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Globo e : reflexões e apontamentos para uma história comparada

MARIA ANGELA RAUS*

RESUMO

O presente trabalho é um desdobramento da pesquisa de doutorado em História Econômica, Do rádio para a TV: circulação, produção e consumo de histórias (1941- 1971). Com o objetivo de entender a circulação da telenovela como mercadoria pelo espaço latino- americano, foi necessário compreender a história de algumas empresas de comunicação que se destacam na sua produção. O , do qual faz parte a TV Globo, é reconhecidamente a empresa brasileira de maior destaque. Outro grande grupo de comunicação é o Grupo Televisa, que, assim como , também possui empresas voltadas para comunicação e entretenimento. Ambos possuem influência em seus países de origem e atendem a interesses que vão de questões políticas a modelos culturais. Há elemento comuns em suas trajetórias, que se relacionam com o desenvolvimento da televisão, o consumo de informação e de conteúdos audiovisuais, a formação de opinião e as relações com interesses políticos. Além disso, as famílias fundadoras Marinho (Globo) e Azcárraga (Televisa) ainda possuem o controle das empresas. A história de cada um desses grupos pode ser encontrada em seus sites oficiais, que apresentam todas as suas empresas, suas atividades econômicas e uma narrativa de desenvolvimento de sucesso, enfatizando sua influência em âmbito nacional e internacional. Este trabalho pretende destacar aspectos das histórias das empresas a partir desses dados oficiais, relacionando-os com outras fontes, tendo como elemento norteador a produção de telenovelas.

PALAVRAS-CHAVE: Comunicação; Televisão; Telenovela.

Introdução

Apesar das mudanças nas formas de consumo do conteúdo audiovisual e da informação, a televisão ainda é um veículo de comunicação de extrema importância, que tem impacto na formação de opinião e nas questões culturais.

Se a televisão constitui um objeto de estudo interdisciplinar, sua produção também tem essa condição. O presente trabalho é um desdobramento da pesquisa de doutorado em História Econômica, Do rádio para a TV: circulação, produção e consumo de histórias (1941- 1971).

* Doutoranda em História Econômica (FFLCH/USP).

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Com o objetivo de entender a circulação da telenovela como mercadoria pelo espaço latino-americano, foi necessário compreender a história de algumas empresas de comunicação que se destacam na sua produção.

No Brasil, o Grupo Globo, do qual faz parte a TV Globo, é reconhecidamente a empresa brasileira de maior destaque. Outro grande grupo de comunicação é o Grupo Televisa, no México, que assim como o Globo, também possui empresas voltadas para comunicação e entretenimento. Ambos têm grande influência em seus países de origem e atendem a interesses que vão de questões políticas a modelos culturais. Há elementos comuns em suas trajetórias, que se relacionam com o desenvolvimento da televisão, o consumo de informação e de conteúdos audiovisuais, a formação de opinião e as relações com interesses políticos. Além disso, as famílias fundadoras Marinho (Globo) e Azcárraga (Televisa) ainda possuem o controle das empresas.

A motivação para estudar este tema parte do momento atual da indústria cultural, destacando a teledramaturgia como mercadoria de grande circulação no mundo, que pode ser vendida já filmada, em formato de audiovisual seriado, ou apenas em forma de roteiros, a serem produzidos na indústria local, sofrendo adaptações em particularidades culturais.

Este trabalho pretende destacar aspectos das histórias das empresas a partir de dados oficiais, relacionando-os com outras fontes, tendo como elemento norteador a produção de telenovelas.

As fontes

A história de cada um desses grupos pode ser encontrada em seus sites oficiais, que apresentam suas empresas, suas atividades econômicas e uma narrativa de desenvolvimento de sucesso, enfatizando sua influência em âmbito nacional e internacional.

A discussão sobre as fontes é parte fundamental do trabalho do historiador. No caso, utilizam-se com frequência fontes audiovisuais e material de . Esses tipos de fontes, que em outras áreas do conhecimento, em especial na Comunicação, talvez sejam frequentes e tenham seu uso incentivado, são objeto de grande debate na área de História:

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Falar da especificidade das fontes do presente não é tarefa fácil, pois existe uma ambiguidade fundamental. Trata-se de refletir sobre fontes do “nosso tempo”, que logo será um tempo passado, permanecendo nosso? ou sobre aquelas que são específicas do “presente”, enquanto tal, tempo renovável à medida que o tempo passa? No primeiro caso, pensamos em fontes novas – o audiovisual, a imagem, o som – que ainda são novas neste fim do século XX, mas não o permanecerão por muito tempo, por força de banalizar-se, e não o serão mais para futuros historiadores do seu tempo (FRANK, 1999:103).

A percepção do “novo” nas fontes históricas tem relação com o tempo. As questões sobre o audiovisual e a internet ganharam novos contornos nas últimas duas décadas, com as possibilidades oferecidas por plataformas de vídeos e pelas redes sociais. A imprecisão de conteúdos, que podem ser alterados ou excluídos da rede, ou a confiabilidade de seus autores, são questões que precisam também ser tratadas.

Os dados extraídos dos sites das empresas podem ser conflitados com outras fontes como material de jornais, revistas e sites especializados. Em relação aos sites, há também o que é produzido profissionalmente, por jornalistas e por pesquisadores, e o que é produzido por espectadores, que podem emitir críticas positivas ou negativas.

Outro tipo de fonte encontrada nesta pesquisa foi um tipo de publicação, de caráter jornalístico e biográfico, sobre personagens relevantes nas empresas, em particular de seus donos. Esse tipo de material também possui propósitos diferentes ao ser produzido pela empresa ou fora dela.

América Latina: telenovela e pesquisa acadêmica

Pode-se dizer que a telenovela faz parte da identidade cultural latino-americana. Segundo Jesús Martín-Barbero:

No que diz respeito à televisão, é certo que, do México à Patagônia argentina, essa mídia convoca hoje as pessoas, como nenhuma outra, mas o rosto de nossos países que aparece na televisão é um rosto contrafeito e deformado pela trama dos interesses econômicos e políticos que sustentam e amoldam essa mídia. Ainda assim, a televisão constitui um âmbito decisivo do reconhecimento sociocultural, do desfazer-se e do refazer-se das identidades coletivas, tanto a dos povos como as de grupos. A melhor demonstração desses cruzamentos entre memória e formato, entre

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lógicas da globalização e dinâmicas culturais, é constituída, sem dúvida, pela telenovela: essa narrativa televisiva, que representa o maior sucesso de audiência, dentro e fora da América Latina, de um gênero que catalisa o desenvolvimento da indústria audiovisual latino-americana, justamente ao mesclar os avanços tecnológicos da mídia com as velharias e anacronismos, que fazem parte da vida cultural desses povos. O que, em nenhum momento, pode nos ocultar que o relato telenovelesco remete também à longa experiência do mercado para captar, na estrutura repetitiva da série, as dimensões ritualizadas da vida cotidiana e, juntando o saber fazer contas com a arte de contar histórias, conectar com as novas sensibilidades populares para revitalizar narrativas midiáticas gastas (MARTÍN- BARBERO; REY, 2001:114-115).

A passagem acima é do início da década passada, porém ainda tem elementos válidos. Fala da importância da televisão na América Latina e como as narrativas gastas conseguem ser reconfiguradas para novas gerações: TV, internet, série, não importa a modificação. As histórias, as mensagens, as relações culturais permanecem, mesmo que deformadas por interesses econômicos e políticos.

Atualmente, no campo da Comunicação e dos estudos sobre ficção seriada, muito se discute a perda de audiência da televisão para outras formas de consumo possibilitadas pela internet. São essas formas os sites e aplicativos, estes últimos disponíveis para celulares, tablets ou Smart TVs.

Isso pode ser observado, no âmbito acadêmico, na produção do Obitel, publicada anualmente e que faz um balanço das produções.

O OBSERVATÓRIO IBERO-AMERICANO DA FICÇÃO TELEVISIVA, constituído como Obitel, desde seu surgimento, em 2005, na Colômbia, tem se consolidado como um projeto intercontinental da região ibero-americana, incluindo países latino-americanos, ibéricos e os Estados Unidos de população hispânica. Tal como à época, considera-se importante falar de um âmbito iberoamericano devido ao crescente interesse de diferentes nações de fazerem aí confluir uma série de políticas de produção, troca e criação midiática, cultural, artística e comercial diferenciadas, o que pode colaborar para constituir uma zona de referência geopolítica e cultural importante (LOPES; OROZCO GÓMEZ, 2017:19).

O trabalho realizado pelo Obitel tem início em 2005, porém os anuários são publicados a partir de 2007. O primeiro foi publicado em espanhol pela Editorial Gedisa. A partir de 2008, o anuário é publicado em português, com a colaboração do Globo

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Universidade1 (LOPES; OROZCO GÓMEZ, 2011:12). Atualmente, publica-se em três idiomas: português, espanhol e inglês.

Seus estudos abrangem cinco dimensões: produção, circulação, consumo, comercialização, conteúdos temáticos e, a partir de 2010, transmidiação (LOPES; OROZCO GÓMEZ, 2017:19).

Quanto à metodologia, realiza: 1) monitoramento sistemático anual dos programas de ficção dos canais abertos dos países participantes; 2) geração de dados quantitativos comparáveis; 3) análise dos dez títulos mais vistos, quanto aos temas centrais e audiência; 4) destaques do ano para mudanças nas produções, narrativas e nos conteúdos temáticos; 5) contexto audiovisual de cada país e as tendências mais importantes; 6) análise da recepção transmídia; 7) proposição de um tema de estudo comum para o ano; 8) publicação dos resultados na forma de Anuário (LOPES; OROZCO GÓMEZ, 2017:19-20).

Atualmente, fazem parte do Obitel os seguintes países: Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Espanha, Estados Unidos, México, Peru, Portugal, Uruguai e Venezuela. Por meio desses anuários é possível observar as mudanças nesse tipo de produção no contexto latino-americano; por isso, serão usados como fontes.

As relações entre a academia e o setor produtivo são destacadas

Outro resultado igualmente importante do Obitel tem sido a parceria da universidade com o setor produtivo, renovada ano a ano, provando ser possível, porque desejada, a aliança de interesses em torno do estudo de nosso principal produto televisivo e cultural – a telenovela– e outros formatos decorrentes. (LOPES; OROZCO GÓMEZ, 2017:16-17).

O texto indica uma parceria com o setor produtivo; porém, em nota divulgada em seu site, o Globo Universidade, coloca a Globo como realizadora do seminário:

Com o objetivo de ampliar o diálogo sobre os estudos da ficção televisiva entre a academia e o mercado, a Globo realizou nos dias 5 e 6 de dezembro o VI Encontro

1 Globo Universidade: “área de relacionamento da Globo com o meio acadêmico e com o público jovem”. Atua com pesquisa, inovação e formação. GLOBO UNIVERSIDADE. Quem somos. Disponível em: . Acesso em: 22 dez. 2017.

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Obitel Brasil, que reuniu pesquisadores, professores e estudantes de telenovela no auditório da Escola de Comunicação e Artes da USP. "A ideia do Obitel não é ser apenas um projeto acadêmico, mas híbrido. Precisamos fazer pontes com produtores e realizadores desta área. E o Globo Universidade consolidou e permitiu essa conexão", comentou Maria Immacolata Vassalo de Lopes, coordenadora do Obitel Brasil.2

Observa-se uma grande participação da Globo na organização dos eventos acadêmicos relacionados ao Obitel no Brasil. Nesses eventos, a empresa costuma enviar autores, roteiristas, colaboradores, diretores e executivos de áreas diversas. Também há a participação de especialistas do Kantar Ibope Media do Brasil.

De acordo com questões levantadas em eventos do Obitel para professores estrangeiros, não há colaboração de empresas de televisão, em seus países de origem, semelhante à da Globo no Brasil.

Globo X Televisa

Foram pensadas algumas questões para comparação entre as duas empresas, como a organização dos sites, como eles se apresentam, as histórias e as famílias.

Enquanto grupos empresariais, ambos possuem sites com informações corporativas. O site do Grupo Globo apresenta em seu Menu: Estrutura Corporativa; Empresas do Grupo Globo; Responsabilidade Social; Notícias; Comunicação Corporativa. A página inicial também apresenta: Áreas de Atuação do Grupo Globo; Essência Globo (Missão, Visão, Princípios); Princípios editorias e uma linha do tempo, com link para outro site com a História do Grupo Globo.3 O site da Televisa apresenta um Menu com entradas para: Marcas; Acerca de Nosotros; Contacto. Na parte de baixo da página, encontram-se mais entradas para informações empresariais, mescladas com Menu para canais, programação e para redes sociais: Corporativo; Sala de Prensa; Inversionistas; Sostenibilidad; Código de Ética y Defensoría de Audiencia. Há também endereços da empresa na Cidade do México e

2 GLOBO UNIVERSIDADE. VI Encontro Obitel Brasil reflete sobre prática de fãs. Disponível em: . Acesso em: 22 dez. 2017. 3 GRUPO GLOBO. Disponível em: . Acesso em: 22 dez. 2017.

7 internacionais na Europa e nos EUA. Além dessas entradas, ao final da página estão as entradas: Apps; Anúnciate; Responsable Derecho de Réplica; Convenio del Usuario; Política de privacidad; Oferta Pública de Infraestructura.4

O Grupo Globo se apresenta com o seguinte texto:

Somos um grupo de mídia que cria, produz e distribui conteúdos de qualidade que informam, educam e divertem. O Grupo Globo é um conjunto de empresas que tem como missão informar, entreter e contribuir para a educação do país através de conteúdos de qualidade. Queremos cada vez mais ser o ambiente onde todos se encontram. E encontram informação, diversão e cultura, instrumentos essenciais para uma sociedade que almeja a felicidade de todos e de cada um. Um grupo 100% brasileiro. O Brasil é a sua origem, maior inspiração e responsabilidade. 5

O grupo Televisa coloca:

ACERCA DE NOSOTROS Es la empresa de medios de comunicación más grande en el mundo de habla hispana con base en su capitalización de mercado siendo uno de los principales participantes en el negocio de entretenimiento a nivel mundial. Opera cuatro canales de televisión abierta en la Ciudad de México, produce y distribuye 26 marcas de televisión de paga para distribución en México y el resto del mundo y exporta sus programas y formatos a Estados Unidos a través de Univision Communications Inc. (“Univision”) y a otros canales de televisión en más de 50 países. Ambas as empresas procuram a autovalorização e a promoção de seus produtos dentro do mercado do entretenimento, porém o discurso do Grupo Globo destaca sua contribuição para a educação no país em função da qualidade dos seus produtos. Destaca também a nacionalidade brasileira. Já o texto da Televisa foca mais no mercado externo, mostrando que é a maior empresa de comunicação no mercado hispano-falante, colocando seus dados de mercado e operação.

O Grupo Globo apresenta uma linha do tempo, com imagens e informações, distribuídas em datas, organizadas por mês e ano, totalizando setenta e sete datas de destaque na história do Grupo. Alguns exemplos:

- Jul. 1911: Lançamento do Jornal A Noite - Começa a circular o primeiro número do jornal A Noite, vespertino fundado por Irineu Marinho.

4 TELEVISA. Disponível em: < http://www.televisa.com/>. Acesso em: 31 jul. 2018. 5 Site GRUPO GLOBO.

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- Jul. 1925: Chega às bancas O Globo, fundado por Irineu Marinho, com duas edições diárias. - Abr. 1965: Inauguração da TV Globo. Em 26 de abril de 1965, é inaugurada a TV Globo, canal 4, no . A emissora é o embrião da futura Rede Globo de Televisão. - Jan. 1975: TV Globo consolida o conceito de rede. A Globo exibe grande parte de sua programação, simultaneamente, para todo o país, consolidando no Brasil o conceito de rede de televisão. Nesse momento, a Rede Globo firma-se como líder de audiência com um modelo de grade de programação horizontal e vertical, exibida de segunda a sábado, e o horário nobre preenchido por duas novelas intercaladas pelo Jornal Nacional, e finalizado com um programa da linha de shows. - Mar. 1976: Globo começa a exportar programas. A novela O Bem-Amado, de Dias Gomes, inaugura a venda de programas para o exterior. El Bien Amado estreia na TV Monte Carlo de Montevideo, Uruguai, em 22 de março de 1976. Em seguida, é vendida para quase todos os países da América do Sul e México. A novela abre caminho para as vendas internacionais da produção brasileira de televisão, tornando- se um produto de exportação. Antes, apenas os textos eram negociados, como os das novelas Véu de Noiva, Irmãos Coragem e O Homem que Deve Morrer. No ano seguinte, a novela Gabriela, adaptação de Walter George Durst do romance Gabriela, Cravo e Canela, de Jorge Amado, é vendida para Portugal, tornando-se a primeira telenovela exportada para outro continente. A partir dos anos 1980, a teledramaturgia da Rede Globo passa a ser exportada para centenas de países de todo o mundo, transformando-se em uma das principais divulgadoras da história e da cultura brasileira. - Jan. 1998: Nova estrutura na gestão das empresas Globo. As Organizações Globo implantam uma nova estrutura com base em unidades de negócios. e seus filhos – Roberto Irineu, João Roberto e José Roberto – deixam suas funções executivas e formam o Conselho de Gestão, dedicado à definição de estratégias para as empresas. São organizados núcleos de negócios comandados por diretores-gerais. - Mar. 1999: Criação do Memória Globo. É criado o Memória Globo, área responsável pela história da TV Globo e de seus profissionais. Com equipe formada por jornalistas e historiadores, o Memória pesquisa e produz conhecimento sobre a programação da Globo, seus marcos institucionais e as transformações tecnológicas e estéticas pelas quais a emissora passou desde sua fundação, em 1965. O Memória Globo desenvolve um programa de história oral e já realizou cerca de mil entrevistas com funcionários, ex-funcionários e colaboradores do Grupo Globo. A área produziu vários livros... Desde 2008, mantém um site onde é possível encontrar informações, fotos e vídeos sobre telejornais, coberturas jornalísticas e esportivas, perfis de profissionais e programas, da inauguração da Globo aos dias atuais. - Abr. 2001: Contrato entre a Globo e a Telemundo. A Rede Globo e a Telemundo (braço hispânico da rede americana NBC) assinam um contrato de cinco anos para a produção de telenovelas em espanhol. Vale Tudo, de Gilberto Braga, exibida em 1988, é a primeira novela da Globo adaptada para o mercado hispânico nos Estados Unidos. Vale Todo, como foi chamada, marca o início das produções da Globo voltadas exclusivamente para o exterior. - Out. 2002: Renegociação das dívidas do grupo. Afetadas por dívidas contraídas a partir do início da década de 1990 em função de investimentos das empresas e pela desvalorização do Real, as Organizações Globo declaram moratória. Roberto Irineu Marinho assume a liderança do grupo para renegociar a dívida e reestruturar os negócios. São adotadas medidas para tornar as empresas mais eficientes e mais competitivas. Dentre as diversas ações, o Grupo decide concentrar-se na produção e programação de conteúdos, saindo gradativamente do ramo de distribuição de TVs por assinatura. Outra decisão é a fusão da holding Globopar com a Globo Comunicação e Participações (GCP), o que vem a acontecer em 2005. A dívida é

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renegociada com todos os credores. Em 20 de outubro de 2006, a situação financeira é completamente resolvida, antes mesmo do prazo acordado com os credores.6

Os acontecimentos destacados são uma escolha subjetiva da empresa, que pretende destacar seus feitos e suas superações em situações de crise. Entre os exemplos transcritos acima estão marcos da internacionalização das novelas, como 1976, com o início das exportações, e 2001, com o contrato de produção conjunta com a Telemundo. Até 1976, segundo o site, apenas os textos eram negociados. O acordo com a Telemundo previa que a Globo produzisse em espanhol para o público latino nos EUA. Outra questão importante é a necessidade de renegociação financeira em 2002, justificada por dívidas contraídas no início dos anos 1990 e, posteriormente, pela desvalorização do Real, chegando a provocar declaração de moratória. O projeto de memória recebeu grande investimento, contando com trabalho de historiadores e a aplicação de história oral na coleta de depoimentos. A parte histórica da Televisa é colocada de maneira sintética, em formato de texto. Segue a transcrição do texto:

Hablar de la historia de Televisa, es hablar de la historia de la televisión en México. Todo comienza en 1930 con la visión empresarial de Emilio Azcárraga Vidaurreta, quien fundó la XEW "La Voz de la América Latina desde México", primera radiodifusora con cobertura nacional. Posteriormente ante los cambios tecnológicos mundiales surgieron importantes adelantos en medios electrónicos, hecho que lo alistó para emprender un nuevo reto: la televisión. En 1955, Emilio Azcárraga Vidaurreta y los propietarios de XHTV Canal 4 y XHGC Canal 5, deciden fusionarse para colocar la infraestructura necesaria y llevar la señal a todos los rincones del país, formando Telesistema Mexicano.Fue hasta el 8 de enero de 1973 cuando Independiente de México y Telesistema Mexicano se fusionaron para dar nacimiento a Televisa (Televisión Vía Satélite). Bajo el liderazgo de Emilio Azcárraga Milmo, su estrategia de negocio fue un proceso acelerado de internacionalización. En 1976, Televisa exportaba sus contenidos a Univisión, lo que permitió llegar al público de habla hispana más allá de las fronteras. El crecimiento de la empresa había sido indiscutible desde su creación y, a principios de la década de 1990, Televisa entró a cotizar en la Bolsa Mexicana de Valores y para el año de 1993 en la Bolsa de Nueva York, dándole mayor solidez. En 1997 asume la presidencia Emilio Azcárraga Jean, trayendo consigo una ola de innovación y crecimiento que han posicionado a Televisa como una empresa que se mantiene a la vanguardia en su oferta de contenido y plataformas de distribución.

6 GRUPO GLOBO. História/ Grupo Globo. Disponível em: . Acesso em: 22 dez. 2017.

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Hoy, la empresa ha extendido sus horizontes hacia otros mercados, basándose en una estrategia de diversificación en distintas líneas de negocio: · Contenidos: televisión, , internet, móviles, cine, Consumer Products, eventos. · Telecomunicaciones: Telefonía fija y servicios de banda ancha. Actualmente, Televisa tiene una visión: ser líder mundial en la producción y distribución de contenidos de habla hispana para todas las plataformas actuales y futuras.El negocio del entretenimiento, impulsado por la tecnología ha obligado a ampliar los contenidos a otras plataformas, para crecer en otras latitudes y consolidar a la empresa en la apertura de nuevos mercados y generar alianzas en todo el mundo mediante la creación de coproducciones y formatos de exportación. Asimismo, esta etapa de innovación se caracterizó por la gran preocupación de Televisa por la causas sociales por medio de Fundación Televisa, en donde a través de los distintos programas de ayuda se apoya a la sociedad mexicana. Desde la creación de Futel y Espacio (Hoy Tag DF) se busca a emprendedores universitarios. Sin duda alguna, Emilio Azcárraga Jean ha sabido adaptarse a las tendencias mundiales y contribuir responsablemente a la sociedad. Grupo Televisa ha asumido un compromiso directo y palpable con la Sostenibilidad. Hoy el éxito de la empresa debe ir más allá de los resultados de rentabilidad, ya que se necesita una visión Sostenible a futuro que tome en cuenta y equilibre aspectos económicos, ambientales y socioculturales en la operación. 7

Apesar de ser menos detalhista em sua história, a empresa foca em mostrar sua vocação empresarial e expansionista. Destaca as três gerações de proprietários da mesma família, os Azcárraga. Como a Globo, a exportação de conteúdos sobressai em 1976. Outros dados econômicos importantes são a entrada nas Bolsas de Valores do México (1990) e Nova York (1993). Ao final, indica o comprometimento da empresa com a sustentabilidade. No Menu correspondente a isso, abre-se uma cartilha produzida em 2016, que apresenta orientações relacionadas com meio-ambiente, mas também com ética, corrupção e cidadania.

Um ponto de comparação entre as empresas é que ambas tiveram a sua origem em outros veículos de comunicação que não eram a TV. O Grupo Globo tem início antes, em 1911, no jornal, e a Televisa em 1930, no rádio. Ambas são empresas de origem familiar: Marinho e Azcárraga, estando na 3ª geração gestora.

Como já foi citado, houve um grande investimento no projeto de memória do Grupo Globo, em particular da TV. Inicialmente foram produzidas algumas publicações como o Dicionário da TV Globo, v.1: programas de dramaturgia & entretenimento. O Dicionário apresentava toda a produção de teledramaturgia até a data da sua publicação. Atualmente,

7 TELEVISA. Corporativo. Quiénes Somos. Historia. Disponível em: . Acesso em: 22 dez. 2017.

11 essas informações podem ser encontradas no site Memória Globo, que oferece, além das informações, recursos audiovisuais e de interação, como vídeos das novelas, depoimentos de artistas, autores, diretores e técnicos e mecanismos de pesquisa.

Do que foi pesquisado, a Televisa não possui um projeto parecido em termos de organização institucional, porém em seu site, na parte de entretenimento, produz um material audiovisual sobre artistas consagrados de suas telenovelas e depoimentos sobre as produções, que constituem uma memória da empresa e da indústria cultural no México. É um material que, pela forma como é disponibilizado, muitas vezes se perde, por não ter um espaço permanente no site.

Como parte desse projeto, em 2004, foi lançada uma biografia de Roberto Marinho, escrita por Pedro Bial. Por se tratar de um livro editado pela empresa e escrito por um jornalista empregado dela, o teor do livro reforça de maneira positiva a construção da memória da empresa.

Com relação à Televisa, encontrou-se uma gama de publicações que criticam negativamente à Televisa, seja por questões técnicas ou por seu envolvimento em outras situações, como a política. Algumas geram muitas dúvidas de confiabilidade de suas informações. Entre essas publicações, destaca-se: El tigre: Emilio Azcárraga y su imperio Televisa, que é a biografia de Emílio Azcárraga Milmo (1930 – 1997), segundo da família a assumir o controle da empresa. Foi quem consolidou a empresa no campo da comunicação, com estratégias monopolistas e autoritárias, segundo o livro. Apresenta também aspectos biográficos, que demonstram uma personalidade controversa. Narra situações de relações com empregados, dos mais simples a artistas famosos, sua atuação como empresário e sua visão de negócios. Oferece também informações sobre a história da Televisa, as características de suas produções, a construção de um modelo de star system. Também destaca que é uma empresa movida mais por favorecimentos do que por posições ideológicas (PAXMAN; FERNÁNDEZ, 2013). Apesar de não ter um projeto de memória estruturado, a Televisa também se esforça por relembrar seus falecidos donos e suas realizações para o crescimento da empresa.

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Conclusão

Este trabalho propôs destacar aspectos das histórias das empresas Globo e Televisa a partir de dados oficiais, relacionando-os com outras fontes, tendo como elemento norteador a produção de telenovelas.

Em seus discursos, elas constroem uma imagem para o público consumidor, mas também para anunciantes e investidores, além de parceiros estrangeiros.

Entre as semelhanças nas trajetórias das empresas, encontraram-se a presença das famílias fundadoras, preocupações sociais (educação e sustentabilidade) e a construção de uma imagem positiva para o mercado e para o público, seja por meio da projeção no mercado internacional (Televisa) ou pela defesa da ideia da qualidade de sua produção (Globo).

Existe em ambas a preocupação para a construção de uma memória institucional, porém, pelo que foi observado, a Globo investiu em projetos e espaços de divulgação dessa memória de maneira mais eficaz do que a Televisa.

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FONTES

BIAL, Pedro. Roberto Marinho. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004.

Dicionário da TV Globo, v.1: programas de dramaturgia & entretenimento (Projeto Memória das Organizações Globo). Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2003.

GRUPO GLOBO. Disponível em: . Acesso em: 22 dez. 2017.

GRUPO GLOBO. História/ Grupo Globo. Disponível em: . Acesso em: 22 dez. 2017.

PAXMAN, A.; FERNÁNDEZ, C. El tigre: Emilio Azcárraga y su imperio Televisa. 3ª Ed. Cidade do México, MX: Ediciones Raya em Agua, S.A. de C.V., 2013.

TELEVISA. Disponível em: < http://www.televisa.com/>. Acesso em: 31 jul. 2018.

TELEVISA. Corporativo. Quiénes Somos. Historia. Disponível em: . Acesso em: 22 dez. 2017.

REFERÊNCIAS:

FRANK, R. Questões para as fontes do presente. In: CHAVEAU, A. Questões para a história do presente. Bauru: EDUSC, 1999, p. 103-117.

GLOBO UNIVERSIDADE. Quem somos. Disponível em: . Acesso em: 22 dez. 2017.

______. VI Encontro Obitel Brasil reflete sobre prática de fãs. Disponível em: . Acesso em: 22 dez. 2017.

LOPES, M. I. V.; OROZCO GÓMEZ, G. (coord). Qualidade na ficção televisiva e participação transmidiática nas audiências. : Globo, 2011.

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______.; OROZCO GÓMEZ, G. (coord). Uma década de ficção televisiva na Ibero-América. Análise de Dez anos do Obitel (2007-2016). Porto Alegre: Sulina, 2017.

MARTÍN-BARBERO, J; REY, G. Os exercícios do ver: hegemonia audiovisual e ficção televisiva. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2001.