Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 43º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – VIRTUAL – 1º a 10/12/2020 A historicidade da ficção seriada: temporalidades e modos de narração 1 teledramatúrgica 2 Daniel Rossmann JACOBSEN 3 Leonardo Miranda RANGEL 4 Miranda PEROZINI 5 Patrícia Cardoso D'ABREU Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, ES RESUMO A partir de pesquisas, reflexões e debates do Grupo de Estudos e Pesquisas em Ficção Seriada (Gefics) da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), este artigo busca contextualizar a ficção seriada no processo de reinvenção do folhetim através da história, partindo dos jornais impressos do século XIX e alcançando a ficção audiovisual contemporânea on demand. Explorando classificações que dão conta das obras tanto em sua anatomia interna quanto em seu contexto externo, este trabalho se baseia em uma revisão bibliográfica básica composta de Meyer, Sodré, Campedelli e Jost para apontar os diferentes tempos pertinentes à cultura da ficção seriada: o tempo cronológico, o tempo industrial e o tempo individual. PALAVRAS-CHAVE: ficção seriada; historicidade; folhetim; temporalidades. 1. INTRODUÇÃO A ficção seriada, ou seja, os produtos audiovisuais produzidos para serem consumidos de forma “fatiada” em capítulos ou episódios, encontrou definitivamente seu espaço na academia. O que antes era encarado como produto de baixo valor estético se mostrou importante objeto de estudo cultural, ao ser investigado como socialmente relevante e de importância comercial inegável, suscitando estudos sérios na academia principalmente a partir dos anos 1990, como explicam Castilho e Lemos (2018). Com origem no folhetim francês do século XIX, o modo de consumir histórias em pequenos 1 Trabalho apresentado no IJ04 – Comunicação Audiovisual, da Intercom Júnior – XVI Jornada de Iniciação Científica em Comunicação, evento componente do 43º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. 2 Graduando em Comunicação Social - habilitação em Jornalismo na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas em Ficção Seriada (Gefics/Ufes). E-mail: [email protected]. 3 Graduando em Comunicação Social - habilitação em Jornalismo na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Integrante do Gefics/Ufes. E-mail: [email protected]. 4 Graduanda em Comunicação Social - habilitação em Jornalismo na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Integrante do Gefics/Ufes. E-mail: [email protected]. 5 Orientadora do trabalho. Docente no departamento de Comunicação Social da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Coordenadora do Gefics/Ufes. E-mail: [email protected]. 1 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 43º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – VIRTUAL – 1º a 10/12/2020 pedaços conquistou a televisão e, recentemente, a internet, sendo produto central das plataformas de streaming de consumo on demand. O termo “ficção seriada” atua como um guarda-chuva, que abriga sob si uma gama de produtos cuja complexidade constitutiva, muitas vezes, leva a confusões entre as categorias telenovela, série, minissérie, microssérie, seriado e sitcom. Produto tão importante na comunicação e na mídia contemporânea, reflexo da ideologia da transparência tão prezada nas sociedades democráticas (JOST, 2012), a ficção seriada tem motivado a criação de grupos de estudo e pesquisa no Brasil e no mundo. Se destacam o Observatório Ibero-americano da Ficção Televisiva (OBITEL), com grupos integrantes em todo o Brasil, e o Grupo de Pesquisa Ficção Seriada da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (GP Ficção Seriada – Intercom), além da crescente massa de monografias, dissertações e teses na área, produzidos em faculdades e programas de pós-graduação em Comunicação Social em todo o país. Na Universidade Federal do Espírito Santo, o destaque é o Grupo de Estudos e Pesquisas em Ficção Seriada (Gefics), que teve suas atividades iniciadas no segundo semestre de 2019. Este trabalho manifesta algumas das primeiras impressões do Gefics a partir dos estudos desenvolvidos até o momento e objetiva elucidar conceitos úteis para estudos futuros, além de encaminhar discussões que terão sucessão em outros artigos. 2. A FICÇÃO SERIADA: FORMATOS INDUSTRIAIS E FORMAS DE SUSPENSÃO DRAMÁTICA A expressão “ficção seriada” é utilizada para designar a variedade de obras audiovisuais produzidas de forma descontínua: novelas, minisséries, microsséries, séries, seriados e sitcoms. A estrutura interna dessas obras é a da suspensão sistemática que se dá de duas formas: em capítulos ou em episódios. Entendemos capítulo como parte de uma trama cujas causas e consequências estão necessariamente ligadas a um drama maior definido na sinopse e a mercê da audiência. Um capítulo é, assim, a parte de um todo no qual várias suspensões orbitam e\ou sustentam a suspensão diária de uma trama principal fracionada. Todo capítulo é, portanto, parte articulada internamente a 2 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 43º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – VIRTUAL – 1º a 10/12/2020 uma obra com começo e fim e articulada externamente a determinada audiência. Este é o caso de novelas (como Pecado Capital, Roque Santeiro, Barriga de Aluguel e Avenida Brasil), minisséries (como O tempo e o vento, Anos Dourados, O sorriso do Lagarto e Os dias eram assim) e microsséries (como Dalva e Herivelto – Uma Canção de Amor, O canto da sereia e Chacrinha). É importante ressaltar que, tradicionalmente, a articulação externa dos capítulos com a audiência se dá de forma quantitativa no caso específico das telenovelas (daí serem chamadas de “obras abertas”) e de forma qualitativa no caso de minisséries e microsséries (daí serem classificadas como “produtos diferenciados”). Já episódio definimos como parte independente de uma trama que se articula em temporadas fechadas. Um episódio é uma situação ou conflito que se resolve em si, a despeito de suas causas e consequências dramáticas no interior de uma temporada. Todo episódio é, portanto, uma suspensão independente articulada internamente a uma temporada que, por sua vez, se articula externamente a uma audiência específica. Este é o caso de séries (como Batman, As Panteras, e Black Mirror), seriados (como Jornada nas Estrelas, Dallas, Mulher e Lost) e sitcoms (como A Feiticeira, Armação Ilimitada, Seinfeld e Friends). As suspensões de uma obra de ficção seriada ocorrem de quatro formas: I) Dentro de um capítulo: durante a exibição de um capítulo de novela, é necessário que os diversos plots pertencentes a ela sofram alguns avanços em suas respectivas tramas. Para que isso ocorra, a estrutura de um capítulo deve ser dividida em blocos, sendo estes separados por intervalos comerciais. Mas, para que o interesse na exibição do capítulo não se perca, e o telespectador troque de canal durante a pausa, é importante que as suspensões que precedem os intervalos comerciais despertem a curiosidade para os acontecimentos do próximo bloco. Em Amor de Mãe (TV Globo, 21 horas, 2019), por exemplo, os intervalos aconteciam nos principais polos de tensão do capítulo, e deixavam o telespectador ainda mais ansioso para o que aconteceria a seguir. Um exemplo disso são as descobertas da personagem Lurdes (Regina Casé) a respeito de seu filho desaparecido, Domênico (Chay Suede); 3 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 43º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – VIRTUAL – 1º a 10/12/2020 II) De um capítulo para o outro: Tendo em vista que a telenovela é exibida diariamente, é necessário criar ápices de tensão no final de cada capítulo para prender o telespectador e o incentivar a acompanhar os desdobramentos da trama apresentados no dia seguinte. Diferentemente das séries, onde cada episódio tem um plot próprio, a ser desenvolvido e resolvido, os capítulos de novela são finalizados no momento de maior ápice dramático. O grande sucesso de João Emanuel Carneiro, Avenida Brasil (TV Globo, 21 horas, 2012) foi marcado por finais de capítulos explosivos, com momentos importantes para o desenvolvimento da trama: a morte de Genésio (Tony Ramos) provocada acidentalmente por Tufão (Murilo Benício), na Avenida Brasil, a descoberta de Carminha (Adriana Esteves) de que Nina (Débora Falabella) era Rita e a morte de Max (Marcello Novaes) são alguns exemplos. As suspensões de cada capítulo de Avenida Brasil, inclusive, ficaram marcadas esteticamente na memória do público, por “congelarem” dramaticamente alguma personagem ao som de uma música de suspense seguida pelo famoso refrão “oi, oi, oi”; III) De um episódio para outro: Em um episódio, com a conclusão de sua trama individual, torna-se necessário articular elementos que encadeiam situações que se resolverão no episódio seguinte, ou em outro momento da temporada. A suspensão no fim de um episódio é geralmente carregada com mais suspense que uma suspensão de capítulo de telenovela, visto que se supõe um intervalo maior entre dois episódios em relação a dois capítulos. Em Pretty Little Liars (ABC Family, 2010), por exemplo, o fim de cada episódio exibia as mãos do antagonista “A.”, com suas usuais luvas, realizando um ato instigante que despertava a curiosidade
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