9 ABRIL 2015 Ciclo “Isto é Jazz?” Comissário: Pedro Costa

Universal Indians + Joe McPhee © Geert Vandepoele criação artística é um “pós-qualquer importantes. Ele faz com que dêmos um coisa”: «Para mim, a designação free passo para fora, de maneira a podermos jazz representa sobretudo o estado de ver o quadro geral. Estas colaborações espírito em que me encontro quando acontecem porque há quatro indivíduos toco. Um estado de espírito que me dá que querem interagir, no palco e fora absoluta liberdade de estar no momento dele. O facto de estarmos em diferentes com as pessoas com quem partilho o estágios das nossas vidas torna esta palco e que estão na audiência. Mas situação ainda mais significativa.» também é o idioma musical represen- Entre os quatro, grupo e convi- tado por músicos como Joe McPhee. dado, parecem ser os dois sopradores, Nunca falamos com ele, ou entre nós, Dikeman e McPhee, aqueles que mais sobre o estilo de música que vamos “fora” têm ido. Se o lendário trompe- tocar, deveríamos tocar ou tocámos tista e saxofonista já colaborou com a antes. Encontramo-nos simplesmente e eletroacústica deep listening de Pauline atiramo-nos aos sons, sem combinações Oliveros, com o noise da Nihilist Spasm ou compromissos.» Band e com as incursões proto-rock dos A admiração não explica, por si só, The Thing de com, o motivo por que foi McPhee chamado ou sem, os Cato Salsa Experience, o por este grupo constituído por um primeiro tem dividido a sua atenção norte-americano radicado na Holanda com a improvisação reducionista, o rock Qui 9 de abril de mentes abertas que estão sempre (Dikeman) e dois noruegueses, tendo exploratório nascido com a no wave Pequeno Auditório · 21h30 a olhar para fora e a procurar novos um deles (Østvang) também passado e até a revisitação dos blues originais, Duração: 1h · M6 impulsos. Não importa onde, com quem uma temporada no país dos moinhos. em bandas como Cactus Truck, Blast, ou com que género musical. É isso, aliás, O convite derivou igualmente do Pumporgan ou Missing Dog Head. Saxofones John Dikeman Contrabaixo Jon Rune que nos identifica com Ayler.» reconhecimento que aquele multi- Diz Østvang: «O John tem uma mul- Strøm Bateria Tollef Østvang Assim é apresentado o grupo -instrumentista tem enquanto símbolo… tiplicidade de abordagens e neste grupo Saxofones, trompete Joe McPhee Universal Indians pelo seu porta-voz, «Tocar com Joe McPhee aproxima- está autorizado a fazer com elas o que o baterista Tollef Østvang. O nome vem -nos dos fundamentos do , sem muito bem entender. Enquanto secção de um tema de , incluído dúvida, mas não como se estivéssemos rítmica, eu e o Jon Rune motivamo-lo a Gritemos com eles no álbum Love Cry. A estética prati- a olhar para trás. O Joe está sempre à abrir a goela com utilização de dinâmi- cada é uma continuação daquela que procura de outras fórmulas e direções. cas, entrando em situações abstratas ou «Escolher um nome como o nosso para o histórico saxofonista introduziu Na verdade, ele aproxima-nos da pró- fixando-nos mais convencionalmente o trio manifesta uma óbvia ligação a juntamente com , John pria música. Encoraja-nos a tomar os no tempo, na melodia e na harmonia. Albert Ayler. Mas mais do que definir a Coltrane, Cecil Taylor e… Joe McPhee, o riscos que são necessários para criar boa O que quer dizer que os resultados são nossa música em relação à música dele, convidado especial da formação de que música», argumenta Tollef. potencialmente diferentes em cada con- direi que o nome da banda representa também fazem parte John Dikeman e «Só há ação em águas profundas. certo. Ele tem desenvolvido trabalho no a nossa maneira de entender a música Jon Rune Strøm: o free jazz. A presença de Joe McPhee incentiva- campo do near silence, mas nós estamos como linguagem universal. Esse é um Com uma perspetiva particular, -nos a estar tão “no momento” quanto é mais em casa no contexto do free jazz. de muitos fatores que fazem com que ditada pela própria evolução da música possível. Com ele percebemos que a arte Esta secção rítmica é héctica, rápida e toquemos juntos insistentemente. e pelo contexto hoje vivido, o de um de não tocar fortalece a arte de tocar poderosa, nada tendo de conceptual. É uma conexão social. Somos músicos mundo globalizado em que toda a e que o tempo e o espaço são deveras Ter liberdade para tocar é essencial

2 3 para mim. Não gosto de me rotular e em Amesterdão me proporcionou. E o trumento. Valorizo muito o som acús- mas há alturas em que tal é necessário, não gosto quando os outros me colam primeiro músico com quem lá toquei foi tico da bateria que nos chega da história imprescindível mesmo, e esta é uma um rótulo. E claro que ter Joe McPhee John Dikeman», acrescenta o responsá- do jazz. Uma grande parte da minha delas. Pois gritemos com eles… como parte desta banda reforça essa vel pela percussão. carreira incidiu em tornar esse som e atitude.» Dikeman, Strom e Østvang já se essas técnicas numa expressão espon- Rui Eduardo Paes As estruturas e composições que vão conhecem bem (os dois últimos estão, tânea. A agressividade e o jogo héctico Crítico de música, ensaísta, aparecendo na música dos Universal de resto, juntos nos projetos Friends também são ferramentas minhas, mas editor da revista online jazz.pt Indians acontecem com toda a natura- & Neighbors e All Included) e a sua não se sustentam em procedimentos lidade. «Surgem da bagagem musical associação dispensa a existência de extensivos.» que cada um de nós traz consigo. É essa um líder… «Pensamos de maneiras O free “pós-free” dos Universal John Dikeman a beleza desta forma de fazer música. bastante semelhantes. Temos referên- Indians com Joe McPhee tem, na sua saxofones O tempo, a melodia e a harmonia são cias comuns, tanto musicalmente como urgência e na sua visceralidade, uma tão importantes para nós como para no que respeita à vida e à sociedade. De pronunciada carga política. A mesma Nasceu no Nebraska, EUA, em 1983 e qualquer músico de outro género. qualquer modo, quando tocamos faze- que estava em , um marco passou a infância e a juventude numa A diferença está no facto de que não mos questão de começar por uma folha do Black Power: «A postura política e pequena cidade do Wyoming. Em o decidimos e planeamos antecipada- em branco. E desafiamo-nos constante- social do Joe está mais presente hoje do Kemmerer, o saxofonista John Dikeman mente. Adoro quando os nossos quatro mente. É difícil encontrar boas formas que alguma vez antes. Não costumamos não tinha muito mais que fazer senão pares de ouvidos nos levam para esse e bons movimentos numa música livre. conversar sobre os nossos pontos de dedicar-se aos seus estudos musicais, o tipo de paisagens sonoras. É uma sensa- Exige de nós um enorme foco ou tudo vista, mas no palco fazemos “clique” que fez em grande parte por sua conta e ção impossível de descrever.» acaba por desabar. Cada atuação é quase imediatamente. A música fala risco. A profissionalização como músico Apesar do envolvimento de dois um salto no precipício. Sermos uma mais alto do que as palavras, ainda que surgiu cedo, aos 16 anos, em colabo- americanos e dois noruegueses, o jazz democracia torna a música mais sólida este seja outro cliché. Quando falo em rações com Stefan Dill e Jack Wright. aberto dos Universal Indians deve quando encontramos esses movimen- público ou com outros tendo a ser um Em 1999 deixou a sua terra natal para muito ao modus operandi que foi sendo tos e formas. O trabalho em equipa é bocado trapalhão na retórica, mas a frequentar a Interlochen Arts Academy formulado na Holanda: «A cena holan- sempre melhor do que qualquer traba- tocar é como se os meus argumentos e, durante um período, o Bennington desa foi para mim um abrir de portas. lho com alguém a dirigir, não é?» irrompessem em caudal da bateria. College, onde teve Milford Graves como Mais tarde, acabou mesmo por me Tollef Østvang dá razão a Derek Acho até que, nestes últimos anos, o mestre. Nessa altura, teve ainda aulas ligar à cena de Chicago. A ligação entre Bailey quando este afirmou que a meu engajamento político tornou a particulares do saxofonista Joe Maneri. ambas e a da Escandinávia pareceu- improvisação não tem de ser experi- minha maneira de tocar mais afirmativa. Quando se mudou para Filadélfia, come- -me muito clara quando voltei para a mental: «Referiu-o muito objetivamente É o que também vejo nele: as suas inten- çou a rodar com alguns grandes nomes Noruega. Todas as três têm uma atitude no seu livro Improvisation e no docu- ções e a sua filosofia estão mais fortes do jazz, como Daniel Carter, Nate liberal relativamente à aprendizagem e mentário On the Edge. A improvisação do que nunca.» Wooley, Mike Pride e Reuben Radding. à execução da música. “Encontrarmo- é algo que faz parte de qualquer género Acrescenta Tollef: «Toca como se não Em 2004, foi viver para o Egipto, nos a nós próprios” pode parecer um musical. Assim sendo, tanto adotamos houvesse amanhã!» E o certo é que esse associando-se à estrela pop Mohamed estereótipo, mas é a condição funda- técnicas instrumentais extensivas como ânimo contamina os companheiros de Mounir, ao DJ Haze e à Orquestra mental para nos tornarmos num bom não. A forma muscular como o Rune McPhee, somando-se à energia positiva Sinfónica do Cairo. Em 2007, fixou-se na ser humano e musical. Não toco para toca contrabaixo baseia-se em técnicas que eles já têm consigo. As conse- Holanda e aí permanece, colaborando me impressionar ou para impressio- alternativas, e o mesmo acontece com o quências são explosivas, justificando com figuras locais de renome como Han nar os outros. É muito mais profundo John. Devo dizer, no entanto, que para plenamente a menção deste tipo de jazz Bennink, Ab Baars, Wilbert De Joode, do que isso. Confiar em mim e nos mim as coisas são diferentes: tenho uma como “estética do grito”. É verdade que Raoul van der Weide, Eric Boeren, Andy meus desejos foi algo que a estadia abordagem mais tradicional ao meu ins- gritar, e ouvir gritar, pode ser cansativo, Moor, Terrie Ex e muitos mais.

4 5 Jon Rune Strøm Joe McPhee Próximo espetáculo contrabaixo saxofones, trompete © S&V Tendo como fonte de inspiração Proveniente de Miami, , onde Satélites no contrabaixo o Gary Peacock da nasceu em 1939, Joe McPhee aprendeu juventude, bem como o jazz aberto a tocar trompete com o pai aos 8 anos de Sofia Dias & Vítor Roriz de Frode Gjerstad (a cujo trio atual- de idade, aprofundando os seus conhe- mente pertence), Jon Rune Strøm vem cimentos na banda do exército. A esse trabalhando com figuras como Paal instrumento acrescentou o saxofone Dança Sex 10, sáb 11 de abril Nilssen-Love e Mats Gustafsson, tendo em 1968, depois de ouvir Albert Ayler. Palco do Grande Auditório · 21h30 integrado a Nilssen-Love Large Unit O seu primeiro registo discográfico foi Duração aproximada: 1h · M12 e o Nu Ensemble. Pertence a grupos o histórico álbum Freedom & Unity, da nova geração de improvisadores de , pouco antes de escandinavos como Saka, All Included gravar Underground Railroad com o “Satélites é uma imagem para o que é periférico, para o movimento da e na e Friends & Neighbors e seja com eles seu próprio quarteto, a que se seguiram periferia. Um movimento em relação a um centro que nunca se nomeia ​e cujo ou desenvolvendo um projeto a solo títulos fundamentais da discografia do lugar não se determina​.” S&V conquistou o estatuto de contrabaixista free jazz como Nation Time, Trinity e de referência. Conhecido pelo seu estilo . Em 1975, foi fundada a Próximo espetáculo de música altamente enérgico, emparceirou já com etiqueta suíça Hat Hut, com o propósito figuras de renome internacional como inicial de editar a sua música, casos © Amaral Moreira e Steve Swell. de Topology, Linear B e Oleo. A sua João Mortágua contribuição para os princípios Deep Tollef Østvang Listening de Paulino Oliveros data de Quarteto bateria 1981, assim entrando nos domínios da música contemporânea. Ao longo Janela Nascido em 1985, com residência em das décadas esteve à frente de vários Ciclo “Jazz +351” Trondheim, Tollef Østvang é líder dos grupos, entre eles se destacando Trio X, seus próprios grupos, integra a Available com e , e Comissário: Pedro Costa Jelly Big Band, pertence aos coletivos All Survival Unit III, com Fred Lonberg- Included e Friends & Neighbors e vem Holm e . Jazz Sáb 18 de abril colaborando com músicos como Tobias Pequeno Auditório · 21h30 · Dur. 1h · M6 Delius, Wolter Wierbos, Michael Moore, , Josh Berman e Keefe Jackson, entre outros. Começou a tocar “O sax alto de Mortágua ouve-se com o maior dos prazeres. Tem um sopro bateria aos 6 anos de idade e fez a licen- próprio e uma elasticidade que vai de Lee Konitz a John Zorn, o que eu antes não ciatura e o mestrado (este terminado julgava possível. O trabalho de guitarra de Miguel Moreira é excelente (…) a ação em 2012) no Departamento de Jazz da combinada do baixista José Carlos Barbosa e do baterista José Marrucho mantém Universidade de Trondheim, com passa- tudo o mais a pulsar com uma solidez inebriante. O que mais poderíamos desejar gens pelo Conservatório de Amesterdão de uma estreia?” Rui Eduardo Paes, jazz.pt, crítica 4 estrelas a Janela. e pelo Conservatório Nacional Superior de Música e Dança de Paris. Mais informações em www.culturgest.pt

6 As emissões de gases com efeito de estufa associadas à produção desta publicação foram compensadas no âmbito da estratégia da CGD para as alterações climáticas. Conselho de Administração Comunicação Maquinaria de Cena Presidente Filipe Folhadela Moreira Nuno Alves (chefe) Álvaro do Nascimento Estagiária: Artur Brandão Administradores Sara Amaral Técnico Auxiliar Miguel Lobo Antunes Publicações Vasco Branco Margarida Ferraz Marta Cardoso Frente de Casa Assessores Rosário Sousa Machado Rute Sousa Dança Atividades Comerciais Gil Mendo Bilheteira Catarina Carmona Teatro Manuela Fialho Patrícia Blazquez Francisco Frazão Edgar Andrade Arte Contemporânea Serviços Administrativos e Financeiros Clara Troni Miguel Wandschneider Cristina Ribeiro Receção Paulo Silva Serviço Educativo Sofia Fernandes Teresa Figueiredo Raquel Ribeiro dos Santos Auxiliar Administrativo Direção Técnica Direção de Produção Nuno Cunha Paulo Prata Ramos Margarida Mota Coleção da Caixa Geral de Depósitos Direção de Cena e Luzes Produção e Secretariado Isabel Corte-Real Horácio Fernandes Patrícia Blázquez Inês Costa Dias Mariana Cardoso Assistente de Direção Cenotécnica Maria Manuel Conceição de Lemos José Manuel Rodrigues Jorge Epifânio Audiovisuais Exposições Américo Firmino Coordenação de Produção (coordenador) Mário Valente Ricardo Guerreiro Produção Suse Fernandes António Sequeira Lopes Iluminação de Cena Paula Tavares dos Santos Edifício Sede da CGD Fernando Ricardo (chefe) Fernando Teixeira Rua Arco do Cego, 1000-300 Lisboa, Piso 1 Vítor Pinto Culturgest Porto Tel: 21 790 51 55 · Fax: 21 848 39 03 Susana Sameiro [email protected] · www.culturgest.pt

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