UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Instituto de Geociências

DÉBORA ASSUMPÇÃO E LIMA

TERRA, TRABALHO E ACUMULAÇÃO: O AVANÇO DA SOJA NA REGIÃO MATOPIBA

CAMPINAS 2019

DÉBORA ASSUMPÇÃO E LIMA

TERRA, TRABALHO E ACUMULAÇÃO: O AVANÇO DA SOJA NA REGIÃO MATOPIBA

TESE APRESENTADA AO INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS PARA OBTENÇÃO DO TÍTULO DE DOUTORA EM GEOGRAFIA NA ÁREA DE ANÁLISE AMBIENTAL E DINÂMICA TERRITORIAL

ORIENTADOR: PROF. DR. VICENTE EUDES LEMOS ALVES

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA DÉBORA ASSUMPÇÃO E LIMA E ORIENTADA PELO PROF. DR. VICENTE EUDES LEMOS ALVES.

CAMPINAS 2019 Ficha catalográfica Universidade Estadual de Campinas Biblioteca do Instituto de Geociências Cássia Raquel da Silva - CRB 8/5752

Lima, Débora Assumpção e, 1986- L628t LimTerra, trabalho e acumulação : o avanço da soja na região Matopiba / Débora Assumpção e Lima. – Campinas, SP : [s.n.], 2019.

LimOrientador: Vicentes Eudes Lemos Alves. LimTese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Geociências.

Lim1. Mercado de terras. 2. Trabalho. 3. Região Matopiba. 4. Mercadorias. I. Alves, Vicente Eudes Lemos, 1967-. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Geociências. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Land, labor and accumulation : the expansion of soybean in the Matopiba region Palavras-chave em inglês: Land market Labor Matopiba, Region Comercial products Área de concentração: Análise Ambiental e Dinâmica Territorial Titulação: Doutora em Geografia Banca examinadora: Vicente Eudes Lemos Alves Ricardo Abid Castillo Carlos de Almeida Toledo Sérgio Sauer Fernando Cézar de Macedo Mota Data de defesa: 13-06-2019 Programa de Pós-Graduação: Geografia

Identificação e informações acadêmicas do(a) aluno(a) - ORCID do autor: https://orcid.org/0000-0003-0571-1314 - Currículo Lattes do autor: http://lattes.cnpq.br/7926924261133452

Powered by TCPDF (www.tcpdf.org) UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

AUTORA: Débora Assumpção e Lima

TERRA, TRABALHO E ACUMULAÇÃO: O AVANÇO DA SOJA NA REGIÃO MATOPIBA

ORIENTADOR: Prof. Dr. Vicente Eudes Lemos Alves

Aprovado em: 13 / 06 / 2019

EXAMINADORES:

Prof. Dr. Vicente Eudes Lemos Alves - Presidente

Prof. Dr. Fernando Cézar de Macedo Mota

Prof. Dr. Ricardo Abid Castillo

Prof. Dr. Carlos de Almeida Toledo

Prof. Dr. Sérgio Sauer

A Ata de defesa com as respectivas assinaturas dos membros, encontra-se disponível no SIGA - Sistema de Fluxo de Tese e na Secretaria de Pós-graduação do IG.

Campinas, 13 de junho de 2019.

AGRADECIMENTOS

Se a Geografia nos ensina fazer a guerra, ou fazer uma tese, os estudos agrários nos ensinam a ser mais coletivos. Apesar desta tese ter uma única autora, uma quantidade mãos, que ainda não consigo mensurar com precisão apoiaram, compartilharam suas histórias e conhecimentos para que esse trabalho se concretizasse. Sonhos, uma moto para ir a um lugar distante, um pouso, uma lágrima, uma palavra de luta, um livro, um incentivo.

Muchisimas gracias al Luciano Concheiro (por todo) e a todxs aquelxs que nos receberam e permitiram trocas de saberes em 2016 e em 2017 no México a partir do estágio PDSE Capes: Rose (in memoriam), Violeta Núñez , Adelita e Guadalupe (por la admiración acadêmica y por seren mujeres increibles), Sofia Blanco e Lourdes (por la sororidad entre las mujeres y por las interesantes platicas), Armando Bartha, David, Alejandro e Jorge Armando (por la rebeldia zapatista), Otavio, Roman, Beto; Pedro e família (por la enseñanza de la autonomia de Cherán), Jazmin e família (por compartir su cultura purepecha); Antonio Posadas e família (por la solidariedad y los enseñamientos sobre los campesinos y sobre Sinaloa) , Monica Monalvo (por el drama pasional lleno de emoción y lucha), Rosalinda (mi casa es su casa), Valéria (por su mirada sensible, por compartir los sonidos de las montañas latino-americanas, por las utopias anarquistas y geográficas), Christian e Paulina (y su hijx hechx en Brasil), às mulheres da família Barranco, à Martha (por su poder de cura, por la Navidad más colectiva que ya tuve y por presentar su família).

Agradeço as instituições mexicanas que também me receberam: Centro de Estudios para el Desarrollo Rural – CESDER (Zautla); - Centro Indígena de Capacitación Integral – CIDECI – UNITERRA (San Cristobal de las Casas, Chiapas); Comunidades de la Sierra Norte de Puebla (Zautla e Cuetzalan del Progeso, Puebla) y de la región de la Selva Lacadona (Ocosingo, Chiapas). Cooperativa Tosepan Titataniske (Cuetzalan del Progeso, Puebla); - Empaque de tomates Vitanova (Los Mochis, Sinaloa); Empresa campesina "Productos Agropecuarios Selva Lacandona”; Empresa Campesina Marcelo Loya Ornelas (Guasave, Sinaloa); ; Fondo de Aseguramiento Agrícola "Productores Unidos del Frente" (Guasave, Sinaloa); Universidad Intercultural Autónoma de Sinaloa (Los Mochis, Sinaloa); Universidad Pedagógica Nacional Morelia (Michoacán); Fundación Semillas por la Vida (Ciudad de Mexico) e talvez algumas que não me recorde.

À Comunidade de Ecatzingo, que me mostrou o que significa a palavra reconstrução, onde participei das brigadas pós terremoto em 2017.

Aos amigos latino americanos da Escuela Campesina da CLASCO, em especial Angelica (Colômbia), David Luna (Argentina), Carlos Pastor (Equador), Erika Barzola (Argentina).

Essa tese não é sobre o México nem sobre a América Latina, mas foi fundamental para desenvolver meu caminhar como pesquisadora ir até a última fronteira latino-americana com um novelo de perguntas (e com uma bolsa de estágio do Programa de Estágio de Doutorado Sanduíche no Exterior – PDSE/Capes). Fazer pesquisa em outro país significa encontrar respostas e saídas distintas para uma antiga pergunta feita a partir da realidade brasileira. Ou, em muitos casos, novas perguntas. Mas infelizmente não só de perguntas vivem as teses (e sxus escritorxs).

Agradeço à minha família não tradicional mineira: Terezinha, Geralda (in memoriam), Mírian, Luís, André, Edma – princípio de tudo.

Aos tupiniquins que auxiliaram na feitura de perguntas: Carlão (vulgo professor da USP Carlos de Almeida Toledo) e Fábio Pitta, obrigada pela paciência, pela horizontalidade no ensinar – todos no bonde da precarização unidos –, pelas risadas e gols na cinza paulicéia. Ao Carlão agradeço o aceite do convite em participar da banca de qualificação e da defesa, as conversas e a disponibilidade em me receber para discutir questões teóricas e anseios do campo.

Ao Caminho do Sertão, pelas veredas, por ser Minas, por permitir que caminhos nos cruzem e nos obrigue a entender o tempo que cabe em uma perna.

Às funcionárias da Secretaria da Pós-graduação, em especial Ana Beatriz, Val e Gorete. Por sempre terem paciência com os prazos e desesperos burocráticos. Pela presença, pelos cafés e risadas. Por fazer as idas ao instituto serem menos maçantes.

Aos docentes do IG/UNICAMP que cruzaram meu caminho e de alguma forma auxiliaram nesta trajetória, principalmente Ricardo Castillo, Tereza Paes e Rafael Straforini. Ao Castillo, agradeço as oportunidades de aprendizado desde a graduação, os estágios docentes compartilhados, as indicações de leitura. Aos cigarros fumados e compartilhados que

já não se encaixam aqui, a abertura de compartilhar pensamentos acadêmicos e não acadêmicos.

Agradeço aos professores da banca examinadora, Fernando Macedo do Instituto de Economia da UNICAMP e Sérgio Sauer, do qual tenho grande admiração por seu trabalho dentro e fora da academia.

Ao Ilú Obá de Min, por existir.

Aos alunxs, companheiros e companheiras temporárixs do IGCE/UNESP Rio Claro, em especial ao professor Gilberto (pela acolhida e pelas polêmicas), Raquel Fulino (pelos conhecimentos compartilhados e pelo caos), Yuri Martenauer, Lisie Tatiane. À Livia Toneli, pela sua alegria e vivacidade. À Mariana Traldi, agradeço a parceria geográfica que completa quase uma década.

Ao meu orientador professor Vicente Alves, por deixar-me ir até o poço do caos. Por entender que temos outras tarefas e dramas que vão além dos muros da universidade. Pelo apoio quase incondicional a pesquisa, pela prosa leve. Pelo orientar não guiado. Por ser uma pessoa que pouco usa a palavra “não”. Por acreditar nesta tese, em alguns momentos, mais do que eu. Que os anos de parceria sigam e continuem semeando alegrias.

À Mariana Nóbrega, a irmã que a vida me presenteou. Obrigada por compartilhar seus devaneios, suas angústias (e escutar as minhas). Por me ensinar o que as entrelinhas dos livros não contam. Pela parceria. Saiba que minha admiração pela mulher de luta e pesquisadora que você é não cabe em caracteres.

À Mariana Ruggieri. Crescer é florescer juntas. Obrigada por fazer perguntas sem respostas, por buscar caminhos imaginativos e imaginários. Por auxiliar na construção da tese. Obrigada pela parceria de vida e por compartilhar a fórmula de como “podemos nos permitir cair e ser feita em pedaços”, de aprender como “é inútil culpar a rede por ter buracos”, como nos contou Maggie Nelson em Argonautas.

Às mulheres incríveis que me aceitam e me amparam independente de qual parte da Terra eu esteja: Priscila Altivo, pela altivez, por ser minha sagitariana favorita, por sempre estar perto e longe. Pela compreensão mútua que muitas vezes nem precisa ser mediada por palavras; a Ana Maria Raietparvar, por mostrar ser possível ser louca, acadêmica, mãe e incrível. Pilar Guimarães, por ser a força que é, por rodar a saia e comandar os ventos, por

inebriar a vida de sabores; Yssyssay Divina, por não temer mudanças; Biscoito (vulgo Daniele Motta) pelas risadas e causos sem fim. À Helena Rizatti e Vanessa Diniz: nossas temporalidades não permitem a quantidade de encontros que gostaria, mas o amor permanece. Por fazer possível construir uma Geografia a partir do café da manhã, da mesa de bar, das discussões infindáveis, do pôr-do-sol, do campo, do trabalho de campo, da rua, da marcha, do centro acadêmico, dos afetos, do trabalho precarizado conciliado com a graduação e com a pós-graduação, da festa, da cachoeira, do churrasco, do almoço de domingo. À Paula Carvalho, por acompanhar os dramas de fim de tese, pelo carinho, por dar a mão no meio do redemoinho, e pela possibilidade de reinventar(nos) bruxarias.

Aos minino: William Kenji (melhor vizinho), Lucas Baptista (mineiro também errante nas terras paulistas e nos mundos acadêmicos; presente nos momentos mais importantes e queridos), Danilo Restaino (ruivo e canceriano favorito, melhor companheiro de casa que o inesperado poderia ter me dado).

Ao Eder e ao Luciano, que fazem o Tocantins e São Paulo ficar colorido e divertido sempre, por deixar os dramas acadêmicos mais leves e por caminharmos juntos atrás do trio elétrico.

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo financiamento da pesquisa (Processo 165674/2015-6). À FAEPEX/UNICAMP (Projeto Faepex nº 519.292 Correntista nº 2334/19) pelo apoio no mestrado que me levou até esta etapa e pelo Auxílio Ponte de um mês para o término da tese.

À todas as pessoas e instituições que nos auxiliaram a construir esta pesquisa:

Aos professorxs da UFT de Porto Nacional, Miracema e Araguaína; Cleidson, do IFMA de Porto Franco; aos professores da UFPI e da UESPI (em especial Daniel).

Aos órgãos estatais que concederam entrevistas, visitas técnicas e materiais: Embrapa (em especial a Embrapa Tocantins e a Marta Eichemberger pela confecção dos mapas), MAPA, Conab, Incra, Itertins, Interpi, SDR Piauí, SEAGRO Tocantins, Seplan Tocantins, Adapec, Agerpi, Naturatins, DERCA Tocantins, Vara Agrária do Piauí, Fapcen (MA).

As empresas que cordialmente deixaram conhecer suas instalações ou concederam entrevistas: Bunge Porto Nacional (TO), Bunge Porto Franco (MA), Bunge Balsas (MA),

Cargil Porto Franco (MA), COAPA (TO), Granol (TO), Poolcen (MA), Fazenda Santa Luzia (MA).

À Rede Social de Justiça, pela doação de materiais e apoio em trabalho de campo.

A 10envolimento, Instituto Sociedade, População e Natureza, AATR/BA pelo apoio em trabalho de campo e informações e entrevistas concedidas.

Aos movimentos e instituições sociais: CPT Piauí (em especial Altamiran), Maranhão (Antônio Criolo) e Tocantins (frei Xavier Plassat, Laudinha, Pedro, Edmundo e principalmente Valéria Santos, por abrir a sua história e a sua casa. Sem seu apoio e suas reflexões as informações e percepções sobre o Tocantins não teriam sido tão profundas), Associação dos Pequenos Agricultores do Tocantins (APA-TO), EFA de Porto Nacional, EFA Padre Josimo, Centro de Educação e Cultura do Trabalhador Rural (CENTRU).

À Manuel da Conceição e Denise, pela luta, por resistirem e fazer história.

Aos STTR Araguaína (TO), STTR Divinópolis do Tocantins (TO), STTR Esperantina (TO); STTR São Raimundo das Mangabeiras (MA), STTR Loreto (MA), STTR Imperatriz (MA), STTR Santa Filomena (PI), STTR Gilbués (PI), FETAG Piauí. Ao MST do Piauí e do Tocantins.

Às comunidades e assentamentos: Brejo das Meninas, Comunidade Melancias, Sete Lagoas, Chupé, Rio Preto, Comunidade do Salto, Comunidade Morro D’Água – localizadas no Piauí; Acampamento Santa Maria, Comunidade Gabriel Filho, P.A Ponte Alta, Quilombo Dona Juscelina, Quilombo Cocalinho, TI Xambioá, Comunidade Sete Barras – localizadas no Tocantins; PA Nova Descoberta e Acampamento Irmã Dorothy – localizadas no Maranhão e Comunidade Taguá (BA).

Aos pássaros, grilos e cigarras que cantam ao fundo de cada entrevista.

À energia dos orixás que me acompanha até aqui.

RESUMO

A pesquisa aqui desenvolvida tem como intuito captar as formas de acumulação do capital via avanço da sojicultura na região Matopiba. A região, oficializada a partir do decreto no 8447 em 2015 é delimitada pelos municípios dos estados do Tocantins, sul do Maranhão, sul do Piauí e oeste da Bahia. A partir de levantamentos bibliográficos, compilações de dados, materiais impressos de sindicatos, visitas técnicas a órgãos estatais e outras instituições, notícias de jornais, entrevistas de campo com lideranças de movimentos sociais, assentados, acampados, quilombolas, indígenas, representantes de órgãos estatais e do terceiro setor pude analisar a região do Matopiba a partir da ótica das transformações do mercado de terras, do trabalho e do mercado de commodities (soja). A partir de diversas óticas é possível compreender que a região Matopiba não é homogênea. A rigidez das notas técnicas estatais, responsáveis pelo recorte “oficial” da região, se contrastam com a diversidade do cerrado, com o processo de formação e ocupação dos povos e comunidades tradicionais, dos processos de migração regional e extrapolam as linhas que constituem o Matopiba no diário oficial. O avanço da produção de commodities, no caso aqui analisado a soja, demonstra o enfoque agroexportador da região, impulsionado por diversos projetos agrícolas estatais e federais desde meados do século XX. O mercado de terras na região conta sua história juntamente com a grilagem, com o avanço do Estado e o modo de produção capitalista, atrelado à expansão de infraestruturas para o avanço de monocultivos (no caso aqui estudado a soja) importantes para a balança comercial. Pensando o Matopiba como uma fronteira, o agronegócio encara a região como estoques de terras e recursos naturais passíveis de apropriação e acumulação. A valorização da terra e o aumento dos preços das terras agrícolas demonstra o avanço da produção, financeirização e ficcionalização da agricultura capitalista via land grabbing e acumulação por desposessão. A mão de obra barata que permite os baixos custos de produção das commodities e a rentização da terra já não consegue frear a tendência da queda geral da taxa de lucro, demonstrado a partir da análise dos custos de produção da soja. A transformação do camponês para trabalhador assalariado distancia-o do retorno a posse da terra. A ideia de “empregado” está relacionada à ideia de trabalhador assalariado rural, fortalecendo as relações de precariedade e de não-pertencimento resultado da modernização, mobilidade e autonomização das relações capitalistas no campo. As terras de alta produtividade tiveram um aumento de preço por hectare exponencial, mas é fundamental se questionar sobre a valorização da natureza, na qual áreas de cerrado e mata são as terras que tiveram maior valorização percentual nos últimos 10 anos. As formas de violência e a formação do mercado de terras e trabalho na região Matopiba, tendo em grande medida o Estado como responsável ou mediador desta violência foi fundamental para organizar uma região que garantisse a entrada do capital. Desta feita, a soja é tomada como projeção da crise multidimensional do capital, em que as formas de acumulação, para serem passíveis ao longo da história, dialogam com as formas de violência (im)possível: tornando seus processos de pilhagem pelas vias legais (normas e leis, projeto de desenvolvimento territorial, incentivos fiscais) ou ilegais (ameaças de morte, assassinatos, coerção de comunidades) para garantir que o sistema capitalista avance na fronteira agrícola.

Palavras-chave: mercado de terras, trabalho, região Matopiba, commoditty

ABSTRACT

The research developed here aims to capture the forms of capital accumulation through the advance of soybean in the Matopiba region. The region, made official by decree 8447 in 2015, is delimited by the municipalities of the states of Tocantins, southern Maranhão, southern Piauí and western Bahia. From bibliographic surveys, data compilations, trade union printed materials, technical visits to state agencies and other institutions, newspaper news, field interviews with leaders of social movements, peasants, quilombolas, indigenous people, representatives of state agencies and from the third sector, I was able to analyze the Matopiba region from the perspective of land, labor and commodity (soy) market transformations. From various perspectives it is possible to understand that the Matopiba region is not homogeneous. The rigidity of the state technical notes, responsible for the “official” delimitation of the region, contrast with the diversity of the cerrado, with the process of formation and occupation of traditional peoples and communities, the processes of regional migration and extrapolate the lines that constitute Matopiba. in the official diary. The advance of commodity production, in this case of soybeans, demonstrates the region's agro-export focus, driven by several state and federal agricultural projects since the mid-twentieth century. The land market in the region tells its story along with land grabbing, the advancement of the state and the capitalist mode of production, linked to the expansion of infrastructures for the advancement of monocultures (in the case studied here the soy production) important for the trade balance. Thinking Matopiba as a frontier, agribusiness views the region as stocks of land and natural resources that can be appropriated and accumulated. Land valorization and rising farmland prices demonstrate the advance in production, financialization and fictionalization of capitalist agriculture via land grabbing and accumulation by dispossession. The cheap labor that allows low commodity production costs and land tenure can no longer curb the trend of the overall fall in profit rate, demonstrated from the analysis of soybean production costs. The transformation from peasant to wage laborer distances him from return to land property. The idea of “employee” is related to the idea of rural wage laborer, strengthening the precarious relations and non- belonging resulting from the modernization, mobility and autonomy of capitalist relations in the countryside. High-productive agricultural lands have had an exponential increase in price per hectare, but it is essential to question the appreciation of nature, where cerrado and forest areas are the lands that have had the highest percentage appreciation in the last 10 years. The forms of violence and the formation of the land and labor market in the Matopiba region, with the state largely responsible for or mediating this violence, was instrumental in organizing a region that guaranteed the entry of capital. This time, soy is taken as a projection of the multidimensional crisis of capital, in which the forms of accumulation, to be passable throughout history, dialogue with the forms of (im) possible violence: making their plundering processes through legal ways ( norms, laws, territorial development project, tax incentives) or illegal (death threats, murders, community coercion) to ensure that the capitalist system advances at the agricultural frontier.

Keywords: land market, labor, Matopiba region, commoditty

LISTA DE FOTOS

Foto 1 - Camponeses e camponesas, pescadores do Bico do Papagaio ...... 66 Foto 2 Acampamento Santa Maria (TO) ...... 68 Foto 3 - Camponeses dos cerrados do Matopiba ...... 70 Foto 4 - Camponesas dos cerrados do Matopiba ...... 70 Foto 5 Comunidades tradicionais do Matopiba ...... 71 Foto 6 - Acampamento Irmão Dorothy, Arraias (MA) ...... 90 Foto 7 - Instalação, refeitório e transporte dos trabalhadores rurais ...... 98 Foto 8 - Silos e instalações da Fazenda Santa Luzia ...... 101 Foto 9 - Campanha da Bayer para as fazendas de soja do Tocantins: a força está no trabalho ...... 105 Foto 10 - Entrada da Bunge em Balsas e Rio Coco (MA) e os acidentes de trabalho ...... 107 Foto 11 - Guia de convênio do STTR de Araguaína ...... 117 Foto 12 - Diversidade dos cerrados no Matopiba ...... 160 Foto 13 - Diversidade dos cerrados no Matopiba ...... 160 Foto 14 - Matopiba: uma disputa de projetos ...... 167 Foto 15 - A soja como patrimônio ...... 174 Foto 16 - Segurança armada no Matopiba ...... 194 Foto 17 - Entre a religião, a resenha e a família: a moto ...... 206 Foto 18 - Foto Cemitério de Mojuí dos Campos (PA) ...... 207 Foto 19 - Pulverização área no sul do Piauí ...... 215

LISTA DE QUADROS

Quadro 1- Reconhecimento jurídico da terra dos povos e comunidades tradicionais do Matopiba ...... 79 Quadro 2 - Mobilidade do trabalhador de acordo com tipo de propriedade e relação de trabalho na região Matopiba ...... 89 Quadro 3 - Conflitos e ameaças para os povos e comunidades do Matopiba ...... 196

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Perfil dos Trabalhadores Resgatados – Brasil (2003 a 2017) ...... 92 Tabela 2 - Fazendas de soja e trabalho escravo no Matopiba (2003-2017) ...... 93 Tabela 3 - Acompanhamento dos Benefícios Auxílios-Doença Acidentários segundo CNAE, Brasil (2013-2017) ...... 106

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Pessoal ocupado no agronegócio por segmento no Brasil entre 2012-2018 ...... 121 Gráfico 2 - Número de trabalhadores no setor agropecuário nos estados do Matopiba (2012- 2018) ...... 122 Gráfico 3 - Trabalhadores empregados na sojicultura por categoria CNAE nos estados do Matopiba (2010-2017) ...... 123 Gráfico 4 - Participação do custo de mão-de-obra na produção de soja por hectare na Bahia, Maranhão e Tocantins (2006- 2018) ...... 138 Gráfico 5 - Número de tratores existentes nos estabelecimentos agropecuários por estado do Matopiba (1985-2017) ...... 139 Gráfico 6 - Preço de terra de alta produtividade no Matopiba (2003-2017) ...... 175 Gráfico 7 - Preço da terra de média e baixa produtividade no Matopiba (2003-2017) ...... 176 Gráfico 8 - Preço da terra de cerrados no Matopiba (2003-2017) ...... 177 Gráfico 9 - Evolução das áreas de lavouras permanentes no Matopiba (2000-2017) ...... 181 Gráfico 10 - Número de conflitos no Matopiba (1996 - 2016) ...... 186

LISTA DE MAPAS

Mapa 1 - Municípios percorridos em trabalho de campo ...... 26 Mapa 2 - Tipos de solo e localização de assentamentos, terras indígenas e quilombos no Matopiba ...... 161 Mapa 3 - Localização dos assentamentos rurais, quilombolas e terras indígenas e Unidades de Conservação nos Matopiba ...... 166 Mapa 4 - Evolução dos conflitos de terra no Matopiba e avanço da soja (2000- 2016) ...... 184

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AATR/BA – Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais no Estado da Bahia

ABIOVE – Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais

ABIPA – Associação dos Apicultores do Bico do Papagaio

ACT – Acordos Coletivos de Trabalho

Adapec – Agência de Defesa Agropecuária

Agerp /MA – Agência Estadual de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural do Maranhão

AMB – Associação de Mulheres de Buriti

APA-TO – Associação dos Pequenos Agricultores do Tocantins

CCT – Convenções Coletivas de Trabalho

CDVCH/CB – Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos Carmen Bascarán

CESDER – Centro de Estudios para el Desarrollo Rural

CENTRU – Centro de Educação e Cultura do Trabalhador Rural

CEPEA/ESLAQ – Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada

CIDECI-UNITERRA – Centro Indígena de Capacitación Integral

CIPATR – Comissão Interna de Prevenção de Acidentes no Trabalho Rural

CIMI – Conselho Indigenista Missionário

CLASCO – Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales

CLT – Consolidação das Leis do Trabalho

CNA – Confederação Nacional da Agricultura

CNAE – Classificação Nacional de Atividades Econômicas

CNTRR – Congresso Nacional de Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares

CRB – Confederação Rural Brasileira

COAPA – Cooperativa Agroindustrial do Tocantins

COMIVALE – Cooperativa Mista Valverde Ltda

Conab – Companhia Nacional de Abastecimento

CONTAG – Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares

CONTAR – Confederação Nacional dos Trabalhadores Assalariados e Assalariadas Rurais

CPT – Comissão Pastoral da Terra

CUT – Central Única dos Trabalhadores

DERCA – Delegacia Especializada na Repressão de Conflitos Agrários

DIEESE – Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos

EFA – Escola da Família Agrícola

EJA – Escola de Jovens e Adultos

ELETRONORTE – Centrais Elétricas do Norte do Brasil S.A.

Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

EZLN – Ejército Zapatista de Liberación Nacional

FAEMA – Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Maranhão

Fapcen – Fundação de Apoio à Pesquisa Do Corredor De Exportação Norte

FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo

FETAEMA – Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras do Estado do Maranhão

FETAET – Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Tocantins

FETAG – Federação de Trabalhadores na Agricultura

FETAGRO – Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar de Rondônia

FETAPI – Federação de Trabalhadores na Agricultura do Estado do Piauí

FGTS – Fundo de Garantia do Tempo de Serviço

GETAT – Grupo Executivo de Terras do Araguaia-Tocantins

GITE – Grupo de Inteligência Territorial Estratégica

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IFMA – Instituto Federal do Maranhão

IFTO – Instituto Federal do Tocantins

IGCE/UNESP – as Instituto de Geociências e Ciências Exatas Unesp -Rio Claro

INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

INSS – Instituto Nacional do Seguro Social

ISPN – Instituto Sociedade, População e Natureza

ITERTINS – Instituto de Terras do Tocantins

MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

Naturatins – Instituto Natureza do Tocantins

UAM – Universidad Autónoma Metropolitana

PA – Projeto de Assentamento

PDA Matopiba – Plano de Desenvolvimento Agropecuário do Matopiba

PGC – Programa Grande Carajás

PLANTRE – Plano Nacional dos Trabalhadores Rurais Empregados

PLC – Projeto de Lei Complementar

POLOAMAZÔNIA – Programa de Pólos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia

Provárzea – Programa de Várzea

PRODIAT – Projeto de Desenvolvimento Integrado da Bacia do Araguaia-Tocantins

PRORURAL – Programa Estadual de Apoio ao Pequeno Produtor Rural

OIT – Organização Internacional do Trabalho

ONG – Organização Não-Governamental

SDR/PI - Secretaria de Desenvolvimento Rural do Estado do Piauí

Seagro – Secretaria da Agricultura, Pecuária e Aquicultura

Seplan – Secretaria da Fazenda e Planejamento

SENAI – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial

SNCR – Sistema Nacional de Cadastro Rural

SUB - Sistema Único de Benefícios

SUDAM – Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia

SUDENE – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste

SUDECO – Superintendência de Desenvolvimento do Centro-Oeste

STTR – Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadores Rurais

TI – Terra Indígena

UESPI – Universidade Estadual do Piauí

UFPI – Universidade Federal do Piauí

UFT – Universidade Federal do Tocantins

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...... 27

CAPÍTULO I ...... 44

VIOLÊNCIA, TRABALHO E ACUMULAÇÃO NA AGRICULTURA CAPITALISTA .... 44

1.1 Mobilidade e terra: construindo a região Matopiba ...... 45

1.2 Camponês, indígena, quilombola e povos e comunidades tradicionais ...... 71

CAPÍTULO II ...... 81

TUTAMEIA E TRABALHO NA REGIÃO MATOPIBA ...... 81

2.1 Tutameia, mobilidade e exploração ...... 82

2.2 Constituição dos Sindicatos de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais no Matopiba .. 110

2.3 Os STTR’s no contexto do avanço da soja e da precarização do trabalho ...... 119

2.3.1 Acordos Coletivos da Soja no sul do Maranhão ...... 126

2.3.2 Acordos e Convenções Coletivos da Soja no sul do Piauí ...... 129

2.3.3 ACT dos trabalhadores e trabalhadoras assalariadas da Bahia ...... 133

2.4 Buscando a terceira margem: invisibilidade do trabalho nos custos de produção da soja ou quando o trabalhador assalariado agrícola não é mais camponês ...... 135

CAPÍTULO III ...... 144

TERRA, SOJA E ACUMULAÇÃO NO MATOPIBA ...... 144

3.1 PDA Matopiba e o avanço da soja ...... 146

3.1.1 A criação de uma região e o avanço da soja ...... 146

3.1.2 PDA Matopiba: cerrados ...... 159

3.3 Matopiba e o mercado de terras ...... 168

3.4 Violência e avanço dos conflitos no Matopiba ...... 179

3.5 Conflitos: as faces da hidra e o diabo (e a imanente crise do capital) ...... 204

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...... 217

REFERÊNCIAS ...... 225

APÊNDICES ...... 244

23

CONVENÇÕES

‘entre aspas simples’: neologismos; sentido particular de alguma palavra ou expressão; termos e expressões coloquiais e utilizadas pelos camponeses, quilombolas e povos e comunidades tradicionais do Matopiba.

“entre aspas”: relativização de expressões e conceitos.

“itálico entre aspas”: reprodução de falas e entrevistas diversas realizadas nos trabalhos de campo. As falas e entrevistas não acompanham a formatação da citação ABNT para referências bibliográficas. Acredito que as reflexões permitidas pelas entrevistas caminham juntamente com as reflexões realizadas a partir das referências bibliográficas, de forma que a diferenças entre as formatações não devam reforçar desigualdades entre as formas de saberes. Esteticamente, os recuos da margem esquerda de 4cm para as entrevistas deixariam o texto mais prolixo e cansativo ao leitor. Os registros e entrevistas realizadas juntamente com assentados, acampados, camponeses, trabalhadores rurais, lideranças de movimentos sociais, consultores de ONG’s, advogados populares, gerentes de fazendas de soja, funcionários públicos também compõem com mesma relevância a escrita da autora, apesar dos entrevistados e entrevistadas não terem responsabilidade acadêmica, legal ou ideológica sobre a tese aqui apresentada.

itálico: termos em língua estrangeira.

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PREÂMBULOS (OU REMEMBRAMENTOS)

La papa “sabe” El hombre puede “saber”

(Esquema para analogía 2, Victor Grippo)

Sertão: quem sabe dele é urubu, gavião, gaivota, esses pássaros: eles estão sempre no alto, apalpando ares com pendurado pé, com o olhar remedindo a alegria e as misérias todas...

Grande Sertão: veredas, João Guimarães Rosa (p.523)

O capitalismo é o senhor do tempo. Mas tempo não é dinheiro, isso é uma brutalidade. O tempo é o tecido de nossas vidas.

Discurso de Antônio Cândido na inauguração da Biblioteca da Escola Nacional Florestan Fernandes

Os recursos não chegariam, mesmo que minguados, se não tivesse essa luta aí. A escola não chegava, o Pronaf não chegava, o salário, a aposentadoria não chegavam, o atendimento à saúde não chegava. A questão dos filhos de pobre ir pra universidade não ia acontecer... tudo isso se deu da luta do trabalhador que talvez nem esteja mais entre nós, mas começou lá.

Antônio Criolo, Comissão Pastoral da Terra (MA). Entrevista de campo

¿Puede el pensamiento crítico por sí solo “desmontar la persistencia de la Hidra del sistema? ¿Necesita el Yolao de la confrontación con la realidad? O al revés: ¿puede la lucha organizada de abajo, por si sola, liquidar a la Hidra Capitalista? […]¿Podríamos, solas-solos-soloas, ya no digamos llevar al núcleo fundacional de la Hidra, sino siquiera alcanzar a definir cada una de sus variadas cabezas?

Si, de acuerdo, demasiadas preguntas. Y desordenadas, sí. E incompletas, claro.

El Pensamiento Crítico Frente a la Hidra Capitalista I, Comisión Sexta del EZLN (p.280-281)

E tem o pai da mata. É ele que governa a mata. Diz que quando o pessoal tá derrubando a mata, aí diz que a gente ouve o clamor dele, porque estão devorando a mata [...] Fica triste e clama. Dá um tipo de fantasma que aparece pro pessoal, porque dá uma tristeza muito funda nas pessoas

Regina Sader. Histórias do Estevão, Espaço e Lutas no Bico do Papagaio.

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INVENTÁRIO

1 impeachment

906 mortos, desaparecidos e feridos no campo

5 trabalhos de campo

39 sinusites

13 hospícios

4 carnavais

3.710.432 hectares de soja

1.764 conflitos por terra

28.309.178 vacas

8.498 templos

(distorcido e modificado a partir da obra de Juan Bercetche, 1973. Os números apresentados estão embasados no processo de vivido do término da tese, nos dados de 2018 do IBGE e nos Cadernos do Campo da CPT, SUS para os números de hospícios, e estimativa derivada de compilação de dados para o número de templos)

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Mapa 1 - Municípios percorridos em trabalho de campo

Fonte: Débora Lima e Embrapa Pesca e Aquicultura (2018) 27

INTRODUÇÃO

Boas tardes, dias, noites, madrugadas, aqueles e aquelas que se dispuseram a ler este texto, sem se importar com seus calendários e geografias1.

A pesquisa aqui desenvolvida tem como intuito captar as formas de acumulação do capital globalizado via avanço da sojicultura. As observações e análises propostas, a partir de alguns pilares – terra, acumulação e trabalho – foram realizadas nos estados do Tocantins, sul do Maranhão e Piauí e oeste da Bahia, região de diversos projetos agrícolas estatais e federais e que constituem a região Matopiba. Neste âmbito, realizei um debate crítico sobre a formação da região, a mobilidade do trabalho e suas transformações bem como o mercado imobiliário de terras agrícolas e do mercado de commodities2.

Gostaria de acreditar na ciência como os zapatistas a definem: racional, coletiva, sistemática e falível. Falível sempre serei como indivíduo, e falível sempre será uma tese. A tese que agora pode-se ler, abarca a tentativa de sistematizar algumas questões estudadas e vivenciadas, um recorte e uma mirada subjetiva dos temas dissertados.

Na etapa do mestrado o mote foi pesquisar sobre a expansão da fronteira agrícola, focando no circuito espacial produtivo da soja. Adoto para minha teses o signo da paixão gramsciana presente no livro “Elegia para uma Re(li)gião” , escrito por Francisco de Oliveira (1981): de “colocar-se em uma posição e, mediante essa colocação e por causa dela, tentar entender uma tragédia” (p.13).

Compartilho dos sentimentos de Regina Sader, que estudou o Bico do Papagaio e também criou uma relação de paixão com sua investigação. Ela diz: “é verdade que a paixão pode amplificar os fatos, supervalorizá-los, mas a relação de conhecimento permanece possível” (1986, p.17). Aqui sigo, numa nova etapa acadêmica, agora estudando uma região um pouco mais ampla – mas que começou e que até hoje abarca o Tocantins.

1 Traduzido e adaptado livremente do Livro zapatista “El Pensamiento Crítico Frente la Hidra Capitalista I”, sem edição precisa, editora ou ISBN. 2 Por commoditiy entendemos um produto primário ou semielaborado, mineral ou agrícola, padronizado mundialmente, cujo preço é cotado nos mercados internacionais em bolsas de mercadorias. Trata-se de uma criação não apenas econômico-financeira, mas também política, que submete o produtor das commodities agrícolas a uma lógica mundial (CASTILLO, 2011). 28

O conceito de abdução de Peirce (1998) foi uma das formas escolhidas para mirar as paisagens, histórias e problemáticas que foram compartilhadas no campo; processo que gerou hipóteses para dar conta dos eventos que me surpreendem, sejam acadêmicos ou cotidianos. Sob a lógica da abdução, afasto-me das aplicações de regras e preconceitos gerais para não reduzir o texto a uma pré-formatação e, assim, tentar caminhar sobre o possível e conjectural. O início de qualquer pesquisa seria então, a abdução. Aliada à surpresa, a abdução nasce da ruptura de um hábito, da quebra de um pensamento pré-concebido ou de uma expectativa, criando uma outra racionalização, uma nova regulamentação, uma outra forma de ver3 (PEIRCE, 1998).

Não estamos aqui escrevendo para provar determinadas afirmativas, já que as incertezas transbordam os limites da página, incertezas que evidenciam o desafio de estudar movimentos recentes do capitalismo na agricultura brasileira. O central aqui é a permanência do olhar crítico aos intuitos propostos. O importante, talvez, seja a forma ou o caminho que se toma para concatenar as ideias, onde alguns pingos nos i’s, juntos, formam na verdade reticências ...

Neil Smith nos indica uma direção: “o valor de uma teoria reside mais nas suas provocações do que nas suas afirmativas. Suas provocações levam-nos a ver ligações, relações e perspectivas que são raramente perceptíveis na segurança da vida diária e simbiose entre teoria e pesquisa empírica” (1988, p.08), nos afastando da construção de verdades; ou como Victor Grippo nos leva a refletir: “La papa “sabe”/El hombre puede “saber”” (aspas do original).

O pensamento crítico inerente à forma ensaio desafia e questiona a verdade totalizante imposta sobre as experiências singulares. Porém, esse próprio pensamento sabe, por outro lado, que a verdade não pode ser limitada pelo olhar individual. É nessa relação, nesse campo de incerteza em que não há um fechamento absoluto entre geral e particular. Na verdade, o ensaio busca sair dessa contradição a partir da própria contradição, ou seja, seu objetivo nada mais é do que a busca de um conhecimento geral, mas não totalizador.

3 Como aponta Aldous Huxley, em seu livro “A arte de ver” (2000), a maioria dos “defeitos de visão” são funcionais, devido a hábitos defeituosos, ligados ao estado de esforço e tensão de nossos cotidianos, esforço que afeta não só o corpo, devido à natureza unitária do organismo humano, mas também a mente. O trabalho de campo, seria assim, também uma forma de (re)aprender a ver. 29

Devido à extensão da região de estudo, só foi possível concluir a tese com apoios, amizades, estudos, materiais, artigos e teses já desenvolvidos sobre o tema. Esse trabalho só não tem uma autoria compartilhada por não ser possível quebrar tal formalidade acadêmica, assumindo individualmente os argumentos e posições construídas nesta tese.

Descobri uma tese de autoria coletiva no Departamento de Desarrollo Rural da Universidad Autónoma Metropolitana, México4. Lá também descobri uma universidade que está em constante diálogo com as comunidades e com os movimentos sociais. A tese que aqui estou defendendo é uma tentativa de reverberar um pouco do que pude ver ao longo dos trabalhos de campo, entrevistas e conversas. Uma publicação, que desfrutei e tenho orgulho de ter participado, foi “Dona Francisca: Entre Cabaças, Caminhos De Luta e Sementes de Resistência”, publicada no dossiê Matopiba da Revista NERA (2019)5, de autoria de Dona Francisca Pereira, Mariana Conceição e minha. Porque se trata de dar a autoria àquela que nos recebeu em sua casa e transmitiu conhecimentos, que não estão presentes em nenhuma dezena de artigos, ou estão lá, sem reconhecê-la ou citá-la. Significou receber a aprovação de uma camponesa, mulher, liderança, guerreira que leu e gostou do que viu, deu visto para publicar. Significou mudar, nem que seja um pouco, o formato do discurso, tentar caminhar ao lado e não à frente.

Sobre os dados, sistematizei uma gama de informações a partir de dados secundários (públicos e privados) e entrevistas (semi-estruturadas e não-estruturadas), que compõem um pilar metodológico da tese. São referências sobre o tema estudado, especialistas locais. Tais especialistas também têm suas formas de sistematizar – não necessariamente a forma escrita, na qual vejo como uma forma de divulgar, semear, racionalizar, dar ênfase a um tipo de debate crítico. Há uma polifonia na construção do olhar crítico da tese, a partir das entrevistas de secretários de agricultura, instituições diversas dos governos estaduais e municipais, ONG’s sindicatos e movimentos sociais, somando cerca de 70 entrevistas. Algumas entrevistas de instituições e movimentos do sul do Piauí foram cedidas pela Rede Social de Justiça. Foi mantido o nome real daqueles e daquelas que ao longo das entrevistas quiseram ter suas vozes identificadas. A sistematicidade adotada tenta se assemelhar ao exercício de classificação dos camponeses, que diariamente, inventariam o conhecimento dos

4 Carreón, Areli y San Vicente, Adelita. La disputa por el maíz: comunalidad versus mercantilismo en el debate del maíz transgénico, tesis de maestría en Desarrollo Rural, UAM-Xochimilco (2011). 5 Disponível em http://revista.fct.unesp.br/index.php/nera/article/view/6276 . 30

bichos, da lua, das plantas. Separam as plantas de comer, de curar, que alimentam. Compreendem processos históricos, se reinventam.

Eu perguntei se não aprendiam nada de Geografia. Não precisa, disse um deles, isso a gente aprende é no pé. Os igarapés vão pro Tocantins. O Tocantins desce pro mar, é só olhá, né? No topo daquele monte não serve pra plantá. A terra é ruim. No baixo é boa. É no pé mesmo, andando e olhando (SADER, 1986, p. 105).

Fiz levantamentos bibliográficos a partir de materiais impressos de sindicatos, órgãos estatais e outras instituições e entrevistas de campo. Sobre os levantamentos bibliográficos, tentei incluir autores e autoras latino-americanas; trabalhos desenvolvidos de autoria das universidades presentes na área de pesquisa, dialogar para além das referências masculinas, brancas e dos “centros” no intuito de diversificar olhares. Realizei 5 trabalhos de campo, percorrendo os estados do Tocantins e Maranhão, Piauí e Bahia ao longo dos anos em que desenvolvi a pesquisa de doutoramento. Ainda sobre a região, é importante registrar que tenho visitado sistematicamente estes estados desde 2012, principalmente o Maranhão e Tocantins, sendo que neste último desenvolvi um trabalho junto a Comissão Pastoral da Terra (CPT) por cerca de dois meses em Araguaína (TO). Além disso, empreendi visitas técnicas e diálogos com a Embrapa, instituição responsável por realizar notas técnicas e mapeamentos que respaldaram o PDA Matopiba.

Diferentemente dos trabalhos que vem discutindo a região do Matopiba, buscou- se compreender como essa região, que aparentemente parece ter surgido nos anos 2010 a partir da expansão do agronegócio e de um Plano de Desenvolvimento Agrícola, na verdade, vem sendo moldada pelas relações capitalistas via expropriação dos camponeses e projetos agrícolas desde o início do século XX. Um dos caminhos que tentou-se traçar é, como diferentes “regiões”, diferentes processos territoriais culminaram na região econômica do PDA Matopiba e como o capital tenta homogeneizar espaços para viabilizar processos de acumulação.

O Matopiba, foi oficialmente materializado pelo Decreto 8.447, em maio de 2015, criando um marco que conectou diversas ações do Estado agroexportador como promotor do avanço da fronteira agrícola moderna no país - plantio, implicações normativas e logísticas na produção e circulação das commodities. De acordo com as notas técnicas, disponibilizadas pela Empresa de Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a delimitação territorial proposta para o Matopiba abrange 31 microrregiões do Instituto Brasileiro de Geografia e 31

Estatística (IBGE), 337 municípios em uma área total de 73.173.485 ha. Além disso, a região engloba 324.326 mil estabelecimentos agrícolas (MIRANDA et al., 2014).

A delimitação territorial proposta para o Matopiba corresponde a 33% da extensão territorial do estado maranhense; 08 microrregiões localizadas em 139 municípios, e abarcando uma área de 27.772.052 ha, correspondendo a 38% do estado tocantinense; 04 microrregiões distribuídas em 33 municípios abrangendo uma superfície territorial de 8.204.588ha, representando 11% do estado piauiense e por fim 04 microrregiões espacializadas em 30 municípios, compreendendo 13.214.499 hectares, representando 18% do estado baiano (BRASIL, 2015).

Entendo que a adoção da região delimitada pela Embrapa como Matopiba está inserida dentro do contexto dos cerrados do centro-norte. A tese tem como enfoque o Matopiba, acrônimo criado a partir da necessidade do agronegócio de nomear a área de expansão da fronteira agrícola no início dos anos 2010 e posteriormente delimitada e planificada pelo Estado brasileiro, culminando no PDA Matopiba. Diversos deputados, unidos na Frente Parlamentar sobre o Matopiba, reuniões na Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural, reuniões no Ministério dos Transportes (ALMEIDA; SODRÉ; MATTOS JÚNIOR, 2019), estudos e notas técnicas da Embrapa, Grupo de Inteligência Territorial Estratégica (GITE) foram fundamentais para criar a região Matopiba como ferramenta (RIBEIRO, 2004).

Com mudanças políticas após o impeachment da presidenta Dilma Rouseff em 2016, as diretrizes do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) deixaram de priorizar a execução do PDA Matopiba, especialmente após o fechamento da Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos do Matopiba em 2015 e a saída da ministra tocantinense Kátia Abreu da gestão do MAPA. O PDA, enquanto um plano de desenvolvimento territorial integrado, não foi executado, e poucas ações foram implementadas, na qual o término da ferrovia Norte-Sul é um dos exemplos. Apesar das alterações dos rumos políticos, os investimentos privados na região não cessaram, bem como a expansão da fronteira agrícola. O avanço do capital independe da formalidade estatal, movimento em marcha na região há pelo menos 30 anos.

Utilizei como recorte espacial a delimitação proposta pelo PDA Matopiba, por identificar os movimentos de consolidação do agronegócio via capital nacional, e na última década, um crescente avanço do capital estrangeiro. Apesar do Matopiba ser considerado uma 32

“as últimas áreas de fronteira agrícola da soja”, a tese irá apontar para uma região nada homogênea, distanciando-se do conceito da região da Geografia econômica de Boudeville (1972) e aproximando-se do conceito de região econômica e política discutida por Toledo6 (2008), Haesbaert (2010), Oliveira (1981) e Oliveira (2016)

A relação entre homem e natureza toma um formato quase dicotômico desde o início do capitalismo industrial, levando a interpretações binárias do que seria o homem e a natureza – como se houvesse uma intencionalidade, um finalismo guiado, como se fossemos o pináculo da evolução. O resultado “humano” e “natural” a que chegamos difere-se da interpretação darwiniana de que a tendência à perfeição, jamais alcançável, estaria em termos de adaptabilidade ao ambiente (GERALDINO, 2016).

É essa transformação (não) finalista da natureza que mostra como o vírus capitalista se reproduz, contamina e se apropria de conceitos como seletividade, adaptabilidade, como aponta a moral do filme “Trabalhar Cansa” (2011). Este retrata o ápice da superstição secundária, conceito adorniano no qual o oculto deixa de ser o místico, o marginal, para se tornar o institucionalizado, objetivado e amplamente socializado7. “O ocultismo moderno está ligado à sociedade capitalista avançada não só por sua relação de transformação de tudo em mercadoria, mas também por sua analogia ao totalitarismo”, levando às últimas consequências o caráter de fetiche da mercadoria (RESENDE, 2006, p.133). Na última cena do filme, um mago do mundo corporativo, uma espécie que nos anos 2010 desdobra-se no coaching, esbraveja para uma sala cheia de homens vestidos em seus ternos sóbrios: “A questão é: como se destacar? Hum?! Como vencer na selva? Para responder essas perguntas, o homem moderno tem que retomar o contato com suas raízes. Entrar em contato com o seu lado primitivo, canalizar essa energia animal para sua profissão”. A aproximação com nossas raízes, neste caso, sempre mediada pelo trabalho.

6 Ver também Heidmann; Toledo; Boechat (2014) E Boechat; Pitta; Toledo (2019). 7 Como diria SupGaleno do EZLN no livro “El Pensamiento Crítico Frente a la Hidra Capitalista I” (2015), em diálogo com Paul Klee e Walter Benjamin: “para consejos, queridoas amigoas y enemigoas, hay filosofias, religiones, pseudos-ciencias, [horóscopos, completaria Adorno], partidos políticos institucionales, la pomada de tigre, el té de armadillo, el ungënto de víbora de cascabel, la homeopatia, los cursos de supercíon personal, las técnicas de como ganar amig@s, likes, fllowers, elecciones, encuestas, en fin, um lugar relevante en la posmodernidad” (p.281). 33

A humanidade8 estaria caracterizada por uma adaptação ativa, um metabolismo que, por meio do trabalho, cria condições materiais de sua própria reprodução, recordando os ideais modernos (tanto socialistas quanto capitalistas) que o “homem” é substituído por um “super-homem”, empenhado em quebrar as barreiras naturais tradicionais por novas formas planificadas e projetadas (ECHEVERRIA, 1998). A apropriação de homens e mulheres da sua própria natureza é parte da transformação da natureza em ser humano. Em virtude dessa constituição interna do trabalho9, a situação típica do ser humano é a reprodução ampliada, que está expressa nas relações autonomizadas aos homens e mulheres, reduzidos a essa contradição em processo.

Não é a unidade do ser humano vivo e ativo com as condições naturais, inorgânicas, do seu metabolismo com a natureza e, em consequência, a sua apropriação da natureza que precisa de explicação ou é resultado de um processo histórico, mas a separação entre essas condições inorgânicas da existência humana e essa existência ativa, uma separação que só está posta por completo na relação entre trabalho assalariado e capital (MARX, 2011, p.648 – grifos da edição).

Determinar um tipo de uso a natureza (inclusive o próprio corpo) é determinar um tipo de apropriação mediada por um aspecto do trabalho – que nas vias da especialização e da troca, mediada pelo dinheiro, faz com que os homens e mulheres se afastem cada vez mais da natureza (MARX, 1986).

Na maioria dos países industriais avançados, temos dominado as forças naturais para colocá-las a serviço do homem; assim, multiplicamos a produção ao infinito, de modo que uma criança produz hoje mais do que uma centena de adultos no passado. E qual é o resultado? Um excesso de trabalho cada vez maior, a miséria sem cessar crescente das massas, e a cada dez anos, a explosão de uma tremenda crise. Darwin não se dava conta da sátira tão amarga que escreveu sobre os homens (ENGELS, 1961 p.17 - tradução livre).

8 Na obra de Peter Sloterdijk, há uma crítica ao humanismo e sua ideia de "homem", a partir de uma polaridade entre civilização e barbárie, o humanismo é proposto como uma tecnologia para a formação/educação dos homens, partindo de uma noção de "homem" que sobrevive à barbárie, que a educação correta pode domesticar. Em “Normas para o parque humano” (2003), Sloterdijk levanta a crise do humanismo a partir do craqueamento da imagem do homem “adestrado”, mais que necessário para o avanço das relações não somente subjugadas, mas fetichizadas pelo capital. Além disso, é inevitável observar como as atuais ondas conservadoras se utilizam dos valores civilizatórios. 9 "trabalho" é um conceito que mascara sua constituição na experiência burguesa, protestante e iluminista do mundo - o ethos de dominação da natureza (e do feminino, do de cor, do estrangeiro etc.) - do homem branco, viril, maníaco pela atividade, que tende a perder a capacidade da própria experiência da diferença e da qualidade (KRISIS, 1999, p. 08). 34

Antes da primeira metade do século XX, o trabalho ainda era tido como um motor indispensável ao processo de acumulação capitalista, centrado na produção de mercadorias (KURZ, 1993). No entanto, a atual forma social passa a não precisar produzir a vida enquanto momento essencial de sua manutenção, não mais central ao processo de acumulação. Ou seja, a vida não é mais um elemento indispensável. Mas o que acontece quando se abre mão da produção da vida em larga escala? A barbarização das relações espaciais foi uma das formas encontradas para garantir o funcionamento débil de um sistema focado na valorização a partir de elementos fictícios. Os corpos que caminham e possuem uma “vida sem valor” (AGAMBEN, 1999), totalmente despojados de suas terras e sem a possibilidade de criar valor a partir do trabalho podem ser aniquilados.

A “dominação da natureza”, pressuposto do desenvolvimento da agricultura e o fim do nomadismo10, pressuposto para sobrevivência e criação de assentamentos11, é de certa forma a principal linha de “compreensão” da evolução da sociedade. “A dominação da natureza é uma realidade aceita por todos, quer ela seja vista com espanto, como uma medida do progresso humano, ou com temor, como um trágico prenúncio de um desastre eminente” (SMITH, 1988, p.27).

Seja ou não hostil, o fato da exterioridade da natureza é o bastante para legitimar a dominação da natureza; de fato, esse próprio processo de subjugação veio a ser tratado como "natural". Em segundo lugar, e mais importante hoje, é a função ideológica da concepção universal. Isso não mais atua como um quadro retórico" para justificar a conquista da natureza exterior e nem um pouco como uma visão moral que estimule o comportamento social adequado à classe dominante. Essas funções vieram juntas. O efeito é ainda o da conquista — ou mais precisamente, o controle — e a meta é ainda o comportamento social [...] A competição, o lucro, a guerra, a propriedade privada, o erotismo, o heterossexualismo, o racismo, a existência de ricos e de despossuídos, ou de "caciques e índios" — a lista é infinita — tudo isso é considerado natural. A natureza, e não a história humana, é considerada responsável; o capitalismo é tratado não como historicamente contingente mas como um produto inevitável e universal da natureza que, enquanto

10 “A passagem do nomadismo pastoril à agricultura sedentária é o fim da liberdade ociosa e sem conteúdo, o princípio do labor. O modo de produção agrário em geral, dominado pelo ritmo das estações, é a base do tempo cíclico plenamente constituído. A eternidade é-lhe interior: é aqui embaixo o regresso do mesmo. O mito é a construção unitária do pensamento, que garante toda a ordem cósmica em volta da ordem que esta sociedade já realizou, de fato, dentro das suas fronteiras” (DEBORD, 1997, p.86). 11 “Curiosamente, foi o Velho Testamento que melhor se ajustou em essência à cultura aborígene. De fato, em Levítico é possível encontrar interditos relacionados à mutilação durante períodos de luto, bem como a prática de comer répteis ou animais selvagens como avestruzes [...]. Ao ler a Bíblia, após minha primeira estada na Austrália, fiquei extremamente impressionada com o fato de que o Levítico normaliza, à sua própria maneira, a passagem da vida de caçadores nômades para a de agricultores sedentários. Os alimentos proibidos são todos os recursos selvagens que permitiram os povos orientais – bem como em outras regiões do mundo – sobreviverem sem que tivessem que cultivar a terra ou criar animais. Proibir o acesso a esses recursos pode ser considerado uma justificativa a posteriori para o cultivo da terra e para uma certa sedentarização” (GLOWCZEWSKI, 2015, p. 104) 35

ele possa estar hoje em pleno apogeu, ele pode ser encontrado na antiga Roma ou entre bandos de macacos saqueadores, onde a sobrevivência do mais apto é a regra. O capitalismo é natural; lutar contra ele é lutar contra a natureza humana (SMITH, 1988, p.45-46).

As problemáticas da natureza, do trabalho, do espaço são juntamente mimetizadas pelo próprio capital. A crise capitalista, representada no pensamento zapatista pelo monstro da hidra, nos remete ao processo inexorável de reprodução ampliada, reificação e violência no qual estamos submetidos, mas que também alimentamos.

la hidra es ese ser mitológico con muchas cabezas, que anuncia muerte y sufrimiento, y no solamente lo anuncia sino que lo cumple, es decir que no se queda sólo en la teoría. Un ser que corrompe y envenena el aire, que es el mal de la hidra que la gente tenía que dejar sus tierras, las cuales ya no podrían labrar, en las cuales a sus muertos yo no podían sepultar. Y la hidra era tal que al cortarle alguna de sus cabezas salían tres más […]Y en ese sentido autocrítico, digo que soy yo, que somos nosotros también la hidra, somos alguna de sus cabezas, o tal vez varias ¿Son – me pregunto, nos pregunto – nuestros cuerpos individuales y colectivos el lugar donde la mitología y la biología se unen? ¿Dónde la hidra mitológica se encuentra y se reconoce con el ser biológico? Somos a la vez cabeza de hidra y la espada que la corta. Somos víctimas y victimarios. Sistema y antisistema. Somos los críticos y, como ayer lo dijo SCI Moisés, los que idealizamos (Pensamiento Crítico Frente a la Hidra Capitalista tomo II, 2015, p.186).

A peculiaridade da atual crise é seu caráter multidimensional (BARTRA, 2013): civilizatória, econômica, política, ecológica, alimentaria, sanitária, etecetera. Sua dimensão múltipla não é resultado de uma relação unilateral, já que a crise civilizatória expressa conflitos políticos, resultado das correlações de poder de um determinado tempo histórico, que define formas e tempos da vida.

El ser humano si algo tiene es su capacidad de definir su propio mundo, de definir las formas en las formas de convivencia en las que quiere desarrollarse, de darse forma así mismo y de construir su mundo. Esta es la libertad del ser humano, porque esa cualidad le ha sido enajenada por un sujeto sustitutivo, esta idea es la más importante en Marx para hablar del problema civilizatorio. Ese sujeto substitutivo aparece en la circulación de mercancías y ese sujeto sustitutivo, explica Marx, es el valor económico, el valor la mercancía, el valor de la mercancía capital: el valor que se valoriza. Ahí donde circulan los valores de uso como mercancías, aparece una forma, un virus diríamos ahora, que hace que aparezca un valor muy peculiar que es el de la mercancía capitalista. Ese valor tiene como característica fundamental que se autovaloriza. La riqueza para Marx es una cantidad de dinero viva que genera plusvalor. Este valor que genera plusvalor es el que sustituye al ser humano como sujeto, y se convierte en un dictador que lanza sus órdenes desde la esfera de la circulación. La sociedad humana no tiene ya la capacidad de decidir por si misma, ha perdido su subjetidad, la capacidad de dirigir estaría en la mano secreta del mercado, guía da por este pequeño virus que es el sujeto sustitutivo: el valor que se valoriza (ECHEVERRÍA, 2010, p.06-07).

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Essa subjetividade humana, que tem como pressuposto o controle da natureza e seu manuseio como projeto e extensão da humanidade, aparece em um primeiro momento como ferramenta para alcançar a liberdade. No entanto, Marx incansavelmente demonstra em o Capital (2013) que tal liberdade só é permitida a partir de processos e relações reificadas, mimetizando nossos corpos como mera força de trabalho. A falsa liberdade alcançada pela suposta dominação da natureza nos aprisiona a partir da reprodução de relações cada vez mais viciosas. Se a positivação do trabalho já apresentaria problemas (e limites) ao sistema produtor de mercadorias, uma vez que desde a década de 1970 o sistema capitalista vive uma superprodução de mercadorias, ou melhor – a produção de coisas que não mais se efetivam como troca, não se efetivam como mercadoria –; a valorização a partir da ficcionalização das relações capitalistas apresentará uma face capitalista de uma monstruosidade sem precedentes.

Talvez uma das monstruosidades dos tempos atuais seja violentar-nos de tal forma que inclusive nosso lado animalesco é apropriado, regurgitado nas inúmeras formas de violência. Não uma violência naturalizada, mas uma violência tecnificada12. A violência naturalizada seria uma violência inerente a sociedade, uma violência incontornável, inelutável a tudo que é bicho-humano. A violência naturalizada é perene em qualquer sociedade, porque as tensões em uma sociedade viva são permanentes, sendo necessário entender a violência, por exemplo, da relação homem-natureza, constitutiva de movimentos violentos, criação e destruição, assim como Luckás (2010) reconhece a violência como algo indissociável da sociedade. No entanto, é a violência tecnificada que fortalece a dicotomia entre homem- natureza, baseado numa modelo técnico cada vez mais especializado e fragmentado e em uma necessidade crescimento macroeconômico falida.

A violência tecnificada está mascarada no Estado, nas frentes civilizatórias, no trabalho, no letramento, no conflito de interesses, no poder. A sociedade torna-se mais mortífera quanto mais o Estado se utiliza de seu monopólio da violência, “pacificando”13 as relações sociais de maneira profunda. Echeverría (1998), retoma a ideia de Marx e Horkheimer da mão invisível carregada de um só sentido, em que a sociedade seria o lugar das desigualdades, estrutural e sistematicamente reproduzida, movida por classes com

12 Ver Pedro Duarte, “as novas formas de violência” e Maria Rita Khel, “contra a lei do mais forte” e “Do mito fundador ao assassinato do pai”. Vídeos para Seminário Sesc “Mutações: fontes passionais da violência, realizado em São Paulo no ano de 2014. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=FgkdDlFtmSI

13 Sobre o conceito de paz, também ver o poema de Marcelino Freire, “Da paz”, na obra “Rasif: mar que arrebenta” (2008). 37

interesses não só distintos, mas irreconciliáveis: “vivir y dejar vivir es la norma de la sociedad civil” (p.06).

Sobre a pacificação da sociedade, lembro de um comentário feito pelo prof. Dr. Ariovaldo Umbelino de Oliveira na minha defesa de mestrado, afirmando que a fronteira no Tocantins já estaria “pacificada”, sendo mais “tranquilo” para a realização de trabalhos de campo, ou desenvolvimento de uma pesquisa. Apesar do Estado ainda não ser onipresente no território tocantinense, de fato ele possui o monopólio da violência. Acredita-se que a área de estudo aqui proposta não esteja ainda “pacificada”: a intensificação de conflitos no Tocantins, Bahia, Piauí e Maranhão mostra as dificuldades do capital se adentrar nos rincões do país. Somente no ano de 2016, o Maranhão registrou 154 conflitos de terras numa zona de 1.419.869ha, na Bahia 98 conflitos, envolvendo cerca de 518 mil hectares, Piauí 34 conflitos em uma área de 19.323ha e no Tocantins, 66 conflitos, litígio de aproximadamente 90mil ha. Os números registrados para o ano de 2016 são maiores do que a somatória dos conflitos ocorridos nos últimos 10 anos (CPT, 2017).

Bolívar Echeverría (1998) apresenta o conceito de violência dialética, aquela que está subtraída em toda a constituição do mundo social. Uma violência “benigna”, “que saca de naturalidad al ser humano, reprimiendo o fortaleciendo desmensuradamente determinados aspectos de su sustancia animal, para adecuarla sistemáticamente en uma figura de humanidad” (p.12); uma violência que se converte como feito harmônico, como uma necessidade estratégica de sacrificar certas possibilidades de vida em favor de outras dentro de uma supervivência comunitária – quase como uma autoviolência, um sacrifico criativo. A ideia de violência dialética, “benigna”, construtiva ou paideica está, sem dúvida, como pano de fundo da vida humana institucional e civilizada14.

Atualmente, esse tipo de violência justifica os avanços (neo)desenvolvimentistas na região Matopiba e também na Amazônia, a implementação de megaprojetos, a destruição dos biomas para avanço da fronteira agrícola e supressão dos povos e comunidades

14 Poder-se-ia abrir um parêntese aqui para discutir formas de violência e fascismo, prato que estamos comendo diariamente na sociedade brasileira ao longo dos anos que realizei a tese (2015-2019), passando pelos governos da Dilma Rouseff (PT), Michael Temer (PMDB) e Jair Bolsonaro (PSL). No exame de qualificação, houve um debate sobre como a sociedade cultivou um grande conhecimento técnico de forma alienada, e aqui poder-se-ia debater a partir das ideias de Adorno e também do que vem sido discutido pelo Paulo Arantes. A técnica é utilizada como um grande poder destrutivo, ou um “poder da maioria do Estado” via alienação dos meios políticos, no qual as comunidades quilombolas, indígenas e camponesas devam ser varridas para dar espaço a expansão do agronegócio. Apesar da técnica, da violência e do fascismo serem um prato cheio para análises da atual conjuntura, a tese dialoga apenas com os dois primeiros conceitos: violência e técnica. 38

tradicionais, justificado como “um mal” necessário a ser executado para desenvolvimento do Brasil.

Além disso, para Echeverría (1998), há também um aumento da violência “selvagem”, apresentada como uma violência não institucionalizada via grupos antinacionais ou disfuncionais. Assim como a violência tem aumentado na região Matopiba, as ações de milícias e seguranças privadas, como Dhama, Estrela e empresa NSSP (Norte Sul Segurança Privada) tem tido uma crescente presença na região. A violência privada também é alimentada pelo “monstro” estatal, que valida e legitima as ameaças, assassinatos e expulsões causadas por fazendeiros, grupos especuladores de terra, grupos do agronegócio.

Por trás de toda a retórica sobre o Estado e seu papel civilizador, há sempre, em última análise, alguém que esmaga a cabeça de outro ser humano, ou que pelo menos tem a possibilidade de fazê-lo. As funções e o funcionamento do Estado variam muito ao longo da história, mas o exercício da violência é seu denominador comum (JAPPE, 2013, p.19).

O Estado pode ocupar-se do bem-estar, construir e manter infraestruturas, regular a economia, estar abertamente a serviço de um pequeno grupo, mas não necessariamente – nada disso é essencial. No entanto, um Estado sem homens armados que o defendam e salvaguardem a ordem não é um Estado. “Sobre esse ponto, podemos dar razão tanto a Hobbes quanto Carl Schmitt: a possibilidade de administrar a morte permanece o pivô de toda a construção estatal” (JAPPE, 2013, p.20).

A violência tecnificada parece ser uma violência singular da contemporaniedade, via um atual Estado democrático, muito mais equipado do que os Estados totalitários de outrora, para eliminar tudo o que possa fazer-lhe oposição, com sistemas tecnológicos que obedecem à mesma lógica. Ela se monta a partir de uma espécie de indistinção entre violência e não violência, pouco a pouco apagando a fronteira do que seria uma coisa e outra:

la violencia, a diferencia de la ira, es una operación de cálculo, no es sólo un sentimiento, es una intención programática que excede los hechos mismos. La violencia no es un acto singular, es un conjunto articulado de prácticas cuyo fin es la producción artificial de diferencias (INCLAN, p.17, 2015).

O direito à vida como dádiva do Estado, ou necropolítica (MBEMBE, 2011), reflete a guerra social, a crise civilizatória e capitalista prolongada, cuja violência militarizada 39

é acompanhada pelo direito militarizado, com dois procedimentos centrais: o estabelecimento de um permanente estado de emergência, em que estão suspensos aleatoriamente os direitos15 (AGAMBEN, 1999) e a organização do tempo coletivo, sob os princípios de um estado de sítio para "defender" a vida digna de uma ameaça não identificada necessariamente (MBEMBE, 2011). A violência, mediante a uma ameaça de morte, é de certa forma, uma ação contrária a uma autonomia, implicando a negação de um sujeito humano livre. Em “Homo sacer – El poder soberano y la nuda vida”, de Giorgio Agamben (1999) caracteriza as formas de vida em que se pode dar cabo uma morte impune, uma matança sem consequência jurídica, desde que seja uma morte ligada ao que é considerado marginal, ao que é considerado descartável, ou ao que “atrapalha” projeto civilizatório. Foucault (2015, p. 155) afirma que “o homem moderno é um animal em cuja política sua vida de ser vivo está em questão”.

Já são inúmeros os casos de mortes e violência no campo. Os dados ficam rapidamente obsoletos, e dão lugar à grilagem e ao avanço da fronteira agrícola. Nos meses de maio e junho de 2017, ocorreram violentos ataques da história agrária brasileira: massacre do Pau D’Arco (PA), onde 11 pessoas morreram (mesmo número de mortos de Corumbiara (RO, em 1995); Colniza (MT), 9 trabalhadores rurais mortos e feridos; No município de Vilhena, em Rondônia, 3 trabalhadores foram mortos na luta pela Reforma Agrária; Lençóis, na Bahia, 6 lideranças quilombolas no Território de Luna também foram assassinadas, sendo 4 delas dentro de suas casas; e Viana (MA), onde 22 índios Gamelas foram violentados e torturados16 (ALVES et. al, 2018).

A violência é um conceito transversal do avanço dos movimentos da fronteira e da civilidade. A tese aqui desenvolvida não está fora da perversa reprodução da violência, já que fazer “ciência” também pode ser um tipo de violência.

Science, I have said, has become a new reason of state. The state and its various arms can kill, main or exploit in the name of science. Science in turn, as a raison

15 Florestan Fernandes, em “ Poder e contrapoder na América Latina” (1981) também disserta sobre como a crise estrutural leva a periódicos momentos de suspensão do estado de direito e movimentos de fascismo na América Latina e no Brasil. No caso de Florestan, há uma diferença entre o fascismo clássico europeu e latino-americano, explicado a partir da teoria marxista da dependência, caminho teórico que não tomamos neste texto. 16 É possível aprofundar a leitura do avanço da violência nos momentos atuais a partir dos textos publicados no Dossiê Michael Temer e a Questão Agrária, publicado pela Revista Okara em 2018, em especial o artigo “ O avanço da violência contra as comunidades agroextrativistas camponesas no espaço regional do Matopiba e Pré- Amazônia”, de autoria coletiva de Vicente Alves, Débora Lima, Mariana Nóbrega, Erick Kluck . Dossiê disponível em www.periodicos.ufpb.br/index.php/okara/issue/current/showToc .

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d'état, can inflict violence in the name of national security or development (NANDY, 1988, p.9).

Os investimentos feitos pela civilização na ciência têm sido na direção de oferecer controle sob uma base política, na forma de abstração para aumentar o controle ao homogeneizar seu objeto, criando uma realidade artificial que pode ser vigiada. O monopólio da violência também tem sua base na subordinação do conhecimento como forma de dominação. Um dos equívocos fundamentais de nossos tempos é de que a ciência aumentou nosso controle sobre a natureza. Na verdade, o que a ciência conseguiu foi uma substituição dos princípios da natureza pela sua própria, imitando seus processos. Essa imitação também nos coloca em uma crise em espiral, já que a natureza não pode ser totalmente controlada, devido a sua irreversibilidade, singularidade e, mais importante, sua diversidade.

Longe de reafirmar uma ciência de Estado, ou imitar a natureza, caminhamos com nossas contradições, de forma violenta e violentada. A violência é aqui explicitada desde o momento da introdução da tese, por ser uma característica dialogicamente presente neste texto, configurando-se como o termo geral para apontar os diversos processos e formas de dominação, superexploração, rapina, espoliação, despossessão – conceitos conectados à acumulação, um dos pilares deste trabalho.

No primeiro capítulo, “Violência e trabalho na agricultura capitalista” discuto como as formas de violências, em grande medida tendo as ordens da metropole o Estadocomo responsável ou mediador desta violência, foi fundamental para organizar uma região que garantisse e entrada do capital. A formação de uma força de trabalho, imprescindível para tal processo, criou uma legião de expropriados de suas terras para servirem a abertura da fronteira; mão de obra barata que permitisse os baixos custos de produção das commodities. A violência aparece como uma característica inexorável a todos os processos de avanço da fronteira da soja, e como já dito por Marx, ela “é a parteira de toda velha sociedade que traz uma nova em suas entranhas. Ela mesma é uma potência econômica” (MARX, 2011, p.998).

Discuto também as formas de flexibilização do trabalho no circuito da soja. A sazonalidade do trabalho na lógica das culturas temporárias cria uma relação precária com o trabalhador e as fazendas, fazendo com que os assalariados rurais trabalhem ao longo do ano em distintas cadeias de commodities (soja, cana, eucalipto e pecuária), e até mesmo em distintos lugares, acompanhando as variações de calendário de colheita e plantio dentro do 41

Matopiba. É possível observar frentes de migração de trabalhadores que vão em direção ao oeste baiano, e das colheitas de soja, milho e algodão baianas adentram ao Tocantins (mais rarefeita), Sul do Piauí e Maranhão. Do sul do Piauí, há rotas para o sul do Maranhão e Bahia. Muitos destes trabalhadores assalariados são superexplorados pelas empresas que os expulsaram (ou que expulsaram seus pais ou avós), a partir dos processos de captura da terra e suas variantes formas de acumulação.

No capítulo 2, “Tutameia e a força de trabalho na região Matopiba” analiso as transformações que vêm ocorrendo no mundo do trabalhador rural. Entendendo que o camponês também é um trabalhador rural de múltiplas identidades na região de estudo (agricultor familiar, quilombolas, indígenas, quebradeiras de coco, pescadores, caboclos, comunidades de fundo e fecho de pasto, geraizenses e sertanejos), os Sindicatos de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR), por mais heterogênea que tem sido sua atuação e presença no Matopiba, têm pleiteado direitos dos trabalhadores rurais, garantindo acesso a políticas agrícolas e agrárias, fazendo alguns enfrentamentos para reconhecimento de direitos sobre a posse da terra junto à outras instituições e movimentos sociais.

No entanto, nos últimos anos, há uma crescente criação de entidades específicas para os trabalhadores assalariados rurais, como as Federações de Trabalhadores Assalariados Rurais e Federações de Empregados Rurais Assalariados.

A saída dos trabalhadores assalariados dos STTR esmaece a relação entre o assalariado rural e a terra, distanciando a possibilidade de retorno a terra. A ideia de empregado relacionada à ideia de trabalhador assalariado fortalece relações de precariedade e de não-pertencimento, resultado da modernização, automação e autonomização das relações capitalistas no campo. A ideia de empregado como força de trabalho também carrega o conceito de mobilidade, mostrando a dificuldade de permanecer em um lugar. Se antes era possível “mover-se” e ocupar “novos” espaços na região de estudo, como relata Becker (1982), pela falta de presença ou uma presença rarefeita do Estado, crescente desde os anos 1930 e mais efetivamente a partir dos anos 1970; hoje, com o avanço da fronteira agrícola, a presença do Estado, seja pelas alianças com as elites locais, pelas políticas públicas, pelas parcerias com o capital estrangeiro, ou até mesmo pelos celulares, não há muitas saídas nem terras devolutas (terra devoluta não é terra vazia) para o deslocamento (ou fuga?) desses populações, gerando e alimentando conflitos cada vez mais violentos e aparentes. 42

Se no primeiro e segundo capítulo o movimento central são as formas positivas e negativas que o trabalho assume ao longo do avanço da fronteira, no terceiro capítulo, as categorias de terra, renda e acumulação norteiam a discussão sobre mercado de terras e commodities. Tomando a soja como projeção dos processos de acumulação, concentração e crise do capital, o capítulo 3 “Terra, soja e acumulação no Matopiba” demonstra e analisa os processos de territorialização do capital, via mercado de terras e produção de commodities para compreender as formas de acumulação atuais.

O mercado de terras conta sua história juntamente com a grilagem, com o avanço do Estado e o modo de produção capitalista. Como já indicava Monbeig (1984), o mercado de terras está atrelado à expansão de infraestruturas, em especial do transporte, para o avanço de monocultivos (no caso aqui estudado a soja). Além do avanço da soja, as formas capitalistas acompanham tal movimento de expansão, em que as formas de acumulação também estão presentes na terra. Pensando o Matopiba como uma fronteira, o agronegócio encara os fundos territoriais como áreas não devastadas, autênticos estoques de terras e recursos naturais passíveis de apropriação futura. Ainda sobre a busca pela valorização máxima da terra, apontarei as formas de apropriação e acumulação dos grandes capitais agrícolas – já que a financeirização da agricultura cria diversas artimanhas para a captura da terra: moderniza as formas de grilagem, permite a compra de terras por estrangeiros – artimanhas essas ligadas tanto ao processo de ficcionalização quanto como à acumulação por despossessão (HARVEY, 2011), nesta última como tentativa de frear a tendência da queda geral da taxa de lucro via rentização da terra.

Na esfera produtiva do circuito da soja, a presença dessas grandes empresas nos cerrados alterou substancialmente as relações de comercialização de grãos na região, na medida em que atua instituindo formas de monopólio na compra da soja, na venda de fertilizantes para os agricultores e, ainda, no financiamento das safras. As formas de acumulação para serem passíveis ao longo da história, dialogam com as formas de violência (im)possível: seja tornando seus processos de pilhagem pelas vias legais (normas e leis, projeto de desenvolvimento territorial, incentivos fiscais) ou ilegais (ameaças de morte, assassinatos, coerção de comunidades) para garantir que o sistema capitalista avance ao longo da expansão da fronteira agrícola.

No terceiro capítulo desenvolve-se os outros dois eixos da fórmula trinitária para além do trabalho Marx (1985): o capital e a terra: “meios de produção monopolizados por 43

determinada parte da sociedade, os produtos autonomizados em relação à força de trabalho viva e às condições de atividade exatamente dessa força de trabalho, que são personificados no capital por meio dessa oposição” (MARX, 1985, p.269).

As considerações finais, apontam, como já destacado nesta introdução, para a complexidade do tema e uma conclusão não linear. Estou aqui, como em “Grande Sertão: Veredas”, desmantelados pelo caminho do trabalho, tentando interpretar acontecimentos que remetem a problemáticas estruturais do capitalismo agrário brasileiro.

A atualidade dos fenômenos aqui retratados, as recentes mudanças políticas que interferiram diretamente na região do Matopiba sob o arranque dos processos de acumulação ainda vista como fronteira agrícola a partir da financeirização do circuito da soja, as relações entre Estado, mercado terras e trabalho mostram os impasses do capitalismo em suas diversas faces, nas quais todas reforçam o caráter de crise imanente ao qual estamos sendo subjugados.

A expansão da soja tomada aqui como processo para explicitar tais movimentos do capital mostra que o avanço do monocultivo acompanha a degradação das relações espaciais mediada pelas mais diversas formas de violência – a expulsão de camponeses e povos e comunidades tradicionais de suas antigas áreas de moradia e produção; o loteamento e conversão generalizada da terra à propriedade privada, passível de ser absorvida pela crescente especulação imobiliária rural; o avanço da monocultura, primeiramente nas áreas de chapada, facilmente mecanizadas e em um segundo momento nos vales; o crescimento e mobilidade do trabalho assalariado, sazonal e precarizado nos novos espaços de produção agrícola modernizada da soja. Tais movimentos do capital são necessários para abastecer o mercado de terras e commodities mundial, permitindo novas dinâmicas de acumulação (via despossessão) e valorização do valor via ficcionalização dos capitais agrícolas. Os conflitos, que antes eram mascarados pela presença pouco assistida do Estado agora se tornam inevitáveis. Como diz Antônio Criolo, da Comissão Pastoral da Terra no Maranhão: “quando a gente percebe, o negócio já aconteceu”. O vírus capitalista se alastrou, e junto, os monocultivos da soja, a especulação de terras, a violência estrutural. Ainda sem respostas, seguimos, entre a vida e a hidra.

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CAPÍTULO I

VIOLÊNCIA, TRABALHO E ACUMULAÇÃO NA AGRICULTURA CAPITALISTA

“… tudo, para mim, é viagem de volta…” (Tutameia, João Guimaraes Rosa)

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1.1 Mobilidade e terra: construindo a região Matopiba

Corpo e espaço se (re)produzem em determinados movimentos do capital, “movimento que é reprodução ampliada das relações sociais capitalistas – relações de produção, mas não apenas” (VAINER, 1984, p.21). O processo histórico da região Matopiba, onde a violência e a mobilidade podem ser consideradas pilares destas relações, permeiam e constroem as relações capitalistas que avançam com a fronteira, em suas diversas acepções.

A mobilidade da população rural da região está interligada a um conjunto de processos produtivos: mineração, expansão da pecuária sobre áreas de lavoura, que exigiam mão de obra em maior número (como café, algodão, milho e feijão); novas lavouras (soja, cana) com alto grau de mecanização que acompanhava as tendências da Revolução Verde; valorização imobiliária de terras próximas aos centros urbanos e áreas de fronteira agrícola consolidada, inviabilizando a permanência de populações tradicionais.

A região Matopiba, distante da história do Brasil litorâneo, reverbera de maneira particular os processos de modernização. O discurso do sertão, a presença da população doente e fraca – cuja energia era sugada pelo minério e pela cana do sistema colonial – com dificuldades de empreender, marcavam um espaço que, apesar de “não civilizado” e “atrasado”, participava das relações modernas de acumulação.

Segundo Furtado (2005), o litoral não possuía boa qualidade de pastos para abrigar o gado, justificando a penetração no sertão no começo do século XVII, ultrapassando o rio São Francisco, alcançando o rio Tocantins, estendendo para o Maranhão, ocupando a região sul no século XVIII. Quanto mais os produtores se interiorizavam, mais oneroso ficava o transporte do gado até as regiões litorâneas. Com os lucros caindo, o interesse pela criação de animais também diminuía e, ao mesmo tempo, a relação de trabalho se diversificava entre meeiros, indígenas e escravos. Era uma atividade em grande parte de subsistência, uma vez que se aproveitava tudo o que o gado oferecia para garantir a sobrevivência no sertão. Para Valverde (1985, p. 163), “foi pelas fazendas de criação que se povoou todo o Piauí e o sul do Maranhão até as barrancas direitas do Tocantins”. Atravessaram o rio Tocantins no século XIX e ocuparam o norte de Goiás (Tocantins). Essa organização possibilitou a formação do sócio menor, constituído por pequenos proprietários de rebanhos que viviam isolados especificamente na porção norte, uma vez que, em decorrência da economia açucareira, houve uma interiorização desta atividade no sul do Maranhão e no norte de Goiás (Tocantins). Era 46

uma atividade de subsistência, mantendo uma relação comercial do excedente da produção com os engenhos do Nordeste.

As investigações históricas fundamentadas em documentos do judiciário produzidos entre os anos de 1870 e 1900, referidos à Província de Goiás apontam para uma gerência territorial distanciada17. Os papeis selados, as estampilhas, eram constantemente ameaçadas pelo poder da pólvora, não só na região do norte da província, mas também no interior da Bahia e Piauí. As forças policiais eram mais que minguadas no interior e, por causa do difícil acesso deixava que os conflitos fossem solucionados à margem da lei.

Com a presença rarefeita de instituições coloniais, e uma imensidão de terras devolutas, a propriedade privada da terra ainda era um conceito difuso; e a lei da força, ferro e fogo fazia com que os documentos da distante metrópole apenas ratificassem as decisões do poder local. A rudimentariedade dos escrivães e “homens da lei” era notória, e agravava o cenário. Se em 1609, o Tribunal do Brasil se instalou com magistrados profissionais em regiões litorâneas, na região Matopiba essa situação permanece até as primeiras décadas do século XX (MELO, 2017). “As formalidades dos códigos confrontavam-se com práticas e costumes de povoações tradicionais, analfabetas, para as quais as leis escritas eram um mistério insondável” (MELO, 2017, p.52). As nomeações daqueles que exerciam a performance do poder local era escolhida pelos proprietários de terras e pelos presidentes da província, que desde então já confluía o poder político, judiciário e a propriedade privada da terra.

A regulamentação dos “terrenos da província” preocupava os administradores, desejosos de assegurar a propriedade da terra e impedir que “os vagabundos” entrassem pelo sertão afora e demarcassem “arbitrariamente posses”, que depois pudessem vender a “diligentes” fazendeiros. (MELO, 2017 apud RELATÓRIO QUE À ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DE GOYAZ APRESENTOU NA SESSÃO ORDINÁRIA DE 1835, O EXM. PRESIDENTE DA MESMA PROVÍNCIA, JOSÉ RODRIGUES JARDIM, 1835, p.30).

17 Seria difícil demarcar um momento em que tal gerência se faz presente no Matopiba. Primeira e obviamente, por ser uma área que abrange quatro estados – Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia – com processos de formação e tempos e dinâmicas espaciais heterogêneos. Tentaremos, ao longo da tese, apontar alguns pontos de convergência e divergência do avanço da fronteira agrícola, da relação capital x Estado na região. Também se faz necessário afirmar que a ação (ou não ação), presença ou não-presença (material ou imaterial) do Estado, embrionário de meados do século XIX, indica determinadas intencionalidades, independentemente de sua capilaridade. A ação do Estado ao longo dos momentos históricos é mutante, e como veremos ao longo dos capítulos apresentados, contraditória. 47

Os crimes e as contravenções de proprietários de terras, de comerciantes e agenciadores públicos eram parte constitutiva da região18. Juntamente aos funcionários da administração, distantes do poder central, que eram acusados de insubordinação e crimes contra a administração, os vadios, as “hordas de bandidos”, os “homens sem ocupação útil”, os ladrões de gado eram responsáveis pelo “fraco adiantamento” da região (MELO, 2017 apud RELATÓRIO [...] SESSÃO ORDINÁRIA DE 1835, p. 34). Os crimes e delitos praticados por vaqueiros, prestadores de serviços, plantadores de roças e libertos eram tidos por atos bárbaros, interessados na posse da terra enquanto seu uso. Aos presidentes e administradores das comarcas cabia a tarefa de realizar a lei da metrópole, inserida num projeto de modernização que começava pela formação de um corpo policial e um aparato jurídico, a fim de garantir o domínio privado da terra e a segurança judicial ao projeto civilizacional19. Em “Os sertões” (2016), há menções de como as regiões do Rio Grande e do Rio Preto, no oeste da Bahia eram violentas, destacando “rivalidades partidárias e desmandos impunes de uma política intolerável de potentados locais”. (p.209), e áreas onde a vida era menos segura em toda a colônia20. A dinâmica de crescimento da pecuária da região do Matopiba esteve condicionada a reprodução de fazendas em que o gado é deixado a mercê das grandes extensões de terra. É dispendido pouca atenção, e o maior cuidado consiste em evitar o seu extravio e reuni-lo para ser utilizado (PRADO JÚNIOR, 1982).

Esta característica da dinâmica de fazenda de acumulação foi condicionada pelo processo de territorialização do capital na área. Trata-se de uma sociedade de milicianos que se tornam burocratas, ou proprietários ausentes, que deixam suas fazendas com mulatos. Uma sociedade em que a violência é exercida por cangaceiros. Gente pobre de Portugal em busca da riqueza passível de ser acumulada

18 “Diversos aventureiros, desherdados ou empobrecidos em desespero ou por inclinação pelas empresas bárbaras, vagabundeavam proscriptos pelo sertão, commettendo crimes de toda a espécie, ora a serviço de outrem, ora por conta propria, e escapam por muito tempo à justiça, devido ao conhecimento que tem da região e ao auxílio de parentes alliados. Antes de haver ahi qualquer organização judiciária, eram taes bandidos (valentões) muito freqüentes,instrumentos de horrorosos crimes, que a inveja, a ambição e o ciume mandavam cometer” (TOLEDO, 2008 apud SPIX E MARTIUS 1938, p. 43).

19 “Os juízes, promotores, delegados e oficiais de justiça, a polícia conheciam os aderentes, os agregados e os afiliados que, em último caso, trabalhavam nas casas deles, nas fazendas, roças, currais, e serviços ilícitos. Eram do conhecimento de todos os valores morais reguladores daquelas relações de interdependência. Essa proximidade espacial contaminava e impedia o estabelecimento de uma justiça pautada pela neutralidade” (MELO, 2017, p. 66). Claro que aqui fica a pergunta: seria a justiça neutra? A defesa desta tese aponta que a justiça e a neutralidade geograficamente nunca se encontraram. 20 “colonias son zonas en las que la guerra y el desorden, las figuras internas y externas de lo político, se tocan o se alternan unas con otras. Como tales, las colonias son el lugar por excelencia en el que los controles y las garantías del orden judicial pueden ser suspendidos, donde la violencia del estado de excepción supuestamente opera al servicio de la “civilización” (MBEMBE, 2011, p.39). 48

com o trabalho de escravos africanos e de índios absorvidos. O processo de expropriação destes trabalhadores não se fez de uma vez. Entre a perda das condições nas quais reproduziam suas vidas antes do início de sua expropriação e a constituição da superpopulação relativa, que é o pressuposto fundamental da reprodução da acumulação capitalista autônoma nacional, transcorreu mais de um século de história (TOLEDO, 2008, p.62).

As formas de mediação na região do Matopiba se transformaram radicalmente no século XIX: a dimensão abstrata de propriedade e de valor passa a ser determinante na forma como o poder territorial é exercido na sesmaria, na fazenda, em sua relação com o boi e no escravo: territórios do capital (TOLEDO, 2008).

A Guerra do Paraguai, neste sentido, também é um evento de interessante análise para compreender o projeto civilizacional da região do Matopiba. Diversos homens, indígenas e principalmente negros21 desta região foram recrutados para a guerra. A guerra foi vencida pelo Brasil, e vencidos foram os soldados que retornaram à região.

A indiferença da elite brasileira aos maus tratos sofridos pela tropa que acabara de derramar seu sangue e suas mãos para manutenção do território que ainda precisava realizar enormes esforços para delimitar suas fronteiras era latente. Ao retornar às suas províncias, (Grão-Pará, Bahia, Piauhy, Goyaz e Maranhão), a tropa não encontrou as promessas de posses de terras nos “vazio demográfico”, liberdade (algumas centenas foram de fato alforriados) e vantagens econômicas. Muitos chegaram a vender suas roupas de guerra e condecorações para sobreviver ao pós-guerra (RODRIGUES, 2014). A Bahia chegou a enviar cerca de 17mil homens, negros e escravos libertos22 em sua esmagadora maioria conhecidos como “zuavos baianos”, ou Companhias Zuavas (SILVA, 2016; FELIX JÚNIOR, 2011).

No final do século XIX, doenças, fome e miséria caminhavam junto aos corpos indígenas, e principalmente negros. No texto “Os esquecidos pela Guerra do Paraguai”

21 “De origens múltiplas, todos eles foram transformados — na visão dos europeus — em africanos, como se houvesse homogeneidade para inúmeros povos, línguas, culturas e religiões. Entre os escravizados havia reis, príncipes, rainhas, guerreiros, princesas, sacerdotes, artistas e um sem-número de agricultores, mercadores urbanos, conhecedores da metalurgia e do pastoreio. Ao atravessar o Atlântico, entraram em contato com um ambiente de trabalho intenso, de exploração e de produção de riquezas. O sistema colonial nas Américas se nutria cada vez mais de mão de obra escrava, para trabalhar na terra e na agricultura voltada para o mercado mundial” (GOMES, 2015, p.08). Em grande medida podemos realizar tal comentário aos indígenas, população “autóctone” (colocamos em aspas pois como não haviam limites para definir, sendo de grande complexidade afirmar o que seria autóctone da região, além da mobilidade indígena, como a nação Tupinambá pelos cerrados e bioma amazônico por exemplo). 22 Os homens livres que foram convocados à guerra podiam enviar substitutos de seus corpos para o combate. Em geral, os escravos foram os substitutos dos corpos brancos convocados ao combate. Como não era possível que um escravo lutasse pela pátria e fosse reconhecido como algo para além da mercadoria, a alforria era concedida para que ele pudesse representar a “pátria” na Guerra. 49

(RODRIGUES, 2014), relatos dos ex-soldados da guerra, feridos, mutilados, doentes – e vistos como mendigos e inválidos – mostravam como já se moldava o papel da força negra e indígena no projeto de nação, mesmo que naquele momento esses grupos ainda eram vistos como escravizados. Alguns negros já estavam enfermos antes mesmo de ir à guerra, como demonstra Félix Júnior (2011), apresentando documentos sobre as condições físicas dos escravos que foram enviados. Tais condições advinham das precárias condições de vida, da alimentação escassa, e das dezenas de horas no sol a pino, seja no trabalho da lavoura ou da mineração, principais atividades do período colonial:

Olímpio Gomes de Carvalho, 18 anos, natural da Bahia, com epilepsia; Lino Cardoso, 35 anos, natural da Bahia, com hipoesmia incurável; Segisnando, 30 anos, natural da Bahia, com perda da unocular; Donato, 22 anos, natural da Bahia, com fístula no maxilar inferior, Manuel Sabino Pereira, 18 anos, natural do Piauí, com luxação indutível da clavícula direita; Geraldo Ferreira Motta, 24 anos, natural do Piauí, com cegueira do olho esquerdo; Luiz da França, 22 anos, natural do Piauí, com edemacia dos membros inferiores, Rufino Pereira, 24 anos, natural do Piauí, com falta de dentes; Vicente Jozé Ferrira, 55 anos, natural do Piauí, com falta quase total de dentes e idade avançada, e Francisco Ferreira do Ramo, 24 anos, natural do Piauí, com tubecular pulmonares (FÉLIX JÚNIOR, 2011, p.390). Há o caso do soldado baiano,

cujo rosto ficara medonho depois de ficar cego em função de uma descarga à queima-roupa. Privado dos olhos não se fez calar-se bradando pelas ruas: “Viva o Imperador! Viva a nação brasileira”. Era apelidado de “doido” pelos transeuntes e enxotado pelos moleques das ruas, que lhe atiravam pedras. Mas em sua loucura os gritos eram, na verdade, uma ironia direcionada ao governo que lhe abandonara (RODRIGUES, 2014, p.178).

Com uma imensidão de terras ainda não desbravadas, havia ainda poucas vilas e “ocupações sedentárias” no interior do Brasil. A errância e o nomadismo, acompanhando os modos de vida extrativista, e semi-nômade de plantio começam a ser dizimados em larga escala. Como afirma Pedro Puntoni (2002): para que o gado fosse criado solto, foi necessário aprisionar o índio. Euclides da Cunha, corroborando tal afirmativa diz:

O culto dos mortos é impressionador. Nos lugares remotos, longe dos povoados, inumam-nos à beira das estradas, para que não fiquem de todo em abandono, para que os rodeiam sempre as preces dos viajantes, para que os ângulos da cruz deponham estes, sempre, uma flor, um ramo, uma recordação fugaz mas renovada sempre. E o vaqueiro que segue arrebatadamente, estaca, prestes, o cavalo, ante o humilde monumento – uma cruz sobre pedras arrumadas – e a cabeça descoberta, passa vagaroso, rezando pela salvação de quem ele num viu talvez de um inimigo. A terra é o exílio insuportável, morto um bem-humorado sempre. (CUNHA, 2016, p.139)

50

Dinâmica semelhante de “aprisionamento” é observada nos movimentos mais recentes do capital a partir dos anos 1950 e 1960 frente às comunidades de fundo e fecho de pasto no oeste da Bahia. Para expandir a soja, foi necessário, neste segundo momento, encurralar o gado e as comunidades nas áreas de vale.

A Guerra dos Bárbaros é um pressuposto da concepção do sertão: permite a expansão da área destinada ao plantio de cana de açúcar, no recôncavo baiano, e da pecuária, no sertão. Uma das principais correntes pecuárias de avanço ao interior advieram da Bahia. O sertão baiano compreendia toda a região que ocupa o atual território baiano, incluindo a margem ocidental do São Francisco. De lá, se estenderam ao interior do Piaui. Além da corrente baiana, havia outra a partir de Pernambuco.

a expansão da pecuária favorece à colonização do rio São Francisco e, posteriormente, do vale do Parnaíba (Maranhão e Piauí) e do sul do Tocantins, através do Planalto Central. No final do século XVII, os sertões do sul do Tocantins estavam ocupados com fazendas de gado [...] Quando, na terceira década do século XVIII acontecia a descoberta de ouro no sul do Tocantins, a região já detinha um extenso corredor de picadas para os caminhos de gado entre Piauí, Maranhão e ribeiras do São Francisco (APOLINARIO, 2006 p. 51).

A ocupação dos sertões foi sempre apresentada como pacificação sobre a qual o processo de produção racional pode ser estabelecido, via um processo violento de territorialização contra as populações locais (PUNTONI, 2000; TOLEDO, 2008). Toledo (2008, p.54) menciona, em sua tese de doutoramento, ao descrever a formação das lavras na Chapada da Diamantina, Bahia, que

possuir terras na “outra banda do rio Pardo”, às quais não se atribuem valor, por serem “infestados de gentios” e “morreram as criações que lá se botam”. A pacificação do gentio aparece com um pressuposto do valor da terra; onde morrem as criações o capital não aumenta, o que indica que as fazendas de gado são a forma potencial de existência do capital na área do Alto Sertão. A terra tem valor, pois pode ser o suporte da produção agropecuária. Porém, a pacificação do gentio não é o pressuposto da valorização, mas também um obstáculo do valor da terra, onde a produção será realizada, e isso também tem relação aos tapuias23, forma como estas populações são nomeadas.

23Havia uma distinção entre os indígenas: tupis e tapuias. Os tupis eram etnias que haviam feito algum tipo de acordo ou foram pacificados pelos encontros com portugueses ou ao longo das bandeiras. Eram “amigos”. Os tapuias eram vistos como os “índios da língua travada” (por não falaram a “língua geral”), não civilizados, inimigos do colonizador. (RICARDO, 1959). 51

A região vai sendo constituída em expansão na medida em que o rebanho se reproduz e território vai sendo ocupado e pacificado. As populações locais foram absolvidas como mão-de-obra nas fazendas, submetida pelos meios de produção da mercadoria.

Apesar da resistência, os povos indígenas e negros foram (e vem sendo) aos poucos eliminados, mas não sem antes embaraçar consideravelmente o progresso da colonização, lutando e se defendendo24 contra uma persistente e ativa agressividade da civilidade que adentrava o território (PRADO JR, 1982). Os indígenas, como Karajás, Caiapós, Xavantes e Xerentes, tentaram impedir, de diversas formas, a entrada do colonizador pelos rios25. Os interesses pela região e a população indígena se mesclavam entre a preocupação de povoamento da metrópole, o salvamento das almas e a liberdade dos índios via conversão ao cristianismo e a necessidade do indígena como mão-de-obra. Marivone Chaim (1974), ao dissertar em “Os aldeamentos indígenas na Capitania de Goiás: Sua Importância na Política de Povoamento (1749-1811)”, já demonstrou que apesar de distintos, os três tipos majoritários de interesse na região tinham, direta ou indiretamente, a intenção de garantir o acesso aos bens naturais via projetos de desenvolvimento e comercio desde o século XIX – naquele momento ainda pautado fortemente pela navegação. A conquista e chegada da civilização pelos rios fizera com que etnias do grupo Timbira se afastassem das margens dos rios e se refugiassem nos interiores. Diversos grupos timbiras perderam suas notórias habilidades de navegação ao longo do tempo por causa dessa interiorização, do afastamento das margens do rio Araguaia e do rio Tocantins.

O garimpo é uma importante atividade para entender a formação dos cerrados do centro norte, fundamental para compreender a formação e criação de cidades e assentamentos desde o século XVII, bem como a formação do Estado. Já havia feito tal indicação no livro “A fronteira moderna de grãos e as transformações do espaço agrário tocantinense” (2017) de minha autoria como ponto importante para o entendimento das transformações territoriais do Tocantins. Sobre os garimpos e a formação territorial dos estados do Matopiba, podemos

24 A destruição do Presídio Militar de Santa Maria do Araguaia, pela coligação dos índios Xerentes, Xavantes e Karajás, no ano de 1813, deixa evidente a insatisfação com as estranhas atitudes vindas “de fora”. Na primeira tentativa de construção do presídio (1811), na região onde atualmente está situada a cidade de Couto de Magalhães, ocorreu bem o ano, e tudo prometia que o estabelecimento não seria perturbado, porque os índios se mostravam satisfeitos, sempre que iam de visita ao presídio receber brindes e ferramentas. Para os moradores do presídio, os índios sempre se mostraram calmos. Mas, eles aguardavam uma ocasião mais oportuna para destruir, aquele presídio. Depois da destruição, se constrói um pensamento diferente; assegura que eles “tinham um prazer dissimulado e fingido visto que o presídio era para eles um motivo de desgosto, uma ameaça constante” (CARVALHO, 2008, p. 59). 25 Sobre indígenas, civilidade, ciência e colonização ver o filme “O abraço da serpente” (2015). 52

destacar os trabalhos “No caminho das pedras: itinerários na formação da mobilidade garimpeira em Goiás” (1998), “A região das Lavras Baianas (2008). “Nos séculos XVII e XVIII, o sertão do norte da capitania de Goiás — atual estado do Tocantins — foi devassado por sertanistas, missionários, criadores de gado e aventureiros em busca de ouro. A partir do descobrimento das minas do norte de Goiás, formaram-se os primeiros povoados com pequenos aglomerados populacionais constituídos por barracos que, mais tarde, tomaram feições urbanas e constituíram os chamados arraiais, nos quais os negros foram maioria entre os anos de 1780 e 1785” (LOPES OLIVEIRA 2009, p. 110). Por volta de 1700 inicia-se o ciclo do ouro no Norte do Estado de Goiás, atual Tocantins. Durante o ciclo do ouro criam-se muitas cidades na região: Natividade em 1734, Arraias em 1734, Chapada da Natividade em 1740, Conceição, atual Conceição do Tocantins em 1741, São Miguel atual Almas em 1746, Monte do Carmo em 1746 e Porto Nacional em 1751. Por volta de 1800 a mineração na região entra em crise, nessa época a população africana representava 89,3 % do total (Apolinário, 2007). Como consequência da crise da mineração na região, uma parte dos negros e negras escravizados são vendidos e levados para outras regiões, outros fogem e criam quilombos, e outros ainda viram agregados e vaqueiros dos antigos mineradores que passam a serem criadores de gado”. (APA-TO, 2012). Além disso, podemos afirmar a partir da tese de Toledo (2008) que o “trabalhador clandestino, garimpeiro, é um exemplo do processo de desclassificação (Mello e Souza, [1982] 1990:p. 202 e seguintes) que marca a vida dos homens livres no século XVIII. A mobilidade garimpeira é uma dinâmica que surge no período colonial formando a região e permanece em tensão com ela” (p.80). Na região que compreende o PDA Matopiba, também há um apelo aos recursos minerais, mapeados pelas notas técnicas da Embrapa. As notas também enfatizam as jazidas de calcário da região, importante para a fertilização dos solos de cerrado. No entanto, não existem trabalhos com enfoque mineral considerando a abrangência da região dos 4 estados que abarcam o PDA.

A decadência da atividade mineradora e a crise de abastecimento, provocada pela própria mineração do final do século XIX ,que havia adentrado o interior da Bahia e o norte de Goiás criou fluxos migratórios difusos ao longo da região Matopiba. A sociedade mineradora do século XIX era formada por uma pequena elite de mineiros, comerciantes e vaqueiros, e uma massa de marginalizados: escravos, forros, índios e faiscadores26 –

26 O faiscador é considerado um nômade, reunindo-se às vezes, em grande número, em um local franqueado por todos, comumente em zonas de mineração empobrecida e abandonada. O faiscador também se alocava em zonas ribeirinhas, áreas de presença de ouro e cascalho de mais fácil acesso (TESKE, 2011). 53

garimpeiros autônomos, homens livres brancos ou mestiços e que desempenham múltiplas atividades (TESKE, 2011).

Ainda sobre a Bahia, os mandantes locais e suas grandes posses de terra provocava repulsa da população marginalizada. Houve um deslocamento populacional dos oriundos de diversas regiões baianas em direção a montante dos afluentes do rio São Francisco e de seus subafluentes localizados nos gerais do oeste da Bahia.

É comum encontrar moradores nas margens dos médios e altos cursos desses rios originários principalmente de Macaúbas e de outras localidades do vale do Paramirim, afluente da margem direita do São Francisco, na altura do Oeste da Bahia, os quais afirmam terem fugido das rigorosas estiagens ocorridas nas últimas décadas do século XIX e da falta de terras para plantar (SOBRINHO, 2012, p.106- 107).

Quando a presença civilizatória se aproximava de forma violenta, havia ainda caminhos e terras para adentrar-se e garantir o plantio de subsistência e rotação de culturas, a ‘roça no toco’, de um ou cinco anos de descanso/mudança de área de plantio, ou áreas para a pecuária extensiva, de variada escala.

A população, bastante móvel, tem um crescimento absoluto lento – seja pela falta de acurácia dos números “oficiais” para a região Matopiba, seja por causa das enfermidades, mingua e adversidades que marcam a história da região até os meados do século XX27.

Os registros de aldeamentos quilombolas28 e indígenas começam a aparecer principalmente após a Guerra do Paraguai. Existiam quilombos agrícolas, extrativistas,

27 As intempéries do processo de ocupação do sul do Maranhão e do norte do Tocantins também aparecem no estudo de Sader (1986). 28 Hoje, os grupos que são considerados remanescentes de quilombos constituem uma grande diversidade de processos, que de acordo com Schmitt; Turatti e Carvalho (2002) e Almeida (2011) incluem: fugas com ocupação de terras livres e geralmente isoladas, mas também heranças, doações, recebimento de terras como pagamento de serviços prestados ao Estado, a simples permanência nas terras que ocupavam e cultivavam no interior das grandes propriedades, bem como a compra de terras, tanto durante a vigência do sistema escravocrata quanto após a sua extinção. Muitas terras ocupadas pelas comunidades remanescentes de quilombos são chamadas de terras de preto, terras de santo ou santíssimo (ALMEIDA, 2008; MOURA, 2007) ou ainda território negro, indicando coletividades camponesa, definida pelo compartilhamento de um território e de uma identidade (SCHMITT; TURATTI; CARVALHO, 2002). Lopes (2017) e Reis (1996) pontuam que os quilombos, apesar de serem constituídos em grande parte por escravos, também era povoado por soldados desertores, perseguidos pela justiça eclesiástica, vendedores (muitos eram ciganos, adorados pelas mercadorias e odiados pelas falsas promessas que os objetos não cumpriam, como escutamos em alguns relatos em trabalhos de campo pelo Piauí), e grupos indígenas pressionados pelo avanço civilizatório. No século XIX, já tinha-se o registro de 18 quilombos na Bahia (do Rio Vermelho, do Urubu, do Jacuípe, do Jaquaripe, de Maragogipe, de Muritiba, de Campos de Cachoeira, Orobó, Tupim e Andaraí, Quilombos de Xiquexique, do Buraco do Tatu, de Cachoeira, de Nossa Senhora dos Mares, do Cabula, do Jeremoabo, do Rio Salitre, de Inhambupe, de Jacobina até o Rio São Francisco) e 6 no Maranhão (Quilombo da Lagoa Amarela (Preto Cosme), do Turiaçu,

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mercantis, mineradores, pastoris, de serviço e predadores (GOMES, 2011). Assim como os quilombos e mocambos em si, a mobilidade também era uma estratégia de resistência e guerra. Há registros de migração entre quilombos e mocambos, estacas, muralhas e falsos caminhos, que eram construídos para evitar ataques e permitir a fuga. O uso de armas tipicamente indígenas eram utilizados por negros, além de armas de fogo que eram adquiridas por meio de trocas comerciais ou saqueios. De acordo com Oliveira Lopes (2009), os negros do século XVII e XVIII também fugiam e transitavam de canoa pelos rios Araguaia e Tocantins.

Uma das rotas conhecidas pelos negros que saía do Vão das Almas, região dos Kalungas em Goiás até Belém do Pará, é conhecida como a rota do sal. A travessia era feita em sua maioria em ubá, um barco simples de madeira e remos. O barco voltava carregado de sal, querosene, e ferramentas e muitos não conseguiam subir o rio e retornar a suas comunidades, como relata Ricardo (1959), Souza (2013) e o documentário “A Rota do sal Kalunga” (2014). A rota do sal integrava comunidades do Tocantins, Goiás, Bahia, Maranhão e Pará.

Um agente da CPT em Araguaína, que por mais de uma década, atuou junto aos Apinagés no Bico do Papagaio e em outras comunidades camponesas no Matopiba faz uma interessante análise do processo de ocupação da região e a relação entre os povos indígenas e negros:

“Nas comunidades camponesas, é uma coisa muito sutil, mas existe um ou vários elementos que é forte de resistência, da relação com tudo, da terra, da água, que é da cultura Timbira. É a cultura indígena que cai sobre todos os povos aqui dessa região. Então todos os povos indígenas que ainda sobreviveram que estão aí resistiram a toda a pressão, toda a violência são Timbiras. Os Kraôs, aqui no Tocantins, mais a leste – Timbira; os Apinajé mais ao norte, Timbira; os Krikati, Canela, Gavião no Maranhão: Timbira; os Kaiapó no Pará: Timbira. Então é a grande nação Timbira, a região dos cocais e dos babaçuais, o cerrado, as nascentes, os berços de águas dos afluentes dos rios Tocantins e Araguaia. Veja só: Maranhão, bacia do Tocantins, Pará, bacia do Araguaia. Essa região maior, esse território maior que hoje pega praticamente todo o estado do Tocantins, boa parte do Maranhão, Piauí, que aí onde está o Matopiba – Timbira! Território Timbira.

de São Benedito do Céu, do Jaraquariquera, Quilombos de Turiaçu (rio Maracaçumé); Turiaçu (rio Turiaçu) (SANTANA FILHO, 2014). 55

E associa a cultura originária timbira com a africana. Então elas se somam, os indígenas sempre se deram bem com o povo que vem da África, porque são culturas originárias que vem da terra e tem muito em comum. Elas conseguem se entender facilmente, as vezes sem falar a língua. E isso a gente vê nas comunidades e nem sempre elas sabem ... A forma como eles lida ... O Ceará [um camponês] com todo o jeito bruto dele, quando a senhora foi lá na barraca dele perguntar da [grande e pintada] cabaça, ele disse que aquela ele não vendia. Essa concepção de que um objeto não é mercadoria é Timbira. E a cabaça tem uma simbologia muito rica com os Timbira. Talvez ele nem sabia disso, não tá no consciente, mas tá no subconsciente dele, esse respeito à cabaça. Para os Timbira, a cabaça é uma planta sagrada. Nós humanos, os Timbira, se originaram da cabaça. O fruto da cabaça tem o formato do útero, e por aí vai... quem não conhece fica sem intender” (CPT Araguaína, Entrevista realizada em 2018).

Além dos intercâmbios culturais, as guerras e revoltas camponesas, entendendo aqui o indígena e o negro29 como camponês, nesse período são constantes, como aponta os estudos de Clóvis Moura (MESQUITA, 2003), havendo também certo intercambio de culturas negra e indígena. Os rios abarcam a bacia do rio Tocantins-Araguaia, Parnaíba e na bacia do rio São Francisco eram fundamentais tanto para a comunicação das comunidades quanto para sua dispersão ao longo do território, como indicam os estudos de Kluck (2016) e Sobrinho (2012). Como exemplos destas revoltas na região, poderíamos elencar o motim da carne sem osso e farinha sem caroço30 (1858), revolta dos Malês (1835) e a Sabinada (1837- 1838) na Bahia; a Balaiada no Maranhão e Piauí (1838-1841), a revolta do Jenipapo no Piauí (1823).

A Guerra de Canudos, assim como a Guerra do Paraguai, reverbera impactos na formação da região Matopiba. Seu Cantídio Ferreira de Freitas, geraizeiro da comunidade de Ribeirão, no oeste da Bahia, conta que a presença dos índios era grande na região. Sua avó contava que na Guerra de Canudos fugiu um velho Bonifácio, ferido pelo conflito, e sua

29 Sobre algumas similitudes ao processo de colonização e sujeição é importante a associação encontrada na versão de “Os sertões” organizada por Walnice Nogueira Galvão (2016), sobre a palavra quilombo, que indicava o negro foragido e canhembora (cãnybora), cuja sonoridade se assemelha a primeira, e significa índio fugido. Apesar de citarmos o livro de Euclides da Cunha, a visão do determinismo climático e a caracterização de raças e o processo de miscigenação e formação da população dos sertões brasileiros vai em direção oposta ao que estamos propondo aqui. 30 Esse motim tem como motivação a crise de abastecimento que a Bahia sofre no século XIX de alimentos básicos, como a carne verde (carne de animais abatidos na véspera do consumo) e a farinha de mandioca. As causas do motim são diversas, como normatizações da venda da farinha em Salvador, relações alfandegárias e portuárias e o monopólio dos gêneros alimentícios (REIS e AGUIAR, 1996). 56

esposa Nivinha. Vieram adentrando o sertão, ‘subindo’ e chegaram na região (atual município de Formosa do Rio Preto). Outros vieram e chegaram na Cacimbinha, Mutamba, Brejo do Tatu, comunidades localizadas no extremo oeste baiano. Outros de Mansidão até se instalarem em Aldeia. A população negra e indígena, presente no modo de vida e na pele das famílias que ocupam a região, foram se fixando para fugir das secas e das guerras, em busca de água e pastos bons. Euclides da Cunha (2016, p.45) data as grandes secas que marcaram o sertão no século XVIII e XIX: 1710-1711, 1723-1727, 1736-1737, 1744-1745, 1777-1778, 1808-1809, 1824-1825, 1835-1837,1844-1845,1877-1879.

O quilombo da Barra da Aroeira conflui diversos elementos já descritos. Felix Rodrigues, herói fundador da comunidade, foi condecorado por D. Pedro II e teve o direito a escolher terras no interior do Brasil, nas regiões menos povoadas, como prêmio e reconhecimento da Guerra do Paraguai. Após mais de 6 meses no alto de Goiás para decidir o local, assentou-se no Lago de São Domingos, numa área de 12 léguas em quadra, cerca de 62 mil ha31 em 1885. Natural de Parnaguá, sul do Piauí plantou uma carreira de buriti e outras plantas, tentou asseverar que seus descentes, familiares e não familiares, ocupassem toda a terra recebida por direito. Após um incêndio em 1950 na comunidade que queimou os papeis “reais”, os mais velhos, Manuel Maroto e Jacob, mobilizaram-se e foram até o Rio de Janeiro buscar a segunda via do documento da terra. Após 6 meses de viagem, ao descerem do avião das forças armadas que os deixaram em Porto Nacional (TO), o documento é extraviado antes da escritura de ser registrada em cartório. O responsável pelo sumiço do documento foi o doutor Ermando, responsável pelos cartórios de Porto Nacional naquele período. O próprio procurador, ao receber o documento, cancelou a posse das terras da comunidade da Barra da Aroeira.

O Zacarias é meu esposo, ele nasceu ai na Lagoa do Tocantins, ééé alguns tempo já tava com 15 anos que morava lá,[...] em 1915, veio uma febre braba [...] que aconteceu lá na Lagoa do São Domingo né, [...], endoido o cachorro e morreu, aí os pai mandou joga o cachorro fora, o menino pegou [...]jogou o cachorro dentro do córrego, onde eles pegavam a água pra beber, pra tomar banho, pra cozinha e aí ninguém não soube né, [...] ai o que que aconteceu, todo mundo caiu com uma febre e chegou um ponto que tava assim, saia pra enterrar um o outro ficava aqui já morrendo (Izabel Rodrigues apud AMARAL e PEREIRA, 2016, p.70)

A “febre braba” marcou uma fase da comunidade, que começou com a chegada do Félix José Rodrigues e sua família, em 1871 e terminou com a mudança dos moradores, no

31 A partir das notícias e artigos sobre o quilombo, a área, em hectares, que a comunidade tenta atualmente titular varia de 52 a 70mil ha, o que representa de 20% da área originalmente concedida a Félix. 57

ano de 1915 para as margens do córrego da Aroeira. A área do quilombo está dentro dos municípios de Santa Tereza do Tocantins, Lagoa do Tocantins e Novo Acordo, no estado do Tocantins. Até a conclusão desta tese, não receberam o título da terra. O processo de reconhecimento do quilombo, apesar de já chancelado pela Fundação Palmares, tramita no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária e o território encontra-se em disputa com fazendeiros de pecuária e soja. Segundo lideranças quilombolas, hoje existem 94 famílias instaladas em Barra do Aroeira e mais de 80 morando fora da área atualmente pleiteada, nas periferias de algumas cidades ou em assentamentos do INCRA. A apropriação de terras pelo Estado para favorecimento dos fazendeiros via um projeto colonizador é um dos primeiros passos para a manutenção da mão-de-obra escrava e cativa, que posteriormente assume a forma de trabalhador assalariado, seguindo historicamente distante da posse e da propriedade.

As andanças, os contratempos do espaço, as doenças, o isolamento e as dificuldades de locomoção e transporte até o início do século XX e a (in)certeza da terra também marcam a história da comunidade Dona Jucelina, em Muricilândia (TO), onde a busca pela terra foi um elemento central. Dona Ciça, liderança da comunidade quilombola D. Juscelina, conta a história da comunidade, fundada em 1952.

“Quando ele chegou os índios ainda habitavam aqui[...] aí meu pai veio. Todo mundo botava as roças, era pouca casa, casa de tudo a pique, era de pau. E quando as primeiras pessoas chegavam, que não tinha condição de levantar a casa de uma vez fazia só o telhado, o soti. Quando era a noite a gente colocava a escada e subia no soti, por causa de bicho. Onça, a gente estava deitada, escutava os cachorro botando na onça, a onça comendo os cachorro, e era aquela coisa. Cobra tinha muito. Carrapato, do miudinho, do grande, daquele médio vermelho. Uma vez os meninos jogaram um monte de carrapato em mim porque eu era danada e eu quase morro de febre.

Doença morreu muita gente. Porque aqui não tinha médico. Era só remédio caseiro e plantação. Aqui morreu muita gente à míngua. Uma prima minha morreu de parto, gritando32. Ela sofreu tanto que botou a língua pra fora, de tanta dor. Aqui morreu muita gente de parto. Criança, as casas aqui eram tudo embrejada. Então me lembro quando pequena que as criança pegava paralisia, porque as mães não tinha mentalidade e colocavam as crianças no chão frio. Não durava muito e morriam. Deu na minha perna

32 Até meados dos anos 1990’s, doenças relacionadas a gravidez, parto e puerpério forma as principais causas de morte das mulheres entre 15 e 29 anos (ACORDO SUDAM/PNUD, 2001). 58

aquela doença, leshi, estorou minhas pernas tudo. Porque naquele tempo não tinha essas comidas – uva, maça, uma vitamina , não. A gente chupava laranja, tinha muita banana, mas outras coisas não tinha.

[...] Daqui para Araguaína não tinha estrada, era só uma picadinha. Tinha que sair 4 horas da manhã, quando era a tarde parava e daí dormia no Grotão33. Depois no outro dia levantava as 4 horas da manhã e terminava de chegar em Araguaína. Meu pai ia e comprava aqueles sacos de algodão, levava e trazia encomenda a pé e descalço. Naquele tempo meu pai não tinha nem um jumento. A roupa muito simples. Eu não tinha mais que três vestidos.

João Polino contou que quando ele chegou tinha muito de uns tomatinho e enchia eles no jacá pra não machucar o tomate, os coco. Jacá é feito de taboca, tecia, é tipo um coco só que não é de palha, é de taboca. E descia aqui de canoa, para Araguanã, para Araguaci, vender. Com esse dinheiro era que ele comprava os remédios. Não só pra ele, tinha encomenda também.

Quando o fundador chegou aqui, ele separou umas terras, para quando os outros iam chegando já ia montando as roças, porque não tinha ninguém. Daí colhia o arroz e já colhia ali. Aquele pedacinho de terra que dava pra fazer a casa, não era comprado. Ele tinha separado uma boa terra. E depois o INCRA veio, antigamente a gente fala o agrimensor, não era o INCRA. Aí eles mediram a terra, tudo, separou, e quando as pessoas queriam comprar um pedaço de terra, compravam. Meu pai era fraquinho, mas comprou 2 alqueires e 10litro de terra. Ai eu não entendo esse negócio de litro, se era uma linha ou duas. Aí todo mundo ia comprando, comprando. Aí foi chegando aquele povo que tinha mais dinheiro, mais condição, e comprando daqueles que já tinha comprado, porque os pobrezinho quando vê dinheiro fica doido. E aí tomaram conta. As fazendas chegam em 70 e pouco, 80. Apareceu seu Rubens Aguiar, o primeiro fazendeiro. O fundador, também tinha muita terra, comprou um gadinho e foi aumentando, aumentado e foi” (Ciça, quilombo Dona Juscelina, Entrevista realizada em 2018).

33 O trajeto apontado, indicando o quilombo Grotão, localizado na cidade de Filadélfia não é muito lógico, já que o município mais a leste, ou seja, mais distante que Araguaína tomando como origem da caminhada o quilombo D. Juscelina. Neste sentido, Grotão pode estar referindo-se a outro local que era de importância para os quilombolas, ou outro quilombo de mesmo nome que existia nas proximidades do atual município de Muricilândia. 59

No decorrer das entrevistas realizadas na comunidade, as relações da posse e propriedade da terra ficaram pouco claras. Havia determinadas regras a serem seguidas para assentar-se, como local das roças e das casas. No início, as roças ficavam mais distantes, entretanto a partir da década de 1970, as roças ficam no mesmo lote que as casas. Além disso, não foi possível encontrar os limites (ou se havia limites) da área da comunidade estabelecidos pelo fundador José Polino. Com a chegada do INCRA, as terras começam a ser comercializadas, relação antes definida apenas pela chegada na comunidade e uso de determinada terra. Não fica claro, tanto na conversa que tive com Ciça quanto a partir de outras vivencias nesta comunidade quilombola como se deu a monetarização das relações com a terra. Um ponto sobre o qual temos clareza, é que com a chegada do INCRA, a venda e conseguinte saída das famílias para a instalação das fazendas de pecuária e soja é notória.

A chegada das instituições legais em meados do século XX aparecem de forma mais efetiva nos relatos de Ciça e Izabel. É necessário medir a terra com maior acurácia, torná-la quantificável e mensurável para coisificá-la. “Para vender uma coisa, é preciso apenas que seja monopolizável e alienável” (MARX, 1985, p.137). Este é um dos pilares fundamentais do avanço da fronteira: levar a civilidade, a propriedade privada até os rincões do Brasil.

O processo de privatização das terras teve um primeiro impulso a partir de 1891, após a Proclamação da República, quando foi transferida para os Estados a responsabilidade de legislar sobre as terras públicas. Com esta medida, em troca de favores, autoridades estatais concediam títulos de terras aos integrantes das oligarquias e/ou às autoridades das instâncias estaduais ou municipais do poder (OLIVEIRA, 2011), torando a terra como uma das mercadorias fundamentais para a manutenção das relações de poder, na qual o trabalhador precisa ser expropriado dos meios de reproduzir sua existência autonomamente, criando cisões entre terra, trabalho e capital (MARX, 2013; 1985).

Porém, é a dependência do trabalhador, alicerçada sobre a necessidade de vender sua força de trabalho aos proprietários dos meios de produção para poder reproduzir-se, que revela a economia como violência. Essa violência econômica, internalizada pelo trabalhador, acaba por se opor à violência extraeconômica, caracterizada pelo padrão jurídico estatal consolidado historicamente (Heidemann; Toledo; Boechat, 2014, p. 61).

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A escravidão e o trabalho compulsório estão intimamente ligados à composição histórica da região Matopiba. Os primeiros registros de violência sistematizada aparecem na atividade da mineração34, atividade econômica que aparece com maior folego em Goiás (e no atual estado do Tocantins) e Bahia desde o século XVII. A violência material e imaterial (letramento, coerção, normativas, leis, pagamento de tributos) apresentam como fatos fundamentais da constituição da modernidade brasileira. Como demonstra Marx, ao analisar a colônia inglesa norte-americana no capítulo “A teoria moderna da colonização” (1985), o monopólio da violência era fundamental para garantir as relações cativas da força de trabalho. Se o povoamento e a posse da terra fossem estimulados, o processo de acumulação na metrópole seria prejudicado. Desta forma, a titulação da terra foi privada a determinados grupos para a constituição da formação de mão-de-obra. Grupos de escravos acusados de atentados políticos criminais podiam ser condenados ao trabalho, como se tal condição punitiva não estivesse já presente na sua condição de mercadoria após cruzar o Atlântico.

As relações entre índios e brancos eram, frequentemente, violentas e abusivas. [...] Nas décadas de 1810 e 1820, os brancos não pagavam, devidamente, pelos serviços prestados pelos índios; faziam-nos trabalhar tanto, que não tinham tempo de cuidar de suas próprias roças; roubavam suas terras e os puniam, severamente, por infrações menores. Os brancos eram monstros da maldade para infeccionarem tudo com seu hálito pestifero e venenoso (HARRIS, 2017, p.65).

A criminalização das rebeliões no século XVII e XVIII das populações insurgentes, condenava seus líderes a punição com o trabalho de 3 a 12 anos (SOLAZZI, 2007). Crimes contra pessoas que ocupassem cargos de representação estatal e da lei, como homens da assembleia legislativa também eram vistos como graves e punidos com até 20 anos de trabalho forçado. Crimes contra a propriedade e contra o patrimônio público, contrabando e comercialização de mercadoria proibidas eram punidos da mesma forma. A mendicância também era punida com 8 a 30 dias de trabalho forçado. E claro,¸ pena de morte para escravos que matassem ou ferisse um senhor de engenho, fazendeiro e membros da família (SOLEZZI, 2007).

34 “A força armada se mobilizava, a população vivia sob o terror; casas particulares eram violadas a qualquer hora do dia ou da noite, as prisões se multiplicavam. Isto durava não raro muitos meses, durante os quais desaparecia toda e qualquer garantia pessoal. Todo mundo estava sujeito a perder de uma hora para outra seus bens, sua liberdade, quando não sua vida. Aliás, os derrames tomavam caráter de violência tão grande e subversão tão grave da ordem, que somente nos dias áureos da mineração se lançou mão deles” (PRADO JR, 1982, p.40). O declínio do ouro sem nenhuma melhoria ou investimentos na atividade acelerou o declínio e aprofundou a crise mineradora e sua acumulação primitiva, reduzindo as taxas de lucro da atividade. 61

A região hoje compreendida como Matopiba, diferentemente das metrópoles, não possuía uma superpopulação relativa. A violência tem com um dos alvos o posseiro, o pequeno proprietário, o negro quilombola e o indígena35, para separá-los da posse da terra e apropriar de todo o seu trabalho. Harris (2017) em um longo e aprofundado estudo sobre rebeliões amazônicas aponta que as reformas de larga escala dos meados do século XVIII que pressionam o trabalho indígena e pegamentos de tributos ao império fazem com que comunidades lutem e lidem como os aspectos da administração colonial.

Após o fim da escravidão, os negros libertos tinham a obrigatoriedade de estar sempre em posse de sua carteira de trabalho, sob o risco de ser preso e condenado a trabalhar compulsoriamente (novamente). O Império assim garantia algum controle dos escravos libertos no trabalho, no qual os corpos ociosos e escravos fugidos eram enviados para zonas de fronteira, criando uma eficaz economia do castigo para as fazendas de café, algodão, cana e para as minas de ouro.

La propia ocupación colonial es una cuestión de adquisición, de delimitación y de hacerse con el control físico y geográfico: se trata de inscribir sobre el terreno un nuevo conjunto de relaciones sociales y espaciales. La inscripción de nuevas relaciones espaciales (territorialización) consiste finalmente en producir líneas de demarcación y de jerarquías, de zonas y enclaves; el cuestionamiento de la propiedad; la clasificación de personas según diferentes categorías; la extracción de recursos y, finalmente, la producción de una amplia resera de imaginarios culturales. Estos imaginarios han dado sentido al establecimiento de los derechos diferenciales para diferentes categorías de personas, con objetivos diferentes, en el interior de un mismo espacio; en resumen, al ejercicio de la soberanía. El espacio era, por tanto, la materia prima de la soberanía y de la violencia que acarrea (MBEMBE, 2011, p.43).

No Maranhão, por exemplo, a chamada “pacificação” de alguns grupos Awá só veio a efetivar-se nos anos 1970, com a construção da Estrada de Ferro Carajás, empreendimento estratégico da Companhia Vale do Rio Doce para o escoamento do minério de ferro na região de Carajás – PA até o porto de Itaqui, em São Luiz – MA.

Este processo significou a sedentarização de alguns grupos indígenas contatados, que incentivados pelo governo adquiriram novas práticas de subsistência, como a pesca e o cultivo de produtos agrícolas. O encurralamento e as frequentes ameaças do agronegócio significaram a redução intensa do nomadismo e do uso do território pelos dos indígenas e

35 Sobre trabalho compulsório e projetos civilizatórios, ver tese de livre docência de John Monteiro “Tupias, tapuias e historiadores: estudos de história indígena e indigenismo” (2001).

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comunidades tradicionais da região. Assim o nomadismo foi substituído pela migração indígena e camponesa, composição da força-de-trabalho para as fazendas em expansão e formação.

Dona Francisca, quebradeira de coco, liderança camponesa na região do Bico do Papagaio e do Tocantins, liderança da ASMUBIP n, lembra da longa luta para conseguir um pedaço de terra. Filha de lavradores, nasceu no Maranhão, em Tumtum, junto com mais 11 irmãos.

“Assim que a gente foi criado, trabalhando na roça. Meu pai sempre lutou tanto, eu custei entender porque meu pai lutava muito pra ter uma terra. Mas aí do tempo que eu já tava grande com 15 anos aí apareceu uma pessoa que era dono lá da terra. Mesmo aquele pedacinho sendo do meu pai ele não conseguiu ficar lá, porque naquele tempo a luta era mais pouca gente. Era mais ou menos em 1963, por aí assim.[...] Chegando ali nós fomos morar no lugarzinho de junto ao Sítio Novo [Tocantins]. Era mesma coisa do Maranhão botava roça num lugarzinho, 5 anos botava de novo, o coco era livre, muito coco e a gente ficou, quando passou uns três anos chegou o povo de novo, dono das terras. Aí eu fui me embora de lá vim morar num Buriti que tem aqui no município de Itaguatins, junto de São Miguel, nos tamo lá, lá vem o povo de novo, ai eu vim embora para cá pra esse Buriti aqui [no Tocantins]. Aí aqui a gente começou trabalhando, ainda muito pouco, não tinha devoração de babaçu, a gente quebrava coco a vontade, aí a nós fomos trabalhar... a gente chamava centro36...de um senhor que gostou muito de nós, aí ele “não bora lá para o meu centro, lá vocês trabalha mais eu, até vocês achar o pedacinho de vocês, ai fiquemo lá” (Dona Franscica, quebradeira de coco. Entrevista realizada em Burit, 2016).

Como relata Dona Francisca, as expulsões são frequentes. As relações de trabalho estão inevitavelmente ligadas a terra. Para poder garantir que fosse possível explorar os camponeses do Matopiba, onde havia (e há) uma vasta extensão de terras, foi necessário afastar o trabalhador da posse “legal” ou econômica da terra.

36 Otávio Velho (2013), descreve o centro, para as comunidades camponesas da segunda metade do século XX, como os espaços de cultivo e trabalho no interior das florestas e do cerrado, onde estariam os melhores terrenos. Essa conceituação demonstra uma compreensão radicalmente novo sobre as terras férteis, que geralmente eram consideradas aquelas localizadas nas proximidades de grandes rios. As terras próximas aos grandes rios eram chamadas de beira, “lugar onde se situam aglomerados maiores e mais antigos” (p.113), da civilização. Décadas depois, outra beira também é considerada, à beira da estrada, do comércio e da modernidade. As terras no interior, “desocupadas”, ofereciam menos riscos de expulsão a curto e médio prazo aos camponeses. Além disso, é interessante observar a centralidade do trabalho na definição do que é considerado o centro, ou seja, a roça e a mata, natureza não controlada. 63

A migração das comunidades camponesas, fugindo das secas, buscando as bandeiras verdes (MARTINS, 1997), formando a força de trabalho para a agricultura moderna data desde a década de 1920, chegada dos primeiros projetos agrícolas e de colonização no Maranhão e nas décadas seguintes, nos outros estados da região que atualmente chama-se de Matopiba. Os projetos se intensificam nos anos 1970 com o pacote tecnológico nipo- brasileiro do Prodecer, o “amansamento” dos cerrados, as normas e tecnologias do capital. A modificação e “correção” dos solos do cerrado para as sementes adaptadas de grãos aos climas tropicais, soja e milho principalmente – e outros cultivos mecanizados, como o algodão, a cana-de-açúcar, e o eucalipto, que abastece a indústria de papel e celulose e os fornos transformadores de minérios do Pará e do Maranhão formatam os cerrados brasileiros em um dos celeiros do mundo. A natureza, constituída por povos e comunidades tradicionais, perdeu espaço para o modelo de exportação de commodities. Tal ocupação do interior do país, dos cerrados e florestas da região, prescindia da necessidade de lotear as terras ainda não convertidas á normativa da propriedade privada, em prol dos ideais desenvolvimentistas.

Os processos migratórios na região estão atrelados ao projeto de expulsão e expropriação dos camponeses; às difíceis condições de vida e trabalho nas regiões de origem dos migrantes; à ação de colonização do governo militar, nas quais os interesses dos grandes proprietários se sobrepuseram à necessidade verificada pelo governo de aliviar as tensões nas regiões de conflito no norte e nordeste e os projetos de colonização subordinados ao latifúndio.

O Projeto Carajás37 aparece com um marco importante para a mobilidade e constituição da região Matopiba. A partir dos anos 1970, a presença do Estado via projetos de infraestrutura e colonização agrícola cresce abruptamente. Os conflitos fundiários se intensificam com a implementação dos projetos agrominerais que envolvem o Programa Grande Carajás, como a Usina Hidrelétrica de Tucuruí, a Estada de Ferro Carajás, o Terminal Marítimo de Ponta da Madeira em São Luís (MA) e o Porto do Itaquí (MA) (IDESP, 1990; ALMEIDA, 1994).

37 Há uma extensa bibliografia sobre o Projeto Carajás, que além de teses, livros e artigos vai até documentários e as fotografias de Sebastião Salgado. Para não ser desleixada, mas com certeza injusta, indico a leitura dos volumes de Jean Hébette, “Cruzando a Fronteira: 30 anos de estudo do campesinato na Amazônia”, em especial o volume III (2004); o livro “O massacre: Eldorado dos Carajás: uma história de impunidade” (2007), de Eric Nepomuceno, e o documentário “Serra Pelada: lenda da montanha de ouro” (2013), de Victor Lopes. 64

O Programa Grande Carajás (PGC) cobre uma área cerca de 900.000km2 se sobrepõe parcial ou totalmente aos seguintes programas ou planos e projetos: o Projeto de Desenvolvimento Integrado da Bacia do Araguaia-Tocantins (PRODIAT); o Programa de Pólos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia (POLAMAZÔNIA), incluindo, notadamente, os Polos Araguaia-Tocantins (Goiás), Pré-Amazônia Maranhense (Maranhão), Carajás (Pará). Até a pouco tempo, a área do PGC era também objeto de um organismo fundiário específico com poderes especiais, o Grupo Executivo de Terras do Araguaia- Tocantins (GETAT). Esses Programas, Planos ou Projetos são subordinados a coordenações distintas, como a Secretaria de Planejamento da Presidência da República (caso do PGC), o Ministério do Interior, diretamente (PRODIAT) via Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM) (POLAMAZONIA) e o Conselho Nacional de Segurança (CNS).

É possível afirmar, que a região Matopiba configura-se como uma sobreposição de projetos e planos, além de uma secretaria específica – a Secretaria de Assuntos Especiais (extinguida pelo ex-ministro da Agricultura Blairo Maggi em 2016). A mesma região é ainda objeto de outros programas setoriais, sendo um dos mais importantes o Plano de aproveitamento hidrelétrico dos rios Tocantins-Araguaia e Xingu, elaborado pela ELETRONORTE, empresa do Ministério de Minas e Energia. No campo agrícola, existe o Programa de Várzea (Provárzea). Isso fez o PRODIAT reconhecer que o quadro institucional que se opera na região do PGC apresenta alguma complexidade. Além dos governos estaduais (Pará, Maranhão e Goiás, este último na atual área do Tocantins), e de 216 municípios que preexistem áreas de jurisdição de três superintendências regionais (SUDAM, SUDENE e SUDECO) e do Grupo Executivo de Terras do Araguaia-Tocantins (GETAT) (HÉBETTE, 2004). As expulsões, ameaças e assassinatos e a utilização dos camponeses e povos e comunidades tradicionais como mão-de-obra barata nos garimpos e nos latifúndios que “preparam” o território para o avanço do capital38 teve como uma de suas consequências a desorganização da pequena produção agrícola de base familiar e indígena .

A fatídica região do “Bico do Papagaio”, na junção dos Estados do Pará, Maranhão e Goiás, no coração do Programa Carajás, foi sozinha, responsável por 104 mortes causadas por conflitos fundiários em 1985 (40% do total nacional) e 69 em 1986. Nos primeiros seis meses de 1985, nada menos que 26 camponeses de três

38 O resultado mais flagrante desses atos de violência aponta cerca de 110 mil vitimados no estado do Pará, dentre os quais 15.671 famílias ameaçadas de despejo, 3.799 efetivamente expulsas no período compreendido entre os anos de 1964 e 1988. Essa violência se materializou ainda em 121 pessoas feridas, 129 espancadas, 463 presas, sete sequestradas, 116 desaparecidas, 142 ameaçadas de morte e em cerca de 1.064 trabalhadores rurais mantidos em regime de trabalho escravo nas fazendas e garimpos do Estado (IDESP, 1990, p. 34). 65

municípios da área do PGC (Marabá, São João do Araguaia e Xinguara) morreram pelas mãos de pistoleiros em conflitos locais, e 16 em um período de duas semanas em maio de 1986. Tem também havido uma mudança na natureza da violência rural, com o aumento no uso de ameaças. Intimidações, despejos, raptos, espaçamentos, torturas, prisões ilegais e no uso do trabalho escravo (HALL, 1991, p. 145).

A Serra Pelada, garimpo que se abre nos anos 1980, sintetiza as diversas contradições que envolviam o avanço da fronteira, e as diversas faces da violência, material e simbólica deste processo. Com o aumento dos conflitos de terras na região amazônica e do centro-norte, a mina é aberta para a exploração de pequenos garimpeiros, burlando as regras de concessão para as grandes empresas (e para desespero dos acionistas da Vale), já que era necessário controlar a massa de pessoas que se movia para a região em busca de oportunidades e terra, no qual o grito pela Reforma Agrária tornava-se cada vez mais organizado e combativo. O garimpo, juntamente com as forças armadas do Estado39, amenizou os ânimos do reparto agrário, que momentos posteriores, com a decadência do garimpo, foram retomados de forma pulverizada, inclusive com diversas conquistas pontuais pelos camponeses, como narrado por Dona Francisca.

“Aí meu marido inventou de ir para Serra Pelada, porque queria porque queria ir para Serra Pelada. Eu sei que ele andou por lá e desenganou ai disse que não sai mais não, enquanto não arranjasse um pedacinho de terra para ele, ele não ia mais se aquietar e eu morta de medo, porque eu tinha medo mesmo. Ai nos fiquemo e ele lutou por esse pedacinho de terra aqui. Ele foi para o sindicato, ele primeiro foi, eu tinha tendência de lutar por uma coisa que eu já vi meu pai lutando, mas eu tinha medo. Veio para cá um grupo de um grupo de lavrador vieram tudo para cá e aqui eles fizeram o corte dessa terra eles mesmo, não foi Incra não, naquele tempo era GETAT. Os cabra todo dia ... a pressão era doida. A sede dessa fazenda ficava aqui perto, uns dois quilômetros, daqui a gente escutava eles atirando para amedrontar o povo, mas assim mesmo a gente ficou, porque tinha que lutar para a sobrevivência mesmo. Aí nós fiquemos aqui, quando eles cortaram aí com o ano ai o GETAT, veio cortar, só regularizar de quem que era cada pedaço, assim ele veio só fazer os perímetros, mas eles já tinham cortado, limitado, cada um já tinha seu pedaço. Mas ele não fez um novo corte? Ele respeitou? Respeitou, mas foi com muita luta, com muita luta eles respeitaram o corte dessa terra. Porque nós tinha medo de ficar por aqui, dormir por aqui,

39 Duas ações militares das dezenas que ocorreram na região foram a Guerrilha do Araguaia e a Guerra dos Perdidos, ou “a guerra que veio depois” (CAMPOS FILHO, 2014). 66

por só foi loteado um pedaço aqui pelo meio, do outro lado, tudo era fazenda, nós tinha muito medo de algum fazendeiro. Aí a gente veio para cá, e eu já vim para cá. Nós sem condição nenhuma, aí meu marido foi pra um garimpo aqui perto do Cumaru aí no Pará. Foi porque queria comprar um animal para nós carregar esses meninos daqui lá para o Buriti num jumentinho. Aí ele foi, aí ele ganhou um dinheirinho, comprou um jumentinho, arreio a cangalha, nós fiquemos muito alegre pra nós foi uma riqueza muito grande aquele jumento eeeeee, aí fiquemo aqui. (Dona Francisca, Buriti. Entrevista realizada em 2016)”

Os pescadores, Seu Joaquim e outros do STTR de Esperantina, antigo povoado de São Sebastião, participaram dos processos de loteamento e chegada do GETAT. Relembram das minas e das bombas jogadas pelo governo olhando para as estrelas, na beira do rio Araguaia. Sobreviveram ao tempo da grilagem e da ditadura fazendo tocaias e vigias, enquanto outros companheiros cuidavam da roça e mantinham a terra ocupada. “Eram pouco companheiros, mas você podia contar a sua vida com eles”.

No final das contas, de acordo com as entrevistas de campo realizadas, o GETAT queria dar lotes de 4 a 6 alqueires para cada família, mas como o movimento era articulado, conseguiram lotes de 6 a 8 alqueires na beira do rio Araguaia ou lotes que possuíam acesso próximo a corpos d’água, e 13 alqueires os lotes longe da água.

Foto 1 - Camponeses e camponesas, pescadores do Bico do Papagaio

Fonte: Quintal agroecológico do STTR de Esperantina (TO). Pescadores do rio Araguaia e pessoal da APA-TO, Esperantina (TO). Fotos da autora (2016). 67

No entanto, a realidade de Dona Francisca infelizmente não é a regra da maioria dos garimpeiros e camponeses da região, que não conseguiram obter a titulação da terra. Seu Reginaldo, em seus 50 e alguns anos, dedicou 21 ao garimpo. É da região de Araguaína, nascido na época que ainda era Goiás. Lembra que seu registro geral ainda é dos tempos de Goiás, e que a justiça já o avisou que isso pode leva-lo a ter problemas. Conta que sente saudade do garimpo, com um brilho nos olhos de quem acaba de encontrar uma pepita. A ideia era sair por 3 meses, mas acabou largando a mulher e a família para um processo migratório que durou um pouco mais de duas décadas. Andou pelos garimpos do Goiás, do Tocantins, Mato Grosso e Pará. Esteve em Serra Pelada, e disse que nunca viu uma coisa igual àquela – tinha medo das escadas que precisava subir e descer com os sacos de terra e ouro e por isso não ficou muito tempo. O medo vinha dos constantes desabamentos que viu por lá. ‘Bamburrou’. ‘Enricou’, ‘desenriçou’.

Bateu ouro por porcentagem, por diversas formas de acordo de trabalho até perder tudo. “E como é que a gente volta sem nada pra casa? O problema nem é a família, que recebe a gente calada, sem falar nada. O problema são os vizinhos, que ficam fofocando: “coitada da muié desse homi!” (Acampado do município de Nova Olinda, 2016) – que comentam, acham que você sumiu com o dinheiro. Esse sentimento o fez tardar o retorno, indo de bateia em bateia pela região do Bico do Papagaio. Foi até Itaituba, no Pará – atualmente porto de escoamento de minério e soja. Parou um tempo numa fazenda de gado em São Félix do Xingu, onde um primo o arrumou um trabalho. Não queria, mas disse que precisava tentar. Depois de alguns meses trabalhando, conseguiu comprar uma moto. Agora já podia pensar em voltar: retornou a Araguaína nos anos 2000, mas a mulher de 20 anos atrás já não o esperava. Não se zangou. Entendeu, “o errado fui eu”. Mas a vida é feita de rios tortuosos e de ‘escolhas’. Para os corpos que transitam entre os meandros da superexploração na fronteira, tudo é viagem de volta. Seu Reginaldo está no acampamento Santa Maria, no município de Nova Olinda, Tocantins, a 60km de Araguaína, junto à mais 20 famílias na tentativa de conseguir um pedaço de terra.

Domingos, nascido no município de Arapoema (TO), coordenador do acampamento Santa Maria, aguarda junto com Seu Reginaldo uma área para poder assentar- se. Com a suspeita da terra ser da União, ocuparam a beira da estrada próximo à fazenda de mesmo nome. Para ele, a terra é a sobrevivência futura e inclusive de seus filhos. Na beira de estrada, desde 2014, as famílias plantam milho abobora mandioca, melancia. Possuem acesso 68

precário a uma mina de água a 300m do acampamento, e assim seguem na luta com apoio do STTR e da CPT de forma mais efetiva.

Foto 2 Acampamento Santa Maria (TO)

Fonte: foto da autora (2018).

Ainda sobre grupos que não conseguiram acessar à terra, visitei o Acampamento Irmã Dorothy, em Arraias (MA) na beira da rodovia Belém-Brasília. Ao conversar com Carlos, Ialeide e Baiana, vi que as condições de vida eram precárias. Eles estão há 6 anos na luta por um pedaço de terra, sendo três anos na beira da estrada. Possuem dificuldades de acesso a água, os barracos são precários e as pessoas do assentamento estão adoecendo, principalmente de hanseníase. No início eram 250 famílias acampadas, mas atualmente 30 famílias estão de maneira mais efetiva na luta. “Tem mais famílias, mas a maior parte passa mais tempo na cidade” – comenta Carlos, já que não há meios de subsistência no acampamento, não há plantações, já que a área é do Departamento de Estadas e Rodagem. A Lei Federal n 6.766/79 define no Art. 4° a proibição de plantios, ao longo das faixas de domínio das rodovias, ferrovias e rios, e construções que distem a 15 metros da via. A lei tem intepretação diferenciada quando as fazendas de soja estão envolvidas, diferenciando da “agropecuária marginal”, diversificada e para sobrevivência, encontrada nos Acampamentos Santa Maria (TO) e Dorothy (MA) e também descrita no artigo “Agricultura de beira de estrada ou agropecuária marginal ou, ainda, o campesinato espremido”, de Marco Mitidieiro (2014). 69

Não há apoio de entidades, como MST, da prefeitura e do governo. A possibilidade de trabalho nas proximidades é escassa – há muito preconceito contra os acampados. A maioria das famílias são de São Joao Paraiso, Campestre, Montes Altos, Imperatriz e Porto Franco, região do sul do Maranhão. De acordo com o que me foi compartilhado, estão aguardando serem assentados em Porto Franco.

Sobre o processo de formação dos assentamentos no sul do Maranhão, Antônio Criolo40, afirma que há um processo de luta e resistência na região, apesar de suas limitações.

“Começamos essa discussão dentro dos sindicatos, no sentido da mobilização dos trabalhadores, e esses trabalhadores ganharem uma certa consciência de que eles também têm direito, eles começaram a avançam um pouco. E muitas trabalhadoras nessa região conseguiram acampar nas [rodovias]BR, nas MA, começaram a acampar na margem dessas vias aí com o objeto de conseguir um pedaço de terra para plantar e morar. E isso resultou em vários assentamentos, em terra conquistada. Nós temos o assentamento Nova Descoberta em Mangabeiras, Bacurí em São Raimundo das Mangabeiras, Campo Grande, o Alegre e o Sucupira no município de Riachão e temos o assentamento São José e Gado Bravinho, no município de Balsas. Os trabalhadores têm mostrado segurança, porque já foram ameaçados diversas vezes pra ser expulso da terra: mesmo eles tendo emitidos documentos da posse da terra, mesmo depois deles estarem documentados pelo INCRA, o fazendeiro pleiteia através de um advogado na justiça entrar com a liminar de despejo. Mas mesmo assim a gente conseguiu com o acompanhamento dos trabalhadores resistir e continuam todos nas suas comunidades, nos seus assentamentos. Ainda nenhum assentado tem o título definitivo da área, mas todos já estão com documento em mão, a carta de anuência pra que eles possam justamente trabalhar, morar naquela terra com maior tranquilidade. E aí a gente vê diante disso alguns saldos positivos: trabalho dos 45 companheiros, das famílias do Assentamento Alegre, em Riachão. Eles, em parceria com a Cáritas regional, com aquele projeto da Rede Mandioca, estão conseguindo vender e produzir para várias cidades do Maranhão, motivo de nossa alegria! Eu destaquei esse mas todos eles [assentamentos] tem tido trabalhos positivos. Porque tem alguém que trabalha na horta comunitária, tem alguém que trabalha na

40 Antônio Criolo começou sua militância no movimento sindical em 1986. Em começou a desenvolver em 1987 no sul do Maranhão em parceria com CENTRU, participando do processo de retomada dos sindicatos e conquistas de assentamentos na região. Desenvolveu diversos trabalhos junto as comunidades eclesiais de base e atualmente é coordenador do Maranhão da CPT. 70

produção do arroz, da farinha, da criação de pequenos animais, a produção e feijão de frutas e o que a gente pode dizer em síntese, é que o pessoal hoje tem o básico para sobrevivência, pra se sentir um pouco mais” respeitado – uma casa para morar, ter a comida, ter a escola, um atendimento de saúde. (Entrevista com agente da CPT, São Raimundo das Mangabeiras, 2016)”

Foto 3 - Camponeses dos cerrados do Matopiba

Camponês nas proximidades de João Lisboa (MA), em 2012. Plantação da EFA Padre Josimo, Esperantina (TO) em 2015. Fotos da autora.

Foto 4 - Camponesas dos cerrados do Matopiba

Fonte: P.A Nova Descoberta, em São Raimundo das Mangabeiras (MA) produção orgânica. Foto da autora ,2016. Presilino Silva, do brejo do Chupé (PI). Fonte: Agencia Pública , 2018.

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Foto 5 Comunidades tradicionais do Matopiba

Comunidade de fundo de fecho de Pasto do vale do Arrojado, Corretina (BA). Fonte : Metropolis, 2018.

Neste sentido, a expansão da violência e da mediação da via pelas mercadorias, na qual a transformação das populações locais e sua relação com a terra é fundamental para compreender a formação da região Matopiba. Vale ressaltar, que diferentemente do avanço da fronteira agrícola, não se pretende homogeneizar tal região, como já aponta alguns trabalhos de Kluck (2017), Sobrinho (2012) sobre a Bahia e Alves (2006) sobre o Piauí mais especificamente sobre as diferentes histórias, modos de vida, e paisagens da região Matopiba.

1.2 Camponês, indígena, quilombola e povos e comunidades tradicionais

As populações locais podem ser estruturadas em quadro grandes eixos conceituais: indígenas, quilombolas, camponeses e povos e comunidades tradicionais. Para que fique mais claro, indígena seria bem mais que uma categoria sociocultural ampla. O indígena41, de acordo com Kopenawa e Albert (2015) “é uma multiplicidade política

41 Da constituição: “Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá- las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.§ 1º - São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as terras por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.§ 2º - As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.§ 3º - O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei.§ 4º - As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.§ 5º - É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, "ad referendum" do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato

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diferenciada, inserida por um autoconscentimento em um Estado com vocação ‘plurinacional’” (p.20). Isto vai além do conceito de “índio” do período da pré-constituição de 1988, na qual a condição indígena era transitória, votada inexoravelmente à assimilação pela

comunhão nacional”, ao passo que esta última era subentendida ser permanente, em outras palavras eterna – poderá ser objetivamente virada de ponta-cabeça em um futuro não muito remoto. Pois não é impossível que os povos indígenas, com sua máquina territorial primitiva” que antecede milênios ao “aparelho de captura” dos Estados nacionais implantados nas Américas, perdurem após o colapso de muitos, senão de todos, nossos orgulhosos Entes Soberanos”, em um mundo que promete ser materialmente muito diferente daquele que vivemos hoje – o qual , como se sabe, foi construído graças à invasão, ao saque e à limpeza étnica das Américas (KOPENAWA e ALBERT, 2015, p.20)

Apesar de definido pela Constituição, a identidade e pertencimento de indígena é móvel, já que está embasada em processos dinâmicos de construção social. Historicamente, tais mudanças caminham com a destruição, a destituição e confinamento dos povos indígenas.

Sobre as populações tradicionais também se ressalta uma gama de manifestações e identidades: ribeirinhas, caboclas, aquelas comunidades camponesas e extrativistas, cuja consciência da relação com os povos indígenas que as precederam parece ter sido, em alguns casos, abolida. A cultura trazida pelos imigrantes ‘brancos’ das frentes pecuaristas que se fundiram com grupos indígenas e negros e se metamorfoseou, recalcou a memória nativa e se orientou mimeticamente para o Brasil “oficial”.

Na maioria dos casos, porém, a relação apenas entrou em situação de latência, exprimindo-se ‘vestigalmente’ por automatismos práticos e idiomatismos simbólicos. Essa aparente perda de consciência, assim, tem se mostrado cada vez mais frequentemente como sendo não tanto uma ruptura definitiva, mas antes um longo desmaio (KOPENAWA e ALBERT, 2015, p. 21).

Kopenawa e Albert (2015) descreveM que tal desmaio para os povos amazônicos “como uma espécie de coma ético do qual a Amazônia ‘cabocla’ começa a despertar” (2011, p.21). As revoltas e resistências de grupos camponeses, assim como na região Matopiba, não ocorrem de forma isoladas, pois constituíram incursões profundas das comunidades, logo que cesse o risco.§ 6º - São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé.”

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principalmente indígenas para expandir seus horizontes ideológicos para além da esfera da comunidade, ampliando as entidades e lutas coletivas. Na região do Matopiba, diversas comunidades têm lutado pela sua identidade indígena, como comunidades do sul do Piauí42 que buscam seu reconhecimento como Gamela, a luta da extensão da Terra Indígena Araribóia, que envolve camponeses, indígenas Gavião e Guajajara no Maranhão.

Sobre os quilombolas43, são grupos de afro-brasileiros que se autodeclaram a partir de seus laços com a terra , que além de garantir a subsistência do grupo, tem importância histórica e cultural, pois é a terra a responsável pelas transmissões dos valores éticos e morais, dos conhecimentos definidos pelas manifestações, pelas tradições e pelo respeito à ancestralidade.

Tanto para os indígenas quanto para os quilombolas, a questão da terra enquanto um lugar de saberes e tradições é intransponível. É inconcebível que determinada comunidade, indígena44 ou quilombola seja estabelecida em um lugar distinto de seus antepassados, onde estão guardados lugares sagrados45.

Sobre a definição de camponês, a asserção mais importante e que congrega um grande leque de definições e distantes nuances é a despeito de grupos heterogêneos ligados a terra que tem seus modos de vida destruídos ou dominados e incorporados pela economia capitalista mundial.

42 Referencio a comunidade de Sete Lagoas visitada no trabalho de campo no sul do Piauí em 2018. 43 O Decreto no 4.887/2003 regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias: Art. 2o Consideram-se remanescentes das comunidades dos quilombos, para os fins deste Decreto, os grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto- atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida. § 1o Para os fins deste Decreto, a caracterização dos remanescentes das comunidades dos quilombos será atestada mediante autodefinição da própria comunidade.§ 2o São terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos as utilizadas para a garantia de sua reprodução física, social, econômica e cultural. § 3o Para a medição e demarcação das terras, serão levados em consideração critérios de territorialidade indicados pelos remanescentes das comunidades dos quilombos, sendo facultado à comunidade interessada apresentar as peças técnicas para a instrução procedimental. Art. 3o Compete ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, por meio do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA, a identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pelos remanescentes das comunidades dos quilombos, sem prejuízo da competência concorrente dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. 44 Ver o documentário “Martírio” (2017), e a entrevista com Vincent Carelli “Demarcação de terras indígenas latifúndios: a grande tramoia brasileira” disponível em http://www.ihu.unisinos.br/159- noticias/entrevistas/575966-demarcacao-de-terras-indigenas-x-latifundios-a-grande-tramoia-brasileira-entrevista- especial-com-vincent-carelli 45 Recentes processos de retomadas de diversos grupos, como os Guaranais-mbya do Jaraguá em São Paulo, dos Tupinambás, na Bahia (ver ALACON, 2013), dos Guajajara no Maranhão. Apesar do termo “retomada de terras” ter referências desde os anos 1970, com a lutas dos Kaingang, os processos de “retomadas” têm se intensificado nos últimos 15 anos. Em 2018, havia 130 terras indígenas em processo de demarcação. 74

Há razões para definir “camponês” e há razões para deixar indefinida a palavra, uma figura de linguagem fora do domínio onde residem as criteriosas categorias do conhecimento. Tal decisão jamais é inconseqüente, pois este conceito, se aceito como tal, vincula-se ao próprio âmago do pensamento teórico sobre a sociedade global contemporânea e reflete-se em conclusões de imediato interesse político e analítico. O que importa são as maneiras com tais palavras são utilizadas (SHANIN, 2005, p.01).

Apesar de não conceituar o camponês a partir de uma ótica de classe como Kaustky (1980) e Lenin (1974), ou a partir de uma análise binária dos paradigmas da Questão agrária e do Capitalismo Agrário, como vem discutindo Fernandes (2013), é importante indicar alguns caminhos conceituais. Shanin (2005) aponta quatro características para definir o camponês: “a) a propriedade rural familiar como a unidade básica da organização econômica e social; b) a agricultura como a principal fonte de sobrevivência; c) a vida em aldeia e a cultura específica das pequenas comunidades rurais; d) a situação oprimida” (p. 05). Tal esforço seria insastifatório. O modo de produção é um ponto importante, apesar dos camponeses possuírem “um modo de produção porque lhes falta a estrutura político- econômica relativamente autossuficiente, isto é, os sistemas mais significativos de exploração e apropriação do excedente tem sido, de modo geral, externo a eles”46 (SHANIN, 2005, p. 11).

O campesinato ora serve aos interesses capitalistas, ora lhes é contraditória. O modo de vida camponês apresenta simultaneamente uma relação de subordinação e estranhamento com a sociedade capitalista. Se, por um lado, o mercado domina o campesinato, por outro, ele não o organiza (TAUSSIG, 1993; MEDEIROS, 2008).

A vida camponesa continua respondendo a uma teleologia moral. Em seu movimento doméstico e comunitário se entrecruzam valores econômicos, sociais e culturais em uma racionalidade integral que contrasta com a limitada economia lucrativa do capital. Atualmente, a condição camponesa engloba tanto o pequeno produtor de milho, quanto o empresário social, bem como o feirante aldeão, o diretor da associação agroindustrial, o criador de animais e o banqueiro associativo (BARTRA, 2011, p.79)

46 Shanin (20050 faz uma importante provocação para a reflexão sobre o avanço da fronteira agrícola e as transformações do trabalho na agricultura: se o modo de produção do camponês é alheio a sua existência, seria o camponês um pequeno produtor de mercadorias? É inevitável que sim, mas retomado as próprias afirmativas de Shanin palavras são importantes, e por isso o camponês não se define apenas por tal característica. 75

A condição camponesa não é uma repetição, mas uma mudança; um modo específico de mudança”. Há uma tendência em querer ver o produtor doméstico enraizado em alguma tradição ou comunidade agrária sempre idênticas como se um simples desvio o torna- se corrompido. Na verdade, o espaço rural apresenta uma alta plasticidade. Pensando na formação do campesinato brasileiro, Medeiros (2008) aponta uma característica fundamental: a forte mobilidade. A estrutura fundiária concentrada e as precárias formas de posse da terra (posseiro, arrendado, ocupante) coloca o camponês numa condição de instabilidade, em constante busca por terra como pedra filosofal de sua reprodução social. Diferentemente do indígena e do quilombola, é mais seu modo de vida, seu trato com a terra do que a terra em si que caracteriza o camponês (WANDERLEY, 1997), ou seja, assim como afirma Velho (2013), o camponês tem uma certa desconfiança no sistema, ligada á um momento de busca de terras, que não esteja dentro do modo de exploração agrícola do latifúndio, e no caso deste trabalho, produtor de commodities. A mobilidade, a expulsão forçada, “[...] denuncia, até certo ponto, falta de apego a um pedaço particular de terra, em torno do qual não pôde chegar a cristalizar-se uma ideologia camponesa típica por razões objetivas; mas também denuncia o desejo de alguma terra” (VELHO, 2013, p. 137). Aí estaria uma diferença entre camponeses e quilombolas e indígenas: enquanto os camponeses lutam por alguma terra, os quilombolas e indígenas lutam por uma terra específica, determinada por sua ancestralidade, rituais e lugares sagrados47.

Além das identidades camponesas, quilombolas e indígenas, há a criação de identidades tradicionais específicas, que se reconhecem nos processos do “liquidificador modernizante”, como comunidades fundo de pasto, principalmente no oeste da Bahia; quebradeiras de coco babaçu, presentes no sul do Maranhão e Tocantins e Piauí e organizadas em uma rede interestadual48, dentre outras. O chamado “tradicional” aparece como uma

47 Tal diferenciação também é partilhada por alguns agentes do CIMI, confirmada a partir de conversas realizadas em São Paulo, em janeiro de 2019. 48 O Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu do Maranhão, Pará, Piauí e Tocantins emerge em 1991 como uma organização que representa os interesses sociais, políticos e econômicos deste grupo, dando a estas mulheres a possibilidade de serem vistas e reconhecidas. Isto possibilita a chance de se desenvolverem, por meio do conhecimento e experiência que o trabalho do movimento oferece, bem como a verem o mundo além das comunidades. A luta, antes relacionada com o direito à terra e ao babaçu, passou a ser uma luta pela qualidade de vida da mulher no campo. (Retirado do site do MIQCB, disponível em https://www.miqcb.org/quem-somos ). Congrega também leis estaduais , ligadas às dinâmicas locais, tais como os dispositivos das Constituições estaduais, como aquelas do Maranhão e da Bahia, que falam respectivamente em assegurar “a exploração dos babaçuais em regime de economia familiar e comunitária” (Art.196 da Constituição do Maranhão de 1990) e em conceder o direito real de concessão de uso nas áreas de fundo de pasto (Art.178 da Constituição da Bahia de 1989); e as leis municipais aprovadas no Maranhão e no Tocantins desde

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reivindicação em forma de autodefinição coletiva. Antes de serem interpretados como “povos ou comunidades tradicionais49”, aparecem envolvidas num processo de construção do próprio “tradicional” a partir de mobilizações e conflitos. Deste ponto de vista, além de ser do tempo presente, o “tradicional” é, portanto, social, coletivo e politicamente construído, a partir de uma classificação empírica, fruto da existência localizada desses novos movimentos sociais vinculados a terra (THUM, 2017).

Apesar de incompleta, já que o processo de auto identificação é dinâmico, elenco algumas entidades dos povos e comunidades tradicionais do Matopiba a partir de informações de campo e principalmente a partir de Almeida (2004):

. Monape (Movimento Nacional dos Pescadores); . Coapima (Coordenação das Organizações e Articulações dos Povos Indígenas do Maranhão). . Aconeruq – Associação das Comunidades Negras Rurais do Maranhão, formada em novembro de 1997, em substituição à Coordenação Estadual Provisória dos Quilombos, criada em 1995, congrega atualmente 246 comunidades negras rurais e se vincula à Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq). . Central de Pescadores da Bacia Hidrográfica do Araguaia-Tocantins, com vinte entidades que somam 7.633 famílias, das quais 6.672 estão nos arredores do lago da Barragem de Tucuruí, Assema (Associação em Áreas de Assentamento no Estado do Maranhão) . As associações maranhenses Associação Indígena Angico – Tot/Guajajara, Associação dos Povos Guajajara, Krikati e Awá, CIPK e Associação Wyty’Caty do Povo Gavião). . AIX e Conselho das Organizações Indígenas da Bacia Araguaia e Tocantins no estado tocantinense. . Coiab (Confederação Indígena da Amazônia Brasileira); . UNI (União Nacional Indígena) foi fundada em 1978, organização que só ganhou projeção a partir da Assembleia Nacional Constituinte e com a formação da união dos “Povos da Floresta” em 1988. Em setembro de 1989 a

1997, mais conhecidas como “leis do babaçu livre”, que disciplinam o livre acesso aos babaçuais (ALMEIDA, 2004).

49 Decreto 6040/2007: Povos e Comunidades Tradicionais – grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição.

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UNI (união nacional Indígena) constituiu o Centro de Pesquisas Indígenas, em Goiânia (GO)50. . A Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), criada em 1996, em Bom Jesus da Lapa (BA), na reunião de avaliação do I Encontro Nacional de Quilombos (1995). Dela participaram representantes de comunidades de 18 Unidades de Federação, além de entidades do Movimento Negro e ligadas à questão agrária que apoiam a luta dos quilombolas. Movimento dos Pescadores do Maranhão (Mopema). . Central de Fundos de Pasto de Senhor do Bonfim, fundada em 2 de setembro de 197451.

O Projeto GeografAR, da UFBA levantou no decorrer de 2003, em 23 municípios baianos (Andorinhas, Antônio Gonçalves, Brotas de Macaúbas, Buritirama, Campo Alegre de Lourdes, Campo Formoso, Canudos, Casa Nova, Curaçá, Itiúba, Jaguarari, Juazeiro, Mirangaba, Monte Santo, Oliveira dos Brejinhos, Pilão Arcado, Pindobaçu, Remanso, Santo Sé, Seabra, Sobradinho, Uauá, Umburanas), 255 associações de pequenos produtores rurais. Estas associações muitas vezes trazem na sua denominação o nome do fundo de pasto a que se referem. Este nome pode estar ligado ao uso comum de recursos hídricos, à figura daquele que foi pioneiro no uso dos recursos ou a sentimentos religiosos e ainda à alguma característica e beleza da terra. Assim, tem-se referências a aguadas, poços e nascentes, tais como: Fundo de Pasto Lagoa das Baraúnas, Fundo de Pasto Olho d’Água e Fundo de Pasto Lagoa do Anselmo. Tem-se também referências que denotam um sentido bíblico e que evocam a proteção de divindades tais como: Fundo de Pasto Nossa Senhora da Conceição, Fundo de Pasto de Bom Jesus dos Campos e Fundo de Pasto de Terra Prometida. Há referências que afirmam uma beleza perene da natureza, tais como: Fundo de Pasto Primavera e Fundo de Pasto Bom Jardim. Tem-se ainda referências a quem localizou ou abriu os recursos, assegurando seu uso comum, tal como no caso do Fundo de Pasto de Antônio Velho. Vale ressaltar que há associações que estão simultaneamente em duas ou mais redes de movimentos.

50 Para outras informações, consulte: C. A. Ricardo, “Quem fala em nome dos índios”, in Povos indígenas no Brasil: 1987/88/89/90, São Paulo, 1991. 51 Para mais esclarecimentos sobre esta questão, consultar documento intitulado “O fundo de pasto que queremos – política fundiária e agrícola para os fundos de pasto baianos”, Salvador, abril de 2003. 78

Isabel, coordenadora do Instituto Sociedade e Natureza (ISPN), ONG que vem desenvolvendo trabalhos e parcerias pelos cerrados, inclusive nos cerrados e região Matopiba, conta entraves e sutilezas no processo de reconhecimento político dos povos e comunidades tradicionais. “Há um ano atrás, fui numa comunidade [no alto do Rio Preto, oeste da Bahia] e perguntei pra a comunidade sobre o termo quilombola, e o que significava. Era uma reunião com pessoas de várias idades. Muitas deles se entreolharam e disseram que não sabia, e outras queriam dizer não, mas ficaram com vergonha. Aí eu perguntei se alguém sabia o que era, e um menino que estudava na cidade, bem safo, disse: “eu sei o que que é”. E explicou. E daí as outras pessoas fizeram ... ahhhhhh

Provavelmente eles podem ser uma comunidade quilombola, eles são negros, não sei, eu não gosto nem dizer por que essa questão da identidade é muito complexa” (ISPN, Entrevista realizada em 2018).

Para diversas comunidades, em áreas de difícil acesso, o termo “povos e comunidades tradicionais” e suas nuances é algo muito novo ou até mesmo desconhecido, e implica em profundas questões políticas. No “Instituto Sociedade, População e Natureza, há um cuidado de sempre dizer que o público é comunidades tradicionais, indígenas e agricultores familiares, porque tem muitas comunidades que são camponesas, que podem ser reconhecidas como tradicionais – ou não – depende do olhar, da identidade. Tem muita sutileza aí” (ISPN, 2018). E a partir de um trabalho político pode ser que eles se identifiquem, como os Gamela que tem ressurgido lá no sul do Maranhão e no Sul Piauí, mas especificamente na comunidade Sete Lagoas. “É necessário tomar muito cuidado, porque a partir do olhar do agronegócio, pode-se afirmar que eles nem sabem o que são. Que esse decreto 6040 é falso”. (Isabel, ISPN, Entrevista realizada em 20182018). O processo de reconhecimento e organização de algumas comunidades e luta por seus direitos ainda é longo.

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Quadro 1- Reconhecimento jurídico da terra dos povos e comunidades tradicionais do Matopiba

Fonte: retirado de Almeida (2004).

Sobre a questão da terra, no caso das comunidades tradicionais, o formato de terras “não-individuais” são uma possibilidade para a manutenção das comunidades. O loteamento e liberação da terra enquanto propriedade privada, livre para o mercado imobiliário acelera processos especulativos e/ou produtivos (como o avanço dos plantios da soja), expulsando e expropriando as comunidades tradicionais na região. Os movimentos sociais no campo, que desde às últimas décadas vêm se consolidando fora dos marcos tradicionais, conhecem desde 1988-1989 certos desdobramentos, cujas formas de associação e luta escapam ao sentido estrito de uma entidade sindical, incorporando fatores étnicos, critérios ecológicos e critérios de gênero e de autodefinição coletiva que concorrem para relativizar as divisões político-administrativas, sindicatos setoriais. 80

Tal multiplicidade de categorias cinde, portanto, com o monopólio político do significado dos termos camponês e trabalhador rural, que até então eram utilizados com prevalência por partidos políticos, pelo movimento sindical centralizado na Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura) e pelas entidades confessionais (Comissão Pastoral da Terra – CPT, Conselho Indigenista Missionário – Cimi, Ação Cristã no Meio Rural – ACR). Tal ruptura ocorre sem destituir o atributo político daquelas categorias de mobilização. As novas denominações que designam os movimentos e que espelham um conjunto de práticas organizativas traduz transformações políticas mais profundas na capacidade de mobilização destes grupos em face do poder do Estado e em defesa de seus territórios. Em virtude disto é que se pode dizer que mais do que uma estratégia de discurso tem-se se o advento de categorias que se afirmam através de uma existência coletiva, politizando não apenas as nomeações da vida cotidiana, mas também práticas rotineiras no uso dos recursos naturais (ALMEIDA, 2004, p.23).

O reconhecimento dessas comunidades, garante direitos e também coloca – mesmo dentro da política pública e do reconhecimento da identidade – a terra em disputa. A formação do Matopiba enquanto uma região disponível para a produção de mercadorias agropecuárias necessitou da formação de identidades locais com dificuldades de acesso à terra (ou sem- terra) para força-la ao caminho da mobilidade. As categorias de povos e comunidades tradicionais, quilombola, indígena e camponês carregam consigo cicatrizes do passo, abrindo cada vez mais espaço para a face de trabalhador rural – a imposição do trabalho na vida social. Grosso modo, o camponês seria o trabalhador rural autônomo e, portanto, com algum acesso à terra. Porém, raras vezes isso significa equilíbrio produtivo e autossuficiência, arremessando o camponês ao trabalho assalariado.

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CAPÍTULO II

TUTAMEIA E TRABALHO NA REGIÃO MATOPIBA

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2.1 Tutameia, mobilidade e exploração

Tutameia. Tuta e meia. Em qualquer de suas formas, ou de sua origem – ibérica ou africana – os sentidos são semelhantes: pequena quantia, bagatela, preço baixo, pouco dinheiro, pouco valor. Os dicionários Aurélio e etimológico de José Pedro Machado, entre outros, perfilham a definição de tuta-e-meia: quase nada, preço vil, pouco dinheiro, preço irrisório – advinda da expressão matuta e meia, originada no quimbundo mu'kuta. Era moeda de pouco valor na língua dos bantos (Angola). Cândido de Figueiredo, em "Falar e Escrever" (1954), além de apresentar esta hipótese, no entanto, admitiu outra, referindo-se a uma espécie de jogo de cartas espanhol chamado tute. Se a pequena quantia, que se arrisca nesse jogo, pudesse, por explicável adaptação chamar-se tute, poderia este termo explicar também a nossa tute ou tuta-e-meia: barato, econômico, pouca coisa, bagatela.

Uma tutameia é pouco pelo trabalho. O que o trabalho vale é o salário. A tutameia é o não salário, é a exploração a descoberto. O que você chama de palavra silenciada dos dominados é um apalavra clara [...] você captura a consciência do fazendeiro juntamente com a relação social que a sustenta, que a alimenta ‘ao receber licença (para plantar), deve-se licença’. [...]. A tutameia é a mediação que mostra ao trabalhador a um só tempo, o seu trabalho, a sua exploração, o seu explorador, o mundo novo do salário, a nova exploração que ainda não pode ser vista. [...] por isso é muito importante recuperar as relações sociais mais além das palavras com que são batizadas; há relações pagãs nesse universo do pequeno produtor – o revelado e o oculto, o transparente e o opaco, o visível e o invisível (MOURA, 2013, p.33).

Se o trabalho fosse uma aposta – assim como o capital fictício é – poder-se-ia dizer que o azar sorri mais para uns do que outros, onde o Matopiba configura-se como uma região na qual o capital captura o sobretrabalho do camponês, do indígena, das comunidades tradicionais, do trabalhador rural, expropriando-os sucessivamente e forçando-os a migrar.

Uma das facetas comuns às diversas populações rurais é sua face migrante. A mobilidade destas populações não é apenas consequência da invisibilização de suas condições de existência, mas é parte integrante de suas próprias práticas de reprodução, coerção e sobrevivência. A positivação da reprodução das populações do Matopiba a partir do trabalho antecede a titulação da propriedade, momento em que a violência e as cercas garantiam as formas desiguais de poder. Vale registrar que no documentário “Rota do Sal Kalunga” (2014), Catarina, senhora nascida em 1903 em Ipuerias (TO), conta que era uma tapuia, e não comia nada com sal. Na verdade, o sal não tinha grande relevância para os negros e indígenas, mas 83

tinha para os coronéis da região. O sal era uma mercadoria de troca necessária, buscada em Belém para satisfazer os fazendeiros e trocada por ferramentas, querosene e roupas que “pagavam” a viagem. Isso mostra, que os produtos alimentícios que eram produzidos e que circulam pela região também projetam as relações de poder, internas e externas que mediam as relações de trabalho52. Muitos que realizavam a rota do sal, que poderia levar até um ano, não voltavam53.

Essa dinâmica comercial, inclusive envolvendo o sal, também ocorria no Maranhão e Piauí. No Maranhão, a comunidade Gado Bravo, localizada em um dos riachos que abastece o rio Balsas, que até o final dos anos 1980 possuía cerca de 370 a 400 famílias. A dinâmica de produção da comunidade do Gado Bravo era na várzea do rio, com uma produção diversificada – laranja, tangerina, banana, abóbora, mandioca, e culturas anuais como arroz, feijão, milho e fava, além da farinha54.

Irmão, liderança sindical de São Raimundo das Mangabeiras e região, cresceu nesta comunidade. Sua família veio do Piauí e está na região do sul do Maranhão há algumas décadas. “Era muita gente em torno desse riacho, e ele ficava assim, tipo um braço do Rio Balsas e as terras muito férteis. Hoje a parte de cima, funciona o projeto Batavo. Não tinha transporte, descia de balsa, toda essa mercadoria. Têm muita gente oriunda dessa peleja, lá em Balsas. Ali era um celeiro de produção. Faziam o que chamavam de cambagem, no Porto das Caraíbas em Balsas, que era o pessoal de Parnaíba, o rio Balsas era trafegável, eles tinham uns barco que saia de Parnaíba e trafegava com sal, café´, iguarias, ia lá e fazia a troca. Eles deixavam uma carga de sal, açúcar, café, açúcar de pedra. Minha vó guardava, fazia um amarrado no açúcar e botava em cima, amarrado na beira da casa, em cima das trempe do fogão e eu ficava olhando aquele negócio bom, querendo... porque a gente adoçava com mel de rapadura. Café, suco de laranja, tudo que agente tomava era com rapadura, e o açúcar era só para coisa especial. Essas iguarias eram para o Piauí, mais especificamente para a região de Teresina, Bom Jesus, Piripiri. O que eles levavam daqui [do Maranhão] era farinha, feijão, arroz, arroz pilado, arroz pilado de pilão, eles levavam

52 Destaca-se aqui as cidades de Porto Nacional (TO) e Grajaú (MA) como portos importantes da comercialização do sal. 53 Assim como aqueles e aquelas que atualmente fazem a “rota do peão de trecho”, que passa pelo Maranhão, Tocantins e Pará e muitas vezes não retornam, são aprisonados por dívidas, doença e pauperização da condição humana para manter os processos de acumulação na fronteira, nas fazendas de gado principalmente. Sobre essa rota, ver trabalhos da Comissão Pastoral da Terra sistematizados por Xavier Plassat; os trabalhos de Alberto Pereira Lopes; e o documentário “Nas terras do bem virá” (2007). 54 Informações coletadas e observadas em trabalho de campo. 84

muito, aí levavam buriti em raspa, ai levava, jatobá, casca de pau, sucupira, semente de aroeira, o que mais, tinha muito nessa região e chás, chás medicinais... veredas, Piauí não tem vereda”(Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, Entrevista realizada em 2016).

A viagem é parte constitutiva da história desses trabalhadores, de suas famílias e comunidades, que viajam, saem e chegam à procura de trabalho, em busca de terra. “A mobilidade da força de trabalho tem sido condição de constituição da fronteira e a migração não é um processo dominantemente espontâneo” (BECKER, 1995, p.19). A mobilidade da mão de obra, segundo Bertha Becker, é requisito fundamental para o Estado controlar as ações sobre a fronteira. A existência de mão-de-obra em escassez na fronteira é um elemento atrativo para as ações das colonizações oficiais ou privadas. A utilização de mão-de-obra sazonal implica a necessidade de deslocamento de trabalhadores, através de um fluxo urbano- rural e rural-rural nas fronteiras. Para tanto, há necessidade de mão-de-obra não qualificada, como propugnava a legislação que priorizava a utilização de mão-de-obra nordestina (BECKER, 1995).

Tanto Gaudemar (1977) quanto Becker (1982) veem a mobilidade do trabalhador como um movimento forçado, consequência da roda viva que movem os moinhos capitalistas. No entanto, Gaudemar é categórico no emprego do termo mobilidade, afastando-se da característica de plasticidade da força-de-trabalho que Becker atribui aos processos de transformação da mão-de-obra no norte brasileiro.

Porquê utilizar o termo “mobilidade do trabalho”? Porque não falar do uso do trabalho? [...]A resposta é simples: o termo “uso” mantém-se demasiado vago em relação à minha procura de um conceito que designe a qualidade de força de trabalho sem a qual não haveria uso capitalista – isto é, produtor de mais-valia, valorizador do capital, numa palavra, produtivo – de força de trabalho. É certo que eu poderia ter adotado – desviando-os do seu sentido habitual – termos como elasticidade, plasticidade, flexibilidade, etc, muito em voga entre os economistas. Todos estes termos se eliminaram a si próprios, contrariamente ao de mobilidade” (GAUDEMAR, 1977, p.15-16).

A “elasticidade” designa a possibilidade de uma mudança de forma. Do mesmo modo, plasticidade evoca a possibilidade de tomar ou receber diferentes formas, mas conduz a uma passividade do trabalho, elimina suas evocações, os deslocamentos espaciais. “No fim das contas, só o termo mobilidade parece poder dar conta das diferentes aptidões exigidas à força do trabalho pelo seu uso capitalista produtivo” (GAUDEMAR, 1977, p.16). 85

Os homens e mulheres do campo não são livres por natureza, mas tornam-se livres num processo histórico, livres historicamente para “vender” sua força de trabalho. “A falsa ideia de liberdade nos leva a afirmar que ser móvel significa estar apto para os deslocamentos e modificações no emprego, na realização do trabalho abstrato, como também ser indiferente ao conteúdo do trabalho, tanto quanto o capital é” (HEIDEMANN, 2010, p. 30). Essa “liberdade”, na verdade, é o simulacro dos processos de violência, em grande medida estatal, encarregada de dilatar o sistema de mercadorias num primeiro momento, e num segundo momento de criar formas de valorização; abrir territórios; impor novas normas e formas de trabalho; direcionar fluxos migratórios e desarticular processos de resistências (ROUX, 2008).

Apesar da visão eurocêntrica-colonizadora de Harris55 (2017, p.70) ao afirmar que “ambos os lados obtinham vantagens nesse arranjo”: os trabalhadores seguiam com “suas viagens e o empregador sabia contar com uma fonte de trabalho barato”; é importante registrar que desertores e rebeldes, vistos como vadios, abandonavam empreitadas e atacavam fazendas, na qual grande parte era presa e reprimida. No caso de “vadios pacíficos”, vale frisar que estes também eram presos. Trabalhadores sazonais eram tidos como vadios em seus momentos de mobilidade e deslocamento entre as fazendas e empreitadas e presos. Assim, tais trabalhadores garantiam a mão-de-obra necessária nos momentos de safra, abertura de

55 Queixas acerca da vadiagem proliferam no final do século XVIII e início do XIX. Várias leis que tratavam do tema foram introduzidas naquela altura, buscando restringir todo movimento que fosse além dos limites da municipalidade de origem, muito semelhantes às leis inglesas do século XVII analisadas por Marx no capítulo XXIV do Capital, “A assim chamada acumulação primitiva”. Somente aqueles que portassem permissões e papéis para viajar poderiam fazê-lo e qualquer um que não constasse das listagens municipais poderia ser preso. Tais leis visavam não só o absenteísmo indígena, mas também ao crescente número de degredados de Portugal, pois em tentativa de aumentar a população da Amazônia. Apesar de interessantes apontamentos e reflexões sobre a formação da Amazônia, em especial o Pará, não concordo com as críticas realizadas sobre os “tapuais” e a posse da terra levantada por Harris, que ameniza algumas questões espaciais em prol dos movimentos de colonização, ao afirmar que algumas terras não estariam “disponíveis” e que “que a mobilidade do modo de vida de alguns índios fosse uma adaptação às condições que enfrentavam” (p.70). Ainda sobre a mobilidade da população, Sobrinho (2012) a partir dos estudos de Clodomir Morais mostrou como a crise de 1929 atingiu famílias baianas, e como foram implementadas algumas violentas estratégias para frear o esvaziamento demográfico. “Santa Maria da Vitória que, no meio século de seu aparecimento e 20 anos de seu entraria em plena decadência econômica e cultural. O esvaziamento demográfico era tão visível que, em 1938, mais de 40 casas (10% do total de prédios urbanos) estavam vazias e metade destes se arruinando a olhos vistos dado o abandono total. O intendente, ou prefeito municipal, coronel Clemente, com o propósito de conter ae fossem injustas as medidas desses editais bem como as de outros editais combatendo a vadiagem, elas se circunscreviam no entanto, dentro da lógica de dezenas e centenas de assalariados nas colheitas de algodão, sobretudo nas fazendas Mazangá e Lagoa da Tábua[...] .Cabe destacar que a dita empresa Araújo Castro e Cia pertencia ao intendente municipal, coronel Clemente de Araújo Castro. E os desmandos prosseguiam: Para um maior controle do fisco municipal a cidade foi toda cercada com 12 fios de arame farpado em grossos mourões de muçambé e aroeira.” (SOBRINHO, 2012 apud MORAIS,1987, p.79).

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novas frentes de expansão sem qualquer tipo de garantia de sobrevivência ou alguma condição de reprodução de sua própria vida.

No documentário “Aprisionados por promessas: a escravidão rural contemporânea no Brasil” (2006), sobre o trabalho escravo contemporâneo, um homem fala que seu objetivo não é trabalhar de fazenda em fazenda ... é ter uma terra. O trabalhador, à sua maneira, entende que está sendo explorado, e que a ideia de assalariamento, ou a promessa do trabalho também vem com uma arapuca, onde a mobilidade nunca é uma escolha, como apontado por Becker (1995; 1982) e Gaudemar (1977). Um trabalhador encontrado em uma fazenda numa operação documentada pelo filme supracitado suplica: “Porque minhas forças já estão se esgotando, eu tenho 34 anos”. No ano em que foi liberto, a expectativa de vida de um brasileiro era 72 anos. Além disso, diz que para ele, a liberdade é sinônimo de estar em casa, de estar fixado e não ter que sair: “Meu sonho é viver em casa, igual aqui[na fazenda], só que livre. A gente luta muito em sair de casa, e deixar a família da gente sofrendo. A gente saí obrigado.”

A violência física também é retratada na fala dos trabalhadores, em uma dimensão em que o trabalhador do campo se encontra em relações servis de trabalho. Um trabalhador na cidade de Ananás (TO), ao ser perguntado sobre a violência, conta que teve um homem que não queria cumprir o serviço e tomou um tiro na perna, disparado pelos “gatos” Raimundão e Anjo, que cuidavam das fazendas da região de Araguaína, Ananás e Santa Fé (TO) nos anos 1970 (LOPES, 2018).

Relatos mais recentes também mostram a violência como característica estruturante das relações de trabalho, como descreveu Lopes (2018) sobre um homem que passou 5 anos trabalhando em uma fazenda no norte do Tocantins. Além da falta de direitos, os trabalhadores ainda são atrelados as fazendas, numa relação que remonta o cativo da terra.

Nós passamos 5 anos trabalhando em uma fazenda, quando saiu o homem botou ele para fora alegando que ia vender a fazenda, e o que ia comprar talvez não quisesse ele trabalhando porque ia derrubar tudo. Ai o fazendeiro trouxe uns papeis pra ele assinar, depois que ele assinou o fazendeiro disse que ele tava assinado como abandono de serviço. Ai ele não recebeu direito nenhum. Ele não foi atrás porque ficou com medo, porque no tempo que nós trabalhava para esse fazendeiro, ele soube que ele já tinha matado um. [...] Durante esses cinco anos nunca recebeu férias nem decimo terceiro. ele recebia novilha. E depois por fim nada, ficou dois meses sem pregar. Depois de 4 anos deixados pra trás foi ele que assinou a carteira, só tinha um ano assinada, ai deu baixa como abandono de serviço na carteira (LOPES, 2018, p. 252).

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A pele que sua, que caminha, que migra tem cores determinadas para destinos incertos. Margarida Moura analisa criticamente, em “Os Deserdados da Terra” (1988), a construção da imagem da população camponesa negra e indígena como moribunda, verminada, alargadora de desertos que resistiu à mingua, e que compõe a base a força de trabalho de região.

Irmão, de feições da mescla do sertão negro e indígena, liderança sindical dos trabalhadores assalariados de São Raimundo das Mangabeiras no sul do Maranhão, conta a história de sua família, que acompanha as transformações das formas de acumulação, da terra e do trabalho.

“Eu sou filho de vaqueiro, massacrado. Nós não tinha terra, trabalhava naquela comunidade, fazenda Irajá, o dono é o Luís Pires, dono de fazendas no Tocantins e Pará também. Meu avô morou lá, meu pai nasceu lá, e morreu lá, num acidente de trabalho. Aí por isso a gente teve que migrar pra cidade. Mamãe ficou viúva, e o fazendeiro precisava de um vaqueiro e minha mãe não ia dar conta da lida [...] Eu já tinha o traquejo porque eu tinha acompanhado meu avó muito tempo. Meu velhinho, morreu no campo. Veio lá do Piauí, morrendo de fome lá da região Oeiras.

Lá foi assim. Eles sofreram muita perseguição. Escravo néh. Tiveram uma invasão nas terras dele lá. Houve um cerco muito grande e começaram a fazer isso na região de Oeiras, Ipueiras, Itauerias, Piripiri. E aí vieram para o Maranhão. De a pé mesmo. Quarenta e poucos dias. Saíram retirando... ele mais quatro irmão, por causa do roubo das terra. E os outros ficaram lá pelejando na resistência, mais meu bisavô. Isso foi em 66, 68. Eles vinham pra cá. Floriano, Timon, Paraíbano ... Pegava a rota do carro de gado. Ele contava muito de uma guerra. A guerra dos Balaio56” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, Entrevista realizada em 2016).

56 É temporalmente inviável que seu avô tenha participado da guerra, mas é interessante a menção da guerra na memória do avô de Irmão. A Balaiada, que ocorreu entre 1838 e 1841, foi um dos maiores movimentos de rebeldia da região do Maranhão e Piauí, no qual os balaios (vaqueiros, artesãos, lavradores, escravos, mestiços, mulatos, sertanejos, índios e negros), sem direito à cidadania e nem ao acesso à propriedade da terra, buscavam o fim de novas arbitrariedades instituídas pelas oligarquias regionais, além do fim de recrutamentos violentos. A Balaiada prescinde a lei de Terras de 1850, deixando os balaios a margem da propriedade privada da terra e da Guerra do Paraguai, na qual muitos foram convocados. Sobre a Balaiada, ver o mapa disponível em https://atlas.fgv.br/marcos/o-imperador-menino-e-os-regentes/mapas/maranhao- e-piaui-sob-balaiada . Acessado em 14/08/2018. 88

A família de Irmão, após seguir a rota do carro de gado, passa pelas cidades piauienses de Floriano, Paraibano; chega no sul do Maranhão por Timon e Pastos Bons, um local de belos campos abertos, clima suave e abundância de nascentes e rios perenes que se localiza rumo ao ocidente para os nordestinos que fugiam do coronelismo, dos conflitos e da seca no Nordeste. No entanto, as relações coronelistas continuaram após a chegada no sul maranhense, nos trabalhos de montagem dos engenhos de cana-de-açúcar.

“Aí ele resolveu vir-se embora com a família Coelho, que vieram daqui do São Felix, daqui de Balsas, e levaram eles pra lá. Aí se aterrizaram em Balsas pra trabalhar com esses Coelho e logo depois veio os Pires, que também é da mesma região daqui de Batateria, daqui de Loreto. Aí foram lá pra Balsas. Escravo era acostumado a ter dono. Ali levaram ele para o Pará, depois pra Bahia, achou minha avó lá, que vinha do Rio Grande do Norte correndo da fome. Ai minha avó não tem descendência, não conheço a história de minha avó [...] Meu avô me pegou, e ficou botando as fazendas do Pires aqui pela região e eu fiquei acompanhando ele, a gente tava sempre na lida (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, 2016).

O caminho é trilhado em busca da terra, um local para assentar-se, permitindo a reprodução da família. As relações camponesas, mediadas pela relação de trabalho na terra, assumiam em geral três formatos: agregado, que moram e trabalham na fazenda; pequenos sitiantes que tem permissão para fazer a roça dentro da fazenda, e mantem alguma autonomia nas terras de seus sítios; e posseiros, que plantam e vivem nas terras devolutas e que se veem ameaçados e invadidos pela fazendeiro (MOURA, 1988). A partir deste conceito pode-se correlacionar algumas tipologias dos fluxos de migração, trabalho e tipo de atividade agrícola.

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Quadro 2 - Mobilidade do trabalhador de acordo com tipo de propriedade e relação de trabalho na região Matopiba

Tipo de propriedade Formas de trabalho Tipo de fluxo de migração Proprietário de Independente, Experiência de produção pequena propriedade conhecimentos de técnicas agrícola e recursos variados com (variado) investimento.

Terras devolutas e Independente. Mobilidade e Fluxo itinerante com propriedade culturas sazonais experiência e sem recurso financeiro

Média ou grande Diversificada – parceria, Fluxo com pouca experiência e propriedade de meação, trabalho assalariado sem recurso financeiro colonos e posseiros sazonal ou permanente

Grande propriedade e Trabalho assalariado. Experiência de produção fazendas independente variada (Nenhuma, baixa, alta) e sem recursos financeiros

Organização própria. Baseado em ALMEIDA e DAVID (1981) e BECKER, (1982).

Vê-se que história da família de Irmão é uma metonímia das transformações das formas da propriedade da terra, trabalho e mobilidade da região Matopiba. Seu bisavô, avô e seu pai trabalharam nas fazendas em troca da permanência na terra, por um quintal que possibilitaria o plantio para a família. Irmão, quebra a corrente, ao conseguir um lote em um assentamento após anos de luta junto ao STTR de Balsas e São Raimundo das Mangabeiras. No entanto, mesmo após a conquista do lote segue como trabalhador rural nas fazendas de cana-de-açúcar e soja principalmente.

“Aí me deram um caminhão e eu fiquei prestando serviço para as fazendas de soja. E eu lutando por aquela comunidade e não tava dando certo. Ai quando eu fui apresentado pela comunidade pra ser delegado sindical lá do assentamento Bacuri. La são 88 famílias, mas hoje lá tem 66, numa área de 6.646 ha. Aí eu comecei, aí no assalariamento. Aí sofria duas vezes: no assalariamento e no campo. Quatro meses eu puxava soja, (maio, junho, julho e agosto) e deixava o caminhão lá e vinha cuidar da lavoura. Fazer o roçado, e terminava de colher” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, Entrevista realizada em 2016). 90

Os camponeses, mesmo que já estejam assentados, dependem financeiramente do trabalho assalariado na “serra” – expressão para se referir as áreas de chapada onde atualmente localizam-se as fazendas de soja. O tempo do plantio, feitura da farinha de mandioca e venda – esta última muitas vezes demora a se realizar – faz com que o trabalho nas fazendas seja uma solução monetária mais rápida, como indica o trabalho realizado pela CDVCH/CB e CPT em 2017. Nas fazendas, costumam-se realizar serviços de derrubada, roço e juquira e catação de raiz e operação de máquinas. Há relatos do ano 2000 no qual os trabalhadores ganhavam R$600,00 por 40 dias de trabalho com jornadas diárias das 6h às 20h. Atualmente, as diárias giram em torno de R$ 50,00.

Foto 6 - Acampamento Irmão Dorothy, Arraias (MA)

Fonte: Fotos da autora, 2012.

Nesta situação degradante encontram-se diversos camponeses dos Assentamento Grotão e Babaçu (localizados em Axixá), Assentamento Santa Maria (em Nova Colina), Assentamento de Porto Nacional (onde ocorreu uma reintegração de posse em maio de 2018), Acampamento Dorothy (Arraia), Assentamento Gabriel Filho (em Palmeirante), dentre outros na região do Matopiba57.

E quando você acha um serviço, é uma diária, duas ou três, e não dá. E é por isso que as pessoas buscam recurso fora, porque ainda não tá dando pra sobreviver da terra. A gente tá aqui ilegal, porque a terra ainda não foi legalizada, e por isso a gente não pode montar um negócio, notar uma granja de galinha, fazer um criatório de peixe (CDVCH/CB e CPT, 2017, p. 57).

57 Seria fundamental investigar as formas de resistências e modos de vida dos camponeses do Matopiba de forma mais atualizada e aprofundada. Neste sentido, indico os trabalhos já citados na nota 12. 91

De acordo com o artigo 149 do Código Penal brasileiro, trabalho em condição análoga ao de escravo se caracteriza pelas seguintes características: a) trabalho degradante: conjunto de condições no ambiente de trabalho que expõe os trabalhadores a riscos para sua segurança e saúde; b) jornada exaustiva: é aquela jornada de trabalho que não possibilita ao trabalhador se recuperar no intervalo de descanso entre uma jornada e outra, seja pela quantidade excessiva de horas ou pela característica da atividade; c) servidão por dívida: quando o trabalhador é mantido no trabalho para pagar uma dívida fraudulenta contabilizada pelo patrão ou pelo aliciador, seja com adiantamento, deslocamento, alimentação ou equipamentos de proteção individual; d) trabalho forçado: quando o trabalhador é impedido de deixar o trabalho por coação, ameaças, violência, retenção de salários ou de documentos (CDVCH/CB e CPT, 2017, p.17). Segundo a OIT (2007), os trabalhadores aliciados se dividem entre moradores da região, peões de trecho e trabalhadores imigrantes.

A partir dos mapas e os estudos desenvolvidos por Alberto Pereira Lopes sobre o Tocantins (2018), é possível afirmar que a rota do trabalho escravo acompanha o traçado da Belém-Brasília, passando por Arraias, Dianópolis, Almas, Santa Rosa do Tocantins, Porto Nacional, Miranorte, Guaraí, adentrado depois todo o Bico do Papagaio. Além disso, o estado conecta rotas entre o norte e o nordeste, sendo local de parada para trabalhadores que se deslocam entre os estados do Maranhão, Piauí, Bahia e Pará. Ainda sobre as rotas dos trabalhadores da região Matopiba pode-se inferir, a partir de entrevistas e observações de campo, que os maranhenses se deslocam para o sul e sudeste do Pará, Bico do Papagaio no Tocantins, sul do próprio estado do Maranhão, norte e sul do Mato Grosso, sul de Rondônia e oeste da Bahia. Aqueles e aquelas de origem piauiense se deslocam para o sul/sudeste do Pará, Bico do papagaio, sul do Maranhão, norte/sul do Mato Grosso, sul de Rondônia e oeste da Bahia. Os baianos e baianas migram para o sul de Rondônia, centro-norte e centro-sul do Mato Grosso, sul do Pará, sul do Maranhão, e internamente para o oeste do estado. O Tocantins, estado com os maiores índices de trabalho escravo contemporâneo, tem como principais rotas de destino o próprio estado, principalmente o Bico do Papagaio, sul do Maranhão, norte e sul do Mato Grosso, sul de Rondônia (LOPES, 2018).

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Tabela 1 - Perfil dos Trabalhadores Resgatados – Brasil (2003 a 2017)

ESTADO RESIDÊNCIA ORIGEM % RESIDÊNCIA % ORIGEM Maranhão 6428 8001 18,40% 22,90% Tocantins 3047 3394 8,70% 9,70% Bahia 2082 2907 6,00% 8,30% Piaui 1553 2022 4,40% 5,80% Fonte: Registro do Seguro-Desemprego 2003 a 4/2017. Compilação dos dados realizada por Xavier Plassat (CPT/TO).

Os estados do Matopiba, conhecidos como fornecedores de mão-de-obra para as redes de escravidão contemporânea somam 46,7% dos trabalhadores regatados no período entre 2003 a 2017 no Brasil. Maranhão e Piauí também sitiam locais de trabalho escravo em função do avanço do agronegócio no Maranhão, e em atividades tradicionais, como extração de cera de carnaúba e carvoarias em território piauiense (CDVCH/CB e CPT, 2017, p.20). Computando apenas as denúncias de condições degradantes de trabalho (situações que colocam em risco a saúde e a vida do trabalhador, jornada exaustiva, trabalho forçado e servidão por dívida) recebidas pela Campanha da CPT e os demais casos que, quando fiscalizados, revelaram a existência de trabalho escravo, para 2016, foram contabilizados 98 casos de trabalho escravo, envolvendo 968 pessoas. Em 2015, registrou-se 120 casos, envolvendo 2.321 pessoas. Destes trabalhadores, 718 foram libertados em 2016 (contra 895 em 2015). Os setores de atividade afetados por trabalho escravo foram majoritariamente rurais: 70% dos casos e 72% dos resgates, com predominância na atividade pecuária.

As fazendas de pecuária e soja são os principais destinos do trabalho escravo, sendo possível traçar um paralelo entre os destinos do trabalho escravo e as áreas de expansão da fronteira no país. Vale aqui registrar que o Brasil é o maior exportador de carne do mundo, sendo a carne exportada desta conhecida como aquela com um dos menores custos de produção mundial, baseada na apropriação indevida de terras e no trabalho escravo, consequência do avanço de uma violência estrutural contra as comunidades rurais empobrecidas historicamente ocupantes das terras cobiçadas pelo agronegócio. A violência do “sistema da pistolagem”, da “conduta do sertão”, do branco, do homem, a violência política e do letramento. Uma violência agrária, costumeira, material e simbólica, presente nas dinâmicas das relações de dominação e poder, incorporada às relações de trabalho na 93

agricultura desde o período escravocrata. No oeste baiano, destacam-se também as fazendas de algodão, bem como no sul maranhense a cadeia de eucalipto também registra casos de trabalho escravo.

A partir dos dados disponibilizados por frei Xavier Plassat, membro da Comissão Pastoral da Terra do Tocantins organizados a partir das bases de dados do MTE e da própria CPT encontra-se 92 estabelecimentos agropecuários cuja atividade está relacionada a pecuária e a soja no Matopiba, sendo 18 fazendas relacionadas à soja:

Tabela 2 - Fazendas de soja e trabalho escravo no Matopiba (2003-2017)

Nome das Fazendas Município Ano

Agropecuária e Industrial Serra Grande Ltda São Raimundo das Mangabeiras 2009 (Fazenda Agroserra) (MA)

Fazenda Carajá Balsas (MA) 2010-2011

Fazenda Carolina do Norte Alto Parnaíba (MA) 2006-2009

Fazenda Califórnia Antônio Almeida (PI) 2011-2012

Fazenda Lírio Antônio Parisotto Uruçuí (PI) 2009-2011

Fazenda Progresso Uruçuí (PI) 2009

Fazenda Cosmos Ribeiro Gonçalves (PI) 2008-2010

Zona Rural de Ribeiro Gonçalves/PI Ribeiro Gonçalves (PI) 2012

Agropecuária Caracol (Fazenda Caracol) Cachoeirinha (TO) 2011

Carlos Henrique de Almeida / Agropecuária Caracol Cachoeirinha (TO) 2006-2007 Ltda (Fazenda Caracol)

Fazenda São Sebastião Darcinópolis (TO) 2005

Fazenda Angico Campos Lindos (TO) 2010-2011

Fazenda São Simeão Campos Lindos (TO) 2004-2012

Fazenda Itália I Presidente Kennedy (TO) 2006-2010

Fazenda Minas Gerais II Presidente Kennedy (TO) 2010-2012

Cia Melhoramentos do Oeste da Bahia (Fazenda Formoso do Rio Preto (BA) 2009-2012 Estrondo)

Fazenda Nossa Senhora Aparecida Formoso do Rio Preto (BA) 2010

Fazenda São Francisco São Desidério (BA) 2010-2011

Fonte: CDVCH/CB e CPT (2017).

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Entre 1995 a 2017, foram registrados 324 casos envolvendo 6392 trabalhadores e libertando 3044 de situação escrava no Tocantins. Ananás (25), Araguaína (22) e Arapoema (16) – todas localizadas no norte do Tocantins – foram os municípios que registraram maior número de casos. No Piauí, foram registrados 57 casos envolvendo 1406 trabalhadores no mesmo período, sendo 29 casos em municípios da região Matopiba. Os municípios de Uruçuí (4), Monte Alegre do Piauí (3) e Corrente (3) – todos localizados na região do Matopiba – são aqueles que registraram maior número de casos para o estado piauiense. Os municípios maranhenses da região do Matopiba registraram 220 casos de trabalho escravo no período de 1995 a 2017, concentrando 59% dos casos no estado. Açailândia (100), Itinga do Maranhão (13) e Balsas (11) são os municípios onde foram registrados os maiores números de casos da região Matopiba. No período analisado, somente em Açailândia, foram encontrados 608 trabalhadores escravos em operações que envolveram 2624 trabalhadores. O oeste da Bahia concentra 71 do total de 105 casos para o período aqui analisado, envolvendo 4296 trabalhadores. São Desidério (16), Formosa do Rio Preto (12), Correntina (9) e Barreiras (9) são os municípios que concentraram um maior número de casos (CPT, 2018).

A mobilidade do trabalho estabelece fluxos migratórios intermunicipais, que se apoiam sobre a ação de arregimentadores locais, conhecidos também como “gatos”. Em relatos sistematizados pelo Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos Carmen Bascarán e Comissão Pastoral da Terra, um “gato” admite que contrata mão-de-obra para as fazendas de soja do sul piauiense e que existem relações de apadrinhamento e camaradagem estabelecidas entre ele e os fazendeiros. Essas relações também são estabelecidas entre o “gato” e os trabalhadores, que muitas vezes ficam agradecidos pelo emprego, mesmo que precarizado. Foram relatadas situações em que o trabalhador tem uma jornada das 6hs às 20hs, algumas vezes podendo ir até as 23hs. No norte do Tocantins, foi-me relatado em uma entrevista de campo a história de um “gato” que recebeu terras da Agrifirma em um assentamento em Santa Fé do Sul. Quem contou a história foi sua mulher, devota da igreja de Muricilândia, que ao perceber minha curiosidade sobre as relações entre o “gato” e a aquisição das terras, prefere mudar de assunto. O “gato”, a figura do aliciador, de um gerente da mão-de-obra pode ser visto muitas vezes com apreço pelos trabalhadores, como “o trabalhador que deu certo”, tendo alcançado uma posição de trabalho, poder e remuneração melhor. Geralmente é um homem que conhece todas as pessoas nas comunidades, bem quisto e comunicador. 95

Irmão descreve que trabalhou diversos anos como motorista transportando grãos para a fazenda Agroserra. Trabalhou também como assalariado na fazenda Parnaíba, quando era muito jovem.

“Dava muita raiva. Eu era muito revoltado, quando eu olhava de lá, porque a fazenda Parnaíba é de cima de uma serra, e abaixo assim, era o vão onde meus familiares ficavam. O setor agropecuário cresce muito, porque a região pecuária aqui do sul do Maranhão é nesse trecho mesmo: Fortaleza dos Nogueira, Nova Colinas, São Pedro dos Crente, Formosa, Grajaú. E eu ficava muito revoltado... rapaz, esses caras tomaram tudo” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, Entrevista realizada em 2016).

Há décadas os camponeses brasileiros vêm sendo submetidos a um tempo de uma agricultura que o expulsa das terras ou quando termina as épocas de colheita e plantio. Se no século passado as migrações eram feitas a pé, o desenvolvimento dos transportes, a transformação da agricultura – agora espacialmente mais complexa – alargaram os fluxos migratórios. As rotas guardam semelhanças com os caminhos migrantes do século XIX e XX, apesar de atualmente o trabalho assumir novas formas e conteúdo: os atravessadores já não necessitam aprisiona-los ou compra-los por dúzia nas prisões, pois “os próprios camponeses vão aos campos agrícolas por conta própria e, às vezes pagam sua viagem” (BARTRA, 2011, p.81). A figura do “gato” muda de nome e se diversifica: gerente, aliciador, ou até mesmo desaparece, onde a própria fazenda terceiriza (via contração ou criação de uma empresa de serviços) a contratação da mão-de-obra.

Há diversas nuances entre trabalho escravo e trabalho assalariado. Bolivar Echevería (2010, p.09) quando discute a questão do trabalho e escravidão a partir de Marx aproxima os dois conceitos:

Por eso Marx llamaba a la forma capitalista de extraer el excedente, un esclavismo moderno. Para él, el trabajo asalariado es una forma más de esclavitud, que se da sobre una base técnica estaría ahí justamente para eliminar la esclavitud y la explotación del hombre por el hombre.

Discordo da aproximação entre o trabalhador assalariado e o escravo. O conceito de trabalho desdobra-se a partir de relação com a natureza em uma forma determinada de relação com a natureza mediada pela propriedade privada passível de compra e venda. Ressalte-se que o tempo de vida do trabalhador torna-se, desta forma, uma propriedade privada, que não podendo ser vendido como um escravo – uma mercadoria em si – é vendida 96

em unidades de tempo abstrato “contratualmente” e precariamente negociada. Apesar das péssimas condições de trabalho descritas no conceito de trabalho escravo da OIT, da escravidão aparecer nas falas do entrevistado ou até mesmo anteriormente, nas relações de trabalho não-assalariadas, como por exemplo nos casos que relatamos a partir do trabalho da CPT ou presentes em entrevistas, na qual o avô de Irmão que trabalhava nos engenhos de cana-de-açúcar em troca de estadia, comida e um pedaço de terra, as mediações entre trabalho escravo e escravidão são diferentes. As situações de superexploração acontecem na esfera salarial e dizem respeito às ocorrências em que as horas de trabalho não pagas e precárias condições de trabalho e moradia (CPT, 2015).

Vários dos casos confundidos com escravidão diziam e dizem respeito [...] a formas de terceirização do trabalho – de transferência das responsabilidades trabalhistas aos próprios trabalhadores – que estão se difundindo rapidamente na indústria e também estão ocorrendo no campo [...] Essa modalidade de cativeiro, portanto, se insere perfeitamente na lógica da empresa capitalista moderna. [...] os trabalhadores, mesmo os organizados em sindicatos, vão se convencendo de que mais importante do que salários é o emprego, o que vai gerando uma classe trabalhadora politicamente débil e impossibilitada de lutar por seus direitos. (HEIDMANN, TOLEDO, BOECHAT apud MARTINS, 2014, p.63)

“Eu vejo a questão do trabalho assim, é relativo. Trabalhei muito nessa fazenda Agroserra, na fazenda Santa Luzia, como assalariado. Trabalhei lá na Fazenda Parnaíba, na SLC. Então, se eu puder hoje – eu sou assentado da reforma agrária – tirar no campo, produzir minha própria renda, eu não vou precisar sujeitar a esses companheiros. Eu sou do secretariado do sindicato e a gente luta bastante para melhoria das condições de trabalho no campo. Mas os patrões usam todo tipo de artimanha para tirar direito do trabalhador. Todo tipo de artimanha. Escraviza. Porque hoje a escravidão é moderna. Você vai pra Agroserra você entra. Pra você sair, você não sai. Então, você fica sujeito a condição de trabalho que pra mim não é muito diferente da escravidão. Tem uma frase assim que eu visualizo dita pelo pessoal da Cáritas, na Diocese, na CPT: pior que você não arranjar trabalho é não poder sair dele. Porque disso? Porque não tem outra oportunidade. O povo maltrata de todas as formas. As escalas de trabalho, a jornada de trabalho, a não compreensão das entre jornadas, transporte não é muito legal, a falta de diálogo dos encarregados com o trabalhador. Mudança de função sem mudança de registro. Tudo isso acontece né?! Pra mim tudo isso é ruim. A gente já fez denúncia. Os camaradas vêm, mas parece que alguém no dia da fiscalização alguém avisa porque tá tudo bonitinho” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, Entrevista realizada em 2016). 97

A fiscalização do Ministério do Trabalho ocorre, em geral, a cada dois anos, dificultando o andamento e autuação das denúncias. A contratação sazonal conduz a dispersão dos trabalhadores, reduzindo sua chance de trabalhar sempre para o mesmo patrão. Isso impede que eles se conheçam e estabeleçam encontros mais duradouros e frequentes, dificultando a organização dos trabalhadores rurais assalariados para qualquer tipo de reivindicação. Por outro lado, à medida que se acentua a organização empresarial ou que se consegue reunir uma “turma” eficiente de trabalho, a dispersão se torna menos conveniente.

Concluí, a partir de diversas entrevistas e observações de campo, que os trabalhadores que se destacam como corpos constantemente produzidos como dócil politicamente e útil produtivamente (Gaudemar, 1977) são mais disputados pelas empresas. As primeiras empresas que se instalaram no Matopiba, como a Bunge, realizaram treinamentos para formar uma mão-de-obra local para as tarefas de menor complexidade, já que os cargos de gerência eram e ainda são ocupados por homens do sul e sudeste do país. Essa mão-de-obra local formada (ou formatada) pela Bunge acaba sendo remanejada para unidades mais distantes, acompanhando o movimento de expansão da empresa no Matopiba, principalmente entre 2000-2010 ou trabalhando para outras empresas, como Cargil e Algar. Além das empresas que seguem oferendo cursos de capacitação, a maioria dos Institutos Federais, SENAI e STTR’s do Matopiba atualmente também prestam tal serviço58.

58 Algumas fazendas, como a Fazenda Santa Luzia que visitei, também possuem alguns incentivos e programas de formação e educação. No caso de funcionários que querem cursar o ensino superior, a empresa auxilia com parte da mensalidade da faculdade. Além disso, a fazenda auxiliou na construção e manutenção de uma escola. De acordo com o gerente da fazenda, eles interveem na vida dos trabalhadores desde a família. “A gente começa a preocupar se o filho está na escola, se sociabiliza e te torna uma família. A gente sabe que está contribuindo com o emprego, mas sabe que é pouco. A gente tem uma outra empresa, ligada a fazenda, a Luxxo, que criou uma escola em São Francisco do Azeitão. É um município no Maranhão que ficou entre os 10 piores IDH, 100km daqui da gente. O nosso objetivo é também que as pessoas da região se desenvolvam, e não só a empresa.” (Entrevista de campo realizada em 2016).

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Foto 7 - Instalação, refeitório e transporte dos trabalhadores rurais

Fonte: Fazenda Santa Luzia, São Raimundo das Mangabeiras. Foto da autora, 2016.

Ainda sobre o trabalho nas fazendas de soja, encontrei nos relatos dos trabalhadores descrições sobre as condições dos barracões. Os trabalhadores de cargos mais baixos, dormiam numa maloca de lona. Aqueles que tinham um cargo mais elevado dormiam em um barracão de alumínio. Em geral, a alimentação era ruim. As jornadas na lavoura iniciam as 5hs da manhã, com horários de almoço e descanso entre as 11h-13hs. Em geral a jornada termina as 18hs. A presença de seguranças e capatazes, termo comumente utilizado na região até hoje, era frequente nas fazendas. Os capatazes vigiam para que o trabalho seja realizado e que os trabalhadores não desçam para os ‘baixões’ ou para a cidade. Há relatos de trabalhadores que não conseguiam deixar as fazendas de soja. Em geral, o regime de trabalho é de 30 dias na fazenda e 3 dias na cidade, após receberem o pagamento.

“E tinha as tarefas59. Eles colocavam lá pra gente cumprir, a largura da grade do trator, 2km. Lá e volta. Na cata de raiz. E no plantio da soja era assim também, vai lá e volta. Quando terminar já tava liberado. Mas não tinha homem no mundo que terminava aquilo ali as 15h, 16hs. Se não tirar essa tarefa, a diária não fica completa. Na época que eu entrei lá, bem no começo do real em 1994 era 25 centavos. Vinte e cinco centavos de real a diária. Era terrível. Catando pedra, catando raiz. Quando era na planta mesmo a gente ia na enxada catando erva daninha, catando moita, catando tudo. Não tinha equipamento nada, não tinha enxada, a gente que tinha que levar tudo. Ai, quando surgiu essa questão da legalidade, do

59 A medida da tarefa é extremamente variável. Nesta mesma entrevista, Irmão aponta que a tarefa para sua roça uma linha, 250m x250m. Até a tarefa do agronegócio é mais “arrochada”, para extrair o máximo do trabalhador. 99

trabalho escravo, aí ele quiseram dar botina, das uniforme, facão, a enxada; fizeram mais um alojamento.

Quando fizeram esse arranjo assinaram a carteira de alguns. Nessa época, nunca apareceu o Ministério do Trabalho por lá. Foi quando eles levaram o Globo Repórter lá, eu me lembro. Logo uma semana depois chegou um gerente lá, fizeram uma reunião e começou a terceirização de todo o serviço braçal: a matação do gado, tiração de leite, a comida, e os trabalhos braçais era tudo terceirizado. Era um gato, com uma indumentária legal. Que que eles faziam: pegavam um corpo administrativo, a empresa assumia, lá da fazenda Parnaíba mesmo, assinava a carteira e aí beleza. Os outros, ele terceirizava e pagava o gato. Ai o gato, pagava de conta do galpão, tinha uma cantina, essa cantina aí fornecia o fumo, a cachaça, caderno, e biscoito, suco, café, açúcar. Tinha muito dos cabra que quando ia tirar o dinheiro dele num tinha mais nada. Quando ele pegava um biscoito o cara anotava dois” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, 2016).

Na fazenda Agroserra, as condições de trabalho eram bem semelhantes as condições descritas por Irmão na fazenda Parnaíba. Irmão relata que quando trabalhou lá, de 2003 a 2006, transportando os trabalhadores para a catação, que o dormitório consistia em malocas de lona e havia muitas cobras. Duas pessoas chegaram a morrer. Além disso, um caminhão que levava os trabalhadores dos baixões até a serra virou e 16 trabalhadores morreram. “Aí a notícia correu pra todo lado. Veio o pessoal da Delegacia Regional do Trabalho de Imperatriz. Morreu um tio meu, tio Gerson. As famílias até hoje nunca receberam nada. Muitos não tinha carteira assinada. Tinha um que já tava com uns 45 dias trabalhando lá. Aqueles que já tavam mais antigo, como o seu Raimundo, que até hoje trabalha lá e sobreviveu nesse acidente tem carteira assinada. Então ele recebeu todo o apoio da empresa” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, Entrevista realizada em 2016).

O Sindicato de São Raimundo das Mangabeiras entrou com uma ação no Ministério do Trabalho contra a Agroserra, já que não havia sido feita nenhuma dos órgãos públicos a empresa. A fazenda foi notificada e penalizada até 2012, tendo que cumprir normas, respeitar direitos trabalhistas e pagar multas. “Prenderam o cara da cantina, tomaram os cadernos dele. O gato foi embora e até hoje ninguém sabe o paradeiro dele. A partir daquele momento, o Ministério Público reconheceu o Sindicato de São Raimundo das Mangabeiras e o Sindicato começou a fazer trabalho de formação e acompanhanmento lá dentro” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, Entrevista realizada em 2016). 100

Já a fazenda Santa Luzia, dos mesmos donos da fazenda Serra Vermelha, adotam outras artimanhas. De acordo com entrevista de campo feita com o gerente da fazenda em 2016, há 46 trabalhadores fixos e na época do plantio o número de trabalhadores da fazenda chega até cerca de 100.

Há uma guarita na entrada da sede, que fica a nove quilômetros da sede, que vigia a entrada e saída de todas, chegada de fiscalização e de órgãos do governo.

“Então toda vez que chega alguém lá na guarita, precisa se identificar. Quando se identifica, aí automaticamente ele já passa o rádio, pra fazer toda a ação. Por que que eu sei disso? Porque as pessoas lá me dizem, os trabalhadores. Tem muito trabalhador lá sem carteira assinada. Os trabalhadores utilizam a aplicação de veneno sem EPI [Equipamento de Proteção Individual]. As pessoas contam e eu vivenciei isso lá. Tem um caminhão lá que chama espanta cão – peão é um bicho que bota perigo nas coisas. Um caminhão que não tem cabine, só tem uma carroceria interna. Ai quando ele funciona, tá chegando alguém. Ele bota todo mundo dentro do espanta cão e desce pra beira do cerrado. Ai fica lá na fazenda só os homem e os que tem carteira assinada”.

O mesmo ocorre nas fazendas de soja da Região de Uruçuí (REIS, 2010, p. 90) e em Campos Lindos (TO) relatado por um trabalhador: “No dia em que sabia que o Ministério subia com a caminhonete, eles cobriam meus amigos com um plástico. Eles ficaram o dia todinho debaixo daquele plástico, e os patrões vazavam no mundo. O fazendeiro ia embora deixando eles tapados com o plástico [...] Mas eles [os trabalhadores] nunca deram parte” (CDVCH/CB e CPT, 2017, p.47).

Há, nas fazendas, uma diferenciação salarial entre os ‘fichados’ e ‘não-fichados’. Para quem não tem carteira assinada são as oito horas da jornada regular, mais duas horas extras. Quem tem a carteira assinada, respeita-se as Convenções Coletivas de Trabalho (CCT) e os Acordos Coletivos de Trabalho (ACT). O trabalhador que tem a carteira assinada não pode ganhar menos o salário base instituído em cada safra. Quem não tem carteira assinada não recebe o seguro, o FGTS, o INSS, “e precisa trabalhar 10 a 12 hs e também trabalho noturno. Nós já denunciamos, mas a gente não sente essa firmeza do Ministério do Trabalho”.

Na Fazenda Santa Luzia, onde em 2015 foram plantados 5mil ha de soja, 1 mil ha de milho e haviam 2 mil cabeças de gado, não é possível visitar ou realizar atividades ligadas 101

ao sindicato na época de colheita, dificultando a realização de denúncias e comprovação de que a fazenda apresenta irregularidades no trato trabalhista.

Foto 8 - Silos e instalações da Fazenda Santa Luzia

Fonte: Sistema integrado Fazenda Santa Luzia (MA). Fotos da autora (2015).

“Tem atividade [na fazenda Santa Luzia] 24hs. Que nem a Agroserra. Tem colheita, plantio, gradeamento, conservação, 24hs.Aí põe a luz do maquinário. Colhe a noite. Pra colher grão, eles colhem até 19hs, 20hs da noite dependendo da umidade. Agora gradeamento, plantio – só se o solo tiver muito molhado. Se você chegar lá agora, se chegar 12hs da manhã tão gradeando terra, 2hs da manhã, gradeando terra. Se chegar pela frente, todas as luzes do campo se apagam, porque eles passam no rádio, mas se você for por traz da serra você vai ver o povo trabalhando. Quase todas as fazendas aí [na região do sul do Maranhão] funcionam em 3 turnos (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, Entrevista realizada em 2016).”

Com o trabalho interrupto, preparo, catação de pedras, aração, pulverização e semeadura das terras em geral podem ser realizados em quinze dias e as horas extras concentram-se no período de mudança de plantio dentro dos talhões da fazenda. Nas fazendas, a mão-de-obra não ou pouco qualificada utilizada é maranhense.

“Toda empresa do campo que trabalha com 3 turnos tira direito dos trabalhador, no meu ponto de vista. Porque a lei fala que deve ter um intervalo de 11 horas entre uma jornada e outra. Então, o trabalhador do campo, dificilmente vai ter esse intervalo de entre jornada. Porque entre transporte, alimentação e chegada no alojamento, entre tudo, ela tira 102

3 horas. Então a entre jornada dele é menor, é de 9hs. A outra coisa que a gente percebe e o povo não presta muita atenção é que 1 hora de trabalho no campo é reduzida. Eles até fazem essa observação, mas você não consegue ver as horas de adicional noturno no ponto. E se cada semana esse trabalhador tá em um turno, ele não vai ter esse adicional. A escala muda toda semana. Todo mês o trabalhador passa pelos 3 turnos e acaba não recebendo o adicional noturno. Além disso, a escala impede que o trabalhador estude ou se capacite. Ele tem que ficar 24hs disponível para o trabalho. Por exemplo, eu entro agora 19hs da noite. As 3hs eu tenho que sair. Ai se você quiser sair da fazenda só chega às 6hs em casa. Aí ele tem que descansar. Aqui a maioria das vezes descansa na fazenda porque o transporte é precário e a casa do trabalhador é longe. Aí almoça, descansa mais um pouquinho e já tem que entrar de novo. Ele nem saiu do seu ambiente de trabalho. Ele ficou lá mesmo no alojamento. Então isso pra mim é usurpação de direito. Mas o Ministério vem aí e acha que tudo normal (Irmão, Sâo Raimundo das Mangabeiras, Entrevista realizada em 2016).”

Nas fazendas da região de Uruçuí, também é possível encontrar relatos de extensas jornadas de trabalho: das 6hs da manhã às 3hs da manhã do dia seguinte, ou seja, um turno de trabalho de dezoito horas. Como era necessário estar na fazenda às 6hs e o transporte da fazenda até as casas dos trabalhadores pode consumir até 3hs, muitos dormem em condições precárias nas fazendas (REIS, 2010). O pagamento das horas-extras ocorre em algumas situações, entretanto, o mais comum é a compensação e folga pelo “banco de horas”. Em geral, os trabalhadores não compreendem as regras do “banco de horas” ou os cálculos que são realizados pelos gerentes das fazendas. Há reclamações de que as horas de folga computadas são menores do que as horas-extras trabalhadas e a expectativa do trabalhador de ser remunerado pelas horas-extras geralmente não ocorre.

“Uma reclamação muito grande dos trabalhadores é que eles chamam da ‘virada’. Do que chama a virada no turno de domingo. Eu não recebo hora extra na virada do turno de domingo porque no domingo seguinte eu estarei trabalhando pra alguém. Um revezamento. Eu tenho que rodar 24hs pra rodar o turno. Eu entro sábado à noite, às 19hs aí eu trabalho a noite e saio no outro dia as 19hs da noite do domingo. Sem parar. Na segunda ou entro no turno da manhã ou entro no turno da tarde. Todo mês eu tenho que fazer uma virada. É uma obrigação. O benefício é, no próximo final de semana você ficar em casa, porque tem outro trabalhador fazendo a mesma coisa que você fez”. 103

No oeste baiano, também é comum as horas extras serem “contabilizadas” em um banco de horas, que futuramente podem ser convertidas em folgas para visitar a família.

Um problema surgido para os trabalhadores em função desse acordo está relacionado à distância de onde muitos são originários. Nesse caso, segundo afirmação do próprio Secretário de Assalariados do STR-Barreiras, os trabalhadores gastam nas viagens de ida e volta às suas casas, seis dias, restando apenas dois (2) para ficar com a mulher e com os filhos. Outro problema que enfrentam é o custo dessa viagem, o qual gira em torno de 500 reais. Disto, presume-se que, em função desse custo e do salário mensal que percebem, fica inviabilizada a visita à família uma vez por mês (SOBRINHO, 2012, p.82, grifos do original).

Dentro do mundo do trabalho assalariado, há uma gama de atividades: tratoristas e trabalhadores permanentes em fazendas de soja, ou no setor de armazenamento, trabalhadores sazonais, trabalhadores informais, diaristas (como catadores de raíz), ou pequenos camponeses que arrendam suas terras para o monocultivo da soja. As funções na fazenda podem ser dividas como:

. Cozinheiras: preparo das refeições, higienização dos ambientes de cozinha e refeitório60

. Serviços gerais: limpeza do terreno, roçar, catar raiz, auxiliar nos períodos de plantio e colheita

. Operador de máquinas: operação de tratores, pulverizadoras, colheitadeiras

. Motoristas: manejam carros, caminhões e ônibus para o transporte de pessoas (principalmente), insumos e grãos (geralmente prestadora de serviços são responsáveis pelo transporte de insumos e dos grãos).

. Chefes de campo: coordenaram os trabalhadores da lavoura – serviços gerais, motoristas e operador de máquinas

. Gerente da fazenda: responsável pelo monitoramento da produção e produtividade da fazenda, pelas compras de insumos, setor financeiro, calendário agrícola, venda da produção.

60 Apesar de não ser do escopo desta tese, a questão de gênero é um tema fundamental para entender as relações de trabalho no campo. A jornada tripla de trabalho das cozinheiras precisa encaixar-se nos turnos da fazenda e dos outros trabalhadores, fazendo com que a jornada destas mulheres cheguem a 17hs de trabalho (4hs a 21hs). 104

À época da realização da pesquisa de campo, grande parte das funções nas fazendas são ocupadas pela população da região: é tratorista, operador I, operador II, operador III. Funções que requerem maiores requisitos educacionais, como agrônomo, técnico em agronomia, técnico em meio ambiente, em geral ainda são ocupadas pessoas de outras regiões. Em geral, os chefes de campo e os gerentes das fazendas são “gaúchos”, sendo que somente os gerentes possuem curso superior.

Dentro das funções de menor remuneração e de operação mais direta no campo, é comum ocorrer desvios de funções. “O cara é mecânico, mas vira operador de máquina, colhedora de cana, colhedora de soja, aí depois tá dirigindo caminhão” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, 2016). Em geral, o desvio de função ocorre com os trabalhadores permanentes das fazendas. De acordo com o gerente da Fazenda Santa Luzia no sul do Maranhão, a integração lavoura-pecuária permite “aproveitar” mais o trabalhdor: “por exemplo, um operador de máquinas , faço um treinamento nele e vai construir cerca eletrica ou ração animal no período da entresafra. O funcionário tem que ser multifuncional: ele tem que trabalhar na aplicação de agrotóxico e trabalhar na irrigação. Porque quando ele tá trabalhando na aplicação, tá chovendo, então não preciso muito na irrigação. Mas quando está na entressafra, já começo a plantar 100 mudas de frutífera, ele já vai fazendo irrigação por gotejamento, o funcionário tem que fazer um curso técnico, se capacitar, se especializar” (Fazenda Santa Luzia, São Raimundo das Mangabeiras, 2016, grifo meu).

Bruno, do Sindicato de Araguaína, relatou situações semelhantes no Tocantins: tratorista que possuem jornadas das 6hs até as 20hs , sem horário de almoço, acúmulo e desvio de função O trabalhador se alimenta no trator, já que “hoje os maquinários são tão sofisticados que permitem eles têm uma liberdade maior”, disse Bruno em entrevista de campo 2016,. Além da falta de horário de descanso informou que os trabalhadores seguem na lavora mesmo após recentes aplicações de agrotóxico. “E gera uma série de riscos para ele, cansaço, risco de acidente, mas eles não têm essa consciência que é prejudicial” (Bruno, Araguaina, 2016).

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Foto 9 - Campanha da Bayer para as fazendas de soja do Tocantins: “a força está no trabalho”

Fonte: Foto da autora, 2018.

Apesar dos acidentes de trabalho serem recorrentes, dificilmente os trabalhadores conseguem acessar seus direitos, como afastamento por doença, acidente ou invalidez61.

Mesmo ciente da deficiência dos dados, sintetizei os dados disponíveis na Secretaria de Previdência, para as principais atividades agrícolas da região Matopiba. No Brasil, o número de trabalhadores que conseguem acessar benefícios por acidente ou doença vem decrescendo: de 3600 beneficiários em 2013 para 1981 em 2017. O cultivo de cana-de- açúcar continua sendo o setor que apresenta maior risco para os trabalhadores, se compararmos aos cultivos de algodão, soja e pecuária. No setor sojicultor, a armazenagem é a parte da cadeia produtiva que mais apresenta número de beneficiários por acidente ou doenças62.

61 Caso o trabalhador esteja desempenhando uma função diferente daquela designada em seu registro de trabalho, no caso dos trabalhadores formais, como ocorre comumente, não é possível acessar tais direitos. 62 A fabricação de máquinas e equipamentos para a agricultura e pecuária, exceto para irrigação apresenta grande risco de acidentes para o trabalhador; no entanto não iremos abordar tal questão nesta tese. 106

Tabela 3 - Acompanhamento dos Benefícios Auxílios-Doença Acidentários segundo CNAE, Brasil (2013-2017)

Acompanhamento dos Benefícios Auxílios-Doença Acidentários segundo CNAE Código CNAE e atividade 2013 2014 2015 2016 2017 0112 - Cultivo de algodão herbáceo e de outras fibras de lavoura temporária 15 20 17 17 13 0113 - Cultivo de cana-de-açúcar 851 684 454 565 465 0115 - Cultivo de soja 152 157 108 124 101 0141 - Produção de sementes certificadas 35 32 25 30 29 0161 - Atividades de apoio à agricultura 491 390 295 292 230 0162 - Atividades de apoio à pecuária 214 188 112 131 129 0163 - Atividades de pós-colheita 32 33 27 36 29 1066 - Fabricação de alimentos para animais 565 520 376 486 342 2051 - Fabricação de defensivos agrícolas 36 40 22 20 22 2831 - Fabricação de tratores agrícolas 64 61 34 33 23 2832 - Fabricação de equipamentos para irrigação agrícola 15 16 13 6 15 2833 - Fabricação de máquinas e equipamentos para a agricultura e pecuária, exceto para irrigação 1134 1050 650 631 583 2840 - Fabricação de máquinas-ferramenta 193 160 98 93 92 4611 - Representantes comerciais e agentes do comércio de matérias- primas agrícolas e animais vivos 54 21 12 18 21 4622 - Comércio atacadista de soja 93 81 59 75 58 5211 - Armazenamento 736 737 540 526 436 Total soja 3600 3298 2259 2370 1981 Total 31312 27419 19963 29909 32714 Fonte: Dataprev, Sistema Único de Benefícios (SUB)/ Coordenação-Geral de Monitoramento dos Benefícios por Incapacidade - CGMBI/SRGPS/SPREV/MF. Elaboração própria.

“Tem um moço aqui que acabou de ser demitido e não recebeu nada da Agroserra, e nós vamos entrar na justiça. O maior problema que é que os trabalhador tem medo. Pensa que os pequeno não pode ganhar dos grande. Não tem muita fé. Vai se sujar, e depois não vai arrumar emprego em lugar nenhum” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, Entrevista realizada em 2016). Da mesma forma que os trabalhadores de “corpos dóceis” são mais requisitados pelas empresas como já analisado anteriormente, os trabalhadores rurais que pleiteiam e exigem seus direitos são evitados.

“O seu Zé Paciência já foi barrado na verdade. Ele era operador de irrigação, motor estacionado. Tiraram ele, e botaram ele pra guiar, botou ele no de tração. E lá numa carroça, ele teve um acidente no joelho. Aí ele teve o benefício dele negado no INSS porque o técnico de segurança disse que foi desvio de função. Aí ele ficou uns 4 meses sem receber salário.” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, Entrevista realizada em 2016). 107

Caso o trabalhador esteja desempenhando uma função diferente daquela designada em seu registro de trabalho, no caso dos trabalhadores formais, como ocorre comumente, não é possível acessar tais direitos.

“Aqui na Agroserra nós temos situação de aplicação de agrotóxicos. As pessoas trabalham em outra função e vai trabalhar com agrotóxico e se contaminam. Já teve dois casos que procurou a gente aqui no sindicato que tiveram seu benefício negado porque não tava na sua função. Aqui tem todo tipo de agrotóxico; tem maquinário, pulverização manual, tem de avião, de todos os tipos de agrotóxico. Pra mim não é fungicida, inseticida, herbicida; pra mim é veneno mesmo” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, 2016).

Ao longo do trabalho de campo, observou-se nas placas das unidades da Bunge, que não houve acidentes de trabalho nos últimos dez anos, ou mais de cinco mil dias em operação.

Foto 10 - Entrada da Bunge em Balsas e Rio Coco (MA) e os acidentes de trabalho

Fonte: Bunge Balsas (MA), 2016. Foto da direita: Bunge Rio Coco (MA), 2016. Fotos da autora.

“Isso não existe. Todo ano, todo mês, tem acidente. Eu digo porque eu trabalhei na Agrossera e eu passei lá na placa que tava 392 dias sem acidente de trabalho. Por que que ele faz isso e acha que é importante? Tem a legislação que fala da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes no Trabalho Rural – CIPATR. Toda empresa precisa ter. E tem a semana de prevenção de acidentes, onde realiza as palestras. Eles acessam uma verba do governo pra isso e o problema é o comunicado de acidente de trabalho que é o problema. 108

Porque as empresas não comunicam o acidente de trabalho no INSS” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, Entrevista realizada em 2016). A grande maioria dos trabalhadores das fazendas de soja desconhecem a existência da CIPATR e da sua finalidade, como indica as pesquisa de campo nas fazendas maranhenses, quanto nas piauienses feitas por Reis (2010).

Para os fazendeiros e gerentes, a falta de segurança, e prevenção, muitas vezes entendida somente como uso dos EPI’s, é vista como de responsabilidade do trabalhador. “O funcionário ainda acha que aquilo é incômodo pra ele. E realmente, às vezes a roupa é quente, o equipamento incomoda, e ele acaba descuidando disso daí. Os casos que eu vi, é indisciplina do encarregado ou do funcionário ali. Tinha que ser do interesse do funcionário. Tem que se utilizar o EPI, respeitar a entrada de pessoas na área, cumpri as carências (Gerente fazenda Santa Luzia, 2016). No entanto, não se discute ou não há interesse em desenvolver melhores equipamentos de proteção para o trabalhador ou na inadequação ou na pouca ergonometria do EPI, ou até mesmo em adquirir um EPI que seja mais adequado ao trabalho, mas que tenha preço elevado.

A médica do INSS de Balsas é a médica de saúde do trabalho da fazenda Agrosserra. Os trabalhadores que abriram pedidos de afastamento por questões de saúde fazem a perícia do INSS, mas não conseguem afastamentos para realizar os tratamentos dentro de seus direitos. Há indícios que a empresa pediu a médica do INSS não aprovar nenhuma perícia. Além disso, as clínicas de admissão e demissão que avaliam os trabalhadores é a mesma, para todas as empresas.

“A última vez que eu trabalhei no silo foi na Ceagro, carregando soja lá no projeto Batavo. Lá o cara morreu torrado, tentando desenganchar o silo. E tava sem equipamento de segurança e aí morreu torrado. A soja é aquecida. Ele caiu dentro da soja. Parou o sistema todinho. Desceram umas 8 pessoas, os trabalhadores, com umas cordas. Foi quase 3 dias pra tirar. Que já tinha um prejuízo lá porque soja não tava circulando no silo. Então, ele vira uns torraãozinho e não passa na esteira. Aí tem que limpar o sistema [do silo] todo” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, Entrevista realizada em 2016).

Após a retirada do corpo do trabalhador, a soja foi toda processada.

“A outra tava no silo lá e morreu. Caiu de cima. No silo, tem aquelas plataformas que atravessa. E teve um outro que ‘torou’ uma cinta e arrancou o coro todinho da barriga 109

dele assim ó. E foi pra Teresina de avião. Esse escapou63. O outro tava mexendo no painel de comando, que opera as esteiras. Tava limpando lá. O certo é desligar o sistema de operação pra fazer a manutenção. Mas os patrão, falando que não podia parrar o sistema e ele limpando. Ele sofreu uma descarga elétrica. Isso foi 2013, 2014. Ele tá vivo. A sorte foi que a descarga jogou ele pra fora, porque se ele tivesse agarrado no painel tinha morrido. A camisa dele ‘pelou’ todinha, e só ficou cabelo só aonde tinha o capacete. Também levaram ele pra Teresina64 rapidinho. Mas ele ficou todo queimado por dentro, tá aí acidentado” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, Entrevista realizada em 2016).

Os silos são o local no setor sojicultor que oferece mais risco ao trabalhador. Para que os grãos não fermentem e mantenham suas características65, as estruturas em geral seguem funcionando mesmo quando o trabalhador precisa realizar a limpeza do silo, ou consertar alguma pá que não está girando para manter os grãos secos. Não há estatísticas oficiais precisas sobre mortes em armazéns de grãos no Brasil. Como já indicado anteriormente, quando trabalhadores sofrem acidentes, cabe ao empregador informar a ocorrência ao Ministério da Previdência Social. No formulário de notificações, porém, não há um código para armazéns agrícolas, englobados pela categoria mais abrangente de depósitos fixos. Segundo o Ministério do Trabalho, o setor de armazenagem – que inclui o trabalho em silos de grãos, mas também em vários outros tipos de armazéns – teve 11,13 mortes a cada 100 mil trabalhadores em 2016, último ano com dados disponíveis. O índice deixa o setor entre os 25% campos econômicos mais mortíferos para trabalhadores no Brasil. Em outro sistema de contagem, o Ministério Público do Trabalho registrou 14 mortes de trabalhadores por asfixia, estrangulamento ou afogamento causados por cereais e derivados entre 2012 e 2017 (FELLET, 2018). “Moinhos satânicos”66!

63 Nos últimos dois anos algumas parcas notícias têm surgido sobre o tema. Ver https://deolhonosruralistas.com.br/2017/02/21/em-dois-dias-tres-pessoas-morrem-em-silos-em-sp-mt-e-no-rs/ e https://www.bbc.com/portuguese/brasil-45213579 . 64 Os trabalhadores são enviados para o serviço público de saúde de Teresina, conhecido por sua qualidade de atendimento nacional e regionalmente. Sobre o serviço de saúde maranhense, há uma menção na entrevista realizada em 2016 com um trainee da Bunge de Balsas por ser ruim, e muitas vezes distante e ineficiente. 65 Sobre especificidades da soja e seu circuito espacial produtivo ver LIMA (2017). 66 O termo refere-se à sessão do livro “Grande transformação: as origens de nossa época”, de Karl Polany (2010). Essa sessão do livro explicita os processos de transformação da Revolução Industrial e do cercamento dos campos, a valorização das terras a partir do cercamento, a expulsão dos camponeses da terra, a miséria e superexploração da mão-de-obra “livre” e a criação de favelas nas cidades inglesas. Aqui, vê-se que os moinhos satânicos – ou silos satânicos –, seguem triturando e desumanizando os trabalhadores rurais, que são literalmente aniquilados pelos processos supracitados. 110

2.2 Constituição dos Sindicatos de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais no Matopiba

A mobilidade do trabalho e suas relações com a expansão da frente capitalista cria dinâmicas espaciais particulares na “produção de novos corpos, e espaços, destruição de velhos corpos e espaços: este movimento do qual é necessário partir, e que define o espaço do capital em sentido amplo como espaço da subordinação e controle do corpo do trabalhador” (VAINER, p.21). Esse trabalhador, aqui rural e de múltiplas identidades foi forçado ao assalariamento e a mobilidade (HEIDEMANN, TOLEDO, BOECHAT, 2014).

Os tempos mudam no devagar depressa dos tempos na região do Matopiba. Como no conto de Guimarães Rosa, “A terceira margem do rio”, os homens abandonam suas famílias para sobreviver ao ir e vir das colheitas e das fazendas. A propriedade da terra (não só a posse como as condições para dela sobreviver) torna-se uma miragem, algo que está próximo e presente de seu cotidiano, enquanto trabalho, mas distante enquanto posse de fato e liberdade – uma margem que muitos homens ainda não conseguem ver. Homem porque cerca de 70% da mão-de-obra rural brasileira é masculina, e no caso da soja a porcentagem sobe para aproximadamente 90% (PNAD, 2018). Esse comportamento se explica pela forma tradicional de inserção dessa categoria de trabalhadores no processo produtivo dos monocultivos e na mobilidade sazonal do trabalho rural67. Além disso, como já destacava Velho (2013) sobre os estudos das frentes de expansão do interior do país nos anos 1970- 1980, geralmente tais homens migram sozinhos e fazendeiros preferem trabalhadores que não possuem família, podendo ser deslocados (e explorados) com maior facilidade68.

Tais homens são tidos como “trabalhador agrícola”, “trabalhador rural”, que assim como lavrador e produtor autônomo pertencem ao léxico da organização camponesa, que na tentativa de resistir se organizou (e organiza) em sindicatos e associações, formato de luta fundamental no período entre 1960 a 1980.

Embora seja longa a trajetória de estudos na Sociologia Rural, a maioria das investigações sobre o sindicalismo rural no Brasil foram realizados sobre as entidades do Sul

67 E nas relações de gênero, não abordadas nessa tese. 68 Ver documentário “Nas Terras do Bem-Virá” (2007, 110 min), de Alexandre Rampazzo. 111

e Sudeste, como indica os trabalhos de Favareto (2006), Schneider (2010), Leonilde Medeiros (2001), Tavares dos Santos (1982;1978) e sobre cortadores de cana (PITTA, 2016; NAVARRO, 1997; THOMAZ JR, 1996; INCAO, 1976) ou outros trabalhadores setorizados, como na citricultura paulista (MACIEL, 2016; BOECHAT,2013). No tange a sojicultura, a conquista e o mercado imobiliário de terras rurais tem chamado mais a atenção dos pesquisadores, principalmente na região Matopiba69, fazendo com que seja praticamente inexistente os estudos sobre as relações de trabalho no setor sojicultor na região de estudo.

Os STTR’s nasceram à sombra de instituições não especificas do mundo camponês, notadamente no PCB em meados do século XX, com uma grande diversidade de organizações rurais), que frequentemente reuniam ao mesmo tempo empresários, arrendatários, parceiros, moradores de fazenda e trabalhadores assalariados (HEBETT, 2004; MEDEIROS, 1989).

Nos anos 1960, no plano federal, foi criada a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (CONTAG) e inicia-se a efervescência dos STTR no sul do Maranhão. Em 1968, foram reconhecidos oficialmente os Sindicatos dos Trabalhadores Rurais de Urbano Santos e de Santa Inês (MA). Em 1969, foi reconhecido o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Chapadinha e de São Bernardo. Em abril de 1970, o STTR de Balsas. No ano de 1971, foram reconhecidos os STTR de Tutóia e de Mirador. Em plena ditaura militar (1964-1985), o reconhecimento pelo Ministério do Trabalho não ocorria de maneira imediata e a oficialização dos sindidatos podia se prolongar por vários anos70. O STTR de Imperatriz, por exemplo, foi fundado em 29 de janeiro de 1967 e só veio a ser reconhecido quase sete anos depois, em 31 de dezembro de 1973. Imperatriz era um nós fundamentais, uma zona de atração intensa por sua localização privilegiada: município entre o campo, a serra e a terra de cultura (‘mataria’), com bom acesso ao porto de Tocanópolis e a rodovia Belém-Brasília – vetor da expansão agrícola, rodeada por outras pequenas cidades que se comunicam com a estrada através e para onde converge a produção dos municípios do sul do Maranhão, Pará e extremo norte do Tocantins (João Lisboa, Montes Altos, Sitio Novo, Amarante, Grajaú, Axixá, Itaguatins, Araguatins, São

69 Ver Dossiê Matopiba realizado pela Revista do Núcleo de Estudos, Pesquisas e Projetos de Reforma Agrária publicado em 2019. Disponível em http://revista.fct.unesp.br/index.php/nera/issue/view/Dossi%C3%AA%20MATOPIBA 70 Os primeiros sindicatos rurais no Brasil datam de 1962, apesar de suas tentativas de regulamentação datam de 1903 (THOMAZ JR, 1998). 112

Sebastião do Tocantins, Sitio Novo de Goiás, Xambioá, Marabá, São João do Araguaia, Itupiranga, Paragominas) (ALMEIDA, 2004).

A uniformidade da nova denominação, “trabalhadores rurais”, inclui-se entre os quesitos exigidos pelo Ministério do Trabalho”. Este longo período foi marcado pela intensificação da grilagem e por conflitos e tensões sociais em torno da devastação e da usurpação das terras agriculturáveis pela extração madeireira, levada à cabo pela C.I.D.A. (Cia. Industrial de Desenvolvimento da Amazônia) (ALMEIDA, 2004, p.102)

A Reforma Agrária e a defesa dos direitos trabalhistas unificaram as principais reivindicações do sindicalismo rural até os anos 1980. Os trabalhadores do povoado de São Pedro de Água Branca, município de Imperatriz, conceberam um Estatuto da Terra Cabocla defendendo o “direito de cultivarem suas terras sem a praga do capim colonião espalhado por fazendeiros e grileiros” (ALMEIDA, 2004, p.111) e diferenciando a necessidade da terra para camponeses sem terras que compunham o amplo dos “trabalhadores rurais”71 . As pautas centrais dos sindicatos desde os anos 1960 foram:

37– Confiscação de todas as terras dos latifundiários e entrega dessas terras, gratuitamente, aos camponeses sem terra ou possuidores de pouca terra e a todos que nelas queiram trabalhar, para que a repartam entre si. A divisão das terras será reconhecida por lei e a cada camponês será entregue o título legas de sua posse. A lei reconhecerá as posses e ocupação de terras, tanto dos latifundiários como do Estado, anteriormente realizadas pelos camponeses, que receberão os títulos legais correspondentes.

39- Garantia de salário suficiente aos assalariados agrícolas, não inferior ao dos operários industriais não especializados, como também garantia de terra aos que a desejarem.

41- Anulação de todas as dívidas dos camponeses para com os latifundiários, os usuários, os bancos, o governo e as companhias imperialistas norte--americanas.

42- Concessão de crédito barato e a longo prazo aos camponeses para a compra de ferramentas e máquinas agrícolas, sementes, adubos, inseticidas, construção de casas, etc.. Ajuda técnica aos camponeses. Estímulo ao cooperativismo.

43- Construção de sistemas de irrigação particularmente nas regiões do Nordeste assolado pelas secas, de acordo com as necessidades dos camponeses e do desenvolvimento da agricultura.

71 Embora o estatuto não deixasse muito claro a diferença entre latifundiário camponeses ricos que deveriam ter “Garantia legal à propriedade dos camponeses ricos. Tanto a terra cultivada por eles ou por assalariados, como suas outras propriedades, serão protegidas contra qualquer violação” (Tribuna do Povo, São Luíz, 1º de janeiro de 1954 apud Almeida 2004, p.111)

113

45- Garantia pelo Estado de preços mínimos para os produtos agrícolas e pecuários ao abastecimento da população, de modo que permitam aos camponeses desenvolver suas atividades econômicas e aumentar a produtividade de suas terras, sem deixar de defender ao mesmo tempo os interesses da grande massa consumidora.”

(Tribuna do Povo, São Luíz, 1º de janeiro de 1954 apud Almeida 2004, p.111)

Nas pautas, é interessante observar o tom anti-imperialista que já anunciava a entrada de capitais estrangeiros na região; e a equiparação dos salários com os trabalhadores da cidade72, além da necessidade de condição de produção e investimento tecnológico e de

72 Francisco de Oliveira (2003) levanta o importante debate sobre o papel da agricultura via achatamento dos salários e do custo de produção no campo via acumulação primitiva para a viabilização dos processos expansão da cidade que garantem a industrialização e urbanização do Brasil. Sader (1986) também discute tal questão, analisando que de um lado, o capital necessita que haja uma generalização da mercadoria, isto é, que todas as pessoas possam comprar o que é produzido, e também, que o maior número ´possível seja de assalariados, o que garante o consumo. Sob essa ótica, o camponês, que é dono de sua força de trabalho, que é um produtor independente, deve ser eliminado para o capital. Por outro lado, porém, é necessário para o capital que os salários urbanos não sejam elevados, mas que permitam a reprodução da força de trabalho. Então, os alimentos não podem ter um preço proibitivo. E, o barateamento da alimentação só pode ser possível com a produção camponesa, graças ao sobre-trabalho do camponês e sua família, para a produção de alimentos, pois 80% da agricultura de mercado interno do país é fruto das pequenas unidades familiares de produção, ou seja, do campesinato. Então o capital transforma o camponês num trabalhador para ele. Isso explica, de um lado, a política de colônias de assentamento levada a cabo por órgãos oficiais ou privados” (p.30). Velho, em uma ótica semelhante à de Regina Sader, analisa a partir da produção maranhense de arroz e seu abastecimento para mercado interno e externo. Vale ressaltar a diferença de estratégias e alcance de mercado dos gaúchos, que conseguem buscar melhores preços e alçar o mercado internacional dos produtores camponeses. Tais diferenciações podem ainda ser notadas, dadas a suas especificidades temporais e de cultivo, atualmente no caso dos produtores gaúchos da soja. “Assim, poder-se-ia concluir que o arroz do Maranhão possui uma clientela nas camadas inferiores da cidade, e provavelmente, uma faixa imediatamente a seguir em que exerceria, também, uma função supletiva. Tal como o produtor gaúcho buscaria o mercado internacional nos momentos da alta oferta, o produtor maranhense retrair- se-ia para o setor de subsistência, já que, conforme os estudos mais recentes parece indicar, o coeficiente de elasticidade-preço da procura dos produtos agrícolas no Brasil, particularmente de produtos tais como farinha de mandioca, feijão, etc. – exatamente os produtos tradicionais da lavoura de subsistência - é baixo. Com isso, parte da produção não chega a aparecer nas estatísticas. Só aliás, o caráter camponês da agricultura maranhense- paraense, próximo sempre às fímbrias da subsistência, parece permitir custos tão baixos, onde não é computado o salário que o camponês deixa de pagar a si mesmo quando necessário, a ponto de, após percorrer milhares de quilômetros, o produto ainda chegar relativamente barato aos pobres da cidade. Nisso tem influência também as recentes melhorias nos meios de transporte e comunicação. Poderíamos dizer, então, que teríamos os pobres do campo produzindo para os pobres da cidade, cobrindo, assim, uma faixa que, se é minoritária, no entanto, não deixa de ser socialmente crucial em um sentido duas vezes próximo a marginalidade” (Otávio Velho, 2013, p.133).

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infraestrutura, que de fato será implementada nas décadas seguintes, mas favorecendo apenas a produção em monocultivos e em larga escala para exportação.

Na Bahia, o STTR de Santa Maria da Vitória foi fundado em 1974. A intervenção privatista da terra neste município chegou primeiro, protagonizada pelos interessados na implantação de projetos pecuaristas incentivados por escandalosos incentivos governamentais fornecidos pelo Banco do Nordeste/SUDENE. A investida contra a apropriação camponesa da terra foi ferrenha e a resistência foi organizada junto ao Partido Comunista. Em Correntina também houve uma participação efetiva do Partido Comunista, onde fundou-se um STTR em 1980.

No período de 1980 a 1990, destaca-se a criação da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Tocantins/ FETAET, dos Sindicatos de Trabalhadores de Axixá, do Sindicato Regional (abrangendo os municípios de Buriti, São Sebastião e Esperantina) e quatro associações com abrangência, público e enfoques diferenciados. Com exceção da Associação de Mulheres de Buriti/AMB, as três outras associações (Associação dos Apicultores do Bico do Papagaio/ABIPA, Associação dos Trabalhadores Rurais de Buriti e Associação dos Trabalhadores Rurais de Centro Mulatos) foram criadas para responderem às demandas dos pequenos proprietários e agricultores recém assentados no campo da produção e comercialização. A ABIPA, com uma associação de abrangência regional, especificamente voltada para incentivar a produção e a comercialização dos produtos da roça. A AMB, com abrangência local, surgiu da necessidade de promover o trabalho de organização e conscientização das trabalhadoras rurais sobre a luta pela terra e dos direitos da mulher.

Já a FETAET (entidade de representação em escala estadual) e os STTR, surgiram como instrumentos de defesa dos direitos e representação de classe trabalhadora rural, com forte enfoque na luta pela terra. Ao longo da história, a sua bandeira de luta foi se modificando, acompanhando a dinâmica do movimento sindical. É neste período que se criam 67% dos STTR e 16% das associações presentes na região (ALMEIDA, 2004).

Outro traço fundamental foi a constituição de um padrão de ação sindical marcado por uma certa prudência e pelo respeito aos limites dados pela lei. De um lado, a legislação, por meio do Estatuto do Trabalhador Rural reconhecia o conflito social agrário e determinava formas de encaminhamento desses conflitos. De outro, essa mesma legislação instituía um limite bastante rígido para a ação sindical no encaminhamento desses conflitos, cuja transgressão ou questionamento resultava em dura repressão. A prudência sindical e o 115

legalismo foram duas faces desse padrão de ação sindical, o que possibilitou à Contag dar visibilidade e tratamento institucional aos conflitos e, principalmente, conseguir ampliar a malha organizativa no campo brasileiro (MEDEIROS, 1988, FAVARETO, 2006).

A partir de meados da década de 1970, a CONTAG (Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura) passa a perceber que a reforma agrária não dependia apenas da decisão política do Estado e passou a apostar mais na organização dos trabalhadores rurais como forma de reivindicar a aplicação do Estatuto da Terra. Para Favareto (2006, p.28),

algumas características da crise que se abateu sobre o mundo do trabalho na virada para os anos de 1990 abrandou parte dessas tensões, como a impossibilidade ou a dificuldade em combinar a representação dos segmentos assalariados com a representação das formas não-assalariadas de trabalho [...] por outro lado, outras tensões formaram-se neste novo quadro, principalmente aquelas relacionadas ao caráter da ação dos agentes do movimento sindical.

Sobre as investigações realizadas por Favareto, é necessário discordar do caminho teórico do sindicalismo pautado na crise do setor industrial, principalmente automotivo, como análise central para discorrer sobre o novo sindicalismo baseando-se nas teorias de Ricardo Antunes (1995) sobre o trabalho, na produção de mercadorias e o aumento da automação.

Nunca perdendo de vista o setor agrícola, concordo com a crítica já feita por Martins (1985) sobre o domínio das questões urbanas nas pautas políticas do trabalho, não acompanhando as transformações que ocorriam no campo. Nos anos 90 e 2000, os termos “agricultor familiar” e “trabalhador rural” praticamente desapareceram dos documentos das centrais sindicais – que até os anos 1990 era majoritariamente composta por sindicalistas rurais, indicando que apesar da maioria absoluta dos trabalhadores e trabalhadores nos congressos da CUT pertencerem ao setor agrícola, o poder estava nas demandas urbanas.

As lutas por crédito, por melhoria de preços, por formas de comercialização diferenciadas, pela implementação da regulamentação constitucional da previdência social rural, por proteção contra a desregulamentação fizeram a CONTAG aliar-se a outros movimentos, como o Departamento Nacional dos Trabalhadores Rurais (DNTR), ligado à CUT, que havia sido criado em 1988. Essas pautas continuam sendo centrais na CONTAG, como visto nas revistas da instituição de 2016 encontradas nos STTR’s visitados em trabalho de campo para garantir os direitos dos trabalhadores rurais. Analisando os recorrentes assuntos nos boletins e informes da CONTAG, as principais pautas dos assalariados rurais 116

são: condições precárias de trabalho, crédito rural para a agricultura familiar , aposentadoria (questão da vida, idade média para aposentaria, Sistema de previdência) e sucessão rural73.

Os Sindicatos de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR) ao longo das mais de cinco décadas de sua constituição têm pleiteado historicamente pelos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras rurais pelo acesso a políticas agrícolas e agrárias aos camponeses e trabalhadores assalariados rurais, fazendo enfrentamentos para reconhecimento de direitos sobre a posse da terra junto à outras instituições e movimentos sociais, apesar de seu posicionamento e atuação heterogênea ao longo da região do Matopiba e seu formato em geral atrelado a “velha política partidária”, como analisa Alfredo Wagner (2004). Neste sentido, são frequentes as críticas à atuação das tradicionais entidades representativas nos dias atuais, como Sindicatos de Trabalhadores Rurais. Alguns sindicatos tem se distanciado das e suas sedes foram transformadas em agências de acesso a previdência social, seguro desemprego e acordos de demissões e outros benefícios. As tarefas burocráticas esvaziaram as atividades de luta e as assembleias dos sindicatos, transformando suas sedes em prestadoras de serviço. Essa realidade foi observada por Sobrinho (2012) na Bahia e por mim no sindicato de Araguaína.

O próprio presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santa Maria da Vitória e Coribe, assume que atualmente cerca de 70% da sua atuação (sindical)está voltada para a assistência social e os 30% restantes para a luta, para a mobilização dos camponeses na região. As entidades representativas dos camponeses da região passam também por um intenso processo de partidarização. Isto ficou muito claro quando do meu trabalho de campo realizado em julho de 2008, no qual visitei os municípios de Santa Maria da Vitória, Correntina, São Desidério, Barreiras, Formosa do Rio Preto e Santa Rita de Cássia. Desses municípios visitados, somente o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Barreiras não tinha seu presidente candidato a vereador nas eleições municipais daquele ano (SOBRINHO, 2012).

Os jornais, informes e assembleias, em diversos STTR’s, foram substituídos por livretos de descontos e convênios no comércio local e região, como demonstra a foto de um dos materiais distribuídos pelo STTR de Araguaína.

73 Foi proposto um Plano nacional de Juventude e Sucessão Rural para a Safra de 2016/2017 pela Contag como forma de promover oportunidades para os jovens no campo. Como aponta Irmão, liderança sindical dos trabalhadores assalariados rurais no sul do maranhão: “O discurso do desenvolvimento para as comunidades é a geração de emprego, é oportunidade... é seu filho vai poder ficar aqui, não vai precisar trabalhar em Goiânia ou em Brasília, ou para os Estados Unidos. Ele vai poder ficar aqui. Eles pegam na fraqueza. Porque sabe que o povo sai muito também pra estudar, embora já tenha muita coisa que chegou aqui, escola, universidade. Os estudos já estão acessíveis aqui. Mas a questão da oportunidade, dos estudos ainda é muito fraca”.

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Foto 11 - Guia de convênio do STTR de Araguaína

Fonte: foto da autora, 2016.

Com o lançamento do PRORURAL, em 1971, ficou evidente o interesse do Estado em cooptar os STTR’s através de convênios para a administração e outras burocracias e repasses de verbas. Vale lembrar que os assalariados rurais desde 1940 foram captados pela Confederação Rural Brasileira (CRB), oficialmente fundada em 1950 – uma confederação patronal que nem sequer recebia repasses da verba sindical por estar alocada não no Ministério do Trabalho, mas no Ministério da Agricultura. Décadas seguintes, a CRB se transforma em CNA – Confederação Nacional da Agricultura e migra para o Ministério do Trabalho, disputando espaço junto a CONTAG. Conversando com um camponês em Miracema, ele me contou que havia recebido um boleto do CNA sobre um pagamento de uma dívida de R$200,00 que havia contraído junto a Confederação. Sem entender muito bem, estava preocupado com tais implicações da dívida, já que não lembrava de ter se sindicalizado na FAET. O envio do boleto compulsório com o aviso de débito para a residência de diversos camponeses no Tocantins ocorreu na gestão da Kátia Abreu, presidenta da CNA no ano de 2013. A postura dos STTR’s com relação à CNA é heterogênea e alguns sindicatos não vêem a CNA de maneira antagônica, como por exemplo o STTR em Amarante, que apoia esse tipo de ação, apoia a Kátia Abreu e viam como positivo para os agricultores e camponeses a implementação do PDA Matopiba.

No Piauí, a FETAPI origina-se de 05 sindicatos em 1970: Teresina, Amarante, Angical, Campo Maior e Monsenhor Gil – nenhum presente no sul piauiense. O MST chegou em 1989 a partir do apoio da CPT no estado e tem como foco de atuação a região de Teresina, litoral e delta Parnaíba e semiárido (Picos e Santo Antônio de Lisboa). “Na década de 1980, o 118

sindicato era tido como pelego, não pautava a reforma agrária e a política agrícola. Surgiu um movimento de oposição e nessa época a Contag não estava na CUT, tinha uma outra orientação” (MST Piauí, 2018).

Esse movimento da Contag tinha como objetivo ganhar as eleições do Sindicatos e reorganizar a participação dos trabalhadores rurais, movimento que também ocorreu em outros estados – como no extremo norte do Tocantins e de maneira bastante forte e articulada no sul do Maranhão nos anos 1980, tendo Manoel da Conceição com numa forte liderança tanto no processo de ‘retomada’ dos sindicatos como também em ocupações de terra e conquistas de assentamentos.

Mesmo na atualidade, o MST não realiza ações diretas nas regiões do cerrado do sul piauiense. Estrategicamente, o movimento consegue encampar lutas e levar as famílias para regiões tão distantes das cidades e zonas urbanas. A maioria dos assentados são do próprio estado e grande parte dos assentamentos e acampamentos distam até 20 quilômetros de Teresina. “A região norte não tem grande extensões de terra como no Sul e no cerrado do Piauí, mas tem muita gente. Sul tem muita terra e pouca aglomeração de pessoas. Está colocado um desafio pra nós do MST, uma questão que tá colocada pra gente trabalhar: cerrado tem ou não tem sem-terra? É ou não é possível fazer grandes ocupações? Porque as terras estão sendo entregues pra estrangeiros e sulistas” (MST Piauí, 2018).

Juntamente ao afastamento das pautas de luta e a burocratização dos sindicatos, a problematização das novas identidades, que a partir de seus modos de vida (e de produção) não se viam contempladas pelo sindicalismo criaram outros movimentos. Claro que a Reforma Agrária ainda é o eixo central da luta, no entanto, a garantia da natureza e acesso a recursos (naturais e financeiros, esta última via Estado e ONG internacionais) torna-se o pilar destes movimentos sociais mais recentes. É nessa dialética que as organizações surgem e ressurgem como expressões do conflito e portadoras de promessas de sua superação74.

A análise destas situações e suas formas organizativas, que transcendem às diferenciações econômicas internas ao campesinato, pontuam que as distinções (ricos, médios e pobres) variam historicamente, como sugere Wolf, e podem ser transitivas. Elas têm como pano de fundo teórico o conceito de camponês. A relativização da diferenciação econômica interna aos trabalhadores rurais, característica de sua organização sindical, e a indissociação entre reivindicações econômicas e identitárias, que os “novos movimentos sociais” incluem em suas

74 Ver nota 12 e item 1.3 deste capítulo: “Camponês, indígena, quilombola e povos e comunidades tradicionais”, principalmente p.74 e 75. 119

pautas políticas, demonstram um campo singular de distinções e contrastes que, no presente, não significam contradições (ALMEIDA, 2015, p.17).

O movimento que atua de maneira mais articulada na região do Matopiba é a CPT, que há 42 anos apoia a luta pela terra camponesa e denunciao às várias formas de violência no campo, especialmente direito à terra, à vida, à cidadania, ao trabalho decente. A CPT Araguaia-Tocantins (CPT-AT), localizada na cidade de Araguaína, foi uma das primeiras CPT’s a serem constituídas no final dos anos 1970, tendo como abrangência não somente o atual estado do Tocantins (ex-norte de Goiás, criado como estado em 1988), mas também o sudeste do Pará (Marabá/Conceição do Araguaia) e o sudeste do Mato Grosso (Prelazia de São Félix do Araguaia). A CPT do Tocantins e dos outros estados do Matopiba têm historicamente enfrentado os desafios postos pela situação fundiária caótica – a concentração e grilagem – e o avanço da agropecuária moderna latifundiária e monocultora sobre os cerrados. Além disso, a região concentra grande parte dos casos de trabalho escravo do país, como já analisado neste capítulo.

No Maranhão, a CPT vem construindo uma teia, espaços “de discussão de mobilização, de celebração, de todas as comunidades tradicionais. Todas elas chegam na teia com esse mesmo poder de discussão e o objetivo é garantir o seu território. E o espaço aglutinador de todas essas forças seria o que nós chamados de teia, que vai tecendo até se fortalecer. Nós já realizados em várias comunidades, inclusive em Benedito leite. Em maio, fizemos um encontro com mais de 500 pessoas de todo Maranhão. Lá tinha ribeirinho, pescador, quebradeira de coco, quilombola indígena, sertanejo, geraizero, acampados, assentados, e a gente abre uma discussão no sentido de encaminhar ações de fortalecimento desses grupos em seus territórios” (Antônio Criolo, 2016).

2.3 Os STTR’s no contexto do avanço da soja e da precarização do trabalho

Atualmente, as entidades laborais rurais representam apenas 26% do total. Em números absolutos são cerca de 2.830 (DIEESE, 2016). Segundo os dados PNAD/IBGE de 2014, existem 4 milhões de assalariados rurais no Brasil, e 60% aproximadamente encontra-se na informalidade. Dos 2.4 milhões de trabalhadores rurais informais, 52.8% são permanentes 120

e 47.2% temporários. De acordo com as pesquisas do PNAD do período de 2002 a 2013, o emprego agrícola no Brasil caiu de 13% para 7% do total de trabalhadores brasileiros, o que em números absolutos significou a perda de 292 mil postos de trabalho no campo. A mecanização do campo, a concentração da propriedade da terra fruto da capitalização internacional do campo são os principais fatores que podem explicar tal cenário (SANTOS, 2015).

A contratação sazonal é outro complicador na vida dos trabalhadores rurais assalariados, uma vez que esta forma de vínculo cresce continuamente, alterando a regra geral do contrato por tempo indeterminado. Em 2006, a PNAD encontrou naquele ano 1.209.420 empregados permanentes e 271.250 empregados temporários com carteira assinada, perfazendo um total de 1.480.670 empregados rurais formalizados. Em 2012, foram 1.059.076 empregados permanentes e 1.872.028 empregados temporários sem carteira assinada, chegando a um total de 2.931.104 empregados rurais informais. Os trabalhadores contratados temporariamente chegam a 45% do total (CONTAG, 2012).

O agronegócio empregou cerca 20% da mão de obra no país entre 2012 - 2018. Houve pouca variação no percentual ao longo do período, apesar de em termos absolutos o setor registrar a perda de mais de 1 milhão de postos de trabalho no campo, como mostra o gráfico abaixo:

121

Gráfico 1 - Pessoal ocupado no agronegócio por segmento no Brasil entre 2012-2018

Agronegócio Total (A+B+C+D) A) Insumos PESSOAL OCUPADO NO AGRONEGÓCIO

B) Agropecuária POR SEGMENTO

C) Indústria

92.142.301

92.111.790 92.108.191

90.764.124

90.580.681

90.383.848

89.496.407

19.608.846

19.465.161

19.244.697

19.120.376

18.535.102

18.309.434

18.116.898

9.959.511

9.753.779

9.151.903

9.087.138

8.957.006

8.329.532

8.297.022

5.816.277

5.743.969

5.686.030

5.673.028

5.596.470

5.550.242

5.408.214

4.176.137

4.126.252

4.066.219

3.975.850 3.972.818

3.832.976

3.782.880

233.958

230.627 223.317

210.421

198.746

185.291 174.902

2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018

Fonte: CEPEA/ESLAQ, 2018.

Ao analisar os empregos do complexo da soja, não somente aqueles já citados que se referem aos empregos diretos das fazendas, mas também a produção de fertilizantes, maquinário agrícola, implementos químicos, sementes, processamento, beneficiamento, transporte, consultoria torna-se complexo estimar o número de empregos do setor. A análise do funcionamento e das lavouras de soja mostra o quão difícil é a tarefa de mensurar precisamente quantos dos empregos relacionados as atividades acima citadas são gerados especificamente pela soja, já que a as fábricas de fertilizantes, agrotóxicos, máquinas, etc. produzem para todas as atividades agrícolas e outros tipos de cultivo e não somente para a sojicultura. Segundo a ABIOVE (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais), o complexo da soja gerou, em 2010, 900 mil empregos diretos e indiretos no Brasil, sendo 419 mil na etapa de plantio e 481 mil no processamento industrial. Ainda segundo o estudo da ABIOVE, cuja metodologia é pouco esclarecida, quando a soja é processada no local gera-se quatro vezes mais empregos (ABIOVE, 2016, s/n). 122

Gráfico 2 - Número de trabalhadores no setor agropecuário nos estados do Matopiba (2012-2018)

Fonte: PNAD/IBGE, 2019

Em 2012 a força de trabalho rural do Matopiba representava 19% do trabalho rural do país. Em 2018, esse número caiu para 16%. Apesar da queda, a região ainda depende de empregos no setor primário de forma mais contundente que outras regiões brasileiras, já que o mercado internacional de commodities manteve o setor agrícola aquecido na região Matopiba. No Tocantins e Piauí, o número de postos de trabalho rurais praticamente se manteve estável em números absolutos no período de 20012-2018, ao passo que na Bahia e no Maranhão há uma redução de cerca de 30% em ambos estados (PNAD, 2018).

A parte do setor da soja que mais emprega é o cultivo: 76 % Bahia , 82% Piauí 86% Maranhão e 87% no Tocantins. Apesar das tendências de aumento do número de empregos na cadeia da soja, é inexpressiva a mão de obra contratada, totalizando em 2017 1010 trabalhadores na Bahia, 306 no Piauí, 505 no Maranhão e 758 no Tocantins.

A produção de soja do Maranhão é mais expressiva, mas contrata menos que no o estado tocantinense. O Setor de armazenamento contrata parcas dezenas – 117 na Bahia e 10 postos de trabalho no Piauí. O estado do Tocantins empregou 24 pessoas na armazenagem e 123

cargas em 2017, e mesmo com a implementação da Granol em Porto Nacional não houveram aumentos significativos na contratação de mão-de-obra no setor.

Gráfico 3 - Trabalhadores empregados na sojicultura por categoria CNAE nos estados do Matopiba (2010-2017)

Fonte: RAIS/MTE, 2019. Selecionadas do CNAE 2.0: Armazéns Gerais - Emissão de Warrant; Fabricação de

Trabalhadores na sojicultura Trabalhadores na sojicultura

Maranhão 1200 Bahia 600 1000 500 800 400

300 600

200 400

100 200 0 0 2017 2016 2015 2014 2013 2012 2011 2010 2017 2016 2015 2014 2013 2012 2011 2010

Armazenamento, Carga e Descarga Armazenamento, Carga e Descarga

Comércio Atacadista Especializado em Outros Comércio Atacadista Especializado em Outros Produtos Produtos Comércio Atacadista de Matérias-Primas Agrícolas e Comércio Atacadista de Matérias-Primas Agrícolas Animais Vivos e Animais Vivos Fabricação de Produtos Químicos Inorgânicos Fabricação de Produtos Químicos Inorgânicos

Produção de Lavouras Temporárias Produção de Lavouras Temporárias

Adubos e Fertilizantes, Exceto Organominerais; Comércio Atacadista de Defensivos Agrícolas, Adubos, Fertilizantes e Corretivos do Solo; Comércio Atacadista de Soja; Cultivo de soja.

124

Trabalhadores da soja no Piauí 1000 Trabalhadores da soja no Tocantins 400 800 350

600 300 250 400 200 150 200 100 50 0 0 2017 2016 2015 2014 2013 2012 2011 2010 2017 2016 2015 2014 2013 2012 2011 2010 Armazenamento, Carga e Descarga Armazenamento, Carga e Descarga Comércio Atacadista Especializado em Outros Comércio Atacadista Especializado em Outros Produtos Produtos Comércio Atacadista de Matérias-Primas Agrícolas Comércio Atacadista de Matérias-Primas Agrícolas e e Animais Vivos Animais Vivos Fabricação de Produtos Químicos Inorgânicos Fabricação de Produtos Químicos Inorgânicos

Produção de Lavouras Temporárias Produção de Lavouras Temporárias

Fonte: RAIS/MTE, 2019. Selecionadas do CNAE 2.0: Armazéns Gerais - Emissão de Warrant; Fabricação de Adubos e Fertilizantes, Exceto Organominerais; Comércio Atacadista de Defensivos Agrícolas, Adubos, Fertilizantes e Corretivos do Solo; Comércio Atacadista de Soja; Cultivo de soja.

Em 2014, a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), a confederação “patronal” arrecadou R$240.057.339,85; e em 2015 a mesma confederação arrecadou R$284.275.944,15. A Contag em 2014 contabilizou R$67.425.080,80 e no ano seguinte R$67.109.823,75. No mesmo período CNA aumentou 18% na arrecadação ao passo que a Contag registrou uma redução de 0,5% (SANTOS, 2016). Dos 4,0 milhões de assalariados rurais, apenas 591 mil (14,6%) declararam ser sócios de algum sindicato. Entre os assalariados rurais formais, essa cifra sobe para 18,5%, percentual que se reduz para 11,9%, quando o trabalhador está informalmente inserido no mercado de trabalho (DIEESE, 2015). O trabalhador informal não usufrui de alguns direitos trabalhistas e garantias previstas nos acordos setoriais ou nas convenções coletivas. O trabalho sazonal e a frequente migração como já demonstrado dificulta a sindicalização do trabalhador rural.

No entanto, nos últimos anos, há uma crescente criação de entidades específicas para os trabalhadores assalariados rurais – Federações de Trabalhadores Assalariados Rurais 125

ou Federações de Empregados Rurais Assalariados –, federações, que agora representam os trabalhadores assalariados da soja.

“Veio a orientação da FETAEMA que o sindicato fizesse uma alteração em seus estatutos porque o trabalho assalariado rural agora já não é o trabalhador prioritário do sindicato. E isso é uma discussão nova. O acompanhamento a esses trabalhadores assalariados é feito porque muitas vezes eles caem em fazendas e são superexplorados, cai na mão dos aliciadores, dos gatos ... Nós temos pela CPT Nacional a campanha pelo combate ao trabalho escravo. E isso é um trabalho que é feito com CPT com parceria com sindicatos, entidade, com igreja, com tudo. Aqui na diocese de Balsas nós temos uma coordenação que cuida desse acompanhamento dos trabalhadores, pelo menos na garantia de seus direitos, indenização, quando um trabalhador foge [da situação de trabalho escravo] você sabe o que fazer pra que ele não seja morto” (Antônio Criolo75, MA, 2016).

O patrão dos agricultores familiares é o governo. A gente tem que lutar por política de acesso a crédito, estrutura e infraestrutura de campo. Já o assalariado rural é diferente, o patrão dele tá ali bem na frente, representado pelo capataz, por um chefe de campo, pelo uma coisa, então a briga é ali todo dia. É o encarregado dizendo que ele tem que entrar no serviço é 6:30, enquanto ele tem que entrar 7horas, e o capataz dizendo que ele tem que largar o serviço 12hs enquanto o horário dele 11:30. É o capataz dizendo que ele tem que subir no caminhão, enquanto ele devia ter era um transporte. Ele tem que comer em cima da garrafa , no meio do campo, sendo que o que ele precisa é um lugar descente. Então , os sindicato não vai dar conta de fazer essas duas frentes, a não ser que a gente estruture a secretaria [ dos assalariados] pra fazer esse trabalho. E eu olho pra estrutura do sindicato e assalariado nunca foi prioridade. Isso eu dizia, dentro da diretoria do sindicato, pra reflexão real. Ai pega os trabalhador e levava lá pro movimento, para fazer movimento de massa. Terra Brasil, Terra maranhão. Reunião de debate. E os assalariados nunca se encontraram no debate” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, 2016).

Atualmente, as principais ações vistas pelos Sindicatos para garantir algumas condições mínimas de trabalho entre os trabalhadores e empresas a partir são as Convenções

75 Antônio Criolo começou sua militância no movimento sindical em 1986. Em começou a desenvolver em 1987 no sul do Maranhão em parceria com CENTRU, participando do processo de retomada dos sindicatos e conquistas de assentamentos na região. Desenvolveu diversos trabalhos junto as comunidades eclesiais de base e atualmente é coordenador do Maranhão da CPT. 126

Coletivas de Trabalho (CCT) e os Acordos Coletivos de Trabalho (ACT). A CCT é uma negociação entre as entidades patronais e trabalhadoras onde são estipuladas as condições de trabalho que serão aplicadas aos contratos individuais dos integrantes das categorias, tendo a capacidade de dispor conteúdos que não dispõem as leis trabalhistas – seja pela especificidade da atividade do trabalhador, seja como forma do empresariado retirar direitos de categorias que não possuem poder de barganha – como os trabalhadores da sojicultura. A partir de um estudo da Dieese (2015), as principais cláusulas das CCT’s versam sobre salários (85%,6), reajustes (83,6%) e pagamentos e prazos (72%). Demissão (69,7%) e adicional hora extra (63,4%) são os temas mais pleiteados subsequentemente. Os temas menos pleiteados são EPI e ferramentas de trabalho (16,2%) e representação sindical (16%), seguidos de qualificação/formação profissional (15,6%) e sindicalização (15,8%). Já o acordo Coletivo de Trabalho (ACT) é uma negociação entre o empregador (pessoa física ou jurídica) e o Sindicato representativo da categoria profissional. As negociações podem ter validade de até dois anos a partir da data base, que no âmbito rural normalmente é maio. As campanhas de negociações coletivas, as ACT’s e CCT’s são um importante do mercado de trabalho rural. Entre os fatores que tornam complexas as campanhas salariais no meio rural estão as acentuadas diferenças entre os períodos de safra e entressafra (sazonalidade da produção), as formas variáveis de remuneração do trabalho (trabalho por produção) e a elevada rotatividade da mão de obra (trabalho temporário). A seguir analiso os ACT’s e as CCT’s para os estados do Matopiba.

2.3.1 Acordos Coletivos da Soja no sul do Maranhão

Acompanhando os acordos que foram feitos para o setor graneleiro no Matopiba e me foi disponibilizado pelo STTR de São Raimundo das Mangabeiras, no sul do Maranhão, os acordos são realizados pela FETAEMA (instituição sindical) e FAEMA (instituição patronal) para os cerrados do sul do Maranhão e região do Baixo Parnaíba, com participação dos Sindicatos de Balsas, Riachão, Carolina, São Raimundo das Mangabeiras, Fortaleza dos Nogueiras, Sambaíba, São Pedro dos Crentes, São Domingos do Azeitão, Tasso Fragoso, Alto do Parnaíba, Pastos Bons, Benedito Leite, Formosa da Serra Negra, Loreto, São Felix de Balsas, Feira Nova, Afonso Cunha, Água Doce, Anapurus, Araioses, Belágua, Brejo, 127

Buriti de Inácia Vaz, Chapadinha, Coelho Neto, Duque Bacelar, Magalhães de Almeida, Mata Roma, Milagres, Paulino Neves, Santa Quitéria, Santana do Maranhão, São Benedito do Rio Preto, São Bernardo, Tutóia e Urbano Santos. Para o Acordo 2008/2009, o salário mínimo para a categoria foi estipulado em R$483,60, com reajuste de 4% para o ano seguinte. No acordo de 2013/2014, o piso foi determinado em R$741,20, com ajustes de 6% mínimo. Além de piso salarial, o acordo prevê multas de 15% para o atraso de salários, Além disso, o acordo do ano de 2013/2014 obrigava a discriminação dos descontos de encargos e INSS em folha, comprovante que o empregador está contribuindo com o FGTS do trabalhador, complementação de salário família para trabalhadores que possuem filhos menores de 14 anos; obrigatoriedade de alojamentos gratuitos para empresas rurais com mais de 20 funcionários, licença de 180 dias a empregadas gestantes, salário maternidade, proibição do gato76. Somente a partir deste ano que a jornada regular é estimada em 8h48’, não podendo exceder 12hs diárias, com descanso entre jornadas de 11hs77.Intervalo para alimentação pode ser de até 3hs, dependendo do posto e função do trabalhador.

No acordo de 2013, rescisão dos contratos contemplaria o direito a férias proporcional. O empregador além disso deve garantir alimentação, acesso a água potável ou garrafas térmicas e papel higiênico, ferramentas de trabalho e EPIs; e atestado médico remunerado até 15dias.

Sobre afastamento médico, há uma cláusula que aponta: “excluídos os períodos de plantio e colheita das culturas desenvolvidas pelo empregador, desde que haja pré- agendamento de 15 dias o empregador poderá dispensar o empregado, em 03 dias consecutivos sem prejuízo de remuneração para realização de exames”. A multa por infração é de 20%, ou seja, para o fazendeiro compensa correr o risco de ser multado. Sobre as fiscalizações, não há exigência de visitação e fiscalização mínima (até porque isso não compete ao sindicato). Há a criação de uma comissão de entendimento e fiscalização paritária composta por 4 pessoas.

76 Lembrando que a proibição do gato não teve grandes contribuições para a não precarização do trabalho, já que a terceirização de serviços foi uma saída adotada pelas fazendas como aponta o relato de Irmão na página 97 desta tese. 77 O intervalo entre jornadas que não era/é respeitado pelos empregadores, que comumente realizam a “virada”, explicada por Irmão anteriormente. 128

No acordo de 2014/2015 no Maranhão, uma cláusula foi incluída: “desde que mediante autorização escrita do trabalhador, as horas extras trabalhadas em um dia, plantio ou colheita, poderão ser acumuladas e compensadas na safra seguinte”. Empresa de mais de 20 funcionários deve manter espaço físico de escola ou garantir parcerias para garantir acesso à escola gratuita e de qualidade, bem como acesso a escolas noturnas e EJA aos trabalhadores – estas últimas, deve haver no mínimo 25 famílias permanentes nas fazendas. Somente em 2014 aparece a obrigatoriedade de alojamentos para mulheres.

O direito a licença a paternidade de 09 dias também começa a parecer em 2014. Em 2016, há extensão de direito paternidade a pais adotivos. Para empregados com relação trabalhista há mais de um ano, acréscimo de um dia. Um fato curioso é que a cláusula atende também natimortos. Confabulo se o aumento de fetos mau formados, abortos e causas de morte e interrupção da gravidez é agravada pelo excesso de exposição dos trabalhadores e suas famílias, que estariam expostas a mais de uma década aos agrotóxicos.

Ainda sobre exposição de perigos no trabalho é notório que mesmo em 2015 o material de primeiros socorros e atendimento a picadas de insetos era de obrigação do trabalhador.

Uma cláusula recente, observada nos acordos de 2015/2016 é a estabilidade provisória ao trabalhador acidentado de 12 meses após a alta médica e aos trabalhadores que se candidataram as eleições sindicais, estabilidade provisória desde sua candidatura até 12 meses após término do mandato. No entanto, a “garantia de salários ao trabalhador que estiver a 12 meses da percepção da aposentadoria, desde que tenha comunicado previamente o direito a estabilidade e que tenha trabalhado a 10 anos ou mais para o atual empregador torna praticamente impossível para que um trabalhador consiga uma alta médica, seja por questões da sazonalidade e informalidade dos vínculos seja pela mobilidade.

Uma das cláusulas do ACT indica que

“Em virtude das variações climáticas impostas pela natureza, sobre a qual nem a empresa nem seus funcionários tem qualquer controle, interferindo direta e significantemente nas condições técnicas de plantio e colheita, e reconhecida como situação de natureza extraordinária e imperiosa, em que os serviços não podem ser adiados, que é possível a extensão de duas horas de trabalhado sem o adicionais de 100% de hora extra”.

129

É possível ver como o ACT pode significar perda de direitos, e diminuir pagamentos que são garantidos na CLT, como é o caso da hora extra. Se a maior parte do risco do setor sojicultor encontra-se no plantio e colheita, o elo mais fraco, o trabalhador arca com os prejuízos não controlados pelo fazendeiro.

Após diálogos com o STTR, foi incluído o incentivo a campanhas de saúde do trabalhador na entressafra nas cidades de Balsas, Chapadinha e São Luís e obrigatoriedade de acesso à informação, acesso a cartilha de direitos aos trabalhadores. Atualmente está garantido o acesso dos dirigentes sindicais nos locais de trabalho desde que não interfiram as atividades laborais.

2.3.2 Acordos e Convenções Coletivos da Soja no sul do Piauí

No Piauí, os sindicatos responsáveis por firmar os acordos em 2009 são a FETAPI, STTR de Uruçuí, Antônio Almeida, Ribeiro Gonçalves (entidades sindicais) e o Sindicato Rural de Uruçuí e a Federação da Agricultura e Pecuária do Piauí.

Em 2009, o piso salarial para as seguintes funções foram:

I - Operador de máquina especializado: R$ 928,00;

II- Operador de máquina qualificado: R$ 757,00;

III- Tratorista: R$ 645,00;

IV- Trabalhadores rurais perceberão o valor de R$ 559,00;

Quando há atraso de pagamentos, assim como no Maranhão, as multas são corrigidas a partir dos juros da poupança, ou seja, abaixo da inflação e dos aumentos com alimentação do trabalhador.

Além disso, os STTR dos dois estados – o Piauí desde 2009 e o Maranhão desde 2014 – vem se comprometendo a buscar a qualificação profissional dos portadores de necessidades especiais junto aos órgãos públicos de qualificação profissional para atender a inclusão da cota de deficientes junto às empresas, conforme perfis profissionais oferecidos pelas as mesmas. Apesar de presente nos ACTs, os dirigentes de nenhum sindicato entrevistado ou visitado mencionou algo sobre o tema. 130

Retomando sobre o ACT’s do Piauí, desde 2009, há tentativas de adoção de um programa de participação nos resultados operacionais para seus empregados, obedecendo critérios individuais estabelecidos por cada empresa.

No mesmo ACT , apesar do ambiente predominantemente machista e masculino do assalariamento rural, é possível encontrar uma cláusula sobre assedio, sendo assegurado ao “trabalhador (a) rural, o direito de denunciar casos de assédio sexual e discriminação caso venha a sofrer, bem como, ao empregador (a) o direito de denunciar qualquer tipo de discriminações e de situações que venha a ferir sua honra e moral. a punição prevista para o (a) praticante de assédio sexual e de discriminação será de demissão por justa causa, caso o (a) praticante seja colega de trabalho da vítima e de formalização de queixa crime nos termos da lei, se o (a) denunciado (a) for superior hierárquico (a). em ambos os casos deverá ser constituída as comissões paritárias para apuração da denúncia.” Fica assegurado às trabalhadoras gestantes a proibição da despedida imotivada do emprego desde a confirmação da gravidez até 04 meses após o parto, bem como a licença a maternidade de 120 dias.

O transporte para fora da propriedade deve ser oferecido de maneira gratuita ao trabalhador, sendo considerada hora trabalhada o tempo gasto de percurso e espera do transporte. Esse direito em geral não é respeitado pelos empregadores rurais do Matopiba, como já discutido em subitem anterior sobre o trabalho nas fazendas de soja do sul do Maranhão. O empregador também dever fornecer alimentação saudável, a partir de 20 (vinte) empregados com cardápio orientado por um (a) nutricionista.

Em 2009 o Piauí já havia inserido uma cláusula (apesar de bastante genérica) sobre a promoção de cursos, seminários e campanhas de esclarecimento quanto ao uso adequado dos EPI's, preferencialmente no período de entresafra; item discutido nos ACT’s do maranhão somente em 2014.

Fica assegurado o acesso dos diretores sindicais aos locais de trabalho, nas empresas ou fazendas, mediante comunicação prévia. O sindicato laboral deverá comunicar ao sindicato patronal, sobre a visita a ser realizada, com data marcada. Em caso de não autorização, o interessado se fará acompanhar por fiscais da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego, em se tratando de matéria de segurança e saúde do trabalho.

Parágrafo 1º - fica garantido ao trabalhador a remuneração do dia não trabalhado e a integração do repouso semanal remunerado e outros direitos, quando de sua falta para participar das eleições do sindicato e assembleias anual da categoria; 131

Parágrafo 2º - haverá liberação dos trabalhadores sindicalizados que manifestarem o desejo de participar das assembleias gerais dos STTR's convenentes, descontados os dias faltados, sem prejuízo da gratificação natalina, férias e repouso semanal remunerado.

Parágrafo 3º - as empresas facilitarão as campanhas de estímulo à sindicalização dos empregados

O trabalhador sindicalizado contribui para o sindicato circunscrito à área da empresa ou fazenda em que trabalha no valor de 2% do vencimento que recebe, no mês de janeiro de 2010 para os trabalhadores já contratados até dezembro, e demais no primeiro mês de trabalho sobre a vigência desta convenção coletiva de trabalho, no valor que será recolhido mediante a um boleto, sendo que a FETAG-PI a responsável pelo repasse aos seus sindicatos conveniados: sendo retido 15 % do montante para a FETAG-PI e 5% para a Contag. De maneira semelhante é feito nos outros estados do Matopiba.

Em 2010/2011, os STTR Marcos Parente e Baixa Grande do Ribeiro foram incluídos nos arcos e os pisos salariais reajustados:

I - Operador de máquina especializado: R$ 1.945,10;

II - Operador de máquina qualificado: R$ 853,00;

III - Tratorista: R$ 726,40;

IV - Trabalhadores rurais: R$ 661,38;

V - Cozinheiros/as: R$ 661,38;

Nos acordos de 2010/2011, os empregadores rurais darão preferência a contratação de trabalhadores e trabalhadoras do município sede das empresas ou local da cultura plantada e dos municípios vizinhos. Os postos de menor remuneração já vêm sendo ocupados pela mão-de-obra local, e como já afirmado anteriormente, os gerentes das fazendas continuam sendo “paulistas” e “gaúchos”.

É de responsabilidade do empregado a entrega de uma garrafa térmica individual com capacidade para 05 (cinco) litros de água a cada empregado em serviço no campo, bem como, se obrigarão a disponibilizar água potável e fresca em quantidade suficiente e compatível com as atividades dos trabalhadores (as). 132

Neste ano de 2011, foi criada a Comissão Permanente Regional Rural, de composição paritária com no mínimo de três representantes do governo, três representantes dos trabalhadores e três representantes dos empregadores. A comissão teve as seguintes atribuições:

“I - estudar e propor medidas para o controle e a melhoria das condições e dos ambientes de trabalho;

II- realizar estudos, com base nos dados de acidentes e doenças decorrente do trabalho rural, visando estimular iniciativas de aperfeiçoamento técnico de processos de concepção e produção de máquinas, equipamentos e ferramentas;

III - propor e participar de campanhas de prevenção de acidentes no trabalho rural;

IV - incentivar estudos e debates, visando o aperfeiçoamento permanente desta norma regulamentadora e de procedimento no trabalho rural.”

Em 2012, houve uma ampliação da rede que abrange a CCT no Piauí, contemplando todos os trabalhadores e trabalhadoras que exercem atividades agrícolas e pecuárias nos municípios da região dos Cerrados, no Estado do Piauí, com abrangência territorial em Alvorada do Gurguéia, Antônio Almeida, Baixa Grande do Ribeiro, Barreiras do Piauí, Bertolínia, Bom Jesus, Canavieira, Colônia do Gurguéia, Corrente, Cristalândia do Piauí, Cristino Castro, Currais, Eliseu Martins, Floriano, Gilbués, Guadalupe, Jerumenha, Landri Sales, Manoel Emídio, Marcos Parente, Monte Alegre do Piauí, Palmeira do Piauí, Parnaguá, Pavussu, do Piauí, Redenção do Gurguéia, Ribeiro Gonçalves, Santa Filomena, São Gonçalo do Gurguéia, Sebastião Barros, Sebastião Leal e Uruçuí.

No ano de 2012, os trabalhadores e trabalhadoras que exercem atividades agrícolas e pecuárias na região dos cerrados piauienses tiveram um reajuste linear de 8% sobre os salários que recebiam em outubro de 2011; no qual R$715,00. Em 2015, o piso salarial para os trabalhadores e trabalhadoras foi R$950,00.

Já em 2017, a CCT abrangeu os municípios de Alvorada do Gurguéia, Antônio Almeida, Baixa Grande do Ribeiro, Barras, Barreiras do Piauí, Bertolínia, Boa Hora, Bom Jesus, Colônia do Gurguéia, Corrente, Cristalândia do Piauí, Cristino Castro, Curimatá, Currais, Eliseu Martins, Floriano, Gilbués, Manoel Emídio, Miguel Leão, Monsenhor Gil, Monte Alegre do Piauí, Palmeira do Piauí, Palmeirais, Piracuruca, Redenção do Gurguéia, Ribeiro Gonçalves, Santa Filomena, Santa Luz, Sebastião Leal e Uruçuí. 133

Fazendo um comparativo a partir dos municípios do CCT de 2012, foram incluídos os municípios de Barras, Boa Hora, Miguel Leão, Monsenhor Gil, Santa Luz, Curimatá e saíam da Convenção Guadalupe Jerumenha, Landri Sales, Parnaguá, Pavussu, Porto Alegre do Piauí no ano de 2017.

2.3.3 ACT dos trabalhadores e trabalhadoras assalariadas da Bahia

Na Bahia, a Federação dos Trabalhadores da Agricultura do estado é reconhecida como a instituição sindical, enquanto a Federação da Agricultura e Pecuária é tida como a entidade patronal dos acordos setoriais. O acordo, que não abrange somente a soja, é firmado nos muncípios de Angical, Baianópolis, Barreiras, Bom Jesus da Lapa, Buritirama, Catolândia, Cocos, Corretina, Cotegipe, Cristópolis, Formosa do Rio Preto, Luís Eduardo Magalhães, Muquém de São Francisco, Riachão das Neves, Santa Rita de Cássia, Santana, São Desidério e Serra do Ramalho.

Na convenção coletiva da Bahia de 2008, quando, em uma das rodadas de negociações, os STTR’s reivindicavam um salário de R$460,00 mensais para aquele ano e os patrões tinham chegado a R$445,00 e relutavam em atender o que reivindicavam os sindicatos. “Nós colocamos é, um valor de 460, mais eu acredito que deve fechar em 450 porque já ficou em 445. É...? Em 445, acredito que vai ficar por uns 450. O piso salarial. Mas nós tamos querendo fechar com 450” (SOBRINHO, 2012, p.53 – itálico do original). No fim das contas, no ano de 2008/2009, o acordo da safra de 2008/2009 do salário mínimo para os trabalhadores rurais do estado foi de R$445,00. Vale ressaltar que em média, um gerente da fazenda recebe R$ 200mil por safra.

Os STTR que participam ao longo do tempo podem sofrer pequenas alterações. Por exemplo, nos anos de 2013 e 2014 Urbano Santos e Tutóia não participaram. No entanto, sempre mais de 20 Sindicatos firmaram. Dentre as empresas que firmaram os acordos ao longo dos anos são: SLC Agricola, Fazenda Parnaíba, Weisul Agricola Ltda. Ribeirão S/A.

Em 2016/2017, o salário mínimo do trabalhador e trabalhadora rural baiano foi R$972,00, com reajuste para o ano de 2017 de 7,5% (a tentativa do sindicato foi negociar o piso em R$1012,00 e reajuste de 15%). Uma das cláusulas que aparece de maneira recorrente 134

e que não se encontra de maneira tão presente nos outros estados são a melhoria e maior especificação nos acordos das condições dos alojamentos. “os alojamentos deverão preencher os requisitos de salubridade, higiene, segurança e conforto, podendo ser rústico com aproveitamento da matéria prima local, mas vedada em qualquer hipótese o uso de lonas, ficando autorizado o uso de redes aos trabalhadores que assim preferirem”.

A partir da análise dos ACT e CCT’s, o Piauí é o estado que possuí melhores salários, em seguida do Maranhão e o piores salários são pagos aos trabalhadores do oeste da Bahia, estado com maior produção de soja e mais mecanizado no Matopiba. Tomando a safra de 2008/2009 por exemplo, o salário mínimo para a categoria no Piauí foi R$559,00; no Maranhão foi estipulado em R$483,60 e na Bahia em R$445,00.

Retomando sobre o ACT’s do Piauí, desde 2009, há tentativas de adoção de um programa de participação nos resultados operacionais para seus empregados, obedecendo critérios individuais estabelecidos por cada empresa e preocupações, mesmo que ainda genéricas, sem diretrizes de ações concretas para a formação e capacitação da mão-de-obra. Tais elementos somente aparecem de forma contundente em 2014 no Maranhão. O sul maranhense destaca-se por cláusulas que vão além dos salários, como direitos a licença paternidade, extensão de direitos a maternidade, garantia de atuação dos STTR’s dentro das fazendas de soja e garantia de estabilidade no emprego em casos de doença e acidente.

Para a Contag, seria necessárias determinadas ações para a garantia de melhoria da condição dos assalariados, como a) aprovação da PEC 438/2004, que dispõe sobre a expropriação de terra quando constatado trabalho escravo; b) a PEC 438/2001, que prevê a expropriação das fazendas com trabalho escravo para fins de reforma agrária; c) qualificação de 400 mil trabalhadores (as) assalariados (as) rurais, conforme compromisso firmado nas negociações do GTB/2011; d) criação de um programa para os assalariados e assalariadas rurais que assegure, no período de entressafra, o recebimento de uma bolsa pecuniária vinculada à escolarização e qualificação, a exemplo do Programa Mão Amiga (Sergipe) e Chapéu de Palha (Pernambuco); e) encaminhar ao Congresso Nacional uma proposta de Medida Provisória instituindo o sistema de declaração unificada, em substituição a GFIP e outras declarações existentes, que simplifica a formalização dos contratos de trabalho rural de curta duração previsto na Lei 11.718/2008; f) determinar o fim da pulverização aérea de agrotóxicos e a proibição imediata dos ingredientes ativos glifosato, abamectin, fosmete, parathion, forate, thiram, carbofuran, paraquate e lactofem, bem como 135

estabelecer uma fiscalização rígida sanitária; e por fim g) Garantir aos trabalhadores (as) assalariados (as) rurais, acesso aos programas de habitação, readequando as normas considerando as demandas e especificidades deste público (CONTAG, 2016).

De maneira geral, é notória a situação degradante de trabalho na sojicultura. Ainda em 2011, o ACT no Piauí pleiteava a obrigatoriedade de os empregadores fornecerem garrafas de água para seus trabalhadores, ou condições mínimas de alojamento – como a proibição de lonas nas instalações – no oeste baiano no ACT da recente safra de 2016/2017. Tal condição soma-se a lei A lei no 9.601/1998 que “garante” os direitos dos trabalhadores rurais, em que ainda é possível ser descontadas do empregado rural parcelas sobre seu salário: a) até o limite de 20% (vinte por cento) pela ocupação da morada; b)até o limite de 25% (vinte por cento) pelo fornecimento de alimentação sadia e farta, atendidos os preços vigentes na região. A mesma lei dita que o empregado menor de dezesseis anos é assegurado salário mínimo fixado em valor correspondente à metade do salário mínimo estabelecido para o adulto.

É possível ver como o ACT pode significar perda de direitos que são garantidos na CLT, como é o caso da hora extra (ou banco de horas), a suspensão de folgas e extensão de duas horas na jornada de trabalho em caso de intempéries climáticas nos períodos de plantio ou colheita. Se a maior parte do risco do setor sojicultor encontra-se no plantio e colheita, os trabalhadores arcam com os “prejuízos não controlados” do fazendeiro. Outra questão fundamental é a supressão do debate de acesso á terra aos trabalhadores assalariados, não presente nas reinvindicações dos ACT’s e CCT’s e nem nas reinvindicações atreladas aos trabalhadores rurais nos pontos emergências para a melhoria da categoria na CONTAG.

2.4 Buscando a terceira margem: invisibilidade do trabalho nos custos de produção da soja ou quando o trabalhador assalariado agrícola não é mais camponês

“Assim, os sitiantes de um ou alguns alqueires veem o seu pânico aumentar, impotentes de reduzi-lo”, vão se tornando cada vez mais integrados ao sistema na condição de trabalhadores assalariados, como trabalhadores autônomos manipulados , como Otavio Ianni já asseverava em seu livro “Origens Agrárias do Estado brasileiro” (1984, p.106). Claro que a 136

organização dos trabalhadores consegue transitoriamente “diminuir os efeitos da expansão das formas mais refinadas do capital” (IANNI, 1984), mas um questionamento importante a ser feito é onde fica a questão da terra no mundo do assalariado, elemento importante para frenar os processos de concentração e centralização do capital na agricultura.

Um dos marcos da organização dos assalariados foi a 1ª. Mobilização Nacional dos Assalariados e Assalariadas Rurais, que reuniu cinco mil assalariados e assalariadas rurais em 20 de março de 2012, em Brasília, para reivindicar melhores condições de vida e trabalho e construção de políticas públicas que atendesse as demandas específicas dos assalariados rurais78.

Em 2015, a CONTAG parou de representar os assalariados e assalariadas rurais, passando a participar da Confederação somente agricultores familiares e camponeses e camponesas e se fundou uma representação específica para os assalariados e assalariadas rurais – Confederação Nacional dos Trabalhadores Assalariados e Assalariadas Rurais (CONTAR)Para o presidente Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar de Rondônia (FETAGRO), a Confederação foi estruturada na representação sindical de trabalhadores(as) rurais, agricultores(as) familiares e assalariados(as), sendo importante definir qual a representação da Contag nas próximas décadas.

os desafios são grandes em decorrência de a estrutura fundiária ser muito diferente. O Conselho Deliberativo Ampliado da CONTAG terá o desafio de pensar no sentido de representar o País com todas as suas especificidades sem perder a essência”. Uma entidade que defende os agricultores e agricultoras familiares, entre eles, meeiros, arrendatários, posseiros, proprietários, enfim, que trabalham, muitas vezes, em condições de pobreza. Ao mesmo tempo, existem os bem-sucedidos com propriedades mais organizadas, boa renda, com acesso à tecnologia e crédito79.

No entanto, as margens entre o agricultor familiar e camponês e o assalariado são difusas. Uma parcela de assalariados foi expulsa de suas terras por distintos processos de avanço da fronteira agrícola, e outra parcela de trabalhadores assalariados tem um pedaço de terra – seja como proprietário, arrendatário, meeiro, posseiro – mas não consegue produzir e

78 Informações disponíveis no site da CONTAG: http://www.contag.org.br/index.php?modulo=portal&acao=interna&codpag=258&nw=1 . Acessado em maio de 2019. 79 Informações disponíveis no site da CONTAG http://www.contag.org.br/index.php?modulo=portal&acao=interna&codpag=101&id=12107&mt=1&nw=1 . Acessado em maio de 2019.

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ter um assalario como autônomo, trabalhando assim como assalariado sazonal. Então esse assalariado não tem a terra? Não é camponês?

“Pra pensar na divisão dos sindicatos, a gente precisava criar uma política pra cuidar do período que do cabra tiver na agricultura familiar e outra pra quando ele tiver no assalariamento. Se não, não vai adiantar.

Ai o desafio daqui hoje é o assalariamento rotativo. O Brasil hoje é o assalariado que na sua maioria fica girando. Quem é da região, fica nessa ‘bate-e-volta’ no período de safra ele tá lá na fazenda, depois ele volta pra roça dele. O assalariado mesmo, que vive de assalariado fica migrando. Ele vem lá de Pernambuco, vem pro Maranhão, vai pro Goiás, para o Mato Grosso. Aqui na região [de São Raimundo das Mangabeiras] é o povo que vem do Piauí, do norte de Pernambuco, fica no Maranhão, vai pro Goiás, termina no Mato Grosso e depois volta. As vezes vão até Tocantins, Goiatins, Campos Lindos. Dificilmente ele vai para o Pará. Geralmente ele vem do Pará, fica no Maranhão e vai pro Mato Grosso. Faz o ciclo. E quem é da soja trabalha na cana, na pecuária” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, 2016).

Os trabalhos de Alves (2015) apontam para uma intensificação nos processos de migração da região Matopiba, tendo como municípios de maior atração Luís Eduardo Magalhães, Barreiras, Balsas, Porto Franco, Palmas, Porto Nacional, Bom Jesus e Uruçuí. Os processos de migração retorno saídos de São Paulo, Goiás e Distrito Federal impulsionou juntamente com os processos de internos da região a mobilidade do trabalho. No oeste baiano o fluxo de sulistas é importante para compreender as transformações agrícola e agrária (ALVES, 2006; HAESBAERT, 1995). Sobre os fluxos regionais do Matopiba no do sul do Maranhão, os mais relevantes são fluxos intermunicípios maranhenses e saídos do Pará e Tocantins; no Tocantins, os fluxos saídos do Maranhão e do próprio Tocantins ganham força, principalmente nos anos entre 2009-2011; no sul piauiense, os fluxos saídos de Goiás e do Maranhão foram de maior destaque (ALVES, 2015).

É interessante a maior flexibilidade da força de trabalho da soja em comparação à cana de açúcar. Os sistemas integrados soja-milho, soja-pecuária, soja-algodão (mais comum no oeste da Bahia) e soja-feijão (menos frequente, tendo como único caso a fazenda Santa Luzia no sul do Maranhão) fazem com que o trabalhador da soja assuma também outras 138

responsabilidades dentro da fazenda, como já relatado Irmão e pelo gerente da referida fazenda. O ciclo da soja80 (115 a 123 dias) é mais curto se comparado a cana-de-açúcar, que tem ciclos que variam de 12 a 18 meses, fazendo com que os fluxos na sojicultura sejam mais voláteis.

“Tem uns cortador de cana que se adaptaram e o foco deles é cortador de cana. Pega a safra do norte, pega a safra do Pernambuco, pega a safra da Bahia, aí ‘aterriza’ no Maranhão por causa dessa questão do clima, que a safra são em períodos diferentes e ai ele consegue pegar. Mas o cara que tá na soja, o sojeiro mesmo, ele vai pra cana, ele vai pra pecuária. Da cana mesmo dificilmente ele vai pra pecuária” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, 2016).

Gráfico 4 - Participação do custo de mão-de-obra na produção de soja por hectare na Bahia, Maranhão e Tocantins (2006- 2018)

Participação do custo de mão-de-obra na produção de soja por hectare (%) 7 6 5 4 3 2 1 0 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018

Barreiras (BA) Balsas (MA) Pedro Afonso (TO)

Fonte: CONAB, 2019. Foram considerados custos de mão-de-obra as variáveis: mão-de-obra fixa e temporária e encargos sociais. Não há dados disponíveis para o estado do Piauí.

A participação da mão-de-obra no custo de produção é ínfima. No ano de 2006, a mão-de-obra custou R$39,24 por hectare, 3,76% do custo total em Barreiras. O município do

80 O ciclo da mesma cultivar pode variar de 10 a 12 dias de uma região para outra, devido ás distintas condições de temperatura e umidade, fotoperíodo, janela de vazio sanitário de plantio (COAMO, 2009).

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oeste baiano também representa a menor participação: 0,29% em 2012. O Maranhão apresenta queda da participação dos custos da mão-de-obra na produção a partir de 2011 depois mantêm-se estável, cerca de 0,5%, com ligeiro aumento em 2018 (0,71%). A participação da mão-de-obra nos custos é a mais alta em Pedro Afonso: R$ 165,19 (6,59%) em 2015 (CONAB, 2019).

Há uma abrupta queda na participação dos custos de produção da mão-de-obra entre as safras de 2011/2012 a 2014/2015. A implementação da norma N31 em 2011, referente a segurança e saúde no trabalho na agricultura, é entendida pelos fazendeiros como aumento de custos com o trabalhador, aumentando assim o uso de maquinário e substituindo. Há um aumento da produção e da área plantada em 2014, apesar do custo de produção neste ano decrescer, tendência em todos os estados.

Gráfico 5 - Número de tratores existentes nos estabelecimentos agropecuários por estado do Matopiba (1985-2017)

Número de tratores existentes nos estabelecimentos agropecuários por estado do Matopiba (1985-2017)

57274

27587 27613 25443

15953 15385 9942 7950 7887 5173 6045 20572956 24023965 3813 1985 1995 2006 2017 Ano Tocantins Maranhão Piauí Bahia

Fonte: IBGE/ Censo Agropecuário, 2017 (dados preliminares).

Como é possível observar no gráfico acima, o número de tratores vem crescendo na região Matopiba nos últimos 30 anos. Observa-se que ocorreu um crescimento abrupto nos 140

últimos 10 anos, coincidindo com o período de maior entrada de capitais estrangeiros, valorização das terras, investimentos em infraestrutura e projetos agropecuários impulsionados pelo Estado. Do ano de 2006 a 2017, a Bahia teve um crescimento de 207% do número de tratores nas unidades agropecuárias; o Tocantins aumentou a frota de tratores em 277%; o Maranhão 254% e o Piauí 206%. As lavouras temporárias, como a soja, são responsáveis por 43% do tratores baianos, 40% dos tratores piauienses, 31% dos tratores maranhenses e 18% dos tratores tocantinenses.

Assim como apontado nas tabelas de Alves (2015, p. 123-142) sobre a evolução do emprego formal por atividade econômica nos municípios do Matopiba, os empregos formais na agropecuária não apresentam crescimento considerável. Tal análise é endossada pelo gráfico de “Número de trabalhadores no setor agropecuário nos estados do Matopiba (2012-2018)” do subitem anterior, no qual os dados demonstram uma queda do número de empregos da atividade agropecuária na Bahia e estabilidade nos estados do Tocantins, Maranhão e Piauí, apesar do crescimento da área plantada de soja juntamente com a expansão da fronteira agrícola na região81.

“O seu Lenivaldo é da comunidade botequim e o seu Zé paciência, da comunidade paciência, são de comunidade de resistência, trabalham e tem um pedaço de terra. Ai quando eles voltam, eles ficam ali na lida do dia-a-dia. Tem muita gente do meu assentamento que fica um tempo cá [no assentamento] e outro lá [na fazenda].

[...] Agora o agricultor rural [camponês] é atrapalhado pelo assalariamento sazonal. Porque ele pode não receber algum benefício, ter dificuldade de acessar algum crédito. Depois ele joga o CPF lá e vê que ele assinou a carteira. Embora ele tenha uma declaração de posse [ou Declaração de Aptidão do PRONAF (DAP)], o sistema acaba excluindo-o.... é um desafio a ser superado. Às vezes ele fica registrado de 90 a 120 dias” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, 2016).

A exigência de 18 meses de vínculo empregatício para acessar os direitos, implementada nas Medidas Provisórias 664 e 665 em 2014 dificultaram ainda mais a vida dos assalariados. No mesmo ano, a Comissão Nacional dos Trabalhadores Rurais Empregados

81 Os dados do IBGE referentes ao período entre 1985 a 2006 apresentam comportamentos semelhantes para pessoal ocupado em estabelecimentos agropecuários. No Tocantins houve queda de aproximadamente 30%; no maranhão cerca de 40%, o Piauí se manteve estável e a Bahia apresentou queda de 30%. 141

(CNTRAE) parou de atuar. Essa comissão é o espaço para planejar e monitorar as ações previstas no Plano Nacional dos Trabalhadores Rurais Empregados (PLANTRE), pouco conhecido pelos trabalhadores assalariados.

Nos últimos anos, há uma crescente criação de entidades específicas para os trabalhadores assalariados rurais – Federações de Trabalhadores Assalariados Rurais ou Federações de Empregados Rurais Assalariados. A partir de 2013, o Cadastro Nacional de Entidades Sindicais (CNES) apontou a existência de 117 Sindicatos de Assalariados e Assalariadas Rurais. mais 324 pedidos de registro sindical de novas entidades específicas da agricultura familiar ou de assalariados e assalariadas rurais, todos sem qualquer relação com o MSTTR, tramitavam no MTE. Em 2014, o número de pedidos de registro sindical de novas entidades específicas no campo alcançou a marca de 600 processos (CONTAG, 2017). A CONTAR, atualmente possui 87 sindicatos filiados, nenhum destes localizados na região Matopiba. (CONTAR, 2018). No entanto, nos documentos da CONTAG82 , os sindicatos de todos os estados do Matopiba já foram reestruturados e não representam mais o assalariado rural. (CONTAG, 2017).

A saída dos trabalhadores assalariados dos STTR esmaece a relação entre o assalariado rural e a terra, distanciando a possibilidade de retorno a posse da terra83. A ideia de “empregado” relacionada agora exclusivamente à ideia de trabalhador assalariado rural, fortalece as relações de precariedade e de não-pertencimento resultado da modernização, automação e autonomização das relações capitalistas no campo. A ideia de empregado como força de trabalho também carrega o conceito de mobilidade, nos mostrando a dificuldade de permanecer em um determinado lugar. O trabalho não é uma parte da vida; é antes um sacrifício da vida. O que o trabalhador no campo produz agora é o seu salário, no qual as notas de dinheiro (a)pagaram os tomates, as hortaliças, o milho, o feijão, a mandioca. Lembro aqui do trabalho de campo realizado em 2014 em Pedro Afonso (TO). Todos os trabalhadores envolvidos na COAPA haviam substituídos suas lavouras pela soja e o município, que antes possuía uma diversidade de plantios tinha em 2017 mais de 80% da área plantada de soja (LIMA, 2017).

82 Documento Base de Plano e Lutas do 12º CNTRR, disponível em http://www.contag.org.br/imagens/ctg_file_462323100_06032017111506.pdf . Acesso em maio de 2019. 83 Apesar de umas das bandeiras da CONTAR ser a Reforma Agrária, e a entidade participar de atividades ligadas a Contag como o Grito da Terra e a Jornada de Luta pela Reforma Agrária. 142

Na atualidade, a atuação sindical principalmente nos municípios onde a presença do agronegócio se faz mais intensa no oeste baiano – Barreiras, São Desidério e Luis Eduardo Magalhães – está voltada para os assalariados. Isto contraria os princípios que nortearam a criação dos sindicatos de trabalhadores rurais na região: o combate à expansão e à violência da grilagem de terras (SOBRINHO, 2012). Os trabalhadores são atraídos para se submeterem condições de trabalho precário nas lavouras ditas modernas. “Nesta parte aí é onde está a situação. O pessoal não tem documento para trabalhar fichado, alojamento das piores qualidades, era lona preta parecendo assentamento de acampamento” (SOBRINHO, 2012, p.91, grifo do original). Aqui é curiosa a comparação que Sr. Walmir dos Santos, diretor do STR-Barreiras, em entrevista concedida a Sobrinho em janeiro de 2004 faz. Será que a lona preta de um acampamento é a mesma com a dos alojamentos das fazendas? Mesmo material, diferentes sonhos?

Retomando a questão da lida da terra, no livro “El diablo y el fetichismo de la mercancia”, Taussig (1993) disserta que as fases mais importantes do calendário agrícola camponês, tomando como exemplo a agricultura camponesa colombiana, são as colheitas que ocorrem a cada duas semanas. Como há uma grande diversidade de cultivos colhe-se de maneira mais frequente e menos concentrada. Já o preparo e limpeza da terra é realizado duas vezes no ano. Para cerca de dois hectares cultivados, que seria o necessário para garantir a alimentação de uma família, seriam necessários 100 dias de trabalho por ano. É possível obter dessa parcela da terra madeira e palha, mandioca, milho, abóbora, plantas medicinais, criar animais, como aves e porcos – só para ficar nos exemplos já descritos por Michael Taussig (p.121). Neste sentido, seria possível afirmar que o trabalho camponês na região do Matopiba até os meados do século XX, que muito se assemelha a dinâmica dos camponeses colombianos do mesmo período retratado por Taussig (1993) seria também próxima de cem dias de trabalho por ano, fazendo com que o trabalho assalariado fosse muito mais árduo – já que ele ocupa 120 dias por médio das fazendas de soja ou 240 dias para um trabalhador que realiza um jornada de trabalho de segunda a sexta-feira ao longo do ano.

La diferencia de la forma estética entre los campesinos y las plantaciones se reduce a esto: los campesinos tienen algún control de los materiales, las herramientas, el tiempo y la tierra; los trabajadores asalariados no controlan nada de esto. Tomás Zapata lo expresó con claridad: "Mis hijos e hijas son desinteresados. Sólo les importa pasar el día y tomar el dinero por la tarde; ir a trabajar al alba y volver cuando cae la noche. Viven al día. Pero la agricultura es un 143

arte, y ellos no lo entienden. Para este arte, lo primero es la constancia y la tierra (TAUSSIG, 1993 p.120).

Seria possível, assim como o homem-canoa de Guimarães era a terceira margem, que o homem do campo seja dono de sua vontade, de sua liberdade, do direito de ir e vir, liberto dos condicionamentos e constrangimentos? Pode-se dizer que essa terceira margem pode ser chamada de um outro nome: liberdade. Sonhada sempre, é verdade, mas antes sempre negada, adiada, roubada.

Fome, solidão, abandono, intempéries, doenças pouco ou nada lhe valeram ao longo do caminho se ele não criara a condição, nem que precária, para desfrutar e viver a liberdade.

Guimarães Rosa, desde o começo do conto já anunciava um homem cumpridor, ordeiro, positivo. A transição do escravismo para o trabalho assalariado teve como um dos pilares o menor custo de reprodução da mão-de-obra e aquecimento do mercado ao inserir uma população consumidora. Ou seja, era melhor não matar de inanição e castigos a força de trabalho, e sim regular sua sobrevivência. Após o achatamento dos salários e a precarização das condições assalariadas para seguir garantindo taxas de lucro, agora num mercado financeirizado, é importante precarizar o trabalhador para cercear seus direitos e garantir sua mobilidade como força volante do ajuste espacial. “É importante destacar que o sujeito livre carece de ter coragem, como ainda de entender a sua liberdade em sua negatividade” (HEIDEMANN, 2010, p.16)”.

O trabalhador assalariado rural é a terceira margem, problemática multidimansional: camponês, migrante, indígena, quilombola, vaqueiro de fundo de pasto, quebradeira de coco, pescador. E na canoa do conto de Guimarães Rosa ou dos rios Corrente, ou na beira de estrada segue, sem saber se ele é a margem, se está na margem de uma sociedade que não o vê.

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CAPÍTULO III

TERRA, SOJA E ACUMULAÇÃO NO MATOPIBA

¿Cómo puede existir La moneda

Tanta maldad Saltó como un insecto

En un país tan nuevo, Metálico

Tan poquita cosa? De entre sus dedos:

¿Acaso es éste Cara, al sur,

Un espacio diminuto y vacío Cruz, al norte,

Que nada significa, Y luego nos subimos todos

Que nada vale, y que A la camioneta

Sin embargo se te ofrece Y la ciudad

Gratis. De las leyendas

Estarían para siempre Y del miedo

Gobernados Quedó atrás.

Por el azar.

Fragmentos de Neochilenos, Roberto Bolaño

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3.1 PDA Matopiba e o avanço da soja

3.1.1 A criação de uma região e o avanço da soja

A partir da segunda metade do século XX, a presença do Estado via projetos agropecuários ocorre de forma mais “organizada” e planificada na região. Esses projetos agropecuários, em grande medida, levavam o discurso da vocação do plantio de commodities para o abastecimento do mercado externo. Como iniciativas estatais que prepararam o terreno para a criação do Matopiba podemos citar: SPVEA Superintendencia do Planejamento de valorização econômica da Amazônia (1953), Rodovia Belém-Brasília (BR-010) (1958), PIN Programa de integração Nacional (1970), criação do INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, PROTERRA - Programa de Redistribuição de Terras e de Estímulo à Agroindústria do Norte (1971), Projeto Pioneiro de colonização no maranhão (1973), POLOAMAZÔNIA (1974), PGC Programa Grande Carajás (1980), e o PRODECER . Programa de Cooperação Nipo-brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados que ocorreu em 3 fases: 1976 em Minas Gerais, -1982 Minas Gerais, Goiais, Bahia e Mato Grosso -1996 Maranhão e Tocantins. O Prodecer estimulou principalmente a expansão dos cultivos de grãos, em especial a soja nos cerrados com apoio da EMBRAPA, agencia criada em 1972 e que também fundamentou a criação do PDA Matopiba, fortalecendo a tecnificação do campo para produção de soja.

Estudos de Bernardes (2009), Alves (2015; 2006) e os estudos que venho desenvolvendo (LIMA, 2017; 2015) revelam a expansão do agronegócio brasileiro para o Matopiba, ocasionando novos processos de seletividade e especialização produtiva, e sem dúvida, concentração de riqueza e exclusão social. Essa reorganização territorial caracterizada pela divisão territorial e social do trabalho não é nova, pois tais áreas já sofreram organizações anteriores, provocando uma desagregação das relações de grupos sociais e a desconstrução e reconstrução de relações de poder entre esses grupos (BERNARDES, 2009). São visíveis as semelhanças do Plano de Desenvolvimento Agropecuário do Matopiba (PDA-Matopiba) ao Projeto de Lei Complementar (PLC) 228/2012. Tal PLC instituía a região do complexo geoeconômico e social do Corredor Centro-Norte, abrangendo os estados do Maranhão, do Piauí e do Tocantins, este em sua totalidade; o estado de Goiás, 147

acima do paralelo de 16° de latitude; os municípios do sudeste do Pará e o nordeste do Mato Grosso84.

O Corredor Centro-Norte se constitui no principal conjunto multimodal de transportes, destinado a interligar a região central do País ao Norte e ao Nordeste, através da Hidrovia Araguaia-Tocantins, da Ferrovia Norte-Sul e da Estrada de Ferro Carajás, com integração ao sistema rodoviário convencional e ao sistema ferroviário da Companhia Ferroviária do Nordeste.

A importância estratégica do corredor está relacionada à necessidade premente de escoar a produção agrícola, mineral e industrial da região central do País, bem como na necessidade de dotar essa área, que corresponde a mais de 40% do território brasileiro, da infraestrutura exigida pelo seu expressivo dinamismo econômico[...] A implantação de um programa especial para a área do Corredor Centro-Norte contribuirá inegavelmente para a integração nacional, minimizando os custos do transporte de longa distância e interligando as regiões Norte e Nordeste com o Sul e Sudeste, por meio das conexões ferroviárias, rodoviárias e fluviais. (BRASIL, 2012, s/n). A ideia do corredor implicava criar infraestrutura para o avanço da fronteira agrícola e escoamento de commodities em pontos da região, consolidando o corredor Centro- Norte como importante variável para exportação de produtos primários. A lógica que segue junto ao PDA Matopiba é de grande semelhança ao descrito para a região geoeconômica do Centro-Norte, em que o plano

orientará programas, projetos e ações federais relativos a atividades agrícolas e pecuárias a serem implementados na sua área de abrangência e promoverá a harmonização daqueles já existentes, observadas as seguintes diretrizes:

I – desenvolvimento e aumento da eficiência da infraestrutura logística relativa às atividades agrícolas e pecuárias; II – apoio à inovação e ao desenvolvimento tecnológico voltados às atividades agrícolas e pecuárias; e § 3º A implementação do PDA-Matopiba deverá observar a cooperação entre órgãos e entidades federais e entre estes e os órgãos e entidades dos demais entes federativos e a participação dos setores organizados da sociedade local (PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, DECRETO Nº 8. 447 DE 6 DE MAIO DE 2015).

A região oficializada pelo governo brasileiro como Matopiba, já havia sido caracterizada anteriormente por setores da academia de BAMAPITO (BERNARDES et al, 2009), e as análises realizadas, revelavam contradições que se tornam visíveis e acentuadas com a expansão da agricultura monocultora, latifundiária, científica e excludente. Conforme nos esclarece Alves (2009, p. 155):

84 Entretanto, a CONAB inclui o Oeste da Bahia para as análises do corredor Centro-Norte, região que também se destaca pela expansão do plantio de grãos para exportação. 148

A região dos cerrados nordestinos abrange o oeste baiano e o sul dos estados do Maranhão e Piauí, mas pode ser estendida, como área de influência, para a parte centro-oriental do Tocantins, onde se verifica uma situação de modernização contemporânea muito semelhante ao que ocorre nos cerrados nordestinos. Os vínculos econômicos, sob o comando do agronegócio, estabelecidos entre os cerrados nordestinos e Tocantins são responsáveis pela configuração de um novo delineamento regional, o qual recebe a denominação de “MAPITO”, referência utilizada para designar os vínculos dos cerrados maranhenses, piauienses e tocantinenses. Poderíamos incluir nesse novo complexo regional os cerrados do oeste da Bahia, sub-região que possui intensa ligação tanto com o Tocantins quanto o Maranhão e o Piauí. Desse modo, a denominação “BAMAPITO” expressa melhor os contornos geográficos da nova região.

O Matopiba são três regiões diferentes. No Piauí e Bahia o cerrado é mais parecido. No Maranhão, o cerrado não é tão homogêneo como os chapadões da Bahia. De acordo com o gerente da Fazenda Santa Luzia, implementada há 34 anos, o Matopiba tem ainda muito potencial a ser explorado. “Tanto que hoje é muito fértil. Maior fronteira agrícola do mundo néh?!tem uns agricultores que são arrojados, que trabalham mesmo e acreditam, mas a gente ainda tem problema logística de infraestrutura, de energia. Energia chegou aqui em 2014. A gente tinha problemas com água. Antes tinha que trazer gerador, utilizar oléo diesel, havia um alto custo. A gente pagava quase R$ 2 milhões por ano de óleo diesel.” (Fazenda Santa Luzia, 2016). A partir de entrevistas com assessores do MAPA e do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), podemos afirmar que o fenômeno do Matopiba já vinha sendo projetado desde a década de 70. Os gaúchos já estão há três gerações na região. Antes de chamar Matopiba, o Mapitoba já existia, mas começa e tomar força com esse nome quando o governo cria PDA Matopiba. Segundo Alves (2005) e Elias (2006), os Cerrados piauienses foram inseridos mais tardiamente em relação aos demais estados, sendo mais intensamente povoados por grupos sulistas a partir da segunda metade da década de 1990, influenciados pela expansão da fronteira agrícola no oeste baiano e no sul do Maranhão onde a presença dos sulistas é anterior.

“Essa discussão é antiga, eu participo dessa discussão, ou seja, mais profundamente nos últimos 3 anos. Eu sou natural de Balsas. Foi onde nasceu o projeto Matopiba. Em 1981 foi a época que eu cheguei em Balsas, eu nasci no interior, filho de vaqueiro, ai gente veio embora para Balsas. Em 79 começou muito tímido, mas em 85, 86 a expansão agrícola chegou mesmo forte. Em 86 começou a questão da compra, compra um pedaço, depois um pedação, veio muita gente daquela região. A região de Gado Bravo, hoje onde funciona o projeto Batavo, veio muita gente daquela região, eu tinha uma parte da minha família que morava lá, foi expulsa, morreu dois tio meu nessa peleita, os jagunços 149

chegavam e tiravam mesmo, o pessoal chegavam com documento de terra, não sabíamos nem de onde saia, e os camponeses nunca se preocuparam com documentação de terra, nem registro de cartório, ele tava lá, vivendo, era natural, era posseiro... Aí foram para o município de Alto Parnaíba, também fizeram o mesmo processo, aí vieram para cá, para o rumo de Riachão que é o Povoado do Coco, o lado mais manso foi lá no Coco, o lado mais manso dessa história foi alí no Coco85.

Eu me lembro que eu ia no Projeto Batavo, lá onde se transformou, era Bunge que na época era Ceval Alimentos, a Ceval alimentos que se transformou na Bunge, né? E o Projeto Batavo, eu tenho ele hoje como se fosse um projeto de assentamento, onde eles trouxeram de fora, os Poloneses, os Russos, os Gaúchos e Paranaenses, entregaram as terras para eles lá, tomaram as terras dos outros, e entregaram recursos para ele trabalhar, o próprio governo, em parceria com o governo de fora e aí eles dominaram essa região ai, aí onde começou, as estradas eram carreiro, aí abriu, abriram as estradas, depois os russos abandonaram, ai foram para Campos Lindos, que ali no Tocantins. Aí os Polaco, ocuparam parte do Piauí e mais para cá para o Sul da Bahia.

Nos anos 90, aí eles já tinham o desenho. De como era que fazia, a nova fronteira agrícola, já tinha o desenho, Maranhão com essa parte mais do sul mesmo, o Tocantins com Campos Lindos, Goiatins, Serra da Confusão , ainda hoje é uma confusão lá, ai o Alto Parnaiba, Santa Filomena e Luís Eduardo Magalhães, ali na Bahia, tudo fronteira, tudo limite, Gibués, tudo instalado nessa região todinha, aí começou, a desenhar o Matopiba, eles se reuniram aqui e formaram a COMIVAL, Cooperativa Mista Valverde, para discutir essa questão de como eles iam fazer, para essa questão da comercialização, do armazenamento e transporte, aí ainda digo assim, tudo isso é para ganhar o corpo de MATOPIBA, que ainda não tinha essa, aí tinha uma parte do Pará também, eles queriam incluir o Pará, nesse desenho. Depois esses gaúchos do Rio Coco, eles começaram a fazer um exemplo, a COMIVAL, hoje onde é a Bunge. Começou a chegar os investimentos de massa, aí isso já nos anos 92, 93, COMIVAL, era forte, aí hoje a COMIVAL se transformou na SLC e John Deere. Nessa época, aí o grupo SLC assumiu, a Batavo, Pequena Holanda, Nova Holanda e a Fazenda Carolina, e a Ceval mudou para Bunge. Ai extinguiu a COMIVAL, ai surgiu uma outra instituição, não me recordo o nome dela, só foi um ensaio, eles extinguiram

85 Em Rio Coco, no sul do Maranhão há uma unidade de armazenamento da Bunge. Esta inclusive foi uma das unidades já relatadas por Irmão que vimos placas não registrando os acidentes de trabalho da unidade. 150

a COMIVAL, eles começaram a trabalhar de forma isolada, chegou muito, muito... chegou o Zezão da Fazenda Ribeirão, chegou Lavranorte, separou, a SLC ficou representando a John Deere e ficou com a parte de gerenciamento...ai foi se desenhado mais ainda essa questão. Quando eles faziam... quando eu olhava nos eventos deles, aí surgiu essa questão, corredor de exportação norte, era um projeto” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, 2016).

Diferentemente dos trabalhos e notícias na mídia que vem discutindo nos últimos cinco anos a região do Matopiba, essa região, que aparentemente parece ter surgido nos anos 2000 a partir da expansão do agronegócio e do Plano de Desenvolvimento Agrícola Matopiba, na verdade, vem sendo moldada pelas relações capitalistas via expropriação dos camponeses e projetos agrícolas desde o início do século XX. Na segunda metade do século XX, de forma mais organizada e planificada pelo Estado, os projetos agrícolas começam a serem implementados de forma sistemática na região.

Entende- se que essa delimitação, a partir de um arbitrariedade político-econômica adotada pelo Estado torna a região funcional ao agronegócio globalizado. Denise Elias (2015) destaca que essa funcionalidade é um dos elementos da Região Produtiva Agrícola (RPA), híbridos compostos por modernos espaços agrícolas e espaços urbanos não metropolitanos, formando pontos ou manchas de rede agroindustriais86, perpassadas por “circuitos de produção e círculos de cooperação” (SANTOS, 1996). Aqui, o Matopiba se afasta da ideia de região da Geografia Clássica e se aproxima da ideia de lugares funcionais, onde a RPA muitas vezes não participa da ingerência efetiva das produções agrícolas e agroindustriais, abertas às influências exógenas e aos novos signos impostos pelo capital.

O Estado media a criação de formas adequadas no cerrado brasileiro para a produção de commodities para mercado mundial, aumentando a instabilidade espacial em função da turbulência do mercado, exigindo contínuas readaptações das técnicas envolvidas, das empresas, das instituições nas RPAs, aqui operacionalizada no Matopiba.

Esta “nova” lógica está inserida em um contexto de expansão de monocultivos e de suas inter-relações com os projetos de infraestrutura – indústrias siderúrgicas, ampliação e

86 “As redes agroindustriais compõem os territórios do agronegócio globalizado e reúnem as atividades inerentes ao agronegócio globalizado, seja a atividade agropecuária intensiva propriamente dita, sejam as atividades que antecedem essa produção e lhe são fundamentais (pesquisa agropecuária, produção de máquinas agrícolas, sementes selecionadas, fertilizantes, serviços de aviação, etc.), sejam as atividades de transformação industrial cuja máteria-prima provém da atividade agropecuária (indústria de alimentos , biocombustível etc.); sejam as atividades de distribuição comercial de alimentos, in natura ou transformados etc. 151

duplicação de ferrovias e das redes de transmissão de energia que ocupam os espaços de vegetação original ou antigas fazendas de produção de lavouras temporárias, sobretudo de arroz e pecuária bovina. Empresas como a Suzano Papel e Celulose, Bunge, Cargill entre outras supracitadas desempenham esse papel nos estados abarcados pelo Matopiba, com bastante fluidez, traduzido em incentivos fiscais e legislações que regulamentam sua operação.

Aí isso foi se acabando, as cidades foram crescendo, isso aqui foi muito amplo, agora falando do MATOPIBA, que foi se desenhado dentro disso daí, ai eles reivindicaram a estrada, e vieram, fizeram a reabertura da estrada, daí ganharam, fizeram o asfalto de lá, depois a Roseana assumiu o governo ai promove essa, o asfalto dessa BR, aqui ai começou a melhorar e eles cresceram, surge a FAPCEN, por conta dessa questão, não vamos fazer a ferrovia norte sul para beneficiar o corredor de exportação norte, que era para ligar essa questão do Norte com o Sul da Bahia, chegar até no Ceará, era isso a discussão deles, aí a Fapcen, vem para substituir a COMIVAl, os gaúcho pega se une com os paulistas, com os paranaense e cria essa Fapcen mesmo. Hoje a Fapcen é forte, bastante forte mesmo, é tão tanto que negociam até com governo que vem do exterior, sem passar por dentro, é discussão do governo mesmo. Realizam todo ano a feira do AgroBalsas, o presidente é o Zezan, e teve muito tempo a frente da FAPCEN, a Gisela Introvini, a “Kátia Abreu do sul do Maranhão”. Aí começa, a FAPCEN como a fazer umas demarcação, pra estudo, né, geoprocessamento, todo detalhadinho mesmo. A FAPCEN que fez isso tudo, e a Katia Abreu deu suporte e deputados da região contribuíram muito pra esse projeto.

Entretanto, após o segundo semestre de 2016 há uma mudança na política agrícola. E aí quando o Blairo Maggi entrou e a Katia Abreu saiu e ele cancelou o programa – e a gente acha que ia concorrer com a soja dele no Mato Grosso – o estrago já estava feito. Era um negócio que já estava acontecendo e que a Katia Abreu e seus aliados conseguiram colocar na mesa do mercado nacional e internacional com muita destreza, com muita negociação. Era um negócio que já estava ocorrendo, e quando o governo tira o apoio, tira a agencia Matopiba, não fez muita diferença no processo, porque ele agora está se dando a partir de investimentos privados, vide o porto em Santarém da Cargil. “Fazendo as estradas, o asfalto. Eles querem apoio do governo, mas se o governo não dá, eles vão fazendo. O que aconteceu na Bahia na década de 80 principalmente é o que está acontecendo no sul do Piauí agora” (Izabel Figueiredo, ISPN, 2018). 152

Desde 2012, a Katia Abreu possuía uma forte influência no MAPA, ainda no governo Lula. O PDA Matopiba era uma estratégia para a Katia Abreu se legitimar para além do Tocantins. O Matopiba seria a segunda grande conquista dos cerrados, sendo a primeira o Proceder, ambas com parcerias dos japoneses. Apesar de grandes ambições, com ideias de grande transformação na política agrícola nacional para o MAPA e para o Matopiba, a Katia Abreu falou muito e fez pouco, até porque ela pensava que ficaria 4 anos no governo.

“Pra barganhar preço ou combater alguns adversário aí eles se juntam, mas eles tem fissuras. Entre as grandes empresas e os grandes fazendeiros. Por exemplo, o Zezão, o presidente da FAPCEN , que é a grande promotora do Matopiba aqui nessa região [Balsas]. Só que ele não se dá bem com a família do Márcio Honaiser ,que é outra vertente grande que tem o UniBalsas, e algumas empresas poderosas aqui, fazendas grandes. Agora é claro, se alguma coisa colocar em risco o processo de acumulação deles, aí um se cala e o outro assume, e vice-versa” (ALDECY, AGERP, MA, 2016).

Foi realizado um megaevento sobre o Matopiba em Palmas, com cerca de 500 prefeitos, governadores do Tocantins, Maranhão, Piauí, vice-governador da Bahia,e os parceiros do Japão. Foi assinada a Declaração de Palmas, um documento adaptado a partir do texto de um acordo bilateral Brasil/Argentina para que houvesse algum produto (ou factoide). Foi criado, da mesma forma, a Frente dos Prefeitos do Matopiba, mas que não encaminhou nenhuma ação concreta. Em 2016, o MAPA elaborou o Plano Desenvolvimento Matopiba, que atualmente está parado. Há uma disputa territorial entre a elite do agronegócio: com a saída da Kátia Abreu do ministério e a entrada do Blaio Maggi, as ações (crédito rural, logística e outros investimentos) do MAPA foram direcionadas ao centro-oeste, em especial para o Mato Grosso.

“A FAPCEN é o instrumento que fez todas as pesquisas para que o Matopiba se consolidasse. Inclusive articulou a Embrapa, utilizou o governo chinês, utilizou o próprio governo do estado, e fizeram os arranjos todo. A Katia Abreu veio dar suporte, e os chineses vieram com a ferrovia neh, o outro projeto que veio pra revitalizar o rio Parnaíba pra utilizar a hidrovia, e a próprias estradas, a BR 230, e aí os compromissos firmados entre os governos da Bahia, do Piauí e do Tocantins, fazendo a interligações.

E a proposta e desenvolvimento. Eu participei de um debate agora na bacia do rio são Francisco e a Gisele [ex presidente da FAPCEN] tava lá com esse projeto, divulgando. Os discursos dela e ganhar a sociedade, pra quando chegar esses impactos está 153

tudo amenizado. Então conseguiram convencer parte de sociedade com relação as barragens que podem extrair água, construir pivô. Rio Balsas já está assoreado. Tem uma barragem pra baixo do Gado Bravo, que o governo cedeu. Tem muita coisa com o desenvolvimento... muito essa coisa de que a comunidade tá quietinha achando que não vai ser afetada”. (Irmão, Sindicato de São Raimundo das Mangabeiras, 2016).

O gerente da fazenda Santa Luzia, no entanto, alerta que para o agronegócio a questão da água também é um problema, e é necessário que haja alguma mudança no setor. “ A questão da água é importantíssima, porque há lugares que já está tendo salinização da água. Saturou. E vai ser o problema futuro. O mundo vai ter que discutir a questão da água, do estresse hídrico. Dentro da própria fazenda há nascente e vários rios. Na Fazenda Agrosserra, e São Raimundo das Mangabeiras, tem duas nascentes – o Rio Alpercatas, que sai lá pra Francisco Falcão e o [rio] Itapecuru, que abastece a cidade de São Luís. “Aqui se a gente pegar nossos rios, todos aqui desses baixões, todos eles estão com pesticidas, baixo nível de água. Muito ainda não se tocaram da importância de manter as matas ciliares”. Diversos rios foram salinizados e algumas regiões já sofrem com a falta de água.

Mesmo com o PDA Matopiba e a Secretaria de Assuntos estratégicos suspensa, os investimentos privados e o mercado de terras continuam em expansão. Para a ISPN e para a Embrapa, o Matopiba consolidou-se enquanto nova fronteira. Nas entrevistas que fizemos na Embrapa Pesca e Aquicultura, que juntamente com o GITE foram responsáveis para elaboração das notas técnicas do MATOPIBA, há uma crença que o planejamento estatal via PDA Matopiba criou um holofote na região, e houve um acompanhamento maior do que ocorria na região. O PDA chamou a atenção de diversos setores, inclusive da mídia, de ONG’s e coletivos sociais e acadêmicos para a complexidade do avanço da fronteira e seus impactos. Para a Embrapa, a expansão da fronteira agrícola era inevitável, porém, o PDA Matopiba permitia uma expansão planejada ou minimamente assistida pelo Estado.

La forma-Estado es inherentemente dual y conflictiva: expresa la existencia de acuerdos políticos para la ordenación de la convivencia, pero también la expropiación a los ciudadanos del ejercicio cotidiano de la politicidad humana. Las formas alienadas y cosificadas que adoptan las relaciones sociales en el proceso-capital (mercancía, dinero, trabajo asalariado) se despliegan también en la dimensión de la política. La relación estatal se reproduce entonces, como ha sucedido en toda la historia de la civilización humana, desde el establecimiento de un vínculo de mando-obediencia entre gobernantes y gobernados fundado en el reconocimiento de la autoridad política (legitimidad); pero al mismo tiempo, y en contraste con otras formas históricas de asociación política, concentrando el ejercicio del mando nacional (el 154

“poder soberano” del estado) y el uso de la violencia (aquello que en la definición de Weber, anticipada por Trotsky, se llama “monopolio de la violencia legítima”). (ROUX, 2008, p. 264)

O sistema de financiamento dos produtores de soja mantido pela grande empresa privada é ilustrativo das diversas formas de atuação desse capital, onde se realiza o circuito completo de sua valorização: realiza as determinações gerais do modo de produção capitalista, construindo territórios únicos, onde através do desenvolvimento técnico, se agrega cada vez mais trabalho morto.

Existem 289 empresas, entre tradings, comercializadoras, produtoras de sementes, processadores, importadoras e exportadoras de soja87. Do total das empresas, somente 1 não exportou para a China em 2018, a South Agrobusiness International – Eireli. Um fator interessante é observar a participação de grandes empresas do agronegócio que corriqueiramente associamos a outros setores participarem da tabela, como Cutrale, Votorantim e usinas do setor agrocanavieiro, como Usina Açucareira São Manoel S.A (SP)., Usina Conquista do Pontal S.A (SP), Usina De Açúcar Santa Terezinha Ltda (SP), Usina Eldorado S.A (que pertence a Odebrecht em Mato Grosso do Sul)., Usina Frutal Açúcar e Álcool Ltda. (pertencente a Bunge em Minas Gerais), Usina Guariroba Ltda (Bunge em São Paulo), Usina Itajobi Ltda Açúcar e Álcool (SP), Usina Itapagipe Açúcar e Álcool Ltda (Bunge em Minas Gerais), Usina Moema Açúcar e Álcool Ltda (SP), Usina Ouroeste Açúcar e Álcool Ltda, (Bunge em São Paulo), Usina São José S/A (PE). Nota-se que a maioria as usinas que participam do setor são do estado de São Paulo e foram adquiridas pela Bunge.

87 A tarefa de sistematizar as empresas por sua atividade no setor seria demasiado complexa, ainda não havendo trabalhos que esclareçam as atividades empresariais do setor em grandes escaladas de forma aprofundada. O livro de Ariovaldo Umbelino “ A territorialização do capital “ (2016) caminha na direção desse esforço, ao sistematizar as atividades das maiores empresas do setor de grãos, como Bunge, ADM, Cargil, Louys Dreyfus. Esforço maior seria conseguir determinar quais empresas estão atuando na região do Matopiba. Com as oscilações do preço da commoditty e problemas de safras nos últimos 5 anos, fusões entre empresas do setor e joint ventura, seria necessário um estudo minucioso e de maior fôlego. Uma possibilidade seria rastrear os CNPJs de tais empresas da soja, que somam 1.399 registros distintos. A Sipal Indústria e Comercio Ltda possui 22 CNPJ, A SEARA-IND. E COMÉRCIO DE PRODUTOS AGRO-PECUÁRIOS LTDA 18, A NIDERA SEMENTES LTDA 56 registros, A Multigrain S.A 13, Louis Dreyfus 38; LAR COOPERATIVA AGROINDUSTRIAL18, INTEGRADA COOPERATIVA AGROINDUSTRIAL 49; I. RIEDI & CIA LTDA 25; GAVILON DO BRASIL COMÉRCIO DE PRODUTOS AGRÍCOLAS 20; Fiagril Ltda 20; A COFCO INTERNATIONAL GRAINS LTDA Junto com a COFCO BRASIL S.A possuem 57 ; COAMO AGROINDUSTRIAL COOPERATIVA 104; CARGILL ALIMENTOS LTDA junto com CARGILL AGRÍCOLA S.A. 84; CARAMURU ALIMENTOS S.A. 28; C.VALE - COOPERATIVA AGROINDUSTRIAL 53; BUNGE FERTILIZANTES S/A e BUNGE ALIMENTOS S/A 97 ; Amaggi 61 (AMAGGI LOUIS DREYFUS ZEN-NOH GRAOS S.A. são 9 ; AMAGGI EXPORTAÇÃO E IMPORTAÇÃO LTDA 45; AGROPECUÁRIA MAGGI LTDA 7); AGREX DO BRASIL S.A. 13; ADM DO BRASIL LTDA 57; ABC-INDÚSTRIA E COMÉRCIO S/A-ABC-INCO 18. 155

No Brasil estão registrados 852 registros para soja (Glycine max (L.) Merr.), do total de 2391 de todo o banco de cultivares do Sistema Nacional de proteção de cultivares (SNPC, 201888). Destas, 639 são sementes geneticamente modificadas e 213 são sementes a partir de melhoramento sem transgenia89. A AGRIGENETICS, INC possui 72 sementes patenteadas; Associados Don Mario (25) e Associados Dom Mario e GDM Genética do Brasil 63 sementes; GDM Genética do Brasil 5 sementes; BAYER CROPSCIENCE LP 19 sementes, Bayer S.A Paraguay 3 sementes, BAYER S. A. – PARAGUAI e COOPERATIVA DE PROVISION DE SERVICIOS AGRÍCOLAS CRIADERO SANTA ROSA Ltda 7 sementes, Bayer S.A 63 sementes, BAYER S.A. e INSTITUTO RIO GRANDENSE DO ARROZ – IRGA 2 sementes; Monsoy Ltda 102 sementes; DUPONT DO BRASIL S/A - DIVISÃO PIONEER SEMENTES 38 sementes. Embrapa 131 sementes, Embrapa e EMATER 7 sementes, Embrapa e EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA - EMBRAPA_AGÊNCIA GOIANA DE DESENVOLVIMENTO RURAL E FUNDIÁRIO - AGENCIARURAL 3 sementes, Embrapa e _AGÊNCIA GOIANA DE DESENVOLVIMENTO RURAL E FUNDIÁRIO - AGENCIARURALCENTRO TECNOLÓGICO PARA PESQUISAS AGROPECUÁRIAS-CTPA_ 1 semente, Embrapa e EMATER Goiás 2 sementes, Embrapa e EMPRESA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA DE MINAS GERAIS – EPAMIG 17 sementes, Embrapa e FUNDAÇÃO ESTADUAL DE PESQUISA AGROPECUÁRIA-FEPAGRO 1 semente, Embrapa e FUNDAÇÃO ESTADUAL DE PESQUISA AGROPECUÁRIA-FEPAGRO 5 sementes, FTS SEMENTES S.A 28 sementes; Nidera S.A 54 sementes; Sygenta Porteção de Cultivos Ltda 1 semente; Syngenta Seeds Ltda 24 sementes; FTS SEMENTES S.A 24 sementes, TMG TROPICAL MELHORAMENTO E GENÉTICA LTDA_FUNDAÇÃO DE APOIO À PESQUISA AGROPECUÁRIA DE MATO GROSSO - FUNDAÇÃO MT_UNISOJA S/A 5 sementes; TMG TROPICAL MELHORAMENTO E GENÉTICA LTDA_UNISOJA S/A_ 1 semente; Universidade Federal de Viçosa 19 sementes. A Bayer detém no total 94 sementes patenteadas, que somadas às 102 sementes da Monsoy Ltda, setor de sementes da Monsanto, fazem com que o conglomerado Bayer/Monsanto detenha 196 tipos cultivares de soja, 25% do registrado SNPC. A Embrapa aparece em lugar de destaque , que juntamente com outras instituições nacionais detém 167 cultivares de soja, 19% dos registros do SNPC.

88Disponível em http://sistemas.agricultura.gov.br/snpc/cultivarweb/cultivares_protegidas.php?txt_ordem= &postado=1&acao=pesquisar&txt_nome_comum=soja& . Levantamento realizado em 19 de janeiro de 2018. 89 Ver tabelas em anexo. 156

Apesar de apresentar o registro de somente 38 cultivares de soja, a Pioneer tem feito grandes investimentos no setor de sementes de grãos para climas tropicais. Instalada desde 2007, vem realizando teste com mais de 500 variedades de soja e milho. De acordo com informações coletadas em trabalho de campo, o complexo experimental da Pioneer em Porto Nacional é a segunda instalação em âmbito mundial da empresa com maior conteúdo genético em milho, perdendo apenas para a unidade mexicana, país de origem deste grão. Os investimentos em projetos tecnológicos que chegam a US$ 3 milhões. Atualmente, a Pioneer possui um canteiro de produção de sementes de soja em uma área de 30 hectares e outra com 90 hectares de milho90 (2010). A empresa domina cerca de 40% do mercado de sementes de milho nacional e fatura mais de 1 bilhão de reais somente em sementes91 (2016). Outras empresas que também tem centros de sementes em Porto Nacional são: GDM Genética do brasil, Dasoja (Nidera Sementes, Boa Safra Sementes, J&H, Seed Corp HO), Nidera Sementes (COFCO INTL), BRASMAX, Já os dados do Departamento de Gestão e Risco Rural, indicam que na safra de 2009/2010, por exemplo, foram cultivadas 1500 sementes no Brasil, o que mostra que ainda contradições nos dados, ou pouca transparência (e investigação sobre o tema). Na referida safra, foram utilizados 171 tipos distintos de sementes de soja no Matopiba. Para a safra de 2015/2016, a Coordenação Geral de Zonamento Agropecuário, pertencente ao Departamento de Gestão e Risco Rural, registrou 4.949 sementes de soja plantadas em todo o país e 6.393 sementes no ano de 2018. No Matopiba92, foram cultivadas 766 sementes distintas de soja na safra 2015/2016 (MAPA, 2016). Em 2018, foram cerca de 1.300 (MAPA, 2018). Tais número demonstram o alto investimento em tecnologia para o setor sojicultor, além de alto grau de especialização. Cada semente acompanha um manejo específico, tempos de colheita e plantio distintos – podendo ter ciclos médios, longos e curtos para ser combinados com outros cultivares da rotação de culturas, em geral, milho, sorgo, algodão. Além disso, cada semente tem seu “pacote” específico de fertilizantes e agrotóxicos, vendidos em geral pelas empresas detentoras da semente – no caso de Pioneer, Bayer e Monsanto.

90 Informações disponíveis em https://canalrural.uol.com.br/noticias/agricultura/tocantins-investe-tecnologias- para-aumento-produtividade-milho-soja-42301/ . Acessado em 23 de junho de 2018. 91 Informações disponíveis em https://www.dinheirorural.com.br/secao/agronegocios/pioneer-e-o-milho-do- futuro . Acessado em 23 de junho de 2018. 92 Ver tabela em anexo. 157

A FAPCEN, fundação criada para trabalhar com pesquisa em sementes e adubos químicos93, em toda a área agrícola do Maranhão e Matopiba recebe royalties por cultivares e já desenvolveu parcerias com a BASF e Syngenta e a Embrapa soja para desenvolvimento de sementes, parceria rompida em 2014.

Fonte: Entrada da FAPCEN na BR 230. 2015

“Em março houve um evento da Syngenta, que rodou cerca de 1milhão e meio de hectares nas regiões do Tocantins, do Piauí, da Bahia e do Maranhão. Dentro do Matopiba. Todo ano

93 “A FAPCEN é uma organização privada, formada a partir da união de forças entre empresários e produtores rurais, que sem fins lucrativos promovem o melhoramento e sustentabilidade da pesquisa, voltada as necessidades do agronegócio regional. Sediada no município de Balsas – MA, na região dos grandes cerrados brasileiros, a FAPCEN trabalha pelo desenvolvimento de uma das mais importantes fronteiras agrícolas no Brasil, já consolidadas, tanto por sua potencialidade agricultável, quanto pela logística que faz da região um importante polo produtor de grãos. Instituída em 27 de abril de 1993, a Fundação de Apoio à Pesquisa do Corredor de Exportação Norte “Irineu Alcides Bays” – FAPCEN, procura através da cooperação e união entre, pesquisa, extensão, produção e comercialização atender as necessidades voltadas às atividades agrícolas da Região. Missão: Cooperar com o desenvolvimento do agronegócio na Região do Corredor de Exportação Norte gerando conhecimento, soluções inovadoras e sustentáveis atendendo as necessidades agrícolas e socioeconômicas do MATOPIBA (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia)”. (site da FAPCEN. Negritos do original). Disponível em http://fapcen.agr.br/institucional/ .

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eles fazem um evento para lançar o produto deles [aqui na FAPCEN]. Vem produtor de todo o Matopiba” (Engenheiro FAPCEN, 2015).

A FAPCEN também se destaca na região como instituição de apoio a certificação não somente fazendas, de todos os processos produtivos. Ao total, são 5 princípios, 7 critérios e 93 indicadores. Em 2015, eram 4 fazendas certificadas no sul do Maranhão: Fazenda Progresso, Tunísia, Nova Holanda e Sol Nascente – está última somente para desenvolvimento de pesquisa. A questão da certificação não tem o governo diretamente envolvido, que “aqui não apoia tanto quanto nos outros estados. Só quando tem o Agrobalsas [que ocorre na propriedade da FAPCEN], por exemplo, aí eles vêm, mas apoio assim na parte de pesquisa não tem muito. Sempre foi assim” (Engenheiro FAPCEN, 2015).

Apesar do forte discurso que o agronegócio pauta de que não há apoio estatal para o setor, o site da própria FAPCEN mostra que há patrocínio do Banco do Nordeste, do governo federal, Banco do Brasil, Banco da Amazônia, Associação Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Porto de Itaqui e SEBRAE. O único patrocinador privado da AgroBalsas em 2018 foi a Ambev94.

Há um entendimento que a diversificação entre as sementes de soja e a rotação de cultivo não seria enquadrada como monocultivo. Se você há alternância de distintas sementes de soja nos talhões das fazendas em grandes propriedades, os técnicos da FAPCEN não consideram monocultivo.

“Um dos requisitos da certificação é esse: não pode fazer monocultura e não deixar a área desprotegida. Tem que ter um plano de conservação do solo. E esse plano tem que estar implantado na propriedade ou tem que começar a implantar para poder ter o certificado. O que tem se feito aqui hoje é ter soja na primeira safra, na segunda safra faz milho safrinha, aí muitos produtores estão fazendo consórcio de milho com braquiária, que aí pode colar o boi de engorda na entressafra ou simplesmente deixar a braquiária pra proteger o subsolo, porque ele é uma gramínea boa que auxiliar na compactação, reciclagem de nutrientes, e ter uma cobertura. A radiação solar aqui é muito forte, temos um período muito longo de seca se o solo. Sem a cobertura o solo empobrece muito.

94 Ver no site http://fapcen.agr.br/. Acessado em 24 de junho de 2018. Como instituições colaboradoras poderia citar o SENAR, SENAC, Secretaria de Agricultura do Maranhão, Supermercado São Mateus, Fazenda São Mateus dentre outros. 159

3.1.2 PDA Matopiba: cerrados

O PDA Matopiba constitui uma área de 731.734,85 km2, cerca de 35% do total da área do cerrado95 brasileiro. Cerrado não, Cerrados. Neste sentido, as áreas de cerrados dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, totalizam 91% do território (66.543.540,87 hectares) do Matopiba. Remanescentes do bioma Amazônia (7,3% ou 5.319.628,40 hectares) e Caatinga (1,7% ou 1.203.107,22 hectares) foram incluídos na delimitação e são encontrados nos limites noroeste e leste da região, zonas de faixas de ecótonos (EMBRAPA, 2014).

Apesar de não existir uma unanimidade, os cerrados estão inseridos nos domínios morfoclimáticos de chapadões e penetrados por florestas-galerias se estendendo por cerca de 2 mil km2 (AB’SABER, 2003). Enquanto constituição do bioma, Ribeiro e Walter (2008) apontam que apesar de haver uma fisionomia predominante, variações da fauna, flora, solo, clima são encontradas localmente, associadas a eventos temporais. Tais feições podem ser classificadas em 11 principais fitofisionomias: mata ciliar, mata de galeria, mata seca e cerradão (grupo de fisionomia florestal); cerrado denso, típico, ralo, rupestre (grupo de fisionomia savânica); campo sujo, campo limpo, campo rupestre (grupo de fisionomia campestre), veredas, parque de cerrado, palmeiral ( grupo de fisionomia savânica de cerrado em sentido amplo). O clima, a química e física do solo, disponibilidade de água, latitude, frequência de queimadas tem efeitos diretos sobre alterações na vegetação, além de fatores antrópicos, em especial as atividades agropecuárias. Os dois autores também catalogaram cerca de 775 nomes para o Cerrado, demonstrando a enorme diversidade de significados e fisionomias do bioma.

95 O cerrado abrange o Distrito Federal e dez estados: Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Tocantins, Maranhão, Bahia, Piauí, Minas Gerais, São Paulo e Paraná, ocupando uma área aproximada de 2.036 milhões de km² (24% do território nacional) (BRASIL, 2009). 160

Foto 12 - Diversidade dos cerrados no Matopiba

Fonte: Mata ciliar da comunidade Gabriel Filho, Palmeirante (TO). Foto da autora (2018). Áreas de veredes e Chapadas de Correntina (BA). Fonte: Metropolis (2018).

Foto 13 - Diversidade dos cerrados no Matopiba

Fonte: Chapadas e vales em Cristino Castro e Bom Jesus (PI). Fotos da autora (2018). Arredores de Imperatriz (MA). Foto da autora (2012).

O clima possui variações entre o Equatorial quente, úmido 3 meses secos , nas zonas a norte do Tocantins e leste do Maranhão limítrofes ao estado do Pará; Tropical Equatorial quente, semi-úmido 4 a 5 meses secos no centro tocantinense e sul do Maranhão; Tropical Equatorial quente, semi-úmido 4 a 5 meses secos, no centro e sul do Tocantins , oeste da Bahia e extremo sul do Piauí; Tropical Central quente, semi-árido 6 meses secos, no sul do Piauí e oeste da Bahia; e uma pequena parcela entre o Tropical Central quente, semi- árido 7 a 8 meses secos, no extremo nordeste de Bom Jesus da Lapa (BA) (EMBRAPA, 2014). 161

Mapa 2 - Tipos de solo e localização de assentamentos, terras indígenas e quilombos no Matopiba

Fonte: IBGE - EMBRAPA - Mapa de Solos do Brasil. Rio de Janeiro: IBGE, 2001 - Escala 1:5.000.000. INCRA, 2018. Organização da autora e Embrapa Pesca e Aquicultura (2018). 162

No Tocantins, há um predomínio de plintossolos na margem esquerda do Rio Tocantins, a oeste do estado, com manchas de latossolos no centro-sul e no Bico do Papagaio, na região de Araguaína. Destaca-se também a presença de chernossolos nas áreas próximas a Pedro Afonso e Campos Lindos, municípios que inclusive receberam projetos agrícolas para produção de grãos – Prodecer III e Polo Agrícola Campos Lindos respectivamente. Juntamente com a implementação da rodovia Belém Brasília nos anos 1960, o desenvolvimento territorial tocantinense, antes impulsionado pela ocupação e ligação fluvial das cidades a margem direita do rio, como Porto Nacional, Almas, e Tocantinópolis, agora se desloca para a margem esquerda.

Os trilhos de Anápolis hoje, conectam a Ferrovia Norte-Sul, que teve impactos logísticos superestimados e fortemente afetados pela saída da Kátia Abreu do Ministério de Agricultura. A implementação de outras infraestruturas nas últimas décadas na margem esquerda favoreceu a expansão do agronegócio na porção oeste do Tocantins. As áreas de latossolo do Bico do Papagaio, tanto no estado tocantinense quanto maranhense são áreas de disputas e conflitos entre camponeses e quebradeiras de coco desde os anos 1980. Na porção central do Tocantins em que é possível observar uma mancha de latossolos, região das TI Funil (16mil hectares) e TI Xerente (168mil hectares) são as áreas de melhor ph para o plantio de soja. No município de Tocantínia, as plantações margeiam as comunidades indígenas.

O oeste da Bahia e o sul do Piauí são as áreas que apresentam a maior contiguidade de áreas de latossolos. No sul do Tocantins concentram-se superfícies aplainadas degradadas. O domínio de colinas amplas e suaves com baixa inclinação (de 3º a 10º, ou seja, que permitem a mecanização) ocupa 20% da região, juntamente a cerca de 15% de áreas de chapadas e platôs. O latossolo é a classe dominante nos cerrados do Matopiba. São cerca de 28 milhões de hectares (38%), 30,55% latossolos amarelos, caracterizados pelo intenso intemperismo, com fertilidade geralmente baixa, porém, com características físicas favoráveis para o uso agrícola (boa permeabilidade e alta porosidade) (Embrapa, 2006). Encontram-se predominantemente no oeste da Bahia e no sul do Maranhão e Piauí, nos domínios das bacias sedimentares.

As áreas de avanço de commodities no sul do Maranhão predominam chapadas e vales, em manchas de latossolos amarelos cortados por latossolos vermelhos, neossolos litólicos (pouca profundidade e baixa capacidade agrícola de acordo com os índices construídos pela Embrapa) e plintossolos. A zona entre os municípios de Imperatriz, Estreito e 163

Balsas, apresentam a menor vulnerabilidade climática e, as regiões de Estreito, Carolina, Açailândia (TO) já apresenta maior vulnerabilidade climática. No entanto, a região sul do Maranhão apresenta vulnerabilidade geológica moderada e alta no trecho entre Imperatriz e Balsas, e de Balsas ao extremo sul, onde quase toda a região está em zona geológica vulnerável; com solos medianamente estáveis. A zona entre Carolina e Balsas apresenta zonas de extrema fragilidade, assim como alguns pontos próximos a Grajaú (EMBRAPA, 2014)96.

Já no norte e nordeste do Tocantins e sudoeste da Bahia, temos a presença de neossolos quartzarênicos formados essencialmente por areias quartzosas, o que confere uma baixa fertilidade natural. Na região do Jalapão, há ainda a formação de relevos ondulados que não favorecem a mecanização97. No estado tocantinense, o avanço do agronegócio acompanha as manchas mais espraiadas de áreas de chapadas e latossolos que ocorrem de maneira mais descontínua, diferentemente das grandes áreas de chapadas e/ou solos profundos encontradas no oeste da Bahia, Maranhão e no Piauí. Assim como apontaremos outros elementos e processos territoriais sobre a estrutura fundiária da região, pode-se afirmar que as condições geomorfológicas também influenciam no tamanho das fazendas de soja, já que as características naturais também compõem a renda diferencial da terra. No Tocantins, as fazendas podem chegar 10, 12 ou até mesmo 15 mil hectares – como ocorre nos municípios de Santa Fé, Barra do Ouro. No entanto, a média das propriedades produtoras de soja no estado tocantinense é de 1mil hectares, diferentemente das extensas fazendas encontradas no sul do Maranhão, Piauí e Bahia – sendo no sul do Piauí e no oeste da Bahia onde as fazendas atingem maior extensão, sendo comum a presença de fazendas acima de 10mil hectares. Isso não significa que áreas com características “menos favoráveis” não estejam sendo incorporadas para a expansão da produção de soja, já que existem tecnologias agrícolas para a produção da soja “adaptadas” para as diversas características edafoclimáticas nos cerrados do

96 Interessante observar que o estudo da Embrapa Cocais é “encomendado” pela Embrapa Satélite momentos antes da implementação do PDA Matopiba. 97 Tais condições naturais somam-se a outros fatores territoriais e de resistência camponesa que dificultaram a expansão da soja no Jalapão (LIMA, 2017). No entanto, é possível ver um avanço de plantios de eucalipto nos últimos 5 anos. Existem diferentes abordagens e intencionalidades na caracterização dos órgãos estatais para que tipos de solos são considerados férteis ou aptos para a agricultura. Em ação de despejo, tanto no assentamento em Santa Maria, localizado em Nova Colina (TO) quanto no assentamento Gabriel Filho, localizado em Palmeirante(TO), existem laudos do INCRA firmando que não seria possível a efetivação e titulação dos assentamentos já que a terra é considerada não apta a agricultura. Apesar da infertilidade, há grandes interesses de fazendeiros nestas terras, em Nova Colina para a pecuária e em Palmeirante para plantio de grãos. Não é possível encontrar discussões e referências mais aprofundadas sobre tal discussão que aparenta ser de importância para o campo brasileiro. Tal descompasso entre visões de fertilidade sobre a terra já foram observadas em outras disputas de terras e localidades de maneira informal e pouco acurada, sendo necessário maiores investigações sobre o tema. 164

Matopiba. Vale ressaltar, que nos anos 1960 e 1970 houveram diversos estudos agronômicos que classificavam os solos dos cerrados como pobres em nutrientes, de alta acidez e teor de alumínio, demonstrando que a visão sobre fertilidade e classificação do solo da agronomia moderna é bastante restrita, e representa o alcance das taxas de lucro, do discurso do agronegócio e viabilidade técnica pré-concebida.

No entanto, as áreas contíguas de chapadas e latossolos, presentes no sul do Maranhão e no oeste da Bahia, onde a renda diferencial da terra é mais favorável e possibilita custos menores de produção – seja por características naturais como aqui apontado, seja por características normativas, políticas, culturais ou logísticas como será descrito nos capítulos subsequentes –, são incorporadas preferencialmente, desde os anos 1970 de forma intensa, onde a expulsão de comunidades camponesas para a produção de soja acontece de forma mais agressiva.

As áreas de maior aptidão agrícola acompanham os movimentos de expansão agrícola, enquanto as áreas de assentamentos, em sua maioria concentram-se em solos mais pobres e relevos mais acidentados. Outro fato interessante é observar que as zonas de preservação ambiental e áreas de bioma preservado estão mais próximas a assentamentos, quilombos e terras indígenas98.

A região engloba 324.326 mil estabelecimentos agrícolas (BRASIL, 2015). Ocorrem na área 46 unidades de conservação (8.334.679 ha), 39 terras indígenas (4.202.803,83 ha). No Tocantins, há cerca de 15 mil indígenas distribuídos em 14 Terras Indígenas: Karajá, Xambioá, Javaé, Xerente, Krahô, Krahô Kanela, Apinajé e Avá-Canoeiro, Tapirapé, Guarani. No Maranhão, são 23: T.I Tenetehara, Gavião Pukobiê, Kanela, Guajá, Krenyê, Timbira, Krikati. No Piauí, não há nenhuma terra indígena reconhecida pelo estado brasileiro. No entanto, a inexistência de registros de terras indígenas não equivale a

98 Sobre a preservação dos biomas e das comunidades tradicionais, diversas entidades vêm realizando esforços neste sentido, como STTRs, Movimento Interestadual de Quebradeiras de Coco do Babaçu (MIQCB), Comissão Pastoral da Terra (CPT), Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Movimento Quilombola do Maranhão (Moquibom), Alternativa para Pequena Agricultura do Tocantins (APA-TO), 10envolvimento, Rede Cerrado, Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, Centro de Educação do Trabalhador Rural do Maranhão (CENTRU), Comsaúde, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Liga dos Camponeses Pobres, Movimento Camponês Popular, Movimento de Luta pela Terra (MLT), Movimento de Pequenos Agricultores (MPA), Movimento dos Acampados e Assentados e Quilombolas da Bahia (CETA), Articulação Estadual de Fundos e Fechos de Pasto (BA), A Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais no Estado da Bahia (ATTR) além de pesquisas que vem/foram sido desenvolvidas por Regina Sader, Otávio Velho, Carlos Walter Porto Gonçalves, Alfredo Wagner, Mariana Conceição Nóbrega, Marta Inês Medeiros, Helciane Fátima Abreu, Vicente Eudes Lemos Alves, Atamis Fochiera, Marcelo Carneiro, Horácio Antunes de Santanna. 165

inexistência de povos indígenas nem de reivindicações fundiárias, como foi observado em trabalho de campo na comunidade de Sete Lagoas, em Santa Filomena (PI), que pleiteia por sua identidade Gamela a partir do resgate de sua cultura e de parentescos com indígenas do sul do Maranhão. Na Bahia, das 30 T.I reconhecidas no estado, somente 2 estão na região de estudo (FUNAI, 2018). Na região do Matopiba são reconhecidos 24 quilombos, que totalizam uma área de 238.358,88 ha: Lagoa do Peixe, Nova Batalhinha, Riacho da Sacutiaba e Sacutiaba, Mangal e Barro Vermelho (título da FCP), Araçá, Cariacá, Pato, Pedras, Retiro, Lagoa das Piranhas, Barra do Parateca – na Bahia; Santa Maria dos Pinheiros , Santa Joana, Matões dos Moreira, Piqui/Santa Maria dos Pretos, Mata de São Benedito, Árvore Verde, Ipiranga do Carmina, São Francisco Malaquias, Santa Rosa dos Pretos, Pitoró dos Pretos, Monge Belo, Alto Bonito – no Maranhão; Kalunga do Mimoso, Grotão, Barra do Aroeira, Ilha de São Vicente – no Tocantins. Assim como ocorre na titulação de Terras Indígenas, o Piauí não tem nenhuma terra quilombola titulada99. Na área de estudo foram contabilizados 1.126 assentamentos (379 no Tocantins, 83 no oeste da Bahia, 618 no centro sul do Maranhão e 46 no sul do Piauí), totalizando uma área de 4.633.545,06 ha100 (INCRA, 2018).

99 Ainda existem comunidades que estão se organizando para serem reconhecidas como Comunidades Remanescentes de Quilombos, algumas já possuem reconhecimento da Fundação Palmares, porém não tem a titulação da terra, como as comunidades São Joaquim, Fazenda Lageado, Cocalinho, Projeto Baviera, Povoado do Prata, Morro do São João, Cocalinho, Mumbuca, Laginha, Lagoa da Pedra, São José , Malhadinha, Chapada de Natividade, Córrego Fundo, Água Branca, Matão, Mata Grande, Santa Maria das Mangabeiras, Carrapato e Formiga e Ambrósio, Dona Juscelina, Rio das Almas, Curralinho do Portal, Manoel João, Pé do Morro, Ilha de São Vicente, Baião; comunidades sem reconhecimento não possuem certificação pela Fundação Cultural Palmares e nem processo formalizado no INCRA: Maganos, Maria Serra, Miradouro, Mocambo, Quilombo do Pombo, Riachão, Rio das Pedras, São Salvador, Socavão, Ventura, Povoado de Boa Esperança, Poço D’anta. (informações de trabalhos de campo e da APA-TO, 2012). 100 Na Bahia existem 691 assentamentos, sendo 83 na região do Matopiba; 1028 no Maranhão, sendo 618 na região do estado pertencente ao Matopiba; 499 no Piauí, sendo 46 no Matopiba e todos os assentamentos rurais tocantinenses pertencem ao Matopiba. 166

Mapa 3 - Localização dos assentamentos rurais, quilombolas e terras indígenas e Unidades de Conservação nos Matopiba

Fonte: Fonte: IBGE - EMBRAPA - Mapa de Solos do Brasil. Rio de Janeiro: IBGE, 2001 - Escala 1:5.000.000. INCRA, 2018. Organização da autora e Embrapa Pesca e Aquicultura (2018). 167

O Matopiba é apontado pelo agronegócio brasileiro como a nova fronteira do agronegócio, sendo considerado como excelente oportunidade de investimento, encontrando inclusive excelentes condições para o estabelecimento de atividades agroindustriais. No entanto tais investimentos desconsideram as dimensões sociais, culturais e ambientais de grupos sociais que historicamente sempre tiveram seus direitos negados, inviabilizados e eliminados.

Foto 14 - Matopiba: uma disputa de projetos

Fonte: Passeata contra o Matopiba em Brasília (CIMI, 2015) Seu Pricilino em sua casa, na comunidade Chupé (Acervo APública, 2018).

“Mas nós tamo com um senhor de MATOPIBA que é outra luta forte. MATOPIBA, diz que foi implantado no Tocantins, Maranhão, Bahia e Piaui. É um projeto que não vai acabar só a mata, vai acabar é com a vida, acabar é com o povo, e também não é só a vida das zonas rurais que vai morrer. Nós tivemos em Palmas num seminário que falava sobre o MATOPIBA, e também na assembleia dos indígenas que também estão sendo impactados. Os que mais tão sendo atacado é eles ... na verdade é todo mundo, é como eu falei lá, é todo mundo, ou todo mundo se junta para lutar junto ou então... vai ser implantado isso daí que acho que já está aprovado, esse projeto. Nós não vamos ter agua nesses estados, nós não vamos ter pássaro, nós não vamos ter nada, vai acabar, vai morrer muita gente e o pior que não é só das pequenas cidades, vai ser das grandes também, porque na hora que acabar a água. Vocês viram que em 2015 não tinha agua em São Paulo, avalia se entra essa coisa bem daí, esses projetos que acabam com tudo... não vai ter... 168

A gente fica pensando muitas horas como é que vai barrar isso, mas a gente pensa, a gente sabe que é lutando; que a gente nunca ganhou nada de graça até hoje101. Eu ainda não conheci uma coisa assim para gente pobre que veio de graça. Não vem, tem que ter luta, tem que ter coragem pra lutar. Eu já estou dessa idade daqui, mais uns anos não vou aguentar mais a luta. Mas eu espero que juventude que está aí, que ainda estão novo que continuem a luta, porque a gente vai morrer mesmo, porque a gente sabe que vai morrer, mas a gente quer uma morte digna. Ninguém quer morrer de fome e nem de sede não, que é o que vai acontecer se esse projeto bem daí ser aprovado ... porque muitos pássaros aí já estão em extinção. nem é ser aprovado, porque aprovado diz que já tá .... A gente não vê um pássaro, um canto de um passarinho, que aquele cheiro [de agrotóxico] que ofende. Aí se continuar acabou a história da luta do povo, se o povo deixa isso acontecer. A gente não quer deixar. Eu acho que se eu morrer antes disso acontecer, lá onde eu estiver, eu tô metendo meu dedinho para não acontecer; porque é horrível demais, é ruim demais o que vai acontecer...” (Dona Francisca, Tocantins, 2016).

3.3 Matopiba e o mercado de terras

Uma das principais questões sobre a terra na teoria de Marx, tanto no “Formações Pré-capitalistas e mais detalhadamente em “O Capital” (no capítulo XXIV do primeiro livro e na sessão VI do Livro III) é a passagem da terra transformando-se em propriedade privada e seus processos de autonomização. A renda fundiária, forma em que a propriedade fundiária se valoriza, é uma das expressões da fetichização da relação espaço-tempo, tão cara à Geografia, já que ela representa a soma de dinheiro paga pelo tempo de uso de um determinado espaço ao seu dono.

A posse da terra na região é bastante heterogênea, mas de forma resumida, classifico como “pequenos proprietários que detém o título da terra, em geral homens mais velhos; os herdeiros de terra de herança sem partilha; os parentes desses herdeiros que, embora não tenham direito a terra permanecem morando e cultivando nas terras dos parentes,

101 Ou como disse Antônio Criolo, em uma entrevista em 2016: Os recursos não chegariam, mesmo que minguados, se não tivesse essa luta aí. A escola não chega, o Pronaf não chegava, o salário, a aposentadoria não chegava, o atendimento a saúde não chega. A questão dos filho de pobre ir pra universidade não ia acontecer... tudo isso se deu da luta do trabalhador que nem talvez nem esteja mais entre nós, mas começou lá.

169

nos limites dos povoados; os parentes desses herdeiros que apenas residem nos limites desses povoados, mas pagam renda para cultivar em outras terras, de latifundiários ou outros pequenos proprietários; os herdeiros de terra de herança que pagam renda para cultivar a terra em terra de preto, que as usufruem em comum; os herdeiros, ou pequenos proprietários que ocupam as terras de chapada limítrofes ás propriedades, tornando-se também posseiros (Andrade, 1995, p.34); grileiros e arrendatários (nacionais e estrangeiros); donos de médias e grandes propriedades; fundos e empresas donas de terras, fundos e empresas arrendatários de terras.

A Lei 601 de 1850 e políticas de controle e vigilância atingiam especialmente índios, negros e mestiço (CARDOSO, 2014). Conhecida também como Lei de Terras, pedra fundamental para a normatização terra enquanto mercadoria, declara que as terras devolutas no Império, e acerca das que são possuídas por título de sesmaria sem preenchimento das condições legais, bem como por simples título de posse mansa e pacifica; sejam medidas e demarcadas as primeiras e cedidas a título oneroso para empresas particulares bem como para o estabelecimento de colônias de nacionais e de estrangeiros, autorizado o Governo a promover a colonização estrangeira. O Art. 1º da Lei 601/1850 dita que “ficam prohibidas as acquisições de terras devolutas por outro título que não seja o de compra” e no Art 2º criminaliza outras formas de apossamento que não seja a compra (BRASIL, 1850). A despeito de ter perdurado durante mais de dois séculos, este documento teve pouco impacto no ordenamento fundiário regional. Um levantamento realizado por Vianna no começo do século XX mostra que na Província do Grão-Pará (que abrangia os atuais Estados de Pará, Amapá, Amazonas, Maranhão e Piauí), de 1700 até 1835, teriam sido expedidas 2.158 cartas de sesmaria. O mesmo autor afirma que destas só 560 destas cartas foram transformadas em propriedade plena, permitindo a incorporação no patrimônio particular indevido de 4.319.272ha.

Apesar de a legislação colonial prever que só as cartas de sesmarias confirmadas garantiriam o direito de propriedade, ao longo destes séculos inúmeras posses foram estabelecidas em terras públicas sem nenhum consentimento formal por parte do Estado e, consequentemente, à revelia do ordenamento jurídico vigente. Este processo de ocupação espontânea consolidou-se no período de 1822 a 1850 quando, tendo sido extinto o regime sesmarial (Resolução n.º 76, de 17 de julho de 1822), nenhuma lei regulamentava o acesso à terra. Neste período, denominado de “Regime das Posses”, o fato gerador que permitiria a aquisição da propriedade passou a ser a posse. Durante quase trinta anos, porém, 170

não existiu nenhum procedimento jurídico que transformasse estas ocupações em propriedade. Favoreceu-se a ocupação desordenada do território: posses sem limites de tamanho coexistiam ao lado dos latifúndios oriundos das antigas sesmarias (legais ou não).

Saindo da escala da formação territorial brasileira, ou melhor, olhando para suas entranhas, percebe-se que os reflexos dessa modernização, principalmente da modernização da agricultura voltada a produção global, estão presentes nas estruturas legislativas, fundiárias, sociais, econômicas e políticas regionais. De uma repartição de terras em porções continentais, seja repartida pelo Coroa portuguesa, seja “legalizada” na Lei de Terras de 1850, a terra sempre esteve no controle de poucos. Sobre a questão da terra e o controle na mão de poucos, podemos também apontar que são as mesmas mãos que assinam leis e que determinam políticas públicas no país. Entre os políticos eleitos em 2012, por exemplo, a média de hectares por senador chega a 973 hectares. De acordo com os dados especificados e declarados, governadores, senadores, deputados federais e estaduais, prefeitos e vice-prefeitos detém 2,03 milhões de hectares no valor de R$2,16 bilhões de reais.

A região Matopiba passou a receber atenção do Estado nacional brasileiro através de políticas públicas voltadas para a modernização econômica do território, consolidando-se em uma das principais áreas de produção de commodities agrícolas e minerais e avança para a disponibilização de outros tipos de recursos naturais, como energia eólica e solar102. Tais condições despertaram interesses de grupos econômicos estrangeiros pela região a partir de diversos aspectos. Antes de visibilizar a ocorrência desse fenômeno na região em análise, é preciso considerar que tal fenômeno econômico de aquisição de terras por grupos estrangeiros nas áreas de domínio dos Estados nacionais também passa a ser uma das dimensões do processo de avanço do capital no atual momento histórico. A corrida pela apropriação de terras, também abordado teoricamente pelo conceito de land grabbing (SAUER e BORRAS, 2016), refere-se ao processo das formas recentes de acumulação de capital. O termo land grabbing ainda não possui tradução em português, mas podemos dizer que se trata de um conjunto de ações para a apropriação de grandes extensões de terras – entendendo a terra e seu conjunto de recursos naturais, como floresta, água e recursos minerais – por instituições estrangeiras e voltada para a extração de tais recursos e de sua acumulação para destinos também externos. Termos como ‘land rush’, farmland grab’ também são encontrados na bibliografia

102 Principalmente no estado do Piauí e em alguns pontos do oeste da Bahia. 171

internacional (SAUER; BORRAS JR, 2016; BANCO, 2010; GRAIN, 2008) para caracterizar a ação de fundos de pensão, fundos soberanos, empresas de private equity, fundações universitárias, instituições bancárias, seguradoras e grandes corporações. As formas de apropriação da terra em suas diversas dimensões acompanham os processos de financeirização da economia no período contemporâneo (CHESNAIS, 1996, HARVEY, 2004). A financeirização da agricultura cria diversas artimanhas para a captura da terra: moderniza as formas de grilagem, permite a compra de terras por estrangeiros e land grabbing – artimanhas essas ligadas tanto ao processo de ficcionalização quanto à acumulação por despossessão, nesta última, conforme admite Harvey (2004), torna-se tentativa de frear a tendência da queda geral da taxa de lucro via rentização da terra. O land grabbing estimula e cria um vasto mercado global de terras. O desenvolvimento de infraestruturas e serviços é fundamental para permitir vendas e aquisições, obter a posse ou os “direitos de arrendamento, desenvolver instrumentos legais apropriados e até pressionar pela criação de novas leis que acomodem esse compras” (SASKEN, 2016, p.100). A ideia de “apropriação” é o conceito chave para compreender as mudanças no mercado de terras e a presença cada vez maior dos fundos financeiros de investimentos, já que a transferência de direito de propriedade de uma grande parcela dos imóveis rurais é apropriada ilegalmente por grandes grupos econômicos ou associada a falsos títulos.103 Além disso, a maior parte dos capitais estrangeiros está também presente em ramos diversos da cadeia produtiva do agronegócio, como é o caso das sementes e fertilizantes e de empresas comercializadoras, nas quais os contratos de arrendamento de terras ainda é uma estratégica de ajuste espacial dos capitais estrangeiros. Nos últimos anos, observa-se uma expressiva elevação do preço da terra na região. Esse fenômeno está associado ao aumento dos investimentos direcionados para a formação de infraestrutura regional, especialmente de transporte, energia e comunicação e do avanço espacial e produtivo de commodities. É nesse contexto de valorização fundiária que

103 O Programa Terra Legal (TL), que pretende regularizar títulos fundiários para 300 mil posseiros em terra pública na Amazônia Legal brasileira, legaliza a grilagem e fortalece a concentração de terras via legitimação estatal. “Por outro lado, investimentos do agronegócio de larga escala estão aumentando o desmatamento e a concentração fundiária na região do bioma de Cerrados por mecanismos de Estado já bem estabelecidos. Enquanto a imposição de “legibilidade” pode regular a concentração fundiária e o desmatamento, regiões legíveis também facilitam investimentos que provocam desmatamento e concentração de terras” (OLIVEIRA, 2016). O Programa estatal Terra Legal estrutura a corrida por terras em nível nacional – não por que grandes quantidades de terras públicas estão de fato sendo privatizadas por tal regularização, mas por que esse programa limita a possibilidade de redistribuição de terras em outras regiões e consolida a infraestrutura do agronegócio na área de transição entre o Cerrado e a Amazônia. 172

avança o interesse, por parte de grupos econômicos empresariais estrangeiros, por aquisição de terras, seja para transformá-las produtivamente ou para sua apropriação como ativo financeiro, para transformá-las em áreas de reserva de valor. De acordo com Buainain (2014), a participação das terras no patrimônio (valor dos bens) dos estabelecimentos agropecuários mantém-se elevada e crescente nas últimas décadas, tendo subido de 53% em 1970, para 70,5% em 2006, seguidas de prédios e construções (14,3% em 1970 e 9,2% em 2006), animais (26% e 8,1%, em 1970 e 2006, respectivamente), máquinas e equipamentos em geral (5% e 6,4%, em 1970 e 2006, respectivamente), lavouras permanentes e matas plantadas.

Ao examinar as formas de renda fundiária se manifestar, ou seja, o arrendamento que é pago a título de renda fundiária ao proprietário da terra pela utilização do solo, seja para fins produtivos, seja para fins consumptivos, cabe registrar que o preço das coisas que não tem por si nenhum valor, ou seja, que não são produto de trabalho. Tendo o capital como o movimento do valor, entendemos aqui a terra como capaz de gerar renda, seja pelo seu movimento produtivo ou especulativo, no qual o movimento especulativo abona a terra como conservação de riqueza e como ferramenta especulativa, ligada ao capital fictício. Essa questão toma centralidade a partir da crise de 2008, onde o Brasil, assim como algumas regiões da África e do sudeste asiático se tornam localidade preferenciais para capitais financeiros (e fictícios). De acordo com estudos da LandMatrix, percebe-se um padrão de aquisição em áreas com regulamentações fracas ou inexistentes, ou com problemas de fiscalização. Todos em locais com grandes potenciais em termos de a) mercado local, b) ponto estratégico para logística ou c) baixo custo de insumos (terra, capital e mão de obra). Os principais compradores originam-se dos EUA, Holanda, China, Portugal, Espanha, Japão. (todos com sérias restrições de expansão de áreas), como apontam os dados do SNCR104. Chama a atenção a falta de informações das propriedades adquiridas por empresas e fundos estrangeiros, como as fazendas Sagitario, Catuaí Verde, Catuaí Norte e Florida da Radar S/A - Tellus S/A em Balsas; as fazendas da Sollus Mapito Pei Participaçoes Ltda em Campos Lindos (TO), Jaborandi (BA) e João Lisboa (MA); Embora o limite legal imposto pela legislação brasileira tenha indicativo de regramento de acesso a compra de terra por estrangeiros no país, verifica-se que os procedimentos legais estão sendo desrespeitados a partir de diversas manobras empresariais, nas quais envolvem arranjos societários entre empresas nacionais e estrangeiras para se

104 Ver as tabelas de Aquisições de terras por estrangeiros e empresas estrangeiras (tabela 5 e tabela 6) nos anexos. 173

apropriarem de maiores extensões fundiárias. A Lei Brasileira nº 5.709/71 define que “os estrangeiros podem adquirir até um quarto da área do país (artigo 12), ou seja, 212,869 milhões de hectares do território brasileiro” (OLIVEIRA, 2010, p. 53), entretanto, o Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR), órgão do Estado nacional brasileiro de controle de acesso à terra, possui dados subestimados, já que é de caráter auto declaratório, e também desatualizado (possui registro de apenas 50% das terras nacionais), pois quando os cartórios registram separadamente as transações de compra e venda e informam ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), enviam essas informações para as Superintendências Regionais, na maioria apenas em papel, onde acabam ficando represadas nas agências regionais de tal organização estatal e não são computadas no SNCR. Isso justifica, por exemplo, a falta de dados do estado do Piauí, que coincidentemente foi o que apontou elevada valorização de terra nos últimos 10 anos. O estado da Bahia, fronteira agrícola mais consolidada da região de estudo, possui maior número de terras nas mãos de estrangeiros, seguido do Tocantins. Neste último estado, há comprovação de presença de chineses comprando terra, especialmente nos municípios denominados de Lajeado, Miracema do Tocantins e Rio Sono. Esse é um indicativo de que o capital chinês está interessado em desenvolver investimentos na aquisição de terra no país, sobretudo tornando esse recurso em ativo financeiro, na medida em que teve grande valorização nos últimos anos na região. A China foi o país que mais comprou terras em outros países, montante que pode ter chegando até 12 milhões de hectares (SASKEN, 2016). No Brasil, estima-se que as aquisições estrangeiras de terras chegaram a 2.250.000 ha de terras, ou 3,8% da terra cultivada do país. Apesar da porcentagem territorial ainda não muito expressiva (0,26%), o controle das empresas estrangeiras acontece por outros momentos da cadeia de alimentos, encaram a produção (soja) e a capitalização da renda e especulação da terra como formas de valorização do capital; a criação de novas fazendas, com capitalização via renda diferencial, e criação de patrimônio (compra da terra para investimentos em produção, maquinários), agregando trabalho com objetivo de venda futura; e a terra meramente como forma especulativa, via capital fictício. O Estado vai paulatinamente se organizando de modo a viabilizar a operação de diferentes expedientes de espoliação, seja por meio da abertura de novos territórios de acumulação (como nos processos de privatização), seja através da criação exacerbada de capital fictício (principalmente dívida pública), seja como facilitador dos processos de financeirização da riqueza (por conta de deter o monopólio da violência e prerrogativa de formular leis).

174

Foto 15 - A soja como patrimônio

Fonte: Agroguia, Informativo publicitário, novembro 2012.

No estado do Piauí, na região de Floriano, localizam-se as áreas que mais valorizaram no Matopiba: 900%. As áreas tradicionais de fruticultura são as que menos registraram aumento de preço no período, ao passo que as áreas de cerrado e caatinga foram as que mais valorizaram no estado, principalmente nas regiões de Floriano, Bom Jesus e Uruçuí. Na Bahia, áreas de fruticultura desvalorizaram-se no período, como os municípios de Jitaúna e Itagi, Itagibá, localizados em Vitória da Conquista e no oeste da Bahia as áreas de fruticultura foram as que menos valorizaram. 175

Gráfico 6 - Preço de terra de alta produtividade no Matopiba (2003-2017)

25000

20000

15000

10000

5000 T… F… 0 L… 2003 2004 2005 2006 2007 U… 2008 2009 2010 2011 2012 2013 P… 2014 2015 2016 2017 Pedro Afonso (TO) Bom Jesus (PI) Uruçuí (PI) Balsas (MA) Luís Eduardo Magalhães (BA) Barreiras Formosa do Rio Preto São Desidério Tasso Fragoso

Fonte: FNP Agrícola (2003-2017). Valores ajustados ao Índice Geral de Preços e Mercado (IGP-M)105, que nos permite ter uma curva real de valorização da terra.

Para efeito comparativo, no período entre 2007 a 2017, as terras agrícolas de alta produtividade tiveram elevada valorização na região. No município de Pedro Afonso (no estado de Tocantins), a terra obteve valorização de 420%; em Bom Jesus e Uruçuí (no estado do Piauí) as taxas de crescimento desses ativos foram, respectivamente de 415% e 519%; em Balsas (no estado do Maranhão) a taxa foi de 398%; enquanto as terras em Luís Eduardo Magalhaes (no estado da Bahia) obtiveram avanços de sua valorização de 260%. Nas cidades em que o agronegócio está mais consolidado, Luís Eduardo Magalhães e Balsas,

105 O Índice Geral de Preços do Mercado foi concebido em 1947 para ser uma medida abrangente do movimento de preços. Entendia-se por abrangente um índice que englobasse não apenas diferentes atividades como também etapas distintas do processo produtivo. Construído dessa forma, o índice poderia ser utilizado como deflator do índice de evolução dos negócios, indicando mensalmente o nível de atividade econômica no país. Quando foi concebido ele teve como princípio ser um indicador para balizar as correções de alguns títulos emitidos pelo Tesouro Nacional e Depósitos Bancários com renda pós fixadas acima de um ano. Posteriormente passou a ser o índice utilizado para a correção de contratos de aluguel e como indexador de algumas tarifas do setor de energia elétrica.

176

respectivamente, as taxas de valoração são as menores encontradas. Sobre a análise temporal das terras de alta capacidade agrícola nos cerrados, já publiquei um artigo (LIMA, 2017) analisando principalmente o mercado de terras no Tocantins.

Gráfico 7 - Preço da terra de média e baixa produtividade no Matopiba (2003-2017)

16000

14000

12000

10000

8000

6000 P… S… 4000 D… 2000 B… 0 L…

Luís Eduardo Magalhães Balsas Brejo Bom Jesus Uruçuí Campos Lindos Dianópolis Santa Rosa do Tocantins Mateiros Pedro Afonso Porto Nacional

Fonte: FNP Agrícola (2003-2017). Valores ajustados ao Índice Geral de Preços e Mercado (IGP-M)106, que nos permite ter uma curva real de valorização da terra.

106 O Índice Geral de Preços do Mercado foi concebido em 1947 para ser uma medida abrangente do movimento de preços. Entendia-se por abrangente um índice que englobasse não apenas diferentes atividades como também etapas distintas do processo produtivo. Construído dessa forma, o índice poderia ser utilizado como deflator do índice de evolução dos negócios, indicando mensalmente o nível de atividade econômica no país. Quando foi concebido ele teve como princípio ser um indicador para balizar as correções de alguns títulos emitidos pelo Tesouro Nacional e Depósitos Bancários com renda pós fixados acima de um ano. Posteriormente passou a ser o índice utilizado para a correção de contratos de aluguel e como indexador de algumas tarifas do setor de energia elétrica.

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Os municípios de Barreiras, São Desiderio e Formoso do Rio Preto acompanham as tendências de preços de Luís Eduardo Magalhães, e o mesmo ocorre com Tasso Fragoso e Balsas, Alvorada, Figueirópolis, Formoso do Araguaia e Santa Rosa do Tocantins, Anapus, Chapadinha e Brejo. Açailândia, valor surge em 2017, com o hectare a 10mil reais. Idem Grajaú, com o hectare a 7,5mil.

Gráfico 8 - Preço da terra de cerrados no Matopiba (2003-2017)

7000

6000

5000

4000

3000

2000

1000

0 2002 2004 2006 2008 2010 2012 2014 2016 2018

Baianopolis Cotegipe Formosa do Rio Preto Santa Maria da Vitória Wanderley Bacabal Balsas Tasso Fragoso Codó* Imperatriz Uruçuí Araguaína Wanderlandia Dianópolis Formoso do Araguaia Porto Nacional

Fonte: FNP Agrícola (2003-2017). Valores ajustados ao Índice Geral de Preços e Mercado (IGP-M)107, que nos permite ter uma curva real de valorização da terra.

107 O Índice Geral de Preços do Mercado foi concebido em 1947 para ser uma medida abrangente do movimento de preços. Entendia-se por abrangente um índice que englobasse não apenas diferentes atividades como também etapas distintas do processo produtivo. Construído dessa forma, o índice poderia ser utilizado como deflator do

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Os municípios de Mateiros ( TO), Floriano (PI), Cidelândia (MA), Caxias (MA), Buriti (MA ) e Codó apresentaram comportamentos semelhantes para as terras de cerrado, sendo as cidades nas quais o preço da terra chegou em 2017 entre R$ 700,00 q R$900,00, apesar de apresentarem alto percentual de valorização. São Domingos do Leitão (MA) e Presidente Dutra (MA) possuem mesmo comportamento, apresentando valores absolutos 20% superiores. No caso de Floriano, o hectare de cerrado estava em 2003 em torno de R$44,00. O preço de terras de Palmas (TO) segue tendências semelhantes a Porto Nacional, apesar dos preços de terras para a capital tocantinense serem em média 40% superiores. Jaborandi e Formosa do Rio Preto (BA) tem curvas de ascensção do preço da terra concordantes de 2007 até 2017. Entre 2003 e 2007, as terras em Jaborandi (cerca de R$150,00 o hectare) eram abaixo das terras de cerrado de Formosa do Rio Preto, cerca de R$1000,00 o hectare. Os preços de terras de cerrados de Bacabal verificaram queda nos preços ( nos intervalos entre 2004-2005 2015-2017) bem como Baianópolis, que possui a maior queda de preços : em 2004 -2005 ; 2009-2010 e entre os anos de 2014, quando o hectare custava R$4.200,00 e em 2015 passou a ser precificado no mercado R$1.708,00 , representando uma queda de 60%.

No Maranhão, as áreas de solos arenosos e terrenos planos valorizaram-se 526%. Nesse mesmo estado, a região de maior valorização está em Imperatriz, onde se encontra a pré-Amazônia brasileira, transição dos biomas de cerrados e de floresta equatorial, as terras do município de Buriticupu valorizam-se 1150%. O estado de Tocantins, por sua vez, apresentou taxas de valorização das terras menos concentradas ao longo dos limites administrativos, variando de 185% a 470%, com exceção do município de Dianópolis, que cresceu apenas 31,8% entre 2007 a 2016 (FNP, 2003-2017). No oeste baiano, as áreas de cerrado são as que mais valorizaram, com taxas até 635% em Santa Maria da Vitória. A valorização de terras de cerrado e floresta amazônica na região mostram como o valor especulativo da terra e da natureza, e não somente a produção de commodities são elementos centrais da valorização do espaço.

índice de evolução dos negócios, indicando mensalmente o nível de atividade econômica no país. Quando foi concebido ele teve como princípio ser um indicador para balizar as correções de alguns títulos emitidos pelo Tesouro Nacional e Depósitos Bancários com renda pós fixadas acima de um ano. Posteriormente passou a ser o índice utilizado para a correção de contratos de aluguel e como indexador de algumas tarifas do setor de energia elétrica.

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No Maranhão o avanço do agronegócio foi muito associado aos investimentos da soja no estado, porém, estudos mais recentes e os movimentos sociais que atuam no campo começam a relacioná-lo com investimentos na monocultura do eucalipto – nas regiões do Baixo Parnaíba, Tocantina e toda a região dos Carajás108 - e na produção de etanol, a partir da cana-de-açúcar. Nos últimos 20 anos, empresas transnacionais e grandes e médios produtores do Paraná, e São Paulo são atraídos pelas vantagens oferecidas pelo governo estadual – com aporte de recursos públicos, por meio de subsídios, para a produção de monocultivos (PINHEIRO, 2007). O investimento em soja e em eucalipto109 está associado à siderurgia. Todo o produto proveniente do desmatamento no plantio da soja, na região sul e no Baixo Parnaíba, tem uma estreita relação com a produção de carvão vegetal para abastecer a siderurgia no Maranhão. A procura pelo carvão está pressionando grupos que vivem da produção familiar e do extrativismo vegetal, inviabilizando o acesso de populações extrativistas ao bem natural110. A atividade do extrativismo do babaçu, antes assumida predominantemente por mulheres, hoje tem outros sujeitos, como empresas, na disputa pela riqueza natural.

3.4 Violência e avanço dos conflitos no Matopiba

O progressivo avanço da “ocupação” institucionalizada da região Matopiba provoca tensões em torno da terra que se agravam com a entrada voraz de empresários nacionais, estrangeiros e processos de grilagem de terras, muitas vezes assistidos pelo Estado, despreocupado com as populações locais. A ideia de ocupar “espaços vazios”, de falta de infraestruturas foram um dos pressupostos para criar a imagem da imprescindibilidade da

108 Refiro-me à área geográfica que abrange o município de Imperatriz e seu entorno até o sul do estado maranhense e à região dos Carajás, toda a área afetada pela construção da Estrada de Ferro Carajás – EFC, para o escoamento do minério extraído pela Companhia Vale.

109O cultivo de eucalipto no Maranhão vem sendo estimulado e expandido desde a década de 1990, primeiro através da CELMAR Indústria Papel e Celulose, empresa que pertencia a então Companhia Vale do Rio Doce. Inicialmente, a produção de eucalipto teve forte concentração em Açailândia, Imperatriz e em Urbano Santos. Atualmente esse negócio vem sendo assumido pela Suzano Papel Celulose, instalada no município de Imperatriz.

110 Existem situações, em que as mulheres trabalham no chamado sistema de barracão, sistema comum nas regiões maranhenses do Médio Mearim e tocantina, em que um intermediário arrenda um pedaço de terra do fazendeiro e contrata os serviços das quebradeiras de coco babaçu, através do pagamento de diárias, para que elas quebrem o coco e entreguem ao contratante a amêndoa e a casca do coco. PNCSAa (2005); PNCSAb (2005) 180

ação estatal, conjuntamente ou não com a iniciativa privada, de que a região precisava ser demarcada e ocupada direcionando os fluxos migratórios dos povos negros e indígenas da região, Bahia, Tocantins (ou norte de Goiás, até os anos 1990), Piauí e Maranhão.

A territorialização do capital é a transformação dos padrões territoriais em diferentes escalas na qual a violência para mobilizar o trabalho é central. Essa interpretação das relações territoriais revela a formação dos Estados nacionais como ligada intrinsecamente ao capital. Não haveria um espaço econômico senão como percepção autonomizada do processo. A territorialização do Estado nacional é a forma particular necessária à territorialidade do capital como totalidade, ou seja, como espaço de poder em processo de reprodução contraditória que forma o Estado nacional.Por trás do conceito de trabalho está um processo de homogeneização ou abstração real de todas as atividades concretas sob o ditado de um tempo social abstrato da concorrência, cuja finalidade já não é os homens, mas a imanência da própria atividade, do próprio meio: a produção de valor (e mais-valia), que passa por cima das necessidades (TOLEDO, 2003)

A escalada do preço da terra no Matopiba transformou a região em zona de interesse para a especulação fundiária. A possibilidade da compra de terras a preço baixo ocorre no processo de formação das fazendas produtores de commodities em áreas que anteriormente eram de Cerrado, muitas vezes através diversas estratégias de grilagem, apossamento indevido das terras, antes públicas, antes ocupadas por comunidades camponesas. A concorrência comercial e produtiva, com a gradual ocupação dos mercados de alimentos globais pelos estabelecimentos de maior escala e a intensificação tecnológica vêm lentamente, encurralando outros processos de produção–camponesa, policultora ou extrativista.

Pensando nos grandes latifundiários, a concorrência no acesso ao crédito agrícola frente aos pequenos é desigual: as grandes propriedades rurais, com mais de 1.000 hectares concentram 43% do crédito rural, enquanto para 80% dos menores estabelecimentos (inferiores a 10hectares), esse percentual varia entre 13% e 23%. É importante ressaltar que tais pequenos estabelecimentos rurais representam cerca de 47% do total das propriedades do país, mas ocupam menos de 2,3% da área rural total. Esses pequenos produtores produzem mais de 70% dos alimentos que chegam à mesa do brasileiro, já que as grandes fazendas monoculturas da região exportam a maior parte da produção, ou acaba virando ração para granjas e rebanhos de gado, que também são exportados. 181

Na contramão da tão anunciada crise econômica brasileira, o crédito para o agronegócio cresceu 2,63% em comparação com 2014, com destaque para alta de 29% no custeio das lavouras. O maior volume do total destinado ao agronegócio foi para custeio da produção rural, que recebeu pouco mais de R$ 29 bilhões. O montante é 29% superior aos R$ 22,5 bilhões do período julho-agosto em 2014. As linhas de crédito destinadas a esse tipo de agricultura movimentaram R$ 39,972 bilhões entre julho e setembro deste ano, os três primeiros meses do Plano Safra 2015/2016 (PORTAL BRASIL, 2015).

Gráfico 9 - Evolução das áreas de lavouras permanentes no Matopiba (2000-2017)

1800000

1600000

1400000

1200000

1000000

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600000

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0

Piauí Piauí Piauí Piauí Piauí Piauí Piauí Piauí Piauí Piauí Piauí Piauí Piauí Piauí Piauí Piauí Piauí Piauí

Tocantins Tocantins Tocantins Tocantins Tocantins Tocantins Tocantins Tocantins Tocantins Tocantins Tocantins Tocantins Tocantins Tocantins Tocantins Tocantins Tocantins Tocantins

Fava (em grão) Feijão (em grão) Mandioca Soja (em grão)

Fonte: PAM/IBGE, 2019.

A expansão do plantio de grãos nos últimos 10 anos é abrupta e vem colocando os holofotes nesta nova fronteira agrícola. No caso da soja, a região Matopiba responde por aproximadamente 11% das 115 milhões de toneladas produzidas na safra 2017/2018, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). As projeções para o crescimento da 182

produção de soja esperadas são de 82%, saltando de 17,5 milhões de toneladas para 32 milhões até 2029. A soja atualmente representa cerca de 49% da produção nacional de grãos.

Como indica o gráfico acima, nos anos 2000, a Bahia plantava mais feijão que soja: 826693 hectares. Em 2005, a área plantada de soja já superava as áreas de plantio de feijão: 870000 hectares contra 789935 hectares de feijão. Também no ano 2000, as lavouras de mandioca ocupavam a mesma área do plantio de soja no Maranhão e a partir de 2005 a soja supera as áreas de plantio de mandioca maranhense. De maneira geral, os cultivos de subsistência, típicos do campesinato decrescem ao longo dos anos na região para ser substituídos pelo cultivo da soja.

De acordo com a visão de alguns fazendeiros, o custo do plantio de frutas e hortaliças é muito alto. “Você pega aqui o melão, o custo vai lá em cima. Hortaliza .. é tudo hospedeiro. Então quando você pega essas culturas e migra para a cultura da soja, rapaz, é complicado. Tu começa a medir toxinas e termina a fumagem que vem consumir aqueles açúcares. Você vai perder a lavoura. Pivô tem que ser desligado pra ver se quebra o ciclo. É complicado demais. Nosso clima é favorável [às pragas], temperatura sol, atrapalha. Estoura. Aí o custo Brasil vai lá pra cima”.

Enquanto as lavouras de subsistência diminuem, os conflitos aumentam drasticamente. A partir dos dados da CPT, é possível verificar que os conflitos envolvendo terra (ocupações, acampamentos), trabalho (superexploração e trabalho escravo) e água. Nos últimos 20 anos, os conflitos triplicaram na região, chegando ao registro de 272 conflitos no ano de 2016.

A partir do “Mapa Evolução dos conflitos de terra no Matopiba e avanço da soja (2000- 2016)” observa-se que os conflitos no Maranhão são bem concentrados na porção do litoral nordeste e no sudoeste, região do Bico do Papagaio. A maioria dos conflitos do estado maranhense estão na região Matopiba. No oeste baiano, Correntina e São Desidério concentram o maior número de conflitos. No Tocantins, os conflitos ocorrem de maneira mais espraiada, acompanhando o eixo da rodovia Belém-Brasília. Após 2009, os conflitos concentram-se no centro-norte do estado, nas regiões de Araguaína e Campos Lindos. Em 2016, os conflitos no Tocantins aumentam abruptamente, totalizando 97 conflitos.

A valorização de terras de cerrado e floresta amazônica na região mostram como o valor especulativo da terra e da natureza, e não somente a produção de commodities são 183

elementos centrais da valorização de terras, uma vez que a valorização percentual das áreas de cerrado foram superiores à valorização das terras que alta produtividade (maior preço por hectare).

No Piauí, os conflitos se intensificaram a partir de 2014. Isso não significa que os conflitos não ocorriam anteriormente. O estado apresenta menor número de movimentos sociais articulados na porção sul, dificultando a troca de informações, ciência dos conflitos e formas de resistência de tais comunidades. Vale lembrar as fazendas de soja possuem grandes incentivos no sul do Piauí. A disponibilidade de terras a preços baixos e pelos incentivos de Estado existem desde a década de 1970, quando memorandos da Companhia de Desenvolvimento do Piauí determinavam a concessão de terras à iniciativa privada nos seguintes termos: “ se uma empresa tem condições de investir num projeto até 25mil hectares, o governo do estado põe a sua disposição a terra requerida. Para as pessoas físicas, o limite máximo é de três mil hectares”.

Os conflitos por água também aumentam, e em sua grande maioria, os conflitos dos estados estão na região Matopiba. Para os conflitos por água não é possível fazer uma análise histórica, já que não houve uma sistematização deste tipo de conflito em todo o histórico da CPT. No entanto, ao longo das visitas nas comunidades desde 2012, vemos que a pressão por água está cada ver maior.

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Mapa 4 - Evolução dos conflitos de terra no Matopiba e avanço da soja (2000- 2016)

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Gráfico 10 - Número de conflitos no Matopiba (1996 - 2016)

No Matopiba houveram conflitos envolvendo terra (ocupações, retomadas), trabalho e água. O maior número de conflitos ocorreu em 2016: 243 conflitos por terra, 19 disputas pela água e 10 conflitos envolvendo precarização do trabalho ou trabalho escravo. No oeste baiano, entre 1985-2016 foram cerca de 150 conflitos por água (PEREIRA; PAULI, 2019). Os conflitos por água aumentam, e em sua grande maioria, os conflitos dos estados estão na região do PDA Matopiba. Não sabemos se antes se há anos atrás já havia alguma tensão, já que esse tipo de conflito antes não tinha destaque nas análises da CPT. No entanto, ao longo das visitas nas comunidades desde 2012, é possível afirmar que a pressão por água está cada ver maior e que as comunidades vêm relatando e denunciando rios que diminuíram suas vazantes, rios que estão secando, mudança no regime de chuvas. Segundo dados de 2016 publicados pelo Instituto de Meio Ambiente e Recursos Hídricos-INEMA no Diário Oficial do Estado da Bahia, sistematizados por Marcos Rogério Beltrão dos Santos foram concedidos pelos órgãos públicos 124 autorizações para desmatar 72.589,0832 hectares de vegetação nativa em todo o Estado da Bahia. Dessas, 52 autorizações ou 41,9 % do total correspondentes a 70.420,9753 hectares foram concedidas para a região Oeste da Bahia, contra apenas 2.168,0629 hectares nas demais regiões do estado baiano. Em números relativos, 97% da área total autorizada para irrigação em toda a Bahia foram no oeste baiano (PORTO GONÇALVES; CHAGAS, 2018, p.35). 187

Os dois últimos relatórios DATALUTA (2016 e 2017) apontam aquisições de terra no estado da Bahia, onde três empresas chinesas adquirida propriedade entre 2013 e 2017: Bahia Specialty Cellulose, Chongqing Grain Group e Cofco Agri. O último é o mais presente no território brasileiro, com um total de trinta propriedades em sete outros estados. Entre as empresas internacionais envolvidas no agronegócio brasileiro, destacam-se cinco chineses: além dos três citados, a Chinatex Grãos e Óleos Imp. & Exp. E Sanhe Hopefull. Mas, como já mencionado, os financiadores chineses também intervêm em outros ramos das cadeias produtivas do território brasileiro, além da soja. Um dos principais setores de crescente interesse das empresas chinesas é a logística, principalmente a instalação de terminais portuários e a construção ou ampliação de linhas ferroviárias. Dois projetos com participação direta do capital chinês têm grande impacto no ordenamento espacial do Matopiba: a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL) e um terminal portuário no litoral maranhense. O primeiro causou a expulsão da população local, bem como danos permanentes à fauna e flora locais. Quanto ao porto no Maranhão, sua construção foi planejada no território Cajueiro, onde vivem cerca de 500 famílias em 4 comunidades tradicionais: Parnuaçu, Andirobal, Guarimanduba e Morro do Egito, que derivam seu sustento da pesca e agricultura artesanal (Duran, 2017). Essas famílias sofrem os impactos das usinas e refinarias da empresa de capital misto Vale S.A., além de outros projetos de geração de energia e construção civil (Nogueira, 2018), também sofrem. Além disso, a rota de saída de mercadorias destinadas à exportação passa perto das terras das comunidades (Duran, 2017).

As ameaças de expulsão estão direta e indiretamente ligadas à China Communications Construction Company (CCCC), a maior empresa chinesa no setor de infraestrutura, empresa que assinou um acordo com a WTorre nacional para construir o porto. A WPR São Luís, Administração de Portos e Terminais, subsidiária da WTorre, é responsável por ofensivas diretas contra a população de Cajueiro, que vem sofrendo frequentes ameaças e outras formas de violência. A empresa alega ter os documentos que garantem a propriedade da terra. No entanto, a comunidade é registrado no Instituto de Colonização e Terra do Maranhão (ITERMA), o que significa que já tem sido reconhecida como uma comunidade de proprietários camponeses destas terras (Nogueira, 2018). Enquanto isso, o interesse de manter os processos de acumulação capitalista faz com que o Estado crie políticas e ações para favorecer tais capitais internacionais- no caso aqui retratado o capital chinês – permitindo mudanças ambientais irreversíveis na paisagem. 188

A região do Arariboía, localizada nos municípios de Amarante do Maranhão, Arame, Bom Jesus das Selvas, Buriticupu, Grajaú e Santa Luzia foi ocupada por famílias da “civilização do couro”, por frentes migratórias nordestinas de agricultores e camponeses do Ceará, Piauí e Paraíba e pelos povos Tenetehara/Guajajara e os Gavião/Pükob.

Em meados do século XX, os Tenetehara cederam um pedaço de terra a um comerciante da cidade de Grajaú, resultando na formação de povoados como Campo Formoso, Bezerra e Bete, que abarcam a maioria das nascentes do rio Buriticupu e seus pequenos afluentes. De posse dessa área, os pequenos agricultores camponeses e caboclos iniciam um processo de expansão da lavoura do arroz e outros legumes. Com a estrada do arroz já consolidada nos anos 1950, houve uma intensificação do desmate e criação de pastagens, atingindo as margens e nascentes do rio Buriticupu e riachos próximos, como o Faveira e o Ribeirão, que corta o povoado do Campo Formoso.

O Projeto Grande Carajás, a partir de 1962, impulsionou diversas transformações na região do Arariboia, aumentando a presença do dinheiro como mediador das relações, a presença de madeireiros e do desmatamento, a mobilidade de trabalhadores, camponeses e indígenas superexplorados da região, o consumo de mercadorias e impondo signos externos e maioritariamente urbanos.

A homologação da Terra Indígena Araribóia a partir do Decreto 98.852/1990 garantiu 413mil há para as 137 aldeias, com uma população de cerca de doze mil índios para os Gavião e os Guajajara. No entanto, houve um aumento dos conflitos entre os indígenas, camponeses, colonos e fazendeiros de soja e pecuária, consequência da disputa pelo uso do território, como terra indígena, área de ocupação camponesa e de expansão da fronteira agrícola. Atualmente, com a perspectiva de reestruturação dos limites da Terra Indígena Governador (Gavião/Puko) pela FUNAI, os conflitos territoriais se intensificam ainda mais. A disputa pelo acesso à terra, às águas, aos recursos florestais e minerais possui diversas nuances. Conflitos, tanto entre índios Tenetehara e camponeses e fazendeiros como também entre os dois povos indígenas envolvidos tem sido constante. O rio Buriticupu é um demarcador étnico-territorial entre o povo Guajajara e os Gavião, ainda sob disputa (BARATA, 1999). Além disso, há um forte processo de degradação do rio Zutiua, e a presença da Vicenza Mineração e Participações S.A, que já realiza pesquisas para viabilidade 189

de extração da bauxita em mais de 9mil ha da região Arariboia111. A disputa pela terra e seu hoje – expansão da fronteira agrícola da soja, agricultura famíliar e terra indígena de diferentes etnias demonstra como a consolidação do mercado de terras intensificou a disputa.

Milícias, empresas de segurança privada e de setores locais vêm proclamando seu direito de vigiar e matar. No entanto, necessitam de alguma forma do aval do Estado (autônoma ou como braço/incorporação da própria máquina estatal)112, na qual a violência é inclusive ofertada como uma forma de trabalho, de operar um mercado da violência. Ao longo do trabalho de campo realizado em 2016, vimos mensagens de segurança privada ostensiva na FAPCEN – Fundação de Apoio à Pesquisa do Corredor de Exportação Norte “Irineu Alcides Bays”, localizada em Balsas (MA).

No Piauí, empresas como SLC Agrícola/LandCo e Radar S/A utilizam-se de segurança privada da empresa NSSP (Norte Sul Segurança Privada), do mesmo proprietário da CODECA (Colonizadora De Carli), empresa de um grande grileiro de terras da região, demonstrando aqui outro formato de relações entre as empresas privadas, porém explicitando os velhos laços entre as empresas de capital financeirizado e capitais e poderes regional. A NSSP também foi vista circulando dentro de uma comunidade no baixão em Santa Filomena

111 Informação encontrada em https://terrasindigenas.org.br/en/terras-indigenas/3600 . Acessado em 05 out 2017. 112 A Monsanto, grande corporação agrícola responsável pela produção de sementes transgênicas, fertilizantes e agroquímicos, foi uma das 9 contratantes pelo governo americano responsáveis pela manufatura do “agente laranja” (agent Orange), mistura de dois herbicidas (2,4-D e 2,4,5-T) utilizados na guerra do Vietnã. Com codinome "Operação Ranch Hand" (ajudante de fazendeiro), de 1961 a 1971 foram despejados cerca de 80 milhões de litros do produto no Vietnã do Sul, com o objetivo de destruir safras e dizimar as selvas em que se escondiam os vietcongues e o Exército do Vietnã do Norte. Cerca de 16% do território foi comprometido com essas toxinas armazenadas em toneis pretos com faixas laranjas. Em 2005, uma ação movida por 4 milhões de vietnamitas contra os Estados Unidos da América foi arquivada com a alegação defendida pelos advogados da Monsanto (e também de outras companhias envolvidas, como a Dow Chemical) que seus clientes não poderiam ser punidos por algo que foi feito a partir de uma ordem legal dada pelos comandantes-chefe da nação norte- americana. Além disso, não havia “nada que comprovasse que o “agente laranja” tenha causado as doenças a ele atribuídas, principalmente pela ausência de uma pesquisa em larga escala” (afirmação do juiz federal responsável pelo caso em http://www.consciencia.net/2005/mes/06/vietnaeua-impunidade.html). Atualmente, a Monsanto contratou por algumas ocasiões o exército privado Academi, antigo exército mercenário Blackwater e comprado por um grupo de investidores não revelado desde 2011. Em 2014, a empresa foi incorporada novamente, agora pela a Costellis Holdings, uma transnacional do setor de segurança e logística que, de acordo com seu site oficial, possui também atividades no Brasil. Esta última fusão da Academi pode estar ligada à entrada de capitais da Fundação Bill e Melinda Gates, criada juntamente com o bilionário especulador do mercado financeiro Warren Buffet, na Monsanto (as informações sobre a real participação destas fusões e da quantidade de capitais envolvida é caráter de informações especulativas de diversos sities de jornais ao longo da internet. Procurou-se basear em algumas notícias de jornais “confiáveis” como New York Times e Wall Street Journal). A Bill & Melinda Gates Foundation é a maior fundação "filantrópica" mundo, responsável, em parceria com a Fundação Rockfeller da AGRA (Aliança para uma Revolução Verde em África), que visa expandir o uso de sementes Monsanto no continente africano. Como nota da nota de rodapé, vale a pena lembrar que a Fundação Rockfeller foi uma das responsáveis pela Revolução Verde, pacote agrícola direcionado para aos países da América Latina nos 1970, inclusive ao Brasil. Para mais informações sobre corporações e segurança privada ver P. W. Singer (2003) e Suzanne Simons (2009). 190

(PI), limitando a mobilidade das comunidades ao longo de áreas de secularmente utilizadas (PITTA; CERDAS; MENDONÇA, 2017 e ALVES, 2006). Há também registros da atuação da Damnha em fazendas do sul do piauiense.

No Tocantins, a partir dos trabalhos realizados pela CPT Araguaína em 3 regiões do estado: Araguaína, Jalapão e Bico do Papagaio, vemos que a flexibilização das leis e as ações cada vez mais conservadoras e repressoras do Estado têm dificultado a permanência da população camponesa na terra.

Analisando os 51 processos judiciais referentes às comunidades parceiras da CPT – Comunidade Vitória, Comunidade Quilombola Grotão Donizete, Santo Antônio, Bom Sossego, Tauá, Brejo Feio, Barriguda, Sussuarana, Boa Esperança, Taboca, entre outras –, é possível observar o comportamento da justiça regional no que se refere a questão da grilagem de terras. A comunidade Rancheria é uma das grandes impactadas, local de 17 processos de titulação de terras, sendo 15 deles sobre tentativa de reconhecimento de usucapião. Cerca de 400 famílias de 20 comunidades distintas (296 famílias de acampados, 83 de ocupantes e 288 de posseiros) correm risco de expulsão. Elas produzem seu sustento, mas não têm nenhuma segurança de permanecerem em suas áreas, já que sofrem recorrentes ações de reintegração de posse (com demanda de despejo). A luta pela reforma agrária nos últimos anos ficou mais difícil, em função, de um lado, da paralisia da ação do Estado na questão da Reforma Agrária e, do outro, da intensificação da pressão sobre a terra exercida por grileiros, pecuaristas e plantadores de monocultivos agroflorestais, principalmente soja e eucalipto. A maioria das comunidades camponesas dessa sub-região do Matopiba, especialmente quilombolas, não possui suas posses de terra regulamentadas, sendo que vivem nesse local há mais de 50 anos. Se nos últimos 5 anos anteriores a 2016, não havia ocorrido praticamente nenhum processo de reintegração de posse na região das comunidades de conhecimento da CPT, sendo possível dialogar e mover recursos que mantivessem a presença dos posseiros, após a entrada do Governo Temer, a atuação do judiciário sofre mudanças drásticas, uma vez que aumentaram as diligências de reintegração de posse nas comunidades: Tauá (final de 2015), Acampamento Santa Maria (2015 e 2017), Acampamento Dom Celso (2017), São Gabriel, Vitória, Taboca e Campos Lindos (2016), Acampamento Clodomir Santos de Morais (2018)113.

113 Grande parte das informações aqui discutidas tem como fonte os processos jurídicos e entrevistas realizadas com os agentes da CPT Araguaína em 2015, 2016 e 2018. 191

Outra mudança refletiu na atuação de instituições e comunidades no trato dos processos de reconhecimento da terra. Em 2011, o Ministério Público Federal (MPF) propunha audiências públicas e coletivas, realizadas nas próprias comunidades, ou seja, o Ministério Público, o INCRA, a Ouvidoria Agrária a Polícia Federal, o IBAMA e órgãos de terra estaduais deslocavam-se até um lugar onde ocorriam os conflitos. É o caso, por exemplo, de uma audiência realizada em Campos Lindos nesse período, da qual participaram aproximadamente 300 pessoas. A audiência realizada na comunidade permitia assim sua participação, dava visibilidade ao conflito, unia as comunidades que acompanhavam as pautas de outros grupos que estavam envolvidos em processos e lutas semelhantes. Atualmente, as audiências são encaminhadas uma a uma, separando a luta dos posseiros e camponeses, fazendo com que cada grupo, agora com uma viseira jurídica, acompanhe somente o processo de sua terra. Além disso, as audiências são realizadas nas repartições, dificultando a participação dos camponeses. A Ouvidoria Agrária e a Delegacia Especializada na Repressão de Conflitos Agrários (DERCA) do Tocantins têm recuado em suas atividades de forma tímida, alegando que a falta de recursos não permite uma atuação mais direta nos conflitos do campo.114 Além disso, as titulações de novas terras quilombolas estão suspensas (TOCANTINS, 2016).

Desde o segundo semestre de 2016, segundo levantamento da CPT, 96 famílias de trabalhadores rurais sem-terra vinculadas ao MST, cadastradas pelo Incra/SR-26 no acampamento Padre Josimo e que se encontram no projeto de assentamento do Incra denominado Cupim, no município de Carrasco Bonito, estão sofrendo diversas ilegalidades praticadas pelo fazendeiro Ademar Parente, conhecido regionalmente como “coronel Parente”, em conluio com o fazendeiro Armando Caires e outros fazendeiros. Os camponeses são ameaçados de expulsão do acampamento Padre Josimo sem ordem judicial. Além disso, o fazendeiro Armando Caires, vizinho do lote e com interesses particulares nas terras, construiu uma cerca de arame dentro do lote P. A. Cupim, prejudicando os trabalhadores rurais sem- terra no que se refere à produção de roça.

Em Augustinópolis, um grupo de camponeses do acampamento Santa Maria (143 famílias), ligado ao STTR de Carrasco Bonito, sofreu também diversas ilegalidades quando tentou ocupar a área de propriedade do “coronel Parente”, dentro do mesmo projeto de

114 Entrevista realizada com Delegado responsável pela DERCA em maio de 2018. 192

assentamento. Os camponeses foram expulsos com disparos de arma de fogo, que, de acordo com os relatos recolhidos pela CPT, foram efetuados pelo “coronel”.

De acordo ainda com os relatos recolhidos pela CPT, o referido “coronel” algemou dois camponeses e os levou para a sua chácara e, posteriormente, para o destacamento da PM de Augustinópolis acompanhado de 3 policiais militares, sem nenhum mandado ou justificativa legal. Além disso, o “coronel” queimou os pertences de todo o grupo de acampados. Outro grupo de fazendeiros fez barreira na estrada que dá acesso ao acampamento dos trabalhadores rurais do assentamento Santa Maria, prejudicando, assim, o direito de ir e vir dos referidos camponeses. Esse mesmo grupo de fazendeiros dos municípios de Augustinópolis, Carrasco Bonito e Buriti se reuniu em junho de 2016 com pistoleiros e ex- policiais militares para formalizar um “consórcio” para combater ocupações de terras por trabalhadores rurais que buscam acesso ao programa de reforma agrária, tendo, inclusive, criado e registrado em cartório uma associação de fazendeiros. O “coronel Parente”, bem como outros fazendeiros, é conhecido por seu envolvimento em diversos processos de grilagem e violência contra as comunidades rurais.

Diversas comunidades vêm sofrendo com a violência que frequentemente corresponde a ações consorciadas promovidas pelos fazendeiros. Esse é o caso do acampamento Clodomir Santos de Morais, em Brejinho de Nazaré. No outro acampamento, Dom Celso, em Porto Nacional, a população camponesa teve suas casas e plantações queimadas de maneira criminosa, situação que ainda não foi apurada pelos poderes públicos de segurança e do judiciário (G1, 2017)

Um dos casos mais graves ocorreu com as 120 famílias de trabalhadores rurais sem-terra do acampamento Mata Grande, quando estas estavam acampadas na margem da rodovia TO – 222, no quilômetro 15 (sentido povoado Pontão a Santa Fé do Araguaia), sofreram tentativa de homicídio e lesão corporal. Há um registro de ocorrência realizado pela comunidade, no qual são relatados que o proprietário conhecido como “Pitbull” invadiu os acampamentos denominados Mata Grande e Mata Grande I, ambos localizados no município de Santa Fé do Araguaia, e, com 7 homens encapuzados e armados, obrigou os trabalhadores rurais a percorrerem cerca de 10 quilômetros a pé – do acampamento até a sede da fazenda Sossego – em fila, sob ameaças e disparos de armas de fogo.

Nesse sentido, verifica-se que a violência no Tocantins se apresenta de diversas formas. O estado do Tocantins, que nasceu do discurso de uma elite agrária conservadora, cuja disputa por terra representa uma das faces permanentes do problema agrário brasileiro, 193

torna-se revelador das contradições desse processo. Sob um discurso de “espaços vazios”, e de terras devolutas – vale lembrar que quase metade do estado ainda não possui titulação –, o agronegócio aparece como uma pretensa vocação, no discurso dominante, como uma possibilidade de territorialização do capital (LIMA, 2017). O Estado aparece com o seu aparato legitimador, cujas fronteiras do que é “legal” e ilegal115 são difusas. Tudo isso para que um projeto latifundiário e concentrador de capital continue operando e ocupando terras a todo vapor.

115 Mais de 1,5 milhão de hectares foram titulados de forma irregular pelo Itertins em 2013. Ver https://conexaoto.com.br/2013/10/08/1-5-milhao-de-hectares-foram-titulados-irregularmente-no-to- regularizacao-vai-comecar-por-areas-de-conflito. O mesmo órgão foi denunciado e pego em flagrante por emitir títulos fora do expediente em 2018. Ver https://g1.globo.com/to/tocantins/noticia/apos-cassacao-de-governador-policia-flagra-servidores-emitindo- titulos-de-terras-depois-de-expediente.ghtml. 194

Foto 16 - Segurança armada no Matopiba

Fonte: Guarita de controle de passagem, FAPCEN. Foto da autora (2016). Empregado da empresa Estrela Guia

faz segurança armada na Fazenda Rio Claro BA. Foto Metrópolis (2018). Fazenda Granflor, Cotegipe Bahia. Foto da autora (2018).

Apesar de poucos materiais encontrados, é importante mencionar a existência do Grupo Atalaia116. Especializada em segurança patrimonial, atua no Tocantins, Maranhão Piauí

116 “ O GRUPO ATALAIA é formado por 06 Empresas, o GRUPO ATALAIA é líder no mercado Norte e Nordeste na terceirização de serviços. Este título se mantém graças a DEUS e uma estrutura baseada na utilização de alta tecnologia, seguindo rígidos padrões de qualidade em atendimento e prestação de serviços”

195

e Bahia, além de Pará e São Paulo. “ A escolta é a verdadeira pistolagem que tem liberação para matar”, afirma Antônio Lopes de França Filho, de 25 anos, líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST)117 sobre o grupo que possui inúmeros contratos para assegurar o poder de violência dos fazendeiros. O grupo Atalaia também atua também no Chile. “Eles tomaram notoriedade na imprensa com relação a defesa da fazenda do banqueiro Daniel Dantas no Pará. Aquelas invasões que... aquelas defesas que aconteceram foram até televisionados no Jornal Nacional. Eu sei que o grupo Atalaia faz segurança pra eles. Segurança patrimonial. E esse grupo não é diferente de outros grupos que prestam também serviços de segurança particular. Na verdade, eu já tive uma conversa com o proprietário. Com o Renê, ele é de Goiânia. A família, que faz a defesa de conflitos de terra, eu sei que eles, eles fizeram um orçamento para Federação [de Agricultura do Tocantins] com o grupo Atalaia, grupo Alfa... eles apresentaram dois orçamentos para a Federação. Para manter a segurança patrimonial depois que acontecesse a reintegração do patrimônio. Esse orçamento parece que eram quatro agentes trabalhando 24 horas por dia no período de 30 dias, tinha ficado cinquenta e dois mil reais. Mas eu sei que o grupo atua nisso, na defesa de fazenda para quem pode pagar” (Trabalho de campo, Araguaína, 2016). No Tocantins, há também a atuação do Grupo Juda, junto à Agrex, JBS e Fazendão Agronegócio, empresa do ramo de grãos com enfoque na soja. O Estado por ele mesmo pode se transformar em uma máquina de guerra, ou apropriar-se de uma máquina já existente ou até ajudar a criar uma nova, criando uma complexa economia da violência

Além da analise regional do PDA Matopiba, direciona-se o olhar de forma mais aprofundada aos conflitos acompanhados pela Comissão Pastoral da Terra (TO) nas microrregiões de Araguaína e Jalapão para desvelar as contradições e a imanente crise do capital a partir da ótica dos trabalhadores camponeses e migrantes da região dos cerrados do centro-norte.

Nesta região, a CPT-AT tem historicamente enfrentado os desafios postos pela situação fundiária caótica – a concentração e grilagem – e o avanço da agropecuária moderna

(definição encontrada no site da empresa: http://www.grupoatalaiato.com.br/quem-somos/quem-somos/ , grifos do original). 117 Para outros relatos de conflitos entre camponeses, pequenos agricultores e o Grupo Atalaia ver reportagem especial “Terra bruta”, no caderno de política do jornal Estado de São Paulo, em 12 de junho de 2016. Disponível em http://infograficos.estadao.com.br/politica/terra-bruta/ . Um evento que demonstra a organização dos fazendeiros para garantir a posse de terras (legais ou não) é o “Leilão da Resistência”, ocorrido em 2013. A partir do arremate de lotes de animais e grãos, arrecadou-se cerca de R$ 700mil para gastos de fazendeiros do país em conflitos de terra. 196

latifundiária e monocultora sobre os cerrados do centro-norte. Além disso, a região concentra grande parte dos casos de trabalho escravo do país.

Desde o ano de 1998, o regional Araguaia-Tocantins concentra sua atuação na parte norte do Tocantins e atua nas temáticas principais da terra, da água e dos direitos: acesso à terra; segurança na terra; desenvolvimento comunitário e manejo do meio ambiente; prevenção e combate ao trabalho escravo. Atualmente, a CPT-AT acompanha 33 processos jurídicos com advogada da CPT, e outros 51 processos que ocorrem nas comunidades atendidas: Comunidade Vitória, Comunidade Quilombola Grotão, Santo Antônio Bom Sossego, Tauá, Brejo Feio, Barriguda, Sussuarana, Boa Esperança, Taboca, entre outras, contabilizando cerca de 400 famílias em mais de 20 comunidades distintas (296 famílias de acampados, 83 de ocupantes e 288 de posseiros). A comunidade Rancharia é uma das grandes impactas, local de17 processos, sendo 15 sobre tentativa reconhecimento de usucapião frente às tentativas de grilagem que vem ocorrendo. A maioria das comunidades de camponeses e quilombolas estão na luta pela regulamentação da terra há mais de 50 anos. No ano de 2018, os conflitos também se acirraram nas comunidades Gabriel Filho, Barra do Ouro e Tauá.

No quadro síntese das questões que ameaçam os povos do cerrado , elaborado no livro organizado por Carlos Walter Porto Gonçalves “Os cerrados vistos por seus povos: o agroextrativismo no cerrado” (2008) e a partir das investigações que venho desenvolvendo, é interessante observar que as comunidades ameaçadas – i.e comunidades camponesas agroextrativistas, mulheres quebradeiras de coco do babaçu , quilombolas, ribeirinhas , pescadores , assentados rurais e indígenas- possuem clareza dos impactos que sofrem:

Quadro 3 - Conflitos e ameaças para os povos e comunidades do Matopiba

Quem ameaça Questões Comunidades ameaçadas Empresas de Fundiária: terras de uso Camponeses (MATOPIBA), monoculturas aliadas a comum gerais sendo quebradeiras de coco (MATO), empresas multinacionais privatizadas quilombolas (MA), ribeirinhos apoiadas pelo poder (PITOBA), pescadores (TO), público e organismos assentados (MATOPIBA), multinacionais índigenas (MATO)

Fazendeiros, Empresas Fundiária: concentração de Camponeses (MATOPIBA), de monoculturas aliadas terras , minifundização e quebradeiras de coco (MATO), a empresas encurralamento das quilombolas (MA), ribeirinhos 197

multinacionais, fundos de munidades (confinamento (PITOBA), assentados capital financeiro territorial) (MATOPIBA), índigenas (MATO)

Fazendeiros e madereiros Desequiblíbrio hídrico: Camponeses (MATOPIBA), aumento das autorizações quilombolas (MA), ribeirinhos para desmatamento bem (PITOBA), pescadores (TO), como desmatamentos e assentados (MATOPIBA) queimadas ilegais; aumento do número de outorgas de água para pivôs de irrigação e bombeamentos clandestinos, construção de barragens

Fazendeiros Erosão de solos e Camponeses e assentados assoreamento dos rios (MATOPIBA), ribeirinhos e pescadores (TO), quilombolas (MA)

Fazendeiros Contaminação de plantações Camponeses e assentados e criação por pulverizações e (MATOPIBA), pescadores e contaminação por agrotóxico ribeirinhos (sem informação das águas e rios específica)

Fazendeiros, Empresas Plantio de transgênicos Camponeses, assentados, multinacionais que indígenas, quilombolas controlam sistema (MATOPIBA) produtivo (crédito, sementes, agrotóxicos, maquinários, etc)

Desemprego Camponeses e assentados (MATOPI), sem informação aprofundada para as outras populações

Empresas de Desmatamento e perda de Todas as populações do monoculturas aliadas a diversidade biológica MATOPIBA empresas multinacionais apoiadas pelo poder público e organismos multinacionais e Pecuaristas

Empresas de Roubo do patrimônio comum Quebradeiras de coco e monoculturas aliadas a indígenas (MATO) empresas multinacionais apoiadas pelo poder público e organismos multinacionais e madeireiros 198

Poder Público aliado a Criação de UC’s de uso Camponeses (MA), indígenas ONG’s conservacionistas indeirto em áreas de grande (MATO) diversidade biológica com presença humana tradicional

Ausência de políticas Clientelismo/assistencialismo Todas as populações estratégicas visando a ONG’s, ausência de MATOPIBA democratização dos fiscalização , falta de recursos públicos e créditos, falta de política justiça social e ambiental técnico-científica adequada que dialogue com cultura, recursos e saberes locais

Fonte: adaptado de PORTO GONÇALVES (2008) e informações da autora.

Os conflitos nunca tiveram um ponto final, e as áreas de fronteira passam a representar cada vez menos o “mito da terra liberta” (ALMEIDA e DAVID, 1981), onde os migrantes e as populações que ali já viviam com sua diversidade de manifestações apenas a sua manutenção e procuravam uma solução de vida vivenciam a substituição da terra enquanto uso pelo mercado de terras imobiliário. Os processos de violência e as disputas de terra, fazem com que tais populações, até momentos recentes dos anos 1990 e 2000, se afastassem das áreas de conflitos com fazendeiros e com o Estado e buscassem novas áreas, inclusive pelos próprios processos de cultivo agrícola, que exigiam rotações e repouso das áreas e do extrativismo. Com o avanço dos projetos estatais, das relações capitalistas e o avanço de monocultivos, em sua grande parte para exportação, a região Matopiba consolida a propriedade privada como forma generalizada de produção. O avanço da fronteira agrícola vai encurralando os povos e comunidades tradicionais em suas lógicas materiais e imateriais. Sobre os conflitos, é possível detectar diversas artimanhas do agronegócio para desarticular a união das comunidades e formas possíveis de resistência.

“É a mãe lutando contra o agronegócio e o filho subindo pra prestar serviço na [fazenda] chapada porque são uma das poucas fontes de emprego. Porque são lugares em que o trabalho que eles fazem, de extrativismo, de roça, gado é pouco valorizado - daí vem o agronegócio nessa lógica do que é o trabalho, da carteira assinada, de que isso é muito bom, e é uma Fonte em termos monetários e mais rentável do que aquelas. É uma mudança de lógica muito radical. Aí tem um conflito de visões, um conflito geracional, de interesses e 199

uma cooptação da juventude por esse trabalho e pelo dinheiro para que os fazendeiros possam ir enfraquecendo a comunidade e ir expulsando-os de fato dali”.

É comum ver famílias divididas posicionamentos políticos dentro das comunidades. No território quilombola do Camaputiua em Cajari (MA) duas comunidades se reconhecem como quilombolas, mas a comunidade que está na porção central desse território não se reconhece e quer titulação da terra por família, ou seja, lotes individuais.

No oeste da Bahia, as comunidades que estão buscando a titulação coletiva tem descendentes que estavam na cidade que ficaram sabendo da titulação coletiva e que retornam para reafirmar que eles querem o terreno deles. Além do conflitos que está sendo gerado pelo “trabalha no agro ou não trabalha no agro”, têm muitas famílias – e famílias estendidas , porque nessas comunidades todo mundo é parente – que estão brigando pela titulação coletiva ou individual.

Tem casos do fazendeiro “fazer a cabeça” de quem trabalha com ele ou até de pessoas da comunidade, para a comunidade não se reconhecer coletivamente, porque se tiver título individual, o fazendeiro pode ir lá e comprar.

Até teve uma questão no Piauí recente, e no Maranhão também, onde o Ministério Público está tentando intervir com uma representação de que o INCRA está levando o conflito com relação as titutlações individuais em comunidades quilombolas e gerazeiras.”

No intuito de mitigar a concentração fundiária na região, algumas práticas jurídicas vêm se diferenciando, como vem ocorrendo no Piauí, via fortalecimento de espaços públicos e de formas de diálogo e de participação social que vem sendo desenvolvida pelo Núcleo de Regularização Fundiária da Corregedoria Geral da Justiça do estado, que agricultores/as familiares, produtores rurais, extrativistas, pescadores/as artesanais, povos indígenas, quilombolas, povos e comunidades tradicionais, mulheres, jovens, representantes do poder público (OAB, Assembléia Legislativa, Secretaria de Desenvolvimento Agrário, Universidade Federal do Piauí, Instituto Federal do Piauí, INCRA, INTERPI, ANOREG, Defensoria Pública, Associação dos Municípios e Ministério Público Federal e da Associação dos Produtores de Soja) com o objetivo de discutir e planejar as políticas fundiárias do Piauí e seu papel no desenvolvimento regional. 200

Junto a isso, a Vara Agrária de Bom Jesus, juntamente com o Instituto de Terras (INTERPI) tem feito uma revisão das matrículas do imóveis do sul do estado, onde concentram-se os investimentos de capitais financeiros em terras e revisando as cadeias dominiais da terra, chegando ao cancelamento de cerca de 1 milhão de hectares, além de 6 milhões de hectares de matriculas de títulos de terra bloqueadas.

Apesar de entrar no caixa do Estado milhares de hectares, e alguns milhões de reais, Ministério Público Federal (MPF) requereu em dezembro de 2017 a suspensão da aplicação da Lei Estadual nº 6.709/2015 (Lei de Regularização Fundiária do Estado do Piauí), em relação às áreas ocupadas por povos e comunidades tradicionais para que suspendam a execução da lei nessas áreas. Embora as medidas inovadoras do Núcleo Fundiários sejam inovadoras, e estejam alinhadas às políticas do projeto do Banco Mundial "Piauí: pilares de crescimento e inclusão social", não vem tomando como prioritárias perda das comunidades camponesas de suas terras, que enfrentam litígios sobre o uso de água, desmatamento, contaminação de água, solos e animais por agrotóxicos, aumento da violência contra líderes comunitários e perda da biodiversidade. As consequências são a destruição dos meios de subsistência das comunidades, a insegurança alimentar e nutricional. As mulheres são particularmente afetadas pela grilagem de terra em curso e pela perda das riquezas naturais que garantem sua soberania alimentaria, já que elas não podem mais coletar e processar frutos silvestres das florestas do Cerrado, como a bacaba, o araticum, a mangaba, o babaçu. São afetadas também pela constante intimidação, violência física, e presença permanente de guardas armados dentro das comunidades, o que torna impossível para elas planejar sua vida, as colheitas, a permanência e o alimento de suas famílias na região.

O cancelamento das matrículas das grandes propriedades, que a curto prazo se apresenta como algo que possa modificar a estrutura fundiária da região, é ofertada, de maneira legal, aos grandes capitais num segundo momento, já que os ocupantes anteriores têm prioridade de compra das terras. Além disso, com as violências materiais e imateriais sofridas pelas comunidades camponesas, uma regulação de áreas de dinâmicas coletiva em títulos individuais pode fragmentar a organização camponesa, que facilmente será despejada das áreas pela compra das terras pelos capitais nacionais e internacionais que atuam na região, como Radar S/A - Tellus S/A, Sollus, BrasilAgro, Caracol Agropecuária e Agrex, e alguns fundos de pensão, como o TIAA-CREF, e o Fundo dos professores de Harvard. 201

Para que as políticas e a ação do Núcleo sejam mais democráticas, é necessário dar pesos distintos às vozes que a constituem. As comunidades impactadas (Morro d´água Melancias Brejo do Miguel Lagoa do Martins Sete Lagoas Baixão Fechado Chupé) não podem ter o mesmo poder de voto de uma única associação setorial, como a APROSOJA, presente no núcleo.

No documento, os membros do Ministério Público Federal também recomendam que sejam realizados estudos antropológicos prévio de identificação, delimitação e avaliação da forma de ocupação das terras, de modo a garantir, efetivamente, os direitos das comunidades que as ocupam. O órgão recomenda ainda que o Interpi e o Banco Mundial realizem consulta livre e informada aos povos e comunidades tradicionais diretamente afetados pela Lei Estadual nº 6.709/2015, assegurando-lhes o direito de manifestar-se sobre a forma pela qual exercem a posse atual de seus territórios e de que forma pretendem a regularização fundiária das terras devolutas e outras terras sob domínio do estado que ocupam. Os limites de transformação de políticas estão postos por aqueles que as reescrevem, recria-as como estratégias para mitigar problemas tão profundos e transescalares. Sem negar a importância de políticas e instituições públicas que olhem para as comunidades camponesas, seguimos com os papeis constitucionais em uma mão, e uma enxada na outra.

No caso das comunidades camponesas, as titulações tem sido mais individuais, até porque muitas vezes não há uma identidade reconhecida que permite a titulação coletiva. Nas comunidades que a ISPN vem trabalhando no Alto do Rio Preto (BA), “eles não tem essa questão da identidade discutida. Pra eles é muito novidade o fato de que eles terem que se identificar com alguma identidade. No Maranhão, os conflitos já remontam décadas, diferente do que ocorre na Bahia.

No núcleo Panambi, na divisa da Bahia com o Tocantins, há também esse conflito. É um povoado que virou uma cidadezinha que está no meio de grandes plantações de soja. E daí tem um cara da comunidade que vai na cidade comercializar farinha, e já é cooptado, pelo olhar monetário, de fragmentar, que está sendo desfavorecido, as vezes é uma família que na comunidade era marginalizada dentro das relações sociais e já está magoado, e aí faz uma aliança com os fazendeiros. Em quase todas as comunidades há alguém que está desfazendo o trabalho coletivo, cooptando a comunidade.

A cooptação acontece de várias formas. Desde um trabalhador que está ganhando bem e gostando do trabalho da fazenda, e dai vai havendo uma cooptação ideológica até 202

fazendeiros que abertamente expressam que querem que a comunidade se fragmente e que a titulação seja individual e realiza algum tipo de combinado com alguém da comunidade. No Maranhão, há muita troca de favores políticos, já que os fazendeiros estão lá há muitas décadas, as vezes desde a década de 50, já são de lá, não são como os gaúchos e paulistas que nem é na Bahia. Tem muita gente dos partidos, nas eleições municipais e que também influencia.” (Isabel Figueiredo, ISPN, 2018).

No entanto, há diversas histórias de lutas, vivas e que seguem criando frestas de rebeldia. Dentre as formas mais radicais de resistência estão as comunidades de Correntina (BA), que vem entrando em conflito direto com fazendeiros. Em 2017, cerca de 600 a 1.000 pessoas destruíram equipamentos de transmissão de energia, galpões, bombas hidráulicas, tubulações, tratores e pivôs de irrigação de duas fazendas do grupo Igarashi. Houve um apoio popular àquela ação de aberta violência com uma manifestação em que participaram aproximadamente 12000 pessoas, cerca de um terço da população do município nas ruas de Correntina às frentes contra o agronegócio. No município de Formosa do Rio Preto, há um conflito que se arrasta há anos, em que está implicado o Agronegócio Condomínio Cachoeira do Estrondo que, assim, nos traz um tempo de larga duração que nos remete a Canudos que, por sua vez, nos remete a um tempo ancestral-histórico indígena-camponês- colonial, e nos conecta com um tempo de média duração da ditadura civil-militar (1964-1985).

Na verdade, como tantas outras comunidades, as comunidades de Aldeia, Cachoeira, Área de Salu, Gatos, Brejo do Tatu, Mutamba, Marinheiro e Cacimbinha se formaram no Oeste da Bahia, sobretudo até os anos 1960, com famílias que procuravam um lugar seguro para fugir da seca e da violência para viver com liberdade e dignidade. Consideremos que até a transferência da capital para Brasília, essa região estava integrada com outras temporalidades em que camponeses e camponesas, descendentes de indígenas e quilombolas conviviam com/contra outras formas tradicionais de dominação como o coronelismo. O convívio com as terras e as águas disponíveis em abundância na região, assim como o encontro/confronto com os indígenas foram decisivos para que garantissem sua autosustentação, base para sua liberdade e autonomia criando gado, fazendo caça, coleta, pesca, extrativismo, e uma agricultura de sustentação com base no feijão, milho e mandioca. Desde os anos 1970, mais especificamente desde 1975, chega à região o gaúcho Sr. Ronald Levinsohn, filho da primeira geração de uma família de ingleses chegada ao Brasil nos inícios do século XX. Levinsohn alega ter recebido em doação a União 203

de Construtoras à Delfin Rio S.A. Crédito Imobiliário e Delfin S.A Crédito Imobiliário, o que mais tarde viria a ser o Agronegócio Condomínio Cachoeira do Estrondo. No entanto, segundo técnicos e assessores das comunidades que tradicionalmente ali vivem, a fazenda estaria ocupando terras públicas entre os rios Preto, Riachão e do Ouro. Entre os camponeses e camponesas da região há um generalizado sentimento de desconfiança de que teria sido por pressão política do Agronegócio Condomínio Cachoeira do Estrondo e outros grupos do agronegócio regional, que o Tribunal de Justiça da Bahia fechasse a Vara Regional de Conflito Agrário e Meio Ambiente, e afastado das funções junto a esta Vara, a Exma. Juíza Marlise Freire Alvarenga que deferira uma liminar de manutenção de posse, favorável aos camponeses, ainda que em decisão provisória.

Em 2017, onze moradores se uniram e entraram com uma ação de manutenção de posse coletiva na área do vale. O processo chegou à vara regional de Conflito Agrário e Meio Ambiente de Barreiras, a 862 km de Salvador. Três empresas foram citadas nominalmente: Cia Melhoramentos do Oeste da Bahia e a Delfin Crédito Imobiliário, ambas na lista da Estrondo, e Colina Paulista, da qual Levinsohn é administrador.

Harvey distingue três tipos de lutas que se processam em uma variedade de escalas: (1) movimentos sociais e acumulação por espoliação, (2) conflitos em torno da reprodução ampliada do capital, e (3) conflitos sobre a incorporação material de processos sociais na “teia da vida”.

A expansão da soja tomada aqui como processo para explicitar tais movimentos do capital mostra que o avanço do monocultivo acompanha a degradação das relações espaciais mediada pelas mais diversas formas de violência – a expulsão de camponeses e povos e comunidades tradicionais de suas antigas áreas de moradia e produção; o loteamento e conversão generalizada da terra à propriedade privada, passível de ser absorvida pela crescente especulação imobiliária rural; o avanço da monocultura, primeiramente nas áreas de chapada, facilmente mecanizadas e em um segundo momento nos vales; o crescimento e mobilidade do trabalho assalariado, sazonal e precarizado nos novos espaços de produção agrícola modernizada da soja. Tais movimentos do capital são necessários para abastecer o mercado de terras e commodities mundial, permitindo novas dinâmicas de acumulação (via despossessão) e valorização do valor via ficcionalização dos capitais agrícolas. Os conflitos, que antes eram mascarados pela presença pouco assistida do Estado agora se tornam 204

inevitáveis. Como diz Antônio Criolo, da Comissão Pastoral da Terra no Maranhão: “quando a gente percebe, o negócio já aconteceu”.

3.5 Conflitos: as faces da hidra e o diabo (e a imanente crise do capital)

Assim como o documentário “Terra deu, terra come”, a expansão capitalista no campo não passa de mais um ritual fúnebre. “Perguntam-se os presentes se o corpo ainda está inchando, se ainda está quente. Parece que está vivo, mas já morreu” (CESARINO, 2011, p.173). Assim como no documentário, que mescla a realidade com o imaginário, não temos claro quem orquestra o ritual de sepultamentos, e aqui não podemos apontar quem são os coveiros dos projetos de morte instaurados pelo capitalismo. Terra deu, terra come. “Comedores de terra”, afirma David Kopenawa e Bruce Albert em “A queda do céu” (2010). Os comedores de terra, também são (re)conhecidos pelos autores como saqueadores de terra. Seria possível, no sistema capitalista, comer da terra sem ser um saqueador? Os espíritos da floresta estão enfurecidos e emagrecidos. Débora Danoswki e Eduardo Viveiros de Castro escrevem: “o fim do mundo é um tema aparentemente interminável – pelo menos, é claro, até que ele aconteça” (2014, p. 11)118. Em “Há um mundo por vir? Ensaios sobre os medos e afins”, os autores descrevem as diversas linhas de pensamentos, cosmologias e obras sobre o fim do mundo. O mais alarmante do tom apocalíptico em que vivemos e da eminência do fim do mundo é, na verdade, a situação antiutópica criada, na qual a evolução (tecnológica) do sistema capitalista permite a

118 Até mesmo Engels, que destinou maior parte de suas obras a compreender o capitalismo e seus “limites” pensou também no fim do mundo: Sin embargo, "cuanto nace es digno de perecer". Podrán pasar millones de años, cientos de miles de generaciones podrán nacer y morir, pero llegará inexorablemente el día en que, al agotarse el calor del sol, no alcance para fundir los hielos que avanzan desde los polos, en que los hombres, que irán concentrándose más y más junto al Ecuador, no encuentren tampoco allí el calor necesario para vivir, en que poco a poco vayan borrándose hasta los últimos rastros de vida orgánica y la tierra, convertida en una bola muerta y helada como la luna, gire, hundida en profundas tinieblas y en una órbita cada vez más estrecha en torno al sol, también enfriado, para precipitarse, por último, en los espacios cósmicos. Otros planetas caerán antes que ella y otros la seguirán en su caída; en vez del sistema solar, armónicamente ordenado, luminoso y lleno de calor, una esfera fría y muerta recorrerá su camino solitario por los espacios […] ¿Y qué ocurrirá cuando semejante sistema solar acabe de recorrer el ciclo de su vida y se enfrente a la suerte reservada a todo lo finito, es decir, a la muerte? ¿Seguirá el cuerpo muerto del sol rodando por toda una eternidad, como un cadáver, a través del espacio infinito y se hundirán para siempre todas las fuerzas naturales antes diferenciadas en infinita uchedumbre en la sola y única fuerza de movimiento de la atracción? "¿O bien -como se pregunta Secchi (pág. 810)- se contienen en la naturaleza fuerzas capaces de retrotraer el sistema muerto al estado inicial de la nebulosa candente, para infundir otra vez en él una nueva vida? No lo sabemos" (ENGELS, 1961, p.18-19).

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criação de objetos e reverberações destrutivas em escalas e consequências inimagináveis, como reatores nucleares, hidrelétricas, silos de armazéns, cavas e barragens de rejeitos químicos, sementes híbridas e geneticamente modificadas. Desta feita, é mais possível (ou passível?) prever o fim do mundo que o fim do capitalismo. Em diversas religiões, os rituais de passagem, a celebração da morte é o que valida a passagem para o mundo dos mortos. No Quilombo Lagoa da Pedra (TO) está se perdendo uma destas importantes passagens, que é fazer simpatia pra morto que não queria ir para o cemitério. Além disso, hoje não carregam mais o defunto. Ele vai no carro da funerária. “Hoje tá civilizado, os defunto hoje ficou tudo civilizado, não tem esse negócio de pé mais não” (TESKE, 2011, p.228).

A modernização dos cerrados consolidou não só os latifúndios e a propriedade, mas também a entrada de signos que cada vez mais apagam a lógica dos lugares para dar espaço as cores monocromáticas dos monocultivos da soja e às ordens do sistema mundial.

Até a morte vai de carro. O burro, o cavalo e o jegue perdem espaço para as motos – o pasto, a alimentação e cuidados do animal custam mais que a manutenção da moto. Aluguel do pasto pode variar, de R$20,00 a R$70,00 por cabeça, enquanto o litro da gasolina varia de R$4,00 a R$5,00 pelo cerrado adentro.

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Foto 17 - Entre a religião, a resenha e a família: a moto

Fonte: Foto da autora, Muricilândia (2018).

O dinheiro, representado pela moeda, é a salvação no mundo capitalista, mas também representa o fortalecimento dos laços com o diabo. Taussig diferencia o dinheiro a partir dos conceitos de valor de uso e valor de troca, sendo o primeiro tipo de valor natural, tendo como objetivo a circulação das mercadorias, a troca, a satisfação das necessidades básicas e estéril ; enquanto o segundo tem como objetivo a reprodução do dinheiro em si mesmo, não natural, mas fértil, que se autoproduz.

A ideia de empregado e não de camponês ou alguma identidade ligada a posse da terra de maneira clara, também carrega o conceito de mobilidade, nos mostrando a dificuldade de permanecer em um determinado lugar. Se antes era possível “mover-se” e ocupar “novos” espaços na região Matopiba, como relata Becker (1982) pela falta de presença ou uma presença rarefeita do Estado, crescente desde os anos 1930 e mais efetivamente a partir dos anos 1970. Hoje, com o avanço da fronteira agrícola, a presença do Estado, seja pelas alianças com as elites locais, pelas políticas públicas, pelas parcerias com o capital estrangeiro, ou até mesmo pelos celulares, não deixa muitas saídas nem terras devolutas para o deslocamento (ou fuga?) desses populações campesinas e de múltiplas identidades, gerando e alimentando conflitos cada vez mais violentos e aparentes.

Apesar de analisar algumas características da violência e dos projetos de morte enquanto estratégia do capital, o endividamento também pode ser considerado uma forma de morte lenta, no qual o trabalhador é sugado metabólica e financeiramente: “vivir y dejar vivir” es la norma de la sociedad civil. No hay que olvidar que para un propietario privado es siempre más provechoso el contrincante vivo conveniente en deudor que el enemigo muerto” (ECHEVERRÍA, 1998, p.6). Um dia se trabalha como temporário ou sazonal, outro não há ocupação; depois se torna descartável e, como afirma Agamben, podem morrer.

A economia de morte é pode ser também uma máquina de aniquilamento lenta, já que a vida é imprescindível para a exploração. A não ser que você se rebele e não aceite o sistema de exploração e acumulação, daí será aniquilado, como vem mostrado os dados da CPT e os conflitos e assassinatos no campo. Assim como Bartra nos perguntamos sobre os 207

desdobramentos dos projetos de morte e da necropolítica: as formas de violência matam ou mantêm a vida para sugá-la a conta-gotas?

No Pará, em Mojuí do Campos, assim como no Matopiba, a soja também avança. Lá, a soja já ocupa grande parte das áreas de plantio do município. “Só ficou o cemitério, porque infelizmente os mortos não se mudam”, relata a liderança local no documentário “Soja, a promessa da destruição” (2017).

Foto 18 - Foto Cemitério de Mojuí dos Campos (PA)

Fonte: Documentário Soja, a promessa da destruição (FASE, 2017)

Algo semelhante também ocorre na comunidade do Gado Bravo, nas proximidades de Balsas, onde eles “foram expulsos, morreu muita gente lá. Ainda hoje tem lá um cemitério que eles só faziam jogar para lá, foi tomado, foi tomando, foi tomando, até chegar aqui mesmo quase dentro da rua, em Balsas, aí a expansão do agronegócio maior era lá” (Irmão, São Raimundo das Mangabeiras, 2016). Na Fazenda Boqueirão, em Wanderlândia (TO), foi encontrado um cemitério que data de1870, com cerda de 70 pessoas enterradas, antepassados de famílias de agricultores tradicionais, também envoltos pela soja (e pecuária, neste caso).

O mote aqui não é criar uma visão idílica e melancólica do sertão e do campo, afirmando que o “tempo bom” era aquele das mínguas e do deslocamento de longas distâncias 208

a pé, do árduo trabalho na lida da terra, da fuga da seca. No entanto, é inexorável não contestar a positividade da modernidade, como alguns trabalhos já vem apontando, principalmente no que tange a monetarização das relações, as políticas públicas do campo e as formas de expulsão da terra para a expansão da soja ou meramente para a especulação (ALVES, 2006; SOBRINHO, 2012, KLUCK, 2016; LEITE, 2015, HEIDEMANN, 2010).

El uso de metáforas ha sido un recurso utilizado en toda la historia de la teoría política, no para embellecer literariamente el discurso, sino para representar figuradamente – haciendo comprensibles y comunicables– los fenómenos de la dimensión política de la vida social. Leviatán y Behemoth, el estado como “cuerpo político” o la política como un “pacto con el diablo” son algunas de las metáforas que han dejado huella en la historia del pensamiento político y que siguen utilizándose para explicar fenómenos políticos en las sociedades contemporáneas” (ROUX, 2008, p.241)

As leis econômicas triunfam e a busca pela manutenção do capitalismo governam seus “criadores”. O diabo aqui media as relações capitalistas e não capitalistas de produção. Para Karl Polanyi (2000) é possível compreender a mentalidade de mercado e a maneira mercantil de ver o mundo a partir do conceito de ficção da mercadoria e a ficção consumista.

Em outras palavras, de acordo com a definição empírica de urna mercadoria, eles não são mercadorias. Trabalho é apenas um outro nome para atividade humana que acompanha a própria vida que, por sua vez, não é produzida para venda mas por razões inteiramente diversas, e essa atividade não pode ser destacada do resto da vida, não pode ser armazenada ou mobilizada. Terra é apenas outro nome para a natureza, que não é produzida pelo homem. Finalmente, o dinheiro é apenas um símbolo do poder de compra e, como regra, ele não é produzido mas adquire vida através do mecanismo dos bancos e das finanças estatais. Nenhum deles é produzido para a venda (POLANY, 2000, p. 94).

Em sua forma de mercado, a sociedade engendra e organiza essa realidade fictícia, e é com essas abstrações ou símbolos que somos forçados a operar e a entender o mundo globalizado. Dentro do processo de proletarização dos camponeses, da monetarização via trabalho assalariado, avanço das políticas públicas e do mercado mundial de alimentos, representado pelo avanço do plantio da soja no Matopiba, o diabo, o monstro, a hidra, media a vida em prol dos projetos de morte. A transformações regionais e a reprodução da hidra são tidas como antinaturais e malignas, assim como o diabo, figura que presenta enquanto fetichização das relações capitalistas e imagem mediadora do conflito entre os modos pré- capitalistas e capitalistas de objetivação da condição humana. 209

a medida que los campesinos cultivadores pasan a ser asalariados sin tierras, invocan al diablo como parte del proceso de mantener o incrementar la producción. Sin embargo, cuando se trata de campesinos que trabajan su tierra según sus propias costumbres, esto no sucede. Es solamente cuando se los proletariza que el diablo cobra tal trascendencia, no importa cuán pobres y necesitados sean estos campesinos, ni cuán deseosos estén por aumentar la producción (TAUSSIG, 1993, p.30)

Em uma conversa em 2018 com um dos assessores da CPT em Araguaína sobre os processos de avanço da agricultura capitalista da soja e a complexificação das formas de acumulação ao longo dos anos, fica latente a dificuldade de reconhecer o diabo capitalista. Se antes a figura do fazendeiro era conhecida e representava o capital e o poder na região, hoje, é difícil reconhecer quem de fato são os donos do capital, já que as lógicas do capital financeiro complexificaram as relações capitalistas no campo. Muitas vezes ele nem aparece. E até pra nós [CPT] fica difícil. Mas é percebida pelos trabalhadores, pelos indígenas, há muito tempo. Pelo jeito deles. E aí eu pego a frase de um ancião indígena que fala assim: é um monstro. É um monstro tão grande, que a gente não consegue ver ele todo. A gente vê parte dele. A gente vê um braço dele, vê uma perna dele ... é uma ferrovia, é uma hidrelétrica, é uma mina, é um megaprojetro de soja, de eucalipto. É esse monstro, é o capital que está aí. Dentro das mazelas que eles estão deixando que também não é novidade. Quarenta anos atrás eu fui impactado pelo eucalipto lá em Minas [Gerais], a Mannesman expulsou a gente de nossas terras lá. Eu estou vendo acontecer aqui [no Tocantins] o mesmo.

A ideia do monstro indígena dos Apinajés nos retoma a ideia de hidra que vem sendo elaborada pelos indígenas mexicanos zapatistas, um ente de muitas cabeças,

que anuncia muerte y sufrimiento, y no solamente lo anuncia sino que lo cumple, es decir que no se queda sólo en la teoría. Un ser que corrompe y envenena el aire, que es el mal de la hidra que la gente tenía que dejar sus tierras, las cuales ya no podrían labrar, en las cuales a sus muertos yo no podían sepultar. Y la hidra era tal que al cortarle alguna de sus cabezas salían tres más (Pensamiento Crítico Frente a la Hidra Capitalista tomo II, p. 186, 2015).

“O monstro” inclusive acompanha os movimentos da fronteira agrícola nos cerrados. Um dos projetos estatais de avanço da fronteira mais importantes foi o Prodecer, realizado em três fases. A primeira, há quarenta anos atrás, em 1979 teve como área de implementação Minas Gerais. Já a terceira fase, realizada nos meados anos 1990 no Tocantins e Maranhão, cria normativas e materialidades possíveis para tornar Pedro Afonso e Balsas municípios produtores de soja. Mais recentemente, o PDA Matopiba traz novos contornos ao 210

avanço capitalista. Ainda sobre cemitérios e monstros, é importante observar que desde o avanço do plantio da soja no Rio Grande do Sul, área já consolidada, os cemitérios foram tomados pelo grão, que se multiplicou como um vírus ao longo do território.

Há um claro apelo ao projeto de agricultura “comercial”, capitalista, científica, globalizada, mundial, empresarial, agribusiness, agronegócio. Assim como o dito cujo, o diabo, há vários nomes para referenciar-se ao projeto de agricultura capitalista monocultora de exportação.119

O que Matopiba quer? É soja, é barragem, é eucalipto. É tudo isso. A gente não come eucalipto. Nós não comemos soja. Aí a situação é essa.

As pessoas que entram nesse processo. Primeiro eu moro nessa comunidade, eu crio um amor por ela, aí faz parte da minha vida, e eu quero defender. Esse território é a vida das pessoas. E o que ajudou também no meu entendimento que ajudou a reforçar essa resistência foi essa formação e essas informações que nós recebemos desde os anos 80 e estamos recebendo. Isso foi criando em nós esse espírito que isso nos pertence e nós não vamos abrir mãos. Eu acho que é isso que alimenta a nossa resistência. E a sobrevivência: ou tu tens a terra pra trabalhar, ou tu não vai viver.” (Antonio Criolo, Loreto, 2016). O contrato com o diabo vem em formas de assalariamentos sazonais, trabalhos informais. Caso a pobre alma não queria pactuar, a expulsão e a morte são as faces que a hidra mostra ao camponês.

119 Apesar de estar colocando todos esses adjetivos no mesmo cesto lexical do diabo, entende-se que tais adjetivos que acompanham as formas de agricultura advêm de referenciais teóricos que conversam entre si, mas são distintos. Uma questão central seria primeiramente a temporalidade, ou seja, a agricultura moderna seria distinta da agricultura científica. A primeira refere-se ao período da Revolução Verde, doa anos 1970-1990 e o segundo seria dos anos 1990 até a atualidade, já que o implemento de técnicas mais especializadas, o sistema de crédito, e a importância da informação na produtividade e eficiência da produção agrícola dentro do molde latifundiário-monocultor, dentro do pensamento miltoniano desenvolvido por Castillo, Frederico e Elias. Tal periodização e características poderia ser colocada também para a questão agribussiness e agronegócio, na qual atualmente o termo agronegócio é mais utilizado. Os termos agricultura capitalista é tido como um termo mais genérico para contrapor-se a uma agricultura de subsistência ou de resistência, como vem a agricultura indígena, extrativista, as milpas, os manejos de agricultura ligados a agroecologia e a permacultura. No que tange a agricultura camponesa, que abarca um leque maior de vertente e posicionamento conceitual, entende-se que ela está dentro e fora do capitalismo. Seria interessante revisar questões apontadas por Bernardo Mançano (2014a; 2014b; 2013) sobre o Paradigmas do Capitalismo Agrário e o Paradigma da Questão Agrária. Apesar de tal teoria posicionar o campesinato dentro do paradigma agrário, contraposto ás concepções conservadoras de autores da Economia e Sociologia Rural, é necessário apontar questões sobre os camponeses, como a terra enquanto uma propriedade nuclear e como patrimônio de herança, inserção em mercados e algumas estratégias de reprodução que seguem as lógicas e demandas do capital. É claro que o campesinato irá continuar existindo, lutando e tendo formas capitalistas e anti-capitalistas, quer os acadêmicos e seus conceitos ou não, já dizia Teodor Shanin. 211

Regina Sader, em sua tese de doutorado “Espaço e luta no Bico do Papagaio” (1986) já apontava, mais precisamente na abertura dos capítulos as “estórias de Estevão” sobre elementos que a escapavam, mitos e histórias de seres que existem mas não vemos, ou de relatos nas entrevistas de campo que iam para além do “racional”, e que ao longo da construção da tese vivenciei e que seguem escapando. Mitos sobre índios, mãe-d’água, botos, que permeiam todo o imaginário dos cerrados. Se a figura do diabo fica cada vez mais presente, já o lendário pacto com o diabo é uma acusação contra o sistema econômico que força os homens a trocarem suas almas pelo poder destrutivo das mercadorias (TAUSSIG, 1993), a figura dos encantados vai perdendo espaço. A afirmativa de Guimarães Rosa, de que “as pessoas não morrem, ficam encantadas”, fica cada vez mais distante do imaginário das novas gerações do campo.

Para os tupinambás, que estão num processo de retomada de terras na Bahia, a terra não se vende, não se comercializa. Terra é para trabalhar, plantar e colher. “Não se negoceia”, como afirma Maria Gloria de Jesus. A terra era dos encantados120, dos espíritos, dos nossos antepassados”, diz Glicéria Jesus da Silva121.

Dona Ciça, grio da comunidade quilombola D. Juscelina, em Muricilândia, norte do Tocantins, desde pequena trocou os litros de coco pela contação de história. Levava e juntava o coco para as outras quebradeiras, e contava causos e dava risadas para que o dia de todas passasse rápido. Foi parteira, e auxiliar do único posto de saúde durante décadas e guarda as histórias do município, e viveu as transformações e o desaparecimento dos ‘encantados’. Dona Ciça conta história de cobra, de onça, do pé de ferro, pé de garrafa, de um negro de terno branco. “Tudo é história, lendas, mas que aconteceu. As pessoas não veem mais essas coisas porque perdeu-se o encanto, a pureza das coisas, não tem mais. A vaidade tá grande, não tem mais aquela coisa, os jovens quase não dão atenção aos idosos, as

120 Ver o livro “insurreição de saberes: tradição quilombola em contexto de mobilização (2013), em especial o texto “Quem não tem santo tem visagem: a contribuição de santos e encantados na construção de territorialidades quilombolas na baixada maranhense”. Há um reconhecimento de terras sob o domínio dos encantados, ou locais de encantaria no Maranhão. As encantarias estão diretamente ligadas a natureza e sua proteção pela comunidade é o que garante suas aparições. A destruição da natureza assim, levaria ao desaparecimento das encantarias. 121 Ver o documentário “Tupinambá – O retorno da terra” (2015), disponível em https://vimeo.com/126566470. A partir dos anos 2000, os tupinambás, após anos de rituais, foram “autorizados” pelos encantados para retomar e retornar a suas terras, mesmo que aquilo custasse a vida dos tupinambás. Além disso, haviam histórias de que na casa do fazendeiro morava o diabo. Após a expulsão dos fazendeiros da Aldeia da Serra do Padeiro em 2004 fez com que alguns indígenas expulsos há décadas atrás retornassem, assim como alguns animais e os encantados, que são vistos nas penumbras da noite e pelas névoas da manhã. 212

crianças... A beira do rio era mais fechada, muito murici, aqueles cacho de murici, ai os bichos se aproximavam. Aqui era bonito demais. Era muito encanto naquele tempo.

Quando perguntei a ela se o ‘encanto’ poderia voltar, Dona Ciça me respondeu assertiva: “Tem não... o pessoal tá matando tudo a natureza. Mas eu não sei se você vai entender, porque seu tempo aqui é pouco”. A fala de Dona Ciça sintetiza a fronteira enquanto manifestação dos desencontros entre distintas temporalidades e civilizações, onde a perda do encanto avança com o projeto de civilidade imposto pelo avanço dos monocultivos de soja, um só cultivo, um único projeto de nação, e várias mortes.

Um interessante filme guatemalteco, Ixcanul (2015), retrata a vida de trabalhadores de uma fazenda de café. Em sua maioria falantes Kaqchikel, os trabalhadores e trabalhadoras têm dificuldade de compreender o espanhol, no qual seus direitos e leis são mediadas e filtrados pelo dono da fazenda. Maria, jovem trabalhadora nas colheitas de café estava prometida para o gerente da fazenda, o que garantiria uma ascensão de sua família na dinâmica local bem como a casa e o trabalho (o filme não deixa claro, mas há traços de relação de escravidão por dívida, alojamento como parte do pagamento do serviço, e incentivo ao alcoolismo). Uma noite de amor com um trabalhador da colheita provoca uma gravidez inesperada, colocando em risco a permanência de Maria sua família na fazenda e seus contratos de trabalho. As sabedorias ancestrais se mesclam com os efeitos da modernização, “la explotación de las empresas agroexportadoras; desconocimiento del español como situación de desventaja frente a la cultura ladina; el tráfico de niños cebándose en quienes carecen de recursos jurídicos y lingüísticos para defenderse; la cultura patriarcal que dispone de la vida de la mujer sin contar con su libre determinación; el abandono de las áreas rurales (falta de agua potable, luz, vivienda…)” (UMAÑA, 2015). Quando Maria é utilizada como amuleto, já que por carregar a luz da vida em seu corpo teria o poder de espantar as cobras dos campos abertos que estão sendo semeados, Maria é picada por uma serpente. As culturas ancestrais são colocadas nesse momento em xeque: as magias ancestrais não “funcionam” ou sua eficácia na verdade teria sido afetada pela transformação da floresta em monocultivo? A tecnologia xamãnica falha pelo desequilíbrio dos elementos da natureza provocado antes de sua evocação, já que o terreno foi desmatado, queimado, jorrado com pesticidas e fertilizantes. Os encantamentos desaparecem com as matas.

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Antigamente, como conta David Kopenawa em “A queda do céu” (2010), os seres da floresta eram muito mais vulneráveis às fumaças das mercadorias, que exalavam um odor forte; facões soltavam uma fina poeira perfumada (p. 246-247), que levavam os índios a tossir e vomitar. Os mais velhos reconheciam o cheiro dessa fumaça de metal, das coisas, das moedas de longe. “Jamais tínhamos cheirado tal coisa antes da chegada dos brancos. “Essa fumaça devorou a floresta, e junto com ela seus povos”, afirma Kopenawa (p.310). A destruição da hidra, esse intruso amorfo de plasticidade infinita, criado e mantido pela sociedade, monstro gente-alienígena que emite essa fumaça-metal é descrita por David Kopenawa como seres “ferozes e gulosos, que se apoderam das imagens de suas vítimas, decapitam-nas e despedaçam-nas. Devoram em seguida seus corações e engolem o sopro da vida” (p.367). As mercadorias têm valor de epidemia, e é por isso que os males e a morte as contêm. Iremos morrer esmagados pela queda do ceú, pois o que Kopenawa alerta para um céu amarrado e firmado nos xapiri é o que garante a existência de um futuro. No prefáciodo livro “A queda do céu”, Viveiros de Castro afirma: “o vão desejo de ignorar a morte” está ligado à fixação dos brancos na relação de propriedade e na forma-mercadoria. Eles são “apaixonados” pelas mercadorias, às quais seu pensamento permanece completamente “aprisionado”122.

A mercadoria é tomada aqui como uma unidade contraditória, já que media relações fetichistas e alienantes via valor de uso e valor de troca. Tais contradições, alimentadas pela violência histórica da divisão territorial do trabalho, no marxismo clássico podem ser findadas com a socialização das forças produtivas, inerentes ao progresso técnico. O lendário pacto com o diabo é uma acusação contra o sistema econômico que força os homens a trocar suas almas pelo poder destrutivo das mercadorias (TAUSSIG, 1993). O contrato com o diabo vem em formas de assalariamentos sazonais, trabalhos informais. Caso a pobre alma não queria pactuar, a expulsão e a morte são as faces que a hidra mostra ao camponês.

Ao longo da tese aqui defendida seguimos com a seguinte indagação: seria possível pensar no fim da violência? A violência seria, assim como outros males da forma humana ontológico, ou como afirma Mario Duyer (2015), algo mais arraigado e criado pelo

122 “Os brancos não sabem sonhar. Por isso destroem a floresta desse jeito” (p.531); ou “Os brancos não sonham tão longe como nós. Dormem muito, mas só sonham consigo mesmos” (p.390), ambas passagens de KOPENAWA e ALBERT (2010). Se não sabemos sonhar, como construir utopias? 214

sistema capitalista do que encrustado dentro de nós mesmos? A dialética das formas de valor se assemelha a dialética das formas de violência, uma vez que a mercadoria e a mediação das relações, tanto que mediam a construção do ser quanto as medições nas escalas regionais e nacionais são semelhantes.

Uma coisa podemos afirmar: uma sociedade capaz de desviar o desejo de apropriação, ou açambarcamento dos produtos, de manter uma distância entre o valor de uso, de estimular a cobiça, e a pessoa do rival, pode suportar mais violência que uma sociedade na qual os objetos são símbolos representativos das pessoas vivas ou mortas. Isso ocorre porque a racionalidade e o avanço técnico, que também era uma promessa para os tecnocratas, na verdade se transforma em catástrofe, como demonstrado ao longo da tese.

Como diria Aglieta e Orléan (1990, p.45), “o desejo humano tem forças que escapam as determinações que o trabalho supõe”. Nesse vazio teórico, o individualismo triunfante da sociedade burguesa em seu apogeu, pode encontrar sua racionalização” – mesmo que pautada numa “racionalidade irracional”, já que o modelo capitalista se reproduz à medida que nos autodestrói e mata. Monbeig (1984), sobre o projeto capitalista em marcha – civilizatório, usurpador, monocultor, já se perguntava: “o pioneiro não estaria trabalhando contra si mesmo? (p.73). A devastação ambiental, desmatamento e empobrecimento dos solos, a contaminação dos corpos de água dificulta a cada ano manter taxas elevadas de produtividade da safra e eleva os preços da terra via renda diferencial, aumentando os custos de produção a cada ano.

O Brasil tem, segundo estudos de Bombardi (2018; 2011) 504 agrotóxicos de uso permitido. Segundo informações do próprio Ministério da Agricultura (MAPA) há 350 empresas de aviação agrícola e 130 produtores rurais proprietários de aeronaves registrados no órgão. O registro é obrigatório. A fiscalização, porém, está bem aquém. São 70 fiscais para cobrir todo o país (lembrando que há estados que não fiscalizam). A legislação proíbe pulverizações a menos de 250 metros de mananciais e 500 metros de povoados, mas não há nenhum controle ou estimativas oficiais sobre violações das normas. As normas não são respeitadas, e ao longo do trabalho de campo realizado no Piauí, fomos surpreendidos por uma pulverização aérea, realizada de maneira descuidada123. A partir da investigação realizada pela Repórter Brasil, Agência Pública e a Public Eye, entre 2014 e 2017 no

123 Ver história do agricultor Juarez Celestino de Souza, na comunidade de Melancias, relatada em https://apublica.org/2018/05/nos-baixoes-do-piaui-paga-se-o-preco-do-progresso-do-matopiba/ 215

Tocantins e Bahia, únicos estados que possuem informações sobre agrotóxicos no Matopiba, foram encontrados irregularidades no uso de agrotóxicos. No Tocantins, 121 municípios do total de 139 de todo o estado acusaram contaminação na água por 27 agrotóxicos distintos.

Foto 19 - Pulverização área no sul do Piauí

Fonte: APública (2018).

No que tange a questão da terra, a homogeinização e o monocultivo tem impacto maior nas regiões tropicais que nos climas setentrionais, já que nos trópicos encontra-se maior diversidade socio-biológica. Ao longo das décadas, é notório o aumento de secas e veranicos, da multiplicação e disseminação de pragas e doenças (como a lagarta, Phaeospheria no milho e nematoide do cisto e cancro da haste da soja). Em 2013 o regime de chuvas afetou a produção no sul do Maranhão e em 2015 no sul do Piauí, ano em o estado inclusive liberou o uso de benzoato de emamectina para o controle de pragas, produto extremamente agressivo para os trabalhadores que manejam o produto. A soja louca124, fenômeno que contaminou as lavouras em 1980 tem aparecido novamente como um problema para as lavouras, ressurgindo em 2005/2006, 2014/2015. O interessante da soja louca é que há como controlar: é uma

124 https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/noticia/5213621/soja-louca-ii-e-reconhecida-como-nova-doenca- da-soja-pelo-mapa 216

anomalia na qual a planta desenvolve folhagem mas não cria vagem/grãos. No Matopiba, o sul do Maranhão foi a região mais afetada. A soja louca é como o sistema capitalista: só cresce como aparência.

Em 2019, as perdas na safra de soja foram cerca de 20% no sul do Piauí e Bahia – estados com maior perda após o Paraná, que perdeu cerca de 30% da safra; Tocantins 10% e Maranhão 7%. Ao invés de repensar o modelo de produção, o pensamento se volta para como salvar (e saldar) as dívidas dos produtores a partir de repactuação das dívidas e financiamento espacial dentro do BNDES125. O que dá sustentação ao modelo de desenvolvimento em implantação é a cerca de carabina, o calote, os subsídios e incentivos escandalosos, as anistias ambientais e aos grileiros, a rapinagem do grande capital às terras públicas (SOBRINHO, 2012, p.68)

125https://aprosojabrasil.com.br/comunicacao/blog/2019/01/25/perdas-por-clima-sao-gravissimas-estima- aprosoja-brasil/?fbclid=IwAR3HBS56zoG-eoGG-FbtvSzfd2CiIsisCxgaojt5keQLtQheCT8KnbR9ctU. Acessado em 14 de junho de 2019. 217

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em “Marcha para o Oeste”, de Cassiano Ricardo (1959), faz uma distinção entre os mitos, as históricas e o avanço da fronteira. O autor logo no início da obra avisa: “isso não é uma fábula”. Para estudo sobre o avanço da fronteira, dificilmente encontra-se um final feliz.

“No real da vida, as coisas acham com menos formato, nem acabam. Melhor assim. Pelejar por exato dá erro contra a gente. Em Grande Sertão Veredas, Riobaldo fala que transformamos a vida em texto “porque ela não é intendível”. Por isso, escravemos, escrevemos, criamos códigos e sistematizações para entender, ou desentender, pelo menos, uma parte da vida.

Apesar dos soldos recebidos, dos campos, dos livros, ainda tenho grandes dificuldades em responder uma pergunta: para quem é esse trabalho? Antes, tinha uma resposta-objeto – uma estante empoeirada. Com a disponibilização das teses em arquivos digitais, beiramos o acúmulo virtual, mas também a esperança de que os caracteres aqui organizados naveguem pelos rios e cabos-óticos que hoje chegam até o sertão, a hinterlândia, a hiléia.

Diferentemente dos trabalhos que vem discutindo a região do Matopiba, buscou- se compreender como essa região, que aparentemente parece ter surgido nos anos 2010 a partir da expansão do agronegócio e de um Plano de Desenvolvimento Agrícola, na verdade, vem sendo moldada pelas relações capitalistas via expropriação dos camponeses e projetos agrícolas desde o início do século XX; e a partir da segunda metade do século XX tal expansão ocorre de forma mais organizada e planificada pelo Estado, na qual os projetos agrícolas começam a ser implementados de forma sistemática na região.

A conformação de um Brasil refém dos processos de colonização e acumulação refletiu na inserção do país como produtor de mercadorias para o mercado mundial, seguindo a regra ditada a muitos países latino-americanos. Fosse açúcar, fumo, cacau, borracha ou café, utilizando vantagens comparativas geográficas de cada porção do território nacional – todas as regiões são da economia-mundo, articuladas com o mercado mundial através de interesses das elites locais, embora sobredeterminadas pelas economias centrais. A agricultura cumpre um papel vital na expansão do sistema capitalista no território nacional brasileiro, assim como 218

em outros países latino-americanos vizinhos, fornecendo força de trabalho, alimentos, compatibilizando o processo de acumulação global. Neste contexto, o Brasil, atualmente, é o maior exportador de açúcar, café, suco de laranja, soja em grão, carne bovina e de frango e milho. O Estado como promotor do processo de modernização contemporânea do campo brasileiro promove espaços favoráveis à expansão do capital, seja implantando condições físicas de infraestrutura de distintas naturezas para o avanço do capital, seja criando normatizações que possam garantir a instalação e a sua presença, sobretudo naquelas áreas de maior possibilidade de valorização do capital – e permitindo uma nova rodada de acumulação, em conformidade com o que Harvey (2011) nos aponta sobre a nova fase do capitalismo globalizado. A atualidade dos fenômenos aqui retratados, as recentes mudanças políticas que interferiram diretamente na região do Matopiba sob o arranque dos processos de acumulação ainda vista como fronteira agrícola a partir da financeirização do circuito da soja, as relações entre Estado, mercado terras e trabalho mostram os impasses do capitalismo em suas diversas faces, nas quais todas reforçam o caráter de crise imanente ao qual estamos sendo subjugados.

A superação da dinâmica regional acontece por meio da formação de zonas de localização diferenciada, nas quais a renda da terra deixa de ser a forma de extração do excedente para tonar-se um sobrelucro capitalista pago ao proprietário da terra, cujo preço é formado em um mercado de terras autonomizado. A autonomização entre violência econômica e extraeconômica presente no mercado de terras monopolizada pelo Estado nacional juridificado autoriza que a fusão entre o político e o econômico continue ocorrendo, criando uma estrutura de concentração de poder, terra e capital.

As leis econômicas triunfam e em busca pelo lucro governam seus criadores. O diabo aqui, media as relações capitalistas e não capitalistas de produção. Karl Polanyi insere a mentalidade de mercado e a maneira mercantil de ver o mundo sob o conceito de ficção consumista. É uma ficção acreditar que terra e trabalho são coisas que são produzidas para vender. "El trabajo no es más que otro nombre para una actividad humana que va con la vida misma", y la tierra no es más que otro nombre para la naturaleza, que no está producida por el hombre" (1957, p. 72). Com uma sociedade baseada no mercado, a ficção de Polany se torna realidade. Na forma de mercado, a sociedade engendra uma realidade fictícia, com abstrações e símbolos em que somos forçados a operar e comprender o mundo. 219

O trabalho cria uma narrativa da violência: as formas de violências, em grande medida tendo o Estado como responsável ou mediador foram fundamentais para organizar uma região que garantisse e entrada do capital. A formação de uma força de trabalho, imprescindível para tal processo, criou uma legião de expropriados de suas terras que pudessem servir para a abertura da fronteira, mão de obra barata que permitisse os baixos custos de produção das commodities. A violência aparece como uma característica inexorável a todos os processos de avanço da fronteira da soja.

A “economia de morte”, como revela Achille Mbembe, e suas relações produção e poder atuais diferem-se da etapa de violência colonial, já que agora a violência se revela com um fim em si mesmo, e não como um meio exclusivo de alcance da renda. O Estado, nesse jogo que está longe de ser aleatório como uma roleta russa, é instituição-chave no processo de dominação, autonomizando as relações e coisificando os sujeitados. Esse processo de aniquilação dos direitos e da integridade de algumas populações (camponesas principalmente), demonstra como o aparato estatal está pronto para privilegiar processos de acumulação, no qual a violência e a expropriação são dados irredutíveis desse processo, variando em grau, mas sempre presentes em suas manifestações.

A sazonalidade do trabalho na lógica das culturas temporárias cria uma relação precária com o trabalhador e as fazendas, fazendo com que os trabalhadores assalariados rurais trabalhem ao longo do ano em distintas cadeias de commodities (soja, cana, eucalipto e pecuária) e até mesmo em distintos lugares, acompanhando as variações de calendário de colheita e plantio dentro do Matopiba. É possível observar frentes de migração de trabalhadores que vão em direção ao oeste baiano, e das colheitas de soja, milho e algodão baianas adentram ao Tocantins (mais rarefeita), Sul do Piauí e Maranhão. Do sul do Piauí há rotas para o sul do Maranhão e Bahia. Muitos destes trabalhadores assalariados são superexplorados pelas empresas que os expulsaram (ou que expulsaram seus pais ou avós), a partir dos processos de captura da terra e suas variantes formas de acumulação.

Entendendo que o camponês também é um trabalhador rural de múltiplas identidades dentro da região de estudo (agricultor familiar, quilombolas, indígenas, quebradeiras de coco, pescadores, caboclos, comunidades de fundo e fecho de pasto, geraizenses e sertanejos), os Sindicatos de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR), têm um papel fundamental no reconhecimento de direitos sobre a posse da terra e garantia de direitos de tais comunidades. No entanto, nos últimos anos, há uma crescente criação de 220

entidades específicas para os trabalhadores assalariados rurais – Federações de Trabalhadores Assalariados Rurais ou Federações de Empregados Rurais Assalariados. A saída dos trabalhadores assalariados dos STTR esmaece a relação entre o assalariado rural e a terra, distanciando a possibilidade de retorno a posse da terra. A ideia de “empregado” relacionada agora exclusivamente à ideia de trabalhador assalariado rural, fortalece as relações de precariedade e de não-pertencimento resultado da autonomização das relações capitalistas no campo.

O estudo das transformações da relação mercadoria, terra, trabalho a partir do avanço da soja dentro da região Matopiba. centradas apenas no capital produtivo, central na tese e a acumulação de mercadoria não explicam as nuances encontradas ao longo da análise do objetivo proposto. É notória a mobilidade intraregional de indígenas, negros e camponeses que constituem os assentamentos, terras indígenas e quilombos. As relações de trabalho superexploradas garantem, até certa medida, a expansão do agronegócio ao mesmo tempo que expande o assalariamento e expulsa as comunidades. No entanto, a superexploração do trabalho sozinha não consegue frear a tendência da taxa de queda do lucro e a expansão do agronegócio.

Vale perguntar se, no contexto de crise capitalista, apenas a positividade da criação de valor é necessária para os processos de acumulação, o que revela a importância da circulação e financeirização da agricultura e as artimanhas do Estado para a manutenção da estrutura desigual e combinada (e concentrada) do capital. Ao analisar os custos de produção da soja nos estados que compõem a região de estudo, teríamos dificuldade em afirmar que a produção da soja é lucrativa. Nos últimos três anos, para muitos produtores de soja, os custos de produção126 são maiores que o preço das sacas de soja vendidas por hectare. Outra faceta revelada pelas análises das séries históricas dos custos de produção de 2000 a 2017 disponíveis na base de dados da Conab comprova que cerca de 50% dos custos diretos da produção nos estados do Tocantins, Maranhão, Bahia e Piauí, ou seja, despesas de custeio da lavoura (operação com avião, máquinas, mão de obra, sementes, fertilizantes, agrotóxicos, despesas administrativas), despesas pós-colheita (seguro agrícola, assistência técnica, transporte externo, armazenagem) despesas financeiras (impostos, juros, encargos sociais) e

126 Custo de produção será definido a partir da metodologia da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) como: despesas com o custeio da lavoura, despesas pós-colheita, despesas financeiras, depreciações, outros custos fixos, como encargos sociais, seguro e manutenção das máquinas e renda sobre capital fixo e sobre a terra. 221

renda da terra estão voltados para sementes, fertilizantes e agrotóxicos – componentes vendidos pelas grandes empresas como ADM, Cargil, Monsanto, Syngenta, Bunge Alimentos, Multigrain, DuPont Pionner. Além das vantagens lógisticas, as grandes empresas são responsáveis pela maior parte do invertido na produção, ao passo que o custo de produção gasto com o trabalhador assalariado rural (mão-de-obra e encargos sociais) pode variar de 0,24 a 6,5%. Além da superexploração do trabalho como forma de achatar os custos de produção, o Estado como financiador e perdoador de dívidas é fundamental para (a tentativa de) novas rodadas de acumulação, onde o lucro já não é central para a circulação do dinheiro.

Nas décadas recentes, as regras do mercado agrícola estão cada vez mais complexas e a financeirização da agricultura permitiu a entrada de capitais nacionais e estrangeiros que anteriormente não estavam associados a atividades agrícolas, como empresas do setor automobilístico, petroleiras, construtoras e bancos. Além disso, o mercado de futuros permitiu uma ficcionalização de capitais, em que as flutuações do mercado permitiam apostas futuras sobre a produção, sobre a oscilação do câmbio e outros mecanismos do mercado financeiro, como os derivativos. É importante ressaltar que tanto a acumulação primitiva do capital como a reprodução do capital são imanentes ao processo de avanço da sociedade capitalista a partir de um movimento dialético: a acumulação primitiva tem como fundamento a espoliação e a reprodução do capital a exploração (LENCIONE, 2012). Sobre esse segundo aspecto, Virgínia Fontes (2008) ainda aponta que a expropriação é a base social que permite a exploração da força de trabalho, condição imanente da existência humana sob o capital.

No que tange a acumulação de capital, Harvey (2004, p.109) indica que esse conceito revela outros processos, podendo se destacar a mercantilização e privatização da terra e a expulsão forçada dos povos camponesas; a conversão de diversas formas de direitos de propriedade – comum, coletiva, estatal, etc.– em direitos de propriedade exclusivos; a transformação da força de trabalho em mercadoria e a supressão de formas de produção e consumo alternativos, incluindo os recursos naturais; a monetarização das trocas e a arrecadação de impostos, particularmente da terra e, finalmente, o sistema de crédito.

Apesar de sua força cada vez mais destrutiva, o monstro da hidra também possui suas enfermidades, suas contradições internas e inerentes ao sistema capitalista. Pode-se apontar, e complementar e aprofundar aquilo já discutido pelo zapatistas no livro “Pensamiento Crítico Frente a la Hidra Capitalista III”, em especial no texto de Fernanda 222

Navarro (p. 333- 343) e de Juan Waren127 sobre as facetas da hidra, que possui três cabeças fundamentais, seus três centros vitais, passíveis de serem identificadas como os três pilares das questões fundamentais do trabalho aqui exposto.

A primeira cabeça seria a exploração do trabalho, que produz valor e lucro através da produção de bens materiais e serviços. Como a hidra desse trabalho é alimentada pela soja, a produção da soja em grão e de seus derivados constituem essa cabeça. Além disso, as fundações e programas educacionais das empresas, programas de apoio a cultura e educação do agronegócio, cooptação de lideranças locais para trabalhar junto à empresa estariam conectadas a essa face.

A segunda cabeça, ou centro, seria a acumulação por despossessão, que explora os recursos naturais, monetariza as relações das comunidades camponesas, povos e comunidades tradicionais, reconfigurando territórios para seguir reproduzindo. O avanço da fronteira agrícola gerou novas dimensões de conflitos, como o aumento expressivo da especulação imobiliária rural; a expulsão de pequenos produtores de suas antigas áreas de moradia e produção; o aparecimento de trabalho precarizado nas fazendas modernas de produção de grãos; as novas apropriações da natureza como recurso, como reserva de valor e como capital fictício, a degradação ambiental crescente dos ecossistemas locais. Sem contar, ainda, os inúmeros conflitos agrários que é uma constante na formação histórica desse país e não se alteraram com a nova modernização, pelo contrário, as contradições se acirraram nesse segmento.

A terceira cabeça, talvez a mais cruel e difícil de ver, é o capital financeiro. Essa cabeça tem se reproduzido nas últimas décadas sem precedentes. A mercadoria toma formas fictícias, como títulos de propriedade, títulos de dívidas, dentre outros apontados neste trabalho e apresentados com maior profundidade nas investigações de Sergio Leite, Fabio Pitta e Samuel Frederico, reconfigurando os mecanismos de crédito, renda e juros.

127 Warren fala da de uma hidra composta de subsistemas a partir da teoria de sistema-mundo de Wallerstein e de uma mirada pós-colonial, da qual não descordamos, mas seguimos outra mirada teórica na tese. A despossessão como centro e a ação do Estado são centrais para entender o avanço da hidra tanto para Fernanda quanto para Juan, pontos centrais também no trabalho aqui desenvolvido. Seria importante aprofundar nas formas de insurgência contra a hidra, um dos motes centrais do livro zapatista, que aqui não farei. Neste sentido, consultar “Las hidras también lloran... “e o conceito de Navarro e o conceito apresentado por Warren de territórios insurgentes. Ainda sobre formas de insurgência, é fundamental citar os movimentos de autonomia de Cherán, sistematizado no livro “Cherán K’eri. 5 anos de autonomía. Por la seguridad, justicia y la reconstitución de nuestro território” (2017). 223

O vírus capitalista se alastrou, e junto, os monocultivos da soja, a especulação de terras, a violência estrutural. Aqui a estória se acabou. Aqui, a estória acabada. Aqui a estória acaba? Ao que indica seguiremos, já que não conseguimos sonhar e nem projetar o fim da hidra.

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Vídeos https://www.youtube.com/watch?v=AmDfuadOWkI

SOJA - Da Promessa à Destruição (FASE, 2017). 12’27’’ https://www.youtube.com/watch?v=R9Iyisa7iTA

Cerrado e Caatinga como patrimônio (FASE, 2017) https://www.youtube.com/watch?v=P- S66GWi7I8

Rota do Sal Kalunga (2014) https://www.youtube.com/watch?v=InfA-IZYzyg 243

Gerações gerazeiras (2017) https://www.youtube.com/watch?v=gKXH06e3mEI&t=542s

Serra Pelada: a lenda da montanha de ouro (2013) https://www.youtube.com/watch?v=mSDh86t2nG0

Nas terras do bem virá (2007)

“Tupinambá – O retorno da terra” (2015) https://vimeo.com/126566470

Filmes

Trabalhar Cansa. 2011

O Abraço da Serpente. 2015 Félix, o herói da Barra. 2015 Terra deu, terra come. Aprisionados por promessas: a escravidão rural contemporânea no Brasil. 2006 (CPT, Witnees, CEJIL centro de justiça e o Direito internacional) 17 cercas e uma sentença Ixacanul (2015)

244

APÊNDICES

Tabela 1 Empresas do agronegócio da soja (exceto agrotóxicos e maquinários e empresas que sua atuação é exclusivamente semente)

3HC NEGÓCIOS EMPRESARIAIS LTDA-ME AB COMÉRCIO DE INSUMOS LTDA ABC-INDÚSTRIA E COMÉRCIO S/A-ABC-INCO ABIM COMERCIO EXTERIOR & LOGISTICA LTDA ABJ COMÉRCIO AGRÍCOLA LTDA ACRINOR ACRILONITRILA DO NORDESTE S. A. ADAMA BRASIL S/A ADAMI SA MADEIRAS ADECO AGROPECUÁRIA BRASIL LTDA ADECOAGRO VALE DO IVINHEMA S.A. ADM DO BRASIL LTDA AFG BRASIL S/A AGREX DO BRASIL S.A. AGRIBRASIL COMÉRCIO E EXPORTAÇÃO DE GRÃOS LTDA AGRÍCOLA ALVORADA LTDA AGRÍCOLA FERRARI LTDA AGRÍCOLA XINGU S/A

AGRIMERCOSUL IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO DE ALIMENTOS EIRELI – EPP AGRINVEST BRASIL S.A AGRO LATINA LTDA AGROBOM COMERCIO E INDUSTRIA DE CEREAIS LTDA EPP AGROCOMM COM. IMP. E EXP. DE ALIMENTOS LTDA AGROCONTATO COMERCIO E REPRESENTACOES DE PRODUTOS AGROPECUARIOS LTDA AGROINDUSTRIAL CAMPO REAL LTDA AGROINDUSTRIAL SANTA JULIANA LTDA AGROLÓGICA AGROMERCANTIL LTDA AGROMON S.A AGRICULTURA E PECUÁRIA AGROMOND INDUSTRIA E COMÉRCIO INTERNACIONAL DE COMMODITIES LTDA AGRONOVA COMÉRCIO DE INSUMOS AGRÍCOLAS EIRELI EPP AGROPECUÁRIA GLOBAL LTDA AGROPECUÁRIA MAGGI LTDA AGROPECUÁRIA SANTA MARIA DO CERNE LTDA. AGROPECUÁRIA TRÊS PODERES 245

AGROVERDE AGRONEGÓCIOS E LOGÍSTICA ALIANCA AGRICOLA DO CERRADO S.A. ALIBEM ALIMENTOS S.A. ALLEATO ARMAZÉNS GERAIS LTDA ALPHA COMMODITIES S.A. AMAGGI EXPORTAÇÃO E IMPORTAÇÃO LTDA AMAGGI LOUIS DREYFUS ZEN-NOH GRAOS S.A. ANIGER CALÇADOS, SUPRIMENTOS E EMPREENDIMENTOS LTDA. ARMAZÉNS GERAIS LTDA ARMAZÉNS GERAIS BREJEIRO LTDA ARMAZENS GERAIS E TRANSPORTADORA PRIMAVERA LTDA – EPP ARMAZÉNS GERAIS MUNDO NOVO LTDA ARMAZÉNS GERAIS TERMINAL LTDA ARROZEIRA ADIB PEIXOTO LTDA AURELIO BELAGRÍCOLA COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES DE PRODUTOS AGRÍCOLAS S.A. BIANCHINI S/A INDÚSTRIA, COMÉRCIO E AGRICULTURA BIO SOJA INDÚSTRIAS QUÍMICAS E BIOLÓGICAS LTDA BIOSEV BIOENERGIA S.A. BIOSEV S.A. BOA ESPERANÇA AGROPECUÁRIA LTDA BOCCHI AGRONEGÓCIOS & CIA LTDA BOCCHI INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE CEREAIS LTDA BOM JESUS AGROPECUÁRIA LTDA. BRAS NATURE IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA. BRAS NATURE IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA. BRASIL MINERIOS S/A BRENCO COMPANHIA BRASILEIRA DE ENERGIA RENOVÁVEL BSBIOS Indústria e Comércio De Biodiesel Sul Brasil S/A BUNGE ALIMENTOS S/A BUNGE FERTILIZANTES S/A C.VALE - COOPERATIVA AGROINDUSTRIAL CAMERA AGROALIMENTOS S. A. CAMPOFERT COMÉRCIO INDÚSTRIA EXPORTAÇÃO E IMPORTAÇÃO LTDA. CANTAGALO GENERAL GRAINS S.A. CARAMURU ALIMENTOS S.A. CARGILL AGRÍCOLA S.A. CARGILL ALIMENTOS LTDA CARLOS ERNESTO AUGUSTIN CCAB AGRO S.A. CEAGRO AGRÍCOLA LTDA. CEAGRO EXPORTADORA E IMPORTADORA LTDA. 246

CENTRAL AÇUCAREIRA SANTO ANTONIO S.A. CENTRAL GRÃOS COMÉRCIO E EXPORTAÇÃO LTDA CENTRO SUL SERVIÇOS MARÍTIMOS LTDA

CEREAL COMÉRCIO EXPORTAÇÃO E REPRESENTAÇÃO AGROPECUÁRIA S/A CEREALISTA CORADINI LTDA CERVEJARIA PETRÓPOLIS S/A CGG TRADING S.A CHS AGRONEGÓCIO - INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA. CJ INTERNATIONAL BRASIL COMERCIAL AGRÍCOLA LTDA COAGRISOL COOPERATIVA AGROINDUSTRIAL COAGRU COOPERATIVA AGROINDUSTRIAL UNIÃO COAMO AGROINDUSTRIAL COOPERATIVA COASUL COOPERATIVA AGROINDUSTRIAL COCARI - COOPERATIVA AGROPECUÁRIA E INDUSTRIAL COFCO BRASIL S.A. COFCO INTERNATIONAL GRAINS LTDA. COMÉRCIO DE CEREAIS FUZINATTO LTDA COMERCIO DE CEREAIS JRB LTDA COMERCIO DE CEREAIS JRB LTDA COMÉRCIO E EXPORTAÇÃO DE CEREAIS RIO ELIAS LTDA COMMENDA AGRICOLA LTDA COMPANHIA BRASILEIRA DE ALUMÍNIO COMPANHIA BRASILEIRA DE ESTIRENO – CBE COMPANHIA DE ARMAZÉNS E SILOS DO ESTADO DE MINAS GERAIS – CASEMG COMPANHIA SIDERÚRGICA VALE DO PINDARÉ CONSERVAS ODERICH S. A. COOPAVEL COOPERATIVA AGROINDUSTRIAL COOPERATIVA AGRÁRIA AGROINDUSTRIAL COOPERATIVA AGRÍCOLA ÁGUA SANTA LTDA COOPERATIVA AGRÍCOLA MISTA GENERAL OSÓRIO LTDA COOPERATIVA AGRÍCOLA TUPANCIRETÃ LTDA COOPERATIVA AGROINDUSTRIAL DE RUBIATABA LTDA COOPERATIVA AGROPECUÁRIA MISTA DE PIRACANJUBA COOPERATIVA MISTA DOS PRODUTORES RURAIS DO VALE DO PARANAIBA LTDA – AGROVALE COOPERATIVA TRITÍCOLA TAPERENSE LTDA COPAGRI - COMERCIAL PARANAENSE AGRÍCOLA LTDA COPAGRIL COMERCIAL AGRÍCOLA PICCOLI LTDA

COPAGRO - COOPERATIVA DE PRODUTORES AGRÍCOLAS DE RODA VELHA 247

COPALEM - COOPERATIVA DOS PRODUTORES RURAIS DE LUIS EDUARDO MAGALHÃES LTDA COPASPE - COOPERATIVA DE PRODUTORES AGRÍCOLAS DA SERRA DA PETROVINA COPERÁGUAS COOPERATIVA AGROINDUSTRIAL CORREDOR LOGÍSTICA E INFRAESTRUTURA S/A CORSOYAN TRADING EXPORTAÇÃO E IMPORTAÇÃO EIRELI-EPP COSIMA SIDERÚRGICA DO MARANHÃO LTDA. COTRIGUAÇU COOPERATIVA CENTRAL COTRIJAL COOPERATIVA AGROPECUARIA E INDUSTRIAL COTRIJUC - COOPERATIVA AGROPECUÁRIA JÚLIO DE CASTILHOS CPA ARMAZÉNS GERAIS LTDA CUTRALE TRADING BRASIL LTDA DASSOLER AGRONEGÓCIOS LTDA DELONG DO BRASIL EXPORTADORA LTDA. DINI TEXTIL INDUSTRIA E COMERCIO LTDA DISAM DISTRIBUIDORA DE INSUMOS AGRÍCOLAS SUL AMÉRICA LTDA DUETOS AGROCOMMODITIES LTDA DUETOS AGROCOMMODITIES LTDA E D & F MAN BRASIL S/A. ED&F MAN VOLCAFE BRASIL LTDA EFRAIM AGRONEGÓCIOS LTDA ENGELHART CTP (BRASIL) S.A. EVOLVO INTERNACIONAL LTDA-EPP EXPOENTE CORRETORA DE MERCADORIAS, IMPORTAÇÃO, EXPORTAÇÃO, COMÉRCIO E REPRESENTAÇÃO LTDA FERRARI, ZAGATTO E CIA. LTDA FERTIMIG FERTILIZANTES LTDA FERTITEX AGRO - FERTILIZANTES E PRODUTOS AGROPECUARIOS LTDA FIAGRIL LTDA FRANCISCO CARLOS CARRETERO EPP G BRASIL COMÉRCIO IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO AGRÍCOLA LTDA. GÁLATAS COMÉRCIO EXPORTAÇÃO LTDA. GALVANI INDÚSTRIA, COMÉRCIO E SERVIÇOS S/A GAVILON DO BRASIL COMÉRCIO DE PRODUTOS AGRÍCOLAS LTDA GIOVELLI & CIA. LTDA GIRASSOL AGRÍCOLA LTDA GLENCORE IMPORTADORA E EXPORTADORA S.A. GRANELES BRASIL COMERCIAL IMPORTADORA EXPORTADORA AGRICOLA LTDA GRM Trading Importação e Exportação HERMASA NAVEGAÇÃO DA AMAZÔNIA S/A HORITA EMPREENDIMENTOS AGRÍCOLAS S. A. 248

HUMBERG AGRIBRASIL COMERCIO E EXPORTACAO DE GRAOS LTDA I. RIEDI & CIA LTDA INEX EXPORTAÇÃO E IMPORTAÇÃO DE MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS EIRELI INFASA INDÚSTRIA DE FARINHAS S.A. INGÁ VEÍCULOS LTDA INTEGRADA COOPERATIVA AGROINDUSTRIAL INTERALLI ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÕES INVIVO TRADING DO BRASIL LTDA IRMÃOS TREVISAN S/A INDÚSTRIA, COMÉRCIO E AGRICULTURA JATOBÁ COMERCIO IMPORTACÃO E EXPORTACÃO DE CEREAIS LTDA JOSÉ DINON & CIA LTDA JUPARANÃ COMERCIAL AGRICOLA LTDA L & Z COMERCIAL IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA EPP LANSING BRASIL COMERCIAL & EXPORTADORA DE PRODUTOS AGRÍCOLAS LTDA LAR COOPERATIVA AGROINDUSTRIAL LAVORO AGROCOMERCIAL LTDA LAVOURA INDÚSTRIA COMÉRCIO OESTE AS LOTUS GRAINS & OILSEEDS S.A. LOUIS DREYFUS COMPANY BRASIL S.A. LUPIN IMPORTAÇÃO & EXPORTAÇÃO LTDA MACROFERTIL INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE FERTILIZANTES S.A. MARACANÃ ARMAZÉNS GERAIS LTDA MARANGONI TREAD LATINO AMERICA INDUSTRIA E COMERCIO DE ARTEFATOS DE BORRACHA LTDA. MARASCA INCORPORAÇÕES IMOBILIÁRIAS COMÉRCIO E EXPORTAÇÃO LTDA MARUBENI BRASIL S/A MARUBENI GRÃOS BRASIL S/A MASTER ALIMENTOS E CEREAIS LTDA MENDO SAMPAIO S.A METALFRIO SOLUTIONS S/A MGT BRASIL COMERCIAL IMPORTADORA E EXPORTADORA LTDA MICROQUIMICA INDUSTRIAS QUIMICAS LTDA MIRIRI ALIMENTOS E BIONERGIA S/A MOINHO IGUAÇU AGROINDUSTRIAL S.A. MONTE ALEGRE COMERCIO E INDÚSTRIA DE CEREAIS LTDA MONTE NEGRO GRANITOS LTDA MONTEVERDE AGROENERGÉTICA S.A. MULTIGRAIN S.A. NATURALLE AGRO MERCANTIL S.A. NEOBRASIL COMÉRCIO EXTERIOR LTDA 249

NIDERA SEMENTES LTDA NOVAAGRI INFRA-ESTRUTURA DE ARMAZENAGEM E ESCOAMENTO AGRÍCOLA S.A. NUTRI 100 AGRO LTDA NX GOLD S.A. O TELHAR AGROPECUÁRIA LTDA OLAM AGRICOLA LTDA. OLEOPLAN NORDESTE INDÚSTRIA DE BIOCOMBUSTÍVEL LTDA OLEOPLAN S/A ÓLEOS VEGETAIS PLANALTO P C OCOMERCIO IMPORTACAO EXPORTACAO E AGROPECUARIA LTDA PASA - PARANÁ OPERAÇÕES PORTUÁRIAS PAULO MASSAYOSHI MIZOTE PEDRO AFONSO AÇÚCAR E BIOENERGIA LTDA PERDUE COMERCIAL IMPORTADORA E EXPORTADORA LTDA PEREIRA E PARRA PEREIRA LTDA PERON FERRARI S/A PETROVINA SEMENTES LTDA POLO INDÚSTRIA E COMÉRCIO S/A PRIMAVERA IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO DE CEREAIS LTDA PRIMO TEDESCO S/A PRIORI SEMENTES E DEFENSIVOS AGRICOLAS LTDA PROCOMEX CONSULTIORIA EM NEGÓCIOS INTERNACIONAIS LTDA PRODUQUÍMICA INDÚSTRIA E COMÉRCIO S/A PRODUTOS ALIMENTÍCIOS ORLÂNDIA S/A COMÉRCIO E INDÚSTRIA PRODUZIR AGROPECUÁRIA LTDA PROQUIGEL QUÍMICA S.A. PTAX TRADE LTDA – EPP PURO GRÃO IND. E COM. DE ARROZ E SOJA LTDA QUEIROZ GALVÃO ALIMENTOS S.A. RIO GRANDE AGRÍCOLA S.A RIO TURIA SERVIÇOS LOGÍSTICOS LTDA RISA S/A RIVELIN DO BRASIL COM. IMP. EXP. DE CEREAIS LTDA ROLLDEY CORP REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS LTDA ROYAL AGRO CEREAIS LTDA. SAAGROS COM. IND. IMPORTACAO E EXPORTACAO DE CEREAIS LTDA SAINTE MARIE IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA SAN RAFAEL SEMENTES E CEREAIS LTDA SANTHER FABRICA DE PAPEL SANTA THEREZINHA S/A SAVIXX COMÉRCIO INTERNACIONAL S/A. SEARA-IND. E COMÉRCIO DE PRODUTOS AGRO-PECUÁRIOS LTDA SEMENTES CONDOR LTDA SEMENTES GUERRA LTDA 250

SERTRADING S.A. SIDERURGIA SANTO ANTONIO LTDA SILOTI & CIA LTDA SINAGRO PRODUTOS AGROPECUARIOS S.A SIPAL INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA SJC BIOENERGIA LTDA SODRUGESTVO AGRONEGÓCIOS S.A SOLAR COMÉRCIO E AGROINDÚSTRIA LTDA SOPRIL SOCIEDADE ARMAZENADORA PONTALINENSE LTDA SOUTH AGROBUSINESS INTERNATIONAL – EIRELI

SOYBRASIL AGRO TRADING COMMODITIES AGRICOLAS EIRELI SP PROSPEKT COMÉRCIO EXTERIOR LTDA STARLLUPY COMERCIAL EXPORTADORA, IMPORTADORA E ASSESSORIA EM COMÉRCIO EXTERIOR LTDA SUCOCITRICO CUTRALE LTDA SUL BRASIL COMÉRCIO DE CEREAIS E INSUMOS AGRÍCOLAS LTDA SYNAGRO COMERCIAL AGRÍCOLA S.A. TEAG- TERMINAL DE EXPORTAÇÃO DE AÇÚCAR DO GUARUJÁ TEG- TERMINAL EXPORTADOR DO GUARUJÁ LTDA TERLOGS TERMINAL MARÍTIMO LTDA TERMINAL 12 A S.A TERMINAL CORREDOR NORTE S.A. TERMINAL DE GRANÉIS DO GUARUJÁ TGG TERMINAL XXXIX DE SANTOS S.A. TERRA COM E EXP. DE CEREAIS LTDA TERRA SANTA AGRO S.A TES TERMINAL EXPORTADOR DE SANTOS S.A TONON BIOENERGIA S/A TRADING ORION EXPORTACAO DE CAFE LTDA TRÊS TENTOS AGROINDUSTRIAL S.A TRESBOMM COMÉRCIO E EXPORTAÇÃO DE GRÃOS LTDA U.S.J AÇUCAR E ALCOOL S/A UGGERI S/A UNIGEL PLÁSTICOS S. A. USINA AÇUCAREIRA SÃO MANOEL S.A. USINA CONQUISTA DO PONTAL S.A USINA DE AÇÚCAR SANTA TEREZINHA LTDA USINA ELDORADO S.A. USINA FRUTAL AÇÚCAR E ÁLCOOL LTDA. USINA GUARIROBA LTDA USINA ITAJOBI LTDA AÇÚCAR E ÁLCOOL USINA ITAPAGIPE AÇÚCAR E ÁLCOOL LTDA 251

USINA MOEMA AÇÚCAR E ÁLCOOL LTDA USINA MONTE ALEGRE LTDA. USINA OUROESTE AÇÚCAR E ÁLCOOL LTDA USINA SÃO JOSÉ S/A VEGRANDE VEICULOS CASAGRANDE VIA TREND COMÉRCIO DE PRODUTOS TÊXTEIS LTDA VIA TREND COMÉRCIO DE PRODUTOS TÊXTEIS LTDA VIAGRI IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO DE CEREAIS LTDA VILELA, VILELA & CIA. LTDA. VOTORANTIM METAIS ZINCO S.A. WORLD FOODS IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA Fonte: MAPA, SECEX (2018). Organização da autora.

Tabela 2 Tipos de semente de soja utilizadas na safra 2015/2016 no Matopiba

Obtentor/ Cultivar UF Macro GRUPO Grupo de Mantenedor Maturidade região Relativa*

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANrr85 509 BA 4 II 8,5 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc78 017 BA 4 I 7,8 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc83 022 BA 4 II 8,3 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc89 109 BA 4 III 8,9 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc93 101 BA 4 III 9,3 LTDA

BAYER S/A CZ 58B40RR BA 4 II 8,4

BAYER S/A CZ 58B81RR BA 4 III 8,8

BAYER S/A IGRA 526 BA 4 I 6,6

BAYER S/A IGRA 545TR BA 4 I 5,9

BAYER S/A IGRA 645TR BA 4 I 6,2

BAYER S/A IGRA818 BA 4 II 8,2

BAYER S/A RA516 BA 4 I 5,6

BAYER S/A RA626 BA 4 I 6,4

BAYER S/A RA628 BA 4 I 6,4

BAYER S/A ST 815 RR BA 4 II 8,2 252

BAYER S/A ST 820 RR BA 4 II 8,2

BAYER S/A ST 920 RR BA 4 III 9,2

BAYER S/A ST860RR BA 4 III 8,6

BAYER S/A W 811 RR BA 4 II 8,1

BAYER S/A W 842 RR BA 4 II 8,3

BAYER S/A W 875 RR BA 4 III 8,7

COMPANHIA DE PROMOÇÃO CM 102 BA 4 III 8,6 AGRÍCOLA - CPA/CAMPO

COMPANHIA DE PROMOÇÃO CM 136 BA 4 II 8,5 AGRÍCOLA - CPA/CAMPO

COMPANHIA DE PROMOÇÃO CM 149 BA 4 III 8,7 AGRÍCOLA - CPA/CAMPO

COMPANHIA DE PROMOÇÃO CM 15 BA 4 III 8,9 AGRÍCOLA - CPA/CAMPO

COMPANHIA DE PROMOÇÃO CM 17 BA 4 III 8,8 AGRÍCOLA - CPA/CAMPO

COMPANHIA DE PROMOÇÃO CM 34 BA 4 III 9,1 AGRÍCOLA - CPA/CAMPO

COMPANHIA DE PROMOÇÃO CM 51 BA 4 III 9,2 AGRÍCOLA - CPA/CAMPO

Coodetec CD 219 RR BA 4 II 8,2

Coodetec CD 246 BA 4 II 8,1

Coodetec CD 2792RR BA 4 II 7,9

Coodetec CD 2800 BA 4 II 8,0

Coodetec CD 2828 BA 4 II 8,2

DU PONT DO BRASIL S/A 97R73 BA 4 I 7,7

DU PONT DO BRASIL S/A 97Y07 BA 4 I 7,0

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y12 BA 4 II 8,1

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y30 BA 4 II 8,3

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y52 BA 4 II 8,5

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y71 BA 4 III 8,7

DU PONT DO BRASIL S/A 99R03 BA 4 III 9,0

DU PONT DO BRASIL S/A 99R09 BA 4 III 9,0

DU PONT DO BRASIL S/A BG4184 BA 4 II 8,4

DU PONT DO BRASIL S/A BG4284 BA 4 II 8,4

DU PONT DO BRASIL S/A BG4290 BA 4 III 9,0 253

DU PONT DO BRASIL S/A BG4377 BA 4 I 7,7

DU PONT DO BRASIL S/A P98C81 BA 4 III 8,7

DU PONT DO BRASIL S/A P98Y11 BA 4 II 8,1

DU PONT DO BRASIL S/A P98Y51 BA 4 II 8,5

DU PONT DO BRASIL S/A P98Y70 BA 4 III 8,7

EMATER-GO Emgopa 314 BA 4 III 9,1

EMATER-GO Emgopa 315 BA 4 II 8,3

Embrapa BRS 217 [Flora] BA 4 II 7,9

Embrapa BRS 263 BA 4 III 9,2 [Diferente]

Embrapa BRS 313 [Tieta] BA 4 III 8,7

Embrapa BRS 314 BA 4 III 9,2 [Gabriela]

Embrapa BRS 315RR BA 4 III 8,9 [Livia]

Embrapa BRS 7580 BA 4 I 7,5

Embrapa BRS 7680RR BA 4 I 7,6

Embrapa BRS 7980 BA 4 II 7,9

Embrapa BRS 8082CV BA 4 II 8,0

Embrapa BRS 8180RR BA 4 II 8,1

Embrapa BRS 8280RR BA 4 II 8,2

Embrapa BRS 8381 BA 4 II 8,3

Embrapa BRS 8480 BA 4 II 8,4

Embrapa BRS 8482CV BA 4 II 8,4

Embrapa BRS 8560RR BA 4 II 8,5

Embrapa BRS 8580 BA 4 II 8,5

Embrapa BRS 8581 BA 4 II 8,5

Embrapa BRS 8780 BA 4 III 8,7

Embrapa BRS 9180IPRO BA 4 III 9,1

Embrapa BRS 9383IPRO BA 4 III 9,3

Embrapa BRS Barreiras BA 4 III 9,2

Embrapa BRS Corisco BA 4 III 9,1

Embrapa BRS Gisele RR BA 4 III 8,8

Embrapa BRS Juliana RR BA 4 III 9,1 254

Embrapa BRS Raimunda BA 4 III 9,0

Embrapa BRS Sambaíba BA 4 III 9,3

Embrapa/Emater-GO BR/Emgopa 314 BA 4 III 9,1 (Garça Branca)

Embrapa/Emater-GO BRSGO 8360 BA 4 II 8,3

Embrapa/Emater-GO BRSGO BA 4 III 8,8 Amaralina

Embrapa/Emater-GO BRSGO Jataí BA 4 III 8,8

Embrapa/Emater-GO BRSGO Luziânia BA 4 II 8,3

Embrapa/Epamig BRSMG 68 BA 4 II 8,0 [Vencedora]

Embrapa/Epamig MG/BR 46 BA 4 II 8,1 (Conquista)

Embrapa/Fundação MT BRSMT Uirapuru BA 4 III 9,0

FTS SEMENTES S.A FTS 2178 BA 4 I 7,8

FTS SEMENTES S.A FTS 4188 BA 4 III 8,8

FTS SEMENTES S.A FTS ATHENA BA 4 II 8,4 RR

FTS SEMENTES S.A FTS AVANTE BA 4 II 8,0 RR

FTS SEMENTES S.A FTS BALSAS BA 4 I 7,8 RR

FTS SEMENTES S.A FTS CAMPO BA 4 II 8,3 NOVO RR

FTS SEMENTES S.A FTS BA 4 III 8,7 DIAMANTINO RR

FTS SEMENTES S.A FTS BA 4 III 8,8 ESPERANÇA RR

FTS SEMENTES S.A FTS GALANTE BA 4 II 7,9 RR

FTS SEMENTES S.A FTS GRACIOSA BA 4 II 8,0 RR

FTS SEMENTES S.A FTS JACIARA BA 4 II 8,0 RR

FTS SEMENTES S.A FTS MASTER BA 4 II 8,1 RR

FTS SEMENTES S.A FTS BA 4 III 9,3 PARAGOMINAS 255

RR

FTS SEMENTES S.A FTS TRIUNFO BA 4 II 8,1 RR

FTS SEMENTES S.A FTS URUÇUI BA 4 III 8,8 RR

FTS SEMENTES S.A FTS VISTA BA 4 III 8,8 ALEGRE RR

FUNDAÇÃO MT FMT Tucunaré BA 4 II 8,3

Gaúcha Melhoramento e Avanço em GMX BA 4 I 6,2 Genetica LTDA CANCHEIRO RR

Gaúcha Melhoramento e Avanço em GMX BA 4 I 7,0 Genetica LTDA REDOMÃO RR

GDM Genética do Brasil Ltda. 8579RSF IPRO - BA 4 II 8,0 Bônus

GDM Genética do Brasil Ltda. 9086RSF IPRO - BA 4 III 8,7 Opus

GDM Licenciamento do Brasil Ltda. RK8115 IPRO BA 4 I 7,8

Geneze Sementes S/A GNZ 690S RR BA 4 I 6,9

Instituto Mato-Grossense do Algodão IMA 84114RR BA 4 II 8,4

Instituto Mato-Grossense do Algodão IMA 87112RR BA 4 III 8,7

MONSOY TMG 2183IPRO BA 4 II 8,3

MONSOY AS 3797IPRO BA 4 II 7,9

MONSOY AS 3810IPRO BA 4 II 8,1

MONSOY AS 3850IPRO BA 4 II 8,5

MONSOY AS 8197RR BA 4 II 8,1

MONSOY AS 8380RR BA 4 II 8,3

MONSOY CD 2820IPRO BA 4 II 8,2

MONSOY GB 874RR BA 4 III 8,7

MONSOY GB 881RR BA 4 III 8,8

MONSOY M7739IPRO BA 4 I 7,7

MONSOY M8230RR BA 4 II 8,2

MONSOY M8349IPRO BA 4 II 8,3

MONSOY M8372IPRO BA 4 II 8,3

MONSOY M8473IPRO BA 4 II 8,5

MONSOY M8527 RR BA 4 II 8,5 256

MONSOY M8766RR BA 4 III 8,7

MONSOY M8808IPRO BA 4 III 8,8

MONSOY M8849RR BA 4 III 8,8

MONSOY M8867RR BA 4 III 8,8

MONSOY M9056 RR BA 4 III 9,0

MONSOY M9144RR BA 4 III 9,1

MONSOY M-SOY 8757 BA 4 III 8,7

MONSOY M-SOY 8866 BA 4 III 8,8

MONSOY M-SOY 8870 BA 4 III 8,8

MONSOY M-SOY 9350 BA 4 III 9,3

MONSOY NS8330IPRO BA 4 II 8,3

NIDERA SEMENTES LTDA A 7002 BA 4 II 8,5

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8500 BA 4 II 8,3

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8572 BA 4 II 8,2

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8690 BA 4 III 8,6

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8843 BA 4 III 8,8

NIDERA SEMENTES LTDA NA 8015 RR BA 4 II 8,2

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7202 IPRO BA 4 I 7,2

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7447 IPRO BA 4 I 7,4

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7505 IPRO BA 4 I 7,5

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7667 IPRO BA 4 I 7,6

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7709 IPRO BA 4 I 7,7

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7901 BA 4 II 7,9

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8270 BA 4 II 8,3

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8290 BA 4 II 8,2

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8393 BA 4 II 8,3

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8490 BA 4 II 8,4

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8693 BA 4 III 8,6

SYNGENTA SEEDS LTDA NK 7074 RR BA 4 I 7,4

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1080 RR BA 4 II 8,0

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1180 RR BA 4 II 8,0

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1182 RR BA 4 II 8,2

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1183 RR BA 4 II 8,3 257

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1190 RR BA 4 III 9,0

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1278 RR BA 4 I 7,8

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1282 RR BA 4 II 8,2

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1285 RR BA 4 II 8,5

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1288 RR BA 4 III 8,8

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1289 RR BA 4 III 8,9

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN13830 IPRO BA 4 II 8,3

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN13840 IPRO BA 4 II 8,4

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1385 RR BA 4 II 8,4

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN13850 IPRO BA 4 II 8,4

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1387 RR BA 4 II 8,5

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN13870 IPRO BA 4 III 8,6

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN9074 RR BA 4 I 7,1

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN9078 RR BA 4 I 7,8

UFU UFUS 7910 BA 4 II 8,2

UFU UFUS 8710 BA 4 II 8,5

UFU UFUS BA 4 II 8,3 XAVANTE

UNISOJA /TMG TMG2185IPRO BA 4 II 8,5

UNISOJA /TMG TMG2187IPRO BA 4 III 8,7

UNISOJA S/A 5G801 BA 4 II 8,0

UNISOJA S/A 5G850 BA 4 II 8,5

UNISOJA S/A TMG1168RR BA 4 I 7,8

UNISOJA S/A TMG1175RR BA 4 I 7,5

UNISOJA S/A TMG1180RR BA 4 II 8,0

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG GNZ 721SRR BA 4 I 7,2

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG SA701RR BA 4 I 7,0

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG115RR BA 4 III 8,6

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1174RR BA 4 I 7,4

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1176RR BA 4 I 7,6

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1179RR BA 4 II 7,9

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1181RR BA 4 II 8,1

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1182RR BA 4 II 8,2 258

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1187RR BA 4 III 8,7

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1188RR BA 4 III 8,8

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG123RR BA 4 I 7,4

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG125RR BA 4 I 7,2

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG127RR BA 4 I 7,2

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1288RR BA 4 III 8,8

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG132RR BA 4 II 8,5

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG133RR BA 4 II 8,5

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG4182 BA 4 II 8,2

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG4185 BA 4 II 8,5

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG4190 BA 4 III 9,0

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG7188RR BA 4 III 8,8

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG801 BA 4 II 8,2

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANrr85 509 MA 5 I 8,5 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANSB Integração MA 5 III 9,7 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc78 017 MA 5 I 7,8 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc83 022 MA 5 I 8,3 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc84 107 MA 5 I 8,4 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc89 109 MA 5 II 8,9 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc93 101 MA 5 II 9,3 LTDA

BAYER S/A CZ 58B40RR MA 5 I 8,4

BAYER S/A CZ 58B81RR MA 5 II 8,8

BAYER S/A IGRA 526 MA 5 I 6,6

BAYER S/A IGRA 545TR MA 5 I 5,9

BAYER S/A IGRA 645TR MA 5 I 6,2

BAYER S/A IGRA818 MA 5 I 8,2

BAYER S/A ST 815 RR MA 5 I 8,2

BAYER S/A ST 820 RR MA 5 I 8,2

BAYER S/A ST 920 RR MA 5 II 9,2 259

BAYER S/A ST860RR MA 5 I 8,6

BAYER S/A W 791 RR MA 5 I 7,7

BAYER S/A W 842 RR MA 5 I 8,3

BAYER S/A W 875 RR MA 5 II 8,7

Caraiba Genética LTDA-ME CG 67RR MA 5 I 7,4

Caraiba Genética LTDA-ME CG 68RR MA 5 I 7,3

Caraiba Genética LTDA-ME CG 7464RR MA 5 I 7,4

Caraiba Genética LTDA-ME CG 7665RR MA 5 I 7,6

Caraiba Genética LTDA-ME CG 8166RR MA 5 I 8,1

Coodetec CD 251RR MA 5 II 8,8

Coodetec CD 2828 MA 5 I 8,2

Coodetec CD 2860 MA 5 I 8,6

DU PONT DO BRASIL S/A 97R73 MA 5 I 7,7

DU PONT DO BRASIL S/A 97Y07 MA 5 I 7,0

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y12 MA 5 I 8,1

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y30 MA 5 I 8,3

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y52 MA 5 I 8,5

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y71 MA 5 II 8,7

DU PONT DO BRASIL S/A 99R03 MA 5 II 9,0

DU PONT DO BRASIL S/A 99R09 MA 5 II 9,0

DU PONT DO BRASIL S/A BG4184 MA 5 I 8,4

DU PONT DO BRASIL S/A BG4284 MA 5 I 8,4

DU PONT DO BRASIL S/A BG4290 MA 5 II 9,0

DU PONT DO BRASIL S/A BG4377 MA 5 I 7,7

DU PONT DO BRASIL S/A P98C81 MA 5 II 8,7

DU PONT DO BRASIL S/A P98Y11 MA 5 I 8,1

DU PONT DO BRASIL S/A P98Y51 MA 5 I 8,5

DU PONT DO BRASIL S/A P98Y70 MA 5 II 8,7

EDELTRAUT ERICA STROBEL PAMPEANA 10 MA 5 III 9,8 RR

EDELTRAUT ERICA STROBEL PAMPEANA 20 MA 5 III 9,8 RR

Embrapa BRS 271RR MA 5 II 9,3

Embrapa BRS 279RR MA 5 II 8,8 260

Embrapa BRS 325RR MA 5 II 9,0

Embrapa BRS 326 MA 5 II 8,7

Embrapa BRS 333RR MA 5 III 9,4

Embrapa BRS 8180RR MA 5 I 8,1

Embrapa BRS 8280RR MA 5 I 8,2

Embrapa BRS 8381 MA 5 I 8,3

Embrapa BRS 8480 MA 5 I 8,4

Embrapa BRS 8560RR MA 5 I 8,5

Embrapa BRS 8590 MA 5 I 8,5

Embrapa BRS 8890RR MA 5 II 8,8

Embrapa BRS 8990RR MA 5 II 8,9

Embrapa BRS 9090RR MA 5 II 9,0

Embrapa BRS 9180IPRO MA 5 II 9,1

Embrapa BRS 9383IPRO MA 5 II 9,3

Embrapa BRS Barreiras MA 5 II 9,2

Embrapa BRS Carnaúba MA 5 III 9,6

Embrapa BRS Gisele RR MA 5 II 8,8

Embrapa BRS Juliana RR MA 5 II 9,1

Embrapa BRS Pérola MA 5 II 8,8

Embrapa BRS Raimunda MA 5 II 9,0

Embrapa BRS Sambaíba MA 5 II 9,3

Embrapa BRS Sambaiba MA 5 II 9,3 RR

Embrapa BRS Tracajá MA 5 II 9,2

Embrapa/Emater-GO BRSGO 8360 MA 5 I 8,3

FTS SEMENTES S.A FTS 2178 MA 5 I 7,8

FTS SEMENTES S.A FTS 4188 MA 5 II 8,8

FTS SEMENTES S.A FTS ATHENA MA 5 I 8,4 RR

FTS SEMENTES S.A FTS AVANTE MA 5 I 8,0 RR

FTS SEMENTES S.A FTS BALSAS MA 5 I 7,8 RR

FTS SEMENTES S.A FTS CAMPO MA 5 I 8,3 NOVO RR 261

FTS SEMENTES S.A FTS MA 5 II 8,7 DIAMANTINO RR

FTS SEMENTES S.A FTS MA 5 II 8,8 ESPERANÇA RR

FTS SEMENTES S.A FTS GALANTE MA 5 I 7,9 RR

FTS SEMENTES S.A FTS GRACIOSA MA 5 I 8,0 RR

FTS SEMENTES S.A FTS JACIARA MA 5 I 8,0 RR

FTS SEMENTES S.A FTS MASTER MA 5 I 8,1 RR

FTS SEMENTES S.A FTS MA 5 II 9,3 PARAGOMINAS RR

FTS SEMENTES S.A FTS TRIUNFO MA 5 I 8,1 RR

FTS SEMENTES S.A FTS URUÇUI MA 5 II 8,8 RR

FTS SEMENTES S.A FTS VISTA MA 5 II 8,8 ALEGRE RR

GDM Licenciamento do Brasil Ltda. RK8115 IPRO MA 5 I 7,8

MONSOY AS 3810IPRO MA 5 I 8,1

MONSOY AS 3820IPRO MA 5 I 8,2

MONSOY AS 3850IPRO MA 5 I 8,5

MONSOY M8349IPRO MA 5 I 8,3

MONSOY M8372IPRO MA 5 I 8,3

MONSOY M8473IPRO MA 5 I 8,5

MONSOY M8615IPRO MA 5 I 8,6

MONSOY M8644IPRO MA 5 I 8,6

MONSOY M8766RR MA 5 II 8,7

MONSOY M8808IPRO MA 5 II 8,8

MONSOY M8867RR MA 5 II 8,8

MONSOY M9056 RR MA 5 II 9,0

MONSOY M9144RR MA 5 II 9,1

MONSOY M-SOY 8866 MA 5 II 8,8 262

MONSOY M-SOY 8870 MA 5 II 8,8

MONSOY M-SOY 9350 MA 5 II 9,3

NIDERA SEMENTES LTDA A 7002 MA 5 I 8,5

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8500 MA 5 I 8,3

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8572 MA 5 I 8,2

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8690 MA 5 I 8,6

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8843 MA 5 II 8,8

NIDERA SEMENTES LTDA NA 8015 RR MA 5 I 8,2

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7901 MA 5 I 7,9

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8270 MA 5 I 8,3

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8290 MA 5 I 8,2

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8393 MA 5 I 8,3

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8490 MA 5 I 8,4

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8693 MA 5 I 8,6

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1080 RR MA 5 I 8,0

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1190 RR MA 5 II 9,0

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1285 RR MA 5 I 8,5

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1288 RR MA 5 II 8,8

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN13830 IPRO MA 5 I 8,3

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN13840 IPRO MA 5 I 8,4

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN13842R MA 5 I 8,5 IPRO

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1385 RR MA 5 I 8,4

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN13850 IPRO MA 5 I 8,4

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1387 RR MA 5 I 8,5

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN13870 IPRO MA 5 I 8,6

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN9078 RR MA 5 I 7,8

UFU UFUS 8710 MA 5 I 8,5

UFU UFUS MA 5 I 8,3 XAVANTE

UNISOJA /TMG TMG2185IPRO MA 5 I 8,5

UNISOJA /TMG TMG2187IPRO MA 5 II 8,7

UNISOJA S/A 5G801 MA 5 I 8,0

UNISOJA S/A 5G850 MA 5 I 8,5 263

UNISOJA S/A TMG1180RR MA 5 I 8,0

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG115RR MA 5 I 8,6

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1182RR MA 5 I 8,2

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1187RR MA 5 II 8,7

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1188RR MA 5 II 8,8

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1288RR MA 5 II 8,8

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG132RR MA 5 I 8,5

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG133RR MA 5 I 8,5

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG4182 MA 5 I 8,2

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG4185 MA 5 I 8,5

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG4190 MA 5 II 9,0

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG7188RR MA 5 II 8,8

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANrr85 509 PI 5 I 8,5 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANSB Integração PI 5 III 9,7 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc78 017 PI 5 I 7,8 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc83 022 PI 5 I 8,3 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc84 107 PI 5 I 8,4 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc89 109 PI 5 II 8,9 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc93 101 PI 5 II 9,3 LTDA

BAYER S/A CZ 58B40RR PI 5 I 8,4

BAYER S/A CZ 58B81RR PI 5 II 8,8

BAYER S/A IGRA 526 PI 5 I 6,6

BAYER S/A IGRA 545TR PI 5 I 5,9

BAYER S/A IGRA 645TR PI 5 I 6,2

BAYER S/A IGRA818 PI 5 I 8,2

BAYER S/A ST 815 RR PI 5 I 8,2

BAYER S/A ST 820 RR PI 5 I 8,2

BAYER S/A ST 920 RR PI 5 II 9,2

BAYER S/A ST860RR PI 5 I 8,6 264

BAYER S/A W 791 RR PI 5 I 7,7

BAYER S/A W 842 RR PI 5 I 8,3

BAYER S/A W 875 RR PI 5 II 8,7

Caraiba Genética LTDA-ME CG 67RR PI 5 I 7,4

Caraiba Genética LTDA-ME CG 68RR PI 5 I 7,3

Caraiba Genética LTDA-ME CG 7464RR PI 5 I 7,4

Caraiba Genética LTDA-ME CG 7665RR PI 5 I 7,6

Caraiba Genética LTDA-ME CG 8166RR PI 5 I 8,1

Coodetec CD 251RR PI 5 II 8,8

Coodetec CD 2828 PI 5 I 8,2

Coodetec CD 2860 PI 5 I 8,6

DU PONT DO BRASIL S/A 97R73 PI 5 I 7,7

DU PONT DO BRASIL S/A 97Y07 PI 5 I 7,0

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y12 PI 5 I 8,1

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y30 PI 5 I 8,3

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y52 PI 5 I 8,5

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y71 PI 5 II 8,7

DU PONT DO BRASIL S/A 99R03 PI 5 II 9,0

DU PONT DO BRASIL S/A 99R09 PI 5 II 9,0

DU PONT DO BRASIL S/A BG4184 PI 5 I 8,4

DU PONT DO BRASIL S/A BG4284 PI 5 I 8,4

DU PONT DO BRASIL S/A BG4290 PI 5 II 9,0

DU PONT DO BRASIL S/A BG4377 PI 5 I 7,7

DU PONT DO BRASIL S/A P98C81 PI 5 II 8,7

DU PONT DO BRASIL S/A P98Y11 PI 5 I 8,1

DU PONT DO BRASIL S/A P98Y51 PI 5 I 8,5

DU PONT DO BRASIL S/A P98Y70 PI 5 II 8,7

Embrapa BRS 271RR PI 5 II 9,3

Embrapa BRS 279RR PI 5 II 8,8

Embrapa BRS 325RR PI 5 II 9,0

Embrapa BRS 326 PI 5 II 8,7

Embrapa BRS 333RR PI 5 III 9,4

Embrapa BRS 8590 PI 5 I 8,5 265

Embrapa BRS 8890RR PI 5 II 8,8

Embrapa BRS 8990RR PI 5 II 8,9

Embrapa BRS 9090RR PI 5 II 9,0

Embrapa BRS 9180IPRO PI 5 II 9,1

Embrapa BRS 9383IPRO PI 5 II 9,3

Embrapa BRS Barreiras PI 5 II 9,2

Embrapa BRS Carnaúba PI 5 III 9,6

Embrapa BRS Pérola PI 5 II 8,8

Embrapa BRS Raimunda PI 5 II 9,0

Embrapa BRS Sambaíba PI 5 II 9,3

Embrapa BRS Sambaiba PI 5 II 9,3 RR

Embrapa BRS Tracajá PI 5 II 9,2

FTS SEMENTES S.A FTS 2178 PI 5 I 7,8

FTS SEMENTES S.A FTS 4188 PI 5 II 8,8

FTS SEMENTES S.A FTS ATHENA PI 5 I 8,4 RR

FTS SEMENTES S.A FTS AVANTE PI 5 I 8,0 RR

FTS SEMENTES S.A FTS BALSAS PI 5 I 7,8 RR

FTS SEMENTES S.A FTS CAMPO PI 5 I 8,3 NOVO RR

FTS SEMENTES S.A FTS PI 5 II 8,7 DIAMANTINO RR

FTS SEMENTES S.A FTS PI 5 II 8,8 ESPERANÇA RR

FTS SEMENTES S.A FTS GALANTE PI 5 I 7,9 RR

FTS SEMENTES S.A FTS GRACIOSA PI 5 I 8,0 RR

FTS SEMENTES S.A FTS JACIARA PI 5 I 8,0 RR

FTS SEMENTES S.A FTS MASTER PI 5 I 8,1 RR

FTS SEMENTES S.A FTS PI 5 II 9,3 PARAGOMINAS 266

RR

FTS SEMENTES S.A FTS TRIUNFO PI 5 I 8,1 RR

FTS SEMENTES S.A FTS URUÇUI PI 5 II 8,8 RR

FTS SEMENTES S.A FTS VISTA PI 5 II 8,8 ALEGRE RR

GDM Licenciamento do Brasil Ltda. RK8115 IPRO PI 5 I 7,8

Instituto Mato-Grossense do Algodão IMA 84114RR PI 5 I 8,4

MONSOY AS 3810IPRO PI 5 I 8,1

MONSOY AS 3820IPRO PI 5 I 8,2

MONSOY AS 3850IPRO PI 5 I 8,5

MONSOY M8349IPRO PI 5 I 8,3

MONSOY M8372IPRO PI 5 I 8,3

MONSOY M8473IPRO PI 5 I 8,5

MONSOY M8615IPRO PI 5 I 8,6

MONSOY M8644IPRO PI 5 I 8,6

MONSOY M8766RR PI 5 II 8,7

MONSOY M8808IPRO PI 5 II 8,8

MONSOY M8867RR PI 5 II 8,8

MONSOY M9056 RR PI 5 II 9,0

MONSOY M9144RR PI 5 II 9,1

MONSOY M-SOY 8866 PI 5 II 8,8

MONSOY M-SOY 8870 PI 5 II 8,8

MONSOY M-SOY 9350 PI 5 II 9,3

NIDERA SEMENTES LTDA A 7002 PI 5 I 8,5

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8500 PI 5 I 8,3

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8572 PI 5 I 8,2

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8690 PI 5 I 8,6

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8843 PI 5 II 8,8

NIDERA SEMENTES LTDA NA 8015 RR PI 5 I 8,2

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8270 PI 5 I 8,3

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8290 PI 5 I 8,2

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8393 PI 5 I 8,3 267

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8490 PI 5 I 8,4

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8693 PI 5 I 8,6

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN 13870 IPRO PI 5 I 8,3

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1080 RR PI 5 I 8,0

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1190 RR PI 5 II 9,0

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1285 RR PI 5 I 8,5

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN9078 RR PI 5 I 7,8

UFU UFUS 8301 PI 5 I 8,3

UNISOJA /TMG TMG2185IPRO PI 5 I 8,5

UNISOJA /TMG TMG2187IPRO PI 5 II 8,7

UNISOJA S/A 5G801 PI 5 I 8,0

UNISOJA S/A 5G850 PI 5 I 8,5

UNISOJA S/A TMG1180RR PI 5 I 8,0

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG115RR PI 5 I 8,6

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1182RR PI 5 I 8,2

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1187RR PI 5 II 8,7

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1188RR PI 5 II 8,8

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1288RR PI 5 II 8,8

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG132RR PI 5 I 8,5

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG133RR PI 5 I 8,5

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG4182 PI 5 I 8,2

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG4185 PI 5 I 8,5

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG4190 PI 5 II 9,0

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG7188RR PI 5 II 8,8

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANrr85 509 TO 4 II 8,5 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANSB Integração TO 5 III 9,7 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc78 017 TO 4 I 7,8 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc78 017 TO 5 I 7,8 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc83 022 TO 4 II 8,3 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc83 022 TO 5 I 8,3 268

LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc84 107 TO 4 II 8,4 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc84 107 TO 5 I 8,4 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc89 109 TO 4 III 8,9 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc89 109 TO 5 II 8,9 LTDA

Agro Norte Pesquisa e Sementes ANsc93 101 TO 5 II 9,3 LTDA

BAYER S/A CZ 58B40RR TO 4 II 8,4

BAYER S/A CZ 58B40RR TO 5 I 8,4

BAYER S/A CZ 58B81RR TO 4 III 8,8

BAYER S/A CZ 58B81RR TO 5 II 8,8

BAYER S/A IGRA 526 TO 5 I 6,6

BAYER S/A IGRA 545TR TO 5 I 5,9

BAYER S/A IGRA 645TR TO 5 I 6,2

BAYER S/A IGRA818 TO 5 I 8,2

BAYER S/A RA516 TO 4 I 5,6

BAYER S/A RA516 TO 5 I 5,6

BAYER S/A RA626 TO 4 I 6,4

BAYER S/A RA626 TO 5 I 6,4

BAYER S/A RA628 TO 4 I 6,4

BAYER S/A RA628 TO 5 I 6,4

BAYER S/A ST 815 RR TO 4 II 8,2

BAYER S/A ST 815 RR TO 5 I 8,2

BAYER S/A ST 820 RR TO 4 II 8,2

BAYER S/A ST 820 RR TO 5 I 8,2

BAYER S/A ST 920 RR TO 5 II 9,2

BAYER S/A ST860RR TO 4 III 8,6

BAYER S/A ST860RR TO 5 I 8,6

BAYER S/A W 791 RR TO 5 I 7,7

BAYER S/A W 842 RR TO 4 II 8,3

BAYER S/A W 842 RR TO 5 I 8,3 269

BAYER S/A W 875 RR TO 4 III 8,7

BAYER S/A W 875 RR TO 5 II 8,7

Caraiba Genética LTDA-ME CG 67RR TO 4 I 7,4

Caraiba Genética LTDA-ME CG 67RR TO 5 I 7,4

Caraiba Genética LTDA-ME CG 68RR TO 4 I 7,3

Caraiba Genética LTDA-ME CG 68RR TO 5 I 7,3

Caraiba Genética LTDA-ME CG 7464RR TO 4 I 7,4

Caraiba Genética LTDA-ME CG 7464RR TO 5 I 7,4

Caraiba Genética LTDA-ME CG 7665RR TO 4 I 7,6

Caraiba Genética LTDA-ME CG 7665RR TO 5 I 7,6

Caraiba Genética LTDA-ME CG 8166RR TO 4 II 8,1

Caraiba Genética LTDA-ME CG 8166RR TO 5 I 8,1

COMPANHIA DE PROMOÇÃO CM 102 TO 5 I 8,6 AGRÍCOLA - CPA/CAMPO

COMPANHIA DE PROMOÇÃO CM 136 TO 5 I 8,5 AGRÍCOLA - CPA/CAMPO

COMPANHIA DE PROMOÇÃO CM 149 TO 5 II 8,7 AGRÍCOLA - CPA/CAMPO

COMPANHIA DE PROMOÇÃO CM 15 TO 5 II 8,9 AGRÍCOLA - CPA/CAMPO

COMPANHIA DE PROMOÇÃO CM 17 TO 5 II 8,8 AGRÍCOLA - CPA/CAMPO

COMPANHIA DE PROMOÇÃO CM 34 TO 5 II 9,1 AGRÍCOLA - CPA/CAMPO

COMPANHIA DE PROMOÇÃO CM 51 TO 5 II 9,2 AGRÍCOLA - CPA/CAMPO

Coodetec CD 246 TO 4 II 8,1

Coodetec CD 246 TO 5 I 8,1

Coodetec CD 251RR TO 4 III 8,8

Coodetec CD 251RR TO 5 II 8,8

Coodetec CD 266 TO 4 III 8,6

Coodetec CD 266 TO 5 I 8,6

Coodetec CD 2792RR TO 4 II 7,9

Coodetec CD 2828 TO 5 I 8,2

Coodetec CD 2860 TO 4 III 8,6

Coodetec CD 2860 TO 5 I 8,6 270

DU PONT DO BRASIL S/A 97R73 TO 4 I 7,7

DU PONT DO BRASIL S/A 97R73 TO 5 I 7,7

DU PONT DO BRASIL S/A 97Y07 TO 4 I 7,0

DU PONT DO BRASIL S/A 97Y07 TO 5 I 7,0

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y12 TO 4 II 8,1

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y12 TO 5 I 8,1

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y30 TO 4 II 8,3

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y52 TO 4 II 8,5

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y52 TO 5 I 8,5

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y71 TO 4 III 8,7

DU PONT DO BRASIL S/A 98Y71 TO 5 II 8,7

DU PONT DO BRASIL S/A 99R03 TO 4 III 9,0

DU PONT DO BRASIL S/A 99R03 TO 5 II 9,0

DU PONT DO BRASIL S/A 99R09 TO 4 III 9,0

DU PONT DO BRASIL S/A 99R09 TO 5 II 9,0

DU PONT DO BRASIL S/A BG4184 TO 4 II 8,4

DU PONT DO BRASIL S/A BG4184 TO 5 I 8,4

DU PONT DO BRASIL S/A BG4284 TO 4 II 8,4

DU PONT DO BRASIL S/A BG4284 TO 5 I 8,4

DU PONT DO BRASIL S/A BG4290 TO 4 III 9,0

DU PONT DO BRASIL S/A BG4290 TO 5 II 9,0

DU PONT DO BRASIL S/A BG4377 TO 4 I 7,7

DU PONT DO BRASIL S/A BG4377 TO 5 I 7,7

DU PONT DO BRASIL S/A P98C81 TO 4 III 8,7

DU PONT DO BRASIL S/A P98C81 TO 5 II 8,7

DU PONT DO BRASIL S/A P98Y11 TO 4 II 8,1

DU PONT DO BRASIL S/A P98Y11 TO 5 I 8,1

DU PONT DO BRASIL S/A P98Y51 TO 4 II 8,5

DU PONT DO BRASIL S/A P98Y51 TO 5 I 8,5

DU PONT DO BRASIL S/A P98Y70 TO 4 III 8,7

DU PONT DO BRASIL S/A P98Y70 TO 5 II 8,7

EMATER-GO Emgopa 313 TO 4 III 9,2

EMATER-GO Emgopa 313 TO 5 II 9,2 271

EMATER-GO Emgopa 313RR TO 4 III 8,9

EMATER-GO Emgopa 313RR TO 5 II 8,9

EMATER-GO Emgopa 314 TO 4 III 9,1

EMATER-GO Emgopa 314 TO 5 II 9,1

Embrapa BRS 279RR TO 5 II 8,8

Embrapa BRS 325RR TO 5 II 9,0

Embrapa BRS 326 TO 5 II 8,7

Embrapa BRS 333RR TO 5 III 9,4

Embrapa BRS 7580 TO 5 I 7,5

Embrapa BRS 7980 TO 5 I 7,9

Embrapa BRS 8082CV TO 5 I 8,0

Embrapa BRS 8180RR TO 5 I 8,1

Embrapa BRS 8280RR TO 5 I 8,2

Embrapa BRS 8381 TO 5 I 8,3

Embrapa BRS 8480 TO 5 I 8,4

Embrapa BRS 8482CV TO 5 I 8,4

Embrapa BRS 8560RR TO 4 II 8,5

Embrapa BRS 8560RR TO 5 I 8,5

Embrapa BRS 8590 TO 5 I 8,5

Embrapa BRS 8780 TO 5 II 8,7

Embrapa BRS 8890RR TO 5 II 8,8

Embrapa BRS 8990RR TO 5 II 8,9

Embrapa BRS 9090RR TO 5 II 9,0

Embrapa BRS 9180IPRO TO 4 III 9,1

Embrapa BRS 9383IPRO TO 4 III 9,3

Embrapa BRS Barreiras TO 5 II 9,2

Embrapa BRS Carnaúba TO 5 III 9,6

Embrapa BRS Gisele RR TO 4 III 8,8

Embrapa BRS Juliana RR TO 4 III 9,1

Embrapa BRS Pérola TO 5 II 8,8

Embrapa BRS Pétala TO 4 III 8,7

Embrapa BRS Raimunda TO 5 II 9,0

Embrapa BRS Sambaíba TO 4 III 9,3 272

Embrapa BRS Sambaíba TO 5 II 9,3

Embrapa BRS Sambaiba TO 5 II 9,3 RR

Embrapa BRS Tracajá TO 5 II 9,2

Embrapa/Emater-GO BR/Emgopa 314 TO 4 III 9,1 (Garça Branca)

Embrapa/Emater-GO BRSGO 8661RR TO 5 I 8,6

Embrapa/Emater-GO BRSGO 8860RR TO 5 II 8,8

Embrapa/Emater-GO BRSGO 9160RR TO 5 II 9,1

Embrapa/Emater-GO BRSGO TO 4 III 8,6 Chapadões

Embrapa/Emater-GO BRSGO Jataí TO 4 III 8,8

Embrapa/Emater-GO BRSGO Luziânia TO 4 II 8,3

Embrapa/Epamig MG/BR 46 TO 4 II 8,1 (Conquista)

FTS SEMENTES S.A FTS 2178 TO 4 I 7,8

FTS SEMENTES S.A FTS 2178 TO 5 I 7,8

FTS SEMENTES S.A FTS 4188 TO 4 III 8,8

FTS SEMENTES S.A FTS 4188 TO 5 II 8,8

FTS SEMENTES S.A FTS ATHENA TO 4 II 8,4 RR

FTS SEMENTES S.A FTS ATHENA TO 5 I 8,4 RR

FTS SEMENTES S.A FTS AVANTE TO 4 II 8,0 RR

FTS SEMENTES S.A FTS AVANTE TO 5 I 8,0 RR

FTS SEMENTES S.A FTS BALSAS TO 4 I 7,8 RR

FTS SEMENTES S.A FTS BALSAS TO 5 I 7,8 RR

FTS SEMENTES S.A FTS CAMPO TO 4 II 8,3 NOVO RR

FTS SEMENTES S.A FTS CAMPO TO 5 I 8,3 NOVO RR

FTS SEMENTES S.A FTS TO 4 III 8,7 DIAMANTINO RR

FTS SEMENTES S.A FTS TO 5 II 8,7 273

DIAMANTINO RR

FTS SEMENTES S.A FTS TO 4 III 8,8 ESPERANÇA RR

FTS SEMENTES S.A FTS TO 5 II 8,8 ESPERANÇA RR

FTS SEMENTES S.A FTS GALANTE TO 4 II 7,9 RR

FTS SEMENTES S.A FTS GALANTE TO 5 I 7,9 RR

FTS SEMENTES S.A FTS GRACIOSA TO 4 II 8,0 RR

FTS SEMENTES S.A FTS GRACIOSA TO 5 I 8,0 RR

FTS SEMENTES S.A FTS JACIARA TO 4 II 8,0 RR

FTS SEMENTES S.A FTS JACIARA TO 5 I 8,0 RR

FTS SEMENTES S.A FTS MASTER TO 4 II 8,1 RR

FTS SEMENTES S.A FTS MASTER TO 5 I 8,1 RR

FTS SEMENTES S.A FTS TO 4 III 9,3 PARAGOMINAS RR

FTS SEMENTES S.A FTS TO 5 II 9,3 PARAGOMINAS RR

FTS SEMENTES S.A FTS TRIUNFO TO 4 II 8,1 RR

FTS SEMENTES S.A FTS TRIUNFO TO 5 I 8,1 RR

FTS SEMENTES S.A FTS URUÇUI TO 4 III 8,8 RR

FTS SEMENTES S.A FTS URUÇUI TO 5 II 8,8 RR

FTS SEMENTES S.A FTS VISTA TO 4 III 8,/ ALEGRE RR

FTS SEMENTES S.A FTS VISTA TO 5 II 8,8 ALEGRE RR 274

Gaúcha Melhoramento e Avanço em GMX TO 4 I 6,2 Genetica LTDA CANCHEIRO RR

Gaúcha Melhoramento e Avanço em GMX TO 4 I 7,0 Genetica LTDA REDOMÃO RR

GDM Licenciamento do Brasil Ltda. RK8115 IPRO TO 5 I 7,8

Instituto Mato-Grossense do Algodão IMA 84114RR TO 4 II 8,4

Instituto Mato-Grossense do Algodão IMA 84114RR TO 5 I 8,4

MONSOY TMG 2183IPRO TO 4 II 8,3

MONSOY AS 3810IPRO TO 4 II 8,1

MONSOY AS 3810IPRO TO 5 I 8,1

MONSOY AS 3820IPRO TO 5 I 8,2

MONSOY AS 3850IPRO TO 4 II 8,5

MONSOY AS 3850IPRO TO 5 I 8,5

MONSOY M8349IPRO TO 4 II 8,3

MONSOY M8349IPRO TO 5 I 8,3

MONSOY M8372IPRO TO 4 II 8,3

MONSOY M8372IPRO TO 5 I 8,3

MONSOY M8473IPRO TO 5 I 8,5

MONSOY M8615IPRO TO 4 III 8,6

MONSOY M8615IPRO TO 5 I 8,6

MONSOY M8644IPRO TO 4 III 8,6

MONSOY M8644IPRO TO 5 I 8,6

MONSOY M8766RR TO 4 III 8,7

MONSOY M8766RR TO 5 II 8,7

MONSOY M8808IPRO TO 4 III 8,8

MONSOY M8808IPRO TO 5 II 8,8

MONSOY M9056 RR TO 4 III 9,0

MONSOY M9144RR TO 4 III 9,1

MONSOY M9144RR TO 5 II 9,1

MONSOY M-SOY 8866 TO 4 III 8,8

MONSOY M-SOY 8866 TO 5 II 8,8

MONSOY M-SOY 8870 TO 4 III 8,8

MONSOY M-SOY 8870 TO 5 II 8,8 275

MONSOY M-SOY 9350 TO 4 III 9,3

MONSOY M-SOY 9350 TO 5 II 9,3

NIDERA SEMENTES LTDA A 7002 TO 4 II 8,5

NIDERA SEMENTES LTDA A 7002 TO 5 I 8,5

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8500 TO 4 II 8,3

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8500 TO 5 I 8,3

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8572 TO 4 II 8,2

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8572 TO 5 I 8,2

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8690 TO 4 III 8,6

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8690 TO 5 I 8,6

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8843 TO 4 III 8,8

NIDERA SEMENTES LTDA AN 8843 TO 5 II 8,8

NIDERA SEMENTES LTDA NA 8015 RR TO 4 II 8,2

NIDERA SEMENTES LTDA NA 8015 RR TO 5 I 8,2

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7202 IPRO TO 4 I 7,2

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7202 IPRO TO 5 I 7,2

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7447 IPRO TO 4 I 7,4

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7447 IPRO TO 5 I 7,4

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7505 IPRO TO 4 I 7,5

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7505 IPRO TO 5 I 7,5

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7667 IPRO TO 4 I 7,6

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7667 IPRO TO 5 I 7,6

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7709 IPRO TO 4 I 7,7

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7709 IPRO TO 5 I 7,7

NIDERA SEMENTES LTDA NS 7901 TO 4 II 7,9

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8270 TO 4 II 8,3

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8270 TO 5 I 8,3

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8290 TO 4 II 8,2

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8290 TO 5 I 8,2

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8393 TO 4 II 8,3

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8393 TO 5 I 8,3

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8490 TO 4 II 8,4

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8490 TO 5 I 8,4 276

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8693 TO 4 III 8,6

NIDERA SEMENTES LTDA NS 8693 TO 5 I 8,6

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1080 RR TO 4 II 8,0

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1080 RR TO 5 I 8,0

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1190 RR TO 4 III 9,0

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1279 RR TO 5 I 7,9

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1285 RR TO 5 I 8,5

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1288 RR TO 5 II 8,8

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN13830 IPRO TO 5 I 8,3

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN13840 IPRO TO 5 I 8,4

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN13842R TO 5 I 8,5 IPRO

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1385 RR TO 5 I 8,4

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN13850 IPRO TO 5 I 8,4

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN1387 RR TO 5 I 8,5

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN13870 IPRO TO 5 I 8,6

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN9078 RR TO 4 I 7,8

SYNGENTA SEEDS LTDA SYN9078 RR TO 5 I 7,8

UFU UFUS TO 4 II 8,3 XAVANTE

UNISOJA /TMG TMG2185IPRO TO 4 II 8,5

UNISOJA /TMG TMG2185IPRO TO 5 I 8,5

UNISOJA /TMG TMG2187IPRO TO 4 III 8,7

UNISOJA /TMG TMG2187IPRO TO 5 II 8,7

UNISOJA S/A 5G801 TO 5 I 8,0

UNISOJA S/A 5G850 TO 4 II 8,5

UNISOJA S/A 5G850 TO 5 I 8,5

UNISOJA S/A TMG1180RR TO 4 II 8,0

UNISOJA S/A TMG1180RR TO 5 I 8,0

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG115RR TO 4 III 8,6

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG115RR TO 5 I 8,6

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1181RR TO 4 II 8,1

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1181RR TO 5 I 8,1

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1182RR TO 4 II 8,2 277

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1182RR TO 5 I 8,2

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1187RR TO 4 III 8,7

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1187RR TO 5 II 8,7

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1188RR TO 4 III 8,8

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1188RR TO 5 II 8,8

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1188RR TO 5 II 8,8

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1288RR TO 4 III 8,8

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG1288RR TO 5 II 8,8

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG132RR TO 4 II 8,5

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG132RR TO 5 I 8,5

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG133RR TO 4 II 8,5

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG133RR TO 5 I 8,5

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG4182 TO 4 II 8,2

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG4182 TO 5 I 8,2

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG4185 TO 4 II 8,5

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG4185 TO 5 I 8,5

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG4190 TO 5 II 9,0

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG7188RR TO 4 III 8,8

UNISOJA/FUNDAÇÃO MT/TMG TMG7188RR TO 5 II 8,8

Fonte: MINISTERIO DA AGRICULTURA Secretária de Politica Agrícola – SPA. Departamento de Gestão de Risco Rural – DEGER. Coordenação Geral de Zoneamento Agropecuário - CGZA . Zoneamento Agícola de Risco Climático SOJA - Safra 2015 / 2016

Tabela 3. Fazendas de soja e pecuária e trabalho escravo no Matopiba (2003-2017)

Nome das Fazendas Município Ano

Agropecuária e Industrial Serra Grande Ltda São Raimundo das Mangabeiras (MA) 2009 (Fazenda Agroserra)

Fazenda Campo Grande Açailândia (MA) 2004-2005

Fazenda Meu Xodó Açailândia (MA) 2005-1006

Fazenda Igarashi Açailândia (MA) 2004-2005

Fazenda Lagoinha Açailândia (MA) 2004-2013

Fazenda Redenção Açailândia (MA) 2010-2011 278

Fazenda Boa Vista Açailândia (MA) 2004-2009

Fazenda Boa Sorte Açailândia (MA) 2006-2009

Fazenda Nova Esmeralda Açailândia (MA) 2006-2008

Fazenda Pindaré/Ouro Preto Açailândia (MA) 2005-2009

Fazenda São Francisco Açailândia (MA) 2006-2009

Fazenda Mauro Rossati Açailândia (MA) 2004-2009

Fazenda Carajá Balsas (MA) 2010-2011

Fazenda Brejo das Araras João Lisboa (MA) 2006-2010

Fazendas Zonga e Rezende João Lisboa (MA) 2004-2006

Fazenda Rezende João Lisboa (MA) 2004-2004

Fazenda Zonga João Lisboa (MA) 2003-2005

Fazenda Ana Carla Alto Alegre do Maranhão 2008-2009

Fazenda Santa Maria Amarante do Maranhão 2006-2009

Fazenda Nova Era Itinga do Maranhão (MA) 2004-2005

Fazenda Progresso Itinga do Maranhão (MA) 2007-2009

Fazenda Maria de Jesus Governador Acher MA) 2010-2011

Fazenda Uberlândia Santa Luzia (MA) 2008-2009

Fazendas Reunidas Monte Castelo Senador La Roque (MA) 2004-2005

Fazenda San Maria Imperatriz (MA) 2006-2008

Fazenda Carolina do Norte Alto Parnaíba (MA) 2006-2009

Fazenda Boi Gordo Morro Cabeça no Tempo (PI) 2010-2012

Fazenda Califórnia Antônio Almeida (PI) 2011-2012

Fazenda Lírio Antônio Parisotto Uruçuí (PI) 2009-2011

Fazenda Progresso Uruçuí (PI) 2009

Perímetro Irrigado do Gurguéia Alvorada do Gurguéia (PI)

Fazenda Cosmos Ribeiro Gonçalves (PI) 2008-2010

Zona Rural de Ribeiro Gonçalves/PI Ribeiro Gonçalves (PI) 2012

Fazenda Boa Esperança (Fazenda Santo Antônio) Arapoema (TO) 2008-2012

Fazenda Jardim Arapoema (TO) 2007-2009

Fazenda Vista Alegre Araguanã 2010-2011

Fazenda São Judas Tadeu Silvanópolis (TO) 2006-2008 279

Fazenda Três Irmãos Recursolândia (TO) 2010-2011

Fazenda Cantão Bandeirantes do Tocantins 2006

Fazenda Polinardo Bandeirantes do Tocantins 2006-2009

Fazenda São José Bandeirantes do Tocantins 2004-2005

Agropecuária Caracol (Fazenda Caracol) Cachoeirinha (TO) 2011

Carlos Henrique de Almeida / Agropecuária Caracol Cachoeirinha (TO) 2006-2007 Ltda (Fazenda Caracol)

Fazenda Três Corações Carmolândia (TO) 2007-2011

Fazenda Boa Esperança Carmolândia (TO) 2004-2006

Fazenda Poção Bonito Ponte Alta (TO) 2006-2012

Fazenda São Mariano III Darcinópolis 2006-2012

Fazenda São Sebastião Darcinópolis 2005

Fazenda São Sebastião Colméia (TO) 2011-2012

Fazenda São Carlos (Fazenda Caçula) Xambioá (TO) 2008-2010

Fazenda Califórnia I e II Xambioá (TO) 2009-2010

Fazenda Serra Nova Xambioá (TO) 2005

Fazenda Serra Bonita Xambioá (TO) 2007

Fazenda São Miguel Xambioá (TO) 2010-2012

Fazenda Grotão Colinas do Tocantins 2010-2011

Fazenda Tupitinga Colinas do Tocantins 2011-2012

Fazenda Angico Campos Lindos (TO) 2010-2011

Fazenda São Simeão Campos Lindos (TO) 2004-2012

Fazenda Jardim Novo Jardim (TO) 2007-2008

Fazenda Itália I Presidente Kennedy 2006-2010

Fazenda Minas Gerais II Presidente Kennedy 2010-2012

Fazenda Vale dos Sonhos Araguanã (TO) 2004-2006

E.C.I. Empresa de Invest. Particip. E Ananás (TO) 2007-2008 Empreendimentos Ltda. Leonardo Jácomi Patriota e Laurita Patriota

Fazenda Água Roxa Ananás (TO) 2010-2011

Gurupi Participações S/C Ltda (Atual Maximus’s Ananás (TO) 2004-2007 Participações S.A)Fazenda Légua de Pedras

Fazenda Recanto do Araguaia Ananás (TO) 2005-2006 280

Fazenda Nossa Senhora Aparecida Ananás (TO) 2007-2008

Fazenda Castanhal Ananás (TO) 2004-2011

Fazenda Sertaneja Ananás (TO) 2006-2008

Fazenda Casa Branca Ananás (TO) 2006-2007

Fazenda Vitória Ananás (TO) 2005-2006

Fazenda Guanabara Ananás (TO) 2008-2010

Fazenda Floresta Ananás (TO) 2006-2007

Fazenda Araguanajá Araguaína (TO) 2011

Fazenda Açaí Araguaína (TO) 2006-2008

Fazenda Esporãozinho Araguaína (TO) 2010-2011

Fazenda Jardim Araguaína (TO) 2006-2012

Fazenda Jota Araguaína (TO) 2007-2008

Fazenda Santa Antônia – Lotes 154 a 158 Araguaína (TO) 2007-2012

Fazenda Pantanal Axixá do Tocantins (TO) 2007-2012

Fazenda Bacuri Axixá do Tocantins (TO) 2006-2009

Fazenda Itajubá Santa Rosa do Tocantins (TO 2007-2009

Fazenda Pantera Nova Bandeirante 2004-2007

Fazenda São José Darcinópolis (TO) 2005

Fazenda Cangalha Riachinho (TO) 2008

Cia Melhoramentos do Oeste da Bahia (Fazenda Formoso do Rio Preto (BA) 2009-2012 Estrondo)

Fazenda Nossa Senhora Aparecida Formoso do Rio Preto (BA) 2010

Fazenda Guací Baianópolis (BA) 2010

Fazenda Shirabe Luís Eduardo Magalhães (BA) 2007-2009

Fazenda Laranjeiras I São Desidério (BA) 2006-2009

Fazenda Bananal São Desidério (BA) 2010-2011

Fazenda São Francisco São Desidério (BA) 2010-2011

Fonte: CDVCH/CB e CPT (2018). As fazendas destacadas em vermelho são fazendas de soja.

281

Foto 1. Boleto para quitação de dívida de camponês na CNA

Fonte: Foto da autora, 2012. Foi omitido dados e o nome do camponês

Tabela 4. Aquisição de Terra por Estrangeiros ( Pessoa Física) no Matopiba Nome Do Nome do Proprietario Denominacao do Área Pais Município Imovel

Tutóia Mário Salgueiro lha Do Canto 100 Moçambique 282

Santa Karl Hermann Isenberg Fazenda Monte 580,9 Espanha Quitéria Do Serrano Maranhão

Balsas Jaspert Arie Slob Lote Rural14 524,939 Holanda

Balsas Jaspert Arie Slob Lote Rural14 130,6552 Holanda

Riachão Dania Susana Gil Aguila FAZENDA 19 Cuba VEREDA GRANDE 02

Alto Parnaíba Jaspert Arie Slob Lote Rural14 107,9 Holanda

Balsas Jaspert Arie Slob Lote Rural14 867,6 Holanda

Estreito Dirk Johannes Janse Fazenda 122 Holanda Lagoinha

Montes Altos Richard Carston Fazenda 255,2 EUA Holthouser Generosa

Grajaú Fernando Ribeiro Da Costa Fazenda 612 Portugal Fortaleza I

Grajaú Fernando Ribeiro Da Costa Fazenda 60,5 Portugal Fortaleza Iii

Grajaú Fernando Ribeiro Da Costa Fazenda 130 Portugal Fortaleza Ii

Lima Campos Francisco Rodrigues De Sitio Vista 100 ? Araujo Alegre

Balsas Kyung Jo Kim Faz Pedra De 63 Coreia do Fogo Sul

Porto Franco Secondo Valério Della Fazenda São Hen 30 Vedova

Balsas Henrica Maria Wilhermina Gleba Sao Pedro 1.500,00 Holanda Gerarda Kok

Balsas Abraham Johannis Van Fazenda Pindaiba 1.300,00 Holanda Kempen

Estreito Yasuhide Watanabe Fazenda Belo 6.531,50 Japão Horizonte

São Eliomar Nunes Cda Silva Poços D'Agua 93,00 ? Raimundo Das Mangabeiras

Açailândia Jesus Gonzalo Canicoba Faz São Jose 136,8 Espanha Rodriguez 283

Açailândia Jesus Gonzalo Canicoba Faz Sto Amario 143,1 Espanha Rodriguez

Açailândia Jesus Gonzalo Canicoba Faz Martins 105,8 Espanha Rodriguez

Buriti Primo Vezzosi Morrinho 50,7075 Itália

Governador Jaime Cal Gil Faz. Tabuleiro 159,9714 Espanha Edison Lobão Comprido

Governador Jaime Cal Gil Faz. Água Fria 41,9727 Espanha Edison Lobão

Balsas ANTONIUS GERARDUS FAZENDA 160,29 MARIA SCHREVEN CUMI II

Balsas ANTONIUS GERARDUS FAZENDA 250 MARIA SCHREVEN CUMI E CUMI I

Aurora Do Dong Hwan Lee Lote 15 do 1.919,99 Coreia do Tocantins Loteamento São Sul Marcos

Sandolândia Izabel Pereira De Lima Pa Bandeirantes 56,3 ?

Novo Acordo Zlata Sauer Lote 09 1.341,83 Polonia

Lizarda Stefan Muller São Judas Tadeu 505,4 Iugoslávia - Fazenda

Palmas Antonio Jacinto Medeiros Chacara Do Meio 12,0698 Portugal

Palmas Antonio Jacinto Medeiros Chacara 6,0825 Portugal Braganca

Palmas Antonio Jacinto Medeiros Chacara 549 5,8555 Portugal Gleba AÂgua Boa

Palmas Antonio Jacinto Medeiros Chácara 340 7,1074 Portugal

Almas Christoph Peter Hrdina Fazenda Gamba 582,289 Alemanha

Recursolândia Yasuo Nakashima FAZENDA 300,1022 Japão MORADA DO SOL III

Recursolândia Yoshitsugu Nakashima FAZENDA 300,1022 Japão MORADA DO SOL III

Recursolândia Yasuo Nakashima FAZENDA 333,468 Japão MORADA DO SOL IV

Recursolândia Yoshitsugu Nakashima FAZENDA 333,468 Japão MORADA DO 284

SOL IV

Wanderlândia Pedro Timoteo Dos Reis Chacara Santo 79,8 ? Reis

Rio Da Roberto Alves De Souza Fazenda 28,9 ? Conceição Catingueiro

Formoso Do Arend Anthonie Evert Fazenda Projeto 552,4 Holanda Araguaia Reedijk Rio Formoso

Uruçuí Jorge Adan Krzyzanowski Fazenda 206,462 Argentina Mercedes Condominio União

Uruçuí Jorge Adan Krzyzanowski Fazenda Sao Jose 21,1199 Argentina

Uruçuí Jorge Adan Krzyzanowski FAZENDA 45,9313 Argentina CABECEIRA DO VAO DO POÇO

Baixa Grande Hinderikus Jan Borg Fazenda Sao 3.508,00 Do Ribeiro Paulo

Uruçuí Prudent Josef Marie Fazenda Rassa 20.000,50 ? Aernoudts

Uruçuí Jorge Adan Krzyzanowski Fazenda Araripe 22,3181

São Gonçalo Clay Robert Earl Fazenda Bela 500 EUA Do Gurguéia Vista

São Gonçalo Clay Robert Earl Fazenda Bela 460 EUA Do Gurguéia Vista I

Santa Very Laurina Hoogerheide Faz Malhadinha 1.346,00 Holanda Filomena

Luis Eduardo Todd Kenneth Topp Fazenda Rio 635,8144 EUA Magalhães Azul I Gleba 01- 02-03

São Desidério Aiko Tachibana e Outra FAZENDA 245,7085 Japão VEREDA DOS MURRAIS

Correntina Felisberto Francisco De Fazenda Dois 21,7375 ? Souza Irmãos

Formosa Do Tokuko Kanashiki Fazenda Lote Ii - 248,7574 Japão Rio Preto Kumagai (Parte)

Formosa Do Kozo Sato Lote N 05 Faz 1.500,10 Japão Rio Preto Espirito Santo 285

Riachão Das Taeko Kumagai E Outros Lote Rural 3a ? Japão Neves Desmembrado

Riachão Das Yoshitaka Kusumoto Fazenda 399,6 Japão Neves Kusumoto

Riachão Das Nobuyo Ichida Kusumoto Fazenda 399,6 Japão Neves Kusumoto

Riachão Das Katsuki Okada Fazenda Okada 1.163,60 Japão Neves

Riachão Das Noboru Kumagai Lote N 3 C 889 Japão Neves Desmembraçao

Riachão Das Tokuko Kanashiki Lote Rural N 3 B 393,5 Japão Neves Kumagai

São Desidério Itiro Kitano Fazenda Assai Ii 876,6

São Desidério Kozo Hirata Fazenda Tropical 1.074,50

São Desidério Toshijuki Jamanaka Fazenda Irmaos 1.068,75 Iamanaka

Jaborandi Ezio Nicola Cavuto Fazenda San 300 Nicola

Formosa Do Klaus Adalbert Holzapfel Melanda Lote N 500 ? Rio Preto 18

Cocos Gercindo Severino Da Sitio Canal Ii 5 ? Silva

Correntina Augusto Baldrati Fazenda Extrema 4 Itália

Cocos Manuel Farinha Fazenda Santa 3.000,00 Portugal Cruz

Santa Maria Lucas Da Conceição Fazenda Canaã Ii 400 Da Vitória Genovevo

Luis Eduardo SACHA LOUISE Fazenda Ruali 427,9027 Nova Magalhães THOMSON Zelandia

Luis Eduardo JAMES PATRICK FAZENDA 259,6602 Nova Magalhães WEBSTER THOMSON KIWI Zelandia

Formosa Do Klaus Adalbert Holzapfel Fazenda Melanda 2.400,00 ? Rio Preto

Cocos Antonio Abreu Vieira Fazenda 1.230,00 Portugal Agropastoril Canaa S/A

Carinhanha Carolina Cremonini Lote Rural 30 ? Silveira Lucena A 232 286

Carinhanha Maria Luiza Dos Santos Fazenda Nova 40 ? Esperanca

Paratinga Jose Henriques Ramos Fazenda 4.084,00 Portugal Conforto

Santa Maria Valdemir Jose Pereira Fazenda Pajeu 7 ? Da Vitória

Sítio Do Mato Arsenio Francisco Da Ilha Do Sitio Do 1 ? Purificacao Mato

Fonte: SNCR (2018).

Tabela 5. Aquisição de Terra por Empresas Estrangeiras no Matopiba Municipio Nome Empresa Nome do Imovel Área %Capital Extrangeiro Alto Parnaíba Radar S/A - Tellus Faz. S/A Marimbondo/Engano Balsas Sollus Mapito Pei Fazenda Serrinha 2.411,37 60 Participaçoes Ltda Balsas Sollus Mapito Pei Fazenda Bela Vista I e 1.167,39 60 Participaçoes Ltda II Balsas Sollus Mapito Pei Fazenda Nova 783,4552 60 Participaçoes Ltda Esperança I E II Balsas Sollus Mapito Pei Fazenda Santa Tereza 1.882,21 60 Participaçoes Ltda Balsas Radar S/A - Tellus Faz. Sagitário ? S/A Balsas Radar S/A - Tellus Faz. Catuaí Verde ? S/A Balsas Radar S/A - Tellus Faz.Catuaí Norte ? S/A Balsas Radar S/A - Tellus Faz Florida ? S/A Barreiras Agropecuaria Osman Fazenda Osman E 1.051,33 99 Ltda Outras Barreiras BrasilAgro Fazenda Jatobá 31.606 Barreiras BrasilAgro Fazenda Preferência 17.799 Bom Jesus Sollus Mapito Pei 8.000 Participaçoes Ltda Bom Jesus Tiba Agro Faz. São João do 60 Pirajá Campos Sollus Mapito Pei 6.000 Lindos Participaçoes Ltda Correntina Brausssie Fazenda Braussie 11.576,3 100 Agropecuária Ltda 0 Correntina AGRICOLA XINGU Fazenda Susi E Outras 8.365,71 100 287

S/A Correntina AGRICOLA XINGU Fazenda Tabuleiro VII 3.000,00 100 S/A Correntina BrasilAgro Fazenda Chaparral 37.182 Cotegipe CARACOL Fazenda Paraiso 1.736,19 90 AGROPECUARIA LTDA Cotegipe CARACOL Fazenda NSra 1.363,40 90 AGROPECUARIA Conceição da Praia LTDA Cotegipe CARACOL Fazenda Nova 2.697,53 90 AGROPECUARIA Esperança Iii LTDA Cotegipe CARACOL Fazenda Botagofo I 2.685,97 90 AGROPECUARIA LTDA Cotegipe CARACOL FAZENDA 1.775,42 90 AGROPECUARIA BOTAFOGO II LTDA Cotegipe CARACOL CAMPO LARGO DO 955,5899 90 AGROPECUARIA RIO GRANDE II LTDA Cotegipe CARACOL CAMPO LARGO DO 1.009,86 90 AGROPECUARIA RIO GRANDE III LTDA Cotegipe CARACOL Fazenda Campo Largo 4.884,05 90 AGROPECUARIA do R Grande I LTDA Cotegipe CARACOL Fazenda Botafogo 3 1.398,13 90 AGROPECUARIA LTDA Jaborandi Sollus Mapito Pei 4.000 Participaçoes Ltda João Lisboa Sollus Mapito Pei 10.000 Participaçoes Ltda Luis Eduardo Agropecuaria Osman Fazenda Osman III 1.039,66 99 Magalhães Ltda Mansidão ANNA PURNA Fazenda Vedica 4.668,10 98.76 AGRICULTURA Maharishi LTDA Mansidão CARACOL CAR 23 FAZENDA 2.088,34 90 AGROPECUARIA CACHOERINHA V LTDA Mansidão CARACOL CAR 24 FAZENDA 3.219,04 90 AGROPECUARIA CACHOERINHA VI LTDA Mansidão CARACOL CAR 25 FAZENDA 2.257,69 90 AGROPECUARIA CACHOERINHA VII LTDA 288

Mateiros AGROPECUARIA Fazenda Serra 830,7004 100 SEVERINO Jalapinha LIMITADA – ME Nova Sartenne Sartenne 463,1912 88,98 Rosalândia Agropecuaria Ltda Agropecuaria Ltda Ribeiro BrasilAgro Fazenda Parceria II 7.455 Gonçalves Santa Radar S/A - Tellus Faz. Filomena S/A Ludmila/Laranjeiras São Agropecuaria Osman Fazenda Osman III 1.039,66 99 Desidério Ltda São AGRICOLA XINGU Fazenda Nossa 3.019,32 100 Desidério S/A Senhora de Fatima São AGRICOLA XINGU Fazenda Real - 24.797,0 100 Desidério S/A Tabuleiro IV 9 São Hertz Brazil Farm FAZENDA HERTZ 505,4874 99 Desidério Ltda IV São AGRICOLA XINGU Fazenda JK III 728,16 100 Desidério S/A São Hertz Brazil Farm FAZENDA HERTZ 132,5352 99 Desidério Ltda IV - RESERVA Tasso Agrex Do Brasil S/A Fazenda Bacuri 606,4 Fragoso Tasso Agrex Do Brasil S/A Fazenda Bahia 700 Fragoso Tasso Agrex Do Brasil S/A Fazenda Santa Maria 962,85 Fragoso Tasso Agrex Do Brasil S/A Fazenda Bandeirante 2.098,00 Fragoso Tasso Agrex Do Brasil S/A Fazenda Penitente 621,55 Fragoso Fonte: SNCR (2018).

289

Tabela 6. Preço de terras de cerrado e floresta nos municípios do Matopiba em R$ (2003-2017) Município 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 Baianopolis 543 641 531 536 959 1611 1833 1282 1800 1258 3.750 4.200 1.708 2000 2000

Cotegipe 318 330 374 374 363 413 483 400 583 790 1.733 1.833 1.800 1.800 1.800

Formosa do Rio Preto 1062 1062 1062 1.073 1.060 1.283 1.283 1.283 1800 2.850 2.850 2.850 4.450 4.500 4.500

Jaborandi 146 170 170 170 959 503 650 650 650 2.200 2.200 2.200 4.000 4.000 4.000

Santa Maria da 159 165 175 190 204 256 300 262 300 471 743 1.167 1.500 1.500 1.500 Vitória

Wanderley 1865 2068 2068 2068 2.417 3658 3867 3867 3867 5.683 5.683 5.683 6.050 6.000 6.000

Bacabal 348 443 103 673 673 675 600 600 600 683 725 958 1.400 1.383 1.300

Presidente Dutra 207 229 223 217 280 343 350 350 483 550 575 933 1.100 1.100 1.100

São Domingos do 207 229 223 339 280 343 350 350 450 550 575 933 1.100 1.100 1.100 Maranhão

Balsas 891 1126 879 885 1.097 1799 1867 2.300 2.833 2.850 3.717 4.400 5.500 5.500 5.500

Fortaleza dos 276 169 450 447 770 770 770 2.333 2.833 2.750 3.383 3.917 3.800 3.800 3.800 Nogueiras

Cidelândia 78 103 103 102 174 250 257 368 483 490 562 698 710 700 700

Tasso Fragoso 151 169 131 131 229 300 300 375 483 597 643 852 800 800 800

Brejo 246 284 366 366 601 748 867 983 1200 1.225 1.200 1.283 1.983 2.200 2.200

Caxias* 100 103 127 131 231 310 250 220 350 508 503 627 758 800 800

Chapadinha 366 366 366 601 601 601 601 1.225 1.225 1.225 1.200 1.283 1.983 2.200 2.200 290

Buriti 65 66 66 65 147 240 263 300 300 477 493 742 858 900 900

Codó* 127 127 127 231 231 231 231 508 508 508 503 627 758 800 800

Açailândia 346 356 389 385 385 385 400 400 500 1.142 1.517 2.017 2.017 2.000 2.000

Imperatriz 346 356 389 385 385 385 400 400 500 1.142 1.517 2.017 2.017 2.000 2.000

Bom Jesus 491 669 579 570 739 1687 1800 1900 2167 2.000 2.250 3.583 4.300 4.500 4.500

Floriano 44 46 45 45 60 173 207 190 277 327 357 495 600 600 643

Uruçuí 571 751 581 578 727 1651 1800 2000 2267 2.500 2.933 3.900 4.300 4.500 4.500

Araguaína 196 327 282 278 493 618 733 625 850 1.233 1.442 1.925 2.467 2.500 2.500

Wanderlandia 452 465 489 479 506 503 500 450 550 1.183 1.500 1.783 1.800 2.033 2.200

Dianópolis 1472 2065 1.572 1555 1.518 1474 1533 2500 2500 2.300 2.175 1.817 1.867 2.000 2.000

Formoso do Araguaia 727 727 794 784 742 700 717 842 900 1.112 1.442 2.233 3.617 4.000 4.000

Gurupi 329 329 344 330 351 470 500 517 550 845 910 1.192 1.767 2.000 2.000

Mateiros 115 166 142 140 202 300 300 248 277 367 440 688 750 750 750

Palmas 651 873 913 900 1.050 1200 1200 808 1017 1.417 1.608 2.108 2.967 3.000 3.000

Porto Nacional 405 556 557 547 560 560 750 517 550 807 1.142 1.817 2.633 2.700 2.700

Fonte: FNP Agrianual (2018). *Bacabal Floresta/Mata Cocais; Presidente Dutra: brejo; Açailândia: Floresta Amazônica

Tabela 7. Preço de terras de alta produtividade nos municípios do Matopiba em R$ ( 2003-2017) Município 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 291

Pedro Afonso (TO) 1340 1758 1634 1629 2401 3829 4133 5467 6617 7333 9033 10950 12167 12500 12.500

Bom Jesus (PI) 1667 2159 1671 1659 1745 3654 4000 3800 4033 4567 6633 8000 8750 9000 9000

Uruçuí (PI) 2194 2816 1936 1883 2009 4096 4500 4250 4983 6867 8500 10000 10000 10000 10000

Balsas (MA) 3084 3754 2928 2869 2940 3200 3333 4400 7133 9167 13317 14417 14500 14667 15000

Luís Eduardo 5542 6182 4793 4804 5682 9150 10000 10033 10267 14950 14500 16083 19500 20500 20500 Magalhães (BA)

Barreiras 4474 3.239 4804 5.682 8825 10.267 11.000 14.950 10.633 12.250 19.500 20.500 20.500

Formosa do Rio 4474 3.239 4804 5.682 8825 10.267 11.000 14.950 10.633 12.250 19.500 20.500 20.500 Preto

São Desidério 4474 3.239 4804 5.682 8825 10.267 11.000 14.950 10.633 12.250 19.500 20.500 20.500

Tasso Fragoso 3084 3754 2928 2869 2940 3200 3333 4400 7133 9167 13317 14417 14500 14667 15000

Fonte: FNP Agrianual (2018).

Tabela 8. Preço de terras de média e baixa produtividade nos municípios do Matopiba em R$ ( 2003-2017)

Município 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017

Barreiras 4474 5148 3.239 4.025 5.100 9017 9333 9.333 10.100 13.067 10.633 12.250 16.000 16.000 16.000

Formosa do Rio 4474 5148 3.239 4.025 5.100 9017 9333 9.333 10.100 13.067 10.633 12.250 16.000 16.000 16.000 Preto

Luís Eduardo 4474 5148 3.239 4.025 5.100 9017 9333 9.333 10.100 13.067 10.633 12.250 16.000 16.000 16.000 292

Magalhães

São Desidério 4474 5148 3.239 4.025 5.100 9017 9333 9.333 10.100 13.067 10.633 12.250 16.000 16.000 16.000

Grajaú 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 7.500

Balsas 1820 2440 1.903 1.865 1.837 2083 2233 3.267 4.100 6.100 9.450 10.500 11.417 11.500 11.500

Tasso Fragoso 1820 2440 1.903 1.865 1.837 2083 2233 3.267 4.100 6.100 9.450 10.500 11.417 11.500 11.500

Anapurus 567 953 1.024 1.015 1.658 2050 2633 3150 3667 4.367 5.400 5.517 5.900 6.333 7.000

Brejo 567 953 1.024 1.015 1.658 2050 2633 3150 3667 4.367 5.400 5.517 5.900 6.333 7.000

Chapadinha 567 953 1.024 1.015 1.658 2050 2633 3150 3667 4.367 5.400 5.517 5.900 6.333 7.000

Açailândia 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 10.000

Bom Jesus 1101 1408 1.090 1082 914 1756 2000 1767 2133 2.833 4.083 4.850 4.883 5.000 5.000

Uruçuí 1417 1783 1.380 1376 1.094 1654 1867 2017 2733 4.000 5.400 6.350 5.833 6.000 6.000

Campos Lindos 2068 2068 3.429 3285 3.264 5152 5152 5500 6000 7.200 11.183 12.833 13.000 13.000 13.000

Alvorada 1345 3498 1.687 1664 1.974 2733 5000 4450 4933 6.267 8.550 9.000 9.000 9.000 9.000

Dianópolis 3246 3754 2.810 2791 3.084 3936 4167 5950 7000 10.567 13.833 13.750 13.500 14.000 14.000

Figueirópolis 1345 3498 1.687 1664 1.974 2733 5000 4450 4933 6.267 8.550 9.000 9.000 9.000 9.000 293

Formoso do 1345 3498 1.687 1664 1.974 2733 5000 4450 4933 6.267 8.550 9.000 9.000 9.000 9.000 Araguaia

Santa Rosa do 1345 3498 1.687 1664 1.974 2733 5000 4450 4933 6.267 8.550 9.000 9.000 9.000 9.000 Tocantins

Mateiros 3246 3754 2.810 2791 3.084 3936 4167 5950 7000 10.567 13.833 13.750 13.500 14.000 14.000

Pedro Afonso 852 1141 1.054 1042 1.670 2745 2650 3433 3500 4.283 5.300 7.167 8.000 8.000 8.000

Porto Nacional 1218 1747 1.703 1704 2.362 3397 3550 4983 5300 6.333 8.300 10.183 12.167 12.500 12.500

Fonte: FNP Agrianual (2018).