Os Pataxó Hã Hã Hãe E O Problema Da Diferença

Os Pataxó Hã Hã Hãe E O Problema Da Diferença

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE ANTROPOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ATROPOLOGIA SOCIAL Hugo Prudente da Silva Pedreira Os Pataxó Hã hã hãe e o problema da diferença (versão corrigida) São Paulo 2017 Universidade de São Paulo Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas Departamento de Antropologia Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Os Pataxó Hã hã hãe e o problema da diferença (versão corrigida) Hugo Prudente da Silva Pedreira Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo para obtenção do título de Mestre em Antropologia Social. Orientador: Prof. Dr. Márcio Ferreira da Silva De acordo:_____________________________ Prof. Dr. Márcio Ferreira da Silva São Paulo 2017 Os Pataxó Hã hã hãe e o problema da diferença. PEDREIRA, Hugo Dissertação de Mestrado apresentada ao Departamento de Antropologia da Universidade de São Paulo como requisito para obtenção do título de Mestre em Antropologia Social. BANCA EXAMINADORA ___________________________________________________ Márcio Ferreira da Silva - PPGAS/USP (Orientador) ___________________________________________________ Marta Rosa Amoroso – PPGAS/USP (Titular) ___________________________________________________ Maria Rosário Gonçalves de Carvalho – FFCH/UFBA (Titular) ___________________________________________________ Sylvia Caiuby Novaes – PPGAS/USP (Suplente) ___________________________________________________ João Dal Poz Neto – PPGCSO/UFJF (Suplente) ___________________________________________________ Ana Claudia Duarte Rocha Marques – PPGAS/USP (Suplente) AGRADECIMENTOS Agradeço à Capes pela bolsa concedida durante o curso, fundamental para que este trabalho fosse realizado. Aos funcionários do PPGAS, que nunca hesitaram em me ajudar no que fosse necessário. Ao PINEB e à ANAI. Por tudo o que me ensinaram e por compartilhar comigo a confiança dos Pataxó Hã hã hãe. À equipe do CIMI em Itabuna. Sempre que nos encontramos, tive oportunidade de conhecer mais sobre os Pataxó Hã hã hãe, sobre dedicação e sobre generosidade. Aos membros da banca, que já acompanham este trabalho há algum tempo, muito obrigado! À professora Maria Rosário de Carvalho pela parceria e pelo exemplo, ao meu orientador Márcio Silva por amar a Antropologia e por também gostar dos Pataxó e à professora Marta Amoroso pelo cuidado, estímulo e sugestões precisas. Ainda entre os mestres, agradeço também à professora Ana Claudia Marques pelas valiosas contribuições e à professora Dominique Gallois pelo estimulante diálogo. O tempo é o elemento da narrativa, assim como é o elemento da vida. Li isso em um romance, mas acredito que serve também para este texto. Desde que conheço os Pataxó e os Pataxó Hã hã hãe, as pessoas que dividem o seu tempo comigo também fazem parte deste trabalho. Agradeço aos Pataxó Hã hã hãe por tudo o que dividiram comigo, pela generosidade, pela confiança, pela claridade das ideias. Com carinho especial, agradeço à família Muniz e aos Titiah, que me receberam em suas casas. Dona Maria, Nailton e Mocinha, Rodrigo, Fábio, Davi, Maura... O tempo com vocês passou depressa e nunca acabou. Como é bom conversar! Aos Pataxó que conheci antes, em Aldeia Velha. Agradeço a todos vocês na pessoa de Dona Maria d’Ajuda, que sempre tem as melhores palavras a dizer. Aos amigos. Na ida ou na volta, vocês me fazem sentir-me em casa. Em especial, porque suas palavras de misturam com as minhas: a Thiago Haruo, Thais Tiriba, Leo Braga, Waldor Botero, Aura Hurtado, Carlos Moro, Fernando Fileno, Wilker Campos, Jurema Machado, Daniela Alarcon, Marília Lima, Izadora Guedes, Lucas D’Elion e meu primo Daniel. A Larissa, meu bem, por tudo. E é claro, à família, obrigado por existirmos juntos. Aos meus primos, por ensinarem seus filhos a me chamar de tio. Esse trabalho é para os meus sobrinhos, para que sejamos sempre chegados. Aos meus pais Maria Rita e Davi, que amam o futuro, tudo o que nasce. Ao meu avô Bemvindo Manoel, uma novidade de noventa anos, e minha avó Maria José, uma fortaleza. A todo mundo que está em Canavieiras para nos receber ou que volta sempre para lá. Em especial ao meu tio César, que fez esse tempo em São Paulo ser ainda melhor. À minha avó Neuza, que anda na nossa frente, e às minhas avós Delmira e Raimunda, uma de cada lado. Aos seus filhos e filhas, nossa família. À minha irmã Olívia e aos meus irmãos Lúcio, Manoel e Bruno: é muito bom vê- los crescer! E também à minha irmã que continuou pequenininha, e que a gente nunca esquece. Vocês estão sempre comigo! RESUMO Esta dissertação, de cunho fundamentalmente etnográfico, explora o problema da diferença, tal como definida pelos Pataxó Hã hã hãe. O ponto de partida são as diferenças de sangue que as famílias ou etnias reconhecem entre si e o processo de mistura que conduz um movimento, nunca acabado, de tornar-se “uma parentagem só”. A persistência das distinções entre as famílias remete às narrativas sobre o passado, entre índios vindos do mato e índios vindos de fora. Elas apontam o processo que transformou povos de origens diversas em parentes e nos reportam o perigo da metamorfose. Neutralizar o devir-outro dos antigos, dos bravos, é a condição do parentesco. Sob a temível diferença do Estado e dos contrários, os índios souberam combinar suas diferenças e fazerem- se parentes. O problema da relação na distância também é um tema recorrente das narrativas dos Pataxó Hã hã hãe, que por longo tempo viveram “esparramados”, longe de suas terras e dispersos. A habilidade da “visão”, os sonhos e as viagens noturnas do “anjo de guarda” demarcam uma série de dispositivos acionados na relação com os parentes que estão longe, inclusive os mortos. Este trabalho segue as figuras do outro e as formas da relação Pataxó Hã hã hãe. Palavras-chave: Pataxó Hã hã hãe, Parentesco, Território, Alteridades, Índios do Nordeste ABSTRACT This dissertation, fundamentally ethnographic, explores the problem of difference as defined by the Pataxó Hã hã hãe. The starting point is the blood differences which families or ethnic groups recognize in each other and the mixing process which leads to a never ending movement to become a single nation. The persistence of distinctions among families refers to past related narratives between bush and outside Indians. They point to the process that turned indigenous peoples from diverse origins into relatives and report on the danger of metamorphosis. Neutralizing the becoming-other of the old, the brave, is the kinship condition. Under the daunting difference of the State and the contraries, the Indians knew how to combine their differences and make themselves relatives. The problem of the relationship in distance is also a recurring theme of Pataxó Hã hã hãe narratives, that for a long time lived far from their land and dispersed. The ability of “vision”, dreams and the nightly trips of the “guardian angel” demarcate a number of devices activated in the relationship with relatives who are far away, including the dead. This work follows the figures of the other and forms the Pataxó Hã hã hãe relationship. Keywords: Pataxó Hã hã hãe, Kinship, Territory, Alterity, Northeast Indians SUMÁRIO Introdução 9 Sangue e Mistura: o manejo da diferença 17 Primos carnais, primos-irmãos e primo-com-primo 27 A Dissertação 42 1 “A briga por esta terra nunca acaba” 45 “Estejam Mansos!”: o século XIX 46 A Reserva Caramuru 51 A Retomada do Caramuru 61 Família e Lugar 67 Cônjuge não-índio, um caso 78 2 Memória da diferença 82 Índios do Mato e Índios de Fora 82 Os Velhos e a Terra 94 Expulsões, rezas e proteção 101 “A velha era braba”: diferença e geração 104 O desejo dos velhos 112 3 Parentes Ausentes: a relação na distância 117 Anjo de Guarda 117 Tanta gente esparramada 122 Os mortos 129 Visão e conhecimento 140 4 Diferença e Relação 145 Primo onça: parentesco e hostilidade 145 Corpo, alimentação e metamorfose 148 Visão, relação 153 Ex-parente 160 Políticas da Diferença: considerações finais 165 Referências Bibliográficas 168 Anexo 175 9 Introdução Os Pataxó Hã hã hãe dizem que são uma mistura de povos. Isto coloca a diferença no centro da reflexão nativa sobre a sua própria vida social. Este é o ponto de partida desta investigação. Eles reconhecem diferenças internas na forma de famílias ou etnias, que remetem aos distintos povos indígenas acolhidos na Reserva Caramuru criada pelo SPI1 na segunda década do século XX no sul da Bahia. É na reserva, portanto, que acontece a mistura2. Eles contam a sua história como a história da “briga por esta terra”. Foram violentamente expulsos dali e passaram longo tempo fora da Terra Indígena, esparramados. Empreenderam juntos a primeira retomada no início do anos oitenta e muitas outras se seguiriam nas décadas seguintes. Desde então, ao longo de mais trinta anos até a completa reocupação do território, que teve como marco jurídico uma decisão do Supremo Tribunal Federal em maio de 2012, as retomadas se tornaram uma espécie de síntese moral do povo Pataxó Hã hã hãe, da sua disposição para o embate, na busca do que reconhecem como seu direito3. “O povo Pataxó hã hã hãe é a união de cinco etnias: Baenã, Kariri-Sapuyá, Kamakã, Tupinambá e Pataxó. Essa reunião se originou no ano de 1982 quando surgiu a primeira retomada” (Fábio Titiah, Caramuru, 2012). Assim teria começado a redação de um livro que os Pataxó Hã hã hãe ali presentes esperavam que viesse contar a “história verdadeira” daquele povo. Estávamos reunidos na capela de São Sebastião, no Caramuru, antiga Fazenda São Lucas - a primeira que foi retomada pelos índios. O grupo reunia cerca de vinte índios Pataxó Hã hã hãe, das diversas etnias, e uma equipe de pesquisadores da UFBA que eu integrava como estudante e bolsista. De nossa parte, esperávamos produzir um registro do projeto de pesquisa e extensão, que durara dezoito meses entre maio de 2011 e outubro de 2012.

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