Agradecimentos especiais à

3 8 L ☆ ENGLISH LAVENDER SOUZA CRUZ ATKINSONS

1 O ANOS ENCLISH LAVENDER ATKINSONS

por Marcelo Cipis

xpediente

Dançar - Empresa Editorial de Comunicações Ltda. Rua Alabastro, 304 - Aclimação - São Paulo - SP - Brasil Telefone: (011) 279-4158 - Fax: (011) 277-1088

Diretor Geral: Pedro G. Bianco Jr. D iretora: Nildes Bianco

Editores de texto: Christine Greiner, Marcos Bragato Editor de arte: Neilor Lopes

Colaboradores: • Texto: Helena Katz, Dino Carrera, Cássia Navas, Saulo Borges • F otos: P.l 1 - Carmen Lobos (foto 1), Verônica Falcão (foto 2); P. 12 - Carmen Lobos (fotos 1 e 2); P. 13 - Emídio Luisi (3); P. 14 - Gérson Zanini (1 e 2); P. 17 - Cláudio Renato (1 e 2), Mário Castello (3); P. 18 - Paulo Pinheiro (1); P.20 - Carmen Lobos; P.23 - Lelli e Masotti (1), Gilberto Melo (2); P.25 - Edson Meirelles (2); P.26 - Emídio Luisi (1); P.38 e 39 - Cromolaser, Fernando Ziviani (1, 2 e 3); P.40 e 41 - Marcelo Dau, Teatro Municipal General San Martin, Emídio Luisi (1 a 6); P.42 - Thomás de Paz (1, 2 e 3); P.44 - Marcelo Dau (1); P.46 - Marcelo Dau (1 e 2); P.49 - Sylvia Mazini (1); P.50 e 51 - Fernando Ziviani; P.52 - Ruy Teixeira; P.56 - Novosti (1); P.57 - United Artists (2); P.58 - Paulo Camarão Jr. (1); P.69 - Gérson Zanini; P.70 - Miguel Aun (3), Cláudio Renato (1), Atílio Avancini (2); P.71 - Maurice Leymour, NY (4); P.74 e 75 - Diana Wojcwodzki (1 e 2); P.81, 82 e 83 - Mario Castello; P.85 e 87 - Thomás de Paz; P.86 - Bobby Fulton (2), Louis Greenfield (1); P.89 - Marcos Pereira; P.90 - J. L. Lambeau; P. 101 - Colette Masson / Kipa (2); P. 104 - J. L. Pederneiras, Amir Sfair Filho; P. 105 - Áurea; P. 108 - Lewy Moraes (3), Gil Grossi (1 e 2); P. 109 - Flash Studio, Emídio Luisi; P. 114 - Sérgio Vieira (1 e 2); P. 115 - Norberto Avelaneda (3); P.l 16 - Rui Arsego (1); P.l 19 - Alexs Szabzon (1); P. 120 - Sandra Narezzi (1), João Caldas (2); P. 122 - Sérgio Vieira (2). As demais fotos foram cedidas para divulgação.

Departamento Administrativo: Silvia Bianco Departamento Comercial: Soraya Galgane, Guilherme Hungria, Angela Cirello Secretárias: Débora Cristina Aznar Teixeira e Renata Teixeira Auxiliar de Escritório: Ricardo Alexandre Oliveira Assessoria Jurídica: Cássio Felix Advogados T ráfego: André Ricardo A. Barra Assessoria Contábil: Pedro Geraldo Bianco

Editoração Eletrônica: BBM - Comunicação Visual Fotocomposição: Compacta Fotolito: Italcolor Impressão: OESP Gráfica

C apa: The Ballerina , Edgar Degas (Keystone) As matérias assinadas não representam necessáriamente a opinião da editora.

O MINISTÉRIO DA SAUDE ADVERTE FUMAR É PREJUDICIAL À SAÚDE. u m á r i o

Editorial 7

1982 - Ano Zero j 9

1983 - Ano I j 15

1984 - Ano II j 21

E ducação: pensar a dança 27

• Educação da dança: conhecimento do corpo e da alma 27

1985 - Ano III j 35

1986 - Ano IV j 47

M ercado: abrir caminhos 59

• Pesquisa em dança 59

• Mercado da dança - Antes e depois: as fissuras do mercado j 61

1987 - Ano V j 67

1988- Ano VI j 79

10 anos da dança internacional 91

• A dança na América Latina 91

• A vanguarda no Japão e nos Estados Unidos 93

• A vanguarda européia 95

• Balé, entre americanos e europeus 96 i 1989 - Ano VII j 99

1990- Ano VIII j 106

1991 - Ano IX ! 110

1992 - Ano X j 117

F estivais: intercâmbio de idéias 123

• A informação que vem de fora 123

• Festivais Nacionais 128

D ez A nos 131

Revista Dançar completa dez anos como a única publicação brasileira especializada na área. A despeito das dificuldades que têm abalado o meio artístico na última década, Dançar tem se mantido fiel aos compromissos originais. Ou seja, fazer a cobertura dos eventos nacionais e Ainternacionais e, além disso, participar ativamente no meio, incentivando novos nomes, resgatando aqueles que têm construido a dança brasileira, e construindo, por assim dizer, • uma espécie de memória viva dos movimentos da dança.

Esta edição especial é um presente àqueles que fazem, apreciam e incentivam a dança no país. É dividida em duas partes que se enlaçam no decorrer do texto. A primeira é um catálogo de fotos que recupera momentos antológicos dos grandes intérpretes, companhias e convidados estrangeiros que nos visitaram. São fotos selecionadas desde a revista número zero. E a segunda parte divide-se em quatro blocos de matéria que analisam a última década da dança no Brasil e no mundo, do ponto de vista educacional e profissional, recuperando grandes eventos nacio­ nais e internacionais que encantaram o público nos últimos anos. Além disso, Dançar traz uma coletânea com textos de críticos especializados, que estudam dança produzida no exterior.

Na verdade, a lista dos nomes daqueles que, cada qual a seu modo, têm contribuído para desenvolver a dança no Brasil, é ampla. Com os problemas que ainda hoje dificultam a comuni­ cação entre as grandes capitais e o interior das regiões mais afastadas, torna-se quase impossível mencionar todos estes pro­ fissionais.

Assim, o nosso objetivo foi conceituar aspectos importantes da dança e apenas iniciar este árduo trabalho de memorizar a produ­ ção artística nacional, para a qual, dez anos, é apenas o começo. o

E lançada a Revista Dançar, a primeira e única publicação especializada do país

ANO ZERO Dançar Á 10 Anos

ano que inaugura eventos nacionais

Dançar é a -m y o dia 7 de junho é lançada a revista Dançar, no Teatro primeira e única / \ / TBC em São Paulo, e no mês seguinte, no Teatro Galeria X Y no , com o incentivo do SNT (Serviço revista Nacional de Teatro), que continuou estimulando a revista nos especializada em anos seguintes como INACEN e, posteriormente, FUNDACEN. dança do pais, Dançar é a primeira e única revista especializada do país, ocupando um ocupando um espaço vazio, fruto de uma educação deficiente e espaço até então de um limitado hábito de leitura, que tem restringido o público vazio em geral ao consumo imediatista das informações veiculadas pela mídia eletrônica. 1982 é um ano com acontecimentos marcantes. Acontece pela segunda vez, por iniciativa do Centro Educacional de Balé Leda Iuque, o Congresso Nacional de Ensino da Dança e a Exposição de Ensino da Dança. Durante estes eventos, que contaram com a presença de celebridades como Laura Proença, Ana Lázaro, Fernando Bujones e o ortopedista William Hamilton, a revista Dançar foi divulgada ao grande público, participando ativamente. O coreógrafo e educador mineiro Klauss Vianna passa a dirigir o Balé da Cidade de São Paulo, rompendo a hierarquia acadêmica da companhia. Nasce o ENDA ( Encontro Nacional da Dança Amadora ) criado por Magaly Bueno, presidente da APPD (Associação Paulista dos Profissionais da Dança, que existe desde 14 de outubro de 1977). A Companhia portuguesa Gulbenkian de Bailado faz uma turnê pelo Brasil, dando início a um diálogo cultural duradouro. O Balé Stagium completa 10 anos e comemora a proeza, admirável em meio às dificuldades econômicas da sociedade, com a coreografia "Vida", de Decio Otero. O Balé Teatro Castro Alves, a primeira companhia oficial de dança do Norte-Nordeste, dirigida por Antonio Carlos Cardoso, ex-diretor do Corpo de Baile de SP, ganha repercussão nacional e busca pesquisar uma linguagem brasileira para a dança. E despontam novos talentos como J.C.Violla destaque na montagem de "Petrouchka", de Célia Gouvêia e direção de Naum Alves de Souza. O Projeto Carlton que já havia se iniciado em 1981, apoia as montagens^j "Homenagem a Stravinsky", "Giselle" e "Don Quixote". 1 e 2 O Balé da FUNARJ monta o clássico Don Quixote com Ana Botafogo e Fernando Bujones nos papéis principais. É o início de uma famosa parceria e do namoro de Bujones com a companhia carioca. Dançar 10 Anos

1 e 2 A bailarina e atriz Marilena Ansaldi destaca- se no panorama nacional com uma criação particular de espetáculos, explorando temas psicológicos e existenciais através da simbiose entre dança e teatro. Foram famosos: "Isso e Aquilo", "Por dentro , por fora","Escuta Zé", "Fundo de Olho", "Sopro de Vida", "Geni" e "Picasso e Eu "(na foto).

3 Décio Otero e Márika Gidali em "Qualquer maneira de amor vale amar", reafirmando o estilo do Stagium no panorama nacional. 3 1 e 2 “ Bolero” , do Balé da Cidade de São Paulo, é o cartão de visita da gestão Klauss Vianna. A preocupação de instalar uma nova relação entre o intérprete e o coreógrafo permite com que o elenco participe do processo de criação dirigido por Lia Robatto. A concepção do espetáculo é de Emilie Chamie. o

Grandes companhias nacionais s e afirmam profissionalmente

A N O I Dançar 10 Anos

U m ano de grandes coreógrafos

Navarro e ois coreógrafos, um contemporâneo do outro, marcam o Arrieta renovam ano de 1983. O primeiro, o espanhol Victor Navarro, D representou quase que integralmente a idéia da mudança a dança iniciada em 74 por Antonio Carlos Cardoso: abolir a dança acadêmica de repertório e buscar um estilo próprio, a exemplo das criações européias. Navarro já havia desenvolvido na metade dos anos 70 a sua mais importante produção no Balé da Cidade de SP, com o espetáculo "Paixão" que chega a SP em 83. Nesta obra, sintetiza ao máximo a relação entre movimento e música. O segundo coreógrafo é o argentino Luis Arrieta, que estudou com Oscar Araiz, tendo sido premiado em 77, 79 e 80 no ex-Corpo de Baile do Teatro Municipal, passando a dirigir a companhia em 82. Continuou o processo instaurado por ACC e Navarro enriquecendo a única companhia oficial de dança de SP. Para o Cisne Negro, começa a coreografar em 80. "Do homem ao poeta" de 83 é o seu terceiro trabalho. No Balé da Cidade de SP, enquanto em 82, o "Bolero" representou o auge da direção de Klauss Vianna, a produção de "A Dama das Camélias" em 83, foi uma espécie de despedida. Uma colagem de diferentes estilos, muita improvisação, um espetáculo plasticamente bonito e esteticamente indefinido. Yellê Bittencourt é contratado como maitre do Balé da Cidade de SP mostrando a competência adquirida no Orfanato da União das Operárias de Jesus, onde estudaram Míriam Guimarães e Amélia Moreira, além de Mareia Haydée e Laura Proença, estas somente como alunas do curso de dança. No Rio de Janeiro, a coreógrafa Marly Tavares troca o palco pela TV, abrindo novas possibilidades para a dança. Esta famosa ; "partner" de Lenie Dale coreografa a novela "Baila Comigo" e • faz sucesso em comerciais como o da Caixa Econômica Federal. j O Balé da FUNARJ monta o espetáculo "Gabriela" com música de . Nasce o Festival de Joinville. 1 e 2 O musical “ Evita” é a primeira associação do teatro musicado e a dança no país. Antes, "Jesus Christ Superstar" e "Hair", dos mesmos autores (Tim Rice e Andrew Lloyd Webber) já haviam instalado a idéia do musical. No entanto, em "Evita" ocorre a associação completa entre dançarinos e atores. A direção é de Maurício Sherman, a coreografia de Larry Fuller e o papel principal da cantora Claudia. 3 O musical "Chorus Une", produzido por Walter Clark, seduz o grande público popularizando este gênero teatral no país. Muitos atores e bailarinos que participaram desta montagem foram mais tarde reconhecidos, como J.C.Violla, Thales Pan Chacon e Claudia Raia, entre outros.

•• i. v s. * • » • Dançar 10 Anos 1 A companhia paulista Cisne Negro apresenta "Do homem ao poeta", de Luis Arrieta, e reafirma o seu papel de uma das grandes companhias nacionais.

2 , um dos grandes mitos da dança clássica internacional, vem ao Brasil com o Ballet Théatre Français de Nancy.

3 e 4 O Ballet Teatro Guaíra, do Paraná, pela primeira vez destaca-se no circuito nacional e internacional, apresentando em Portugal "O Grande Circo Místico". O atrativo especial é a música de , Edu Lobo e vozes conhecidas da MPB. Uma comemoração especial dos 20 anos de luta de Carlos Trincheiras e Isabel Santa Rosa.

pág. 20 A brasileira mais famosa na Europa e, sem dúvida, a mais bem sucedida, Márcia Haydée, volta ao Brasil como diretora do Balé Stuttgart, substituindo o diretor e coreógrafo John Cranko. Márcia renova o repertório da companhia incluindo obras, por exemplo, do holandês Jiri Kyliam. Na foto, Márcia e Jorge Donn em "Leda e o Cisne". o

A dança fora do eixo Rio - São Paulo ganha destaque

A N O II Dançar 10 Anos

U m ano da dança mineira

Carlos Leite, ■ 1 o ano da dança mineira. O pioneiro foi Carlos Leite. Klauss Vianna e Iniciou a sua carreira em 32. Em 48 monta a sua escola. I ^ Em 58, funda o grupo Balé de Minas Gerais. Em 66, ocupa Décio Otero são o Palácio das Artes. Em 70, faz o primeiro espetáculo com a os primeiros Ópera "O Guarani". Em 74 é fundado o atual Balé do Palácio mineiros das Artes. Para o Brasil, a dança mineira lança nomes fam osos importantes como os de Klauss Vianna e de Decio Otero. Mas cria também grupos menores como o Studio Cristina Helena, o Geraes Cia de Dança, e espetáculos que buscavam uma associação entre teatro e música como "Elis, como um pássaro em seu ombro" do Baleteatro Minas e "Noturno para Pagu" do Teatro de Pesquisa. A Companhia Oficial mineira Balé da Fundação Clóvis Salgado, hoje Balé do Palácio das Artes, apresenta "Tribana", um espetáculo preocupado em explorar a linguagem da dança e suas particularidades, tendo como tema a questão tribal. Em São Paulo, o Casa Forte, fundado por Edson Claro, apresenta um novo caminho em direção à dança moderna com "Omma Dawn" , de Ana Maria Mondini, e "Oração das mães da Plaza de Mayo", a crítica política de Luis Arrieta. Da união dos coreógrafos Clarice Abujamra e Vai Folly, nasce o TBD, Teatro Brasileiro de Dança, alargando o mercado com novas propostas de trabalho ancoradas na dança moderna. Em Curitiba, a UAIC (União dos Artistas Independentes Contemporâneos), representa o lado mais irreverente da dança local. O Balé da Cidade de São Paulo une três gerações de artistas brasileiros: a coreógrafa Suzana Yamauchi, o versátil cenógrafo Flávio Império e o experiente Francisco Giacchieri. O balé "Absurdos ou os 12 trabalho de Flérsules" é uma colagem de temas que têm desde samurais até secretárias eletrônicas. O Balé da FUNARJ monta "Orfeu", concepção e direção de Fernando Bicudo e coreografia de Vicente Nebrada. 1

1 2 0 "Alia Scala de Milano” , a mais famosa companhia italiana, visita o Brasil. Traz a sua versatilidade mostrando o espírito romântico de "Giselle” , obras de Maurice Béjart e de Balanchine, e uma das grandes estrelas, em evidência no balé europeu - Peter Schaufuss.

2 O coreógrafo e diretor artístico Antonio Carlos Cardoso, após 3 anos de trabalho árduo na direção e implantação do Balé Teatro Castro Alves, na Bahia, é afastado pelas autoridades estatais. Desde 1974, Cardoso despontava como um dos mais brilhantes diretores artísticos das Companhias Oficiais, tendo sido convidado para reformular o ex-CBM (atual Balé da Cidade de SP). Estimulou o trabalho de coreógrafos residentes no Brasil, como foi o caso de Luis Arrieta e Victor Navarro. 1 Antonio Carlos Rebelo, o Pipoca, completa 18 anos de televisão. Foi o primeiro a coreografar a dança com a câmera. Dirigiu para a TV Cultura, em SP, programas como o “ Corpo de Baile” e o “ Coreografia” , desempenhando um papel importante no processo de documentação da dança.

3 O Balé du Grand Théâtre de Genève vem ao Brasil com quatro bailarinos, a assistente de direção e o professor de técnica clássica, todos brasileiros. Sob a batuta de Oscar Araiz, encanta o público com belos espetáculos. pág. 26 - 1 A bailarina e diretora húngara Márika Gidali comemora 13 anos de Balé Stagium. A companhia se afirma no cenário nacional e internacional, buscando temas de cunho político e algumas vezes nacionalista, levando a dança a todo tipo de público, das grandes capitais ao interior mais inacessível do país.Na foto, “ Missa dos Quilombos” .

pág. 26 - 2 Durante a comemoração do 4310 aniversário, São Paulo lembra a criação do Balé do IV Centenário, com uma exposição que recupera a história deste grupo, organizado em 1954 e cujo valor histórico é superlativo. A grande maioria dos profissionais que emergiram nos anos 50 e são hoje consagrados no país, estiveram presentes nesta experiência como Ismael Guiser, Ady Addor, Yoko Okada, Ruth Rachou, Márika Gidali e assim por diante. Flashes da o História

3 Dançar 10 Anos Educação pensar a dança ©i

^ ducação da dança : conhecimento do corpo e da alma

Christine Greiner

educação no Brasil é um dos proble­ Revendo as edições da revista Dançar é mas mais sérios do país e o ensino da possível encontrar em praticamente todos Adança, envolvido neste contexto, os números matérias, entrevistas e críticas tem padecido das mesmas carências. Ou de profissionais ligados à dança na tentati­ melhor: conta com alguns agravantes, por va de refletir sobre alguns aspectos exemplo, uma espécie de desprezo pela cul­ importantes. Retomando alguns destes te­ tura e pela memória artística brasileira, que As técnicas do balé mas e ouvindo novos depoimentos, vem sendo cultivado há algumas décadas. e da dança tecemos uma crítica a determinados aspec­ moderna chegaram As reclamações se repetem ano após ano tos do panorama educacional brasileiro, ao Brasil por três abordando ciclicamente os mesmos temas: sem a preocupação de resgatar todas as vias: estrangeiros falta de verba, falta de apoio oficial, desin­ iniciativas ( desta vez, não se trata de uma que decidiram teresse da maioria das empresas privadas, reportagem) mas pensando de uma maneira residir no país, falta de público etc, etc, etc. globalizante, justamente onde está a fragi­ visitantes lidade maior do sistema, que conta com É evidente que alguma coisa está errada. O uma carência insustentável de grandes pen­ convidados para público existe. Basta verificar o que acon­ sadores. dar cursos e tece quando um evento de grande porte brasileiros que conta com o apoio da mídia. A crise pode 0 formação do bailarino Em deixaram o país comprometer em parte a bilheteria, mas há geral, a formação do bailarino brasileiro para estudar e uma resposta positiva do público. O mesmo ancora-se em oito anos de estudo de balé retornaram ocorre quando aparece uma academia com clássico (sem distinções específicas entre ensinando as alguma proposta nova, o número de alunos as diversas escolas clássicas) e, neste meio técnicas aumenta, a receptividade logo aparece. tempo, ou logo após a formatura, são dadas aprendidas algumas noções de dança moderna. No entanto, tudo não passa de episódios isolados. O público se desfaz quando acaba A crítica e pesquisadora de dança Helena o evento, a academia se esvazia se não Katz, que acompanha o mercado há 20 mantiver a proposta consistente. Portanto, anos, afirma que o primeiro passo para se não vamos, mais uma vez, enumerar pro­ pensar seriamente na educação da dança no blemas que fazem parte da pauta de Brasil é reconceituar as palavras bailarino discussões há tantos anos, repetindo-os e formação: "Não existe o bailarino para a como o fazem as campanhas políticas na­ dança, e sim um bailarino para uma dança. cionais em prol do menor abandonado e do Uma escola precisa ter uma companhia x e fim do analfabetismo no país. É preciso para isto formar de maneira x os seus bai­ pensar na dança de maneira mais profunda larinos. O produto final, que é aquilo que o e não apenas sintomática. bailarino dança, a escolha estética dele, é > "A situaçao ideal que é a escolha da sua formação”. obteriam condições de entrar na universidade por não contarem com a bagagem cultural com­ nunca vai existir; é As informações técnicas, tanto do balé pleta nas outras disciplinas (exigência do preciso começar clássico quanto da dança moderna, chega­ vestibular), foi criado o curso de segundo grau agora." ram ao Brasil, basicamente por três vias: relacionando através das aulas de educação Maria Duschenes estrangeiros que decidiram residir no país, artística na escola e a formação universitária, visitantes convidados para Festivais e ou­ um intercâmbio bastante rico e potencialmente tros eventos, e os próprios brasileiros que produtivo. deixaram o país para estudar ou trabalhar e retornaram ensinando as técnicas aprendi­ As idéias eram interessantes mas a prática, das. O fato é que além de importar as no decorrer dos anos, mostrou deficiências diversas técnicas importou-se o método de gravíssimas. A professora de Teoria da ensino que passou a ser "adaptado” à reali­ dança, ex-diretora da UFBA, Dulce Aqui- dade brasileira. Vale lembrar que todo este no, escreveu à Dançar 30, um artigo processo ocorre com alguns anos de atraso, constatando que "a criação do curso de portanto, os modelos aplicados hoje já es­ Educação Artística gerou sérias distorções tão muitas vezes superados no país de para o ensino das artes. Com relação à dan­ origem. O resultado desta aculturação é o ça foi mais grave, inadequado e enfrentamento com as peculiaridades do inconseqüente. Além da licenciatura de mercado brasileiro e de seus bailarinos. curta duração com habilitação geral em Educação Artística que possibilita a forma­ Um bom exemplo é a Universidade Fede­ ção do professor polivalente, com carga ral da Bahia, a pioneira do país, com mais horária de 1500 horas em um ano e meio, a de 30 anos. modalidade de licenciatura plena, de acor­ A Federal da Bahia foi criada com base no do com a resolução 23/73 do Conselho pensamento expressionista alemão através Federal de Educação, fixa como habilita­ de professores como Rolf Gelewsky, entre ção específica artes cênicas e não dança ou outros. Com uma formação sólida nos prin­ teatro.” cípios ensinados por Mary Wigman e Harald Kreutzberg, este grupo pioneiro Este é apenas um exemplo de como muitas logo encontrou dificuldade em "adaptar” vezes o problema está na concretização das esta filosofia alemã à realidade baiana. Foi boas idéias. É difícil começar um processo de um processo longo. Para aproveitar, por aprendizado se ainda não há um número su­ exemplo, os meninos que praticavam o can­ ficiente de professores aptos a levar adiante domblé nos terreiros e tinham uma o projeto. Se é necessário formar alunos é formação excelente em dança, mas jamais também necessário criar professores. P k Educação pensar a dança I

A húngara Maria Duschenes, que faz parte fazendo parte deste ensino o seguinte conjunto da preciosa lista de estrangeiros que deci­ de matérias: Técnica de Dança Clássica, Téc­ diram viver no Brasil, e há mais de 50 anos nica de Dança Moderna, Expressão Artística, dedica a sua vida à dança e especialmente Danças Populares e Folclóricas, Música, etc, ao ensino, é responsável pela importação com todas as subdivisões que dão liberdade do método Laban, uma das vertentes da ainda maior para atuar no campo do desenvol­ dança moderna alemã. Duschenes tem par­ vimento artístico, físico e emocional da ticipado de inúmeras propostas de criança". Em artigo escrito para Dançar 30, educação. Em 67, integrou um projeto para Paula esclarece ainda a necessidade de "utilizar criar o Departamento de Dança na ECA técnicas diferentes que ao se completarem da­ (Escola de Comunicações e Artes da Uni­ rão aos alunos uma formação completa e versidade de São Paulo), que não foi adequada". concretizado por falta de verbas. Nos anos Diante deste tipo de proposta educativa 80, tentou a legalização da obrigatoriedade (em Curitiba, o curso de primeiro e segun­ do ensino da dança no primeiro e segundo do grau assim como o profissionalizante da graus. O projeto também não foi aprovado. Fundação Teatro Guaíra têm objetivos bas­ No entanto, durante todos estes anos Dus­ tante semelhantes aos de São Paulo) chenes formou muitos seguidores que têm surgem duas perguntas: até que ponto é desenvolvido o método Laban em cursos viável e útil apostar nesta "formação com­ livres nas Universidades, em Centros Cul­ pleta" dos alunos? E, ao mesmo tempo, turais e até nas Bibliotecas Públicas com como as crianças poderão optar por uma Até que ponto é crianças em formação. Duschenes está con­ especialização futura se não tiverem , de viável e útil apostar victa de que é necessário investir em todas fato, um leque amplo de opções durante a as pontas "tanto no ensino das crianças na formação sua formação básica? como na universidade", afirmando desde a completa dos alunos? E, por primeira vez que foi entrevistada na Dançar ^^mportar modelos prontos 15 e, mais tarde na Dançar 19, que : "a outro lado, como as , professor, bailarino e co­ situação ideal nunca vai existir, é preciso crianças poderão reógrafo, discutia já na revista Dançar 17, começar agora". optar por uma a questão de como descobrir o caminho E as tentativas prosseguem. A proprietária para um resultado estético específico. especialização de escola Paula Castro, por exemplo, é a "Quando a gente é jovem não tem seguran­ futura se não criadora dos cursos de primeiro e segundo ça para escolher o melhor caminho. Mas conhecerem um grau em dança, em São Paulo, e explica: desde cedo eu sabia que o ideal não era a amplo leque de "organizei uma grade curricular que envol­ importação de fragmentos americanos. O opções durante o ve os alunos sobre vários aspectos técnicos, resultado desta importação é hoje muito > seu aprendizado? É fundamental vago e insatisfatório. Vejo em todas essas es- generalidades, das verdades absolutas. Se as que existam colas importadas, gente muito bem academias continuarem apresentando possibi­ profissionais da intencionada tentandotransformar intuitiva­ lidades de formação muito semelhantes a todos dança com uma mente essa linguagem importada. Inutilmente, os milhares de estudantes que as procuram todo base intelectual porque ela representa a reflexão particular de o ano, os corpos vão continuar sendo semelhan­ uma pessoa sobre o seu mundo e o seu processo tes e o mercado não terá condições de absorver sólida para manter criador e o que era trazido para cá eram apenas toda esta mão de obra", conclui Helena. a coerência das pequenos fragmentos das propostas de José A carioca Gilda Murray, criadora da escola propostas e levá-las Limon, de Martha Graham, de Merce Cunning- de dança moderna Espaço Dança no Rio de adiante, tanto na ham. Isso não era suficiente para transformar Janeiro, na década de 70 e residente em São área de criação, ninguém e, efetivamente, não vi nenhum resul­ Paulo nos últimos 10 anos como professora quanto na de tado dessa provável transformação." da ECA (Escola de Comunicações e Artes educação Mas se não adianta importar modelos pron­ da USP), acaba de partir para uma nova tos, por outro lado, no exterior há exemplos investida apostando justamente na diferen­ importantes de conduta baseados nas espe- ciação. O Projeto CENA (Centro de cificidades, lembra Helena Katz. 11 O Encontro das Artes) resgata com o auxílio bailarino do New York City Ballet não é o de Ruth Rachou (outra importante repre­ mesmo do American Ballet Theatre embora sentante da dança moderna no Brasil) a estejam a 100 metros de distância um do idéia do antigo Espaço Dança oferecendo outro. Assim como o Kirov não é o mesmo aos profissionais o contato com convidados do Bolshoi e assim por diante. Não se trata estrangeiros que oferecem cursos especia­ portanto de criar uma escola brasileira de lizados em suas técnicas, uma informação dança. Não há modelos hegemônicos nem preciosa para que os bailarinos possam, in­ no balé nem na dança moderna, nem no jazz clusive, optar pelo caminho a seguir, ou ou em qualquer estilo. Cada bailarino deve mesmo para completar a sua formação. O saber o que quer para ele." projeto já trouxe Lori Belilove (técnica Duncan) e Maxime Steinman (técnica Lí- Isto quer dizer que nem sempre será neces­ mon). Esta iniciativa polariza um processo sário estudar oito anos de balé clássico para que muitas vezes ocorre isoladamente, se­ alguém se tornar bailarino. "É preciso com­ não com a presença de profissionais preender a situação localizadamente. estrangeiros especializados, através de bra­ Talvez para este bailarino, para aquilo que sileiros que já deixaram o país fazendo ele quer desenvolver, dois anos de clássico cursos no exterior e retornando, como afir­ sejam suficientes, para o outro quatro. Pre­ mamos anteriormente, para transmitir as cisamos romper a idealização das novas informações. Até certo ponto, trata- Educação pensar a dança ®l

se de uma atitude perigosa no sentido de que questão que seja assim. O país é subdesenvol­ alguns contentam-se com pequenos cursos de vido porque quer. O brasileiro tem muito férias sem qualquer aprofundamento. No en­ potencial e tem que aprender que se aprende até tanto, há aqueles bastante competentes. Sonia o fim da vida. Tem sempre que melho- Motta (técnica de Louis Falco), Clarisse Abu- rar."(Dançar 20). jamra e Penha de Souza (técnica de Martha Entre erros e acertos, os anos 80 são sem Graham), o próprio Ivaldo Bertazzo (diversas dúvida marcados pelo crescente interesse técnicas orientais), Suzana Yamauchi (técnica educacional. Sobretudo no que diz respeito Jennifer Muller) e Célia Gouvêia (formada na ao ensino universitário. Em 84 foi criado o escola Mudra de Maurice Béjart), são alguns Curso Superior de Dança da Fundação Tea­ dos nomes importantes que têm se destacado nos últimos anos. tro Guaíra/PUC-PR, logo em seguida, a Faculdade de Dança do Rio de Janeiro, as­ No que diz respeito ao balé clássico, a con­ sociada à Faculdade da Cidade, e em 85, o fusão é ainda maior, uma vez que muitas Departamento de Artes Corporais da UNI- vezes as diversas escolas de balé são ensi­ CAMP, em São Paulo. Depois surgiu a nadas de maneira misturada e alguns alunos Faculdade de Dança da Universidade Santa sequer desconfiam que existem diferentes Cecília dos Bandeirantes, em Santos (SP). tendências. No entanto, há felizmente, os Na época da criação do curso carioca, a sua profissionais que têm formado muitos bai­ idealizadora, Dalal Achcar, falava à Dan­ larinos competentes. çar 1 1 sobre o papel do ensino universitário: "é uma vitória de toda a clas­ Alguns completaram seus estudos fora do país. se, o reconhecimento do valor do trabalho Eliana Karin (especializou-se na técnica Vaga- da dança. Não se vai ensinar a dançar, mas nova no Kirov) falou a Dançar 23 sobre a preparar-se mestres para a dança, alargan­ necessidade do "conhecimento profundo da­ do-lhes os horizontes técnicos e pessoais quilo que se faz", enquanto Jane Blauth, para que possam passá-lo às novas gera­ exilada voluntariamente do Brasil durante 10 ções." anos na Europa para lapidar sua técnica, con­ cluiu "não gosto e não quero mentiras". Dançar Tendo em vista esta mesma linha ideológi­ com a verdade de fato não é fácil. Para Tatiana ca, Carla Reinecke Tavares coordena o Leskowa "antes de mais nada é preciso ser projeto desenvolvido no Paraná em dois muito exigente, ter fé na dança, honestidade e pólos: o Curso Superior e o profissionali­ procurar a perfeição máxima de cada ser huma­ zante (já citado anteriormente) que só foi As Universidades no. Tem que dar 100% de si mesmo, como se reconhecido o ano passado mas já existe criam pensadores e fosse uma religião. Eu sou exigente e faço desde 1956. O ensino em Curitiba, contou > não bailarinos Dançar 10 Anos

j com o apoio de uma excelente profissional 1991 e 1992 para "colocar a casa em ordem". "Os j chamada Eva Schull, cujo nome não pode ser alunos não queriam ler, queriam uma extensão j esquecido, tendo sido responsável pela for- das academias, ser apenas bailarinos quando o j mação de excelentes bailarinos. Além das objetivo da faculdade é criar professores- pen­ j aulas, um grupo pré-profissional apresenta sadores". j espectáculos e funciona como um estágio Alguns dos grandes educadores da dança j para os alunos. "Os objetivos são bem deter- no Brasil, têm com clareza este lado inte­ j minados", explica Carla, "o lectual e até certo ponto filosófico da í profissionalizante forma bailarinos e o supe- educação e cultivam há anos princípios im­ j rior já está mais voltado à formação de portantes a serem recuperados quando se j professores, pesquisadores". O ano que vem procura pensar na dança. Nina Verchinina ; provavelmente o Curso Superior passará a fala por exemplo na mentalidade dos alu­ j integrar a Faculdade Estadual do PR. O estu- nos "pena que o aluno de hoje seja tão j do tornar-se-á gratuito e a remuneração dos imediatista, ele não sabe o que é construir j professores deixará de ser por hora-aula pas- o corpo. Nosso corpo tem que conseguir j sando a ser por carga horária. Assim, movimentos, desenvolver a coordenação, ; incentivará mais a pesquisa, como ocorre em lapidar os gestos e nada disso vem de um i outras Universidades como a UNICAMP dia para o outro" (Dançar 19). j (entre outros projetos há o das professoras j Graziela Rodriguez que escreveu à Dançar Este ponto de vista é partilhado por gran­ j sobre a pesquisa da dança brasileira nos ter- des mestres que têm em comum a mesma j reiros de Umbanda, e de Holly Cavrell que seriedade e competência como Toni Seitz | trabalha coreografia em dança moderna apre- Petzhold , Eugenia Feodorova, Halina j sentando espetáculos bastante expressivos). Biernacka e Ismael Guiser, por exemplo. 0 papel do ensino superior Biernacka lamenta "a falta de uma seleção i A função das universidades é uma das ques- rigorosa e de uma escola completa para j tões importantíssimas no contexto formar bailarinos. A seleção é fundamental porque algumas pessoas não serão bailari­ j educacional se compreendida com objetivi- j dade. Quer dizer: universidades não criam nos nunca nem dançando três horas por dia desde a infância. Na minha terra é feita uma j bailarinos e sim pensadores da dança, se- ; jam eles professores, pesquisadores ou escolha rigorosa para que os alunos não comecem a dançar para agradar aos pais e i críticos. sim para serem profissionais". Ismael Gui­ j Na Faculdade de Santos, a diretora Luciana ser completa, afirmando que o principal | Racine chegou a cancelar o vestibular em problema da educação no Brasil é o fato das ■k Educação pensar a dança !

pessoas não tomarem a sério a dança. "Enquan­ fadas, estando em sincronia com o momento da to a dança for considerada um divertimento e vivência das mudanças e da procura de um não uma profissão não acontecerá nada. Tudo desenvolvimento criativo". é feito pela metade. Se os próprios profissionais Esta aspiração ao orgânico, à uma dança não levarem a sério o seu trabalho, o público portadora do ritmo do Universo, e ao mes­ também não o fará. Não haverão bons profes­ mo tempo, sintonizada com o corpo sores nem bons alunos". individual do bailarino, também esteve pre­ É desestimulante constatar que há um sé­ sente à espécie de busca permanente de culo a dança moderna denuncia a Klauss Vianna, uma das grandes perdas necessidade do autoconhecimento para se desta década. Em seu livro "A Dança", chegar à expressão da vida e à formação em Klauss evidenciou a sua luta para que a dança e até hoje discutimos os mesmos te­ consciência do corpo estivesse à frente de mas assim como a falta de metas qualquer trabalho físico. Consciência pré-determinadas, de perseverança e serie­ Esta consciência do corpo implica, como dade para chegar lá, como também explicou Renée, na consciência do mundo corporal implica em ensinaram os mestres clássicos. e da realidade exterior em relação ao uni­ consciência do verso interior. Daí a necessidade do mundo e da Renée Gumiel, aluna dos grandes expoen­ bailarino de se equilibrar em duas pontas: realidade exterior tes do expressionismo alemão e precursora o autoconhecimento que vai propiciar a es­ em relação ao da dança moderna no Brasil, analisa: "o colha lúcida dos seus objetivos e as universo interior requisito desde o princípio para quem esco­ condições para levar adiante os projetos, o lhe a dança para a sua forma de expressão que implica em sintonia com o mundo con­ é que fique consciente da união entre cor­ temporâneo, apoio político e econômico. po, alma e mente, chegando ao Angel Vianna, no Rio de Janeiro, e Rainer conhecimento profundo de todos os seg­ Vianna, em São Paulo, desenvolvem este mentos de seu corpo. Um trabalho feito mesmo tipo de pesquisa buscando o conhe­ com paciência e persistência. O corpo é cimento corporal, importantíssimo como complexo e o trabalho deve ser feito sem instrumento do bailarino, e, como diria o forçar a sua estrutura. Cada movimento próprio Klauss, de todas as pessoas. deve ser consciente e significativo. Sem a emoção que vem da alma, o corpo é apenas Assim, a despeito da falta de tradição, a uma máquina obediente. O bailarino deve dança no Brasil caminha em direção a um sentir e pensar, saber da evolução, das mu­ amadurecimento. Há muita gente compe­ danças das artes, tudo está interligado e a tente. Lembramos apenas alguns dos dança há muito tempo não é um conto de grandes nomes. > Mas é importante salientar que para auxi­ sem concretizar nenhum de seus projetos. liar o processo de crescimento da dança no A maioria das universidades logo comple­ país, é necessário que existam profissionais tará a primeira década e o reflexo no da dança com base intelectual para ordenar mercado tem sido irrisório, a despeito das as diversas propostas. boas intenções. E a responsabilidade é in- Criar estruturas sólidas para levar adiante comensurável. É preciso formar os projetos. Há uma série de problemas a professores com cultura geral, para não serem enfrentados como, por exemplo, a transmitirem apenas informações técnicas. escassez de publicações na área ( a maior Assim como os antigos mestres precisam parte dos livros teóricos sobre dança ainda estar sempre se renovando. Há mais de uma só pode ser encontrada em língua estrangei­ opção. Ou nos contentamos em reclamar ra). Durante todos estes anos Dançar tem das precárias condições de trabalho ou tra­ publicado na seção Leitura, alguns destes tamos de alargar o mercado a fim de títulos e fica evidente a falta de informação conquistar novos recursos econômicos e para pesquisa. melhorar a qualidade da mão de obra le­ vando adiante mais e mais projetos. No que diz respeito à criação, as grandes É preciso destruir o companhias clássicas e contemporâneas Agora, no que diz respeito ao ponto de mito do bailarino têm seguido o seu caminho, com propostas partida deste processo, não há opções. É que não pensa. estéticas definidas. Por isso sobreviveram preciso destruir de uma vez por todas o Para tanto, é às crises. O mesmo não tem acontecido mito do bailarino que não pensa. urgente que se com as academias e escolas em geral que Para tanto, é urgente que se comece a pensar abrem e fecham com a mesma fragilidade comece a pensar. O Festival Internacional do Rio de Janeiro abre espaço para eventos grandiosos

A N O I I I u anom das grandes coreógrafas

Mara Borba, ssim como a dança brasileira, a portuguesa também Sonia Motta e experimenta o seu "boom". A vinda da Companhia Nacional de Bailados para uma turnê pelo Brasil fecha o Beth Coelho A ciclo iniciado com a visita da Gulbenkian. mostram em cena novos Mas 1985 é o ano das coreógrafas modernas brasileiras. Mara Borba e Sonia Motta engendram, em espaços diferentes, as suas talentos danças. A primeira, no grupo mineiro Transforma, esquematiza coreografias com fortes traços teatrais. A segunda, no Balé da Cidade de São Paulo, brinca com misturas musicais usando muita pantomima. Sônia Motta é reconhecida como uma das maiores professoras brasileiras, identificada em especial com o estilo de Louis Falco. No balé nacional,o bailarino e professor Denis Gray completa 40 anos de Teatro Municipal do RJ, enquanto Ismael Guiser, outra celebridade no meio clássico, lança o seu espetáculo "Hommage", associando dança e música ao vivo. A produção das grandes companhias também se fez presente. O Balé Teatro Castro Alves encena "SanctusM,de Luis Arrieta, constituindo um emblema de resistência ao seu afastamento dos grandes centros. O BTCA expõe um vínculo estreito com a expressão mais primitiva e popular. E o Cisne Negro faz seu primeiro vôo internacional. A proeza é o resultado dos esforços da brilhante diretora Hulda Bittencourt. Neste vôo, o Cisne aterrissa na Espanha e na Escócia. O Balé Teatro Guaíra também rompe o isolamento da dança fora do eixo Rio-São Paulo, apresentando um repertório amplo em turnê por todo o país. Maria Lucia Priolli estréia o musical "Plim" no Rio de Janeiro. "Canibais Eróticos", de Ciro Barcelos, do grupo carioca Balé do Terceiro Mundo, combina forte sugestão erótica e jazz. A atriz Bete Coelho começa a merecer destaque através das montagens de Carmen Paternostro, a exemplo da peça de dança-teatro "Lulu a caixa de Pandora". Paternostro viveu na índia e na Alemanha, onde conheceu a coreógrafa Pina Bausch. E Brenno Mascarenhas, conhecido professor de jazz, monta o espetáculo "Navegando", sobre a obra do poeta português Fernando Pessoa. Flashes da ® H istó ria

1 e 2 Francisco Giacchieri completa 38 anos de cenografia, representando a memória viva do Teatro Municipal de SP. No seu currículo constam importantes montagens de espetáculos de dança, como a Ópera de Paris, o Balé do Século XX e Alwin Nikolais, entre outros

2 1, 2 e 3 O grupo mineiro Corpo faz 10 anos comemorando o que é raro no país: o sucesso de seu próprio coreógrafo, Rodrigo Pederneiras. Nas fotos, “ Sonata” e “ Noturno” . Flashes da História Dançar 10 Anos

1 a 6 1 O I Festival Internacional do RJ traz o Balé Stuttgart, o Balé do Teatro San Martin e Alwin Nikolais. Dos brasileiros, Corpo, Stagium e Balé da FUNARJ.

7 Dalal Achcar cria o Festival Internacional do RJ para trazer a cada ano grupos destacados no exterior. Dalal dirige o Teatro Municipal do RJ, a Faculdade de dança da cidade, além de ser membro do Conselho Estadual de Cultura do Estado do RJ.

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3 Flashes da História 1, 2 e 3 1 O grupo Ópera Paulista, o mais jovem da cidade, com apenas um ano de vida e bailarinos ainda inexperientes, surpreende a todos sendo convidado a participar do Forum da Dança em Paris. Destaca-se como um dos mais promissores do país.

4 O Cisne Negro estréia "Destino” , de Luis Arrieta. Mostra a imagem do imigrante oriental, estrangeiro e solitário.

pág. 44 e 45 A famosa briga entre Fernando Bujones e Mikhail Baryshnikov, ancorada na rivalidade de duas grandes estrelas internacionais, levaria Bujones à saída do American Balé Theatre. A polêmica foi o convite de Béjart para criar um balé especialmente para Bujones e a recusa de Baryshnikov em aceitar o convite. Uma richa, na verdade, mais ampla entre americanos e europeus.

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Flashes da História 1 e 2 1 Fernando Bujones e Cecília Kerche no pas-des-deux “ Cisne Negro” , durante apresentação do Balé do Teatro Municipal do RJ. Duas personalidades da dança. E o Corpo de Baile da FUNARJ na dança das fitas em “ La Filie Mal Gardée” . De junho a setembro o Balé da FUNARJ realizou 33 espetáculos.

2 Fernando Bujones assume o papel de coreógrafo da FUNARJ

A N O IV Dançar 10 Anos

ano difícil, mas positivo com a Lei Sarney

Muitos Brasil sedia no Rio de Janeiro, pela primeira vez, o profissionais Congresso Internacional sobre Dança e, em sua terceira O versão, o Congresso Nacional de Ensino da Dança, talentosos evento organizado pelo Centro Educacional do Balé Leda Iuque. deixam o país O elenco de convidados e professores reúne diversos representantes dos diferentes gêneros de dança como Gus Giordano, autor do livro "Anthology of American Jazz", Jeanne Ruddy, a primeira bailarina da Martha Graham Dance Company e os russos Azari Plisetski e Raissa Struchkova do Balé Clássico de Moscou. A lista se completa com a vinda do médico ortopedista americano Richard Bacharach, de Geneviéve Oswald, curadora da coleção de dança do Lincoln Center em NY, da espanhola Ana Lázaro, fundadora do Ballet Concierto de Madrid, do editor da Dance Magazine William Como e dos bailarinos e organizadores do Joffrey Ballet. O confronto entre as escolas de jazz , a do americano Gus Giordano e a do francês Rhedá Benteifour (em visita ao pais na mesma época), mostra que há leituras diferentes para cada estilo. Enquanto Rhedá traz profissionalismo e inventividade, Giordano desencanta com o seu amadorismo, apesar do currículo interessante. O Teatro Municipal do RJ oferece ainda ao público duas opções: a FUNARJ faz o seu "Quebra Nozes" de fim de ano e o coreógrafo Silvio Dufrayer, primeiro lugar na Mostra de Novos Coreógrafos de 84, dá um tratamento original ao balé na ópera "O Guarani". No entanto, a crise econômica rouba muitos profissionais talentosos do país. As cariocas Jânia Batista e Daniela Panessa, o paranaense Sidney Ribeiro e os paulistas Antonio Interlandi, Tologi e Renato Paroni, partem em busca do mercado internacional. João Maurício que já integra a Companhia Paul Taylor, volta ao Brasil apenas de passagem. Apesar das dificuldades, outros profissionais preferem continuar criando no Brasil como é o caso do Balé Stagium, que completa uma década e meia e de grupos menores como os cariocas Bandança e Atores-Bailarinos, que mostram os seus trabalhos nas comemorações do primeiro dia de maio. O Festival "Dos pés a cabeça " reúne grupos de todo o país, provando que a produção artística, embora deficiente, sobrevive. O grupo Tran chan chama a atenção com a coreografia "A ponto de" no Festival Dos Pés a Cabeça, em São Paulo. E a Lei Sarney é assinada dando início a inúmeros debates sobre a sua eficácia e aplicação. 1, 2 O francês Redhá Benteifour e a sua companhia Friends, visitam o Brasil trazendo um jazz maduro e sofisticado. “ Voyage” mostra a relação de personagens no underground da grande metrópole.

2 1 Kazuo Ohno, mentor da dança butô, ao lado de Tatsumi Hijikata, visita o Brasil trazendo algumas obras importantes do seu repertório como "La Argentina". Esta é considerada pelo próprio Ohno, a grande virada na sua vida, a inspiração definitiva da sua dança. La Argentina é a bailarina Antonia Marcé, especializada em dança espanhola.

2 e 3 O coreógrafo e bailarino Ismael Ivo deslumbra os alemães partindo definitivamente para uma carreira internacional, seguindo uma via independente através da fundação de um projeto artístico definido. Luis Nascimento,ex-Teatro Guaíra e ex-Balé da Cidade de SP, também conquista o seu espaço na Europa em companhias oficiais.

4 "Prelúdios" e "Bachiana" fixam o estilo de Rodrigo Pederneiras e afirmam o Corpo na categoria internacional. F la sh es da História

A 72720 0M í,-

MIT TV-PROGRAMM UNO 14TAGB BERLIN-KALENDER 1 1 e 2 Dançar lança a sua primeira edição especial. O tema é o clássico “ Don Quixote’’ de Cervantes.Faz parte da publicação: a história do libreto, as diferentes montagens, entrevistas com os bailarinos que dançaram este grande clássico e a importância da obra.

3 e 4 O II Festival Internacional de Dança do RJ mostra o Balé Teatro Guaíra com " 0 Trono” de Carlos Trincheiras e o Sadlers Royal Ballet, que provou ser menor do que o famoso Royal Company, apenas em tamanho, uma vez que a qualidade dos bailarinos é excepcional.

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1 a 5 1 Ainda como parte do Festival Internacional, o público foi presenteado com o tradicional Teatro Kabuki japonês (1 e 2), cuja origem remonta aos séculos XVI e XVII. O Pilobolus (3) foi o representante da dança moderna americana. E o Balé da FUNARJ apresentou “ La Bayadère” com Fernando Bujones e Cecília Kerche (4) e “ Concerto” , de Pederneiras (5).

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1 1 Ao contrário do que pensa o grande público, a primeira companhia soviética é o Kirov, que formou astros como Baryshnikov, Nureyev e Makarova. No entanto, o grande sucesso mundial tem sido o Bolshoi. Uma grande companhia, dirigida por Yuri Grigorovich, que aposta com sucesso nos grandes temas como a personalidade carismática de “ Ivan, O Terrível” (na foto).

2 A coreógrafa alemã Susanne Linke encantou a todos no Festival de Paris, apresentando a sua versão da dança alemã. Um estilo criado na escola Folkwang, em Essen, dirigida por Pina Bausch. A característica mais forte deste trabalho é a relação intersemiótica entre a linguagem da dança e do teatro, de maneira a desaparecerem os limites entre estas duas artes. Embora Linke prefira se deter no estudo específico da dança.

3 Twyla Tharp, coreógrafa americana que ficou conhecida do grande público com trabalhos para o cinema como “ Hair” , mostra que é possível e benvinda a relação entre a tradição e o experimentalismo, na medida em que se pode renovar a partir de uma técnica clássica a fim de criar um processo próprio de pesquisa e criação.

HHI

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1 O musical Faces, de Maria Lucia Priolli, estréia no RJ a procura de uma fórmula de musical brasileiro, como os americanos descobriram a sua há tantos anos. O patrocínio da Shell permitiu uma super produção. M ercado abrir caminhos ©5

P-esquisa em dança Cássia Navas, pesquisadora da Divisão de Pesquisas/ CCSP (IDART) e do Núcleo de Dança

urante os últimos 15 anos, cresce- determinados procedimentos do fazer científi­ È Iram no Brasil os coreógrafos e co foram transpostos para muitos dos fazeres bailarinos que reconheceriam em artísticos modernos. Nesse período torna-se co­ seu trabalho um fazer investigativo, auto- mum a utilização de nomes, expressões e denominando-se pesquisadores, práticas da pesquisa científica no cotidiano das realizadores de pesquisa em dança. Não artesemgeral. Assim,expressões comopeso, que anteriormente o universo da dança não vetor de força, tempo, balanço e impulso to­ contasse com pesquisadores. Entretanto, a mam conta das salas de aula dos construtores partir de um certo período fazer ou falar de da dança moderna. Datam dessa época, pro- j pesquisa tornou-se uma constante entre postas das diversas formas de "composição j aqueles que se propunham como descobri­ coreográfica", que determinariam as fases de ; dores de novos veios, atuando mais longe elaboração do trabalho cênico, de acordo com j do eixo da transição, embora não automati­ etapas que se encadeariam entre si, em ten- j camente mais próximos do eixo das tativas de transformar as salas de dança em j modificações e novidades. espécies de laboratórios. j

Neste contexto, fazer pesquisa começou a esquisa Prática Fazer pesquisa ; Nos últimos 15 significar uma série de procedimentos às em dança, muitas vezes ficou sendo uma j anos coreógrafos e vezes nada investigativos, provocando um idéia associada à modernização da lingua- j bailarinos têm se certo barateamento da expressão, usando- gem e dentro desse paradigma atuaram j se a palavra como um qualificativo nobre, muitos dos coreógrafos brasileiros, para os ; autodenominado via de regra, não correspondia aos cami­ quais uma das maneiras de tornarem mais j pesquisadores nhos adotados para a construção dos modernos os seus produtos foi artificial- j produtos. Nesse sentido, muitas vezes os mente associá-los a um fazer investigativo j experimentos dos grupos do circuito ama­ subjacente. j dor ou escolar, que atuam, e devem atuar cada vez mais dentro do âmbito da forma­ Todavia, dentro de outro circuito de profis­ ção, foram apressadamente considerados sionais, alguns professores, coreógrafos e trabalhos dé pesquisa e não produtos de grupos de dança seguiram, apesar do quase aprendizado, onde a vontade, ainda que não inexistente auxílio institucional, em seu manifesta, era aprender a investigar, dentro trabalho de investigação de novas linhas de das especificidades do que se queria levar linguagem. A pouca ajuda dessas institui­ ao palco. ções se deve, em grande parte, à especificidade da formação dos artistas em A aura que os nem tanto pesquisadores es- dança, em sua grande maioria, estruturam tavam tentando fixar em seus trabalhos, suas carreiras fora de organismos de ensino quando os momeavam de pesquisa tem raí­ ou de pesquisa, "strictu sensu". zes históricas nas vanguardas da arte moderna do início do século 20, quando Com isso, não se quer propor que, necessa- > riamente, os profissionais de dança devam se esse interesse que, em 1987, se estruturou o ligar a instituições - incluindo-se as cinco fa­ Núcleo de Dança (SP), cujo principal objetivo culdades de dança existentes no país pelos seria o de reunir pessoas, pesquisadores ou não, tradicionais vínculos propostos por elas. interessadas em aspectos teóricos da dança, Caberia a esses órgãos encontrar maneiras funcionando informalmente, através de grupos de acolher a "informalidade" das pesquisas de estudos de temas específicos. desse grupo de artistas, funcionando como Resta acrescentar que a pesquisa em dança estruturas de apoio, de preferência em ca­ no Brasil, encontra uma considerável difi­ ráter sazonal, para os trabalhos de cada um culdade para o seu desenvolvimento: a falta deles. Nesse sentido, cabe ressaltar que, de sistematização de fontes primárias, de nos anos 80, algumas instituições passa­ onde se costuma partir para outras investi­ riam a instituir, com regularidade, a gações, pois faltam acervos específicos e distribuição de bolsas de pesquisa em dan­ pesquisas de base. ça, como é o caso da Fundação Vitae, de São Paulo. Nesse sentido, a construção de uma memó­ ria em dança, não entendida somente como ^^esquisa teórica Nos últimos a guarda e a reverência frente aos documen­ anos, no universo dos artistas que atuaram tos que se recolhe, mas como uma reflexão A pesquisa em profissionalmente dentro do eixo da mo­ constantemente atualizada sobre eles, é dança no Brasil dernização da linguagem, uma das uma necessidade básica e quase sempre in- encontra a falta de tendências foi a busca da expansão dos li­ contestavelmente reconhecida, embora sistematização de mites do corpo e da cena, em estratégias de pouco resolvida, quer seja pelo escasso fontes primárias imbricações de técnicas, procedimentos elenco de instituições que se dedicam a técnicos e linguagens afins, como teatro e essa atividade, quer seja pelas sempre reno­ artes plásticas. Se por um lado a tônica foi vadas dificuldades que enfrentam esses a expansão desses limites, uma necessidade organismos. de alargamento do conhecimento em dança Mesmo assim, uma das questões da pesqui­ foi sinalizada pelo interesse no estudo de sa na área, seria discutir estratégias de suas questões teóricas. construção de uma memória, depois das De certa maneira, esse interesse se insere litogravuras dos balés românticos do sécu­ dentro do panorama da pesquisa em artes lo 19, das fotos da virada do século, dos em geral, que nos últimos 15 anos teve seu filmes e notações coreográficas das danças campo expandido, como prova o aumento modernas e dos vídeos e computadores de da procura dos cursos de pós-graduação em última geração, cabendo perguntar quais artes como um todo e, em dança em parti­ seriam as novas propostas de documenta­ cular, apesar da quase inexistência de ção e pesquisa teórica que devem ser programas específicos de pós-graduação da construídas num jogo constante com as inú­ linguagem no Brasil. Também foi devido a meras propostas das cenas da dança. # M ercado 9 abrir caminhos

ercado da dança m Antes e Depois: As fissuras do mercado Marcos Bragato

f B mercado de dança se constitui num tripé: ensino, criação Ê M e atuação estão como que interligados. Um opera sobre o outro. Quando há um canal efetivo e objetivo entre os três o produto segue seu curso desaguando naquilo que conhecemos como a imagem pública da dança. É aqui que a profissão se espraia, no resultado do trabalho de três segmentos que de alguma forma devem pensar entre si. Mas se houver mais ruídos do que fluidez a dança demora para acontecer como sistema profissional. A história dos anos 80 revela que o binômio dedicação e meta se expressou atra­ vés de trajetórias pessoais ricas enovas dentro da dança brasileira. "Não precisamos de uma lei para fazer Mercado - Como funcionou essa entidade Palavras como crise, dificuldades, desinte­ cultura. Investimos e que parâmetros estabeleceu na dança na­ resse, desinformação, já não causam também em novos cional ? O que é afinal essa palavra para a impacto entre os dançarinos. São com elas, talentos" dança brasileira que, às vezes , tem um aliás, que os profissionais têm sobrevivido João Madeira, Gerente de conceito meio nebuloso, distante da vida e servido suas criações. Espetáculos, even­ Comunicações da Shell (Dançar das pessoas, e em outras, se aproxima mais tos, festivais nacionais e internacionais, 25,1988) do que seria na realidade? A década de 80 novos coreógrafos, novos praticantes (co­ é o símbolo da duplicidade cruel que tem merciais para a televisão, espetáculos assolado o país: por um lado, a dança, a musicais, pequenos grupos). Tudo isso, que exemplo de outros países, experimentou está registrado nas páginas da Dançar , re­ um avanço antes nunca visto; mas por ou­ vela que os 80 encetaram um ganho tro, como outras artes, sofreu duros golpes. avassalador, especialmente nos anos em Sistematicamente a dança é a arte menos que vigorou a tão discutida Lei Sarney. O assistida. Apreciam seu "barato", a capaci­ patrocínio foi a alavanca que os artistas dade de criar mundos poderosos, sonhos, brasileiros (dançarinos, coreógrafos e pro­ mas a olham na verdade como um bem fessores), experimentados com o boom do restrito ou puro lazer. culto ao corpo, precisaram para galopar "Dançar a vida é situar-se no coração das passos à frente. coisas, no ponto de emergência de um futu­O empresariado passou a olhar com maior ro a ponto de nascer e participar em sua atenção para a dança. E a Lei Sarney preen­ invenção "Roger Garaudy chia certos espaços, de um campo imenso, > "Profissional é quase nunca de interesse dos governantes. O efeito foi mais nefasto com as particula­ aquele que vive de res. O Cisne Negro, depois de provar sua O executivo brasileiros raramente se como­ sua profissão. aurora artística, sofre com o recolhimento veu com os empecilhos e o papel que do empresariado. O Balé Stagium encon­ Companhia deveria desempenhar com uma arte como trou suas saídas duramente. Mas a grande profissional seria a dança. União, estado e boa parte das ca­ exceção, que passou ao largo desse inver­ aquela que existe pitais não se importaram com as no, foi o Corpo de Belo Horizonte. O de forma dificuldades dos dançarinos, para assumir contrato estabelecido com a Shell lhe per­ permanente, paga um papel de apoio como aconteceu em paí­ mitiu respirar para desenvolver sua seus artistas e ses europeus. No Brasil, interrompe-se produção. vende entradas para geralmente um processo em curso mesmo um público normal, que parte da fórmula esteja dando certo. O desenlace infeliz fez a oferta de trabalho não familiares e voltar ao estágio inicial dos 80 porque as Proclama-se outras fórmulas mas de práti­ amigos." produções decresceram. O vigor, que atin­ co nada se realiza. A Lei Sarney levou esse giu a metade da década e trouxe grupos de crítico de dança Antonio José Faro tapa que afetou eventos importantes como (Dançar 18,1986) fôlego artístico como os paulistas Marzi- o Festival Internacional e sólidas compa­ pan e o Opera Paulista, o mineiro Camaleão nhias. Até algumas das grandes e o carioca Balé do Terceiro Mundo, esmo- companhias oficiais sentiram o peso dessa receu-se. ausência e da política econômica que se instalou a partir de 90: o Balé do Teatro Alternativas se esgotaram e a inatividade se Guaíra, de Curitiba, e o Balé da FUNARJ, apossou deles agora em 90. Outros como o do Rio. brasiliense Endança, os cariocas Vacilou Dançou, Atores Bailarinos e Balé Contem­ As esfréias diminuiram sensivelmente e as porâneo ou mesmo o mineiro 1Q Ato, o produções maiores deixaram saudade. Para baiano Mantra, os gaúchos Terpsí e Phoe- o Balé do Palácio das Artes, de Belo Hori­ nix, são exemplos de resistência regional, zonte, e o Teatro Castro Alves, de de como criar a sua própria faixa mercado­ Salvador, o horizonte não foi diferente. lógica, de público e o gosto estético dessa Talvez a exceção seja o Balé da Cidade de assistência. São Paulo por estar ligado ao maior dos Surgiram associações querendo reunir dan­ municípios brasileiros. çarinos, coreógrafos e professores. "Em 87, apontava-se uma expansão doBuscando assumir o que os sindicatos de mercado. Formava-se novas frentes de tra­ artistas talvez não pudessem fazer pela ca­ balho, como espaços na televisão, desfiles tegoria. Uma delas, a APPD (Associação de moda, feiras, convenções "( Dançar 22) Paulista dos Profissionais da Dança) no co- M ercado abrir caminhos

meço tinha esta intenção de fazer encontros e A dança teatral é artesanal. Sua existência "A dança é a arte discussões entre alunos e profissionais. é cara. Por isso, para renovar discursos e da flexibilidade. queixas, deve-se olhar para um outro.fenô- Mas como aconteceu com muitas outras, o Fala a língua de meno, o da imagem eletrônica. Com o trajeto se envergou. Acabou se tornando todos os públicos e mundo informatizado pela mídia, a chama­ promotora de eventos sem efetivamente as- a White Martins da terceirização da sociedade, os "eventos" sumir uma luta mais de cunho segue a mesma se internacionalizaram. reivindicativo. É claro, e também sereno, linha" olhar para algumas destas pequenas associ­ Por essa via, a dança brasileira pode massi- Olga Torre, Gerente de ações ou sindicatos de dança que na ficar seu produto e talvez sair desse Comunicação da White Martins (Dançar 25,1988) estância regional têm sua importância de imbróglio mercadológico. Aproveitar sua convivência entre as escolas. Mas não sufi­ proximidade com as tecnologias modernas ciente para fazer da dança uma arte e adentrar ao mundo do vídeo. Entrar na consumida por uma ampla maioria da po­ produção de ponta usando de sua tecnolo­ pulação. gia para difundir sua arte. "Existe um público fiel nos bons espetácu­ Na arte artesanal a contagem de sua assitên- los de dança das companhias de prestígio” cia é feita em dois, três, mil por noite, o Carlos Trincheiras, diretor do Balé do Tea­ máximo de um teatro. No universo da ele­ tro Guaira. trônica a unidade é outra. Sem uma massa de pensadores críticos, pa­ pel que as universidades brasileiras não "O universo da imagem é milhão. Temos estão conseguindo assumir, e sem produtos que entrar nesta unidade e não mais na do diferenciados que as escolas e academias indivíduo senão a gente perde o rabo da poderiam gerir, o produto nacional tem história. As artes cênicas precisam de uma chegado de forma destrambelhada e de im- forte imagem para penetrar na mídia. A proviso. Planejamento está fora de gente precisa acordar para isso. " diz He­ qualquer projeto em razão da conquista e lena Katz da perda de um público ainda em parte Esse fenômeno de ocupar a televisão para infiel. massificar a imagem, o teatro já abraçou. "As companhias quase não circulam pelo Por bem ou por mal, os rostos estão lá. Os país. Elas padecem dos mesmos problemas dançarinos brasileiros devem pensar nessa para se conseguir realizar suas turnês pe­ hipótese. Mas como no teatro, a dança nem los estados. Todas estão perdendo" por isso deixará de construir seu artesanato. Tíndaro Silvano, diretor do Balé do Palácio Ele não deixará de existir enquanto labora­ das Artes. tório. Apesar da nova possibilidade, a por "Canções", "Missa do Orfanato", "Varia­ capacidade monoestilística da televisão (a ções Enigma" e "Três Concertos", esse mineiro massificação), é na pluralidade de idéias faz da dança uma empresa conceituada. Dança artísticas que a dança pode se fazer e música se transformam em vida pulsante. Há presente mais fundo no tecido social. propostas diferentes em cada coreografia e Amplia público, alarga o espectro depara qualquer público. "Queremos manter apreciadores, consequentemente, faz Hoje em arte, na verdade, não existe a idéia com o nosso brotar novas oportunidades de existência. de uma corrente principal. A "mainstream" consumidor um Os anos 80 foram emblemáticos nesse não vigora mais em nossa cultura. A ima­ canal de aspecto Trouxeram uma série de criadores gem de um rio sem delta, adotada pelo que se encarregam de manter à tona a comunicação cada inquieto músico americano John Cage, profissionalização da dança, como uma via vez mais apurado" cabe no que apareceu, e de que forma, na de múltiplas direções. Reinaldo Paes Barreto, Gerente de dança brasileira. Comunicação Social da Souza Cruz ( Dançar 25,1988) Há uma lista significativa de nomes. Uns con­ A cultura se dividiu a ponto de não saber­ solidando seu instrumental, como Luis Arrieta. mos mais qual é a corrente principal. Na São decisivas obras como "Destino" (85), listagem, as múltiplas tendências atestam o "Sanctus" (85) e "Sagração da Primavera" (85). contrário da penúria material. A criação A ponte entre elas é a maneira como Arrieta faz encontrou seu espaço de uma forma ou de os dançarinos se despojarem. Viscerais cada outra. As diversas correntes podem ser in­ qual do seu jeito. Décio Otero de "Pantanal" (8) teressantes, mesmo que alguns resultados e "Shamaim" (92), estabelece novas parcerias, artísticos estejam aquém das pretensões. O num hiato de um tempo longo. Mas, com o Balé que vale, decididamente, é a abertura e a Stagium, conseguiu manter seu público. flexibilidade da mente.

Parafraseando o professor de teoria teatral Outros, como o mineiro Rodrigo Pedernei­ Jacó Guinsburg: "A dança é a arte da atua­ ras, realizam um percurso absolutamente lização. A cada trabalho, a cada noite, a particular, aos saltos. Pederneiras provoca uma idéia atrás da outra. Esse percurso se cada instante, ela não apenas renasce, po­ rém nasce. " impõe pela continuidade de sua criação. Pela feitura de porte seqüencial, raro entre E isso aconteceu justamente no decorrer da coreógrafos brasileiros. Neste caso, Peder­ década de 80, com a geração que passou neiras constrói junto ao Corpo. É o único boa parte do tempo investindo e reinvestin­ exemplo de coreógrafo residente provoca- do no barato da criação. Ana Maria dor de tantas mudanças em seu próprio Mondini, Denilto Gomes, Suzana Yamau- trabalho. De "Prelúdios" a "21", passando chi, Umberto da Silva, tem colocado no ■K M ercado ^ abrir caminhos \

palco uma plena e fulgurante visão do movi­ ra. Consciente ou inconscientemente acabaram mento. escolhendo o ensino ou o próprio ensino talvez as tenha escolhido, num país onde as aulas de Maturação de riscos que a arte pede o favor dança moderna são freqüentadas por uma mi­ de procurar. Temeridade e rigidez são ter­ noria comparada à grande massa que pratica mos que não podem ser aplicados a esses balé ou jazz. criadores: Mondini sempre brincando com "... Nas outras áreas as formas e tecendo sua relação original Elas conseguiram dispor, ao mesmo tempo, existe escolaridade ensino e criação, com ou sem acertos. Al­ com a música; Denilto Gomes ritualizando oficial e obrigatória, seu corpo, instrumento do resgate de ele­ gumas conseguiram até formar uma legião uma espécie de mentos de sonhos com personagens sem de adeptos, como Sonia Mota em São Pau­ passaporte sexo ou idade; Yamuchi burilando a junção lo, e Eva Schull, em Curitiba. de dança e narrativa; e Umberto Silva sen­ indispensável para a A atração por esse método de estudo deve vida profissional. do o próprio meio de um projeto iniciado ter se dado por ordenação de princípios e Chegou o momento com Vai Folly, de parentesco próximo ao por elas terem percebido a dose certa de dos participantes de teatro-dança. transmissão e criatividade . O traçado entre estúdio e palco poderia estar mais claro na dança se Ivaldo Bertazzo, Célia Gouvêa, ao lado de organizarem com o Maurice Vaneau, Regina Miranda, retra- cabeça dos praticantes. objetivo de çando as possibilidades de danças Nos anos 70, outros já haviam lançado prá- descobrir qual o diferentes. As de Bertazzo entre o ocidente ticas mas sem organização de um melhor passaporte e o oriente, entre o artesanal da dança oci­ aprendizado próprio. Parte, antes da meta­ para si mesmos" dental e a herança cultural da índia. As de de e outra depois, quase agora. Explosões Célia Gouvêa na sistematização de um jogo geradas nos 80 muitas vezes tiveram impul­ pesquisadora e crítica de dança Helena Katz (Dançar 18,1986) entre MbrasilidadeM e expressão teatral. E as so e de outro lado sofreram o lento interesse de Regina Miranda próximas da "angst" dos alunos. Mas não deixava de ser o deli- alemã. E tem ainda mais mulheres : Sonia neamento de faixas particulares dentro do Mota e Mara Borba, Eva Schull e Debby consumo de dança, enquanto prática e en­ Growald, Carlota Albuquerque e Clarisse quanto assistência. Neste caso, podemos Abujamra. citar também a participação de Ivaldo Ber­ tazzo e Regina Miranda. Uma característica marca a ascenção des­ sas mulheres e as diferencia, de certo As metas artísticas são opostas mas uma modo, no panorama da recente modernida­ similaridade une a produção de dois outros de nacional. São potencialmente importantes coreógrafos, Luiz Mendonça pedagogas de técnicas modernas, européias e Antonio Nóbrega: a origem pessoal de e americanas, cada qual fazendo sua leitu­ campos diferentes dos da dança e a experi- > mentação de longo tempo para serem confla­ para essa nova geração, no sentido de que agora gradas num evento internacional. Nóbrega a criação pode passar a ter mais uma nova face. aproxima-se mais de uma certa teatralidade Se pensarmos que hoje a modernidade se para representar o imaginário popular brasilei­ generalizou desigualmente em escala mun­ ro. Mendonça parte de elementos da dança dial, que a própria demanda da sociedade moderna para criar um corpo que se solta, de consumo e a informatização dos tecidos desliza. sociais modificam a nossa experiência do presente, a dança como arte teatral poderá Mas há também um discurso recente, que assim mesmo manter sua transfusão com a se aflora no princípio desta década e poderá cena. Mas deverá olhar para esse outro lado seguir ainda outras etapas. Nomes como os que grita a céu aberto, sob pena de retroce­ de Renata Melo, Eliana Carneiro, Cláudia der. Deverá refletir sob que condições de Souza e Zélia Monteiro, Jussara Miran­ poderá seguir adiante. da e Eduardo Laranjeira, Fábio de Mello e Sandro Borelli. Todos acumulam ainda a De como viabilazar uma forma mais rápida função de intérpretes, partindo de sua pró­ de comunicação entre a sala de aula e o pria experiência corporal. Há pouco, uma palco e, consequentemente, com certa facção do mercado começou a olhar o seu público. Começa o 198 Carlton Dance Festival u m ano de novos grupos independentes

Destacam-se o coreógrafo Luis Arrieta está na direção do Balé da Marzipan e o Cidade de São Paulo e realiza dois novos trabalhos: "Trindade” e "Magnificant". Os grupos independentes Teatro Brasileiro O também agitam o mercado: o Marzipan, com "Manos Arriba", de dança comemora quatro anos de vida e o Teatro Brasileiro de Dança faz "Uma Caixa de Outras Coisas". No Rio, o bailarino Fernando Bujones assume pela primeira vez o papel de coreógrafo no Balé do Teatro Municipal. Mas outros eventos se cruzam no eixo Rio-São Paulo: o São Paulo Dança, no Centro Cultural SP, e o Festival Internacional, com os americanos Balé do Harlem e a companhia de Twyla Tharp, o venezuelano Danza Hoy e o argentino do Teatro Colón. No segundo semestre, mineiros se unem aos paulistas com novos espetáculos. O grupo Corpo com "Canções" de Pederneiras e o Grupo Oz, com "Delírios" de Cristina Helena. Ivaldo Bertazzo apresenta e arrebata com seu "O Cavaleiro da Rosa". O Balé Nacional de Cuba volta ao Brasil e Dançar apresenta uma reportagem completa sobre a história desta importante companhia.

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pág. 69 0 grupo paulista Cisne Negro, dirigido por Hulda Bittencourt, completa 10 anos e Dançar lança uma edição especial bilíngüe (inglês/português) distribuída no Brasil e no exterior, contando a história do grupo (repertório, integrantes do grupo,turnês e assim por diante).

1 Nina Verchinina é uma das responsáveis pela formação da dança no Brasil,tendo como mestres Leonide Massine , Nijinska e Martha Graham, entre outros. Desenvolveu um estilo próprio de concepção da dança aliando a preparação clássica rigorosa a uma liberdade individual de expressão.

2 A coreógrafa alemã Susanne Linke visita o Brasil trazendo alguns dos seus mais importantes solos. Em sua turnê, além de dançar, discute a formação do bailarino e fala da necessidade de uma técnica perfeita e da limpeza de clichês sociais impostos pela sociedade.

3 O Corpo estréia "Sonata” de Carlos Gomes para homenagear o sesquicentenário do nascimento do compositor. Coreografia de R. Pederneiras.

4 Tatiana Leskova, uma das mestras russas sediadas no Brasil, explica que a técnica não é o suficiente para criar um profissional, é preciso desenvolver a personalidade e estar pronto para enfrentar os desafios de uma carreira difícil.

1 Pela segunda vez, O Balé Nacional de Cuba e Alicia Alonso visitam o Brasil mostrando as particularidades do estilo cubano. O grande momento de Alicia está em “ A Diva” , onde não aparecem as suas limitações técnicas decorrentes da idade, mas os requintes cênicos dramáticos que só surgem com o amadurecimento de uma grande bailarina.

2 e 3 “ Três estudos para Alexandre” é a coreografia criada por Maurice Béjart, especialmente para Fernando Bujones. Durante 35 minutos um bailarino sonha ser Alexandre, o Grande. Dividido entre presente e passado, a ficção e a realidade. O homem busca o mito. F la sh es da História 1 e 2 O I Carlton Dance traz ao Brasil a americana radicada na França Carolyn Carlson e o inglês Michael Clark mostraram duas tendências diferentes da dança contemporânea. A primeira, a dança minimalista e o segundo a irreverência aliada à técnica clássica.

1 R 2 Participaram ainda do Carlton Dance, o grupo mineiro Corpo (1) e a americana Molissa Fenley (2) , esta última, mostrando uma preparação aeróbica invejável. Estiveram também presentes o Terza Stanza, o Momix e o Balé do Terceiro Mundo.

O bem humorado grupo americano Momix diverte a platéia com a sua dança mágica e de fácil digestão. Sob a influencia direta do Pilóbolus, o coreógrafo Moses Pendleton mistura mímica, acrobacia, iluminação, grandes adereços cênicos , ginástica e dança. A dança de Brasília começa a se destacar u m ano da dança francesa

A Bienal da orre o bailarino inglês Graham Bart, marido de Ana Dança de Lyon Botafogo. No Rio de Janeiro, ficaram marcadas as suas criações de Nacib (balé "Gabriela"), e no dueto centraliza os M "Belong", que dançava com Ana. "Quatro Séculos de Dança na A França escolhe o ano de 88 como o Ano da Dança. A Bienal da Dança de Lyon é o centro dessa comemoração, tendo como tema França" "Quatro Séculos de Dança na França", do Barroco à Contemporaneidade. É também da Europa que o Rio recebe a visita de um trabalho bastante original que conjuga movimento e a música nada tradicional de Stockhausen. Os bailarinos e coreógrafos belgas Michele Noiret e Jean Michel Chalon misturam várias formas num só espetáculo. A dança brasileira também teve entre seus adeptos músicos importantes. O compositor Francisco Mignone, nascido a 3 de setembro de 1897, estaria completando 90 anos. Seu legado é imenso: inclui colaborações para o Balé da Juventude (47), Igor Schwezoff (45) e peças para o Balé do Municipal do RJ. Mas nem só de artistas cariocas e paulistas vive a produção da dança brasileira. A dançarina Eliana Carneiro que sedimentou a sua proposta de dança-teatro em Brasília, mostra suas coreografias para todo o país. A alemã Susanne Linke concebe a sua primeira obra em solo brasileiro, coreografando "Mulheres" para o grupo Corpo em BH. E Luis Arrieta realiza uma grande produção alegórica. E "Mar de Homens" para o Balé da Cidade de SP. Em SP, desponta uma nova companhia: o Balé Teatro do Bixiga monta "Será que Alguém Morreu" de Cláudia Souza e Vai Folly. A bailarina Áurea Storti cativa os cubanos e passa a trabalhar á junto ao Balé Nacional de Cuba. Flashes da História 1

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pág. 81 e 1, 2 e 3 As semanas de Dança Contemporânea Francesa, no Palladium e no Sergio Cardoso.inauguraram o intercâmbio com os principais nomes da vanguarda francesa: Maguy Marin, Regine Chopinot, J.C.Galotta e D.Bagouet.O destaque fica para a “ Cendrillon” de Marin, uma visão inovadora no tratamento das obras clássicas, uma vez que o olhar é adulto, expondo o mundo cruel e inocente da criança que sobrevive dentro dos adultos. A interpretação do elenco de primeira da Ópera de Lyon arremata esta ousada investida. Flashes da História 1 O Balé Guaíra, consagrado como uma das maiores companhias da América do Sul, apresenta no Parque do Iguaçu a coreografia de Carlos Trincheiras "Lendas do Iguaçu’’. Cerca de mil e quinhentas pessoas ovacionaram os 44 bailarinos.

O Balé Popular do Recife comemora dez anos elevando o nível artístico do grupo à categoria de um balé nacional. O espetáculo "Nordeste” recria em cena a essência de algumas manifestações * folclóricas da região.

O II Carlton Dance traz o grupo de butô Sankai Juku, do coreógrafo Üshio Amagatsu, representante da terceira geração da dança butô. Yv = Í'# i x sL mrm

1 J|; m Ê

$ ÍÍ^PSr -„r , 3 árs 1, 2 e 3 1 Também participaram do Carlton Dance, o americano David Parsons (1), o Armitage Balé (2) e o Nederlands Dans Theater (3). Ainda no mesmo festival, vieram o americano Merce Cunningham e os brasileiros Marzipan e Balé Teatro Castro Alves.

1 O Balé de Barcelona alia a cultura catalã à dança moderna americana.

2 O Pilobolus, aos 17 anos de idade, passa do humor ao drama, experimentando a proeza de deixar o universo que conquistou o seu sucesso perante o público. A única presença da dança moaerna no IV Festival Internacional de Dança no RJ.

3 O Balé Guaíra estréia a “ Dança da Meia Lua” , mostrando o trabalho teatral de Miriam Muniz na atuação de Jair Moraes, em especial. E lançando novos talentos como Vania Kesikowski, na foto. pág. 90 No Rio de Janeiro, os bailarinos-coreógrafos Michele Noiret e Jean Michel Chalon criam uma performance sobre a música de Karlheinz Stockhausen, um dos grande compositores alemães deste século. Flashes da História

10 anos ® da dança : internacional

^ s 10 anos da dança internacional

■w- -w-tf recorrências universais. A dança se popularizou. Os festivais cresceram como o Dance 1 m Umbrella (Londres), o Festival da Nouvelle Danse (Montreal), o Jacob’s Pillow Dance ■M. JL Festival (Massachussets), o Festival D'Avignon, entre muitíssimos outros. Os movimentos amadureceram como a dança-teatro na Alemanha, o butô no Japão e a dança pós-moderna flamenga na Bélgica. Surgiram inovadores em países como a Holanda, até então pouco conhecidos como vanguardistas. E a política descentralizada ajudou à produção artística em grandes centros de dança como a França e os EUA, onde muitas companhias importantes mudaram para o interior. É uma década fértil. Evidencia a necessidade de uma visão ampla, culta e inteligente para saber apreciar e compreender os espetáculos deste final de século.

Q dança na América Latina - de duas regiões específicas. Portadores desta in­ Dino Carrero -Para caracterizar a dança da Amé­ fluência, na América Latina, são os grupos de rica Latina, três parâmetros funcionam como grande atividade internacional como a Compania constantes: os elementos da etnogêneses (padrão Nacional Folklórica de México, dirigida por básico de máxima generalidade que não implica Amália Hemández que tem mostrado um folclo- no surgimento de um biotipo único); uma perma­ rismo que sacrifica matrizes e riqueza pela nente troca de influências de outras regiões simultaneidade e a espetacularidade por toda a geográficas; e, por regra geral, uma incapacidade costa, e que conta com muitos exemplos que endêmica dos governos e organizações suprana­ exploram justamente o típico em produtos para cionais para encarar de maneira contida sua turistas, temperados com o mundo erotizante dos proporção e desenvolvimento. shows. A dança folclórica O longo e doloroso proces­ Dos grupos que conheço, as exceções, por seu so de formação das nações do continente, tiveram, trabalho baseado em investigações etnográficas na dança, três resultados evidentes: 1) inibi­ rigorosas e mostrando uma adaptação ao cenário ram-se e exterminaram-se, muitas vezes, formas respeitoso das essências, são o Ballet Folklóricos completas de dança, 2) todavia, produziram-se do Panamá e República Dominicana; e o Conjun­ novos gêneros a partir da síntese de elementos to Folclórico Nacional de Cuba. Há três parâmetros autóctones e importados, 3) algumas manifesta­ O Balé O balé como espécie de dança exibe, mais ções, obrigadas ao enclausuramento permanecem para caracterizar a que qualquer outro, a sua vocação para idioma até hoje em dia. dança universal, mais do que uma sorte de arte magna, A tendência à teatralização destas danças na atua­ como se julga erradamente e com frequência. latino-americana: lidade é tal, que grande parte dos grupos que se etnogênese, a troca No exercício desta vocação chegou em ondas à apresentam em nossos cenários cultivam com de influências e a América Latina desde o romantismo, cujos epígo­ diferentes níveis de sucesso, esta atividade, ainda nos são a bailarina australiana Fanny Essler, no incapacidade dos que o mais freqüente seja seguir o procedimento século passado e, sobretudo, as tumés constantes governos para dos grupos soviéticos como Moisseiev e Berios- dos Balés Russos desde o começo do século XX. ka, , que em versão simplificada da reconhecer o seu espetacularidade balética levaram à cena danças Assim, a escola clássica russa tomou-se a base de > desenvolvimento j todo o desenvolvimento do balé latinoamericano, Brasil, em planos bilaterais com participação do j fornecendo uma clara regularidade em sua cofor- Ballet Nacional de Cuba, Ballet de Camagüey, do j mação não muito diferente ao que logo se sistema nacional cubano de escolas de balé e do : sucederia com a dança moderna. Sob a base desta Instituto Superior de Arte. ! influência, formaram-se os movimentos de balé A razão deste desenvolvimento tem sido sem : com maior personalidade em todo o continente: o dúvida o apoio estatal junto ao trabalho que já j argentino e o cubano. teria realizado Alicia e Fernando Alonso, no de­ j O prestígio do Teatro Colón e de seu Corpo de senho de um método que em Cuba considerava-se j baile estável, está fundamentado em décadas de mais capaz de adaptar-se aos corpos dos latinoa- i trabalho contínuo e no surgimento de figuras im- mericanos. j portantes para o balé mundial desde o triste j desaparecimento de José Neglia, até o sucesso Os esforços para criar mecanismos regionais que j atual de Julio Bocca, pelo qual Buenos Aires tem permitiriam um desenvolvimento conseqüente na j sido considerada predominante no continente, região determinada, tais como o que se pretendeu j que exportou uma grande quantidade de profes- na OEA em 1988, e a Fundação Latinoamericana j sores por todo o Brasil. e Caribenha da Dança que impulsionaram Cuba e o Conselho Brasileiro da Dança, não conseguiram j Até hoje, não obstante, pode-se observar regula- passar do papel. j ridades técnicas que permitem diferenciar os j bailarinos argentinos, tais como a capacidade de A dança moderna As regularidades do pro­ j giro das bailarinas pelos seus partners, não se cesso de surgimento da dança moderna na j pode falar de uma escola propriamente argentina. América Latina, têm sido semelhantes às do balé, diferenciando-se somente porque, neste j No caso cubano, no entanto, desde 1964, fala-se caso, as influências não tomaram uma única j na existência de uma escola que já desde os finais configuração mas sim, duas: aquela provenien­ j dos anos 70, começou a ser presença freqüente te da escola alemã e a legada dos Estados j nas companhias e academias do continente. Por Unidos, a qual outorgou mais riqueza à paisa­ : estes anos é que começou a assessoria cubana à gem. : Compama Nac\ona\ de Danza do México (a\ os j nomes são invertidos, o Ballet Nacional de Méxi- No Chile, Argentina e na Bahia (Brasil), a proe- j co é a companhia de dança moderna dirigida por minência da dança de origem alemã j Guillermina Bravo), que quase havia cessado, (Laban-Wigman-Joos), foi a base de onde a i Esta assessoria ainda permanece fomencendo obra de coreógrafos como Hilda Riveros, Ana : professores, ensaiadores e coreógrafos e foi o Itelman e Lia Robato se apoiaram para suas j início de uma extensão em grande escala que experiências. j cobre uma boa quantidade de companhias de balé Por outro lado, o importante movimento da j de diferentes estados mexicanos. dança moderna mexicana dos anos 40, com Logo nesta primeira experiência, assessorias e obras de Waldeen e Elena Noriega, usaram mestres cubanos distribuem aulas pelo Peru, elementos de Graham-Humphrey como modelo Equador, Colombia, Panamá, Costa Rica, Repú­ e em seu papel pioneiro (deve-se lembrar que blica Dominicana, Chile e a própria Argentina e José Limon era mexicano), irradiou-se por toda 10 anos da dança internacional

América Cantral e Caribe. Em Cuba, Ramiro mis, kimonos sofisticados, cerâmicas, gravuras e Guerra, ex-aluno de Nina Verchinina uniu a seu alta tecnologia, o Japão apaixonou os brasileiros, aprendizado com Martha Graham, as experiên­ a exemplo do que já fizera com o resto do mundo. cias diretas com que foi brindado por Elena Mas nos anos 80, o processo se expôs. Como se o Noriega, e além disso, uma análise do movimento espetáculo chegasse ao final. Com a mesma suti­ dos cubanos, criando nos anos 60 a dança moder­ leza com que o ator dispõe da máscara de seu na deste país. Constante neste processo, é o personagem, apresenta-se uma nova face. Ela nacionalismo confesso e convicto que, a princípio sempre esteve lá. Mas agora se presentifica com explicitamente, e depois de maneira sutil, apro­ o poder de quem sabe que se transformou no pai fundou a personalidade da dança teatral do do grande capital internacional. continente influenciando o próprio balé. Sem timidez, o Japão comprou quarteirões intei­ A personalidade mais importante desta etapa é ros de grandes capitais internacionais. E, no Guillermina Bravo, diretora e coreógrafa do Brasil, onde mora uma de suas colônias mais Ballet Nacional do México, país que junto ao numerosas, foi ainda mais longe. Passou a habitar Brasil registra o maior número de grupos que os sonhos de toda uma legião de descendentes que cultivam a dança moderna e estilos posteriores não tem hesitado em fazer as malas e partir para a terra de seus antepassados com um único obje­ chamados de contemporâneos no México e que Entre a tradição e a no Brasil vêm tomando o nome mais próprio de tivo: enriquecer. vanguarda há uma pósmodernos. Assim, grupos como o Ballet Mas como estética e poder caminham juntos é Independiente do México, o Teatro dei Silencio também dos anos 80 a vinda de Kazuo Ono ao trama ilimitada de o el Forion Ensemble, começaram a explorar Brasil. Ono, ao lado de Tatsumi Hijikata, é pre­ possibilidades novas propostas de movimento que seguiram a cursor da dança butô, e nos presenteou com a estéticas ruptura que se vinha produzindo nos Estados estética contemporânea japonesa, abrindo novos Unidos e Europa, e cujo eco, ainda que um apetites e instigando artistas e pesquisadores a pouco tardiamente, chegou à Cuba, com os conhecerem de perto este outro lado da moeda grupos Danza Abierta, de Marianela Bóan, sem forte do globo. dúvida o mais original e coerente, e outros como Danza Combinatoria e Ballet Teatro de la A trilha da busca do conhecimento é maliciosa. Habana. Merece uma pesquisa aprofundada e , muitas vezes, tem sido vítima de grandes equívocos e Lamentavelmente, não existem festivais como interpretações pessoais enganosas. Não se des­ o de balé de Havana que promovem o inter­ venda uma cultura milenar em alguns meses, câmbio e o autoconhecimento entre os principalmente quando se trata de um terreno latinoamericanos, no que se refere à dança mo­ fértil como o deste pequeno arquipélago, onde a derna da região. # imaginação ampara-se numa lógica tendendo à lógica poética, bastante diferente da nossa. Q vanguarda no Japão e nos A atriz e pesquisadora Alice K. esteve no Japão Estados Unidos - Christine Greiner durante o último ano, estudando diferentes técni­ Japão: estética do poder O fascínio brotou cas, participando e assistindo espetáculos da aos poucos. Inusitadamente. Entre sushis, sashi- vanguarda atual. Algumas coisas mudaram com > a passagem dos anos 80.0 butô explodiu. Apenas ram investir mais no belicismo do que na criação em Tókyo, há dez salas de apresentação reserva­ artística. As grandes companhias já estabelecidas das a este estilo, com espetáculos diários. Além sofreram uma pressão atenuada, como é o caso disso, o próprio espírito da dança das trevas, como daquelas que levam os nomes de coreógrafos foi batizada originalmente por Hijikata, apresenta como Paul Taylor e Alvin Ailey, entre outros. No novas saídas. Dois bons exemplos, conta Alice, entanto, a chamada vanguarda, foi diretamente são as solistas Kuniko Kisanuki e Anzu Furuka- atingida, como experimentou Twyla Tharp (fe­ wa. Ambas fizeram parte do grupo chou e reabriu a sua companhia a duras penas). E Dairakuda-kan, do diretor, coreógrafo e ator o que dizer então de coreógrafos menos conheci­ Maro Akaji, que viveu três anos com Hijikata e dos. Neste novo contexto da "american way of desenvolveu um estilo próprio. life", vingaram as produções relâmpagos, menos exigentes. Assim como as associações com os São, portanto, terceira geração e mostram um esportes que aliaram-se à dança para auxiliar a perfil bastante particular do que pode ser o butô preparação física dos " performers", e agilizar o hoje. A começar pelo toque de feminilidade que ritmo agradando aos sentidos de um público vi- aparece tanto no espetáculo de K.Kisanuki ciado no jogo rápido dos vídeoclips e "Mata-Hari: H-21", sobre os últimos momentos videogames. Nesta linha há toda uma legião de da vida desta espiã, e em "The Diamond As Big coreógrafos como Trisha Brown (apresenta-se As the Ritz", onde A.Furukawa trabalha o humor com freqüência em ginásios esportivos), a já co­ e a ironia, até então bem distantes do butô. nhecida Molissa Fenley (esteve no Brasil em Além destas coreógrafas e dos já veteranos Ono 1988), Elisabeth Streb e David Dorfman, este e Ushio Amagatsu, do Sankai Juku, também co­ último uniu atletismo, dança clássica e moderna nhecido no Brasil, vale destacar no circuito à herança judaica. Não podemos esquecer tam­ cultural deste começo de anos 90, um importante bém o "contact improvisation", criado por coreógrafo contemporâneo, diretor do grupo Tes- Stephen Paxton e Nancy Stark Smith, que nasceu higawara Saburo e Karas. Teshigawara elabora em 1972 mas explodiu em 80. É uma espécie de uma pesquisa interessante no espetáculo "Dah- conversa física entre duas ou mais pessoas, com Dah-Sko-Dah-Dah", apropriando-se da base no toque, no intercâmbio do peso e do equi­ musicalidade da dança ritual folclórica japonesa líbrio, chegando também a movimentos atléticos. cujo som produz a onomatopéia que dá nome ao Há quem diga que se a dança moderna foi influen­ espetáculo, e relacionando-a à matemática eucli­ ciada pela técnica de Martha Graham, a chamada diana. Prova, mais uma vez, que na relação entre nova dança tem por base os ensinamentos de tradição e vanguarda, há uma trama ilimitada de Merce Cunningham, que aliás continua surpreen­ possibilidades estéticas. ® dendo com as suas criações aliadas à computação EUA: um perfil particular O capitalismo gráfica e ao vídeo, como mostrou no último Um- americano sempre apresentou ao mundo a ima­ brella Festival. A lista de seus descendentes, de gem imbatível da segurança e da liberdade de fato é longa, e conta com veteranos como Douglas expressão. No entanto, os anos 80 mostraram as Dunn, esteve no Brasil na 2\- Bienal, a própria fragilidades desta hipotética felicidade, a partir do Twyla Tharp, que por ora retoma o intelectualis- momento em que governos conservadores decidi­ mo que marcou o começo de suas criações 10 anos da dança internacional

incluindo até discurso em uma de suas recentes witzky Company e Gloria Newman Dance Thea­ obras, Yvonne Rainier, Elisabeth Keen, Meredith ter, para a Califórnia. Monk, David Gordon, Rudy Perez, entre outros. Num balanço geral pode-se dizer que os america­ Mas é difícil estabelecer regras para classificar nos têm se mantido fiéis a um perfil bastante estas "novas danças O Projeto do grupo carioca peculiar, criado desde os pioneiros da dança mo­ Contadores de Estórias trouxe ao Brasil represen­ derna, que os diferencia de qualquer outra tantes da vanguarda novaiorquina (veja matéria manifestação de dança no mundo, apesar das di­ dos Festivais Internacionais), mas na ampla estei­ versificações que tramam a sua lógica interna de ra da vanguarda há muitas outras personalidades criação. A começar pelo próprio aprendizado, como mostrou em janeiro de 1992, o "Altogether muito mais voltado ao aperfeiçoamento do físico Different Festival " que apresentou trabalhos de e do movimento em si, do que, por exemplo, o que Mark Dendy, Peter Pucci, Sally Silvers, Doug ocorre em outros países como a Alemanha, onde Varone, Randy Warshaw e as já citadas Fenley e a filosofia e a história têm um peso indiscustivel- Streb. Todos, à exceção de Fenley, são criadores mente maior. # da segunda metade dos anos 80. Vale lembrar também nomes como Laura Dean, Martha Clarke, 0 vanguarda européia - Helena A dança renova as Bill T. Jones e Stephen Petronio (também dançou Katz - Uma certa permissividade, um tempo com relações com as no Brasil com o inglês Michael Clark). outras leis, um espaço habitado por figuras insó­ outras artes. Não litas. A dança nascida na França, na Holanda e na As experiências dos anos 60, que influenciaram Bélgica pode ser entendida como um laboratório como a imagem que os 70, refletindo-se ainda na última década, im­ histórico da produção da última década. Desde se espelha, mas puseram a ordem da diversificação e romperam a que Nikolais, em 1966, foi convidado a criar, em hegemonia do espaço teatral como o templo da como um modelo Angers, o CNDC (Centre National de Dance Con- dança. Espetáculos performáticos invadiram ba­ que confeccionou temporain), o trânsito Estados Unidos e França se res, museus, ginásios esportivos o cinema e o estabeleceu como uma ponte aérea utilizada pela sua aura própria vídeo. Um bom exemplo é o de John Kelly que maioria dos jovens e inquietos criadores. Pouco a explodiu em março de 92 no La Mama Annex pouco, a "post-modem danse" norteamericana se (N Y) compondo personagens como o pintor Egon "acultura" em solo europeu com cara própria. Schiele. A dança conheceu a improvisação e re­ tomou à técnica com uma especialização que Sozinha, provavelmente, a insatisfação resultaria busca cada vez mais a simplicidade. Namora o em nada. Mas amparada por uma política cultural minimalismo, diferenciando-se da dança moder­ como a praticada na França nos dois períodos de na que foi concebida em um contexto de "art governo de Mitterrand, ela simplesmente polini- nouveau", "vaudeville" e exotismos orientais. zou a dança. Regionalizada, a dança francesa Além disso, a exemplo do que ocorreu na França, hibridou-se com as influências orientais, africa­ a descentralização tomou conta dos EUA. Com­ nas, barrocas; aproximou-se das passarelas da panhias espalharam-se pelo interior como: moda mais avançada e da publicidade mais ousa­ Pilobolus Dance Theater em Connecticut, a Nan- da; seduziu-se pela imagem formatada para cy Hauser Dance Company em Minnesota, o existir tendo um monitor como suporte; e criou Repertory Dance Theater foi para Utah, The Bill um corpo que sabe de Nietzsche, Artaud, Bataille, Evans Dance Company, para Seattle e Bella Le- Barthes. Entre nós, pouco conhecemos deles. Mas deve­ mica e obsessiva, constantemente modulada pelo mos anotar nomes como os de Karine Saporta, trágico e pelo burlesco. Anna Térésa de Keersmacker, Hidey ki Yano, Quando Anne Térése de Keersmacker faz o jogo Joelle Bouvier/Régis Obadia, Catherine Diver- do dentro/fora, cor/preto e branco, como em "Ot- rés/Bemardo Montet, Angelin Preljocaj, Régine tone,Ottone", o faz também no corpo de seus Chopinot, Dominique Bagouet, Jean-Claude Ga- bailarinos, cujos braços e pernas se tomam armas lotta, Josef Nadj. E caçar informação. E descobrir contra o equilíbrio. as pistas que nos levam a seus trabalhos. A dança entendida como um conjunto de passos Uma dança que abandonou a "especificidade co- coreografados se rarefaz também com Joelle reográfica " para navegar num contexto cultural Bouvier/Régie Obadia. Os bailarinos de "Derriér- de misturas. Dançar = pensar. Precisamos pôr esta re le Mur" falam e de suas falas não se ouve o som, equação debaixo do braço, para atravessar a cena só se vê a articulação. Quem liga os acontecimen­ européia da última década. tos cênicos, a certa altura, são fios de seda que se Coreógrafos europeus contemporâneos fazem do estendem pelo espaço aberto. Corpos suspensos corpo uma presença de exasperação narcísica mimetizam a claustrofobia dos sarcófagos. num universo de clausura cada vez mais intensa. As folhas secas do celeiro abandonado onde Odil- A atração de grande parte deles pelo cinema ou le Dubou realizou "2 minutes d’antenne", a pela imagem digitalizada talvez se explique mais "neve" de "Temoin I", as dunas de "La Collection através das próprias transformações que impri­ - été quatrième époque", da dupla Nicole e Nor- mem ao corpo do que pela necessidade de bert Corsino, destas danças, a releitura da exposição de suas idéias. Afinal, um corpo des- natureza se faz de modo pictorial, também como materializado de suas caracterizações habituais citação. precisa de um meio onde esta outra materialidade seja a maneira de lá existir. Uma dança que renova as relações com as outras artes. Não como a imagem que se espelha, mas A nova cena se chama encenação. Não mais ape­ como um modelo que confeccionou sua aura pró­ nas corpos que dançam coreografias, mas danças pria. # com complexas construções narrativas, frequen­ temente pontuadas pela preocupação com a ^ alé, entre americanos e eu­ sobrevivência ou com a catástrofe. Sempre uma ropeus - Marcos Bragato - Arte codificada confrontação simbólica com uma situação inicial e altamente formal, com origens nos salões de onde tudo pode ser (re)construído. baile das cortes européias, o balé ocidental foi Uma dança, de certa forma, maneirista com a sua tomado por episódios que colocam novamente a lógica formal. E que parece haver surgido como questão de como sustentar uma grande tradição. uma excelente resposta à demanda de dissociação De como suportar um edifício de base sólida e de típica da sociedade do nosso tempo. Cruzamento rumo artístico prestigioso mas assediado pelas da citação com o fragmentário e o contínuo, da ameaças de ordem econômica e administrativa. evocação com o lento e o rápido, produziu um Esse legado pede um número considerável de vocabulário e, com ele, a sua gramática. Vozes, bailarinos e direções carismáticas, talentos e per­ silêncios, memória, numa heterogeneidade dinâ­ sonalidades do balé. Se na Europa e Rússia boa 10 anos © da dança internacional

parte das grandes companhias estão ligadas aos que a rixa é só memória, passado. E isso não ficou O balé ocidental tem grandes teatros, os mais importantes de sustenta­ restrito às três grandes companhias sediadas em questionado como ção estatal, nos EUA o perfil é diferente. O Nova York, ou mesmo ao Dance Theatre qf Har- sustentar a tradição modelo segue também a contribuição da socieda­ lem, um conjunto de bailarinos negros que fazem de na forma de mecenato. Por essa razão, os anos balé, mas se dispersou junto a grupos das maiores e transgredí-la 80 do balé americano não foram assim tão traqui- cidades americanas. Alguns desses modernos los, como pelo menos a aparente clama do lago passaram a alterar até a iconoclastia pelo vocabu­ europeu, que seguiu agitando apenas as entranhas lário padrão do balé. de sua veia artística. As três mais importantes companhias americanas ficaram órfãs de seus A pujança do balé americano percorre quase todos gigantes criadores substituídos por uma nova ge­ os estados da América. E as mais importantes, ração de líderes. George Balanchine, fundador do fora de Nova York, são dirigidas por ex-alunos de New York City Ballet com Lincoln Kirstein, mor­ Balanchine: Helgi Tomasson, San Francisco Bal­ let; Edward Villela, Miami City Ballet; John reu em 83 assinalando o fim de uma era. Em 86, Clifford, Ballet of Los Angeles; Daniel Duell, foi Lucia Chase, fundadora do American Ballet Theatre. Em 88, é a vez de Robert Joffrey criador Chicago City Ballet; e Robert Bamett, Atlanta Ballet. Elas, como outras, nasceram na explosão do Joffrey Ballet. Em certo momento, o balé americano ficou em estado de fluidez mas acon­ dos últimos 20 anos mas emplacaram seu trabalho na década passada. O novaiorquino Feld Ballet tecimentos recentes o deixam com algumas certezas. Que o sucessor de Balanchine, o baila­ talvez seja a exceção desse modelo. Eliot Feld, seu coreógrafo e fundador prefere associar ao balé rino dinamarquês Peter Martins, ilumina com seu uma condição atlética. O balé europeu também trabalho o espaço formado pelo mestre. O balé da não ficou livre das perdas. Dois ingleses deixaram mais famosa companhia americana continua se em aberto a sucessão: morreram a bailarina Mar- arranjando em novos formatos. got Fonteyn e o coreógrafo Kenneth MacMillan, O New York City Ballet continua sendo a frente, uma dupla de alta consideração para o mundo da a sala de visita. Já sua conterrânea, o American dança e para os apreciadores do Royal Ballet. De Ballet Theatre, passou a década de 80 com troca resto, procurou manter a fama de sua escola como sucessiva de direção, enfrentou grande polêmica, o sempre impecável Balé Real da Dinamarca. A entre o seu famoso diretor e bailarino Mikhail novidade desse panorama são os novos ventos que Baryshnikov e outra estrela, Fernando Bujones. se abateram sobre a Ópera de Paris. Quem a viu, Talvez por essa e outras razões, o ABT entrou em na recente tumê ao Brasil, pode confirmar como 90 em crise a ponto de cancelar a tumê ao Brasil está rejuvenescida. E isso ela deve a Rudolf Nu- por falta de caixa para financiar os ensaios. O reyev, que no final dos 70 provocou ABT é talvez a mais eclética das companhias de reformulações sem conceder à ignorância, ao balé, misturando repertório do século 19, os dra­ imobilismo ou mesmo a conservação do velho. mas psicológicos de Antony Tudor e Mas o balé europeu é muito mais rico em corren­ colaboradores da dança moderna. Ao lado desses tes do que o americano. Brotam cabeças fatos, um fenômeno percorreu os estúdios ameri­ revigoradas. Dão um novo ânimo aos trabalhos canos: coreógrafos de dança moderna começaram que se sustentam basicamente da técnica clássica a colaborar com os conjuntos de balé, provando ou fazem dela uma leitura maluca e apaixonante. Na cabeça desses coreógrafos o mundo pode ser trabalho de captar várias colaborações quando captado em todo o seu clamor, em toda a sua não remonta balés de repertório graças a um elen­ magnitude. Um deles é o sueco Mats Ek. Fica co primoroso. difícil colocá-lo numa redoma mas em perspecti­ Quem sofreu uma queda vertiginosa nos anos 80 va, seus trabalhos partem da condição do balé, foi Maurice Béjart. Ao se mudar de Bruxelas, com elementos teatrais e da dança moderna. São onde dirigia o Balé do Século XX, no Teatro de conhecidas e aplaudidas suas versões de" Giselle" La Monnaie, para Lausanne, o coreógrafo francês (82) e do "Lago dos Cisnes"(87), onde o elenco não encontrou mais o eixo. Manteve-se até agora dança de tutu e descalço. O local dessas experiên­ a repetir a fórmula que havia conquistado o mun­ cias é o Cullberg Ballet, do qual é diretor desde do nos anos 70. No Béjart Ballet Lausanne os 88, depois de sua mãe a bailarina e coreógrafa vícios de uma companhia de estrelas estão mais Birgit Cullberg tê-lo fundado nos anos 50. que expostos. A criatividade cedeu lugar ao esno- O Nederlands Dans Theater se converteu também bismo. numa grande usina de idéias de dança. O cérebro da impulsão da companhia é o tcheco Jiri Kylían. Dois fenômenos de intérpretes merecem desta­ Partindo da técnica clássica, Kylían tem afirmado que: a bailarina francesa Sylvie Guillem, que aos uma produção sólida e quase uma escola de cria­ 19 anos já era" étoile" da Ópera de Paris e hoje, ção, uma nova maneira de dispor as peças de um essa bailarina de físico privilegiado, dança no jogo coreográfico que muitos teimam em afirmar Royal Ballet. E Irek Mukhamedov, cujos saltos como abstrato. Kylían é mais do que essa simpli­ espetaculares e a força muscular deixaram o Bols- ficação. Seus bailarinos são exímios profissionais hoi para se acasalar também na companhia naquilo que praticam. O Nederlands, criado em inglesa, seguindo os mesmos passos de Nureyev. 81, transformou-se em mais do que uma simples O balé russo é análise à parte. Fechado e tranca­ companhia escola. É hoje a outra frente da verten­ fiado na antiga URSS, começa a respirar novos te Kylían, uma escolha primordial pela música e ares com a queda do regime soviético e a abertura por traços também da dança moderna. Essa capa­ de Gorbatchev. Se o Bolshoi era o símbolo desse cidade se estendeu a de descobrir talentos, como período da guerra fria, onde as danças ostentavam o espanhol Nacho Duato agora residente em seu virtude, rompantes, num clima de vitória, o Kirov, país. berço do melhor balé russo, começa a freqüentar Um americano residente na Europa conquistou os teatros europeus e mostrar sua exuberância. A também novas platéias. Ao assumir a direção do Europa pôde ver e rever suas estrelas e a perfeição Frankfurt Ballet, William Forsythe já gozava de de sua escola: limpeza, fidelidade à estética ro­ prestígio. Seu trabalho foi o de dar uma nova cara mântica e especialização ímpar. Até hoje é ao grupo alemão. Outros, porém, como o Sttutgart modelo para o ocidente, e não o Bolshoi que se Ballet, de Márcia Haydée, ainda não se recuperou converte no porta-voz de uma estética "realista", com a morte de John Cankro. O estrondo do de muito mau gosto, especialmente, período Cankro se foi. Márcia Haydée tem o a traçada por Yuri Grigorovich. Fervem as novas produções paulistas u m ano da dança americana

O American -w- -r-m dos cartões de visita dos EUA, o American Ballet Ballet Theater Ê / Theater faz 50 anos. A novidade é a direção de uma K-S famosa dupla: Mikhail Baryshnikov e Twyla Tharp. Mas faz 50 anos é outra facção da dança americana que visita o Brasil: Lori Belilove, dançarina e diretora artística da Isadora Duncan Foundation. Belilove apresenta peças do repertório e ensina, nessa primeira temporada em SP, os princípios técnicos e filosóficos de Duncan. As superproduções do Balé Bolshoi também revisitam o país em turnê por seis capitais. A direção ainda é de Yuri Grigorovitch. E para provar que nem tudo está perdido e que a história do bailarino que não pensa é bastante discutível, Edson Claro lança "Método Dança - Educação Física", seu primeiro livro que propõe , entre outras coisas, integrar dança e educação física. No segundo semestre paulista, fervem as novas produções. Cisne Negro e os "Cânticos Místicos" do português Vasco Wellenkamp. O Stagium com "Cenas sem Palavras" de Décio Otero e o Marzipan com o seu "Tico-tico". O Balé Teatro Castro Alves apresenta-se em Campina Grande no XI Encontro Nacional de Grupos de Dança e VII Ciclo de Dança Norte e Nordeste, trazendo peças contemporâneas de Oscar Araiz e Debby Growald, esta última, responsável pelo período mais despojado do BTCA. Flashes da // i s l ó ri a

1 Dançar realizada uma edição especial para 1 o Festival de Joinville, contando a história deste grande evento nacional.

2 Dançar lança uma edição especial, calendário de 1989, com fotos de diversos estilos de dança e um texto discutindo a questão da modernidade na linguagem da dança. Na foto, Antonio Gades.

3 O Balé Teatro Guaíra completa 20 anos e Dançar prepara uma edição especial de aniversário com toda a história do grupo, repertório e entrevistas com os profissionais que participaram da criação da companhia. Dançar (CÊ 10 Anos Hpr

1 a 5 O III Carlton Dance trouxe Win Vandekeybus, UEmsemble, Martha Graham, Iso e os brasileiros Antonio Nóbrega e os Cisne Negro.

1

3

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\ 1 a 3 O V Festival Internacional do RJ apresentou o Lar Lubovicht (1) dos EUA, o Cullberg Balé (2) da Suécia e os brasileiros Balé da Cidade de SP (3) e Balé do Teatro Municipal do RJ.

4 Apesar dos grupos independentes, a dança portuguesa continua polarizada entre duas grandes companhias : o Ballet Gulbenkian e a Companhia Nacional de Bailado. Maria José Branco e Miguel Lyzarro aparecem em “ Sílfide” , com a Companhia Nacional de Bailado.

5 O Balé da UFPR, único grupo de dança moderna que trabalha sob o teto de uma instituição universitária no Paraná é destaque no VII Festival de Joinville, na sua sétima versão.

Surge mais um projeto internacional de dança Flashes da História

u m ano desastroso com o fim da Lei Sarney

notícia já era muito esperada. Finalmente é lançado o La Sylphide livro "A Dança", Editora Siciliano, de Klauss Vianna, sob revive detalhes o patrocínio da Bolsa Vitae de Artes. Resultado da A de época no pesquisa que esse mineiro desenvolve desde menino, o livro cruza vida e arte e registra a filosofia do método de ensino Municipal concebido por este importante educador da dança no Brasil. Com a dupla Ana Maria Mondini e Umberto Silva o trabalho de criação tem um quê de cumplicidade. O traçado é desenhado a quatro mãos, mas cada um compõe a sua história coreográfica. Com Umberto, a última é "Cachorro sem dono". Com Mondini, "Emoções Baratas" e "Alma em Fogo". Novas criações e novas vertentes surgem no segundo semestre. A visão do aparecimento do mundo e das coisas está em "Criação", de Rodrigo Pederneiras, uma das grandes produções do Corpo. O carioca Fábio Melo é a nova via da dança carioca que marca o início do Balé Contemporâneo do Rio. Lá mesmo, a companhia oficial mantém seu alvo. "La Sylphide", produção concebida pelo francês Pierre Lacotte, tenta reviver os detalhes de época nos corpos dos bailarinos do Teatro Municipal. O Vacilou Dançou , misturando jazz e dança moderna, apresenta "Poetas, Escritores, Bailarinos ... Sonhadores". E o projeto do Grupo Contadores de Estória, de Paraty, quer mais do que mostrar espetáculos. Além de trazer a nova dança americana, como a de Ralph Lemon, o Contadores aposta no intercâmbio organizando cursos. Morre o crítico de dança Luis Sorel, uma personalidade importante no meio e colaborador da revista Dançar. Jorge Donn e Cipe Lincovsky dançam "Nijinsky, palhaço de Deus", criação de Maurice Béjart. A Companhia de Dança do Palácio das Artes estréia "Pássaro de Fogo", direção de Tíndaro Silvano, coreografia de Luis Arrieta e música de Igor Stravinsky. Acaba a Lei Sarney, comprometendo gravemente a produção artística nacional. D ançar 10 Anos

1 Bebeto Cidra aparece em “ Machucadinhos” , nas Semanas da Dança do Centro Cultural SP. Este coreógrafo tem se destacado com intervenções importantes na cena nacional.

2 O Balé Ópera Paulista apresenta “ Volúpia” , obra dirigida por Angela Nolf e coreografada por Ana Maria Mondini. Uma feliz associação que marca uma fase importante do grupo. Após 6 anos de trabalho, a presença de Mondini e da americana Holly Cavrell (na foto dançando em Volúpia), renovam as possibilidades coreográficas para o Balé.

3 A montagem inédita do clássico “ La Shyphide” para o Balé do Teatro Municipal do RJ e a oportunidade dos bailarinos brasileiros trabalharem ao lado de grandes nomes da Ópera de Paris são o tema de mais uma especial da revista Dançar que conta a história deste grande clássico romântico e conversa com os integrantes da montagem nacional. Na foto, Platel e Legris no pas-des-deux do 10 ato.

pág. 109 No IV Carlton Dance estiveram presentes Pina Bausch (2), Nikolais and Louis (4), Bill T. Jones (1), David Gordon e Terpsi Teatro de Dança (3) e Victor Navarro.

Morre o crítico de dança 199 Antonio José Faro

ANO IX Flashes da História

u m ano de convidados importantes

evigorada por uma nova geração de intérpretes, o Balé da Dançar lança Ópera de Paris desembarca com um programa eclético. O uma nova JL V Trockadero de Montecarlo também mostra a sua versão publicação, a dos grandes clássicos, com homens vestidos de bailarinas. A presença de Shakespeare na dança também não é muito comum, Dançar Press mas o Cisne Negro nos faz conhecer a versão do escocês Peter Darrell de "Otelo". O oposto dessa escolha é a do Balé do Teatro Castro Alves: "Retratos da Bahia " , a mais nova coreografia da diretora Debby Growald. A editora Dançar coloca em circulação uma nova revista, a Dançar Press, em versão mais enxuta. As temporadas do Balé Real da Dinamarca e a dupla Stephen Petronio e Michael Clark coloca de frente dois estilos distintos. Ivaldo Bertazzo apresenta "Raga", coreografia inspirada em um dos mais antigos livros do mundo, o Mahabharata, ligado ao hinduísmo. É a sinalização de uma futura estética a ser trabalhada pelo coreógrafo. Antônio Nóbrega, conhecido pelo sucesso no Carlton Dance, em 89, apresenta o espetáculo-demonstração "Figurai", parte da sua pesquisa sobre a gestualidade brasileira, patrocinada pela bolsa Vitae de Artes. Já a bailarina Rose Calheiros, decide desembarcar na Alemanha como bailarina, coreógrafa e assistente do Balé de Manheim, aos 40 anos e com toda a maturidade profissional a que tem direito. O tradicional TBC, Teatro Brasileiro de Comédia, abre uma programação especial de dança às terças e quartas feiras, organizado por Aura Rejane, instalando novo espaço para a dança. Morre o crítico de dança Antonio José Faro, um dos grandes colaboradores da revista Dançar, deixando uma lacuna significativa num mercado de trabalho já tão deficiente como a crítica especializada em dança no Brasil. O Balé do l9 Ato de Minas Gerais, consegue Patrocínio do Banco Rural e faz uma importante turnê. Ao lado do Oz e do Camaleão, passa a fazer parte dos grupos independentes mineiros que têm sobrevivido à crise financeira, agitando a produção artística do seu estado. Halina Biernacka, uma das grandes professoras de balé clássico do Brasil comemora 50 anos de ensino, sendo responsável pela formação de numerosos profissionais no país. E o Balé Stagium completa 20 anos.

“ Sair Pro Mar” de Decio Otero é a decolagem dos 20 anos do Balé Stagium. Explora a figura do mar, retratada pelas canções de .

2 A Companhia de Dança Palácio das Artes é atração do Festival de Uberlândia em “ Aquelarre” .

3 Completando dez anos de existência, o Vacilou Dançou mostra técnicas modernas de jazz no IX Festival de Joinville.

4 Morre Martha Graham, precursora da dança moderna americana. Graham criou uma escola com vocabulário próprio e características bastante específicas que passou a ser uma das possibilidades de formação dos bailarinos ao lado do balé clássico. 1 1 A estrela Cecília Kerche na abertura do IX Festival de Joinville.

2 "Estância” de Luis Arrieta, marca a volta do Balé Teatro Guaíra, que promete um intercâmbio com o Teatro San Martin de Buenos Aires.

3 Na tentativa de suprir a ausência do Carlton Dance Festival, cancelado pela crise financeira que abala o país, a 21 ? Bienal de SP assume a dança. Dos quatro convidados internacionais, comparecem apenas dois: Douglas Dunn (americano) e Astrakan (francês). Os brasileiros estão representados por Maria Duschenes e Cristina Brandini.

2 Flashes da História

3 1 1 Jânia Batista, solista do Balé Lausanne (Suiça) de Maurice Béjart, no Festival de Joinville.

2 Elizabeth Platel e Laurent Hilaire na coreografia “In the night” do BALLET DA ÓPERA DE PARIS, em visita ao Brasil, fevereiro de 91.

2 As tendências mais radicais se afirmam Dançar 10 Anos

!

U m ano de grandes perdas

Morrem ■ ^ com coreógrafos internacionais que o Balé da Cidade de Jorge Donn, SP e o Cisne Negro dão a largada do ano. O primeiro com í ^ a coreografia "(Zero)2" do alemão Johann Kresnik e o Klauss Vianna segundo com MMozartíssimo" do franco romeno Gigi Caciuleanu. e Vai Folly O Stagium prefere abordar o descobrimento da América com "Shamaim" de Décio Otero. Três grandes nomes desaparecem: Jorge Donn, Vai Folly e Klauss Vianna. O Ballet Ismael Guiser cria "Jornadas de Fé 2" , um projeto iniciado em 1991 como homenagem a Martha Graham. O grupo tem se apresentado pelo estado de São Paulo mostrando "Amar, Amor,Amei" do próprio Guiser em cima dos estudos de Chopin e "Andante" de Luis Arrieta, entre outras. O Teatro Guaíra monta "Don Quixote". O Balé da FUNARJ faz três temporadas . E o Festival de Joinville completa 10 anos, uma verdadeira vitória no panorama nacional que enfrenta uma de suas piores crises econômicas, afetando diretamente os eventos culturais. Apesar de todos os problemas financeiros, desponta uma luz no final do túnel com a radicalização das novas tendências através da pesquisa de importantes coreógrafos como Denilton Gomes, Suzana Yamauchi, Ana Mondini e Umberto da Silva. Nos trabalhos apresentados por estes bailarinos-coreógrafos no Centro Cultural SP, vê-se a sinalização de novas estéticas a serem desenvolvidas por estes criadores no decorrer desta década que se inicia. A Mostra Gradiente de Filmes de Dança com o acervo da i Cinematheque de la Danse, da França, e curadoria de Helena Katz traz 87 filmes da dança internacional, pela segunda vez ao Brasil. Em dezembro, a Conexão América, criada pela Artecultura promove uma mostra da nova dança realizada em A Buenos Aires e São Paulo.

pág. 119 e 1 O evento “ Coreógrafos-Dançarinos” trouxe ao Centro Cultural SP alguns dos mais 1 importantes artistas-pesquisadores da vanguarda nacional: entre outros, Denilton Gomes (1) em “ Serra dos Órgãos 4” , Suzana Yamauchi (pág. 119) em “ À flor da pele” e Ana Maria Mondini e Umberto Silva em “ Stress sob as Estrelas” .

2 Renée Gumiel, uma das precursoras da dança moderna no Brasil, aluna dos luminares da dança expressionista alemã.

3 O Grupo Corpo estréia “ 21 ” , de Rodrigo Pederneiras. O balé tem partes independentes e os números musicais são baseados nesta contagem. Abre um novo espaço entre dança e música brasileira. “ 21 ” é também o nome da música composta por Marco Antonio Guimarães e executada pelo grupo UAKTI.

4 O IV Carlton Dance trouxe o grupo canadense LaLaLa Human Steps mostrando corpos com musculatura bem trabalhada e soluções coreográficas bastante violentas.

3 Flashes da História D ançar 10 Anos Hpr

1 a 4 Estiveram também presentes no Carlton, os americanos Garth Fagan (1), a Companhia Paul Taylor (2), Mark Morris (3) e o brasileiro Endança (4).

2 Festivais: intercâmbio : de idéias I

informação que vem de fora

Christine Greiner

-w-^y °is grandes eventos, organizados Grandes companhias clássicas e suas cele­ Ê 1 anualmente, têm sido responsáveis bridades vieram mais de uma vez ao país pela presença de companhias durante os últimos dez anos. O Balé B*ols- estrangeiras no país: o Festival hoi e Yuri Grigorovitch foram um grande Internacional de Dança e o Carlton Dance sucesso de público, o que não significa que Festival. O primeiro nasceu em 1985, não possamos lamentar a sua hegemonia seleciona as principais companhias oficiais sobre o Kirov, uma grande companhia que do mundo e coreógrafos já consagrados.O jamais esteve no Brasil. O Balé Stuttgart e segundo, realizado desde 1987, conta com a brasileira Márcia Haydée, o Balé de Cuba uma proposta diferente, preferindo trazer e Alicia Alonso foram outros convidados ao país representantes da vanguarda e da importantes. Na verdade, a preciosa lista de história da dança moderna internacional. companhias clássicas é longa. A Sadler’s Nos dois eventos são escolhidos em média Well Royal Ballet, companhia de menor dois grupos brasileiros para participarem. porte do que a famosa Royal Company da Inglaterra, esteve presente no II Festival O saldo deste intercâmbio é sempre positi­ Internacional (1986), exibindo a técnica im­ vo, embora em alguns casos possa ser pecável que caracterizou o seu estilo questionado o critério de seleção. Além da particular. O Nederlands Dance Theater Jú­ possibilidade oferecida ao público de assis­ nior, da Holanda, com obras do coreógrafo tir a espetáculos aos quais normalmente o Jiri Kylian apresentou-se no II Carlton acesso seria bastante difícil, há a oportuni­ Dance. Os italianos Alia Scala de Milão e dade de avaliação da produção artística o Balé da Ópera de Riga, com a obra de "Num mundo nacional, uma conseqüência inevitável do Tchecov, também encantaram o público. O probabilístico não contato com as atividades desenvolvidas Balé do Teatro San Martin e o Balé Colón, mais lidamos com fora do Brasil. Mas condições de trabalho ambos da Argentina, visitaram o país res­ quantidades e e sistemas de patrocínio são apenas alguns pectivamente em 1985 e 1987 (este último afirmações que dizem dos pontos avaliados, após a visita dos gru­ como parte do III Festival Internacional), respeito a um pos estrangeiros. mostrando a tradição clássica das compa­ universo específico e nhias latino americanas. Dentro deste quadro é possível também re­ real como um todo. O Danzahoy da Venezuela ( III Festival cuperar uma espécie de diagrama estético Mas, em vez disso, Internacional), já mostrou um trabalho di­ onde se relacionam diversas informações formulamos perguntas que remontam aos grandes clássicos, à his­ ferente, mesclando a tradição clássica cubana com a tradição moderna americana. que podem ter tória da dança moderna e à vanguarda do respostas num grande final do nosso século. Para tanto, analisare­ No que diz respeito às grandes companhias contemporâneas, o final da década de 80 é mos também a presença de outros grupos número de universos que visitaram o país fora do esquema traça­ particularmente especial. similares" do pelos grandes festivais. A Companhia de Maurice Béjart nos visi- > Norbert Wiener tou mais de uma vez trazendo nomes como o Mas se a pesquisa das etnias e suas possí­ de Jorge Donn. Em 1989, o americano Lar veis combinações é importante, as Lubovitch é convidado a participar do V manifestações estéticas sem a interferência Festival Internacional. Fluente no vocabulário de outros códigos também provam o grande clássico e no moderno (estudou com expoentes valor artístico e cultural, especialmente de diversas tendências como Antony Tudor, quando se trata de grupos de primeira linha José Limon, Graham e Anna Sokolow, entre como foi o caso por exemplo, daqueles que outros), Lubovitch é capaz de brincar com a estiveram no Brasil em 1988: o soviético estrutura de códigos pré-concebidos como em Balé Moisseiev, os chineses da Ópera de "Concerto 622", onde decompôs minuetos Pequim, do Teatro de Fantoches e da Trupe transitando pelos clássicos com humor e com­ Acrobática, e os espanhóis como Antonio petência. No mesmo festival, a sueca Brigit Gades, conhecido do grande público atra­ Cullberg e seu filho Mats Ek apresentam o vés do sucesso do filme "Carmem" de resultado de 20 anos de pesquisa fundindo a Carlos Saura. técnica clássica e a moderna na releitura ímpar Recordando os principais espetáculos da de " Giselle" e " Romeu e Julieta". Outro des­ segunda metade dos anos 80 e começo dos taque é o Balé Contemporâneo de Barcelona 90, é possível ainda fazer uma verdadeira (pela primeira vez no Brasil em 1988) que mes­ "Consciência de reconstituição da história da dança moder­ cla dança moderna (Graham e Cunningham) linguagem implica na e contemporânea, sobretudo americana, com fortes referências da catalunha. consciência de sua através dos convidados internacionais das organização icônica. Em se tratando de estudos étnicos ( a rela­ diversas tendências que se apresentaram no ção entre traços culturais típicos e outros Brasil. E esta história começa de fato em Estar realmente códigos, como a dança moderna, por exem­ seus primórdios. A coreógrafa americana consciente da plo) não há como não lembrar a dança Lori Belilove (em 1988 e em 1992) mostra linguagem significa negra americana. A pioneira é Katherine o repertório de Isadora Duncan, pioneira da estar liberto da Dunham (veio ao Brasil em 1987), inspiran­ dança moderna no ocidente. do uma série de estudos coreográficos ilusão da No III Carlton Dance, a companhia de sobre a questão da preservação da caracte­ contiguidade" \ Martha Graham traz ao palco a idealização rística típica negra (como o uso da energia do vocabulário gestual que se tornou a car­ vigorosa e a própria movimentação afro). tilha da maioria dos bailarinos modernos de No V Carlton Dance, Garth Fagan traz a sua todo o mundo. No II Carlton, é a vez de companhia e o estudo da dança jamaicana rela­ Merce Cunningham, um dos alunos mais cionada à escola moderna americana. Já a brilhantes de Graham, apresentando a pes­ grande companhia Dance Theatre of Harlem, quisa gestual que mudou a concepção no III Festival Internacional mostra um traba­ coreográfica dos anos 50-60 ao voltar o lho reconhecido como um dos destaques movimento para si mesmo em um tempo- dentro do mercado americano e no exterior. espaço desierarquizado onde todos os Festivais: intercâmbio de idéias

elementos cênicos são amarrados no processo moderno e ao jazz, criando um estilo pessoal, aleatório de seleção. Da sua vertente, represen­ cheio de energia, com linhas bastante defini­ tando uma nova geração, encontramos Karole das. O segundo nome é David Parsons (II Armitage (no mesmo festival). A bailarina Carlton Dance). Parsons explora o humor, os punk que alinhavou Balanchine à Cunning- efeitos cênicos e a preparação esportiva herda­ ham, ao rock, e à música oriental, tudo banhado da de Taylor. É parte de uma facção da dança asensualidadepós-modernaamericana.Três americana voltada ao entretenimento. Um dos anos depois, na 21- Bienal de São Paulo, Dou­ grandes responsáveis por esta gama de coreó­ glas Dunn, um dos mais influentes coreógrafos grafos humoristas é o grupo Pilobolus (II do pós-modernismo americano solidificado Festival Internacional). A dinâmica do movi­ nos anos 70, mostra como lançou para o futuro mento ágil e a experimentação dos encaixes de os ensinamentos de Cunningham, trabalhando, corpos humanos entre si e com objetos cênicos, por exemplo, o silêncio e a visualização musi­ constroem o perfil do grupo, misturando balé, cal. A chamada nova dança de Nova York, cuja dança moderna, expressão corporal, ginástica e alavanca básica foi inicialmente a técnica Cun­ acrobacia. Na linha direta descendente do Pilo­ ningham, chegouaoBrasilatravésdoProjeto bolus estão o grupo Momix (I Carlton Dance), Contatos Cênicos, organizado desde 1990 pelo o Iso (II Carlton Dance) e Bill T.Jones (IV grupo Contadores de Estórias, de Parati (RJ), Carlton Dance). conhecido internacionalmente pelo seu teatro Na verdade, a preparação dos bailarinos com bonecos. Em convênio com o Dance Thea- embasada em esportes não chega a ser uma "O homem é ter Workshop (DTW) vieram os coreógrafos raridade na década de 80. Molissa Fenley totalmente Doug Varone, David Zambrano, Donald Fle­ no I Carlton Dance já mostrava o resultado ming e Ralph Lemon (1990) e, no ano seguinte, responsável pelo da preparação aeróbica invejável aliada ao universo, pela sua a associação com o Performance Space 122, o cooper, estudando o movimento além dos história, pelo seu PS 122, trouxe Ron Brown, Sarah Skaggs, Jo- seus limites. Esta experiência nos remete nathan Stone e Grisha Coleman. ao grupo canadense La La La Human Steps futuro, pelos seus Abrindo novos caminhos na descendência ( V Carlton Dance) cuja preparação corpo­ deuses" da escola Graham, a Paul Taylor Dance ral exibe o mesmo virtuosismo muscular Martha Graham Company (V Carlton Dance), mostra o es­ com soluções coreográficas bastante vio­ tilo atlético, com a técnica impecável, que lentas. garantiu o sucesso de público. Dois grandes Na vertente americana batizada pela crítica nomes saídos da escola Taylor apontaram como expressionista, Alwin Nikolais apre­ diferentes caminhos a seguir. sentou no I Festival Internacional e no IV O primeiro é Twyla Tharp (III Festival In­ Carlton Dance, o estudo de luzes e cenários ternacional). Famosa por coreografar em busca da dança pura, independente dos musicais no cinema como Hair, Tharp pas­ próprios corpos dos bailarinos. No I Carl­ seia por várias técnicas do clássico ao ton ,uma de suas principais alunas, a D ançar 10 Anos

americana radicada na França, Carolyn Carl- Jean Michel Chalon exibiram na performance son, trouxeàcenaadançaminimalista, uma póswagneriana sobre a música de Karlheinz possibilidade de direcionamento da obra de Stockhausen, em 1988, no Rio de Janeiro. Neste Nikolais, que relaciona a coreografia a ou­ caso, os bailarinos-coreógrafos explicaram que tras artes e busca o movimento mínimo, a questão era a linguagem musical, uma coisa algumas vezes repetitivo. concreta a partir da qual a dança era apenas uma coadjuvante. No trabalho de Pina, as lingua­ Do diálogo entre a dança e as outras mani­ gens dialogam de igual para igual. Não há uma festações artísticas, em especial o teatro, mais importante. Acaba o prevalescimento da toda uma série de coreógrafos aqui estive­ linguagem verbal sob o gesto e vice-versa. A ram mostrando diferentes visões deste partir daí as possibilidades são infindáveis. E relacionamento. Há os mais tradicionais viável até mesmo, retornar à dança em suas como o inglês Michael Clark que satiriza particularidades como o fez SusanneLinke temas através do cenário e dos figurinos (visitou o Brasil em 1988). A partir do que mas quanto ao movimento em si, trafega aprendeucomPinanaescolaFolkwang,Linke pelo próprio vocabulário já estabelecido do fez um caminho de mão dupla. Recebeu a "Separado de seus balé. E verdadeiros prodígios como o belga formação em dança-teatro e voltou os olhos companheiros e Win Vanderkeybus, expoente da dança de novamente para a dança, preferindo trabalhá-la daquilo que eles seu país, que emergiu nesta década com em sua matriz: o gesto. Há a marca alemã em destaque. Vanderkeybus ( III Carlton Dan­ hão de vir a ser, o suaobra,umtrabalhodeenergiacriadodesde ce) trabalhou a linguagem teatral usando homem é apenas os pioneiros como Mary Wigman, e o toque situações psicológicas através de movi­ uma negação" dramático de Pina, mas em cena, a matriz é a mentos concisos e cotidianos, explorando dança. Charles Sanders Peirce oposições nas emoções e no gesto. Quando parece que já vimos tudo, no pró­ Este interesse pelo teatro mostra-se clara- prio IV Carlton Dance, a dança-teatro mente*uma vertente mais européia. Micha japonesa do grupo de butô Sankai Juku Van Hoecke (L’Ensemble) e Laura Marto- mostrou o que é relacionar corpo e verbo, rana (Terza Stanza), respectivamente no III vida e morte, modernidade e tradição, se­ e IV Carlton Dance mostraram como o balé gundo os padrões orientais, ou melhor, é capaz de diálogar com o teatro. Mas foi japoneses. sem dúvida a presença de Pina Bausch( IV O II Festival Internacional já havia trazido Carlton Dance) que provou como é possível o teatro kabuki e a tradição japonesa ( revi- instaurar uma nova estética, criando um sitada, uma vez que o kabuki já é uma novo gênero artístico: a dança-teatro. releitura do teatro nô, este sim ,a estética A partir da pesquisa alemã da escola Folk- mais tradicional). Kazuo Ono, no mesmo wang, a dança deixou de ser tratada apenas ano de 1986 mostrou a dança butô da pri­ com dramaticidade como Michele Noiret e meira geração (os criadores do estilo foram F estivais: pp intercâmbio : de idéias

Ono e Tatsumi Hijikata). Mas com Ushio Ama- século, Hijikata e Cunningham no pós-guerra, gatsu e o Sankai Juku, foi possível vislumbrar Pina Bausch e Amagatsu às vésperas fia mu­ a estética de um corpo cheio de sensações aos dança de milênio. olhos da pós-modemidade (a terceira geração butô). As bombas atômicas deflagraram o an- Neste contexto de interferências estéticas, koku butoh enquanto dança da crueldade, o especificidades e trânsito de informações, pós-modemismo e a tecnologia de primeira está o grande valor das investidas de Festi­ linha que fizeram explodir o Japão no mercado vais como o Carlton Dance e o Festival internacional, não despiram o corpo sacrificado Internacional. E tudo seria perfeito se a pela guerra da sensação da morte, mas tatuaram realidade fora do sistema estético instaura­ nele a sensação do poder. do por estes maravilhosos eventos não interferisse como agente corrosivo. Sem Em 1988, as Semanas de Dança Contempo­ apoio político e econômico interrompe-se o rânea Francesa, mostraram ainda, o que a processo. O ano de 1991, por exemplo, mer­ descentralização ( e não o esfacelamento gulhado na crise, sacrificou a vinda de artístico) é capaz de provocar no processo grandes artistas e os festivais experimenta­ "Componho uma de criação. A iniciativa política de desfazer ram o fracasso dos cancelamentos. Uma espécie de o circuito da capital fomentou novas pes­ verdadeira tragédia face à fragilidade a amálgama entre o quisas e a dança cresceu. A diversificação que está sujeito o público brasileiro, sem­ ser humano arcáico de estilos se fez regra como mostraram Re- pre tão distante das investidas e o homem gine Chopinot, Jean Claude Galotta (de internacionais. volta ao Brasil no V Carlton Dance), Domi- ultramoderno e nique Bagouet e, com maestria invejável, O processo de criação e a produção artística computadorizado" Maguy Marin. Marin, ex-solista da Compa­ estão inseridos nos pontos de tensão entre Gozo Yoshimasu nhia de Maurice Béjart relê a obra de Petipa arte, poder, comunicação , apoio político e trazendo a baila a sua "Cendrillon" em um econômico, de maneira vital. As coisas não cenário de personagens de brinquedo (bo­ vêm umas depois das outras, mas umas de necos), mascarados, com movimentos dentro das outras. Esta é a chave da poética quebrados, ligados por passos corretamen­ das linguagens e da criação estética. Fratu­ te encaixados e não estilizados. A rar a relação arte-poder é interromper o crueldade infantil transparece, no âmago fluxo de produção. do ser humano. O código é modificado mas a crueldade é a Que a crise dos anos 80 não se repita mesma que fascinou Artaud no começo do mais! ® Dançar 10 Anos HPr

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f “ ------Saulo Borges

A febre dos aglutinação da categoria em eventos organizada. A partir dessa experiência outras festivais invade o e encontros já havia começado nos foram se sucedendo: Inventores da Dança (os território brasileiro Aanos 70, mas a febre de festivais vai workshops de Ruth Rachou), São Paulo Dança, invadir o território brasileiro na década de a partir da década Semanas de Dança e Dançarinos-Coreógrafos, 80. No desenrolar histórico da ascensão e quase todos realizados no Centro Cultural São de 80 queda, dois eixos marcam essa Paulo na segunda metade da década de 80. É proliferação: um tem como parâmetro nesse período que vai surgir também o Movi­ expor a produção local e a extensão de sua mentos de Dança do Sesc Vila Nova. A crítica, reunir a criação e intercambiar a motivação básica deste evento é trazer a emer­ diversidade; um outro tem como princípio gência, a trajetória em gestação de artistas o estabelecimento da competição. Neste pouco conhecidos do grande público. Este é o caso, classificam-se os participantes em caso também do Dança Nova do Teatro Brasi­ categorias e os trabalhos em modalidades leiro de Comédia. sob a avaliação de uma comissão julgadora. No Rio de Janeiro, os Ciclos de Dança O primeiro desses eventos nacionais a co­ promovidos pelo antigo Serviço Brasileiro locar a troca entre dançarinos e coreógrafos de Dança do INACEN, no Teatro do Liceu, brasileiros como a marca mais evidente foi a Mostra de Novos Coreógrafos e os Fóruns a Oficina Contemporânea da Bahia, que da Dança no MAM ( Museu de Arte Moder- passou a existir como tal em 82. Organiza­ na ) tentaram cumprir seu papel de do pelo departamento de dança da incentivo à criatividade, numa cidade em Universidade Federal da Bahia, a Oficina que a tradição mede forças de forma brutal. buscava não reiterar a consagração mas es­ Outro exemplo de resistência artística é o timular o surgimento de novas idéias. São Dança Porto Alegre, que após os espetácu­ Paulo mostrou um evento com essa preocu­ los promove debates que se transformam pação mas apenas uma vez, em 86 : o "Dos em espaço de trabalho. Existe desde 88, Pés à Cabeça ", organizado por Maurice atendendo à dança da capital gaúcha, e re­ Vaneau, trouxe profissionais de pelo me­ velou um grupo para o Carlton Dance, o nos seis estados. A mostra se estendeu do Terpsí Teatro de Dança. Teatro Sérgio Cardoso ao antigo templo da Um outro bloco mescla convidados e esco­ dança paulista contemporânea, o Teatro las, e onde a esfera de influência é regional: . Constituiu-se num marco o Dança Alegrete (RS) tem como caracte­ importante pela forma abrangente, pelo es­ rística o congraçamento de toda a pectro estético que chegou a reunir numa comunidade; o Festival de Londrina (PR) rara situação da dança brasileira. tem a dança como fato importante o ano A capital paulista já se mobilizara anterior­ inteiro; e há aqueles em que a produção mente: o São Paulo Independente, em 83, amadora local é disposta de forma organi­ colocava no Teatro São Pedro toda a dança zada como o Dança Sul (Pelotas - RS), o Festivais: intercâmbio de idéias

Dança Cruz Alta (RS), o Festdança (São José Elba Nogueira, do Rio de Janeiro, sob o título Hoje o espírito é de dos Campos - SP), o de Campos de Jordão (SP), de Festival Nacional de Dança. Logo depois, estimular o o do Sesc de Nova Friburgo (RJ), o Encontro surgem os outros três maiores do país: o ENDA intercâmbio entre de Vitória (ES), o Entandan de São Luis (MA), ( Encontro Nacional de Dança), em São Paulo, os grupos locais e o de Campina Grande (PB) e o Ciclo de Dança o Festival de Joinville (SC) e o Festival do os coreógrafos do Recife (PE). Estes dois últimos com trajeto Triângulo de Uberlândia (MG), respectiva­ convidados histórico irregular mas com papel importante mente. na região norte-nordeste. Com os Gala Coreo- O primeiro começou como um encontro de gráfica, Ismael Guiser procurou reunir profissionais e amadores e alguma premia- bailarinos consagrados, não só do Rio e de São ção, mas em seguida se converteu Paulo, mas de outras capitais onde a dança especialmente em um evento competitivo clássica está implantada profissionalmente. num esquema de eliminatórias por todo o Mas a dança como uma forma de encontro estado, sob a direção da APPD (Associação também se instalou em Minas. O Festival Paulista dos Profissionais da Dança ). de Inverno da Universidade Federal de Mi­ O segundo, o de Joinville, iniciou-se com nas Gerais deu abrigo durante toda a pequeno porte, crescendo depois na quanti­ década para cursos e espetáculos, configu­ dade de participantes. Durante uma rando-se num evento particular por unir semana, bailarinos e grupos amadores se durante um mês das artes visuais às técni­ revesam em diferentes modalidades, sob a cas do cinema. Nesse mesmo clima de avaliação de uma mesa de especialistas. integração surgiu agora no início de 90 uma outra mostra patrocinada pelo Sesc de San­ A abertura do festival é a noite dos bailari­ tos. O que antes colocava a dança e a nos convidados; Joinville conseguiu ginástica como concurso, hoje o espírito é durante a década de 80 levar todas as com­ de estimular o intercâmbio entre os grupos panhias oficiais e os grandes grupos da cidade e os coreógrafos convidados. brasileiros a se apresentarem no palco do Ginásio Ivan Rodrigues. Este parece ser, aliás, a tendência desta década: a de conviver um tempo razoável De um número irrisório de interessados nos com a informação para apreender novos idos dos anos 80, Joinville implementou-se dados e torná-los parte de uma formação já na metade da década como um concurso que não se recusa à novidade. que chegava a quatro mil participantes e mais de 100 escolas. Q s Concursos Nacionais Um dos mais antigos deles é o do Conselho Brasi­ A existência do Festival do Triângulo é leiro de Dança. Foi fundado em 1979 pela mais recente. Começou em 87 mas seu cres­ seção brasileira do Conselho Internacional cimento também foi vertiginoso, atraindo de Dança da UNESCO, sob o comando de bailarinos de todo o país. Um ano depois de > D°n\ar 10 Anos Ê)

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São Paulo tem sua fundação tornou-se nacional, graças a Em São Paulo, a quantidade de eventos maior número de união entre a Associação das Academias de competitivos é bem maior do que o resto do eventos Uberlândia e a Secretaria Municipal de Cultura país. O Rommel Halpe antinge primordial­ que o apoia até hoje. Assim como em Joinvil- mente o público infanto-juvenil; os de competitivos le, o Festival do Triângulo também Osasco e o de Diadema têm alcance regio­ promove cursos e palestras para esclarecer nal; o MPB de Dança atua, por sua vez, com questões como , por exemplo, aquelas de temas musicais essencialmente brasileiros. cunho histórico, estético e de criação. Esta característica difere de todos os outros Em Belo Horizonte, o Concurso Mineiro de por estimular a utilização do repertório Dança tem conseguido também absorver a musical nacional na feitura dança amadora da cidade. dos trabalhos.

s T udo começou com amigos de faculdade. Na realidade era o futuro, Destino da vitalidade. Pessoas acreditavam, Pessoas desconfiavam, Éramos apenas jovens, Saídos da faculdade. Nossos objetivos já trilhávamos... Amigos, diferentes rumos, Mas para alguns, o sonho Nem sempre se torna uma realidade. O destino, uma corrente, Sempre caminhando para frente. A união se faz constante, Para se eliminar O que não é de se esperar. Da luta à fé, Acreditar no objetivo, Acreditar em pessoas, Até que já sem forças, Surge a recompensa. A fé se multiplica, O sonho se retoma. Caminhos diferentes, De cá e de lá. Mas, o objetivo se faz, Se forma, se transforma. Porém, sempre presente. O tempo passa. Trazendo novas idéias, Novos objetivos, Novas linhas, Sempre contribuindo com o tempo, Um universo de ideais. Dez anos se passaram: Dez anos de fé, Dez anos de trabalho honesto, Com força e maturidade. E tudo continua, Agora, a mais difícil das conquistas A faculdade da vida. A alegria e a felicidade, E o agradecimento maior a todos. E à Arte que é uma constante, E à vida que é apenas Uma pequena contribuição À história. Pedro Bianco