O Campo E a Cidade Na Literatura Brasileira
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O CAMPO E A CIDADE NA LITERATURA BRASILEIRA Luiz Ricardo Leitão O CAMPO E A CIDADE NA LITERATURA BRASILEIRA 1ª edição ITERRA Veranópolis, 2007 Copyright © Instituto Técnico de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária – Iterra Revisão de português: Miguel Cavalcanti Yoshida Projeto gráfico, capa e diagramação:ZAP Design Impressão e acabamento: Capa: Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser utilizada ou reproduzida sem a autorização. 1a edição: junho de 2007 DistribuiÇÃO Gratuita ITERRA Rua Rua Princesa Isabel, 373 Cx. Postal 134 CEP 95330-000 – Veranópolis-RS Fone/Fax: (54) 3441-1755 Endereço eletrônico: [email protected] Sumário APRESENTAÇÃO Aos educandos e educadores do movimento social .................................................7 PaRTE 1 - O CONCEITO DE LITARATURA E SUAS PARTICULARIDADES CaPÍTULO 1 - O QUE É LITERATURA? Funções básicas da criação estética. Linguagem literária e linguagem não-literária. ............................................................................................17 CaPÍTULO 2 - NOÇÕES DE VARIABILIDADE LINGÜÍSTICA Língua escrita e língua falada. Cultura letrada e cultura popular. Gírias, jargões e falares regionais na literatura. .........................................................27 CaPÍTULO 3 - NOÇÕES DE SEMÂNTICA E ESTILÍSTICA Denotação, conotação e polissemia. Tropos e figuras de linguagem. .......................33 CaPÍTULO 4 - FORMAS DE COMPOSIÇÃO VERBAL Linguagem em prosa e linguagem em verso. Descrição, narração e dissertação. .............................................................................41 CaPÍTULO 5 - OS GÊNEROS LITERÁRIOS A tríade clássica: o lírico, o épico e o dramático. Formas da era moderna: a crônica, o conto, a novela e o romance. .........................51 CaPÍTULO 6 - OS ESTILOS DE ÉPOCA As fontes seminais da literatura ocidental: Antigüidade Clássica greco-romana e Idade Média. .................................................67 PaRTE 2 - O CAMPO E A CIDADE NA LITERATURA BRASILEIRA CaPÍTULO 7 - A PRIMEIRA ONDA DE GLOBALIZAÇÃO SOBRE A PÁTRIA GRANDE A literatura da conquista, os “cronistas das Índias” e a obra dos jesuítas. Os filhos da terra: os textos de resistência dos povos pré-colombianos. ...................93 CaPÍTULO 8 - OS CAMINHOS E DESCAMINHOS DA ERA COLONIAL Origens da literatura nacional. A exuberância do Barroco na poesia e na oratória. ..................................................105 CaPÍTULO 9 - O SURGIMENTO DAS ELITES OLIGÁRQUICAS NO BRASIL COLONIZADO Os mitos bucólicos do Arcadismo de importação. O legado do Iluminismo europeu nas Minas Gerais. ...............................................121 CaPÍTULO 10 - A INDEPENDÊNCIA CONSENTIDA NO SÉCULO DA EXPANSÃO IMPERIALISTA O projeto de “documentação da nacionalidade”: o Indianismo na I geração romântica. Ecos da crise espiritual burguesa sobre a poesia periférica na II geração. A luta pelo abolicionismo na III geração. As ambigüidades do romance romântico. .................................................................131 CaPÍTULO 11 - DO IMPÉRIO À REPÚBLICA, DO REALISMO AO PRÉ-MODERNISMO Os impasses da ordem liberal-oligárquica na Belle Époque O triunfo da ficção e da autonomia estética no Realismo brasileiro O Naturalismo e a emersão do popular sob a ótica positivista. A letra a serviço dos excluídos: os escritores militantes do Pré-Modernismo. ..........153 CaPÍTULO 12 - UMA EXPERIÊNCIA PERIFÉRICA DE MODERNIDADE: DE JECA A MACUNAÍMA, O DILEMA DA IDENTIDADE NACIONAL Regionalismo e cosmopolitismo: a geração de 1922 e os dois pólos do Modernismo. A representação do campo no imaginário coletivo nacional: visões do Pós-Modernismo. .......................................................................................................179 CaPÍTULO 13 - DOS “ANOS DE CHUMBo” à erA NEOLIBERAL: OS DIVERSOS CAMINHOS DA ARTE Anos 60: entre as “reformas de base” e a eterna viagem à utopia. As trincheiras poéticas da MPB. A lírica do campo e da cidade e a afirmação da escrita feminina. A violência social no discurso ficcional: do caos urbano à literatura marginal. ....... O CAMPO E A CIDADE NA LITERATURAA resistênciaBRASILEIRA do sertanejo na literatura de cordel. ....................................................215 Apresentação Aos educandos e educadores do movimento social ENSINAR LITERATURA: POR QUE E PARA QUÊ? Toda literatura sempre faz parte do patrimônio cultural de um povo. Afinal de contas, nenhuma língua é propriedade privada desta ou daquela corporação. Ainda que os manuais de lingüística consignem o conceito do idioleto (a linguagem exclu- siva de um único indivíduo), não existe, na prática, nenhuma língua individual. A expressão verbal humana, bem o sabemos, é fruto da interação social. Ao contrário do que supõe o pensamento idealista, segundo o qual a categoria fundadora da história é a linguagem, esta constitui, em última instância, um produto do laborioso processo de construção da humanidade por meio do intercâmbio social, engendrado pela necessidade de produção da vida, conforme tão bem descreveram Friedrich Engels e Karl Marx em A ideologia alemã.1 Portanto, as línguas e as literaturas são um produto social, compartilhado por membros de uma comunidade que costuma servir-se de tal produção como se ela fosse a sua própria “carteira de identidade”. O lingüista britânico M. Halliday frisa que, mesmo que um indivíduo domine e empregue vários idiomas, a sua língua materna, com a qual satisfará todas as tarefas que exijam o uso de uma linguagem, só pode ser definida pelo grupo social que ele integra;2 ou, como diria o poeta, “minha pátria é minha língua”. Como a história do homo sapiens tem sido a história da luta de classes, nenhuma atividade humana pôde dissociar-se das mazelas advindas do caráter desigual e con- traditório de nossas sociedades. Dessa forma, por força das distorções empreendidas pela ideologia dominante, aquilo que costuma ser designado como uma literatura nacional termina por ser, quase sempre, apenas a produção literária reconhecida 1 Marx assinala: “Os homens têm história porque têm de produzir a sua vida, e para mais de determinado modo: isto é dado pela sua organização física, tal como o é a sua consciência”. Sobre a linguagem e a consciência, os dois autores escrevem: “A linguagem é tão velha como a consciência – a linguagem é a consciência real prática que existe também para outros homens e que, portanto, só assim existe também para mim, e a linguagem só nasce, como a consciência, da necessidade, da carência física de intercâmbio com outros homens”. ENGELS, Friedrich & MARX, Karl. A ideologia alemã. In: Obras escolhidas, t. I. EdiçõesAvante!/Edições Progresso, Lisboa/Moscou, O CAMPO E A CIDADE NA LITERATURA BRASILEIRA 1982, pp. 21-22. 2 HALLIDAY, M. K.; MCINTOSH, Angus & STREVENS, Peter. As ciências lingüísticas e o ensino de línguas. Editora Vozes, Petrópolis, 1974, pp. 257-258. pelas elites de uma nação ou etnia. Conforme já denunciaram inúmeros histo- riadores, a memória oficial de uma sociedade registra tão-somente os relatos dos vencedores. Por isso, quando algumas das mais pródigas e férteis criações do nosso povo são agrupadas sob o pomposo título de Literatura Brasileira, convém examinar com rigor a amplitude e abrangência desse conceito. Se o aparelho estatal de um Estado capitalista periférico como o nosso o converte em uma disciplina “escolar”, por exemplo, a cautela deverá ser redobrada. Nunca é demais relembrar que a criação do MEC, nos anos 30, por iniciativa do Governo Getúlio Vargas, procurou uniformizar os currículos para a formação da mão-de-obra imprescindível à nova etapa – corporativo-monopolista – da evolução capitalista brasileira e, de quebra, empenhou-se em aniquilar toda e qualquer influência de anarquistas e comunistas sobre o processo de educação popular (a alfabetização dos filhos dos operários com cartilhas e panfletos sindicais era algo inadmissível para as elites tupiniquins). Assim, a construção do conceito de nação na era Vargas, com a efetiva partici- pação de renomados artistas e intelectuais (o poeta Carlos Drummond de Andrade era chefe de gabinete do Ministro Gustavo Capanema e o genial compositor Heitor Villa-Lobos contou com valioso apoio do Ministério para realizar sua vasta pesquisa folclórico-musical), influenciou diretamente a pauta pedagógica do Estado Novo. No âmbito do chamado currículo mínimo do incipiente sistema formal de ensino do país, “disciplinas” como História do Brasil ou Língua Portuguesa raramente concederam espaço aos relatos dos vencidos ou às formas lingüísticas e artísticas de menor prestígio dentro da hierarquia social vigente. OS ABISMOS ILETRADOS DE NOssa PÁTRIA Em 1960, 40% dos brasileiros eram completamente analfabetos. Se acrescentás- semos a esse percentual os semi-ágrafos e os analfabetos funcionais, ou seja, aqueles que não conseguem redigir um único parágrafo articulado ou mal sabem assinar o próprio nome, esse percentual certamente ultrapassaria mais de metade da população do maior país da América Latina. Em 1990, segundo dados do IBGE, apesar de uma queda sensível nos números, a taxa de analfabetismo ainda atingia a inquietante cifra de 17% dos homens e mulheres desta nação que, em compensação, abriga uma arraigada e multifacetada cultura oral e, ao mesmo tempo, possui uma música popular que se tornou um cartão de visitas do Brasil nos quatro cantos do planeta. Excluído pelas elites do imprescindível direito social ao letramento, o povo brasileiro soube compensar a sua privação por meio de uma cultura oral repleta de criativas formas artísticas,