| XIII - SHCU | Tempos e Escalas da Cidade e do Urbanismo | paranoá 13

PATRIMÔNIO E IDENTIDADE LOCAL

Inventário do patrimônio arquitetônico e histórico em Santa Isabel do Sul – Arroio Grande-RS: o caso das edificações institucionais e de socialização

SALABERRY, Jeferson Dutra

Resumo Abstract: O presente artigo é resultado do trabalho deno- This paper stems from the research entitled minado Inventário do Patrimônio Arquitetônico de Inventory of Architectural Heritage of Santa Isabel Santa Isabel do Sul – Arroio Grande-RS, e trata do Sul – Arroio Grande-RS. It presents the listing do arrolamento e registro das estruturas arquite- and records of local surviving architectural and tônicas e urbanas remanescentes e portadoras urban structures that bear the cultural values of de valores culturais da referida localidade. Os the region. The main goals of this work involve objetivos centrais do trabalho foram o resgate e recovering and learning about the local architec- o conhecimento/reconhecimento da arquitetura ture, as regards both its aesthetical and historical da localidade, tanto em relação aos seus valores values. This work’s specific goal, in turn, involves estéticos como aos históricos. Como objetivos presenting a historical description of the loca- específicos, procedeu-se a uma descrição históri- tion, as well as records and documentation of ca da localidade e a um registro e documentação surviving old buildings. The methodology applied dos antigos prédios remanescentes. A metodolo- is historically-oriented and the inventory as a re- gia utilizada é histórica e de inventário, trabalho search tool requires the use of several techniques de pesquisa que exigiu a utilização de diversas and procedures, e.g. expeditious photographic técnicas e procedimentos como: levantamento survey, metric architectural survey, and the filling fotográfico expedito, levantamento métrico arqui- in of records of architectural characterization and tetônico e preenchimento de fichas de caracteri- historical contextualization. The most relevant zação arquitetônica e contextualização histórica. results obtained were: (a) knowledge of build- Os resultados mais importantes do estudo foram: ings’ current state of decharacterization, which (a) o conhecimento do estado atual de descarac- enables comparison with previous diagnoses; (b) terização em que se encontram as edificações, knowledge of the plans of all the buildings studied, o qual permite a comparação com diagnósticos a piece of information not known prior to this re- anteriores; (b) o conhecimento da organização search. It is possible to conclude that the village of em planta de todos os imóveis estudados, in- Santa Isabel do Sul has architectural remains that formação desconhecida até a presente pesqui- are highly significant because of their historical sa. Podemos concluir que a vila de Santa Isabel value and – despite their decharacterization and do Sul apresenta remanescentes arquitetônicos state of abandonment – depiction of aesthetical muito significativos pelo seu valor histórico e por elements of the architecture that was typical of identificar edificações que, apesar das desca- ’s early urbanization period. racterizações e do abandono, são significativas, por serem portadoras dos elementos estéticos Keywords: Heritage. Preservation. Architecture. da arquitetura característica do período inicial da Santa Isabel do Sul–Arroio Grande-RS. urbanização do Rio Grande do Sul.

Palavras-chave: Patrimônio. Preservação. Arquitetura. Santa Isabel do Sul – Arroio Grande-RS.

145 Patrimônio e identidade local. Paranoá, Brasília, no 13, 2014. Patrimônio e identidade local. Paranoá, Brasília, no 13, 2014.

Introdução Figura 1: Canal São Gonçalo, Sangradouro da Lagoa Mirim. Porto, sabonetes Alvat, munição, tecidos de Castilhos, Presidente do Estado, suprimiu o mu- Poucos distritos têm em sua trajetória uma em- seda e anis fomentavam a rede do comércio que nicípio isabelense, que lhe fora infi el politicamen- blemática e cativante história como Santa Isabel. subia a serra até Arroio Grande (MENDONÇA, te (MENDONÇA, 2002). Envolvida geografi camente pelos caminhos pio- 2002). neiros no sul do Brasil, estruturou-se dentro dos Novos tempos começaram. Santa Isabel voltou projetos de avanço português em direção ao As queixas contra Arroio Grande e o descaso de a ser distrito e os antigos prédios públicos fi ca- Prata, na ocupação dos campos sulinos. Assim, sua administração cresceram. Os novos sopros ram vazios. Viriam, ao mesmo tempo, a silenciosamente, o distrito foi presença signifi ca- liberais e movimentos de emancipação irreme- Revolução Federalista e os caminhos fl ancos tiva nos acontecimentos políticos e militares que diavelmente sairiam dos fuxicos interioranos aos revolucionários de Gaspar Martins e delinearam as divisas e fronteiras no sul do para converter-se na mais importante experiên- Gumercindo Saraiva. Desordem social, vânda- Brasil. cia emancipatória do extremo sul. Em 9 de maio los, oportunistas, abandono e despreparo das de 1882, com a Lei Provincial 1.368, foi criada a forças policiais e processos de migrações força- Entre 1882 e 1893, Santa Isabel se emancipou Vila de Santa Isabel. As eleições para vereado- das caracterizaram a curta resistência que Santa do município do Arroio Grande. Potencialidades res ocorreram em 1º de julho de 1882 e o Auto Isabel poderia oferecer. Restaram frágeis raízes e movimentos liberais demarcaram um rumo, de Instalação ocorreu no dia 27 de janeiro de que vêm se perdendo ao longo do tempo, além uma utopia, alicerçada em um tripé básico: prin- 1883 (MENDONÇA, 2002). do desconforto de não serem reconhecidos os cípios econômicos liberais, produção de bois Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012. herdeiros da antiga Santa Isabel. para as e o escravismo pungente A arrecadação da Vila girava em torno de impos- nas relações sociais e econômicas estabeleci- tos taxados das exportações de gado, olarias, das na região àquele tempo, no fulgor do século A metodologia utilizada é histórica e de inventá- caieiras, casas de comércio e arrematações dos As edifi cações do Distrito de Santa XIX. rio, trabalho de pesquisa que exigiu a utilização Passos dos Canudos, Maria Gomes e Orqueta. Isabel de diversas técnicas e procedimentos como: ar- Com percentuais menores, apareciam as ferra- A ocupação desse território começa com as vas- rolamento e registro das estruturas arquitetôni- rias, carpintarias e mascates. Não era tipicamen- Entre as construções remanescentes da locali- tas doações, pelo governo português, no ano de cas e urbanas com levantamento fotográfi co, te um município rico, mas as principais difi culda- dade, o grande destaque é a Capela localizada 1789, de sesmarias aos fazendeiros militares, levantamento métrico arquitetônico e preenchi- des estavam nos constantes embates com ao centro do povoado (Figura 3). Destaca-se pe- para a ocupação e proteção das fronteiras. O mento de fi chas de caracterização arquitetônica Arroio Grande, que não aceitava a perda de seu las suas qualidades morfológicas e valor artísti- local demorou a se desenvolver como núcleo e contextualização histórica (BLOCH, 2001). ex-distrito. co de sua arquitetura (tipologia, estilo), pois suas urbano, mas inevitavelmente estava situado em características expressam o “ponto alto” da ar- um ponto estratégico, à beira do canal São Com a queda do Império e a chegada da quitetura religiosa do século XIX, característico Gonçalo (Figura 1), portal de saída ou entrada da Contextualização Histórica República em 1889, novos e fortes rumores cir- dos vilarejos em seu período inicial de urbaniza- Lagoa Mirim. Somente em 1835, na Revolução Em 1865, durante a viagem a Jaguarão, D. Pedro culavam e atormentavam a Junta Municipal. ção na fronteira sul do Rio Grande do Sul. , foi que se percebeu um contingente II foi visitar a nascente Vila de Santa Isabel, epi- Depois das rixas ao longo dos anos, agora os Atualmente a capela se encontra em razoável semiurbano, em que estavam agrupados milita- sódio a que o Conde D’Eu (1981) fez referência liberais sairiam de cena da vida política e uma estado de conservação e principalmente em res, escravos, peões de estâncias ou as conhe- em suas Memórias Militares. Naquele tempo, nova batalha se avizinhava. Arrastou-se até adequada situação de preservação das caracte- cidas tropas contrabandeadas do Uruguai. O sua Igreja já estava benta; o terreno para a cons- 1893, quando o Ato nº 11 de 16 de janeiro, com rísticas originais. porto passava a ser o contato, as idas e vindas, trução da igreja foi doado em 1859 e as obras a rubrica já preestabelecida de Julio de o comércio e as esperanças das oligarquias ru- concluídas em 1861. Movimentos no porto, pro- rais e seus projetos políticos (SALABERRY; dutos importados do Uruguai, contrabando con- MENDONÇA; LÚCIO, 2012). veniente, e nos empórios da Vila o vinho do Figura 3: Implantação da Vila de Santa Isabel do Sul. A presente pesquisa tem como tema a preserva- ção do patrimônio arquitetônico. A delimitação Figura 2: Mapa do Brasil e Rio Grande do Sul e Mapa Hidroviário físico-espacial é o distrito de Santa Isabel do Sul localizando o porto de Santa Isabel do Sul. (Figura 2), situada no município de Arroio Grande-RS. A justifi cativa do trabalho está vin- culada à emergência da preservação. O distrito de Santa Isabel encontra-se afastado das áreas de desenvolvimento econômico e social. Também é importante destacar que parte signi- fi cativa da população do local é proveniente de outros municípios, o que resulta na baixa estima desta em relação aos valores da localidade. Os objetivos centrais foram o resgate e o conheci- mento/reconhecimento da arquitetura da locali- dade, tanto em relação aos seus valores estéti- cos como aos históricos. Como objetivos específi cos, procedeu-se a uma descrição his- tórica da localidade e a um registro e levanta- mento dos antigos prédios remanescentes. Fonte: Salaberry, 2012. Fonte: Mapa elaborado pelo autor tendo como base o Google Earth.

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Introdução Figura 1: Canal São Gonçalo, Sangradouro da Lagoa Mirim. Porto, sabonetes Alvat, munição, tecidos de Castilhos, Presidente do Estado, suprimiu o mu- Poucos distritos têm em sua trajetória uma em- seda e anis fomentavam a rede do comércio que nicípio isabelense, que lhe fora infi el politicamen- blemática e cativante história como Santa Isabel. subia a serra até Arroio Grande (MENDONÇA, te (MENDONÇA, 2002). Envolvida geografi camente pelos caminhos pio- 2002). neiros no sul do Brasil, estruturou-se dentro dos Novos tempos começaram. Santa Isabel voltou projetos de avanço português em direção ao As queixas contra Arroio Grande e o descaso de a ser distrito e os antigos prédios públicos fi ca- Prata, na ocupação dos campos sulinos. Assim, sua administração cresceram. Os novos sopros ram vazios. Viriam, ao mesmo tempo, a silenciosamente, o distrito foi presença signifi ca- liberais e movimentos de emancipação irreme- Revolução Federalista e os caminhos fl ancos tiva nos acontecimentos políticos e militares que diavelmente sairiam dos fuxicos interioranos aos revolucionários de Gaspar Martins e delinearam as divisas e fronteiras no sul do para converter-se na mais importante experiên- Gumercindo Saraiva. Desordem social, vânda- Brasil. cia emancipatória do extremo sul. Em 9 de maio los, oportunistas, abandono e despreparo das de 1882, com a Lei Provincial 1.368, foi criada a forças policiais e processos de migrações força- Entre 1882 e 1893, Santa Isabel se emancipou Vila de Santa Isabel. As eleições para vereado- das caracterizaram a curta resistência que Santa do município do Arroio Grande. Potencialidades res ocorreram em 1º de julho de 1882 e o Auto Isabel poderia oferecer. Restaram frágeis raízes e movimentos liberais demarcaram um rumo, de Instalação ocorreu no dia 27 de janeiro de que vêm se perdendo ao longo do tempo, além uma utopia, alicerçada em um tripé básico: prin- 1883 (MENDONÇA, 2002). do desconforto de não serem reconhecidos os cípios econômicos liberais, produção de bois Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012. herdeiros da antiga Santa Isabel. para as charqueadas e o escravismo pungente A arrecadação da Vila girava em torno de impos- nas relações sociais e econômicas estabeleci- tos taxados das exportações de gado, olarias, das na região àquele tempo, no fulgor do século A metodologia utilizada é histórica e de inventá- caieiras, casas de comércio e arrematações dos As edifi cações do Distrito de Santa XIX. rio, trabalho de pesquisa que exigiu a utilização Passos dos Canudos, Maria Gomes e Orqueta. Isabel de diversas técnicas e procedimentos como: ar- Com percentuais menores, apareciam as ferra- A ocupação desse território começa com as vas- rolamento e registro das estruturas arquitetôni- rias, carpintarias e mascates. Não era tipicamen- Entre as construções remanescentes da locali- tas doações, pelo governo português, no ano de cas e urbanas com levantamento fotográfi co, te um município rico, mas as principais difi culda- dade, o grande destaque é a Capela localizada 1789, de sesmarias aos fazendeiros militares, levantamento métrico arquitetônico e preenchi- des estavam nos constantes embates com ao centro do povoado (Figura 3). Destaca-se pe- para a ocupação e proteção das fronteiras. O mento de fi chas de caracterização arquitetônica Arroio Grande, que não aceitava a perda de seu las suas qualidades morfológicas e valor artísti- local demorou a se desenvolver como núcleo e contextualização histórica (BLOCH, 2001). ex-distrito. co de sua arquitetura (tipologia, estilo), pois suas urbano, mas inevitavelmente estava situado em características expressam o “ponto alto” da ar- um ponto estratégico, à beira do canal São Com a queda do Império e a chegada da quitetura religiosa do século XIX, característico Gonçalo (Figura 1), portal de saída ou entrada da Contextualização Histórica República em 1889, novos e fortes rumores cir- dos vilarejos em seu período inicial de urbaniza- Lagoa Mirim. Somente em 1835, na Revolução Em 1865, durante a viagem a Jaguarão, D. Pedro culavam e atormentavam a Junta Municipal. ção na fronteira sul do Rio Grande do Sul. Farroupilha, foi que se percebeu um contingente II foi visitar a nascente Vila de Santa Isabel, epi- Depois das rixas ao longo dos anos, agora os Atualmente a capela se encontra em razoável semiurbano, em que estavam agrupados milita- sódio a que o Conde D’Eu (1981) fez referência liberais sairiam de cena da vida política e uma estado de conservação e principalmente em res, escravos, peões de estâncias ou as conhe- em suas Memórias Militares. Naquele tempo, nova batalha se avizinhava. Arrastou-se até adequada situação de preservação das caracte- cidas tropas contrabandeadas do Uruguai. O sua Igreja já estava benta; o terreno para a cons- 1893, quando o Ato nº 11 de 16 de janeiro, com rísticas originais. porto passava a ser o contato, as idas e vindas, trução da igreja foi doado em 1859 e as obras a rubrica já preestabelecida de Julio de o comércio e as esperanças das oligarquias ru- concluídas em 1861. Movimentos no porto, pro- rais e seus projetos políticos (SALABERRY; dutos importados do Uruguai, contrabando con- MENDONÇA; LÚCIO, 2012). veniente, e nos empórios da Vila o vinho do Figura 3: Implantação da Vila de Santa Isabel do Sul. A presente pesquisa tem como tema a preserva- ção do patrimônio arquitetônico. A delimitação Figura 2: Mapa do Brasil e Rio Grande do Sul e Mapa Hidroviário físico-espacial é o distrito de Santa Isabel do Sul localizando o porto de Santa Isabel do Sul. (Figura 2), situada no município de Arroio Grande-RS. A justifi cativa do trabalho está vin- culada à emergência da preservação. O distrito de Santa Isabel encontra-se afastado das áreas de desenvolvimento econômico e social. Também é importante destacar que parte signi- fi cativa da população do local é proveniente de outros municípios, o que resulta na baixa estima desta em relação aos valores da localidade. Os objetivos centrais foram o resgate e o conheci- mento/reconhecimento da arquitetura da locali- dade, tanto em relação aos seus valores estéti- cos como aos históricos. Como objetivos específi cos, procedeu-se a uma descrição his- tórica da localidade e a um registro e levanta- mento dos antigos prédios remanescentes. Fonte: Salaberry, 2012. Fonte: Mapa elaborado pelo autor tendo como base o Google Earth.

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Figura 4: Capela de Santa Isabel. Figura 5: Fachada Principal da Capela de Santa Isabel, Batistério A história da capela remonta aos primeiros habi- Figura 7: Capela de Santa Isabel. e Sacristia. tantes do arraial, segundo Arlindo Rupert (1994, p. 253). O Capitão José Corrêa Mirapalheta e sua mulher, Dona Faustina Corrêa, doaram, em 2 de agosto de 1859, uma quadra de terreno com 56 braças de frente e 56 de fundo para que fosse erguida uma capela à Santa Isabel. No lu- gar denominado Canudos, acima do passo de mesmo nome, à margem do Rio São Gonçalo, onde já havia uma bonita povoação, foi lançada a pedra fundamental, no dia 1º de novembro do referido ano, pelo vigário do Rio Grande, Padre José Maria Damásio Mattos. Concluída a igreja em 1861, em 3 de maio de 1863, foi benta por D. Sebastião Dias Laranjeiras, que no dia seguinte (4 de maio) celebrou a primeira missa. No mes- Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012. Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012. mo ano (1861), o Comendador Domingos Faustino Corrêa paramentou essa grande e bela igreja. Mais tarde, por desavenças com o capi- A nave da capela é coberta com telhado capa- pilastras, frontão recortado, tudo de forma a tão Mirapalheta, retomou os ricos paramentos -canal em forma de duas águas, sendo na facha- compor harmonicamente o conjunto de três si- que doara. Pela Lei Provincial nº 586 de 7 de da principal delimitada por frontão triangular nos (Figura 6). dezembro de 1866, foi esta capela elevada à ornamentado com cornija e cimalha e a fachada Paróquia. Por Provisão do Diocesano de 16 de Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012. posterior caracterizada por empena cega. A fa- A igreja, apesar de não representar uma arquite- fevereiro de 1882, foi canonicamente instituída, chada principal é de inspiração Palladiana e, tura monumental, foi construída com os melho- sendo designado para ela o Padre Antônio apesar da pequena dimensão, lembra a impor- res materiais disponíveis na época de sua cons- Troccoli (1882–1889) (MENDONÇA, 2002). nas ruas da Vila, a alegria da emancipação tância compositiva das pilastras de San Giorgio trução, comparável às igrejas da cidade de (MENDONÇA, 2002). Maggiore, em Veneza. O conjunto de pilastras ou da capital da província. Mas o grande Atualmente o Bailão Vento Sul, hoje juntamente monumentais é o principal elemento ornamental, destaque e valor de sua arquitetura é a compo- com a associação comunitária, a escola estadu- Com relação à história da referida edifi cação de ocupando toda a superfície entre o umbral da sição dos seus espaços funcionais, dos seus al e a capela, forma o conjunto de espaços de bailes não foram encontrados dados históricos porta e o limite da fachada. Também merece elementos de composição e de arquitetura, de socialização, que além de atender às demandas específi cos. Pode ser que se trate do mesmo destaque a rosácea instalada sobre a única por- notável qualidade estética (Figuras 7 e 8). da comunidade é o ponto de referência para salão de bailes ou não. Não se identifi caram ou- ta da fachada principal (Figura 4). uma extensa área rural. tras citações nas fontes primárias, entre o perí- odo de sua construção, na segunda metade do A volumetria da igreja é constituída de mais dois Figura 6: Fachada posterior da Sacristia. No dia 8 de janeiro de 1882, nas festividades de século XIX e o início do XX. A partir da segunda volumes, sendo estes destinados ao batistério e instalação do município, animava a festa a metade do século XX efetivamente a edifi cação outro à sacristia. O batistério é um espaço com Banda Isabelense, no coreto da Praça Aliança. funcionou como espaço de lazer na região. planta quadrada de dois metros de lado, com À noite, a aristocracia rural, brancos pobres e Funcionou como cinema, de propriedade de seus limites externos chanfrados, situado na la- negros livres dividiam os espaços no “Salão de Enedino Costa, por longa data. A partir dos anos teral esquerda e recuado em relação à fachada Bailes da Vila”. Nada de classes misturadas, mas 1880 transformou-se defi nitivamente no atual principal. A cobertura deste pequeno comparti- na noite animada com lampiões a querosene, salão de bailes (Figura 9). mento é uma pequena cúpula coberta em azu- lejos portugueses (Figura 5). Figura 8: Interior da Capela de Santa Isabel. O volume designado de sacristia consiste em dois compartimentos, sendo o menor utilizado como local de guarda ou de apoio para as ativi- dades religiosas. As fachadas da sacristia se destacam dos volumes descritos anteriormente, por apresentarem características compositivas, assim como base, corpo, cimalhas, vergas, mol- duras que não se diferenciam dos elementos arquitetônicos utilizados na arquitetura das de- mais construções urbanas, exceto a parede que delimita a fachada posterior, que avança sobre o volume do telhado, vindo a formar uma “torre” sineira. Esta fachada, apesar de compreender a fachada posterior da igreja, é bastante ornamen- tada, de composição tripartida tanto no sentido vertical como horizontal; possui cornijas, Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012. Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012.

148 149 Patrimônio e identidade local. Paranoá, Brasília, no 13, 2014. Patrimônio e identidade local. Paranoá, Brasília, no 13, 2014.

Figura 4: Capela de Santa Isabel. Figura 5: Fachada Principal da Capela de Santa Isabel, Batistério A história da capela remonta aos primeiros habi- Figura 7: Capela de Santa Isabel. e Sacristia. tantes do arraial, segundo Arlindo Rupert (1994, p. 253). O Capitão José Corrêa Mirapalheta e sua mulher, Dona Faustina Corrêa, doaram, em 2 de agosto de 1859, uma quadra de terreno com 56 braças de frente e 56 de fundo para que fosse erguida uma capela à Santa Isabel. No lu- gar denominado Canudos, acima do passo de mesmo nome, à margem do Rio São Gonçalo, onde já havia uma bonita povoação, foi lançada a pedra fundamental, no dia 1º de novembro do referido ano, pelo vigário do Rio Grande, Padre José Maria Damásio Mattos. Concluída a igreja em 1861, em 3 de maio de 1863, foi benta por D. Sebastião Dias Laranjeiras, que no dia seguinte (4 de maio) celebrou a primeira missa. No mes- Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012. Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012. mo ano (1861), o Comendador Domingos Faustino Corrêa paramentou essa grande e bela igreja. Mais tarde, por desavenças com o capi- A nave da capela é coberta com telhado capa- pilastras, frontão recortado, tudo de forma a tão Mirapalheta, retomou os ricos paramentos -canal em forma de duas águas, sendo na facha- compor harmonicamente o conjunto de três si- que doara. Pela Lei Provincial nº 586 de 7 de da principal delimitada por frontão triangular nos (Figura 6). dezembro de 1866, foi esta capela elevada à ornamentado com cornija e cimalha e a fachada Paróquia. Por Provisão do Diocesano de 16 de Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012. posterior caracterizada por empena cega. A fa- A igreja, apesar de não representar uma arquite- fevereiro de 1882, foi canonicamente instituída, chada principal é de inspiração Palladiana e, tura monumental, foi construída com os melho- sendo designado para ela o Padre Antônio apesar da pequena dimensão, lembra a impor- res materiais disponíveis na época de sua cons- Troccoli (1882–1889) (MENDONÇA, 2002). nas ruas da Vila, a alegria da emancipação tância compositiva das pilastras de San Giorgio trução, comparável às igrejas da cidade de (MENDONÇA, 2002). Maggiore, em Veneza. O conjunto de pilastras Pelotas ou da capital da província. Mas o grande Atualmente o Bailão Vento Sul, hoje juntamente monumentais é o principal elemento ornamental, destaque e valor de sua arquitetura é a compo- com a associação comunitária, a escola estadu- Com relação à história da referida edifi cação de ocupando toda a superfície entre o umbral da sição dos seus espaços funcionais, dos seus al e a capela, forma o conjunto de espaços de bailes não foram encontrados dados históricos porta e o limite da fachada. Também merece elementos de composição e de arquitetura, de socialização, que além de atender às demandas específi cos. Pode ser que se trate do mesmo destaque a rosácea instalada sobre a única por- notável qualidade estética (Figuras 7 e 8). da comunidade é o ponto de referência para salão de bailes ou não. Não se identifi caram ou- ta da fachada principal (Figura 4). uma extensa área rural. tras citações nas fontes primárias, entre o perí- odo de sua construção, na segunda metade do A volumetria da igreja é constituída de mais dois Figura 6: Fachada posterior da Sacristia. No dia 8 de janeiro de 1882, nas festividades de século XIX e o início do XX. A partir da segunda volumes, sendo estes destinados ao batistério e instalação do município, animava a festa a metade do século XX efetivamente a edifi cação outro à sacristia. O batistério é um espaço com Banda Isabelense, no coreto da Praça Aliança. funcionou como espaço de lazer na região. planta quadrada de dois metros de lado, com À noite, a aristocracia rural, brancos pobres e Funcionou como cinema, de propriedade de seus limites externos chanfrados, situado na la- negros livres dividiam os espaços no “Salão de Enedino Costa, por longa data. A partir dos anos teral esquerda e recuado em relação à fachada Bailes da Vila”. Nada de classes misturadas, mas 1880 transformou-se defi nitivamente no atual principal. A cobertura deste pequeno comparti- na noite animada com lampiões a querosene, salão de bailes (Figura 9). mento é uma pequena cúpula coberta em azu- lejos portugueses (Figura 5). Figura 8: Interior da Capela de Santa Isabel. O volume designado de sacristia consiste em dois compartimentos, sendo o menor utilizado como local de guarda ou de apoio para as ativi- dades religiosas. As fachadas da sacristia se destacam dos volumes descritos anteriormente, por apresentarem características compositivas, assim como base, corpo, cimalhas, vergas, mol- duras que não se diferenciam dos elementos arquitetônicos utilizados na arquitetura das de- mais construções urbanas, exceto a parede que delimita a fachada posterior, que avança sobre o volume do telhado, vindo a formar uma “torre” sineira. Esta fachada, apesar de compreender a fachada posterior da igreja, é bastante ornamen- tada, de composição tripartida tanto no sentido vertical como horizontal; possui cornijas, Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012. Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012.

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Figura 9: Bailão Vento Sul. conjunto de várias outras residências, em quar- que um grande casarão do conjunto foi comple- Rio Grande do Sul. Apesar do conhecimento do teirão denominado “Alto do Bronze”, constituin- tamente demolido. Os demais que já se encon- valor cultural e também da proteção de um ins- do, de certa forma, a base da estrutura adminis- travam com alguma alteração. Hoje estão muito trumento de preservação, ambos não tiveram trativa e de serviços públicos do distrito, a partir modifi cados. Um deles encontra-se em situação efeito prático sobre a conservação das antigas do século XX: Subintendência, depois de ruína. edifi cações. As edifi cações centenárias são de- Subprefeitura, Posto de Controle Naval da molidas, abandonadas, subutilizadas e fi cam Marinha e Central Telefônica nos anos 1880. Na A Rua José Correa Mirapalheta, em que está si- sem manutenção. década de 1890 voltou a ser a sede da tuado o conjunto “Alto do Bronze”, já consta em Subprefeitura de Arroio Grande. documentos públicos em 1869. Antes da cons- Recentemente, a Prefeitura Municipal de Arroio trução do aterro da rodovia RS-473, eram prova- Grande passou a investir na preservação do pa- Essas edifi cações compõem o eixo histórico- velmente esta rua, a Rua Princesa Isabel ou a trimônio de Santa Isabel, através do Inventário Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012. -arquitetônico de Santa Isabel da fase interme- Rua do Imperador, onde também estava locali- do Patrimônio Arquitetônico de Santa Isabel do diária da ocupação urbana, ou seja, com facha- zada a cadeia, as principais vias da localidade. Sul – Arroio Grande-RS e também da promoção das planas, com vergas retas, elementos É por meio de uma destas três que se dava o de dois seminários de preservação, visando, as- Com relação a sua arquitetura, podemos desta- geometrizados (Figura 11), diferentes das cons- acesso para o a área rural e a cidade de Arroio sim, proporcionar o desenvolvimento econômico car a composição da fachada subdividida em: truções mais antigas das vergas em portas e Grande. e social dos moradores da localidade. base destacada do corpo, corpo com portas e janelas, com arcos plenos, com cimalhas e mol- janelas emolduradas e com verga de arco pleno duras ornamentadas. Ao realizarmos o Inventário do Patrimônio e coroamento com cimalha e beira. Atualmente O Patrimônio Arquitetônico Arquitetônico de Santa Isabel do Sul, percebe- o prédio encontra-se bastante alterado – parte Com relação à arquitetura deste conjunto, so- O patrimônio arquitetônico de Santa Isabel vem mos que essas edifi cações mostram o desenvol- da construção antiga ruiu e posteriormente foi mente pode-se identifi car que algumas das al- sendo estudado há algum tempo, como pode vimento da arquitetura no fi nal do século XIX, remodelada, tanto no seu interior como no exte- venarias são remanescentes das antigas edifi ca- ser verifi cado no “Relatório de avaliação do valor pois a antiga freguesia teve um signifi cativo de- rior. Suas fachadas posteriores e cobertura so- ções, especifi camente o lote em que funcionava histórico visando propostas de preservação da senvolvimento durante a segunda metade do freram muitas modifi cações. Apesar das mudan- a antiga subprefeitura. Nenhum elemento arqui- Vila de Santa Isabel do Sul”, elaborado no de- século XIX e arrefeceu na última década do mes- ças, este prédio de socialização da comunidade tetônico é identifi cável como autêntico. correr do ano de 1994 e coordenado pelo pro- mo século, fi cando os prédios sem maiores in- é bastante signifi cativo e com estrutura rema- fessor Rogério Gutierrez Filho, da Faculdade de tervenções modernizantes durante todo o século nescente de elevado valor arquitetônico. Ao analisar as condições de preservação, com- Arquitetura/UFPEL, que estudou ao mesmo tem- XX. parando com o inventario de 1994, verifi ca-se po questões ambientais e patrimoniais de Santa Com relação ao prédio da cadeia, não restou Isabel (GUTIERREZ FILHO, 1994). Um universo signifi cativo de edifi cações não re- nada mais do que ruínas de uma das celas da Figura 10: Ruína da antiga cadeia de Santa Isabel do Sul. sistiu ao tempo, à ação das águas das enchentes prisão. Foi inventariado, não por seu valor artís- Quase uma década depois, com autoria do en- e principalmente à ação do homem. Das poucas tico, mas pela informação histórica, assim como tão deputado Bernardo de Souza, foi aprovada edifi cações que resistiram, algumas não passam para registrar e divulgar que não apenas os pré- a Lei 11.585 de 12 de janeiro de 2001, que decla- de ruínas e não resistirão à situação de abando- dios históricos de utilização privada são demoli- rou “integrantes do Patrimônio Cultural do no em que se encontram. Contudo, as constru- dos, mas também os prédios públicos (Figura Estado conjuntos urbanos e edifi cações [...]”, ções remanescentes devem ser mais bem estu- 10). mencionando, no inciso VI do seu artigo 1º, a dadas e terem sua existência material garantida, “[...] área histórica da Vila de Santa Isabel do Sul, principalmente a signifi cativa Igreja de Santa A construção da cadeia fez-se necessária com sede do Distrito do Município de Arroio Grande Isabel. a criação da Vila, assim como a organização po- [...]”, com suas delimitações. A lei tinha por obje- licial e de juízes. Foi constatada a utilização do tivo a preservação da história e da arquitetura do Também é importante destacar o grande patri- referido prédio em 1885. O primeiro delegado foi lugar (RIO GRANDE DO SUL, 2001). mônio natural que possui a localidade. Podemos empossado no dia 1º de agosto de 1883, tenente observar em algumas fotografi as a presença de Cecílio Machado da Costa. O delegado seria de- Desde os primeiros estudos, houve o reconhe- grandes fi gueiras convivendo de forma relativa- mitido em 7 de agosto de 1885 e não teria, por cimento do valor estético, arquitetônico e histó- mente harmoniosa com as edifi cações antigas. bom tempo, autoridade policial e prédio que ser- rico do lugar. Também é importante destacar o Ambas devem ser preservadas, já que a Vila de vissem à Delegacia. Na ata 158 (cópia), de 23 de Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012. histórico das condições de abandono em que se Santa Isabel fi ca localizada dentro da área des- fevereiro de 1886, da Câmara de Vereadores da encontra o conjunto arquitetônico de Santa tinada a ser uma Reserva Ambiental (Mato Santa Isabel, no ofício do Balancete do ano de Figura 11: Conjunto Arquitetônico “Alto do Bronze”. Isabel. Segundo o relatório de 1994, a sede do Grande). 1885, nas despesas, constam luzes e melhora- distrito encontrava-se “em condições precarís- mentos da Secretaria de Polícia e Cadeia. Em 24 simas de desenvolvimento econômico, contendo Espera-se que o inventário, o registro e a divul- de maio de 1886, em ofício à Assembleia uma população de baixa renda, habitando um gação resultem na preservação ambiental, patri- Provincial, o delegado reclama da falta de auxí- espaço urbano que se encontra praticamente monial; que o conhecimento da história e o de- lio, ao que a Câmara responde dizendo do es- em ruínas” (GUTIERREZ FILHO, 1994, p. 3). senvolvimento cultural possam ser úteis para o banjamento com querosene, papel e tinta futuro, gerando desenvolvimento econômico e (MENDONÇA, 2002). qualidade de vida para a população local. Considerações Finais Com relação às construções de uso público Atualmente, podemos facilmente verifi car a pe- também pode ser destacada a antiga subprefei- quena efi cácia que teve o arrolamento do patri- tura, atual cooperativa de pescadores mônio e também da lei que declarou a vila como (COOPESI). Esta edificação faz parte de um Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012. integrante do Patrimônio Cultural do Estado do

150 151 Patrimônio e identidade local. Paranoá, Brasília, no 13, 2014. Patrimônio e identidade local. Paranoá, Brasília, no 13, 2014.

Figura 9: Bailão Vento Sul. conjunto de várias outras residências, em quar- que um grande casarão do conjunto foi comple- Rio Grande do Sul. Apesar do conhecimento do teirão denominado “Alto do Bronze”, constituin- tamente demolido. Os demais que já se encon- valor cultural e também da proteção de um ins- do, de certa forma, a base da estrutura adminis- travam com alguma alteração. Hoje estão muito trumento de preservação, ambos não tiveram trativa e de serviços públicos do distrito, a partir modifi cados. Um deles encontra-se em situação efeito prático sobre a conservação das antigas do século XX: Subintendência, depois de ruína. edifi cações. As edifi cações centenárias são de- Subprefeitura, Posto de Controle Naval da molidas, abandonadas, subutilizadas e fi cam Marinha e Central Telefônica nos anos 1880. Na A Rua José Correa Mirapalheta, em que está si- sem manutenção. década de 1890 voltou a ser a sede da tuado o conjunto “Alto do Bronze”, já consta em Subprefeitura de Arroio Grande. documentos públicos em 1869. Antes da cons- Recentemente, a Prefeitura Municipal de Arroio trução do aterro da rodovia RS-473, eram prova- Grande passou a investir na preservação do pa- Essas edifi cações compõem o eixo histórico- velmente esta rua, a Rua Princesa Isabel ou a trimônio de Santa Isabel, através do Inventário Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012. -arquitetônico de Santa Isabel da fase interme- Rua do Imperador, onde também estava locali- do Patrimônio Arquitetônico de Santa Isabel do diária da ocupação urbana, ou seja, com facha- zada a cadeia, as principais vias da localidade. Sul – Arroio Grande-RS e também da promoção das planas, com vergas retas, elementos É por meio de uma destas três que se dava o de dois seminários de preservação, visando, as- Com relação a sua arquitetura, podemos desta- geometrizados (Figura 11), diferentes das cons- acesso para o a área rural e a cidade de Arroio sim, proporcionar o desenvolvimento econômico car a composição da fachada subdividida em: truções mais antigas das vergas em portas e Grande. e social dos moradores da localidade. base destacada do corpo, corpo com portas e janelas, com arcos plenos, com cimalhas e mol- janelas emolduradas e com verga de arco pleno duras ornamentadas. Ao realizarmos o Inventário do Patrimônio e coroamento com cimalha e beira. Atualmente O Patrimônio Arquitetônico Arquitetônico de Santa Isabel do Sul, percebe- o prédio encontra-se bastante alterado – parte Com relação à arquitetura deste conjunto, so- O patrimônio arquitetônico de Santa Isabel vem mos que essas edifi cações mostram o desenvol- da construção antiga ruiu e posteriormente foi mente pode-se identifi car que algumas das al- sendo estudado há algum tempo, como pode vimento da arquitetura no fi nal do século XIX, remodelada, tanto no seu interior como no exte- venarias são remanescentes das antigas edifi ca- ser verifi cado no “Relatório de avaliação do valor pois a antiga freguesia teve um signifi cativo de- rior. Suas fachadas posteriores e cobertura so- ções, especifi camente o lote em que funcionava histórico visando propostas de preservação da senvolvimento durante a segunda metade do freram muitas modifi cações. Apesar das mudan- a antiga subprefeitura. Nenhum elemento arqui- Vila de Santa Isabel do Sul”, elaborado no de- século XIX e arrefeceu na última década do mes- ças, este prédio de socialização da comunidade tetônico é identifi cável como autêntico. correr do ano de 1994 e coordenado pelo pro- mo século, fi cando os prédios sem maiores in- é bastante signifi cativo e com estrutura rema- fessor Rogério Gutierrez Filho, da Faculdade de tervenções modernizantes durante todo o século nescente de elevado valor arquitetônico. Ao analisar as condições de preservação, com- Arquitetura/UFPEL, que estudou ao mesmo tem- XX. parando com o inventario de 1994, verifi ca-se po questões ambientais e patrimoniais de Santa Com relação ao prédio da cadeia, não restou Isabel (GUTIERREZ FILHO, 1994). Um universo signifi cativo de edifi cações não re- nada mais do que ruínas de uma das celas da Figura 10: Ruína da antiga cadeia de Santa Isabel do Sul. sistiu ao tempo, à ação das águas das enchentes prisão. Foi inventariado, não por seu valor artís- Quase uma década depois, com autoria do en- e principalmente à ação do homem. Das poucas tico, mas pela informação histórica, assim como tão deputado Bernardo de Souza, foi aprovada edifi cações que resistiram, algumas não passam para registrar e divulgar que não apenas os pré- a Lei 11.585 de 12 de janeiro de 2001, que decla- de ruínas e não resistirão à situação de abando- dios históricos de utilização privada são demoli- rou “integrantes do Patrimônio Cultural do no em que se encontram. Contudo, as constru- dos, mas também os prédios públicos (Figura Estado conjuntos urbanos e edifi cações [...]”, ções remanescentes devem ser mais bem estu- 10). mencionando, no inciso VI do seu artigo 1º, a dadas e terem sua existência material garantida, “[...] área histórica da Vila de Santa Isabel do Sul, principalmente a signifi cativa Igreja de Santa A construção da cadeia fez-se necessária com sede do Distrito do Município de Arroio Grande Isabel. a criação da Vila, assim como a organização po- [...]”, com suas delimitações. A lei tinha por obje- licial e de juízes. Foi constatada a utilização do tivo a preservação da história e da arquitetura do Também é importante destacar o grande patri- referido prédio em 1885. O primeiro delegado foi lugar (RIO GRANDE DO SUL, 2001). mônio natural que possui a localidade. Podemos empossado no dia 1º de agosto de 1883, tenente observar em algumas fotografi as a presença de Cecílio Machado da Costa. O delegado seria de- Desde os primeiros estudos, houve o reconhe- grandes fi gueiras convivendo de forma relativa- mitido em 7 de agosto de 1885 e não teria, por cimento do valor estético, arquitetônico e histó- mente harmoniosa com as edifi cações antigas. bom tempo, autoridade policial e prédio que ser- rico do lugar. Também é importante destacar o Ambas devem ser preservadas, já que a Vila de vissem à Delegacia. Na ata 158 (cópia), de 23 de Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012. histórico das condições de abandono em que se Santa Isabel fi ca localizada dentro da área des- fevereiro de 1886, da Câmara de Vereadores da encontra o conjunto arquitetônico de Santa tinada a ser uma Reserva Ambiental (Mato Santa Isabel, no ofício do Balancete do ano de Figura 11: Conjunto Arquitetônico “Alto do Bronze”. Isabel. Segundo o relatório de 1994, a sede do Grande). 1885, nas despesas, constam luzes e melhora- distrito encontrava-se “em condições precarís- mentos da Secretaria de Polícia e Cadeia. Em 24 simas de desenvolvimento econômico, contendo Espera-se que o inventário, o registro e a divul- de maio de 1886, em ofício à Assembleia uma população de baixa renda, habitando um gação resultem na preservação ambiental, patri- Provincial, o delegado reclama da falta de auxí- espaço urbano que se encontra praticamente monial; que o conhecimento da história e o de- lio, ao que a Câmara responde dizendo do es- em ruínas” (GUTIERREZ FILHO, 1994, p. 3). senvolvimento cultural possam ser úteis para o banjamento com querosene, papel e tinta futuro, gerando desenvolvimento econômico e (MENDONÇA, 2002). qualidade de vida para a população local. Considerações Finais Com relação às construções de uso público Atualmente, podemos facilmente verifi car a pe- também pode ser destacada a antiga subprefei- quena efi cácia que teve o arrolamento do patri- tura, atual cooperativa de pescadores mônio e também da lei que declarou a vila como (COOPESI). Esta edificação faz parte de um Fonte: Salaberry; Mendonça; Lúcio, 2012. integrante do Patrimônio Cultural do Estado do

150 151 Patrimônio e identidade local. Paranoá, Brasília, no 13, 2014. | XIII - SHCU | Tempos e Escalas da Cidade e do Urbanismo | paranoá 13

Referências BLOCH, M. Apologia da história ou o ofício do historiador. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

D’EU, L. F. M. F. G. D’O., Conde. Viagem militar sobre os autores ao Rio Grande do Sul. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia, 1981.

GUTIERREZ FILHO, R. et al. Relatório de avalia- ção do valor histórico visando propostas de preservação da Vila de Santa Isabel do Sul. Pelotas: FAURB-UFPEL, 1994. (Relatório de Alana Figueirêdo Pontes Pesquisa). Graduanda de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Ceará(UFC). Bolsista PIBIC anos 2013/2014 da UFC MENDONÇA, C. V. A Vila de Santa Isabel: digni- dade de um povo. [S.l.: s.n.], 2002. No prelo. Amanda Lima do Santos Carvalho A autora é arquiteta e urbanista pela Universidade Federal Fluminense, formada em 2009. Na gradua- RIO GRANDE DO SUL. Lei nº 11.585, de 12 de ção participou de dois projetos como monitora de duas disciplinas diferentes. O primeiro, de 2007, era: janeiro de 2001. Diário Oficial [do] Estado do Iconografia e Documentação Visual da Arquitetura clássica, renascentista e eclética. O segundo, de 2009, Rio Grande do Sul. , RS: Poder era: Quem tem medo de quem? As políticas públicas e os muros nas favelas cariocas. Ambos foram Executivo, 15 jan. 2001. apresentados na semana de monitora. Em 2008 ganhou Menção Honrosa em um concurso promovido pelo Instituto de Arquitetos do Brasil, na categoria Conservação e Valorização do Patrimônio Construído, RUPERT, A. A história da Igreja no Rio Grande com o trabalho: Casa da Árvore: Rua Bambina, nº 40. Atualmente está finalizando o mestrado iniciado em do Sul. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1994. agosto de 2012, também na UFF, em história do urbanismo, mais especificamente no desenvolvimento do Rio de Janeiro durante o século XIX. SALABERRY, J. D. História e arquitetura da agroindústria no Bairro do Porto: Pelotas-RS Ana Lúcia Ciffoni (1911-1922). Pelotas: Editora Universitária/UFPel, Graduada em Arquitetura e Urbanismo (UFPR, 1981), especialista em Paisagismo (PUCPR, 1982), es- 2012. pecialista em História da Arte (PUCPR, 2008) e mestre em Gestão Urbana (PUCPR, 2012). É Arquiteta do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC) desde 1990. Tem experiência na SALABERRY, J. D.; MENDONÇA, C. V.; LÚCIO, área de Planejamento Urbano, com ênfase em Uso do Solo e Patrimônio Cultural. E. C. Inventário do Patrimônio Arquitetônico de Santa Isabel do Sul – Arroio Grande-RS. Angela Lúcia de Araújo Ferreira Pelotas: Jeferson Dutra Salaberry, 2012. É professora do Departamento de Arquitetura e dos Programas de Pós-Graduação em Arquitetura e CD-ROM. Urbanismo e em Estudos Urbanos e Regionais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Arquiteta pela Universidade de Brasília, Doutora em Geografia pela Universitat de Barcelona/Espanha e com estágio pós-doutoral na Universidad de Murcia e Universitat de Barcelona, atualmente coordena o Grupo de Pesquisa História da Cidade, do Território e do Urbanismo (HCUrb) e o Grupo de Estudo sobre Processos Urbanos e Regionais (GEPUC/ECoHabitat) do Departamento de Arquitetura da UFRN. Integra o Núcleo Natal da Rede Observatório das Metrópoles (UFRJ/BR) e a Rede Internacional Geocrítica (UB/ ES). Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq.

Beatriz Siqueira Bueno Possui graduação em História pela Universidade de São Paulo (1990), graduação em Artes Plásticas pela Fundação Armando Álvares Penteado (1988) e doutorado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (2001), onde leciona as disciplinas de Estudos de Urbanização desde 2002. Atua princi- palmente nos seguintes temas: História da urbanização e do urbanismo no Brasil; cultura profissional dos arquitetos e engenheiros; História do mercado imobiliário em São Paulo; e História da cartografia. Possui bolsa de produtividade em pesquisa do CNPq - PQ-2. É autora dos livros: Desenho e desígnio: o Brasil dos engenheiros militares (1500-1822) (EDUSP, 2011), Aspectos do mercado imobiliário em perspectiva histórica: São Paulo (1809-1950) (FAUUSP, 2008) e São Paulo: um novo olhar sobre a história. A evolução do comércio de varejo e as transformações da vida urbana (Via das Artes, 2012).

Caliane Christie Oliveira de Almeida Pós-doutoranda do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (IAU-USP), bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e pesquisadora do Grupo de Pesquisa História da Cidade, do Urbanismo e do Território (HCURB), do Departamento de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Possui graduação em Arquitetura e Urbanismo pela UFRN, mestrado em Arquitetura e Urbanismo pela Escola de Engenharia de São Carlos (EESC- USP) e doutorado em Arquitetura e Urbanismo pelo IAU-USP.

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