A missão católica dos capuchinhos em Itambacuri: disputas em torno da “civilização” dos índios no século XIX

Tatiana Gonçalves de Oliveira 1

O Aldeamento de Imaculada Conceição de Itambacuri foi fundado no Vale do Mucuri, no ano de 1873 pelos frades capuchinhos, Serafim de Gorizia e Ângelo de Sassoferrato. Espaço de disputas e de negociações entre índios, nacionais, missionários, negros e fazendeiros locais, Itambacuri pôde proporcionar diferentes formas de experiências do projeto indigenista no século XIX.

As missões estrangeiras estavam proibidas de entrar no país até o ano de 1840, quando houve o retorno das ordens religiosas para o Brasil, a partir de um acordo entre o governo brasileiro e a Sé Romana. A vinda oficial dos frades capuchinhos baliza esse revigoramento das missões religiosas, e com eles uma tarefa, ou melhor, uma incumbência, o cuidado da catequese e civilização dos indígenas, como previsto no decreto nº 426, de 24 de Julho de 1845 2.

Em sua narrativa acerca da fundação do aldeamento de Itambacuri, frei Jacinto Palazzolo (1973) enaltece a obra dos freis capuchinhos como uma verdadeira epopeia, homens sem qualquer interesse material, que fundaram um verdadeiro campo de apostolado. Logicamente, essa visão apologética do historiador da Igreja estava relacionada aos objetivos do seu livro, que era perpetuar a memória das missões franciscanas no Brasil.

Frei Serafim, abandonando então o rio São Mateus e cedendo às insistências dos índios, acompanhado pelos mesmos, tomou o caminho indicado, em busca da terra de Canaã. Na tarde do dia 19 de fevereiro de 1873, Frei Serafim, seu fiel companheiro e sua estranha comitiva chegaram ao alto da serra que divide as águas do Itambacuri e Córrego d’Areia. Do alto, dominando as alturas do soberbo vale que se deparava com extasiando a vista, como que arrebatado pela beleza selvagem do panorama imponente, compreendeu ser aquele lugar indicado pela vontade de Deus para plantar o marco da fundação do aldeamento e a tenda do seu apostolado, inspirado e

1 Mestranda em História pela Universidade Federal de . Bolsista CAPES. 2 O Regulamento acerca das Missões de catequese, e civilização dos Índios de 1845 regulou sobre a questão indígena, os direitos dos índios, a organização das missões e todo o serviço de catequese no século XIX.

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com acento profético, exclamou: DAQUI NÃO SAIREI MAIS!(PALAZZOLO, 1973:43). A descrição feita por Palazzolo sobre a fundação do aldeamento de Itambacuri ressalta a ação desbravadora dos missionários no “descobrimento” de uma verdadeira terra prometida. Segundo o autor, seria através do trabalho dos missionários que se efetivaria a transformação do aldeamento em uma cidade. Nesse sentido, a grande obra de frei Serafim e Ângelo foi a de criar as bases de uma futura “civilização” Católica, ordenada e convertida pela fé e trabalho nas matas do Mucuri.

Para além da visão apologética de Palazzolo, pensamos no aldeamento de Itambacuri não apenas como local para a catequese e “civilização” indígena, mas também como espaço de conflitos e disputas, onde as relações de sociabilidade poderiam ser transversais, horizontais, mas sempre marcadas por negociações, por adaptações. Mas como nos bem lembra John Monteiro, as relações de sociabilidade indígena eram vistas externamente à sociedade, somente nos espaço próprios, ou seja, nos aldeamentos. Esse fato, para autor, pode explicar parte considerável da história social e cultural do país, marcada pela exclusão do índio . Assim, nos aldeamentos, o espaço em que o índio existia enquanto sujeito social era dividido também hierarquicamente, entre as famílias indígenas, colonos e missionários. (MONTEIRO, 2001).

As famílias de nacionais que moravam em Itambacuri eram atraídas pelas terras que ganhavam ao se fixarem próximas ao aldeamento. O casamento entre indígenas e nacionais possibilitaria uma “transformação espontânea dos selvagens”. (PALAZZOLO, 1976: 196). A miscigenação estava no Regulamento de 1845, e ancorada nos pressupostos raciais do século XIX, entendia que o casamento entre índios e brancos tenderia a “transformar” o sangue indígena e civiliza-lo, vencendo sua “barbaridade” inata. Além disso, o Regulamento acreditava que no convívio dentro do aldeamento dos índios com os missionários e trabalhadores seria o melhor modo de persuadi-los ao trabalho, educação e moral cristã através do “bom exemplo”.

A missão capuchinha praticada em pelos missionários italianos guardava, dessa forma, grande proximidade em sua prática com o exercício de reflexão de um historiador da Ordem: em ambos os terrenos, tratava-se de enfrentar a decomposição apenas aparente do universo, tendo em vista sua representação recomposta. No caso de Itambacuri, a missão

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católica pretendeu apresentar a mistura purificadora, da qual emergiria a unidade possível, o índio que pela mistura das raças era feito cristão laborioso . (AMOROSO, 2009:55). “A mistura purificadora” só seria possível com o casamento entre os índios e os brancos que viviam no aldeamento de Itambacuri. O próprio Regulamento das missões de 1845 tinha como um dos artigos principais em sua diretriz o casamento e consequentemente a miscigenação, uma vez que as crianças nascidas desse matrimônio seriam educadas desde a infância na língua “civilizada”. O casamento e batismo, sinais da cultura cristã, se associavam também a outros objetivos como o de transformar o índio e seu modo de vida, sedetentarizando-os nos aldeamentos e dando-lhes utilidade como trabalhadores nas roças plantadas e também na construção de casas dentro das aldeias.

Em Relatório à Assembleia Provincial no ano de 1875, o então presidente da província, Pedro Vicente de Azevedo trazia em anexo o Relatório do diretor geral dos índios, Luiz de Magalhães Musqueira, que falava sobre a situação do aldeamento e das lavouras plantadas pelos freis para atender as necessidades dos habitantes de Itambacuri.

O Director ( Frei Serafim de Gorizia, grifo meu) me comunicou que já tem quatro pequenas aldeas estabelecidas junto ao aldeamento central, nas quaes tem cada família sua cultura e economia em separado, as quaes elle visita constantemente, ministrando-lhes ferramentas, e excitando-lhes a emulação para augmentarem as plantações de cereais e do café. (Relatório de Presidente de Província de 1875). As roças de feijão, milho, café eram plantadas no aldeamento por colonos que arrendavam parte das terras e pelos índios, que de acordo com o Regimento das Missões de 1845 tinham direito a um pedaço de terra para cultivarem. O que se produzia era utilizado para alimentar os índios e colonos que lá moravam, e também era vendido no comércio local, gerando renda para o estabelecimento, que deveria prestar contas de seus lucros na Secretária da Diretoria Geral dos Índios. O comércio praticado pelos freis gerou muitos conflitos com os fazendeiros locais, principalmente os ligados à família Otoni, os liberais da região.

Esse tipo de conflito, ligado à prática do comércio pelos missionários, remonta as próprias origens das missões na colônia, quando os jesuítas eram constantemente acusados de estarem utilizando o trabalho indígena para benefício próprio, e nesse

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sentido usurpando os direitos dos colonos de usarem a mão de obra indígena. Muitos comerciantes locais de Philadelphia (atual cidade de Teófilo Otoni) e fazendas próximas ao aldeamento iam comercializar em Itambacuri, necessitando, no entanto, da permissão de Frei Serafim para fazê-lo. (MISSAGIA DE MATTOS, 2004:195).

As trocas comerciais, dentro do aldeamento, eram de certo modo controladas pelos diretores, a fim de evitar fáceis explorações e abusos. Tanto o índio, como o pequeno lavrador civilizado podia, por qualquer indivíduo de pouca consciência, ser facilmente levado a ceder o fruto de seu trabalho [...] (PALAZZOLO, 1973:148). Em relatório à Assembleia Provincial mineira, o então Diretor Geral dos índios, Antônio Luiz de Magalhães Musqueira elogiava a criação dos aldeamentos centrais em Minas Gerais e comparava a situação dos índios antes e depois da adoção do trabalho dos missionários capuchinhos.

Fiel interprete e executor do pensamento do Governo Imperial, não poderia de forma alguma anuir às representações que lhe erão dirigidas, e à Exma. Presidência, e a esta directoria para expulsão dos índios daqueles lugares, por meio da força, isto é exterminando-os. Agradeço a Deos a resistência que me inspirou para semelhantes solicitações, porque não era esse o meio de tranquillisar aquelles vales em bem dos colonos e de meus curatelados, cuja causa foi-me confiada, e advogo com todas as forças. Tive, portanto, de pedir com instancia a vinda de dous religiosos que se encarregassem da nobre missão de chamar aquelles infelizes ao grêmio da sociedade pelo único meio racional e possível- a palavra do Evangelho- Felizmente o Governo Imperial , atendendo a tão justo reclamo, enviou os reverendos capuchinhos Frei Serafim de Gorizia e Frei Anjo de Sasso Ferrato, que partindo desta Capital no dia 5 de Agosto deste anno chegarão a Philadelphia em 13 de Setembro subsequente, a fim de darem começo à fundação do grande aldeamento central dos índios daqueles vales .( Relatório do diretor Geral dos índios, 30 de novembro de 1872. In: Relatório que o presidente da província Joaquim de Godoy apresentou à Assembleia legislativa provincial em 15 de Janeiro de 1873,). A ocupação do Mucuri foi feita pela Companhia de Comércio e Navegação do político liberal Teófilo Benedito Otoni no ano de 1847, e se realizou através da imigração estrangeira, principalmente com famílias de colonos oriundos da Alemanha. Estes fundaram a primeira colônia do Vale, chamada Philadelphia, hoje Teófilo Otoni. Regina Horta, ao analisar a ocupação do Mucuri e as relações entre índios e colonos, apontou para as disputas entre os mesmos, e a consequente violação das terras dos indígenas e sua dizimação pelos fazendeiros locais, e posteriormente sua dominação cultural, imposta pelas ações missionárias na região.

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A Companhia teve, no entanto, sérios problemas para levar adiante seu projeto. Os principais empecilhos foram os conflitos entre índios e fazendeiros. O que levou Teófilo Otoni a escrever sobre os selvagens no Mucuri. Segundo Otoni deveria ser revisto o modo como os colonos lhe davam com os índios daquela região. Contrário ao uso de força e da guerra justa, até então empregada, Otoni defendia a via pacífica, ganhando a confiança dos gentios por meio de concessão de presentes aos mesmos. 3

Para além dessa visão verticalizada, de sobreposições de culturas nas relações de disputa em torno da natureza e sociedade em Itambacuri, Marta Amoroso enfatiza o papel dos aldeamentos na construção de sociabilidades, ressignificação de identidades, e trocas simbólicas. Para a autora, através da Propaganda Fide , as missões dos capuchinhos ganharam um teor mais moderno, devido à preocupação do Vaticano em romanizar o Catolicismo. Nesse sentido, a antropóloga enfatiza a preocupação dos missionários capuchinhos em desenvolver uma metodologia de conversão dos índios em cristãos trabalhadores.

Segundo Amoroso, “A catequese capuchinha vai além da conversão, sendo um conjunto de relações sociais que podem ou não envolver a conversão ao Catolicismo.” (1998:8). Amoroso argumenta que os capuchinhos, diferentemente dos jesuítas, não acreditavam na capacidade intelectual do índio, por este viver em constante estado de selvageria não conseguiria aprender nada que não fosse por imitação. Logo, segundo a autora, a metodologia capuchinha entendia que deveria haver uma ação constante no cuidado com os indígenas, e que somente o casamento com nacionais poderia transformar lentamente a “infantilidade primitiva” dos mesmos.

Frei Serafim e Ângelo de Sassoferrato encontraram grandes dificuldades para mediar as relações entre os índios e os colonos no Mucuri, principalmente pelo histórico de conflitos entre estes. Como vimos anteriormente na fala de Musqueira, era um de seus objetivos com as missões a formação de colônias agrícolas nos aldeamentos, que a longo prazo se tornariam núcleos proto-urbanos. De acordo com Izabel Missagia, o

3A historiadora Regina Horta Duarte organizou correspondências e cartas escritas por Teófilo Otoni acerca dos povoadores do Mucuri, os índios que lá habitavam quando chegou sua companhia, e em especial os relatos de Otoni foram, que foram respostas às críticas feitas pela opinião pública à sua empresa. Ver mais em: DUARTE, Regina Horta. Notícia sobre os Selvagens do Mucuri . : UFMG, 2002.

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projeto de formação de cidades da política imperial do século XIX estava de acordo com o projeto missionário na concepção do aldeamento como um espaço em transição para uma futura vila. (MISSAGIA DE MATTOS, 2004:260).

Maria Regina Celestino de Almeida, ao estudar os índios aldeados no Rio de Janeiro colonial, identificou a mudança de status em relação aos não- aldeados, e percebeu que os primeiros conseguiam certos direitos no momento em que se tornavam cristãos. A historiadora buscou em sua tese repensar as relações de contato entre índios e colonizadores, pois, ao aceitar a “situação de aldeamento” os índios estariam praticando um tipo de resistência adaptativa “[...] através da qual os povos indígenas re- socializavam-se, reelaborando valores, culturas e tradições no contato cotidiano das aldeias repleto de tensões, negociações e conflitos entre todos os agentes sociais ali envolvidos.” (ALMEIDA, 200:5).

A situação de aldeado também não era fácil, a verba que o governo Imperial destinava a esse fim era pequena, e intermitente. O Ministério da Agricultura, juntamente com a Assembleia Provincial destinavam anualmente a quota que deveria ser distribuída entre os aldeamentos. No relatório da Diretoria Geral dos Índios, na seção receita e despesa, o diretor geral falava sobre a verba destinada aos missionários no ano anterior, e as que foram votadas para o próximo.

RECEITA E DESPEZA.

Exercício de 1873 Á 1874.

Pelos balanços ns. 1 e 2, V.Exc. verá que as quotas votadas para este exercício de 1873 à 1874 forão pela Assembleia Provincial de 30:000$000, e a dada pelo ministério da Agricultura foi de 15:000$000 especiaes para o auxilio da construção das igrejas matrizes nos três aldeamentos do Itambacury, Rio Doce, e Manhuassû[...].

Exercício Corrente De 1874 Á 1875.

As quantias votadas pelo ministério d’ Agriculltura são 20:000$000, e mais 6:000$000 especiais para auxílio das matrizes.

A votada pela Provincia foi de 30:000$000, a qual vai sendo distribuída regularmente pelos aldeamentos em gratificações aos Religiosos, subvenções para as obras, alimentação, vestuário, brindes aos indígenas, e outras epigraphes mencionadas nas contas especiais de cada aldeamento.

ORÇAMENTO PARA O FUTURO EXERCICIO DE 1875 Á 1876.

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Por elle se vê que a despeza orçada para este exercício é de 48:300$000, para o qual tem esta Directoria tão somente 15:000$000, pela quota dada na última lei do orçamento. Havendo um defcit de 33:300$000, que si poderá ser suprido pelo Ministério a cargo de V. Exc.. ( Relatório do diretor Geral dos índios, , 18 de Fevereiro de 1875. In: Relatório apresentado à Assembleia legislativa provincial de Minas Gerais por ocasião de sua instalação em 9 de Setembro de 1875 pelo Exm. Sr. Dr. Pedro Vicente de Azevedo, presidente desta Província). Como podemos observar a verba não era suficiente para cobrir todas as despesas dos aldeamentos. As diferentes atividades e serviços feitos nas aldeias ajudavam com os dispêndios. Em Itambacuri, por exemplo, os Relatórios nos mostram que havia uma significativa produção de café e cereais, além de gêneros alimentícios.

A autossuficiência dos aldeamentos era um dos objetivos do Ministério da Agricultura e do Comércio, que pouco despendia para a manutenção desses espaços. No entanto, como relata frei Serafim em documento dirigido ao diretor geral dos índios no ano de 1875, a autonomia do aldeamento ainda não era possível naquele momento.

Tenho presente o ofício de V. Exa., datado de novembro do ano ultimamente findo, no qual nos recomenda ‘que, além dos progressos morais dos nossos estabelecimentos, também se adiantem as obras, e plantações de cereais e do café, para contar esse aldeamento com recursos próprios no futuro[...]’ Agora, dito respeitável ofício nos amedronta bastante. Contudo é consolador o progresso moral conseguido, tanto que já temos no aldeamento alguns meninos que sabem ler e um pouco escrever, e ajudar a Santa Missa; entre eles conta-se um da tribo Pogichá [...] E a respeito do progresso das obras e da cultura, nos é mister (mesmo segundo o conselho de V. Exa.) atendermos atualmente muito mais a esta ultima, do que as primeiras, e sobretudo tratar da plantação do café, cana, mandioca, batata, taioba, etc; pois o que já se tem é pouco para esta gente indígena, acostumada a arrancar logo que principia a dar, e comer também de noite; e a propósito do café, nutrimos a esperança de aumenta-lo a seu tempo, embora não frutifique senão depois de alguns anos. (Carta de Frei Serafim de Gorizia ao Diretor Geral dos índios, Luiz de Magalhães Musqueira, 1874. In: PALAZZOLO, 1973:69). A partir da arte da persuasão, frei Serafim apontava para o diretor geral a impossibilidade de se continuar aquele trabalho sem a ajuda do Governo. Ainda, para confirmar sua posição, o frei elencara alguns avanços na catequese indígena, mas principalmente enfatizava o fato de já haver índios Pojichás em seu aldeamento. No entanto, logo após afirmar o “progresso moral” em que se encontravam parte dos aldeados, alude para o fato de as roças não terem progredido ainda devido aos maus hábitos dos índios, que não esperavam as plantações crescerem para poder colhê-las.

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Considerações Finais

A falta de investimentos do governo na catequese, mesmo que a província de Minas tenha procurado sistematizar tal serviço, numa tentativa de obter mais informações acerca das aldeias e de sua situação, nos faz pensar acerca do caráter empresarial que a historiografia tem dado aos aldeamentos. A ideia de que esses espaços atuaram de fato como apêndice do Império português em seu processo de expansão é problemático, por exemplo, quando percebemos certo abandono do governo central com a manutenção dos aldeamentos. Apesar disso, acredito que, para a província a questão indígena era um problema a ser resolvido, e depois de várias tentativas, as missões foram apenas mais uma opção. No entanto, com exceção de Itambacuri, foram poucos os aldeamentos que sobreviveram muito tempo, seja pela falta de verbas, de missionários, ou pelo reduzido número de índios aldeados.

O aldeamento de Itambacuri pôde vivenciar empiricamente os debates em torno da questão indígena que se desenvolvia no Brasil no século XIX. Saindo dos gabinetes, as leis, como o decreto de 1845, não satisfaziam na prática os anseios políticos de “civilização dos sertões” e de “suas gentes”, pois eram vários os problemas enfrentados, como a resistência indígena e os embates locais.

Em Itambacuri, os conflitos entre frei Serafim e a elite local pelo direito de aldear os índios foi travado tanto na corte, com o apelo constante do frei ao Imperador, por mais auxílio e defesa contra os interesses particulares em torno da missão, como também na Província, nos relatórios dirigidos à Diretoria Geral dos índios. O missionário usaria toda a sua persuasão e “carisma” para defender a necessidade da missão católica para o progresso de Minas e do próprio Império. Contra a catequese católica, os liberais do vale do Mucuri defenderam o retorno da administração leiga dos índios, incentivada nos anos 40 pela Companhia de Comércio e Navegação de Teófilo Otoni. E nesse jogo de interesses, redes de poder se formavam ao redor do aldeamento de Itambacuri, na disputa pelos “meios mais eficazes de civilização” dos índios.

Fontes

Relatórios de Presidente de Província (1870-1889) disponíveis no endereço eletrônico: http://www.crl.edu/brazil/provincial/minas_gerais

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Jornal O Apóstolo , disponível no Laboratório Multimídia de Pesquisa Histórica da Universidade Federal de Viçosa.

Regulamento acerca das Missões de catequese, e civilização dos Índios , disponível em: http://www2.camara.gov.br/legin/fed/decret/1824-1899/decreto-426-24-julho-1845- 560529-publicacaooriginal-83578-pe.html .

Referências Bibliográficas

AMOROSO, Marta . Mudança de Hábito: catequese e educação para índios nos aldeamentos capuchinhos . Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v.13, nº 37, 1998. ______. Natureza e sociedade . Disputas em torno do cultivo da paisagem em Itambacuri. Revista Brasileira de Ciências Sociais (Impresso), v. 24, p. 55-72, 2009. ALMEIDA, Maria Celestino de. Os índios Aldeados no Rio de Janeiro Colônia - novos súditos Cristãos do Império Português. Campinas, São Paulo, 2000. Tese de doutorado- Universidade Estadual de Campinas, IFCH. DUARTE, Regina Horta. Notícia sobre os Selvagens do Mucuri . Belo Horizonte: UFMG, 2002. MISSAGIA DE MATTOS, Izabel. Civilização e revolta: os botocudos e a catequese na Província de Minas. Bauru: Edusc/Anpocs, 2004. MONTERO, Paula. Índios e Missionários no Brasil: para uma teoria da mediação cultural. IN: MONTERO, Paula (org.). Deus na Aldeia : missionários, índios e mediação cultural. São Paulo: Globo, 2006. MONTEIRO, John. Tupis, Tapuias e Historiadores . Estudos de História Indígena e do Indigenismo. Tese de livre docência, Unicamp 2001. PALAZZOLO, Frei Jacinto de. Nas selvas dos Vales do Mucuri e do Rio Doce . 3 ed. São Paulo: Brasiliana, 1973.

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