UNIVERSIDADE VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI Centro de Educação do Balneário Camboriú Mestrado Acadêmico em Turismo e Hotelaria

FELIPE DE SOUZA SIQUEIRA

ARACATI/CE: DAS CHARQUEADAS AO POLO TURÍSTICO DE CANOA QUEBRADA

Balneário do Camboriú 2013 Felipe de Souza Siqueira

ARACATI/CE: DAS CHARQUEADAS AO POLO TURÍSTICO DE CANOA QUEBRADA

Dissertação apresentada ao programa de Pós- Graduação Stricto Sensu em Turismo e Hotelaria, da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do titulo de Mestre em Turismo e Hotelaria.

Orientadora: Dra. Raquel Maria Fontes do Amaral Pereira.

Balneário do Camboriú 2013

Folha reservada para a Ficha catalográfica.

ARACATI/CE: DAS CHARQUEADAS AO POLO TURÍSTICO DE CANOA QUEBRADA

Dissertação submetida ao programa de Pós-Graduação em Turismo e Hotelaria da Universidade do Vale do Itajaí, como requisito para obtenção de grau de Mestre.

Balneário Camboriú, 27 de agosto de 2013.

BANCA EXAMINADORA

______Profa. Dra. Raquel Maria Fontes do Amaral Pereira Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI (Orientadora)

______Prof. Dr. Paulo dos Santos Pires Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI (Examinador)

______Profa. Dra. Adriana Marques Rossetto Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC (Examinador)

À minha mãe, pelo apoio e dedicação durante minha vida, que Deus a tenha.

AGRADECIMENTOS

Escrever uma dissertação não é tarefa fácil nem corriqueira, principalmente quando se tem que dar conta de casa, trabalho e filho; pois você dedica boa parte do seu tempo à pesquisa, exigindo muita concentração e momentos solitários.

Agradecer a todos que colaboraram com esta obra é uma tarefa difícil, pois com certeza deixarei de mencionar alguém e acabarei cometendo alguma injustiça. Por isso, gostaria de agradecer a todos que compartilharam comigo momentos pessoais e profissionais, pois todos de alguma forma contribuíram e me ajudaram a chegar ao final dessa trajetória. A Deus, pois o que seria de mim sem a fé que eu tenho nele, que colocou pessoas certas em meu caminho, me conduzindo em diferentes etapas da minha vida.

À minha mãe, pessoa muito especial, que sem ela jamais teria chegado aqui e que Deus a tenha, pois no meio desta jornada ela nos deixar. À minha esposa, Débora Urano, que muito me ajudou neste trabalho. Ao meu filho, Noah Gabriel, que é fonte de luz em minha vida e inspiração. E a toda minha família que, com muito carinho e apoio, não mediu esforços para que eu chegasse até esta etapa de minha vida, principalmente meus irmãos Rita, Karla, Cristina e Zino.

À professora e minha orientadora Raquel Fontes do A. Pereira, pela paciência na orientação e por incentivos que tornaram possível a conclusão desta dissertação e por seu apoio e inspiração no amadurecimento dos meus conhecimentos pela sua força e dedicação que foram essenciais para a conclusão desta pesquisa.

Ao professor e coordenador do Curso de Mestrado em Turismo e Hotelaria, Francisco do Anjos, pelo convívio, apoio, pela compreensão, pelos ensinamentos, pela amizade.

A todos os professores do Mestrado em Turismo e Hotelaria da UNIVALI, em especial, ao Josemar pelas suas reflexões filosóficas; Yolanda, pelo seu conhecimento acadêmico, Paulo Pires, que muito estimula os alunos do mestrado à pesquisa e ao estudo e que sempre tinha um tempinho para me escutar; Doris Ruschmann, pelo seu amplo conhecimento e experiência no turismo, que foram tão importantes para a minha vida acadêmica.

À Márcia e Núbia secretárias do programa de Mestrado em Turismo e Hotelaria, pela paciência e apoio recebido durante esses anos.

À equipe da Escola Estadual de Educação Profissional do Aracati sempre muito pacientes e compreensivos quando eu tinha que me ausentar, em especial a todos do núcleo gestor e aos amigos professores da SEDUC e do CENTEC.

Aos meus amigos do Mestrado em Turismo da UNIVALI, que sempre me ensinaram e incentivaram, em especial, Leia Pacheco, Sâmea Beatriz, Lú Imes, Katarzyna Bortnowska, Sérgio Winkert, Leana Bernardi, entre muitos outros, pelo apoio constante e ajudas nos trabalhos acadêmicos.

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“Não é a consciência do homem que lhe determina o ser, mas, ao contrário, o seu ser social que lhe determina a consciência.”

Karl Marx

RESUMO

O estudo realizou uma análise das origens da formação sócio-espacial da faixa litorânea do , destacando, especialmente, o município de Aracati e sua evolução, enfocando as transformações socioeconômicas que foram alterando o seu desenvolvimento até os dias atuais. Aracati, município litorâneo do estado do Ceará, sobressaiu-se no passado como centro de charqueadas e, mais recentemente, destaca-se como destino turístico, devido à atratividade da praia de Canoa Quebrada. Como fundamento teórico a pesquisa recorreu ao paradigma de formação sócio-espacial proposto por Milton Santos, que permite considerar a relação dialética entre espaço e sociedade, buscando identificar aspectos naturais e humanos que acabaram por determinar diferentes ciclos sócio-econômicos ao longo do processo histórico. O trabalho tem início com a discussão da gênese da ocupação do litoral do nordeste brasileiro, em especial com a ocupação do litoral cearense para uma maior compreensão de sua dinâmica atual. Foram utilizadas referências de autores nacionais e cearenses voltados para a análise da realidade do país e do Ceará, bem como de estudiosos do fenômeno do turismo no estado. A pesquisa bibliográfica, somada aos dados empíricos coletados acerca do turismo em Canoa Quebrada e aliada ao referencial teórico adotado, permitiu analisar o desenvolvimento das atividades ligadas ao turismo no estado do Ceará, principalmente na zona costeira e particularmente em Aracati, visando à compreensão da realidade objeto da investigação no contexto atual. Foi possível, através do estudo, analisar a gênese da formação sócio-espacial do litoral cearense e da cidade de Aracati, bem como as diferentes etapas de sua evolução urbana e da atividade turística, identificando os elementos responsáveis por essa expansão e as principais características dessa dinâmica que promoveu grandes transformações sócio-espaciais em Canoa Quebrada.

Palavras-chaves: FORMAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL; LITORAL DO CEARÁ; ARACATI; GÊNESE E TRANSFORMAÇÕES DO TURISMO.

ABSTRACT

The study made an analysis of the origins of the socio-spatial formation of Ceará's coastal zone, highlighting, especially, the city of Aracati and its evolution, focusing on the socio-economic transformations that have changed its development until the current days. Aracati, coastal city in the state of Ceará, excelled in the past as a center of charqueadas and, mre recently, it stands out as a tourist destination, because of the attractiveness of Canoa Quebrada beach. As a theoretical framework, the research used the paradigm of socio-spatial formation proposed by Milton Santos, which allows considering the dialectical relationship between space and society, seeking to identify the natural and human aspects that ultimately determines different socio-economic cycles throughout the historical process. The paper begins with a discussion about the genesis of the occupation of Brazilian northeast coast, especially about the occupation of Ceará's coast, for a greater understanding of its current dynamic. It was used references of national authors and authors from Ceará, for the analysis of the reality of the country and the state of Ceará, as well as scholars of the phenomenon of tourism in the state. The bibliographic research, added to the empirical data collected about tourism in Canoa Quebrada, and allied to the theoretical frame of reference adopted, allowed to analyze the development of activities related to tourism in the state of Ceará, especially in the coastal zone and, particularly, in Aracati, in order to understand the reality object of the investigation in the current context. It was possible, through this study, to analyze the genesis of the socio-spatial formation of the coast of Ceará and the city of Aracati, as well as the different stages of the urban evolution and the different stages of the tourist activities, identifying the elements which were responsible for this expansion and the main features of this dynamic that promote great socio-spatial transformations in Canoa Quebrada.

Keywords: SOCIO-SPATIAL FORMATION, COAST OF CEARÁ; ARACATI; GENESIS AND TRANSFORMATION OF TOURISM.

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Município de Aracati ...... 26 Figura 2 - Sistema rodoviário de Aracati: com destaque para a BR 303 ...... 27 Figura 3 - Vista aérea do aeroporto regional do Aracati ...... 28 Figura 4 - Praia Lagoa do Mato ...... 31 Figura 5 - Majorlândia ...... 32 Figura 6 – Praia da Quixaba ...... 33 Figura 7 - Praia do Cumbe ...... 33 Figura 8 - Praia da Fontainha ...... 34

Figura 9 - Cheia na Rua Grande ...... 38 Figura 10 - Bloco Chico de Jane anos 1960 ...... 40 Figura 11- Casarões da Rua Grande ...... 41 Figura 12 - Rua Grande ...... 41 Figura 13 - Casarão na Rua Grande ...... 42 Figura 14 - Casa de Adolfo Caminha na Rua Grande ...... 42 Figura 15 - Penetração do gado no sertão ...... 62 Figura 16 - Estradas do Siará Grande ...... 63 Figura 17 - Fabrica Santa Tereza ...... 66 Figura 18 - Exploração do sal nas salinas em Aracati ...... 69 Figura 19- Carnaubeira na entrada de Aracati ...... 71 Figura 20 - Artesanato da folha de carnaúba ...... 72 Figura 21 - Cavalinho Petrobras ...... 74 Figura 22 - Localização poço Canoa Quebrada ...... 75 Figura 23 - Usina eólica Canoa Quebrada ...... 76 Figura 24 – Litoral cearense Prodetur/CE ...... 86 Figura 25- Centro de Eventos do Ceará ...... 89 Figura 26 – Construção do Acquario ...... 89 Figura 27 – Aquário do Ceará ...... 89 Figura 28 - Rodovias de acesso à Canoa Quebrada...... 94 Figura 29 - Possível localização presidio Canoa Quebrada ...... 96 Figura 30 – Rua sem alimento e calçada ...... 102 Figura 31 – Típico beco de Canoa Quebrada ...... 102

Figura 32 - Imagem do traçado urbano de Canoa Quebrada ...... 103 Figura 33 - Foto aérea de Canoa Quebrada, 1986 ...... 105 Figura 34 - Foto aérea Canoa Quebrada, 1996 ...... 105 Figura 35 - Foto aérea Canoa Quebrada, 2006 ...... 106 Figura 36 - Foto aérea Canoa Quebrada, 2013 ...... 106 Figura 37 - Foto aérea APA de Canoa Quebrada (sem escala) ...... 108 Figura 38 - Pousada Maria Alice (2013) ...... 113 Figura 39 - Casa do gerador 1983 ...... 113 Figura 40 - Pousada dona Diva (Broadway) ...... 114 Figura 41 - Pousada Lua Morena (2012) ...... 115 Figura 42 - Pousada Lua Morena (1984) ...... 115 Figura 43 - Pousada Latitude ...... 116 Figura 44 - Localização das pousadas-décadas de 1970 / 80 ...... 116 Figura 45 - Hotel Tropicália ...... 118 Figura 46 - Pousada do Toby ...... 118 Figura 47- Hotel Falésia ...... 119 Figura 48 - Vista Aérea do Resort Porto Canoa ...... 120 Figura 49- Entrada Porto Canoa ...... 120 Figura 50- Entrada Porto Canoa ...... 120 Figura 51 - Pousada Sete Mares Piscina ...... 122 Figura 52 - Sete Mares Chalés ...... 122 Figura 53 - Hotel Long Beach ...... 123 Figura 54 - Área piscina Long Beach ...... 123 Figura 55 - Construção da pousada Aruanã - 2004 ...... 124 Figura 56 - Pousada Aruanã - 2010 ...... 124

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - População residente no Município de Aracati ...... 36

Tabela 2 - Evolução das sesmarias na Ribeira do ...... 50 Tabela 3 - Quantidade de algodão exportado pelo Ceará, em 1795 (em quilos) ...... 64 Tabela 4 - Participação dos Produtos na Exportação do Ceará ...... 65 Tabela 5 - Fiações e tecelagem cearense em 1901 ...... 67 Tabela 6 - Indústrias do Algodão - ano de 1919 ...... 67 Tabela 7 - Exportação - Setores emergentes - 2011 ...... 70 Tabela 8 - Setor hoteleiro de Canoa Quebrada...... 125 Tabela 9 - Evolução da Hotelaria de Canoa Quebrada ...... 128

LISTA DE QUADRO

Quadro 1 - Evolução Política do município de Aracati ...... 55

Quadro 2- Políticas Públicas de Turismo no Brasil: velhos e novos paradigmas ...... 87

Quadro 3 - Investimentos hoteleiros programados para o Estado do Ceará ...... 91

Quadro 4 - Pousadas da década de 1990 ...... 121

LISTA DE ABREVIATURA E SIGLAS

APA – Área de Proteção Ambiental

BNB- Banco do Nordeste do Brasil

BNH – Banco Nacional de Habitação

CAGECE – Companhia de Água e Esgoto do Ceará

CHESF - Companhia Hidroelétrica do São Francisco

COELCE – Companhia Energética do Ceará

COHAB – Companhia de Habitação

EMBRATUR – Empresa Brasileira de Turismo

EMCETUR – Empresa Cearense de Turismo

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IPECE - Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará

IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

MTUR – Mistério do Turismo

OMT – Organização Mundial de Turismo

PMA – Prefeitura Municipal de Aracati

PRODETUR - Programa de Ação para o Desenvolvimento do Turismo

SETUR – Secretaria de Turismo

WIC - Companhia Neerlandesa das Índias Ocidentais

SUMÁRIO

LISTA DE ILUSTRAÇÕES ...... 11

LISTA DE TABELAS ...... 13

LISTA DE QUADRO ...... 14

SUMÁRIO ...... 16

INTRODUÇÂO ...... 17

2. GÊNESE E EVOLUÇÃO DA FORMAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL DO LITORAL DO CEARÁ...... 25

2.1 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO DE ARACATI...... 25

2.2 ARACATI NO CONTEXTO NACIONAL E REGIONAL ...... 34

2.3. ARACATI TERRA DE FILHOS ILUSTRES ...... 43

2.4 A OCUPAÇÃO DO LITORAL NORDESTINO NO BRASIL COLONIAL...... 43

2.5 OS PRIMÓRDIOS DA OCUPAÇÃO DO CEARÁ ...... 48

2.6 EVOLUÇÃO POLÍTICA E ECONÔMICA DO MUNICÍPIO DE ARACATI...... 55

3. TURISMO E TRANSFORMAÇÕESSÓCIO-ESPACIAIS NO LITORAL CEARENSE ...... 78

3.1 A OCUPAÇÃO TURÍSTICA LITORAL CEARENSE ...... 78

3.2 POLÍTICAS PÚBLICAS DE TURISMO NO CEARÁ...... 90

4. A PRAIA DE CANOA QUEBRADA ...... 94

4.1 OCUPAÇÃO DO ESPAÇO DE CANOA QUEBRADA ...... 94

4.2 REFLEXOS DA ATIVIDADE TURÍSTICA NA ORGANIZAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL DE CANOA QUEBRADA ...... 110

4.2 EVOLUÇÃO DA HOTELARIA EM CANOA QUEBRADA...... 112

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...... 130

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...... 134

ANEXOS ...... 140

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INTRODUÇÂO

O tema dessa pesquisa, Aracati/CE: das charqueadas ao polo turístico de Canoa Quebrada, está atrelado a alguns questionamentos levantados acerca das mudanças sócio-espaciais que vêm se processando no território da Praia de Canoa Quebrada, no município de Aracati, localizado no litoral Leste do Estado do Ceará, em face da expansão do turismo, a partir da década de 1970 até os dias atuais. Trata-se, portanto, de uma investigação científica que aborda as origens do município de Aracati, e as diferentes fases de sua evolução sócio-econômica, ligadas a várias atividades até tornar-se um destino turístico.

Partindo deste contexto, a pesquisa procurou perceber as transformações geradas no território correspondente ao município de Aracati decorrentes da expansão urbana e do crescimento de diferentes atividades econômicas ao longo de diferentes períodos de sua história, bem como seus reflexos sobre o desenvolvimento do município, até o surgimento do polo turístico de Canoa Quebrada. No desenvolvimento do estudo, o espaço urbano foi apresentado como fruto de relações historicamente determinadas, em que o processo de produção é ao mesmo tempo histórico e social.

O trabalho teve como objetivo geral analisar as origens de Aracati e sua evolução histórica, interpretando sua trajetória, das charqueadas à constituição do polo turístico de Canoa Quebrada,

Para alcançar esse objetivo geral, foram traçados os seguintes objetivos específicos:

 Compreender a gênese da formação sócio-espacial do litoral do Ceará e, em particular, do município de Aracati;

 Identificar os principais ciclos econômicos de Aracati seus impactos, conflitos e resistências.

 Identificar o início da ocupação de Canoa Quebrada enquanto espaço turístico e de lazer.

 Caracterizar o setor hoteleiro de Canoa Quebrada.

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 Levantar as principais modificações introduzidas na organização sócio-espacial de Canoa Quebrada, a partir das transformações provocadas pela expansão do turismo.

O interesse em estudar a formação sócio-econômica do litoral leste do Ceará e, em particular, de Aracati das charqueadas até o surgimento e evolução do polo turístico de Canoa Quebrada, está relacionado à intenção de conhecer a sociedade local na sua totalidade e nas suas frações, a partir do entendimento de que existe uma relação dialética entre os vários elementos que constituem essa realidade, sejam eles de ordem natural ou humana.

Para o conhecimento da realidade concreta recorreu-se à aplicação do paradigma de formação sócio-espacial que se insere numa perspectiva teórica marxista que favorece o resgate da categoria espaço no interior do materialismo histórico-dialético, abrindo novas e importantes possibilidades de explicação de realidades concretas. A abordagem científica da temática proposta leva em consideração a relação dialética entre os elementos naturais e humanos em diferentes escalas: mundial, nacional, regional e local.

No desenvolvimento da temática foram analisadas a evolução sócio- econômica e as alterações ocorridas no espaço de Canoa Quebrada, inserido no contexto do desenvolvimento do turismo no litoral do Ceará, buscando definir as principais modificações introduzidas em sua organização sócio-espacial ao longo do tempo.

O trabalho está voltado, portanto, para a análise da atividade turística em Canoa Quebrada, sua expansão e as transformações decorrentes do crescimento urbano e dos fluxos turísticos, bem como do setor hoteleiro, o que exigiu a identificação das iniciativas pioneiras e sua relação com o crescimento das atividades ligadas ao turismo naquela localidade.

Deste modo, a tarefa de analisar as alterações geradas no espaço da Praia de Canoa Quebrada foi realizada numa perspectiva evolutiva que permitiu estabelecer um quadro geral de todo o processo, desde as suas origens até a sua consolidação como um polo turístico, o que exigiu o estabelecimento de relações entre a realidade local e um contexto maior, capaz de permitir uma análise que

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transcendesse o seu próprio espaço urbano, considerando elementos explicativos situados em diferentes escalas: local, regional, nacional e internacional.

Essa abordagem levou ao estudo da formação sócio-espacial cearense através da divisão e do uso do espaço fundiário para a pecuária, verificando os primeiros criadores de gado que foram gradativamente expulsando os habitantes nativos e definindo a produção de um novo espaço até as atividades econômicas mais destacadas que foram se consolidando, no decorrer do século XVIII, nas margens de dois importantes rios cearenses (Jaguaribe e Acaraú), os quais influenciaram o povoamento e a colonização de grandes extensões de terra, dando origem às primeiras vilas.

Os portos de Aracati e foram elementos primordiais na gênese da colonização e povoamento do Ceará, servindo de atracadouro para as embarcações e para o escoamento de mercadorias, com destaque para o charque. A expansão da atividade portuária resultou na demanda por infraestrutura de apoio, para atender os que chegavam à cidade, bem como ao desembarque de mercadorias negociadas no comércio local.

A necessidade de atender ao fluxo crescente de pessoas e de mercadorias acabou estimulando a instalação de novos serviços urbanos. Assim, ao lado das edificações que começaram a surgir para o atendimento dessa demanda, espaços residenciais, utilizados inicialmente apenas pela comunidade local, foram paulatinamente sendo transformados em áreas para prestação de serviços, ligados às atividades comerciais

Assim, a partir dos grandes marcos da história nacional, foi definida uma periodização em que se procurou apreender as relações sócio-econômicas dominantes, identificando o papel destas na organização sócio-espacial da região, tendo em mente que o presente é o resultado de distintas fases do passado. A partir do ciclo da charqueadas, buscou-se entender as relações socioeconômicas dominantes, identificando o papel destas na organização do espaço de Aracati.

Portanto, Aracati, tal como o estado do Ceará, foi marcado desde as suas origens por diversos ciclos econômicos. A criação e o comércio do gado marcaram o primeiro ciclo econômico da região dos aracatienses, passando pelo ciclo do algodão, sal, carnaúba e mais recentemente, pela exploração do petróleo, parque

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eólicos, além do desenvolvimento de fazendas de camarão e da atividade turística, o que propiciou, nas últimas décadas, uma diversificação de sua economia.

Deste modo, a organização do espaço correspondente ao núcleo urbano de Aracati vem se defrontando na atualidade com mudanças impostas pelo crescimento da própria cidade e de atividades ligadas ao setor turístico, reflexo de uma realidade gerada por novas estruturas sócio-econômicas e políticas. A agricultura, a pecuária e outras atividades do setor primário que ocupavam um número maior de pessoas e de recursos foram substituídas pelos novos negócios estimulados pela expansão capitalista que fez emergir com maior destaque o lazer, o turismo e os serviços a eles vinculados, a partir dos anos 90 do século passado. As praias de Jericoacoara, na porção oeste e Canoa Quebrada, no litoral leste do Ceará ganharam notoriedade como destinos turísticos. Assim é que o município de Aracati, em especial a sua orla litorânea, passa a ter destaque como território de lazer e turismo, o que promove uma intensa ocupação e a conseqüente especulação imobiliária.

Levando-se em conta as idéias acima apresentadas, tornou-se necessário resgatar o processo de desenvolvimento econômico e urbano de Aracati, inserida no contexto nacional, considerando os elementos espaciais propostos por Milton Santos: os homens, as firmas, as instituições, o chamado meio ecológico e a infraestrutura. Antes de tudo, porém, é preciso lembrar que a organização espacial de Aracati foi influenciada, desde as suas origens, por sua localização estratégica no litoral nordestino e pelo fato de ter sido a principal cidade portuária do Ceará no século XVII, com ligação direta com Recife, sede da capitania.

No desenvolvimento do estudo, a configuração do espaço litorâneo foi interpretado como um produto de relações sociais situadas ao longo do tempo. A relação dialética entre a sociedade e as características naturais da faixa litorânea do Ceará e, em particular, do município de Aracati, confirmam a citação de Santos (1977), segundo a qual “a História não se escreve fora do espaço e não há sociedade a-espacial. O espaço, ele mesmo, é social”, o que significa considerar as características físicas do espaço onde se constituiu a cidade e a história da sociedade que aí se implantou

A proposta teórico-metodológica encontrou apoio na categoria de formação econômico-social ou formação social, de origem marxista, como conceito fundamental para a apreensão de uma realidade concreta, em sua totalidade

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histórico-espacial. Entretanto, para um melhor entendimento da evolução das atividades econômicas, fez-se uso também da teoria dos Ciclos Longos ou Ciclos de Kondratieff que caracterizam o desenvolvimento do capitalismo. Com duração aproximada de 50 anos, os ciclos são emanados pelos países do centro do sistema capitalista exercendo influência também sobre os países localizados na periferia desse sistema. Eles se caracterizam pela existência de fases de expansão, seguidas por períodos de crise da economia mundial, durante os quais são gestadas mudanças tecnológicas que permitem uma nova etapa de crescimento econômico. Esse comportamento cíclico da economia tem reflexos no desenvolvimento dos países de capitalismo tardio, como é o caso do Brasil, cuja economia responde positivamente aos períodos de expansão acompanhando o crescimento da economia mundial, bem como nos períodos de crise produzindo para o abastecimento do mercado interno, substituindo importações.

Ao analisar os ciclos econômicos, percebe-se que eles exerceram um papel fundamental no desenvolvimento da formação brasileira, bem como das distintas regiões do país. O comportamento cíclico da economia capitalista constitui um elemento importante para o entendimento das grandes mudanças na estrutura econômica do Brasil, do Ceará e de Aracati. A introdução e expansão do ciclo do gado estimularam o surgimento de um mercado interno ligado à produção açucareira pernambucana, dando origem ao comércio de importação e exportação que, por sua vez, deu origem também às camadas sociais cearenses mais abastadas (a burguesia).

A evolução econômico-social propiciada pelo ciclo do gado na vila de Aracati gerou uma nova demanda por trabalhadores que resultou num aumento da população local. São visíveis ainda hoje as transformações urbanas, sobretudo no núcleo central, onde aos poucos foi surgindo o casario dos barões das charqueadas. Houve, igualmente, uma divisão de classes entre os possuidores dos meios de produção (a classe capitalista) e a mão de obra assalariada que não detinha os meios de produção, representando a classe trabalhadora.

Tendo em vista que a presente pesquisa tem como ponto de partida o entendimento de que as relações sociais dominantes em cada época, estão em íntima relação com as condições naturais do espaço no qual se instala uma determinada sociedade, o que permite reconhecer a relação dialética entre o homem

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e a natureza. Portanto, a pesquisa desenvolvida pode ser caracterizada como histórica e explicativa, pois exigiu a realização de pesquisas bibliográficas e de campo.

A investigação da realidade empírica enfocada apoiou-se, por um lado, em concepções teóricas, mas por outro exigiu um levantamento de dados que permitissem descrever e interpretar as diferentes etapas da evolução urbana e da atividade turística em Aracati, identificando os elementos responsáveis por essa expansão, as principais características dessa dinâmica e o desenvolvimento da atividade turística no litoral do Ceará, relacionando-o ao desenvolvimento de Canoa Quebrada, caracterizando, por fim, o setor turístico local.

Por se tratar de uma pesquisa com sustentação histórica, a etapa da coleta de dados, segundo Richardson, (1999, p. 206), exigiu a responsabilidade do pesquisador em buscar as informações disponíveis sobre o tema, bem como novas fontes, capazes de ampliar o conhecimento, contribuindo para o aprofundamento da análise. Quanto à pesquisa qualitativa nas ciências sociais, o trabalho de campo representa uma possibilidade de aproximação com aquilo que se deseja conhecer.

No que tange às técnicas e aos métodos de pesquisa, este trabalho desenvolveu-se através de pesquisa qualitativa, por sua utilidade como suporte para o pesquisador na apreensão da complexidade do tema investigado, permitindo assim, “compreender e classificar processos dinâmicos vividos por grupos sociais e possibilitar, em maior nível de profundidade, o entendimento das particularidades do comportamento dos indivíduos” (RICHARDSON, 1999, p. 43). A pesquisa qualitativa permite a aquisição de um conhecimento mais denso de casos específicos, sendo a mais utilizada nas ciências sociais.

Assim, para assegurar o êxito dos propósitos traçados para esse estudo, optou-se pela realização de uma pesquisa histórica e exploratória, de abordagem qualitativa. Segundo Gil (2002), a pesquisa exploratória proporciona maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a construir hipóteses. O seu planejamento é muito flexível, o que possibilita a consideração dos mais variados aspectos relacionados ao fato estudado.

Na fase inicial do trabalho, foi realizada pesquisa bibliográfica e levantamento de dados junto aos órgãos públicos Instituto de Pesquisa e Estratégia

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Econômica do Ceará (IPCE) e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na busca de informações históricas sobre as origens e evolução da cidade de Aracati. Foi igualmente consultado o acervo da Biblioteca Pública do estado do Ceará e do Instituto do Ceará, bem como o das bibliotecas de Universidades e Faculdades, entre as quais a da Universidade Federal do Ceará - UFC; da Universidade Estadual do Ceará- UECE, Universidade de Fortaleza - UNIFOR e da Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI.

Na segunda etapa, a investigação concentrou-se na pesquisa bibliográfica, através da leitura de obras relacionadas à evolução da formação sócio-espacial e da história do Ceará e à área do turismo, como forma de reunir não apenas informações específicas sobre o litoral cearense, mas também de embasar conceitualmente a pesquisa através da definição de termos e categorias analíticas para dar suporte ao trabalho. O acesso e a consulta de diferentes livros, artigos científicos, dissertações e projetos, bem como ao material disponível na internet permitiu a fundamentação teórica do trabalho, assim como a definição de resultados e conclusões.

A terceira etapa da investigação concentrou-se especificamente em entrevistas com algumas pessoas, como historialistas da região de Aracati e Canoa Quebrada e moradores antigos de Canoa Quebrada. No decorrer da pesquisa, visando à coleta de mais informações, foram também realizadas visitas técnicas aos 30 meios de hospedagem em funcionamento na atualidade, no polo turístico de Canoa Quebrada.

Ainda com o intuito de obter mais informações, foram feitas também visitas ao museu Jaguaribano, bem como pesquisa em fotos antigas, artigos e anúncios dos jornais de época (XVIII até XXI) para formar um quadro mais claro das diferentes etapas da evolução do município de Aracati.

A estrutura do presente trabalho é constituída, além da introdução por três capítulos, sendo que o primeiro deles apresenta uma análise geral da formação sócio-espacial de Aracati, abordando a gênese de seu povoamento marcado pela chegada do gado no sertão cearense, o desenvolvimento da atividade pecuária, a consolidação do latifúndio pastoril e as transformações socioeconômicas desencadeadas pela indústria do algodão e os demais ciclos econômicos. O segundo capítulo tem foco na dinâmica do turismo no litoral do Ceará e as

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transformações espaciais decorrentes do desenvolvimento da atividade turística nesse espaço. Já o terceiro e último capítulo aborda, a partir de informações levantadas através de visitas in loco, a evolução da atividade turística circunscrita ao polo turístico de Canoa Quebrada, mostrando as transformações pelas quais vêm passando essa comunidade por conta do crescimento do turismo nas últimas décadas e as principais iniciativas relacionadas aos meios de hospedagem de Canoa Quebrada.

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2. GÊNESE E EVOLUÇÃO DA FORMAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL DO LITORAL DO CEARÁ.

2.1 Caracterização da área de estudo de Aracati.

O munícipio de Aracati – CE possui uma área de 1.247,301 km² e está situado na região denominada litoral-leste, a 156 km da capital, Fortaleza. Possui uma altitude média de 5 metros. Segundo os dados estimados do IBGE para 2011, a população total da cidade era de 69.771 habitantes, conforme projeções do último censo, realizado em 2010.

Localizada no litoral leste, região de grande fluxo turístico do estado, banhada pelas águas do Oceano Atlântico e pelas águas do Rio Jaguaribe1, Aracati faz limite ao norte com o Oceano Atlântico; ao sul, com os municípios de Itaiçaba, e ; a leste, com o estado do Rio Grande do Norte e o município de Icapuí; e a oeste, com os municípios de e , conforme demonstra a Figura 1.

Aracati tem como principal via de acesso a CE 040, rodovia estadual de caráter radial que liga a capital, Fortaleza, sendo a principal via turística do litoral que corta os principais municípios deste litoral. Nela trafegam carros de pequeno e médio porte; carretas só são permitidas quando vão fazer alguma entrega em umas das cidades do litoral. Outra forma de acesso se dá pelo sertão, através da BR 304, que interliga a BR 116 à BR 101, que permite acessar o município de Aracati, bem como chegar à capital e ao interior do estado, além dos municípios de Mossoró e Natal, no Rio Grande do Norte. Cabe salientar, ainda, que essa rodovia é responsável pela maior parte do transporte de carga entre o estado do Ceará e o Rio Grande do Norte, assim como para Pernambuco e Paraíba. Para uma melhor compreensão, Observe a figura 2.

1 Fonte bibliográfica inválida especificada.. A Bacia hidrográfica do rio Jaguaribe é a maior e a mais importante bacia do Ceará, ocupando aproximadamente 48% do território cearense. O rio Jaguaribe apresenta o maior volume de água no estado e é responsável pelo abastecimento de grande parte da população cearense. Além disso, existem vários projetos públicos e privados de irrigação que se utilizam das águas do rio Jaguaribe. Dada a sua extensão, a bacia apresenta acentuada variação litológica, morfológica, climática, pedagógica, de vegetação e de uso e ocupação. (ZANELLA, 2007)

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Figura 1 - Município de Aracati Fonte: Google Maps (2013)

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Figura 2 - Sistema rodoviário de Aracati: com destaque para a BR 303 Fonte: Google Maps, adaptada pelo autor (2013)

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Quanto à infraestrutura de transporte, Aracati conta com um aeroporto inaugurado em 2011, que pode ser observado na figura 3, com uma pista de pouso e decolagem com 1.800 metros de comprimento. Batizado de Aeroporto Dragão do Mar, o terminal de Aracati foi projetado para receber aviões de grande porte, que normalmente operam em voos internacionais e recebeu em investimentos do Ministério do Turismo e Tesouro do Estado, R$ 23.746.467,94 na pista de pouso, área de taxiamento e hangares. Também irá funcionar no aeroporto de Aracati, o Centro de Tecnologia, Manutenção e Comercialização de Aeronaves e Prestação de Serviços Aeronáuticos da TAM Aviação Executiva. Este centro vai receber investimentos de R$ 26 milhões - sendo R$ 13 milhões em incentivos fiscais estatais - e empregar diretamente 150 pessoas na assistência técnica de aeronaves, helicópteros e jatos executivos, e deve ficar pronto em junho de 2014. Está previsto, em contrato, a priorização dos trabalhadores locais na contratação da mão de obra, introdução de tecnologia e formação de trabalhadores para o setor aéreo conforme Governo do estado do Ceará (CEARÁ, 2013).

Figura 3 - Vista aérea do aeroporto regional do Aracati Fonte: Google Maps (2013)

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O município conta ainda com uma rodoviária na qual operam três empresas, duas interestaduais e uma intermunicipal. O transporte coletivo do munícipio é praticamente feito pelos veículos alternativos ou “paus-de-arara2”.

Atualmente, sua economia baseia-se na agricultura, no cultivo do caju, cana- de-açúcar, mandioca, milho, feijão; na maricultura, criação de camarões em cativeiro; e na agropecuária, com criações bovinas, suínas e avícolas. O sal e a extração mineral de argila são outras importantes fontes de renda do município. O turismo é a principal fonte de renda, seja em serviços de alimentação ou de hospedagem, seja na produção e comércio de artigos artesanais, impulsionado, principalmente, pela praia de Canoa Quebrada, conhecida internacionalmente como paraíso dos hippies nos anos 70.

No que se refere aos aspectos ambientais, o município é caracterizado pelo clima tropical quente, semiárido brando, pluviosidade (mm) 935,9, temperatura média anual entre 26°C e 28°C. O período chuvoso é estende-se de janeiro a abril. Ainda no que se refere às suas características é composto em seu relevo é formado por Planície Litorânea, Tabuleiros Pré-Litorâneos e Chapada do Apodi. Sua vegetação é composta pelo Complexo Vegetacional da Zona Litorânea, pela Floresta Mista Dicotillo Palmácea e pela Floresta Perenifólia Paludosa Marítima, segundo dados do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (IPECE, 2011).

Sobre a origem do topônimo, Aracati é uma palavra indígena composta de ARA (tempo) e CATU (bom) significando “bons tempos” (Barba Alardo). João Brígido escreve: ARACATY ou ARACATU, onde ARA (claridade) e CATU (bonançoso), significando, “uma região que impressionava pela claridade e mansidão de suas águas”. Já Teodoro Sampaio define ARACATI como “vento muito” ou “rajada forte”, também podendo ser “aragem cheirosa” ou “vento que cheira”. (IBGE, 2013)

O perfil populacional de Aracati apresenta dois grupos distintos: no primeiro, uma população fixa, que são aqueles que residem no município e no segundo grupo,

2 É o nome dado a um meio de transporte irregular, e ainda utilizado no Nordeste do Brasil. Consiste na se adaptação de caminhões para o transporte de passageiros, constituindo-se em substituto improvisado para os ônibus convencionais.

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uma população flutuante, formada por veranistas que passam temporadas em suas casas de veraneios e turistas que se hospedam em hotéis e pousadas, principalmente por ocasião das festas populares como é o caso do carnaval, que atrai para o município uma média de 150.000 visitantes. Este grande número de pessoas que formam a população flutuante contribui sobremaneira para a geração de emprego e renda para seus moradores, incrementando e desenvolvendo o setor turístico municipal.

Na parte habitacional, Aracati possui antigos sobrados e casarões tombados como Patrimônio Histórico do Ceará, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Estes casarios são representantes da época do ciclo do gado, que marcou a economia do município no século XVIII.

Aracati é beneficiada com energia hidroelétrica fornecida pela Companhia Hidroelétrica do São Francisco (CHESF) e distribuída pela Companhia Energética do Ceará (COELCE), sendo esta a única forma de energia consumida em grande escala. Potencial eólico do município também é explorado através de estações eólicas implantadas no seu litoral, que repassa a energia produzida para a CHESF.

A repartição da água fica a cargo da CAGECE - Companhia de Água e Esgoto do Ceará, que atende boa parte da população da sede, seja em ligações domiciliares ou chafarizes para as comunidades da periferia, através de fontes de abastecimento em poços tubulares.

A limpeza urbana é um fator preocupante em Aracati, pois o município não conta com um aterro sanitário; além disso, a falta de limpeza por parte da prefeitura e a falta de politica pública para o setor deixa Aracati numa situação bastante precária no que se refere a limpeza de ruas e praças.

A cultura pode ser demonstrada pelo comportamento de seu povo que evoluiu das nações indígenas, teve ligações com o colonizador europeu e forte presença africana, desenvolvendo assim uma população heterogênea, semelhante às demais populações do Ceará e do Brasil. Os aspectos culturais podem ser vistos nas artes, que localmente se apresentam sob vários aspectos, dentre os quais se destacam a formação religiosa, a presença musical, as artes de pesca, a culinária e o artesanato.

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Outro grande traço cultural de Aracati são seus monumentos arquitetônicos, podendo ser destacadas a igreja matriz Nossa Senhora do Rosário, com construção iniciada no século XVIII e concluída na segunda metade do século XIX, com estilo barroco, localizada na Praça da Matriz, na Rua Dragão do Mar. Essa igreja possui algumas imagens de interesse e mesa de comunhão de jacarandá de belíssimo desenho, fora outras características notáveis. Há, ainda, como parte da atração cultural o Instituto do Museu Jaguaribano, fundado em 15 de Novembro de 1968, com estilo neoclássico, localizado no antigo sobrado do Barão de Aracati, à Rua Alexanzito, 743. Essa instituição cultural da cidade possui um bom acervo de peças de arte popular e de documentos de seu passado.

Aracati possui características naturais privilegiadas, com cerca de 30 km de litoral dividido em seis praias, Canoa Quebrada, Cumbe, Quixaba, Fontainha, Majorlândia, e Lagoa do Mato, que ajudam a compor o polo turístico de Canoa Quebrada, cada uma com suas características paisagísticas e culturais próprias.

Lagoa do Mato é um pequeno núcleo praiano, basicamente ocupado por pescadores, com acesso por estrada de barro, distante 18 km, aproximadamente, da sede do município. Possui uma paisagem nativa exuberante. Entretanto, já apresenta sinais de desrespeito ao ambiente natural, é o caso da constrição de como algumas casas de veraneio instaladas sobre suas falésias à beira-mar.

Figura 4 - Praia Lagoa do Mato Fonte: Prefeitura Municipal de Aracati (2013)

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Majorlândia caracteriza-se pelo turismo e lazer que atende às camadas médias e altas do Estado que buscam a área para instalar suas residências de veraneio. Recebeu esse nome em homenagem ao Major Bruno da Silva Figueiredo, proprietário destas terras. Assim como em Canoa Quebrada, a implantação desordenada de construções afeta a geomorfologia da área provocando problemas de erosão e poluição. Muito utilizada pelos moradores de Aracati, fica lotada aos domingos. Localiza-se, aproximadamente, a 13 km do centro de Aracati.

Figura 5 - Majorlândia Fonte: Prefeitura Municipal de Aracati (2013)

Quixaba: A 3 km de Majorlândia e a 15 km de Aracati, fica situado sobre falésias e dunas, a beleza do local é constituída é formada por suas pelas falésias e com excelentes local de banho e de captação d’água; sendo, a comunidade um o núcleo de pescadores tem um ancoradouro na praia; onde os barcos de pesca ficam fundeados na água ao longo da praia.

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Figura 6 – Praia da Quixaba Fonte: Prefeitura Municipal de Aracati (2013)

Cumbe: localizada na foz e na margem direita do rio Jaguaribe; sua formação geográfica é composta de grandes dunas ao fundo; o acesso é difícil, somente por trilhas sobre dunas; plantação de coqueiros, local de terreno alagado, ponto de onde é possível visualizar uma paisagem de rio, praia e mar.

Figura 7 - Praia do Cumbe Fonte: Prefeitura Municipal de Aracati (2013)

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Fontainha: Está localizada a 19 km da cidade de Aracati, praia na base das falésias, conta com mar de ondas fortes e falésias em tons terrosos e avermelhados.

Figura 8 - Praia da Fontainha Fonte: Prefeitura Municipal de Aracati (2013)

2.2 Aracati no contexto nacional e regional

Para a análise das transformações ocorridas na organização sócio-espacial do atual Munícipio de Aracati, faz-se necessário compreender o contexto histórico em que se deu a colonização brasileira, e do estado do Ceará acima já debatido.

A história de Aracati assemelha-se com a de outros munícipios do litoral brasileiro, sendo portão de entrada para a então coroa portuguesa. É, contudo, fonte de fixação de instrumental bélico de defesa territorial. Em agosto de 1604, o então explorador Pero Coelho de Sousa oriundo da região dos açores, porém já estabelecido na Paraíba foi o primeiro concessionário da coroa portuguesa em solos aracatienses que até então era habitada por tribos indígenas locais.

Pero Coelho tinha como destino a capitania do Maranhão, ou seja, estava apenas de passagem em Aracati. No entanto, deixou erguido, às margens do rio

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Jaguaribe, o Fortim de São Lourenço. Depois disso no século XVII, Aracati foi contemplada com outras edificações bélicas como a Bateria do Retiro Grande, o Presídio da Ponta Grossa, o Presídio de Coroa Quebrada, o Presídio do Morro de Maceió, entre outras.

Após o ano 1644, com a expulsão dos holandeses do Recife, colonos portugueses, pernambucanos e paraibanos instalaram-se nas ribeiras do rio Jaguaribe. Com esse afluxo de imigrantes, o vilarejo começou a se desenvolver, constituindo-se, de pronto, em centro de interesse comercial. A pecuária tomou impulso e o comércio de exportação de couros e peles tornou-se importante para a época.

A ocupação definitiva do local foi aproximadamente no início do século 1700, efetivada com a chegada da pecuária no sertão do nordeste, pois a região contava com aspectos geográficos como rio Jaguaribe para fazer a ancoragem dos barcos e o clima, com bons ventos, favorecia a produção da carne de charque. A produção de sal, nas salinas da região, também favorecia o processo de produção artesanal do charque.

A importância deste município no contexto estadual data do início do século XVIII e tem origem no pioneirismo das charqueadas, instaladas, como enfatizado anteriormente, no estuário do rio Jaguaribe. Por possuir uma zona sertaneja e outra praiana, Aracati manteve-se por muito tempo, em função da produção e comercialização da carne bovina e do couro, como a localidade de maior influência no processo de formação sócio-econômica e política do Ceará.

O Aracati sofreu várias mudanças econômicas até vir a se tornar uma cidade conhecida mundialmente pelo turismo, com a praia de Canoa Quebrada; e uma relativa modernização na sua organização industrial, agrícola e energética, o que levou a um processo de acumulação de capital nos últimos anos. Com transformações estruturais na política econômica, Aracati foi crescendo em todas as direções norte, sul, leste e oeste.

O aumento acentuado da população da cidade provocou a expansão da malha urbana, como aconteceu na maioria das cidades brasileiras a partir da década de 1970. Em Aracati, há um aumento populacional na zona urbana e um decréscimo

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na população rural (IBGE, 2010). Na tabela 1, pode ser observada a evolução da população desde o censo demográfico de 1970 até o atual.

Tabela 1 - População residente no Município de Aracati

CENSO ARACATI

1970 50.120 hab.

1980 61.142 hab.

1991 60.687 hab.

1996 56.771 hab.

2000 61.146 hab.

2010 69.159 hab.

Fonte: IBGE, Censos Demográficos e Contagem Populacional (2013)

De acordo com a evolução demográfica do município, a partir da década de 1970, observa-se um decréscimo populacional do ano de 1991 para o ano de 1996; havendo, em seguida, uma retomada do crescimento da população, tendo o turismo como um mecanismo que alavanca o crescimento econômico promovendo o aumento populacional. Com isso, pode-se citar a construção do Resort Porto Canoa, um dos primeiros empreendimentos dessa categoria no estado. Também, nesse período, houve a instalação da multinacional Kraft Foods, com a produção de refrescos em pó (Tang e Fresh) e a conquista do governo federal pelo Partido dos Trabalhadores, com a implantação de políticas públicas tais como “fome zero”, “bolsa família” e abertura de várias frentes de obras no nordeste, que fizeram com que a população permanecesse na sua localidade, além de estimular o processo inverso de migração de mão de obra. Os desmembramentos com a criação de novos municípios como Fortim, Itaiçaba e Icapuí, pode explicar a diminuição da população do Aracati.

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Em Aracati, o crescimento sem planejamento, juntamente com o aumento populacional levou à ocupação de várias áreas de risco, tanto pelo fator ambiental de saneamento e enchentes, quanto pela insegurança com o aumento das favelas. O fluxo migratório para as cidades decorre da atração que o espaço urbano exerce sobre os habitantes da zona rural e de pequenos municípios sobre os quais Aracati tem influência econômica, promovendo o deslocamento de pessoas em busca de novas oportunidades de emprego e moradia. Além disso, é importante registrar o fluxo migratório que ocorre no seu litoral com a chegada de vários imigrantes de outros países para buscar oportunidades de negócio, principalmente no setor turístico em Canoa Quebrada.

Com o passar dos anos, Aracati sofreu várias mudanças na sua configuração espacial, com a perda de território para a criação de novos municípios como , Itaiçaba 1956, Icapuí 1984 e Fortim em 1992. Perdeu, inclusive, população e recursos, uma vez que a região de Icapuí possui a maior quantidade de poços de petróleo do estado do Ceará.

Aracati durante muitas décadas sofreu com a perda de força econômica e política no estado do Ceará, levando a cidade a passar anos de recessão econômica, cultural e política. Outro grande fator que contribuiu para o declínio da economia aracatiense foi a ação da própria natureza, como ocorreu, por exemplo, em 1924, com o assoreamento do rio Jaguaribe, visto que, até então, Aracati era um dos principais portos marítimos do estado. Além disso, Aracati sofreu com várias enchentes que devastaram a cidade.

“Desde o inicio da fundação do Aracati, essa vila e as terras onde assenta foram flageladas, nos anos de abundante inverno, pelas constantes inundações do Jaguaribe, que apesar de grande, obedece, como qualquer outro daquela região, ao regime torrencial. Naturalmente as charqueadas muito sofriam com isso. No ano de 1789, a água subiu nas ruas principais a doze palmos. A esse dilúvio seguiu-se a grande e horrenda seca de 1790 a 1794, que devastou os rebanhos sertanejos e acabou de vez com a produção da carne-seca. Desapareceu, desta sorte, dos rebanhos nacionais a verdadeira carne-do-ceará. Somente seu nome ficou rotulado a de outras procedências” (BARROSO , 2004, p.99).

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O município de Aracati, como se pode observar, foi sendo castigado pela variação climática desde o início da sua fundação3. Segundo Barroso, pode-se afirmar que o processo de decadência do ciclo econômico da charqueada deu-se em decorrência dessas variações climáticas, visto que essa vila e as suas terras eram flageladas nos anos de inverno pelas inundações constantes do rio Jaguaribe conforme Figura 9. Aracati, que antes da seca de 1791, exportava “para Europa 30.000 couros de bois por ano, depois de 1794 não podia enviar um” (BARROSO, 2004, p. 99). Para sobreviver recorreu ao plantio de algodão, e após a seca, colhia já 18 mil arrobas, isto é 270 toneladas. Quando a seca terminou havia tamanha falta de gado no sertão do Ceará que se tornou necessário buscar algumas manadas no Piauí. Diante deste cenário várias famílias se retiraram da região procurando outras mais prósperas, como, por exemplo, a família dos Martins que foram colher abrigo na região sul do Brasil, no caso em , município Gaúcho.

Figura 9 - Cheia na Rua Grande Fonte: Prefeitura Municipal de Aracati (2013)

3 Segundo Henry Koster (apud BARROSO, 2008, p. 147), “A vila do Aracati compõe-se exclusivamente de uma rua muito comprida, com outras pequenas, que dela nascem para o lado do sul. Está situada à margem meridional do rio Jaguaribe, que sofre em grande parte o efeito das marés. O rio é vadeável à jusante e vários trechos ficam seco nas vazantes, porque se estende muito além do seu grande canal. As casas são diferentes das dos outros lugares por onde passei, tendo um andar superior sobre o térreo. Perguntei a razão e explicaram-me que era devido às inundações do rio, as quis forçavam os moradores a se refugiarem na parte mais alta de suas residência. A vila em três Igrejas, a casa da Câmara e a pressão, não possuindo conventos.” Henry Koster, viajante inglês criado em Portugal, veio ao Brasil a procura de um clima melhor, pois estava com tuberculose. Percorreu vários estados do nordeste brasileiro.

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Aracati sofreu, pois, com as secas e as inundações do rio Jaguaribe, controladas somente com a construção do dique na década de 90 do século XX. Talvez, um dos motivos para a existência de tantos sobrados na cidade tenha sido o estigma das enchentes, pois o viajante Henry Koster (apud BARBOSA, 2013), ao visitar a vila de Aracati, em 1810, fez o seguinte relato: A vila do Aracati consiste principalmente numa longa rua, com várias outras de menor importância, (...) As casas do Aracati não parecem com as vistas n'outras paragens que visitei. Tem um andar superior sobre o térreo. Perguntando a razão, explicaram que as águas do rio inundam algumas vezes, obrigando uma retirada para os altos das residências.

Segundo o memorialista Abelardo Gurgel Costa Lima (apud BARBOSA, 2013), em sua obra Pequena Coreografia do Município de Aracati, de 1956, as cheias do Jaguaribe mais faladas foram as dos anos de 1732, 1741, 1743, 1789, 1805,1832, 1839, 1842, 1866, 1917, 1921, 1922, 1924. Outras mais recentes também se tornaram bem afamadas, são elas as cheias de 1964,1974 e 1985.

Aracati traz também na sua história a alegria marcada por um carnaval animado, sendo um dos mais movimentados do estado em números de foliões. Até o ano de 1940 o carnaval de Aracati sempre mantinha a tradição de começar os festejos no mínimo 15 dias antes da data oficial. A animação era por conta da charanga cantando e tocando marchinhas e frevos. Os ensaios dos blocos eram realizados até sexta e no sábado à noite os blocos já desfilavam pela principal rua da cidade, Rua Cel. Alexanzito (Rua Grande). O sábado anterior ao do carnaval iniciava com a chegada do Zé Pereira, que era um bloco que animava o povão para a abertura do carnaval. A festa carnavalesca era feita com lança perfume nas moças, serpentina e o confete pela manhã, à tarde saiam várias pessoas vestidas de Papangu4. Logo em seguida vinha Chico de Janes, conforme a figura 10. (HERMES, 2012)

4 Papangu - personagem carnavalesco mascarado que sai a rua geralmente em grupos, embrulhado de lençóis, coberto de dominós ou disfarçado de todas as maneiras; fantasia sem luxo, nem brilhos que se encontra nos carnavais do nordeste brasileiro.

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Figura 10 - Bloco Chico de Jane anos 1960 Fonte: Prefeitura de Aracati (2013)

O acervo arquitetônico da cidade, com casarões do século XVIII, traz sua marca histórica de um tempo repleto de luxo e ostentações dos comerciantes do ciclo do gado. Atualmente, ainda representa um bom lugar para visitação turística.

Segundo Barbosa (2011, p. 38) “passados três séculos desde seu surgimento, no século XVIII, Aracati ainda guarda, na largura de suas ruas, na estreiteza de seus becos, nas casas de sobrados e de janelas avarandadas, nos templos religiosos, peculiaridades que a distinguem de tantas outras cidades coloniais do Brasil”. Essas particularidades estão presentes no seu próprio traçado urbano retilíneo com ruas largas, cortadas por becos, diferenciando-a de outras cidades do referido período, caracterizadas por ruas estreitas e pela sinuosidade do traço urbano como pode ser vistas nas figuras 11,12,13 e 14. Basta citar, como exemplo, o centro histórico de Salvador e as cidades históricas mineiras. Todavia, o centro histórico de Aracati assemelha-se bastante ao centro histórico de Icó (CE), Oeiras (PI), Açu (RN), Pombal (PB), cidades coloniais do Nordeste brasileiro.

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Figura 11- Casarões da Rua Grande Fonte: Acervo do Autor

Figura 12 - Rua Grande Fonte: Acervo do autor (2013)

Embora possua um acervo arquitetônico que poderia impulsionar ainda mais a atividade turística, quem passa pela Rua Grande depara-se com vários casarões deteriorados e praticamente esquecidos, conforme pode ser observado na Figura 12.

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Figura 13 - Casarão na Rua Grande Fonte: Acervo do autor (2013)

Figura 14 - Casa de Adolfo Caminha na Rua Grande Fonte: Acervo do autor (2013)

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2.3. Aracati terra de filhos ilustres

Aracati é terra de pessoas que muito contribuíram para a história do Ceará e até mesmo do Brasil, dentre as quais podem ser citadas: Paula Ney, o juiz Barão de Aracati (José Pereira da Graça), Francisco José do Nascimento (Dragão do Mar), Castro e Silva, Monsenhor Bruno, entre muitos outros que se destacaram na história política, econômica e social do Ceará.

Ao fazer referência aos filhos ilustres, não têm como deixar de mencionar Adolfo Caminha, romancista, contista e poeta, que saiu de Aracati após o falecimento de sua mãe para morar com familiares em Fortaleza. Foi oficial da Marinha do Brasil até 1890, quando o romancista envolveu-se em um escândalo amoroso que o obrigou a deixar a Marinha indo morar com sua amada no Rio de Janeiro, onde teve duas filhas. Suas principais obras são: A Normalista (1893), Bom Crioulo (1895), A Tentação (1896) - romances; Judith (1893), Lágrimas de um Crente (1893) – contos; Vôos Incertos (1886) – poesia; Cartas Literárias (1895) – crítica; e No País dos Ianques (1894) – crônica.

Outro grande aracatiense foi Jacques Klein, um dos pianistas brasileiros de mais prestigiosa carreira e maior projeção internacional. Seu nome passou a ser reverenciado internacionalmente, em 1953, quando cursava o Conservatório de Música de Viena, além de ter conquistado, por unanimidade, o primeiro lugar do Concurso Internacional de Execução Musical, de Genebra.

2.4 A Ocupação do litoral Nordestino no Brasil Colonial.

No século XV, Portugal detinha a hegemonia marítima e começou a conquista das costas da África e da América, chegando ao Brasil oficialmente em 1500. Contudo, essas terras já eram habitadas pelos tupi-guaranis, tupiniquins, tupinambás, tamoios, caetés, potiguaras e tabajaras, entre outras tribos indígenas. De início foi tudo tranquilo, mas depois o genocídio foi geral. Se comparada aos brancos e negros, a população indígena só diminuiu. A história do Brasil foi marcada pela escravidão, por doenças trazidas pelos homens brancos, pela perda da identidade cultural e linguística do povo indígena. Mas a história do Brasil foi marcada por outros fatos também. É preciso reconhecer que já em meados do

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século XVI, o Brasil se tornara o maior produtor de açúcar, fato que gerou enormes lucros para Portugal. O ciclo do açúcar deu lugar ao ciclo do ouro que teve início no final do século XVII. O ouro foi descoberto no interior – na região de Minas Gerais - e sua exploração favoreceu enormemente a Coroa Portuguesa.

Porém, a descoberta das terras que deram origem ao Brasil deu-se em virtude da expansão marítima portuguesa, estimulada pela busca do caminho marítimo para as Índias. A metrópole portuguesa embora estivesse inicialmente mais interessada no vantajoso comércio com o Oriente, logo percebeu que era necessário tomar posse efetiva do território brasileiro que passou a ser alvo da cobiça de outros povos europeus. Foi no interior desse processo que teve início a ocupação do litoral brasileiro em geral e do nordestino em particular. Esse processo de ocupação pela Coroa Portuguesa do território colonial brasileiro iria alterar toda a realidade cultural e demográfica original, composta pela presença das populações indígenas que antes do descobrimento já ocupavam essas terras. A implantação dos povoados no nordeste foi assegurada a partir do desenvolvimento dos ciclos econômicos da cana de açúcar e da pecuária, que deram origem às primeiras vilas e cidades no litoral.

De início, a ocupação do território ficou restrita à zona costeira. O crescimento da produção açucareira, principalmente na Capitania de Pernambuco, reforçou essa característica. Além do limitado interesse da Coroa Portuguesa pelo seu desenvolvimento, os primeiros núcleos de povoamento eram muito dispersos e distantes uns dos outros.

As primeiras décadas de ocupação de terras brasileiras foram marcadas por constantes saques de corsários que buscavam o pau-brasil e metais preciosos, levando no século XVII a uma ocupação defensiva por parte de Portugal que decidiu, então, dividir suas terras em Capitanias Hereditárias, como forma de viabilizar sua ocupação.

O Nordeste Brasileiro traz essa marca histórica de ocupação através do modelo de Capitanias Hereditárias implantado pelos portugueses, preocupados com a defesa do território. Como bem enfatiza Caio Prado Jr.,

“Vários fatores determinaram essa dispersão do povoamento. O primeiro é a extensão da costa que coube a Portugal na partilha de Tordesilhas, o que obrigou, para uma ocupação e defesa eficientes, encetar a colonização simultaneamente em vários pontos dela. Foi tal o objetivo da divisão do território em capitanias, o que de

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fato, apesar do fracasso do sistema, permitiu garantir à coroa portuguesa a posse efetiva do longo litoral” (2011, p.35).

A implantação do sistema de Capitanias Hereditárias, conforme assinala Caio Prado Jr., foi o ponto de partida para a colonização do Brasil. Foi ele que assegurou a Portugal a preservação da posse da terra, lançando os fundamentos da colonização com base na ocupação militar e religiosa e, ainda, constituída pela grande propriedade rural, pela monocultura de um produto de larga aceitação na Europa (o açúcar) e pelo trabalho escravo. Ou seja, a economia brasileira começa a se viabilizar com a implantação de grandes latifúndios onde se cultivava a cana de açúcar com a utilização de mão de obra escrava. Mamigoniam (1997) também faz referências à importância das Capitanias Hereditárias para o sucesso da colonização do Brasil, destacando o seu caráter feudal, uma vez que os capitães donatários eram vassalos do rei de Portugal, além de salientar o êxito alcançado por Duarte Coelho, donatário da Capitania de Pernambuco, de acordo com a seguinte afirmação:

“A presença da coroa portuguesa no território colonial americano começou a se efetivar pelo estabelecimento do sistema de capitanias hereditárias e de doações de sesmarias, tipicamente feudal. Delas, Pernambuco foi a mais bem sucedida, mas a insuficiência dos resultados em outras capitanias forçou o estabelecimento direto da administração civil militar portuguesa (Bahia), concomitantemente à sobrevivência e mesmo à criação de novas capitanias hereditárias até 1685 (Xingu, na Amazônia).” (MAMIGONIAN, 1997, p. 3)

As Capitanias de Pernambuco e São Vicente foram as que mais se desenvolveram inicialmente. Vale ressaltar também que esse sistema teve vários problemas, dentre os quais convém assinalar a ausência dos próprios donatários nomeados pelo rei no território das capitanias recebidas, apesar de que em muitas delas terem se estabelecido gradualmente grupos de pessoas que começaram a povoar as diferentes regiões, dando origem às primeiras vilas e a distintas formações sociais.

O território brasileiro, porém, era muito extenso diante dessa ocupação inicial tão esparsa. Foi essa aparente negligência na exploração do território tropical sul- americano que abriu espaço para várias invasões por parte dos franceses e holandeses, além do fato de que no período de 1580 a 1640 Portugal foi comandada

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por Filipe II, formando a União Ibérica entre Portugal e Espanha e seus respectivos territórios coloniais.

Como os portugueses, no início, deram preferência aos negócios no Oriente – a denominada “Carreira das Índias” – por serem mais lucrativos, ao que se somou o fato de Portugal não dispor de um contingente populacional suficiente para ocupar todo o vasto território colonial português, os opositores dos espanhóis e rivais do rei Filipe II, principalmente os holandeses, começaram a realizar tentativas para invadir essas terras. Após os desentendimentos entre a Coroa Espanhola e os holandeses, em 1595, partiu a ordem de Filipe II para fechar os portos portugueses aos navios holandeses, agravando a situação entre os dois países que culminou na revolta dos povos Neerlandeses5 e deposição do próprio Filipe II, rei da Espanha, com a declaração da República das Sete Províncias Unidas dos Países (MELLO, 2009).

Em 1624, 23 navios da República das Sete Províncias Unidas dos Países Baixos realizaram a primeira invasão do território brasileiro, tendo por alvo a cidade de Salvador, na Bahia, que foi atacada e conquistada após a rendição do governador. Essa conquista, que teve início em maio de 1624, durou menos de um ano, com a reconquista por parte dos portugueses em abril de 1625, dando início a uma guerra ultramarina entre os dois países em continente americano.

Em 1630, os neerlandeses em um ataque à cidade de Olinda, em Pernambuco, saem vitoriosos e em poucos dias conquistam a cidade de Recife, abrindo, assim, um longo processo de permanência no território colonial português que se estendeu até 1654.

Em 1637, após várias conquistas no nordeste brasileiro começa o governo de Maurício de Nassau (Johan Maurits van Nassau-Siegen), sobrinho neto de Wilhelm D’Orange, principal líder da revolta neerlandesa contra os espanhóis. Como relata Krommen (1997), Maurício de Nassau dedicou-se à politica interna, garantindo a todos os habitantes a liberdade religiosa e a recuperação da produção de açúcar, além da defesa do território. No começo de 1642, os neerlandeses já haviam conquistado os territórios da faixa litorânea de Sergipe até o Maranhão. Entretanto, divergências entre a sua forma de governar e os lucros esperados pela Companhia

5 Neerlandeses formam o grupo étnico predominante nos Países Baixos. São geralmente vistos como um povo germânico, sendo chamados popularmente, mas incorretamente, de "holandeses"

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Neerlandesa das Índias Ocidentais (WIC), levaram Nassau a renunciar ao cargo e retornar à Europa em 1644.

Após a saída de Nassau do Brasil Holandês, ocorreram várias batalhas por conta da forte pressão exercida pela WIC sobre os colonos brasileiros comandados por Matias de Albuquerque. Este foi um administrador colonial português, irmão do donatário da Capitania de Pernambuco, e militar superior português na Guerra da Restauração, confronto armado travado entre o reino de Portugal e Espanha, no período compreendido entre 1640 e 1668. (MELLO, 2009)

Albuquerque, juntamente com outros senhores de engenho e acompanhado do indígena Filipe Camarão e do negro Henrique Dias, lideraram a Insurreição Pernambucana, movimento nativista para expulsar os neerlandeses de Pernambuco, fato relacionado também à restauração de 1640, isto é, à libertação de Portugal da Espanha. Em 1641, a dinastia de Bragança assinou um tratado de paz com a Holanda de 10 anos, porém os neerlandeses não respeitaram o acordo e continuaram os ataques à costa brasileira. As longas batalhas para manutenção da costa brasileira ajudou os portugueses a manter a defesa desse vasto território brasileiro. Expulsos do nordeste brasileiro, os neerlandeses foram para as Antilhas, onde deram início à produção açucareira. E na metade do século XVII, devido à concorrência do açúcar produzido pelos neerlandeses nas Antilhas, a produção no nordeste brasileiro entrou em decadência. (MELLO, 2009)

Ao longo do século XVI, a organização de boa parte do espaço nordestino esteve relacionada à economia canavieira, que proporcionou poder político e econômico à região no período colonial. A criação de gado foi outra importante atividade econômica que se desenvolveu no Nordeste nesse período, relacionada inicialmente à produção de açúcar. Os bois eram utilizados nos engenhos como animais de tração e de transporte da cana-de-açúcar e constituíam fonte de abastecimento de carnes e couro.

Os engenhos de açúcar exigiam grande contingente de mão-de-obra para fazer a limpeza e o preparo dos terrenos, bem como no processo de produção, que deu início à escravidão no Brasil. Os portugueses traziam os negros africanos de suas colônias na África para utilizar como mão-de-obra escrava nos engenhos de açúcar. Os comerciantes vendiam os africanos trazidos nos navios negreiros como

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se fossem mercadorias. Os mais saudáveis chegavam a valer o dobro daqueles mais fracos ou velhos.

Embora o açúcar fosse o principal produto no Brasil, sua produção foi acompanhada pelo desenvolvimento da pecuária no nordeste. A pecuária não estava voltada ao abastecimento do mercado externo, mas sim para subsidiar as atividades relacionadas à produção de açúcar e atender à demanda interna. O boi não era utilizado apenas para alimentar o crescente contingente populacional estimulado pela nova atividade, mas também para as funções de movimentação dos moinhos de cana e transporte da produção. Seu couro era utilizado também na fabricação de calçados, roupas e outros utensílios. Diferentemente da produção açucareira, a pecuária adentrou o sertão nordestino, visto que, por razões óbvias, o gado não podia ser criado em áreas muito próximas às do plantio da cana. Uma Carta Régia de 1701 proibia a criação a menos de 10 léguas da costa, o que fez com que essa atividade contribuísse para a ocupação do sertão do nordeste brasileiro.

O período colonial também foi marcado por forte presença da igreja católica romana com a cultura jesuíta e suas obras de catequização. Com o objetivo de espalhar a fé católica pelo mundo, os jesuítas eram subordinados a um regime de privações. A principal tarefa dos jesuítas no Brasil seria trazer os índios para o catolicismo, procurando eliminar seus hábitos e costumes, tais como a nudez, a poligamia e o canibalismo. Com isso, pode-se observar que a colonização do nordeste brasileiro deu-se de duas formas: uma pela agricultura canavieira no litoral que ia do Rio Grande do Norte até o Recôncavo Baiano e a outra, pela pecuária, com o ciclo econômico do couro que sai da Bahia e Pernambuco adentrando o sertão nordestino.

2.5 Os primórdios da ocupação do Ceará

O processo de povoamento da Capitania do Ceará dar-se-á, em primeira tentativa, de forma tardia em 1603, com Pero Coelho de Souza, com o objetivo de defesa militar e, também, visando alcançar o estado do Maranhão por terra.

Essa primeira tentativa de colonização do território cearense ocorreu de forma desastrosa para os portugueses, após a forte batalha na serra da Ibiapaba contra os índios e os corsários franceses. O grupo de Pero Coelho ficou bastante

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debilitado. Ainda sob os efeitos da seca de 1605, Pero se retira do Ceará, após perder um filho e soldados. Vale ressaltar que nesse grupo encontrava-se Martim Soares Moreno conhecido como o desbravador do Ceará.

“O regimento da expedição de Pero Coelho de Sousa foi-lhe dado a 21 de janeiro de 1603, mas os preparativos duraram até meados do ano, de modo que a partida só efetuou em julho. Compunham-na 65 veteranos portugueses, sob comando de Manuel de Miranda, Simão Nunes Correia, João Cide, João Vaz Tataperica e Martim Soares Moreno.” (BARROSO, 2004, p. 25)

De início, a ocupação da Capitania do Ceará teve, portanto, uma função estratégica – militar, com a fixação de um posto avançado para guarnição e abastecimento de contingentes armados, cuja intenção consistia na defesa do território contra piratas e corsários estrangeiros. Em virtude de uma seca (a primeira noticiada na história do Ceará), Pero Coelho foi obrigado, como já foi destacado, a abandonar o estado do Ceará e o forte de São Tiago, no ano 1605 (SILVA FILHO, 2004).

Pero Coelho abandona o Ceará por vários motivos, entre os quais a perda de parte dos seus homens na luta contra os franceses a caminho do Maranhão e a grande seca de 1605, que é o primeiro registro de uma seca no estado do Ceará. Em 1607, após a retirada de Coelho, foram enviados ao Ceará, a mando do governo da Capitania de Pernambuco, dois padres jesuítas com o objetivo de catequizar os indígenas que habitavam essa região, sem, contudo, obter muitos resultados, pois a seca ainda castigava o Ceará.

Por volta de 1612, Martim Soares Moreno retorna ao Ceará com o intuito de fixar, às margens do rio Ceará, um forte com objetivo de defesa militar. O forte chamado de São Sebastião corresponde à segunda tentativa de fixação dos colonizadores em terras cearenses. Esse forte, porém, foi tomado pelos holandeses em meados de 1637.

A ocupação pelos Neerlandeses dar-se-á no período de 1637 a 1644, sendo os ocupantes atacados constantemente pelos índios, até que, em 1644, todos foram mortos em um ataque. Em 1649, porém, os holandeses voltam ao Ceará com Mathias Beck e constroem um novo forte, denominado Schoonenborch, às margens do rio Pajeú, onde mais tarde, veio a ser fixada a capital do estado.

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A retomada portuguesa do Ceará acontece em 1654. Com a rendição dos holandeses em Pernambuco, abre-se caminho para Álvaro Azevedo Barreto, Capitão-Mor da Coroa Portuguesa, tomar o forte sem nenhuma resistência. Barreto rebatiza o forte com o nome de Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção, que depois passa a ser chamada apenas de Fortaleza. No século XVII, ainda foram registrados na região muitos embates provocados pela hostilidade dos indígenas. Em 1713, os índios invadiram a cidade de , até então sede da capitania do Siará, matando cerca de centenas de colonos. Essa invasão levou à retirada de grande parte da população local para a vila de Nossa Senhora de Assunção. Como se pode constatar, a ocupação do Ceará era dificultada pela resistência dos indígenas e pelas secas constantes.

O povoamento do Ceará se efetiva com as primeiras sesmarias entre 1679 a 1681 implantadas inicialmente na zona litorânea, principalmente nos estuários do rio Jaguaribe (BEZERRA, 2012, p.35). Em 1681 é feita a primeira concessão de sesmarias no rio Jaguaribe, em terras antes nunca povoada por brancos, segundo relata o capitão-mor de Abreu Soares e mais 13 companheiros, que, vindos do Rio Grande do Norte, fizeram a requisição da sesmaria.

Tabela 2 - Evolução das sesmarias na Ribeira do Jaguaribe

Período Nº de cartas N° de sesmeiros

1681 1 13

1704-1708 47 65

1711-1719 18 27

1729-1722 18 25

1746-1748 4 5

Total 88 135

Fonte: (NOGUEIRA, 2010)

Segundo relata Bezerra (2012), em 1707, o rio Jaguaribe estava conhecido até suas nascentes, e as terras de suas margens, de certo modo, povoadas. Depois

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desta data é que o povoamento e as fazendas ganharam força, com a instalação das fazendas de charque que não produziam somente para a subsistência, mas tinham como objetivo o mercado litorâneo que estava voltado para a produção de cana de açúcar.

O vale do Jaguaribe6 também foi marcado por grandes lutas entre os portugueses e os indígenas que habitavam aquela região. O confronto deu-se entre o Capitão-Mor João de Barros Braga, comandante do regimento de cavalaria auxiliar do Jaguaribe e a então conhecida Confederação dos Cariris, movimento de resistência de indígenas que ocupavam a Região do Nordeste do Brasil Colônia, composta pelas tribos dos Kariris, Anacés, Jaguaribaras, Acriús, Canindés, Jenipapos, Tremembés e dos Baiacus.

Foi na região do vale do Jaguaribe que nasceu a principal atividade econômica do século XVIII no estado do Ceará: a pecuária, associada ao comércio do charque. Este foi decisivo para a vida econômica do estado durante um bom período, sendo tudo aproveitado do boi, visto que a partir do couro se faziam praticamente todos os objetos necessários à vida do homem sertanejo como roupas, chapéus, botas e muitas outras coisas. No apogeu do charque, a região do vale do Jaguaribe passa a ser a mais importante região econômica do estado. Cidades como Icó e Aracati ganham força com o comércio da carne de charque, O período das charqueadas foi compreendido entre os anos de 1680 e 1790 e ajudou a fomentar essa região que prosperou até o início do século XX, passando por vários ciclos econômicos como o do algodão, o da carnaúba e o do sal.

Logo a seguir, o século XVIII foi marcado por fortes secas, ocasionando grandes prejuízos aos rebanhos e às pessoas, tendo muitos morrido de fome. Outro fato a ser destacado é que, ao se iniciar o século XVIII, a maior parte da população era de formada por índios e mestiços.

A fixação da população do território cearense se deu margeando os cursos dos rios Acaraú, Coreaú e Jaguaribe. A presença dessa rede fluvial foi fundamental para a atração e permanência dos portugueses, os quais procuravam as terras com

6 Vale do Jaguaribe é uma das sete mesorregiões do estado brasileiro do Ceará. É formada por 21 municípios agrupados em quatro microrregiões: Baixo Jaguaribe, Litoral de Aracati, Médio Jaguaribe Serra do Pereiro. As principais cidades são: , , , Aracati, Jaguaribe e Jaguaruana.

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pastos para alimentar o gado fora da região litorânea já ocupada com o cultivo da cana de açúcar. Assim, no século XVIII, apenas doze vilas tinham sido instaladas no Ceará: Aquiraz (1713); Fortaleza (1726); Icó (1738); Aracati (1748); Caucaia (1759); Viçosa do Ceará (1759); Crato (1764); Baturité (1764); Sobral (1773), Granja (1776), Quixeramobim (1789), (1796) (SOUZA, 2007).

Para uma melhor comunicação entre as vilas foram abertas estradas, cujas principais consistiam nas estradas dos boiadeiros, a Estrada Velha, a Estrada Geral do Jaguaribe, a Estrada Nova das Boiadas, a Estrada das Boiadas, a Estrada Camocim-Ibiapaba, a Estrada Crato-Oeiras, a Estrada Crato-Piancó.

A Estrada Geral do Jaguaribe era a mais importante via de penetração e escoamento de mercadoria da Capitania do Ceará no século XVIII. Passava em Russas e Icó, seguia o rio Salgado e ultrapassava a chapada do para alcançar os sertões do Pernambuco em direção à Bahia, por onde eram levadas as mercadorias do sertão para as principais cidades litorâneas e vice-versa.

Praticamente no começo do século XIX, o Ceará torna-se independente administrativamente de Pernambuco. Logo em seguida, a fase do plantio de algodão despontou como uma extraordinária atividade econômica geradora de divisas para o estado. Já por volta de 1861, com a crise na produção de algodão norte americana, a cidade de Fortaleza, localizada no litoral, assume importância como porto para o escoamento do algodão, cera de carnaúba, café e outros produtos produzidos no sertão, deixando Aracati para trás, assumindo o papel de cidade mais importante da capitania.

O século XIX foi marcado pela prosperidade da cidade de Fortaleza perante suas rivais litorâneas, Aquiraz e Aracati, passando então ser a principal cidade portuária do estado e também a mais forte econômica e politicamente.

No final do século XIX e início do século XX, a capital cearense passou por um período de grandes transformações urbanas entre 1860 e 1930, conhecido por Belle Époque. Em 1900, tinha como principal meio de transporte público os bondinhos puxados por burros. A capital possuía uma elite formada notadamente por comerciantes e profissionais liberais vindos de outras regiões brasileiras e do exterior, sendo estes promotores de mudanças importantes em Fortaleza.

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Já em 1932, uma grande seca atinge o Ceará, provocando uma forte migração do sertanejo atrás de acolhimento nas cidades litorâneas, principalmente na capital Fortaleza. Para controlar esse êxodo, o governo do estado criou vários campos de contingência de pessoas em todo o estado, conforme Rios (2006, p. 53).

“Com pouco mais de um mês de funcionamento, as concentrações apresentavam uma inesperada quantidade de sertanejo. Conforme às estatísticas oficiais, os dados eram os seguintes: 6.507 em Ipu, 1800 em Fortaleza, 4.542 em Quixeramobim, 16.221 em , 28.648 Cariús (S. Matheus) e 16.200 no Crato ( Buriti), perfazendo um total de 73.918 flagelados” (Cf. O povo, 30/06/1932)

Estes campos que ficaram conhecidos por campos de concentração eram algo desumano, porque neles as pessoas ficavam muitas vezes em condições sanitárias precárias e pouca alimentação. Na verdade, os campos surgem como medida de assistência aos flagelados que não tinham trabalho nas frentes de serviço contra a seca, como destaca Rios, afirmando que “Os flagelos eram atraídos com a promessa de comida, assistência médica e segurança”. Lá não encontravam a estrutura prometida e não podiam sair do campo, sendo mantidos presos. Tudo para evitar que eles pudessem chegar à Fortaleza.

Só entre 1939 e 1950 é que Fortaleza é contemplada com o início de grandes obras, como a do porto do Mucuripe para evacuar sua produção agrária. Depois com a indústria, a região do porto recebe a instalação do polo de moinhos de trigo do Ceará, com o pioneirismo do grupo J. Macedo, em 1950. O Moinho Cearense da família Jereissati e o Moinho Dias Branco surgiram décadas depois, fazendo do Ceará um dos principais exportadores de trigo do país. O porto do Mucuripe perde apenas para o de Santos e Rio de Janeiro na exportação de trigo. Com a construção do porto do Mucuripe, a Praia de Iracema, a principal praia de veraneio da época, entra em declínio em consequência do avanço do mar causado pelo assoreamento no porto.

Na década 60, durante o período militar, o país é marcado pelo incremento do setor automobilístico nacional. O Ceará, porém, não é beneficiado diretamente com o setor automotivo. Entretanto, algumas indústrias começam a se instalar, como foi o caso da Esmaltec, em 1963, especializada na fabricação de fogões domésticos, pertencente ao grupo Edson Queiroz que já era proprietário da Nacional Gás

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Butano, empresa que fazia carregamento de botijões de gás GPL, criada em 1953 de forma inovadora no estado do Ceará.

Já no final da década de 1960 e começo da década de 1970 novas politicas habitacionais são implantadas no Brasil. Para Santos (2009, p. 59) este novo período consagra também uma redistribuição das classes médias no território, e uma redistribuição dos pobres, os quais as cidades maiores são capazes de acolher. Segundo Costa (2007, p. 84) na década de 70, a política do Banco Nacional que utilizava recursos do FGTS para financiar habitações populares a baixo custo procurou reduzir o déficit habitacional e responder às pressões populares. De acordo com Silva (2007, p. 115) na capital cearense a partir dos anos 70, inicia-se a construção de grandes conjuntos habitacionais ao longo da linha Tronco-SUL do setor de trens suburbanos da Rede Ferroviária Federal - RFFSA e nas imediações do distrito industrial. Surgem, assim, na capital Fortaleza, conjuntos habitacionais como o do José Walter para moradias populares.

Existia, além disso, um boom na construção civil, tanto de residências num processo coordenado pelo Banco Nacional da Habitação (BNH), como de grandes obras que davam continuidade aos investimentos estatais em setores básicos como, por exemplo, o de energia e o de transportes. A produção industrial se ampliava a todo o vapor, e as exportações batiam recordes. Também nos anos 1970, o turismo começa a dar os primeiros passos no Ceará, com o governo de Virgílio Távora, tema que será retomado mais adiante no próximo capítulo.

A década de 1980 foi marcada por novas tendências ou políticas. Assim, é que se inicia, em 1987, no Ceará, o “mudancismo desenvolvimentista” de Tasso Jereissati. Foi o primeiro governo neoliberal implantado no estado do Ceará e até mesmo no Brasil, pois foi durante a gestão do governador Tasso Jereissati que ocorreram as primeiras privatizações e a abertura da guerra fiscal entre os estados. Em busca de novos investimentos nos seus respectivos estados, eram oferecidos determinados benefícios fiscais aos contribuintes, tais como créditos especiais de ICMS ou empréstimos subsidiados de longo prazo.

O Governo Tasso Jereissati foi responsável pela privatização de algumas empresas públicas, como foi o caso da Companhia Energética do Ceará (Coelce), privatizada em 2 de abril de 1998 e da Telecomunicações do Ceará - S/A

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(TELECEARÁ ), em 29 de julho de 1998. Seu sucessor e aliado político, naquele momento, Lúcio Alcântara, deu continuidade a esse processo com a privatização do Banco do Estado do Ceará (BEC), no ano de 2005. Durante as décadas de 80/90, os governos neoliberais deixaram alguns legados para o estado do Ceará, como o açude Castanhão, o Complexo Portuário do Pecém, o Aeroporto Internacional, o Centro Cultural Dragão do Mar, o Canal da Integração e a reforma e capeamento de algumas rodovias.

Nos dias atuais, pode-se dizer que o Ceará é um dos maiores produtores do setor têxtil e calçadista do país. Desponta também na produção agrícola de fruticultura, especialmente do melão e da castanha de caju. A empresa Cione de propriedade de Jaime Tomaz de Aquino, em 12 de novembro de 1962, e oficialmente inaugurada no dia 1º de maio de 1963, tem sua sede na cidade de Fortaleza fundada e é considerada a maior plantadora de cajueiros do mundo. É, ainda, um dos principais destinos turísticos do Brasil, tendo em vista que o estado possui inúmeros atrativos naturais e conta hoje com uma boa infraestrutura hoteleira e um grande centro de eventos localizado na capital, sendo o segundo maior da América Latina com capacidade para 30.000 pessoas (Opovo, 2012).

2.6 Evolução política e econômica do município de Aracati.

O quadro 1, apresenta resumidamente um histórico da evolução política do município de Aracati, do século XVIII até a atualidade, destacando os acontecimentos mais importantes, entre os quais se destacam os desmembramentos ocorridos em meados do século XX.

Quadro 1 - Evolução Política do município de Aracati

ANO EVOLUÇÃO POLÍTICA ADMINISTRATIVA

1747 Elevado à categoria de município e distrito com a denominação de Aracati, pela resolução régia de 11-04-1747 1766 Distrito criado com a denominação Santa Cruz de Aracati, por provisões de 12-09-1766 e 20-06-1780. 1842 Alteração toponímica municipal de Santa Cruz de Aracati para

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simplesmente Aracati alterado, pela provisão nº 244, de 25-10-1842. Elevado à condição de cidade com a denominação de Aracati, pela provisão nº 244, de 25-10-1842. 1875 Pelo ato provincial de 01-08-1875 é criado o distrito de Areias e anexado ao município de Aracati. 1911 Em divisão administrativa referente ao ano de 1911, o município é constituído de 2 distritos: Aracati e Areias. 1929 Pela lei estadual nº 2677, de 02-08-1929 é criado o distrito de Lagoa da Cruz e anexado ao município de Aracati. 1933 Em divisão administrativa referente ao ano de 1933, o município aparece constituído de 4 distritos: Aracati, Areia, Canoé e Lagoa da Cruz.. Assim permanecendo em divisão territorial datada 31-XII- 1936. 1937 Pela lei estadual nº 386, de 14-10-1937, o distrito de Canoé passou a denominar-se Fortinho e o distrito de Lagoa da Cruz a denominar- se Cabreiro. Em divisão territorial datada de 31-XII-1937, o município constituído de 4 distritos: Aracati, Areia, Canoé e Cabreiro ex-Lagoa da Cruz. 1938 Pela lei estadual º 448, de 20-12-1938, são criados os distritos de Caiçara, Mata Fresca e Tibau, com terras desmembradas do distrito de Areal. Sob a mesma lei o distrito de Fortinho passou a denominar-se Fortim. 1939 No quadro fixado para vigorar no período de 1939-1943, o município é constituído de 7 distritos: Aracati, Areias, Cabreiro ex-Lagoa da Cruz, Caiçara, Fortim ex-Fortinho, Mata Fresca e Tibau. 1943 Pelo decreto-lei estadual nº 114, de 30-12-1943, o distrito de Caiçara passou a denominar-se Icapuí, o distrito de Tibau denominar-se Cupiranga e o distrito de Areias a denominar-se Ibicuitaba. 1950 Em divisão territorial datada de 1-VII-1950, o município é constituído de 7 distritos: Aracati, Cabreiro, Cuipiranga ex-Tibau, Fortim, Ibicuitaba ex-Areias, Icapuí e Mata Fresca. Assim permanecendo em divisão territorial datada de 1-VII-1955 1959 Pela lei estadual nº 4461, de 15-01-1959, desmembra do município de Aracati os distritos de Icapuí, Ibicuitaba e Cuipiranga. Para formar o novo município de Icapuí. 1960 Em divisão territorial datada de 1-VII-1960, o município é constituído de 4 distritos: Aracati, Cabreiro, Fortim e Mata Fresca. Assim permanecendo em divisão territorial datada de 31-XII-1963. 1965 Pela lei estadual nº 8339, de 14-12-1965, Aracati adquiriu o extinto município de Icapuí. 1979 Em divisão territorial datada de 31-XII-1968, o município é constituído de 7 distritos: Aracati, Cabreiro, Cuipiranga, Fortim, Ibicuitaba, Icapuí, Mata Fresca.

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Assim permanecendo em divisão territorial datada de 1-I-1979. 1988 Pela lei estadual nº 11481, de 20-07-1988, é criado o distrito de Barreiras dos Vianas e anexado ao município de Aracati. 1990 Pela lei municipal nº 046-B, 04-04-1990, é criado o distrito de Córrego dos Fernandes e anexado ao município de Aracati. Pela lei municipal nº 046-C, de 04-04-1990, é criado o distrito de Jirau e anexado ao município de Aracati. Pela lei municipal nº 046-A, de 21-02-1990, é criado o distrito de Santa Teresa e anexado ao município de Aracati 1991 Em divisão territorial datada de 17-I-1991, o município é constituído de 8 distritos: Aracati, Barreira dos Vianas, Cabreiro, Córrego dos Fernandes, Fortim, Jirau, Mata Fresca e Santa Teresa. 1992 Pela lei estadual nº 11928, de 27-03-1992, desmembra do município de Aracati o distrito de Fortim. Elevado à categoria de município. 1995 Em divisão territorial datada de 1-VI-1995, o município é constituído de 7 distritos: Aracati, Barreiras dos Vianas, Cabreiro, Córrego dos Fernandes, Jirau, Mata Fresca e Santa Teresa. 2005 Assim permanecendo em divisão territorial datada de 2005 Fonte: IBGE (2013) Elaboração :Felipe de S. Siqueira

A incorporação da economia do Ceará, tal como do Brasil, dar-se-á de forma particular frente às pressões da metrópole portuguesa inserida no contexto europeu de transição do feudalismo para o capitalismo. Quando em Aracati se iniciava a chamada civilização do boi, utilizando métodos do feudalismo, a Europa já se encaminhava para o início da Revolução Industrial, e para o capitalismo industrial, marcado pela aplicação de capital e novas invenções no setor produtivo. O trabalhador assalariado se fixava nesse espaço, e então ficava nítida a separação de classes. À primeira classe pertencem os donos dos meios de produção e à segunda, o trabalhador possuidor apenas da sua força de trabalho (proletariado).

Para um melhor entendimento, a evolução econômica de Aracati pode ser dividida em quatro ciclos: o ciclo do Gado ou Couro, ligado ao setor da pecuária; Ciclo da Agricultura, ligado, principalmente, ao algodão, carnaúba e sal; Ciclo energético e petroquímico, ligado às fazendas de petróleo e usinas eólicas e o Ciclo da Tecnologia, Informação e Serviços, no qual entram os setores de informatização, automação e prestações de serviços como turismo, alimentação, entre outros. Como se sabe, o Brasil é um país situado na periferia do centro do sistema capitalista e, ao longo de sua história, teve que promover grandes mudanças sócio-econômicas e

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políticas para se inserir no mercado mundial. Para uma melhor compreensão desse processo é preciso recorrer a teorias que permitam compreender essas mudanças, ou seja, a forma como o país reage frente aos movimentos da economia internacional. Para tanto, é de extrema valia a utilização da teoria dos ciclos longos ou ciclos de Kondratieff, que segundo Mamigonian (1999) acontecem devido a uma tendência à queda da lucratividade no capitalismo que estimula o nascimento de invenções. Estas por sua vez, reestabelecem a lucratividade e são, sucessivamente, aplicadas aos diferentes setores e ramos da economia (fase “a”). Todo este movimento gera um esgotamento da lucratividade possível, provocando a necessidade de novas invenções (fase “b).

Para se entender a evolução da formação econômica brasileira é preciso analisa-la conforme destaca Ignácio Rangel, frente a conjuntura econômica europeia na época do descobrimento da América ela se caracteriza por uma dualidade, ou seja, apresentava um polo externo e um polo interno no que diz respeito à dinâmica das relações econômicas entre este continente e as colônias. No polo externo ou seja aquele que entrava em contato com as novas terras descobertas dominavam os interesses comerciais, enquanto internamente prevaleciam relações feudais.

No seu polo interno, as áreas mais avançadas da Europa já se encontravam numa etapa de transição para o capitalismo como era o caso da Inglaterra. No polo externo, apesar do predomínio dos interesses mercantis, ainda dominava o feudalismo que, sobretudo na Península Ibérica foi reforçado pelo sistema colonial, visto que o Rei era o senhor absoluto dos novos territórios descobertos. Nessa dualidade vigente na Europa no período das grandes descobertas marítimas, o polo interno era mais avançado do que o polo externo que entrava em contato com as colônias. O capitalismo mercantil conferia à Europa um extraordinário dinamismo econômico, razão pela qual interessava às metrópoles extrair das colônias produtos de interesse para o mercado europeu.

Em contrapartida, a dualidade da economia brasileira se inicia tendo no polo interno um sistema retrógrado de produção, visto que os latifundiários – no caso do nordeste, os grandes senhores de engenho – haviam recebido suas terras do rei de Portugal do qual eram vassalos, mas para fazê-las produzir precisaram recorrer à mão de obra escrava. Vê-se, pois que o feudalismo dominante no polo externo tinha um lado mais atrasado ainda, ou seja, um caráter não-feudal. Como o polo interno

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brasileiro era estruturado sobre o escravismo e um pré-feudalismo, a economia brasileira só veio a se consolidar a partir da Abertura dos Portos em 1808 (e a Independência, em 1822), trazendo um novo aparelhamento de intermediação mercantil.

Até a Revolução Industrial, a humanidade teve suas atividades econômicas dirigidas pelos ritmos da natureza, ou seja, pelos elementos naturais que exerciam forte influência sobre a produção. Pode-se observar isso na economia cearense, onde os períodos das secas desempenharam um papel fundamental, não apenas sobre as atividades produtivas, como também sobre acontecimentos históricos, conforme descrito no item 2.5 quando foi abordado os primórdios da ocupação do Ceará.

A Revolução Industrial do fim do século XVIII inaugurou um novo comportamento para a economia, ditado pelos ciclos longos ou ciclos de Kondratieff com duração aproximada de 50 anos, apresentando cada um deles uma fase expansiva (“a”) e uma fase depressiva (“b”).

Os períodos dos ciclos são estimulados por iniciativas e surgimento de inovações responsáveis por transformações que não se limitam à esfera produtiva, mas afetam também a organização espacial e o consumo. Os ciclos ajudam, ainda, a compreender as crises do sistema capitalista ao longo da história e suas consequências na evolução sócio-espacial de determinadas regiões.

Quando se analisa a evolução econômica de Aracati percebe-se que a sua primeira etapa está relacionada à introdução da pecuária e das charqueadas, num período histórico que é um pouco anterior ao primeiro ciclo de Kondratieff (1790 – 1848) que tem suas origens ligadas à 1ª Revolução Industrial (final do século XVIII). A partir de 1800 é que Aracati começa a viver os seus melhores momentos, quando o Ceará passa a ser exportador de carne seca e couro.

Com as oficinas de charque, Aracati conhece o seu apogeu como vila a partir do gado vindo do sertão e comercializado na ribeira do Jaguaribe, diretamente com Recife, então sede da capitania. Com a consolidação dessa economia lidada ao ciclo do Gado, a região tornou-se o lugar preferido para a fixação da população, visto que a circulação de bens e mercadorias gera novas oportunidades de negócio. Essa dinâmica transforma o espaço de Aracati em espaço urbano, com a abertura

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de ruas, a chegada do clero e a construção de Igrejas. Com a fundação da Vila de Santa Cruz do Aracati, em 1748, haviam sido demarcados o lugar da matriz, da Câmara e da Cadeia. Ainda nos traços iniciais que esboçavam a Vila de Aracati, duas ruas faziam a comunicação com o Porto dos Barcos para dar acesso às oficinas de charque.

A partir de então forma-se uma elite integrada pelos proprietários dessas oficinas e por comerciantes da carne-de-sol, que passam a construir belos sobrados e casarões, com azulejos trazidos de Portugal, localizados na conhecida Rua Grande, a qual apresenta, nos dias atuais, um belo acervo arquitetônico e turístico. Surge também a classe dos proletariados representada por trabalhadores ligados à produção do charque.

Essa divisão de classe era bem nítida na comunidade aracatiense, pois havia a existência da igreja dos pobres e da igreja dos abastados da cidade. A então igreja dos pretos era a Igreja N. Sra. Rosário dos Pretos, construída no século XIX, conhecida, atualmente, somente, como igreja do Rosário.

Sendo a pecuária a principal atividade econômica do século XVIII, no estado do Ceará, a atividade comercial da carne de charque foi decisiva para a vida econômica social do Aracati e do estado do Ceará durante um bom período. Do boi tudo era aproveitado, visto que a partir do couro eram produzidos, praticamente, todos os objetos necessários à vida do sertanejo.

A implantação das fazendas de gado exigiu o incremento da mão de obra para as atividades relacionadas à pecuária, sendo os índios e trabalhadores livres a mão de obra mais utilizada. Segundo Holanda (2011, p. 48) “Os índios antigos moradores da terra, eram, prestimosos colaboradores na indústria extrativa, na caça, na pesca e em determinados ofícios mecânicos e na criação de gado” (2011, p.48). Eles se adaptavam melhor à pecuária por ser uma atividade livre, e menos fiscalizada. Entretanto, os índios não tinham boa adaptação às atividades mais fiscalizadas e confinadas, como o cultivo da cana de açúcar.

Para Funes (2007, p. 104), à medida que a ocupação no Ceará foi se efetivando, como consequência natural da frente de expansão, consolidou-se um espaço de trabalho que atraiu um contingente de homens livres em sua maioria pobres, negros e pardos, vindos de províncias vizinhas, na condição de vaqueiros,

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trabalhando no sistema de quarta ou morador junto e agregado junto às fazenda de criação. Pode-se dizer que o charque exigia uma mão-de-obra “livre”, pois o gado era criado em pastoril aberto e necessitava viajar pelo sertão.

De acordo com Leite (1994, p. 61), portanto, a população escrava no Ceará, foi sempre pouco significativa - em 1854, para 400.065 habitantes, havia somente 32.239 escravos, enquanto que em 1857 numa população de 482.287, apenas 35.011 eram escravos. Em 1872, existiam apenas 31.915 escravos, o que corresponde a 4,4% do total populacional de 721.688 habitantes, o que demonstra a utilização dominante de mão de obra livre no Ceará.

Isso não quer dizer que no Ceará não havia mão de obra escrava. Ela se concentrava, principalmente, nas regiões serranas produtoras de cana de açúcar. No Aracati encontra-se registro em casas de comerciantes do charque e para Bezerra (2012, p. 54) “os negros trazidos na condição de escravos para a região, muito raramente se tratavam de africanos, (....) tem-se a impressão geral que os escravos eram utilizados nas fazendas do sertão somente nas tarefas domésticas e no trabalho dos pequenos engenhos”, como afirma Raimundo Girão(1947)7

No apogeu do ciclo do gado, a cidade de Aracati representava o principal centro econômico do estado e a principal saída do charque cearense que vinha de outros centros regionais pelas trilhas abertas pelas boiadas, tais como as vilas de São Bernardo de Russas (hoje Russas), Telhas (hoje ), Retiro do Curralinho (hoje Picos, no Piauí). Aracati passa a respirar ares de progresso e sucesso com o comércio do charque, conforme relata Barroso:

“Com a fabricação da carne-seca, que se tornou a grande fonte de riqueza local, consumindo anualmente a média de vinte mil bois, Aracati tornou-se em pouco tempo, além do centro mais populoso e economicamente mais importante, terra de gente adiantada e culta com relações diretas com Pernambuco e com a Europa. Comercializa por meio dos veleiros que frequentavam o porto do Fortim e muitos de seus principais negociantes foram sócios de firmas inglesas. (2004, p. 98)

O ciclo do Gado abriu caminhos para a circulação do próprio gado e do comércio, dando origem às primeiras vias de circulação que gradativamente se

7 Girão, Raimundo – História Econômica do Ceará – Editora Instituto do Ceará – Fortaleza -CE, 1947, p.9

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transformaram em estradas. De acordo com Caio Prado Jr. (2011, p. 247), “o comércio do gado formava uma imensa teia de ligação terrestre que cobrem a parte povoada do território colonial de norte a sul e de leste a oeste”. No Ceará podem ser citadas a Estrada Geral do Jaguaribe, a Estrada Novas Boiadas e a Estrada das Boiadas. Esses caminhos traçados pelas boiadas foram fundamentais para ocupação do território cearense. Desde o início da colonização, o gado, trazido principalmente de Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte, definiu percursos que tinham como destino as ribeiras dos rios, local de implantação dos primeiros povoados conforme Figuras 15 e 16.

Figura 15 - Penetração do gado no sertão Fonte: Barbosa (2004)

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Figura 16 - Estradas do Siará Grande Fonte: Barbosa (2004)

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Com essas estradas, a pecuária conquistou no sertão do Nordeste uma grande área territorial e fixou-se como principal atividade econômica. A agricultura no sertão nordestino estava vinculada apenas à sobrevivência das populações envolvidas com a criação de gado. Em consequência da seca de 1790 a 1793 que assolou o estado do Ceará e dizimou praticamente todo o rebanho cearense, chegou ao fim o ciclo do Gado e, com ele, o das oficinas de charque aracatienses, bem como o apogeu do comércio do baixo Jaguaribe.

Assim sendo, o Aracati entra no século XIX com uma nova perspectiva econômica: o algodão. Essa atividade já era realizada na vila de Aracati no final do século XVII, e existia uma produção em baixa escala para o consumo interno do país, conforme apresentado na tabela 3.

Tabela 3 - Quantidade de algodão exportado pelo Ceará, em 1795 (em quilos)

Anos Quantidade 1777 1.170 quilos 1778 3.510 quilos 1792 450,00 quilos 1795 277,500 Quilos (só Aracaty) Fonte: Amaral (1940, p. 277)

Como esclarece Amaral (1940), até o final do século XVIII, a exportação dos produtos cearenses era feita através de Pernambuco, por isso fica difícil avaliar a quantidade e o valor exato do algodão comercializado pelo Ceará.

O boom do ciclo do algodão no Brasil teve início em meados do século XIX, com a Revolução Industrial na Europa. Entretanto, somente com a abertura dos portos brasileiros em 1808, o Ceará passa a exportar o algodão diretamente para o mercado internacional. Aqui já se pode fazer um análise com base na evolução dos ciclos de Kondratieff, pois a Revolução Industrial ocorrida na Inglaterra nas décadas finais do século XVIII trouxera mudanças tecnológicas com um profundo impacto no processo produtivo, no plano econômico e social.

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O algodão veio crescendo em relação às outras atividades, muito embora a criação do gado ainda estivesse presente, pois as sobras do algodão eram utilizadas para a alimentação do gado. No entanto, cada vez mais o gado vinha perdendo força para a cotonicultura, conforme demonstra a tabela 4.

Tabela 4- Participação dos Produtos na Exportação do Ceará

Anos Algodão Couros Outros 1803 3.934.720 53.900 28.000 1804 15.600,640 5.363.800 617.840 1805 39,987.200 6,993.700 309.700 1806 54, 219.200 9.461.750 3.678.700 1807 91.330.560 12.611.30 832.800 Fonte: Arruda (1980, p. 278)

Como se observa, o crescimento da produção de algodão tem início logo no começo do século XIX. Os números apontam um aumento de mais de 1000% em praticamente quatro anos. A partir de 1820, porém, o algodão americano entrou em cena, e o avanço tecnológico inglês forçou a queda do preço do produto no mercado mundial. Em 1822, a produção algodoeira no Ceará declinou acentuadamente, sobretudo devido a uma doença conhecida como “mofo”, além da seca no período de 1824 a 1826 e conflitos políticos que desestabilizaram a vida na região.

Também as secas de 1816, 1817 e 1825 afetaram de maneira drástica o plantio agrícola do Vale do Jaguaribe, onde o algodão tinha substituído o gado como força econômica. Além das secas, que devastaram a agricultura e a pecuária, a população também sofria pela fome, pela violência e o flagelo da epidemia de “bexiga” (varíola) e febre amarela que se alastrava por toda a Província cearense.

A partir de 1860, as exportações de algodão voltaram a ser estimuladas por causa da guerra civil nos Estados Unidos. A produção de algodão no Ceará cresceu, estimulada pelo bom preço pago no exterior, principalmente, na Inglaterra, país fortemente beneficiado com a Revolução Industrial. Com a guerra da Secessão nos Estados Unidos, que era o principal fornecedor de algodão para as indústrias inglesas, houve uma queda significativa da produção norte-americana. O Ceará viu- se, então, beneficiado com esse conflito, pois as nações industrializadas passaram a

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comprar a matéria-prima de outros centros fornecedores. Dessa maneira, através do algodão, o Ceará foi inserido no mercado internacional.

A cotonicultura marcou profundamente o Ceará, a começar pelo fato de que Fortaleza só passou a assumir ares de capital na medida em que se tornou o centro receptor da produção algodoeira, adquirindo uma importância econômica que, até então, estava reservada às cidades inseridas no ciclo do couro, como foi o caso de Aracati. Com o assoreamento do rio Jaguaribe no ano 1857, Aracati perde mais força econômica e social para suas principais rivais: Mossoró, no estado do Rio Grande do Norte que passa a dominar a produção do sal e Fortaleza que escoa a produção algodoeira do estado.

O ciclo do algodão não foi tão bom para o Aracati quanto o ciclo do couro, pois parte da distribuição do algodão vindo da região do sertão central passa a ser exportado pelo porto de Fortaleza, trazendo a Aracati perdas econômicas e perda do posto de principal cidade econômica do estado do Ceará.

Diferentemente das charqueadas, a produção algodoeira foi marcada pela presença da mão de obra escrava. De acordo com Funes (2007, p. 106), a mão de obra escrava não deixou de estar presente no Ceará a partir das últimas décadas do século XVIII. Com a lavoura do algodão era acentuado o número de escravos nas lavouras. A região de Aracati, no entanto, não mantinha o cultivo do algodão, mas a comercialização e a industrialização do algodão nas fábricas de tear.

Figura 17 - Fabrica Santa Tereza Fonte: Prefeitura de Aracati - Ano desconhecido

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No início do século XX, a fábrica de tecidos Santa Tereza, funcionava com máquinas de fiação e tecelagem, ao todo 51 teares. Empregava 110 operários e os salários eram diferenciados entre homens, mulheres e menores de idade como de costume na época. Tinha como sócios, o Major Miguel Leite Barbosa, Dr. José Leite Barbosa e monsenhor Francisco Leite Barbosa. De acordo com Viana no começo do século XX, a fábrica Santa Teresa, no Aracati, possuía um capital de 260 contos e empregava 108 pessoas (22 homens, 56 mulheres e 30 crianças. que utilizavam 25 teares na produção de 1.250 peças mensais.

Tabela 5 - Fiações e tecelagem cearense em 1901

Localidade Nomes Proprietários Capital Fuso Teares Força Nº de Produção anual em motriz operários contos de réis Tecidos Fios kg Fortaleza - Pompeu & 600 6.534 128 100 230 1.900.00 15.000 Irmãos Fortaleza Ceará Alfredo 400 3.0344 70 50 140 800.000 10.00 Industrial Ferreira & irmão Sobral - Ernesto & 600 4.656 122 150 191 960.00 20.00 ribeiro Aracati Santa M.L. 300 1.706 51 100 110 - - Teresa Barbosa & Cia Total 1.900 15,930 371 400 671 - - Fonte: Almanaque do Ceará - Ano 1902 (apud Viana, 1919)

Tabela 6 - Indústrias do Algodão - ano de 1919

Localidades Proprietários Capital em Força Operários Teares Fuso contos de reis Aracati M .L. BARBOSA 900 450 400 200 7.000 Fortaleza Pompeu & irmão 600 100 210 128 6.530 Fortaleza Cia Ceará 400 50 160 70 3.004 Industrial Fortaleza A..D.Siqueira 250 80 70 - 2.000 Sobral Ernesto & Ribeiro 600 150 310 122 4.656 TOTAL 2,750 830 1,150 23.190 Fonte: Perarse (1923, p. 169) adaptado pelo autor

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A fábrica de Santa Tereza manteve-se em atividade em Aracati até por volta de 1987. Após a enchente de 1986, a fábrica, com dificuldades, revolveu fechar as portas. Entretanto, nessa data, não funcionava mais sobre o nome de Santa Tereza, mas Unitextel. Hoje a fábrica ainda está em atividade na cidade de Fortaleza e já vai para quarta geração na mesma família.

Apesar de altos e baixos ao longo dos anos, nos séculos 19 e 20 a civilização do algodão e sua cadeia representaram uma das principais atividades econômicas, não apenas no Ceará, mas de todo o Nordeste, senão a mais importante. Como relatado anteriormente, para a cidade de Aracati, no entanto, o ciclo do Algodão não foi tão promissor quanto o ciclo do Gado.

O sal foi outro produto econômico de grande significado para Aracati, desde a época das charqueadas. O Ceará foi o segundo maior produtor de sal do Brasil, superado apenas pelo vizinho Rio Grande do Norte. Nos bons tempos, o Ceará vendia para o país e para o exterior, cerca de 100 mil toneladas de sal por ano. Todo esse volume garantia um fortalecimento econômico do estado.

As salinas já tiveram um papel importante na economia aracatiense. A região reunia condições muito favoráveis para a extração do sal marinho: pouca chuva durante seis meses do ano, sol forte e ventos constantes. No começo do século XX, as salinas do Canoé estavam entre as principais salinas brasileiras. Situadas à margem do rio Pirangy, distante 21 quilômetros do porto do Fortim. Nesse percurso, existe uma estrada de ferro com a bitola de 1 metro que percorria 23 quilômetros. A empresa encomendou para os Estados Unidos duas locomotivas grandes, possuindo um total de 6 locomotivas. Assim Aracati destacou-se outra vez por suas salinas, tornando-se um dos principais produtores de sal do país.

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Figura 18 - Exploração do sal nas salinas em Aracati Local: Aracati (CE) Ano: maio 1952 Fonte: IBGE

Porém, umas das causas da decadência do ciclo do sal foi o assoreamento do rio Jaguaribe impedindo a ancoragem das embarcações para fazer o transporte. Segundo Martins e Girão (1966, p. 167), em Icapuí, na época distrito de Aracati, existia um ancoradouro regular, onde se encontravam as importantes salinas Betânia e Nazaré. Dessa forma, pode-se confirmar que as salinas já se encontravam no município de Aracati, antes do início do século XX.

Aracati e a cidade de Camocim abrigavam os principais escoadouros da produção cearense. A decadência desses portos sucedeu com a centralização da atividade no Porto de Fortaleza, abolindo a primazia exportadora do município de Aracati. O golpe final para o abandono definitivo dos portos do Aracati e Camocim ocorreu no fim do século XIX, quando foi iniciada a construção da estrada de ferro que ligaria Fortaleza a Baturité.

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O assoreamento do rio Jaguaribe também contribui para a decadência do porto, conforme relatado no blog Histórias do Aracati: “O porto do Fortim, todavia, cada vez mais assoreado, recebia em 1909, em média 5 vapores por mês que faziam o serviço de cabotagem, trazendo e levando mercadorias e passageiros para o norte e sul do Brasil”. Em conversas e entrevista com o pessoal do Museu Jaguaribano foi relatado que há um documento em posse da Universidade Federal do Ceara (UFC) que contém informações acerca de pedidos para drenagem do rio Jaguaribe no século XIX.

Porém, a economia de Aracati não ficou somente no charque, algodão e sal. O extrativismo vegetal da carnaúba entra em cena na década de 1940, no pós- guerra. Ao longo da história, tem dado grande contribuição para a geração de riquezas e ocupação de parcela da população rural do Nordeste, principalmente no vale do rio Jaguaribe e no Estado do Ceará. De acordo com a tabela, o Ceará é responsável por 51% da exportação de cera vegetal.

Tabela 7 - Exportação - Setores emergentes - 2011

Fonte: FIEC (2013)

A fibra extraída da folha da carnaúba serve para produzir , escovas, cordas, chapéus, bolsas, esteiras, etc.; a casca serve como lenha; a palha serve para a cobertura de casas e de solos agrícolas; os cachos dos frutos, colhidos

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maduros e submetidos à secagem, servem para a extração de óleo comestível e para a alimentação do gado; o tronco (caule), com duração indefinida, serve para fazer ripas e caibros usados em construções. A carnaúba é a árvore símbolo do Estado do Ceará, conhecida como árvore da vida, devido os seus múltiplos usos.

Figura 19- Carnaubeira na entrada de Aracati Fonte: Acervo do autor – ano 2013

O emprego industrial da carnaúba envolve diversas áreas devido às características da cera, a qual após ser refinada, conforme as variadas classificações, é utilizada na fabricação de produtos farmacêuticos, cosméticos, filmes plásticos e fotográficos, participando ainda, na composição de revestimentos, impermeabilizantes, lubrificantes, vernizes, na confecção de chips, tonners, códigos de barras e na indústria alimentícia. O vale do Jaguaribe como um todo se apresenta como um dos maiores produtores da cera de carnaúba do Brasil.

Nos últimos anos, as exportações de cera de carnaúba vêm aumentando como consequência de novos usos industriais. Porém, o “boom” do Ciclo da Carnaúba se verificou durante a II Guerra Mundial. Até mesmo o turismo tirou uma palhinha da carnaúba com a confecção de artesanato no Aracati e o centro de artesanato na entrada da cidade, na rodovia CE-040.

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Figura 20 - Artesanato da folha de carnaúba Fonte: Prefeitura Municipal de Aracati (2013)

Herbert Johnson, proprietário do grupo Johnsons de Wisconsin, EUA, presidente da empresa SC Johnson, fabricante das Ceras Johnson e de outros produtos de limpeza, veio ao Ceará, em 1935, para pesquisar as potencialidades da carnaúba, pois tinha preocupação com os recursos renováveis e manejáveis da planta. No Aracati, a carnaúba é aproveitada ao máximo, do artesanato à comercialização da cera. Ela também tem forte ligação com o turismo, pois serve para criação de vários souvenirs.

De acordo com Maria Edivanir (2003, p.137), entre as décadas de 1930 e 1950 a atividade extrativa voltada para a produção da cera e da fibra da carnaúba, teve seus índices mais elevados. Para Lima (apud BARBOSA, 1979, p.32), em Aracati, na década de 1940, “a indústria extrativa foi uma das mais importantes fontes de renda do município. Os dois principais ramos – a cera de carnaúba e o sal são os mais promissores, rendosos e fortes esteios da economia do município”.

Ainda segundo Barbosa (2003, p. 138), passado o apogeu da economia da carnaúba, pela sua desvalorização no mercado externo, os produtos originados

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desta planta passaram a ter uma baixa circulação no mercado, em razão da descoberta de outros similares sintéticos mais modernos. Atualmente, a atividade extrativa vegetal tem pouca expressão para a indústria e o comércio local. Todavia, a mesma representa no baixo Jaguaribe fonte de renda para algumas famílias, que se dedicam ao artesanato da palha.

Quando se faz referência aos ciclos do extrativismo, não se pode deixar de mencionar a empresa Costa Lima & Myrtil, fundada em 1875. Dentre seus sócios encontrava-se Alexandre Matos Costa Lima, conhecido por Cel. Alexanzito. De acordo com Fernandes (2006, p. 97), essa empresa era um empório onde se encontravam importados, do vinho aos tecidos, ferragens e porcelanas. Vendiam produtos nacionais, como fumo, tecidos e muitos outros, também exportavam algodão, couros, peles, cera de carnaúba, oiticica. A empresa se manteve ativa até o ano de 1975, já com o nome de Cia. Indústria e Exportação S/A.

Ao analisar os ciclos extrativistas da carnaúba, bem como o do algodão, pode-se observar a sua relação com os ciclos longos do Kondratieff do primeiro ao segundo, sendo o primeiro iniciado em 1800, com a Revolução Industrial ligado à máquina a vapor e à tecelagem do algodão. O algodão produzido e escoado em Aracati para a Inglaterra coincide com o período de expansão do ciclo. Já a segunda fase do ciclo do algodão nasce também com a segunda fase do ciclo de Kondratieff, em 1860, sendo desta vez utilizado mais internamente nas fábricas de tear em Aracati ou seja a produção destinava-se ao mercado interno.

A partir dos anos 1950, já dentro do 3º ciclo de Kondratieff, o Ceará passa pela ampliação do sistema de transporte e da produção industrial que promove mudanças na organização urbana-espacial do estado. Através da abertura de estradas na região de Aracati e a inauguração da ponte sobre o rio Jaguaribe. Nessa mesma década, ocorre a inauguração do porto do Mucuripe e o surgimento de empresas no setor industrial de Fortaleza, o que aumentou a supremacia da capital.

Somente nos meados da década de 1970, é que Aracati rompe o período de estagnação econômica com o descobrimento do petróleo e o início bem tímido do turismo, na fase da sua descoberta, com a chegada de jovens mochileiros.

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O petróleo é a outra atividade econômica do município de Aracati A Fazenda Belém, que se situa entre os municípios de Icapuí e Aracati, tem a quarta maior reserva de petróleo do Brasil e, até o inicio deste ano, foi anunciado um projeto de perfuração de novos poços de acordo com matéria vinculada no Jornal Diário do Nordeste. O local, que funciona desde 1979 - mas com operação apenas a partir de 1980 - recebeu este nome por conta da propriedade, uma fazenda de caju que pertence ao Grupo J. Macêdo.

Figura 21 - Cavalinho Petrobras Fonte: Acervo do autor (2013)

Aliás, foi em Mossoró, cidade do Rio Grande do Norte que faz divisa com Aracati, que tudo começou. Em 1977, quando perfuravam poços para construir um balneário de águas quentes, o que encontraram foi um líquido preto viscoso. Onde era para jorrar água, jorrou petróleo. Ainda, a Petrobras, em fevereiro deste ano, concluiu, após cinco meses de trabalho, a perfuração do segundo poço em alto-mar no Ceará, denominado Canoa Quebrada (1-BRSA-1114-CES), e constatou "indícios de hidrocarbonetos" (petróleo e gás). Conforme a estatal, a descoberta já foi informada à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). O

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volume do petróleo descoberto, contudo, ainda não foi divulgado pela empresa, este fato foi veiculado em diversos meios de comunicação.

CANOA QUEBRADA

Figura 22 - Localização poço Canoa Quebrada Fonte: Diário do Nordeste 2013 - adaptado pelo autor

Conforme Figura 22, elaborada pelo jornal Diário do Nordeste, pode-se observar que o novo poço foi encontrado em águas a 400m da zona litorânea cearense, recebendo-se a denominação de Canoa Quebrada por encontrar-se em frente à praia de Canoa Quebrada. Além do petróleo, Aracati possui grande potencialidade energética. Como o Brasil possui um dos maiores potenciais eólicos do planeta, nos últimos anos, uma grande quantidade de parques eólicos se instalaram no litoral cearense disputando espaço de dunas com o turismo, conforme apresentado na figura 23. O Ceará tem um dos maiores potenciais eólicos instalados no Brasil e várias usinas já estão sendo planejadas pela iniciativa privada. Além disso, fábricas de componentes como a Wobbem, que fabrica pás para as usinas, se instalaram no estado, na região do porto do Pecém.

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Figura 23 - Usina eólica Canoa Quebrada Fonte: Acervo do autor, 2013

As análises efetuadas ao longo deste capitulo reforçam as teses que relacionam a expansão urbana da cidade e sua reorganização interna à dinâmica econômica promovida a partir das atividades pastoril, cotonicultora, Salineira, extrativismo vegetal da carnaúba, que contribuíram para o desenvolvimento da atual configuração sócio-espacial de Aracati.

O estudo do processo de sua formação sócio-econômicas permitiu algumas considerações a respeito da expansão econômica da região e da cidade do seu início até o quadro atual. Para compreender a cidade que temos hoje, foi necessário rever o seu passado, que relaciona os eventos econômicos ao surgimento do núcleo urbano, a partir do ciclo do gado, a primeira atividade promover Aracati regionalmente, o que fez fortalecer a sua economia e posteriormente a cidade.

Percebe-se, que a economia encontra-se em constante mudança e que as crises não podem ser consideradas ocasionais. A superação da crise, se faz através

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outros ciclos de renovação econômica que após um determinado período pode acarretar um nova crise, a partir da qual se origina novo ciclo. Rangel sempre pensou na economia com sendo um processo histórico, cíclico e dialético, não sendo alterada pelos governantes ou formuladores econômicos. Assim, pode-se concluir que esse processo econômico cíclico de Aracati foi gerado por várias circunstância no decorrer de sua historia, inserida num contexto mais amplo alterando a formação da região e da cidade.

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3. TURISMO E TRANSFORMAÇÕESSÓCIO-ESPACIAIS NO LITORAL CEARENSE

3.1 A ocupação turística litoral cearense

O litoral do Ceará é banhado pelo Oceano Atlântico e fica localizado logo abaixo da linha do Equador. Sua posição apresenta uma vantagem competitiva frente a outros Estados brasileiros e até mesmo a outros países da América do Sul, pois a distância que o separa de cidades tais como Lisboa, Miami e Madrid é curta, sendo o tempo de viagem, por avião, para qualquer uma das localidades citadas, de 7 a 8 horas. Antes da introdução do turismo, porém, a zona costeira do Ceará era um espaço no qual dominavam atividades relacionadas à subsistência da população local. Assim, as atividades produtivas se baseavam na pesca, no extrativismo vegetal e na agricultura de subsistência. Com a chegada dessa nova atividade econômica, o litoral passou a apresentar estabelecimentos comerciais e de serviços para o atendimento da demanda turística, apesar da pesca ainda existir, embora não mais como principal atividade.

Na década de 1990, o Ceará entra na disputa pelo turismo de massa através de uma campanha publicitária que intitulava o estado como “Terra da Luz”. Essa denominação, no entanto, foi dada ao Ceará, inicialmente em 1884, como forma de reconhecimento pelo seu feito histórico de ser o pioneiro entre os estados brasileiros na libertação dos escravos. Em 1889, a terminologia ‘Terra da Luz’ serviu como slogan para abolir de vez a escravatura, em referência a “luz” que “invade” as trevas. De acordo com Abreu (2002, p. 9), cem anos depois o mesmo slogan foi utilizado numa campanha publicitária do governo do estado, agora em referência ao espaço litorâneo formado por belas paisagens, dunas exóticas e à fama do Ceará ter sol e praia o ano inteiro.

A importância da zona litorânea cearense para a prática da atividade turística é evidente, constituindo um importante elemento impulsionador do seu desenvolvimento sócio-econômico e suscitando novas formas geográficas nesse espaço. De acordo com Santos (2012, p.12), é importante considerar o espaço como

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uma instância da sociedade, da mesma forma que a instância econômica e a instância cultural-ideológica, o que significa dizer que o espaço contém e é contido pelas demais instâncias.

Milton Santos (2012, p. 12), salienta ainda que o espaço não é formado apenas por coisas, objetos geográficos de origem natural, fruto da ação da natureza. O espaço é isso mais a sociedade que ali vive, visto que cada fração da natureza abriga uma fração da sociedade atual. Assim, existe, de um lado, um conjunto de objetos geográficos naturais distribuídos sobre um território no qual se instala um determinado grupo humano. Entre a sociedade e a natureza se estabelece uma relação dialética, ou seja, a natureza influencia a vida dessa sociedade que, por sua vez, age de acordo com as características naturais daquele espaço. A ação do homem – ou da sociedade – sobre o meio geográfico do litoral cearense gerou uma nova organização espacial a partir da introdução das atividades ligadas ao turismo. Trata-se do “território turístico”, decorrente de transformações que têm sua origem mais recente ligada ao processo de urbanização e ocupação das áreas do litoral cearense para a prática do lazer e do turismo, a partir do final dos anos 60 e começo dos anos 70 do século XX.

Esse processo de ocupação do litoral, entretanto, não ocorreu isoladamente no estado do Ceará. Isso se dá em escala nacional e mundial, acompanhando a expansão da indústria automobilística e petroquímica, que trouxe como consequência, desde a década de 1960, a implantação do sistema rodoviário nacional com o traçado de rodovias federais e estaduais que passaram a facilitar as comunicações entre as diferentes regiões do país. De acordo com Santos (2009, p. 41) , 5 milhões de passageiros são transportados por meio de rodovias em 1970, em 1980 eram 11 milhões, em 1973 o Brasil tinha 3,8 milhões de automóveis circulando, em 1981 eram 10,5 milhões.

Também conforme destaca Milton Santos (2009), os avanços dos meios de telecomunicação através de ondas, depois a satélite, difundindo o uso do telefone e do telex contribuíram para a interligação das regiões e a expansão da urbanização brasileira. Há que se destacar ainda que as transmissões televisionadas de uma localidade geravam curiosidade e uma expectativa de conhecer determinadas regiões, gerando, assim, um público em potencial “o Turista”. Outro fato que precisa ser lembrado quando se discute o crescimento das atividades ligadas ao turismo,

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são as conquistas trabalhistas da década de 1930, que definiram o direito a férias e ao descanso semanal remunerado, bem como ao 13º salário, benefícios que estimularam a prática do turismo e do lazer.

Já o período após o golpe militar de 1964, pode-se salientar que crescimento econômico, também foi beneficiado pela conjuntura mundial daquele momento que correspondia à fase expansiva do quarto ciclo de Kondratieff. Iniciada no pós- II Guerra Mundial, mais precisamente no final da década de 40 (1948), a fase A do quarto ciclo longo teve o seu boom na em fins dos anos de 1960 e início da década de 1970. É importante destacar que foi a partir do golpe militar de 1964, que o país entrou definitivamente, no circuito internacional do capitalismo.

No início do Regime Militar a inflação no Brasil era muito alta, o crescimento do Produto Nacional Bruto (PNB) era muito baixo e a taxa de investimentos quase nula. Diante desse quadro, o governo adotou inicialmente uma política recessiva e monetarista, consolidada no Programa de Ação Econômica do Governo (Paeg). Contudo, ainda nessa mesma década, foram criadas algumas instituições brasileiras que interferiram no processo de desenvolvimento econômico do Brasil. Já no turismo, pode-se ser citada a criação da Empresa Brasileira de Turismo (EMBRATUR) no ano de 1966, como ação dessa política econômica. Além da EMBRATUR, foi constituída uma política nacional de turismo, que nos anos seguintes, culminaram com a criação de empresas de desenvolvimentos turísticos em diversos estados brasileiros.

Em 1971, no governo de Cesar Cals8, o estado do Ceará ganha sua primeira instituição oficial de turismo: a Empresa Cearense de Turismo (EMCETUR), criada pela lei Nº 9.511 de 13 de Setembro de 1971, cujo objetivo era a promoção do turismo. Em 1974, Cals entrega ao estado do Ceará o Centro de Convenções em Fortaleza, que é um dos primeiros equipamentos do gênero instalado no Brasil. Vale ressaltar que as ações implantadas por César Cals acompanham a política “burocrática-militar” que começa a ser implantada na esfera federal em 1966 para a atividade turística, com a criação da Empresa Brasileira de Turismo (EMBRATUR) e o Conselho Nacional de Turismo (CNT).

8 César Cals de Oliveira Filho foi governador do estado do Ceará no período de 1971 a 1975. É considerado por muitos um impulsionador do turismo cearense. A Assembleia Legislativa cearense instituiu o Troféu César Cals de Turismo, criado para estimular os municípios a investir cada vez mais no turismo.

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No Ceará, por conta desse cenário nacional relacionado à indústria cultural, nesse mesmo período de 1960 a 1970, ocorre a mercantilização do lazer no litoral cearense, com a valorização imobiliária e a criação de vários clubes e colônias de férias na região litorânea, tais como a Cofeco - Colônia de Férias dos Servidores da Companhia Elétrica do Ceará (Coelce) e o residencial Marina Morro Branco, na praia de Morro Branco, para o veraneio das famílias cearense, principalmente, as da capital, Fortaleza. Nesse período da década de 1970, no estado do Ceará foi instaurada uma política de “modernização conservadora”, liderada por três Coronéis da política estadual: Virgílio Távora, César Cals e Adauto Bezerra. Os três fizeram do clientelismo o ponto chave dos seus mandatos, onde a política de relações falava mais alto.

Vasconcelos (2005), ao tratar da introdução do turismo nas comunidades da zona litorânea, distingue três momentos diferentes, mas interligados e subsequentes. O primeiro momento se inicia no final dos anos 60, se consolidando na década de 80, e se caracteriza pelo veraneio. O litoral é descoberto por veranistas, principalmente fortalezenses, que constroem segundas residências ao longo do litoral do Ceará, gerando alguns impactos nas comunidades costeiras, em consequência da injeção de novos recursos financeiros na economia local, através da oferta de empregos de cozinheira, jardineiro, vigilante que acarretou um maior consumo nessas localidades, fazendo aumentar a circulação da moeda.

No entanto, esta grande procura pelo espaço litorâneo provocou ocupações desordenadas que acarretaram diferentes impactos ambientais, sociais, econômicos e culturais, como destaca Vasconcelos (2005, p. 16). A ocupação humana de forma desordenada dessas regiões ocasiona o rompimento do equilíbrio natural existente, com consequências sempre negativas para o ambiente costeiro. Além disso, é na zona costeira que se fazem sentir mais acentuadamente os impactos das mudanças globais, como a elevação do nível do mar e as manifestações climáticas.

Há, da mesma forma, efeitos negativos na esfera social, visto que a oferta de novos empregos provoca uma diminuição da atividade pesqueira, uma vez que os filhos de pescadores abandonam a pesca para se dedicar a esses empregos ligados ao desenvolvimento do turismo. O impacto é tanto econômico, devido à diminuição da renda familiar, quanto cultural, pois a pesca artesanal faz parte da cultura dessas comunidades, sendo uma tradição e costume passados de pai para

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filho. O contato dos veranistas com a comunidade local causa, portanto prejuízos culturais em consequência da implantação de novos costumes e da mudança de valores. Conforme Coriolano (2003, p. 44),

É bem verdade que, no final da década de 1980, o Ceará intensificara o uso do litoral com as segundas residências já experimentadas nas grandes metrópoles brasileiras desde 1960, e só na década de 1990, a onda do turismo de sol e praia instalava-se no seu litoral. As segundas residências, que caracterizam o veraneio, o lazer local e não o turismo; foram as primeiras responsáveis pelos atritos na apropriação da terra no litoral cearense, com a forte especulação imobiliária dominando as principais áreas, que, na década de 1990, associaram-se à onda do turismo, de aumento dos fluxos e ampliação dos espaços, sobretudo os mais bem situados, com paisagens consideradas cênicas e mais preservadas e originais, em contrapartida de maiores valores. Na década de 1990, diversas comunidades litorâneas foram destinadas à implantação dos meios de hospedagens aos turistas – hotéis e resorts e pousadas, além de equipamentos para lazer como parques temáticos.

Nesse sentido, o segundo momento se dá com a implantação nessas localidades de equipamentos turísticos tais como hotéis, bares e parques aquáticos, em razão do interesse turístico advindo das atividades de veraneio.

O desenvolvimento das atividades turísticas, por outro lado, promove melhorias na infraestrutura com a construção de estradas, a instalação das redes de eletricidade, de água e de saneamento básico, além da construção de aeroporto. Impactos positivos decorrem dessas melhorias e da geração de empregos, tanto diretos quanto indiretos. Entretanto, houve também uma transformação na cultura local, pois as comunidades perderam sua identidade própria, sobretudo aquelas ligadas às atividades pesqueiras, em razão dos empregos em outras atividades econômicas. Com o surgimento de estabelecimentos ligados ao lazer noturno, tais como bares e boates, cresce também a prostituição e o consumo de drogas que acaba por atingir a população local.

Segundo Marx (2008, p. 16), em O Manifesto Comunista “A burguesia suprime cada vez mais a dispersão dos meios de produção, da propriedade e da população. Ela aglomerou as populações, centralizou os meios de produção e concentrou a propriedade em poucas mãos”. No litoral cearense, isso vem acontecendo com as comunidades litorâneas que estão sendo afastadas do mar para dar espaço aos grupos com forte poder econômico. Uma grande argumentação

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desses grupos elitistas e do próprio governo é a geração de empregos. No entanto, normalmente esses trabalhadores locais recebem uma parcela mínima da geração de divisas e são explorados com elevadas cargas de trabalho, além de deixarem para trás sua cultura e sua tradição.

Segundo Cruz (2006), a distribuição da riqueza no espaço turístico não é igual alegando que muitos lugares pobres, capturados pela atividade do turismo, tornam-se economias dinâmicas e passam por profundas transformações em seus territórios sem que necessariamente, suas populações tivessem se tornado automaticamente detentoras de melhores condições de vida e de renda. Ingenuidade teórica ou manipulação inescrupulosa de dados e informações: é isso, todavia, que o discurso dominante sobre o turismo quer fazer crer.

Portanto, zonas costeiras são ambientes que se tornam alvo de uma intensa pressão populacional. Com o passar dos anos há uma apropriação privada dos recursos e elementos naturais, em decorrência do processo de valorização turística do litoral. Assim, passam a proliferar pequenos e médios hotéis e pousadas, distribuídos ao longo de toda a orla marítima, de forma dispersa e incipiente, bem como fragilmente conectados às condições estruturais, sociais e ambientais das diferentes localidades.

Para Coriolano (2003, p. 368), o turismo é uma das mais novas modalidades do processo de acumulação, que vem produzindo novas configurações geográficas e materializando espaços de forma contraditória, pela ação do estado, das empresas, dos residentes e dos turistas. Já para Rodrigues (2006), o turismo [...] Manifesta-se em países pobres e emergentes não somente na inversão direta de capitais, mas também por benefícios outorgados pelo estado a grandes empresas, as quais, sem investir em infraestrutura básica, obtêm grandes facilidades para viabilização dos seus equipamentos, tais como resorts, grandes hotéis, parques temáticos, aeroportos, marina, etc.

O turismo está diretamente atrelado aos padrões impostos pelo sistema capitalista, em que tudo e todos tornam-se mercadoria e têm valores diferenciados, valores estes, impostos pela especulação do capital. As coisas não têm valor real, pois tudo tem um preço imposto pelos interesses do grupo dominante. Percebe-se isso, claramente, no Estado do Ceará, com a elevação do preço dos terrenos em áreas litorâneas ou serranas. Essas áreas sofrem forte pressão dos setores ligados

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à construção civil e ao trade turístico, com a criação de megaprojetos que visam somente o lucro, deixando de lado a valorização da cultura e da população local.

Como o estado nasceu da necessidade de refrear os antagonismos de classes, no próprio conflito dessa classe, resulta, em princípios, que o estado é sempre o estado da classe mais poderosa, da classe economicamente dominante que, também graças a ele, se torna a classe politicamente dominante e adquire, assim, novos meios de oprimir e explorar a classe dominada. (LENIN, 2007, p. 30)

Essa realidade aparece ainda com nitidez ao serem adotadas pelo Estado brasileiro políticas neoliberais, que acabam por privilegiar os grandes empreendimentos estrangeiros com mais facilidade na obtenção de financiamento e na aprovação de seus projetos pelos órgãos da esfera pública, diferentemente do empreendedor local que encontra mais dificuldades no acesso às verbas públicas, sem falar na fiscalização que é mais rigorosa. Vale ressaltar que as comunidades locais sofrem ainda a pressão dos turistas que vão gradativamente adquirindo suas terras.

Com o aumento do número de visitantes nessas localidades, nasce o interesse por parte destes em adquirir ou construir residências e prestar serviços turísticos. É o que caracteriza o terceiro momento. Muitos desses visitantes são estrangeiros ou provenientes de outros estados, possuindo um poder aquisitivo bem superior ao dos moradores locais, o que acaba por estimular a venda, por parte dos residentes, de suas próprias casas. Os forasteiros, por possuírem em geral mais recursos, passam a dominar ainda os negócios da localidade, restando à comunidade empregos sazonais, ou com baixos salários, além da própria perda de espaço.

A especulação imobiliária é um dos mais nocivos impactos sobre a região litorânea e desde o primeiro momento com o veraneio, foi possível observar a apropriação dos espaços por pessoas de fora, gerando conflitos e perdas, tanto ambientais, como culturais e econômicas, às comunidades. Como assinala M. Santos,

As condições atuais do crescimento capitalista criaram uma forma particular de organização do espaço, indispensável à reprodução das relações econômicas, sociais e políticas. A forma como atualmente se distribuem as infraestruturas, os instrumentos de produção, os homens – enfim, as forças produtivas – possui até um

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certo ponto um carácter de permanência, isto é, de reprodução ampliada, amparadas exatamente, na longevidade de um grande número de investimentos fixos (SANTOS, 1986)

Por volta de 1986, começa o período denominado de Nova República no Ceará com a vitória nas urnas de Maria Luiza Fontenele para o cargo de prefeita de Fortaleza. Foi a primeira prefeita de uma capital estadual eleita pelo Partido dos Trabalhadores e a primeira mulher a ser eleita para esse cargo após o regime militar. O descontentamento com a política instaurada durante a ditadura militar e o movimento de redemocratização ocasionam grandes transformações no cenário político brasileiro, provocando o declínio da habitual superioridade do coronelismo. No governo estadual do Ceará, assume Tasso Jereissati, empresário, filho da tradicional família do empresário e senador Carlos Jereissati. Tasso consegue se eleger com a promessa de modernizar a administração pública, afastando-se do clientelismo dos governos anteriores, de promover a austeridade fiscal e desenvolver a economia estadual. A nova gestão passa a se autodenominar "Governo das Mudanças". No segundo mandato de 1995 a 1999, sua administração foi marcada pelos investimentos em infraestrutura, como foi o caso da construção do aeroporto internacional e da transformação do estado em importante polo turístico.

Essas ações são realizadas através do Programa de Ação para o Desenvolvimento do Turismo (PRODETUR), iniciado em 1990 e voltado ao crescimento do turismo em núcleos do território do Estado. O programa previa ampliar a região de intervenção no litoral e a instalação de infraestruturas, tais como a duplicação, adequação e melhoramento das rodovias, a construção de vias de acesso aos litorais leste e oeste e aeroportos regionais, como os de Aracati, de Camocim e de Jijoca de Jericoacoara, assim como a ampliação do aeroporto internacional de Fortaleza, entre outros projetos.

De acordo com a Secretaria do Turismo do Estado do Ceará - SETUR, o PRODETURIS/CE, voltado para o ordenamento do espaço litorâneo cearense, selecionou quatro regiões, com reconhecida vocação para o turismo, a saber:

• região I - compreende a região metropolitana de Fortaleza;

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• região II - Caucaia, São Gonçalo do Amarante, , , e Itapipoca;

• região III - Aquiraz, Cascavel, Beberibe, Aracati, Icapuí, e Fortim; e

• região IV - , , Acaraú, Cruz, Camocim, Barroquinha, Chaval, Granja e Jijoca de Jericoacoara.

Figura 24 – Litoral cearense Prodetur/CE Fonte: Dantas, (2003)

Na primeira fase, o Estado do Ceará elegeu como prioritária a região turística II, situada a uma distância média de 40 km, a oeste, de Fortaleza. Ao todo o Prodetur - Ceará reúne um conjunto de 127 projetos, que contam com uma previsão de investimentos totais da ordem de R$ 160,92 milhões, dos quais R$ 79,87 milhões financiados pelo BID, através do Banco do Nordeste do Brasil S.A., e R$ 47,40 milhões de recursos governamentais financiados pelo BID, através do Banco do Nordeste do Brasil (BNB). Nas metas contempladas nos projetos do Prodetur/CE, estavam a criação de empregos, serviços de esgotamento sanitário e abastecimento d’água, para atendimento a 175 mil habitantes, implantação e melhoria de 252,86 km de rodovias, preservação de 2.238 hectares no meio-ambiente, implementação de 44 projetos de capacitação de órgãos governamentais e a ampliação e modernização do Aeroporto Internacional Pinto Martins (BNDES, 99).

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Essas ações do Prodetur marcam o período correspondente à primeira fase do governo Fernando Henrique Cardoso, época em que ocorreu um fortalecimento das políticas neoliberais, iniciadas pelo governo Collor. Dentre as principais medidas implementadas pelo governo pode-se citar o fim da discriminação constitucional em relação às empresas de capital estrangeiro, a transferência para a União do monopólio da exploração, refino e transporte de petróleo e gás, antes detido pela Petrobrás, a autorização para o Estado passar a conceder o direito de exploração de todos os serviços de telecomunicações a empresas privadas. (SALLUM JR, 2001)

De acordo com Cruz (2002 ), a consagração do neoliberalismo como paradigma econômico e político conheceu nos anos 90, no Brasil, possivelmente a fase mais aguda da transição de um estado interventor para um estado parceiro do mercado, o que se reflete, no turismo, na forma de políticas públicas comprometidas com a produção e a reprodução do capital. Vejamos este contexo na tabela ( 9).

Quadro 2- Políticas Públicas de Turismo no Brasil: velhos e novos paradigmas

Passado (até final dos anos 80) Presente Criação de facilidade para implantação de Implementação/ melhorias de INFRA-ESTRUTURA infraestruturas turísticas infra-estrutura básica e de (binômino fomento-roviarização) transporte (aeroportos, principalmente); Geração de riqueza (desenvolvimento Geração de emprego e renda DESENVOLVIMENTO econômico a qualquer preço) desenvolvimento sustentável ECONÔMICO Centralização Descentralização / gestão GESTÃO participativa Nacional  regional Regionallocal ESCALA Estado regulador / interventor Liberalização/ MERCADO desregulamentação Objeto de atração Objetivo de atração e de NATUREZA proteção Palco de ações deliberadas Receptáculo de ações ESPAÇO/TERRITÓRIO planejadas (espaço-objetivo)

Fonte: América Latina: cidade, campo e turismo. (Cruz, 2006)

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Logo após a abertura política brasileira, dá-se o processo de implantação de políticas neoliberais adotadas a partir do governo de Fernando Collor, com continuidade no governo de seus sucessores. Observando os dados históricos percebe-se que o turismo acompanhou o crescimento juntamente com essa politica neoliberal a partir desta data percebe-se um grande numero empreendimento de grupos estrangeiros no Brasil.

O Ceará é, hoje, o oitavo estado em população do Brasil, com cerca de 8 606 005 habitantes, segundo estimativa de 2012 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). De acordo com o Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (IPECE), 70% da economia cearense está relacionada ao setor de serviços que tem como atividades de maior destaque o comércio e o turismo. Por ter um litoral extenso e oferecer infraestrutura, o Ceará vem sendo bastante procurado para investimentos em turismo por grupos nacionais e internacionais, que estão loteando e retalhando todo o litoral cearense com a construção de empreendimentos que muitas vezes degradam a natureza e o bem-estar social da população local, especialmente a das zonas costeiras.

Essa valorização de megaprojetos para o turismo continua sendo reforçada pela política do atual governador do Estado, Cid Gomes que prevê a criação de projetos de grande porte, tais como um aquário gigante, localizado na Praia de Iracema que custará, ao todo, US$ 250 milhões e um Centro de Feiras e Eventos já concretizado, cujo investimento total será de R$ 270 milhões. Essas políticas têm, ainda, como característica a falta de participação da população local nas decisões tomadas, muito embora essa seja a mais afetada pelos impactos do turismo.

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Figura 25- Centro de Eventos do Ceará Fonte: Jornal Diário do Nordeste (2012)

O Aquário do Ceará, cuja obra foi iniciada em 2012, já tem as escavações e fundações prontas. Localizado na Praia de Iracema, tem previsão para ser inaugurado em 2014 quando se tornará um ícone arquitetônico e turístico de Fortaleza, voltado para “edutenimento”, conceito que engloba educação e entretenimento.

Figura 26 – Construção do Acquario Figura 27 – Aquário do Ceará Fonte: Jornal O Povo - 2012 Fonte: TV Verde Mares – 2012.

Com os dados aqui apresentados, podemos concluir que a zona costeira cearense vem sofrendo ao longo das últimas décadas com o inchaço populacional,

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com problemas de assoreamento e ocupação inadequada de áreas de dunas e mangues em todo o litoral, em decorrência de políticas que foram sendo implantadas pelos governos da década de 70 e 90, apoiadas por incentivos fiscais e isenções que beneficiaram o capital nacional e a entrada do capital estrangeiro, além de um estado menos fiscalizador.

O grande problema do espaço litorâneo cearense é o uso inadequado do solo por parte dos empreendimentos turísticos de massas. Para Krippendorf (2003, p. 149) “o turismo engole os terrenos, a natureza e o patrimônio cultural. Torna-se um novo colonizador e destrói o meio ambiente”. Diante das circunstâncias dos impactos ambientais e sociais, torna-se necessário um planejamento para o turismo na zona litorânea e políticas públicas que envolvam as comunidades locais tradicionais nos debates.

3.2 Políticas públicas de turismo no Ceará.

Como na maioria dos estados federativos brasileiros, o órgão máximo do turismo no Ceará é a Secretaria de Turismo do estado - SETUR. Os primeiros passos para a regulamentação do turismo no estado foram dados pelo Conselho Estadual do Turismo - CETUR - criado em 1971, pela Lei nº 9.511, com o objetivo de sugerir diretrizes gerais para o desenvolvimento turístico do Ceará e propor soluções concernentes a essa atividade. O conselho sempre é presidido pelo Secretário Estadual do Turismo. A Secretaria do Turismo – SETUR, por sua vez, foi criada pela Lei nº 12.456/95 e modificada pela Lei nº 13.875/2007. Foi constituída como órgão da administração direta estadual, de natureza substantiva e regida por regulamento próprio instituído pelo Decreto nº 28.876/2007, pelas normas internas e a legislação pertinente em vigor.

De acordo com a SETUR/CE ela busca consolidar o Ceará como um destino turístico nacional e internacional, mantendo e estimulando a competitividade econômica, social e ambiental e a sustentabilidade dos investimentos públicos e privados, contribuindo, assim, para uma sociedade mais equitativa e desenvolvida. Porém, o que se vê é uma politica de grandes empreendimentos que muitas vezes gera impactos ambientais em áreas de dunas e mangue.

De acordo SETUR-CE as principais ações estão incluídas nos seguintes Programas:

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 Desenvolvimento de Destinos e Produtos Turísticos;  Marketing Turístico;  Captação de Investimentos;  Planejamento Estratégico;  Programa de Ação para o Desenvolvimento do Turismo no Nordeste (PRODETUR) O planejamento estratégico do Estado do Ceará estabelecido pela SETUR, para o período 1995 até 2020, tem como objetivo central consolidar a inserção do Estado do Ceará como um destino turístico internacional, na Região Nordeste. Para tanto, as ações estratégicas necessárias voltam-se para o fomento de investimentos privados em localidades dotadas de atributos essenciais ao desenvolvimento da atividade turística, capazes de abrigar complexos turísticos ambiciosos, cuja "ancoragem" seja preenchida por resorts operados por redes hoteleiras de reconhecida atuação global (BNDES, 99) como pode ser observada no quadro 3.

Quadro 3 - Investimentos hoteleiros programados para o Estado do Ceará

Prováveis Invest. Município Descrição do projeto investidores 1 Fortaleza (capital) Construção de um flat, com Grupo Accor 109 UH’s, da categoria Parthenon (valor de R$ 15 milhões) 2 Caucaia / praia de Construção de um apart-hotel, Portugueses Tabuba com 300 UH’s, e de um hotel, de 130 UH’s, com campo de golf, em área de 500 hectares (valor de R$ 17 milhões) 3 Aquiraz / Prainha Construção de um apart-hotel, Italianos com 130 UH’s, e de um resort, com 130 UH’s, em área de 2 160 mil m 4 Aquiraz / praia – Porto Construção de um resort, Construtora local das Dunas atrás do Condomínio Aquaville 5 Aquiraz / praia – Porto Construção de um hotel, com Grupo Accor das Dunas 133 UH’s, da categoria Íbis 6 Aquiraz / praia Construção de um complexo Grupo Odebrecht turístico litorâneo, ancorado em resorts operados por cadeias hoteleiras internacionais

Fonte a) Balanço Anual Gazeta Mercantil – Ceará / 1998 (invest. 1 a 5); e b) Secretaria do Turismo do Estado do Ceará, O Turismo: uma política estratégica para o desenvolvimento sustentável do Ceará – 1995/2020, setembro/1998 (invest. 6). Apud (BNDS, 1999)

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No âmbito das ações de fomento aos investimentos turísticos privados, o Governo do Estado do Ceará garante, por sua vez, a realização das obras de infraestrutura necessárias e essenciais à própria operação do empreendimento como estradas aeroportos entre outros.

No setor do turismo, além das atividades diretas como hospedagem, alimentação, agenciamento e transporte, algumas outras oportunidades de negócios podem ser exploradas, assim como lojas ou quiosques de lembranças junto à atração turística; guia de turismo; passeios ecológicos, com enfoque ambiental ou de aventura; organização de eventos; agências de viagem especializada em intercâmbios; fornecimento de equipamentos e utensílios para restaurantes e hotéis; lavanderia industrial e empresa de turismo rural. Tudo isso constitui a oferta turística, propiciando a geração de renda e empregos nos setores de comércio, artesanato, confecções, bancos, transportes, saúde e comunicações e criando uma nova dinâmica espacial através da expansão de infraestrutura básica e de serviços e, consequentemente, do aumento do fluxo, da qualificação do produto e da conquista de novos mercados.

A Organização Mundial do Turismo – OMT (2009) define a oferta turística como o conjunto de produtos turísticos e serviços postos à disposição do usuário turístico num determinado destino, para seu desfrute e consumo. Neste sentido, os destinos turísticos devem atentar para expandir e diversificar ao máximo sua oferta turística aumentando, consequentemente, sua atratividade.

Dessa forma, Observa-se, a partir do que já foi exposto, que o Estado do Ceará vem desenvolvendo as condições primárias de infraestrutura básica e de serviços, principalmente através do Prodetur, buscando propiciar a atratividade mínima necessária ao desenvolvimento de seu produto turístico (BNDES, 99). Portanto, o Estado do Ceará adquiriu no cenário nacional, uma importância crescente no que se refere ao turismo, o que pode ser comprovado à luz do desempenho obtido na década de 1990 até os dias atuais, que o coloca entre os maiores receptores de turismo doméstico no Brasil.

Porém, essas políticas causam instabilidade e a dependência excessiva do turismo por parte de determinadas localidades que segundo Cruz (2002), os estados nordestinos instituíram duas politicas para a atividade turística: o Prodetur e a politica de Megaprojetos Turísticos. Conforme as ideias apresentadas por Cruz, os

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resorts (Megaprojetos), nascem como cidades que foram implantadas em regiões litorâneas que eram praticamente “desertas”, onde o hóspede encontra tudo sem sair do estabelecimento. Um exemplo é o resort Costa do Sauipe, no estado da Bahia, que tem extensão territorial de uma cidade, e o resort Porto Canoa, em Aracati, no Ceará. Entretanto, há, na verdade, certa venda do espaço litorâneo brasileiro para grupos estrangeiros. De acordo com M. Santos (2013) os países subdesenvolvidos são sempre para atender às demandas dos países mais desenvolvidos.

Essa busca por terrenos para construção de estabelecimentos hoteleiros e casas de veraneio gera inflação e especulação imobiliária, com isso aumento da valorização excessiva de terrenos, residências e aluguéis, também se incluem entre os aspectos negativos trazidos pelo turismo. Assim sendo, população local é a mais afetada por esses fatores, pois a renda trazida pelos turistas nem sempre compensa os aumentos. Por outro lado, a sazonalidade da demanda, que acarreta a concentração de turistas em determinadas épocas do ano e a quase ausência em outras, compromete a rentabilidade dos equipamentos turísticos, contribuindo para o desemprego na baixa estação.

Por último, pode-se citar o abandono das atividades econômicas primárias como a pesca, agricultura e artesanato, pela população autóctone, que busca oportunidades de emprego nas empresas turísticas atraídas por maior rentabilidade. Isso pode acarretar a necessidade de importação de produtos do exterior, no entanto, os rendimentos com a moeda estrangeira nem sempre conseguem compensar.

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4. A PRAIA DE CANOA QUEBRADA

4.1 Ocupação do espaço de Canoa Quebrada

Canoa Quebrada está situada sobre falésias de até 30 metros acima do nível do mar. Localiza-se na área litorânea do município de Aracati, distante 12 km da sede municipal e 165 km da capital do estado, sendo considerada, no entanto, área urbana Aracati pela prefeitura municipal. O acesso a Canoa Quebrada pode ser feito por rodovias federais e estaduais. A BR-304 é sua via principal, possuindo entroncamento com a BR-116, ambas da malha rodoviária federal. Já, as CE’s 040 e 276 pertencem à malha rodoviária estadual.

Figura 28 - Rodovias de acesso à Canoa Quebrada

Fonte: Pousada Califórnia (2013)

De acordo com dados do censo de 2010 realizado pelo IBGE, Canoa Quebrada é considerada uma área urbana isolada – AUI, por se tratar de área urbana definida por lei municipal, separada da sede por uma área rural ou por outro limite legal. A AUI de Canoa Quebrada é composta por cinco setores censitários

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(unidade territorial de coleta): e possui uma população total de 2.918 habitantes, sendo composta por 1.491 domicílios.

A origem de Canoa Quebrada está ligada ao mar. Este, desde sempre, exerceu influência nas atividades econômicas e culturais da localidade. A pesca e atividades correlatas, como as conservas e salga de peixe, estão presentes desde as origens deste povoado garantindo o sustento dos seus habitantes. Até o final dos anos 60, essa localidade se assemelhava a outras praias do litoral do Nordeste brasileiro, com praias tranquilas, e uma vida simples de uma típica vila de pescadores artesanais.

A ocupação do espaço correspondente à praia de Canoa Quebrada data do século XVII, pois existe relatos de uma fortificação denominada de Presídio de Canoa Quebrada que se encontrava próximo à ribeira do Jaguaribe. Aracati tornou- se um ponto de apoio militar e várias edificações foram construídas, entre elas uma denominada de Presídio de Coroa Quebrada9, que, provavelmente, seria uma fortificação localizada onde é, hoje, a localidade de Canoa Quebrada. No mapa cartográfico, Carta da Capitania do Ceará, de António José da Silva Paulet, do ano 1813, que se encontra anexo a esta obra, já se encontrava registro da localidade de Canoa Quebrada. Essa fortificação na região do rio Jaguaribe data, segundo Studart Filho10, do século XVII, conforme citação abaixo.

Além do fortim de diminuta erigido, em fins do século XVII, para o amparo do colonos do Baixo Jaguaribe contras os gentios paiacus, levantaram mais os luso-brasileiro, na parte littoranea d’aquella região, três outros reductos cuja memoria remota iremos tentar reviver aqui.

Eram eles:

O reducto Canoa Quebrada, Guarnecido com quatro bocas de fôgo e situado a poucas léguas ao nascente do Phoral do Aracaty.

9 Essas informações foram obtidas através do site da Wikipedia, com base em dados extraídos de BARRETO, Aníbal (Cel.). Fortificações no Brasil (Resumo Histórico). Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército Editora, 1958. 368 p. GARRIDO, Carlos Miguez. Fortificações do Brasil. Separata do Vol. III dos Subsídios para a História Marítima do Brasil. Rio de Janeiro: Imprensa Naval, 1940. SOUSA, Augusto Fausto de. Fortificações no . RIHGB. Rio de Janeiro: Tomo XLVIII, Parte II, 1885. p. 5-140.

10 Revista do Instituto do Ceará - ANNO XLIII – 1929 - As fortificações do Ceará: As fortificações da ribeira do baixo Jaguaribe.

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O reducto Aracaty, que erguia próximo da villa do mesmo e artilhado com seis peça.

O reducto da Barra do Aracaty, levantado junto á emborccadora do rio Aracaty e defendido por dois calhoes.

Portanto, é provável que a localidade de Canoa Quebrada, fosse um local ideal para montagem de uma guarnição de segurança, pois se encontra em cima de uma falésia de 30 metros de altura aproximadamente, proporcionando uma boa observação da margem da foz do rio Jaguaribe até o cabo de Ponta Grossa, como pode ser observado na figura 31.

Figura 29 - Possível localização presidio Canoa Quebrada Fonte: Google maps, adaptado pelo autor (2013)

Canoa Quebrada tem como sua marca uma meia lua e uma estrela. Este símbolo recebe as mais variadas interpretações. Para alguns moradores foi implantado na região por um muçulmano que passou uma temporada na vila de pescadores do Estevam, tendo em vista que a lua-estrela é um símbolo milenar do povo mulçumano. Entretanto, Nelson, em seu livro Canoa e suas histórias (2004), relata que o inventor mesmo é Chico Aliziaro, conhecido como Chico Artesão:

O símbolo de Canoa acontece quando a lua está crescente, nós vemos a lua e a estrela juntas, a cada dia que a lua vai crescendo a estrela se distancia. Por volta de dois anos atrás a estrela ficou bem na ponta da lua, era lindo, muitas pessoas tiraram fotografias, isto chamou atenção dos visitantes que na época navegavam nas ruas de canoa, e viram pela primeira vez o símbolo executado no espaço por obra natural, tendo por heroína nossa mãe natureza. O nativo Chico artesão começou a fazer o símbolo de canoa antes

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dos turistas chegarem aqui, ele fazia a lua e a estrela trabalhando em casco de tartaruga e chifre de boi. (BARROS, 2004, p. 15)

O ícone, a lua e a estrela, faz parte atualmente da vida cotidiana do povo canoense. Vários artesanatos e quadros são expostos todas as noites na rua principal Broadway. Panfletos e vários outros materiais de publicidade da SETUR- CE e MTUR também vincularam esse símbolo ao turismo de Canoa Quebrada.

Sobre o topônimo Canoa Quebrada, o memorialista Nelson Pereira Barros, nativo da vila, em seu livro de memórias, afirma que quem pode contar melhor essa história é o poema de José da Rocha Freire, o Zé Melancia11, segundo o qual o nome originou-se de um feito histórico ocorrido na praia de Ponta Grossa. O navegante Capitão-de-Mar-e-Guerra, Francisco Aires da Cunha, vindo de Portugal com destino ao Brasil para fundar novos povoados, choca sua nau contra uma pedra e tenta levar sua embarcação até a foz do Jaguaribe, entretanto, a mesma encalha onde hoje seria Canoa Quebrada. Segundo ele, esse fato ocorreu em 1650, época em que foi fundado o povoado.

Porém, os registros das primeiras sesmarias para o povoamento da capitania do Ceará datam de 1678, ou seja, vinte oito anos depois da data apontada no poema de Zé Melancia. Dessa forma, provavelmente, o fato deve ter acontecido, porém, os índios que já habitavam a região litorânea e as ribeiras do Jaguaribe é que devem ter visto e colocado esse nome, até em razão de que a palavra canoa é de origem indígena.

Dentre outras datas que atestam a antiguidade de Canoa Quebrada, pode-se citar o nascimento de Francisco José do Nascimento (Chico da Matilde) ou Dragão, em 15 de abril 1839. Cavalcante (2002, p. 16), narra em seu livro, intitulado Dragão do Mar, o seguinte fato: “do filho do pescador Manoel do Nascimento e de Matilde Maria da Conceição, residente em Canoa Quebrada, teve uma espinha atravessada na garganta foi desenganado. Seus pais valeram-se de Nossa Senhora do Rosário, mas tão grave era o estado do recém-nascido que cheguei a rezar pela sua alma inocente”. Este menino depois se tornaria o Dragão do Mar, cearense, aracatiense,

11 Zé Melancia. Foi pescador, construtor de jangadas, cantador, estatístico de pesca, presidente da colônia de pescador Z.10 e poeta popular. Nasceu na vila de Canoa Quebrada em agosto de 1909.

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que nasceu na vila de Canoa Quebrada e ficou conhecido por suas ideias abolicionistas. Os relatos apresentados confirmam que Canoa Quebrada é tão antiga quanto Aracati.

A primeira ocupação da praia de Canoa Quebrada dar-se-á abaixo das falésias na beira do mar. Com o avanço da maré, porém, as famílias foram obrigadas a transferir suas residências para a parte de cima. A partir do século XX tem-se um grande número de migrações da beira-mar para cima das falésias. A igreja foi transferida na década de 1930. Atualmente, a área da praia só tem as barracas, as quais vêm sofrendo há alguns anos com a forte alta das marés.

Contudo, o ponto de partida para a urbanização da vila de Canoa Quebrada data da década de 1970 e está intimamente ligada à história do turismo, pois nesse período é que começaram a chegar os primeiros visitantes e a localidade passou a se destacar como um dos símbolos do “estilo de vida alternativo”. Segundo Barros (2004 ), os primeiros visitantes de Canoa Quebrada teriam sido médicos franceses em 1968, integrantes de um grupo em missão científica no Brasil que atendia os doentes em Marjorlândia. Uma vez ou outra vinham a Canoa Quebrada para atendimento e filmagens.

No primeiro momento, os moradores de Canoa Quebrada não cobravam dos visitantes a estadia nem a alimentação, ficando estes acomodados na casa dos próprios pescadores. Isso foi relatado durante várias entrevistas realizadas com os moradores mais antigos. Nelson Barros (2004) afirma, também, em seu livro ser uma “grande alegria para nós em receber as pessoas e não cobrávamos dormida, nem comida, fazíamos tudo com maior prazer”. Dessa forma percebe-se, nesse primeiro momento, um turismo que não estava ligado diretamente ao capital, podendo-se até dizer que existia em Canoa Quebrada, o que se chama hoje de turismo solidário e comunitário. Contudo, o capitalismo consegue transformar tudo em mercadoria ou em bem capital, o que não seria diferente com Canoa Quebrada, principalmente com a chegada dos europeus que começam a enxergar nessa praia uma fonte de lucratividade e uma oportunidade econômica comercial.

Na metade da década de 1970, Canoa Quebrada começa a despontar para alguns como o ‘paraíso hippie’. Não há, entretanto, indícios de que estes visitantes

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eram realmente hippies. De acordo com o empresário Élcio Antônio Fernandes12, em informação verbal, muitos desses visitantes eram mochileiros e ao desembarcar de ônibus em Aracati eram tachados de hippies, pois chegavam de mochila nas costas, a maior parte deles com cabelos compridos, barba e uma vestimenta diferente, provenientes de todas as partes do Brasil e do mundo. Esse fato gerou, também, a fama da praia ser ponto de maconheiros e de perversão, pela prática do nudismo. Nessa época, o acesso à vila de pescadores era precário, pois ainda não existia estrada pavimentada para a localidade, sendo o único acesso realizado por meio de trilhas e, boa parte, feito pelas dunas.

No entanto, nas últimas três décadas, a massificação do turismo em Canoa Quebrada, fruto da expansão da atividade turística, a tornou uma das praias mais conhecidas do país, em razão de sua bela paisagem e das noites animadas com diversos estilos musicais, atraindo pessoas de todos os lugares do mundo e transformando a vila de Canoa Quebrada em um espaço turístico.

Conforme Boullón (2005), a existência do espaço turístico está condicionada à presença de atrativos turísticos. Estes são a matéria-prima do turismo, uma vez que constituem a causa principal que motiva uma viagem turística. Canoa, então, dotada de belas paisagens litorâneas, cercada por dunas e falésias tinha a matéria- prima nescessária para o desenvolvimento da atividade turística.

Com a constituição desse espaço turístico, Canoa Quebrada passou a receber visitantes diariamente, ter sua paisagem natural alterada pelos empreendimentos turísticos e a ter ainda uma vida social agitada pelas baladas, como afirma Souza Neto (2011).

Praia passou a atrair visitantes e logo depois pessoas que se dedicavam a negócios turísticos, quando o lugar deixa de ser colônia de pescadores e passa a ser uma das praias internacionais do país. O turismo passou a ser a atividade econômica preponderante em Canoa Quebrada, ocorrendo a urbanização da praia. Logo mais, intensa ocupação de bares, restaurantes e empreendedores de outros países e estados, que chegam ao lugar e implantam seus megaempreendimentos (2011, p. 107)

12 Proprietário da empresa ArtCanoa, que vende objetos artesanais, e que chegou a Canoa Quebrada aos 18 anos, em fevereiro de 1978, vindo de Santo André-SP

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Passado o período de descobrimento pelos visitantes mochileiros, a Praia de Canoa Quebrada transformou-se num local de acolhimento do setor turístico, gerando, com isso, impactos no território anteriormente ocupado por pescadores e mulheres rendeiras e promovendo uma verdadeira mudança na vida social dessa comunidade que deu origem ao território turístico.

Com condições e infraestrutura para o desenvolvimento do turismo, Canoa Quebrada passa a ser identificada como local de lazer, sendo transformada e produzida para o turismo. A produção espacial foi sendo alterada ao longo dos anos, impulsionada pelo modo de produção capitalista, trazendo a Canoa Quebrada recursos, mas também grandes perdas culturais e patrimoniais, gerando vários problemas decorrentes da urbanização, principalmente, nas áreas de falésias e dunas.

Para Boullón (2005, p. 31), o funcionamento do espaço turístico exige uma superestrutura administrativa integrada por organizações privadas e organismos do estatais que se especializam em definir e harmonizar o conjunto de normas e critérios que regulamentam as formas operacionais do setor.

Foi a partir da década de 90, que Canoa Quebrada começou a ser vista como um polo turístico de grande potencialidade. A instalação de empreendimentos ligados à inciativa privada, após o investimento do setor público em infra-estrutura, como energia elétrica, água encanada e estradas, ofereceu as condições mínimas para a expansão das atividades turísticas. Dentre os empreendedores que surgiram na década de 90 destacam-se os estrangeiros (holandeses, italianos, espanhóis, dentre outros) e os provenientes de outros Estados do Brasil. Amplia-se, então, a construção de estabelecimentos de hospedagem e alimentação que são, na maioria dos casos, de propriedade de pessoas que chegaram, inicialmente, como turistas, e depois se fixaram nesse lugar, montando seus próprios negócios e criando um centro turístico.

Segundo Boullón (2005, p. 32), os centros turísticos são o principal elemento que compõe o espaço turístico, pois se comportam como uma economia de aglomeração que facilita a integração ou complementação das diferentes categorias e tipos adotados pelos serviços turísticos ali instalados. Segundo ele, os serviços ao turista podem ser classificados nas sete categorias seguintes: hospedagem,

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alimentação, passeios, esportes, comércio de artigos tipo souvenirs, transportes e agência de viagens.

A vila de Canoa vive um processo de urbanização, subordinado à lógica da atividade turística. O núcleo urbano “centro turístico”, agora, se desenvolve em função do consumo das paisagens e do espaço social habitado, fazendo surgir um novo modo de vida urbano, novas formas de paisagem e, por conseguinte, um novo território – o território turístico – assinalado pela descaracterização do espaço original, sendo, também, redefinido o conceito de modo de vida.

De acordo com Cruz (2006, p. 338), o turismo se dá na escala e na efervescência da vida nos lugares e mesmo nos lugares cuja vida está profundamente imbricada à atividade do turismo. Sua existência sempre vai além das lógicas impostas por essa atividade. Tal foi o caso de Canoa Quebrada, cujo crescimento acelerado do turismo nos últimos anos, provocou significativas transformações na realidade local, tanto no que se refere aos aspectos físicos e humanos, como por exemplo à melhoria das estradas de acesso, criação do aeroporto regional de Aracati, ampliação da infraestrutura urbana, pavimentação das ruas e iluminação pública, apesar de ainda precárias em algumas ruas. As mudanças mais significativas no espaço territorial resultam da construção de equipamentos turísticos, como pousadas, restaurantes, e lojinhas de souvenires.

Apesar do crescimento, a distribuição espacial da riqueza não foi a mesma. A maior parte da população de Canoa viu a economia se dinamizar e assistiu a profundas transformações em seu território, sem que fosse beneficiada com ganhos financeiros e melhores condições de vida. Ao contrário, observa-se na comunidade uma favelização em decorrência da falta de políticas públicas, constatada pelas ruas desordenadas, pela falta de saneamento básico, que redunda na acumulação de entulhos e lixo, entre outros problemas relacionados ao crescimento do território turístico, conforme demostram as figuras 30 e 31.

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Figura 30 – Rua sem alimento e calçada Figura 31 – Típico beco de Canoa Quebrada Fonte: Acervo do Autor (2013) Fonte: Acervo do autor (2013) A falta de controle e fiscalização na ocupação e gestão do solo, facilita a degradação ambiental com reflexos negativos para o bem-estar da população local. A carência de um planejamento integrado, com base nos princípios urbanísticos, por parte do governo, faz com que a localidade ainda tenha uma estrutura urbana deficiente no que se refere ao saneamento, pavimentação e iluminação em algumas ruas.

Como se observa na figura 32, Canoa Quebrada conta com a existência de quadras descontínuas, conectadas por becos e ruas sem nenhum tipo de alinhamento oficial, o que demonstra uma ocupação desorganizada do espaço.

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Figura 32 - Imagem do traçado urbano de Canoa Quebrada Fonte: www.canoaquebrada.tur.br (2013)

Em Canoa Quebrada, o processo de reprodução do espaço, originado pelo boom da atividade turística, evidencia a expulsão, por parte do capital, dos moradores locais cujas residências estavam localizadas mais próximas da orla marítima e da rua central – Broadway – para dar lugar aos restaurantes, bares e pousadas, provocando, assim, uma redefinição espacial, muito embora esse espaço não apresente divisas ou fronteiras.

O modo como se dá a apropriação de uma determinada parte do espaço geográfico pelo turismo depende da politica pública de turismo que se leva a cabo no lugar. À política pública de turismo cabe o estabelecimento de metas e diretrizes que orientem o desenvolvimento socioespacial da atividade, tanto no que tange à esfera pública como no que se refere à iniciativa privada. Na ausência da política pública, o turismo se dá à revelia, ou seja ao sabor de inciativas e interesses particulares. (CRUZ, 2002 , p. 9).

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Assim sendo, o espaço turístico perde e ganha valor com as interferências que nele se processam, transformando as localidades de diferente forma. Em Canoa Quebrada, a ocupação territorial, como já foi destacado anteriormente, deu-se de forma desorganizada, em razão da falta de políticas públicas para a implantação de negócios ou imóveis, o que gerou condições propícias para ocupações desordenadas e disputas pelo espaço geográfico entre os moradores nativos e estrangeiros.

A maioria das pousadas, especialmente as de maior tamanho e sofisticação, pertencem a pessoas que investiram em Canoa Quebrada por acreditarem em suas potencialidades turísticas. Da mesma forma, furam construidas residências secundárias, por pessoas oriundas de fortaleza e do exterior (Itália e Espanha) sobretudo nas áreas mais próximas do mar e na rua principal. A valorização do preço da terra nessas áreas está, como em todo o território de Canoa Quebrada, entre as mais altas do município de Aracati.

Sendo assim, a procura pelo espaço turístico, anteriormente utilizado apenas pelos nativos (pescadores), começa a provocar um intenso e abrupto processo de transformação, decorrente de toda uma ocupação espacial e urbana necessária ao fazer turístico, originando um processo de reordenamento sócio-espacial da comunidade nos últimos anos. Em Canoa Quebrada, tal como praticamente em todo o litoral cearense, isso vem acontecendo periodicamente. As comunidades litorâneas estão sendo afastadas do mar para dar espaço aos grupos com forte poder econômico.

A seguir, são apresentadas imagens aéreas das três últimas décadas que demonstram a evolução do espaço urbano de Canoa Quebrada, em consequência de sua transformação em território turístico.

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Figura 33 - Foto aérea de Canoa Quebrada, 1986 Fonte: Dantas (2003).

Figura 34 - Foto aérea Canoa Quebrada, 1996 Fonte: Dantas (2003).

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Figura 35 - Foto aérea Canoa Quebrada, 2006 Fonte: Google Maps (2013).

Figura 36 - Foto aérea Canoa Quebrada, 2013 Fonte: Google Maps (2013).

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Nos últimos 30 anos, a estrutura produtiva local passou por uma intensa transformação, a qual, por sua vez, viria a induzir outras atividades e o crescimento populacional, assim como para os novos patamares de comércio “turismo” e residenciais. As mudanças ocorridas na estrutura físico-territorial foram intensificadas mais ainda após a década de 1990, com a chegada da água encanada, energia elétrica e estrada asfaltada. Assim, pode-se afirmar que a expansão urbana de Canoa Quebrada, de certa forma, surgiu como um processo subordinado à lógica da atividade turística. O núcleo urbano se desenvolve em função do consumo das paisagens e do lazer, fazendo emergir um modo de vida urbano, novas paisagens e, por conseguinte, um novo território - “território turístico”- marcado pela descaracterização do lugar, sendo, também, redefinido o conceito de modo de vida.

A praia de Canoa Quebrada, porém, mesmo sendo a principal responsável pela atividade turística do município de Aracati, gerando condições sócio- econômicas favoráveis ao município, não se tornou um distrito independente de Aracati, como no caso de muitas outras praias no Brasil que adquiriram status de Município, como, por exemplo, Balneário Camboriú, no Estado de Santa Carina, que se desvinculou do município catarinense de Camboriú. Isso se deve pelo fato de Canoa Quebrada encontrar-se em uma área geográfica desfavorável ao desmembramento, tendo em vista que a localidade está fixada sobre uma falésia, sendo praticamente toda circundada por campo de dunas móveis, não permitindo uma expansão muito maior desse núcleo praiano. Mesmo com o incremento da atividade turística, a praia manteve sempre um elo de dependência com a sede municipal de Aracati, visto que boa parte dos elementos de consumo necessários à sobrevivência da comunidade, como os serviços públicos e de saúde, concentram- se ali.

O predomínio de dunas e falésias atribui um caráter singular à paisagem, proporcionando um cenário típico do turismo de áreas naturais, o que faz Canoa Quebrada receber turistas de várias partes do planeta, com destaque para o turismo interno, realizado por grandes operadoras turísticas, tais como a CVC e a TAM Viagens. É uma das praias mais importantes do Nordeste brasileiro, não pela sua extensão ou número de edificações, mas pelas suas paisagens naturais que são notáveis.

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Para proteger as características naturais de Canoa Quebrada em 1998 foi oficialmente criada pelo Poder Público Municipal a ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL (APA), regulando a exploração e ocupação da região. Ela se estende do Resort Porto Canoa à foz do Rio Jaguaribe. Essa APA foi criada através da Lei nº 40/98, de 20 de março de 1998. (SEMACE, 2013).

Figura 37 - Foto aérea APA de Canoa Quebrada (sem escala) Fonte: Projeto Canoa / PMA / GAU, março de 2002 ( apud DANTAS, 2003)

Vale ressaltar que a criação desta APA deu-se depois de intensas lutas da comunidade local contra grupos de grileiros que começaram a aparecer por volta da década de 1980. Sobre a especulação imobiliária, o professor Carlo Limaverde (Kako), descreve em artigo publicado no ano de 2001, no jornal CANOARACATI, do qual o mesmo era colaborador, que:

Historicamente as dunas não valiam um centavo. Local de difícil acesso a construções, ficaram até o ano de 1975 sem titulação particular, configurando local como terras públicas. Em escrituras de 1962, os limites ao nascente dos sítios agricultáveis são: “os morros da Canoa Quebrada”. A falta de títulos particulares foi descoberta pelos especuladores, que se valendo do pouco interesse do verdadeiro dono, que é o governo, fabricaram escrituras de usucapião e outras, se valendo da displicência dos cartórios, policia, judiciário, políticos e comunidade, ampliando os limites dos morros de Canoa até o Oceano Atlântico, coisa de 1.200 m de comprimento, ganhou de uma só canetada, ou também chamadas de “retificações de área”. De posse dos documentos, os donos vendem para outros e assim os registros vão passando de mão e desta forma se perde a origem pública, como se um

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objeto roubado depois de vendê-lo várias vezes ficasse legalizado, ou então aproveitam para querer ganhar fortunas através da indústria da indenização (LIMAVERDE e SILVA, 2002, p. 61)

De acordo com Lima Verde e Silva (2002, p. 69), a atividade turística ganha velocidade em 1984 com a melhoria da estrada carroçável que liga definitivamente a “ilha Canoa” ao mundo contemporâneo. Também, destaca que Pedro Feitosa de Andrade, proprietário do loteamento Baia de São Pedro, sugeriu que a comunidade fosse transferida para outra localidade, ao norte do terreno onde hoje se encontra a comunidade dos Estevão. A oferta, fora de certa forma, rejeitada pela comunidade, razão pela qual Pedro Feitosa de Andrade entrou com um inquérito e um processo judicial, visando à expulsão dos moradores que ali residiam a várias gerações. Esse processo arrastou-se por anos saindo, ao final, vencedora a comunidade.

Dentre as muitas lutas e manifestações contra a grilagem das terras de Canoa, pode-se destacar a manifestação cultural do show AME Canoa Quebrada. Nesse espetáculo, realizado em 16/01/1986, reuniram-se várias estrelas locais, músicos e fotógrafos, na concha acústica da Universidade Federal do Ceará – UFC, no bairro do Benfica, em Fortaleza. Limaverde e Silva (2002, p. 71) lembra que nesse show estavam presentes Raimundo Fagner, Belchior, Ednardo e tantos outros.

No centro desta disputa encontrava-se a comunidade dos Estevão, cuja origem remonta à década de 1930, com a história de Estevão Pereira da Silva, pescador, natural de Aracati, que residia na comunidade de Fontainha, localidade litorânea que faz limite com o município de Icapuí. Chegando a Canoa Quebrada, o Sr. Estevão conheceu e casou-se com Maria Valente da Silva e juntos tiveram 13 filhos. Escolheu residir próximo à enseada que fica atualmente entre Canoa Quebrada e o Resort Porto Canoa, pois era um bom local para ancoragem de sua embarcação, além de possuir uma bela paisagem até Ponta Grossa, hoje munícipio de Icapuí. A origem do nome da localidade canoense, segundo Barros (apud LIMAVERDE E SILVA, 2002, p. 68) refere-se ao Sr. Estevão. Em estudo sobre a comunidade de Estevão de 1968, relata que a pequena distância que separava sua casa de palha das outras serviu para batizar o local de “estevão”. Os pescadores iam “lá pro Estevão” à procura do companheiro quando chegava a hora de ir para o mar.

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De acordo com Dantas (2003), nos primeiros meses de 1983, iniciou-se a abertura de uma estrada carroçável como parte de um projeto do loteamento “Paraíso da Canoa”, distante 2 km do centro do povoado. Em 1984 foi concluída a estrada de acesso à vila, cortando a grande duna do Por do Sol para permitir a chegada dos carros até o começo da Broadway. A implantação da referida estrada fez com que a especulação imobiliária interferisse nas mudanças de comportamento da população, abrindo precedente para seu processo de crescimento e descaracterização.

4.2 Reflexos da atividade turística na organização sócio-espacial de Canoa Quebrada

Como já foi destacado anteriormente, Canoa Quebrada é reconhecida internacionalmente. Grande parte dos turistas estrangeiros chega através de voos charters ou regulares pelo aeroporto internacional Pinto Martins, em Fortaleza, que, aliás, é o portão de entrada do turismo no Estado do Ceará. De Fortaleza pode-se chegar à Canoa Quebrada de ônibus (aproximadamente 3,5 horas de viagem) ou de avião, desembarcando no aeroporto regional de Aracati, em um voo com duração aproximada de 15 a 20 minutos. A maioria dos turistas estrangeiros é proveniente da Holanda, Itália e Espanha e os nacionais são, em grande parte, procedentes dos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.

Em buscas pela internet, encontra-se vários anúncios sobre Canoa Quebrada apresentada como um paraíso ou uma praia alternativa, estratégia de utilizada marketing para vender a localidade. Porém, não se pode negar que Canoa é um destino consolidado no mercado nacional e internacional. De acordo com Cruz (2006), ingressar no competitivo rol dos destinos turísticos nacionais e internacionais não é objetivo fácil de ser alcançado. Tornar-se um destino nacional e internacionalmente conhecido é resultado de um feixe de ações e relações, fatores endógenos e exógenos cujo comando, na maioria das vezes, não pertence ao lugar receptor. Ao contrário, a hegemonia dos mais importantes polos emissores do país e do mundo é que vai influenciar esse processo. Nesse sentido, nota-se que Canoa Quebrada não se fez sozinha no mundo do turismo. Foram realizadas muitas ações (muitas das quais de infraestrutura) após os anos de 1990 pela SETUR/CE e várias

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campanhas de marketing nos principais polos emissores de turismo no Brasil e na Europa.

Assim sendo, com o turismo, espaços antes não-urbanizados de pequenas localidades como Canoa Quebrada, passam por processos de transformação, decorrentes da instalação de infraestrutura urbana necessária ao fazer turístico. Na atualidade, a atividade turística é vista como um importante fator de valorização econômica e de desenvolvimento das localidades, porém a ocupação desordenada dessas áreas conduz a inúmeros impactos negativos de âmbito social, ambiental e, também, econômico, que se tornam preocupantes na medida em que desestabilizam ecossistemas e interferem negativamente nas condições de vida dos moradores das comunidades locais. Com a chegada do turismo novas relações de trabalho são ditadas nas pequenas vilas de pescadores, baseadas anteriormente na pesca de subsistência.

A partir do interesse turístico, surgem melhorias na infraestrutura com a construção de estradas, a implementação de serviços de luz, água e saneamento básico e a construção de aeroporto. Esses impactos positivos dão-se devido a essas melhorias e à geração de empregos, tanto diretos quanto.

No caso de Canoa Quebrada, um dos setores que contribuiu para o fortalecimento desse território turístico foi o alimentício, tendo duas áreas espaciais principais: a zona de beira da praia, abaixo da falésia, onde se encontram as barracas de praia, em um total de 26, espalhadas por toda a orla de Canoa e servindo diariamente pratos típicos do litoral cearense, como a peixada cearense, lagosta, camarão acompanhado de baião de dois e macaxeira; a outra zona, que concentra boa parte dos restaurantes, é o núcleo central de Canoa Quebrada, a Av. Dragão do Mar, conhecida como Broadway, que oferecem principalmente comidas italianas como massas e pizzas, pois grande parte dos seus proprietário são europeus, principalmente, italianos.

De acordo com Oliveira Barros (2005, p. 97), o fluxo de turistas em Canoa Quebrada teve um aumento de 82% no período de 2001 a 2002 gerando desafios e pressões adicionais à localidade. Ainda em sua pesquisa sobre os arranjos produtivos de Canoa Quebrada afirma que 90,7% dos empreendimentos são de micro e pequenas empresas. Também foi constatado que 51,6 % da mão de obra tem até o ensino fundamental e 45,2% tem ensino médio. Ele, relata, também que a

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maior parte dos empregados é da própria comunidade, 66,7 %. O autor acrescenta que, apesar de limitado o nível de qualificação e de preparo dos funcionários, o turismo representa uma fonte de emprego e renda para as pessoas e uma oportunidade para o incremento da atividade econômica.

O aumento dos fluxos migratórios de turistas, de certa forma, contribuiu para o processo de urbanização de Canoa Quebrada, o que não difere de outras localidades turísticas, nas quais registra-se um aumento dos fluxos migratórios de mão de obra relacionada à atividade turística, que emerge na localidade, muito embora a própria atividade turística demande mão de obra local, o que contribui para intensificar esses fluxos.

4.2 Evolução da hotelaria em Canoa Quebrada.

Os primeiros estabelecimentos de apoio ao turismo em Canoa Quebrada datam da década de 1970, tendo sido pioneiro Adolfo Alves dos Santos. De acordo com o blog Canoanet, ele “recebeu os primeiros turistas de Canoa Quebrada em meados dos anos 70. Como os turistas eram muito brancos, a população tinha medo daqueles que julgavam ser vampiros. Seu Adolfo para receber melhor esses hóspedes, abriu o alpendre na sala da sua casa que funcionara como o primeiro restaurante de Canoa”. Em relatos feitos por Adolfo Neto, isso ocorreu por volta de 1972 a 1975. Conforme depoimento do mesmo, nos três primeiros anos somente seu avô tinha uma hospedaria, em seguida foram surgindo outras.

De acordo com Esmeraldo (2002, p. 85), além da casa de seu Adolfo, os nativos alojavam os turistas nas suas próprias casas. Quando gostavam do visitante deixavam passar o tempo que quisessem; quando não gostavam, pediam para que saíssem das suas casas. Dá para observar que não existia, nesse primeiro momento, uma relação comercial, ou seja, não havia uma relação de mercado capitalista.

Hoje a pousada do Sr. Adolfo é administrada pelos seus filhos e conta com oito quartos para alugar. Não tem uma estrutura com a das pousadas mais modernas e encontra-se como desativada no cadastro da SETUR/CE.

Na mesma década, surgiu a pousada da Maria Alice, que ainda está em atividade. Após uma reforma, ela funciona com quartos em cima e lojas no piso térreo, compondo um centrinho comercial juntamente com outras lojas de suvenires,

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mercadinhos, entre outros estabelecimentos. Na década de 1980, a pousada assegurava o fornecimento de energia por meio de um gerador próprio que ficava próximo a praia, como mostra a figura 41. Após a morte de Maria Alice, no ano 2002, a administração da pousada ficou sob a responsabilidade de sua nora Maria Auxiliadora. Atualmente conta com 16 Uhs e 38 leitos. Giorgio Guerzoni, atual proprietário do Hotel Tropicália (relato verbal), conta que na segunda vez que veio a Canoa Quebrada ficou hospedado na pousada de dona Maria Alice, que oferecia a melhor estrutura da época.

Figura 38 - Pousada Maria Alice (2013) Figura 39 - Casa do gerador 1983

Fonte: Acervo do Autor Fonte: Blog Canoart

A pousada da Dona Didi também é uma das que foram instaladas em meados da década de 70. Começou, também, como as outras duas, alugando rede e depois um quarto para hospedar os turistas que iam chegando. Localiza-se na Av. Dragão do Mar (Broadway) e também possui várias lojas para alugar na parte de baixo e a hospedagem fica na parte de cima. Conta atualmente com 10 UHS e 20 leitos.

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Figura 40 - Pousada dona Diva (Broadway) Fonte: www.passagenseturismo.com.br (2013)

Os hotéis originários da década de 1970, não suportaram a competitividade de uma hotelaria mais moderna com inovações tecnológicas, perdendo espaço no mercado e deixando de funcionar como estabelecimentos para hospedagem. Passaram a investir em outros segmentos como, por exemplo, o comércio. Muitos deles transformaram as suas instalações para a implantação de centros comerciais, como foi o caso das pousadas de Dona Diva e Maria Alice.

Já na década de 80, surgiram duas novas pousadas: Lua Morena e Latitude. A pousada Lua Morena nasce por volta de 1984, de acordo com informações verbais de Toinho Correia, tendo como proprietário Miguel Correia, natural de Aracati, que incialmente dispunha de 8 chalés. No ano de 2000, foi ampliada para 16 chalés e passou a ser administrada por Jean Pierre. Foi a primeira a ter água encanada movida por um cata-vento e, também, uma das primeiras a fazer uso de telefone em Canoa Quebrada. Na parte central do terreno onde está situada a pousada, há uma residência datada da década de 1970, uma das primeiras no estilo de veraneio com varada de fora a fora.

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Figura 41 - Pousada Lua Morena (2012) Figura 42 - Pousada Lua Morena (1984) Fonte: Pousada Lua morena (2013) Fonte: Pousada Lua morena (2013)

A Pousada Latitude também situada na Av. Dragão do Mar (Broadway), foi instalada por dona Roseli, empreendedora oriunda da região amazônica brasileira, no início da década de 1980. Na época, a pousada foi construída com carnaúba, especialmente seu telhado e sua base de sustentação. Numa área de mais de 1.000 m2, foi levantado um prédio de três pavimentos, dando origem, assim, a uma das primeiras pousadas de Canoa Quebrada.

No final da década de 1990, a amazonense Roseli resolveu voltar para sua terra natal e arrendou a pousada para o casal mineiro, Paulo e Cacilda. O casal, que naquela época já tinha outros investimentos em Canoa Quebrada, convidou Marta, mãe de Paulo, para assumir a gerência da pousada Latitude. Em 2006, o casal mineiro comprou, definitivamente, a pousada deixando na administração os pais de Paulo, Rui Barbosa Soares e Marta Soares, que fizeram várias reformas e melhorias na pousada. Como os demais meios de hospedagem que surgiram na Broadway, a pousada conta, na sua infraestrutura, com o Latitude Center, um mini-shopping com caixas eletrônicos do Banco do Brasil e Bradesco, Agência dos Correios, Casa Lotérica e uma loja de moda esportiva unissex.

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Figura 43 - Pousada Latitude Fonte : www.portalcanoaquebrada.com.br

As primeiras pousadas da década de 1970/80 a surgirem na AUI de Canoa Quebrada localizavam-se no setor 230110905000088, o mais central dos setores. Na figura 44, pode-se observar, também, que a maior concentração delas ocorria na Av. Dragão do Mar, conhecida como Broadway.

Figura 44 - Localização das pousadas-décadas de 1970 / 80 Fonte: Elaborada pelo autor (2013)

O surgimento do setor hoteleiro de Canoa Quebrada, mais ligado às relações comerciais e trabalhistas, por sua vez, dar-se-á no final da década de 1980, com a chegada das redes de energia elétrica e água encanada, respectivamente nos anos

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de 1989 e 1992. Essas duas novas infraestruturas favoreceram a construção de estabelecimentos hoteleiros de imigrantes de outros estados e países, principalmente, os europeus.

Com o passar dos anos, a população de Canoa Quebrada assistiu às transformações de sua organização espacial em decorrência do aumento significativo do setor hoteleiro e de alimentação. Além disso, diversas obras e medidas relacionadas à infraestrutura foram implantadas pelo governo do estado, permitindo que Canoa Quebrada recebesse um maior fluxo turístico, com destaque para a pavimentação do acesso até a sede do município.

Até o final da década de 1980 e início dos anos de 1990, a rede hoteleira de Canoa Quebrada era pacata e calma, com poucos prédios construídos. Porém, diante da melhoria de sua ligação com a rede rodoviária nacional e estadual e outras infraestruturas criadas pelo Prodetur/CE, começa, após a década de 90, o incremento do fluxo migratório, a instalação de várias pousadas e um aumento da atividade turística, bem como do mercado imobiliário. Fica clara, então, a real mudança do espaço local.

Em razão da nova conjuntura turística que surge, nos anos de 1990, no Nordeste brasileiro com o Prodetur/Nordeste, surge em Canoa Quebrada uma hotelaria voltada para o turismo de megaprojetos. A chegada do resort Porto Canoa marca essa adaptação das estruturas hoteleiras para atender um grande público, com estrutura para eventos. Também na mesma época merece destaque o surgimento de alguns empreendimentos do setor hoteleiro dentro da área central de Canoa Quebrada, como a construção do Hotel Tropicália, da Pousada Falésia e da Pousada do Toby.

O Hotel Tropicália é de propriedade de Giorgio Guerzoni, italiano que veio ao Brasil em busca de um lugar para fazer um bom investimento. Segundo relato do próprio Guerzoni, ele veio subindo a procura de um bom lugar para fazer sua pousada, começando pelo litoral baiano onde passou por Porto Seguro e Porto de Galinhas, em Pernambuco, que já eram áreas bem mais exploradas do que Canoa na década de 80. A partir de 1992, ele começa a construção do atual Hotel Tropicália que conta com 20 apartamentos e 78 leitos.

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Figura 45 - Hotel Tropicália Fonte: Acervo do autor (2013)

A Pousada do Toby foi construída em 1990 e parte do sonho de dois dinamarqueses, Torben e Frank. Essa parceria resultou na concretização de um prédio de três andares o primeiro verticalizado de Canoa Quebrada, localizado na rua Leandro Bezerra, a uma distância de 60 metros da Broadway. Possui 23 Uhs, 66 leitos e ainda tem, na sua cobertura, um bar e restaurante. A pousada emprega uma média de 16 funcionários.

Figura 46 - Pousada do Toby Fonte: Pousada do Toby

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O Falésia Praia Hotel começou a funcionar no dia 31 de dezembro de 1994, a partir dos ideais empreendedores do Sr. Moisés, que largara o Banco do Nordeste (BNB) para se fixar como empresário do setor hoteleiro em Canoa Quebrada. Seu nome deriva das formações de barreiras arenosas que dão origem às falésias de Canoa Quebrada. O Hotel está localizado na rua Sudoeste, a 200 m da praia e da Broadway. Hoje, o hotel encontra-se sob a responsabilidade da esposa do Sr. Moisés, Maria Salete Santigo e seu filho, Igor Santiago Moisés.

Figura 47- Hotel Falésia Fonte: www.falesiahotel.com.br

No ano de 1996, pode-se destacar a inauguração do maior empreendimento hoteleiro de Canoa Quebrada, o Porto Canoa Resort com bandeira Bestwestern, do empresário Clodomir Girão. O empreendimento possuía uma infraestrutura com salão de convenções, um amplo auditório para reuniões com capacidade para 130 pessoas e duas salas para serviços de apoio aos eventos como seminários, congressos e treinamentos. Contava ainda com dois restaurantes: o Villa dos Pescadores e o Restaurante Porto Canoa Sea Club, o principal restaurante de The Great Sea de Porto Canoa Resort, um complexo que contava ainda com um parque aquático e lojinhas, além de 180 apartamentos em atividade.

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Figura 48 - Vista Aérea do Resort Porto Canoa Fonte: Google Maps (2013)

Encravado entre Canoa Quebrada e Majorlândia, sua arquitetura tem estilo mediterrâneo. Dentro do complexo há uma pousada, o hotel resort e três residenciais de apartamento. Na parte hoteleira, o Resort Porto Canoa tinha 137 UHs, com 272 leitos; a pousada mais 24 UHs e 48 leitos. O resort permaneceu em atividade por dez anos até seu fechamento total. Hoje, no local ainda funcionam os residenciais com aluguel de apartamentos para mensalista e na alta temporada. Já a parte do hotel encontra-se em ruínas, conforme pode ser observado nas figuras 49 e 50.

Figura 49- Entrada Porto Canoa Figura 50- Entrada Porto Canoa Fonte : Acervo do autor (2013) Fonte : Acervo do autor (2013)

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As figuras mostram o descaso com um empreendimento que esse ano completa 7 anos fechado. Mesmo fechado, o grupo Girão conta ainda com 16 funcionários para manter o local, embora de forma bastante precária.

Na década de 1990, surgiram ainda outros empreendimentos hoteleiros na AUI de Canoa Quebrada, conforme Quadro 4.

Quadro 4 - Pousadas da década de 1990

Chalé atmosfera

Falésia

La Dolce Vita

Pancho Villa

Alternativa

Residência Oceanus

Califórnia Pousada Carol

Chataleta

Pousada das Cores Década de 90 Castelinho

Pousada do Holandês

Pousada do Toby Pousada Toquinho

Pousada Europa

Pousada Fortaleza

Lua Estrela

Oasis do Rei

Pousada subindo as dunas Vale do Luar

Via láctea

Villagem Pousada

Fonte: SETUR/CE adaptado pelo autor

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Já na década de 2000 tem início uma intensa ocupação do setor 88 da AUI de Canoa Quebrada por parte do setor hoteleiro, como por exemplo, a Pousada & Mares, o Hotel Long Beach, a Pousada Missare, a Pousada Presidente Hotel e a Pousada Aruanã.

Uma das primeiras pousadas a ocupar esse setor foi a Pousada 7 Mares, que nasceu do empreendedorismo de um jovem casal oriundo de Fortaleza, Veronica e Guilherme, em julho de 2000. Segundo o proprietário (informação verbal), o mesmo abriu seu negócio em Canoa Quebrada após aderir ao programa de demissão voluntária no Banco do Estado do Ceará (BEC), que iria ser privatizado. O programa proporcionou o capital para montar o negócio, além da realização de vários cursos na área de empreendedorismo, hotelaria, alimentos e bebidas e outros. Depois de um demorado processo de estudo de viabilidade e pesquisa de mercado, e de ter visitado várias praias no litoral, escolheram Canoa Quebrada para a sede de seu empreendimento. A pousada iniciou sua operação com 5 chalés, sendo que o casal morava em um e alugava os outros quatro. Hoje, a pousada conta com 7 chalés e 3 apartamentos. Guilherme relata, ainda, as dificuldades iniciais, pois pretendia comprar um terreno próximo à Broadway, mas os valores não eram acessíveis. Por isso adquiriu um terreno em uma área ainda pouco habitada em Canoa, que não tinha estrada, energia elétrica trifásica, nem telefone. Com a construção da pousada teve que fazer o nivelamento do terreno, abrir a estrada até a pousada e puxar energia trifásica e telefone. Segundo ele, a energia tri-fase só chegou à região após a construção do Hotel Long Beach, em 2002.

Figura 51 - Pousada Sete Mares Piscina Figura 52 - Sete Mares Chalés Fonte: Acervo do Autor (2013) Fonte: Acervo do Autor (2013)

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O Hotel Long Beach representa um novo marco na hotelaria de Canoa Quebrada, pois dentro de Canoa não havia um empreendimento dessa categoria (5 estrelas). Sua estrutura é com certeza a melhor de Canoa Quebrada, conta com salão para eventos, restaurante dentro do estabelecimento, bar, padaria, lavanderia, toda a estrutura de um grande hotel, que na região só é encontrada no Porto Canoa.

O Hotel Long Beach inicialmente de propriedade do Sr. Sérgio, oriundo da Itália, da região da Sardenha, foi vendido, em 2008, para o Sr. Juan, esse de origem espanhola, que realizou várias reformas e expandiu o hotel com a construção do Residencial Long Beach, que conta com 22 apartamentos luxo, piscina olímpica e bar, dentro de uma área bem arborizada.

Figura 53 - Hotel Long Beach Figura 54 - Área piscina Long Beach Fonte: www.longbeachcanoa.com/ Fonte: www.longbeachcanoa.com/ A Pousada Aruanã é outra localizada dentro do setor 35, na rua dos Bugueiros, s/n, em uma área de 3.600 m². Foi construída em 2005 com 15 apartamentos, sendo logo em seguida, após a constatação da crescente demanda, construídos mais 6 apartamentos. Emanuele Samore, o proprietário da pousada, é de procedência italiana. Como podemos conferir nas figuras 55 e 56, a Pousada Aruanã é uma das pousadas estabelecidas em Canoa Quebrada após o ano 2000 fora do setor central da AUI de Canoa Quebrada. A ocupação desse setor começa a ocorrer, primeiro porque o setor central já estava praticamente todo urbanizado e, segundo, devido aos preços mais acessíveis. Vale ressaltar que no local as ruas têm

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um traçado melhor do que as do setor central, facilitando a circulação dos veículos automotivos.

Figura 55 - Construção da pousada Aruanã - 2004 Fonte: Google Maps (2013)

Figura 56 - Pousada Aruanã - 2010 Fonte: Google Maps (2013)

Os estabelecimentos que surgiram após a década de 2000, trouxeram, na sua maioria, equipamentos e instalações modernas: TVs de última geração, trancas das portas com cartões magnéticos, sistema informatizado de reserva, zonas de internet wireless, entre outros, fazendo com que os equipamentos das décadas anteriores ficassem ultrapassados, o que obrigou muitos proprietários a reformar e modernizar

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suas pousadas. Os que não acompanharam esse processo acabaram tendo que baixar o valor das diárias, assim como sua rentabilidade e buscar a melhora da qualidade no serviço.

Assim, como visto, no polo turístico de Canoa Quebrada, os meios de hospedagem existentes são bem diferenciados, incluindo desde as simples pousadas familiares até as mais luxuosas que oferecem serviços como áreas de lazer, bar e restaurantes. Atualmente, a oferta hoteleira do município de Aracati é composta de 84 estabelecimentos sendo 60 somente em Canoa Quebrada, a Algumas pousadas, porém, como ficou constatado, não se encontram nos cadastros da SETUR/CE. Por isso esse número pode ser bem maior.

Os períodos considerados de maior ocupação em Canoa Quebrada são o Carnaval, a Semana Santa, o Reveillon, e a alta estação no meses de Julho, Dezembro e Janeiro. Os outros períodos não apresentam grandes oscilações de demanda, com exceção dos finais de semana, quando os hotéis estão sempre cheios.

Como se pode observar, o desenvolvimento da atividade hoteleira em Canoa Quebrada deu-se mesmo de forma mais evidente a partir da década de 90, acompanhando o desenvolvimento do turismo no estado do Ceará. Em último levantamento colocado à disposição sobre a rede hoteleira de Canoa Quebrada pela SETUR/CE, em 2013, ela composta das seguintes pousadas conforme a tabela 9.

Tabela 8 – Setor hoteleiro de Canoa Quebrada13

Quant. Empreendimentos Leitos UHS Cadastur

1 Adolfo’s Pousada 8 4 Sem cadastro

2 Beach Flat Canoa 84 21 Sem cadastro

3 Canoa Beach Pousada 20 7 Cadastrada

4 Chalé Atmosfera 16 12 Sem cadastro

5 Chalé do Carlinhos/Pousada 8 4 Sem cadastro Caminho do Mar

6 Chalés da Mata 38 14 Cadastrada

7 Falésia Praia Hotel 41 19 Sem cadastro

13 Tabela cedida pela Secretaria de Turismo do Ceará no mês de julho de 2013, adaptada pelo autor.

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8 Hotel Pousada Tropicália 78 20 Cadastrada

9 Hotel Latino Piratas 20 4 Sem cadastro

10 La Dolce Vita Pousada 55 16 Cadastrada

11 Hotel Pousada Canoa Quebrada 71 29 Sem cadastro

12 Long Beach Village Hotel 120 64 Cadastrada

13 Pancho Villa Pousada 10 4 Sem cadastro

14 Pousada Carol 35 15 Sem cadastro

15 Pousada Alternativa 10 8 Sem cadastro

16 Pousada Aruanã 60 20 Cadastrada

17 Pousada Azul 26 10 Sem cadastro

18 Pousada Azul Marinho 10 5 Sem cadastro

19 Pousada Califórnia 55 30 Cadastrada

20 Pousada Chalés da Mata 24 12 Cadastrada

21 Pousada Chataleta 40 18 Sem cadastro

22 Pousada Colibri 11 4 Sem cadastro

23 Pousada da Tia Jack 8 2 Sem cadastro

24 Pousada das Cores 15 6 Sem cadastro

25 Pousada Casa de Rossi 23 7 Sem cadastro

26 Pousada Jardim da Lu 20 6 Sem cadastro

27 Pousada Dona Helena (Dell’Amicízia) 20 8 Sem cadastro

28 Pousada do Assis 12 4 Sem cadastro

29 Pousada do Castelinho 37 17 Sem cadastro

30 Pousada do Holandês 42 18 Sem cadastro

31 Pousada do Toby 66 23 Sem cadastro

32 Pousada do Toquinho 12 4 Sem cadastro

33 Pousada Dona Flor 18 6 Cadastrada

34 Pousada Europa 36 12 Sem cadastro

35 Pousada Fortaleza 77 27 Cadastrada

36 Pousada Iguana 32 12 Cadastrada

37 Pousada Latitude 41 16 Cadastrada

38 Pousada Long Oceanus 29 10 Cadastrada

39 Pousada Lua Estrela 30 11 Sem cadastro

40 Pousada Lua Morena 52 17 Cadastrada

41 Pousada Luna Rosa 16 8 Cadastrada

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42 Pousada Maria Alice 38 16 Sem cadastro

43 Pousada Missare 48 24 Cadastrada

44 Pousada da Maria 40 3 Sem cadastro

45 Pousada Morada do Sol 35 10 Sem cadastro

46 Pousada Nascer do Sol 12 6 Sem cadastro

47 Pousada Residência Oceanus 32 11 Cadastrada

48 Pousada Oasis do Rei 56 20 Sem cadastro

49 Pousada Por do Sol 36 14 Sem cadastro

50 Pousada Quebra Mar 15 5 Sem cadastro

51 Pousada Reencontro 8 4 Sem cadastro

52 Pousada Sete Mares 10 26 Cadastrada

53 Pousada Solar dos Ventos 20 10 Sem cadastro

54 Pousada Subindo as Dunas 21 9 Sem cadastro

55 Pousada Sírius Canoa 36 18 Cadastrada

56 Pousada Vale do Luar 25 9 Cadastrada

57 Pousada Via Lactea 20 15 Cadastrada

58 Pousada Vila Canoa 24 8 Sem cadastro

59 Residenza Canoa Pousada 17 7 Cadastrada

60 Tranquilandia Village Pousada 51 17 Cadastrada

Fonte: SETUR/CE, 2013 adaptada pelo autor

A Política Estratégica do Turismo, nas duas últimas décadas, contribuiu para esse crescimento do setor hoteleiro de Canoa Quebrada, que apresentou um grande avanço, representado pelo aumento do fluxo turístico responsável pelo surgimento de uma nova organização territorial. Ficou evidenciada a forte presença do capital privado na instalação e ampliação dos meios de hospedagem e de alimentação, na realização da produção cultural, de entretenimento e lazer, bem como na diversificação dos serviços turísticos.

Assim sendo, ocorre ao mesmo tempo um processo de urbanização identificado através da otimização dos espaços para uso do setor hoteleiro. Com isso, muitas das edificações típicas de vila de pescadores foram sendo destruídas para atender às novas funções da hotelaria, situação comprovada, principalmente, com a construção dos prédios na Broadway, para abrigar os meios de hospedagem e restaurantes.

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Outro registro importante quanto aos hotéis no período compreendido entre as décadas de 1970 e 1980, diz respeito a sua concentração numa área específica do centro urbano de Canoa e que os mesmo não tinham áreas de lazer, nem estacionamento. Já os hotéis inaugurados de 1990 a 2000, refletem uma tendência de modernização, acompanhando o novo padrão arquitetônico das construções dos grandes centros urbanos, ao mesmo tempo em que introduzem melhorias físicas e de serviços, tais como dormitórios com banheiro privativo, serviços completos de hotelaria e área de lazer com piscina.

Até 1990, o turismo, em Canoa Quebrada, era praticado por um público menos massificado; após a década de 90, o mercado turístico dessa região teve a sua natureza modificada, fato que gerou um grande impacto espacial. Trata-se não apenas da transformação e da ampliação da ocupação diante dessa atividade, mas de uma mudança de qualidade e de abrangência do mercado, para atender um turista muito mais exigente com os serviços de apoio.

A tabela 10, a seguir, demonstra o crescimento da oferta de unidades habitacionais de 1990 a 2013.

Tabela 9 - Evolução da Hotelaria de Canoa Quebrada

Década Hotéis

Antes de 90 5

1990 24

2000 69

2013 84

Fonte : SETUR/CE (Apud SOUZA NETO, 2011), adaptado pelo Autor

Como se pode observar através dos dados relacionados na tabela acima, até antes de 1990, constata-se um crescimento mínimo com registro de 5 pousada, porém existia muitas casas com quartos para alugar. Já no intervalo, entre 1990 a 2000, percebe-se um aumento significativo, correspondente a 1000% no número de habitações. No período entre 1990 e 2005, houve um crescimento em Canoa

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Quebrada decorrente da instalação de novas infraestruturas, que contribuem, positivamente, para o aumento na oferta de unidades habitacionais em razão aos mais de 40 hotéis que surgiram no núcleo urbano de Canoa Quebrada. Vale lembrar que as redes hoteleiras chegaram a Canoa Quebrada após o ano 2000, aumentando a competitividade do mercado hoteleiro.

Assim sendo, pode-se dividir o desenvolvimento do turismo em Canoa Quebrada em três momentos. O primeiro coincide a do descobrimento do lugar, durante a década de 70 e 80 e com a chegada dos mochileiros provenientes de outras regiões do Brasil e de outros países. O segundo com a consolidação do destino na década de 1990, período no qual se constata um expressivo aumento dos fluxos de turistas e do número de pousadas. E o terceiro momento, após o ano 2000, caracterizado por um destino já consolidado, com uma hotelaria mais moderna e uma grande transformação sócio-espacial em Canoa Quebrada.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

As considerações aqui apresentadas correspondem aos resultados de uma investigação que procurou analisar a evolução do município de Aracati a partir do seu primeiro ciclo econômico, a pecuária, que deu origem ao como “ciclo do gado”, até a formação do polo turístico de Canoa Quebrada, com ênfase no setor hoteleiro, grande responsável pelas mudanças na organização sócio-espacial da praia de Canoa Quebrada. Ao longo deste trabalho, foram discutidas as transformações decorrentes da expansão econômica da cidade de Aracati, assim como a ocupação do litoral cearense e seus reflexos na paisagem, dando novas formas geográficas ao espaço costeiro.

Assim sendo, conclui-se que a organização sócio-espacial deste município é obra de distintos períodos histórico-econômicos e advém de um processo contínuo de transformações, impulsionado pelo aumento das atividades econômicas até culminar com o turismo. Nesse sentido, a investigação partiu do entendimento de que o espaço resulta da combinação de elementos naturais e humanos e de relações sociais historicamente determinadas, pois o processo de produção de qualquer espaço é, ao mesmo tempo, histórico e natural, visto que a sociedade imprime suas marcas sobre o quadro físico.

O referencial teórico básico utilizado para a análise teve como ponto de partida a utilização de categorias analíticas, que permitiram compreender a gênese e a evolução do município de Aracati até o surgimento e a consolidação do polo turístico de Canoa Quebrada, inserido no contexto regional, nacional e internacional. Deste modo, a pesquisa apoiou-se em obras de referência apropriadas à análise da realidade sócio-espacial e do turismo, com destaque para as contribuições teórico-metodológicas difundidas por Milton Santos. Já para um melhor entendimento da evolução das atividades econômicas, fez-se uso da teoria dos Ciclos Longos ou Ciclos de Kondratieff que caracterizam o desenvolvimento do capitalismo em períodos de aproximadamente 50 anos, durante os quais a fase de expansão econômica é seguida por um período depressivo.

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Com isso, pôde-se observar que a evolução econômica de Aracati está dividida em quatro ciclos: o ciclo do Gado, ligado ao setor da pecuária; o Ciclo da Agricultura, ligado, principalmente, à produção de algodão, carnaúba e sal; o Ciclo energético e petroquímico, ligado às fazendas de petróleo e usinas eólicas; e o Ciclo da Tecnologia, Informação e Serviços, durante o qual se destacam os setores de informatização, automação e prestação de serviços como turismo, alimentação, entre outros.

Os períodos dos ciclos foram estimulados por iniciativas e pelo surgimento de inovações responsáveis por transformações que não se limitam à esfera produtiva, mas afetam também a organização espacial e o consumo. A definição dos ciclos permitiu, ainda, a compreensão das crises vivenciadas pelo município, geradas pelo comportamento cíclico da economia capitalista ao longo da história, com consequências sobre a evolução sócio-espacial da cidade.

Sobre o desenvolvimento do espaço urbano de Aracati até o polo turístico de Canoa Quebrada, buscou-se estudar as características espaciais e temporais, para assim compreender a configuração atual. Para tanto, foi preciso remontar às origens de sua organização urbana, interpretando as alterações decorrentes da dinâmica da sociedade em cada período histórico e fragmentando por partes para um melhor entendimento do todo. Não era possível atingir o objetivo sem a compreensão das variáveis que atuaram em diferentes períodos históricos afetando a sociedade local e a organização do espaço objeto da investigação.

Desde a colonização portuguesa até a consagração como destino turístico consolidado, as relações sócio-econômicas foram definindo o projeto urbano de Aracati. A cidade teve seu destino marcado por uma localização geográfica singular e pelas atividades portuárias e comerciais, cujos reflexos podem, ainda hoje, ser observados no seu ordenamento espacial.

No início do século XVIII, Aracati era o maior centro exportador do Estado motivado pela exportação do charque, e sua função comercial importadora e exportadora se manteve em expansão até a segunda metade do século XIX. Gradativamente, a cidade vai perdendo a sua importância de praça comercial no contexto regional e nacional, passando a exercer a função de uma típica cidade litorânea sem expressão econômica.

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A partir da década de 90 do século XX, Aracati passou a ter o seu desenvolvimento incrementado por iniciativas ligadas à atividade turística, que alteram as relações sócio-econômicas vigentes, consolidando-a como um centro prestador de serviços turísticos e voltando a ganhar destaque em razão de uma nova atividade econômica.

Foi a partir da metade da década de 1970, que a atividade turística começou a dar os seus primeiros passos no município de Aracati, com a descoberta da vila de Canoa Quebrada por andarilhos de várias comunidades do Nordeste brasileiro. O despertar do interesse de visitantes no final da década de 1960 e início dos anos 70, pode ter sido motivado pela expansão da malha rodoviária nos anos 60, pois como assinala M.Santos (2009), a partir da década de 1960, constroem-se estradas de rodagem de primeira ordem no país. O Brasil passa a ser cruzado por um grande número de rodovias de boa qualidade, entre as quais um bom percentual de autopistas. Isso facilitou o deslocamento dos visitantes, e também boa parte do êxodo rural.

Portanto, a partir do final da década de 1970 e início dos anos 80, o espaço geográfico de Canoa Quebrada passa pela fase de descoberta do turismo, quando começam a chegar vários jovens desbravadores e aventureiros em busca de um novo “paraíso”, fazendo com que a praia entrasse num roteiro alternativo, no qual era permitido o nudismo e o uso da maconha.

Dessa forma, até a década de 1970, não existia estrutura de hospedagem em Canoa Quebrada. Somente a partir da segunda metade dessa mesma década é que começaram a surgir lentamente as primeiras iniciativas, com hospedarias simples, até porque a principal atividade econômica do local era vinculada à pesca e à agricultura de subsistência, e não a atividade turística. Assim, os primeiros estabelecimentos hoteleiros de Canoa Quebrada possuíam características distintas dos existentes hoje. Os prédios não exerciam apenas a função de hospedagem, mas abrigavam também atividades relativas à alimentação, disponibilizando refeições diárias baseadas nos hábitos alimentares locais, como peixe com farinha e tapioca.

Entretanto, na década de 1990, o surgimento de novos grupos sociais interessados em “Canoa” gerou mudanças espaciais no local que outrora fora uma simples vila de pescadores. Na configuração geral do novo espaço ganharam

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destaque as construções de equipamentos turísticos. Essa imposição do turismo, a partir da década de 1990, dar-se-á com a concretização das políticas públicas implantadas pelo Prodetur Nordeste, voltadas principalmente à infra-estrutura.

Assim sendo, a partir da década 1990, um expressivo crescimento dos fluxos turísticos, estimulou os investimentos no setor hoteleiro e na prestação de serviços tais como bares, restaurantes, lojinhas de suvenirs entre outros. Nesse cenário, o turismo desponta estimulado por iniciativas do setor público e privado, dando início a várias atividades turísticas e promovendo o crescimento do número de hotéis e pousadas. É importante destacar que, nesse período, foi desencadeado um forte processo de urbanização de Canoa Quebrada.

Já a partir de 2000, pode-se constatar que os novos hotéis, pousadas, bares e restaurantes foram se equipando à medida em que a sociedade evoluía. Surgiram, assim, novos equipamentos e serviços, fazendo com que os antigos estabelecimentos hoteleiros e turísticos imprimissem uma nova formatação às estruturas. Isso não se refere apenas à aparência de suas construções, mas, também, à busca por tecnologias de última geração, capazes de atender as necessidades e as exigências dos seus clientes atuais.

A pesquisa que ora se finaliza parece ter cumprido as pretensões delineadas no Projeto, estabelecendo relações entre as primeiras atividades econômicas do município de Aracati até a concretização do polo turístico de Canoa Quebrada, destacando as diferentes etapas da evolução histórico-econômica da cidade. Foi possível, também, através do estudo, compreender a gênese da formação sócio- espacial do litoral cearense, nele inserida as origens da cidade de Aracati, bem como as diferentes etapas da evolução urbana e da atividade turística, identificando os elementos responsáveis por essa expansão e as principais características desta dinâmica. Ainda, foi analisada a evolução do setor hoteleiro localizada na praia de Canoa Quebrada caracterizada nos diferentes períodos de desenvolvimento do polo turísticos até a atualidade.

Por fim, salienta-se que, os estudos sobre o setor turísticos na cidade de Aracati bem com na praia de Canoa Quebrada não se esgotam aqui, certamente abre questionamentos e motivações para novas pesquisas.

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139

140

ANEXOS

141

ANEXO A - Planta vila de Aracati ano 1813

142

ANEXO B – Planta setor 89 AUI

143

Anexo C - Planta setor 88 AUI

144

ANEXO D - Planta setor 37 AUI

145

ANEXO E - Planta setor 36 AUI

146

ANEXO F - Planta setor 85 AUI

147

ANEXO G – Planta AUI Canoa Quebrada

148

ANEXO H – Fóruns regionais de cultura e turismo

149

ANEXO I - Número de estabelecimento com hospedagem