UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECOLOGIA, CONSERVACÃO E MANEJO DE VIDA SILVESTRE

A ICTIOFAUNA DO RIO SANTO ANTÔNIO, BACIA DO RIO DOCE, MG: PROPOSTA DE CONSERVAÇÃO

FÁBIO VIEIRA

Belo Horizonte/MG 2006

FÁBIO VIEIRA

A ICTIOFAUNA DO RIO SANTO ANTÔNIO, BACIA DO RIO DOCE, MG: PROPOSTA DE CONSERVAÇÃO

Tese apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Ecologia, Conservação e Manejo de Vida Silvestre da Universidade Federal de Minas Gerais como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor em Ecologia, Conservação e Manejo de Vida Silvestre.

Orientador: Prof. Dr. Francisco A. R. Barbosa

Belo Horizonte/MG 2006

2

INSTITUIÇÕES PATROCINADORAS

“The origin of the diversity of tropical fish might be obscure, but the sources of biodiversity losses are clearer: exploitation, habitat destruction and the introduction of exotic species have all played a role in making fish one of the most threatened groups in the world” IUCN, 1996. Red List of Threatened , IUCN (World Conservation Union)

3

Dedico esse trabalho ao meu pai “in memoriam” e minha mãe, que mesmo com ínfimo conhecimento acadêmico se dispuseram a investir longos anos de suas vidas para que seus filhos pudessem trilhar melhores caminhos que os seus. Pai, embora você já não esteja mais fisicamente presente... nunca deixarei de sentir saudades!!!!

4 AGRADECIMENTOS Certamente em um trabalho desenvolvido ao longo de um tempo extenso demais para os padrões atuais, muitos tiveram participação direta ou indireta para que chegasse a termo. Dessa forma, certamente será impossível agradecer a todos, razão pela qual peço desculpas antecipadas por eventuais omissões. A Fundação O Boticário de Proteção a Natureza pelo financiamento e apoio que permitiram o início e conclusão desse trabalho. Ao Programa Espécies Ameaçadas, subsidiado pelo Fundo de Parceria para Ecossistemas Críticos (CEPF) e coordenado pela Fundação Biodiversitas e pelo Centro de Pesquisas Ambientais do Nordeste (CEPAM), pelo financiamento dos estudos com espécies de peixes ameaçados na bacia do rio Doce, parte dos quais ainda se continuam nesse momento. Aos Projetos NEODAT (The Inter-Institutional Database of Fish Biodiversity in the Neotropics), Catalog of Fishes (California Academy of Sciences), Centro de Referência em Informação Ambiental (CRIA) e FishBase pela possibilidade de acesso irrestrito aos bancos de dados sobre espécies de peixes e exemplares depositados em museus. A Agência Nacional de Águas (ANA), pelo acesso ao banco de dados disponibilizado via Hidroweb: Sistema de Informações Hidrológicas, fonte da série temporal de dados pluviométricos, de vazão e físicos e químicos da água na bacia do rio Santo Antônio. Aos amigos incondicionais de sempre, referindo-me aos primórdios desse trabalho Carlos B. M. Alves (Cacá), Luiz A. Rocha (Muminha) e Gilmar B. Santos (Ilgão). Ao Paulo Pompeu, que além da grande amizade auxiliou nas coletas em campo e fez a leitura crítica e sugestões em várias partes do trabalho aqui apresentado. Ao Flávio C. T. Lima, José L. Birindelli e Edson L. Pereira pela ajuda em solucionar algumas identificações, notadamente exemplares depositados no Museu de Zoologia da USP (MZUSP) e da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS. A Volney Vono, Márcia e Renê Hojo que confirmaram informações preciosas sobre a ocorrência de espécies a jusante da UHE Salto Grande. Alexandre L. Godinho (Sam) pelo espaço franqueado e uso incondicional do laboratório e equipamentos.

5 Ao Dr. Francisco A. R. Barbosa pela confiança e disponibilidade em aceitar me orientar, pois mesmo não tendo os peixes como linha de pesquisa direta, sempre defendeu a idéia de estudos integrados que permitissem uma visão mais completa e abrangente dos sistemas aquáticos. Em particular durante os últimos tempos de elaboração da tese, quando as coisas sempre pareciam intermináveis. Ao “Gatulê” pela oportunidade de conhecer a região da Serrinha (Ferros-MG), informações sobre peixes e pesca no rio Santo Antônio além da acolhida em seu sítio. Célio Casemiro de Souza, que foi o primeiro a me falar o nome popular de Henochilus wheatlandii (andirá), indicar locais e contar “causos” de pescadores vividos no rio Santo Antônio. João L. Gasparini (Gaspa) e Renato R. Souza (Galça), grandes amigos que sempre deram força, mas refiro-me especialmente àquelas ajudas virtuais nos sábados e domingos passados em frente a uma tela de computador, quando trocar um e-mail sobre qualquer assunto já representava um alívio. Antônio P. L. S. Almeida (Toninho), pela “saíra-apunhalada no pau-Brasil” que proporcionou risadas providenciais em momentos críticos da redação da tese. A João Pedro (Jota) e Maria Cecília (Ciça), que se dispuseram a “sofrer” minha orientação durante esse período de tese... a chegada de vocês foi muito agradável e recompensadora... bons frutos iremos colher! Aos amigos de laboratório pela convivência, Gisele, Francisco Neto (Xico), Luiz Gustavo (Luizão), Clarissa Chalub, Alexandre (Jequié). Fábio C. Garcia (Capivara), amigo de bons papos, cafés e sofrimento conjunto nessa reta final de tese. Aos grandes amigos e excelentes pescadores Ivanildo A. Figueiredo (Moreno), Ivo A. Figueiredo e Dedé (in memorian), sem os quais muitos peixes sequer estariam figurando nesse trabalho. À banca examinadora composta pelos professores doutores Ângelo Antônio Agostinho, Francisco Langeani Neto, Paulina Maia-Barbosa e Alexandre Lima Godinho pelas discussões e contribuições ao documento final. Por último, mas não em último, a Queila agradecimento especialíssimo, pela companheira inseparável e sempre disposta a ajudar, mas principalmente pela paciência nos últimos tempos... que reconheço, se foram difíceis para mim... ela que o diga o quanto sofreu!!!

6 Sumário RESUMO ...... 8 ABSTRACT...... 9 INTRODUÇÃO GERAL...... 10 A BACIA DO RIO SANTO ANTÔNIO...... 12 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...... 20 CAPÍTULO 1...... 23 COMUNIDADES DE PEIXES NA DRENAGEM DO RIO SANTO ANTÔNIO, BACIA DO RIO DOCE, MG...... 24 RESUMO ...... 24 INTRODUÇÃO...... 24 METODOLOGIA ...... 26 ÁREA DE ESTUDO ...... 26 AMOSTRAGEM DA ICTIOFAUNA ...... 28 QUALIDADE DA ÁGUA...... 29 ANÁLISE DOS DADOS...... 30 RESULTADOS...... 32 DISCUSSÃO...... 45 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...... 51 CAPÍTULO 2...... 59 DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL E ASPECTOS DA ECOLOGIA DE PEIXES AMEAÇADOS DE EXTINÇÃO NA DRENAGEM DO RIO SANTO ANTÔNIO, BACIA DO RIO DOCE, MG...... 60 RESUMO ...... 60 INTRODUÇÃO...... 60 METODOLOGIA ...... 62 RESULTADOS...... 65 DISCUSSÃO...... 72 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...... 80 CAPÍTULO 3...... 88 ÁREAS PRIORITÁRIAS PARA A CONSERVAÇÃO DA FAUNA DE PEIXES NA DRENAGEM DO RIO SANTO ANTÔNIO, BACIA DO RIO DOCE, MG...... 89 RESUMO ...... 89 INTRODUÇÃO...... 89 CARACTERÍSTICAS DA DRENAGEM E DA ICTIOFAUNA PARA DELINEAMENTO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO...... 91 AS ÁREAS SELECIONADAS PARA CONSERVAÇÃO ...... 95 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...... 99

7 RESUMO Analisamos a riqueza, distribuição e aspectos biológicos das assembléias de peixes que ocorrem na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG. Essa drenagem é reconhecida como prioritária para conservação da diversidade de peixes em Minas Gerais e no bioma da Mata Atlântica. Além da ampliação do conhecimento sobre a ictiofauna, o objetivo do estudo foi selecionar áreas que possam manter a diversidade de peixes nessa drenagem, atualmente ameaçada com a construção de barragens e outros impactos antrópicos. Os dados foram obtidos em estudos de campo e complementados com os registros de exemplares depositados em museus, cobrindo uma série temporal entre os anos de 1989 e 2005. No total foram feitos registros da ictiofauna em 61 pontos, sendo 27 localizados em córregos e 34 na calha central do Santo Antônio e de seus maiores afluentes. Nossos resultados indicaram que a bacia do rio Santo Antônio abriga mais espécies de peixes nativas (57 sp.) que qualquer área de tamanho comparável na bacia do rio Doce. Desse total, pelo menos dez são novas para a ciência. A ictiofauna também inclui todas as espécies ameaçadas de extinção na bacia do rio Doce, e para as quais são necessárias ações destinadas à conservação (andirá – Henochilus wheatlandii; timburé – Leporinus thayeri; pirapitinga – Brycon opalinus; piabanha – B. devillei e surubim-do-Doce – Steindachneridion doceanum). A maioria das espécies exóticas apresentou distribuição restrita ao baixo rio Santo Antônio, a jusante da UHE Salto Grande. Principais impactos antrópicos são a construção de barragens, introdução de peixes exóticos, retirada da vegetação ciliar e assoreamento. Atualmente, pelo menos duas subdrenagens (rios Guanhães e Tanque) e a parte baixa do rio Santo Antônio não mantêm mais características apropriadas para o desenvolvimento de programas de conservação. Com base nos resultados obtidos foram identificadas três áreas distribuídas ao longo do canal principal e tributários, as quais em conjunto deverão manter a maior parte da ictiofauna registrada na bacia. A estratégia de conservação indicada para essas áreas foi a transformação em Áreas de Proteção Ambiental (APA). Essa nova condição regional inviabiliza a implantação de quatro pequenas centrais hidrelétricas, que em seu conjunto representam 16,4% do potencial energético inventariado para a bacia. Entretanto, mesmo com implicações econômicas negativas, essas obras devem ser consideradas fora de um planejamento regional onde o objetivo seja a manutenção desse importante componente da ictiofauna neotropical.

8 ABSTRACT

Species richness, distribution, and biological features of freshwater fish assemblages were analyzed within the Santo Antônio River drainage, Doce River basin, Minas Gerais state. Santo Antônio’s drainage is recognized as one of the conservation priority areas for fish diversity in Minas Gerais state and Atlantic rain forest biome. In addition to the increasing knowledge of its ichthyofauna, the aim of this study was to identify significant areas that could support fish diversity in the drainage, which is threatened by dam’s construction and other anthropogenic impacts. Data were obtained during field surveys and complemented with those registered in museum, embodying a temporal series from 1989 to 2005. Fishes were caught in 61 sampling sites, 27 of which in streams and 34 in the main channel of Santo Antônio River and its tributaries. Our results suggested that Santo Antônio River supports more native fishes (57 species) than any other area of comparable size in the Doce River basin. We found at least ten new species among the collected species, including also all threatened species from Doce River, for which conservation measures are needed (andirá - Henochilus wheatlandii; timburé - Leporinus thayeri; pirapitinga - Brycon opalinus; piabanha - B. devillei and surubim-do-Doce - Steindachneridion doceanum). Most of exotic species were restrict to low stretches of Santo Antônio River, below the Salto Grande Hydropower Plant. The major impacts in the Santo Antônio River Basin are dam construction, introduction of exotic species, clearing of the riparian vegetation and silting. Guanhães and Tanque Rivers and the low stretch of Santo Antônio River were not considered for conservation programs as they showed a relative high degree of degradation. Our results support the selection of three areas in the main channel and tributaries that together can maintain most of the ichthyofauna recorded in the drainage. As a conservation strategy we suggest their establishment as Environmental Protection Areas (EPA). This new regional scenario would not permit the implementation of four small hydropower projects which together represents 16.4 % of the energy powerful in the Santo Antônio River Basin.

9 INTRODUÇÃO GERAL

Existe um consenso de que as possibilidades de manutenção da biodiversidade a longo prazo aumentarão com o estabelecimento de um planejamento para conservação em escala regional ou que contemple grandes unidades de paisagem (Conservation International, 2000a). Estratégias para a conservação da diversidade biológica ao nível global foram representadas pela Agenda 21 Global e pela Convenção sobre a Diversidade Biológica (IUCN, 1994). Entre as metodologias empregadas estão aquelas destinadas a definir hotspots, áreas de alta biodiversidade e sob alta pressão antrópica (Myers, 1988, 1990; Myers et al., 2000), os programas de avaliação rápida (RAP’s), desenvolvidos pelo Conservation International (Willink et al., 2000) e a realização de workshops para definição de áreas prioritárias para a conservação.

Os workshops têm abordado unidades geográficas diferentes, incluindo grandes biomas, subconjuntos regionais de ecossistemas ou países isoladamente. No Brasil, foram realizados diversos eventos dessa natureza, sendo que dois destes abrangeram a bacia do rio Santo Antônio (Figuras 1 e 2; Costa et al., 1998, Conservation International, 2000b; Drummond et al., 2005), que foi objeto do presente estudo. Um ponto comum desses workshops é que os mesmos representam uma importante ferramenta para captação e aplicação dos recursos disponíveis para conservação, assim como para direcionamento das atividades de pesquisa.

Figura 1 – Áreas prioritárias para conservação da fauna de peixes no estado de Minas Gerais conforme definidas em 1998 (esquerda) e 2005 (direita). As áreas que abrangem o rio Santo Antônio são indicadas pelas setas. Fonte: Costa et al. (1998), Drummond et al. (2005)

10

Figura 2 – Áreas prioritárias para conservação da fauna de peixes na Mata Atlântica e nos Campos Sulinos, sendo que a drenagem do rio Santo Antônio está indicada pela seta. Fonte: Conservation International (2000b). Também deve ser considerado que na prática da conservação, informações como riqueza de taxa indicadores, endemismos e riqueza total de espécies têm sido utilizadas para identificar possíveis áreas de conservação (Landres, 1988; Curnutt et al., 1994; van Jaarsveld et al., 1998). Adicionalmente, as características regionais das assembléias de espécies e a probabilidade de ocorrência de uma dada espécie em reservas potenciais também são consideradas em conservação da biodiversidade (Pressey et al., 1993; Wahlberg et al., 1996; Margules & Pressey, 2000).

11 Entretanto, se por um lado definições de diretrizes gerais para a conservação da biodiversidade têm sido ampliadas, os esforços concretos para transformá-las em ações efetivas para conservação ainda permanecem como um objetivo a ser alcançado. Esse fato ficou muito evidente no estado de Minas Gerais, em que perdas significativas de áreas consideradas prioritárias para conservação da fauna de peixes ocorreram no curto espaço de sete anos (Drummond et al., 2005).

No que se refere a ictiofauna, a bacia do rio Santo Antônio atende a alguns requisitos que justificam sua indicação como área prioritária para conservação, destacando-se a ocorrência de diversas espécies endêmicas, ameaçadas de extinção (Vieira et al., 2000; Vieira & Alves, 2001; Castro et al. 2005, Rosa & Lima, 2005) e por apresentar elevada diversidade de espécies.

Neste contexto, definir as áreas que mantêm alta diversidade de espécies constitui o elemento primário para a proteção da biodiversidade (Allan & Flecker, 1993), embora determinar como essas áreas se originaram e são mantidas representa um considerável desafio científico. Assim, após essas áreas serem identificadas serão necessários estudos adicionais, que associados a ações legais, representarão uma forma efetiva de proporcionar a sua manutenção em longo prazo.

Embora exista reconhecimento formal que a bacia do rio Santo Antônio seja uma área de grande importância para peixes no bioma Mata Atlântica, faltam diretrizes básicas para a definição de estratégias de conservação. Este estudo teve como objetivos: i) inventariar e mapear a distribuição das espécies de peixes que ocorrem nessa drenagem e ii) definir as áreas e estratégias de conservação que poderão mantê-las no futuro.

A bacia do rio Santo Antônio

A bacia do rio Doce possui área total de aproximadamente 82.000 km2, dos quais 86% no estado de Minas Gerais. Suas nascentes estão em um dos contrafortes da Serra do Espinhaço, no município de Ressaquinha, a 1220 m de altitude. Em Minas Gerais seus principais afluentes pela margem direita são os rios Chopotó, Casca, Matipó, Cuieté e Manhuaçu, enquanto pela margem esquerda são os rios Piracicaba, Santo Antônio, Corrente Grande e Suaçuí Grande (CETEC, 1983).

O rio Santo Antônio nasce nas proximidades da Serra Tromba D’Anta, no município de Conceição do Mato Dentro. Tem como principais formadores os rios do

12 Peixe, Preto do Itambé, Guanhães e Tanque e uma área total de drenagem de 10.390 km2. A totalidade da drenagem do rio Doce encontra-se inserida no bioma Mata Atlântica, atualmente reduzido a menos de 8% de sua área original (Conservation International, 2000b). Segundo Espindola (2005), a cobertura vegetal da bacia do rio Doce conservou-se de forma significativa até o início da década de 1930, concentrando- se nas três décadas seguintes a fase de devastação generalizada. Esse processo resultou em intensa fragmentação florestal, como pode ser observado na drenagem do rio Santo Antônio, onde atualmente a maior densidade de remanescentes encontra-se nas cabeceiras, principalmente em áreas elevadas na vertente da cadeia do Espinhaço (Figura 3).

Figura 3 – Remanescentes florestais da mata atlântica na bacia do rio Santo Antônio. A linha pontilhada indica a área principal de inserção da bacia. Fonte: http://www.sosmatatlantica.org.br/?secao=atlas (outubro/2005)

Drenagens

Área Urbana

Remanescente florestal Nessa bacia existem três usinas hidrelétricas (UHE’s) de médio e grande porte em funcionamento: Salto Grande e Porto Estrela (calha do Santo Antônio) e Dona Rita (rio do Tanque). Além dessas, pelo menos mais doze foram incluídas no inventário da Eletrobrás (Eletrobrás, 1999) (Figura 4). Parte desses aproveitamentos já foi estudada e

13 os processos de licenciamento encontram-se em tramitação na Fundação Estadual de Meio Ambiente de Minas Gerais (FEAM-MG).

o o v

v 44 00’ v 42 00’

18o30’

v

v v

v

v v Cadeia de montanhas o

ç Cidades

a

v

h v Cursos d’água n i p Guanhães UHE’s implantadas s rio

E UHE’s em estudo

v

v Co rren

te de r an

i Gr v

o v v rio P G

a Conceição do u

ra r a uninha Mato Dentro io n v h v ã d e o s e ri c o o

D P io Senhora da v ôn e nt ix A Penha

o Sa e Ferros

d nto Belo

Oriente

v

v bé Itam S. Sebastião do o Rio Preto ri

o v P d

Parque Nacional da reto

o ue

ri nq v Serra do Cipó v a o T Itambé do d Ipatinga

Mato Dentro o

rio o v 19 30’ v ba a a i ic

c e 0 20 e a

ir c

P o

d

Itabira rio D a v km Antônio Dias

C

o

i

r

Figura 4 – Mapa de localização da bacia do rio Santo Antônio indicando os prováveis eixos de usinas hidrelétricas conforme apresentado em Eletrobrás (1999 As UHE’s de Salto Grande e Porto Estrela foram construídas na calha do Santo Antônio, em um trecho que pode ser considerado como um divisor do rio em porções distintas com relação às suas características fisiográficas. O seu baixo curso, desde a UHE Porto Estrela até a foz no rio Doce, com cerca de 47 km, apresenta menor profundidade e leito recoberto predominantemente por areia. Essa condição fica ainda mais evidente com a operação diária dessas usinas, quando parte do leito fica exposta

14 pelo rebaixamento da lâmina d’água. No restante da drenagem, localizado acima do barramento da UHE Salto Grande, o leito é predominantemente rochoso, apresentando extensas áreas de corredeiras intercaladas com poções mais profundos. Nesse trecho, existem afluentes que drenam diretamente da cadeia do Espinhaço e possuem características únicas dentro da bacia, apresentando águas de cor escura e pH ligeiramente ácido (Galdean et al., 2000) (Figura 5). A coloração da água foi elemento preponderante na toponímia local, tanto no que se refere a nomes de rios como de municípios. Na bacia do rio Doce, excetuando-se a drenagem do rio Santo Antônio, essa característica (águas pretas) somente é observada em um pequeno afluente do rio Santa Bárbara, drenagem do rio Piracicaba, e cujas nascentes estão na Serra do Caraça, também na cadeia do Espinhaço.

Figura 5 – Visão geral de um trecho do rio Preto do Itambé, que possui águas de coloração escura e leito rochoso. A bacia do rio Santo Antônio ocupa uma área com precipitações totais entre 900 e 1500 mm anuais (Figura 6). O período de chuvas se estende de novembro a março, com precipitação total mensal que pode superar 500 mm, enquanto o período seco característico vai de maio a setembro, com meses sem qualquer chuva (Figura 7). Os meses de abril e outubro podem ser caracterizados como de transição entre esses

15 períodos. Conforme pode ser observado, os valores de precipitação total mensal são semelhantes, seja na parte baixa, média ou alta da bacia.

ü

Figura 6 – Precipitação total anual em milímetros para as séries históricas entre 1931 e 1990. A bacia do rio Santo Antônio está indicada pela seta. Fonte: INMET – Instituto Nacional de Meteorologia, consultado em 2005 http://www.inmet.gov.br/climatologia/combo_climatologia_C.html

16 600

500

400

300 Naque 200

100

0

600

500

400

300 Ferros 200

100

0

600 Precipitação (mm) 500

400

300

200

100

Conceição do Mato dentro Conceição do Mato 0 Jan-1992 Jan-1994 Jan-1996 Jan-1998 Jan-2000 Jan-2002 Jan-2004 Jan-1993 Jan-1995 Jan-1997 Jan-1999 Jan-2001 Jan-2003 Jan-2005 Mês/Ano Figura 7 – Precipitação total mensal (mm) no período de jan/1992 a out/2005 em três postos fluviométricos localizados nos trechos baixo (Naque), médio (Ferros) e alto (Conceição do Mato Dentro) da bacia do rio Santo Antônio. Fonte: http://hidroweb.ana.gov.br/

O regime pluviométrico resulta em vazões diárias que podem chegar até 2.658 m3/s próximo à foz, medidos na estação fluviométrica de Naque Velho. O padrão de cheia no rio é similar, tanto nas cabeceiras como junto à foz (Figura 8). As duas UHE’s existentes na calha do Santo Antônio não exercem regulação de fluxo sazonal, operando com vazões que alteram somente as descargas diárias.

17 45 Mediana A Percentis 25%-75% 40 Mín-Máx

35

30 /s) 3 25

20 Vazões (m

15

10

5

0 Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Meses

1000 B Mediana Percentis 25%-75% Mín-Máx 800

600 /s) 3

Vazão (m 400

200

0 Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Meses Figura 8 - Vazões médias mensais obtidas para as séries históricas em dois postos fluviométricos localizados na bacia do rio Santo Antônio: (A) Conceição do Mato Dentro, cabeceira - jan/1947 a dez/2001 (B) Naque Velho, foz - jan/1975 a dez/2001. Fonte: http://hidroweb.ana.gov.br/ A temperatura média anual está entre 21 e 24 ºC, enquanto as máximas chegam a 30ºC e as mínimas a 15ºC (Figura 9).

18

ü

ü

ü

Figura 9 – Climatogramas referentes às temperaturas, máxima, mínima e média anual. A localização da bacia do rio Santo Antônio está indicada por uma seta. Fonte: INMET – Instituto Nacional de Meteorologia, acesso em 2005 http://www.inmet.gov.br/climatologia/combo_climatologia_C.html

19 O rio Santo Antônio, na região da sua foz, apresentou índice de qualidade das águas (IQA) no nível médio em 2002, 2003 e 2004 (IGAM, 2005). Fatores que mais contribuíram para estes resultados foram coliformes fecais e a turbidez. Como pode ser observado na Figura 10, existe correlação negativa significativa entre o aumento da vazão no período chuvoso e o IQA, condição verificada ao longo dos anos e que está associada ao arraste de material para a calha do rio. Contaminação por tóxicos no rio Santo Antônio foi detectada para fenóis, cujos valores estiveram acima do limite legal nas duas campanhas realizadas em 2004 (IGAM, 2005).

85

80 r = - 0,77 p < 0,001

75

70

65

60

55

Índice de Qualidade Água (IQA) Índice 50

45

40 0 50 100 150 200 250 300

3 Vazão (m /s) Figura 10 – Relação entre IQA e as vazões do rio Santo Antônio (estação RD 039) no período de março/1998 a outubro/2004. Fonte: IGAM (2005) com modificações.

Referências bibliográficas Allan, J. D. & Flecker, A. S. 1993. Biodiversity conservation in running waters: identifying the major factors that threaten destruction of riverine species and ecosystems. BioScience, 43(1): 32-43 Castro, R. M. C.; Vari, R. P.; Vieira, F. & Oliveira, C. 2004. Phylogenetic analysis and redescription of the genus Henochilus (Characiformes: Characidae). Copeia, 2004 (3): 496–506 Cetec, 1983. Diagnóstico Ambiental do Estado de Minas Gerais. Série Publicações Técnicas, 10. 158p.

20 Conservation International, 2000a. Planejando paisagens sustentáveis: a Mata Atlântica Brasileira. Conservation International & Instituto de Estudos Sócio- Ambientais do Sul da Bahia. 28 p. Conservation International, 2000b. Avaliação de ações prioritárias para a conservação da biodiversidade da Mata Atlântica e Campos Sulinos. Ministério do Meio Ambiente, Brasília, 40 p. Costa, M. R. C.; Hermann, G.; Martins, C. M.; Lins, L. V. & Lamas, I. R. 1998. Biodiversidade em Minas Gerais: um atlas para sua conservação. Belo Horizonte: Fundação Biodiversitas, 94 pg. Curnutt, J.; Lockwood, J.; Luh, H. K.; Nott, P. & Russel, G. 1994. Hotspots and species diversity. Nature, 367: 326-327 Drummond, G. M.; Martins, C. S.; Machado, A. B. M.; Sebaio, F. A. & Antonini, Y. 2005. Biodiversidade em Minas Gerais: um Atlas para sua conservação. 2ª. Ed., Belo Horizonte, Fundação Biodiversitas. 222p. Eletrobrás, 1999. Mapa do potencial hidrelétrico brasileiro: usinas acima de 10 MW. Espindola, H. S. 2005. Sertão do rio Doce. EDUSC, Bauru, SP, 485 p. Galdean, N.; Callisto, M. & Barbosa, F. A. R. 2000. Lotic ecosystems of Serra do Cipó, southeast Brazil: water quality and a tentative classification based on the benthic macroinvertebrate community. Aquatic Ecosystem Health and Management, 3 (4): 545-552 IGAM, 2005. Relatório de monitoramento das águas superficiais na Bacia do Rio Doce em 2004. Instituto Mineiro de Gestão das Águas, Belo Horizonte, IGAM, 233p. IUCN, 1994. A guide to the convention on biological diversity. Gland, IUCN Landres, P. B.; Verner, J. & Thomas, J. W. 1988. Ecological uses of vertebrate indicator species: a critique. Conservation Biology, 2: 316-328 Margules, C. R. & Pressey, R.L. 2000. Systematic conservation planning. Nature, 405: 243-253 Myers, N. R. 1988. Threatened biotas: hotspots in tropical forests. The Environmentalist, 8: 178-208 Myers, N. R. 1990. The biodiversity challenge: expanded hotspots analysis. The Environmentalist, 10: 243-256 Myers, N.; Mittermeier, R. A.; Mittermeier, C. G.; Fonseca, G. A. B. & Kent, J. 2000. Biodiversity hotspots for conservation priorities. Science 403: 853-858.

21 Pressey, R. L.; Humpries, C. J.; Margules, C. R, Vane-Wright, R. I & Williams, P. H. 1993. Beyond opportunisms: key principles for systematic reserve selection. Trends in Ecology & Evolution 8: 124-128 Rosa, R. S. & Lima, F. C. T. 2005. Peixes. pp . 65-81 in. Machado, A. B. M.; Martins, C. S. & Drummond, G. M. (eds.) Lista da Fauna brasileira ameaçada de extinção: incluindo as espécies quase ameaçadas e deficientes em dados. Fundação Biodiversitas, Belo Horizonte, 160p. van Jaarsveld, A. S.; Freitag, S.; Chown, S. L.; Muller, C.; Koch, S.; Hull, H.; Bellamy, C.; Krüger, M.; Younga, S. E.; Mansell, M. W. & Scholtz, C. H. 1998. Biodiversity Assessment and Conservation Strategies. Science, 279: 2106-2108 Vieira, F. & Alves, C. B. M. 2001. Threatened fishes of the world: Henochilus wheatlandii Garman, 1890 (Characidae). Environmental Biology of Fishes 62 (4): 414 Vieira, F.; Alves, C. B. M. & Santos, G. B. 2000. Rediscovery and first record of Henochilus wheatlandii (Teleostei: Characidae) a rare Neotropical fish, in Doce river basin, southeastern Brazil. Ichthyological Exploration of Freshwaters 11(3): 201-206 Wahlberg, N.; Moilanen, A. & Hanski, I. 1996. Predicting the occurrence of species in fragmented landscapes. Science, 273: 1536-1538 Willink, P. W.; Chernoff, B.; Alonso, L. E.; Montambault, R. & Lourival, R. (eds.) 2000. A biological assessment of the aquatic ecosystems of the Pantanal, Mato Grosso do Sul, Brasil. RAP Bulletin of Biological Assessment 18. Conservation International, Washington, DC

22

CAPÍTULO 1

23 COMUNIDADES DE PEIXES NA DRENAGEM DO RIO SANTO ANTÔNIO, BACIA DO RIO DOCE, MG

RESUMO Foi realizado um inventário sistematizado da ictiofauna na drenagem do rio Santo Antônio, segundo maior afluente do rio Doce, desde suas cabeceiras até a foz, com o objetivo de determinar suas características de distribuição longitudinal, altitudinal e entre ambientes. Os dados foram obtidos em trabalhos de campo e registros em museus, cobrindo uma série temporal entre os anos de 1989 e 2005. Foram confirmados registros de 71 espécies, das quais 14 são exóticas. Parcela considerável das espécies apresentou algum grau de endemismo ou estão ameaçadas de extinção. Predominaram espécies nativas de pequeno porte (< 20 cm), enquanto as exóticas atingem em sua maioria tamanhos superiores a 30 cm. A diversidade de espécies apresentou diferenças significativas entre seções da drenagem, com maiores valores a montante da UHE Salto Grande, área que também mantém a maior riqueza de espécies nativas e menor número de exóticas. A altitude, a área da drenagem e o tipo de curso d’água influenciaram diretamente a riqueza e distribuição das espécies. Entretanto, o isolamento pela barragem da UHE Salto Grande do trecho médio-alto do rio Santo Antônio, parece ter sido o elemento fundamental para os resultados obtidos. A qualidade da água indicou mudanças sazonais e entre áreas, podendo em algumas drenagens influenciar a ocorrência de espécies. A bacia do rio Santo Antônio é a que abriga a maior riqueza de espécies nativas por unidade de área dentro da bacia do rio Doce, confirmando sua indicação como de extrema importância para conservação da diversidade de peixes do leste brasileiro. Projetos de aproveitamento hidrelétricos propostos para a bacia necessitam serem avaliados em um contexto mais amplo que a realidade local, pois implicam na perda de qualidade ambiental e impossibilidade de manter a ictiofauna registrada atualmente.

INTRODUÇÃO Informações sobre a distribuição e requerimentos de hábitats das espécies ou comunidades de peixes são necessárias para conservação, determinação do potencial para restauração da biodiversidade e previsão dos efeitos do manejo de ambientes aquáticos e terrestres em determinada drenagem (Jowett & Richardson, 2003).

24 A região sudeste do Brasil possui diversos rios que drenam diretamente para o oceano Atlântico e que foram agrupados em um contexto geral por diferentes autores como “leste brasileiro” (Gery, 1969; Menezes, 1972; Ringuelet, 1975). Mais recentemente, Paiva (1982) definiu como drenagens de leste aquelas existentes desde o sul da foz do rio São Francisco até o Paraíba do Sul. Essas drenagens, embora tratadas rotineiramente como grandes unidades, possuem características diferenciadas quanto à composição da fauna de peixes, sendo que os estudos disponíveis demonstram que a riqueza de espécies e o grau de endemismo por bacia são bastante diferenciados (Menezes, 1988; Vari, 1988; Bizerril, 1994; Godinho et al., 1999; Bizerril & Primo, 2001; Oyakawa et al., 2006). Essa constatação indica que as estratégias conservacionistas devem ser desenvolvidas para cada uma das bacias separadamente, visto que as necessidades das comunidades locais podem ser diferenciadas. Embora o leste brasileiro seja importante área mantenedora de diversidade de peixes de água doce, ainda não foram realizados estudos completos sobre a composição e distribuição dos peixes em grande parte das drenagens que compõem essa região. Essa condição, que determina um conhecimento fragmentado acerca da distribuição das faunas existentes, se reflete de forma negativa frente aos esforços conservacionistas, impedindo que esse importante componente da biota neotropical possa ser mantido em longo prazo. Para o rio Doce, a maioria dos estudos com peixes disponíveis na literatura se concentrou no seu curso médio, principalmente no sistema de lagos existentes dentro do Parque Estadual do Rio Doce e entorno (Sunaga & Verani, 1991; Vieira, 1994; Godinho, 1996; Vono & Barbosa, 2001; Latini & Petrere, Jr., 2004; Espíndola et al., 2005), se estendendo ao seu maior afluente nessa região, o rio Piracicaba (Barbosa et al., 1997, Vieira et al., 2000). Entretanto, devido a uma série de estudos ambientais conduzidos para construção de usinas hidrelétricas na drenagem do rio Doce, pode-se admitir que existe um conhecimento relativamente amplo sobre a composição das espécies da bacia. As informações geradas nesses estudos, aliadas àquelas da literatura, foram primordiais para uma estimativa inicial do número de espécies de peixes nativos (64 sp.) que existe na porção mineira da bacia do rio Doce e fundamentaram a seleção de áreas prioritárias para conservação da ictiofauna (Drummond et al., 2005).

Entre as áreas selecionadas como prioritárias para conservação da fauna de peixes em Minas Gerais está a bacia do médio-alto rio Santo Antônio, segundo maior

25 afluente do rio Doce e que abriga diversas espécies endêmicas, ameaçadas de extinção (Vieira et al., 2000; Vieira & Alves, 2001; Castro et al., 2004, Rosa & Lima, 2005), além de possuir elevada riqueza ictiofaunística. Embora essa bacia atenda a diferentes requisitos para ser indicada como uma área prioritária para conservação, diversos aspectos da sua ictiofauna ainda carecem de avaliação. Entre esses, está o conhecimento ainda incompleto da distribuição das espécies na drenagem e a taxonomia em nível específico, que segundo discussão apresentada em Vari & Weitzman (1990) e Vari & Malabarba (1998), representam limitações importantes para os estudos de biogeografia histórica com peixes neotropicais. O objetivo desse estudo foi realizar um inventário sistematizado das comunidades de peixes que ocorrem na drenagem do rio Santo Antônio, desde suas cabeceiras até a foz, para determinar suas características de distribuição longitudinal, altitudinal e entre ambientes. Adicionalmente, os resultados obtidos permitirão estabelecer uma base de dados que no futuro poderá ser usada para avaliar mudanças nas comunidades de peixes induzidas por ações antrópicas dentro da drenagem, notadamente aquelas relacionadas aos barramentos.

METODOLOGIA

Área de estudo

O rio Santo Antônio nasce nas proximidades da Serra Tromba D’Anta, no município de Conceição do Mato Dentro. Tem como principais formadores os rios do Peixe, Preto do Itambé, Guanhães e Tanque e uma área total de drenagem de 10.390 km2 (Figura 1) (Cetec, 1983). Representa 12,6% da drenagem do rio Doce, sendo seu segundo maior afluente (HIDROTEC – http://www.ufv.br/dea/hidrotec - outubro 2005). Toda a bacia encontra-se inserida no bioma Mata Atlântica, formação florestal que se encontra reduzida para menos de 8% de sua área original (Conservation International, 2000a). Atualmente, os maiores remanescentes florestais existentes na drenagem encontram-se nas cabeceiras, principalmente em áreas elevadas na vertente da cadeia do Espinhaço (SOS Mata Atlântica - http://www.sosmatatlantica.org.br/?secao=atlas - outubro/2005). Afluentes que drenam essa região possuem características únicas dentro da bacia, com águas de cor escura e pH ligeiramente ácido (Galdean et al., 2000). Na bacia do rio Doce, ambiente similar ocorre somente na drenagem do rio Piracicaba, em um pequeno afluente do rio Santa Bárbara, cujas nascentes também se encontram na cadeia do Espinhaço.

26

v v v v o

v v v v v v v v 42 00’

18o30’

v v v v

v v v v v v v

v Pontos de coleta

v v v v

v v v v v v v v

o Cadeia de montanhas

ç

v v v v

v v v a v Cidades h n i Guanhães Cursos d’água p rio

s UHE’s implantadas v v v v

v v v v E

Co

rren

r te

i G

v v v v o

r v v v v v v v v an rio de P G

a Conceição do u

ra r a

uninha Mato Dentro io n v v v v h

v v v v ã d e o s r e io

oc

D

P io Senhora da v v v v tôn

e An

ix Penha o o o

o Sa e Ferros Belo d d d

d nto

Oriente

v v v v

v v v v é

amb S. Sebastião do

It o

Rio Preto ri

v v v v do Pre

Parque Nacional da to e

rio nqu v v v v v v v Serra do Cipó v a o T Itambé do d Ipatinga Mato Dentro

rio o v v v v

19 30’ v v v v ba a a

i ic

e e e

c e 0 20

e a

c c c

o ir c

o o o

P o

44 00’ d

D D D

Itabira rio D a v v v v km

Antônio Dias

C

o

i

r

Figura 1 – Parte dos pontos de amostragem da ictiofauna na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG.

O rio Santo Antônio pode ser dividido em duas seções com características fisiográficas distintas: o baixo curso, da foz até cerca de 47 km acima, apresenta menor profundidade e declividade, além de leito recoberto predominantemente por areia. No restante da drenagem o leito é principalmente rochoso, com extensas áreas de corredeiras intercaladas com poções mais profundos. Dividindo essas seções do rio encontram-se as duas maiores usinas hidrelétricas da bacia, Salto Grande e Porto Estrela, cujo funcionamento foi iniciado em 1956 e 2001, respectivamente. As precipitações totais variam entre 900 e 1500 mm anuais (INMET – Instituto Nacional de Meteorologia, ( INMET - http://www.inmet.gov.br/climatologia/combo_climatologia_C.html consultado em 2005). O período de chuvas se estende de novembro a março, com precipitação total mensal que pode superar 500 mm, enquanto o período seco característico vai de maio a setembro. Os meses de abril e outubro podem ser caracterizados como de transição entre esses períodos (Hidroweb, http://hidroweb.ana.gov.br/ consultado em 2005)

27 Segundo a classificação de Köppen e de acordo com a distribuição regional de climas em Minas Gerais (Antunes, 1986), na maior parte da bacia do rio Santo Antônio predomina o clima Cwa, definido como temperado chuvoso (mesotérmico), com inverno seco e verão chuvoso. Segundo IGAM (2005), o rio Santo Antônio a montante da confluência com o rio Doce (estação RD 039), apresentou índice de qualidade das águas (IQA) no nível médio nos anos de 2002 a 2004. Coliformes fecais e a turbidez foram os fatores que mais contribuíram para o decréscimo dos valores de IQA, o qual apresenta correlação negativa com o aumento da vazão. Deve-se destacar que esses resultados se referem somente uma estação de amostragem localizada próximo à foz, sendo que o restante da drenagem pode apresentar condição diferenciada.

Amostragem da ictiofauna A área de estudo compreendeu toda a drenagem do rio Santo Antônio, desde sua foz até os afluentes localizados nas áreas mais elevadas próximo às nascentes (Figura 1). No total foram feitos registros da ictiofauna em 61 pontos, sendo 27 localizados em córregos e 34 na calha tanto do Santo Antônio e de seus maiores afluentes. Os dados foram obtidos em amostragens distribuídas em períodos distintos ao longo dos anos de 1991-1996, 1999 e 2000-2005, sendo que a intensificação dos estudos foi conduzida entre 2002 e 2005. Adicionalmente às amostragens em campo conduzidas especificamente para esse estudo, foram levantados todos os registros disponíveis de peixes coletados na bacia do rio Santo Antônio e que possuem exemplares testemunhos depositados em museus que mantêm suas coleções disponíveis para consulta através da rede mundial de computadores (Internet): Museu Nacional (MNRJ), Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo (MZUSP) e Museu de Ciências e Tecnologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (MCP). Os dados foram obtidos através de consultas ao Projeto NEODAT III (http://www.mnrj.ufrj.br/search1c.htm) e ao Centro de Referência em Informação Ambiental, CRIA (http://splink.cria.org.br/simple_search?criaLANG=pt). Coletas quantitativas na calha dos rios foram realizadas com redes de emalhar com tamanhos de malha de 24, 30, 40, 50, 60, 70, 80, 100 e 120 mm (medidos entre nós opostos). As redes sempre foram armadas à tarde e retiradas na manhã do dia seguinte, permanecendo na água por aproximadamente 12 horas. Nos córregos e ribeirões as

28 amostragens foram realizadas com peneiras (malha 2 mm) e tarrafas (malha 3 e 5 cm), artefatos que também foram empregados em rios maiores. Todos os exemplares capturados foram separados por local de captura e acondicionados em sacos plásticos e imediatamente fixados com formalina a 10%. No laboratório os peixes foram identificados ao menor nível taxonômico possível e medidos (comprimento padrão em mm), sendo então transferidos para álcool 70° GL. Para a determinação taxonômica foram utilizados trabalhos que abordam a ictiofauna da bacia do rio Doce, além de comparações com material disponível de outras bacias que abrigam espécies similares. Algumas espécies foram mantidas com a designação “cf.”, pois as diagnoses não permitiram reconhecer com exatidão os peixes analisados. Alguns exemplares, mesmo após consulta a especialistas, continuaram sem determinação específica, razão pela qual foram mantidos no nível genérico ou em categoria taxonômica superior. Os nomes científicos e autores das espécies seguem aqueles empregados nas descrições originais, atualizados através de Reis et al. (2003) e Eschmeyer (1998), cuja obra pode ser consultada em: http://www.calacademy.org/research/ichthyology/catalog/fishcatsearch.html. A diferenciação entre espécies exóticas e nativas foi feita com base na literatura, principalmente os trabalhos de Reis et al. (2003) e Alves et al. (no prelo).

Qualidade da água Dados relativos à qualidade da água foram obtidos junto ao Sistema de Informações Hidrológicas (Hidroweb) mantido pela Agência Nacional de Águas (ANA) em http://hidroweb.ana.gov.br/. Deste banco de dados foram selecionados o pH, temperatura da água (oC), oxigênio dissolvido (mg/l), sólidos totais em suspensão (mg/l), condutividade (µs/cm), turbidez (NTU), coliformes totais e fecais (NMP/100ml). A série temporal utilizada abrange os anos de 1993 a 2005, sendo que os dados foram obtidos com periodicidade mínima semestral em cinco pontos localizados ao longo da drenagem (Tabela I).

29 Tabela I – Características das estações onde foram realizadas amostragens para parâmetros físicos, químicos e biológicos na bacia do rio Santo Antônio.

Nome original da estação Dom Joaquim Fazenda Barraca Senhora do Conceição do Ferros Naque Velho Porto Mato Dentro

Código adotado nesse Peixe Tanque Guanhães Sto. Antônio 1 Sto. Antônio 2 Sto. Antônio 3 estudo

Rio do Peixe do Tanque Guanhães Santo Antônio Santo Antônio Santo Antônio

Município Dom Joaquim Ferros Senhora do Conceição do Ferros Açucena Porto Mato Dentro

Responsável/Operadora ANA/CPRM ANA/CPRM ANA/CPRM ANA/CPRM ANA/CPRM ANA/CPRM

Altitude (m) 648 482 581 501 477 240

Área de Drenagem (km2) 972 1280 1521 301 4058 10170 Fonte: Sistema de Informações Hidrológicas (Hidroweb) em http://hidroweb.ana.gov.br/ Para efeito comparativo com os dados referentes a ictiofauna, também foram registradas as características de cada ponto de amostragem no que se refere a tipo de curso d’água (córrego/ribeirão ou rio1), altitude (m) obtida através de GPS e confirmada em cartas topográficas do IBGE na escala 1:50.000 e coloração da água.

Análise dos dados Como indicador de riqueza foi utilizado o número total de espécies registrado em cada ponto de amostragem. O comprimento total máximo das espécies foi obtido em Reis et al. (2003) e Froese & Pauly (2005), e quando não disponível foi utilizado dos exemplares registrados durante os trabalhos. Dados foram expressos com base na distribuição de freqüência de espécies por classes de tamanho considerando-se exóticas e nativas separadamente. Para cálculo da diversidade de espécies foi utilizado o índice de Shannon, S H' =− ∑ ()*(log)pin pi , onde: S = número total de espécies na amostra; i = espécie 1, i=1 2 ... na amostra; pi = proporção de indivíduos da espécie i na amostra (Magurram, 1988). Para essa análise, foram utilizados somente os dados de capturas com redes de emalhar, padronizados através das capturas por unidade de esforço (CPUE), utilizando a

12 equação CPUEi = ∑(Ni / EPm) *100 , onde: CPUE = captura em número por unidade m=2,4

1 As denominações para córrego/ribeirão e rio foram tomadas nas cartas topográficas editadas pelo IBGE. No primeiro caso se referem de forma geral a cursos d’água que não ultrapassam 5 metros de largura e pequena profundidade, enquanto ambientes maiores são reconhecidos como rios.

30 de esforço para a espécie i; N = número total de exemplares da espécie i capturados na 2 malha m; Epm = esforço de pesca, que representa a área em m das redes de malha m; m = tamanho da malha (2,4 a 12 cm). Esse procedimento foi necessário para padronização dos dados, visto que o esforço de pesca foi diferente entre pontos de coleta. As diferenças nos valores de H’ entre áreas foram verificadas através de testes não paramétricos (Kruskall-Wallis e Mann–Whitney), visto que os dados não atendiam aos requisitos de distribuição normal e homogeneidade das variâncias (homocedasticidade) para emprego de análises paramétricas (Zar, 1999). A contaminação da drenagem por espécies exóticas foi determinada conforme proposto em Alves et al. (no prelo), cujos resultados variam de 0 em comunidades sem espécies exóticas até 1, onde somente existem espécies exóticas. A razão é expressa por IC = E/N+E onde: IC = índice de contaminação, E = número de espécies exóticas, N = número de espécies nativas. Esse mesmo procedimento foi utilizado com modificações (nesse caso substituindo espécies exóticas por endêmicas/raras/ameaçadas) para determinar a razão entre espécies endêmicas/raras/ameaçadas e a riqueza total de espécies nativas em cada um dos pontos de amostragem. Para verificação da similaridade na composição em espécies entre áreas foi utilizada a análise de agrupamento (cluster) pelo método de ligação completa (Anderberg, 1973), com base em uma matriz de presença/ausência das espécies em cada uma das drenagens consideradas. Como coeficiente de similaridade (medida de distância), foi utilizado a Distância Euclidiana. Deve-se destacar que esse procedimento analisa somente a composição de espécies entre as áreas, pois é dado peso igual para todas as espécies, independente da abundância de cada uma. O coeficiente de correlação de Pearson foi usado para expressar as relações entre os dados das comunidades de peixes, altitudes e área da bacia, as quais demonstram em parte a distribuição das espécies no eixo longitudinal e altitudinal dentro das drenagens. Todas análises foram conduzidas utilizando o pacote STATISTICA versão 6 adotando o nível de significância estatística de 0,05.

31 RESULTADOS Ao longo do período de estudos foram obtidos registros de 9.912 exemplares, sendo 7.355 oriundos das capturas realizadas e 2.557 referentes a registros em museus. Esses exemplares se distribuíram por 71 espécies, 19 famílias e cinco ordens (Tabela II). Dessas espécies, pouco mais de 50% são comuns a outras drenagens do leste brasileiro e 20% são exóticas, enquanto um percentual que varia entre 1,5 e 8,5% apresentou algum grau de endemismo ou estão ameaçadas de extinção (Tabela II e Figura 2). Pouco mais de 18% das espécies permaneceram com determinação em nível de gênero ou categoria superior e não puderam ser incluídas nas categorias definidas.

Figura 2 – Percentual de espécies de peixes registradas na bacia do rio Santo Antônio entre 1989 e 2005, distribuídas por diferentes categorias.

As curvas cumulativas de espécies demonstram que houve um incremento constante no número de espécies registradas ao longo dos anos de amostragem e que o número total de espécies que ocorre na drenagem pode ainda não ter sido estabelecido (Figura 3). Entretanto, o processo de adição de espécies nos últimos anos é mais evidente para as exóticas, cujo aumento é marcante após 2002, quando as amostragens foram intensificadas e passaram a cobrir a parte baixa da bacia, principalmente a jusante da barragem da UHE de Salto Grande.

32

Figura 3 – Curvas cumulativas de espécies (nativas, exóticas e o total) registradas na bacia do rio Santo Antônio entre 1989-2005.

Tabela II - Espécies de peixes registradas na bacia do rio Santo Antônio no período de 1989-2005, com suas respectivas categorias relacionadas à distribuição geográfica: (1) comuns a outras bacias do leste brasileiro; (2) exóticas; (3) no rio Doce ocorre somente no Santo Antônio; (4) ameaçadas de extinção; (5) endêmica do rio Doce; (6) endêmica do Santo Antônio e (7) sem dados

Ordem Família Espécie Autor / ano Categorias Characiformes Anostomidae Leporinus conirostris Steindachner 1875 1 Leporinus copelandii Steindachner 1875 1 Leporinus macrocephalus Garavello & Britski 1988 2 Leporinus mormyrops Steindachner 1875 1 Leporinus thayeri Borodin 1929 1, 3, 4 Characidae Astyanax bimaculatus (Linnaeus 1758) 1 Astyanax fasciatus (Cuvier 1819) 1 Astyanax scabripinnis (Jenyns 1842) 1 Astyanax sp. - 7 Astyanax taeniatus (Jenyns 1842) 1 Brycon devillei (Castelnau 1855) 1, 4 Brycon opalinus (Cuvier 1819) 1, 4 Deuterodon pedri Eigenmann 1908 5 Hasemania sp. - 7 Henochilus wheatlandii Garman, 1890 4, 6 Knodus sp. - 7 Moenkhausia doceanus (Steindachner 1877) 1 Oligosarcus argenteus Guenter 1864 1 Continua...

33 Tabela II - Espécies de peixes registradas na bacia do rio Santo Antônio no período de 1989-2005, com suas respectivas categorias relacionadas à distribuição geográfica: (1) comuns a outras bacias do leste brasileiro; (2) exóticas; (3) no rio Doce ocorre somente no Santo Antônio; (4) ameaçadas de extinção; (5) endêmica do rio Doce; (6) endêmica do Santo Antônio e (7) sem dados.

continuação.... Ordem Família Espécie Autor / ano Categorias Characidae Piaractus mesopotamicus (Holmberg 1887) 2 Pygocentrus nattereri Kner 1858 2 Salminus brasiliensis (Cuvier 1816) 2 Serrapinnus cf. heterodon (Eigenmann 1915) 1 Characidae gen e sp. nova - 3 Crenuchidae Characidium cf. timbuiensis Travassos 1946 1 Curimatidae Cyphocharax gilbert (Quoy & Gaimard 1824) 1 Erythrinidae Hoplias lacerdae Ribeiro 1908 1 Hoplias malabaricus (Bloch 1794) 1 Prochilodontidae Prochilodus costatus (Cuvier & Valenciennes 1849) 2 Prochilodus vimboides Kner 1859 1 Cyprinodontiformes Poeciliidae Poecilia reticulata Peters 1859 2 Poecilia vivipara Bloch & Schneider 1801 1 Phalloceros caudimaculatus (Hensel 1868). 1 Gymnotiformes Gymnotidae Gymnotus carapo Linnaeus 1758 1 Sternopygidae Sternopygus cf. macrurus (Bloch & Schneider 1801) 1, 3 Perciformes Cichlidae Cichlasoma facetum (Jenyns 1842) 1 Geophagus brasiliensis (Quoy & Gaimard 1824) 1 Oreochromis niloticus (Linnaeus 1758) 2 Tilapia rendalli (Boulenger 1897) 2 Sciaenidae Pachyurus adspersus (Steindachner 1878) 1 Siluriformes Auchenipteridae Glanidium cf. melanopterum Miranda-Ribeiro 1918 1 Pseudauchenipterus affinis (Steindachner 1877) 1 Trachelyopterus striatulus (Steindachner 1876) 1 Callichthyidae Callichthys callichthys Linnaeus 1758) 1 Hoplosternum littoralle (Hancock 1828) 2 Clariidae Clarias gariepinnus (Burchell 1822) 2 Heptapteridae Imparfinis sp. - 7 Pimelodella sp. - 7 Rhamdia quelen (Quoy & Gaimard 1824) 1 Delturus carinotus (LaMonte 1933) 5 Harttia sp. - 7 Hemipsillichthys sp. A - 7 Hemipsillichthys sp. B - 7 Hemipsillichthys sp. C - 3 gên. e sp. novos - 7 Hypostomus affinis (Steindachner 1875) 1 Continua...

34 Tabela II - Espécies de peixes registradas na bacia do rio Santo Antônio no período de 1989-2005, com suas respectivas categorias relacionadas à distribuição geográfica: (1) comuns a outras bacias do leste brasileiro; (2) exóticas; (3) no rio Doce ocorre somente no Santo Antônio; (4) ameaçadas de extinção; (5) endêmica do rio Doce; (6) endêmica do Santo Antônio e (7) sem dados.

continuação.... Ordem Família Espécie Autor / ano Categorias Loricariidae Hypostomus luetkeni (Steindachner 1877) 1 Loricariichthys castaneus (Castelnau 1855) 1 Neoplecostomus sp. - 7 Parotocinclus sp. - 7 wertheimeri (Steindachner 1867) 2 Rineloricaria sp. - 7 Pimelodidae Lophiosilurus alexandri (Steindachner 1876) 2 Pimelodus maculatus Lacepède 1803 2 Pseudoplatystoma sp. - 2 Steindachneridion doceanum (Eigenmann & Eigenmann 1889) 4,5 Pseudopimelodidae Microglanis sp. - 3 Trichomycteridae Trichomycterus cf. alternatus (Eigenmann 1917) 1 Trichomycterus cf. brasiliensis Lütken 1874 1 Trichomycterus cf. immaculatus (Eigenmann & Eigenmann 1889) 1 Trichomycterus sp. A - 3 Trichomycterus sp. B - 7

A ordenação das espécies mais abundantes é diferenciada entre as áreas de jusante e montante da barragem de Salto Grande (Figura 4). Entretanto, nessas duas regiões predominaram characiformes de pequeno porte (<15 cm), notadamente Astyanax spp., Deuterodon pedri, Hasemania sp e Oligosarcus argenteus. Entre as espécies exóticas, as que apresentaram maiores abundâncias foram o barrigudinho (Poecilia reticulata) e a tilápia (Oreochromis niloticus), respectivamente a montante e jusante da UHE Salto Grande.

35

Figura 4 - Curva espécie-abundância em relação ao número total de indivíduos (%) registrados na drenagem do rio Santo Antônio a montante (A) e jusante (B) da UHE Salto Grande.

Os valores de diversidade de espécies, representados pelo índice de Shannon, demonstraram diferença significativa entre as subdrenagens amostradas (Kruskal-Wallis

- Diversidade - H': (5,31) = 17,7, p < 0,05) (Figura 5). O rio do Peixe e a calha do rio Santo Antônio a montante da barragem de Salto Grande se destacaram como os pontos com maiores valores médios, enquanto os rios Guanhães e do Tanque registraram os menores valores de diversidade. No rio Preto do Itambé e Santo Antônio jusante os valores foram intermediários.

36 3,0 Média a 2,8 ± Desvio padrão Mín-Máx 2,6 b, c a, b 2,4

2,2

2,0 b, c

1,8 c c 1,6 Diversidade (H') 1,4

1,2

1,0

0,8 Preto do Itambé Guanhães Sto. Antônio (montante) Peixe Tanque Sto. Antônio (jusante) Rios

Figura 5 – Índice de diversidade de Shannon (H’) nos afluentes e na calha do rio Santo Antônio, sendo que este último foi individualizado nos trechos de montante e jusante da barragem da UHE Salto Grande. Letras diferentes indicam diferenças significativas (p < 0,05) entre os pares.

Na bacia estão representadas espécies nativas com comprimentos totais quando adultas que variam de 5 cm (ex.: Poecilia vivipara e Phalloceros caudimaculatus) a 1 metro (Steindachneridion doceanum), com maiores freqüências nas classes até 20 cm (Figura 6). Para as espécies exóticas esse padrão é diferente, pois praticamente todas as espécies quando adultas possuem comprimentos superiores a 25 cm. A única exceção é representada pelo barrigudinho (Poecilia reticulata), que se encontra disseminado por toda a drenagem, tanto nos rios como nos córregos.

37 20 n = 57 A 16

12

nativas 8

4

0 20 n = 14 16 B

12 Número de espécies

exóticas 8

4

0 < 10 20 30 40 50 > 50 Classes de comprimento total máximo (cm)

Figura 6 – Distribuição de freqüência por classes de comprimento total máximo alcançado pelas espécies nativas (A) e exóticas (B) registradas na bacia do rio Santo Antônio.

Observa-se que o trecho localizado a montante da barragem da UHE Salto Grande, que representa aproximadamente 83% da bacia do rio Santo Antônio, abriga mais de 80% das espécies nativas e ameaçadas/endêmicas. Para as espécies exóticas esse padrão é inverso, com somente cerca de 28% delas ocorrendo nesse trecho do rio (Figura 7). As espécies endêmicas/ameaçadas registradas exclusivamente a jusante da barragem são a piabanha (Brycon devillei) e um pequeno bagre (Microglanis sp.), que estão restritos a calha do Santo Antônio e ao ribeirão Pitangas, respectivamente. A ocorrência do andirá (Henochilus wheatlandii) nesse trecho do rio foi considerada acidental e relacionada às cheias, quando alguns exemplares passam para jusante do barramento através do vertedouro, área onde não existem populações estabelecidas. A jusante da UHE Salto Grande foram registradas todas as 14 espécies exóticas confirmadas para a bacia, entre as quais estão o dourado (Salminus brasiliensis), o pacumã (Lophiosilurus alexandri), a piranha (Pygocentrus nattereri), o bagre-africano

38 (Clarias gariepinus) e o surubim-ponto-e-vírgula ou cachara (Pseudoplatystoma corruscan X P. fasciatum), que são piscívoros de médio a grande porte. Entre as espécies exóticas registradas a montante, somente o bagre-africano e o cachara encontram-se na categoria de grandes piscívoros.

100 n = 12 80 60 40 20

Ameaçadas/Endêmicas 0

100 n = 14 80 60 40 Exóticas 20 0 % de espécies 100 n = 57 80 60 40 Nativas 20 0 0 20406080100 . montante jusante Área da drenagem (%) Figura 7 – Percentual de espécies nativas, exóticas e ameaçadas/endêmicas em função da área total de drenagem do rio Santo Antônio e em relação ao trecho de jusante e montante da UHE Salto Grande.

A riqueza de espécies nativas foi fortemente influenciada pela altitude, uma vez que apresentou correlação negativa significativa tanto nos ambientes amostrados nas calhas dos rios (r = - 0,59; p = 0,0003; n = 33) (Figura 8A), como nos córregos (r = - 0,53; p = 0,0056; n = 26) (Figura 8B).

39 35

A r = - 0,5901 p < 0,001 30

25

20

15 Riqueza de espécies

10

5

0 100 200 300 400 500 600 700 Altitude (m)

18 B 16 r = - 0,527 p < 0,01

14

12

10

8 Riqueza de espécies 6

4

2

0 200 300 400 500 600 700 800 Altitude (m) Figura 8 – Relação entre altitude e riqueza de espécies para os ambientes amostrados na bacia do rio Santo Antônio: rios (A) e córregos (B)

A distribuição de espécies exóticas foi expressa pelo índice de contaminação (IC), que mostrou correlação negativa significativa em relação à altitude para a calha dos rios (r = -0,69, p < 0,001; n = 27). (Figura 9A). Porém essa condição não foi registrada nos córregos (r = 0,09, p = 0,64; n = 27) (Figura 9B), onde foram registradas somente duas espécies (Poecilia reticulata e Tilapia rendalli).

40 0,30 A

0,25 ) IC

0,20

0,15

0,10

0,05 Índice de contaminação por exóticos ( por exóticos de contaminação Índice 0,00 r = -,695 p < 0,001

-0,05 100 200 300 400 500 600 700 Altitude (m)

0,35 B 0,30

) r = ,093 p > 0,05 IC 0,25

0,20

0,15

0,10

0,05 Índice de contaminação por exóticos ( por exóticos de contaminação Índice 0,00

-0,05 200 300 400 500 600 700 800 Altitude (m) Figura 9 – Relação entre altitude e o índice de contaminação por espécies exóticas (IC) para rios (A) e córregos (B) na bacia do rio Santo Antônio.

A razão entre espécies endêmicas/ameaçadas em relação à riqueza total de nativas não mostrou correlação significativa com a altitude (r = 0,15; p = 0,42; n = 28) (Figura 10). Entretanto, proporções de espécies endêmicas/ameaçadas superiores a 15% da comunidade foram encontradas somente em pontos localizados em altitudes superiores a 450 m, como o curso médio do rio Santo Antônio e o baixo de grandes afluentes, como o rio do Peixe e Preto do Itambé. Estas regiões estão todas localizadas acima do barramento da UHE Salto Grande.

41

0,30

r = ,148 p > 0,05 0,25

0,20

0,15

Razão 0,10

0,05

0,00

-0,05 100 200 300 400 500 600 700 Altitude (m) Figura 10 – Relação entre a razão de espécies endêmicas-ameaçadas/nativas e a altitude em ambientes localizados na calha dos rios amostrados na bacia do rio Santo Antônio.

A análise de similaridade indicou que a bacia do rio Santo Antônio abriga assembléias de peixes distintas, as quais se distribuem de forma diferenciada nos ambientes (córregos – rios – reservatórios) e ao longo do eixo longitudinal da calha principal (Figura 11). Quatro agrupamentos foram evidenciados: 1) todos os córregos localizados a montante da barragem da UHE Salto Grande mais os rios Guanhães e Tanque; 2) O rio Santo Antônio a jusante desse barramento; 3) O reservatório de Salto Grande, no braço alagado do rio Guanhães e 4) Os rios Santo Antônio, Preto do Itambé e Peixe, mais os córregos que drenam diretamente para o Santo Antônio na parte baixa da bacia.

42 Sto. Antônio-cór-jus .

Peixe-rio-mont .

Preto Itambé-rio-mont .

Sto. Antônio-rio-mont .

Guanhães-reservatório-mont .

Guanhães-cór-mont .

Sto. Antônio-cór-mont .

Peixe-cór-mont .

Preto Itambé-cór-mont .

Tanque-cór-mont .

Tanque-rio-mont .

Guanhães-rio-mont .

Sto. Antônio-rio-jus .

2345678 Distância Euclidiana Figura 11 – Dendrograma obtido através da análise de cluster baseada nos dados de presença-ausência das espécies entre ambientes (rios – córregos - reservatório) nos afluentes e na calha do rio Santo Antônio, sendo que este último foi individualizado nos trechos de montante e jusante da barragem da UHE Salto Grande.

Dados físicos, químicos e biológicos referentes à qualidade da água na bacia indicaram alterações marcantes entre os períodos de chuva e seca nos rios analisados (Figura 12). Assim, temperatura da água, sólidos totais em suspensão, turbidez, coliformes totais e fecais aumentaram com as chuvas, enquanto o pH e teores de oxigênio dissolvido diminuiram. Dados de condutividade atingiram valores máximos em todos os pontos sempre no período de seca, fato também registrado quando se consideram os percentis 75%, exceto para os rios Guanhães e Peixe. Em relação aos rios, são marcantes as diferenças na calha do rio Santo Antônio, representado por três pontos de amostragem no sentido longitudinal, onde todos os parâmetros avaliados tiveram seus valores aumentados no sentido da nascente para a foz, padrão que se repete independente do período do ano. Nas demais drenagens, rios do Peixe, Tanque e Guanhães, as alterações mais importantes foram para coliformes totais e fecais, que apresentaram valores mais elevados nos dois últimos e sempre relacionados ao período de chuvas (Figura 12).

43 32 10,5 A B 30 10,0

28 9,5

26 9,0 24 8,5 C

o 22 mg/l 8,0 20

7,5 18

7,0 16

14 6,5

12 6,0 Guanhães Tanque Sto. Antônio 2 Guanhães Tanque Sto. Antônio 2 Peixe Sto. Antônio 1 Sto. Antônio 3 Peixe Sto. Antônio 1 Sto. Antônio 3 Estações de coleta de dados (rios) Estações de coleta de dados (rios)

8,0 400 C 7,8 D 350 7,6

7,4 300

7,2 250 7,0

6,8 200 pH mg/l

6,6 150 6,4

6,2 100

6,0 50 5,8

5,6 0 Guanhães Tanque Sto. Antônio 2 Guanhães Tanque Sto. Antônio 2 Peixe Sto. Antônio 1 Sto. Antônio 3 Peixe Sto. Antônio 1 Sto. Antônio 3 Estações de coleta de dados (rios) Estações de coleta de dados (rios)

120 100 E F 90 105

80 90 70

75 60

60 50 S/cm NTU µ

40 45

30 30 20

15 10

0 0 Guanhães Tanque Sto. Antônio 2 Guanhães Tanque Sto. Antônio 2 Peixe Sto. Antônio 1 Sto. Antônio 3 Peixe Sto. Antônio 1 Sto. Antônio 3 Estações de coleta de dados (rios) Estações de coleta de dados (rios)

90000 35000 G 80000 H 30000

70000 25000 60000

20000 50000

40000 15000 NMP/100 ml NMP/100 ml

30000 10000 20000

5000 10000

0 0

Guanhães Tanque Sto. Antônio 2 Guanhães Tanque Sto. Antônio 2 Peixe Sto. Antônio 1 Sto. Antônio 3 Peixe Sto. Antônio 1 Sto. Antônio 3 Estações de coleta de dados (rios) Estações de coleta de dados (rios) Figura 12 - Parâmetros físicos, químicos e biológicos referentes à qualidade de água na bacia do rio Santo Antônio (1993-2005). (A) temperatura da água, (B) oxigênio dissolvido, (C) pH, (D) sólidos totais em suspensão, (E) turbidez, (F) condutividade, (G) coliformes totais e (H) coliformes fecais. Barras transparentes (período chuvoso) e hachuradas (período seco)

44 DISCUSSÃO A drenagem do rio Santo Antônio, embora represente menos de 13% de toda a área da bacia do rio Doce, abriga parte expressiva da fauna de peixes nativos, visto que mais de 89% (57 sp.) das espécies registradas para o rio Doce em Minas Gerais (Drummond et al., 2005) estão aí representadas. Essa situação contrasta com outros rios afluentes do rio Doce que possuem inventários sistematizados da ictiofauna. Um desses, o rio Piracicaba (6,7% da bacia do rio Doce), que drena áreas altamente populosas e industrializadas abriga somente 25 espécies de peixes entre nativas e exóticas (Barbosa et al., 1997, Vieira et al., 2000; obs. pes.). Mesmo sistemas localizados nas áreas mais preservadas da bacia do rio Doce e estudados ao longo de vários anos, como os lagos existentes dentro do Parque Estadual do Rio Doce e entorno (Sunaga & Verani, 1991; Vieira, 1994; Godinho, 1996; Vono & Barbosa, 2001; Latini & Petrere-Jr., 2004; Espíndola et al., 2005), não abrigam em seu conjunto mais que 38% da ictiofauna nativa registrada na bacia dentro do estado de Minas Gerais. Apesar do número de espécies não depender exclusivamente da área de uma bacia, relações do tipo espécie/área foram demonstradas para diversos grupos (Ricklefs, 1996), representando um parâmetro útil para estabelecer indicativo inicial do número de espécies passíveis de ocorrer em uma determinada área e para se identificar regiões onde o esforço de coleta empregado não tenha sido adequado. Embora baseado em um banco de dados hoje desatualizado, é possível avaliar quão expressiva é a riqueza de espécies de peixes nativos na drenagem do rio Santo Antônio através da fórmula proposta por Welcomme (1985), para rios sul-americanos {N = 0.169 x A0,552, onde: N = número de espécies esperado para a bacia; A = área da bacia em km2}. O resultado obtido com o emprego dessa equação indica um total esperado de 28 espécies de peixes para o rio Santo Antônio (10.390 km2), enquanto os dados demonstraram valor maior que o dobro (57 sp.). Embora em uma bacia com este tamanho o inventário não possa ser dado por encerrado com esse estudo, os dados expressos através da curva do coletor demonstraram tendência à estabilização para o número de espécies nativas a partir do ano de 2003, confirmando um esforço amostral compatível para a drenagem. O incremento observado nos últimos três anos de amostragem se refere quase que exclusivamente aos registros de espécies exóticas, em sua maioria ocorrendo à jusante do barramento da UHE Salto Grande.

45 Outro fato que deve ser considerado é que em toda a bacia do rio Doce, somente no rio Santo Antônio existem registros atuais do timburé (Leporinus thayeri), do sarapó (Sternopygus cf. macrurus), de um pequeno bagre (Microglanis sp.) e de um lambari, cujo gênero e espécie ainda não foram descritos. Adicionalmente, abriga a maior população conhecida da pirapitinga (Brycon opalinus) e do andirá (Henochilus wheatlandii), ambos ameaçados de extinção (Rosa & Lima, 2005), sendo o último endêmico dessa bacia e ocorrendo exclusivamente no trecho localizado a montante da barragem da UHE Salto Grande (Vieira et al., 2000, Vieira & Alves, 2001; Castro et al., 2004). Assim, independente dos novos registros de espécies que possam ocorrer, os resultados obtidos corroboram a indicação de que parte dessa drenagem apresenta elevada importância para conservação da diversidade de peixes do leste brasileiro (Conservation International, 2000b; Drummond et al., 2005). Não foi encontrada uma explicação a priori para o número relativamente elevado de espécies endêmicas ou com registros exclusivos no rio Santo Antônio (H. wheatlandii, L. thayeri, S. cf. macrurus, Microglanis sp. entre outras), condição que até o presente não é aplicável a outras áreas estudadas na bacia do rio Doce e que pode ser uma característica intrínseca da drenagem. Entretanto, a presença de parcela significativa dessas espécies somente a montante da UHE Salto Grande foi um dos elementos determinantes para os resultados obtidos, apesar de novos estudos serem necessários em outras drenagens do rio Doce para corroborar os resultados aqui encontrados. A ictiofauna nativa do rio Santo Antônio foi representada predominantemente por espécies de porte pequeno, ou seja, mais de 60% não alcançam tamanhos superiores a 20 cm quando adultas. Entre essas, se destacam vários lambaris do gênero Astyanax, que estão entre as espécies numericamente mais abundantes nas comunidades amostradas ao longo da drenagem. O predomínio da ictiofauna de pequeno porte é uma característica que pode ser estendida para a bacia do rio Doce e também é compartilhada com outros rios do leste brasileiro, como o Mucuri (Pompeu, 2005), Paraíba do Sul (Bizerril, 1994; Bizerril & Primo, 2001), Jequitinhonha (Godinho et al., 1999; Bizerril & Lima, 2005) e Ribeira do Iguape (Oyakawa et al., 2006). Esse padrão só é alterado em trechos dessas bacias mais próximos ao mar devido à ocorrência de peixes diádromos de maior porte, como os robalos (Centropomus spp.), o tarpão (Megalops atlanticus), os xaréus (Caranx spp.), entre outros.

46 Nas bacias do leste brasileiro, a predominância marcante de espécies de menor porte pode ter contribuído para inúmeras introduções de peixes exóticos ao longo dos anos. Essa condição possui relação com os órgãos responsáveis pelo fomento da pesca (e.g., antiga SUDEPE – Superintendência de Desenvolvimento da Pesca), que adotaram a premissa básica do aumento da produtividade pesqueira, obtida geralmente com liberação de espécies que alcançam grande porte e proporcionam maiores rendimentos com as capturas (Welcomme, 1988; Alves et al., no prelo). Adicionalmente, a degradação ambiental dessas drenagens associada ao declínio das espécies nativas exploradas na pesca artesanal também foram fatores que culminaram para a situação presente (Alves et al., no prelo; obs. pes.). Como resultado, na atualidade as espécies exóticas registradas no rio Santo Antônio são todas de tamanhos superiores a 20 cm, exceção feita ao barrigudinho (Poecilia reticulata). Entre as espécies de grande porte estão o bagre-africano (Clarias gariepinnus) e o cachara (Pseudoplatystoma sp.), que atingem tamanhos máximos superiores à maior espécie nativa do rio Doce, o surubim (Stendachneridion doceanum). A substituição gradual e contínua da biota nativa por espécies cosmopolitas e exóticas é um processo global, usualmente como um resultado de introduções por humanos, que diminui a distinção da fauna e flora entre regiões e apresenta conseqüências genéticas, taxonômicas e funcionais nos sistemas onde se processa (Olden et al., 2004). Na literatura é tratado como homogeneização biótica (McKinney & Lockwood, 1999; Rahel, 2002; Olden et al., 2005), constituindo um processo em expansão e ligado diretamente ao domínio humano sobre praticamente todos os ecossistemas (Vitousek et al., 1997). Segundo Angermeier (1994), a diversidade pode ser ampliada artificialmente em qualquer nível organizacional, incluindo o genoma (pela transferência de genes), comunidades (por espécies exóticas) e paisagens (por fragmentação). Entretanto, mesmo quando se verifica que a biodiversidade foi ampliada por introduções de espécies, esse aumento freqüentemente inclui taxa que já são amplamente difundidos, tolerantes a hábitats degradados e em alguns casos representando pragas (Angermeier, 1994, Pimentel et al., 2000; Scott & Helfman, 2001). Na bacia do rio Doce, o longo processo de introdução de espécies exóticas culminou com alterações substanciais nas comunidades de peixes ao longo de várias drenagens formadoras, resultando em poucas oportunidades de selecionar áreas para conservação e manutenção da ictiofauna nativa (Marques & Barbosa, 2002; Drummond

47 et al., 2005). No rio Santo Antônio, isso ficou evidente no trecho localizado a jusante da UHE Salto Grande, cujas características fisiográficas e ligação direta com a calha do rio Doce permitiram a colonização por um elenco variado de peixes exóticos. Nessa área não foram estabelecidas até o presente relações de causa-efeito em que essas espécies alterassem as comunidades de peixes nativos, ou mesmo induzissem extinções locais. Entretanto, essa constatação parece estar relacionada mais à ausência de estudos específicos que uma realidade local, pois em áreas em que esses foram desenvolvidos verificaram-se relações negativas advindas da substituição da fauna nativa por peixes exóticos (Godinho & Formagio, 1992; Godinho et al., 1994; Alves et al., no prelo). Desse modo, não é possível prever sob quais condições futuras serão mantidas as comunidades de peixes nesse trecho da drenagem, principalmente após a disseminação mais recente de grandes piscívoros como Clarias gariepinnus (Alves et al., 1999) e Pseudoplatystoma sp. (Vieira & Pompeu, 2001). A ictiofauna do rio Santo Antônio apresentou padrão de riqueza de espécies nativas relacionado a altitude, independente do ambiente considerado, rios ou córregos. Assim, constatou-se que o número de espécies nativas decresce à medida que se direciona para as cabeceiras, padrão esse que tem sido descrito para diferentes sistemas de rios (Balon & Stewart, 1983; Ibarra & Stewart, 1989; Fu et al., 2004; Braga & Andrade, 2005). Entretanto, para as espécies exóticas foi registrada correlação negativa do índice de contaminação (IC) e altitude somente nos ambientes de rios. Para essas espécies, a dispersão ao longo da calha do rio Santo Antônio foi influenciada pela presença da barragem da UHE Salto Grande, que representa o limite para os deslocamentos de qualquer espécie que se distribua no baixo curso dessa drenagem e no rio Doce, e em última análise determinou o grande número de peixes exóticos registrados a jusante da mesma. Nos ambientes de córregos, embora se tenham registrado valores de IC maiores que os observados na calha dos rios, foram encontradas somente duas espécies exóticas, a tilápia (Tilapia rendalli) e o barrigudinho (Poecilia reticulata). Dessa forma, maiores valores de IC foram obtidos em função do menor número de espécies nativas presentes nestes ambientes, e não pelo número elevado de espécies exóticas que os colonizam. Esses resultados demonstraram que os córregos são restritivos para a maioria dos peixes exóticos existentes na bacia, sendo essa restrição atribuida à preponderância de espécies de porte grande que ocorrem na drenagem, as quais não encontram condições adequadas para manterem populações em cursos de água menores.

48 Apesar de se ter constatado que os córregos foram colonizados por poucas espécies exóticas, em algumas situações os impactos negativos proporcionados por essas espécies nesses ambientes podem ser mais acentuados para a fauna nativa que aqueles registrados em rios. De modo geral, córregos possuem microhábitats específicos e com espécies endêmicas, sendo muitas vezes de distribuição restrita a pequenos trechos (Buckup, 1996), fato verificado na drenagem em estudo. Dessa forma, alterações nas características ambientais originais desses ambientes podem favorecer a expansão das populações de exóticos generalistas em detrimento das espécies nativas com requerimentos específicos, condição que pode culminar com eventos de extinção local, como relatado para outros sistemas (Bayley & Li, 1992; Scott & Helfman, 2001). Para as espécies endêmicas/ameaçadas de extinção, a maior riqueza relativa foi registrada em altitudes intermediárias (acima de 450 m), condição também relatada em sistema distinto do estudado (Fu et al., 2004). No rio Santo Antônio esse resultado guarda relações com os seguintes fatores: i) número relativamente elevado de espécies com registros exclusivos em segmentos específicos da drenagem; ii) maior complexidade estrutural em altitudes intermediárias; iii) qualidade ambiental e iv) conectividade longitudinal da drenagem. Ecossistemas lóticos são caracterizados por gradientes ambientais multidimensionais (Ward, 1989), sendo que na dimensão longitudinal, a altitude e as diferentes unidades fisiográficas conferem heterogeneidade espacial à bacia (Ward & Tockner, 2001). Adicionalmente, a qualidade física e química das águas representa outro fator responsável pela manutenção da biodiversidade dentro de uma drenagem (Marques & Barbosa, 2002). O trecho a montante da UHE Salto Grande inclui rios de diferentes dimensões e com um mosaico de ambientes (corredeiras, cachoeiras, poções, reservatórios), que em conjunto conferem estrutura altamente heterogênea à paisagem. Nessa região, a qualidade física e química da água mostrou diferenças mais acentuadas no que se refere ao aspecto sazonal de seca e chuva que na zonação longitudinal, embora essa tenha sido evidenciada nas três estações localizadas ao longo da calha do rio Santo Antônio. As alterações longitudinais e temporais nos parâmetos físicos e químicos estão de acordo com o previsto pelas teorias do “continuum fluvial” e do “pulso de inundação”, as quais também incluem mudanças nas comunidades bióticas (Vannote et al., 1980; Junk et al., 1989; Allan, 1995). Embora tenham sido verificadas diferenças sazonais e na dimensão longitudinal, os valores obtidos para todos os

49 parâmetros físicos e químicos não indicaram condições que possam ser caracterizadas como limitantes para as espécies de peixes que ocorrem na bacia. De uma forma geral, a melhor qualidade física e química da água pode ser atribuída à baixa densidade populacional em grande parte da bacia, predominância de atividades agro-pastoris e alta capacidade de depuração apresentada pelos extensos trechos de corredeiras a montante da UHE Salto Grande. Entretanto, somente a qualidade física e química da água adequada para peixes não representou necessariamente maior representatividade da ictiofauna em uma determinada área. Esse fato foi observado nos rios do Tanque e Guanhães, onde se constatou as maiores diferenças para os coliformes totais e fecais e onde foram registrados os menores valores de diversidade de espécies. Nessas duas drenagens, excetuando o trecho do rio Guanhães alagado pelo reservatório da UHE Salto Grande, não foram registradas espécies ameaçadas como H. wheatlandii, L. tahyeri e B. opalinus, relativamente comuns nas outras seções de rio. O último fator se refere à conectividade longitudinal, condição considerada essencial para manutenção da biodiversidade em rios e cuja perda pode alterar a viabilidade de populações de espécies nativas (Allan & Flecker, 1993; Abell et al., 2002; Wiens, 2002). A construção de barragens representa um dos principais elementos responsáveis pela perda de conectividade em ambientes de rios e está associada ao declínio da biodiversidade em ecossistemas aquáticos continentais brasileiros (Agostinho et al., 2005). Entretanto, no rio Santo Antônio, a descontinuidade longitudinal proporcionada pela barragem da UHE Salto Grande, que entrou em operação em 1956 e manteve o trecho médio-alto da bacia isolado, parece ter sido o elemento de importância primária na manutenção de uma ictiofauna bastante diversificada e com baixo grau de contaminação por espécies exóticas. Esse fato ainda guarda estreita relação com a extensão do trecho de rio que ficou isolado, o qual representa cerca de 80% da bacia e ao que tudo indica foi suficiente para que as espécies nativas se mantivessem. A importância desse barramento no processo de isolamento pode ser ilustrada pela distribuição do dourado (Salminus brasiliensis = S. maxillosus), espécie introduzida no rio Doce pelo Instituto de Caça e Pesca após sua aclimatação na estação de piscicultura de Aimorés, MG (Ruschi, 1965). Sua dispersão se deu por praticamente toda a bacia do rio Doce, excetuando-se algumas áreas de cabeceiras, cujo acesso foi impedido por obstáculos naturais ou por barragens, caso do rio Santo Antônio. Dessa

50 forma, até o presente a barragem da UHE Salto Grande representou um impedimento efetivo na dispersão natural de qualquer espécie introduzida na partes baixas da drenagem. Sob esse aspecto, o cumprimento literal da lei estadual sobre transposição de peixes (Minas Gerais, 1997) representaria um fator decisivo na dispersão das espécies exóticas para o trecho de montante do barramento, razão pela qual foi recomendado que esse processo não fosse efetivado (obs. pes.). Entretanto, a integridade da ictiofauna no alto-médio rio Santo Antônio, proporcionada pelo isolamento foi alterada em anos mais recentes com a introdução de grandes piscívoros como o cachara (Pseudoplatystoma corruscans X P. fasciatum) e o bagre-africano (Clarias gariepinnus). A primeira é mantida em uma piscicultura comercial na drenagem do rio do Tanque (Coelho & Cyrino, 2006), de onde se disseminou para a drenagem após escapes dos tanques-redes, enquanto a segunda é oriunda de fugas de tanques de criação e de estabelecimentos do tipo pesque e pague. O impacto dessas espécies para a ictiofauna nativa nesse trecho do rio Santo Antônio ainda é desconhecido e necessita de análises futuras. Os resultados obtidos evidenciaram que o rio Santo Antônio embora representando 12,6% da bacia do rio Doce, mantêm número de espécies de peixes mais expressivo que qualquer outro afluente estudado até o presente. Entre essas espécies várias, são endêmicas ou de ocorrência restrita à drenagem, fato que demonstra a importância da mesma como área mantenedora de biodiversidade nas bacias do leste brasileiro. Essa condição deixou claro que alterações como a construção de novas usinas hidrelétricas, principalmente em algumas seções das drenagens a montante da UHE Salto Grande, podem ter conseqüências que extrapolam análises de impactos ambientais desenvolvidas em nível local e deverão representar o empobrecimento da ictiofauna ou mesmo extinção de espécies. Adicionalmente, as estratégias atuais disponíveis e adotadas para a mitigação dos impactos negativos de barragens (transposição de peixes, repovoamentos e outros), não deverão ser suficientes para garantir a diversidade de peixes atual. Essa constatação está relacionada às alterações estruturais na drenagem, principalmente a fragmentação e supressão de áreas lóticas que, conforme demonstrado, são requisitos essenciais para a maior parte da ictiofauna.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Abell, R.; Thieme, M.; Dinerstein, E. & Olson, D. 2002. A sourcebook for conducting biological assessments and developing biodiversity visions for ecoregion

51 conservation. Vol. II: Freshwater Ecoregions. World Wildlife Fund, Washington. 202p. Agostinho, A. A.; Thomaz, S. M. & Gomes, L. C. 2005. Conservation of the biodiversity of Brazil’s inland waters. Conservation Biology, 19(3): 646-652 Allan, J. D. & Flecker, A. S. 1993. Biodiversity conservation in running waters. BioScience, 43(1): 32-43 Allan, J. D. 1995. Structure and function of running waters. Chapman & Hall, London, 388p. Alves, C. B. M., Vieira, F., Magalhães, A. L. B. & Brito, M. F. G (no prelo). Impacts of non-native fish species in Minas Gerais, Brazil: present situation and prospects. In: Bert, T. M. (ed.), Ecological and Genetic Implications of Aquaculture Activities, Kluwer Academic Publishers, The Netherlands Alves, C. B. M., Vono, V. & F. Vieira 1999. Presence of the walking Clarias gariepinnus (Burchell, 1822) (Siluriformes; Clariidae) in Minas Gerais state hydrographic basins, Brazil. Revista Brasileira de Zoologia, 16(1): 259-263 Anderberg, M. R. 1973. Cluster analysis for applications. Academic Press, New York, 359p. Angermeier, P. L. 1994. Does biodiversity include artificial diversity? Conservation Biology, 8: 600–602 Antunes, F. Z. 1986. Caracterização climática do Estado de Minas Gerais. Informe Agropecuário, 12 (138): 9-13 Balon, E. K. & Stewart. D. J. 1983. Fish assemblages in a river with unusual gradient (Luongo, Africa - Zaire system), reflections on river zonation, and description of another new species. Environmental Biology of Fishes, 9: 225-252 Barbosa, F. A. R., Souza, E. M. M., Vieira, F., Renault, G. P. C. P., Rocha, L .A., Maia- Barbosa, P. M., Oberdá, S. M. & Mingoti, S. A. 1997. Impactos antrópicos e biodiversidade aquática. pp. 345-454 In: Paula, J. A. et al. (coord.). Biodiversidade, população e economia: uma região de mata atlântica. Belo Horizonte, UFMG/Cedeplar, ECMVS, PADCT/CIAMB Bayley, P. B. & Li, H. W. 1992. Riverine fishes. pp.: 251-281 In. Calow, P. & Petts, G. E. (eds.) The rivers handbook: hydrological and ecological principles. Blackell Science, London Bizerril, C. R. S. F. & Lima, N. R. W. 2005. Ictiofauna do curso inferior do rio Jequitinhonha (BA/MG) Brasil. Acta Biológica Leopoldensia, 27(3):169-173

52 Bizerril, C. R. S. F. & Primo, P. B. 2001. Peixes de água interiores do estado do Rio de Janeiro. FEMAR – SEMADS, Rio de Janeiro, 417 p. Bizerril, C. R. S. F. 1994. Análise taxonômica e biogeográfica da ictiofauna de água doce do leste brasileiro. Acta Biológica Leopoldensia, 16: 51-80 Braga, F. M. S. & Andrade, P. M. 2005. Distribuição de peixes na microbacia do Ribeirão Grande, Serra da Mantiqueira Oriental, São Paulo, Brasil. Iheringia, Série Zoologia, 95(2):121-126 Buckup, P. A., 1996. Biodiversidade dos peixes da mata atlântica. In.: Padrões de biodiversidade da mata atlântica do sudeste e sul do brasil, BDT – Base de Dados Tropicais. http://www.bdt.fat.org.br/workshop/mata.atlantica/SE-S/peixes#buckup Castro, R. M. C., Vari, R. P., Vieira, F. & Oliveira, C. 2004. Phylogenetic analysis and redescription of the genus Henochilus (Characiformes: Characidae). Copeia, 2004(3): 496–506 Cetec, 1983. Diagnóstico Ambiental do Estado de Minas Gerais. Série Publicações Técnicas, 10. 158p. Coelho, S. R. C. & Cyrino, J. E. P. 2006. Custos na produção intensiva de surubins em gaiolas. Informações Econômicas, 36(4): 7-14 Conservation International, 2000a. Planejando paisagens sustentáveis: a Mata Atlântica brasileira. Conservation International & Instituto de Estudos Sócio- Ambientais do Sul da Bahia. 28p. Conservation International, 2000b. Avaliação de ações prioritárias para a conservação da biodiversidade da Mata Atlântica e Campos Sulinos. Ministério do Meio Ambiente, Brasília, 40 p. Drummond, G. M., Martins, C. S., Machado, A. B. M., Sebaio, F. A. & Antonini, Y. 2005. Biodiversidade em Minas Gerais: um Atlas para sua conservação. 2ª. Ed., Belo Horizonte, Fundação Biodiversitas. 222p. Eschmeyer, W. N. 1998. Catalog of Fishes. Special publication nº 1 of the Center for Biodiversity Research and Information. California Academy of Sciences. vols. 1- 3: 1-2905 Espíndola, E. L. G., Branco, M. B. C., Fracácio, R., Guntzel, A. M., Moretto, E. M., Pereira, R. H. G., Rietzler, A. C., Rocha, O., Rodgher, S., Smith, W. S. & Tavares, K. S. 2005. Organismos aquáticos. pp.: 202- 238, in.: Rambaldi, D.M. & Oliveira, D.A.S. (Orgs.) Fragmentação de ecossistemas: causas, efeitos sobre a

53 biodiversidade e recomendações de políticas públicas. Brasília, 2ª. Ed., MMA/SBF Froese, R. & Pauly, D. (eds.) 2005. FishBase, World Wide Web electronic publication. , version (11/2005). Consulta em dezembro de 2005 Fu, C., Wu, J., Wang, X. Lei, G. & Chen, J. 2004. Patterns of diversity, altitudinal range and body size among freshwater fishes in the Yangtze river basin, China. Global Ecology and Biogeography, 13: 543-552 Galdean, N.; Callisto, M. & Barbosa, F. A. R. 2000. Lotic ecosystems of Serra do Cipó, southeast Brazil: water quality and a tentative classification based on the benthic macroinvertebrate community. Aquatic Ecosystem Health and Management, 3 (4): 545-552 Gery, J. 1969. The Freshwater Fishes of South America. pp. 828-848. In. Fittkau, E. J., Illies, J., Klinge, H., Schwabe, G. H., Sioli, H. (eds.) Biogeography and Ecology in South America, Vol. 2. Kluwer Academic Publishers, The Hague Godinho A. L. 1996. Peixes do Parque Estadual do Rio Doce. Belo Horizonte: Instituto Estadual de Florestas/Universidade Federal de Minas Gerais, 32 pp. Godinho, A. L. & Formagio, P. S. 1992. Efeitos da introdução de Cichla ocellaris e Pygocentrus sp. sobre a comunidade de peixes da Lagoa Dom Helvécio, Minas Gerais. , pp. 93-102 In: Associação Mineira de Aqüicultura, Belo Horizonte (eds.), Resumos do Encontro da Associação Mineira de Aqüicultura, Associação Mineira de Aquicultura, Belo Horizonte Godinho, A. L.; Fonseca M. T. & Araújo, L. M. 1994. The ecology of predator fish introductions: the case of Rio Doce valley lakes. pp. 77-83. In: Pinto-Coelho, R. M.; Giani, A. & von Sperling, E. (eds.), Ecology and Human Impact on Lakes and Reservoirs in Minas Gerais with Special Reference to Future Development and Management Strategies. SEGRAC, Belo Horizonte Godinho, H. P.; Godinho, A. L. & Vono, V. 1999. Peixes da bacia do rio Jequitinhonha. pp. 414-423 In. Lowe-McConnell, R. L. Estudos ecológicos em comunidades de peixes tropicais. São Paulo, Edusp Ibarra, M. & Stewart, D. J. 1989. Longitudinal zonation of sandy beach fishes in the Napo river basin Eastern Ecuador. Copeia, 1989: 364-381 IGAM, 2005. Relatório de monitoramento das águas superficiais na Bacia do Rio Doce em 2004. Instituto Mineiro de Gestão das Águas, Belo Horizonte, IGAM, 233p.

54 Jowett, I. G. & Richardson, J. 2003. Fish communities in New Zealand rivers and their relationship to environmental variables. New Zealand Journal of Marine and Freshwater Research, 37: 347–366 Junk, W. J., Bayley, P. B. & Sparks, R. E., 1989. The flood pulse concept in river- floodplain systems. In: Proceedings of the International Large River Symposium, ed. D.P. Dodge. Canadian Special Publications: Fisheries and Aquatic Sciences 106: 110–127. Latini, A. O. & Petrere, Jr., M. 2004. Reduction of a native fish fauna by alien species: an example from Brazilian freshwater tropical lakes. Fisheries Management and Ecology, 11: 71–79 Magurran, A. E. 1988. Ecological diversity and its measurement. Princeton University Press, New Jersey, 179p. Marques, M. M. & Barbosa, F. A. R. 2002. Áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade aquática no trecho médio da bacia do rio Doce, MG. Naturalia, 27: 211-229 McKinney, M. L. & Lockwood, J. L. 1999. Biotic homogenization: a few winners replacing many losers in the next mass extinction. Trends in Ecology and Evolution, 14: 450–453 Menezes, N. A. 1972. Distribuição e origem da fauna de peixes de água-doce das grandes bacias fluviais do Brasil. pp. 79-108. In: Comissão internacional da bacia Paraná-Uruguai. Poluição e piscicultura. São Paulo, Faculdade de Saúde Pública da USP/Instituto de Pesca Menezes, N. A. 1988. Implications of the distribution patterns of the species of Oligosarcus (Teleostei Characidae) from Central and Southern South America. pp. 295-304 In: Vanzolini, P E & Heyer, W R (Eds) Proceedings of a Workshop on Neotropical Distribution Patterns. Academia Brasileira de Ciências, Rio de Janeiro. Minas Gerais, 1997. Lei no. 12.488, de 09 de abril de 1997. Torna obrigatória a construção de escadas para peixes de piracema em barragem edificada no Estado. Minas Gerais, Órgão Oficial dos Poderes do Estado, Belo Horizonte, 10 de abril de 1997 Olden, J. D., Douglas, M. E. & Douglas, M. R. 2005. The human dimensions of biotic homogenization. Conservation Biology, 19(6): 2036–2038

55 Olden, J. D.; Poff, N. L. R.; Douglas, M. R.; Douglas, M. E. & Fausch, K. D. 2004. Ecological and evolutionary consequences of biotic homogenization. Trends in Ecology and Evolution, 19(1): 18-24 Oyakawa, O. T.; Akama, A.; Mautari, K. C. & Nolasco, J. C. 2006. Peixes de riachos da Mata Atlântica nas unidades de conservação do vale do rio Ribeira de Iguape no estado de São Paulo. São Paulo, Editora Neotrópica, 201 p. Paiva, M.P. 1982. Grandes represas do Brasil. Editerra, Brasília, 292p. Pimentel, D,; Lach L.; Zuniga, R. & Morrison, D. 2000. Environmental and economic costs of nonindigenous species in the United States. BioScience 50:53–65 Pompeu, P. S. 2005. Estudo da regra operativa e avaliação de um mecanismo de transposição de peixes do tipo elevador com caminhão-tanque. Tese de Doutorado – Meio Ambiente, Saneamento e Recursos Hídricos com ênfase em Hidráulica e Recursos Hídricos. Belo Horizonte, UFMG. 190pp. Rahel, F. J. 2002. Homogenization of freshwater faunas. Annual Review Ecology and Systematics, 33: 291–315 Reis, R. E., Kullander, S. O. & Ferraris, C. J. 2003. Check list of the freshwater fishes of South and Central America. Porto Alegre, EDIPUCRS: i-xi + 729 p. Ricklefs, R. E. 1996. Ecology. 3a. ed., W. H. Freeman and Company, New York, 896p. Ringuelet, R. A. 1975. Zoogeografía y ecología de los peces de aguas continentales de la Argentina y consideraciones sobre las áreas ictiológicas de América del Sur. Ecosur 2: 1–122 Rosa, R. S. & Lima, F. C. T. 2005. Peixes. pp . 65-81 In. Machado, A. B. M.; Martins, C. S. & Drummond, G. M. (eds.) Lista da Fauna brasileira ameaçada de extinção: incluindo as espécies quase ameaçadas e deficientes em dados. Fundação Biodiversitas, Belo Horizonte, 160p. Ruschi, A. 1965. Lista dos tubarões, raias e peixes de água doce e salgada do estado do Espírito Santo e uma observação sobre a introdução do dourado no rio Doce. Boletim Museu Biologia Mello Leitão, 25A: 1-23 Scott, M.C. & Helfman, G. S. 2001. Native invasions, homogenization, and the mismeasure of integrity of fish assemblages. Fisheries, 26(11): 6–15 Sunaga T. & Verani J.R. 1991. The fish communities of the lakes in Rio Doce Valley, Northeast, Brazil. Verhandlungen der Internationalen Vereinigung für Theoretiche und Angewandte Limnologie 24, 2563–2566

56 Vannote, R. L., Minshall, G. W., Cummins, K. W., Sedell, J. R., Cushing, C. E., 1980. The river continuum concept. Canadian Journal Fisheries Aquatic Sciences, 37: 130-137. Vari, R. P. & Malabarba, L. R. 1998. Neotropical ichthyology: an overview. pp 1-11 In: Malabarba, L. R.; Reis, R. E.; Vari, R. P.; Lucena, Z. M. S. & Lucena, C. A. S. (eds) Phylogeny and classification of neotropical fishes, EDIPUCRS, Porto Alegre Vari, R. P. & Weitzman, S. H. 1990. A review of the phylogenetic biogeography of the freshwater fishes of South America. pp. 381-393 In: Peters, G. & Hutterer, R. (eds.) Vertebrates in the tropics. Museum Alexander Koenig, Bonn, Vari, R. P. 1988. The Curimatidae, a lowland neotropical fish family (Pisces: Characiformes): distribution, endemism, and phylogenetic biogeography. pp. 343- 377 In: Vanzolini, P. E. & Heyer, W. R. (eds.) Proceedings of a workshop on neotropical distribution patterns. Academia Brasileira de Ciências, Rio de Janeiro Vieira, F. & Alves, C.B.M. 2001. Threatened fishes of the world: Henochilus wheatlandii Garman, 1890 (Characidae). Environmental Biology of Fishes, 62 (4): 414 Vieira, F. & Pompeu, P. S. 2001. Peixamentos: uma ferramenta para conservação da ictiofauna nativa? Ciência Hoje, 30 (175): 28-33 Vieira, F. 1994. Estrutura de comunidades e aspectos da alimentação e reprodução dos peixes em dois lagos do médio rio Doce, MG. Dissertação Mestrado, Ecologia, Conservação e Manejo de Vida Silvestre, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte. Vieira, F., Alves, C.B.M. & Santos, G. B. S. 2000. Rediscovery and first record of Henochilus wheatlandii (Teleostei: Characidae) a rare Neotropical fish, in Doce river basin, southeastern Brazil. Ichthyological Explorations of Freshwaters 11(3): 201-206 Vieira, F.; Pompeu, P. S. & Baumgratz, S. S. 2000. Os peixes e a pesca no rio Piracicaba – MG. Ecodinâmica/Belgo Mineira/Samarco - Belo Horizonte Vitousek, P. M.; Mooney, H. A.; Lubchenco, J. & Melillo, J. M. 1997. Human Domination of Earth’s Ecosystems. Science, 277: 494-499 Vono, V. & Barbosa, F. A. R. 2001. Hábitats and littoral zone fish community structure of two natural lakes in southeast Brazil. Environmental Biology of Fishes, 61 (4): 371 - 379

57 Ward, J. V. & Tockner, K., 2001. Biodiversity: towards a unifying theme for river ecology. Freshwater Biology, 46: 807-819 Ward, J. V., 1989. The four-dimensional nature of lotic ecosystems. Journal North Amererican Benthological Society, 8: 2-8 Welcome, R. L. 1988. International introductions of Inland aquatic species. FAO Fisheries Technical Papers, 294: 318 p. Welcomme, R. L., 1985. River Fisheries. FAO Fisheries Technical Papers, 262: 330p. Wiens, J. A. 2002. Riverine landscapes: taking landscape ecology into the water. Freshwater Biology, 47: 501–515 Zar, J. H. 1999. Biostatistical analysis. 4a. ed., Prentice Hall, New Jersey, 663 p.

58

CAPÍTULO 2

59 DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL E ASPECTOS DA ECOLOGIA DE PEIXES AMEAÇADOS DE EXTINÇÃO NA DRENAGEM DO RIO SANTO ANTÔNIO, BACIA DO RIO DOCE, MG

RESUMO Foram analisadas cinco espécies de peixes ameaçados de extinção que possuem distribuição na drenagem do rio Santo Antônio. Os dados foram obtidos em trabalhos de campo e registros em museus, cobrindo uma série temporal entre os anos de 1989 e 2005. Todas as espécies apresentaram distribuição restrita a ambientes lóticos, em rios com larguras superiores a 10 m e em altitudes de até 670 metros. Brycon devillei e Steindachneridion doceanum não foram avaliados quanto a aspectos da biologia por serem muito raras e terem baixa representividade nas amostragens. Henochilus wheatlandii é uma espécie de grande porte que possui crescimento isométrico e cuja dieta muda de invertebrados bentônicos para frutos e podostemáceas ao longo do desenvolvimento ontogenético. Brycon opalinus também apresenta crescimento isométrico e apresentou dieta onívora incluindo principalmente recursos alóctones, notadamente frutos e insetos que caem na água. Leporinus thayeri apresentou crescimento alométrico negativo e hábito alimentar invertívoro, predando formas adultas e larvais de insetos aquáticos bentônicos. As três espécies apresentaram ciclo reprodutivo relacionado ao período de chuvas. Programas de conservação são viáveis para as três últimas espécies, enquanto para as demais as perspectivas são menos promissoras, pois as populações parecem estar em acentuado declínio, tanto no Santo Antônio como no restante do rio Doce.

INTRODUÇÃO Para uma parcela considerável das espécies, o risco de extinção está ligado ao número total de indivíduos remanescentes, enquanto que para outras esse processo está relacionado com a distribuição espacial e, por conseguinte, com a quantidade de hábitat ocupado (Gaston 1994; Kunin & Gaston, 1997). Causas primárias do declínio da fauna de peixes são atribuídas a cinco categorias principais: demanda pelo uso da água, alteração de hábitats, poluição, introdução de espécies exóticas e exploração comercial (Moyle & Leidy, 1992). Embora uma ou duas causas principais possam ser identificadas

60 para cada espécie isoladamente, o declínio resulta quase sempre de efeitos múltiplos, cumulativos e de longo prazo. Apesar dos problemas metodológicos inerentes à elaboração de listas de espécies ameaçadas de extinção (Regan et al., 2005), essas constituem uma das principais ferramentas utilizadas atualmente para estabelecer prioridades para conservação (Mace & Lande, 1991), representando uma informação imprescindível no estabelecimento de critérios para uso dos recursos financeiros, que em sua maioria são bastante limitados (Darwall & Vié, 2005; Grammont & Cuarón, 2006). A primeira lista de animais ameaçados de extinção no Brasil foi formulada somente ao final da década de 1960 (Coimbra-Filho & Magnanini, 1968), e não incluía peixes. Esse resultado estava relacionado primariamente à falta de análise para o grupo e não a uma realidade sobre melhores condições de conservação. Essa situação perdurou nas demais listas de abrangência nacional publicadas posteriormente (IBDF, 1973; IBAMA, 1989; MMA, 2003), cuja mudança ocorreu somente em 2004 (MMA, 2004; Rosa & Lima, 2005). Nesse espaço de tempo, alguns estados com legislação mais vanguardista listaram suas espécies de peixes ameaçadas (Machado et al., 1998; São Paulo, 1998; Mazzoni et al., 2000; Marques et al., 2002; Abilhoa & Duboc, 2004), permitindo a adoção de mecanismos para proteção efetiva, ainda que somente em nível estadual. Em Minas Gerais, a primeira lista incluia somente três espécies ameaçadas de peixes (Machado et al., 1998): Zungaro jahu = Paulicea luetkeni (Lundberg & Littmann, 2003), Brycon orbignyanus e Characidium lagosantensis, nenhuma das quais com ocorrência na bacia do rio Doce. Com a publicação da lista nacional (MMA, 2004), esse número foi significativamente alterado e passou a incluir 34 espécies para Minas Gerais, das quais cinco distribuídas no rio Doce. Essas espécies foram relacionadas como ameaçadas por serem raras ou possuírem populações extremamente reduzidas – e.g., Steindachneridion doceanum e Brycon devillei (obs. pes.), ou apresentarem distribuição restrita a uma determinada drenagem sob forte ameaça de alteração ambiental – e.g., Henochilus wheatlandii, Brycon opalinus e Leporinus thayeri (Vieira et al., 2000; Vieira & Alves, 2001; obs. pes.). As três primeiras espécies são endêmicas do rio Doce, enquanto as demais apresentam distribuições mais amplas nas drenagens do leste brasileiro. No rio Doce, H. wheatlandii foi a única dessas espécies abordada em estudos mais amplos nos últimos anos, primariamente em função de problemas de distribuição

61 geográfica (Vieira et al., 2000) e interessse filogenético (Castro et al., 2004). A pirapitinga (B. opalinus) teve populações da bacia do rio Paraíba do Sul, onde também está distribuída (Lima, 2003), submetidas a estudos utilizando marcadores moleculares do DNA mitocondrial, cujas informações foram utilizadas para planejar a formação e o manejo dos estoques de reprodutores mantidos em cativeiro, indicar áreas para conservação de populações isoladas geneticamente e orientar programas de repovoamento (Hilsdorf et al., 2002; Hilsdorf & Petrere-Jr., 2002). De uma forma geral, o desconhecimento sobre aspectos básicos da biologia de peixes ameaçados de extinção constitui um dos grandes entraves para adoção de ações de conservação, fato normalmente relacionado à baixa representatividade dos mesmos em ambientes naturais. Dessa forma, oportunidades de estudos com essas espécies devem ser aproveitadas em sua totalidade, fator preponderante para que as mesmas possam ser melhor conhecidas e mantidas a longo prazo. Nesse contexto, foram avaliadas características biológicas e de distribuição das cinco espécies ameaçadas que ocorrem no rio Doce, algumas com ocorrência restrita a subdrenagem do rio Santo Antônio.

METODOLOGIA Á área amostrada cobriu a drenagem do rio Santo Antônio, desde sua foz até os afluentes localizados nas áreas mais elevadas próximo às nascentes totalizando 61 pontos de coleta, sendo 27 localizados em córregos e 34 nas calhas dos rios maiores (Figura 1). As amostragens foram aperiódicas e distribuídas ao longo dos anos de 1991- 1996 e 1999-2005, sendo que a intensificação dos estudos foi conduzida entre 2002 e 2005. Registros adicionais, referentes as cinco espécies ameaçadas, foram obtidos na literatura e nos bancos de dados do Museu Nacional (MNRJ), Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo (MZUSP) e Museu de Ciências e Tecnologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (MCP), através de consultas ao Projeto NEODAT III (http://www.mnrj.ufrj.br/search1c.htm) e ao Centro de Referência em Informação Ambiental, CRIA (http://splink.cria.org.br/simple_search?criaLANG=pt).

62

v v o

v v v v 42 00’

18o30’

v v

v v v

v Pontos de coleta

v v

v v v v

o Cadeia de montanhas

ç

v v

v a v Cidades h n i Guanhães Cursos d’água p rio

s UHE’s implantadas v v

v v E

Co

rren

r te

i G

v v o

r v v a v v n rio de P G

a Conceição do u

ra r a

uninha Mato Dentro io n v v h

v v ã d e o s r e io c

o

D

P io Senhora da v v ôn e nt

ix A Penha o

o Sa e Ferros Belo d

d nto

Oriente

v v

v v é amb S. Sebastião do It o

Rio Preto ri

o v v d

Pre

Parque Nacional da to e

rio qu v v n v Serra do Cipó v a o T Itambé do d Ipatinga Mato Dentro

rio o v v

19 30’ v v ba a a

i ic e

c e 0 20

e a c

o ir c

o P o

44 00’ d

D

Itabira rio D v v km

Antônio Dias

Ca

o

i

r

Figura 1 – Pontos de amostragem da ictiofauna na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG. Parte dos pontos não é apresentada em função da escala em que se encontra o mapa, a qual não permite reproduzir cursos d’água de pequeno porte.

Em cada ponto foram registradas as características referentes ao tipo de curso d’água (córrego ou rio), coloração da água (preta ou clara) e altitude (m) obtida através de GPS e conferida em cartas topográficas do IBGE na escala 1:50.000. Capturas foram realizadas com redes de emalhar com tamanhos de malha de 24 a 120 mm (medidos entre nós opostos). Nos córregos foram utilizadas peneiras (malha 2 mm) e tarrafas (malha 3 e 5 cm), artefatos que também foram empregados em rios maiores. Os exemplares foram separados por local de captura e fixados em formalina a 10%. Em laboratório os exemplares foram medidos {comprimento padão (CP) e total (CT) em mm}, pesados (precisão 1 g) e dissecados para separação dos estômagos e posterior análise da dieta. O coeficiente intestinal foi determinado para cada exemplar através da razão entre o tamanho do peixe (CP) e do intestino, medido em milímetros. O coeficiente de correlação de Pearson foi usado para expressar as relações entre os valores do coeficiente intestinal e o comprimento padrão para cada espécie isoladamente. A análise do conteúdo estomacal foi realizada sob estereomicroscópio e os itens encontrados identificados até a menor categoria taxonômica possível. Foram utilizados,

63 os métodos de freqüência de ocorrência e gravimétrico (peso úmido), segundo Hyslop (1980). Freqüência de ocorrência é definida como a percentagem de estômagos contendo determinado item, em relação ao total de estômagos com alimento. O peso úmido foi obtido através da pesagem de cada item alimentar em balança Mettler P1210 com precisão de 0,01g, após o mesmo ter sido mantido sob papel de filtro para eliminar o excesso de água. Os dados das porcentagens do peso úmido e freqüência foram correlacionados através do índice alimentar proposto por Kawakami & Vazzoler (1980), descrito pela equação:

(*)Fi Pi IAi = n , onde: ∑(*)Fi Pi i=1

IAi = índice alimentar; i = 1, 2,... n = determinado item alimentar; Fi = frequência de ocorrência (%) de determinado item; Pi = peso úmido (%) de determinado item.

Na apresentação dos resultados, alguns organismos foram agrupados em categorias mais amplas, como por exemplo invertebrados aquáticos, que englobam diversas ordens de insetos. Quando este procedimento foi adotado, os itens identificados foram discriminados na apresentação dos resultados. A relação peso-comprimento para cada espécie (machos e fêmeas agrupados) foi estimada através do ajuste de uma curva exponencial, PC = a CPb (Ricker, 1975). Os parâmetros a e b da curva exponencial foram estimados por regressão linear utilizando os dados de comprimento e peso logaritimizados (ex.: ln PC = ln a + b . ln CP), onde PC = peso corporal (g), CP = comprimento padrão (mm), a o intercepto e b a inclinação, usando o método dos mínimos quadrados (Zar, 1999). O grau de associação entre as variáveis ln PC e ln CP, foi avaliado pelo coeficiente de determinação (r2). A hipótese nula de crescimento isométrico (Ho: b = 3) foi testada através do teste t usando a equação ts = (b-3) / Sb, onde Sb é o erro padrão do coeficiente de regressão, adotando o nível de significância estatística de 0,001 (Sokal & Rohlf, 1995). As análises estatísticas foram conduzidas através do programa Statistica 6.0 (Statsoft, 2001).

64 RESULTADOS Foram capturados 131 exemplares distribuídos entre quatro das espécies ameaçadas (Tabela I). O surubim-do-Doce (S. doceanum) foi a única espécie registrada somente através de dados secundários, nesse caso uma cabeça mantida sêca por um pescador local, cujo exemplar foi pescado na calha do rio Santo Antônio abaixo da confluência do rio do Tanque, no município de Ferros (Figura 2D). A piabanha (Brycon devillei) foi outra espécie muito rara, com somente dois exemplares capturados a jusante da UHE Salto Grande (Figura 2D). Embora restritas ao trecho de montante da UHE Salto Grande, as demais espécies (andirá – Henochilus wheatlandii; pirapitinga – Brycon opalinus e o timburé – Leporinus tahyeri) foram registradas em maior abundância e em áreas mais amplas da drenagem (Figuras 2A, 2B e 2C). Todas as espécies ocorreram exclusivamente em ambientes de rios (larguras superiores a 15 metros e em altitudes de até 670 metros – Tabela I e Figura 3), que incluem a calha do Santo Antônio e o baixo curso de afluentes maiores: Guanhães, Parauninha, Peixe e Preto do Itambé. No rio Guanhães, a única espécie registrada foi B. opalinus, representada por dois exemplares no reservatório da UHE de Salto Grande. Steindachneridion doceanum e B. devillei tiveram os registros limitados à calha do rio Santo Antônio. O rio do Tanque foi o único afluente de maior porte onde não foi registrada nenhuma das espécies. Henochilus wheatlandii, B. opalinus e o L. thayeri ocorreram tanto em rios de águas pretas (Preto do Itambé e parte alta do rio Santo Antônio) como de águas claras (Peixe e médio Santo Antônio), enquanto S. doceanum e a B. devillei estiveram restritos a ambientes de águas claras. Tabela I – Distribuição altitudinal, comprimentos totais e pesos máximos e mínimos para as espécies de peixes ameaçadas de extinção na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG. Comprimento Espécie Altitude (m) total (mm) Peso (g) n mín. máx. mín. máx. mín. máx. Leporinus thayeri 50 520 670 117 257 18 157 Brycon opalinus 45 382 670 89 296 8 364 Henochilus wheatlandii 34 449 591 102 320 10 376 Brycon devillei 2 194 220 227 330 247 410 Steindachneridion doceanum 1 - 440 - - - -

65

v v v

v o o

o v v v v v v v 42 00’ 44 00’ v 42 00’

o o

v v

18 30’ 18 30’

v v v v

v v

v v

v v v v v v v Cadeia de montanhas v Cidades Área de ocorrência

o o

ç ç Leporinus thayeri

v v v v v v v a Cursos d’água a v h h n n i Guanhães UHE’s implantadas i Guanhães p rio p rio

s Área de ocorrência s v v v v

v v

E v v E C Brycon opalinus

or Co

ren rren

r te r t

i G i e G

v v

v o v

o

r r v v v v v v a a v n v n rio de rio de P G P G

a Conceição do u a Conceição do u

r r a r

a Mato Dentro i ra a

uninha o n uninha Mato Dentro io n v v h v v h

v v ã v v ã d e d e o s o s r e r e io c io c

o o

D D

P io Senhora da io Senhora da v v P v ôn v ôn e nt e nt

ix A Penha i A Penha o

o x o e o

Sa Ferros Belo Sa e Ferros

d d n Belo d

to d nto

Oriente Oriente

v v v v

v v v bé v bé Itam S. Sebastião do Itam S. Sebastião do

o o

Rio Preto ri Rio Preto ri

o v v o v P d v P d

Parque Nacional da reto ret

o ue Parque Nacional da o o e

ri nq ri qu v v v v n v v v Serra do Cipó Ta Serra do Cipó v a o o T Itambé do d Ipatinga Itambé do d Ipatinga

Mato Dentro o Mato Dentro o

rio o rio o v v v v

19 30’

v v 19 30’ v a v b ba a a a a

i ic i ic

e e e

c 0 20 c e 0 20

e a e

c c a c

o ir ir c

o o

o

P P o

44 00’ d d

D

Itabira o D D

ri Itabira rio D a v v v km v

Antônio Dias km

Antônio Dias

Ca C

o o i i

r r

A B

v v o v v

v v v v v v v 44o00’ v 42o00’ 44o00’ 42 00’

18o30’ 18o30’

v v

v v

v v v v v v v v Área de ocorrência Registros

o Henochilus wheatlandii o Steindachneridium doceanum

ç ç

v v v v v v

v a v a h h n n Brycon devillei i Guanhães i Guanhães

p rio p rio

s s

v v v v

v v

E v v E

Co Co

rren rren

r te r te

i G i G

v v v v o o

r r v v v v v v a v v an n rio de rio de P G P G

a Conceição do u a Conceição do u

r r a r r a

a a Mato Dentro i

uninha Mato Dentro io n uninha o n v v v v h h

v v v v ã ã d e d e o s o s r e r e io c io c

o o

D D

P io Senhora da P io Senhora da v v v v tôn tôn

e n e An

ix A Penha ix Penha o o o

o e e

Sa Ferros Belo Sa Ferros Belo d d d

d nto nto

Oriente Oriente

v v v v

v v v bé v bé Itam S. Sebastião do Itam S. Sebastião do o o

Rio Preto ri Rio Preto ri

o v v v v o P d P d

Parque Nacional da ret Parque Nacional da ret

o o ue o o ue

ri nq ri nq v v v v v v v Serra do Cipó a Serra do Cipó v a o T o T Itambé do d Ipatinga Itambé do d Ipatinga

Mato Dentro o Mato Dentro o

rio o rio o v v v v

19 30’

19 30’ v v v v ba ba a a a a

i ic i ic

e e e

c e 0 20 c 0 20

e a e a c c c

ir ir c

o o

o P P o

d d

D D

D

Itabira rio Itabira rio D v v v km v km

Antônio Dias Antônio Dias

Ca Ca

o o

i i

r r C D

Figura 2 – Área de ocorrência das espécies de peixes ameaçadas de extinção na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG.

A B

C D

E F

Figura 3 – Ambientes de calha amostrados na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG: A – Rio Santo Antônio a montante da UHE Salto Grande; B – Rio do Peixe; C – Rio Preto do Itambé; D – Rio Guanhães no final do reservatório da UHE Salto Grande; E – Rio Santo Antônio a jusante da UHE Salto Grande; F – Rio do Tanque.

Os valores do IAi para os itens alimentares, utilizados pelas três espécies com exemplares disponíveis para análises demonstraram dietas e estratégias de obtenção do alimento diferenciadas (Tabela II). Para Henochilus wheatlandii, foi verificada forte ontogenia trófica, com exemplares menores que 15 cm de comprimento padrão se alimentaram basicamente de invertebrados bentônicos (efemerópteros, hemípteros – Gerridae e larvas de dípteros), e os exemplares acima desse tamanho passando a utilizar frutos (Moraceae – Ficus sp.) e talos de Podostemaceae (Figura 4A). A categoria invertebrados terrestres incluiu himenópteros (formas aladas de Formicidae), coleópteros e lepdópteros, todos com baixa representatividade tanto nos exemplares de pequeno como de grande porte. A mudança de hábito alimentar se refletiu no coeficiente intestinal, cujos valores aumentaram significativamente com o crescimento dos exemplares (Figura 5). Exemplares de maior porte e com hábito alimentar herbívoro apresentaram forte infestação por nematóides, que em alguns preenchiam grande parte do intestino (Figura 4B). A dieta de L. tahyeri foi composta quase que exclusivamente por invertebrados bentônicos, sendo estes representados por Trichoptera, Odonata, Hemiptera – Naucoridae e larvas de Diptera (Tabela II). Invertebrados terrestres foram ocasionais e representados somente por coleópteros. Para essa espécie, não foi encontrada variação significativa do coeficiente intestinal ao longo do crescimento (Figura 5). Brycon opalinus apresentou hábito alimentar mais diversificado, embora com predominância de invertebrados terrestres (Tabela II). Para essa espécie, também foi verificado aumento significativo no coeficiente intestinal com o crescimento (r = 0,74; p < 0,01; n = 15), embora bem menos pronunciado que aquele registrado para H. wheatlandii (Figura 5). Frutos de Moraceae (Ficus sp.) foram registrados somente em exemplares acima de 20 cm, enquanto que partes de sementes e outros frutos não identificados estiveram presentes nos estômagos de exemplares desde 7,5 cm. Invertebrados terrestres foram representados por coleópteros e himenópteros (formas aladas ou não de Formicidae), enquanto que os aquáticos pertenciam às ordens Diptera, Hemiptera e Odonata, esses ocorrendo em baixa freqüência e peso. As três espécies utilizam diferentes táticas para obterem o alimento. Assim, L. thayeri e exemplares de H. wheatlandii com tamanhos até 15 cm são predadores bentônicos que exploram o substrato para captura de invertebrados aquáticos, primariamente formas juvenis pertencentes a várias ordens de insetos; B. opalinus é um

68 onívoro que utiliza itens alóctones de origem vegetal e animal e que são capturados na superfície e coluna d’água; por último os exemplares maiores de H. wheatlandii (> 15 cm), aqui considerados como primariamente herbívoros e que exploram tanto vegetais que caem na água (frutos e sementes) como partes de plantas aquáticas (Podostemaceae). Invertebrados terrestres foram considerados como itens acessórios na dieta.

Tabela II – Índice alimentar (IAi) para as espécies de peixes ameaçadas de extinção na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG.

Item alimentar / Índice de Importância Alimentar (IAi)

Espécie Amplitude n Invertebrados Invertebrados Moraceae Sementes e Podoste- CP (mm) aquáticos terrestres (Ficus sp.) frutos maceae

H. wheatlandii 80 – 145 8 0,975 0,024 - - 0,002

160 – 262 9 - 0,015 0,954 - 0,031

L. thayeri 94 – 209 30 0,999 0,001 - - -

B. opalinus 72-211 21 0,002 0,563 0,074 0,361 -

B A Figuras 4 – A) Estômago de Henochilus wheatlandii preenchido com frutos de Moraceae (Ficus sp.) e partes de Podostemaceae B) Seção do intestino de um exemplar de H. wheatlandii cujo lúmem encontra-se totalmente preenchido por nematóides.

69 3,0

2,8 Henochilus wheatlandii r = 0,96 p < 0,001 Brycon opalinus r = 0,74 p < 0,01 2,6 Leporinus thayeri r = 0,23 p > 0,05

2,4

2,2

2,0

1,8

1,6

1,4

1,2 Coeficiente intestinal 1,0

0,8

0,6

0,4 60 80 100 120 140 160 180 200 220 240 260 280 Comprimento padrão (mm)

Figura 5 – Relação entre o comprimento padrão e o coeficiente intestinal para três espécies de peixes ameaçados de extinção na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG. As relações peso-comprimento, as equações correspondentes e os valores dos coeficientes de determinação (r2) encontram-se na Figura 6. O teste t para o tipo de crescimento das três espécies indicou crescimento do tipo alométrico negativo para L. tahyeri e isométrico para H. weatlandii e B. opalinus (p < 0,001). O coeficiente de determinação ficou acima de 98% para todas as espécies.

70 200

175 Leporinus tahyeri 150 Y = 0,00006 * X 2,792 r2 = 0,98 125

100 Peso (g)

75

50

25

0 0 25 50 75 100 125 150 175 200 225 Comprimento padrão (mm) 400

350 Henochilus wheatlandii

Y = 0,00001 * X 3,0895 300 r2 = 0,99

250

200 Peso (g)

150

100

50

0 0 40 80 120 160 200 240 280 Comprimento padrão (mm) 400

350 Brycon opalinus

Y = 0,00002 * X 3,0869 300 r2 = 0,99

250

200 Peso (g)

150

100

50

0 0 25 50 75 100 125 150 175 200 225 250 Comprimento padrão (mm) Figura 6 - Relação peso comprimento para espécies de peixes ameaçados de extinção na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG.

71 DISCUSSÃO As cinco espécies ameaçadas aqui analisadas representaram menos de 1,5% do total de exemplares capturados na drenagem do rio Santo Antônio, incluindo todos os dados das amostragens em campo e aqueles referentes ao material testemunho que se encontra depositado em museus. Devido à raridade ou ausência nas amostragens, duas espécies (B. devillei e S. doceanum) não puderam ser avaliadas quanto aos aspectos de sua biologia na drenagem do rio Santo Antônio, embora os registros obtidos tenham sido utilizados como um indicativo das áreas e hábitats que as mesmas utilizam. O nome B. devillei tem sido utilizado para designar as piabanhas que ocorrem na calha e nos lagos do médio rio Doce (Sunaga & Verani, 1991; Godinho, 1996), razão pela qual foi utilizado na lista de espécies ameaçadas do Brasil (MMA, 2004; Rosa & Lima, 2005). Entretanto, segundo revisão taxonômica do gênero, trata-se de uma espécie nova ainda não descrita (Lima, 2001). Os poucos estudos com informações biológicas indicam que alcança tamanho de até 60 cm e possui dieta que inclui frutos, sementes, larvas de Odonata, camarões, insetos terrestres e peixes (Godinho, 1996; Lima, 2001). Esses dados demonstram o hábito alimentar onívoro, condição também relatada para outros Brycon de maior porte, tanto em rios amazônicos como no sudeste brasileiro (Goulding, 1980; Lowe-McConnell, 1987; Lima & Castro, 2000). Os dois registros obtidos no baixo rio Santo Antônio foram congruentes com os dadso sobre a ocorrência da espécie somente em altitudes inferiores a 300 metros e nos rios de maior porte da bacia do Doce (dados inéditos). Assim, a ausência de B. devillei acima da UHE de Salto Grande parece estar relacionada à sua distribuição original e não ao impedimento do deslocamento para montante proporcionado pelo barramento. Embora não existam dados sobre abundância, trabalhos desenvolvidos no baixo rio Doce na região de Aimorés (MG) demonstraram que a espécie já fez parte da pesca artesanal local, desaparecendo da mesma durante a década de 1970 (Alves et. al., no prelo). Atualmente, além dos exemplares obtidos no baixo Santo Antônio, os únicos registros adicionais foram feitos em localidades específicas no rio Suaçui Grande e na região da foz do Manhuaçu em Aimorés (obs. pes.), além dos lagos Dom Helvécio, Carioca e Palmeiras (Sunaga & Verani, 1991; Godinho et al., 1994). As causas do declínio populacional ao longo de toda a bacia são desconhecidas, embora a expressiva supressão da vegetação com conseqüente redução da disponibilidade de recursos alimentares alóctones e perda de hábitats por assoreamento, pode ter sido a causa principal. Hipótese similar foi proposta para B. vermelha do rio

72 Mucuri (Lima & Castro, 2000), e para outras espécies congêneres de grande porte (Pádua & Audi, 1984; Agostinho et al., 2003). No rio Santo Antônio, o intenso assoreamento do baixo curso pode ser a principal causa da baixa representatividade da espécie ao longo dos estudos desenvolvidos. No gênero Steindachneridion, estão incluídas seis espécies que possuem distribuições restritas às drenagens costeiras do leste do Brasil, Alto Paraná e rio Uruguai (Garavello, 2005), sendo que quatro encontram-se listadas como ameaçadas de extinção (MMA, 2004). A não inclusão de S. melanodermatum e S. punctatum como ameaçadas está relacionada a aspectos taxonômicos, visto que a primeira foi descrita posteriormente à elaboração da lista de espécies ameaçadas, enquanto a segunda foi revalidada no mesmo estudo de revisão do gênero (Garavello, 2005). Entre as espécies oficialmente reconhecidas como ameaçadas, aquelas endêmicas do rio Doce (S. doceanum), Jequitinhonha/Pardo (S. amblyurum) e Paraíba do Sul (S. parahybae) são as que se encontram em situação mais crítica de conservação (MMA, 2004; Rosa & Lima, 2005). Steindachneridion doceanum é a maior espécie de água doce nativa na bacia do rio Doce, com relatos de peixes pesando até 17 kg (obs. pes.). De forma similar ao relatado para a piabanha (B. devillei), já fez parte da pesca artesanal na região de Aimorés, onde não é mais capturado desde o final da década de 1970 (Alves at al., no prelo). Segundo relato de pescadores e observações em campo, é uma espécie que possui como hábitats específicos os locais mais profundos na calha do rio Doce e de seus maiores afluentes, primariamente em poções com fundos rochosos e localizados abaixo de corredeiras e cachoeiras. O uso exclusivo desse tipo de ambiente também foi descrito para as demais espécies do gênero (Garavello, 2005). Nenhuma informação está disponível sobre aspectos da biologia da espécie, fato relacionado ao reduzido número de exemplares disponíveis. Os dados mais recentes sobre a distribuiçãode S. doceanum na bacia do rio Doce se resumem a três exemplares capturados no rio Piranga e imediatamente abaixo da confluência desse com o rio do Carmo, quando passa a ser denominado rio Doce (Garavello, 2005), além do baixo rio Manhuaçu e médio Santo Antônio (obs. pes.). No médio Santo Antônio o registro foi feito com base em material observado com pescador e se refere somente a cabeça de um exemplar. A raridade dessa espécie na bacia do rio Doce parece estar relacionada primariamente à retirada da cobertura vegetal, com conseqüente assoreamento que

73 eliminou grande parte de seus hábitats. Em anos recentes, a introdução do híbrido resultante do cruzamento do surubim com o cachara (Pseudoplatystoma corruscans x P. fasciatum), ocorreu por todo o rio Doce e representa uma ameaça potencial, mas sem qualquer avaliação até o presente (Vieira & Pompeu, 2001; Alves et al., no prelo). As formas de introdução do híbrido na bacia do rio Doce não estão registradas na literatura, embora no rio Santo Antônio esteja relacionada aos escapes de tanques-rede usados para criação. Essa constatação está embasada no fato de ser mantido dentro do rio do Tanque, no município de Santa Maria do Itabira, o maior cultivo comercial da espécie na bacia do rio Doce (Coelho & Cyrino, 2006). O híbrido, conhecido popularmente como surubim-ponto-e-vírgula ou cachara, é um piscívoro de grande porte (exemplares de até 25 kg já foram capturados no rio Doce - obs. pes.) e nada se conhece sobre a suas relações com S. doceanum, apesar de registros em ambientes similares àqueles originalmente ocupados pela espécie nativa. Dados de campo indicam que o híbrido possui menores restrições ambientais que S. doceanum, colonizando até mesmo rios de menor porte como o Matipó e áreas bastante alteradas (obs. pes.). As espécies com exemplares disponíveis para análises biológicas (H. wheatlandii, B. opalinus e L. thayeri) apresentaram distribuições similares, as quais se resumem ao trecho localizado a montante da UHE Salto Grande e incluiu exclusivamente a calha do rio Santo Antônio e o médio-baixo curso de alguns afluentes maiores. Henochilus weatlandii foi a única que teve exemplares registrados a jusante desse barramento (Volney Vono & Renê Hojo, com. pes.). Entretanto, considero que esses eventos foram ocasionais e estiveram relacionados a períodos de fortes chuvas, quando é possível a passagem de alguns peixes através das comportas dos vertedores. Dessa forma, em função de H. weatlandii não manter populações nessa região, os registros foram considerados acidentais e não foram considerados como área de distribuição da espécie. As três espécies ocorreram primariamente em ambientes lóticos de rios maiores, sempre com larguras superiores a 10 metros, utilizando áreas com leito rochoso e extensas áreas encachoeiradas, essas intercaladas por regiões de deposição de areia onde são formados poções e remansos. A maioria das áreas mantinha vegetação ciliar expressiva, entretanto, também ocorreram em trechos onde houve supressão e substituição parcial por pastagens. A única exceção a esse padrão foram os dois exemplares de B. opalinus coletados no braço do reservatório da UHE Salto Grande, dentro do rio Guanhães. Esse reservatório recebe água do rio Santo Antônio através de

74 um aqueduto, o qual pode funcionar como uma rota para chegada desses peixes a esse ambiente. Entretanto, a baixa representatividade quando comparada as demais áreas de distribuição é um indicativo de que a espécie talvez não estabeleça populações com ciclo de vida completo nesse ambiente. Vieira et al. (2005) utilizaram a presença de juvenis como indicativo para inferir que a reprodução deve ocorrer em áreas lóticas em trechos mais elevados da drenagem. As três espécies ocorreram indistintamente em ambientes de águas claras e naqueles que possuem águas de coloração escura e pH ligeiramente ácido, como no rio Preto do Itambé (Galdean et al., 2000) e trecho superior do rio Santo Antônio. Ao que tudo indica, são as características fisiográficas da drenagem que determinam o padrão de distribuição registrado para as três espécies. O andirá (H. wheatlandii) foi descrito em 1890 com base em um exemplar obtido na localidade de Santa Clara, bacia do rio Mucuri (Garman, 1890). Decorrido mais de um século após a descrição e amplos esforços de coleta no rio Mucuri, nenhum outro exemplar foi obtido. Esse fato culminou com a sua inclusão na lista de espécies ameaçadas (Rosa & Menezes, 1996), sendo posteriormente considerado extinto no leste do Brasil (Swerdlow, 1998). Em setembro de 1996, Vieira et al., (2000) registraram dois exemplares no rio Preto do Itambé, bacia do rio Santo Antônio e propuseram duas hipóteses para explicar a ausência da espécie no rio Mucuri: erro na designação da localidade tipo ou extinção local. Essas hipóteses ainda permanecem sob debate (Castro et al., 2004), embora o holótipo continue a ser o único exemplar conhecido proveniente do rio Mucuri e o rio Santo Antônio a única área com registros atuais. É uma espécie de porte grande (sensu Agostinho et al., 1995), que chega a mais de 40 cm de comprimento total (holótipo) e cujo crescimento isométrico indica proporcionalidade entre o aumento de tamanho e o ganho de peso. A primeira indicação de hábito alimentar herbívoro foi feita por Garman (1890), posteriormente corroborada com a análise de outros cinco exemplares (Vieira & Alves, 2001, Castro et al., 2004). Entretanto, segundo Castro et al. (2004) a espécie passa por mudanças acentuadas na dieta, tamanho do trato digestivo e dentição ao longo do desenvolvimento ontogenético, mas devido ao pequeno número de exemplares analisados (3), indicaram que havia necessidade de ampliar as observações. A análise da dieta demonstrou a ontogênese trófica, permitindo inferir que a mudança de hábito alimentar se processa em exemplares com cerca de 15 cm de comprimento padrão. A partir desse tamanho ocorre um incremento acentuado no

75 tamanho do intestino, o qual chega a atingir quase 3 vezes o comprimento padrão em exemplares com 26 cm. Dessa forma, exemplares pequenos são predadores de invertebrados bentônicos enquanto os maiores passam a utilizar quase que exclusivamente vegetais superiores, incluindo plantas terrestres (Moraceae) e aquáticas (Podostemaceae), além de insetos terrestres em pequena proporção. Segundo Gerking (1994), nenhum peixe herbívoro adulto utiliza somente vegetais na alimentação, fato demonstrado em diversos estudos de dieta. Entretanto, na maioria dos casos, itens de origem animal foram interpretados como ingeridos acidentalmente durante o forrageamento, o que parece não se aplicar a H. weatlandii. O registro exclusivo de insetos alóctones e também grandes quantidades de frutos de Ficus sp., que flutuam e são arrastados pela corrente, indica que é feita captura ativa, tática de forrageamento que pode ser classificada como cata na superfície (“surface picking” sensu Sazima, 1986) e alimentação de itens a deriva (“drift-feeding” sensu Grant & Noakes, 1987). Dessa forma, os insetos terrestres utilizados pelos exemplares de maior porte são intrerpretados como um complemento da dieta, cujo hábito alimentar é aqui considerado como primariamente herbívoro. No leste brasileiro, os relatos sobre o uso de podostemáceas como alimento por peixes são muito raros (Vilella et al., 2002), contrastando com o uso de vegetais terrestres, principalmente frutos e sementes (Araújo-Lima et al., 1995; Barrella et. al, 2000; Gomiero & Braga, 2003; Alvim & Peret, 2004; Bennemann et al., 2005). Na área estudada, Ficus sp. representou o principal item alimentar dos exemplares de H. wheatlandii com tamanhos superiores a 15 cm. Brycon opalinus também fez uso desse recurso, embora os itens principais tenham sido invertebrados terrestres seguidos de outros frutos e sementes diversas. Embora o uso de itens alimentares pelos peixes possa mudar em função da disponibilidade local e temporal (Gerking, 1994), nossas observações reforçam a importância da vegetação ripária como fonte importante de recursos para as duas espécies. Segundo Philbrick & Novelo (1995), a família Podostemaceae possui distribuição principalmente tropical e ocupa ambiente único para as angiospermas, que são as rochas em áreas de rios com corredeiras e cachoeiras. Em função de formarem extensos estandes, essas plantas têm sido descritas como importantes hábitats para vários organismos (Vadas & Orth, 2000; Hutchens et al., 2004), além de servirem diretamente como alimento para diversas espécies de peixes, principalmente em rios amazônicos (Santos et al., 1997; Horeau et al., 1998; Santos & Rosa, 1998; Zanata & Lima, 2005;

76 Jégu & Keith, 2005). Nas drenagens do leste brasileiro, além do uso por H. wheatlandii, o único relato adicional de podostemáceas como alimento de peixes foi feito para espécies do gênero Astyanax (Vilella et al., 2002). Podostemáceas abrigam uma grande diversidade de invertebrados aquáticos, alguns ocorrendo em altas densidades e que são utilizados como fonte de alimento pelos peixes (Hutchens et al., 2004). No rio Santo Antônio, esse recurso parece ser explorado pelos exemplares pequenos de H. wheatlandii (< 15 cm de CP), que se alimentam primariamente de invertebrados aquáticos e foram capturados principalmente junto às corredeiras onde essas plantas crescem em abundância. Segundo Winemiller (1992), a forma dos dentes dos Characiformes é um bom indicativo sobre as diferenças no comportamento e no uso de recursos alimentares. Em H. wheatlandii, além do aumento no tamanho do intestino, ocorrem mudanças no formato dos dentes com o crescimento e estas também foram associadas à mudança no hábito alimentar de invertívoros para herbívoros (Castro et al., 2004). Características semelhantes (adultos com intestino longo e dentes com cúspides arredondadas) foram descritas para Mylesinus paraschomburgkii e Tometes lebaili em rios amazônicos, embora nessas espécies a alimentação dos adultos seja mais especializada incluindo quase exclusivamente podostemáceas (Jégu & Santos, 1988; Jégu et al., 1989; Santos et al., 1997; Jégu & Keith, 2005). Nas outras espécies, cuja dieta incluiu podostemáceas (Vilella et al., 2002; Zanata & Lima, 2005), não estão descritas mudanças ontogenéticas na dentição e trato digestivo, fato que pode estar associado as mesmas não serem herbívoras quando adultas. Entre os exemplares analisados de H. wheatlandii, os que estavam em estádio avançado de maturação das gônadas ou desovados/espermiados, foram capturados em março de 2005, com o menor peixe medindo 20 cm de comprimento padrão. Esse é um indicativo que a repodução ocorre durante o período chuvoso, padrão descrito para grande parte dos Characiformes da América do Sul (Vazzoler & Menezes, 1992). A maturação sexual parece ser alcançada após as mudanças ontogenéticas descritas para a dieta, embora não pareça ocorrer concomitantemente. Apesar desse indicativo, estudos com maior número de exemplares são necessários para validar essas observações. Da mesma forma que para M. paraschomburgkii (Thatcher & Jégu, 1996; Santos et al., 1997), também em H. wheatlandii foi registrado que partes do intestino de todos os exemplares grandes e com hábito alimentar herbívoro encontravam-se tomadas por nematóides. Santos et al. (1997) colocaram em dúvida ser esse um caso de parasitismo,

77 visto que todos os exemplares analisados estavam em excelentes condições nutricionais e sem qualquer sinal de patologias. A mesma observação se aplica a H. wheatlandii, restando estudos mais detalhados para definir a verdadeira relação entre o hospedeiro e os nematóides encontrados em seu trato digestivo. Tanto B. opalinus como L. thayeri foram descritos a partir de exemplares do rio Paraíba do Sul (Garavello & Britski, 2003; Lima, 2003), sendo que mais recentemente tiveram populações localizadas em outras drenagens do leste brasileiro (Vieira, 2005; J. Birindelli, com. pes.; obs. pes.). Assim, a distribuição confirmada das duas espécies abrange a área entre as drenagens que vão do rio Doce ao Paraíba do Sul, não sendo válida a indicação de ocorrência de L. thayeri feita para o rio Jequitinhonha por Garavello & Britski (2003). Na bacia do rio Doce, as únicas populações representativas das duas espécies são as existentes no médio e alto rio Santo Antônio. Os únicos registros adicionais estão restritos ao rio Piranga (B. opalinus – MZUSP 59287) e córrego Taquaraçu (L. thayeri – MZUSP 41727), ambos os lotes representados por um exemplar cada e que foram coletados há mais de uma década. Brycon opalinus é uma espécie reofílica, necessitando indução hormonal para desovar quando mantido em cativeiro (Narahara et al., 2002). No rio Santo Antônio, foram registrados exemplares de até 30 cm e que no seu conjunto apresentaram crescimento isométrico. O menor exemplar em atividade reprodutiva mediu 21 centímetros de comprimento padrão e foi registrado em março de 2005, semelhante ao encontrado para H. wheatlandii. A dieta foi composta quase exclusivamente por recursos alóctones (insetos, frutos e sementes), caracterizando o hábito alimentar onívoro, padrão reconhecido para a maioria das espécies desse gênero (Menezes, 1969; Goulding, 1980; Horn, 1997; Sabino & Sazima, 1999; Lima & Castro, 2000). Embora o coeficiente intestinal tenha apresentado correlação significativa em relação ao crescimento, o valor máximo de 1,2 foi inferior àquele relatado para B. guatemalensis, cujos exemplares adultos possuem intestino maior que o dobro do tamanho e apresentam dieta composta quase inteiramente por frutos e folhas (Drewe et al., 2004). Entretanto, esses autores argumentaram que o aumento ontogenético no comprimento do intestino pode ser uma característica comum para Brycon sem conexão com troca de dieta, sendo nesse caso a quantidade de material vegetal ingerido o elemento crítico para a compreensão dessa relação. Nossos dados corroboram essa premissa, uma vez que exemplares grandes de

78 B. opalinus possuem dieta mais diversificada e relação intestino/comprimento menor que B. guatemalensis. Espécies de Brycon têm sido relacionadas a processos de dispersão de sementes, principalmente em áreas de florestas alagáveis (Horn, 1997; Goulding, 1980; Banack et. al., 2002; Drewe et al., 2004). Embora a possibilidade de dispersão de sementes por B. opalinus não tenha sido avaliada, é possível que essa relação não seja tão efetiva na região de estudo, visto que a maioria das sementes encontradas nos estômagos estava quebrada. Entretanto, deve-se considerar que os estudos que comprovam a relação de espécies do gênero Brycon como dispersoras foram feitos tendo como modelo Ficus spp., que possui sementes muito pequenas e que não são trituradas para a ingestão (Horn, 1997; Banack et. al., 2002; Drewe et al., 2004). Sob esse aspecto, tanto B. opalinus como H. wheatlandii utilizaram Ficus sp. e podem ser dispersores efetivos, uma relação que necessita maiores investigações. Como relatado para B. guatemalensis (Horn, 1997), a dispersão seria particularmente importante para sítios a montante do local onde se encontram as plantas em frutificação, condição provável de ocorrer pelo menos com B. opalinus, para o qual existem indícios de deslocamentos para trechos mais elevados da drenagem durante o período reprodutivo (Vieira et al., 2005). Leporinus thayeri é um anostomídeo relativamente raro e com distribuição disjunta em rios de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo (Vieira, 2005). No final da década de 1970 foi considerado sinônimo de L. mormyrops (Garavello, 1979), condição que perdurou até recente revalidação da espécie (Garavello & Britski, 2003). É uma espécie de médio porte (maior exemplar com 26 cm) e apresentou crescimento alométrico negativo, condição que se traduz em animais com corpo baixo e alongado. Adicionalmente, esse formato de corpo é característico de peixes que vivem em trechos encachoeirados e com forte velocidade da corrente, áreas onde a maioria dos exemplares foi capturada. Dados da dieta demostraram que é um ínvertivoro bentônico que utilizou quase que exclusivamente formas imaturas e adultas de insetos aquáticos, notadamente Trichoptera e larvas de Diptera. O uso intensivo de larvas de Diptera também foi relatado para L. amblyrhynchus, outro anostomídeo com tamanho e características morfológicas similares a L. thayeri, mas com distribuição geográfica distinta (Callisto et al., 2002; Mendonça et al., 2004). Segundo Winemiller (1992), predadores bentônicos tendem a possuir perfil ventral reto e dorsal convexo, boca orientada para baixo e nadadeiras peitorais pequenas, todas essas características observadas em L. thayeri.

79 Diferente de B. opalinus e H. wheatlandii, L. thayeri não apresentou variação ontogenética nos valores do coeficiente intestinal, que esteve entre 0,73 e 1,11 para exemplares de 9,4 a 20,9 cm de comprimento padrão. Exemplares em atividade reprodutiva foram registrados em diferentes anos de amostragem sempre entre os meses de novembro e março, coincidindo com o período de chuvas, uma característica comum para Characiformes do leste brasileiro (Vazzoler & Menezes, 1992). Todas as espécies aqui analisadas são reofílicas e demonstraram que as particularidades na distribuição espacial, uso de hábitats e de recursos alimentares estão intimamente relacionadas aos ambientes lóticos da drenagem do rio Santo Antônio. Pelo menos três espécies mantêm populações significativas no trecho médio-alto da drenagem, fato aqui atribuído a ser esse um sistema ainda pouco alterado em termos de sua fisiografia. Esse fato indica que programas de conservação são viáveis e podem garantir a permanência das mesmas a longo prazo. Para B. devillei e S. doceanum, as perspectivas de conservação são menos promissoras, pois as populações parecem estar em acentuado declínio, tanto no Santo Antônio como no restante do rio Doce.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Abilhoa, V. & Duboc, L. F. 2004. Livro vermelho da fauna ameaçada do Paraná. Curitiba, Instituto Ambiental do Paraná – IAP (Versão eletrônica em: http://celepar7.pr.gov.br/livrovermelho/index.asp?idmenu=intr&idgrupo=0 Agostinho, A. A.; Gomes, L. C.; Suzuki, H. I & Júlio Jr., H. F. 2003. Migratory fishes of the Upper Paraná River Basin, Brazil, p. 19-98. In: Carolsfeld, J., Harvey, B., Ross, C. & Baer, A. (eds.). Migratory fishes of South America: Biology, Fisheries and Conservation Status. IDRC and World Bank. 372 p. Agostinho, A. A.; Vazzoler, A. E .A. M. & Thomaz, S. M. 1995. The high river Paraná basin: limnological and ichthyological aspects. pp. 59-103 In: Tundisi, J. G., Bicudo, C. E. M. & Tundisi, T. M. Limnology in Brazil, ABC/SBL, Rio de Janeiro Alves, C. B. M.; Vieira, F.; Magalhães, A. L. B. & Brito, M. F. G (no prelo). Impacts of non-native fish species in Minas Gerais, Brazil: present situation and prospects. In: Bert, T. M. (ed.), Ecological and Genetic Implications of Aquaculture Activities, Kluwer Academic Publishers, The Netherlands Alvim, M. C. C. & Peret, A. C. 2004. Food resources sustaining the fish fauna in a section of the upper São Francisco river in Três Marias, MG, Brazil. Brazilian Journal of Biology, 64(2): 195-202

80 Araújo-Lima, C. A. R. M.; Agostinho, A. A. & Fabré, N. N. 1995. Trophic aspects of fish communities in Brazilian rivers and reservoirs. In.: Limnology in Brazil (J.G. Tundisi, C.E.M. Bicudo & T. Matsumura-Tundisi, eds.). ABC/SBL, Rio de Janeiro, p.105-136 Banack, S. A.; Horn, M. H. & Gawlicka, A. 2002. Disperser- v. establishment-limited distribution of a riparian fig tree (Ficus insipida) in a Costa Rican tropical rain forest. Biotropica 34(2): 232–243. Barrella, W.; Petrere Jr., M.; Smith, W. S. & Montag, L. F. A. 2000. As relações entre as matas ciliares, os rios e os peixes. In.: Rodrigues, R. R. & Filho, H. F. L. (eds.) Matas ciliares: Conservação e Recuperação. EDUSP, São Paulo, p.187-207 Bennemann, S. T.; Gealh, A. M.; Orsi , M. L. & Souza, L. M. 2005. Ocorrência e ecologia trófica de quatro espécies de Astyanax (Characidae) em diferentes rios da bacia do rio Tibagi, Paraná, Brasil. Iheringia, Série Zoologia, 95(3):247-254 Callisto, M.; Vono, V.; Barbosa, F. A. R. & Santeiro, S. M. 2002. Chironomidae as a food resource for Leporinus amblyrhynchus (Teleostei: Characiformes) and Pimelodus maculatus (Teleostei: Siluriformes) in a Brazilian reservoir. Lundiana, 3: 67-73. Castro, R. M. C.; Vari, R. P.; Vieira, F. & Oliveira, C. 2004. Phylogenetic analysis and redescription of the genus Henochilus (Characiformes: Characidae). Copeia, 2004(3): 496–506 Coelho, S. R. C. & Cyrino, J. E. P. 2006. Custos na produção intensiva de surubins em gaiolas. Informações Econômicas, 36(4): 7-14 Coimbra-Filho, A. F. & Magnanini, A. 1968. Animais raros ou em vias de desaparecimento no Brasil. Anuário Brasileiro de Economia Florestal, 19: 149- 177 Darwall, W. R. T. & Vié, J-C. 2005. Identifying important sites for conservation of freshwater biodiversity: extending the species-based approach. Fisheries Management and Ecology, 12: 287–293 Drewe, K. E.; Horn, M. H.; Dickson, K. A. & Gawlicka, A. 2004. Insectivore to frugivore: ontogenetic changes in gut morphology and digestive enzyme activity in the characid fish Brycon guatemalensis from Costa Rican rain forest streams. Journal of Fish Biology 64 (4): 890-902 Galat, D. L. & Zwemüller, I. 2001. Conserving large-river fishes: is the highway analogy an appropriate paradigm? Journal North American Benthological Society, 20(2): 266–279

81 Galdean, N.; Callisto, M. & Barbosa, F. A. R. 2000. Lotic ecosystems of Serra do Cipó, southeast Brazil: water quality and a tentative classification based on the benthic macroinvertebrate community. Aquatic Ecosystem Health and Management, 3 (4): 545-552 Garavello, J. C. & Britski, H. A. 2003. Anostomidae - (Headstanders). pp. 71-84. In: Reis, R.E., Kullander, S.O. & Ferraris-Jr., C. J. (eds.) Checklist of the Freshwater Fishes of South and Central America. Porto Alegre, EDIPUCRS Garavello, J. C. 1979. Revisão taxonômica do gênero Leporinus Spix, 1829 (Ostariophysi, Anostomidae). Tese de doutoramento, Universidade de São Paulo, São Paulo. 451p. Garavello, J. C. 2005. Revision of genus Steindachneridion (Siluriformes: Pimelodidae). Neotropical Ichthyology, 3(4): 607-623 Garman, S. 1890. On a genus and species of the Characines (Henochilus wheatlandi, gen, et sp. nov.). Bulletin Essex Institution, 19: 49-52 Gaston, K. J. 1994. Rarity. Chapman & Hall, London, 205 p. Gerking, S. D. 1994. Feeding ecology of fishes. Academic Press, London. 416p. Godinho A. L. 1996. Peixes do Parque Estadual do Rio Doce. Belo Horizonte: Instituto Estadual de Florestas/Universidade Federal de Minas Gerais, 32 pp. Godinho, A. L.; Fonseca M. T. & Araújo, L. M. 1994. The ecology of predator fish introductions: the case of Rio Doce valley lakes. pp. 77-83. In: Pinto-Coelho, R. M.; Giani, A. & von Sperling, E. (eds.), Ecology and Human Impact on Lakes and Reservoirs in Minas Gerais with Special Reference to Future Development and Management Strategies. SEGRAC, Belo Horizonte Gomiero, L. M. & Braga, F. M. S. 2003. O lambari Astyanax altiparanae (Characidae) pode ser um dispersor de sementes? Acta Scientiarum 25 (2): 353-360 Goulding, M. 1980. The fishes and the forest: explorations in Amazonian life history. University of California Press, Berkely, 280 p. Grammont, P. C. & Cuarón, A. D. 2006. An evaluation of threatened species categorization systems used on the American continent. Conservation Biology, 20 (1): 14–27 Grant, J. W. A. & Noakes, D. L. G. 1987. A simple model of optimal territory size for drift-feeding fishes. Canadian Journal of Zoology, 65: 270-276 Hilsdorf, A. W. S. & Petrere-Jr., M. 2002. Conservação de peixes na bacia do rio Paraíba do Sul. Ciência Hoje, 30(180): 62-65

82 Hilsdorf, A. W. S., Espin, A. M. A., Krieger M. H. & Krieger, J. E. 2002. Mitochondrial DNA diversity in wild and captivity population of Brycon opalinus (Cuvier, 1819) (Characiforme, Characidae, Bryconiae), in the Paraíba do Sul Basin, Brazil. Aquaculture, 214: 81-91 Horeau, V.; Cerdan, P.; Champeau, A. & Richard, S. 1998. Importance of aquatic invertebrates in the diet of rapids-dwelling fish in the Sinnamary River, French Guiana. Journal of Tropical Ecology, 14: 851-864 Horn, M. H. 1997. Evidence for dispersal of fig seeds by the fruit-eating characid fish Brycon guatemalensis Regan in a Costa Rican tropical rain forest. Oecologia, 109(2): 259-264 Hutchens, J. J.; Wallace, J. B. & Romaniszyn, E. D. 2004. Role of Podostemum ceratophyllum Michx. in structuring benthic macroinvertebrate assemblages in a southern Appalachian river. Journal of North American Benthological Society, 23(4):713–717 Hyslop, E. J. 1980. Stomach contents analysis – a review of methods and their application. Journal of Fish Biology, 17: 411-29. IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, 1989. Dispõe sobre a Lista Oficial de Espécies da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção. Portaria IBAMA Nº 1.522, de 19 de dezembro 1989, publicada no Diário Oficial da União, de 23 de fevereiro de 1989 IBDF – Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal, 1973. Lista oficial de espécies animais em perigo de extinção da fauna indígena. Portaria no. 3.481 – DN de 31 de maio de 1973 Jégu, M. & Keith, P. 2005. Threatened fishes of the world: Tometes lebaili (Jégu, Keith & Belmont-Jégu 2002) (Characidae: Serrasalminae). Environmental Biology of Fishes, 72: 378 Jégu, M. & Santos, G. M. 1988. Une nouvelle espèce du genre Mylesinus (Pisces, Serrasalmidae), M. paucisquamatus, décrite du bassin du Rio Tocantins (Amazonie, Brésil). Cybium, 2 (4): 331-341 Jégu, M.; Santos, G. M. & Ferreira, E. 1989. Une nouvelle espèce du genre Mylesinus (Pisces, Serrasalmidae), M. paraschomburgkii, décrite des bassins du Trombetas et du Uatuma (Brésil, Amazonie). Revue Hydrobiologie Tropicale, 22 (1): 49-62

83 Kawakami, E. & Vazzoler, G. 1980. Método gráfico e estimativa de índice alimentar aplicado ao estudo de alimentação de peixes. Boletim Instituto Oceanográfico, 29 (2): 205-207. Kunin, W. E. & Gaston, K. J. 1997. The biology of rarity: causes and consequences of rare-commom differences. Chapman & Hall, London, 280 p. Lima, F. C. T. & Castro, R. M. C. 2000. Brycon vermelha, a new species of characid fish from the rio Mucuri, a coastal river of eastern Brazil (Ostariophysi: Characiformes). Ichthyological Explorations of Freshwaters, 11 (2): 155-162 Lima, F. C. T., 2003. Characidae - Bryconinae (Characins, tetras). pp. 174-181. In: Reis, R.E., Kullander, S.O. & Ferraris-Jr., C. J. (eds.) Checklist of the Freshwater Fishes of South and Central America. Porto Alegre, EDIPUCRS Lima, F. C. T. 2001. Revisão taxonômica do gênero Brycon Müller & troschel, 1844, dos rios da América do Sul cisandina (Pisces, Ostariophysi, Characiformes, Characidae). Dissertação de mestrado, Instituto de Biociências, Universidade de São Paulo, São Paulo, 312 pp. Lowe-McConnell, R. H. 1987. Ecological studies in tropical fish communities. Cambridge University Press, London, 382 p. Lundberg, J. G. & Littmann, M. W. 2003. Family Pimelodidae (long-whiskered ). pp. 432–446 In: Reis, R.E., Kullander, S.O. & Ferraris Jr., C.J. (Eds.), Check List of the Freshwater Fishes of South and Central America. EDIPUCRS, Porto Alegre, Mace, G. M., & Lande, R. 1991. Assessing extinction threats: toward a re-evaluation of IUCN threatened species categories. Conservation Biology, 5:148–157. Machado, A. B. M., Fonseca, G. A. B., Machado, R. B., Aguiar, L. M. S. & Lins, L. V. 1998. Livro vermelho das espécies ameaçadas de extinção da fauna de Minas Gerais. Belo Horizonte, Fundação Biodiversitas. 605 p. Marques, A. A. B.; Fontana., C. S.; Vélez, E.; Bencke, G. A.; Schneider, M. & Reis, R.E. (Orgs.) 2002. Lista das Espécies da Fauna Ameaçadas de Extinção no Rio Grande do Sul. - Decreto n 41.672, de 11 de junho de 2002. Porto Alegre: FZB/MCT-PUCRS/PANGEA, 52 p. Mazzoni, R.; Bizerril, C. R. F. S.; Buckup, P. A.; Filho, O. C. M., Figueiredo, C. A.; Menezes, N. A.; Nunam, G. W. & Tanizaki-Fonseca, K. 2000. Peixes. pp. 63-76, in.: Bergallo, H. G.; Rocha, C. F. D.; Alves, M. A. S. & Sluys, M. V. (eds.). A

84 fauna ameaçada de extinção do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: UERJ & FAFERJ. Mendonça, F. P.; Hahn, N. S. & Loureiro-Crippa, V. E. 2004. Feeding aspects of Leporinus amblyrhynchus (Characiformes: Anostomidae) in the first stages of formation of a Neotropical reservoir, Brazil. Neotropical Ichthyology, 2(3):145- 150 Menezes, N. A. 1969. The food of Brycon and three closely related genera of the tribe Acestrorhynchini. Papéis Avulsos de Zoologia 22: 217-223 MMA – Ministério do Meio Ambiente. 2003. Lista das espécies da fauna brasileira ameaçada de extinção. Instrução Normativa no. 3, de 27 de maio de 2003, Brasília MMA – Ministério do Meio Ambiente. 2004. Lista nacional das espécies de invertebrados aquáticos e peixes ameaçados de extinção. Instrução Normativa no. 5, de 21 de maio de 2004, Brasília Moyle, P. B. & Leidy, R. A. 1992. Loss of biodiversity in aquatic ecosystems: evidence from fish faunas. pp. 127-169 in.: Fiedler, P.L. & Jain, S. K. (eds.) Conservation biology: the theory and pratice of nature conservation, preservation, and management. Chapman & Hall, London, 507p. Narahara, M. Y.; Andrade-Talmelli, E. F.; Kavamoto, E. T. & Godinho, H. M. 2002. Reprodução induzida da Pirapitinga-do-Sul, Brycon opalinus (Cuvier, 1819), mantida em condições de confinamento. Revista Brasileira de Zootecnia. 31(3):1070-1075 Pádua, M. T. J. & Audi, A. 1984. Espécies da fauna silvestre ameaçadas de extinção - sua ocorrência e proteção nos parques nacionais e reservas biológicas federais. Boletim FBCN, 19: 49-80 Philbrick, C. T. & Novelo, A. 1995. New world Podostemaceae: ecological and evolutionary enigmas. Brittonia, 47(2): 210-222 Regan, T. J., Burgman, M. A., Mccarthy, M. A., Master, L. L., Keith, D. A., Mace, G. M & Andelman, S. J. 2005. The consistency of extinction risk classification protocols. Conservation Biology, 19 (6): 1969–1977 Ricker, W. E. 1975. Computation and interpretation of biological statistics of fish populations. Bulletin of the Fisheries Research Board of Canada, 191: 1-382 Rosa, R. S. & Lima, F. C. T. 2005. Peixes. pp . 65-81 in. Machado, A. B. M.; Martins, C. S. & Drummond, G. M. (eds.) Lista da Fauna brasileira ameaçada de extinção: incluindo as espécies quase ameaçadas e deficientes em dados. Fundação Biodiversitas, Belo Horizonte, 160p.

85 Rosa, R. S. & Menezes, N. A. 1996. Relação preliminar das espécies de peixes (Pisces, Elasmobranchii, ) ameaçadas no Brasil. Revista Brasileira de Zoologia, 13: 647–667. Sabino, J. & Sazima, I 1999. Association between fruit-eating fish and foraging monkeys in southwestern Brazil. Ichthyological Explorations of Freshwaters, 10 (4): 309-312 Santos, G. M. & Rosa, P. S. 1998. Alimentação de Anostomus ternetzi e Synaptolaemus cingulatus, duas espécies de peixes amazônicos com boca superior. Revista Brasileira de Biologia, 58: 255-262. Santos, G. M.; Pinto, S. S. & Jégu, M. 1997. Alimentação do pacu-cana Mylesinus paraschomburgkii (Teleostei, Serrasalmidae) em rios da amazônia brasileira. Revista Brasileira de Biologia, 57: 311-315. São Paulo, 1998. Decreto no. 42.838, de 4 de fevereiro de 1998. Declara as espécies da fauna silvestre ameaçadas de extinção e as provavelmente ameaçadas de extinção no estado de São Paulo e dá providências correlatas. Sazima, I. 1986. Similarities in feeding behaviour between some marine and freshwater fishes in two tropical communities. Journal Fish Biology, 29: 53-65. Sokal, R. R. & Rohlf, F. J. 1995. Biometry: the principles and practice of statistics in biological research. W. W. Freeman and Company, New York, 887 p. StatSoft, Inc. 2001. STATISTICA (data analysis software system), version 6. www.statsoft.com Sunaga T. & Verani J.R. 1991. The fish communities of the lakes in Rio Doce Valley, Northeast, Brazil. Verhandlungen der Internationalen Vereinigung für Theoretiche und Angewandte Limnologie 24, 2563–2566 Swerdlow, J. 1998. Making sense of the milennium. National Geographic, 193: 2-33\ Thatcher, V. E. & Jégu, M. 1996. Intestinal helminths as population markers of the Amazonian fish Mylesinus paraschomburgkii, with description of five new genera and seven species of trematodes. Amazoniana, 14 (1/2):143 - 155. Vadas, R. L. & Orth, D. J. 2000. Habitat use of fish communities in a Virginia stream system. Environmental Biology of Fishes 59: 253–269, 2000. Vazzoler, A. E. A. M. & Menezes, N. A. 1992. Síntese de conhecimentos sobre o comportamento reprodutivo dos Characiformes da América do Sul (Teleostei, Ostariophysi). Revista Brasileira de Biologia, 52 (4): 627-640

86 Vieira, F. & Alves, C. B. M. 2001. Threatened fishes of the world: Henochilus wheatlandii Garman, 1890 (Characidae). Environmental Biology of Fishes, 62:414. Vieira, F. & Pompeu, P. S. 2001. Peixamentos: uma ferramenta para conservação da ictiofauna nativa? Ciência Hoje 30 (175): 28-33 Vieira, F. 2005. Distribuição e aspectos da biologia de Leporinus tahyeri nas drenagens do leste brasileiro. In: XVI Encontro Brasileiro de Ictiologia, João Pessoa, PB. Vieira, F.; Alves, C. B. M. & Santos, G. B. 2000. Rediscovery and first record of Henochilus wheatlandii (Teleostei: Characiformes) a rare neotropical fish, in rio Doce basin of southeatern Brazil. Ichthyological Explorations of Freshwaters, 11:201–206. Vieira, F.; Santos, G. B. & Alves, C. B. M. 2005. A ictiofauna do Parque Nacional da Serra do Cipó e áreas adjacentes. Lundiana, 6: 77-87 Vilella, F. S.; Becker, F. G. & Hartz, S. M. 2002. Diet of Astyanax species (Teleostei, Characidae) in an Atlantic forest river in southern Brazil. Brazilian Archives of Biology and Technology, 45(2): 223-232 Winemiller, K. O. 1992. Ecomorphology of freshwater fishes. Natural Geographical Research and Explorations, 8: 308-327 Zanata, A. M. & Lima, F. C. T., 2005. New species of Jupiaba (Characiformes: Characidae) from Rio Tiquié, Upper Rio Negro Basin, Brazil. Copeia (2):272-278 Zar, J. H. 1999. Biostatistical analysis. Prentice Hall, New Jersey. 663 p

87

CAPÍTULO 3

88 ÁREAS PRIORITÁRIAS PARA A CONSERVAÇÃO DA FAUNA DE PEIXES NA DRENAGEM DO RIO SANTO ANTÔNIO, BACIA DO RIO DOCE, MG

RESUMO

Poucas áreas têm sido criadas primariamente para a conservação dos ambientes de água doce, embora se reconheça que essas mantêm biodiversidade expressiva e grande parte se encontre ameaçada por impactos ambientais diversos. Nesse estudo utilizamos a fauna de peixes como modelo para definir áreas de preservação dentro da bacia do rio Santo Antônio, segundo maior afluente do rio Doce e considerado de importância especial para conservação de peixes em Minas Gerais. Os resultados obtidos indicaram que a bacia constitui um mosaico com diferentes graus de modificação antrópica. Duas subdrenagens (rios do Tanque e Guanhães) e o baixo rio Santo Antônio foram excluídos da estratégia de conservação e para as mesmas são indicadas ações de recuperação ambiental. Três áreas foram identificadas e delimitadas, estando distribuídas ao longo do canal principal e nos tributários. No seu conjunto deverão manter a maior parte da ictiofauna registrada na bacia, inclusive quatro espécies ameaçadas de extinção. A estratégia de conservação indicada para os trechos de rios selecionados foi transformá- los em Áreas de Proteção Ambiental (APA). Essa nova condição regional terá implicações econômicas, pois inviabiliza a implantação de quatro usinas hidrelétricas, que no seu conjunto representam 16,3% do potencial hidrelétrico inventariado para toda a bacia. Entretanto, consiste na única forma para que a ictiofauna encontrada atualmente possa ser mantida em longo prazo.

INTRODUÇÃO Em um grande número de revisões recentes há o consenso de que a biodiversidade existente em sistemas de água doce encontra-se altamente ameaçada, sendo que para alguns autores, mais que em qualquer outro ecossistema (ex.: Allan & Flecker 1993; Leidy & Moyle, 1998; McAllister et al., 1997; Ricciardi & Rasmussen, 1999; Malmqvist & Rundle, 2002; Saunders et al., 2002). As principais causas são amplamente conhecidas e estão relacionadas a perda e degradação de habitats, superexplotação das espécies, poluição, introdução de organismos exóticos e usos diversos da água - abastecimento, geração de energia, irrigação, etc...(e.g., McAllister et al., 1997; Revenga & Kura, 2003; Agostinho et al., 2005).

89 Segundo Ravenga & Kura (2003), em relação aos vertebrados, avaliações globais e regionais de biodiversidade em ambientes de água doce incluem mais informações sobre os peixes que qualquer outro grupo, fato também constatado no Brasil (Agostinho et al., 2005). Essa condição está relacionada a serem esses organismos os componentes mais conspícuos da biota aquática, apresentarem grande diversidade de espécies, além de serem utilizados como recurso econômico. Entretanto, o maior conhecimento relativo ao grupo não significa que o mesmo esteja em melhor situação de conservação. No Brasil, das 159 espécies de peixes relacionadas em alguma categoria de ameaça de extinção, 135 (85%) são de água doce (Rosa & Lima, 2005). Desse total, 119 espécies ocorrem no sul e sudeste, região com o maior índice de desenvolvimento no país e, portanto, com maior pressão sobre os ambientes aquáticos interiores. É importante destacar que esse número reflete uma análise ainda incompleta, visto que nem todas as espécies existentes nessa porção do território brasileiro foram avaliadas simplesmente pelo desconhecimento de aspectos básicos da biologia, incluindo a distribuição geográfica. Áreas protegidas representam uma solução parcial para a degradação ambiental, entretanto, poucas têm sido criadas especificamente para ambientes de água doce e sua biota (Saunders et al., 2002; Agostinho et al., 2005). No Brasil, essa é uma situação marcante, visto que, apesar dos peixes constituirem o segundo grupo de vertebrados com maior número absoluto de espécies ameaçadas de extinção (Machado et al., 2005), nenhuma área protegida foi criada prioritariamente para manutenção desses organismos, embora não faltem indicativos para tal (Agostinho, 1997; Marques & Barbosa, 2002; Drummond et al., 2005).. Esse fato certamente guarda relação com a maior complexidade em se preservar sistemas de rios, que se extendem por grandes áreas sujeitas aos mais diferentes usos, tornando as ações de conservação mais difíceis e dispendiosas (Moss, 2002).

O estado de Minas Gerais sempre se destacou em políticas conservacionistas, não sendo diferente na definição de áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade (Costa et al., 1998; Drummond et al., 2005). Entretanto, apesar de contar com esse instrumento de planejamento, a falta de ações concretas baseadas nos indicativos apresentados tem levado a perda de importantes áreas para a manutenção da biodiversidade de peixes no Estado. Adicionalmente, todas as áreas indicadas necessitam avaliações subseqüentes detalhadas, o que permite traçar seus reais limites e

90 definir a ações a serem tomadas, uma condição que não tem sido efetivada para os ambientes aquáticos. Em vista do exposto, são apresentados neste capítulo os critérios e o delineamento das áreas para manutenção de peixes na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, uma área considerada de importância biológica especial para peixes em Minas Gerais (Drummond et al., 2005).

CARACTERÍSTICAS DA DRENAGEM E DA ICTIOFAUNA PARA DELINEAMENTO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

Os dados obtidos acerca da distribuição da ictiofauna (capítulos 1 e 2) mostraram padrões diferenciados para as espécies, além de indicarem que nem toda a bacia do rio Santo Antônio apresenta o mesmo potencial para conservação. Essa constatação está relacionada às condições e impactos a que estão submetidas determinadas subdrenagens, especificamente os rios Guanhães e Tanque e o trecho do rio Santo Antônio a jusante da UHE Salto Grande. O rio Guanhães é o maior afluente do rio Santo Antônio e, cuja bacia possui a segunda maior densidade populacional (Figura 1). Embora seja a maior subdrenagem, encontra-se bastante alterado em termos estruturais e possui baixa riqueza de espécies, não reunindo nesse momento características desejáveis para um programa de conservação. Como as alterações estruturais estão relacionadas primariamente à eliminação de vegetação ripária e assoreamento, agravado pelo lançamento de esgotos, o mais indicado para essa drenagem será implementar um programa de recuperação, incluindo a eliminação/contenção das fontes de assoreamento, tratamento de esgotos e recomposição da vegetação ciliar.

91

Figura 1 – Área percentual das subdrenagens do rio Santo Antônio e respectivas densidades populacionais estimadas para 2005. Fontes de dados conforme especificadas abaixo (consulta em fevereiro/2006). http://www.alemg.gov.br/index.asp?grupo=estado&diretorio=munmg&arquivo=municipios (população) http://www.ufv.br/dea//hidrotec (área das drenagens)

O rio do Tanque representa pouco mais de 10% do total da drenagem e baixa densidade populacional (Figura 1). Entretanto, foram registrados impactos que contribuem para a perda continuada da qualidade ambiental, refletida na baixa diversidade e ausência de todas as espécies ameaçadas de extinção. O primeiro destes impactos se refere ao complexo de exploração de minério de ferro existente no município de Itabira. Apesar de uma série de programas ambientais em curso nessa região (obs. pes.), uma parcela da drenagem superior foi afetada negativamente pela construção de barragens de contenção de rejeitos e assoreamento. Deve-se destacar que embora Itabira seja o município mais populoso da bacia (106.016 hab. estimados em 2005), seu núcleo urbano que agrega cerca de 90% da população está localizado na bacia do rio Piracicaba. Dessa forma, os problemas originados com o lançamento de esgotos nos cursos d’água são refletidos em outra drenagem e não no rio do Tanque. O segundo é aqui considerado o mais importante e se refere à piscicultura comercial do surubim-ponto-e-vírgula (Pseudoplatystoma corruscans X P. fasciatum), implantada no município de Santa Maria do Itabira (Coelho & Cyrino, 2006). Após o início desse cultivo e devido aos escapes dos tanques-rede, esse peixe alcançou a

92 drenagem e se disseminou amplamente pela bacia. Segundo diversos autores (ex.: Moyle & Light, 1996; Lozon & MacIsaac, 1997), o sucesso da invasão por organismos exóticos tem maiores probabilidades de ocorrer em ambientes alterados. Entretanto, a habilidade e o potencial dos peixes exóticos prosperarem em ambientes alterados e impactarem a estrutura e função dos ecossistemas aquáticos, sugere que possam representar tanto um sintoma como uma causa de declínio das comunidades nativas (Kennard et al., 2005). Nesse caso em específico, há necessidade de medidas efetivas para evitar que os escapes continuem e o desenvolvimento de um programa de monitoramento da espécie e seu estabelecimento na drenagem. Por se tratar de um híbrido (Coelho & Cyrino, 2006), existe a possibilidade do mesmo não se reproduzir naturalmente no ambiente, entretanto, essa hipótese necessita verificação. Desde que essa hipótese seja verdadeira e havendo o controle rígido dos locais de criação e supressão de qualquer nova introdução, a possibilidade de manejo e sua consequente eliminação da bacia estaria assegurada. Por fim, ainda existe marcante atividade relacionada ao desmate das áreas mais íngremes da bacia, o que em última análise contribui para o assoreamento excessivo do curso d’água e perda de qualidade ambiental. A terceira área é representada pelo rio Santo Antônio a jusante da UHE Salto Grande, região mais densamente povoada da bacia (Figura 1). Embora nessa área tenham ocorrido espécies nativas exclusivas dessa porção da bacia (Imparfinis sp., Loricariichthys castaneus, Moenkhausia doceana, Pimelodella sp., Poecilia vivipara, Rineloricaria sp., Trachelyopterus striatulus e Trichomycterus sp.), todas são relativamente comuns e possuem distribuição ampla na bacia do rio Doce. As únicas exceções são Microglanis sp. e a piabanha (Brycon devillei), a primeira representando o único registro conhecido na bacia do rio Doce e a segunda ameaçada de extinção. Apesar da ocorrência dessas espécies, essa área foi a que apresentou maior número de peixes exóticos, praticamente todos conhecidos para a bacia do rio Doce (Alves et al., no prelo). Adicionalmente, a implantação das duas maiores usinas hidrelétricas (Salto Grande e Porto Estrela) nesse trecho da bacia, modificou substancialmente o padrão diário de vazão do rio Santo Antônio. Em função dessas características ocorreu uma perda considerável da qualidade ambiental, traduzida de forma mais evidente no excessivo assoreamento que eliminou as características dos hábitats originais.

93 Para as cinco espécies ameaçadas de extinção os dados de campo foram complementados com as informações da literatura e composta uma avaliação qualitativa em relação ao risco de extinção ao qual estão submetidas na bacia do rio Santo Antônio, cuja síntese é apresentada na Figura 2. A integração dos dados indicou que existe risco de extinção decrescente entre as espécies, sendo S. doceanum e B. devillei as que se encontram em condições mais críticas. As demais espécies, embora tenham sido registradas com maiores abundâncias, possuem particularidades próprias que definem as suas possibilidades de permanência na drenagem em longo prazo, em particular o uso de hábitats mais específicos e área de ocorrência menor. maior Steindachneridion doceanum m ai or Brycon devillei específicos Raridade

Henochilus wheatlandii

Leporinus thayeri

Brycon opalinus Hábitats utilizados menor m e no

variados r restrita ampla Distribuição na drenagem

Figura 2 – Modelo indicando a probabilidade de extinção, que aumenta no sentido da linha tracejada, ao qual estão submetidas espécies de peixes ameaçados de extinção com ocorrência na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG

De especial importância para manutenção da fauna de peixes do rio Santo Antônio será o seu uso futuro para geração de energia, possivelmente a maior ameaça ambiental no curto e médio prazos. Na Tabela I são especificados todos os empreendimentos para a bacia, incluindo os já construídos e em operação e aqueles outorgados.

94 Tabela I – Usinas hidrelétricas implantadas e em estudo para implantação na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG. Usinas Situação Potência Município Rio hidrelétricas instalada (MW) Porto Estrela Em operação 112 Açucena, Braúnas e Joanésia Santo Antônio

Salto Grande Em operação 102 Braúnas Santo Antônio e Guanhães

Dona Rita Em operação 2,4 Santa Maria do Itabira Tanque

Dores do Guanhães Estudos 12 Dores de Guanhães Guanhães

Funil Construção 22,5 Dores de Guanhães Guanhães

Jacaré Estudos 10,5 Dores de Guanhães Guanhães

Senhora do Porto Estudos 9 Dores de Guanhães Guanhães

Brejaúba Estudos 11 Conceição do Mato Dentro Peixe Santo Antônio do Rio Abaixo

Monjolo Estudos 15 Conceição do Mato Dentro Peixe Santo Antônio do Rio Abaixo

Quinquim Estudos 14 Conceição do Mato Dentro Santo Antônio Santo Antônio do Rio Abaixo

Sumidouro Estudos 13 Conceição do Mato Dentro Santo Antônio Santo Antônio do Rio Abaixo Fonte: Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL. Banco de Informações de Geração – BIG. 2003. Disponível em: www.aneel.gov.br/15.htm (consulta em fevereiro/2006).

Do potencial total de geração na bacia (323,4 MW), observa-se que 67% já se encontram explorados, restando 33% (107 MW), parte dos quais já licenciados e parte em análise nos órgãos ambientais do Estado. O nosso estudo indicou que desses 107 MW restantes é possível explorar 54 MW, distribuídos em quatro usinas, todas localizadas no rio Guanhães, considerado aqui como menos importante para conservação. As demais, localizadas na calha do rio Santo Antônio e baixo rio do Peixe, são consideradas incompatíveis com a manutenção das áreas aqui identificadas para conservação da ictiofauna, notadamente as espécies ameaçadas de extinção.

AS ÁREAS SELECIONADAS PARA CONSERVAÇÃO Com base na exclusão de parte das drenagens e demais características discutidas anteriormente, o restante da bacia foi analisado para definir duas questões fundamentais: maior número de espécies de peixes mantidas em longo prazo X menor área necesssária para proteção efetiva. Atendendo a essas premissas foram selecionadas três regiões que em seu conjunto deverão garantir a manutenção de populações

95 significativas da maioria das espécies de peixes conhecidas na bacia, cujo mapa síntese é mostrado na Figura 3. A primeira área é representada pela drenagem do rio Preto do Itambé. Aliado as boas características ambientais e estruturais, essa drenagem abriga ictiofauna muito diversa e com populações do andirá (H. wheatlandii), da pirapitinga (B. opalinus) e do timburé (L. thayeri), embora somente as duas últimas sejam abundantes. Outras condições positivas para a seleção dessa drenagem são: 9 Ausência de grandes fontes de impacto, excetuando-se aquelas representadas pelo lançamento de esgotos. 9 Continuidade com a área do Parque Nacional da Serra do Cipó, onde está a nascente do seu principal afluente, o rio do Peixe. 9 Não existirem aproveitamentos hidrelétricos previstos ao longo de toda a drenagem. 9 Ser a maior drenagem com águas de coloração escura, que embora não tenha representado um ambiente específico para peixes, necessita de estudos detalhados para os demais organismos aquáticos, parte dos quais podem ser exclusivos desse tipo de ambiente. Um bom exemplo são as podostemáceas, plantas aquáticas importantes para os peixes do rio Santo Antônio, para as quais recentemente foram descritos gêneros e espécies endêmicas de rios de águas escuras na cadeia do Espinhaço em Minas Gerais (Philbrick et al., 2004a; 2004b). A segunda área em importância é o canal central do rio Santo Antônio e baixo curso do rio do Peixe. Essa área compreende a região que se inicia a jusante da foz do rio do Tanque e se estendende para montante até a foz do ribeirão Mata-Cavalos. No rio do Peixe seu limite superior foi posicionado junto à foz do ribeirão Folheta, localizado abaixo do núcleo urbano de Dom Joaquim. Essa área foi selecionada por ser a única onde existem registros do surubim-do-Doce (S. doceanum), por manter as maiores populações das espécies ameaçadas de extinção e pela maior riqueza de espécies. Fator potencial de mudança ambiental está relacionado à existência de quatro barramentos projetados e já em estudos (Tabela I). Apesar desse problema, essa área é primordial no contexto de manutenção da ictiofauna da bacia. A terceira área compreende a drenagem do rio Parauninha, que apresenta comunidade de peixes bastante representativa. Adicionalmente, essa região encontra-se pouco alterada e com baixa densidade populacional, condições desejáveis para uma área a ser protegida. Essa drenagem também é utilizada como área para reprodução de L.

96 thayeri, além de várias espécies de pequeno porte e que vivem associadas a trechos de corredeiras. Após a seleção das áreas procurei enquadrá-las dentro das categorias definidas pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação Nacional (SNUC) (Costa, 2006) Segundo as proposições apresentadas em Boon (1992), concluímos que a bacia do rio Santo Antônio constitui um caso para conservação onde a estratégia a ser adotada será a limitação de usos. Com base nessa premissa concluímos que as três áreas possuem características adequadas para enquadramento como APA (Áreas de Proteção Ambiental), cuja definição é apresentada a seguir. “As APAs são áreas submetidas ao planejamento e à gestão ambiental e se destinam a compatibilização de atividades humanas com a preservação da vida silvestre, a proteção dos recursos naturais e a melhoria da qualidade de vida da população local. Elas podem compreender uma ampla gama de paisagens naturais, semi-naturais ou alteradas, com características bióticas, abióticas, estéticas ou culturais notáveis que exijam proteção para assegurar as condições ecológicas locais. Podem conter ecossistemas urbanos ou outras Unidades de Conservação mais restritivas em termos de utilização, e permitem a experimentação de novas técnicas e atitudes que possibilitem conciliar o uso da terra e o desenvolvimento regional com a manutenção dos processos ecológicos essenciais” (Costa, 2006).

Além de disciplinar o uso adequado da drenagem, a efetivação dessas áreas como APA’s deverá ser capaz de conciliar as atividades econômicas com a conservação da maior parte da ictiofauna encontrada na bacia. Por outro lado, evitará a necessidade de exaustivos processos de desapropriação e uso de amplos recursos financeiros, em sua maioria bastante limitados (Darwall & Vié, 2005; Grammont & Cuarón, 2006), que tornam a implementação de UC’s no Brasil um processo muito lento. Adicionalmente, ainda falta uma definição de atividades que poderão ser compatíveis com os objetivos de uma APA, fato que demanda uma análise mais criteriosa e particular em cada uma das áreas selecionadas, o que se traduz na elaboração de seus respectivos planos de manejo. Apesar dessa informação não estar disponível em sua totalidade, constitui um fato que as usinas hidrelétricas previstas nas áreas selecionadas não são compatíveis com os propósitos de conservação aqui apresentados. Dessa forma, embora com implicações econômicas negativas, essas usinas hidrelétricas devem ser consideradas inviáveis dentro do planejamento regional onde o objetivo seja a manutenção desse importante componente da ictiofauna neotropical.

97

v v o

v v v v 42 00’

18o30’

v v

v v v

v Áreas selecionadas

v v

v v v v

o Cadeia de montanhas

ç

v v

v a v Cidades h n i Guanhães Cursos d’água p rio

s UHE’s implantadas v v

v v E

Co

rren

3 r te G i

v v o

r v v v v an rio de G

Pa Conceição do u

r r a

a Mato Dentro i n

uninha o h v v

ã v v d e o s r e io P c

e o

ix io D Senhora da v v e tôn

An Penha o o

Sa Belo d

d nto

Oriente

v v

v v bé Ferros 1 Itam S. Sebastião do o

ri

Rio Preto

o v v P d

ret

Parque Nacional da o o 2

ri ue v v v Serra do Cipó v anq o T Itambé do d Ipatinga

Mato Dentro o

rio o v v

19 30’ v v ba a a

i ic e

c e 0 20

e a c

o ir c

o

P o

44 00’ d

D

Itabira rio D a v v km

Antônio Dias

C

o

i

r

Figura 3 – Áreas prioritárias para a conservação da ictiofauna na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG. 1 = Rio Preto do Itambé; 2 = Rio Santo Antônio e 3 = Rio Parauninha.

98 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Agostinho, A. A. 1997. Qualidade dos habitats e perspectivas para a conservação. pp.: 455-460 In.: Vazzoler, A. E. A. M.; Agostinho, A. A. & Hahn, N. S. (eds.) A planície de inundação do alto rio Paraná: aspectos físicos, biológicos e socioeconômicos. Editora da Universidade Estadual de Maringá, PR Agostinho, A. A.; Thomaz, S. M. & Gomes, L. C. 2005. Conservation of the biodiversity of Brazil’s inland waters. Conservation Biology 19(3): 646-652 Allan, J. D. & Flecker A. S. 1993. Biodiversity conservation in running waters: identifying the major factors that threaten destruction of riverine species and ecosystems. BioScience 43:32-43. Alves, C. B. M., Vieira, F., Magalhães, A. L. B. & Brito, M. F. G (no prelo). Impacts of non-native fish species in Minas Gerais, Brazil: present situation and prospects. In: Bert, T. M. (ed.), Ecological and Genetic Implications of Aquaculture Activities, Kluwer Academic Publishers, The Netherlands Boon, P. J., 1992. Essential elements in the case for river conservation. pp.: 11-33 In: Boon, P. J.; Calow, P. & Petts, G. E. (eds) River Conservation and Management, John Wiley, Chichester Coelho, S. R. C. & Cyrino, J. E. P. 2006. Custos na produção intensiva de surubins em gaiolas. Informações Econômicas, 36(4): 7-14 Costa, J. P. O. 2006. Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). Versão online acessada em março de 2006. http://www.mre.gov.br/cdbrasil/itamaraty/web/port/meioamb/arprot/snuc/index.htm Costa, M. R. C.; Hermann, G.; Martins, C. M.; Lins, L. V. & Lamas, I. R. 1998. Biodiversidade em Minas Gerais: um atlas para sua conservação. Belo Horizonte: Fundação Biodiversitas, 94 p. Darwall, W. R. T. & Vié, J-C. 2005. Identifying important sites for conservation of freshwater biodiversity: extending the species-based approach. Fisheries Management and Ecology, 12: 287–293 Drummond, G. M.; Martins, C. S.; Machado, A. B. M.; Sebaio, F. A. & Antonini, Y. 2005. Biodiversidade em Minas Gerais: um Atlas para sua conservação. 2ª. Ed., Belo Horizonte, Fundação Biodiversitas. 222p. Grammont, P. C. & Cuarón, A. D. 2006. An evaluation of threatened species categorization systems used on the American continent. Conservation Biology, 20 (1): 14–27 Kennard, M. J.; Arthington, A. H.; Pusey, B. J. & Harch, B. D. 2005. Are alien fish a reliable indicator of river health? Freshwater Biology, 50:174-193 Leidy R. A. & Moyle, P. B. 1998. Conservation status of the world’s fish fauna: an overview. Pp. 187–227 in.: Fiedler P. L.; Kareiva, P. M. (eds.). Conservation Biology. 2 ed. New York: Chapman and Hall Lozon J. D. & MacIsaac H. J. 1997. Biological invasions: are they dependent on disturbance? Environmental Reviews, 5: 131–144. Machado, A. B. M.; Martins, C. S. & Drummond, G. M. (eds.) 2005. Lista da Fauna brasileira ameaçada de extinção: incluindo as espécies quase ameaçadas e deficientes em dados. Fundação Biodiversitas, Belo Horizonte, 160p Malmqvist, B. & Rundle, S. 2002. Threats to the running water ecosystems of the world. Environmental Conservation 29 (2): 134–153 Marques, M. M. & Barbosa, F. A. R. 2002. Áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade aquática no trecho médio da bacia do rio Doce, MG. Naturalia, 27: 211-229 McAllister, D. E.; Hamilton, A. L. & Harvey, B. 1997. Global Freshwater Biodiversity: Striving for the integrity of freshwater ecosystems. Sea Wind 11 (3): 1-140 Moss, B. 2002. Biodiversity in fresh waters – an issue of species preservation or system functioning? Environmental Conservation, 27(1): 1-4 Moyle P. B. & Light, T. 1996. Biological invasions of freshwater: empirical rules and assembly theory. Biological Conservation, 78: 149–161. Philbrick, C. T., Novelo, R. A. & Irgang, B. E., 2004b. A new species of Ceratolacis (Podostemaceae) from the State of Minas Gerais, Brazil. Novon,14: 108-113 Philbrick, C.T.; Novelo, R.A. & Irgang, B.E. 2004a. Two new genera of Podostemaceae from the State of Minas Gerais, Brazil. Systematic Botany, 29 (1): 109-117 Revenga, C. & Kura, Y. 2003. Status and trends of biodiversity of inland water ecosystems. Secretariat of the Convention on Biological Diversity, Montreal, Technical Series no. 11. 122p. Ricciardi, A. & Rasmussen, J. B. 1999. Extinction rates in North American freshwater fauna. Conservation Biology 13:1220-1222. Rosa, R. S. & Lima, F. C. T. 2005. Peixes. pp . 65-81 in. Machado, A. B. M.; Martins, C. S. & Drummond, G. M. (eds.) Lista da Fauna brasileira ameaçada de extinção: incluindo as espécies quase ameaçadas e deficientes em dados. Fundação Biodiversitas, Belo Horizonte, 160p.

100 Saunders, D. L.; Meeuwig, J. J. & Vincent, C. J. 2002. Freshwater protected areas: strategies for conservation. Conservation Biology, 16(1): 30-41

101