APOPULAÇÃO DA ILHA DO FAIAL NO CONTEXTO AÇORIANO 1950-1970

GILBERTA PAVÃO NUNES ROCHA

Rocha, G. P. N. (2007), A população da ilha do Faial no contexto açoriano 1950-1970. Boletim do Núcleo Cultural da , 16: 117-136.

Sumário: A intensidade da emigração faialense resultante da erupção do vulcão dos dá-se numa época em que as saídas dos açorianos para o estrangeiro eram bastante reduzidas, o que se verifica desde o início dos anos trinta. Esta evolução tinha conduzido a um forte aumento e rejuvenescimento demográfico do conjunto do arquipélago, com influência na mor- talidade e na natalidade, que apresenta alguma diversidade entre as várias ilhas. A importância da emigração faialense do final dos anos cinquenta e princípios de sessenta contribuiu para modificações na dinâmica demográfica e alterou ainda a configuração interna da distribuição da população, assistindo-se a uma maior concentração urbana e desertificação das rurais, principalmente as mais atingidas por aquela catástrofe natural.

Rocha, G. P. N. (2007), Faial Population in the Azorean Archipelago 1950- -1970. Boletim do Núcleo Cultural da Horta, 16: 117-136.

Summary: The emigration of Faial as result of Capelinhos’s vulcanic eruption was an excep- tional one. Indeed, during the XX century the Azoreans did not go out to live abroad since the earlier thirties, which had resulted in a population increase and had consequences too in the age structure and in the levels of mortality and fertility. This dynamic had contributed to a greater diversity in the demographic variables in the different islands of the archipelago. That emigra- tion had yet a great influence in the distribution of the population inside the island, with a decline of the rural population, namely those who were victims of that natural catastrophe.

Gilberta Pavão Nunes Rocha – Departamento de História, Filosofia e Ciências Sociais. Univer- sidade dos Açores. Rua da Mãe de Deus. Apartado 1422. 9501-801 Codex.

Palavras-chave: Dinâmica demográfica, mortalidade, natalidade, emigração, concentração urbana.

Key-words: Demographic dynamic, mortality, fertility, emigration, rural population. 118 Boletim do Núcleo Cultural da Horta

O impacto demográfico da erupção cidade faialense nas décadas de cin- vulcânica dos Capelinhos, como con- quenta e sessenta surgem evidencia- sequência da forte emigração dela de- das, como não podia deixar de ser, corrente, já foi minuciosamente trata- uma vez que a emigração aparece de do por Ricardo Madruga da Costa em forma destacada na sua excepciona- artigo com o mesmo nome (COSTA, lidade. 1998: 339-351). Servindo-se, prin- Neste sentido, tendo como ponto de cipalmente, da informação constante partida os estudos acima referidos, nos registos de passaportes do ano pretendemos, tanto quanto possível, de 1959, traça-nos um perfil do emi- dar uma visão um pouco mais alarga- grante da ilha do Faial que contempla da do movimento da população faia- aspectos que vão desde a sua naturali- lense nos anos cinquenta e sessenta. dade, residência, idade e sexo – fun- Contudo, a informação demográfica damentais para uma caracterização disponível é já quase toda conhecida estritamente demográfica – a outros e trabalhada, exceptuando, tanto quan- de cariz mais social ou sócio-demo- to sabemos, o volume demográfico gráfico, como o estado civil, a pro- por freguesias. Claro que muito há fissão, o nível de instrução ou até o ainda a fazer no que respeita especifi- destino. Daí avança para uma síntese camente ao conhecimento da emigra- da própria emigração, enquanto fenó- ção ao longo deste período, recorren- meno determinante da evolução popu- do aos dados constantes nos registos lacional do Faial num período mais de passaportes, como fez Ricardo alargado, de cinquenta anos, que vai Madruga da Costa para o ano de 1959 de 1920 a 1980, através da Taxa Bruta e que possibilitou a análise pormeno- da Emigração, nas várias décadas que rizada que consta no artigo referido. o compõem. Todavia, este tipo de trabalho requer A dinâmica demográfica desta ilha uma investigação de algum fôlego, também já foi por nós tratada no con- que não temos realizada, e que, assim, texto mais vasto do arquipélago, da não pode ser agora objecto da nossa sua unidade e diversidade ao longo análise, pelo que esta pequena refle- dos primeiros oitenta anos do século xão se fará, como referimos, balizada passado (ROCHA, 1991), no qual se fundamentalmente pelos trabalhos inserem as datas que se pretende aqui acima referidos. Uma análise de âm- assinalar. Embora o período em ques- bito social mais vasto, que não res- tão tenha como enquadramento a peite especificamente à emigração, é periodicidade e tipologia adoptadas igualmente dificultada pela falta de para o conjunto da região, a especifi- informação a nível de ilha, ou conce- Gilberta Pavão Nunes Rocha 119 lho, uma vez que os dados censitários verificam-se nos anos de mudança de publicados para esta época respeitam sentido situações distintas, nos quais ao conjunto do distrito. Neste sentido, algumas ilhas apresentam situações o estudo de Ricardo Madruga da similares às do período antecedente e Costa, ainda que respeitante unica- outras já às do subsequente. A década mente aos emigrantes, dá também de cinquenta é disto paradigmática uma perspectiva importante do que com as ilhas de Santa Maria, S. Mi- poderá ser o perfil social do faialense guel e Terceira ainda com ritmos de nessa época, em termos profissionais crescimento positivos e as restantes e de habilitações académicas. já com decréscimos. Nestas últimas, destacam-se o Faial e as Flores com Se podemos identificar três tendên- os declínios mais significativos, da cias bem distintas na evolução da ordem dos 16%. população açoriana no século XX Observando o GRÁFICO I, constata-se – 1900-1920, 1920-1960 1960-2001 que a diminuição da população na (ROCHA, 1991; ROCHA et al., 2005), ilha do Faial é superior à verificada o primeiro e o último de declínio e o no conjunto do arquipélago. Todavia, segundo de aumento demográfico –, se na década de cinquenta os valores

GRÁFICO I

VARIAÇÃO PERCENTUAL DA POPULAÇÃO DOS AÇORES E DA ILHA DO FAIAL NAS DÉCADAS DE CINQUENTA E SESSENTA

5,00

0,00 1950/1960 1960/1970 -5,00

AÇORES -10,00 FAIAL

-15,00

-20,00

-25,00

FONTE: Recenseamentos da População de 1950 a 1970. 120 Boletim do Núcleo Cultural da Horta globais se devem, fundamentalmente, nuição populacional, tanto aqueles à dinâmica demográfica das ilhas de que se situam entre 1900 e 1920, maior dimensão – S. Miguel e Ter- como de 1960 a 1981, correspondem ceira –, embora com aumentos menos a elevados valores de saídas para o significativos do que nas décadas an- estrangeiro, enquanto que o de au- teriores, já na de sessenta, onde o de- mento, verificado entre 1920 e 1960, clínio é generalizado, o Faial regista respeita a anos nos quais a emigração um dos maiores decréscimos, ainda é de fraca intensidade, o que é espe- que nestes anos ele seja mais expres- cialmente uma realidade muito evi- sivo em Santa Maria e no Corvo. dente nos anos trinta e quarenta da Com efeito, a variação percentual do centúria passada. volume demográfico é da ordem dos O aumento da emigração tem igual- 25% na primeira destas ilhas e dos mente influência na estrutura etária, 30% na segunda, enquanto que no envelhecendo-a no topo e rejuvenes- Faial é inferior a 20%, com quanti- cendo-a na base, uma vez que as saí- tativos similares aos que encontra- das são mais preponderantes no grupo mos em S. Jorge, Pico ou mesmo na em idade activa. Todavia, o maior ou Graciosa. Ou seja, apesar da diferen- menor envelhecimento demográfico ça do Faial face ao conjunto do arqui- é também resultado da intensidade pélago, sempre bastante influenciado das variáveis do movimento natural, pela situação da ilha de S. Miguel, cuja diversidade está bem patenteada onde residem sensivelmente metade dos habitantes dos Açores, encon- nas ilhas açorianas em meados do tramos, neste período, ilhas que, de século XX (ROCHA, 1991). algum modo, não se distinguem da Independentemente da grandeza dos tendência de diminuição do volume valores, tanto dos nascimentos como populacional observada no Faial, que dos óbitos, respeitantes à totalidade viveu acontecimentos que normal- do arquipélago (GRÁFICO II) e da ilha mente abalam, e abalaram, de modo do Faial (GRÁFICO III), obviamente significativo a sua caracterização de montantes distintos, facilmente se demográfica. verifica que as respectivas tendên- Os fluxos emigratórios de relativa cias não são perfeitamente similares, expressividade têm sempre uma in- designadamente ao nível dos aconteci- fluência decisiva na dinâmica demo- mentos que determinam a natalidade. gráfica e, no caso dos Açores, são res- O acréscimo global deste fenómeno, ponsáveis pela periodicidade acima que atinge o seu grau mais elevado referida. Com efeito, os anos de dimi- por volta de 1960, não tem, com Gilberta Pavão Nunes Rocha 121

GRÁFICO II

EVOLUÇÃO DOS NASCIMENTOS E ÓBITOS NOS AÇORES 1950 A 1970

Açores 12000

10000

8000 NASC 6000 OB 4000

2000

0 0 2 4 6 8 0 2 4 6 8 0 5 5 5 5 5 6 6 6 6 6 7 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1

FONTE: INE, Estatísticas Demográficas (Anuário Demográfico). efeito, correspondência na população conhecer pela aplicação de métodos faialense. indirectos, que pressupõem uma boa O saldo positivo do movimento natu- qualidade dos restantes dados para ral é, no entanto, uma realidade tam- poderem ter credibilidade. De qual- bém para o Faial, pelo que a dimi- quer modo, estas não nos parecem re- nuição da população observada no levantes nos anos cinquenta e sessen- GRÁFICO I resulta, consequentemente, ta do século XX (ROCHA, 1991), como de saídas por via da mobilidade, em posteriormente veremos. particular da emigração, embora não As diferenças respeitantes à mortali- se possam à partida excluir as migra- dade e à natalidade são perfeitamente ções internas, quer no interior da re- visíveis e comparáveis nos GRÁFICOS gião, como para outros pontos do país. IV e V, nos quais apresentamos as Com efeito, a falta de informação não respectivas taxas brutas. Se, em 1950, nos permite apreender directamente o Faial regista uma Taxa Bruta de esta vertente da mobilidade, o mesmo Mortalidade (TBM) inferior ao con- acontecendo com o regresso dos emi- junto regional, o mesmo não acontece grantes, razão pela qual só as podemos nas datas seguintes, o que, em nosso 122 Boletim do Núcleo Cultural da Horta

GRÁFICO III

EVOLUÇÃO DOS NASCIMENTOS E ÓBITOS NO FAIAL 1950 A 1970

600

500

400

NASC 300 OB

200

100

0 0 2 4 6 8 0 2 4 6 8 0 5 5 5 5 5 6 6 6 6 6 7 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1

FONTE: INE, Estatísticas Demográficas (Anuário Demográfico).

GRÁFICO IV

TAXAS BRUTAS DE MORTALIDADE NOS AÇORES E NO FAIAL NOS ANOS DE 1950, 1960 E 1970 TBM

16 14 12 10 Faial 8 Açores 6 4 2 0 1950 1960 1970

FONTE: ROCHA (1991). Gilberta Pavão Nunes Rocha 123 entender, resulta de níveis de enve- nupcialidade e, consequentemente, na lhecimento mais elevados nesta ilha natalidade (ROCHA, 1991) –, não po- face ao conjunto da região e não pro- demos deixar de sublinhar a sua per- priamente a um acréscimo da intensi- manência nestas datas, principalmen- dade do fenómeno. De igual modo, é te em 1950. Efectivamente, neste ano afectada a natalidade que apresenta a emigração não tinha relevância há quantitativos significativamente mais mais de duas décadas e a população baixos. tinha entretanto aumentado, rejuve- Embora o maior envelhecimento de nescido e equilibrado na sua reparti- algumas ilhas, nomeadamente a do ção quantitativa entre o sexo masculi- Faial, seja uma realidade visível já no e feminino, diferentemente do que em anos anteriores ao período que acontecia nos finais de Oitocentos. estamos a tratar – em grande parte Podemos, todavia, pensar que as alte- devido a desequilíbrios na estrutura rações verificadas nas variáveis do por sexo provavelmente resultantes movimento natural relativas aos finais de emigrações preponderantemente dos anos cinquenta, como aos de masculinas dos finais do século XIX sessenta, estão, pelo menos em parte, e que acabaram por ter influência na associadas à intensa emigração que

GRÁFICO V

TAXAS BRUTAS DE NATALIDADE NOS AÇORES E NO FAIAL NOS ANOS DE 1950, 1960 E 1970 TBN

35

30

25

20 Faial 15 Açores

10

5

0 1950 1960 1970

FONTE: ROCHA (1991). 124 Boletim do Núcleo Cultural da Horta então se registou, como consequência O mesmo não se pode dizer da morta- da erupção do vulcão dos Capelinhos lidade, uma vez que a diminuição e que contribuiu para um maior enve- mais acentuada se faz ao longo da dé- lhecimento populacional da ilha faia- cada de quarenta. lense. No primeiro caso, cuja representação Uma análise comparativa da mortali- consta do GRÁFICO IV, identifica-se a dade e da natalidade, através da Taxas alteração registada em 1960 e 1970, Brutas da Mortalidade (TBM) e das quando este indicador passa a ter Taxas Brutas da Natalidade (TBN) quantitativos mais elevados, o que dos Açores e do Faial, torna, com não acontecia em períodos anteriores, efeito, mais visível o maior envelhe- como se comprova no ano de 1950. cimento desta ilha, uma vez que não Na natalidade, as alterações não são considerámos que neste período haja tão visíveis, até porque nesta variável um efectivo declínio da intensidade as repercussões são mais de médio e deste último fenómeno, que, no caso longo prazo, contrariamente ao que dos Açores, surge mais tardiamente. acontece na mortalidade, que tem

GRÁFICO VI EVOLUÇÃO DA IMPORTÂNCIA RELATIVA DOS JOVENS, ACTIVOS E IDOSOS NA ILHA DO FAIAL, NOS ANOS DE 1950, 1960 E 1970

Faial

64,4 63,8 70,0 61,3 60,0

50,0

40,0 JOVENS 27,3 26,3 ACTIVOS 30,0 25,1 IDOSOS 20,0 13,6 8,4 9,9 10,0

0,0 1950 1960 1970

FONTE: Recenseamentos da População de 1950 a 1970. Gilberta Pavão Nunes Rocha 125 consequências imediatas na estrutura Se, como temos vindo a fazer, com- demográfica. Com efeito, a saída de pararmos esta evolução com a ten- população Jovem e Activa mais jovem dência do conjunto do arquipélago, torna logo mais preponderante o peso verifica-se que já em 1950 este regis- relativo dos mais idosos, enquanto tava uma estrutura etária mais jovem, que a diminuição dos nascimentos tanto por um maior peso relativo deste decorrente do menor peso de popula- Grupo Funcional, como por uma ção em idade de procriar surge mais menor importância relativa de idosos dilatada no tempo. (GRÁFICO VII). Contudo, tanto num Observando o GRÁFICO VI, onde caso como no outro estamos perante representamos a quantificação dos uma população que se pode classi- Grupos Funcionais 1 no Faial, confir- ficar como tipicamente jovem, quer ma-se o duplo envelhecimento acima na base quer no topo. mencionado, ainda que atenuado, Na década seguinte, a diferença entre fruto do aumento da mobilidade de o Faial e os Açores globais, que era saída, uma vez que as alterações nas de pouco mais de dois pontos percen- variáveis do movimento natural não o tuais na população mais nova, passa parecem justificar. De sublinhar, no para mais do dobro, enquanto que nos entanto, que as modificações respei- mais velhos a diferença percentual tantes à década de sessenta, que estão também aumenta cerca 1,5 pontos per- patenteadas nos quantitativos do ano centuais. Esta tendência acentua-se censitário de 1970 e que são conse- nos anos que se seguem, sendo de real- quência da emigração, não podem ser çar a importância relativa dos Idosos, também dissociadas do enorme fluxo com um quantitativo de 13,6% em açoriano para o continente norte- 1970, o que já não configura o mode- -americano que teve lugar a partir de lo de uma população jovem no topo. 1965 e que já não está propriamente O mesmo não se verifica no todo dependente da erupção do vulcão dos regional, cujo valor percentual é mais Capelinhos, mas de alterações globais baixo, ainda inferior a 9%, o que evi- da política de emigração dos Estados dencia a juventude da estrutura etária Unidos da América. regional (GRÁFICO IX).

1 Estruturamos a população tendo em conta Funcionais: Jovens, Activos e Idosos (Velhos) os níveis etários 0-14; 15-64 e 65 e mais. De correspondem aos grupos de idade com sublinhar que não foi a opção tomada na idades compreendidas entre 0-19; 20-59 e obra Dinâmica Populacional dos Açores no 60 e mais, respectivamente. século XX (ROCHA, 1991), na qual os Grupos 126 Boletim do Núcleo Cultural da Horta

GRÁFICO VII

IMPORTÂNCIA RELATIVA DOS JOVENS, ACTIVOS E IDOSOS NA ILHA DO FAIAL E NOS AÇORES NO ANO DE 1950 (%) 1950

64,4 70,0 62,5

60,0

50,0

40,0 30,8 27,3 Faial 30,0 Açores

20,0 8,4 6,7 10,0

0,0 JOVENS ACTIVOS IDOSOS

FONTE: Recenseamento da População de 1950.

GRÁFICO VIII

IMPORTÂNCIA RELATIVA DOS JOVENS, ACTIVOS E IDOSOS NA ILHA DO FAIAL E NOS AÇORES NO ANO DE 1960 (%) 1960

63,8 70,0 60,2 60,0

50,0 33,1 40,0 Faial 26,3 30,0 Açores

20,0 9,9 6,7 10,0

0,0 JOVENS ACTIVOS IDOSOS

FONTE: Recenseamento da População de 1960. Gilberta Pavão Nunes Rocha 127

GRÁFICO IX

IMPORTÂNCIA RELATIVA DOS JOVENS, ACTIVOS E IDOSOS NA ILHA DO FAIAL E NOS AÇORES NO ANO DE 1970 (%)

1970

70,0 61,3 58,3 60,0

50,0 32,9 40,0 Faial 25,1 30,0 Açores

20,0 13,6 8,8 10,0

0,0 JOVENS ACTIVOS IDOSOS

FONTE: Recenseamento da População de 1970.

GRÁFICO X

EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE EMIGRANTES DO FAIAL E DOS AÇORES ENTRE 1950 E 1970

14000

12000

10000

8000 Faial Açores 6000

4000

2000

0 0 2 4 6 8 0 2 4 6 8 0 5 5 5 5 5 6 6 6 6 6 7 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1

FONTE: SREA, Demografia; INE, Estatísticas Demográficas (Anuário Demográfico). 128 Boletim do Núcleo Cultural da Horta

Identificadas as principais diferenças 1969, com cerca de 13.000 emigran- demográficas, quer a nível dos aspec- tes, sendo que a partir de 1966 a emi- tos globais da população, quer das gração retoma a expressividade de variáveis do movimento natural, cen- outros tempos, passando de valores trar-nos-emos agora na mobilidade e, da ordem dos 3.000 emigrantes para em especial, na emigração. mais de 10.000. Como se sabe, nos Açores, o prin- No Faial (GRÁFICO X), cuja tendência cípio deste período, pelo menos até geral não é muito distinta, surge com meados da década de sessenta, carac- especial evidência o ano de 1959, teriza-se por ter um volume de emi- com 3.887 emigrantes 2, isto é, cerca gração relativamente fraco, princi- de metade do registado para o con- palmente se comparado com os das junto do arquipélago. Este fluxo, da primeiras décadas do século XX, década de cinquenta e princípios da quando atingiu valores entre os de sessenta, distingue-se dos restan- 40.000 e os cerca de 60.000 emigran- tes, isto é, daqueles que respeitam a tes, embora também já se distancie datas posteriores a 1965, que tem dos quantitativos dos anos quarenta e características distintas, como já refe- cinquenta, de volume bastante mais rimos. Com efeito, até 1956 os quan- reduzido, de cerca de 3.500 e 2.500 titativos conhecidos são sempre infe- emigrantes, respectivamente. Nas dé- riores a 100, não atingindo em alguns cadas de cinquenta e sessenta, o nú- anos os 30 emigrantes. No entanto, a mero de emigrantes oficiais açoria- primeira grande alteração respeita nos são de pouco mais de 30.000 na ao ano de 1957, com 277 saídas, não primeira data e de 72.000 na segunda. sendo de negligenciar os números De resto, ao longo do século passado relativos aos anos de 1960 e 1961 de, só nos anos setenta se regista um va- respectivamente, 774 e 846 emigran- lor um pouco mais elevado, da ordem tes oficiais. dos 75.000. Se a influência da emigração já foi Em termos anuais, e no que respeita referida, quer na evolução do volume ao período que medeia os anos de como da estrutura etária, iremos em 1950 a 1970 (GRÁFICO X), o quantita- seguida aprofundar um pouco mais tivo mais elevado respeita ao ano de esta questão da dinâmica demográ-

2 O número apontado por Ricardo Madruga distintas, principalmente em datas mais da Costa é ligeiramente diferente – 3.811. recuadas e num fenómeno de difícil quanti- Com efeito, é frequente surgirem estas desi- ficação como é a mobilidade. gualdades quando se trabalha com fontes Gilberta Pavão Nunes Rocha 129

GRÁFICO XI

EVOLUÇÃO DO SALDO NATURAL E DO SALDO NATURAL MENOS A EMIGRAÇÃO NA ILHA DO FAIAL, ENTRE 1950 E 1970

500

8

6 4

2 0

8 6 4

2 0 0

6

6 6

6 6

5 5 5

5 5

9

9 9

9 9

9 9 9

9 -500 9

1

1 1

1 1

1 1 1

1 1 -1000

-1500 SMN -2000 SMNE

-2500

-3000

-3500

-4000

FONTE: SREA, Demografia; INE, Estatísticas Demográficas (Anuário Demográfico). fica do Faial, vendo a sua associação saída de pessoas, quer por esta via, às variáveis do movimento natural. quer pela da mortalidade, seja sufi- Conforme se pode observar no GRÁ- ciente para ultrapassar o número de FICO XI e decorre do que anterior- entradas resultantes dos nascimentos. mente apresentámos, o saldo do mo- Temos, assim, e na ausência de conhe- vimento natural (SMN) é positivo ao cimento de outras formas de mobili- longo de todo o período em análise, dade – como são os movimentos no uma vez que os nascimentos são interior do mesmo país, designada- sempre em número superior ao dos mente os de saída –, que a população óbitos, o que origina uma população aumenta. É esta situação que é inver- jovem, onde os efeitos da Transição tida logo em 1957, mas muito parti- Demográfica são ainda muito ténues, cularmente em 1959, quando o saldo como consequência de se estar numa natural diminui devido à emigração. sociedade de fraco desenvolvimento A perda demográfica é, então, de económico e social. A reduzida emi- cerca de 3.700 indivíduos, uma vez gração registada entre 1950 e 1956 que o SMN é inferior a 200. Tal facto não é, pois, suficiente para que a não pode deixar de ter repercussões 130 Boletim do Núcleo Cultural da Horta numa população com um valor da ciadas à da do último ano da década ordem dos 23.000 habitantes, pois de cinquenta. corresponde a mais de 16% do seu Se considerarmos os dados dos óbi- total. Nestes dois decénios, o Faial tos, nascimentos e emigrações perfei- perde cerca de 8.000 habitantes, sen- tamente fiáveis, restariam por conta- sivelmente, 4.000 em cada um deles. bilizar apenas 313 e 274 habitantes A comparação entre o Saldo do nos anos censitários de 1960 e 1970, Movimento Natural (SMN) e a deste respectivamente. Como já referimos, associado à emigração (SMNE), estamos a trabalhar com informação representadas no GRÁFICO XI, evi- relativa à emigração que, no ano de dencia, de forma que entendemos ser 1959, não é coincidente com a apre- bastante clarificadora, a importância sentada por Ricardo Madruga da das saídas para o estrangeiro no ano Costa, embora a diferença seja pouco de 1959 no conjunto da dinâmica significativa, de mais 76 pessoas nos demográfica da ilha do Faial. Com nossos dados. Neste sentido, pode- menor intensidade estão os fluxos dos mos pensar num valor residual, infe- anos de 1961 e 1962, mas cujas reper- rior a 300, relativo a saídas do Faial cussões se amplificam quando asso- para outros pontos do país, porven-

GRÁFICO XII

EVOLUÇÃO DA IMPORTÂNCIA RELATIVA DOS NASCIMENTOS, ÓBITOS E EMIGRAÇÕES NA ILHA DO FAIAL ENTRE 1950 E 1970

1970 1968 1966 1964 1962 EMIG 1960 OB 1958 NASC 1956 1954 1952 1950 0,0 20,0 40,0 60,0 80,0 100,0

FONTE: SREA, Demografia; INE, Estatísticas Demográficas (Anuário Demográfico). Gilberta Pavão Nunes Rocha 131 tura para outras ilhas açorianas. De Entre 1950 e 1957, a principal deter- qualquer modo, esta situação nunca minante é, sem dúvida, a variável retiraria a efectiva e real importância natalidade, cujo peso oscila nestes da emigração como fenómeno deter- anos entre os 45% e os 60% do total. minante do evoluir da população faia- Perde, posteriormente, esta posição a lense neste período. favor da emigração, com excepção A importância relativa dos aconteci- dos anos de 1963 a 1965. A mortali- mentos demográficos de que dispo- dade regista sensivelmente a mesma mos para a análise da dinâmica demo- tendência que a natalidade, ainda que gráfica faialense nos anos cinquenta e com quantitativos sempre inferiores, sessenta regista alterações de relevo, pois os seus valores percentuais mais como resultado da forte corrente emi- elevados não ultrapassam os 35%. gratória que adquire especial signifi- A caracterização global que temos cado nos anos já identificados e que vindo a realizar não dispensa uma surgem bem visíveis no GRÁFICO XII. referência particular às unidades admi-

QUADRO 1 EVOLUÇÃO DA POPULAÇÃO RESIDENTE NA ILHA DO FAIAL E POR FREGUESIAS, 1950-1970

ILHA/FREGUESIAS 1950 1960 1970 Faial 23.923 20.281 16.375 1.369 851 460 1.869 1.670 1.495 2.912 2.289 1.555 2.188 1.916 1.300 2.069 1.876 1.490 Angústias (Horta) 3.191 2.973 2.885 Conceição (Horta) 1.778 1.565 1.360 (Horta) 3.595 2.951 2.695 1.402 1.136 825 953 903 725 686 515 240 1.064 893 650 Salão 847 743 695

FONTE: Recenseamentos da População de 1950 a 1970. 132 Boletim do Núcleo Cultural da Horta nistrativas de menor dimensão – as modo muito particular as zonas mais freguesias –, embora a informação atingidas, em especial a do demográfica seja neste caso ainda Capelo. Assim, dos 1.369 habitantes mais deficitária, apenas relativa ao recenseados em 1950, restam apenas volume da população, sexos separa- 851 em 1960, quantitativo que dimi- dos, nos vários anos censitários. nui para 460 em 1970 (QUADRO 1). Se a distribuição da população por Especificando a evolução demográ- freguesias já era, no início do perío- fica em cada um dos decénios, encon- do, muito naturalmente distinta, uma tramos algumas diferenças que cremos catástrofe natural da natureza da serem dignas de registo e cuja repre- erupção vulcânica dos Capelinhos, sentação apresentamos no GRÁFICO com o declínio demográfico assina- XIII. lado, conduz a uma reconfiguração do É nos anos cinquenta que em várias povoamento do Faial, afectando de localidades os declínios da população

GRÁFICO XIII

VARIAÇÃO DA POPULAÇÃO NAS FREGUESIAS DA ILHA DO FAIAL, ENTRE 1950-1960 E 1960-1970

Salão Ribeirinha Praia Norte Praia Almoxarife Pedro Miguel Matriz 1960/1970 Conceição 1950/1960 Angústias Flamengos Feteira Cedros Castelo Branco Capelo

-800 -700 -600 -500 -400 -300 -200 -100 0

FONTE: Recenseamentos da População de 1950 a 1970. Gilberta Pavão Nunes Rocha 133 são, efectivamente, mais elevados, agravam muito a situação resultante nomeadamente, e em primeiro lugar, das saídas anteriores. nas freguesias da Matriz e Capelo. A perda populacional entre 1950 e Além da primeira, as das Angústias e 1970 é, de facto, muito significativa e Conceição, que perfazem o conjunto diversa nas várias freguesias, confor- da cidade da Horta, também são das me se pode observar no GRÁFICO XIV. mais atingidas nestas datas, assim As que registam menores decrésci- como Castelo Branco e Salão. Nas mos percentuais globais são, de um restantes, que são em maior número, modo geral, as da cidade da Horta a diminuição no volume da popu- – se exceptuarmos a do Salão –, em lação faz-se preponderantemente no especial a das Angústias, com um de- decénio seguinte. créscimo de cerca de 10%, enquanto Todavia, estes valores são bastante que as da Conceição e Matriz apre- influenciados pela diversidade da di- sentam diminuições mais expressivas, mensão demográfica das freguesias, da ordem dos 25%. Em sentido inver- so, temos as freguesias do Capelo e o que justifica os elevados quantitati- Praia do Norte, com declínios muitís- vos, nomeadamente os registados pela simo acentuados, de cerca de 65% Matriz da Horta. Se esta evolução é das respectivas populações. De subli- em si mesma importante, ela não per- nhar, ainda, os casos das freguesias mite verificar todo o impacto que a dos Cedros, Feteira e Pedro Miguel, catástrofe teve na nova configuração com variações percentuais entre os demográfica da ilha. De igual modo, 40% e os 45%. as variações percentuais por década Assim, quando o quantitativo mais são influenciadas pelas diminuições baixo é da ordem dos 10%, o que cor- anteriores, fazendo com que os anos responde a uma média anual de sensi- sessenta surjam com maior relevo. velmente 0,5% e os mais elevados Ou seja, se tomarmos como exemplo correspondem a diminuições popula- a freguesia do Capelo, verifica-se que cionais médias anuais de mais de 3%, a maior variação percentual registada ao longo de vinte anos, estamos pe- nos anos sessenta não pode deixar rante uma modificação demográfica de tomar em consideração o volume de carácter excepcional, com impli- demográfico em 1960 que já era mui- cações nos mais diversos níveis da to mais baixo do que aquele que tinha vida económica e social. em 1950. Releva-se, no entanto, a Estas enormes e distintas percas po- preponderância que as saídas conti- pulacionais conduzem a alterações nuam a ter nos anos sessenta e que relevantes no peso demográfico das 134 Boletim do Núcleo Cultural da Horta

GRÁFICO XIV

VARIAÇÃO PERCENTUAL DA POPULAÇÃO DA ILHA DO FAIAL, POR FREGUESIAS, ENTRE 1950 E 1970

1950/1970 0,0 Faial -10,0 Capelo Cedros -20,0 Feteira Flamengos -30,0 Angústias (Horta) Conceição (Horta) -40,0 Matriz (Horta) Pedro Miguel -50,0 Praia do Almoxarife

-60,0 Praia do Norte Salão -70,0

FONTE: Recenseamentos da População de 1950 a 1970.

GRÁFICO XV

VARIAÇÃO PERCENTUAL DA POPULAÇÃO DA ILHA DO FAIAL, POR FREGUESIAS, ENTRE 1950 E 1970

Salão Ribeirinha Praia do Norte Praia do Almoxarife Pedro Miguel Matriz (Horta) 1970 Conceição (Horta) 1960 Angústias (Horta) 1950 Flamengos Feteira Cedros Castelo Branco Capelo

0,0 5,0 10,0 15,0 20,0

FONTE: Recenseamentos da População de 1950 a 1970. Gilberta Pavão Nunes Rocha 135 várias freguesias, cujos valores apre- a arbitrariedade que ela comporta, a sentamos no GRÁFICO XV. Da sua caracterização pode ser ainda mais observação facilmente se constata evidente, o que não acontece com o que, apesar das diferenças, existe gráfico anterior. Com efeito, das treze uma maior homogeneidade interna na freguesias da ilha do Faial, as da distribuição demográfica do ano de Praia do Almoxarife, Praia do Norte, 1950. A diversidade aumenta nos Ribeirinha e Salão registam em todos anos censitários seguintes, com uma os anos valores inferiores a 5% do diminuição em muitas das freguesias total da população faialense. Todavia, de menor dimensão e acréscimo nas a segunda e a terceira ainda perdem já mais populosas, designadamente importância relativa nos anos cin- na cidade da Horta. quenta e sessenta, o que não acontece Estabelecendo uma tipologia com com a Praia do Almoxarife e o Salão. intervalos quinquenais, não obstante Em 1950, a maioria das freguesias,

QUADRO 2 AGRUPAMENTO DE FREGUESIAS POR PESO DEMOGRÁFICO (%)

% / Anos 1950 1960 1970 5 ou < Praia do Almoxarife Praia do Almoxarife Praia do Almoxarife Praia do Norte Praia do Norte Praia do Norte Ribeirinha Ribeirinha Ribeirinha Salão Salão Salão Capelo Capelo Pedro Miguel > 5 < 10 Capelo Castelo Branco Castelo Branco Castelo Branco Feteira Feteira Feteira Flamengos Flamengos Flamengos Conceição Conceição Conceição Pedro Miguel Pedro Miguel Cedros 10 < 15 Cedros Cedros Angústias Angústias Matriz Matriz 15 ou > Angústias Matriz

FONTE: Recenseamentos da População de 1950 a 1970. 136 Boletim do Núcleo Cultural da Horta cerca de metade, situavam-se nos 15%, respectivamente, com 16,5% e limites entre os 5% e os 10% da popu- 17,6% e a dos Cedros até então inte- lação da ilha, como era o caso das grada nesta classificação, com per- do Capelo, Castelo Branco, Feteira, centagens da ordem dos 12%, para Flamengos, Conceição e Pedro Mi- apenas 9,5% (QUADRO 2). guel. Em 1960, e como resultado Será com esta nova configuração, de da evolução consequente à erupção mais acentuada diversidade, de deser- dos Capelinhos, o Capelo passa a tificação do mundo mais ruralizado e integrar o grupo das freguesias de concentração urbana, que a ilha do menor dimensão populacional, situa- Faial parte para anos de grandes trans- ção que mantém em 1970, nesta data formações demográficas. Trata-se não acompanhada também pela de Pedro só da emigração, que se vai acentuar Miguel. no primeiro quinquénio da década de setenta, como do aproximar de novas A evolução verificada nos anos ses- condições de vida, que fazem dimi- senta intensificou, assim, a desigual- nuir significativamente a mortalida- dade interna do Faial, não só porque de, em especial a mortalidade infantil, se ampliou o número de freguesias de e novos valores que influenciam a menor dimensão, como aumentou o natalidade, ambos fenómenos que peso demográfico das maiores, como determinam o envelhecimento demo- é o caso das da Matriz e Angústias. gráfico que caracteriza a contempo- Desaparecem freguesias com valores raneidade das sociedades do mundo entre os 10% e os 15%, passando as ocidental. últimas para valores superiores a

BIBLIOGRAFIA

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