Desempenho Esportivo versus Desempenho Financeiro: O que nos diz o EBITDA de Clubes de Futebol Brasileiros? MONIQUE CRISTIANE DE OLIVEIRA Universidade Federal de Santa Catarina SULIANI ROVER Universidade Federal de Santa Catarina JOSÉ ALONSO BORBA Universidade Federal de Santa Catarina Resumo A visão do esporte como um negócio é recente, embora ainda não disseminada em todo o mundo. No que diz respeito ao futebol, o processo de profissionalização está presente no atual estágio de desenvolvimento do esporte no mundo. A comparação com empresas permite a adoção da lógica corporativa aos clubes, utilizando-se de ferramentas de gestão e a adoção de indicadores para sua análise financeira, dentre os quais se encontra o EBITDA, o qual seu uso tem sido adotado amplamente para as empresas como um indicador que tenta se aproximar do fluxo de caixa. Desta forma, o objetivo da pesquisa é identificar as características que influenciam no EBITDA de clubes de futebol brasileiros, que, para ser atingido, foi realizada uma análise de dados em painel para o período compreendido entre 2011 e 2015 em 18 clubes que participaram da Série A do Campeonato Brasileiro de 2012 a 2016. Devido às características de constituição dos clubes brasileiros, adaptações ao indicador foram necessárias, criando-se o EBITDAFut. Dentre os principais resultados destaca-se que o ano com maior valor do EBITDAFut para a área foi 2012, enquanto 2011 apresentou o menor valor. O Corinthians foi o clube que apresentou o maior valor de EBITDAFut no período. Além disso, verificou-se que as variáveis tamanho, desempenho esportivo e liquidez corrente têm correlação positiva com o indicador, embora fraca, enquanto que a variável RAI tem pouca correlação e o efeito é negativo. Constatou-se que o modelo de efeitos aleatórios é o que melhor explica as variações sofridas pelo EBITDAFut, sendo que as variáveis que o influenciam são desempenho esportivo e liquidez corrente. Palavras chave: EBITDAFut, Geração de Caixa, Clubes de Futebol. 1 1 Introdução O futebol desde seu início era tratado apenas como um esporte e não como um negócio. As finanças não eram bem gerenciadas, a gestão dos clubes era ineficiente, e ainda é na maioria deles, e o torcedor tratado apenas como espectador e não como cliente. No entanto, nas últimas duas décadas, com a evolução do futebol europeu (Bács & Nagy, 2014; Morrow & Howieson, 2014), começou a surgir a indústria do futebol, onde os clubes passaram a se profissionalizar e serem vistos como grandes empresas, tornando esta atividade um produto a ser vendido aos torcedores, que, neste momento, passaram a ser clientes e demais interessados. A evolução do futebol europeu, segundo Morrow e Howieson (2014), ocorreu, na maior parte, em função da oferta dos direitos de mídia, que transformou os times em negócios complexos envolvidos, intrinsecamente, com questões financeiras. Porém, embora estivessem se profissionalizando, os clubes europeus ainda lidavam com grandes perdas financeiras. Para frear esse crescimento insustentável foi instituído o Financial Fair Play Regulations, um regulamento de práticas financeiras criado pela Union of European Football Associations (UEFA) (Sass, 2012). A partir deste momento os clubes europeus passaram a conciliar o sucesso financeiro e desportivo, influenciando os demais times a iniciarem um processo de profissionalização. No Brasil, diversas leis foram criadas para tentar acelerar este processo e melhorar a gestão dos clubes. A medida mais recente tomada foi a criação do Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro (PROFUT), por meio da Lei 13.155/2015. No entanto, o que se percebe nos clubes brasileiros é ainda uma gestão ineficiente dos recursos, que se reflete em campo para alguns times e, principalmente fora dele, no que diz respeito aos atrasos recorrentes em pagamentos de dívidas, como salários de funcionários e jogadores e pagamento de dívidas tributárias (Brum, 2014), que é notado em quase todos os clubes brasileiros, inclusive aqueles denominados “grandes”. Devido a estes atrasos e os encargos gerados sobre eles, o endividamento dos times brasileiros cresce, portanto, se as receitas não aumentarem em proporção maior, os clubes entram em um clico financeiro insustentável. Assim, uma forma de avaliar a geração de caixa e a influência das atividades operacionais nesta ocorre através do Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization (EBITDA), que segundo Machado, Machado, Murcia e Machado. (2012, p.102) “representa o potencial de uma empresa gerar caixa através de suas operações”, uma informação voluntária e não regulada. Moreira, Jones, Tavares, Fehr e Silva (2014, p.9) complementam que “[...] representa o quanto a empresa gera de recursos apenas em sua atividade, sem levar em consideração os efeitos financeiros e de impostos”, sendo capaz de auxiliar na projeção de caixas futuros (Gradilone, 2002). Desta forma, a pergunta que orienta esta pesquisa é quais as características influenciam no EBITDA dos clubes brasileiros? Portanto, o objetivo do trabalho é identificar as características que influenciam no EBITDA de clubes de futebol brasileiros. O estudo se justifica em função da necessidade de saber a capacidade de geração de fluxos de caixa de clubes de futebol brasileiros, reconhecer os meios pelos quais eles têm captado recursos para cobrir suas dívidas, principalmente aquelas perante ao Governo, visto que segundo a Revista Veja (2015), ultrapassam mais de R$ 2 bilhões de reais, sendo que cerca de R$ 580 milhões foram perdoados pelo Governo Federal (Mattos, 2016). Outra justificativa está pautada na necessidade de análise financeira das equipes, principalmente aquelas que aderiram ao PROFUT, visto que terão amplo prazo para pagamento das dívidas perante a União. Estudos que demonstram a realidade financeira destas organizações são 2 necessários como forma de contribuir para o seu processo profissionalização, por meio da identificação de fatores chave que afetam sua gestão. Estudar o EBITDA dos clubes brasileiros permite abrir espaço às reflexões iniciais sobre sua gestão de caixa, pois, como mostra a ESPN (2016), muitos têm despesas superiores as receitas, gastando mais do que faturam. Portanto, é necessário verificar os pontos cruciais na gestão com vistas a melhoria dos indicadores financeiros. Além disso, conforme Grafietti et al. (2016), apontam que há uma esperança para a solução da grave crise financeira dos clubes brasileiros, isto porque o EBITDA dos clubes brasileiros apresentou uma melhora em 2015. Assim, investigar um período maior contribui para a ampliação dos resultados encontrados na referida análise e o estabelecimento de uma perspectiva futura para a gestão financeira de caixa dos clubes. É importante identificar, também, se os eles são capazes de se sustentar por meio de suas operações, informação que o EBITDA apresenta de forma simples. 2 Revisão da Literatura 2.1 A Indústria do Futebol A indústria do esporte amador ou profissional vem ganhando destaque pelo aumento da sua importância em termos econômicos e sociais, isto porque está se inserido em estruturas econômicas voltados ao lucro que tem como fator de sucesso o aumento do número de torcedores ou de atletas (Procházka, 2012). Gonçalves e Carvalho (2006) pontuam que nas últimas três décadas as organizações esportivas passaram por um processo de transformação que impactou na forma de gerir as associações. O surgimento do futebol profissional como atividade econômica mundial teve seu início a partir dos anos 1990 (Bács & Nagy, 2014), e de acordo com Rodrigues e Silva (2009), é o ramo da cultura que tem sofrido grande impacto com a introdução da lógica mercantil no seu contexto, lógica esta que Gonçalves e Carvalho (2006) pontuam como motivador para a inserção e aplicação de elementos empresariais na organização. O foco do crescimento deste esporte como potência econômica ocorreu na Europa nas duas últimas décadas, conforme Morrow e Howieson (2014), em função do aumento da oferta de direitos de mídia. Os direitos de mídia são parte importante da renda dos clubes e geralmente são ofertados em função do desempenho esportivo de cada um. Conforme Karpavicius e Jucevicius (2015), a popularidade e a imagem de um clube de futebol são elementos fundamentais para alcançar a eficácia das atividades econômicas diretamente atreladas com os resultados desportivos que moldam a imagem, positiva ou negativa, de um clube. A concepção de que a grande oferta de direitos de mídia foi o elemento propulsor no processo de profissionalização do futebol é corroborada por Bazanini, Santos, Ribeiro e Bazanini (2014), os quais argumentam que a expansão provocada pela globalização dos mercados transformou o futebol em um negócio complexo e bilionário devido ao desenvolvimento e modernização dos diferentes meios de comunicação. Os direitos de mídia, em geral, provêm da transmissão dos jogos das competições das quais os clubes participam, de forma que Karpavicius e Jucevicius (2015) pontuam que para um time ter eficiência econômica deve participar em diversos campeonatos. Assim, há também a comercialização de produtos e serviços, tornando as instituições mais visíveis, o que pode exigir uma ação comercial e social no setor (Kolyperas, Morrow & Sparks, 2015). A evolução da indústria do futebol se deu não só pelo desenvolvimento dos clubes como empresas, mas também pelo crescimento dos organismos responsáveis pela regulamentação das competições e a criação das ligas. No entanto, estas organizações ainda são pouco transparentes
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