MONOCULTURA DE EUCALIPTO, ENTENDIMENTOS DÍSPARES E SUAS IMPLICAÇÕES:UMA ANÁLISE DOS MUNICIPIOS DE GAMELEIRAS/MG E BONITO DE MINAS/MG INTEGRANTES DO PROJETO 10ENVOLVER

SILVA, Tathiane Paraiso da77;

77 Mestre em Desenvolvimento Social; coordenação do N EPISS; professora do Curso de Serviço Social da Universidade Estadual de – UNIMONT ES e integrante da equipe do Projeto NASCIMENTO, Geusiani Pereira Silva78.

RESUMO:Os discursos sobre os possíveis benefícios socioeconômicos advindos da monocultura do eucalipto têm sido apreendidos de formas diferenciadas pelos sujeitos sociais nos municípios. Se tratando de regiões com baixo Índice de Desenvolvimento Humano – IDH essa situação se complexifica, até pel o horizonte de possibilidades concretas que poderiam viabilizar melhores condiçõe s de vida para a população. Nesta direção, este trabalho tece considerações dispares sobre a monocultura do eucalipto, e suas implicações, questionando se as propostas em v oga sinalizam uma falácia desenvolvimentista ou uma solução para o cresciment o econômico dos municípios. Seguindo com as análises, contextualizam-se a realidade norte-mineira contraditória e as experiências singulares dos municípios de Gameleiras/MG e Bonito de Minas/MG, ambos atendidos pelo Projeto 10envolver. Tais observações foram construídas com base em estudos bibliográficos e através das visitas técnicas realizadas pelo referido projeto.Pretende-se, portanto, ampliar a compreensã o acerca dos argumentos contraditórios em torno da temática, bem como as consequências das decisões de apoio a essas práticas sobre esses municípios e as diversas comunidades rurais e tradicionais existentes.

PALAVRAS-CHAVE: monocultura de eucalipto; Projeto 10envolver; comunidades tradicionais.

A partir do Projeto 10envolver 79 pôde-se conhecer e compreender a dinâmica política e a realidade socioeconômica de a lguns municípios norte-mineiros com baixo IDH. Trata-se de uma iniciativa da Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Sociais (CIMOS) e do Centro de Estudos e Aperfeiçoa mento Funcional (CEAF),desenvolvida desde 2013, em parceria com universidades, com a gestão local e instâncias de participação popular dos municípios a tendidos. Este Projeto se propõe a conhecer, diagnosticar, an alisar, fomentar o empoderamento popular e o fortalecimento sócio-polí tico das instâncias de participação popular em municípios mineiros de baixo IDH, tais como: Bonito de Minas, Fruta de Leite, , Indaiabira e Gameleiras (da mesorregião do Norte de Minas); Crisólita, Novo Oriente de Minas, Bertópolis e (no V ale do Mucuri), e (no Vale do rio ).

10envolver. Contatos: (38) 92157669 - E-mail: [email protected]

78Mestre em Desenvolvimento Social; coordenação do N EPISS; professora do Curso de Serviço Social da Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONT ES e integrante da equipe do Projeto 10envolver. Contatos: (38) 9208-9063 - E-mail: [email protected]

79O Projeto 10envolver é assim denominado porque está sendo desenvolvido em 10 municípios mineiros com baixo IDH, sendo cinco no Norte de Minas, 01 no Vale do Jequitinhonha e 04 no Vale do Mucuri. Particularmente, ao contextualizar o IDH dos cinco municípios localizados no Norte de (Gameleiras, Indaiabira, Pai Pedro, Fruta de Leite e Bonito de Minas), à realidade nacional, tem-se uma disparidad e ainda mais latente: eles também se situam entre os municípios com os mais baixos Índices de Desenvolvimento Humano de todo o país. De acordo com o Atlas de Desenvolvimento Humano de 2013, entre os Estados situados nas posições extremas tem-se o Dis trito Federal no 1º lugar, com IDH de 0.824, e o de Alagoas, no 27º lugar, com IDH de 0.631. Em2010, comrelação ao IDH dos 5.565 municípios do Brasil, Gameleiras ocupava a posição 3.115ª, Indaiabira a 3.902ª, Pai Pedro ocupava a 4.395ª posição, Fruta de Leite a 5.277ª e Bonito de Minas, quase no final do ranking, ocupava a 5.345ª posição . Nesse sentido explicita-se a vulnerabilidade existente nos indicativos de saúde, educação e renda nesses municípios norte - mineiros. A partir dos trabalhos e visitas técnicas realizadas nesses municípios duas outras realidades se sobressaíram: a primeira, diz respeito à realidade do município Gameleiras/MG que há tempos abriu espaço, em seu território, para as monoculturas de eucalipto e hoje “colhe” os efeitos perversos dessa iniciativa; a segunda contrasta o desejo de grande parte dos munícipes de Bonito de Minas/MG que acreditam na monocultura de eucalipto como fator de desenvolvimento. Por meio dos estudos bibliográficos apreendeu-se que a caracterização clássica da monocultura de eucalipto no Norte de Minas Gerais se deu a partir dos incentivos gerados pelo processo de modernização do campo através de políticas desenvolvimentistas adotadas, principalmente, após a década de 1970 onde a monocultura de eucalipto era fonte geradora da produção de carvão vegetal que abasteciamas siderúrgicas, principalmente da região central do Estado. Tais processos têm moldado e transformado significativamente a paisagem rural brasileira, especificamente o cenário norte mineiro em seus aspectos sociais, culturais e econômicos das comunidades tradicionais e de pequen os produtores que sofreram e sofrem graves conseqüências com as escolhas políticas desenvolvimentistas implantadas na região. Percebe-se também que nos últimos anos o setor tem conferido uma nova dinâmica, utilizando-se das certificações, créditos de carbono e os projetos de Mecanismos de Desenvolvimento Limpo- MDL como novas ferramentas encontradas a fim de garantir maiores lucros,o que intensifica ainda mais os conflitos e os impactos ao modo de reprodução social das comunidades em áreas de plantio de eucalipto. Tais estratégias podem ser observadas através dos projetos de gestão sustentável adotado por esse setor utilizando os instrumentos citados como forma de garantia de bom manejo ambiental, o que têm impulsionado a incessante busca das empresas pelos órgãos responsáveis em garantir ao setor esse diferencialpara maior lucratividade. Inúmeras são as pesquisas financiadas pelo setor que atestam a rentabilidade das plantações florestais com títulos convincentes denominados em sua maioria pela “desmistificação do vilão”. Tais discussões revelam o discurso modernizador às regiões por onde estão espalhadase a importância do setor p ara a economia brasileira. Segundo o site da Associação Mineira de Silvicultura (AMS, 2008) “a entrada dos eucaliptos no atraente mercado da celulose representou um avanço sem precedentes para a indústria brasileira e abriu as portas a novos empreendimentos no setor”.As discussões sobre as mudanças climáticas e a inserção dos chamados MDL’s para a mitigação do clima se intensificam e as tendências de expansão do consumo e conseqüentemente dos processos industriais, tem causado desajustes socioambientais de proporções irreversíveis. Maiores são ainda as pesquisas 80 que testificam as graves consequências que tais práticas apresentam ao meio ambiente e a todosos sujeitos envolvidos direta e indiretamente nesse processo, principalmente aos que dependem da terra para sobreviver como é o caso dos pequenos produtores rurais e tradicionais, que tem em seu território todo um modo próprio de manejo e preserv ação dos recursos, saberes repassados de geração em geração. Esse contexto revela um cenário contraditório de formas de apropriação do território e reprodução material, social e cultural das diversas comunidades expulsas por esse modelo de apropriação territorial revelandoem seu conjunto uma série de arbitrariedades e desrespeitos aos direitos dos agricultores e extrativistas norte mineiros.Quando as empresas de plantações de eucali pto chegaram aos sertões não foram dadas devidas considerações às especificidade s do lugar. A cultura extrativista, tida como atrasada e arcaica, foi substituída pelas plantações de eucalipto que em pouco tempo cobriram grande parte dos Cerrados e Chapadas.

80Referências a autores como BARBOSA, R. S. & FEITOSA, A M.. A dinâmica de luta pela terra no norte de Minas Gerais, 2005.; CHEVEZ POZO, O. V. Regimes de propriedade e recursos naturais: a tragédia da privatização dos recursos comuns no norte de minas gerais, 2002.; DAYRELL, C.A; LUZ, Claúdia (org.). Cerrado e Desenvolvimento: tradição e atualidade, 2000 e inúmeros outros autores que apontam as consequências e transformações do espaço rural e das diversas comunidades tradicionais existentes. Ao reconhecer a situação conflitante de tais fenôme nos e os sujeitos envolvidos nesses processos, o projeto 10envolver se deparou com a realidade dos municípios de Gameleiras/MG e Bonito de Minas/MG, com percepções diferenciadas sobre tais práticas. Em entrevista realizada com osgestores do município de Bonito de Minas, por exemplo, percebeu-se que o grande desafio político, para eles, se revelam em conseguir atender a todas as exigências para atrair uma grande empresa de eucalipto. Nas palavras do prefeito, o que tem impedido essa “ conquista”são justamente as áreas de veredas, ambientes típicos do cerrado, pois o municipio se concentra em uma das principais áreas de preservação ambiental – APA Est adual do Rio Pandeiros.Para o gestor, a quantidade de empregos e os benefícios que o setor geraria para a região seria o suficiente para tirar o município da situação de crise em que se encontra. Vale ressaltar que essa percepção não é exclusiva do ges tor, parte dos munícipes que representam as principais instâncias de participaçã o popular também compartilham desse entendimento, mesmo não tendo informações amp liadas a esse respeito. Diferentemente, as entrevistas realizadas com os moradores e gestores do município de Gameleiras/MGretratam a insatisfação c om esse setor, por ter causado inúmeros transtornos ambientais e sociais aos moradores. Em pesquisas realizadas por historiadores locais81, evidencia-se que o eucalipto foi o grande responsável pela atual situação de atraso em o município se encontra, pois as empresas exploraram todo o território, destruíram os recursos naturais existen tes e abandonou o município sem ter deixado qualquer benefício para os moradores locais. Um dos maiores problemas enfrentados é sem dúvida a seca, fato intensificado, segundo os moradores, pelo eucalipto. Os indicativos, então, são claros: de um lado tem-s e a percepção da monocultura do eucalipto como fator de desenvolvimento e de outro, como fator de precariedade e prejuízos. É a partir desse conhecim ento que já se identificou a necessidade de aproximar as duas localidades para que haja trocas de experiências e maiores conhecimentos a esse respeito. Diante do exposto, reforça-se a necessidade de construção de outras estratégias que viabilizem e esclareça as consequências socioambientais geradas pelas grandes plantações de eucalipto. 81 Ver mais em: BALEEIRO, Zaurindo Fernandes. Gameleiras: dos primórdios à emancipação. Montes Claros:ed. Unimontes, 2006.