Expansão urbana e turismo no litoral de : o caso das microrregiões de Itajaí e Florianópolis* Urban expansion and tourism in the coast of Santa Catarina: the case of the micro-regions of Itajaí and Florianópolis L’expansion urbaine et le tourisme dans la côte de Santa Catarina: le cas des micro-régions d’Itajaí et Florianópolis La expansión urbana y el turismo en el litoral de Santa Catarina: el caso de las micorrregiones de Itajaí y de Florianópolis

Raquel Maria Fontes do Amaral Pereira**

Recebido em 19/2/2010; revisado e aprovado em 11/6/2010; aceito em 13/9/2010

Resumo: Os núcleos urbanos do litoral de Santa Catarina e, em particular, da denominada microrregião de Itajaí, onde se destacam as cidades de Itajaí e Balneário Camboriú e da microrregião de Florianópolis, na qual despontam, além da capital, São José, Biguaçu e Palhoça, vem apresentando, nas últimas décadas, um dinamismo econômico e demográfi co, que somado ao expressivo fl uxo de turistas, deram a estas duas áreas litorâneas uma posição de destaque no cenário estadual e regional. Fundamentado no paradigma de formação sócio-espacial, o artigo compara as microrregiões, buscando analisar os elementos responsáveis por esta nova dinâmica. Palavras-chave: Formação Sócio-Espacial. Litoral Catarinense. Expansão Urbana e Turismo. Abstract: The unstable social tissues of rural Brazilian area shows that ownership of the land itself has failed to develop. Of the institutions that came into contact with before and after land ownership, religious organizations are most remembered. The article analyzed the role of religion in the social organization of the settlement by interviews with settlers. The trust has stood as the decisive action of restoring the fragile bonds in the studied community. Key-words: Socio-Spatial Formation, Santa Catarina Coastline, Urban Expansion and Tourism. Résumé: Les noyaux urbains de la côte de Santa Catarina et, en particulier, la micro-région appelée de Itajaí, où se mettent en évidence les villes de Itajaí et Balneário Camboriú, et la micro-région de Florianópolis, dans laquelle émergent, au-delà de la capitale, les villes de São José, Biguaçu et Palhoça; montrent dans les dernières décennies un dynamisme économique et démographique, lequel, ajouté à l’affl ux considérable de touristes, ont donné à ces deux zones côtières une place marquante dans le scénario de l’état et des régions. Basé sur le paradigme de la formation socio-spatiale, l’article compare les micro-régions, en analysant les facteurs responsables de cette nouvelle dynamique. Mots-clés: Formation socio-spatiale. Côte de Santa Catarina. Expansion Urbaine et Tourisme. Resumen: Los núcleos urbanos del litoral de Santa Catarina y, en particular, de la denominada microrregión de la desembocadura del río Itajaí, donde se destacan las ciudades de Itajaí y Balneário Camboriú y de la microrregión de Florianópolis; y en la cual surgen, además de la capital, São José, Biguaçu y Palhoça, presentan, en las últimas décadas, un dinamismo económico y demográfi co, que sumado al expresivo fl ujo de turistas, dieron a estas dos áreas litoraleñas una posición de destaque en el escenario estadual y regional. Fundamentado en el paradigma de la formación socioespacial, el artículo compara las microrregiones de la desembocadura del río Itajaí y de Floria- nópolis, buscando analizar los elementos responsables por esta nueva dinámica. Palabras clave: Formación Socioespacial. Litoral Catarinense. Expansión Urbana y Turismo.

Introdução minações extrapolam os limites físicos dos espaços que as contém e que sobressaem no A faixa costeira de Santa Catarina, contexto catarinense, nas últimas décadas, povoada originalmente por vicentistas e por apresentarem um novo dinamismo eco- açorianos, é cortada pelos inúmeros vales nômico e demográfi co, somado ao crescente atlânticos onde se instalaram, no século XIX, fl uxo de turistas. imigrantes europeus. Nela se localizam as O século XX imprimiu novas caracte- microrregiões de Itajaí e de Florianópolis, rísticas à formação litorânea catarinense, frutos de uma formação histórica cujas deter- aprofundando a crise das comunidades

* Esse artigo resulta da ampliação e do aprofundamento dos resultados de um trabalho de Iniciação Científi ca realizado pelo acadêmico Douglas Eigi Sawaki, do Curso de Graduação em Turismo e Hotelaria da UNIVALI, na condição de bolsista do CNPq. ** Doutora em Geografi a pela USP; professora do Programa de Pós-Graduação em Turismo e Hotelaria da UNIVALI e integrante do corpo docente do Programa de Pós-Graduação em Geografi a da UFSC; bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq.

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açorianas, herdeiras de um modelo econômi- décadas, sobretudo, este dinamismo se mani- co centrado na pequena produção mercantil1. festou na crescente expansão urbana da área A pequena propriedade familiar destas áreas situada junto à foz do rio Itajaí-Açu, cujo pólo litorâneas ocupadas por açorianos favoreceu é Itajaí, importante cidade portuária a qual a prática de uma policultura de subsistência se junta o Balneário Camboriú, bem como que, associada à produção pesqueira, gerou do aglomerado urbano da porção central do excedentes para a ampliação das relações que litoral catarinense onde se destacam Floria- fi zeram crescer o movimento das principais nópolis e as cidades do seu entorno. praças comerciais (Florianópolis e Itajaí). O advento da fase depressiva do terceiro ciclo As microrregiões de Itajaí e de de Kondratieff (1920-1945), entretanto, deu Florianópolis origem a um novo pacto de poder no interior da formação social brasileira, expresso pela Dividido em 293 municípios, o território aliança entre a burguesia industrial – dissi- catarinense apresenta, segundo o IBGE, seis dência dos comerciantes – e os latifundiários mesorregiões e vinte microrregiões, dentre as feudais (RANGEL, 1985), fazendo os núcleos quais se destacam as microrregiões de Itajaí urbanos do litoral catarinense mergulhar e de Florianópolis situadas, respectivamente, numa letargia que começou a ser superada nas porções do litoral designadas por centro- apenas a partir dos anos de 1960 por uma -norte e centro, como pode ser observado na nova dinâmica sócio-econômica. Nas últimas fi gura 1.

Figura 1 - Localização das microrregiões de Itajaí e de Florianópolis. Fonte: Adaptado de IBGE/2005

1 Conforme Bastos (2000), a permanência das relações bem como à existência de um artesanato muito diver- pré-capitalistas nas áreas de colonização açoriana pode sifi cado que impedia a especialização do artesão. Cabe ser atribuída a uma série de fatores. Dentre eles merece lembrar ainda a fragmentação excessiva das pequenas destaque o papel concentrador e aristocratizante dos propriedades por ocasião da sucessão da posse da terra, capitais comerciais de Desterro e do Rio de Janeiro o esgotamento do solo arenoso pelo uso da coivara e o que permitiram que apenas uma pequena parte do recrutamento dos açorianos para as tropas portuguesas, excedente fi casse nas mãos dos pequenos produtores, o que desfalcava a família de mão-de-obra produtiva.

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 12, n. 1 p. 101-111, jan./jun. 2011. Expansão urbana e turismo no litoral de Santa Catarina: o caso das 103 microrregiões de Itajaí e Florianópolis

A microrregião de Itajaí, localizada na território estadual, limitando as relações porção centro-norte do litoral catarinense, é econômicas das diferentes regiões entre si e formada pela planície costeira e pelas eleva- com a própria capital, quadro este que se mo- ções das Serras do Leste Catarinense, termi- difi cou nas últimas décadas, conforme atesta nando, a oeste, na Serra Geral. Nesta área, a publicação sobre Regiões de Infl uência das destaca-se a bacia do rio Itajaí-Açu que nasce Cidades do IBGE (2008, p. 18) ao destacar que nas encostas da serra e deságua no oceano, na atualidade Florianópolis “assume o contro- integrando juntamente com outros rios de me- le de quase todo o Estado de Santa Catarina nor extensão, a denominada vertente Atlânti- (excetuando-se a rede de , no norte, ca. Formada por municípios que apresentam que continua diretamente ligada a Curitiba)”. altos índices de crescimento demográfi co, A microrregião de Itajaí é integrada essa microrregião possui dois portos – Itajaí pelos municípios de Balneário Camboriú, e - com elevada movimentação , , Camboriú, , de mercadorias. Já a microrregião de Floria- Itajaí, Itapema, Navegantes, Penha, Balneário nópolis localiza-se na parte central do litoral Piçarras, e São João do Itaperiú, catarinense e se caracteriza pela presença de os quais juntos abrigam uma população esti- rochas cristalinas pré-cambrianas que inter- mada de 526.375 habitantes (IBGE, 2009). rompem a continuidade da planície costeira. É Dentre eles, apenas os municípios de São nela que se encontra a Ilha de Santa Catarina, João do Itaperiú, Ilhota e Camboriú não são onde se localiza a cidade de Florianópolis, balneários, embora o território deste último capital do estado cujo porto desempenhou um município esteja integrado ao de Balneário importante papel para a economia regional Camboriú, que apresenta a maior densidade até meados do século passado. As características sócio-espaciais im- primiram também uma singularidade à rede 2 Em Santa Catarina, além da separação entre o planalto urbana catarinense, na qual chama atenção a e o litoral, marcada pelos contrafortes das serras do Mar ausência de grandes cidades. A inexistência e Geral, inibidores das relações entre estas macrorre- giões, agravada pela precariedade das comunicações de unidade espacial acabou gerando várias até muito recentemente, observa-se também uma sub-regiões urbanas independentes que pre- ausência de unidade espacial. A compartimentação do cisam ser analisadas a partir do processo de espaço correspondente à fachada atlântica do território catarinense (litoral e encostas) decorre da presença de implantação das atividades primárias e secun- numerosos vales, ao longo dos quais surgiram várias dárias em Santa Catarina (MAMIGONIAN, sub-regiões urbanas. Também no planalto percebe-se 1966)2. Por outro lado, essa característica que uma subdivisão territorial com destaque para o planalto serrano, planalto norte, meio oeste e extremo oeste. O tem suas origens profundamente relaciona- geógrafo A. Mamigonian, já nos anos de 1960, apontava das ao quadro natural, deu ao estado um a existência em Santa Catarina de oito regiões urbanas desenvolvimento urbano mais equilibrado, pequenas, independentes umas das outras, ligadas em primeira instância às duas metrópoles do Brasil meri- contrário ao que ocorreu com os seus vizi- dional, Porto Alegre e Curitiba, quanto ao consumo nhos, onde Porto Alegre e Curitiba, as duas de bens e serviços e às metrópoles maiores (São Paulo metrópoles do Brasil meridional, unifi cam a principalmente) quanto ao escoamento da produção (MAMIGONIAN, 1966). vida sócio-econômica do Rio Grande do Sul 3 O governo federal, na década de 40 do século passado, e do Paraná, integrando as diferentes regiões tomou iniciativas no sentido de buscar a integração do que os compõem. Deve-se acrescentar ainda mercado nacional. Neste sentido, viabilizou a elabo- que as duas principais rodovias federais do ração do Plano Rodoviário Nacional (1944), adotando critérios principalmente econômicos para a implantação estado, as atuais BR-116 e BR-101 percorrem das rodovias federais. A construção da BR-116 e da 3 o território catarinense no sentido Norte-Sul , BR-101 que atravessam longitudinalmente o território cortando-o, pois, longitudinalmente sem catarinense agravou a falta de integração do Estado, di- fi cultando relações econômicas entre as suas diferentes convergir para a capital, diferentemente do regiões e com a própria capital, situação esta contornada que ocorreu em outras unidades da federa- em parte pela construção da BR 470 ligando o planalto ção brasileira, cujas capitais constituíram-se e o vale do Itajaí ao litoral, facilitando o deslocamento de pessoas e o escoamento de mercadorias para o porto em importantes centros de produção e dis- de Itajaí e para o litoral centro-norte do estado onde se tribuição, herança dos períodos históricos localizam alguns dos mais importantes balneários cata- anteriores. O traçado das rodovias tornou rinenses.Só muito recentemente é que a conclusão da mais visível ainda a compartimentação do rodovia BR 282, ao cortar o estado no sentido leste-oeste, ligou fi nalmente a região Oeste ao Litoral catarinense.

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 12, n. 1 p. 101-111 , jan./jun. 2011. 104 Raquel Maria Fontes do Amaral Pereira demográfi ca (2.219,1 hab/km²) do estado de mercantil agroindustrial colonial dos vales Santa Catarina (IBGE, 2009). A análise dos do Rio Itajaí-Açu e Itajaí - Mirim, a partir de dados estatísticos acerca do crescimento da meados do século XIX. No período situado população dos 12 municípios que integram a entre 1930 e 1970, as atividades portuárias microrregião de Itajaí (Tabela 1) permite cons- estavam representadas em sua quase totali- tatar que apenas 2 deles (São João do Itaperiú dade pelo comércio e exportação de madeira e Ilhota) tiveram uma taxa de crescimento no procedente do planalto catarinense. A deca- período de 1991 a 2000 inferior a média do dência do ciclo da madeira afetou a economia estado que é de 1,87%. Por outro lado, os muni- e o desenvolvimento urbano do município. cípios de Itapema (8,82%), Bombinhas (7,09%), Após uma fase de desenvolvimento da in- Balneário Camboriú (6,96%), todos litorâneos, dústria pesqueira, o porto reorientou-se para apresentaram um crescimento muito superior a movimentação de cargas conteinerizadas, a média estadual, revelando a relação entre as tornando-se, atualmente, um dos principais atividades voltadas para o setor turístico e a canais de exportação do Estado de Santa Cata- grande expansão demográfi ca registrada. rina, destacando-se no cenário nacional como Itajaí, com 172.081 habitantes, é o 7o mu- o primeiro terminal brasileiro em exportação nicípio mais populoso do estado (IBGE, 2009) de produtos congelados e frigorifi cados. Na e cidade-pólo da microrregião da foz do Rio margem esquerda do rio Itajaí-Açu, entrou Itajaí-Açu, apresentando setores econômicos em funcionamento recentemente o porto de diversifi cados e importantes para a região, Navegantes, no município de mesmo nome com destaque para a atividade portuária. O que abriga também o segundo aeroporto mais porto de Itajaí passou por várias transforma- movimentado do estado, perdendo apenas ções, desde a sua fase “natural”, quando ser- para o Aeroporto Internacional Hercílio Luz via de escoadouro para a pequena produção de Florianópolis.

Tabela 1 - Evolução da População da Microrregião de Itajaí

Fonte: IBGE

A microrregião de Florianópolis en- o IBGE (2009), uma população estimada globa os municípios de Antônio Carlos, de 848.224 habitantes. A análise dos dados Biguaçu, Florianópolis, Governador Celso estatísticos acerca do crescimento da popu- Ramos, Palhoça, , Santo Amaro da lação desses 9 (nove) municípios demonstra Impe ratriz, São José e São Pedro de Alcântara que 4 deles, Santo Amaro da Imperatriz (Tabela 2), que juntos apresentam, conforme (1,81%), Antônio Carlos (1,54%), São Pedro

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 12, n. 1 p. 101-111, jan./jun. 2011. Expansão urbana e turismo no litoral de Santa Catarina: o caso das 105 microrregiões de Itajaí e Florianópolis de Alcântara (1,28%) e Paulo Lopes (0,77%) Palhoça). A peculiaridade do sítio urbano de tiveram uma taxa de crescimento, no período Florianópolis – cuja área central está situada de 1991 a 2000, inferior a média do estado. Já na Ilha de Santa Catarina – e a sua expansão os municípios de Palhoça e de Biguaçu fo- demográfi ca nas últimas décadas geraram uma ram os que apresentaram maior crescimento mancha urbana praticamente contínua que de mográfi co, cabendo salientar ainda que se estende da capital aos municípios circun- dos 10 (dez) municípios mais populosos de vizinhos localizados no continente próximo, Santa Catarina, 3 (três) deles estão localizados acompanhando o eixo representado pela BR nesta microrregião (Florianópolis, São José e 101, inaugurada no início da década de 1970.

Tabela 2: Evolução da População da Microrregião de Florianópolis

Fonte: IBGE

Expansão urbana e turismo nas microrre- correspondia a 28.356 mil habitantes, ou seja, giões de Itajaí e Florianópolis 68,77% do total de brasileiros A população Analisando o processo de urbanização urbana brasileira ultrapassou a população no Brasil, Milton Santos (1988, p. 85), destaca rural em 1970, ano em que os moradores que a população brasileira em 1940 correspon- das áreas agrícolas somavam 41.054 mil de dia a 41.326 mil habitantes e que em 1980 pessoas, correspondendo a aproximadamente era constituída por 119.099 mil, fato que 44,2% do total da população do país e em demonstra o crescimento “de 77.773 mil ha- 1980, a população rural correspondia a 38.566 bitantes num período de 40 anos, o que nos mil habitantes correspondendo a 32,40% da dá um crescimento de 188,19% se quisermos população brasileira. Esta acelerada diminui- colocá-lo em termos relativos”, enquanto a ção da população rural resulta do processo população urbana no mesmo período, “passa de industrialização do Brasil que acarretou de 10.891 mil para 82.013 mil, o que perfaz uma verdadeira revolução urbana, visto que um crescimento de 71.122 mil habitantes vi- o último censo realizado pelo IBGE (2000) vendo em aglomerações ou um aumento de comprovou que apenas 19% dos brasileiros 653,03%”. Isto signifi ca dizer que ao longo vivem no campo, enquanto 81% do total da destas 4 décadas (1940 a 1980) “a população população vivem nas áreas urbanas. Seguindo total do Brasil triplica, enquanto a população a tendência nacional, em Santa Catarina, se- urbana multiplica-se por sete vezes e meia”. gundo dados do IBGE, 78,75% da população Registra-se, pois, uma inversão entre a po- é urbana. pulação urbana e rural, já que em 1940 a Esta verdadeira revolução urbana trou- população que vivia nas áreas rurais do país xe problemas de várias ordens para as cidades

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 12, n. 1 p. 101-111 , jan./jun. 2011. 106 Raquel Maria Fontes do Amaral Pereira e seus habitantes. A maneira como se deu a Tabela 3: Evolução da população urbana e organização do espaço e o crescimento da rural em Santa Catarina* população no século XX, somada à tendência ANO URBANA RURAL TOTAL mundial de esvaziamento do campo (devido 1940 253.717 924.623 1.178.340 à mecanização da agricultura e uma nova 1950 362.717 1.197.785 1.560.502 divisão do trabalho) e de expansão do espaço 1960 695.347 1.451.562 2.146.909 urbano sem a infra-estrutura correspondente, 1970 1.247.158 1.654.502 2.901.660 infl uenciaram no aumento da pobreza, da 1980 2.154.250 1.474.042 3.628.292 degradação ambiental e da violência. 1991 3.208.537 1.333.457 4.541.994 1996 3.565.130 1.310.114 4.875.244 Assim, pois, a urbanização e a expansão 2000 4.217.931 1.138.429 5.356.360 demográfi ca de uma infi nidade de localidades Fonte: IBGE, 2009. estão diretamente ligadas ao processo de in- *Em 1920, a população urbana e a rural não eram dustrialização e desenvolvimento regional, apresentadas separadamente. Em 1930, o Censo que pode estar relacionado a diferentes ativi- não foi realizado devido à Revolução. dades econômicas e até culturais. Segundo Bastos (2007), dentre os elementos que podem A análise atenta dos dados acima (tabela ser elencados como responsáveis pela expan- 3) permite constatar que a população urbana são urbana e demográfi ca das duas áreas aqui de Santa Catarina, que em 1940 representava enfocadas, estão principalmente “[a soma 21,53% do total da população do estado, sal- dos] fatores de atração (geração de empregos tou de 253.717 habitantes naquele ano para pela indústria nos grandes centros urbanos) e 4.217.931 em 2000, passando a corresponder de repulsão (impossibilidade do trabalhador a mais de 78% da população catarinense. O rural tornar-se pequeno proprietário)”. Tais crescimento absoluto de 3.964.214 habitantes fatores estão relacionados ao extraordinário vivendo nas aglomerações urbanas indica desenvolvimento industrial brasileiro, sobre- que a população residente nas cidades teve tudo após a década de 1930 e à ampliação da um aumento de 1562%, ou seja, enquanto a infra-estrutura regional, que gerou fl uxos população geral do estado cresceu 4 vezes e migratórios, do interior do estado de Santa meia, a população urbana de Santa Catarina Catarina e de estados próximos para as cida- multiplicou-se 16 vezes e meia. des situadas na faixa litorânea catarinense, Diante dos números apresentados cons- nas quais o crescimento industrial desde a tata-se, como já foi destacado, que a dinâmica década de 1940 é superior à média nacional. populacional catarinense refl ete a brasileira, Bastos ressalta que no ano de 1940, a produção pois o crescimento absoluto da população catarinense correspondia a 1,9% do montan- residente nas cidades foi acompanhado por te industrial brasileiro, em 1970, a 2,6%, em uma redução relativa da população rural. 1980, a 3,9% e que em 2000, saltou para 4,4%. No decênio de 1970 para 1980, por exemplo, enquanto a população urbana cresceu de Estes dados expressam o extraordinário salto 1.247.158 para 2.154.250 (72%), a população da produção industrial de Santa Catarina, rural caiu de 1.654.502 para 1.474.042 (11%). considerando-se especialmente que a partici- É preciso considerar ainda que em Santa pação da população absoluta do estado, frente Catarina o processo de urbanização das últi- ao total da população do país, permaneceu de mas décadas vem induzindo a conurbação 1940 a 2000 em torno de 3%. dos núcleos urbanos, particularmente os do Por outro lado, há que se considerar litoral centro-norte, situação esta intensifi cada que os descendentes de imigrantes europeus pelos crescentes fl uxos turísticos que contri- estabelecidos no interior do estado a partir buem para a aceleração das transformações na da metade do século XIX, impossibilitados de organização socioespacial das cidades locali- continuar suas atividades agrícolas passaram a zadas na fachada atlântica. Esse movimento migrar para as áreas urbanas, especialmente a demográfi co é explicado por Santos (1988) partir da década de 1950, em busca de melhores quando afi rma que a melhoria da rede viária condições de vida. Dentre outros fatores, nas reduz o tempo de viagem de um lugar a outro, áreas coloniais marcadas pela pequena produ- favorecendo a acessibilidade. ção mercantil, a crise agrária decorre do parce- Os municípios de Santa Catarina com lamento das propriedades entre herdeiros. taxa de crescimento populacional acima da

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 12, n. 1 p. 101-111, jan./jun. 2011. Expansão urbana e turismo no litoral de Santa Catarina: o caso das 107 microrregiões de Itajaí e Florianópolis média estadual localizam-se principalmente serviços e/ou nas atividades decorrentes do ao longo da rodovia BR 101, que corta o terri- turismo. tório catarinense no sentido norte-sul, acom- No caso específi co de Florianópolis, panhando a linha costeira. Entre a capital, destaca-se, sobretudo a partir da década de Florianópolis, e Joinville, o município mais 1960, uma acelerada expansão de vários se- populoso situado no litoral norte do estado, tores ligados à prestação de serviços, com a passando pela região da foz do rio Itajaí-Açu, criação de inúmeros órgãos e repartições esta- estão localizados alguns dos núcleos urbanos duais e federais, como foi, por exemplo, o caso catarinenses mais industrializados, como é o da Universidade Federal de Santa Catarina e caso de , Brusque e Jaraguá do Sul, da sede da ELETROSUL, transferida para a assim como alguns dos que mais recebem capital catarinense. Somado a esses fatores, turistas, como ocorre, por exemplo, com Bal- há que se considerar a expansão, nas últimas neário Camboriú e Itapema. A expansão dos décadas, das atividades ligadas ao turismo, núcleos urbanos situados na faixa litorânea que tem contribuído para a aceleração das catarinense tem como principal agente o transformações na organização sócio-espacial crescimento econômico dessas localidades não apenas da capital como também de outras baseado na industrialização, na prestação de cidades localizadas no litoral catarinense.

Tabela 4 - Os 10 municípios mais populosos de Santa Catarina.

Taxa de cresci- Estimativa Posição Municípios 1991 2000 mento (1991- 2009 (posição) 2000) % 1° Joinville 353.070 429.604 2,22 497.331 2° Florianópolis 255.390 342.315 3,34 408.161 3° Blumenau 212.025 261.808 2,39 299.416 4° São José 136.293 173.559 2,75 201.746 5° Criciúma 146.320 170.420 1,72 188.557 6° Chapecó 111.390 146.967 3,16 174.187 7° Itajaí 119.631 147.494 2,38 172.081 8° Lages 142.999 157.682 1,1 167.805 9° Jaraguá do Sul 76.968 108.489 3,92 139.017 10° Palhoça 68.430 102.742 4,66 130.878 População de Santa 4.541.994 5.356.360 1,87 6.118.743 Catarina Fonte: IBGE, 2009.

Apenas dois dos dez maiores municí- e Balneário Camboriú (6,96%). É preciso res- pios do estado em população, Lages e Cha- saltar, porém, que a elevada concentração da pecó, não estão situados na zona litorânea. população na fachada atlântica é um fato já re- Conforme a tabela 4, dentre eles o que mais gistrado no passado, visto que em 1856 Santa cresceu, no período de 1991 a 2000, foi Palhoça Catarina possuía 111.109 habitantes, dos quais (4,66% ao ano), localizado na microrregião 104.317 viviam no litoral (PEREIRA, 1943, p. de Florianópolis, enquanto Lages, situada no 43). Diante destes dados, constata-se que o planalto serrano, registrou o menor índice, “fenômeno da litoralização” da população, crescendo, no mesmo período, apenas 1,10% apontado como uma realidade demográfi ca ao ano. Os municípios com as mais elevadas recente, constitui uma meia verdade, visto taxas de crescimento demográfi co anual no que esta concentração demográfi ca no litoral período citado, localizam-se nas áreas costei- catarinense não é um dado recente. ras, como é o caso de Itapoá (9,28%), Itapema Por outro lado, dados econômicos e de- (8,82%), (7,37%), Bombinhas (7,09%) mográfi cos atestam na atualidade o acelerado

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 12, n. 1 p. 101-111 , jan./jun. 2011. 108 Raquel Maria Fontes do Amaral Pereira crescimento, na faixa costeira, de um eixo segundo Monteiro (2005), o turismo era inci- de urbanização situado ao longo da BR 101, piente e ocasional, visto que a cidade não especialmente entre a capital do estado e tomara consciência de sua vocação turística. Joinville. Neste trecho concentram-se sete dos Apenas no fi nal da década de 1980, passa-se dez municípios catarinenses mais populosos a defender a vocação do município para o do estado. Estão entre eles, como pode ser turismo e a indústria da alta tecnologia, enten- observado na tabela 4, além de Joinville e didas como duas indústrias não poluentes e Florianópolis, respectivamente o primeiro e o adequadas ao riquíssimo ambiente natural da segundo mais populosos, Blumenau, São José, Ilha de Santa Catarina (RIZZO, 2005). Criciúma, Itajaí, Jaraguá do Sul e Palhoça, Por conta da valorização das terras em todos localizados em áreas de pequena pro- Florianópolis, os municípios vizinhos à ca- dução mercantil4. pital também passam por um incremento na É sabido que o adensamento da popu- ocupação territorial devido à oferta de terras lação no litoral de grande parte dos estados mais baratas, fato que culminou na suplanta- brasileiros possui raízes históricas, em conse- ção da taxa de crescimento demográfi co dos quência do próprio processo de colonização. municípios de São José, Palhoça e Biguaçu em Entretanto, dentre os estados que compõem relação à própria capital. a Região Sul – aos quais se poderia também Na microrregião de Itajaí, o processo de juntar o de São Paulo – apenas Santa Catarina ocupação da orla da então chamada praia de apresenta esta característica, visto que tanto o Camboriú teve início no fi nal da década de Rio Grande do Sul como o Paraná têm as suas 1920. Em 1926, surgiram as primeiras casas de maiores cidades localizadas fora da zona lito- veraneio, no centro da praia, pertencentes a rânea. Some-se a isso o fato de que o quadro moradores de Blumenau5. Em 1928, foi inau- geográfi co conferiu ao espaço litorâneo catari- gurado o primeiro hotel e, seis anos depois, o nense certas peculiaridades (PEREIRA, 2007) segundo empreendimento hoteleiro. Os ale- que, somadas ao processo de colonização, o mães do Vale de Itajaí trouxeram para a praia tornaram singular frente aos outros estados de Camboriú, o hábito de veranear, ou seja, que integram a Região Sul do Brasil: enquanto de utilizar a praia como lazer, já que o banho a faixa costeira do estado do Paraná é extre- de mar, até então, só era recomendado como mamente reduzida, a do Rio Grande do Sul, forma de tratamento e, para os pescadores, o sem elevações além das dunas, apresenta uma mar representava o espaço do trabalho. Esse grande extensão quase retilínea de mar aber- hábito contribuiu com o aumento do número to. Deve-se acrescentar ainda que até meados de estabelecimentos comerciais e de prestação do século passado, Santa Catarina estava à de serviços, mas o município cresceu de for- mercê de uma rede rodoviária defi ciente, o ma mais acentuada a partir de 1950. Durante que contribuía para agravar ainda mais a sua a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), os fragmentação em duas macrorregiões geoeco- alemães deixaram de freqüentar o local por nômicas que mantinham pouquíssima ligação entre si (o litoral e o planalto). 4 Os vales fl uviais fl orestados integrantes da bacia do Em 1950, Florianópolis, embora con- rio Uruguai, tal como os vales atlânticos constituem tasse com 58.264 habitantes, não se colocava também áreas de pequena produção mercantil em que como o município mais ativo economicamen- se desenvolveu uma rede urbana da qual fazem parte, dentre outros, o município de Chapecó, o 6º em popu- te, se comparado com outras cidades coloniais lação no estado, e os municípios de Caçador, Concórdia como Joinville e Blumenau, tanto que a BR 101 e Içara, todos com mais de 50.000 habitantes, colocados foi asfaltada primeiramente entre Joinville entre os vinte maiores de Santa Catarina. Lages, o 8º mu- nicípio do estado em população, é o único representante e Curitiba e entre Criciúma e Porto Alegre, da área latifundiária do planalto serrano que integra a sendo asfaltada no trecho de Florianópolis lista dos mais povoados. apenas no fi nal da década de 1960 (RIZZO, 5 A origem e o crescimento do Balneário Camboriú, o 2005). “A cidade de Florianópolis só polariza- mais famoso do litoral de Santa Catarina, não se expli- cam sem o reconhecimento da infl uência das colônias va economicamente uma área que podia ser alemães do Vale do Itajaí cuja expansão, na primeira balizada por ao norte, Paulo Lopes ao metade do século XX, até a desprezada faixa costeira do sul e Angelina a oeste” (MONTEIRO, 2005, então município de Camboriú, do qual se emancipou p. 12). No fi nal da década de 1960, ainda em 1964, foi marcada pelo caráter empreendedor dos descendentes desses imigrantes.

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 12, n. 1 p. 101-111, jan./jun. 2011. Expansão urbana e turismo no litoral de Santa Catarina: o caso das 109 microrregiões de Itajaí e Florianópolis medo de serem hostilizados, já que o exército e no fortalecimento do setor de construção brasileiro passou a utilizar os hotéis e mora- civil, fato que gerou milhares de empregos, dias como postos de observação da costa bra- atraindo um fl uxo migratório para atuar neste sileira. A partir de 1964, com a emancipação setor. Provenientes de municípios do interior de Balneário Camboriú que originalmente e até mesmo de outras regiões do país, estes fora um distrito do município de Camboriú, migrantes chegam ao litoral catarinense em seu crescimento explodiu, sobretudo após a busca de alternativas de emprego e renda. inauguração da BR 101, em 1971. A integra- Uma parcela signifi cativa dessa mão-de-obra ção do município à rede urbana regional, é absorvida pelo setor da construção civil e aumentou o fl uxo de pessoas e consolidou de serviços, porém devido à sazonalidade a sua vocação turística, o que pode ser cons- do turismo, a oferta de trabalho no setor de tatado através da sua evolução demográfi ca serviços assume um caráter temporário. Em que, entre 1970 e 2009, fez a sua população razão do alto valor dos imóveis nas regiões saltar de 10.810 para 102.081 habitantes. O centrais, os migrantes instalam-se na periferia expressivo crescimento registrado nas últimas das cidades, contribuindo para o processo de décadas colocou o Balneário Camboriú como expansão da área urbana. um dos principais centros urbanos do litoral Além da migração rural-urbana, que o de Santa Catarina e, consequentemente, da avanço do capitalismo no campo acentuou microrregião de Itajaí. Elemento decisivo para com a modernização da agropecuária, há essa expansão foi, sem dúvida, a melhoria também que se considerar a migração urbano- do sistema rodoviário, com destaque para a -urbano, infl uenciada pela difusão por meio construção da BR-101, inaugurada no início da mídia brasileira acerca da qualidade de da década de 1970, e duplicada na porção nor- vida nas microrregiões de Florianópolis e de te do estado, em 2000. Há que se considerar Itajaí. Moradores principalmente de Blume- também na conurbação entre Itajaí e Balneário nau, Joinville, Curitiba, Porto Alegre e até Camboriú o destacado papel desempenhado mesmo da Argentina e São Paulo procuram pela duplicação da rodovia Osvaldo Reis as cidades pertencentes à área metropolitana (SC, em 1994. Ao longo desta via, registra-se de Florianópolis e Itajaí para residir, construir um acelerado adensamento da ocupação do residências de veraneio (segunda moradia) espaço, em conseqüência da construção de ou investir em imóveis. Balneário Camboriú residências e estabelecimentos comerciais tem se tornado também um centro receptor de responsáveis por um fl uxo ininterrupto de pessoas aposentadas que ali fi xam residência. veículos, demonstrando a interdependência Além deste fl uxo urbano-urbano regional, é entre as duas cidades, no que se refere ao notável também a migração de famílias de trabalho e ao lazer. outros estados, principalmente do Rio Gran- O mesmo fenômeno de supervalori- de do Sul, Paraná e São Paulo, atraídas pela zação das terras em Florianópolis também qualidade de vida das microrregiões de Itajaí ocorreu em Balneário Camboriú contribuindo e Florianópolis, somada a fatores de repulsão para a expansão da área urbana a oeste da BR dos locais de origem, tais como violência, 101 (onde se fi xou a população de baixa renda, trânsito caótico, poluição do ar e outros as- que constitui a mão-de-obra de sustentação pectos que afetam visivelmente a qualidade das atividades turísticas), além da verticaliza- de vida dos grandes centros. Pode-se citar ção acentuada no centro da cidade. Segundo também como fator de atração o IDH do SKALEE (2008), “com fi ns turísticos, ou para estado de Santa Catarina que, segundo o atender a demanda habitacional, a estrutura PNUD (2000), é de 0,822, o que corresponde urbana de Balneário Camboriú sofreu rápi- das transformações nas últimas 4 décadas: alterações na malha viária, infra-estrutura, 6 É importante destacar que a especulação imobiliária novas concentrações de moradia e hospeda- nas áreas de grande potencial turístico do estado de- corre, em parte, da forte crise que teve início nos anos gem e centros de comércio, saúde e lazer que de 1990 quando os investimentos produtivos passaram visam dar suporte ao crescente número de a obter taxas de lucro muito baixas, provocando, con- usuários”. O investimento em imóveis6 tam- sequentemente, a aplicação de expressivos capitais no setor da construção civil e na aquisição de imóveis, como bém foi fundamental no crescimento urbano uma possibilidade de reserva de valor.

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 12, n. 1 p. 101-111 , jan./jun. 2011. 110 Raquel Maria Fontes do Amaral Pereira ao segundo maior dentre os estados do Brasil turístico, recebeu em 2007 (alta temporada) (o IDH nacional é de 0,766). Além disso, dos 748.456 turistas e em 2008, 685.946 e em 2009 12 municípios pertencentes à microrregião 770.355 visitantes. de Itajaí, 5 deles possuem IDH alto (acima Por outro lado, é preciso lembrar que o de 0,800), sendo o município de Balneário período de estagnação vivido pela cidade de Camboriú o detentor de um IDH de 0,867, o Florianópolis após a Revolução de 1930, foi segundo maior do estado. Dos 9 municípios superado pela modernização do sistema rodo- da microrregião de Florianópolis, 6 possuem viário e pela instalação de várias instituições IDH alto – dentre eles a própria cidade de prestadoras de serviços a partir da década Florianópolis que ocupa a primeira posição de 1960, apesar de sua função portuária ter no ranking estadual de IDH, com o índice entrado em decadência. A cidade ganhou um de 0,875. novo dinamismo diretamente relacionado às Na comparação entre as duas microrre- novas funções que passou a exercer em virtu- giões cabe ainda destacar que a acelerada de do desenvolvimento industrial do país e do expansão urbana dos municípios localizados estado. A capital catarinense recebeu maciços junto à foz do rio Itajaí, pode ser atribuída nos investimentos dos governos estadual e federal últimos anos, genericamente, às atividades que modifi caram radicalmente o seu perfi l, portuárias, às indústrias pesqueira e naval, aceleraram a urbanização, modernizaram e ao desenvolvimento do comércio (atacadista reforçaram o setor terciário, atribuindo novas e varejista), ao incremento do setor de servi- funções administrativas de âmbito estadual e ços, à popularização do veraneio e à dinami- federal e dinamizando os serviços, rompendo zação das práticas de lazer e turismo. Estas o longo período de estagnação econômica e últimas promoveram formas diferenciadas social em que mergulhara a partir de 1930. de ocupa ção e crescimento populacional, transformando precocemente algumas loca- Considerações fi nais lidades em centros de atração de veranistas e turistas, como foi o caso de Balneário A comparação entre as duas microrre- Camboriú e Itapema, enquanto outras, como giões enfocadas permite concluir que a Bombinhas e Penha, foram afetadas mais re- acelerada expansão urbana na Foz do rio centemente. Do ponto de vista demográfi co, Itajaí-Açu, pode ser atribuída, nos últimos essa microrregião de Itajaí é a que apresenta anos, às atividades portuárias, às indústrias o maior dinamismo no Estado, apesar da pesqueira e naval, ao desenvolvimento do co- taxa de crescimento populacional da própria mércio (atacadista e varejista), ao incremento cidade de Itajaí não ser das mais expressivas do setor de serviços, à popularização do ve- (2,41%). Se até mais da metade do século pas- raneio e à dinamização das práticas de lazer sado, a expressão de Florianópolis no contexto e turismo. Estas últimas promoveram formas catarinense restringia-se basicamente às suas diferenciadas de ocupação e crescimento funções político-administrativas como capital populacional, transformando precocemente do estado, percebe-se hoje uma complexifi - algumas localidades em centros de atração cação responsável pela ampliação de sua de veranistas e turistas, como foi o caso de importância regional baseada, sobretudo, no Balneário Camboriú e Itapema. Do ponto setor terciário. Segundo dados da SANTUR de vista demográfi co, essa microrregião é a (2010), a partir do ano de 2007, Florianópolis que apresenta o maior dinamismo no estado, se tornou o primeiro pólo receptor de turistas muito embora a cidade de Itajaí não seja a que no estado de Santa Catarina. Neste ano de apresenta a maior taxa de crescimento popu- 2007, ela recebeu na alta temporada (janeiro e lacional. Balneário Camboriú transformou-se, fevereiro) um total de 780.583 visitantes, dos em algumas décadas, num centro regional de quais 143.095 estrangeiros e na alta tempo- lazer, cuja infl uência ultrapassa os limites do rada de 2008, 776.374 entre os quais 146.996 estado de Santa Catarina, indo mesmo além turistas eram estrangeiros. Já em 2009, a de Curitiba e Porto Alegre, atraindo também capital catarinense recebeu 798.441 turistas, um expressivo fl uxo de turistas estrangeiros. dos quais 652.055 nacionais e 146.386 estran- Não se trata de uma mera disputa entre as geiros. Balneário Camboriú, o segundo pólo duas cidades mais importantes cidades dessa

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 12, n. 1 p. 101-111, jan./jun. 2011. Expansão urbana e turismo no litoral de Santa Catarina: o caso das 111 microrregiões de Itajaí e Florianópolis microrregião, visto que a supremacia no Referências campo turístico é inquestionavelmente de Bal- BASTOS, José Messias. Urbanização, comércio e peque- neário Camboriú. Itajaí, entretanto, não pode na produção pesqueira na Ilha de Santa Catarina. In: permitir-se perder os próprios elementos de LINS, Hoyêdo Nunes et al. (Orgs.). Ensaios sobre Santa centralidade e vivência urbana, sob pena Catarina. Florianópolis: Letras Contemporâneas, 2000. de, num breve espaço de tempo, se tornar ______. Considerações sobre a urbanização do litoral um aglomerado de quarteirões sem forma, catarinense. In: SIMPÓSIO DE GEOGRAFIA URBANA, X., 2007, Florianópolis. Anais... Florianópolis: SIMPURB, sem centro urbano, destituído de identidade 2007. p. 01-08. própria, praticamente um bairro de Balneário INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTA- Camboriú. TÍSTICA - IBGE. IBGE Cities – População Estimada 2009. No caso da microrregião de Florianó- Disponível em: . Acesso em: 19 dez 2009. das atividades ligadas ao turismo, levou à ex- ______. Rede de infl uência das cidades 2007. Rio de Janeiro: pansão de uma mancha urbana praticamente IBGE, 2008. contínua da parte insular da capital às terras ______. Censo Demográfi co do Estado de Santa Catarina circunvizinhas do continente, em virtude da 2000. Disponivel em: . Acesso em: 19 dez 2009.. polis na direção dos municípios vizinhos. Se MAMIGONIAN, Armen. Vida Regional em Santa até mais da metade do século passado a sua Catarina. In: Revista Orientação. IG-USP, n. 2, 1966. expressão no contexto catarinense restringia- ______. Indústria. In: Atlas de Santa Catarina. Florianó- se basicamente às suas funções político-admi- polis: GAPLAN, 1986. nistrativas como capital do estado, percebe-se MONTEIRO, Carlos Augusto de Figueiredo. Florianó- hoje um quadro diverso em que não apenas polis: o direito e o avesso. In: PIMENTA, Margareth de ampliou-se a sua importância regional como, Castro Afeche (Org.). Florianópolis do outro lado do espelho. dependendo da distância e do acesso, foi mi- Florianópolis: Editora da UFCS, 2005. p. 7-34. nimizada a infl uência das capitais dos estados PEREIRA, Carlos da Costa. A região das Araucárias. In: vizinhos sobre Santa Catarina, além de ter se Revista do Instituto Histórico e Geográfi co de Santa Catarina. o transformado num importante pólo receptor Florianópolis, 2 sem., 1943. de turistas nacionais e estrangeiros. PEREIRA, Raquel Maria Fontes do Amaral. A particu- A infra-estrutura viária teve importân- laridade do quadro urbano do litoral catarinense no processo de urbanização do sul do Brasil. In: SIMPÓSIO cia fundamental para o desenvolvimento DE GEOGRAFIA URBANA, X, 2007, Florianópolis. urbano e para o crescimento dos fl uxos turís- Anais... Florianópolis: SIMPURB, 2007. p. 01-17. ticos destas duas importantes microrregiões RANGEL, Ignácio. Economia: milagre e anti-milagre. Rio do litoral de Santa Catarina, tendo a BR-101 de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 1985. desempenhado um papel fundamental, li- RIZZO, Paulo Marcos Borges. A natimorta Tecnópolis gando o estado à região Sudeste e aos demais do Campeche em Florianópolis. In: PIMENTA, Marga- estados da região Sul, ao mesmo tempo em reth de Castro Afeche (Org.). Florianópolis do outro lado do que favoreceu também a chegada de turistas espelho. Florianópolis: Editora da UFCS, 2005. p. 61-84. estrangeiros. A ampliação do sistema rodo- SANTOS, Milton. Espaço e sociedade no Brasil: a viário muito mais fl exível do que o transporte urbanização recente. GEOSUL, Florianópolis, n. 5, p. 85-100, 1988. ferroviário, o qual além da inércia espacial SANTUR. Disponível em: . Acesso em: 11 jul. 2010. para a sua implantação, possibilitou o acesso SKALEE, Milena; REIS, Almir Francisco. Crescimento quase irrestrito às diferentes localidades, pro- urbano-turístico: traçado e permanências urbanas em vocando um forte impacto na redefi nição dos Balneário Camboriú. Diez años de cambios en el Mundo, espaços na faixa litorânea de Santa Catarina. en la Geografía y en las Ciencias Sociales, 1999-2008. In: COLOQUIO INTERNACIONAL DE GEOCRÍTICA, X. Anais... Barcelona: Universidad de Barcelona, 2008. Disponível em: Acesso em: 10 ago 2009.

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