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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ESTUDOS EM SAÚDE COLETIVA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA MESTRADO EM SAÚDE COLETIVA

LUIZA LENA BASTOS

O CONSÓRCIO INTERNACIONAL SOBRE CONTRACEPÇÃO DE EMERGÊNCIA: UM ESTUDO DOS ARGUMENTOS PARA DIFUSÃO DOS CONTRACEPTIVOS DE EMERGÊNCIA EM PAÍSES EM DESENVOLVIMENTO

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

RIO DE JANEIRO | JANEIRO 2015

LUIZA LENA BASTOS

O CONSÓRCIO INTERNACIONAL SOBRE CONTRACEPÇÃO DE EMERGÊNCIA: UM ESTUDO DOS ARGUMENTOS PARA DIFUSÃO DOS CONTRACEPTIVOS DE EMERGÊNCIA EM PAÍSES EM DESENVOLVIMENTO

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito para a obtenção do título de Mestre em Saúde Coletiva.

ORIENTADORAS: PROFA. DRA. MIRIAM VENTURA DA SILVA PROFA. DRA. ELAINE REIS BRANDÃO

RIO DE JANEIRO 2015

B334 Bastos, Luíza Lena. O Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência: um estudo dos argumentos para difusão dos contraceptivos de emergência em países em desenvolvimento / Luíza Lena Bastos. – Rio de Janeiro: UFRJ / Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, 2015. 179 f.; 30 cm.

Orientadora: Miriam Ventura da Silva. Co-orientadora: Elaine Reis Brandão.

Dissertação (Mestrado) - UFRJ / Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, 2015.

Referências: f. 122-129.

1. Anticoncepção pós-coito. 2. Sexualidade. 3. Gênero. 4. Direitos reprodutivos. 5. Saúde reprodutiva. I. Silva, Miriam Ventura da. II. Brandão, Elaine Reis. III. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Estudos em Saúde Coletiva. IV. Título.

CDD 363.96

AGRADECIMENTOS

Este trabalho de dissertação de mestrado é resultado de muitos esforços tanto individuais como coletivos. Não poderia ter sido realizado sem o apoio de muitos e muitas que cruzaram meu caminho. Meus profundos agradecimentos às minhas orientadoras: Miriam Ventura e Elaine Reis Brandão, pela imensa generosidade, amizade, compreensão e brilhantes contribuições teóricas e metodológicas. Sem o trabalho incessante das orientadoras, de correções e avaliação crítica, questionando-me e fazendo-me refletir sobre meus próprios pressupostos, este trabalho não teria sido possível. A vocês, a minha eterna admiração. Agradeço aos órgãos de fomento à pesquisa que deram suporte material, bolsas de estudo, para realização do trabalho: à Coordenação de Aperfeiçoamente de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) e ao Insituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IESC/UFRJ) pelo acolhimento institucional. Agradeço às professoras que fizeram parte de minha banca de defesa, as quais acompanham o trabalho desde a qualificação do projeto de mestrado: Cristiane Cabral, Daniela Manica, Jaqueline Ferreira e Neide Emy Kurokawa. As contribuições e o diálogo dentro e fora do IESC foram fundamentais para a realização deste trabalho. Agradeço também aos professores da área de Ciências Sociais e Humanas do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, com os quais estabeleci maior diálogo durante o curso de mestrado: Rachel Aisengart Menezes, Mauro Brigeiro, Veriano Terto e Fernanda Alzuguir. Agradeço às amigas e colegas do grupo de pesquisa que integrei no Instituto de Estudos em Saúde Coletiva: Sabrina Pereira Paiva, Iolanda Szabo e Naira Vidal de Oliveira pelo carinho, amizade e aprendizado. Agradeço as/aos amigas/amigos do mestrado e doutorado do IESC/UFRJ: Alan Camargo, Angela Speroni, Priscila Castro, Fernanda Monteiro, Micheli Machado, Mariana Alves, Raquel Guimarães e Mária Pires. Agradeço aos funcionários do IESC/UFRJ, os quais foram solícitos quando precisei: Roberto Unger e Sheila Ferreira da biblioteca, Fátima Gonçalves e Nadja Oliveira da secretaria do Programa de Pós-Graduação do IESC/UFRJ. Agradeço também aos professores e coordenadores do curso de Especialização em Gênero e Sexualidade (EGeS) do Instituto de Medicina Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, o qual tive a oportunidade de participar durante a construção deste trabalho.

Especialmente ao meu professor e orientador no curso, Lucas Tramontano pelas discussões sempre inteligentes, o carinho e a amizade. Agradeço também aos meus amigos e colegas do curso de Farmácia da Universidade Federal de Santa Maria, com os quais iniciei esta jornada até a Saúde Coletiva. Tenho certeza que sem o seu apoio e amizade nada seria possível: Lídia Einsfeld, Lívia Bueno, Marília Abreu, Diego Fontana de Andrade, Aline Schwertner Palma, Cláudia Romero, Izabelle Gindri, Fernanda Bacin, Vanessa Trindade Bortoluzzi, Robson Borba, Leila Somavilla e Cláudia Sala de Andrade. Agradeço às minhas queridas amigas Joyce das Flores e Marcela Alves de Abreu do IESC/UFRJ, com quem muito aprendi sobre saúde coletiva, amizade e solidariedade. Agradeço aos amigos do EGeS que contribuíram tanto para este trabalho, seja nas discussões durante o curso, seja nas mesas de bar: Carolina Maia, Vanini Lima, Lívia, Carolyna Barroca, Jaqueline Sant’ana e Vanessa. Obrigada amigos e amigas pelo “fé no café and keep going”, pelas discussões acaloradas, pelas “conversas jogadas fora” ou pelos ombros amigos. Por último, mas não menos importante, agradeço à minha família, minha mãe Cleonice, meu pai Luiz e minha irmã Laura pelo amor incondicional em todos os momentos de minha vida. Agradeço a toda minha família, tios, primos e avós tão importantes nessa jornada. Agradeço também à família do Vinícius pelo amor e carinho, por ser uma família que também posso chamar de minha. Aos meus familiares e amigos o meu muito obrigada por entenderem as ausências, pela força em momentos difíceis. Finalmente agradeço ao Vinícius, meu companheiro, amigo, amor e porto seguro. Definitivamente, ao Vinícius todo meu amor e admiração: obrigada por tudo!

“E lá, onde hoje vemos a história de uma censura dificilmente suprimida, reconhecer-se-á, ao contrário, a lenta ascensão, através dos séculos, de um dispositivo complexo para nos fazer falar do sexo, para lhe dedicarmos nossa atenção e preocupação, para nos fazer acreditar na soberania de sua lei, quando, de fato, somos atingidos pelos mecanismos de poder da sexualidade” (Michel Foucault, 1977, p.148).

RESUMO

BASTOS, Luiza Lena. O Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência: um estudo dos argumentos para difusão dos contraceptivos de emergência em países em desenvolvimento. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) – Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2015.

O Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência (ICEC) é uma organização não governamental formada em 1996, por um conjunto de organizações, cuja formação foi uma iniciativa da Fundação Rockefeller. O ICEC tem sido o principal interlocutor no cenário mundial na defesa do acesso aos contraceptivos de emergência (CE) e na difusão deste medicamento nos países em desenvolvimento. Seu website é uma importante fonte de informação e veículo para advogar em prol dos CE. Para compreender os argumentos deste consórcio para expansão do uso dos CE foi realizado um estudo socioantropológico, de natureza documental, no website do ICEC, no período de 2013 e 2014. O estudo se justificativa diante da necessidade de compreendermos os sentidos da difusão dos CE, e ampliarmos no Brasil a discussão sobre o uso dos medicamentos de contracepção de emergência como mais uma tecnologia, que possa vir a possibilitar uma melhor vivência da reprodução e sexualidade para mulheres e homens. O resultado da pesquisa revelou três linhas argumentativas preponderantes para expansão do uso dos CE nesses países. A sanitária que enfatiza “problemas de saúde pública”, advogando-se em prol dos CE pela redução da mortalidade materna, das taxas de abortos e de uma “epidemia de gravidezes imprevistas”, com especial ênfase na gravidez na adolescência. A farmacêutica, que enfatiza a segurança, eficácia e o mecanismo de ação das pílulas, ressaltando os contraceptivos de emergência na forma farmacêutica de comprimido, e que podem ser utilizados livremente pelas mulheres para evitar as gravidezes imprevistas, destacando-se o fato de não ser abortiva. A dos direitos, em especial os direitos reprodutivos das mulheres e adolescentes ao controle de sua fecundidade e o acesso aos contraceptivos e CE como meios para garantia desses direitos, enfatizando o direito à saúde, à autonomia sexual e reprodutiva, e ao planejamento familiar. Concluiu-se que os contraceptivos de emergência aparecem simbolizados pelo consórcio como medicamentos de “estilo de vida” os quais poderiam ampliar as oportunidades de melhoria das condições sociais para mulheres e adolescentes, e, consequentemente, o desenvolvimento humano e social dos países.

Palavras-chave: Contracepção de emergência, sexualidade, gênero, direitos sexuais e reprodutivos, saúde reprodutiva.

ABSTRACT

BASTOS, Luiza Lena.The International Consortium for Emergency Contraception: A study of the arguments for dissemination of emergency contraception in developing countries. Rio de Janeiro, 2014 Master thesis (Master in Public Health) – Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2015.

ICEC is a non governmental organization founded in 1996 by a group of a consortium organizatinos. The consortium formation was a Rockefeller Foundation initiative. Its website is an important source of information about EC, considering that ICEC has been the main interlocutor worldwide in defense the difusion of emergency contraceptives for developing countries. This master's thesis is a socioantropological study, with a documental nature, accomplished in the ICEC's website in the 2013 and 2014 period. The aim of the study was to understand the arguments of this consortium to expand de use of EC. The study is justified given the need to broaden the discussion in Brazil about the use of EC as another technology that may enable a better reproductive and sexual experience for women and men. The results revealed three predominant argumentative lines for expanding the use of the EC in these countries. The sanitarian that emphasizes "public health problems", advocating on behalf of the EC by reducing maternal mortality, the rate and an "epidemic of unplanned ," with special emphasis on teenage . The pharmaceutical, which emphasizes the existence of a hormonal pharmaceutical form of EC, the emergency contraceptive drug safe and effective, which can be freely used by women to prevent unplanned pregnancies; accordingly, the mechanism of action and the fact of not being abortive emerge as important discursive aspects. The "right argument" which is the of women and girls to control their fertility and access to contraceptives and EC as a means to guarantee these rights, recognized in the United Nations International Conferences, in particular, under the right to health, sexual and reproductive autonomy and . Emergency Contraceptives appear symbolized by the consortium as "lifestyle" drugs which could enhance opportunities for improvement of social conditions for women and adolescents, and consequently, the human and social development of countries.

Keywords: Emergency contraception; sexuality; gender; reproductive rights; .

LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Representação da pílula de emergência como back up control...... 34 Figura 2: Mapa do website do Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência ... 45 Figura 3: Registro de CE no mundo...... 57 Figura 4: Propaganda do Postpill ® na Etiópia ...... 79 Figura 5: Propaganda da empresa Pfizer sobre Viagra®...... 80 Figura 6: Sistema articulado entre saúde reprodutiva e resultados econômicos ...... 83 Figura 7: Cartaz de campanha pela venda OTC em farmácias...... 100 Figura 8: Página Inicial do website do ICEC...... 181

LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Número de documentos selecionados ...... 47 Quadro 2: Tipos de documentos e datas de publicações ...... 48 Quadro 3: Principais argumentos para difusão dos CE ...... 50 Quadro 4: Parceiros do ICEC - ano de fundação, país de origem e sede da organização ...... 52 Quadro5: Financiadores/Parceiros do Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência...... 130 Quadro 6: Documentos do ICEC - seção " What is EC? " ...... 150 Quadro 7: Documentos do ICEC - Seção " Country-by-Country Information " ...... 151 Quadro 8: Documentos do ICEC - Seção " EC Issues " ...... 156 Quadro 9: Documentos do ICEC - Seção " Publications and Resources "...... 158

LISTA DE ABREVIATURAS

AIM - Ativistas pela Informação Médica ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária ARABWORLD - Arab World Regional EC Network ASEC - American Society of Emergency Contraception BEMFAM - Sociedade Civil de Bem-Estar Familiar no Brasil BMGF - Bill and Melinda Gates Foundation BPAS – British Pregnancy Advisory Service CDH/ONU - Conselho de Direitos Humanos/ Organização das Nações Unidas CE - Contracepção de Emergência CIADH - Comissão Interamericana de Direitos Humanos CIPD - Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento CLADEM - Comité de América Latina y el Caribe para la Defensa de los Derechos de la Mujer CLAE - Consorcio Latino Americano de Anticoncepción de Emergencia CMCE - Consórcio Mexicano de Contracepção de Emergência CMM - IV Conferência Mundial sobre a Mulher DES - Dietilbestrol DIU - Dispositivo Intra-Uterino ECEC – European Consortium for Emergency Contraception FDA - Food and Drug Administration FHI - Family Health International FIGO - International Federation of Gynecology and FLASOG - Federación Latinoamericana de Sociedades de Obstetricia y Ginecología GA - Gravidez na Adolescência GIRE - Grupo de Información em Reproducción Elegida GRAVAD - Gravidez na adolescência: Estudo Multicêntrico sobre Jovens, Sexualidade e Reprodução no Brasil ICEC - The International Consortium for Emergency Contraception IFPMA - Federação Internacional de Produtores e Associações Farmacêuticas IMAP - International Medical Advisory Panel IMC – Índice de Massa Corporal IMIFAP - Instituto Mexicano de Investigación em Familia y Poblácion

IPPF - International Federation LGBTTQI - Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros, Transexuais, Queer e Pessoas LME - Lista de Medicamentos Essenciais MOA – Mechanism of Action NAFTA - North American Free Trade Agreement NEPAIDS - Núcleo de Estudos para a Prevenção de Aids da Universidade de São Paulo NICHHD - Center for Population Reasearch at the National Institute of Child Health and Human Development OMS - Organização Mundial da Saúde ONG - Organização não Governamental ONU - Organização das Nações Unidas OPAS - Organização Pan-Americana de Saúde OTC - Over the Counter PAISM – Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher PATH - Program for Appropriate Technology in Health PCO - Pílulas Contraceptivas Orais PIWH - Pacific Institute for Women’s Health PNDS - Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher PP-WP - Planned Parenthood – World Population REDE CE - Rede Brasileira de Promoção de Informações e Disponibilização da Contracepção de Emergência RHTP - Reproductive Health Technologies Project RRC - Rock Reproductive Clinic UNFPA - United Nations Population Fund UPA - Acetato de Ulipristal USAID - United States Agency for International Development WCC - Women’s Capital Coorporation WFEB - Worcester Foundation for Experimental Biology WHO/HRP - World Health Organization Special Programme of Research, Development, and Research Training in Human Reproduction

SUMÁRIO

Entre a Farmácia e as Ciências Sociais em Saúde...... 16

INTRODUÇÃO ...... 21

CAPÍTULO 1: Uma segunda alternativa para conter a “explosão demográfica” ...... 23

1.1. Contracepção de Emergência: contraceptivos de reforço ...... 23

1.2. A construção de um consenso para a difusão dos contraceptivos de emergência ...... 29

CAPÍTULO 2: Abordagens Teóricas ...... 35

2.1. Sexualidade e reprodução em cena: a vontade de saber ...... 35

2.2. Biopolítica e Biopoder: antigos e novos campos e modos de atuação. Saúde Pública, Direitos Reprodutivos e Farmacologização...... 38

CAPÍTULO 3: Percurso metodológico ...... 42

3.1. A pesquisa documental como estratégia metodológica ...... 42

3.2. A fonte dos dados: o website do ICEC ...... 44

3.3. Seleção de documentos e principais resultados ...... 46

3.4. Análise dos documentos ...... 49

CAPÍTULO 4: O ICEC e a missão de expandir o acesso aos Contraceptivos de Emergência para os países em desenvolvimento ...... 53

4.1. O Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência ...... 53

4.2. “Nossa missão permanece crucial: expandir o acesso aos CE no mundo, com foco nos países em desenvolvimento” ...... 57

4.3. A expansão dos contraceptivos de emergência no cenário brasileiro ...... 69

CAPÍTULO 5: Os argumentos do Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência: uma articulação de diferentes discursos ...... 75

5.1. O argumento sanitário: a gravidez imprevista como um problema de saúde pública ...... 76

5.1.1. A redução das taxas de gravidezes imprevistas como indicador da melhoria da saúde pública ...... 76

5.1.2. A preocupação com a gravidez na adolescência e a “epidemia de gravidezes não intencionais e de abortos inseguros” ...... 85

5.2. O argumento farmacêutico: entre a autonomia reprodutiva e a farmacologização do corpo feminino...... 93

5.2.1. Segurança e eficácia dos contraceptivos de emergência como questões centrais...... 94

5.2.2. Contracepção de emergência – entre a ciência e a política: “Para algumas pessoas o mundo ainda é plano e Galileo Galilei ainda um herege” ...... 104

5.3. O argumento do direito: o direito ao acesso aos contraceptivos de emergência ...... 109

5.3.1. O direito ao acesso aos contraceptivos de emergência e à saúde reprodutiva ...... 111

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ...... 119

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...... 122

8. APÊNDICES ...... 130

ANEXO – PÁGINA INICIAL DO WEBSITE ...... 181

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Entre a Farmácia e as Ciências Sociais em Saúde

No ano de 2006 entrei para a Faculdade de Farmácia na Universidade Federal de Santa Maria no Rio Grande do Sul. Naquele mesmo ano, cheia de curiosidades pela experimentação e manipulação de substâncias químicas, ingressei em um dos laboratórios de pesquisa em Bioquímica Toxicológica no Departamento de Ciências Naturais e Exatas da UFSM (CCNE/UFSM), onde fiz iniciação científica até o ano de 2010. Durante este período, para além de aprender muito sobre diversas vias metabólicas e compostos químicos, observava como se dava o cenário da ciência biomédica brasileira. O contato com a “ hard science” e a leitura de obras críticas ao modelo biomédico atual acabaram gerando conflitos entre mim e a profissão que havia escolhido. Quanto mais eu lia e debatia com colegas sobre aqueles textos que clamavam por uma saúde democrática, holística e participativa, mais eu me distanciava dos laboratórios. Certa vez Monteiro Lobato escreveu que “o Farmacêutico sorri filosoficamente dentro do seu laboratório”, pois bem, decidi que precisava sorrir filosoficamente para além daquelas quatro paredes. Fui então à busca de novos caminhos que pudessem me colocar mais em contato, no âmbito profissional, com meus anseios. Em 2010 saí do laboratório de Bioquímica e conheci a Unidade Dispensadora de Medicamentos Antirretrovirais do Hospital Universitário de Santa Maria (UDM/HUSM), ingressei em um estágio durante todo o ano de 2010 junto à equipe de farmacêuticos coordenada pela Farmacêutica Cláudia Sala para a dispensação desses medicamentos e realização de Atenção Farmacêutica para as pessoas vivendo com HIV/Aids. Ali pude observar diversos casos e histórias de vida e, apesar de uma parca infraestrutura para o atendimento, em uma sala muito pequena, vivíamos diariamente absortos em diversas trocas e emoções, interagindo e sendo afetados por nossos usuários. Além disso, ingressei em um projeto de extensão, em uma escola de ensino fundamental da cidade, que visava à promoção de saúde para os alunos com uma equipe multiprofissional. Éramos estudantes de medicina, nutrição, farmácia e enfermagem e esse contato com outros colegas universitários, professores, alunos e funcionários da escola, todos os dias, acabou acirrando cada vez mais minha vontade de entender aquelas trajetórias e as relações que estabelecíamos. Assim, observando aquele espaço e dialogando com colegas acadêmicos e farmacêuticos, ingressei na disciplina de Saúde Coletiva, um curso oferecido pela Faculdade de Enfermagem da mesma instituição. Nesse momento, pude aprender um pouco sobre sociologia, políticas públicas de saúde e escrever um pequeno diário de campo sobre as visitas domiciliares que realizei com as colegas em uma comunidade de classe média baixa da

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cidade. Além disso, tive a oportunidade também de participar das aulas de Educação e Saúde do curso de Enfermagem, onde conheci as obras de Paulo Freire, sua visão relativizadora, sua metodologia dialógica e sua pedagogia da libertação. Essa descoberta teve muita influência sobre minha trajetória, pensar a metodologia de Freire no campo da saúde foi também um dos motivos que me levou a querer desvendar o universo da antropologia e sociologia. Entretanto, meu encontro com a saúde coletiva precisou esperar mais um pouco. No final de 2010 surgiu a oportunidade de estagiar em uma indústria farmacêutica de grande porte da região sul do país. Como eu precisava deste estágio para a finalização de meu curso de graduação em Farmácia, fui para a entrevista na empresa e comecei então a trabalhar no local. Por diversos motivos pessoais e éticos, decidi que não ficaria na empresa para além do período de estágio obrigatório. Logo após minha formatura, no dia 4 de setembro de 2011 embarquei em um vôo de Porto Alegre para o Rio de Janeiro sem ter muita certeza do que viria pela frente em minha vida profissional. Alguns meses antes eu havia pesquisado sobre alguns professores para realizar contato e conversar sobre a possibilidade de um mestrado em Saúde Coletiva. Qual foi minha surpresa quando a professora Elaine Brandão respondeu meu contato. Justamente a professora que estava pesquisando sobre farmacêuticos e contracepção de emergência. No começo, foi a ideia de problematizar minha própria profissão que me impulsionou a escrever para a professora, por um momento, ainda mergulhada no universo biomédico e tentando dele me despir, estranhei a pesquisa ser sobre contracepção de emergência - o que haveria de pesquisas na área de saúde coletiva sobre isso? O que a área de ciências sociais em saúde, mais especificamente a área de meu interesse, teria a questionar sobre temas que envolvessem esse contraceptivo? Dias se passaram até que finalmente fui ao encontro marcado com a professora e rapidamente comecei a integrar o grupo de pesquisa por ela coordenado no Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IESC/UFRJ). Ao longo do tempo fui percebendo o quanto eu não mais poderia separar aquilo que em minha formação sempre foi segregado: de um lado a ciência, a técnica e as moléculas, de outro o social e a política. Como a professora Daniela Manica bem recordou durante minha qualificação do projeto de dissertação: "A técnica também é política". E como Latour (2009) argumenta em “Jamais fomos modernos”: natureza e sociedade são ambas efeitos de redes heterogêneas. Apesar de Latour e Lévi-Strauss apresentarem algumas divergências teóricas, o próprio Lévi-Strauss (1985) já nos dizia em seu clássico “Antropologia Estrutural” que a técnica também preenche uma função sociológica.

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Em História da sexualidade, Foucault (1977) questiona se sua análise da sexualidade enquanto um dispositivo político implicaria na elisão do corpo, da anatomia, do funcional. Ao passo que ele mesmo responde que não. Muito longe de apagar o corpo, as tecnologias, o biológico ou de constituir o biológico e o histórico enquanto uma sequência como no evolucionismo de antigos sociólogos é importante ligar a complexidade crescente destes domínios. O projeto intitulado "Uma investigação socioantropológica no âmbito das farmácias/drogarias: posição de farmacêuticos e balconistas sobre a contracepção de emergência” 1 foi minha primeira experiência nos estudos sobre contracepção e também sobre ciências sociais e a motivação para este trabalho. Foi neste grupo que aprendi o quão pode ser instigante, por vezes contraditório, mas sempre complexo, estudar a luz das ciências sociais, temas relativos à reprodução humana e à contracepção. Minha participação no grupo permitiu que eu fosse construindo meu objeto de pesquisa. Tive a grande oportunidade de discutir com profissionais experientes no campo dos direitos sexuais e reprodutivos, como as professoras Cristiane Cabral, Elaine Brandão e Miriam Ventura, sobre a contracepção de emergência e também sobre a atuação e o papel dos farmacêuticos no Brasil. Logo que comecei a trabalhar na pesquisa atuei como assistente de pesquisa e uma de minhas tarefas era observar a lista de e-mails trocados por membros do Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência (ICEC), bem como seu website . Observava semanalmente suas discussões e de forma mensal fiz alguns relatórios que serviam de material para os pesquisadores pensarem o que estava sendo debatido no âmbito internacional sobre CE. Foi nesse momento que comecei a ter meu primeiro contato com o ICEC e seus atores institucionais. Meu interesse em estudar os documentos disponibilizados no website se deu porque percebi que esta era uma ferramenta importante para o consórcio difundir argumentos para difundir CE para países em desenvolvimento. Em paralelo, pude ir participando de aulas no IESC. Aprendi muito com professores como Mauro Brigeiro, Rachel Aisengart Menezes e Jaqueline Ferreira sobre o universo da antropologia e das ciências sociais. Foram estas aulas que me introduziram à Geertz,

1 Esta dissertação de mestrado foi concebida no âmbito da pesquisa “Uma investigação socioantropológica no âmbito das farmácias/drogarias: posição de farmacêuticos e balconistas sobre a contracepção de emergência” (2012-2014),coordenada pela Profa. Elaine Reis Brandão, no IESC-UFRJ. A equipe é composta por Profa. Miriam Ventura (IESC-UFRJ); Profa. Cristiane da Silva Cabral (FSP-USP); Naira Vidal de Oliveira (FF-UFRJ) e Iolanda Szabo (FF-UFRJ); Sabrina Pereira Paiva e Luiza Lena Bastos (IESC-UFRJ). O estudo conta com apoio FAPERJ e CNPq. Trata-se de desdobramento de projeto anterior, vinculado ao Programa JCNE-2008 (apoio FAPERJ).

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Foucault, Bourdieu, entre tantos outros autores que marcaram minha trajetória acadêmica de modo profundo, e com os quais aprendi a importância de desnaturalizar o objeto a ser observado. De vestir "lentes" para olhar o mundo. De que todo discurso traz consigo uma ordem e um poder que dele emanam. Foi em uma aula de discussões sobre "O poder simbólico" de Bourdieu que aprendi com a professora Elaine Brandão que a partir do momento em que vestimos nossas "lentes" começamos uma travessia que nos permite olhar diferente, de forma distanciada e analítica. A medida que o tempo foi passando, a professora Miriam Ventura costurou e cristalizou em minha trajetória dentro do Instituto a importância do rigor metodológico e da argumentação fina. Não me deixou esquecer nunca que os discursos são performáticos e poderosos. Também em 2013 ingressei no curso de Especialização em Gênero e Sexualidade do Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos e Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (EGeS/CLAM/IMS-UERJ). As discussões no EGeS foram fundamentais para complementar esta trajetória que se iniciou no IESC/UFRJ e ajudaram a refletir sobre meu objeto de estudo. Distanciar-me deste objeto foi, por muitos momentos, difícil. Enquanto mulher a minha relação é íntima com os contraceptivos e assim o tema perpassou meu corpo, questionou posicionamentos, desafiou – me. No contexto em que nasci e vivi, falar sobre os aspectos técnicos da contracepção sempre foi corriqueiro. Sendo este um “assunto de mulher”, ao longo da adolescência fui aprendendo a como “me cuidar” para não por a “perder” a juventude e uma carreira profissional que já estava sendo forjada para mim, independente do ofício que eu me direcionasse. Aqueles tantos questionamentos com os quais cheguei ao Rio deram lugar a muitos outros, mas com certeza hoje sei que muito temos a dizer e refletir sobre o tema da contracepção de emergência. Assim como diria Lévi-Strauss, este contraceptivo e o próprio consórcio são “bons para pensar” sobre como se encontram atualmente os discursos internacionais sobre sexualidade e reprodução. Estas mudanças de território e de perspectivas acadêmicas abriram mais um processo de ritualização em minha vida. Van Gennep (2011) consagrou bem as etapas desses rituais, inclusive os de "primeira vez". No meu caso, a primeira vez que me distanciei do local que considero meu lar. Concordo com Da Matta (2009, p.9) quando diz:

[...] O importante, o arriscado, o fatal, o que tem a ver com entrega e doação sempre implica uma primeira vez [...]. Toda primeira vez sinaliza um empacotamento de vida. Toda estreia assinala a possibilidade de (re)fazer uma história que, por ter

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início, meio e fim, como descobriu Van Gennep, aniquila um pouco a indiferença ao pipocar de vida e de paixão que eventualmente surge em seu seio (Da Matta, 2009, p.9).

Ao embarcar no campo da Saúde Coletiva, experimentei este (re)fazer de minha história, resignificando minha trajetória e encontrando um novo espaço para discutir questões que muito me interessam e me instigam. Foi neste começo que pude (re)encontrar as ciências humanas e delas me apropriar para olhar meu universo profissional, meu objeto de estudo e também a mim mesma.

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INTRODUÇÃO

O Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência (ICEC) se constitui como uma rede integrada por atores - principalmente organizações filantrópicas e organizações de planejamento familiar - que tem por objetivo expandir ao redor do mundo o uso de contraceptivos de emergência (CE), os quais podem ser utilizados pelas mulheres após as relações sexuais como um recurso importante para evitar a gravidez. O ICEC tem como parceiros as indústrias farmacêuticas e às chamadas organizações de planejamento familiar, e é o principal ator na discussão e difusão deste tipo de contraceptivo tendo seu foco direcionado para os “países em desenvolvimento”. A existência de um consórcio dedicado exclusivamente a advogar em prol de um tipo específico de contraceptivo materializa a tensão dialética permanente que transpassa a sexualidade, o corpo, o prazer e a reprodução; e nos remete para a discussão da biopolítica e do gerenciamento social e político dos corpos, especialmente do corpo feminino nos âmbitos da saúde pública, biomedicina e o direito. A pergunta norteadora desse estudo é se o ICEC, considerando sua posição estratégica de organização internacional privilegiada no diálago com as instâncias internacionais das Nações Unidas, Estados e suas agências regulatórias, organizações feministas e de saúde, e indústrias farmacêuticas, tem contribuído à ampliação da autonomia e autodeterminação reprodutiva ou fortalece dispositivos de poder em prol do gerenciamento do corpo feminino? Para observar esta problemática busquei analisar os documentos do website do ICEC e também diálogos entre seus membros na lista de e-mails do consórcio. Utilizei referenciais teóricos que discutem conceitos de medicalização, farmacologização e biopolítica. O objeto de estudo é o conjunto de argumentos do consórcio em prol da difusão dos CE para os países em desenvolvimento, e busca discutir como esses atores se mobilizam e discursam sobre a importância deste tipo de contraceptivo. Nesse sentido, o objetivo geral foi compreender a partir dos documentos disponibilizados no website do ICEC e na sua lista de e- mails os argumentos desta organização. O estudo se justificativa diante da necessidade de ampliarmos no Brasil a discussão sobre o uso dos medicamentos de contracepção de emergência como mais uma tecnologia que possa vir a possibilitar uma melhor vivência da reprodução e sexualidade para mulheres e homens.

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No capítulo 1 da dissertação apresento uma contextualização histórica sobre o desenvolvimento dos contraceptivos de emergência destacando a relação desta história com o ICEC mostrando algumas motivações que o fizeram surgir. Importante destacar que a história dos CE se confunde com a história do ICEC, que vai sendo formada a partir da construção de um consenso em torno destes contraceptivos. No capítulo 2, apresento abordagens teóricas e principais conceitos e constructos que utilizei como referencial para análise do material. Recorri, fundamentalmente, a autores que adotam a perspectiva analítica foucaultiana sobre sexualidade e reprodução como objetos do biopoder e da biopolítica, conjugada com a contextualização histórica sobre organizações internacionais de planejamento familiar. No capítulo 3, demonstro o percurso metodológico que utilizei para dar conta de meu objetivo de pesquisa. No capítulo 4, analiso os principais elementos constitutivos organizacional do ICEC, seus membros (atores), aspectos de sua fundação (processo de constituição) e as estratégias utilizadas para a expansão dos CE com “foco nos países em desenvolvimento”. No capítulo 5, analiso os argumentos utilizados pelo ICEC identificados nos documentos veiculados no seu website e na lista de e-mails do consórcio. Três enfoques são dados pelo consórcio para expandir os CE. O enfoque da saúde pública, considerando que o acesso ao contraceptivo é importante devido a riscos de uma “gravidez não planejada” ou “não desejada” para saúde das mulheres, especialmente as adolescentes, e as implicações relacionadas ao abortamento sobre a saúde das populações. O farmacêutico, que enfatiza a segurança, eficácia e o mecanismo de ação das pílulas, ressaltando a contracepção de emergência na forma farmacêutica de comprimido, muito mais que o DIU (dispositivo intra- uterino), e que pode ser utilizado livremente pelas mulheres para evitar as gravidezes imprevistas, destacando-se o fato de não ser abortiva . E o enfoque dos direitos, em especial os direitos reprodutivos das mulheres e adolescentes ao controle de sua fecundidade e o acesso aos contraceptivos e CE como meios para garantia desses direitos, enfatizando o direito à saúde, à autonomia sexual e reprodutiva, e ao planejamento familiar.

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CAPÍTULO 1: Uma segunda alternativa para conter a “explosão demográfica”

1.1. Contracepção de Emergência: contraceptivos de reforço

Neste capítulo busco contextualizar historicamente o surgimento dos contraceptivos pós-coitais e do Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência. Ao longo do capítulo é possível observarmos que a problemática entre o gerenciamento social e político do corpo feminino e o reconhecimento da ampla autonomia e liberdade individual da mulher no âmbito reprodutivo estiveram presentes em todos os momentos de sua formulação e discussão sobre sua difusão enquanto medicamento contraceptivo. Desde as primeiras gerações de contraceptivos de emergência, principalmente na ideia da criação de um novo método de reforço contraceptivo que pudesse vir a corrigir os “erros” de uso de contraceptivos regulares. Desde a década de 1920, com os estudos de A.S. Parkes e W. Bellerby que perceberam que a ingestão de altas doses de estradiol poderia interferir na gravidez de mamíferos, os contraceptivos de emergência têm se desenvolvido em meio a disputas morais, econômicas e políticas, existindo hoje quatro “gerações” de CE que assumem a forma farmacêutica de comprimido 2 e um deles que se apresenta na forma de um dispositivo intra- uterino (DIU) de cobre. O DIU de cobre é eficaz como CE se introduzido até cinco a sete dias depois da relação sexual (FOSTER e WYNN, 2012; PRESCOTT 2011; ELLERTSON 1996; HASPELS e ANDRIESSE, 1973; TRUSSELL, 2012). O Dietilbestrol (DES) é um estrogênio sintético que foi utilizado principalmente na década de 1950 como contraceptivo de emergência. Os contraceptivos de pílulas combinadas são as pílulas contraceptivas orais (PCO) que contêm estrogênio (etinil estradiol) e progestinas (levonorgestrel ou norgestrel), também conhecidos como método Yuzpe. Quando utilizadas como CE devem ser administradas em altas doses (dependendo da marca e quantidade de hormônios, deve-se administrar até 6 pílulas para obter o efeito de contracepção após o coito). A CE contendo apenas progestina (levonorgestrel) pode ser utilizada em duas doses de 0,75 mg após o coito e mais 0,75 mg 12 horas após a primeira dose dentro de 72 horas. Além disso, estudos recentes mostraram que levonorgestrel 1,5 mg

2 Formas Farmacêuticas são diferentes formas físicas que os medicamentos podem ser apresentados para possibilitar seu uso pelo(a) usuário(a). As diferentes formas farmacêuticas existem para facilitar a administração, garantir a precisão da dose, proteger a substancia ativa durante o percurso pelo organismo, garantir a presença do ativo no local de ação e facilitar a ingestão da substância ativa. As formas farmacêuticas são: comprimidos, cápsulas, pós, granulados, xaropes, soluções, supositórios, óvulos, cápsulas ginecológicas, aerossóis, pomadas e suspensões (ANVISA, 2010).

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também é eficaz se administrado em até 120 horas (DUNN e GILBERT, 2013; TRUSSELL, 2012; WEISBERG e FRASER, 2009). Além dessas formas de CE, mais recentemente tem sido estudada a mifepristona que é considerada uma antiprogestina, essa substância atua como um modelador do receptor de progesterona e já foi aprovada na China e Vietnã para o uso do aborto medicamentoso no primeiro trimestre de gravidez. Entretanto, quando utilizada em uma dose muito menor do que aquela usada para o aborto medicamentoso, a mifeprestona é extremamente eficaz como contraceptivo de emergência. Também o Acetato de Ulipristal (UPA), considerado segunda geração de antiprogestina, tem sido estudado e já é comercializado na Europa como ellaOne ® e nos EUA como ella ® (DUNN e GILBERT, 2013; TRUSSELL, 2012, P.20; WEISBERG e FRASER 2009). Estas gerações de CE começaram a tomar forma na década de 1930. De acordo com Prescott (2011), a repórter e ativista pró-aborto Lawrence Lader, em artigo publicado no jornal New York Times celebrava os achados revolucionários daqueles considerados os três “pais” da pílula contraceptiva hormonal: Dr. Gregory Pincus (pesquisador diretor da Worcester Foundation for Experimental Biology – WFEB); Min Chueh Chang (pesquisador sênior na WFEB) e John Rock (ginecologista e obstetra chefe da Rock Reproductive Clinic – RRC). Segundo o estudo referido, os achados poderiam se tornar “precursores de uma segunda revolução do controle de nascimentos”. Em 1930, Gregory Pincus e seu colaborador H.O. Burdick reproduziram os experimentos dos pesquisadores britânicos em coelhos e camundongos e perceberam que o estradiol não só poderia interromper uma gravidez, mas também prevenir se administrado em alguns dias após a copulação. Oito anos depois, Parkes. E. C. Dodds e R. L. Noble sintetizaram dois compostos: o Etinil Estradiol e o Dietilbestrol. Embora estes pesquisadores tenham observado estes efeitos contraceptivos das suas substâncias, eles estavam mais interessados em utilizar estes resultados para o tratamento de desordens reprodutivas em animais e humanos, para tratar da infertilidade (PRESCOTT, 2011, p.9). Ao mesmo tempo, médicos e cientistas estavam preocupados com o uso incorreto dos contraceptivos pelas mulheres e clamavam por novos métodos que pudessem dar conta desses erros e pudessem servir como um “ back up control ”, isto é, um reforço contraceptivo. Muitos também eram contra as práticas abortivas, alegando que elas seriam mais prejudiciais do que a ingestão de pílulas hormonais, argumento problematizado por segmentos feministas americanos no sentido de que a legalização do aborto em 1973 nos EUA havia dado uma

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opção mais segura para a prevenção de uma gravidez do que a “pílula do dia seguinte” poderia dar (PRESCOTT, 2011). Na década de 1960, após a aprovação da pílula contraceptiva hormonal, especialistas em população argumentavam que o DIU era o contraceptivo ideal para que se evitassem esses erros principalmente aqueles cometidos por mulheres de baixa renda, com baixa escolaridade, as quais eles consideravam que seriam mais propensas a esquecer da pílula de uso contínuo. Esse paternalismo que perpassava o desenvolvimento dos contraceptivos era posto em prática, de um lado, por profissionais que trabalhavam para melhorar o acesso das mulheres a serviços de contracepção e saúde, e por outro lado, por profissionais que acreditavam que a solução para a redução da pobreza era de ordem científica. Desta forma, um dos métodos desenvolvidos para lidar com tais erros foi a tão popularmente conhecida “pílula do dia seguinte” (PRESCOTT, 2011, p.8-9). Para Chang, estas novas descobertas contraceptivas teriam implicações para a chamada “explosão demográfica” e sugeriu que as “pílulas do dia seguinte”, “pílulas abortivas”, “pílulas da noite anterior” ou “pílulas de reconsideração” seriam desenvolvidas em um futuro próximo. Entretanto, os estudos de Pincus e Chang na WFEB, sobre os contraceptivos pós-coito, só se desenvolveram após o falecimento de Pincus, em 1967. Após a morte do colega, Chang voltou sua atenção para o estudo de métodos de fertilização in vitro. (PRESCOTT, 2011, p.19). Os primeiros pesquisadores a darem continuidade ao trabalho de Pincus e Chang nos EUA foram John McLean Morris e Gertrude van Wagenen do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia na Escola de Medicina da Universidade de Yale. Assim como outros pesquisadores que entravam para o campo da inovação contraceptiva, Morris acreditava que o problema mais importante para a profissão médica era o controle populacional. Dessa forma, apesar de na metade da década de 1960 existirem diversos compostos de estrogênio para tratar desordens ginecológicas e complicações da gravidez, os dois pesquisadores escolheram utilizar o DES em suas pesquisas porque o consideravam mais potente, além de ser mais barato de produzir, pois poderia ser encontrado facilmente a partir do alcatrão de carvão. Este baixo custo de produção também tornou o DES um contraceptivo atraente para as indústrias farmacêuticas (PRESCOTT, 2011, p.20). Desde 1952 o DES já era aprovado pelo FDA para tratamento de desordens reprodutivas, entretanto, médicos já estavam prescrevendo-o de forma off-label 3 como

3 Quando o medicamento é prescrito e usado de forma diferente daquela que está regulamentada pelo órgão regulador de medicamentos.

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contraceptivo pós-coito, até mesmo porque publicações na revista Science News anunciavam o composto como tendo uma “vida dupla”, tanto para tratamento de desordens reprodutivas como sendo uma “pílula do dia seguinte”. Assim, de acordo com Prescott (2011, p.21), o caminho estava sendo trilhado para os pesquisadores explorarem o DES como contraceptivo pós-coito em humanos. Dessa forma, em 1966 Morris e Wagenen anunciaram os resultados do primeiro estudo amostral em humanos com o contraceptivo pós-coital DES, durante o Encontro Anual da Sociedade de Ginecologia Americana. As primeiras mulheres que serviram de sujeitos desta pesquisa foram vítimas de estupro tratadas no Hospital Yale-New Haven. Nenhuma das participantes do estudo engravidou e também os efeitos negativos foram considerados raros. Além disso, solicitaram a participação do que eles chamaram “voluntárias corajosas”, estudantes que eram casadas e realizavam sua graduação na Universidade de Yale e que aceitaram fazer parte dos testes, as quais também não engravidaram (PRESCOTT, 2011; ELLERTSON, 1996). O professor de ginecologia Somer Sturgis da Escola Médica de Harvard sugeriu na ocasião que o trabalho de Morris e Wagenen poderia ser considerado o maior avanço científico em “antifertilidade” para a humanidade desde o trabalho de Pincus. Para Sturgis, a grande relevância deste trabalho se devia ao problema da explosão demográfica, principalmente em regiões economicamente mais pobres, onde não havia se conseguido resolver o problema do controle populacional com a pílula hormonal de uso regular. Para Prescott (2011, p.23), estas declarações refletem os vieses de raça e classe que moldaram as pesquisas sobre contraceptivos nos Estados Unidos. Os avanços foram vistos como meios para a “cura” da “doença” da “gravidez indesejada 4” entre mulheres economicamente pobres e negras tanto em solo norte-americano, quanto nos países em desenvolvimento. Durante os anos 1960 e 1970 surgiram muitas publicações de “auto-ajuda” sobre a contracepção pós-coito em várias universidades norte-americanas, formuladas por estudantes próximas ao movimento feminista que demandavam direitos para as mulheres. Estudantes homens também participaram deste movimento de autoajuda pela contracepção, dentre eles, James Trussell que começou a dar aulas sobre controle reprodutivo para os colegas. Além de estas publicações oferecerem informações sobre contracepção e sexualidade elas sensibilizavam os universitários sobre a “pílula do dia seguinte” (PRESCOTT, 2011, p. 32). Importante destacar que, atualmente, este professor de Economia e Relações Públicas do

4 Este é um termo nativo, utilizado pelo consórcio. O ICEC utiliza os termos: “gravidez indesejada” ou “não desejada” e também “gravidez não planejada”.

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Instituto de Pesquisa Populacional da Universidade de Princeton faz parte do grupo técnico consultivo do Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência (ICEC). Quanto mais as informações se disseminavam, mais estudantes mulheres procuravam pela pílula. Neste percurso as mulheres descobriram que os afiliados da Planned Parenthood – World Population (PP-WP) constituiam o melhor caminho para acessar este contraceptivo. Em 1969, a revista Time publicou que estudantes mulheres de Stanford procuravam ajuda contraceptiva na Planned Parenthood de Palo Alto. Em resposta a este interesse, a PP-WP iniciou um programa de ação para a comunidade estudantil sob a direção de Don Pellegrom, um estudante recém-formado na Universidade de Columbia. Este programa recebeu críticas de líderes afro-americanos. Em 1969, Louis Lomax, um professor negro da Universidade de Hofstra, alegou que estudantes negras de dezenove anos estavam sendo colocadas em estudos clínicos sobre baixas doses de estrogênio e que haviam reclamado sobre um recrutamento agressivo da PP-WP no campus da universidade (PRESCOTT, 2011, p.34). Porém, o almejado uso do DES teve algumas conseqüências desastrosas. Em 1971, pesquisadores que estudavam câncer no Hospital Geral de Massachusetts em Boston publicaram estudos mostrando a alta incidência de câncer vaginal em filhas de mulheres que haviam utilizado o DES durante a gravidez. Em 1973 o grupo de Ativistas pela Informação Médica (AIM) publicou em seu jornal feminista “ Her-self” que milhares de mulheres ingeriram o DES durante a gravidez e que médicos não haviam informado sobre os efeitos colaterais dessa substância ao prescreverem-na para as mulheres, continuando a dizer que o contraceptivo era seguro. Após este escândalo com o DES, o Center for Population Reasearch at the National Institute of Child Health and Human Development (NICHHD), começou a se interessar por novas substâncias que pudessem substituir o DES como contraceptivo pós-coito e anunciaram então um plano de financiamento de cinco anos para pesquisas voltadas para o desenvolvimento de novos métodos contraceptivos. Ativistas feministas contestavam a necessidade do desenvolvimento desses novos métodos. Em artigo publicado na revista Ms.Magazine , Kay Weiss, co-fundadora da AIM argumentava que os centros de pesquisa que estivessem de acordo com a condução desses estudos estavam arriscando a vida de mulheres pelo interesse nos lucros advindos de contratos federais. De acordo com muitas feministas, a legalização do aborto em 1973 nos EUA deu uma opção mais segura para a prevenção de uma gravidez do que a “pílula do dia seguinte” poderia dar. E ainda assim, grupos feministas como o Jane collective , em Chicago, permaneciam críticos ao modelo médico sobre o aborto, o qual focava no tratamento da “doença” da “gravidez indesejada” ao invés de uma abordagem larga sobre a autodeterminação reprodutiva das

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mulheres. Durante toda a década de 1970 e 1980 a vigilância sobre a segurança dessa nova forma de contracepção foi uma preocupação do movimento feminista norte-americano (PRESCOTT, 2011, p. 57-58). Ao mesmo tempo em que as pesquisas estavam sendo conduzidas nos Estados Unidos, pesquisadores canadenses buscavam alternativas mais seguras que o DES. O acesso ao aborto no Canadá era mais restrito do que nos EUA, apesar de sua legalização em 1969 no país, as mulheres podiam realizar procedimentos apenas se sua vida ou saúde estivesse em perigo. Esse fato foi um propulsor dos estudos sobre métodos pós-coito no Canadá. Para responder a esse tipo de necessidade de saúde reprodutiva, o professor associado de obstetrícia e ginecologia da University Western Ontario , Albert Yuzpe, iniciou uma clínica de ginecologia nesta Universidade, pois o presidente da instituição, na época, Dr. Carlton Williams, estava preocupado com as taxas de gravidez entre estudantes solteiras e acreditava que disseminar o uso de contraceptivos na comunidade acadêmica “aliviaria o problema” (PRESCOTT, 2011, p.67). Tomando conhecimento do trabalho de Haspels com levonorgestrel na Holanda e estudos que estavam sendo conduzidos em Hong Kong também apenas com o levonorgestrel, os quais demonstravam poucos efeitos colaterais quando comparados aos contraceptivos contendo estrogênio, Dr. Yuzpe começou a estudar a combinação disponível no mercado farmacêutico canadense comercialmente conhecida como Ovral ®, que continha progestina e Etinil Estradiol. O Ovral ® representava duas vantagens em relação ao DES: em primeiro lugar era mais vantajoso porque podia ser administrado em uma dose enquanto o DES necessitava de 50 mg por dia durante 5 dias; em segundo lugar e mais importante, o fato de o Ovral ® ser utilizado rotineiramente excluiria o “fator medo” que vinha acompanhando o DES desde os escândalos devido ao seu potencial cancerígeno (WYNN, 2012; PRESCOTT, 2011). O método Yuzpe disseminou-se entre grupos de mulheres e ativistas feministas. Entretanto, o conhecimento sobre o método ainda continuava precário, o que levou médicos a começaram a oferecer tablets do contraceptivo para mulheres que necessitassem. Ao mesmo tempo em que o método ia sendo cada vez mais disseminado, grupos de ativistas feministas ainda levantavam preocupações em relação aos contraceptivos pós-coitais, pois para as ativistas o aborto e técnicas como a extração da menstruação 5 seriam métodos de reforço mais

5 Esta técnica emergiu no movimento de mulheres nos EUA na década de 1970. Em 1971 Lorraine Rothman e Carol Downer do Centro de Saúde Feminista de Los Angeles inventaram o Del-Em, um dispositivo mecânico utilizado para extração da menstruação. Remover o fluxo menstrual era uma performance utilizada por vários motivos: uma forma de controle dos períodos menstruais, contracepção e uma forma de aborto (MAMO e FOSKET, 2009).

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seguros e eficazes porque não envolveriam o uso de “drogas” que não tinham sua segurança e eficácia garantidas totalmente. Entretanto, com a erosão do direito ao acesso ao aborto, nos EUA, especialmente para mulheres de baixa renda, cujo acesso ao procedimento era dificultado por segmentos sociais e políticos conversadores, durante a década de 1980. Considerando os bloqueios ideológicos ao exercício do direito ao aborto, houve uma reavaliação das ativistas feministas sobre sua posição em relação aos contraceptivos pós- coito. Em 1988, por exemplo, houve a eleição de George H.W. Bush e seu vice-presidente Dan Quayle, ambos alinhados ideologicamente a princípios conservadores e fortes oponentes ao aborto. Assim, grupos de feministas também passaram a defender o acesso aos CE quando outros métodos contraceptivos falhassem (PRESCOTT, 2011; PILLSBURY, COEYTAUX, JOHNSTON, 1999).

1.2. A construção de um consenso para a difusão dos contraceptivos de emergência

Segundo Wynn (2012), na década de 1980 o método Yuzpe era o método dominante. A Schering chegou a introduzir o “Schering PC4TM”, regime combinado de etinilestradiol e norgestrel no Reino Unido, países europeus, África do Sul e Nova Zelândia. Mas ainda assim, mesmo nos países onde este produto dedicado era aprovado, as pílulas contraceptivas diárias continuavam a ser mais usadas, pois eram mais baratas e disponíveis. A terceira e quarta gerações de contraceptivos de emergência (pílula contendo apenas levonorgestrel 0,75mg ou 1,5mg e antiprogestinas) foram desenvolvidas em meio a intensas atividades políticas, educativas e de advocacy tanto de movimentos feministas quanto do próprio consórcio. Durante a década de 1990 as pesquisas sobre esses contraceptivos se intensificaram e em 1992 dois artigos foram publicados na revista Family Planning Perspectives por James Trussell e Felicia Stewart 6, os quais traziam dados científicos sobre os CE e também cunhavam o termo “pílulas contraceptivas de emergência”. De acordo com os artigos, estes contraceptivos poderiam reduzir o número de “gravidezes indesejadas” e abortos além de, individualmente, “livrar as mulheres de uma angústia”. De acordo com os autores, alguns passos precisavam ser dados para torná-la altamente disponível, era preciso: educar mulheres sobre CE; educar médicos e remover barreiras para obter a pílula dentro de 72 horas após o sexo não protegido. Para Trussell e Stewart havia apenas uma maneira de seguir este

6 Diretora e professora do Centro de Política e Pesquisa em Saúde Reprodutiva da Universidade da Califórnia – EUA, de 1999 até 2006, ano de seu falecimento. Também participou ativamente do ICEC.

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caminho, produzindo um produto dedicado para CE 7 (PILLSBURY, COEYTAUX, JOHNSTON, 1999, p.7). Também em 1992, foi criada uma força tarefa sobre contracepção pós-coito por iniciativa de um grupo de ativistas criado em 1988, o Reproductive Health Technologies Project (RHTP) 8, liderado por Felicia Stewart. Este grupo debatia a utilidade do termo “pílula do dia seguinte” e apontava que o termo teria associações negativas e não informava corretamente que o método poderia ser usado para além da manhã ou do dia seguinte, mas em 72 horas 9. Os membros dessa força tarefa acreditavam que o termo “emergência” iria tornar o método mais confiável e as mulheres passariam a solicitá-lo. Essa demanda faria com que as empresas farmacêuticas enxergassem oportunidades comerciais e que os médicos se sensibilizassem com a necessidade do contraceptivo pelas mulheres. Foi na década de 1990 que a Organização Mundial Saúde (OMS)10 conduziu estudos clínicos comparando o Yuzpe ao método contendo apenas progestina e demonstrou superioridade deste último, o que renovou o interesse em se desenvolver um produto dedicado à CE contendo apenas progestina. Segundo os autores do livro “ Emergency Contraception: The story of a global reproductive health technology ”, que também fazem parte do ICEC como Angel Foster que integra a Ibis Reproductive Health e coordena a Rede Regional de Contracepção de Emergência do Mundo Árabe, foram os estudos da OMS que criaram interesse em expandir o acesso aos CE, o que foi coordenado e estimulado por colaboração internacional (WYNN, 2012). O grande interesse nesses estudos é que o contraceptivo contendo apenas a progestina seria mais fácil de manejar, o que aumentaria a adesão ao “tratamento” e conseqüentemente as vendas do mesmo. Além disso, os estudos demonstraram menos efeitos colaterais. O método Yuzpe demonstra ser um pouco mais complicado para o uso: apresentações com 0,2 mg de etinilestradiol e 1 mg de levonorgestrel, devem ser divididas em duas doses iguais com intervalo de 12 horas. Ou ainda, aquelas que contêm 0,05 mg de etinilestradiol e 0,25 mg de

7 A expressão “produto dedicado” refere-se a um produto com dose e embalagem específica, com aprovação para ser comercializado como contraceptivo pós-coito. Como explicam Foster e Wynn (2012), os contraceptivos orais regulares eram utilizados como contraceptivos pós-coitais, mas a ideia era a de fabricar um produto específico para este tipo de contracepção, que pudesse ser mais fácil de usar, um “produto dedicado à CE”. 8 Esse grupo incluía grupos feministas, como: National Women’s Health Network; The National Latina Health Organization; The National Black Women’s Health Project. Também incluía: Population Council; Planned Parenthood Federation of America; American Public Health Association (Pillsbury, Coeytaux, Johnston, 1999, p.8). 9 Considera-se atualmente que os contraceptivos de emergência contendo levonorgestrel podem ser administrados até 120 horas após a relação sexual. 10 Um dos estudos mais importantes foi publicado em 2002: von Hertzen, H; Piaggio, G; Ding, J et al. Low dose of mifeprestone and two regimens of levonorgestrel for emergency contraception: a WHO multicentre randomised trial. Lancet, 360(9348), 1803-10, 2002.

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levonorgestrel devem ser utilizados 2 comprimidos a cada 12 horas ou quando as apresentações são de 0,03 mg de etinilestradiol e 0,15 mg de levonorgestrel por comprimido devem ser administradas 4 comprimidos a cada 12 horas. Já o novo contraceptivo seria mais fácil para o uso: nas apresentações de 0,75 mg de levonorgestrel ele seria administrado em apenas duas doses, 1 comprimido a cada 12 horas e quando a apresentação contém levonorgestrel 1,5 mg, neste caso, apenas 1 dose é administrada após a relação sexual (BRASIL, 2011), o que demonstra a preocupação dos pesquisadores e empresas com a “aceitabilidade” destes novos contraceptivos pelas mulheres. Em 1994 a pressão pelo produto dedicado à CE continuou. O professor James Trussell lançou um website (www.not-2-late.com) para dar informações sobre contraceptivos de emergência e sobre quais marcas de contraceptivos regulares poderiam ser utilizados como CE. Ao mesmo tempo em que esta estratégia interessava por lembrar que o produto não deveria ser vendido sob prescrição médica (deveria ser OTC – Over the counter ), também almejava mostrar que sem a aprovação de um produto dedicado à CE pelo FDA, os contraceptivos de emergência nunca teriam legitimidade entre o público. Também em 1994, o RHTP enviou uma de suas diretoras, Sharon Camp, para uma viagem de estudos na Europa para aprender como tornar os CE disponíveis para mulheres. Camp notou que as empresas farmacêuticas estavam comercializando produtos dedicados à contracepção de emergência que eram amplamente disponíveis em países como Reino Unido, Holanda, Alemanha, Suíça, Finlândia, Suécia, Hungria e outros países do leste europeu (WYNN, 2012; PILLSBURY, COEYTAUX, JOHNSTON, 1999). De acordo com uma publicação de Pramilla Senanayake (1996), secretária geral do IPPF (International Planned Parenthood Federation ), o IMAP (International Medical Advisory Panel) , grupo criado para fornecer conselhos para médicos e organizações de planejamento familiar, começou a tratar mais especificamente dos contraceptivos de emergência em 1981 e recomendar que todas estas organizações no mundo fornecessem este tipo de contracepção. Logo após estas recomendações, o IPPF conduziu um estudo para analisar quantas das suas organizações afiliadas estavam disponibilizando os CE. Notou-se que das 72 organizações que responderam, 43% delas estavam disponibilizando, incluindo ao menos um afiliado em cada região do mundo, exceto os países árabes. Os afiliados do IPPF deram diversas justificativas sobre não fornecer CE: não havia demanda; contraceptivo ilegal; podem ser vistos como abortivos e fornecê-los podia ligar o serviço de planejamento familiar ao aborto que seria ilegal em alguns países; não existia um produto dedicado aos CE no

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mercado farmacêutico; funcionários não eram treinados para sua dispensação ou a agência nunca considerou em oferecê-los (SENANAYAKE, 1996). Esta publicação de Senanayake (1996) mostra, segundo a autora, a grande importância de expandir o acesso aos CE, pois apesar do empenho do IPPF em prol destes contraceptivos, os seus afiliados não estavam distribuindo-os. A publicação do IPPF (SENANAYAKE, 1996) foi lançada no mesmo ano em que o Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência começou a atuar e parece dar substância para que um consórcio dedicado a expandir o acesso a estes contraceptivos pudesse existir. Além disso, mostra que esta organização (IPPF) já vinha preparando-se tecnicamente para dar suporte sobre os contraceptivos de emergência. Também revela duas preocupações dos atores envolvidos com o interesse de expandir o acesso aos CE. Em primeiro lugar, a sua introdução nos países em desenvolvimento:

Although provision of emergency contraception is not universal, at least one affiliate in every region except the Arab world offers it. This finding suggests that in principle, the method is suitable for both developed and developing country settings (SENANAYAKE, 1996, p. 70).

Em segundo lugar, sua preocupação em produzir um produto dedicado à contracepção de emergência: The lack of an approved product designed and marketed specifically for emergency contraception hinders at least some family planning associations that are willing to offer de service (SENANAYAKE, 1996, p. 70).

Os anos 1990 foram anos de intenso trabalho das organizações de planejamento familiar para que um produto dedicado existisse e pela aprovação dos CE pelo FDA, como assinala Wynn (2012). Em 1994 uma petição do Centro sobre Política e Lei Reprodutiva, fundado pela Packard Foundation , foi arquivada junto ao FDA assinada pela Associação Médica Americana de Mulheres, Associação Americana de Saúde Pública, e Planned Parenthood de Nova York. A petição pedia ao FDA que declarasse a segurança e eficácia do levonorgestrel como CE, mas isto só foi garantido em 1999, após a criação do ICEC (WYNN, 2012). As organizações em prol da contracepção pós-coito começaram então a tentar persuadir empresas farmacêuticas norte-americanas a produzir um produto dedicado à CE também nos Estados Unidos, pois, após a viagem de Sharon Camp, confirmaram suas certezas de que a melhor maneira de disseminar o conhecimento sobre a CE seria obtendo este produto específico. Camp argumentava que cortar tablets de pílulas regulares não se parecia com uma

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“medicina real”. Assim, após negociações, a empresa Gynetics começou a produzir o Preven ®, em 1995, um contraceptivo de emergência do tipo Yuzpe. Mas Sharon Camp e outros parceiros ainda achavam que apenas um produto dedicado não era suficiente, segundo Camp: The more companies that are out there advertising emergency contraception directly to consumer and educating healthcare providers, the more likely it is that emergency contraception will become a standard part of reproductive health (PRESCOTT, 2011, p.102).

Ao mesmo tempo em que estas organizações estavam avançando em transformar os CE em produto dedicado nos EUA, eles também estavam olhando para além do solo norte- americano a fim de torná-los também disponíveis em “países em desenvolvimento”. Com o propósito de discutir essa expansão em 1995, a Fundação Rockefeller convocou uma reunião que deu origem ao Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência, sob liderança de Sharon Camp. No mesmo ano, a OMS inseriu a CE em sua lista de medicamentos essenciais (LME) alinhando-se aos acordos internacionais firmados nas conferências sobre População e Desenvolvimento, no Cairo, em 1994 e na IV Conferência Mundial sobre as Mulheres, em Pequim, em 1995 (COSTA et al, 2008). Por meio deste resgate histórico podemos perceber as estratégias de cientistas, médicos, ativistas e organizações de planejamento familiar que vão moldando culturalmente e coletivamente os hormônios para transformá-los na contracepção de emergência, a fim de obter um contraceptivo de reforço que permitisse a “correção” de erros cometidos pelas mulheres, caso a pílula regular falhasse. A idéia do “ back up control” e da “emergência” surgem como bandeiras para levar adiante uma agenda internacional preocupada com a “explosão demográfica” a qual poderia acarretar um problema econômico de ordem mundial. A figura abaixo (Figura 1) ilustra a ideia de emergência adotada estrategicamente pelos defensores do CE. Percebe-se que o desenvolvimento deste contraceptivo não esteve vinculado exclusivamente ao mercado farmacêutico, muitas das justificativas para o fomento de pesquisas na área articulavam-se com interesses demográficos, econômicos e políticos. Destas articulações, redes de colaboração foram formadas, como o consórcio ICEC, objeto de análise deste trabalho.

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Figura 1: Representação da pílula de emergência como back up control em situações emergenciais no relatório “Mainstreaming Emergency Contraception: A Report on the Compton Foundation’s Emergency Contraception Initiative” de 2008. Disponibilizado na seção Partner Publications , no website do ICEC.

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CAPÍTULO 2: Abordagens Teóricas

Neste capítulo apresento as abordagens teóricas, conceitos e constructos que serviram na construção do referencial de análise da problemática dos CE e dos argumentos do Consórcio para expansão dos CE principalmente para os países em desenvolvimento. Recorri, fundamentalmente, a autores que adotam a perspectiva analítica foucaultiana sobre sexualidade e reprodução como objetos do biopoder e da biopolítica, conjugada com uma breve contextualização histórica sobre organizações internacionais de planejamento famíliar.

2.1. Sexualidade e reprodução em cena: a vontade de saber

The story of the pill is a story about liberation and control. On the one hand pill is “except for the word ‘no’ the most effective and convenient contraceptive ever devised”, a technology that contributed to the increasing liberation of women. On the other hand it is a story about Western science ignoring the local needs of specific users, particularly the communities on the Caribbean islands and other Third World countries” (OUDSHOORN, P.149-150, 1994).

Esta frase de Oudshoorn (1994) ilustra os desafios de refletir sobre contraceptivos, estas tecnologias forjadas pela ciência ocidental. Se de um lado temos a história, importantíssima tanto para as mulheres como para toda a sociedade, da liberação da mulher - devido à desvinculação entre sexo e reprodução - por outro lado não podemos deixar de problematizar como estas tecnologias foram sendo utilizadas para a regulação de corpos femininos e das populações. Nesse sentido, com o objetivo de analisar os discursos do Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência sobre o acesso aos CE é importante refletir sobre a inserção do consórcio neste histórico processo de regulação dos corpos no que diz respeito à sexualidade e reprodução. Elias (1994) demonstra uma ordem de impulsos emocionais e racionais que entrelaçados estabeleceram um processo social que moldou nossa conduta e nossos sentimentos como “civilizados”. Em relação à sexualidade, podemos chamar esta ordem que o autor nos fala de “ dispositivo ”, um “dispositivo da sexualidade”, como bem aponta Foucault (1980). É por meio deste dispositivo que discursamos e “colocamos o sexo em discurso” por meio de canais e linhas tênues que fazem com que o poder regulador, normalizador e normatizador, cheguem às condutas individuais. O dispositivo representa um conjunto de discursos e práticas produzidos como mecanismo que, em determinado momento histórico, surge no âmbito das relações de poder com a função de responder a determinada demanda

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considerada urgente pela biopolítica , (VENTURA, 2010, p. 14) a qual significa para Foucault (1977) o gerenciamento da vida (nascimento, saúde, morte e sexualidade) pelo poder político. A sociedade ocidental tem permanecido por séculos atada à tarefa de dizer tudo sobre o sexo, de discursar cuidadosamente produzindo efeitos múltiplos. Falou do sexo sempre como uma coisa que não se deve simplesmente coordenar ou tolerar, mas gerir, regular para o bem de todos, fazer funcionar para um bem ótimo. “O sexo não se julga apenas, administra- se” (FOUCAULT, 1977). Foi preciso uma aparelhagem do poder público com seus procedimentos de gestão para regular o sexo por meio de discursos úteis e públicos e não pelo rigor da proibição, por meio das pedagogias da medicina e da economia e não mais da eclesiástica. O fim do século XVIII apresentou a nova tecnologia do sexo, como um negócio do Estado, onde a sociedade é convidada a colocar-se em vigilância. A fisiologia sexual das mulheres e a demografia eram assuntos que iam se associando com o objetivo da regulação espontânea ou planejada dos nascimentos. Existem diferentes correntes de pensamento que trataram de questões demográficas ao longo da História Moderna no que diz respeito aos significados econômicos e sociais do chamado “problema populacional”. No final do século XVIII, o reverendo Thomas Malthus inaugurou a mais conhecida e influente destas vertentes, a qual acumulou diversos cálculos e argumentos para demonstrar que o crescimento populacional era um “entrave” para o progresso humano. Entretanto, nem todos os pensadores deste século trataram da questão da mesma forma, sob a ótica malthusiana. Vários deles consideraram que o crescimento populacional era um fator “neutro”, principalmente aqueles pensadores alinhados às teorias liberais e também marxistas. Outro grupo de pensadores enfatizava não a quantidade da população, mas sim a “qualidade” da mesma, conhecidos como correntes eugênicas. Além disso, podem ser identificadas visões religiosas e enfoques “científicos” que consideravam o crescimento populacional um fator positivo para o desenvolvimento (OUDSHOORN, 1994; ALVES e CORRÊA, 2003). De acordo com Alves e Corrêa (2003), é importante lembrar que estes enfoques acerca do “problema populacional” foram traduzidos em políticas de Estado e foram também disseminados por diversas organizações internacionais que se dedicavam ao “planejamento familiar”, como por exemplo, a Fundação Rockefeller, USAID ( United States Agency for International Development ), IPPF, entre outras. O malthusianismo deu lugar ao neomalthusianismo que preconizou medidas administrativas destinadas a desencorajar a fecundidade. Este foi um enfoque que ganhou corpo na metade do século XX e materializou- se em medidas voltadas para o controle coercitivo da fecundidade.

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Um dos fatos utilizados como maior trunfo da ideologia da modernização após a segunda guerra mundial foi a queda consistente da mortalidade e a duplicação da esperança de vida, a despeito das elevadas disparidades nacionais e internacionais. Entretanto, por outro lado, este feito fez emergir diversas preocupações, pois as taxas de crescimento populacional se aceleraram e o espectro de Mathus voltou a pairar. O pessimismo demográfico voltou a predominar e em 1958 Coale e Hoover lançaram o livro “População e desenvolvimento econômico” , no qual alertavam para o “problema populacional” em países de baixa renda, ou de Terceiro Mundo. Segundo estes autores, a queda da mortalidade havia ocorrido nos países agrários e rurais porque segmentos das sociedades não industriais preocupavam-se com a redução das mortes e valorização da vida. Porém, em relação à redução das taxas de fecundidade, o mesmo não acontecia, pois as sociedades tradicionais resistiam à diminuição do número médio de filhos. Segundo Coale e Hoover, as crenças populares e religiosas funcionam como escoras culturais pró-natalistas que, ao longo da História, somente são quebradas pelas forças do desenvolvimento econômico. Esta análise dos autores deu lugar a uma interrogação: “como resolver a questão do alto crescimento populacional dos países do Terceiro Mundo que conseguiram reduzir a mortalidade, mas não a natalidade?” (ALVES e CORRÊA, 2003). Para estes autores, o alto crescimento demográfico inviabilizaria o desenvolvimento dos países e sem desenvolvimento também não haveria redução da fecundidade. Pensadores que se alinharam a estas análises são chamados de neomalthusianos. Eles compartilham a ideia de Malthus de que o alto crescimento populacional inviabiliza o combate à pobreza, mas divergem quanto às soluções propostas, pois ao invés de defenderem um salário de subsistência como “freio positivo”, eles pregam o controle da fecundiade dentro e fora de casamentos. Livres dos preconceitos religiosos de Malthus, os neomalthusianos advogam a utilização de métodos contraceptivos eficientes. São defensores de metas populacionais, de forma a eliminar os entraves demográficos para o desenvolvimento, condição para redução da pobreza (ALVES e CORRÊA, 2003). Ao longo da história, o tema do controle populacional transita entre domínios ideológicos que o colocam ora como um problema, ora como uma solução para entraves sociais e econômicos. Neste sentido, os discursos sobre regulação da fecundidade da população compõem inevitavelmente a teia dos dispositivos de poder. Como bem demonstra Foucault (1977), não foi e não é por meio de mecanismos repressores e verticalizados, que assumem um algoz e uma vítima, a regulação da sexualidade e da reprodução acontece ao longo da história ocidental utilizando dispositivos de poder e de saber, de produção de

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verdades e de prazeres, que bem diferentes da repressão, multiplicam discursos e fatos de interdição e de ocultação. Esses discursos e práticas se moldam de forma a introjetar suas normas nos diferentes contextos sociais e culturais. Nesse sentido, é preciso que estejamos atentos para a “imensa vontade de saber” sobre a sexualidade e a explosão de discursos em seu entorno, que consolidou uma forma sofisticada de poder, que serve de objeto, ao que chama Foucault de biopoder (FOUCAULT, 2005a). Foi apenas na década de 1950 com a preocupação internacional sobre o crescimento demográfico que as pesquisas sobre contraceptivos encontraram um contexto favorável para se desenvolver (OUDSHOORN, 1994) e foram desde então se expandindo pelo mundo por iniciativas das organizações internacionais como a Fundação Rockefeller. O sucesso da transformação de hormônios em contraceptivos exigiu uma ligação com um mundo que antes não era habitado pelos hormônios: o mundo do planejamento reprodutivo. Entrando neste domínio, a história dos hormônios se tornou entrelaçada a grandes interesses políticos. Esta arena foi e ainda é constituída por ideologias sobre controle populacional misturadas com imperialismo cultural (OUDSHOORN, 1994). Os discursos e as práticas das organizações internacionais e de “planejamento familiar” na regulação da sexualidade e reprodução tiveram grande impacto no Brasil e em toda a América Latina, ou, nas palavras dessas organizações, nos países ditos de “Terceiro Mundo”. O processo histórico de regulação das populações se processou no íntimo dos corpos, especialmente das mulheres no que diz respeito à reprodução, por meio de um dispositivo de poder (FOUCAULT, 1977) que claramente pode ser visualizado ao longo do trabalho, na constituição de alianças que formam um consórcio voltado para expandir acesso a um contraceptivo para os “países em desenvolvimento”, e na formulação de diferentes modos de gestão da reprodução. Essas organizações unidas por um mesmo ideal tratam de estabelecer e organizar o modo como a humanidade vai se comportando em relação à reprodução e ao sexo.

2.2. Biopolítica e Biopoder: antigos e novos campos e modos de atuação. Saúde Pública, Direitos Reprodutivos e Farmacologização.

Por muito tempo o sistema de conhecimento e práticas da medicina ocidental, conhecido como biomedicina foi pouco analisado em relação à sua natureza social e cultural, ao contrário, foi aceito como um sistema “neutro” e “científico”. Entretanto, desde as análises

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de Michel Foucault a biomedicina tem sido vista como um sistema simbólico e um lugar para reprodução de relações de poder (LUPTON, 1995). Como aponta Lupton (1995), há a necessidade de se discutir mais a dimensão da biomedicina na saúde pública. As bases doutrinárias dos discursos sociais sobre a saúde emergeriam na segunda metade do século XVIII, na Europa Ocidental, em um processo histórico de disciplinamento dos corpos. Por um lado, a higiene, enquanto conjunto de normatizações e preceitos a serem seguidos e aplicados no âmbito individual produz um discurso sobre a boa saúde circunscrito à esfera moral. Por outro lado, as propostas de uma polícia médica estabelecem a responsabilidade do Estado como definidor de políticas, leis e regulamentos referentes à saúde no coletivo e como agente fiscalizador da sua aplicação social (FOUCAULT, 2005b). Segundo Paim e Almeida Filho (1998), a clássica definição de saúde pública trazia os elementos da prevenção das doenças e promoção da saúde mediante esforços organizados da comunidade. O que passou a vigorar após a emergência destes discursos sanitários foi que a medicina aplicada ao âmbito social seria uma política para “curar os males da sociedade”. Esse paradigma sanitarista leva em consideração que é necessário conhecer estatisticamente os “males” da sociedade para resolvê-los mediante a aplicação de tecnologias e atividades profiláticas destinadas principalmente aos pobres e setores excluídos da população (PAIM e ALMEIDA FILHO, 1998). De fato, esta forma de saúde pública constitui um elemento central da biopolítica. Na teoria de Foucault, a sexualidade, por exemplo, é uma representação ou prática que foi, paulatinamente, afastada do instituto da moral para o instituto da biomedicina, por meio da medicalização. A importância assumida pela sexualiadade se encontra numa articulação entre a disciplina dos corpos e a política da vida. Isto é, existe uma relação muito próxima entre a disciplina do corpo individual, a regulação das populações, a qualidade de vida da população, a reprodução biológica da espécie e a possibilidade de riqueza das nações. Como afirma Foucault, “o sexo é acesso, ao mesmo tempo, à vida do corpo e à vida da espécie” (FOUCAULT, 1977). Para Foucault, a medicalização é uma conseqüência inevitável dos processos de transformação social que criam a medicina moderna e ao mesmo tempo se submetem a ela. Para Conrad (2007), ela é um processo de transformação de problemas anteriormente não considerados “médicos” (ou “de saúde”, como acrescenta Camargo (2013)) em problemas médicos (CAMARGO, 2013). Além disso, alguns autores (CLARKE et al, 2003), argumentam que a medicalização está se transformando em uma biomedicalização, onde a saúde está se tornando uma responsabilidade individual que deve ser preenchida por meio do

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melhor acesso à informação, ao conhecimento, à prevenção de riscos e serviços e tecnologias de saúde. Como uma conseqüência dos processos de medicalização, o conceito formulado por Williams, Martin e Gabe (2011), “farmacologização” ( pharmaceuticalization) , pode ser entendido como a tradução ou transformação de condições, capacidades e potencialidades humanas em oportunidades para intervenções farmacológicas. Mesmo que mantenha sua interface com a medicalização, a farmacologização não estaria necessariamente ligada a algum tipo de diagnóstico médico (CAMARGO, 2013), como se vê, por exemplo, na utilização de medicamentos over-the-counter , acesso que é amplamente defendido pelo ICEC em relação aos contraceptivos de emergência. Para além do conceito de medicalização, a farmacologização se firma cada vez mais como novo constructo para a compreensão da relação entre tecnologias farmacêuticas e a sociedade, que leva em consideração: a redefinição ou reconfiguração dos problemas de saúde como tendo uma solução farmacêutica; as mudanças nas relações entre as agências regulatórias e a indústria farmacêutica; a mediação dos produtos farmacêuticos na cultura popular e na vida diária; a criação de uma nova identidade tecno-social, com a mobilização de grupos pacientes ou consumidores sobre os medicamentos; o uso dos fármacos para propósitos não médicos e a criação de um novo mercado consumidor; inovação de medicamentos e a colonização do futuro da saúde, apesar da crise de produção e inovação da indústria (WILLIAMS, MARTIN e GABE, 2011). Neste contexto, Nikolas Rose (2013) sugere que discursos e tecnologias têm desenvolvido um papel de gerenciamento de pessoas alinhado a princípios do liberalismo e democracia. Dentro destes contextos políticos e econômicos, a “baixa produtividade” e certa “obrigação” por liberdade (incluindo autonomia, responsabilidade pessoal, escolha e auto- realização) são farmacologizadas. De acordo com Liebert (2010), esta retórica tem sido nutrida pelo marketing de empresas farmacêuticas, as quais tornam seus produtos como oportunidades para as mulheres atingerem a almejada liberdade. Além das preocupações com as taxas de nascimentos, mortes, doenças e com gerenciamento de riscos, a política da vida contemporânea também se preocupa em admnistrar, controlar, projetar, remodelar e modular capacidades vitais dos seres humanos. Há uma reorganização dos poderes do Estado, o qual devolve a administração da saúde e da reprodução para entidades regulatórias quase autônomas – corporações privadas. Essas modificações nas racionalidades e nas tecnologias de governo também implicaram crescente ênfase sobre a responsabilidade dos indivíduos na administração dos próprios negócios, na provisão da própria segurança com prudente olho no futuro (ROSE, 2013).

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Em relação à reprodução, isto se faz muito eloqüente, pois as mulheres são estimuladas a se tornarem consumidoras ativas e responsáveis. Essa complexa mercadização, autonomização e responsabilização conferem um caráter particular à política contemporânea da vida (ROSE, 2013). A análise de Rose (2013) sobre a biopolítica é especialmente interessante para este trabalho. De acordo com o autor, a teoria de Foucault, sobre o século XVIII e XIX deixou claro que o campo da biopolítica, mesmo no ponto alto do Estado social, não era a implementação pelo Estado de uma única estratégia de regulação. Transpondo isto para este estudo, compreende-se que a biopolítica imersa nos argumentos do Consórcio nos revela o gerenciamento de populações, o governo dos corpos e de seus comportamentos estimulando discursos sanitários, mas também autonomizadores e responsabilizadores, numa espécie de “liberdade regulada”. Estes argumentos são estratégias biopolíticas que consistem, não mais em promover a reprodução daqueles cujas características biológicas são mais desejáveis, mas consiste em uma variedade de estratégias que tentam identificar, tratar, gerir ou administrar pessoas ou grupos onde o risco é considerado alto (ROSE, 2013). Resta claro que a saúde pública, a biomedicima e o direito têm servido historicamente como instrumentos da biopolítica e o biopoder, tanto na produção de normas como na gestão da sexualidade e reprodução. Mais recentemente, agrega-se esse novo instrumento, o fenômeno da farmacologização que não só expressa a expansão da indústria farmacêutica em uma sociedade capitalista, mas, sobretudo, um diferente modo de gestão da vida que se entrelaça aos demais.

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CAPÍTULO 3: Percurso metodológico

3.1. A pesquisa documental como estratégia metodológica

O ICEC é constituído e representa um interlocutor privilegiado de diferentes organizações internacionais de saúde, feministas, agências das Nações Unidas, agências regulatórias e outros órgãos governamentais de diferentes países. Seu propósito principal é difundir os CE para todo o mundo, com ênfase nos países em desenvolvimento. Suas ações e as informações sobre CE são divulgadas por meio de seu website, e tem como principais destinatários os profissionais de saúde, principalmente médicos e farmacêuticos, ativistas pelos contraceptivos de emergência e gestores de saúde. A atuação do ICEC, como já enfatizado, remete a problemática que transpassa o corpo feminino, e nos faz questionar se atua, autenticamente, com vistas à ampliação da autonomia e autodeterminação reprodutiva, ou se os discursos que veicula tem o propósito de fortalecer dispositivos de poder em prol do gerenciamento do corpo feminino. Nesse sentido, essa dissertação buscou compreender os argumentos 11 que o Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência utiliza para expandir o acesso aos CE ao redor do mundo. Para tanto, foram analisados os documentos veiculados no seu website e discussões dos membros do ICEC em sua lista de e-mails, a partir de uma perspectiva socioantropológica. Importante dizer que o Consorcio Latino Americano de Anticoncepción de Emergencia (CLAE) representa um braço direto do ICEC na América Latina, porém não foi tomado como objeto central de análise no trabalho em razão da indisponibilidade do seu website para consultas no momento inicial do desenho da pesquisa. Hoje, com a plataforma online disponível, pode-se ver que os documentos do CLAE reproduzem e reforçam os argumentos do ICEC, com ênfase na discussão sobre a situação legal e jurídica dos CE na América Latina, por serem considerados por diversos países da região como “abortivos”. Assim, pode-se observar certa ênfase no mecanismo de ação não abortivo dos CE, na tentativa de neutralizar embates ideológicos por meio de um discurso científico, e, definitivamente, tratar CE e aborto como uma questão de saúde.

11 Entende-se argumento como um procedimento discursivo onde se conecta um enunciado com outro para demonstrar uma tese. Um argumento não é apenas uma afirmação de certos pontos de vista, são tentativas de fundamentar certos pontos de vista com razões (WESTON, 2009).

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De acordo com Bacellar (2006), ao iniciar uma pesquisa documental é preciso conhecer da melhor maneira possível a história daquela peça documental que se tem em mãos. Desvendar sob quais condições o documento foi redigido, com qual propósito, por quem, ou seja, contextualizar o documento que se elegeu para análise. Nenhum documento é neutro e sempre carrega consigo a opinião da pessoa ou órgão que o escreveu. Realizar a pesquisa documental é não se submeter à fonte, exige que se desconfie das fontes, das intenções de quem a produziu. É preciso o olhar crítico e a correta contextualização do documento (BACELLAR, 2006). Nesse sentido, a análise documental não tem o objetivo de dizer a verdade sobre o outro, mas fazer uma objetivação relativa, colocar em cena, pensar e ponderar os fatos que se está observando. A intenção é extrair do discurso as condições de sua história e não mostrar a verdade traduzida pelo caráter normativo que este deve possuir. O que conta nas coisas ditas pelos homens não é tanto o que teriam pensado aquém ou além, mas aquilo que as sistematiza, que as torna acessíveis a novos discursos e transformações (PORTOCARRERO, 1994). Neste sentido, Portocarrero (1994) considera que o objetivo final não é dizer o que pode haver de verdadeiro no conhecimento, mas saber até onde e como é possível pensar de outro modo. Além da contextualização, Bacellar (2006) enfatiza que a pesquisa documental exige que se tome alguns cuidados. Primeiramente, faz-se necessária uma leitura atenta, acurada ao material; seguida de uma apreensão e aprimoramento de técnicas de levantamento, seleção e anotação do que é interessante destacar e do registro de referências. Também é importante identificar os dados que identifiquem o documento e estar atento às medidas utilizadas por quem o produziu. Dessa forma, o autor esclarece: Munido das armas e precauções dispostas anteriormente, de conhecimento prévio sobre o assunto [...] o pesquisador está pronto para prosseguir na análise e na interpretação de suas fontes. Já pode cotejar informações, justapor documentos, relacionar texto e contexto, estabelecer constantes, identificar mudanças e permanências e produzir um trabalho (BACELLAR, 2006, p.71).

Igualmente, Cellar (2008) recomenda que antes de realizar uma análise em profundidade sobre o material é importante uma análise preliminar bastante crítica sobre ele. Essa avaliação crítica constitui a primeira etapa de toda análise documental e se aplica em todas as dimensões da análise. Avaliar o contexto social global, no qual foi produzido o documento e no qual mergulham os autores. É imprescindível conhecer a conjuntura política, social, cultural e identificar pessoas e grupos sociais que propiciaram a produção de um

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determinado documento. A identificação dos autores é outra dimensão importante para a interpretação de um texto. Saber de que lugar falam os indivíduos, em nome de que grupos ou instituições. Qual a posição destes autores para fazerem esta ou aquela observação e estabelecer determinado julgamento. A autenticidade e confiabilidade do texto também devem ser consideradas. Além disso, a natureza do texto a ser analisado deve ser esclarecida, se os textos podem ser classificados de natureza teológica, médica ou jurídica, por exemplo. Por fim, deve-se ter cautela com os conceitos-chave inseridos no documento e delimitar adequadamente o sentido das palavras e conceitos (CELLAR, 2008). Devido ao fato de que este trabalho se centrou na análise de material documental de domínio público, na internet, não houve a necessidade de encaminhá-lo ao comitê de ética. Além disso, utilizei trocas de e-mails entre membros do ICEC para refletir sobre o objeto de estudo. Em relação a esta lista, ela é divulgada no website e qualquer pessoa que se interesse pelas discussões do consórcio pode incluir seu próprio e-mail e passar a recebê-las. Desta forma, ela também se constitui em material de domínio público. Houve o cuidado de se abreviar os nomes dos membros que participaram de discussões nesta lista, reiterando os princípios éticos de responsabilidade e respeito para com as pessoas envolvidas e cujas ideias compuseram o objeto da análise.

3.2. A fonte dos dados: o website do ICEC

Antes de demonstrar como realizei a seleção de documentos dentro do website do consórcio ( http://www.cecinfo.org ), apresento abaixo o mapa que representa a plataforma virtual.

Homepage 45

Country-by- Publications and About What is EC? Country EC Issues Contact Us Resources information

In-Depth Mission and General Country Where to acess Activities Information ICEC Publications Information

What do the Status & Legal & History Experts say Availability Opposition Partner about EC? Database Issues Publications

Members and Pill How EC Pills Status & Partners Formulations Work Availability Database

EC Access award EC and Medical IUDs for EC Winners Abortion

Non- Prescription acess to EC

Provision of EC in crisis situations

Sexual violence and EC acess

Product Distribution Issues Youth and EC

Figura 2: Mapa do website do Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência

Dentro destas seções é que estão contidos os documentos que selecionei para análise. As seções “What’s EC?” e “EC Issues” não continham documentos anexados, portanto, tomei as próprias seções e suas subseções enquanto documentos. Na seção about, os membros do ICEC, sua história e parceiros são apresentados. Seguindo a árvore da esquerda para a direita, pode identificar-se a representação gráfica dos principais elementos discursivos que constituirão as principais linhas argumentativas do ICEC. Em primeiro lugar, as informações farmacológicas sobre os contraceptivos de emergência, na seção (W hat is EC?). Em seguida uma seção específica que fornece informações sobre o status destes contraceptivos em diversos países ( Country – by – country information ) e o status dos CE nos países em desenvolvimento (In-Depth Country Information ). Ao lado, a seção EC Issues que apresenta as discussões importantes para a expansão do CE mobilizadas pelo ICEC. São elas: onde se dá o acesso; as oposições legais, como os CE funcionam, a diferenciação dos CE do aborto medicamentoso; o acesso sem a prescrição (OTC); CE em situações de crise e violência contra a mulher e o uso de CE por

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jovens. Também apresentam, logo a seguir, uma seção dedicada às publicações de parceiros do consórcio ( Partner Publications ) e por último uma seção para contato com interessados sobre as discussões que envolvem os CE. Dentro da página inicial também existe uma seção de notícias ( EC News ), esta veicula notícias de diversos jornais que publicaram matérias sobre os contraceptivos de emergência. De acordo com o próprio website do ICEC, na sua seção “About” , apesar de existirem diversos parceiros colaborando com o consórcio, empenhados na expansão do acesso à contracepção de emergência, o gerenciamento, inclusive do website , escolha de documentos e textos a serem incluídos na plataforma virtual, são selecionados por um grupo chamado de comitê diretivo: Elizabeth Westley é a Coordenadora do ICEC e faz parte da Family Care International , a organização que atualmente hospeda o ICEC; Alan Lambert é o presidente e fundador da PROSALUD Interamericana ; Christine Bixiones é Associada Sênior do conselho técnico da Population Services International ; Elisha Dunn-Georgiou é a Vice Presidente de advocacy da Population Action International ; Martha Brady, é Associada Sênior no Population Council ; Dr. Raffaela Schiavon, é a líder do Ipas Mexico e Sharif Hossain que é associada ao Population Council em Bangladesh.

3.3. Seleção de documentos e principais resultados

Um primeiro passo da pesquisa foi selecionar os documentos veiculados pelo consórcio em seu website para posterior análise. Para tanto, foram selecionados e privilegiados na análise sistemática e em profundidade os documentos da subseção “ ICEC Publications ” por conterem apenas publicações dos membros do ICEC, considerando o objetivo do estudo. Entretanto, documentos contidos nas outras seções também foram acessados por conterem material importante para a melhor compreensão da organização e da problemática do estudo, servindo, ainda, na contextualização. Estas outras seções possuem documentos publicados por parceiros do consórcio, os quais dão apoio material e político para o ICEC. A coleta deste material foi realizada por etapas. Nos meses de agosto e setembro de 2013 realizei visitas “flutuantes” para “captar os documentos” e em outubro de 2013 realizei visitas em maior profundidade já selecionando material. Novamente, em 2014, retornei a visitar o website em profundidade nos meses de março, abril e maio. Portanto, foram nestes períodos que selecionei os documentos a serem analisados.

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No caso dos documentos, os procedimentos de seleção e inclusão obedeceram aos seguintes passos: 1) leitura flutuante do conjunto de documentos (aproximadamente 133); 2) identificação de categorias temáticas recorrentes nos documentos lidos (gravidez “não planejada”, gravidez “não desejada”, gravidez na adolescência, saúde pública, segurança, eficácia, mecanismo de ação, venda OTC, direito ao acesso aos contraceptivos); 3) seleção dos documentos que abordavam prioritariamente os temas identificados como estratégicos para argumentação do consórcio. Assim, foram selecionados 83 documentos para análise em profundidade. Além disso, resgatei elementos de uma lista de e-mails utilizada por membros do consórcio que aceita como participante qualquer pessoa que se interesse pelas discussões do ICEC sobre CE. Entrei na lista de e-mail no dia 5 de abril de 2012, por orientação da coordenadora do grupo de pesquisa do qual participava, com o objetivo de acompanhar os debates deste consórcio. Até o dia 2 de maio de 2014 eu havia recebido 211 e-mails do consórcio. Nos meses de março, abril e maio de 2014 eu a visitei em maior profundidade para colher material para análise. Com certo tempo de participação na lista percebi que as discussões que ocorriam ali se assemelhavam muito aos elementos que eu estava encontrando no website , por isso, decidi focar nos documentos, mas sem deixar de acompanhar a discussão da lista, que foi muito importante na reflexão sobre os argumentos do ICEC. Nesta lista, selecionei os e-mails que apresentavam as temáticas que eu já havia identificado nos documentos.

Quadro 1: Número de documentos selecionados Seção do website Número de documentos selecionados About 3 What’s EC? 3 Country-by-Country Information 15 EC Issues 9 Publications and ICEC Publications 23 Resources Partner Publications 23 EC News 7 Total 83

Pode-se perceber que existem documentos de natureza distinta no website e com diferentes datas de publicação. A classificação dos tipos de documentos encontrados é feita pelo próprio consórcio e por seus parceiros e se dividem como demonstra o quadro abaixo.

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Até minha última visita em profundidade em maio de 2014, eles correspondiam a estas datas de publicação.

Quadro 2: Tipos de documentos e datas de publicações Seção do website Tipos de documentos Datas das publicações What’s EC? Página do website Não informado Country-by-Country Fichas técnicas 2005; 2006 e 2013 Information Casos de estudo EC Issues Página do website Não informado • Diretrizes médicas • Fichas técnicas • Declarações técnicas • Declarações Políticas ICEC 2003; 2007; 2009; 2010; • Documentos Publications 2011; 2012; 2013 ; 2014 temáticos de instrução para defensores da CE • Artigos científicos • Artigos científicos Publications • Fichas Técnicas and • Resumo de política Resources de intervenção • Informe sobre políticas públicas Partner 1998; 2003; 2004; 2005; • Relatórios Publications 2008; 2010; 2011; 2012 2013 • Declarações Políticas • Manuais técnicos, clínicos, políticos e jurídicos • Informativos • Boletim

EC News Notícias na página do website 2005; 2006; 2007; 2008

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A natureza distinta dos documentos remete ao fato de que o ICEC possui uma plataforma virtual estratégica para argumentar em prol dos CE. Nesse sentido seleciona e distribui os documentos no seu website de maneira a atender diferentes públicos-alvo e propósitos, sistematizando-o os materiais informativos atentos as diferentes linguagens e dimensões da problemática que envolve a difusão dos CE.

3.4. Análise dos documentos

Após a seleção e sistematização dos documentos e dados obtidos a partir do website realizei a análise aprofundada do seu conteúdo. Para esta análise foram importantes alguns níveis de interpretação levando em consideração o contexto sócio-histórico, institucional e a articulação dos dados e dos referenciais teóricos. Para Geertz (2012), o esforço interpretativo tem como tarefa essencial as descrições minuciosas: “o objetivo é tirar grandes conclusões a partir de fatos pequenos, mas densamente entrelaçados”. Comecei, portanto, fazendo o exercício de manter os elementos encontrados nos documentos em diálogo com o referencial teórico adotado. Seguindo o pensamento weberiano, o próprio cientista é quem atribui os aspectos do real e da história que examina, procurando estabelecer uma relação entre os fenômenos. Assim, produz o “tipo ideal”. Para Max Weber o fundamental é captar a especificidade dos fenômenos estudados e seus significados. Entretanto, sendo a realidade cultural infinita, o cientista precisa isolar, “da imensidade absoluta, um fragmento ínfimo” que considera relevante. Dessa forma, o ideal da objetividade e inteligibilidade nas ciências sociais é possível. Ao tipificar seus fenômenos, o cientista discrimina, organiza e, enfim, abstrai certos aspectos da realidade. Este princípio de seleção de fenômenos não é algo apenas subjetivo, portanto, mas se associa ao resultado da formação teórica e dos exercícios práticos do pesquisador (WEBER, 2003; BARBOSA e QUINTANEIRO, 2002; MARTINS, 2004). Ao elaborar o “tipo ideal”, o cientista escolhe, dentro de uma realidade infinita de alguns elementos do objeto a ser interpretado os considerados por ele mais relevantes. Esse processo de seleção vai acentuar, necessariamente, certos traços e deixar de lado outros, o que, segundo Barbosa e Quintaneiro (2002), confere unilateralidade ao modelo. O tipo ideal é um modelo simplificado do real, elaborado com base em traços considerados essenciais segundo critérios de quem pretende explicar um fenômeno. Dessa forma, foi realizada a leitura e análise interpretativa do material e finalmente sua tipificação para desenvolvimento da análise crítica.

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Também a partir da primeira leitura do material foram identificadas temáticas: gravidez “não desejada” e gravidez na adolescência como problemas de saúde pública; venda OTC de contraceptivos de emergência; segurança, eficácia e mecanismo de ação dos CE; direito aos CE, que busquei articular com a discussão das principais linhas argumentativas tipificadas. O primeiro resultado do processo de análise dos elementos argumentativos presentes nos documentos está representado no Quadro 3, a seguir .

Quadro 3: Principais argumentos para difusão dos CE Principais elementos argumentativos para expandir o Seção do website acesso à CE - é importante porque se trata de um produto seguro e eficaz para contracepção; - é importante para reduzir riscos para a saúde das What’s EC? mulheres; - é um direito das mulheres como meio indispensável a garantia de sua autonomia reprodutiva sua fecundidade. - redução de “gravidezes não desejadas"; - CE é uma segunda chance para evitar “gravidez não desejada”; - o acesso é importante por meio de farmácias, sob Country-by-Country information venda over the counter (OTC); - altas taxas de fecundidade e “gravidez não desejada”; - altas taxas de morbidade e mortalidade materna; - altas taxas de abortamentos. - CE não é um medicamento abortivo (ênfase no seu mecanismo de ação); - CE deve ser vendida de forma OTC em farmácias; EC Issues - essencial em casos de violência sexual; - essencial para adolescentes onde a gravidez pode ser “questão de vida ou morte”. - acesso importante porque se trata de um produto Publications seguro, eficaz e não abortivo (ênfase no mecanismo de and ICEC Publications ação); Resources - reduzir o número de abortamentos e “gravidezes não desejadas”;

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- contraceptivo estratégico para garantia dos direitos humanos e o imperativo da saúde pública; - segunda chance para prevenção da gravidez; - reduzir os riscos de “gravidez não desejada”; - reduzir epidemia de “gravidez não desejada” e abortamentos em países em desenvolvimento. - o acesso aos CE leva a benefícios de saúde, sociais e econômicos para mulheres e sua família; - redução de “gravidezes não planejadas”, taxas de abortamentos e número de crianças negligenciadas e abandonadas; - acesso importante porque se trata de um produto seguro, eficaz e não abortivo (ênfase no mecanismo de Partner ação); Publications - direito de escolha, acesso é um direito humano; garantia de direitos reprodutivos; - benefícios para saúde pública; - aliviar o problema (social e econômico) da gravidez na adolescência; - gravidez na adolescência é um problema de saúde pública; - redução de abortamentos e gravidezes “não desejadas”; - ponto de entrada para contracepção regular; EC News - é uma questão de saúde pública e direitos humanos; - direito das mulheres.

Logo após, seguiu-se a análise em profundidade e crítica do material a partir dos referenciais teóricos elegidos. Conclui que o ICEC possui três fortes linhas argumentativas cujos elementos se entrelaçam e reforçam-se entre si: o argumento “sanitário”; o argumento “farmacêutico” e o argumento dos “direitos”, os quais são desenvolvidos no próximo capítulo. A seguir busquei identificar as Organizações que são parceiras do ICEC, encontrando o total de 25. Para melhor compreensão dos atores e de suas articulações realizei visita nos websites de cada uma das organizações. Nota-se que o ICEC possui parceiros tradicionais no fornecimento de contraceptivos ao redor do mundo, como é o caso do Population Council e IPPF, por exemplo, fundados na década de 1950 em um contexto de amplo fornecimento de contraceptivos para a América

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Latina. Além disso, o país de origem destas organizações e suas sedes atuais nos revelam o contexto sociocultural em que estão inseridas.

Quadro 4: Parceiros do ICEC - ano de fundação, país de origem e sede da organização.

Sede ONG Ano de fundação País de origem Atual Population Council 1952 EUA EUA IPPF (International Planned Parenthood 1952 Índia Inglaterra Federation) IPPF (International Planned Parenthood 1954 Índia EUA Federation)/Western Hemisphere Region Pathfinder International 1957 EUA EUA ARHP - Association of Reproductive Health 1963 EUA EUA Professionals PAI Population Action International 1965 EUA EUA Planned Parenthood Federation of America 1966 EUA EUA CONRAD - Contraception Research and 1968 EUA EUA Development FCI - Family Care International 1968 EUA EUA Guttmacher Institute 1968 EUA EUA Bpas - British Pregnancy Advisory Service 1968 Inglaterra Inglaterra PATH 1970 EUA EUA PSI Population Services International 1970 EUA EUA FHI 360 - Family Health International 1971 EUA EUA HRP - Special programme of research, Cooperação development and research training in human 1972 Suíça Internacional reproduction. EUA CFC - Catholics for Choice 1973 EUA

Ipas Health, access, rights 1973 EUA EUA JSI (John Snow Inc.) Research & Training for 1978 EUA EUA Women’s Health DKT international 1989 Índia EUA CRR - Center for Reproductive Rights 1992 EUA EUA Meridian Group International 1997 EUA EUA Ibis Reproductive Health 2002 EUA EUA Gynuity Health Projects 2003 EUA EUA Woman Care Global 2009 Inglaterra EUA Prosalud Interamericana Foundation 2003 EUA EUA

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CAPÍTULO 4: O ICEC e a missão de expandir o acesso aos Contraceptivos de Emergência para os países em desenvolvimento

O “foco nos países em desenvolvimento” tornou-se um aspecto central no decorrer da pesquisa. Desta forma, foi importante refletir sobre isto, pois os argumentos do ICEC para expandir o acesso aos CE se voltam especialmente para estes países. Minha intenção neste capítulo é discutir o “foco nos países em desenvolvimento”, e o faço a partir da análise do conjunto de documentos de três seções do website: About, Partner Publications e Country-by- Country Information . Esta última seção possui uma subseção específica ( In-Depth Country Information ) que disponibiliza documentos sobre países em desenvolvimento. Também importante para esta discussão é a recuperação da formação do ICEC e identificação de seus parceiros (Apêndice 1), que se encontram notadamente em um contexto norte-americano.

4.1. O Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência

O estudo e o desenvolvimento do potencial contraceptivo de determinados hormônios, bem como sua introdução em diversos países, abriu espaço para a articulação de alianças – ou, no sentido conferido por Latour (2007), para a constituição de “associações” importantes. Para falar delas, apresento a seguir uma discussão sobre a formação do ICEC e as alianças firmadas que fundam este Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência,a fim de atingirem seus objetivos. Foi com o objetivo de “estabilizar” os CE, estes “objetos sociotécnicos 12 ” – na tentativa de estabilizar e resolver embates sobre seus efeitos individuais (sobre a saúde sexual e reprodutiva, a sexualidade e a fertilidade) e coletivos (demográficos, econômicos, políticos) e fazer com que essa “rede” de atores e de produção de fatos tomasse grandes proporções (LATOUR, 1983; MANICA, 2009), que no mesmo ano em que acontecia a IV Conferência Mundial sobre as Mulheres em Pequim, em 1995, a Fundação Rockefeller 13 convocou uma reunião com vários grupos interessados em promover a contracepção de emergência como uma alternativa para o aborto, especialmente nos países em desenvolvimento (PRESCOTT, 2011, p.103). Esta reunião foi realizada em Bellagio na Itália, com a presença de vinte e

12 Para Latour (1983), os objetos são materializações de processos sociotécnicos, de rede de atores que convergem seus interesses na intenção de produzir um objeto. 13 A Fundação Rockefeller é uma fundação filantrópica historicamente preocupada com questões de planejamento familiar (CLARKE, 1998) - http://www.rockefellerfoundation.org/about-us.

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quatro especialistas de todo o mundo, incluindo o pesquisador brasileiro Dr. Elsimar Coutinho, da Universidade Federal da Bahia, que atuou como presidente da Conferência. Após esta conferência foi criada a “Declaração de Consenso sobre a Contracepção de Emergência”. Neste documento, os especialistas declaram que é papel dos governos, agências intergovernamentais e organizações não governamentais assegurar que os CE sejam inclusos nas políticas de planejamento reprodutivo e nas Listas de Medicamentos Essenciais. A presença de um brasileiro, Dr. Elsimar Coutinho, como ator importante que coordena a articulação para fundação do ICEC, bem como seu envolvimento com as agências internacionais supracitadas, aponta certo entendimento comum das organizações fundadoras da necessidade de um controle mais eficiente sobre a natalidade nos países em desenvolvimento, consenso que foi e continua se configurando como um tema crucial. O envolvimento de Elsimar Coutinho com a Fundação Rockefeller aparece já no início de sua vida profissional. Ele se apresentava como um ator importante no meio acadêmico e político sobre contraceptivos e reprodução humana agindo nos termos das organizações internacionais, ou seja, afinado com as metas de controle populacional, participando de reuniões no FDA para aprovação de contraceptivos e também para assegurar formas de sua distribuição para os países em desenvolvimento. Ele também já havia sido fundador junto com Sheldon Segal (presidente do Population Council em 1986) do projeto South-to-South, em 1986, que seria uma instituição voltada para financiamento de pesquisas em países em desenvolvimento (MANICA, 2009). Estratégias e decisões políticas resultavam da configuração deste “problema” dos “países em desenvolvimento”, e os contraceptivos foram, em grande medida, parte das soluções almejadas. Além da indústria farmacêutica, comitês internacionais (IPPF, Population Council , OMS) financiavam uma profícua agenda de pesquisas, que garantia que o tema da contracepção se constituísse como uma área de conhecimento científico (dentro dos campos da ginecologia, endocrinologia e reprodução humana). A amplitude do desenvolvimento de métodos hormonais para contracepção de emergência desde a década de 1970 é, portanto, resultante do agenciamento desses interesses, verbas, substâncias, pesquisas e pesquisadores (MANICA, 2009). Ao todo, sete organizações estavam envolvidas nesta conferência que posteriormente fundam o Consórcio: The Concept Foundation , International Planned Parenthood Federation (IPPF ), Pacific Institute for Women’s Health , Pathfinder International , PATH (Program for Appropriate Technology in Health), Population Council, World Health Organization Special

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Programme of Research, Development, and Research Training in Human Reproduction (WHO/HRP). É importante também destacar que o consórcio é composto, atualmente, por pessoas que representam tais organizações e formam um comitê que o dirige, chamado de “Steering Committee” : Elizabeth Westley é a Coordenadora do ICEC e faz parte da Family Care International , a organização que atualmente hospeda o ICEC; Alan Lambert é o presidente e fundador da PROSALUD Interamericana ; Christine Bixiones é Associada Sênior do conselho técnico da Population Services International ; Elisha Dunn-Georgiou é a Vice Presidente de advocacy da Population Action International ; Martha Brady, é Associada Sênior no Population Council ; Dra. Raffaela Schiavon, é a líder do Ipas Mexico e Sharif Hossain que é associada ao Population Council em Bangladesh. Também existem os diretores regionais: Kelly Cleland é pesquisadora na Universidade de Princeton, no escritório de pesquisas populacionais e diretora executiva do American Society of Emergency Contraception (ASEC), formado em 1997; Larissa Arroyo, coordenadora do Consorcio Latino Americano de Anticoncepción de Emergencia (CLAE), formado em 2000; Angel Foster é associada ao Ibis Reproductive Health e também serve como coordenadora da rede Regional de Contracepção de Emergência do Mundo Árabe (Arab World Regional EC Network – Arab World) , formado em 2003; e Saumya RamaRao, Associada Sênior ao programa de saúde reprodutiva no Population Council , onde coordena a rede de CE para África (ECAfrique), formado em 2003. Além disso, mais recentemente em 2012, o Consórcio Europeu sobre Contracepção de Emergência (ECEC – European Consortium for Emergency Contraception) foi formado sob a coordenação de Cristina Puig. São estes membros regionais que atuam coordenando localmente as ações do ICEC que são apoiadas política e financeiramente pelas organizações já citadas, dentre outros financiadores. Além destes diretores, o ICEC reúne um grupo técnico consultivo “Technical Advisory Group” . Este é um grupo de cientistas que, segundo a seção About, não são afiliados ao ICEC, mas fornecem consultorias técnicas sobre contraceptivos de emergência para o consórcio. Os pesquisadores são: Diana Blithe do “National Institute of Child Health and Human Development” (NICHD), nos EUA; Francine Coeytaux co-fundadora do Pacific Institute for Women’s Health e fundadora do Reproductive Health Technologies Project e dirigiu a iniciativa sobre Contracepção de Emergência da Compton Foundation ; Daniel Davis é um revisor médico da Divisão de produtos reprodutivos e urológicos do FDA; Aníbal Faúndes, professor de obstetrícia e ginecologia da Universidade de Campinas; Ian Fraser é professor de medicina reprodutiva na Universidade de Sydney; Helena Von Hertzen é

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consultora pela Concept Foundation ; Jeff Spieler, conselheiro sobre população e saúde reprodutiva foi chefe de pesquisa sobre esta temática na USAID; James Trussell, demógrafo e diretor do escritório em pesquisas sobre população na Universidade de Princeton; Paul Van Look, consultor independente sobre saúde sexual e reprodutiva, foi diretor do departamento de pesquisa em saúde reprodutiva da OMS. O ICEC é uma estrutura organizacional peculiar. Agrega entre seus membros o setor privado, representado por indústrias farmacêuticas e o setor público, fazendo parcerias com governos de diversos países. Além disso, integram o ICEC organizações não governamentais diversas, feministas, de direitos reprodutivos, com destaque para as de planejamento familiar (Quadro 4). Cada elemento da estrutura organizacional do ICEC possui uma especificidade na defesa da proposta e confere apoio financeiro e político para que um novo contraceptivo como os CE, pudessem ser desenvolvidos. De acordo com Mastroianni et al (1990), qualquer elemento que diminua a rentabilidade para o setor privado irá diminuir o seu papel na rede organizacional para produção de novos contraceptivos. Da mesma forma, as ONG podem obter sucesso até que obtenham fundos individuais, de fundações privadas ou de governos. Qualquer elemento que diminua a ajuda governamental e de fundações irá reduzir o envolvimento de determinada organização nas atividades. O ICEC representa um conjunto organizacional bem sucedido no desenvolvimento e introdução de um novo contraceptivo, reunindo uma variedade de expertises – desde o conhecimento biomédico até a habilidade de lidar com complexos requerimentos regulatórios e atividades de propaganda. Segundo Mastroianni et al (1990), as atividades das ONG não terminam no desenvolvimento de um novo método, mas é necessário que este método seja introduzido nos países. Assim, o ICEC se propõe, além de outras atividades de introdução dos CE, a registrá-los nos sistemas regulatórios no mundo inteiro e monitorar sua difusão, mantendo seu foco nos “países em desenvolvimento”, como ilustra a figura abaixo.

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Figura 3: Registro de CE no mundo. Material website ICEC. Westley, Rich e Lawton. The Unfinished Agenda: Next Steps to increase access to emergency contraception , 2013.

4.2. “Nossa missão permanece crucial: expandir o acesso aos CE no mundo, com foco nos países em desenvolvimento”

Os documentos do ICEC constantemente fazem menção à necessidade de levar CE para os “países em desenvolvimento”. Essa expressão se associa com preocupações do consórcio em combater o crescimento populacional e a perpetuação da pobreza. O documento “By choice, not by chance” organizado pela grande parceira do consórcio com o UNFPA, agência das Nações Unidas para o desenvolvimento, localizado na subseção Partner Publications, diz sobre a preocupação com o crescimento da população:

Last year, the world’s population surpassed 7 billion and it is projected to reach 9 billion by 2050. Population growth is generally highest in the poorest countries, where fertility preferences are the highest, where governments lack the resources to meet the increasing demand for services and infrastructure, where jobs growth is not keeping pace with the number of new entrants into the labour force (UNFPA, By choice, not by chance. 2012, p. 17)

Além disso, advogam pela contracepção de emergência como parte do “planejamento familiar”, o qual seria a intervenção mais efetiva e custo-efetiva para acumular capital humano e “aliviar” a pobreza. Assegurar o planejamento reprodutivo por meio dos CE para os membros do consórcio é uma medida importante para que os países atinjam seus objetivos de desenvolvimento.

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Senanayake (1999) corrobora o observado neste estudo quando diz que o ICEC agrega muitas agências do setor público trabalhando em cooperação com setores comerciais para atingir um único objetivo que é o de expandir o acesso aos CE, introduzi-los e comercializá- los pelo mundo, com foco nos países em desenvolvimento. O próprio website do ICEC chama atenção em sua página inicial:

In 1996, the year ICEC was founded, only a handful of countries had a “dedicated” Emergency Contraception (EC) product on the market. Now women in over 140 countries can buy emergency contraception – sometimes known as the morning after pill - and in 60 countries, EC is readily available over the counter. ICEC and its member organizations have played a key role in introducing EC in a wide range of settings. Still, women’s access to EC is far from assured, and our mission remains critical: to expand access to EC worldwide, with a focus on developing countries (Página Inicial no website do ICEC).

Os primeiros parceiros que ajudaram o consórcio doando recursos para projetos e atividades de introdução dos CE foram: Packard, Rockefeller, Compton, Summit e Gerdobe Foundation. Com essas doações iniciais, o Consórcio pode dar continuidade aos seus trabalhos e teve seu objetivo facilitado, contribuindo para a expansão do planejamento reprodutivo pelo mundo (SENANAYAKE, 1999). Além disso, outros financiadores dos projetos do Consórcio, como mostra Senanayake (1999), foram muito importantes para financiar e tornar seus interesses viáveis, como por exemplo, a USAID ( United States Agency for International Development ) e a UNFPA ( United Nations Population Fund ou FNUAP Fundo de População das Nações Unidas ). Estas duas agências, a primeira do governo americano e a segunda das Nações Unidas, financiam muitas das organizações parceiras do ICEC (Quadro 4), com recursos destinados a viagens e manutenção de quadro de funcionários, por exemplo (SENANAYAKE, 1999). A fim de alcançar com êxito seus objetivos e interesses, o ICEC também possui parceria com o setor privado representado pela Gedeon Richter, uma empresa farmacêutica húngara que já na década de 1970 coordenava pesquisas na América Latina sobre um produto contendo apenas progestina (WYNN, 2012). A Concept Foundation teve um papel específico em atuar como mediadora entre os membros do consórcio e a Farmacêutica Gedeon Richter, a qual se tornou parceira do ICEC no setor privado já em 1996. Esta ONG negocia licenças com autoridades de países em desenvolvimento para assegurar que o produto será disponibilizado no setor público com o valor mais baixo possível. Forneceu todo o suporte para a empresa farmacêutica ao selecionar os países em desenvolvimento e também na propaganda do produto. O acordo foi de cobrir 30 a 40 países em desenvolvimento, no que diz respeito ao registro do contraceptivo. Além disso,

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os direitos autorais referentes ao produto produzido pela Gedeon Richter (Postinor ®) e vendidos no setor privado destes países, seriam repassados para a Concept Foundation . Esta arrecadação serviria para promover o trabalho da ONG e o trabalho do ICEC em expandir os CE (SENANAYAKE, 1999). O contrato firmado com a Gedeon Richter consistia numa via de mão dupla: o laboratório húngaro produziria o produto dedicado à CE e o ICEC forneceria informações sobre o produto, facilitaria o registro e trabalharia para incorporar os CE em normas nacionais (de cada país) e manuais. O foco no acesso para vítimas de violência sexual foi uma prioridade na expansão do acesso e uma via estratégica para ganhar apoio político e incorporar os CE nas normas sanitárias dos países (WYNN, 2012). Como é dito no website na seção About, subseção History, o ICEC começou a trabalhar a partir de quatro países: Sri Lanka, México, Indonésia e Quênia para distribuir o Postinor ®, um novo tipo de CE contendo apenas levonorgestrel, produzido pela Gedeon Richter. Segundo o consórcio, apoiando-se em estudos de investigação randomizada 14 , realizada em Hong Kong com apoio da OMS, no qual se comparou a eficácia do regime Yuzpe com Levonorgestrel (0,75 mg em duas doses de 12 horas de intervalo) na contracepção pós-coito, este novo contraceptivo apresentava menos incidência de náuseas, vômitos e fadiga (WYNN, 2012). De acordo com Prescott (2011), Sharon Camp, primeira coordenadora do ICEC, acreditava que à medida que o consórcio lançava o contraceptivo nos países em desenvolvimento, se tornava clara a necessidade de se aprovar o produto no FDA, uma agência que tinha a fama de ser a instituição regulatória mais “resistente” do mundo. Os membros do ICEC acreditavam que ao aprovar o produto no FDA iriam acelerar a adoção deste método contraceptivo por todo o mundo. Entretanto, por questões políticas, a Gedeon Richter não concordou em levar o produto aos Estados Unidos, mas forneceria secretamente as substâncias para alguma empresa farmacêutica norte-americana. Como nenhuma empresa do país estava disposta a lançar um produto tão controverso (nem mesmo a Gynetics que já produzia o Preven ® - Yuzpe - estava disposta a lançar um novo contraceptivo ), Camp fundou sua própria empresa em janeiro de 1997, a Women’s Capital Coorporation (WCC) com o interesse de comercializar CE contendo apenas levonorgestrel – o Plan B ® (PRESCOTT, 2011, p.103). Após firmar estas alianças com o setor privado e com as organizações internacionais, em 1999 o FDA respondeu à petição criada pela Packard Foundation declarando a segurança

14 von Hertzen, H; Piaggio, G; Ding, J et al. Low dose of mifeprestone and two regimens of levonorgestrel for emergency contraception: a WHO multicentre randomised trial. Lancet, 360(9348), 1803-10, 2002.

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e eficácia da CE contendo apenas levonorgestrel, o Plan-B®. O registro do produto dedicado a CE continuou e mais empresas farmacêuticas começaram a se interessar em produzir o produto contendo apenas esta progestina. Em 1999 a francesa HRA Pharma lançou o Norlevo ® e também começou a trabalhar com organizações não governamentais para registrar e comercializar seu produto em países em desenvolvimento (WYNN, 2012; PRESCOTT, 2011). As organizações internacionais e de planejamento familiar tiveram um grande impacto na regulação da sexualidade e reprodução não só no Brasil como em toda a América Latina ou nos países de “terceiro mundo” ou em “desenvolvimento”. De acordo com Bonan (2005), estas organizações abriram brechas para posicionamentos tanto pró-natalistas, para uma visão maternalista da mulher e contribuíram para ideia de procriação como finalidade maior da sexualidade feminina, quanto anti-natalistas com a emergência da preocupação com a “explosão demográfica”. O predomínio do enfoque demográfico destes programas num contexto de poucas condições democráticas e transparentes como foi o contexto da década de 1960 até meados da década de 1980 no Brasil, significou um reforço do poder e autoridade médica e em alguns casos estatal sobre o corpo e a fecundidade feminina. Isto é bem demonstrado por Manica (2009) em sua tese de doutorado sobre a trajetória do Dr. Elsimar Coutinho. Analisando o Quadro 4, anteriormente apresentado, as instituições parceiras, suas sedes e origem, para refletir sobre esta intenção de expandir os contraceptivos de emergência para os países de “terceiro mundo”, percebe-se que a maioria dos parceiros do ICEC possuem suas sedes em terras norte-americanas, exceto três delas: Bpas – British Pregnancy Advisory Service ; IPPF e WHO/HRP – Special Programme of Research, Development and Research Training in Human Reproduction . Além disso, apenas cinco parceiros não tiveram origem nos Estados Unidos: Bpas – British Pregnancy Advisory Service ; IPPF; IPPF/ Western Hemisphere Region ; WHO/HRP – Special Programme of Research, Development and Research Training in Human Reproduction ; DKT International e Women Care Global . De acordo com o documento produzido pela UNFPA “By choice, not by chance” (subseção Partner Publications ) de 2012, os Estados Unidos é o país que mais contribui para o “planejamento familiar” internacionalmente. Segundo o documento existe uma lista de “graduação” para os países de acordo com sua taxa de fecundidade. Dependendo do total desta taxa os países são colocados ou retirados dessa lista e recebem menos ou mais atenção e suporte dos Estados Unidos.

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The United States, for example, a major contributor to international family planning, has placed a growing number of countries on a “graduation” list. As countries “graduate”, they are seen as no longer requiring the same level of support they once enjoyed. Countries slated for graduation are those with total fertility rate of 3.0 or less and a modern contraceptive prevalence rate of 55 per cent or more. Countries in Latin America have been especially affected by the graduation process, since some of the region’s ministries of health have not filled the void as United States funding ends or is phased out (UNFPA, By choice, not by chance. 2012, p. 90).

Para problematizar o lugar do ICEC junto a seus parceiros internacionais, é importante trazer o aspecto dessa discussão ao longo das últimas décadas. A partir de 1960 quando a questão populacional passou a ser central na política externa norte-americana para os países do “terceiro mundo”, a ONU (Organização das Nações Unidas) e o governo norte-americano atuavam intensamente para que os países adotassem programas de controle de natalidade. Do ponto de vista do governo norte-americano “controlar a natalidade, evitar a explosão demográfica” passa a ser considerado algo do mesmo grau de importância que o combate às doenças. A partir de 1965 foram fundadas agências e organizações internacionais para tratar dos problemas populacionais: financiadas por países doadores (como a USAID), por doadores particulares (Rockefeller), agências intergovernamentais (UNFPA) e internacionais não governamentais (como a IPPF) (MANICA, 2009). Para Sobrinho (1993), a revolução Cubana, em 1959, provocou mudanças na política externa norte-americana direcionada para a América Latina. Estas mudanças ocasionaram o que o autor designa como “continentalização” – a concepção de que os países latino- americanos compartilhavam problemas políticos, militares, ecnonômicos, etc.– e alteraram a política dos EUA que antes envolvia intervenção militar para outra que incorporasse “ajuda econômica” e “apoio material ao desenvolvimento econômico social”. De acordo com este autor, o subdesenvolvimento latino-americano se tornava uma questão de segurança nacional para os Estados Unidos. Esperava-se que as universidades latino-americanas, especialmente as faculdades de Medicina, assegurassem a hegemonia norte-americana. O autor cita o documento “ Report of working group on education in medicine and related fields in Latin America, Africa and Asia” , de 1961, elaborado por representantes do Departamento de Estado dos Estados Unidos e também por membros da OPAS (Organização Pan-Americana de Saúde). Nele destaca-se que a medicina deveria contribuir não apenas para a saúde pública, mas também para fortalecer estruturas econômicas e sociais das nações em desenvolvimento e também para a segurança dos Estados Unidos. O working group mostrava no documento a insegurança que motivara sua existência declarando que a democracia não poderia florescer em atmosferas de pobreza e doenças e os Estados Unidos teriam o “dever”, para consigo

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próprios e para com as nações em desenvolvimento, de “ajudar” a fortalecer tais nações, sendo o controle populacional uma peça chave para este “fortalecimento” (SOBRINHO, 1993, p.83). A década de 1960 pode ser vista como marco mundial de intensificação internacional de promoção de controle de natalidade. Como aponta Sobrinho (1993), o ano de 1965 é emblemático. É o ano em que o IPPF leva ao senado norte-americano um plano para discutir uma legislação referente à população; também neste ano a ONU, através de suas agências, começou a atuar na mesma direção. Em 1965 o Conselho Econômico e Social da ONU deu respaldo a um grande programa que havia sido preparado pela Comissão de População da ONU. Este programa também pretendia a intensificação das atividades de planejamento reprodutivo no Terceiro Mundo. Além disso, neste mesmo ano, ocorreu a Conferência Mundial de População em Belgrado também promovida pela ONU (SOBRINHO, 1993, p. 95). A partir do ano de 1965, com uma mudança de postura do governo norte-americano agora abertamente favorável a programas de controle de natalidade e em conformidade com as mudanças de perspectiva colocadas em pauta pela ONU, foram fundadas diversas organizações internacionais dedicadas ao apoio de atividades populacionais de diversos tipos, desde pesquisas acadêmicas até a distribuição direta de contraceptivos, das quais a mais importante é a IPPF, patrocinadora das atividades da BEMFAM (Sociedade Civil de Bem- Estar Familiar no Brasil) (SOBRINHO, 1993, p. 95). Além disso, de acordo com Berquó (2014, p.19), em 1966 vários países propuseram na Assembléia Mundial de Saúde que a OMS deveria incluir em suas atividades a provisão e assessoria para elaboração, execução e avaliação de programas de planejamento reprodutivo. Foi aprovada então uma proposta menos radical, da direção da OMS, segundo a qual a organização poderia, quando solicitada pelos membros, oferecer tal assessoria como parte de serviço organizado de saúde. O fato de a OMS já ter uma infraestrutura bem sucedida para o controle de doenças ajudou a criar uma infraestrutura essencial à implantação dos programas de “planejamento familiar” ao redor do mundo (BERQUÓ, 2014, p.19). As conferências da ONU a partir da década de 1970 tornam explícita a discussão “bipolar” em relação à temática de população. A Conferência Mundial de Bucareste em 1974 revelou, por exemplo, grande debate entre os “controlistas” e “não-controlistas”. Já na Conferência Internacional de População do México, em 1984, foi enfatizado pela UNFPA a necessidade da estabilização da população mundial – o “crescimento zero” dentro de um

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período mais curto possível. Para o UNFPA esta estabilização tornaria mais fácil aos países em desenvolvimento melhorar seus padrões de vida (BERQUÓ, 2014, p.20). É importante reiterar, entretanto, que diversos esforços teóricos e políticos aconteceram no sentido de criticar à perspectiva neomalthusiana. Estes desaguaram na Conferência Mundial sobre População e Desenvolvimento , no Cairo, em 1994 (CIPD), conferindo a dimensão reprodutiva uma positividade e ligada à ideia de liberdade e direitos sociais, e nesse sentido, deveres de prestações das nações, ao referir-se como um conjunto de direitos humanos (BERQUÓ, 2014; CÔRREA, 2014). Atualmente, um dos grandes financiadores norte-americanos das ONG que constituem o ICEC é a Bill and Melinda Gates Foundation (BMGF) (ver Apêndice 1). Hoje, a BMGF é a maior fundação filantrópica do mundo e possui uma grande estratégia para o “planejamento familiar” voltado para os países em desenvolvimento. A expansão da contracepção ao redor do mundo é uma das “bandeiras” levantadas pela BMGF, tendo como principal porta voz a Sra. Melinda Gates. De acordo com o documento “By choice, not by chance” (2012, p. iii), disponibilizado na seção Partner Publications, a UNFPA e BGMF possuem uma parceria que envolve $2,6 bilhões de dólares para financiar iniciativas sobre planejamento familiar para os países em desenvolvimento até o ano de 2020. A publicação The Unfinished Agenda: Next Steps to increase access to emergency contraception de 2013 publicada na seção Partner Publications foi realizada em parceria do ICEC com a Bill and Melinda Gates Fund. Essa publicação, direcionada para as ONG de planejamento familiar, governos e ativistas pelos CE (Apêndice 2), mostra um passo-a-passo sobre como introduzir o contraceptivo em um país: 1) promover informações precisas, dissipando mitos sobre CE; 2) criar contextos políticos nacionais para assegurar o engajamento do setor público para fornecê-la, registrando ao menos um produto, incluindo os CE nas listas de medicamentos essenciais (LME); 3) assegurar que fornecedores distribuam os CE para as mulheres por meio de treinamentos; 4) Aumentar conhecimento sobre CE e sua demanda nas comunidades; 5) Requerer o acesso aos CE para o cuidado pós-estupro; 6) Tornar os CE consistentemente viáveis em contextos de crise; 7) Capitalizar mais o potencial de marketing social sobre CE, isto é, torná-los mais disponíveis a partir das organizações de planejamento familiar; 8) Definir e preencher lacunas sobre o acesso aos CE. Segundo esta publicação, estes passos são fundamentais e precisam ser dados para expandir os CE para mulheres que vivem em países menos desenvolvidos, consideradas nesses documentos como as mais vulneráveis:

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Investments in EC Access have yielded great dividends: women in almost all countries can purchase EC, global policies and guidelines include EC, and many manufacturers supply EC. But at the country and local levels, access has stalled, especially for the most vulnerable – women who are poor, live in less developed countries, face sexual assault, or are affected by conflict. Advocates, donors, researchers, governments, and service delivery organizations must take the next steps so that all women can access the full range of contraceptive methods, including emergency contraception (ICEC, The Unfinished Agenda: Next Steps to increase access to emergency contraception . 2013, p. 10).

No Brasil, a BGMF também firmou parceria com o Ministério da Saúde. De acordo com notícia recente publicada no website da OMS/OPAS 15 , o MS brasileiro, representado no ano de 2012 pelo Ministro Alexandre Padilha, assinou na abertura do Encontro com a Comunidade Científica, no dia 16 de abril de 2012, uma parceria com a BMGF para investimento desta fundação na Rede Cegonha 16 . O Ministério e a Fundação concordaram em investir R$ 14,7 milhões (50% do financiamento advém da BMGF e 25% do MS) em pesquisas na área de saúde materna e neonatal. No que diz respeito aos CE neste contexto da Rede Cegonha, neste mesmo ano de 2012, o MS lançou um protocolo permitindo aos enfermeiros(as) a dispensação destes contraceptivos, facilitando seu acesso na rede pública de saúde para mulheres que deles necessitarem (BRASIL, 2012). Ao contrário da histórica política norte-americana que se apoiava no tom explicitamente malthusiano do controle populacional, a BMGF parte para uma defesa do planejamento reprodutivo a partir da lógica da ajuda filantrópica para que as mulheres possam ter “autonomia” e “liberdades de escolhas”, colocando os métodos contraceptivos como uma saída para que as mulheres possam realizar seus objetivos de vida para além da maternidade. O que se observa é o que Haraway e colaboradores (2013) chamam de uma “informática de dominação” para explicar que estamos no meio de uma transição de sentidos das velhas e confortáveis dominações hierárquicas para novas redes de controle. De acordo com a autora, as estratégias de controle em relação a este argumento do “controle populacional” dão lugar a uma nova linguagem que se “traveste” numa abordagem sobre “liberdades”, mas se expressa também em termos de controle, sobretudo, nas palavras de Haraway et al (2013):

15 http://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=2815:ministrio-da-sade-assina- parceria-com-a-fundao-bill-&-melinda-gates-&catid=844:bra-02-c-noticias&Itemid=455.

16 De acordo com a Portaria n° 1.459 de 2011, que institui a Rede Cegonha no Brasil, ela consiste numa rede de cuidados que visa assegurar à mulher o direito ao planejamento reprodutivo e à atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério, bem como à criança o direito ao nascimento seguro e ao crescimento e ao desenvolvimento saudáveis.

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As estratégias de controle irão se concentrar nas condições e nas interfaces de fronteira, bem como nas taxas de fluxo entre fronteiras, e não na integridade de objetos supostamente naturais [...] Por exemplo, as estratégias de controle aplicadas às capacidades das mulheres de dar à luz a novos seres humanos serão desenvolvidas em uma linguagem que se expressará em termos de controle populacional e de maximização da realização de objetivos, concebendo-se estes últimos como um processo individual de tomada de decisão (HARAWAY et al, p. 2013, p. 62).

A preocupação do ICEC com o controle da fecundidade das populações, principalmente nos “países em desenvolvimento”, se revela na coleção de documentos produzidos pelos seus próprios membros e disponibilizados no website. Estes documentos se prestam a informar o ICEC, seus afiliados e um público de profissionais de saúde, gestores, ativistas em prol dos CE, sobre como o contraceptivo está sendo utilizado no mundo e sua distribuição e assim apontam desafios para que suas intervenções nestes países possam ser aprimoradas. Na seção Partner Publications foi encontrado um documento produzido pela Reproductive Health Supplies Coalition , intitulado Product Brief: Emergency Contraception Pills, de 2012 que estrategicamente justifica as intervenções do consórcio nos países em desenvolvimento alegando que muitos desses países precisam dos CE porque muitos casais estão em “risco de uma gravidez não desejada ou não planejada”. Segundo o documento, nestes contextos em desenvolvimento é baixa a taxa de acesso a contraceptivos, e alta as necessidades não atendidas de planejamento reprodutivo:

Emergency oral contraceptive pills are a post-coital contraceptive option, allowing women to prevent pregnancy after intercourse has occured. Low contraceptive- prevalence rates along with high levels of unmet need for family planning in many developing countries indicate a high frequency of unprotected sexual relationships. As a result, many couples are at risk for an unplanned and/or unwanted pregnancy (ICEC website. Reproductive Health Supplies Coalition. Product Brief: Emergency Contraception Pills , 2012, p. 1).

Na seção do website intitulada “Country-by-Country information” , mais especificamente na sua subseção “ In-Depth Country Information” (Informações em profundidade sobre países - em desenvolvimento), estão disponibilizados documentos produzidos pelo Consórcio e que abordaram questões como: políticas nacionais e guias sobre CE, conhecimento e uso pelas mulheres, opinião de provedores e líderes, a disponibilidade dos CE no mercado dos países. Estão listados: Bangladesh, Etiópia, Índia, Indonésia, Kenya, América Latina, Peru, México, Nigéria, Paquistão, Ruanda, Senegal, Sri Lanka e Zambia. Elegendo o caso do México, observa-se o tom “colonizador” e “filantrópico”. No documento referente ao México, da seção Country-by-Country information , “ Navigating a

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Politically Sensitive Landscape , 2006”, o ICEC informa que os gestores mexicanos estavam apreensivos em disponibilizar os CE, mesmo com as altas taxas de “gravidezes não desejadas” e as complicações de abortos ilegais. Como resultado dessas “preocupações”, o consórcio implementou estratégias para introduzir os CE em programas de planejamento reprodutivo. Neste “caso de estudo”, como o documento assinala, a intervenção do ICEC no México é considerada pelo consórcio como um caso emblemático de sua atuação nos “países em desenvolvimento”. Foi o primeiro país da América Latina e Caribe a receber um grande leque de ações financiadas pelo ICEC e pelas organizações de planejamento reprodutivo para introdução deste contraceptivo. O Consorcio Latino-Americano de Anticoncepción de Emergencia (CLAE) foi criado em 2000 em Nova York e em 2001 organizou uma reunião na Cidade do México para um planejamento estratégico de ações que o CLAE viria a desenvolver na região. A escolha do México foi estratégica, pois o consórcio considerava-o como tendo uma cultura de forte interação entre sociedade civil e organizações não governamentais. Além disso, o fato de o México utilizar normas internacionais, ditadas pelo NAFTA ( North American Free Trade Agreement ), para regular diferentes aspectos da saúde no setor público e privado, facilitaria as ações do consórcio e inclusive a questão crucial da parceria com as empresas farmacêuticas para registrar a CE localmente e incluí-la na lista de medicamentos essenciais mexicana (WESTLEY e SCHIAVON, 2012). Em 1990, o ICEC adotou uma estratégia, a qual chama de “demanda orientada” para introduzir os CE nos programas de planejamento reprodutivo neste país. Dois parceiros coordenaram as ações: Population Council e Pacific Institute for Women’s Health (PIWH) e agiram com organizações locais para treinar pessoas para prestação de serviços na entrega do contraceptivo. Também criaram campanhas de marketing direcionadas para as consumidoras e disseminaram pesquisas para a comunidade científica e para o Ministério da Saúde mexicano. Mexican women experience a high rate of and complications from illegal abortion. As a result of this concern, beginning in the late 1990, the Consortium adopted a demand-oriented strategy to introduce emergency contraception intro family planning programs. Led by Population Council in collaboration with the Pacific Institute for Women’s Health and local agencies such as Mexfam, GIRE, IMIFAP 17 . The Consortium worked to improve provider training and service delivery, conducted and innovative marketing and educational campaign directed at potencial method users, and disseminated research results among academic and institutional colleagues, including Ministry of Health officials (ICEC website. Navigating a Politically Sensitive Landscape , 2006, p.1).

17 GIRE é o Grupo de Información em Reproducción Elegida e o IMIFAP é o Instituto Mexicano de Investigación em Familia y Poblácion.

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Tanto Population Council como o PIWH agiram no México como representantes do ICEC e criaram o Consórcio Mexicano de Contracepção de Emergência (CMCE). Este consórcio foi o organizador de intervenções políticas, distribuição, treinamento médico, registro do produto e “conscientização” do público (WESTLEY E SCHIAVON, 2012). O consórcio local programou suas atividades para três anos, mas seu trabalho continuou durante dez anos, após essa fase piloto. Formalmente, o consórcio mexicano não existe mais, embora de acordo com Westley e Schiavon (2012, p. 93): “ the work is still ongoing” . Se a década de 1960 foi a década de intensificação do controle de natalidade no mundo, talvez possamos pensar a década de 1990 como uma renovação deste controle a partir dos contraceptivos de emergência, com a criação do ICEC, um consórcio voltado, especificamente, para a expansão deste contraceptivo para os “países em desenvolvimento”. Esta pode ser vista como uma das estratégias globais já anunciadas na Conferência do México em 1984, como nos mostra Berquó (2014, p.20), que preconizava a necessidade da rápida redução populacional no menor tempo possível. Além disso, as empresas farmacêuticas têm voltado seus mercados no sentido de enfatizar os efeitos secundários das pílulas contraceptivas regulares, como efeitos que possuem benefícios para a saúde, eliminando acne, oscilações de humor e dores menstruais. Isto abriu espaço para um mercado de novos contraceptivos, aqueles que podem ser utilizados após o sexo (MAMO e FOSKET, 2009; WATKINS, 2012; NUCCI, 2012). Os interesses econômicos e ideológicos das organizações de planejamento reprodutivo e indústria farmacêutica culminaram na criação do ICEC para expandir os contraceptivos de emergência para os países em desenvolvimento. A partir desse momento, o ICEC começou a forjar contextos propícios em cada país para introdução dos CE. As grandes ações do consórcio foram motivadas porque almejavam o controle populacional a partir de um “ back up control ”, ou seja, conferir um reforço contraceptivo caso houvesse “erros” com o uso da pílula hormonal de uso regular. Em certos contextos ocidentalizados, este contraceptivo foi bem aceito, pode-se perceber que o uso dos CE pode estar associado a certa liberdade sexual e controle feminino da reprodução, a pílula é tomada em até 120 horas em uma única dose e ainda permite certa discrição no momento da ingestão. Entretanto, em contextos diversos das sociedades ocidentais, o consórcio teve que buscar formas de disciplinarização do comportamento sexual e reprodutivo. Embora os produtores aleguem que as pílulas contraceptivas sejam universais, independente de contextos contraceptivos, elas nem sempre se dirigem para uma usuária

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específica: a mulher, disciplinada o bastante para tomar a “medicação”, acostumada a exames ginecológicos e visitas regulares a médicos. Este quadro que os contraceptivos se inserem revela que são tecnologias culturalmente específicas, com variações mesmo dentro de uma cultura (OUDSHOORN, 1994). O contexto do oeste africano, por exemplo, foi revelado em uma pesquisa realizada por Teixeira et al (2012) e demonstrou que os CE são vistos como uma “norma farmacêutica ocidental” naquela região, pois diversas percepções negativas em relação a sua toxicidade e efeitos adversos são também expressões políticas, representam uma resistência das mulheres africanas em relação ao controle exercido pelo ocidente. Como afirma Oudshoorn (1994), a transformação dos contraceptivos em tecnologias altamente aceitáveis requer um contexto específico, pois os artefatos científicos não são universais e independentes de contextos socioculturais. Segundo a autora, eles exigem que exista uma infraestrutura de saúde que seja bem desenvolvida e facilmente acessível; que as pessoas estejam acostumadas aos medicamentos passíveis de prescrição ou com o status “over-the-counter ” (sem necessidade de prescrição médica) para que possam comprar contraceptivos mais facilmente; as mulheres devem ser acostumadas ao controle médico e homens e mulheres devem ser livres e seguros em suas posições de gênero para a negociação dos contraceptivos. É possível pensar a posição do ICEC nesta empreitada de introduzir a CE no mundo a partir do que diz Oudshoorn (1994) quando considera que um contraceptivo pode se tornar universalmente aceito apenas quando os produtores colocam grande esforço para mobilizar e disciplinar pessoas e instituições a conhecer os requisitos específicos de uma nova tecnologia. Dessa forma, como Clarke (1998) aponta em seu livro “ Disciplining Reproduction” , a quem de fato a disciplinarização, este controle sobre a reprodução estaria se dirigindo? Evocando a análise de Foucault sobre o biopoder, Clarke (1998) explica que existem dois lugares chaves em que o biopoder age: o corpo e a população. Segundo Clarke (1998), a “vontade de saber” sobre a reprodução permaneceu inerte até meados do século XX e se expressou para além da formação de um campo científico de estudos sobre reprodução, mas nos movimentos de controle reprodutivo, eugênico e neomalthusiano. Neste investimento realizado por diversas organizações de “planejamento familiar”, o casal malthusiano e a mulher histérica (representada pelo seu ciclo menstrual) foucaultianos acabaram caindo sobre as ciências reprodutivas, sobre os corpos e as populações. Importante destacar que a disciplinarização aqui referida é no sentido conferido por Foucault (1977), que afirma que o poder possui tanto potencialidades negativas quanto positivas de resistência e liberação, bem como de repressão e dominação. Adele Clarke (1998)

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aponta os diferentes sentidos do título de seu livro “ Disciplining reproduction” . Afirma a autora que disciplinar a reprodução se refere à formação de um campo científico, de uma disciplina, mas também as possibilidades de controle pelo conhecimento, principalmente pelo desenvolvimento dos métodos contraceptivos – para liberação e repressão. A reprodução é social, cultural e economicamente centrada em vidas individuais, mas também estão em foco interesses de nações, corporações e outros interesses globais. A reprodução é um lugar específico onde o desejo de controlar a vida se manifesta.

4.3. A expansão dos contraceptivos de emergência no cenário brasileiro

Continuando a problematização sobre a expansão dos CE sobre “o foco nos países em desenvolvimento”, discuto a seguir a expansão destes contraceptivos no Brasil, também considerado um país em desenvolvimento pelo consórcio. Nota-se a presença do ICEC no país desde a introdução destes contraceptivos em 1996. A CE foi introduzida no Brasil através do método Yuzpe a partir de estratégias do ICEC e suas organizações filiadas. Sua visibilidade se manteve restrita por algum tempo apenas entre setores dos movimentos de mulheres e profissionais de ginecologia principalmente em casos de violência sexual. De acordo com Heimburguer et al (2003), a IPPF/WHR ( International Planned Parenthood Federation/Western Hemisphere Region ) lançou um modelo estratégico para introduzir os CE na América Latina e no Brasil. Segundo estas autoras, a BEMFAM é uma afiliada da IPPF no Brasil e teve papel central na incorporação do contraceptivo pós-coito no país, negociando preços razoáveis para a distribuição de produtos dedicados aos CE. De acordo com Souza e Brandão (2009), o contexto jurídico do país era positivo para a introdução dos CE em 1996, quando o contraceptivo (Yuzpe) foi normatizado. Isto se deve muito ao fato de que, como apontam Manica (2009) e Fonseca Sobrinho (1993), desde os anos 1960 vinham acontecendo articulações nacionais e internacionais para que o contexto brasileiro se tornasse propício para receber os contraceptivos. Nessa época, o perigo de uma “nova Cuba” foi sendo substituído por outro espectro que pairava sobre os países em desenvolvimento, o da “bomba demográfica”. Se antes a “bomba política” estava prestes a detonar, agora a preocupação voltava-se para o controle das populações nos países menos desenvolvidos, o que passou a ser considerado como mais preocupante para o governo dos

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Estados Unidos que postulava que esta “bomba demográfica” teria efeitos economicamente mais devastadores em longo prazo (SOBRINHO, 1993, p.91). O ICEC, por meio de afiliados, foi responsável pela criação de condições viáveis para a incorporação desse medicamento no Manual de Assistência e Planejamento Familiar do Ministério da Saúde (MS) em 1996, no Brasil. Em uma oficina sobre contracepção de emergência promovida pelo Population Council juntamente com a Coordenação de Saúde Materno-Infantil do MS em 1996 discutiram-se diretrizes para a introdução dos CE no Brasil. O resultado desta oficina foi a incorporação destes contraceptivos no manual já citado recomendando a utilização do regime Yuzpe (HARDY et al, 2001). Assim, em 1999 esse método foi permitido para os casos de violência sexual no Brasil, a partir da Norma Técnica para atendimento das vítimas de violência sexual, que previa também o atendimento por uma equipe multidisciplinar. No mesmo ano foi aprovada pela ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) a comercialização do Postinor-2® (levonorgestrel) pelas drogarias, com prescrição médica (SOUZA e BRANDÃO, 2009). De acordo com documento de 2006, intitulado “Marco Referencial para a Promoção e Defesa dos Direitos de Adolescentes e Jovens à Contracepção de Emergência”, publicado pela ECOS – Comunicação em Sexualidade, com coordenação técnica de Juny Kraiczyk, redigido por Arruda (2006) e apoiado pela BEMFAM. O NEPAIDS (Núcleo de Estudos para a Prevenção de Aids da Universidade de São Paulo) foi uma das primeiras instituições a introduzir a questão dos CE no Brasil em parceria com o CLAE. Em 2000 o NEPAIDS/USP desenvolveu junto com o Pacific Institute for Womens Health , uma das sete organizações que estavam envolvidas com a criação do ICEC, o “1° Treinamento Nacional em Contracepção de Emergência”, em Recife e São Paulo, promovendo materiais que pudessem instrumentalizar grupos que atuassem com saúde, direitos sexuais e reprodutivos no Brasil para promoção dos CE no país. Também entre os anos de 1998 e 2000, o NEPAIDS/USP e o UNFPA realizaram atividades no Rio Grande do Norte para capacitar diretorias regionais de saúde para a implantação dos CE no método Yuzpe na região (ARRUDA, 2006). Nos anos 2000, segundo este documento, o NEPAIDS/USP em parceria com o PIWH continuou atuando e participou da criação do CLAE. Também durante este período, realizou o “2° Treinamento Nacional em Contracepção de Emergência” que foi expandido para sete capitais brasileiras: São Paulo, Recife, Rio de Janeiro, Fortaleza, Salvador, Brasília e Belo Horizonte, os treinamentos contaram com a participação de ONG parceiras, profissionais estratégicos da área da saúde e direitos reprodutivos. Além deste segundo treinamento, em

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2000, a parceria entre NEPAIDS/USP e PIWH gerou uma rede de comunicação e troca de informações, estudos e materiais entre entidades que estavam trabalhando com o tema – a REDE CE (Rede Brasileira de Promoção de Informações e Disponibilização da Contracepção de Emergência) e também em 2002, possibilitou que o NEPAIDS integrasse juntamente com a BEMFAM e Population Council do Brasil a representação do país na I Conferência Latino- Americana – Direito à Contracepção de Emergência na América Latina e Caribe, realizada em 2002, em Quito, no Equador. Desta conferência organizada pelo CLAE emergiram algumas conclusões e recomendações, dentre elas que a contracepção de emergência:

Deve estar incorporada às normas de saúde reprodutiva, planejamento familiar ou violência em todos os países e deve-se trabalhar decisivamente para que isso aconteça, oferecendo-se esta opção a mais às mulheres; devem-se ter ações de promoção mais centradas específicas em países onde há maior resistência em aceitar a normatização do método; será promovida com apoio do CLAE às ações que promovam as propostas apresentadas na América Latina (ARRUDA, 2006, p. 9-10).

Um documento encontrado na seção Partner Publications – Mainstreaming Emergency Contraception: A report on the Compton Foundation’s Emergency Contraceptive Initiative (2002-2007) , publicado em 2008, diz que o CLAE está bem estabilizado na América Latina. De acordo com esta fundação parceira do ICEC, o CLAE possui interlocução com mais de 100 organizações governamentais e não governamentais, universidades, grupos de mulheres e indústrias farmacêuticas na região e hoje, graças aos esforços desta rede de atores (LATOUR, 2007), os CE estão amplamente disponíveis no setor privado latinoamericano. Mas segundo este documento, o mesmo não pode ser dito sobre os serviços públicos de saúde. A partir dessas articulações regionais, em 2005 o governo brasileiro decidiu ampliar o fornecimento dos CE para atender a todas as mulheres que dele necessitassem, independente do motivo. Entretanto, a investigação de Figueiredo e Paula (2012) em municípios paulistas, demonstra que quase a metade da rede básica de municípios não incorporou a oferta dos CE e, na outra metade, o quantitativo dispensado é bastante restrito, explicitando a falta de divulgação do insumo à população. A situação é mais crítica nas Unidades de Saúde da Família, em que quase 70% dos municípios não incluíram a dispensa do método (FIGUEIREDO e PAULA, 2012, p. 70). As autoras destacam que a falta de preparo técnico das equipes de saúde para lidar com estes contraceptivos, verificada em pelo menos 30% das Secretarias Municipais de Saúde do Estado de São Paulo, pode ser considerado o principal desafio para a implementação do método no Estado. Encontra-se disseminada a ideia de que sua promoção implicaria em um

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uso “indiscriminado” e “abusivo”, podendo resultar em diminuição do uso de métodos regulares de contracepção e aumento de DST/Aids (FIGUEIREDO e PAULA, 2012; SOUZA e BRANDÃO, 2009). Além disso, alguns setores religiosos tentam influenciar decisões legislativas desfavoráveis à sua distribuição nos serviços públicos, como foi o caso da Câmara Municipal de Jundiaí (SP), em 2008, que por meio da Lei Municipal 7.025 determinava a retirada dos contraceptivos de emergência dos serviços de saúde da cidade, a qual foi considerada inconstitucional em 2009 (VENTURA, 2009). Apesar destas barreiras, em 2012 o MS publicou protocolo no contexto da Rede Cegonha permitindo a sua dispensação por enfermeiros (as) nos serviços públicos (BRASIL, 2012). Contudo, o acesso aos CE acontece amplamente pela via das farmácias comerciais no Brasil (PAIVA e BRANDÃO, 2012). Segundo a PNDS (Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher) de 2006, as farmácias são a principal fonte de obtenção de contraceptivos orais, particularmente nos grupos situados nos extremos da distribuição da escolaridade. Elas são citadas como última fonte de obtenção de contraceptivos orais por 55,8% das usuárias com 1 a 4 anos de escolaridade e por 80,4% das usuárias com 8 e mais anos de escolaridade. Isto revela que os esforços do ICEC em tornar os CE amplamente disponíveis no país acabaram sendo concretizados por meio das farmácias privadas, e a razão disto pode estar no fato que o acesso ao produto se dá sem obrigatoriedade de retenção da prescrição médica, facilitando a compra dos CE. Importante reiterar que uma estratégia amplamente divulgada e defendida pelo consórcio no website , a de tornar o produto dedicado como over the counter (OTC), isto é, um produto que não necessite de prescrição e possa ser comercializado em farmácias sem o auxílio de qualquer profissional. Embora no Brasil, não tenhamos a venda OTC de contraceptivos hormonais, a estratégia do ICEC de enfatizar o acesso por meio das farmácias se faz presente. O sucesso na ampliação do acesso aos CE no Brasil é notório segundo a PNDS de 2006. Nesta pesquisa, 12% das mulheres de 15 a 49 anos afirmaram ter utilizado esses contraceptivos, cujo consumo teve maior representatividade na faixa etária de 20 a 24 anos (18,5%) e 10,4% entre mulheres de 15 a 19 anos. E estes contraceptivos passaram a ocupar o quinto lugar entre todos os métodos contraceptivos usados e o terceiro entre mulheres não unidas e ativas sexualmente (BRASIL, 2008, p. 131). A introdução dos CE no Brasil foi promovida, portanto, pelas organizações parceiras do ICEC que penetraram sobre a América Latina por meio do CLAE, motivados pelo seu objetivo maior de expandir o acesso aos CE aos países em desenvolvimento. No Brasil, a

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aliança dessas organizações que compõem o ICEC e o CLAE com a BEMFAM, foi extremamente estratégica para incorporação do método Yuzpe. De acordo com Manica (2009), desde 1967 a BEMFAM passou a se expandir através de entidades filiadas em todo o país com a ideia do “bem-estar através do planejamento familiar”, a qual estava atrelada à preocupação médica com a prevenção de abortos provocados. A expansão da contracepção vai sendo pensada como um “mal menor”, como aponta Manica (2009), perante o aborto. O envolvimento da BEMFAM com a introdução e difusão de contraceptivos é histórico no Brasil. A intenção de criar uma organização voltada para o “planejamento familiar” no país teve origem com a organização norte-americana IPPF preocupada com o crescimento populacional brasileiro. Desta preocupação surgiu a BEMFAM – Sociedade Civil de Bem-Estar Familiar no Brasil, na XV Jornada de Ginecologia e Obstetrícia no Rio de Janeiro em 1965. Uma organização não governamental, com o objetivo de “promover e propugnar pelo bem estar da família, como célula constitutiva da nação” (SOBRINHO, 1993). De acordo com Vieira (2003), a partir de 1965, o governo brasileiro permitiu a proliferação de clínicas privadas de planejamento reprodutivo e o comércio de contraceptivos em todo o país. Na década de 1990, a Associação Brasileira de Entidades de Planejamento Familiar chegou a registrar 140 organizações atuantes. Segundo Sobrinho (1993), apesar de a BEMFAM ter declarado diversas vezes que sua preocupação não era com o crescimento populacional, mas com a prevenção de abortos, a questão do “excesso de população” estava colocada já na conferência que deu origem à organização quando o professor Octávio R. Lima abriu os trabalhos da Mesa 1 dizendo: “o problema do excesso de população existe, e deve ser debatido à luz da moral e das leis”. A ideia de “combate ao aborto criminoso” utilizada desde as primeiras horas pelos fundadores da BEMFAM mostrava-se sem dúvida como uma estratégia eficaz para uma política de controle reprodutivo, e seria de fato incorporada ao discurso inclusive oficial e legitimador da prática de planejamento reprodutivo no Brasil. A difusão dos contraceptivos já fazia parte das discussões das mesas redondas da XV Jornada de Ginecologia e Obstetrícia como estratégias importantes para o almejado “planejamento familiar”. Um dos itens de conclusão das mesas dizia: “É necessário o estudo de uma legislação destinada a instituir o ensino e difusão dos meios anticoncepcionais, nos casos de justa indicação” (SOBRINHO, 1993, p.104). O Brasil gestou por quase duas décadas uma política social voltada para o planejamento reprodutivo, como demonstra Sobrinho (1993). Esta política culminou no PAISM – Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher que incorporou reivindicações dos movimentos das mulheres e se constituiu como uma política desvinculada de metas

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demográficas. Entretanto, como bem relativiza Manica (2009, p.277), não podemos sugerir que o discurso neomalthusiano tenha sido desacreditado e excluído das discussões relacionadas à contracepção, e nem anunciar o triunfo dos direitos reprodutivos nos programas de planejamento reprodutivo. Para Manica (2009, p.277), no processo de consolidação das áreas de demografia (que passa a produzir conhecimento mais sistemático sobre fecundidade) e ginecologia (que passa a se concentrar na emissão de laudos científicos sobre segurança ou viabilidade de métodos contraceptivos, principalmente elaborados pela indústria farmacêutica) nos anos 1980, os discursos sobre os usos políticos da contracepção, e seus efeitos populacionais foram sendo desviados dos circuitos mais “legítimos” ou “oficiais” das ciências e da política. No Brasil, estudos indicam que a queda da fecundidade na segunda metade do século XX ocorreu por vários motivos. Algumas teorias explicam que o Brasil é um exemplo clássico de modernização, com redução da força de trabalho agrícola, urbanização e aumento do trabalho feminino. Outra teoria relaciona o declínio da fecundidade com a intensificação do processo de proletarização. Mas de acordo com alguns estudos, a influência cultural dos meios de comunicação como as telenovelas; a extrema medicalização da saúde em um modelo curativo e hospitalar; a difusão, através das organizações internacionais de métodos contraceptivos, além das altas taxas de esterilização das mulheres particularmente na região nordeste do país, são as principais razões para o fenômeno (BERQUÓ, 1993; FARIA e POTTER, 2002; PEDRO, 2003; VIEIRA, 2003; BOZON, 2005). O sociólogo francês Michel Bozon (2005) ao analisar a transição demográfica brasileira e a “espetacular” redução das taxas de fecundidade no país avalia que existe uma cultura reprodutiva muito específica no Brasil, impulsionada por uma onda de medicalização caracterizada por um “mix de contraceptivos”. Para o sociólogo, as organizações internacionais, por mais que não pareçam estar presentes em todo o território nacional (tendo maior visibilidade de atuação no nordeste brasileiro), tiveram sua influência neomalthusiana de forma indireta no país por meio da mídia propagandeando famílias de pequeno tamanho (BOZON, 2005). Dessa forma, os discursos produzidos por estas organizações que trabalham em conjunto com o ICEC colaboraram também para a divulgação dos contraceptivos abrindo espaço para um cenário favorável à incorporação deste novo método de reforço contraceptivo no Brasil.

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CAPÍTULO 5: Os argumentos do Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência: uma articulação de diferentes discursos

O objetivo deste capítulo é discutir os argumentos encontrados nos documentos do consórcio. Ao entrar no website do ICEC pelas primeiras vezes observei na página inicial algumas imagens girando com frases ao lado e nelas certo padrão me chamou atenção: a ênfase em questões como eficácia e segurança do contraceptivo, privilegiando-se as pílulas hormonais, tidas como artefatos mais fáceis de utilizar, o que aumentaria a “adesão” ao método, em detrimento do DIU como uma possibilidade de contracepção de emergência; a chamada para venda OTC (over the counter ) – medicamento vendido sem necessidade de prescrição; a ênfase na “segunda chance” que os CE poderiam conferir às mulheres para “prevenir” uma gravidez. Quando passei então a vasculhar os documentos para a pesquisa, estes elementos se repetiram constantemente mesclados a outros de ordem sanitária, econômica e do direito ao acesso ao contraceptivo. A linguagem preponderante utilizada nos documentos é técnico-científica, voltada para legisladores e gestores de saúde, para profissionais de saúde, principalmente médicos e farmacêuticos, havendo certa ênfase para os farmacêuticos, fato que expressa e reforça a defesa do Consórcio pela distribuição deste contraceptivo em farmácias, locais de mais fácil acesso em tempo hábil (120 horas) para efetividade das pílulas de emergência. Claramente, os destinatários são atores considerados estratégicos para introdução e distribuição segura e eficaz dos CE. Os conteúdos das informações enfatizam aspectos sanitários e farmacológicos, reforçando as razões científicas para a difusão. Assim, gráficos sobre taxas de fecundidade no mundo, tabelas estatísticas sobre uso do contraceptivo, cálculos sobre o efeito dos CE em reduzir taxas de gravidezes e abortamentos; explicações sobre eficácia, segurança e mecanismo de ação são comuns nos documentos divulgados no website . Imagens de caixas de medicamentos, como do Postpill ® e mulheres com expressões de apreensão e dúvida também apareceram nos documentos. Como dito no capítulo 3, também utilizo elementos da lista de e-mails para refletir sobre os argumentos do ICEC. Muitos documentos que se encontram no website são inclusive veiculados pelos membros na lista. Dessa forma, após leitura atenta ao material, identifiquei três tipos de argumentações que o ICEC utiliza para a expansão dos CE, especialmente para os países em desenvolvimento: o argumento “farmacêutico”, o “sanitário” e dos “direitos”, que apresento a seguir.

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5.1. O argumento sanitário: a gravidez imprevista como um problema de saúde pública

O argumento sanitário enfatiza “problemas de saúde pública”, advogando-se em prol dos CE pela redução da mortalidade materna, das taxas de abortos e de uma “epidemia de gravidezes imprevistas”, com especial ênfase na gravidez na adolescência. Esses argumentos realçam aspectos dos discursos sociais de um modelo de saúde pública voltada para a prevenção das doenças e promoção da saúde mediante esforços dos indíviduos e da comunidade, de uma medicina aplicada ao âmbito social como uma política para “curar os males da sociedade”, reforçando um tipo de paradigma sanitarista, que deve conhecer estatisticamente os “males” da sociedade para resolvê-los mediante a aplicação de tecnologias e atividades profiláticas destinadas principalmente a segmentos específicos (PAIM e ALMEIDA FILHO, 1998) Os aspectos biopolíticos são evidentes e razões sanitárias e populacionais se entrelaçam reforçando a necessidade de “liberdade regulada” das mulheres para solução de um problema social e de saúde.

5.1.1. A redução das taxas de gravidezes imprevistas como indicador da melhoria da saúde pública Um dos argumentos mais difundidos para expandir o acesso aos CE é o problema das gravidezes imprevistas ou “não desejadas”, expressão também utilizada, e as taxas de abortos, como um “problema de saúde pública”. De acordo com o ICEC, os contraceptivos de emergência seriam aqueles que dariam conta de reduzir a magnitude deste problema, por ser um reforço contraceptivo quando as mulheres “falham” em utilizar seus métodos regulares, reduzindo, assim, taxas de gravidezes “não desejadas”. O argumento sanitário subsidiariamente se reforça trazendo à tona a dimensão macro-política, socio-economica e individual deste “problema de saúde pública”, apontando que a gravidez indesejada gera problemas econômicos tanto para as mulheres individualmente, como para sua família e também para as nações. O Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) é a agência de desenvolvimento internacional da ONU que trata de questões populacionais, sendo responsável por ampliar “o acesso universal à saúde sexual e reprodutiva, incluindo o planejamento familiar voluntário e a maternidade segura; e busca a efetivação dos direitos e oportunidades para as pessoas jovens”. Na subseção Partner Publications, o documento do UNFPA “By choice, not by chance”, de 2012, serve de base empírica para o argumento do ICEC demostrando que ao se

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investir $4,1 bilhões nos serviços de distribuição de contraceptivos modernos, o mundo economizaria $5,7 bilhões em “serviços materno-infantis” ao prevenir as “gravidezes não planejadas” e abortos inseguros (UNFPA, p.91, 2012) Outro documento-chave nesta argumentação é o produzido pelo Center for Reproductive Rights (CRR), e também publicado na subseção do website “Partner Publications ”, intitulado “ Governments worldwide put emergency contraception into women’s hands” de 2004. Esta ONG tem como missão desenvolver estratégias jurídicas e a defesa das liberdades reprodutivas como direitos humanos fundamentais, que todos os governos são legalmente obrigados a proteger e respeitar. O documento do CRR informa que até o ano 2000 as mulheres do mundo inteiro experimentaram 300 milhões de gravidezes “não desejadas”, destas, 700.000 morreram de causas relativas à gravidez e 400.000 por complicações decorrentes de abortos inseguros. Esses dados estatísticos apontam o conteúdo do direito à liberdade e à saúde para reforçar a importância da perspectiva sanitária. Segundo os membros do consórcio, muitas destas mulheres poderiam ter evitado estas conseqüências prevenindo a gravidez, utilizando um contraceptivo de emergência, pois estes contraceptivos possuem o potencial de reduzir a morbidade e mortalidade materna. Nos Estados Unidos, 51.000 abortos foram evitados pelo uso dos CE no ano de 2000, dado que é utilizado neste documento do Center for Reproductive Rights e também por uma “declaração política” do ano de 2003 publicada na subseção “ICEC Publications” , intitulada “ Improving Access to Emergency Contraception” . Entretanto, em editorial para a revista Contraception de 2012, Elizabeth Westley, coordenadora atual do ICEC, relativiza tais expectativas sobre os CE, dizendo que as projeções de que o seu uso iria reduzir drasticamente o número de “gravidezes não planejadas” e conseqüentemente a necessidade de serviços de aborto não é uma realidade. Apesar de os CE reduzirem as chances de gravidez das mulheres, individualmente, em âmbito populacional isto não tem ocorrido. Para o Consórcio isso se deve pelo fato de que as mulheres não estão utilizando os CE, não os utilizam corretamente ou não possuem conhecimento da existência dos contraceptivos, o que ressalta a necessidade de novas mensagens de saúde pública que efetivamente respondam a um “cálculo do risco que as mulheres estão correndo”. Assim, para “atingir o benefício da saúde pública”, gestores devem incluir os CE em protocolos legais e médicos, provedores devem oferecê-los para as mulheres e as mulheres devem poder obtê-los sem a necessidade de prescrição médica. O grande foco na gravidez e aborto como um problema sanitário permite refletir sobre uma preocupação que vem se constituindo no ocidente desde o século XIX. Trata-se, como

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Lupton (1995) designa, do imperativo da saúde que se configura como um conjunto de mecanismos pelos quais são assegurados a ordem, o crescimento canalizado de riquezas e as condições de manutenção da saúde “em geral”. A política médica delineada permite articular uma ética “privada”, no caso uma ética “privada” das mulheres, para a boa saúde da população (FOUCAULT, 2005a; LUPTON, 1995). As mulheres, para o consórcio, são as responsáveis por gerir a contracepção e alavancar uma “solução sanitária” para toda a população, reduzindo as “gravidezes não planejadas” e as taxas de abortamentos ao se colocarem o tempo todo sob uma “vigilância contraceptiva”. Ao “falharem” com seu método contraceptivo regular, recomendam que devem imediatamente procurar o “ back up control” o que aumentaria as chances de os CE atingirem as expectativas populacionais e sanitárias almejadas. A expressão do pesquisador James Trussell: “it works if you take it” , citada algumas vezes na lista de e-mails trocados pelos membros do ICEC, nos dias 11 a 14 de junho de 2012, corrobora esta responsabilização. O argumento sanitário desenvolvido pelo consórcio para além de propor “aliviar” o problema das “gravidezes não desejadas” e do aborto, se apresenta como um argumento político de gestão da população e do corpo feminino (FOUCAULT, 2005a). Newman, L., diretor executivo da Family Planning Health Services , escreveu em resposta a e-mails trocados no dia 13 de junho de 2012 sobre a provisão adiantada de CE (compra antecipada do contraceptivo, compra antes da relação sexual), a qual seria, em sua opinião, a melhor forma de as mulheres utilizarem o contraceptivo, reduzindo assim as taxas de gravidez. I also am convinced that Plan B in advance of need has reduced the unintended pregnancy rate of our patients . . . as I communicated (poorly, I'm sure) a few years back at the NY meeting . . . our pregnancy rate to contracepting patients dropped from 5.5%/year to approx 2%/year and has held there for the past 6 years. I understand the pregnancy rate among women in North America has not declined, nor probably even Wisconsin . . . but on the "it works if you take it" principle, EC in advance of need with explanation and reminders has, I think, worked among our clients (Newman, L., grifo nosso).

Estas mensagens convidam a refletir que as pílulas contraceptivas podem representar uma ampliação da autonomia reprodutiva feminina, em especial se considerarmos que até o final do século XVIII e começo do século XIX as mulheres dispunham de um arsenal limitado para evitar filhos. Mas é importante lembrar, como afirma Oudshoorn (2003), no século XX nenhum novo método contraceptivo masculino foi desenvolvido, exceto o aperfeiçoamento dos já existentes, como o preservativo e a esterilização. Não obstante, vários novos métodos contraceptivos femininos foram criados, entre eles as pílulas hormonais, os dispositivos intra-

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uterinos e as pílulas hormonais de emergência. Além disso, de acordo com Cabral (2011), o fato de os homens poderem se abster de responsabilidades contraceptivas parece ter gerado maior responsabilização feminina. Estudiosos como Bozon (2005) e Berquó (1993), também discutem que a difusão da contracepção pelo mercado e pela imposição de procedimentos médicos levou à queda das taxas de fecundidade no Brasil. Entretanto, isto não teve nenhum efeito sobre a redução da forte iniqüidade de gênero no domínio da reprodução no país. As imagens de mulheres com expressões faciais apreensivas ao lado de caixas de contraceptivos de emergência (Figura 4) e as imagens “objetivas”, como os diversos gráficos utilizados pelo consórcio mostram que à contracepção de emergência não é conferida o símbolo de medicamento que permitiria maior atividade sexual. Ao contrário, ela envolve os sentidos sobre riscos, prevenção e uma “segunda chance” de proteção. Já a simbologia envolvida em propagandas sobre o Viagra ® (Figura 5), por exemplo, privilegia bordões como “rigidez é o objetivo”; “rigidez mantém o equilíbrio das relações”; “liberdade que permite ao paciente viver com maior espontaneidade e sem pressão de tempo” (AZIZE, 2002; FARO et al, 2013). Esta ideia de “segunda chance” também era utilizada por organizações que defendiam o uso do Norplant ® (WATKINS, 2010), como Population Council , com pretensões de controle populacional.

Figura 4: Propaganda do Postpill ® na Etiópia. Figura retirada da página inicial do website do ICEC

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Figura 5: Propaganda da empresa Pfizer sobre Viagra®. Fonte: Pfizer. In: Faro, et al (2013).

Na preocupação sanitária com as gravidezes e abortos, o ICEC coloca o sexo em discurso através da contracepção de emergência. Observo nos documentos e nas trocas de e- mails uma descrição da sexualidade, sobretudo feminina, como aponta Foucault (1977), como um ponto de passagem pelas relações de poder; entre homens e mulheres, entre jovens e idosos, entre administração e população. A sexualidade feminina aqui passa a ser reduzida à sua função reprodutiva. Ao invés do foco sobre a possível liberdade sexual que este contraceptivo poderia conferir às mulheres, a preocupação sanitária revela uma “socialização das condutas de procriação” por meio de uma socialização médica, pelo valor patogênico atribuído às gravidezes (FOUCAULT, 1977). Isto é possível de se observar no excerto retirado do documento “From childhood to womanhood: meeting the sexual and reproductive health needs of adolescent girls” (2012), publicado na subseção “Partner Publications” e de autoria da UNFPA.

Adolescent pregnancies put newborns at risk. Deaths during the first month of life are 50 to 100 per cent more frequent if the mother is an adolescent than if she is older. The younger the mother is, the higher the risk for the baby (UNFPA, 2012, p.2).

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O sexo enquanto campo de disputa política está o tempo todo permeando o argumento sanitário. O sexo se encontra, como demonstrou Foucault (1977), entre dois eixos que desenvolveram toda a tecnologia política da vida. De um lado, faz parte da disciplina do corpo – a disciplinarização dos corpos femininos para que utilizem CE. Do outro lado, integra a regulação das populações. Dessa forma, o bordão muito utilizado pelo ICEC para se referir à CE, como uma “segunda chance” ou “última chance” para as mulheres “prevenirem” uma gravidez, é também uma “segunda chance” para melhoria das taxas populacionais e da saúde pública. Podemos dizer que a história se repete com a contracepção de emergência quando consideramos a história da pílula hormonal desenvolvida na década de 1960. O efeito que os contraceptivos, tanto de uso regular quanto os de emergência, tiveram sobre a sociedade foi enorme. Após o seu desenvolvimento, as mulheres passaram a controlar sua fertilidade quase completamente e pela primeira vez na história, sexo e procriação puderam ser separados. Entretanto, como um corolário, a gravidez “não desejada” ou imprevista passou a ser vista como uma falha tecnológica (LUKER, 1997). Luker (1997) discute historicamente a relação entre os contraceptivos e a redução da pobreza travestida com um problema sanitário nos Estados Unidos, país sede do ICEC e da maioria de seus parceiros (Quadro 4) e um grande impulsionador de políticas de controle de natalidade no mundo. Segundo a autora, a chegada dos contraceptivos naquele país gerou uma ansiedade que extrapolou seu território. Dois fatos contribuíram para aumentar a preocupação de que o acesso precário aos contraceptivos iria aumentar as taxas de gravidezes entre pessoas de baixa renda: o custo estabelecido pelo setor privado e o “recomendável” acompanhamento médico por causa da ingestão de hormônios, o que tornaria os contraceptivos menos acessíveis à população mais pobre. Em documento para reforçar a necessidade de CE em Ruanda, “Counting what counts: tracking access to emergency contraception in Rwanda” de 2013, gráficos demonstram que o uso e conhecimento sobre CE é baixo neste país, o que se torna uma preocupação para o consórcio. Já no primeiro parágrafo deste documento informam que este país é o mais densamente povoado da África e que após o genocídio acarretado pela guerra civil de 1994, o país vem se reconstruindo economicamente, mas possui a maior parte de sua população em áreas rurais e apenas 2,8% das mulheres completaram o ensino secundário. As organizações de planejamento familiar e seus financiadores se engajaram na ideia de que, como protetores da saúde pública, deveriam mitigar os efeitos da revolução sexual proporcionada pelos contraceptivos e a falta deles poderia levar ou perpetuar a pobreza

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(LUKER, 1997). A gravidez se torna a questão principal e o “remédio” recomendado são os contraceptivos de emergência. A falha tecnológica representada pela gravidez e a remediação do “problema” a partir dos contraceptivos; a conduta prescritiva do consórcio de que após a relação sexual a mulher deve imediatamente recorrer aos CE, em caso de falha do seu método contraceptivo regular, remete à lógica do normal e do patológico desenvolvida por Canguilhem (1978). A partir destes argumentos do ICEC, podemos perceber que os CE vão se tornando uma prescrição para solucionar problemas. Como por exemplo, o “problema” da gravidez na adolescência. Conforme a reflexão de Luker (1997) sobre a gravidez na adolescência (uma grande preocupação do ICEC), este termo tomou tamanha proporção chegando ao ponto de ser patologizado pelas meninas que tiveram tal experiência. A gravidez imprevista, ainda mais nesta faixa etária, passou a ser vista, inclusive, como motivo para tentativas de suicídio. Alguns setores midiáticos se referiram às meninas grávidas como se estivessem “contaminado” outras meninas a se comportarem da mesma maneira (LUKER, 1997). Segundo Canguilhem (1978), a normalização é a expressão de um conjunto de exigências coletivas que relacionam a estrutura daquela sociedade, seus valores, com o que consideram como sendo seu bem particular. O maior bem para as nações tem sido, por séculos, a preservação das futuras gerações, mas não de qualquer geração, garantindo a sua soberania. Segundo Rohden (2003), a emergência de movimentos eugênicos, malthusianos e a tomada de grandes proporções do feminismo revelaram que sexo e reprodução eram questões fundamentais. O ponto central é que o aborto e a contracepção são discutidos não só em função das suas conseqüências para os indivíduos que os praticam, mas também em relação a todo o coletivo.

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Desta forma, poderíamos dizer que a contracepção de emergência é simbolizada pelo consórcio como um objeto de reforço que atua estabilizando e normalizando uma situação preocupante em termos sanitários – a “gravidez indesejada” - para uma situação normalizada, regulando as taxas de gravidezes e abortos e controlando os nascimentos.

Figura 6: Sistema articulado entre saúde reprodutiva e resultados econômicos. UNFPA, By choice, not by chance: family planning, human rights and development , 2012.

Apesar de o consórcio não utilizar explicitamente o termo “controle de natalidade”, a preocupação com a estabilização demográfica e o desenvolvimento econômico dos indivíduos e da sociedade aparece, por exemplo, na Figura 6 (acima), em documento da UNFPA “By choice, not by chance” (2012). Cito mais uma vez este documento, pois além de ele estar contido na subseção “ Partner Publications ”, membros do consórcio enfatizaram-no em 16 de dezembro de 2012, quando o postaram em sua subseção “EC News” . Sua divulgação mais ampla reforça sua importância e a menção que esta fundação faz aos CE como parte essencial do “planejamento familiar”. Este fluxograma que articula saúde reprodutiva e desenvolvimento econômico está contido em um capítulo do relatório da UNFPA chamado “ The social and economic impact of family planning” . Este capítulo é dedicado ao debate sobre o acesso aos serviços e às

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tecnologias de “planejamento familiar” como estratégias chaves para melhorar a saúde e o impacto econômico para as mulheres e para a população.

Some of the most rigorous evidence of the effect of fertility decline on improvements in women’s health comes from Matlab, Bangladesh, where a long- term maternal and child-health programme provided doorstep-delivery of contraceptives, pre-natal care, vaccinations, safe-delivery kits and a variety of other health services to women in their homes. Over the course of 30 years, the programme not only reduced fertility by about 15 per cent and improved maternal and child mortality rates, but also had a variety of spillover effects on women’s health. Women who were exposed to the programme throughout their reproductive lives experienced increases in their weight, body mass and general health status (UNFPA, 2012, p. 74).

No capítulo citado, enfatizam o quanto o “planejamento familiar” é importante para as economias das famílias. O declínio das taxas de fecundidade estaria correlacionado com o aumento da expectativa de vida e a economia familiar.

There is ample evidence to support this relationship between fertility decline and savings rates. Many studies find a positive correlation between declines in fertility or increases in life expectancy on the one hand, and savings rates on the other (UNFPA, 2012, p. 80).

Além disso, discutem que tal planejamento faz com que as mulheres possam ascender em suas carreiras profissionais, se tornando “importante capital humano”. O declínio das taxas de fecundidade reduzem riscos de complicações da gravidez, diminuindo morbidade e mortalidade maternas e aumentando a produtividade das mulheres no mercado de trabalho. O relatório também assinala os benefícios do acesso aos serviços e tecnologias de planejamento familiar para meninos e homens, no que diz respeito às trajetórias que podem ser comprometidas ao enfrentarem uma “gravidez não desejada”. Em relação à dimensão populacional, o relatório defende que a transição demográfica – conceito que descreve a dinâmica populacional - foi responsável pela melhoria do desenvolvimento sustentável de diversas economias mundiais.

But after fertility rates steadily decline over the course of 20 or 30 years, the number of income-generating adults grows relative to the number people who depend on them to support, thus creating more favourable conditions for economic growth and sustainable development. One of key drivers of improved economic growth during the demographic transition is the increase in the level of savings and investment in the economy. Adults with fewer children may be able to reallocate more of their resources towards saving for their own retirement. This increases the amount of capital available for investment (UNFPA, 2012, p.84).

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Este esforço de correlacionar o declínio de taxas de fecundidade (uma promessa que os membros do consórcio diversas vezes atualizam) com o desenvolvimento econômico sustentável faz parte de uma perspectiva neomalthusiana que preconiza que a pobreza é resultado prioritário do número de filhos de um casal e que o uso de métodos contraceptivos leva ao desenvolvimento econômico. Isto reverbera nos corpos das mulheres, pois se a fecundidade feminina é a principal causa das crises econômicas, isto torna estes corpos como principais locais de intervenção. Isto abre brechas tanto para o controle antinatalista – como em casos de esterilização e abortos realizados sem consentimento informado, além de testes de contraceptivos hormonais em regiões mais pobres – quanto a posições políticas pró- natalistas – restringindo o acesso à contracepção e ao aborto (BONAN, 2005).

5.1.2. A preocupação com a gravidez na adolescência e a “epidemia de gravidezes não intencionais e de abortos inseguros”

Um dos argumentos do ICEC para expansão do acesso à CE também recai sobre o alto número de gravidez na adolescência (GA) que ocorre principalmente em países em desenvolvimento, onde 88% dos adolescentes vivem (UNFPA, p. 1, 2012 – “From childhood to woman: meeting the sexual and reproductive health needs of adolescent girls” ). A continuidade de um projeto biopolítico é apresentada pelo ICEC ao posicionar a reprodução humana como uma questão de saúde pública. No mesmo editorial anteriormente citado, publicado na revista Contraception em 2012, Elizabeth Westley, diretora do consórcio, reafirma a preocupação do ICEC com este problema, “alertando” para o que chama de “epidemia de gravidezes não intencionais e abortos inseguros” e situando os CE, mais uma vez, como a solução para o “problema”.

What is rarely discussed is the fact that few women anywhere in the world consistently have easy access to EC, although a global epidemic of unintended pregnancy and unsafe abortion rages on. In many developing countries, women continue to die from unsafe abortion, yet a large majority has simply never heard of EC (WESTLEY. 2012, p. 429).

Tal “epidemia” que a autora se refere inclui as gravidezes imprevistas de mulheres adultas e adolescentes. Na subseção “ Partner Publications ”, seis documentos se referem à questão da adolescência e o ICEC também disponibiliza um espaço único para este tema na subseção “ EC Issues ”, que se intitula “ Youth and EC” . Neste local do website , a necessidade de contraceptivos, especialmente os de emergência, é justificada porque consideram que a GA

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é um risco para as meninas já que pode gerar diversas complicações no parto. Avaliam que é a principal causa de morte entre adolescentes meninas em idade entre 15 a 19 anos em países em desenvolvimento. A identificação da GA como um problema de saúde pública não é nova. De acordo com Reis (1998), ao avaliar a produção literária sobre o tema desde a década de 1930, o autor observa grande produção realizada especialmente nos Estados Unidos sobre GA. As produções científicas sobre este assunto, na sua maior parte, englobaram a perspectiva da saúde pública e da psicologia, com um pico de produções na década de 1960. Neste contexto, os anos 1960 representam um período de muita relevância na compreensão da GA sendo considerada como um problema de saúde pública. Concorre para isto certo número de fatores: após a Segunda Guerra Mundial a proporção de adolescentes aumentou subitamente; na década de 1960, especificamente, ocorreu a intensa participação da juventude no movimento de transformação de padrões de comportamento sexual prevalecentes no Ocidente; a adesão gradativa das mulheres à difusão do arsenal tecnológico capaz de assegurar o exercício da sexualidade na independência da maternidade; a participação das jovens na luta feminista permitindo às mulheres levar adiante projetos próprios desvinculados de orientações masculinas e tradicionais (REIS, 1998, p. 117). Essa característica de um pensamento sanitário que perpassa o website do consórcio, considerando a existência de uma “epidemia” de gravidezes não intencionais em todas as faixas etárias, revela a mulher ou menina grávida enquanto fenômeno humano, determinado e coletivo, passando a ser visto, no pensamento da saúde pública, com os qualitativos de “enfermidade”, “doença” e “epidemia”. Para Reis (1998), estes diferentes elementos abrem caminho para uma análise interpretativa deste pensamento sanitário que evidencia um plano alarmista e preventivista. Para o autor, quando se metaforizam gravidezes como epidemias estão alocando ao fenômeno em pauta os atributos de: quantidade excessiva, fenômeno não habitual, moléstia ou doença. Ao tratá-la como “doença”, Reis (1998) se apoia em Parsons que dizia que uma moléstia só é aceita e tolerada, socialmente, caso preencha as seguintes condições: deve ter uma origem não deliberada; os indivíduos atingidos pela doença devem querer dela se livrar; o indivíduo doente deve procurar ajuda competente. Ora, as gravidezes tanto na adolescência ou na vida adulta, chamadas de imprevistas, podem não preencher estas condições descritas. Desta forma, segundo Reis (1998), a gravidez passa a ser envolta por uma aura de rejeição e intolerância tendo em vista a preocupação com as questões econômicas – principalmente entre pessoas de baixa renda.

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A gravidez na adolescência, especialmente, é descrita pelo ICEC e seus parceiros como um fato “universalmente reconhecido como problemático”. A publicação na subseção “Partner Publications” , de 2005, “Adolescents and Emergency Contraception Pills in Developing Countries” , produzida pela “Family Health International” (FHI) – uma organização sem fins lucrativos voltada para o “desenvolvimento humano” -, com autoria de Chris Parker levanta números de pesquisas demográficas realizadas em Ghana, Kenya, Namibia e Brasil. De acordo com as pesquisas citadas no documento, a proporção de meninas grávidas com menos de 20 anos e que reportaram que suas gravidezes seriam “fora de propósito” ou “não desejadas” foi de 46%; 50%; 55% e 58% respectivamente. Dessa forma, avaliam que tornar os CE acessíveis para estas adolescentes pode ajudar a prevenir a gravidez não intencional e a evitar riscos associados à gravidez precoce, tanto para a mãe quanto para a criança. Neste sentido, os CE assumem um duplo papel: espera-se que as meninas e mulheres pratiquem a contracepção utilizando CE para evitar, ou nos termos do consórcio, “prevenir” uma gravidez, mas também para que os recém nascidos possam viver. A gravidez na adolescência é assertivamente associada a problemas sociais como o estigma que acarreta para a menina, para sua saúde e a saúde do filho e os problemas econômicos para os indivíduos e sociedade.

Adolescent pregnancy can lead to serious social stigma and health consequences for both mother and child. The adverse social and economic consequences for an adolescent who becomes pregnant will depend on her particular marital, cultural, familial, and community situations. However, in many developing countries, pregnancy severely limits adolescent in pursuing education and in having broader economic opportunities in the future (PARKER, 2005, p.2).

O discurso utilizado pelo consórcio se configura como uma “mudança de orientação”, como apontado por Reis (1998). Ao invés da preocupação com a gravidez (da adolescente) passa a se preocupar com a adolescente (grávida). Para Luker (1997), este tipo de enfoque à GA é fruto de posicionamentos conservadores e de uma moral puritana norte-americana colocada a partir da preocupação do sexo fora do casamento e também pelos problemas econômicos que filhos de adolescentes não casadas poderiam gerar. A contracepção de emergência seria o “alívio” para o problema e a recomendação é que o acesso seja cada vez mais ampliado, principalmente por meio de farmácias e com a venda over-the-counter . Entretanto, uma preocupação que emerge entre setores conservadores é que o acesso e a possibilidade de uso repetido deste contraceptivo levariam à “promiscuidade” e a iniciação da vida sexual mais prematuramente. O consórcio se esforça

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para refutar estas argumentações no sentido de “acalmar os ânimos” em relação à sexualidade adolescente citando trabalhos (PARKER, 2005, p.8; American Academy of Pediatrics , 2005, p.1031) que evidenciaram que o acesso a métodos contraceptivos, incluindo os CE, não leva ao “comportamento promíscuo” ou antecipa a iniciação sexual entre adolescentes. Schalet (2000), em estudo comparativo entre os padrões culturais norte-americanos e holandeses acerca da sexualidade de adolescentes, demonstra que a cultura norte-americana tende a falar a partir de concepções biologicistas (os ditos “hormônios em fúria”) sobre uma atividade individual que causa perturbações tanto para os adolescentes quanto para sua família – dramatizando a sexualidade dos adolescentes, ao passo que a cultura holandesa “normaliza” a sexualidade nesta faixa etária, partindo da ideia de que ao se falar em sexo devem-se enfatizar os laços afetivos que os adolescentes possam ter. Esta dramatização que se apresenta na cultura norte-americana parece se apresentar nos documentos analisados quando anseiam por refutar argumentos conservadores que associam os CE à “promiscuidade” ou a iniciação prematura da vida sexual. Como explica a autora: “Esta dramatização da pessoa e das relações sociais vincula uma ênfase em elementos voláteis da natureza humana, seus perigos bem como seus potenciais” (SCHALET, 2000, p. 100). A socióloga Kristin Luker (1997) dedica atenção à temática da gravidez na adolescência discutindo como se construiu uma epidemia em torno do fenômeno que até meados do século XX não existia. Explica que a GA enquanto um fenômeno sanitário emergiu na mídia e nos círculos políticos entre 1970 e 1980 nos Estados Unidos e preencheu a necessidade de se identificar as causas desse mal-estar social em torno das gravidezes de adolescentes que passaram a decidir por levar suas gravidezes adiante sem a tutela de um casamento. Toda a miríade de fatores que impulsionaram a “epidemia” de gravidezes entre adolescentes – as sessões no congresso norte-americano; as histórias publicadas na mídia; relatórios técnicos demonstrando diversos dados demográficos – não teriam convencido o público a embarcar nessa visão se não houvesse sido desenvolvido, juntamente a estes discursos, certo “pânico moral” sobre o assunto. O entendimento da GA enquanto um problema sanitário que precisa ser combatido com os contraceptivos ajudou a encontrar uma explicação para mudanças que vinham ocorrendo. Ela aparentava explicar um número de fenômenos desanimadores como: sinais de aumento de pobreza; iniqüidades raciais persistentes; costumes sexuais mais livres; e uma nova estrutura familiar (LUKER, 1997).

The new patterns of sexual behavior and new family structures were simply more visible among younger people, who had not committed themselves to the older set of choices. At the time, teenagers, especially those who had children, were defined as people who were embarking on a lifetime poverty (LUKER, 1997, p.86).

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Os riscos à saúde apresentados nos documentos do ICEC extrapolam as preocupações com a saúde materno-infantil. Incluem a “incapacidade psíquica para criar” e a “incapacidade fisiológica para gestar e o agravamento da pobreza” (BRANDÃO, 2006). Em uma ficha técnica “From childhood to womanhood: meeting the sexual and reproductive health needs of adolescents girls”, lançada pela UNFPA em 2012 e publicada na subseção “Partner Publications” , a preocupação é a de levar saúde sexual e reprodutiva para adolescentes vivendo em países em desenvolvimento, especialmente na África subsaariana onde existe uma “necessidade urgente” de serviços de saúde reprodutiva.

Adolescent pregnancy brings detrimental social and economic consequences for a girl, her family, her community and her nation. Many girls who become pregnant drop out the school, drastically limiting their future opportunities. A woman’s educations is strongly correlated to her earning potential, her health and the health of her children. Thus, adolescent pregnancy only fuels the intergenerational cycle of poverty and ill health (UNFPA, 2012, p.2).

Isto vai de encontro com o que Luker (1997) discute quando relativiza que este tipo de discurso parece incorporar nas adolescentes grávidas um comportamento essencialista – “a menina grávida que deixa a escola comprometendo seu futuro e o futuro de sua família” – e que a própria expressão “gravidez na adolescência” continua a ser um recurso simbólico para se referir ao problema da pobreza. Parece que a retórica dos anos 1970, gerada a partir de discursos que pretendiam assegurar às mulheres o acesso aos contraceptivos, criou uma fantasia não realista para explicar fatos de incerteza econômica, depositando a responsabilidade de tal incerteza sobre os corpos femininos. O discurso sanitário que aloca a GA como um “problema” se configura como homogeneizador sobre a “adolescente grávida”. Trabalhos extraídos da pesquisa GRAVAD (Gravidez na adolescência: Estudo Multicêntrico sobre Jovens, Sexualidade e Reprodução no Brasil ), que realizou um inquérito com jovens de 18 a 24 anos das cidades do Rio de Janeiro, Porto Alegre e Salvador, problematizam que estes discursos “homogeneizadores” traduzem-se em discursos morais e reguladores que colocam jovens mulheres como vítimas da própria ignorância e inconsequência, resultando em políticas voltadas ao controle da “gravidez precoce” (AQUINO et al, 2003; BRANDÃO, 2003; BRANDÃO, 2006; HEILBORN, BRANDÃO e CABRAL, 2007; HEILBORN e CABRAL, 2011). De acordo com Luker (1997), historicamente, o fato de as mulheres engravidarem no início de suas vidas reprodutivas não se constituía como um fenômeno problemático. Mas esta

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questão ganha novos sentidos com a entrada dos adolescentes no mercado de trabalho, a inserção profissional, a escolarização, sobretudo entre adolescentes do sexo feminino, e com novas pesquisas demográficas que demonstram uma queda da taxa de fecundidade adulta, em contraste ao aumento ou uma manutenção de taxas de maternidade entre as faixas etárias de 15 a 19 anos, como vem ocorrendo na América Latina, exceto no Brasil, Paraguai, Panamá e Nicarágua que vem reduzindo as taxas de maternidade na adolescência (CLADEM, 2014). Heilborn e Cabral (2011) discutem a partir de uma perspectiva histórica que a transição demográfica brasileira tem sido identificada como um elemento central do intrigante panorama da “reprodução precoce”. No censo de 1970 o total da taxa de fecundidade no Brasil era de 5.76 filhos por mulher, chegando a 1.81 em 2010. Tradicionalmente, as altas taxas de fecundidade eram vistas em mulheres entre 25 a 29 anos e de 30 a 34 anos, faixas etárias frequentemente compreendidas como um padrão tardio de fecundidade. Desde 1980 observou-se, entretanto, o aumento nas taxas de fecundidade entre mulheres de 15 a 19 anos, um dado que começou a se tornar notável quando comparado à queda simultânea das taxas de fecundidade entre mulheres de outros grupos etários. Embora o aumento dessas taxas de fecundidade entre mulheres adolescentes (15 a 19 anos) não tenha sido estatisticamente significativo, e de fato tenha sido um reflexo da profunda redução na participação de mulheres mais velhas no total da taxa de fecundidade, esses dados passaram a ser utilizados para compor uma cena de “epidemia” de gravidez na adolescência, sobretudo nos segmentos de baixa renda da população brasileira (HEILBORN e CABRAL, 2011). A pesquisa GRAVAD também obteve resultados parecidos com pesquisas divulgadas pelo relatório do CLADEM (Comité de América Latina y el Caribe para la Defensa de los Derechos de la Mujer,2014 ). Nestas pesquisas observou-se que, no Brasil, a prevalência de gravidez na adolescência nas capitais brasileiras foram menores do que as que podem ser inferidas em países da África, Ásia e alguns países da região Caribenha. Os valores estimados pela pesquisa GRAVAD foram de que 1/3 das mulheres já tinham pelo menos um filho antes dos 20 anos e 15,0% a 20,0% delas o tiveram antes dos 18 anos. Entretanto, os pesquisadores enfatizam que a grande maioria das gestações ocorreu, na sua primeira vez, aos 18 e 19 anos, quando as jovens já tinham atingido o marco da maioridade civil, ainda que mantendo relações de dependência econômica e domiciliar com suas famílias de origem, sendo que a maior parte das gestações ocorreu fora de uniões conjugais (AQUINO et al, 2003). Nota-se que o argumento sanitário das organizações que compõem o ICEC reverbera no Brasil quando observamos a GA sendo vista como um problema social que deve ser administrado pelas jovens mulheres. A importância das hierarquias de gênero tem sido pouco

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modificada quando se refere às decisões contraceptivas e, além disso, a educação sexual continua sendo um tópico difícil tanto no seio familiar quanto nas instituições escolares brasileiras. Também, ao contrário do observado nos documentos do consórcio, que enfatizam a GA em camadas de classe baixa, numa constante associação entre a gravidez precoce e a pobreza, no Brasil, a GA também está presente entre jovens de estratos sociais mais elevados. Isto significa que ela também ocorre entre adolescentes que possuem acesso a informações, contracepção e ao aborto seguro - embora clandestino - e com reais possibilidades de preencherem um projeto de vida em que a paternidade ou maternidade possui o status de algo que deve ser experimentado em um momento posterior da vida (HEILBORN et al, 2002; BRANDÃO, 2003; HEILBORN e CABRAL, 2011). É importante relativizar que não se trata de dizer que a questão da GA não exista e não acarrete problemas para a vida dos adolescentes, principalmente as meninas. Entretanto, cabe refletir que os discursos que se utilizam para falar dela podem estar nos levando a um retorno ou continuidade de um projeto de “planejamento familiar” que procura resolver tais questões apenas com a distribuição de contraceptivos (LUKER, 1997; CORRÊA, 2014). E, além disso, como já foi dito (LUKER, 1997) e é reforçado por Heilborn e Cabral (2011), é importante problematizar o tom moralista que tende a tratar o fenômeno como homogênio e contemporâneo, bem como designar uma nova forma de compreensão dos eventos reprodutivos nas biografias juvenis. Para refletir sobre o argumento que centra a gravidez na adolescência enquanto um problema social e sanitário como justificativa para expandir o acesso aos CE é preciso “sociologizar” o estatuto do problema (HEILBORN, et al, 2002). Tomo emprestada a problematização realizada pela equipe GRAVAD, onde os pesquisadores propuseram inserir a GA num quadro analítico fora do escopo sanitário, mas na perspectiva da aprendizagem e experimentação da sexualidade com parceiro, considerando especificidades da “cultura sexual brasileira” – sob esta perspectiva a gravidez na adolescência passa a ser considerada como uma possibilidade na trajetória dos jovens. Tal perspectiva crítica demonstrada pelos resultados e discussões da equipe GRAVAD também permitem refletir sobre as profundas disparidades econômicas e culturais entre classes sociais e entre as posições femininas e masculinas que vigoram na nossa cultura. Problematizando o argumento sanitário do ICEC, à luz da perspectiva socioantropológica, podemos interpretá-lo enquanto homogeneizador das práticas sexuais entre jovens a partir de um discurso voltado, em sua maior extensão, para o sexo feminino e para classes com menor poder econômico. Concordo com Heilborn et al (2002) para pensar o argumento sanitário do ICEC.

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Essa argumentação subestima o fato de que o leque de oportunidades sociais não é igualmente oferecido para jovens de diferentes classes e, além disso, supõe como universal o valor ou o projeto de um novo papel feminino (HEILBORN et al, 2002, p.18).

Entre um dos “benefícios de ação” apresentados pela UNFPA no documento citado, “From childhood to womanhood: meeting the sexual and reproductive health needs of adolescent girls” de 2012, publicado na subseção Partner Publications do ICEC, além de mencionarem a prevenção da GA pelo investimento em educação, saúde e direitos, pois isto melhoraria a contribuição das meninas com suas famílias, gerando mais renda e novas oportunidades para futuras gerações - “Combined, their actions can help lift communities and countries out of poverty” (UNFPA, 2012, p.4) -, também assinalam que a prevenção da GA poderia diminuir as taxas de crescimento populacional.

Studies have shown that preventing adolescent pregnancy and increasing the age of first births could significantly lower population growth rates, potentially generating broad economic and social benefits, in addition to improving the health of adolescents (UNFPA, p. 4, 2012).

Além disso, segundo Westley et al (2013), em artigo publicado na revista International Journal of Gynecology and Obstetrics , contido na subseção ICEC Publications (A review of global access to emergency contraception ), as adolescentes são um grupo que possuem especial necessidade dos CE, pois são vulneráveis à coerção sexual, menos propensas à utilização de método contraceptivo regular e ao conhecimento sobre contracepção e saúde reprodutiva. Essas versões homogênias e neomalthusianas abrem espaço para que as mães adolescentes pobres e solteiras possam ser alvo de uma ação profilática. De acordo com Heilborn et al (2002), algumas indagações devem ser direcionadas a este modo de alocar as gravidezes e as práticas contraceptivas, indagações que possam complexificar estas questões. Em primeiro lugar trata-se de questionar a definição médica de uma faixa etária universal que não responde a questões difíceis, como: se a GA ocorre por causa de uma falta de planificação e de uso dos contraceptivos, como bem apontam o ICEC e seus parceiros, é pertinente aplicar esta designação para os casos em que a gestação ocorre de forma programada? Será que estamos diante de um fenômeno que atinge da mesma forma todos os adolescentes, independente dos contextos socioculturais nos quais se inserem?

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Para Lawlor e Shaw (2004) a gravidez na adolescência vista como um problema de saúde pública também homogeiniza experiências. As autoras partem do argumento de que o que se tem estudado ultimamente é que a GA não acarreta problemas de saúde comumente a ela associados, ao contrário. E também não leva à perpetuação de situações de pobreza. Tais riscos se devem a determinantes sociais, econômicos e culturais do universo em que as adolescentes se encontram. O argumento sanitário de que existe uma epidemia de gravidezes não intencionais e que por isso os CE devem ter seu acesso expandido possui no seu interior um processo de medicalização da sexualidade feminina. A aproximação da gravidez a uma lógica do risco, da patologia e da epidemia tende a enraizar na biologia e nas teorias demográficas alarmistas a complexidade da sexualidade feminina em um corpo humano a-histórico. Vários trabalhos já demonstraram entre nós as especificidades que cercam a prática sexual entre homens e mulheres, jovens e adultos, ressaltando as hierarquias de gênero, a complexidade das relações familiares, as situações de vulnerabilidade que predispõem ao não uso do método contraceptivo ou de proteção às DST e ao HIV e os cálculos que envolvem um risco negociado ao se lançar em uma relação sexual sem proteção (BRANDÃO, 2009; CABRAL, 2011). Do ponto de vista sociológico, o argumento sanitário, presente nas declarações e documentos do ICEC, reifica os CE e reforça a perspectiva prescritiva e da normatização e normalização de condutas na saúde pública, que reduz a compreensão do exercício da sexualidade adulta, adolescente e juvenil ao simples uso de métodos contraceptivos para proteção da gravidez, e nesse sentido, reduz o alcance de um autêntico acesso.

5.2. O argumento farmacêutico: entre a autonomia reprodutiva e a farmacologização do corpo feminino.

Outro argumento encontrado nos documentos veiculados pelo ICEC é o que denomino de farmacêutico. Refiro-me assim a esta categoria de análise por ter percebido a ampla divulgação de material biomédico enfatizando aspectos farmacológicos do CE no website . Os argumentos de natureza farmacológica dos CE estão presentes o tempo todo, apontando e dirimindo algumas inquietações em torno do contraceptivo. Em primeiro lugar, a segurança e eficácia dos CE são pauta de diversas discussões e se apresentam amplamente nos documentos. Para o ICEC, o fato de os CE serem seguros é um argumento forte para que as

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mulheres devam acessá-los. A segurança e eficácia são premissas para uma ampla campanha do consórcio para que os CE sejam distribuidos pelos farmacêuticos, profissionais que consideram estratégicos porque estão mais próximos do público em geral, ou mesmo que sejam distribuídos de forma over the counter em farmácias, ou seja, o cliente poderia acessá- lo sem qualquer interação com o profissional de saúde, diretamente nas gôndulas de produtos. Além disso, o mecanismo de ação dos CE é um dado farmacológico que gera muitas inquietações em setores conservadores como a Igreja Católica, por exemplo. Eles são considerados “abortivos” e tal oposição é amplamente discutida tanto no website quanto na lista de e-mails do consórcio. A estratégia é afastar os CE do aborto, “purificando-os” como um produto científico que deve ser tomado em sua dimensão científica e não política (LATOUR, 2009). Este argumento se diferencia do argumento sanitário, primeiramente, por sua dimensão individualizante. Enquanto o argumento sanitário invoca a todo o momento a preocupação com a coletividade, o argumento farmacêutico envolve um discurso mais “exclusivo”, dirigido para a mulher. O ICEC associa a segurança e eficácia como elementos fundamentais para a “obtenção” da “autonomia” feminina. Ao demonstrar estas características farmacológicas o discurso ganha legitimidade científica para advogar em prol da “autonomia”, do “empoderamento” feminino por meio dos CE. Mamo e Fosket (2009) sugerem que existe um discurso de marketing farmacêutico que tem associado os contraceptivos à liberdade, escolhas e possibilidades, discurso que parece estar sendo incorporado pelo Consórcio. Em segundo lugar, a diferença é que, enquanto o argumento sanitário é normatizador, o argumento farmacêutico se detém em separar, estrategicamente, a política e a ciência, no sentido de que o acesso à inovação científica e tecnológica beneficia a vida humana e, portanto, deve ser garantido.

5.2.1. Segurança e eficácia dos contraceptivos de emergência como questões centrais.

Como dito, os CE para o consórcio são envoltos pela simbologia do “risco”, da “prevenção”, “da última ou segunda chance” de se evitar uma gravidez. São tidos como contraceptivos “perigosos” por setores conservadores, notadamente a Igreja Católica. Dessa forma, uma das estratégias do ICEC, para expansão dos CE, tem sido focar na segurança e na eficácia dos contraceptivos. Documenta-las tem sido fundamental para o consórcio que dialoga principalmente com profissionais e gestores do campo da saúde. Um dos primeiros

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documentos que tive contato no website chamado “Fact sheet on the safety of levonorgestrel- alone emergency contraceptive pills (LNG ECPs)” publicado pelo ICEC em parceria com a OMS, FIGO, IPPF e HRP (que agrega UNFPA, OMS, Banco Mundial), de 2010, fala sobre o levonorgestrel ser bem tolerado, não alergênico, ser excretado rapidamente pelo corpo, não ser viciante e nem apresentar reações tóxicas, ou seja, um medicamento seguro. Além disso, não apresenta riscos para desenvolvimento de câncer e contem menos da metade da dose encontrada em cartelas de contraceptivos de uso regular. Recentemente, em abril de 2014, uma discussão sobre a eficácia reduzida da CE contendo levonorgestrel, quando utilizada por mulheres pesando 75 Kg ou mais, esteve presente na lista de e-mails do ICEC. A discussão teve início a partir de uma solicitação de autoridades européias em 2013 para a modificação do rótulo do Norvelo ® (levonorgestrel 1,5 mg), produzido pela HRA pharma. A empresa farmacêutica teve que adaptar o rótulo do produto com os dizeres:

Em testes clínicos a eficácia do contraceptivo foi reduzida em mulheres pesando 75 Kg (166 lbs) ou mais, e levonorgestrel não foi efetivo em mulheres que pesavam mais de 80 Kg (176 lbs) (HRA pharma, 2014).

Em artigo publicado na revista Contraception , veiculado na lista de e-mails no dia 7 de julho de 2014, intitulado “A tale of two label changes” , Cleland e Wood (2014) argumentam que se deve ter cautela e realizar mais estudos para afirmar que esta relação é válida e para que se modifique o rótulo de um medicamento. A discussão gerou várias reações dos membros do consórcio e diversos estudos foram lançados. Um membro da lista de e-mails, O’Brien, P., do serviço de contracepção e saúde sexual e reprodutiva “ Raymede Clinic ” em Londres questionou, no dia 21 de abril de 2014, que os interesses da empresa podem estar obscurescendo os dados sobre o assunto, por que é produtora do Ulipristal (Ella ®/ellaOne ®) e teria muito a ganhar ao demonstrar a ineficácia do levonorgestrel. Em resposta, alguns membros se posicionaram relatando que o Ulipristal é realmente o mais eficaz, mas que em sua falta, os contraceptivos de emergência contendo levonorgestrel seriam “melhores do que nada”. A empresa Gedeon Richter, parceira do ICEC, também lançou nota em 2013 sobre o assunto por meio do seu setor de relações públicas, posicionando-se pela efetividade e segurança dos contraceptivos de emergência em mulheres com maior massa corporal:

Gedeon Richter levonorgestrel containing products have been on the market for more than 30 years and this is the very first time when any possible association has

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arisen between BMI and EC failure. Available extensive clinical and post-marketing data contradict the assumption of an increased risk of EC failure in overweight and obese women. Based on the available long-term experience, Gedeon Richter is of the opinion that the administration of the Company’s LNG containing emergency contraceptive products in overweight and obese women is safe and effective (Zsuzsanna Beke, Head of Public Relations and Public Affairs, 2013).

O arsenal tecnológico utilizado para produção de contraceptivos já foi debatido por Mastroianni et al (1990) e Hardon (1992), que avaliam que a maior parte dos contraceptivos no mercado farmacêutico não tem atendido plenamente às necessidades das mulheres. Embora os contraceptivos sejam efetivos, isto não é uma realidade para todas as pessoas, pois as falhas de uso não são baixas. Desta forma, Mastroianni (1990) avalia que um contraceptivo barato, fácil de usar, com poucos efeitos colaterais e altamente eficaz ainda é necessário. Hardon (1992) vai além e critica que a maior parte dos estudos para o desenvolvimento de contraceptivos não fornece um entendimento sobre as representações ou visões de mundo que as pessoas possuem sobre suas fisiologias reprodutivas e suas próprias percepções sobre o mecanismo de ação, pois as crenças em torno destas questões podem afetar a percepção sobre o método. Estas discussões chamam atenção para um aspecto fundamental que diz respeito ao papel das indústrias farmacêuticas nas novas formas de medicalização da sexualidade e na produção do “encanto dos medicamentos” como objetos desejáveis (VAN DER GEEST e WHYTE, 2011). Para tanto, as empresas farmacêuticas se tornaram aliadas a setores médicos, ativistas feministas e ativistas dos direitos sexuais e reprodutivos. Para Van Der Geest e Whyte (2011), o grande desejo pelo uso de medicamentos vai além de sua eficácia bioquímica, mas implica também uma eficácia que é culturalmente construída. De acordo com Rose (2013), uma área chave nos gastos com saúde atualmente é o mercado farmacêutico. O IMS Health “ a única fonte global de inteligência do mercado farmacêutico que fornece informação crítica, análises e serviços que norteiam decisões e modelam estratégias ” estima que o consumo farmacêutico durante os doze meses anteriores a maio de 2004, nos Estados Unidos, foi de US$ 167, 9 bilhões, 10% a mais em relação ao ano anterior; no Reino Unido, foi avaliado em US$ 14,2 bilhões, 11% acima, com taxas de crescimento ainda maiores na América Latina (Rose, p.56, 2013). De acordo com Biehl (2007, p.1097), o mercado farmacêutico na América Latina cresceu 18,5% em 2005, chegando a acumular US$ 24 bilhões. Além disso, no Brasil este mercado acumulou US$ 10 bilhões em 2005, tornando-se o décimo primeiro maior mercado farmacêutico no mundo.

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Para Cottingham e Berer (2013), em nenhuma outra área da saúde há tanta “medicação” para pessoas saudáveis como na seara da reprodução e sexualidade, onde os produtos farmacêuticos são utilizados durante todo o período de vida sexual ativa. Segundo estas autoras, o mercado de contraceptivos movimenta em torno de 6,2 bilhões de dólares, enquanto que o mercado de diagnóstico e tratamento para problemas cardiovasculares movimenta cerca de 111 bilhões de dólares. Isto pode explicar a interação entre as indústrias produtoras de contraceptivos e o ICEC, que pode facilitar, por exemplo, o acesso aos CE, incrementando ainda mais o mercado de contraceptivos. A advocacy promovida por este consórcio para a venda OTC se baseia amplamente em dados de eficácia e segurança dos contraceptivos de emergência que estão no mercado. Desta forma, para pensar sobre o argumento farmacêutico lanço mão de algumas perspectivas analíticas sobre o conceito de medicalização e farmacologização (WILLIAMS, MARTIN e GABE, 2011) que nos ajudam a pensar a difusão dos contraceptivos de emergência pelo consórcio. É interessante notar que o processo de medicalização da sexualidade passou por um longo desenvolvimento desde meados do século XIX, com os estudos sobre “perversões” aos estudos de Masters e Johnson sobre o orgasmo. Hoje, assistimos a uma nova fase deste processo. Russo (2013) nos mostra a passagem da “segunda onda sexológica” para uma terceira fase, a fase da Medicina Sexual. Esta nova fase, capitaneada pela indústria farmacêutica se esforça para resolver problemas a partir dos medicamentos, no caso do ICEC, o problema da “gravidez não planejada”. O esforço empreendido pelo consórcio para tornar a CE contendo levonorgestrel como um medicamento essencial pode servir para pensarmos o conceito de farmacologização (WILLIAMS, MARTIN e GABE, 2011). Algumas dimensões descritas pelos autores são úteis para refletirmos a respeito: em primeiro lugar, a redefinição ou reconfiguração dos problemas de saúde como tendo uma solução farmacêutica – no caso, o problema da “gravidez não planejada”, da “gravidez na adolescência”; a mediação dos produtos farmacêuticos na cultura popular e na vida diária – como exemplo temos as campanhas ECOTC promovidas em parceria com o consórcio; e além disso a inovação de medicamentos e a colonização do futuro da saúde, apesar da crise de produção e inovação da indústria. Definir os contraceptivos de emergência como medicamentos parece, entretanto, contraditório porque eles não tratam nenhuma doença, uma vez que, como se costuma dizer “gravidez não é doença”. Porém, eles possuem todos os requisitos de uma tecnologia farmacêutica. São produtos farmacêuticos, elaborados com base em evidências científicas da biologia, da biomedicina e da farmácia. Pensar sobre contraceptivos como medicamentos

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implica em perceber que a produção farmacêutica é um dos lugares onde a sociedade deve tratar dilemas complexos relativos tanto à gestão do futuro quanto à definição do bem-estar (DESCLAUX, 2006). Além disso, embora os contraceptivos não tenham sido reconhecidos como “medicamentos de estilo de vida” quando foram planejados, eles podem ser assim reconhecidos. Desse modo, vão além de um simples produtos terapêuticos, mas tornam escolhas de vida em possibilidades reais. Há um processo onde existe uma circularidade de vozes que ora valorizam a questão da doença e do medicamento e, ora o potencial que possuem em conferir melhorias na qualidade de vida das pessoas (AZIZE, 2002). Para estruturar um processo contingente de busca pela saúde pelas sociedades industriais contemporâneas o conceito de medicalização foi formulado. Entretanto ele adquire algumas formas para diferentes autores. Para Foucault, por exemplo, a medicalização é uma conseqüência inevitável dos processos de transformação social que criam a medicina moderna e ao mesmo tempo se submetem a ela. Para Conrad (2007), ela é um processo de transformação de problemas anteriormente não considerados “médicos” (ou “de saúde”, como acrescenta Camargo, 2013) em problemas médicos (CAMARGO, 2013). Ainda, alguns autores (CLARKE et al, 2003) argumentam que a medicalização está se transformando em uma biomedicalização, onde a saúde está se tornando uma responsabilidade individual que deve ser preenchida por meio do melhor acesso a informação, conhecimento, prevenção de riscos e serviços e tecnologias de saúde. Para Nikolas Rose (2013), o que está ocorrendo no século XXI é uma biopolítica contemporânea pautada em cinco dimensões que ele denomina: molecularização, otimização, subjetificação, expertise somática, economias de vitalidade. Destas, considero três delas especialmente interessantes para pensar o argumento farmacêutico. Em primeiro lugar, a molecularização – “o estilo de pensamento” da biomedicina contemporânea considera a vida no nível molecular como uma série de mecanismos vitais e entidades moleculares que podem ser identificadas, isoladas, manipuladas, etc. Para o autor, a indústria farmacêutica - e podemos dizer que o ICEC também se apropria deste discurso - fala e pesquisa em termos moleculares sobre mecanismos de ação e agentes terapêuticos. Como afirma Clarke (1998), as ciências reprodutivas tiveram que ser disciplinadas e traduzidas para o universo da biomedicina, no caso destas ciências o processo de “molecularização” se deu junto com a emergência de ciências como a bioquímica, com a “descoberta” ou construção dos hormônios como substâncias chave para o controle dos nascimentos. A otimização – para Rose (2013), além da polaridade saúde/doença hoje podemos observar a biomedicina voltada para o objetivo de melhorar um futuro, mas isto se dá de

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forma controversa sobre o que realmente significa um estado excelente para a vida humana ou coletiva. Neste caso, o discurso do ICEC vai no sentido de que os CE, enquanto uma opção para as mulheres, poderiam melhorar seu futuro, dando-as uma segunda chance de construírem uma carreira profissional, planejarem seus filhos, viverem com maior liberdade. Outra dimensão desta biopolítica contemporânea é a subjetificação – os direitos e as expectativas em relação à vida dos indivíduos fez emergir uma "ética somática” que seriam valores para condutas de vida e que atribui lugar central à existência corporal e física. A saúde passou a ser um valor ético fundamental e dessa forma, deve-se cuidar ao máximo do próprio corpo. Rose (2013) ainda acrescenta que a mulher deve cuidar, além do seu corpo, do corpo do coletivo (parceiros, filhos). Enquanto o Estado se engaja para preservar e administrar a saúde coletiva da população, seja gerenciando a reprodução, seja tentando eliminar toxinas, os indivíduos devem exercitar a prudência biológica, para seu próprio bem e para o bem de todos. Neste caso, Rose (2013) argumenta que nossa subjetividade passa cada vez mais por nossa corporalidade, pelo biológico. Em relação ao corpo reprodutivo, Clarke (1998) já defendia que ele existe sob uma ética econômica da fecundidade, derivada da teoria malthusiana. Esta ética declara que as famílias não podem ter mais filhos do que podem manter. Este corpo ainda requer das ciências reprodutivas e de seus produtos tecnocientíficos para que a sua natureza seja cada vez mais operacionalizada pelo bem da sociedade (CLARKE, 1998). Para Rose (2013), estamos assistindo uma biopolítica que expõe nossa vida como jamais antes para exploração econômica e ao mesmo tempo, a individualiza. Nossa vida, cada vez mais está aberta à escolhas e à responsabilidade e assim, à “política da vida em si”. Como conseqüência desse processo, o conceito formulado por William, Martin e Gabe (2011) é interessante e reflete que os processos atuais escapam ao conceito de medicalização, mas se encaixam na lógica da “farmacologização” ( pharmaceuticalization) , conceituada por eles como a tradução ou transformação de condições, capacidades e potencialidades humanas em oportunidades para intervenções farmacológicas. Ainda que com uma interface com a medicalização, a farmacologização não estaria necessariamente ligada a algum tipo de diagnóstico médico (CAMARGO, 2013). Por exemplo, a utilização de medicamentos over- the-counter , acesso que é amplamente defendido pelo ICEC em relação aos contraceptivos de emergência, demonstra o conceito entre nós. O acesso OTC dos contraceptivos de emergência é muito defendido pelo ICEC. A Pharmacy Provision é defendida porque a farmácia seria o local de mais fácil acesso da população e, portanto, facilitaria à obtenção dos CE em tempo oportuno. De acordo com o

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documento “Emergency Contraception: Steps being taken to improve access” de 2002, publicado pela Guttmacher Institute e encontrado na subseção Partner Publications , o fornecimento por meio destes estabelecimentos farmacêuticos preveniram uma estimativa de 2000 “gravidezes não planejadas”. Olhando para estas dimensões e refletindo sobre as discussões em relação à segurança e eficácia e acesso OTC, os quais integram parte de um argumento mais amplo que denomino como “farmacêutico”, podemos pensar que estes discursos para ampliação do acesso parecem servir tanto à ampliação da autonomia reprodutiva feminina quanto à intensificação desta farmacologização – da sociedade e da sexualidade - que se encontra imersa em uma biopolítica contemporânea. Para Foucault os contraceptivos seriam “tecnologias disciplinares” que poderiam disciplinar o comportamento de diversas maneiras. Mas ao mesmo tempo, dependendo do contexto que se fala, os contraceptivos podem ser meios de libertação, oferecendo estratégias de resistência contra a disciplinarização do gênero, raça e classe (CLARKE, 1998).

Figura 7: Cartaz de campanha pela venda OTC em farmácias. “Estas regras são ridículas. Uma pílula que é mais segura do que aspirina não deveria estar atrás do balcão. Contracepção de emergência precisa estar em nossas mãos”. Reproductive Health Technologies Project (RHTP), acessado em maio 2014: http://rhtp.org/ECotc.asp.

A campanha do ICEC para tornar os CE contraceptivos OTC é ampla no website e na sua lista de e-mails. Analisando estes espaços me deparei com um projeto maior do qual o consórcio faz parte em parceria com o Reproductive Health Technologies Project (RHTP), que se intitula “ECOTC” . O RHTP tem como principal objetivo: “que cada mulher possa

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atingir completa liberdade pelo acesso às tecnologias seguras, eficazes para que assegurem a si mesmas sua saúde e controle da sua fertilidade”. A campanha em parceria com RHTP para o acesso OTC pode ser encontrada acessando o website “http://rhtp.org/ECotc.asp” e contou com pedido de assinatura de petições e cartazes, como o visto acima que dá um tom “jovial” à campanha. Ao argumentar em prol da venda OTC dos contraceptivos de emergência, o consórcio se refere à natureza dos medicamentos ocidentais, os quais podem se desprender dos profissionais médicos e farmacêuticos. De alguma forma cabe pensar que a contracepção de emergência objetifica o trabalho dos profissionais de saúde e o agrega em um produto que pode ser usado por qualquer um (VAN DER GEEST e WHYTE, 2011). Esta argumentação pela venda OTC leva às últimas conseqüências o que Van Der Geest e Whyte (2011) argumentam quando dizem que os medicamentos são libertadores, pois quebram a hegemonia dos profissionais e habilitam as pessoas a se responsabilizarem por sua administração farmacológica. Os autores mostram estudos que demonstraram o distanciamento que os medicamentos podem agenciar quando em relação com os especialistas. Por exemplo, os estudos de Allend Jr em 1970 demonstraram que as pessoas não procuravam tanto a ajuda profissional em hospitais, mas sim medicamentos. Estes locais eram vistos como fontes de medicação. Apesar de os medicamentos quebrarem a hierarquia com profissionais de saúde, um dos seus “encantos” é que, mesmo removidos de seu contexto, eles mantêm uma potencial conexão com médicos, laboratórios que os produziram, com a ciência biomédica que forma sua base essencial (VAN DER GESST e WHYTE, 2011). Além disso, eles podem também se tornar veículos de individualização, como no caso dos contraceptivos ou no caso dos medicamentos abortivos, onde as mulheres utilizam-nos de forma privada, diminuindo a dependência dos médicos e de outros profissionais. É a concretude dos contraceptivos de emergência que estabelece o seu “encanto”, fácil de manusear após o ato sexual. São mercadorias que envolvem um acordo geral quanto ao seu valor e frequentemente visões divergentes de suas características e capacidades particulares (VAN DER GEEST e WHYTE, 2011). Se por um lado temos, mais evidente no argumento sanitário, uma preocupação com a saúde da população, com o número de filhos e as questões econômicas que uma gravidez inesperada possa acarretar, o argumento farmacêutico foca na responsabilidade individual pelo acesso particular aos contraceptivos de emergência, sendo responsabilidade da usuária se informar sobre segurança, eficácia, mecanismo de ação, posologia do contraceptivo, tendo também a possibilidade, caso deseje, de consultar um profissional de farmácia, seja ele o

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farmacêutico ou o balconista. Isto recorda o que Foucault (1990) chama de “tecnologias do eu”. Para o autor, não se pode aceitar nenhum conhecimento como um valor dado, mas sim como “jogos de verdades” que se relacionam com técnicas específicas que as pessoas utilizam para entender a si mesmas. As tecnologias do eu permitem aos indivíduos efetuarem por conta própria, ou com a ajuda de outros, certo número de operações sobre o corpo, obtendo uma transformação ou atingindo um objetivo específico. A própria mulher deve equipar-se de um saber médico do qual pode servir-se permanentemente. A farmacologização proposta pelo ICEC, por meio do argumento farmacêutico, enfatiza a individualização dos problemas sociais, pois transforma um problema social em um problema individual. A gravidez imprevista, “indesejada” ou na adolescência passa de um problema coletivo para um problema que deve ser administrado pelas mulheres por meio dos CE. Neste caso, a automedicação não toma a forma de um protesto contra normas sociais, mas se configura como a própria norma a ser seguida (CANGUILHEM 1978; FAIZANG, 2013) Desde o século XVIII que médicos e filósofos dissertavam sobre suas críticas à maneira dos médicos se “apoderarem” da existência de seus clientes para regê-las nos seus detalhes. Acreditavam que a medicina teria tamanho valor que os clientes não deveriam submeter-se a um médico quando estivessem em boa saúde. Era necessário que todos compreendessem a medicina para que pudessem ser seus próprios conselheiros. E dentro deste quadro global tão fortemente marcado pela centralidade do corpo, da saúde e da medicina, a sexualidade passa a ser marcada por valores positivos e negativos girando dentro de um sistema de controle que ora a coloca de frente para a autoridade médica e ora aliada à “autonomia” que a tecnologia farmacêutica possa conferir (FOUCAULT, 1985). Para Faizang (2003; 2013), o uso de medicamentos revela sobre os indivíduos e uma sociedade. O uso dos medicamentos e a percepção sobre a receita médica irá variar de acordo com o universo simbólico dos indivíduos o que coexiste em relação à eficácia, à segurança, características inerentes do medicamento, e ao saber e autoridade de profissional de saúde. Com a emergência de tecnologias governamentais cada vez mais pautadas em perspectivas liberais ocorre a crescente ênfase sobre a responsabilidade dos indivíduos administrarem seu propóprio futuro. De acordo com Rose (2013), no campo da saúde isso tem se tornado muito eloqüente, as pessoas estão sendo cada vez mais estimuladas a tornarem-se consumidores ativos e responsáveis dos serviços e produtos da medicina e da farmácia que vão de drogas medicinas às tecnologias reprodutivas. Esse processo é o que Rose (2013) denomina de “Etopolítica”. A etopolítica é um conceito criado pelo autor que, ao analisar a biomedicina contemporânea, pôde concluir que se a disciplina individualiza e normaliza; a biopolítica

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coletiviza e socializa; já a etopolítica diz respeito às autotécnicas pelas quais os indivíduos julgam a si mesmos e intervém em si mesmos. Esta etopolítica consegue promover um “médium” dentro do qual o autogoverno de um indivíduo “autônomo” pode estar conectado com os imperativos de um “bom” governo. Esta conexão diz respeito ao estímulo da “autonomia” para o bem da coletividade. Considerando a eficácia e segurança dos CE como garantidas pelo consórcio e seus parceiros produtores e pesquisas que demonstram que o almejado “efeito populacional” dos CE não pode ser constatado, existe uma articulação de discursos que ora apontam para a necessidade de expansão do acesso devido às questões sanitárias e populacionais e ora se voltam para advogar em prol das escolhas contraceptivas e o empoderamento feminino ao acessarem os contraceptivos de emergência. Como apontado anteriormente no argumento sanitário, a lógica do “ It works if you take it ” somada ao discurso que torna os CE como opção que confere empoderamento às mulheres pode estar associado ao que Rose (p. 48, 2013) chama de um novo tipo de “poder pastoral”. O autor avalia que especialmente as mulheres são obrigadas a assumir a responsabilidade por seus próprios futuros – no que diz respeito à medicina - e por aqueles de suas famílias e filhos, são princípios éticos direcionados por um tipo de “pastoreio” entre aqueles que aconselham (ICEC) e aqueles que são aconselhados (as mulheres), o qual obscurece as fronteiras da coerção e do consentimento. Os discursos biomédicos utilizados pelas sociedades liberais transformam a subjetividade daqueles que são aconselhados, oferecendo novas linguagens para descrever sua situação e novos critérios para calcular as possibilidades e os perigos. Isto pode ser percebido por esta passagem escrita por Westley, Coeyataux e Wells (2009) em artigo publicado na revista Contraception, “Emergency Contraception: have we come full circle?” e também disponibilizado na subseção ICEC Publications.

Wome’s health advocates have fought long and hard to make “choice”, not demographic indicators, the foundation of reproductive health services. Emergency Contraception is a prime example of a method that expands choice, not only because it provides a unique post-coital opportunity, but also because women can access it for themselves with minimal medical supervision (Westley, Coeyataux, Wells, 2009, p.3).

Desta forma, podemos refletir a partir da ideia de Rose (2013) sobre a política da própria vida. Quando o ICEC argumenta a partir da farmacologia dos contraceptivos de emergência e da venda OTC, torna a contracepção de emergência como um contraceptivo passível de ser escolhido. Nossas individualidades somáticas e corpóreas se tornam campos de

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escolhas e responsabilidade. Nossa vida biológica entrou no domínio da decisão e da “escolha”, na era da política vital, da ética somática e da responsabilidade biológica (ROSE, 2013, p.66). Em parte, devido à intervenção feminista, houve de fato uma mudança da abordagem que coloca os contraceptivos em um “tamanho único” para uma abordagem que cabe em um nicho pós-moderno e individualizante ao qual Clarke (1998) chama de abordagem “cafeteria”, que oferece uma ampla gama de possibilidades contraceptivas. Entretanto, é preciso ponderar se esta variedade de contraceptivos que se encaixa nesta visão pós-moderna se encontra no hemisfério norte do globo, e se o “tamanho único” continua dominante em alguns países do hemisfério sul.

5.2.2. Contracepção de emergência – entre a ciência e a política: “Para algumas pessoas o mundo ainda é plano e Galileo Galilei ainda um herege”

O mecanismo de ação (MOA – Mechanism of action) dos contraceptivos de emergência hormonais é um dos maiores argumentos para expansão do acesso a estes tipos de CE pelo ICEC. Dizer que eles não são abortivos é uma estratégia muito cara ao Consórcio e se apresenta em praticamente todos os documentos analisados, pois consideram que isto tem surtido efeito positivo para expandirem os CE principalmente para países com cenários políticos conservadores, tendo ajudado a sua inserção em países onde o aborto é proibido, como no Brasil. Para muitos setores conservadores da sociedade os CE são abortivos porque se encontram nesta situação liminar: uma forma de contracepção utilizada após o coito. O consórcio se esforça em contra-argumentar dizendo que eles não atuam após o óvulo fecundado já ter sido implantado e tenta “desmistificar” fatos defendendo que os CE na sua forma farmacêutica de comprimido são “apenas uma pílula contraceptiva” . No documento EC and Medical Abortion , publicado em 2013, na subseção ICEC Publications , produzido pelos membros do consórcio, explicam o mecanismo de ação e dizem que é fundamental para os ativistas, gestores e profissionais da saúde realizarem a distinção entre os CE e o aborto. Além disso, o website designa uma subseção específica para esta diferenciação: EC and Medical Abortion . Também em uma publicação de 2012 ( ICEC Publications ) “Mechanism of action: how do levonorgestrel-only emergency contraceptive pills (LNG ECPs) prevent pregnancy?”

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apresentam diversos estudos que mostram que este tipo de contraceptivo previne ou atrasa a ovulação e por isto ressaltam que a “linguagem da implantação” não deve estar presente quando se fala sobre CE. Além disso, atestam que o fato de os CE não serem 100% efetivos corrobora o fato de não agirem na implantação. Estes dados farmacológicos sobre mecanismo de ação geraram algumas discussões na lista de e-mails do ICEC. Pesquisadores, profissionais de saúde e membros da coordenação do ICEC se utilizam dos dados farmacológicos para construir estratégias políticas que possibilitem o acesso aos contraceptivos. Em uma troca de e-mails em junho de 2012, a coordenadora do ICEC elogiou um editorial publicado no jornal The New York Times, dia 8 de junho de 2012, intitulado “How Morning-After Pills Really Work” o que gerou uma série de discussões. Em resposta a isto, um dos membros do ICEC Reymond, E., consultora científica da parceira Gynuity , problematizou a atitude do consórcio em sua preocupação com o mecanismo de ação.

These articles give the impression that such a mechanism is an important, even central part of the justification for women’s right to have access to the method. Clearly it is for some people. But we should not allow those people to hold the rest of us hostage. We need methods with post-fertilization mechanisms. Let’s face it: although the current LNG EC regimen works better than nothing, it doesn’t work very well. Research has failed to demonstrate any population-level benefit, and even for individuals, the pre-ovulation mechanism means that this regimen can help only those women who actually take it before ovulation. Women deserve better. And any more effective postcoital method will have to work after fertilization. Technically, such methods are certainly feasible; what’s holding us back from developing them is anxiety about post-fertilization mechanisms. If we give in to that anxiety – accept it as legitimate – we reinforce its effect. In the long term, that hurts women. We need to make clear that women need access to all effective fertility control methods, regardless of mechanism (Reymond, E. Junho, 2012).

Outros membros como Croxatto, H; Garcia, A. e Wysocki, S. concordaram com a problematização da colega. Garcia, A. sinaliza a ansiedade em relação ao mecanismo de ação.

As advocates, we do seem to want to defend EC and it’s mechanism as not an abortifacient. In fact, we take offense when someone inadvertently refers to EC as the abortion pill. That’s why taking the stance you propose initially feels uncomfortable. What I love about it is…the reverse psychology of it! As if the opposition was catching us thinking out loud saying, “if only EC worked after fertilization, then it would prevent pregnancy better than it does.” This attitude would go a long way toward reducing anxiety and making it more accessible. We advocates have recognized the deficiencies of EC, including “limited mechanism means limited efficacy” but are forgiving because EC has a special place and purpose as the only postcoital contraceptive. Absolutely right, EC is an important option for women but they deserve better (Garcia, A. Junho, 2012).

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Além disso, Croxatto, H. fornece argumentação científica a qual, segundo ele, seria útil para argumentar em favor de um método que pudesse agir após o processo de fertilização já ter iniciado. Para o pesquisador, uma argumentação estratégica seria a ideia de que logo após a implantação existe apenas um aglomerado de células que “não podem ser uma pessoa”. Entretanto, Picavet, C. profissional do Centro Alemão de Saúde Reprodutiva respondeu, utilizando uma metáfora sobre Galileo Galilei - personagem incônico que abalou o pensamento epistemológico da Idade Média – ao afirmar não acreditar que algum argumento possa ser válido para a “oposição” e que a eficácia limitada dos CE deve ser utilizada para promover o uso da contracepção regular.

For some people the world is still flat and Galileo Galilei still a heretic. I think for ‘the opposition’ not any argument is going to work. However, I don’t think the general public needs oneliners (and certainly not only oneliners). The less ideologically prejudiced are just ordinary people who are concerned with any number of issues, of which ending life may be one. They need nuanced and accurate information. After that, they can make their own decisions. Actually, the limited efficacy of EC can be used as an incentive to promote ongoing contraception, which should be our first and most important aim. EC remains a backup method (Picavet, C. Junho, 2012).

Esta discussão se prolongou por alguns dias e culminou, no final do mês de junho, em um documento não oficial que circulou pela lista de e-mails, enviado por Kelly Cleland (coordenadora ASEC). Este documento produzido pela direção do ICEC sintetizou as discussões de como o ICEC aborda o MOA e as posições dos membros do consórcio sobre isso, as quais podem ser distribuídas em quatro perspectivas. Em primeiro lugar, alguns membros concordaram que o ICEC deveria advogar por métodos pós-coito que agissem após a ovulação (como antiprogestinas em determinadas doses, por exemplo), ao invés de métodos que atuam pré-fertilização – como o levonorgestrel. Isto porque consideram que os métodos pós-fertilização são mais efetivos, e para que não se fechem as portas para métodos que possam estar disponíveis no futuro. Consideram que focar apenas em métodos pré-fertilização poderia implicar que os métodos pós-fertilização não são aceitáveis pelo consórcio. Além disso, estes membros concordaram que o ICEC deveria se concentrar mais no porque as mulheres precisam dos CE, ao invés de focar no contraceptivo em si, em como ele age. Em uma segunda perspectiva, membros do ICEC concordaram que o consórcio deve continuar promovendo os métodos atuais de contracepção de emergência, mesmo que não sejam tão efetivos quanto seriam se agissem após a ovulação. Para estes membros não se deve

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enfatizar muito a falta de efetividade dos CE, pois isto poderia se transformar em argumento para mais oposição em relação ao contraceptivo, limitando seu acesso.

Even as we state that a post-ovulatory method would be more effective, we should continue to emphasize that women need access to EC. The key is to balance overestimating and underplaying the effectiveness of EC. Our current methods are what we have to offer women and until there is something more effective, we need to do what we can to protect and promote them (ICEC, comitê diretivo, junho 2012).

Uma terceira perspectiva dos interlocutores nesta troca de e-mails sobre o MOA se pautou em defender uma linha de argumentação que afastasse os CE do aborto. Para alguns, o fato de eles agirem apenas antes da ovulação pode ajudar a torná-la mais amplamente aceita, particularmente entre aqueles que se opõem ao aborto.

Promoting the fact that EC is a contraceptive, and a contraceptive only, can help us gain a foothold in contentious policy debates. Particularly in Latin America, the theoretical implantation mechanism (listed on the FDA-approved US label) has been used to prohibit access to EC (ICEC, comitê diretivo, junho 2012).

Por último, a direção do ICEC sintetizou que alguns integrantes se posicionaram pela perspectiva de que o consórcio deve modificar seu foco inteiramente voltado para o mecanismo de ação da CE e contemplar mensagens de prevenção. Para estes, o ideal seriam campanhas com slogans como: “It works if you use it” e “You can’t have an abortion before you are pregnant” . Além disso, acreditam que “a ciência não é atraente para todos” e que defender a expansão do acesso a este contraceptivo apenas por meio de evidências científicas pode não atingir a todos. Para estes membros, as mensagens que não focassem no mecanismo de ação seriam mais efetivas para argumentar em defesa do acesso aos CE. Se, por um lado, alguns membros defendem menos foco sobre o contraceptivo em si e seu mecanismo de ação, por outro lado, alguns acreditam que o discurso sobre ele é estratégico para aumentar o acesso aos CE. A argumentação científica seria, para estes membros, “neutra” e capaz de purificar este contraceptivo de todo tipo de abordagem política ou ideológica. É por meio deste argumento farmacêutico que o consórcio evidencia caminhos que discutem a “estabilização”, isto é, um formato mais consensual e constante sobre os contraceptivos de emergência. Além disso, revelam as fronteiras entre ciência e política. Há uma clara articulação entre o “político” e o “científico” constituindo os CE como híbridos que ora fazem parte da natureza, ora parte do político (LATOUR, 2009). Quando os CE ainda não eram permitidos nos EUA para menores de 17 anos, Cleland et al (2011), publicaram um comentário na revista Contraception onde diziam que a “política triunfa sobre a ciência”. Argumentavam que não haveriam motivos, a não ser políticos e

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ideológicos para que estes contraceptivos não pudessem ser vendidos para todas as idades. O argumento farmacêutico é, portanto, um argumento chave para a expansão do acesso porque sustenta, por meio de uma rede de atores, um fato científico que é a contracepção de emergência. Os CE enquanto contraceptivos seguros, eficazes e com determinado mecanismo de ação, não se universalizam. Na realidade, é uma rede de atores que estende este fato científico em grandes proporções e o estabiliza (LATOUR, 2007; 2009). Como nos mostram os science studies , caracterizados por Latour (2007) como “ciências, técnicas, sociedades”, não se pode separar os conhecimentos exatos do exercício do poder. O argumento farmacêutico vai sendo construído por dois conjuntos de práticas: a tradução e a purificação. Traduzir significa deslocar objetos, interesses, dispositivos, seres humanos. A purificação significa partir o mundo em natureza, de um lado, e cultura de outro, o que cada vez mais se revela difícil. Utilizando estas práticas, o ICEC vai traduzindo outros atores numa vontade única da qual tem se tornado porta-voz: expandir o acesso à contracepção de emergência ao redor do mundo, com foco nos países em desenvolvimento. As tentativas de fazer parecer que o poder da ciência é apolítico, de que a ciência é mera representante da natureza, sentido que interpreto deste argumento farmacêutico utilizado pelo consórcio, são importantes para que o ICEC possa expandir seu objetivo e conquistar mais investidores, despertar mais interesses e convencer mais pessoas. Desta forma, este argumento não se caracteriza tão somente por sua objetividade e racionalidade ou veracidade dos fatos que ele engendra, mas implica que devemos considerar as noções de natureza e sociedade, não como causas, mas como efeitos alcançados a partir de tensões próprias à rede de atores (FREIRE, 2006; LATOUR, 2007). De acordo com Clarke (1998), as interpretações que existem acerca das ciências reprodutivas, das quais os contraceptivos fazem parte, vão desde aqueles que enfatizam questões biológicas até os que consideram estas ciências como uma blasfêmia. O que é moral, político, ideológico e o que é ciência está o tempo todo em debate quando se utiliza o argumento farmacêutico que enfatiza o mecanismo de ação dos CE. Como aponta Clarke (1998), dois tipos de política se cruzam neste caminho: a política de fazer ciência se encontra com a política de modificar moralidades. O resultado disso é um trabalho científico que se atualiza apesar de seu status controverso. Os pesquisadores membros do ICEC se utilizam da estratégia do argumento farmacêutico, isto é, da autoridade científica para gerenciar a ilegitimidade que o assunto “contraceptivo de emergência” suscita. Eles atualizam a história das ciências reprodutivas,

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enfatizando as ciências bioquímicas que foram responsáveis por trazer um status de respeitabilidade para estas ciências (CLARKE, 1998). Mas onde isto nos leva? A perspectiva da ciência como uma atividade humana, atravessada pela ideologia, poder e política, limitada pela própria linguagem, não exlcui sua capacidade de gerar conhecimento confiável. Os desenvolvimentos tecnocientíficos carream ganhos óbvios (CAMARGO, ROHDEN e CÁCERES, 2011), o que aumenta a responsabilidade de seus porta-vozes em relação à vigilância epistemológica sobre seus achados, necessitando de constante diálogo com a sociedade em geral e com profunda reflexão sobre a repercussão do conhecimento produzido sobre a vida das pessoas.

5.3. O argumento do direito: o direito ao acesso aos contraceptivos de emergência

Os direitos sexuais e reprodutivos pensados no interior dos direitos humanos implicam, entre outros atributos, respeito pela privacidade e escolhas reprodutivas e, desta forma, as tecnologias reprodutivas e seu livre acesso podem contribuir para garantir esta livre escolha. Tais direitos são concepções que situam a sexualidade e a reprodução enquanto formações culturais e políticas e extraem o sexo da ordem natural das coisas. A aplicação dos direitos humanos ao âmbito da sexualidade e da saúde reprodutiva significa que seus interesses podem ser protegidos com algumas especificidades, dentre elas: o direito à saúde, à não discriminação, à autodeterminação reprodutiva e livre escolha da maternidade. A implementação do direito à autodeterminação reprodutiva e livre escolha da maternidade serviu para reduzir o poder do Estado nas escolhas reprodutivas dos indivíduos. A estratégia discursiva de vincular direitos reprodutivos aos direitos humanos tem sido positiva no sentido de oferecer às pessoas uma proteção contra intervenções legislativas por parte de seus países, como no caso do planejamento da gravidez e de liberdade privada na esfera sexual e reprodutiva (VENTURA, 2009; COOK, DICKENS E FATHALLA, 2004). Setores conservadores da sociedade questionam se o acesso aos CE deve ser garantido para as mulheres, como um direito reprodutivo, devido ao seu status liminar que pode colocar em dúvida se seu mecanismo de ação é a de um “medicamento abortivo”. Assim, ao questionarem o uso do CE estão, de fato, questionando o próprio direito ao aborto como um direito reprodutivo. Discussão esta presente na própria história dos CE, como contextualizado inicialmente neste estudo.

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O fato é que a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, realizada no Cairo,em 1994, e a Conferência Mundial sobre as Mulheres, em Pequim, 1995, operam, exatamente, reconhecendo os direitos reprodutivos e sexuais como um direito do cidadão e como dever das nações proteger a saúde sexual e reprodutiva, conferindo maior liberdade para que as pessoas possam decidir sobre suas vidas sexuais e reprodutivas (VENTURA, 2009; COOK, DICKENS e FATHALLA, 2004). Os esforços teóricos e políticos das críticas feministas à perspectiva neomalthusiana desaguaram na Conferência Mundial sobre População e Desenvolvimento , no Cairo, em 1994 (CIPD), conferindo a dimensão reprodutiva uma positividade e ligada à ideia de liberdade e direitos sociais, e nesse sentido, deveres de prestações das nações, ao referir-se como um conjunto de direitos humanos (Leite, 2013). No parágrafo 7.3 do documento os direitos reprodutivos são consagrados:

[...] os direitos reprodutivos abrangem certos direitos humanos já reconhecidos em leis nacionais, em documentos internacionais sobre direitos humanos e em outros documentos consensuais. Esses direitos se ancoram no reconhecimento do direito básico de todo casal e de todo indivíduo de decidir livre e responsavelmente sobre o número, o espaçamento e a oportunidade de ter filhos e de ter a informação e os meios de assim o fazer, e o direito de gozar do mais elevado padrão de saúde sexual e reprodutiva. Inclui também seu direito de tomar decisões sobre a reprodução livre de discriminação, coerção ou violência, conforme expresso em documentos sobre direitos humanos (CIPD, Programa de ação , parágrafo 7.3, 1994).

Em 1995, os conteúdos da CIPD de 1994 seriam novamente debatidos, reafirmados e expandidos com a Conferência Mundial das Mulheres em Pequim (IV CMM). Como ampliação das discussões em Pequim surge então à discussão relacionada à sexualidade feminina. O parágrafo 97 da CMM não explicita o termo “direitos sexuais”, que reafirma o direito da mulher de decidir sobre o controle de sua sexualidade.

Os direitos humanos das mulheres incluem seu direito a ter controle sobre as questões relativas à sexualidade, incluída sua saúde sexual e reprodutiva, e decidir livremente a respeito dessas questões, sem se verem sujeitas à coerção, à discriminação ou à violência. As relações sexuais e a reprodução, incluído o respeito à integridade da pessoa, exigem o respeito e o consentimento recíprocos e a vontade de assumir conjuntamente a responsabilidade das conseqüências do comportamento sexual (IV CMM, Plataforma de ação , parágrafo 97, 1995).

As conferências de Cairo e Pequim foram apenas o começo de uma empreitada que continua até os dias de hoje. Corrêa (2014) revisitou os sentidos e ramificações da CIPD a partir de uma “moldura biopolítica” avaliando que os legados do Cairo são amplos e que no percurso há muito que se valorizar e contabilizar sobre “ganhos” proporcionados pelos

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desdobramentos do Cairo, incluindo, por exemplo, resoluções do Conselho de Direitos Humanos – CDH ONU, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos – CIADH e do Conselho da Europa. Nesse estudo, Corrêa (2014) conclui, guardando as devidas cautelas, que o principal legado da CIPD foi consagrar, após diversas negociações sobre os direitos humanos, as mulheres como pessoas plenas para além da reprodução. Além disso, avalia que nos últimos 15 anos temos visto a “era dos direitos sexuais”, apesar de estes terem sido excluídos estrategicamente da CIPD e legitimados no texto de Pequim, em especial, os direitos LGBTTQI (lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, transexuais, queer e pessoas intersex). Entretanto, esse percurso também apresenta limitações. Essas limitações podem ser identificadas na própria argumentação dispendida pelo ICEC na defesa do direito reprodutivo e sexual de acesso aos CE, como apresento a seguir.

5.3.1. O direito ao acesso aos contraceptivos de emergência e à saúde reprodutiva

A partir dos pressupostos dos direitos sexuais e reprodutivos, é interessante notar que o ICEC, por meio de seu “poder simbólico” enquanto organização que possui um capital simbólico para falar e agir sobre este contraceptivo (BOURDIEU, 2009a; HAHN E HOLZSCHEITER, 2013), advoga em prol da concepção de direitos sexuais e reprodutivos, como direitos humanos, e o direito ao acesso aos contraceptivos de emergência e ao “progresso científico” como um de seus atribuitos, apropriando-se, assim da força do consenso internacional e da enunciação da sexualidade e reprodução como um direito. Na subseção ICEC Publications o documento “Expanding access to emergency contraception” publicado por Westley, Hertzen e Faúndes, em 2007, afirma que negar o acesso aos contraceptivos de emergência é violar os direitos humanos, o direito ao acesso a medicamentos essenciais e ao progresso científico.

Denying or placing barriers to access to EC violates basic human rights, including the right to decide whether and when to bear children, the right to non- discrimination based on gender and/or age, and the right to have access to essential medicines and benefit from scientific progress (Westley, Hertzen e Faundes, 2007, p. 236).

Já em outro documento direcionado para a América Latina, produzido pelo ICEC/CLAE e FLASOG ( Federación Latinoamericana de Sociedades de Obstetricia y Ginecología ) e localizado na subseção ICEC Publications “Píldoras anticonceptivas de emergência: Guías médicas y de entrega de servicios em América Latina y el Caribe” de

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2013, o consórcio juntamente com a FLASOG afirmam que têm trabalhado juntos para traduzir os manuais sobre contracepção de emergência para o espanhol para adapta-la para a região latinoamericana. A FLASOG se posiciona neste documento “fortemente comprometida com os direitos das mulheres na América Latina e do Caribe, seus direitos humanos e em particular seus direitos sexuais e reprodutivos” (2013, p.4). Na subseção “What do the experts say about EC?” , contida em “What’s EC?” , o ICEC disponibiliza opiniões de seus membros sobre CE. A IPPF declara que a disponibilidade dos CE é importante devido à “saúde”, à “escolha” e ao “direito ao acesso a um contraceptivo efetivo e seguro”.

“IPPF EN wants emergency contraception to be available, affordable and easily accessible to all individuals living in Europe for reasons of: health, as it provides an efficient and low-risk method that involves a simple procedure and a minimum of side effects, choice, as it offers the possibility to avoid an unwanted pregnancy, rights, as it gives access to an effective, affordable and safe post-coital contraceptive.” (Subseção “What do the experts say about EC?” contida em “What’s EC?” website do ICEC).

Como vimos, o argumento sanitário está preocupado com o “problema de saúde pública” das “gravidezes não desejadas”, “imprevistas” ou na adolescência, enquanto o argumento farmacêutico enfatiza a existência de uma nova tecnologia efetiva e o direito ao acesso a esta inovação, que serve, ao mesmo tempo, para garantir, na perspectiva pública, uma solução para um problema coletivo de saúde e na perspectiva privada a autonomia feminina. O argumento que invoca os direitos é, sobretudo, um direito da mulher aos contraceptivos como uma liberdade individual e uma responsabilidade coletiva, enfatizando o “empoderamento” feminino por meio dos CE, e a responsabilidade da mulher em relação à contracepção. Os direitos reprodutivos, em particular, têm sido objeto sistemático de ataque do dogmatismo religioso e de outros setores conservadores. Corrêa (2014) avalia que é neste terreno que temos assistido perdas concretas seja nos retrocessos de políticas públicas sobre o direito ao aborto, seja no esvaziamento do conteúdo dos direitos reprodutivos que não se referem à simples oferta de contracepção. O que vem ocorrendo atualmente é o que a autora chama de uma “política da oferta de contraceptivos” a qual vem promovendo o rápido retorno ao velho planejamento familiar que agora, como podemos perceber pelos documentos do ICEC, focaliza mais atentamente a África subsaariana e alguns países asiáticos. Na sua análise crítica Corrêa (2014) aponta que as organizações internacionais e os Estados nacionais tem se comprometido apenas a implementar pautas mais “bem

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comportadas” que emergiram da CIPD, ou seja, a saúde sexual e a saúde reprodutiva, deixando de lado ou resistindo mais abertamente às pautas mais radicais: gênero (na sua concepção mais complexa e instável), direitos reprodutivos e sexualidade. Portanto, esta “política de oferta de contraceptivos” (CORRÊA, 2014) que se revela através do ICEC e se propõe à melhoria da saúde reprodutiva das mulheres, melhorando também economicamente suas vidas e a vida da população, pode ser lida como um novo fortalecimento das correntes neomalthusianas. O conteúdo dos direitos que o ICEC defende é, principalmente, o direito ao acesso ao medicamento e à saúde reprodutiva, deixando subjacentes os direitos sexuais e reprodutivos, ao se limitar em promover esta política de oferta de contraceptivos, como podemos observar no excerto que segue. Criminal laws and other legal restrictions that reduce or deny access to family planning goods and services, including emergency contraception, violate the right to health and reflect discriminatory notions of women’s roles in the family and society (Subseção “What do the experts say about EC?” contida em “What’s EC?” website do ICEC, grifo nosso).

Segundo Corrêa e Ávila (2003), o direito à saúde reprodutiva é uma fusão entre direitos reprodutivos e saúde reprodutiva. Embora esta fusão seja muito habitual, segundo as autoras, é problemática. Isto pode levar a uma interpretação que venha a diluir o significado do direito como prerrogativa de autonomia dos sujeitos nas esferas da sexualidade e reprodução. Por outro lado este vínculo entre direito e saúde possui ganhos inequívocos já que um sistema público universal e gratuito de saúde é um dos pilares inegociáveis para a promoção da igualdade e do exercício pleno dos direitos sexuais e reprodutivos. Entretanto, dizer que este sistema universal e gratuito de saúde é crucial para a redução da desigualdade social e racial em saúde não resolve fatores que restringem os direitos reprodutivos e sexuais das mulheres, aqueles que estão no âmbito das relações interpessoais de gênero, por exemplo. Além disso, nota-se que esta aproximação que o ICEC faz dos direitos reprodutivos ao direito à saúde reprodutiva e ao acesso ao medicamento submete seu discurso à lógica biomédica, normativa e disciplinar. Ao mesmo tempo em que esta rede de atores (LATOUR, 2009) que forma o ICEC age emoldurando a demanda pelo acesso aos CE como um direito humano, designando-os enquanto uma “segunda” ou “última chance” que confere o direito ao progresso científico, o mercado farmacêutico ganha força e alimenta a compreensão do direito à saúde sexual e reprodutiva como o direito ao acesso aos contraceptivos (BIEHL e PETRYNA, 2011).

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Para dar fôlego ao argumento dos direitos o ICEC enfatiza as Listas de Medicamentos Essenciais (LME). Esta ênfase nas LME é estratégica porque elas são instrumentos importantes para o planejamento da Assistência Farmacêutica no mundo. Um medicamento ao ser incluído nestas listas passa a ser constantemente adquirido e disponibilizado pelos países e logo se constitui como um direito para os cidadãos e cidadãs. De acordo com o documento de 2003 “Emergency Contraception in National Essential Medicines Lists”, também contido na ICEC Publications , a lista mais recente de medicamentos essenciais (LME) da OMS 18 (março de 2011) inclui o levonorgestrel. Embora outros contraceptivos possam ser utilizados como contracepção de emergência, apenas a forma contendo levonorgestrel consta na LME da OMS, incluindo tanto a apresentação com os dois comprimidos de 0,75 mg quanto 1 comprimido de 1,5 mg. Segundo o documento, dos 113 países que possuem uma LME disponível, 58 contém as pílulas contraceptivas de emergência. O Brasil apresenta desde 2010 CE no regime de levonorgestrel 1,5 mg em sua LME divulgada pela ANVISA. Para a OMS os medicamentos essenciais se consituem como principais instrumentos para a realização de uma efetiva política de medicamentos e são definidos como:

Aqueles que servem para satisfazer às necessidades de atenção à saúde da maioria da população. São selecionados de acordo com a sua relevância na saúde pública, provas quanto à eficácia e à segurança e com estudos comparados de custo- efetividade. Devem estar sempre disponíveis, nas quantidades adequadas, nas formas farmacêuticas requeridas e a preços que os indivíduos e a comunidade possam pagar (RENAME, 2010; WHO, 2001).

Biehl (2007), Greene (2010), Biehl e Petryna (2011), são autores que refletiram sobre o direito à saúde estar se transformando no direito ao acesso a medicamentos. Biehl (2007), ao observar o contexto do HIV/AIDS no Brasil, discute que diversas ONG em parceria com o Banco Mundial emolduraram uma demanda por acesso aos antiretrovirais enquanto um direito humano, de acordo com a Constituição Federal que prevê o direito à saúde (DALLARI, 2009), e ativistas realizaram o lobby por uma legislação específica para tornar os medicamentos universalmente disponíveis. De acordo com Greene (2010), é crescente a centralidade dos medicamentos em discussões e propostas de intervenção de organizações internacionais como a OMS e entidades filantrópicas como a Bill and Melinda Gates Foundation , na área da saúde e inclusive em questões de saúde reprodutiva com parceria desta fundação com o ICEC.

18 A lista de medicamentos essenciais da OMS, a qual este documento do ICEC se baseia, pode ser acessada em: www.who.int/selection medicines/country lists/en/index.html.

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Segundo o autor, nove dos quatorze desafios lançados no Global Challenge 19 da Fundação Bill and Melinda Gates se referem ao fornecimento de medicamentos. De acordo com este projeto da fundação, o objetivo é incentivar iniciativas científicas e tecnológicas que resolvam os problemas “chaves” de saúde nos países em desenvolvimento. Há meio século a centralidade dos medicamentos não era tão óbvia. A constituição de 1946 da OMS não mencionava – os. Este processo de farmacologização (WILLIAMS, MARTIN e GABE, 2011) não se relaciona apenas com o desenvolvimento tecnológico na área, mas também com mudanças políticas, epidemiológicas, etc (GRENNE, 2010). Quando a OMS publicou em 1977 uma lista com 186 “medicamentos essenciais” definidos como “básicos, indispensáveis e necessários para a saúde das populações” tornou os medicamentos como questões-chave na política econômica internacional. Esta “essencialidade” sustenta as estratégias de grupos de advocacy a descrever a falta de acesso aos medicamentos como algo moralmente inaceitável. Organizações não governamentais cada vez mais têm contornado a soberania de países e detentores de patentes em seus esforços de trazer os medicamentos essenciais para populações necessitadas de condições básicas de sobrevivência. Desta forma, esta discussão vem se dando em paralelo ao debate dos direitos humanos (GRENNE, 2010). Foi a partir da década de 1970, quando algumas delegações de países “passaram a defender que era função da OMS prover fármacos essenciais para países em desenvolvimento”, que os medicamentos essenciais foram entendidos como indispensáveis, cuja ausência significa uma falha de direitos humanos. Entretanto, a própria definição do que são considerados medicamentos essenciais foi objeto de disputa. A IFPMA (Federação Internacional de Produtores e Associações Farmacêuticas) rejeitou a noção de que boa parte de seus produtos não era essencial, pedindo que fosse usado o termo “drogas básicas”. O medo era que se enraizasse nos países desenvolvidos a ideia de medicamentos essenciais, limitando mercados lucrativos (GREENE, 2010). Ainda, segundo Greene (2010), o lobby da indústria dentro da OMS contribuiu para que listas de medicamentos essenciais deixassem de lado medicamentos novos, com alto potencial de carrear lucros, fazendo com que fossem essenciais os medicamentos há mais tempo no mercado. Biehl (2007, 2011) e Greene (2010), defendem que o acesso aos medicamentos é uma condição necessária, mas não bastam para resolver disparidades que se apresentam na vida em sociedade. É neste sentido que alguns autores como Hunt (2008) tem aproximado esse direito

19 Esta iniciativa da fundação Bill e Melinda Gates pode ser acessada em Grand Challenges in Global Health pelo endereço: http://www.grandchallenges.org/Pages/Default.aspx

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de acesso a medicamentos aos direitos humanos e ao direito à saúde. Nesta perspectiva do direito à saúde, o direito ao acesso a medicamentos não pode estar sujeito a restrições orçamentárias, impõe deveres exigíveis de imediato. Também, dentro do escopo do direito à saúde, engloba tanto liberdades ou direitos de natureza negativa (tais como, não ser submetido a tratamentos não consentidos, não participar de exames clínicos não acordados, etc), quanto direitos de caráter positivo (como, por exemplo, o direito a um sistema de tratamento e proteção da saúde) e, além disso, devem ser culturalmente aceitáveis (HUNT, 2008). O direito à saúde está sempre mais afetado pelas novas configurações do biopoder, cujas intervenções se manifestam não só pelo Estado, mas pelo poder simbólico de organizações internacionais e do mercado de tecnologias de saúde. As empresas biotecnológicas suscitam crescentes demandas de consumo de saúde, tornando seu consumo objeto de um direito. Nesta situação também é importante voltar à compreensão do direito à saúde na interface entre direitos humanos e, especialmente, apontando para os determinantes sociais de saúde (JUNGES, 2009). Como dito, ao se apropriar desta linguagem de direitos, o consórcio reconhece, sobretudo, o direito ao acesso a contraceptivos, deixando subordinado a este direito os direitos sexuais e reprodutivos. Ele cria sujetividades, moralidades e também um mercado consumidor. Para Bourdieu (2009b), o território do direito também contém parte de uma mágica, de uma ilusão de que o direito só reconhece e não cria. Entretanto, na autonomia do campo do direito enquanto um poder simbólico, ele cria, fixa e estabiliza a vida social. Desta forma, um consórcio inteiramente dedicado aos contraceptivos de emergência, que advoga pelo direito das mulheres ao acesso aos CE, consegue por meio deste “poder simbólico” do direito transformar estes contraceptivos em objetos indispensáveis. No artigo que já mencionei anteriormente, publicado por Westley, Coeyataux e Wells (2009), na revista Contraception, “Emergency Contraception: have we come full circle?”, também disponibilizado na subseção ICEC Publications , as autoras discutem a mudança de foco do consórcio de uma argumentação voltada para o controle demográfico para uma argumentação do direito das mulheres de usar um método contraceptivo.

Our expectations for EC’s effectiveness were biased upwards by an early estimate that expanding Access to emergency contraception could dramatically reduce the incidence of unintended pregnancy and subsequent abortion. This estimate made a compelling and is likely a key reason why donors and others were willing to support efforts to expand access to EC. Now that we realize that this was an overly optimistic calculation – not because emergency contraception is ineffective in stopping pregnancy in individual women who use it, but because women with enhanced access to

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emergency contraception do not seem to always use it when they need it – we seem unable to acknowledge that individual women have a right to use the contraceptive method that best suits them, not the one that best contributes to overall demographic indicators and we seem to have forgotten that an important way to increase contraceptive coverage and reduce fertility at the population level is by enhancing the choice of contraceptive methods available (Westley, Coeyataux, Wells, 2009, p.2. Grifo nosso).

Em uma sociedade mediada pelo direito, o termo “direitos” parece assumir diversas formas. Esta inflexão do controle demográfico para o direito individual das mulheres de acessar um contraceptivo, melhorando suas escolhas, é na verdade também uma estratégia que contribui para a redução das taxas de fecundidade em nível populacional, como dizem na passagem acima: “temos esquecido que um caminho importante para melhorar a cobertura de contraceptivos e reduzir as taxas de fecundidade da população é aprimorando as escolhas pelos métodos contraceptivos disponíveis”. Neste caso, a ideia de “liberdades, escolhas e direitos” se aproximam e revelam um discurso estratégico mediado pela biopolítica contemporânea (ROSE, 2013). Esta inflexão do controle demográfico para o direito individual demonstra aquilo que está na raiz da biopolítica e do biopoder: a tensão entre autonomia da pessoa (corpo unitário), espécie humana (vida) e coletividade (corpo social). Fica claro que para o ICEC existe uma tensão constante entre valores, direitos e interesses individuais e coletivos (VENTURA, 2010). De acordo com Ventura (2010), apesar dos avanços biotecnocientíficos e de toda expectativa social e pessoal de alargamento de espaços de liberdade, em razão desses avanços, verifica-se que as premissas de autonomia (possibilidade de decidir livremente sobre intervenções em seu próprio corpo) não estão inteiramente compreendidas ou aceitas na cultura vigente. Desta forma, apesar de existir esta aproximação aos direitos sexuais e reprodutivos, que alargam o exercício da autonomia sexual e reprodutiva feminina, este discurso não se faz muito presente nos documentos ou listas de e-mails. É o medicamento, um produto científico, “neutro”, que está em cena, é o acesso a ele que deve se constituir como um direito para que as taxas de fecundidade se estabilizem. Estas organizações que constituem o ICEC tiveram e ainda tem um papel importante na difusão de contraceptivos ao redor do mundo e também no Brasil. Os argumentos que utilizam para esta expansão foram e continuam sendo fundamentais nas políticas de planjemaneto reprodutivo e afetam também as experiências, sobretudo das mulheres, com estas tecnologias. De acordo com Pedro (2003), ao analisar as vivências de mulheres de “geração 20-30”, isto é, que nasceram entre 1920 e 1939 e mulheres da “geração pílula” que

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nasceram entre 1940 e 1959, a autora percebeu que o acesso aos métodos contraceptivos hormonais por estas brasileiras não significavam uma grande conquista para sua autonomia. De fato, no Brasil, a possibilidade de utilizar as pílulas contraceptivas não foi resultado de reivindicação ou luta coletiva. Os contraceptivos hormonais são pensados como algo necessário para definir uma família de menor porte. Em contrapartida na França, por exemplo, a possibilidade de controlar a reprodução por meio da contracepção hormonal foi um dado muito importante na busca da autonomia, vivência mais livre da sexualidade e dos direitos reprodutivos (PEDRO, 2003). Assim, Pedro (2003) discute que o contexto francês, livre da herança de uma ditadura militar, permitiu maior discussão e participação cidadã das mulheres na conquista desses direitos. Ao contrário do Brasil que, como Manica (2009) nos mostra, foi neste clima político (ditatorial) que as organizações internacionais de planejamento familiar começaram a introduzir a contracepção hormonal. Ainda hoje podemos perceber a perspectiva malthusiana e sanitária por meio deste consórcio comprometido com a expansão destes contraceptivos emergenciais. O que fica claro nos documentos analisados é que nossos corpos, especialmente os femininos, estão imersos em um campo de responsabilidades e escolhas. A partir dos argumentos analisados temos uma boa demonstração da biopolítica contemporânea (ROSE, 2013) - uma forma de poder coletivizador e individualizador, preocupado com o bem estar de todos.

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6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa de dissertação teve por objetivo compreender os sentidos dos argumentos do Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência. Diante da observação e análise dos documentos veiculados pelo ICEC em seu website e da lista de e- mails do consórcio, pude identificar que há uma tradução de interesses mútuos que são construídos coletivamente em torno destes contraceptivos (LATOUR, 1983; OUDSHOORN, 1994). A partir de alguns temas recorrentes no material analisado pude classificar três tipos de argumentações utilizadas pelo ICEC para expansão do acesso aos CE. A argumentação farmacêutica, sanitária e dos direitos ao acesso aos contraceptivos de emergência. Por um lado as evidências científicas, farmacológicas sobre CE estão a todo o momento presentes, demonstrando para gestores, profissionais de saúde e ativistas em prol dos CE, que a segurança e eficácia são essenciais. O acesso aos CE torna-se, portanto, uma resposabiliade das mulheres que devem utiliza-los de forma individualizada, pela via over the counter , em farmácias. Além disso, o consórcio evidencia que o mecanismo de ação destes contraceptivos não é abortivo, afastando os contraceptivos de emergência de qualquer debate político que o tema do aborto suscita. Há também uma ênfase num “problema de saúde pública” de uma “epidemia” de gravidezes “não desejadas” e, principalmente, na adolescência, o que acaba por considerar o corpo feminino apenas na sua dimensão reprodutiva. É notável a presença de fortes correntes neomalthusianas no argumento sanitário. Além destes dois argumentos, o direito ao acesso aos CE é invocado. Subordinado a ele, os direitos sexuais e reprodutivos aparecem em alguns documentos. Entretanto, o interesse é argumentar pelos medicamentos contraceptivos de emergência. É o direito a eles que tornará escolhas, projetos de vida e desenvolvimento das nações em possibilidades reais. É possível dizer que a linguagem biomédica está muito bem documentada neste espaço virtual e se configura em um importante idioma para justificar a necessidade do acesso a este medicamento pelas mulheres. O ativismo que pretende tornar este medicamento acessível a todas as mulheres se preocupa com um discurso farmacológico, onde a centralidade do princípio ativo é notável. É a partir de um componente químico que se poderá conferir mais segurança, possibilidade de escolhas e uma segunda chance de empoderamento e liberdade para mulheres e homens. De fato, o ICEC tem utilizado uma linguagem poderosa sobre saúde e ciência para justificar as suas posições, os argumentos foram muito mais frequentemente justificados na

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linguagem da saúde pública, na promessa de que ao expandir o acesso aos CE, as taxas de abortos e gravidezes imprevistas se reduziriam. Uma questão importante para o ICEC ponderar em favor do acesso aos CE foram os efeitos da pílula sobre o nível populacional, o discurso centrado na saúde pública para redução de taxas de gravidez imprevista e de abortos. De acordo com Wynn (2012), afirmou-se que se as mulheres tivessem uma “última chance” de prevenção da gravidez, haveria redução de “gravidezes indesejadas” e de abortamentos. Assim, o acesso sem a prescrição seria importante para a redução da morbidade relacionada à gravidez e de custos para serviços de saúde. Entretanto, existem controvérsias sobre esta realidade. Desta forma, diante deste “fracasso”, Wynn (2012) diz que nas reuniões do ICEC discutiu-se em mudar o foco da argumentação da saúde pública para os direitos individuais. Tal deslocamento acaba tornando o medicamento um dispositivo que mescla segurança, prevenção e autonomia. Esta articulação de uma ordem sanitária e uma ordem farmacológica para o direito individual ao acesso aos contraceptivos de emergência que protegem as mulheres de uma “gravidez indesejada”, de complicações que podem decorrer de uma gravidez, etc; faz pensar que não há um “descolamento” da sexualidade de um contexto potencial de perigo. Em outras palavras, a sexualidade feminina é abordada na perspectiva do risco e não do direito ao exercício da sexualidade. A sexualidade feminina aparece no website como um objeto socialmente útil e politicamente conservador. A farmacologização do corpo da mulher é um dispositivo que relaciona questões políticas mais gerais, relativas à população, e aspectos mais individuais de cuidado com o corpo feminino (VIEIRA, 2003). Estes discursos são voltados principalmente para os países em desenvolvimento e, desta forma, é interessante notar a reflexão de Pedro (2003) em relação à expansão de contraceptivos hormonais. Comparando Brasil e França, a pesquisadora discute que as mulheres francesas se articuluraram pelo acesso aos contraceptivos indo contra a uma política natalista que parecia se instalar no país, já no Brasil os contraceptivos foram amplamente estimulados pela preocupação com questões econômicas, como a pobreza. Estes argumentos parecem reverberar ainda no Brasil quando observamos que profissionais de farmácia os utilizam em seu dia-a-dia de trabalho (PAIVA, 2014). A convivência destes discursos apresenta uma forma de regulação dos corpos por meio de uma inflexão sobre a responsabilidade individual. Dentro deste processo no qual tem lugar a farmacologização da sociedade. A autonomia individual surge como um dispositivo regulador. Não se trata de “vigiar e punir”, mas de regulamentar condutas a partir de normas que sejam consideradas saudáveis e que o indivíduo acredita as escolher livremente. Trata-se

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de dispor as coisas e utilizar táticas para que se chegue a um fim. Há uma “intencionalidade sem sujeito” onde a dinâmica é instaurada e reproduzida por todos. Este regime das táticas permite o controle entre os corpos e seus costumes, hábitos, formas de agir e pensar a epidemia, a morte, a reprodução, a sexualidade, etc. Dessa forma, para Foucault (1979), o ato de governar terá como instrumento fundamental tanto o interesse individual, quanto o interesse coletivo, de gerir a coletividade de modo profundo, nos seus detalhes. Portanto, compreender os argumentos para a difusão dos contraceptivos de emergêngica pelo ICEC me proporcionou refletir que o discurso sobre estes novos métodos, na percepção desse consórcio, envolve assumir que eles são soluções científicas, de alto nível tecnológico e farmacológico que garantem autonomia e alavacam uma solução sanitária para as taxas de aborto e gravidezes imprevistas. E mesmo quando se assume a linguagem do direito e das escolhas individuais, as taxas de fecundidade são invocadas. A mensagem que se encontra subjacente é que as mulheres só encontram as “liberdades” e “escolhas” possuindo acesso aos contraceptivos de emergência. Desta forma, considero que este trabalho contribui para elucidar as bases sob as quais o ativismo do ICEC se sustenta, demonstrando que velhas e novas argumentações se fazem presentes entre nós, especialmente no que tange aos corpos femininos.

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130

8. APÊNDICES

APÊNDICE 1 - TABELAS SOBRE OS DOCUMENTOS DO ICEC. Quadro 5: Financiadores/Parceiros do Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência*.

Ano de Tipo de País de Sede da ONG Missão Presidência Website Financiadores/Parceiros Fundação Organização Origem Organização ARHP - Prover serviços de saúde, Association of conduzir pesquisas e Wayne C. ONG sobre http://www. Reproductive 1963 EUA EUA A1

influenciar políticas de Shields saúde. arhp.org/ Health saúde reprodutiva. Professionals

Prover serviços de saúde reprodutiva, prover apoio e cuidado a mulheres que Bpas - British procuram pelo aborto legal, http://www. Pregnancy informar e educar gestores, Clínica de 1968 Ian Hammond Inglaterra Inglaterra bpas.org/bp B1 Advisory formadores de opiniões caridade

aswoman Service sobre questões de gravidezes indesejadas. Prover conselhos contraceptivos.

131

Ano de Tipo de País de Sede da ONG Missão Presidência Website Financiadores/Parceiros Fundação Organização Origem Organização Moldar e avançar na ética sexual e reprodutiva, baseada em uma justiça que reflete o CFC - http://www. comprometimento com o ONG pró- Catholics for 1973 Jon O'Brien EUA EUA catholicsfor C1 bem-estar das mulheres e a escolhas.

Choice choice.org/ capacidade de homens e mulheres realizarem decisões morais sobre suas vidas.

Melhorar a saúde reprodutiva, especialmente em países em desenvolvimento. O CONRAD - principal objetivo é ajudar ONG ligada à Contraception Gustavo http://www. 1968 a desenvolver produtos e pesquisa EUA EUA D1

Research and Doncel conrad.org/ métodos seguros, aceitáveis clínica Development e acessíveis de contracepção e/ou prevenir a transmissão de HIV e outras infecções.

132

Ano de Tipo de País de Sede da ONG Missão Presidência Website Financiadores/Parceiros Fundação Organização Origem Organização Utiliza a lei para avançar nas liberdades reprodutivas CRR - Center como direitos humanos ONG ligada http://reprod for 1992 fundamentais que todos os Nancy Northup aos direitos EUA EUA uctiverights. E1 Reproductive

governos são legalmente humanos org/ Rights obrigados a proteger e respeitar.

Organização

de caridade Prover opções seguras e ligada ao http://www. acessíveis de planejamento Philip D. DKT planejamento Índia EUA dktinternati F1 1989 familiar e prevenção de Harvey international - familiar e onal.org/ HIV/AIDS por meio do prevenção de marketing social HIV.

133

Ano de Tipo de País de Sede da ONG Missão Presidência Website Financiadores/Parceiros Fundação Organização Origem Organização

Tornar a gravidez e o http://www. FCI - Family ONG sobre nascimento de crianças familycarei Care 1968 Ann M. Starrs saúde da EUA EUA G1 seguro. Dedica-se à saúde ntl.org/en/h International mulher

materna. ome

Trabalham na área da ONG sobre FHI 360 - saúde, educação, saúde pública Albert J. http://www. Family Health 1971 marketing, gênero, e EUA EUA H1

Siemens fhi360.org/ International pesquisa, juventude, dentre desenvolvime outras. nto

Promover saúde sexual e reprodutiva através de um ONG de http://www. Guttmacher programa que inter- Nadine direitos guttmacher. 1968 EUA EUA I1 Institute relaciona pesquisas, Peacock sexuais e org/index.ht

análises políticas e reprodutivos. ml educação pública.

134

Ano de Tipo de País de Sede da ONG Missão Presidência Website Financiadores/Parceiros Fundação Organização Origem Organização Tornar as tecnologias de Organização Gynuity saúde reprodutiva Beverly de pesquisa e http://gynuit Health 2003 EUA EUA J1

acessíveis, aceitáveis, Winikoff assistência y.org/ Projects seguras e convenientes. técnica

Realizar pesquisas sociais e http://www. Ibis clínicas priorizando o ONG de Kelly ibisreproduc Reproductive 2002 acesso ao aborto legal e direitos EUA EUA K1 Blanchard tivehealth.o Health expandir acesso à reprodutivos

rg/ contracepção.

Assegurar que as mulheres possam obter um aborto seguro. Terminar com mortes preveníveis e ONG de sequelas de um aborto não direitos http://www. Ipas Health, seguro. Trabalha com Elizabeth S. reprodutivos 1973 EUA EUA ipas.org/en. L1 access, rights sistemas de saúde e Maguire com foco na

aspx gestores advogando para o questão do aborto legal, realizam aborto legal pesquisas sobre aborto inseguro e treinamentos de médicos, enfermeiras.

135

Ano de Tipo de País de Sede da ONG Missão Presidência Website Financiadores/Parceiros Fundação Organização Origem Organização Presta serviços de JSI (John consultoria e pesquisa Snow Inc.) http://www. sobre saúde pública para Research & ONG de jsi.com/JSII 1978 outras empresas visando Joel Lamstei EUA EUA M1 Training for saúde pública nternet/inde melhorar a saúde de

Women’s x.cfm indivíduos e comunidades Health ao redor do mundo

Melhorar a saúde sexual e IPPF reprodutiva das pessoas por (International ONG de meio de advocacy e Tewodros http://www. Planned 1952 saúde sexual Índia Inglaterra N1

serviços, especialmente Melesse ippf.org/ Parenthood e reprodutiva pessoas pobres e Federation) marginalizadas. IPPF (International Melhorar a saúde sexual e Planned reprodutiva das pessoas por Carmen ONG de http://www. Parenthood meio de advocacy e Barroso 1954 saúde sexual Índia EUA ippfwhr.org O1 Federation)/ serviços, especialmente (diretora

e reprodutiva /en Western pessoas pobres e regional) Hemisphere marginalizadas. Region

136

Ano de Tipo de País de Sede da ONG Missão Presidência Website Financiadores/Parceiros Fundação Organização Origem Organização

Melhorar condições Meridian socioeconômicas, de saúde ONG para http://meridi Group 1997 e ambientais para aqueles Victoria Baird melhoria de EUA EUA an- P1 International,

que vivem em países em saúde group.com/ Inc. desenvolvimento.

Melhorar a saúde global. Ajudar parceiros a PATH atingirem as regiões mais (Program for necessitadas do planeta. ONG para http://www. Appropriate 1970 Seu trabalho abrange Steve Davis melhoria de EUA EUA Q1

path.org/ Technology in epidemias, tecnologias de saúde Health). saúde, saúde materna e infantil, saúde reprodutiva, vacinação e imunização.

Assegurar os direitos e ONG de http://www. Pathfinder oportunidades de viver de 1957 Purnima Mane saúde sexual EUA EUA pathfinder.o R1 International forma saudável a vida

e reprodutiva rg/ sexual e reprodutiva.

137

Ano de Tipo de País de Sede da ONG Missão Presidência Website Financiadores/Parceiros Fundação Organização Origem Organização

Influenciar políticas internacionais utilizando ONG de PAI estratégias de advocacy que saúde http://popul Population 1965 se associam com Suzanne Ehlers reprodutiva e EUA EUA ationaction. S1 Action

populações, saúde planejamento org/ International reprodutiva, meio ambiente familiar e desenvolvimento.

Conduzir pesquisas biomédicas, de saúde ONG de http://www. Population pública e ciências sociais Peter 1952 planejamento EUA EUA popcouncil. T1 Council para melhorar o bem estar e Donaldson

reprodutivo org/ saúde reprodutiva de indivíduos pelo mundo.

Fornecer serviços de saúde Planned complementar e ONG de http://www. Parenthood reprodutiva; advogar para Cecile 1966 saúde sexual EUA EUA plannedpare U1 Federation of que políticas públicas Richards

e reprodutiva nthood.org/ America desses temas sejam asseguradas.

138

Ano de Tipo de País de Sede da ONG Missão Presidência Website Financiadores/Parceiros Fundação Organização Origem Organização Prover apoio técnico e financeiro para ONG da América Latina que visam ONG sobre Prosalud http://www. melhorar a saúde sexual e planejamento Interamerican prosaludinte 2003 reprodutiva reduzindo a Alan Lambert familiar e EUA EUA V1 a Foundation, ramericana. incidência de gravidezes prevenção de

Inc. org/english/ indesejadas, infecções por HIV/AIDS HIV e mortalidade e morbidade materna.

É uma organização que trabalha em prol da saúde PSI reprodutiva, HIV, malária, Population e sobrevivência infantil. ONG ligada à http://www. 1970 Karl Hofmann EUA EUA X1

Services Sua missão é empoderar as área da saúde psi.org/ International populações mais vulneráveis para levarem uma vida mais saudável.

139

Ano de Tipo de País de Sede da ONG Missão Presidência Website Financiadores/Parceiros Fundação Organização Origem Organização

HRP - Special HRP é um instrumento das programme of Nações Unidas para UNICEF, Programa de research, pesquisas sobre WHO, pesquisa http://www. development Cooperação 1972 reprodução. Reúne WORLD sobre saúde Suíça who.int/hrp/ Z1 and research Internacional

cientistas, gestores, BANK, UNDP, sexual e en/ training in legisladores, clínicos, UNFPA reprodutiva human consumidores. reproduction.

Tem como principal missão ONG de http://www. Woman Care fornecer acesso a Saudra 2009 saúde Inglaterra EUA womancare Y1 Global tecnologias reprodutivas Pelletier

reprodutiva global.org/ para as mulheres.

Fonte: Website do Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência. *As organizações que contém nesta tabela estão distribuídas na ordem em que foram elencadas pelo ICEC em seu website .

140

Discriminação dos Financiadores/Parceiros das ONG parceiras do ICEC

A1 – Nenhuma informação encontrada.

B1 – Sistema NHS.

C1 - Doações individuais (indivíduos e organizações na América Latina e Canadá).

D1 – CDC (Center for Disease Control and Prevention), USAID (U.S. Agency for international development -Population and Contraception), USAID (Microbicides), NICHD (National Institute of Child Health and Human Development ), NIAID U19 Subawards and Other Microbicide Funding, Gates Foundation (Contraception), Gates Foundation (Microbicides),Concept Foundation.

E1 - Financiamento Público do governo norte-americano, concessões de governos internacionais, financiamentos privados (dentre as fundações: The Bill and Melinda Gates Foundation, David and Lucile Packard Foundation, The Huber Foundation, The William and Flora Hewlett Foundation,Bristol-Myers Squibb, Bank of America Matching Gifts Program, American Express Foundation, Google Gift Matching Program, Pfizer Foundation Matching Gifts Program, Microsoft Matching Gifts Program), United Nations Population Fund. e também doações individuais.

F1 - AusAID (the Australian Agency for International Development); Department for International Development (DFID); Britain; Government of India, Irish Aid, KfW (German Development Bank); Marie Stopes International, National AIDS Commission, Indonesia; National AIDS Control Organization (India); Population Council; The Bill and Melinda Gates Foundation; The David and Lucile Packard Foundation; Ministry of Foreign Affairs of the Netherlands; The William and Flora Hewlett Foundation; United Nations Population Fund; US Agency for International Development.

G1 - Bristol-Myers Squibb Foundation; Bristol-Myers Squibb Foundation; Burkina Faso Ministry of Health Canadian; International Development Agency - Bolivia office; Danish International Development Assistance; Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ); Ford Foundation; undación Anesvad; Fundación Interarts; The Bill

141

& Melinda Gates Foundation; Richard and Rhoda Goldman Fund; Gynuity Health Projects; The William and Flora; Hewlett Foundation; IBIS Dinamarca y Asociación; IBIS - HIVOS Fondo Mundial; International Planned Parenthood Federation; Ipas; Johnson & Johnson; Laboratoire HRA Pharma; The John D. and Catherine T.; MacArthur Foundation; Merck & Co., Inc.; Mutual of America; The David and Lucile Packard Foundation; Pan American Health Organization; Partnership for Maternal, Newborn & Child Health; Population Action International - PAI; Results for Development Institute, Inc.; Societé de Gynécologues et Obstétriciens du Burkina (SOGOB); UK Department for International Development (DFID) - Kenya office; UNICEF - headquarters and Bolivia office; United Nations Foundation; UNFPA-United Nations Population Fund - headquarters; regional office for Latin America and the Caribbean; Bolivia, Burkina Faso, and Mali country offices; The White Ribbon Alliance; Women Deliver; The World Bank; World Health Organization.

H1 - Setor privado: Bassett Healthcare Network; Darden Restaurants, Inc.; GlaxoSmithKline; Google.org; The Hershey Company; Hess Corporation; Johnson & Johnson; JPMorgan Chase & Co.;Pfizer Inc.; Procter & Gamble (P&G) Children’s Safe Drinking Water Program; Qualcomm Wireless Reach™; The Shell Petroleum Development Company of Nigeria Limited. Fundações: Alcoa Foundation; The Atlantic Philanthropies; Bill & Melinda Gates Foundation; Bush Foundation; Children’s Investment Fund Foundation; Citi Foundation; Drosos Foundation; Educate A Child, the Education Above All; Foundation chaired by Her Highness Sheikha; Moza bint Nasser; Ford Foundation; GE Foundation; Kenora Family Foundation; Oak Foundation; The Philadelphia Foundation; Robert Wood Johnson Foundation; The Rockefeller Foundation; Wallace Foundation; The William and Flora Hewlett Foundation; W.K. Kellogg Foundation. ONG: American Forests; Center for the Study of Social Policy; Community Based Care of Central Florida; icddr,b; International AIDS Vaccine Initiative; Medicines for Malaria Venture; Murdoch Childrens Research Institute; National Forum to Accelerate; Middle-Grades Reform; PATH; Patient-Centered Outcomes; Research Institute; Profamilia; PSI (Population Services International); united Way for Southeastern Michigan. Além disso, agências do governo dos EUA também são financiadoras da FHI360.

I1 - Fundações: Fred H. Bixby Foundation; The Brico Fund; Brush Foundation; The California Wellness Foundation; Educational Foundation of America; Ford Foundation; Bill and Melinda Gates Foundation; Wallace Alexander Gerbode Foundation; David B. Gold

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Foundation; Lisa and Douglas; Goldman Fund; The Grove Foundation; Gynuity Health Projects; The Irving Harris Foundation; The William and Flora; Hewlett Foundation; Institute of International Education; International Planned; Parenthood Federation; Ipas; F. M. Kirby Foundation; Likhaan Center for Women; JPB Foundation; The John D. and Catherine T. MacArthur Foundation; The London School of Hygiene & Tropical; Medicine Marie Stopes International; Mesa por la Vida y la Salud de las Mujeres; The National Campaign to Prevent Teen and Unplanned Pregnancy; New Directions Foundation; The David and Lucile Packard Foundation; Population Council; Population Services; International The Prentice Foundation, Inc.; Prospect Hill Foundation; Public Health Institute Public Health Solutions; B.T. Rocca Jr. Foundation; Society of Family Planning; The Summit Charitable Foundation; United Nations Foundation (Better World Fund); Wiancko Charitable Foundation; Mary Wohlford Foundation. Setor Privado: Apple Matching Gifts Program; Dell Giving; GE Foundation; Girlfriend Films; Google Matching Gifts; Merck Partnership for Giving; Pfizer Foundation. Além disso, existem financiadores individuais, governos e agências multilaterais (CDC; UNFPA, United Nations Population Fund; Dutch Ministry of Foreign Affairs; Swedish International Development Cooperation Agency; United Kingdom Department for International development.

J1 - The Bill and Melinda Gates Foundation; The David and Lucile Packard Foundation; DFID/MRC/Wellcome Trust through the Joint Global Health Trials Scheme; Family Care International; The Food and Drug Administration Office of Orphan Products Development; International Partnership for Microbicides; International Planned Parenthood Federation/Western Hemisphere Region; The John D. and Catherine T. MacArthur Foundation; National Institute of Allergy and Infectious Diseases; National Institute of Child Health and Human Development; Planned Parenthood Global; Population Council; Richard and Rhoda Goldman Fund; Society for Family Planning; Swedish International Development Cooperation Agency (SIDA); The Rockefeller Foundation; The William and Flora Hewlett Foundation. Além de doadores anônimos.

K1 - Columbia University; Ford Foundation; The Wallace Alexander Gerbode Foundation; Harvard University; The William & Flora Hewlett Foundation; International Planned Parenthood Federation/Western Hemisphere Region; Ipas; The Lalor Foundation; Marie Stopes International; The Oma Fund of the Ms. Foundation for Women; The David & Lucile Packard Foundation; Safe Abortion Action Fund; Society of Family Planning; University of

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California, San Francisco; University of Texas at Austin; The Mary Wohlford Foundation; World Health Organization e doadores anônimos.

L1 – Nenhuma informação encontrada.

M1 - Abt Associates; Action for Boston Community Development (ABCD); American Legacy Foundation; Anne Carlsen Center for Children; Banner Health; Behavioral Health Network; Blue Cross and Blue Shield of Massachusetts Foundation; Bristol-Myers Squibb; CAB Health and Recovery Services, Inc.; Center for Global Development; Children's Health Funds; Colorado Community Managed Care Network; Community Visiting Nurse Association; Fallon Community Health Plan; Fred Hutchinson Cancer Research Center; Harbor Health Services; International Society for Environmental Epidemiology; International Society of Exposure Science; International Trachoma Initiative; La Clínica del Pueblo; Lahey Clinic; Maine Primary Care Association; Massachusetts Hospital Association; Metro Community Provider Network; Montana Public Health Association; National Association of Manufacturers; New Jersey Primary Care Association; Partners HealthCare; Pfizer, Inc.; Primary Health Care Community Coalition; Reproductive Health Supplies Coalition; South Boston Community Health Center; Stamford Hospital; Uncompahgre Medical Center; WomanCare Global; Women of Color AIDS Council. Além de agências governamentais dos EUA e algumas universidades.

N1 - Babette Kabak Trust; Beyond our Borders; Comic Relief; David & Lucile Packard Foundation; Del Mar Global Trust; Education for Choice; EuroNGOs; Erik E & Edith H Bergstrom Foundation; European Commission (EC); Ford Foundation; Fox Foundation; German Foundation for World Population (DSW); Gesellschaft fur Technische Zusammenarbeit (GTZ); Global Fund to Fight AIDS, Tuberculosis and Malaria; Good Gifts; Herbert Smith (in memory of David Kato); John Hopkins University (Advanced Family Planning); Libra Foundation; John D & Catherine T MacArthur Foundation; MAC AIDS Fund; Make a Difference Trust; Management Sciences for Health (MSH); Netembea Foundation; Nirvana Manana Institute Foundation; Overbrook Foundation; PATH; The Philadelphia Foundation; Population Services International (PSI); The Prospect Hill Foundation; The Summit Foundation; The World Conservation Union; United Nations Population Fund (UNFPA); Joint United Nations Programme on HIV/AIDS (UNAIDS); The Unmet Need; VIIV Healthcare; Westwind Foundation; Wild Flowers Foundation; William &

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Flora Hewlett Foundation; World Health Organization (WHO); Youth Coalition; 786 Foundation. Além disso, indivíduos e governos internacionais também participam como financiadores.

O1 – Idem financiadores N1.

P1 - Essa organização é uma divisão não lucrativa do grupo Meridian Group International Inc. empresa que trabalha com produtos da área da tecnologia. O grupo possui parcerias de trabalho com empresas do ramo farmacêutico como: Bayer e HRAPharma. No caso da Bayer, trabalha em parceria em um projeto financiado pela USAID chamado Contraceptive Security Initiative. No caso da HRAPharma, trabalha em nome do projeto RESPOND Project, um projeto sobre planejamento familiar.

Q1 - Além de financiamento de governos de diversos países e doações individuais, os financiadores são: Fundações: Abbott Fund; The Atlantic Philanthropies; Bill & Melinda Gates Foundation; Catherine Holmes Wilkins Foundation; Cleveland H. Dodge Foundation; Conrad N. Hilton Foundation; Dean & Vicki Allen/McKinstry; Charitable Foundation; Dover Foundation; Elizabeth Glaser Pediatric AIDS Foundation; ExxonMobil Foundation; Foundation for Development of Ukraine; Foundation for Innovative New Diagnostics; The Frankel Foundation; Fred H. Bixby Foundation; Global Health Technologies Competitiveness Fund; Horace W. Goldsmith Foundation; The John D. and Catherine T. MacArthur Foundation; Keith & Mary Kay McCaw Family Foundation; Kellogg Family LLC; Kuehlthau Family Foundation; Laird Norton Family Foundation; Lee Family Charitable Lead Trust; MAC AIDS Fund; Martin-Fabert Foundation; McMinn Foundation; Medtronic Foundation; The Merck Company Foundation; Michael & Susan Dell Foundation; M.J. Murdock Charitable Trust; Moccasin Lake Foundation; The Moriah Fund; The Norcliffe Foundation; Open Society Foundations; The Overbrook Foundation; The Radheshwar Family Charitable Fund; Raikes Foundation; Robert Wood Johnson Foundation; The Rockefeller Foundation; Satya and Rao Remala Foundation; Seattle International Foundation; Sheng-Yen Lu Foundation; Shickman Family Foundation; Silver Family Foundation; Skoll Foundation; Starbucks Foundation; Stavros Niarchos Foundation; Susan G. Komen for the Cure®; Titcomb Foundation; The Trustees of Columbia University; The Turnip Top Foundation; UBS Optimus Foundation; Vanguard Charitable Endowment Program; Vitol Foundation; Wallace Alexander Gerbode Foundation; Weber Shain Foundation; The William and Flora

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Hewlett Foundation. ONG: Abt Associates; Agros International; BIO Ventures for Global Health; Boston University; Cancer Research UK; Chemonics International; dance4life International; Drugs for Neglected Diseases initiative; FHI 360; Georgia Institute of Technology; Global Alliance for Livestock Veterinary Medicines; Global Health Nexus, Seattle; Greenwich Academy; Gynuity Health Projects; ICF International; Instituto de Salud Global de Barcelona; International Clinical Epidemiology Network; International Consortium for Emergency Contraception; International Development Enterprises; International Potato Center/Centro Internacional de la Papa; IntraHealth International, Inc.;Jhpiego; John Snow, Inc.; Keck Graduate Institute of Applied Life Sciences; London School of Hygiene & Tropical Medicine; Management Sciences for Health; NicaSalud Network Federation; Norwegian Cancer Society; Pathfinder International; PCI; Plan International; Puntos de Encuentro; The Research Council of Norway; Roll Back Malaria Partnership; RTI International; Save the Children; Seattle BioMed; Seattle Children’s; SightLife; Swedish Medical Center; Task Force for Global Health; Tulane University; Universal Access to Female ; University of Bristol; University of California, Davis; University of Georgia; University of Maryland; University of Washington; University Research Co., LLC; Washington Biotechnology & Biomedical Association; The White Ribbon Alliance for Safe Motherhood. Setor Privado: Accenture. Arbor Vita Corporation; Aristides Capital, LLC; AVIE Consulting Inc.; Bank of America Merrill Lynch; Beijing Tiantan Biological Products Co., Ltd.; Bell Harbor International Conference Center; Bharat Biotech; BHP Billiton Sustainable Communities Trust; Blistex Inc.; Cascade Designs, Inc.; CH2M HILL; Chevron Corporation; Claremont BioSolutions; Cooley LLP; Crucell; Davis Wright Tremaine LLP; Dell Inc.; DSM Nutritional Products; Eulysis Ltd.; Evergreen Associates Ltd.; ExOfficio LLC; Flex-Plan Services Incorporated; GlaxoSmithKline; The Global Good Fund I, LLC; GMMB; Google Inc.; Hewlett-Packard Development Company, LP; Hotchkis & Wiley Capital Management, LLC; JPMorgan Chase; Laerdal Global Health A/S; Masimo Corporation; MasterCard Worldwide; Matthew G. Norton Co.; MBio Diagnostics, Inc.; McCrea Cellars; McKinsey & Company; Merck & Co., Inc.; Microsoft Corporation; Pan Pacific Hotel Seattle; Parker, Smith & Feek; Point B, Inc.; Riddell Williams P.S.; Russell Investments; Sanergy; Sanofi Pasteur India; The Seneca Real Estate Group, Inc.; SID Technologies, LLC; Silver Fern Chemical; SkB Architects, Inc.; Synapse Product Development; Temptime Corporation; Weber Shandwick; Wellspring Advisors, LLC; Zyomyx, Inc. Agências Multilaterais: Centers for Disease Control and Prevention; Defense Threat Reduction Agency; GAVI Alliance; Global Alliance for Improved Nutrition; Pan

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American Health Organization; United Nations Children’s Fund; United Nations Environment Programme; United Nations Population Fund; The World Bank Group; World Health Organization.

R1 - Fundações: Africa Family Planning and HIV Integration Fund at Tides Foundation; The Atlantic Philanthropies; BelleJAR Foundation; The Brush Foundation; Compton Foundation, Inc.; George and Patricia Ann Fisher Foundation; The Ford Foundation; The Foundation for a Just Society; Bill & Melinda Gates Foundation; Global Giving Foundation; Global Giving UK; Richard and Rhoda Goldman Fund; The William and Flora Hewlett Foundation; George Frederick Jewett Foundation; The John D. and Catherine T. MacArthur Foundation; The McKnight Foundation; Money Well Spent Fund at the Tides Foundation; The David and Lucile Packard Foundation; Results for Development Institute; The Rockefeller Foundation; Safe Abortion Action Fund; The Summit Charitable Foundation, Inc.; Tides Canada Foundation’s Pathfinder International; Fund of Tides Foundation; The Trull Foundation; Wallace Global Fund; Women, Children and Family Service Charities of America. David W. Husch; Kahn Charitable Foundation. ONG e associações: BBC World Service Trust; Creative Associates International; ESAR Foundation; Family Health International; Georgetown University of Reproductive Health; Elizabeth Glaser Pediatric AIDS Foundation; IntraHealth International, Inc.; Kaiser Permanente Community Giving Campaign; Management Sciences for Health; MSI-US; Pact, Inc.; PATH; Population Action International; Population Services International; The Regents of the; University of California; Reproductive Health Uganda; The Trustees of Columbia University, City of New York; Uganda Red Cross Society; United Way of Silicon Valley; World Bank; World Learning. Setor Privado: Bayer Schering; ExxonMobil Foundation; GlaxoSmithKline; Google Incorporated.; Johnson & Johnson Asia Pacific Contribution; Committee JustGive.org ; The Positive Action for Children Fund; Query On, Inc.; Yo La Tengo, Inc. Adobe Matching Gift Program; Aetna; AMD Matching Gift Program; Flora Family Foundation; GE Foundation Matching Gift Program; Google Matching Gifts Program; Grantham, Mayo, Van Otterloo & Co. LLC; William and Flora Hewlett Foundation; Matching Gift Program; Longview Foundation; Meredith Corporation Foundation Matching; Gift Program; Microsoft Matching Gifts Program; Millennium Matching Gift Program; Pepsico Foundation Matching Gift Program; Pfizer Foundation. Agências Multilaterais: Centers for Disease Control and Prevention; The Global Fund to Fight AIDS, Tuberculosis and Malaria; International Centre for Diarrhoeal Disease Research, Bangladesh; United Nations Development Programme

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(UNDP); United Nations Development Fund for Women (UNIFEM); The United Nations Population Fund (UNFPA); United States Agency for International Development (USAID).

S1 - The Bill & Melinda Gates Foundation; Summit Foundation; United Nations Foundation; The David and Lucile Packard Foundation; The William and Flora Hewlett Foundation; RHSC Innovation Fund; Compton Foundation, Inc.; University of North Caroline; PATH; Brush Foundation. U.S. Government.

T1 - Além de doações individuais e de governos internacionais: Agências Multilaterais, agências governamentais: Global Network of People Living with HIV/AIDS (GNP+); International Consortium for Emergency Contraception (ICEC); Joint United Nations; Programme on HIV/AIDS (UNAIDS); Poverty and Economic Policy; Research Network (PEP); United Nations Children’s; Fund (UNICEF); United Nations Development; Fund for Women (UNIFEM); United Nations Foundation; (UNF) United Nations Population; Fund (UNFPA); World Bank Group; World Health Organization (WHO); Agency for International Development (USAID); Centers for Disease; Control and Prevention (CDC); National Institutes of Health (NIH). Fundações e ONG: AIDS Foundation of Chicago (AFC); Albert Einstein College of Medicine (AECOM); The Atlantic Philanthropies; Bayer Schering Pharma AG; Better World Fund; The Fred H. Bixby Foundation; BRAC USA; Columbia University Medical Center; Deutsche Gesellschaft für Internationale ; Zusammenarbeit GmbH; The William H. Donner; Foundation Elton John AIDS Foundation; Emory University; EngenderHealth; Equality Now; FHI 360; The Ford Foundation; H. B. Fuller Foundation; Futures Group International, LLC; The Bill & Melinda Gates Foundation; Georgetown University; Girl Hub; Guttmacher Institute; Harvard School of Public Health; Health Decisions; The William and Flora; Hewlett Foundation; HRA Pharma; Institute of International Education; International Centre for Diarrhoeal Disease Research, Bangladesh (icddr,b); International Development Research Centre (IDRC); International Food Policy; Research Institute (IFPRI); International Planned Parenthood Federation (IPPF); International Rescue Committee (IRC); IntraHealth; Henry M. Jackson Foundation for the Advancement of Military; Medicine Jacobs Foundation; John Snow, Inc./JSI Research and Training Institute, Inc.; The Johns Hopkins University; Levi Strauss & Co. Foundation; London School of Hygiene & Tropical Medicine (LSHTM); The John D. and Catherine T.; MacArthur Foundation; Magee-Women’s Research Institute and Foundation (MWRIF); Marie Stopes International (MSI); New York University (NYU); Nike Foundation; NoVo Foundation;

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Overseas Development Institute (ODI); The David & Lucile Packard ;Foundation Partridge Foundation; The Passport Foundation; Plan International Population Reference Bureau (PRB); Population Services International (PSI); Program for Appropriate Technology in Health (PATH); Public Health Foundation of India (PHFI); Research & Advocacy Fund (RAF) of the British Council; Research Triangle Institute International (RTI); Society for Family Health (SFH); Solutions for Innovative Policies, Programs and Technologies; Summit Foundation Inc.; Syria Trust for Development; Teva Pharmaceuticals; University of California at San Diego; University of California at San Francisco;University of Connecticut; Health Center; University Research Co.; LLC ; ViiV Healthcare.

U1 – Nenhuma informação encontrada.

V1 - European Society of Contraception and Reproductive Health; ANESVAD Foundation; International Foundation; Microsoft; Nesst; DANIDA; Atkinson Foundation; Brush Foundation; Rotary Club Interantional; UNAIDS; Edith & Erick E. Bergstrom Foundation; Conservation, Health and Food Foundation; Summit Foundation; United Nations Family Planning Fund; governos internacionais. Além disso, a PROSALUD possui parcerias com: Gedeon Richter; Laboratorios Carnot; GELCAPS Exportadora de México; Finishing Enterprises, Inc.; Suretex Limited; Female Health Company; Wondfoo Ltd.

X1 - Asian Development Bank; Bill & Melinda Gates Foundation; Canadian International Development Agency; Centers for Disease Control and Prevention; ExxonMobil Foundation; Global Fund to Fight AIDS, Tuberculosis and Malaria; KfW Entwicklungsbank; National AIDS Control Organisation of India; Netherlands Government Ministry of Foreign Affairs; Oxfam Novib, the Dutch affiliate of Oxfam International; Procter & Gamble Fund of the Greater Cincinnati Foundation; Three Diseases Fund; United Kingdom Department for International Development; United Nations Children’s Fund; United Nations Population Fund; United States Agency for International Development; United States Department of Defense.

Z1 - Possui como parceiros e é patrocinado por: UNDP (United Nations Development Programme); UNFPA (United Nations Population Fund); WHO (World Health Organization); The World Bank. Parceiros: The International Planned Parenthood Federation (IPPF); UNAIDS.

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Y1 – Nenhuma informação encontrada.

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Quadro 6: Documentos do ICEC - seção " What is EC? "* Subseção Título Autoria Classificação do documento Argumentos para facilitar o acesso à CE Objetivo da Publicação

Demonstração de eficácia e segurança, General garantindo que o produto não representa risco. Informar sobre eficácia e ** ICEC Página do website. Information Argumentar em prol do acesso à CE por meio segurança do contraceptivo. de dados científicos e farmacológicos.

Redução de riscos à saúde; devido à violência sexual, à vulnerabilidade dos adolescentes na Apresentar argumentos de What do the sociedade; é um direito das mulheres terem parceiros como IPPF; OMS; experts say about ** ICEC Página do website. acesso à informação e serviços de UNFPA, entre outros em EC? contracepção de emergência, assim como favor do acesso à CE. outros métodos contraceptivos.

Demonstração de eficácia e segurança, garantindo que o produto não representa risco. Apresentar as marcas de Pill Formulation ** ICEC Página do website. Argumentar em prol do acesso à CE por meio produtos contendo CE. de dados científicos e farmacológicos.

Fonte: Website do Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência. * A data de publicação dos documentos é indisponível. Data de acesso: outubro de 2013 e março 2014. ** Título idêntico ao nome da subseção

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Quadro 7: Documentos do ICEC - Seção " Country-by-Country Information "

Data de Classificação do Argumentos para facilitar o Subseção Título Autoria Objetivo da Publicação publicação documento acesso à CE

Building National Redução do número de gravidezes Capacity to Deliver Demonstrar estratégias de In-Depth “Fact Sheet”. Ficha Técnica não desejadas. Os CE garantem Emergency Population inclusão dos contraceptivos Country 2005 sobre inclusão de CE em “última chance” para “salvarem” a Contraception Council de emergência em Information Bangladesh. si mesmas da gravidez não Services in Bangladesh. desejada. Bangladesh.

Counting what O acesso à CE na Etiópia tem In-Depth Counts: Tracking “Fact Sheet”. Ficha Técnica Rastrear informações para crescido graças a sua distribuição Country Access to emergency ICEC 2013 sobre inclusão de CE na expansão do acesso na em farmácias com o apoio da DKT Information contraception in Etiópia. Etiópia. international. Ethiopia.

Counting what Argumentar da importância da In-Depth Counts: Tracking “Fact Sheet”. Ficha Técnica Rastrear informações para CE por meio de informações Country Access to emergency ICEC 2013 sobre inclusão de CE em expansão do acesso na em demográficas e dados sobre uso Information contraception in Gana. Gana. da CE. Ghana.

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Data de Classificação do Argumentos para facilitar o Subseção Título Autoria Objetivo da Publicação publicação documento acesso à CE

Counting what Reduz morbidade e mortalidade In-Depth “Fact Sheet”. Ficha Técnica Rastrear informações para Counts: Tracking maternas devido a abortos Country ICEC 2013 sobre inclusão de CE na expansão do acesso na Access to emergency inseguros; evitar gravidez Information Índia. Índia. contraception in India. indesejada.

Redução do número de gravidezes não desejadas, especialmente nos Studying the países em desenvolvimento. Utilization of In-Depth Informe sobre treinamento Proteger um grande número de Demonstrar estratégias de Emergency Population Country 2005 de pessoal para provisão de mulheres do trauma de abortos treinamento de pessoal Contraceptive Council Information CE. induzidos reduzindo taxas de para provisão de CE. Services Through mortalidade e morbidade de Paramedics in India. abortos e complicações da gravidez.

Alto número de abortamentos; Demonstrar estratégias de In-Depth “Case Study”. Estudo de ICEC worldwide case CE poderia reduzir índices de inclusão dos contraceptivos Country ICEC 2006 caso da introdução da CE na study – Indonesia: morbidade e mortalidade de emergência na Information Indonésia. decorrentes do aborto. Indonésia.

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Data de Classificação do Argumentos para facilitar o Subseção Título Autoria Objetivo da Publicação publicação documento acesso à CE

Apresentar informações Counting what demográficas sobre o Quênia, In-Depth Counts: Tracking “Fact Sheet”. Ficha Técnica Rastrear informações para estatísticas CE. O acesso à CE no Country Access to emergency ICEC 2013 sobre inclusão de CE no expansão do acesso no Quênia tem se dado por meio da Information contraception in Quênia. Quênia. venda OTC em farmácias e no Kenya. setor público de saúde.

In-Depth “Fact Sheet”. Ficha Técnica Demonstrar estratégias de Alto número de gravidezes não Country ICEC worldwide case ICEC 2006 sobre inclusão de CE no inclusão dos contraceptivos desejadas e de abortamentos. Information study – Mexico: México. de emergência no México.

Counting what counts: Informa sobre o acesso facilitado In-Depth Tracking Access to “Fact Sheet”. Ficha Técnica Rastrear informações para por meio de ONG e farmácias Country emergency ICEC 2013 sobre inclusão de CE na expansão do acesso na comerciais no país, além de Information contraception in Nigéria. Nigéria. serviços públicos de saúde. Nigeria.

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Data de Classificação do Argumentos para facilitar o Subseção Título Autoria Objetivo da Publicação publicação documento acesso à CE

Altas taxas de fecundidade (5.7%); ICEC Worldwide In-Depth “Case Study”. Estudo de taxas muito altas de morbidade e Demonstrar estratégias de Case Studies: Nigeria. Country ICEC 2006 caso da introdução da CE na mortalidade materna; estimados inclusão dos contraceptivos Ensuring Access and Information Nigéria. 610,000 abortos ilegais de emergência na Nigéria. Correct Use through anualmente. social marketing. Counting what counts: Informa sobre o acesso facilitado In-Depth Tracking access to “Fact Sheet”. Ficha Técnica Rastrear informações para por meio de ONG e farmácias Country emergency ICEC 2013 sobre inclusão de CE no expansão do acesso no comerciais no país, além de Information contraception in Paquistão. Paquistão. serviços públicos de saúde. Pakistan.

Counting what counts: Informa sobre o acesso facilitado In-Depth “Fact Sheet”. Ficha Técnica Rastrear informações para Tracking access to por meio de ONG e farmácias Country ICEC 2013 sobre inclusão de CE no expansão do acesso no emergency comerciais no país, além de Information Peru. Peru. contraception in Peru. serviços públicos de saúde.

Counting what counts: Informa sobre o acesso facilitado In-Depth Tracking access to “Fact Sheet”. Ficha Técnica Rastrear informações para por meio de ONG e farmácias Country emergency ICEC 2013 sobre inclusão de CE em expansão do acesso em comerciais no país, além de Information contraception in Ruanda. Ruanda. serviços públicos de saúde. Rwanda.

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Data de Classificação do Argumentos para facilitar o Subseção Título Autoria Objetivo da Publicação publicação documento acesso à CE

Counting what counts: Informa sobre o acesso facilitado In-Depth “Fact Sheet”. Ficha Técnica Rastrear informações para Tracking access to por meio de ONG e farmácias Country ICEC 2013 sobre inclusão de CE em expansão do acesso em emergency comerciais no país, além de Information Senegal. Senegal. contraception in serviços públicos de saúde. Senegal. ICEC Worldwide Demonstrar estratégias de In-Depth Case Studies: Sri “Fact Sheet”. Ficha Técnica Altas taxas de abortamentos e inclusão dos contraceptivos Country Lanka. Ensuring ICEC 2006 sobre inclusão de CE em Sri gravidezes não desejadas. de emergência em Sri Information Program Lanka. Lanka. Sustainability. Fonte: Website do Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência.

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Quadro 8: Documentos do ICEC - Seção " EC Issues "

Argumentos para facilitar o Subseção Título Autoria Classificação do documento Objetivo da Publicação acesso à CE Informar profissionais e consumidores onde é possível Mostram serviços essenciais para conseguir acesso à CE, como em Where to Access ** ICEC Página do website. garantia do acesso ao contraceptivo. farmácias, clínicas de saúde privadas ou públicas e escolas (França e Holanda) e ONG. Argumentam a partir de normas internacionais, invocam a Argumentar em favor do acesso à Legal and ** ICEC Página do website. conferência do Cairo em 1994 e CE buscando embasamento em Opposition Issues normas de regulação da CE nos normas regulatórias. EUA. Argumentam em prol do acesso Demonstrar que a CE não é demonstrando que a CE não é How ECPs Work ** ICEC Página do website. abortiva a partir dos dados abortiva, por meio do seu farmacológicos. mecanismo de ação.

Argumentam em prol do acesso Demonstrar que a CE não é EC and Medical demonstrando que a CE não é ** ICEC Página do website. abortiva a partir dos dados Abortion abortiva, por meio do seu farmacológicos. mecanismo de ação.

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Argumentos para facilitar o Subseção Título Autoria Classificação do documento Objetivo da Publicação acesso à CE Argumentam que as mulheres Non-Prescription necessitam da CE de forma rápida, Advogar em prol do acesso sem ** ICEC Página do website. Access to EC devido ao seu tempo de ação e prescrição médica para a CE. eficácia no organismo. O acesso é importante devido à Argumentar que o acesso é Provision of EC in ** ICEC Página do website. violência sexual que as mulheres importante por causa de situações Crisis Situation estão sujeitas. de violência sexual. O acesso é importante devido à violência sexual. O acesso à CE Argumentar que o acesso é Sexual Violence ** ICEC Página do website. poderia ter evitado 25.000 importante por causa de situações and EC access gravidezes resultantes de estupros de violência sexual. nos EUA em 1998. Product Argumentam que a disponibilidade Mostrar a distribuição de CE pelo Distribution ** ICEC Página do website. dos produtos é essencial para o mundo. Issues acesso pelas mulheres. Demonstrar que a CE é importante A gravidez pode ser questão de vida Youth and EC ** ICEC Página do website. e deve ser acessada por ou morte para adolescentes. adolescentes. Fonte: Website do Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência. * A data de publicação do documento é indisponível. Data de acesso: agosto de 2013 e março 2014. ** Título idêntico ao nome da subseção.

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Quadro 9: Documentos do ICEC - Seção " Publications and Resources ".

Data de Classificação do Argumentos para facilitar o Objetivo da Subseção Título Autoria Apoiadores da Publicação Publicação documento acesso à CE Publicação HRA Pharma; ARHP; bpas; Catholics For Choice; CONRAD; DKT; Family Dar suporte Care International; FHI360; Emergency baseado em Guttmacher; Gynuity; Ibis Contraceptive Pills: Argumentação farmacológica evidências ICEC Reproductive Health, Ipas; Diretrizes médicas para Medical and Service ICEC 2012 sobre segurança, eficácia, científicas para Publications IPPF; IPPF /WHR; entrega e serviços. Delivery Guidelines, mecanismo de ação, etc. os programas de Meridian group; Path; 3 Ed. planejamento Pathfinder; Planned familiar. Parenthood; Population Council; Prosalud; PSI; WomanCare Global; FIGO. CLAE; FLASOG (Federación Píldoras Dar suporte Latinoamericana de Anticonceptivas de baseado em Sociedades de Obstetricia y Emergencia: Guías Argumentação farmacológica evidências ICEC Ginecología); Prosalud; Diretrizes médicas de médicas y de entrega ICEC 2013 sobre segurança, eficácia, científicas para Publications Cemicamp (Centro de entrega e serviços na AL. de servicios en mecanismo de ação, etc. os programas de Pesquisas em Saúde América Latina y el planejamento Reprodutiva de Campinas); Caribe familiar na AL. IPPF Western Hemisphere; Profamilia; Ipas; ICMER.

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Data de Classificação do Argumentos para facilitar o Objetivo da Subseção Título Autoria Apoiadores da Publicação Publicação documento acesso à CE Publicação

Clinical Summary: Argumentação farmacológica Dar informações ICEC Emergency ICEC 2013 Não informado. Resumo clínico. sobre segurança, eficácia, farmacológicas Publications Contraceptive Pills mecanismo de ação, etc. sobre CE.

Fact sheet on the Publicação conjunta do safety of ICEC com o departamento Argumentação farmacológica Garantir que o ICEC levonorgestrel-alone Ficha técnica sobre ICEC 2010 de pesquisa em saúde sobre segurança da CE contraceptivo é Publications emergency segurança do levonorgestrel. reprodutiva da OMS, IPPF e contendo levonorgestrel. seguro. contraceptive pills FIGO. (LNG ECPs) Mechanism of Argumentação farmacológica Action: How do sobre mecanismo de ação levonorgestrel-only Garantir que os ICEC Declaração sobre mecanismo mostrando que não é abortiva. emergency ICEC 2012 FIGO; ICEC. CE não são Publications de ação. Pode reduzir número de contraceptive pills abortivos. abortos por reduzir gravidezes (LNG ECPs) prevent não desejadas. pregnancy?

Emergency Demonstrar para Contraception and Declaração sobre diferença Argumentação farmacológica defensores e ICEC Medical Abortion: ICEC 2012 Não informado. entre CE e aborto sobre mecanismo de ação provedores que Publications What’s the medicamentoso. mostrando que não é abortiva. os CE não são Difference? abortivos.

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Data de Classificação do Argumentos para facilitar o Objetivo da Subseção Título Autoria Apoiadores da Publicação Publicação documento acesso à CE Publicação Argumentação farmacológica sobre dosagem e tempo de Dar informações ICEC Regimen Update: Declaração sobre dosagem e administração. Tomar uma ICEC 2013 Não Informado. farmacológicas Publications Dosage and Timing tempo de administração. dose é mais simples para as sobre CE. mulheres do que outros regimes de CE.

Over-the-counter Defender o ICEC Declaração sobre acesso A CE evita gravidezes não access to emergency ICEC 2013 Não Informado. acesso aos CE, Publications OTC. desejadas. contraception pills OTC.

Defender o acesso aos CE EC for rape survivors: A CE é um contraceptivo em casos de ICEC e WHO/Sexual ICEC a human rights and Declaração para estratégico para garantia de violência ICEC 2013 Violence Research Publications public health sobreviventes de estupro. direitos humanos e para o invocando a Initiative. imperative. imperativo da saúde pública. saúde pública e os direitos humanos.

Emergency Argumentar pela ICEC Contraceptive Pill Informe sobre registro de Dá uma segunda chance de ICEC 2014 Não Informado. importância do Publications Registration Status by CE. prevenção da gravidez. registro dos CE. Country.

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Data de Classificação do Argumentos para facilitar o Objetivo da Subseção Título Autoria Apoiadores da Publicação Publicação documento acesso à CE Publicação Defender e Emergency informar sobre a ICEC Contraception in Informe sobre inclusão da Dá uma segunda chance de ICEC 2013 ICEC/WHO. importância da Publications National Essential CE em LMEs. prevenção da gravidez. inclusão dos CE Medicines Lists. em LME. Dar suporte baseado em evidências The Intrauterine Argumentação farmacológica científicas para ICEC Device (IUD) for Declaração sobre o DIU ICEC 2012 Não Informado. sobre segurança, eficácia, usuários, Publications Emergency como CE. mecanismo de ação, etc. profissionais e Contraception. programas de planejamento familiar.

Informar profissionais e Emergency usuários sobre Importância do acesso para ICEC Contraception for Informe sobre provisão de materiais que ICEC 2012 Não Informado. garantia dos direitos humanos Publications Crisis Settings: Key CE em situações de crise. informam como e da saúde reprodutiva. Resources. prover CE em situações de crise.

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Data de Classificação do Argumentos para facilitar o Objetivo da Subseção Título Autoria Apoiadores da Publicação Publicação documento acesso à CE Publicação Demonstrar que não há problema Repeated Use of no uso repetido, “Policy Statement”. Argumentação farmacológica ICEC Emergency pois aos CE é ICEC 2003 B1 Declaração de política sobre sobre segurança, eficácia, uso Publications Contraception: The mais segura que o uso repetido da CE. repetido. Facts. uma gravidez ou uma gravidez não desejada. Redução de gravidezes não Improving Access to “Policy Statement”. Defender o ICEC desejadas, redução de Emergency ICEC 2003 B2 Declaração de política para acesso aos CE Publications abortamentos, segura e eficaz Contraception. melhorar o acesso à CE. via OTC. para os programas de saúde.

Mostrar a The Unfinished Elizabeth necessidade de Documento temático e de Essencial para dar uma ICEC Agenda: Next Steps Westley; Sarah ICEC/Bill and Melinda ampliação do 2013 instrução para segunda chance à mulher para Publications to Increase Access to Rich e Hilary Gates Foundation. acesso aos CE defensores/ativistas. evitar a gravidez. EC. Lawton. para países em desenvolvimento

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Data de Classificação do Argumentos para facilitar o Objetivo da Subseção Título Autoria Apoiadores da Publicação Publicação documento acesso à CE Publicação

Dar suporte baseado em Emergency evidências Contraception: Documento temático e de Argumentação farmacológica científicas para ICEC Questions and ICEC 2013 Não Informado. instrução para sobre segurança, eficácia, usuários, Publications Answers for defensores/ativistas. mecanismo de ação, etc. profissionais e Decision-Makers. programas de planejamento familiar.

Informar sobre o Emergency fórum realizado Contraception: How em 2011 que far have we come? Discussões farmacológicas, ICEC/WHO Department of Documento temático e de objetivou levar ICEC What’s new? What’s sobre desafios frente à moral ICEC 2011 Reproductive Health instrução para novos membros Publications next? Final Report: religiosa; prescrição OTC; Research. defensores/ativistas. para o ICEC e Online discussion acesso por adolescentes; discutir desafios forum, held March para acesso aos 2nd -16 th , 2011. CE.

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Demonstrar a necessidade de aumentar o Elizabeth acesso aos CE, A review of global Westley; ICEC/Family Care Artigo publicado em: Redução de taxas de gravidez; ICEC principalmente access to emergency Nathalie Kapp; 2013 International; WHO. International Journal of por causa da violência sexual; Publications para países contraception Tia Palermo; Gynecology and Obstetrics. jovens são mais vulneráveis. pobres onde a Jennifer Bleck. CE é pouco conhecida como uma opção.

Discutir desafios e oportunidades para expansão do Emergency Elizabeth Existe uma epidemia de ICEC; Center for Research acesso: ICEC contraception: global Westley e Artigo publicado em: gravidezes não planejadas e 2012 on Health Care - University distribuição pelas Publications challenges, new Eleanor Bimla Contraception. abortos inseguros em muitos of Pittsburgh. ONG, opportunities. Schwarz. países em desenvolvimento. divulgação via internet, televisão, rádio.

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Linda Dominguez, Donald F. Gravidez não desejada Material Emergency Downing, Beth ICEC; Association of continua a ser um grande estratégico de ICEC Contraception: Jordan, Deborah Artigo publicado em: 2010 Reproductive Health problema de saúde pública. CE informação sobre Publications Uptade for Kurnik, Eleanor B. Pharmacy Today. Professionals. possui o potencial de reduzir a CE para pharmacists. Schwarz, James Trussell, Elizabeth este risco. farmacêuticos. Westley

Discutir sobre Francine Os indivíduos devem ter acesso aos CE Emergency Coeytaux, Elisa informação suficiente para para reduzir ICEC Artigo publicado em: contraception: have S. Wells e 2009 ICEC decidirem sobre o uso da CE. gravidezes não Publications Contraception. we come full circle? Elizabeth As mulheres devem escolher, desejadas em Westley querer esta tecnologia. âmbito populacional.

ICEC; UNFPA; WHO; O acesso deve ser facilitado World Bank Special porque reduz o risco de uma Elizabeth Expanding Access to Programme of Research, Artigo publicado em: mulher engravidar. Devido ao Revisar questões ICEC Westley, H.von emergency 2007 development and research International Journal of grande número de gravidezes importantes Publications Hertzen, A. contraception training in human Gynecology and Obstetrics indesejadas; ao uso incorreto sobre CE. Faundes. reproduction, Universidade de outros contraceptivos e à de Campinas – Brasil. violência sexual.

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Data de Classificação do Argumentos para facilitar o Objetivo da Subseção Título Autoria Apoiadores da Publicação Publicação documento acesso à CE Publicação O acesso à CE leva a benefícios de saúde, sociais e Informar com Contraceptive econômicos para as mulheres e embasamento Partner Mia Foreman e USAID; Population “Fact Sheet”. Ficha técnica Evidence: Questions 2013 suas famílias, incluindo a biomédico sobre Publications Jeff Spieler Reference Bureau. sobre contraceptivos. and Answers. saúde materno-infantil, métodos redução de gravidezes não contraceptivos. planejadas e abortos inseguros.

Dar suporte WHO Fact Sheet: Argumentação farmacológica baseado em Partner “Fact Sheet”. Ficha técnica Emergency WHO 2012 WHO sobre segurança, eficácia, evidências Publications sobre CE. Contraception. mecanismo de ação, etc. científicas sobre CE.

Argumentação farmacológica sobre segurança, eficácia, Dar suporte Product Brief: Reproductive mecanismo de ação, etc. Por baseado em Partner Reproductive Health “Fact Sheet”. Ficha técnica Emergency Health Supplies 2012 ser um contraceptivo seguro e evidências Publications Supplies Coalition sobre CE. Contraceptive Pills Coalition eficaz pode prevenir o risco de científicas sobre gravidez não desejada ou não CE. planejada.

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Redução do número de Mostra Jill Keesbury, gravidezes não desejadas; Mainstreaming resultados de Monica Population Council e “Policy Brief”- Resumo de redução de taxas de Partner Emergency uma iniciativa Wanjiru e 2010 Population Services política de intervenção para abortamento, o número de Publications Contraception Pills in para melhorar o Katherine International. melhoria do acesso à CE. crianças negligenciadas e Kenya. acesso aos CE no Maina. abandonos. Quênia.

Mainstreaming Emergency O acesso à CE é um direito Contraception: A Relatar as humano, provê às mulheres Report on the Relatório de iniciativa para iniciativas de segunda chance de prevenir Partner Compton Robert C. aumentar conscientização e intervenção para 2008 Compton Foundation. uma gravidez; benefícios para Publications Foundation’s Blomberg. acesso à CE com ênfase na aumento do saúde pública; direitos de Emergency América Latina e África. acesso aos CE na escolha, empoderamento das Contraception AL e África. mulheres. Initiative (2002- 2007).

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Redução de taxas de abortos e Emergency gravidezes não intencionais. Discutir a Partner Contraception: The Heather Informe sobre políticas Estas taxas poderiam ser necessidade de 2003 Guttamacher Institute. Publications Need to Increase Boonstra. públicas. reduzidas se as mulheres expansão do Public Awareness. soubessem da existência da acesso aos CE. CE.

Emergency Argumenta que a Partner Contraception: Steps Heather Informe sobre políticas Redução dos risco de gravidez; provisão OTC 2003 Guttamacher Institute. Publications Being Taken to Boonstra. públicas. taxas de abortamentos. melhora o acesso Improve Access. aos CE.

Governments Worldwide Put Redução dos risco de gravidez; Examina Emergency Center for taxas de abortamentos. iniciativas para Partner Contraception into Reproductive 2004. Center for Reproductive Rights. Documento informativo. Mulheres devem ter o direito tornar os CE Publications Women’s Hands: A Rights. de controlar sua vida mais Global Review of reprodutiva. acessíveis. Laws and Policies.

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Maior risco de complicações na gravidez e no parto; From Childhood to United gravidez na adolescência é um Demonstrar Woman: Meeting the “Fact Sheet”. Ficha Nations peso econômico e social para a importância da Partner Sexual and United Nations Population Fund Técnica sobre saúde Population 2012 adolescente, a família e a redução da Publications Reproductive Health (UNFPA). sexual e reprodutiva na Fund nação. 50% de abortos gravidez na Needs of Adolescent adolescência. (UNFPA). inseguros em países de renda adolesência. Girls. média e baixa são realizados por adolescentes.

Demonstrar um Prevenir gravidez não panorama geral Adolescents and Relatório sobre gravidez planejada; complicações, Family Health International sobre gravidez Partner Emergency na adolescência e riscos de saúde na gravidez e Chris Parker 2012 (FHI); William and Flora Hewlett na adolescência Publications Contraceptive Pills in contracepção de no parto. Peso econômico e Foundation. e acesso aos CE Developing Countries emergência. social para a adolescente. em países em Prevenção do aborto. desenvolvimento

Mostrar campanhas que ECafrique Bulletin: Partner Population William and Flora Hewlett Informes sobre CE e Prevenir gravidez não almejaram EC and Young 2005 Publications Council. Foundation; Comptom Fund. adolescência. planejada e aborto. facilitar o People. acesso aos CE na África.

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Dar Gravidez na adolescência é um informações Emergency “Policy Statement”. problema de saúde pública, CE técnicas, American Partner Contraception Declaração sobre tem o potencial de reduzir farmacológicas Academy of 2005 Não informado. Publications Committee on políticas publicada em: estas gravidezes que seriam sobre CE e Pedriatics. Adolescence. Pediatrics. “riscos” individuais e custos apoiar a sociais. distribuição OTC.

Lançar diretrizes para Responding to profissionais da intimate partner saúde sobre violence and sexual Manual clinico e Risco de gravidez não como agir Partner violence against WHO. 2013 WHO. político sobre violência desejada e abortos em clinicamente Publications women: WHO sexual contra mulheres. situações de violência. em resposta a clinical and policy situação de guidelines. violência contra a mulher.

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Lançar diretrizes The Clinical clínicas para Management of profissionais de Children and Manual clínico para Acesso à CE é importante para serviço Adolescents Who Partner adolescentes que risco de gravidez não desejada primário em Have Experienced USAID. 2013 USAID. Publications sofreram violência e abortos em situações de saúde sobre Sexual sexual. violência. como agir Violence: Technical clinicamente Considerations for em resposta a PEPFAR Programs. situação de violência.

Lançar U.S. A National Protocol diretrizes Department of Manual clínico e for Sexual Assault clínicas e Partner Justice Office U.S. Department of Justice Office jurídico para adultos e Acesso à CE é importante para Medical Forensic 2013 jurídicas em Publications on Violence on Violence Against Women. adolescentes que risco de gravidez não desejada. Examinations: resposta a Against sofreram violência. Adults/Adolescents. situações de Women. violênca.

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Estabelecer atividades prioritárias The Inter- para prevenir e Agency gerenciar Working conseqüências The Minimum Initial Manual que estabelece Acesso à CE é estratégico para Partner Group da violência Service Package 2011 IAWG atividades prioritárias risco de gravidez não desejada Publications (IAWG) on sexual; (MISP). em crises humanitárias. decorrente de violência sexual. Reproductive transmissão de Health in HIV; excesso Crises de mortalidade e morbidade materna e do recém nascido.

Facilitar a provisão de Inter-Agency serviços de Kit de saúde reprodutiva Acesso à CE é importante para Partner Reproductive Health saúde UNFPA 2008 UNFPA para agências seu no tratamento do estupro e Publications Kits for Crisis reprodutiva humanitárias. planejamento familiar. Situations. durante situações de crise.

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Data de Classificação do Argumentos para facilitar o Objetivo da Subseção Título Autoria Apoiadores da Publicação Publicação documento acesso à CE Publicação The Reproductive Aumentar Acesso à CE é importante para Emergency Health acesso a risco de gravidez não desejada; Contraception for Response in informações Documento técnico abortos em situações de Conflict Affected Crisis sobre CE The Reproductive Health sobre serviços de violência; mortalidade Partner Settings: A Consortium; especialmente 2004 Response in Crisis Consortium; contracepção de materna. Fornece uma segunda Publications Reproductive Health UNFPA; para UNFPA; WHO; UNHCR. emergência em chance para mulheres evitarem Response in Crises WHO.United profissionais contextos de conflito. gravidez não planejada e reduz Consortium Distance Nations High trabalhando risco de doenças e Learning Module. Commissioner com pessoas complicações do parto. for Refugees refugiadas. (UNHCR).

Material organizado Boletim de informações Acesso à CE é estratégico para para melhorar e ECafrique Bulletin: Partner Population sobre CE com foco reduzir risco de gravidez não expandir a EC and Care for 2004 Population Council. Publications Council. sobre violência sexual desejada decorrente de distribuição e Sexual Assault. em países africanos. violência sexual. qualidade de serviços sobre CE.

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Padronizar um The New Emergency kit com Health Kit 98: Drugs Documento de Acesso à CE é estratégico para medicamentos Partner and Medical Supplies informações sobre o kit WHO 1998 WHO risco de gravidez não desejada e suprimentos Publications for 10,000 People for para situações de decorrente de violência sexual. de saúde para Approximately 3 emergência. situações de Months emergência.

Manual para treino de Manual para CE possui papel crucial para Emergency médicos, Partner Pathfinder treinamento de programas de planejamento Contraceptive Pills, 2008 Pathfinder International. enfermeiros e Publications International. profissionais de saúde familiar evitando uma Second Edition. parteiras sobre sobre CE. gravidez indesejada. contracepção de emergência.

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Informar sobre introdução de CE em países Redução do número de em “Kit de ferramentas”. abortos; riscos de saúde; desenvolvimento Resources for Guia para advocacy , redução de custos para para Emergency ferramentas de Partner sistemas de saúde e para a legisladores; Contraceptive Pill PATH. 2004 PATH. avaliação, treinamento Publications sociedade por causa de planejadores de Programming para provedores, gravidezes não planejadas; programas; Toolkit. informações a clientes acesso é um direito humano e profissionais de sobre CE. da mulher. saúde; profissionais de planejamento familiar.

Advogar em State of the World prol do direito Population 2012: By Margaret Acesso à CE é garantia ao Choice, Not By Relatório da UNFPA Partner Greene; essencial dos direitos humanos planejamento Chance: Family 2012 UNFPA. sobre planejamento Publications Shareen Joshi; e reprodutivos. familiar. Planning, Human familiar. Omar Robles. Mostrar Rights and desafios e Development. avanços.

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Noticiar ação EC launched in DKT espera que a distribuição da DKT na Indonesia by Notícia divulgada no de CE na Indonesia reduza as EC News ICEC 2005 ICEC. Indonésia para Consortium member website. taxas estimadas em 2 milhões reduzir número DKT International. de abortos no país. de abortos.

Noticiar uma publicação do IPPF que defende o uso, a distribuição e O acesso à CE é um ponto de o acesso aos entrada para a contracepção CE mesmo que IPPF stands by Notícia divulgada no EC News ICEC/IPPF 2006 IPPF regular e o meio mais efetivo estudos statement on EC website. para redução de gravidezes mostrem que não desejadas. ela não esteja reduzindo taxas de gravidezes não intencionais ou abortos.

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Noticiar sobre O acesso à CE é uma questão oposição aos The uncertain future Notícia divulgada no EC News ICEC 2008 ICEC. de saúde pública e direitos contraceptivos of EC in Chile website. humanos. de emergência no Chile

Informar sobre carta escrita pela Essencial para situações de coordenadora violência quando a gravidez do ICEC ao ICEC comments: EC Elizabeth Notícia divulgada no EC News 2007 ICEC. pode ser um segundo trauma. New York necessary after rape. Westley. website. Este risco é altamente Times sobre diminuído com o uso da CE. notícia de epidemia de estupros no Congo. Notícia sobre caso de acesso EC debate in Italy Notícia divulgada no negado à CE EC News ICEC 2008 ICEC. É um direito das mulheres. continues. website. para duas mulheres na Itália.

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Data de Classificação do Argumentos para facilitar o Objetivo da Subseção Título Autoria Apoiadores da Publicação Publicação documento acesso à CE Publicação O acesso deve ser garantido Noticiar sobre EC closer to over-the- porque são contraceptivos mudança de Notícia divulgada no EC News counter status in ICEC 2008 ICEC. seguros e eficazes que status em website. Canada. previnem gravidezes não farmácias intencionais. canadenses. Noticiar que a CE foi inclusa junto a uma 10 years of EC in the Altos índices de gravidez não gama de Notícia divulgada no EC News Spanish province ICEC 2008 ICEC desejadas, abortos legais e estratégias para website. Cantabria gravidezes na adolescência. reversão da situação na região espanhola. Fonte: Website do Consórcio Internacional sobre Contracepção de Emergência.

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APÊNDICE 2 - PRINCIPAIS MARCOS SOBRE DISSEMINAÇÃO DA CONTRACEPÇÃO DE EMERGÊNCIA.

1992 – Publicação de James Trussell e Felicia Stewart que cunhava o termo “pílula de emergência” na revista Family Planning Perspectives . 1992 – Criada força tarefa sobre contracepção pós-coito pelo grupo RHTP ( Reproductive Health Technologies Project ), liderado por Felicia Stewart. 1994 – James Trussell lança website para divulgar informações sobre CE – www.Not-2-late.com. 1994 – Petição do Centro sobre Política e Lei Reprodutiva da Packard Foundation foi arquivada junto ao FDA, assinada pela Associação Médica Americana de Mulheres, Associação Americana de Saúde Pública e Planned Parenthood de Nova York. A petição solicitava que o FDA declarasse a segurança e eficácia da CE contendo levonorgestrel. 1995 – A empresa Gynetics começa a produzir o Preven ® (Yuzpe). 1995 – Formação do ICEC em Bellágio, na Itália, por iniciativa da Fundação Rockefeller. O consórcio foi liderado na época por Sharon Camp. 1996 – ICEC firma parceria com Gedeon Richter, empresa farmacêutica Húngara, produtora do Postinor ® (levonorgestrel). 1996 – A CE pelo método Yuzpe é normatizada no Brasil e incorporada no Manual de Assistência e Planejamento Familiar do Ministério da Saúde. 1996 – Ano em que ocorreu uma oficina produzida pelo Population Council no Brasil, junto à coordenação de Saúde Materno Infantil do MS para debater diretrizes para introduzir a CE no país. 1997 – A Women’s Capital Corporation é fundada por Sharon Camp para comercializar a CE contendo apenas levonorgestrel, o Plan B ®. 1999 – FDA responde à petição da Packard Foundation, declarando a segurança e eficácia do Plan B ®. 1999 – Regulamentação da Norma Técnica para atendimento às vítimas femininas de violência sexual no Brasil, que permitiu a administração da pílula de emergência nos serviços públicos de saúde em tempo oportuno, além do atendimento por uma equipe interdisciplinar. 1999 – Aprovação pela ANVISA da comercialização do Postinor-2® (levonorgestrel) pelas drogarias, com prescrição médica.

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2005 – O governo brasileiro lançou a cartilha “Anticoncepção de Emergência: perguntas e respostas para profissionais de saúde” e ampliou o fornecimento da pílula de emergência para atender a todas as mulheres que dela necessitam, para além das situações de violência sexual. 2006 – O Ministério da Saúde editou a Nota Técnica sobre a “Anticoncepção de Emergência”, o qual foi mais um instrumento para institucionalizar a pílula de emergência no cenário nacional. 2006 – Nota do Conselho Federal de Medicina posicionando-se favorável ao uso da pílula de emergência, inclusive pelas adolescentes, pois ela não é abortiva e pode ser usada em qualquer idade. 2012 – Publicação de protocolo pelo Ministério da Saúde que permite a dispensação da contracepção de emergência pelo(a) enfermeiro(a) nos serviços públicos de saúde, no contexto da Rede Cegonha.

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ANEXO – PÁGINA INICIAL DO WEBSITE

Figura 8: Página Inicial do website do ICEC.