Revista Brasileira de Ensino de F´ısica, v. 37, n. 2, 2303 (2015) www.sbfisica.org.br DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1806-11173721688

Sinos: F´ısicae m´usicafundidas em bronze (: physics and music cast in bronze)

Thiago Corrˆeade Freitas1, Ana Lucia Ferreira2, Thales Gon¸calves Barros1

1Curso Superior de Tecnologia em Luteria, Universidade Federal do Paran´a,Curitiba, PR, Brasil 2Curso de Engenharia Mecˆanica, Universidade Tecnol´ogica Federal do Paran´a,Campus Guarapuava, Guarapuava, PR, Brasil Recebido em 29/9/2014; Aceito em 28/2/2015; Publicado em 30/6/2015

Os sinos s˜aoinstrumentos de percuss˜ao,da fam´ıliados idi´ofonos.S˜aodispositivos de produ¸c˜aode som apenas aparentemente simples. O seu corpo ´econstitu´ıdode uma liga met´alicachamada bronze, que ´euma combina¸c˜ao de cobre e estanho em propor¸c˜oesque podem sofrer ligeiras varia¸c˜oes.No interior do sino encontra-se o badalo - um pˆenduloque, quando oscila, atinge o corpo fazendo com que o sino soe. A fundi¸c˜aode um sino ´ebastante complexa e envolve um grande n´umerode procedimentos, desde a constru¸c˜aodos moldes at´ea metalurgia e afina¸c˜ao. O sino moderno sofreu apenas algumas mudan¸casna sua forma em compara¸c˜aoaos primeiros sinos fundidos do S´eculoIX. Do ponto de vista da ac´usticaexistem dificuldades para a sua modelagem, tanto devido aos m´etodos matem´aticosenvolvidos quanto `aobten¸c˜aode resultados experimentais, j´aque o tamanho exage- rado impede o seu translado para um laborat´orio. Neste artigo trataremos brevemente da origem, hist´oria,e utiliza¸c˜aodo sino, bem como dos principais processos de fundi¸c˜aoempregados na sua fabrica¸c˜aoe da descri¸c˜ao f´ısicade como o sino produz som. Palavras-chave: sino, campanologia, ac´ustica,frequˆenciasnaturais de vibra¸c˜ao,f´ısicae m´usica.

Bells are percussion instruments from the idiophones family, being devices to produce sound which are simple only in appearance. The bells bodies are made of an alloy called bronze, which is a combination of copper and tin in a variable ratio. Inside the there is the clapper, a pendulum that hits the bell from inside in order to start the sound. Bell foundry is quite complex and involves a large number of procedures which range from the construction of the molds until the metallurgy and its tuning. The modern bell suffered only minor changes in its shape when compared to the first casted bells from the 9th century. Complex mathematical methods are needed to create acoustical models for vibrating bells and, due to their exaggerated size, it is difficult to transport them to a laboratory in order to perform experimental analysis. This article presents a brief discussion on the origin, history and uses of the bell, as well as the main steps in the casting process and the physical description of the vibrating bell. Keywords: bell, , acoustics, natural frequencies of vibration, physics and music.

1. Introdu¸c˜ao soar ´eatingi-lo externamente com uma esp´eciede mar- telo acionado por um mecanismo. Como a produ¸c˜ao Os idi´ofonoss˜aodefinidos como instrumentos musicais de som no sino depende de uma batida em seu corpo, em que o pr´opriocorpo do instrumento vibra para que ele ´eum idi´ofonopercutido ou, mais simplesmente, um ocorra a produ¸c˜aode som. A vibra¸c˜aopode ser inici- instrumento de percuss˜ao. ada tanto pela percuss˜aode um elemento externo ao O uso de instrumentos musicais pelo homem, se- instrumento como por uma parte do pr´oprioinstru- gundo as atuais evidˆencias, remonta ao per´ıodo pa- mento [1, 2]. No primeiro caso tem-se como exemplo leol´ıtico m´edio. Concebe-se como primeiras mani- o xilofone, no qual uma baqueta atinge a barra de ma- festa¸c˜oesmusicais humanas as vocaliza¸c˜oes,palmas e deira e inicia a vibra¸c˜aoe a consequente produ¸c˜aode batidas de p´e,juntamente com instrumentos de per- som. Um sino representa, na maioria das vezes, um cuss˜aoconstru´ıdos a partir de recursos naturais sem exemplo do segundo caso. O badalo - pˆendulopreso no grandes altera¸c˜oes,como materiais vegetais e/ou ani- interior do sino - colide com suas paredes internas, inici- mais facilmente degrad´aveis, como caba¸cas, peles e ando assim a produ¸c˜aode som. Outra forma de fazˆe-lo troncos [3]. Apesar da pequena chance de preserva¸c˜ao 1E-mail: [email protected].

Copyright by the Sociedade Brasileira de F´ısica.Printed in Brazil. 2303-2 Freitas et al. desse material arqueol´ogico,´ecorreto afirmar que os gunda metade do S´eculoXX, assim como as facilida- instrumentos idi´ofonospercutidos est˜aoentre os mais des que estes trouxeram para a pesquisa de maneira antigos criados/utilizados pelo homem. geral, surgiram mais artigos relacionados aos sinos. Na A origem dos sinos ´e bastante antiga, provavel- Alemanha, destacam-se dois livros com cap´ıtulosque mente junto com o surgimento da metalurgia, quando abordaram o tema, tendo como autores Fehn [24], Se- peda¸cosde metal golpeados produziram sons pela pri- ewann e Terhardt [25]. Rossing editou um livro em meira vez. Os primeiros sinos foram feitos a partir l´ınguainglesa sobre o tema [26]. O design e afina¸c˜aofoi de placas met´alicasdobradas de modo a formar um abordado por Bagot [27]. Uma maior ˆenfasena an´alise tronco de cone de base retangular - forma muito si- dos modos de vibra¸c˜aoe do funcionamento f´ısico foi milar `ados sinos de animais ainda utilizados em al- dada pelo grupo de Perrin em uma longa s´eriede tra- gumas partes do mundo [4, 5]. O pr´oximopasso in- balhos [28–38]. A modelagem computacional foi inicial- ventivo na sua fabrica¸c˜aofoi constru´ı-losn˜aomais de mente proposta por Lehr e colaboradores [39–42] e foi folhas met´alicas,mas utilizando um conjunto de for- tema de interesse de McLachlan e colaboradores [43]. mas nas quais se depositaria metal fundido liquefeito. Alguns trabalhos mais recentes s˜aoos de Fletcher e co- Atrav´esdeste m´etodo, que envolve a fundi¸c˜aodo me- laboradores [44], Lavan e colaboradores [45], Ozak¸cae tal e a utiliza¸c˜aode formas, foi poss´ıvel produzir sinos G¨og¨us[46] e novamente de Rossing e Perrin [31]. Por cada vez maiores, resultando em sons cada vez mais fim, existe a recente tese de Hibbert [47], que trata da intensos. Existem alguns poucos exemplares produzi- quantifica¸c˜aodo tom de sinos de igreja e conta com dos desta maneira que remontam ao S´eculoXI e ainda ampla revis˜aodo tema, al´emdo desenvolvimento de al- encontram-se preservados [6]. O sino fabricado atrav´es guns programas de computador para an´alisedo som dos da fundi¸c˜aodo metal sofreu algumas altera¸c˜oesna sua sinos. forma desde o S´eculoXI at´eos dias atuais. No entanto, O artigo est´a organizado de forma que inicial- essas mudan¸casn˜aoalteraram o princ´ıpiode seu funci- mente trata-se da nomenclatura das partes, da forma onamento e as linhas gerais do seu formato geom´etrico. geom´etricae de como se inicia a produ¸c˜aode som. Na Al´emdo uso musical, existem alguns usos civis dos sequˆencia,´efeita uma descri¸c˜aohist´oricados usos mu- sinos, como a sinaliza¸c˜aode a¸c˜oesou aviso sobre si- sical, civil e religioso. Utiliza-se a teoria de combina¸c˜oes tua¸c˜oesde perigo como incˆendios,invas˜oese etc. Em para mostrar que, mesmo com um n´umeroreduzido de particular, o toque cont´ınuo de sino com 90 a 120 ba- sinos, ´eposs´ıvel criar m´usica. Discute-se brevemente daladas por minuto foi extremamente utilizado na Ale- o carrilh˜ao,instrumento musical que depende de si- manha e na Fran¸ca,ao ponto de existirem palavras es- nos para a produ¸c˜aode som. A fundi¸c˜aodo sino ´e pec´ıficaspara design´a-lo.Em alem˜aoesse toque chama- uma se¸c˜aocujo objetivo ´edar ao leitor as principais se St¨urmlauten [7] e em francˆes tocsin [8]. Por´em,o informa¸c˜oessobre os materiais e m´etodos que s˜aoutili- uso predominante dos sinos ´ereligioso, sendo que ins- zados no processo de cria¸c˜aode um sino. A ´ultimase¸c˜ao titui¸c˜oesreligiosas possuem, nas suas leis e normas, trata da aplica¸c˜aoda f´ısicapara entender como os sinos men¸c˜oesespec´ıficassobre a montagem e utiliza¸c˜aode produzem som. S˜aodiscutidos os principais modos de sinos [9]. Desta maneira, uma breve descri¸c˜aodo uso vibra¸c˜aodos sinos, suas frequˆenciasrelativas, linhas no- dos sinos com finalidade religiosa ´einteressante. Curi- dais e simetrias. Al´emde uma introdu¸c˜aosucinta aos osamente, dada a inventividade humana, tocar sinos j´a m´etodos utilizados em modelagem dos sinos e as no- foi considerado uma esp´eciede esporte ou atividade re- vas propostas que da´ısurgiram, conclui-se o artigo com creativa [4, 5]. O estudo da origem, fundi¸c˜aoe hist´oria uma an´aliseemp´ıricada dependˆenciada frequˆenciado dos sinos d´aorigem a um campo do conhecimento cha- modo fundamental do sino com a sua massa e o seu mado de campanologia. Campan´ologo´eo indiv´ıduo tamanho. versado em ou que se dedica `acampanologia. Embora os sinos j´atenham chegado a uma forma 2. Descrevendo os sinos funcional est´avel h´amuito tempo, existem poucos es- tudos de car´atercient´ıfico que discorrem sobre o as- A forma geom´etricade um sino n˜ao´esimples de ser sunto, especialmente sobre o seu funcionamento des- descrita matematicamente, uma vez que a espessura da crito a partir da f´ısica. A primeira abordagem deste sua parede varia significativamente com a posi¸c˜ao.Um ponto de vista foi feita por Lord Rayleigh [10] no in´ıcio tronco de cone de base circular que seja oco interna- da ´ultimad´ecadado S´eculoXIX. Na mesma d´ecada, mente ´eo objeto mais simples que lembra vagamente Simpson [11, 12] publicou dois trabalhos onde explicou um sino. Nos instrumentos primitivos, constru´ıdosa os processos, at´eent˜aoemp´ıricos,de afina¸c˜aodos sinos. partir de uma chapa met´alicacortada e soldada [4, 5], Existem apenas alguns artigos da primeira metade do a forma ´erealmente muito pr´oximaa de um tronco S´eculoXX: os de Jones [13–17], o de Mayer e Klaes [18], de cone de base retangular internamente oco. Dada a o de Tyzzer [19], os de Arts [20, 21], o de Curtiss e Gi- forma de sua constru¸c˜ao,a espessura da sua parede ´e annini [22] e outro de Stuber e Kallenbach [23]. constante. Estes s˜aoos sinos ainda hoje utilizados em Atrav´esdos desenvolvimentos tecnol´ogicosda se- animais em v´arioslugares do mundo. Uma proposta Sinos: F´ısicae m´usicafundidas em bronze 2303-3

de equa¸c˜aoque descreve o formato do perfil do sino foi um sistema f´ısicocuja dinˆamica´erelativamente com- feita por Perrin e colaboradores [34], levando a um bom plexa [48]. Com a movimenta¸c˜aodo sino, o badalo acordo com a forma de um sino convencional. E´ uma tamb´ementra em movimento e passa a atingir o ins- equa¸c˜aode um c´ırculode raio C, centrada na origem, trumento em sua parte interna, resultando na produ¸c˜ao com uma perturba¸c˜aode magnitude A e um parˆametro de som. O acionamento deste movimento pode ser ma- B, dada por nual, atrav´esde uma corda presa a uma roda que faz o sino girar, ou atrav´esde um motor el´etricoque de- 2 2 2 − 2 − 2 x + y + A(x y ) sin By C = 0, (1) sempenhe tal fun¸c˜ao[4, 6, 49]. Uma representa¸c˜aoes- onde os valores que descrevem um sino real s˜ao A = quem´aticadesta forma de acionamento ´efeita na Fig. 2 0, 943, B = 1, 510 e C2 = 0, 968 [34]. O nome sugerido e foi criada a partir da Ref. [48]. Aqui, dependendo para a curva gerada ´ecampanoide, devendo-se obser- da altura do eixo de rota¸c˜aodo sino e do badalo ser var que ela descreve apenas um sino com paredes de preso ou n˜aoquando o movimento se inicia, surgem espessura constante. v´ariossistemas diferentes, resultando em sonoridades Os sinos possuem uma nomeclatura de suas partes tamb´emdiferentes. A outra forma de acionar o sino que ´ecaracter´ıstica. Na parte superior, por onde s˜ao ´emantendo-o preso atrav´esda coroa e movimentando sustentados, fica a coroa, que em geral ´ericamente de- exclusivamente o badalo atrav´esde uma corda. Este ´e corada. Suspenso na parte interna h´ao badalo, uma conhecido como sistema russo [4] e ´emais utilizado no esp´eciede pˆenduloque bate internamente na parede do leste europeu. Em sinos acionados por um mecanismo sino para produzir som. A massa do badalo ´epropor- acoplado a um rel´ogio,que d˜aoas badaladas referentes cional `amassa do sino, sendo que para sinos de grande `asdeterminadas horas, o sino permanece fixo. Para que porte, pode chegar a cerca de 1000 kg [6]. As diferen- o som seja produzido, outra parte do mecanismo pode tes regi˜oesdo corpo de um sino s˜aodenominadas da tanto movimentar o badalo quanto acionar uma esp´ecie seguinte maneira: a parte inferior aberta ´ea boca; logo de martelo, que atinge o sino externamente. acima da boca encontra-se a borda sonante ou arco so- nante; na sequˆenciafica a cintura, parte onde se encon- tram a maioria dos ornamentos; finalmente, com uma maior inclina¸c˜ao,o ombro ´ea parte que liga a cintura e a coroa. Para maior clareza, todas as partes s˜aoindi- cadas na Fig. 1.

Figura 2 - Representa¸c˜aoesquem´aticade como o sino ´ependu- rado e pode girar em torno de um eixo que passa pr´oximo`acoroa. As duas situa¸c˜oesmostradas correspondem `aposi¸c˜oesextremas do movimento de rota¸c˜aodo sino. Quando a corda ´eacionada (situa¸c˜aoda esquerda), ocorre uma rota¸c˜aono sentido hor´ario e, na situa¸c˜aoda direita, uma rota¸c˜aono sentido anti-hor´ario. Ilustra¸c˜aocriada a partir da Ref. [48].

3. Os diversos usos dos sinos

O primeiro uso documentado de sinos em uma pe¸camu- sical ´eatribu´ıdoao compositor Georg Melchior Hoff- Figura 1 - Sino com 65 mm de diˆametroexterno na abertura, 80 mm de altura e massa de 195 g. Superior: vis˜aofrontal; Meio: mann (1679-1715). Na partitura da cantata f´unebre Vis˜aode cima para baixo; Inferior: Vis˜aode baixo para cima. A Schlage doch, gew¨unschteStunde, s˜aosolicitados dois correspondˆenciadas partes nessa figura ´e: A coroa; B ombro; C pequenos sinos. Na ´opera Camille de Nicolas-Marie cintura; D borda sonante; E boca e F badalo. Dalayrac (1753-1809) ´esolicitado o toque de sinos de H´aduas formas como um sino pode ser acionado, igreja, da mesma forma que na ´opera La R´evolutiondu independentemente de manual ou mecanicamente. Na Dix Aoˆut de Ignaz Pleyel (1757-1831). Outra ´opera, primeira, o sino ´epreso a um sistema que o permite Les Huguenotes de Giacomo Meyerbeer (1791-1864), rotacionar ao redor de um eixo ligeiramente acima da solicita um sino grande, especialmente feito para ser coroa. Esta configura¸c˜aotorna o sino, como um todo, utilizado nessa obra. Finalmente, na Abertura 1812 de 2303-4 Freitas et al.

Piotr Tchaikovsky (1840-1893), o compositor solicita na A inclus˜aode um 13o sino referente `anota d´ouma oi- partitura ‘todos os sinos de Moscou’. Esses s˜aoalguns tava acima da nota do sino mais grave permite agora exemplos de inclus˜oesde sinos em pe¸casorquestrais e 6.227.020.800 combina¸c˜oesde toques. As sequˆenciasde oper´ısticas[50]. toques para conjuntos formados por 1, 2 e 3 sinos s˜ao Conjuntos de sinos utilizados para fazer m´usicare- mostradas na Tabela 1. montam ao S´eculoX, sendo o mais comum o de oito sinos, abrangendo uma oitava diatˆonica (correspon- Tabela 1 - Combina¸c˜oesposs´ıveis de n sinos tocados um ap´os dendo, por exemplo, `asnotas: d´o,r´e,mi, f´a,sol, l´a, o outro em sequˆenciasde n sinos. Com apenas um sino, s´oh´a s´ıe d´o)[4, 49]. Para que sejam tocados, os sinos s˜ao uma permuta¸c˜aoposs´ıvel, enquanto com dois sinos existem duas permuta¸c˜oesposs´ıveis. Para um conjunto de trˆessinos, o n´umero acionados por uma corda, que os faz girar ao redor de de permuta¸c˜oessobe para seis e, se tent´assemosescrever aqui as um eixo ligeiramente acima da sua coroa. Com o giro, o permuta¸c˜oespara um conjunto de quatro sinos, nossa tabela teria badalo percute a parte interna do sino e produz o som. vinte e quatro linhas. E´ poss´ıvel controlar a rota¸c˜aodo sino para que este soe 1 1 2 1 2 3 apenas quando se queira. Quando se deseja que o sino 2 1 1 3 2 pare de badalar, ele ´emantido em repouso com a boca 2 1 3 voltada para cima, de forma a manter o badalo tamb´em 2 3 1 em repouso, como mostrado na Fig. 2. Nesse sistema, 3 1 2 3 2 1 se faz necess´ariauma pessoa para o acionamento de cada sino atrav´esde sua respectiva corda. Essa forma de fazer m´usica com sinos levou `a A maneira mais simples de se tocar um conjunto de cria¸c˜aode uma nota¸c˜aomusical particular, baseada nos sinos de, por exemplo, trˆessinos, consiste em toc´a-los n´umerosatribu´ıdosaos sinos. A nota¸c˜aoconsiste em em uma sequˆencia,um ap´oso outro. Convencionou-se uma sequˆenciade linhas com o n´umerodos sinos na denotar esta sequˆenciapor 3 2 1, onde o maior n´umero sequˆenciaem que devem ser tocados. A leitura ´efeita corresponde ao sino de som mais agudo e o menor da esquerda para a direita e de cima para baixo, como n´umeroao de som mais grave. Por´em,essa forma de na escrita ocidental. Essa escrita musical ´esimilar `as toc´a-losn˜aopermite explorar toda a m´usicaque pode combina¸c˜oesmostradas na Tabela 1. Nas composi¸c˜oes, ser extra´ıdade um conjunto de sinos. Isso levou as pes- adota-se uma regra para facilitar a execu¸c˜aomusical, a soas a toc´a-losem sequˆenciasdiferentes da que vai do qual consiste em fazer com que o sino 1 mude apenas sino mais agudo para o mais grave. Esse fato fez com para posi¸c˜oesadjacentes entre uma sequˆenciae outra, que o n´umeroposs´ıvel de sequˆenciasnas quais os sinos ou ainda permane¸cana mesma posi¸c˜ao. Isto permite poderiam ser tocados crescesse de maneira assustadora, acompanhar facilmente o sino mais agudo, o qual tem mesmo para conjuntos com alguns poucos sinos. papel de l´ıderdo grupo [5]. Na forma tradicional de toc´a-losem um conjunto, A ideia de dispor um conjunto de sinos acionados cada sino ´etocado um ap´oso outro, n˜aohavendo re- por um mecanismo em uma sequˆenciade frequˆencias, peti¸c˜aoenquanto todos os outros n˜aotenham sido to- de modo a produzir as notas de uma escala musical [51] cados. Ou seja, os sinos s˜aotocados formando per- remonta `aB´elgicado S´eculoXVII. Esta disposi¸c˜aoper- muta¸c˜oes P de n sinos agrupados tamb´emem n´umero mite a execu¸c˜aode m´usicascomo em qualquer outro de n. Sabemos que a permuta¸c˜aode n objetos combi- instrumento. Ao conjunto de sinos acionados por uma nados em r elementos ´eexpressa por esp´eciede teclado acoplado a um mecanismo d´a-seo n! nome de carrilh˜aoe o m´usicoque o toca chama-se car- P (n, r) = . (2) rilhonista. Na Fig. 3, a representa¸c˜aoesquem´aticade (n − r)! como uma tecla do carilh˜aoaciona o sino ´emostrada. Como todos os sinos s˜aotocados sempre, eles s˜aoagru- O sino permanece preso e, quando a tecla ´eacionada, o pados de forma que r = n e, a express˜aoanterior movimento ´etransmitido at´eo badalo por um sistema simplifica-se de alavancas, fazendo com que o sino soe. Cada tecla corresponde a um sino e um sistema mecˆanicoinde- P (n = r) = P (n) = n! (3) pendente dos demais. Desta maneira, s˜aonecess´arios v´ariossinos para ter notas diferentes suficientes para Para um e dois sinos existem, respectivamente, uma tocar musicas. e duas possibilidades de toque. Com trˆes sinos, o A cidade de Bruges, norte da B´elgica,possui um car- n´umerode possibilidades vai a seis e, para quatro sinos rilh˜aoconstitu´ıdopor 47 sinos, cuja massa total ´ede a vinte e quatro. Para uma oitava diatˆonicaconstitu´ıda 27.535 kg [5]. Esse carrilh˜ao,entre outros no mundo, foi por oito sinos existem 40.320 sequˆenciasposs´ıveis. Se acoplado mecanicamente ao rel´ogioda torre na qual se passamos para um conjunto de doze sinos, uma oitava encontra montado, tocando assim melodias em fun¸c˜ao crom´atica(formada, por exemplo, pelas notas d´o,d´o♯, da passagem das horas. Embora existam carrilh˜oesem r´e,r´e♯, mi, f´a,f´a♯, sol, sol♯, l´a,s´ı♭ e s´ı), existem as- todo o mundo, a maior concentra¸c˜aodeles est´aloca- sombrosas 479.001.600 sequˆenciasde toques poss´ıveis. lizada ao norte da Europa continental, principalmente Sinos: F´ısicae m´usicafundidas em bronze 2303-5

na Fran¸ca,B´elgica,Paises Baixos e Alemanha [51]. Se- res passassem a ser constru´ıdas em fun¸c˜aodos sinos gundo a Federa¸c˜aoMundial do Carrilh˜ao[52], existem que receberiam. Isso obrigou arquitetos e engenheiros apenas dois no Brasil: um com 61 sinos na Catedral a encontrarem solu¸c˜oesem termos de estrutura, forma Metropolitana (Catedral da S´e)e o outro no Santu´ario e materiais que possibilitassem a constru¸c˜aode torres Nossa Senhora do Sagrado Cora¸c˜ao,contando com 47 para suportar sinos de dezenas de toneladas a muitos sinos, ambos na cidade de S˜aoPaulo - SP. metros do ch˜ao. A coloca¸c˜aodo sino no alto da torre tamb´emacabou se tornando mais complexa [6]. O uso lit´urgicodos sinos ´ebastante extenso, sendo que algumas institui¸c˜oes religiosas, como a Igreja Cat´olica,possuem regras e normas para o seu uso [54]. Na Instru¸c˜aoda Sagrada Congrega¸c˜aodos Ritos Sobre a M´usicaSacra e a Sagrada Liturgia [9], no cap´ıtuloIII, existem 12 aspectos que devem ser observados quando do sino como elemento religioso. Em particular, a ins- tala¸c˜aodos sinos deve seguir determinados ritos, como pode ser observado na Ref. [55]. Carrilh˜oese sinos de uso lit´urgicodevem ser tidos como objetos diversos cuja utiliza¸c˜aon˜ao´eintercambi´avel, ou seja, o carilh˜aon˜ao ´epara uso religioso. O cuidado e considera¸c˜aosobre os sinos e a sua uti- liza¸c˜aos˜aoexemplos de como esse instrumento musi- cal se agregou `acultura religiosa. No caso de sinos que ser˜aoinstalados em igrejas, como os novos sinos fundidos para substituir os que estavam na Igreja de Notre Dame de Paris [55] em Paris, Fran¸ca,´ecomum que o processo de fundi¸c˜aoseja acompanhado por um religioso, que procede com um rito antes do in´ıciodo dep´ositode bronze liquefeito na forma do sino. Este procedimento ´e seguido por outro ainda mais intri- gante e que atribui, de certa forma, a caracter´ıstica de uma personalidade aos sinos: o antigo batismo de um sino, que hoje ´echamado apenas de benedi¸c˜ao. Muitos dos principais sinos de igreja possuem nomes Figura 3 - Representa¸c˜aoesquem´aticado sistema de acionamento que remetem a pessoas, ou possuem at´emesmo algum de um carrilh˜ao. O sino permanece fixo, enquanto o badalo ´e significado especial dentro da cultura na qual se en- colocado em movimento por um sistema de alavancas que s˜ao contram [4]. Os novos sinos instalados na Catedral de acionadas pela tecla do carrilh˜ao. Um sistema como esse ´ene- cess´ariopara cada sino do carrilh˜ao. Ilustra¸c˜aocriada a partir Notre Dame, por exemplo, chamam-se [56]: Marie, Ga- da Ref. [53]. briel, Anne-Genevi`eve, Denis, Marcel, Etienne,´ Benoˆıt- Tanto os carrilh˜oescomo os grandes sinos instalados Joseph, Maurice e Jean-Marie. Esses nomes remetem em catedrais adicionam uma massa consider´avel `aes- a pessoas que deram contribui¸c˜oesimportantes para a trutura onde est˜aomontados. O exemplo mais famoso cristianiza¸c˜aoda Fran¸ca. ´eo sino , com uma massa de 13.760 kg [5], ins- talado no Pal´aciode Westminster, em Londres. Por´em, 4. A fundi¸c˜aodo sino o Big Ben possui pouco mais da metade da massa dos maiores sinos da Europa: o Pummerin, instalado na Ca- Ao contr´ariodo violino, por exemplo, onde ´eposs´ıvel tedral de Santo Estev˜ao,Viena, com 20.130 kg, e o sino que apenas um construtor - o luthier - realize todo o de S˜aoPedro, na catedral de Colˆonia,com 23.500 kg processo de constru¸c˜aodo instrumento, a fundi¸c˜aode [4, 6]. Com aproximadamente 220.000 kg e sem nunca um sino envolve, necessariamente, um n´umeromaior ter soado, o sino Czar, em Moscou, ´eo maior j´afun- de pessoas. Esta necessidade surge de fatores como: a dido at´ehoje. Em 1737, houve um incˆendioenquanto magnitude da quantidade de material utilizado no sino; o sino ainda se encontrava no seu po¸code fundi¸c˜aoe, a parte art´ısticaenvolvida na produ¸c˜aodos moldes; a devido ao calor das chamas, seu corpo sofreu aqueci- afina¸c˜aodo sino e a sua instala¸c˜ao[6]. Ou seja, den- mento. Inadvertidamente, ´aguafria foi jogada sobre tro da fundi¸c˜aode sinos existem profissionais que s˜ao o mesmo, fazendo com que ele trincasse [4]. Se inici- especialistas em determinados procedimentos, de ma- almente sinos eram colocados nas torres para que pu- neira similar `aind´ustriado piano, onde existem profis- dessem ser ouvidos a maiores distˆancias,a fabrica¸c˜ao sionais para o trabalho com metal, outros para a monta- de exemplares cada vez maiores fez com que as tor- gem do teclado, etc. A atua¸c˜aode diversas pessoas em 2303-6 Freitas et al.

fun¸c˜oesespec´ıficasda fundi¸c˜aodo sino ´ebem ilustrada ouro ou/e prata na liga met´alica,geralmente associadas na Ref. [55]. a supersti¸c˜oesde que o brilho desses metais traria, de A prepara¸c˜aoda liga met´alicachamada de bronze alguma forma, brilho ao som do sino [4, 5,49]. ´efeita fundindo cobre e estanho na propor¸c˜aoaproxi- O primeiro passo ´edefinir qual o tamanho do sino a mada de 75% de cobre para 25% de estanho. Se o sino ser fundido, o que ir´atamb´emdeterminar a nota emi- for muito grande, procede-se com uma altera¸c˜aona liga, tida quando ele soar. Isso ´efeito atrav´esdo ac´umulo de diminuindo a quantidade de estanho, o que torna o sino conhecimento emp´ıricode mais de um milˆenio,sinteti- mecanicamente mais resistente. Existem segredos in- zado na Tabela 2. Nela, as rela¸c˜oesentre a frequˆencia dustriais com rela¸c˜ao`apropor¸c˜aoexata de cada metal da nota, o diˆametroda boca do sino e a sua massa s˜ao utilizado de forma a se obter um am´algamade alta qua- apresentadas. Estes dados devem ser entendidos mais lidade. A temperatura de fus˜aodo bronze depende das como aproximados do que exatos, uma vez que peque- propor¸c˜oesrelativas de cada metal mas, de forma geral, nas altera¸c˜oesno formato do sino, mantendo a mesma varia entre 1000 oC e 1200 oC[6]. Algumas lendas fa- massa e diˆametro,podem levar a resultados sonoros zem men¸c˜ao`aintrodu¸c˜aode pequenas quantidades de distintos [40]. Isso ser´adiscutido posteriormente.

Tabela 2 - Rela¸c˜aoentre as notas musicais da escala crom´aticacujas frequˆenciascorrespondem `aescala temperada, tomando a nota l´a4 com frequˆencia440 Hz. Para cada nota musical ´emostrada a massa e o respectivo diˆametronecess´ariospara que o sino emita a respectiva nota como som fundamental, o qual corresponde ao som produzido pelo segundo modo normal de vibra¸c˜ao.Os valores para a massa s˜aoaproximados, uma vez que as frequˆenciasdos modos de vibra¸c˜aodependem da forma do sino e o fato de que perde-se massa durante o processo de afina¸c˜ao.Adaptado da Ref. [6].

Nota f (Hz) m (kg) d (mm) f (Hz) m (kg) d (mm) D´o 130,8 13.000 2.808 523,2 210 702 D´o# 138,6 11.000 2.640 554,4 170 660 R´e 146,8 9.700 2.536 587,3 160 634 R´e# 155,6 8.000 2.364 622,2 125 592 Mi 164,8 6.800 2.248 659,2 105 562 F´a 174,6 5.690 2.112 698,5 88 528 F´a# 185,0 4.770 1.996 740,0 74 500 Sol 196,0 4.200 1.896 784,0 60 474 Sol# 207,6 3.320 1.764 830,6 52 441 L´a 220,0 3.000 1.696 880,0 46 423 S´ı♭ 233,1 2.380 1.584 932,3 36 396 S´ı 246,9 2.100 1.508 987,8 30 376 D´o 261,6 1.740 1.404 1046,5 26 351 D´o# 277,2 1.360 1.320 1108,7 20 330 R´e 293,7 1.240 1.260 1174,7 18 317 R´e# 311,1 1.040 1.182 1224,5 15 295 Mi 329,6 830 1.124 1318,5 13 281 F´a 349,2 710 1.056 1396,9 10 264 F´a# 370,0 610 998 1480,0 9 249 Sol 392,0 510 948 1568,0 8 237 Sol# 415,3 410 882 1661,2 6 220 L´a 440,0 370 846 1760,0 5 211 S´ı♭ 466,2 310 792 1864,6 4 198 S´ı 493,9 270 754 1975,5 3 188 ⌈

Um gabarito em madeira, correspondendo `ametade adequado da superf´ıcieda alma [6]. O gabarito, que ro- da proje¸c˜aodo formato interno do sino, ´econstru´ıdoe taciona sobre o eixo vertical, permite ao construtor dar fixado a um eixo vertical que se encontra preso a uma o formato sim´etricoexato `aalma, como mostrado na base e que permite que este gabarito preso ao eixo gire Fig. 4. de 360o. O gabarito ´econstru´ıdode forma a possuir A argamassa aqui utilizada possui em sua com- exatamente o contorno interno do sino, e ´eutilizado posi¸c˜aoargila, areia, palha e crina de cavalo. Era para construir a primeira parte do molde, chamada de comum a utiliza¸c˜aode estrume de cavalo, por´emele alma (em portuguˆes,podemos encontrar a designa¸c˜ao n˜ao´emais t˜aoutilizado por quest˜oesde higiene. Uma de macho para este molde interno). Sua primeira es- vez que a alma ´ecolocada em seu formato final, esta trutura ´econstru´ıdacom pequenos tijolos refrat´arios, pe¸cadeve ser reservada para que a argamassa seque. E´ pedras ou peda¸cosde coque. Uma vez feita a estrutura poss´ıvel expor a alma a temperaturas levemente mais com os pequenos tijolos, uma camada de argamassa ´e altas do que a temperatura ambiente para facilitar a se- colocada sobre eles de forma a permitir um acabamento cagem. A Ref. [57] possui boas ilustra¸c˜oesdo processo Sinos: F´ısicae m´usicafundidas em bronze 2303-7

de constru¸c˜aodos moldes. Agora, uma pe¸camaci¸ca ades˜aoentre ela e a superf´ıcie do falso sino. Alguns e de dimens˜oesexternas idˆenticas ao sino almejado ´e dias depois, a argamassa seca completamente e o con- constru´ıda. Utiliza-se tamb´empequenos tijolos e uma junto forma e falso sino ´edesmontado [5]. Para isso, argamassa similar `aempregada na constru¸c˜aoda alma. ´enecess´arioquebrar o falso sino, por´emsem danificar Essa pe¸ca´eo falso sino, uma vez que ´eidˆentica ao sino, a argamassa que agora cont´emo formato do sino e to- mas n˜aose trata de forma alguma de um sino [6]. No dos os ornamentos. Neste est´agioa argamassa passa a falso sino todos os ornamentos desejados j´adevem estar ser um molde, o qual ´edenominado de manto (em por- presentes. Estes consistem de inscri¸c˜oese desenhos em tuguˆes,podemos encontrar a designa¸c˜aode fˆemeapara alto relevo feitos em cera, os quais devem ser aderidos `a este molde externo) [57]. A limpeza do manto deve ser superf´ıciedo falso sino [4]. Uma vez conclu´ıdo,o falso feita para que n˜aofiquem resqu´ıciosde argamassa ou sino ser´autilizado para a confec¸c˜aodo molde externo cera, o que causaria altera¸c˜oesno formato final do sino. do sino final. Para a remo¸c˜aode eventuais restos de cera, ´ecomum utilizar um fluxo de ar quente de um soprador t´ermico. Na parte superior do manto existem canais que servir˜ao para depositar o bronze fundido em um dos passos finais da fundi¸c˜aodo sino [6]. Ap´osestes processos, tanto o molde externo do sino como o molde interno est˜aofinalizados. O pr´oximo passo consiste em montar o manto sobre a alma em uma superf´ıciehorizontal. Nesta etapa do processo de fundi¸c˜aodeve-se tomar muito cuidado para que o manto e a alma estejam com seus respectivos eixos verticais ali- nhados, de forma que os espa¸cosvazios entre essas duas partes sejam sempre iguais em uma mesma altura. Caso n˜aoseja feita uma centraliza¸c˜aoadequada, o sino ter´a diferentes espessuras a uma mesma altura, o que pode prejudic´a-lodo ponto de vista tanto estrutural quanto ac´ustico[49]. Uma vez que o alinhamento foi realizado com sucesso, o manto ´efixado `abase onde a alma foi constru´ıdapara evitar movimentos que possam desali- nhar a estrutura do conjunto, conforme mostrado na Fig. 5. Figura 4 - Representa¸c˜aoesquem´aticade como ´econstru´ıdaa alma, molde da parte interna do sino. Um molde em madeira ´ecolocado ao eixo central do sino. O molde pode girar, permi- tindo ao art´ıficea constru¸c˜aoda alma de maneira sim´etricaem rela¸c˜aoa este eixo vertical. E´ importante garantir essa sime- tria para que a parte interna do sino n˜aoprovoque problemas de n˜aoalinhamento do sino depois de fundido, podendo levar a uma distribui¸c˜aon˜aohomogˆeneada espessura a uma mesma altura. Ilustra¸c˜aocriada a partir da Ref. [6]. Para a confec¸c˜aodo molde externo do sino, pode-se utilizar tanto uma forma met´alicaquanto uma cons- tru´ıdade argamassa, desde que suas dimens˜oessejam maiores do que as do sino a ser constru´ıdo.O falso sino tem a sua superf´ıciepulverizada com grafite em p´o,vi- sando minimizar a aderˆenciada argamassa que entrar´a em contato com ele [55]. O falso sino ´eent˜aocolocado sobre uma superf´ıciehorizontal plana e nivelada. Sobre ele ´ecolocada a forma previamente constru´ıda,sendo que as duas partes devem estar devidamente alinhadas em rela¸c˜aoao eixo horizontal que passa pelo centro de ambas. Ap´oso correto alinhamento, o conjunto ´epreso Figura 5 - Croquis da estrutura montada antes do in´ıcio da fundi¸c˜aodo sino. A alma ´edenotada por A, o manto por M para evitar movimentos que possam causar algum de- e * indica o canal por onde o bronze liquefeito ´edepositado. Ao salinhamento [6]. lado de * existem dois canais para a sa´ıdade ar. O espa¸cova- Uma argamassa pouco viscosa ´einjetada atrav´esde zio entre a alma e o manto, que possui o formato do sino a ser aberturas na parte superior da forma. Esta argamassa fundido e ser´apreenchido por bronze liquefeito, est´aindicado em preto. No caso de sinos muito grandes (com massa da ordem passa a preencher o espa¸coexistente entre a forma e o de toneladas), essa estrutura costuma ser enterrada. Isso ´efeito falso sino e o grafite em p´oevita que ocorra uma forte tanto por raz˜oesde seguran¸caquanto de estabilidade mecˆanica 2303-8 Freitas et al.

da estrutura, e ainda para que o resfriamento ocorra de maneira das frequˆenciasharmˆonicaspara um determinado som lenta. Ilustra¸c˜aocriada a partir da Ref. [6]. fundamental [60]. Isso, por´em,n˜aoimpediu os constru- No caso de sinos de dimens˜oespequena e m´edia,o tores desses instrumentos de encontrarem maneiras de conjunto manto-alma fica no ch˜aoe o bronze fundido e alter´a-los,de forma a modificar o som e obter sons mais liquefeito ´edepositado com um cadinho no espa¸cova- pr´oximosde harmˆonicos. zio entre a alma e o manto atrav´esdos canais e orif´ıcios Em uma corda, existe o conceito de n´oou nodo, na parte superior do manto [57]. J´ano caso de sinos que ´eum ponto onde n˜aoexiste movimento. J´apara de dimens˜oesgrandes, da ordem de algumas toneladas, objetos com mais dimens˜oes,o conceito passa a ser o essa estrutura geralmente fica enterrada. Os canais do de linha nodal, uma linha sobre a qual n˜aoexiste mo- manto ficam no n´ıvel do ch˜aoe o bronze liquefeito sai vimento [61]. Essas linhas s˜aorespons´aveis pelos com- diretamente da fundi¸c˜aopara preencher o espa¸coentre plexos desenhos que surgem em tampos e fundos de o manto e a alma, como mostrado na Ref. [55]. Uma instrumentos musicais quando s˜aofeitas figuras de Ch- vez conclu´ıdoesse processo, ´enecess´arioaguardar que ladni [58]. O conceito de linha nodal pode ser utilizado o sino esfrie dentro do molde e o metal se solidifique, o para que se fa¸cauma representa¸c˜aopict´oricados modos que pode levar desde alguns dias para sinos pequenos de vibra¸c˜aode um objeto como o sino. at´ecerca de duas semanas para sinos cuja massa seja Nesta representa¸c˜aoas linhas nodais ser˜aodenota- da ordem de toneladas. das, bem como o modo com que elas dividem as partes Ap´oso metal ter esfriado e solidificado-se, chega vibrantes do sino, tanto de maneira longitudinal como a hora de extrair o sino de dentro do molde formado de maneira circular [39]. As linhas nodais meridionais, pelo manto e pela alma. Para a extra¸c˜ao´enecess´ario que ocorrem na vertical do sino, o dividem angular- quebrar a alma, que ficou na parte interna do sino, e mente em partes que vibram para dentro e para fora depois quebrar a argamassa que ficou entre o sino e o em antifase. A proje¸c˜aodestas linhas sobre um c´ırculo molde utilizado para a confec¸c˜aodo manto, procedi- exemplifica como as partes vibrantes do sino est˜aodi- mento tamb´emmostrado em [55]. Deve-se tomar um vididas em fun¸c˜aodo n´umerodestas linhas. J´aa linha cuidado extremo para n˜aocausar nenhum dano ao sino nodal circular, que ´eapenas uma nos principais modos quando se est´aquebrando o molde. Ap´osser retirado, de vibra¸c˜ao,divide o sino na vertical, em duas par- o sino ´elimpo, sua sonoridade ´eavaliada e, eventuais tes [26, 31]. Essa linha nodal ´eum c´ırculoao redor do ajustes na sua afina¸c˜aos˜aoexecutados. Em particular, sino e est´alocalizada a uma altura bem definida. Nos fundidores italianos, com a sua longa experiˆenciana diferentes modos normais aqui estudados, alteram-se ´area,conseguem fazer sinos que j´asaem devidamente apenas a posi¸c˜aoda linha nodal circular e o n´umerode afinados - o que ´emotivo de orgulho desta escola naci- linhas nodais meridionais. onal [6]. O ponto de maior deslocamento da posi¸c˜ao de equil´ıbriocorresponde ao ponto onde o sino ´eatingido 5. F´ısicaaplicada aos sinos pelo badalo. Existe uma regi˜aonodal na parte superior do sino, por onde ele ´ependurado [26]. Para representar Antes de descrever como o sino vibra e o processo pelo as linhas nodais circulares utiliza-se a metade do cro- qual ele ´eafinado, ´eimportante relembrar alguns con- quis do sino e a ideia de que a parede do sino possui um ceitos que ser˜aoutilizados daqui para frente. O pri- movimento parecido com o de uma barra [59]. A parte meiro ´eo conceito de harmˆonico: quando uma ´unica superior do sino, onde se encontra a coroa, equivale `a corda ´etocada em um violino, por exemplo, uma s´erie extremidade presa da barra, enquanto a extremidade de sons ´eemitida simultaneamente [58]. Ao som com a da boca do sino corresponde `aextremidade solta da menor frequˆencia,o mais grave em termos musicais, barra. A analogia para por aqui, j´aque n˜ao´eposs´ıvel ´e dado o nome de fundamental, aqui denotado por associar os modos de vibra¸c˜aoda barra com os modos f0. Os outros sons emitidos, que possuem valores da de vibra¸c˜aodo sino. frequˆenciaque s˜aom´ultiplosinteiros da frequˆenciafun- Rayleigh [10] ofereceu uma vis˜aofascinante sobre damental, s˜aodenominados de harmˆonicos,tal que o investiga¸c˜aocient´ıfica inicial das vibra¸c˜oese sons de n-´esimoharmˆonicosegue fn = nf0, com n=1, 2, 3... . sinos. Um dos principais objetos de seu trabalho foi De maneira geral, no caso dos idi´ofonos,os sons pro- apresentar os resultados de um experimento realizado duzidos juntos com o som fundamental possuem uma com v´ariossinos de igreja. Dado `asdificuldades ex- rela¸c˜aoque n˜aoobedece uma regra de m´ultiplosin- perimentais, tanto tecnol´ogicasquanto ligadas `asdi- teiros da frequˆenciafundamental. Neste caso, esses mens˜oesdos sinos, coube a Rayleigh fazer uma des- sons deixam de ser harmˆonicose passam a ser cha- cri¸c˜aoqualitativa dos modos de vibra¸c˜aodestes instru- mados de parciais, sobretons ou ainda sobretons de- mentos. Esta an´aliseapontou a existˆenciadas linhas sarmˆonicos[59]. O sino ´ejustamente um exemplo onde nodais meridionais e verificou que o contorno inicial- as frequˆenciasdos sobretons desviam significativamente mente circular do sino torna-se el´ıpticoquando ele est´a Sinos: F´ısicae m´usicafundidas em bronze 2303-9

a vibrando. Modos normais sim´etricosem torno do eixo ´e2, 0f0, correspondendo a um intervalo musical de 8 vertical foram tamb´emreportados, mas nenhuma im- justa com o som do modo fundamental. portˆanciaac´usticafoi atribu´ıda aos mesmos. Foram Os cinco modos normais anteriormente descritos s˜ao feitas algumas tentativas de identificar os modos de vi- os mais importantes na produ¸c˜aode som musical por bra¸c˜aocorrespondentes aos diferentes tons de um sino um sino e, de forma geral, s˜aoestes cinco sons que de igreja, obtendo-se apenas sucesso parcial, uma vez s˜aoharmonizados (afinados) pelos construtores de si- que somente os modos de vibra¸c˜aocorrespondente aos nos. Existem ainda trˆesmodos normais de vibra¸c˜ao cinco tons mais graves foram identificados. Nos seus bem conhecidos que sucedem os anteriores [64]. S˜ao experimentos, Rayleigh observou que o quinto tom cor- eles: sexto modo normal, com oito linhas nodais meri- responde a oitava nominal da tonalidade do sino. dionais e uma linha nodal circular. Possui frequˆencia a Os modos de vibra¸c˜aode um sino s˜aomostrados 2, 5f0 e forma um intervalo musical de 3 maior com de maneira pict´oricana Fig. 6, onde as linhas nodais o som do quinto modo. O s´etimomodo normal tem s˜aorepresentadas por linhas tracejadas. Existem linhas dez linhas nodais meridionais e uma linha nodal circu- nodais meridionais, que ocorrem na vertical e, linhas lar, com frequˆencia3, 0f0. Forma um intervalo musical nodais circulares, que formam um c´ırculohorizontal ao de 5a justa com o som do quinto modo. Finalmente, redor do sino. O n´umerode meridianos nodais ´edado o oitavo modo normal tem 12 linhas nodais meridio- por 2m, com m= 0, 1, 2, 3, ... , enquanto o n´umerode nais e uma linha nodal circular. Sua frequˆencia´ede a c´ırculosnodais ´e n, com n=0, 1, 2, 3, ... . O primeiro 4, 0f0, formando um intervalo de 8 justa com o som modo normal de vibra¸c˜aodo sino (A) ´erespons´avel do quinto modo. Uma an´alisede sinos reais feita por pela produ¸c˜aode um som semelhante a um zumbido, o Oancea et al. [65] mostra que, de forma geral, os sinos que lhe confere o nome, em inglˆes,de hum tone [47,62], podem ser harmonizados de forma que as rela¸c˜oesen- aqui chamado de som de hum. Nesse modo existem tre as frequˆenciasdos diversos modos com o modo fun- quatro linhas nodais meridionais, de forma que o sino damental sejam muito pr´oximasdas idealizadas para fica divido em quatro partes que se movem alternada- formarem intervalos musicais bem definidos. mente para fora e para dentro. Possui frequˆencia0, 5f0, Os modos de vibra¸c˜aode um sino podem ser ana- onde f0 , corresponde `afrequˆenciado modo fundamen- lisados a partir da teoria de grupos [29]. Para tanto, tal, B, formando com este um intervalo musical de 8a ´epreciso considerar o sino como sendo de material ho- justa [63]. mogˆeneo,algo muito pr´oximoda realidade, por´emdes- No segundo modo de vibra¸c˜ao(B) - o qual recebe considerando os ornamentos, que correspondem a ape- o nome de fundamental ou, em inglˆes, prime [64] - as nas uma pequena fra¸c˜aoda massa total do sino. Por fim quatro linhas nodais meridionais do primeiro modo se a coroa, que ´euma parte essencialmente est´atica,n˜ao mant´em. Al´emdelas, surge uma linha nodal cirular entra na an´alise. Dessa forma, o sino pode ser gerado localizada mais para a parte inferior do sino, o qual pela rota¸c˜aodo perfil no entorno de uma linha verti- fica dividido em oito partes que vibram alternadamente, cal. E´ f´acilperceber que uma rota¸c˜aode um ˆangulo deslocando-se para fora e para dentro. Esse modo de ϕ no entorno dessa linha vertical ´euma opera¸c˜aode vibra¸c˜aopossui frequˆencia f0, que ´e,de modo geral, simetria, a qual ser´adenotada por C(ϕ). No caso par- muito pr´oxima`afrequˆenciado som produzido pela pan- ticular ϕ=0, essa ´ea opera¸c˜aoidentidade E. Outra cada do badalo no sino, que recebe o nome de som da opera¸c˜aode simetria ´ea reflex˜aoespecular do sino em badalada ou strike tone, em inglˆes[47]. um plano que contenha a linha vertical. Esta reflex˜ao O terceiro modo normal (C) divide o sino em doze ´edenotada por σv, sendo que existem infinitos planos partes, sendo que passam a existir seis linhas nodais que contemplam a condi¸c˜ao.O conjunto de opera¸c˜oes meridionais e uma linha nodal circular mais ou menos de simetria formado por E, C(ϕ) e σv forma o grupo no meio do sino. A frequˆenciadeste modo corresponde pontual C∞v [66]. a a 1, 2f0, formando assim um intervalo musical de 3 O grupo C∞v possui infinitas representa¸c˜oesirre- menor com o modo fundamental [63]. dut´ıveis, tamb´emchamadas de simetrias. As` simetrias Em (D), o quarto modo normal, continuam a existir Σ+ e Σ− correspondem modos com m = 0, os quais seis linhas nodais meridionais e uma linha nodal circu- n˜aopossuem meridianos nodais e n˜aos˜aoimportantes lar, e o sino continua dividido em doze partes [64]. Este acusticamente [29]. Aos modos com m= 1, 2, 3 e 4, cor- modo difere do terceiro na posi¸c˜aoda linha nodal cir- respondem as simetrias Π, ∆, Φ, Γ, respectivamente. A cular, a qual est´alocalizada mais pr´oximada boca do correspondˆenciaun´ıvoca entre m e cada representa¸c˜ao sino. Sua frequˆencia´e1, 5f0, que, musicalmente, ´eum irredut´ıvel permite agrupar os modos de vibra¸c˜aoem intervalo de 5a justa com o modo fundamental [63]. fam´ıliascom o mesmo n´umerode meridianos nodais, J´ano quinto modo normal (E), existem oito linhas mas que possuem um n´umerovariado de c´ırculosno- nodais meridionais. A linha nodal circular est´alocali- dais. Na Tabela 3, ´efeita uma s´ıntese das informa¸c˜oes zada mais pr´oximaao ombro do sino, o qual se encon- sobre frequˆencias,nomes, linhas nodais e simetria dos tra dividido em dezesseis partes [64]. A sua frequˆencia principais modos de vibra¸c˜aorepresentados na Fig. 6. 2303-10 Freitas et al.

Tabela 3 - Modos de vibra¸c˜ao,frequˆenciasrelativas frel, nome do modo de vibra¸c˜ao,n´umerode c´ırculosnodais n, n´umerode meridianos nodais 2m e representa¸c˜aoirredut´ıvel (simetria) de cada modo. ∗Na Ref. [29] o valor ´e n = 0 por´em,verificou-se posteriormente a existˆenciade um c´ırculonodal muito pr´oximo`aboca do sino.

Modo Nome frel n 2m Simetria A Som de hum 0,5 0 4 ∆ B Fundamental 1,0 1 4 ∆ C Ter¸camenor 1,2 1 6 Φ D Quinta justa 1,5 1∗ 6 Φ E Oitava nominal 2,0 1 8 Γ

Figura 6 - Representa¸c˜aopict´oricados cinco primeiros modos de vibra¸c˜aode um sino, de A at´e E. As informa¸c˜oessobre cada modo de vibra¸c˜aoest˜aoem colunas, sendo que a primeira linha da figura corresponde `arepresenta¸c˜aodo modo de vibra¸c˜aoe as linhas tracejadas representam as linhas nodais meridionais e circulares. A segunda linha da figura ´euma proje¸c˜aoda metade do perfil do sino, com o qual se faz a analogia parcial entre os modos de vibra¸c˜aodo sino e uma barra presa em uma extremidade. Na terceira linha da figura ´efeita a proje¸c˜aosobre um circulo das linhas nodais meridionais. A nomeclatura dos modos ´e: A som de hum; B fundamental; C ter¸ca(menor); D quinta (justa); E oitava (justa). As frequˆenciasrelativas s˜ao,respectivamente, 0,5 f0, 1,0 f0, 1,2 f0, 1,5 f0 e 2,0 f0. Detalhes de cada modo normal de vibra¸c˜aos˜aodiscutidos no texto. Ilustra¸c˜aocriada a partir da Ref. [62].

O conhecimento das frequˆenciasnaturais de um sis- tema vibrante ´ede suma importˆanciapara a sua uti- pn fm,n = Cn(m + bn) . (4) liza¸c˜ao. No caso dos sinos, elas est˜aoassociadas dire- tamente `asnotas musicais produzidas. Dispor de uma Na d´ecadade 1890, Canon A.B. Simpson [11, 12] rela¸c˜aoque permita obter as frequˆenciasdos modos de conseguiu mostrar que os processos de afina¸c˜aoutiliza- vibra¸c˜aoa partir dos n´umeros m e n foi o objeto dos dos pelos fundidores de sinos por s´eculosestavam am- trabalhos do grupo de Perrin [38]. A proposta consiste parados cientificamente [59]. Ele mostrou que os cinco em modificar a lei de Chladni, inicialmente formulada principais sons podem ser afinados separadamente uns para placas planas e n˜aoplanas, de forma a torn´a-la dos outros, atrav´esde varia¸c˜oesna espessura da parede aplic´avel aos sinos. A forma original da lei ´edada do sino nos pontos que correspondem aos ventres des- 2 por fm,n = Cn(m + 2n) , onde fmn ´ea frequˆenciado tes modos, como mostrado na segunda linha da Fig. 6. modo associado aos ´ındices m, n e Cn ´euma constante Esse processo de afina¸c˜aorequer muito cuidado uma vez emp´ıricaque depende apenas de n. A lei de Chladni que, caso o sino seja deixado com uma espessura menor modificada para sinos ´eescrita com a inclus˜aode mais do que a desejada, torna-se imposs´ıvel recuper´a-losem dois parˆametrosemp´ıricos, b e pn, conforme a Eq. (4). que ele precise ser fundido novamente. Essa forma emp´ıricade descrever as frequˆenciasdos si- Quase cem anos depois dos trabalhos de Simpson, nos mostrou-se capaz de se adequar a dados de mais de Lehr [40] realizou um estudo te´orico,com simula¸c˜oes 60 diferentes modos de vibra¸c˜ao,a ´unicaregi˜aoque n˜ao computacionais e um pr´atico,com a constru¸c˜ao- pelos ´ebem descrita [38] por essa lei modificada ocorre para fundidores de sino - dos modelos obtidos no compu- m ≤ 2. tador. A abordagem utilizada para a modelagem dos Sinos: F´ısicae m´usicafundidas em bronze 2303-11

sinos ´ea do M´etodo dos Elementos Finitos, onde a es- fun¸c˜aodo inverso do raio, obt´em-seuma reta. Ou trutura complexa do sino ´econstitu´ıdade um n´umero seja: a rela¸c˜aofoi linearizada [68], como mostrado na finito de elementos com formas simples. Usando a Fig. 8. Pode-se ajustar uma reta f(R) = aR + b, onde teoria das interpola¸c˜oes constr´oi-se uma formula¸c˜ao R = 1/r, a = 184, 6 e b = −0, 1264, mostrando que num´erica,onde os elementos devem satisfazer algum realmente f ´einversamente proporcional a r. Proce- crit´eriode otimiza¸c˜aode forma a produzir uma solu¸c˜ao dendo da mesma forma para a rela¸c˜aoentre frequˆencia num´erica[67]. e massa, verifica-se que, quando n = 3, obt´em-sea line- O objetivo de Lehr era alterar o sino de forma que ariza¸c˜aoda rela¸c˜aode forma que f(M) = a′M+b′, onde 3 ′ ′ o modo C - que corresponde a um intervalo ter¸came- M = 1/m , a = 3010, 8√ e b = 14, 069, indicando uma nor com o som fundamental, caracterizando, na m´usica rela¸c˜aoda forma f ∝ 1/ 3 m. Essa breve an´aliseserve ocidental, um som l´ugubre- passasse a ser uma ter¸ca como indicador, para este conjunto de dados, de como maior, intervalo associado a uma sonoridade mais ale- a frequˆenciado modo fundamental do sino depende do gre [63]. Ap´osuma s´eriede estudos baseados em si- raio e da sua massa. mula¸c˜oescomputacionais, chegou-se a uma nova forma para o sino, como mostrado na Fig. 7. A frequˆencia do modo C no sino com forma alterada passa de 1, 2f0 para 1, 26f0. Posteriormente, os ‘sinos com ter¸camaior’ foram fundidos. No entanto, o estudo foi aparente- mente mais acadˆemicodo que uma proposta aceita pela ind´ustriada fundi¸c˜aode sinos.

Figura 8 - Dependˆenciada frequˆenciado modo fundamental do sino como fun¸c˜aodo inverso do raio da boca e como fun¸c˜aodo inverso da raiz c´ubicada massa. C´ırculosrepresentam valores obtidos dos dados da Tabela 2, tra¸cocont´ınuo representa a reta ajustada aos dados.

6. Conclus˜oes

Este artigo traz informa¸c˜oessobre o sino, instrumento musical classificado como idi´ofonopercutido. Primei- ramente o sino foi discutido como um objeto, como sua forma e como ele ocorre. Geralmente os sinos aparecem em torres de igreja em diversas formas, desde um sino solit´arioat´eum conjunto de alguns instrumentos. Eles Figura 7 - A` esquerda representa¸c˜aodo croquis de um sino ociden- tamb´empodem ocorrer em um conjunto de dezenas de tal tradicional e, `adireita, do sino proposto por Lehr. Ilustra¸c˜ao unidades que formam um carrilh˜ao.Foi realizada uma criada a partir das Refs. [6] e [40]. revis˜aobibliogr´aficaonde constam os principais traba- A partir dos dados da Tabela 2, pode ser realizada lhos de cunho cient´ıficosobre os sinos, assim como sobre uma an´aliseda dependˆenciada frequˆenciado modo a sua fundi¸c˜ao. Os usos musical e lit´urgicodos sinos, fundamental dos sinos tanto com o seu raio quanto bem como algumas particularidades e tradi¸c˜oesforam com sua massa. Intuitivamente, pode-se pensar que apontadas de forma sucinta. Uma descri¸c˜aode todo o quanto maior o raio, maior o caminho que a onda es- processo de constru¸c˜aode formas e da fundi¸c˜aosegue tacion´ariano sino precisa percorrer, logo, menor ser´a na sequˆencia,atentando-se para a clareza em relatar os a sua frequˆencia. Supondo que a frequˆencia´einver- principais passos e processos envolvidos. Finalmente, samente proporcional ao raio, ´eposs´ıvel propor uma uma descri¸c˜aode como o som ´eproduzido pelos sinos rela¸c˜aoentre a frequˆencia f e o raio r da forma f(r) ∝ foi apresentada atrav´esde uma an´alisedo ponto de vista 1/r. Da mesma forma, analisando os dados, pode-se da f´ısica,dando ˆenfasena descri¸c˜aodo comportamento propor uma rela¸c˜aoentre f e a massa m do sino que dos seus modos normais e como altera¸c˜oesgeom´etricas pode ser escrita da seguinte maneira f(m) ∝ 1/mn, afetam esses modos e s˜aoempregadas em ajustes na com n a ser determinado. Fazendo o gr´aficode f em sonoridade final do instrumento. 2303-12 Freitas et al.

Agradecimentos [25] M. Seewann and E. Terhardt, Messungen der wahrge- nommenen Tonh¨ohevon Glocken In: Fortschritte der Os autores agradecem ao Prof. Evaldo Ribeiro, ao Prof. Akustik (VDE-Verlag, Berlim, 1980). Jos´eRoberto do Carmo Jr., ao Fabio A.S. Rahal e `a [26] T.D. Rossing (ed.), Acoustics of Bells (Van Nostrand, Claudia L. Borio pelas sugest˜oese ideias que deram Reinhold, 1984). para este trabalho. Agradecemos tamb´em`aRaisa R. [27] H. Bagot, Acoust. Aust. 14, 35 (1986). Jakubiak pelo aux´ılio com a revis˜aotextual e `aAn- [28] R. Perrin, T. Charnley and J. de Pont, J. Sound Vib. dressa Brotto pela cuidadosa revis˜aogeral. 90, 29 (1983). [29] R. Perrin and T. Charnley, J. Sound Vib. 31, 411, Referˆencias (1973). [30] R. Perrin, J. Sound Vib. 52, 307 (1977). [1] C. Sachs e E.M. von Hornbostel, Galpin Soc. J. 14, 3 (1961). [31] T.D. Rossing and R. Perrin, App. Acoust. 20, 41 (1987). [2] A.L. Schmid, G.G.B. Romanelli, I.M. Fomin, J. Berg- mann Filho, L.H.M. Mombach, R.M. Pereira, T.C. [32] R. Perrin and T. Charnley, J. Sound Vib. 117, 411 Freitas e T. Madalozzo, Museu dos Instrumentos Mu- (1987). sicais (MIMU) (Editora UFPR, Curitiba, 2014). [33] R. Perrin and T. Charnley, J. Sound Vib. 119, 243 [3] I. Morley, The Evolutionary Origins and Archaeology of (1987). Music Tese de Doutorado, Cambridge University, 2003. [34] R. Perrin, T. Charnley, J.H. Samson and H.P.W. Got- tlieb, J. Sound Vib. 151, 163 (1991). [4] S.N. Coleman, Bells Their History, Legends, Making, and Uses (Rand McNally, Chicago, 1928). [35] T.D. Rossing, R. Perrin, H.J. Sathoff and R.W. Peter- son, J. Acoust. Soc. Am. 76, 1263 (1984). [5] S.N. Coleman, The Book of Bells (John Day, Nova Ior- que, 1938). [36] R. Perrin, T. Charnley and G.M. Swallowe, App. Acoust. 46, 83 (1995). [6] A.D. Quadri, Arte Campanaria (Arte Tipografica, N´apoles, 2010). [37] R. Perrin, G.M. Swallowe, T. Charnley and C. Marshall, J. Sound Vib. 227, 409 (1999). [7] G. Drosdowski (ed.), Duden Deutsches Univer- sal W¨orterbuch (Bibliographisches Institut & F.A. [38] R. Perrin, T. Charnley, H. Banu and T.D. Rossing J. Brockhaus AG, Mannheim, 1989). Sound Vib. 102, 11 (1985). [8] A. Rey (ed.), Le Robert Micro Dictionnaire de la langue [39] A. Lehr, J. Acoust. Soc. Am. 79, 2000 (1986). fran¸caise (Dictionnaires Le Robert, Paris, 1998). [40] A. Lehr, Music Percept. 4, 267 (1987). [9] M.J. Francisco (ed.), Documentos Sobre a M´usica [41] A. Lehr, Acustica 83, 320 (1997). Lit´urgica (Paulus, S˜aoPaulo, 2005). [42] A. Schoofs, F. Van Asperen, P. Maas and A. Lehr, Mu- [10] Lord Rayleigh, Phil. Mag. 29, 1 (1890). sic Percept. 4, 245 (1987). [11] C.A.B. Simpson, Pall Mall Mag. 7, 183 (1895). [43] N. McLachlan, B.K. Nigjeh and A. Hasell, J. Acoust. Soc. Am. 114, 505 (2003). [12] C.A.B. Simpson, Pall Mall Mag. 10, 150 (1896). [44] N.H. Fletcher, W.T. McGee and A.Z. Tarnopolsky, J. [13] A.T. Jones, Phys. Rev. 31, 1092 (1928). Acoust. Soc. Am. 111, 1437 (2002). [14] A.T. Jones, J. Acoust. Soc. Am. 1, 373 (1930). [45] D. Lavan, S. Hogg and J. Wolfe, Acoust. Aust. 31, 4 [15] A.T. Jones, J. Acoust. Soc. Am. 1, 382 (1930). (2003). [16] A.T. Jones and G.W. Alderman, J. Acoust. Soc. Am. [46] M. Ozak¸caand¨ M.T. G¨og¨us,J. New Mus. Res. 33, 61 3, 297 (1931). (2004). [17] A.T. Jones and G.W. Alderman, J. Acoust. Soc. Am. [47] W.A. Hibbert, The Quantification of Strike Pitch and 4, 331 (1933). Pitch Shifts in Church Bells Tese de Doutorado, The Open University, 2008. [18] E. Mayer and J.J. Klaes, Naturwissenschaften 39, 697 (1933). [48] J. Woodhouse, J.C. Rene, C.S Hall, L.T.W. Smith, F.H King and J.W. McClenahan, Adv. Acoust. Vib. [19] F.G. Tyzzer, J. Franklin Inst. 210, 55 (1930). 681787, 1 (2012). [20] J. Arts, J. Acoust. Soc. Am. 9, 344 (1938). [49] Still Ringing After All These Years: A Short His- [21] J. Arts, J. Acoust. Soc. Am. 10, 327 (1939). tory of Bells Dispon´ıvel em http://www.bbc.co.uk/ [22] A.N. Curtiss and G. M. Giannini, J. Acoust. Soc. Am. programmes/b018ct1c. Acesso em: 23 set. 2014. 5, 159 (1933). [50] R. Dearling (ed.), The Encyclopedia of Musical Instru- [23] C. Stuber and W. Kallenbach, Bl¨atter 5, 268 (1949). ments (Smithmark, Nova Iorque, 1996). [24] T. Fehn, Die Gliederung des Tonaufbaus in ihrer Be- [51] R. Bragard e F.J. de Hen, Musical Instruments in Art deutung f¨urdie Klangqualit¨atder Glocke In: Beitr¨age and History (Viking Press, New York, 1968). zur Glockenkunde. (Beratungsausschuß f¨urdas Deuts- [52] Federa¸c˜aoMundial do Carilh˜ao,Dispon´ıvel em http: che Glockenwesen, Heidelberg, 1970). //www..org. Acesso em: 23 set. 2014. Sinos: F´ısicae m´usicafundidas em bronze 2303-13

[53] M. Havryliv, F. Geiger, M. Gurtler, F. Naghdy and G. [60] A. Samolov, Telfor J. 2, 82 (2010). Schiemer, Springer-Verlag Lectures Notes in Computer Science 5763, 91 (2009). [61] T.C. Freitas and A. Laibida Jr., Physicæ 8, 19 (2009). [54] M.D. Herrera, Sanctus Bells (Tixlini Scriptorium, San [62] T.D. Rossing, The Science of Sound (Addison-Wesley, Luis Obispo, 2004). New York, 1990). [55] Les voix de Notre-Dame: la r´esonnance des cloches. [63] B. Med Teoria da M´usica (MusiMed, Bras´ılia,1996). Dispon´ıvel em http://www.francetvinfo.fr/feuilleton- 1-5-les-voix-de-notre-dame-la-resonnance-des- [64] N.H. Fletcher and T.D. Rossing, The Physics of Musi- cloches 283871.html. Acesso em: 23 set. 2014. cal Instruments (Springer, New York, 1990). [56] Des nouvelles cloches pour Notre-Dame de Paris. Dis- pon´ıvel em http://www.notredamedeparis2013.com/ [65] C. Oancea, C. Gheorghies and S. Condurache-Bota, projets/nouvelle-sonnerie-de-cloches/. Acesso Eur. J. Sci. Theol. 7, 103 (2011). em: 23 set. 2014. [66] A. Fazzio e K. Watari, Introdu¸c˜ao`aTeoria de Grupos [57] L. Sebastian, In: Trajectos na Hist´oria (Museu Muni- (Editora UFSM, Santa Maria, 1998). cipal de Coruche, Coruche, 2008), v. 3. [67] A.F.L. Nogueira, Revista Brasileira de Ensino de F´ısica [58] J.P. Donoso, A. Tann´us,F. Guimar˜aese T.C. Freitas, 29, 565 (2007). Revista Brasileira de Ensino de F´ısica 30, 2305 (2008). [59] I. Johnston, Measured Tones: The Interplay of Physics [68] R. Custodio, J.C. Andrade e F. Augusto, Qu´ım.Nova and Music (IOP, Londres, 1989). 20, 219 (1997).