Urgencia Das Ruas

Urgencia Das Ruas

2 Urgência das Ruas Para outras obras livres acesse: www.sabotagem.cjb.net Organizador: Ned Ludd (Coletivo Baderna) Título: Urgência das ruas: Black Block, Reclaim The Streets e os Dias de Ação Global Capa: Giseli Vasconcelos & Marcelo Ramos Tradução: Leo Vinícius Data Publicação Original: 2002 Data da Digitalização: 2005 Esta obra foi reformatada, revisada pelo Coletivo Sabotagem. Ela não possui direitos autorais pode e deve ser reproduzida no todo ou em parte, além de ser liberada a sua distribuição. 3 Urgência das Ruas SUMÁRIO Antes de tudo... 05 AGP e o inicio dos Dias de Ação Global 13 O J18 em Londres (OMC) - Janeiro de 1999 18 Texto do panfleto internacional,18 de junho de 1999 19 O que foi o dia 18 de Junho? 22 Abandone o ativismo 24 A ideologia da "globalização” · 38 OMC - Por que totemizar a opressão? 42 A Batalha de Seattle (OMC) - Novembro de 1999 46 O que foi o dia 30 de novembro (1999)? 47 Comunicado do N30 Black Block pelo coletivo ACME 50 Entrevista com participante do Black Block do N30 58 Sobre desorganização 64 Washington (Banco Mundial e FMI) - Abril de 2000 66 Dossiê antiglobalização/EUA - Black Block... 68 Black Block de Los Angeles... 79 Reação Global (Mayday) - Maio de 2000 82 4 Urgência das Ruas A política das ruas: uma resposta à cobertura da mídia do MayDay 84 Um S.O.S. ao MayDay: Terceira Onda versus Terceira Via 87 A Batalha de Praga (FMI) - Setembro de 2000 97 A polícia se prepara para Praga 98 Praga: um relato recebido... 100 Situação nas prisões 111 Entrevista com participante da Ação Global dos Povos 113 Cercando a ALCA 119 Usar uma camiseta toma você um terrorista 120 Por integrantes do Black Block – Canadá 122 Radicalize! Construindo a resistência à ALCA... 140 Comitê de Boas-Vindas ao Encontro das Américas (CASA) 144 O Black Block em Quebec: uma análise 147 O Cerco de Gênova (G8 e FMI) - Julho de 2001 150 Contra a criminalização do Black Block 154 Gênova, Itália: um relato 156 Gênova, 21 de julho... impressões após os distúrbios 182 De um irlandês no Black Block 184 Depois de Gênova 186 Não nos salvemos à custa do Black Block 187 Carta de dentro do Black Block 189 Uma entrevista com usuários do Black Block 191 Explicação da motivação do bloco negro/anarquista 192 Gênova: indo além do debate sobre a violência... 197 Um trabalho Italiano 207 Nova chamada à ação da convergência anticapitalista 208 Era assim antes... 219 5 Urgência das Ruas Apêndice 212 6 Urgência das Ruas ANTES DE TUDO... Este livro não é sobre o "movimento antiglobalização". Tal movimento foi criado na tela da 1V e nas colunas dos jornais burgueses. Infelizmente, cada vez mais pessoas que têm protestado nas ruas do mundo estão assumindo essa identidade forjada pela mídia, delegando assim explicitamente esse poder a ela. A definição dos próprios termos da discussão, impondo assim limites a uma suposta dissidência, é o próprio diagnóstico da saúde de qualquer relação de poder. Ele também não pretende ser um retrato totalizante dos grupos e pessoas - seus pensamentos e formas de ação - que têm ocupado as ruas de Seattle, Washington d.C., Londres, Praga, Quebec, Gênova... Apreender tamanha diversidade exigiria uma enciclopédia e não apenas um volume, se é que tal empreendimento é possível. Reduzir a complexidade da vida transformando-a em produto para o consumo de espectadores é a especialidade da mídia. Deixemos esse trabalho sujo a ela. 7 Urgência das Ruas O fenômeno das manifestações-bloqueio em encontros dos gestores do capitalismo internacional, ou mais genericamente os Dias de Ação Global, que têm impedido e perturbado as reuniões de instituições reguladoras do capitalismo global - como a Organização Mundial do Comércio (OMC), o Banco Mundial (BM), o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) - nos países da Europa e da América do Norte, gerando verdadeiras batalhas nas ruas, tem sido um fator importante de deslegitimação, senão das instituições capitalistas como' um todo, ao menos do pensamento econômico neoclássico que tem pautado de forma absolutista as políticas ditadas pelo BM, FMI, OMC, BID. A partir desse processo de deslegitimação da vertente neoliberal do capitalismo, a contestação praticada nas ruas, organizada basicamente por grupos de afinidade de forma autogestionária, isto é, não-hierárquica, não-burocrática e autônoma, naturalmente tenta ser capitalizada na forma de dividendos políticos pela esquerda capitalista: representada por ONGs (Organizações NãoGovernamentais) e partidos que buscam maior espaço na gestão do capitalismo. Afinal, transformar os impulsos de revolta contra a sociedade instituída em simples reivindicações compatíveis com o imaginário instituinte da sociedade capitalista sempre foi a prática da esquerda institucionalizada. De qualquer forma, o fato é que uma resistência anticapitalista e antiautoritária tomou com força nessa virada de milênio os palcos das ruas da Europa e da América do Norte. Esse tom anticapitalista e libertário que anima os Dias de Ação Global e as manifestações-bloqueio - nascido das selvas de Chiapas (México), da música verdadeiramente underground (não de Rage Against The Machine como gostam de citar os jornais burgueses), de raves, de squats1 e infoshops anarquistas - ao mesmo tempo que é por demais evidente e enormemente significativo, tende a ser desprezado e preterido cada vez mais pela mídia e pelos capitalistas de esquerda, o que não poderia deixar de ser diferente. Qual será o espaço reservado para esses anticapitalistas e antiestatistas na história oficial? Serão eles engolidos nessa massa uniforme que chamam “movimento antiglobalização”, "povos de Seattle" ou "povo de Porto 1 Casas ou prédios abandonados, que são transformados em locais de moradia e centros culturais e sociais. (N.T.) 8 Urgência das Ruas Alegre?” E suas energias serão relembradas como se tivessem sido postas a serviço do cancelamento da dívida do terceiro mundo, da taxação do capital financeiro ou do orçamento participativo municipal? Servirão os "radicais" libertários de bucha de canhão e tropa de choque para o ganho político dos capitalistas de esquerda? A resposta será dada também pela capacidade de articulação e estruturação dessa resistência anticapitalista e libertária. Os textos apresentados aqui formam uma coletânea de relatos, comunicados, artigos e entrevistas de participantes de "grupos" anticapitalistas e antiautoritários com presença ativa, importante, destacada, e muitas vezes polêmica, nas manifestações- bloqueio e nos Dias de Ação Global. Além de apresentar, documentar e difundir as idéias e as práticas destes grupos anticapitalistas, os textos coletados buscam contar um pouco da participação e das idéias de dois deles em especial: o carnavalesco Rec1aim The Streets inglês, e os "malditos" Black Blocks. Surgido na Inglaterra no início dos anos 90 a partir da luta antiestradas, uma das características do Rec1aim The Streets (RTS) tem sido uma auto crítica severa, algo realmente inspirado r e não muito comum, seja em indivíduos ou coletividades, o que dá ao RTS a propriedade de estar sempre em movimento, procurando cobrir suas insuficiências e encontrar as práticas adequadas para suplantar o capitalismo em prol de sua visão de sociedade ecológica, comunista e libertária. Grande parte dos textos produzidos e publicados pelo RTS são auto críticos, sendo que o leitor encontrará aqui uma amostra deles. Essa reflexividade e autocrítica talvez tenham sido o motivo que levou o RTS a reduzir sua iniciativa na organização e divulgação de Dias de Ação Global Contra o Capitalismo ao longo do tempo. O RTS inglês foi inicialmente o principal impulsionador na Europa, e talvez no mundo, do mecanismo de coordenação de movimentos sociais chamado Ação Global dos Povos (AGP). Foi também ele um dos grandes impulsionadores dos primeiros Dias de Ação Global. Sua auto crítica logo o levou a compreender a limitação da prática do Dia de Ação Global, e provavelmente já o fez dividir mais sua energia, caminhando por outros rumos. A diminuição do protagonismo exibido pelo RTS inglês pode ser percebido ao longo dessa coletânea, através da diminuição da própria produção de artigos pelo RTS concernentes aos Dias 9 Urgência das Ruas de Ação Global no decorrer do tempo. Enquanto o RTS, os Black Blocks e os imensos e organizados distúrbios que acompanham as tentativas de encontro dos gestores do capitalismo mundial têm sido um fenômeno essencialmente do Norte (EUA, Canadá e Europa), algumas questões e polêmicas levantadas em tomo dessas ações, e do Black Block em especial, não são novas e concernem também ao Sul. Muito provavelmente os manifestantes que formam os Black Blocks estão 'entre os que menos nutrem ilusões em relação à natureza do capitalismo e do Estado, mesmo em sua feição democrática. Seus métodos e práticas exprimem de alguma forma essa percepção, e, coincidentemente ou não, recebem por isso a pecha de "violentos" tanto pela mídia quanto por ONGs, partidos políticos, capitalistas de esquerda e de direita, liberais, sejam eles também manifestantes ou não. Certamente categorias tão carregadas de peso moral como violência e não- violência têm tudo para se tomarem artifício retórico reacionário no contexto de levantes populares. Todas as "greves selvagens" e insurreições populares, dos communards aos zapatistas, sempre foram pelo menos em algum momento - até quando os defensores da ordem estabelecida puderam sustentar seus discursos - descritas como irrupções de violência, na tentativa de isolá-Ias, criminalizá-Ias e desqualificá-Ias moralmente. Se levarmos em conta que as ações dos Black Blocks nessas manifestações-bloqueio feriram sem gravidade no máximo apenas alguns poucos policiais, enquanto milhares de manifestantes saíram feridos pelas investidas policiais, tachá-Ios de "violentos" deveria ser algo RTSível, que só demonstra o quanto àqueles que assim os rotulam ainda se encontram imersos e devedores da moral e da ordem burguesa. Com certeza não se deve deixar de criticar ou discordar das ações dos Black Blocks com base em aspectos táticos ou de efetividade, caso a caso, mas o simples apelo à categoria moral violência, quando se está a enfrentar a força repressiva do Estado, faz tanto sentido quanto atirar balas de borracha neles ou prendêlos.

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