tor saúde, Moyses tais como e Moyses o uso de (2012) contrato descrevem de gestão a necessida e incenti- - vos profissionais,Observa-se espera-se a necessidade que estes de uma provoquem nova gestão mudan pú- blicaças no surge processo em um de trabalhocenário de e gerência.críticas ao modelo burocrá- - micas, políticas e sociais colocadas para o Estado (SANO; ABRÚCIO,tico da administração 2008). pública e de novas exigências econô 35 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA O artigo de Paiva et al (2014) descreve o proces-

com transtornos mentais. Estes autores constataram o de- so de trabalho da equipe de saúde que atua com pacientes romperem com a fragilidade das ações multissetoriais, isto é,safio ações para baseadas os profissionais, em um envolvimentogestores e líderes mínimo comunitários entre os - lação em torno de um objetivo comum, qual seja, promover adiversos reinserção serviços social e dossetores, usuários sem, dede drogas.fato, haver uma articu É possível depreender, como resultado da pesqui- sa, que o processo de estigmatização repercute no distan- ciamento social e que gera consequências negativas para a saúde e o bem-estar do usuário. Essas consequências, de

acesso a cuidados em saúde, educação, emprego, moradia eforma outros geral, (PAIVA podem et al, ser2014). indiretas, como a dificuldade de

Dessa forma fica evidente neste artigo que alguns vistadesafios o seu necessitam processo serde inserção enfrentados social no efetiva tocante (PAIVA à análise et al, e 2014).cuidado do usuário de substâncias psicoativas, tendo em Com os altos índices de prisões motivadas pela venda e consumo de drogas as consequências para o setor da saúde logo seriam sentidas e o enfrentamento deste tipo de demanda exige um grau maior de organização por parte

Redesdo Estado, de Atenção principalmente à Saúde (RAS),no trabalho mas que multiprofissional precisa avançar e interdisciplinar, que em parte esta desenhada através das

cada3.3 Processo vez mais deem gestão. eficiência e eficácia. Nesta última categoria também foram utilizados

com mecanismos desenvolvidos pela gestão dos serviços dois artigos selecionados por este estudo que trabalham-

A accountability em saúde pública: uma revisão de literatura A accountability em saúde pública: uma revisão ços à população. tendo em vista a buscar de uma36 melhor prestação de servi 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Para Bonacim e Araujo (2010) a metodologia de apropriação dos custos ABC (activity based costing) utili- zada pelo Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto (SP) pos- sibilita a avaliação individual dos departamentos, uma vez que se pode associar, a cada departamento, o tipo do servi- ço prestado, suas respectivas quantidades e o “quanto cus- - tor de cada departamento considerando a relação entre os taram”. Dessa forma, pode-se avaliar o desempenho do ges De acordo com Bonacim e Araujo (2010) devido à complexidaderecursos a ele (gestor)do sistema confiados de custos e o daquanto referida foi produzido.instituição e pela quantidade de procedimentos realizados, a entidade optou por implantar o método de custeio ABC em unidades piloto como forma de delinear um modelo, ou seja, uma es- truturação ou exemplo que pudesse ser seguido com pe- quenos ajustes, para as demais áreas.

Hospital, foi necessária a conscientização da organização Para melhorar a qualidade das informações do- vimento dos responsáveis das unidades com relação ao Marcelo de Moura Carvalho e Maria Dalva Macedo Ferreira fornecimentosobre a importância de dados de referentes um sistema à produção de custeio do e setor o envol sob sua responsabilidade (BONACIM; ARAUJO, 2010). Observa-se a necessidade de uma maior com- preensão do processo de funcionamento das institui- ções por parte da gestão como é o caso do Hospital das Clínicas Ribeirão Preto que é da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMRP-USP) para buscar emuma um melhor setor prestaçãoque sofre constantementede contas aos órgãos pela falta competentes, de recur- como também, a busca da melhoria a assistência prestada, O ultimo artigo analisa as características da ino- vaçãosos financeiros. da gestão local do setor saúde na dimensão social no Brasil entre os anos de 1996 e 2006, através de quatro itens: (1) Elaboração do orçamento; (2) Estabelecimento 37 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA de prioridades; (3) Prestação de contas e (4) Fluxo de in- formações, que são os 4 atributos da governança local.

(2010) constataram que em 2006, os prefeitos (82,0%) e os secretáriosQuanto de saúde a elaboração (49,5%) foram do orçamento, os atores que Fleury mais etexer al;-

participaçãoceram influência e deliberação na elaboração da política do orçamentode saúde pela municipal. socieda- dePor civil, outro foi lado, considerado o Conselho por Municipal 28,3% dos de secretários Saúde, instância como um de

Neste item falta um aprofundamento desta pesqui- saator para de altasaber influência ate que naponto definição as propostas dos recursos que surgemmunicipais. nos

poder executivo, pois de acordo com vários estudos sobre esteConselhos ponto, de é sempre Saúde sãovista manipuladas/ com certa ressalva influenciadas a verdadeira pelo autonomia destes espaços de participação democrática.

(2010) em 2006, na percepção dos secretários de saúde, o parecerPara do ocorpo estabelecimento técnico (62,8%), de prioridades as propostas Fleury de conet al-

osselhos itens ou mais conferências relevantes de para saúde o estabelecimento (58,3%) e os incentivos de prio- ridadesfinanceiros em saúdedo Ministério nos municípios. da Saúde Tendo (50,3%) destaque constituíram para as solicitações de políticos locais que caíram de forma expres-

um fortalecimento técnico dos menores municípios. siva nos municípios de até 5 000 habitantes, o que indica- ção de contas que em 2006, a maioria das secretarias de Fleury et al (2010) verificaram quanto a presta

(74,7%).saúde prestava Somente contas 0,9% ao declararam conselho municipalque não prestavam de saúde (92,7%), ao prefeito (78,8%) e à câmara de vereadores- centual de secretarias de saúde que prestam contas a contas. Na década em estudo, houve um aumento no per A accountability em saúde pública: uma revisão de literatura A accountability em saúde pública: uma revisão todos os atores, sobretudo a câmara de vereadores e ao 38 conselho de saúde. 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS et al (2010) é que 45,3% das secretarias realizavam au- diência públicaUm dado para importante prestação da de pesquisa contas, forma realizada considera Fleury- da mais democrática e que possibilita a ampliação do deba- te na esfera pública. Vale, também, destacar o aumento da utilização dos meios de comunicação de massa (rádio, TV, jornais) no período de 1996 a 2006. Apesar do aumento da utilização dos meios de comunicação de massas para a realização desta prestação de contas faz se necessário analisar de maneira criteriosa como é repassada para a população essa informação, pois na maioria das vezes, essa população se torna refém da qualidade e dos interesses particulares vinculadas nestas informações. pode-se observar que as informações mais oferecidas à populaçãoPor em fim, 2006 para foram o atributo referentes do fluxo às ações de informação e campa-

Contudo, a década de 1996 a 2006 foi marcada por con- siderávelnhas (95,7%) aumento e ao funcionamentono percentual dedos secretarias serviços (72,9%). que di- Marcelo de Moura Carvalho e Maria Dalva Macedo Ferreira vulgavam informações inovadoras à sociedade, principal- mente referentes aos resultados da gestão (18,6% para 37,9%). - dade recebe informações diversas, incluindo a prestação de contasPara de gestão, Fleury eta partir al (2010), de diferentes cada vez mecanismos mais a socie e meios. Em outras palavras, para esses autores, esse novo padrão de governança local é marcado pelo aumento da accountability.

Apud Reis, Dacorso e Tenório (2015), o objetivo da nova administraçãoDe acordo pública com é construir Bresser-Pereira um Estado e Spink democrático, (2005) que responda às necessidades de seus cidadãos, para que seja possível aos políticos fiscalizarem o desempenho dos 39 burocratas e estes sejam obrigados por lei a lhes prestar ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

- contas, bem como para que os eleitores possam fiscalizar o desempenho dos políticos e estes também sejam obriga dos,CONCLUSÃO por lei, a lhes prestar contas. Com a realização desta pesquisa no intuito de responder ao questionamento de: Como a sociedade civil pode controlar ou monitorar a ação de seus representan- tes? Utilizando-se de uma busca criteriosa em bases de da- - nismos possíveis da sociedade civil exigir o accountability dedos seus científicos, representantes pode-se constatarna busca umado desenvolvimento variedade de meca de cultura política mais participativa. No entanto, existe vários entraves para a consoli- dação de uma democracia mais participativa ou mesmo de uma democracia representativa para além da mera parti- cipação do processo eleitoral que ocorre a cada 4 anos em nosso país.

Municipal, ainda são alvo de muitas críticas pela fragili- dade emOs que Conselhos conduzem de suasSaúde, ações seja deem deliberação nível Estadual sobre ou temas relevantes para o atendimentos das reais necessi- dades da população do seu território, na maioria das ve- zes, funcionam meramente para validar uma demanda do gestor do sistema de saúde que pode ser bem diferente das demandas dos representados dentro dos referidos

Pode-se concluir que o termo accountability vem conselhos. existe a necessidade de mais estudos sobre os diversos ti- posganhando de accountability importância aplicados nos estudos a este da setor área tão da importantesaúde, mas

empara um a vida país deem nossa que a população, sociedade civil,para porpodemos vezes, colhermos apresenta

A accountability em saúde pública: uma revisão de literatura A accountability em saúde pública: uma revisão lampejosmaiores e de melhores participação frutos civil de umaem busca cultura de cívicaseus direitos. engajada, 40 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS REFERÊNCIAS

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A accountability em saúde pública: uma revisão de literatura A accountability em saúde pública: uma revisão - 42 ceptual desde la filosofía política y la ciencia políti 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS ca. Colomb.int. [online]. Bogotá, v.82, n. 3, p. 261-

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13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS A GOVERNAMENTALIDADE APLICADA AOS EMPREENDIMENTOS ECONÔMICOS NANOTECNOLÓGICOS: A NANOÉTICA

Daniela Pellin1 Wilson Engelmann2

RESUMO: - - A nanotecnologia é um ramo eficiente das inova dianteções. É daa área peculiar da técnica condição que demelhor agregar atende valor às à necessidaindustria- lizaçãodes da globalizaçãode bens e serviços humana, e o econômica,fortalecimento social dos e Estados.política, - responsávelEntretanto, estão durante presentes o ciclo osde riscos vida deao homemum nanomaterial. e ao ecos Asistema pesquisa que enfrenta necessitam como ser tema, geridos a construção de forma eficienteadequada e da NanoÉtica nacional. A problemática está na ausência

- de comprometimento social e gerenciamento eficiente dos- nançariscos corporativa nanotecnológicos pela governamentalidade por parte dos agentes do bem econômi para a cos, assim como, a hipótese está na emancipação da gover

1 Doutoranda em Direito Público na UNISINOS/RS. Bolsista da CAPES/ Daniela Pellin e Wilson Engelmann gestãoPROEX. eficiente, Mestre responsável em Direito da Sociedade e nanodemocrática. da Informação pela Para FMU/SP. esse Professora e Pesquisadora em Nanotecnologias, Empresas, Sociedades e Globalização. Membro do Grupo de Pesquisa JusNano/CNPq. Advogada. Email: [email protected] 2 Doutor e Mestre em Direito Público pelo Programa de Pós-Graduação em Direito (Mestrado e Doutorado) da UNISINOS/RS. Coordenador- Adjunto da Pós-Graduação em Direito (Mestrado e Doutorado) na

Direito dos Negócios e das Empresas da UNISINOS/RS. Líder do Grupo deUNISINOS/RS. Pesquisa JUSNANO Coordenador (CNPq). Executivo Bolsista dopor Mestrado produtividade Profissional da CAPES. em

Orientador de Bolsistas de Iniciação Científica PIBITI/CNPq, PIBIC/ CNPq e FAPERGS. Advogado. E-mail:45 [email protected] ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA desiderato, o objetivo geral é inserir a governamentalidade - ça corporativa para inseri-la em uma visão estruturante da NanoÉtica.na ética empresarial, Como metodologia, e específico, o ensaio emancipar se socorrerá a governan da co-

análise sistêmica-construtivista. leta de dados, da revisão bibliográfica interdisciplinar e da PALAVRAS-CHAVE: Nanotecnologia. Riscos. Governamentalidade. Gestão Corporativa. Emancipação.

Gestão THEeficiente. GOVERNMENTALITY APPLIED TO THE ECONOMICS DEVELOPMENTS IN NANOTECNOLOGY: THE NANO ETHICS ABSTRACT: -

Nanotechnology is an efficient branch of inno- vations. It is the area of the technique the best meets the- needs of human globalization, economic, social and po litical, on the particular condition to add value to the in dustrialization of goods and services. However, there are presents risks to humans and the ecosystem. It need to be managed efficiently during the life cycle of a nanomaterial.- Research faces as a theme, a possible reflection structure for Nano Ethics. The problem is the lack of social commit ment and efficient management of nanotechnological risks- on the part of economic agents, as well as the hypothesis is- the emancipation of corporate governance by governmen tality for efficient management. To this aim, the general ob jective is to insert governmentality in business ethics, and specific, emancipate the corporate governance to insert it- into a structural view of Nano Ethics. As methodology, the test is will rescue data collection, interdisciplinary litera ture review and inductive-deductive analysis, especially KEYWORDS: phenomenological.

A governamentalidade aplicada aos empreendimentos econômicos nanotecnológicos: a nanoética econômicos nanotecnológicos: aplicada aos empreendimentos A governamentalidade management. Nanotechnology. Risks. Governmentality. Corporate management. Emancipation. Efficient 46 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS I. Introdução

O desenvolvimento nanotecnológico representa

- mao auge em dosnove avanços vezes paratécnicos interagir, da humanidade. de forma programada,A proposta é comreduzir outras uma moléculas molécula dea um interesse tamanho para negativo a transformação de si mes das coisas. Daí possível dizer que é menor que uma ca-

- temente,vidade de os poro resultados humano, na imperceptível industrialização, a olho na medicina nu, apta ae namodificar tecnologia. todas as estruturas imagináveis e, consequen - e das necessidades,É com esse desenvolvimentovêm sendo promovidos científico na expectativaque os em preendimentos econômicos, em todas as áreas dos saberes- envolvendoda maximização governos, do tempo empresas e das e riquezas universidades, econômicas nacionais pe elos internacionais. detentores da informação, do conhecimento e do poder, Entretanto, os mais avisados pesquisadores vêm alertando para os riscos já diagnosticados, prováveis ou incertos, acerca do uso dos produtos industrializados a partir da intervenção das nanotecnologias; uma vez em de nanointoxicação que podem afetar a saúde e o meio am- biente,contato causando, com humanos até, o e evento ou ecossistema, morte. há possibilidades Daniela Pellin e Wilson Engelmann Neste cenário de segregação e concentração, de um lado; e, de incertezas sociais, de outro, a economia en- tende que o valor agregado pela nanotecnologia promove a

Homemmais valia. pela A sociologiasua própria reclama criatura melhor que o destruirá.compartilhamento O Direito e inclusão sociais. A filosofia aponta para a escravidão do- ricas que a pós-modernidade pretende destruir e, por isso, entende a necessidade de manter-se fiel às tradições histó 47 fica à margem dos anseios sociais de proteção, regulação, ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

contato com essa realidade. pacificação e mantença do contrato social, resistindo o que recortes epistemológicos traem os resultados, em- presta suaA pesquisavisão global contemporânea, sobre o todo social, neste contexto,cujo foco é em o Homem, para aglutinar, dialógica e interdisciplinarmente,

a verdade e a justiça social. Isso só é possível através da metodologiatodos os interesses sistêmica-construtivista. e queixas envolvidas, a fim de buscar

voltados para a nanotecnologia e os sociais para as expec- Nesse caso, onde os olhares econômicos estão categoria Ética para a Nanotecnologia – a NanoÉtica - deve tativas dos homens e do meio ambiente, certamente, uma bom e ruim, do justo e injusto, do certo e errado, do ex- refletir, adequadamente, o exercício do bem e do mal, do desse dilema. cesso e razoável,Assim, fincar do lucro as estruturas e risco, sobre éticas a gestão para oeficiente desen-

as nanotecnologias, significa remodelar a atividade eco- volvimento industrial, social e econômico envolvendo coletivo instituído e instituinte; incluir regras políticas nômica e a própria sociedade, a partir do inconsciente como valores definidos para um único objetivo e senti- do;que exercitar tenham princípioso comprometimento constitucionais com o como desenvolvimen diretrizes,- to distributivo; a assimilação da responsabilidade social, que é afetada pelas decisões de todos, parecem ser a adequada estrutura científica para a construção dessa NanoÉtica. E mais. Nesse sentido é que deve ser pensada sob os pilares fundamentais da governamentalidade, que é - cipados os próprios critérios de gestão corporativa mera- comprometida com o todo social, a fim de, uma vez eman A governamentalidade aplicada aos empreendimentos econômicos nanotecnológicos: a nanoética econômicos nanotecnológicos: aplicada aos empreendimentos A governamentalidade mente econômica, possa orientar, em conjunto, a gestão 48 social e eficiente dos riscos nanotecnológicos. 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS II. O estado das artes nanotecnológicas: dentre riscos e benefícios, presentes e futuros

A par disso, os investimentos nanotecnológicos, ao redor do mundo, em 2007, foram em torno de U$ 135 - - blicadobilhões; emem 2008,2012, oU$ setor 693 químicobilhões; ocupoue, em 2015, 53% U$ dos 2,95 inves tri- timentos;lhões. Em estudoo de semicondutores, feito, em 2007, pela34% Científica e os setores, Ltda., juntos, e pu farmacêutico, automotivo e de defesa, 1 a 7%3. Em outro extremo, a sociedade global organizada vem discutindo os riscos que incluem danos tóxicos a pes- soas e ao meio ambiente, expectativas alarmantes de dis- - torção econômica devido à proliferação de produtos bara- garemtos, opressão a usar econômicaa nanotecnologia gerada molecular, por uma escalada risco pessoal artificial ou socialde preços, por restriçõesrisco pessoal abusivas, se criminosos mal-estar ou social terroristas perante che os novos produtos ou formas de vida, corrida ao armamento, danos coletivos ao meio ambiente como consequência de produtos não regulamentados, total disponibilidade de au- toreplicadores (gray-goo), formação de mercado negro de nanotecnologia, concorrência entre diferentes programas de nanotecnologia molecular e afastamento e ilegalidade 4

da nanotecnologia molecular . Daniela Pellin e Wilson Engelmann Uma vez desenvolvida em laboratório pelos pes- quisadores, a indústria se apropria, manufatura e indus- trializa para o destinatário final: a Sociedade; as pessoas. Tudo assistido, incentivado e alinhavado pelos Governos. 3 em Panorama 30/07/2016. da Nanotecnologia no Mundo e no Brasil. http://www. desenvolvimento.gov.br/arquivos/dwnl_1266607883.pdf. Acessado

4 Acessado Disponível em 30/07/2016. em http://www.euroresidentes.com/futuro/nanotec nologia/nanotecnologia_responsavel/riscos_nanotecnologia.htm. 49 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA As nanotecnologias desenvolvidas são implantadas em bens e serviços com o objetivo de favorecer o Homem e sua qualidade de vida, panaceia para a Humanidade do

de capital. Hoje, praticamente, todos os setores produtivos jáséculo sofrem XXI, a esbarrainterferência nos avanços das nanotecnologias: econômicos e no acúmulo

5 Nesse contexto, os dados mostram a força com que as sociedades vêm se desenvolvendo a partir da produção cientí- -

fica em nanotecnologias.6, aponta Indicadores os Estados de junho Unidos de em2016, primeiro publi lugar,cados no pelo placar Instituto geral da StatNano: produção Nano em nanotecnologias; Science, Technology também and mostramIndustry Scoreboardos dez países que despontaram em publicações Web Sciense:

5 Disponível em . Acessado em 08/07/2016. científicas, indexadas na ISI, pela 6 O principal objetivo do StatNano é monitorar continuamente as ativi- dades dos paíseswww.google.com.br/search em termos de elaborar indicadores de nanociência, tecnologia e inovação, de caráter global e regional, bem como, as po- líticas de desenvolvimento em nanociência e nanotecnologia. O jornal informativo tem sido preparado para informar ao público, sempre, os últimos indicadores. Disponível em . Acessado em

A governamentalidade aplicada aos empreendimentos econômicos nanotecnológicos: a nanoética econômicos nanotecnológicos: aplicada aos empreendimentos A governamentalidade 06/07/2016. Tradução livre. www.statnano.com 50 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

Países que publicaram acerca de nano- Número de artigos publicados e inde- ciência e nanotecnologias/maio 2016. xados na ISI – Web Science/maio 2016. CHINA 1º lugar: 18.867 EUA 2º lugar: 8.460 ÍNDIA 3º lugar: 4.293 COREIA DO SUL 4º lugar: 3.285 ALEMANHA 5º lugar: 3.046 IRÃ 5º lugar: 2.978 JAPÃO 6º lugar: 2.691 FRANÇA 7º lugar: 2.020 REINO UNIDO 8º lugar: 1.913 ESPANHA 9º lugar: 1.709 Segundo o StatNano, um total de 709.454 inova- ções nanotecnológicas foram patenteadas nos Estados Unidos pelo Escritório de Marcas e Patentes deles, o United States Patent Trademark Office (USPTO), em 2015. Os Estados Unidos ocuparam primeiro lugar em publicação de patentes, mundialmente e, além disso, dividiu 50% da pro- avança.dução do O Japão, país está Coreia inserido do Sul nessa e Alemanha. corrida, embora, na pla- taforma Noda modernidadeBrasil, a situação tardia. científica é bem módica, mas, É parte integrante do Mercosul que representa 3%

da pesquisa mundial. Vem, desde 2000, implantando políti- Daniela Pellin e Wilson Engelmann cas inclusivas e desenvolvimentistas em nanociência. De lá para cá, os indicadores mostram o quadro evolutivo divul- gado pelo Ministério de Ciência e Tecnologia. O documento, publicado em 25/11/20157, mostra os recursos nacionais aplicados na área de ciência e tecno- logia entre 2000 e 2013, incluindo investimentos em pes- quisa e desenvolvimento, públicos e privados, atividades

7 Disponível em http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/ 9058.html. Acessado em 06/07/2016.51 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA 8. Investimentos em reper- tório nanotecnológico estão diluídos nesse contexto. científicas e técnicas correlatas

(1) Ciência e Tecnologia(em (C&T) milhões de R$ correntes) Atividades Científicas e Técnicas Ano Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) Total Correlatas (ACTC) Orçamento Ensino Orçamento Ensino Total (2) Total (2) executado superior executado superior

2000 15.839,1 12.560,7 9.349,3 3.211,4 3.278,4 3.278,4 -

2001 17.655,6 13.973,0 10.444,4 3.528,6 3.682,6 3.682,6 -

2002 19.756,7 15.031,9 10.957,4 4.074,6 4.724,8 4.724,8 -

2003 22.278,8 17.169,0 12.590,3 4.578,7 5.109,8 5.109,8 -

2004 25.437,7 18.861,6 14.109,4 4.752,2 6.576,1 6.576,1 -

2005 28.179,8 21.759,3 16.764,3 4.995,0 6.420,5 6.420,5 -

2006 30.540,9 23.807,0 18.018,3 5.788,7 6.733,9 6.733,9 -

2007 37.468,2 29.416,4 21.331,0 8.085,4 8.051,8 8.051,8 -

2008 45.420,6 35.110,8 25.730,8 9.380,0 10.309,8 10.309,8 -

2009 51.398,4 37.285,3 27.713,1 9.572,2 14.113,1 14.113,1 -

2010 62.223,4 45.072,9 33.662,6 11.410,2 17.150,5 17.150,5 -

2011 68.196,3 49.875,9 35.981,5 13.894,3 18.320,4 18.320,4 -

(2) 2012 76.466,3 54.254,6 38.547,6 15.707,0 22.211,7 22.211,7 -

(3) 2013 85.654,3 63.748,6 45.149,0 18.599,6 21.905,7 21.905,7 -

8 Fonte: Coordenação-Geral de Indicadores (CGIN) - ASCAV/SEXEC - Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). Elaboração: Coordenação-Geral de Indicadores (CGIN) - ASCAV/SEXEC - Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). Notas: (1) ciência e tecnolo-

e técnicas correlatas (ACTC); 2) considerados os gastos da pós-gradua- gia (C&T) = pesquisa e desenvolvimento (P&D) + atividades científicas-

A governamentalidade aplicada aos empreendimentos econômicos nanotecnológicos: a nanoética econômicos nanotecnológicos: aplicada aos empreendimentos A governamentalidade perior (IES); e 3) dados preliminares. ção como proxy dos dispêndios em P&D das instituições de ensino su 52 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS de investimentos entre 2000 e 2013, na vertical. É possível Denota-se que houve um salto interno significativo- ras em desenvolvimento, inclusive, sendo superior aos in- vestimentosver, na horizontal, em pesquisas que a primazia de qualquer foi de gênero.aplicações Além financei disso, - - é pouco expressivo o investimento em atividades científi decas. informações Não obstante, dentre lamentavelmente, vários setores nãoe investimentos há como assegu sem arar política a fidedignidade adequada nados formação dados informados, do banco de dada dados. a difusão Em 06/11/2015, na Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial9, foi realizado o 2º Ciclo de Diálogos de Nanotecnologia, em Brasília. Lá o Ministério de Ciência e Tecnologia, através de seu porta voz, Alfredo Mendes, disse que entre 2004 e 2014, foram investidos - talecimento dos laboratórios conveniados, por meio da Iniciativamais de R$ Brasileira 870 milhões, de Nanotecnologia com maiores (IBN), aplicações que visa no ace for- das atividades das entidades com setores da economia para alerar articulação os processos do marco de inovação legal junto e promover ao Governo. o alinhamento Entretanto, a diretora de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação da que os dados de investimentos são dispersos, pulverizados emAgência, várias Maria agências Luísa de Camposfomento Machadoe programas Leal, de mencionou incentivos - Daniela Pellin e Wilson Engelmann dade das informações cedidas pelo próprio Ministério. à inovação,No osetor que industrialconfirma a nacional, assertiva a da mesma “pouca” agência, credibili em 2010, no documento “Panorama Nanotecnologia10, infor- Science Metrix em pesquisas nanotecnológicas, com bastante ener- mou que o Brasil ocupa a 25º posição no ranking da aspx?i=4030. Acessado em 27/07/2016. 910 DisponívelAGÊNCIA BRASILEIRA em http://www.abdi.com.br/Paginas/noticia_detalhe. DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Panorama nanotecnologia. Série Cadernos da indústria ABDI XIX. Brasília: ABDI, 2010, p. 32. 53 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA gia e investimentos gastos nos últimos anos, em franca ex- pansão, especialmente nos setores farmacêuticos, quími- cos, cosméticos e agroindustrial. Esse documento ressaltou ser o mercado deveras

inserir a nanotecnologia em sua atividade lucrativa por causapromissor da economia e muitas empresasnos custos têm da interesse produção; econômico em 2014, em o

seja, 15% da produção global de bens manufaturados11. patamarA de Nanociência investimentos e a Nanotecnologiaremontou a US$12 2,6 tem trilhões, sido obje ou- to de interesse em setores industriais e acadêmicos, devido

soberaniaaos benefícios concorrencial. na corrida tecnológica global e emancipação econômica que fortaleça os vínculos da13 globalização de 25/05/2015, e da - notecnologiaSegundo por ser a Folha um mercado de São Paulomuito rentável e o fatu- pequenas empresas nacionais estão trabalhando com na com estudos em mestrado e doutorado, também, estão ramento exponencial. Profissionais que saem da academia ativo intelectual. sendo empresários do conhecimento adquirido, ou seja, do 11 05/1632954-cientistas-abrem-pequenas-empresas-investindo-em- Disponível em: . que representa Acessado os estudosem 27/07/2016. dos nanomateriais, que são produzidos Aplicações na nanoescala tecnológicas e/ou dos aqueles conhecimentos que contêm nano-objetos. produzidos Para pela ser considerado nanotecnológico, um produto deve atender a pelo me- nos uma das duas premissas: 1.Conter materiais em nanoescala com - xo de 100nm em uma ou mais dimensões, e 2.Proporcionar produtos tamanho de partícula controlado, geral, mas não exclusivamente, abai dos átomos, moléculas e materiais macroscópicos. (GUTERRES, Silvia melhores, que explorem as novas propriedades, que diferem daquelas Nanocosmecêuticos. IN: COSTA, Adilson (Org.). Tratado Internacional deStanisçuaski; Cosmecêuticos BECK,. Rio Ruy de Janeiro: Carlos Guanabara Ruver; POHLMANN, Koogan, 2012, Adriana p. 428). Raffin. 13 1632954-cientistas-abrem-pequenas-empresas-investindo-em-nano-

A governamentalidade aplicada aos empreendimentos econômicos nanotecnológicos: a nanoética econômicos nanotecnológicos: aplicada aos empreendimentos A governamentalidade Disponível em:

tecnologia.shtml>. Acessado em54 27/07/2016. 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS da Universidade de Campinas, São Paulo, divulgou em seu O Laboratório de Química do Estado Sólido (LQES) de São Paulo e a Estadual de Campinas estão entre as ins- jornal de novidades de junho de 2016, que a Universidade- méticos no mundo, ocupando a 1º e 8º posições, conforme relatoutituições o científicasestudo do mais State produtivas of Innovation na pesquisa201614, realizado em cos pela área de negócios de propriedade intelectual e ciência 15. A área dos cosméticos é a que sofre maior intervenção do desenvolvimento proporcionado pe- dalas Thomsonnanotecnologias. Reuters O estudo apontou que a USP publicou 177 artigos Web of Sciense relacionados a cos- méticos no período de 2005 a 2015, à frente da agência regulatóriacientífico indexado de alimentos na e fármacos americana, com 108 publicações; da empresa norte-americana de bens e con- sumos Procter & Gamble, com 103 artigos; e da Harvard University, com 83 publicações. no mesmo período e superou a University of California, Los AngelesJá a (70) UNICAMP e a University publicou of California, 78 trabalhos São científicos Francisco (68). O sucesso reside no fato de ambas as universida- des brasileiras adotarem a forma da inovação aberta, con- sistente em parcerias entre corporações, universidades, órgãos governamentais e institutos de pesquisa para ino- Daniela Pellin e Wilson Engelmann var produtos e tecnologias no mercado, conforme aponta o estudo. O problema é que a busca pelo desenvolvimento ainda está concentrada na iniciativa privada. Os resultados

14 Disponível em . Acessado econômicosem 30/07/2016. otimizados pelas nanotecnologias indicam 15 www.stateofinnovation.thomsonreuters.com

em Disponível 30/07/2016. em http://www.lqes.iqm.unicamp.br/canal_cientifico_ne ws_cit/lqes_news_2016_lqes_news_novidades_2071.html. Acessado 55 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

têmque hásido maior sopesados preocupação nas decisões em concentração empresariais, de diante riquezas da do que valorização do humano; sobretudo, os riscos não

ecossistema.falta de alguma segurança científica quanto às interações molecularesO Documento e atômicas da com OXFAM as células 21016, de humanas 18 de janeiro e com de o 2016, informou que a desigualdade global está no seu auge, concentrando toda riqueza em 1% da população mundial: “poderes e privilégios estão sendo usados para distorcer o

ricos e o resto da população. Uma rede global de paraísos sistema econômico, aumentando a distância entre os mais-

fiscais permite que os indivíduos mais ricos do mundo es condam 7,6 trilhões de dólares das autoridades fiscais”. - cionais paraRecentemente, com o Brasil, o Instituto elaborou de Pesquisas estudo denominado Econômicas “MegatendênciasAplicadas (IPEA), Mundiais a fim de 2030: cumprir o que seus entidades objetivos e instituperso- nalidades internacionais pensam sobre o futuro do mundo? Nesse documento, o instituto fornece suporte téc- nico e institucional às ações governamentais para a ado- ção de políticas públicas e de programas para o desenvol- vimento, considerando o presente com vistas ao futuro, e as tendências mundiais que atingirão o país nas áreas da população e da sociedade; na sua conformação geopolítica; na ciência e tecnologia; economia e meio ambiente. Ao debruçar-se sobre o estudo, investimentos em ciência e tecnologia estão no topo das tendências, conten- do quatro aspectos mundiais, dentre eles, o crescimen- to dos investimentos e aplicações no campo das nano e biotecnologias17.

16 Disponível em . Acessado em 30/07/2016. 17 http://www.oxfam.org.br/noticias/relatorio_davos- das_2016 quatro megatendências, listadas a seguir, e 21 sementes de futuro

A governamentalidade aplicada aos empreendimentos econômicos nanotecnológicos: a nanoética econômicos nanotecnológicos: aplicada aos empreendimentos A governamentalidade relacionadas Dispõe o documento a essas megatendências, que: “Nos estudos conforme analisados, será abordado foram identifica ao longo 56 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS No geral, as megatendências, para 2030, são: a) ma- nutenção da revolução tecnológica, integrando a biotecno- logia, a nanotecnologia, as tecnologias da informação (TIC) e as tecnologias dos materiais em ritmo acelerado; b) ma- nutenção dos avanços e aplicações tecnológicas no campo

- truçãoda engenharia civil; c) Os dos biomateriais materiais, principalmentede alta funcionalidade nos setores serão desenvolvidoseletrônicos, construção e estarão node mercadoaeronaves, até automóveis 2030; d) manuten e cons- ção dos avanços e aplicações no campo da nanotecnologia - mente para usos em dispositivos computacionais de saúde, com propriedades melhoradas dos materiais, principal- macos e próteses robóticas; revestimento e embalagens e monitoramentopara monitoramento do meio humano, ambiente; liberação e) desenvolvimento controlada de fár de embalagem inteligente para alimentos e bebidas com base em nanotecnologia, até 2030. (p. 117) - cias economia, política e tecnologia são os comandos cen- trais do Nessadesenvolvimento fotografia sobre e concorrência o painel das global. megatendên Por isso, o presságio dos riscos é, no mínimo, preocupação para a pesquisa do presente. Iniciativa da ABDI em parceria com a Universidade de Campinas, 2011, elaborou estudo destinado aos in- dustriários nacionais que têm investido na inovação: “Nanotecnologias: subsídios para a problemática dos ris- cos e regulação18. Daniela Pellin e Wilson Engelmann

deste capítulo. As megatendências são: • aceleração do desenvolvimento tecnológico, multidisciplinar, com aplicações tecnológicas cada vez mais

estrutura de produção, de educação, de relação entre as pessoas e lazer; •integradas; crescimento • as dos TIC investimentos continuarão emmodificando automação a enatureza robótica; do • crescimentrabalho, a- to dos investimentos e aplicação no campo da nanotecnologia e biotec-

mid=38%203.nologia”. (p. 101). Acessado Disponível em 27/07/2016. em http://www.ipea.gov.br/portal/index. 18 php?option=com_content&view=article&id=26450&catid=345&Ite

Disponível em http://www.abdi.com.br/Estudo/Relat%C3%B3rio%20 Nano-Riscos_FINALreduzido.pdf57 Acessado em 27/07/2016. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

ao desenvolvimento e aplicação nanotecnológica, a proble- Trata o documento de uma cartilha de orientações destinadas ao público, acerca da percepção sobre nanotec- mática dos riscos; a necessidade de campanhas educativas- - dosnologia orientar quanto os aoslegisladores benefícios participando e riscos; e, quantoativamente à regu da regulamentação.lação, menciona queSobretudo, há necessidade agir de forma dos agentes segura envolvia evitar os infortúnios dentro dos estabelecimentos com os atores envolvidos diretamente, mediante boas práticas de gover- nança e ética no exercício da atividade. A agência, ao produzir o documento, pretendeu re-

os quais carecem de regulação e de conduta ética para a ex- latar aos agentes econômicos os riscos nanotecnológicos,19. - ploração da atividade econômica nacional - movem dentroTodavia, das o setorempresas. produtivo Não políticanão compartilha governamental as in queformações exija a relacionadastroca de informações aos avanços e a transparência científicos que com pro o público consumidor. Por isso, o banco de dados disponível - rido de informações divulgadas fora das fronteiras nacio- nais.é raso O eque pouco paira confiável. no absurdo. Os pesquisadores têm se socor

em contrapartida, no “Diagnóstico Institucional de Nanotecnologia”A Agência20, 25 de de Vigilânciamarço de Sanitária2014, mostrou (ANVISA), que,

1970, foi a partir de 2005, que as nanotecnologias passaram amuito ser adotadas embora, comosendo oportunidade acanhadamente de alavancardesenvolvida os merca desde-

19 Agência Brasileira De Desenvolvimento Industrial. Panorama nanotec- nologia. Série Cadernos da indústria ABDI XIX. Brasília: ABDI, 2010, p. 42. 20

cional+de+Nanotecnologia+-+CIN+2014+-+Dicol.pdf?MOD=AJPERES. Disponível em http://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/

A governamentalidade aplicada aos empreendimentos econômicos nanotecnológicos: a nanoética econômicos nanotecnológicos: aplicada aos empreendimentos A governamentalidade Acessadofb117d80436c3cacb1b5b72a042b41f5/Diagn%C3%B3stico+Institu em 29/07/2016. 58 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS dos, cuja perspectiva até 2020, é a de estar no topo da eco- nomia de mercado massivo, como valor agregado que é de sua natureza. Relata que o número de produtos manufaturados com base em nanotecnologia, também, avolumou-se: em 2005, eram entre 0 (zero) a 200; já, em 2011, já remonta- - tecnologias e 150 que as desenvolvem, cujos setores em francavam a 1600. expansão No Brasil, são da há indústria 608 empresas química, que petroquímica utilizam nano e mostrar que, em um levantamento realizado pela própria ANVISAda área da21, emsaúde. convênio Fato que com chama o Comitê a atenção Interministerial é o documento de Nanotecnologia, do poder Executivo Federal, em 2014, dos 637 produtos manufaturados a partir da nanotecnologia, 599 eram da área cosmética, correspondendo a 94% da produção total. - capazes Láde constouafetar o ossistema infortúnios gastrointestinal, aos humanos cérebro, em se pultra- mões,tando dasistema interação circulatório entre células e linfático, humanas coração, e nanopartículas doenças au- toimunes, dermatites, urticárias e vasculites, a depender da forma de ingestão ou contato com uma nanopartícula ou nanomaterial. Todavia, esses dados não foram produzidos pelas pesquisas nacionais. - - Daniela Pellin e Wilson Engelmann metros, Acompreendidos situação é agravada em medidas a partir negativas,do tamanho ou da seja, na nopartícula, pois, ela pode variar dentre 10 a 100 nanô- - tícula,não vistas maior a olhos a possibilidade nus, portanto, de capazesela interagir de miniaturizar com as cé- -se igual as células humanas. Quanto menor a nanopar mencionados. lulas humanas, causando os possíveis infortúnios acima 21 - 117d80436c3cacb1b5b72a042b41f5/Diagn%C3%B3stico+Instituci onal+de+Nanotecnologia+-+CIN+2014+-+Dicol.pdf?MOD=AJPERES. Disponível em http://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/fb Acessado em 29/07/2016. 59 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Na Agenda Regulatória da ANVISA – Ciclo 22, a Agência incluiu no “Tema 74” de suas propostas, a regula- çãoQuadrienal da nanotecnologia 2013-2016 relacionada – para o biênioa produtos 2015/2016 e processos - gulatória como sendo o “Conjunto de requisitos para ava- liaçãosujeitos e controleà vigilância de produtos sanitária, que definindo utilizam essa nanotecnologia, proposta re dentre eles nanopartículas ou nanomateriais relacionados à saúde”. -

aplicadasPara na manufaturação justificar a interferência de produtos da e Agência, processos o docuestão disponíveismento expõe no o mercado fato de quede consumo. tais inovações E, por isso, tecnocientíficas se faz neces- - - sária a identificação dos elementos sujeitos à vigilância sa nitária, a fim de avaliar segurança, eficácia e riscos associa23 dos. SemEsses embargo dois disso,extremos, também dentre há presente ausência e regulatória, futuro, ris- assimetriaco e desenvolvimento, de informação saídas e insuficiência estão sendo metodológica. buscadas pelas - dica. Mas, o cientista jurídico já sabe que, sem o acoplamen- topesquisas sistêmico de de diversas outras ciênciasáreas científicas, não será dentrepossível elas, construir a jurí - ciente desse panorama. Por isso, a proposta interdiscipli- nara segurança na presente jurídica pesquisa, necessária aproveitando-se, e consolidar em aespecial, gestão dasefi

para consolidar o logos e a práxis jurídica. ciências econômica, social e filosófica, a partir do contexto,

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15.compressed.pdf?MOD=AJPERES. Disponível em http://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/ Acessado em 29/07/2016. 128f3b004b3a0f878a1faec9eb767343/relatorio_agenda_regulatoria A governamentalidade aplicada aos empreendimentos econômicos nanotecnológicos: a nanoética econômicos nanotecnológicos: aplicada aos empreendimentos A governamentalidade 23 idem 60 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS III. A prática da governança corporativa sob influência da governamentalidade: a estruturação da NanoÉtica

A Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial publicou, em 02/02/2011, o estudo “Nanotecnologias: subsídios para a problemática dos riscos e regulação”. Nele - 24. consta queEsta a percepçãoreferência públicano início acerca do tópico dos riscosserve parae benefí jus- cios figura como questão-chave - matificar capitalista a inclusão usa das como pessoas ferramenta na gestão para eficiente racionalizar dos riscos o faz semnanotecnológicos, incluí-las, muito já que embora, a ciência todo econômica avanço se a faça que emo siste seu nome. O contexto em que as práticas de gestão corpora- tiva surgem está intimamente relacionado com a explora- ção de territórios e das sociedades, posto que, convergem - - corremem políticas com asde estruturascomportamento dos Estados-nações. econômico para Surge as corpo neste cenáriorações em e temrespeito como à matrizcompetitividade, ideológica asa emancipaçãoquais, hoje, con do capitalismo linear exploratório para o formato do capita- século. lismo sustentável:A gestão corporativa, maior desafio até receberpresente os neste contornos início que de Daniela Pellin e Wilson Engelmann tem, passou por três períodos evolucionistas, a partir do século XIX: a primeira fase, do empreendedorismo; a se- gunda fase, marcada pelo expansionismo, os mercados de capitais foi a mola propulsora; e, a terceira fase, a da frag- mentação, motivada pela demanda de recursos, dando azo a ofertas pública de ações em aumento crescente. Durante essas fases os processos de gestão foram alavancados e, cul-

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Disponível em http://www.abdi.com.br/Estudo/Relat%C3%B3rio%20 Nano-Riscos_FINALreduzido.pdf.61 Acessado em 28/07/2016. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA minaram com a criação da classe executiva de dirigentes, detentores de poder, em especial, no Pós-Segunda Guerra,

A terceira fase marca o ceticismo com o sistema ca- pitalistao que reconfigurou linear, entre o asambiente décadas empresarial de 1960 e 1970, hodierno. marcadas - ram, de forma desigual, todos os países capitalistas que vi- por crises social, política, econômica e ideológica que afeta

nham pregando ser este o sistema – utilitarista puro - ideal- para a felicidade e harmonia social. Hunt, historiador econômico, conta que, antes dis- so, nos quinze anos que se seguiram ao final da Segunda- tros,Guerra nem Mundial, tanto, mas, os paísesem relação se recolheram aos categorizados e adotaram como po de líticas econômicas conservadoras, uns bem-sucedidos, ou e poderoso movimento político que resultou, em muitas de- las,Terceiro numa Mundo, independência ou seja, as política colônias, nominal “registrou-se que foi um saudada amplo

- como o fim do imperialismo capitalista” (2005, p. 472). - Relata que, na Europa, houve a retomada da es vidatrutura dos institucional básica, social e econômica do capita foilismo de puro,absolutismo mas, incluiu liberal, reformas ruptura destinadas com ideais a demelhorar socialis a- mo, comunismo,trabalhadores. movimentos Nos Estados sociais Unidos, e sindicais, o movimento inclusi- ve, nas universidades, eleito como indexador das moedas

guerra. Nesse cenário global, o capitalismo recuperou suas vertentes,mundiais, tendocaracterizadas em vista seu pelo estoque planejamento em ouro calculado ao final da e racional, cuja estrutura de classes se apoia no monopólio sobre as propriedades dos meios de produção e promove a desigualdade na distribuição da renda. Essa desigualdade, por sua vez, dá ensejo à instabilidade geral, à estagnação e irracionalidade, promovendo o caos inerente ao próprio sistema. Hunt menciona que muitos fatos desastrosos nos

A governamentalidade aplicada aos empreendimentos econômicos nanotecnológicos: a nanoética econômicos nanotecnológicos: aplicada aos empreendimentos A governamentalidade bastidores do governo norte-americano vieram à tona e 62 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS colaboraram para a destruição da “convicção de muitos de que os governos capitalistas serviam ao povo de forma neutra, benevolente e democrática, interessados apenas em maximizar o bem-estar da população e promover a

- minadapaz, harmonia com a ecrítica, a fraternidade advinda dosem escritostodo o mundo” de Karl (2005, Marx, p. 473). Com isso, a ciência econômica pura fora conta critériosque influenciaram, de gestão corporativa, sobremaneira, nos asmoldes escolas de um austríaca possível e capitalismode Chicago, sustentável.surgindo, ali, os primeiros ensaios acerca dos

O processo histórico do capitalismo e de formação,- sobretudo,tar da gestão das corporativa sociedades que, anônimas desde a metade em decorrência dos anos 80 de todoe mais o fortemente,processo histórico na última comercial, década do acompanha século, dois o diferendesper-

- tes conjuntos de fatores levaram as companhias a aderirem a melhores práticas de governança: um, de caráter inter- te,no, provenientegerenciamento do deuniverso eficiência dos nos negócios, resultados; concorrencial, outro, de decaráter alta gestão,externo, cujas de caráter razões complexo,podem ser mutável resumidas e desafian sob três aspectos essenciais: 1) relacionamento acionistas-corpo- rações (regularidade, formalidade, rigor, democracia acio- nária, justa retribuição de investidores minoritários); 2)

- Daniela Pellin e Wilson Engelmann timento, responsabilidade, resultados, resolução de con- constituição de conselhos de administração (comprome flitos, perfil de excelência, alternância e nomeação, pelos- acionistas, de conselheiros independentes); e, 3) atuação da direção executiva para dirimir conflitos de agência (ali nhamento negociado de interesses para resultados, gestão- rasde resultados, de valor, prestação avaliação responsável e homologação de contas) pela assembleia (ANDRADE; ou ROSSETTI,conselhos de2007, acionistas, p. 91). estratégias agressivas e gerado 63 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Dado esse conjunto de diversidades, somado, ain- da, aos primeiros passos da governança corporativa, espe- cialmente, no Brasil, a governança tem seu conceito forma- do por quatro grupos teóricos:  Como guardiã de direitos das partes com interesses

governança corporativa trata de Justiça, da transpa- rênciaem jogo e da nas responsabilidade empresas, Williansom das empresas explica no que trato “a de questões que envolvem os interesses do negócio e os da sociedade como um todo”. (1996);

 Como sistema de relações pelo qual as sociedades são dirigidas e monitoradas, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa reza no sentido de que:

Governança corporativa é o sistema pelo qual as sociedades são dirigidas e monitoradas, envolven- do os relacionamentos entre acionistas/cotistas,

conselho de administração, diretoria, auditoria- mentarindependente o valor eda conselho sociedade, fiscal. facilitar As boasseu acesso práticas ao capitalde governança e contribuir corporativa para sua têm perenidade. a finalidade (2003) de au

 Como estrutura de poder que se observa no interior

dos Estados Unidos, citado por Andrade e Rossetti, das corporações, o Cadbury Committee de finanças estrutura de poder que regem os mecanismos atra- dispôs: “a governança corporativa é o sistema e a- ladas” (1992); vés dos quais as companhias são dirigidas e contro  -

Por fim, como sistema normativo, que rege as rela- porativações internas é expressa e externas por dasum companhias,sistema de valores tem-se que em

A governamentalidade aplicada aos empreendimentos econômicos nanotecnológicos: a nanoética econômicos nanotecnológicos: aplicada aos empreendimentos A governamentalidade regeAdrian as Cadbury,organizações, dito oem seguinte: sua rede “A de governança relações inter cor- 64 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS -

comportamentonas e externas. Ela, da então, sociedade” reflete (1999). os padrões da com panhia, os quais, por sua vez, refletem os padrões de Assim, tem-se a compreensão de que, em se tra- apropriado pelas empresas, com o aval e incentivo gover- tandonamental, de esse desenvolvimento tipo de exploração científico da inovação nanotecnológico também

Brasil, que vale comentar, é a conduta responsável adotada peladeve holdingser regido da empresapelas melhores O Boticário práticas,25. exemplo disso, no A empresa deu um passo em favor da inovação de testes alternativos na indústria cosmética com a criação de organs on a chip. Trata-se de tecnologia que simula um

É uma aposta em estudo na indústria farmacêutica em ou- trosórgão países, humano inclusive. em um O chip objetivo para éevitar testar testes processos em animais. alérgi- cos a produtos. Márcio Lorencini, gerente de pesquisa biomole- cular do Grupo Boticário, disse que “A avaliação da sensi- bilização da pele é um tema altamente discutido na comu- tendência complementa-se ao desenvolvimento de novas técnicasnidade científica alternativas no cenário in vitro nacional para a substituição e internacional. de testes Essa em animais”. A tecnologia utilizada para o desenvolvimento do Daniela Pellin e Wilson Engelmann Brasil será feito em parceria com o Laboratório Nacional dechip Biociências é da empresa (LNBio), alemã TissUselaboratório e o desenvolvimento ligado ao Centro no Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) e com apoio do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) e da Rede Nacional de Métodos Alternativos ao Uso de Animais (RENAMA). Os primeiros testes funcionais, em laboratório, estão previstos para co-

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Disponível em file:///C:/Users/admin/Downloads/artigo_promise_ of_history_RRI.pdf. Acessado em65 26/07/2016. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA meçar ainda em 2016 e para o próximo ano, 2017, o Grupo Boticário deverá lançar os primeiros produtos testados a

O Grupo Boticário adota métodos in vitro desde partir2000, eliminandode órgãos simulados testes em em animais. chip. Em 2015, a empresa inovou mais uma vez ao ser a primeira do Brasil a desen- - sa e o desenvolvimento do material foram realizados pelo Centrovolver ade pele Pesquisa humana e Desenvolvimento em laboratório, doa Pele Grupo, 3D. localizadoA pesqui

O material é utilizado para o teste de matérias-pri- namas planta e produtos de São Joséacabados dos Pinhais (cremes, (PR). loções e maquiagens),

formulações quanto na segurança dos produtos. Para ela- borartanto paraa Pele a escolha3D, são deutilizadas ingredientes células que isoladas serão usadosa partir nas de tecido descartado de cirurgias plásticas, nos casos em que

de Comitê de Ética e Pesquisa da instituição. Em laborató- rio,há o a consentimento pele é formada, do célula doador a célula, para estecamada fim pore aprovação camada,

tal como a pele humana. A tecnologia é reconhecida pelo (ANVISA).Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (CONCEA)É eexatamente pela Agência essa Nacional a resposta de Vigilância que se Sanitária espera.

Diante das incertezas científicas nanotecnológicas adotar- outro caminho é efetivar a política do valor de cautela para- tarevitar ou queseja osimpagável. riscos se Osconfirmem avanços tecnológicose o cálculo do comedidos custo-be nefício das consequências seja pesado demais para supor ambiente, garantem espaço para as futuras gerações. Isso épor nanoética: decisões Thisracionais approach de valorização points to the do dutieshumano and e dorespon meio- sabilities that arise from respecting persons, nonmaleficen- ce and justice. Other values involved in this approach

A governamentalidade aplicada aos empreendimentos econômicos nanotecnológicos: a nanoética econômicos nanotecnológicos: aplicada aos empreendimentos A governamentalidade include recognizing the limits os scientific understanding, 66 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS and acknowledding the vulnerability oh human health and ecosystems (O’MATHÚNA, 2009, p. 81). Disto extrai que as decisões e condutas empresa- riais devem ser pautadas em conformidade com as normas- -objetivo contidas no artigo 170, da Constituição Federal (GRAU, 2015); também, devem atentar para a boa-fé e a probidade (artigo 422, Código Civil), sobretudo, fazer va- ler a função social dos negócios (artigo 421, Código Civil). - cionalizar valores. Tudo issoDa deve leitura nortear das obrigaçõesas atividades descritas econômicas, no parágrafo institu deveúnico, usar do artigoseus poderes 116, da de Lei controle das Sociedades para atingir Anônimas, o escopo é dapossível empresa verificar e a sua os função deveres social; do acionista atentar para controlador. suas respon Este- com a comunidade do seu entorno levando em conta seus interessessabilidades e para atendendo-os; com os demais garantindo, acionistas assim, e trabalhadores; a efetividade do escopo constitucional (COMPARATO; SALOMÃO FILHO, 2008, p. 365). O papel corporativo e, assim, institucional da em- diplomaspresa é identificado legislativos, através mas dede regrasnatureza de comportamentointerna, priva- daformal e outra, e informal, de natureza não social, necessariamente difusa; todavia, codificadas se prestam em a referendar os comportamentos da macrossociedade. Daniela Pellin e Wilson Engelmann Historicamente, as empresas construíram seus alicerces dentro do seio social. As instituições formais e informais pautam-se na ética, na moral, nos conceitos de boa-fé e bom comporta- mento empresarial, a exemplo tomado de um bom pai de família que rege bem os negócios da família (art. 1011, Código Civil). A teoria da nova economia institucional questiona a economia neoclássica (liberalismos e utilitarismo) que 67 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA - ximizador, quando toda ação e decisões empresariais estão embrincadasprima por escolhas com as hiperracionais instituições formais e comportamento e informais maque

(ZYLBERSZTAJN; SZTAJN, 2005, p. 3). influenciamReale os diz resultados que o sucesso da empresa da teoria pelo do reflexo equilíbrio social e estabilidade institucional depende de questões políticas,

crise capitalista está intimamente ligada à competitividade, éticas e de administração econômica, pois, a superação da

mas, os trabalhadores e as respectivas famílias não podem 2005,esperar p. os4). reajustes espontâneos das empresas. Portanto, a revisãoÉ, dos pois, conceitos na empresa se faz que necessária se devem (WALD; conciliar FONSECA, os in- - vergentes e interdependentes entre investidores, admi- nistradores,teresses. Os empregados, interesses conflitantes, consumidores materialmente e meio ambiente; con

globalizada. As decisões empresariais devem ser tomadas comconstituem responsabilidade. a mola propulsora Timm explica da ordem que novao mercado econômica onde a empresa atua “é um espaço público de interação social e coletiva tendente a situações de equilíbrio. Com efeito,

vale dizer, como fato” (TIMM, 2008, p. 82). o mercado existe como uma instituição social espontânea,- ração carrega na gestão, valores intrínsecos e extrínsecos Uma empresa que seja identificada como corpo - çãona inovaçãode recursos como produtivos sinônimo e deainda progresso não experimentados econômico e (SCHUMPETER,social, a qual consiste, 1971, p. essencialmente, 35). na melhor aloca As empresas politicamente responsáveis incluem em seus objetivos: proteção ao meio ambiente; informa-

indicadores de comprometimentos; critérios de gestão

A governamentalidade aplicada aos empreendimentos econômicos nanotecnológicos: a nanoética econômicos nanotecnológicos: aplicada aos empreendimentos A governamentalidade relacionadosções acerca de a dadosprogramas, socioeconômicos metas e monitoramentos e financeiros com de 68 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS resultados sociais efetivos; o desenvolvimento de ativida- de atendendo às conformidades legais. Sobretudo, adotam posicionamento ético em face de seus fornecedores; men- suram impacto de produtos desenvolvidos (nocividade, dano e risco à saúde); estabelecem critérios de governança corporativa e de transparência; exibem à sociedade seus balanços sociais. Os dados informados nessa pesquisa mostram que esse desiderato político vem sendo cumprido, sendo esta a razão de pensar e decidir o país. Há desenvolvimento - econômico e social, mesmo que isso seja visto pelo cresci problemamento econômico com a moralidade de poucos nae da aplicação mera inclusão da política, social que no mercado consumidor, de muitos. A bem da verdade, há um ao tratar sobre a Nanoética: Ethics is often seen as a ratio- nalsó a approachética pode to resolver moral comodilemas mencionado which helps por people O’Mathúna, think through and defend choices about right and wrong” (2009, p. 31). Oportunamente, Engelmann tratou da juridiciza- ção das nanotecnologias no IAMOT 2015 (Internacional Association for Management of Technology), fazendo fren- te às expectativas brasileiras para amparar os avanços do

2015, que as práticas de gestão corporativa podem ser ins- desenvolvimento, apresentando entre 08 e 11 de junhoThe de Daniela Pellin e Wilson Engelmann compliance programs as an alternative to business mana- gementtrumental to dealeficaz with na thegestão right do to risco consumer nanotecnológico: information and with the risks brought by nanotechnology (ENGELMANN, 2015).

26, em Em harmonia com as disposições internacionais, o 26 Segundo se pode ler na página principal do NanoReg: “O potencial Brasil aderiu ao projeto europeu chamado NanoReg - çado pela compreensão limitada dos aspectos de segurança ao longo inovador e econômico dos nanomateriais engenheirados está amea

das cadeias de valor. Esforços69 substanciais deram insights toxicidade ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA 2014. O projeto pretende tratar da regulação internacional e fomentar a criação de banco de dados, em consórcio com todos os países, acerca das informações técnicas envolven- do nano e que deve ser alimentado e pode ser consulta- do por todos os aderentes. Engelmann concorda com essa That is, the constructed response should still be aligned with the internationaladesão, desde standards que tenha on foco Human nos RightsDireitos and Humanos: meet legal de- cisions already produced by International Courts of Human Rights, being regional or global (BOTHA, 2015). Por ocasião da adesão, o coordenador geral de Nanotecnologia da Secretaria de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação, Flávio Plentz, ressaltou em entre- vista dada ao Portal Brasil, em 27/08/201427, que o pro-

as questões de regulação nacional; portanto pode servir de materialjeto europeu de consulta visa dar interna. suporte técnico e científico a todas Em artigo intitulado, “O Direito frente aos desa-

que a regulação deverá ser feita mediante sistema dialó- fios trazidos pelas nanotecnologias”, Engelmann indica- verno por objetivos”: qualidade da comunicação entre as partesgico; democrático envolvidas no e desenvolvimento horizontalizado; da mediante nanotecnologia; um “go

entre trabalhadores, consumidores, empresas, sindicatos, (ENGELMANN,órgãos reguladores 2013). etc. O escopo é humanizar a técnica e os possíveisAcrescenta efeitos que maléficos “a gestão antesdo risco que engloba eles ocorram a atua- ção gerencial da boa-fé, como aquele agir sem a intenção

ae aperguntas exposição abertas para nanomateriais. é urgentemente No necessária.entanto, o conhecimento A abordagem deem hoje cir- nãoculação é suficientemente da NanoReg irá abrangente fornecer as pararespostas fins de certas regulação, para a Sociedade,a resposta a Indústria e os Regulamentos nacionais e as autoridades Legislação. 27 2014/08/comite-de-nanotecnologia-aprova-adesao-do-brasil-ao-

A governamentalidade aplicada aos empreendimentos econômicos nanotecnológicos: a nanoética econômicos nanotecnológicos: aplicada aos empreendimentos A governamentalidade Disponível em:

nanoreg>. Acessado em 26/07/2016.70 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS de causar prejuízo ou dano” (ENGELMANN, 2012, p. 392). Os critérios de governança corporativa aplicáveis não são os atrelados, somente, aos interesses dos stakeholders”28 e shareholders.29 A ampliação do conceito e atitude deve comportar, sistematicamente, diálogos com a sociedade civil, organizada ou não, e com o Poder Público; constru- ção dos Códigos Deontológicos em toda a cadeia de vida de - seuma de nanopartícula uma nanodemocratização. e de política democrática e horizontali zada paraNesse que sejacenário efetiva deveras (DALTON-BROWN, complexo, a governamen2015). Trata-- talidade, que é um ramo da ciência da educação e que serve para conformar toda uma rede de ensino, também, serve para promover um salto na gestão corporativa e in- cluir, no exercício do poder, de fato, a institucionalização das pessoas, ou seja, agregar valor institucionalizante e emancipador. As práticas de gestão corporativa, muito embora, al-

- velcancem pela setoresformação externos dos valores na sua sociais atividade e, com econômica, isso, muito deve an- tesrecobrar da formação sua importância dos Estados, histórica já exercia ao seressa agente função responsá precípua de conformar comportamentos e aglutinar a sociedade a ca-

- 30 minhote e responsável da emancipação da governamentalidade e apropriação pública. aplicada como Daniela Pellin e Wilson Engelmann Nesse sentido, é possível que o uso devido, eficien 28 - pos de interesses que são externos à atividade das empresas, mas são atingidos, Stakeholders direta é uma ou indiretamente, nomenclatura porestrangeira ela. para identificar os gru 29 - pos de interesses que são internos à atividade das empresas e são atin- gidos, Shareholders diretamente, é uma por nomenclatura ela. estrangeira para identificar os gru 30 Explica a Professora de Educação, Cláudia Dal’Igna, em entrevista ao Instituto Humanitas Unisinos intitulada Governamentalidade, gênero e educação, uma relação complexa que a “[...] governamentalidade pode ser compreendida como uma grade de análise para as relações de po- der implicadas nas formas de condução da conduta, na medida em que 71 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA - - mizaçãointerventora de riquezas em políticas sem deo aumentodecisão econômica da pobreza e orientasocial e ção deontológica, auxilie os agentes econômicos na maxi mitigando os riscos dos infortúnios. impeça osA governamentalidadeexperimentos nanotecnológicos é ferramenta com do humanos,biopoder para subjetivação do comportamento da moral social, do inconsciente coletivo, na conformação da sociedade; de intervenção na existência coletiva, por meio dos quais, os sujeitos são levados a atuar sobre si próprios, em nome de sua própria vida ou de alguma forma, da vida coletiva, ex- plica a Professora de Educação, Cláudia Dal’Igna (2015).

educação,A Dr. governamentalidade, Karin Amos, da Universität termo Tübingen acunhado, como por Michael Foucault (1991) é compreendido pelo Professor de [...]uma preocupação com a problemática geral de regulamentar, direcionar e governar nas socie- dades modernas em todas as principais áreas do

família e as crianças [...] (AMOS, 2010, p. 25-26). Estado, o que inclui a economia, o oykos, isto é, a Assim, se a ética empresarial que se espera, na -

inclusive,exploração internacional; econômica das a governamentalidade nanotecnologias, é parteprecede inte à grante dos critérios de governança corporativa de âmbito, colimados pelos agentes empresariais corporativos, já que, elaboração dessa ética, pois, a deve orientar para os fins as empresas são responsáveis pela conformação social, parapor tradição o bem ou histórica para o mal; herdada para o das crescimento corporações ou involução; de ofício, para o desenvolvimento ou dominação. As empresas são as responsáveis por regras formais e informais conformadas socialmente, se revestem de referências.

produzindo um modo de ser e de viver a feminilidade e a masculini- regula e modifica as relações de mulheres e homens consigo mesmos,

A governamentalidade aplicada aos empreendimentos econômicos nanotecnológicos: a nanoética econômicos nanotecnológicos: aplicada aos empreendimentos A governamentalidade 27/07/2016. dade”. Disponível em http://www.ihuonline.unisinos.br. Acessado em 72 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Um dos aspectos que Karin explica a governamen- talidade em Foucault, se dá como

[...] o conjunto formado por instituições, proce-

táticas que possibilitam o exercício de sua forma dimentos, análises e reflexões, os cálculos e as tem por alvo a população, por principal forma de assaz específica, embora complexa, de poder, que técnico essencial os aparatos de segurança [...] (AMOS,conhecimento, 2010, p. a26). economia política e por meio

Muito embora, a ferramenta da governamentalida- de seja objeto de investigação na área da ciência da educa- ção, se aplica ao caso do comportamento empresarial maxi- mizador, multi e transnacional, incluindo, micro e pequenas empresas nacionais. É a técnica que tem como objeto a con- formação do comportamento social em um mesmo sentido. A governança, por sua vez, deve associar-se à go- - incutirvernamentalidade na Nano Ética, a fim objetivosde ampliar de seu conformação alcance – ou social reto frentemá-lo, aosa partir riscos de e seu infortúnios contexto nanotecnológicos, histórico e genético. median Deve- te a educação pela informação e transparência, incluir a

- mica,sociedade objeto no da desenvolvimento economia clássica, e aparelhá-la diminuindo do a poder margem de dedecisão, prejuízos o que, indenizatórios, por via reflexa, eventos maximizará morte a riquezae tóxicos, econô a se- Daniela Pellin e Wilson Engelmann rem reparados por toda a expectativa de vida dos atingidos pelos infortúnios. - - diante propostaOu seja, deo valor emancipação econômico das agregado pessoas pelaspara osnano en- frentamentostecnologias, deve necessários ser compartilhado e para isso comocorrer a sociedade, de forma meefe- de projetar nos indivíduos um padrão de comportamento tiva e eficaz, a governamentalidade empresta a sua técnica 73 social e econômico. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Conclusões

- nidade de recursos que prometem alavancar o atendimen- As nanotecnologias, de fato, apresentam uma infi

comporto de muitas o quadro necessidades de desenvolvimento humanas. Os riscospara a e busca infortúnios, da se- sempre atrás nas pesquisas científicas, são reclamados a- tamente atendido, independentemente, de qualquer inter- vençãogurança do humana Direito, e enquantoambiental. norma Isso é reguladora justo e deve dos ser limites pron ao desenvolvimento nanotecnológico, investimento e apro-

A forma de atender a essa demanda latente, pode terveitamento como ferramenta econômicos. a elaboração de Códigos de Ética que tem como escopo a governança. Entretanto, os critérios que orientam a governan- ça, certamente, não atendem à problemática apontada, não - - cossendo, e sociais para a que segurança não emancipam pretendida, os indivíduos suficiente. e,A autoregusequer, os incluilação práticano desenvolvimento insere em sua como formatação, agentes aspectos de decisão, econômi quiçá, uma participação nanodemocrática. Assim, a governamentalidade é capaz de eman- cipar a própria governança nanotecnológica a incluir a - porativos, promover a conformação social que outorgue o obrigatoriedade de os agentes econômicos, enquanto cor- senvolvimento e a maximização de riquezas com justiça socialpoder edemocrático não a mera administraçãode escolha consciente do prejuízo. e auxilie, o de

REFERÊNCIAS

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A governamentalidade aplicada aos empreendimentos econômicos nanotecnológicos: a nanoética econômicos nanotecnológicos: aplicada aos empreendimentos A governamentalidade TRIAL. Agência Brasileira de Desenvolvimento 74 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Industrial Panorama nanotecnologia/Agência Brasi- leira de Desenvolvimento Industrial. – Brasília: ABDI, 2010. 180 p. (Série Cadernos da Indústria ABDI XIX). Future Thinking and Management of Technology. IAMOT, 2015. Disponível em: BOTHA, Anthon. . Acesso emhttp://www.iamot2015.com/documents/ 27/07/2016. AMOS, FutureThinkingAndMOT-IAMOT2015.pdfKarin. Governança e governamentalidade: relação e relevância de dois conceitos científico-sociais proeminentes na educação comparada. Educação e Pesquisa. São Paulo. v. 36, n. especial. 2010. Disponível em spea03.pdf. Acessado em 28/07/2016. http://www.scielo.br/pdf/ep/v36nspe/v36nGovernança Corporativa: fundamentos, desenvolvimento e ten- ANDRADE,dências. Adriana; 3ª ed. ROSSETTI,Atlas. São Paulo: José Paschoal. 2007. CADBURY, Adrian. The future of governance: the rules of the game. Journal of General Management, v. 24, 1999. COMPARATO, Fábio K.; SALOMÃO FILHO, Calixto. O poder de controle da sociedade anônima. 5ª ed. Forense. Rio de Janeiro: 2008.

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13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS A REFORMULAÇÃO DA POLÍTICA NACIONAL DE DST/AIDS NO BRASIL: UM ESTUDO COMPARATIVO ENTRE A PERSPECTIVA DO ESTADO E DO MOVIMENTO SOCIAL DE LUTA CONTRA AIDS DO RIO GRANDE DO SUL E PERNAMBUCO

Luciane Pinheiro Jardim1

RESUMO: O presente artigo trata da realização de uma pesquisa qualitativa para construção de tese de doutorado, que por meio de um estudo comparativo visa compreen- der de que maneira os governos estaduais: do Rio Grande do Sul e Pernambuco, e municipais: Porto Alegre e Recife, (representados pelos programas estaduais e municipais de DST/HIV/Aids), e o Movimento Social de Luta contra Aids (MSLA RS e PE), percebem a reformulação da Lei da de Serviço Especializado às DST/HIV/Aids para o Serviço dePolítica Atenção Nacional Básica. de ODST/Aids estudo comparativo no Brasil, que tem altera por ofunda fluxo- a política de DST/HIV/Aids nas diferentes regiões: sul e mento reconhecer como os governos locais administram de atendimento à Atenção Básica, às particularidades re- gionaisnordeste, de levando simetria em ou conta assimetrias a alteração da gestão no fluxo dos do serviços serviço Luciane Pinheiro Jardim públicos voltados à epidemia de Aids, o caráter federativo que propicia a autonomia política administrativa de esta- dos e municípios, e as implicações que envolvem o proces- so democrático para a efetivação da política de DST/HIV/

1 Doutoranda do PPG Ciências Sociais da Unisinos. Bolsista Capes II.

[email protected] 79 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Aids. Essas considerações entre as regiões sul e nordeste, se darão através da percepção dos atores envolvidos, neste caso, gestores locais e movimento social, em relação à polí- tica pública de Aids. Como proposta para técnicas de coleta dos dados será indicada: a entrevista semiestruturada, a análise documental, o diário de campo e a observação par- ticipante. Como técnica de tratamento e análise de dados será sugerida à análise comparativa qualitativa. A pesquisa está em andamento com coleta de dados já realizada e en-

caminhamentoABSTRACT: para construção da tese. - This article deals with the realization of a qual itative research for doctoral thesis construction, which by means of a comparative study aims to understand how the state governments: the Rio Grande do Sul and Pernambuco, and city: Porto Alegre and Recife ( represented by state and municipal STD / HIV / AIDS), and the Social Movement for the Fight against AIDS (MSLA RS and PE), realize the reformulation of the National Policy Act of STD / AIDS in , which changes the flow of Service specialized STD / HIV / AIDS for the Primary Care Service. The comparative study is founded recognize how local governments manage the STD / HIV / AIDS policy in the different regions: South- and Northeast, taking into account the change in the flow of service to Primary Care Service, regional symmetry fea tures or asymmetries the management of public services- for the AIDS epidemic, the federal character which provides the administrative political autonomy of states and mu- nicipalities, and the implications involving the democratic process for effective STD / HIV / AIDS policy. These con localsiderations managers between and social the South movement, and Northeast in relation regions, to public will through the perception of the actors involved in this case,

A reformulação da Política Nacional de DST/AIDS no Brasil Nacional de DST/AIDS da Política A reformulação policy AIDS. As a proposal for data collection techniques- will be indicated: a semi-structured80 interviews, document analysis, field diary and participant observation. As a treat 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS ment technique and data analysis will be suggested to the qualitative comparative analysis. Research is underway with data collection already performed and referral to the thesis construction.O presente artigo trata da realização de uma pes- quisa qualitativa para construção de tese de doutorado, que por meio de um estudo comparativo visa compreen- der de que maneira os governos estaduais: do Rio Grande do Sul e Pernambuco, e municipais: Porto Alegre e Recife, (representados pelos programas estaduais e municipais de DST/HIV/Aids), e o Movimento Social de Luta contra Aids (MSLA RS e PE), percebem a reformulação da Lei da Política Nacional de DST/Aids no Brasil, através da portaria

Especializado às DST/HIV/Aids para o Serviço de Atenção Básica.01 de 16 de janeiro de 2013 que altera o fluxo de Serviço Na conjuntura atual, segundo dados empíricos le- vantados durante a pesquisa de mestrado: Estudo do pro- cesso de construção da identidade coletiva do Movimento Social do Rio Grande do Sul2 - ras sobre o impacto dessa reformulação, nem um estudo até o momento encontrado que, ainda responda: não há O respostas que muda cla na prática o serviço de saúde em atenção as DST/ Aids após a portaria 01 de 16 de janeiro de 2013? O que pensa o Movimento Social de Luta contra Aids sobre a reformula- ção da lei? Como os representantes do Estado e do MSLA percebem algum impacto (positivo ou negativo) em rela-

ção ao acesso dos pacientes ao serviço público de saúde na Luciane Pinheiro Jardim - los que interferem na articulação entre os atores do Estado erede do Movimentode atenção Socialbásica? de Quais Luta Contraos facilitares Aids em e/ou torno obstácu da re-

2 JARDIM, Luciane. P. (2013). Estudo do processo de construção da iden- tidade coletiva do Movimento Social do Rio Grande do Sul. Dissertação de Mestrado, São Leopoldo, Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade do Vale do Rio dos Sinos/UNISINOS. 81 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA formulação na política de Aids? Na relação Estado e MSLA

causa da reformulação da lei? Frente a essas perguntas é quehouve se propõe o estabelecimento esse estudo. de tensões entre os atores por

ser relevante na medida em que traga para o cenário aca- dêmico asNesse discussões sentido políticasconsidera-se que quemarcam a pesquisa este período venha de mudanças na legislação, vislumbrando a complexidade dos aspectos que envolvem os processos de tomadas de decisões em relação à formulação e reformulação das leis que orientam as políticas públicas, nesse caso a política de Aids, e com isso fazer um comparativo entre as diferentes posições/visões dos atores sociais envolvidos no processo. No Brasil, existem estudos3 nos quais se cons-

Movimento Social de Luta contra Aids na culminação das políticastata historicamente públicas brasileiras a importância de atenção da à participação saúde e aos di do- reitos sociais para as pessoas infectadas pelo HIV: Vírus

que a política de enfrentamento da epidemia da Aids no Brasilda Imuno foi fomentada Deficiência por Adquirida. vários grupos Esses sociais estudos que mostram se mo- bilizaram formando um movimento em busca dos direitos das pessoas portadoras do HIV/Aids. O Movimento Social de Luta contra Aids se organizou nos anos 80, realizando diversas manifestações em todo país e com isso, trouxe a

- nacional,implementação fornecido de uma pelo política Banco Mundialde saúde fazendo específica com para que a odoença, Estado com desse financiamento uma resposta próprio para toda de a cooperação sociedade no inter que se refere a epidemia. Essa resposta se efetivou num primeiro momento na criação do Programa Nacional de DST/Aids em 1986,

do Estado com o Movimento Social de Luta contra Aids era contudo segundo Parker (1997) e Galvão (2000), a relação A reformulação da Política Nacional de DST/AIDS no Brasil Nacional de DST/AIDS da Política A reformulação

3 Ver Parker (1997 e 1999), Galvão(2000)82 e Marques (2003). 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS marcada por tensionamentos devido as características cen- tralizadoras do poder público e a morosidade nas ações. Assim esse momento foi apontado pelo descaso em relação prostitutas e usuários de drogas), que sofriam também por preconceitoàs populações e discriminação. mais afetadas pela doença (homossexuais, No entanto, a ocorrência de sucessivas mortes e o aumento do número de novos casos trouxe à tona as discus- que já se alastrava afetando outros segmentos da socieda- de.sões Em sobre contrapartida as deficiências o Movimento do Estado emSocial relação de Luta à epidemia contra Aids fazia pressão política para que a Aids fosse pauta prio- ritária na agenda governamental com o estabelecimento de diretrizes e normas a serem incorporadas capazes de atender as demandas sociais reivindicadas na época. Nesse cenário político a disputa entre Estado e o Movimento Social inaugurou um modelo inédito de ar- política de DST/Aids no Brasil. Com isso considera-se que ticulação que configurou o panorama na formulação da Estado com a participação do Movimento Social de Luta contraessa política Aids, epública o auxílio foi de um acordos construto de cooperaçãosocial definido interna pelo- cional, no qual o Banco Mundial assumiu um papel impor- tante na resposta de enfrentamento à epidemia através de desenvolvimento. financiamentosCom os derecursos projetos advindos dos governos dos acordos dos países de coo em- peração internacional com o Banco Mundial (Aids I, Aids

II e Aids III)4 - Luciane Pinheiro Jardim destinados ao, houveHIV/Aids a implementação e outras Doenças das leisSexualmente de incen Transmissíveis,tivo na qual havia repassados recursos própriosaos estados do governo e municípios. federal -

4 Com relação aos projetos Aids I, Aids II e Aids III, será mais aprofunda- Estes dorecursos no decorrer tinham do artigo. como finalidade reduzir a incidên 83 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA cia e transmissão do HIV/Aids a partir do investimento em: diagnóstico, atendimento, assistência, internações, trata- mento e prevenção ao HIV/Aids, e também, fazer repasse de recurso para os projetos das organizações não-governa- mentais através de editais de parceria para execuções das ações de prevenção. - co conforme constatado na dissertação do mestrado de Jardim (2013),Contudo no houvequal mostra uma mudançaa preocupação no cenário do MSLA/RS políti com os direcionamentos da política de Aids, que a partir de 2013 sofre uma reformulação na legislação por meio da portaria: nº 1 de 16 de janeiro, que altera a tabela de ser-

deviço atendimento de atenção aosàs DST/HIV/Aids pacientes com daHIV/Aids Vigilância para em Atenção Saúde Básica(Especialidades) nas redes públicase institui denovos saúde. regulamentos Porém essa para reformula o fluxo- ção na legislação não foi aprofundada e nem analisada até

o momento, através de um estudo científico. - plexo e mutante,De acordo e com aParker rapidez (1999), que a aepidemia epidemia se de move, Aids faltamno Brasil estudos é caracterizada que analisem por um e avaliem perfil epidemiológico em profundidade com o impacto das políticas públicas que vem sendo desenvolvi- das pelos órgãos governamentais brasileiros. Frente a esse contexto trazido até aqui, pode se considerar a epidemia

em que abre espaço para o cientista social pesquisar a par- tirda Aidsde dados como empíricos, um fenômeno as práticas social importanteinstitucionais na quemedida en- volvem o processo de (re)formulação da política pública,

na articulação entre os atores do Estado e do Movimento Socialidentificando de Luta oscontra facilitadores Aids na arenae obstáculos política. que interferem Um estudo, nesse contexto atual, de mudança na legislação da política de Aids é extremamente relevante,

A reformulação da Política Nacional de DST/AIDS no Brasil Nacional de DST/AIDS da Política A reformulação se for levado em consideração que ainda ela é uma doen- 84 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS ça que vitimiza inúmeras vidas, segundo o relatório da ONU: Organização das Nações Unidas, divulgado no dia 16/07/2014, onde menciona que no cenário mundial, nos últimos oito anos, a epidemia está em queda de 27%, en- quanto no Brasil vem crescendo em 11% o número de no- vos casos e de mortes associados a doença, representantes 5 esses índices a uma maior oferta do governo justificam essede teste discurso. e uma Jámelhor nos cenários notificação regionais de novos no casos,estado contudo do Rio Grandenão há até do oSul momento a epidemia um vemestudo avançando apresentado de forma que legitime bastan- maior incidência6. te significativaEssa tendência e Pernambuco do país é contráriao estado nordestinoà realidade comglo-

Grande do Sul, abre algumas lacunas que incitam ques- tõesbal, ea aserem dinâmica respondidas, epidemiológica e isso motivou principalmente a proposta do para Rio realização desse estudo de doutoramento, que a partir de uma pesquisa qualitativa no campo das Ciências Sociais, a reformulação da política de Aids nesse contexto atual. A pesquisabuscará contribuir será realizada para atravésuma reflexão de um mais estudo profunda comparativo sobre entre os atores sociais envolvidos (MSLA e Estado): na re- gião sul (RS) e na região nordeste (PE). O estudo comparativo tem por fundamento re- universal de DST/HIV/Aids nas diferentes regiões: sul e conhecer como os governos locais administram a política Luciane Pinheiro Jardim nordeste,sobre-panorama-da-aids-no-mundo. levando em conta a alteração Acesso em: no 03/03/15.fluxo do serviço 65 Disponível Disponível no no boletim site: http://www.aids.gov.br/noticia/2014/relatorio- epidemiológico 2013 no site: . O

maior número de incidência em infecção por HIV/Aidswww.aids.gov.br e Pernambuco Rio Grande do Sul está liderando o ranking de municípios do país com- pactos da epidemia em questões vinculadas a esse projeto, adiante, se- guemlidera oso rankingdados disponíveis dos estados no nordestinos. mesmo boletim. As referências sobre os im 85 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA de atendimento à Atenção Básica, às particularidades re- gionais de simetria ou assimetrias da gestão dos serviços públicos voltados à epidemia de Aids, o caráter federativo que propicia a autonomia política administrativa de esta- dos e municípios, e as implicações que envolvem o proces- so democrático7 para a efetivação da política de DST/HIV/ Aids. Essas considerações entre as regiões sul e nordeste, se darão através da percepção dos atores envolvidos, neste caso, gestores locais e movimento social, em relação à polí- tica pública de DST/Aids. Contextualizando, a epidemia da Aids surge no

em alguns estados, e o MSLA estar em pleno processo de reivindicaçãoBrasil em 1982, e emborapressão jápolítica, haver serviços o governo de atenção federal àainda Aids

saúde pública, somente em 1985 o Ministério da Saúde se não havia reconhecido a doença como um problema de respeito. O estado de São Paulo se destacou devido ter sido precursorpronunciou de oficialmente muitas mudanças trazendo no o setorreconhecendo da saúde anesse esse

Sanitarista, deu-se o primeiro passo para o enfrentamen- toperíodo. da epidemia Com a criandoinfluência o Programado pensamento Estadual do deMovimento Aids em 1983. (Marques, 2003). A organização do Programa de Aids de São Paulo foi uma resposta que trouxe,

A estrutura do novo programa que articulou qua- tro estratégias: serviços de referência assistencial - ção e educação à população, mobilização e parti- cipaçãoe laboratorial, social. vigilânciaEntre as diretrizes,epidemiológica, se destacam informa o combate à discriminação, a garantia do acesso uni-

7 Considera-se aqui que democrático seja um regime político a participação direta através de representantes da sociedade civil nos leisem, ou que atra há- vés ainda de representantes políticos eleitos, exercendo o poder da go-

A reformulação da Política Nacional de DST/AIDS no Brasil Nacional de DST/AIDS da Política A reformulação vernaçãoconselhos através deliberativos do sufrágio na criação universal e desenvolvimentos. de 86 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS versal ao tratamento, promoção da equidade para grupos sociais mais afetados no acesso aos recur- sos disponíveis. (GRANGEIRO et al, 2009, p. 89).

- rista, o Programa de Aids de São Paulo serviu de referência para implantaçãoCom as estratégias de outros queprogramas vinham emdo ideáriovários estados sanita do país, e também para própria organização do Programa Nacional de Aids. Assim a resposta governamental à epidemia teve seu início em 1983 nos estados, sendo motivada por dois eixos fundamentais, primeiro: pela participação do Movimento Social de Luta contra Aids que trazia as deman-

Aids, e em segundo: a contribuição de técnicos especializa- dosdas e comprometidosreivindicava uma com política o ideário de saúde sanitarista específica para para cons a- trução do SUS, que buscavam o acesso universal de saúde para todos, e que o Estado assumisse essa responsabilida- de. (Villela, 2009). E a partir da implantação do Programa Nacional de Aids em 1986, criou-se uma rede de interlocução e arti- o que trouxe como consequência uma resposta nacional paraculação epidemia, entre profissionais e também a adesãoe instituições de diretrizes em todo que o fundaBrasil,- mentaram as primeiras ações de enfrentamento à doença no país. Essa articulação se fortaleceu na década de 90, prevenção e assistência governamentais e não-governa- quando o Banco Mundial passou a financiar projetos de sobre a doença. Luciane Pinheiro Jardim mentais,Galvão e incorporar (2000), novas também tecnologias relata como e conhecimentos um momen- to importante na década de 90 à participação do Banco Mundial como parceiro no gerenciamento da epidemia frente ao cenário nacional. Outro aspecto trazido por ela

1996, que trouxe a novidade relacionada à terapia antir- foi a XI Conferência de Vancouver ocorrida em julho de 87 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA retroviral, a qual o Programa Nacional decide garantir o acesso às pessoas que vivem com HIV e Aids. Essa atitude

epidemia, pois as pessoas vítimas do HIV/Aids começaram ocasionou mudanças significativas no cenário nacional da Segundo dados do Programa Nacional de Aids8, aessa ter participaçãoesperança e melhorado Banco na Mundial qualidade se deude vida. através de três acordos de cooperação internacional: Projeto Aids I (1994- 1998), o Projeto Aids II (1998- 2003) e o Projeto Aids III (2003-2006). A injeção de recursos por parte do Banco Mundial estimulou as parcerias público-privadas, aumen- tando consideravelmente a capacidade de cobertura do Programa Nacional de DST/Aids. -

entre o governoApesar dessebrasileiro estímulo e o Banco que seMundial, deu a partirno que dos se re fi- ferenanciamentos, às prioridades houve da divergênciaspolítica de Aids, em entre alguns elas, momentos, a distri- buição gratuita da terapia antirretroviral, conforme Villela menciona,

enfrentamento da epidemia de HIV/Aids não pode Na visão histórica da construção das políticas para presente nas negociações que envolviam o gover- deixarno, a sociedade de ser mencionada civil e o Banco a relação Mundial. conflituosa No caso - ção de medicamentos antirretrovirais destoa das recomendaçõesespecífico da Aids, do ondeBanco o Mundial,programa cuja de posiçãodistribui é de que os pacientes com Aids devem pagar por seu tratamento da mesma forma e da mesma medida dos pacientes com outras doenças, as divergências

acordos. (VILLELA, 2009, p. 41). não chegaram a impedir a assinatura de novos Como se percebe nessa citação da autora, embora a posição contrária preconizada pelo Banco Mundial, o go-

8 Disponível no site do Ministério da Saúde: . Acesso em:

A reformulação da Política Nacional de DST/AIDS no Brasil Nacional de DST/AIDS da Política A reformulação 22/10/2014. www.aids.gov.br 88 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS verno brasileiro e o MSLA, conseguiram através do diálogo político negociar novos acordo de cooperação internacio- nal, e com isso, possibilitar o acesso ao tratamento e outros

- insumoscia e transmissão de saúde, do melhorando HIV/Aids e a outras resposta DST, ao e HIV/Aids.também for- talecer asO instituiçõesprojeto Aids governamentais I tinha como foco e não-governamenreduzir a incidên- tais envolvidas na prevenção e controle das DST/Aids. Com o crescimento do número de ações para o enfrentamento da epidemia em todo o país e a distribuição dos medica- mentos, o Programa Nacional obteve maior visibilidade, tanto dentro do Brasil como internacionalmente.

O segundo acordo, o projeto Aids II tinha como- lidadefinalidade do diagnóstico, diminuir a infecçãodo tratamento das DST/Aids, e da assistência bem como, aos portadoresexpandir o acessodo HIV/Aids. ao serviço Nesse de períodosaúde melhorando segundo Teixeira a qua - mente, e apoiado em projetos de cooperação internacional, passando(1997), o Programaa centralizar Nacional normas fica e fortalecido atividades institucionala serem im- plantadas em todo país, iniciando um processo inverso, na sua relação com os estados. De acordo com o Programa Nacional de AIDS, nessa ocasião 27 SES: Secretarias Estaduais de Saúde e 150 SMS: Secretarias Municipais de Saúde, além das ONG/Aids, receberam recursos repassados via convênios, - nados por concorrências nacionais através das Agências daspara Nações financiar Unidas, projetos UNESCO estratégicos e UNODC. e projetosTambém selecioé nesse Luciane Pinheiro Jardim

- momento que o Programa Nacional ganha visibilidade e dereconhecimento Aids do mundo. político tanto a nível nacional quanto in ternacional,Nessa sendo ocasião considerado se aprova como nao melhor CIT: ProgramaComissão - 89 Intergestores Tripartite, em agosto a proposta de finan ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA - tabilidade das ações em HIV/Aids e outras DST’s, através deciamento acordos no com SUS os que processos trabalha políticos com a questão e operacionais da susten do SUS pela NOAS: Norma Operacional de Assistência a Saúde 2001/2002. A partir da NOAS, foi publicada em dezembro a Portaria nº 2.313/GM, que instituiu o Incentivo das Ações no Âmbito do Programa Nacional de DST e Aids, por meio da transferência de recursos do Fundo Nacional de Saúde aos fundos estaduais e municipais. O terceiro acordo, o projeto Aids III além de manter as principais metas dos acordos anteriores, ti-

do Programa Nacional DST/Aids, garantindo sua visibili- dadenha como política objetivo a partir fortalecer da redução a efetividade da incidência e eficiênciadas DST/

vivem com HIV/AIDS, com a introdução de novas tecno- logiasAids e nomelhorando campo de avacinas atenção e tratamentoà saúde das com pessoas a terapia que antirretroviral. - tória da epidemia da Aids esteve intrinsecamente ligada à criação doSegundo Sistema Grangeiro Único de eSaúde. colaboradores A noção de (2009), saúde comoa his um direito a ser assegurado pelo Estado, fundamentado nos princípios de universalidade, equidade, integralida- de e controle social, foram características trazidas pelo

programas de saúde na década de 80, período em que se registraramMovimento os Sanitário primeiros que casos influenciaram de Aids no o Brasil. desenho Nesse de contexto político e epidemiológico que surge em 1983 a primeira resposta do governo para o enfrentamento da epidemia que foi a criação na cidade de São Paulo do pri- meiro Programa Estadual de Aids no país, pois a princípio a política de saúde referente à Aids era uma subpolítica do SUS, sendo assim, estabelecida a nível local. Logo após, em dezembro de 1983, no Rio Grande

A reformulação da Política Nacional de DST/AIDS no Brasil Nacional de DST/AIDS da Política A reformulação do Sul, também começou a se estruturar através da 90 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS - ferência as diretrizes da Reforma Sanitária e da política Secretaria de Dermatologia Sanitária, que tinha como re de hanseníase, algumas ações governamentais no sul do clínicos,país. Já na o programaregião do estadualnordeste de especificamente Aids só se estruturou no estado em 1987,de Pernambuco, impulsionado apesar pelo dasPrograma notificações Nacional e atendimentos de Aids que danos da epidemia. (GRANGEIRO et al, 2009). havia se Assimorganizado sendo, um o cenárioano antes da devido década a degravidade 90 foi mar dos- cado por intensa mobilização e participação política, que

- demiacontribuiu que avançava,no processo e com de amudança implementação no país. do No SUS âmbito pro- piciou-seda saúde haviao atendimento inúmeras descentralizadoreivindicações em dos relação pacientes, à epi a realização de diagnóstico e o acesso à terapia. Com isso, as pessoas soropositivas passaram a ter esperança, pois a dispensação gratuita da terapia antirretroviral, fez com que os pacientes respondessem bem ao efeito dos medi- país.camentos, Essa distribuiçãooportunizando também uma melhor foi positiva qualidade na terapêuti de vida- cae diminuindo de gestantes significativamente soropositivas que oao número acessarem de morteo serviço no de pré-natal, passaram a fazer o tratamento com antirre- - missão vertical. trovirais,Segundo reduzindo Villela significativamente (1999), o surgimento os riscos da de Aidstrans a nível mundial trouxe uma articulação entre Estado e a Sociedade Civil (representados pelos movimentos sociais Luciane Pinheiro Jardim e ONGs), para o enfrentamento da epidemia no que se refe- re as políticas públicas. Esse modelo foi caracterizado pelo estabelecimento de parcerias com as ONG/Aids, que além de trazerem suas demandas para formação de uma agenda, acabavam elaborando e executando projetos e propostas

91 financiadas pelo governo. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Nos cenários regionais9, no estado do Rio gran-

Não- Governamentais (ONGs) e do Movimento Social de Lutade do contra Sul e em Aids Pernambuco, não foram distintas.a história Eladas esteveOrganizações intrin- secamente ligada e dependente da própria trajetória da epidemia da Aids e dos Movimentos Sociais no Brasil. Baseando-se nas leituras, atas, depoimentos, jornais, leis, folders, estatutos, e-mails, entre outras fontes po- de-se perceber que as instituições envolvidas com a Aids geralmente estavam ligadas aos grupos da igre-

soropositivas. ja, aos homossexuais,No Rio Grande do profissionais Sul o Movimento do sexo Social e pessoasde Luta Contra Aids começa se organizar em 28 de agosto de 1999, sendo constituído por 43 instituições de diferentes segui- mentos como representantes da igreja, de pessoas que vi-

- tovem negro. com Ao HIV/Aids, longo dos homossexuais, anos, o Movimento profissionais Aids foi se do estru sexo,- turandousuários ede se drogas, adequando movimento as exigências de mulheres políticas, e o movimen com isso foram se constituindo juridicamente, como Fórum ONG/ Aids. Sua missão está voltada a ampliar e articular políticas de prevenção e assistência às DST/Aids e colaborar para o fortalecimento político das instituições que atuam no

- âmbitomentos destade políticas doença públicas nos cenários para a regionais,população constituindo afetada pela umaepidemia rede emONG/Aids todo o país. de encaminhamentos e acompanha Em Pernambuco no ano de 1996 se organiza uma articulação entre instituições e membros para o enfrenta- mento da epidemia. Atualmente o MSLA se organiza atra-

9 As descrições no texto foram baseadas nas leituras de atas, depoimen- tos, jornais, leis, folders, textos, estatutos, e-mails, entre outros docu- mentos obtidos junto ao MSLA e das anotações realizadas durante os encontros e reuniões enquanto militante do movimento durante cinco

A reformulação da Política Nacional de DST/AIDS no Brasil Nacional de DST/AIDS da Política A reformulação anos e a realização da dissertação de mestrado. 92 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS vés de 32 membros bastante diferenciados de acordo com - liticamente as ONG/Aids do nordeste, contudo diferente- menteFontes dos(2006), outros com estados a mesma brasileiro, a finalidade o Fórum de articular ONG/Aids/ po PE não é institucionalizado juridicamente, segundo seus coordenadores, se denominam como um movimento polí- tico que aceitam além de instituições não-governamentais, ativistas independentes e pesquisadores envolvidos com a questão da epidemia. Conforme Fontes (2006) em Pernambuco, e Jardim (2013) no Rio Grande do Sul, o Movimento Social de Luta - ção das políticas públicas de saúde para o enfrentamento dacontra epidemia. Aids, obteve Desta umaforma forte a atuaçãoinfluência de política diversos na gruposexecu sociais em todo o país ao longo dos anos 80 e 90 foram voltadas a construção de políticas públicas saúde e polí- eticas conferências. democráticas Entretanto, que foram além se dofortalecendo envolvimento e ganhando político, osnovos atores espaços sociais, de participaçãotambém passaram junto aos a se conselhos, envolver fórunscom a execução de projetos. No sentido político o contexto nacional dos anos

(Organizações da Sociedade Civil) e dos Fóruns Regionais ONG/Aids,80, no que seforam refere pautados ao trabalho por diversasdo MSLA ações através judiciais das OSC e protestos contra os governantes, tendo em vista a obten- ção de uma política de saúde que trouxesse uma resposta à

- Luciane Pinheiro Jardim epidemia,cimento gratuito bem como, de teste melhores anti-HIV, condições preservativos para os doentes,e medi- financiamento de projetos e campanhas educativas, forne pessoas que viviam com HIV/Aids. camentos para garantir uma melhor qualidade de vida às- a recursosNo tantofinal dosdo Bancoanos 90, Mundial as ONGs quanto brasileiras de agências que tra e balhavam com as questões da Aids, passaram a ter acesso 93 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA 10. Dessa forma, - fundações internacionais de financiamento dosconseguiram portadores financiamentos de HIV (pessoas para que desenvolver não desenvolvem suas ativi ain- dadades sintomas com projetos das doenças de prevenção oportunistas, e de pois acompanhamento possuem carga viral baixa e CD4 alto11) e doentes de Aids (pessoas que já -

paradesenvolvem combater a assíndrome infecções da de doença, doenças). estão debilitadas fisi camenteA por partir não possuirde 2001, defesas o governo suficientes federal no organismoconstituiu como etapa inicial a elaboração de uma Agenda de Saúde com um conjunto de eixos prioritários de intervenções no enfrentamento da epidemia de Aids para estados e muni- cípios. Nessa agenda constam as diretrizes e responsabili-

deveriam priorizar, formando assim, entre as três esferas dedades poder: que federal,os gestores estadual das diferentes e municipal, instâncias um acordo de poder esta- belecido entre gestores, representados pela CTI: Comissão Intergestores Tripartite12.

10 Mundial de Saúde cria um programa especial de Aids, e com isso passa- -se Segundo a ter uma Parker mobilização e Galvão global (1999, de p. ações 8) em para 1986 se enfrentara OMS: Organização a epidemia no mundo. Com os esforços internacionais para o controle da doen-

Noça houveBrasil tiveramum grande três investimento acordos internacionais: de recursos Aids que I, atravésAids II e do Aids Banco III. 11 MundialLinfócitos foram responsáveis financiando pela projetos defesa do nos organismo. países em desenvolvimento. 12 Segundo o site do DATASUS: “As Comissões Intergestores Tripartite: CTI são espaços intergovernamentais, políticos e técnicos em que ocor- rem o planejamento, a negociação e a implementação das políticas de saúde pública. As decisões se dão por consenso (e não por votação), o que estimula o debate e a negociação entre as partes. Desde que foram instituídas, no início dos anos 90, as Comissões Intergestores Tripartite (na direção nacional) vêm se constituindo em importantes arenas políticas de representação federativa nos processos de formula- ção e implementação das políticas de saúde. Todas as iniciativas inter- governamentais de planejamento integrado e programação pactuada na gestão descentralizada do SUS estão apoiadas no funcionamento dessas comissões. É constituída (em nível federal) paritariamente por A reformulação da Política Nacional de DST/AIDS no Brasil Nacional de DST/AIDS da Política A reformulação

representantes do Ministério da94 Saúde (MS), do Conselho Nacional de 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Nesse processo de pactuação, através da Comissão Intergestores Tripartite, em 19 de dezembro de 2002, surge

Saúde, a Portaria Ministerial 2313, de políticas de Incentivo Âmbitoa partir dodo Ministério Programa da Nacional Saúde/Secretaria de DST/Aids. de Vigilância Nessa nova em

HIV/Aids e outras DST’s, repassado os recursos fundo a política de incentivo há recursos próprios destinados ao a política de incentivo às DST/Aids estava incluída no pla- nejamentofundo para doestados PAM: ePlano municípios. de Ações Nos e Metas, âmbitos que estaduais, abrange três frentes de atuação: Promoção, Prevenção e Proteção – Diagnóstico, Tratamento, e Assistência – Desenvolvimento Institucional e Gestão - Parcerias com OSC: Organização da Sociedade Civil. E foi nesse momento que o governo passou a fazer parcerias com os Fóruns ONG/Aids e as ONG/Aids, através a políticas de incentivo às DST/Aids. Conforme Grangeiro et al (2010), o processo de construção da resposta nacional à Aids pode ser visto sob a ótica da política de descentralização. Para o autor o pro- cesso de descentralização se deu em três fases: nos anos 80 com uma resposta descentralizada baseada na atuação de estados, municípios e organizações não-governamentais; - vel federal, que ocorre paradoxalmente em conjunto com onos fortalecimento anos 90 o poder dos decisórioestados e emunicípios de financiamento expandindo no ní a resposta por todas as regiões do país; e nos anos de 2000 com a implantação de políticas de descentralização que vi- -

verno federal para os governos locais. Luciane Pinheiro Jardim savam transferir recursos financeiros e atribuições do go

estratégias,Secretários deprogramas, Saúde (Conass) projetos e doe alocação Conselho de Nacional recursos de do Secretarias SUS. Tem composiçãoMunicipais deformada Saúde por (Conasems). 15 membros, Na CIT, sendo são cinco definidas indicados diretrizes, pelo MS, cinco Conass e cinco pelo Conasems. A representação de estados e municípios é regional, sendo um representante para cada uma das

08/05/15. cinco regiões do País”. Disponível em: www.datasus.gov.br. Acesso em: 95 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Assim sendo, dos anos 2000 a 2013 os princípios e diretrizes da política Nacional de Aids direcionavam seu

saúde para o HIV e Aids, organizado na rede do SUS nos: atendimento para um Serviço Especializado, específico de de Atenção Especializada, CRT: Centro de Referência e Treinamento,CTA: Centro de ADT: Testagem Assistência e Aconselhamento, Domiciliar Terapêutica SAE: Serviço e UDM: Unidade Dispensadora de Medicamentos; onde toda estrutura de atendimento deveria ser composta por uma equipe multidisciplinar. A partir da portaria de nº 01 de

Especializado para o atendimento na Rede de Atenção Básica16 de janeirode Saúde. de 2013, fica alterado a tabela de Serviço Essa alteração no serviço de atendimento para Rede de Atenção Básica gerou preocupação para o MSLA dos dois estados: RS e PE. Segundo o que seus represen- tantes relataram nas visitas de campo, isso se deve por dois motivos: primeiro porque o Serviço de Atenção Básica que é a porta de entrada de acesso ao SUS, não está devida- mente preparado/capacitado para receber as pessoas com condição sorológica positiva para o HIV, e segundo, porque essas pessoas infectadas tem receio de procurar e acessar o serviço de saúde de Atenção Básica, que por vezes é mais próximo de sua moradia, por causa do estigma e preconcei- to gerado em torno da epidemia de Aids. Essa preocupação pode ser constatada através de uma carta organizada pelo Movimento Social de Luta con-

pedindotra Aids e a enviada revisão aourgente CNS: Conselho da política Nacional de Aids de no Saúde, Brasil, que posteriormente foi encaminhada ao Ministério da Saúde ...É diante de tantos desafios que solicitamos uma reavaliação da resposta nacional de AIDS, buscando avançar na superação de dados preocupantes. No Brasil o preconceito e discriminação ainda são rea-

A reformulação da Política Nacional de DST/AIDS no Brasil Nacional de DST/AIDS da Política A reformulação lidade para as Pessoas que Vivem com HIV e AIDS; 96 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS 12 mil pessoas ainda morrem em decorrência da AIDS e 34 mil novos casos são registrados por ano; a transmissão vertical não foi erradicada; os servi- ços, principalmente no Sul, Norte e Nordeste, ainda são precários – e por isso insistimos que a estra- tégia de ampliar a testagem tem que vir acompa-

absorver a nova demanda em rede de serviços que atuemnhada decom medidas qualidade. que Ogarantam movimento a capacidade de AIDS não de está dormindo. Temos nos articulado incansavel- mente e apresentado propostas claras para superar tais problemas. Assim, temos mobilizado a opinião pública e organizado atos de protestos (ações legí- timas em um regime democrático) e levado nossas

entre governo e sociedade civil13. preocupações às instâncias pertinentes de diálogo Compreende-se que essa preocupação sobre a po- lítica de Aids seja legítima, pois nesses anos de epidemia apesar de se ter uma legislação nacional voltada para es- tados e municípios, sabe-se que alguns momentos na prá- tica, os serviços de saúde são frágeis. Nesse sentido como se percebe, apesar da grande atuação do Movimento Aids junto ao Estado, existe uma apreensão em relação aos ru- mos que a Política de Aids terá nos próximos anos. Segundo o boletim epidemiológico de 2015, o per- - de magnitude com uma incidência de crescimento anual, e comfil da aepidemia prevalência de HIV/Aids generalizada, no Rio ou Grande seja, a do infecção Sul é de atinge gran

Em Pernambuco a epidemia tem média magnitude com umaa população incidência em degeral: crescimento mulheres, anual,homens, e com jovens prevalência e idosos. Luciane Pinheiro Jardim jovens e idosos. em populaçõesPara o enfrentamento específicas, ou da seja, epidemia, atinge a mais partir homens, de da- dos preliminares pode-se constatar que a descentralização

13 Acesso em: 10/06/2015 Disponível em: https://www.rets.org.br, publicado em 06/12/12. 97 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA da política de DST/Aids para a Atenção Básica no Rio Grande do Sul e na capital em Porto Alegre dá seus primeiros pas- sos em 2012 devido a alta incidência da epidemia no RS, através da construção de uma rede estadual de apoiadores do nível central, regional, municipal e local, através de ca-

pacitação com trabalhadores das coordenações de Atenção Saúde,Básica, equipes DST/AIDS, de Saúde Saúde Indígena da Mulher e Prisional. e Saúde da Criança – PIM (Primeira Infância Melhor), Unidades Básicas de-

2015, e Oé estadodividido gaúcho em 497 tem municípios, uma população possui de 19ª11,2 CRS: mi Coordenadoriaslhões de habitantes Regionais conforme de apontaSaúde, eestimativa tem implantados do IBGE 99 SAE: Serviço de Assistência Especializada, sem incluir os 10 SAEs da capital. A descentralização da Política do HIV/Aids para Atenção Básica iniciou com as capacitações

para testagem rápida e aconselhamento em 2012 nos 95 cujamunicípios população prioritários, total corresponde (com casos a 68,12% notificados da população de Sífilis doCongênita Estado. em 2011 à junho de 2012) dos 497 municípios, A partir dos dados epidemiológicos criou-se a Resolução nº 235/2104 – CIB/RS, tendo em conta as ca- racterísticas que a epidemia vem assumindo nos últimos -

anos no estado do Rio Grande do Sul, houve a necessida serviráde da criação para fortalecer recursos a específicos ampliação parae a descentralização o financiamento dasdo combate ações de à epidemia,promoção esse e prevenção incentivo àfinanceiro saúde, acesso estadual ao

pessoas vivendo com HIV/Aids (PVHA) e outras Doenças Sexualmentediagnóstico, tratamento Transmissíveis e compartilhamento (DST) na rede do de cuidado Atenção às Básica em Saúde/Estratégia Saúde da Família. O incentivo

A reformulação da Política Nacional de DST/AIDS no Brasil Nacional de DST/AIDS da Política A reformulação - financeiro é repassado para 64 municípios, entre eles os 98 habilitados na Resolução nº 143/14 - CIB/RS em que con 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS ano de 2012. Já a implantação da testagem rápida do HIV nacentram Atenção 90% Básica dos casosno Estado de Aids do Rionotificados Grande dono SulSINAN ocorre no atualmente em 442 municípios, obtendo 90 % de cobertu- ra no estado. Em Pernambuco e na capital Recife, devido a ma-

Saúde através da Resolução nº 578/2014, considerou que o númeronifestação de da casos Articulação de HIV e Aids/PE, AIDS continuava o Conselho aumentando, Estadual de e cuidado integral e prevenção para o HIV e da AIDS, resolveu havendo a necessidade de intensificar as ações na linha de- mover a prevenção, diagnóstico e assistência integral em constituir o Grupo de Trabalho (GT), com o objetivo de pro Vivendo com HIV contribuindo para redução da transmis- sãoDST da e AIDS,infecção, melhorando morbi-mortalidade a qualidade e para de Vida consolidação das Pessoas do SUS como sistema universal, integral e equitativo. A partir deliberou através da Resolução nº 582/2014, recomendou quedesse a Secretaria GT, o Conselho Estadual Estadual de Saúde de – Saúde SES/PE, de reestruturas Pernambuco- se os SAEs – Serviço de Assistência Especializada e conti- nuasse sendo os serviços de referência a AIDS. (Publicada

26.). Assim no estado a política de DST/Aids continua com no Diário Oficial do Estado de 17 de setembro de 2014_pág Em Pernambuco segundo dados do IBGE 2015 tem o fluxo de atendimento no serviço de saúde especializado. em 185 municípios. Para apoiar todos os 184 municípios uma população de 9,28 milhões de habitantes distribuídos Luciane Pinheiro Jardim criadas as 12 Gerências Regionais de Saúde (Geres), possui de Pernambuco mais a ilha de Fernando de Noronha, foram Serviço de Assistência Especializada, e dos 185 municípios, 16132 CTA: realizam Centro a descentralização de Aconselhamento da testagem e Testagem, rápida. 37 SAE: Compreende-se que nesses mais de trinta anos da epidemia, existe um esforço do poder público, através 99 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA dos governos: Federal, Estadual e Municipal em traduzir as demandas sociais numa política pública de saúde espe-

as fragilidades nos serviços de saúde, principalmente na redecifica de para Atenção o HIV/Aids, Básica, contudo devem ser as levadasdiferenças em regionaisconta pelo e Ministério da Saúde. Os dados epidemiológicos vêm apontando um cres- - cimento atual dos gestores públicos sobre a magnitude da cimento da infecção pelo vírus HIV, e isso exige o reconhe serviços de saúde na Atenção Básica; caso contrário, esse processoepidemia deque descentralização ainda hoje adentra da políticao país e de da HIV/Aids, fragilidade pode dos acabar não possuindo uma aplicabilidade efetiva nos servi- ços de saúde pública, e com isso, comprometer a qualidade do atendimento das pessoas que vivem com HIV/Aids. - ticipação política dos Movimentos Sociais na manutenção do processoPor outro democrático lado, constata-se de constituição a importância das políticas da par públicas em HIV/Aids. Frente a isso, exige-se um esforço contínuo no engajamento político dos Movimentos Sociais junto aos órgãos governamentais, para que os direitos das pessoas que vivem com HIV/Aids não se tornem dispersos, e nem esquecidos. É importante lembrar que a implementação de

garantia de direitos, o que efetiva os direitos são as cons- tantesuma política participações de saúde desses específica movimentos para HIV/Aids no campo não de traz ne a- gociação lutando pela manutenção e mudanças das polí-

Estado a concessão de direitos. ticas públicas, definindo através de negociações junto ao REFERÊNCIAS

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A reformulação da Política Nacional de DST/AIDS no Brasil Nacional de DST/AIDS da Política A reformulação Janeiro: Francisco Alves, 1991, p. 245. 100 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS CAPELLA, Ana Cláudia. Perspectivas Teóricas sobre o Processo de Formulação de Políticas Públicas. In: HOCHMAN, Gilberto. et al (org.). Políticas Públicas no Brasil. Rio Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2007. CHIZZOTTI, Antonio. Pesquisa em ciências humanas e so- ciais. São Paulo: Cortez, 1998. DEMO, Pedro. Pesquisa e construção do conhecimento: me-

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103

13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS A TRIBUTAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE REALIZAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL

Marciano Buffon1 Lilian Ramos Jacob2

RESUMO: O artigo tem como objetivo principal a abor- dagem da concretização de políticas públicas a partir do dever fundamental de pagar tributos, ou seja, o dever so- lidário que cabe a todos os cidadãos de contribuir para o propõe é: De que modo a tributação pode contribuir para a financiamento do gasto público. Assim, o problema que se - pecialmente,concretização a de consulta políticas à doutrina públicas e no legislação, Brasil? O tendo trabalho como se referencialdesenvolveu teórico com pesquisa alguns autores bibliográfica nacionais sobre e ointernacio tema, es- nais que tratam sobre o assunto abordado. PALAVRAS-CHAVE: Políticas Públicas. Tributação. Dever tributário.

1 Doutor em Direito - ênfase em Direito do Estado – pela UNISINOS,

com período de pesquisa na Universidade de Coimbra – Mestre em Marciano Buffon e Lilian Ramos Jacob Direito Público. Advogado Tributarista, com especialização em Direito Empresarial, Professor de Direito Tributário na UNISINOS e em cur- sos de pós-graduação (especialização) em Direito Tributário noutras instituições. Professor no Programa de Pós-Graduação em Direito – Mestrado da UNISINOS. E-mail: [email protected] 2 Mestranda em Direito pelo Programa de Pós-Graduação em Direito

em Direito do Estado pela Fundação Escola Superior do Ministério Público/RS.– Unisinos, comGraduada bolsa node curso financiamento de Direito Capes.pela Universidade Possui Especialização do Vale do

e Bolsista de Desenvolvimento Tecnológico Industrial – CNPq, na Unisinos.Rio do Sinos Advogada – Unisinos. inscrita Foi na bolsista OAB/RS. de Iniciação Científica, Monitora E-mail: [email protected]. 105 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA TAXATION AS PUBLIC POLICY ACHIEVEMENT INSTRUMENT IN BRAZIL ABSTRACT: -

The article aims to approach the implemen tation of public policies from the fundamental duty to pay taxes, ie the solidarity duty incumbent on all citizens- to contribute to the financing of public spending. Thus, the problem that is proposed is: How taxation can con- tribute to the achievement of public policy in Brazil? The work was developed with literature on the subject, es- pecially the query to the doctrine and legislation, with KEYWORDSthe theoretical number of national and international au thors that deal with the subject matter. : Public policy. Taxation. Tax duty. 1 INTRODUÇÃO

A análise das políticas públicas parte da incorpo- ração dos direitos sociais nas Constituições do segundo pós-guerra, principalmente, com a garantia e concretiza-

O cidadão passou a ter a garantia de ser protegido, umação de vez direitos que a humanos.estrutura do modelo de Estado trazia con-

desigualdades sociais existentes e garantir uma vida digna asigo todos. inúmeros direitos aos indivíduos, a fim de dissipar as Por isso, o Estado, para cumprir suas promessas constitucionais, no que se refere às políticas públicas, precisa

efetivá-las por completo. de orçamento,Em decorrência ou seja, sem disso, dinheiro o artigo, o Estado portanto, não consegue tem por objetivo principal a abordagem da concretização de políti- cas públicas a partir do dever fundamental de pagar tribu- tos, ou seja, o dever solidário que cabe a todos os cidadãos A tributação como instrumento de realização de políticas públicas no Brasil de realização A tributação como instrumento 106 de contribuir para o financiamento do gasto público. 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Assim, rumar-se-á ao enfrentamento da seguinte questão: De que modo a tributação pode contribuir para a consultaconcretização à doutrina de políticas e legislação públicas sobre no o Brasil?tema, tendo O trabalho como referencialse desenvolveu teórico com alguns pesquisa autores bibliográfica, nacionais especialmente e internacio- nais que tratam sobre o assunto abordado. Para o desenvolvimento do estudo, num primeiro momento, se abordará sobre contexto em que surgem as políticas públicas, ou seja, primeiramente, abordando o nascimento do Estado Social, com a implementação de di- reitos sociais no contexto constitucional. Após, serão examinadas as políticas públicas, como instrumento de operacionalização da concretização dos direitos, para, logo após, se expor sobre o dever funda- mental de pagar tributos, ou seja, o dever de contribuir no atual Estado Democrático de Direito, como forma de efeti- var as políticas sociais constitucionalmente postas.

2 O ESTADO SOCIAL E AS POLÍTICAS PÚBLICAS

Para a análise das políticas públicas é essencial a especial, o Estado Social já que intimamente ligado com a

proteçãoabordagem e garantia dos períodos de direitos históricos fundamentais que se sucederam, aos cidadãos em Marciano Buffon e Lilian Ramos Jacob pelo Estado. Sendo assim, se inicia o estudo ora apresenta- do com as principais características das políticas públicas no Brasil e como se inseriram no contexto constitucional em períodos passados. As políticas públicas decorrem de uma relação en- tre política e poder público, e não é de se estranhar que- o direito, por sua vez, venha a tratar deste tema, que, por evezes, será, temportanto, enfrentado ao judiciário fatores que complexos, muitos recorrem já que os ao fenô não menos sociais ao se modificarem,107 exigem novas respostas, ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA obterem a solução do poder público para suas angustias e penitencias, seja por problemas relacionados à saúde, educação, segurança, moradia, dentre outros, que o Estado “Provedor” se comprometeu em garantir aos membros dessa coletividade3. A análise das políticas públicas parte da incorpo- ração dos direitos sociais nas Constituições do segundo pós-guerra, principalmente, com a garantia e concretiza-

ção de direitos humanos. A partir do século XX, o Estado,- -sepor Estadoinfluência Providência, dos socialistas de forma e cristãos a dar a-sociais, todos condições cunhou a adequadastarefa de providência de vida através dos malsucedidos. da intervenção Por no isso, domínio chamou eco- 4. Historicamente, a Magna Carta Inglesa é en- nômicotendida, e quasesocial consensualmente, como a primeira das Constituições do Estado, sendo que, em última e rasa análi- se, ela surge com o objetivo de limitar o poder do soberano, notadamente o poder de tributar. Com isso, ela funda os denominados direitos de primeira geração ou dimensão, os quais visam especialmente proteger a vida, liberdade e propriedade daqueles que mereciam o rótulo de cidadão, não obstante tal rótulo estar restrito a uma parcela dimi- nuta da população. Com a Revolução Francesa, outro direito desta na- tureza adquire o status de direito de cidadania: o direito a igualdade perante lei. Esta conquista é de tal forma impor- tante que transformou dita revolução num marco temporal

igualdade de condições, independentemente de classe so- cial,de ruptura representou histórica. uma O verdadeira direito a ser revolução tratado pelo no imaginário Estado em

3 BUCCI, Maria Paula Dallari. O conceito de política pública em direito.

sobre o conceito jurídico. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 03. 4 In:FERREIRA BUCCI, Maria FILHO, Paula Manoel Dallari Gonçalves. Bucci (Org.). Estado Políticas de direito Públicas: e Constituição. Reflexões

A tributação como instrumento de realização de políticas públicas no Brasil de realização A tributação como instrumento 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 40. 108 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS igualdade – num plano prático – também não se tratar de algoe na vidaabsoluto. dos habitantes do Século XVIII, não obstante essa Se a Revolução Francesa – e a conquista da igual- - - dade perante a lei – decorre reconhecidamente da ascen- tesão se social convencionou de uma nova denominar classe – ade burguesia Estado do-, há Bem-Estar de se re Social,conhecer também que o surgimentodecorre do surgimentodo modelo, quede uma posteriormen nova clas- se socialJá – não forjada bastava, no âmbito pois, que da o revolução Estado assegurasse industrial: os direitostrabalhadores. a vida, liberdade, propriedade e igualdade perante lei. Fazia-se necessário que este Estado encontrasse meios de proteção daquela nova classe cuja vida transcorria em condições,O adventoas quais dohoje Estado não haveria do Bem-Estar nenhum Social, exagero dessa em identificá-las como análogas à escravidão. com os alicerces que tradicionalmente fundamentavam o Estado.forma, representouEsta nova concepção uma espécie caracterizava-se de ruptura significativa pela inter-

O cidadão passou a ter o direito a ser protegido, indepen- venção estatal nos setores econômicos, sociais e culturais.-

-estar dos membros da comunidade é garantido por meio Marciano Buffon e Lilian Ramos Jacob dentemente de sua situação econômica, sendo que “o bem - tarde serviçosbem; boa sociais sorte; organizadosfelicidade; estar pelo bem Estado”. (de umaNessa pessoa, linha, comunidade“Bem-estar” éou definido coisa); progressocomo “o estado na vida, ou prosperidade” condição de es 5. As primeiras Constituições a incorporarem os di- reitos sociais foram a Constituição Mexicana de 1917 e

5 KERSTENETZKY, Celia Lessa. O estado do bem-estar social na idade a Constituiçãoda razão de Weimar em 1919, sendo que no Brasil, Rio de Janeiro: Elsevier, 2012. Primeira página de Premissas. : A Reinvenção do estado social no mundo contemporâneo. 109 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA este processo começou a ser incorporado na Constituição de 1934, pois “como poderia, por exemplo, um analfabeto exercer plenamente o direito à livre manifestação do pen- samento? Para que isso fosse possível é que se formulou e se positivou nos textos constitucionais e nas declarações internacionais o direito à educação” 6.

e, conformeA versão Esteruelas, britânica este do representou Estado Social, o grandenomeada salto de quantitativo“Welfare State”, e qualitativo surge com do oEstado Plano Social Beveridge, 7. Esta emevolução 1942 decorre do fato de que o Estado de Bem-Estar se caracte- riza pelo predomínio da lei sobre o poder, da responsabi- lidade sobre a força, da Constituição sobre a revolução, do consenso sobre o comando, da difusão do poder sobre sua concentração, da democracia sobre a demagogia. Nessa

Estado Democrático de Direito8. acepção, um welfare state não se distinguiria muito de um Social, ou Estado de Bem-Estar, depois da Segunda Guerra Assim, “a consagração do chamado Estado- intervencionismo”9. Isto é, o Estado assume a postura de Mundial,prover o bem leva para muito a sociedade. adiante a tendência desenhada pelo O último passo dessa evolução do Estado Social é o

como fundamento não só a busca pela igualdade formal, maschamado também Estado pela Democrático igualdade material, de Direito, visando o qual passaminimizar a ter as desigualdades sociais e os níveis de pobreza.

6 BUCCI, Maria Paula Dallari. O conceito de política pública em direi- to. In: BUCCI, Maria Paula Dallari Bucci (Org.). Políticas Públicas:

7 ESTERUELAS, Cruz Martinez. La Agonía del Estado: ¿un nuevo orden mundial?Reflexões Madrid:sobre o conceitoLaxes, S.L. jurídico. Ediciones. São p.Paulo: 121. Saraiva, 2006. p. 03. 8 KERSTENETZKY, Celia Lessa. O estado do bem-estar social na idade da razão Rio de Janeiro: Elsevier, 2012. : A Reinvenção do estado social no mundo contemporâneo. 9 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Estado de direito e Constituição.

A tributação como instrumento de realização de políticas públicas no Brasil de realização A tributação como instrumento 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 40. 110 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS produtor de igualdade fática. Trata-se de um conceito que Para Bonavides, “o Estado social é, enfim, Estado em se tratando de estabelecer equivalência de direitos”. Emdeve vista iluminar disso sempreo Estado toda resta a hermenêuticaobrigado a prover constitucional, prestações positivas e os “meios, se necessário, para concretizar co- mandos normativos de isonomia”10. tentativa de adaptação do Estado tradicional (pelo que en- tendemos,Para nesse García-Pelayo, caso, o Estado o Estado Liberal Social burguês) significa às con “a- dições sociais da civilização industrial e pós-industrial”11, que se desenvolveu a parir de política social “cujo objetivo imediato é remediar as péssimas condições de vida das ca- madas mais desamparadas e necessitadas da população”12. marco importantíssimo para a evolução e universalização dos direitosConstata-se sociais. Estaque oconcepção, advento do pois, Welfare exige State a garantia foi um educação, assegurados a todo o cidadão, não como carida- de,de “tipos mas como mínimos direito de renda,político”. alimentação, Tais condições saúde, mínimas habitação, são essenciais para tornar possível a plena liberdade, uma vez quais a vida se desenvolva em situação precária, mesmo porque,que não ninguémhá como éreconhecê-la livre numa situação presente de em extrema condições pobreza. nas

social formaram um todo, “dito de outra forma, tendem a Marciano Buffon e Lilian Ramos Jacob transformar-seAssim, aem teoria subsistemas econômica, de aum política sistema e asuperior. política Isso quer dizer que cada um desses subsistemas é condi- cionado pelos demais, ao mesmo tempo em que os condi- ciona” 13 -

10 BONAVIDES,. Isto é, transformou-sePaulo. Curso de Direito numa Constitucional política socioeconô. 11. ed. São

11 GARCÍA-PELAYO, Manual. As transformações do estado contempo- Paulo: Malheiros, 2001. p. 343. râneo. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 6. 12 Ibid.. 13 Ibid., p. 8 111 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA mica sistêmica, pois seus componentes estão conectados entre si14. Desse modo, a intervenção do Estado no domínio

econômico passou a ser uma realidade a partir do século- dial,XX. Pode-se assim como, perceber o direito que, hoje, à saúde o direito e o direito à educação ao ambien é uma- tevariável ecologicamente que define equilibrado a posição de constituem um país no referenciais cenário mun de inserção dos Estados em patamares superiores em níveis de competitividade entre países, sobretudo, no que diz res- peito à inserção de países em níveis de competição em eco- nomia mundial15. A estrutura do modelo de Estado trazia consigo - sigualdades sociais existentes e garantir uma vida digna ainúmeros todos. A direitosincorporação aos cidadãos, de novas a fimnecessidades de dissipar a seremas de providas pelo Estado, o avanço tecnológico, a globaliza- ção e, principalmente, o desemprego em massa e de longa duração, não estavam nos planos do modelo do Estado- providência. Como sustentava Beveridge, a política de se- gurança social só fazia sentido se ligada ao pleno empre- go,16 razão pela qual a combinação nefasta desses fatores representa uma forte agressão ao Estado de Bem Estar Social. O debate acerca da crise estrutural, decorrente da - - emergência de novos riscos sociais se inicia no final da dé críticacada de ao 1960 Estado e se de aprofunda Bem-Estar com Social a crise pelo econômica neoliberalismo. inter Talnacional crise ocorreda década após de um 70, período quando – passaquase atrinta ganhar anos força – de a

14 Ibid;. p. 9. 15 BUCCI, Maria Paula Dallari. O conceito de política pública em direi- to. In: BUCCI, Maria Paula Dallari Bucci (Org.). Políticas Públicas:

16 OST, François. O Tempo do Direito. Lisboa: Instituto Piaget, 1999. p. Reflexões sobre o conceito jurídico. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 04. A tributação como instrumento de realização de políticas públicas no Brasil de realização A tributação como instrumento 339. 112 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS segunda grande guerra. inequívocaNo prosperidadeentanto, como econômica, já sustentava vivenciada Rosanvallon, depois a cri da- - mico entre o que o Estado arrecada e as demandas sociais, quese não necessitam está relacionada ser atendidas. apenas O com que o está desequilíbrio em causa, econôpois, é um abalo muito mais profundo, de forma que as relações da sociedade com o Estado passam a ser questionadas.

- çasEm públicasvista disso,17. é possível reconhecer que a fonte da crise é muito maisO Estado extensa de Bem-Estar, do que o simples na medida desajuste em que das vai finan am- pliando a concretização de direitos fundamentais aos seus cidadãos, provoca, de certo modo, um esquecimento acerca dos deveres de cidadania, especialmente no que se refere à questão da solidariedade. Ao invés de efetivos cidadãos, o Estado acaba por forjar o surgimento de verdadeiros “in- divíduos-clientes”, que exigem, sempre em proveito exclu-

- riedadesivamente entre próprio, os atores respostas sociais, cada que vez deixam mais designificativas se respon- sabilizardo Estado. pelos Portanto, efeitos há decorrentes uma quebra da dos exposição vínculos aos de solidariscos, transferindo ao Estado e dele exigindo o cumprimento in- tegral dessa tarefa. O que se pode observar é que, para se efetivar polí- Marciano Buffon e Lilian Ramos Jacob solidariedade entre os cidadãos. As políticas públicas preci- samticas depúblicas, cidadãos há comprometidosnecessidade de secom reconstruir o outro na o sociedade.vínculo da Uma obrigação que cabe a cada indivíduo, tendo em vista os preceitos do atual Estado Democrático de Direito, que visa, notadamente, a busca pela igualdade entre todos na mesma comunidade. Assim, as políticas públicas, por sua vez, podem ser

17 ROSANVALLON, Pierre. A Crise do Estado-Providência. Trad.: Joel definidas como “programa de ação governamental, visando

Pimentel de Ulhôa. Goiânia: UFG;113 Brasília: UnB, 1997. p. 25. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA realizar objetivos determinados”18. Ou ainda, a política públi- ca é conceituada como um programa ou quadro de ação go- vernamental, “consiste num conjunto de medidas articuladas (coordenadas), cujo escopo é dar impulso, isto é, movimentar a máquina do governo, no sentido de realizar algum objeti- vo de ordem pública, ou na ótica dos juristas, concretizar um direito”19. Exemplo disso, podemos destacar a Lei nº 11.096/2005, que instituiu o Programa Universidade para Todos (ProUni), que visou a concretização de um programa de inclusão de alunos pobres em universidades privadas,

para inclusão social, segundo critérios de renda estabele- mediantecidos por esta o preenchimento legislação20. de determinadas condições, Importante destacar que, o Estado, para cumprir suas promessas constitucionais, no que se refere às políticas

não consegue efetivá-las por completo. Por isso, “os instru- mentospúblicas, orçamentários precisa de orçamento, dispostos pois na sem Constituição dinheiro oFederal, Estado plano plurianual (PPA), lei de diretrizes orçamentárias (LDO) e lei orçamentária podem ser consideradas as expressões ju- rídicas de políticas públicas, por excelência”21. Outro tema que tem levantado interesse na atuali- dade, diz respeito ao controle judicial das políticas públicas.

18 BUCCI, Maria Paula Dallari. O conceito de política pública em direi- to. In: BUCCI, Maria Paula Dallari Bucci (Org.). Políticas Públicas:

19 Ibid., p. 14. Reflexões sobre o conceito jurídico. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 11. 20 BRASIL. Lei nº 11.096, de 13 de janeiro de 2005. Institui o Programa Universidade para Todos - PROUNI, regula a atuação de entidades

no beneficentes de assistência social no ensino superior; altera a Lei 10.891, de 9 de julho de 2004, e dá outras providências. Disponível 21 em:BUCCI, . Acesso em: 26 Jul. 2016. to. In: BUCCI, Maria Paula Dallari Bucci (Org.). Políticas Públicas: A tributação como instrumento de realização de políticas públicas no Brasil de realização A tributação como instrumento

Reflexões sobre o conceito jurídico.114 São Paulo: Saraiva, 2006. p. 15. 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS A competência para atribuir políticas públicas seria apenas

Legislativo. Entretanto, por vezes, o Poder Judiciário tem feito estedo Poder papel, Executivo, tendo em vistadentro as denormas marcos programáticas definidos pelo inseridas Poder na Carta Fundamental. Tendo em vista que a Constituição Federal Brasileira de 1988 estabelece no artigo 5º, inciso XXXV, que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, resta evidente que as políticas públicas são submeti- das a controle jurisdicional. Como destaca Bucci:

A proposição constitucional centra-se na proteção a direito, sendo esse o elemento de conexão a con- siderar. O Judiciário tutela as políticas públicas na medida em que elas expressem direitos. Excluem- se, portanto, os juízos acerca da qualidade ou da

ou administrativos do governo, consubstanciando naadequação, política pública em si, de22. opções ou caminhos políticos

Exemplo disso, o Ministério Público, por meio da Lei da Ação Civil Pública, o inquérito civil e o termo de ajustamento de conduta, tem contribuído na formulação e implementação de políticas públicas, superando omissões por parte do Poder Executivo que é o principal competente para concretizá-las. Marciano Buffon e Lilian Ramos Jacob - no da judicialização excessiva da política, ou seja, em que Juízes e PromotoresEntretanto, de deve-se Justiça ter passam cuidado a substituir com o fenôme as tare- fas do Poder Executivo, que teria a legitimidade para tanto, passando a atuar de forma ativista23. Deve-se sempre levar em consideração o caráter fundamental do direito a ser conferido pela política públi- ca, mais, ainda, se deve ter em conta que os direitos sociais

22 Ibid., p. 31. 23 Ibid., p. 33. 115 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA possuem um custo, e a questão se colocará na reserva do possível, com margem a seleção de prioridades, de modo desordenado24. Portanto, as políticas públicas passam pelo reco-

nhecimento do direito, uma vez que devem estar de acordo Podercom os Público, parâmetros Executivo, da legalidade Legislativo, e da Judiciárioconstitucionalidade. e até mes- mosDeve dos haver, membros sobretudo, da sociedade, uma atuação para coordenadaa efetivação entredas po o- líticas públicas. Os cidadãos devem participar de modo mais efe-

forma de se analisar a concretização de políticas públicas étivo, através inclusive, do dever na fiscalização de pagar tributos das suas que contribuições. compete a cadaUma indivíduo. O dever tributário efetivamente exercido possi- bilita a concretização de políticas públicas já que sua prin-

consciênciacipal fonte de desse financiamento. dever, pois contribuindo para o Estado, possibilitaráPor isso,a redução imprescindível de desigualdades é que as pessoase concretização tenham de direitos fundamentais, principalmente, no que se refere à saúde, educação e segurança, essencial no atual Estado Democrático de Direito.

3 O DEVER FUNDAMENTAL DE PAGAR TRIBUTOS COMO INSTRUMENTO DE CONCRETIZAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

sua maior parte, portanto, advém do pagamento de tri- butos, queO são financiamento exigidos dos para cidadãos as políticas através de públicas, um dever na ético e solidário de contribuir para o desenvolvimento da sociedade, assim como, para a concretização de direitos fundamentais.

A tributação como instrumento de realização de políticas públicas no Brasil de realização A tributação como instrumento 24 Ibid., p. 36. 116 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Diante disso, “submeter-se à tributação corres- ponde a um imperativo de liberdade. Tal ocorre porque ela corresponde à condição de possibilidade de concretização das promessas contidas nos direitos fundamentais, espe- 25. Tendo em vista que o Estado assumiu o compro- missocialmente de corrigiraqueles asde mazelascunho social” e promover o bem comum, - los cidadãos, o dever fundamental de pagar tributos resta fundamental,notadamente conformea partir de Casalta políticas Nabais: públicas, financiadas pe

Como dever fundamental, o imposto não pode ser encarado nem como um mero poder para o estado,

constituindo antes o contributo indispensável a umanem vida como em um comunidade mero sacrifício organizada para os em cidadãos, estado -

primadofiscal. Um da tipo autorresponsabilidade de estado que tem na dos subsidiarie cidadãos pelodade seuda sua sustento própria o açãoseu verdadeiro(econômico-social) suporte. e Daí no que se não possa falar num (pretenso) direito fun- damental a não pagar impostos26.

O atual Estado possui a característica de um Estado geridas a partir do pagamento de tributos pelos cidadãos. Deve-se,Fiscal, a partirpor sua do vez, qual levar suas em necessidades consideração financeiras a capacidade são Marciano Buffon e Lilian Ramos Jacob contributiva dos indivíduos, já que “a capacidade contribu- tiva constitui o pressuposto e o critério da tributação” 27. Desse modo, o artigo 145, § 1º, da Constituição Federal de 1988, que estabelece que “Sempre que possí-

25 BUFFON, Marciano. Tributação e dignidade humana: entre os direi- tos e deveres fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 92. 26 NABAIS, Jose Casalta. O dever fundamental de pagar impostos: con- -

27 tributoIbid., p. para 688. a compreensão constitucional do estado fiscal contempo râneo. Coimbra: Almedina, 2009. p. 679. 117 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA vel, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados - do à administração tributária, especialmente para conferir segundo a capacidade econômica do contribuinte, faculta- - efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os28 di reitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os ren efetivadimentos capacidade e as atividades do cidadão. econômicas do contribuinte” , há necessidade, portanto, que a carga fiscal seja adequada à- tário, isto é, dever de contribuir, ao constatar que: Chulvi enfatiza a importância dada ao dever tribu

Uno de losdeberes que há acompanado al Estado desde elmismo momento de sunacimiento ha sido- eldeber tributário. El pasodeltiempo y laevolución pasadoem las formasde ser concebido históricas únicamente estataleshan como ido dejanmedio dosuhuellaenel fundamento de este deber que ha- mite la subsistência del Estado a ser um instru- para conseguir la necessária financiación que per del Estado redistribuidor29. mento al servicio de la política social y econômica Nesse sentido, o cumprimento do dever tributário - ceposibleel regular funcionamiento de losserviciosestata- constitui “condición de vida para lacomunidad porque ha cabo el Estado”. les y elcumprimiento de las finalidades sociales que lleva a social desfavorável à imposição do dever tributário, isto é, Por outro lado, atualmente, há uma consciência - tivahá uma del individuo,resistência por social motivos em pagar de conciencia, tributos. Chulvi a someterse define como objeção de consciência fiscal, que significa a “nega 28 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

. Disponível em: . Acesso em: 26 jul. 2016. sostenimiento de los gastos públicos. Madrid: Centro de Estudios A tributação como instrumento de realização de políticas públicas no Brasil de realização A tributação como instrumento

Políticos y Constitucionales, 2001.118 p. 296. 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS a la conducta jurídicamente exigible de contribuir al sos- que se otorga a sucontribución contraria su conciencia personal”tenimiento30 .de los gastos públicos porque el destino final Em decorrência desse fato, a evasão fiscal deve ser combatida na atual sociedade, pois decorre, nota- damente, do sentimento de inexistência de respostas Estatais às demandas sociais, como também, da visível corrupção e desvios de recursos que assolam o poder público, ou seja, “não basta que a justiça esteja sendo - teja sendo feita, e isso é condição de aceitabilidade de qualquerfeita; é fundamental sistema fiscal” que 31haja. a percepção de que ela es A partir disso, nota-se que, o sistema tributário tem muito a contribuir para a realização de políticas pú- constitui meio que efetiva os direitos fundamentais da so- blicas,ciedade, a partircomo pordo respectivo exemplo, ofinanciamento, direito a saúde, uma o direito vez que à - to à segurança, dentre outros elencados na carta constitu- cionaleducação, brasileira. o direito à moradia, o direito ao trabalho, o direi Para isso, faz-se necessário que cada cidadão este- ja disposto a assumir seus deveres, notadamente, o dever fundamental de pagar tributos, para a reconstrução dos vínculos de solidariedade como preconiza o atual Estado

Democrático de Direito. Marciano Buffon e Lilian Ramos Jacob A Constituição Federal Brasileira de 1988 estabe- lece o dever de solidariedade no a partir do artigo 3º, em que um dos objetivos da República Brasileira é a constru- ção de uma sociedade livre, justa e solidária32.

30 Ibid., p. 298. 31 BUFFON, Marciano. Tributação e dignidade humana: entre os direi- tos e deveres fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 105. 32 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa

do Brasil de 1988. Disponível em: .119 Acesso em: 30 jun. 2016. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA É necessário reconstruir a concepção de solida-

Estadoriedade socialmente social como justo. fundamento da exigência fiscal, pois apenas estaAssim, pode o justificarliame da asolidariedade legitimidade deé oum fundamento modelo de - - rênciaque justifica inafastável e legitima de pertencer-se o dever fundamental a uma sociedade de pagar33 , triou butos, haja vista que esse dever corresponde a uma decor seus deveres, em especial, o dever de contribuir a partir dosseja, tributos, é necessário já que que indispensável os cidadãos para tenham a concretização consciência dos de direitos fundamentais de todos numa sociedade. - - velam ConstituiçõesComo muito com bem indiferença explica Canotilho, aos deveres as experiên funda- mentais,cias históricas sobrepondo, dos períodos assim, apósapenas o ideárioos direitos comunista, fundamen re- tais, como segue:

A República era o reino da virtude no sentido ro- mano, que só pode funcionar se os cidadãos cum- prem um certo número de deveres: servir a pá- tria, votar, ser solidário, aprender. Nesse sentido, a teoria da cidadania republicana implica que um indivíduo teria não apenas direitos, mas também deveres. Nos começos do século, sob a inspiração

intitulada “Direitos fundamentais e Deveres fun- damentaisda Constituição dos dealemães”, Weimar, a onde doutrina existia juspublicis uma parte- ta falava de igual dignidade de direitos e deveres fundamentais (Heller). Todavia, também já nesta altura não faltavam a considerar os deveres fun- damentais como contrários à ideia de estado de

categoria de deveres fundamentais reaparece nas construçõesdireito liberal jurídico-políticas (Carl Schmitt). nacional-socialista A centralidade da e comunista. No ideário nazi, os deveres funda-

33 BUFFON, Marciano. Tributação e dignidade humana: entre os direi- tos e deveres fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009.

A tributação como instrumento de realização de políticas públicas no Brasil de realização A tributação como instrumento p. 99. 120 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS mentais dos cidadãos convertem-se em deveres fundamentais dos “membros do povo” (dever de

defender o povo). Na compreensão comunista, os direitosserviço defundamentais poderes, dever eram de também trabalhar, relativizados dever de

direitos conexos com deveres, o que, nos quadros políticospelos deveres dos fundamentais:ex-países comunistas, os indivíduos acabou tinham por

- aniquilar os direitos e hipertrofiar os deveres. emEstas face duas dos experiências deveres fundamentais históricas 34explicam. a des confiança e indiferença dos textos constitucionais Contudo, no atual Estado Democrático de Direito é essencial a reconstrução dos vínculos de solidariedade que como indivíduos de numa sociedade que preconiza o e, sobretudo, quanto aos deveres fundamentais, haja vista diferenças ainda existentes no contexto social. bem comum,Conforme nada Comparato,melhor que “acontribuir solidariedade para reduçãoprende-se das a ideia de responsabilidade de todos pelas carências ou neces- sidades de qualquer indivíduo ou grupo social”. Sendo assim, “o fundamento ético desse princípio encontra-se na ideia de justiça distributiva, entendida como a necessária compensa- ção de bens e vantagens entre as classes sociais, com a socia- 35. Nesse sentido, com base no princípio da solida- lização dos riscos normais da existência humana” - Marciano Buffon e Lilian Ramos Jacob dos no rol dos direitos sociais, “que se realizam pela exe- riedade,cução de ospolíticas direitos públicas, humanos destinadas passaram a agarantir ser reconheci amparo e proteção social aos mais fracos e mais pobres; ou seja, aqueles que não dispõem de recursos próprios para viver dignamente”36.

34 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003. p. 531. 35 COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos hu- manos. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 65. 36 Ibid. 121 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Diante disso, o dever fundamental de pagar tri- butos se faz indispensável diante do atual contexto cons-

da solidariedade, esculpido dentre os objetivos da Magna titucional brasileiro, haja vista que consagra o principio realização dos direitos fundamentais, ditos direitos sociais, notadamente,Carta, assim como, através possibilita, de políticas através públicas. da financeirização, a

4 CONCLUSÃO

a tarefa de prover o bem para todos na sociedade, median- A partir do século XX, o Estado Providencia cunhou que se referem à saúde, educação, segurança, moradia, tra- te o reconhecimento de direitos sociais, principalmente, os - balho,nados previdência,direitos de primeira dentre outros. geração ou dimensão, os quais visam especialmenteApós o período proteger liberal, aque vida, reconheceu liberdade os e denomiproprie- dade, surgiu o Estado Social ou Providência, que buscou,

principalmente,Fazia-se reconhecernecessário osque direitos o Estado das coletividades, encontrasse meioscunhados de proteção sob o propósito da nova do classe bem quecomum. agora surgia, os tra-

nova concepção caracterizou-se pela intervenção estatal balhadores, sobretudo, após a revolução industrial. Esta- sou a ter o direito a ser protegido, independentemente de nos setores econômicos, sociais e culturais. O cidadão pas Assim, as políticas públicas passaram a ser garan- tidassua situação aos cidadãos econômica. como forma de concretizar os direitos mínimos à população, na maioria das Constituições do se-

as péssimas condições de vida das camadas mais desam- paradasgundo pós-guerra, e necessitadas já que das tinham sociedades. por finalidade remediar No entanto, após o seu apogeu, o Estado Providencia A tributação como instrumento de realização de políticas públicas no Brasil de realização A tributação como instrumento 122 sofreu uma crise estrutural, mais que financeira, uma crise 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS ideológica, pois, apesar de ter ampliado a concretização de direitos fundamentais aos seus cidadãos, também provo- cou, de certo modo, um esquecimento acerca dos deveres de cidadania, especialmente no que se refere à questão da solidariedade. O que se pode observar é que, para se efetivar polí- solidariedade entre os cidadãos. As políticas públicas preci- samticas depúblicas, cidadãos há comprometidosnecessidade de secom reconstruir o outro na o sociedade.vínculo da Uma obrigação que cabe a cada indivíduo, tendo em vista os preceitos do atual Estado Democrático de Direito, que visa, notadamente, a busca pela igualdade entre todos na mesma comunidade. Por serem, as políticas públicas, programas gover- namentais que visam realizar os objetivos constitucionais e, principalmente, os direitos fundamentais, necessitam de orçamento para a sua efetivação. Sendo assim, o dever fun-

- casdamental sociais. de pagar tributos assume importância crucial, já que semOs contribuição indivíduos fiscal,devem o assumirEstado não a responsabilidade atinge as políti de estar numa coletividade, ou seja, devem contribuir para - da na atual sociedade. Em virtude do sentimento de inexis- tênciao bem de todos,respostas por isso,Estatais a evasão às demandas fiscal deve sociais, ser combati muitas Marciano Buffon e Lilian Ramos Jacob e isso decorre, também, da visível corrupção e desvios de recursosvezes, os quecidadãos assolam deixam o poder o compromisso público. fiscal de lado, Por isso, importante se faz a reconstrução do vín- culo de solidariedade entre os cidadãos, especialmente, no que diz respeito ao dever fundamental de pagar tributos, já que possibilita a operacionalização das políticas públi- cas e a concretização de direitos fundamentais a partir da tributação. O atual contexto constitucional brasileiro estabe- lece os direitos sociais mínimos a uma convivência digna 123 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA a toda coletividade, por isso, nada mais justo que cada um

o dever tributário como parte dos demais deveres para se convivercontribua em com liberdade. sua parcela de humanidade, isto é, assuma Assim, o Estado Democrático de Direito cumprirá com seus objetivos, ou seja, a tributação contribuirá para uma sociedade livre, justa e solidaria. Ainda, colaborará para a redução das desigualdades e valorização dos cida- dãos com efetivação de políticas públicas, para uma convi-

realização de direitos fundamentais. vência mais harmoniosa com os ditames constitucionais na REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:

BRASIL.. Programa Universidade Acesso para em:Todos 30 -jun. PROUNI, 2016. re- - cia social no ensino superior; altera a Lei no 10.891, gula a atuação de entidades beneficentes de assistên

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A tributação como instrumento de realização de políticas públicas no Brasil de realização A tributação como instrumento Livraria do Advogado, 2009. 124 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003. CHULVI, Cristina Pauner. El deber constitucional de contribuir al sostenimiento de los gastos pú- blicos Constitucionales, 2001. COMPARATO,. Fábio Madrid: Konder. Centro A afirmação de Estudios histórica Políticos dos y direitos humanos. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. ESTERUELAS, Cruz Martinez. La Agonía del Estado: ¿un nuevo orden mundial? Madrid: Laxes, S.L. Ediciones. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Estado de direito e Constituição. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 1999. GARCÍA-PELAYO, Manual. As transformações do estado contemporâneo. Rio de Janeiro: Forense, 2009. KERSTENETZKY, Celia Lessa. O estado do bem-estar so- cial na idade da razão: A Reinvenção do estado

Elsevier, 2012 - Primeira página de Premissas. NABAIS,social Jose no Casalta. mundo O contemporâneo dever fundamental – Rio dede Janeiro: pagar impostos: contributo para a compreensão consti- Marciano Buffon e Lilian Ramos Jacob Almedina, 2009. OST, François.tucional O do Tempo estado do fiscal Direito contemporâneo.. Lisboa: Instituto Coimbra: Piaget, 1999. ROSANVALLON, Pierre. A Crise do Estado-Providência.

UnB, 1997. Trad.: Joel Pimentel de Ulhôa. Goiânia: UFG; Brasília:

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13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS BIOPOLÍTICA E FINANCEIRIZAÇÃO DA VIDA

Rodrigo Diaz de Vivar y Soler1

- porações que darão nome a tudo. A esfera estelar Quando a exploração estelar crescer, serão as cor

IBM. A galáxia Microsoft. O planeta Starbucks. Edward Norton em Clube da Luta. RESUMO: através do diálogoEste trabalho junto a autores procura como explorar Foucault, as possíveisDeleuze, correlações entre a biopolítica e a financeirização da vida- vestigação teórica nos propusemos a pensar quais seriam asNietzsche, condições Benjamin, de possibilidade Peters e paraoutros. a produção Baseados de numa um dis in- positivo de assujeitamento na nossa contemporaneidade a partir da constituição de discursos sobre o endividamento e suas estratégias de modos de subjetivação e formas de governamentalidade presentes no contexto da nossa socie- a pensar os rastreamentos de uma possível ruptura em re- dade capitalística. Nossas considerações finais são dedicas da vida através da criação de uma estética da existência lação ao processo de endividamento e de financeirização dispositivos biopolíticos. Nesse sentido, elaborar uma lei- turaresponsável sobre o porprocesso ultrapassar de correlação a tênue linhaentre dea biopolíticacaptura dos e Rodrigo Diaz de Vivar y Soler tentativa de compreensão em torno da lógica neoliberal a financeirização da vida significa desconstruir qualquer campo dos debates de uma prática política referendada pelados discursostese de que, econômicos a luta pela tradicionais vida passa, paranecessariamente inseri-la no pela construção de uma alegoria sobre os agenciamentos

1 UNISINOS/Centro Universitário Estácio Santa Catarina 127 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA maquínicos de uma experiência rizomática proveniente de outras formas de subjetividade. PALAVRAS-CHAVE: Biopolítica; Financeirização da Vida; Dispositivo.

INTRODUÇÃO

A biopolítica é um dos conceitos mais importantes para a construção de uma problematização sobre os modos de vida no contexto da sociedade ocidental. Compreendida como uma tática gerencial cuja função seria a de instituir padrões reguladores e normativos sobre a vida, a biopo- lítica pode ser caracterizada como um dispositivo que percorre os mais variados processos que envolvem as es- tratégias de saber, as práticas de poder e os processos de subjetivação.

organiza sua estrutura através de uma série de regulações Nesse contexto, é correto afirmar que a biopolítica- co em torno das formas de governamentalidade que en- responsáveis por instituir uma espécie de crivo hierárqui

volvem os aspectos históricos, políticos culturais e sociais. Nas palavras de ChignolaEste processo, (2015, mais p. uma 08) vez, não percorre geo-

é traçada entre quem recebe a “somatização” da existênciagrafias lineares. singular Trata-se que é produzida de uma fronteira por estas – “bio que- políticas” materiais da vida e quem é impedido ou excluído – que divide blocos de população dentro das grandes metrópoles globais territorializando de forma diferenciada singularidade e classes. O

ao mapa de riscos que caracteriza o ambiente da regulaçãodesenho do neoliberal. espaço social derivante corresponde

Biopolítica e financeirização da vida constitui como uma prática asséptica responsável por ar- É correto afirmar, portanto que a biopolítica se 128 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS quitetar todo um processo de padronização das condutas e dos modos de vida. Nesse sentido, os problemas lança- dos pela biopolítica na elaboração de novas leituras sobre as práticas sociais e culturais vivenciadas pelo sujeito na contemporaneidade nos convida a elaborar uma proble- matização da produção de certos regimes de verdade. Um vida como estratégia de captura praticado pelas formas de desses problemas seria o dispositivo de financeirização da Elaborar uma problematização das correlações governo presentes no mundo de hoje. constatar que um dos efeitos mais devastadores sobre os processosentre a biopolítica de subjetivação e a financeirização provenientes vida de umasignifica, racionali pois- dade neoliberal consiste na suspensão de direitos e garan- tias fundamentais em nome da emergência de um Estado cada vez mais austero em relação aos grupos minoritários. os idosos e os pobres, num sentido geral, são sempre as primeirasO que ora afirmamosvítimas das é articulações que grupos comoestabelecidas os negros, pelas os gays, for- mas de governamentalidade provenientes da biopolítica. Nos propusemos a pensar os principais aspectos os desdobramentos da biopolítica na nossa sociedade, baseadosda financeirização nas contribuições da vida a partirde autores de uma como leitura Foucault, sobre - plorar as nuances do processo de emergência e prove- niênciaNietzsche, da dívida Benjamin, como Deleuze um recurso e Peters imprescindível para procurar para ex o adestramento e a produção de modos de subjetivação na Rodrigo Diaz de Vivar y Soler contemporaneidade através da estruturação de doutrinas de governamentalidade. Estruturada nessa perspectiva, a crise experimen- tada pela maioria dos sujeitos não é apenas um problema que envolve a estruturação de uma série de medidas que afetamde ordem as práticas econômica, sociais mas dentro sobretudo, do contexto uma questão da socieda ética- 129 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

dívida equivale a pensar as formas pelas quais são estrutu- radasde atual. as práticasInvestigar, de portanto,policiamento a ilustração da vida atravésdo fenômeno da lógica da neoliberal já que cada vez mais percebe-se a presença do

- rizaçãoque poderíamos da vida como chamar um de processo indivíduos marcado descapitalizados. por novas for- Nesse sentido, faz-se necessário pensar a financei como inibidora de qualquer possibilidade ou estratégia de experiênciamas de subjetivação ética ou agenciamento articuladas à governançapolítico. Nosso financeira ensaio procura articular essa problematização pensando o endi- vidamento e todos os seus contornos como um dos maio-

agenciamentosres desafios a serem ou rupturas enfrentados necessárias pelo pensamento para uma possível crítico superaçãonos dias de deste hoje elementoatravés do tão questionamento atroz responsável dos porpossíveis acos- sar nossas vidas. Trata-se, no caso de se promover uma

uma estratégia fulminante não somente da precarização problematização acerca da financeirização da vida como doutrinamento de uma política fascista que institui a rela- çãodas relaçõescredor – humanas,devedor como mas sobretudo,uma ferramenta como deuma dominação forma de

cultural, política e histórica. BIOPOLÍTICA, SOCIEDADE DE CONTROLE E FINANCERIZAÇÃO DA VIDA

Em ensaio consagrado a atualidade do pensamen- to foucaultiano, Gilles Deleuze (1992) nomeia nossa con- temporaneidade como a época por excelência dos dispo- - lar, uma vez que desde a segunda metade do século XX a universalidadesitivos refinados do de modelo controle. disciplinar Essa característica parece entrar é singu cada vez mais em um declínio acentuado. As estruturas fabris, Biopolítica e financeirização da vida 130 os modelos escolares, as dinâmicas familiares, as prisões, 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS seu infrutífero aspecto de proceder a felicidade e a garantia deos manicômiossegurança aos tudo indivíduos isso parece nas sociedadester ficado para capitalísticas. trás dado2 regramento de sanções e processos normativos cada vez O modelo do controle assume sua eficácia pelo talvez seja o da palavra crise. É ela que nos atormenta to- dosmais os móveis dias transformando-nos e heterogêneos cujo em efeito reféns mais da biopolítica. sintomático O elemento alegórico da sociedade de controle para Deleuze (1992) não é a mão do carrasco que disciplina nosso cor- po conforme a performatividade do aparato estatal, mas o desejo dos indivíduos tornarem-se dividuais, isto é, nume- rosos dados estatísticos sobre o controle da vida espécie, - tes modos de subjetivação são responsáveis por instituir o quea permanente Deleuze (1992, troca p.de 22) fluxos nomeia e a percentagem como culto magistral em diferen ao dinheiro - ção entre as duas sociedades, visto que a disciplina É o dinheiro que talvez melhor exprima a distin que servia de medida padrão, ao passo que o con- sempre se referiu a moedas cunhadas em ouro – fazem intervir como cifra uma percentagem de trole remete a troca flutuantes. Modulações que

masdiferentes a serpente amostras o é das de sociedades moedas. A de velha controle. toupeira monetária é o animal dos meios de confinamento, Essas palavras indicam a presença nas sociedades de controle de um novo modo de subjetivação vinculado ao Rodrigo Diaz de Vivar y Soler dispositivo do endividamento como ferramenta intrínseca aos procedimentos de governo como forma de manuten-

2 Optamos por empregar o termo capitalístico em vez de capitalista, por

para quem as primeiras designariam todos os modelos de sociedade nos orientarmos segundo a definição proposta por Guattari (1990) estilos de vida do Capital independentemente da sua orientação ideo- lógicaresponsáveis ou mesmo por política.flertar ou mesmo adotar os padrões normativos e de 131 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA ção não somente das desigualdades sociais das diferentes classes, mas da governamentalidade exacerbada das gran- des corporações. Diferentemente do poder pastoral que, segundo Foucault (2011), era responsável por governar a conduta das almas, o nosso sistema corporativo gover- na nossas condutas em relação ao dinheiro. Forma gregária típica do tempo presente em que está em jogo o processo de endividamento como sustentação das práticas de poder. No artigo intitulado Economias Biopolíticas da Dívida, Peters (2016) aponta a dívida como um dos recur-

sendo utilizado inclusive como argumento para a suspen- sãosos maisde direitos eficazes e de ao garantiasprocesso defundamentais. assujeitamento Nesse dos contex povos- to, o processo de endividamento torna-se o elemento cen- tral de um estilo de vida proveniente da cultura ocidental. - mento não só dos países periféricos como ocorrera no auge daAssistimos Guerra Fria,hoje amas um profundotambém nas e perverso nações jogoindustrializadas de endivida da Europa e mesmo nos Estados Unidos. No site do Fundo Monetário Internacional3 - bramentos dessa economia biopolítica do endividamento é possível acompanhar os desdo - gouonde a chega-seconsumir a 225.80perceber % que do Produtoa dívida públicaInterno deBruto. algumas Não nações desenvolvidas como a do Japão, por exemplo, che Europeia já apresentam sinais de desgaste político e social nopor que acaso se querefere mesmo a suspensão os blocos das econômicos garantias fundamentaiscomo a União da sua população através da supressão de serviços públi- cos por meio de estratégias escusas como o aumento da

e o aumento do tempo de contribuição para a conquista da aposentadoria.jornada de trabalho, Peters a (2016) precarização aponta dos que, serviços em escala de global, saúde muitos países têm se deparado com três modelos de crise: o primeiro referente ao processo de descapitalização dos Biopolítica e financeirização da vida

3 Disponível em: 132 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS bancos, o segundo correspondente ao acelerado processo de endividamento dos países fiscalmente mais fracos e o ressaltaterceiro Petersalinhado (2016, a uma p. 05)política que social ineficaz contra os problemas econômicos estruturais. Ainda a esse respeito Os próprios países que são os menos competitivos enfrentam os níveis mais altos de dívida sobera- na, doméstica e corporativa, uma característica que agrava a interligação das crises. A situação da Grécia demonstra exatamente essa crise tripla e a

que tendem a usar recursos desproporcionais paradificuldade atender de os sucessivos níveis existentes “socorros da dívida financeiros” públi- ca (na qual o índice de endividamento para o PIB é superior a 180%) ao invés de criar crescimento -

enfatizarou empregos. uma maiorAs atuais austeridade condições através de “socorro de cortes fi nananceiro” assistência impulsionadas social e aumento pela Alemanha dos impostos. tendem a

Em relação a esse aspecto assinala Bolaño (2002) aceleramentoque a doutrina da decrise, finançeirização contribuindo, da dessa vida forma, proveniente para a proliferaçãoda biopolítica de contemporânea argumentos contrários atesta para ao oWelfare permanente State. Nos casos dos processos de endividamento dos países emergentes esses sintomas são ainda mais latentes uma vez que muitos deles atravessam, nesse momento, uma - Rodrigo Diaz de Vivar y Soler rada de crise política proveniente desse modelo, o qual profunda recessão socioeconômica muitas vezes masca- vidamento, ou seja, um lastro de decomposição dos indi- Peters (2016) chama de estabilização do índice de endi nome do fortalecimento dos dispositivos de encargos que nãocadores se limitam econômicos apenas e das a dívida políticas pública de inclusão estendendo-se social em à vida dos indivíduos residentes, sobretudos nas periferias do mundo capitalístico. 133 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Crise, endividamento, juros passam a ser pala- vras que circulam não pelo imaginário, mas pelo cotidia- no das práticas sociais atormentando, deste modo, os já precários subsídios fornecidos aos idosos, aos programas

osociais, Jornal as O políticasGlobo trabalhistas e ao sistema educacional.- sídiosEm recente do nosso editorial governo publicado federal no emdia 24relação de Julho à Educação de 2016, Superior público edefendeu gratuito alegandopublicamente que, dentroo fim dosda reali sub- dade brasileira, o ensino superior público é uma questão de injustiça social, uma vez que apenas uma parcela míni- ma da população teria acesso as universidades federais e estaduais enquanto que a grande maioria tornar-se refém da iniciativa privada.4 A crise da dívida opera, portanto, como um dispositivo biopolítico intimamente relaciona- do aos programas de austeridade como forma não de en- frentamento aos problemas sociais e políticos, mas como estratégia fundamental da perpetuação das desigualda- des através do aumento da má distribuição de renda e de uma gestão da vida pautada em uma relação credor-deve- dor a partir da construção de um processo ético no qual aquele que deve é dotado de uma consciência marcada pela culpa.

relação credor-devedorA esse respeito eacaba explicitamente por produzir influenciado uma forma pelo de subjetivaçãopensamento marcadade Nietzsche, pela duplaPeters tarefa (2016) da aponta exploração que essae da dominação transformando todos em devedores diante das novas modalidades capitalísticas presentes na nossa socie- dade. Na sua segunda dissertação da genealogia da moral - dio para pensarmos essa relação no contexto da biopolítica Nietzsche (1998, p. 47) nos fornece um importante subsí 4 Editorial Jornal O Globo: Crise Força o Fim do Injusto Ensino Superior Biopolítica e financeirização da vida Gratuito. Ver mais detalhes em: http://oglobo.globo.com/opiniao/ crise-forca-fim-do-injusto-ensino-superior-gratuito-19768461.134 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Criar um animal que pode fazer promessas - não

é esta a tarefa paradoxal que a natureza se impôs,- macom esteja relação em ao grande homem? parte Não resolvido é este o verdadeirodeve pare- cerproblema ainda domais homem?... notável Opara fato quem de que sabe este apreciar proble plenamente a força que atua de modo contrário, a do esquecimento. Esquecer não é uma simples vis inertiae [força inercial], como creem os super-

mais rigoroso sentido, graças à qual o que é por ficiais, mas uma força inibidora ativa, positiva no não penetra mais na nossa consciência, no estado nós experimentado, vivenciado, em nós acolhido,- lação psíquica”), do que todo o multiforme pro- cessode digestão de nossa (ao nutriçãoqual poderíamos corporal chamarou “assimilação “assimi

O impactofísica”. dessa nefasta relação acaba por produ- zir formas de subjetivação elencadas no que poderíamos sujeito da dívida. Nesse sentido, a dívida se tor- na o elemento categórico de um dispositivo confessional dechamar adestramento de das subjetividades capturando modos de - - resistência no contexto do mundo contemporâneo. O alas governamentalidadetramento da crise financeira delimitadas não colocapelo modo sob suspeitaneoliberalista a so deberania se pensar dos territórios as relações somente, e as práticas mas intensificasociais. Fina formas película de de assujeitamento, portanto, responsável por impelir o su- jeito em constituir-se para além de qualquer outro projeto que não o do Capital. Rodrigo Diaz de Vivar y Soler Em A Vontade de Saber, Foucault (2015) aponta que nossa sociedade viu emergir, a partir do século XVIII, uma série de dispositivos responsáveis por administrarem anátomo-política do corpo, dea vida poder através responsável da formação por produzir do que formasele mesmo de gestão chamou volta de- das para a garantia da vida istodas é,grandes uma específica populações. economia 135 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Ávila e Conceição (2015) relatam que o processo - des e desigualdades em relação a formação de um processo de financeirização da vida gera uma série de arbitrarieda dessa possibilidade, a maioria dos sujeitos se vê obrigada a tencionarde equidade suas econômica vidas nos contornose social. Cada das relaçõesvez mais de distantes crédito, pois no contexto do neoliberalismo a biopolítica atua no sentido de deslocar os direitos sociais para o contexto das

processo de suspensão da garantia de direitos faz proliferar inúmerasdívidas sociais. práticas Isso orquestradas significa, segundo pelos governos Peters (2016) em relação que o

no que corresponde aos grupos étnica e socialmente mino- ritários.a sustentação Sciré (2011)de um sistemacompreende financeiro que um austero dos grupos sobretudo mais - lidade são os mais pobres. Destituídos de qualquer sistema jurídicoafetados ou pela político crise sistêmica contra o doendividamento, mundo financeiro as categorias na atua mais populares acabam por entoar em uníssono o mantra que diz: crédito é força, dívida é culpa, ou seja a presença espectral de uma governamentalidade neoliberal respon- - empresa individual. sável porDecorre produzir, dessa como constatação, aponta Chignola o fato (2015),de que oa estraneoli- nha figura de um sujeito como - do estrito do termo, mas um modo de vida responsável por beralismo não é somente um conceito econômico no senti no próprio corpo dos indivíduos os aspectos sepulcrais da criseidentificar como eelemento propagar constante elementos dos gestuais, modos deisto vida é, inscrever e da bio-

(2016, p. 11) que política de financeirização. A esse respeito escreve Peters

- duzir... financeirização todo valor que é um é trocado termo que(seja descreve tangível, umin- tangível,sistema ou futuro um processoou presente, econômico promessas, que etc.) tenta a umre Biopolítica e financeirização da vida

instrumento 136financeiro ou a um derivativo de um 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS - nanceirização é poder reduzir qualquer produto instrumento financeiro. A intenção original da fi- cambiável. É um aspecto da maior simbolização, matematização,ou serviço de um etrabalho informatização a um instrumento dos mercados inter -

financeiros que são tendências dentro do capita comlismo a dointernacionalização conhecimento. O do neoliberalismo capital e a globaliza é uma- çãoexpressão dos mercados. do poder da fiança que ganhou ritmo

- tral dentro do debate entre a biopolítica e as formas de go- vernamentalidadeA crise financeira na medida ocupa, que portantosinaliza os um aspectos papel cen pe-

homo sapiens converte-se emlos quaishomo aeconomicus financeirização. Sendo da ovida capitalismo acarreta umaa precarização força que atuadas relações no sentido humanas de administrar em que o a vida, o processo de en- dividamento transforma-se num espiral responsável por dívidainstituir do uma plano multiplicidade de saúde... todos de fluxos: elementos dívida pulsantesdo cartão de umcrédito, agenciamento dívida da casamaquínico própria, cujo dívida impacto do cheque se dá pela especial, dívi- da como modo de governança. Em reportagem publicada em 29 de Março de 2016 o jornal Correio Braziliense endividamento das famílias brasileiras atingira o recorde de 44, 6% da população durante o mêschega de aJaneiro afirmar do que mes o- 5 Como categoria punitiva, por excelência, a dívi- mo ano. Rodrigo Diaz de Vivar y Soler da acaba por produzir sujeitos cada vez mais adestrados pelos enunciados do crivo capitalístico do mundo contem- de adaptação em relação aos desdobramentos assumidos porâneo através da formulação de estratégias frustradas pela crise financeira. A biopolítica da financeirização acaba 5 Disponível: http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/eco nomia/2016/03/29/internas_economia,524614/endividamento-das -familias-fica-em-44-6-em-janeiro-diz-bc.shtml.137 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA por constituir os elementos de uma busca incessante não somente pela manutenção do emprego, mas pelo acelera- - cura por modos alternativos de se complementar a renda familiar.mento das precárias condições de trabalho através da pro

leva um número cada vez maior de sujeitos a abrir mão de um envolvimentoA obrigação com em a terpolítica, de honrar com aseus cidadania compromissos e com a ética uma vez que o dispositivo do endividamento é pro- fundamente controlador dos desejos e afecções inibindo qualquer potência criativa por parte do sujeito. - tivo agregado a lógica do mercado neoliberal que procu- A financeirização da vida é, portanto, um disposi subjetivação do sujeito, já que ela se baseia na propagação dera, discursosa todo custo, referentes intensificar a uma o esperança controle dosquase processos escatológi de- ca por parte do indivíduo em acordar e não possuir dívida alguma, ou pelo menos, passar um único dia de sua curta existência sem ter de colocar a mão na carteira para sacar seu cartão de crédito. Em uma sociedade na qual as práticas sociais não são mais do que um mero serviço de consumo, as subje- tividades tornam-se orquestradas pela visão de mundo

tudo e, nesse contexto, o valor de uma pessoa não está mais ligadoem que as é concepçõespreciso sempre éticas intensificar ou políticas, a comercialização e sim a capacidade de desse indivíduo converter suas ações e projetos em indica- - cidade de administração e de pagamento das suas dívidas. Interessadodores de um em possível investigar potencial a degradação financeiro da através experiência da capa no

21) indica que contexto do mundo capitalístico Walter Benjamin (2013, p. O capitalismo deve ser visto como uma religião, isto é, o capitalismo está essencialmente a serviço Biopolítica e financeirização da vida

da resolução138 das mesmas preocupações, aflições 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

religiões quiseram oferecer resposta. A demons- traçãoe inquietações da estrutura a que religiosa outrora doas assimcapitalismo, chamadas que não é só uma formação condicionada pela religião, -

paracomo umapensou polêmica Weber, masgeneralizada um fenômeno e desmedida. essencial Nãomente temos religioso, como nospuxar levaria a rede ainda dentro hoje da a qual desviar nos encontramos.

Essas palavras acabam por indicar a necessidade biopolítica voltada para o estreitamento das relações de de se pensar a financeirização da vida como uma prática formas de governamentalidade provenientes dos sistemas corporativos,culto ao Capital. acarretam Nesse sentido,na produção é correto de uma afirmar subjetividade que as privatizada. Em entrevista concedida a Revista do Instituto Humanitas,

Yann Boutang afirma que os desdobramentos- turada financeirização dos seres viventes da vida alastrando acabam por seus articular, dispositivos através por de meiouma rede de elementos complexa culturaise heterogênea e espirituais. os movimentos6 Como deconse cap- quência desses efeitos têm-se a formação de um aparato de governança intrinsecamente relacionado aos desdobra- mentos de políticas neoliberais voltadas para a disciplina- se evitar, a todo custo, o endividamento da população por rização e vigilância da vida sob a alegação de que é preciso meio da Relacionada estratificação a essa do que perspectiva Deleuze encontra-se e Guattari (2005) a tese Rodrigo Diaz de Vivar y Soler chamam de máquina capitalista civilizada.

Idadede que Média. a prática No contextocapitalística da vida do século monástica XXI, osse padresassemelha en- tendiammuito aos que processos uma alma de somente mortificação poderia existentes ser salva na se Alta re- nunciasse ao seu corpo, e tal renúncia acontecia por meio

6 Disponível: http://www.ihuonline.unisinos.br/index.php?option= com_content&view=article&id=6016&secao=468.139 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA de rituais nos quais os indivíduos eram levados por meio

seu Deus ou à Igreja. Era preciso criar estratégias que de- da confissão a reconhecerem-se credores em relação ao

mãosveriam de levar instrumentos ao flagelo como do próprio a castidade, corpo ocomo jejum, categoria a práti- de um espírito imundo que deveria ser purificado pelas

emca do constante silício e aprocesso confissão. de Jáaperfeiçoamento no contexto capitalístico em relação esse as mesmo indivíduo é levado a reconhecer-se como devedor- jetivação na relação de dívida permanente. Deste modo, diretrizes econômicas justificadas por estratégias de sub Bispo para espiar seus pecados no mundo medieval, agora naao mesmocontemporaneidade, tempo que em o se indivíduo deveria dirigirprojeta-se à figura numa de umre- lação de doutrinamento bancário e corporativo dirigindo todas as suas expectativas e projetos dentro do curso das práticas de governamentalidade neoliberais. Dito de outro modo, enquanto que na Idade Média o sujeito produzia sua experiência através de uma tentação ontológica do cristia- nismo, agora ele produz sua subjetividade através de uma ontologia do endividamento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como se pode observar, o processo de endivida- - tualização dos processos biopolíticos na sociedade contem- mento é um fenômeno muito importante para uma contex

porânea. Recurso, portanto de adestramento, de vigilância doe de qual controle o sujeito dos seafetos constitui e da criatividade, a partir de um a financeirização perverso jogo presenteda vida acaba na relação por instituir entre culpa uma eespécie endividamento. de ethos por meio -

Biopolítica e financeirização da vida acerca daA morte esse respeitode Deus, nãodeveria seria ser exagero lido como nenhum um proces afir- marmos que o diagnóstico140 empreendido por Nietzsche 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

so de desdobramento em que a figura transcendental não- desaparece em absoluto da história, mas converte-se em dinheiro.de subjetivação. Pagar dívidas, nesse caso torna-se o único recur so estatutário para o sujeito nos dias de hoje como forma - blematizadosPercebe-se, pelo contexto deste modo do pensamento como a financeirização crítico e, nes da- sevida caso, se constituia tarefa seria num a dos de semaiores procurar desafios instituir a seremoutras pro for- mas de governamentalidade capazes de ultrapassar a fina instrumentopelícula presentes de captura na conjetura e, nesse sentido, da biopolítica. o conceito O desafio de es- téticaconsiste, da existênciaem reconhecer-se pensado como por Foucault sujeito para(1984) além pode desse ser compreendido como uma importante ilustração de um ar- tefato político voltado para a experimentação da vida com- - sante voltado para a construção de uma experiência ética preendida como um escândalo da verdade. O elemento pul de liberdade. autênticaElaborar e capaz umade produzir leitura sobre formas, o processo ou melhor, de práticascorrela-

ção entre a biopolítica e a financeirização da vida significa paradesvencilhar inseri-la qualquer no campo tentativa dos debates de compreensão de uma prática em políti torno- cada referendadalógica neoliberal pela dostese discursos de que a econômicosluta pela vida tradicionais passa, ne- cessariamente pela elaboração de uma alegoria sobre os agenciamentos maquínicos através da construção de uma Rodrigo Diaz de Vivar y Soler experiência rizomática de outras formas de subjetividade. Nesse caso, a pergunta a ser formulada seria: como elaborar essas estratégias de produção de uma estética da existência? Uma possível resposta pode estar ancorada na hecceidade pensado por Deleuze (1992) no que se refere a construção de modos de vida marcadosdefinição dopela conceito prática de incessante da vida vulgar, o ato de 141 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA se constituir para além dos encantamentos da biopolítica. - das para o enfrentamento, em seus relevos dessas formas deO desafio dominação consiste, presentes pois na no elaboração contexto da de biopolítica estratégias através volta da compreensão da vida como coragem da verdade.

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13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS CRISE SISTÊMICA E PROTEÇÃO SOCIAL: UMA ANÁLISE NOS GOVERNOS DE CENTRO-ESQUERDA DE BRASIL E ARGENTINA

Luciana Pazini Papi1

RESUMO: O objetivo do artigo é explorar o modelo de proteção social não contributivo, especialmente das polí- ticas de transferência de renda e programas de assistên- cia social implementados por governos de centro-esquer- da de Brasil e Argentina no contexto latino-americano da

é parte de uma pesquisa maior sobre as continuidades e rupturasvirada do no século sistema XXI. de Tendo proteção em contasocial quelatino-americano, este trabalho trazemos uma sistematização parcial da pesquisa em an- damento na qual a preocupação central é compreender o cenário de retomada do desenvolvimento na virada do século XXI e a centralidade das políticas sociais, especial- mente: qual o tipo mais disseminado de políticas e seu representa ruptura ou continuidade em relação aos pa- drõesdesenho neoliberais. de implementação; e se o modelo implementado PALAVRAS-CHAVE: conjuntura de crise, desenvolvimento, políticas de proteção social

1 Doutoranda em Ciência Política na UFRGS. É mestre em Ciência Política Luciana Pazini Papi

é Pesquisadora do GT, Avaliação de Políticas Públicas e do GT, Gestão Pública,e bacharel Município em Ciências e Federação Sociais dopela Centro mesma de EstudosUniversidade. Internacionais Atualmente so- bre Governo (CEGOV/UFRGS). Dedica-se às temáticas de Federalismo, implementação de Políticas Públicas, município, gestão, planejamento

visualizacv.do?id=K4356921U4 e Assistência Social. Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/ 145 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA INTRODUÇÃO

O capitalismo tem se reinventado ao longo do sé- culo XX por conta das sucessivas crises que o afetam e são parte intrínseca de seu funcionamento2. Dessa forma os -

modelos econômicos em combinação com arranjos polí ticos e sistemas de proteção social tem se modificado ao- longogualdades da história e desequilíbrios. como forma de sustentar a sobrevivência desse sistemaNa crise econômico de 1929, o que modelo tende de àLaissez-faire produção de vigente desi do Imperialismo britânico de Livre comércio (ARRIGHI, 1996) entra em de- clíniodurante3 (desde o século o pós XIX a sobre I guerra a hegemonia mundial) cedendo espaço para um modelo de desenvolvimento carreado pelo Estado em que as políticas de proteção ou bem estar social tor- nam-se parte estratégica de um sistema sustentado na as-

No centro, as saídas da crise passaram pelas ideias sociação do capital ao trabalho e ao consumo de massas. era para o capitalismo baseado no pleno emprego e no consumode John Maynard de massas. Keynes Na periferiaque buscava a saída construir da crise uma passou nova pelo modelo de inversão de importações sustentadas nas ideias desenvolvimentistas que passaram pela formula- ção de teóricos como Ignácio Rangel, e Raul

atreladas ao grau de desenvolvimento das sociedades em Prebisch (BIELCHOWSKI, 2004). Com suas peculiaridades,

2 Marx assinalou que o capitalismo tende a entra em crise cíclica pauta,dado tais a modelos tendência naturaleconômicos à queda dae políticos taxa de lucros. sustentavam-se Posteriormente Kondratieff aplica parcialmente a teoria para entender os ciclos capi- talistas por ondas longas e curtas de desenvolvimento derivadas das

3 Por conta do modelo de produção rígida e em larga escala baseado no flutuações de longo prazo no preço das mercadorias. Crise sistêmica e proteção social e proteção Crise sistêmica consumo de massas que leva à crise de superprodução e ao Crash da bolsa de New York (HARVEY,146 2005) 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS em um papel ativo do Estado como interventor na econo- mia (através da criação de bancos públicos, indústrias na- cionais e infraestrutura) e como provedor de políticas de Bem Estar social (através de proteção ao emprego formal e assistência aos desvalidos e pobres). Ademais tal sistema se estruturava em instituições fortes e centralizadas com

2009). grandes estruturas de planejamento econômico (PEREIRA, capitalismo moderno, de sistemas de Bem Estar Social, Conforme assinala Polanyi (1944), a criação, no- posta a uma exigência intrínseca do sistema de mercado. cujas origens estão na Alemanha de Bismarck, foi uma res serO capitalismo trocada no eliminou mercado. as Destruiu formas orgânicasas instituições de existência, tradicio- reduzindo a força de trabalho à condição de mercadoria a nais que protegiam a vida e o trabalho, mas não poderia destruir Nesseo trabalho sentido, em si.o modeloAo contrário, erguido exigiu no pós-guerraa proteção quedo homem articulou contra a intervenção o mercado. deliberada do Estado soma- do à ampliação de direitos sociais como educação básica, acesso à saúde, a renda e ao emprego, garantiu não apenas - rante todo o decorrer do século XX, mas uma referência de atuaçãoaltos índices estatal de paracrescimento futuros econtextos estabilidade de criseeconômica em que du o mercado sem condições de sustentar-se autonomamente

Com efeito, após esses anos de crescimento, a déca- darecorre de 1980 ao Estado e 1990 paraassinalam lhe garantir períodos sobrevivência. de novas crises e re- novação do discurso liberal. A década de 1970 foi marcada Luciana Pazini Papi e política que afetou tanto o Centro quanto a Periferia do sistemapor uma mundial. profunda Entre crise deas causasnatureza principais econômica, se encontramenergética a crise do petróleo representado pelo aumento do preço em 1973 e 1979 que afetou a produção e comércio mundial 147 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA (MILANI, 2014). Isso levou paulatinamente a uma redução - lizados e nos países de industrialização recente passando adas afetar taxas as de políticas crescimento do Estado econômico de bem-estar nos países social industria e a legi- timidade do modelo político de desenvolvimento erguido no pós II Guerra. Neste sentido, o processo de crise que teve como

tardou a ser caracterizado como uma crise política em que ocausa modelo profunda de gestão um panorama do Estado econômico e seu padrão e geopolítico, de desenvol não- - ção de serviços) passam a ser responsabilizados como os vimento (baseado na intervenção econômica e na produ se alçavam na premissa de foram os modelos de Estados interventoresgrandes desencadeadores. altamente dispendiosos As justificativas de paragastos tais para teses a - - vamanutenção ‘inadequado’ dos para serviços os novos e da burocraciatempos em públicaque a abertura que ha viam levado à crise fiscal. Ademais tal modelo se mostra- mas de superação do passado interventor e assistencial oriundoeconômica do emodelo a globalização socialista se soviético. colocavam Conforme como paradig decla-

TINA em que proclama a inevitabilidade da globalização, dasrou Margaretleis do mercado, Thatcher do no capitalismo seu argumento e do neoliberalismoconhecido como – parecia que nesse período – “There Is No Alternative”.

começa a ser responsabilizada politicamente pelo mains- tream Ou seja, uma crise eminentemente econômica que viriam a ser propostas em larga escala4, sobretudo, aos internacional para justificar as mudanças e reformas 4 Um conjunto de formulações teóricas contribuíram para o desgaste e questionamento do modelo anterior de atuação estatal. O ‘Fim da História’ (FUKUYAMA, 1989), a Inevitabilidade da Globalização profe-

- rido por Margareth Tatcher (“There Is No Alternative”) (CHANG, 2008) legitimaçãoe por fim as daselaborações mudanças do ocorridas modelo de no Estado cenário neoliberal internacional consubstan das dé-

Crise sistêmica e proteção social e proteção Crise sistêmica ciadoscadas de pelo 1970 Consenso e 1980 de Washington, finalizam o contexto teórico de 148 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS países em desenvolvimento. A partir de então o padrão de política interna e externa desses países começam a sofrer grandes revezes. Se no centro da economia mundo, as propostas - ra para a Globalização, assim como pela readequação de órgãosde reforma e atividades passam pelaestatais a abertura que abrangeu comercial programas e financei de privatizações, projetos de delegação e descentralização. Na periferia do sistema internacional, por sua vez, as formu- teórico à ‘necessária’ saída da crise, indicado pelos países centraislações do aos Consenso em desenvolvimento de Washington (CHANG, foram o 2008,sustentáculo DINIZ, 2005). Neste contexto, as instituições multilaterais, sobre- tudo o Banco Mundial e o FMI passaram a se envolver em - cial do mundo em desenvolvimento orientando os rumos quasedas reformas. todas as áreas da política econômica e da agenda so maior ou menor intensidade de tais orientações, o que im- No caso5 um da movimento América Latina, de desregulamentação houve a adoção comeco- pôsreformas na região estatais que buscaram integrar as economias à eranômica, da globalização privatização (HARVEY, dos bens 2005), nacionais provocando e um conjunto um efeito de de minimização do papel do Estado no processo de desen- volvimento nacional. mudança importante na maneira de entender a política social e Noo papel que diz do respeito Estado naàs políticasprovisão sociais, de bem-estar houve uma em toda a América Latina (CEPAL, 2014), levando a extensivas propostas de focalização nos mais pobres em detrimento da ampliação de políticas de caráter universal. Ademais, as Luciana Pazini Papi metas sociais foram sendo progressivamente deslocadas

5 Datam deste período os governos de Fujimori no Peru, Salinas no México, Carlos Menen na Argentina e Fernando Henrique Cardoso no Brasil, que embora envolvidos com a implementação das orientações

políticas de Washington, o fizeram149 em ritmos e escalas diferentes. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA das agendas nacionais, que se tornou cada vez mais res- tritiva por meio da priorização das metas de estabilização

àse ajuste próximas fiscal gerações (DINIZ, 2007).foram complexas.Nesse sentido Além como do aprofun assinala- Sônia Draibe (2009) os legados deixados por esse modelo- tucional para o trato com as questões de proteção social nosdamento países da da pobreza, América houve Latina uma dado intensa o crescente fragilidade ‘mal instiestar social’ na região. Os anos 2000 assinalaram novamente uma nova onda de crise e reformas para a os países centrais e peri- féricos. Diante da conjuntura de queda de crescimento dos

(2015) vem perdendo paulatinamente peso geopolítico no séculopaíses centraisXXI, vide nos a queda anos na2000 participação que segundo do PIBBoschi mundial e Gaitan de

emergentes passam a ter nos inúmeros fóruns internacio- nais63% (G20 em 2002 e G77, para IBAS) 52% e instituições em 2011 e pelamultilaterais relevância como que noos

novos contornos são dados na relação Estado-mercado. Se noFMI; centro, somada o Estadoa crise dapassa bolha por imobiliária uma revalorização de 2008 nos no EUA,con- trole e regulação do mercado através, por exemplo, da compra de bancos privados como a Lehman Brothers, na periferia, sobretudo na América Latina, a eleição de gover- nos de centro-esquerda6 incentiva a revisão do paradigma neoliberal e a crítica à estratégia de desenvolvimento até então vigente. Considerando as diferentes trajetórias e matrizes institucionais, assim como as opções das elites nacionais, foi possível perceber nesses países a retomada da valori- zação política do papel do Estado como principal condu-

6 Iniciado em 2003 no Brasil, através da eleição de um operário ligado ao

Partido dos Trabalhadores, tal movimento se fez seguir pela região com

Crise sistêmica e proteção social e proteção Crise sistêmica entreas eleições outros de Kirchner na Argentina (2003), Evo Morales na Bolívia (2005), de uma militante socialista no Chile – Michele Bachelet (2006), 150 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS tor do desenvolvimento (BRESSER PEREIRA 2007, FIORI 2007, DRAIBE E RIESCO 2009; 2011; DINIZ, 2007; BOSCHI, 2015), assim como a centralidade que as políticas sociais 7 lembrando o modelo outrora adotado pelos países centrais e periféricos nos contextos ganharamde crise do nessemercado. contexto Ademais, conforme salientou Evans (1993), o Estado e suas instituições, nesse contexto foram recoloca- dos no centro da promoção de mudanças, passando a não

Desta forma, a tendência foi a da revalorização da capaci- dademais serda açãoreconhecidos estatal como como um problema, pré-requisito mas como do êxito solução. dos governos nas situações de crise e atenção às demandas so- cietárias (DINIZ, 2007). O caso brasileiro e Argentino foram ilustrativos - vel constatar um recuo nos processos de minimização do Estadonesse sentido. e um conjunto Nos governos de ações Lulaque buscaram e Kirchner´s restituir foi possí e até mesmo criar capacidades estatais8 - - te de setores estratégicos, como o energético perdidas. Quantoem ambos à ma os paísestriz produtiva, (BOSCHI houve e GAITÁN, um recuo 2015); nas com privatizações respeito à e burocra o resga-

7 Com efeito, a nova década recolocou a pauta do combate à pobreza, cia, houveàs desigualdades o esforço e de a promoção re-capacitação da inclusão da social força como de condiçãotrabalho, de para o desenvolvimento dos países da região e superação do ‘mal estar deixado pelos governos pretéritos (DRAIBE E RIESCO 2011, CECCHINI & MARTÍNEZ, 2011, DINIZ, 2007).

analisar o poder do Estado na arrecadação de impostos. Hoje é apli- 8 O tema sobre capacidades estatais foi cunhado por Tilly (1981) para Luciana Pazini Papi

cado por vários ramos das ciências humanas. No campo da Ciência política o tema ganhou relevância com o trabalho de Teda Skocpol,- vos.Rueschemeyer Sinteticamente e Evans podemos em que conceituar se relacionou capacidades a autonomia estatais relativacomo o conjuntodo Estado de com instrumentos a habilidade e instituições do Estado de que implementar dispõe o Estado seus objeti para estabelecer objetivos, transformá-los em políticas e implementá-las. Conforme Evans (1993) trata-se da capacidade de ação do Estado. 151 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA 9 e investimento na recompo- sição do planejamento estatal (CARDOSO, 2011). Nos dois sobretudo, em âmbito federal - zadas pelo crescimento do mercado interno e pela inclusão socialpaíses – houve seja através estratégias de programas de ‘expansão de emprego para dentro’ formal, dinami seja pela proteção não contributiva implementada.

a priorização desta pauta nas agendas domésticas destes países que No expandiramcaso específico seus da sistemas Proteção nasocial última foi evidente década; buscaram superar problemas originários como a extensa -

Porseletividade meio do eprograma focalização; Bolsa e por família fim einvestiram SUAS, assim importan como o AUH,tes recursos novas institucionaisestratégias de e políticas financeiros sociais neste que setor articulam (2014). focalização e conteúdo universal de garantia de direitos foram colocados no centro das atenções governamentais. - lo focalizado implementado nos anos 1990, mudanças qua- litativasEmbora seforam tenha imprimidas uma aparente nos continuidadeconteúdos de com políticas o mode de proteção social na última década nesses países da América Latina. A par dessa conjuntura o objetivo do artigo é ex- plorar o modelo de proteção social não contributivo, espe- cialmente das políticas de transferência de renda e progra- mas de assistência social implementados por governos de centro-esquerda de Brasil e Argentina no contexto latino-

uma pesquisa maior sobre as continuidades e rupturas no sistema-americano. de proteção Tendo em social conta latino que americano, este trabalho trazemos é parte uma de sistematização parcial da pesquisa em andamento na qual a preocupação central é compreender o cenário de retoma-

9 Segundo dados que integram o boletim estatístico de pessoal do Ministério do Planejamento, 2010, apenas durante a gestão do pre- sidente Luiz Inácio Lula da Silva ingressaram no Executivo 151,2 mil servidores, número 193% maior que os 51,6 mil contratados para a

Crise sistêmica e proteção social e proteção Crise sistêmica carreira pública no governo de Fernando Henrique Cardoso. 152 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS da do desenvolvimento na virada do século XXI e a centrali- dade das políticas sociais, especialmente: qual o tipo mais e se o modelo implementado representa ruptura ou conti- nuidadedisseminado em relação de políticas aos padrões e seu desenho neoliberais. de implementação; - nas que seguem apresenta-se o panorama de construção do sistemaPara de dar proteção conta dossocial objetivos de Brasil do etrabalho Argentina, nas assim pági como os padrões de políticas implementadas na década de 1990. A seguir traz-se o contexto dos governos de centro- -esquerda e as diferenças entre modelos e conteúdos de e aceno de pesquisas futuras. políticas para a seguir concluirmos com algumas reflexões Sistema de proteção social: os legados de Brasil e Argentina e o perfil dos programas na década de 1990

A proteção social é um conceito de ampla abran- gência uma vez que perpassa questões como direitos a sobrevivência e integração na vida social, oferta de servi- ços em diferentes demandas. A forma como as sociedades estruturam seus sistemas de proteção social, partindo da relação Estado, mercado e família (ESPING ANDERSEN,

Welfare State, das políticas sociais, dos sistemas de seguri- dade1991), contributivos permite compreender e não contributivos, a configuração em quedo modelo se situa de o caso da assistência social.

De maneira geral, as diferentes tipologias dos sis- Luciana Pazini Papi temas de proteção social resultaram da complexidade so- - ca. Em razão dessas realidades, as sociedades mais tradi- cionais,cietária, periféricasdo nível de conflitosou de desenvolvimento e da realidade sócio-econômi tardio, como a

153 América Latina, terão configurações distintas de proteção ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA - camente padrões de proteção segundo uma lógica e tempo distintossocial do (DRAIBEque sociedades e RIESCO, centrais 2011). que acumularam histori Se na Europa, os sistemas de proteção social (DI GIOVANNI, 1998) transitaram de um padrão de atenção

e no status local, para modernos sistemas de proteção so- cialocasional em que aos o Estadopobres nacional e desvalidos, passou baseado a assumir na filantropiapaulatina- mente o dever de proteção frente às crescentes demandas oriundas das transformações capitalistas da modernidade (ampliando direitos e políticas sociais); na América Latina se permaneceu por longa data preso à ótica securitária, em

direitos como saúde e educação, relegando ao restante da que apenas os trabalhadores formais tinham a garantia de (DUMONT, 1995). populaçãoIsso não se assalariada deve ao nosso à gestão modelo filantrópica de desenvolvimen da miséria-

ao desarollismo de bienestar social latino-americano ELADBESto específico,10 (DRAIBE, conforme 2011) aponta que DRAIBE buscou epor RIESCO meio (2007),da pro- dução de infra-estrutura, serviços e erguimento do desen- volvimento industrial deixar para trás o passado exclusi- vamente exportador e atrasado. Para tanto foi necessário - dores assalariados urbanos) que passam a ocupar lugar proeminentegestar o surgimento na nova de etapa classes de desenvolvimento(empresariado e etrabalha assegu-

para que participassem no mercado de consumo. Por esse motivorar a proteção os sistemas social, de sobretudo proteção aos social trabalhadores latino-americanos formais,

- foram historicamente caracterizados como seletivos em que grande parte da população ficou historicamente sujei 10 ta a gestãomodelo filantrópica de funcionamento da dospobreza. EBS de países em desenvolvimento em

Crise sistêmica e proteção social e proteção Crise sistêmica comparação Para mais ver com DRAIBE os países e RIESCO centrais. (2011) que caracterizaram o perfil e o 154 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Desta forma os graus de exclusão social tenderam a permanecer em patamar elevado (DRAIBE, 2011) duran- que a “dívida social” acumulada na região mostrava dimen- te o ciclo desenvolvimentista e igualmente no seu final em este panorama. sões significativas. Os casos argentino e brasileiro refletem- cial na Argentina três princípios básicos funcionaram si- Pode-se afirmar que em matéria de proteção so- picas de atenção aos pobres, veiculada pelas instituições demultaneamente la Sociedad de até Beneficencia meados do, um século extenso XX: sistema Ações filantró público de educação básica moldado sobre o princípio de cidada- nia, e um crescente sistema de seguridade social contri- - rando uma visão trabajocéntrica butiva destinado aos trabalhadores assalariados, configu (ARCEDIÁCONO, 2012). que impregna até hoje os olhares sobre o modelo de bem estar social argentino- do peronista (ISUANI, 2006, REPETTO E MASSETO, 2011). Este foi umTal modeloperíodo aprofunda-seem que se expande e massifica-se a participação no perío do Estado na atenção médica11 e na ampliação da cobertura do sistema previdenciário12. No entanto no que se refere ao - Eva Peron,sistema que de perpetua-seassistência social, como hálegado o aprofundamento para a proteção do social mo delo de benemerência institucionalizado na figura de - to de vista institucional, não se pode falar em uma política não contributiva ao longo da história argentina. Do pon centralização da formulação e execução se colocava acima dospública interesses e sim em e poderes ações de locais. cunho assistencialista em que a Os anos 1980 e 1990 foram períodos recessivos Luciana Pazini Papi

11 - para a Argentina marcando a produção da chamada “nova para Conforme 108 mil Pérez em 1955.Irigoyen (1989), ao final do governo peronista incre 12 mentou-se os leitos hospitalares de 63 mil camas existentes em 1946,- tuplicando a cobertura existente em 1944 (Feldman et al, 1988). Em 1949 a cobertura havia alcançado a 2.328.000 trabalhadores, quin 155 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA questão social”, gerada pelos altos níveis de desemprego, subemprego, informalidade e a exclusão social (CEPAL, 2014; REPETTO e DAL MASSETO, 2011). Desta forma, para um país que investiu desde os primórdios no mode- lo de inclusão por meio do assalariamento e em meados

- vodo possuiuséculo XX um parecia impacto marchar profundo para em a termo inclusão dos massiva problemas de sociaistrabalhadores e demandas no sistema por políticas de direitos, de proteção o contexto (REPETTO recessi E DAL MASETTO, 2011). Do ponto de vista institucional, os programas de focalização, privatização e descentralização de políticas -

medidasociais matizaramem que a focalização as escolhas era dos tida governos como o mecanismo deste con detexto. concentrar A lógica destarecursos escolha escassos institucional na população justificava-se realmente na demandante (CEPAL, 2014); já a descentralização foi a for- ma pela qual o Estado se desonerou de prover de políticas sociais liberando recursos e atividades para outros níveis de governo e entidades (ISUANI, 2006; REPETTO E DAL MASSETO, 2011). Em face ao crescente empobrecimento, a partir de meados doas anos 1990 as políticas de Transferências condicionadas de renda, galgaram um importante centra- lidade no objetivo de amenizar a pobreza. Foram criados programas de alcance massivo, como o “Plan Trabajar13” de 1995 (ZARAGAZA, 2014). Plano Jefes y Jefas de Hogar (PJJH) de 2002, cujo objetivo foi diminuir os efeitos da crise

econômicaDo deponto 2001. de O planovista daalcançou construção em 2003, institucional uma média e dasde 2.500.000 estratégias beneficiarios de coordenação (RONCONI para 2009). implementar tais

13 Durante cinco anos, o “ Plan Trabajar” manteve em média 80,000 bene- -

Crise sistêmica e proteção social e proteção Crise sistêmica dades como condição de una transferência monetária. ficiários que realizavam tarefas básicas de manutenção nas municipali 156 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS programas, em 1994 foi criado a Secretaría de Desarrollo Social e implementação das políticas focalizadas já em um pro- cesso de(SDS) centralização. como o principal No entanto, organismo a reforma para o constitudesenho- dos Ministros para coordenar o gabinete social, implican- docional em decerta 1994 superposição incorporou de a funçõesfigura do com chefe a SDS, de Gabineteuma vez que o mencionado gabinete era integrado por ministros social (ZARAZAGA, 2014). Como síntese deste quadro na Argentina,da Economia, em da 1997 Saúde, existiam Educação, sessenta Trabalho programas e Seguridade sociais e Secretarias diferentes. Por isso, uma das características dasem âmbitopolíticas nacional sociais de que combate dependiam à pobreza de nove no período Ministérios foi a alta fragmentação institucional e a baixa resolutividade. Ou naseja, Argentina a construção (ISUANI, da SDS 2006), não nemsignificou mesmo a concentração uma atuação nodo sentidodesenho, de controle, universalização e/ou execução das políticas. dos programas sociais Por outro lado, como mostram Repetto e Dal Masseto (2003, p. 5) nesse período as províncias resga- taram seu poder institucional, receberam transferências intergovernamentais, porém foram as maiores responsabi- lizadas pela prestação de serviços sociais, tais como a edu- cação e saúde, habitação e alimentação (ibdem p.11). Disso- resultou uma grande heterogeneidade de respostas, uma14, vezburocráticas, que a realidade quando provincial não dominada argentina, pelos foi historicamenclientelismos telocais. marcada por grandes desigualdades socioeconômicas Luciana Pazini Papi

- Diante desse cenário, os benefícios prometidos 14 IDH Ciudad de Buenos Aires 0,867 Centro, Córdoba 0,685, Tierra del pela descentralização no âmbito social, não tardaram a re-

Fuego 0,653, Corrientes 0,227, Jujuy 0,187, Formosa 0,156 níveis seme lhantes às regiões tal e tal do 157Brasil. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA velar seus limites. Segundo Repetto e Dal Masseto (2003), os processos de descentralização resultaram em uma mar- cante dispersão e fragmentação institucional no modo de

argentina. Disso decorreu não apenas a existência de múl- decidir, desenhar, financiar e implementar a política social quem faz o que, com que recursos e com que impactos so- bretiplos a integralidade desenhos, mas dos a problemas falta de responsabilização sociais e do bem sobreestar coletivo (2003, p. 13). Segundo os autores, neste contexto de reformas pró-mercado, a Argentina recuou sobremaneira em ma- téria de proteção social, sobretudo a não contributiva. No - gramas setoriais focalizados nos mais pobres, sem acor- doâmbito geral nacional sobre o vigorou que fazer, a expansão somados descontrolada à deterioração de social pro e territorial e a disseminação de ações fragmentadas sem coordenação intergovernamental e intersetorial. Os lega- dos deixados para os próximos governos foram, além do aprofundamento da pobreza, a intensa fragilidade institu- cional para o trato com as questões de proteção social na nação argentina. No caso brasileiro, os anos 1930 marcam o início da constituição de nosso Sistema de Proteção Social a par- tir da instauração do governo Vargas e a tentativa de cons- trução do Estado Nacional moderno. As ações promovidas nas bases produtivas para substituir o modelo agro-expor- tador pautado na monocultura do café para um modelo urbano-industrial provocaram intensa migração do campo para a cidade trazendo consigo a formação de uma classe

governamentais voltadas para a atender as demandas des- tatrabalhadora classe. e a exigência de um conjunto de iniciativas -

Crise sistêmica e proteção social e proteção Crise sistêmica Neste contexto, surgem as primeiras configura ções de políticas sociais definidas pelo Estado. Observa-se 158 o surgimento de um conjunto de iniciativas no âmbito da 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS criação de órgãos gestores de Políticas sociais, tais como o de Educação e Saúde Pública, assim como direitos ligados Ministério do15 Trabalho,que estruturam Indústria um e modeloComércio, de e proteção o Ministério so- aoproteção trabalho de um Estado que objetivava manter a ordem e incluircial focado esta camada nos trabalhadores societária no urbanos mercado em de expansão consumo sobpor meio da garantia de direitos. - social noNeste Brasil sentido, caracteriza-se semelhante pelo amploao caso esforço argentino de regu po- lamentaçãode-se afirmar do quemundo a tentativa do trabalho de construção assalariado, da e proteçãoinserção destes no mercado consumidor deixando fora do alcance do sistema de proteção social, as populações não partici- pantes do processo de acumulação. Por este motivo, a des- peito de todos os avanços promovidos no período, não se pode sustentar o surgimento de um verdadeiro Welfare State, senão da criação de um Estado caracterizado, “no - teresses mediante uma ampla legislação social” (RIBEIRO, 2002,plano social,p. 2). pela administração de conflitos e tutela de in Neste sentido, a proteção social às populações vul- - nuaria, durante longo período, orientada na forma de uma neráveis não incorporadas pelo trabalho assalariado conti- mente por instituições privadas16. gestão filantrópica da pobreza, realizada predominante 15 - - É neste período que situamos a nacionalização do Trabalho; a institui- ção da carteira de trabalho; jornada de 8h diárias no comércio e indús tria; regulamentação do trabalho feminino; regulamentação do traba Luciana Pazini Papi lho de menores; direito à férias, além de pensões e aposentadorias a ser provido pelos Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAP´S). Outras- mentistamedidas dede cunhoVargas. social Para comomais ver a valorização Cornis e Earp da saúde (p. 38). do trabalhador e 16 campanhasEm 1942 o sanitaristasgoverno brasileiro foram levadas cria a Legião à cabo Brasileirapelo projeto de desenvolviAssistência - lias dos expedicionários brasileiros, entretanto, posteriormente se vol- (LBA). Inicialmente tinha por objetivo prestar serviços sociais às famí 159 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Com o golpe militar de 1964 inaugura-se um mo- delo estatal autoritário marcado pelo aprofundamento do ideário desenvolvimentista. Neste contexto, as instituições sociais direcionam seus programas para uma política de integração dos ainda não inclusos no mercado de traba- 17 no processo de desenvolvimento nacional amplian- do. Além disso, datam do período a criação do Ministério lhoda Previdência e Assistência Social (MPAS) que incluiu a Legião Brasileira de Assistência – LBA e a Fundação Nacional de Bem Estar do Menor – FUNABEM. Entretanto, a despeito dos avanços em termos de incorporação de novas massas populacionais ao sistema de proteção social, assim como, o início de ações incipien- - ve uma ruptura com os padrões prevalecentes até então. Conformetes de Assistência RIZOTTI Social, (2007, não p.8), se “A pode política sustentar social duranteque hou o regime militar manteve o caráter assistencialista”. A partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, inaugura-se um regime político democrático com a meta de “resgate da dívida social”. Do ponto de vista da proteção social não contributiva, especialmente a assis- tência social passam a contar prioritariamente na agenda

a política de convênios com as beneméritas instituições sociais, que irá seta paraenraizar a Assistência na relação à maternidadeentre a emergente e à infância. Assistência Nesse Social momento, brasileira, inicia com a Filantropia e a benemerência. “Assistência Social, Filantropia e Benemerência tem sido tratadas no Brasil como irmãs siamesas, subs- titutas umas da outras” (Mestriner: 2001:14). 17 Temos então nesse período, a incorporação pelo o Instituto Nacional de Previdência Social, de novos segurados; A expansão da assistência mé- dica previdenciária; Criação, em 1974 a Renda Mensal Vitalícia (RMV) para idosos e inválidos com baixa renda; criação de novos mecanismos de poupança compulsória através do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, e posteriormente o PIS/ PASEP; Criação do Programa

de Habitação; Centros Sociais Urbanos; o Programa de Interiorização de AçãoAssistência de Saúde ao Trabalhadore Saneamento Rural no Nordeste (Pro Rural); (PIASS); Sistema o Programa Financeiro de

Crise sistêmica e proteção social e proteção Crise sistêmica Financiamento de Lotes Urbanizados (PROFILURB). 160 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS de reformas da nova República (ARRETCHE, 2000). Nesse ano, criou-se uma comissão formada prioritariamente por social, que padecia da excessiva centralização das decisões profissionais da área, para reestruturação da assistência- titucional responsável por ações desconexas, superpostas e execução,pouco resolutivas, de insuficiência além de de forte recursos, clientelismo fragmentação e prática ins do primeiro damismo em nível local (ALMEIDA, 1995). As rei- para a agenda constitucional, sendo a assistência alçada ao statusvindicações de política dos profissionais pública garantidora da área acabaramde direitos, entrando consti- tuinte do Sistema de Seguridade Social, junto da saúde e da previdência social, possuindo como principal característi- ca o caráter público e descentralizado. - tucional que a assistência galgou a partir da CF/1988, essa política públicaNo entanto, demorou apesar a se do concretizar reconhecimento nos três legal/insti níveis de governo, tal como formulada sob a lógica da garantia de di- reitos. A desconcentração da União foi um processo lento, e a instabilidade ministerial que caracterizou os governos - tações em diversos ministérios, continuando a ser utiliza- Sarney, Collor e Itamar deixou a assistência sujeita a adap (ARRETCHE, 2000). Desta forma, se por um lado alguns autoresda como analisam moeda deo período troca e subsequente barganha política ao autoritarismo no período como um período de avanços pela constitucionalização de nova década, um terço da população brasileira estava em estadogarantias, de pobrezapela afirmação (DRAIBE, dos 1993, direitos p. 44). sociais, no início da Luciana Pazini Papi de reformas das políticas sociais brasileiras, o primeiro, Pode-se, portanto, identificar dois grandes ciclos- mica e do processo de democratização; enquanto o segun- do,nos aanos partir 1980, de 1995,é fruto é domarcado quadro pelos de instabilidade processos de econô des-

161 centralização já em um quadro de estabilização econômica ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA e reformas institucionais (VAITSMAN et al, 2009, p. 734; DRAIBE, 2005). Desta forma, no governo de FHC cuja ban- deira política assentou-se nas premissas de ajuste estrutu- ral, iniciativas no sentido de implementação de ações foca- lizadas foram feitas, principalmente para as áreas da saúde e educação (BRASIL, 1996). No que diz respeito à política de combate à pobreza, tem início as políticas de transfe-

um conjunto de transferências monetárias18 a pessoas ou famíliasrência direta de mais de baixarenda. renda A chamada (DRAIBE, ‘Rede 2003). Social’, concebia No entanto, mesmo com a ampliação das políticas focalizadas, a prioridade dada às políticas de PSNC no sen- tido da estruturação da rede de serviços e dos princípios

Social, foi modesta. Com efeito, restou para os municípios acontidos formulação na Constituição e implementação e na Lei completa Orgânica da assistênciade Assistência so- cial neste período devido ao baixo apoio e coordenação fe- deral em um contexto federativo bastante descentralizado. Desta forma, a despeito dos avanços legais, a assistência continuava reproduzindo um modelo de operar bastante associada com o passado assistencialista, de ações frag- mentadas e pouco resolutivas (PAPI, 2014). - tados do período neoliberal deixam um legado acumulado de “dívidaDe social”, forma assemelhadaassim como necessáriasao caso argentino, reformas os resul esta- tais para os novos governos eleitos.

18 A rede social foi formada pelos seguintes programas: Bolsa-Alimentação (na área de saúde), Agente Jovem (na Secretaria da Assistência Social) e, pouco mais tarde, Auxílio-Gás (2002). Posteriormente, foram acopla-

Crise sistêmica e proteção social e proteção Crise sistêmica Infantil (PETI). dos o Bolsa-Escola, de 1998, e o Programa de Erradicação do Trabalho 162 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Governos de Esquerda e as novas propostas de políticas de Proteção Social Não Contributivas

No Brasil a constituição do Programa Bolsa Família, a construção institucional do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à fome – MDS - para dar - sim como a criação do Sistema Único de Assistência Social tratamento específico e prioritário às políticas sociais, as da– SUAS Administración - , marcam Nacional os caminhos de la escolhidosSeguridad Socialpara tratar - ANSES tal -dívida. torna-se Na oArgentina, marco articulador a criação doda novoAUH realizadamodelo de no proteção âmbito social não contributiva. Como veremos ambos programas – o PBF e o AUH- possuem um caráter nacional de forma a conseguir penetração em todos os níveis de governo adap- tando e coordenando os federalismos e poderes locais. Por outro lado o esforço de construção institucio- nal é ainda um processo em curso demandando esforços pela superação da fragmentação precedente e pela produ- ção de capacidade burocrática e administrativa. No caso argentino, o documento do Bicentenário Argentino (2010), disponibilizado pelo Ministerio do Desarollo Social o projeto de governo e a proposta de construção de no- vas institucionalidades no governo para superar de Cristina o modelo Kirchner, de política ilustra social compensatória em que parte da sociedade possui direitos e outra não (2010, p.10). Para tanto, a estratégia referida, parte da revalorização do papel do Estado como articulador das políticas sociais que tem por objetivo, su- perar a fragmentação institucional que marcou as políticas Luciana Pazini Papi anteriores; superar as práticas locais que aplicavam discri- cionariamente a política social à favor da perpetuação da clientela política; suplantar a noção de assistência como caridade e a noção de pobreza como algo natural e propen- so à “vagabundagem” (2010, p.11). 163 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Entretanto, como demonstram Díaz Langou et All (2010), a despeito da intencionalidade do governo, a frag- mentação institucional não foi facilmente superada neste período, de forma que determinados programas de trans- ferência condicionada de renda foram distribuídos entre

termos de cobertura e orçamento, sob a responsabilidade o MDS e o MTEySS – ficando aquelesArgentina mais relevantes Trabaja”, queem

do MTEySS. Ademais, o programa “ utilizadobusca reincorporar como moeda ao trabalho,de troca política trabalhadores e associado que formama visões assistencialistasparte de cooperativas, (DÍAZ ficouLANGOU sob ETcondução AL, 2010). do MDS,Segundo sendo os autores, o ministério MDS, é um organismo de criação re- cente cujo processo de consolidação possui um resultado errático (Ibdem, 2010, p.18) e como tal, restou à grande in- terferência política, especialmente por parte do Executivo federal (BICHIR, 2012). Do ponto de vista dos programas de transferên- cia de renda desenvolvidos durante o período de Nestor Familias por la Inclusión Social (PFIS) – sob a responsabilidade do MDS; Programa JefasKirchner, y Jefes temos de Hogar o Programa Desocupados (PJJHD) e o Seguro de Capacitación y Empleo

limites destes programas (SCyE)19, em 2008, sob a inicia responsabilidade no congresso do a MTEySS. Tendo em conta os problemas institucionais e os- cios monetários, a exigência de condicionalidades e crité- riosdiscussão de elegibilidade sobre a necessidade (DÍAZ LANGOU de unificação ET. AL., 2010).destes benefí

AsignaciónNo Universal entanto, diantepor Hijo do (AUH) estancamento é anunciado econômico em 29 em 2009 (quando o crescimento do PIB ficou em 1%) o 19

Que sofriam críticas por não alcançar os setores mais vulneráveis da napopulação; implementação, críticas especialmenteem torno dos valoresnos casos dos do benefícios PJJHD e PFIStransferidos, (NEFFA,

Crise sistêmica e proteção social e proteção Crise sistêmica 2008)se seriam suficientes ou não e denúncias de clientelismo e patronagem 164 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS do Decreto 1602/09 (ZARAZAGA, 2014, p.3). A partir de então,de outubro o AUH pela tornou-se presidenta a iniciativa Cristina Kirchner,de proteção por social meio mais importante das últimas décadas, dado seu alcance (ZARAZAGA, 2014; REPETTO e LANGOU, 2010). Conforme atestam Repetto e Langou,

A AUH é a iniciativa mais importante em matéria de proteção social da Argentina dos últimos anos.

- teçãoSua implementação social no país. significou O AUH garantiu um passo um de repas suma- importância para se avançar em um piso de pro implicando assim uma importante redução nos índicesse mínimo de pobreza, em cerca indigência de dois milhões e desigualdade de famílias de renda no país. Além de seu impacto na situação so- cial dos sectores mais vulneráveis, a AUH também

transferências condicionadas (PTC) mais relevan- tesimplicou que se na implementaram unificação parcial no país. dos Deste programas modo, dese constitui como um possível pilar para a constru- ção de um incipiente sistema de proteção social (SPS) da Argentina (2010, p. 2)

- Em termos de conteúdo a AUH é um benefício- destinado aos filhos menores de 18 anos de pessoas mode- notributistassocupadas, ou sociales que trabalham no mercado informal e ga nham menos de um salário mínimo mensal, além de “ que possam ser regularizados)” (contribuição e aqueles tributária incorporados simplificada ao Regimepara trabalhadores Especial de emSeguridade situação deSocial vulnerabilidade, para Empregados para

Domésticos e que recebam menos de um salário mínimo. Luciana Pazini Papi

éO maior,benefício 1.500 também pesos se por destina família a famílias por mês, com contra pessoas 460 com pe- algum tipo de deficiência, o valor atualmente transferido- tar assim a centralidade do tipo de inserção no mercado sos mensais para famílias do primeiro perfil. Pode-se no 165 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA -

possuide trabalho condicionalidades como eixo central em desaúde elegibilidade e educação para que o pro de- grama. É um programa que, assemelhado ao Bolsa Família, Libreta Nacional de Seguridadvem ser cumpridos Social, Salud pelos y Educaciónbeneficiários. Seu cumprimento- ciáriosé verificado recebem anualmente mensalmente por meio o equivalente da a 80% do va- , sendo que os benefi-

lor do benefícioDo ponto e osde 20% vista restantes das estratégias são transferidos de coordenação anual utilizadasmente após pelo a verificação governo federal,(BICHIR, Repetto 2012). e Lagon, (2010, p.2) destacam que para dar corpo a intervenções mais integrais em termos de proteção social, foram necessá-

entes federados; 2) alocação acordada de responsabilida- rias 1) a fixação de prioridades compartilhadas entre os- mentação com ações complementares de múltiplos atores. Entretanto,des no momento levando do em desenho consideração das intervenções; a magnitude 3) do imple pro-

desse país, que conta distintos padrões de relação entre governograma e federal os desafios e unidades colocados subnacionais pela dimensão para a implemen federativa- tação de políticas sociais, a estratégia levada a cabo pelo governo foi centralizar suas decisões e implementação no executivo federal. Conforme atestam as Díaz Langou et All (2010, p.63), as províncias e os municípios são passivos na implementação do programa. Isto se deve, pois as transfe- rências se realizam diretamente por meio da ANSES aos be- neficiários. As províncias somente se colocam à disposição, no caso da ANSES requerer maiores informações. Os municí- pios também são passivos. A outra estratégia para driblar a fragmentação ministerial existente na Argentina e centralizar as ações deste programa, foi a alocação da AUH na ANSES. Por ser

Crise sistêmica e proteção social e proteção Crise sistêmica seu alcance territorial e seus sistemas de informação, es- um organismo reconhecido por sua capacidade de gestão, 166 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS tes critérios incidiram sobre a decisão de alocar a AUH nesta instituição (REPETTO E LAGON, 2010). Isto permi- tiu a ampla centralização da formulação e implementação do programa. Conforme os autores, o programa se imple- menta com um manual de operações detalhado e com um mesmo sistema de informação em todo território nacional. (Ibdem, 2010, p.3). No entanto se esta estratégia garantiu certa maneira, a implementação de uma política nacional capaz de vencer os vetos locais bastante enraizados na matriz federativa da Argentina, ainda são inúmeras as li- mitações para a consolidação de um sistema de proteção social não contributiva integrado na Argentina, não ape- nas do ponto de vista vertical, mas horizontal. Conforme salienta Bichir Podemos dizer que a AUH coloca-se como uma pri-

de persistência entre os programas de transferên- ciameira de alternativarenda na Argentina, de maior umafôlego vez e quepossibilidade foi incor- porada como o pilar não contributivo do “Regimen de Asignaciones Familiares”. Entretanto, a grande

Argentina acaba por relegar para segundo plano centralidade do mundo do trabalho – formal – na- pulação mais vulneráveis que passem por políticas a relevância de esquemas de proteção para a po normativo com o qual muitos gestores operam é a dopúblicas pleno deemprego, assistência e não social a consideração – já que o horizonte de situa- ções mais persistentes de informalidade ou mes- mo “inempregabilidade” (2012, p. 31). Luciana Pazini Papi uma amplaAssim aspiração como napela Argentina mudança dos do governosmodelo implemen Kirchner,- tadono Brasil com basescom a nas eleição diretrizes de Lula neoliberais para a presidência (DINIZ e BOSCHI, houve 2007). Partindo do diagnóstico sobre a excessiva concen- tração social e espacial da renda e da riqueza, o aumento 167 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA da pobreza e a exclusão social, a baixa criação de empre- go e a inefetividade das políticas do período precedente, a agenda proposta por Lula (anunciada no PPA 2004-2007), articulou um conjunto de investimentos para dinamizar o mercado de consumo interno, partindo do investimento em políticas de emprego e renda, na valorização do salá- rio mínimo, na ampliação de crédito e, sobretudo, em po- líticas de inclusão social que passam por Programas de Transferência Condicionada de renda PTCs, articuladas a estratégias de proteção social não contributiva, como a as- sistência social, no atendimento e na prevenção às vulne- rabilidades sociais. Assim como no caso argentino, no Brasil da década de 1990, período governado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, iniciou-se a implementação de Programas de Transferência de Renda Condicionada (PTCs)20, que não articulavam-se entre si e eram muitas vezes executadas por ONGs que passavam ao largo das demais ações preventivas e de fortalecimento de vínculos que deveriam ser prestador pela rede pública de assistên- cia social (PAPI, 2012). Neste período, embora algumas ini- - cional para o campo da assistência social21, estabeleceu-se ciativas tenham sido tomadas para dar densidade institu 20 Exemplo de iniciativa no campo dos PTCs foi a Rede Social formada pelos seguintes programas: Bolsa-Alimentação (na área de saúde), Agente Jovem (na Secretaria da Assistência Social) e, pouco mais tarde, Auxílio-Gás (2002). Posteriormente, foram acoplados o Bolsa-Escola,

21 a extinção da antiga LBA e a criação da Secretaria de Assistência Social (SAS),de 1998, ligada e o Programa ao Ministério de Erradicação da Previdência do Trabalho Social, para Infantil implementar (PETI) as medidas de transição de um modelo centralizado para um descentra- lizado (ARRETCHE, 2000); a implementação de instituições e órgãos

edo os novo fundos sistema, estaduais como e municipais; o Conselho a Nacionalaprovação da da Assistência primeira Política Social Nacional(CONANDA), de Assistência o Fundo NacionalSocial em da1997, Assistência e posteriormente Social, osem conselhos 1998, as- sim como a edição das NOBs de 1997 e 1998; e ainda a implantação do Crise sistêmica e proteção social e proteção Crise sistêmica

Benefício de Prestação Continuada168 (BPC), em 1996. 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS primazia dada aos programas de transferência direta im- pedindoum claro queconflito a proteção entre o social desenvolvimento se constituísse desta como área uma e a política sistêmica. Ademais diante do contexto de ideologia da “descentralização” em uma federação como a brasilei- ra em que os três níveis de governo gozam de autonomia constitucional (ABRÚCIO, 2006), restou aos municípios a completa gestão de políticas de assistência social sem ar- ticulação com as demais políticas sociais e sem apoio fe- deral. Por tudo isso o modelo focalizado e pouco inclusivo imprimido pelo governo FHC, não foi capaz de superar a matriz assistencialista e clientelista das políticas de prote- ção social não contributiva, brasileira. Desta forma o governo Lula inicia com grandes - tributiva como uma política sistêmica: 1) resolver os pro- blemasdesafios de para fragmentação efetivar o campo e isolamento da proteção entre social os campos não con da transferência direta de renda e a assistência social; 2) dar densidade ao campo de assistência social, resolvendo pro- dos serviços, clientelismo e voluntarismo; e 3) produzir “umblemas mapa” históricos sobre a desituação superposição da proteção de ações,social no ineficiência país para ser possível seu planejamento, uma vez que não existiam dados sistematizados sobre os programas e serviços pres- tados em cada nível de governo. - tacar a criação do Ministério do Desenvolvimento Social e CombateNo à Fomeque diz (MDS) respeito em ao2004, primeiro que buscou desafio, articular cabe des e centralizar as políticas de transferências direta de renda, de segurança alimentar, assim como, de assistência social, Luciana Pazini Papi

Interministerial do Programa Bolsa Família e em dois ou- trosantes distintos dispersas ministérios: na Secretaria o MinistérioExecutiva do Extraordinário Conselho Gestor de Segurança Alimentar – MESA, e o Ministério de Assistência Social – MAS. Com efeito, a alta prioridade dada pelo go- 169 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA verno ao recém criado Programa Bolsa Família22, principal programa de transferência de renda condicionada do go- verno federal e, o maior da América Latina, tanto em orça- mento quanto em cobertura (CAVALCANTE, 2009), exigia esforços para que sua implementação nos três níveis de go- verno se realizasse de forma efetiva, sem alimentar a opo- sição política do programa, para seus possíveis problemas

p.15), no caso do MDS, havia uma missão política prioritá- ria:e limites. implantar Conforme o PBF, restrito salientam a uma Veiga das e áreas Magalhães do ministério. (2014, No entanto, ao contrário do ANSES, que era uma - ceiros consolidados, o recém criado MDS carecia de quadro próprioestrutura de institucional funcionários, com de recursosrecursos burocráticosmateriais e técnicose finan para possibilitar o planejamento e direcionar as ações das equipes – entre eles, bases de dados e recursos informa- cionais – (Ibdem, 2014). Entretanto, a partir de 2005 após um ano de sua criação, o Ministério veio a consolidar as equipes que possibilitaram a implantação do PBF e poste- riormente do SUAS tornando-se central na implementação de políticas de desenvolvimento social, tendo uma posição política bastante distinta de sua contraparte na Argentina (BICHIR, 2012). Do ponto de vista das similitudes entre os mode- los argentino e brasileiro, a centralização da formulação da

22 implantados no governo FHC – o Bolsa Escola, o Auxílio-Gás, o Bolsa Alimentação O PBF foi criado e o Cartão em 2003 Alimentação para unificar –, o aoBolsa Fome Família Zero osé umprogramas progra- ma de transferência de renda condicional para famílias em situação de pobreza, que visa a promover o alívio imediato da pobreza por meio da transferência direta de renda. A ruptura do ciclo intergeracional da pobreza é esperada por meio das condicionalidades, que reforçam o exercício de direitos sociais nas áreas de saúde e educação e que, po- tencialmente, propiciam o combate à pobreza futura, com investimento -

todono desenvolvimento o país, o que corresponde de capital humano. a um quarto Desde da sua população implantação brasileira o pro

Crise sistêmica e proteção social e proteção Crise sistêmica (IPEA,grama 2013).foi responsável por tirar da miséria, 13,8 milhões de famílias em 170 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS política e o controle do executivo federal sobre sua imple- coordenação, a despeito do que dizem os documentos nor- mentação,mativos que chamam apontam atenção para a como descentralização. a principal estratégia de Conforme artigo 11, do Decreto que regulamen- tou o PBF, estabeleceu-se que a implementação e ges- tão do programa se fundamenta na descentralização, por meio da conjugação de esforços entre os entes federados, observada a intersetorialidade, a participação comunitá- ria e o controle social. Entretanto, conforme argumenta oposto, isto é, rumo a um modelo centralizador da ges- tão.M.H.T. O CadastroAlmeida (2005,Único dosp.38), Programas o PBF caminhou Sociais do no Governo sentido Federal (CadÚnico) que consiste na base de dados sobre a localização e as características das famílias é ilustrativo;

Secretaria Nacional de Renda e Cidadania- SENARC- MDS comAlimentado base em pelos critérios municípios, de cobertura sua seleção de atendimento fica a cargo dade

Entretanto, tal modelo embora centralizado, insti- tuiucada aocidade longo e dodestes perfil anos das famílias.estratégias de coordenação de modo que municípios e estados assumissem responsabi- lidades para o cumprimento dos objetivos propostos e mi- nimizassem os problemas de desvios. Dentre eles se desta- cam: os termos de adesão no qual os municípios passaram a possuir responsabilidades no que tange ao cadastramen- to, monitoramento das condicionalidades, gestão de bene-

- tesfícios do e poder oferta públicode programas e da sociedade complementares; civil; E a acriação formação do Luciana Pazini Papi Índiceinstâncias de Gestãode controle Descentralizada social (ICS) compostas(IGD), um porindicador integran de qualidade de gestão municipal que condicional o repasse

Do ponto de vista da articulação entre tal pro- gramade verbas e a federais assistência para social,o âmbito cabe local. destacar que paulati- 171 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA namente o programa de transferência de renda tem se apoiado em serviços e na estrutura produzida para a as- sistência social, de forma a ser possível a emancipação dos

fortalecimento de vínculos e a prevenção a situações de vulnerabilidade.beneficiários do sistema por meio de estratégias como o

do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) é emblemá- tica, umaNo vez que que diz tratará respeito de aotransformar segundo desafio, efetivamente a criação os moldes de operação da assistência social no país, seja pelo maior aporte de recursos para a área da assistência social, seja pela instituição de novas regras de prestação de servi- ços, assim como pela intenção de reordenar o pacto federa- tivo que orienta essa política pública.

- tência social,A implantação em que a articulaçãodo SUAS em entre 2005 as configurou três esferas uma de governoconcepção constitui-se de sistema elemento orgânico fundamental,da política pública a exemplo de assis do Sistema Único de Saúde. A partir de então, estabeleceu-se a regulação e a organização em todo o território nacional das ações socioassistenciais, em que todos os entes federados têm responsabilidades23 na implementação da política de - das na Norma Operacional Básica do SUAS. assistência social, com atribuições específicas estabeleci ações da assistência por níveis de proteção (básica, média e alta complexidade),Ademais, o sistema o que classificoupossibilitou a organizaçãoa construção das de uma referência unitária em todo o território nacional de: nomenclatura, conteúdo, padrão de funcionamento, indi- cadores de resultados, estratégias e medidas de prevenção

23 De acordo com as novas regras, cabe à União a coordenação e o esta- belecimento de normas gerais, enquanto aos estados e aos municípios cabe a coordenação e a execução dos programas (BRASIL, 2004). Ainda se estabeleceu que cada esfera federativa possui a tarefa de coordenar, -

Crise sistêmica e proteção social e proteção Crise sistêmica tizar informações pertinentes à sua esfera de atuação. formular e co-financiar as ações, além de monitorar, avaliar e sistema 172 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS quanto à presença ou agravamento e superação de vitimi- zações, riscos e vulnerabilidades sociais. (BRASIL, 2010). Institui-se uma rede pública de equipamentos através dos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS)24 e o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS)25, além dos abrigos/casas/lares de crianças, ado- - - lescentes,tabeleceu aidosos, utilização mulheres de indicadores que operam para pela a realizaçãoAlta comple da xidade. Quanto ao financiamento da assistência, o SUAS es seus indicadores socioterritoriais, a capacidade de gestão, departilha atendimento de recursos, e de arrecadação considerando de ocada porte município. populacional, - ção dos recursos federais pelos municípios. Estes, para te- rem acessoOutra aos novidade recursos doé a Fundo maior Nacional fiscalização da Assistência da utiliza Social (FNAS), necessitam prestar contas anualmente atra- vés do Relatório Anual de Gestão, renovar o plano de as- sistência social a cada quatro anos e manter ativo o con- aos novos instrumentos produzidos no governo federal paraselho coordenarmunicipal, ainstância política dede participaçãoassistência social, popular. a criaçãoAlia-se da Secretaria de Gestão da Informação (SAGI) do MDS, que permitiu monitorar e avaliar nacionalmente as ações de assistência, por meio da produção de dados e informações de planejamento da política e na tomada de decisão nacio- nalfidedignas e local (JANNUZI,sobre a rede 2012). de serviços, auxiliando no processo

24 O CRAS atua como a porta de entrada ao Sistema Único e tem por ob- jetivo prestar serviços à população no sentido de fortalecer a função protetiva das famílias, evitando a ruptura de vínculos e o agravamento Luciana Pazini Papi de problemas sociais, como a violência de diferentes matizes, a situa- ção de rua, entre outros 25 O CREAS é o equipamento onde funcionam os serviços de média com- plexidade, em situações de agravamento de problemas sociais, tais como famílias e indivíduos em situação de ameaça ou violação de di- - mento de medidas socioeducativas em meio aberto. reitos, violência física, psicológica, sexual, tráfico de pessoas e cumpri 173 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Como pode-se observar, não foram poucos os es- forços feitos pelo governo federal para inverter a lógica da gestão e operação da assistência social. Desde então, as mudanças em curso no campo da assistência não são

uma grande adesão por parte dos municípios ao SUAS. Até 2010,pequenas. dos A5.564 partir municípios de sua instituição, brasileiros, em 5.526 2005, (99,3%) houve - belecidos pela NOB/SUAS 2005 e apenas 38 municípios estavam habilitados em algum dos níveis de gestão esta- te institucionalização da assistência social no Brasil por meio(0,7%) de não instalações o estavam. de equipamentosPor conseguinte públicos. houve a Até crescen 2010, foram implantados no país 7.475 CRAS, em 5.254 muni- cípios (95% dos municípios brasileiros) e 2.109 CREAS. Dados do Censo SUAS de 2011 apontam que 75% dos mu- nicípios brasileiros contam com secretarias municipais exclusivas, em contraposição ao período anterior, quando a assistência constava como um departamento da saúde,

Assim, ao contrário do ocorrido até então com os municípioshabitação etc. que formulavam suas agendas de programas e ações de assistência de forma isolada e reclamavam da ausência das demais esferas federativas no apoio técnico e

com a pactuação ao SUAS, esse quadro muda, de forma que osfinanceiro municípios para agora a concretização responsabilizam-se da política por de se assistência,adequar ao sistema e implementar a política, independentemente da correlação de forças políticas locais.

da articulaçãoAtravés entre deste políticas quadro focalizadassintético sobre e as as de PNSC´s natureza no protetivaBrasil, pode-se e preventiva notar que com houve ‘vocação’ avanços universal do ponto como de ovista são

construção, sua consolidação e avanço com relação ao mo-

Crise sistêmica e proteção social e proteção Crise sistêmica deloas do anterior SUAS. Por são mais evidentes. que se trate de um caminho ainda em 174 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Do ponto de vista institucional, esforços foram fei- tos para superar a fragmentação e a descentralização de- sordenada que delegou ao níveis inferiores de governo e ONGs, a produção destas políticas. Ademais o modelo ex- clusivamente focalizado tem sido substituído pela ideia de articulação entre focalização e universalização como cami-

As estratégias de coordenação vertical utilizadas pelonhos governonão excludentes federal pore sim sua complementares. vez são inúmeras, incluindo condicionantes para transferências de recursos no caso do PBF; pactuação entre os entes federados baseado em níveis de gestão; regras e normas estabelecidas pelo governo fe- de monitoramento e avaliação em nível federal que acom- deral que tipificam e padronizam os serviços; mecanismos do sistema; além de um sistema de articulação entre políti- caspanham setoriais os resultados emplacados e limitações pelo BSM. encontrados na ‘ponta’ proteção social não contributiva, e especialmente da assis- tência socialIsto do tudo país, modificou que migrou sobremaneira de um modelo o fragmenta quadro da- - do e com objetivos claros que devem ser perseguidos pelos trêsdo e níveisvoluntarista de governo para paraum modelo sua efetivação. público, profissionaliza Em suma, um balanço das políticas públicas na área social brasileira ao longo das últimas décadas revela

- gramas.uma diversificação Outra característica em termos marcante de bens dessee serviços processo criados, da aumento nos benefícios sociais e criação de novos pro-

- Luciana Pazini Papi temaexpansão de proteção das áreas social sociais e de no geração Brasil éde a ampliaçãooportunidades signifi ao longocativa dasdo contingente duas últimas de décadas. beneficiários incorporados ao sis inequívoca de indicadores sociais, percebendo-se um me- Tais esforços tiveram por resultado uma melhoria- 175 lhor desempenho nos indicadores que revelam concentra ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA - frido uma queda constante, passando de 0,6 em 1993 a 0,5 ção de renda e desigualdade. O coeficiente de Gini tem so teve lugar em todas as regiões, tendo caído a um patamar inferiorem 2011. a A0,5 melhoria nas regiões do perfil Sul edistributivo Sudeste e convergidoda renda no parapaís o patamar 0,5 no Nordeste e no Centro-Oeste (BRASIL, 2013c). A taxa de extrema pobreza, cujo índice em 1992 era de 22,55, decresceu para 17 pontos ao longo da década -

de 1990. É a partir de 2003 que a queda se acentua, refle xo do crescimento econômico e dos impactos do Programa Bolsa Família, fazendo com que o índice de 17,49 chegue ao final da década de 2000 a 8,51 (MADEIRA et All, 2014). CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como buscou-se ilustrar, ainda que de maneira ex- ploratória, o governo federal tanto no caso brasileiro como no caso argentino, na última década vem investindo esfor- ços na recuperação da capacidade estatal como forma de viabilizar a nova estratégia de desenvolvimento que com-

embina ambos crescimento os casos econômico os esforços e desenvolvimento dispendidos no sentido social. de dar maiorMesmo densidade apresentando institucional desafios à área diferentes, de proteção nota-se so- cial não contributiva, a ampliação do escopo de cobertura

universais de proteção social. Ademais o esforço de tornar oe acaráter caminhada de tais pela políticas articulação como permanentes,entre formas focalizadasou seja, pro e- tegidas das mudanças imprimidas pelo ciclo político eleito- ral, também são evidentes.

como verticais mostram-se indispensáveis para viabilizar a implementaçãoPara tanto de estratégias políticas nacionais de coordenação de proteção horizontais social

Crise sistêmica e proteção social e proteção Crise sistêmica - 176 não contributivas, que até então eram desenhadas e imple 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS mentadas de forma desarticulada pelos entes constitutivos das federações, não tendo alcance e resolutividade coleti- va. Desta forma, seja como estratégia anticíclica ou como agenda de governo percebe-se que as políticas de proteção social são parte estratégica de governos que sustentados em premissas não liberais entendem que o crescimento

A última década demostrou o esforço de inúmeros gover- econômiconos da América passa Latina indispensavelmente em reverter o pela passado inclusão pouco social. in- porclusivo Brasil e produtor e Argentina de pobrezade maneira produzido ilustrativa historicamente sendo que a pesquisana região. em O artigoandamento buscou pretende resgatar explorar o caminho os distintos percorrido ca- renda. Ademais tem-se como futura agenda de pesquisa entenderminhos percorridos as mudanças por ocorridas países com no tocante distintos ao desenvolvipadrões de- mento e políticas de proteção social no contexto mais con- e liberal em todos países da América Latina em mais um temporâneo, em que há um aceno de regresso conservador crise e índices alarmantes de pobreza para retomarmos a agendaciclo que de aparentemente desenvolvimento? se fecha. Será preciso uma nova

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Marco Antônio de Oliveira Tessarotto1

RESUMO: O tema da democratização das comunicações, da política pública e do direito à cidadania no Brasil é insti- gante, pois, assim como a terra, o acesso à fala tornou-se objeto e privilégio de poucos muito ricos ou detentores de prestígio social, dos quais se utilizam deste instrumento como mecanismo de controle e de poder. A questão apre- sentada analisou como os membros das comunidades qui- lombolas/rurais dizem a respeito sobre a democratização dos meios de comunicação com o seguinte questionamen- - ção dos segmentos negros/rurais em sua grade de progra- mação?to e hipótese: A atual a programação rádio comunitária é de interesse contempla dos a segmentos participa rurais? A pesquisa de campo sobre a democratização da

- Marco Antônio de Oliveira Tessarotto tre o centro urbano e a zona rural dos municípios de Serra Redonda,comunicação Alagoa revelou Grande o jogo e Santa conflituoso Luzia, a respeitodas opiniões do papel en social da rádio comunitária. PALAVRAS-CHAVE: comunicação comunitária; política pública; democratização. ABSTRACT: -

The theme of the democratization of commu 1 Doutorando em Ciências da Comunicação, UNISINOS. nications,E-mail: public [email protected] policy and the right to .citizenship in Brazil 183 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

is thought-provoking, as well as the land, the access to the talks became object and privilege of a few very wealthy or holders of social prestige, which use this instrument as a mechanism of control and power. The question presented analyzed how members of the “quilombo” communities/ rural say about the democratization of media with the following question and hypothesis: the community radio contemplates the participation of black/rural segments in- your programming grid? The current programming is of interest to rural segments? Field research on the democ- tiesratization of “Serra of communications Redonda”, “Alagoa revealed Grande” the and game “Santa conflict Luzia”, of views between the urban center and the rural municipali KEYWORDS: democratizationabout the social role of community radio. communication; public policy; APRESENTAÇÃO: INICIANDO O DIÁLOGO

O termo participação sempre encontrou resis- tência para sua efetivação devido, em parte, aos regimes autoritários vivenciado pelos países latino-americanos, por isso, grande parte de nossa população e, em especial a rural que se encontra em uma situação que impossibi- lita sua participação na vida política, nas instituições ou organismos de caráter popular, como é o caso das rádios

enquanto protagonista social. Neste aspecto, a pesquisa de campocomunitárias, realizada ou noseja, Mestrado o de se (UFPB-PPGS,reconhecer naquele 2009) revelouespaço - vilegiadas (políticos, personagens de prestígio social, reli- giosos)a existência pertencentes de dois campos à zona urbana em conflito: e, dos silenciadoso das vozes (qui pri-

Entre estabelecidos e outsiders Entre agrário), do espaço rural. lombolas, população de assentamento e áreas de conflito 184 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS A pesquisa analisou a grade de programação das rádios comunitárias que cobrem os territórios urbanos e rurais das cidades de Serra Redonda, Alagoa Grande e e 3 da Lei 9.612/98 estavam sendo implementados pelas rádiosSanta Luzia,comunitárias verificando das cidadescomo o supracitadas.dispositivo dos artigos 2 comunitárias das cidades de Serra Redonda, Alagoa Grande e Santa LuziaO estudo incluem procurou na sua ainda, programação verificar como a participação as rádios dos segmentos da população local rural, de acordo com os que estas mídias exercem, fortalecendo ou desconstruin- dotermos identidades, da Lei 9.612/98; silenciando identificando ou não as vozes o tipo dos de segmentos influência sociais periféricos e, como as comunidades quilombolas e rurais reagem aos conflitos de interesse entre o direito à voz e os poderes hegemônicos. AS PONTES: ENTRE O DIÁLOGO E O PODER INSTITUCIONALIZADO está em curso nas comunidades rurais e quilombolas na O conflito contra-hegemônico (sistêmico) ainda- queles que estão no comando e direção destas rádios co- Paraíba. O estudo traçou, inicialmente, um perfil claro da Marco Antônio de Oliveira Tessarotto nível de instrução com segundo grau completo e perten- centesmunitárias: à corrente são homens neopentecostal brancos com de maisigrejas de 25evangélicas anos, de (Assembleia de Deus, Deus é Amor). Ao considerar que a rádio comunitária pertence à uma política pública, tal experiência deveria ser o instru- - cluídos, mas somente no momento em que a mesma deixe “demento ser demero libertação instrumento e reconhecimento da política e impõedestes sua grupos própria ex gramática com a qual os políticos têm que negociar” e, com isso, passe a formar “um dos pré-requisitos para que as dis- 185 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA cussões a favor do reconhecimento encontrem ressonância” (BARBALHO, 2005, p. 36). É, deste ensejo social que a co- municação comunitária poderá se constituir enquanto ins- trumento dialógico democrático. A construção das vozes na rádio comunitária e seu

que o sujeito pode contrapor-se enquanto força social, de- senvolvendoreconhecimento alternativas da multiplicidade e “formas socialde lidar é umacom formaos proces em- sos de exclusão gerados pela concentração de poder e pela impossibilidade de acesso a formas de participação na vida coletiva que tenha justamente em conta essas diferenças” (SILVEIRINHA, 2005, p. 42). - líticos partidários na radiodifusão comunitária é explica- da por umaA imposição “progressiva dos políticadiscursos pensada homogêneos para os e/ou grandes po sujeitos históricos, como a nação e a classe” (SILVEIRINHA, 2005, p.42). Na pesquisa, os sujeitos que estão à frete da -

políticosrádio são locais. em sua maioria, homens acima de 25 anos, pre dominantementeDesta questão brancos, levantada parentes acima, ou a apadrinhadossuperação da ne de-

gação do protagonismo social significa: multiidentitárias para garantir a representação e[...] participação enfrentar das desafios minorias, especiais protegendo, em sociedade promo-

das reivindicações dessas minorias é a ideia nor- vendomativa e de realizando que os indivíduos os seus direitos. e os gruposO fio condutor sociais

sua ‘diferença’. (SILVEIRINHA, 2005, p. 42) têm de obter ‘reconhecimento’ ou respeito pela O que foi possível diagnosticar na atual gestão das concessões públicas da comunicação comunitária nas cidades analisadas (Alagoa Grande, Serra Redonda e Santa Luzia) na Paraíba é que, ao contrário que a legisla-

Entre estabelecidos e outsiders Entre ção prevê observa-se uma espécie de “ordem natural, esta- 186 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS belecida por Deus e consolidada pela experiência humana” (GONÇALVES, 2005, p.15) predominantemente urbana. Na análise de conteúdo das entrevistas foi possível de- tectar que, mesmo diante das transformações do mundo padrões sociais, mas seu fortalecimento e convivência no presentemoderno, com não ocorreunovas roupagens a destituição institucionalizadas, dos velhos preceitos agora e midiatizadas que, aliada à tradição interiorana da política partidária e suas vertentes acabam por construir regras que pertencem ao sistema e de outro, os que estão de fora (sítios,de um jogocomunidades hegemônico, negras, onde, etc). de Esteum ladocomportamento estão aqueles é explicado, pois “uma classe social constrói e reconstrói sua liderança intelectual e moral sobre as demais classes, repro- duzindo ativamente valores, as ideias, as práticas culturais por uma determinada perspectiva e impondo-a ao conjunto da sociedade”. (GONÇALVES, 2005, p. 95).

SOBRE A HISTÓRIA: CONEXÕES E NEGAÇÕES e comunidades rurais sempre no passado, como se estes A história brasileira tem se referido aos quilombos o silenciamento têm produzido ao longo dos séculos, todo não fizessem parte da vida social do País. O preconceito e Marco Antônio de Oliveira Tessarotto - positivostipo de conflito legais comque adisciplinam sociedade brasileira,a radiodifusão questões comunitá estas,- ria.afirmadas Esta problemática com a desconfiguração foi percebida dos pelo propósitos estudo realizado dos dis na cidade de Campinas – SP. O pesquisador Bruno Fuser (2002) analisou 14 rádios comunitárias, que:

[...] criadas com o objetivo de serem a expressão aberta e plural de uma comunidade ou bairro,

terem se transformado em espaço ocupado por gruposestimulando religiosos a cultura e comerciais. local e sem Apenas fins trêslucrativos, das 14 187 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA emissoras pesquisadas possuem características que permitem considerá-las como parte de uma esfera comunitária [...] (FUSER, 2002, p. 53)

identidadesNeste culturais, olhar, a orientandomídia local como que irradia as falas seus de prestí sinais- gioeletromagnéticos devem ser apresentadas, atua como no matriz universo configuradora tomado para dases- tudo, nas cidades paraibanas todas as três emissoras pos- suem as mesmas descaracterizações citadas acima. As primeiras experiências com a rádio comunitária remontam os anos 70, mas somente uma década mais tarde, os atores sociais, entidades e seus respectivos movimentos se apoderaram deste instrumento comunicacional no Brasil.

de um protagonismo juvenil, mas apenas do espaço urba- noSobre e em o perfilgrande das parte rádios de analisadas,movimentos verifica-se religiosos. a Osexistência demais jovens do contexto rural, onde se inserem os quilombolas estão excluídos e silenciados da grade de programação das rádios comunitárias (Sorriso – Serra Redonda, Piemonte – - co das comunidades rurais, as entidades de representação socialAlagoa (sindicatos, Grande e 104 associações) FM – Santa possuem Luzia). pouca No caso atuação específi vol- tada para a construção da interação entre os instrumentos comunicacionais locais e os segmentos sociais rurais, ou seja, o de estimular processos dialógicos de informação, in- centivando a inserção e participação nos processos de mo- bilização popular, a favor da cidadania e do cumprimento do dispositivo legal, expressos na normativa da Lei 9612/98, Art. 4º, §3 que rege a radiodifusão comunitária O Ministério das Comunicações que fomenta e dis-

de rádio comunitária legítima que é aquela que: ciplina as ações das rádios comunitárias fala de um perfil [...] deve divulgar a cultura, o convívio social e eventos locais; noticiar os acontecimentos comu-

Entre estabelecidos e outsiders Entre nitários e de utilidade pública; promover ativi- 188 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

condições de vida da população. Uma rádio comu- dades educacionais e outras para a melhoria das de qualquer tipo, tais como: partidos políticos, instituiçõesnitária não podereligiosas ter fins etc. lucrativos A programação nem vínculos diária de uma rádio comunitária deve conter informação, lazer, manifestações culturais, artísticas, folclóri- cas e tudo aquilo que possa contribuir para o de- senvolvimento da comunidade, sem discriminação de raça, religião, sexo, convicções político-partidá- rias e condições sociais. Deve respeitar sempre os valores éticos e sociais da pessoa e da família e dar oportunidade à manifestação das diferentes opiniões sobre o mesmo assunto. (Ministério das Comunicações)

A intenção de implementação de uma rádio comu- nitária pretende criar novos canais dialógicos de enten- dimento, fomentando a emancipação do indivíduo e dos grupos silenciados. Segundo Jüngen Habermas (2003), na Teoria do Agir Comunicativo, este fenômeno, da rádio- docomunitária da vida (comunitário/rural) se encaixa em suas pelas reflexões, forças pois sistêmicas contribuiu (do neocoronelismopara a compreensão político/religioso). do fenômeno da colonização do mun Objetivando a análise das mídias comunitárias, a pesquisa discorreu sobre a atuação das seguintes rádios

comunitárias: Rádio Piemonte (Alagoa Grande); Sorriso da Marco Antônio de Oliveira Tessarotto Serra (Serra Redonda) e Santa Luzia 104 FM (Santa Luzia).

DESCREVENDO O CONFLITO: ENTRE O LEGAL E O REAL

- ça de duas populações com opiniões distintas, num mes- A pesquisa de campo realizada verificou a presen- mo espaço geográfico. Os dados e entrevistas foram de 189 codificados pelo software estatístico SPSS e tratados pelo ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Professor Doutor José Carlos Leite, do Departamento de Estatística da UFPB, que descreveu a seguinte situação:

- nidade quilombola e o centro urbano apresentam opiniões[...] o que diferentes.se verificou Enquanto no teste q2a épopulação que a comu do centro urbano considera que a rádio comunitária cumpre com seu papel, com relação à comunida- de quilombola foi diferente, eles consideram que 50% da amostra considera que a rádio não cumpre com seu papel, e 25% que ela cumpre parcialmen- te, então, isso caracteriza bem que a comunidade quilombola não considera que está sendo bem assistida com relação ao papel social das rádios comunitárias. Uma observação é que se faz neces- sária coletar mais dados que estas primeiras im- pressões apresentaram (José Carlos Leite, UFPB)

Ainda, a pesquisa de campo detectou facilmente nas falas dos depoentes, a existência de uma força política - na a programação e a forma como as falas são difundidas naquelehegemônica espaço. e partidária do grupo da situação que coorde A programação da rádio não é um produto da co- munidade, atua naquele espaço apenas um locutor/técni- co que nem sequer abre espaço para as falas dos ouvintes. Inexiste um programa idealizado pelos artistas locais e da comunidade rural.

sistêmicos na radiodifusão comunitária será com o deslo- camentoUm de antigos dos desafios preceitos para da a superaçãocomunicação, dos se processos constrói pelo questionamento quanto à veracidade e manutenção de

de construção da igualdade almejada, como nova ferramen- taantigos de interlocução, dogmas. A masrádio “há comunitária muito ainda se que insere pensar na dinâmica e tentar” (PAIVA, 2005, p. 24), a exemplo da participação e inclusão de sindicatos, associações, movimentos sociais e comunidades

Entre estabelecidos e outsiders Entre negras na programação das rádios comunitárias. 190 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Os dados são referentes à primeira fase da pesqui- sa e as tabelas comprovam as impressões sobre a exclusão dos segmentos negros na rádio comunitária.

1. Sexo dos entrevistados nas três cidades

Fonte: SPSS, 2009

2. O Sr. (a) costuma sintonizar a rádio comunitária (Sor- riso, Piemonte e Santa Luzia)?

Fonte: SPSS, 2009

3. 10ª pergunta: O Sr. (a) considera que a rádio está cum- prindo com a sua função social para a comunidade? Marco Antônio de Oliveira Tessarotto

Fonte: SPSS, 2009 191 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA O primeiro item em destaque é que a metade de ambos os sexos responderam os questionários nesta fase preliminar dos dados. O segundo ponto, sobre a audiência da rádio comunitária, mais de 87% dos entrevistados nas cidades de Serra Redonda, Alagoa Grande e Santa Luzia são ouvintes da emissora local pelo menos uma vez ao dia. O que nos interessa nesta análise é a última va- riante da pesquisa, onde se questiona à ambas populações, tanto do espaço urbano, bem como a rural, se a rádio co- munitária estaria cumprindo com o seu papel social, como preconizado no dispositivo legal de seu funcionamento. Estes números revelaram a sobreposição da - sava-se que ambas as populações não encontrariam opi- niõesHipótese discordantes (H1) sobre sobre a (H0) o papel ou nula. social Na dahipótese rádio, (H0)o que pen não

problemática proposta na análise do estudo, de fato, existe foi confirmado. Este dado revela a confirmação central da centro urbano e a população rural. em curso, um conflito de interesses entre os moradores do possível inclusão ou não de segmentos quilombolas na rá- dio comunitáriaA hipótese foi levantadaampliado, pois na pesquisa além dos inicial quilombolas, sobre a as vozes dos moradores dos sítios, sindicalistas rurais e líderes de assentamento não ressoam naquele espaço “de- mocrático” das falas. Dos depoentes, destacamos a descrição de uma das rádios comunitárias tomadas para estudo, a rádio co- munitária Piemonte na cidade de Alagoa Grande-PB, onde o professor do ensino fundamental e médio, José Abelardo Freire explicou que:

A questão da programação da rádio comunitária existe uma insatisfação da comunidade porque a rádio comunitária nos últimos quatro anos foi mais uma rádio político-partidária. Eu costumo di-

Entre estabelecidos e outsiders Entre zer que ela é uma extensão política da prefeitura. 192 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS - - masEra mais, da oposição, mas agora a rádionão, chegou cortou. o Numaperíodo apologia eleito tãoral egrande, conteve-se um dosmais. locutores Inclusive da havia rádio dois é assessor progra

da rádio é candidato a vereador do lado do pre- feitode comunicação (José Abelardo da câmaraFreire, 38, municipal, professor, o diretorAlagoa Grande).

O deslocamento de sentido ou a extinção da fala ideal é a morte anunciada do protagonismo social. A co- lonização do mundo da vida pelo da ação sistêmica passa - mando a relação direta do sujeito/sujeito pela do sujeito/ a coisificar as dimensões da ação comunicativa, transfor agricultora, Áurea Alves, na cidade de Alagoa Grande que objeto. Esta consideração pode ser confirmada pela fala da na rádio comunitária há pessoas: Contra a gente que somos agricultor, nós queremos o menino do sindicato de Alagoa Grande não pode ser uma voz na rádio, não pode falar pelo povo na rádia, porque ele não deixa, não deixe a participa- ção do sindicato na rádia, é isso que nós queremos ter direito, nós queremos participar da rádia de Alagoa Grande (Áurea Alves, 63, agricultora). Marco Antônio de Oliveira Tessarotto Nesse ponto, a rádio passa a valorizar as relações - diência”, em detrimento aos programas artístico-culturais dosde poder movimentos político sindicais e econômico e negros. em prol A política de uma pública, “maior per au- tencente ao mundo da vida foi colonizada pelas forças sis- - cínios; políticos). O controle, o sistêmico se instaura com forçastêmicas, sutis, de financeirização utilizando para de isto, capitais a da tecnologia, (econômicos-patro conforme imagem a seguir: 193 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

Fonte: TESSAROTTO, 2009.

vozes, entre o espaço urbano e rural, ainda na cidade de Alagoa ConfirmandoGrande, a Rádio a hipótese Piemont sobre utiliza o conflitode equipamento entre as tecnológico (ao lado do telefone da emissora) que serve

- daspara e filtrar as falas as dosvozes moradores de prestígio, da zona onde rural os representantes são bloqueadas. da política local da rádio ganham espaço, enquanto as deman CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os desvios dos princípios normativos da radio- difusão comunitária através de uma abordagem sobre os modelos atuais de implementação das políticas públicas universalistas comprovamos que as mesmas permanecem viciadas pelos antigos sistemas burocráticos do regime mi-

nas comunicações que são os “neocoronéis” midiáticos. litar, contribuindoDeste cenário para em o surgimento que o sistêmico de uma se novaapropriou, figura questionamos se a rádio comunitária poderá ser o instru- mento e canal dialógico para a participação de todos os atores sociais, como reverter o equilíbrio perdido? O desa- -

comunicacional,fio dos segmentos aquilo silenciados que reprime será o de e redescobrir distorce o diálogoo cami

Entre estabelecidos e outsiders Entre (neocoronelismo,nho para a emancipação, política partidária).afastando desta política pública 194 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Nas rádios comunitárias foi possível perceber que além de não estimularem o exercício da cidadania, ao não conclamar a participação dos diversos segmentos sociais e em especial àqueles excluídos (negros, sindicalistas, sitian- tes) a mesma atua difundindo e valorizando a cultura pro- veniente dos centros urbanos, não agregando quaisquer valores de empoderamento na cultura local.

REFERÊNCIAS

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13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS O CAPITAL NO SÉCULO XXI E SUA APLICABILIDADE À REALIDADE BRASILEIRA

Róber Iturriet Avila1 João Santos Conceição2

RESUMO: O ca- pital no século XXI, Este artigo apresenta uma resenha do livro o debate teórico dade distribuição Thomas Piketty, com amparo e traz indicadores no seu estudo do inéditoBrasil que em se um coadunam prazo temporal à temática extenso, do livro. iniciando-se Piketty resgata no ano 1700 até o atual estágio. Além de dialogar com outros teó- desigualdade. O livro aponta o crescimento da desigualda- dericos, de rendaedifica e sua de riquezaprópria apósconstrução 1980 e teóricatraz proposições para explicar polí a- ticas para reversão desse processo. Após o resumo do livro, são expostos dados brasileiros de distribuição de renda, de riqueza e a estruturação tributária, de modo a conectar o

PALAVRAS-CHAVE: trabalho do autor com indicadores nacionais.

ABSTRACT: Distribuição. Thomas Piketty. Brasil. Róber Iturriet Avila e João Santos Conceição

This text makes a review of Capital in the XXI- century of Thomas Piketty and brings indicators of Brazil related to theme of the book. Piketty rescues the theoreti cal debate of distribution supported in its study, beginning in the year 1700 until the current stage. In addition to this, there is a dialogue with other theoretical and he builds his own theoretical construct to explain inequality. The book pointsRio out Grande the do growing Sul, professor inequality da Universidade of income do Vale do and Rio dos wealth Sinos 1 e Doutor, pesquisador mestre da e Fundaçãobacharel em de Economia pelae Estatística. Universidade Federal do

dos Sinos e estagiário de Economia do Instituto Humanitas Unisinos. 2 Graduando em Ciências Econômicas na Universidade do Vale do Rio 197 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA -

after 1980 and brings policy proposals to reverse this pro cess. In addition to the summary, this are exposed Brazilian income distribution data, wealth and the tax structure in KEYWORDS: order to connect the book with national indicators. Distribution. Thomas Piketty. Brazil. Introdução

O capital no século XXI obteve uma repercussão incomum dentre os textos advin- dos da academia.O livro de O Thomas sucesso Piketty não foi fortuito. Após 15 anos de pesquisa, o autor aborda, de maneira acessível, um tema que foi o centro do estudo da economia política nos séculos

a questão distributiva. Além de instigante, sua abordagem temporalXVIII e XIX, se masinicia que no perdeu ano de espaço1700, contemplando na ciência econômica: desde o nascedouro do capitalismo até o atual estágio do capitalis-

empírica sobre a distribuição e uma construção teórica so- bremo financeiro.os fatores queO livro levam tem àduas convergência facetas: uma ou demonstração à divergência distributiva. - trado nos oito países3mais desenvolvidos, com destaque para FrançaEmbora e Estados abranja Unidos o mundo, (EUA). seu A trabalhoprincipal está fonte cen de

- rançadados éé exploradoa declaração a partir de renda dos dadosdo capital da França. e do trabalho aos órgãos fiscaisAlém dosda introdução, países. O detalhamento o livro divide-se de dados em quatrode he partes. Três são as contribuições mais relevantes que o es- tudo efetua: a) a compilação de dados e a explicitação da concentração de renda e da riqueza no mundo, a partir de 1980, com as políticas liberalizantes, com destaque para o

O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade e Austrália. 3 Estados Unidos, Japão, Alemanha, França, Grã-Bretanha, Itália, Canadá 198 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS crescimento exponencial da participação do 1% mais rico e do 0,1% mais rico, em especial nos Estados Unidos; b) o debate da relação entre mérito e riqueza, trazendo da- capital são mais determinantes na riqueza do que o acú- dos que mostram que a herança e a remuneração sobre o articula essa questão com a política, remontando o papel mulo de conhecimentos e habilidades; além disso, o autor- - talismocentral delaseja controladona organização para socialo interesse e econômica; geral, por c) meio propo da democracia.sições para o ajustamento distributivo, a fim de que o capi - tigo expõe dados brasileiros de distribuição de renda e de Além da resenha do livro de Piketty, o presente ar- cadores nacionais. Na sequência, é observada a estrutura- riqueza, de modo a conectar o trabalho do autor com indi

ção tributária do Brasil, a fim de observar a potencialidade de alteração distributiva a partir de sugestões de Piketty. Por fim, estão registradas as considerações finais. Uma resenha de O capital no século XXI

A primeira parte do livro traz alguns conceitos, - Róber Iturriet Avila e João Santos Conceição importanteequações teóricas que o deautor Piketty desenvolve e uma visãoé estoque global de do capital/ cresci mento econômico4. Ela diz equantas demográfico vezes odesde estoque 1700. de Umacapital relação é su- perior à apropriação da renda (que é contabilmente equi- renda (β) - 4 Piketty usa conceitos próprios, e o mais controverso é o de capital. Ele trata capital como sinônimo de riqueza, o que não se observa na lite ratura econômica. A constituição de um conceito não é um problema- sequênciaem si, mas disso, confunde o retorno o leitor, do capital ao, por (r) exemplo, abarca aluguel, tratar daarrendamento, herança. Há distinção em herdar empresas, imóveis e capital financeiro. Como con

partejuros, dalucros, riqueza ganhos não está com no especulação, sistema produtivo, dentre e,outros. ao se considerarEsses possuem toda ela,remunerações o r e contribuições sociais heterogêneas. Adicionalmente,

fica subestimado, o que199 abre espaço para falsas interpretações. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA valente à produção). Essa relação traz a Primeira lei do ca- r - pitalismo:nal, r α = x β - Onde α é a participação do capital na renda nacio é o retorno do capital e β é a relação estoque de capi detal/renda. 30%; e oNos r está países entre ricos, 3% βe 5%.paira em torno de 600%, ou seja, o estoqueNo Capítulo de capital 5, na é Parte 600% II, da o renda;autor expõe α gira outro em torno ele- mento relevante de sua construção teórica, que é a Segunda lei fundamental do capitalismo, s/g Essa equação é válida para o longo prazo, em que dada pela equação: β = taxas de poupança (s) e de crescimento (g). Com relação a razão estoque de capital/renda (β) é uma relação entre privada entre 1970 e 2010 derivado, em grande medida, aos países ricos, Piketty mostra um crescimento da riqueza mãos privadas, uma vez que o crescimento da renda per capitade bolhas de ativos e transferência de capital público para

com a funçãoficou entre de produção 1,6% e 2,0% Cobb-Douglas. no mesmo Osperíodo. dados da eco- nomia estadunidenseNessa parte do explorados livro há também para o uma período comparação 1899 e

- 1922 fizeram sucesso e permitiram assumir uma ideia de rendimentoharmonia e justiçado capital social na narenda estabilidade não implica da relaçãoestabilidade capi natal-trabalho. relação estoque Entretanto de capital/renda a estabilidade e natampouco participação garante do - gentes ao considerarem a estabilidade da relação, assim comoharmonia os marxistas social. Para erram Piketty, em considerar Cobb-Douglas a participação foram negli do capital sempre crescente. Nesse sentido, o Modelo não é adequado para um estudo de longo prazo. -

que ocorreuPara nos Piketty, países parece ricos, entre ser bem 1970 estabelecida e 2010. Assim, a ten o r

O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade dência de estoque de capital/renda (β) aumentar. Foi isso 200 cai à medida que β cresce. É provável que a participação do 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS capital cresça nas décadas à frente, até os níveis do início deu-se porque este se tornou mais importante no processo dedo produção.século XIX. O crescimento da participação do trabalho

Nos últimos séculos, o conhecimento e a destreza- humana aumentaram, mas o estoque de capital também.- Assim,de. Nessa não questão, houve uma o autor mudança dialoga de com uma a sociedadeteoria do capitalbasea da no capital para outra baseada no talento e na habilida- logia, poderosas forças de convergência capazes de ajus- tarhumano, as desigualdades que vê, na difusão e permitir do conhecimentoremunerações eadequadas da tecno à destreza. Mas os resultados de seu estudo apontam que democráticos e da racionalidade meritocrática. o progressoA Parte econômico III é a mais e tecnológico importante não do implicalivro, por avanços trazer mais dados sobre a distribuição de renda e de riqueza e também por nela estar presente a principal argumentação teórica do autor. É contemplada ainda a discussão acerca riqueza. do trabalho,No doperíodo mérito atual,pessoal em e da paísesherança como como fonteFrança, de aproximadamente 60% da riqueza nacional. E, invariavel- Róber Iturriet Avila e João Santos Conceição mente,Alemanha, os 50%Grã-Bretanha mais pobres e Itália, possuem os 10% menos mais ricosde 10% detêm da riqueza nacional. Nos EUA, por exemplo, o decil mais alto detém 72% da riqueza nacional, enquanto os 50% mais pobres possuem 2%. nas mãos do 0,1% mais rico e, sobretudo, nas do 0,01% mais rico.A Entre renda os do 10% capital mais assume ricos, os decisiva 9% mais importância abaixo são assalariados, entretanto esses assalariados são os execu- - tivos das grandes empresas e do setor financeiro. Nas úl timas décadas, houve um fenômeno de crescimento dos 201 supersalários, que se configura, fundamentalmente, pela ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA remuneração dos administradores das grandes empresas (CEOs). - gualdade. Um exemplo é a França após 1990, que obteve crescimentoDesde elevado 1983, nodos entanto, salários há mais crescimento altos (sobretudo da desi

o 0,01% mais rico, o crescimento do poder de compra foi de quaseexecutivos 50% eentre de empresas 2000 e 2010, financeiras). em um contexto Entre o 0,1%de bai e- xo crescimento e estagnação do poder de compra para a

- tisfatoriamentemaioria dos trabalhadores. pela teoria da tecnologia e da educação. Na O fenômeno dos supersalários não é explicado sa- cia entre os salários mais altos e os mais baixos se manteve relativamenteFrança, a despeito estável da médiaem um salarial prazo terlongo, crescido, independente a distân- mente da maciça democratização do ensino no período, isto é, a elevação do nível educacional não reduziu a de-

até a década de 70 e passou a crescer a partir da década de 80sigualdade do século salarial. passado. Nos EUA, a distância salarial diminuiu - vro é a 9.2. Ela mostra a apropriação do 1% mais rico em Uma das figuras mais interessantes de todo o li bastante claro que a participação dos mais ricos na renda passouquatro paísesa cair nas(Austrália, décadas Canadá, de 30 eGrã-Bretanha 40 do século e passado, EUA). É

aumentado desde então. Há que destacar que, no período chegando ao percentual mais baixo na década de 80, tendo implementação da progressividade tributária. Na década entre guerras, o capitalismo foi mais regulado e houve a entrou na fase neoliberal. de 80, houveA produtividade reversão de marginal,políticas regulatórias, a tecnologia ee oa mundoeduca- ção não parecem fornecer boas explicações para essa dis- paridade pós-1980. O que auxiliou na elevação salarial dos

O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade decis mais baixos foi o salário mínimo, que segue normas 202 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS e valores coletivos de justiça social, e não a elevação do maior nível educacional. No que tange aos bilionários, de 1987 para cá a -

Ummédia crescimento do patrimônio de 6,8% do 1/100 ao ano. milhões A média mais anual ricos do do cresci mun- do passou de US$ 3 bilhões para US$ 35 bilhões em 2013.- - riosmento foi, econômico portanto, muitodo período superior foi deà média 2,1%, dee da crescimento renda mé dia foi de 1,4%. O crescimento do patrimônio dos bilioná A partir desses dados, a visão de que o salário correspondeeconômico. à produtividade marginal se torna uma visão superiores frente às reduzidas rendas dos demais. Nesse ideológica que justifica as elevadas rendas das camadas- porquesentido, estimar segundo a Piketty,contribuição a definição de um salarialfuncionário é largamen é muito te arbitrária e relacionada à hierarquia empresarial, até tecnologia deem uma explicação plausível para diferentes difícil. Embora a produtividade marginal, a habilidade e a- tações explicativas. remuneraçõesNo Capítulo no longo 10 prazo, do livro, é preciso o argumento identificar central as limi é riqueza dá-se pela relação entre o retorno do capital (r) e Róber Iturriet Avila e João Santos Conceição adesenvolvido. taxa de crescimento A grande (g influência). Se o retorno sobre do a capital distribuição for supe da- rior à taxa de crescimento, o risco de divergência, em ter- mos distributivos, é elevado. O que leva à concentração de renda é, portanto: r > g - torno do capital em uma fase de crescimento relativamen- te baixo.O Nessa estoque situação, de capital/renda a riqueza passada (β) aumenta tem umapelo imre- rápido do que a produção e a renda. Nessas condições, a portância desproporcional. Ou seja, a herança cresce mais- - riqueza herdada tende a superar, em larga medida, a rique 203 za acumulada ao longo da vida de trabalho. E a concentra ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA ção de capital agudiza-se, de forma incompatível com os valores de meritocracia e de justiça social. Some-se a isso que a taxa de poupança cresce bruscamente com a rique- -

za herdada. E a taxa de retorno do capital individual ten exemplo,de a ser maior a divergência quanto maiorestrutural for a acentua-se. herança recebida. Caso haja elevaçãoA desigualdade do preço dos r>g bens é um imóveis fato observado e do petróleo, em quase por - ria. Provavelmente, continuará no século XXI, a depender toda a história desde 1700, mas não uma lógica necessá que g r mesmo sem a intervenção e regulação estatal, no casoda regulação de a produtividade entre capital crescer e trabalho. rapidamente Entretanto ou é depossível cons- > tecnologicamente avançados. A lógica r>g é uma realidade tanteque depende inovação. de Pode uma ocorrer variedade também de fatores, caso hajacomo mais desenvol países- vimento institucional, social, cultural, imposições de gru-

das forças de convergência para equalização da riqueza e pos específicos e psicologia individual. Contudo, a despeito A questão tributária explica, em grande medida, as mudançasda renda, há ocorridas forças de no divergência século XX. que Até são a Primeiramais poderosas. Guerra Mundial (PGM)5 capital e sobre a renda6. E o imposto sobre a riqueza era baixo, o que aumentou, praticamente após a nãoPGM. havia Contudo, imposto na sobredécada o

5 Há, também, uma contradição interna no approach de . Como o próprio autor demonstra, o período de égide liberal, tanto antes da Primeira Guerra Mundial quanto após 1980, foi o de maiorPiketty crescimen-

esse processo de liberalização e agudiza suas características, o autor o saúda.to da desigualdade. Mesmo sabendo que a dinâmica capitalista gera

mecanismo de preços e não em políticas de rendas, mesmo que elogie 6 o Piketty salário propõe mínimo. correções Não considera via taxação a busca do capital,de ampliação ou seja, da pelo participação ajuste no - letárias, por exemplo. O autor não teoriza sobre as crises capitalistas, mesmodo trabalho que coloquena renda, a desigualdadeatravés de movimentos como grande sindicais fonte da e instabilidadede lutas pro O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade

financeira recente. 204 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS de 80, com a liberalização financeira, os impostos sobre o capital caíram drasticamente. Houve uma amplificação de ordem política que aumentou também a influência política teoriados beneficiários. de desigualdade estável. Pareto analisou o período Piketty dialoga também com Vilfredo Pareto e sua da desigualdade, que Pareto tenta esconder. De qualquer forma,1880-90. sua Mesmo teoria nãonesse serve período, de base houve para efetuarum leve uma aumento análi- se de longo prazo, uma vez que ele se deteve em um perío- do curto. Essa perspectiva de Pareto, de que a desigualdade - va no longo prazo. é estável,Posto permanece esse diagnóstico, até hoje, mas a tendência não é isso paraque se o obserséculo XXI é de redução da participação do capital na renda, redu- ção da taxa de retorno do capital e de crescimento maior do que o observado até o século XIX. Ou seja, cairá a diferença entre r e g. supere a do início do século XX, mesmo que ela continue crescendo. Assim, não há tendência de que a desigualdade - no séculoA XXI tendência será tão é concentrada que a herança quanto ganhe no mais século impor XIX. tância no futuro, o que não quer dizer que a distribuição - Róber Iturriet Avila e João Santos Conceição quezaNeste últimodo que século,outrora. a herança era um elemento central da sociedade; no XXI, a renda terá mais influência sobre a ri

Embora a habilidade e o conhecimento individuais tenham ganhado em importância ao longo do tempo para- çãoexplicar e na concentraçãoa riqueza, a herança de renda também e que o o sucesso tem. Piketty social expõe obti- doque através não há do naturalidade talento, do esforçoou espontaneidade e do estudo éna uma distribui ilusão. sobretudo após a Segunda Guerra Mundial (SGM), quan- Os mais ricos são os que receberam as maiores heranças, do a herança passou a aumentar de importância, e muitos 205 desses herdeiros não trabalham e vivem como rentistas. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA A Figura 11.10, no Capítulo 11, traz elementos

interessantes. Com dados da França, há a comparação da aorenda padrão obtida de pelovida 1%dos mais50% ricomais devido pobres. à suaDaqueles herança que com vi- o 1% mais rico devido ao seu trabalho, ambos comparados o dos 50% mais pobres, de forma relativamente estável, entrevem do 1790 seu trabalho,e sua projeção o padrão até 2030.de vida Já é no 10 que vezes se maiorrefere queaos

de vida era 27 vezes maior que o dos 50% mais pobres. Durantemais ricos vasto que período,vivem da portanto, sua herança, o 1% em mais 1790 rico seu o erapadrão por

- herança do capital. No século XIX, os herdeiros de fortunas tinham um padrão de vida três vezes superior ao dos tra- balhadores mais ricos. - A sociedade “meritocrática” não permite que figu aore noindivíduo topo quem um rendimentonão é herdeiro 10 vezesde uma superior fortuna. à Nomédia. mun E do contemporâneo, o conhecimento e a titulação permitem - tiça,àqueles da menor que estão virtude, na base da ausência da pirâmide de mérito social, e daa dominação baixa pro- dutividade.de outros segmentos As crenças é justificadameritocráticas a partir evocam de valores a valores de jus de - cia é utilizada para explicar os supersalários e o rentismo, emjustiça detrimento para justificar daqueles as disparidades que não estão de nessasrenda. Acamadas meritocra so- ciais. A crença de que a iniquidade advém de princípios ra- cionais e não arbitrários é difundida. Entretanto, o estudo da

imperativariqueza mostre a discussão que há mais da arbitrariedademesma em relação do que ao se mérito. pensa. O fato de a riqueza reproduzir-se sozinha torna ela pode se perpetuar além dos limites razoáveis e sem jus- Não importa o quão justificável seja a origem da riqueza,- tos casos, as arbitrariedades da acumulação de riqueza são

O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade tificativa racional em termos de utilidade social. Em mui 206 mais amplas do que as de heranças. 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS A parte IV do livro sugere a taxação sobre o capi- tal. Entre 1920 e 1980, o gasto social cresceu consideravel- - rias. Logo após, de 1980 a 2010, as taxas se estagnaram. A mente, e todos os países ricos tinham altas taxas tributá com o passar dos anos. figura 13.1 da publicação mostra as variações das alíquotas para o estado social: o acesso igualitário à educação, em especial Pikettya educação concentra-se superior, eme o futuro dois problemas dos sistemas atuais de - co e populacional. Para solucionar essas questões, ele faz umapensão proposta: em um impostomundo com sobre baixos o capital. crescimentos econômi considera que elas devem ser baixas e anuais, e não aplicá- No que se refere às taxas sobre riqueza, Piketty- vernos tomam, por exemplo, um quarto da riqueza do país, veis no momento do recebimento da herança, pois se os go não haverá quase nada remanescente nos anos futuros. A sugestão do autor é: 0% para fortunas de até € 1 milhão; atingidos1% ao ano sobre para esses fortunas impostos de € 1 2,5% a € 5de milhões; pessoas, e e 2% se arrepara- fortunas acima de € 5 milhões. Na Europa de hoje, seriam

cadaria 2% do atual PIB europeu (hoje de € 15 trilhões), o Róber Iturriet Avila e João Santos Conceição éque majoritária, resultaria ementre € 300os economistas, bilhões em arrecadação. a concepção teórica de que aO desigualdade sucesso que o é livro uma obteve consequência chama atenção das diferentes porque de que a educação formal e o mérito permitem a ascensão individualaptidões e e conhecimentos a convergência dosdistributiva indivíduos,7 como também

7 Do ponto de vista teórico, um estudo tão abrangente não é efetuado desde Kuznets. No entanto, seus dados são preciosos,. Na mesma mas, no livro, linha, não

há o devido rigor científico e metodológico em suas demonstrações. O- do,autor a linguagem,disponibiliza-os alguns em exemplos páginas eeletrônicas, os dados do mas livro essa não característica têm o rigor adequado,afasta o trabalho transpassando do método que, acadêmico em certa medida, e científico. o autor No “extrapolamesmo senti nas tintas”. Mesmo com dados amplos, sua teoria ainda precisa de valida- 207 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA a lei de oferta e demanda e a mobilidade de capital e de

- mentariatrabalho levariam a poupança, à maior que igualdade. seria transformada Além disso, em com capital: mais ouconhecimento seja, na contemporaneidade, difundido, a participação a informação do trabalhoé uma força au de convergência de renda. Para o autor, contudo, essa visão é ilusória, pois seu estudo sinaliza que as forças de divergência são mais fortes do que as de convergência e que as últimas são mais

lado,fracas os do salários que se imagina. mais elevados Além disso, afastam-se há pouca dos evidência demais em de largaaumento medida. da participação O crescimento do trabalho ocorre com no produto. maior produtivi De outro- dade e educação, mas o incremento dessas variáveis não é de 4% no longo prazo, salvo em situações de catching up. Logo, r e g tendem à disparidade. Em assim sendo, a tendência é os empresários se - - nalidadetornarem com rentistas o estoque e mais inicial dominantes de capital. sobre Some-se os trabalha a isso dores, e o tamanho dessa divergência guarda proporcio vida superior aos assalariados mais ricos em quase todo o fato de que os herdeiros de capital têm um padrão de- mento normal do capitalismo gera arbitrariedades e desi- gualdadeso período, desdeque distorcem o final do os século valores XVIII. de Assim,meritocracia o funciona e da democracia.

- duziu a Ainiquidade história da foi distribuição entre 1910 de eriqueza 1950, temcom sido guerras, mais crisespolítica e dopolíticas que econômica. sociais adotadas O período8. O crescimentoem que o mundo da desi re-

taisção. disparidades.O uso de dados fiscais é interessante, por ser mais dificultada a 8 omissãoA principal do quecrítica nas que contas se pode nacionais, desferir mas, ao livroainda é assim, a relação há queentre pontuar políti-

O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade - ca e economia na visão de Piketty. Ele observa que mudanças políticas corrigiram distorções distributivas208 no século XX e permitiram melho 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS gualdade após os anos 80 também possui razões políticas, - asobretudo elevação comda desigualdade relação a impostos e a projeção e finanças, de que sob continue influên cia e poder dos atores beneficiados. O que é mais grave é- ção da riqueza individual. crescendo,Se inclusivea intenção com é equilibrar maior papel as daforças herança divergentes na defini e suabuscar proposição mais meritocracia para uma esociedade maior democracia, mais justa há em que ter se- moselaborar sociais, um dentro imposto dos global marcos sobre institucionais o capital. Pikettycapitalistas. tem Embora faça projeções, ele explicita que isso depende da política e das decisões da sociedade9.

parece subestimá-lo. As mudanças ocorridas no século XX não ocor- rias sociais. Embora o autor trate do poder econômico na política, ele guerra e da ameaça comunista estabelecida pela ordem internacional. Nasreram décadas por boa de vontade, 1930 a 1970,e sim osporque movimentos havia um de contexto esquerda de cresceram crise, de

os países com ideias socialistas estavam perdendo poder. Diante de pelo mundo, o que se tornou uma ameaça. No final da década de 1970,- ça na política e na economia, o neoliberalismo, que fez aumentar as desigualdades.uma nova crise econômica ocorrida na década de 1970, houve mudan

certa medida, refém do processo de dominação do capital. Há neces- 9 sidade Piketty de evoca que oa envolvimentopolítica altere político. o rumo Mas concentrador a política é a coautora que o mundo e, em Róber Iturriet Avila e João Santos Conceição

automática do capital. Assim, a mudança política só ocorre quando o caminha, mas é ingenuidade imaginar que isso ocorrerá com a adesão

capital é obrigado a ceder. Há dominação da esfera econômica sobre dea política. capitais, Uma por exemplo, configuração que maisestá dentro social exigedo liberalismo profundas que alterações o autor compactua,políticas e econômicas é uma patente que maneira não são de de doutrinar fácil consecução. os governos A mobilidade de acordo

com os interesses do capital, além de aumentar o poder de influência- sezpolítica de crédito do capital. e, possivelmente, Caso o país não redução se enquadre do investimento, na política que econômica, levará a umahá fuga crise de capitais,e ao desemprego. desvalorização E mesmo cambial, o liberalismo elevação dacomercial inflação, permi escas-

menores salários. Países com sistemas de proteção social elevado têm te ganhos de competitividade aos países com menos direitos sociais e direitos. Desse modo, a convivência de estado social com liberalismo muita dificuldade de competir via livre comércio com países sem esses 209 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

indicadores de renda e de riqueza do Brasil à luz de seu estudo. FeitaNesse a sentido,resenha ado seção livro doseguinte Piketty, averiguará cabe olhar tais os distribuições.

Distribuição de renda e de riqueza no Brasil

A iniquidade na distribuição pessoal da renda é mensurada de distintas maneiras, levando-se em conta - ção de renda são difundidos a partir da Pesquisa Nacional pormais Amostra de um parâmetro.de Domicílios No (PNAD), Brasil, osefetuada dados pelo de distribui Instituto - tudo, serão analisados os indicadores após a implantação doBrasileiro Plano Real, de Geografia de modo e Estatísticaa desconsiderar (IBGE). variações No presente abrup es- tas na participação de rendimentos que eventualmente ocorrem em alterações monetárias. Assim, são observados os dados desde 1995. Além da análise da renda, esta se- ção averiguará a apropriação da riqueza a partir de recen- tes informações disponibilizadas pela Receita Federal do

aBrasil, variação especificamente da apropriação referente de renda ao ano pelas de faixas2012. 10% su- A partir de dados da PNAD, o Gráfico 1 expressa

maisperiores. baixos Logo e os abaixo,50% mais o Gráficobaixos10 2, para apresenta o mesmo a variaçãoperíodo, deda 1995apropriação a 2013 11dos. segmentos que figuram entre os 40%

- tar social; caso contrário, o liberalismo implode o sistema. 10 comercialUsualmente exige na queliteratura, todos os são países considerados tenham o osmesmo 10% nívelmais deelevados bem-es e os 40% mais baixos. Contudo, ao longo deste artigo será estimada a distribuição da riqueza para os 50% mais pobres, a partir da referência

11 O crescimento da participação dos menores decis se deu pela: i) maior Piketty (2014). Desse modo, estão expostas ambas as segmentações. -

O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade riação real positiva do salário mínimo; e iii) pelas políticas de trans- demanda por mão de obra, oriunda do crescimento econômico; ii) va 210 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

10% superiores no Brasil (1995-2013) Gráfico 1 – Apropriação de renda pelas faixas

FONTE: Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (PNAD/IBGE). Elaborado pelos autores. NOTA: Para os anos de 2000 e 2010 foi efetuada interpolação linear.

e 50% inferiores no Brasil (1995-2013) Gráfico 2 – Apropriação de renda pelas faixas 40% Róber Iturriet Avila e João Santos Conceição

FONTE: Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (PNAD/IBGE). Elaborado pelos autores. NOTA: Para os anos de 2000 e 2010 foi efetuada interpolação linear.

questões, mas cabe destacar que Dedecca et al (2008) expõem que a ferênciavariação dedo renda.salário Nãomínimo está tem no escopoimpacto do forte trabalho no terceiro aprofundar e quarto essas de-

intervalos decíclicos. cis. Já o Programa Bolsa Família exerce influência nos dois primeiros 211 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA - priação de renda daqueles que estão na faixa dos 10% mais elevadosConforme passou de apresentam 47,9% em 1995, os Gráficos para 41,6% 1 e 2,em a 2013. apro Já aqueles que estão nas faixas 50% mais baixas passaram - te os 10% mais elevados e os 50% mais baixos na mesma escala,de 12,4% no paraintuito 16,4%. de deixar O Gráfico mais 3 nítida apresenta a variação conjuntamen ao longo da série.

e 10% superiores no Brasil (1995-2013) Gráfico 3 – Apropriação de renda pelas faixas 50% inferiores

FONTE: Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (PNAD/IBGE). Elaborado pelos autores. NOTA: Para os anos de 2000 e 2010 foi efetuada interpolação linear. - buição de riqueza12. Houve apenas uma estimativa reali- zada emO 2004, Brasil no não Atlas dispunha da Exclusão de informações Social (POCHMANN; de distri

Federal Fábio Avila Castro defendeu sua dissertação de mestradoAMORIM, utilizando 2003). Entretanto, os dados oda auditor Receita, fiscal até daentão Receita bas- tante restritos (CASTRO, 2014). Esses dados foram divul- gados no site da instituição e a partir deles é possível es- tabelecer um quadro da repartição da riqueza no Brasil. A

12 como “riqueza” os valores monetários declarados como bens e direitos

O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade para Não háa Receita um único Federal indicador do Brasil. de riqueza. Estão sendo considerados aqui 212 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Tabela 1 foi divulgada no site da Receita Federal do Brasil, com dados das declarações de imposto de renda de 201213 (BRASIL, 2014b). Tabela 1 – Declaração de bens e direitos na declaração

Faixa de Valores (R$de pessoa física no Brasil (2012)Valores de Bens e Direitos 1.000,00) Declarações (mil) Quantidade de Até 1 9.611 (R$ milhões)224 1 a 5 968 3.118 5 a 15 1.493 15.117 15 a 30 1.769 40.233 30 a 50 1.725 68.608 50 a 75 1.489 92.454 75 a 100 1.202 105.068 100 a 150 1.701 210.287 150 a 300 2.554 544.867 300 a 500 1.336 514.835 500 a 750 705 428.782 750 a 1.000 356 308.111 1.000 a 1.500 303 367.673 Acima 1.500 406 2.361.876 Total 25.618 5.061.250

FONTE: Brasil (2014). Elaborado pelos autores. Róber Iturriet Avila e João Santos Conceição Há limitação nas conclusões a partir dos dados da Tabela 1, uma vez que, em muitos casos, os bens imóveis declarados possuem defasagem de avaliação14. Além disso,

13 O autor disponibilizou os dados de 2006, 2009 e 2012. Neste artigo serão apresentados apenas os dados de 2012. Uma análise mais ampla seria adequada, para tanto, seriam necessários mais dados da Receita Federal do Brasil. 14 Os bens e direitos declarados são apartamento (14%), casa (12%),

poupançaquotas ou quinhões(4%), fundos de capital de longo (9%), prazo veículo e fundo automotor de investimento terrestre em (8%), di- reitosaplicação creditórios de renda fixa (7%), terreno (5%), ações (5%), caderneta de nacional (3%), crédito decorrente de empréstimo (3%), outras apli- (4%), terra nua (4%), dinheiro em espécie em moeda 213 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

uma parcela do patrimônio está contabilizada em pessoas jurídicas. Há que considerar também omissões. Por fim, inédito.cônjuges nem sempre declaram bens em separado. De todo modo, esseApós é oessas melhor ressalvas, dado de foi patrimônio efetuado umdo Brasilexercício e é para compreender esses números no universo da popula- - ram imposto de renda no País. Esse contingente represen- tavação brasileira. 13% da população Em 2012, total. 25,6 Comomilhões as deposses pessoas dos declaranão de- - ses para tentar generalizar os dados para toda a população. clarantesEm persistem termos indisponíveis,internacionais, foram os 50% efetuadas mais hipótepobres obtêm aproximadamente 4% da riqueza em países menos desiguais, como a França, por exemplo. Já os 10% dos fran- ceses mais ricos possuíam 62% da riqueza em 2011, de

mais pobres detêm 2% da riqueza, enquanto os 10% mais ricosacordo possuem com Piketty 72%. (2014). Nos Estados Unidos, os 50%

brasileira, foi assumido que os 50% mais pobres possuem Frente ao histórico da formação socioeconômica aqueles que estão entre o quarto e o quinto decis rece- beram,2% do em patrimônio média, R$ dos 761,00, brasileiros. em 2012. Isso Já ponderando aqueles entre que o quinto e o sexto decis receberam, em média, R$ 928,00.

que declaram imposto de renda, 4,9% somam um patri- Daqueles que figuram entre os 13% da população

estámônio concentrado de 0,004% com do total8,1% notificado, da população. conforme os dados da TabelaSabe-se 1. Em assimtambém sendo, que todo quem o patrimônio recebeu mais declarado de R$

(2%), fundo de curto prazo (2%), prédio residencial (1%), prédio comercialcações e investimentos (1%), depósito (2%), bancário Vida Geradorem contra de correnteBenefício no Livre país – (1%),VGBL construção (1%), sala ou conjunto (1%), outras participações societá- rias (1%), fundos de ações (1%), outros fundos (1%) e outros bens e

O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade direitos (7%) (BRASIL, 2015d). 214 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS 1.499,16 mensais declarou imposto de renda, e que aque- entre os 50% com menores rendimentos15. É ainda neces- les que receberam em média R$ 761,00 mensais figuravam declararamsário ter uma imposto estimativa de renda. do patrimônio Sabe-se, daquelesainda, que que aqueles estão entre os 50% da base da pirâmide de renda e os 13% que- gados a declarar. Deduz-se, adicionalmente, que aqueles que possuemnão declararam patrimônio possuem acima riquezas de R$ 300.000,00 menores do são que obri os estratos superiores. - - Face à dificuldade de estimar tais dados, foi assu patrimoniaismida a hipótese dos de declarantes que os não declarantes(até R$ 30.000,00). possuem Mesmoum pa trimônio equivalente à média das quatro primeiras faixas- mento, tal suposição encontra fundamento no patamar de correndo o risco de superestimar o patrimônio desse seg depatrimônio 2012 é o das seguinte faixas16 inferiores: os 50% maisde declarantes. pobres detêm 2% da riqueza; Diante37% dos dessas brasileiros considerações detêm e10,6% hipóteses, da riqueza; o quadro e 13% possuem 87,4% da riqueza.

10%, 1% e 0,1% mais ricos, é preciso efetuar adaptações, já que osPara informes se chegar da Receita às comparações Federal do internacionais Brasil estão agre dos- Róber Iturriet Avila e João Santos Conceição 15 É preciso ressalvar que os dados de rendimento mensal por decis são extraídos da PNAD. Essa pesquisa considera a população que tem mais de 15 anos. 16 Ao contrário da PNAD, os dados expostos fazem referência à participa- ção dos respectivos segmentos da sociedade na riqueza, levando-se em conta toda a população. Ao se efetuar o mesmo exercício, considera-

do apenas os indivíduos acima de 15 anos, há uma pequena alteração. entreNesse R$caso, 1.000,00 os 89,61% e R$ da 100.000,00, população perfazendoacima de 15 5,61% anos detinham,da população em 2012, 9,53% da riqueza. A faixa daqueles que declararam patrimônio

acima de 15 anos, detinha 5,8% da riqueza. Já aqueles que declararam possuir patrimônio acima de R$ 100.000,00 e abaixo de R$ 500.000,00, da3,63% riqueza. da população acima de 15 anos, detinham 22,70% da riqueza. Por fim, aqueles que estão entre os 1,15% mais ricos possuíam 61,97% 215 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA gados. Uma das referências quantitativas importantes na literatura é a participação dos 0,01% mais ricos. Esse corte -

maisanalítico ricos não do é País. possível Com de a base ser realizado, existente, embora é possível seu apontar conhe acimento participação desnudasse dos 8,1%, o patrimônio 0,9% e 0,2% dos mais 19.500 ricos: indivíduos 8,1% das pessoas possuem 87,4% da riqueza; 0,9% detêm 59,9% do total; e 0,2% detêm 40,8% da riqueza dos brasileiros. Em 2012, 0,2% da população representou 406.064

médio daqueles que estão entre os 0,2% brasileiros mais indivíduos. É interessante observar que o patrimônio

ricos era de R$ 5,8 milhões, mesmo que o corte esteja a Alémpartir disso, de R$ as 1,5 faixas milhão. mais Isso altas indica possuem, que a sobretudo,concentração renda do patrimônio está entre os indivíduos do topo mais restrito.

do capital, enquanto as outras se concentram no trabalho. Essa configuração distributiva é retratada no Gráfico 4.

de riqueza no Brasil (2012)Gráfico 4 – Distribuição

FONTE: Brasil (2014). Elaborado pelos autores.

NOTA: A Receita Federal do Brasil disponibiliza os dados dos decla- - clarantes como sendo equivalente à média das quatro primeiras faixas rantes. O gráfico acima foi realizado estimando a riqueza dos não de-

O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade gregados constam na Tabela 1. dos declarantes (patrimônio até R$ 30.000,00). Os dados mais desa 216 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS - tões de correção de concentração de renda e de riqueza através daPosto tributação o trabalho e do de Estado Thomas social, Piketty convém e suas estudar suges como é a estrutura tributária do Brasil, à luz da concentra- ção existente, efetuando-se uma comparação com outros países. Esse é o tema da seção seguinte.

Estrutura tributária brasileira em perspectiva internacional

Os dados que a Receita Federal do Brasil disponi- para o debate sobre a estruturação tributária. No intuito de compreenderbilizou favorecem a relação o conhecimento que os impostos do País possuem e dão subsídios sobre a são os principais tributos, assim como a sua incidência. distribuição da renda e da riqueza, convém detalhar quais- tos brasileiros e efetua uma comparação com alguns países selecionadosNesse intento, com essa nível seção de aborda renda pera configuração capita mais dosaltas tribu17 do que o Brasil e países com nível de renda per capita seme- 18 tendo em vista que os dados disponibilizados pela Receita lhanteFederal maisa do Brasil.recentes O períodosão desse escolhido ano. foi o ano de 2012,

Para atender a esses objetivos, foram utiliza- Róber Iturriet Avila e João Santos Conceição das informações tributárias das publicações Revenue Statistics 2014 e Revenue Statistics in Latin America 2014 da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento 19, tendo colaboração na última da

17 EconômicoUnido e Suécia. (OCDE) 18 Argentina, Alemanha, México Chile, e Coreia Turquia. do Sul, Dinamarca, Estados Unidos, Reino 19 A OCDE compõe um grupo de 34 países mais industrializados, desen-

volvidos e alguns emergentes. O objetivo deles é efetuar intercâmbio de membros.informações, Dentre alinhamento os países deselecionados políticas para no artigo, aprimorar apenas o crescimento a Argentina eeconômico o Brasil não e colaborar integram noa Organização. desenvolvimento dos países membros e não 217 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

e do Centro Interamericano de Administrações Tributárias (CIAT).Comissão Além Econômica da análise para tributária, América Latinaserá averiguada e o Caribe (CEPAL) a renda per capita dos países selecionados a partir dos dados do Banco Mundial. As Tabelas 2 e 3 sintetizam principalmente essas informações. Tabela 2 – Participação percentual de cada base de incidência na receita tributária total e renda per capita para países selecionados (2012)

Renda Renda Bens e Demais Países e Salarial e Propriedade per capi- Serviços tributo Lucros SeguridadeFolha ta (US$) 30,4 38,3 2,4 28,4 0,4 43.932 Argentina 17,3 22,2 9,0 50,4 1,0 14.437 Alemanha Brasil 17,8 26,5 3,9 49,7 2,1 11.923 39,7 5,2 4,2 50,7 0,2 15.253 Coreia do Sul 29,9 25 10,6 31,2 3,4 24.454 Chile Dinamarca 61,9 2,5 3,8 31,4 0,3 57.636 Estados Unidos 47,9 22,3 11,8 17,9 0,0 51.457 México 26,3 16,5 1,5 54,5 1,2 9.721 Reino Unido 35,6 19,1 11,9 32,9 0,5 41.051 Suécia 34,3 33,9 2,4 29,1 0,4 57.134 Turquia 21,8 27,2 4,2 45,0 1,7 10.646 América Latina 26,4 17,7 3,3 51,3 1,4 7.938 OCDE 33,6 27,3 5,5 32,8 1,0 40.402

FONTE:Centro InteramericanoOrganização para de a CooperaçãoAdministrações e o Desenvolvimento Tributárias (CIAT), Econômico Banco (OCDE),Mundial Comissãoe Receita FederalEconômica do Brasil. para AméricaElaborado Latina pelos e autores. o Caribe (CEPAL), NOTA: A média para América Latina leva em conta os dados dos dezoito países com informações disponíveis. Em 2012, a receita tributária brasileira somou R$

- 1,6 trilhão. Conforme apresentado na Tabela 2, 49,7% dos- lárioimpostos e seguridade recolhidos social, nas três 17,8% esferas na renda, de governo 3,9% tiveramna proprie ori- dadegem noe 2,1% consumo em demais de bens impostos e serviços,20. O 26,5%montante na folhaarrecadado de sa

20 Para adequar os dados da Receita Federal do Brasil às incidências tribu- - O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade tárias da OCDE, foram incluídos os impostos sobre transações financei ras dentro dos demais tributos.218 No referido ano, tais tributos financeiros 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS 21. Os impostos sobre o consumo possuem a característica de ob- correspondeter a mesma alíquota a 35,9% para dos todosR$ 4,4 os trilhões segmentos produzidos sociais; des- sa forma, a oneração dos grupos médios e de baixa renda é superior, em termos relativos, frente aos estratos mais ele- vados22 - rios. Outra. Em característica linha semelhante, desse a tipo tributação de estruturação sobre o salário é que osonera preços mais dos os benstrabalhadores e serviços em são comparação majorados. aos empresá países, se observa que na Dinamarca e nos Estados Unidos, por exemplo,Quando metade é efetuada da arrecadação uma comparação está centrada com emoutros im- postos sobre a renda e lucros. Esse último país possui uma carga tributária menor do que a média dos países selecio- nados, 24,4%, conforme a Tabela 3. Entretanto, o Estado não oferta ensino superior gratuito e sistema universal de saúde pública, por exemplo. A tributação sobre seguridade - - çãosocial relativamente e folha de salário mais doidosa. Brasil é semelhante àquela veri ficada nosNo países que tange da OCDE, aos paísesos quais da possuem América uma Latina popula sele-

- cocionados país que no possuiartigo, umaque possuemincidência formação tributária sócio-histórica sobre renda Róber Iturriet Avila e João Santos Conceição esemelhante lucros acima à do da Brasil, média salta da região,aos olhos representando que o Chile é 39,7% o úni da arrecadação de 2012, conforme explicitado na Tabela no Brasil. Eles alcançaram 3,9% da carga tributária em 2. Os impostos sobre patrimônio também são mais baixos representaram 2% da arrecadação e 0,7% do PIB. 21 tributos e o PIB a preços de mercado, ambos considerados em termos nominais A carga tributária (BRASIL, bruta 2014a). é definida como a razão entre a arrecadação de 22 Impostos indiretos são regressivos, pois sua incidência não tem como referência a renda, apenas o consumo. Não diferencia, portanto, os di- ferentes níveis de poder aquisitivo. A maior participação deste tipo de tributo vai de encontro ao princípio de equidade. 219 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA 2012, ao passo que no Reino Unido e na Argentina foram de 11,9% e 9,0%, respectivamente. O Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), o Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) e o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) representam, respectiva- mente, 1,7%, 1,3%, 0,5% e 0,2%. Somados, atingiram R$ (BRASIL, 2014a). Convém desta- car que a cobrança do IPVA é para veículos terrestres, não incidindo60,6 bilhões, sobre 1,4% veículos do PIB aéreos e aquáticos. Deve-se recor- dar, ainda, que 46% dos bens e direitos declarados (Tabela 1) referem-se a bens móveis e imóveis. A participação do Imposto Territorial Rural (ITR)

pela Receita Federal desde 1995 até 2012 mostram que suatem colaboraçãoincidência insignificante. está na faixa Osde dados0,04% disponibilizados da arrecadação

às baixas alíquotas cobradas, as quais iniciam em 0,03%. Podemtotal (R$ ser 609,4 maiores, milhões) a depender e 0,01% dado áreaPIB. Taltotal fato do deve-se imóvel rural e seu respectivo grau de utilização (BRASIL, 2014a). Não passa despercebido que o Brasil é um país extenso, conformado por vastas áreas rurais. O incremento da ar- recadação deste imposto oportunizaria maior progressi- vidade tributária e justiça social, preconizada por teóri- cos desde o século XIX.

impostosQuando indiretos. se analisamDessa maneira, especificamente esses foram os tributospreferi- brasileiros, verifica-se uma maior representatividade dos sobre os bens e serviços é o Imposto sobre Operações re- lativasdos na à análise Circulação a seguir. de Mercadorias A cobrança e desobre maior Prestações relevância de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS). Em 2012, sua arrecadação foi de R$ 327,5 bilhões, representando 21,1% da receita tributária to-

O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade tal e 7,5% do PIB (BRASIL, 2014a). 220 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS A Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) responderam pelo aumento da participação dos tributos sobre os bens e serviços. Ambas as contribuições representavam 9,2%, em 1995, e passa- ram a 14% em 2012 (BRASIL, 2014a). O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e o Imposto sobre Serviços - te 5,6% do bolo tributário (BRASIL, 2014a). Esses cinco impostosde Qualquer indiretos Natureza selecionados (ISS) representam foram responsáveis conjuntamen por - presentando, aproximadamente, 85% da arrecadação com impostos40,7% da indiretosarrecadação e 14,5% total dedo 2012produto (R$ (BRASIL, 634,4 bilhões), 2014a). re Tabela 3 – Participação percentual de cada base de incidência no PIB e carga tributária bruta para países selecionados (2012)

Carga Renda e Bens e Demais Países Salarial e Propriedade tributária Lucros Serviços tributos SeguridadeFolha bruta 11,1 13,9 0,9 10,4 0,2 36,5 Argentina 6,5 8,3 3,3 18,8 0,4 37,3 AlemanhaBrasil 6,4 9,5 1,4 17,8 0,7 35,9 8,3 1,1 0,9 10,6 0,0 20,8 Coreia do 7,4 6,2 2,6 7,7 0,8 24,8 SulChile Dinamarca 29,2 1,2 1,8 14,8 0,2 47,2 Estados

11,7 5,4 2,9 4,4 0,0 24,4 Róber Iturriet Avila e João Santos Conceição Unidos México 5,2 3,2 0,3 10,7 0,2 19,6 Reino 11,8 6,3 3,9 10,9 0,0 33,0 Unido Suécia 14,5 14,4 1,0 12,3 0,1 42,3 Turquia 6,0 7,5 1,2 12,4 0,5 27,6 América 5,2 4,1 0,8 10,4 0,3 20,8 Latina OCDE 11,4 9,4 1,8 10,8 0,3 33,7 FONTE: Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento

Caribe (CEPAL), Centro Interamericano de Administrações Tributárias Econômico(CIAT) e Receita (OCDE), Federal Comissão do Brasil. Econômica Elaborado para pelos América autores. Latina e o NOTA: A média para América Latina leva em conta os dados dos dezoi- to países com informações disponíveis. 221 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

de rendasTendo no Brasil em perspectiva em comparação as considerações aos países selecionade Piketty- (2014), é producente observar a tributação sobre o fluxo

acumulaçãodos. Em linha de semelhante, riqueza por cabe gerações detalhar passadas as alíquotas exerce sobre so- breas heranças as gerações e doações presentes. recebidas, visto a influência que a Tabela 4 – Estrutura do Imposto de Renda Pessoa Física para países selecionados (2012)

Alíquotas Número IRPF/CT IRPF/PIB Marginais Países de (%) (%) (%) Alíquotas Mínima Máxima

24,8 9,1 42 45 2 Argentina 6,7 2,5 9 35 7 Alemanha Brasil 7,6 2,7 7,5 27,5 4

7 1,4 4 40 7

ChileCoreia do Sul 14,8 3,8 6 38 5 Dinamarca 50,7 24,2 6,8 21,8 2

Estados Unidos 37,1 8,9 10 39,6 7

México 13,6 2,6 1,9 30 8

Reino Unido 28,2 10,1 20 45 3

Suécia 27,7 12,2 20 25 2

Turquia 13,5 3,8 15 35 4

América Latina 6,4 1,3 10,6 27,4 4,3

OCDE 24,1 8,5 15,1 35,3 4,5 FONTE: Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento

Caribe (CEPAL), Centro Interamericano de Administrações Tributárias Econômico(CIAT) e Receita (OCDE), Federal Comissão do Brasil. Econômica Elaborado para pelos América autores. Latina e o NOTA 1: As fontes consideram alíquotas do governo central, mas em

NOTA 2: A média para América Latina leva em conta os dados dos de-

O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade zoitoalguns países países com há tributaçãoinformações de disponíveis. IRPF por órgãos subnacionais. 222 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Os dados da Tabela 4 mostram que, enquanto a ar- recadação de IRPF representa 2,7% do produto brasileiro (7,6% da arrecadação)23, nos países que integram a OCDE esse valor corresponde a 8,5%, em média (24,1% da arre- cadação). Mesmo ao se comparar com países com níveis de - rior. Na Turquia, por exemplo, é 13,5% e no México 13,6%. Arenda maior semelhante, participação observa-se percentual que dono Brasilimposto a relação de renda é infe no PIB e na carga tributária dentre os países selecionados é a Dinamarca, com 24,2% e 50,7%, respectivamente. a mínima quanto a máxima estão entre as mais baixas da Tabela 4.Quanto Desde às1998, alíquotas a alíquota marginais máxima, brasileiras, no Brasil, tantoé de 27,5%24 no México é de 30%. .Além Já na Alemanhade alíquotas é de relativamente45%, na Turquia menores, é de 35% no e Brasil, é possível deduzir do imposto de renda as contri- buições à previdência, despesas médicas, dispêndio com dependentes e pensão alimentícia, entre outros. Em 2012, - dação e 6,1% do produto. Averiguando-se os valores de- as deduções foram de R$ 269,6 bilhões, 17,1% da arreca médicas, despesas com dependentes e despesas com ins- clarados, as deduções mais significativas foram despesas Róber Iturriet Avila e João Santos Conceição 25 (BRASIL, 2015d). trução, respectivamente, R$ 45,9 bilhões, R$ 29 bilhões e 23 O montante de tributo advindo de impostos de renda sobre a pessoa R$ 18jurídica bilhões representou 6,6% da arrecadação total e 2,4% do PIB. Nesse sentido, os rendimentos do capital são menos taxados do que os rendi-

24 - masmentos fases. do Atrabalho primeira (BRASIL, fase em 2014a). 1962 com 14 alíquotas progressivas que iniciavamSintetizando em o3% histórico e atingiam do imposto até 65% de dos renda, rendimentos. é possível A aventar partir destealgu período, a alíquota máxima oscilou entre 60% a 45% dos rendimentos até 1988. Outra fase de redução das quantidades das faixas tributadas e das alíquotas máximas, entre 1989 e 1993, com alíquota mínima de 10% e máxima de 25% dos rendimentos e, desde então, somente em 2010

25 houve mudanças nas faixas de rendas tributadas (NÓBREGA, 2014). Os mais ricos declaram deduções na ordem de R$ 101,2 milhões com dependentes, R$ 83,2 milhões223 com instrução e R$ 786,5 milhões em ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Os rendimentos isentos e não tributáveis soma- - 26 des- saram categoria R$ 566,4 provém bilhões dos em 2012lucros (36,1% e dividendos da arrecadação distribuídos tri aobutária declarante e 13,3% e/ou do dependentesPIB). O valor27 mais. Cumpre significativo frisar que no ano de 1995 a Lei nº 9.249 isentou a tributação sobre os dividendos, ampliando a regressividade dos impostos no Brasil28 -

. Desde então, houve expressiva migração de pro sobfissionais o regime liberais do lucro para presumido inscrição como as alíquotas pessoa acabamjurídica sencom- o objetivo de reduzir a contribuição ao fisco, uma vez que despesas médicas. No total, os abatimentos representaram uma média de R$ 13,2 mil por indivíduos (BRASIL, 2014d). 26 Ainda compõem essa categoria as transferências patrimoniais como

herança e/ou doação (R$ 48 bilhões), renda de sócio e/ou titular de- lamicroempresa isenta de proventos ou empresa de aposentadoria pequeno porte para (R$ declarante 47 bilhões), com lucro65 anos na alienação de bens e direitos de pequeno valor (R$ 38,9 bilhões), parce - ou mais (37,1 bilhões), parcela isenta correspondente à atividade rural reforma(R$ 32,8 oubilhões), pensão renda recebidos da caderneta por portador de poupança de doença e graveletras (R$hipotecá 31 bi- rias (R$ 17,2 bilhões), rendimentos provenientes de aposentadoria, - lhões), indenizações por rescisão de contrato de trabalho e Fundo de transferênciasGarantia por Tempo patrimoniais de Serviço e meação – FGTS e (R$dissolução 19,3 bilhões), da sociedade incorpora con- ção de reservas ao capital e/ou bonificações em ações (R$ 15 bilhões),-

jugal e da unidade familiar (R$ 6,6 bilhões), capital das apólices de se guro ou pecúlio pago por morte (R$ 3,1 bilhões), outros rendimentos isentos e não tributáveis dos dependentes (R$ 2,8 bilhões), bolsas de 27 estudo e pesquisa (R$ 1,8 bilhões) e demais rendimentos isentos e não rendimentostributáveis (R$ isentos, 57,3 bilhões) 13,1% na (BRASIL, receita 2015d).tributária total e de 4,7% do PIB (BRASIL, O total foi 2014d). de R$ 208,5 bilhões, o que representa 37,7% do total dos 28 - ca o modelo de isenção sobre os dividendos. Ao averiguar as alíquo- tas Dentre máximas o grupo dos de países países selecionados que integram sobre a OCDE, os dividendos, apenas a Estônia observa-se apli

nosque Estadosa regressividade Unidos, 21,2%; tributária no Reinopersiste. Unido, Na Alemanha,36,1%; na Suécia,a alíquota 30%; é de e, na26,4%; Turquia, no Chile, 17,5%. 25%; O México na Coreia passou do a Sul,tributar 35,4%; em na17,1% Dinamarca, os dividendos 42%;

O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade em 2014 (OCDE, 2015). 224 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS do inferiores29. A isenção de impostos sobre dividendos se

30 (CASTRO, 2014). justificaria para evitar a bitributação, entretanto na maior- parte dos países há bitributação gastos dosDiante segmentos do exposto, sociais é possível que possuem aventar maior que acapaci confi- dadeguração contributiva do imposto31. de renda para pessoa física subsidia os

29 Considerando apenas as declarações de 1.991,2 mil recebedores de

Neste caso, esse segmento deteve 59,1% dos rendimentos isentos e não tributáveislucros e dividendos, totais. Já osos rendimentos52.711 recebedores isentos chegamde lucros a R$mais 334,7 ricos bilhões. decla-

rendimentos isentos e não tributáveis totais). Essa monta representou ram, em 2012, R$ 150,9 bilhões de rendimentos isentos (26,6% dos - uma isenção de 66,5% das suas rendas totais (R$ 226,8 bilhões). Esses indivíduos declararam um patrimônio total de R$ 1 trilhão. Dessa ma 30 neira,A mesma a renda Lei também média individual isentou a remessaanual é dede R$lucros 4,3 emilhões dividendos e a médiaao ex- patrimonial é de R$ 19,3 milhões por pessoa (BRASIL, 2015d).

eramterior. tributadas Em 2012, emforam 15%. enviados Caso fossem ao exterior tributados US$ 28,6com bilhõesa mesma (R$ alíquo 71,7- bilhões) na forma de lucros e dividendos. Até 1995, essas remessas

ta, somente em 2012 possibilitaria uma arrecadação de R$ 8,8 bilhões.- dadeDesde de 1996 as empresas até 2012 deduzirem se deixou dasde arrecadar receitas tributáveis cerca de R$ os 80,5“juros bilhões sobre o(SINDIFISCO capital próprio”. NACIONAL; O juro ANFIP,do capital 2014). próprio Adicionalmente, é tributável há ao a acionista,possibili

mas com uma alíquota menor do que a máxima que os trabalhadores Róber Iturriet Avila e João Santos Conceição pagam. Em linha semelhante, os rendimentos de aplicações financeiras 31 em renda fixa e variável possuem tributação menor do que a alíquota destacarmáxima do brevemente rendimento as do despesas trabalho. tributárias. A carga tributária bra- sileira Embora no aano ênfase de 2012 da seçãofoi de tenha35,9%. sido O Produto nas receitas Interno tributárias, Bruto (PIB) cabe do

2015b).mesmo ano Nessa foi medida,de R$ 4,4 a médiatrilhões. de Repartindo impostos pagos essa montapor brasileiro pelo número foi de R$de habitantes,666,75 por chega-semês naquele à renda ano. perDo percentualcapita de R$ da 22.349,98 carga tributária (BRASIL, do Brasil, em 2012, 3,8 pontos percentuais foram destinados para a saúde (BRASIL, 2015b) e 6 pontos percentuais para a educação (INEP, 2015). A previdência é centralizada no Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), porém existem também organismos estaduais e municipais. Considerando apenas o INSS, o gasto em percentual do PIB é de 7,7% (BRASIL, 2015c). A soma dessas três rubricas perfaz 17,5% do PIB, o que representa 49% da arrecadação. Os juros nominais despendidos 225 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA A tabela a seguir contem as alíquotas de imposto - formações, são consideradas apenas alíquotas médias. sobre herança e doação. Frente à restrição de maiores in

(2014) Tabela 5 – Impostos sobre herança e doação para países selecionados Imposto sobre Herança Imposto sobre Doação Países Alíquotas Marginais (%) Alíquotas Marginais (%) Média Máxima Média Máxima 28,5 50 28,5 50 Brasil 3,8 8 3,2 8 Alemanha 13 25 18,2 35 Estados Unidos 29 40 29 40 Chile França 32,5 60 25 45 Itália 6 8 6 8 Índia - - 15 30 Japão 30 50 30 50 Luxemburgo 24 48 8,1 14,4 Reino Unido 40 40 30 40 Suíça 25 50 25 50

FONTE: Ernst & Young (2015). Elaborado pelos autores. NOTA: A fonte não especifica, mas pode haver alíquotas do governo cen- tral e/ou dos órgãos subnacionais. Ao efetuar comparações das alíquotas do imposto

- preendersobre herança a exacerbada e doação, concentração observa-se que da riquezao desalinhamento brasileira. Apersiste alíquota sob no o Reino aspecto Unido de justiçaé de 40%. fiscal Em e éoutros possível países com32,

pelo setor público, em 2012, foram de 4,9% do PIB, valor superior ao que é gasto em saúde nas três esferas da administração pública. 32 Suécia, por exemplo, é contrabalançada nos impostos de renda e sobre A ausência de tributação sobre herança e doação na Dinamarca e-

O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade o patrimônio. Dessa maneira, existe um alto pagamento de impostos di retos em vida, e, assim, os herdeiros ou beneficiários de doações ficam isentos na hora de transferir o226 patrimônio. 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS ela é variável: nos Estados Unidos, a média é de 29%33; no com cada estado. A alíquota média é 3,9%, porém, elas va- riamChile, entre 13%. 1%No Brasile 8%, acom cobrança faixas dedíspares ITCMD de varia acordo de acordo com o volume patrimonial. Isso tudo posto, é possível considerar que os im- contapostos a sobre tendência renda concentradora e patrimônio no existente, Brasil são apontada mais baixos por do que a média dos demais países verificados. Ao se ter em- - Piketty (2014), é possível aventar que a ampliação de im- postos sobre patrimônio, heranças e dividendos, por exem peloplo, contribuiriam lado da despesa, para constatou-se a justiça fiscal, que mitigando quase a metade a concen dos recursostração de é renda destinada e de àriqueza saúde, existenteà educação no eBrasil. à previdência Por fim, pública.

Considerações finais

dados desdeA repercussão 1700, com uma atingida formulação pelo teórica livro de para Thomas tratar dePiketty um tema não foi candente fortuita. como Ele une a distribuição. uma extensa O compilação centro de seu de Róber Iturriet Avila e João Santos Conceição r) e a taxa de crescimento (g). Se r>g, trabalho está na relação entre o retorno do capital ( - ritária, entre os economistas, a concepçãohá concentração. teórica de que a desigualdadeO sucesso é uma do consequência livro chama atençãodas diferentes porque aptidões é majo o mérito permitem a ascensão individual e a convergência e conhecimentos dos indivíduos. E que a educação formal e- distributiva. Na mesma linha, a lei de oferta e de deman 33 Freitas (2015) estimou que se a alíquota média de ITCMD brasileira se da, a mobilidade de capital e de trabalho levariam à maior

igualasse à dos EUA, a arrecadação adicional seria de R$ 31,9 bilhões anuais, passando de R$ 4,7 bilhões227 para R$ 36,6 bilhões. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

- riaigualdade. transformada Além disso, em capital. com mais Ou seja, conhecimento na contemporaneida difundido,- de,a participação a informação do é trabalho uma força aumentaria de convergência a poupança, de renda. que se Contudo, essa visão é ilusória para o autor, seu estudo sinaliza que as forças de divergência são mais for- tes do que de convergência e as últimas são mais fracas do -

osque salários se imagina. mais Além elevados disso, se há afastam pouca dosevidência demais de em aumen larga medida.to da participação O crescimento do trabalho ocorre comno produto. maior produtividade De outro lado, e educação, mas o incremento dessas variáveis não é de 4% no longo prazo, salvo em situações de catching up. Logo, r e g tendem à disparidade. Além de trazer as principais ideias do livro de

desde 1995 no que tange à distribuição de renda. Foi veri- Piketty, este artigo observou o que tem ocorrido no Brasil de declarações de imposto de renda da Receita Federal do ficada também a distribuição da riqueza a partir de dados de renda, embora ela seja ainda elevada. Adicionalmente, o estudoBrasil. Constatou-seexplicitou a magnitude que houve da redução regressividade da concentração tributária no Brasil sobre renda e riqueza em comparação a países

éselecionados. possível ser aventadoTal configuração que a ampliação penaliza asde camadas impostos menos sobre abastadas da sociedade. Ante o trabalho de Thomas Piketty,

patrimônio, heranças e dividendos contribuiriam para a ejustiça que estão fiscal em e a aberto melhoria para distributiva futuras pesquisas. no Brasil. O trabalho de Piketty inspira muitos outros estudos relativos ao Brasil O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade 228 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal do Brasil. Centro de estudos tributários e aduaneiros.

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em: . Acesso em: 17 de set. O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade brasileira O capital no século XXI e sua aplicabilidade à realidade 232 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS O DESAFIO DA INCLUSÃO PRODUTIVA DE FAMÍLIAS POBRES EM CONTEXTO DE DESIGUALDADE SOCIOECONÔMICA E POLÍTICAS PÚBLICAS FRAGMENTADAS

Adriane Vieira Ferrarini1

Estelamaris de Barros Dihl2 Adriane Vieira Ferrarini, Estelamaris de Barros Dihl, Jéssica Caroline Wallauer e Gustavo Oliveira Jéssica Caroline Wallauer3 Gustavo Oliveira4

RESUMO: A globalização capitalista tem legado avanços

- tecnocientíficos,sistentes no Brasil. mas Desde também a Constituição o vertiginoso Federal aumento de 1988, das desigualdadesa assistência social e da pobrezapassou a - serfenômenos um direito históricos de cidadania e per

Bolsa-família seu principal programa. A inclusão produti- vae enseja é um dos políticas seus eixos com finalidadedesta política, emancipatória, o qual visa sendoà auto o- -

Estenomia texto econômica tem o objetivo de famílias de analisar assistidas os principais através da avanços quali ficação profissional e do ingresso no mundo do trabalho. economia.e limites das A açõespesquisa de inclusãoempírica produtiva foi realizada de beneficiárias no municí- do Bolsa-família frente aos impactos da financeirização da 1 Doutora em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFGRS). Professora do Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS) 2 Mestre em Ciências Sociais pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS) 3 Economista e mestranda em Ciências Sociais pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS) 4 Administrador de empresas e mestrando em Ciências Sociais pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS) 233 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA pio de Canoas (RS) através de pesquisa-ação participante e de entrevistas com gestores e técnicos da política social

faltae econômica, de intersetorialidade bem como com entre beneficiárias. as políticas Ossociais resultados e eco- demonstraram que os maiores desafios dizem respeito à produtiva no interior da assistência social (necessidade de consensonômicas, dificuldadeconceptual de e metodológicoplanejamento e gestãodesarticulação da inclusão de

para a população em situação de pobreza e vulnerabilida- derecursos) social. Oe estudoàs escassas conclui oportunidades que a inclusão econômicas produtiva dignas susci- ta um debate ainda controverso entre redução de direitos sociais ou autonomia, prestando-se tanto para interpreta- ções conservadoras quanto emancipatórias. ABSTRACT:

Capitalist globalization has legacy techno- scientific advances, but also the increase in inequality and- poverty - historical and persistent phenomena in Brazil.- Since the Constitution of 1988, the social assistance has be come a right of citizenship and entails policies with eman cipatory purpose, such as Bolsa Família, its main program.- The productive inclusion is one of the axes of this policy, which aims at economic empowerment of the assisted fam ilies through training and the access to the labour market. This text aims to analyze the main advances and limits of the productive inclusion of the Bolsa Família beneficiaries in front of the financialization impacts. Empirical research was carried out in Canoas (Rio Grande do Sul State -RS) through participant action research and interviews with- managers and technicians of social and economic policy, as well as beneficiaries. The results showed that the big- gest challenges are related to the lack of intersectionality between social and economic policies, difficulties on plan-

O desafio da inclusão produtiva de famílias pobres em contexto de desigualdade socioeconômica e políticas públicas fragmentada em contexto pobres de famílias O desafio da inclusão produtiva ning and managing the productive inclusion policy within the social assistance (need for234 conceptual and methodolog ical consensus and disjointed resources) and the scarce of 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS - worthyproductive economic inclusion opportunities raises still afor controversial the population debate in pov be- erty and social vulnerability. The study concludes that the tween reduction of social rights or autonomy, lending as wellFontes to conservativede financiamento: and emancipatory interpretations. 0001/2013 – 11/2013-11/2015); MCTI/CNPq (Universal n. 14/2014 – 02/2015-01/2017); FAPERGS MCTI, (Pesquisador CNPq/MEC/CAPES Gaúcho (n. 22/2014 – 12/2014-12/2017) Adriane Vieira Ferrarini, Estelamaris de Barros Dihl, Jéssica Caroline Wallauer e Gustavo Oliveira -

A sociedade contemporânea globalizada expressa di 1977).nâmicas A eSegunda impactos Revolução resultantes Industrial do processo - que deocorreu Revolução mais precisamenteIndustrial, iniciado entre 1850 ainda e no1900 século e se XVIIIalastrou (HOBSBAWN, pelos mais diversos países da Europa, América e Ásia - conduziu a um por gerar excedente de mão-de-obra (desemprego) e, por processo de substituição do homem pela máquina e acabou 2008). consequência,Com a Terceira desigualdade Revolução econômica Industrial e socialtem início (CASTEL, o ca- pitalismo financeiro, mais especificamente a partir dos sergovernos uma resposta de Thatcher à Guerra e Reagan, Fria, podendo entre 1979 ser aconsiderada 1981. Esta comoúltima uma etapa revolução de desenvolvimento conservadora, econômico na qual não credores deixou dode “G7” (grupo dos sete países mais ricos) tomou medidas de liberalização e desregulamentação do capital (CHESNAIS in CARRION; VIZENTINI, 2000). “Capitalismo desorganiza- do” é outra designação para esse período no que se refere - - àssemprego mudanças (SANTOS, profundas 2000) no através mundo das do políticastrabalho dee àswelfare cres statecentes, exitosas dificuldades pelo menosde regulação na Europa social desde da pobreza o pós-Segunda e do de Guerra mundial (CASTEL, 1998). 235 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA O capital especulativo reproduziu-se de forma veloz e volátil ao redor do mundo, dispensando ainda mais o fator - são capitalista, se destaca a exponencial concentração de renda:trabalho. 1% Atualmente, da população como mundial resultado detém concreto de 46% dada riqueza expan que existe no planeta e as 85 pessoas mais ricas do mun-

dado populaçãopossuem um mundial), patrimônio situação de valor que igualtem sidoao das acentuada pessoas nosmais últimos pobres 25 do anos mundo,5. que somam 3,5 bilhões (a metade - ca da relação desigual do modelo de produção, somada à Portanto, a pobreza é resultado da herança históri-

consensofragilização na e atualidade fragmentação de que das a políticas pobreza públicas não se restringe e da he gemonia do modelo capitalista e mercados financeiros. Há e política (imaterial), caracterizada pela baixa escolarida- de,à sua falta dimensão ou precária econômica acesso (material); a serviços elae direitos, é também exclusão social social, baixa autoestima e condições desumanas de vida, que conduzem ao alijamento do exercício de direitos fun- damentais (FERRARINI, 2013).

da concentraçãoO Brasil, país de historicamente renda. Ávila e marcadoConceição pela (2015) pobreza mos e- desigualdadetraram em seu social, estudo reflete - a partir a realidade da base mundialde dados no até âmbito então restritos da Receita Federal, referentes à declaração do im- posto de renda brasileiro - que, em 2012, 0,21% da popu-

lação detinha 46,67% do patrimônio declarado, enquanto 0,69%As da lutas população contra adetinha pobreza 21,82%. no Brasil Assim, caracterizaram-se a riqueza dos 0,9% mais ricos representa 68,49% do total notificado. - nalista e eleitoreiro. A Constituição Federal de 1988 repre- historicamente por ações de caráter assistencialista, pater O desafio da inclusão produtiva de famílias pobres em contexto de desigualdade socioeconômica e políticas públicas fragmentada em contexto pobres de famílias O desafio da inclusão produtiva 5 Segundo relatório da ONG britânica Oxfam divulgado em janeiro de 2014. Dados disponíveis no site236 . 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS sentou o marco inicial para uma mudança de paradigma na artigo 6º que “são direitos sociais: a educação, a saúde, a proteção social. Em primeiro lugar, ficou estabelecido no segurança, a previdência social, a proteção à maternidade alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a- do lugar, a assistência social deixou de ter o viés caritativo, passandoe à infância a sere a assistênciaconsiderada aos como desamparados”. direito de todo Em cidadão segun que dela necessitar. Em terceiro lugar, o Estado passa a ser

- Adriane Vieira Ferrarini, Estelamaris de Barros Dihl, Jéssica Caroline Wallauer e Gustavo Oliveira to e gestão políticas sociais, na perspectiva de cooperação compreendido como responsável direto pelo financiamen Desta forma, a década de 1990 marca inovações nas políticasentre as instâncias sociais brasileiras. federal, estaduais O Estado e inicia municipais. a descentrali - zação das políticas sociais, amplia o poder dos municípios e a participação da população. Ocorre a delimitação de territórios prioritários de atendimento. O Estado aproxi- ma-se dos movimentos sociais, do terceiro setor e estimu-

2002). la os A conselhos legitimação municipais da assistência de controle social decorre social (DRAIBE, da apro- vação da Política Nacional relativamente nova no Brasil da Assistência Social (LOAS), criada em 1993. A Política Nacional(2004), a dequal Assistência materializou social os (PNAS)princípios envolve da Lei uma Orgânica visão social capaz de entender que a população tem necessida- des, mas também possibilidades ou capacidades que de- vem e podem ser desenvolvidas. Ela propõe três tipos de segurança: a de sobrevivência, a qual visa o acesso a uma forma monetária de garantir sua sobrevivência, mesmo quando o sujeito apresenta limitações para realizar algu- - ca atender as necessidades (como direito à alimentação, vestuárioma atividade e abrigo produtiva; digno) a esegurança a segurança de deacolhida, convívio, que a busqual prima pelo direito ao convívio social e a resistência à situa- 237 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA ção de exclusão. Assim, a PNAS preconiza ações articuladas com as políticas setoriais (BRASIL, PNAS, 2004). As políticas públicas têm papel fundamental na su-

e famílias que vivem em contexto de pobreza e vulnera- bilidadeperação dossocial. problemas Segundo econômicos o levantamento e sociais feito dos pelo cidadãos Banco Mundial, entre os anos de 2001 e 2013, o percentual de brasileiros que vivem em situação de extrema pobreza di- minuiu de 10% para 4%, respectivamente, sendo as ações federais de redistribuição de renda (como o Programa Bolsa Família e o Plano Brasil sem Miséria) fatores impres- cindíveis a este resultado satisfatório.

partirO bom de desempenho 2001, bem maisbrasileiro estável se queexplica o registrado por três nasmotivos. duas Primeiro,décadas anteriores. pelo crescimento Segundo, econômico pelas polí a- ticas públicas com foco na erradicação da pobreza, como Bolsa Família e Brasil sem Miséria. Terceiro,

pesquisa, aumentaram as taxas de emprego e o percentualpelo mercado de deempregos trabalho formais nacional: (60% no períodoem 2012). da O relatório ainda aponta a evolução do salário mí- nimo, que fortaleceu o poder de compra dos brasi- leiros (CERRATI, 2015).

O governo brasileiro, a partir da Política de Transferência Condicionada de Renda (PTCR), materia-

assumindo, mesmo que em parte, sua responsabilidade paralizada com no o Programa enfrentamento Bolsa-família, das situações vem reconhecendode desigualdade e

um programa de transferência de renda com condicionali- dadese pobreza. que integra O Programa a política Bolsa-família de saúde, de se educação, configura de como as- sistência social e de emprego e renda. Este programa tem

extrema pobreza. O critério para a inclusão é a renda per

O desafio da inclusão produtiva de famílias pobres em contexto de desigualdade socioeconômica e políticas públicas fragmentada em contexto pobres de famílias O desafio da inclusão produtiva capitapossibilitado familiar, que prevendo milhões detambém famílias auxílio saiam para da situação que estas de 238 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS consigam manter a qualidade de vida no contexto em que estão inseridas (PINZANI; REGO, 2013). Na atualidade, 14 - brasileira.milhões de famílias são beneficiadas, perfazendo 50 mi lhões Pensarde pessoas, na superação o que significa da pobreza um quarto de forma da emancipapopulação-

- tória,tiplas considerandoformas: emprego o sistema formal, econômicoempreendedorismo vigente, remete indivi- à questão da inserção no mundo do trabalho em suas múl dual e associativo, este último envolvendo economia soli- Adriane Vieira Ferrarini, Estelamaris de Barros Dihl, Jéssica Caroline Wallauer e Gustavo Oliveira dária, cooperativismo e desenvolvimento local. Para tanto, naações política de qualificação pública brasileira, profissional sendo e geraçãotradicionalmente de trabalho vol e- renda fazem-se necessárias. Tais ações têm longo histórico Não atualidade, contudo, um novo público passou tadas a trabalhadores desempregados. - a ser prioritário, composto por mulheres do Programa Bolsa-família (PBF), as quais apresentam dificuldades es pecíficas de acesso à qualificação profissional e ao mundo- dadedo trabalho de prover devido cuidados a condições domésticos de vulnerabilidade (não atendidos social: pelos baixa escolaridade, problemas crônicos de saúde, necessi- serviços sociais), moradia de risco, dificuldade de mobili- gardade a urbana,esse público. etc. Apenas Para suprir para exemplificar, essa lacuna, afoi qualificação criada em 2011profissional a política estava de inclusão dispersa produtiva, em 18 ministérios, no então Ministério sem che do Desenvolvimento Social. A inclusão produtiva passou a ser definida como[...] um processo de fortalecimento de vínculos sociais, acesso a serviços, exercício de cidadania e inclusão em oportunidades mais efetivas de tra-

garantia de renda. Ela envolve processos de infor- balho, com acompanhamento socioeconômico e- mentos em situação de pobreza e vulnerabilidade mação, encaminhamento e monitoramento de seg 239 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA - sional e à elevação de escolaridade (FERRARINI; social ao mundo do trabalho, à qualificação profis

WALLAUER, 2015). Portanto, a inclusão produtiva surge como perten- -

cente ao campo da assistência social, auxiliando os benefi queciários entenda e promovendo o indivíduo sua como inclusão um sujeitoao mundo capaz, do portadortrabalho. Para ser sustentável, a inclusão produtiva requer um olhar além do individual, incluindo sua família e sua situação so- de habilidades e competências, bem como um olhar para Sendo assim, a inclusão produtiva demarca um novo ciclocial e eeconômica concepção, (PNAS/2004). que envolve tanto a área de desenvolvi-

uma travessia para outras políticas setoriais e meio para mento social quanto do econômico. Indo além, trata-se de-

oda exercício existência de cidadania.das oportunidades Porém, para que que estão ela tenhadisponíveis, suces so, quatro condições são imprescindíveis: conhecimento-

parasabendo o aproveitamento onde as portas das de saídaoportunidades, estão; qualificação quando estas pro fissional adequada, provendo as habilidades necessárias- criminação e exclusão social; e a garantia das condições mínimas,existirem; como eliminação o salário das barreirasmínimo, transporte artificiais, comoe alimen dis- tação (PRESIDÊNCIA DA REPUBLICA: SECRETARIA DE ASSUNTOS ESTRATÉGICOS, 2011). Segundo o documento da secretaria, a promoção da - buição do setor público e também do privado. Porém, neste caso,inclusão as políticasprodutiva públicas no mundo precisam do trabalho estar focadasdeve ter em contri pro- - - porcionar o acesso efetivo dos trabalhadores às oportuni dadesEm existentes, poucos oferecendo,anos, os avanços por exemplo, nas ações cursos de profisinclu-

O desafio da inclusão produtiva de famílias pobres em contexto de desigualdade socioeconômica e políticas públicas fragmentada em contexto pobres de famílias O desafio da inclusão produtiva sãosionalizantes produtiva e foramde qualificação. muitos. No período de três anos, o 240 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC), sua principal ação, foi implementado em 4.947 prefeituras municipais (adesão de 89% dos muni- cípios brasileiros) e o Programa de Promoção do Acesso

(MONTAGNER;ao Mundo do Trabalho MULLER, (ACESSUAS) 2015). recebeu repasses de R$ 254,4 milhões, totalizando 1.379 municípios em 2014- pais avanços e limites das ações de inclusão produtiva de

Este trabalho tem o objetivo de analisar os princi- Adriane Vieira Ferrarini, Estelamaris de Barros Dihl, Jéssica Caroline Wallauer e Gustavo Oliveira nanceirização da economia, a qual amplia a desigualdade beneficiárias do Bolsa-família frente aos impactos da fi pobres. A pesquisa empírica foi realizada no município de Canoassocial e (RS)reduz no as período oportunidades de 2013 aeconômicas 2016. A metodologia para os mais foi composta por etapa exploratória (estudos, entrevistas e consulta a dados secundários), pesquisa-ação participan- te com gestoras e técnicas da AS, reuniões intersecretarias

- (Desenvolvimentorias do Programa Bolsa-famíliaSocial e Desenvolvimento e educadores Econômico) do Instituto e entrevistasFederal). (com gestores do Governo Federal, beneficiá A análise da política no município revelou que bons resultados operacionais parecem ser decorrentes do mon- tante sem precedentes de recursos em programas de qua-

- lificaçãorie de vulnerabilidades profissional direcionados sociais. Contudo, a segmentos dados preliminacom baixa- escolaridade, sem experiência profissional e com uma sé- mento no município) evidenciaram reduzida efetividade nosres (vistoresultados. não haver um sistema estruturado de monitora Tal evidência relaciona-se a um conjunto de elemen- - são produtiva no município, que podem ser sucintamente tos identificados na implementação das ações de inclu- apresentados a partir de dois blocos: no âmbito da políti 241 ca pública (específicos da assistência social e referentes à ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA intersetorialidade) e elementos estruturais (vinculados ao

- sistema econômico). - são e Quantoaceitação à política do termo pública, “inclusão no tocante produtiva”, à assistência bem como so dacial, atribuição inicialmente requerida identificou-se por parte dificuldade dos técnicos de da compreen assistên- - pouco uma metodologia para a inclusão produtiva, pois cia“cada social. CRAS Não fazia havia do seudebate jeito”. acumulado sobre o tema, tam - - tido, cabeAlém esclarecerdisso, havia que, receio no Brasil, de que a ainclusão inclusão produtiva produti trata-seva conduzisse de travessia as famílias de políticas à perda amparada,do benefício. uma Neste vez senque o desligamento voluntário é um dispositivo previsto na Instrução Operacional nº 48 de 13/10/2011 do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS)/ Secretaria Nacional de Renda de Cidadania (SENARC). Tal dispositivo prevê que,

caso o beneficiário faça o desligamento voluntário e volte 2015).a precisar Contudo, do benefício, destaca-se o receberá ainda que de as forma técnicas imediata alegavam até já36 serem meses bastante após o desligamentocomplexas as funções(FERRARINI; de enfrentamento WALLAUER; à violação de direitos, redução de vulnerabilidades e for- talecimento de vínculos familiares e comunitários, não se sentindo possuidoras das competências necessárias para - trou a inexistência de integração entre as ações do social e lidar com as questões do mundo do trabalho, o que demons-

do econômico. Os cursos de qualificação e encaminhamen intersetorialidade.to para o mercado Admite-sede trabalho que ocorriam a intersetorialidade através de ações não épontuais simples de nem cada imediata, secretaria, pois não requer havendo mudança um processo da cultura de organizacional na gestão pública tradicionalmente seto- rializada, em que os ministérios e secretarias, não apenas

O desafio da inclusão produtiva de famílias pobres em contexto de desigualdade socioeconômica e políticas públicas fragmentada em contexto pobres de famílias O desafio da inclusão produtiva não se articulam quanto competem entre si por recursos e 242 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS metas. Contudo, ela é imprescindível para que indivíduos em situação de pobreza e vulnerabilidade social acessem o

A inclusão produtiva tem característica intersetorial justamentemundo do trabalho. porque não depende apenas de oportunidades disponíveis se dá quando as demais necessidades, que im- pedemde trabalho. esses cidadãosO acesso deintegral ingressar e efetivo de forma às oportunidadesemancipatória

políticas tem demanda de diversas áreas, como educação Adriane Vieira Ferrarini, Estelamaris de Barros Dihl, Jéssica Caroline Wallauer e Gustavo Oliveira no mundo do trabalho, são sanadas. O público alvo destas- ção (por morar em domicílios precários em locais de alto (creches ou aulas de turno integral, por exemplo); habita por alguma cirurgia ou dependência de tratamento), além derisco inúmeras de contaminação outras. ou de enchente) e saúde (na espera de saberesA intersetorialidade e experiências, significa para que a superação assim sejam de divisõessolucio- nadossetoriais problemas e de conhecimento, de maior complexidade. através do compartilhamento Portanto, requer uma visão integrada, superando a fragmentação setorial e os interesses individuais de cada secretaria ou de um gru- sociais;po específico. é uma nova “A intersetorialidade maneira de abordar incorpora os problemas a ideia so de- integração, de território, de equidade, enfim, dos direitos Para Inojosa (2011), as políticas públicas setoriais nãociais” são (JUNQUEIRA, bem sucedidas 2004, devido p. 3). ao fato de não considerar “as pessoas e as famílias como as totalidades que são”. Ela processos são decididos pelo topo, distante da base onde afirma que há uma “hierarquia verticalizada”, na qual os- - secupa-se situa coma maior ela própria,parte da tomandopopulação, decisões e que nestaisoladamente, “pirâmi desem fatiada” considerar (pirâmide o todo. setorizada), Isso também cada se deve fatia ao (setor) fato de preo que as metas de governo são determinadas e cobradas indivi- 243 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA dualmente para cada secretaria, conforme os planos de go- verno. Esta fragmentação de poderes acaba gerando com- petição dentro do próprio governo, entre os setores, sem desconsiderar o predomínio de perspectiva epistemológi- ca tradicional, norteadora de formações especializadas dos agentes formuladores e operadores das políticas.

lado, a reprodução do ciclo de pobreza devido a questões, tais como:Quanto (1) às à questõesgravidez naestruturais, adolescência, percebeu-se, com suas por múlti um- -

aplas cuidados implicações; familiares, (2) incapacidade bem escassez de de as oportunidademulheres ingres es- sarem em empregos que lhes ocupem todo o dia devido mas seguro); (3) não raras vezes, o interesse central em cursostáveis quede ascapacitação encoraje agirava largar em o benefíciotorno do (que recebimento é pouco,

simbólico para elas); (4) falta de alternativas estruturantes ouda cestade oportunidades básica (que tambémdignas; (5)tem alto um grau significado de reincidência também nos cursos e (6) falta de um projeto de vida ligado à vida laboral. Ainda assim, não se constatou o sentimento de aco-

modação por parte das beneficiárias, mas sim, desejo por uma vida melhor (PINZANI; REGO, 2013). A maioria das masbeneficiárias se estimuladas entrevistadas e orientadas, estava poderiaminserida em se atividadesvincular a oportunidadesprodutivas, dentre mais as efetivasalternativas e adquirir que lhes maior eram autonomia possíveis, - xar de registrar que, de modo geral, os cursos não prima- social e econômica (DIHL, 2015). Também não se pode dei- cados problemas, tais como, falta de material, inadequação deram estruturas por uma eformação conteúdos, de dentreexcelência, outros. tendo sido identifi O estudo conclui que, à iminência de término de um -

O desafio da inclusão produtiva de famílias pobres em contexto de desigualdade socioeconômica e políticas públicas fragmentada em contexto pobres de famílias O desafio da inclusão produtiva - ciclo marcado por crescimento econômico e governos po 244 pulares, o Brasil tem o desafio histórico de promover a in 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS da população que vive em extrema pobreza. O Programa Bolsa-famíliaclusão no mundo já tem do uma trabalho década de deuma existência, parcela significativa mas os mu- nicípios utilizaram muito tempo e recurso para constituir - ção ao recebimento de recursos, processo necessário para asa mudança equipes dee infraestrutura paradigma na necessáriasassistência social.para sua Além habilita disso, a etapa inicial foi voltada à garantia da proteção social, a qual também demandou dos municípios a implementação de um conjunto complexo de procedimentos, visto que os Adriane Vieira Ferrarini, Estelamaris de Barros Dihl, Jéssica Caroline Wallauer e Gustavo Oliveira serviços ofertados devem respeitar critérios de acompa-

A inclusão produtiva, já tida com uma “travessia de nhamento para a promoção de cidadania. de implementação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS)políticas”, e étem ainda se constituídomuito nova comona política uma daspública etapas brasilei finais- ra. Porém, corre o risco de perder sua efetividade no lim- reincidênciabo entre a política e baixa econômica efetividade e a social.para esseO Governo público, Federal pois tem priorizado cursos profissionalizantes, porém com alta - moramentoas mulheres danão gestão se enquadram e operacionalização no perfil requisitado para responder pelo àsmercado demandas de trabalho.multidimensionais Ademais, háfrente necessidade à estrutura de buro apri- crática e fragmentada do Estado, bem como de criação de - recione esforços públicos e privados para um projeto de oportunidadesdesenvolvimento econômicas mais sustentável dignas, eo inclusivo.que requer que se di Ainda que exista um conjunto de ações voltadas à in- clusão produtiva, tanto em nível municipal quanto federal, implementá-las de forma intersetorial é algo totalmente e metodológicas, a realidade de incerteza dos gestores e novo e desafiador. Para além das dificuldades conceituais - profissionais da assistência social no tocante à inclusão 245 produtiva - identificada nesta pesquisa - revela uma reali ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA dade mais ampla em cenário nacional. Tal incerteza vai ao encontro do debate predominante na literatura especiali-

(cuja concepção, em tese, se aproxima com a perspectiva dazada, inclusão o qual questionaprodutiva) se convergem as chamadas para políticas a ampliação de ativação de direitos sociais ou para sua redução, com clara tendência para a segunda opção (SOUZA, 2016).

das políticas sociais, que estão sendo postas em causa as formasAs tradicionais medidas de de ativação ação social testemunham, (LAVILLE, 2000 no campo apud MOSER, 2011). Por um lado, se considerado o acesso ao - tada, a inclusão produtiva pode ser entendida como resti- trabalho como direito econômico a uma vida autossusten dimensão emancipatória na medida em que os programas detuição ativação ao direito promovem negado, a reconhecendo reinserção social a existência e vida plenade uma a pessoas que viviam dependentes de subsídios. Neste senti- do, a inclusão produtiva poderia ser considerada uma nova abordagem dos direitos sociais.

em especial pela dimensão moral, que questiona a ajuda incondicional.Por outro Por lado, detrás, são-lhe repousa desveladas a ideia inúmeras de que críticas,a assis- tência social é uma política com efeito perverso, que tor- na os pobres dependentes da ajuda do Estado e de que o bem-estar incondicional fracassou frente aos imperativos do capital; ele passa a ser produto do mérito individual e não mais direito social (SILVA, 2011). Isso vem ao encon- tro de fundamentos meritocráticos fortemente presentes na cultura política e no imaginário brasileiro (SCALON, 2011; SOUZA, 2004), naturalizando as desigualdades so- ciais e a subcidadania e impedindo a preconizada mudan- ça de paradigma na proteção social, preconizada desde a Constituição Federal de 1988 e materializada em avanços legais, jurídicos e socioinstitucionais que já constituem um

O desafio da inclusão produtiva de famílias pobres em contexto de desigualdade socioeconômica e políticas públicas fragmentada em contexto pobres de famílias O desafio da inclusão produtiva legado sem precedentes no Brasil. 246 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Dessa forma, a inclusão produtiva envolve um deba- te controverso e repleto de dilemas, prestando-se tanto a interpretações conservadoras quanto emancipatórias. As pesquisas sobre o tema no Brasil são ainda recentes, apre- sentando-se como um campo que merece ser analisado em profundidade do ponto de vista teórico-conceitual, ético- -político e metodológico, considerando as ações empreen- didas nos últimos anos, os recursos investidos e a premên- cia da superação emancipatória da pobreza no Brasil. Adriane Vieira Ferrarini, Estelamaris de Barros Dihl, Jéssica Caroline Wallauer e Gustavo Oliveira REFERÊNCIAS

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13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS OS LIMITES FINANCEIROS E ORÇAMENTÁRIOS DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM POLÍTICAS PÚBLICAS DE MEIO AMBIENTE

Julia Marta Drebes Dörr1 Fernanda Dalla Libera Damacena2

RESUMO: - to do compromisso constitucional com a proteção e pro- moção do Asdireito falhas ao e meio a omissão ambiente do Estado ecologicamente no cumprimen equi- librado têm ensejado a propositura de inúmeras ações implementar políticas públicas visando a efetividade da tu- telajudiciais, ambiental. cuja finalidade Contudo, éa aformulação condenação e ado execução ente público de po a- líticas públicas, na busca pela garantia do direito ao meio Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena ambiente, representa um considerável dispêndio de recur- sos públicos. Neste sentido, o presente artigo tem o objeti- vo de demonstrar a repercussão orçamentária da decisão judicial que pretenda uma intervenção em políticas públi- cas voltadas à proteção do meio ambiente, e como este im- no momento da decisão. O artigo orientou-se pelo méto- dopacto dedutivo, financeiro partindo deve serde umaobservado análise pelo geral Poder a respeito Judiciário dos conceitos de política pública, orçamento público e do cus- to do direito ao meio ambiente, para uma análise sobre a

1 Graduanda em Ciências Jurídicas e Sociais – Universidade do Vale do repercussãoRio dos Sinos. orçamentária E-mail: [email protected]. e financeira da decisão judicial. 2 Mestre e Especialista em Direito Público. Doutoranda em Direito e Professora do Curso de Direito– Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Advogada. E-mail: [email protected]. 251 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

a jurisprudencial, sendo apresentadas algumas decisões judiciais,As técnicas que de demonstram pesquisa utilizadas como os foram Tribunais a bibliográfica brasileiros e

intrínseca relação existente entre o orçamento público e as políticastêm enfrentado públicas o deproblema. meio ambiente, Ao final, e é como possível as decisões perceber ju a-

ao erário público, sendo que este aspecto deve ser conside- radodiciais pelo representam Poder Judiciário, um impacto com o financeiro intuito de e se orçamentário produzirem

decisõesABSTRACT: equilibradas, razoáveis e eficazes.

Failures and state omissions to fulfill the- constitutional commitment in protect and promote the right to an ecologically balanced environment have occa sioned the filing of numerous lawsuits whose purpose is to impose on public entity the efficient implementation of public policies for environmental protection. However, representsthe formulation a considerable and implementation expenditure of public public funds. policies In in the pursuit of ensuring the right to the environment,

this sense, this article aims to demonstrate the budgetary impact of the court decision that want an intervention in- public policies aimed at protecting the environment, and- how this financial impact should be observed by the rul ings. The article used the deductive method. It methodol ogy started from a general analysis about the concepts of- public policy, public budget and the cost of the right to the environment, for an analysis on the budgetary and fi nancial implications of the court decision. The researches- techniques used were the literature and jurisprudence. The research presents some judicial decisions demon strating how the Brazilian courts have faced the problem. At the end, it is possible to observe two strengths: i) the

Os limites financeiros e orçamentários da intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas de meio ambiente do Poder da intervenção e orçamentários financeiros Os limites intrinsic relationship between public budget and public policy environment; ii) how252 judicial decisions represent a financial and budgetary impact on the public treasury. 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS - ced, reasonable and effective decisions. Both aspects are fundamental in order to produce balan 1 INTRODUÇÃO

No Brasil, o meio ambiente ecologicamente equi- librado alcançou o patamar de direito fundamental com a Constituição Federal de 1988, carta constitucional por meio da qual o Estado, dito Democrático de Direito, assu- miu um verdadeiro compromisso de transformação da so- ciedade, responsabilizando-se pela garantia do extenso rol de direitos fundamentais que foram prometidos. Contudo, - zar este plano constitucional, por vezes o direito ao meio ambienteem razão dasresta falhas desassistido, e da omissão ocasionando do Estado a procuraem concreti pelo Poder Judiciário como alternativa na busca pela garantia da proteção ambiental. Assim, o Poder Judiciário é provo- cado pelos atores legitimados, por meio dos remédios pro- cessuais cabíveis, a intervir em políticas públicas de meio ambiente, mediante a postulação de condenação de entes Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena públicos a implementarem medidas necessárias para a ga- rantia de proteção e promoção do meio ambiente ecologi- camente equilibrado. A partir dessa perspectiva, o presente artigo tem o objetivo de demonstrar a repercussão orçamentária da decisão judicial que pretenda uma intervenção em políti- cas públicas voltadas à proteção do meio ambiente, e como - ção pelo Poder Judiciário, na busca por decisões judiciais razoáveiseste impacto e equilibradas.financeiro necessita Isso porque ser levado a implementação em considera de políticas públicas de meio ambiente representa um ex- pressivo dispêndio de recursos públicos, expressos no or- çamento público. Para tanto, é utilizado o método dedutivo, cuja op- ção metodológica é orientada por uma análise geral que 253 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA parte dos conceitos de política pública, orçamento público e do custo do direito ao meio ambiente, para uma análise

das decisões judiciais em matéria de política pública am- biental.específica As acerca técnicas da derepercussão pesquisa utilizadasorçamentária são ea financeirabibliográ-

análisefica, por da meio atuação da revisão judicial, da imprescindível literatura a respeito que se do investi tema,- guee jurisprudencial. como os Tribunais Como brasileirosse trata de têm,um trabalho de fato, voltadoenfrenta à- do o problema proposto. Assim, são apresentadas algumas decisões judiciais, de caráter ilustrativo, que levaram em

orçamentária que está por trás da concretização do direito aoconsideração meio ambiente. nos seus fundamentos a questão financeira e

- volvendoA o reflexãocontrole propostajudicial de se políticas mostra públicas de fundamental de meio importância, pois é crescente o número de demandas en e omissões do Estado em relação à proteção ambiental. ambiente, especialmente em razão das inúmeras falhas-

Assim, se torna necessária a reflexão e a produção cien tífica a respeito da repercussão no orçamento público e- do impacto financeiro da decisão judicial, a fim de que a constitucionalatuação dos poderes de proteção do Estado e promoção seja harmônica, do direito equilibra ao meio ambienteda, ponderada ecologicamente e eficaz no equilibrado. cumprimento do compromisso

2 ORÇAMENTO PÚBLICO, POLÍTICAS PÚBLICAS E O CUSTO DO DIREITO AO MEIO AMBIENTE

debate em torno da possibilidade de intervenção do Poder JudiciárioAspecto em políticas da maior públicas relevância de meio quando ambiente se enfrenta diz res o- Os limites financeiros e orçamentários da intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas de meio ambiente do Poder da intervenção e orçamentários financeiros Os limites 254 peito ao impacto financeiro e à repercussão orçamentária 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS das decisões judiciais, muito embora esta questão, por ve- zes, seja deixada de lado. Maria Paula Dallari Bucci3 consi- dera este, dentre os argumentos utilizados como limite ao controle judicial de políticas públicas, o mais perturbador, especialmente pelo fato de que é matéria que escapa à sea- ra de estudo exclusiva do Direito.

Estado assume o compromisso constitucional de proteger e promoverNeste o caminho,direito ao a meio partir ambiente do momento ecologicamente em que o equilibrado, se faz necessário organizar um mecanismo de planejamento e ação para cumprir este compromisso. Este planejamento, por sua vez, envolve o desenvolvimento de políticas públicas. Maria Paula Dallari Bucci4 o conceito de política pública: assim define

As políticas públicas devem ser compreendidas como arranjos institucionais complexos, expres- sos em estratégias formalizadas ou programas de ação governamental, visando coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades privadas, Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena para a realização de objetivos socialmente rele- vantes e politicamente determinados, e resultam de processos conformados juridicamente.

Políticas públicas são, portanto, “[...] um conjun- aqueles obrigados pelo Direito a atender ou realizar um to heterogêneo de medidas e decisões tomadas por todos 3 BUCCI, Maria Paula Dallari. Controle judicial de políticas públicas: possibilidades e limites. In: BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita; BERCOVICI, Gilberto; MELO, Claudineu de (Org.). Direitos humanos:

4 democraciaBUCCI, Maria e república: Paula Dallari. homenagem Controle a judicialFábio Konder de políticas Comparato. públicas: São possibilidadesPaulo: Quartier e Latin, limites. 2009.p. In: BENEVIDES, 699-700. Maria Victoria de Mesquita; BERCOVICI, Gilberto; MELO, Claudineu de (Org.). Direitos humanos:

democracia e república: homenagem a Fábio Konder Comparato. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p.255 701. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA 5. Por conseguinte, fim ou uma meta consoante com o interesse público” As políticas públicas são os instrumentos que pos- suem os governos para tanto e o planejamento constitui requisito indispensável para o sucesso das políticas públicas, sendo o orçamento a princi- pal peça do planejamento. Não se fazem governos sem políticas públicas, não se fazem políticas pú- blicas sem planejamento e não se faz planejamen- to sem orçamentação6. As políticas públicas sociais precisam sempre levar em consideração a dimensão ambiental7. O Poder Público, no cumprimento do dever constitucional de pro- teção e promoção ao meio ambiente, deve desenvolver po- líticas públicas em matéria ambiental, mas a proteção do meio ambiente também precisa ser um valor incorporado a qualquer política pública formulada.

5 FIGUEIREDO, Marcelo. O controle das políticas públicas pelo Poder Judiciário no Brasil – uma visão geral. Revista Eletrônica da Faculdade de Direito da PUC-SP, São Paulo, v. 1, p. 15, jan./dez. 2008.

públicasDisponível se extrai em: de .de políticas públicas Acesso: estudo em: 13 sobre jul. 2016. a constitucionalização Outra definição de dopolíticas direi- to ao meio ambiente. Porto Alegre: Fi, 2014. p. 79-80: “[...] a política pública deve ser um processo, que representa uma sequência de atos - to institui uma continuidade de manifestações dos mais diversos atores sociais,sempre contráriacoordenados ou favorável, com a realização reducionista de determinados ou ampliativa, fins, mas porquan sempre se discutindo os prós e contras da atuação ou implementação da inter-

6 BOGOSSIAN, André. Levando o orçamento a sério como instrumen- tovenção de controle estatal na de realização políticas depúblicas. determinados Revista fins”. Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 5, n. 2, p. 190, jan./dez. 2015. Disponível em:

7 . Acesso em: 13 jul. 2016.

meio ambiente e a participação do judiciário. In: KISHI, Sandra Akemi

Os limites financeiros e orçamentários da intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas de meio ambiente do Poder da intervenção e orçamentários financeiros Os limites Shimada; SILVA, Solange Teles da; SOARES, Inês Virgínia Prado (Org.). Desafios do direito ambiental no século XXI: estudos em homenagem a Paulo Affonso Leme Machado.256 São Paulo: Malheiros, 2005. p. 443. 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS - tanto, o orçamento público. A visão clássica do orçamen- to públicoA peça o interpretava chave do planejamento de forma simplista, do governo como é, por um e autorização das despesas. Porém, com a concepção do Estadomero documento Social, o orçamento que continha passou a previsãoa ser considerado das receitas um importante instrumento estatal para o desenvolvimento e execução do programa constitucional. Como as políti- cas públicas são mecanismos utilizados pelo Estado para colocar em prática o programa constitucional, é notória a relação existente entre orçamento e políticas públicas8. O planejamento dos gastos que o Poder Público terá com as políticas públicas ambientais, portanto, é ex- presso por meio do orçamento público, o que denota que de decisão do administrador público, que seguirá a diretriz fornecidaesta fase de pela escolha política e priorização ambiental traçadade gastos9. integra a seara O administrador não possui completa liberdade e ampla discricionariedade no momento de decidir como os Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena recursos públicos serão alocados. Existem diversos limites à discricionariedade da Administração Pública, entre eles o princípio da supremacia da Constituição10

8 MÂNICA, Fernando Borges. Teoria da reserva do possível: direitos fundamentais a prestações e a intervenção do poder, ou judiciário seja, ona fim im- plementação de políticas públicas. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, Salvador, n. 25, p. 3, fev./abr. 2011.

2016.Disponível em: .SOARES, Inês Virgínia Prado. Meio ambiente e orçamento Acesso em: público. 13 jul.In:

Virgínia Prado (Org.). Desafios do direito ambiental no século XXI: KISHI, Sandra Akemi Shimada; SILVA, Solange Teles da; SOARES, Inês

10 estudos em homenagem a Paulo Affonso Leme Machado. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 557. Verba Juris, João Pessoa, v. 4, n. 4, p. 90, jan./dez. SCAFF, Fernando Facury. Reserva do possível, mínimo existencial e direitos humanos. 2005. Disponível em: . Acesso257 em: 13 jul. 2016. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA último do planejamento de governo deve ser a realização das promessas constitucionais. Assim, “[...] as políticas de-

administrativa, através da imposição de procedimentos ou finidas atuam para limitar ou excluir a discricionariedade11. Como o direito ao meio ambiente ecologicamen- date fixaçãoequilibrado de obrigações é uma dessas legais depromessas fazer ou não-fazer”constitucionais, ele deve integrar o planejamento orçamentário. Gilson Jacobsen12 entende que, em se tratando do direito ao meio ambiente, sequer existiria liberdade e discricionariedade do administrador público, pautado em critérios de oportunida- de e conveniência, diante do dever imposto constitucional- mente ao Poder Público de proteger e promover o direito ao meio ambiente, essencial à sadia qualidade de vida. Assim, o orçamento público, abastecido por toda a gama de tributos instituídos pelo legislador brasileiro, é alocado conforme o planejamento de governo, sendo que um dos mecanismos deste planejamento é a formulação de - lidade a garantia de preceitos constitucionais, dentre eles apolíticas conservação públicas, do meio cuja implementaçãoambiente13. Conforme deve ter Inês como Virgínia fina Prado Soares14:

11 SOARES, Inês Virgínia Prado. Meio ambiente e orçamento público. In:

KISHI, Sandra Akemi Shimada; SILVA, Solange Teles da; SOARES, Inês Virgínia Prado (Org.). Desafios do direito ambiental no século XXI: 12 estudosJACOBSEN, em homenagemGilson. Meio a ambiente Paulo Affonso e omissão Leme Machado.do Estado São à luz Paulo: da Constituição.Malheiros, 2005. In: p.VAZ, 558. Paulo Afonso Brum; SCHÄFER, Jairo Gilberto (Org.). Curso modular de direito constitucional. Florianópolis: Conceito Editorial, 2008. p. 218. 13 SANTOS, Cristiano Lange dos. Controle judicial de políticas públicas: estudo sobre a constitucionalização do meio ambiente. Porto Alegre: Fi, 2014. p. 81. 14 SOARES, Inês Virgínia Prado. Meio ambiente e orçamento público. In:

Os limites financeiros e orçamentários da intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas de meio ambiente do Poder da intervenção e orçamentários financeiros Os limites KISHI, Sandra Akemi Shimada; SILVA, Solange Teles da; SOARES, Inês Virgínia Prado (Org.). Desafios do direito ambiental no século XXI: estudos em homenagem a Paulo258 Affonso Leme Machado. São Paulo: 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS A realização das políticas ambientais depende -

quantoprioritariamente nas tarefas dos que recursos podem ser financeiros, realizadas tanem conjuntoto nas tarefas pelo Estado típicas e do sociedade: Estado deeducação fiscalização am- biental, informação, preservação, conservação etc. Pela própria natureza do bem resguardado, cabe ao Estado estabelecer as diretrizes e as metas para o meio ambiente, materializando-as na lei orça- mentária, com a sistematização dos recursos que poderão ser alocados na defesa e preservação do meio ambiente [...].

- zes de realizar os direitos fundamentais pressupõem deci- sões acercaNesta do linha,dispêndio portanto, de recursos “[...] as públicos” ações estatais15. capa Garantir o direito ao meio ambiente, por conse- guinte, implica em gastos públicos, e esta realidade não pode ser ignorada pelas decisões judiciais que tratam so- bre o tema. A análise dos direitos fundamentais sob a ótica dos seus custos vem sendo timidamente construída pela

moderna literatura jurídica, e encontrou grande notorie- Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena dade com a obra The cost of rights: why liberty depends on taxes16, dos professores norte-americanos Cass Sunstein - mental da obra é demonstrar que todos os direitos funda- mentaise Stephen são Holmes, positivos, publicada ou seja, todosem 2000. demandam O objetivo prestações funda estatais, logo, todos demandam custos para a sua garantia. No Brasil, poucos são os estudiosos que tem se debruçado sobre o tema. Entre eles, Flávio Galdino, que introduziu a

15 BARCELLOS, Ana Paula de. Constitucionalização das políticas públi- casMalheiros, em matéria 2005. de p. 553.direitos fundamentais: o controle político-social e

TIMM, Luciano Benetti (Org.). Direitos fundamentais: orçamento e “re- servao controle do possível”. jurídico no2. ed.espaço Porto democrático. Alegre: Livraria In: SARLET, do Advogado, Ingo Wolfgang; 2010. p. 116. 16 The cost of rights

HOLMES, Stephen; SUNSTEIN, Cass R. : why liberty depends on taxes. New York: 259W. W. Norton & Company, 2000. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA - nal por meio de seu livro Introdução à teoria dos custos dos direitos:teoria de direitos CassSunstein não nascem e Stephen em árvores Holmes17 .no cenário nacio

que todos os direitos são positivos18 e demandam gastos pú- blicos, mesmoA obra os de direitos Cass Sunstein de primeira e Stephen geração Holmes19– os defendedireitos de propriedade e liberdade, por exemplo, exigem do Poder Público a implementação de políticas públicas de segurança, o que naturalmente demanda gastos. Neste sentido,

17 GALDINO, Flávio. Introdução à teoria dos custos dos direitos: direi- tos não nascem em árvores. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. 18 GALDINO, Flávio. Introdução à teoria dos custos dos direitos: direi- tos não nascem em árvores. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.p. 204. 19

Convencionou-se classificar os direitos fundamentais em gerações, não para afirmar uma maior importância de uma geração em relação à- outra, mas porque “[...] os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circuns nemtâncias, de umacaracterizadas vez por todas”. por lutas BOBBIO, em defesaNorberto. de novas A era liberdadesdos direitos contra. Rio develhos Janeiro: poderes, Elsevier, e nascidos 2004. p.de 9. modo Para ogradual, autor, anão primeira todos degeração uma vezseria e composta por aqueles direitos de inspiração liberal, que representam uma proteção da autonomia pessoal frente ao poder estatal, cuja con- sagração se deu principalmente com a Revolução Francesa. Os direitos de segunda geração seriam os direitos sociais, que necessitam para a sua concretização de uma atuação positiva do Estado – ao contrário dos direitos de primeira geração, que demandam um aspecto de atuação negativo –, e guardam relação com a justiça social. BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. p. 9-10. Os direitos de terceira geração, por sua vez, “peculiarizam‐se pela titularidade difusa - mem isoladamente, mas de coletividades, de grupos”. MENDES, Gilmar Ferreira;ou coletiva, BRANCO, uma vez Paulo que Gustavosao concebidos Gonet. Cursopara a deprote direitoço n aconstituo do ho- cional. 10. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 137-138.Sendo assim, os direitos de terceira geração representam os interesses da -

Direitocoletividade, do Ambiente e, portanto, é considerado melhor classificação de terceira não geração, haveria para para além o direi dos to ao meio ambiente, como afirma Édis Milaré: “na ciência jurídica, o difusos, que incluem o ambiental. Com efeito, nada mais difuso do que odireitos meio ambiente, individuais tudo e sociais aquilo clássicos. que vai àAgora nossa é volta,a afirmação ou seja, dos a biosferadireitos inteira”.MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 9. ed. rev., atual. e ampl.

Os limites financeiros e orçamentários da intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas de meio ambiente do Poder da intervenção e orçamentários financeiros Os limites São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 114. 260 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS -

To the obvious truth that rights depend on gover- nment must be added a logical corollary, one rich- with implications: rights cost money. Rights can not be protected or20 .enforced without public fun ding and support. […]. All rights make claims upon the public treasure 21, outro doutrinador bra- sileiro que se debruçou sobre a obra The cost of rights, as- sim se expressaAnizio Pires em relaçãoGavião Filhoà inexistência de direitos que sejam puramente negativos, ou seja, que não demandam qualquer intervenção estatal:

- tal é a mesma para todo e qualquer direito funda- mental,[...] a questão seja direito da disponibilidade fundamental a financeiraprestações esta ma- teriais, seja direito fundamental de liberdade. [...]. Não se pode pensar na realização de algum direito fundamental sem que tal não implique custo, pois todos os direitos demandam algum tipo de pres- tação por parte do Estado, inclusive os direitos de

liberdade. Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena prestacionais, não se duvida de que necessitam do desem- bolso deQuanto recursos aos públicos direitos para de segunda sua garantia. geração, Em sociais relação e ao meio ambiente, direito de terceira geração, que possui uma dimensão positiva e uma negativa, não poderia ser di- ferente. Proteger e promover o direito ao meio ambiente

20 “À óbvia verdade de que os direitos dependem do governo deve ser adi- ecologicamentecionado um corolário equilibrado lógico, rico implica em implicações: em gasto direitos de dinheiro custam di-

suporte público. Todos os direitos reivindicam ao tesouro público” (tra- nheiro. Direitos não podem ser garantidos e compelidos sem recursos e

2000.dução p.livre). 15. HOLMES, Stephen; SUNSTEIN, Cass R. The cost of rights: 21 whyGAVIÃO liberty FILHO, depends Anizio on Pires. taxes. Direito New York:fundamental W. W. Norton ao ambiente. & Company, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 156. 261 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA público, até mesmo na perspectiva negativa do dever esta- 22,

tal. Como afirma [...]Flávio estabelecendo-se Galdino deveres negativos para o Estado, mister deixar claro que esses deveres ne- gativos impõem para o Estado outros correlatos deveres positivos, no mínimo para manter uma estrutura que garanta o respeito aos direitos fun- damentais em questão.

- viduais são positivos foi por muito tempo ignorado em vir- O reconhecimento de que também os direitos indi- tos que a sua garantia envolve, ao contrário do que ocorre tude da dificuldade de se apreender concretamente os cus23

com os direitos sociais. Cass Sunstein e Stephen Holmes vigorousafirmam state que “[…]action”. Americans Neste sentido, seem easilyaponta to José forget Casalta that Nabaisindividual24: rights and freedoms depend fundamentally on

Na verdade, todos os direitos têm custos comuni-

portanto custos públicos não só os modernos di- tários,reitos sociais, ou seja, aos custos quais financeiros toda a gente públicos. facilmente Têm aponta esses custos, mas também custos públicos os clássicos direitos e liberdades, em relação aos

na sombra ou mesmo no esquecimento. quais, por via de regra, tais custos tendem a ficar 22 GALDINO, Flávio. Introdução à teoria dos custos dos direitos: direi- tos não nascem em árvores. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 226. 23 “Os americanos parecem facilmente esquecer que os direitos e liber- dades individuais dependem fundamentalmente de uma vigorosa atua- The cost of rights ção estatal” (tradução livre). HOLMES, Stephen; SUNSTEIN, Cass R. 24 NABAIS, José :Casalta. why liberty A face depends oculta ondos taxes. direitos New fundamentais: York: W. W. Norton os de &- Company, 2000. p. 14. veres e os custos dos direitos. Revista Direito Mackenzie, São Paulo,

Os limites financeiros e orçamentários da intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas de meio ambiente do Poder da intervenção e orçamentários financeiros Os limites 13v. 3, jul. n. 2016.2, p. 20, jan./dez. 2002. Disponível em: . Acesso em: 262 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Virgílio Afonso da Silva25, por sua vez, constrói uma ressalva em relação à teoria de que todos os direitos,

- micossejam civiscustam e políticos mais dinheiro ou sociais: e econômicos, igualmente demandam gastos. Para o autor, os direitos sociais e econô Por isso, os gastos com a manutenção das institui- ções políticas são gastos que abrangem a realiza- ção tanto dos direitos políticos, quanto dos direi-

O mesmo vale para os gastos com a manutenção detos instituições civis, quanto judiciárias. dos direitos Diante sociais disso, e econômicos. esses ‘gas- tos institucionais’, que são diluídos na efetivação de qualquer tipo de direito, devem ser deixados de lado quando se comparam os custos dos direitos

dos direitos civis e políticos, de outro. sociais e econômicos, de um lado, com os custos Sabendo que todos os direitos – de acordo com a demandam gastos, e diante do orçamento público, enquan- toteoria principal desenvolvida instrumento por Cass para Sunstein consecução e Stephen do plano Holmes de go –- Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena os recursos públicos, que são escassos e limitados26, o que verno, o administrador possui a difícil tarefa de direcionar pensar que é possível atender satisfatoriamente a todas as o leva a fazer escolhas trágicas. São trágicas, pois é irreal 25 SILVA, Virgílio Afonso da. O judiciário e as políticas públicas: entre transformação social e obstáculo à realização dos direitos sociais. In: SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel (Org.). Direitos sociais: fundamentação, judicialização e direitos sociais em espécie. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 593. Alceu Maurício Jr., em con- trapartida, entende que “também não prospera o argumento de que a implementação dos direitos sociais seja mais onerosa do que a dos serviços estatais que visam a proteger os direitos individuais. Por

ou um tribunal?”. MAURÍCIO JÚNIOR, Alceu. A revisão judicial das esco- exemplo, um hospital custa mais aos contribuintes do que uma prisão Horizonte: Fórum, 2009. p. 59. 26 lhasGALDINO, orçamentárias: Flávio. Introdução a intervenção à teoria judicial dos custosem políticas dos direitos: públicas. direitos Belo não nascem em árvores. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 156. 263 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA demandas de todos os cidadãos brasileiros, diante da es- cassez dos recursos27, logo,

[...] o direcionamento de recursos para um setor

para que outros interesses sejam satisfeitos, na significa retirar (ou ao menos reduzir) recursos- ciários em montante tal que permita compensar a perdatentativa de bem-estarde incrementar dos prejudicados o bem-estar28 dos. benefi

Pública, dentre um universo de diversas possibilidades, passam pelaAs escolhas eleição de trágicas prioridades, feitas que pela são Administração guiadas pela corrente política e ideológica que inspira os representan- tes democraticamente eleitos29. A relação entre os recursos arrecadados e a sua destinação implicará na “implemen- tação de políticas públicas diversas em distintos lugares e para diferentes populações, pois os problemas são dis- tintos e peculiares a cada grupo de pessoas”30, ou seja, os

27 BARCELLOS, Ana Paula de. Constitucionalização das políticas públi- cas em matéria de direitos fundamentais: o controle político-social e

TIMM, Luciano Benetti (Org.). Direitos fundamentais: orçamento e “re- servao controle do possível”. jurídico no2. ed.espaço Porto democrático. Alegre: Livraria In: SARLET, do Advogado, Ingo Wolfgang; 2010. p. 116-117. 28 BOGOSSIAN, André. Levando o orçamento a sério como instrumen- to de controle de políticas públicas. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 5, n. 2, p. 182, jan./dez. 2015. Disponível em:

29 . de controle de políticas Acesso públicas. em: Revista13 jul. 2016. Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 5, n. 2, p. 182, jan./dez. 2015. Disponível em:

30 . Acesso em: 13 jul. 2016. SCAFF, Fernando Facury. Reserva do possível, mínimo existencial e di

Os limites financeiros e orçamentários da intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas de meio ambiente do Poder da intervenção e orçamentários financeiros Os limites reitos humanos. Verba Juris, João Pessoa, v. 4, n. 4, p. 99, jan./dez. 2005. Disponível em: . Acesso em:264 13 jul. 2016. 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS decisão. Neste sentido, refere Ana Paula de Barcellos31: valores de cada sociedade possuem influência direta nesta

preciso ainda decidir como gastar, tendo em con- Além da definição genérica de em que gastar, é

ta os objetivos específicos que se deseje alcançar. queEssas devem escolhas, ser perseguidos portanto, em recebem caráter a prioritário. influência direta das opções constitucionais acerca dos fins gastos públicos não constituem um tema integral- menteDito de reservado outra forma, à deliberação as escolhas política; em matérias ao contrá de- rio, o ponto recebe importante incidência de nor- mas jurídicas de estatura constitucional.

A questão ambiental, pela própria natureza do bem protegido, deve ter prioridade na previsão legal dos 32. Porém, é inegável que, ao decidir sobre uma questão que versegastos sobre públicos, políticas definida públicas por meio de meio do orçamento ambiente, público determi- nando que o Poder Público implemente uma ou outra me- dida, o Poder Judiciário estará interferindo neste orçamen- Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena to público e adentrando no processo de alocação dos re- cursos públicos. Por conseguinte, a decisão judicial terá um - sar despercebido ao julgador, que também precisa levar em consideraçãoimpacto econômico. alguns Estelimites, aspecto, como portanto,o da reserva não do pode possível pas e dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

31 BARCELLOS, Ana Paula de. Constitucionalização das políticas públi- cas em matéria de direitos fundamentais: o controle político-social e

TIMM, Luciano Benetti (Org.). Direitos fundamentais: orçamento e “re- servao controle do possível”. jurídico no2. ed.espaço Porto democrático. Alegre: Livraria In: SARLET, do Advogado, Ingo Wolfgang; 2010. p. 117. 32 SOARES, Inês Virgínia Prado. Meio ambiente e orçamento público. In:

Virgínia Prado (Org.). Desafios do direito ambiental no século XXI: KISHI, Sandra Akemi Shimada; SILVA, Solange Teles da; SOARES, Inês

estudos em homenagem a Paulo Affonso Leme Machado. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 563. 265 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA 3 A REPERCUSSÃO ORÇAMENTÁRIA E A NECESSÁRIA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE DA DECISÃO JUDICIAL

A decisão judicial que obrigue o Poder Público a implementar uma política pública de meio ambiente na- turalmente terá uma repercussão orçamentária, tendo em vista que as políticas públicas demandam gastos. Como os recursos públicos são limitados e muito inferiores ao ne- cessário para prover a todos os cidadãos todos os direi- tos constitucionalmente garantidos, a decisão judicial que priorize o direito ao meio ambiente poderá prejudicar a tutela de outro direito fundamental. Diante deste quadro de escassez, criou-se um li- mite fático para a exigibilidade judicial dos direitos, que é

Estado, e que não pode ser ignorado pelas decisões judi- a sua vinculaçãoreserva estrita docom possível a capacidade33. Este limite econômica fático “[...] do impõe um complexo balanceamento de razões, que envolve ociais, conjunto a chamada de necessidades de dispêndios públicos, exigi- bilidade jurídica desses dispêndios e possibilidade fática de sua realização”34. A teoria da reserva do possível foi desenvolvida a partir de um julgamento do Tribunal Constitucional ale- Numerus clausus.

mão,sido admitidosdecisão que em ficou escolas conhecida de medicina, como em razão da po- líticaA demanda de limitação foi proposta das vagas por em estudantes cursos de que nível não superior haviam -

33 que foireserva adotada do possível pela Alemanhana jurisprudência em 1960.do STF. AoRevista decidir de Direito a ques GV, WANG, Daniel Wei Liang. Escassez de recursos, custos dos direitos e

São Paulo, v. 4, n. 2, p. 540, jul./dez. 2008. Disponível em: . Acesso em: 13 jul. 2016. tárias: a intervenção judicial em políticas públicas. Belo Horizonte:

Os limites financeiros e orçamentários da intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas de meio ambiente do Poder da intervenção e orçamentários financeiros Os limites Fórum, 2009. p. 62. 266 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS tão, o Tribunal entendeu que a prestação desejada pelos estudantes esbarrava na reserva do possível, ou seja, aqui- lo que o cidadão pode, racionalmente, esperar da socieda- de35. A reserva do possível, portanto, não guarda relação apenas com o direito que é colocado à apreciação do Poder Judiciário e com a previsão orçamentária para a sua ga- rantia, mas sim com a razoabilidade da pretensão, embora balizador36. no BrasilEntretanto, a teoria tenha por diversaso aspecto vezes financeiro a questão como do maiorcusto do direito ao meio ambiente e da repercussão da decisão judicial no orçamento público não é levada em considera- ção pelo Poder Judiciário, pois não se confere ao orçamento público o legitimado caráter democrático que possui, en- quanto expressão do planejamento de governo eleito pelos cidadãos. Contudo, a realidade orçamentária precisa ser le- vada a sério, pois o “[...] desperdício de recursos públicos, em um universo de escassez, gera injustiça com aqueles potenciais destinatários a que deles deveriam atender”37. Assim, “[...] não se pode impedir o controle jurisdicional, Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena

35 MÂNICA, Fernando Borges. Teoria da reserva do possível: direitos fundamentais a prestações e a intervenção do poder judiciário na implementação de políticas públicas. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, Salvador, n. 25, p. 11, fev./abr. 2011.

2016.Disponível em:.MÂNICA, Fernando Borges. Teoria da reserva do Acesso possível: em: direitos 13 jul. fundamentais a prestações e a intervenção do poder judiciário na implementação de políticas públicas. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, Salvador, n. 25, p. 11, fev./abr. 2011.

2016.Disponível em:. Acesso em: 13 jul.- tos fundamentais: uma perspectiva de direito e economia? In: SARLET, TIMM, Luciano Benetti. Qual a maneira mais eficienteDireitos de proverfundamen direi- tais: orçamento e “reserva do possível”. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do IngoAdvogado, Wolfgang; 2010. TIMM,p. 60. Luciano Benetti (Org.). 267 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA mas este não pode simplesmente ser feito sem qualquer

resguarde as decisões alocativas feitas legitimamente”38. tipo de parâmetro ou critério objetivo que minimamente Flávio Galdino39 assim refere a respeito:

Na verdade, de modo geral, sequer são cogitados os

sem medo de incorrer em rigor excessivo, é possí- efeitos econômicos das decisões judiciais. De fato,-

vel afirmar que a análise jurídica ignora quase com pletamente as variáveis econômicas envolvidas nas Outras decisõesquestões que judiciais, lhe são postas contudo, para solução. para além de não levarem em consideração a questão do custo do di- reito e da repercussão orçamentária da decisão, colocam o tema como sendo inferior à necessidade de tutela do di- reito ao meio ambiente, sem perceber que a garantia do direito passa, fundamentalmente, pela questão orçamentá- ria. Neste sentido,

Esse tipo de decisão ignora as consequências dis- tributivas, de decisão de alocação de recursos,

- pois decide que alguns ganharão sem pensar em Portanto,quem perderá. tratar Afinal,de direitos se os como recursos se fossem são escasabso- lutossos, nada é decidir que usando custe dinheiro uma dogmática pode ser jurídica absoluto. que faz uso apenas das regras jurídicas e se esquece da realidade40.

38 BOGOSSIAN, André. Levando o orçamento a sério como instrumen- to de controle de políticas públicas. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 5, n. 2, p. 181, jan./dez. 2015. Disponível em:

. não nascem em árvores. AcessoRio de Janeiro:em: 13 jul. Lumen 2016. Juris, 2005. p. 161. 40 reserva do possível na jurisprudência do STF. Revista de Direito GV, WANG, Daniel Wei Liang. Escassez de recursos, custos dos direitos e Os limites financeiros e orçamentários da intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas de meio ambiente do Poder da intervenção e orçamentários financeiros Os limites São Paulo, v. 4, n. 2, p. 563, jul./dez. 2008. Disponível em: .268 Acesso em: 13 jul. 2016. 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Como exemplo deste tipo de decisão, a Primeira ação civil pública por meio da qual o Ministério Público EstadualCâmara Cível pretendia do Tribunal a condenação de Justiça Município do Amazonas de Manaus apreciou a promover o reordenamento de ocupação de área de prote- ção ambiental, bem como a recuperação da área degradada e a implementação de atividades voltadas à educação am- biental, no prazo de 120 dias41 procedentes os pedidos, e o Município de Manaus apelou . A sentença havia julgado- sentençaafirmando era que muito tem adotadoexíguo e umaque aspolítica medidas de desenvolvimen postuladas iam to urbano de forma progressiva, mas que o prazo fixado na O Tribunal, contudo, manteve a sentença de con- muito além dos recursos financeiros do ente público. - ca e orçamentária arguidos pelo Município. O relator, Desembargadordenação, afastando Flávio os Humberto argumentos Pascarelli de ordem Lopes, econômi assim se manifestou:

Apelante, o meio ambiente, como bem jurídico de Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena valorQuanto que à não questão permite orçamentária, a relativização, levantada não se pelotra- ta de gasto extraordinário, mas que deve constar desde a elaboração do orçamento público, uma vez que se trata de bem jurídico integrante ao ‘mí- nimo existencial’. Ou seja, o meio ambiente integra àqueles bens da vida que são indispensáveis à dig- 42.

41 AMAZONAS. nidadeTribunal da pessoade Justiça. humana Apelação nº 0025863-

Manaus. Apelado: Ministério Público do Estado do Amazonas. Relator: 65.2003.8.04.0001, da Primeira Câmara Cível. Apelante: Município de

2016.Des. Flávio Humberto Pascarelli Lopes. Manaus, 22 de junho de 2015. 42 DisponívelAMAZONAS. em: .Tribunal de Justiça. Apelação Acesso nº em:0025863- 13 jul.

Manaus. Apelado: Ministério Público do Estado do Amazonas. Relator: 65.2003.8.04.0001, da Primeira Câmara Cível. Apelante: Município de

2016.Des. Flávio p. 6. Humberto Pascarelli Lopes. Manaus, 22 de junho de 2015. Disponível em: . Acesso em: 13 jul. 269 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA O que se percebe desta decisão é que a questão or- çamentária restou totalmente preterida, sendo colocado o

julgadores asseveraram que o meio ambiente deve fazer partemeio ambienteda elaboração acima do de orçamento qualquer aspectopúblico, econômico. contudo, sem Os levar em consideração a questão da escassez de recursos e da existência de outras possíveis prioridades do adminis- trador público no momento de decisão a respeito de como alocar os recursos públicos. Não apenas a jurisprudência, mas também a dou- trina por vezes deixa de levar em consideração a questão do custo do direito ao meio ambiente e da repercussão da decisão judicial no orçamento público, ou simplesmente afasta categoricamente este argumento, como se infere do posicionamento da Procuradora da República Analúcia de Andrade Hartmann43:

O outro argumento – além da discricionariedade – utilizado pelos órgãos do Estado para a não imple- mentação de políticas públicas, diz respeito à falta das verbas necessárias para tanto. Tal alegação deve

a obrigatoriedade da inclusão, nas previsões orça- igualmente ser afastada pelos Tribunais, haja vista atendimento dos direitos previstos na Constituição. mentárias, dos recursos financeiros necessários ao Assim também é o entendimento de Flávia Piovesan e Renato Stanziola Vieira44:

43 HARTMANN, Analúcia de Andrade. Políticas públicas ambientais: a atuação do Ministério Público. In: D’ISEP, Clarissa Ferreira Macedo; NERY JUNIOR, Nelson; MEDAUAR, Odete (Coord.). Políticas públicas

Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 47. 44 ambientais:PIOVESAN, Flávia;estudos VIEIRA, em homenagem Renato Stanziola. ao professor Justiciabilidade Michel Prieur. dos direi São- Araucaria:

tos sociais e econômicos no Brasil: desafios e perspectivas. us.es/revistas/Araucaria/A%C3%B1o%208%20%20N%C2%BA%20Revista Iberoamericana de Filosofia, Política y Humanidades, Sevilla, 15%20%202006/Flavia%20Piovesan%20e%20Renato%20Stanziola.ano 8, n. 15, p. 140, abr. 2006. Disponível em:

pdf>. Acesso em: 13 jul. 2016.270 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Ora, a Constituição Federal não depende do or- çamento público para a efetivação dos direitos fundamentais (sejam eles individuais ou sociais). Ao contrário, o orçamento, ou as receitas, é que, a partir da preferência constitucional que se deu aos direitos fundamentais, merecem reformu- -

Estado.lação, caso os recursos financeiros sejam escas sos à cobertura geral da demanda financeira do A reserva do possível, enquanto limite imposto à comprovadadecisão judicial45 pela insuficiência de46 recursos vai além: do Estado, somente poderá ser invocada quando esta insuficiência for . FernandoA teoria da Facury Reserva Scaff do Possível somente poderá - cursos arrecadados estão sendo disponibilizados deser formainvocada proporcional se houver comprovação aos problemas de queencontra os re- - dimentos ao pleno exercício das capacidades se- jamdos, sanadose de modo no progressivomenor tempo a fimpossível. de que os impe Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena do Tribunal de Justiça de Santa Catarina julgou apelação in- Neste sentido, a Terceira Câmara de Direito Público

45 MÂNICA, Fernando Borges. Teoria da reserva do possível: direitos terpostafundamentais pela CASAN a prestações (Companhia e a intervenção Catarinense do poder de judiciário Águas na e implementação de políticas públicas. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, Salvador, n. 25, p. 12, fev./abr. 2011.

2016.Disponível Neste mesmo em: . públicas pelo Poder Judiciário. Revista do CursoAcesso de em: Direito 13 jul. da Faculdade de Humanidades e Direito, São Paulo, v. 7, n. 7, p. 24,

em:jan./dez. 13 jul. 2010. 2016. Disponível em: . Acesso Verba Juris, João Pessoa, v. 4, n. 4, p. 99, jan./dez. SCAFF, Fernando Facury. Reserva do possível, mínimo existencial e direitos humanos. 2005. Disponível em: . Acesso271 em: 13 jul. 2016. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Saneamento)47, em face de sentença prolatada nos autos de ação civil pública proposta pelo Ministério Público Estadual, que condenou o ente público a, solidariamente com o Município de Dionísio Cerqueira, regularizar o sistema de

que,esgoto embora urbano a reservado Município. do possível A Câmara seja um negou argumento provimento a ser levadoao recurso em consideração, e o relator, Desembargador não basta ao ente Cesar público Abreu, a alegação afirmou

Em se tratando da concretização de direitos fundamentais, ogenérica Estado edeve retórica comprovar da ausência analiticamente ou insuficiência a razão de pela verbas. qual não possui condições de implementar programa eleito como prioritário pela Constituição. No caso dos autos, a invocação da reserva do possível pelo ente público se deu de maneira genérica, deixando a CASAN de comprovar expressamente a

de tratamento de esgoto. Assim, a o conteúdo da cláusula da reservaalegada doinsuficiência possível, porém, de recursos o afastou para48. implementar a rede Em relação ao direito ao meio ambiente, que pos- sui como característica o envolvimento tanto da sociedade como do Poder Público para a sua proteção e promoção49, é

47 SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 2010.061968- 0 Catarinense de Águas e Saneamento). Apelado: Ministério Público do Estado, da Terceira de Santa Câmara Catarina. de Direito Relator: Público. Des. Apelante: Cesar Abreu. CASAN Florianópolis, (Companhia

06 de março de 2013. Disponível em: . 48 SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 2010.061968- 0 Catarinense de Águas e Saneamento). Apelado: Ministério Público do Estado, da Terceira de Santa Câmara Catarina. de Direito Relator: Público. Des. Apelante: Cesar Abreu. CASAN Florianópolis, (Companhia

06 de março de 2013. Disponível em: .O art. 225 da Constituição Federal estabelece que “todos têm direi-

Os limites financeiros e orçamentários da intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas de meio ambiente do Poder da intervenção e orçamentários financeiros Os limites to ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum 272 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS e completa do caso concreto, levando em consideração os aspectospreciso que fáticos a decisão e jurídicos, judicial não proponha sendo possível uma análise a mera global ale- aspecto ser ignorado.,Assim é a lição de Paulo Marcio Cruz egação Zenildo de insuficiênciaBodnar50: de recursos, mas não podendo este

Essa cautela é relevante para que os objetivos pre- conizados pela Constituição não sejam entendidos apenas como direitos subjetivos contra o Estado, mas principalmente como uma estratégia coleti- va para o alcance da justiça social e ambiental. As limitações fáticas e orçamentárias não podem ser

implementação das políticas públicas ambientais previstaspostas como de forma justificativa completa geral na paraConstituição. a inércia Por na isso, é fundamental a análise criteriosa dos dados

decisões implementadoras de direitos fundamen- taisempíricos prestacionais. do caso concreto para a justificação das

A pesquisa de jurisprudência revela que algumas - Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena ceiro e orçamentário, sendo que pode ser causa de improce- dênciadecisões da judiciais demanda levam a não comprovaçãoem consideração de que o aspecto o ente público finan - lítica pública ambiental postulada. Neste sentido, a Primeira dispõe de recursos suficientes para a implementação da po do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as pre- sentes e futuras gerações”. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

. Disponível em: . meio Acesso ambiente em: ecologicamente 13 jul. 2016. A equilibrado.norma constitucional, portanto, atri 50 CRUZ, Paulo Marcio; BODNAR, Zenildo. A atuação do Poder Judiciário na implementação das políticas públicas ambientais. Revista de Estudos Constitucionais, Hermenêutica e Teoria do Direito (RECHTD), São Leopoldo, v. 4, n. 1, p. 87, jan./jun. 2012. Disponível

em: . Acesso em:273 13 jul. 2016. ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

de Justiça de São Paulo, ao julgar a Apelação nº 0003173- 09.2012.8.26.0294Câmara Extraordinária51, negou de provimento Direito Público à irresignação do Tribunal do Ministério Público Estadual, que se insurgiu contra sentença de improcedência de ação civil pública proposta em face do Município de Cajati. Na referida ação, o Ministério Público pretendia a condenação do Município à obrigação de insta- lar e manter um Centro de Controle de Zoonoses. A sentença julgou os pedidos improcedentes, de- cisão que foi mantida pelo Tribunal. A Desembargadora Luciana Bresciani, ao proferir voto-vista, fez referência à questão orçamentária e à teoria dos custos dos direitos, in- clusive citando o livro de Flávio Galdino, Introdução à teo- ria dos custos dos direitos: direitos não nascem em árvores52. Para ela, as providências requeridas na ação civil pública implicariam em uma revisão da previsão orçamentária do Município, sendo que o Ministério Público não apontou se

para a implementação das medidas postuladas ou se seria obrigadoo ente público a subtrair municipal recursos dispunha de outras de recursos áreas mais suficientes neces- sitadas. Para a julgadora, este constitui um dos principais problemas da substituição da discricionariedade do admi- nistrador público pela do Poder Judiciário, ou seja, quando a decisão judicial impõe determinada obrigação ao Poder - sos do erário53. Público, mas não verifica a real disponibilidade de recur 51 SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Apelação nº 0003173- 09.2012.8.26.0294 Público. Apelante: Ministério Público do Estado de São Paulo. Apelado: Município de Cajati. ,Relator: da Primeira Des. Oscild Câmara de ExtraordináriaLima Júnior. São de Paulo, Direito 05

Acessode novembro em: 13 jul. de 2015.2016. Disponível em: . 52 GALDINO, Flávio. Introdução à teoria dos custos dos direitos: direi- tos não nascem em árvores. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. 53 SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Apelação nº 0003173-

Os limites financeiros e orçamentários da intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas de meio ambiente do Poder da intervenção e orçamentários financeiros Os limites 09.2012.8.26.0294

, da Primeira274 Câmara Extraordinária de Direito 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Sob o prisma do orçamento público, é preciso que o meio ambiente passe a ocupar um lugar de protagonis- entretanto, não é isso que tem sido observado, mesmo com todata no aplanejamento sequência de de catástrofes governo, devido ambientais à sua importância,presenciada. 54:

Assim afirma PauloA integração Affonso Lememeio ambiente Machado e desenvolvimento não é um favor ao meio ambiente. Alguns políticos e empresários, e até meios de comunicação, em numerosos países, entendem que se devem reser-

ambiente, não enxergando que, agindo contra a natureza,var somente o fracasso as migalhas do empreendimento ou as sobras para se o nãomeio é imediato, virá a médio ou longo prazo.

Analisando a questão sob a perspectiva proposta na obra The cost of rights55, a partir do momento em que se assume que a atuação do Estado é indispensável para a efetivação de todos os direitos – até mesmo aqueles que se entendiam como negativos Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena – e se verifica que o Estado somente funciona com os recursos financeiros obtidos permita”por meio56 da. Sendo tributação, assim, se“[...] torna chega-se inconcebível à conclusão uma decisãode que judicialos direitos que só coloque existem a questãoonde há orçamentária fluxo orçamentário como inferior que os à da concretização do direito ao meio ambiente, pois esta depende daquela.

Público. Apelante: Ministério Público do Estado de São Paulo. Apelado: Município de Cajati. Relator: Des. Oscild de Lima Júnior. São Paulo, 05

Acessode novembro em: 13 jul. de 2015.2016. p. Disponível 18-19. em: . 54 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 24. ed.

55 The cost of rights São Paulo: Malheiros, 2014. p. 86. HOLMES, Stephen; SUNSTEIN, Cass R. : why liberty 56 GALDINO, Flávio. Introdução à teoria dos custos dos direitos: direi- tosdepends não nascem on taxes. em New árvores. York: Rio W. deW. Janeiro:Norton & Lumen Company, Juris, 2000. 2005. p. 204. 275 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA A decisão judicial, diante da devidamente compro-

poderávada insuficiência determinar de a inclusãorecursos da e adespesa fim de nãonecessária prejudicar para as a implementaçãoescolhas orçamentárias da política realizadas pública paraque seja o ano objeto em questão, da ação judicial no orçamento do ano seguinte57. José Reinaldo de Lima Lopes58 concorda com esta proposta, assim expondo:

Muitas vezes a impossibilidade econômica existe Nesteporque caso, não éhouve perfeitamente previsão orçamentáriapossível dizer no que ano é impossívelem curso, masaqui podee agora bem conceder haver no certa ano pretensão, seguinte. mas será perfeitamente possível concedê-la no futuro próximo e imediato. Para tais casos, seria aceitável que a decisão consistisse em exigir um novo programa, com prazos, investimentos, mu- danças que adequem a política.

Por conseguinte, se eventualmente o representan- te do Poder Executivo não cumprir esta determinação ju- dicial, socorrendo-se da liberdade na elaboração da peça orçamentária, estará incorrendo em crime de respon- sabilidade, pela desobediência a uma decisão judicial59. Pautando nestes moldes as suas decisões, “[...] os juízes

57 GRINOVER, Ada Pellegrini. O controle das políticas públicas pelo Poder Judiciário. Revista do Curso de Direito da Faculdade de Humanidades e Direito, São Paulo, v. 7, n. 7, p. 24, jan./dez. 2010.

2016.Disponível em: .LOPES, José Reinaldo de Lima. Em torno da “reserva Acesso do em:possível”. 13 jul.In: Direitos fun- damentais: orçamento e “reserva do possível”. 2. ed. Porto Alegre: SARLET,Livraria doIngo Advogado, Wolfgang; 2010. TIMM, p. 170. Luciano Benetti (Org.). 59 SOARES, Inês Virgínia Prado. Meio ambiente e orçamento público. In:

Virgínia Prado (Org.). Desafios do direito ambiental no século XXI: KISHI, Sandra Akemi Shimada; SILVA, Solange Teles da; SOARES, Inês Os limites financeiros e orçamentários da intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas de meio ambiente do Poder da intervenção e orçamentários financeiros Os limites estudos em homenagem a Paulo Affonso Leme Machado. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 567. 276 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS não conduzirão as políticas públicas, mas apenas determi- - meiosnarão quenecessários” se atenda60 .a uma necessidade específica, deixan do a cargoA docoleta legislador jurisprudencial e do administrador revela aque escolha alguns dos Tribunais têm entendido desta forma, buscando solu- ções razoáveis e equilibradas, que pretendam a proteção do meio ambiente, mas levando em consideração os li- mites orçamentários do ente público. Na Apelação Cível nº 1.0394.02.023051-9/00161 Tribunal de Justiça de Minas Gerais apreciou a irresignação , a Quarta Câmara Cível do de Água e Esgoto) contra a sentença que os condenou a im- plementardo Município uma de série Manhuaçu de medidas e do SAAEem relação (Serviço ao tratamento Autônomo - tes industriais, para evitar o lançamento de dejetos no Rio de efluentes da rede pública de coleta de esgoto e efluen A condenação dos entes públicos a cumprirem as determinaçõesManhuaçu. da sentença restou mantida pelo Tribunal, contudo, o acórdão estabeleceu algumas limitações à deci- Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena são, levando em consideração a repercussão orçamentária da decisão judicial, determinando a inclusão da previsão - gado da decisão62. das medidas no primeiro orçamento após o trânsito em jul 60 MAURÍCIO JÚNIOR, Alceu. A revisão judicial das escolhas orçamen- tárias: a intervenção judicial em políticas públicas. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p. 260. 61 MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 1.0394.02.023051-9/001

Apelado: Ministério Público, do da Estado Quarta de Minas Câmara Gerais. Cível. Relator: Apelante: Des. AudebertMunicípio Delage. de Manhuaçu; Belo Horizonte, Serviço Autônomo19 de março de de Água 2009. e EsgotoDisponível (SAAE). em:

. Acesso em: 13 jul. 2016. 1.0394.02.023051-9/001

Apelado: Ministério Público, do da Estado Quarta de Minas Câmara Gerais. Cível. Relator: Apelante: Des. Município de Manhuaçu; Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE). 277 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Neste mesmo sentido, em ação civil pública ajui- zada pelo Ministério Público Estadual em face do Estado do Rio de Janeiro e do Município de São Sebastião do Alto, -

interditarrestou concedida ou desocupar a antecipação residências de tutela, ao longo para finsda extensão de com pelir os entes públicos a tomarem providências a fim de

do curso hídrico do Córrego Valão do Barro, bem como a- promover obras de canalização63 e rebaixamento da calha do curso hídrico. Desta decisão, o Estado do Rio de Janeiro in decisãoterpôs agravo judicial, de sendo instrumento que se deveria, afirmando, levar dentreem conta outros a li- argumentos, o grave prejuízo financeiro provocado pela Em relação a este argumento, a Vigésima Primeira mitação financeira e orçamentária do Estado. - tendeu que a complexidade das medidas impostas, que de- mandamCâmara Cível um alto do Tribunalcusto, associadas de Justiça às do limitações Rio de Janeiro orçamen en- tárias, ou seja, a questão da reserva do possível, não pode ser levantada quando estão em jogo áreas já consideradas de risco iminente, que é o caso da região objeto da ação civil pública. Sendo assim, quando constatada a urgência da medida, a reserva do possível e a separação de poderes devem ceder espaço ao direito ao meio ambiente, aliado à saúde, moradia e integridade da comunidade afetada64.

Audebert Delage. Belo Horizonte, 19 de março de 2009. Disponível em:

. Acesso em: 13 jul. 2016. p. 9. 0047878-91.2015.8.19.0000 Agravante: Estado do Rio de Janeiro. Agravado: Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. Relator:, da Des. Vigésima André PrimeiraRibeiro. Rio Câmara de Janeiro, Cível.

16 de março de 2016. Disponível em:. Acesso em: 13 jul. 2016. 0047878-91.2015.8.19.0000 Agravante: Estado do Rio de Janeiro. Agravado: Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. Relator:, da Des. Vigésima André PrimeiraRibeiro. Rio Câmara de Janeiro, Cível. Os limites financeiros e orçamentários da intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas de meio ambiente do Poder da intervenção e orçamentários financeiros Os limites

16 de março de 2016. Disponível278 em:

grau, nosContudo, termos do a decisão voto do doRelator, Tribunal Desembargador desenhou algumas André limitações, modificando em parte a decisão de primeiro- damente, medidas judiciais que provoquem, de imediato, umRibeiro, alto custoque afirmou aos cofres não públicos, ser possível sem impor, que primeiramente indiscrimina - mentária própria. Assim, se buscou viabilizar a realização dashaja providências um projeto de urgentes, custo e lançamento, mas sem perder com deprevisão vista os orça cri- quetérios no financeiros prazo de um necessários ano os réus para apresentassem a sua efetivação. um projeto Dessa forma, a decisão agravada foi modificada, para determinar- tos necessários para a implementação das medidas deter- minadasde custo ejudicialmente, lançamento, quesendo contenha que a suao orçamento execução dedeverá gas observar os procedimentos licitatórios previstos em lei, fazendo constar a previsão orçamentária próprias das des- pesas necessárias65. Apesar das ressalvas feitas em relação à teoria da reserva do possível, a consideração do seu conteúdo é im- prescindível para que não sejam tomadas decisões judiciais Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena estatal, deixando desamparados, por consequência, outros direitosque impliquem fundamentais. em uma O juiz, falência portanto, da máquina deve realizar econômica uma decisão proporcional e razoável. Neste sentido é oportuna análise ponderada do problema, 66 buscando: chegar a uma a liçãop. de208. Clèmerson Merlin Clève ConsultaProcesso.aspx?N=201500251841>. Acesso em: 13 jul. 2016. 65 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento nº 0047878-91.2015.8.19.0000 Agravante: Estado do Rio de Janeiro. Agravado: Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. Relator:, da Des. Vigésima André PrimeiraRibeiro. Rio Câmara de Janeiro, Cível.

208-209.16 de março de 2016. Disponível em: . Acesso em: 13 jul. 2016. p. Boletim Científico da Escola Superior do Ministério Público da CLÈVE, Clèmerson Merlin. A eficácia dos direitos fundamentais sociais. 279 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Mas a reserva do possível não pode, num país como o nosso, especialmente em relação ao mí- nimo existencial, ser compreendida como uma cláusula obstaculizadora, mas, antes, como uma - ponsabilidade no campo da atividade judicial. cláusula que imponha cuidado, prudência e res Portanto, se a Administração Pública deve levar em consideração, na elaboração das políticas públicas, os 67, entendida como um dever geral de “otimizar o emprego dos meios disponíveis para, com eles, critérios de eficiência interesse público”68 obterbusca osdo melhoresjusto equilíbrio resultados entre possíveis os meios relevantes empregados para e os o e proporcionalidade,69, assim também quedeverá significa se dar “a a decisão judicial que vier a interferir na seara de atuação do finsPoder a seremExecutivo, alcançados” em se tratando da tutela ambiental.

qualquer um dos poderes, inclusive do Poder Judiciário – é ainda maisA questão exigível dano queeficiência tange àda gestão ação doestatal meio – ambien seja de-

União

, Brasília, ano II, n. 8, p. 160, jul./set. 2003. Disponível em: . o desperdício na utilização Acesso de em: recursos”. 13 jul. 2016. TIMM, Luciano Benetti. Eficiência pode ser compreendida como “[...] a busca pelo ótimo, evitan

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Os limites financeiros e orçamentários da intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas de meio ambiente do Poder da intervenção e orçamentários financeiros Os limites 2016.Disponível em: . Acesso em: 13 jul. 280 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS intimamente ligada com a prevenção de danos e agressões aote, poismeio a ambiente, eficiência naconstituindo promoção ume proteção compromisso ambiental indecli está- nável do Poder Público70. As limitações impostas ao controle judicial das políticas públicas de meio ambiente pela questão dos custos do direito e das implicações orçamentárias das decisões, portanto, não impedem a intervenção do Poder Judiciário, apenas a restringem a algumas condicionan- tes, como a de que as decisões sejam tomadas levando-se em consideração os princípios da razoabilidade e da pro- porcionalidade71. Como proposto por Ingo Sarlet e Tiago Fensterseifer72, o que se busca é que o Poder Judiciário cada vez mais cumpra seu papel constitucional na gover- nança ambiental, mas sempre de uma maneira responsá- vel e equilibrada, respeitando os critérios da razoabilida- de e proporcionalidade.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena

- dem ser elucidadas, embora o tema proposto ainda seja bastanteAo recente final destee controvertido artigo, algumas na doutrina considerações e jurispru po- dência brasileira.A pesquisa demonstrou a repercussão orçamentária da decisão judicial que pretenda uma inter- venção em políticas públicas voltadas à proteção do meio

70 JACOBSEN, Gilson. Meio ambiente e omissão do Estado à luz da Constituição. In: VAZ, Paulo Afonso Brum; SCHÄFER, Jairo Gilberto (Org.). Curso modular de direito constitucional. Florianópolis: Conceito Editorial, 2008. p. 217. 71 BOLLAMANN, Vilian. Políticas públicas, direitos fundamentais e os limites da atuação do Poder Judiciário. In: VAZ, Paulo Afonso Brum; SCHÄFER, Jairo Gilberto (Org.). Curso modular de direito constitu- cional. Florianópolis: Conceito Editorial, 2008. p. 610. 72 e o papel do poder judiciário à luz da Constituição de 1988. Interesse PúblicoSARLET,, BeloIngo Horizonte,Wolfgang; FENSTERSEIFER;v. 10, n. 50, p. 42-43, Tiago. jul./ago. A tutela 2008. do ambiente 281 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

ser levado em consideração pelo Poder Judiciário. ambiente,O eEstado a relevância Democrático de o impacto de Direito, financeiro inaugurado da decisão no Brasil com a Constituição Federal de 1988, assumiu um compromisso com a transformação da sociedade, por meio da garantia de um extenso rol de direitos fundamentais, sendo que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado está entre eles. A norma constitucional atri- buiu ao Poder Público e à coletividade o dever de defen- der e proteger o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. Contudo, a Administração Pública se submete a

diversas vezes impedem que o Estado cumpra aquele com- promissouma série assumido de entraves na cartaburocráticos constitucional. e financeiros Neste cenário,que por o direito ao meio ambiente resta, muitas vezes, desampa-

concretas ou omissões no seu dever constitucional. rado e violadoDiante pelos deste entes quadro, públicos, tem aumentado seja por meio consideravel de falhas- mente o número de demandas judiciais levadas à aprecia- ção do Poder Judiciário, pretendendo a responsabilização dos entes públicos à implementação de políticas públicas

públicas, por sua vez, são os instrumentos que o adminis- tradorcom a finalidadepúblico possui de tutela para doconcretizar meio ambiente. o seu plano As políticas de go-

clara a vinculação entre as políticas públicas ambientais e overno, orçamento cuja peça público, chave pois é o a orçamento sua formulação público. e implementa Portanto, é- ção depende do dispêndio de recursos públicos. Proteger o meio ambiente tem elevado custo, ou seja, a garantia do direito ao meio ambiente representa um expressivo gasto

Em função desta, dentre outras razões, mesmo diantede dinheiro de um público. cenário de escassez de recursos vivenciado -

Os limites financeiros e orçamentários da intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas de meio ambiente do Poder da intervenção e orçamentários financeiros Os limites nanceiras de garantir todos os direitos a todos os cidadãos, pelo País, observa-se que o Estado não possui condições fi 282 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS de maneira que não raras vezes o administrador público

área serão alocados os recursos públicos. Muitas são as ve- zes,precisa portanto, fazer em escolhas, que o meio momento ambiente em não que representa decide em uma que prioridade para o administrador, e nas situações em que ao meio ambiente, de forma grave e excepcional, o Poder Judiciárioesta escolha pode do ser Estado provocado provocar a intervir, uma violação controlando ao direito a im- plementação de políticas públicas. Conforme mencionado ao longo deste artigo, as decisões judiciais que tratam sobre a intervenção em po- líticas públicas de meio ambiente têm importante reper- cussão no orçamento público, pois o juiz poderá, ou não, determinar de que forma o ente público deve empregar os seus recursos, na busca pela proteção e promoção do meio ambiente. Em caso positivo, a implementação da decisão judicial pode ser bastante dispendiosa. trazer à luz o fato de que em muitas decisões judiciais, os

Nessa linha, o presente artigo pretendeu debater e Julia Marta Drebes Dörr e Fernanda Dalla Libera Damacena consideração, ou, quando são, cedem espaço para a neces- sidadeaspectos de financeiros tutela do direito e orçamentários ao meio ambiente, não são esquecendolevados em - ceira do Estado e a garantia dos direitos fundamentais, re- presentadao julgador da pelo relação limite existente da reserva entre do possível. a capacidade As decisões finan judiciais apresentadas a título ilustrativo demonstram exa- tamente essa realidade. Note-se que a tutela do meio am- biente é absolutamente fundamental. Sobretudo porque se trata de um dos mandamentos constitucionais do Estado Democrático de Direito. Contudo, é importante observar que a sua garantia pela via do Poder Judiciário deve se orientar pela possibilidade de efetividade. Não são raras as vezes em que pela impossibilidade fática de realização do dispositivo da sentença, a tutela do meio ambiente acaba enfraquecida ou mera retórica. 283 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA A garantia do direito ao meio ambiente depende de recursos públicos, de maneira que decisões envolvendo essa questão têm importante repercussão no orçamento público. Neste sentido, se consideram decisões razoáveis e equilibradas aquelas que pretendem a tutela do meio am-

por exemplo, determinando a inclusão da verba necessária parabiente, a implementaçãomas que respeitam da política os limites pública financeiros ambiental do Estado, no or- çamento do ano seguinte. Assim, devem ser levados em con- sideração os limites estabelecidos pela reserva do possível, sendo realizada uma investigação concreta a respeito da necessidade da política pública ambiental postulada e da capacidade econômica do ente público, respeitando os prin- cípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

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Mélodi Ferrari1

RESUMO: O artigo proposto apresenta um breve resumo museal.histórico Além das políticasdisso, com culturais vista no implementadas cenário atual, analisa-seno Brasil, umabuscando proposta compreender de atuação como baseada elas influenciaram no modelo americano no campo de gestão de instituições culturais que possa ser implan- tada visando a ampliação do conceito de museus como instituição formadora da identidade cultural brasileira, em toda sua pluralidade. PALAVRAS-CHAVE: economia da cultura, museus, políti- cas culturais

ABSTRACT

: This article aims to present a brief historic outlook of the cultural policies implemented in Brazil, in search of understanding how they influenced the museum landscape. Furthermore, in regards to the current scenario, it analyzes a proposal of museum functionality, based on- the american model of managing cultural institutions, that- can be implemented with the goal of amplifying the con KEYWORDScept of museum as an institution that plays a part in form ing brazilian cultural identity, in all its plurality. : cultural economy, museums, cultural policy Mélodi Ferrari 1 Formada em Comunicação Social e com pós-graduação em Economia da Cultura, ambas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), atualmente cursa a graduação de História da Arte na mesma

instituição. Email: [email protected] ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Introdução

- - tura, desinteressantes.Mausoléus, depósito É com deesses velharias, adjetivos vácuo pejorativos de pro quefissionais a população qualificados, costuma péssimas descrever condições os museus de infraestru brasilei-

Instituições museológicas na Europa e Estados Unidos são ros. Mas afinal, como e por que chegamos a essa situação?- - mente.reconhecidas Casos comointernacionalmente o Louvre em Paris, pela ou qualidade o MoMA emde Novaacer Iorque,vo e programação, são importantes e atraem atrativos milhões turísticos de visitantes que movimen anual- tam a economia local e divulgam a identidade nacional. O que impede que esse panorama se desenvolva no Brasil? De acordo com dados do relatório Museu em Números2, o país possui mais de 3 mil unidades museoló- gicas, dentre essas 67,2% são geridas pela esfera pública,

declaram possuir fonte de recursos próprios. Se o papel cerca de 5,7% encontram-se fechadas e somente 22,3% responsável pela situação vigente? Assim, o enfoque desse artigode financiador não será daa demanda cultura pertence por cultura, ao governo, mas sim seriaa oferta. ele Ao questão central é compreender, através de uma breve aná-

tem acerca da cultura, e como isso afeta a gestão dos equi- pamentoslise histórica, culturais, qual o papelprincipalmente e o entendimento os museus. que oEm Estado um país com um contexto político e social como o nosso, que sofreu períodos de colonização e de ditaduras, as políti- cas públicas funcionam como estabilizador e propagador da autoridade vigente. Os últimos vinte anos que vivemos são importantes para compreendermos a mudança desse paradigma. A ampliação do entendimento do conceito de cultura e a criação de mecanismos para a desburocrati-

2 INSTITUTO BRASILEIRO DE MUSEUS (IBRAM). Museus em Números.

Políticas culturais em museus: panorama e perspectivas do cenário brasileiro e perspectivas em museus: panorama culturais Políticas Brasília: Instituto Brasileiro de Museus, 2011; vol. 1 e 2. 292 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS zação do campo museal serão pontos discutidos no arti- go. Como exemplo, apresento o caso do Museu de Arte do Rio de Janeiro (MAR), um dos primeiros no país a seguir o modelo de Organização Social, administrado através de parceria público-privada que vem recebendo um público considerável e exibindo exposições de qualidade.

Políticas Culturais e Financiamento da Cultura

Como ponto de partida, utilizaremos o conceito de -

“cultura” apresentado por Coelho (1997), que utiliza a de finição provinda da antropologia, entendendo ser culturaaquela que melhor se enquadra ao objeto de estudo em questão seja– políticas ela material culturais ou contemporâneas.simbólica, em um Para processo o autor, sociológi - codiz de respeito constituição. a tudo aquiloOu seja, que cultura resulta é manifestaçãoda produção humana, popular produzida com ou sem a intervenção do Estado. Contudo, o modo como a administração governamental trata o tema é relevante para ampliar e difundir a cultura. As políticas culturais têm função de desenvolver o setor, fortalecendo a produção, formação, difusão e consumo da cadeia cultural, articulando planos, estratégias e diagnósticos que corri-

- lítica,jam as e falhas não aonesse contrário; sistema assim, (BARBALHO, o Estado 2005). possui Segundo papel fundamentalBotelho (2001), de oregulamentador financiamento édesse determinado processo. pela Para po a compreensão do funcionamento das políticas públicas cul- - rica acerca do tema. turais no Brasil, faz-se necessária uma breve revisão histó

As intervenções na área cultural podem ser obser- Mélodi Ferrari vadas desde o período colonial no Brasil. Segundo Rubin (2012), quando o Estado, ainda sob formato de monarquia, persegue as culturas indígenas e africanas e proíbe a ins- talação da imprensa nacional e a criação de universidades, 293 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA está indiretamente interferindo na política cultural, apesar de tratar-se de tempo anterior a essa caracterização. Sob esse contexto, observa-se uma doutrina autoritária, utili- zada para preservar e legitimar uma cultura dominante. O panorama não irá mudar nem com a Independência do país nem com o advento da República. Será somente na década de 30, com a ascensão de Getúlio Vargas ao poder e a criação do Estado Novo, que

como a industrialização, urbanização e a construção de umas políticas Estado nacionalculturais centralizadooficialmente favoreceramtomam forma. a Fatorescriação das primeiras organizações públicas voltadas para a pre- servação das identidades culturais. Dentre elas se desta-

(SPHAN)3 e outros órgãos destinados a regulamentar ca o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional de Teatro (SNT), o Instituto Nacional do Livro (INL) e o Institutoáreas específicas Nacional dado culturaCinema como Educativo o Serviço (INCE), Nacional todos veiculados ao Ministério da Educação e Saúde durante a gestão de Gustavo Capanema. Contudo, esses mecanis- mos ainda possuíam a visão de cultura caracterizada pelo autoritarismo. Naturalmente, pelo caráter totalitário do instituto, esse meio era orquestrado pelo Departamento de Informação e Propaganda (DIP), que articulava censu- ras às manifestações culturais, próprias de qualquer dita- dura. O Estado utilizava a cultura como instrumento para a construção de uma nação, “valorizando o nacionalismo, -

a brasilidade, a harmonia entre as classes sociais, o traba lho e o caráter mestiço do povo brasileiro” (RUBIN, 2012, p. 33), moldando o discurso da forma com que melhor lhe conviesse. No período de redemocratização, não houve 3 que O SPHAN é uma posteriormenteautarquia do Governo se transformará do Brasil, novinculada Instituto ao do Ministério Patrimônio da Cultura,Histórico responsável e Artístico pelaNacional preservação (IPHAN), do existenteacervo patrimonial até os dias tangível de hoje e

Políticas culturais em museus: panorama e perspectivas do cenário brasileiro e perspectivas em museus: panorama culturais Políticas intangível do país. 294 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS políticas culturais. significativasEm 1964, intervenções apesar da governamentais intervenção militar no noque país, tange as políticas relacionadas à cultura não sofrem grandes trans- formações, inicialmente; o momento político atribulado fertilizou a articulação de diversos segmentos de cultura popular nos variados cantos do Brasil, como os centros populares de cultura (CPC) e o movimento dos estudantes nas universidades. Porém, quanto mais duro tornava-se o regime, maior era a censura e opressão a esses segmentos, - eperíodo crescia denominado a imposição abertura,de uma cultura sob o governo midiática de sofistica Geisel e Figueiredo,da e reprodutora a produção da ideologia cultural oficialvolta a (RUBIN,ter papel 2012). essencial No - ve uma ampliação dos investimentos na área, a criação dacomo Fundação formadora Nacional da identidade de Artes nacional(FUNARTE) – inclusive,4 e do primei hou- ro Plano Nacional de Cultura (PNC)5, em 1975. Fernandes (2013) conclui que essas articulações foram importantes, pois marcaram uma mudança na destinação dos recursos para a cultura: se, antes, a prioridade era a preservação do - dades culturais. Esses movimentos culminaram na autono- miapatrimônio do Ministério histórico, da Cultura,agora, passam-se criado como a incentivar órgão indepen ativi-

Uma importante medida tomada pelo Ministério dente em 1985, já no governo Sarney. essa iniciativa caracterizou um movimento paradoxal, pois, aoda Culturamesmo foitempo a criação em que da Leidiversos Sarney. órgãos Para Rubineram (2012),criados para centralizar a administração da produção cultural, a

- Mélodi Ferrari cas públicas de fomento às artes visuais, à música, ao teatro, à dança e 4 ao Órgão circo. existente até hoje responsável pelo desenvolvimento de políti 5 O PNC é um conjunto de diretrizes estratégicas formuladas a partir de - mente atores, ações e políticas públicas de cultura. amplos debates com a sociedade, cujo fim é o de articular sistemica 295 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

diminui sua participação, e estabelece que as verbas se- jamlei propunha buscadas ono financiamento mercado. Inaugura-se, indireto daassim, área. a Oforma Estado de

financiamento cultural, com incentivos fiscais. Segundo- teDurand divulgados (2013), e avaliados.a Lei Sarney Além sofreu disso, diversas a lei não críticas, distinguiu e até ashoje iniciativas seus resultados culturais, quantitativos sem processo não de foram aprovação propriamen técnica, - le de onde os recursos estavam sendo investidos, podendo- dos projetos propriamente ditos; assim, não houve contro- ramento dessa lei deu-se no governo de Fernando Collor de-se Melo,financiar realizado espetáculos em 1991, puramente dentro do comerciais. Programa O Nacional aprimo de Apoio à Cultura (Pronac)6

, com a chamada Lei Rouanet – um dosEssas principais propostas mecanismos foram decorrentes de financiamento da onda cultural neoli- beralutilizados surgida no paísa partir até daos décadadias de dehoje. 80. A política de enxuga- mento do Estado pela redução dos investimentos nas áreas sociais impulsionou o governo a revisar as políticas públi- cas, atingindo, principalmente, a cultura. A problemática atual relativa ao incentivo cultural no Brasil é a não-revisão dessa proposta desatualizada, representada pela vigência praticamente inalterada da lei Rouanet. Para Durand, a lei

recursos públicos, pois o mecenato aqui imposto tornou-se umde incentivo mero repasse fiscal denão verbas muda públicas. a dependência Assim, do os setor setores pelos de

patrocínios da área cultural, privilegiando somente um segmentomarketing seguro das empresas de mercado, atuam no como qual distribuidoresprojeta-se retorno dos pecuniário aos seus investimentos.

Fundo Nacional de Cultura (FNC) previsto por editais; o indireto, re- 6 O PRONAC prevê o financiamento por três vias: o direto, através do

realizaçãonúncia fiscal; de projetos e o misto, artísticos Fundos com de Investimentoparticipação dos Cultural investidores e Artístico nos

Políticas culturais em museus: panorama e perspectivas do cenário brasileiro e perspectivas em museus: panorama culturais Políticas possíveis(Ficart) até lucros. hoje não implantado, que prevê recursos privados para a 296 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

relacionam-seOs problemas existentesao fato de hojeprodutores no Brasil, culturais quanto de à grandecaptação e depequeno recursos portes via leislutarem de incentivo pelos mesmos fiscal, recursos, num universo ao qual se somam as insti- tuições públicas depauperadas, promovendo uma concorrência desequilibrada com os produtores independentes. (BOTELHO, 2001, p. 78)

Contudo, a Constituição de 1988 reserva uma se- o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes dação cultura específica nacional, para a e Cultura: apoiará “oe incentivaráEstado garantirá a valorização a todos e a difusão das manifestações culturais” (BRASIL, 1988, - tural brasileiro bens de natureza material e imaterial, va- lorizandoartigo 215). memórias Além disso, e identidades firmam-se comode diferentes patrimônio grupos cul formadores da nação. Ou seja, responsabiliza-se o Estado pela produção cultural nacional, em sua pluralidade de manifestações. Foi a partir de 2003, com a ascensão do Partido dos - ra foram aplicadas. O presidente Luis Inácio Lula da Silva nomeiaTrabalhadores como Ministro ao poder, da que Cultura novas o diretrizesartista baiano para Gilberto a cultu Gil, cuja marca como gestor, em suas próprias palavras, se- ria a abrangência. Deste modo, prioriza-se o diálogo com a sociedade – maneira de combater o unilateralismo vigente na área, e ampliar o escopo de políticas culturais democrá- ticas na área da cultura (RUBIN, 2012). Além disso, adota-se o conceito antropológico de cultura, fundamental para esse novo momento. Segundo essa concepção, não só os artistas, mas todos os indivíduos

são produtores de cultura, e é através das suas relações in- Mélodi Ferrari terpessoais que constroem-se sentidos, valores e identida- des, permitindo a estabilidade social. Direcionando as polí- ticas culturais a partir desse caráter abrangente, coloca-se em foco a diversidade de culturas existente no país, dando 297 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA voz às manifestações populares, de gênero, afro-brasilei- ras, indígenas, dentre outras.

Embora as duas dimensões – antropológica e so- ciológica – sejam igualmente importantes, do pon- to de vista de uma política pública, exigem estra- tégias diferentes. Dadas suas características estru- turais, devem ser objeto de uma responsabilidade

em seu conjunto. A distinção entre as duas dimen- sõescompartilhada é fundamental, dentro pois do temaparato determinado governamental o tipo de investimento governamental em diversos paí- - gente de cultura e outros delimitando o universo ses, alguns trabalhando com um conceito abran - específico das artes como objeto de sua atuação. A delimitaçãoabrangência de dos estratégias termos de de cada suas uma respectivas dessas defi po- líticasnições culturais.estabelece (BOTELHO, os parâmetros 2001, que p. 74) permitem a

construído foi o Sistema Nacional de Cultura (SNC), que prevê a gestãoNa mesma dos investimentos linha, outro importantena área de forma mecanismo trans- parente, democrática e inclusiva; as políticas culturais de- vem, assim, serem realizadas de forma participativa, abran- gendo as três esferas governamentais – município, estado, nação. Também, expressa-se respeito às inúmeras culturas que compõem a matiz nacional. O SNC é regulamentado - gão colegiado, integrante do Ministério da Cultura, ao qual competepelo Conselho a formulação Nacional de depolíticas Política públicas Cultural para (CNPC), a cultura ór a partir da articulação de diferentes níveis do governo e da sociedade civil organizada. Seus membros são acadêmicos, empresários e representantes do setor artístico. Também, em 2013, o MinC instituiu o Programa

-

Políticas culturais em museus: panorama e perspectivas do cenário brasileiro e perspectivas em museus: panorama culturais Políticas de Cultura do Trabalhador, cujo principal projeto é o Vale Cultura. Trata-se de um benefício no valor de 50 reais men 298 sais destinado aos trabalhadores que recebem até cinco 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS salários mínimos. O vale pode ser utilizado em serviços e produtos culturais como teatro, exposições, cinema, con- que se cadastrarem no programa podem abater o valor até 1%certos, do showsimposto e comprade renda de devido. livros, CDsO objetivo e DVDs. desse As empresas progra-

àsma práticas é colocar culturais, a decisão visando de escolha a democratização no que tange odo consumo setor. da cultura nas mãos do trabalhador, incentivando o acesso poder, as mudanças no setor cultural vem sendo graduais, Apesar do Partido dos Trabalhadores se manter no- ceira em todos setores; muito vem sendo realizado, contu- e sujeitam-se a um panorama internacional de crise finan que uma das principais limitações das políticas culturais públicasdo ainda nohá muitoBrasil queé o fatoser feito. delas Botelho, nunca alcançarem, em 2013, afirmou por si próprias, a dimensão antropológica.

Os Museus Brasileiros e o Modelo Americano

O campo museal passou por diversas transforma- ções nas últimas décadas. No início do século XX, os museus - daforam indústria criticados cultural, por representarem decretou-se a somentesua morte. a história Contudo, ofi a partircial e o do patrimônio movimento das denominado elites. Nos anos Nova 60, Museologia com o advento, seu conceito amplia, o museu se consolida como importante instrumento de difusão e democratização cultural.

Os museus conquistaram notável centralidade no panorama político e cultural do mundo contem-

setores da política e da intelectualidade brasilei- Mélodi Ferrari raporâneo. apenas Deixaramcomo casas de onde ser se compreendidos guardam relíquias por

como lugares de interesse secundário do ponto de vistade um sociocultural. certo passado Eles ou, passaram na melhor a serdas percebidos hipóteses, 299 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA como práticas sociais complexas, que se desenvol- vem no presente, para o presente e para o futuro, como centros (ou pontos) envolvidos com cria-

e preservação de bens e manifestações culturais. Porção, tudo comunicação, isso, o interesse produção político de nesse conhecimentos território simbólico está em franca expansão. (MINC, 2010, p.24)

No Brasil, a partir da década de 30, foram criados diversos museus com o intuito de valorizar a identidade

propostas pelo Estado Novo. Esse movimento resultou emnacional, um esforço seguindo para os o parâmetrosdesenvolvimento das políticas do setor. culturais Nas dé- cadas seguintes, impulsionado pelo período pós-Segunda

Internacional de Museus (ICOM) consolidando a área mu- seológicaGuerra, houve – inclusive a articulação no Brasil, para país amembro criação dessa do Conselho organi- zação desde sua fundação. Segundo Santos (2004), os regimes ditatoriais da década de 70 na América Latina fomentaram as discussões - tiplicação dos museus na década de 80. “O aumento dos museusacerca do locais papel representaria do museu na asociedade, abertura derefletindo lugares nade mulcon- vívio, dando espaço tanto para o fortalecimento de auto-es- tima e criatividade, como para manifestações solidárias” (2004, p.71). Enquanto no cenário mundial – Europa e EUA – buscava-se o processo de comercialização de narrativas e dos elementos simbólicos, captando grandes investimen- tos e atraindo o maior número de visitantes possíveis, no Brasil a situação era diferente. O modelo neoliberal pouco contribuiu para o desenvolvimento do setor, pois aliou a infraestrutura estatal precária com o modelo de incentivo - tais que possuíam maiores investimentos. fiscal, ocorrendoComo já umamencionado, centralização o campo dos museuscultural nasrearticu capi-

Políticas culturais em museus: panorama e perspectivas do cenário brasileiro e perspectivas em museus: panorama culturais Políticas lou-se no Brasil nos anos 2000, e novas perspectivas para 300 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS os museus foram propostas. Na administração cultural de , em 2003, previsto dentro do Sistema Nacional de Cultura, foi lançado o documento que estipulou o pro- cesso de construção da Política Nacional de Museus. Dentro de suas diretrizes está a criação do Sistema Brasileiro de - - tura,Museus fomento (SBM), para o fomento aquisição de ecapacitação preservação de de recursos acervo hue a criaçãomanos para do Cadastro área, informatização, Nacional de Museus. melhorias da infraestru O SBM tem como objetivo desenvolver e promover as diversas instituições museológicas existentes no país. A iniciativa representa uma importante ferramenta de ar- ticulação da Política Nacional de Museus, pois consolida e amplia a rede de parcerias institucionais, promovendo a capacitação de servidores e divulgando ações regionais em nível nacional. Atuando em conjunto com o SBM, o Cadastro com amplitude nacional dos museus, formando o primeiro censoNacional museológico. de Museus Essa estabelece iniciativa uma é fundamental plataforma unificadapara co- a partir desse cenário, é que as políticas culturais da área serãonhecer construídas. e mapear as diferentes instituições existentes pois, Em 2009 foi criado o Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM), uma autarquia vinculada ao Ministério deveres e obrigações relacionados aos museus federais. Oda órgão Cultura. tornou-se Atua em responsável substituição pela ao Política Iphan nosNacional direitos, de preservação dos acervos, aumento de arrecadação e da vi- Museus, implementando melhorias no setor – aquisição e- to das articulações culturais que ocorrem no país e da nova sitação. O Ibram representa um marco histórico, pois é fru formulação de conceito ampliado de museu, valorizando Mélodi Ferrari seu papel na consolidação das diversas culturas nacionais. Além disso, agora, as instituições museais possuem órgão - rismo na área. próprio de regulamentação,301 fiscalização e fomento ao tu ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Apesar das articulações a nível político, a situação da maioria dos museus no Brasil ainda é precária. O pró- prio MinC, através do Relatório de Gestão das Políticas de

cenário atual: precariedade no nível jurídico e administra- tivo,Museus falta especifica de fomento alguns aos fatoresinvestimentos, que contribuem má gestão, para falta o de público e a não-valorização das pesquisas e dos acer- vos. Aqui, não se pretende abordar as questões relativas a público e pesquisa, mas sim o caráter gerencial e a capta- ção de recursos, pois acredita-se que somente com inves-

vivo, aberto e de diálogo com a sociedade. timento em ações significativas o museu será um espaço

no modeloComo francês. já ficou Contudo, claro no não capítulo é assim anterior, que funciona no Brasil, na prática;o Estado as tem leis o de papel incentivo, de financiador como a Lei da Rouanet, cultura, represencom base- tam uma grande parcela do investimento: 25,7%, segundo dados do Museu em Números. Para Abreu (2010), apesar da iniciativa privada ter assumido o papel de investidor da cultura, o apoio se dá em situações pontuais, onde visa-se retorno em termos de imagem institucional – diferente de - - uma cultura de mecenato, que se baseia na noção de filan tropia (investimento em benefícios sociais que não neces sariamente necessitam de uma contraposta de benefício fiscal).

poucaQuando autonomia, tratamos daque dependência demandam a da captação política de patrocíniosmarketing das de curtoempresas, prazo, temos em geral instituições a cada tempo com- rada, a cada exposição, a cada nova turnê de uma orquestra ou a cada novo ciclo de um programa educativo. (SCHULER, 2012, p.130)

O modelo americano baseia-se no oposto do fran- cês: a opinião pública coloca-se contra o patrocínio go-

Políticas culturais em museus: panorama e perspectivas do cenário brasileiro e perspectivas em museus: panorama culturais Políticas vernamental das artes e a política de mecenatos é extre- 302 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

mamente forte. Contudo, não se pode 7dizer. Abreu que (2008) não haja irá a intervenção do Estado; há políticas culturais muito bem- definidas para esse sistema funcionar - identificar duas concepções que embasam essa sistemáti ca: primeiro, historicamente, houve a criação de organiza forteções etradição associações de envolvimento que servem comodo empresariado fiscalizadoras e dae queso- acompanham as ações do poder público; e, segundo, há ciedade civil,Uma quedas vêemprincipais a importância estratégias do utilizada investimento nos EUA em áreas culturais, a fim de valorizar a identidade nacional. - - foi a criação do National Endowment for the Arts, que ser ve para fomentar a sustentabilidade financeira de institui ções culturais, além de financiarendowments pesquisas, são: incentivar o intercâmbio de artistas e profissionais da área (DURAND, 2012). Segundo Schuler os uma determinada organização faz crescer conti- nuamente,Fundos permanentes apenas retirando de aplicação (para ofinanceira, cumprimento que dos objetivos da instituição) os resultados líqui- dos obtidos, isto é, o rendimento alcançado me-

fazer o fundo crescer consistentemente ao longo donos tempo, a inflação de modo do período que os deresultados apuração. por O ele foco ge é- rados possam custear uma parcela recentemente

p. 131) significativa do orçamento da organização. (2012, Ainda segundo o autor, o fundo patrimonial, como é denominado no Brasil, é uma garantia de permanência e ampliação contínua dos serviços culturais de um museu. Sabendo antecipadamente a fatia de orçamento que pode- Mélodi Ferrari

- 7 Não existe nenhuma estrutura administrativa semelhante ao Ministério- pondemda Cultura pelos nos segmentos EUA. Contudo, políticos. há uma A principal multiplicidade no ramo de cultural agências está re o guladoras que são fiscalizadas por comitês do poder legislativo e res

National Endowment for the Art.303 (DURAND, 2013) ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA rá ser resgatada, é mais fácil gerir os recursos e estipular quais são as prioridades a serem tomadas, e o planejamen- to entra em foco. Normalmente, o endowment de certa ins- - suidoras de grandes fortunas. No caso americano, os endo- wmentstituição é constituído por doações de pessoas físicas, pos

cultural que constituem-se será preservada. pelo forte Ou seja, sentimento a doação filantrópicotem um ca- ráterque existe: perpétuo, o objetivo, vinculada pessoal, ao dever é a garantia social. de uma herança Durand questiona a existência do mecenato no

eBrasil. não o Para empresário ele, o modelo e sua vigente família. de Para redução Abreu, fiscal o Estado faz com já adotouque as alguns empresas incisos se tornemclaros com as principaisrespeito ao financiadoras, mecenato no país, como instituir a doação incentivada – ou seja, a trans- - ceiros para projetos culturais, previamente aprovados pelo ferência, sem finalidade promocional, de recursos finan criar a cultura de compromisso das elites com a responsa- bilidadeMinC. Mas, sócio/cultural. segundo Botelho, a real dificuldade está em

- Aca escolha e pelo qualdo indivíduo ele se dispõe é por não aquilo só aque investir, lhe é mais mas próximo,também a por lutar. aquilo Por isso com o investidoro qual mais individual se identifi é a fatia que o Brasil precisa conquistar na ampliação dos parceiros do jogo nesta articulação de esfor- ços que, cabe insistir, têm de ser articulados por

(BOTELHO, 2001, p.79) uma política pública criteriosamente escolhida.

endowments - No Brasil, ainda não há nenhum modelo de lei para dos museus. . ASchuler rede brasileira destaca, étambém, composta que, por além museus do proque são,blema em do sua financiamento, maioria, geridos há a questãopor e como da política órgãos depúblicos. gestão

Políticas culturais em museus: panorama e perspectivas do cenário brasileiro e perspectivas em museus: panorama culturais Políticas - 304 Assim, os museus brasileiros financiam-se mediante recur 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

Estado repassa apenas os recursos mínimos para a manu- sos orçamentários e editais das leis de incentivo fiscal. O dos museus é negligenciada. Ou seja, projetos educativos, tenção e administração desses institutos, mas a função-fim- pendentes de iniciativas políticas, em cada uma das esferas demuseografia governo. Mesmo e exposições os museus têm seus privados aportes requerem financeiros de fun de- dos dessa espécie para seu funcionamento. Segundo dados do Museu em Números, 77,7% dos museus brasileiros não possuem orçamento próprio. Muitas vezes, os museus, para ter uma fonte ex- tra de recursos, optam pela criação das Associações de Amigos – parcerias entre o poder público e a sociedade ci- - to, não podem deixar de serem revistos no modelo atual de administraçãovil. Contudo, outros museal. fatores, Cita-se, além entre da falta eles, de a rigidezfinanciamen buro- crática, a permanente instabilidade política na gestão e a imobilidade e estabilidade dos empregados públicos, que não possuem incentivos. brasileiro que tem dado resultado, quando se trata de insti- tuições culturais:Segundo a Schuler, Organização há um Social modelo (OS). administrativoAs OS, criadas por lei federal número 9.637 em 1998, funcionam como civil; esta, através de organizações culturais privadas sem uma gestão compartilhada entre o governo e a sociedade- rais. A relação é regida por um contrato de metas, regras e valores;fins lucrativos, as primeiras assume devem a gestão ser alcançadas,dos equipamentos e as segundas cultu - tegralmente. Dessa forma, governo e sociedade civil criam umobedecidas, acordo simbiótico, para que o sustentado repasse financeiro pelo interesse se concretize mútuo inna Mélodi Ferrari

Assim, ainda de acordo com o autor, com a possi- preservaçãobilidade dessa e noforma fomento de administração do patrimônio jurídica, cultural. a institui-

305 ção ganha autonomia cultural, organizacional e financeira; ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA ou seja, passa de uma gestão voltada aos meios para uma

- ramentasque prioriza que os outrora, fins. Além sob disso,o modelo esse burocrático modelo possibilita de gestão a estatal,multiplicação não eram das fontespossíveis, de financiamentocomo: o aluguel através dos espaços de fer para eventos, a venda de produtos próprios (loja e café), a venda de ingresso e o aumento do patrocínio direto e das parcerias institucionais. Importante ressaltar que a OS não se trata de privatização e sim publicização, pois não envol- ve lucro.

O Museu de Arte do Rio de Janeiro

Criado em 2012, o Museu de Arte do Rio de Janeiro (MAR), é um museu público de arte e cultura visual admi- nistrado por uma Organização Social, o Instituto Odeon. Aberto ao público em março de 2013, o MAR faz parte do projeto de revitalização da região portuária do Rio de Janeiro, uma iniciativa da Prefeitura. Segundo o relatório de gestão de 2013, o foco da instituição é na educação e aquisição e preservação de acervo, visando a democratização do público, consolidan- do o museu como um equipamento cultural da cidade. Programas de atendimento às escolas públicas e a capaci- tação de professores são importantes instrumentos utiliza- dos pelo MAR para a consolidação de sua missão, só possí- veis graça a autonomia de gestão. Apesar da recente abertura, o MAR já possui nú- meros invejáveis para qualquer museu brasileiro, são mais de 300 mil visitantes em 2013 e 200 mil em 2014. Além - 8. disso, segundo pesquisa da Datafolha a instituição é conhe cida porSecretaria mais Municipalde 60% dedos Cultura habitantes e J. Leiva doCultura Rio & de Esporte. Janeiro Outubro

Políticas culturais em museus: panorama e perspectivas do cenário brasileiro e perspectivas em museus: panorama culturais Políticas 8 de Fonte: 2013. Pesquisa Hábitos Culturais dos Cariocas - Instituto Datafolha, 306 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS

FIGURA 1 – Percentual de fontes orçamentárias MAR FONTE: Relatório de Gestão MAR 2013

Segundo dados do Relatório de Gestão de 2013

(FIGURA 1). Apesar da maioria do investimento ainda ser provenienteé possível identificar do poder público as fontes – o orçamentáriasrepasse governamental do MAR da captação pelo patrocínio da Lei Rouanet, que aumen- foi 24 milhões durante os dois anos de gestão – e através- guinte, é interessante observar a porcentagem de recursos tou de 5.2 milhões em 2013 para 8.1 milhões no ano se tímida, na primeira fase em 2014, somaram mais de 88 mil reais.provenientes de doações sem incentivos fiscais. Apesar de O repasse governamental, segundo o Relatório de Gestão, dá conta das despesas relativas ao funcionamento

- e operação do museu. Sendo assim, pode-se afirmar que Mélodi Ferrari ao programaçãorestante das fontes expositiva orçamentárias e as atividades – as não-estataiseducativas. Para– fi osnanciam próximos a manutenção anos, segundo das a atividades-fins própria instituição, do MAR, projeta-se como um incremento do percentual orçamentário advindo das fontes privadas. 307 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Considerações finais

- rais brasileiras, pode-se compreender a atual situação em que o paísRevisando se encontra, o processo no que histórico toca as manifestaçõesdas políticas cultu cul-

- turais financiadas pelo Estado. A cultura é ainda um setor que sofre grande influência quanto ao panorama econômi- caco mundial;não podem porém, ser esquecidos. em meio à criseA discussão econômica, deve os continuar avanços crescendo,que os últimos no sentido governos da conquistaram valorização da nessa cultura, área da específi memó- ria e das identidades locais e regionais. O modelo de gestão através de OS não traz solu- ções imediatas, mas é um passo positivo em direção à des-

brasileirosburocratização não se dos interessam processos por de institutos viabilização deste financeira caráter dos museus. Deve-se desmistificar a concepção de que os-

de– de museus que museus trata-os são como prédios espaços velhos vivos e e empoeirados, democráticos, es e acreditamosquecidos e abandonados que, ampliando-se por definição. os escopos A nova de articulaçãoprograma- ção, amplia-se a participação do público e, consequente-

museológicas para a sociedade. mente, a relevância cultural e ideológica das instituições REFERÊNCIAS

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Luiz Felipe Teves de Paiva Sousa1

RESUMO: A proposta do presente artigo se baseia na ela- - ção com a política urbana através da análise de um caso em especial:boração de o processouma leitura de dotransformação atravessamento presente da financeiriza na opera- ção urbana consorciada (OUC) da região portuária do Rio

Para tanto, serão utilizados como fundo teórico os autores ligadosde Janeiro, à pesquisa conhecido acerca como do projetobiocapitalismo, do Porto enquanto Maravilha. a comnova relação apresentação à gestão da do configuração território e dos do sujeitos, capitalismo entenden atual.- do,Elaborar-se-á nos arranjos o atravessamento construídos através do processo da utilização das finanças dos au- tores destacados, as facetas das mudanças jurídicas, políti- cas e governamentais que conduziram e conduzem o em- com a vinculação que existiria entre o controle do capital

sobrepreendimento a vida (bios urbano.) e as Assim, políticas transitará públicas na urbanas financeirização em suas Luiz Felipe Teves de Paiva Sousa complexidades concretas. No caso em especial, por dois para o projeto; e, vinculação do projeto e da vida à capaci- dadepilares: do utilização empreendimento de um fundo de ser público valorizado dos trabalhadores via mercado de capitais.

Rio de Janeiro – UERJ. Graduado em Direito pela Universidade Federal 1 do Mestre Rio de em Janeiro Filosofia – UFRJ.e Teoria E-mail: do Direito [email protected]. pela Universidade Participante Estadual doda

rede Universidade Nômade. 311 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA PALAVRAS-CHAVE: -

Porto Maravilha; biocapitalismo; fi nanceirização;ABSTRACT: flexibilização jurídico-política. - The purpose of this article is based on the de velopment of a reading of the crossing of financialization with urban policy through the analysis of a particular case: the process of transformation present in the consortial urban operation (OUC) of the port area of ​​Rio de Janeiro, known as the Porto Maravilha project. For this purpose,- will be used as theoretical background the authors linked to the research about biocapitalism, as the new presen tation of the current capitalism configuration. It will be elaborated through the crossing of the process of finance regarding the management of the territory and subjects,- understanding through arrangements constructed by the reading of those prominent authors, the facets of the le gal, political and governmental changes that permeates the- highlighted urban development. Thus, carried forward in financialization with the link that exists between the con trol of capital over the life (bios) and urban public policies- in their concrete complexities. In the particular case, over two pillars: the use of a public fund of workers for the proj ect; and project linking and life to the enterprise’s ability to KEYWORDS: - be valued via the capital market. Porto Maravilha; biocapitalism; financializa tion; flexibility of politics and law. Introdução

Ao longo dos últimos anos, as políticas públicas implementadas por dentro da lógica do Estado de Bem- Estar social não têm encontrado mais lugar. Mundialmente, principalmente a partir da década de 1990, como veremos, os novos impulsos para investimentos em quaisquer áreas,

Porto Maravilha: entre a financeirização, o biocapitalismo e a flexibilização do direito a financeirização, o biocapitalismo e flexibilização entre Maravilha: Porto - 312 públicas e privadas, adviriam das formas de financeiriza 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS ção e de garantias que repousariam no papel central exer- cido pelo mercado de capitais. Formas que cada vez mais individualizariam os investimentos e os riscos, operacio- nalizando-se através de uma ótica de securitização a ser

E, da mesma forma, as políticas públicas urbanas, assumida pelos sujeitos nas suas escolhas no mercado. - - vésde transformações da atuação dos das mercados cidades efundiários das habitações e da sociais,regulação se guem esses fluxos. Conforme Raquel Rolnik afirma, “atra também uma economia política da urbanização, reestrutu- urbanística, a economia política da habitação implicou das cidades e na vida dos cidadãos” (2015. p. 29). Formas novasrando ade cidade lidar (...),com com a previsão impactos e profundoso exercício no dos redesenho direitos, não mais a serem demandados diante do Estado providên- cia, mas a serem organizados através das garantias e dos

Nesse cenário, a proposta do presente artigo é entendermecanismos essas creditícios transformações dos mercados mais geraisfinanceiros. e também da economia política urbana através de uma breve análise de - um caso concreto: o projeto do Porto Maravilha. A ques- preendimentotão que se colocaria e a gestão frente dos a sujeitosesse desafio no território. seria a tentativa Deve-se ressaltarde compreender que já existem como análises a financeirização que se propuseram atravessa explo o em- aprofundar um pouco mais na direção das tendências do Luiz Felipe Teves de Paiva Sousa rar o papel das finanças, mas talvez ainda seja necessário- pitalismo. As análises já realizadas, muito ricas e estrutu- radas,capitalismo baseiam-se contemporâneo principalmente por dentro no papel da chave do Estado do bioca que, contrariamente à propaganda difusa acerca do neolibera- lismo, não possuiria nada de mínimo, e que os recursos

- tidemocráticanos projetos urbanos do projeto, estariam não se vindo voltando em última para quaisquer instância do dinheiro público. Também, toda a faceta autoritária/an 313 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA preocupações com a população da região, que, combinada - serir a cidade em um movimento global de valorização. com as finanças,Contudo, mercantilizariam apesar de todos aos cidade acertos com dessas vistas análi a in- - tíssemos de outros pressupostos. Essa mudança de pers- pectiva,ses, há certos na mesma pontos medida que poderiam em que permitiriamser aclarados enxergar se par os mesmos processos abertos e exploratórios do capital, aprofundariam em adição as novas particularidades que acabam sendo deixadas de lado quando não são atravessa- das por uma posição teórica que as revele. Nesse sentido, -

proporemos entender a financeirização enquanto proces Mezzadra,so que se insereentre outros,na dinâmica entendem daquilo como que biocapitalismo,Negri e Hardt, comobem comoa captura Andrea e comando Fumagalli, atual Christian sobre uma Marazzi, nova composi Sandro-

ção da produção e do trabalho. Estrutura jurídico-política do projeto do Porto Maravilha

Menos de um mês após o anúncio da vitória do Rio de Janeiro para sediar os Jogos Olímpicos de 2016, foram - tendo a previsão da realização da maior Operação Urbana Consorciadaenviados para (OUC) a Câmara do BrasilMunicipal (OLIVEIRA. três projetos 2012, de p. lei 239). con Esses projetos, que foram votados em regime de urgência - datura para sediar os Jogos (Ibid. 240)2 e que resultaram sob a justificativa de atender aos compromissos da candi

2 A relação dos Jogos Olímpicos com o Porto Maravilha foi fundamental documentospara justificar que a saídasubsidiaram do projeto a candidatura do papel, mas do Rio logo de foi Janeiro revista para como os Jogosuma parte Olímpicos do projeto de 2016, olímpico. a região Conforme portuária Alvaro não Pereira estava afirma:incluída “nos en- tre as localidades que receberiam instalações relacionadas ao evento. Porto Maravilha: entre a financeirização, o biocapitalismo e a flexibilização do direito a financeirização, o biocapitalismo e flexibilização entre Maravilha: Porto

Num momento posterior, entretanto,314 o prefeito Eduardo Paes propôs 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS nas Leis Complementares 101/09, 102/09 e LC 5.128/09, - dimento urbano da região central do Rio de Janeiro, em es- tratariam da instituição do Porto Maravilha. Um empreen- buição de políticas públicas direcionadas. Circunscrevendo umapecial Área da área de Especial portuária, Interesse historicamente Urbanístico relegada (AEIU), na distrio em- - drados, vinculando direta ou indiretamente seis bairros dopreendimento município: Saúde, envolveria Gamboa, cinco Santo milhões Cristo, de metrosCentro, quaSão Cristóvão e Cidade Nova. A estrutura jurídica desse empreendimento esta- ria atrelada ao Estatuto da Cidade (Lei 10.257/01), princi- palmente quanto ao seu instrumento da OUC. Trata-se de federal com o Estatuto3, sendo o seu objetivo principal a participaçãoum instrumento de diferentes que surgiu atores pela emprimeira uma reelaboração vez em âmbito es- pacial e política, com “transformações urbanísticas estru-

- turais, melhorias sociais e a valorização ambiental” (art. às autoridades olímpicas que se transferisse para a região portuária a 32, §1ºconstrução do Estatuto da vila dosda árbitrosCidade) e da de mídia, um estruturas espaço queurbano inicialmente defi seriam implantadas na mesma área onde se concentraram as princi- pais instalações relacionadas aos jogos, na região da Barra da Tijuca. Com essa alteração, o prefeito buscava reforçar a associação entre os Jogos Olímpicos e o projeto de revitalização da zona portuária. Por um

jogos para a cidade. Por outro lado, aproveitava-se o contexto dos jogos elado, a obrigação o Porto Maravilhaassumida depassava construir a figurar as instalações como parte que do abrigariam “legado” dos os

participantes do evento para impulsionar a promoção de empreendi- Luiz Felipe Teves de Paiva Sousa mentos imobiliários na região portuária” (2015. p. 249-50). - tas de longa data. Inclusive, é possível datar a sua previsão em alguns 3 Planos Contudo, Diretores o instrumento durante da a OUC década já tinha de 1990. as suas Ermínia discussões Maricato e as propos e João

operaçõesFerreira mostram na cidade que de haviaSão Paulo uma (2002, variação p. 1), acerca como da nas nomenclatura, fracassadas mas o instrumento já tinha inclusive sido implementado em algumas tiveram sucesso, como a da Faria Lima (OUCFL) e na da Água Espraiada (OUCAE).Operação ParaUrbana mais Anhangabaú sobre esses e casos Operação em São Urbana Paulo, Centro, conferir: ou PEREIRA nas que (2015); e, MARICATO, FERREIRA (2002). 315 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA nido (AEIU). Apesar de englobar a participação virtual de todos os atingidos na área, a sua realização seria normal- mente atrelada à constituição de parcerias público-priva- das e através de processos licitatórios (Lei 8.666/1993), com o estabelecimento de uma empresa ou consórcio a ser responsável pelas obras e pela conservação do espaço. Além disso, para viabilizar a realização da OUC, em termos das necessidades quanto aos recursos a serem desprendidos, o Estatuto da Cidade também possuiria a

de Potencial Adicional Construtivo (CEPACs). Eles seriam direitosprevisão de para construção esse instrumento além da daprevisão emissão na de legislação Certificados ur-

a serem emitidos pelo poder público municipal para se- rembanística comercializados que seriam transformadosna bolsa de valores. em títulos Um mecanismofinanceiros

das exigências construtivas da legislação urbana com a contrapartidaque funciona com de capitalizar o intuito de e possibilitarpermitir uma a realizaçãoflexibilização do empreendimento sem o dispêndio direto de verbas públi- cas (art. 34 do Estatuto da Cidade). É nesse sentido que os - cializados enquanto direito em potencial que seriam trans- formadosCEPACs são em reconhecidos títulos. como “terrenos virtuais”, comer

É dessa formaO potencial que construtivoPereira identifica é regulado e aaprofunda: partir do es-

tabelecimento de coeficientes de aproveitamento- básico e máximo. Permite-se edificar até o limite- cientedo potencial de aproveitamento construtivo básico, básico, definido gratuitamente. em fun ção do produto entre a área do terreno e o coefi- mento de uma contrapartida pela outorga de direi- tosPara construtivos se edificar além adicionais, deste limite, o que exige-seé feito por o pagameio da aquisição de CEPACs (...). O proponente de um projeto paga pelos direitos construtivos adicionais

Porto Maravilha: entre a financeirização, o biocapitalismo e a flexibilização do direito a financeirização, o biocapitalismo e flexibilização entre Maravilha: Porto prevista e o potencial construtivo básico do terre- na proporção da diferença entre a área edificada 316 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS no. Os recursos auferidos são usados para custear as intervenções previstas na operação urbana, cujas diretrizes gerais são estabelecidas na lei que

tempo de duração da operação urbana, as regras dea cria. governança, Essa norma a quantidade define também de CEPACs fatores quecomo po o- dem ser emitidos, o estoque total de potencial adi- cional de construção, as fórmulas de cálculo para a conversão de CEPACs em direitos construtivos, a distribuição do estoque de potencial adicional em diferentes segmentos da área de abrangência da operação urbana, entre outros aspectos. (2015, p. 137-8)

Quanto ao caso específico na implementação do RegiãoPorto Maravilha,do Porto do empreendimentoRio de Janeiro (CDURP). em curso Seria atéuma 2026, com- instituiu-se a Companhia de Desenvolvimento Urbano da e que seria responsável por coordenar o empreendimento urbanopanhia 4de. Desde economia a sua mista, criação, criada ela é através coordenada da LC pelo102/2009, muni- cípio e acabou se tornando responsável por assumir tam- bém todos os serviços públicos municipais na região (art. 1º, PU, LC 102/2009), como iluminação, coleta de resíduos, paisagismo etc., durante o período da duração do projeto (Dec. 32.576/2010). Contudo, como parte da inovação quanto ao ins- - são de realização da obra em sua integralidade, mas os ser- Luiz Felipe Teves de Paiva Sousa viçostrumento públicos da OUC e a domanutenção Porto Maravilha, urbana não foram somente também a previ dele- gados ao serviço privado, não restando mais sob a respon- sabilidade da CDURP, que seria indiretamente controlada pelo município. Na modalidade de concessão administra- tiva, as responsabilidades quanto ao empreendimento fo-

4 De acordo com o art. 3º, §2º da LC 102/2009, a CDURP também po- deria abrir o capital a qualquer momento, transformando-se assim em mais um campo aberto de valorização no mercado de capitais. 317 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA ram transferidas para a vencedora da licitação, a Consórcio Porto Novo S.A., um consórcio formado pelas empresas

dessa concessão reside justamente nas novas facetas dos serviçosOdebrecht, municipais OAS e Carioca delegados, Engenharia. bem como A na particularidade integralidade das obras de grande porte5, desde a construção de museus,

(Perimetral) etc. Por isso mesmo, a integralidade da remu- a trechos de túneis, rede cicloviária, destruição de viadutos - culadosneração emdevida 2010. ao consórcio pelo período das obras ficou previsto Noem sentidoquase R$ da 8 capitalizaçãobilhões, ao menos para nosa realização valores cal do projeto, optou-se pela comercialização de CEPACs, que fo- ram lançados em 2011 em lote único, diferentemente das outras OUC já implementadas, com o custo de aporte pre-

Fundovisto de de R$ Garantia 3,5 bilhões. por Tempo O lote, de que Serviço foi constituído (FGTS)6 por um- cativapouco paramais a de aquisição 6,4 milhões por partede CEPACs, do FGTS foi se arrematado deu no sentido pelo . A justifi- to, na medida em que os valores dos títulos ainda viriam ade ser afirmar revendidos a viabilidade na bolsa e ode potencial valores, deou retornoseja, no domercado proje secundário, podendo retornar com juros sobre cada ponto extraído da valorização do empreendimento. Não obstante, para garantir a viabilidade do -

5 Não mais o parcelamento da construção e das licitações via obras par- empreendimento,ciais, conforme foi haviafeito nas tambémoutras OUC em a necessidadeSão Paulo (PEREIRA. de 2015, co p. 192). 6 O FGTS adquiriu os CEPACs através da criação de um Fundo de Investimento Imobiliário (FII). A utilização desse instrumento por par- -

teatravés do FGTS de mudançasnunca havia sucessivas sido feita, por o que Resoluções exigiu mudanças (nº 578/08, nos seus 591/09 ter mos regulatórios para a sua permissão. O Conselho Curador (CCFGTS), para esses tipos de investimentos urbanos mais especulativos e menos

Porto Maravilha: entre a financeirização, o biocapitalismo e a flexibilização do direito a financeirização, o biocapitalismo e flexibilização entre Maravilha: Porto sociais.e 681/13), permitiu esse mecanismo e desde então abriu o horizonte 318 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS mercializar os terrenos públicos existentes na região. Compreendendo até 70% da área do projeto (PEREIRA. 2015, p. 215), esses terrenos pertenciam a entes federais, - rentes leilões para a aquisição desses por parte da CDURP. estaduais e municipais. Assim, houve a realização de dife seremA importância aplicados. desse Dessa leilão forma, residia construiu-se no risco uma dos transposi estoques- deção CEPACs e aquisição ficarem pela encalhados CDURP dos pela terrenos, falta dos que terrenos os adquiriu para a preços mais baixos que os de mercado7, se analisados a

Essapartir revenda do investimento futura somada em potencial ao aporte do dos Porto valores Maravilha, aufe- ridosassumindo pelas eCEPACs ficando resultariam responsável no pela retorno sua e futura a amortiza venda.- ção dos valores globais do empreendimento – que, como vimos, na avaliação realizada em 2010, chegavam a cerca- çãode R$ dos 8 bilhões.CEPACs pelo FGTS e da venda de terrenos públicos por fora Pordos fim,preços além de das mercado, vantagens instituiu-se concedidas também na aquisi uma incentivo para a região e para atrair os empreendimentos urbanosgrande flexibilização nacionais e internacionais tributária. Como para mais o espaço, uma forma o poder de público municipal criou um pacote de isenção de seus tri- butos (ITBI, IPTU e ISS) para os empreendimentos lança- dos na região nos primeiros anos da operação urbana (Lei Luiz Felipe Teves de Paiva Sousa Portanto, analisando brevemente o projeto do Municipal n° 5.128/ 2009). - revitalizaçãoPorto Maravilha, de uma pode-se área perceberque por décadas a junção não dos recebeu instru atençãomentos jurídicos,dos investimentos políticos e do financeiros poder público. para o Articula-seprojeto de

7 Conforme Pereira aponta, a possibilidade da comercialização desses terrenos a preços baixos estava atrelada ao contexto favorável de ali-

a presidência, o governo estatual e a prefeitura (2015, p. 214). nhamento entre as três esferas de governo: as coalizões políticas entre 319 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA uma ampla mobilização dos mecanismos do Estado e seus recursos para viabilizar o empreendimento de revitali- zação da área, ao mesmo tempo em que garante todos os subsídios para o mercado, minimizando os custos e riscos, socializando os possíveis prejuízos da falência do projeto.

Finanças e biocapitalismo

A partir do quadro jurídico-político do Porto

Maravilha, a questão que ainda remanesceria aberta no- riaseu ahorizonte compreensão seria justamentedas razões apara identificação o atravessamento do papel dasen- trefinanças. a gestão Uma do questão empreendimento que para ser e do respondida território edemanda a sua in-

uma questão que não poderia simplesmente se restringir serção no fluxo global de capitais na figura dos CEPACs. E,-

a atribuir um papel fictício às finanças. Então, para come çarmos a destrinchar os caminhos da resposta, talvez seja seuinteressante movimento resgatar de captura qual daseria vida o (papelbio). das finanças por dentro do capitalismo contemporâneo, reconhecendo-o no

Nessas trilhas, e reconhecendo os aportes de- Christian Marazzi, podemos iniciar com8, a a sua identificação centralidade de eque, seu apesar grau de da impacto existência no emundo do papel atual das é umfinanças dos novos no capi fa- torestalismo do não capitalismo. ser um fenômeno Como Marazzi recente mostra, a atual parti- cularidade desse mercado reside na sua ampla difusão e

extensão sobreO Longo a vida Século cotidiana, XX “espalhando-se ao longo 8 surgimento Sandro Mezzadra, e da consolidação ao perseguir do capitalismo, os caminhos nos deixados séculos por XIV Giovannie XV, em FlorençaArrighi ( (FUMAGALLI; MEZZADRA.), mostra 2011,que as p. finanças 13). Não existiam por menos, desde Karl o Marx também analisou a sua existência (Livro III de O Capital), no mo- mento de seus estudos acerca da externalidade do “capital portador de Porto Maravilha: entre a financeirização, o biocapitalismo e a flexibilização do direito a financeirização, o biocapitalismo e flexibilização entre Maravilha: Porto

juros” em referência ao “capital320 de comércio de dinheiro”. 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS se fariam presentes desde os mecanismos do comércio de capitaisde todo ona ciclo bolsa econômico” de valores, (2011. até os p. de 35). crédito Os seus dos circuitos cartões nas “compras no supermercado” e das relações creditícias na “indústria automobilística” (Ibid., p. 36).

- Destrinchando as razões históricas e concretas- vestidores.para tal difusão Desde das certas finanças, transformações Marazzi aponta sedimentadas primeira aomente longo o fenômenodas décadas da demultiplicação 1980 e 1990, dos consolidou-se seus atores e umin aumento no número de fontes, adensando o montante de - sa crescente fatores como: os lucros industriais não rein- vestidoscrédito a mais ser investidoem capital na material financeirização. e salários, Insere-se na medida nes da “queda do lucro industrial em torno de 50% entre os anos sessenta e setenta” (Ibid., p. 31); os lucros dos juros dos de capital derivados das matérias-primas; a rápida difusão doempréstimos online trading aos9 , paísescom o desvio em desenvolvimento; das reservas privadas, os ganhos das famílias e de investidores para o mercado de capitais (Ibid., p. 37), dentre outros. Nesse sentido, podemos identificar- ceirizaçãocom Marazzi e do a intensificaçãomercado de capitais. da transferência dos valores da economiaAdemais, mundial também para poros grandes dentro processosdo processo de definan in-

parte especial de atores também foi envolvida: os traba- Luiz Felipe Teves de Paiva Sousa clusão nas finanças e como novidade no capitalismo, uma aponta que, tendo iniciado de maneira “silenciosa”, esse lhadores. Na mesma direção de Marazzi, Andrea Fumagalli a “revolução dos fundos de pensão” (2010, p. 57): a utili- fenômeno de envolvimento dos trabalhadores surgiu com zação das divisas acumuladas pelos trabalhadores para 9 por Fenômeno sites de de corretagem difusão da com comercialização o mercado de de capitais instrumentos através financeiros do pregão pela internet, principalmente pela conexão direta das pessoas físicas

eletrônico. 321 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA investimentos nos mercados de capitais10. Essa inclusão -

dos trabalhadores teria sido crucial para presente forma- ção do quadro central das finanças: “eliminar a separação aosentre processos capital e detrabalho transformação/restruturação implícita na relação salarial capitalista” fordis (MARAZZI.ta, através da 2008, vinculação p. 37). das Assim, poupanças tratou-se dos de trabalhadores um grande processo de inclusão de todos direta ou indiretamente nos - res ao futuro do mercado das bolsas e dos diferentes inves- mercados financeiros, atrelando os ganhos dos trabalhado

transformaçãotimentos financeiros. como um todo dos salários, dos direitos Dentro dessa inclusão, reconhece-se também a- ponsabilidade dos bancos, fundos de pensão e de inves- timento.sociais e Nesses aposentadorias movimentos, em ativoso principal financeiros a ser realçado sob res

acessopara Marazzi a sua rendae Fumagalli e aos seusseria direitos. a vinculação Esses do autores trabalhador iden- como um interessado na valorização financeira para ter - zariamtificam osa passagem investimentos do antigo até então papel sociais securitário e vinculariam do Estado o crescimentopara as finanças de todos e o mercado ao seu bem-estar. de capitais, A rendaque individuali social que

que garantiriam da sua forma a distribuição e o acesso aos bens,antes principalmenteera assumida pelo através Estado do passariacomprometimento para as finanças, de to- dos via empréstimos e crédito. Uma expansão e distribui- ção caracterizada pelo endividamento11.

10 O primeiro caso da utilização dos fundos públicos que Fumagalli apon-

instaurou na década de 1970. A saída da crise se deu pelo comprometi- ta seria o da sua utilização durante a crise fiscal de Nova York que se Para mais, conferir: FUMAGALLI. 2010, p. 56. 11 mentoMaurizio do fundoLazzarato dos trabalhadoresnos mostra que com essa os títulosfaceta domunicipais endividamento da cidade. foi

mascarada dessa expansão do crédito seria a formação de uma nova

Porto Maravilha: entre a financeirização, o biocapitalismo e a flexibilização do direito a financeirização, o biocapitalismo e flexibilização entre Maravilha: Porto a resultante da crise financeira de 2008: crise dos subprimes. A lógica-

figura do homo oeconomicus:322 homo debitor (2013). A crise que explo 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS - nanças que passa pela completa incorporação de todos no Também, por dentro dessa centralidade das fi “comunismo do capital” (2010). Comunismo por ser jus- tamentemercado o de ponto capitais, de união, Marazzi de condensação reconhece o entre fenômeno os inves do- bolsa” (Ibid - ceirizaçãotidores, no se“capital apresentaria financeiro, como enquanto a esfera capital pública cotado do capi em- . 2008, p. Ibid16).. E,2010, é nesse p. 58): fenômeno o Estado que e aos finan ato- - trariamtal contemporâneo indistintamente ( diluídos no mercado de capitais. res privados, os trabalhadores e a vida de todos se encon - vidoDiferentemente na relação salarial dos horizontes fordista, docom Estado as políticas de Bem-Estar sociais e asocial, representação da cidadania política keynesiana atreladas e do ao aparato pacto fabril social entre envol o controle e dominação com a vinculação de todos no merca- capital e o trabalho, o capitalismo passaria a orientar o seu Contudo, quanto a essas razões da grande trans- do financeiro e de capitais. - da mais ao resgatar as grandes contribuições de Antonio formação no mercado financeiro, podemos aprofundar ain Fumagalli (2010) e Sandro Mezzadra (2011), Giuseppe CoccoNegri (2009;(1999; 2015)2009; e2015) Michael e doHardt próprio (2005; Marazzi 2009; (2008;2014), 2009; 2010; 2011). Segundo esses autores, para se com- - Luiz Felipe Teves de Paiva Sousa umapreender mudança a incorporação no próprio dosregime trabalhadores produtivo do e decapitalismo. todos so Umabre o transformação regime das finanças que diria seria respeito preciso não analisar somente também à pas-

diu em 2008 e que se agravou em 2010, na crise dos papéis soberanos, seria para Lazzarato justamente o ponto de ruptura da lógica expansio- nista da exploração do biocapitalismo e da governamentalidade neo-

sistema que não conseguiria mais se sustentar sobre as mesmas bases daliberal. acumulação Dessa forma, do bios. a figuraContudo, do endividadoisso não quer seria dizer a chantagemque o sistema de deium- xe de explorar e continuar o seu controle sobre a vida, mas apenas que o seu cenário é de uma crise permanente. 323 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA sagem do regime fabril e disciplinar da sociedade fordista - - para a pós-fordista, da produção flexível e de todas as mu dodanças valor. na Uma divisão transformação social e global que do passaria trabalho, a desenvolvermas princi epalmente explorar das o bios características, a vida social, do naquilotrabalho que e da esses constituição autores apontam como biocapitalismo. - ção no capitalismo se orienta ao menos desde as crises de- Fumagalli afirma que a transformação da produ- tariam inseridas em um espectro: desde as objetivas, como flagradas na década de 1970 (2010, p. 148). Crises12 ;que até esàs subjetivas, com os diferentes movimentos sociais organi- zadoso choque em revoltado petróleo contra e ao reproduçãofim do Bretton social Woods do capital ba- seada na produção fabril, como a multiplicação das reivin- dicações operárias e estudantis de 1968, passando pelas lutas feministas e dos negros, como também da antibelicis- ta nos EUA, no interregno das décadas de 1960 até 1980. O biocapitalismo teria surgido por dentro desse - rismo na produção, do fordismo no planejamento político, processo de desestabilização das grandes chaves do taylo 1988, p. 205). Como Fumagalli aponta, a contestação do re- gimee do keynesianismobaseado na fábrica no planejamentoe do seu pacto econômico social e estatal (NEGRI. que

encontrada teria se dado pelo deslocamento para o mo- o sustentava impôs um desafio ao capitalismo. A solução 12 - drão ouro e a sua paridade com o dólar, como a única moeda com las- tro O Bretton em relação Woods às outras foi um existentes compilado no de mundo. acordos Seria que um estabeleceu mecanismo o pa de

entre os EUA e os outros países capitalistas avançados e o “estabele- cimento“afirmação de dauma hegemonia relação imperialista global dos EUA”, dos EUA de “acordo com relação de estabilização aos países subdesenvolvidos” (NEGRI. 2004, p. 145). Conforme Fumagalli aponta (FUMAGALLI. 2011, p. 46), deu-se início com esses acordos ao proces- so de “desmaterialização da moeda”, que foi efetivamente completo Porto Maravilha: entre a financeirização, o biocapitalismo e a flexibilização do direito a financeirização, o biocapitalismo e flexibilização entre Maravilha: Porto com o seu fim, com a perda total de lastro material do dólar e a nova configuração de um regime de324 câmbios flexíveis (Ibid., p. 48). 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS delo pós-fordista: transformação na divisão internacional outsourcing da produção – expansão e terceirização mundial da produção fabril pelo domundo, trabalho, principalmente com o processo para dea Ásia e, mais atualmente, para a África; mudanças da lógica valorativa para os fatores de externalidade das empresas e negócios; desmantela- mento do Estado de Bem-Estar, com todos os seus direitos e garantias; decomposição e fragmentação do mercado de seus direitos, em direção a uma instabilidade por contra- tostrabalho, em tempo com oparcial progressivo e através fim da do pejotização; contrato estável e, liberali e dos- zação do mercado de capitais (2010, p. 148-9). Além disso, inicialmente dentro dos grandes centros, mas depois no - setormundo terciário como um ou todo, de serviços. haveria também a passagem da pre dominânciaPor dodentro emprego dessas no transformaçõessetor secundário, mais fabril, objetivas para o que, juntamente com Marazzi (2009) e os outros autores destacadosdo cenário produtivo,acima, o cenário Negri dee Hardt fundo (2014) central identificariam seria o desen- volvimento da exploração sobre a imaterialidade da produ- ção. Um processo que teria se instaurado principalmente a envolver aquilo que extravasou das paredes da fábrica e quedesde reordenou a década as de suas 1990 coordenadas: no cenário do as trabalho,redes sociais, passando as di- ferentes formas de cooperação, a criatividade, a comunica- ção dentro das novas tecnologias (NTICs13), como também Luiz Felipe Teves de Paiva Sousa

13 As NTICs (Novas Tecnologias de Informação e Comunicação) foram tecnologias informáticas que transformaram os modos de relaciona- - ção de redes virtuais conferiam uma outra temporalidade às trocas e àsmento interações, e a configuração em movimentos da atividade cada vez laborativa mais rápidos, da sociedade. ultrapassando A forma as

- do-semeras para interações toda a físicas.metrópole Ao longoe para das o mundo. décadas E, de é dentro 1990 e dessa 2000, mudan o fluxo- çainterativo comunicacional e informacional que a fábrica se tornava tentaria cada incorporar vez mais intenso,essa comunicação espalhan em antecipação do consumo que se formava fora. 325 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA os afetos e os bens culturais produzidos difusamente pelo tecido social. Assim, envolveria muito mais a produção de

14. conhecimentos,E, é em de torno informação dessa mutação e de relações nas qualidadessociais do que do somente o trabalho-máquina das fábricas questão para o capital: a busca por formas de explorar e de controlartrabalho socializado essa produção. que Umase colocaria busca por uma rearticular séria e grande o con- trole e a extração do valor quando a produção não estaria mais sob as suas mãos, sobre a sua orientação por dentro das paredes da fábrica, que resumiam antes todo o princi- pal ciclo produtivo. Como única saída, a exploração teria - brica e se dispersava sobre o território, sobre as cidades e metrópolesentão que acompanhar15. a produção, que saía do chão da fá - rença entre os dois momentos produtivos: o fordismo que buscava Écriar dessa os forma meios que da Negrivida social, e Hardt em afirmariam contraponto a dife ao pós-fordismo, que precisaria envolver e investir sobre a pró-

14 -

Deve-se salientar, contudo, que, quando se afirma a existência e a im portância de algo como o trabalho imaterial, não se quer aduzir que esse trabalho não resulte em um desgaste físico ou que aquele trabalho materiala que figurativamente industrial ainda se éopõe predominante, a esse, o material, ao menos tenha quantitativamen desaparecido.- te,Em em verdade, grande como parte Negri do mundo. e Hardt Sustenta- apontam se, (2014, pelo contrário,148-150), que,o trabalho assim

como progressivamente o trabalho na fábrica ao longo do séc. XIX foi se tornando hegemônico quantitativa e qualitativamente em relação ao da agricultura (no teor da tendência capturada por Marx), houve uma nova transformação que ditou o deslocamento em direção à hegemonia mudançado trabalho qualitativa imaterial, já que apresentada se apresenta quanto hoje ao ainda valor qualitativamente. das empresas e dosUma seus realidade produtos. que tenderia a progressivamente a mudar, haja vista a 15 É nesse sentido que Negri e Hardt sustentam: “a cidade, com certeza,

sistemas de coleta de lixo e de cabos de comunicação, mas também re- não é somente um local constituído por prédios, ruas, metrôs, parques, redes afetivas e instituições sociais” (2009, p. 154). A metrópole é para

Porto Maravilha: entre a financeirização, o biocapitalismo e a flexibilização do direito a financeirização, o biocapitalismo e flexibilização entre Maravilha: Porto ospresenta autores uma o centro dinâmica produtivo viva de por práticas excelência. culturais, circuitos intelectuais, 326 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS pria vida social, a própria bios (2005). A bioprodução que seria justamente a produção da vida pela vida, “do homem pelo homem”, ou seja, uma antropogenética (MARAZZI. 2009). Um trabalho como geração de vida (COCCO. 2014,- p. 83) que o capital estrategicamente reconheceria como o“coração sangue pulsante”que pulsa (FUMAGALLI. na produção. 2010,Reconhecendo p. 19), inserindo na mes- -sema paramedida determinar em que se a suacolocaria valorização artificialmente ao mesmo como tempo o seuem que baseia a sua extração16. E, esse órgão vital seria jus- toda a faceta produtiva, ligada aos grandes mecanismos reguladorestamente as finanças, dos índices com do a mercado sua expansão de capitais e dispersão que deter por- - quente extração. minariam a identificação das fontes de valor e a sua subse- ceirização seriam o controle sobre o bios, como um governo biopolíticoNesse sobre horizonte, essa produção o mercado que deescapou capitais do e controlea finan direto do capital; e, o biocapitalismo se apresentaria como - plora, ou seja, a vida social e afetiva dos sujeitos: “que já investiuo marco ado totalidade reconhecimento da sociedade da produção (...), isto que é, o oconjunto capital exda vida humana individual e social que é posta, enquanto tal, a 16 trabalhar. (NEGRI. 2015, p. 57-58). O governo das finanças para Essa pessoas é a lógica de por baixa trás, renda, por exemplo,envolvendo da assimcrise hipotecária também os nospobres, EUA. di A- Luiz Felipe Teves de Paiva Sousa lógicanamizava da renegociaçãoa economia e davadas hipotecas um contorno e dos à criseempréstimos anterior daconcedidos new eco- nomy, na expansão do crédito via empréstimos, restando ao Estado apenas a reconhecida no estouro da bolha da internet. Essa saída resultou- se de 2008 mostra, estava ausente, perto dos diferentes instrumentos figura de regulador nessas operações. Um regulador que, como a cri-

criados para a realização dessa engenharia. A securitização dos em depréstimos baixa renda, e das comhipotecas a negociação se formou desses como ativos uma depirâmide alto risco que através permitiu de instrumentoscontornar as possíveis de condensação dificuldades de títulos de acesso com diferentesao crédito grausàs populações de risco. Para mais, conferir: FUMAGALLI, MEZZADRA. 2011. 327 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA passaria então a ser entendido como a saída encontrada para retomar o comando sobre a produção e a sua conse- cutiva exploração.

- cimento Portanto,do biocapitalismo, pensando podemos o Porto articular Maravilha uma com aproxi base- maçãona estrutura do controle que as sobrefinanças a vida assumem em produção a partir com do reconhe a lógica de valorização que estaria atrelada ao empreendimento. - ção seriam formas de restaurar o controle do capital, agora Na medida em que os processos abertos da financeiriza- lor produtivo sobre a região portuária da cidade do Rio de Janeiro,sobre a vida,introduziu-se pode-se reconhecer um projeto que, total para sobre se extrairo território, o va buscando valorizá-lo e controla-lo sem grandes despesas diretas para capital imobiliário, através do comprometi- mento do FGTS como uma socialização dos riscos existen- tes no projeto, e construí-lo como um espaço a ser ocupado produtivamente pelos sujeitos. É no sentido dessa incorporação da produção que se apostou e ainda se aposta, na medida em que o proje- to ainda está aberto, na valorização da região da cidade dentro do ponto de articulação com grandes investimen- tos globais, para a atração de grandes empresas e em- preendimentos – como as construções na região portuária das Trump Towers Brazil, da sede do YouTube Spaces e de dois custosos museus (Museu de Arte do Rio e Museu do

- Amanhã), sendo um deles desenvolvido por um arquiteto global, o Santiago Calatrava (Museu do Amanhã). O cená umrio seespaço concentra produtivo na confiança, nos termos figura mais central claros da damoeda produção e das mundialfianças, que imaterial repousaria e de vida,na capacidade tornando ade área tornar do centroa região e

- todo seriaporto o um de espaçoum futuro competitivo de uma região e “hiperconectado” altamente ocupada com o

Porto Maravilha: entre a financeirização, o biocapitalismo e a flexibilização do direito a financeirização, o biocapitalismo e flexibilização entre Maravilha: Porto eresto produtiva. da cidade produtiva e com o globo. O horizonte aber 328 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS projeto, a área delimitada (AEIU) seria um nó dentro de Dentro desse horizonte, para garantir o futuro do a revisão das regulações urbanísticas, dando surgimen- touma a um grande direito estrutura potencial de de flexibilização: construção, e do a subsequente direito, com tributária, com os incentivos para as construções a serem realizadastransformação no local;desse direitoe, da gestão em ativo governamental, financeiro (CEPACs); com a transferência direta dos serviços públicos municipais para que representaria o comprometimento vinculado ao pro- empresas privadas, ou melhor, para o Consórcio. Um nó- sibilidades de realização democrática e alternativa, tendo jeto até o prazo de 2026. Ou seja, um fechamento das pos- cado – inserindo-se aqui todo o processo de remoções da regiãoem vista (tanto o futuro no Morro do projeto da Providência, que não poderia como nos ser imóveismodifi mais próximos do eixo principal do porto17), bem como o dos moradores e dos atores com o território (principal- fechamento das formas culturais e históricas das ligações- demente lazer do ligadas movimento ao território). de resgate da cultura negra, da histó ria do tráficoHaveria negreiro a transformação na região e dodas direito práticas de artísticas construir e - em um ativo financeiro, desvinculando o direito e o terre- no, assumindo uma forma abstrata do valor econômico do Luiz Felipe Teves de Paiva Sousa 17 As ocupações eram bastante presentes na região central do Rio de potencialJaneiro, construtivo, tanto articuladas ou seja,em movimentos um lastro políticos econômico mais concretos, no di

rearticulação dessa área, inúmeros movimentos de resistência se con- como autônomas. Durante todo o processo realizado pelo Estado para

Providências,solidaram para a Ocupaçãoresistir, tais Casarão como: AzulOcupação e a Zumbi Quilombo dos Palmares, das Guerreiras, dentre outras.Ocupação Para Machado mais sobre de Assis, esses as processos formações desencadeados comunitárias antes,do Morro duran da-

COMITÊ POPULAR RIO DA COPA E DAS OLIMPÍADAS. 2013, p. 29-32; e, CONTAGEMte e depois do REGRESSIVA Porto Maravilha, – EPISÓDIO conferir: 3 (ZONA TRAMONTANI. PORTUÁRIA). 2012, 2016. p. 349; 329 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

mercado de capitais se tornam fundamentais. As CEPACs permitemreito de construir. pensar a Nesse transversalidade cenário, o papel do regime das finanças de controle e do

do projeto, na medida em que a viabilidade e o prossegui- mentodo mercado do empreendimento financeiro sobre urbanísticoa realização dependeriam e implementação das

conferidas pelo mercado, através da bolsa de valores. A es- ferafinanças, pública do doseu mercado reconhecimento restaria ecomo das garantiaso ponto de a seremanáli- se crucial do projeto. Todas as exigências voltadas para a

do Porto), como os sistemas de governança corporativa, de transparênciaCDURP (Companhia e de degarantias Desenvolvimento do projeto, Urbano estipuladas da Região em lei e presentes nos discursos dos seus próprios gestores (XAVIER. 2012, p. 115), articular-se-iam nesse sentido do governo direto do mercado. A produção que escapou seria gestada dentro da - marcações e conseguir explorar depois. Dependeria assim dacapacidade capacidade do deempreendimento criar um ambiente de fechá-laprodutivo nas em suas espiral, de tornando o local um ponto produtivo no Rio de Janeiro, no

justamente o governo da avaliação da produção, o coração queBrasil permitiria e, principalmente, controlar noessa mundo. produção A financeirização dispersa, dando seria o subsídio e explorando ao mesmo tempo. Ao Estado, dian- - trole sobre a produção que escapa, ou seja, que se produz te das flexibilizações, restaria a responsabilidade do con

descontentamento.em outros horizontes que não os delimitados no projeto: repressão e controle sobre as brechas de democracia e de recai encerram é o futuro, a capacidade de, a partir do pre- sente, encapsularAssim, o que o futuro as finanças dentro e do o projeto crédito sobre e da sua o qual explo ela-

Porto Maravilha: entre a financeirização, o biocapitalismo e a flexibilização do direito a financeirização, o biocapitalismo e flexibilização entre Maravilha: Porto - ração dilatada no tempo. Portanto, não é de se estranhar 330 o comprometimento de bilhões do FGTS com o empreen 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS diretamente interessados no projeto ao mesmo tempo em quedimento, socializa uma os adesão riscos quede sua coloca possível os trabalhadores falência. Também, como títulos, ou seja, o direito construtivo adicional seja desvin- não é de se estranhar que as CEPACs sejam lançadas como atrair e permitir uma captação de recursos antes da sua materialização,culado do território ou seja, e se encerrar torne um o ativo.futuro, A coadunajustificativa com de a eliminação de quaisquer controvérsias sobre o projeto. O lado democrático nem seria posto em questão, na medida em que a avaliação do projeto dependeria do pleno contro- le sobre a produção de uma vida para a valorização.

Conclusão

- cepção, teria funcionado como um marco de um projeto para reestruturarSendo assim, uma o determinadaPorto Maravilha, região desde dentro a sua de con um - meteria a vida como um todo para colocá-la para produ- controle sobre os fluxos produtivos. Um controle que sub - mentaçãozir em determinados e pela socialização horizontes, de seus encerrando custos em um caso futuro de predeterminado e orientado pela confiança da sua imple - riainsucesso. a esfera A pública avaliação que desse recairia futuro sobre caberia o empreendimento às finanças e urbano.ao mercado de capitais, que na inflexão biocapitalista se Luiz Felipe Teves de Paiva Sousa Contudo, esse grande projeto, a maior operação urbana (OUC) já realizada no Brasil, ainda remanesce aber- to e em disputa. Em disputa justamente pelas resistências em luta pelo direito à cidade, à construção democrática da cidade. Lutas que resultaram no estancamento, mesmo que parcial, dos processos de remoção (principalmente no Morro da Providência) e na inclusão no projeto da cons- trução de moradias sociais – que resultou, ainda que cri- 331 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

Social (PHIS-Porto). E também, lutas que ainda persistem ticado e insuficiente, no Plano de Habitação de Interesse- dições e por garantias de permanência através de freios ao no cotidiano dos moradores da região, por melhores con – EPISÓDIO 3, ZONA PORTUÁRIA. 2016) claro processoAlém disso, de gentrificação esse projeto (CONTAGEM também se REGRESSIVA encontraria aberto pela sua real possibilidade de falência. Uma parte das CEPACs, depois de adquiridas pelo FGTS, foi colocada no mercado novamente em 2012, para retornar o investi- mento e também para permitir as construções acima dos requisitos urbanísticos. Foram ofertados 100 mil títulos ao dobro do preço de aquisição inicial e, nesse negócio, ape- nas 26% foi adquirido pelo mercado. Atualmente, apenas 10,8% das CEPACs foram efetivamente realizadas como di- reito de construção adicional. -

Essas dificuldades para a realização do investi- riamento em secrise: justificam pela desaceleração em grande parte do mercado pela confiança imobiliário, sob a qual o projeto se baseava. Confiança que hoje se encontra- lência do projeto desenvolvimentista sob o qual se uniam aspara três não esferas afirmar de a governo sua bolha; estatal pelo (municipal,Brasil em termos estatal da e fafe- deral); do porto e de seus serviços comerciais navais, no desaquecimento da economia e também da Petrobrás, que no Rio de Janeiro adquire um papel fundamental; e, pelas próprias empreiteiras, que estariam envoltas nos proces- sos decisivos da operação judicial e investigativa da Lava Jato. Entretanto, apesar da crise nacional e local, da au-

que estaria atrelado ao projeto da região portuária, outro grandesência de projeto confiança urbano na moeda está sendo do instrumento gestado nos e do mesmos futuro

Porto Maravilha: entre a financeirização, o biocapitalismo e a flexibilização do direito a financeirização, o biocapitalismo e flexibilização entre Maravilha: Porto nova fronteira da região das Vargens na Zona Oeste (en- moldes do Porto Maravilha no Rio de Janeiro. Trata-se da 332 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS globa Vargem Grande, Pequena, Camorim e parte da Barra da Tijuca e de Jacarepaguá), que corresponderia a 25% do território do município. Apesar desse projeto não ser re- cente, apenas no ano passado o seu Plano de Estruturação - visão de uma OUC, como consta através do Projeto de Lei ComplementarUrbana foi concebido 140/15. e enviado Trata-se à deCâmara uma áreado Rio cerca com de a pre dez existindo toda uma mobilização das resistências em vida novezes território maior do para que frear a área o projeto,do Porto além Maravilha. de todo E, mesmoo cenário já da crise, o projeto continua e persiste como uma ameaça em aberto quanto a sua implementação, visto que as au- foram conduzidas no primeiro semestre do presente ano dediências 2016. públicas na Câmara Municipal do Rio de Janeiro já - ser construídoDessa das forma, Vargens, tanto as no questões projeto quese concentram hoje é imple so- mentado do Porto Maravilha, ou mesmo no futuro ainda a- zação, da gestão do território como controle sobre a produ- çãobre todase da socialização as coordenadas dos riscos do biocapitalismo, sobre as políticas da financeiri públicas. Sob a crise instaurada e o futuro do comprometimento do FGTS, que assumiu o valor total do empreendimento (R$ 8 as tendências atuais apontam para mais uma tentativa de controlebilhões), enão de hágestão certezas. que sePodemos articulou apenas com umreconhecer futuro mer que- cantilizável e que não mais encontra as bases, não conse- Luiz Felipe Teves de Paiva Sousa gue mantê-las para a valorização/exploração. - cia desse projeto – e das Vargens, se realizado da mesma Contudo, nesse cenário, reconhecer a crise e falên- forma, com o comprometimento do FGTS – significa tam forjadosbém identificar no compromisso a perda generalizada assumido pelo da sociedade fundo dos posta tra- para trabalhar, da vida social produtiva. Pelos encargos 333 balhadores, isto é, pela socialização do risco, amarrou-se ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA o projeto a uma lógica de exploração completa: ou se tem sucesso e a região se torna um ponto de exploração sobre a

e o prejuízo é dissolvido entre os sujeitos que já foram pos- vida dos sujeitos postos para trabalhar, ou há a sua falência lógica alternativa, se assim podemos pensar, que não mais poderiatos para setrabalhar dar pela e estruturaque trabalhariam do Estado ainda social, na região.já atrelada E, a aos imperativos do mercado, não existirá sem ser através da própria força e movimento das resistências: pela luta por uma democratização e pela gestão comum do territó- rio e das políticas públicas.

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Porto Maravilha: entre a financeirização, o biocapitalismo e a flexibilização do direito a financeirização, o biocapitalismo e flexibilização entre Maravilha: Porto Janeiro. 336 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS - rações sobre os discursos que (re)criam a cida- XAVIER,de. P. Dissertação 2012. Do porto (Mestrado) ao Porto - Instituto Maravilha: de Pesquisa conside e Planejamento Urbano e Regional, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro. Luiz Felipe Teves de Paiva Sousa

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13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA EM LONDRINA/PR: CONVERGÊNCIA ENTRE ESTADO E CAPITAL IMOBILIÁRIO

Eliane Barbosa Santos Pagani1

RESUMO: Este artigo analisa a relação entre Estado e ca- socioespacial urbana. Nesta o acesso à moradia não escapa àpital sua imobiliário, adaptação àbem lógica como do seusmercado. impactos O artigo na configuração adota como analisarecorte asa investigação contradições da resultantes habitação dede interessesua implementação social com noenfoque Residencial no Programa Vista Bela Minha em Londrina/PR.Casa, Minha Vida Por (PMCMV)se tratar de e

- ráteruma pesquisadescritivo. qualitativa, metodologicamente o trabalho PALAVRAS-CHAVE:está apoiado em revisão Estado. bibliográfica Capital imobiliário. e documental Habitação. de ca ABSTRACT: - This article analyzes the relationship between state and real estate capital, as well as its impact on so cio-urban setting. This access to housing does not fail to adapt to the market logic. The article adopts as clipping the- Eliane Barbosa Santos Pagani tionsinvestigation arising fromof social its implementationhousing with a focusat Residencial on the Minha Bela Casa, Minha Vida (PMCMV) and analyzes the contradic

Vista in Londrina/PR. Because it is a qualitative research, KEYWORDS:methodological State. work real is supported estate capital. by literature Housing. review and documentary descriptive character. 1 Assistente Social da Prefeitura Municipal de Londrina. Mestranda em Serviço Social e Política Social - Universidade Estadual de Londrina- UEL. E-mail: [email protected] 339 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA 1. INTRODUÇÃO

Mesmo com o advento dos instrumentos urbanís- ticos, a partir da Constituição Federal de 1988, do Estatuto da Cidade (2001) e da Política Nacional de Habitação (2004), para garantia de cidades inclusivas e democráticas, é comum as grandes cidades brasileiras apresentarem uma

céus, servidas de infraestrutura e equipamentos urbanos e,paisagem na maioria formada das vezes, por áreas em áreas nobres, opostas repletas e distantes, de arranha as - cárias e irregulares, carentes de infraestrutura e equipa- mentos,periferias mantendo formadas um por modelo bairros de populares, urbanização habitações desigual. pre Este quadro não é ocasional. Ao analisar a ques-

articuladatão da habitação com a especulaçãolevando em consideraçãoimobiliária, o aque apropriação conduz à reservada terra de urbana espaços verifica-se privilegiados a continuidade da cidade para da os ocupacão grandes

movimento percebe-se que a segregação socioespacial se faze rentáveis cada vez empreendimentos mais presente através na área do daprocesso habitação. de valori Neste- zação imobiliária e de decomposição e recomposição (des-

das cidades sofrem uma dupla expulsão. De um lado são expulsosterritorialização das suas e moradiasreterritorialização), e, de outro, onde da própria os habitantes cidade. A cidade capitalista caracteriza-se pela velocidade de circulação de mercadorias, base da acumulação de ca-

desenvolvimento das cidades. Engels, em seu estudo sobre pital, e de pessoas. Esta é uma tendência que acompanha o por exemplo, que nas cidades A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra observa,

os Estados, e todas as classes, que se apressam Estas centenas de milhares de pessoas, de todos

Programa Minha Casa, Minha Vida em Londrina/PR: convergência cntre Estado e capital imobiliário cntre Minha Casa, Vida em Londrina/PR: convergência Programa possuindo as mesmas qualidades e capacidades e e se empurram, não serão todas seres humanos 340 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS o mesmo interesse na procura da felicidade? E não - mos métodos e processos? E, contudo, estas pes- soasdeverão, cruzam-se enfim, procurarapressadas, a felicidade como se com nada os tives mes- sem em comum, nada a realizar juntas, e a única convenção que existe entre elas é o acordo tácito pelo qual cada um ocupa a sua direita no passeio,

cruzam não se constituam mutuamente obstáculo; e,a fimcontudo, de que não as vemduas ao correntes espírito dade multidãoninguém aque ideia se - rença brutal, este isolamento insensível de cada indivíduode conceder no aseio outro dos um seus olhar interesses sequer. particulares, Esta indife

- tesão reduzido tanto mais espaço. repugnantes (ENGELS, e 1985,chocantes p. 36). quanto é maior o número destes indivíduos confinados nes Além disso acentua a impossibilidade de resolver a questão urbana dentro dos marcos do capitalismo. Um dos traços essenciais deste processo é a privatização da terra do Estado. A consequência direta deste processo é a luta peloe da habitação,espaço e o acompanhadacrescimento das pela periferias intervenção metropolitanas, reguladora com a consequente segregação socioespacial. Além das dimensões apontadas pode-se com- preender a cidade como espaço da produção e reprodução - priação no urbano expressam-se, também, com mais fre- quência,da força dea luta trabalho, de classes. e, por Deste se tratar modo, de érelações possível de detectar expro em nível mais imediato que o espaço urbano é ocupado di- Eliane Barbosa Santos Pagani ferencialmente por critérios que não se encontram deter- minados pelas vontades individuais. Efetivamente a ocupa- ção diferenciada da terra urbana está diretamente ligada ao processo de acumulação capitalista que promove a dis- tribuição desigual da riqueza produzida resultando, igual- mente, em respostas diferenciadas às demandas da popu- lação de baixa renda, ou seja, uma significativa parcela da 341 população está privada dos benefícios da urbanização, tais ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

maneirascomo facilidades de exprimir de acesso a questão ao mercado social já de estavam trabalho, no bens cam e- serviços produzidos, dentre os quais, o da habitação. Estas

po de visão de Marx quando afirma:

quanto[...] já a maiorsituação a centralização habitacional dos é fácil meios de deentender. produ- ção,Qualquer tanto maior observador o amontoamento desprevenido correspondente percebe que,

quanto mais rápida a acumulação capitalista, tanto de trabalhadores no mesmo espaço e, portanto,

progressomais miseráveis da riqueza, as habitações a demolição dos detrabalhadores. quarteirões malOs ‘melhoramentos’ construídos, a construçãourbanos que de acompanham palácios para o bancos, lojas, etc., o alargamento de ruas para o tráfego comercial e para as carruagens de luxo, o - salojam evidentemente os pobres, expulsando-os estabelecimentopara refúgios cada de vez linhas piores para e mais bondes, abarrotados etc., de de gente. (MARX, 1988, p. 764).

No caso aqui analisado, ou seja, o de Londrina e, - bitação de interesse social tem favorecido muito mais a particularmente, o Residencial Vista Bela, a política de ha- cial no espaço urbano que resulta em segregação socioes- pacialacumulação no mesmo capitalista, processo intensificando que anuncia a ter diferenciação a função precí so- pua de atender ao direito à moradia digna para a popula- ção de baixa renda. O PMCMV – Residencial Vista Bela, começou a ser implementado em 2011 com a construção prevista de

- cia2712 do unidadesVista Bela habitacionais, como lócus empírico em área para distante a pesquisa, do centro con- tudo,urbano, não sem está o emaparato sua dimensão das políticas quantitativa públicas. eA sim importân no fato de que através dele é possível investigar e compreender as

Programa Minha Casa, Minha Vida em Londrina/PR: convergência cntre Estado e capital imobiliário cntre Minha Casa, Vida em Londrina/PR: convergência Programa formas de intervenção do poder público municipal na ci- 342 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS dade de Londrina/PR, favorecida pela ação do Estado por relações com o processo de urbanização, seus impactos no aquecimentomeio das políticas do setor habitacionais imobiliário de eminteresse contradição social come suas a defesa de acesso ao direito à moradia digna preconizado pela PNH (2004). - rial na gestão das políticas sociais em Londrina/PR”. Trata- se de umaAs cooperação reflexões são acadêmica parte da entrepesquisa a UEL- “A lógica Universidade territo

Estadual de Londrina/Paraná e a PUC/SP, financiada pelo CNPq, por meio da Chamada Pública MCTI/CNPq/MEC/ Capes2. CAPITAL – Ação Transversal IMOBILIÁRIO, n. 06/2011 RENDA – Casadinho/Procad. FUNDIÁRIA E POLÍTICA DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL modo de produção capitalista, cuja mercantilização de- manda aA intervenção questão da dohabitação Estado, é que estrutural por meio e inerente da política ao interesses do grande capital. A Política Habitacional é, por- tanto,de habitação analisada preconiza no campo o direito das políticas à moradia sociais e contempla de respon os- sabilidade do Estado. - te esteve atrelada ao mercado imobiliário, ou seja, é uma mercadoriaA política que tem de ao habitação seu custo node produção Brasil historicamen agregado o Eliane Barbosa Santos Pagani custo da terra urbana regulada pela propriedade privada. Disso resulta um preço em geral inacessível para a classe - - liários.trabalhadora, Isto sem sobretudo considerar, a de também, baixa renda, que para que um para extenso satis fazer sua demanda recorre a longos financiamentos imobi- contempladoscontingente de pelo trabalhadores PMCMV. a habitação é uma mercado ria cujo acesso é difícil, mesmo em se tratando de valores 343 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA -

que ela Apossa terra ser não transformada sofrendo ação em do trabalhocapital. Anão terra tem não va podelor. A incorporaçãoser reproduzida do trabalhopelo capital à terra como é fundamental as demais merpara- cadorias que auferem lucro e os proprietários de terra so- mente obtém dela uma renda decorrente do seu direito de

propriedade. Ou,Se como lembrarmos afirma queMaricato: a terra urbana, ou um peda- ço de cidade, constitui sempre uma condição de

igual a outro, e sua localização não é reproduzí- monopóliovel - estamos - ou diante seja, nãode uma há um mercadoria trecho ou especialterreno

de renda. A cidade é um grande negócio, e a renda imobiliária,que tem o atributo seu motor de captarcentral. ganhos (MARICATO, sob a forma2015, p. 23).

Um elemento determinante para atribuir valor à

um processo de mercantilização do espaço. Esta mercan- tilizaçãohabitação da é oterra preço coloca da terra em urbana,contato adquiridaproprietários dentro priva de- dos, isto é, o vendedor da terra, o capitalista que realiza o empreendimento e o comprador que detém parte dos re- cursos monetários para comprar o imóvel. Neste sentido,

como resultante de um processo sob controle do capital privado,Harvey (1980) pois na explica economia a mercantilização capitalista a terra da terra também urbana re- presenta uma mercadoria e esta tem seu valor estabeleci- do a partir de duas dimensões, quais sejam: seu valor de uso e seu valor de troca. O primeiro é determinado por sua utilidade, enquanto o último é conferido pela possibilidade de compra e venda que transforma a terra em mercadoria.

e irá depender essencialmente das condições de construti- A variação do preço da terra é um fenômeno social- Programa Minha Casa, Minha Vida em Londrina/PR: convergência cntre Estado e capital imobiliário cntre Minha Casa, Vida em Londrina/PR: convergência Programa bilidade dos terrenos, a natureza física do terreno propria 344 mente dito, ou seja, da sua topografia, das características 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS geomorfológicas, da sua localização no espaço da cidade, dos acessos a equipamentos urbanos, da permissão de uso do solo, pois, a terra assume papel e valor diferenciado no comercial, industrial e etc.) e de infraestrutura. (CARDOSO, 2008,processo p. 16). de edificaçõesE nesse aspecto (sejam as legislações,elas para uso mediadas residencial, pelo Estado, são determinantes para favorecer e atribuir valor a determinados territórios. Além das legislações de uso, ocupação e parcela- mento do solo que atribui valor a terra, a valorização ou desvalorização de uma região depende também dos inves- timentos públicos no espaço que alteram substancialmen- renda fundiária ou imobiliária parece ser uma riqueza que te o mercado imobiliário. Maricato (2015) afirma que a graças a investimentos públicos e/ou privados feitos nas proximidades.flutua no espaço “Assim, e aterrisa as grandes em determinadas obras públicas propriedades de redese- ou frentes pioneiras para o capital imobiliário”. (ROLNIK, 1995,nho da p. cidade 63). funcionam como territórios reconquistados Sobre a terra urbana como capital privado agre- ga-se o capital imobiliário pela valorização do preço dessa mercadoria, seja como um espaço vazio, seja pela cons- trução de moradias ou imóveis destinados ao comércio. capital imobiliário: o setor improdutivo, que lucra com a rendaDe acordo de aluguel; com Harvey e o setor (1982), produtivo, há dois representadotipos principais pelas do Eliane Barbosa Santos Pagani construtoras e incorporadoras. Segundo o autor, o espaço torna-se muitas vezes fragmentado por uma série de ações de capitalistas individuais que agem sobre ele.

A renda fundiária corresponde assim ao sobre- lucro espacial apropriado pelos proprietários de terra: quanto mais férteis, mais bem localizados,

diferenciados e exclusivos forem os terrenos e mais bem dotados de infraestrutura, enfim, mais 345 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA imóveis, maior é a renda fundiária que pode ser auferida pelos seus proprietários. Ainda que en- quanto bem de mercado um determinado preço possa ser atribuído à terra, a mesma não incorpo-

manufaturada, cujo preço de produção correspon- ra valor-trabalho, ao contrário de uma mercadoria- rio para sua produção. O preço do solo correspon- de entãoao quantum à capitalização de trabalho da renda socialmente total (síntese necessá de diversas modalidades de rendas fundiárias que obedecem a lógicas e escalas espaciais distintas) suportada por cada lote, ou ao preço do direito do proprietário de receber essa renda periodicamen- te. (MENDONÇA; COSTA, 2011, p. 19).

- tação sempre esteve relacionada ao mercado imobiliário. Deste modo,Observa-se a concentração que historicamente da propriedade a política fundiária, de habi a especulação imobiliária, a desigualdade de distribuição de riquezas sociais, são marcas da urbanização brasileira com

rebatimentos na produção de habitação de interesse social.- lismo, é Todavia,inegável aindaque a atual que persistindopolítica urbana velhas e apráticas, política herdadas de um processo de colonização e patrimonia

existenteshabitacional no apresentamBrasil, tanto no conquistas seu marco quando regulatório comparadas quanto naàs modalidadessua estruturação. de políticas A estruturação habitacionais da PNH anteriormente (2004) conta com um Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS) e Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS), e seu principal programa o MCMV apresenta a

famíliascriação de de fundos baixa renda que garantem e a diretriz o financiamento de integração doentre setor os enteshabitacional, federados. possui Importa subsídios destacar do governo a defesa federal dos movimen para as-

Programa Minha Casa, Minha Vida em Londrina/PR: convergência cntre Estado e capital imobiliário cntre Minha Casa, Vida em Londrina/PR: convergência Programa sertos subsidiada sociais pela para moradia a população ao afirmarem de baixa querenda, se pois a política o ato habitacional é altamente privatizada346 e financeirizada deve 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS de (re)produção do ser social. de morarNeste é um sentido,direito humano o PMCMV que impulsionouestá entre as condiçõesa política de Habitação (1964-1985), teve conquistas orçamentárias habitacional estagnada após a extinção do Banco Nacional construídas supera as modalidades anteriores. No entan- para o setor e o quantitativo de unidades habitacionais-

Nettoto, o PMCMV (1996) denominanão ficou ilesode imbricação a tendência entre de afinanceiriza função po- ção das políticas públicas, seu desenho pode ilustrar o que PMCMV demonstra a existência da luta de classes na cida- delítica em e disputaeconômica pelo das fundo políticas público, sociais. de um A configuraçãolado os agentes do privados em busca de remuneração para o capital, de outro os que demandam por políticas públicas. Nas palavras de Maricato (2015) a disputa entre aqueles que vêem na cida- de seu valor de uso, e de outro, os que vêem seu valor de troca. Como parte constitutiva do Programa de - ver investimentos e infraestrutura que permitam aumen- tarAceleração a produtividade do Crescimento das empresas, (PAC), cujaestimular finalidade investimentos é promo privados e reduzir as desigualdades regionais, o PMCMV foi concebido para promover o aquecimento da economia por meio do estímulo ao setor da construção civil, segmen- to que gera demanda expressiva por mão de obra de baixa - Eliane Barbosa Santos Pagani dequalificação, recessão, comosendo ocorreu frequentemente após a crise mobilizado capitalista como acirrada ele emmento 2008 de nos políticas Estados econômicas Unidos e Europa. anticíclicas (CARDOSO, em momentos 2011) - de construçãoMaricato de novas(2015, casas, p. 37) sem afirma considerar que o “PMCMVo espaço urre- banotoma ema visão seu conjuntoempresarial e a cidadeda política comprometida habitacional, pela ou baixa seja, - 347 qualidade”. Observa-se que o setor habitacional está con ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA templado em investimento em infraestrutura e estímulo ao

questão fundiária”. crédito e ao financiamento, mas “permanecendo intocada a- tação a uma posição de destaque na agenda do Governo Federal éEmbora importante o PMCMV destacar tenha a sobreposição alçado o tema do programa da habi - - a política de habitação que ficou focado apenas na constru- cionalção de moradiascomo exemplo com estímulo a regularização ao crédito fundiária. e ao financiamen Para isso, oto, governo sem investimentos adotou medidas em demais como açõesa redução da política das taxas habita de

um Fundo Garantidor de Habitação (FGHAB), desenvolveu juros em financiamentos habitacionais e dos seguros, criou baixa renda, além de reduzir os prazos e os custos carto- riais.os incentivos Entretanto, fiscais este para tipo a de produção programa de favorecemoradias a paratrans a- ferência de recursos públicos para a iniciativa privada, em especial, do setor da construção civil.

[...] é indiscutível o efeito contracíclico do MCMV sobre a indústria da construção civil. De acordo com dados da Revista do Sinduscon, o sindica- to das empresas de construção, o setor cresceu 47,1% no período de 2003-2013, enquanto o PIB no mesmo período cresceu 45,9%. Foram criados - - ciadas2,23 milhões pelo FGTS de postos e SBPE de foram trabalho lançadas formais. por A parano, umtir de número 2010, quatrocerca de vezes 1 milhão maior de do unidades que em 2003; finan a

72%, no mesmo período. Nesse sentido, podemos produção de tintas cresceu 75% e a de vergalhões,-

bem-sucedida,afirmar que do oponto que, desem vista dúvida, do crescimento angariou apoio eco dosnômico setores e da geraçãoempresariais de empregos, sindicais. a estratégia (ROLNIK, foi 2015b, p. 306).

-

Programa Minha Casa, Minha Vida em Londrina/PR: convergência cntre Estado e capital imobiliário cntre Minha Casa, Vida em Londrina/PR: convergência Programa te principal da ampla produção de moradias é a “era de Neste sentido, Rolnik348 afirma que o determinan 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS crescente da extração de renda sobre o capital produtivo hegemonia das finanças, do capital fictício e do domínio - ceiro”.que resulta (ROLNIK, na desconstrução 2015a, p. 26). daAlém habitação dos fatores como macroeco um bem- social e de sua transmutação em mercadoria e ativo finan do PMCMV, não diretamente relacionado às necessida- nômicos, outro aspecto decisivo que influenciou o desenho imobiliário: des habitacionais, foi uma conjuntura específica do setor Várias das principais empresas desse segmento

anos anteriores à crise. [...] Para que pudessem ampliarhaviam abertosuas carteiras seu capital de projetos,na bolsa demuitas valores dessas nos empresas formaram grandes bancos de terra. [...] Tendo sido formulado com intensa participação de representantes dessas empresas, para além de - mico de caráter anticíclico, o PMCMV foi também uma políticasaída encontrada habitacional para e deevitar um pacotea falência econô ge- neralizada de empresas de grande porte no setor imobiliário, mantendo a oferta de crédito no pa- tamar necessário para que o setor pudesse man- ter suas atividades em ritmo acelerado e, assim, dar vazão ao capital imobilizado na formação de estoques de terra no período anterior. (ROLNIK, 2015b, p. 131).

Na medida em que os construtores investiram em terras tornaram-se também os maiores proprietários de

imóveis urbanos e passaram a ter o controle da política Eliane Barbosa Santos Pagani urbana e o direcionamento da expansão e reordenamento das cidades. Na última década o setor imobiliário – cons- trutoras, incorporadoras, proprietários de terra urbana ti- veram um crescimento potente com incentivos e estímulos do poder público. Com injeção de recursos públicos do PAC

- verame do BNDES sua expansão as grandes e internacionalização, construtoras, Odebrecht, abriram Camargo capital Correia, OAS, Andrade Gutierrez349 e Queiroz Galvão, promo ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA na bolsa, adquiriram um imenso banco de terras e expandi-

geração de energia elétrica e a petroquímica. Deste modo, oram investimento seus horizontes em imóveis para outros superou ramos a rentabilidade como a telefonia, de to a-

dos os outrosCom ainvestimentos detenção da possefinanceiros das terras de 2008 urbanas a 2013 são e asrendeu próprias cinco construtoras vezes acima queda inflação. indicam (BOULOS, a localização 2016) para a construção dos empreendimentos do MCMV geralmente - tiva do poder público municipal é de que nas regiões mais afastadasem áreas maisdo centro distantes urbano dos o centros preço da urbanos. terra é Emenor a justifica e as-

No entanto, o que pode ser observado é que o for- simtalecimento poderiam rápido ser construídas e intenso mais do capitalunidades imobiliário habitacionais. por - nanciamento de imóveis aqueceu o mercado imobiliário poismeio considera-sedas políticas existirde ampliação um aumento de crédito no poder como de para com fi- pra do consumidor. Promoveu uma valorização da terra que elevou também os preços dos imóveis e de seus alu-

que se refere ao gasto excessivo das famílias com aluguel, guéis com consequência direta no déficit habitacional no

(FJP)pois o apontam aumento quedos salárioso número não de acompanha famílias de o baixaaumento renda do commercado gasto imobiliário. excessivo com Os dados aluguel da aumentou. Fundação JoãoEnquanto Pinheiro em 2007 era de 1.965.981, em 2012 esse número passou para 2.660.348 domicílios, aumentando de 32% em 2007 para

Enquanto as corporações imobiliárias faturaram alto46% ampliandodo déficit habitacional seus investimentos em 2012. nas grandes cidades, - latórias do poder público para conter o capital imobiliário regiões inteiras foram reconfiguradas sem medidas regu-

Programa Minha Casa, Minha Vida em Londrina/PR: convergência cntre Estado e capital imobiliário cntre Minha Casa, Vida em Londrina/PR: convergência Programa dores para regiões periféricas das cidades. A combinação ao mesmo tempo em que ocorreu a expulsão dos trabalha 350 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS da expansão dos novos empreendimentos imobiliários, maior facilidade de crédito e o aumento da renda tiveram - tou a procura e elevou os preços. O aumento nos valores dosreflexos imóveis também para nosvenda imóveis e aluguel já construídos, disparou a ofertapois aumen de no- vos empreendimentos do PMCMV resultando em espaços desiguais e áreas segregadas distantes do centro urbano, bem como a ampliação das áreas irregulares e de moradias precárias. Deste modo, pode ser observado que o PMCMV quantitativo e o mesmo continua a ser usado muito mais não foi capaz de conter o déficit habitacional qualitativo e- vas moradias e expandir a acumulação capitalista do que efetivamentepelo mercado atenderimobiliário a demanda para justificar da população a produção de de baixa no renda. - cipal agente da produção do espaço urbano, o que permite compreenderNeste quesentido, os “estados o Estado não se foram configura diminuidos como o comoprin fez crer o ideário neoliberal, mas adaptaram-se às exi-

(MARICATO, 2015, p. 73). gências das grandes corporações e do capital financeiro”. 3. MORADIA COMO MERCADORIA – RESIDENCIAL VISTA BELA

Londrina tem 97,40% de sua população urba-

na. Sua Região Metropolitana congrega 17 municípios. O Eliane Barbosa Santos Pagani Paraná é o estado do sul do Brasil com maior número de moradias precárias, este número no Estado cresceu 39% entre 2011 e 2012 acima do índice nacional que foi de 34%. Em Londrina, conforme dados do Plano Local de Habitação de Interesse Social (PLHIS, 2011), existiam 62 agrupamentos irregulares (assentamentos e ocupações), 12 remanescentes da década de 1970 e 08 da década de - 351 80. O déficit habitacional no município atinge 43 mil famí ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA lias, sendo 16 mil famílias com renda até 03 salários mí- nimos, assim distribuídas: zona norte (27%), zona leste (21%), zona oeste (19%), zona sul (17%), e centro (16%). (COHAB-Ld, 2014). Observa-se que dentre as famílias com renda até 03 salários mínimos a maioria da demanda está localizada na região norte. O que demonstra que esta região além de concentrar o maior número de empreendimentos

e 1980, persiste como a maior demanda por moradia na faixahabitacionais de renda construídos até 03 salários pela mínimos. COHAB Aona mesmodécada detempo 1970 o Censo (2010) indica a existência de 27.539 domicílios não ocupados. O PMCMV realizou a construção de 5153 unidades - nimos. Destes 2974 foram construídas na região norte do municípiohabitacionais, e 2712 sendo compõe 3635 parao Residencial a faixa de Vista 0 a 3 Bela,salários destas mí 840 famílias residiam em áreas de ocupação irregular (fun- do de vale, assentamentos e ocupações). O Residencial Vista Bela possui uma população de 8395 pessoas sendo 48,7% composta por crianças e ado- lescentes e foi implantado sem a provisão de equipamen- tos sociais e serviços públicos, além de ser constituído por famílias advindas de regiões distintas do município, não considerando o princípio da territorialidade estabelecido

Importa destacar que o município teve apenas o mercadona política como de habitação. parceiro na implementação do programa. Ainda que por meio da modalidade Entidade a aplicação - - dos recursos poderiam reverter em unidades habitacio equipamentosnais com melhor sociais. qualidade, uma vez que sem fins lucra tivos todoCom o recurso a exclusividade é investido para na melhoria a implementação da moradia do e -

Programa Minha Casa, Minha Vida em Londrina/PR: convergência cntre Estado e capital imobiliário cntre Minha Casa, Vida em Londrina/PR: convergência Programa plementar os empreendimentos, ou seja, em áreas perifé- PMCMV o mercado imobiliário teve a livre escolha para im 352 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS ricas onde a terra é mais barata. Desta forma, o que impera dos empreendimentos em Londrina é a lógica da rentabili- edade. define Uma o desenho contradição da política aos avanços habitacional recentes e naa localização legislação

O PMCMV alavancou a construção de moradia estagnadaque rege o acessodesde aao década espaço deurbano 1980 e quandoa habitação. foram cons- norte do município com recursos do BNH, mas contribuiu truídas mais de 10 mil unidades habitacionais na região- tor da construção civil. Segundo Sindicato da Habitação efundamentalmente Condomínios do paraParaná o aquecimento (SECOVI-PR), econômico os valores no dosse imóveis residenciais em Londrina apresentaram alta de 10,17% e demonstra que 74% dos imóveis à venda na ci- dade custam mais de R$ 200 mil. (GALIOTTO, 2014, p. 4). se enquadram no PMCMV que oferece subsídios do gover- noOs imóveisfederal e mais juros difíceis reduzidos de serem às famílias encontrados com renda são osaté que R$ 1,6 mil mensais. O aumento no valor dos terrenos aliado ao enca- recimento da mão de obra na construção civil, inviabiliza construções de casas com valor abaixo do teto do PMCMV, e esta tem sido a receita para impulsionar as famílias de baixa renda para áreas onde a terra é mais barata e con- sequentemente o valor do aluguel é menor. Neste sentido, Londrina teve em janeiro de 2014 o crescimento de 11 ocu- pações irregulares em áreas públicas e particulares em di- Eliane Barbosa Santos Pagani ferentes regiões da cidade. - resse social o poder público municipal promove expansão do perímetroPara contemplar urbano, alteração a demanda na lei por de habitação zoneamento de inte do município e do Plano Diretor com o consequente distan- ciamento dos empreendimentos de HIS e manutenção de vazios urbanos. Neste momento entram em confronto inte- resses distintos de uso da terra urbana. 353 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Em contrapartida, observa-se o crescimento da procura por imóveis milionários que podem variar de R$

região sul da cidade com a crescente verticalização e a ex- 1 milhão a R$ 12 milhões em condomínios horizontais na O que pode-se observar é que o declínio da po- líticapansão urbana de condomínios está relacionado horizontais. ao paradoxo: (SANTIN, “as2014). práticas exemplares de governos locais “democráticos e populares” desenvolveram-se durante o período das décadas perdi- - vestimentos federais em políticas urbanas - Programa de das, isto é, durante os anos de ajuste fiscal e recuo dos in (MCMV) - alguns capitais (ligados ao ambiente construído) tomamAceleração o comando do Crescimento das cidades, (PAC), concomitante Minha Casa, ao Minha enfraque Vida- cimento dos movimentos que criaram a agenda da Reforma Urbana”. (MARICATO, 2015, p. 11). Neste sentido, a moradia é um direito que se con- cretiza mediante a aquisição monetária no mercado e/ou - mento desse bem, evidenciando a enorme defasagem entre ospor princípios meio de igualitários políticas sociais e democráticos que promovam da lei e o a financia realida- de social repleta de desigualdades e segregação.

4. CONCLUSÃO

A cidade não só oferece as condições necessárias para a acumulação capitalista no espaço urbano como tor- na-se ela mesma produto de acumulação capitalista no

processo é o Estado. Com o avanço do processo de acumu- lação,movimento o Estado de financeirização, cada vez mais cujoparticipa principal da realização agente deste do grande capital, fornecendo insumos básicos e tornando-se ele próprio um agente produtor, provocando a crescente -

Programa Minha Casa, Minha Vida em Londrina/PR: convergência cntre Estado e capital imobiliário cntre Minha Casa, Vida em Londrina/PR: convergência Programa cesso produtivo. exclusão de trabalhadores das354 riquezas produzidas no pro 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS Em Londrina podemos constatar que o espaço ur- bano tem se estruturado a partir de intervenções do poder público associado aos incorporadores imobiliários, levan-

últimos anos. do a cidade a experimentar mudanças significativas nos- teresse social é o caráter mercantil marcada pela segrega- ção socioespacialO que se eobserva espraimento na política das fronteiras de habitação da cidade. de in A análise do PMCMV, demonstra sua permanência associada - lações populista sem enfrentar a questão urbana, perma- necendoao fortalecimento intocada econômicoas questões ligado estruturais, à construção como a civil proprie e re- dade da terra. No entanto, o direito à moradia não é direito de propriedade. Moradia não é somente casa. A moradia dig- na deve abarcar os elementos essenciais para o desenvol- - ções efetivas de oportunidades e acesso à educação, saúde, vimento humano e econômico das pessoas, ou seja, condi adequada. Considerando estes princípios constantes no ordenamentotrabalho, lazer, jurídico dentre brasileirooutros, que e inclusiveoportunizam em pactosuma vida in- ternacionais dos quais o Brasil é signatário, o não cumpri- mento dos mesmos caracteriza-se claramente em violação de direitos. O Residencial Vista Bela embora apresente êxito quantitativo demonstra uma lacuna considerável entre o arcabouço legal e a prática do poder público municipal no Eliane Barbosa Santos Pagani - - tocante às condições que asseguram à habitação como di- tegraçãoreito humano à cidade universal. e reproduz O PMCMV um modelofalha na deoferta urbanização de opor desigualtunidades e de segregaçãoacesso social, socioespacial econômico ee impactacultural empara toda in a cidade. Deste modo, retrata a opção por um modelo de gestão neoliberal que visa acima de tudo os interesses eco- - 355 nômicos de um grupo privilegiado (construtoras, incorpo ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA radoras e especuladores imobiliários), em detrimento da

dignidade humana e dos direitos sociais. REFERÊNCIAS

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Santin).out. 2012. Disponível em . Acesso em: 11 dez. 2012. [Reportagem de Wilhan Eliane Barbosa Santos Pagani

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13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS SCHULD: DÍVIDA E CULPA NA GENEALOGIA DA MORAL, DE NIETZSCHE

Márcia Junges1

RESUMO: Este artigo se propõe a analisar a genealogia da palavra alemã Schuld Segunda Dissertação de A Genealogia da Moral, quando aponta a duplicidade de seu, em sentido, Nietzsche, qual apresentadaseja: culpa e dí na- originou-se em uma ideia materialista de “dívida”. Hoje, o vida. De acordo com o filósofo, o princípio moral da culpa fabricado ininterruptamente nas engrenagens de um sis- temahomem que endividado, oferece crédito, como masformula produz Maurizzio dívida Lazzarato,e aprisiona é- mento através desse dispositivo. Assim, atentos à captura dos sujeitos pelos dispositivos da dívida, pelo biocapitalis- política, as políticas públicas e a vida como um todo, pensa- mosmo e ser a financeirização importante elucidar a que estáas origens submetida da palavra a economia, Schuld a nesse escrito do pensador alemão. PALAVRAS-CHAVE:

dívida; culpa; financeirização; Nietzsche A dívida castigada, ou sobre o prazer em fazer sofrer

É na Segunda Dissertação de A genealogia da moral - Márcia Junges

Uma(II GM) primeira que Nietzsche abordagem irá se trata ocupar das de“condições modo analítico-ge psicológi- nealógico sobre a gênese da culpa de maneira detalhada. - da do Prof. Dr. Castor Bartolomé Ruiz. E-mail: [email protected] 1 Doutoranda em Filosofia pelo PPG em Filosofia da Unisinos, orientan 359 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA -

causadoras’co-filosóficas do da ato culpa do castigo fundadas resolvem no direito a questão de punição: da culpa” a in2. clusãoPor outro da ‘nãolado, liberdade uma segunda da vontade’ abordagem e das tenta ‘circunstâncias “esclarecer a consciência de culpa: os ‘antigos’ não viam ‘entre culpa e

uma ‘infelicidade inocente’; ‘apenas no Cristianismo tudo seinfelicidade torna um nenhumabem merecido ‘relação castigo” adequada’,3. conheciam ainda Conceitos judaico-cristãos formadores das so- ciedades ocidentais como responsabilidade, consciên- cia moral do pecado e castigo são examinados em GM II. Cabe observar atentamente o aforismo 4 de GM II, no qual

- Nietzsche questiona de modo emblemático: origem naSuspeitaram, ideia material sequer de “dívida”? por sonhos, ou queestes o genealogiscastigo, en- quantotas da moral represália, que o se conceito desenvolveu essencial independentemente “falta” tenha a sua de 4

setoda “tirou a hipótese o seu poderde livre-arbítrio esta ideia eprimordial de obrigação? tão arraigada, (...) de quePara o prejuízoNietzsche, e a é dor da relaçãosão equivalentes credor e devedor5”. Tal noção, que sustenta, é tão antiga quanto a “própria noção de “sujeição legal”, que, por sua vez, nos leva às formas primitivas de 6”.

compra e venda de câmbio - A fim de inspirar confiança, seriedade e reputação- misso:junto àquele “(...) para com gravar quem na detém sua própria uma dívida consciência e precisa a neces hon- sidaderá-la, o dedevedor pagamento firma sobum contrato,a forma de um dever, pacto, de um obrigação, compro

A genealogia da moral. São Paulo: Moraes, 1985, p. 123 e 124 32 Ibid. NIETZSCHE, p 124 Friedrich. 4 Ibid., p. 33 5 Ibid. p. 33

Schuld: dívida e culpa na Genealogia da Moral, de Nietzsche e culpa na Genealogia da Moral, Schuld: dívida 6 Ibid., p. 33 360 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS compromete-se, em virtude de um contrato com o credor, a indenizá-lo, em caso de insolvência, com alguma coisa que ‘possui’.7” Nisso poderia estar incluso desde seu cargo, sua mesmo no céu, no caso dos seguidores crentes de certas religiões.mulher, bens e propriedades, sua liberdade na Terra e até Uma certa economia taxava determinadas partes quais dívidas. Dessa forma, estava aberta a possibilidade dedo quecorpo o credorem sua pudesse importância cobrar como a dívida, pagamento na falta a taisde ouou-

Nisso se depositava inclusive uma certa alegria, menciona tra paga melhor, com a hostilização física do endividado. - Nietzsche, que seria “tanto mais intensa, quanto mais baixa comofor na umescala antegozo social a de classe condição do credor, superior. quanto8” Esse mais “direito humil dedos a amos”sua condição: concede ser-lhe-á ao credor saborosa o gozo decomo maltratar uma iguaria seus inou- feriores, desprezá-los, num direito conferido de ser cruel9, de martirizar e fazer sofrer, de provocar constrangimento, a sensação de estar em falta.

- ta’, ‘consciência’,No aforismo ‘dever’, seguinte, ‘santidade o VI, do Nietzsche dever’. Estas afirma ideias, que comoé nesse tudo âmbito o que que é grande se originam sobre a “os terra, conceitos foram regadas morais com‘fal sangue”10. Ou seja, conceitos que o judaico-cristianismo tem em alta conta, formadores das suas pilastras morais e origem ignominiosa. O próprio imperativo categórico de Kant,de seu aríete edifício elegante religioso, contra possuem, o agir interessadosegundo Nietzsche, em retornos uma pois rescenderia à crueldade. Um dever que exala os odo- (aquele nomeado como hipotético), é posto sob suspeita, Márcia Junges 7 Ibid., p. 34 8 Ibid., p. 34 9 Ibid. p. 34-35 10 Ibid., p. 35 361 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA res da vingança - assim a ideia máxima de Kant ressoava a

- Nietzsche.ra festa”11, e isso compensaria a dor causada pelas dívidas. O contrasteFazer social sofrer, entre adverte credor Nietzsche, e devedor, era uma quanto “verdadei maior fosse, aumentava esse sentimento de gozo pelo sofrimento daquele que expiava a culpa pagando o que devia. Contudo, -

semreconhece pensar o pensador,em que o essaexame seria é aqui uma muitoprobabilidade, doloroso “por12”. O queproblema é difícil da ver vingança, claro no nesses fundo termos,destas coisas passava subterrâneas, a ser clara- mente evocado, aparecendo o quanto a “espiritualização e divinização progressiva da crueldade13” deixou suas mar- cas na composição das sociedades que se regozijavam em fazer sofrer, que celebravam o castigo pelo “poder” que

Estaríamos muito distantes disso em nossos dias, quandoseus perpetradores bancos tomam detinham. imóveis de pessoas que não conse-

eguem doentes honrar que os passam contratos a viverassumidos às custas e não de têm parentes para onde ou mesmoir, desde na adultos rua, vagando sãos, com a procura filhos ou de sem comida eles, e até abrigo? idosos E tais fatos não se dão apenas num Brasil manipulado por uma cena midiática dulcilíssima a um Judiciário coniven-

date comOrganização práticas dasdesumanas, Nações Unidas mas se - ONU.espalha inclusive nos Estados Unidos e inúmeros países europeus, sob os olhos com a crueldade não desapareceu, ele se “sutilizou”14 em formas comoNo aforismo “compaixão VII, Nietzschetrágica” ou admite “nostalgias que oda deleite cruz”. Vemos o quanto muda a caracterização do fazer sofrer en-

11 Ibid., p. 35 12 Ibid., p. 35 13 Ibid., p. 36

Schuld: dívida e culpa na Genealogia da Moral, de Nietzsche e culpa na Genealogia da Moral, Schuld: dívida 14 Ibid. p. 37 362 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS tre credor e devedor. Em nossa sociedade, expia a dívida aquele que se endivida dia após dia através de sistemas de concessão de crédito fácil e atrativo. Para participar do grande edifício sacrificial de bens a serem adquiridos e ostentados numa sociedade ocupada pelo horizonte de (metáforagrandes lojas para de a retiradadepartamentos de pessoas e projetos indesejáveis de shopping que vi- vemcenters ou frequentam para gentrificar determinados as cidades, locais, “revitalizando-as” como ocorreu no caso das Olimpíadas 2016 e os moradores em situação de rua no entorno das arenas, no Rio de Janeiro), o su- jeito moderno é capturado por dispositivos que o man- tém refém de um sistema que opera de modo globalizado,

Porém, o mais impressionante é que, mais do que nun- ca,oferecendo nos colocamos garantias voluntariamente e dinheiro sob sob a formao cabresto de crédito. de um mercado que nos convence de adquirir bens “imprescin- anos, uma vida inteira, abrindo mão de vivências autênti- casdíveis”, e intransferíveis. pelos quais trabalhamos dias, semanas, meses, Enquanto isso, os grandes substitutos do templo, os bancos, se regozijam em seus lucros inacreditáveis, ao passo que seus credores não cessam de imolarem-se em novos empréstimos para poderem pagar suas dívidas. Fazer sofrer, portanto, nunca foi tão atual. Expiar uma cul- pa ininterrupta por um consumo ditado pelas necessida-

des impostas peloTudo mercado tem seu é preço, a tônica tudo de pode nosso ser pago.tempo. Este foi

ingênuo, o começo de toda a “vontade”, de toda a “equidade”,o cânon moral de toda da justiça,a “boa vontade”, o mais antigode toda e a mais“ob- jetividade” sobre a Terra.15 Márcia Junges

15 Ibid., p. 39 363 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA A marca judaico-cristã da culpa

Culpa, Hubert

No Léxico Nietzsche, no verbete Thüring observa [...]que a transição do conceito material de culpa para o sentimento de uma culpa moral irreparável, presente na cultura judaico-cristã é analisada por - ção jurídico-privada do devedor com seu credor’ foiNietzsche ‘interpretada’ em uma dentro segunda da parterelação do daquelestexto: ‘a rela que estavam presentes com seus antepassados16.

Assim, era preciso retribuir as benesses aos ante-

o passar do tempo, essa dívida para com a progenitura foi passados através de força e sacrifícios em sua honra. Com

alertasendo quereconfigurada a e colocou Deus como o grande credor ao qual a humanidade deveria prestar contas. Nietzsche [...] consciência de ter uma dívida para com a Divindade não terminou com o estabelecimento

eda também organização a sua social. propensão Assim para como estabelecer a humanidade clas- herdou os conceitos ‘bom’ e ‘mau’ da aristocracia transmitiu a divindade dos fundadores da raça e o ses distintas, assim o mesmo caminho da herança17.

temor de os não haver honrado o bastante - - mento deSe obrigação, Deus havia de representado dever, de cumprimento o máximo dade expresum dé- são divina, por outro lado, havia criado o ápice do senti

16 Léxico de Nietzsche. Trad. André Muniz bito. Refletindo no aforismo XX de GM II é que se percebe o NIEMEYER, Christian. Org. Garcia, Ernani Chaves, Fernando Barros, Jorge Luiz Viesenteiner, 17 A genealogia da moral. São Paulo: Moraes, William Matiolli. São Paulo: Edições Loyola, 2014, p. 124 Schuld: dívida e culpa na Genealogia da Moral, de Nietzsche e culpa na Genealogia da Moral, Schuld: dívida 1985, p. 56 NIETZSCHE, Friedrich. 364 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS movimento de decadência na fé cristã, e, por conseguinte, o declínio dessa consciência devedora humana, Nietzsche comprediz respeito que “o àtriunfo sua ‘causa completo prima’. e Odefinitivo ateísmo doé uma ateísmo espécie há de segundalibertar ainocência. humanidade18” de todo o sentido de obrigação apresentada no aforismo XVI, é uma espécie de “estado A hipótese do surgimento da má consciência,- rentado à argola da sociedade e da paz”19. Acostumado a umamórbido” vida selvagem, na qual o à homem peleia e cai toda quando sorte de se intempéries, torna “acor - bres instintos20”, sendo, assim, “reduzido” tão somente à suao homem consciência. se vê obrigado “Os instintos a “renunciar sob a enorme a todos força os seus repres no- siva, ‘volvem para21 dentro’, a isto se chama ‘interiorização- do homem’; assim se desenvolve o que mais tarde se há de chamar ‘alma’. ” Os instintos voltados contra o homem in terior formam aquilo que o filósofo nomeia de “o homem adventodoente de da si consciência mesmo”. Nietzsche22. escreve que talvez nunca houvesse antes desgraça tamanha sobre a Terra quanto o Então veio ao mundo a maior e mais perigosa de

foi consequência de um divórcio violento com otodas passado as doenças, animal, o dehomem um alto“doente para de novas si mesmo”; situa- ções, para novas condições de existência, de uma declaração de guerra contra os antigos instintos que antes constituíam a sua força e o seu temível caráter23.

18 Ibid., p. 57

19 Ibid., 50 Márcia Junges 20 Ibid., p. 51 21 Ibid., p. 51 22 Ibid., p. 51 23 Ibid., p. 52 365 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA Os bancos como os novos “templos”

Esse ser amedrontado, em total antítese ao mode-

à consciência e ao cumprimento do dever e das promes- saslo guerreiro agora espiritualizadas, e livre de antes, entre incauto elas ea andarilho,de saldar suas se aferra dívi- das, sob pena de castigos inomináveis e desonra perante a

dívidacomunidade domina e seuàs instâncias agir, e ele naspresta quais contas está incessantemen envolvido, seja- tenas agora esferas não pessoal, apenas profissional aos antepassados ou espiritual. veneráveis, A moral nem da a Deus como outrora, mas sim aos bancos, os novos templos aos quais a Modernidade rende graças diariamente.

Para entendermos o que está acontecendo, é preciso tomar ao pé da letra a ideia de Walter Benjamin, segundo o qual o capitalismo é, real- mente, uma religião, e a mais feroz, implacável e irracional religião que jamais existiu, porque não

conhece nem redenção nem trégua. Ela celebra um culto ininterrupto cuja liturgia é o trabalho e funcionárioscujo objeto é eo especialistasdinheiro. Deus - assumiu não morreu, o lugar ele dase Igrejatornou e Dinheiro. dos seus O padres Banco e,– comgovernando os seus cinzentoso crédito (até mesmo o crédito dos Estados, que docilmente abdicaram de sua soberania), manipula e gere a fé

ainda traz consigo24. – a escassa, incerta confiança – que o nosso tempo O diagnóstico sombrio de Giorgio Agamben situa com clareza a violência simbólica à qual o novo crente do ad aeternum. A dívida se converte num modo de vida, numa modalidade de subje- culto ao dinheiro é submetido 24 AGAMBEN, Giorgio. Deus não morreu. Ele tornou-se Dinheiro”. Entrevista com Giorgio Agamben. Site IHU, 30-08-2012, disponível

Schuld: dívida e culpa na Genealogia da Moral, de Nietzsche e culpa na Genealogia da Moral, Schuld: dívida acesso em 10-08-16 em http://www.ihu.unisinos.br/noticias/512966-giorgio-agamben, 366 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS tivação, “associada como um instrumento ou mecanismo para o governo da subjetividade que funciona à margem 25. Como pontua do dinheiro, poder, economia e moral” Lazzarato, a dívida[...] não mas é sim apenas uma questãouma questão política econômica, de sujeição à dívida que disciplina as populações, legitimando ainda mais a austeridade e até mesmo a suspensão - - laçãoda democracia. credor-devedor Em A fábricapara mostrar do homem como endivida a dívida envolvedo, Lazzarato, um tipo seguindo especial Nietzsche,de relação examinade poder a ‘que re

implica formas específicas de produção e controle- plorada subjetividade uma compreensão – uma forma da dívida particular como de a homo base paraeconomicus, a vida social o ‘homem e fornece endividado’. uma genealogia Lazzarato da exdí- vida e do devedor antes de traçar a ascendência da dívida no neoliberalismo.26

Estar em dívida tornou-se um modo de vida em nosso tempo, conforme a genealogia traçada por Lazzarato - tos comuns que se veem instados a viver “a crédito”, quanto aosvia Nietzsche, próprios Estados, e isso se que aplica são tanto cooptados a pessoas por físicas, dívidas a impasujei- gáveis criadas no âmbito de um capitalismo globalizado e- dosde uma abutres economia na Argentina, financeirizada, o caso grego basta em lembrar 2015 e mesmode casos o recentes como a bolha financeira de 2008 nos EUA, os fun de um estado de exceção que se escamoteia por trás de jus- que ocorre no Brasil de 2016, sob a fantasmagórica figura- emtificativas um problema de “pedaladas passível fiscais”, de punição cuja prática ou mesmo era corriquei imolação Márcia Junges política.ra até governos anteriores sem que isso se configurasse

25 Economias biopolíticas da dívida. Cadernos IHU Ideias, Ano 14, nº 236, vol. 14, 2016, p. 4 26 Ibid.,PETERS, p. 7 Michael. 367 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA

as decisões políticas e, portanto, políticas públicas, porque Essa memória da dívida acompanha e acorrenta- tárias numa gestão que deseja o lucro ou, ainda, manter o tais ficam em segundo plano, uma vez que não são priori do cumprimento de parcelas que devem ser saldadas com crédito junto aos órgãos financeiros internacionais a partir

fundos abutres ou[...] mecanismos a economia da semelhantes. dívida neoliberal se baseia e atua através da produção moral dos indivíduos endividados. O neoliberalismo é o mecanismo de -

estudantescontrole mais27. eficiente que, através da dívida, cap tura a resistência por parte dos trabalhadores e - meros países inauguram modelos de governamentalidade, incluindoAssim, a criação as crises de impostos financeiras como vivenciadas forma dos sujeitos em inú- -cidadãos expiarem sua parte da culpa nesse processo cre-

diametralmenteditício. Uma dívida separados termina pelo por fatocriar de hierarquias, que um deve e expiarassim suapodemos culpa pensarao outro, na seja figura em do forma credor de e juros do devedor, sobre juros, que estão seja

como é o caso dos créditos imobiliários e universitários incentivadossobre um montante e oferecidos do qual em terá larga poucas escala. chances Inúmeras de quitar, pes- soas perdem suas moradias ou se veem endividadas após a

compromisso assumido de pagar o empréstimo contraído. Oformatura castigo não simplesmente tarda a aparecer, porque e assim não conseguem cresce exponencial honrar o- mente o número de sem-teto e o de desempregados, que - seguem emprego numa sociedade em que inclusive as re- mesmo qualificados com diploma universitário, não con

lações de trabalho foram subsumidas por um dispositivo

Schuld: dívida e culpa na Genealogia da Moral, de Nietzsche e culpa na Genealogia da Moral, Schuld: dívida 27 Ibid., p. 8 de controle que fabrica menos postos de trabalho e onera 368 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS aquele tempo de ócio que a pessoa necessita quando está fora de seu emprego.

ConformeEmbora adverte muitas Michael das novas Peters: formas de análise ten-

entender a base espiritual e ética da cultura da dam a tirar suas lições iniciais de Nietzsche para - finança no dístico dívida/culpa, alguns também- bi”,defendem que utiliza uma aanálise metáfora econômica de produção que absorva de zumbis va nalores cultura culturais, popular tais comoque distingue na chamada zumbis “teoria de zumvam- piros. Assim, por exemplo, Fred Bottling documen-

O Ataque da Dívida Zumbi), que registra o retorno deta o dívidas “Attack incobráveis of Zombie Debt” de longo (numa prazo tradução não cobra livre,- das que não são baixadas, mas retornam depois que são vendidas a preços baixos para empresas especializadas de cobrança28.

ascensãoUm do dosneoliberalismo aspectos da quefinanceirização, tem na privatização a integração e na livremundial iniciativa e a globalização seus grandes das baluartes. finanças, Dívidas é concomitante que podem à virtual, que não existe, posto que não está em lugar algum, umaser contraídas vez que se a trata qualquer de uma momento transação a partir fantasmática, de dinheiro são os aríetes dessa economia que funciona em rede e que não - tável, inacessível e incompreensível para os sujeitos. Essa cessa de criar bolhas em um sistema bancário imperscru vez, à discussão da assunção dos bancos no lugar dos tem- plos.sacralização A partir do das sistema provocações financeiro de Agamben, nos remete, não maisseria umaina- diável profanar tais instituições e delas fazer um novo uso? - Márcia Junges ceirização é tornar qualquer produto ou serviço algo a ser Tendo em conta que o grande horizonte da finan

28 Ibid., p. 10 passível de câmbio, de negociação, desde a saúde, até a 369 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA educação e a moradia, surgem iniciativas privadas de levar - viços, as pessoas passam a ter acesso a eles. Uma captura “simples”a cabo tais e âmbitosinescapável. da vida humana. Pagando por tais ser A governamentalidade exercida por tais mecanis-

percebeu ao examinar o conceito de Schuld naquele escrito mos é, assim, a expressão globalizada daquilo. A dívida que culpabiliza Nietzsche seu devedor, que deve expiar por seu não pagamento, seja devolvendoque há tantos o imóvel anos se onde mantém vive, ou atual ainda tirando novos em- préstimos para saldar o crédito educativo ou amargando

garantidos por políticas públicas bem estruturadas e prio- ritárias,em filas masà espera que sãode serviçossubstituídas de saúdepor negociações que deveriam entre ser a “iniciativa privada”. Como podemos perceber, a dívida como instru- mento de governo, como dispositivo de captura e rendição do sujeito não cessa de se atualizar em nossos dias, seja no Brasil, nos Estados Unidos ou na Europa. Em mercados que funcionam conexos através de um mecanismo neoli-

devedor em todos os outros aspectos sociais. O sujeito já beral globalizado, o devedor em um âmbito é já, e sempre,

estabelecimento,nasce endividado. seja Seu elenome privado será vasculhadoou público. até Um receber nome acreditação suficiente de que está “quite” com tal ou qual- - leira“sujo”, de fichado “caloteiro” na categoria é a atualização de devedor, daquela atendendo culpa detectada pela al cunha de mau pagador, ou, na conhecidaSchuld ocupa expressão a dupla brasi eti- mologia de culpa e dívida. por NietzscheE numa quando sociedade aponta judaico-cristã que que cedeu seus templos aos bancos em suas magistrais articulações e im- pessoalidades, expiar a culpa é fundamental, para que se - serindo enquanto cidadão através do consumo e da aqui-

Schuld: dívida e culpa na Genealogia da Moral, de Nietzsche e culpa na Genealogia da Moral, Schuld: dívida siçãopossa de manter bens. Umao rito crise fictício que de é nãoseguir é só comprando sistêmica, mase se “dein 370 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS globais interligados. Essa é uma mudança fundamental que todo sistema capitalista baseado em mercados financeiros- pria vida.29” representa a financeirização da esfera reprodutiva da pró Antonio Negri e um dos fundadores da Revista Multitudes, ponderaYann que Moulier Boutang, companheiro intelectual de

número um e a última ratio da desordem na ter- rafazer é praticar da finança exorcismo e do neoliberalismoobscurantista, é o retardar inimigos a conscientização da realidade das transformações e dos potenciais libertadores que elas contêm, e da elaboração de políticas alternativas30

- nanceirização como espécie de braço armado da transfor- mação queNão o capitalismoé à toa que estáesse buscando pensador operar compreende31. A liquida a fi-

ção e a liquidez da velha economia passam, assim, por esse- tual,processo oriundo de financeirizaçãodo crédito, é a força que temque nasorrateiramente dívida enquanto in- cluiculpa o seusujeito grande no duplo elemento papel sustentador. de cidadão Ume de dinheiro endividado. vir Além das consequências apontadas acima, o pesquisador italiano Massimo Amato, da Università Bocconi, em Milão, - - zadochama32, aespécie atenção de para algema a “despolitização para a qual esticamos da política” os quebraços re comsulta grande desse processoalegria. econômico financeirizado e globali

29 Ibid. 12 30 BOUTANG, Yann Moulier. A financeirização e as mutações do capita- lismo. Márcia Junges 31 Ibid., p. Revista 35 IHU On-Line, ed. 468, 29-06-2015, disponível em http:// bit.ly/1Jd213u, acesso em 12-08-16, p. 34 32 AMATO, Massimo. “No capitalismo as dívidas não existem para se- rem pagas, mas para serem compradas e vendidas”. Revista IHU , acesso em 12-08-16, p. 42 On-Line, ed. 468, 29-06-2015, disponível em http://bit.ly/2aR9AEK 371 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA - locar seu capital de um lado a outro do planeta a Aqualquer ‘comunidade momento, financeira é quem global’,agora decide que pode o destino des das nações. Mas o verdadeiro problema é que ela não é uma verdadeira comunidade, senão simples- mente uma comissão de credores irresponsáveis pelos efeitos das próprias decisões33.

Transformada em mercadoria, a dívida não existe para ser paga, saldada, mas antes de tudo para ser compra- - ro34. A dívida soberana, contraída por populações inteiras semda ou que vendida. elas nem Tal émesmo a lógica o quesaibam, move o oqueiram mercado ou financei o deci- dam, são o elo mais funesto da relação credor-devedor que

feito na França aponta que cada bebê nasce com uma dívi- daacompanha de 22 mil os euros, sujeitos o que do nos nascimento leva a concluir à morte. que Um o pecadoestudo original já não se dá mais pelo nascimento, mas por dívi- das que gerações antecedentes contraíram em seu nome35. As dívidas que antes eram tributárias à comunidade, aos deuses, aos antepessados, agora migraram para a entidade - cos e seus suntuosos aparatos técnicos de captura de novos clientesespectral e dode “deus”manutenção Capital, dos cuja antigos personificação através de são metas os ban que os funcionários devem cumprir sob pesadas pressões por resultados que redundam, ou não, em premiações de prê- mios salariais. Essa relação é carregada dentro de nossos bolsos,

crédito36”. Relação de poder universal, a dívida inclui tam- afirma provocativamente Lazzarato, “inscrita no cartão de 33 Ibid., p. 45 34 Ibid., p. 44 35 LAZZARATO, Maurizio. O “homem endividado” e o “deus” capital: uma dependência do nascimento à morte. Revista IHU On-Line, ed.

08-16, p. 47 468, 29-06-2015, disponível em http://bit.ly/2b3yLPe, acesso em 12- Schuld: dívida e culpa na Genealogia da Moral, de Nietzsche e culpa na Genealogia da Moral, Schuld: dívida 36 Ibid., p. 46 372 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS bém aqueles que são pobres demais para terem acesso ao crédito. Estes “devem pagar juros a credores pelo reembol- so da dívida pública; até mesmo os países pobres demais para se dotarem de um Estado de bem-estar social devem pagar suas dívidas37”. A dupla acepção da palavra alemã Schuld enquanto culpa e dívida nos constitui enquanto sujeitos governáveis, submetidos a um dispositivo que controla nossa vida em anteviu essa relação em meio ao surgimento dos castigos eseus da inscriçãomais ínfimos dolorosa e secretos da culpa aspectos. por débito, Quando as bolsas Nietzsche não operavam no frenesi capaz de derrubar governos. Naquele - - tempo,va de seu nem espaço mesmo na havia polis, umauma mídia “democracia encarregada gerencial” de es38 enfraquecidapetacularizar pelo a política dispositivo hoje já da descapitalizada matriz pastoral e àque deri a compõe, mas fortalecida enquanto gênese do núcleo pró- prio de um capitalismo exacerbado, que produz a dívida incondicionalmente. Estamos, pois, sob o domínio de uma oikonomia, de uma biopolítica da dívida, que torna a vida impagável - - e sua manutenção um eterno render graças à entidade fic tícia do dinheiro e de um mercado globalizado e financei rizado, mergulhados numa crise sistêmica que ainda não umcolapsou, evento mascentral que sobre caminha o qual para não atemos beira como do abismo prever emou nosdiferentes precaver. momentos Ou, se isso e circunstâncias,fosse possível, como mas querevelou tendem Inside a job (Trabalho interno), H. Fergunson em 2010, informações privilegiadas prote- documentário dirigido por Charles geram alguns investidores, jamais a massa devedora que Márcia Junges

37 Ibid., p. 47 38 KARMY, Rodrigo. A democracia gerencial em crise e a potência anárquica do poder destituinte. Revista IHU On-Line, ed. 468, 29-06-

2015, disponível em http://bit.ly/2aSk8Qg,373 acesso em 12-08-16, p. 66 ANAIS DO IV COLÓQUIO INTERNACIONAL IHU: POLÍTICAS PUBLICAS, FINANCEIRIZAÇÃO E CRISE SISTÊMICA -

se imola em hipotecas intermináveis e impagáveis. A cor rupção sistêmica entre os serviços financeiros nos Estados Unidos surpreendeu, e figurões como George Soros,- Barney Frank, Lee Hsien Loong, Christine Lagarde, Eliot concluísseSpitzer e Dominique que a própria Strauss-Kahn sociedade ouvidos permite no e documentá facilita que existario fizeram uma diferençacom que muitoa economista tênue entre brasileira crime Ledaorganizado Paulani e

oferta de serviçosAssim, financeiros. aquilo de que precisamos é politizar a nossa dívida e interromper o processo do capital. Politizar a nossa dívida (no sentido de “usá-la”)

controle estatal da economia, mas interromper os diversosnão significa mecanismos necessariamente envolvidos advogarna sua produção, por um restituindo, assim, a vida comum. Dessa manei- ra, politizar a nossa dívida e profanar a democra- cia são uma mesma fórmula, cuja única ênfase é traçar as condições para uma verdadeira política anticapitalista39.

Aqui notamos o nexo irrecusável entre o diagnós- - oi- kostico parade Nietzsche a polis e a compreensão agambeniana da cap tura biopolítica da vida humana e da deriva política da - samos avançar .em Porém, termos adverte de somente o filósofo pontuar chileno “o Rodrigo caráter ‘despolitizante’Karmy, para criticar da democracia o capitalismo gerencial contemporâneo, e mostrar como preci o - duzir um verdadeiro processo de politização da economia e depolítico economização foi capturado da política. pelo econômico,40” a ponto de se pro

39 Ibid., p. 71

Schuld: dívida e culpa na Genealogia da Moral, de Nietzsche e culpa na Genealogia da Moral, Schuld: dívida 40 Ibid., p. 73 374 13 E 14 DE SETEMBRO DE 2016 UNISINOS – SÃO LEOPOLDO/RS REFERÊNCIAS

AGAMBEN, Giorgio. Deus não morreu. Ele tornou-se Dinheiro”. Entrevista com Giorgio Agamben.

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acesso em 12-08-16 29-06-2015, disponível em http://bit.ly/1Jd213u, LAZZARATO, Maurizio. La fabrique de l’homme endetté. Essai sur la condition néolibérale. Paris: Editions Amsterdam, 2011. O “homem endividado” e o “deus” capital: uma dependência do nascimento à mor- ______,te. Revista Maurizio. IHU On-Line, ed. 468, 29-06-2015, dispo-

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Trad. http://bit.ly/2aSk8Qg,Léxico acesso emde 12-08-16Nietzsche.

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On-Line, ed. 454, 15-09-2014,A economia disponível e suas técnicas em http:// de governobit.ly/L2PyO1, biopolítico acesso. Revistaem 05-07-16 IHU On-Line, ed. 390, ____, Castor Bartolomé. acesso em 05-07-16 30-04-2012, disponível em http://bit.ly/L2PyO1, Schuld: dívida e culpa na Genealogia da Moral, de Nietzsche e culpa na Genealogia da Moral, Schuld: dívida 376

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