Ana Catarina Pereira. a Mulher Cineasta

Ana Catarina Pereira. a Mulher Cineasta

A MULHER- -CINEASTA DA ARTE PELA ARTE A UMA ESTÉTICA DA DIFERENCIAÇÃO ANA CATARINA PEREIRA A MULHER- -CINEASTA DA ARTE PELA ARTE A UMA ESTÉTICA DA DIFERENCIAÇÃO ANA CATARINA PEREIRA LABCOM.IFP Comunicação, Filosofia e Humanidades Unidade de Investigação Universidade da Beira Interior Ficha Técnica Título A mulher-cineasta: Da arte pela arte a uma estética da diferenciação Autora Ana Catarina Pereira Editora LabCom.IFP www.labcom-ifp.ubi.pt Coleção ARS Direção Francisco Paiva Design Gráfico Cristina Lopes Revisão Ana Isabel Albuquerque ISBN 978-989-654-276-4 (papel) 978-989-654-278-8 (pdf) 978-989-654-277-1 (epub) Depósito Legal 406275/16 Tiragem Print-on-demand Universidade da Beira Interior Rua Marquês D’Ávila e Bolama. 6201-001 Covilhã. Portugal www.ubi.pt Covilhã, 2016 © 2016, Ana Catarina Pereira. © 2016, Universidade da Beira Interior. O conteúdo desta obra está protegido por Lei. Qualquer forma de reprodução, distribuição, comunicação pública ou transformação da totalidade ou de parte desta obra carece de expressa autorização do editor e dos seus autores. Este livro, bem como a autorização da publicação das imagens, é da exclusiva responsabilidade da autora. Por sua vontade expressa, a presente edição não segue a grafia do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. Agradecimentos Em primeiro lugar, à própria Fundação para a Ciência e Tecnologia, pelo privilégio de uma bolsa de investigação e pelo persistente incentivo ao progresso científico, mesmo em tempos tão conturbados como os actuais. Ao LabCom.IFP, enquanto laboratório de investigação/ editora que aceita a publicação da tese e que, gratuitamente, a faz chegar ao mundo, por ser esse o propósito do conhecimento. Ao Professor Tito Cardoso e Cunha, por acreditar na pertinência e actualidade do tema, bem como nas capacidades da orientanda para concretizar tão ambicioso projecto. Mas sobretudo pelo respeito, pelo compromisso e pelos valores transmitidos ao longo de quatro anos de trabalho conjunto. Ao Professor Paulo Serra, pelo apoio concedido a todos os alunos e alunas do terceiro ciclo de Ciências da Comunicação, e ao Professor António Fidalgo, pelo incentivo à investigação como meio de evolução, não apenas dos profissionais, mas também, e essencialmente, dos seres humanos. Aos membros do júri que avaliou a tese: Professores Eduardo Paz Barroso, Anabela Branco de Oliveira, Manuela Penafria e Teresa Joaquim, pela análise e ponderação demonstradas. Aos meus alunos, alunas e colegas de trabalho que partilham o gosto pela observação, leitura, pesquisa e produção de conhecimento. Aos amigos e amigas que vão fazendo questão de estar presentes e aos cinéfilos e cinéfilas que me inspiram. À minha família e, essencialmente, aos meus pais, pelo amor e pela educação que fizeram de mim a pessoa que hoje sou. Desde o primeiro dia. Índice Prefácio 9 Introdução 11 PARTE I TEORIA 15 Capítulo 1 - Direitos Humanos e Feminismo(s) 17 Historicidade dos direitos humanos 17 Primeiras tentativas de jurisdição 23 As primeiras imagens em movimento 28 As primeiras mulheres-cineastas 33 Capítulo 2 - A segunda vaga de um feminismo beauvoiriano 39 A Europa nos anos 50 39 A construção de um léxico feminista 48 Ventos de mudança no pós-Segundo Sexo e a sua influência na sétima arte 52 “Women are messed over, not messed up” 58 Quando a esfera privada se torna política 61 A primeira causa feminista internacional 63 Capítulo 3 - A fragilidade do direito à igualdade nas sociedades democráticas 73 Conceito “igualdade” em Norberto Bobbio 73 Regra de justiça 76 Sistemas de implementação do direito à igualdade 80 A opressão como mecanismo gerador de desigualdade social 83 Capítulo 4 - Arte e política: A mulher vista como o outro 89 Filmes que preservam preconceitos 89 Imagens distantes 93 O olhar de Laura Mulvey 99 Um cinema político 110 Capítulo 5 - A mente feminina num cinema masculino 113 A sensível 113 A sexualizada 118 Capítulo 6 - Do espectador universal à passividade da mulher que assiste 125 O espectador universal 125 O processo de identificação da espectadora 129 O espectador indefinido 135 O mecanismo de criação de imagens 138 Alterar o cinema dominante 141 O não-lugar da espectadora 145 Festivais de cinema de mulheres em todo o mundo 147 Capítulo 7 - A insustentável leveza de uma definição: Existirá uma estética feminina? 151 Esquecimento e subversão 152 Cinema feminino versus cinema masculino 154 A arte (e o cinema) feminista como arma política 162 Texto e contexto 168 PARTE II - METODOLOGIA 173 Capítulo 8 - O estranho caso do cinema português 175 As precursoras 175 Os filmes realizados 180 Filmar em democracia 187 Dados comparativos 196 Metodologias e desenho de uma investigação 199 PARTE III - EMPIRIA 221 Capítulo 9 - O adultério feminino pelo olhar de Monique Rutler: O charme discreto de uma burguesia republicana e falsa-moralista 223 Socialmente incorrecta 224 Um filme não assumidamente feminista 228 O olhar de Monique Rutler sobre Portugal 233 Pecados de um adultério no feminino 239 Considerações finais sobreSolo de Violino 246 Capítulo 10 - O niilismo de Cláudia Tomaz: O eterno-retorno a um cinema português centrado no miserabilismo humano 249 Imagens sufocantes 250 As influências de Teresa Villaverde e Pedro Costa 257 Niilismo e eterno retorno 263 A passividade feminina 266 A evolução no percurso cinematográfico de Cláudia Tomaz 272 Capítulo 11 - Cine-ensaios de Solveig Nordlund: Hologramas de um futuro próximo no qual tolerância e feminismo conduzem a uma mudança de paradigma 277 J. G. Ballard e Solveig Nordlund: O escritor e a realizadora da utopia no caos da pós-modernidade 278 A feminização de um conto essencialmente masculino 281 O medo como instrumento de governação 288 As autoras que marcaram a evolução de um género 294 O futuro da ficção científica 302 A recusa de uma androgenia futurista 306 A eterna procura de um feminismo inclusivo 309 Capítulo 12 - O fantasma do feminismo na obra de Catarina Ruivo 317 “O eu és tu” 318 Desigualdades que persistem 321 A urgência da felicidade e a ausência de limites 330 A presença indelével de Virginia Woolf em Daqui p’rá frente 334 Considerações finais 341 Anexos 351 Referências bibliográficas 357 Prefácio Que o feminino tem uma presença avassaladora no cinema desde os seus primórdios, isso todos o sabemos, e não é, só por si, a principal questão abordada neste livro. O problema é o de saber qual o lugar que aí, no cinema, a mulher tem ocupado. E se, no cinema, se trata sempre de um olhar que sobre o mundo da vida se lança, a pergunta é a de saber o que nesse olhar se vê. Ao que é que ele está atento. Grandes cineastas — Bergman, Antonioni, por exemplo — fizeram-nos ver o feminino através dos seus filmes. Mas quem é esse feminino que eles viram e nos fizeram ver? Se é certo que o cinema no masculino, isto é, feito e visto por homens, está desde sempre atento ao feminino — nomeadamente a todos os seus clichés imaginários — a que feminilidade está ele particularmente atento? Sobre esta questão já Laura Mulvey nos ensinou bastante. Muito desse ensinamento foi retido pela autora na sua investigação. Mas a questão que a anima está para além disso. Trata-se de interrogar o olhar feminino posto no cinema. O feminino que esse olhar vê e o(s) feminino(s) com que se fazem os filmes pelas mulheres cineastas. Tudo centrado no caso português, onde o olhar cinematográfico no feminino quase sempre escasseou, como em todo o lado. Sendo o cinema, e particularmente o “cinema ficção” — o mesmo é dizer “cinema narrativo” — um meio privilegiado para as projecções do/a expectador/a, não será de espantar que, nas suas narrativas, se reflictam distintas visões do mundo e que, nestas, o olhar feminino se exerça diferentemente sobre o mundo da vida, mostrando, porventura, o que é invisível a um olhar e a uma vivência no masculino. A autora, ao abordar estes temas, apoia-se numa dupla fundamentação: por um lado, a do cinema, e particularmente do cinema português, cujo conhecimento só muito recentemente tem sido mais aprofundado por toda uma nova geração de investigadores em que o seu nome se destaca. Por outro, uma investigação prévia em que procurou sobretudo melhor compreender a relação entre media e gender studies. Foi isso que a levou a dedicar uma particular atenção à até então pouco pensada presença da mulher na elaboração do cinema português. Se, como já dizia o sábio oriental, a gens feminina é quem suporta a metade do céu, só nos pode espantar porque é que, sendo a presença de mulheres tão central nas narrativas cinematográficas, o olhar que sobre elas e por esse meio recai não tinha até agora sido interrogado em Portugal de maneira mais extensa e aprofundada. Se as personagens femininas são tão visíveis no cinema, por que é que esse feminino era tão imaginariamente circunscrito? Pela primeira vez nesta obra, Ana Catarina Pereira encara teoricamente de frente, e em toda a sua extensão, a problemática do olhar cinematográfico, bem como o mundo da vida que esse olhar reflecte, nomeadamente na figura das realizadoras cujos filmes aqui são analisados. Este entendimento dos filmes realizados em Portugal por mulheres cineastas mostra-nos como um outro olhar sobre o mundo da vida é possível, nos chega filmicamente e nos abre novos horizontes de compreensão. Tito Cardoso e Cunha 10 Ana Catarina Pereira Introdução “Eu não falo apenas sobre mim: procuro falar sobre algo que se expande infinitamente para além da minha singularidade; procuro falar sobre tudo o que é necessário para conceber uma obra literária, sobre como é para mim criar um universal concreto, um universal singular.” Simone de Beauvoir A História do Cinema teve início nos finais do século XIX, em sociedades europeias heterogéneas com uma estrutura patriarcal comum.

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