In G. A. R. Melo & I. Alves-dos-Santos, ApoideaMachos Neotropica: de HomenagemEuglossa aosem 90flores Anos dede JesusCrinum Santiago Moure. Editora UNESC, Criciúma, 2003.201

Coleta de fragrâncias por machos de Euglossa townsendi Cockerell (Hymenoptera, Apidae, Euglossini) em flores de Crinum procerum Carey (Amaryllidaceae)

Ana Karina Braga Carlos Alberto Garófalo

ABSTRACT. Fragrance collecting by males of Euglossa townsendi from Crinum procerum was observed on the campus of the University of São Paulo, Ribeirão Preto, State of São Paulo, Brazil, in December 1998, February, March, November and December 1999, and January 2000. The were grown in a study plot, 12.25 m2 (2.85 x 4.30 m), established near the laboratory. The number of flowers on each of the inflorescences of C. procerum ranged from 6 to 8, and each flower had 6 tepals. The pattern of daily visitation by males was determined by continuous observations from 07:00 to 18:00h during 31 days. The males visited the inflorescences from about 07:30 to 16:00h, but most of visits occurred between 09:00-12:00h. The time of permanence of the males at the flowers ranged from 4 to 58 minutes (n = 100), and they spent 123-2886 seconds (n = 100) brushing on the surface of tepals and from 3 to 991 seconds (n = 100) transferring perfume from the front tarsi to the hind tibiae. The fragrance-collecting behavior shown by the males of E. townsendi was similar to that described for other species of Euglossini. The pattern of daily visitation of E. townsendi to the inflorescences of C. procerum resembled the pattern of visitation to artificial baits observed for males of several other species. The identification of the components of floral fragrances produced by C. procerum could explain why males of E. townsendi have rarely been attracted to artificial baits.

RESUMO. A coleta de fragrâncias por machos de Euglossa (Euglossa) townsendi Cockerell, 1904 (Hymenoptera, Apidae, Euglossini) em flores de Crinum procerum Carey (Amarayllidaceae) foi observada no campus da Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil, em dezembro de 1998, fevereiro, março novembro e dezembro de 1999, e janeiro de 2000. As plantas foram cultivadas em um canteiro com 12,25 m2 (2,85 x 4,30 m), preparado próximo ao laboratório. O número de flores por inflorescência de C. procerum variou de seis a oito e cada flor tinha seis tépalas. O padrão de atividades diárias dos machos foi determinado por observações feitas no período das 7:00h às 18:00h, durante 31 dias. Os machos iniciaram as visitas às inflorescências por volta das 7:30h e terminaram as atividades por volta das 16:30h. O tempo de permanência dos machos nas flores variou de 4 a 58 minutos (n = 100), e eles gastaram de 123 a 2886 segundos (n = 100) escovando a superfície das tépalas e de 3 a 991 segundos (n = 100), transferindo perfume dos tarsos anteriores para as tíbias posteriores. O comportamento de coleta de fragrâncias apresentado pelos machos de E. townsendi foi similar ao descrito para outras espécies de Euglossini. O padrão de visitas diárias dos machos de E. townsendi às inflorescências de C. procerum não diferiu do padrão de visitas a iscas artificiais apresentado por machos de várias outras espécies. A identificação dos componentes das fragrâncias florais produzidas por C. procerum poderá explicar porque machos de E. townsendi têm sido raramente atraídos por iscas artificiais.

KEYWORDS. Crinum procerum; Euglossa townsendi; floral fragrances; male euglossine bees; orchid bees.

INTRODUÇÃO Cyphomandra (Solanaceae), Dalechampia (Euphor- biaceae), Tovomita (Guttiferae) e Unonopsis (Annonaceae) A coleta de fragrâncias em flores de orquídeas e em (WILLIAMS & DRESSLER 1976; ARMBRUSTER & WEBSTER 1979; outras fontes florais e não-florais pelos machos é uma DRESSLER 1982; WILLIAMS 1982; SAZIMA et al. 1993; NOGUEIRA das características mais peculiares dos Euglossini et al. 1998; CARVALHO & WEBBER 2000). A maioria das flo- (DODSON & FRYMIRE 1961; DRESSLER 1982; WILLIAMS 1982; res visitadas pelos machos de Euglossini possui fortes ACKERMAN 1983a,b). Embora a associação com espécies fragrâncias que podem ser detectadas a longas distâncias de (ACKERMAN 1983c; WILLIAMS & WHITTEN (DRESSLER 1967) e que funcionam como recompensas 1983) seja a mais notável e conhecida, os Euglossini florais, pois muitas flores não produzem néctar (ACKERMAN mantém também estreitas associações com uma ou mais 1983c). Entre as fontes não-florais de compostos espécies dos gêneros Spathiphyllum e Anthurium aromáticos freqüentemente procuradas pelos machos de (Araceae), Drymonia e Gloxinia (Gesneriaceae), Euglossini estão madeiras podres, frutas em 202 Braga & Garófalo decomposição, troncos de árvores e fezes (ver ZUCCHI et da qual C. procerum faz parte, possuem fortes fragrânci- al. 1969; WILLIAMS 1982; ACKERMAN 1983b; REBÊLO & as, são bissexuais e epígenas com dois arranjos circula- GARÓFALO 1991; ELTZ et al. 1999). res trímeros possuindo perianto e estames; os periantos O processo de coleta de fragrâncias pelos machos são petalóides, conectados pela base formando um lon- de Euglossini consiste em escovar a fonte com os tarsos go tubo (SINGH 1972). As flores possuem seis estames, das pernas anteriores e transferir as substâncias coletadas opostos às tépalas, podendo apresentar expansão para fendas preenchidas com pêlos (semelhantes a petalóide na base dos filetes (JOLY 1983). Os estames esponjas) existentes nas tíbias posteriores (VOGEL 1963; são coloridos e alargados na base; as anteras são CRUZ-LANDIM et al. 1965; KIMSEY 1984). Durante a coleta dorsofixadas, largas, sagitadas e bilobadas, com cada de fragrâncias, os machos aplicam à superfície do lobo constituído por dois microsporângios; o estigma é substrato uma mistura de lipídios não-polares secretados capitado, consistindo de três lobos; o ovário é trilocular a partir das glândulas labiais cefálicas que, aparentemente, com axila placentária e os óvulos geralmente estão pre- ajudariam os machos a reterem os compostos voláteis sentes em grande quantidade (SINGH 1972). aumentando, dessa forma, a eficiência da coleta (WHITTEN As observações foram feitas em um canteiro de et al. 1989). Embora exista concordância entre os autores 12,25m2 (2,85m x 4,30m), estabelecido próximo ao de que a coleta de fragrâncias pelos machos de Euglossini Laboratório de Ecologia do Departamento de Biologia, esteja relacionada com as atividades reprodutivas dessas onde um cultivo de C. procerum havia sido realizado. A abelhas não se sabe, até o momento, o verdadeiro papel floração de C. procerum ocorre somente no verão (LORENZI daqueles compostos naquelas atividades (DODSON et al. & SOUZA 1999). 1969; DRESSLER 1982; WILLIAMS & WHITTEN 1983; SCHEMSKE & LANDE 1984; STERN 1991; ELTZ et al. 1999; PERUQUETTI Procedimentos 2000). Durante o período de florescimento de C. procerum No presente trabalho são descritos os foram anotados o número de flores abertas em cada comportamentos apresentados por machos de Euglossa inflorescência e a duração, em dias, que as flores (Euglossa) townsendi Cockerell, 1904 durante a coleta de permaneciam atrativas aos machos de E. townsendi. fragrâncias em flores de Crinum procerum Carey As observações das visitas dos machos às flores foram (Amaryllidaceae). Segundo MEEROW et al. (1999), feitas no período das 7:00h às 18:00h, durante 31 dias Amaryllidaceae é uma família cosmopolita, predomi- distribuídos nos meses de dezembro de 98, fevereiro, nantemente pantropical, de monocotiledôneas petalóides, março, novembro e dezembro de 99 e janeiro de 2000. originária do oeste da África. Possui aproximadamente Os valores da temperatura foram anotados em intervalos 65 gêneros e cerca de 860 espécies, sendo pobremente de 30 min, a partir de um termômetro instalado a sol pleno, representada no Brasil onde somente os gêneros próximo ao canteiro com C. procerum. Durante as Amaryllis, Hippeastrum (as conhecidas açucenas), observações foram anotados os horários que os machos Crinum e Alstroemeria são espontâneos e representados chegavam e abandonavam o local, o tempo total que eles por poucas espécies (JOLY 1983). permaneciam coletando fragrâncias, o tempo total gasto por eles no processo de transferência das fragrâncias das MATERIAL E MÉTODOS pernas anteriores para as posteriores e a freqüência de visitas às flores ao longo do dia. O tempo que cada macho Local de estudo permanecia escovando o substrato em cada uma das O trabalho foi realizado no campus da Universidade de vezes que ele pousava na tépala foi estimado dividindo-se São Paulo, Ribeirão Preto, SP (21o 05’ – 21o 15’ S e 47o o tempo total gasto por ele escovando o substrato pelo 50’- 47o 55’ W). O clima de Ribeirão Preto, de acordo com número de vezes que ele realizou aquele comportamento. o Sistema Internacional de Köeppen, é do tipo Aw, tropical, De maneira similar, a duração de cada processo de com uma estação quente e chuvosa ocorrendo de transferência de fragrâncias foi estimado dividindo-se o setembro a abril, com a temperatura média mensal variando tempo total gasto pelo macho naquele processo pelo de 23o a 25,4o C e precipitação de 26 a 336,7mm, e uma número de vezes que ele foi realizado. Na apresentação estação fria e seca, estendendo-se de maio a agosto, dos resultados, o tempo médio da duração de cada com a temperatura média mensal variando de 18,9o a 21,8o comportamento exibido pelos machos é seguido pelo valor C e precipitação de 0 a 97,2mm. do desvio padrão.

A planta RESULTADOS As espécies do gênero Crinum são predominan-temen- te herbáceas, com folhas radicais, nascendo de um bul- O número de flores por inflorescência de C. procerum bo, lanceoladas largas, de base invaginante, podendo às variou de seis (n= 9) a oito (n = 7), sendo sete o número vezes apresentar margem espinhosa (JOLY 1983). mais freqüente (n= 34). As flores continham seis tépalas As flores das espécies da subfamília Amaryllidoidea, e seis estames. Os meses com maior número de Machos de Euglossa em flores de Crinum 203 inflorescências abertas foram novembro e dezembro de ficando entre 301 e 1200 segundos (Fig. 2). A duração de 1999, com oito e 32, respectivamente, e o número delas cada um dos processos de escovar o substrato variou de abertas diariamente variou de cinco a 15. 2 a 41,4 segundos. Os machos quando chegavam ao canteiro, Após permanecer escovando a tépala por algum tempo, aproximavam-se das inflorescências, pairavam, por alguns o macho pairava em frente à flor e iniciava a transferência segundos, em frente a uma ou mais flores e, em seguida, da fragrância para as tíbias das pernas posteriores. Nesse pousavam em uma das tépalas e iniciavam o processo processo, o material coletado era, primeiramente, de coleta de fragrâncias. De 130 casos observados, em transferido dos tarsos das pernas anteriores para os tarsos 70 deles a coleta de fragrância foi feita na superfície das pernas medianas e, em seguida para as cavidades ventral da tépala, em 45, na superfície dorsal e em outros das tíbias das pernas posteriores onde a substância 15 casos, os machos coletaram tanto na superfície dorsal coletada é absorvida. Do tempo total que o macho quanto na ventral. permaneceu no local coletando fragrâncias, ele utilizou 3 O maior número de visitas às flores em um único dia a 991 segundos (x= 252,7 ± 187,4; n = 100), com 61,0% foi 22, observado no dia 3 de novembro de 1999, quando das freqüências ocorrendo de 51 a 300 segundos, no havia apenas uma inflorescência com cinco flores abertas. processo de transferência das fragrâncias (Fig. 3). A O número máximo de machos presentes ao mesmo tempo duração de cada processo de transferência de fragrâncias coletando fragrâncias foi cinco. Quando mais de um variou de 2 a 15,7 segundos. macho estava presente no local, eles podiam coletar na Os processos de coleta e transferência de fragrâncias mesma inflorescência ou até na mesma flor ou tépala, foram realizados sempre da mesma maneira, com os mas logo um deles expulsava o outro ou os demais; nesses machos pousando nas tépalas, coletando as substâncias casos, o resultado final dessas interações era cada macho (Fig. 4) e transferindo-as, enquanto pairando em frente à permanecer coletando em uma tépala. inflorescência (Fig. 5). Para um total de 51 casos, o As inflorescências permaneceram com flores de dois número de vezes que o macho pousou e pairou em frente a cinco dias. Quando havia mais de uma inflorescência à flor durante a coleta e transferência das fragrâncias variou aberta e com várias flores em cada uma delas, os machos de 10 a 160 vezes com 66,7% das freqüências ocorrendo preferiam as flores mais novas. Na ausência de opções, de 20 a 70 vezes. os machos coletavam fragrâncias nas flores disponíveis. O tempo de permanência dos machos nas flores, Mesmo depois de toda a inflorescência tombar, fato esse desde a chegada até o abandono do local, variou de 4 a que ocorreu dentro daquele período de dois a cinco dias, 58 min (x= 22,6 ± 12,3; n = 100), com 44,0% dos casos suas flores podiam ser visitadas pelos machos se elas ocorrendo entre 9 e 20 min e 14,0% entre 25 e 28 min não estivessem completamente murchas. (Fig. 6). Nos 31 dias de observações, ocorreram 151 visitas Quando outros insetos, tais como borboletas ou outras dos machos às flores. As primeiras visitas foram feitas abelhas, pousavam na mesma flor que um macho estava por volta das 7:30h, com uma temperatura média de 24°C, coletando fragrâncias, ele interrompia a coleta e ficava e as últimas por volta das 16:00h, com temperatura média voando próximo à flor. Quando o outro inseto abandonava de 32°C. As freqüências de visitas em cada intervalo de a flor, o macho retornava à ela e continuava o processo de horário aumentaram continuamente até as 12:00h; das coleta de fragrâncias. 12:00 às 13:00h houve uma diminuição nas visitas, aumentando novamente entre 13:00 e 14:00h; em seguida, as freqüências declinaram continuamente até o final do período de atividades (Fig. 1). As freqüências de visitas 35 N° de visitas 36 do período da manhã, entre 7:00 e 12:00h, correspondendo Temperatura 30 34 a 62,3% do total de visitas observadas, diferiram 32 25 significantemente daquelas que ocorreram no período da 30 χ2 20 tarde, entre 12:00 e 16:00h ( = 8,58; gl = 1; P < 0,05). 28 15 Além do período do dia, a temperatura e as condições 26 N° de visitas N° 10 do tempo (nublado ou com sol) influenciaram o início e/ou 24 Temperatura (°C ) (°C Temperatura o término das atividades dos machos, pois quando a 5 22 temperatura estava baixa ou muito alta e o tempo estava 0 20

nublado a freqüência de machos nas flores diminuía. 7~8 8~9 9~10 10~11 11~12 12~13 13~14 14~15 15~16 16~17 17~18 O processo de coleta de fragrâncias iniciava-se quando Horário do dia o macho pousava na tépala da flor e escovava, com os tarsos das pernas anteriores, o substrato. Do tempo total Fig. 1. Freqüência de visitas de machos de Euglossa townsendi a flores de Crinum procerum em função da temperatura, durante 31 que um macho permaneceu no local coletando fragrâncias, dias de observação, no período de dezembro de 1998, fevereiro, ele utilizou 123 a 2886 segundos (x= 1105,9 ± 657,3; n = março, novembro e dezembro de 1999 e janeiro de 2000. Os valores 100) escovando o substrato, com 54,0% das freqüências de temperatura correspondem a média entre os dias de observação. 204 Braga & Garófalo

Embora nenhuma análise tenha sido realizada na ten- 25 tativa de explicar o padrão de atividade dos machos de E. 20 townsendi, a relação direta e positiva entre temperatura e 15 número de machos em atividade no período da manhã 10 encontrada por ARMBRUSTER & MCCORMICK (1990), pode Freqüência 5 também ser aqui observada. Para o resto do dia,

0 ARMBRUSTER & MCCORMICK (1990) não encontraram relação entre aquelas variáveis, como também sugerem os dados 0~300

301~600 601~900 obtidos nesse trabalho, e segundo ARMBRUSTER & BERG 901~1200 1201~1500 1501~1800 1801~2100 2101~2400 2401~2700 2701~3000 (1994), a diminuição das atividades de coletas de Tempo (segundos) fragrâncias pelos machos de Euglossa no período da Fig. 2. Tempo que os machos de Euglossa townsendi permaneceram tarde não está relacionada com os efeitos do calor. Ainda nas flores de Crinum procerum escovando as tépalas para a obtenção segundo aqueles autores, os machos podem procurar por de fragrâncias. outros recursos no período da tarde ou, alternativamente, a queda naquela atividade refletiria uma resposta aos padrões normais de abundância de recursos de fragrâncias. Como o padrão de visitas dos machos a uma DISCUSSÃO fonte floral pode estar relacionado com a intensidade do odor liberado pela fonte (ARMBRUSTER et al. 1989), seria A única informação disponível de coleta de fragrâncias interessante verificar se existe alguma relação entre por machos de Euglossini em uma espécie de horários e intensidade dos odores produzidos pelas flores Amaryllidaceae foi relatada por ACKERMAN (1983a). Crinum de C. procerum. erubescens L.f. ex Aiton, uma espécie de várzeas úmidas Os comportamentos de coleta e transferência das da América Tropical, inclusive o Brasil, com flores fragrâncias dos machos de E. townsendi foram, de perfumadas, de cor branca internamente e vinho na parte maneira geral, semelhantes àqueles observados por outros externa e com florescimento no verão (LORENZI & SOUZA autores tais como DODSON (1962, 1967), VOGEL (1966), 1999), é, segundo ACKERMAN (1983a), uma das fontes DRESSLER (1967, 1968), EVOY & JONES (1971), MICHENER et alternativas para coleta de fragrâncias pelos machos de al. (1978), KIMSEY (1984) e WHITTEN et al. (1989). Euglossini no Panamá. Assim, o presente trabalho adiciona As durações dos comportamentos de coleta e mais uma espécie de Amaryllidaceae como fonte de transferência de fragrâncias observadas para os machos fragrâncias para machos de Euglossini. de E. townsendi estão de acordo com a variação reportada A maioria das flores visitadas pelos Euglossini produz por ZUCCHI et al. (1969), para machos de Eufriesea auriceps fortes fragrâncias (DODSON et al.1969) as quais concen- Friese, 1899 e (Linnaeus, 1758), em tram-se principalmente nas regiões das bordas da flor, flores de saccatum Lindl., EVOY & JONES (1971), onde as coletas sempre ocorrem (EVOY & JONES 1971). para machos de Eulaema meriana (Olivier, 1789) e Esse fato foi observado nesse trabalho com os machos Euglossa liopoda Dressler, 1982, em flores de Catasetum de E. townsendi realizando a maioria das coletas nas longifolium Lindl. e Catasetum barbatum Lindl., respecti- extremidades das tépalas. Apenas raramente os machos vamente, SOARES et al. (1989), para machos de Euglossa escovaram a parte mediana ou superior das tépalas e isto mandibularis Friese, 1899 em flores de Cyphomandra só aconteceu quando as extremidades das tépalas calycina Sendtn. (Solanaceae), e por MELO (1995), para apresentavam-se desgastadas pelas coletas anteriores e não havia outras flores mais novas no local. Embora o padrão de atividade diária dos machos possa ser influenciado pela intensidade luminosa, temperatura, 25 umidade relativa e pelo tipo de composto químico que 20 eles estão coletando (INOUYE 1975; BRAGA 1976; 15 ARMBRUSTER & MCCORMICK 1990; REBÊLO 1993; ARMBRUSTER 10

& BERG 1994), o padrão de atividade dos machos de E. Freqüência townsendi nas flores de C. procerum foi, de maneira geral, 5 semelhante àqueles relatados por outros autores a partir 0 de observações de visitas de machos tanto a fontes florais 0~50 51~100 101~200 201~300 301~400 401~500 501~600 601~700 701~800 801~900 901~1000 (DODSON et al. 1969; ARMBRUSTER et al. 1989; SOARES et al. Tempo (segundos) 1989; EVOY & JONES 1971; ARMBRUSTER & MCCORMICK 1990) como a iscas com compostos aromáticos (POWELL & Fig. 3. Tempo gasto pelos machos de Euglossa townsendi transferindo POWELL 1987; ARMBRUSTER & MCCORMICK 1990; REBÊLO as fragrâncias coletadas em Crinum procerum para as tíbias das 1990, 1993; ARMBRUSTER & BERG 1994; OLIVEIRA 1999). pernas posteriores. Machos de Euglossa em flores de Crinum 205

Figs. 4-5. Machos de Euglossa townsendi em flores de Crinum procerum. 4, macho escovando a tépala com os tarsos das pernas anteriores para a coleta de fragrâncias; 5, macho pairando em frente à tépala durante a transferência de fragrâncias das pernas anteriores para as posteriores.

machos de Euglossa ignita Smith, 1874 visitando flores Panamá, de um total de 16083 machos, distribuídos em de Ternstroemia dentata Sw. (Theaceae). Da mesma 28 espécies de Euglossa, atraídos por 16 compostos, forma, as durações dos processos de coleta de fragrâncias apenas dois deles, coletados em isca de salicilato de observados nesse trabalho não diferem daqueles metila (ACKERMAN 1989) eram de E. townsendi (ACKERMAN reportados por JANZEN (1981), para machos de Eulaema 1983b). Em dois fragmentos de mata do Estado de São polychroma (Mocsáry, 1899) em flor de Catasetum Paulo, REBÊLO & GARÓFALO (1997), utilizando três iscas maculatum Kunth, e SAZIMA et al. (1993), para machos odores, amostraram apenas um macho de E. townsendi, de Eufriesea violacea (Blanchard, 1840) em flores de em eugenol, na Estação Experimental de Zootecnia Cyphomandra sciadostylis Sendtn.(Solanaceae). (Sertãozinho, SP), de um total de 613 machos de Interações agressivas entre os machos durante a Euglossa, e dois machos, em cineol, na Fazenda Santa coleta de fragrâncias, como relatado por JANZEN (1981), Carlota (Cajuru, SP), de um total de 597 machos entre machos de E. polychroma em flor de C. maculatum, coletados. NEVES & VIANA (1997), trabalhando em Cajaíba, e SOARES et al. (1989), entre machos de E. mandibularis região sul do Estado da Bahia, e utilizando cinco iscas em flores de C. calycina, não foram observadas entre os odores, coletaram 579 machos de Euglossa distribuídos machos de E. townsendi. Embora os machos de E. em 11 espécies; daquele total apenas dois eram de E. townsendi tenham também, algumas vezes, competido pela fonte de fragrância, em nenhum caso agressões entre eles ocorreram.

Euglossa townsendi é uma espécie com distribuição 18 geográfica ocorrendo desde o México até o Norte da 16 14 Argentina (REBÊLO & MOURE 1995). Um aspecto 12 interessante é que machos dessa espécie quando 10 8 6 amostrados em trabalhos de levantamento da fauna de Freqüência 4 Euglossini ocorrem sempre em pequeno número. JANZEN 2 et al. (1982), trabalhando no Parque Nacional de Santa 0 0~4 5~8 9~12

Rosa, Costa Rica, e utilizando cinco compostos como 13~16 17~20 21~24 25~28 29~32 33~36 37~40 41~44 45~48 49~52 53~56 57~60 iscas odores, amostrou, de um total de 644 machos Tempo (minutos) distribuídos em 11 espécies de Euglossa, 12 machos de Fig. 6. Tempo de permanência dos machos de Euglossa townsendi E. townsendi; esses machos foram atraídos por eugenol nas flores de Crinum procerum, desde a chegada até o abandono do (dois), cineol (cinco) e cinamato de metila (cinco). No local. 206 Braga & Garófalo townsendi e ambos visitaram a isca de eucaliptol. Euglossini). Dissertação de Mestrado. Faculdade de Filosofia, Quando a ocorrência de uma espécie em um local é Ciências e Letras de Ribeirão Preto-USP. Ribeirão Preto. 90p. BRAGA, P. I. S. 1976. Atração de abelhas polinizadoras de Orchidaceae conhecida, a ausência ou a presença de pequena com auxílio de iscas-odores na campina, campinarana e floresta quantidade de machos daquela espécie nas amostragens tropical úmida da região de Manaus. Ciência e Cultura 28(7): realizadas tem sido, tentativamente, explicada pela falta 767-773. de associação, quando da ausência, ou devido à fraca CARVALHO, R. & A. C. WEBBER. 2000. Biologia floral de Unonopsis guatterioides (A.D.C.) R.E. Fr., uma Annonaceae polinizada por associação, quando poucos machos são coletados, entre Euglossini. Revista Brasileira de Botânica 23(4): 421-425. a espécie e os compostos utilizados como iscas odores. CRUZ-LANDIM, C.; A. C. STORT; M. A. COSTA-CRUZ & E. W. KITAGIMA. 1965. Por outro lado, a coleta de pequeno número de machos Órgão tibial dos machos de Euglossini. Estudo ao microscópio pode, simplesmente, refletir a própria estrutura populacional óptico e eletrônico. Revista Brasileira de Biologia 25(4): 323- 341. EBÊLO ARÓFALO daquela espécie (R & G 1991). Provavelmen- DODSON, C. H. 1962. The importance of pollination in the evolution of the te, o pequeno número de machos coletados nos traba- orchids of tropical America. American Orchid Society Bulle- lhos anteriormente citados se deve à fraca associação tin 31: 525-534, 641-649, 731-735. entre eles e os compostos químicos utilizados como is- DODSON, C. H. 1967. Relationships between pollinators and orchid flowers. Atas do Simpósio sobre a Biota Amazônica 5: 1- cas. Infelizmente o componente majoritário da fragrância 72. produzida pelas flores de C. procerum só pode ser identi- DODSON, C. H. & G. P. FRYMIRE. 1961. Preliminary studies in the genus ficado como um derivado de salicilato de metila (BRAGA Stanhopea. Annals of the Missouri Botanical Garden 58: 2000). Além de novas análises, experimentos no campo 137-172. DODSON, C. H.; R. L. DRESSLER; H. G. HILLS; R. M. ADAMS & N. H. WILLIAMS. deverão ser conduzidos com a utilização de outros com- 1969. Biologically active compounds in orchid fragrances. Sci- postos químicos na tentativa de identificar qual composto ence 164:1243-1249. ou quais compostos são realmente os efetivos na atração DRESSLER, R. L. 1967. Why do euglossine bees visit orchid flowers? de machos de E. townsendi. Atas do Simpósio sobre a Biota Amazônica, Rio de Janeiro 5: 171-180. DRESSLER, R. L. 1968. Pollination by euglossine bees. Evolution 22: Agradecimentos. Esse trabalho é dedicado ao Prof. Padre Jesus 202-210. Santiago Moure, na ocasião de seus 90 anos de idade, em DRESSLER, R. L. 1982. Biology of the orchid bees (Euglossini). Annual reconhecimento aos seus trabalhos sobre as abelhas. Os autores Review of Ecology and Systematics 13: 373-394. agradecem a Gabriel A.R. Melo e Isabel A. dos Santos pelo convite ELTZ, T.; W. M. WHITTEN; D. W. ROUBIK & K. E. LINSENMAIR. 1999. Fragrance para participar desse volume comemorativo. Agradecemos também collection, storage, and accumulation by individual male orchid a José C. Serrano pelos registros fotográficos e auxílio técnico e à bees. Journal of Chemical Ecology 25(1): 157-176. Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior EVOY, W. H. & B. P. JONES. 1971. Motor patterns of male euglossine (CAPES) pela concessão de uma bolsa de mestrado para A.K. Braga. bees evoked by floral fragrances. Animal Behaviour 19: 583- 588. INOUYE, D. W. 1975. Flight temperature of male euglossine bees (Hy- REFERÊNCIAS menoptera: Apidae: Euglossini). Journal of the Kansas Ento- mological Society 48(3): 366-377. ACKERMAN, J. D. 1983a. Specificity and mutual dependency of the JANZEN, D. H. 1981. Bee arrival at two Costa Rican female Catasetum orchid-euglossine bee interaction. Biological Journal of the orchid inflorescences, and a hypothesis on euglossine popula- Linnean Society 20: 301-314. tion structure. Oikos 36(2): 177-183. ACKERMAN, J. D. 1983b. 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