JUSCELINO KUBITSCHEK: (1940-1945)

MATHEUS ABREU DO ROSARIO

INTRODUÇÃO

A partir dos anos 1900, algumas cidades brasileiras sofreram algum tipo de intervenção1, seja ela urbanística, arquitetônica ou cultural. Neste trabalho iremos nos atentar para as ocorridas em Belo Horizonte, entre os anos de 1940 a 1945. Capital do Estado das , BH, como é popularmente chamada pelos seus habitantes, era uma cidade que possuía alguns problemas em áreas como saneamento, habitação e pavimentação. Ademais existiam poucos espaços culturais e de lazer. No início da década de 1940, Juscelino Kubitscheck é nomeado pelo interventor de Minas Gerais, Benedito Valadares para o cargo de prefeito de Belo Horizonte. Ao longo de seu mandato, realizou obras de saneamento e pavimentação das principais avenidas da capital, construção o Conjunto Arquitetônico da Pampulha, e a realização da Semana de Arte com a exposição e presença de artistas do quilate de Tarsila do Amaral e Cândido Portinari. Logo em seus primeiros meses convidou à cidade, o urbanista francês, Alfred Agache2, onde este detectou uma cidade paradoxal, em que a área central estava se desenvolvendo, já a “periferia”, caminhava em sentido oposto, no caso ao subdesenvolvimento. Após este diagnóstico, a prefeitura promoveu intervenções ao longo da cidade.

JK E A SINGULARIDADE DE BELO HORIZONTE

Quando se aborda Belo Horizonte, uma das primeiras imagens que surgem a mente é o Complexo Arquitetônico da Pampulha e de seu arquiteto, Oscar Niemayer. No entanto até a criação do mesmo, BH passou por um período de intervenção por parte da administração municipal. Esta se iniciou a partir de 1940, com a nomeação de Juscelino Kubitscheck para o cargo de prefeito. O novo chefe do executivo municipal era casado com Sarah Lemos, jovem

 Graduando em História pela Universidade do Estado do . Bolsista na linha de pesquisa Intelectuais e Educação no Mundo ibero-americano, coordenada pela Profa. Dra. Adir da Luz Almeida, pertencente ao Grupo de Pesquisa Intelectuais e Poder no Mundo Iberoamericano, liderado pela Prof.a Dra. Maria Emília Prado. 1 Rio de Janeiro e Goiânia. 2 Responsável pelas intervenções ocorridas na área central da cidade do Rio de Janeiro.

2 pertencente de uma tradicional família. Com isso Juscelino Kubitscheck constituiu relações com lideres da política mineira, inclusive o interventor de Minas Gerais, Benedito Valadares. Até então Kubitscheck era um médico que lutou com o Estado de Minas Gerais na Revolução Constitucionalista de 19323, contra o Estado de São Paulo. Sua atuação na área médica foi considerada determinante para a vitória de Minas. A partir disto estreitou sua relação com Valadares. Antes da nomeação para prefeito havia feito uma incursão na política, sendo eleito como Deputado Federal em 1934, sendo cassado pelo Estado Novo de Vargas, em 1937. Desta data até 1940, prosseguia exercendo a sua formação em urologia, atendendo em seu consultório. Em um primeiro momento, recusa a nomeação, pois havia declarado em não seguir a carreira política novamente pós cassação de seu mandato como deputado. Argumento este que foi utilizado na negativa à Valadares. Após dois meses, Juscelino recebeu um telefonema, onde solicitava um encontro com urgência. Na linha telefônica estava Olinto Fonseca, diretor da Imprensa Oficial do Estado. Fonseca mostra uma mensagem de Benedito Valadares ordenando a publicação do nome de Juscelino Kubitscheck de Oliveira para o cargo de prefeito de Belo Horizonte. Desta vez, JK aceita o cargo e declara: Na noite de 18 de abril de 1940, após longa vigília no escritório, decidi sobre o caminho que devia seguir. Sendo prefeito, iria agir outra vez como médico. O doente ali estava. Era Belo Horizonte, um doente que repousava num leito de fícus e de rosas. A política havia me envolvido de novo. E dessa vez definitivamente. (COUTO, 2013, p. 45).

Belo Horizonte possuía uma população estimada em 200 mil habitantes. O historiador Ronaldo Costa Couto, relata que os habitantes presenciaram um governo liderado por um homem que: “moderniza, participa, dinamiza, democratiza. Projeta, executa, fiscaliza, avalia, inaugura, divulga” (COUTO, 2013: p. ). O prefeito tinha uma grande tarefa a ser realizada: a entrega da Avenida do Contorno. Até então a principal obra em execução na capital era complexa, pois ligaria a área central ao

3 A revolução constitucionalista de 1932 foi um levante de tropas paulistas contra o Presidente Getúlio Vargas, que ao assumir em 1930. Cabe ressaltar que São Paulo juntamente com Minas Gerais se revezavam na Presidência da República. Vargas assumiu após uma revolução, em que o candidato paulista Júlio Prestes havia vencido o pleito, mas foi impedido de assumir por tropas militares advindas de várias partes do país. Com isso Vargas tornou- se presidente.

3 subúrbio. A pressão pelo término da obra era enorme, pois o calçamento desta, vinha desde o governo Octacílio Negrão de Lima, em 1935. A importância desta intervenção era tamanha que Benedito Valadares aproveitando a presença do Presidente Getúlio Vargas em Minas, o convidou para estar presente na inauguração. Juscelino fiscalizava constantemente o andamento dos trabalhos. Em 12 de maio de 1940, sob os olhares de Vargas, foi inaugurada, e o primeiro teste de Kubitscheck foi cumprido. (BOJUNGA, 2001). JK fez o seu raio-x da cidade, logo ao iniciar seu governo. A impressão do prefeito era: Belo Horizonte era uma cidade nova e como tal carente de muitas coisas. Parecia mais um jardim do que um centro urbano. (...) Aarão Reis havia idealizado uma cidade de cerca de 25 mil habitantes, o que já seria uma metrópole nos primeiros anos após a queda do Império. Nesse sentido estabelecera proporções dos logradouros públicos: ruas de 20 metros de largura e avenidas de 35 metros que se cruzavam em ângulos retos. Existia apenas uma exceção, para confirmar a regra da exiguidade dessas medidas: a avenida , que cortaria a cidade de norte a sul e seria destinada à ligação dos bairros opostos. Sua largura era de 50 metros. E, por fim, como uma espécie de cinta, estendia-se a avenida Contorno. Fora desta avenida, as ruas se reduziam a 12 metros, pois os planejamentos não sonhavam com a era do automóvel. (BOJUNGA, 2001, p.176).

Andando pela cidade novos “diagnósticos” : a constatação de falta de calçamento e saneamento por grande área da cidade. O pavimento existente foi considerado obsoleto pelo prefeito: eram de paralelepípedo. O novo chefe do executivo municipal desejava o novo, então este tipo de situação não era pertinente à BH que desejava renovar. Neste momento o urbanista francês Alfred Agache convidado por Kubitscheck, visita Belo Horizonte. Em sua avaliação a área central estava correta, mas o subúrbio da capital era completamente desordenado, com falta de saneamento e calçamento que impediam a circulação dos bondes. A visão de Agache, desperta na prefeitura a vontade para solucionar essa questão, mas existe um grave problema: falta de dinheiro em caixa. JK, já havia sido alertado por seu antecessor José Osvaldo de Araújo, que existiam muitas contas a serem pagas. Em um primeiro momento, Juscelino não considerou muito a fala de Araújo, entretanto ao querer realizar suas intervenções, fica claro os cofres vazios da cidade.

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O prefeito toma a decisão de buscar financiamento. Conseguiu através do Banco Comércio e Indústria de Minas Gerais. Com isso promoveu o asfaltamento da Avenida Afonso Pena, ampliou para outros bairros as obras, como por exemplo: Carlos Prates e Lagoinha. Novos contratos são assinados e a população belo-horizontina fica impressionada com a velocidade das obras. A alcunha de “prefeito furacão”, surge neste momento para Juscelino (BOJUNGA, 2010). Com o asfalto a circulação de automóveis torna-se mais comum na capital mineira. Desapropriações acontecem para a implementação de saneamento e a abertura de novas vias. Algumas destas foram para ligarem o centro ao novo parque industrial que foi inaugurado em 1941, através de investimento estatal e estrangeiro. Os investimentos promovidos pelo Estado Novo à Belo Horizonte, eram um ponto da administração de Getúlio Vargas:

Como ocorrido em outros centros urbanos brasileiros, os investimentos por parte do poder público e do capital privado em Belo Horizonte, influenciados e financiados pelo novo governo, viriam a trazer mudanças significativas nos planos urbanístico, social e econômico, que refletiram no crescimento físico-espacial da capital entre o período abordado, de 1930 a 1945 (BORZAGLI, 2015, p. 26).

Novo financiamento é conseguido, desta vez com o Instituto dos Industriários (IAPI), onde se construiu um bairro industrial. Após sua ascensão ao poder em 1930, Vargas procurou industrializar o Brasil e se relacionar com intelectuais, que com o apoio estatal, buscaram em produzir um “sentimento de nação” ao “povo” brasileiro. Neste contexto de modernização, JK que compartilhava das idéias modernistas, e as empreendeu com grande engajamento, pois “a modernidade era uma forma de tomar consciência para o próprio destino” (BAHIA, 2004: p.19). Na obsessão por modernizar Belo Horizonte, JK volta seus olhares para Pampulha. Esta que havia sido criada por Octacílio Negrão como uma represa para abastecer a cidade, torna-se um grande complexo arquitetônico. Ele imaginava construir ali um centro de diversões. Ao descrever a sua primeira impressão sobre a área, declarou:

A Pampulha estava lá, desafiando minhas reservas de imaginação. Um prefeito não deve pensar tão somente em coisas práticas. A beleza, sob todas as formas, precisa fazer parte de suas cogitações. Numa cidade, vivem massas humanas que sentem que

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são capazes de emoções e que, portanto, não prescindem de estimulantes espirituais. Em face daquele desafio, o que pretendia era aliar o útil ao agradável: criar um centro de turismo e fazê-lo, emprestar uma ressonância de poesia à iniciativa municipal. (KUBITSCHEK, 1976: pág.19)

Para colocar o projeto em prática fez um concurso para apresentação de projetos para a Pampulha. Muitos foram rejeitados por serem considerados réplicas de construções já existentes em âmbito nacional e internacional. Indicado pelo diretor do IPHAN, Rodrigo de Melo Franco de Andrade, o arquiteto Oscar Niemayer conversou com o prefeito e juntos foram a barragem: Assim foi o primeiro encontro: Estacionei o carro ali, e saímos a pé, percorrendo a bacia. Mostrei-lhe os alicerces da barragem, dizendo que iria reforça-los de forma a que pudessem suportar o volume de água que pensava em represar. Expus em seguida, a ideia que tinha em mente. No fundo do vale, o terreno avançava numa saliência, que seria construída uma espécie de promontório quando o lago estivesse construído. Pensava construir ali um restaurante, debruçado sobre a água. Na curva, formada pelo morro vizinho, talvez pudessem construir uma igreja, sob a invocação de São Francisco- o mesmo patrono do velho templo de Diamantina, no interior do qual estava sepultado meu pai. Ao longo das margens do futuro lago, outros edifícios poderiam ser construídos, arrematando o conjunto arquitetônico e imprimindo-lhe a indispensável unidade. (BOJUNGA, 2001, p.182)

No dia seguinte ao encontro, Oscar Niemayer apresentou seus croquis ao prefeito que ficou fascinado com o seu arrojo. Em 1943, foi inaugurada como grande área de lazer e divertimento para a classe média belo-horizontina, o Complexo Arquitetônico da Pampulha. Local projetado com a arquitetura moderna de Oscar Niemayer, em que cada espaço são delineados com seus traços. O complexo para Belo Horizonte simbolizava a modernidade presente na capital mineira. A historiadora Denise Bahia, ao descrever sobre a construção da Pampulha, faz a seguinte observação: O Conjunto Arquitetônico da Pampulha pode ser percebido como signo da modernidade, expressão da nação moderna imaginada, como materialização de um 128 tempo histórico que articula, no tempo presente, o passado – ainda que somente pelas referências à arquitetura colonial barroca reinterpretada na linguagem

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moderna, visto que não dialoga com a cultura urbana existente da “Pampulha Velha” e da cidade, de um modo geral – e uma expectativa de futuro. Forma livre, virtuosismo estrutural, espacialização cenográfica conferida aos espaços coletivos, de uso público, são aspectos do Conjunto e do processo de modernização que ganhou concretude e significado a partir da arquitetura política e cultural do tempo que a produziu e que a constitui. Na modernização de Belo Horizonte empreendida politicamente na década de 1940, a Pampulha simbolizou a tarefa de simbolizar um tempo presente diverso e, notadamente, o futuro. (BAHIA, 2011, p:128).

A cultura foi amplamente promovida nos anos de 1940, em BH. Com a criação do Complexo Arquitetônico, uma nova área para o debate das artes é construída: o Instituto de Belas Artes. Sob o comando de mestre Guingard, cursos criaram um novo ambiente no município. O ambiente congregava várias camadas da sociedade mineira, desde artistas, intelectuais, pintores, jornalistas e pessoas interessadas em discutir sobre questões presentes que se apresentavam no contexto modernista vigente em “Belô”. Resumindo era um espaço onde “conservadores” e “modernistas” debatiam sobre a cidade. (BAHIA, 2011). 2.1) – A Modernização e a Exposição de Arte Moderna em Belo Horizonte Com atmosfera cultural pulsando, a prefeitura de Belo Horizonte, promoveu no ano de 1944, a Exposição de Arte Moderna de Belo Horizonte. Esta era um desejo pessoal de JK, que desejava reproduzir em Minas, a Semana de Arte Moderna de São Paulo, realizada em 1922. A semana mineira ocorreu logo após a inauguração do Instituto de Belas Artes, e contou com a presença de vários artistas como: Tarsila do Amaral, Lasar Segall, Di Cavalcanti, e outros. Foi organizada por José Guimarães Menegale4 e intelectuais do Rio e São Paulo: (Jorge Amado, José Lins do Rego, Samuel Weiner , Millôr Fernandes, Sérgio Milliet, Paulo Emílio Salles Gomes, Caio Prado Júnior e Oswald de Andrade. Ao abrir a exposição o prefeito discursa sobre a sua visão sobre o artista e a sua função social: “o artista de hoje não pode se confinar à atmosfera de seu “atelier”. Precisa sentir a vida e através da emoção que sua arte desperta abrir à humanidade nova e surpreendentes perspectivas” (A CIDADE...,1944, s.p).

4 Assessor cultural de JK.

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A exposição de 1944 desejava ser uma continuidade da semana de 1922, na visão de Oswald de Andrade. A convite de Kubitscheck, expressou a seguinte opinião: Perguntou-me alguém se o título que dei a esta palestra “O caminho percorrido” indicava o trajeto ferroviário de São Paulo a Belo Horizonte. Não disse que não. E fiquei pensando nessa curiosa analogia em que a distância entre as duas capitais pode ilustrar uma etapa superada no tempo. O caminho percorrido de 22 a 44. São Paulo do Centenário, Belo Horizonte de Juscelino Kubitschek. Em 22, São Paulo começava. Hoje, Belo Horizonte conclui... Porque enquanto Minas procura unificar o Brasil, São Paulo se dispersou em setenta panelas e foi preciso virmos a Belo Horizonte para darmos o espetáculo duma família solidária e respeitável. Indagar por que se processou na nossa capital a renovação literária é o mesmo que indagar por que se produziu em Minas Gerais a Inconfidência. (MATTAR, 2008, p.103).

A Exposição obteve uma grande repercussão entre a população, debates e reações entre a intelectualidade. A mesma chegou a sofrer retaliações de grupos conservadores, utilizando gilete para destruírem as telas. A imprensa assim abordou: Ninguém é obrigado a aceitar as correntes artísticas. Essas nunca nasceram para ser impostas ao gosto popular. Pois é na diversidade de gostos e de opiniões que reside a fonte permanente da renovação estética. Por isso mesmo só pode ser levado à conta de demonstrações selvagens o que acaba de se verificar no recinto da Exposição de Arte Moderna, instalada no Edifício Mariana. Oito dos quadros expostos foram retalhados à gilete. A atitude do responsável por esse crime veio empanar o brilho das discussões que, em torno da arte moderna, estavam se desenrolando no cenário cultural da cidade. Se pretendia com sua atitude lavrar um protesto contra a pintura moderna tal cavalheiro (aliás, muito sem cavalheirismo), apenas demonstrou ser ainda muito mais radical que os modernos, recuando até os tempos agitados do dadaísmo.” (A CIDADE...,1944, s.p.)

Este evento foi o último grande ato da administração Kubitscheck na Prefeitura de BH. No ano seguinte, foi destituído do cargo por causa do fim do regime do Estado Novo, onde o Presidente Getúlio Vargas foi deposto e todos os interventores regionais nomeados por Vargas tiveram mesmo caminho.

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Inegável que durante cinco anos, a cidade de Belo Horizonte presenciou um governo privilegiando obras de infraestrutura e modernização: Dentre as realizações constantes dos relatórios do prefeito, destacam-se: remodelação da área central da cidade, modernizando estruturas de água, luz, esgoto e telefonia; abertura de vias, saídas, „bocas‟, com a função de articular o polo industrial criado na capital com o restante do estado; término da urbanização da Avenida do Contorno; calçamento da Avenida Afonso Pena; prolongamento da Avenida Amazonas; abertura da Avenida Presidente Antônio Carlos; criação da cidade universitária; construção do Conjunto Habitacional IAPI; criação do bairro Cidade Jardim – cujo modelo urbanístico será analisado adiante; urbanização das áreas adjacentes à orla da lagoa da Pampulha. (BAHIA, 2011, p. 96).

No discurso e em suas ações tinha uma ação determinantemente modernizadora: Centro geográfico de Minas, Belo Horizonte condensa a vida econômica, política e social do Estado. Entre menina e moça, caracteriza-se pela modernidade de suas linhas e relevos. Com efeito, delineada há quarenta e cinco anos, à beira do sertão virgem, é tão nova que ainda se lhe percebe o cheiro da terra lavrada de pouco. Mas já exubera em realizações: grande cidade, povoada de cerca de duzentos e cinquenta mil habitantes, agita-se, produz, estuda, diverte-se, amplia-se e prospera. 95 Obra de audácia e tenacidade, Belo Horizonte assenta-se no domínio do homem sobre a natureza, que a emoldura de híspidas montanhas de ferro. Os elementos essenciais, de que já dispõe a fartar a cidade azul e verde, foram acumulados e disciplinados pela energia de suas administrações, e não representam uma dádiva fácil das circunstâncias naturais. A dez quilômetros do centro da cidade, a Pampulha corresponde a uma dessas concepções do gênio e do esforço dos homens que a edificaram: um lago artificial, circundado por uma avenida de quase vinte quilômetros de extensão, ali rebrilha, como uma placa de cristal, à luz do céu – espelho do mar longínquo – com uma dupla função utilitária e decorativa. Reserva de milhões de litros d‟água para a cidade que se agiganta, a Pampulha realiza, ali, um sonho do Atlântico entre as montanhas. O Casino, o Baile, o Iate Golfe Clube e o Parque em construção, em meio das vivendas que se vão debruçando sôbre o lago. Completa, no soberbo conjunto, o núcleo turístico, em função do qual os homens submetem, por fim, Belo Horizonte, integralmente, ao seu signo de modernidade”. (REVISTA..., 1944, p:3).

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Ao nos debruçarmos sobre a administração de Juscelino Kubitscheck em Belo Horizonte, entre o período de 1940 a 1945, constata-se que esse discurso modernista foi aplicado à capital. Desde as suas intervenções urbanísticas, com a abertura de vias e calçamento e saneamento das já existentes, até o símbolo de seu governo, persistindo até os tempos presentes como legado à cidade: O Complexo Arquitetônico da Pampulha. Tornou-se o local em que a classe média belo-horizontina dispunha de restaurante até cassino, passando por iate clube e igreja. Para complementar esta observação apresento neste texto, à visão de Denise Bahia sobre o projeto modernista de JK: A modernização pretendida e levada a cabo pelo jovem prefeito envolvia, portanto, a vida econômica, política e social. A cultura não era entendida, na sua visão desenvolvimentista, como uma dimensão dissociada da vida, das demais esferas do mundo social; e sua promoção tornou-se condição seminal para qualquer cidade ou Estado que se pretendesse moderno, sendo que a política da cultura constitui parte integrante do projeto desenvolvimentista. No discurso de Kubitschek, percebe-se o objetivo funcional que justifica a criação da Pampulha para fins de abastecimento, lazer e turismo, e o entendimento de que a beleza deve ser considerada e relevante. A região reluz no discurso e na política urbana de Kubitschek com uma „dupla função utilitária e “decorativa‟, evidenciando a importância dada à arquitetura e à estética do empreendimento. (BAHIA, 2011, p:95).

A capital do Estado das Minas Gerais, através do “Prefeito Furacão”, presenciou uma grande quantidade de obras públicas entre 1940 a 1945. Intervenções estas que marcam a cidade até a atualidade. Juscelino Kubitscheck, ao deixar a prefeitura, confirmou o seu nome entre os belo-horizontinos, como o político com alta capacidade e determinação de construir e “modernizar” o já existente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS A CIDADE. Folha de Minas. Belo Horizonte, 13 jun. 1944. BAHIA, Denise Marques. A arquitetura política e cultural do tempo histórico na modernização de Belo Horizonte (1940-1945). 2011. BOJUNGA, Cláudio. JK: o artista do impossível. Editora Objetiva, 2001.

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COUTO, Ronaldo Costa. O essencial de JK: visão e grandeza, paixão e tristeza. Planeta do Brasil, 2013. KUBITSCHEK, Juscelino. Meu caminho para Brasília: a escalada política. Rio de Janeiro: Bloch, 1976. v 2. MATTAR, Denise (Org.). O olhar modernista de JK. Belo Horizonte: Instituto dos Arquitetos do Brasil MG, 2008. Catálogo de exposição, 10 dez./1º mar. 2009, Palácio das Artes. Revista Pampulha. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, s.n., 1944