INSTITUTO EVANDRO CHAGAS NÚCLEO DE ENSINO E PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM VIROLOGIA

TAIANA ANDRADE FREITAS

CARACTERIZAÇÃO ANTIGÊNICA E GENÉTICA DE CEPAS DO VÍRUS DA RAIVA, CIRCULANTES NO ESTADO DO PARÁ, NO PERÍODO DE 2010 A 2017

ANANINDEUA 2018

TAIANA ANDRADE FREITAS

CARACTERIZAÇÃO ANTIGÊNICA E GENÉTICA DE CEPAS DO VÍRUS DA RAIVA, CIRCULANTES NO ESTADO DO PARÁ, NO PERÍODO DE 2010 A 2017

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Virologia do Instituto Evandro Chagas, para obtenção do título de Mestre em Virologia.

Orientadora: Profª. Drª. Elizabeth Salbé Travassos da Rosa Coorientadora: Drª. Livia Medeiros Neves Casseb

ANANINDEUA 2018

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Biblioteca do Instituto Evandro Chagas

Freitas, Taiana Andrade. Caracterização antigênica e genética de cepas do vírus da raiva, circulantes no estado do Pará, no período de 2010 a 2017. / Taiana Andrade Freitas. –

Ananindeua, 2018. 73 f.: il.; 30 cm

Orientadora: Dra. Elizabeth Salbé Travassos da Rosa Coorientadora: Dra. Lívia Medeiros Neves Casseb Dissertação (Mestrado em Virologia) – Instituto Evandro Chagas, Programa de Pós-Graduação em Virologia, 2018.

1. Vírus da raiva. 2. Vigilância epidemiológica. 3. Epidemiologia molecular. I. Travassos da Rosa, Elizabeth Salbé, orient. II. Casseb, Lívia Medeiros Neves. III. Instituto Evandro Chagas. IV. Título.

CDD: 579.2566

TAIANA ANDRADE FREITAS

CARACTERIZAÇÃO ANTIGÊNICA E GENÉTICA DE CEPAS DO VÍRUS DA RAIVA, CIRCULANTES NO ESTADO DO PARÁ, NO PERÍODO DE 2010 A 2017

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Virologia do Instituto Evandro Chagas, para obtenção do título de Mestre em Virologia.

Aprovado em: ____/____/______

BANCA EXAMINADORA

Dra. Valéria Lima Carvalho Instituto Evandro Chagas

Dr. Sandro Patroca da Silva Instituto Evandro Chagas

Dra. Rita Catarina Medeiros Sousa Instituto Evandro Chagas

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Dra. Elizabeth Salbé, por toda a paciência e dedicação empregadas na minha orientação e por me auxiliar em tudo que precisei durante o mestrado. Muito obrigada!

À Livia Casseb, que me ensinou e reensinou tantas lições, que me fez muitas cobranças e que me fez entender responsabilidade. Agradeço não somente pela orientação acadêmica, mas pelos conselhos, conversas, por entender as dificuldades, por se preocupar com meus problemas pessoais, e por me prestar ajuda sempre que precisei. Sou e serei sempre muito grata.

À Armando Pereira, que foi quem me acompanhou desde o início das minhas atividades no laboratório, enquanto ainda era estagiária e me transmitiu muitos ensinamentos, não só no que diz respeito a estudo, mas sobre a vida.

À Érika Dayane, uma amiga com quem compartilhei muitas manhãs, risadas e aflições.

Aos colegas do Laboratório de Raiva, Francisco Amilton e Taciana Fernandes e Fernanda Monik por todo auxílio prestado.

Aos amigos do laboratório de Sequenciamento: Samir Casseb, Karla de Melo, Sandro Patroca, Jardel Ferreira, Walter Félix e Francisco Luna, muito obrigada por terem sido tão solícitos e pela grande ajuda prestada durante o desenvolvimento desse trabalho.

Ao Instituto Evandro Chagas pela oportunidade de estudar nessa grande instituição.

Às agências de fomento: CNPq e Fapespa, pelo incentivo financeiro estudantil.

Ao meu namorado Victor Leal, que dentro do limite de suas possibilidades me ajudou no desenvolvimento deste trabalho. Também agradeço por toda a paciência nos momentos turbulentos, por me incentivar incansavelmente aos estudos e, pelo companheirismo e amor.

Por fim e não menos importante, agradeço a minha família, por apoiarem as decisões que tomei em minha vida, por incentivarem e possibilitarem meus estudos, e especialmente, agradeço por todo amor dedicado.

''Se você quer saber como um homem é, preste atenção em como ele trata quem é inferior a ele, não seus iguais.'' Sirius Black 12

RESUMO

A raiva é uma doença de caráter antropozoonótico, de distribuição cosmopolita, causada pelo . A identificação das variantes virais possibilita associar variante viral e hospedeiro auxiliando na compreensão do ciclo de manutenção do vírus da raiva em determinadas áreas geográficas. A caracterização antigênica e genética possibilita o entendimento dos múltiplos ciclos epidemiológicos e o potencial de transmissão interespécies, ou seja, identificar e conhecer as variantes antigênicas do RABV possibilitam o reconhecimento de questões associadas a transmissão, estratégias e elaboração de medidas de controle e prevenção do RABV. O objetivo do trabalho foi caracterizar antigênica e geneticamente cepas do vírus da raiva isoladas no Laboratório de Diagnóstico de raiva do Instituto Evandro Chagas (IEC), de amostras procedentes do Estado do Pará, no período de 2010 a 2017. De acordo com o banco de dados do laboratório, entre os anos de 2010 e 2017 foram diagnosticadas como positivas pelas provas de IFD e PB, 73 amostras provenientes do Estado do Pará. Estes isolados foram caracterizados antigenicamente pelo painel de anticorpos monoclonais cedido pelo CDC/OPAS, e caracterizados geneticamente segundo a metodologia adaptada de Barbosa (2007). Das 73 amostras positivas no período, 65,75% eram bovinos, 17,81% equinos, 8,22% caninos, 6,85% quirópteros e 1,37% felino. Das amostras positivas no período, 58 de 73 foram submetidas à caracterização antigênica, das quais 91,38% (53/58) foram compatíveis com algum padrão de leitura do painel de AcM. Das cepas virais isoladas de encéfalos de bovinos, 93,94% (31/33) mostraram-se compatíveis com o padrão de leitura da VAg3 e 6,06% (2/33) não corresponderam a nenhum padrão de leitura. Para as amostras de equinos, 84,62% (11/13) foram compatíveis com a VAg3 e 15,38% (2/13) não corresponderam a nenhum padrão de leitura. Das amostras de encéfalos caninos, 100% (6/6) foram compatíveis com VAg2 e, a única amostra positiva de felino correspondeu a VAg2. Das cepas virais isoladas de encéfalos de quirópteros, 80% (4/5) corresponderam a VAg3. Das 58 amostras que foram submetidas a caracterização antigênica, cinco apresentaram perfil de leitura não compatível com o painel de anticorpos monoclonais e outras 15, do ano de 2017, não foram submetidas à IFI, sendo submetidas somente ao sequenciamento parcial do gene N. De acordo com a análise filogenética, todas as amostras sequenciadas foram agrupadas no grupo da VAg3, relacionada ao morcego hematófago Desmodus rotundus, onde, a maioria das amostras se relaciona com amostras caracterizadas em estudos anteriores realizados no Estado Pará. A caracterização antigênica e genética do RABV de amostras do Estado do Pará, entre os anos de 2010 e 2017, permitiu concluir que a distribuição temporal demonstra que houve um aumento do número de casos no ano de 2015, decaindo no ano de 2016, para então aumentar novamente em 2017, sugerindo possíveis falhas nas ações de controle e prevenção. A associação das técnicas de caracterização antigênica e genética possibilitou uma melhor compreensão da epidemiologia molecular do vírus da raiva no Estado do Pará.

Palavras-chave: Vírus da raiva; Vigilância epidemiológica; Epidemiologia Molecular.

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ABSTRACT

Rabies is a anger is an anthropozoonotic disease, of cosmopolitan distribution, caused by Rabies lyssavirus, which is kept and perpetuated in nature by mammals, which serve as reservoirs. The identification of viral variants makes it possible to associate viral and host variants, helping to understand the maintenance cycle of rabies in certain geographic areas. The antigenic and genetic characterization makes possible the understanding of the multiple epidemiological cycles and the potential of interspecies transmission, that is, to identify and to know the antigenic variants of the RABV allow the recognition of issues associated with transmission, strategies and elaboration of measures of control and prevention of RABV. The objective of this work was to characterize antigenic and genetically isolated strains from the Evandro Chagas Institute (IEC) rabies laboratory, from samples from the State of Pará, from 2010 to 2017. Between 2010 and 2017, 73 samples from the State of Pará were diagnosed as positive by the IFD and PB tests. These isolates were characterized antigenically by the panel of monoclonal ceded by CDC/PAHO and genetically characterized according to the methodology adapted from Barbosa (2007). Of the 73 positive samples in the period, 65.75% were bovine, 17.81% equine, 8.22% canine, 6.85% chiroptera and 1.37% feline. Of the positive samples in the period, 58 of 73 were submitted to antigenic characterization, of which 91.38% (53/58) were compatible with some reading pattern of the AcM panel. Of the viral strains isolated from bovine brain, 93.94% (31/33) were compatible with the reading standard of VAg3 and 6.06% (2/33) did not correspond to any reading pattern. For the equine samples, 84.62% (11/13) were compatible with VAg3 and 15.38% (2/13) did not correspond to any reading standard. From the canine brain samples, 100% (6/6) were compatible with VAg2, and the only feline positive sample corresponded to VAg2. Of the viral strains isolated from bats brains, 80% (4/5) corresponded to VAg3. Of the 58 samples that underwent antigenic characterization, five presented a reading profile that was not compatible with the panel of monoclonal antibodies and another 15, of year 2017, were not submitted to IFI because they originated from cattle and were only submitted to partial sequencing of the N gene. According to the phylogenetic analysis, all the sequenced samples were grouped in the VAg3 group, related to the hematophagous bat Desmodus rotundus, where most of the samples are related to samples characterized in previous studies carried out in the State of Pará. The antigenic and genetic characterization of RABV in samples from the State of Pará, between 2010 and 2017, allowed to conclude that the temporal distribution demonstrates that there was an increase in the number of cases in the year 2015, decreasing in the year 2016, for then increase in 2017, suggesting possible failures in control and prevention actions. The association of antigenic and genetic characterization techniques allowed a better understanding of the molecular epidemiology of rabies virus in the state of Pará.

Key-words: Rabies virus; Epidemiological Monitoring; Molecular Epidemiology.

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 Ilustração esquemática da partícula do vírus da raiva 17

Figura 2 Interação do vírus da raiva com a célula hospedeira 18

Figura 3 Demonstração esquemática da patogênese da infecção pelo vírus da raiva 20

Figura 4 Países ou áreas de risco para infecção pelo vírus da raiva 24

Figura 5 Ilustração esquemática do ciclo de transmissão da raiva 25

Figura 6 Morcegos hematófagos Desmodus rotundus. 26

Quadro 1 Casos de raiva Humana, Grandes Regiões e Unidades Federadas 2000 a 28 2016

Quadro 2 Número de casos de raiva animal por espécie segundo Região e UF no 30 período de 2011 a 2016.

Figura 7 Distribuição espacial das mesorregiões do Estado do Pará, Brasil 36

Quadro 3 Padrões de reação para as diferentes variantes antigênicas com os 38 anticorpos monoclonais.

Quadro 4 Iniciadores utilizados no protocolo de RT-PCR para amplificação do 39 RABV

Quadro 5 Variantes do vírus da raiva utilizadas nas análises filogenéticas, de acordo 42 com hospedeiro, origem geográfica, anos de isolamento e variantes antigênicas

Figura 8 Mapa do Estado do Pará, mostrando os municípios de procedência das 46 amostras positivas para raiva.

Quadro 6 Morcegos examinados e identificados no Laboratório de raiva/IEC 48

Quadro 7 Amostras submetidas ao sequenciamento parcial do gene N 49

Figura 9 Análise filogenética das sequências nucleotídicas parciais do gene N do 51 RABV pelo método NJ com cálculo de bootstrap baseado em 1000 pseudoréplicas.

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Total de amostras positivas, examinadas e percentual de positividade de 45 raiva animal, de acordo com o ano, analisadas entre janeiro de 2010 e dezembro de 2017

Tabela 2 Total de amostras positivas, examinadas e percentual de positividade de 47 raiva animal, de acordo com as mesorregiões do Estado do Pará, analisadas entre janeiro de 2010 e dezembro de 2017

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...... 12 2 OBJETIVOS ...... 15 2.1 OBJETIVO GERAL ...... 15 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ...... 15 3 REVISÃO DA LITERATURA ...... 16 3.1 VÍRUS DA RAIVA ...... 16 3.2 PATOGÊNESE ...... 19 3.3 SINTOMATOLOGIA ...... 22 3.4 EPIDEMIOLOGIA ...... 23 3.5 TRATAMENTO E PROFILAXIA ...... 31 3.6 DIAGNÓSTICO LABORATORIAL ...... 31 3.7 CARACTERIZAÇÃO ANTIGÊNICA E GENÉTICA ...... 33 4 MATERIAL E MÉTODOS ...... 35 4.1 CRITÉRIOS ÉTICOS ...... 35 4.2 ÁREA DE ESTUDO ...... 35 4.3 AMOSTRAS ...... 36 4.4 CARACTERIZAÇÃO OU TIPIFICAÇÃO ANTIGÊNICA ...... 37 4.5 CARACTERIZAÇÃO GENÉTICA PELO SEQUENCIAMENTO PARCIAL DO GENE N ...... 39 4.5.1 Extração do RNA viral ...... 39 4.4.2 Reação em Cadeia Mediada pela Polimerase precedida de Transcrição Reversa (RT-PCR) ...... 39 4.5.2.1 Iniciadores específicos ...... 39 4.5.2.2 RT-PCR ...... 40 4.5.2.3 Visualização do produto da RT-PCR ...... 40 4.5.3 Purificação ...... 41 5.5.4 Sequenciamento nucleotídico ...... 41 4.5.5 Análise Filogenética ...... 41

5 RESULTADOS ...... 44 5.1 CARACTERIZAÇÃO ANTIGÊNICA ...... 48 5.2 CARACTERIZAÇÃO GENÉTICA ...... 49 6 DISCUSSÃO ...... 52 7 CONCLUSÕES ...... 60 APÊNDICE A ...... 69 APÊNDICE B ...... 70 APÊNDICE C ...... 73

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1 INTRODUÇÃO

A raiva é uma doença de caráter antropozoonótico, de distribuição cosmopolita, com altos índices de letalidade, possui grande relevância, não somente pela severidade com que a doença se apresenta clinicamente, tornando-se um problema de saúde pública, mas também para a economia, pois, a raiva em herbívoros é responsável por causar grandes prejuízos à pecuária (MATTOS et al., 1998; ALBAS et al., 2005; APPOLINÁRIO et al., 2015a; TEIXEIRA et al., 2015). A doença é causada pelo, Rabies lyssavirus (RABV), um vírus que se replica nos neurônios, sendo esta infecção responsável por gerar quadros de encefalite aguda. Esse vírus é mantido e perpetuado na natureza através de mamíferos, que servem de reservatórios (ACHKAR et al., 2010; BRASIL, 2011; APPOLINÁRIO et al., 2015b; BÁRCENAS- REYES et al., 2015; TEIXEIRA et al., 2015; ICTV, 2017). No Brasil, entre os anos de 1990 a 2009 foram notificados 572 casos de raiva em humanos, de 2010 até 2016, foram notificados 19 casos de raiva em humanos. Até 2003, tinha-se a variante viral comumente encontrada em caninos (variante antigênica 2 - VAg2) como a principal causadora da enfermidade, em 2004, a variante comumente encontrada no morcego Desmodus rotundus (VAg3) passou a ser a mais identificada nos casos de raiva humana, onde, entre 2015 e 2017, foi identificada em seis dos sete casos positivos de raiva humana (BRASIL, 2008; 2017a). O Desmodus rotundus é o morcego hematófago mais prevalente nas Américas, e é apontado como o principal responsável da transmissão da raiva a herbívoros. As medidas de controle e prevenção aplicadas no Brasil contribuem para o controle da raiva urbana. Contudo, animais silvestres, sejam eles do ciclo terrestre ou do ciclo aéreo, tem contribuído para a manutenção do ciclo da raiva nos centros urbanos, sendo, a expansão urbana desordenada, apontada como um dos responsáveis para a aproximação de humanos e animais domésticos, com animais silvestres. Especialmente na Amazônia, onde, a maioria das comunidades ribeirinhas está localizada longe dos grandes centros urbanos, e exibem uma grande escassez de infra-estrutura básica, além das características de moradias, que são em 13 sua maioria palafitas, com cobertura de palha, facilitando a entrada de um animal agressor. (BRASIL, 2011; SOUZA; AMARAL; GITTI, 2014; NASCIMENTO et al., 2017.). A identificação das variantes virais possibilita conhecer a origem do vírus da raiva circulante em uma determinada região e em consequência, os ciclos existentes e as espécies envolvidas. Associar variante viral e hospedeiro pode elucidar sobre o ciclo de manutenção do vírus da raiva em determinadas áreas geográficas, pois, características topográficas e hidrográficas possibilitam a formação de barreiras físicas que impossibilitam a movimentação animal, promovendo nesta região a evolução do vírus em um hospedeiro específico. Todavia, o deslocamento desses animais para áreas onde não existe circulação de determinada variante, propicia o inicio de um surto (MENOZZI, 2012). Assim, compreender a evolução do RABV é de grande importância para estabelecer bases de variabilidade fenotípica e genotípica das populações virais, bem como, o surgimento de novas variantes do vírus, podendo as mutações alterar a patogenicidade e virulência do vírus (ITO et al., 2001; MENOZZI, 2012). O desenvolvimento da técnica de anticorpos monoclonais (AcM) para nucleoproteínas do RABV, possibilitou a identificação e classificação deste vírus, assim como, a obtenção de avanços na epidemiologia da raiva, permitindo estabelecer a distribuição geográfica e reservatórios específicos das variantes do RABV (MENOZZI, 2012). Estudos no âmbito molecular revelaram, que muito embora, existam diferenças antigênicas nos isolados do RABV das mais variadas espécies, esses isolados têm mantido regiões conservadas no gene, que permitem que sejam usados como marcadores epidemiológicos (CARNIELI et al., 2008; CASSEB, 2009; MENOZZI, 2012). Travassos da Rosa e colaboradores (2006) descreveram dois surtos da doença em humanos no Estado do Pará, que ocorreram nos municípios de Portel, na mesorregião do Marajó e em Viseu, no Nordeste paraense, em 2004, e nesse estudo a tipificação antigênica identificou a VAg3, comumente encontrada no morcego hematófago Desmodus rotundus, sendo confirmada pela caracterização genética. Barbosa e colaboradores (2008) caracterizaram geneticamente o RABV, de estirpes isoladas de amostras de humanos, animais domésticos e selvagens, de um surto de raiva no município Augusto Corrêa, Nordeste paraense, em 2005. E os dados moleculares obtidos no 14 estudo identificaram em casos de humanos e animais domésticos a VAg3, associada ao morcego hematófago Desmodus rotundus. Estudos realizados com morcegos capturados no Nordeste paraense demonstraram alta positividade para RABV, e também mostraram que áreas urbanas e rurais não apresentam uma variação significativa da positividade para RABV em morcegos (OLIVEIRA, 2015). As alterações no perfil epidemiológico da raiva evidenciam que conhecer a distribuição espaço-temporal de casos de raiva no Estado do Pará, é de suma importância. Desta maneira, as caracterizações antigênica e genética, são importantes ferramentas na determinação e entendimento dos múltiplos ciclos epidemiológicos e o potencial de transmissão interespécies. Identificar e conhecer as variantes antigênicas do RABV possibilita o reconhecimento de questões associadas à transmissão, estratégias e elaboração de medidas de controle e prevenção do RABV (BRASIL, 2008; MENOZZI, 2012; COSTA, 2013; OLIVEIRA, 2015).

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2 OBJETIVOS

2.1 OBJETIVO GERAL

Caracterizar antigênica e geneticamente cepas do vírus da raiva isoladas no Laboratório de Diagnóstico de raiva do Instituto Evandro Chagas (IEC), de amostras procedentes do Estado do Pará, no período de 2010 a 2017.

2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

• Realizar análise epidemiológica dos casos de raiva no Estado do Pará, mediante levantamento de dados de amostras positivas diagnosticadas no IEC.

• Caracterizar antigenicamente cepas de RABV isoladas no IEC, de amostras procedentes do Estado do Pará no período do estudo, utilizando o painel de anticorpos monoclonais anti-nucleoproteína viral, produzidos e cedidos pelo CDC/Atlanta.

• Caracterizar geneticamente por detecção e amplificação do genoma viral pela técnica de RT-PCR com posterior sequenciamento nucleotídico parcial do gene N, todas as amostras que não foram compatíveis com o painel de anticorpos monoclonais utilizado.

• Realizar análises filogenéticas a partir das sequencias nucleotídicas obtidas para comparação com as sequencias de outras cepas de RABV já publicadas e disponíveis no GenBank.

• Descrever as variantes antigênicas e genéticas do RABV caracterizadas no estudo.

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3 REVISÃO DA LITERATURA

3.1 VÍRUS DA RAIVA

Segundo o Comitê Internacional de Taxonomia de Vírus (International Committee on Taxonomy of – ICTV), o RABV pertence à Ordem , família e ao gênero Lyssavirus. Este gênero possui dezesseis espécies, sendo elas, o Aravan lyssavirus, Australian bat lyssavirus, Bokeloh bat lyssavirus, , European bat 1 lyssavirus, European bat 2 lyssavirus, Gannoruwa bat lyssavirus, Ikoma lyssavirus, Irkut lyssavirus, Khujand lyssavirus, Lagos bat lyssavirus, Lleida bat lyssavirus, , Rabies lyssavirus, Shimoni bat lyssavirus e West Caucasian bat lyssavirus. Estes possuem a forma de projétil, e são constituídos de ácido ribonucleico, polaridade negativa, linear, não segmentado (CHAVES, 2010; BRASIL, 2016a).

A partícula viral é composta por duas porções: o ribonucleocapsídeo (RNP) e um envelope lipoproteíco, onde, o ribonucleocapsídeo, além de ser constituído pelo RNA, possui três proteínas: (i) a nucleoproteína (N) que está associada ao RNA viral e atua na resposta imune celular; (ii) a proteína L, uma RNA polimerase dependente de RNA, responsável pela transcrição e replicação do RNA viral, e (iii) a proteína P, uma fosfoproteína que interage com a nucleoproteína no processo de encapsidação. Já o envelope viral é constituído pela proteína matriz (M), que é muito importante na fase de maturação viral, e a glicoproteína (G), considerada a mais importante, pois, é a principal indutora da produção de anticorpos neutralizantes, através de estímulos a células T, e atua também no processo de adsorção vírus/célula (Figura 1) (BRASIL, 2008; 2011).

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Figura 1 – Ilustração esquemática da partícula do vírus da raiva

Fonte: Adaptado de Swiss Institute of Bioinformatics, 2017.

No ciclo de replicação do RABV, após a entrada no organismo, ocorre o desencadeamento de eventos ao nível celular tais como: adsorção, penetração, desnudamento, transcrição, tradução, replicação, montagem e brotamento virais (CASSEB, 2009). Os genes estruturais do vírus possuem diversas funções, que variam de acordo com a fase da infecção. A proteína G vai mediar o primeiro evento da replicação viral, a adsorção do vírus na membrana celular. Posteriormente, o vírus vai penetrar a célula por endocitose e vai ocorrer a liberação de RNP no citoplasma celular por fusão do envelope viral ao vacúolo lisossomal. Seguida a liberação, inicia-se a transcrição do RNA viral nos cinco RNAs mensageiros de sentido positivo, na ordem N, P, M, G e L, sendo a transcrição desses RNAs realizadas pela proteína L, que atua como RNA polimerase-RNA dependente, e somente após a transcrição das cinco proteínas que ocorrerá o inicio da replicação do genoma do vírus. Primeiramente, vai ocorrer a síntese do anti-genoma de sentido positivo, que servirá como molde do genoma de sentido negativo (CASSEB, 2009; CHAVES, 2010). Após a produção de proteínas virais (N, P, M, G e L) e RNA genômico, ocorrerá a morfogênese. A união de N, P e L ao RNA, formará as RNPs, e ocorrerá simultaneamente ao 18 deslocamento das proteínas M e G para membrana celular, para então ocorrer a gemação do virion. A morfogênese viral está associada a formação da matriz intracitoplasmática conhecida como corpúsculos de Negri, que precedem a formação de novos virions. As RNPs vão exercer pressão nos locais onde G e M estão, fazendo com que ocorra o revestimento do virion, pela membrana celular do hospedeiro, formando o envelope do RABV, para então ocorrer a liberação de novas partículas infectantes (Figura 2) (CASSEB, 2009; CHAVES, 2010).

Figura 2 – Interação do vírus da raiva com a célula hospedeira

Fonte: Adaptado de Rupprecht et al., 2002.

A neutralização do vírus se dá pela perda da capacidade da partícula viral de infectar o hospedeiro, por conta de uma reação com anticorpos específicos, obtendo-se um efeito protetor, contra a proteína de superfície que participa da adsorção (BRASIL, 2008). O RABV possui diversas variantes antigênicas (VAg), conforme a espécie animal e a região ou país proveniente. As diferenças antigênicas do RABV são correlacionadas evolutivamente e molecularmente com as espécies animais de origem, a partir daí foram desenvolvidos anticorpos monoclonais para biotipagem de RABV, sendo a tipificação das 19

VAg realizada pela técnica de imunofluorescência indireta usando painel de anticorpos monoclonais (AcM) anti-nucleoproteína produzidos nos Centers for Diseases Control and Prevention (CDC), Atlanta, EUA (WIKTOR; KOPROWSKI, 1978; SWANGO, 1997; KONEMAN; WINN, 2001; TAKAOKA et al., 2003). No serviço de vigilância epidemiológica da raiva no Brasil, está disponível um painel de oito AcM, que são capazes de identificar as 12 VAg que mais comumente circulam na América Latina, onde, VAg1 e VAg2 são comumente detectadas em cães domésticos (Canis familiaris), porém a VAg2 tem sido detectada em canídeo silvestre (Cerdocyon thous) no nordeste brasileiro; VAg3, VAg4 e VAg6 em morcergos Desmodus rotundus, Tadarida brasiliensis e Lasiurus spp, respectivamente, além de uma variante antigênica específica de primata não humano, Callithrix jacchus (BRASIL, 2008; 2016a; CHAVES, 2010).

3.2 PATOGÊNESE

O RABV é excretado na saliva do animal infectado e depositado nos tecidos do local da mordedura, a progressão do RABV até o Sistema Nervoso Central (SNC) pode variar, em decorrência dos fatores que interferem no período de incubação, tais como, local da mordida e carga viral, porém, ao alcançar o SNC a disseminação é rápida, ocorrendo através de sinapses transneurais, e então ocorre a disseminação para os nervos periféricos de forma centrífuga e invade os tecidos, como a glândula salivar, ocorrendo a replicação no epitélio dos ácinos, para então ser excretado na saliva (figura 3) (CASSEB, 2009; JACKSON, 2016).

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Figura 3 – Demonstração esquemática da patogênese da infecção pelo vírus da raiva

Fonte: Adaptado de Murray et al., 1992.

Quando ocorre a infecção dos neurônios na medula espinhal, posteriormente, através do transporte axonal, ocorre a disseminação neurônio a neurônio dentro dos axônios no SNC. Vários tipos celulares neuronais e não-neuronais são infectados, onde, nas células neuronais ocorre uma ampla disseminação no SNC, enquanto que nas células não-neuronais ocorre em menor frequência. A infecção do cérebro acarreta em várias mudanças comportamentais, provavelmente em decorrência da infecção de neurônios de áreas límbicas, facilitando a transmissão do RABV através de mordidas (CASSEB, 2009; JACKSON, 2010; 2016). 21

O cerébro possui imunoprivilégio cerebral, que são características que diferem sua resposta inflamatória da de outros órgãos, onde, a barreira hematoencefálica possui junções estreitas que limitam a penetração de anticorpos, mediadores e células imunes, e junções endoteliais, que controlam a abertura e fechamento das junções célula-célula. Essas junções são compostas por complexos multiproteicos, que são reguladores da permeabilidade celular. Além disso, o cérebro não possui vasos linfáticos no parênquima cerebral para direcionar antígenos e células do sistema imune (FERNANDES, 2015). No SNC, o RABV se depara com a micróglia, que são células fagocitárias. A micróglia apresenta várias funções no SNC, dentre elas, a de células apresentadoras de antígeno (APC), sendo mais eficiente nesse papel do que os astrócitos. Outra função importante da micróglia é a produção de TNF-α e óxido nítrico, que tenta combater a infecção. O ambiente citocínico promove a quebra da barreira hematoencefálica e permite que células imunes da periferia entrem no SNC. Às Células Natural Killer também desempenham função protetora na resposta imune inata contra o vírus da raiva. Às células da glia e neurônios expressam TLR (receptor toll-like), incluindo TLR3. Após a infecção dos neurônios pelo RABV, essas células podem desencadear a resposta imune antiviral clássica, o que inclui IFN-β e citocinas inflamatórias. A resposta imune para o vírus da raiva envolve um infiltrado inflamatório de células mononucleares, composto principalmente por linfócitos, os linfócitos se deslocam da periferia para o SNC, atraídos por estímulos de citocinas pró-inflamatórias, como, IL-1, TNF-α e IL-6, além das quimiocinas CCL-5, CXCL-10. Células T e B podem ser detectadas no SNC logo após o 3º dia de infecção, entretanto, a alta expressão das citocinas pro- inflamatórias pode levar ao dano neuronal, exercendo um papel deletério ao invés de protetor na infecção pelo RABV (HOOPER, 2005; MÉNAGER, 2009; FERNANDES, 2015). A glicoproteína G do RABV é a mais importante proteína indutora de anticorpos neutralizantes específicos, estudos com modelos experimentais, demonstram o papel protetor dos linfócitos B como fonte de anticorpos neutralizantes para o RABV, o que possibilita a sobrevivência do indivíduo. A barreira hematoencefálica íntegra é impermeável para a maioria dos anticorpos, quando ocorre o rompimento dessa barreira, os anticorpos neutralizantes podem exercer seu papel protetor nos locais de proliferação viral, contribuindo para eliminação do vírus da raiva do SNC (FERNANDES, 2015). 22

Os linfócitos TCD4 são as principais células na resposta imune contra o RABV, exercendo um papel protetor mais do que os linfócitos TCD8 citotóxicos, pois, induzem a formação de citocinas fundamentais para o controle da infecção (IFN-, IL-2, IL-14), e interagem com linfócito B através de estímulos de quimiocinas, contribuindo para a produção de anticorpos específicos para o vírus. Os linfócitos TCD8 citotóxicos, sozinhos, não são capazes de proporcionar proteção contra infecção, porém, as proteínas G, N e P do vírus são indutores de linfócitos TCD8 citotóxicos. A proteína P do vírus da raiva afeta diretamente a via JAK-STAT, afetando a produção de interferons, que são as principais citocinas antivirais que caracterizam o padrão de resposta imune do tipo Th1. Em neurônios humanos infectados com RABV (linhagem mais virulenta) há uma expressão aumentada de HLA-G (molécula de MHC-I não clássica) e isso induz à imunotolerância, deste modo, o neurônio infectado não será reconhecido pelo sistema imune (FERNANDES, 2015).

3.3 SINTOMATOLOGIA

O período de incubação, após a exposição, da raiva é variável, geralmente de 20 a 90 dias, mas pode variar de alguns dias a um ano ou mais. De modo geral, inicialmente, há sintomas prodrômicos não específicos que consistem em fadiga, perda de apetite, dor de cabeça, insônia, ansiedade, irritabilidade e febre que duram em média 10 dias. Os sintomas neurológicos iniciais frequentemente incluem parestesias, dor e/ou prurido no local da entrada viral, que pode ser uma ferida de mordida curada. Esses sintomas provavelmente refletem a infecção e inflamação da raiz dorsal ou dos gânglios sensitivos cranianos. Existem duas formas clínicas de raiva: a raiva furiosa e a raiva paralítica; a febre ocorre em ambas as formas. Acredita-se que na raiva furiosa a infecção envolva o cérebro, ao passo que, a raiva paralítica envolve a medula espinhal, as raízes nervosas e os nervos periféricos (JACKSON, 2016). Na raiva furiosa, há episódios de excitação generalizada ou hiperexcitabilidade separados por períodos lúcidos. A disfunção autonômica pode ser proeminente e incluir hipersalivação, sudorese e piloereção. Isso pode ser causado por infecção direta dos centros do sistema nervoso autônomo ou pelo envolvimento de vias autônomas no hipotálamo, na 23 medula espinhal ou nos gânglios. A hidrofobia ocorre em cerca de 50 a 80% dos pacientes e consiste em contrações do diafragma e musculatura acessória da inspiração com a deglutição. A hidrofobia é provavelmente causada por uma infecção envolvendo neurônios do tronco cerebral que inibem os neurônios motores inspiratórios nas proximidades do núcleo ambíguo. Também pode ocorrer aerofobia. Posteriormente, há progressão da doença com comprometimento da consciência e desenvolvimento de quadriparesia. Se os pacientes são tratados de forma inadequada em uma unidade de cuidados intensivos, as complicações cardiorrespiratórias e a falência multissistêmica de órgãos geralmente se desenvolvem antes da morte. A raiva é quase sempre fatal em 14 dias, a partir dos sintomas iniciais (JACKSON, 2016). Na raiva paralítica, a fraqueza geralmente se desenvolve inicialmente no membro onde ocorreu a mordida, e há progressão para a quadriparesia com fraqueza facial. Os pacientes geralmente estão alertas e mentalmente normais quando seus sintomas começam. A progressão neurológica ocorre subsequentemente, sem o desenvolvimento da hidrofobia, que é seguida de morte. O desenvolvimento da raiva paralítica não está relacionado com o local anatômico da moderdura, e os tempos de sobrevida são geralmente mais longos do que para pacientes com a forma furiosa da doença (JACKSON, 2016).

3.4 EPIDEMIOLOGIA

A raiva é uma doença infecciosa que afeta a humanidade desde a antiguidade. Atualmente, há cerca de 60.000 mortes por raiva humana no mundo, especialmente em continentes onde a doença é endêmica, como Ásia e África. Na América do Norte, a raiva é endêmica na vida selvagem, sendo os morcegos a principal fonte de ameaça para a transmissão da doença a seres humanos. (JACKSON, 2016). Abaixo é apresentado um mapa mundial de risco de raiva (Figura 4)

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Figura 4 – Países ou áreas de risco para infecção pelo vírus da raiva

Fonte: Adaptado de WHO, 2013.

O ciclo epidemiológico da doença é dividido didaticamente em quatro ciclos: urbano, rural, silvestre aéreo e o silvestre terrestre. Estudos realizados com amostras isoladas no Brasil nos últimos anos possibilitaram propor um ciclo epidemiológico da raiva, no qual há uma inter-relação entre os ciclos, onde, diversas espécies de animais que se relacionam, são responsáveis pela manutenção do ciclo de transmissão. O ciclo urbano é mantido por cães e 25 gatos domésticos, o ciclo rural e silvestre aéreo é mantido pelos morcegos hematófagos e o ciclo silvestre terrestre por carnívoros silvestres (Figura 5) (BRASIL, 2008; ACHKAR et al., 2010; BRASIL, 2014).

Figura 5 – Ilustração esquemática do ciclo de transmissão da raiva

Fonte: Adaptado de Brasil, 2014.

O genótipo I é amplamente distribuído no mundo e o de maior relevância epidemiológica e corresponde as cepas clássicas, que representam o vírus fixo, vacinais e aos isolados de mamíferos terrestres e morcegos hematófagos e não-hematófagos. Deve-se distinguir o vírus da raiva chamado vírus de ”rua” do vírus “fixo”. A denominação vírus de “rua” é utilizada para cepas isoladas de animais infectados em ciclos de transmissão natural da doença, já o vírus ”fixo” são as cepas adaptadas em animais de laboratório, através de passagens intracerebrais em série (IP, 2009; CHAVES, 2010; BRASIL, 2016a). Na América Latina, os cães sempre foram considerados os principais reservatórios do vírus da raiva, porém, as campanhas de vacinação para animais domésticos resultaram na redução de 90% no número de casos de transmissão da raiva por esses animais, desde os anos 80. No entanto, em 2004, o morcego hematófago Desmodus rotundus (Figura 6), 26 passou a ser um importante transmissor da raiva, pois, alimenta-se preferencialmente de sangue de mamíferos, sendo atualmente, o principal responsável pela manutenção da doença, especialmente nos ciclos silvestre, aéreo e rural. No que diz respeito ao ciclo rural, a espécie é comum em regiões que possuem grandes rebanhos de gado, favorecido pela presença abundante de alimento, onde, a doença é responsável por gerar enormes despesas financeiras, devido aos custos com medidas de controle e prevenção, além dos prejuízos causados na produtividade (ANDRADE et al, 2016; COSTA; FERNANDES, 2016).

Figura 6 – Morcegos hematófagos Desmodus rotundus

Fonte: Fine Art America, 2012.

A participação do Desmodus rotundus na transmissão da raiva na América do Sul começou a atrair atenção crescente, devido a mudança no perfil epidemiológico da doença que teve grande relevância na Amazônia Legal Brasileira, em virtude de surtos de raiva humana causadas por essa espécie de morcego em 2004 e 2005, onde foram relatados 38 casos no Estado do Pará e 24 casos no Estado do Maranhão. O desequilíbrio gradual na dinâmica natural da relação entre vírus e hospedeiro silvestre, em decorrência dos impactos 27 ambientais que afetam essa região do Brasil, provavelmente, proporcionou essa mudança no ciclo de transmissão da raiva (COSTA; FERNANDES, 2016). No Brasil, de 2006 a 2016 foram registrados 34 casos de raiva humana, tendo o Estado do Maranhão a maior incidência, com 15 casos (Quadro 1). Em 2016 foram registrados dois casos de raiva em humanos, um no Estado de Roraima e outro no Estado do Ceará, em ambos os casos a variante detectada foi VAg3 (BRASIL, 2015; 2016c).

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Quadro 1 – Casos de raiva Humana, Grandes Regiões e Unidades Federadas 2000 a 2016

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 Região Norte 9 6 5 0 24 17 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 Rondônia 4 4 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

Acre 2 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 Amazonas 0 0 2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

Roraima 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 Pará 3 2 1 0 22 17 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

Amapá 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 Tocantins 0 0 2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

Região Nordeste 13 10 4 15 5 26 7 1 2 2 3 2 3 5 0 1 1 Maranhão 7 2 0 3 4 24 5 1 0 2 0 2 2 3 0 0 0 Piauí 1 2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2 0 0 0

Ceará 1 1 2 7 0 1 0 0 1 0 2 0 1 0 0 0 1 Rio Grande do Norte 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0

Paraíba 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 *Pernambuco 1 0 0 1 0 0 1 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0

Alagoas 0 2 1 1 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 Sergipe 1 1 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

Bahia 2 2 1 3 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 Região Sudeste 0 3 1 2 1 1 2 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 Minas Gerais 0 1 1 1 1 1 1 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 Rio de Janeiro 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

Espírito Santo 0 1 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 São Paulo 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

Região Centro-Oeste 4 2 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 1 0 0 1 0 Mato Grosso do Sul 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 Mato Grosso 3 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0

Goiás 1 1 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 Distrito Federal 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

Região Sul 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 Paraná 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

Santa Catarina 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 Rio Grande do Sul 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

Brasil 26 21 10 17 30 44 9 1 3 2 3 2 5 5 0 2 2

Fonte: Brasil, 2016. *Raiva humana (2008) Estado Pernambuco evolução para cura.

29

A raiva animal é endêmica no Brasil, e de 2011 a 2016 foram registrados 5.448 casos de raiva animal, sendo os bovinos a espécie mais acometida, com 3.616 casos (Quadro 2). As regiões Sudeste e Sul são as regiões que possuem a maior prevalência, com 2.334 e 1.229 casos de raiva animal, respectivamente. Atualmente, embora os animais de produção sejam as espécies mais acometidas pela raiva, para a saúde pública, a raiva urbana é a que apresenta maior relevância epidemiológica de transmissão contínua. A raiva urbana está sob controle, exceto por epizootias que ocorreram de 2011 a 2014 no Estado do Maranhão e em 2015 no Estado do Mato Grosso do Sul. Em 2016, foram registrados 15 casos de raiva urbana, sendo nove casos em caninos e seis em felinos. Por outro lado, a raiva silvestre adquiriu grande relevância, constituindo-se um desafio para a vigilância e controle da doença, devido à complexidade do processo epidemiológico (BRASIL, 2016b).

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Quadro 2 – Número de casos de raiva animal por espécie segundo Região e UF no período de 2011 a 2016

Região/UF C G B E MH MnH Me CS O Norte 8 2 197 36 6 7 0 0 4 Rondônia - - 18 4 - 3 - - - Acre - - 14 3 - - - - 1 Amazonas - - 9 1 - - - - - Roraima - 1 ------Pará 7 1 52 13 2 1 - - 2 Amapá 1 - 2 ------Tocantins - - 102 15 4 3 - - 1 Nordeste 196 16 487 39 17 147 34 99 26 Maranhão 159 6 117 7 - 3 - 2 4 Piauí 3 - 19 - - - 3 - 2 Ceará 13 4 37 2 11 40 30 32 6 Rio Grande do Norte 11 1 39 2 2 68 - 17 2 Paraíba - 1 19 2 - 1 - 1 - Pernambuco 7 2 92 1 - 23 1 21 3 Alagoas - - 2 - - - - 1 - Sergipe 1 1 30 - - - - 1 - Bahia 2 1 132 25 4 12 - 24 9 Sudeste 7 12 1575 280 32 395 0 1 32 Minas Gerais 1 - 567 78 5 79 - - 10 Espírito Santo - 1 241 40 11 10 - - 3 Rio de Janeiro - - 198 35 - 4 - - 2 São Paulo 6 11 569 127 16 302 - 1 17 Sul 1 3 984 69 16 143 0 0 13 Paraná - - 296 33 7 81 - - 8 Santa Catarina 1 - 233 5 3 16 - - 1 Rio Gande do Sul - 3 455 31 6 46 - - 4 Centro-Oeste 75 1 373 72 2 27 0 0 14 Mato Grosso do Sul 74 - 60 11 - 9 - - 5 Mato Grosso - - 244 22 1 3 - - 8 Goiás 1 1 68 35 1 11 - - - Distrito Federal - - 1 4 - 4 - - 1 Total 287 34 3616 496 73 719 34 100 89 Fonte: Brasil, 2016. C - Cão; G - Gato; B - Bovino; E - Equino; MH - Morcegos Hematófagos; MnH - Morcegos não Hematófagos; Mc - Macacos; CS – Canídeos Silvestres; O – Outros. 31

3.5 TRATAMENTO E PROFILAXIA

No Brasil, o esquema de profilaxia da raiva (profilaxia antirrábica pós-exposição e profilaxia antirrábica pré-exposição) segue as normas técnicas recomendadas pelo Ministério da Saúde que são pautadas nas recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS). Para indivíduos que devido a natureza das atividades profissionais, estão expostos ao risco de infecção pelo vírus da raiva, a profilaxia antirrábica pré-exposição é recomendada, do mesmo modo, a indivíduos que viajam para Estados ou Países com alta prevalência da doença ou pela natureza das atividades que realizarão e estarão expostos ao risco de se infectar com o RABV, devem ser imunizados. A profilaxia antirrábica pós-exposição é recomendada para indivíduos que possam ter se exposto ao vírus da raiva, e inclui a realização da higienização do local da lesão e administração de imunobiológicos específicos (POERNER, 2007; BRASIL, 2008; 2011; LIMA; GAGLIANI, 2014; MOTA et al., 2016). Em 2004, uma jovem paciente de Wisconsin, sobreviveu à raiva e a terapia utilizada foi nomeada de protocolo de Milwaukee, sendo este protocolo, um tratamento para a raiva focado no coma terapêutico e uso de terapia antagonista do receptor N-metil D-aspartato (NMDA). O relato de caso deste protocolo foi publicado em 2005 e desde então muitas mudanças foram feitas no protocolo para chegar à sua versão atual. Em 2011 o Ministério da Saúde do Brasil publicou o protocolo de tratamento da raiva humana baseado no protocolo americano de Milwaukee, para orientar a condução clínica de pacientes suspeitos de raiva, para tentar reduzir a mortalidade por esta doença. Embora existam relatos de cura, a raiva segue sendo uma doença letal, com rápida e severa evolução clínica, e tem a prevenção como principal aliado na redução da incidência e letalidade da doença (BRASIL, 2008; 2011;

LIMA; GAGLIANI, 2014; ZEILER; JACKSON, 2016).

3.6 DIAGNÓSTICO LABORATORIAL

O diagnóstico definitivo da raiva só pode ser obtido por investigações laboratoriais, sendo o diagnóstico precoce essencial para que se possam adotar medidas de controle e prevenção da doença (CHAVES, 2007; WHO, 2018). 32

O diagnóstico laboratorial ante-mortem da raiva em humanos constitui-se na pesquisa do RABV em amostras de saliva, líquido cefalorraquidiano (LCR), detecção de antígenos virais em impressões de córnea e biópsia de pele da região nucal ou do local da mordedura, pesquisa de anticorpos neutralizantes do vírus em amostras de soro e LCR e pela reação em cadeia da polimerase precedida de transcrição reversa (RT-PCR) em amostras de saliva, folículo piloso e LCR. O estágio da doença é quem definirá a técnica a ser utilizada, uma vez que é possível detectar antígeno nos primeiros dias, enquanto que anticorpos neutralizantes no LCR e soro, de modo geral, aparecem depois de 7-10 dias depois do inicio da doença, sendo a presença de anticorpos neutralizantes no soro e LCR, de indivíduos que não realizaram imunização recente contra a raiva, um indicativo de infecção pelo RABV. E a detecção do genoma viral por RT-PCR é possível a partir do primeiro dia após o início dos sintomas. Todavia, resultados negativos não excluem a possibilidade de infecção pelo RABV, sendo indicada a pesquisa do vírus no SNC no diagnóstico post-mortem (CHAVES, 2007; BRASIL, 2009; CASSEB, 2009). Os métodos de diagnóstico laboratorial realizados ante-mortem apresentam baixo índice de positividade, entretanto, o diagnóstico laboratorial post-mortem não apresenta impedimentos, uma vez que o SNC está repleto de antígeno viral. Por isso, a necropsia de tecido nervoso é utilizada no método de diagnóstico post-mortem, porém, também é possível detectar o vírus na retina e no epitélio da córnea (BRASIL, 2008; CASSEB, 2009). Os testes amplamente utilizados para o diagnóstico da raiva são: Imunofluorescência Direta (IFD), para detecção de antígenos, apresentando resultados rápidos e confiáveis; e a Prova Biológica (PB), pela inoculação intracerebral em camundongos recém-nascidos, com confirmação realizada pela IFD, sendo esses dois métodos realizados rotineiramente e concomitantemente no diagnóstico. Existem também outros métodos utilizados, como a técnica histológica pela coloração de Sellers, que consiste na coloração de impressões de diferentes porções do SNC com o corante de Sellers e pesquisa da presença de corpúsculos de Negri, que são inclusões patognomônicas da infecção rábica; e a Reação em Cadeia da Polimerase precedida de Transcrição reversa (RT-PCR) que detecta o genoma do vírus (BRASIL, 2008; CASSEB, 2009). 33

Como complementação às provas de rotina, é feita a identificação das amostras de RABV isoladas, através da tipificação ou caracterização antigênica, pela técnica de imunofluorescência indireta (IFI) com anticorpos monoclonais (AcM), e pela caracterização genética por RT-PCR e sequenciamento nucleotídico com análise filogenética (BRASIL, 2008).

3.7 CARACTERIZAÇÃO ANTIGÊNICA E GENÉTICA

A caracterização antigênica é realizada pela técnica de Imunofluorescência Indireta (IFI), e consiste no uso de dois anticorpos, o primeiro, anticorpo-alvo, que se liga a sítios específicos da nucleoproteína viral, em impressão de tecido nervoso em lâminas, e o segundo, um anticorpo que está ligado a um fluorocromo, que vai reconhecer o anticorpo alvo e a reação é lida em microscópio de fluorescência (CASSEB, 2009). A IFI é realizada, utilizando um painel de oito AcM direcionados a nucleoproteína viral do RABV, produzidos e distribuídos pelo CDC-OPAS (Centers of Disease Control and Prevention, Atlanta, GA, USA-Organização Panamericana de Saúde), que foram previamente estabelecidos para estudar a epidemiologia molecular do RABV nas Américas, auxiliando no estudo das diferentes variantes circulantes e seus reservatórios específicos (FAVORETTO, 2002; BRASIL, 2008). A utilização do painel, já permitiu a identificação das variantes que circulam no Brasil como: VAg2 (cão), VAg3 (D. rotundus), VAg4 (Tadarida brasiliensis) e VAg6 (Lasiurus cinereus), além de outras variantes que são raramente encontradas, como a VAg5 que já foi detectada em morcegos do tipo Eumops auripendulus e Eptesicus furinalis, além de outros quatro perfis antigênicos não compatíveis com os apresentados no painel. Desta forma, a caracterização antigênica para classificar o RABV, vem contribuindo com os avanços obtidos na epidemiologia da raiva, possibilitando a determinação da distribuição geográfica e reservatórios específicos das variantes do Rabies lyssavirus (MENOZZI, 2012). Tal metodologia deve ser complementada pela caracterização genética por RT-PCR, sequenciamento nucleotídico e análise filogenética (FAVORETTO, 2002; BRASIL, 2008). 34

O gene N é um excelente alvo quando se trata de comparação das amostras por períodos de evolução mais longos, se tratando de similaridade das sequências de aminoácidos, a proteína N é a mais conservada dentre os sete genótipos dos Rabies lyssavirus, apesar de possuir alta diversidade genética (MENOZZI, 2012). Algumas regiões do gene da nucleoproteína viral dos diferentes genótipos, possuem regiões específicas que apresentam maior conservação de aminoácidos, em decorrência das funções chaves na replicação viral realizadas por essas regiões, apresentando epítopos específicos que auxiliam na diferenciação dos Rabies lyssavirus e suas variantes, pelos padrões de reação de anticorpos monoclonais (AcM) para estes epítopos (MENOZZI, 2012). Estudos mostraram que a RT-PCR, auxilia tanto no diagnóstico, quanto nas tipagens para determinação das sequencias de nucleotídeos, sendo assim, o gene N tem sido amplamente utilizado na detecção e tipificação do vírus da raiva (FAHL, 2009; MENOZZI, 2012). A caracterização antigênica e molecular da raiva é importante para a epidemiologia, além disso, a análise genética tem permitido e viabilizado a compreensão das diferenças antigênicas e as adaptações do vírus a diferentes espécies de animais, revelando que existe uma conservação nas alterações genéticas. Desta forma, a caracterização genética e antigênica auxilia na compreensão dos múltiplos ciclos endêmicos e transmissão interespécies (MENOZZI, 2012).

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4 MATERIAL E MÉTODOS

4.1 CRITÉRIOS ÉTICOS

O presente trabalho foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética no Uso de Animais (CEUA) do Instituto Evandro Chagas (IEC) (Apêndice A). O estudo utilizou tecidos do sistema nervoso central de amostras animais pertencentes ao acervo do laboratório de Raiva da Seção de Arbovirologia e Febres Hemorrágicas do IEC, sendo a utilização previamente autorizada pelas chefias do laboratório, da seção e direção do IEC, após aprovação da CEUA/IEC.

4.2 ÁREA DE ESTUDO

O estudo foi realizado a partir de amostras animais positivas para o vírus da raiva provenientes do Estado do Pará, compreendendo as seis mesorregiões: Baixo Amazonas, Marajó, Metropolitana de Belém, Nordeste Paraense, Sudeste Paraense e Sudoeste Paraense (Figura 7). O Estado do Pará situa-se na região Norte do Brasil, possui 8.366.628 habitantes e ocupa uma área de 1.248.000 km² (IBGE, 2017).

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Figura 7 – Distribuição espacial das mesorregiões do Estado do Pará, Brasil

Fonte: Adaptado de IBGE, 2018.

4.3 AMOSTRAS

Foi realizada uma triagem através do banco de dados do Laboratório de raiva do IEC, que registrou o recebimento de 5.051 amostras provenientes do Estado do Pará no período estudado, dessas, 73 amostras de encéfalos de animais (Apêndice B) foram positivas nos testes de IFD e PB, sendo essas amostras positivas agrupadas de acordo com a mesorregião, espécie e ano. Foram incluídas no estudo somente amostras de encéfalos animais positivas para a raiva em ambos os testes, de IFD e PB, procedentes do Estado do Pará, no período de janeiro de 2010 a dezembro de 2017. Foram excluídas do estudo as amostras que não se encaixavam nos critérios mencionados acima.

37

4.4 CARACTERIZAÇÃO OU TIPIFICAÇÃO ANTIGÊNICA

A tipificação antigênica foi realizada segundo a técnica de IFI descrita no Manual de Diagnóstico Laboratorial de raiva, do Ministério da Saúde (2008). Foram preparadas lâminas com impressão de cérebros dos camundongos infectados, uma para cada anticorpo monoclonal, que foram mantidas à temperatura ambiente (TA) por 30 minutos e fixadas em acetona PA a -20°C durante toda a noite. Posteriormente, foram retiradas da acetona e deixadas para secar por 15 minutos em TA. Em seguida, foram colocados 15μL da diluição de trabalho (1:3000), previamente estabelecida, de cada um dos oito anticorpos monoclonais em cada impressão. As lâminas foram identificadas com o número de cada anticorpo monoclonal (1, 4, 9, 10, 12, 15, 18 e 19) e incubadas a 37°C, por 30 minutos, em câmara úmida. Após, foram retiradas da estufa e lavadas com auxílio de uma pisseta com PBS 0,01M, pH 7,6, cada impressão foi lavada duas vezes, após a lavagem, as lâminas foram submersas em PBS (0,01M, pH 7,6) por dez minutos. E em seguida foram postas para secar. Foi colocado em cada impressão 30μL de conjugado anti-camundongo (1:800), e as lâminas foram incubadas a 37°C por 30 minutos, em câmara úmida. Posteriormente, foram retiradas e lavadas conforme o procedimento anterior. Após serem retiradas do PBS foram lavadas em água destilada e colocadas para secar. As lâminas foram montadas com glicerina tamponada (pH 8,5) e lamínulas. E então, foi realizada a leitura em microscópio de IF, observando os padrões de reação apresentados no quadro 3. 38

Quadro 3 – Padrões de reação para as diferentes variantes antigênicas com os anticorpos monoclonais

Painel de Monoclonais (CDC/Atlanta)

C1 C4 C9 C10 C12 C15 C18 C19 VAg

CVS/ERA SAD/PAST + + + + + + + + Lab

Canina/Capivara + + + + + + - + 1

Canina (Brasil) + + - + + + - + 2

Desmodus rotundus - + + + + - - + 3 (Brasil)

Tadarida brasiliensis - + + + + - - - 4 (Brasil)

D. rotundus (Venezuela) - + v + + v - v 5

Lasiurus cinereus v + + + + - - - 6

Raposa do Arizona + + + + + + - + 7

Gambá (EUA) - + + - + + + + 8

Tadarida brasiliensis + + + + + - - - 9 (Mexico)

Gambá (Califórnia sul) + + + + - + - + 10

D. rotundus (México) - + + + - - - + 11

Callithrix jacchus (Brasil) - - + + - - - - C.jacchus

Fonte: Favoretto et al., 2002. C (Diferentes tipos de anticorpos monoclonais), VAg (Variante Antigênica), + (Positivo), - (Negativo), Lab (Variante Laboratorial), V (Reação débil).

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4.5 CARACTERIZAÇÃO GENÉTICA PELO SEQUENCIAMENTO PARCIAL DO GENE N

As amostras que não foram compatíveis com as das variantes já identificadas pelo painel de anticorpos monoclonais, utilizado no estudo, foram caracterizadas geneticamente, segundo metodologia adaptada de Barbosa (2007).

4.5.1 Extração do RNA viral

As amostras utilizadas foram extraídas utilizando o kit comercial Maxwell 16 Viral Total Nucleic Acid Purification Kit (Promega, Madson, EUA) de acordo com recomendações do fabricante, utilizando a plataforma Maxwell® 16.

4.4.2 Reação em Cadeia Mediada pela Polimerase precedida de Transcrição Reversa (RT-PCR)

4.5.2.1 Iniciadores específicos

O par de inciadores (Quadro 4) foi desenhado através do Programa OligoPerfect™ Designer disponível no site da Invitrogen, baseado na região conservada do gene N, a partir de análise do alinhamento entre o protótipo de RABV e amostras isoladas no Brasil.

Quadro 4 – Iniciadores utilizados no protocolo de RT-PCR para amplificação do RABV

Iniciador Posição no Genoma Sequência GC% TmA* Produto

Rab NF 868(+) GGAAGAGATAAGAAGAAGAATGTTTG 34.78 54.16

490pb

Rab NR 1359(-) TTGGAGCTGACTGAGACATA 45.00 54.33

TmA = Temperatura de anelamento (50mM Na+); pb = pares de base; GC = percentual de guanina e citosina

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4.5.2.2 RT-PCR

Foi realizada a RT-PCR em dois passos distintos. Inicialmente, foi realizado o passo da RT, utilizando 5µL do RNA extraído, que foi desnaturado por 1 minuto a 94ºC. Para a obtenção do DNA complementar (cDNA), foi realizada a RT, ajustada para volume final de 10µL, sendo constituída de uma mistura de 5µL de RNA e 5µL do mix de transcrição reversa, composto por tampão RT 1X (250 mM Tris-HCI , 100mM NaCl, 15mM MgCl² e 0,1 mM EDTA), 0,5mM de dNTP, 10 mM de DTT, 10U/µL de enzima SuperScriptIII, 2,5µM do iniciador 868NF (5'-GGAAGAGATAAGA AGAATGTTTG-3') e foi processada em um termociclador, utilizando a temperatura de 42ºC por 90 minutos. Após a RT, foi realizada a PCR, sendo o volume da reação de 25µL, contendo 5µL do produto de cDNA da RT e 20µL do mix de reação, composto por tampão de PCR (250mM de Tris-HCI, 100mM de NaCl, 0,1 mM de EDTA), 1,5mM de MgCl², 0,2µM de dNTPs, 1µM de cada iniciador 868 NF e 1359 NR e 0,05U/µL de DNA Polymerase (Platinum Taq DNA Polymerase), e a PCR foi realizada em 35 ciclos, de 40 segundos a 94ºC para desnaturação, 40 segundos a 55ºC para anelamento e 1 minuto a 74ºC para síntese.

4.5.2.3 Visualização do produto da RT-PCR

Os produtos de PCR foram submetidos a eletroforese em gel de agarose a 1,5% em tampão TAE 1x (Tris 10mM. Acetato 0,1 M, EDTA 1mM pH 7,2) corado com SyberSafe (Invitrogen) e visualizados em transiluminador com fonte de luz ultravioleta. Os produtos amplificados foram colocados para migrar juntamente com um marcador indicativo do número de pares de base (Low DNA Mass - 100 bp ladder, Invitrogen) e produto da extração do controle negativo (CCN) e controle positivo (CVS) durante 30 minutos a uma voltagem e amperagem média de 80V e 7mA, respectivamente.

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4.5.3 Purificação

Após a realização da corrida em gel de agarose, as melhores bandas obtidas na RT- PCR foram purificadas com o kit Quick Gel Extraction (Promega, EUA), seguindo recomendações do fabricante.

5.5.4 Sequenciamento nucleotídico

O cDNA foi sequenciado em ciclos com o Kit Dye Terminator versão 3.0, que emprega o método de terminação de cadeia por didesoxiribonucleotídeo (Sanger et al., 1977), marcados com diferentes fluoróforos para cada nucleotídeo na extremidade 3’. A mistura para cada reação de sequenciamento continha 4 μL de Terminator ready reaction mix, 50 ng do produto de PCR, 3,5 pmoles de oligonucleotídeos que foram utilizados para o PCR (Quadro 3) e quantidade suficiente de água para um volume final de 20 μL. A amplificação foi realizada usando o programa que consiste de 25 ciclos, cada um composto por etapas de desnaturação a 96ºC por 10 segundos, hibridização dos iniciadores a 52ºC por 5 segundos e extensão a 60ºC por 4 minutos. Após este processo o produto de sequenciamento foi purificado utilizando o kit comercial X-terminator (Applied Biosystems, EUA) conforme recomendações do fabricante.

4.5.5 Análise Filogenética

As sequências nucleotídicas obtidas foram comparadas com sequências disponíveis no GenBank, com o auxílio da ferramenta BLAST (https://blast.ncbi.nlm.nih.gov/Blast.cgi), para verificar similaridade com outras variantes do RABV, para então serem analisadas pelo programa Geneious (BIOMATTERS, 2017). A árvore filogenética foi construída utilizando os métodos Neighbor Joining (NJ) (Saitou e Nei, 1987), utilizando o programa MrBayes. Foi utilizado também modelo evolutivo kimura-2-parâmetros, com 1.000 repetições de bootstrap, por meio do programa Mega 2 (KUMAR et al., 2001). As variantes foram agrupadas de acordo com o quadro 5.

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Quadro 5 – Variantes do vírus da raiva utilizadas nas análises filogenéticas, de acordo com hospedeiro, origem geográfica, anos de isolamento e variantes antigênicas

GeneBank Variantes do Local (País, Hospedeiro Ano VAg (Código de Referência RABV município/UF) acesso) Vírus GI:55770806 - França, Paris - NC_006429 Le Mercier; Jacob; Tordo, 1997 Mokola

África, República da Vírus 86132AF - 1986 U22848 Kissi; Tordo; Bourhy, 1995 áfrica do Sul Duvenhage

IP6609sg/05CE Callithrix jacchus Brasil, CE 2005 Callithrix FJ829027 Kotait; Carrieri; Castilho

IP6648sg/08CE Callithrix jacchus Brasil, CE 2008 Callithrix FJ829029 Kotait; Carrieri; Castilho

Brasil, São José do Rio BR-NL2 Nyctinomops laticaudatus 1999 Eptesicus AB201807 Kobayashi et al., 2005 Preto/SP

Brasil, Américo de BR-EA1 Eumops auripendulus 1998 Eptesicus AB201809 Kobayashi et al., 2005 Campos/SP

Brasil, São José do Rio BR-EF1 Eptesicus furinalis - Eptesicus AB201811 Kobayashi et al., 2005 Preto/SP

BR-MM1 Molossus molossus Brasil, Jales/SP 2002 Molossus AB201815 Kobayashi et al., 2005

BR-MM2 Molossus molossus Brasil, Ilha Solteira/SP 2002 Molossus AB201816 Kobayashi et al., 2005

BR-NL4 Nyctinomops laticaudatus Brasil, Rio de Janeiro/RJ 2004 Nyctinomops AB297647 Kobayashi et al., 2007

BR-TL-1 Tadarida laticaudata Brasil, Rio de Janeiro/RJ 1999 Nyctinomops AB297648 Kobayashi et al., 2007

BR-TL-2 Tadarida laticaudata Brasil, Rio de Janeiro/RJ 1999 Nyctinomops AB297649 Kobayashi et al., 2007

Velasco-Villa; Orciari; 440Mxgrodg99 Cão Mexico, Guerrero 1999 VAg1 FJ228506 Rupprecht

Velasco-Villa; Orciari; 3121Mxdfhm91 Humano Mexico, Distrito Federal 1991 VAg1 FJ228508 Rupprecht

Velasco-Villa; Orciari; 3142Mxdffer90 Furão Mexico, Distrito Federal 990 VAg1 FJ228509 Rupprecht

9126MEX - México - VAg1 U22477 Kissi; Tordo; Bourhy, 1995

10564ctPB Gato Brasil 2003 VAg2 EF152239 Carnieli Jr. et al., 2008

4372CthPI Cerdocyon thous Brasil 2005 VAg2 EF152243 Carnieli Jr. et al., 2008

6970CthPE Cerdocyon thous Brasil 2005 VAg2 EF152255 Carnieli Jr. et al., 2008

6973CthPE Cerdocyon thous Brasil 2005 VAg2 EF152256 Carnieli Jr. et al., 2008

7578CthBA Cerdocyon thous Brasil 2005 VAg2 EF152273 Carnieli Jr. et al., 2008

8575dgPA Cão Brasil 2005 VAg2 EF152276 Carnieli Jr. et al., 2008

BRbv32 Bovino Brasil, São Roque/SP 1994 VAg3 AB083805 Ito et al., 2003

Brasil, São José do Rio BR-AP1 Artibeus planirostris 1998 VAg3 AB117972 Shoji et al., 2004 Preto/SP

BR-AL4 Artibeus lituratus Brasil, Dracena/SP 2002 VAg3 AB201802 Kobayashi et al., 2005

Brasil, São José do Rio BR-DR3 Desmodus rotundus 2001 VAg3 AB201805 Kobayashi et al., 2005 Preto/SP

DR.Braz Bovino Brasil 1986 VAg3 AF351847 Nadin-Davis et al., 2001

IP3066M Humano Brasil, Portel/PA 2004 VAg3 EF363742 Travassos da Rosa et al., 2006 43

IP3067M Humano Brasil, Portel/PA 2004 VAg3 EF363743 Travassos da Rosa et al., 2006

IP7541 Humano Brasil, Viseu/PA 2004 VAg3 EF363757 Travassos da Rosa et al., 2006

TB70450 Tadarida brasiliensis Chile - VAg4 AF070450 Warner et al., 1999

TB1 Tadarida brasiliensis EUA, Texas - Vag4 AF351849 Nadin-Davis et al., 2001

Velasco-Villa; Orciari; NMBATDic2007 Tadarida brasiliensis EUA, Novo México 2007 VAg4 FJ228486 Rupprecht

93RABN6220 Lasiurus cinereus Canadá, Ontario 1993 VAg6 AF351846 Nadin-Davis et al., 2001

91RABN6832 Lasiurus borealis Canadá, Ontario 1991 VAg6 AF351856 Nadin-Davis et al., 2001

LB7; V583 Lasiurus borealis EUA, Connecticut 1998 VAg6 AF351857 Nadin-Davis et al., 2001

96RABN4502 Lasiurus cinereus Canadá, Ontario 1996 VAg6 AF351858 Nadin-Davis et al., 2001

V680 Lince (Lynx rufus) Mexico, Chihuahua 1991 VAg7 AY854590 Nadin-Davis; Loza-Rubio, 2006

Velasco-Villa; Orciari; 3907Mxsonbct Raposa do Arizona Mexico, Sonora 2002 VAg7 FJ228540 Rupprecht

CVS vírus fixo - - VLab D42112 Tordo et al., 1986

AV01(avirulenta) vírus fixo - - VLab X13357 Poch; Tordo; Keith, 1988

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5 RESULTADOS

Segundo o banco de dados do Laboratório de raiva do IEC, no período de janeiro de 2010 a dezembro de 2017, um total de 5.051 amostras de encéfalos de animais, procedentes das mesorregiões do Estado do Pará, foi analisada pelas técnicas de IFD e PB, destas, 73 (1,44%) foram positivas, com percentual de positividade abaixo de 1% entre os anos de 2010 a 2014 e a partir de 2015 com o recebimento das amostras procedentes da Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará (ADEPARÁ), este percentual aumentou, chegando a 6,41% (30/468) em 2017. Das 73 amostras positivas, 65,75% (48/73) eram bovinos, 17,81% (13/73) equinos, 8,22% (6/73) caninos, 6,85% (5/73) quirópteros e 1,37% (1/73) felino (tabela 1). Foram recebidas 2.237 amostras de quirópteros, apesar do grande número de amostras recebidas no laboratório, ao longo do estudo, contudo, apenas cinco animais foram positivos. Enquanto que os herbívoros (bovinos e equinos) apresentaram os maiores índices de positividade. Sendo que os bovinos tiveram maior número de amostras positivas, onde, no ano de 2017 os bovinos obtiveram maior número de amostras positivas.

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Tabela 1 – Total de amostras positivas, examinadas e percentual de positividade de raiva animal, de acordo com o ano e espécies analisadas entre janeiro de 2010 e dezembro de 2017

Positivos/Examinados (%)

Espécie Percentual de positividade

2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 Total

-/5 -/10 1/3 -/- 1/4 17/49 7/57 22/80 48/208 Bovinos 0% 0% 33,3% 0% 25,0% 34,6% 12,2% 27,5% 23,07% 2/4 -/3 1/1 -/- -/- 3/9 2/7 5/21 13/45 Equinos 50,0% 0% 100% 0% 0% 33,3% 28,5% 23,8% 28,88% 5/704 1/593 -/398 -/199 -/108 -/138 -/99 Caninos 0,71% -/67 6/2306 0,16% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0,26% -/25 1/37 -/15 -/15 -/7 -/14 -/8 -/17 1/138 Felinos 0% 2,70% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0,72% 1/455 -/301 -/307 -/136 Quirópteros 1/548 0,21% -/62 -/240 3/188 5/2237 0% 0% 0% 0,18% 0% 0% 1,59% 0,22% -/3 -/- -/6 -/- -/1 -/8 -/4 -/95 -/117 Outros* 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0%

3/931 7/1302 3/878 -/276 1/427 20/458 9/311 30/468 73/5051 Total 0,32% 0,53% 0,34% 0% 0,23% 4,36% 2,89% 6,41% 1,44% *anta, bubalino cutia, ovino, preguiça, raposa, roedor, símio e suíno.

Ao analisarmos a demanda por espécie e por mesorregião do Estado do Pará, foi possível observar que a mesorregião metropolitana de Belém foi a que mais demandou amostras ao laboratório (2.170), seguida pelo Nordeste paraense (1.594). Das amostras positivas, 52,05% (38/73) pertenciam a mesorregião do Sudeste Paraense, 38,36% (28/73) ao Nordeste Paraense, 6,85% (5/73) a Metropolitana de Belém e 2,74% (2/73) ao Sudoeste Paraense, os percentuais de positividade por mesorregião do Estado e por espécie, dentre as amostras examinadas, podem ser observados na tabela 2. Na análise da distribuição dos casos positivos, de acordo com o município, verifica-se que Bragança, no Nordeste Paraense, foi o município com maior número de amostras positivas, seguido de Paragominas e Marabá, ambos municípios do Sudeste Paraense (Figura 8).

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Figura 8 – Mapa do Estado do Pará, mostrando os municípios de procedência e número de amostras positivas para raiva

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Tabela 2 – Total de amostras positivas, examinadas e percentual de positividade de raiva animal, de acordo com as mesorregiões do Estado do Pará e espécies analisadas entre janeiro de 2010 e dezembro de 2017

Positivos/Examinados (%) Percentual de positividade Espécie Baixo Metropolitana Nordeste Sudeste Sudoeste Marajó Total Amazonas de Belém Paraense Paraense Paraense -/2 -/3 2/7 19/62 25/118 2/16 48/208 Bovinos 0% 0% 28,57% 30,64% 21,186% 12,5% 23,07% -/- /- 1/3 6/18 6/24 -/- 13/45 Equinos 0% 0% 33,33% 33,33% 25,0% 0% 28,88% -/236 -/14 -/1513 -/157 6/383 -/3 6/2306 Caninos 0% 0% 0% 0% 1,566% 0% 0,26% -/14 -/4 -/105 -/3 1/12 -/- 1/138 Felinos 0% 0% 0% 0% 8,33% 0% 0,72% -/136 -/189 2/509 3/1330 -/68 -/5 5/2237 Quirópteros 0% 0% 0,39% 0,22% 0% 0% 0,22% -/31 -/5 -/33 -/24 -/13 -/11 -/117 Outros* 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% -/419 -/215 5/2170 28/1594 38/618 2/35 73/5051 Total 0% 0% 0,23% 1,756% 6,14% 5,71% 1,44% *anta, bubalino cutia, ovino, preguiça, raposa, roedor, símio e suíno.

Das cinco amostras positivas de quirópteros, identificadas no laboratório de diagnóstico de raiva do IEC, duas correspondiam à espécie de morcego hematófago, Desmodus rotundus, e três amostras correspondiam a espécies de morcegos não hematófago do gênero Artibeus, sendo duas de Artibeus planirostris e uma de Artibeus lituratus (quadro 6).

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Quadro 6 – Morcegos examinados e identificados no Laboratório de raiva/IEC

Ano Família Espécie Hábito Mesorregião Alimentar 2011 Phyllostomidae Artibeus Frugívoro Metropolitana de planirostris Belém 2012 Phyllostomidae Artibeus Frugívoro Nordeste Paraense planirostris 2017 Phyllostomidae Desmodus Hematófago Nordeste Paraense rotundus 2017 Phyllostomidae Desmodus Hematófago Nordeste Paraense rotundus 2017 Phyllostomidae Artibeus Frugívoro Metropolitana de lituratus Belém

5.1 CARACTERIZAÇÃO ANTIGÊNICA

Das amostras positivas no período, 79,45% (58/73) foram submetidas à caracterização antigênica, utilizando o painel de AcM previamente estabelecido pelo CDC para caracterização de cepas circulantes nas Américas, das quais 91,38% (53/58) foram compatíveis com algum padrão de leitura do painel de AcM. Das cepas virais isoladas de encéfalos de bovinos, 93,94% (31/33) mostraram-se compatíveis com o padrão de leitura da VAg3 e somente 6,06% (2/33) não puderam ser caracterizadas, pois não corresponderam a nenhum padrão de leitura. Para as amostras de equinos, 84,62% (11/13) foram compatíveis com a VAg3 e 15,38% (2/13) não corresponderam a nenhum padrão de leitura. Das amostras de encéfalos caninos, 100% (6/6) foram compatíveis com VAg2, o mesmo foi observado na única amostra positiva de felino, que também correspondeu a VAg2. Das cepas virais isoladas de encéfalos de quirópteros, 80% (4/5) corresponderam a VAg3, sendo duas de Artibeus planirostris, duas de Desmodus rotundus. Uma amostra de Artibeus lituratus proveniente da mesorregião Metropolitana de Belém não correspondeu a nenhum padrão de leitura no painel de AcM.

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5.2 CARACTERIZAÇÃO GENÉTICA

Das 58 amostras caracterizadas antigenicamente, cinco que apresentaram perfil de leitura não compatível com o painel de anticorpos monoclonais e outras 15 que não foram submetidas à IFI e, foram submetidas ao sequenciamento parcial do gene N, determinado entre as posições 868 e 1359 da nucleoproteína do RABV (quadro 7).

Quadro 7 – Amostras submetidas ao sequenciamento parcial do gene N Registro da amostra Ano Espécie no banco de dados do Procedência Mesorregião laboratório Eldorado dos 2014 Bovina 39964 Sudeste Carajás 2015 Equina 40902 Baião Nordeste 2015 Bovina 41193 Pacajá Sudoeste 2016 Equina 41652 Breu Branco Sudeste Novo 2016 Bovina 43199 Sudeste Repartimento 2017 Quiróptero 43570 Belém Metropolitana 2017 Bovina 43940 Ipixuna do Pará Nordeste 2017 Bovina 43946 Augusto Corrêa Nordeste 2017 Bovina 44598 Ipixuna do Pará Nordeste 2017 Bovina 44605 Augusto Corrêa Nordeste 2017 Bovina 44700 Capitão Poço Nordeste Novo 2017 Bovina 44715 Sudeste Repartimento 2017 Bovina 44806 Paragominas Sudeste 2017 Bovina 44821 Ipixuna do Pará Nordeste 2017 Bovina 44822 Bragança Nordeste 2017 Bovina 44847 Paragominas Sudeste 2017 Bovina 45064 Tomé-Açu Nordeste 2017 Bovina 45065 Tomé-Açu Nordeste 2017 Bovina 45070 Ipixuna do Pará Nordeste Goianésia do 2017 Bovina 45135 Sudeste Pará

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Para a construção da árvore filogenética, foram utilizadas as sequências obtidas nas amostras deste estudo, juntamente com as outras retiradas do Genbank, relativas a isolados de herbívoros, cães, humanos e morcegos hematófagos, frugívoros e insetívoros. Ambos os métodos utilizados, NJ e Bayesiano, apresentaram árvores filogenéticas com topologias similares, utilizando o modelo de substituição nucleotídica (Apêndice C). GTR+G (Base=[0,2880; 0,1899; 0,2487]; Nst=6; Rmat=[1,7507; 7,3084; 0,9473; 0,4698; 9,5367]; Taxa=gama, formato=0,2860 , Pinvar=0) determinado pelo Critério de Informação de Akaike (AIC). A topologia gerada que foi a mais confiável e que traduz a epidemiologia da raiva é representada na figura 9. De acordo com a análise filogenética, todas as amostras sequenciadas foram agrupadas no grupo da VAg3, relacionada ao morcego hematófago Desmodus rotundus (Figura 6), com valor de bootstrap de 99%, agrupadas em dois clados, mas não foi possível observar características territoriais, tais como agrupamentos de variantes por mesorregião do Estado. No clado I foram agrupadas amostras provenientes das mesorregiões do Sudeste Paraense (43199, 44715, 41652, 44847, 45135), Nordeste Paraense (43940, 40902, 45065, 45070, 45064, 44821), Sudoeste Paraense (41193) e Metropolitana de Belém (43570). No clado II foram agrupadas amostras provenientes somente das mesorregiões Sudeste Paraense (39964 e 44806) e Nordeste Paraense (44700, 43946, 44598, 44605 e 44822). A maioria das amostras se relaciona com amostras caracterizadas em estudos anteriores realizados no Estado Pará.

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Figura 9 – Análise filogenética das sequências nucleotídicas parciais do gene N do RABV pelo método NJ com cálculo de bootstrap baseado em 1000 pseudoréplicas

Observa-se formação de dois grupos principais, Quirópteros e Carnívoros, e subdivisão em clados relacionado às variantes antigênicas, sendo os vírus Duvenhage e vírus Mokola utilizados como grupo externo. A identificação das amostras deste estudo iniciam pelo número de registro, seguida do hospedeiro, mesorregião e ano de isolamento. As demais cepas do RABV estão denominadas de acordo com o número de acesso do GenBank, hospedeiro, e país de isolamento, podendo algumas conter ainda o ano.

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6 DISCUSSÃO

Embora a raiva seja evitável, e medidas efetivas de controle estejam disponíveis, o número de mortes em decorrência da doença ainda é alto e estima-se que 60.000 pessoas morrem de raiva a cada ano no mundo, com a Ásia e a África subsaariana respondendo por mais de 95% dessas mortes, e mais de 3,3 bilhões de pessoas correm risco de infecção pelo vírus da raiva. A raiva afeta de forma desproporcional as populações mais pobres que vivem em países de baixa e média renda, onde a vacinação de cães domésticos não é amplamente implementada e o acesso à profilaxia pós-exposição é mais limitado, consequentemente, sua incidência está aumentando em alguns países, como a Etiópia e Moçambique (JEMBERU et al., 2013; HAMPSON et al., 2015; SALOMÃO et al., 2017). Além do impacto negativo sobre a mortalidade, a raiva também causa um impacto econômico negativo em populações já empobrecidas. A falta de dados confiáveis sobre a carga e os fatores de risco associados à raiva humana representam um desafio crítico para a formulação de políticas e estratégias para controlar a doença e tem sido considerada uma das principais causas do subinvestimento nas medidas de controle da raiva (JEMBERU et al., 2013; HAMPSON et al., 2015; SALOMÃO et al., 2017). Nas Américas, a incidência da raiva diminuiu após 2003, entretanto, a raiva ainda é endêmica no Haiti, Bolívia e surtos esporádicos ainda ocorrem em Cuba, Nicarágua, Venezuela, e em territórios de fronteira de vários países da América Central, como El Salvador, Honduras, Guatemala, México e Brasil (VIGILATO et al., 2013). Atualmente, nas Américas, a raiva tem sido transmitida, principalmente, pelos morcegos, que são os envolvidos no “ciclo aéreo”, no qual tanto morcegos, hematófagos quanto não hematófagos, mantêm a circulação do vírus e os mesmos são capazes de transmiti-lo para uma grande diversidade de animais domésticos, como cães e gatos, animais de produção, como bovinos e equinos, e também para o homem. Portanto, a vigilância passiva de morcegos é uma importante atividade de vigilância dessa doença (RODRIGUES et al., 2017). Na América do Sul, os morcegos hematófagos da espécie Desmodus rotundus são os principais reservatórios e fontes de RABV para os gados. Bovinos e equinos são alvos 53 frequentes da alimentação de Desmodus rotundus e, são atualmente as principais espécies de animais acometidos pela doença. O controle da raiva animal transmitidos por morcegos hematófagos baseia-se na vacinação sistemática do gado e no controle de populações de morcegos. Apesar da eficácia das vacinas antirrábicas, a raiva animal, transmitida por morcegos hematófagos, é endêmica em muitos Estados brasileiros, causando importantes prejuízos econômicos aos produtores. A cobertura vacinal insuficiente parece contribuir para esta situação (CARGNELUTTI et al., 2017). Um dos pilares importantes do programa de vigilância da raiva proposto pelo Ministério da Saúde é a campanha anual de vacinação contra a raiva em cães e gatos, a fim de manter, uma parcela significativa dessas populações imunes ao vírus. As campanhas começaram com a criação do Programa Nacional de Profilaxia da Raiva (PNPR) em 1973, que auxiliou na redução do número de casos de raiva em cães e gatos. No entanto, até hoje, a distribuição de casos humanos permanece heterogênea, com maior incidência nas regiões Norte e Nordeste do país (RODRIGUES et al., 2017). Segundo Menezes (2013) o ciclo da raiva no Brasil é extremamente complexo e apresenta semelhanças no ciclo urbano e silvestre em diversas localidades, provavelmente devido aos diferentes ecossistemas existentes nas regiões. A técnica de caracterização antigênica utilizando anticorpos monoclonais e as técnicas moleculares têm permitido a identificação e caracterização das variantes do RABV circulantes, bem como as espécies envolvidas, auxiliando na compreensão dos ciclos epidemiológicos, da evolução do vírus da raiva e sua dispersão, seja interespécies ou em um hospedeiro específico, ou no surgimento de novas variantes, proporcionando avanços na epidemiologia do RABV (CASSEB, 2009; MENOZZI, 2012). Levando em consideração os anos deste estudo, a prevalência da raiva na espécie canina foi de 8,21% (6/73), sendo mais prevalente no ano de 2011, com 83,33% (5/6) casos positivos nesta espécie. Segundo o Ministério da Saúde, o número de casos de raiva canina vem diminuindo no Brasil, onde, entre os anos de 2000 a 2009, foram registrado no Brasil 3.204 casos de raiva canina e, entre os anos de 2010 a 2015 foram registrados 290 casos, onde, o ano de 2011 apresentou um dos maiores índices de positividade, desta forma, estes 54 dados corroboram o presente estudo, uma vez que cinco das seis amostras de caninos eram do ano de 2011 (BRASIL, 2014; 2015). A caracterização antigênica de cepas isoladas de epizootias em cães e gatos, nos Estados do Maranhão, Ceará e Rio Grande do Norte, identificaram a VAg2, esses dados corroboram o presente estudo, uma vez que a VAg2 foi identificada em todas as amostras de cães e na única amostra positiva de felino (BRASIL, 2017b). A redução do número de casos de raiva canina, observada nessa década, acompanha o decréscimo de raiva em humanos, pois, o cão é o principal reservatório e responsável por manter a circulação do vírus no ciclo urbano (WADA; ROCHA; MAIA-ELKHOURY, 2011). Segundo a OMS (2018), a circulação do RABV está sob controle na população canina e felina, porém, ações de vigilância devem ser reforçadas e suportes de recursos políticos, técnicos e em educação devem ser continuados. Se a vigilância for reduzida, o vírus pode se reestabelecer no ciclo urbano. Os estudos epidemiológicos sobre raiva demonstram que no ciclo rural os herbívoros representam a maior ocorrência de raiva, principalmente os bovinos, seguido dos equinos. Pela análise antigênica e filogenética, observou-se que as amostras de bovinos e equinos do estudo foram homólogas à sequências de vírus da raiva, relacionadas à linhagem comumente encontrada no morcego hematófago Desmodus rotundus. Esse resultado confirma a importância do Desmodus rotundus na manutenção da raiva, visto que esta espécie é considerada a principal transmissora do vírus da raiva aos herbívoros (SANTOS, 2016). Souza, Amaral e Gitti (2014) relataram no Rio de janeiro a ocorrência de casos de raiva em herbívoros em ambiente urbanizado, corroborando os dados encontrados nesse estudo, que detectou elevado percentual de positividade em herbívoros na Mesorregião Metropolitana de Belém, onde, possivelmente, os animais não tinham acompanhamento médico veterinário e/ou não eram vacinados contra raiva. Estudos realizados no Brasil com isolados de herbívoros encontraram resultados semelhantes aos apresentados neste estudo, onde, a análise filogenéticas de isolados pertencentes aos Estados de Pernambuco, Paraíba, Pará, Rondônia e Tocantins constataram que todas as amostras analisadas pertenciam à variante associada ao Desmodus rotundus (VAg3) (MOCHIZUKI et al., 2012; PEIXOTO et al., 2014; SANTOS, 2016). 55

Os herbívoros são hospedeiros acidentais do vírus da raiva, apesar de participarem da cadeia epidemiológica da raiva no ambiente rural, eles são considerados como animais sentinelas à circulação do vírus. Sua participação neste processo restringe-se ao óbito do animal, não havendo envolvimento no processo natural de transmissão às outras espécies, salvo quando de forma acidental. Esta afirmação é devido ao fato de que a raiva nos herbívoros tem baixa ou nula probabilidade de transmissão a outros animais (SOUZA; AMARAL; GITTI, 2014), entretanto, Brito et al. (2011) relatou o óbito de um profissional de saúde (veterinário) que não havia sido previamente imunizado contra a raiva e que recusou a profilaxia pós-exposição após ter entrado em contato com um herbívoro infectado pelo vírus da raiva, enfatizando que veterinários e/ou proprietários de animais que lidam com esses animais correm o risco de contrair a doença, pois, independentemente das espécies a que pertençam, os animais infectados eliminam o vírus em sua saliva durante as fases pré- sintomática e sintomática. Morcegos não hematófagos diagnosticados como positivos para a raiva não são raros, no Brasil, desde a década de 1930, cerca de 41 espécies de morcegos não hematófagos foram diagnosticadas com raiva. No Rio de Janeiro, entre os anos de 2001 e 2010, o laboratório da Unidade Jorge Vaitsman (UJV) recebeu 135 morcegos não hematófagos para o diagnóstico da raiva, onde 11 foram positivos para o vírus. A importância crescente destes morcegos como fator de risco para a transmissão da raiva deve ser alvo de maiores estudos, pois na maioria das vezes estes animais, quando doentes, são encontrados em locais não habituais, como por exemplo, no chão virando alvo fácil para o contato com cães, gatos e até mesmo para as pessoas (SOUZA; AMARAL; GITTI, 2014). Neste trabalho observamos cepa proveniente de Artibeus lituratus compatível com a VAg3, comumente encontrada e transmitida pelo morcego hematófago Desmodus rotundus, resultado que corrobora achados de outros estudos, como o realizado na cidade de Botucatu, São Paulo, em que espécies de morcegos hematófagos e não hematófagos dos mais variados gêneros têm apresentado a VAg3 (FAHL, 2009; MENOZZI, 2012). Assim como estudos realizados no Rio Grande do Sul, no qual foi detectado o vírus da raiva em morcegos frugívoros também da espécie Artibeus lituratus, e morcegos encontrados na região urbana do Município de Dois Irmãos, apresentaram RABV com características antigênicas e 56 genômicas semelhantes às características de amostras isoladas de morcegos hematófagos Desmodus rotundus (BATISTA, 2011). Outro estudo que corrobora o nosso é o de Menezes (2013), que detectou o RABV em morcegos não hematófagos provenientes do Rio do Grande do Norte. Este resultado não surpreende, uma vez que eventos de transmissão inter- espécie entre morcegos hematófagos e morcegos não hematófagos têm sido descritos (BATISTA, 2011). Este fato pode ser tranquilamente explicado pela possibilidade da transmissão entre diferentes espécies de morcegos, ideia que se torna plausível uma vez que diversas famílias de morcegos compartilham um mesmo abrigo, ou ainda, em função da capacidade de voo, percorrem grandes distâncias, compartilhando territórios, o que favorece a transmissão do RABV entre eles. Os morcegos Desmodus rotundus, por exemplo, utilizam muitos tipos de abrigos e podem dividir este espaço com outras espécies de morcegos, o que reforça a teoria da transmissão do vírus entre espécies de hospedeiros, tornando viável que variantes do RABV circulem ao longo de uma determinada área, fato este que permite sua identificação, pois são adaptadas e mantidas pelas diferentes espécies animais distribuídas regionalmente (FAHL, 2009; MENOZZI, 2012). Segundo Lucca (2013) os morcegos demonstram serem menos vulneráveis as degradações florestais do que outros mamíferos, devido a habilidade de se dispersar para ambientes peri-urbanos e urbanos, favorecendo o contato com humanos, animais domésticos e animais de produção. Os morcegos são importantes na manutenção do ciclo da raiva, uma vez que eles podem manter a infecção ao longo do tempo, podendo transmitir a doença a outros hospedeiros, isso pode ser enfatizado nos resultados apresentados no presente estudo, onde, as VAg3 obtidas, se alinham à linhagem do Desmodus rotundus, caracterizando este ciclo inter-espécies (MENOZZI, 2012). Segundo Santos (2016), a raiva transmitida por morcegos hematófagos apresenta aspectos epidemiológicos que estão associados às características geográficas e topográficas das áreas ocupadas por rebanhos e aos fatores que influenciam a ecologia dessa espécie de morcego. Barbosa (2007) identificou no cluster da VAg3 uma clade com amostras do Pará, subdivida em três subclades: I-a, I-b e I-c. Na subclade I-a foram agrupadas as cepas 57 provenientes das mesoregiões do Baixo Amazonas, Nordeste Paraense e Sudeste Paraense. A subclade I-b agrupa quatro cepas da mesoregião Nordeste Paraense e a A subclade I-c, relaciona-se com as cepas da mesorregião do Marajó. O mesmo não pode ser observado no presente trabalho, uma vez que não se identificou a formação dessas clades e subclades, onde, talvez, um estudo utilizando um bloco contendo amostras do Pará, como o utilizado no estudo anteriormente mencionado, possa viabilizar a obtenção desse tipo de agrupamento. O Pará possui condições climáticas e abrigos para manter as populações de morcegos, em relação à densidade do gado, o Estado do Pará é segundo maior produtor de gado da Região Norte do país, esses fatores, somados a urbanização desordenada contribuem para a ocorrência de raiva no Estado. A ocorrência de surtos na região da bacia Amazônica em 2004 e 2005, ocasionados por morcegos hematófagos, aumentou a ocorrência da doença acima dos níveis habituais nesta região. A predominância da transmissão da raiva por morcegos hematófagos na região da bacia Amazônica, fez com que o número de casos humanos transmitidos por cães e morcegos se tornasse equivalentes, o que difere do perfil de outras décadas, quando a maior proporção de casos de raiva humana era transmitida por cães. Esses dados enfatizam a mudança do ciclo epidemiológico da raiva (WADA; ROCHA; MAIA-ELKHOURY, 2011). A mesorregião do Sudeste Paraense possui vastas áreas de rebanho de gado, sendo a principal produtora de gado do Estado, entretanto, é caracterizada por baixas taxas de desmatamento. A presença de pastagens próxima a áreas florestais favorece o acesso de morcegos ao gado e, essas características da mesorregião se refletem nos resultados aqui obtidos, pois, o Sudeste Paraense apresentou o maior número de casos positivos e, onde, em herbívoros, detectou-se exclusivamente a VAg3 (ANDRADE et al., 2016). No Nordeste Paraense encontram-se algumas das principais áreas de desmatamento do Pará, especialmente na zona costeira que é um mosaico de manguezais próximo a paisagens antropogênicas e, esta mesorregião é a terceira maior produtora de gado do Estado. Os manguezais são considerados um ambiente importante para muitas espécies de mamíferos, incluindo morcegos, onde os riachos de maré e outras massas de água podem fornecer corredores de acesso, ligando diferentes habitats e, viabilizando a dispersão de morcegos 58 hematófagos, bem como, reforçando a adaptabilidade desta espécie a mudanças nas características do habitat. As características mencionadas acima reforçam os resultados deste estudo, onde, esta mesorregião obteve a segunda maior prevalência de casos de raiva em herbívoros, bem como, a maior prevalência de casos de raiva em morcegos, sendo em todos os casos positivos, identificada a VAg3, associada ao morcego hematófago Desmodus rotundus (IBGE, 2016; ANDRADE et al., 2016). No sudoeste do Estado, áreas de médio risco para bovinos estão mudando gradualmente para áreas de alto risco, com exceção de uma grande zona central que coincide exatamente com reservas indígenas e áreas de proteção ambiental. As evidências indicam um número baixo de casos de raiva em geral, e especialmente no Sudoeste Paraense, possivelmente porque os grandes rebanhos encontrados nessa região estão concentrados em um pequeno número de fazendas muito grandes, onde as autoridades de saúde pública e os proprietários de terras conduzem mais efetivamente a monitorização e controle das zoonoses (ANDRADE et al., 2016). As regiões do Baixo Amazonas e Marajó não obtiveram nenhum resultado positivo ao longo do período estudado, todavia, esses resultados não representam a ausência da doença, em vez disso, essa diferença entre as mesorregiões pode indicar áreas silenciosas em que a subnotificação provavelmente ocorre. A ampla distribuição geográfica do Desmodus rotundus e a livre circulação do vírus entre os morcegos são dois dos fatores que mais contribuem para a persistência da doença na Amazônia brasileira. A ocorrência de surtos em determinadas áreas também está relacionada diretamente ao desempenho das autoridades locais de saúde pública responsáveis pelo controle da doença. Na prática, o controle dessa zoonose é dependente da identificação dos chamados eventos sentinela, ou seja, a primeira morte, que normalmente ocorre em bovinos, onde, a entidade responsável pelo controle da raiva em humanos está envolvida. Porém, uma estratégia eficaz de prevenção seria baseada no monitoramento e controle da ocorrência de ataques por morcegos hematófagos em humanos e bovinos, principalmente nas zonas de alto risco, pois, permitiria a visualização da interação entre ataques de morcegos e variáveis associadas (ANDRADE et al., 2016). 59

A caracterização antigênica e genética possibilita documentar a mudança e/ou manutenção no ciclo epidemiológico da raiva no Estado do Pará. No trabalho de Barbosa (2007), observou-se que entre 2000 e 2004 no Estado do Pará, as espécies mais acometidas eram a canina, humana e felina. E em 2005 foi registrado um elevado número de casos de raiva em animais de produção e humanos, sendo identificada a VAg3 e, observou-se uma redução no número de casos transmitidos por cães e um aumento no número de casos transmitidos por morcegos. No presente trabalho, observou-se que as amostras sequenciadas alinharam com VAg3, e os resultados encontrados no Estado do Pará tem sido semelhante aos encontrados em outros Estados do Brasil e ao de outros países da América Latina, em que a variante associada ao Desmodus rotundus tem sido amplamente identificada. 60

7 CONCLUSÕES

Neste estudo podemos concluír:

• A distribuição temporal demonstra que houve um aumento do número de casos no ano de 2015, decaindo no ano de 2016, para então aumentar novamente em 2017, sugerindo possíveis falhas nas ações de controle e prevenção;

• Os focos de raiva em herbívoros estavam distribuídos nas messoregiões do Sudoeste, Nordeste, Sudeste Paraense e Metropolitana de Belém, onde, a maior ocorrência foi observada na mesorregião do Sudeste Paraense;

• Nos ciclos rural (herbívoros) e silvestre aéreo (quirópteros) a variante circulante é a VAg3, comumente isolada de morcegos hematófagos Desmodus rotundus.

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APÊNDICE A – Parecer de aprovação da Comissão de Ética no Uso de Animais (CEUA) do Instituto Evandro Chagas (IEC)

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APÊNDICE B – Lista de Amostras utilizadas neste estudo, positivas para raiva, por ano, espécie, município de origem e mesorregião (continua) N° Ano Espécie Registro Procedência Mesorregião 1 2010 Canina 33804 Marabá Sudeste 2 2010 Equina 34044 Ipixuna do Pará Nordeste 3 2010 Equina 34053 Ipixuna do Pará Nordeste 4 2011 Canina 34727 Marabá Sudeste 5 2011 Canina 34961 Marabá Sudeste 6 2011 Canina 35001 Marabá Sudeste 7 2011 Quiróptero 35010 Belém Metropolitana 8 2011 Canina 35164 Marabá Sudeste 9 2011 Canina 35165 Marabá Sudeste 10 2011 Felina 35392 Marabá Sudeste 11 2012 Quiróptero 36128 Tracuateua Nordeste 12 2012 Bovina 36370 Castanhal Metropolitana 13 2012 Equina 36458 Castanhal Metropolitana Eldorado dos 14 2014 Bovina 39964 Sudeste Carajás 15 2015 Bovina 40263 Ulianópolis Sudeste 16 2015 Equina 40269 Marabá Sudeste 17 2015 Equina 40354 Dom Eliseu Sudeste 18 2015 Bovina 40414 Paragominas Sudeste 19 2015 Bovina 40553 Ulianópolis Sudeste 20 2015 Bovina 40561 Ulianópolis Sudeste 21 2015 Bovina 40562 Bannach Sudeste 22 2015 Bovina 40654 Ulianópolis Sudeste 23 2015 Bovina 40899 Baião Nordeste 24 2015 Bovina 40900 Baião Nordeste 25 2015 Bovina 40901 Pacajá Sudoeste 26 2015 Equina 40902 Baião Nordeste Bom Jesus do 27 2015 Bovina 41138 Sudeste Tocantins 28 2015 Bovina 41142 Abel Figueiredo Sudeste 29 2015 Bovina 41181 Paragominas Sudeste 30 2015 Bovina 41188 Paragominas Sudeste São Domingos 31 2015 Bovina 41190 Sudeste do Araguaia 32 2015 Bovina 41193 Pacajá Sudoeste 33 2015 Bovina 41258 Paragominas Sudeste São Domingos 34 2015 Bovina 41263 Sudeste do Araguaia 35 2016 Equina 41652 Breu Branco Sudeste 71

(continuação) N° Ano Espécie Registro Procedência Mesorregião São Geraldo do 36 2016 Bovina 42286 Sudeste Araguaia 37 2016 Bovina 43003 Paragominas Sudeste 38 2016 Bovina 43004 Paragominas Sudeste 39 2016 Bovina 43055 Bragança Nordeste 40 2016 Equina 43135 Bragança Nordeste 41 2016 Bovina 43136 Curionópolis Sudeste 42 2016 Bovina 43195 Inhangapi Metropolitana Novo 43 2016 Bovina 43199 Sudeste Repartimento 44 2017 Bovina 43218 Bragança Nordeste 45 2017 Bovina 43219 Bragança Nordeste 46 2017 Equina 43299 Paragominas Sudeste 47 2017 Bovina 43349 Bragança Nordeste Conceição do 48 2017 Equina 43497 Sudeste Araguaia 49 2017 Equina 43566 Bragança Nordeste 50 2017 Quiróptero 43570 Belém Metropolitana 51 2017 Quiróptero 43595 Bragança Nordeste 52 2017 Bovina 43717 Bragança Nordeste Conceição do 53 2017 Equina 43794 Sudeste Araguaia 54 2017 Bovina 43795 Itupiranga Sudeste 55 2017 Bovina 43940 Ipixuna do Pará Nordeste 56 2017 Bovina 43946 Augusto Corrêa Nordeste 57 2017 Bovina 43958 Redenção Sudeste 58 2017 Quiróptero 43961 Augusto Corrêa Nordeste 59 2017 Bovina 43979 Ipixuna do Pará Nordeste 60 2017 Equina 44016 Bragança Nordeste 61 2017 Bovina 44028 Viseu Nordeste 62 2017 Bovina 44598 Ipixuna do Pará Nordeste 63 2017 Bovina 44605 Augusto Corrêa Nordeste 64 2017 Bovina 44700 Capitão Poço Nordeste Novo 65 2017 Bovina 44715 Sudeste Repartimento 66 2017 Bovina 44806 Paragominas Sudeste 67 2017 Bovina 44821 Ipixuna do Pará Nordeste 68 2017 Bovina 44822 Bragança Nordeste 69 2017 Bovina 44847 Paragominas Sudeste 72

(conclusão) N° Ano Espécie Registro Procedência Mesorregião 70 2017 Bovina 45064 Tomé-Açu Nordeste 71 2017 Bovina 45065 Tomé-Açu Nordeste 72 2017 Bovina 45070 Ipixuna do Pará Nordeste Goianésia do 73 2017 Bovina 45135 Sudeste Pará

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APÊNDICE C – Taxas de relações evolutivas

A história evolutiva foi inferida usando o método Neighbor-Joining (Saitou & Nei, 1987). A árvore ótima foi gerada a partir da soma do comprimento do ramo = 0,86211519. A porcentagem de árvores replicadas em que a taxa associada é agrupada no teste de bootstrap (1000 réplicas), sendo mostrada ao lado dos ramos (Felsenstein, 1985). A árvore é desenhada em escala, com comprimentos de ramos nas mesmas unidades das distâncias evolutivas usadas para inferir a árvore filogenética. As distâncias evolutivas foram calculadas usando o método da distância p (Nei e Kumar, 2000) e estão em unidades do número de diferenças de bases por local. A análise envolveu 46 sequências nucleotídicas. As posições dos códons incluídas foram 1º + 2º + 3º + Não codificável. Todas as posições contendo lacunas e dados perdidos foram eliminadas. Houve um total de 425 posições no conjunto de dados final. Análises evolutivas foram conduzidas no MEGA6 (Tamura et al, 2016).