![Jackson Do Pandeiro](https://data.docslib.org/img/3a60ab92a6e30910dab9bd827208bcff-1.webp)
Suplemento literário do Jornal A União Julho - 2019 Ano LXX - Nº 5 R$ 6,00 Exemplar encartado no jornal A União apenas para assinantes. Nas bancas e representantes, R$ 6,00 Jackson do Pandeiro 100 anos Jornalistas, pesquisadores e artistas trazem à tona a obra e a intimidade do gênio paraibano 6editorial Jackson do Pandeiro faz 100 anos Em meio a resenhas de Um timaço de ta nas lembranças da viúva livros, poemas e artigos, o Neuza Flores e de músicos Correio das Artes abre pas- jornalistas, que conviveram no palco sagem para reverenciar um com ele, ou o viram de per- mestre da música, um gênio pesquisadores, to em apresentações pelo nascido no interior da Pa- Nordeste, em depoimentos raíba, alguém que sincopou historiadores e inéditos que se somam a le- certo por ritmos tortos e des- artistas compõe vantamentos biográficos e ta batida diferente saiu uma memórias que tornam este nova linguagem, reverencia- um relicário exemplar, uma fonte rica da até hoje, 100 anos depois para consulta de fãs, estu- do seu nascimento. de memórias, dantes e apreciadores do le- A edição que você tem em gado do Rei do Ritmo. Tudo mãos é especial. Por ocasião fatos e análises isso orientado pelo melhor do centenário de José Gomes guia que se pode ter na pra- Filho, o Jackson do Pandei- que tornam ça: o pesquisador e biógrafo ro, um timaço formado por do artista, Fernando Moura. jornalistas, pesquisadores, Jackson, um Para coroar o material, historiadores e artistas, que imortal uma seleção exclusiva com conheceram bem o homem e/ 20 músicas que retratam o ou sua obra, compõe um re- talento e a majestade de Jack- licário de memórias, fatos e son do Pandeiro, com comen- análises que tornam Jackson, tários faixa-a-faixa e que o um imortal. de, intrinsecamente ligada leitor poderá ouvi-la a partir Nas próximas páginas, aos batuques do quilombo do seu smartphone, através você irá mergulhar no berço Caiana dos Crioulos, à con- de um QR Code que você en- que trouxe Jackson do Pan- sagração no Rio de Janeiro, contrará na página. deiro ao mundo e a estrada depois de passar por Campi- de sucesso que ele seguiu, da na Grande (PB) e Recife (PE). O editor sua origem em Alagoa Gran- A intimidade do ritmis- [email protected] 6 índice , 38 @ 40 2 42 D 46 SARAU LITERATURA CLARISSER AO RÉS DA PÁGINA Levando poesia e Com misto de 'making of' e Professora Analice Pereira "O sonho é a ficção da performance aos palcos resenha, Roberto Menezes mergulha no universo memória". A partir desta de João Pessoa, grupo disseca 'Carta à Rainha do escritor Leonardo afirmação, o escritor Tiago Evocare é tema de análise Louca', novo romance da Padura a partir do seu Germano avalia o papel do do professor e poeta vencedora do Jabuti, Maria mais recente livro, 'A inconsciente na criação Expedito Ferraz Júnior. Valéria Rezende. Transparência do Tempo' literária. SECRETARIA DE ESTADO DA COMUNICAÇÃO INSTITUCIONAL EMPRESA PARAIBANA DE COMUNICAÇÃO S.A. Naná Garcez de Castro Dória DIRETORA PRESIDENTE Albiege Léa Fernandes Maria Eduarda dos Santos Figueiredo DIRETORA DE MÍDIA IMPRESSA DIRETORA DE RÁDIO E TV Correio das Artes Uma publicação da EPC BR-101 Km 3 - CEP 58.082-010 Distrito Industrial - João Pessoa/PB OUVIDORIA: Phelipe Caldas André Cananéa Paulo Sergio de Azevedo 99143-6762 GERENTE EXECUTIVO DE MÍDIA IMPRESSA EDITOR DO CORREIO DAS ARTES DIAGRAMAÇÃO Domingos Sávio PABX: (083) 3218-6500 / ASSINATURA-CIRCULAÇÃO: 3218-6518 / Comercial: 3218-6544 / 3218-6526 / REDAÇÃO: 3218-6539 / 3218-6509 ARTE DA CAPA 6 jackson 100 anos Turururururur Jack-som-do-Pandeiro ♫♫♫ DO NASCIMENTO EM ALAGOA GRANDE À BOÊMIA EM CAMPINA GRANDE: UM CONTEXTO HISTÓRICO DAS ORIGENS DE JACKSON DO PANDEIRO Vanderley de Brito e Ida Steinmüller Especial para o Correio das Artes ocê bem sabe que a ema quando canta, vem trazendo no seu canto um bocado de azar, e parece que naquele dia de 31 de agosto de 1919, quando nascia o filho do oleiro José Gomes e da cantadora de coco Flora Mourão, a ema gemeu nas circun- V jacências do Engenho Tanques, município de Alagoa Gran- de, no brejo paraibano. Negro, pobre, nordestino, raquítico e da voz fina, anasa- lada, José Gomes Filho tinha tudo para não dar certo. Foi um sinal bem triste, mas parece que nesse momento nas- cituro, enquanto a ema gemia seu agouro no tronco do juremá, na Lagoa do Paó, simultaneamente, o sapo esta- va contente, alegrando o dia com sua toada improvisada em dez pés: Tião, Oi! Foste? Fui! Compraste? Comprei! Pagaste? Paguei! Me diz quanto foi? Foi quinhentos réis. Naquela palhoça, o menino brejeiro veio ao mun- do sob o signo do sincretismo sonoro da tristeza e da alegria, tomando gosto pelo ritmo para se tornar um negrinho de olhar triste, mas com uma capacidade in- TO comum e inigualável de semear alegria. I Sendo supostamente neto de escravos, e certamen- te filho de cantadeira, solto de cangas pelo vale do Mamanguape, o negrinho do Engenho Tanques pas- sou sua infância entre as vocalizações da natureza brejeira misturado aos sons do bumbo, triângulo, ganzá e dos sapateios que animavam os cocos-de- -roda e cirandas, expressões mais vivas da tradição ILUSTRAÇÃO: VANDERLEY DE BR musical de raiz negra escravocrata. Nesse contexto, de clima úmido e festivo, o negrinho se impregnou de sistemática musical simples, replicante, conta- giante e simbiótica com o enlevo jocoso, mordaz e sensual das danças de roda... c | João Pessoa, julho de 2019 4 Correio das Artes – A UNIÃO ARCERVO FERNANDO MOURA c Uê, uê... uê, uá..Uê, uê... uê, uá... A lua vai saí e eu vô girá/ A lua vai saí e eu vô girá. Vou caçá meu tatu, meu ta- manduá/ Vou caçá meu tatu, meu tamanduá. (Lundu de Roda - autor desco- nhecido) Sua infância foi entre o traba- lho na roça, a caieira de tijolos, as brincadeiras de criança e as rodas de coco. Entre os seus, no compasso dessas cantorias que aconteciam vinculadas ao co- tidiano do trabalho de eito e do entretenimento, aos sete anos de idade o negrinho aprendeu a tocar zabumba, iniciando-se na percussão ao substituir o zabum- beiro que acompanhava sua mãe nas apresentações. Tum-tum- -tum, tum-tum-tum... Nascia o percussionista. Talvez você já tenha entendi- do que o negrinho que estamos a falar, no futuro seria considera- do um dos maiores ritmistas da história da música popular bra- sileira. Mas para entender esse Engenho Tanques, em Alagoa fenômeno, nascido nos ermos do um dos 13 legítimos quilombos Grande: avós, supostamente brejo paraibano, é preciso, pri- brasileiros pela Fundação Cultu- escravos, de Jackson do meiro, se reportar às suas raízes ral Palmares. Essa comunidade, Pandeiro ficaram entre os que mais remotas: Pois bem, em tem- que até hoje mantém viva as tra- não foram removidos para o quilombo pos de 1872, um censo feito pelo dições herdadas de seus antepas- Império indicou que a freguesia sados, ainda se brinca e se diverte de Nossa Senhora da Conceição com o coco-de-roda e a ciranda, de Areia, que englobava a re- que aliava canto, dança e alegria gião de Alagoa Grande, com seus (veja mais na página 8). 1.424 escravos, era na Paraíba a Desde pelo menos a década de região com a maior população 1940, a comunidade também já ciaram das ações dos idealistas escravizada. era conhecida pela sua banda ca- abolicionistas e os avós escravos Nesses tempos, dois morado- baçal, que animava festas na sede do negrinho ficaram entre os que res de Areia tomaram a frente no do município de Alagoa Gran- não foram removidos para qui- processo de libertação de escra- de. Provavelmente, os pais do lombo, permaneceram, portanto, vizados: o farmacêutico Manuel menino José Gomes Filho eram no Engenho Tanques, que à épo- Silva e o bacharel Coelho Lisboa, ligados por laços familiares com ca pertencia ao político renoma- que atuaram na organização de esses quilombolas e, sem dúvi- do Apolônio Zenaide. eventos para arrecadar recursos das, muitas vezes o negrinho de Em 1888, com a Lei Áurea, que para a compra de escravizados, engenho acompanhou seus pais permitiu a liberdade de todos os acolhiam escravos fugitivos e até à comunidade, e essas visitas, escravizados, por comodismo ou mesmo incentivavam a fuga de certamente, ficaram mais cons- medo de enfrentar esse mundo cativos. tantes quando o menino passou hostil, muitos escravos se man- Nessa dinâmica idealista, nas- a acompanhar sua mãe na ani- tiveram voluntários nos afazeres ceram os quilombos que circun- mação de festas nos sítios e feiras do engenho. dam a região do brejo paraibano, dos arredores de Alagoa Grande. Em seu livro Menino de Enge- com especial destaque para a co- Ela, tocando ganzá, cantando e nho, José Lins do Rego conta a munidade quilombola de Caiana dançando cocos, e ele, na percus- forma como os negros libertos do dos Crioulos, estabelecida com são do zabumba, como já lhe ex- engenho da sua família “fizeram culturas de subsistência num ter- pomos linhas atrás. muita festa no dia 13 de maio de reno bastante elevado e aciden- É bom que você saiba que os 1888, mas no dia seguinte conti- tado a 12 quilômetros da atual Gomes não eram propriamen- nuaram a trabalhar no campo. cidade de Alagoa Grande, e reco- te quilombolas, pois nem todas Não me saiu do engenho um ne- nhecido, em maio de 2005, como as senzalas da região se benefi- gro só. Para esta gente pobre a c A UNIÃO – Correio das Artes João Pessoa, julho de 2019 | 5 c abolição não serviu de nada”.
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