Redalyc.Ozires Silva. Engenharia, Indústria Aeronáutica E Pioneirismo
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Exacta ISSN: 1678-5428 [email protected] Universidade Nove de Julho Brasil Henriques Librantz, André Felipe; Roos, Darius; Correia, Expedito; Dutra, Júlio César Ozires Silva. Engenharia, indústria aeronáutica e pioneirismo no centenário da aviação Exacta, vol. 4, núm. 1, janeiro-junho, 2006, pp. 15-32 Universidade Nove de Julho São Paulo, Brasil Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=81040102 Como citar este artigo Número completo Sistema de Informação Científica Mais artigos Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal Home da revista no Redalyc Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto Entrevista Ozires Silva Engenharia, indústria aeronáutica e pioneirismo no centenário da aviação Nascido em Bauru (SP), em 1930, Ozires Silva formou-se oficial aviador e piloto militar pela Escola de Aeronáutica do Campo dos Afonsos, no Rio de Janeiro (RJ), em 1951; graduou-se em Engenharia Aeronáutica pelo Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), em 1962, e concluiu o mestrado em Ciências Aeronáuticas no Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech), nos Estados Unidos, em 1966. Doutor honoris causa pela Queen’s University, da Irlanda, foi professor do ITA, na cadeira de Ensaios em Vôo, e liderou o grupo que criou a Empresa Brasileira de Aeronáutica S. A. (Embraer), em 1970. Dirigiu a empresa desde sua fundação até 1986 e, posteriormente, de 1991 a 1995, quando conduziu o processo de privatização. Entre 1986 e 1988, foi presidente da Petróleo Brasileiro S. A. (Petrobras), ministro da Infra- Estrutura, em 1990 e 1991, e presidente da Viação Aérea Rio-Grandense S. A. (Varig), de 2001 a 2003. Detentor de várias condecorações no Brasil e no exterior, ocupa cargos em conselhos de administração de diversas empresas e associações e é presidente da Pele Nova Biotecnologia S. A. Seus livros publicados são A decolagem de um sonho (Lemos, 2002) e Cartas a um jovem empreendedor (Alegro, 2005). Exacta: O senhor se formou numa época em que tanto o ensino quanto a pesquisa de ponta no país, não ape- nas no setor aeroespacial, concentravam esforços e recursos governamentais, sempre com a ativa parti- cipação dos militares. Assim, foram criados institutos e centros tecnológicos de excelência, tais como o ITA, o Centro Técnico Aeroespacial (CTA), a Petrobras Química S. A. (Petroquisa) e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Naquele momen- to político, as conquistas tecnológicas eram, em tese, Exacta, São Paulo, v. 4, n. 1, p. 15-32, jan./jun. 2006 1 patrimônio da nação e respondiam a de- mente interessante: o financiamento de pesquisa mandas de Estado, a conceitos de “sobe- e o desenvolvimento de produtos, por meio de rania”. Hoje, a pesquisa de ponta é cada contratos governamentais; e foi a partir daí que a vez mais financiada pelo setor privado, e pesquisa ganhou enorme impulso, tanto que, para seu resultado, obviamente, é por ele co- este ano, o orçamento dos Estados Unidos prevê lhido. O Estado vem-se demitindo dessa que 80 bilhões de dólares sejam direcionados à tarefa. No caso da pesquisa aeronáutica, inovação na indústria – temos aí, portanto, o Es- atualmente, a Embraer privatizada desen- tado, efetivamente, alocando recursos em proces- volve seus próprios setores de pesquisa. sos inovadores. E as idéias básicas que orientam Como o senhor vê esses novos tempos, em as pesquisas, as inovações, a busca de respostas que o ensino superior público e a pesquisa às perguntas técnicas, tecnológicas ou científicas nos institutos de excelência vivem um pe- vêm das empresas e dos organismos de produção. ríodo de “vacas magras”, com orçamen- Uma estatística apresentada recentemente sobre tos cada vez mais reduzidos? Que efeitos o Instituto de Tecnologia de Massachussets (em tem esse direcionamento da pesquisa e inglês, Massachusetts Institute of Technology da busca da excelência para o mercado? [MIT]) – a instituição de ensino e pesquisa dos Qual o papel do Estado hoje? Estados Unidos que mais produz inovação para o campo produtivo – mostra uma participação de Ozires Silva: A pesquisa, em geral, nasce da 15% do esforço de pesquisas e desenvolvimento cabeça do indivíduo. Se olharmos cem anos para no total da participação daquele país. Essa é uma trás, poderemos verificar que a pesquisa era orien- demonstração muito clara de que o trabalho de tada mais pelas pessoas do que, efetivamente, por pesquisa e desenvolvimento tem origem prática e qualquer coletividade. De um ponto de vista ma- está destinado ao organismo produtivo. Embora croscópico, pode-se afirmar que essa apreciação existam esforços isolados, ainda não se consoli- não variou muito ao longo do século XX; o mes- dou no Brasil uma cultura semelhante, apesar de, mo não pode ser dito em relação ao processo de do ponto de vista burocrático, constar que o país financiamento da pesquisa, que mudou muito no gasta muito com pesquisa. Há o Ministério de mesmo período. Sabemos, por exemplo, que Tho- mas Edison inventou a lâmpada elétrica, mas não Ciência e Tecnologia, as Secretarias Estaduais e quem inventou o computador, a internet etc. Não vários órgãos estatais ligados à área. Porém, são existe mais aquele esforço romântico, individual, reduzidas as possibilidades de financiar o setor que trabalhava com os capitais possíveis, às vezes privado, no qual, pode-se dizer, talvez não ocorra somente com o dinheiro da família para atingir plenamente o processo científico, mas, certamente, objetivos de realização pessoal. Alberto Santos- nele se efetivará a aplicação tecnológica decorren- Dumont e suas conquistas são exemplos categó- te do avanço da ciência; afinal, é por meio das em- ricos desse tipo de financiamento. Nos Estados presas que um produto chega ao mercado. Desde Unidos, a partir das décadas de 1930 e 1940, so- 2005, com a regulamentação da Lei de Inovação, bretudo no período adjacente à Segunda Guerra é possível que contratos de pesquisas com o setor Mundial, houve uma gigantesca reciclagem da privado sejam instituídos por órgãos públicos. De indústria estadunidense para produzir material minha experiência pessoal, posso citar o exemplo bélico. Criou-se uma cultura nesse país, extrema- da Embraer, que no seu início esteve muito ligada 16 Exacta, São Paulo, v. 4, n. 1, p. 15-32, jan./jun. 2006 Entrevista ao Estado brasileiro e hoje desenvolve, interna- resposta para isso é um pouco mais intrincada. mente, boa parte da pesquisa de que precisa. Como disse anteriormente, a inovação surge de uma necessidade, de um requisito qualquer; é uma E.: O binômio que deu origem à Embraer – um idéia que o indivíduo, profissional ou não, traduz instituto de ensino de excelência e um em procedimentos e determina o que deve ser fei- centro tecnológico que, trabalhando em to. Nos dias correntes, vemos, diante de nós, uma conjunto, lançaram as bases do que viria variedade de itens tecnológicos – a filmadora, a a ser uma indústria aeronáutica de suces- lâmpada que nos ilumina, o monitor de TV que so – poderia ser um modelo viável hoje em acompanha a entrevista; enfim, uma grande quan- dia? Seria aplicável tidade e variedade de pro- em instituições priva- “[...] o trabalho dutos que foram fabricados das de ensino, como por empresas. Os conceitos o Centro Universitário de pesquisa usados por essas empresas, Nove de Julho (Uni- e desenvolvimento porém, podem não ter sido nove), que desejas- desenvolvidos por elas mes- sem atingir um nível tem origem prática mas. No centro tecnológico, de excelência, por e está destinado se tivermos a visão pragmá- exemplo, em diferen- tica de planejar a distância, tes especialidades ao organismo de avaliar os eventos que das engenharias? produtivo.” poderão acontecer e qual o O senhor considera caminho a seguir, uma vez investimento em um centro tecnológico que se está entre a pesquisa científica e o desen- e no ensino de excelência fundamental volvimento tecnológico, certamente o modelo vai para gerar uma “massa crítica” e atingir se impor; agora, se me perguntasse, por exemplo, um nível de excelência, ou essa foi uma se a Embraer, hoje, depende do CTA, eu diria que experiência isolada que deu certo? não; mas depende do ITA, tanto que a maioria dos convênios da Embraer firmados com o instituto O.S.: Ao contrário da cultura brasileira, eu visa, na questão de formação, a priorizar aquilo diria que a “massa crítica” é gerada dos recursos que, justamente, pode ser considerado fundamen- humanos. No Brasil, há uma tendência de pensar tal para gerar a real “massa crítica”: os recursos que tudo vem do dinheiro; não é assim, como se humanos. O próprio CTA vem buscando uma pode apreender da experiência dos países de su- vocação nova, daí seu interesse na indústria aero- cesso. Na realidade, a Embraer nasceu do ITA espacial; enveredou por essa área, porque a aero- – uma escola que, efetivamente deu o necessário náutica já está coberta quase integralmente pela embasamento à futura empresa. Sem esse impul- Embraer, à exceção daqueles conhecimentos ou so inicial, arrisco-me a dizer, a Embraer não teria serviços de longo prazo, como homologação de ae- existido; afinal, a educação está na base de tudo. ronaves, pesquisa e desenvolvimento de materiais Mas a pergunta é mais abrangente, trata da im- compostos. Exemplos de novas tecnologias, como portância de existir também um centro de desen- matérias-primas essenciais, muito provavelmente volvimento de tecnologia, no caso o CTA. Se o não poderiam ser desenvolvidos numa empresa, CTA não existisse, poderia existir a Embraer? A mas, sem dúvida, sua aplicabilidade e sua trans- Exacta, São Paulo, v. 4, n. 1, p. 15-32, jan./jun. 2006 17 formação em produto caberiam, efetivamente, ao precisa ser satisfeito; se, de alguma maneira, isso processo produtivo. Hoje, está emergindo no mun- puder ser levado aos estudantes em geral, estou do o conceito de parque tecnológico, não com o certo de que será vantajoso.