![Shaft E O Movimento Blaxploitation: a Emergência Do Protagonismo Negro Nos Anos Setenta](https://data.docslib.org/img/3a60ab92a6e30910dab9bd827208bcff-1.webp)
SHAFT E O MOVIMENTO BLAXPLOITATION: A EMERGÊNCIA DO PROTAGONISMO NEGRO NOS ANOS SETENTA MICHELLE S. CAETANO1 Mestranda em História Social-UFRJ/PPGHIS [email protected] Resumo: Na presente pesquisa buscaremos refletir e analisar o gênero blaxploitation2, representante do cinema negro norte-americano na década de setenta, elegemos o filme Shaft (1971) como exemplar que reúne e incorpora as demandas e características desse movimento. Sendo assim, buscaremos identificar indícios que comprovam que o movimento Blaxploitation foi um marco na mudança da representação do negro no cinema norte-americano. Tentaremos identificar no filme eleito para essa pesquisa uma guinada positiva na representação dos personagens negros, redefinindo com uma nova perspectiva a maneira como os papéis passaram a ser apresentados ao público, demostrando que a partir dos filmes produzidos por esse ciclo cinematográfico a negritude passa a ser representada com proatividade, protagonismo e empoderamento. Para tanto, consultaremos além da fonte fílmica eleita privilegiada também fontes auxiliares, como entrevistas de realizadores do movimento, além de entrevistas dos envolvidos com a fonte fílmica em questão. Palavras-chave: Blaxploitation; cinema negro; Shaft Boa parte da produção empreitada pelo cinema mainstream ao longo do século 20 foi marcada por representações estereotipadas da figura do negro. Partindo da ideia de Gubernikoff (2009), que considera cultura imagética como um meio de intervenção ideológica, pode-se então argumentar que a construção social do negro, realizada por esse cinema tem como base aspectos e critérios pré-estabelecidos socialmente. Optando por uma representação submissa, indolente, malevolente, muitas vezes, com um teor selvagem, incapaz de controlar seus impulsos sexuais. Dessa forma, o cinema 1 Bolsista do Programa de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES. 2 O gênero do cinema negro norte-americano blaxploitation, está situado na década de 70 e que emergiu nesse período com o intuito de produzir e direcionar filmes à comunidade afro-americana, sobretudo, urbana. Esses filmes também são denominados black action films. Esse termo também será usado para denominar o movimento. O movimento blaxploitation também é balizado por estudiosos do tema, entre eles, Todd Boyd, Mike J Koven e Donald Bogle como era, ciclo, estilo ou gênero, não há um consenso acerca da categorização do mesmo. Esses diferentes modos de localizá-lo serão úteis para o desenvolvimento desta pesquisa hegemônico reforçou a manutenção de forças opressivas que confere ao negro o status de inferioridade, nulificando-o como sujeito social e cerceando seu papel social como construtor da própria imagem. A obra mais emblemática, fundadora de diverso tipos pejorativo foi O Nascimento de uma Nação (1915), de acordo com Sims, o filme de D. W. Griffith, inaugurou o arquétipo do personagem mammy, estabelecendo parâmetros para um padrão de personagem totalmente estereotipado que se repetiu ao longo do século XX, tornando o personagem um tycasting3, o longa: [...] apresentou na tela a primeira representação negativa da mulher afro- americana, por ter uma atriz branca vestindo blackface, exagerando as característica afro-americanas, interpretando o que mais tarde ficou conhecido como a figura da mammy. [...] a representação caricatural dos afro-americanos estabeleceram as bases para a representação subsequentes de mulheres afro- americanas.4 (MEISS, 2005, p. 9-10). Essa espécie de apartheid de tipos negros associados ao negativos e tipos brancos associados a bondade e virtude vai perdurar por mais ou menos um século, culminando na luta pela participação plena dos negros na sociedade americana, ou seja, a luta pelos direitos civis nos anos sessenta. O cinema nao vai fugir desse entendimento de mundo nos EUA. Os filmes vão incorporar aspectos de distincão racial e elementos míticos, que segundo Vugmam: “[...] os elementos míticos criados pela sociedade norte-americana, são representativos dos puritanos, dos primeiros colonizadores”. (MASCARELLO, 2006, p. 162) 5 Ao mesmo tempo, no início do século 20, ja existia um cinema negro reagindo as representações pejorativas e preconceituosas. Os chamados race pictures nasceram ainda na década de vinte como resposta direta as produções como O Nascimento de uma Nação (1915). Os race pictures se “[...] empenhavam em representar os aspectos positivos do caráter e da vida nas comunidades a que pertencia” (ALMEIDA, 2012, p. 3 Tycasting são o conjunto de característica que formam determinados tipos de personagens. 4 SIMS, Yvonne D. From Headscarves to Afros: Redefining Africa-American femininity and empowerment in selected 1970s black action films. In: MEISS, Tait G. Ethnic Media in America: Taking Control. Dubuque, Iowa: Kendall Publishing, 2005, p.9-10. 5 VUGMAM, Fernando Simão. Western. In: MASCARELLO, Fernando, Org. História do Cinema Mundial. Campinas – SP: Ed. Papirus, 2006, Pg.162. 33). O maior representante dessses filmes é o cineasta negro Oscar Micheaux 6, no qual as produções como The Symbol of The Unconquered (1920), Within Our Gates (1920) e Body and Soul (1925), já apontavam para uma tentativa de representar a comunidade negra com uma agência política, integrados na sociedade. Da mesma forma, a obra The Notorious Elinor (1940) já indicava uma pretensa tentativa de combate a descriminação racial e a condição de marginalidade imposta aos negros. Oscar Micheaux foi pioneiro em vários aspectos e o conjunto da sua obra representa um legado importantíssimo para os estudos do cinema negro e História da comunidade negra americana. Ousado, à frente de seu tempo, Micheaux produziu obras transgressoras em um ambiente onde a segregação racial ditava os rumos da sociedade norte-americana. Os race pictures continuaram a ser produzidos, sevindo como base nos anos setenta ao gênero blaxpoitation. Sendo assim, o movimento cinematográfico blaxploitation, eclodiu na década de setenta e estava sincronizado com as demandas da contracultura e da luta pelos direitos civis, isto é, o gênero estava intimamente inserido em um contexto de extrema politização. O movimento, nasce inicialmente em Chicago, para suprir a demanda do público negro urbano que não se via representado nas telas de cinema. Os principais contribuintes para que o gênero ascendesse são os diretores (que também eram produtores e atores) Gordon Parks7, Melvin Van Peebles, e Larry Cohen, os filmes do movimento vão do gênero policial, ação, suspense, terror, entre outros. O movimento abarca de forma bem abrangente diversos gêneros cinematográficos com seus respectivos conjuntos de narrativas e temáticas, porém todos eles têm algo em comum: são filmes que procuram de alguma forma mostrar a saída da marginalidade e, ao mesmo tempo, a entrada para legitimidade, toda essa produção cinematográfica está buscando legitimar a participação da comunidade afro-americana nos anos da contracultura. Os filmes desse ciclo eram dirigidos geralmente por cineastas negros, protagonizados por atores/atrizes negros e a maioria do elenco também o era, pois tinha como finalidade atingir o público negro, 6 O cineasta Oscar Micheaux escreveu, produziu e dirigiu em torno de quarenta longas-metragens com a temática race pictures. Ele foi um dos maiores cineastas do cinema negro, sua obra representa um legado para o estudo dos race pictures. 7 Gordon Parks foi uma das grandes figuras do movimento blaxploitation, jornalista, músico, compositor, roteirista, diretor, ator e fotógrafo, contribuiu para enriquecer o movimento, é considerado pela comunidade afro-americana como um dos grandes ativistas da causa negra. Gordon Parks é diretor do filme Shaft. sobretudo, urbano. Pode-se dizer que o movimento blaxploitation possui um parentesco com a categoria de filmes chamados de race pictures, que nasce ainda na década de 1910, como resposta as representações raciais pejorativas efetuadas pelo cinema dominante. Mas agora esses filmes ganham força com a pluralidade das demandas da contracultura. O gênero blaxploitation deu então continuidade à luta por representação, também tentando criar ambientes e temáticas que reproduzissem relações de identidade e pertencimento da comunidade negra. O gênero projetou diretores como Melvin Van Peebles e Gordon Parks, que dirigiram os sucessos de bilheteria Sweet Sweetback's Baadasssss Song (1971) e Shaft (1971), respectivamente. Os sindicatos de cinema norte-americanos em boa parte do século XX, dificultou e segregou a participação de pessoas negras em todas as etapas da produção cinematográfica, pautados no código Hays8, contudo, a conjuntura contextual das transformações políticas da década de setenta favoreceu iniciativas ousadas como a atitude audaciosa do então ator e diretor Melvin Van Peebles. Van Peebles no final dos anos sessenta insatisfeito com a censura e barreiras na produção dos filmes reuniu diversos profissionais que trabalhavam em sets de longa-metragem (inclusive de filmes pornôs), Peebles convocou vários profissionais negros para filmarem com liberdade de criação e sem os grilhões do código Hays, nascia o movimento blaxploitation. Gênero que expôs na tela do cinema a afirmação racial como um gesto político. Nas obras desse movimento, questões do cotidiano como participação social e política são elucidadas pela iniciativa dos próprios membros dessa comunidade, seja pela atitude proativa do protagonista, seja pela ação de qualquer outro personagem. Em vista disso, o presente projeto almeja compilar indícios que indiquem que os filmes do estilo blaxploitation
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