YURI SOCRATES SALEH HICHMEH.Pdf

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ YURI SÓCRATES SALEH HICHMEH O DOMÍNIO PELOS LIVROS: A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE JAPONESA COMO PARTE DO PROCESSO DE CENTRALIZAÇÃO POLÍTICA NA ERA TOKUGAWA CURITIBA 2018 YURI SÓCRATES SALEH HICHMEH O DOMÍNIO PELOS LIVROS: A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE JAPONESA COMO PARTE DO PROCESSO DE CENTRALIZAÇÃO POLÍTICA NA ERA TOKUGAWA Tese apresentada ao curso de Pós-Graduação em História, Setor de Ciências Humanas, Universidade Federal do Paraná, como requisito parcial à obtenção do título de Doutor em História. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Andréa Doré CURITIBA 2018 Dedico esta pesquisa aos meus alunos, com quem compartilho tanto de minha vida e que me mostram, todos os dias, que o futuro pode ser esperançoso. Continuem a viver, sigam seus sonhos e não deixem que o mundo acinzente as suas existências. RESUMO O Japão da Era Edo (1603-1868) pode ser entendido como um momento de ricas transformações políticas e culturais. Parte destas transformações se deu a partir da consolidação de um modelo administrativo centrado na linhagem Tokugawa, que monopolizou o poder e desenvolveu um aparato burocrático amparado não apenas pelo poder das armas, mas também da produção e difusão cultural. Esta tese tem por objetivo determinar como o Japão daquele período cunhou a própria identidade a partir de elementos internos e externos ao arquipélago. A identidade japonesa, representada por padrões comportamentais, obras literárias e práticas rituais, foi produto do empreendimento de oposição do Bakufu Tokugawa a múltiplos “outros” que compuseram, em diferentes momentos, o cenário nipônico. Os europeus e o cristianismo, bem como elementos provenientes da China, atuaram como combustíveis para a consolidação de uma identidade que se expressou em âmbito cultural, marcada por ressignificações e apropriações de elementos estrangeiros, lidos a partir da ótico japonesa, a fim de diferenciar aquele espaço de seus vizinhos próximos ou visitantes ocidentais. A fim de satisfazer à tese proposta, utilizamos fontes ocidentais, bem como japonesas, abarcando desde o epistolário jesuíta e relatos de navegadores, bem como obras literárias e confucionistas, como as de Hayashi Razan, do Japão dos séculos XVII e XVIII. Palavras-chave: História do Japão. Cristianismo no Japão. Cultura escrita. Confucionismo. Era Tokugawa. ABSTRACT Edo Japan (1603-1868) is understood as a moment of rich political and cultural transformations. Some of these can be seen as part of the centralization process under the Tokugawa rule, which monopolized the power through a bureaucratic complex, based not only in the use of force, but also on the spread of cultural productions. This study aims to determine how Japan was able to create its own identity from its own understanding of the culture within and outside the archipelago. The Japanese identity, represented by various standards, literacy and rituals, was a reflex of the Bakufu’s opposition towards the “other”, composed mainly by the European and the Chinese. These foreigners and their legacy served as fuel for the forging of an identity marked by processes of cultural reappropriation and redetermination. This study is based on primary sources from European travelers and Jesuits, plus Japanese literacy and Confucianism scholar’s, such as Hayashi Razan. Keywords: Japanese History. Christianity in Japan. Written Culture. Confucianism. Tokugawa. SUMÁRIO INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 10 1 O “SÉCULO CRISTÃO” DO JAPÃO E O INÍCIO DA PERSEGUIÇÃO ............................... 21 1.1 Da expansão ibérica ao início da missionação ....................................................................... 21 1.2 A acomodação cultural e a expansão do cristianismo em solo japonês ............................. 35 1.3 Fabian Fukan, Myotei Mondo e os curtos passos do clero nativo japonês ........................ 48 2 A CENTRALIZAÇÃO POLÍTICA DO JAPÃO NO SÉCULO XVII: A RECEPÇÃO E A MARGINALIZAÇÃO DOS EUROPEUS ........................................................................................ 56 2.1 O cristianismo sob o processo de centralização Tokugawa: o édito de 1614 e o martírio ............................................................................................................................................................. 56 2.2 Um conflito global chega ao Japão: os mercadores holandeses e a “solução final” para o problema cristão ................................................................................................................................ 64 2.3 Fabian Fukan, Ha Daiusu e a doutrina Tokugawa anticristã ................................................ 85 3 A EDUCAÇÃO, A INFORMAÇÃO E A LITERATURA COMO INSTRUMENTOS DE PODER ............................................................................................................................................................. 94 3.1 O Japão após 1640: o relativo isolacionismo e o dinamismo cultural da sociedade Tokugawa ........................................................................................................................................... 94 3.2 A educação como instrumento de poder: a expansão da leitura entre os estratos urbanos e camponeses .................................................................................................................................. 111 4 O CONFUCIONISMO E A IDENTIDADE JAPONESA NA ERA TOKUGAWA .................. 128 4.1 Os pilares confucionistas ......................................................................................................... 128 4.2 As escolas confucionistas ........................................................................................................ 136 4.3 A ambivalência do confucionismo: a definição da identidade a partir do “outro” ............. 140 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................................... 160 FONTES ........................................................................................................................................... 165 BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................................... 167 ANEXO – MAPA ............................................................................................................................. 171 10 INTRODUÇÃO Em 1790, durante o governo do Shōgun Tokugawa Ienari (1773-1841) e sob a aprovação de seu regente, Matsudaira Sadanobu (1759-1729), foi instituído um conjunto de reformas reacionárias, de ordem política e cultural, que ficaram conhecidas como as Reformas Kansei ( ᐶᨻ␗Ꮵ⚗). 1 Estas medidas visavam fortalecer a posição do governo central e as bases doutrinárias que o sustentavam. Exemplo disto está na distinção feita nas Reformas acerca do conhecimento escrito, dividido em seigaku (ṇᏥ) e igaku (␗Ꮵ), ou “ensinamento correto” e “ensinamento desviante”, respectivamente. Estas categorias abrangiam, no final do século XVIII e início do XIX, a cultura escrita (literatura popular, livros religiosos, manuais técnicos, dentre outros), os pilares filosóficos e o aparato de educação popular e especializada que se fundamentou desde o século XVII. Como seigaku, o governo categorizava os alicerces confucionistas que, de forma geral, legitimavam a hierarquia daquela sociedade: a obediência, o respeito filial, as funções dos estratos guerreiros, dos comerciantes, dos camponeses e, por fim, das autoridades políticas. Os “ensinamentos corretos” compunham os livros didáticos e as lições transmitidas nas escolas públicas e instituições privadas de ensino e defendiam que a manutenção da ordem se dava por meio do respeito filial e da lealdade e subordinação às autoridades. Os “ensinamentos desviantes”, por sua vez, abarcavam um conjunto maior de temas: livres interpretações de doutrinas confucionistas e budistas, materiais considerados impróprios para a população ou que remetessem a corpos de valores destoantes dos seigaku, como foi o caso do cristianismo. As Reformas Kansei, assim, dividiram o saber e a sua produção no Japão, tendo como principal critério a existência ou não de alguma ameaça ao poder e à organização daquele país. As Reformas, entretanto, não foram um conjunto isolado de medidas adotadas pelo governo, mas apenas parte de um projeto que já transcorria desde o início do 1 Tokugawa Ienari foi o décimo primeiro Shōgun da Era Tokugawa e assumiu o cargo, sob a tutela e regência de Matsudaira Sadanobu, a partir de 1787. A presença de Sadanobu junto a Ienari se deu até o ano de 1793, quando, com 20 anos, o Shōgun assumiu suas responsabilidades de forma direta. Entre 1787 e 1793, entretanto, Sadanobu, como principal autoridade política do Japão – por representar a família Tokugawa – desenvolveu políticas econômicas que atuaram na contramão dos excessos e gastos do Shōgun anterior, Tokugawa Ieharu, e que visavam o fortalecimento da imagem do Bakufu perante os principais daimyō. Ver: MORTON, W. Scott. Japan Its History and Culture. New York, McGraw-Hill, 1994. 11 século XVII, quando o primeiro Shōgun (ᑗ㌷)2 da linhagem Tokugawa encerrou um contexto de mais de cem anos de guerra civil e deu origem à Era Edo (1603-1868).3 O historiador George Elison, acerca do início deste período, escreveu que “Tokugawa Ieyasu conquistou o Japão sobre um cavalo, mas dominou por meio dos livros”, em alusão aos usos dados pelo emergente líder e seus sucessores à educação,

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