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UM HOMEM CHAMADO TEFFÉ por Daniel Camargo, Fábio Vellozo e Rodrigo Pereira

1 À memória do crítico Jorge Kuraiem Filho

AGRADECIMENTOS

Dos autores: aos entrevistados Anselmo Duarte, Antonio Pica, Celso Faria, Chiara Antonia Spadaccini de Teffé, Cristina Novaes, Dominique Boschero, Eduardo Fajardo, Elisa Montés, Elke Sommer, Enzo G. Castellari, Esmeralda Barros, Fábio Sabag, Franca Bettoja, Francesco Maselli, Gemma Cuervo, Geoffrey Greeman, , Helena de Teffé, Jorge Cherques, Jorge Rivero, Juan Bosch, Juan Julio de

2 Abajos, Luiz de Teffé, Manuel de Teffé, Mark Damon, Mauro Câmara, Nicoletta Machiavelli, Pasquale Fanetti, Ray Lovelock, Rossana Ghessa, Scilla Gabel, Sérgio Goldhirch, Stelio Candelli e Susana Spadaccini; aos colaboradores Ally Lamaj, M. Motta, Carlos Primati, Carlos Thomaz Albornoz, Chris Casey, Eric Maché (também por sua incomesurável ajuda em relação aos títulos em inglês), Guilherme de Almeida Prado, Heráclito Maia, Isabel Butcher, Jaime Eduardo Palhinha, José Carlos Monteiro, José Luiz Jiménez García, Kit J. Gavin, Tim Lucas, Tom Betts, Ulrich P. Bruckner e Vilma Oliveira; ao revisor Jorge Cotrin; aos funcionários da Biblioteca Bastos Tigre (ABI), da Biblioteca do Itamaraty, da Fundação Biblioteca Nacional e da Cinemateca do MAM, no , e das bibliotecas Jenny Klabin Segall (Museu Lasar Segall), Mário de Andrade e Paulo Emílio Salles Gomes (Cinemateca Brasileira), em São Paulo.

3 De Daniel Camargo: a A.C. Gomes de Mattos, Alfredo Bezerra Camargo, Angela Maria Gonçalves Camargo, Armindo Aloysio Wagner, Inês Machado Wagner, Maria Aparecida Machado Wagner, Sérgio Leemann e Victor Portella

De Fábio Vellozo: a Elaine Pinto, Fernanda Vellozo J. Monteiro, Júlio Sérgio J. Monteiro, Marcus Quintanilha.

De Rodrigo Pereira: a Fabrício Pereira, Hélio Pereira, Lolita da Silva Pereira, Mariana Mello de Moraes e Tatiana Nakae.

4 Introdução I

Meu pai foi quem pela primeira vez me contou a respeito de Anthony Steffen, o brasileiro que fizera sucesso nos westerns italianos dos anos 1960 e 1970. Anos depois, já adulto, trabalhando como repórter, eu imaginei que se o ex-caubói morasse em São Paulo poderia render uma entrevista curiosa. Em 2002 onversei com algumas pessoas, mandei e-mails, fiz telefonemas... Então, uma amiga jornalista encontrou o nome de batismo do sujeito, Antonio Luiz de Teffé, na lista telefônica do Rio de Janeiro. Ela ligou, verificou se era ele mesmo, anotou o número e me enviou. Em março de 2003, o amigo e pesquisador Carlos Thomaz Albornoz me disse ter ouvido dizer que Steffen havia morrido anos atrás. Expliquei-lhe que tal informação não procedia, pois o ex-galã estava morando no Rio. Empolgado com a descoberta, Thomaz me apresentou a dois velhos conhecidos dele: o engenheiro químico Fábio Vellozo e o cineasta

5 Daniel Camargo, ambos fãs de westerns spaghetti. Começamos a trocar e-mails e a traçar planos para um documentário a respeito do astro aposentado. Daniel e Fábio, que não se conheciam, moram em Niterói1, a cerca de uma hora de carro da luxuosa cobertura onde Teffé vivia, no Leblon. Apesar de eu nunca haver estado frente a frente com nosso personagem, meus dois parceiros me transmitiam, por e-mails e telefonemas, relatórios completos sobre cada encontro com ele. Entre as muitas conversas que ambos me descreveram com riqueza de detalhes, veio a explicação do porquê da recusa de Teffé em se deixar gravar: a vaidade não lhe facultava aparecer sem cabelo diante da câmera. A queda de pêlos era decorrência das sessões de quimioterapia às quais vinha se submetendo na luta contra o câncer. A notícia da morte dele foi como tiros de Winchester em nós três. Restaram as não poucas histórias reais, ora

1 Apenas os 13,29 quilômetros da Ponte Rio-Niterói, que cruza a Baía de Guanabara, separam Niterói do Rio de Janeiro.

6 divertidas, ora trágicas, sempre reveladoras, que Daniel e Fábio haviam compilado nas idas àquele apartamento. Certo dia, vi à venda a biografia de um ex-ator. E pensei: “Por que não”?.

Rodrigo Pereira

7 Introdução II

Houve um tempo em que os westerns italianos passavam na tevê brasileira. Foi assim que conheci o subgênero, ainda garoto, no início da década de 1980. As cópias exibidas eram feias e desbotadas, além de pessimamente dubladas em português, mas nada disso importava: não perdia nenhum bangue-bangue à italiana. Com o advento do videocassete, comecei a garimpar, religiosamente, fitas VHS pelas locadoras do meu bairro, em Niterói. Não tardou para que Anthony Steffen aparecesse, sob a forma de uma empoeirada caixa do filme Train for Durango. “Um brasileiro fazendo papel de caubói na Itália?”, indaguei-me quando me revelaram, tempos depois, a nacionalidade e o verdadeiro nome do astro: Antonio de Teffé. Mais de uma década se passou e minha pergunta continuava sem resposta. Em 2001, li que o ator morava na zona sul do Rio de Janeiro. 8 Imediatamente busquei a lista telefônica. Encontrei um Antonio Luiz de Teffé, mas faltou coragem para ligar. “Deve ser um parente”, pensei. Só obtive a confirmação de que o homem do Rio era o mesmo do Velho Oeste em 2003, graças a meus parceiros Daniel Camargo e Rodrigo Pereira. Os integrantes do grupo, apresentados uns aos outros e reunidos pelo jornalista gaúcho Carlos Thomaz Albornoz, tinham um plano ambicioso: fazer um documentário sobre o caubói do Leblon. Fiquei encarregado do contato inicial, pois conhecia bem a obra de Steffen. Achei que seria fácil. Ledo engano. O mais experiente operador de telemarketing tremeria ao ouvir a voz alta e pouco amistosa que atendeu ao telefone. Quase desisti. Nos dois meses seguintes, liguei semanalmente e mandei cartas. Numa sexta-feira à noite, Antonio me telefonou pela primeira vez. Conversamos por mais de uma hora. Quando insisti sobre a viabilidade do documentário, Antonio revelou, com a calma costumeira, que há meses lutava contra

9 um câncer. Pedi desculpas e pensei em desligar. Sua reação, no entanto, foi nos convidar para uma visita. Durante aproximadamente um ano, eu e Daniel desfrutamos a hospitalidade e a amizade do barão Antonio de Teffé. Nos almoços de sábado, as lasanhas e musses de chocolate − preparadas por sua mulher, Cristina, sob a supervisão do companheiro, um chef de mão cheia − eram saboreadas ao som das histórias do nobre que sobreviveu a uma Guerra Mundial e que militou por mais de trinta anos nas trincheiras do cinema popular italiano. O aristocrático Antonio, tal como o príncipe de Salina, o Leopardo da obra de Lampedusa, era um dos últimos de sua raça − representante de um cinema esquecido por muitos, mas que deixou marcas em todos aqueles que, como eu, cresceram ao som estridente dos Colts. Fábio Vellozo

10 Introdução III

O dia estava bonito demais para um enterro. No caixão, o corpo de Anthony Steffen parecia bem menor que o caubói que víamos nos filmes. Sua expressão estava serena, como se fosse sorrir a qualquer instante. Lembrei-me de nosso primeiro encontro, quando Antonio Luiz de Teffé (seu verdadeiro nome) nos confessou ter suspeitado, a princípio, que eu e Fábio Vellozo fôssemos ladrões maquiavélicos a ponto de descobrir tudo sobre a carreira dele, lhe conquistar a confiança e depois roubá-lo − o tipo de idéia que só poderia mesmo vir da cabeça de um roteirista especializado em cinema de gênero. Impressionado com nossos conhecimentos, Antonio resolvera correr o risco e nos convidou a seu apartamento. Percebeu então que, além de não sermos assaltantes, tampouco éramos os “coroas” que ele esperava. Mais: com menos de 30 anos, tínhamos 11 aproximadamente a idade dos dois filhos dele, que vivem em Roma. Aquela tarde foi a primeira de várias. Infelizmente, o mesmo mal que vitimara o caubói norte-americano por excelência, John Wayne, estava no rastro do ítalo-brasileiro. E o câncer, uma vez mais, saiu-se vitorioso. Após o fechamento do caixão, os carregadores levaram-no para fora do velório do Cemitério São João Batista. Quando passaram por mim rumo à sepultura, o peso pareceu triplicar. Precisei ajudá-los de improviso, segurando justamente na cabeceira. Se não fosse ele o morto, o cético Antonio teria considerado esse acontecimento mero acaso. Para mim, ficou a impressão de que ele me quis ao seu lado até o último momento. Achamos que escrever a biografia de Steffen seria fácil, após termos passado horas com ele e assistido a muitos de seus filmes. Depois de colocar tudo que apuramos no papel, percebemos que havia várias lacunas. Começou então a parte mais trabalhosa da trama. Como detetives de um , eu, Fábio e

12 Rodrigo localizamos filmes, livros, artigos, entrevistas, atores, atrizes e diretores em sete países além do Brasil. Demoradas ligações para Roma, Madri e Los Angeles tornaram-se usuais em nossas contas telefônicas. Nunca imaginei que pudéssemos aprender italiano e espanhol tão rapidamente. Uma vez montado o quebra-cabeça, tínhamos em mãos a história do cinema popular italiano pós-Segunda Guerra pelos olhos de um de seus mais prolíficos protagonistas. Uma vida tão fantástica quanto ele próprio.

Daniel Camargo

13 Blood Ties (a.k.a. The Adventurer Baron)

O primeiro Teffé a pisar no Brasil não era um Teffé. Chamava-se Frederico Guilherme von Hoonholtz. Prussiano de ascendência aristocrática, havia estudado engenharia na prestigiosa Universidade de Leipzig. Como militar, participou com bravura das batalhas que puseram fim ao domínio do imperador francês Napoleão Bonaparte sobre a Europa: a de Leipzig (1813) e a de Waterloo (1815). A Prússia recuperou províncias que estavam sob o jugo napoleônico. Von Hoonholtz perdeu o pai, os bens da família e as perspectivas de futuro em sua terra natal. Dez anos depois, cruzou o Atlântico a fim de servir como mercenário − atividade à margem da lei que cineastas europeus converteriam em elemento-

14 chave do spaghetti, seja na figura do pistoleiro de aluguel, seja na do caçador de recompensas. Foi a Guerra da Cisplatina (1825-1828) que o trouxe ao Brasil. A Banda Oriental do Uruguai, ou Província Cisplatina, havia sido anexada ao Brasil em 1821. O controle do território, localizado na entrada do estuário do Rio da Prata, tinha importância para a navegação e o comércio na região. O Brasil, que era então uma colônia de Portugal, declarou sua independência no ano seguinte, 1822. Três anos depois foi a vez da Cisplatina se libertar do Brasil, com o apoio das Províncias Unidas do Rio da Prata − atual Argentina. A peso de ouro, o imperador brasileiro dom Pedro I recrutou tropas germânicas. Em vão. Soldados brasileiros e mercenários prussianos sofreram sucessivas derrotas perante os exércitos uruguaio e argentino. A 27 de agosto de 1828, o Brasil reconheceu a independência do Uruguai. Von Hoonholtz jamais retornou à Prússia. Ficou no Brasil, onde desposou Joana Cristina van

15 Engel e fixou residência na Vila de São Francisco Xavier de Itaguaí, no Rio de Janeiro. Morreu em 1837, aos 42 anos, oito meses após o nascimento de seu quinto filho, Antonio Luiz. Este herdou do pai a sede de conhecimento e o espírito aventureiro. Aos 21 anos já era professor de hidrografia e segundo-tenente da Marinha. Seu nome passaria à história do Brasil por causa da atuação na Guerra do Paraguai (1864- 1870). Comandante da canhoneira Araguari, foi responsável pela captura de um oficial superior e de quatro embarcações adversárias na Batalha Naval do Riachuelo (11 de junho de 1865). Sempre à frente de seus homens, ficou exposto ao fogo cruzado 22 vezes durante a guerra. O heroísmo lhe garantiu diversas condecorações, entre as quais a importantíssima Ordem Imperial do Cruzeiro. Em meio a idas e vindas ao Paraguai, se casou no Rio de Janeiro com a descendente de ingleses Maria Luisa Dodsworth. Em 1871, embarcou numa nova empreitada a serviço do Brasil: demarcar os limites da fronteira com o Peru. Embrenhado por três anos pelas margens

16 do Rio Javari, na Foresta Amazônica, seu grupo enfrentou flechas envenenadas dos indígenas, doenças e tempestades. Cerca de 55 homens faleceram durante as duas fases da missão. Carlos, irmão mais velho do comandante, morreu vítima de beribéri. A despeito das perdas, von Hoonholtz regressou vitorioso. Graças a seus cálculos, o império brasileiro recuperou 400 mil quilômetros quadrados de terras férteis e ricas em minérios. A aldeia de Teffé, às margens do Rio Solimões, servira de base para a primeira etapa dessa epopéia amazônica. Em 11 de junho de 1873, no oitavo aniversário da Batalha do Riachuelo, o capitão- de-fragata Antonio Luiz von Hoonholtz recebeu o título de barão de Teffé. Além da canhoneira Araguari e do marco Brasil-Peru, uma terceira façanha figuraria em seu brasão de armas: a observação da passagem do planeta Vênus pelo Sol em 6 de dezembro de 1886. A Academia de Ciências de Paris convidara o imperador brasileiro dom Pedro II a participar da documentação do fenômeno, que ajudaria a definir a distância entre a

17 Terra e o Sol. Dom Pedro II ordenou três expedições com esse fim. Incumbido de organizar o observatório das Antilhas, o barão levou a esposa, o filho Álvaro, de 6 anos, e alguns homens para a Ilha de São Tomás. Nem sequer existia água potável no lugar, onde o pequeno grupo viveu por três meses. Nesse período, ventos fortes, temporais e três terremotos sacudiram a paisagem. Os registros obtidos por Teffé, de forma rudimentar, resultaram idênticos aos das comissões organizadas por astrônomos franceses. Diretor da Repartição Hidrográfica da Marinha Imperial desde 1876, o barão não teve seu prestígio abalado após a Proclamação da República (1889). O primeiro presidente do Brasil, Manuel Deodoro da Fonseca, nomeou-o ministro plenipotenciário no ano seguinte. Tal cargo designa diplomatas com plenos poderes para representar o país. Exerceu a função em Bruxelas, na Bélgica, e em Roma, na Itália. Exonerado do posto, viveu na cidade francesa de Nice até 1905.

18 Voltou ao Brasil e foi morar bem longe da maresia, conforme desejava, na cidade fluminense de Petrópolis. Lá, o herói que sobrevivera a esquadras inimigas, índios selvagens e terremotos morreria vítima de seu próprio cão. Ao ver o dono se levantar da cama, o enorme são-bernardo correu animadamente em sua direção e o derrubou. A queda o levou à morte em 8 de fevereiro de 1931, aos 94 anos. Seu título nobiliárquico é lembrado em nomes de ruas e estabelecimentos comerciais no Brasil, além de batizar o navio oceanográfico que a Marinha brasileira utilizava nas expedições à Antártida. O barão de Teffé teve quatro filhos: Oscar, Otávio, Álvaro e Nair. Nascida a 10 de junho de 1886 no Rio de Janeiro, a menina foi educada na França. Era ainda adolescente quando jornais do Rio de Janeiro e de Paris começaram a publicar suas caricaturas, assinadas sob o pseudônimo de Rian (anagrama de Nair). De volta ao Brasil, seguiu a carreira de caricaturista e, esporadicamente, atuou como atriz de teatro − atividade então considerada

19 depreciativa para uma moça de família. Casou-se em 1913 com o presidente , a quem fora apresentada por seu pai. Os saraus promovidos pela primeira-dama no Palácio do Catete, sede do governo, introduziram a música popular nos eventos da alta sociedade. Num deles, ela executou ao violão o maxixe Corta-jaca, de Chiquinha Gonzaga2, baseado na dança popular homônima. A quebra de protocolo causou escândalo. Na tribuna do Senado, o senador oposicionista Rui Barbosa discursou: “A mais baixa, a mais chula, a mais grosseira de todas as danças selvagens, a irmã gêmea do batuque, do cateretê e do samba. Mas nas recepções presidenciais o corta-jaca é executado com todas as honras de música de Wagner, e não se quer

2 A pianista, compositora e regente Francisca Edwiges Neves Gonzaga (a.k.a. Chiquinha Gonzaga, 1847-1935) foi um dos nomes mais importantes dos primórdios da música popular brasileira. Suas músicas enveredam por ritmos tipicamente nacionais (marchas de Carnaval e chorinhos) ou importados (polcas, valsas, tangos), numa época em que compositoras mulheres ligadas à música popular sofriam grande preconceito. Chiquinha Gonzaga tornou-se tambéma primeira mulher a reger uma orquestra no Brasil. 20 que a consciência deste país se revolte, que nossas faces se enrubesçam e que a mocidade se ria.” O irmão mais velho de Nair, Oscar de Teffé, também enveredou pela política, exercendo com brilho o posto de embaixador em vários países da Europa. Exímio esgrimista e um dos primeiros brasileiros a praticar jiu-jítsu, Oscar legou ao filho Manuel o amor por esportes. Manuel de Teffé se formou em Direito, mas trocou o diploma pelo automobilismo. Ele estreou nas pistas de corrida em 1927. Alto, calvo e dono de um sorriso cativante, o bon vivant se revezava entre o jet set europeu e as propriedades da família em Petrópolis, no Brasil. No começo da década de 1930, pressionado por seu pai, abandonou em Roma um filho recém- nascido e uma ex-namorada com quem não se casaria. Refugiado no Brasil, angariou o apoio do presidente Getúlio Vargas, amigo de seu pai, para inserir o país no calendário automobilístico mundial. Com o aval do presidente, ajudou o Automóvel Club a organizar o Grande Prêmio Cidade do Rio de Janeiro. A prova,

21 realizada em 8 de outubro de 1933, marcou a inauguração do Circuito da Gávea, que sediaria corridas pelos próximos 21 anos, e teve o próprio Manuel como vencedor. Ao volante de seu Alfa Romeo, ele completou as vinte voltas de 11,16 quilômetros do circuito, também conhecido pelo macabro apelido de Trampolim do Diabo, em três horas e dezenove minutos. Vitórias em diversos torneios contribuíram para torná-lo um ídolo nacional. A popularidade lhe rendeu uma participação no filme João Ninguém3 (Brasil, 1936), dirigido e estrelado pelo comediante Mesquitinha. Por vias tortas, o talento nas pistas levaria Manuel a seguir a carreira do pai. Tudo porque Getúlio Vargas apostou nele na edição de 1939 da prova batizada de Circuito da Gávea Nacional. Como sinal de gratidão pela vitória, o presidente nomeou-o diplomata. Um barão herói de guerra, uma primeira-dama à frente de seu tempo, um embaixador renomado, um

3 O título do filme é o correspondente em português a “John Doe”. 22 corredor dublê de diplomata (ou vice-versa)... Apesar de tantas figuras históricas na árvore genealógica dos Teffé, apenas o filho de Manuel se tornaria conhecido nos quatro cantos do planeta. Verdadeiro símbolo do cinema popular italiano, Antonio Luiz de Teffé atuou em mais de sessenta filmes. A exemplo da tia-avó Nair, construiu carreira sob pseudônimo. Fez dramas, comédias, aventuras, épicos históricos, suspenses, policiais, terror e, principalmente, westerns − 26 westerns, para ser exato − como Anthony Steffen.

23 2. Hope and Glory (a.k.a. In the Movies)

Manuel de Teffé conquistava, com igual habilidade, troféus dentro das pistas e corações femininos fora delas. Numa recepção no Clube Tevere Remo, em Roma, ele conheceu a deslumbrante e jovem italiana de origem nobre Wanda Barbini. Fruto do romance dos dois, Antonio Luiz de Teffé nasceu em 21 de julho de 1930. O parto realizado na embaixada brasileira em Roma, o luxuoso Palácio Dora Pamphilj, na Praça Navona, garantiu dupla nacionalidade ao bebê de brilhantes olhos azuis. O embaixador Oscar de Teffé não autorizou o casamento do filho, enviando-o ao Brasil logo após o nascimento de Antonio.

24 Wanda estava mais interessada em desfrutar romana do que em cuidar do garoto. A mãe dela, jogadora inveterada, tampouco dispunha de tempo para o neto. As duas lhe bateram não poucas vezes. No rosto, inclusive. O menino cresceu genioso e sem nutrir muito afeto pelo lado materno da família. Passou a infância sob os cuidados de duas babás, Livia e Caterina, que faria questão de sustentar por toda a vida. Quando Caterina morreu, em 1984, ele ficou inconsolável. “Foi minha verdadeira mãe”, diria. A mãe biológica de Antonio brilhava nas festas de uma Itália confiante na ditadura fascista de il duce Benito Mussolini. Wanda freqüentemente era vista em companhia da formosa atriz e condessa tcheca Dana Edita Fischerova. Nem mesmo o interesse de ambas pelo aviador fascista italiano Ettore Muti, herói da Guerra da Etiópia (1935), abalou a amizade. Após a invasão da Polônia por tropas alemãs, as intrigas amorosas de Wanda, de Dana e do resto da humanidade perderam relevância. Naquele 1º

25 de setembro de 1939, começava a Segunda Guerra Mundial. Certo do triunfo nazista, Mussolini se aliou ao chanceler Adolf Hitler. Operações militares malsucedidas na Grécia, no Egito e no Mar Mediterrâneo deixaram a Itália cada vez mais dependente da Alemanha. A população enfrentou escassez de comida, crescimento do mercado negro, inflação desenfreada e, de quebra, um inverno rigoroso. Wanda não teve escolha senão trocar as jóias da família Barbini por alimentos. As forças aliadas bombardearam Roma em 19 de julho de 1943. Antonio, que havia sido mordido por seu cão, esperava para tomar vacina no posto de saúde. De repente, um barulho ensurdecedor. Do lado de fora, trilhos de bonde retorcidos e arredores devastados. No dia 25, o rei da Itália, Victor Emmanuel, depôs e mandou prender Mussolini. O novo primeiro-ministro, Pietro Badoglio, assinou um armistício em 8 de setembro. Em resposta, os alemães

26 ocuparam a península ao norte de Nápoles, libertaram Mussolini e tentaram restabelecer o regime fascista. Nos dois anos seguintes, a nação se viu reduzida a um campo de batalhas entre aliados e nazistas. Em 1944, aos 14 anos, Antonio fugiu de casa para se unir à resistência italiana. Furtou uma metralhadora alemã e chegou a matar durante o conflito. Il duce e membros do alto escalão fascista foram executados por integrantes da resistência em 28 de abril de 1945. Dois dias depois, acuado, Hitler cometeria suicídio em Berlim. A Alemanha depôs armas após uma semana. Em 1946, eleições gerais na Itália determinaram o fim da monarquia e a adoção do regime republicano. Para Antonio, restaram as cicatrizes, principalmente atrás do pescoço, causadas por estilhaços de bombas e granadas. Por toda a vida, sentiria dores na nuca sempre que o clima mudava. Enquanto o filho acumulava traumas, Manuel de Teffé cumpria missão diplomática na base aérea norte- americana instalada na cidade de Parnamirim, no

27 estado do Rio Grande do Norte, no Brasil. Os dois não tiveram contato durante o conflito. A Itália em ruínas serviria de berço para uma revolução cinematográfica, posteriormente batizada de neo-realismo italiano. A tendência começou a se consolidar a partir do drama criminal Ossessione (Itália, 1943), de Luchino Visconti, e alcançou êxito mundial com Open City (Itália, 1945), de Roberto Rossellini. Seguiram-se obras como (Itália, 1948), de Vittorio De Sica; Variety Lights (Itália, 1950), de Federico Fellini e Alberto Lattuada; e Behind Closed Shutters (Itália, 1951), de Luigi Comencini. Críticas quanto aos problemas político- sociais e inovadoras em termos de linguagem, tais fitas influenciariam cinematografias emergentes ao redor do mundo − a brasileira, inclusive. Ironicamente, esse movimento de esquerda devia sua infra-estrutura ao fascismo. A ditadura de Mussolini havia reorganizado a caótica indústria audiovisual do país, além de estatizar o complexo de estúdios Cinecittà e o núcleo de documentários

28 Instituto Luce. O regime também foi responsável pela fundação do Centro Experimental de Cinematografia. Por essa escola de formação técnica passaram alguns dos futuros diretores do neo-realismo, que se converteriam em símbolos do cinema de arte europeu. De Sica e Rossellini não cursaram o Centro Experimental, mas antes de realizar seus clássicos neo-realistas se exercitaram na direção sob os auspícios do fascismo. Vittorio De Sica era o cineasta predileto de Antonio. O drama dos meninos engraxates o levava às lágrimas a cada revisão de Shoe-Shine (Itália, 1946). Graças à mãe, que lhe conseguiu um bico como assistente-quebra-galho, o rapaz acompanhou as filmagens de Bicycle Thieves, talvez o maior clássico dirigido por seu ídolo. A equipe incluía também, nas funções de assistente de direção e figurante, o futuro artífice do western spaghetti, . Tanto para Sergio quanto Antonio, os dias de glória ainda se encontravam distantes. Quando

29 não estava na academia de boxe, o ítalo-brasileiro se dedicava ao teatro. Bom boxeador, disputara alguns títulos e tivera uma imperfeição no nariz corrigida pelos socos de um oponente. Depois de excursionar com uma companhia especializada em peças do irlandês George Bernard Shaw, abandonou o pugilismo a fim de preservar a beleza do rosto. Em casa, ele e a mãe viviam às turras. O relacionamento entre Wanda e o proprietário de padarias Marcello Tonini só piorou a situação. Disposto a ir embora e, ao mesmo tempo, fugir do serviço militar, o rapaz viajou em 1951 para uma longa temporada com o pai no Rio de Janeiro. De volta a Roma, retomou o ofício de assistente em produções como Ci Troviamo in Galleria (Itália, 1953), de Mauro Bolognini, estrelada por e , o filme em episódios 100 Years of Love (Itália, 1954), de Lionello De Felice, e Abandoned (Itália, 1955). Francesco Maselli, diretor desse último, recorda: “A mãe dele ia

30 visitá-lo no set e gritava para todo mundo ouvir: ‘Assista direitinho, Antonio’. Ele morria de vergonha.” Vergonha maior sentiria ao ser incumbido de um personagem nesse drama de tom neo-realista, em razão da desistência do intérprete original. “Além de boa aparência, ele tinha registro de ator”, justifica Maselli. Dessa imprevista maneira, Antonio de Teffé estreou diante das câmeras. O papel de um jovem que se envolve com the partisan resistance in , vale lembrar, tinha muito em comum com sua própria vida. A trama enfoca uma rica família numa luxuosa vila da Lombardia, norte do país, durante a ocupação alemã, no verão de 1943: a condessa Luisa (a veterana atriz italiana Isa Miranda), seu filho Andrea (o ator francês e futuro diretor Jean-Pierre Mocky), o sobrinho Carlo (Teffé) e o amigo Ferruccio (o italiano Leonardo Botta). Andrea se apaixona pela camponesa refugiada Lucia, interpretada pela miss Itália 1947, Lucia Bosé – no mesmo concurso, ficou em segundo lugar, em terceiro e Eleonora Rossi Drago em

31 quarto; outra futura grande diva do cinema italiano, , não conseguiu chegar à final. Na ausência da condessa, Andrea acolhe um grupo de partisans após o armistício de 8 de setembro. Delatados por Ferruccio, os rebeldes resolvem fugir para as montanhas, mas a condessa retorna a tempo de demover o filho de acompanhá-los. Entre a família e a mulher que ama, Andrea fica com a primeira opção. Carlo e Lucia seguem com os membros da resistência. A caminho da fronteira, o caminhão é interceptado, mas consegue escapar. Na fuga, Carlo e Lucia são mortos. Poucos dias depois, a Itália declara geurra à Alemanha. Abandoned está repleto das influências de esquerda que andavam muito em voga entre a classe artística italiana à época e que seriam recorrentes nos trabalhos seguintes de Maselli. A condessa Luisa e Andrea, donos de fábricas em Milão, simbolizam claramente o poder opressor dos mais ricos. Mais do que o fato de Andrea e Carlo estarem abrigando partisans, o que realmente incomoda Ferrucio (e o

32 leva a delatar seus amigos) é a mistura destes com camponeses. O personagem de Teffé, Carlo é apresentado como uma pessoa séria e reservada, filho de um líder do partido fascista. Ao contrário de Andrea e Ferruccio, ele não passa por grandes transformações ao longo da narrativa. Seu grande momento é ao final, quando a baronesa também tenta dissuadi-lo de partir com Lucia e os soldados. Ela diz que seu pai jamais aprovaria aquela atitude. O jovem responde com um seco "good!", renegando sua criação e o fascismo. Seja pelo papel pouco desenvolvido, seja pela contenção, a atuação de Teffé não se equipara às de Jean-Pierre Mocky, Isa Miranda e Lucia Bosé. Além dele, o elenco incluía, num papel bem menor, outro futuro astro dos westerns spaghetti: Mario Girotti (a.k.a. Terence Hill), equivocadamente creditado nos letreiros como Marco Girotti. Uma cooperativa formada por membros da equipe e amigos financiou esse primeiro longa do curta-metragista Francesco Maselli, ex-assistente de

33 Luchino Visconti e Michelangelo Antonioni. As filmagens começaram na clandestinidade, pois o governo democrata-cristão proibia referências ao período nazi-fascista. O salário da estrela Lucia Bosé chegou a ser usado para comprar latas de negativo. “Costuramos os uniformes nós mesmos e fizemos as armas com pedaços de pau”, conta Maselli. Aplaudido pela crítica, Abandoned ganhou menção honrosa para diretor estreante no Festival de Veneza em 1955. Cada integrante da produção tinha direito a uma parcela dos lucros. Com a parte que lhe coube, Teffé comprou um Alfa Romeo novo em folha. O ítalo-brasileiro voltaria ao cartaz na comédia dramática Eighteen Year Olds (Itália, 1955), de Mario Mattòli. Produzida por e , é a refilmagem de um antigo sucesso do mesmo diretor. Na pele do professor de física Andrea La Rovere, Teffé contracena com as estrelas em ascensão Marisa Allasio e . Ele logo se engajaria no drama histórico Castle of the Banned Lovers (France/Italy, 1956), de

34 Riccardo Freda. A história real de Beatrice Cenci, ocorrida na Roma do século 16, originou poemas, peças e filmes. Tratada de forma desumana por seu pai, ela contou com a ajuda do amante, dos irmãos e da madrasta para assassinar o algoz. Confissões arrancadas sob tortura e um julgamento sensacionalista condenaram o filho mais novo à prisão perpétua e os demais cúmplices à morte. Na romanceada versão de Freda, a linda Beatrice (Mireille Granelli) é apenas uma vítima das tramóias da madrasta Lucrezia (Micheline Presle). O veterano está perfeito como o autoritário patriarca Francesco. Teffé faz o antipático e submisso Giacomo, irmão de Beatrice e amante de Lucrezia. Nascido no Egito e criado na Itália, Freda costumava comandar sets aos berros, às vezes ao lado de seu cão mastim napolitano. Dono de um apurado senso visual, esse ex-escultor e crítico de arte experimentou a maioria dos gêneros cinematográficos. Ele inclusive dirigiu sua então amante Gianna Maria

35 Canale em dois filmes no Rio de Janeiro: a chanchada4 O Caçula do Barulho5 (Brasil, 1949) e a co-produção O Guarani6 (Brasil/Itália, 1950), baseada na vida do brasileiro Antonio Carlos Gomes, compositor da ópera Il Guarani. Em O Caçula do Barulho, Gianna Maria fazia par com o brasileiro Anselmo Duarte7. O ex-galão declara no depoimento que deu origem à biografia O Homem da Palma de Ouro8 (2004): “Caçula do Barulho foi importante na minha evolução porque foi o filme que me ensinou a fazer cenas de pancadaria

4 Chanchada era um tipo de comédia musical muito popular no Brasil dos anos 1940 e 1950, com trilhas sonoras recheadas de sambas de sucesso no Carnaval – festa- símbolo daquele país. 5 Título que em inglês significa ______.

6 O título não tem tradução para o inglês. Guarani designa uma etnia indígena que, antes da colonização européia, dominava os territórios que hoje constituem o Brasil e também a Bolívia, o Paraguai, a Argentina e o Uruguai. 7 Anselmo Duarte (1920-2009) foi o mais famoso galã do cinema brasileiro dos anos 1940 e 1950, atuando principalmente em chanchadas. Consagrou-se como diretor com o drama The Given World (Brasil, 1962), primeiro e, pelo menos até 2010, único filme brasileiro a conquistar a Palma de Ouro em Cannes. No total, dirigiu oito longas, o último deles em 1979. 8 Em inglês, “______”. 36 bem-feitas. Elas eram sempre muito fracas nas comédias carnavalescas da Atlântida. E aí o Severiano9 trouxe da Itália o Riccardo Freda, que depois voltou à Europa e dirigiu filmes de aventuras que agradavam particularmente aos críticos franceses dos Cahiers Du Cinéma. O Freda trouxe know-how para a gente”. Na verdade, Freda já desfrutava de prestígio por seus filmes (e não apenas os de aventura) desde antes de sua passagem pelo Brasil. Mais do que isso: ao volante de um Rolls-Royce, sempre em companhia de mulheres formosas, era presença certa nos eventos concorridos de Roma. Levava o estilo de vida com o qual Teffé vivia a sonhar. Por ora, o galã se contentava em interpretar o rico Giorgio, interesse romântico da pobre Maria Molinaro (Alessandra Panaro) no well-crafted melodrama The Foundling of Pompeii (Itália, 1957), do especialista em filmes populares e pintor Giacomo

9 Duarte refere-se a Luiz Severiano Ribeiro Jr. (1912-1991), dono de salas de cinema no Rio de Janeiro, importante distribuidor de filmes e principal acionista do estúdio Atlântida. 37 Gentilomo. Na equipe técnica, o posto de operador de câmera coube a Stelvio Massi, que se firmaria como diretor de competentes thrillers policiais nos anos 1970. Injustamente acusada do assassinato de Edvige (Ilse Peterson), Maria enfrenta no tribunal o procurador Guillermo Curti (encarnado por um ótimo ). Este ignora que a ré é sua filha, abandonada ainda bebê nas ruas de Nápoles a mando da mãe dele, a baronesa Curti (Tina Lattanzi). Após muitas lágrimas e reviravoltas, o verdadeiro criminoso (Carlo Giustini) acaba desmascarado e, ao som da melosa trilha sonora de Franco Langella, os jovens Giorgio e Maria ficam juntos. O elenco trazia ainda, num papel menor, a bela ex-bailarina italiana Franca Bettoja (amiga e posteriormente namorada de Teffé). Na pele de Giorgio, o ítalo-brasileiro retoma a imagem, já exibida em Eighteen Year Olds, de namorado e genro dos sonhos. Ele consegue driblar as armadilhas do papel e,

38 com uma atuação contida, dá vida a um personagem que demandava apenas um rosto bonito. Teffé protagonizaria a seguir City at Night (Itália, 1958), estréia na direção de Leopoldo . Conhecido por peças e filmes como I Vitelloni (France/Italy, 1953), de Fellini, o ator escreveu e dirigiu esse drama existencialista sobre jovens integrantes de uma trupe teatral. Nino Rota, parceiro habitual de Fellini, assina a trilha sonora, ao passo que o futuro diretor de obras-primas do terror Mario Bava responde pela fotografia. Rodada em 1956, a fita só chegaria às telas dois anos depois. Colecionou elogios no Festival de Veneza de 1958, mas fracassou nas bilheterias. Pelo resto da carreira, Teffé buscaria evitar projetos de pretensões intelectuais. Seus quatro trabalhos seguintes evidenciam tal opção: a aventura mitológica Aphrodite, Goddess of Love (Itália, 1958), o musical The Jukebox Kids (Itália, 1959) e os swashbucklers Devil's Cavaliers (Itália, 1959) e Savage Cavalcade (Itália, 1960).

39 O primeiro se passa na cidade de Corinto, em 67 a.C., onde o escultor Demetrio (Teffé) recebe a incumbência de construir uma estátua da deusa Afrodite. O ator monta a cavalo em algumas cenas, atividade que se tornaria comum no decorrer de sua trajetória artística. A direção ficou a cargo de Mario Bonnard, o “Rodolfo Valentino italiano” da fase do cinema mudo, que assumira a cadeira de diretor a partir de 1917. Seu Peddler and the Lady (Itália, 1943) é considerado um dos precursores do neo-realismo. Na década seguinte, ele virou sinônimo de competência à frente de épicos e melodramas. O discípulo Sergio Leone, seu assistente numa série de produções, comparece nos créditos de Aphrodite, Goddess of Love como roteirista e diretor-assistente. “Ele não dirigiu quase nada, só uma cena e olhe lá”, assegura Teffé. O ítalo-brasileiro ganhou o coadjuvante papel de Henry, irmão da heroína vivida por Emma Danielli, em Devil's Cavaliers. Sob direção de Siro Marcellini,

40 ele também contracena com o galã norte-americano dos anos 1940 Frank Latimore, o cantor Nunzio Gallo e a musa de Riccardo Freda, Gianna Maria Canale. Sem demora, Teffé trocou os trajes franceses do século 16 pelo rock’n roll do século 20. The Jukebox Kids, de , se inspirava na onda de películas sobre o ritmo do momento. Enquanto Rock Around the Clock (EUA, 1956) e Jailhouse Rock (EUA, 1957) traziam, respectivamente, Bill Halley e Elvis Presley, The Jukebox Kids apresentava como primeiro nome do elenco o ídolo pop italiano Tony Dallara. Com uma direção stylish de Fulci, the thin plot trata do conflito de gerações entre a bela Giuglia (a alemã Elke Sommer) e seu pai, o commendator Cesari (interpretado pelo comediante Mario Carotenuto). Dono de uma gravadora tradicional, ele se recusa a aceitar os novos ritmos que fazem sucesso entre a juventude. Curiosamente, a narração da história fica por conta da jukebox do clube La Fogna,

41 cujo dono, Paolo Macelloni (Teffé), é namorado de Giuglia. Tem-se assim uma boa desculpa para um showcase de rocks e baladas – além de Tony Dallara, cantam Betty Curtis, Fred Buscaglione e Adriano Celentano (a resposta italiana a Elvis Presley, que também misturava em suas performances a influência do humor histriônico do comediante Jerry Lewis, com quem apresentava grande semelhança). Algumas das canções, que se sucedem com pouca ou nenhuma importância dramática, criticam de maneira ácida a conservadora sociedade italiana do final dos anos 1950 e início dos 1960. Fulci mantém o ritmo ágil, alternando números musicais, sequências cômicas (a cargo de Carotenuto, Giacomo Furia e Benedetta Rutili) e situações românticas (entre Teffé e Sommer, estreando nas telas aos 19 anos). O próprio diretor faz uma cameo como um talent agent mais interessado nas mulheres que frequentam o La Fogna do que nos cantores.

42 Antonio de Teffé, que já havia demonstrado ser um eficiente ator dramático, apresenta um ótimo timming nessa sua primeira comédia. Ao contrário da maior parte do elenco, ele não executa nenhuma mirabolante coreografia de rock’n’roll. Mas dá provas de seu potencial para leading man ao dançar cheek to cheek e protagonizar empolgadas cenas de amor com a deslumbrante Elke Sommer. “O Antonio era educadíssimo e costumava ensaiar o texto comigo”, lembra a atriz alemã, hoje radicada em Los Angeles. O êxito de bilheteria de The Jukebox Kids ensejou outra fita na mesma linha, Juke Box Urli d'Amore (Itália, 1959), com Mario Carotenuto à frente da parte humorística e Adriano Celentano encabeçando o elenco de cantores. Fulci, por sua vez, dirigiu outras comédias antes dos sanguinolentos títulos de horror e suspense que lhe valeriam o rótulo de “mestre do macabro”. Quando Teffé havia já se consolidado como caubói, o cineasta o convidou a participar de um western spaghetti. O galã recusou, pois queria passar

43 mais tempo com a família. “Ele me xingou à beça e desligou o telefone na minha cara”, recorda. “Nunca mais nos falamos.” Teffé desempenhou um pequeno papel em Savage Cavalcade, de Piero Pierotti. Sua participação não passava de pretexto para ficar perto da agora namorada Franca Bettoja, que persuadira os produtores a contratá-lo. No roteiro escrito por Luciano Martino, Franca desempenha a nobre por quem se apaixona o herói Lorenzino (Massimo Girotti), uma versão italiana de Robin Hood. A review from the 28/29th February 1962 edition of Nuovo Spettatore Cinematografico, the most important Italian film criticism magazine from the late 50's to 1963, called Savage Cavalcade a “(…) 17th century adventure of brave knights, damsels in distress, some sword fighting and a happy ending. Customary10.”

10 Cavalcata Selvaggia. In: POPPI, Roberto, PECORI, Mario. Dizionario del Cinema Italiano – I Film Vol. 3, dal 1960 al 1969. 44 The Tank of September 8th (Itália, 1960), de Gianni Puccini, ostentava ambições maiores. Escrito a doze mãos, o roteiro teve colaboração dos cineastas Elio Petri, Giulio Questi e Pier Paolo Pasolini. Esse drama de guerra com toques cômicos gira em torno do cabo italiano Carlo Pollini (o suíço Jean-Marc Bory) e seu tanque, a partir do armistício de setembro de 1943. Também constam do elenco Gabrielle Ferzetti e beldades como , Elsa Martinelli e as francesas Catherine Spaak e Yvonne Furneaux. Uma crítica publicada na revista Tempo em outubro de 1960 afirmava sobre The Tank of September 8th: “Wanted to be a realistic fable about the misadventures of a tank driver on a journey through a country at the mercy of chaos, and hope denied by painful events. Pherhaps Puccini, when he conceived the film, had in mind some Calvino11 style partisans immersed in an atmosphere of magical enchantment, in which are not accepted details of a

11 Italo Calvino (1923-1985) was an Italian writer, partisan and intellectual perhaps the most important Italian novelist of the 20th century. 45 shocking reality. Ambitions, however, are not helped by the results (...) poetry and fable remain outside the door. We must, however, recognize Puccini's attemptive of chosing such a difficult way12”. Solitudine (Itália, 1960), dirigido por Renato Polselli, é um melodrama ambientado em Nápoles. O roteiro escrito por Antonio Margheritti e pelo próprio diretor, a partir de um argumento de Renato Parravicini, mostra o pescador Alberto (Rosario Borelli) sendo preso por um assassinato que seu meio- irmão, o egoísta Paolo (Teffé), cometeu. Alberto regains freedom and the love of his mother Rosa (Tecla Scarano) through the repentance of Paolo’s accomplice Dalila (actress and voice actress Franca Dominici) – o elenco conta ainda com a beleza das atrizes Annamaria Ubaldi e Tina Gloriani. Satisfeito com a atuação do ítalo-brasileiro, Polselli escalou-o para um outro papel vilanesco em Last Chance for

12 Il Carro Armato dell’8 Setembre. In: POPPI, Roberto, PECORI, Mario. Dizionario del Cinema Italiano – I Film Vol. 3, dal 1960 al 1969. 46 Life (Itália, 1962), o do sádico nazista lieutenant Krüger. Durante a Segunda Guerra, cinco italianas tornam-se prisioneiras dos invasores alemães. Entre elas está Mara Berri (Franca Bettoja), filha do líder partisan local. Sob o comando do capitão Schneider (Cláudio Gora), o tenente Krüger tenta arrancar informações das mulheres sobre as atividades da resistência na área. Quando Rossella, irmã mais nova de Mara, é morta por engano, as prisioneiras se rebelam e tomam como refém o filho do capitão Schneider, Hans (Fabrizio Capucci). O ultimato do título vem do tenente Krüger: se Mara não libertar Hans, os nazistas explodirão o cativeiro. Enquanto tem ótimos momentos como o capitão Schneider, dividido entre o amor ao filho e o dever de reprimir a rebelião das mulheres, Teffé rouba a cena no coadjuvante papel de Krüger – nascidos na Itália, ambos contracenam em alemão. A crueldade do tentente nazista não parece ter limites.

47 Ele até ameaça enforcar a caçula Rossella diante de Mara, indiferente ao desespero da irmã mais velha. Quando o questionam sobre a possibilidade de Hans ser morto por causa do ultimato, Krüger responde friamente: “Ele está a serviço do Führer.” A atuação de Teffé em nada lembra a imagem de wooden face actor pela qual ele ficaria estereotipado em função dos westerns. Quando essa fase de enorme sucesso junto ao público chegasse, Last Chance for Life seria relançado na Itália como Nelle Mani delle SS13. O novo material de divulgação suprimia o nome de Fabrizio Capucci – “Capucci was always so stupid and full of himself”, conforme declarou Poselli em entrevista a Jason J. Slater publicada na revista inglesa Diabolik (number 2, 1999) – para destacar a imagem do tenente Krüger e o pseudônimo que seu intérprete vinha usando desde 1963: Anthony Steffen. Antes da adoção do novo nome artístico, surgiu um promissor convite para um papel em

13 Em inglês, “Nas Mãos da S.S”. 48 Boccaccio ’70 (France/Italy, 1962). Nessa comédia, os mestres do cinema italiano Federico Fellini, Luchino Visconti, Vittorio De Sica e Mario Monicelli assinam episódios livremente inspirados nos contos medievais de Giovanni Boccaccio. Como Visconti desejava um intérprete de porte nobre em seu episódio, o nome de Antonio de Teffé foi cogitado. “O papel seria meu, desde que eu desse a bunda para ele”, desdenha o galã. Assim, Boccaccio ’70 ficou de fora da sua filmografia.

49 3. Clash of Titans (a.k.a. )

Sodoma, a cidade bíblica do pecado, 1900 a.C. Astaroth (o galês Stanley Baker), irmão da rainha sodomita, beija a hebréia Shuah (a libanesa Rossana Podestà). O sádico capitão do exército de Sodoma (Teffé) adentra o quarto e se surpreende diante do que vê. A jovem fica constrangida e, ao mesmo tempo, fascinada. Ao perceber, Astaroth indaga: − Você prefere o capitão? Ele é lindo, não é? Quer beijá-lo? Shuah não responde. O nobre a conduz até o oficial. − Ela não é adorável? Tome-a em seus braços. O capitão olha por alguns instantes, como se a despisse com os olhos. Em seguida, se dirige a Astaroth: − Pensei que anos de devoção à sua pessoa merecessem, ao menos, respeito! E sai, indignado. Antonio de Teffé interpretando um pederasta da Antigüidade? É o que

50 se verifica em The Last Days of Sodom and Gomorrah (France/Italy/EUA, 1962), do norte- americano Robert Aldrich. Ainda no período silencioso, a Itália havia realizado os épicos The Last Days of Pompeii (Itália, 1908), de Arturo Ambrosio e Luigi Maggi; Quo Vadis? (Itália, 1912), de Enrico Guazzoni; e Cabiria (Itália, 1914), de Giovanni Pastrone (a.k.a. Piero Fosco), entre outros. O fracasso de um remake de Quo Vadis? (EUA, 1925), produzido por Ambrosio e dirigido pelo italiano Gabriellino D'Annunzio e pelo alemão Georg Jacoby, instaurou o marasmo no cinema italiano. Este só recuperaria forças a partir de sua estatização pelo regime fascista. Em 1937, Mussolini inaugurava o complexo de estúdios Cinecittà. A realização de filmes triplicou e ressurgiram épicos, a exemplo de Scipio Africanus: The Defeat of Hannibal (Itália, 1937), de Carmine Gallone. O país atingiu o auge em 1942, com quase 120 títulos lançados. Tal cenário sofreria mudanças drásticas durante a Segunda Guerra. Estúdios foram

51 destruídos por bombardeios ou convertidos em quartéis pelas tropas aliadas. Após a queda de Mussolini, menos de 15% das películas exibidas na Itália eram italianas. O sucesso de Open City, Bicycle Thieves e demais exemplares do neo-realismo não chegou a entusiasmar os produtores. Haveria uma única investida no gênero histórico com Fabiola (Itália, 1949), de Alessandro Blasetti, que marcou a reinauguração de Cinecittà. Essa superprodução sobre uma nobre romana convertida ao cristianismo contou com catorze roteiristas e dezenas de assistentes, incluindo um jovem Antonio de Teffé. Entre as décadas de 1950 e 1960, a tradição italiana em fitas históricas assentaria feito luva aos interesses dos grandes estúdios hollywoodianos. Giulio Andreotti, subsecretário do primeiro-ministro Alcide De Gasperi, elaborara uma lei que obrigava as companhias estrangeiras a gastar dentro da Itália parte do dinheiro arrecadado nas bilheterias do país. A obrigatoriedade ensejou um ciclo de superproduções ambientadas na Palestina, na Grécia, no Império

52 Romano ou no Egito. Os diretores, as estrelas e, principalmente, o capital vinham de Hollywood. Cinecittà entrava com os estúdios locados a baixo custo, mais a mão-de-obra barata, porém experiente, dos técnicos e atores locais. O gigantismo e o colorido serviam de resposta à pequena tela preto-e-branca da tevê, que começava a ganhar força ao redor do mundo. O êxito da versão norte-americana de Quo Vadis (EUA, 1951), dirigida por Mervyn LeRoy, precedeu extravagâncias do porte de The Robe (EUA, 1953), de Henry Koster; Helen of Troy (EUA, 1956), de Robert Wise; Ben-Hur (EUA, 1959), de William Wyler; Esther and the King (EUA/Itália, 1960), de Raoul Walsh (creditado nas versões lançadas dentro e fora da Itália) e Mario Bava (creditado somente na versão italiana); e The Last Days of Sodom and Gomorrah (EUA/France/Italy, 1962), de Robert Aldrich. Ao contrário dos épicos anteriores, concebidos por executivos de Hollywood, esse último nascera como um projeto do napolitano Goffredo

53 Lombardo. Dono da Titanus, maior empresa cinematográfica do país, ele persuadiu o norte- americano Joseph E. Levine, que ganhara fortunas distribuindo aventuras italianas de Hércules na América, a co-produzir essa suntuosa adaptação do conto bíblico. O orçamento também contou com dinheiro francês, a cargo das companhias S.G.C. e S.N. Pathé Cinéma. O astro britânico Stewart Granger faz Lot, líder hebreu às voltas com as pecaminosas cidades do título. Pier Angeli vive Ildith, a escrava por quem ele se apaixona. Além de Stewart Granger, Pier Angeli, Stanley Baker, Rossana Podestà e Antonio de Teffé, o elenco multinacional inclui a francesa Anouk Aimée, a dançarina japonesa Mitsuko Takara e os italianos Rik Battaglia, Giacomo Rossi-Stuart, Gabriele Tinti, Daniele Vargas e Scilla Gabel. A direção da segunda unidade, responsável pelas seqüências de ação, coube a Sergio Leone. O velho conhecido de Teffé, àquela altura, já dirigira os épicos The Last Days of Pompeii

54 (Italy//Monaco/West , 1959), creditado ao mestre Mario Bonnard, que adoeceu durante as filmagens, e The Colossus of Rhodes (France/Italy/Spain, 1961). As cenas internas de The Last Days of Sodom and Gomorrah foram rodadas nos estúdios da Titanus, em Roma; as externas, nas locações em Ouarzazate, Marrakesh e the ksar (fortified city) of Aït Benhaddou14, no Marrocos. “Bob Aldrich, the director, rang me and said, ‘Ken, we'll have some fun. Come over to and find some locations. We shouldn't be more than six weeks.’ Well, we worked fo a year and a half on The Last Days of Sodom and Gomorrah!”, remembers awarded English art director Ken Adam on his autobiography Ken Adam Designs the Movies: James Bond and Beyond (2008). Certa feita, em um intervalo das filmagens, Teffé elogiou um marroquino que tomava conta dos cavalos. O sujeito retrucou:

14 Several films have been shot in Aït Benhaddou, including Lawrence of Arabia (England, 1962), The Man Who Would Be King (England/USA, 1975) and Gladiator (England/USA, 2000). It has been a Unesco World Heritage Site since 1987. 55 − Eles são meus, assim como tudo aqui, inclusive você. Sou o rei Hassan II. O ítalo-brasileiro não se conteve: − Ah, é? Então, eu sou Winston Churchill. A um gesto do homem, todos os presentes se curvaram. O soberano, famoso por receber equipes de cinema em seus domínios, entrou na brincadeira: − Muito prazer, senhor Churchill. Apesar da colaboração das autoridades locais, as duas semanas de filmagem no Marrocos transcorreram de forma caótica. Leone admirava o clássico faroeste Vera Cruz (EUA, 1954), de Aldrich, mas detestou a experiência de trabalhar ao lado do ídolo. Ambos tinham concepções distintas a respeito de como The Last Days of Sodom and Gomorrah deveria ser. Para complicar, as setenta pessoas da equipe e os milhares de extras trabalhavam sob condições extenuantes. Havia ainda a dificuldade de comunicação entre italianos, norte-americanos, franceses e marroquinos.

56 Em sua resenha na revista Filmcritica (nº 129, janeiro de 1963), o respeitável crítico e historiador do cinema italiano Adriano Aprà elogiou a direção de Robert Aldrich: “Films that we like the physical aspects, Aldrich's ability to film bodies, the way his actors move, the lucid coolness of his eye, the mobility of its editing. The film is all about the relationship between the camera and actors. (...) Aldrich confirmed its predilection for physical relationships between actors rather than their relationship with space and the set15”. A maior parte dos colegas de profissão de Aprà, contudo, não concordava com ele. “One critic said the most expressive actor was the pillar of salt”, says Ken Adam, on his autobiography, about the Old Testament venture that was his third collaboration with Aldrich. “The sets and costumes attracted better notices”, he concludes.

15 Sodoma e Gomorra. In: POPPI, Roberto, PECORI, Mario. Dizionario del Cinema Italiano – I Film Vol. 3, dal 1960 al 1969. 57 Lombardo tinha investido rios de dinheiro em The Last Days of Sodom and Gomorrah, mas nem mesmo a bilheteria16 de 1,15 bilhão de liras na Itália compensou seus custos elevadíssimos. O fracasso do épico bíblico, associado ao do drama histórico The Leopard (France/Italy, 1962), de Luchino Visconti, decretou o fim da Titanus. A falência da produtora levou os bancos da Itália a cancelar as até então generosas linhas de crédito para a atividade cinematográfica. Era o prenúncio da crise. Cleopatra (EUA/Inglaterra/Suíça, 1963), de Joseph L. Mankiewicz, seria a próxima produção milionária a naufragar. No ano seguinte, The Fall of the Roman Empire (EUA, 1964), de Anthony Mann, pôs fim ao império do megaprodutor russo radicado em Hollywood Samuel Bronston. Ele teve de encerrar as atividades de seu estúdio em Las Matas, perto de Madri, onde haviam sido rodados sucessos como El

16 Todas os dados relativos às bilheterias dos filmes na Itália apresentados neste livro baseiam-se em Dizionario del Cinema Italiano – I Film Vol. 3, dal 1960 al 1969 e Dizionario del Cinema Italiano – I Film Vol. 4, dal 1970 al 1979 A/L, ambos de Roberto Poppi e Mario Pecorari. 58 Cid (Italy/USA/UK, 1961), do mesmo Anthony Mann, e King of Kings (EUA, 1961), de Nicholas Ray. Com o cachê recebido por The Last Days of Sodom and Gomorrah, Teffé comprou dois apartamentos em Roma. Ele perderia a mãe pouco depois, vítima de um câncer que a fez sofrer durante anos. O filho ficou ao lado de Wanda Barbini até o fim. As diferenças entre os dois estavam resolvidas havia tempos. O ator, que morreria do mesmo mal, cuidou também do padrasto, Marcello Tonini, e chegou a ajudar financeiramente Roberto, filho de Tonini e Wanda. Embora tratasse o meio-irmão com reservas, guardava em seu apartamento no Rio de Janeiro uma foto dele quando criança. Se a moda dos filmes históricos arrefecera na Itália dos anos 1960, restavam ao galã os modestos subgêneros que mantinham Cinecittà na ativa. As comédias maliciosas, por exemplo. O diretor Renato Polselli (Solitudine e Last Chance for Life) lhe

59 confiou um papel numa delas, Avventura al Motel17 (Italy, 1963). Trata-se de uma comédia de episódios sobre casais que ocupam um mesmo quarto de motel, mas nunca conseguem realizar seus reais intentos. Coube a Bruno Corbucci e roteirizarem as historietas, criadas pelo próprio Poselli. Teffé atua no mais erotizado dos episódios que compõem o filme, com a escultural Gina Rovere mostrada através de uma cortina de chuveiro enquanto toma um banho. Os demais episódios traziam de chamariz extra para os espectadores masculinos a húngara Eva Bartok, a inglesa Margaret Lee e as italianas Dorian Gray e Claudia Mori. O elenco masculino contava com Gino Cervi (intérprete do pai do personagem de Teffé em Castle of the Banned Lovers), o popular duo de comediantes italianos Franco & Ciccio ( e ) e até o famoso centro- atacante do time de futebol Associazione Sportiva Roma, Francisco Lojacono.

17 Em inglês, “______”. 60 Como cada artista trabalhava por apenas um ou dois dias, o grande cast, que custaria uma fortuna em uma produção de longo prazo, saiu por uma ninharia. Assim, embora exibido quase que exclusivamente em cinemas do interior da Itália, Avventura al Motel tornou-se um sucesso de bilheteria. A fita seguinte de Teffé, o melodrama The Revenge of the Black Knight (Italy, 1963), dispôs do Palácio Dora Pamphilj como locação. O próprio ator cuidou de viabilizar o empréstimo da sede da embaixada brasileira, onde nascera, para esse capa e espada dirigido por Nick Nostro. Com ágil montagem do futuro diretor especializado em filmes de gênero Bruno Mattei, trata-se da terceira adaptação cinematográfica na Itália do romance La Cieca di Sorrento (1852), de Francesco Mastrian. O filme segue o livro quase à risca, mas adiciona ao enredo elementos de capa e espada – gênero em voga no cinema italiano da época. A produção ganharia um título típico dessa vertente ao

61 ser reestrear em 1966: La Vendetta del Cavalieri Nero – cuja tradução literal corresponde ao título com o qual foi lançado nos países de língua inglesa, The Revenge of the Black Knight. O neto do embaixador Oscar de Teffé desempenha o doutor George Welby, líder do grupo de mascarados que combate o vilão Amadeo (Alberto Farnese, a.k.a. Albert Farley). A blind girl do título original é a heroína Isabel (Diana Martin), que perde a visão ao testemunhar o assassinato do pai. O ítalo- brasileiro foi persuadido por um dos produtores a adotar um pseudônimo anglo-americanizado, a fim de aumentar o potencial mercadológico da fita. Daí em diante, por toda a sua carreira, Antonio de Teffé seria Anthony Steffen. A segunda aparição do novo nome artístico se dá nos créditos do peplum The Invincible Brothers Maciste (Italy, 1964), de Roberto Mauri. Peplum é a versão latinizada da palavra grega peplos, que designa uma espécie de saiote usado por homens na Antigüidade. O vocábulo batizou o subgênero

62 cinematográfico acerca de heróis mitológicos encarnados por fisiculturistas metidos nos tais pepla (plural de peplum). Esses épicos de baixo orçamento aproveitavam cenários e objetos de cena deixados na Itália pelas equipes norte-americanas. Nos Estados Unidos, receberam uma denominação igualmente sujeita a acessórios cênicos: sword and sandal films. A moda teve início com Hercules (Italy/Spain, 1958), de , no qual o ex-mister universo norte-americano Steve Reeves interpreta o semideus grego. Décima segunda maior bilheteria daquele ano, arrecadou acima de 900 milhões de liras nas salas de exibição italianas. O distribuidor norte-americano Joseph E. Levine (futuro produtor de The Last Days of Sodom and Gomorrah) adquiriu os direitos, providenciou uma dublagem tosca e faturou cerca de 4 milhões de dólares nos Estados Unidos. Logo, o diretor Francisci, o astro Reeves e o cinematographer Mario Bava repetiam a fórmula em Hercules Unchained (France/Italy/Spain, 1959), também comercializado

63 por Levine na terra do Tio Sam. Logo Cinecittà estava tomada por aventuras de Hércules, Sansão, Maciste, Ursus, Golias e afins. O subgênero geraria quase 200 obras até 1965. Quando Steffen vestiu saiote em The Invincible Brothers Maciste, o público não tinha mais tanto interesse em ver heróis musculosos arremessando pedras de isopor contra legiões inimigas. Edoardo Mulargia e o diretor Roberto Mauri, autores do roteiro, bem que tentaram inovar, mas a presença de dois macistes não evitou o fiasco. Na trama, Maciste número 1 (Richard Lloyd) e Maciste número 2 (Mario Novelli, a.k.a. Anthony Freeman) ajudam o príncipe Akim (Steffen) a resgatar sua amada Jhana (Pier Anna Quaglia, a.k.a. Ursula Davis) das garras da rainha dos homens-leopardo do mundo subterrâneo, Thaliade (Claudie Lange). Vários diretores de pepla se adaptariam à moda dos westerns spaghetti, inaugurada por Sergio Leone em 1964. Entre eles, Giorgio Ferroni, Mario Caiano, , Antonio Margheriti,

64 Ferdinando Baldi, e . Este, antes de se firmar como “o outro Sergio” dos bangue-bangues europeus, experimentou pepla, dramas e até comédias, a exemplo de I Figli del Leopardo18 (Italy, 1965). Trata-se de uma paródia de The Leopard encabeçada por Franco & Ciccio. O elenco inclui ainda Anthony Steffen, com quem a dupla já dividira os créditos (ainda que atuando em episódios diferentes) em Avventura al Motel. A caríssima adaptação de Visconti para a novela de Giuseppe Tomasi di Lampedusa havia ganho a Palma de Ouro em Cannes. Apesar do fracasso de bilheteria, ou por causa disso, se tornara um dos filmes mais comentados da época. Na versão cômica de Corbucci, Franco e Ciccio interpretam irmãos metidos em encrencas durante a reunificação italiana do século 19. Steffen faz uma pequena participação como um tenente das tropas revolucionárias de Garibaldi.

18 Em inglês, “______”. 65 “Directed with little effort, the film does not touch either parody or humor19”, definiu a revista Segnalazioni Cinematografiche (vol. 58, 1965). O falta de empolgação dos críticos não comprometeu os bons resultados na bilheteria – como de praxe, em se tratando das paródias estreladas pelos siciclianos Franco & Ciccio. Eles eram os príncipes da comédia italiana, enquanto o cetro de rei pertencia ao napolitano Antonio Griffo Focas Flavio Dicas Commeno Porfirogenito Gagliardi De Curtis Di Bisanzio (a.k.a. Totó). Fã do humorista, Steffen divide com ele os créditos de Latin Lovers (Italy, 1965), sob direção de Mario Costa. Jamais contracenaram, no entanto. O ítalo-brasileiro vive o psicólogo Riccardo Ferrari no segmento sobre a proprietária da agência de aconselhamento sentimental Telefono Consolatore, Beata (a comediante Gisella Sofio). Totó comparece

19 I Figli del Leopardo. In: POPPI, Roberto, PECORI, Mario. Dizionario del Cinema Italiano – I Film Vol. 3, dal 1960 al 1969. 66 em Amore e Morte20, outro dos cinco episódios da fita. O filme foi bem sucedido nas bilheterias e, segundo a resenha escrita pelo crítico Vice no jornal bolonhês Il Resto del Carlino (7 de junho de 1965), o crítico Vice escreveu a respeito dos episódios: “The only reasonable ones were those entrusted to Toto and Sofio21”. Após I Figli del Leopardo e antes de Latin Lovers, o ator estrearia no gênero que lhe trouxe fama e fortuna. Co-produção germânico-ítalo-espanhola lançada em 1965, The Last Tomahawk é o primeiro de seus 26 faroestes.

4. Tall in the Saddle (a.k.a. Death Rides a Horse)

20 Em inglês, Love and Death

21 Gli Amanti Latini. In: POPPI, Roberto, PECORI, Mario. Dizionario del Cinema Italiano – I Film Vol. 3, dal 1960 al 1969. 67 O fascínio do Velho Continente pelo western é um romance antigo. Desde o cinema mudo, caubóis como Tom Mix e William S. Hart faziam vibrar platéias da Europa. Três anos após The Great Train Robbery (EUA, 1903), de Edwin S. Porter, ter inaugurado o gênero, o ator francês Jean Hamman já o transpunha para seu país. Na América, ele atuara no circo de Buffalo Bill, o Wild West Show. De volta à França, rodou dezenas de curtas nos Alpes de Camargue entre 1906 e 1913. Produtores da Alemanha, Inglaterra, Espanha e Itália igualmente enveredaram pelos bangue-bangues silenciosos. Em 1955, já na fase do cinema falado, o diretor espanhol Joaquín Romero Marchent lançou dois faroestes de El Coyote. Eram adaptações das populares novelas de José Mallorquí a respeito de um justiceiro mascarado que agia no México − uma cópia do Zorro do escritor norte-americano Johnson McCulley, que Marchent também adaptaria no começo da década seguinte.

68 Outro herói europeu a migrar da literatura ao cinema foi o guerreiro apache Winnetou. Desde a publicação de sua primeira novela em 1893, esse personagem do escritor saxônio Karl May se convertera num fenômeno de vendas. O francês Pierre Brice e o norte-americano Lex Barker interpretam, respectivamente, Winnetou e seu companheiro de aventuras, o caçador branco Karl “Old Shatterhand”, na primeira versão cinematográfica, Treasure of Silver Lake (Alemanha/Iugoslávia, 1962). O sucesso levou Brice a estrelar mais dez fitas de Winnetou até 1968, todas filmadas na Iugoslávia. O ex-Tarzã Lex Barker viveu “Old Shatterhand” em sete delas, sendo substituído pelo canadense Rod Cameron (como “Old Firehand”) numa e pelo inglês Stewart Granger (“Old Surehand”) noutras três. Nove episódios foram realizados pelo produtor original, o alemão Horst Wendlandt, e dois por um concorrente, o também alemão Artur Brauner. A direção de cinco exemplares da série coube ao veterano Harald Reinl. Nascido na Áustria, esse ex-

69 advogado estreara no cinema como assistente da documentarista de confiança de Adolf Hitler, Leni Riefenstahl. Na Alemanha pós-Segunda Guerra, tornou-se um artesão especializado em gêneros populares. Embora tentasse convencer seus leitores de que era o próprio Karl “Old Shatterhand”, Karl May nunca pisara nos Estados Unidos. Seus conhecimentos acerca do Velho Oeste vinham das leituras feitas nas bibliotecas dos presídios onde cumprira pena em duas ocasiões. O romance The Last of the Mohicans (1826), do norte-americano James Fenimore Cooper, foi uma de suas principais inspirações. Enquanto permaneceu afastado da série Winnetou, o diretor Reinl recorreu à mesma fonte para imitar a imitação. Livremente adaptado da obra de Cooper, The Last Tomahawk (Italy/Spain/West Germany, 1965) contou com dinheiro alemão, espanhol e italiano. Além de Steffen e Stelio Candelli (a.k.a. Stanley Kent) no elenco, a parte italiana da produção contava com os roteiristas Giovanni

70 Simonelli e Roberto Bianchi Montero, cinematographer Giuseppe La Torre, composer e o futuro diretor Bruno Mattei na montagem. As verdejantes paisagens da Iugoslávia deram lugar ao deserto de Almería, na Espanha, como cenário de um fictício Velho Oeste. Os papéis do branco Hawkeye e do índio Uncas ficaram a cargo, respectivamente, de Steffen e do espanhol Daniel Martín. Este retomaria o personagem em Last of the Mohicans (Spain/Italy, 1965), de Mateo Diaz Caño (a.k.a. Mathew Kane). The Last Tomahawk alcançou relativo êxito na Alemanha e Espanha. Na Itália, porém, fracassou por completo. Uma revolução cinematográfica estava em curso e, diante dela, as imitações de faroeste praticadas por Harald Reinl não mais faziam sentido. Ironicamente, o contexto favorável para tal revolução se devia em grande parte a Treasure of Silver Lake, que o próprio Reinl havia dirigido.

71 Em decorrência do sucesso da série Winnetou, um novo surto de westerns eclodira em Cinecittà. Surgiram títulos como Gunfight at Red Sands (Spain/Italy, 1963), de Ricardo Blasco; Buffalo Bill, Hero of the Far West (France/Italy/West Germany, 1963), de Mario Costa (a.k.a. John W. Fordson); Massacre at Grand Canyon (Italy, 1964), de Sergio Corbucci (a.k.a. Stanley Corbett); e Gunmen of the Rio Grande (Spain/France/Italy, 1964), do argentino Armando Bartolomé Demichelli (a.k.a. Tulio Demicheli. Diretores, produtores e atores adotavam pseudônimos anglo-americanizados na tentativa de vender seus bangue-bangues como produções de Hollywood. A estratégia não surtiu o efeito desejado nas bilheterias. Uma exceção chegaria às telas em 1964. (Italy/Spain/West Germany), de Sergio Leone (a.k.a. Bob Robertson, pseudônimo que logo abandonaria), nasceu da parceria entre a empresa italiana Jolly e a alemã Constantin, mais a espanhola Ocean.

72 Simultaneamente, as duas primeiras produziam Bullets Don't Argue (Spain/Italy/West Germany), de Mario Caiano (a.k.a. Mike Perkins). Ambas as fitas foram rodadas no deserto de Almería e no vilarejo cenográfico de Golden City, em Hoyo de Manzanares, a 40 quilômetros de Madri. O cenário havia sido usado antes por diretores como Joaquín Romero Marchent, criador da série cinematográfica de El Coyote. Veterano de seriados e faroestes B hollywoodianos, o canadense Rod Cameron estrelou Bullets Don't Argue. Um desconhecido ator da série televisiva Rawhide (EUA, 1959-1966) veio dos Estados Unidos para protagonizar A Fistful of Dollars. era seu nome. Mesmo dispondo de um orçamento inferior ao de Caiano, Leone fez história. Com 3,182 bilhões de liras em ingressos vendidos, seu filme ficou em primeiro lugar entre as maiores bilheterias italianas de 1965 – 804 milhões de liras à frente do segundo colocado, a comédia Marriage

73 Italian-Style (France/Italy, 1964), de Vittorio De Sica, que arrecadou 2,378 bilhões. Bullets Don't Argue, um western nos moldes tradicionais, não alcançou repercussão e faturou apenas 169 milhões de liras (um bom montante, mas muito abaixo do filme de Leone). A Fistful of Dollars obteve êxito nos quatro cantos do mundo e modificou de forma irreversível o mais norte-americano dos gêneros cinematográficos. De quebra, pôs fim à crise que assombrava o cinema europeu. O rótulo western spaghetti, cunhado por críticos em tom depreciativo, acabou sendo acolhido para definir a novidade. Os procedimentos técnicos utilizados por Leone se tornaram regra. Closes exagerados de mãos e olhos se alternam com abrangentes panorâmicas das paisagens. Os zooms e cortes rápidos criam um clima de tensão. Enquadramentos tradicionais se misturam a ângulos distorcidos e inusitados. O tempo que antecede os duelos é dilatado ao máximo. A montagem segue o ritmo da música, ingrediente fundamental.

74 Ao criar a trilha de A Fistful of Dollars, o maestro estabeleceu os cânones musicais do subgênero. Compositores como Bruno Nicolai, Carlo Rustichelli, Gianni Ferrio, Angelo Francesco Lavagnino, Piero Piccioni e Francesco De Masi rapidamente adequaram seus talentos ao novo estilo. As partituras são fúnebres, tétricas e atonais, em sintonia com o que acontece na tela. A guitarra elétrica surge com freqüência, na companhia de ruídos animais (uivos, relinchos, cacarejos) ou mecânicos (revólveres engatilhados, sinos). Destaca-se ainda o uso melódico dos assobios e da voz humana. A violência gráfica e o bizarro senso de humor dão o tom da narrativa. Nela, os clichês do Velho Oeste hollywoodiano, puritano e liberal, caem por terra. Os cenários enlameados, o suor que escorre dos rostos e a aparência suja dos caubóis revelam a influência do neo-realismo italiano. A serviço de uma narrativa épica, o realismo aparece de maneira grotesca, quase expressionista.

75 O sucesso inspirou filmes no Japão, na Turquia, no Brasil e até nos Estados Unidos, país berço do western. The Wild Bunch (EUA, 1969), de Sam Peckinpah; Meu Nome É... Tonho22 (Brasil, 1969), de Ozualdo Candeias; O Tesouro de Zapata23 (Brasil, 1969), de Cícero Adolpho Vitório da Costa (a.k.a. Adolpho Chadler); Two Mules for Sister Sara (EUA, 1970), de Don Siegel; e Gringo, o Último

22 Inédito em países de língua inglesa, Meu Nome É... Tonho poderia ser traduzido como “My Name Is... Tony” (“Tonho” é o apelido usado no Brasil para “Antonio”, o correspondente a “Antony”). Trata-se de um dos maiores clássicos dos chamados “westerns feijoada”, ou seja, westerns produzidos no Brasil – o rótulo ironiza o conceito de westerns spaghetti, uma vez que “feijoada” é um dos mais representativos pratos da culinária brasileira. Ozualdo Candeias (1918-2007), o diretor, realizou a obra inaugural do movimento underground conhecido como cinema marginal (“______”), A Margem (1967) - ______, em inglês. Dirigiu oito longas, além de curtas e média-metragens. Meu Nome É... Tonho, seu segundo longa, é o único western em sua filmografia. 23 Em inglês, “The Treasure of Zapata”. Foi o primeiro western feijoada ambientado no fora do Brasil, mais especificamente no México – até então, títulos como Meu Nome É... Tonho seguiam a fórmula dos westerns, mas com a ação transcorrendo em áreas rurais brasileiras. Adolpho Chadler (1931-____), que havia trabalhado como figurante em seriados da NBC nos Estados Unidos, voltou ao Brasil em 1966, onde se dedicou à produção de filmes policiais, de terror e westerns. Além de O Tesouro de Zapata, dirigiu e protagonizou outros dois westerns feijoada: Vinte Passos para a Morte (1970) – em inglês, “______” – e Jerônimo, o Herói do Sertão (1972) – em inglês, “______”. 76 Matador24 (Brasil, 1972), de Mauri de Oliveira Queiroz (a.k.a. Tony Vieira), são apenas alguns exemplos. A lista de influenciados inclui ainda o maior êxito de público da carreira de Glauber Rocha25, o clássico Antonio das Mortes26 (Brasil/França/Alemanha, 1969).

24 Em ingles, “Gringo, the Last Killer”, also known as Gringo, o Matador Erótico (“Gringo, the Erotic Killer”). Esse filme estrelado pelo próprio diretor e por sua namorada, Claudette Jaubert, inaugurou a bem-sucedida onda de westerns feijoada com pitadas de erotismo (no caso, algumas cenas em que Claudette aparece com os seios à mostra). Especialista em filmes de ação, Tony Vieira (1938-1990) voltaria a misturar nudez e western com A Filha do Padre (1975) – em inglês, “The Priest’s Daughter” –, Os Violentadores (1978) – ______–, Condenada por um Desejo (1981) – ______–, e Calibre 12 (1987) – ______. A partir de 1983, passou à direção de filmes pornográficos. 25 Glauber Rocha (1939-1981) foi o principal articulador do movimento brasileiro chamado de cinema novo (new cinema), que obteve certa repercussão na Europa, misturando o discurso social do neo-realismo italiano com as inovações de linguagem da nouvelle vague francesa. Considerado um dos filmes inaugurais do cinema novo, seu Black God, White Devil (1964) concorreu ao Grande Prêmio do Festival de Cannes daquele ano – que acabou sendo vencido pelo musical The Umbrellas of Cherbourg (1964). 26 Interpretado por Maurício do Valle, Antonio das Mortes é o personagem-título, um matador de aluguel que já havia aparecido em um filme anterior do cineasta, o drama social Black God, White Devil. Por Antonio das Mortes, Rocha ganhou o prêmio de melhor diretor no Festival de Cannes de 1969 – derrotando, entre outros, Costa- Gravas, Sidney Lumet, Louis Malle e Dennis Hopper, que concorria por Easy Rider. 77 Em fins dos anos 1960, uma equipe européia filmaria no Nordeste brasileiro The Magnificent Bandit (Italy/Spain, 1969), cujo título original é O’Cangaceiro – grafia errada para forçar alguma semelhança com O Cangaceiro, de Lima Barreto, produção brasileira que, após ser premiada como melhor filme de aventuras no Festival de Cannes, correu o mundo sob o título The Bandit (Brasil, 1953). O diretor italiano Giovanni Fago, o ator cubano , o espanhol Eduardo Fajardo e demais envolvidos em The Magnificent Bandit eram figurinhas fáceis no western spaghetti. Caminho inverso percorreriam os brasileiros Celso Faria, Esmeralda Barros e Norma Bengell, que, radicados na Itália, atuaram em bangue-bangues por lá. Mas a maior contribuição do Brasil à vertente, de acordo com a imprensa brasileira, chamava-se Anthony Steffen. A maioria dos jornais e revistas ignorava ou não se dava ao trabalho de explicar que ele nascera e crescera em Roma. Era brasileiro e pronto. Em seu Pequeno Dicionário Crítico do

78 Cinema Brasileiro27 (1983), o crítico Roberto Bandeira reincide no erro ao escrever um verbete sobre Teffé, Antônio de: “Brasileiro que fez sucesso na Itália em faroestes, mudando o nome para Anthony Steffen. De volta ao Brasil, ainda espera oportunidades.” No ano da publicação do livro o ítalo- brasileiro não estava “de volta”, mas sim morando no Brasil pela primeira vez. Ademais, não era do seu feitio ficar de braços cruzados à espera de oportunidades. Quando os produtores começaram a procurar atores parecidos com Clint Eastwood, lá estava ele. Profissional com dez anos de carreira, lutava boxe, conhecia armas de fogo e sabia cavalgar. Arrumou um chapéu de couro, tirou fotos travestido de caubói e peregrinou pelos escritórios dos agentes romanos, imitando o protagonista de A Fistful of Dollars. “Era fácil, bastava ficar parado”, diria décadas depois.

27 Em inglês, “______”. 79 Steffen tinha 1,90 metro, porte atlético, rosto de galã, fisionomia austera, cabelo castanho-claro e olhos azuis. Deixando de lado a vaidade, recorria às técnicas de maquiagem aprendidas nos tempos de teatro para simular a face marcada pelo sol escaldante e a barba por fazer. Aos 35 anos, parecia uma década mais velho. A insistência lhe garantiu o papel principal em Why Go on Killing? (Italy/Spain, 1965). Ao contrário do anterior The Last Tomahawk, esse faroeste seguia à risca as novas convenções instituídas por Leone. Trata-se, portanto, do primeiro western spaghetti do ator (embora seja seu segundo western). No apartamento em Roma, ele aprimorou diante do espelho a velocidade no saque do revólver e o modo de disparar. Durante as filmagens, aprendeu a galopar de rédea solta, tombado sobre o cavalo e atirando. Steven McDougal (Steffen) abandona o Exército e volta à cidade natal disposto a vingar o assassinato de seu pai. O culpado é o traficante de armas Lopez (José ‘Pepe’ Calvo). Este contrata o bando de Gringo (Aldo Berti) para eliminar o recém-

80 chegado. O mercenário liquida o próprio patrão e seqüestra a irmã do herói, Judy (Ida Galli, a.k.a. Evelyn Stewart). Após uma perseguição no deserto, trava-se o duelo entre McDougal e Gringo. Vitorioso, o protagonista se entrega aos soldados que o perseguiam por deserção. Como a maioria dos bangue-bangues continentais do período, esse foi considerado pela crítica um arremedo de A Fistful of Dollars. Em sua primeira aparição, de barba por fazer e poncho, o protagonista lembra um pouco Eastwood. Contudo, a semelhança se limita ao visual. O Homem sem Nome da fita de Leone luta por dinheiro; o McDougal de Steffen, por vingança. “Nada fará com que eu mude de idéia, nem mesmo você”, assegura à irmã. “Por que seguir matando?”, ela indaga, ma frase que dá título à película. Embora algumas intervenções cômicas prejudiquem o clima sombrio da narrativa, a tragédia marca o desfecho. Steffen começa assim a estabelecer sua persona do vingador solitário e amargurado.

81 Segundo os letreiros, a direção coube ao espanhol José Antonio de la Loma. “Quem?”, pergunta o ex-astro, indignado. O verdadeiro diretor foi Edoardo Mulargia (a.k.a. Edward G. Muller), co- autor do argumento e do roteiro. Caso o cineasta responsável fosse nascido ou radicado na Espanha, as co-produções rodadas naquele país pagavam menos impostos. Desse modo, José Antonio de la Loma virou “diretor” de Why Go on Killing? sem jamais ter pisado no set. Em entrevista a Amilcare Di Mezza, publicada na revista italiana Nocturno Cinema (nº 62, setembro de 2007) o verdadeiro diretor explica a situação, muito comum na época (as perguntas aparecem identificadas como NC e as respostas de Edoardo Mulargia, como EM): “EM: (...) Why Go On Klling… which actually would be released as ‘an Edward G. Muller production, directed by Antonio De La Loma’, due to the co-production agreement. (…) “NC: Was it a Spanish imposition?”

82 “EM: Italian too, to share the possibility to get government funds. So, as Italian had the plot, the screenplay, the male leading man, the leading lady…” “NC: Evelyn Stewart…” “EM: Yes, beautiful lady… however, the director should be Spanish. Besides, it was my first film. We released it soon after For a Fistful of Dollars (...).” Na mesma entrevista, Mulargia conta o trabalho para fazer de Steffen um caubói: “(...) Antonio couldn’t ride, so I had to send him to learn to ride. Every day he attended the lessons. Then, he had to come to me and show his skills with the pistol. This training went on for two months before the movie. Well, he became so good, that at Fraga28, shooting a wild horse chase, he with a Winchester – with I and the camera operator on the camera-car, at 60 kilometers per

28 Spanish municipality in the province of Huesca in the autonomous community of Aragon. 83 hour29 in front of him – could shoot six rifle shots not holding the reins. Pretty close to the ravines! Antonio, there, with these two months of lessons, was spetacular”. Mulargia divide o roteiro com Vincenzo Musolino (a.k.a. Glenn Vincent Davis), que responde pela parte italiana da produção. Ator, roteirista, diretor e produtor, Musolino já tinha produzido um peplum co-roteirizado por Mulargia e com Steffen no elenco, The Invincible Brothers Maciste. Ele também seria responsável por lançar os brasileiros Celso Faria e Esmeralda Barros no cinema italiano. Em seguida, o caubói protagonizaria A Coffin for the Sheriff (Italy/Spain, 1965), de Mario Caiano. Na trama, a esposa do xerife Joe Logan (Steffen) morre durante um assalto. Dois anos depois, ele assume a identidade de Shenandoah e se infiltra no bando de Jerry Krueger (Arturo Dominici, a.k.a. Arthur Kent) e Lupe Rojo (Armando Calvo) para

29 O equivalente a 37.284 milhas por hora. 84 encontrar o responsável. A quadrilha descobre o disfarce quando o novato frustra um ataque ao rancho do velho Wilson (George Rigaud). Os bandidos torturam o homem da lei, porém este consegue escapar e liquida um a um. O último a morrer vem a ser o assassino que ele procurava, Murdock (Eduardo Fajardo). Finda a missão, Logan joga fora sua estrela de xerife e deixa a cidade. O gesto evoca o de Will Kane (Gary Cooper) no clássico High Noon (EUA, 1952), de Fred Zinnemann. Em meio a muitas seqüências de ação, uma cena trivial quase pôs fim à carreira de Steffen. Ao montar um cavalo andaluz, o animal desabou em cima dele. As dores na coluna o acompanhariam por toda a vida. Mesmo antes do acidente, ele tremia frente a cavalos. “São traiçoeiros”, costumava repetir. Vinda de alguém que ganhou fama como caubói, a frase surpreende. Ele se explica: “Os cavalos espanhóis pareciam monstros, bem maiores que os cavalos marroquinos com os quais eu havia lidado em The Last Days of Sodom and Gomorrah. Sentia medo, mas

85 não tinha escolha. Ou montava, ou ficava sem trabalho.” A Coffin for the Sheriff marcou o início da uma longa parceria com o espanhol Eduardo Fajardo, que rouba as cenas na pele do sádico Murdock. Magro, calvo, de olhar ardiloso e sorriso sarcástico, Fajardo foi um vilão emblemático do subgênero. Entre seus papéis mais marcantes está o major Jackson do clássico (Italy/Spain, 1966), de Sergio Corbucci. “Um ator talentosíssimo, um ser humano maravilhoso”, assim Steffen se referia ao amigo que tantas vezes matara nas telas. Um ano depois de ter seu Bullets Don't Argue ofuscado pelo êxito de A Fistful of Dollars, Caiano voltava a duelar contra Leone. Sem chances de vitória, diga-se. A Coffin for the Sheriff chegou às telas em 23 de dezembro de 1965, cinco dias após (Italy/Spain/West Germany) – enquanto este faturou 3,492 bilhões de liras na Itália, aquele não passou dos 131 milhões. Novamente com trilha de Ennio Morricone, o segundo faroeste de Leone reunia

86 o agora astro Clint Eastwood e o semi-aposentado ator norte-americano , cuja carreira ganharia sobrevida nos westerns spaghetti. Rendeu na Itália o dobro que o recordista anterior, La Dolce Vita (France/Italy, 1960), de Fellini. Tal resultado decretou o fim das incertezas quanto à viabilidade do estilo inaugurado por Leone. Entre 1964 e 1974, Itália, Espanha e Alemanha produziram cerca de 450 bangue-bangues. Um caubói de traços aristocráticos, rosto envelhecido, chapéu cerrado sobre os olhos, jaqueta de couro claro e calça surrada lutaria por vingança em vários deles. Em 1965, aos 35 anos, Anthony Steffen começava a escrever seu nome na história do western spaghetti... à bala.

87 V. A Reason to Live, a Reason to Die (a.k.a. And God Said to Cain)

A segunda metade da década de 1960 foi fértil em tiroteios para Anthony Steffen, com três westerns lançados em 1965, quatro em 1966, três em 1967, quatro em 1968, três em 1969 e quatro em 1970. Teriam sido cinco em 1966, caso um acidente não houvesse interrompido a rodagem de um deles. Por volta das 5 da madrugada, alguém bateu aflito à porta de seu quarto de hotel em Almería. Era seu dublê, um gago cuja gagueira aumentava quando nervoso. O caubói recorreu ao manjado truque de lhe pedir que falasse cantando. O dublê respirou fundo, se concentrou e cantou: − Quatro bombas atômicas caíram aqui pertinho da gente. Existem registros históricos do fato. Um avião B-52 e uma aeronave de abastecimento KC-135 dos Estados Unidos colidiram sobre Palomares, vilarejo de pescadores na costa de Almería, em 17 de janeiro

88 de 1966. O B-52 carregava quatro bombas de hidrogênio de 25 megatons cada uma. Das três que caíram no solo, somente uma permaneceu intacta. O impacto da queda acionou os detonadores das outras duas, que espalharam plutônio pela região. A quarta bomba desapareceu no Mar Mediterrâneo. Em plena Guerra Fria, a possibilidade de tal arma cair em poder dos comunistas pôs a Casa Branca em alerta vermelho. Diante dos olhares atônitos de Steffen e seus colegas de filmagem, centenas de soldados norte-americanos cercaram a área. Mergulhadores levaram três meses até reaver, em 7 de abril, o artefato. O governo espanhol acompanhou de perto as operações de busca e descontaminação, que custaram cerca de 180 milhões de dólares aos cofres de Washington. O spaghetti que ficou incompleto não fez falta. Afinal, naquele ano o ítalo-brasileiro estrelou dois pequenos clássicos do subgênero, ambos inspirados em salmos bíblicos: Seven Dollars to Kill (Italy/Spain, 1966) e Blood at Sundown (Italy/West

89 Germany, 1966), dirigidos por Alberto Cardone (a.k.a. Albert Cardiff) e produzidos por Mario Siciliano (a.k.a. Marlon Sirko). Blood at Sundown marcou a estréia no subgênero do futuro ídolo Giovanni Garkovich30 (a.k.a. John Garko). Acerca da dupla responsável pelos filmes, o ator iugoslavo esclarece que ambos dirigiam: “Siciliano era um produtor controlador, que metia a mão na massa e dava muitas sugestões. Cardone cuidava principalmente da parte técnica, na qual tinha vasta experiência.” Como assistente de direção e diretor de segunda unidade, Cardone trabalhara em Summertime (Inglaterra/EUA, 1955), de David Lean; Ben-Hur (EUA, 1959), de William Wyler; e outras produções hollywoodianas. Desfeita a sociedade, Alberto Cardone (a.k.a. Albert Cardiff) dirigiria $20.000 on No. 7 (Italy, 1967) e Mario Siciliano (a.k.a. Marlon Sirko), Taste of Vengeance

30 Ao longo da carreira, Giovanni Garkovich usou os pseudônimos de Gianni Garko (pelo qual ficou mais conhecido), John Garko (como aparece nos créditos de Blood at Sundown), Johnny Garko e Gary Hudson (em homenagem a Gary Cooper e Rock Hudson). 90 (Italy/Spain, 1968) − conclusões não-oficiais da trilogia bíblica que haviam iniciado juntos. Seven Dollars to Kill abre com o assassinato da esposa e o rapto do filho de Johnny Ashley (Steffen) pelo bando de Chacal (). Criado pelo bandoleiro e sua mulher (Carla Calò, a.k.a. Carroll Brown), Jerry cresce e vira um criminoso (Roberto Miali, a.k.a. Jerry Wilson). Anos depois, a gangue planeja um assalto ao banco de Wishville. Ashley chega por acaso à cidade, ajuda o xerife (Franco Fantasia, a.k.a. Frank Farrell) a deter os foras-da-lei e mata Chacal. Disposto a vingar o assassinato do homem que acreditava ser seu pai, Jerry desafia o forasteiro. Quando a mulher de Chacal revela a verdade a Ashley, este se recusa a enfrentar o próprio filho e implora ao rapaz que fuja. Jerry não lhe dá ouvidos, insiste no combate e morre nas mãos de seu verdadeiro pai. Nessa recriação da parábola do filho pródigo, notam-se influências do faroeste The Searchers (EUA, 1956), de John Ford, no qual John Wayne busca a

91 sobrinha raptada por índios; e dos dramas sobre relações familiares Mildred Pierce (EUA, 1945), de Michael Curtiz; e Imitation of Life (EUA, 1959), de Douglas Sirk. Seria o pseudônimo Marlon Sirko um tributo de Mario Siciliano ao alemão Douglas Sirk, mestre dos melodramas hollywoodianos? É provável que sim. Seven Dollars to Kill foi inteiramente rodado em Roma. Somente na versão italiana, a abertura traz um provérbio de Salomão: “Quem anda com os sábios será sábio; mas o companheiro dos tolos sofre aflição” (Provérbios, 13:20). Além do ótimo roteiro de Melchiade Coletti (a.k.a. Mel Collins), Arnaldo Franciolini (a.k.a. Arne Franklin) e Juan Cobos, a primeira parceria de Siciliano e Cardone conta com um elenco primoroso. Fernando Sancho conquistara o status de vilão mexicano por excelência dos bangue-bangues mediterrâneos graças ao cabelo ensebado, o bigode farto, a cara rechonchuda e a gargalhada sádica. No papel de Chacal (rebatizado de Sancho na dublagem

92 em inglês), seu desempenho ultrapassa o tipo físico. Basta um olhar do personagem à sua companheira para insinuar que ele é estéril − razão pela qual insiste em criar o garoto raptado como se fosse seu filho. Em meio a uma cena de briga no estúdio Elios Film, Sancho começou a bater para valer. “Eu lhe pedi que parasse, mas não adiantou”, lembra Steffen. “Perdi a paciência e acertei um direto na cara dele. O bolha ficou desmaiado por uns dez minutos e o soco acabou incluído na montagem final.” O título original, 7 Dollari sul Rosso, significa “sete dólares no vermelho” em italiano e diz respeito tanto ao jogo de roleta quanto à seqüência de abertura. Chacal mata a esposa mestiça de Ashley e deixa sete moedas sobre a saia vermelha dela: “Ela é apenas uma vagabunda. Com esse ouro ele pode comprar outra.” Melancólica, a trilha de Francesco De Masi reforça o tom de tragédia. O clímax se desenrola sob chuva torrencial, nas ruas desertas de Wishville. Durante o duelo entre pai e filho, as cores esmaecem e Steffen logra uma interpretação contida e emocionante.

93 Críticos como B. Duffort não nutriam nenhum afeto por esse tipo de cinema – algo que fica evidente em sua implacável crítica ao filme publicada na revista francesa Saison ‘71: “Shooting (...) fists, riding (...) scenes that begin and end with no apparent reason (…) give the film a disjoined and inconsistent aspect (…). Fernando Sancho in his usual Mexican role (...) doesn’t convince anyone31”. Os espectadores, é claro, pensavam diferente. Com 311 milhões de liras arrecadas nas bilheterias da Itália, Seven Dollars to Kill tornou-se o maior sucesso da carreira de Anthony Steffen. A película seguinte, o terror An Angel for Satan (Italy, 1966), de Camillo Mastrocinque, não desfrutaria igual sorte. Na trama passada no final do século XIX, o conde de Montebruno (Claudio Gora) convida o escultor Roberto Merigi (Steffen) para restaurar uma velha estátua resgatada do fundo de um lago. A população do vilarejo acredita que a obra é

31 7 Dollari sul Rosso. In: POPPI, Roberto, PECORI, Mario. Dizionario del Cinema Italiano – I Film Vol. 3, dal 1960 al 1969. 94 amaldiçoada, mas Merigi não acredita em supertições. Então, chega ao local a bela e reservada Harriet, sobrinha do conde. Idêntica à escultura, ela passa supostamente a incorporar o espírito da cruel e devassa Belinda, que serviu de modelo para a obra original. O escultor se apaixona pela jovem e descobre que as possessões são na verdade comandas pelo tio dela e pela governanta da mansão, Ida (, a.k.a. Maureen Melrose), via hipnose – eles querem tirá-la do caminho para ficar com toda a fortuna dos Montebruno. Quando o conde se vê obrigado a revelar o plano, uma enlouquecida Ilda o assassina e encontra a morte ao afundar junto com a estátua no lago. Com o fim da ameaça, Merigi e Harriet deixam o vilarejo juntos. Apesar de certos exageros na interpretação, Steffen se sai bem no papel de herói – aparentando bem menos idade do que em seus westerns, nos quais a maquiagem sempre contribuiria para fazê-lo parecer mais velho. Sua primeira aparição em cena, com a aba

95 do chapéu a lhe cobrir os olhos, funciona quase como um prenúncio do que seria sua carreira nos anos seguintes. Contribui ainda mais para isso a trilha sonora assinada por Francesco De Masi, que ainda comporia música para dezenas de westerns (quatro deles com Steffen no elenco). Mario Brega e Aldo Berti, dois atores italianos que fariam carreira como coadjuvantes foras- da-lei em westerns spaghetti, também estão no elenco de An Angel for Satan: o primeiro como o aldeão Carlo, que luta com o personagem de Steffen num bar, bem à moda dos eurowesterns; o outro na pele do deficiente mental Vittorio, diante do qual Harriet fica nua antes de chicoteá-lo no rosto sem piedade. Ela seduz ainda outros homens do vilarejo e se insinua até para sua inocente criada, Rita (Ursula Davis), namorada do professor local. Em sequências assim, nas quais a heroína, sob o efeito de hipnose, age como se estivesse tomada pelo espírito de Belinda, Barbara Steele tem seus melhores momentos no filme.

96 A exemplo de Riccardo Freda, o diretor Mastrocinque havia trabalhado no Brasil. Viera contratado a peso de ouro para dirigir em São Paulo o drama Areão32 (Brasil, 1952). Especialista em comédias de Totó, também demonstrou talento no ciclo italiano de horror gótico inaugurado por Freda com The Devil's Commandment (Italy, 1957). O filão ganhou força a partir do êxito de Black Sunday (Italy, 1960), de Mario Bava, que consagrou Barbara Steele. Before becoming an icon scream queen, exotic English born Barbara Steele worked as a model in late 50’s London. She then got an acting contratac with The Rank Organisation film company, which sold it to 20th Century-Fox in 1959. Thinking for the best for its new property, the American studio brought Barbara to Hollywood, had her hair dyed blonde and casted her opposite Elvis Presley in his western vehicle Flaming Star. Her big break lasted just a week. She and the American director Don Siegel

32 O título em português se refere a um tipo de areia muito utilizada na fabricação de cimento – a trama de Areão se desenrola numa olaria. 97 didn’t get along and the 19-year-old English actress was replaced by Barbara Eden. Work got scarce due to lack of good parts and a major Screen Actors Guild strike, so Barbara Steele went back to for better opportunities. Mario Bava was casting for his official directorial debut when he saw a photograph of her. After Black Sunday, Barbara went working with horror filmmakers specialists Roger Corman and Riccardo Freda – Pit and the Pendulum (USA, 1961) and The Horrible Dr. Hichcock (Italy, 1962), respectively – among others, besides such directors as the Italian Federico Fellini in 8½ (France/Italy, 1963), the Italian Mario Monicelli in For Love and Gold (France/Italy/Spain, 1966) and the French Louis Malle in Pretty Baby (USA, 1978). “Uma drogada”, resume Steffen. An Angel for Satan foi o último dos nove horror all’italiana que Barbara Steele estrelou. As glórias passadas da atriz, a fama recente de Anthony Steffen, a belíssima fotografia em preto-e-branco de Giuseppe Acquari, nada disso impediu o modesto

98 desempenho do filme, que fez 87 milhões de liras nas bilheterias italianas. A bola da vez eram os banhos de sangue dos sempre coloridos westerns spaghetti. Naquele 1966, The Good, the Bad and the Ugly (Italy/Spain/West Germany), de Sergio Leone, quebraria todos os recordes de público anteriores. Ambientado na Guerra de Secessão, esse epílogo da “trilogia dos dólares” coloca Clint Eastwood e Lee Van Cleef, dos episódios anteriores, na companhia do igualmente norte- americano Eli Wallach. A música-tema de Ennio Morricone até hoje acompanha duelos e paródias de duelos no cinema e na tevê. Na esteira do Homem sem Nome vivido por Eastwood surgiriam diversos heróis, reaproveitados sem cerimônia por produtores, diretores, roteiristas e distribuidores. Cada sucesso gerava um punhado de arremedos e continuações extra-oficiais. Assim, Ringo, Django e se tornaram nomes recorrentes. Por vias tortas, Steffen logo cruzaria com os três.

99 Primeiramente, de novo sob a direção de Mario Caiano (A Coffin for the Sheriff) e ao som de uma trilha de Francesco De Masi (Seven Dollars to Kill) em Ringo the Mark of Vengeance (Italy/Spain, 1966). Duccio Tessari dirigira as duas pioneiras aventuras de Ringo, A Pistol for Ringo (Italy/Spain, 1965) e The Return of Ringo (Italy/Spain, 1965). Embora ambos os protagonistas sejam feitos por (a.k.a. Montgomery Wood), trata-se de personagens distintos. Não seria diferente no caso de Ringo the Mark of Vengeance . Ringo (Steffen) e o velho Tim (Eduardo Fajardo) são parceiros de aventura. A dupla se une ao jogador Trickie Ferguson (Frank Wolff) e ao ex- presidiário Fidel (Armando Calvo), que tem tatuada nas costas a metade de um mapa. Este indica o esconderijo, no México, de uma fortuna em ouro roubado. A metade restante se encontra na tatuagem do xerife Sam Dellinger (Alfonso Goda), ex-colega de cela de Fidel.

100 Ao contrário do que o título sugere, não existe missão de vingança. Há, sim, sucessivas trapaças e reviravoltas. Steffen faz um tipo bem-humorado e sorridente, algo raro em sua carreira. Entretanto, as desgraças não tardarão. Presos por Dellinger, os aventureiros queimam as costas de Fidel com uma vela a fim de apagar o mapa. Os quatro escapam e quando a mexicana Manuela (Alejandra Nilo) se junta ao grupo, Ferguson joga Tim contra Ringo. Bêbado, o velho tenta violentar a moça e termina morto pelo amigo. Após achar o tesouro, Ringo luta com Fidel. Em seguida, apanha por quase um minuto dos capangas de Ferguson. Sua aparência em nada lembra os caubóis de Hollywood: camisa rasgada, face cheia de ferimentos, andar cambaleante. Nessas condições, ele persegue Ferguson e recupera o ouro. Depois, doa a fortuna ao povoado onde Manuela vivia e parte com ela rumo ao horizonte. Parte dessa co-produção ítalo-espanhola foi rodada em exteriores no deserto de Almería (locação

101 quase obrigatória para um western spaghetti que se preze). Numa seqüência de tirar o fôlego, Ringo e seus sócios fogem a galope de bandoleiros mexicanos. Enquanto cavalga, o astro recarrega seu rifle e atira contra os adversários. As cenas evidenciam que, apesar do trauma de cavalos, Steffen não usou dublês. Os demais intérpretes também têm seus momentos de brilho. Ao consentir que deixem sua pele em carne viva, Fidel encontra no rosto de Armando Calvo a expressão exata da dor. O norte- americano Frank Wolff, com sorriso sonso e bigode de janota, torna crível o maquiavélico Trickie Ferguson. Distante de seu habitual tipo vilanesco, Eduardo Fajardo transforma Tim numa versão mundana do velhote Gabby Hayes (auxiliar cômico de caubóis dos seriados B hollywoodianos, a exemplo de Roy Rogers e Ken Maynard). A barba grisalha e o traje de garimpeiro remetem ainda ao Howard de The Treasure of Sierra Madre (EUA, 1948), que rendeu um Oscar de ator coadjuvante a Walter Huston − pai do diretor, .

102 Além do clássico de Huston, o filme de Caiano evidencia a influência de Greed (EUA, 1923), do austro-húngaro Erich von Stroheim. Trata-se de uma fábula sobre cobiça, entremeada por brigas e tiroteios. A respeito do diretor Caiano, Steffen é sucinto: “Comunista”. Igualmente de esquerda, Sergio Corbucci emplacaria um marco em 1966: Django (Italy/Spain). Ex-crítico de cinema, ex-assistente de Roberto Rossellini, diretor de comédias, pepla e westerns, o “outro Sergio” construiu um violentíssimo spaghetti centrado na figura do vingador taciturno. Graças ao personagem cujo nome homenageia o guitarrista cigano de jazz Django Reinhardt, passou de figurante em The Bible: In the Beginning... (Italy/USA, 1966), do norte-americano John Huston, ao estrelato. Corbucci não dirigiu nenhuma das aproximadamente trinta aventuras posteriores de Django. Diversos atores incorporaram o sombrio pistoleiro, com chapéu e sobretudo escuros e luvas sem dedos. A fim de explorar a popularidade do

103 nome, redublavam-se películas e trocavam-se títulos. So, a western com Steffen virou, da noite para o dia, A Few Dollars for Django (Italy/Spain, 1966). Nenhum personagem se chama Django nas dublagens originais, em italiano e espanhol, mas o nome do protagonista chegou a ser alterado nas versões alemã e francesa. O caçador de recompensas Reagan (Steffen) recupera 12 mil dólares roubados de uma mineradora e vai até Montana em busca dos assaltantes. No caminho, descobre assassinado o sujeito que ia ocupar o posto de xerife da cidade. Ele assume a identidade do homem da lei e se envolve no conflito entre barões de gado e agricultores. Mentor do assalto à mineradora, Jim Norton se faz passar por seu irmão Trevor Norton. O agricultor Trevor (ou seja, Jim) só deseja levar uma vida honesta com sua sobrinha (ou melhor, filha) Sally (Gloria Osuña). Descobertas as verdadeiras identidades de Reagan e Jim, os dois se unem para deter os desonestos criadores de gado. A dupla triunfa, mas Jim é morto no conflito.

104 A produção assinala a estréia não-oficial do diretor Enzo Girolami. Sob o pseudônimo de Enzo G. Castellari, ele assinaria uma longa lista de contribuições ao cinema comercial italiano, incluindo o policial Street Law (Italy, 1974), o western crepuscular Keoma (Italy, 1976) e a aventura de guerra (Italy, 1978) – homenageado por no título de seu (EUA, 2009), que também cita o diretor do original na cena em que o tenente Aldo Raine (Brad Pitt) tenta se passar por italiano e alega se chamar “Enzo Girolami”. A Marco Film, companhia pertencente ao pai de Enzo, Marino Girolami, produziu A Few Dollars for Django em parceria com a R.M. Films, de Madri. Nos letreiros, consta como diretor o argentino radicado na Espanha León Klimovsky − célebre por filmes de terror estrelados pelo espanhol Jacinto Molina (a.k.a. Paul Naschy). “O tampinha Klimovsky não dirigiu sequer um fotograma de Few Dollars for Django”, assegura Steffen. “Ele ficava no set apenas

105 para justificar os benefícios que o governo espanhol concedia”, explica Castellari. Na prática, Marino Girolami dirigiu a primeira unidade e seu filho cuidou das seqüências de ação. Castellari aparece em cena numa ponta, sendo assassinado por Steffen. Enio Girolami (a.k.a. Thomas Moore), seu irmão, representa um dos capangas do vilão Amos (Alfonso Rojas). As filmagens se deram em Colmenar Viejo e La Pedriza de Manzanares el Real, nos arredores de Madri, pois transportar e hospedar a equipe em Almería excederia o modesto orçamento do projeto. No decorrer de sete semanas, técnicos, diretores e atores tiveram de suportar o terrível inverno da capital espanhola. O frio não impedia Steffen e Castellari de saírem a paquerar por Madri. “Para um astro de cinema, ele era muito tímido”, recorda o diretor, que costumava apresentar mulheres ao amigo. Os dois se conheciam havia tempos. “Antonio e eu freqüentávamos a mesma academia de boxe, em Roma”, relata o cineasta. “Ele era alto, forte, tinha

106 braços e pernas muito longos. Todos gostavam de vê- lo treinar.” Assim como em Ringo the Mark of Vengeance , não há o vingador típico de Steffen em A Few Dollars for Django. As fitas têm ainda em comum a presença de Frank Wolff, considerado um ator extraordinário por Castellari e Steffen. “Não reclamava do frio nem da comida e estava sempre de bom humor”, define o primeiro. “Totalmente maluco”, completa o segundo. Wolff trabalhara em séries televisivas e produções de Roger Corman antes de emigrar para a Itália, onde se destacou no drama policial Salvatore Giuliano (Italy, 1962), de Francesco Rosi. Um de seus mais memoráveis papéis seria o do marido de Jill McBain (), chacinado com os filhos por Frank (o astro norte-americano Henry Fonda) e seus homens no majestoso Once Upon a Time in the West (Italy/USA, 1968), de Sergio Leone. No ano seguinte, Wolff mancharia de vermelho as paredes de seu quarto no Hotel Hilton, em Roma, ao cortar a

107 própria garganta − ou pênis, segundo algumas versões. As hipóteses para o suicídio variam de descontentamento com os papéis que lhe eram oferecidos a rompimento com a mulher que amava. A tragédia também permeia Blood at Sundown (Italy/West Germany, 1966), segundo faroeste bíblico do diretor Alberto Cardone (a.k.a. Albert Cardiff) com o produtor Mario Siciliano (a.k.a. Marlon Sirko). Johnny Liston (Steffen) passa doze anos na prisão por um crime que seu irmão, “el general” Sartana (Giovanni Garkovich, a.k.a. John Garko), cometeu. A mãe dos rapazes (Carla Calò, a.k.a. Carroll Brown) encobre as atrocidades de Sartana, seu filho predileto. De volta à cidade de Campos, Johnny se alia ao surdo-mudo Jerry (Roberto Miali, a.k.a. Jerry Wilson) para enfrentar a quadrilha do irmão. Este, em represália, ordena o massacre dos moradores de Campos, incluindo sua própria mãe. Após matar Sartana num duelo, Johnny toma o cadáver nos braços e deixa a cidade. “Não odiarás a

108 teu irmão no teu coração...” (Levítico, 19:17), apregoa a citação bíblica que encerra a película. Essa recriação da história de Caim e Abel reúne praticamente os mesmos elenco e equipe técnica de Seven Dollars to Kill. O roteiro combina de novo melodrama ao estilo Douglas Sirk e bangue-bangue, dessa feita assinado por Ernesto Gastadi, Rolf Olsen e Vittorio Salerno. O jogo de roleta volta como metáfora no título original, 1.000 Dollari sul Nero, que em italiano quer dizer “mil dólares no preto”. Na cena em questão, Sartana deposita um colar de pérolas sobre o vestido preto da mãe. Steffen retoma o perfil de vingador, porém Garko lhe rouba a cena. Obcecado pela mãe e com delírios de divindade, Sartana habita um templo asteca em pleno deserto. Não hesita em surrar um deficiente ou chutar a mulher que roubou do irmão. “Construí o personagem nos moldes de um gângster sádico, completamente enlouquecido, à Richard Widmark”, define Garko, citando o intérprete indicado ao Oscar pelo papel de Tommy Udo em Kiss of Death (EUA,

109 1947), do norte-americano Henry Hathaway. “Steffen era um astro e eu, um desconhecido. Nas cenas de luta, ele receava que eu, por inexperiência, acertasse seu nariz sem querer. Mas foi sempre educado, um autêntico gentleman. Steffen adorava falar da ascendência nobre de sua família. Não havia muitos atores de sangue azul entre nós...” Blood at Sundown rendeu menos que Seven Dollars to Kill na Itália, mas, com 217 milhões de liras de bilheteria, passou longe de ser um fiasco. A crítica assinada por B. Duffort na revista francesa Saison ‘71, por sua vez, passou longe de ser elogiosa: “Violence mixed with primitive sadism, endless fights (...). More thinking and less anger would surely make this attemptive of western more acceptable33”. O vilão se sobressaiu tanto, que Garko aparecia mais que Steffen nos cartazes italianos. Na Alemanha, onde a produção recebeu o título de Sartana, o nome dele vinha antes. “Os distribuidores

33 1.000 Dollari sul Nero. In: POPPI, Roberto, PECORI, Mario. Dizionario del Cinema Italiano – I Film Vol. 3, dal 1960 al 1969. 110 alemães exigiam outro filme comigo, qualquer filme, desde que eu me chamasse Sartana”, rememora o iugoslavo. If You Meet Sartana... Pray for Your Death (Italy/West Germany, 1968), de Gianfranco Parolini (a.k.a. Frank Kramer), reinventou o personagem, a partir de então um caçador de recompensas calcado no agente secreto James Bond. O visual repetido por Garko nos quatro episódios iniciais inclui chapéu sobre os olhos, cigarrilha entre os lábios, capa preta revestida de vermelho e uma pequena pistola Derringer escondida na manga. O uruguaio , o austríaco , o italiano Giovanni Scarciofolo (a.k.a. Jeff Cameron) e outros intérpretes se incumbiriam de dar continuidade à série. Os westerns que Steffen estrelava no auge do subgênero lhe permitiam levar uma vida de playboy como a que seu pai tivera no passado. No apartamento embaixo do seu, em Roma, moravam as ex-babás Caterina e Livia, agora suas criadas. Ao acordar, ele batia com o pé no chão para que as duas lhe levassem o café-da-manhã. Além do gosto pela boa vida,

111 herdou do pai o jeito mulherengo de ser. No início da carreira, tivera romances com divas como a francesa Michèle Mercier e a italiana , amiga de sua mãe e doze anos mais velha que ele. O relacionamento com Franca Bettoja durou de 1958 até 1961. Onze anos depois a atriz desposaria o comediante . Steffen seria amigo do casal até a morte de Tognazzi, em 1990, e de Franca por toda a vida. Em 1965, ele começou a namorar Antonia Caramazza, mais conhecida como Antonella. De ascendência nobre, a moça era secretária de um de seus melhores amigos, o conde Nick Da Vinci. Durante seus namoros, o ator não resistia a tentações como a alemã Karin Dor. Os dois haviam atuado em The Last Tomahawk (1965), dirigido pelo então marido dela, Harald Reinl. Em 1968, a recém- divorciada Karin estava em Roma para tentar a sorte na efervescente indústria cinematográfica italiana. Sorte de Steffen, azar de Reinl. O cineasta austríaco casou com a atriz tcheca Daniela Maria Delis, que o

112 mataria a facadas na cidade espanhola de Tenerife em 1986.

113 6. ¡Que viva México! (a.k.a. Once Upon a Time... the Revolution)

No western tal como concebido por Hollywood, foras-da-lei mexicanos costumam cruzar o Rio Grande a fim de desafiar a lei e a ordem nos Estados Unidos. Caubóis norte-americanos percorrem o trajeto inverso, ora para derrubar algum tirano latino − Vera Cruz (EUA, 1954), de Robert Aldrich −, ora para defender peóns ameaçados por bandoleros − The Magnificent Seven (EUA, 1960), de John Sturges. Após terem alterado de modo definitivo a fórmula narrativa do gênero, cineastas italianos cuidariam de subverter os estereótipos relativos ao México. No livro Cowboys and Europeans: from Karl May to Sergio Leone (1981), o pesquisador inglês Christopher Frayling classifica a tendência de zapata-spaghetti. Com o fim da Segunda Guerra e do regime fascista, o ideário de esquerda ganhara força na Itália. O movimento neo-realista se incumbia de levar questões sociais às telas. Não faltavam nas lides

114 cinematográficas profissionais filiados ao Partido Comunista. Em 1963, o primeiro-ministro Aldo Moro, do conservador Partido Democrata Cristão, assumiu o poder apoiado pelo Partido Socialista. Divergências racharam a esquerda do país. Nos anos posteriores, a Europa conviveria com greves, passeatas estudantis, atentados de extrema esquerda e atentados de extrema direita. Jornais, rádios e tevês registravam a eclosão de movimentos revolucionários ao redor do globo. O temor do avanço comunista levou os Estados Unidos a tentarem invadir Cuba em 1961 e a intervirem militarmente na República Dominicana em 1965. A instalação de uma base de mísseis da União Soviética na ilha de Fidel Castro quase desencadeia uma guerra nuclear em 1962. No crepúsculo da década, os Estados Unidos sairiam derrotados da Guerra do Vietnã (1959-1969). Os zapata-spaghetti lançados entre 1967 e 1971 refletiam esse cenário, com a Revolução Mexicana (1911-1919) de Emiliano Zapata e Pancho

115 Villa convertida em metáfora dos levantes terceiro- mundistas. Embora a ação não transcorra na época da Conquista do Oeste (1840-1890), os estereótipos e fórmulas narrativas do faroeste marcam presença de maneira inequívoca. A Bullet for the General (Italy, 1966), de , estabeleceu a diretriz do subgênero (zapata-spaghetti) dentro do subgênero (western spaghetti): um mercenário estrangeiro (Lou Castel) se une a um revolucionário mexicano (Gian Maria Volonté). O elenco traz ainda o polonês Klaus Kinski na pele do padre revolucionário Santo, inspirado em dois personagens de Black God, White Devil (Brasil, 1964), de Glauber Rocha: o beato Sebastião (Lídio Silva) e o matador de cangaceiros Antônio das Mortes (Maurício do Valle). Aplaudido por obras como The Lipstick (France/Italy, 1960) e Blood Feud (Italy, 1961), Damiani se arriscava no subgênero mais execrado pelos críticos sem prescindir de suas convicções. O roteiro de A Bullet for the General tem assinatura de Franco Solinas, responsável por dramas políticos do

116 porte de Salvatore Giuliano (Italy, 1962), de Francesco Rosi, e The Battle of Algiers (Argélia/Itália, 1965), de Gillo Pontecorvo. Os préstimos de Solinas ao ciclo também incluem o roteiro de The Big Gundown (Italy/Spain, 1967), de Sergio Sollima; a supervisão do roteiro de Blood and Guns (Italy/Spain, 1968), de Giulio Petroni (no qual o cineasta norte- americano Orson Welles faz um coronel mexicano); e o argumento de A Professional Gun (a.k.a. The Mercenary, Italy, 1968), de Sergio Corbucci. O novo e lucrativo filão gerou ainda títulos como Kill and Pray (Italy/West Germany, 1967), de Carlo Lizzani (com o diretor e marxista de carteirinha Pier Paolo Pasolini no papel de um padre revolucionário); Face to Face (Italy/Spain, 1967) e Run Man Run (Italy, 1968), ambos de Sergio Sollima; e The Magnificent Bandit (Italy/Spain, 1969), de Giovanni Fago, variação do tema rodada no Brasil. Sollima, aliás, considerava o cinema novo de Glauber Rocha uma fonte de inspiração para seus bangue- bangues de esquerda. Até Sergio Leone se aventuraria

117 por essa vertente em A Fistful of Dynamite (Italy, 1971). Anthony Steffen protagonizou um exemplar pioneiro do subgênero, o pouco lembrado Killer Kid (Italy, 1967). Coincidência ou não, naquele mesmo ano ele estrelaria outras duas fitas que tinham o México por cenário. O lugar-comum dos bandoleros prevalece em Gentleman Killer (Italy/Spain), enquanto Train for Durango (Italy/Spain) aborda a Revolução Mexicana in a comic tone. Em maior ou menor grau, todos fizeram sucesso na Itália: Killer Kid arrecadou 64 milhões de liras; Train for Durango, 90 milhões; e Gentleman Killer, impressionantes 124 milhões. Dirigido por Giorgio Stegani (a.k.a. George Finley), esse último traz imagens raras, senão únicas, na carreira do maltrapilho caubói. Steffen entra em cena barbeado e troca de figurino várias vezes. É um personagem sob medida para alguém que se considerava o homem mais vaidoso do mundo. “Se eu

118 pudesse, mandaria uma dúzia de rosas para mim mesmo todos os dias”, dizia, orgulhoso. Um vilarejo na fronteira dos Estados Unidos está prestes a ser anexado ao México. A quadrilha do mexicano Ferreras (Eduardo Fajardo) assassina o capitão Clay Rees (Mariano Vidal Molina), representante do governo norte-americano na negociação. A missão de vingança caberá ao jogador e dândi Joe Rees (Steffen), irmão do oficial morto. O público já sabia, àquela altura, que os personagens do ator estavam fadados às piores torturas. Nenhum astro padeceu tanto quanto ele nos filmes do subgênero, e Gentleman Killer não foge à regra. Os bandidos espancam o herói e o obrigam a beber várias garrafas de uísque. Sua vida é salva por soldados mexicanos, que chegam e executam Ferreras pelos crimes cometidos. Os críticos, como de hábito, execraram o filme. No volume 63 da revista italiana Segnalazioni Cinematografiche (1968), um texto não assinado dispara: “The final, unpredictable and unexpected (...)

119 and some particular scenes are the very few original ideas that the direction doesn’t use to elevate from the irritating mediocrity unfortunately now customary in this kind of movie34”. Além do habitual Fajardo, a trupe de malfeitores reúne dois requisitados coadjuvantes do cinema europeu. O espanhol Antonio Iranzo interpreta Bruce, um pistoleiro baixinho que Ferreras insiste em irritar chamando de muchachito. O outro intérprete, Benito Stefanelli, foi um dos maiores maestri d’azione (dublê e técnico em armamentos) dos spaghetti. Presença constante nos westerns de Sergio Leone, ele criou um marca registrada do subgênero: as coreografias de morte, nas quais atores e dublês rodopiam de forma espalhafatosa antes de caírem ao chão. Da ficha técnica, constam ainda Bruno Nicolai e Ennio Morricone. Parceiros de longa data, o primeiro costumava conduzir as partituras de autoria

34 Gentleman Jo... Uccidi. In: POPPI, Roberto, PECORI, Mario. Dizionario del Cinema Italiano – I Film Vol. 3, dal 1960 al 1969. 120 do segundo. Em Gentleman Killer, eles invertem as funções habituais: Nicolai responde pela trilha sonora, baseada em Carmina burana, de Carl Orff; Morricone, pela condução. Steffen voltaria ao cartaz com Killer Kid. A direção coube a Leopoldo Savona, que havia sido assistente do brasileiro radicado na Europa Alberto Cavalcanti em Venetian Honeymoon (France/Italy, 1959) e de Pier Paolo Pasolini em Accattone (Italy, 1961) − ambos cineastas ligados ao comunismo. Savona divide o roteiro com Sergio Garrone e Ottavio Poggi. Ilustrados por Rodolfo Gasparri (desenhista dos cartazes de For a Few Dollars More e Once Upon a Time in the West), os créditos de abertura evidenciam o tom populista: “This film is dedicated to the Mexican people whose bravery allowed the birth of a modern, free, democratic republic.” Para pôr fim à venda de armas do exército dos Estados Unidos aos rebeldes mexicanos, o capitão Morrison (Steffen) adota a identidade do fora-da-lei Killer Kid e se engaja no movimento revolucionário

121 de El Santo (Nelson Rubien). A sobrinha deste, Mercedes (Luisa Baratto, a.k.a. Liz Barrett), cai de amores pelo recém-chegado, mas Vilar (Fernando Sancho), braço direito de seu tio, não confia nele. No final, Mercedes se sacrifica ao ajudar Morrison a explodir o carregamento de armas destinado aos rebeldes. Após a morte da amada, ele honra a promessa feita ao moribundo El Santo e assume o comando da causa. Indagado sobre o destino dos soldados feitos prisioneiros, responde friamente: “Fuzile-os.” E se afasta ao som dos tiros. Um epílogo amargo, porém não tão subversivo quanto o conselho de Chuncho (Gian Maria Volonté) em A Bullet for the General: “Não compre pão com aquele dinheiro, hombre. Compre dinamite! Dinamite”! Steffen, que mantinha em sua cobertura no Rio de Janeiro um retrato de Benito Mussolini, nunca nutriu apreço por ideais de esquerda. No entanto, estrelou em 1967 uma película cuja ficha técnica parece ata de assembléia do Partido Comunista italiano. Dirigido por seu velho conhecido Mario

122 Caiano (agora sob o pseudônimo de William Hawkins) e produzido por Bianco Manini (responsável pelo explosivo A Bullet for the General), o filme tinha outro militante no elenco, − excelente intérprete, dublador de Clint Eastwood em For a Few Dollars More e futuro diretor dos dramas The Anonymous Venetian (Italy, 1970) e Dear Parents (France/Italy, 1973), estrelados pela atriz brasileira Florinda Bolkan35. Train for Durango constitui uma sátira aos zapata-spaghetti − ao ciclo, não à ideologia. A divertida trilha sonora do veterano Carlo Rustichelli acompanha uma série de quiprocós. A ação começa

35 Nascida em 1941 em Urubuterama, no sertão do estado do Ceará, no Nordeste brasileiro, Florinda Soares Bulcão foi descoberta para o cinema italiano na segunda metade dos anos 1960, quando trabalha como aeromoça na Varig – uma importante companhia aérea brasileira. Com o nome artistico de Florinda Bolkan, ela atou em mais de cinquenta produções cinematográficas e televisivas européias – incluindo A Complicated Girl (Itália, 1968), de Damiano Damiani; The Damned (Italy/West Germany, 1969), de Luchino Visconti; Investigation of a Citizen Above Suspicion (Italy, 1970), de Elio Petri; e A Brief Vacation (Italy/Spain, 1973), de Vittorio De Sica. Viveu por 18 anos um romance com a condessa e produtor italiana Marina Cicogna. A atriz continua na ativa, tendo rodado ao lado de outra diva, a italiana Virna Lisi, o drama historico Boogie Woogie (Italy), de Andrea Frezza, cuja estreia está anunciada para 2011. 123 quando revolucionários mexicanos atacam o trem do título, roubam um cofre cheio de ouro e raptam a jornalista Hélène (Dominique Boschero). Entre os passageiros, apenas o norte-americano Gringo (Steffen) e o mexicano Luca (Salerno) sobrevivem. A dupla se apodera das chaves do cofre e parte em busca dos rebeldes. Gringo pretende resgatar Hélène e botar as mãos na fortuna roubada. A seu parceiro, somente a fortuna interessa. Freqüentemente envolvidos em enrascadas, os anti-heróis são salvos diversas vezes por um cavalheiro (Mark Damon) a bordo de um automóvel Oldsmobile. Munido de pistola, rifle, metralhadora e granadas, a princípio ele se apresenta como Brown. Depois, revela ser o major Samuel Lee Barrett, incumbido pelo exército dos Estados Unidos de recuperar o ouro roubado. Em conclusão, descobre-se que ele não passa de um vigarista ianque de nome MacPherson. Brown/Barrett/MacPherson abandona Gringo e Luca no meio do deserto e foge com o ouro e Hélène (na verdade, sua esposa).

124 Na pele da mulher do trambiqueiro, a francesa Dominique Boschero esbanja malícia. A atriz, cujo currículo inclui trabalhos ao lado do conterrâneo Jean- Paul Belmondo, da italiana Gina Lollobrigida e do norte-americano William Holden, relata suas lembranças: “Caiano era um diretor talentoso; Steffen, uma pessoa simpática; Enrico, muito complicado. Ele pregava idéias comunistas o tempo todo, a não ser quando estava bebendo. Quanto ao Mark, íamos nos casar. O relacionamento, porém, não seguiu adiante.” O norte-americano Mark Damon começara a carreira na Hollywood dos anos 1950, alternando pontas em fitas de grande orçamento e papéis maiores em produções B. Na década seguinte, sagrou-se astro na Itália. Atuou no clássico Black Sabbath (France/Italy, 1963), de Mario Bava, no zapata- spaghetti Kill and Pray (Italy/West Germany, 1967) e em dezenas de filmes. De volta aos Estados Unidos, virou produtor de êxitos como Nine 1/2 Weeks (EUA, 1985), de Adrian Lyne; The Lost Boys (EUA, 1987),

125 de Joel Schumacher; e o premiado Monster (EUA/Alemanha, 2003), de Patty Jenkins. Diretor de fotografia da película de Caiano, o italiano Enzo Barboni posteriormente usaria o pseudônimo de E.B. Clucher para dirigir e roteirizar They Call Me Trinity... (Italy, 1970) e Trinity Is STILL My Name! (Italy, 1971). Nesses dois faroestes de enorme sucesso, Mario Girotti (a.k.a. Terence Hill) e Carlo Pedersoli (a.k.a. Bud Spencer) são os irmãos Trinity e Bambino. Esfarrapados como Gringo e Luca, eles vivem igualmente metidos em encrencas. A fita com Steffen e Salerno aposta na comédia de situações; a série protagonizada por Hill e Spencer, no pastelão. A despeito do tom humorístico, Train for Durango evidencia a verve antiimperialista do diretor Caiano e do produtor Manini. A Revolução Mexicana merece várias menções no roteiro do próprio Caiano e Duccio Tessari − criador da série Ringo e diretor de outro zapata-spaghetti satírico, Don't Turn the Other Cheek (Italy/Spain/West Germany, 1971). O ouro roubado do trem pertence à fábrica norte-americana

126 Colt, acusada de fornecer armas à ditadura de Porfírio Diaz. Ainda sobram farpas à crise econômica em tempos de revolução − “São dias difíceis. E os preços sobem”, ironiza o cambista de passagens − e ao militarismo exacerbado − “Bom trabalho, muchacho! O general vai ficar muito orgulhoso de você”, assegura o líder rebelde. “Qual general?”, indaga um terceiro personagem. “Quem sabe?”, diverte-se o muchacho. “No México, todo mundo é general.” Humildes camponeses cometem roubos e se desculpam, cheios de esperança: “Desta vez a revolução tem de vencer.” Enquanto os companheiros de equipe discutiam o materialismo dialético e temas afins, Steffen buscava coragem para filmar uma das seqüências mais arriscadas de sua carreira. Gringo e Luca são enterrados até o pescoço e um bando de cavaleiros galopa em direção à dupla. O cineasta russo Sergei Eisenstein rodara imagens semelhantes no inacabado ¡Que viva México! (México/EUA, 1931/1932), a fim de realçar a brutalidade da ditadura

127 de Diaz. Décadas depois, diretores de bangue-bangues europeus voltariam a explorar a força dramática desse tipo de tortura. Homens enterrados até o pescoço e cavalos em disparada aparecem, por exemplo, em Pray to God and Dig Your Grave (Italy, 1968), de Edoardo Mulargia (a.k.a. Edward G. Muller) − com a cabeça do brasileiro Celso Faria entre as patas dos animais − e no clássico zapata-spaghetti Companeros (Italy/Spain/West Germany, 1970), de Sergio Corbucci. Em Train for Durango, os cascos dos cavalos não atingem Steffen e Salerno por centímetros. As imagens evidenciam não haver dublês em cena. Como o ítalo-brasileiro conseguiu suplantar a fobia de cavalos durante a filmagem? “Eu era jovem e maluco”, justifica. “Tinha de ganhar o pão nosso de cada dia.”

128 7. The Specialist (a.k.a. )

“Mesmo quando sou eu a atirar − e quase sempre eu atiro e os outros morrem −, tenho vontade de sair correndo do estúdio”, desabafou Anthony Steffen em entrevista a Ivy Fernandes na revista Manchete (30 dez. 1967). Concluídas as filmagens de Train for Durango, o astro estava de férias no Rio de Janeiro. A reportagem O Tiro Certo de Antonio de Teffé36 o descrevia acertadamente como “romano de nascimento, mas brasileiro no registro civil” − a imprensa do Brasil costumava lhe atribuir apenas a nacionalidade brasileira. Sobre a carreira de caubói, ele continuava: “Não suporto o barulho do tiroteio, o bangue-bangue explode dentro de mim. Quando penso que a matança terminou, o diretor manda repetir a cena. O resultado é que até dormindo a gente se desvia das balas.” Os traumas da Segunda Guerra explicam a aversão aos tiros, inclusive aos de festim. Havia,

36 Em inglês, “______”. 129 entretanto, um motivo adicional para o desprezo ao subgênero. Em 1º de janeiro daquele 1967, morrera no Rio de Janeiro, aos 61 anos, Manuel de Teffé. Envolvido na rodagem de mais um faroeste, Steffen não pôde comparecer ao enterro. Guardava mágoa do pai, todo o tempo distante, porém nunca deixara de amá-lo. Até o fim da vida, preservaria os troféus e medalhas conquistados por Manuel nas pistas de automobilismo. O galã, àquela altura, já estava habituado ao ritmo industrial dos spaghetti. Eram rápidos, baratos, filmados ao ar livre e sem som direto. A imagem de Steffen aparecia freqüentemente nas telas, mas a voz variava conforme o mercado exibidor. “Nunca dublei minha voz nos westerns”, explica. “Existiam profissionais para isso. Eu não tinha tempo, precisava correr e ganhar mais dinheiro noutro set.” Convertido numa mina de ouro, o subgênero começou a atrair produtores de toda espécie − alguns sem condições de honrar seus compromissos financeiros. Steffen e Eduardo Fajardo enfrentaram

130 problemas dessa e de outras ordens em A Stranger in Paso Bravo (Italy/Spain, 1968). O eterno vilão relata: “Eu me recusei a rodar a última cena, na qual morro num incêndio, enquanto nós, atores, não fôssemos pagos. Três dias depois, o produtor chegou com uma maleta de dinheiro e enfim pude morrer.” Acombar (Fajardo) é o responsável pelos assassinatos da mulher e da filha de Gary Hamilton (Steffen). Este, injustamente acusado dos crimes, regressa a Passo Bravo após quatro anos. Ele se finge de covarde e sofre humilhações nas mãos dos capangas de Acombar. Então, empunha armas de novo para liderar os moradores contra o tirano. Quando lhe perguntavam qual o melhor diretor com quem havia trabalhado, Steffen não hesitava: “Anthony Steffen”. A Stranger in Paso Bravo, oficialmente atribuído a Salvatore Rosso, marcou sua única experiência na direção. Rosso, na verdade, foi demitido nos primeiros dias de filmagem. O produtor espanhol Francesco Carnicelli implorou ao

131 protagonista que assumisse a direção. Como garantia de pagamento, lhe entregaria sua própria Ferrari. “Não me interessava, pois eu já possuía um Alfa Romeo”, recorda o intérprete de Gary Hamilton. “Aceitei porque era aquilo ou nada. Saí com a Ferrari uma ou duas vezes no máximo. Ficou pegando poeira na minha garagem. Meses depois, Carnicelli apareceu com o tutu e eu lhe devolvi o carro.” Apesar de corriqueira, a fita tem algumas boas seqüências. Entre elas, a morte da mula do herói (uma referência ao personagem de Clint Eastwood em A Fistful of Dollars, que usa o mesmo tipo de montaria) e o sádico vilão se emocionando diante do nascimento de um potro. Os críticos, obviamente, não concordavam com Steffen quanto à qualidade da direção (ainda que acreditassem Salvatore Rosso estivesse sentado na cadeira de diretor, e não o astro da película). No Segnalazioni Cinematografiche (vol. 65, 1968) lia-se: “The film is identical to dozens of other Spaghetti Westerns made up by a fixed formula in which

132 violence is the main ingredient37”. Nem os fãs do caubói ítalo-brasileiro parecem ter gostado muito de A Stranger in Paso Bravo, que não ultrapassou os 34 milhões de liras nas bilheterias italianas. Steffen viveria outro Gary em Two Guns and a Coward (Italy, 1968), com resultados bem melhores nas bilheterias da Itália: 132 milhões de liras. Dessa feita, a direção ficou a cargo de Giorgio Ferroni (a.k.a. Calvin Jackson Padget). Incapaz de encarar situações violentas, Gary McGuire coloca sua habilidade de atirador a serviço de um espetáculo circense. Quando malfeitores, liderados por Coleman (Giovanni Cianfriglia, a.k.a. Ken Wood), aprisionam e torturam o menino Tony (Marco Stefanelli), o ás do gatilho precisa superar seus traumas para salvá-lo. Essa produção mediana tem por ponto alto o embate final entre artistas de circo e bandidos. No papel de um ídolo dos picadeiros, Steffen traja os figurinos mais coloridos de sua carreira.

37 Uno Straniero a Paso Bravo. In: POPPI, Roberto, PECORI, Mario. Dizionario del Cinema Italiano – I Film Vol. 3, dal 1960 al 1969. 133 Na cena em que Gary é achincalhado by Coleman’s henchman Owl Roy (o inglês Richard Wyler) diante da platéia do circo, Steffen demonstra uma versatlidade nem sempre aproveitada. O rosto do ator expressa um pavor e uma fragilidade dificilmente vistos nos heróis de western spaghetti. Como se trata de um típico exemplar do subgênero, o protagonista acaba fazendo aquilo que se espera dele: revida para salvar a vida do jovem Tony. Como um favor ao velho amigo Georgio Ferroni, o genial diretor de filmes de terror Mario Bava passou alguns dias no set, substituindo o cinematographer Sandro Mancori – Bava e Steffen haviam trabalhado juntos pela primeira vez em 1956, o primeiro como diretor de fotografia e o segundo como ator, ainda com seu verdadeiro nome, Antonio de Teffé, em City at Night. Em entrevista para a biografia Mario Bava – All the Colors of the Dark (2007), do crítico norte-americano Tim Lucas, o ator Richard Wyler remembers:

134 “I’m sure that man behind the câmera was Mario Bava. I wish I’d known more about him at the time. I dont rememember what happened to bring him there, but I remember his name because someone wrote it on the clapboard, one day. When he looked through the viewfinder of his camera and saw this, he walked round and rubbed it out with his elbow. He gave everyone a stern look, then went back behind the camera as everyone laughed.” Sobre o diretor e o astro de Two Guns and a Coward, o ator britânico diz: “I liked the director. But Tony Steffen was a bit of a snob”. Steffen retomaria o visual maltrapilho em A Name That Cried Revenge (Italy, 1968), de Mario Caiano (a.k.a. William Hawkins). Davy Flannagan (Steffen) perde a memória durante a Guerra Civil. Ao chegar à cidade de Dixon, toma conhecimento de que vem sendo procurado por deserção. Pior: sua ex- mulher, Lisa (Ida Galli, a.k.a. Evelyn Stewart, de Blood at Sundown), casou com o bandido Clay Hackett (Claudio Undari, a.k.a. Robert Hundar). O

135 verdadeiro responsável pelas desgraças na vida do herói é o juiz Sam Kellog (William Berger). A conclusão se dá numa cidade fantasma, onde Lisa assassina Hackett e Flannagan ajusta contas com Kellog. A exemplo de tantos outros westerns spaghetti, A Name That Cried Revenge fez fortuna nos cinemas da Itália (118 milhões de liras) – o que não o impedia de ser massacrado por críticos como N. Simsolo, da revista Saison ’72: “The Italian western series is a bit more tedious than that of Hollywood’s and a little less pernicious for the audiences. Everything is in surplus and melodramatic, with a desire to please everyone (...). Every Italian filmmaker wants to be a ‘little lion’ behind the... Leone, but the teeth are too short to compete with a similar spike38”. A derradeira das quatro parcerias entre Steffen e Caiano (Blood at Sundown, Ringo the Mark of Vengeance, Train for Durango e Man Who Cried for

38 Il Suo Nome Gridava Vendetta. In: POPPI, Roberto, PECORI, Mario. Dizionario del Cinema Italiano – I Film Vol. 3, dal 1960 al 1969. 136 Revenge) assinala também o primeiro desempenho do ítalo-brasileiro ao lado do austríaco William Berger. Um dos mais prolíficos intérpretes do cinema europeu, Berger faria quase oitenta filmes em trinta anos de carreira − encerrada com sua morte, em 1993. Numa entrevista a Christian Kessler publicada no fanzine European Trash Cinema (nº 13, 1996), ele critica o desafeto: “Anthony Steffen. Oohhh. Well, he can't, he isn't... (laughter). He can be quite horrible sometimes. He likes to make himself a little bit bigger than he actually is. I mean, he can't act, he can't remember his lines, he can't even fall properly. I can recall a funny incident. William Berger is not a very brave man, I have to admit (laughs). We shot a western and there was a scene with a suspension bridge. Antonio and I were supposed to meet each other on the bridge with our horses. The director thought it would be too dangerous for us to ride onto the bridge so we were supposed to ride close to the abyss, then the stuntmen were supposed to take over in a long shot. Steffen

137 started a long discussion with the director because he thought it would be too dangerous to ride so close to the abyss because the horse might go wild, he could fall into the deep, blah blah blah. Finally, the director shouted over to my side of the bridge to tell me they won't do this scene because Antonio considered it to be too dangerous. Incredible. I found this so stupid, I couldn't help but ride over the bridge with my horse and ask the director ‘What, I couldn't understand what you were saying?’ (laughs).” Na mesma entrevista, Berger expressa seu descontentamento por haver aceitado o convite para A Name That Cried Revenge e, em função disso, ter perdido a chance de atuar no clássico zapatta- spaghetti Run Man Run (Italy, 1968), de Sergio Sollima. Amarguras à parte, o depoimento dá provas da influência de Anthony Steffen nos westerns que lhe serviam de veículo – tendo inclusive o direito de alterar os roteiros de acordo com sua vontade: “My first Steffen western was quite a horrible experience for me because it was such a good

138 screenplay at the beginning. When I finished Faccia A Faccia39 for Sollima, he told me that the Siringo character I played in this film was supposed to occupy a much bigger part in his next western. He wrote the entire screenplay for me. Tomas Milian and I were supposed to play the leading parts, but because there were some delays I accepted the Steffen- project. Two weeks into shooting, Run Man Run (1968) was ready to be shot, and I couldn't work on it because I was stuck with that damn Steffen crap. I only signed for it because of the great treatment they gave me to read. Unfortunately, they changed the screenplay according to Steffen. The original story went like this. The hero has lost his memory, doesn't know what happened to him and who he actually is. I play his enemy, pretending to be his best friend. The whole story was very much a psychological thing, full of very well written dialogue and fascinating ideas. Much beyond

39 Berger cita por seu título original a co-produção ítalo-espanhola lançada em língua inglesa como Face to Face (Italy/Spain, 1967). Trata-se do segundo dos três zapata- spaghetti dirigidos por Sergio Sollima, antecedido por The Big Gundown (Italy/Spain, 1966) e precedido por Run Man Run (Italy, 1968). 139 the usual scenarios. When I read the screenplay, I couldn't believe my eyes. Steffen, of course, wanted to play the hero who immediately knows who is the evil one to be liquidated and who isn't. God. What a shit. If I only would have waited for the Sollima film.” A respeito dos ataques, Steffen dá de ombros e dispara: “Berger era um drogado.” O western seguinte do ítalo-brasileiro, Dead Men Don’t Count! (Italy/Spain, 1968), teve a direção de Rafael Romero Marchent, membro de um ilustre clã do cinema popular hispânico. Seu irmão mais velho, Joaquín, dirigiu eurowesterns considerados precursores dos spaghetti; o caçula, Carlos, fez carreira como ator. O enredo acompanha a chegada dos caçadores de recompensa Fred (Steffen) e Johnny (Mark Damon) a Blackstone. Eles logo arrumam encrenca com o xerife Bob (Piero Lulli), envolvido num esquema ilícito de compra de terras. Por trás do golpe se encontra Steve Rodgers (Luis Induni), cuja esposa (Maria Martín) passa a suspeitar que Johnny é seu

140 filho desaparecido. Quando as suspeitas da mulher se confirmam, ela mata o marido para salvar a vida do rapaz. Após eliminarem Gregory Lassiter (Raf Baldassarre), capanga de Rodgers, e o corrupto Bob, os dois protagonistas partem para novas aventuras. Além de mesclar habilmente ação e violência, o cineasta explora a boa química entre Steffen e Damon, que tinham atuado juntos em Train for Durango. A imprensa brasileira dedicou à película o preconceito de praxe. Em O Globo40 (27 set. 1969), por exemplo, Fernando Ferreira escreveu: “Anthony Stephen [sic] vai tentando imitar Clint Eastwood, em western italiano, o que já não é para imitar, enquanto Mark Damon vai dando demonstração de incurável canastrice. A tudo preside, sem capacidade maior do que a de filmar brigas violentas e tiroteios ridículos, o señor Rafel Romero Marchent, que segue a linha dos westerns ditos italianos, rodados por vezes na

40 O Globo é um importante jornal brasileiro diário, publicado desde 29 de julho de 1925. À frente dele, Roberto Marinho (1904-2003), filho do fundador, construiu o maior império de telecomunicações do Brasil, que inclui, além do jornal, a Rádio Globo, a Editora Globo e, principalmente, a Rede Globo de Televisão. 141 Espanha. Aconselhamos o espectador a passar longe, muito longe desses spaghetti westerns.” O descaso era parecido do outro lado do Oceano Atlântico, como se verifica na resenha do jornal italiano Il Resto del Carlino (9 de maio de1969): “For this reason it drags wearily, without a spark of originality, this Italian-Spanish film shot (...) in a barren Iberian landscape of Rafael Romero Marchent. Abandoned to chance, as (Marchent's) direction, ate the interpretation of Anthony Steffen and Mark Damon41”. Indiferentes à opinião dos críticos, Rafael Romero Marchent e Anthony Steffen voltariam a se reunir em Garringo (Italy/Spain, 1969). Com Joaquín Romero Marchent na função de roteirista e Carlos Romero Marchent no elenco, o diretor fez desta uma de suas melhores obras. Trata-se de um raro faroeste centrado na figura de um serial killer.

41 I Morti Non Si Contano. In: POPPI, Roberto, PECORI, Mario. Dizionario del Cinema Italiano – I Film Vol. 3, dal 1960 al 1969. 142 Na infância, Johnny (o alemão Karl Hirenbach, a.k.a. Peter Lee Lawrence) testemunhou o assassinato de seu pai por um oficial ianque. O trauma o transformou num assassino em série, que tortura e mata militares. O tenente Garringo (Steffen) chega a Bells City a fim de desvendar as mortes. Durante a tentativa de assalto a uma diligência, Johnny leva um tiro do tenente. De volta à cidade, é morto à sangue- frio por seu comparsa, Damon (Raf Baldassarre, de Dead Men Don’t Count!). Este duela contra Garringo, que sai vitorioso e leva com ele o cadáver de Johnny. A despeito de haver um momento de humor ou outro, o clima sombrio domina a narrativa. O próprio Garringo, agente da lei, tortura prostitutas e mata homens desarmados para cumprir sua missão. Se o mocinho age assim, o que esperar do vilão? O loiro e franzino Peter Lee Lawrence dá um show à parte na pele do psicopata Johnny. Após fazer uma ponta em For a Few Dollars More, Lawrence virara uma espécie de herói das matinês do spaghetti. Seus bangue-bangues via de regra o traziam como o caubói

143 impoluto, figura não muito comum no subgênero − Garringo constitui, obviamente, uma exceção. Um tumor no cérebro o levaria à morte − ou ao suicídio, segundo a versão usualmente aceita − em 1974, aos 29 anos. O filme seguinte de Steffen, No Room to Die (Italy, 1969), dirigido por Sergio Garrone, assinala seu reencontro com William Berger. “Lembro vagamente de Antonio e do senhor Berger discutindo, talvez sobre o roteiro, contudo era Berger quem estava sempre aos berros”, conta a atriz Nicoletta Machiavelli, hoje uma professora de italiano em Seattle, Estados Unidos. “Permaneceu na minha cabeça a imagem daquele homem alto, queimado de sol, de olhos claros e tristes, no qual a roupa de caubói ficava perfeita. Diferente dos demais astros de spaghetti, verdadeiras divas cheias de si, Antonio era discreto e profissional. Um autêntico cavalheiro.” Johnny Brandon (Steffen) e David “Bible” Murdock (Berger), caçadores de recompensa, se unem a fim de capturar fugitivos da Justiça que prestam

144 serviço ao fazendeiro Fargo (, irmão do diretor), responsável pela migração ilegal de peões mexicanos para os Estados Unidos. Ao tomar conhecimento das atividades ilegais do fazendeiro, a jovem Maja (Nicoletta) o recusa e termina seqüestrada pelos homens dele. Brandon descobre que Murdock e Fargo são cúmplices, elimina-os num duelo a três, liberta Maja e entrega o dinheiro do vilão para ela repartir entre os mexicanos. O confuso roteiro, de autoria do próprio Garrone, ganha força graças ao senso visual do cineasta, do qual dão provas os enquadramentos insólitos no decorrer da fita e o duelo tríplice no final − uma homenagem a The Good the Bad and the Ugly, de Sergio Leone. Steffen recria o tipo estóico que o consagrou, transpirando dor na seqüência de espancamento de seu personagem: os homens de Fargo surram Brandon, obrigam-no a cavar a própria cova e, fingindo lhe oferecer água, jogam tequila nas feridas dele.

145 Berger, por sua vez, brilha no papel de Murdock, um pistoleiro-pregador vestido de preto da cabeça aos pés e com a bíblia nas mãos. Supostamente, esse personagem teria inspirado Quentin Tarantino a criar o Jules Winnfield vivido por Samuel L. Jackson em Pulp Fiction (EUA, 1994). O filme de Garrone, inclusive, estava entre os 32 selecionados para a retrospectiva Secret History of Italian Cinema: the Spaghetti Western, realizada no 64º Festival de Veneza, em 2007, com Tarantino como “godfather”. Em depoimento ao catálogo da mostra, Garrone fala a respeito dos percalços para realizar esse seu terceiro western (de um total de dez nos quais esteve envolvido como roteirista, produtor ou diretor): “I had a great cast, a nice idea, but we ran out of money half way through. We had to stop at Magliana because we'd run out of film. I went and asked another crew shooting a film nearby to lend us two reels of film, so I finished the day's shoots”.

146 Os 75 milhões de liras que No Room to Die faturou nas bilheterias da Itália ficaram aquém dos westerns mais bem-sucedidos do ítalo-brasileiro, que em geral utrapassavam a casa das centenas de milhões de liras. A fórmula dos westerns spaghetti começava a dar sinais de desgaste, mas os orçamentos cada vez mais modestos dos filmes ainda garantiam algum lucro. Assim, Steffen e Garrone voltaram a trabalhar juntos em The Stranger’s Gundown, baseado num roteiro que haviam escrito a quatro mãos. Última das três aventuras do caubói a estrear naquele 1969, essa película não se saiu muito melhor que a anterior nas bilheterias: 78 milhões de liras. Mas isso não impediu que se tornasse objeto de culto entre os fãs do western spaghetti, assegurando ao galã-roteirista um lugar de honra na história do subgênero.

147 VIII. Duel in the Sun (a.k.a. Today We Kill Tomorrow We Die)

Um misterioso homem com capa e chapéu azuis chega a um vilarejo, onde mata Sam Hawkins (Victoriano Gazzara). Em Desert City, o mesmo estranho aparece diante do fazendeiro Rod Murdock (Paolo Gozlino). É Django (Steffen), que serviu sob suas ordens durante a Guerra de Secessão. Os oficiais confederados Rod Murdock, Sam Hawkins e Ross Howard (Jean Louis) haviam permitido a chacina de seus soldados pelo exército ianque em troca de dinheiro. Quando Howard também morre assassinado, Murdock se convence de que Django retornou do mundo dos mortos em busca de vingança. Irmão de Murdock, o insano Luke (Luciano Rossi, a.k.a. Lu Kamante) não acredita e logra alvejar o suposto fantasma. Em júbilo, exibe a mão manchada de sangue: “Eu o acertei! Ele não é sobrenatural, é de carne e osso”!. Mesmo ferido, o vingador consegue

148 liquidar Luke, Murdock e os mercenários a serviço dos irmãos. Na revista francesa Saison ’71, o crítico H. Arnault chamou a atenção para a violência excessiva e a falta de originalidade (acusações recorrentes em se tratando dos westerns spaghetti de então): “It could be accused of plagiarism of Sam Peckinpah (The Wild Bunch) or a tribute to the violence erected at the beginning (...). The hero shows, in this context, his superiority due to his almost supernatural gifts42”. O enredo de The Stranger’s Gundown (Italy, 1969) leva as assinaturas do diretor e do astro da película. Embora Steffen já fosse conhecido por sugerir modificações nos roteiros, a parceria com Sergio Garrone representou sua estréia oficial no posto de roteirista − função sempre exercida sob seu verdadeiro nome, Antonio de Teffé. No original, o título do filme é Django, Il Bastardo. De olho no êxito de Django (Italy/Spain, 1966), o duo havia se

42 Django, Il Bastardo. In: POPPI, Roberto, PECORI, Mario. Dizionario del Cinema Italiano – I Film Vol. 3, dal 1960 al 1969. 149 apropriado indevidamente, como de hábito no cinema italiano da época, do nome do herói. No filme de Corbucci, Django é um ex-soldado ianque; no de Garrone, um ex-confederado. Em vez das amplas e ensolaradas paisagens típicas do subgênero, a fita explora cenas noturnas e claustrofóbicas, filmadas no estúdio romano Elios Film. Gino Santini responde pela fotografia de atmosfera gótica. Com um orçamento ainda menor que o de No Room to Die, o diretor Garrone novamente investe em posicionamentos de câmera desconcertantes. Ele terminaria a carreira dirigindo tramas de violência e erotismo transcorridas em campos de concentração e presídios femininos, a última delas lançada em 1985. Depois, abriria uma pizzaria em Roma. Quatro anos após a estréia italiana de The Stranger’s Gundown, chegava às telas dos Estados Unidos uma obra com ponto de partida bastante similar. Dirigido e estrelado por Clint Eastwood, High Plains Drifter (EUA, 1973) gira em torno de um

150 xerife que, supostamente, regressa do além em busca de vingança. Segundo o astro e diretor norte- americano, High Plains Drifter surgiu de um tratamento de nove páginas que circulava havia anos nos corredores da Universal Pictures. Ernest Tidyman, vencedor do Oscar por The French Connection (EUA, 1971), desenvolveu o roteiro a partir desse esboço. Para críticos como o norte-americano Paul Simpson, não restam dúvidas que High Plains Drifter é copiado de The Stranger’s Gundown. Em seu livro The Rough Guide to Westerns (2006), ele vai ainda mais longe, sugerindo que outro sucesso de bilheteria dirigido e estrelado por Eastwood, teria bebido da mesma fonte: “A horror Western spun off the famous Django franchise, this crude, yet not ineffective, tale is an obvious inspiration for Eastwood’s High Plains Drifter (1973) and Pale Rider (1985), his supernatural take on Shane. As the mysterious stranger, Anthony Steffen walks like a man recovering from rigor mortis

151 – appropriately, since he is a reencarnated Civil War veteran seeking revenge”. Não deixa de ser irônico que um faroeste dirigido pelo norte-americano se assemelhe tanto a um filme anterior co-escrito por um ator tachado de “resposta italiana a Clint Eastwood” − rótulo que Steffen, aliás, detestava. Além dos argumentos semelhantes, The Stranger’s Gundown e High Plains Drifter têm em comum o acento gótico nas trilhas sonoras43 e o uso de flashbacks na hora de explicar a motivação dos protagonistas. A visão de uma garrafa de uísque impele o Django de Steffen a rememorar o massacre de seu pelotão. De maneira análoga, o som de chibatadas faz o Estranho de Eastwood recordar o açoitamento até a morte do xerife de Lago. As afinidades entre as produções não passaram despercebidas ao norte-americano Herman Cohen, produtor de I Was a Teenage Werewolf (EUA,

43 Vassili Kojucharov e Elsio Mancuso compuseram a trilha de The Stranger’s Gundown; Dee Barton, a de High Plains Drifter. A dupla italiana de compositores também assina a música de No Room to Die, parceria anterior do diretor Sergio Garrone com Anthony Steffen. 152 1957), I Was a Teenage Frankenstein (EUA, 1957) e outros cult movies. Coube a ele adquirir os direitos de Django, Il Bastardo e lançá-lo, sob o título de The Stranger’s Gundown, nos Estados Unidos em 1974 – numa flagrante tentativa de pegar carona no sucesso de High Plains Drifter. “Um demônio... do inferno”, responde Django, em tom monocórdio, quando lhe perguntam quem é. O olhar morto e os movimentos mecânicos de Steffen, freqüentemente acusado de inexpressivo pelos críticos, conferem um ar fantasmagórico ao vingador. O tom da interpretação se altera depois que o herói leva um tiro. Então, o rosto de Steffen mistura a dor do ferimento ao desejo de vingança. A razão do ódio vem à tona no flashback do extermínio da tropa confederada, quando seus companheiros de farda são assassinados à traição. Nos braços de Django morre o soldado Evans, desempenhado pelo brasileiro Celso Faria. A carreira de Faria no cinema brasileiro começara nos anos 1950. Na segunda metade da década seguinte, ele

153 desembarcou na Itália sem um tostão no bolso e conquistou papéis secundários em westerns de baixo orçamento, como Don’t Wait Django, Shoot! (Italy, 1967), Django and Sartana’s Showdown in the West (Itália, 1970) e Brother Outlaw (Italy, 1971). Ao voltar para o Brasil, Faria fez piada com os jornalistas que o aguardavam no aeroporto: “Vieram me perguntar qual pseudônimo eu havia usado lá. Como não tinha nenhum, misturei Tony Curtis com Dana Andrews e respondi Tony Andrews.” Publicada pelos jornais da época, a falsa informação consta até da Enciclopédia do Cinema Brasileiro44 (2000), a mais importante publicação do gênero naquele país. Em Roma, Faria chegou a conhecer Clint Eastwood numa festa. “Fumei maconha com ele no banheiro”, rememora. A nacionalidade brasileira aproximou-o de outro astro dos spaghetti: “Steffen e eu costumávamos nos encontrar na Piazza del Popolo,

44 Em inglês, “______”. 154 onde os atores e jornalistas se reuniam. Graças a ele, consegui o papel em The Stranger’s Gundown .” Após esse filme, Antonio de Teffé co- escreveu um novo roteiro para Anthony Steffen. A exemplo do anterior, Shango (Italy, 1970) tangenciava a Guerra Civil e tinha como co-roteirista o próprio diretor da fita, Edoardo Mulargia (a.k.a. Edward G. Muller). O nome do título funde o caubói interpretado por Alan Ladd em Shane (EUA, 1953), de George Stevens, com o pistoleiro-símbolo do spaghetti, Django. Em uma de suas melhores obras, o cineasta narra a história do único sobrevivente do massacre de um pelotão ianque. Para obrigar Shango a revelar o esconderijo de uma fortuna em ouro, o major confederado Droster (Eduardo Fajardo) e o bandido mexicano Martinez (Maurice Poli) o aprisionam. Ele escapa e encontra guarida no vilarejo mexicano dominado por capangas da dupla. Refeito dos ferimentos, o herói lidera os aldeões numa revolta contra os opressores.

155 As cenas internas foram filmadas em Cinecittà; as externas, em Comune di Manziana, município a sudeste de Roma, próximo ao Mar Tirreno. A cor outonal do lugar, raramente vista no subgênero, acentua o clima melancólico. Outro reforço nesse sentido vem da trilha sonora de Gianfranco Di Stefano. Nela, destaca-se a versão vocal, mas sem palavras, do tema confederado When Johnny Comes Marching Home. Na galeria de tipos sujos e malvestidos de Steffen, Shango atinge as condições mais subumanas. O galã-roteirista teve de abrir mão de sua assumida vaidade para encarná-lo. Ele aparece preso como um gorila numa jaula e bebendo água feito um cachorro que acabou de cruzar o deserto. Não são menores os sofrimentos dos habitantes da aldeia. Martinez enterra mulheres até o pescoço e incendeia círculos de óleo ao redor das cabeças delas. O major Droster, por sua vez, manda seus homens abrirem fogo contra os camponeses num dia de festa.

156 Aos 11 anos, o intérprete infantil Giuseppe Valerio Fioravanti (a.k.a. Giusva Fioravanti) vive Pedrito, garoto mexicano que ajuda Shango. Já adulto, ele fundaria o grupo terrorista de extrema direita N.A.R. (Nuclei Armati Rivoluzionari45). Fioravanti e a mulher, Francesca Mambro, foram condenados pelo atentado à bomba ocorrido na Estação de Bolonha em 2 de agosto de 1980, no qual 85 pessoas morreram e 200 ficaram feridas. Preso em 6 de fevereiro de 1981, ele cumpriu 23 anos de pena e conseguiu a liberdade condicional em abril de 2004. “Era um bom menino”, atesta Steffen. “Não criava problemas no set.” Uma curiosidade: por causa do pavor a cavalos, na função de roteirista o ítalo-brasileiro cuidava de criar para si caubóis que se mantinham a distância da sela. Tanto em The Stranger’s Gundown quanto em Shango, ele não cavalga uma vez sequer. Entre uma filmagem e outra, seguia a bancar o playboy internacional. O brasileiro Sérgio Goldhirch o conheceu no fim dos anos 1960, em Londres. Num

45 Em inglês, “armed revolutionary nuclei”. 157 café, viu aquele sujeito alto e bem-apessoado amassar uma nota de dinheiro e jogá-la ao chão. O ator esperou passar uma bela garota, apanhou a cédula e perguntou se lhe pertencia. “Diante da resposta negativa, o safado pediu champanhe ao garçom, pagou com o dinheiro que fingira achar e convidou a moça a beber junto”, relata Goldhirch. O galã e diretor brasileiro Anselmo Duarte também conheceu Steffen naquela época. Vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes por The Given Word (Brasil, 1962), ele pretendia dirigi-lo numa co-produção ítalo-brasileira sobre a vida do revolucionário italiano Giuseppe Garibaldi. O encontro se deu em Roma, no apartamento do astro- caubói. “O Anselmo bebeu todo o meu uísque e saiu de lá carregado, sem falar coisa nenhuma a respeito do projeto”, diz Steffen. Duarte retruca: “Ele não passava de um italiano metido a besta.”

9. The Fastest Gun Alive (a.k.a. Blazing Bullets)

158 Clint Eastwood, Franco Nero, Giuliano Gemma, Gianni Garko, Tomás Milian, Lee Van Cleef… Nenhum deles nem ninguém estrelou mais westerns europeus do que Anthony Steffen. Foram 26, incluindo o pré-spaghetti The Last Tomahawk e a aventura Siete Chacales − ambientada na Espanha, porém com feitio de bangue-bangue. Quintessência dos faroestes ítalo-espanhóis de baixo orçamento, ele se tornou o único artista a encarnar três dos quatro principais heróis do subgênero: Ringo, Django e Sabata. Embora jamais tenha sido Sartana, participou de sua gênese quando Gianni Garko fez pela primeira vez um personagem com tal nome, ainda como vilão, em Blood at Sundown. Consciente do ritmo industrial do qual sua carreira dependia, nunca hesitou em assumir papéis alheios. Em Arizona Colt Returns (Italy/Spain, 1970), de Sergio Martino, por exemplo, Steffen vive o caubói que Giuliano Gemma havia interpretado em Arizona Colt (France/Italy, 1966). Acusado injustamente de

159 um assalto, Arizona Colt (Steffen) conta com a ajuda do beberrão Double Whisky (Roberto Camardiel) para desbaratar a quadrilha do verdadeiro criminoso, Kean (o espanhol Aldo Sambrell, de Train for Durango). O roteiro leva a assinatura de Ernesto Gastaldi (Last Chance for Life e Blood at Sundown), cuja extensa lista de bons serviços prestados ao cinema popular italiano inclui outros westerns − o Arizona Colt (France/Italy, 1966) original, de Michele Lupo; Days of Wrath (Itály/West Germany, 1967), de Tonino Valerii −, além de filmes de guerra − Desert Assault (France/Italy,1969), de Mino Loy −, suspense − The Sweet Body of Deborah (France/Itália1968), de Romolo Guerrieri; All the Colors of the Dark (Italy/Spain, 1972), de Sergio Martino − e terror − Terror in the Crypt (1964, Italy/Spain), de Camillo Mastrocinque (a.k.a. Thomas Miller); The Vampire and the Ballerina (Italy, 1960), de Renato Polselli. “Gastaldi era inteligente, mas em Arizona Colt Returns, as boas idéias foram sugestões minhas”, assegura Steffen, com arrogância.

160 A exemplo de Arizona Colt Returns, Viva Sabata! (Italy/Espanha, 1970) começa no registro da comédia e termina no da tragédia. O gringo Sabata (Steffen) e o mexicano Mangosta (Eduardo Fajardo) se associam ao caixa de banco Peter (Karl Hirenbach, a.k.a. Peter Lee Lawrence) para um roubo de 300 mil dólares. Após o golpe, Mangosta foge com o produto do assalto rumo ao México. Quando seus dois ex- sócios o localizam, mercenários a serviço dele enfrentam mercenários incumbidos de capturá-los. Os três escapam. É a vez de Peter trair Sabata, revelando seu plano de ficar com o dinheiro. O duelo final acontece enquanto um ferido Mangosta, em delírio, queima nota por nota a fortuna roubada. Do caçador de recompensas feito por Lee Van Cleef em Sabata (Italy, 1969) e The Return of Sabata (France/Italy/West Germany, 1971), ambos de Gianfranco Parolini (a.k.a. Frank Kramer), o diretor e co-roteirista argentino Tulio Demichelli aproveita apenas o nome. O Sabata de Steffen é um reles ladrão de bancos, sem a complexidade dos personagens de

161 Lawrence (adversário do astro em Garringo) e Fajardo (seu mais freqüente vilão). De novo, o espanhol rouba a cena. Nem a peruca ridícula tira o brilho do ardiloso Mangosta por ele interpretado. Fajardo e Steffen digladiam novamente em A Man Called Joe Clifford (1970), de Leopoldo Savona. O ator mambembe Joe Clifford (Steffen) vai a Landberry para tomar posse da mina de ouro herdada de seu tio. Lá, fica sabendo que o responsável pela morte do velho Frank Clifford, Berg (Fajardo), controla a mina e toda a cidade. Joe Clifford usa punhos, revólveres e talento dramático a fim de vingar o tio. É o mote para humor e acrobacias na linha das séries Sabata e Sartana. A temática política de Killer Kid, parceria anterior entre o diretor e o caubói, dá lugar a um espetáculo de ação ininterrupta. A narrativa se encerra com um dos maiores tiroteios da história do bangue- bangue. Ao longo de quase vinte minutos, Joe Clifford abate feito moscas dezenas de bandidos. A um deles pede, disfarçado de mulher, que tome conta de seu

162 carrinho de bebê. Dentro, há bananas de dinamite prestes a explodir. A seqüência presta tributo a Chuck Jones, diretor de desenhos da turma do Pernalonga. Outro homenageado é o dramaturgo inglês William Shakespeare. Sob disfarce de velho corcunda, Clifford encena em praça pública um trecho de Macbeth acerca de ganância e morte. Na abertura do filme, o herói recita o monólogo de Hamlet e extermina cinco bandidos com uma pistola oculta dentro da caveira em suas mãos. Profundo conhecedor das peças de Shakespeare, Pirandello, Tennessee Williams, Arthur Miller e Eugene O’Neill, Steffen vislumbrou naquela cena a chance de exibir seu talento dramático. Contudo, à exceção do “ser ou não ser”, todas as falas do monólogo foram encobertas pela trilha sonora de Bruno Nicolai. “Sacanagem”, queixa-se, amuado. Depois de se chamar Shango, Arizona Colt, Sabata e Joe Clifford em 1970, o ítalo-brasileiro voltou a ser Django em A Man Called Django! (Italy, 1971), de Edoardo Mulargia (a.k.a. Edward G.

163 Muller). Em busca de vingança pela morte de sua mulher, Django (Steffen) impede o enforcamento do mexicano Carranza (Glauco Onorato). O fora-da-lei, ao que tudo indica, conhece a identidade dos assassinos. A caçada leva a dupla a enfrentar o bando de Jeff (Stelio Candelli). Na conclusão, Django descobre que Carranza tomou parte no assassinato de sua mulher. “Adios, amigo”, despede-se, antes de descarregar três tiros fatais. As filmagens se deram no estúdio Elios Film e na Villa Mussolini, em Roma. Nos bastidores, Steffen teve de driblar o assédio da intérprete da garçonete apaixonada por Django. “Eu sou amigo do seu pai, Simonetta, e já peguei você no colo”, justificava-se para Simonetta Vitelli (a.k.a. Simone Blondell), filha do cineasta Demofilo Fidani. Outra paixão a ultrapassar os limites do roteiro foi a de Stellio Candelli pelas curvas perfeitas da brasileira Esmeralda Barros. Ela desempenha Lola, amante do personagem de Candelli e mulher do dono de saloon Paco (o intérprete e diretor teatral Donato Castellaneta).

164 Baiana de Ilhéus, Esmeralda fez diversas fitas no Brasil e na Europa. Afastada da carreira artística, ela mora hoje em Itaipava, no Rio de Janeiro. Sobre Steffen, opina em tom bem-humorado: “Era um pedante, tinha o rei na barriga.” Embora se aproprie do Django de Sergio Corbucci, A Man Called Django! contém referências em maior número à obra de Sergio Leone. Quando o herói acende seu charuto com uma banana de dinamite e a arremessa contra o adversário, a fala de Paco alude a A Fistful of Dollars: “Um truque desses vale um punhado de dólares.” Uma caixa de música evoca a mulher do protagonista, cumprindo a mesma função do relógio musical da irmã do coronel Mortimer (Lee Van Cleef) em For a Few Dollars More. Na pele do mexicano Carranza, o ator e dublador Glauco Onorato é quase um clone do Tuco de Eli Wallach em The Good, the Bad and the Ugly. E a seqüência na qual Django o salva da forca igualmente busca inspiração nesse derradeiro episódio da “trilogia dos dólares.”

165 Àquela altura, o subgênero andava com a corda no pescoço. Os tempos estavam mudando e novos filões populares ganhavam força na Itália. No mesmo ano de A Man Called Django!, Steffen estrelaria seu primeiro não-western desde 1966. Também em 1971, Antonella Caramazza, sua namorada havia seis anos, se tornaria a senhora Antonio Luiz de Teffé. Definitivamente, os tempos estavam mudando.

166 10. Yellow Sky (a.k.a. The Smiling Cowboy)

Em 1929, a editora italiana Mondadori começou a publicar romances de mistério com complexos desenhos dentro de janelas circulares sobre um fundo amarelo na capa. Tais livros ficaram conhecidos como gialli, plural de giallo (amarelo em italiano). Um subgênero cinematográfico inspirado nesse tipo de literatura começou a tomar forma a partir do thriller preto-e-branco The Evil Eye46 (Italy, 1963), de Mario Bava. O uso da cor em Blood and Black Lace (France/Italy/West Germany, 1964) permitiu ao mesmo cineasta definir padrões para as seqüências de homicídio típicas do giallo: estilizadas e delirantes, de um colorido quase psicodélico. Coube a Dario Argento consolidar a filão com seu The Bird with the Crystal Plumage (Italy/West Germany, 1970). Em síntese, nos gialli um serial killer mata boa parte do elenco até ser desmascarado numa

46 Released in DVD as The Girl Who Knew Too Much. 167 conclusão surpreendente. Embora o figurino dos personagens seja contemporâneo, o criminoso via de regra utiliza luvas negras, chapéu fedora e sobretudo de couro démodés. A polícia geralmente se revela incapaz de desvendar os crimes, ficando a solução a cargo do principal suspeito. Convertido à força em detetive, este precisa correr contra o tempo a fim de provar sua inocência. No decorrer da investigação, câmeras subjetivas transformam o espectador em testemunha ocular de cenas de sexo e atos de violência. Como a maioria das vítimas são mulheres, muitos críticos acusam a fórmula de misógina. O primeiro giallo de Anthony Steffen, The Night Evelyn Came Out of the Grave (Italy, 1971), é exemplar nesse sentido. O lorde inglês Alan Cunninghan (Steffen) tortura prostitutas ruivas semelhantes à sua finada mulher, Evelyn. O protagonista passa de vilão a herói quando um assassino de luvas negras começa a eliminar membros de sua família. Caberá a ele descobrir por trás da máscara do assassino o simpático

168 primo George (Enzo Tarascio, a.k.a. Rod Murdock), que planeja enlouquecê-lo e herdar a fortuna dos Cunninghan. Para isso, George conta com o auxílio da segunda esposa de Alan, Gladys (Marina Malfatti), e de uma das vítimas do lorde, Susie (Enrica Bianchi Colombatto, a.k.a. Erika Blanc, de Blood at Sundown), que se faz passar pelo fantasma de Evelyn. A atuação caricata de Steffen contribui para o clima de grand-guignol que o bissexto diretor Emilio Paolo Miraglia imprime à narrativa. Nos moldes daquelas peças teatrais de horror, populares na Europa em fins do século 19, bizarras reviravoltas se sucedem na trama. O filme tornou-se o maior sucesso do ítalo- brasileiro nos Estados Unidos, onde estreou como The Night Evelyn Came Out of the Grave em 1972. No livro de ensaios Danse Macabre (1981), Stephen King apresenta uma valiosa informação sobre as exibições desse clássico giallo em solo norte- americano: “During one imported Italian turkey, The Night Evelyn Came Out of the Grave (nifty title!), the

169 theaters advertised ‘bloodcorn’, which was ordinary popcorn with a red food dye added”. Em 2006, a NoShame Films lançou na Itália e nos Estados Unidos a primeira edição do filme em DVD a fazer jus à concepção visual do diretor. As versões anteriores, tanto em VHS quanto em DVD, tinham imagem opaca e cortes que em alguns casos chegavam a vinte minutos dos 103 originais – essas monagens mutiladas talvez justifiquem, em parte, a má impressão que Stephen King manifestou a respeito de The Night Evelyn Came Out of the Grave no livro Danse Macabre. O brilho nos olhos azuis de Steffen ao pedir às prostitutas que calcem botas de couro antes de açoitá-las, por exemplo, estava ausente na maioria das cópias. O mesmo vale para a morte de tia Agatha (Joan C. Davies), cuja cabeça é espatifada contra uma rocha e o corpo, atirado num viveiro de raposas. Outra seqüência marcante diz respeito ao encontro entre lorde Cunninghan e Susie no pub onde ela trabalha. Ao som da trilha de Bruno Nicolai, a

170 dançarina sai de um caixão e realiza um excêntrico número de strip-tease. “And it was me who invented that scene”, conta Erika Blanc em entrevista a Christian Kessler no fanzine European Trash Cinema (nº 15, 1997). “They only told me, ‘Erika, do a nice strip-tease’, and I decided to bring in the weird stuff. There was quite a good atmosphere on the set.” Em depoimento para o bônus da edição em DVD da NoShame, Erika comenta sobre seu colega de cena, com quem já havia trabalhado antes: “With de Teffé I made Blood at Sundown, a western movie. He was a very conceited man, even more than me. Now you see me putting on some makeup but I’m not so vain, while he used to... Before shooting a scene he used to take his mirror and if he had a cigar... [Erika coloca um lápis de maquiagem na boca, como se fosse um cigarro, e faz pose de galã, imitando Steffen]. ‘Are you ready’? ‘Yes, I’m ready’. (...) He was vainer than me”. “I think it was this movie where we rented a castle or a mansion from a young guy whose father

171 was on vacation”, lembra Steffen sobre os bastidores de The Night Evelyn Came Out of the Grave. “The son wanted to earn some money. It was supposed to be an old castle, with lots of shattered windows and stuff, so we had to make it up, kick some furniture around, break some stuff... Then the father came back early, and he almost had a heart attack”! O ator não nutria apreço por essa produção. “Era uma bobagem”, dizia. O posto de obra favorita em sua filmografia cabe a outro giallo, The Crimes of the Black Cat (Italy, 1972), dirigido por Sergio Pastore. “Tive de treinar muito para interpretar um cego”, justifica. “Foi um dos papéis mais difíceis da minha carreira.” Deficiente visual, o compositor Peter Oliver (Steffen) ouve num bar os ajustes de um assassinato. No dia seguinte, sua ex-namorada é morta no ateliê de alta-costura de Françoise Bally (a croata Sylva Koscina). As suspeitas recaem sobre o marido de Françoise, Victor Morgan (Giacomo Rossi-Stuart, de The Last Days of Sodom and Gomorrah). Outros

172 crimes se seguem. Em comum, há uma echarpe de seda amarela ao lado de cada vítima. Com a ajuda do mordomo Burton (Umberto Raho) e da modelo Margot Thornhill (Shirley Corrigan), Oliver investiga as mortes por conta própria. O inverossímil modus operandi do assassino consiste em enviar às vítimas uma echarpe e uma cesta de piquenique. De dentro da cesta sai um gato preto que ataca quem usa o adereço. Impregnadas de veneno, as garras do animal levam à morte. Os pacotes mortais são remetidos pela ex-artista circense Susan Leclerc (Giovanna Lenzi, a.k.a. Jeannette Len). Ela cumpre ordens de madame Françoise Bally, responsável por sustentar seu vício em morfina. Desfigurada por causa de um acidente de carro, a estilista usa Susan para eliminar as modelos que chantageiam seu marido. Só mesmo um giallo seria capaz de converter a musa do cinema italiano Sylva Koscina numa vilã insana e disforme Bastante popular à época, a estrela recebe homenagem no título da música-tema da vilã

173 Françoise: Sylva Bossa. A trilha, fundamentada em vocais femininos e piano, foi composta por Manuel De Sica, filho do mestre do neo-realismo Vittorio De Sica. Não era a primeira vez em que Sylva desfilava nas telas ao som do ritmo tipicamente brasileiro: uma década antes ela havia filmado no Brasil a comédia em episódios Girl Game (/France/Italy, 1962), uma co-produção dirigida pelo italiano Steno e com os brasileiros Tom Jobim, Vinícius de Moraes e outros mestres da bossa nova na trilha sonora. O cinema popular italiano nunca teve pudores em reciclar idéias alheias. A blind writer (Van Johnson) who overhears a conversation that leads him into a complex investigation, along with his girlfriend (Vera Miles) and his butler (Cecil Parker) was exactly used on Henry Hathaway’s thriller 23 Paces to Baker Street, (USA, 1956), written by Nigel Balchin based on the novel The Nursemaid who Disappeared (a.k.a. Warrant for X, 1938), by Philip MacDonald. Ou seja, com relação ao argumento original, o filme de Pastore

174 só mudou a profissão do protagonista: músico, em vez de escritor. Propositadamente labiríntico, The Crimes of the Black Cat ainda presta tributo a alguns clássicos do giallo. A ambientação no mundo da moda, por exemplo, remete a Blood and Black Lace, de Mario Bava. A morte de uma modelo nos trilhos do metrô e o herói cego evocam The Cat o’ Nine Tails (France/Italy/West Germany, 1971), de Dario Argento. A metalinguagem se torna explícita quando uma seqüência de Lizard in a Woman’s Skin (France/Italy/Spain, 1971), de Lucio Fulci, é apresentada como se pertencesse à película para a qual Oliver está compondo a trilha sonora. Protagonista daquele filme, a brasileira Florinda Bolkan participa das cenas que aparecem em The Crimes of the Black Cat. A fita de Pastore marca a única aparição conjunta de Florinda e Steffen nas telas, embora apenas ele estivesse realmente no set.

175 Escrito pelo próprio diretor em parceria com Alessandro Continenza e Giovanni Simonelli, o roteiro de The Crimes of the Black Cat reúne estelionato, uso de drogas, lesbianismo e nudez. Em sua mais controversa seqüência, o filme cita Psycho (EUA, 1960), de Alfred Hitchcock. O assassinato de Margot no chuveiro mostra tudo que o sempre elegante cineasta inglês se limitou a sugerir. Ao ser lançado na Inglaterra natal de Hitchcock, o filme foi proibido para menores de 18 anos. Não faltam sexo e sangue no giallo seguinte de Steffen, Death in Haiti (Italy, 1972). De férias no país do título, o casal Fred (Gabriele Tinti, de The Last Days of Sodom and Gomorrah) e Grace (a sueca Anita Strindberg) Wright encontra o doutor Williams (Steffen). Antigo amigo de Fred, o médico inventou uma poderosa droga. Aqueles que a cobiçam são mortos por Philippe (Umberto Raho, de The Crimes of the Black Cat), dono do hotel onde os Wright estão hospedados. Fato incomum no subgênero, grande parte da ação transcorre à luz do dia. Ainda mais

176 incomum é a inclusão de cenas dos costumes locais, filmadas in loco no Haiti. A fita fez 112 milhões de liras no mercado doméstico mereceu elogios do critico Vice, no jornal italiano Il Resto del Carlino (6 de julho de 1973): “Death in Haiti is a film directed by four hands of Edward Muller and Gian Paolo Lomi, but the result is quite effective: the causes of suspense blend perfectly with the evocative Haiti where the story takes place. Particularly interesting are the scenes involving the voodoo, the ancient magical ritual of the Antilles that becomes a wanton orgy47”. A expressão “wanton orgy” se justifica. Há uma rinha de galos, noivos nus e amarrados numa cerimônia de casamento e o sacrifício de um boi durante um verdadeiro ritual vodu. Para a posteridade, ficou registrada em celulóide a estupefação do elenco diante dos haitianos em transe, dançando freneticamente e bebendo o

47 Al Tropico del Cancro. In: POPPI, Roberto, PECORI, Mario. Dizionario del Cinema Italiano – I Film Vol. 4. 177 sangue do animal. Tais imagens transformam a produção numa mistura de giallo e documentário exótico na linha mondo − vertente inaugurada por Mondo Cane (Italy, 1962), de Gualtiero Jacopetti, Franco Prosperi e Paolo Cavara, coletânea de imagens hediondas e supostamente reais que alcançou grande êxito e teve a canção More indicada ao Oscar. Death in Haiti marca a volta de Steffen à função de co-roteirista, creditado com seu verdadeiro nome. Antonio de Teffé assina a história em parceria com os diretores Edoardo Mulargia (a.k.a. Edward G. Muller) e Giampaolo Lomi. Na verdade, Mulargia dirigiu a obra sozinho. Lomi, um italiano cuja carreira de documentarista começara no Brasil, apenas ajudou no roteiro e viabilizou a filmagem no Haiti. Ele era amigo do ditador haitiano François “Papa Doc” Duvalier e de seu filho, Jean-Claude “Baby Doc” Duvalier, que assumira o poder após a morte do pai, em abril de 1971. Mulargia recorda, na entrevista a Amilcare Di Mezza para a revista Nocturno Cinema (nº 62,

178 setembro de 2007): “The film was made at Haiti and was produced to be Gianpaolo Lomi first film as director. At first, I was supposed to be a supervisor, but by the end I was given the direction. Lomi shot only a small scene with a black boy, without any of the leading actors; with Anthony Steffen and Anita Strindberg he hasn’t done anything. (...) Lomi, who knew the places, had the task to provide that I could work calmly, but unfortunately, there were several problems during filming. Some scenes we couldn’t make there had to be done in Rome, like the interior of a factory and other things. In the crew there were some black guys who could not enter the white American ‘civilized’ areas. Thus, in these places, I could enter just with people that come with me from Rome”. Steffen não guardava boas recordações de seus colegas de elenco: “Anita Strindberg? Uma estúpida que não decorava as falas! Chamei-a num canto e dei-lhe uma bronca: ‘Você é uma atriz de merda, mas aqui está lidando com profissionais.

179 Portanto, aja como uma’! Gabriele Tinti era um grosseirão. A Norma Bengell48 se deu mal por ter se casado com ele.” Quem se deu bem naquele início dos anos 1970 foram o diretor Enzo Barboni (a.k.a. E.B. Clucher) e os atores Mario Girotti (a.k.a. Terence Hill) e Carlo Pedersoli (a.k.a. Bud Spencer) com They Call Me Trinity... (Italy, 1970) e Trinity Is STILL My Name! (Italy, 1971). Esse díptico de westerns cômicos bateu recordes de bilheteria e, de quebra, garantiu uma sobrevida ao ciclo dos spaghetti. Devido ao sucesso da série Trinity, Steffen precisou reassumir o chapéu e

48 Norma Aparecida Almeida Pinto Guimarães d’Áurea Bengell é uma atriz brasileira, nascida no Rio de Janeiro. Belíssima, começou sua carreira cinematográfica fazendo uma paródia de Brigitte Bardot na chanchada O Homem do Sputnik (Brasil, 1959) – em inglês, “______”. Ela protagonizou o primeiro nu frontal do cinema brasileiro em The Unscrupulous Ones (Brasil, 1962). É um dos filmes do cinema novo mais claramente influenciado pela nouvelle vague francesa Quando O Pagador de Promessas (1962), no qual interpretava a prostituta Marli, conquistou a Palma de Ouro em Cannes, Norma seguiu de lá para a Itália, contratada por produtores daquele país. Contracenou com o grande ator italiano Alberto Sordi em Mafioso (Itália, 1962) e foi dirigida por Mario Bava na ficção científica Planet of the Vampires (Itália/Espanha, 1965) e por Sergio Corbucci no western (Itália/Espanha, 1967). Voltou definitivamente ao Brasil em 1975, após o término do casamento com o ator italiano Gabriele Tinti. 180 os Colts em bangue-bangues humorísticos que pouco ou nada tinham a ver com a figura do vingador taciturno construída ao longo de sua carreira. Assim, eis o intérprete de rosto incisivo e melancólico metido em trapalhadas na co-produção ítalo-espanhola Too Much Gold for One Gringo (Italy/Spain, 1972), do catalão Juan Bosch. Cinco pistoleiros aguardam a libertação de Jonathan Carver (Manuel Guitián), preso vinte anos antes por roubar 28 sacos de ouro de uma companhia mineradora. O mais esperto deles, Trash Benson (Steffen), se associa ao fugitivo mexicano Paco (Daniel Martín) para tirar o velho do presídio e obrigá-lo a revelar o paradeiro da fortuna. Carver morre no caminho, mas os dois descobrem que ele doara um santo padroeiro ao vilarejo de San Firmino. Lá, enfrentam o bando de Rojas (Fernando Sancho) e descobrem não haver nada dentro da estátua. O ouro, na verdade, se encontrava na caverna onde fica o altar do santo. Paco entrega uma parte ao povo de San Firmino e foge com o restante, tendo Benson no seu encalço.

181 Em geral a cargo do personagem Paco, o humor não impede o diretor Bosch de construir algumas passagens violentas. A seqüência na qual Benson é amarrado, espancado e deixado à mingua em praça pública evoca uma situação recorrente nos spaghetti de Steffen. As presenças dos espanhóis Martín (colega de cena em seu primeiro faroeste, The Last Tomahawk) e Sancho (seu antagonista em Seven Dollars to Kill e Killer Kid) reforçam a impressão de um retrospecto da carreira do caubói ítalo-brasileiro − não-intencional, certamente. Rodado quase todo em exteriores, Too Much Gold for One Gringo seria seu último western digno de nota. O bangue-bangue seguinte dá bem uma idéia do que estava por vir. Steffen surge visivelmente desinteressado em Shoshena (Italy/Spain, 1973). Um covarde (Roberto Camardiel, de Train for Durango e Arizona Colt Returns) encontra o cadáver do pistoleiro Jaguar e assume a identidade dele. O arrombador de cofres Shosena (Steffen) se une ao suposto fora-da-lei a fim de juntos assaltarem o banco

182 da cidade de Chadran. Uma vez lá, tomam partido dos pequenos proprietários de terra na luta contra o latifundiário Decoven (Eduardo Fajardo). O argentino radicado na Espanha Tulio Demicheli (Viva Sabata!) responde pela direção dessa trama confusa e equivocadamente cômica. Ver Steffen batendo num bandido com um bacalhau ou atirando no pé de outro com uma arma escondida dentro de um frango assado não tem a menor graça. As investidas do ator nos filões da moda renderiam melhores frutos na seara do poliziesco. Em quatro exemplares do subgênero, ele trajou figurinos contemporâneos para viver um jornalista, um médico, um policial e um engenheiro às voltas com a criminalidade urbana.

183 11. A Tough Cop (a.k.a. Once Upon a Time in the West)

Saem latifundiários, barões de gado e foras- da-lei, entram seqüestradores, traficantes e mafiosos. Em vez de xerifes, tiras durões. No lugar dos caubóis, cidadãos comuns em busca de vingança. Assim, o duelo entre o Bem e o Mal no cinema italiano migra das cinzas dos westerns spaghetti para os polizieschi (plural de poliziesco). As usual on Italian popular cinema, a inspiração vinha do êxito de produções hollywoodianas, como The French Connection (EUA, 1971), de William Friedkin, e Dirty Harry (EUA, 1972), dirigida por Don Siegel e estrelada por Clint Eastwood. Diretores como Fernando Di Leo, Enzo G. Castellari, Umberto Lenzi e Stelvio Massi e intérpretes como Franco Nero, Maurizio Merli, Fabio Testi, o cubano Tomas Milian e o francês Luc Merenda logo se adaptaram às películas policiais de Cinecittà. Sempre afeito a filões de apelo popular,

184 Anthony Steffen não negaria fogo no poliziesco. Sua estréia no subgênero ocorreu em Lady Dynamite (Italy, 1973), de Giuseppe Vari (a.k.a. Al Pisani). O oportunista título original, La Padrina, tentava se aproveitar do sucesso de The Godfather (USA, 1972), de Francis Ford Coppola, lançado na Itália como Il Padrino. Viúva de um chefão da máfia nova-iorquina, Costanza Cavallo (Lidia Alfonsi) vai à Sicília atrás do responsável pela morte de seu marido. Ela conta com a ajuda de um ex-amante, o jornalista Nico Barresi (Steffen), que investiga o vínculo entre traficantes de armas e autoridades. Barresi morre numa emboscada, mas Costanza consegue sua vingança. Prejudicada pelo ritmo lento, Lady Dynamite tem a seu favor o bom elenco, a trilha sonora roqueira de Mario Bertolazzi e as locações em Siracusa e Palermo, na Sicília. O personagem do ítalo-brasileiro encontra a morte à luz do dia, ao sair de uma cabine telefônica no centro de Palermo. Cravado de balas, ainda tenta

185 fugir. É novamente atingido e cai, exangue, diante da vitrine de uma loja. O clima de tensão à época reinante na capital siciliana deixou os moradores em pânico durante a filmagem. “Foi uma correria”, lembra Steffen. “Pensaram que era um atentado de verdade.” Dos braços da máfia para os de uma ninfeta, o galã faria a seguir Sixteen (Italy, 1973), de Tiziano Longo. O título não deixa dúvidas quanto ao conteúdo desse drama erótico calcado em Lolita (1955), o romance do russo Vladmir Nabokov que o cineasta norte-americano Stanley Kubrick adaptara para o cinema em 1962. Mara (a monegasca Eva Czemerys) abandona o marido e vai viver ao lado de Steve (Steffen). A filha dela, Francesca (Ely Galleani), não medirá esforços para seduzir o namorado da mãe. Além da nudez de todo o elenco feminino, a fita contém as seqüências de sexo (simulado, é claro) mais audaciosas da carreira do artista. Ele voltaria a interpretar um homem com problemas conjugais no poliziesco The Killers Are

186 Our Guests (Italy, 1974), dirigido, montado e fotografado por Vincenzo Rigo. Dessa feita, o thriller The Desperate Hours (EUA, 1955), de William Wyler, serve de inspiração. Assaltantes de uma joalheria invadem a casa do médico Guido Malerva (Steffen), onde sua esposa, Mara (Livia Cerini), faz dele gato e sapato. Mantidos reféns, ela continua a humilhá-lo: xinga-o, deita na cama com um dos invasores e seduz a única mulher da quadrilha, Elisa (a inglesa Margaret Lee). Inesperadamente, abandonando seu discurso pacifista, o médico atira em dois bandidos e na própria esposa. Guido e Elisa, na verdade, são amantes e cúmplices. Eles planejam fugir rumo ao Brasil com as jóias, porém o inspetor Di Stefano (Luigi Pistilli) chega a tempo de impedi-los. The Killers Are Our Guests saiu-se bem nas bilheterias italianas, faturando 122 milhões de liras. No jornal milanês Il Giorno (13 de julho de 1974), o crítico Pietro Bianchi escreveu: “For a debut film, the camera operator and sometimes director Vincenzo Rigo is the scapula of the skin of our teeth. The film is

187 weak in its trivial and ineffective dialogue, but certain situations are quite hair-raising (...). The suspense is balanced with a sense of narrative rhythm as the story finds strenght in a new actress, the very pretty Livia Cerini, an interpreter who shows mastery on the dramatic situations49”. Steffen troca o papel de criminoso pelo de homem da lei em The Killer with a Thousand Eyes (Italy/Spain, 1974), de Juan Bosch. O inspetor inglês da divisão de narcóticos Michael Lawrence (Steffen) desembarca em Lisboa para desvendar o assassinato de um colega da Interpol. Todos que tentam ajudá-lo terminam mortos. Embora as suspeitas recaiam sobre o contrabandista brasileiro Costa (Eduardo Fajardo), a investigação de Lawrence o conduz ao detetive Albert (o espanhol Antonio Pica). Este comete os assassinatos a fim de encobrir sua ligação com o tráfico de drogas.

49 Gli assassini sono nostri ospiti. In: POPPI, Roberto, PECORI, Mario. Dizionario del Cinema Italiano – I Film Vol. 4, dal 1970 al 1979. 188 Co-escrito por Steffen e pelo diretor Bosch, mais Alberto De Stefanis e Ángel G. Gauna, esse seria o último roteiro de Antonio de Teffé a ganhar as salas de exibição. Há uma seqüência inteira copiada de The French Connection, quando o inspetor Lawrence encontra num bar cocaína escondida nas roupas dos clientes e dentro de uma garrafa de bebida. Trata-se, apesar do plágio, de uma realização acima da média. Rodado em Roma, Barcelona e Lisboa, o filme adiciona elementos de giallo à fórmula do poliziesco. Do primeiro subgênero vem o assassino de luvas pretas e máscara; do segundo, as cenas de ação nas quais o herói distribui golpes de caratê e tiros de metralhadora. Em Portugal, Steffen surpreendeu a equipe com seu conhecimento da língua lusitana. O português fluente e a fama advinda dos faroestes lhe foram igualmente úteis na filmagem de uma perseguição de carro. Nela, o veículo dos vilões derruba uma mureta protetora e despenca de uma ponte. “O diretor do tráfego era meu fã e autorizou o fechamento da

189 ponte”, orgulha-se o ex-astro. “Provocamos um engarrafamento caótico.” Com o spaghetti a caminho da sepultura, os produtores italianos apostavam cada vez mais em arremedos dos megassucessos de Hollywood. Não é de estranhar, portanto, o título atribuído à co-produção Evil Eye (Italy/Spain/ 1975) no México: Más Allá del Exorcismo. Dirigido e produzido por Mario Siciliano, Evil Eye tentava aproveitar o êxito do terror The Exorcist (EUA, 1973), de William Friedkin. Embora apareça como o primeiro nome do elenco nas cópias italianas, Steffen é coadjuvante do musculoso superstar mexicano Jorge Pous Ribe (a.k.a. Jorge Rivero). Ele já fizera várias fitas no México e nos Estados Unidos, tendo até contracenado ao lado de John Wayne no faroeste Rio Lobo (EUA, 1970), de Howard Hawks. Assombrado por pesadelos com rituais satânicos, o playboy Peter Crane (Rivero) pede ajuda ao doutor Stone (o norte-americano Richard Conte). A morte de pessoas próximas ao ricaço leva o tenente

190 Ranieri (Steffen) a investigá-lo. Forças sobrenaturais começam a agir e, numa cena assustadora, o mordomo Walter (Eduardo Fajardo) vomita sapos e bile como a adolescente desempenhada por Linda Blair em The Exorcist. Crane aparentemente morre num desastre de carro. No entanto, o roteiro reserva uma reviravolta nada original: ele desperta e percebe que tudo não passou de um pesadelo. Evil Eye marca a última das onze parcerias de Eduardo Fajardo e Anthony Steffen. Antes, eles haviam trabalhado juntos em A Coffin for the Sheriff, Ringo the Mark of Vengeance, Gentleman Killer, A Stranger in Paso Bravo, Shango, Viva Sabata!, A Man Called Joe Clifford, Shoeshena, The Killer with a Thousand Eyes e a até então inédita produção espanhola Siete Chacales. Atualmente o ator espanhol vive em Almería, a antiga terra prometida dos westerns spaghetti, onde se dedica ao teatro com deficientes físicos e pessoas de baixa renda. Após produzir e dirigir Evil Eye, Mario Siciliano se associou ao venezuelano Espartaco

191 Santoni – ator, produtor e empresário do ramo hoteleiro radicado na Espanha – para produzir Diary of an Erotic Murderess (Italy/Spain, 1974). Sob falsa identidade, a ladra Elizabeth (a austríaca Marlies Theres Moitzi, a.k.a. Marisa Mell) é contratada para cuidar do filho do magnata Alexander Thurman (Richard Conte), Mark (Juan Ribo). O rapaz, mudo e sujeito a acessos de raiva, se apaixona pela nova babá. Esposa do cruel Richard (Steffen), ela assassina o marido e Thurman. Pretende botar a mão na herança a que Mark tem direito, mas a fortuna vai para Charles (Richard Baron), filho bastardo do milionário. Ao descobrir que Charles e Elizabeth planejam interná-lo, o deficiente mata o meio-irmão e se trancafia junto da ladra na cela onde costumava ficar preso. A direção desse bem realizado drama de suspense coube ao espanhol Manuel Mur Oti, autor do roteiro com o conterrâneo Emilio Martínez Lázaro (a.k.a. Lazarus Kaplan) e o produtor Siciliano. Do elenco participa ainda, no secundário papel de uma freira, uma jovem atriz espanhola chamada Carmen

192 Maura, que se tornaria musa do cineasta Pedro Almodóvar em filmes como Women on the Verge of a Nervous Breakdown (Espanha, 1988) – ela atuaria também em 800 Bullets (Espanha, 2002) nostálgica homenagem do conterrâneo Álex de la Iglesias aos coadjuvantes e dublês que atuaram nos westerns spaghetti rodados no deserto espanhol de Almería. No jornal ABC de Sevilha de 12 de maio de 1974, o crítico Antonio Colon escreveu sobre Diary of an Erotic Murderess: “Manuel Mur Oti, viajante por vocação, escritor e cineasta por passatempo, sempre gostou do bizarro: na época em que gostava de ser ‘O Gênio’ e rodear-se de uma aura ‘proibida’ e mefistofélica, fez vários filmes ambiciosos, desiguais, barrocos e impactantes como Condenados (1953) e Orgullo50 (1955). Mas, com o tempo, as razões econômicas foram se tornando mais poderosas que o ‘demoníaco’ e Mur Oti, hoje em dia, tornou-se um

50 Os english titles que o site Internet Movie Database atribui a esses dois filmes espanhóis são, na verdade, traduções literais: Pride e The Condemned Ones. Como não há registros de que tenham sido realmente exibidos em países de língua inglesa, optamos por manter os títulos originais. 193 correto construtor de filmes comerciais, de boa aceitação. Nessa linha se encontra Diary of an Erotic Murderess. Como lembrança de sua primeira fase há o sentido ‘diabólico’ do argumento – um thriller – e um certo barroquismo formal. (...) Marisa Mell e Richard Conte, os protagonistas, estão corretos; ela, como sempre, brilha mais como mulher do que como atriz e ele dá provas de sua comprovada experiência. Num segundo plano encontramos Anthony Steffen, o famoso intérprete de westerns. Junto com o resto do elenco, eles colaobram eficazmente para os objetivos da produção.” Na ativa desde o final da década de 1940, Mur Oti se especializara em melodramas como o já citado Orgullo (Espanha, 1955), estrelado pelos brasileiros Alberto Ruschel e Marisa Prado, então populares na Europa por causa do sucesso de The Bandit (Brasil, 1953), de Lima Barreto. O diretor falou sobre Diary of an Erotic Murderess numa entrevista concedida ao jornalista espanhol Augusto M. Torres em agosto de 1992 – e posteriormente publicada no livro Cineastas

194 Insólitos – Conversaciones con Directores, Productores y Guionistas Españoles51 (2000): “Protagonizado por Marisa Mell52, pobre mulher, acaba de morrer, e produzido por Espartaco Santoni, o filme teve problemas. Faltou dinheiro, muito dinheiro. Revi-o há pouco tempo, não é tão ruim, mas tampouco é muito bom. Quando se tem sete ou oito películas com uma qualidade indiscutível, de um total de dezesseis53....” A Academia de Artes e Ciências Cinematográficas da Espanha concedeu a Mur Oti um prêmio Goya especial em 1992, onze anos antes de sua morte. Mario Siciliano jamais recebeu honraria semelhante. Co-diretor não-creditado e produtor de Seven Dollars to Kill e Blood at Sundown, diretor e produtor de Evil Eye e produtor de Diary of an Erotic

51 Em inglês, “______”.

52 A bela Marisa Mell morreu aos 53 anos, em 16 de maio de 1992, de câncer na garganta. Deixou uma filmografia com mais de 60 títulos, muitos deles filmes cult do cinema popular europeu. 53 De 1949 a 1976, o espanhol Manuel Mur Oti dirigiu 17 filmes, sendo Diary of an Erotic Murderess o antepenúltimo deles. 195 Murderess, ele enveredou pelo cinema pornográfico nos anos 1980 e morreu em 1987, no ostracismo. Depois de Evil Eye e antes de Diary of an Erotic Murderess, Steffen aparece numa ponta em Charlotte (France/Italy/West Germany, 1975). Sua participação no papel de príncipe Massimo Sforza foi filmada em apenas um dia, na paradisíaca ilha italiana de Ischia. Ele contracena com duas beldades, a alemã Sabine Glaser (Agnès, a esposa do príncipe) e a finlandesa Sirpa Lane (Charlotte Marley, a “jovem assassinada” do título original, La Jeune Fille Assassinée), e com o francês Roger Vadim (diretor e protagonista da película). A beleza das atrizes, contudo, não redime a superficialidade dos personagens e o ritmo moroso desse drama criminal. Diretor de ...And God Created Woman (França, 1956), com a francesa Brigitte Bardot, e Barbarella (France/Italy, 1968), com a norte- americana Jane Fonda, Vadim é reconhecido mais por suas conquistas amorosas (Brigitte, Jane, a dinamarquesa Annette Stroyberg, a francesa Catherine

196 Deneuve) do que pelo talento como cineasta (ou mesmo como intérprete). Steffen discordava: “Era um homem de primeira classe, um gentleman. Ele sabia dirigir atores como poucos”. À época do lançamento de Charlotte, Vadim afirmava haver encontrado na protagonista daquele filme sua próxima Brigitte Bardot. Nascida em 1952 em Turku, na Finlândia, Sirpa Salo (a.k.a. Sirpa Lane) havia sido descoberta por David Hamilton, fotógrafo inglês célebre por seus retratos de adolescentes nuas. Devido ao forte sotaque finlandês, ela precisou ser dublada pela atriz francesa Brigitte Fossey – cuja carreira inclui The Man who Loved Women (França, 1977), de François Truffaut; e Cinema Paradiso (France/Italy, 1988), de Giuseppe Tornatore. Isso não impediu que Charlotte fosse um fracasso de bilheteria. Sirpa Lane estrelaria no ano seguinte um clássico do erotismo cinematográfico, The Beast (França, 1975), no qual interpreta uma mulher do século 18 violentada numa floresta por um monstro. Exibiu sua nudez em outros seis filmes até 1983, quando se afastou do

197 cinema, vindo a falecer dezesseis anos depois, de complicações decorrentes do vírus da AIDS. Ten Killers Came from Afar (Italy/Spain, 1975) marcaria o melancólico adeus de Anthony Steffen aos westerns spaghetti. Trata-se de um dos piores trabalhos do diretor Juan Bosch, dos bons Too Much Gold for One Gringo e The Killer with a Thousand Eyes. Duas gangues rivais, uma formada pelos irmãos de Drac Bright (Claudio Undari, a.k.a. Robert Hundar, de A Name That Cried Revenge) e outra pelos capangas de Rompimani (o espanhol Ricardo Palacios), querem se apropriar da mina de esmeraldas de Glenda (a egípcia Gillian Hills). Terão, entretanto, de enfrentar Dallas (Steffen) e Lumacone (Fernando Sancho, de Seven Dollars to Kill, Killer Kid e Tôo Much Gold for One Gringo), que chegam à Brownville dispostos a ajudar a moça. Nessa pálida imitação da série Trinity, o quase loiro Steffen e o gordo Sancho fazem as vezes de Terence Hill e Bud Spencer.

198 A exemplo da carreira de caubói, o casamento do ítalo-brasileiro chegava ao fim. Casados por cinco anos, ele e Antonella tiveram dois filhos. Manuel, o primogênito, nascera em 1972; Luiz, em 1976, pouco antes da separação. O ex-galã espumava de ódio ao falar da ex-mulher, que ficou com os filhos e um dos apartamentos do ator em Roma. No mesmo ano do desquite, o astro se despediu dos polizieschi com Roma, l’Altra Faccia della Violenza54 (France/Italy, 1976). O assassinato de Carol (Roberta Paladini) transforma o pai dela, o engenheiro Alessi (Steffen), num auxiliar extra-oficial do protagonista, o comissário Carli (o francês Marcel Bozzuffi). Por trás do crime estão filhos da alta burguesia romana. Na trama, estes não recebem da Justiça tratamento igual àquele dispensado aos delinqüentes da periferia. A crítica social contida no roteiro de Gianfranco Clerici e Vincenzo Mannino é transposta às telas com eficiência pelo veteraníssimo Marino

54 Em inglês, “______”. 199 Girolami (a.k.a. Franco Martinelli), pai do também cineasta Enzo G. Castellari. Girolami havia produzido Few Dollars for Django, no qual dividira com o filho a função de co-diretor (ambos não-creditados). Em Roma, l’Altra Faccia della Violenza, ele promove a melhor adaptação para o cenário urbano do vingador trágico que Steffen encarnou em clássicos do spaghetti. Um ano depois, estreava na Espanha – e apenas lá – Siete Chacales55 (Espanha, 1977). Dirigido pelo espanhol José Luís Madrid, o filme reúne dois veteranos caubóis dos westerns spaghetti: Anthony Steffen e Gianni Garko. Havia tiroteios e perseguições a cavalo, mas não no Velho Oeste dos Estados Unidos. A trama, ambientada na Andaluzia do início do século 19, buscava inspiração na história real dos bandoleiros nacionalistas conhecidos como Siete Niños de Écija56 – Écija é um município espanhol na

55 Em inglês, “Seven Jackals”.

56 Em inglês, “seven boys from Écija”. 200 província de Sevilha, onde os Siete Niños agiram entre 1814 e 1818. A produção foi muito alardeada pela imprensa local, com Franco Nero e o norte-americano Chris Mitchum (filho do veterano astro hollywoodiano Robert Mitchum) sendo cogitados para os papéis que no fim acabaram entregues a Steffen e Garko. O elenco contou ainda com o eficaz Eduardo Fajardo, e as belas atrizes hispânicas Patricia Loran, Diana Lorys, Carmen Roldán e Maria José Cantudo. Esta se tornara conhecida por sua nudez no filme Blood and Passion (Espanha, 1975), do espanhol Jorge Grau – a primeira nudez feminina no cinema da Espanha após a morte do general Franco e o conseqüente fim do regime ditatorial daquele país. Apesar da fama de caubóis que ainda restava à dupla Steffen-Garko e do desfile de beldades na tela, Siete Chacales enfrentou sérios problemas de distribuição. Embora filmado em 1974, só chegou aos cinemas três anos depois, sem alcançar grande repercussão. Em julho de 1980 teve mais uma chance

201 nos cinemas, exibido na Espanha em programa duplo com Zorro the Invincible (Espanha, 1971), de José Luis Merino. Novamente, sem êxito algum. Se não deu conta de ressuscitar os bangue- bangues europeus, Siete Chacales ao menos promoveu o reencontro entre Garko e Steffen. Enquanto rodavam nas locações em Jerez de la Frontera, na Espanha, os astros de Blood at Sundown foram convidados ao casamento de uma integrante da família Domecq. Por dias, eles comeram do bom e do melhor e assistiram às corridas de cavalo na imensa propriedade dos fabricantes do conhaque Domecq – o mais célebre dos conhaques espanhóis. Segundo Garko, nem o término da festa nem o das filmagens puseram fim à farra: “Steffen e eu rumamos para Madri, onde íamos aos melhores restaurantes em companhia de garotas espanholas maravilhosas”.

202 12. Twilight's Last Gleaming (a.k.a. The Final Countdown)

“Quando o western começou a sair de moda, perguntei a Antonio o que ele pretendia fazer”, rememora o cineasta catalão Juan Bosch. “‘Seguirei trabalhando’, respondeu-me. ‘Se não puder mais usar sombrero nos spaghetti, serei sádico nos gialli ou tira nos polizieschi’.” Graças a tal determinação, a carreira de Steffen sobreviveu durante uma década à ascensão e queda de subgêneros no cinema popular italiano. Entretanto, à medida que envelhecia, o galã testemunhava o descaso do público e o definhar das fórmulas de sucesso. Os personagens principais rareavam, restando-lhe os coadjuvantes em produções de segunda categoria. Houve uma ou outra proposta interessante, a exemplo do convite para o épico de gângsteres que Sergio Leone vinha planejando desde 1967: Once Upon a Time in America (EUA, 1984). Embora o ator e o diretor nunca tenham sido grandes amigos, suas

203 carreiras haviam se cruzado antes da fama em algumas oportunidades − ambos como assistentes em Bicycle Thieves, o primeiro em funções técnicas e o segundo como intérprete em Aphrodite, Goddess of Love e The Last Days of Sodom and Gomorrah. Ademais, Leone inaugurara o filão dos westerns spaghetti no qual Steffen se consagraria. A oferta de um pequeno papel em Once Upon a Time in America foi reiterada várias vezes, porém os freqüentes adiamentos no início das filmagens impediram o ítalo-brasileiro de participar. Seria o último trabalho de Leone, morto em 1989. “Fui eu quem lhe sugeriu Robert De Niro para interpretar o protagonista”, vangloria-se Steffen, que havia se impressionado com a atuação do norte-americano em The Godfather: Part II (EUA, 1974), de Francis Ford Coppola. Enquanto Leone buscava viabilizar o projeto de seus sonhos, o ex-caubói seguia na ativa. A proposta de receber em dólar para rodar uma fita em

204 Angra dos Reis57 e no Rio de Janeiro, onde costumava passar férias, lhe pareceu irrecusável. Assim, ele embarcou em Killer Fish (Brazil/France/Italy/USA, 1979). Essa aventura sobre ladrões em busca de esmeraldas escondidas numa represa infestada de piranhas tem como primeiro nome do elenco o astro norte-americano Lee Majors, à época recém-saído do seriado televisivo The Six Million Dollar Man (EUA, 1973-1978). A direção coube ao italiano Antonio Margheriti (a.k.a. Anthony M. Dawson), que falou sobre o filme numa entrevista publicada no livro Spaghetti Nightmares− Italian fantasy-horrors as Seen Through the Eyes of Their Protagonists (1996), de Luca M. Pamerini e Gaetano Mistretta: “Lee Majors was enjoying the hige success he'd had with the The Six Million Dollars Man series, and the other actors were all valid second leads. Unfortunately, it was shot as a replacement for another film that we were going to have made in

57 Angra dos Reis é uma cidade turística, com centenas de ilhas em seu litoral, a 157 quilômetros do Rio de Janeiro. 205 South Africa and the new script was constantly being changed. Watching it again today, I find it well adapted for television (in fact it was financed by CBS in America) and, while we're on the subject, I'd like to make it clear that it is not an imitation of Piranha - that came out later! However, it's not one of the films I like to remember most... the screenplay was porr and from directing point of view, it's on an inferior standard to the previous ones.” A argumentação de Margheriti faz sentido, pois seu filme começou a ser rodado em abril de 1978, quatro meses antes da estreia nos Estados Unidos de Piranha (1978), de Joe Dante – a mais bem-sucedida entre as várias imitações de Jaws (EUA, 1975), de Steven Spielberg. Durante as filmagens no Brasil, a co-produção ítalo-franco-americano-brasileira era chamada de Greed ou, às vezes, de Naked Sun. O oportunista título Killer Fish só seria atribuído depois, provavelmente numa tentativa de aproveitar o sucesso da fita de Joe Dante. Apesar de haver os tais “peixes

206 asssassinos” no enredo, os ataques cometidos por eles não constituem o ponto central da narrativa. Steffen vive Max, capitão do barco locado para uma sessão de fotos e posteriormente invadido por ladrões de jóias. Membro da quadrilha e protagonista da trama, Bob Lasky é encarnado por Lee Majors. Segundo Steffen, a cada dia Majors aparecia com uma companhia feminina diferente. “The six million dollar man era um merda”, tripudia o brasileiro Jorge Cherques, que desempenha o delegado à caça dos criminosos. “Andava sempre com dois seguranças, encarregados de lhe arranjar mulheres.” Para o brasileiro Fábio Sabag, intérprete do dono do hotel onde os assaltantes se hospedam, a pedra no sapato foi o norte-americano James Franciscus. “Ô sujeitinho chato, reclamava de tudo”, diz a respeito do artista incumbido do personagem Paul Diller, mentor do assalto. À arrogância dos gringos, os brasileiros reagiam com bom humor. Por sugestão de Cherques, durante a rodagem de uma

207 cena, Sabag enfiou o dedo na bunda do desafeto. “Franciscus precisava fazer cara de espanto e tenho certeza de que minha dedada ajudou”, diverte-se. A cena, lamentavelmente, ficou de fora na montagem final. O papel de Kate Neville, mulher do personagem de Franciscus, coube à norte-americana Karen Black. Completamente vesga, ela surpreendia a equipe com a habilidade de corrigir seus olhos quando diante das câmeras. Espanto maior causou o acidente automobilístico da também norte-americana Elsa Schiaparelli (a.k.a. Marisa Berenson), que interpreta a produtora de moda Ann. Com ela no carro estava o italiano Alex Ponti – incumbido por seu pai, o megaprodutor Carlo Ponti, de supervisionar as filmagens no Brasil.

208 A importante revista brasileira Veja58 não economizou em ironia na hora de noticiar o acidente, em sua edição de 14 de junho de 1978: “Dizem as más línguas que a atriz americana Marisa Berenson e o produtor italiano Alex Ponti estavam por demais entretidos um com o outro – e assim não repararam no automóvel que cruzava o carro em que passeavam por uma das ruelas de Angra dos Reis. O choque ocorreu no último dia 3, e não chegou a ser violento, mas Berenson e Ponti sofreram pequenas escoriações e tiveram de abandonar as filmagens de Greed, uma superprodução ítalo-brasileira rodada em Angra. O casal, porém, pode prescindir dos serviços do hospital local e aportar suavemente na milionária clínica carioca do cirurgião Ivo Pitanguy, onde já recebeu alta”.

58 Publicada pela Editora Abril desde 11 de setembro de 1968, Veja tornou-se rapidamente a mais importante revista semanal de informação do país – com reportagens focadas em assuntos diversos, como política, comportamento, economia, artes e espetáculos. O formato baseia-se em outras publicações do gênero, a exemplo das revistas norte-americanas Time e Newsweek. Atualmente, a tiragem de Veja ultrapassa 1 milhão de exemplares por semana. 209 Embora bem informada quanto ao tórrido romance entre Ponti e Marisa, a revista Veja parecia ignorar a gravidade do acidente. Com a face desfigurada, a atriz precisou se submeteu a uma cirurgia plástica de emergência na clínica de Ivo Pitanguy – à época o maior cirurgião plástico do Brasil e um dos mais respeitados no mundo. Pelo restante das filmagens, o cabelo de Marisa encobriria as cicatrizes no rosto dela. Conterrânea de Karen e Marisa, a belíssima e uma das mais bem pagas supermodels de sua época, Margaux Hemingway vive a modelo Gabrielle. Transformada em atriz pelo produtor italiano Dino De Laurentiis em Lipstick (EUA, 1976), ela morreria de overdose duas décadas depois, em 1996. Para alguns, teria sido acidente; para outros, suicídio, como no caso de seu avô, o célebre escritor Ernest Hemingway. “O momento em que Margaux sai da água com a camisa molhada deixou a equipe toda babando”, lembra Sabag. “Apesar de linda e simpática, ela já chegava ao set ‘cheirada’ logo de manhã.”

210 A presença dessas atrizes de rara beleza e extremamente liberadas em Angra dos Reis rendia farto material para as colunas sobre celebridades nas revistas brasileiras, como demonstra a reportagem publicada na Veja de 24 de maio de 1978: “O acontecimento tem se revelado importante também para outros brasileiros, contratados para atividades menores no set das filmagens, armado no Hotel do Frade. Em meio a uma dezena de figurantes menos famosos, refulgem as estrelas Karen Black, Marisa Berenson e Margaux Heminghway – cujos hábitos causaram pasmo entre os nativos. Karen, por exemplo, anda nua dentro de casa e vai à praia de meias e pijamas. Além disso, não mostra qualquer inibição em desabotoar a blusa e amamentar o filho de 3 anos – esteja onde estiver. A nudez das estrangeiras, aliás, pode ser observada por qualquer curioso pelas vidraças do vestiário feminino, eternamente de cortinas abertas. Um eletricista da produção, por exemplo, levou um susto da primeira vez que viu Marisa Berenson trocar de roupa e acabou martelando

211 o dedo. ‘Não valeu a pena’, garante ele. ‘Ela é muito ossuda.’ Um cozinheiro paulista, que cuida da alimentação da equipe (mais de sessenta pessoas, no total) quando a filmagem é em alguma ilha distante, também teve seu momento de glória – e acabou apaixonando-se por Margaux desde o dia em que a observou sentar-se com displicência na grama. ‘Ela não usa nada por baixo’, contou”. E a reportagem prossegue, tratando do astro da produção e das piranhas utilizadas nas filmagens: “A curiosidade em torno do astro Lee Majors (o ‘homem biônico’ da televisão) não é menor, mas ele não dá chance a quem o procura. Anda eternamente de cara fechada, recusa-se a conceder entrevistas (...) e, quando não está filmando, some em companhia de Mônica, uma loura milionária brasileira. Antes, porém, não deixa de telefonar para a mulher, Farrah Fawcett, nos Estados Unidos. Dizem os abelhudos que, diariamente, após juras de amor eterno, ele pergunta quando Farrah vem visitá-lo – assim poderá precaver-se contra algum desagradável flagrante.

212 Majors está ganhando 300 mil dólares para fazer o papel do chefe de uma quadrilha de ladrões de esmeraldas que, no final, ao tentar recuperar o produto do roubo, jogado no fundo de uma represa, será devorado por um cardume de piranhas. As piranhas vêm de avião do Rio Araguaia, ao custo de 2,5 mil cruzeiros cada. Mas, das primeiras 3 mil, apenas cinqüenta sobreviveram. Para resolver esse problema, foi contratado um especialista em peixes, Luís Maluf, que ganha 100 mil cruzeiros mensais e já está sendo conhecido como ‘massagista de piranhas’. O apelido tem procedência: quando um dos peixes começa a mostrar sinais de debilidade, Maluf pega em sua cauda e a massageia por alguns minutos. Logo a piranha volta a nadar”. O elenco contava ainda com o ídolo de futebol norte-americano Dan Pastorini (como um dos bandidos), o ator teatral norte-americano Roy Brocksmith (na pele do fotógrafo Ollie) e, num pequeno papel, o brasileiro Celso Faria. Este, que regressara da Itália em 1974, não conhecia o diretor.

213 Simplesmente se submeteu ao teste e passou. “Por que você não me procurou antes, Celso?”, indignou-se Steffen ao reencontrá-lo. “Margheriti é meu amigo, eu teria conseguido coisa melhor para você.” Em Inglourious Basterds, na já referida cena em que soldados norte-americanos tentam se passar por italianos, o falso nome adotado pelo sargento Donny Donowitz (o ator e cineasta norte-americano Eli Roth) é “Antonio Margheriti”. Trata-se de uma sincera homenagem de Quentin Tarantino a esse que foi um dos mais profícuos diretores da Itália pós- Segunda Guerra – antes de estrear na direção, havia sido co-roteirista de Solitudine, 11º filme de Antonio de Teffé, entre outros. Quase sempre sob o pseudônimo de Anthony M. Dawson, às vezes sem o “M”, em 36 anos de carreira ele dirigiu 55 exemplares de vários gêneros e subgêneros comerciais (ficção científica, peplum, espionagem, western spaghetti, giallo, poliziesco, horror all’italiana etc.). Conquistou igualmente a fama de especialista em efeitos especiais e maquetes,

214 tanto em seus longas-metragens quanto nos de outros diretores. Ele próprio produziu em Roma todas as seqüências dessa natureza de Killer Fish, com piranhas empalhadas trazidas do Brasil na bagagem. Presas a finíssimos fios de náilon, elas serviram para tomadas como aquelas nas quais o personagem de Steffen é parcialmente devorado. A fim de dar verossimilhança aos ataques, o cineasta adicionou imagens de arquivo com peixes vivos. Imagens documentais também ajudaram a simular o tornado que destrói uma represa. De improviso, o diretor filmara uma ventania no hotel onde a equipe estava hospedada em Angra dos Reis. Depois, acrescentou takes de miniaturas sofrendo a fúria de um falso furacão. A despeito das soluções engenhosas, nenhum efeito especial poderia tornar crível um tornado no Rio de Janeiro − afinal, não há tornados no Brasil. Há, no entanto, diversas florestas. A equipe ultimava os preparativos de um vôo até a Amazônia, onde rodaria algumas poucas cenas, quando Steffen

215 sugeriu ao diretor a Floresta da Tijuca, uma das maiores áreas urbanas verdes do mundo. “Margheriti ficou maravilhado com aquele imenso matagal em plena cidade do Rio de Janeiro”, conta o intérprete do capitão Max. Ele, Cherques, Sabag e Faria são unânimes nos elogios a Antonio Margheriti, ou Anthony M. Dawson, falecido em 2002. Killer Fish estrearia mais de um ano após ter sido filmado, naufragando nas bilheterias. O lançamento se deu em meio a uma série de escândalos envolvendo dívidas do produtor Carlo Ponti e de sua então mulher, a diva do cinema italiano Sophia Loren. Em sua edição de 30 de abril de 1980, a revista Veja expôs a situação nada favorável do casal: “Desde janeiro de 1979, Sophia Loren e Carlo Ponti não põem o pé na Itália, onde devem 24 milhões de dólares em impostos. Agora estão diante do dilema de evitar também os Estados Unidos, onde acabam de ser condenados a pagar 700 mil dólares ao cineasta underground Andy Warhol. Ponti usou seu nome, sem autorização, nos filmes Andy Warhol’s Frankenstein e

216 Andy Warhol’s Dracula. Para piorar a situação, o filme Killer Fish, rodado no Brasil com Lee Majors e Margaux Heminghway foi um fracasso: estreou nos Estados Unidos em dezembro, foi massacrado pelos críticos e saiu de cartaz”. De volta a Roma após as filmagens no Brasil, Steffen rodou Play Motel (Italy, 1979), seu quarto, derradeiro e pior giallo. Dirigida por Mario Gariazzo (a.k.a. Roy Garrett) na fase terminal do ciclo, a produção abusa da nudez das atrizes e tem como estrela uma diva das comédias eróticas de então, Annamaria Rizzoli. Ao sair do Play Motel, o casal Roberto (Ray Lovelock) e Patrizia (Annamaria) Vinci encontra no porta-malas de seu carro o cadáver da esposa do comendador Rinaldo Cortesi (Enzo Fisichella). Este havia sido flagrado num dos apartamentos em companhia da modelo de revistas pornográficas Loredana Salvi (a sueca Marina Frajese, a.k.a. Marina Hedman). O assassino de luvas negras, via de regra obrigatório nos gialli, dá cabo igualmente de

217 Loredana e de outra modelo, Anna de Marchis (Antonella Antinori). Responsável pelo caso, o comissário De Santis (Steffen) pede ajuda a Roberto e Patrizia para desmascarar o criminoso. Quase aos 50 anos, o ítalo-brasileiro encarna com visível desinteresse um tipo que pouco lhe oferece. A decepção seria ainda maior caso ele tomasse conhecimento, à época, da inserção de cenas de sexo explícito em algumas cópias destinadas ao mercado externo. Três atores da versão não- pornográfica (Enzo Fisichella, Antonella Antinori e Marina Hedman) participam das seqüências hardcore inseridas em meio à narrativa. “Fiquei furioso”, recorda Ray Lovelock. “Pensei em processar o produtor, mas daria tanto trabalho que acabei desistindo.” No mesmo ano de Killer Fish e Play Motel, entraria em cartaz a fita mais incomum da filmografia de Steffen: a experimental Zoo Zéro (França, 1979), do cultor do surrealismo fantástico, artista plástico, escritor, lingüista e semiólogo francês Alain Fleischer.

218 Além do ex-caubói no pequeno papel de comissário Evariste, o elenco inclui a francesa Catherine Jourdan como a cantora Eva e o polonês Klaus Kinski na pele do diretor de zoológico Yavé. Os problemas criados por Kinski nas muitas produções das quais participou, de westerns spaghetti de quinta categoria a obras suntuosas do alemão Werner Herzog59, já eram lendários no meio cinematográfico. “No primeiro dia de filmagem, ameacei lhe quebrar os dentes caso ele não se comportasse”, relata Steffen. “Kinski morria de medo de mim.” Essa estranhíssima estréia de Fleischer na direção de longas concorreu ao prêmio de melhor filme no festival internacional de giallo e mistério da cidade italiana de Cattolica, o MystFest. Não ganhou. Numa resenha para a revista francesa Cinéma 79 (nº 243, março de 1979), o crítico Raymond Lefèvre tenta explicar a trama que se desenrola ao som de The

59 Werner Herzog dirigiu um documentário sobre sua conturbada parceria com Klaus Kinski, apropriadamente intitulado My Best Fiend (Inglaterra/Alemanha/Finlândia/EUA, 1999). 219 Magic Flute, de Mozart: “Diante dessa alegoria filosófica de uma beleza visual espantosa, é extremamente difícil tentar resumir o enredo, mas, em linhas gerais, assiste-se a uma inversão da dialética cultura-natureza, durante a qual personagens humanos e objetos da civilização (uma bicicleta, uma fita de gravação, um automóvel, um revólver) regridem para o Gênesis numa espécie de Apocalipse regressivo.” Steffen retornou à Itália, onde, para homens de cinema como ele, o cenário era de terra de ninguém. Desde que o Estado perdera o monopólio das transmissões televisivas em 1975, diversos canais particulares haviam surgido. O alto índice de violência nas ruas das grandes cidades e o crescimento da oferta de películas na tevê foram alguns dos fatores que motivaram o fechamento de mais da metade das salas de exibição do país. O número de ingressos vendidos anualmente baixaria de 513 milhões em 1975 a 123 milhões uma década após − cerca de dois ingressos per capita ao ano. A desigual concorrência com Hollywood e seu eficaz esquema de distribuição

220 mundial levou o cinema popular italiano ao fundo do poço. Nesse ambiente pouco promissor, o galã aceitou atuar em Escape from Hell (Italy/Espanha, 1980) e Hotel Paradise (Italy/Spain, 1980) como um favor ao amigo Edoardo Mulargia (co-roteirista de The Invincible Brothers Maciste, diretor de Shango, A Man Called Django! e Death in Haiti, além de diretor não-creditado de Why Go on Killing? e parceiro do astro nos roteiros de Shango e Death in Haiti). Trata- se de dois women in prison (w.i.p.). Atrás das grades em penitenciárias, colônias penais agrícolas, campos de concentração nazistas ou ilhas, as anti-heroínas desse subgênero cinematográfico expõem sua nudez em banhos coletivos, têm seus uniformes rasgados e sofrem torturas nas mãos de guardas sádicos e carcereiras lésbicas. Mulargia assina Escape from Hell sob seu habitual pseudônimo de Edward G. Muller e Hotel Paradiso como Tony Moore. As duas fitas tiveram rodagens simultâneas, com uma reserva ecológica a

221 poucos quilômetros de Roma fazendo as vezes de floresta tropical. Cenários, equipe técnica e boa parte do elenco permaneciam os mesmos. “Mudavam a câmera de posição e já estavam trabalhando no outro filme”, rememora Stelio Candelli (The Last Tomahawk, Apocalipse Joe, A Man Called Django! e Death in Haiti), presente apenas em Hotel Paradiso. “Parecia uma competição para ver qual ficava pior.” Ambos os w.i.p. traziam invariavelmente despidas as atrizes Cinzia Lodetti, Cristina Lai, a Miss Itália 1974 Zaira Zoccheddu e o transexual norte- americano George Wilson (a.k.a. Ajita Wilson). “Ajita era um homem?”, surpreender-se-ia Steffen em 2003. “Eu a considerava uma mulher belíssima!” Uma das prisioneiras arranca a cabeça de uma cobra à dentada em Escape from Hell; outra se finge de louca e simula um romance com um cachorro a fim de não ser violentada pelos guardas; uma terceira morre estrangulada por uma cobra gigante. O ítalo- brasileiro interpreta o doutor Farrell, médico alcoólatra que ajuda as presidiárias a fugirem.

222 Em Hotel Paradiso, ele vive o líder revolucionário Juan Laredo. À moda dos westerns spaghetti, o ator de 49 anos corre, salta e atira de rifle e pistola. Seria seu último papel como homem de ação. O grupo de Laredo invade um presídio a fim de libertar detentas feitas de escravas numa mina de esmeraldas sob o jugo do diretor encarnado por Luciano Rossi (o vilão insano de The Stranger’s Gundown). Além de uma violentíssima seqüência de estupro, há algumas inserções de sexo explícito (ausentes na maioria das versões disponíveis em vídeo). Edoardo Mulargia conta essa história – ou, ao menos, parte dela – na entrevista concedida a Amilcare Di Mezza para a revista Nocturno Cinema (nº 62, setembro de 2007): “I had already finished with the movies, because in the 70’s there was a big crisis in film industry due to some changes in legislation of the producer’s rights over taxes from their box-office incomes. I was four years without working, because producers offered me strange films,

223 porn ones for foreign markets, under pseudonym, which I did not accept. Along with that, in the 80’s, I was directing some films for TV when an article of the Panorama magazine put me as one of the stellars directors of the international porn cinema. I sued them and won… What happened was that some small producers, in films with love scenes, after obtaining the OK from Italian censorship, inserted porn scenes in them for foreign markets. I found it out and I know quite well the names of the responsible. They don’t know that, but I know them”. Escape from Hell e Hotel Paradiso estrearam com sete meses de diferença, em pequenas salas do centro de Roma, e ficaram poucos dias em cartaz. Parecem ruins? O que esperar então de Savage Island (Italy/USA, 1985), remontagem perpetrada pelo produtor norte-americano Charles Band cinco anos depois? Os dois w.i.p. de Mulargia viraram um w.i.p. só, com dublagem em inglês diferente dos enredos originais e uma nova trilha sonora. Não existem outros créditos na filmografia de Nicholas Beardsley,

224 talvez um nome fictício, a quem é atribuída a direção dessa colcha de retalhos. Linda Blair ― a menina possuída de The Exorcist −, o conterrâneo Penn Jillette − da dupla de mágicos-humoristas Penn & Teller − e o veterano intérprete austro-húngaro Leon Askin atuam nos cerca de dez minutos adicionais enxertados no início e no fim. Fugitiva da ilha do título, Daly (Linda) invade o escritório de Luker (Askin), diretor de uma empresa mineradora que escraviza presidiárias na América do Sul. De metralhadora em punho, ela conta como contratou o grupo de Laredo (Steffen) para destruir a prisão e libertar as detentas. Tal relato corresponde a aproximadamente 70 minutos de seqüências reaproveitadas, após as quais Daly mata o empresário. A edição de Savage Island prescinde por completo da lógica e da continuidade. Gilberto Galimberti (No Room to Die, A Man Called Joe Clifford e A Man Called Django!) chicoteia as prisioneiras, numa cena extraída de Escape from Hell, para logo em seguida aparecer como um dos

225 mocinhos de Hotel Paradiso. Entre as duas seqüências, seu figurino passa de uniforme bege a blusão azul estampado. A prisioneira morta por uma cobra no primeiro filme ressurge pouco adiante, numa cena do segundo. Em 1986, Linda Blair receberia o Razzie Award de pior atriz por seu desempenho nessa e em mais duas fitas − Night Patrol (EUA, 1984) e Savage Streets (EUA, 1984). Por praticamente toda a vida, Steffen ignorou a existência na sua filmografia de um longa-metragem com a ex-estrela adolescente convertida em rainha das produções classe Z. Em 1985, quando Savage Island estreou nos Estados Unidos, o ex-caubói já estava havia quatro anos radicado no Rio de Janeiro.

226 13. That Man from Rio (a.k.a. Adios, Gringo)

Antonio Luiz de Teffé pisou no Brasil pela primeira vez em 1951, aos 20 anos, disposto a driblar o alistamento militar na Itália. Rusgas com a mãe e o padrasto também pesaram na decisão de deixar Roma. Talvez houvesse ainda da parte dele uma busca pelo amor do pai, com quem pouco convivera. Se realmente havia tal desejo, a viagem ao Rio de Janeiro não correspondeu à expectativa. De namoro com Alice Tamborindeguy, dama da alta sociedade do Rio de Janeiro, Manuel de Teffé tentou esconder a existência do filho bastardo. Antonio ficou hospedado no rico bairro de Botafogo, no palacete do homem que duas décadas antes desaprovara seu nascimento e proibira o casamento de seus pais: Oscar de Teffé. Acerca da convivência com o avô paterno, as lembranças soam amargas: “Na geladeira, só tinha água. Se eu quisesse telefonar, precisava ir até a loja Sears e pedir o telefone emprestado.” Para aplacar a solidão do rapaz,

227 Manuel lhe apresentou os filhos de alguns conhecidos. Antonio e os amigos passavam horas a treinar boxe no porão da mansão Teffé. No dia 20 de fevereiro de 1951, um desses amigos − o inglês Seymour Greeman −, a irmã dele e Antonio resolveram passear no Pão de Açúcar60. Às 15h15, ainda na primeira etapa do trajeto do teleférico, entre a Praça General Tibúrcio, na Praia Vermelha, e o Morro da Urca, ouviu-se um estrondo. Um dos dois cabos-trilho se rompera e o vagão ficou suspenso somente por um deles, a uma altura de aproximadamente 200 metros. Dentro do bondinho, dois funcionários da Caminho Aéreo Pão de Açúcar (empresa responsável pelo funcionamento do teleférico) e dezenove turistas sentiram um violento baque. O título da reportagem de Arlindo Silva

60 Em inglês conhecido como “Sugarloaf Mountain”. A subida até o topo é feita de teleférico (popularmente chamado bondinho), em duas etapas. A primeira delas sai da Praça General Tibúrcio, na Praia Vermelha, e vai até o alto do Morro da Urca (220 metros de altura). De lá, os passageiros pegam outro teleférico até o topo do Pão de Açúcar (396 metros de altura). 228 publicada na revista O Cruzeiro61 (10 mar. 1951) é emblemático: 22 Vidas por um Fio62. A 22ª vida em risco pertencia a Augusto Gonçalves, chefe do grupo de conservação da empresa, que viajava no topo do carro. Funcionário da companhia havia 32 anos, Gonçalves acalmou os passageiros. Em seguida, gritou e acenou para seus colegas no alto da Urca. Eles amarraram a ponta de uma comprida corda de estopa numa carretilha e a soltaram fio abaixo até o bondinho. Dois operários desceram pela encosta com a outra extremidade da corda e a prenderam a um tronco de árvore. De uma altura de 50 metros, Gonçalves desceu feito Tarzan até a rocha e escalou o morro. Da estação da Urca, comandou a operação de salvamento.

61 O Cruzeiro era então a mais importante revista do Brasil, com uma tiragem que girava em torno de 700 mil exemplares por semana. Publicada desde novembro de 1928, iniciou uma reformulação editorial no final de 1943, deixando-a cada vez mais parecida com a bíblia das revistas ilustradas, a norte-americana Life, no que diz respeito às fotografias. Seu último número chegou às bancas em julho de 1975, há muito já sem o sucesso da fase áurea. 62 Em inglês, “______”. 229 Todas as rádios do Rio de Janeiro interromperam suas programações para noticiar o primeiro desastre em 38 anos de funcionamento do bondinho do Pão de Açúcar. A cidade parou para ouvir. Logo, uma multidão de repórteres e curiosos se aglomerava na Praça General Tibúrcio. Uma tropa de policiais evacuou a área e providenciou um cordão de isolamento. Apenas parentes das vítimas puderam permanecer. Entre eles, um aflito Manuel de Teffé não se importava mais que a existência do filho viesse a público. No interior do bondinho, Antonio ajudou a evitar o pânico. Algumas moças ensinaram palavras em português para ele e Seymour. Juntos, cantaram músicas em italiano, inglês e até marchinhas de Carnaval no esforço de acalmar os ânimos. O único alimento disponível eram três tubos de dropes. Às 19h30, um forte nevoeiro já encobria por completo o teleférico. Uma caçamba de madeira presa por quatro fios de aço a uma roldana deslizou sobre o cabo-trilho restante por volta das 22 horas. Sempre com um

230 bombeiro e um funcionário da Caminho Aéreo Pão de Açúcar a bordo, o veículo construído de improviso resgataria cinco pessoas por vez em idas e vindas que duravam meia hora cada uma. Antonio, Seymour e outros passageiros auxiliaram a embarcar mulheres e crianças. Uma senhora em desespero teve de ser colocada quase à força na caçamba. Passava de 1 da madrugada quando a quinta e última viagem chegou a terra firme, trazendo o ítalo-brasileiro, o inglês e mais três homens. Manuel de Teffé apareceu abraçado ao filho nas páginas de O Cruzeiro e O Globo. “Vi muita coisa durante a guerra na Europa, mas nada me deixou mais horripilado do que este acontecimento de hoje à tarde”, declarou o rapaz na matéria Toda a Cidade Emocionada! 63 (O Globo, 21 fev. 1951). “Tínhamos de demonstrar calma e sangue frio. Travestido de fleumático, tenho a convicção de que fui um grande artista.”

63 Em inglês, “ ______”. 231 O heroísmo descrito na imprensa aumentaria o já significativo sucesso de Antonio com as garotas do Rio de Janeiro. Na praia ou nas festinhas, era o centro das atenções. A estadia dele no Brasil também renderia uma nova conquista amorosa a seu pai. O jovem havia ido ao porto cumprimentar uma amiga de sua mãe, a tcheca Dana Edita Fischerova. Esta se encontrava num navio rumo a Buenos Aires, vindo da Europa. O mulherengo Manuel de Teffé, que acompanhava o filho, caiu de amores pela estrangeira. Casaram-se pouco depois, no México. O divórcio se deu em 1960. No ano seguinte, o suposto assassinato de Dana de Teffé, cujo corpo jamais foi localizado, chocaria o Brasil. Sob as acusações de homicídio, ocultação de cadáver, falsificação de documentos e apropriação indébita dos bens de sua cliente, o advogado Leopoldo Heitor cumpriu nove anos e seis meses de prisão. Apesar das evidências, nenhum júri conseguiu provas para condená-lo.

232 Dana e Manuel ainda estavam juntos quando Antonio, já livre do serviço militar, vendeu o carro que o pai lhe emprestara e retornou à Itália na primeira classe do transatlântico Augustus. Em novembro de 1958, durante a Semana do Filme Italiano, estava de novo no Brasil. Tinha prometido ciceronear a amiga Franca Bettoja, integrante da delegação de artistas que acompanhava a mostra, na Cidade Maravilhosa. Antonio levou-a ao Pão de Açúcar, ao Corcovado64, ao parque Quinta da Boa Vista e às praias do bairro Barra da Tijuca, onde começaram a namorar. A atriz seguiu para São Paulo com a comitiva e depois voltou ao Rio, a fim de passar algum tempo ao lado dele. Fiorella, irmã de Franca, cuidava de vigiar o casal. “Era uma espécie de cão de guarda”, desdenha Teffé. Mesmo sob vigília, o namoro ensejou idílicas fotos de Jáder Neves e uma reportagem de

64 Montanha cujo nome significa, em inglês, “Hunchback”. É nela que se encontra o maior símbolo do Rio de Janeiro, a estátua do Cristo Redentor (“Christ the Redeemer"). 233 Aluízio Flôres, intitulada Romance no Rio65, para a revista Manchete66 (29 nov. 1957). Além de Franca, a comissão da Semana do Filme Italiano incluía o produtor Salvatore Argento, o diretor Mario Monicelli, o futuro astro Renato Salvatori e as atrizes e . Principal estrela da mostra, Giulietta viera lançar a nova fita de seu marido, Federico Fellini, Nights of Cabiria (France/Italy, 1957). Teffé achava Giulietta um amor de pessoa, porém não gostava do marido dela. Em entrevista a Artur Xexéo publicada em O Globo (27 de abril de 2004), o ex-galã dispararia: “Fellini era presunçoso, arrogante. Morávamos a 100 metros um do outro. Mas não nos dávamos. Eu sou romano, tenho 6 mil anos. Ele era de Rimini”. Quando residia na vizinhança de Fellini, Teffé já se consagrara como o caubói Anthony Steffen.

65 Em inglês, “______”.

66 Manchete firmou-se como a principal concorrente de O Cruzeiro na década de 1950,chegando a vender 800 mil exemplares por semana. Por privilegiar mais as fotos que os textos, tinha como principal influência a revista francesa Paris Match. Foi publicada entre os anos 1952 e 2000. 234 Entre um filme e outro, fazia questão de passar férias no Rio de Janeiro. Costumava alugar durante as temporadas brasileiras uma luxuosa cobertura no Leblon, que comprou após as filmagens de Killer Fish. Dois anos antes, uma de suas visitas ao país mereceu, pelo inusitado, uma nota na revista Veja de 1º de dezembro de 1976. Nela, Steffen dava uma polêmica declaração sobre os “esquadrões da morte”, grupos de policiais que faziam justiça com as próprias mãos, executando criminosos nas grandes cidades brasileiras – e que haviam até servido de inspiração para o roteiro de Magnum Force (USA, 1973), de Ted Post, segunda aventura policial na qual Clint Eastwood encarna o policial linha-dura Dirty Harry. O texto na revista era construído a partir de uma comparação com os violentos caubóis que ele havia interpretado na fase áurea dos westerns spaghetti: “Na vida real o ítalo-brasileiro Antonio de Teffé, bisneto do barão de Teffé, não se comporta de maneira muito diferente. Na semana passada, ele chegou ao Rio para um breve período de férias e,

235 armado com dois revólveres, delineou algumas de suas teorias: ‘Há trinta anos não temos uma gerra mundial para aliviar as tensões. Do jeito que o mundo vai, a única solução são os esquadrões da morte’”. Em 1981, desiludido com os rumos de sua carreira em particular e do cinema italiano em geral, o ex-galã fixou residência no Brasil. “As festas dele reuniam a maior concentração de mulheres bonitas que já vi na vida”, lembra o ator e hoje corretor imobiliário Celso Faria. “Eu chegava antes para ajudá-lo no preparo da comida. Antonio era um grande cozinheiro.” Anfitrião de mão cheia, Teffé abria portas de seu apartamento tanto para a alta sociedade do Rio de Janeiro quanto para personalidades italianas em visita à cidade. Os italianos , e Ugo Tognazzi, por exemplo, sentaram-se à sua mesa de jantar. Sergio Martino, que o dirigira em Arizona Colts Return, sempre o visitava quando vinha rever o seu primo, o astro italiano Michelle Massimo Tarantini, que também tinha casa no Rio.

236 Ao se apresentar nos eventos sociais, o ítalo- brasileiro nunca mencionava o pseudônimo Anthony Steffen. Era Antonio Luiz de Teffé, de preferência precedida pelo título nobiliárquico de seu bisavô. “Sou o barão Antonio Luiz de Teffé”, identificou-se ao recepcionista durante a inauguração do terceiro piso do ostentoso shopping center Fashion Mall, para a qual não possuía convite. E foi entrando, seguido por Sérgio Goldhirch. “E o senhor, quem é?”, inquiriu o funcionário. Teffé parou, olhou por sobre o ombro e, de modo aristocrático, respondeu em lugar do amigo: “É o meu namorado.” Sem jeito, o recepcionista abaixou a cabeça e permitiu que ambos entrassem. Casos assim constituíam exceção, pois o astro recebia convites para a maioria dos grandes acontecimentos. Freqüentava boates da moda, como a Regine’s e a exclusivíssima Hippopotamus, da qual tinha carteira de sócio. A vida de playboy lhe renderia várias citações nas colunas sociais de Ibrahim Sued67,

67 Titular de uma coluna no jornal O Globo a partir de 1954, Ibrahim Sued (1924- 1995) foi o mais influente colunista social brasileiro. Suas listas das “Dez Mais” (as dez mulheres mais belas, as dez mais elegantes etc.) marcaram época. De ascendência 237 que havia sido amigo de seu pai. Quando a escola de samba Acadêmicos de Santa Cruz dedicou a Sued seu enredo no Carnaval de 1985, Antonio desfilou no carro alegórico ao lado dele, fantasiado de chofer. Embora evitasse demonstrar, no fundo sentia saudade dos sets. Tanto que em 1982 reassumiu o pseudônimo Anthony Steffen numa participação especial na novela da Rede Globo68 Sétimo Sentido69. Ele interpreta o assassino de Priscila Capricce (Regina Duarte), atriz italiana que reencarna na médium Luana Camará (Regina também) e se envolve com Tião Bento (Francisco Cuoco). Regina Duarte, apelidada de “namoradinha do Brasil”, e Francisco Cuoco eram dois dos astros mais populares das telenovelas de então. No mesmo ano, o ítalo-brasileiro atuaria no

árabe, nascido numa família pobre no Rio de Janeiro, Ibrahim conseguiu ascender socialmente. Além disso, lançou modas e criou um estilo que vigora até hoje nas colunas sociais do Brasil. 68 Mais importante rede de televisão da América Latina e quarta maior emissora do mundo, a Rede Globo é famosa por suas telenovelas, produzidas desde 1965 até hoje. Exubidas em capítulos diários, as novelas representam o carro-chefe da audiência e constituem o principal produto de exportação do canal. 69 Em inglês, “______”. 238 suspense erótico Momentos de Prazer e Agonia70 (Brasil, 1983), do brasileiro Adnor Pitanga. Apesar de ser este o primeiro e único papel de Steffen num longa-metragem totalmente brasileiro, o sucesso de seus westerns spaghetti já havia feito com que sua imagem aparecesse em duas outras produções nacionais. No drama Um Homem sem Importância71 (Brasil, 1970), o protagonista Flávio (Oduvaldo Viana Filho), andando pelas ruas em busca de emprego, pára para observar o cartaz de No Room to Die na porta de um cinema. E em All Nudity Shall Be Punished (Brasil, 1972), há um enorme pôster de A Few Dollars for Django no salão do prostíbulo onde vive Geni (Darlene Glória), a prostituta por quem o conservador viúvo Herculano (Paulo Porto) se apaixona. Rodada na cidade fluminense de Rio Bonito em 1982 e lançada no ano seguinte, Momentos de Prazer e Agonia é uma adaptação bastante livre de um conto do escritor francês Guy de Maupassant,

70 Em inglês, “______”.

71 Em inglês, “______”. 239 ambientada nos dias de hoje, no Brasil. Vinda de São Paulo, a professora Marília (Rossana Ghessa) se envolve com o rico e excêntrico fazendeiro Rodolfo (Steffen). A chegada de Renata (Fátima Leite), ex- amante dela, ao vilarejo dá início a uma série de assassinatos. No final, Marília descobre que Rodolfo, enlouquecido de ciúme, está por trás dos crimes. Monótona, a narrativa conta com extensas seqüências de nudez da coadjuvante Ismênia Kreis e um pálido arremedo do assassinato no chuveiro de Psycho. Nascida em Carbonia, Itália, e criada no Brasil, Rossana Ghessa conquistara o status de musa das pornochanchadas72 graças a êxitos como Memórias de um Gigolô73 (Brasil, 1970), de Alberto Pieralisi, e Lua de Mel e Amendoim74 (Brasil, 1971),

72 Pornochanchadas foram produções de enorme sucesso no Brasil dos anos 1970 ao início dos 1980 – quando deram lugar aos filmes de sexo explícito nas salas de cinema. De certa forma, esses filmes retomavam o humor das chanchadas, mas com nudez feminina no lugar dos números musicais de carnaval. Tinham influência também das comédias eróticas italianas – várias das pornochanchadas brasileiras, aliás, adotaram o formato do longa-metragem dividido em episódios. 73 Em inglês, “______”. 74 Em inglês, “______”. 240 de Fernando de Barros e Pedro Carlos Rovai. Momentos de Prazer e Agonia foi a terceira produção da Rossana Ghessa Produções Cinematográficas, empresa fundada por ela em 1974. A escalação de Steffen se devia à fama dele na pele do herói Django. Ao conhecê-lo pessoalmente, a atriz e produtora se arrependeu: “Eu contratei o galã das fotos, não aquela múmia!”. Embora estivesse longe de seus dias gloriosos como astro de westerns spaghetti, o ítalo-brasileiro tinha a seu favor a amizade com o colunista social mais importante do Brasil. Graças a influência de Ibrahim Sued, o filme de Adnor Pitagan ganhou até reportagem nas páginas do jornal O Globo – algo raríssimo, em se tratando de uma produção de segunda linha. “A filmagem durou umas seis semanas, com orçamento apertadíssimo”, lembra Pitanga. “A falta de dinheiro gerava uma tensão enorme. E a presença de um astro acostumado a trabalhar na Europa só complicava a situação”. A arrogância do ítalo- brasileiro levou alguns membros da equipe a apelidá-

241 lo de “baronesa”. Pequenas divergências geravam brigas homéricas entre ele e Rossana, sempre em italiano. A gota d’água aconteceu quando o intérprete se recusou a rodar uma cena a cavalo. “Que diabo de caubói de faroeste é você?”, indignou-se a estrela, aos berros. “Ofereceram-me um roteiro e na hora de filmar mudaram tudo”, dizia Steffen ao explicar seu ódio pela película. Segundo Rossana, era ele quem queria alterar o roteiro a todo momento. Logo no primeiro dia, o astro tentara convencer o diretor a reproduzir uma cena da aventura pré-histórica Quest for Fire (Canadá/França/EUA, 1981). A estrela ficou fula, visto não existir nada no enredo que justificasse a cena: “Você pode mandar lá em Cinecittà, mas aqui a dona do filme sou eu”!. No que diz respeito às mudanças na trama em meio às filmagens, Adnor Pitanga dá razão a Steffen. Do roteiro escrito pelo próprio diretor, em parceria com Vital Filho, pouca coisa restou em Momentos de Prazer e Agonia. Nos dois anos anteriores, profundas

242 transformações haviam ocorrido no mercado exibidor brasileiro. Em setembro de 1980, com o país sob uma ditadura militar havia 16 anos, a censura liberou a exibição nas salas de cinema da produção franco- japonesa In the Realm of the Senses (1976), de Nagisa Oshima. Pela primeira vez, uma obra com cenas de sexo explícito era exibida legalmente nas telas nacionais. Seguiram-se uma avalanche de fitas pornográficas importadas, até que o diretor italiano Raffaelle Rossi lançasse Coisas Eróticas75 (1981), a primeira de uma extensa lista de produções do gênero feitas no Brasil. “A Rossana conseguiu parte do dinheiro para rodarmos Momentos de Prazer e Agonia com o Luiz Severiano Ribeiro Jr., amigo dela e dono da maior cadeia de cinemas do país”, diz Pitanga. “Naquela época, tantos os produtores quanto os exibidores só queriam saber de filmes com forte apelo erótico. E o Severiano era as duas coisas, produtor e exibidor”. O conto original de Maupassant propunha uma reflexão

75 Em inglês, “______”. 243 sobre o passar do tempo; a adaptação cinematográfica, embora trouxesse Steffen no papel de um fazendeiro assombrado pelo fantasma do envelhecimento, girava basicamente em torno de sexo – tudo simulado, de maneira não-explícita. Em seu filme seguinte, Mulheres Liberadas76 (1983), novamente com Rossana Ghessa no elenco, o diretor se viu obrigado a enxertar na narrativa cenas pornográficas. Ele próprio as dirigiu, com atores especializados nesse tipo de performance. Resultado: apesar de rodado depois, Mulheres Liberadas despertou o interesse dos exibidores e chegou às telas antes do filme anterior, graças às seqüências explícitas. Concluída a via-crúcis de Momentos de Prazer e Agonia, Teffé tratou de se divertir numa festa promovida pelo champanhe Moët Chandon na boate Chez Castel. Ao ver a jovem manequim Cristina Novaes na pista de dança, recorreu a uma de suas cantadas prediletas: − Você tem um martelo aí?

76 Em inglês, “______”. 244 − Não. − E um alicate? − Também não. Para quê? − Para bater na sua cabeça. A modelo riu. Começou assim o relacionamento que duraria 21 anos. As viagens à Itália em companhia de Cristina se tornaram prática comum. Apaixonado por Roma, Teffé levava a namorada aos pontos turísticos e aos melhores restaurantes. O casal reservava boa parte do tempo aos filhos dele, Manuel e Luiz. A ex-mulher, Antonella, era evitada a qualquer custo, mas o ator não media esforços para agradar os meninos. Não era fácil. A exemplo dele, os dois foram criados em Roma enquanto o pai vivia do outro lado do Atlântico, no Brasil. Em 1989, com planos de ir à Itália para rever os filhos, Steffen aceitou atuar no drama erótico Malù e l’Amante77 (Itália, 1990), de Pasquale Fanetti (a.k.a. Frank De Niro). Findas as filmagens no Hotel e Clube

77 Em inglês, “______”. 245 de Golfe Castelfalfi, perto da cidadezinha de San Geminiano, ele e Cristina excursionaram pela região da Toscana e depois foram encontrar Manuel e Luiz em Roma. Essa 64º fita do artista, produzida diretamente para o mercado de vídeo, marca seu adeus à carreira. Trata-se de uma versão pouco fiel e não- creditada do romance Lady Chatterley's Lover (1928), do inglês D.H. Lawrence. Repleta de morosas cenas de nudez e sexo simulado, a trama gira em torno do triângulo amoroso entre o conde Franz (Steffen), sua esposa Joelle (a ex-atriz pornô Ileana Carisio, a.k.a. Malù) e o jardineiro Charles (Kieran Canter, a.k.a. Mack Kiran). Em clima de férias, Cristina acompanhou o trabalho quase na íntegra. Ausentou-se apenas enquanto seu companheiro, em vias de completar 60 anos, rodava uma seqüência softcore com a exuberante protagonista Malù. Embora estivessem juntos desde 1983, Antonio e Cristina moravam em apartamentos separados. Em 1991 ele teve uma filha com a artista plástica Susana Spadaccini, que havia conhecido

246 numa galeria de artes do Rio de Janeiro. Chiara Antonia Spadaccini de Teffé foi reconhecida e registrada pelo pai. Ele nunca contou a Cristina sobre a menina. Criada pela mãe, Chiara visitava Antonio sempre que podia. A despeito do avançar da idade, ele continuava mulherengo e narcisista. Abdominais, flexões de braço e levantamento de halteres faziam parte de sua rotina. Não fumava, bebia pouquíssimo e orgulhava-se da vasta cabeleira − tingida, a fim de ocultar os fios grisalhos − e dos dentes perfeitos. Em 2002, a descoberta de um tumor maligno no pulmão esquerdo, com o câncer já disseminado pelo sistema ósseo, arrasou-o. As sessões de quimioterapia amarelaram seus dentes e provocaram a queda do cabelo. Abatido, não se deixava fotografar. Vaidoso, usava uma peruca acaju para sair à rua. Após o tratamento, a diminuição do nível de c.e.a. (antígeno carcioembrionário) parecia indicar uma vitória sobre a doença. “Vou deixar o cabelo crescer, colocar um piercing e fazer uma tatuagem”,

247 ironizava. Ledo engano. Cansaço, sede intensa, dores na coluna, ardência nas pernas, perda de sensibilidade... Eram os sintomas da metástase, multiplicação e migração das células cancerosas do pulmão para outros órgãos e tecidos. Diante da iminente morte do companheiro, Cristina, àquela altura morando com Antonio, convenceu Luiz a vir ao Brasil. O ex-caubói, sem esconder a emoção, abraçou o filho e chorou. Manuel chegou poucos dias depois. Foi igualmente recebido com lágrimas. Na fase terminal da doença, Antonio e a filha não se encontraram. Ele não queria que a menina o visse naquele estado. Chiara respeitou a vontade do pai. Na madrugada de 5 de junho de 2004, no Rio de Janeiro, aos 73 anos, Antonio Luiz de Teffé (a.k.a. Anthony Steffen) perdeu o duelo contra o câncer. Embora o próprio ator não demonstrasse muito apreço por seus filmes, o culto em torno deles não pára de crescer. Fotos de bastidores, lobby-cards, stills e cartazes são disputados por colecionadores ao

248 redor do globo. Quando o assunto é western spaghetti, sempre há menção aos de Steffen – vide o renomado ensaio Cowboys and Europeans: from Karl May to Sergio Leone (1981), do inglês Christopher Frayling, ou o artigo Anthony Steffen – El Rostro de la Venganza78, de Federico de Zigno, incluído na edição especial sobre o tema da revista espanhola Nosferatu, de outubro de 2002). DVDs com seus filmes, incluindo pelo menos 19 dos 26 westerns que protagonizou, foram editados na Argentina, na Alemanha, no Brasil, nos Estados Unidos, na Inglaterra, na Itália, na Espanha e até no Japão. Enquanto você termina esse livro, outro spaghetti estrelado por ele pode estar chegando ao mercado no formato digital em alguma parte do mundo. Como se vê, nem o pavor que Antonio de Teffé sentia de cavalos nem a morte impediram o caubói Anthony Steffen de seguir galopando.

78 Em inglês, “______”. 249 FILMOGRAFIA

Assistente de direção, não-creditado 1948 Bicycle Thieves (Ladri di biciclette, Itália), de Vittorio De Sica. 1949 Fabiola (Fabiola, Itália), de Al essandro Blasetti.

250 Assistente de direção, como Antonio de Teffé 1953 Ci troviamo in galleria (Itália), de Mauro Bolognini. 1954 100 Years of Love (Cento anni d’amore, Itália), de Lionello De Felice.

Ator, como Antonio de Teffé 1955 Abandoned (Gli sbandati, Itália), de Francesco Maselli. Eighteen Year Olds (Le diciottenni, Itália), de Mario Mattòli. 1956 Castle of the Banned Lovers (Beatrice Cenci (France/Italy), de Riccardo Freda. Inédito no Brasil. 1957 The Foundling of Pompeii (La trovatella di Pompei, Itália), de Giacomo Gentilomo. 1958

251 City at Night (Città di notte, Itália), de . Aphrodite, Goddess of Love a.k.a Slave Women of Corinth (Afrodite, dea dell’amore, Itália), de Mario Bonnard. 1959 Devil’s Cavaliers (I cavalieri del diavolo, Itália), de Siro Marcellini. The Jukebox Kids (I ragazzi del juke box, Itália), de Lucio Fulci. Inédito no Brasil. 1960 Savage Cavalcade (Cavalcata selvaggia, Itália), de Piero Pierotti. Inédito no Brasil. The Tank of September 8th (Il carro armato dell’8 settembre, Itália), de Gianni Puccini. 1961 Solitudine (Itália), de Renato Polselli. 1962 Last Chance for Life (Ultimatum alla vita, Itália), de Renato Polselli.

252 The Last Days of Sodom and Gomorrah (France/Italy/EUA, 1962), de Robert Aldrich. 1963 Avventura al motel (Itália), de Renato Polselli.

Ator, como Anthony Steffen 1963 The Blind Girl of Sorrento (La cieca di Sorrento, Itália), de Nick Nostro. Inédito no Brasil. 1964 The Invincible Brothers Maciste (Gli invincibili fratelli Maciste, Itália), de Roberto Mauri. 1965 I figli del Leopardo ( Itália), de Sergio Corbucci. The Last Tomahawk (Der letzte Mohikaner, Alemanha/Itália/Espanha), de Harald Reinl. Latin Lovers (Gli Amanti Latini, Itália), de Mario Costa. Inédito no Brasil. Why Go on Killing? (Perché uccidi ancora?, Itália/Espanha), de José Antonio de la Loma e Edoardo Mulargia (diretor não-creditado).

253 A Coffin for the Sheriff (Una bara per lo sceriffo, Itália/Espanha), de Mario Caiano. 1966 Seven Dollars to Kill (7 dollari sul rosso, Itália/Espanha), de Alberto Cardone (a.k.a. Albert Cardiff) e Mario Siciliano (a.k.a. Marlon Sirko, diretor não-creditado). An Angel for Satan (Un angelo per Satana, Itália), de Camillo Mastrocinque. Ringo the Mark of Vengeance (Los cuatro salvajes, Espanha/Itália), de Mario Caiano. A Few Dollars for Django (Pochi dollari per Django, Itália/Espanha), de León Klimovsky, Marino Girolami (diretor não-creditado) e Enzo Girolami (diretor não- creditado). Blood at Sundown (1.000 dollari sul nero, Itália/Alemanha), de Alberto Cardone (a.k.a. Albert Cardiff) e Mario Siciliano (a.k.a. Marlon Sirko, diretor não-creditado). 1967

254 Gentleman Killer (Gentleman Jo... uccidi, (Itália/Espanha), de Giorgio Stegani (a.k.a. George Finley). Killer Kid (Killer Kid, Itália), de Leopoldo Savona. Train for Durango (Un treno per Durango, Itália/Espanha), de Mario Caiano (a.k.a. William Hawkins). 1968 Two Guns and a Coward (Itália), de Giorgio Ferroni (a.k.a. Calvin Jackson Padget). A Stranger in Paso Bravo (Uno straniero a Paso Bravo, Itália/Espanha), de Salvatore Rosso e Antonio de Teffé (a.k.a. Anthony Steffen, diretor não- creditado). A Name That Cried Revenge (Il suo nome gridava vendetta, Itália), de Mario Caiano (a.k.a. William Hawkins). Dead Men Don’t Count! (I morti non si contano, Itália/Espanha), de Rafael Romero Marchent. 1969

255 No Room to Die (Una lunga fila di croci, Itália), de Sergio Garrone. Garringo (Garringo, Itália/Espanha), de Rafael Romero Marchent. The Stranger’s Gundown (Django, il bastardo, Itália), de Sergio Garrone. Roteiro de Antonio de Teffé e Sergio Garrone. 1970 Shango (Shango, la pistola infallibile, Itália), de Edoardo Mulargia (a.k.a. Edward G. Muller). Roteiro de Antonio de Teffé e Edward G. Muller. Arizona Colt Returns (Arizona si scatenò... e li fece fuori tutti!, Itália/Espanha), de Sergio Martino. Viva Sabata! (Arriva Sabata!..., Itália/Espanha), de Tulio Demicheli. A Man Called Joe Clifford (Un uomo chiamato Apocalisse Joe, Itália/Espanha), de Leopoldo Savona. 1971 The Night Evelyn Came Out of the Grave (Itália), de Emilio Paolo Miraglia.

256 A Man Called Django! (W Django!, Itália), de Edoardo Mulargia (a.k.a. Edward G. Muller). 1972 The Crimes of the Black Cat (Sette scialli di seta gialla, Itália), de Sergio Pastore. Too Much Gold for One Gringo (La caza del oro, Itália/Espanha), de Juan Bosch. Death in Haiti a.k.a. Tropic of Cancer (Al tropico del cancro, Itália), de Edoardo Mulargia (a.k.a. Edward G. Muller) e Giampaolo Lomi. Roteiro de Antonio de Teffé, Edward G. Muller e Giampaolo Lomi. 1973 Lady Dynamite (Itália), de Giuseppe Vari (a.k.a. Al Pisani). Shoshena (Uno, dos, tres... dispara otra vez, Itália/Espanha), de Tulio Demicheli. Sixteen (Sedicianni, Itália), de Tiziano Longo. 1974 Diary of an Erotic Murderess (La Encadenada, Espanha/Itália), de Manuel Mur Oti.

257 The Killers Are Our Guests (Gli assassini sono nostri ospiti, Itália), de Vincenzo Rigo. The Killer with a Thousand Eyes (Los mil ojos del asesino, Espanha/Itália), de Juan Bosch. Roteiro de Antonio de Teffé, Juan Bosch, Alberto De Stefanis e Ángel G. Gauna. Siete Chacales (Espanha/Itália), de José Luis Madrid. 1975 Charlotte (La jeune fille assassinée, França/Itália/Alemanha), de Roger Vadim. Evil Eye (Malocchio, Itália/Espanha/México), de Mario Siciliano. Ten Killers Came from Afar (Dallas, Itália/Espanha), de Juan Bosch. 1976 Roma, l’altra faccia della violenza (France/Italy), de Marino Girolami (a.k.a. Franco Martinelli). 1978 Killer Fish (EUA/França/Itália/Brasil), de Antonio Margheriti (a.k.a. Anthony M. Dawson). 1979

258 Play Motel (Itália), de Mario Gariazzo (a.k.a. Roy Garret). Zoo Zéro (França), de Alain Fleischer. 1980 Escape from Hell (Femmine infernali, Itália/Espanha), de Edoardo Mulargia (a.k.a. Edward G. Muller). Hotel Paradiso (Orinoco: Prigioniere del sesso, a.k.a. Blood for Liberty, Itália/Espanha), de Edoardo Mulargia (a.k.a. Tony Moore). 1983 Momentos de prazer e agonia (Brasil), de Adnor Pitanga. 1985 Savage Island (EUA/Itália), de Nicholas Beardsley e Edoardo Mulargia (diretor não-creditado). 1990 Malù e l’amante (Itália), de Pasqualino Fanetti (a.k.a. Frank De Niro).

259 OUTRAS PRODUÇÕES CITADAS Incluir: inglourious basterds; Today We Kill, Tomorrow We Die!, No Mercy for the Hunted, The Beast, The Man Who Loved Women e Cinema Paradiso. The Big Gundown Face fo face Run, man, run O Homem do Sputnik

260 Planeta Proibido. O Homem do Sputnik (Brasil, 1959 The Unscrupulous Ones (Os Cafajestes, Brasil, 1962), de Ruy Guerra. Mafioso (Itália, 1962) Planet of the Vampires (Itália/Espanha, 1965) The Hellbenders (Itália/Espanha, 1967). Condenados (1959), de Manuel Mur Oti. Orgullo (1955), de Manuel Mur Oti In the Realm of the Senses (França/Japão, 1976), de Nagisa Oshima Juke Box Urli d'Amore Crypt of the Vampire (La cripta e l'incubo, Itália, 1964), de Camilo Mastrocinque Django Andy Warhol’s Frankenstein (France/Italy, 1973), de Paul Morrissey Mulheres Liberadas (Brasil, 1983), de Adnor Pitanga Coisas Eróticas (Brasil, 1981), de Raffaelle Rossi. Andy Warhol’s Dracula (France/Italy, 1974), de Paul Morrissey

261 Pit and the Pendulum (USA, 1961), de Roger Corman Magnum Force (USA, 1973), de Ted Post

The Horrible Dr. Hichcock (L'orribile segreto del Dr. Hichcock, Italy, 1962), de Riccardo Freda.

8½ (France/Italy, 1963), de Federico Fellini

For Love and Gold (L'armata Brancaleone, France/Italy/Spain, 1966), de Mario Monicelli

Pretty Baby (USA, 1978), de Louis Malle

Lawrence of Arabia (England, 1962), de David Lean The Man Who Would Be King (England/USA, 1975), de John Huston Gladiator (England/USA, 2000), de Ridley Scott Flaming Star (USA, 1960), de Don Siegel. Girl Game (Copacabana Palace, a.k.a. The Saga of the Flying Hostess, France/Italy/Brasil, 1962), de Steno. The Umbrellas of Cherbourg (Les parapluies de Cherbourg, France, 1964), de Jacques Demy Easy Rider (1969), de Dennis Hopper.

262 Lipstick (EUA, 1976), de Lamont Johnson. Two Mules for Sister Sara (EUA, 1970), de Don Siegel. Mildred Pierce (EUA, 1945), de Michael Curtiz. The Anonymous Venetian (Anonimo veneziano, Itália, 1970), de Enrico Maria Salerno. Rock Around the Clock, (EUA, 1956), de Fred F. Sears. Women on the Verge of a Nervous Breakdown (Espanha, 1988), de Pedro 800 Bullets (Espanha, 2002) Andy Wahrol’s Frankenstein (France/Italy, 1973) e Andy Wahrol’s Dracula (France/Italy, 1974). A Complicated Girl (Una ragazza piuttosto complicate, Itália, 1968), de Damiano Damiani The Damned (La caduta degli dei, Italy/West Germany, 1969), de Luchino Visconti Investigation of a Citizen Above Suspicion (Indagine su un cittadino al di sopra di ogni sospetto, Italy, 1970), de Elio Petri.

263 A Brief Vacation (Una Breve Vacanza, Italy/Spain, 1973), de Vittorio De Sica. Boogie Woogie (Italy), de Andrea Frezza, cuja estreia está anunciada para 2011.

Areão (Brasil, 1952), de Camillo Mastrocinque. Arizona Colt a.k.a The Man from Nowhere (Arizona Colt, France/Italy, 1966), de Michele Lupo. Salvatore Giuliano (Salvatore Giuliano, Itália, 1962), de Francesco Rosi. Barbarella (France/Italy, 1968), de Roger Vadim. The Battle of Algiers (La battaglia di Algeri, Itália/ Argélia, 1965), de Gillo Pontecorvo. Desert Assault (La battaglia del deserto, France/Italy, 1969), de Mino Loy. The Lipstick (Il rossetto, France/Italy, 1960), de Damiano Damiani. Kiss of Death (EUA, 1947), de Henry Hathaway. Ben-Hur (Ben-Hur, EUA, 1959), de William Wyler. The Bible: In the Beginning... (EUA/Itália, 1966), de John Huston.

264 Blood and Passion (La trastienda, Espanha, 1975), de Jorge Grau. Pale Rider I Vitelloni (I Vitelloni, France/Italy, 1953), de Federico Fellini. Boccacio ’70 (France/Italy, 1962), de Federico Fellini, Luchino Visconti, Vittorio De Sica e Mario Monicelli. Shane (EUA, 1953), de George Stevens. Buffalo Bill, Hero of the Far West (Buffalo Bill, l’eroe del Far West, France/Italy/Alemanha, 1963), de Mario Costa (a.k.a. John W. Fordson). Cabiria (Itália, 1914), de Giovanni Pastrone (a.k.a. Piero Fosco). O caçula do barulho (Brasil, 1949), de Riccardo Freda. Peddler and the Lady (Campo de’ Fiori, Itália, 1943), de Mario Bonnard. O Cangaceiro (O cangaceiro, Brasil, 1953), de Lima Barreto.

265 Dear Parents (Cari genitori, France/Italy, 1973), de Enrico Maria Salerno. They Call Me Trinity... (Lo chiamavano Trinità..., Itália, 1970), de Enzo Barboni (a.k.a. E.B. Clucher). Scipio Africanus: The Defeat of Hannibal (Scipione l’africano, Itália, 1937), de Carmine Gallone. Cleopatra (EUA/Inglaterra/Suíça, 1963), de Joseph L. Mankiewicz. The Colossus of Rhodes (Il colosso di Rodi, Itália/Espanha/França, 1961), de Sergio Leone. Companeros (Vamos a matar, compañeros, Itália/Espanha/Alemanha, 1970), de Sergio Corbucci. Run Man Run (...Corri uomo corri, Itália, 1968), de Sergio Sollima. Rawhide (EUA, 1959-1966). Série de tevê (CBS). Accattone (Accatone, Itália, 1961), de Pier Paolo Pasolini. Black God, White Devil (Deus e o diabo na terra do sol, Brasil, 1964), de Glauber Rocha. The Big Gundown (La resa dei conti, Itália/Espanha, 1967), de Sergio Sollima.

266 Days of Wrath a.k.a (I giorni dell’ira, Itália/Alemanha, 1967), de Tonino Valerii. Django a.k.a Jango (Itália/Espanha, 1966), de Sergio Corbucci. Django and Sartana’s Showdown in the West (Arrivano Django e Sartana... è la fine, Itália, 1970), de Demofilo Fidani (a.k.a. Dick Spitfire). Don’t Wait Django, Shoot! (Non aspettare Django, spara, Itália, 1967), de Edoardo Mulargia (a.k.a. Edward G. Muller). The Sweet Body of Deborah (Il dolce corpo di Deborah, France/Italy, 1968), de Romolo Guerrieri. La Dolce Vita (France/Italy, 1960), de Federico Fellini. Antonio das Mortes (O dragão da maldade contra o santo guerreiro, Brasil/França/Alemanha, 1969), de Glauber Rocha. Gunfight at Red Sands (Duello nel Texas, Itália/Espanha, 1963), de Ricardo Blasco.

267 Don't Turn the Other Cheek (Viva la muerte... tua!, Itália/ Alemanha/Espanha, 1971), de Duccio Tessari. ...And God Created Woman (Et Dieu... créa la femme, França, 1956), de Roger Vadim. El Cid (EUA/Itália, 1961), de Anthony Mann. Once Upon a Time in America (EUA, 1984), de Sergio Leone. Once Upon a Time in the West (C’era una volta il West, Itália/EUA, 1968), de Sergio Leone. Gunmen of the Rio Grande (Desafío en Río Bravo, Espanha/France/Italy, 1964), de Tulio Demicheli. Esther and the King (EUA/Itália, 1960), Raoul Walsh (creditado nas versões lançadas fora da Itália) e Mario Bava (creditado somente na versão italiana). High Plains Drifter (EUA, 1973), de Clint Eastwood. The Exorcist (EUA, 1973), de William Friedkin. Inglorious Bastards (Quel maledetto treno blindato, Itália, 1978), de Enzo Girolami (a.k.a. Enzo G. Castellari).

268 Fabiola (Fabiola, Itália, 1949), de Alessandro Blasetti. Hercules (Le fatiche di Ercole, Itália, 1958), de Pietro Francisci. Brother Outlaw (Rimase uno solo e fu la morte per tutti, Itália, 1971), de Edoardo Mulargia (a.k.a. Edward G. Muller). I Was a Teenage Frankenstein (EUA, 1957), de Herbert L. Strock. The Lost Boys (EUA, 1987), de Joel Schumacher. The Cat o’ Nine Tails (Il gatto a nove code, Itália/Alemanha/França, 1971), de Dario Argento. A Bullet for the General (¿Quien sabe?, Itália, 1966), de Damiano Damiani. Gringo, o último matador (Brasil, 1972), de Tony Vieira. O guarani (Brasil/Itália, 1950), de Riccardo Freda. Quest for Fire (La guerre du feu, Canadá/França/EUA, 1981), de Jean-Jacques Annaud. Helen of Troy (EUA, 1956), de Robert Wise.

269 Hercules Unchained (Ercole e la regina di Lidia, France/Italy, 1959), de Pietro Francisci. The Six Million Dollar Man (EUA, 1973-1978). Série de tevê (ABC). The Desperate Hours (EUA, 1955), de William Wyler. Imitation of Life, (EUA, 1959), de Douglas Sirk. Behind Closed Shutters (Persiane chiusi, Itália, 1951), de Luigi Comencini. João Ninguém (Brasil, 1936), de Mesquitinha. Keoma a.k.a Keoma the Avenger (Keoma, Itália, 1976), de Enzo Girolami (a.k.a. Enzo G. Castellari). Lizard in a Woman’s Skin (Una lucertola con la pelle di donna, Itália/Espanha/França, 1971), de Lucio Fulci. Venetian Honeymoon (La prima notte, France/Italy, 1959), de Alberto Cavalcanti. Inédito no Brasil. The Leopard (Il Gattopardo, France/Italy, 1962), de Luchino Visconti. I Was a Teenage Werewolf (EUA, 1957), de Gene Fowler Jr.

270 Lolita (EUA/Inglaterra, 1962), de Stanley Kubrick. Lua de mel e amendoim (Brasil, 1971), de Fernando de Barros e Pedro Carlos Rovai. Black Sunday (La maschera del demonio, Itália, 1960), de Mario Bava. The Robe (EUA, 1953), de Henry Koster. Massacre at Grand Canyon a.k.a Massacre at Canyon Grande (Massacro al Grande Canyon, Itália, 1964), de Sergio Corbucci (a.k.a. Stanley Corbett). High Noon (EUA, 1952), de Fred Zinnemann. Marriage Italian-Style (Matrimonio all’Italiana, France/Italy, 1964), de Vittorio De Sica. Memórias de um gigolô (Brasil, 1970), de Alberto Pieralisi. Meu nome é... Tonho (Brasil, 1969), de Ozualdo Candeias. The Wild Bunch (EUA, 1969), de Sam Peckinpah. My Best Fiend (Mein liebster Feind – Klaus Kinski, Inglaterra/Alemanha/Finlândia/EUA, 1999), de Werner Herzog. Monster (EUA/Alemanha, 2003), de Patty Jenkins.

271 Variety Lights (Luci del varietà, Itália, 1950), de Federico Fellini e Alberto Lattuada. Mondo Cane (Itália, 1962), de Gualtiero Jacopetti, Franco Prosperi e Paolo Cavara. Nights of Cabiria (La notti di Cabiria, France/Italy, 1957), de Federico Fellini. 9 ½ Weeks (EUA, 1985), de Adrian Lyne. Ossessione (Itália, 1943), de Luchino Visconti. Inédito nos cinemas do Brasil; The Evil Eye a.k.a. The Girl Who Knew too Much (La ragazza che sapeva troppo, Itália, 1963), de Mario Bava. The French Connection (EUA, 1971), de William Friedkin. Orgullo (Espanha, 1955), de Manuel Mur Oti. Inédito no Brasil. Greed (EUA, 1923), de Erich von Stroheim. The Given Word (O Pagador de promessas, Brasil, 1962), de Anselmo Duarte.

272 The Bird with the Crystal Plumage (L’uccello dalle piume di cristallo, Itália/Alemanha, 1970), de Dario Argento. Night Patrol (EUA, 1984), de Jackie Kong. Dirty Harry (EUA, 1972), de Don Siegel. Piranha (EUA, 1978), de Joe Dante. Bullets Don't Argue (Le pistole non discutono, Itália/Espanha/Alemanha, 1964), de Mario Caiano (a.k.a. Mike Perkins). A Pistol for Ringo (Una pistola per Ringo, Itália/Espanha, 1965), de Duccio Tessari. The Godfather (EUA, 1972), de Francis Ford Coppola. The Godfather: Parte II (EUA, 1974), de Francis Ford Coppola. A Fistful of Dollars (Per un pugno di dollari, Itália/Espanha/Alemanha, 1964), de Sergio Leone (a.k.a. Bob Robertson). For a Few Dollars More (Per qualche dollaro in più, Itália/Espanha/Alemanha, 1965), de Sergio Leone. Jailhouse Rock (EUA, 1957), de Richard Thorpe.

273 Psycho (EUA, 1960), de Alfred Hitchcock. A Fistful of Dynamite a.k.a Duck You Sucker (Giù la testa, Itália, 1971), de Sergio Leone. Summertime (Inglaterra/EUA, 1955), de David Lean. Face to Face (Faccia a faccia, Itália/Espanha, 1967), de Sergio Sollima. The Fall of the Roman Empire (EUA, 1964), de Anthony Mann. ¡Que viva México! (México/EUA, 1931/1932), de Sergei Eisenstein. Quo vadis? (Quo vadis?, Itália, 1912), de Enrico Guazzoni. Quo vadis? (Quo vadis?, Itália, 1925), de Arturo Ambrosio. Quo vadis (EUA, 1951), de Mervyn LeRoy. The Searchers (EUA, 1956), de John Ford. The Magnificent Bandit (O’cangaceiro, Itália/Espanha, 1969), de Giovanni Fago. King of Kings (EUA, 1961), de Nicholas Ray. Kill and Pray (Requiescant, Itália/Alemanha, 1967), de Carlo Lizzani.

274 Pray to God and Dig Your Grave (Prega Dio... e scavati la fossa!, Itália, 1968), de Edoardo Mulargia (a.k.a. Edward G. Muller). The Return of Ringo (Il ritorno di Ringo, Itália/Espanha, 1965), de Duccio Tessari. Rio Lobo (EUA, 1970), de Howard Hawks. Open City (Roma città aperta, Itália, 1945), de Roberto Rossellini. The Great Train Robbery (EUA, 1903), de Edwin S. Porter. Savage Streets (EUA, 1984), de Danny Steinmann. Sabata (Ehi amico... c’è Sabata, hai chiuso!, Itália, 1969), de Gianfranco Parolini (a.k.a. Frank Kramer). The Return of Sabata (È tornato Sabata... hai chiuso un’altra volta, France/Italy/Alemanha, 1971), de Gianfranco Parolini (a.k.a. Frank Kramer). If You Meet Sartana...Pray for Your Death (... Se incontri Sartana prega por la tua morte, Itália/Alemanha, 1968), de Gianfranco Parolini (a.k.a. Frank Kramer).

275 Blood and Black Lace (Sei donne per l'assassino, France/Italy/Alemanha, 1964), de Mario Bava. The Magnificent Seven (EUA, 1960), de John Sturges. Sétimo sentido (Brasil, 1982). Novela de tevê (Globo). Blood Feund (Il sicario, Itália, 1961), de Damiano Damiani. All the Colors of the Dark a.k.a. They’re Coming to Get You (Tutti i colori del buio, Itália/Espanha, 1972), de Sergio Martino. Taste of Vengeance (I vigliacchi non pregano, Itália/Espanha, 1968), de Mario Siciliano (a.k.a. Marlon Sirko). Blood and Guns (Tepepa, Itália/Espanha, 1969), de Giulio Petroni. The Treasure of Sierra Madre (EUA, 1948), de John Huston. O tesouro de Zapata (Brasil, 1969), de Adolpho Chadler.

276 Treasure of Silver Lake (Der Schatz im Silbersee, Alemanha/Iugoslávia/França, 1962), de Harald Reinl. The Good, the Bad and the Ugly (Il buono, il brutto, il cattivo, Itália/Spain/West Germany, 1966), de Sergio Leone. Black Sabbath (I tre volti della paura, France/Italy, 1963), de Mario Bava. Trinity Is STILL My Name! (...Continuavano a chiamarlo Trinità, Itália, 1971), de Enzo Barboni (a.k.a. E.B. Clucher). Jaws (EUA, 1975), de Steven Spielberg. Terror in the Crypt (La cripta e l’incubo, Itália/Espanha, 1964), de Camillo Mastrocinque (a.k.a. Thomas Miller). The Last Days of Pompeii (Gli ultimi giorni di Pompei, Itália, 1908), de Arturo Ambrosio e Luigi Maggi. The Last Days of Pompeii (Gli ultimi giorni di Pompei, Itália/Espanha/Alemanha, 1959), de Mario Bonnard e Sergio Leone (diretor não-creditado).

277 The Devil's Commandment (I vampiri, Itália, 1957), de Riccardo Freda. The Vampire and the Ballerina (L’amante del vampiro, Itália, 1960), de Renato Polselli. Vera Cruz (EUA, 1954), de Robert Aldrich. Street Law (Il citadino si ribella, Itália, 1974), de Enzo Girolami (a.k.a. Enzo G. Castellari). $20,000 on No. 7 (20.000 dollari sul 7, Itália, 1967), de Alberto Cardone (a.k.a. Albert Cardiff). A Professional Gun a.k.a. The Mercenary (Il mercenario, Itália/Espanha, 1968), de Sergio Corbucci. Shoe-Shine (Sciuscià, Itália, 1946), de Vittorio De Sica. Last of the Mohicans (¡Uncas! El fin de una raza, Itália/Espanha, 1965), de Mateo Diaz Caño (a.k.a. Mathew Kane). Zorro the Invincible (El Zorro de Monterrey, Espanha, 1971), de José Luis Merino.

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