REVISTA BRASILEIRA DE GESTÃO DE NEGÓCIOS ISSN 1806-4892 RBGN Review of e-ISSN 1983-0807

37

Cultura organizacional e marketing Recebimento: 25/01/2017 de relacionamento: uma perspectiva Aprovação: interorganizacional 19/06/2017 Editor responsável: Fabiano Larentis1 Prof. Dr. Ignacio Canales 1Universidade de Caxias do Sul, Programa de Pós-Graduação em Administração, Caxias do Sul, Brasil Avaliado pelo sistema: Double Blind Review Claudia Simone Antonello2 Luiz Antonio Slongo2 2Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Programa de Pós-Graduação em Administração, Porto Alegre, Brasil

Resumo

Objetivo – Este estudo analisa a contribuição dos relacionamentos interorganizacionais entre fornecedores e clientes às mudanças culturais organizacionais. Metodologia – Realizou-se um estudo qualitativo de casos múltiplos em dois canais de marketing, por meio de entrevistas em profundidade, observação e análise de dados com base na grounded theory. Resultados – Identificou-se a importância da confiança, do comprometimento, da cooperação e dos processos de aprendizagem nas mudanças culturais organizacionais e na redução dos conflitos de papel dos boundary spanners, assim como o papel da rotatividade de pessoal em enfraquecer essas dimensões e respectivas relações. Contribuições – Evidenciou-se o desenvolvimento de uma cultura interorganizacional, como um sistema de símbolos e significados compartilhados por grupos ou indivíduos de diferentes organizações, em uma base transitória, com o predomínio da perspectiva cultural da fragmentação. É uma cultura originada dos relacionamentos através da intersecção de culturas, ou seja, uma cultura das fronteiras. Palavras-chave – Cultura organizacional; marketing de relacionamento; perspectivas culturais; relacionamentos interorganizacionais; cultura interorganizacional.

Revista Brasileira de Gestão e Negócios

DOI: 10.7819/rbgn.v20i1.3688

37 Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Fabiano Larentis / Claudia Simone Antonello / Luiz Antonio Slongo

1 Introdução organização (Van Maanen & Barley, 1985). Assim, as culturas organizacionais envolvidas Devido à sua natureza colaborativa, o podem, por meio de sistemas específicos de marketing de relacionamento entre empresas significados e símbolos, ser alteradas por causa lhes permite alcançar vantagens competitivas de relacionamentos interorganizacionais, sustentáveis e maior desempenho empresarial, por devido a estratégias e processos de marketing de meio de parcerias e conhecimentos complementares relacionamento. (Gummesson, 2008, Hunt, Arnett & Madhavaram, Nesse contexto, compreender a 2006). Com base na importância e nas práticas cultura organizacional é compreender a vida de marketing de relacionamento, no entanto, é organizacional em toda sua riqueza e variação importante considerar os processos de negócios (Alvesson, 2013). A cultura organizacional associados a ele. pode ser específica para determinados grupos e Os relacionamentos são complexos e contextos, não apenas um conjunto consistente multifacetados porque exigem não apenas a de símbolos e significados compartilhados por seleção de recursos e parceiros, mas também todos os membros organizacionais (Martin, Frost a formação de confiança e comprometimento & O’Neil, 2006). por interações frequentes e qualificadas, bem Este estudo, portanto, pretende como o nível de cooperação e a existência ou analisar a contribuição dos relacionamentos surgimento de valores compatíveis (Hunt, Arnett interorganizacionais às mudanças culturais & Madhavaram, 2006; Morgan & Hunt, 1994; organizacionais, por meio de um estudo de caso Palmatier, Dant, Grewal & Evans, 2006). Em múltiplo em duas empresas brasileiras. Mais relação a isso, o que acontece entre indivíduos, especificamente, pretende-se compreender como de diferentes organizações, envolvidos nessas aspectos da relação interferem no sistema de relações? Qual é o papel da cultura organizacional? símbolos e significados e identificar a existência Essas questões são feitas porque as práticas de uma cultura interorganizacional, decorrente de marketing de relacionamento provêm da das interações. área organizacional de marketing, uma área Este estudo justifica-se, em primeiro lugar, de fronteira em empresas, onde indivíduos de porque conecta duas áreas tradicionalmente diferentes organizações interagem uns com os pesquisadas separadamente. O papel da cultura outros: os chamados boundary spanners [elo entre organizacional no marketing de relacionamento a organização e o meio exterior]. A fronteira é significativamente pouco pesquisado, apesar do consenso sobre a importância deste tema [boundary] é uma linha ou região que divide (Iglesias, Sauquet & Montaña, 2011). Em e estabelece limites (Halley, 2001). A cultura segundo lugar, considera o desenvolvimento de organizacional, por outro lado, é um sistema de relacionamentos interorganizacionais por meio significados e símbolos comuns, compartilhado de lentes culturais, tendo em vista as práticas do no contexto organizacional (Alvesson, 2013). marketing de relacionamento, o que significa Os significados levam à interpretação do objeto/ a formação e a presença principalmente de fala e os símbolos, à expressão desses significados. confiança e comprometimento (Gummesson, A frequência e a qualidade dessas interações, 2017), contribuindo com os acadêmicos, bem juntamente com o surgimento principalmente como com os gestores. Os estudos atuais sobre de confiança, comprometimento e cooperação, a interface de cultura organizacional, em um podem fazer com que indivíduos de diferentes contexto interorganizacional, normalmente organizações comecem a se entender de maneiras se concentram mais nas diferenças de cultura diferentes, podendo assim compartilhar símbolos organizacional do que em compatibilidades e significados e a cultura organizacional (Alvesson, culturais organizacionais (Lu, Plewa & Ho, 2013). Além disso, a cultura organizacional de 2016). Além disso, a pesquisa deve considerar uma perspectiva interorganizacional é notável: como a cultura da empresa é desenvolvida a partir os grupos não se limitam ao domínio de uma da promulgação de atividades de marketing ao 38

Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Cultura organizacional e marketing de relacionamento: uma perspectiva interorganizacional longo do tempo e como estruturas e culturas linguagem, na história, nos mitos, nos rituais, divergentes estão alinhadas (Moorman & nas cerimônias e nos artefatos (Alvesson & Day, 2016). Em terceiro lugar, pesquisa-se um Sveningsson, 2008). Os símbolos são fontes contexto de mercado emergente. De acordo externas de informação e são usados como com Narasimhan, Srinivasan e Sudhir (2015), a representação dos processos sociais e psicológicos. pesquisa em mercados emergentes é cada vez mais Ritos, rituais e cerimônias são atos que moldam crítica para acadêmicos e gestores, fornecendo expressões e dão valor aos símbolos. O mito, como orientação gerencial e ampliando o conhecimento uma narrativa dramática de eventos imaginados, substantivo e teórico de mercados e marketing. geralmente explica origens ou mudanças, combina as formas culturais e consolida-as em um evento 2 Contexto teórico específico (Strati, 1998). As organizações são marcadas por práticas 2.1 Cultura organizacional sociais que podem ser consideradas culturais. Essas práticas, no entanto, podem não representar A cultura implica uma coletividade. As a organização como um todo: a cultura é organizações são entidades simbólicas, porque desenvolvida em ambientes de trabalho (Van funcionam seguindo modelos implícitos na Maanen & Barley, 1985). Nesse sentido, Martin mente de seus membros (Hofstede, 2001), o et al. (2006) propõem quatro perspectivas que interferirá na satisfação dos envolvidos e, diferentes de cultura organizacional: perspectiva consequentemente, no desempenho da empresa de integração, perspectiva de diferenciação, (Gregory, Harris, Armenakis & Shook, 2009). perspectiva de fragmentação e um quadro de A cultura é um produto histórico de um grupo, três perspectivas. Na perspectiva da integração, que afeta interpretações e orienta comportamentos a cultura é um conjunto de expressões culturais (Alvesson, 2013; Hogan & Coote, 2014; Van que geram o consenso de toda a organização, Maanen & Barley, 1985; Vetráková & Smerek, denominada cultura unitária por Van Maane e 2016; Yin, Lu, Yang & Jing, 2014). Barley (1985). Segundo eles, isso acontece quando Cavedon (2003) trata da cultura os membros de uma organização lidam com os organizacional como uma rede de significados mesmos problemas e quando um sistema comum que flui dentro e fora do espaço organizacional, de compreensão é adotado. sendo simultaneamente ambígua, contraditória, É questionável, no entanto, se a cultura complementar, diversa e análoga, mostrando organizacional é tipicamente uma característica homogeneidade e heterogeneidade organizacional. da organização como um todo, ou se é particular Para Alvesson (2013), a cultura organizacional é de grupos ou subculturas dentro dela (Deshpandé vista como um sistema de símbolos e significados, & Webster, 1989). As organizações são marcadas compartilhado no contexto organizacional, de por práticas sociais que podem ser consideradas forma que os indivíduos definem seu meio, culturais, mas essas práticas podem ser confinadas expressam suas crenças e fazem julgamentos. O a grupos específicos, ou subculturas (Van Maane significado refere-se à forma como um objeto ou & Barley, 1985), ou seja, a perspectiva de expressão/fala é entendido. O símbolo condensa diferenciação. Uma organização pode incluir um conjunto de significados em um objeto departamentos e grupos de trabalho culturalmente específico e o anuncia de forma compacta. diversificados (Hofstede, 2001). O autor enfatiza que a cultura não estabelece Na perspectiva da fragmentação, as necessariamente clareza e consenso entre grandes relações entre as expressões culturais não são grupos de pessoas, mas as orienta a lidar com os nem claramente consistentes nem claramente casos de ambiguidade sem muita anarquia. inconsistentes. São complexas e têm muitos A cultura organizacional, portanto, elementos contraditórios e problemáticos. O envolve símbolos e significados, considerando consenso não abrangeria toda a organização, símbolos a expressão dos significados, como na nem seria específico para determinado subgrupo

39 Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Fabiano Larentis / Claudia Simone Antonello / Luiz Antonio Slongo

organizacional. Seria transitório e específico para que os grupos de pessoas interagem socialmente uma questão determinada, levando a afinidades uns com os outros, em um estado de fluxo sem de curto prazo entre os indivíduos e sendo limites claros (Lee, Kim & Park, 2015). Nesse substituído por diferentes modelos, à medida que sentido, a abertura a novas ideias é essencial para outras questões chamem a atenção. Uma cultura a mudança cultural (Alvesson & Sveningsson, organizacional não é um conjunto sólido e bem 2008). formado ou um conjunto estável de subculturas, que é fácil de compreender. Refere-se, no entanto, 2.2 Marketing de relacionamento e a misturas de manifestações culturais de diferentes relacionamentos interorganizacionais tipos e níveis (Alvesson, 2013). Organizações que fazem parte de uma Finalmente, Martin et al. (2006) cadeia de valor reconhecem os benefícios do apresentam um quadro de três perspectivas, em marketing de relacionamento, definido como que alguns valores, interpretações e práticas geram um processo de interação e engajamento que consenso em toda a organização, outros causam estabelece, desenvolve e mantém relacionamentos conflitos e alguns ainda não estão bem definidos. cooperativos de longo prazo com benefícios Nas organizações, segundo eles, haveria uma mútuos entre as partes (Hakansson & Snehota, existência simultânea de elementos de integração, 1995; Morgan & Hunt, 1994; Palmatier, 2008). A conflito, poder e incerteza. interação mostra que os resultados vêm de ações e Por outro lado, o desenvolvimento de uma reações, realizadas pelos envolvidos, porque ambos cultura é um processo de aprendizagem, uma vez os lados desempenham papéis ativos (Hakansson que os fundadores da organização (Dauber, Fink & Snehota, 1995; Pels, Moller & Saren, 2009). & Yolles, 2012; Gagliardi, 1986) consideram um Segundo Cannon e Perreault (1999), conjunto de crenças, mesmo que não sejam claras. relacionamentos eficazes ajudam as partes À medida que certos grupos aprendem a lidar envolvidas a gerenciar a incerteza e a dependência, com seus problemas de adaptação e integração, aumentar a eficiência por meio da redução de desenvolve-se a cultura organizacional, que é custos e melhorar a orientação do mercado, por ensinada aos novos membros desde que seja meio de uma melhor compreensão dos clientes. O considerada e sentida como correta (Schein, marketing de relacionamento tem como objetivo 1991). As respostas a uma organização por parte gerar relacionamentos lucrativos a longo prazo de seus membros são formuladas para resolver entre os parceiros (Miquel-Romero, Caplliure- um problema e também diminuir a ansiedade Giner & Adame-Sánchez, 2014). A este respeito, relacionada a ele (Gagliardi, 1986). Indivíduos quanto mais ambas as partes estiverem motivadas e grupos mais poderosos, entretanto, podem a manter o relacionamento e imbricadas entre si, influenciar a interpretação dos outros sobre menor o risco da dissolução da relação e maior a eventos (Lucas & Kline, 2008). As mudanças na cultura, além dos aspectos disposição delas a investir nesse relacionamento materiais, também incluem uma redefinição – sobretudo em investimentos não recuperáveis de significados, mas não necessariamente de (Scheer, Miao & Palmatier, 2015). valores e significados-chave (Alvesson, 2013; As estratégias de marketing de Alvesson & Sveningsson, 2008). Por outro lado, relacionamento, porém, não são uma solução para alguns aspectos mais enraizados na cultura são todos os clientes em todas as situações possíveis difíceis de mudar, além do que a cultura pode (Agariya & Singh, 2011; Schakett, Flaschner, mudar para permanecer o que sempre foi: as Gao & El-Ansary, 2011). Os relacionamentos mudanças no comportamento não significam dependem do tempo para serem desenvolvidos. necessariamente mudanças nas crenças e valores Além disso, alguns clientes não desejam manter um (Alvesson & Sveningsson, 2008; Gagliardi, 1986; relacionamento próximo com seus fornecedores Ogbonna & Harris, 2014). A cultura, contudo, é e vice-versa. Nesse sentido, os relacionamentos constantemente criada e transformada à medida precisam ser estáveis o suficiente para durar um 40

Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Cultura organizacional e marketing de relacionamento: uma perspectiva interorganizacional tempo e dinâmicos o suficiente para assegurar fronteiras são lugares de contato altamente o desenvolvimento de capacidades (Batt & carregado, onde ocorrem diferenças e trocas Purchase, 2004). (conflito, poder e conversão de recursos) (Halley, Confiança, comprometimento e 2001). Elas ajudam a estabelecer e manter hábitos, cooperação são alguns dos elementos-chave expectativas e papéis, além de fornecer defesa e dos relacionamentos (Agariya & Singh, 2011; permitir o intercâmbio (Araujo et al., 2003, Halley, Gummesson, 2017; Palmatier et al., 2006). 2001). Quanto mais as organizações dependem de Confiança, crença da empresa sobre a honestidade relacionamentos interorganizacionais, mais suas e boa vontade do outro (Geyskens, Steenkamp & fronteiras podem mudar (Araujo et al., 2003). Kumar, 1999), faz com que parceiros fiquem mais Assim, os relacionamentos interorganizacionais propensos a compartilhar informações, aumenta podem ser vistos como dutos através das fronteiras a sensação de segurança e reduz o oportunismo organizacionais (Ballantyne, Christopher & (Palmatier et al., 2006). No entanto, ela diminui Payne, 2003). em ambientes instáveis (Kang & Jindal, 2015). Os boundary spanners representam o Comprometimento é a vontade permanente veículo mais importante para construir e manter de manter um relacionamento (Palmatier et relacionamentos sólidos (Palmatier, 2008). Um al., 2006). Além disso, os relacionamentos são dos problemas que está muito relacionado a eles, moldados por um ambiente social que permite no entanto, é o conflito de papéis, definido como a cooperação, quando as interações passadas as incertezas proeminentes enfrentadas (Singh & são vistas favoravelmente e as ações futuras são Rhoads, 1991). À medida que eles interagem com consideradas construtivas (Morgan, 2000). O membros de outros grupos, podem experimentar comprometimento influencia a cooperação expectativas conflitantes sobre como desempenhar de forma positiva; ambos são influenciados seu papel, o que pode levar a efeitos negativos positivamente pela confiança (Morgan & Hunt, em seus relacionamentos (Friedman & Podolny, 1994; Palmatier et al., 2006). 1992). A existência de relacionamentos pessoais Em relação a esse aspecto, Plewa (2009) de boa qualidade reduz o conflito de papéis, afirma que, em situações incertas, as pessoas atenuando os significados divergentes (Haytko, devem prestar atenção ao aumento da confiança 2004). e à diminuição das diferenças entre os parceiros; em condições mais estáveis, é preciso concentrar- 2.3 Cultura organizacional e marketing se no desenvolvimento do comprometimento. de relacionamento Miquel-Romero et al. (2014) argumentam que O desenvolvimento dos relacionamentos a geração de confiança e comprometimento, que não só exige investimento de recursos e seleção resulta em lealdade, é um objetivo estratégico de parceiros, mas também confiança, valores e uma fonte de rentabilidade a longo prazo, compatíveis, comprometimento, estabilidade, embora a proporção maior de interdependência frequência e qualidade das interações esteja associada a uma maior cooperação díade, (Gummesson, 2008; Iglesias et al., 2011; que pode ser significativamente menor quando Palmatier et al., 2006). Depende de como a a interdependência se baseia em custos de confiança e o comprometimento se transformam transferência em vez de interdependência do valor em cooperação e, portanto, em ação. Por outro do relacionamento (Scheer et al., 2015). lado, como afirmado por Luthans (2010), Nos relacionamentos, um agente quanto mais atividades forem compartilhadas, significativo é o boundary spanner, que atua como mais interações ocorrerão e mais fortes serão um representante da organização ou intérprete do os sentimentos entre as pessoas; quanto mais ambiente externo em fronteiras organizacionais frequentes forem as interações, mais as atividades (Araujo, Dubois & Gadde, 2003), por exemplo, e sentimentos serão compartilhados; quanto mais vendedores, compradores e gerentes relacionados fortes forem os sentimentos, mais pessoas vão a relacionamentos interorganizacionais. As compartilhar atividades e interagir. 41 Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Fabiano Larentis / Claudia Simone Antonello / Luiz Antonio Slongo

Os relacionamentos são culturais: as escolher um parceiro com valores semelhantes interações são construídas em premissas culturais pode manter a cooperação em longo prazo (Wang (Ellis, Lowe & Purchase, 2006). Os benefícios & Zhang, 2017). dos relacionamentos dependerão de quanto eles Por isso, pode notar-se que a cultura são valorizados em nível organizacional e são interorganizacional não é necessariamente a única enraizados na cultura organizacional (Winklhofer, cultura para organizações parceiras (perspectiva Pressey & Tzokas, 2006). Os relacionamentos de integração). A esse respeito, a perspectiva de envolvem o ponto de encontro de diferentes diferenciação, perspectiva de fragmentação ou a culturas (Plewa, 2009). Sobre isso, é a partir estrutura de três perspectivas pode ser considerada da compatibilidade de valores, que precedem a (Martin et al., 2006). confiança e o comprometimento (Morgan, 2000; Morgan & Hunt, 1994), que se podem identificar 3 Método semelhanças entre organizações (experiências passadas, ações atuais e expectativas futuras). Esta pesquisa é classificada como um A ambiguidade e a complexidade são estudo qualitativo de casos múltiplos (Merriam, razões para que a cooperação ocorra, porque 2009; Yin, 2014). Participaram duas unidades de organizações interdependentes com interesses negócios estratégicas (SBUs) localizadas no sul semelhantes, apesar de terem pontos de vista do Brasil, de diferentes grupos industriais. Uma diferentes, geram um certo grau de familiaridade delas fabrica móveis personalizados (Empresa M, e soluções juntas (Pitsis, Kornberger & Clegg, fundada em meados da década de 1990). A outra 2004). Com base em valores compatíveis, presta serviços financeiros (Empresa S, fundada confiança, comprometimento, cooperação e em meados da década de 1980). Essas SBUs foram formas de perceber e lidar com a realidade, é escolhidas por causa do relacionamento próximo possível observar que os relacionamentos podem com seus intermediários de vendas (grande interferir nas culturas organizacionais envolvidas, número de interações e presença de confiança, considerando as perspectivas culturais de Martin comprometimento e cooperação). et al. (2006). Quanto à unidade de análise, a díade Essas mudanças culturais, todavia, podem foi considerada (Achrol, Reve & Stern, 1983) levar ao desenvolvimento de uma cultura que com a participação de indivíduos de empresas envolve pessoas de organizações diferentes, fornecedoras e intermediários de vendas uma cultura interorganizacional? A cultura envolvidos nos relacionamentos. Em relação às interorganizacional pode ser percebida como díades, a Empresa M possui apenas lojas de móveis uma rede de significados e símbolos que circulam exclusivas como intermediários, com contrato entre as fronteiras organizacionais, uma interação exclusivo por região. A Empresa S trabalha com e combinação entre símbolos e significados um sistema de franquias. Gerentes, supervisores, que podem levar a novos significados. Saenz, analistas e assistentes (dos fornecedores) e Revilla e Knoppen (2014) definem a cultura proprietários (dos intermediários) participaram interorganizacional como um conjunto de da pesquisa. Os intermediários foram escolhidos normas ou valores compartilhados por diferentes pelo critério de alto nível de interação com as organizações. empresas (relacionamentos positivos e negativos). Além disso, quanto maior a frequência e o Os dados foram coletados em quatro nível de comunicação nos relacionamentos, maior estágios diferentes. No 1º estágio, durante cinco a chance de integração cultural; quanto maior a meses, realizaram-se quinze entrevistas pessoais compreensão cultural entre os parceiros, maior a em profundidade na Empresa M: uma com o qualidade da relação (Iglesias et al, 2011; Palmatier, gerente de vendas, gerente de marketing e ex- 2008). As diferenças culturais, porém, são maiores gerente de vendas, respectivamente; seis com nos relacionamentos com pior desempenho supervisores de vendas, quatro com assistentes de (Beugelsdijk, Koen & Noorderhaven, 2009) e vendas e um com o supervisor administrativo e 42

Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Cultura organizacional e marketing de relacionamento: uma perspectiva interorganizacional o supervisor de design da loja, respectivamente. e 40 minutos (3º e 4º estágios), foram gravadas Cinco foram realizados em lojas de móveis e transcritas. O número de entrevistas em cada (proprietários). Utilizou-se um mesmo roteiro estágio baseou-se no critério de redundância semiestruturado com base nos objetivos específicos (Merriam, 2009). e no referencial teórico, cujas questões foram Considerando a qualidade no processo de relacionadas à qualidade das interações, confiança, pesquisa qualitativa (Gubba & Lincoln, 2011; comprometimento, aprendizagem, cooperação, Miles, Huberman & Saldaña, 2014; Yin, 2014), papel dos boundary spanners, significados houve confiabilidade devido à coerência na coleta culturais, fatos representativos sobre a evolução de dados (tempo dedicado aos procedimentos de da organização, semelhanças culturais e diferenças coleta de dados, escolha dos entrevistados e tipo de dentro da empresa e entre grupos e organizações, interação com os entrevistados). Sobre a validade, além de mudanças culturais de acordo com a triangulação de dados foi realizada através das o desenvolvimento de relacionamento. Além entrevistas com o pessoal das díades, em quatro disso, observou-se uma Convenção de Lojistas etapas diferentes, juntamente com o uso de de Móveis. No 2º estágio, durante três meses, duas técnicas de coleta, que forneceram provas foram realizadas nove entrevistas em profundidade suficientes para a compreensão do fenômeno, na Empresa S (uma com o gerente de franquias, contribuindo com a plausibilidade e credibilidade o supervisor do serviço ao cliente, o analista de dos resultados. finanças, o assistente de atendimento ao cliente e Utilizou-se o procedimento de análise o assistente de marketing, respectivamente, duas de dados derivado da teoria fundamentada em com assistentes administrativos e assistentes de dados (grounded theory) (Charmaz, 2014). Com vendas, respectivamente) e duas com franqueados base nos procedimentos de Charmaz (2014), (proprietários), com o mesmo roteiro utilizado a partir de dimensões orientadoras (confiança, para a Empresa M. Nesse caso, a observação não comprometimento, cooperação, aprendizagem, foi autorizada pela Empresa S. dificuldades de relacionamento, significados e Tendo os resultados do primeiro e símbolos), derivados do conjunto de perguntas segundo estágios e suas relações com o referencial dos roteiros de entrevista e observação, resumiram- teórico, desenvolveu-se um segundo roteiro se trechos de dados, gerando as principais ideias semiestruturado, cujas questões foram relacionadas (códigos). Por fim, realizou-se uma microanálise, a interações interorganizacionais, conflitos e quando os códigos, agrupados, geraram categorias. incertezas nos relacionamentos, manifestações culturais e suas relações com relacionamentos, 4 Resultados e discussão rotatividade de pessoal, mudanças culturais através de relacionamentos e expectativas com 4.1 Os relacionamentos interorgani- relacionamentos. No 3º estágio, durante um mês, zacionais nas empresas: aspectos gerais foram realizadas seis entrevistas na Empresa M: uma com o gerente de vendas, gerente de marketing A atividade com lojas exclusivas na e supervisor administrativo, respectivamente; Empresa M e com franquias na Empresa S exige duas com supervisores de vendas; uma com um mais proximidade com os intermediários do proprietário de loja. No 4º estágio, durante um canal. Embora existam acordos contratuais, eles mês, houve nove entrevistas na Empresa S: uma não parecem limitar processos sociais e culturais com o gerente de franquias, o supervisor de ligados ao relacionamento. Os processos de vendas atendimento ao cliente, o analista financeiro, o envolvidos podem ser considerados complexos. assistente de atendimento ao cliente, o assistente A Empresa M lida com projetos e montagem, de marketing, um assistente administrativo e um que mobilizam a vida dos consumidores finais assistente de vendas, respectivamente; duas com e suas emoções. Eles também lidam com outros franqueados (proprietários). As entrevistas, que profissionais, como arquitetos e designers de duraram cerca de 65 minutos (1º e 2º estágios) interiores. A Empresa S trata de várias regras

43 Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Fabiano Larentis / Claudia Simone Antonello / Luiz Antonio Slongo

financeiras, que influenciam o desenvolvimento Aprendizagem: Nós aprendemos muito [com de argumentos de vendas. as franquias]. Eles têm sensibilidade na ponta De acordo com os entrevistados, em geral, dos dedos. Muitas práticas que funcionaram a importância do relacionamento deve ser evidente bem em uma franquia, espalhamos para através do nível de preocupação em fazer o que outros. É uma ótima aprendizagem quando foi prometido, através do constante intercâmbio os visitamos. Aprender o que não fazer e o de informações, e através da integração entre as que fazer. Eles são muito críticos ao levantar equipes, confiabilidade sobre o que está sendo os “porquês”, mas há momentos em que eles feito, através da disposição em aprender e resolver percebem que certas questões contribuirão problemas, enfatizando a presença dos elementos centrais do marketing de relacionamento: com a segurança de S e, consequentemente, confiança, comprometimento e cooperação com a segurança da franquia e eles compram (Gummesson, 2017; Palmatier et al., 2006), além a ideia. Existe um espírito de colaboração da importância da aprendizagem, principalmente (Assistente de Vendas S). informal, que fortalece o desenvolvimento e desempenho de relacionamentos (Altinay & A Tabela 1 traz um resumo comparativo Brookes, 2012;. Ellis et al, 2006). Apresentamos entre M e S, com base nos resultados empíricos. alguns trechos da entrevista: Aspectos mais amplos, como a forma como a confiança é vista, a importância da cooperação, Confiança: Como ele [franqueado] entendeu os processos de aprendizagem e problemas são nossa filosofia e a aceitou [contribuição para semelhantes entre elas. A qualidade da confiança, integrar mais]. Ele baixou a guarda. Eu ações de cooperação e aprendizagem são melhores entendo que há um processo e que ele pode na Empresa S. contribuir com esse processo, o que nem Além disso, as principais dificuldades de sempre é a forma que ele quer, mas que relacionamento identificadas estavam relacionadas podemos chegar a um ponto comum. Isso, em ao nível de rotatividade dos funcionários, comparação com os últimos oito anos, você principalmente as equipes de vendas dos pode ver com clareza. Eles entendem mais. O intermediários e a compreensão do outro lado. Os processo mudou (Assistente de Marketing S). altos níveis de rotatividade afetam negativamente o desenvolvimento das organizações (Mohr, Young & Burgess, 2012). O volume de negócios, Comprometimento: Eles têm aumentado associado à redução do tempo disponível muito o número de funcionários para nos para visitar pontos de venda pelas empresas dar apoio. Eles fornecem treinamentos muito fornecedoras, leva o relacionamento a acontecer interessantes. Eles não nos deixam à deriva, principalmente entre proprietários ou gerentes dos eles estão presentes. Claro que o resultado é o intermediários. Nos fornecedores, principalmente que vamos fazer. Esta presença da sua busca nos departamentos de pessoal, predominam a por alternativas demonstra que eles estão dificuldade de entender o outro lado, dada a falta comprometidos (Franquia S). de conhecimento da realidade dos intermediários.

Cooperação: Eles (loja) começam a procurar Sempre que você tem uma franquia com novos mercados, sabem que a empresa irá maior rotatividade de funcionários, os dar-lhes apoio. Antes, tinham muito medo, processos também vêm com um nível de devido ao seu investimento. Agora há muitas dificuldade maior. Geralmente, quando possibilidades com esta loja, eles pedem a franquia tem um volume de negócios opiniões, sugestões. Há essa abertura, de menor, a área de vendas desempenha o palpitar. Ele os devolveu. Ouvi nesta loja no papel esperado, a equipe operacional/ início que eles estavam órfãos e abandonados administrativa já percebe o que falta ou (Supervisor de Vendas M). 44

Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Cultura organizacional e marketing de relacionamento: uma perspectiva interorganizacional

o que precisa ser organizado. O volume para ouvir os problemas dos intermediários. Essas de negócios é um grande problema. O que descobertas indicam uma relação entre culturas causa a insatisfação do cliente é o volume de organizacionais e práticas de relacionamento (Ellis negócios (Assistente Financeiro S). et al., 2006; Gummesson, 2008; Iglesias et al., 2011; Winklhofer et al., 2006). Algumas dessas dificuldades seriam maiores se as empresas não estivessem abertas

Tabela 1 Comparações relativas ao relacionamento – Empresas M e S

Dimensões Empresa M Empresa S • Importância da transparência Confiança • Confiabilidade sobre informações fornecidas, ações realizadas e pessoas • Compartilhamento de informações e ideias • Cumprir as responsabilidades Comprometimento • Alcançar os objetivos • Cuidar bem das pessoas e dos negócios • Discussão de problemas, disposição para escutar e ajudar Semelhanças Cooperação • Percepção parcial com relação à realidade dos intermediários • A empresa aprende com os intermediários, principalmente sobre o mercado • Os intermediários aprendem com as empresas, principalmente sobre as práticas de gestão Aprendizagem • Elementos culturais da aprendizagem (significados) • Preponderância dos processos de aprendizagem informal • Dificuldade para entender o outro lado Dificuldades de • Conflito de funções dos boundary spanners relacionamento • Rotatividade de colaboradores • Falta de regras claras Confiança • Mais transparência • Falta de maior autonomia • Relacionamento com diversos Cooperação • Melhor qualidade dos contatos profissionais Peculiaridades • Necessidade de apoio externo para • Maior troca de informações aprender com práticas passadas • Maior aprendizagem com a troca de Aprendizagem • Prevalência do aprendizagem por experiências meio da ação • Treinamentos mais intensos

4.2 Culturas organizacionais das respeito às diferenças, a Empresa M apresentou empresas menos agilidade e menor ousadia, principalmente devido à centralização da tomada de decisão. Na Identificou-se um número considerável Tabela 2, apresentam-se os resultados empíricos de significados semelhantes, principalmente sintetizados. sobre aspectos positivos, como ética, respeito às pessoas, estabilidade e relacionamento. No que diz

45 Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Fabiano Larentis / Claudia Simone Antonello / Luiz Antonio Slongo

Tabela 2 Culturas organizacionais das empresas pesquisadas

Comparações Empresa M Empresa S • Ações realizadas gradualmente • Humildade • Equilíbrio entre razão e emoção • Importância do relacionamento Semelhanças • Ética • Confiança como valor • Flexibilidade • Estabilidade • Maior enfoque no produto e na produção • Liberdade para criar • Menos agilidade e ousadia • Maior enfoque na aprendizagem Diferenças • Menos formalidade • Maior enfoque em clientes e resultados • Autossuficiência • Maior autonomia para tomar decisões • Maior abertura para a inovação • Maior liberdade para criar Diferenças com o • Menos tradicional • Menos tradicional grupo industrial de • Maior dinamismo • Maior dinamismo origem • Maior importância ao relacionamento • Maior importância ao relacionamento • Mais interesse no desafio • Maior autonomia para tomar decisões

Ambas as empresas têm diferenças e desempenhos financeiros insatisfatórios. Uma relacionadas com as outras unidades de grupos das razões é a forma como a substituição é industriais dos quais elas fazem parte. Por causa vista, quando é preferível dar uma chance para de seus bens/serviços, seus intermediários, os os intermediários melhorarem, relacionada aos mercados em que estão presentes e os seus significados associados à estabilidade. líderes anteriores, as empresas M e S mostram Comparando as empresas com mais dinamismo, mais importância dada aos intermediários, culturalmente, encontraram-se relacionamentos e são menos tradicionais. Na muitas semelhanças. Algumas das características Empresa M, existe abertura para discutir ideias das empresas foram previamente valorizadas e apresentar projetos, mas argumentos muito pelos intermediários, tais como ética, consistentes são necessários para obter uma simplicidade, estabilidade e importância dada aprovação por parte do conselho de administração. aos relacionamentos. Os intermediários que têm Na Empresa S, a maior descentralização leva a um um relacionamento mais próximo são os que mais maior número de decisões a serem tomadas nos desempenham essas características. Uma possível níveis hierárquicos intermediários. Outro aspecto razão está relacionada com os intermediários é o foco no cliente, trabalho em equipe e na que já foram funcionários da empresa, e aos preocupação com a solução de problemas. intermediários com valores compatíveis desde o início dos relacionamentos. As diferenças foram Percebemos claramente características muito observadas principalmente por causa da natureza industriais, de onde vieram (fundadores). do negócio. Os intermediários lidam com varejo Mas há uma maior humanização aqui, uma e têm uma visão mais orientada para o mercado, humildade com profissionalismo. Eu trabalhei enquanto as empresas, principalmente Empresa em uma empresa em que havia rudeza no M, têm uma visão mais industrial. negócio. Aqui, a maneira como você é tratado é polida, não formal. Há respeito pelo ser Eles [empresa e conselho] são muito humildes; humano (Gerente de Vendas M). não mostram o que têm. Eu também vim de uma situação humilde. Não há nenhum Além disso, em ambas as empresas, esforço por parte de todos na empresa no sentido foi possível identificar as dificuldades para de comportar-se de determinadas maneiras, substituir intermediários que apresentam vendas não é artificial, é natural. Todo mundo

46

Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Cultura organizacional e marketing de relacionamento: uma perspectiva interorganizacional

está disponível para ajudar. Eles são pessoas intermediários. Outro aspecto que se destaca tem educadas e humildes (Intermediário M) a ver com as premiações constantes que a empresa Quanto às expressões culturais (símbolos), recebe, o que geralmente melhora o espírito de os mitos dos fundadores dos grupos industriais equipe. foram identificados, as pessoas de origem humilde. Há também o mito do “Patinho Feio”, alusão à 4.3 Mudanças culturais organizacionais rentabilidade da Empresa M e à necessidade As mudanças culturais nas expressões, de investimentos. A partir das cerimônias, bem como em significados, que ocorreram ao que envolvem vários ritos, além das festas de longo do tempo, puderam ser identificadas, tanto confraternização internas, há também eventos para os intermediários quanto para as empresas, de confraternização com os intermediários. Na com uma contribuição dos relacionamentos Empresa M, existe a “Convenção das Lojas de interorganizacionais, considerando que uma Móveis”, quando as ações são oficializadas e as cultura se desenvolve à medida que certos grupos ideias são compartilhadas. Na Empresa S, há uma organizacionais aprendem a lidar com problemas, reunião de franqueados, pelo menos uma vez bem como com a forma de percebê-los ao longo por ano, sob a responsabilidade do franqueado, do tempo (Schein, 1991). Os resultados empíricos para a troca de ideias e integração com novos são apresentados na Tabela 3.

Tabela 3 Mudanças culturais organizacionais

• Valores compatíveis Contribuição das empresas aos • Processos de sistema e gestão intermediários em mudanças culturais • Intermediários (proprietários) como funcionários das empresas no passado Contribuição dos intermediários às • Entendimento das necessidades de mercado empresas em mudanças culturais • Experiências passadas com outros fornecedores Contribuição de outros • Aspectos culturais além das organizações envolvidas (como subculturas profissionais) • Características culturais que facilitam o surgimento ou fortalecimento de outras Relações entre as contribuições do • Papel da liderança fornecedor e do intermediário • Assimetria do poder • Natureza conservadora e estável das culturas

Considerando a contribuição das dos ex-funcionários das empresas que agora são empresas aos intermediários em mudanças intermediários. Nesse caso, as características da culturais, identificaram-se valores compatíveis, cultura organizacional do fornecedor, por ser, no especificamente significados/valores apreciados passado, a principal referência de organização para pelos intermediários. Os entrevistados eles, têm contribuído com o desenvolvimento da enfatizaram a humildade e a importância dada cultura organizacional da nova empresa, apesar aos relacionamentos, que foram reforçadas com dos desafios enfrentados para desempenhar o a interação. papel de empresários. As mudanças culturais também estão relacionadas com práticas de gestão, devido à Nossa escola está lá. Em nossos valores há um falta de referências em gestão dos intermediários. bocado de S. Eu acredito que uma franquia Na Empresa M, o “Conceito”, um conjunto de com as pessoas que foram criadas dentro de S orientações estratégicas e operacionais, faz parte faz dos valores muito mais presentes. Mas, ao do vocabulário e práticas dos proprietários da loja. longo do tempo, os valores são absorvidos por Na Empresa S, há uma forte influência das práticas osmose. Eu vejo a rede de franquias de forma de gestão de pessoas. Há também a situação muito transparente. Não estamos pensando

47 Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Fabiano Larentis / Claudia Simone Antonello / Luiz Antonio Slongo

apenas em nós mesmos, mas na rede. Ao os arquitetos são considerados formadores de fortalecer a rede, estamos fortalecendo a nós opinião no mercado. Alguns de seus aspectos, mesmos (Franquia S). como vocabulário e visão de mundo, foram incorporados pelos proprietários das lojas. A contribuição dos intermediários às Papel semelhante é atribuído aos consultores de empresas diz respeito a uma melhor compreensão franquia, na Empresa S. das necessidades do mercado. Na Empresa S, houve uma mudança na percepção de seus funcionários Esses outros varejistas [com grande sobre o mercado de franquias nos treinamentos desempenho] já enxergaram o todo, o realizados por eles ao pessoal de franquias. conceito do produto, o design, a compreensão, Experiências de mercado compartilhadas oferecem porque eles têm um diálogo mais forte com um entendimento compartilhado (Gebhardt, os arquitetos, eles sabem a linguagem do Carpenter & Sherry, 2006). arquiteto (Designer M).

Eu acho que a visão de mercado por parte Por outro lado, uma característica cultural da Empresa S evoluiu muito. Hoje podemos pode permitir ou facilitar o surgimento ou o mudar algumas coisas lá dentro. Eles estão reforço de uma outra característica cultural. A ouvindo mais. O mercado determina os cultura é transformada à medida que as pessoas caminhos. Depois de conversar muito, eles interagem socialmente com os outros (Lee et al., começam a entender o que o mercado quer 2015), e abertura para novas ideias é essencial para (Franquia S). a mudança cultural (Alvesson & Sveningsson, 2008). O nível de abertura das empresas a novas Outro ponto são as experiências passadas ideias permitiu uma melhor abordagem do dos intermediários com outros fornecedores, mercado. Além disso, uma maior interação das contribuindo com os atuais. Na Empresa M, um empresas com os intermediários e a necessidade dos empresários com o melhor desempenho na de resolver problemas, principalmente na Empresa rede de lojas foi varejista exclusivo de outra marca S, acabaram fazendo departamentos que não por muitos anos, com um foco muito intensivo têm contato direto com o mercado mudar seu em resultados. Este proprietário de loja, apesar de ponto de vista. As percepções do departamento desaprovar tal aspecto, continua a ter um maior operacional tornaram-se mais semelhante aos do foco em resultados do que a Empresa M, herança departamento de vendas, levando à aproximação do antigo fornecedor. das áreas organizacionais da empresa. Os líderes moldam a cultura (Moorman & Alguns varejistas trouxeram elementos Day, 2016). O papel da liderança em mudanças interessantes à rede, o que era algo que eles culturais foi identificado na Empresa M, com estavam procurando incorporar como um o ex-gerente de vendas que desenvolveu o valor, a busca do lucro pela venda, a vontade “Conceito”. Na Empresa S, com um ex-diretor, de vender, o que não era, e ainda talvez não que lançou muitas estratégias de gestão de pessoas. seja, um valor da M. Eles trouxeram valores, Além disso, identificaram-se algumas evidências mas também eles próprios incorporaram a relacionadas com a assimetria de poder, tendo em filosofia M (Ex-Gerente de Vendas M). conta a influência de indivíduos e grupos mais poderosos na interpretação de outros sobre os Além disso, houve uma contribuição dos eventos (Lucas & Kline, 2008). significados dos outros, externa aos fornecedores Com relação a isso, considerando a e intermediários, que mostra uma relação de natureza conservadora e estável das culturas subculturas profissionais (Martin et al, 2006; (Alvesson & Sveningsson, 2008; Gagliardi, 1986), Van Maanen & Barley, 1985). Na Empresa M, muitos dos significados permanecem juntos dentro

48

Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Cultura organizacional e marketing de relacionamento: uma perspectiva interorganizacional das empresas e intermediários. Um exemplo é o Portanto, pode-se afirmar a existência “Conceito”, mencionado anteriormente. O de uma cultura interorganizacional, de forma gerente responsável por sua elaboração havia saído específica e restrita, que depende principalmente e o Conceito deixou de ser usado amplamente, dos relacionamentos interorganizacionais, mas, mesmo assim, permaneceu com os donos de com predominância da perspectiva cultural de lojas. As pessoas saem, mas a cultura permanece. fragmentação (Martin et al., 2006), identificadas Na Empresa S, as práticas de gestão de pessoas na partilha de alguns significados entre indivíduos foram influenciadas por um ex-diretor. de diferentes organizações, como os departamentos de vendas e operacional/administrativo com os Outro gerente [depois de o anterior intermediários, e do Conselho de Administração desenvolver o “Conceito”] tentou eliminar o com os intermediários. Essas relações estão Conceito, mas perceberam que nunca seriam representadas no esquema conceitual proposto capazes de fazê-lo, porque está impregnado. (Figura 1), em que a estrutura de três Os varejistas pediram que este conceito perspectiva pode ser identificada (Martin et voltasse. M pode mudar todos os varejistas, al., 2006) no desenvolvimento de uma cultura mas o rosto do ex-gerente permanece, o interorganizacional. Há a Cultura do Fornecedor Conceito continua (Varejista M). (a) e a Cultura do Intermediário (b), a partir de uma perspectiva de integração, símbolos As mudanças culturais, encontradas em e significados compartilhados por toda uma algumas pessoas, grupos ou símbolos e significados, empresa (Martin et al., 2006; Van Maanen & precisam dos relacionamentos para se fortalecer Barley, 1985), e a Cultura dos Departamentos e se espalhar (Luthans, 2010). Assim, com base do Fornecedor (c) e Cultura dos Departamentos em Ellis et al. (2006) e Alvesson e Sveningsson do Intermediário (d), a partir da perspectiva de (2008), as mudanças culturais identificadas diferenciação, na qual os significados específicos provavelmente ocorreram principalmente devido estão restritos a grupos de trabalho específicos aos momentos de interação e cooperação, os (Martin et al., 2006; Hofstede, 2001; Van processos de aprendizagem, formação de confiança Maanen & Barley, 1985). e comprometimento. Essas mudanças, no entanto, Supõe-se que haveria um desenvolvimento dependiam de um fundo cultural que já estava da cultura interorganizacional nas zonas de presente em ambas as empresas. intersecção entre as perspectivas culturais do fornecedor (“a” e “c”) e perspectivas culturais do 4.4 Desenvolvimento de uma cultura intermediário (“b” e “d”), a partir da perspectiva interorganizacional de fragmentação, em que o consenso seria específico para um problema ou contexto De acordo com os resultados, o determinado (Martin et al., 2006). As perspectivas marketing de relacionamento em um contexto de fragmentação no fornecedor e no intermediário interorganizacional, principalmente através de desempenhariam um papel indireto no seu confiança, comprometimento e aprendizagem, desenvolvimento. Essas áreas de intersecção contribuem com o comportamento cooperativo e reforçam a natureza da cultura interorganizacional com as mudanças em alguns aspectos das culturas como uma rede de significados que flui dentro e organizacionais envolvidas. Essas mudanças, por fora do espaço organizacional, constantemente sua vez, dependem do conflito de papéis e da criada e transformada à medida que grupos de rotatividade dos boundary spanners. Segundo Lu pessoas interagem socialmente com os outros, et al. (2016), manter uma relação bem-sucedida em um estado de fluxo sem qualquer limite claro significa assegurar que as culturas organizacionais (Cavedon, 2003; Lee et al., 2015). entre parceiros são compatíveis.

49 Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Fabiano Larentis / Claudia Simone Antonello / Luiz Antonio Slongo

Desenvolvimento de uma Cultura Interorganizacional (CI)

Cultura de Cultura do Departamentos Fornecedor (a) Perspectiva de do Fornecedor Perspectiva de fragmentação (c) integração dentro do Perspectiva de fornecedor diferenciação

Cultura Interorganizacional (CI) Perspectiva de fragmentação

Perspectiva de Cultura de Cultura do fragmentação Departamentos intermediário (b) dentro do do Intermediário Perspectiva de intermediário (d) integração Perspectiva de Elementos iniciais de IC diferenciação *Significados compartilhados Elementos resultants de IC *Símbolos compartilhados *Práticas de cooperação *Abertura a novas ideias Elementos intermediários de *Significados (novos, *Frequência e qualidade das redefinidos, fortalecidos) interações IC *Confiança relacionada à *Símbolos (novos, *Papel dos boundary redefinidos, fortalecidos) spanners informação, às ações e às pessoas *Redução do conflito de *Experiências e trajetórias papéis dos boundary passadas *Comprometimento com as ações, resultados e pessoas spanners *Papel da liderança *Aproximação das áreas *Assimetria do poder *Processos e resultados de aprendizagem organizacionais das empresas

Elementos de enfraquecimento de CI *Nível de rotatividade dos boundary spanners *Significados não compartilhados *Símbolos não compartilhados

Contexto Aspectos culturais além das organizações envolvidas Dinâmica ambiental (econômica, social natural, tecnológica,)

FiguraFigura 1. 1.Esquema Esquem conceitual:a conceitual: Desenvolvimento Desenvolvimento de uma de culturauma cultura interorganizacional interorganizacional

OSupõe esquema-se que conceitualhaveria um desenvolvimento propõe atravésda cultura de elementosinterorganizac intermediáriosional nas zonas(confiança de queintersecção o desenvolvimento entre as perspec detivas uma culturais cultura do fornecedorrelacionada (“a ”à einformação, “c”) e perspectiv às açõesas e culturaisàs pessoas, interorganizacional, com base em elementos comprometimento com ações, resultados, iniciaisdo intermediário (significados (“b” e símbolos e “d”), acompartilhados, partir da perspectiva e decom fragmentação, as pessoas, processosem que o consensoe resultados seria de aberturaespecífico a novas para ideias, um problea frequênciama ou e acontexto qualidade determinado aprendizagem), (Martin et queal., 2006).poderão As contribuir perspectivas mais das interações, o papel dos boundary spanners, tarde com os elementos resultantes (práticas experiênciasde fragmentação e trajetórias no fornecedor passadas, e no papel intermediário da cooperativas, desempenhar iamsignificados um papel e indiretosímbolos no novos, seu liderançadesenvolvimento. e assimetria deEs poder),sas áreas é influenciado de intersecção redefinidos reforçam e reforçados,a natureza redução da docultura conflito pelos relacionamentos interorganizacionais, do papel do boundary spanner e aproximação interorganizacional como uma rede de significados que flui dentro e fora do espaço 50 organizacional, constantemente criada e transformada à medida que grupos de pessoas Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.INCIAL-FINAL

Cultura organizacional e marketing de relacionamento: uma perspectiva interorganizacional das áreas organizacionais das empresas). Estes diferentes organizações e funciona como um elementos e as relações entre eles são influenciados agente de ligação (Grueso-Hinestroza & Antón- pelos elementos de enfraquecimento (nível de Rubio, 2015). Como as práticas do marketing rotatividade dos boundary spanners e significados de relacionamento dependem de quanto elas são e símbolos não compartilhados). Além disso, esse valorizadas em nível organizacional e enraizadas desenvolvimento está relacionado com o contexto, na cultura organizacional, desempenham, nesse além das organizações envolvidas (aspectos sentido, um papel fundamental, porque permitem culturais, como outras culturas organizacionais o desenvolvimento de pontos de encontro de e elementos das culturas nacionais, bem como diferentes culturas, uma vez que a interação com dinâmica ambiental). É importante observar que as pessoas é construída em premissas culturais os elementos iniciais e intermediários, resultantes (Ellis et al., 2006; Plewa, 2009; Winklhofer et e de enfraquecimento, bem como o contexto, al., 2006). foram originados a partir de categorias emergentes identificadas no estudo, fundamentadas nos 5 Considerações finais resultados. A partir de uma abordagem cultural, as O marketing de relacionamento consiste fronteiras são definidas com base em significados em processos de interação e engajamento para compartilhados, e a cultura é transformada em a manutenção de relacionamentos cooperativos um estado de fluxo sem qualquer limite claro: de longo prazo (Hakansson & Snehota, 1995; culturas organizacionais formam combinações de Morgan & Hunt, 1994; Palmatier, 2008). manifestações culturais (Alvesson, 2013; Lee et Embora o campo do marketing de relacionamento al, 2015). Assim, na estrutura proposta, as linhas tenha sido um tema importante da pesquisa tracejadas representam a permeabilidade entre acadêmica por mais de duas décadas, parece ainda perspectivas culturais, elementos relacionados mais significativo quando os relacionamentos são com o desenvolvimento de uma cultura considerados complexos e multifacetados (Payne interorganizacional, e contexto. As setas duplas & Frow, 2017). representam interações entre os elementos Os relacionamentos interorganizacionais, (relações de interdependência). Elementos iniciais bem como as culturas organizacionais, são podem influenciar e ser influenciados mais tarde complexos. Para seu desenvolvimento, eles por elementos intermediários e os elementos dependem da comunicação, da aprendizagem, da resultantes da cultura interorganizacional. confiança, do comprometimento, de significados e Assim, nosso estudo indica que a cultura de símbolos compartilhados. Os relacionamentos interorganizacional pode ser vista como uma cultura não são escolhidos, mas desenvolvidos (Hunt et de intersecção, dada a associação das perspectivas al., 2006). Por outro lado, a cultura organizacional culturais entre fornecedores e intermediários, ou, apresenta variação e contradição (Alvesson, 2013). ainda, uma cultura de fronteiras. Isso se deve ao Este estudo analisou a contribuição dos fato de a cultura poder criar limites e permitir relacionamentos entre comprador e vendedor nas significados compartilhados entre fronteiras mudanças nas culturas organizacionais envolvidas. (Halley, 2001), e os relacionamentos envolverem Foi possível identificar que os relacionamentos o ponto de encontro de diferentes culturas interferem em questões culturais, considerando (Plewa, 2009). Seria também possível encarar a quantidade e a qualidade de interações a cultura interorganizacional como a cultura entre diferentes organizações, a confiança, o dos boundary spanners, envolvendo a interação comprometimento, a cooperação e os processos dos boundary spanners dos intermediários de aprendizagem. Essas alterações, não restritas (incluindo os proprietários) com os das aos intermediários, interferirão na continuidade empresas, principalmente naquelas áreas em dos relacionamentos. Sobre isso, observou-se o que predominam, como marketing/vendas. A papel dos boundary spanners como profissionais de cultura constrói a coesão entre as pessoas de fronteira, assim como a importância de considerar

51 Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Fabiano Larentis / Claudia Simone Antonello / Luiz Antonio Slongo

os conflitos de papéis e os níveis de rotatividade de interpretação combinada, o que poderia de funcionários. reduzir as diferenças (Fang, Fang, Chou, Yang & Os benefícios dos relacionamentos Tsai, 2011). Além disso, por meio da realização interorganizacionais dependerão de quanto eles são de um estudo de casos múltiplos qualitativo valorizados em nível organizacional e enraizados envolvendo a cultura organizacional e o marketing nas culturas organizacionais (Winklhofer et de relacionamento, o estudo contribui com a al., 2006). Observou-se que o marketing de disciplina do marketing pela necessidade de se relacionamento não está apenas associado às desenvolver mais pesquisas de estudo de caso estratégias dos casos investigados, mas também é para lidar com a complexidade do mundo um elemento de suas culturas. (Gummesson, 2017). Como contribuições teóricas deste estudo, Em relação às limitações do estudo, ficou evidente o poder de explicação e a complexidade verificou-se a necessidade de mais momentos de das múltiplas perspectivas culturais de Martin et al. observação. Além disso, o estudo concentrou-se (2006). Por outro lado, tornou-se clara a importância nos relacionamentos interorganizacionais em dos elementos constituintes do relacionamento canais de marketing de dois casos. Este artigo, nas mudanças culturais, especialmente a confiança por fim, sugere futuros estudos relacionados (Pitsis et al., 2004). Outra questão importante ao papel dos boundary spanners em mudanças é a necessidade de considerar a aprendizagem, culturais; à natureza e a dinâmica das áreas principalmente a informal (Janowicz-Panjaitana & de intersecção entre as diferentes perspectivas Noorderhavenb, 2008). culturais, considerando o esquema conceitual Além disso, este estudo identificou proposto em canais de marketing, bem como em a existência, mesmo que restrita, de uma outros arranjos interorganizacionais, tais como cultura interorganizacional. É uma cultura clusters e redes de cooperação; a investigação do originada de relacionamentos, uma intersecção lado negro da cultura interorganizacional. de culturas, uma cultura de fronteiras. A cultura interorganizacional pode coexistir com outras Referências culturas, mesmo porque é um produto delas e Achrol, R. S., Reve, T., & Stern, L. W. (1983). as suas interações, o que poderia aumentar o The environment of marketing channel dyads: A alcance das pessoas envolvidas, reduzindo assim framework for comparative analysis. Journal of os preconceitos. Chama a atenção, entretanto, o Marketing, 47(4), 55-67. fato de que as culturas organizacionais podem, simultaneamente, criar coesão e orientação, Agariya, A. K., & Singh, D. (2011). What tornando a ação coletiva e a vida organizacional really defines Relationship Marketing? A review possível por causa disso, mas também restringem of definitions and general and sector-specific a autonomia, a criatividade e questionamento defining constructs. Journal of Relationship (Alvesson, 2013). Isso pode ser associado com o Marketing, 10(4), 203-237. lado negro da cultura interorganizacional. Este estudo contribui, ainda, com as Altinay, L., & Brookes, M. (2012). Factors práticas de marketing, indicando a necessidade de influencing relationship development in franchise estar atento às relações entre ações de marketing . Journal of Services Marketing, 26(4), de relacionamento e cultura organizacional. O 278-292. relacionamento acontece porque há uma base cultural (Ellis et al., 2006). Além disso, destaca Alvesson, M. (2013). Understanding organizational a atenção para o papel dos boundary spanners culture. London, UK: Sage. (Araujo et al., 2003), seus conflitos de papéis e níveis de rotatividade. A esse respeito, um canal Alvesson, M., & Sveningsson, S. (2008). Changing adequado para a interação e comunicação entre : Cultural change work in as organizações pode facilitar o desenvolvimento progress. Abingdon, UK: Routledge. 52

Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Cultura organizacional e marketing de relacionamento: uma perspectiva interorganizacional

Araujo, L., Dubois, A., & Gadde, L. (2003). Friedman, R. A., & Podolny, J. (1992). The multiple boundaries of the Firm. Journal of Differentiation of boundary spanning roles. Management Studies, 40(5), 1255-1277. Administrative Science Quarterly, 37, 28-47.

Ballantyne, D., Christopher, M., & Payne, A. Gagliardi, P. (1986). The creation and change of (2003). Relationship marketing: Looking back, organizational cultures: A conceptual framework. looking forward. Marketing Theory, 3(1), 159- Studies, 7(2), 117-134. 166. Gebhardt, G. F., Carpenter, G. S., & Sherry, Batt, P. J., & Purchase, S. (2004). J. F., Jr. (2006). Creating a market orientation: Managing collaboration within networks A longitudinal, multifirm, grounded analysis and relationships. Industrial Marketing of cultural transformation. Journal of Management, 33(3), 169-174. Marketing, 70(4), 37-55.

Beugelsdijk, S., Koen, C., & Noorderhaven, Geyskens, I., Steenkamp, J., & Kumar, N. (1999). N. (2009). A dyadic approach to the impact A meta-analysis of satisfaction in marketing of differences in organizational culture on channel relationships. Journal of Marketing Research, 36 relationship performance. Industrial Marketing (2), 223-238. Management, 38(3), 312–323. Gregory, B. T., Harris, S. G., Armenakis, A. A. & Shook, C. L. (2009). Organizational culture Cannon, J. P., & Perreault, W. D., Jr. (1999). and effectiveness: A study of values, attitudes, Buyer-seller relationships in business markets. and organizational outcomes. Journal of Business Journal of Marketing Research, 36(4), 436-460. Research, 62(7), 673-679. Cavedon, N. R. (2003). Antropologia para Grueso-Hinestroza, M. P., & Antón-Rubio, M. administradores, Porto Alegre, BR: UFRGS. C. (2015). Cultural values in interorganizational networks: A proposal from the model of Shalom Charmaz, K. (2014). Constructing grounded theory. Shwartz (1992). Investigación y Desarrollo, 23(2), London, UK: Sage. 369-390. Dauber, D., Fink, G., & Yolles, M. (2012). Gubba, E. G., & Lincoln, Y. S. (2011). A configuration model of organizational Paradigmatic controversies, contradictions, and culture. Sage Open, 2(1), 1-16. emerging confluences, revisited. In N. K. Denzin, & Y. S. Lincoln (Eds), The SAGE Handbook of Deshpandé, R., & Webster, F. E., Jr. (1989). Qualitative Research, (3rd. ed., Cap. 8, pp. 191- Organizational culture and marketing: defining 234). Thousand Oaks, CA: Sage. the research agenda. Journal of Marketing, 53(1), 3-15. Gummesson, E. (2008). Total relationship marketing (3rd ed.). Oxford, UK: Elsevier: Ellis, N., Lowe, S., & Purchase, S. (2006). Butterworth-Heinemann. Towards a re-interpretation of industrial networks: A discursive view of culture. The IMP Journal, Gummesson, E. (2017). From relationship 1(2), 20-40. marketing to total relationship marketing and beyond. Journal of Services Marketing, 31(1), Fang, S. R., Fang, S. C., Chou, C. H., Yang, S. 16-19. M., & Tsai, F. S. (2011). Relationship learning and innovation: The role of relationship-specific Hakansson, H., & Snehota, I. (1995). Developing memory. Industrial , 40(5), relationships in business networks. London, UK: 743-753. Routledge.

53 Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Fabiano Larentis / Claudia Simone Antonello / Luiz Antonio Slongo

Halley, A. A. (2001). Applications of boundary compatibility. Australasian Marketing Journal theory to organizational and interorganizational (AMJ), 24(1), 93-100. culture. In R. J. Stupak, & P. M. Leitner (Eds.), Handbook of Public (pp. Lucas, C., & Kline, T. (2008). Understanding 135-147). New York, NY: Marcel Dekker. the influence of organizational culture and group dynamics on organizational change and learning. Haytko, D. L. (2004). Firm-to-firm and Learning Organization, 15(3), 277-287. interpersonal relationships. Journal of the Academy Luthans, F. (2010). (12nd of Marketing Science, 32(3), 312-328. ed.). New York, NY: McGraw-Hill. Hofstede, G. (2001). Culture’s consequences: Martin, J., Frost, P. J., & O’Neil, O. A. (2006). Comparing values, behaviors, institutions and Organizational culture: Beyond struggles for across nations. Thousand Oaks, CA: intellectual dominance. In S. R. Clegg, C. Hardy, Sage. T. B. Lawrence, & W. R. Nord (Eds.). Handbook of organizational studies (2nd. ed., pp. 599-621). Hogan, S. J., & Coote, L. V. (2014). Organizational London, UK: Sage. culture, innovation, and performance: A test of Schein’s model. Journal of Business Research, 67(8), Merriam, S. B. (2009). Qualitative research. San 1609-1621. Francisco, CA: Jossey-Bass.

Hunt, S. D., Arnett, D. B., & Madhavaram, Miles, M. B., Huberman, A. M., & Saldaña, S. (2006). The explanatory foundations of J. (2014). Qualitative data analysis (3rd ed.). relationship marketing theory. Journal of Business Thousand Oaks, CA: Sage. Industrial Marketing, 21(2), 72-87. Miquel-Romero, M. J., Caplliure-Giner, E. M., Iglesias, O., Sauquet, A., & Montaña, J. (2011). & Adame-Sánchez, C. (2014). Relationship The role of corporate culture in relationship marketing management: Its importance in private marketing. European Journal of Marketing, 45(4), label extension. Journal of Business Research, 67(5), 631- 650. 667-672.

Janowicz-Panjaitana, M., & Noorderhavenb, N. G. Mohr, D., Young, G. J., & Burgess, J. F. (2008). Formal and informal interorganizational (2012). Employee turnover and operational performance: The moderating effect of group- learning within strategic alliances. Research Policy, oriented organizational culture. Resource 3(8), 1337–1355. Management Journal, 22(2), 216–233. Kang, B., & Jindal, R. P. (2015). Opportunism Moorman, C., & Day, G. S. (2016). Organizing for in buyer–seller relationships: Some unexplored marketing excellence. Journal of Marketing, 80(6), antecedents. Journal of Business Research, 68(3), 6-35. 735-742. Morgan, R. M. (2000). Relationship marketing Lee, S. J., Kim, J., & Park, B. I. (2015). Culture and marketing strategy: The evolution of clashes in cross-border : relationship marketing strategy within the A case study of Sweden’s Volvo and South Korea’s organization. In J. Sheth, & A. Parvatiyar (Eds.), Samsung. Review, 24(4), Handbook of relationship marketing (Cap. 18, pp. 580-593. 481-504). Thousand Oaks, CA: Sage.

Lu, V. N., Plewa, C., & Ho, J. (2016). Managing Morgan, R. M., & Hunt, S. D. (1994). The governmental business relationships: The commitment-trust theory of relationship impact of organisational culture difference and marketing. Journal of Marketing, 58(3), 20-38. 54

Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Cultura organizacional e marketing de relacionamento: uma perspectiva interorganizacional

Narasimhan, L., Srinivasan, K., & Sudhir, K. insights. Journal of the Academy of Marketing (2015). Editorial – marketing science in emerging Science, 43(6), 694-712 markets. Marketing Science, 34(4), 473-479. Schein, E. H. (1991). What is culture? In P. J. Ogbonna, E., & Harris, L. C. (2014). Frost, L. F. Moore, M. R. Louis, C. C. Lundberg, Organizational cultural perpetuation: A case study & J. Martin (Eds.). Reframing organizational of an english premier league football club. British culture (pp. 243-253). Newbury Park, CA: Sage. Journal of Management, 25(4), 667-686. Singh, J., & Rhoads, G. K. (1991). Boundary Palmatier, R. W. (2008). Relationship marketing. role ambiguity in marketing oriented Cambridge, MA: Marketing Science Institute. positions: A multidimensional, multifaceted operationalization. Journal of Marketing Research, Palmatier, R. W., Dant, R., Grewal, D., & Evans, 28(3), 328-338. K. (2006). Factors influencing the effectiveness of relationship marketing: A meta-analysis. Journal Strati, A. (1998). Organizational symbolism as of Marketing, 70(4), 136-153. a social construction: A perspective from the sociology of knowledge. Human Relations, 51(11), Payne, A., & Frow, P. (2017). Relationship 1379-1402. marketing: Looking backwards towards the future. Journal of Services Marketing, 31(1), 11-15. Van Maanen, J., & Barley, S. (1985). Cultural organization: Fragments of a theory. In P. J. Frost, Pels, J., Moller, K., & Saren, M. (2009). Do we L. F. Moore, M. R. Louis, C. C. Lundberg, & J. really understand business marketing? Getting Martin (Eds.) Organizational Culture, (pp. 31- beyond the RM – BM matrimony. Journal of 53). Newbury Park: CA Sage. Business & Industrial Marketing, 24(5), 322-336. Vetráková, M., & Smerek, L. (2016). Diagnosing Pitsis, T. S., Kornberger, M., & Clegg, S. organizational culture in national and intercultural (2004). The art of managing relationships in context. E+ M Ekonomie a Management, 19(1), interorganizational collaboration. M@nagement, 62. 7(3), 47-67. Wang, J. J., & Zhang, C. (2017). The impact Plewa, C. (2009). Exploring organizational culture of value congruence on marketing channel difference in relationship dyads. Australasian relationship. Industrial Marketing Management, Marketing Journal, 17(1), 46–57. 62, 118-127.

Saenz, M. J., Revilla, E., & Knoppen, D. Winklhofer, H., Pressey, A., & Tzokas, N. (2006). (2014). Absorptive capacity in buyer–supplier A cultural perspective of relationship orientation: relationships: Empirical evidence of its mediating Using organizational culture to support a supply role. Journal of , 50(2), relationship orientation. Journal of Marketing 18-40 Management, 22(1), 169-194.

Schakett, T., Flaschner, A., Gao, T., & El-Ansary, Yin, R. K. (2014). Case study research (5th ed.). A. (2011). Effects of social bonding in business- Thousand Oaks, CA: Sage. to-business relationships. Journal of Relationship Yin, S., Lu, F., Yang, Y., & Jing, R. (2014). Marketing, 10(4), 264-280. Organizational culture evolution: An imprinting Scheer, L. K., Miao, C. F., & Palmatier, R. perspective. Journal of Organizational Change W. (2015). Dependence and interdependence Management, 27(6), 973-994. in marketing relationships: Meta-analytic

55 Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56 Fabiano Larentis / Claudia Simone Antonello / Luiz Antonio Slongo

Notas ¹ Artigo derivado da tese de doutorado “Marketing de relacionamento e cultura organizacional: uma perspectiva interorganizacional” defendida por Fabiano Larentis em 2010, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Escola de Administração. Programa de Pós-Graduação em Administração, sob orientação do Prof. Dr. Luiz Antônio Slongo. ² Uma versão preliminar deste artigo foi apresentada no XXXIV EnANPAD 2010, Rio de Janeiro. “Marketing de Relacionamento e Transformações Culturais Organizacionais: Um Estudo de Casos Múltiplos em Díades”

Sobre os autores: 1. Fabiano Larentis, Doutor em Administração, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil. E-mail: [email protected] ORCID 0000-0001-8390-0271 2. Claudia Simone Antonello, Doutora em Administração, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil. E-mail: [email protected] ORCID 0000-0001-9654-5125 3. Luiz Antonio Slongo, Doutor em Administração, Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil. E-mail: [email protected] ORCID 0000-0002-8269-4338

Contribuição dos autores:

Claudia Simone Luiz Antonio Contribuição Fabiano Larentis Antonello Slongo 1. Definição do problema de pesquisa √ √ √ 2. Desenvolvimento das hipóteses ou questões de pesquisa (trabalhos √ √ √ empíricos) 3. Desenvolvimento das proposições teóricas (ensaios teóricos) √ √ 4. Fundamentação teórica/Revisão de literatura √ √ √ 5. Definição dos procedimentos metodológicos √ √ 6. Coleta de dados √ 7. Análise estatística - - - 8. Análise e interpretação dos dados √ √ 9. Revisão crítica do manuscrito √ √ 10. Redação do manuscrito √ √ 11. Outra – Desenvolvimento da estrutura da análise √ √

56

Rev. Bras. Gest. Neg. São Paulo v.20 n.1 jan-mar. 2018 p.37-56