Só há um deus, Stálin, e Losurdo é seu profeta! A apologia ao capitalismo em Fuga da história?, de Domenico Losurdo

MÁRIO MAESTRI *

Resumo : O artigo empreende análise crítica do livro de Domenico Losurdo, Fuga dalla Storia? La rivoluzione russa e la revolucione cinese oggi, publicada em 3ª edição, em Nápoles, em 2012, pela Editora Scuola de Pitagora. O livro, apresentado em primeira edição em 1999, na Itália, foi publicado no Brasil, pela Editora Revan, em 2004, sob o título Fuga da história? A Revolução Russa e a Revolução Chinesa vistas de hoje. O artigo faz parte de revisão crítica da obra do autor, já realizada no que se refere aos livros Stálin : história crítica de uma legenda negra. (: Revan, 2019) e O marxismo ocidental : como nasceu, como morreu, como pode renascer (São Paulo: Boitempo, 2018). No particular, questiona o método, os processos e as interpretação sobre Revolução Russa e Chinesa e as comparação entre os dois processos, assim como as propostas gerais decorrentes dessa démarche . Aborda as origens político-ideológicas do autor e seus eventuais nexos com suas visões tardias. Palavras-chave: Marxismo, URSS, China. There is only one god, Stalin, and Losurdo is his prophet! The apology of in “Escape from history?” , by Domenico Losurdo Abstract : The article undertake a critical analysis of Domenico Losurdo's book, "Fuga dalla Storia? La rivoluzione russa e la revolucione cinese oggi" published in its 3rd edition in , in 2012, by "La scuola di Pitagora editrice". The book, first presented in 1999 in Italy, was published in Brazil by "Editora Revan" in 2004 under the title "Fuga da História? A Revolução Russa e a Revolução Chinesa vistas de hoje". The article is part of a critical review of the author's work, already carried out with regard to the books "Stálin: história crítica de uma legenda negra" (Rio de Janeiro: Revan, 2019) and "O marxismo ocidental: como nasceu, como morreu, como pode renascer" (São Paulo: Boitempo, 2018). In particular, it questions the method, the processes and the interpretation of the Russian and Chinese Revolution and the comparisons between the two processes, as well as the general proposals resulting from this démarche. It addresses the author's political-ideological origins and their possible links with his late views. Key words: ; URSS; China.

* MÁRIO MAESTRI, 72, é brasileiro e italiano. Viveu e estudou como refugiado, no Chile e na Bélgica, de 1971-77. Participou ativamente da Revolução Chilena. Graduou-se e doutorou-se em História pela UCL, Bélgica. Lecionou em instituições universitárias e cursos de Pós-Graduação no RJ e no RS. Tem livros publicados na Itália, França, Bélgica, Paraguai e Brasil. E-mail: [email protected] * Agradecemos a leitura da linguista italiana Carboni.

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Em Domenico Losurdo : um farsante os encadeamentos de propostas na terra dos Papagaios , ensaiamos axiomáticas, alienadas da realidade crítica aos livros Stálin : história crítica histórico-objetiva, sem explicitação dos de uma legenda negra e Marxismo nexos internos e necessários dos Ocidental: como nasceu, como fenômenos. O autor reclama igualmente morreu, como pode renascer , do da personalização do estalinismo em italiano Domenico Losurdo, definido Stálin, mas tende a explicar os sucessos por alguns como pensador marxista históricos a partir da ação de V. Lênin, extraordinário. (MAESTRI, 2020; J. Stálin, L. Trotsky, Mao Tsé-Tung, LOSURDO, 2019; LOSURDO, 2018.) Deng Xiaoping etc. Dá pouquíssima Fomos impugnado em nossa crítica do atenção à luta de classe em suas autor italiano devido a termos analisado interpretações. Há no autor enorme apenas os dois ensaios citados, mesmo desprezo pelos trabalhadores e sendo o primeiro seu trabalho de maior permanente negativa da necessária repercussão e, o segundo, sua última centralidade operária na orientação do publicação e, consequentemente, a devir da humanidade. atualização de suas invectivas contra o marxismo revolucionário. O livro constitui-se de reunião de artigos esparsos e algumas entrevistas Analisamos agora Fuga da História ? sobre, no geral, os mesmos temas. As revoluções Russa e Chinesa vistas Devido ao permanente retorno a de hoje , livro publicado em primeira questões já analisadas, em geral com os edição, na Itália, em 1999 e, em mesmos argumentos, optamos por uma terceira, revista e ampliada, em 2012. discussão dos temas abordados, e não Ou seja, esse seria o primeiro trabalho pela crítica sequencial do texto. As em que o autor apresenta citações traduzidas ao português, a sistematicamente o “socialismo chinês partir da edição italiana de 2012, são de de mercado” como o “caminho de nossa responsabilidade. (LOSURDO, Damasco” do movimento socialista 2012.) Consultamos igualmente a revolucionário. Estrada possível de ser segunda edição, de 1999. O acréscimo trilhada, segundo aquele autor, após os de páginas da terceira edição em relação “marxistas ocidentais” superarem as à primeira e à segunda deve-se pretensas derrapagens milenaristas, sobretudo à diagramação e ao maior utópicas e místicas de viés “judaico- corpo da letra. (LOSURDO, 1999.) cristão” de Marx, Engels e seus seguidores, como veremos. Impugnação do marxismo revolucionário que 1. O marxismo judaico-cristão, o Losurdo apresenta sobretudo em utopismo bolchevique, o fim da URSS Marxismo Ocidental. Em 1989-91, segundo Losurdo, com a Como diversos autores apontam, Fuga explosão da URSS e das ditas da História ? prima pela ignorância das “Democracias Populares”, militantes determinações econômicas dos comunistas teriam aderido através do fenômenos sócio-políticos e pela mundo aos vencedores, renegando a superficialidade da argumentação e dos história do “socialismo real” como um argumentos, apoiados estes últimos todo. (LOSURDO, 1912, p. 23 et seq. ) comumente em premissas incorretas, Sempre segundo o autor, em releitura das quais se deduzem conclusões religiosa do passado, eles propuseram lógicas. Também neste ensaio abundam retorno às origens, a Marx e a Engels,

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cultuando apenas os revolucionários das violências e dos crimes do grande “derrotados, que não puderam participar capital, impugna as denúncias e críticas da gestão do poder”, como Gramsci e dos crimes e das violências do Ernesto Che Guevara. (LOSURDO, estalinismo. Impugnação na lógica do: 1912, p. 27 .) Esquece que Guevara foi se eles — o imperialismo e o grande ministro da Economia e Presidente do capital — fizeram, por que o Banco Central de Cuba. (CORMIER, p. estalinismo não podia fazer? “(…) 272 et seq. ) Para o autor, após os elevavam-se a 2.500 as vítimas dos sucessos da praça de Tiananmen, em trágicos eventos (sic) de 1956 (na 1989, em Pequim, os comunistas Hungria); nove anos antes, em inícios “autofóbicos” destacariam-se pelas de 1947, a repressão” pelo Kuomintang críticas à China, única nação que seria — nacionalistas chineses —, em capaz de defrontar o projeto do “novo Taiwan, “apoiada pelos Estados século americano”. O italiano ”, causou a “morte de 10.000 praticamente esquece as críticas do pessoas.” (LOSURDO, 2012, p. 48.) marxismo internacionalista, desde 1923, à burocratização da URSS e aos crimes As esdrúxula reflexão lusordianas tem do estalinismo, ou os ataques da direita, sido contestadas por autores de com destaque para o “eurocomunismo”, múltiplas orientações, como, entre a partir dos anos 1970. (TROTSKY outros, o historiador marxista- 1963. p. 443-644; CARRILLO, 1977.) revolucionário Jean-Jacques Marie, reconhecido internacionalmente como Os comunistas renegados abraçariam a especialista na história da URSS e do interpretação imperialista da “implosão” movimento comunista. (MARIE, 2020.) da URSS, devido às fraquezas e Carlos Lopes, por sua vez, define contradições do socialismo. Losurdo Losurdo como “autor (pouco) preciso” defende, ao contrário, que o “colapso” e “neo-hegeliano” e impugna ou “implosão” da URSS deveria-se igualmente o uso do princípio jurídico essencialmente à pressão imperialista do “ tu quoque ´”, pelo qual “uma parte durante a Guerra Fria (1947-1991). que desrespeitou os termos de um (LOSURDO, 2012, p. 31, 33.) contrato não pode exigir de outra o Apresenta as razões particulares da respeito aos termos do contrato”. vitória dos USA sobre a URSS: entre (LOPES, 3.03.2019.) Losurdo parece elas, terem obtido a bomba atômica por ignorar que os crimes do imperialismo primeiro e terem realizado ataque dão-se segundo sua natureza e suas “ideológico-propagandístico” terrível, necessidades, para impor a ordem do com destaque para o uso da rádio, grande capital. E que os crimes do instrumento “capaz de transmitir em estalinismo deram-se violando a todas as diversas línguas da União natureza do marxismo revolucionário, Soviética”, usado para “desagregar a para impor a ordem burocrática sobre o base social de consenso do regime poder dos trabalhadores. soviético.” (LOSURDO, 2012, p. 40.) Seguindo o argumento de que, se o Domenico Losurdo denuncia imperialismo fez, o estalinismo podia longamente o imperialismo por ser … também fazer, o italiano empreende o imperialista e ter duas caras e duas amálgama inaceitável entre medidas, que usa segundo seus “estalinismo” e J. Stálin, de um lado, e interesses! Qualquer coisa como o “marxismo”, o “bolchevismo” e descobrir a roda. E, com a apresentação Lênin, de outro. “(…) pode-se sustentar

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que os crimes de Lênin (sic) e de Stálin emancipação dos trabalhadores. Tudo são piores de aqueles em que Clinton se no contexto da luta pela construção de manchou?” (LOSURDO, 2012, p. 62.) uma organização socialista supra- Identifica, assim, a direção compartida nacional da economia e da sociedade. de Lênin com o comitê central Uma nova ordem que marche em bolchevique, em defesa da revolução, direção do fim do trabalho alienado, da aos atos criminais e não raro dissolução do Estado como órgão de monocráticos de J. Stálin contra o constrição social, do avanço do governo soviético dos trabalhadores. socialismo e, no horizonte histórico, do Para ele, os atos de V. Lênin e de J. comunismo. Essas visões horrorizam Stálin foram idênticos e desculpáveis Domenico Losurdo e, ainda mais, que, devido à “permanente situação de em O Estado e a Revolução, V. Lênin excepção” vivida pelo “regime reafirme aqueles princípios, para o soviético”. (LOSURDO, 2012, p. 52.) italiano próprios ao anarquismo. (LOSURDO, 2012, p. 92; LÊNIN, No mundo das ideias 2012.) A critica do italiano ao marxismo Domenico Losurdo defende revolucionário é a mesma avançada explicitamente que a derrota da URSS pelos menchevique já nos primeiros foi mais ideológica e cultural do que tempos da Revolução de econômica, material. “Seria entretanto Outubro.(CARR, 1964. p. 118.) errado super-avaliar o papel da economia naquele sucesso.” O “choque Para Losurdo, ao contrário, a função multi-midiático e ideológico teve um dos revolucionários marxistas, após papel essencial (…).” (LOSURDO, despir-se da utopia, do messianismo e 2012, p. 43, 70, 33; NUNES, 2014.) “Se do milenarismo , é estabelecerem-se houve um colapso na Europa Oriental, como “novo grupo dirigente” propondo ele é ideológico, muito mais do que uma “espécie de pacto” “com a nação econômico.” (LOSURDO, 2012, p. 74.) na sua totalidade” — ou seja, sem E avança explicação culturalista para a exceções de classes. (LOSURDO, 2012, desagregação da base do consenso p. 161-2.) Em Fuga da História , ele social na URSS. Para ele, a causa desdobra-se na defesa da nação , do primeira da debacle fora o nascimento Estado e da necessidade da associação do marxismo impregnado do com a burguesia nacional e milenarismo, utopismo e misticismo de internacional, por um longuíssimo viés “judaico-cristão” de Marx e período, antes do hipotético início da Engels, como assinalado. (MAESTRI, construção do socialismo. Ou seja, 18/02/2020.) E o horror causado pela I capitalismo, agora, socialismo, algum Guerra Mundial (1914-1918) teria dia, quem sabe. Em janeiro de 1918, na consolidado aquelas visões utópicas e Rússia, importante dirigente messiânicas entre as lideranças bolchevique respondia a deputado revolucionárias marxistas e direitista na natimorta Assembléia bolcheviques, desorganizando o Constituinte: “Mas de que socialismo processo revolucionário como um todo estamos falando?” “Do socialismo que — sempre segundo Domenico. chegará em duzentos anos e será conhecido por nossos netos?!” Para o marxismo revolucionário, o LOSURDO, 2012, p. 118.) objetivo da revolução é a vitória sobre a ordem nacional-burguesa e o início, no Para Losurdo, os bolcheviques teriam “aqui e no agora”, do governo e da conquistado o poder para “assegurar ao

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camponês a terra”, ao “povo” “pão e Esta última apresentada como “sistema paz” e a “igualdade das diversas científico relativamente completo, que nacionalidades que constituem o imenso abraça a filosofia, a economia política, país (sic).” (LOSURDO, 2012, p. 161- o socialismo científico (…) a ciência e a 2.) E nada mais. No contexto de tecnologia (…)”. Seu perfeito estudo revolução necessariamente burguesa, permitiria ao homem bater asas e voar, não deveriam ter avançado, como atravessando os oceanos. (BUCHARIN; fizeram, a expropriação da burguesia e a PREOBRAZENSKIJ, 1973. p. IX.; construção do socialismo em uma ZEMIN, 2000. p. 12.) União de Repúblicas Socialistas Rompendo o pacto nacional Soviéticas, de claro viés internacionalista. Essa impugnação do Para Losurdo, o primeiro “pacto” italiano era, precisamente, como já bolchevique, de 1917, rompido com a proposto, a tese-base dos marxistas guerra civil, em 1919, restaurado com a europeus e russos reformistas e NEP, em 1921, teria sido desrespeitado pacifistas em 1917. Tese combatida e novamente em 1928, com a impulsão superada por V. Lênin nas célebres pela burocracia sob a direção de J. Teses de Abril e impugnada, desde Stálin da industrialização acelerada 1906, por León Trotsky, em seu livro apoiada na coletivização forçada do 1905 : balanço e perspectivas . campo. O autor justifica aquelas (LÊNIN, 2018; TROTSKY, 1963.) iniciativas devido à necessidade de alimentar as cidades e, sobretudo, da O pretenso pacto proposto, realizar uma URSS preparar-se para a guerra. “(…) revolução nacional , sem exclusão da ao horizonte se anunciava sempre mais burguesia nacional russa e do grande ameaçadora a sombra da guerra: era capital internacional, desrespeitado necessário preparar-se com um segundo Domenico devido às adequado processo de industrialização necessidades da Guerra Civil (1919- (…).” (LOSURDO, 2012, p. 162.) 1921) e do Comunismo de Guerra, teria sido restaurado com a NEP, em 1922. Como é habitual ao italiano, para apoiar Portanto, para ele, os trabalhadores seus argumentos, ele embaralha datas e deveriam se submeter ,sem reclamar, fatos. A operação de 1928 deveu-se ao por décadas se fosse necessário, a medo da burocracia de restauração condições de vida mais duras que antes capitalista em marcha que poria fim a da Revolução, para assegurar a aliança ela e a seus privilégios. O programa da com a “burguesia nacional”, com o Oposição de Esquerda defendia, desde capital internacional, tudo para 1923, a industrialização acelerada da desenvolver as forças produtivas URSS, em forma planejada, e era materiais. Desenvolvimento que propõe acusado de “romantismo industrial”, de como o alfa e o ômega da revolução e “super-industrialista”, de desconhecer do ordenamento social, seguindo as necessidades dos camponeses, pela estritamente o abecedário da facção de direita do PCUS, comandada restauração capitalista na China. “O por N. Bukharin, e pela burocrática, sob objetivo essencial do socialismo é o a direção de J. Stálin. (BUCHARIN; desenvolvimento das forças PREOBRAZENSKIJ, 1973; DAY, produtivas”, pontificava Jiang Zemin, 1979; TROTSKI, 1923C.) E a guerra no 15º Congresso do PCC, ao elevar às chegou à URSS apenas em 1941, treze estrelas os elogios à restauração anos após 1928, dezoito anos após capitalista e à “teoria” Deng Xiaoping. 1923!

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Para Losurdo, a coletivizarão do campo residências e cultivassem parte da área teria rompido o pacto com o para o consumo próprio e para o livre campesinato e com as minorias mercado. Os anos seguintes foram nacionais. Entretanto, o autor não se marcados pela disputa pela ampliação detém sobre o desastre terrível ensejado da propriedade privada do parque de pela industrialização acelerada e a máquinas agrícolas (…). Na esteira coletivização forçada, realizadas a desta mudança outras aconteceram, não facão, sem planejamento, sem somente na agricultura, mas também no condições materiais mínimas, etc. sob a âmbito das empresas estatais, que direção da burocracia estalinista. O passaram a ter mais autonomia em desastre econômico geral ensejou relação ao planejamento central. Fruto enorme e desnecessária oposição nas desta relação entre a dinâmica externa e cidades, em facções da burocracia e interna, as classes sociais foram sendo sobretudo entre os camponeses. recriadas na URSS e, com elas, os Oposição à qual a burocracia interesses de classes.” (NUNES, 2014.) respondeu, com correções de rota e, Stálin, demiurgo da História sobretudo, com repressão fluvial que deu origem ao estalinismo — o Grande Em singular personalização da história, Terror (1934-1938). (TROTSKY, 1963, o “Pai dos Povos” é apresentado como p. 464, 490, 539.) Um desastre social demiurgo da vitória contra o nazismo. O monumental, causado pela burocracia autor oblitera o massacre ordenado por estalinista, que serve ao autor para J. Stálin, em 1937, da nata das forças justificar a existência e os crimes da … armadas soviéticas: 45 mil oficiais burocracia estalinista! presos, 15 mil fuzilados. O estalinismo teria matado mais generais soviéticos do A “unidade nacional” teria sido que os nazistas durante a guerra! recomposta, sempre segundo (MARIE, 2011, 476 et seq.) E Domenico, quando da invasão da URSS Domenico ignora o desconhecimento pelo exército alemão, em 1941, com a pelo “marechalíssimo” de em torno de decretação da “Grande Guerra oitenta avisos sobre a iminência do Patriótica” pelo estalinismo, que define ataque nazista e sua relutância em como “política de unidade nacional”, determinar contra-ofensiva, obrigando para “defender a independência do país” os aviões soviéticos a permanecerem e salvar “todas as nacionalidades” do em terra e a artilharia a manter-se nazismo. Em verdade, a orientação calada, por 24 horas. Tudo por acreditar patriótica estalinista ensejou recuo nas que o ataque era provocação de oficiais medidas socialistas e facilidades para a nazistas querendo obrigar Hitler a economia pequeno-mercantil; romper a palavra dada a ele, Stálin! reconhecimento da Igreja Ortodoxa (MARIE, 2011. 562; PERRAULT, como religião nacional; dissolução da 1967.) Ações que contribuíram para o III Internacional, etc. peso terrível que custou a vitória dos trabalhadores soviéticos em armas sobre Em crítica ao Fuga da história?, o o nazismo: mais de dez milhões de historiador Sidemar P. Nunes refere-se mortos. ao “pacto” patriótico estalinista: “(…) o Estado soviético fez algumas O novo pacto nacional estalinista teria concessões aos kolkhozes (…), sido abandonado devido às exigências permitindo que os camponeses se da Guerra Fria (1947-91), sem que ele tornassem proprietários de suas explique o porquê. O pacto seria

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liquidado totalmente, em 1956, por N. muito limitada dos anseios da Kruschev, com a denúncia dos crimes e população e dos objetivos de 1917, “demonização” de J. Stálin — sempre devido à situação semi-explosiva que o segundo Losurdo. (LOSURDO, 2012, país vivia. Movimento que não p. 162: Ascesa e declino dello democratizou o poder e esmoreceu após stalinismo, 2012.) O que teria criado os sucessos da Hungria, em 1956, e na uma “crise de identidade” e um “vazio Era Brejnev (1964-1982). Para o histórico” na população da URSS, italiano, o novo pacto utópico e traumatizada, ou coisa parecida, com a messiânico teria levado à “Revolução de Outubro”, em 1917; com desorganização e à indisciplina da a Guerra Civil, em 1919; com a “fábrica” soviética, em uma sociedade coletivização dos campos, em 1928; que veria no comunismo o “ócio com a denúncia de J. Stálin, em 1956 — generalizado”. Prevaleceria naquele esta última teria retirado a confiança contexto um “difuso clima ideológico” popular no demiurgo de aço da vitória que levava a caracterizar como sobre o nazismo, segundo o italiano. “restauração do capitalismo” qualquer Aproveitando aquele vazio, N. tentativa de “racionalização do processo Kruschev propusera um “novo pacto produtivo”. Dos dias de gloriosa e totalmente irrealista” e “mirabolante”, acelerada construção do socialismo sob segundo os disparates utopistas e o chicote de J. Stálin se passara ao messianismo de Marx e Engels , carnaval do ócio e da prodigalidade da superados anteriormente pelo Era Malenkov-Kruschev! (LOSURDO, estalinismo. (LOSURDO, 2012, p. 163- 2012, p. 74; Idem . 2008, p. 246 et seq. ; 4.) FRYER et al ., 2006)

O autor não se refere às razões sociais, Ódio aos trabalhadores econômicas e políticas da Losurdo defende, nos fatos, a volta aos desestalinização controlada e das níveis de consumo e aos códigos medidas de descompressão limitada draconianos de trabalho, com os tomadas já por G. Malenkov (1902- campos de trabalho forçado, da Era 1988), no comando da URSS em 1953- Estalinista (1934-53), como solução 1955: anistia de presos; controle da para uma crise econômica que propõe polícia política; fim dos “processos de origem ideológica! Na sua visão de secretos” e das condenações, mundo, os trabalhadores deveriam ser deportações e execuções sem explorados, até o limite de suas julgamento; fim das penas familiares e energias, com métodos autoritários, nas coletivas; melhorias do código e da fábricas e nos campos de trabalho disciplina de trabalho estalinistas; forçado estalinistas, que ele define sem limitações das desigualdades quanto à pestanejar, em alguns de seus alimentação, moradia, salário, pensões; momentos, quase como campos de maior produção de bens de consumo; veraneio e formação profissional! retorno ao regime de quarenta horas de Qualquer coisa como parques Disney no trabalho! (DEUTSCHER, 1961. p. 9 et Ártico! (LOSURDO, 2008, p. 246 et passim .) seq. ) O fim da URSS deveria-se, portanto, ao Segundo Losurdo, na nova ordem abandono do “pacto nacional”, após a burocrática pós-estalinista, nascida da morte de J. Stálin, pelo “pacto social” morte do “Pai dos Povos”, engambelada de Malenkov-Kruschev, com a acolhida pelas promessas utópicas, que jamais se

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realizavam, no contexto da gestão por outro, imposto na China atual. O burocrática, etc., a população soviética autor abraça firme a visão de que caíra no desânimo, perdera a “pouco importa a cor do gato desde que consciência socialista conquistada no ele capture o rato”. estalinismo, permitindo a vitória político-ideológica da propaganda do Nação, nacionalismo, Estado grande capital. Aí estaria a razão da Em um viés burguês oitocentista, indiscutível “implosão” da URSS, já Losurdo trava batalha de retaguarda, que se deu sem ataque militar do defendendo a necessidades eternas da imperialismo e da OTAN, como se “nação”, território multi-classista de esperava. exploração do mundo do trabalho, e do O autor nega a estagnação econômica Estado, órgão de constrição social dos conhecida pela URSS e pelas “de baixo” pelos “de cima”. “Democracias Populares”, ensejada pela Compreende-se sua ojeriza às propostas administração burocrática e parasitária, marxistas de organização internacional pela falta de autonomia dos dos países de economia nacionalizada e trabalhadores, pela organização planificada e de superação da opressão nacional da economia e sociedade dos de classe e do próprio Estado, mesmo Estados operários, etc. como motivo no horizonte histórico. Nação e Estado central da ruptura do consenso social. construídos sobre as costas e com o suor Paradoxalmente, foram o capital e o de trabalhadores sem futuros, imperialismo que avançaram mais, em verdadeiros inimigos do italiano, já que um sentido patológico mas real, a eternamente querendo trabalhar um internacionalização da produção — pouco menos e viver um pouco melhor. globalização — proposta pelo marxismo Losurdo propõe que o Partido revolucionário e anatematizada pelo Bolchevique soubera construir uma “socialismo em um só país”. teoria para o assalto ao poder, mas A defesa lusordiana da constrição jamais dispusera de teoria de permanente dos trabalhadores para o administração do poder, ao se engolfar crescimento da produção impugna nos, para ele, sonhos da construção qualquer organização soviética da socialista e da luta internacionalista. sociedade ou democracia operária. Avança como outra prova dessa Domenico define os órgãos soviéticos incompetência política de Lênin e de de poder como romantismo próprio aos seus pupilos a incapacidade de primeiros tempos da revolução, que construírem teoria, para a URSS, de deve dar passo a uma ordem madura e gestão das relações com as Democracias autoritária governada desde o alto , já Populares, com a Iugoslávia, com a que o arrocho do mundo do trabalho China, etc. fora de ótica hegemônica. oporia os dirigentes à base . Os Também aqui, jamais aborda essas dirigentes devem manter a autonomia contradições nacionais como produtos de mando e apenas um elo político e necessários da proposta de construção ideológico com os de baixo. Ou seja, isolada das sociedades e economias dos nada de beijos e abraços entre dirigentes Estados operários, segundo a doutrina e o proletariado, na ordem socialista nacionalista “do socialismo em um só abençoada pelo italiano. Visão que país”, em oposição ao princípio de justifica o autoritarismo burocrático- superação internacionalista das nações, estalinista, por um lado, e o capitalista, no contexto de suas singularidades.

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As razões da destruição da URSS e dos Engels e seus epígonos, como vimos. Estados operários são imputadas a Portanto, o uso da categoria “processo insuficiências e a enganos da aplicação de aprendizagem”, sugerida pelo do marxismo, como teoria, ocorridas no italiano, exigiria, por um lado, a “des- mundo das idéias, e, jamais, como demonização de Stálin” e, por outro, idéias e políticas nascidas no contexto logicamente, a “descanonização de das classes em luta, quando dos fluxos e Marx e de Engels” e, por consequência, refluxos da revolução mundial. Como dos teóricos marxistas “clássicos”. proposto, o autor quase ignora as (LOSURDO, 2012, p. 155.) Portanto, os determinações econômicas e da luta de marxistas e revolucionários de hoje classes em suas interpretações sociais e devem deixar de lado tudo que históricas. “O livro não apresenta aprenderam e voltar à escola, para análise propriamente econômica, que “reeducação” segundo a métrica deveria ser a base de uma abordagem lusordiana. marxista”— lembra com razão o já Domenico propõe, sem enrubescer, por citado S. Nunes. (NUNES, 2014.) um lado, refundar o marxismo com a As traições ao marxismo e os crimes da sua louvação da URSS dos tempos do burocracia contra o poder soviético não “Guia Genial dos Povos” e da China de seriam decorrências da luta da Deng Xiaoping. E, por outro, com o burocrática para impor seus privilégios envio por correio expresso de Marx, sociais, como proposto sobretudo pelos Engels e dos teóricos-combatentes do “trotskistas”. “Como é sabido”, a marxismo internacionalista para a questão da “revolução traída” foi “um lixeira da história. Como o italiano tema particularmente caro a Trotsky” — deixou claro, também em O marxismo pontifica o italiano (LOSURDO, 2012, ocidental , igualmente sem pejo, ele não p. 129.) Losurdo corrige esse erro de só anuncia a morte do marxismo mas a interpretação . “Para limpar o campo da sua restauração losurdista! Portanto, pseudo-explicação do tipo idealista” gritemos, todos: "La illa Allah devemos “substituir a categoria de Muhammad rasul Allah! ” — Só há um traição” pela “de aprendizado”. deus, Stálin, e Losurdo é seu profeta! (LOSURDO, 2012, p. 90.) Deslizes Losurdo anti-comunista e pró- como a traição da revolução alemã, imperialista espanhola; o Grande Terror (1934-38); É descomunal a pretensão de Losurdo os Processos de Moscou; o Pacto Stálin- de se levantar como profeta da Hitler, etc. seriam “erros” de restauração do marxismo. Logo ele que “aprendizagem” da gestão de Estado jamais tirou o pezinho do bem pago operário atacado pelo imperialismo e, mundo acadêmico italiano. E, mais portanto, compreensíveis e ainda, com um passado deveras desculpáveis. Estranho abandono do comprometedor, sobre o qual pouco se mundo das explicações idealistas! sabe e pouco se fala. Por longos anos, o A terrível crise histórica que vivemos italiano teria apoiado ativamente a não seria resultado da resolução da luta campanha contra a URSS, contribuindo, de classes em desfavor do mundo do assim, mesmo em forma infinitesimal, trabalho, mas de erros de gestão política para sua “explosão”, que lamentaria, por falta de experiência. Erros décadas mais tarde, com lágrimas de motivados em grande parte por teoria crocodilo. Mas vamos aos fatos que de raiz judaico-cristã criada por Marx e esperam elucidação ainda mais precisa.

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Domenico Losurdo teria despontado na seria, com propunha aquele partido, política como admirador fervoroso, já entre o “proletariado e a burguesia”. não tão jovem, de Mao Tsé-Tung e de Trataria-se de questão nacional. seu “pensamento”, do “Grande Salto Adiante” e da “Grande Revolução Losurdo e Martelli exigiam o abandono Cultural Proletária”, iniciada em 1966, da luta de classe nas fábricas e da quando já tinha 27 anos. Não sabemos mobilização anti-capitalista e anti- quando aderiu ao Partido Comunista da imperialista na Itália. Impugnavam a Itália (marxista-leninista) — PCd´I (m.- consigna do PCd´I (m.-l.) de “controle l.) —, formado, em 1966, por militantes operário e popular sobre os centros operários rompidos com o PCI e por vitais da economia” e de formação de jovens radicalizados. (Note su conselhos de fábrica. Os dois filósofos Domenico Losurdo, 2009.) O PCd´I defendiam que os trabalhadores italianos deveriam ficar quietos e (m.-l.) foi o principal movimento obedientes, pois haveria um combate maoísta italiano, reconhecido pela muito, mas muito mais sério do que a China e pela Albânia, que teria reunido, luta de classes. Ou seja, a defesa da nos melhores momentos, em torno de nação e do Estado italianos. O que é, vinte mil militantes. (DUBLA, s.d.) vimos, uma fixação permanente de Losurdo jamais teria participado da Losurdo. Mas, a defesa da Itália, por direção máxima dessa organização. todos, como um todo, contra quem? Integrou, entretanto, o comitê nacional Contra a URSS que, em conluio com o de redação de Nuova Unità , semanário PCI, estaria procurando a “instauração do PCd´I (m.-l.) que antecedeu a sua de um ditadura aberta social-fascista” fundação. Já em 1975, com outros no Bel Paese! Diante da ameaça da militantes, encontrava-se em dissidência invasão soviética, defendiam o com a direção do partido. Em 1976, ele fortalecimento das forças armadas e Michele Martelli, também filósofo e italianas, da OTAN e tratar as tropas de professor universitário em Urbino e ocupação estadunidenses na península , foram expulsos do PCd´I (m.-l.) como parte do esforço para a “guerra de Em 21 de dezembro daquele ano, a resistência nacional” contra a URSS e o redação de Nuova Unità respondeu, PCI. Os redatores do artigo de Nuova com o artigo “Teóricos da servidão”, ao Unità lembravam aos dois que, se os documento mimeografado no qual os militante do PCd´I (m.-l.) defendessem dois acadêmicos apresentaram suas tais propostas, seriam considerados dissensões políticas com o PCd´I (m.- pelos trabalhadores como “anti- l.). ( Nuova Unità , 21/12/1976.) comunistas e contra-revolucionários”. Formulação elegante para não As razões políticas dos dois professores caracterizar os dois catedráticos como são assustadoras. Losurdo e Martelli tal. acusariam a direção do PCd´I (m.-l.) de privilegiar a luta política contra o A proposta da URSS como ameaça à imperialismo estadunidense; contra a “independência nacional” da Itália e da Democracia Cristã, o principal partido Europa e a necessidade de união da burguesia italiana; e contra o MSI, o nacional dos trabalhadores com o mais forte movimento neo-fascista imperialismo, a burguesia e os fascistas peninsular, envolvido em conspirações em defesa da independência italiana não e atos terroristas. Segundo eles, a era alucinação restrita aos dois contradição política dominante não professores de filosofia. Ela traduzia,

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para a Itália, a aliança anti-URSS, entre Losurdo e Martelli subscrevem Pequim e Washington, consagrada em efetivamente a definição do apoio 1971-2, quando do anúncio e a seguir a internacionalista ao MPLA, por parte visita de Nixon à China. E, o que era da URSS e de Cuba, como, péssimo, ficou ainda pior. Após os respectivamente, ação do “social- beijos e afagos com Nixon, Mao Tsé- imperialismo soviético” e de “suas Tung e o Partido Comunista Chinês tropas mercenárias” — isto é, os interromperam o apoio a movimentos internacionalistas cubanos —, que de libertação nacional através do mundo constituiriam a agressão mais “grave” e passaram a combatê-los, quando era jamais conhecida na “história do necessário para enfraquecer a URSS. movimento de libertação nacional na África desde o fim da segunda guerra Aquele acontecimento inesperado mundial”. Ou seja, os professores dilacerou o movimento marxista- apoiavam, sem pestanejar, não apenas leninista através do mundo, com o ataque imperialista à URSS como a destaque para a Itália, onde ele era contra-revolução em Angola. Mais de profundamente anti-imperialista. Desde dois mil combatentes voluntários o fim da Segunda Guerra, a Itália seguia internacionalistas cubanos morreram ocupada por tropas estadunidenses e a Democracia Cristã era expressão direta enfrentando sobretudo tropas da da política ianque no país. Aquela África do Sul. (PESCE, 11/1976, p. 204.) reorientação levou a direção do PCd´I Em documento da mesma época, (m.-l.) a iniciar rompimento com Mao posterior a expulsão, assinado pelo Tsé-Tung e com o PCC, sob a pressão Comitê Provincial de Pesaro-Urbino, ou de suas bases. seja, Losurdo, Martelli e alguns outros poucos militantes daquele organismo Losurdo e Martelli apresentaram regional, retomam a proposta anti- crítica por escrito ao que definiram comunista e pró-imperialista do “social- como “Ataque à política exterior da imperialismo” da URSS como a maior República Popular Chinesa” da ameaça à humanidade e a bondade da direção revisionista do PCd´I (m.-l.). política externa chinesa, contra ventos e No documento, defendem a aliança de maré. Nesse momento, o processo de Pequim e Washington contra a URSS, restauração capitalista já se consolidava produto do “potente” “pensamento de no país e se transformaria em política Mao Tsé-Tung”. Justificam as relações oficial, dois anos mais tarde, em exteriores do governo chinês com dezembro de 1978, com Deng “este ou aquele país”, sem se Xiaoping , como veremos. referirem ao apoio do PCC ao governo ditatorial de Pinochet, no Chile, em No documento, após saudação aos 1973. Apresentam o “social- “quatro grandes mestres do proletariado imperialismo” soviético como o mundial — “Marx, Engels, Lênin e grande inimigo e definem o FNLA e a Stálin”, à “grande Revolução Cultural Unita como movimentos de libertação, Proletária” e a Mao Tsé-Tung como o grupos terroristas financiados “maior marxista da era contemporânea”, reafirma-se o “social imperialismo respectivamente pela África do Sul- soviético” como o “principal foco de USA e pelo Zaire-China, responsáveis guerra” de então e nega-se sua pela morte de milhares de angolanos. equiparação aos Estados Unidos.

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(PESCE, 11/1976, p. 205-208.) A Nos anos oitenta, Domenico Losurdo, seguir, Domenico Losurdo teria em radical transformismo, colocou-se à continuado, por anos, como garoto sombra do então poderoso Partido propaganda da política internacional Comunista Italiano, já plenamente chinesa contra a URSS, próximo a embrenhado no “euro-comunismo”, ou micro-organizações marxistas-leninistas seja, na colaboração de classe defendida italianas incondicionais da China. pelo italiano anteriormente, em nome do combate ao “social-imperialismo” da Em 4 de novembro de 1978, já como URSS. Deixando de lado tudo de mal membro do fantasmagórico e pró-chinês que dissera daquele partido Partido Comunista Unificado da Itália “revisionista” e aliado privilegiado da (marxista-leninista), de Osvaldo Pesce, então por ele odiada URSS, passou a Losurdo tentou proferir, em nome de escrever gentis artigos no prestigioso uma “Associação Itália-China”, jornal, já muito longe de sua passado conferência em defesa da “acerto” da “marxista-leninista-pensamento do política externa do PCC, em Livorno, presidente Mao Tsé-Tung”. cidade vermelha e operária. Apenas começava sua defesa da teoria maoísta Quando a URSS e o PCI ruíram, o dos “três mundos”, da platéia, exigiu-se professor transferiu-se para a que explicasse o apoio da diplomacia Refundação Comunista e, a seguir, chinesa ao Xá da Pérsia e a Augusto colocando sempre pedras sobre seu Pinochet, ditador do Chile, sobre os passado anti-soviético, encontrou o cadáveres de milhares de militantes nicho político que o levaria ao sucesso anti-ditatoriais. Naquele momento, sobretudo no Brasil. Ou seja, a enfuriava, no futuro Irã, a luta popular comparação elogiosa do sucesso da contra a ditadura sangrenta de China, através da restauração Mohammad Reza Pahlavi. capitalista, em relação ao fracasso da URSS socialista, que conhecera Não prosperaram as tentativas de “implosão” para o qual ele colaborara, tergiversação de cunho histórico e ainda que em forma microscópica, filosófico de Losurdo, entre elas a durante longos anos. lembrança que os “Estados Unidos” eram o “país que por primeiro”, no Nos últimos anos, Domenico Losurdo século 18, “lutou pela independência militava em organização que abiscoitou contra o colonialismo”. E, ao defender o sem sucesso a denominação do antigo e caráter progressista da burguesia, uma poderoso Partido Comunista Italiano. outra sua permanente proposta, a platéia Essa micro-organização de viés neo- formada em boa parte por operários e estalinista eclético inspira-se, entre militantes marxistas-leninista se outros, em Palmiro Togliatti, estalinista inflamou e o professor começou a ser raiz, e Enrico Berlinguer, expoente do destratado como “fascista” e “vendido à “eurocomunismo”. J. Stálin é referência Cia”. Enquanto era esputado pelos presente mas menos explícita. O novo presentes, Domenico escafedeu-se, PCI apoia o presidente sírio Bashar al- Asad, o presidente cinese Xi Jinping e a antes que não apenas seu amor-próprio fosse machucado. A noticia foi dado política exterior de Putin e do Partito pelo jornal Nuova Unità , sob o título Comunista da Federazione Russa, “In una conferenza a Livorno: Cacciato nacionalista, religioso e neo-estalinista, il professor di revisionismo cinese.” quando à política interna. (Nuova Unità , 14/11/1978, p. 4.)

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Em busca do paraíso chinês ampla abertura ao capital internacional e recuperação da burguesia nacional, Losurdo ataca a democracia operária e através do pacto com a “nação na sua defende a imposição de ritmos totalidade”, constituído com a produtivos draconianos aos implementação de uma NEP eterna. O trabalhadores. Acusa Marx e Engels por erro da URSS teria sido não seguir o propor o “superamento dos modelo chinês, o “caminho de antagonismos de classe e das classes Damasco” da revolução nacional. sociais” e a extinção do “Estado”. (LOSURDO, 2012, p. 161.) (LOSURDO, 2012,. p. 92.) Desanca o internacionalismo e acaricia a nação e o A China, sim, tomara o caminho certo, nacionalismo. Empreende ataque geral a após alguns tropeções, quando se O Estado e a Revolução , de V. Lênin e desviou do pacto inicial, que não à tese marxista da dissolução do Estado, comportaria a construção do socialismo. no horizonte histórico. Sobre a crítica “O pacto (chinês) era portanto baseado do italiano ao leninismo, S. Nunes na promessa de por fim à condição lembra: “O autor também não semicolonial e semifeudal da China.” distingue Estado de administração da (LOSURDO, 2012, p. 165.) O sucesso economia (…) o que o leva a chinês se deveria ao PCC não estar aproximar o marxismo ao anarquismo. contaminado pela “tradição messiânica- A análise correta deveria ser sobre as ebraico-cristã” marxista e bolchevique e funções repressivas do Estado, não da ter, finalmente, desenvolvido as forças forma de planejar e distribuir os bens produtivas materiais, após 1978, necessários.” (NUNES, 2014.) estendendo o tapete vermelho à restauração capitalista, ou seja ao Losurdo responsabiliza pela destruição “socialismo de mercado” (LOSURDO, da URSS, para além das minudências, a 2012, p. 168.) ofensiva “ideológico-propagandística” do imperialismo contra um Estado Vejamos, portanto, de mais perto, a enfraquecido pelo “pacto” messiânico e defesa amorosa losordista da utopista de marxismo que nascera restauração capitalista na China, que embebido de milenarismo judaico- propõe como a recuperação do cristão, como registrado. Tradição que marxismo revolucionário de seu inferno exigia a luta pela emancipação dos “judaico-cristão”. trabalhadores, no “aqui e no agora”, sem as escusas de deverem trabalhar como escravos em prol de um deus ou 2. China: a redenção capitalista de uma fé ou de um patrão ou de uma nação, para serem recompensado apenas Na visão de Losurdo, duas propostas após a morte, em um paraíso distante. digladiaram-se na URSS. A da utilização do país para impulsionar a Mas qual seria, então, a superação Revolução Mundial, como mandaria a losurdista do marxismo, em um sentido receita messiânica- hebraico-cristiana- positivo ? A direção da URSS deveria marxista , defendida na época por León ter deixado de lado qualquer proposta Trotsky. A segunda, vitoriosa, propunha de luta pela emancipação dos a construção do socialismo trabalhadores, como no período exclusivamente na URSS, sem estalinista, esfolando-os em favor do revolução mundial, rompendo com as desenvolvimento das forças produtivas visões emancipatórias de raízes judaico- materiais. Isso, no contexto de uma cristãs dos fundadores do marxismo.

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Avançada por Stálin, ela enfatizara a vitorioso em 1991. A grande defesa da nação, sem maiores divergência entre a proposta da preocupações com a população. A Oposição de 1923 e sua implementação apresentação do italiano é distorcida. estalinista era o caminho a ser seguido Vimos que a proposta de L. Trotsky e da para a industrialização. A primeira Oposição de Esquerda, derrotada e propunha o financiamento da esmagada em 1927-29, defendia, desde industrialização com a transferência soft 1923, a industrialização acelerada da de recursos dos campo: impostos, URSS, o fortalecimento do proletariado preços diferenciados, etc., como e do poder soviético, em um país em assinalado. A segunda, empreendeu a que dominava a “ditadura em nome do coletivização violenta, burocrática e proletariado” e não a “ditadura do militarizada, com sequelas jamais proletariado”. O programa da Oposição superadas pela URSS. de Esquerda propunha transferência Na China, mutatis, mutandis, sobretudo econômica, tributárias, etc. da disputaram-se a proposta burocrático- renda rural pequeno-mercantil para estalinista de coletivização do campo, financiar a industrialização socialista. para industrialização do país, sem as O programa de reindustrialização condições materiais mínimas, dirigida acelerada proposto pela Oposição de pelo núcleo da burocracia maoísta Esquerda era combatido pelos inicialmente hegemônico, e a proposta defensores da industrialização a passos restauracionista de N. Bukharin, de uma de cágado ou “minúsculos”, com a NEP eterna, defendida por Liu Shao- abertura para a produção capitalista. chi, Deng Xiaoping, Zhao Zyiang, Hu Essa última opção era apoiada Yaobang , entre outros dirigentes firmemente por N. Bukharin, que comunistas. Losurdo esforça-se para defendia caminho que levaria ao apresentar a restauração capitalista na restauracionismo, e por J. Stálin, China como uma terceira alternativa, representante da burocracia. Era a nascida da sabedoria chinesa, não proposta de uma NEP sem fim. infeccionada pela “tradição messiânica (COHEN, 1990. p. 211.) E dezembro de hebraico-cristã” marxista e bolchevique. 1928, quando era já claro que a Vitoriosa, em 1979, ela desenvolveria a produção capitalista se consolidava, economia chinesa com o aporte do sobretudo no campo, enquanto a área capital internacional e produção de socialista patinava, nas cidades, capital nacional, com enorme ensejando a possibilidade da contra- exploração dos trabalhadores, com revolução e do desaparecimento da referências formais e retóricos casta burocrática, esta última, dirigida decrescentes ao socialismo. por J. Stálin, rompeu com N. Bukharin, China maravilhosa apropriou-se do programa industrialista da Oposição de Esquerda e liquidou em Em visão romantizada da civilização forma brutal a NEP e a produção chinesa, Losurdo fala de “povo de pequeno-mercantil rural. antiquíssima civilização”, com “literatura florescente” e “espírito Na URSS, estiveram na mesa apenas laico”, sem guerras de religião, onde o dois projetos e, sobretudo, duas “privilégio de nascimento” era bem possibilidades: a construção do menor do que na Europa. Império que, socialismo ou o retorno ao capitalismo, no século 18, não precisaria importar derrotado temporariamente em 1928 e qualquer “manufaturado” do exterior —

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“não temos falta de nada” — teriam caráter social, na primeira fase ou no proposto suas autoridades máximas. primeiro passo, a revolução de uma Onde “altos cargos administrativos” colônia ou semi-colônia é seriam ocupados por “concurso fundamentalmente uma revolução público” etc. Um paraíso na terra democrático-burguesa, e, violado, no Oitocentos, por bárbaros da objetivamente, o seu objetivo é limpar o “raça branca dos senhores”, chegados terreno ao desenvolvimento do do Ocidente, que, com as Guerras do capitalismo (…).” (LOSURDO, 2012, Ópio, colocaram o império milenar de p.195, 258, 173; MAO TSÉ-TUNG, joelho, causando “abaixamento geral e 1972, p. 84.) Tese impugnada por drástico do nível de vida, a Trotsky, desde 1905, com a proposta da desagregação do aparato estatal e Revolução Permanente, e liquidada por governativo”.(LOSURDO, 2012, p. 194 V. Lênin, com as Teses de Abril, como et seq .) vimos.

Difícil saber por que uma nação O italiano não explica por que, de 1949 refinada, de centenas de milhões de a 1955, o PCC avançou rapidamente em habitantes, ruiu diante de tropas direção ao socialismo, através da escassas de europeus bárbaros e seus expropriação das grandes industrias e mercenários, enquanto o Japão venceu do 1º Plano Quinquenal, com sucesso semelhante pressão e tornou-se nação real, para o qual contou com o apoio da imperialista. A narrativa lusordiana URSS. Iniciativa que se deu, porém, ignora o atraso do “Império do Meio”; incorporando ao Estado e ao governo as autoridades corruptas; os letrados inúmeros membros do antigo elitistas; os camponeses esmagados pela Kuomintang e indenizando 1.140.000 exploração, trabalhando propriedades de proprietários de indústria minúsculas, com técnicas e snacionalizadas, a 5% durante sete instrumentos rústicos. O grande anos, alguns com somas enormes, ação responsável pela vitória ocidental foi o de nefastas consequências, como arcaísmo da formação semi-feudal veremos. Um grande número dos ex- chinesa e a debilidade da burguesia proprietários seguiram administrando nacional que, apenas em 1911, impôs a suas antigas empresas. (MAITAN, p. República e viu o país mergulhar na 11, 20: MAO TSÉ-TUNG, 1972, p. 84; desordem, superada apenas em 1949, DINUCCI, 1975, 31.) Após 1949, pelo PCC. (GUILLERMAZ, 1970. p. seguiu dominando no país, por décadas, 533 et seq .) a imensa população camponesa que praticava economia pequeno-mercantil Para o autor, a Revolução Chinesa teria e de subsistência. dois grandes objetivos: superar o “desmembramento do território”, Segundo Losurdo, em uma visão nascido do “século da humilhação”, e simplista, em 1956, devido a problemas desenvolver as forças produtivas internacionais e ao medo da agressão materiais. Ponto final. Lembra que Mao externa, fora proposto pela direção do Tsé-Tung propusera, antes de 1949, PCC o “Grande Salto Adiante”: seguindo a cartilha estalinista, que, após desenvolvimento ultra-acelerado, a tomada do poder, empreenderia-se, apoiado na “militarização do trabalho”, por longo período, a expansão da “em uma onda” de “entusiasmo de economia capitalista para, apenas feito massa”, de “forte senso comunitário” e isso, marchar ao socialismo. “Por seu de “radical camaradismo”. (LOSURDO,

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2012, p. 179.) A realidade foi bem reinaria a abundância, prometera-se. A diferente que as consignas publicitárias Inglaterra seria alcançada em quinze da época. A direção maoísta anos. (GUILLERMAZ, 1973. p. 232- impulsionou coletivização forçada do 250; LETIZIA, 2012. p. 105-7; campo que podemos aproximar, no MAITAN, 1969, p. 31-48.) geral, à empreendida, em 1929, pela burocracia na URSS, apenas com meios O objetivo da nova organização era, mais softs , já que, na China, o aumentando a jornada e o ritmo de proletariado industrial era mínimo, em trabalho e comprimindo o consumo, relação aos camponeses, que haviam avançar a produção agrícola e sobretudo realizado a revolução, na qual os liberar mão-de-obra para a produção trabalhadores urbanos participaram manufatureira nas comunas, sobretudo, tardia e marginalmente. e nas cidades, secundariamente. Finalizados os trabalhos nos campos, as Grande salto, queda maior “brigadas” construíam canais de irrigação, açudes, pontes, represas, O Grande Salto propunha acelerar a estradas; exploravam pequenas minas industrialização com super-exploração de carvão, pedreiras, olarias, etc. Para do que se tinha em abundância, a força obras mais portentosas nas comunas, de trabalho camponesa. O território utilizavam-se as “brigadas de trabalho”. nacional foi dividido em milhares de Pretendia-se “mobilização apocalíptica “comunas populares”, com em torno de da energia muscular de todo um povo.” cinco mil famílias, 4.500 hectares de (MENDE, 1962, p. 8.) terras úteis e até cem mil habitantes, cada uma. Coletivizaram-se as parcelas A descentralização do Grande Salto agrícolas familiares, já associadas em Adiante pusera fim ao planejamento da cooperativas. Grupos de “produção”, produção nacional. Espalharam-se as de 20 a 50 famílias, com cem a 150 máquinas de grandes manufaturas pelas camponeses, exploravam em torno de comunas rurais. Pretendeu-se substituir 15 a 50 ha. de terra útil. Diversos as siderurgias por milhares de micro grupos formavam uma “brigada de alto-fornos rurais que produziriam produção”, com de 150 a 200 famílias, e toneladas de aço. Fundaram-se milhares uns 150 ha. de terras agricultáveis. A de pequenas “Empresas de Cantão e comuna tornava-se a nova circunscrição Povoado” nas “comunas populares”, de econômico-administrativa, de vocação propriedade comunal-cooperativada. As polifuncional e tendencialmente auto- orientações técnicas foram substituídos suficiente. Os bens dos camponeses por palavras de ordem. Os conselheiros passavam para a comuna — grãos, soviéticos ficaram desnorteados. O gados, ferramentas, moradias, adubos, Grande Salto foi sobretudo rural. Nas árvores frutíferas. Trabalhadores cidades, organizaram-se apenas umas sobretudo solteiros foram alojados em 60 mil pequenas oficinas, 180 mil dormitórios. Em fins de 1958, refeitórios, 120 mil creches, liberando funcionavam 3.400 mil refeitórios sobretudo mão de obra feminina. A coletivos. Criaram-se lavanderias implementação do Grande Salto em comunitárias. O pagamento dos meio urbano foi logo abandonada. A trabalhadores das “comunas” era em nova ordem político-ideológica bens e serviços e algum salário produziria um novo homem e monetário. Após o Grande Salto revolucionaria as relações sociais de Adiante e seus três anos de sacrifícios, produção, pondo fim ao individualismo,

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ao sentido da propriedade, ao dinheiro, determinados um mínimo de oito horas à divisão entre trabalho intelectual e de sono e quatro para pausas no manual, à própria família. Estava-se trabalho e repouso; uma maior parte do marchando em direção ao comunismo, pagamento em salário monetário; que afirmou-se. (GUILLERMAZ, 1973. p. bens entregues à comuna seguiriam 232-250; BETTELHEIM, 1976. p. 86 et sendo propriedade particular, etc. Em set, ) 1960, agravando-se a situação, abandonou-se a política de Desastre na esquina desenvolvimento harmônico da Com o fim do planejamento central, a indústria e da agricultura, “andar com as produção industrial emperrou, por falta duas pernas”, por verdadeira batalha de matérias-primas e peças, excesso de agrícola, para salvar o país da fome. O produção, dificuldade de escoamento país foi obrigado a importar alimentos dos produtos, etc. A pequena produção de países capitalistas. Era o fracasso do comunal de adubos foi um fracasso. Os objetivo do Grande Salto — a micros alto-fornos produziram aço de industrialização acelerada. Pouco a baixa qualidade, inservível à indústria, a pouco, as comunas perderam os preço superior ao das siderurgias. Como objetivos iniciais para se transformar na URSS, empreendeu-se coletivização em regiões administrativas. A da agricultura com os instrumentos- coletivização da agricultura foi reduzida técnicas da agricultora familiar. A nova sobretudo ao nível do “grupo de ordem ensejou trabalho mais longo e produção”. O “grupo” e a “brigada de mais exaustivo e decadência das já produção” passaram a reter o excedente precárias condições da vida rural. que produziam, além do que devia ser Tentou-se militarizar o trabalho — vendido ao governo, e a opinar sobre o “uma fábrica é um campo militar. planejamento comunal. Concedeu-se Diante às máquinas o operário é aos camponeses hortas familiares e o disciplinado como o soldado.” Da direito à moradia privada, a possuir um exaltação e incentivos ideológicos, ou dois porcos, a vender a produção políticos e morais, passou-se à coerção. excedente no mercado local. Em 1962, Foi imensa a oposição camponesa ao as 24 mil “comunas populares” iniciais Grande Salto. A adesão entusiasta do foram reduzidas significativamente. mundo rural à iniciativa, com os Estimam-se em dezenas de milhões de membros das “brigadas de trabalho” chineses mortos de inanição, devido ao partindo aos campos entoando hinos Grande Salto. A economia voltou ao revolucionários e alçando bandeiras nível de 1957. (GUILLERMAZ, 1973. vermelhas ficou restrita à propaganda p. 251 et seq .; ESMEIN, 1971. p. 43 et do PCC, que galvanizou sobretudo seq .; MAITAN, 1969, p. 38; STÈLES , estudantes universitários europeus. 2012.) (GUILLERMAZ, 1973, p. 232.) Com o enorme fracasso do Grande Já em 1959, começou a ter-se a Salto, Mao Tsé-Tung e seu projeto de dimensão de desastre que, ajudado por industrialização acelerada e acidentes climáticos regionais habituais deslocalização industrial rural perderam e pela suspensão da ajuda soviética, em prestígio diante de boa parte dos 1960, causaria milhões de mortos de quadros históricos do PCC. Em 18-28 fome. O salto fora grande, a queda abril de 1959, quando da reunião da ainda maior. Introduziram-se algumas Segunda Assembléia Nacional, Liu correções ou ajustes. Foram Shao-chi foi eleito presidente da

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República, em substituição a Mao Tsé- iria ser maltratado quando da “Grande Tung. Dirigente comunista histórico, Revolução Cultural Proletária”. Apenas um dos poucos sindicalistas na direção defenestrado, ele foi substituído, em do PCC, defensor do caráter inviolável setembro de 1959, por Lin Piao, na das leis econômicas, ele era já o chefia do ministério da Defesa que, em primeiro vice-presidente do Partido outubro, publicou opúsculo defendendo Comunista e o terceiro homem na e enquadrando o exército segundo a nomenclatura chinesa, após Mao e tradição da Guerra de Libertação e o Chou En-lai. Liu Shao-chi passou a “pensamento do presidente Mao”. expressar a política de correção do Depurou-se o alto comando das forças Grande Salto Adiante, ganhando armadas de aliados e simpáticos a Peng prestígio entre a população, Dehuai. Lin Piao coordenaria a conquistando suas obras maior produção do “Livro vermelho” com 427 aceitação do que as de Mao Tsé-Tung. breves citações de Mao, espécie de Mas o balanço sobre o desastre e suas catecismo do maoísmo que, por alguns razões não se realizou em forma anos, circularia na China e no mundo. explícita devido ao domínio que o (LOSURDO, 2012, 274.) “Grande Timoneiro” mantinha na mais alta direção, ou seja, no comitê central De 1959 a 1961, as reformas do Grande do PCC. (GUILLERMAZ, 1973. p. Salto eram seguidas formalmente e cada 251275; ESMEIN, 1971. p. 55.) vez mais esgarçadas, onde haviam sido aplicadas. Em muitas províncias, o Correção sem autocrítica afrouxamento do planejamento central em favor da descentralização e das Em agosto de 1959, na 8ª sessão do 8º “comunas” permitira que as Comitê Central, no lago de Lushan, em determinações centrais fossem Pequim, o marechal e ministro da obedecidas na forma e não no conteúdo guerra Peng Dehuai, de origem e que fossem, não raro, desobedecidas. camponesa, questionou as estatísticas Mantiveram-se principalmente as manipuladas, o desperdício dos “comunas populares” como organização refeitórios comunais, o desequilíbrio administrativa e as “brigadas de entre as diversas áreas produtivas trabalho”, já que a exploração devido à falta de planejamento, o associada das minúsculas parcelas desastre econômico do Grande Salto. camponesas era exigência material da Teria proposto que, se o camponês produção. Sobretudo, seguiu o chinês não fosse “bom”, o PCC teria inexorável movimento de retificação do conhecido sucessos iguais ao levante Grande Salto e o fortalecimento da operária na Hungria, em 1956. Mao economia mercantil: incentivos Tsé-tung e Lin Piao atacaram duramente materiais no trabalho; liberdades aos o herói militar da guerra de libertação e mercados privados e à agricultura comandante das tropas chinesas na familiar; extensão das hortas privadas Coréia. Resolução aprovada pela em detrimento das terras comunais, etc. maioria do CC, não publicada na ocasião, anatematizou Peng Dehuai, Sob a presidência de Liu Shao-chi e de acusado de se opor ao Grande Salto, de sua equipe, consolidava-se a abertura à organizar tendência anti-partido e pró- economia pequeno-mercantil sobretudo burguesa, etc. Ele e seus apoiadores rural mas também urbana, apoiada e perderam os encargos e permaneceram exigida por centenas de milhões de no partido formalmente. Peng Dehuai camponeses e dezenas de milhares de

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administradores comunistas. No novo Sua explicação do fracasso do Grande contexto, propunha-se que o “grupo de Salto Adiante é sumária, ideológica, produção” e mesmo o grupo familiar simplória. A iniciativa seria correta mas fossem responsabilizados totalmente perdera o apoio camponês —apoio que pela produção agrícola. Exigia-se maior jamais tivera—, pois “não se pode abertura e legalização para o artesanato, apelar em forma permanente e pela para as pequenas manufaturas, para a eternidade à mobilização, à abnegação, indústria ligeira cooperativada e mesmo ao espírito de renuncia e de sacrifício e privada. Propunha-se o direito de ao heroísmo das massas” (LOSURDO, aluguel e de venda da terra. Os 2013, p. 179, 79.) Portanto, o projeto camponeses pressionavam para não fracassara devido a sua incorreta apoderar-se de terras comunais. Em implementação pela burocracia maoísta. verdade, essa proposta de programa era Como veremos, a seguir, ele propõe que comumente aplicada sob a a Grande Revolução Cultural Proletária complacência das autoridades (1966-68) teria a “luta de classes como favoráveis a ela ou venais. Liou Shao-qi elo principal”, isto é, a oposição entre propôs que não mais de 15% das “burguesia e proletariado”, e, como “comunas” funcionariam segundo as objetivo, o desenvolvimento das forças normas propostas inicialmente. Mesmos produtivas materiais. Não diz de onde essas, comumente, mantinham surgira ou se já existia uma burguesia contabilidade de suas contas restrita na China e como a Revolução Cultural apenas ao “grupo de trabalho”, o que pretendia expandir a economia sem permitia todo tipo de desvios dos bens qualquer programa econômico e comunais. (GUILLERMAZ, 1973, convulsionando a sociedade. Outra vez, 368.) Em 1962, Deng Xiaoping teria explica quase nada e propõe proposto que não importava a “cor do axiomaticamente que a derrota da gato (fosse ele socialista ou capitalista) Revolução Cultural se devera também à desde que caçasse o rato”. Ou seja, se o incapacidade de se manter a capitalismo avançasse mais a produção, mobilização ideológica da população. na China, do que o socialismo, ótimo. (LOSURDO, 2012, p. 79, 101, 174.) Na URSS, quando da NEP, Nicolau Bukharin fora mais direto ao sugerir aos A grande revolução proletária sem camponeses: “Enriquecei-vos”. Em proletários 1964, Chu Enlai, primeiro-ministro desde 1949, segundo homem na linha A partir de 1959, a tendência era o do poder, propôs também a política das fortalecimento e ampliação das medidas “Quatro Modernizações”, retomada de correção do Grande Salto, em mais tarde por Deng Xiaoping — desarticulação estrutural, com o Agricola, Industrial, Defesa, fortalecimento no PCC da facção Tecnologia. (MANDEL In: MAITAN, favorável à produção mercantil. Liu 1999. p. 34 et seq .) Shao-chi era o principal representante de bloco político-social que reuniria, Sobre a luta entre o projeto de nos seus extremos, setores minoritários industrialização burocrático, autoritário, preocupados com o planejamento descentralizado e uma acumulação central e a industrialização estatal e pequeno-mercantil, inicialmente facções majoritárias favoráveis à sobretudo rural, que empurrava em economia mercantil. A imensa maioria direção da produção capitalista, dos camponeses desejava a abertura em Domenico Losurdo não diz quase nada. direção da economia pequeno-mercantil

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e a posse-propriedade da terra, dos um viés idealista, muito próprio ao gados, dos instrumentos de trabalho, da “Grande Timoneiro”, o Movimento de moradia. O principal apoio da política Educação Socialista e a Revolução de industrialização estatal era o Cultural propuseram afastar quadros minoritário proletariado industrial, comunistas desviados e tidos como controlado pelas estruturas sindicais do irrecuperáveis e reeducar os definidos PCC e golpeado pelo Grande Salto, a como recuperáveis —95%, segundo a descentralização industrial e o fim do direção maoísta—, sem tocar ou se planejamento central. A orientação da referir às relações sociais de produção, sociedade e da economia corroíam o que eventualmente gerariam e poder do “Grande Timoneiro” sobre o sustentariam aqueles desvios . Sugeria- PCC e terminariam reordenando a se que as revoluções sociais de nomenclatura máxima comunista, em produção haviam sido revolucionadas, detrimento de Mao Tsé-tung, Lin Piao, passando a serem socialistas, enquanto Chou En-Lai. (DAUBIER, 1974.) parte sobretudo de altos dirigentes seguiam com desvios burgueses e pró- Mao Tsé-tung seguia sendo a primeira capitalistas herdados do passado. direção política da China e controlava a Propunha-se, no frigir dos ovos, que a maioria do comitê central do PCC. Seu “existência não determinasse a mais próximo aliado era o marechal Lin consciência”, pressuposto básico do Piao, desde a deposição de Peng materialismo dialético. (ENGELS; Dehuai, chefe do Exército Nacional de MARX, 2007.) Libertação depurado , como vimos. O apoio ao maoísmo se enfraquecia nos A ênfase de combate super-estrutural, quadros médios e inferiores, mais cultural e ideológico da Campanha de próximos das pressões das comunidades Educação Socialista e da Grande sobretudo rurais, favoráreis à orientação Revolução Cultural Proletária, sem pró-mercantil simbolizada por Liu questionamentos nem programas sócio- Shao-chi. Com as forças armadas já produtivos e de governança proletária, enquadradas, a ofensiva de agosto de teria sido devido à consciência de Mao 1959 de Mao Tsé-Tung e de sua facção, Tsé-Tung e de sua facção burocrática de contra o marechal Peng Dehuai, foi que, por um lado, não contavam com o retomada em 1963, através do apoio das classes camponesas para “Movimento de Educação Socialista”. combater os dirigentes da campanha de Ele foi espécie de prólogo da Grande correção do Grande Salto. E de que, por Revolução Cultural Proletária, iniciada outro, a gestão burocrática do Estado e em 1966 e concluída, em 1968, com o o programa econômico que haviam defenestramento da maior parte dos implementado e seguiam defendendo quadros comunistas chineses históricos não lhes permitiam mobilizar o e o pleno domínio do alto comando do proletariado industrial urbano que, PCC por Mao Tsé-Tung e seus mais mesmo minoritário, já não era próximos seguidores. desprezível. Como veremos, a Revolução Cultural pretendeu O Movimento de Educação Socialista e essencialmente defenestrar a alta a Grande Revolução Cultural Proletária direção do PCC, colocando-a, esperava- acusaram duramente Liu Shao-chi e se, para sempre, sob o controle de Mao enorme parte da velha guarda do PCC Tsé-tung e de seus fiéis. de desvios culturais e ideológicos pró- burgueses e pró-restauracionistas. Em

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O exército entra na briga secundar e a enquadrar os guardas vermelhos, que seguiram denunciando, Os dois movimentos convulsionaram prendendo, torturando, humilhando, em sobretudo a China urbana, de 1963 a privado e publicamente, milhares de 1968. Inicialmente, para defenestrar altas direções da capital e das seus opositores novos e antigos, Mao e províncias, refratárias e renitentes. Liu sua facção serviram-se do controle do Shao-chi era o grande objetivo da comitê central do PCC e, quando isso campanha, que golpeou igualmente se mostrou insuficiente, organizaram as Deng Xiaoping. Alguns dos pró- “Guardas Vermelhas”, com mais de dez burgueses foram executados. Quando o milhões sobretudo de estudantes movimento concluiu-se, em 1968, com universitários, com as aulas suspensas a formação de “comitês por semestres, já no contexto da Grande revolucionários” sob domínio maoísta, Revolução Cultural em todas as províncias, dois terços dos Proletária.(MASSARIN In: MAITAN, membros do comitê central havia sido 1999. p. 111 et seq ; ESMEIN, 1971. p. substituídos. Estavam dadas as 115 et set.; DINUCCI, 1975, P. 80 et condições para a realização do 9º seq.) A seguir, as forças armadas, Congresso do PCC, em 1969, e apresentadas pela Revolução Cultural consagração de Mao e seus delfins. como exemplo a ser seguido e como o (ESMEIN, 1971. p. 255 et seq .; “pilar fundamental da ditadura do JOYAUX, 1969, page 3.) proletariado”, sob o comando de Lin Piao, intervieram na ofensiva, A Grande Revolução Cultural secundando e enquadrando os guardas Proletária, movimento burocrático, vermelhos. Todo a Revolução Cultural hierarquizado e controlado pela facção deu-se sob a inspiração do “pensamento maoísta, jamais se apoiou no do presidente Mao Tsé-Tung”, já proletariado, nem propôs maiores sacralizado, e as diretrizes estritas do autonomia e poder para ele. Ao comitê maoísta encarregado de dirigir contrário, quando literalmente deu a aquele movimento. (MAITAN, 1969, p. permissão para que a Revolução 125.) Cultural envolvesse as fábricas, já que elas estavam se mobilizando contra o Os “guarda vermelhos”, agindo em movimento, acusou de “economicistas” Pequim e nos grandes centros do país, e reprimiu os trabalhadores que se atacaram a cultura ocidental como um organizaram em forma autônoma, em todo —literatura, música, pintura, defesa de suas reivindicações, sobretudo etc.—, derrubaram monumentos, em janeiro de 1967, com destaque para renomearam ruas, invadiram Xangai. O proletariado envolvido no universidades, ocuparam repartições movimento se dividiu e, em geral, os administrativas, etc. (MAITAN, 1969, trabalhadores estatais opuseram-se à p. 89; DAUBIER, 1974.) Revolução Cultural e ao igualitarismo Confrontaram-se com operários e camponês dos “guardas vermelhos”, em camponeses, em geral inspirados pelos defesa de seus direitos e conquistas. quadros do PCC restauracionistas (MAITAN, 1969, p. 118; TROTSKY, atacados, resultando mortos e feridos 1963, p. 515) nos embates, sem obterem os objetivos definidos pelo “Quartel General” da direção maoísta. A seguir, como proposto, as forças armadas passaram a

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Fim de festa terceiro, hábil transformista. A grande consigna do congresso foi continuar a Em julho 1968, construído o domínio “eliminar completamente a burguesia” hegemônico da facção maoísta sobre as — ou seja, os quadros ditos pró- direções superiores do PCC, as Guardas burgueses. (GUILLERMAZ, 1973. p. Vermelhas, já relegadas a um segundo 484 et seq .; PIAO, s.d. 97.) plano, foram dispersas, com a ajuda do exército, como já dito. (LOPES, 2020; ; A Grande Revolução Cultural Proletária DENUCCI, 1975, p. 118 et seq ). e o 9º Congresso não promoveram Milhões de jovens estudantes e modificações nas relações sociais de operários foram enviados para o campo produção, sustando, quando muito, para ajudar na produção agrícola, perder algumas iniciativas oficiais de o hábito de se manifestar, minorar a “correção” do Grande Salto. Entretanto, incapacidade de absorção da economia a desordem motivada pela Revolução de jovens diplomados. Em 1-24 de abril Cultural; a consigna de colocar a de 1969, em Pequim, realizou-se “política” na direção de todos os finalmente o 9º Congresso do PCC, com assuntos, que motivou o retraimento dos verdadeira canonização de Mao Tsé- técnicos e administradores; etc. Tung e de seu “pensamento”. Os propiciaram retrocesso e delegados foram cooptados e não desorganização na economia, situação eleitos, criticando-se a fé cega e que favoreceu o avanço da acumulação conservadora nas “consultas pequeno-mercantil através do país, no democráticas”. (GUILLERMAZ, 1973. campo e nas cidades. (BETTELHEIM, p. 484; PIAO, s.d.) 1976. p. 103 et set.) A ofensiva maoísta centrara-se nos quadros superiores e O comitê central foi amplamente pouco se preocupara com a multidão de alargado, 484 membros com os quadros médios e inferiores do PCC, suplentes, com o ingresso de novos em geral, pouco simpáticos para com a chegados em geral desconhecidos. A Revolução Cultural. velha guarda comunista, forjada na Como vimos, o esquerdismo retórico e guerra de libertação, praticamente super-estrutural da Revolução Cultural desapareceu, fora alguns poucos que se conquistou imenso público universitário submeteram à nova realidade — 53 no europeu. Surgiram uma miríade de total do CC. Mais de sessenta por cento novos partidos, organizações, grupos, dos membros do velho órgão supremo coletivos, etc. marxistas-leninistas, com do PCC não participou do novo. Se destaque para a França e a Itália, que realizava defenestramento da velha denunciava como “revisionistas” os guarda, próximo ao ocorrido na URSS, partidos comunistas pró-Moscou, sem o recurso aos massacres hegemônicos no grande operariado estalinistas. Numerosos militares foram daqueles países. No Brasil, o PCdoB e designados como membros plenos do facções da Ação Popular aderiram ao CC —25%—, com o fortalecimento do maoísmo e ao marxismo-leninismo. A marechal Lin Piao como literal convergência entre os USA e a China, “príncipe herdeiro”. O grupo em 1971 e 1972, ensejou enorme crise permanente do Burô Político foi no movimento marxista-leninista, que, constituído por Mao Tsé-Tung, Lin não raro, pôs-se sob a orientação da Piao, Chou En-Lai, Ch´em Po-ta, K´ang Albânia de Enver Hoxha. Sheng - dirigentes dedicados da Revolução Cultural, à exceção do

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O fim da retórica esquerdista ainda que em forma enviesada, com destaque para a África, o Afeganistão, O movimento comandado por Mao Tsé- etc., praticamente até a sua dissolução. Tung e seus quatro escudeiros não Losurdo cala sobre tais fatos, apesar de dispunha de programa político ou de um sua gritaria sobre a inconsciência bloco social sólido que o apoiasse. Ele terceiro-mundista do “marxismo perseguiu e conquistou, sobretudo, o ocidental” e o anti-imperialismo do domínio burocrático super-estrutural, “marxismo oriental”, ou seja, chinês. com o literal afastamento do comando do país de toda a velha guarda que Em 13 de setembro de 1971, o marechal participara da fundação do PCC e da Lin Piao e membros de sua família; Longa Marcha, que não lhe fosse Huang Yungsheng, chefe do Estado incondicional. Seu esquerdismo verbal, Maior das forças armadas; o quando da Revolução Cultural e sua comandante da força aérea Wu Fa- crítica à URSS pela sua tibieza na luta hsien; Li Tso ‐peng, primeiro comissário anti-imperialista se dissolveram político da Marinha e outros altos rapidamente como sorvete ao sol. Em responsáveis militares morreram em 15 de julho de 1971, o presidente Nixon desastre de aviação na Mongólia, já anunciou viagem a Pequim, longe das fronteiras chinesas, quando consolidando-se a aproximação China- aparentemente fugiam para a URSS. USA que se manteria por décadas, Mais tarde, Lin Piao seria acusado de praticamente até a administração organizar golpe de Estado, preventivo à Donald Trump (2016-2020). O sua esperada destituição. Sabemos movimento de aproximação iniciara no pouco sobre as razões políticas da início do ano anterior, em torno de um pugna mortal no mais restrito círculo ano após o 9º Congresso, que propusera maoísta. Propõe-se que Lin Piao se o combate a “burguesia” no país. opunha à aproximação estratégica com (CASA BRANCA, 20/05/2020.) os Estados Unidos, apoiada por Mao e organizada por Chu Enlai (1898-1976), A nova situação causou um golpe e que era favorável à modernização das duríssimo à URSS, então em confronto forças armadas. direto com a China, e ensejou imediata e radical reorientação da direção Os seguidores de Lin Piao foram maoísta, que interrompeu o apoio às defenestrados nos meses seguintes e se revoluções anti-imperialistas no manteve longo silêncio sobre seu Terceiro Mundo. (FRASSON, p. 24.) A desaparecimento até se iniciar, mais aproximação do maoísmo com os USA tarde, campanha contra ele, no estilo da fora uma facada nas costas da Revolução Cultural, denunciando-o resistência vietnamita. Em 11 de como um “contra-revolucionário”. setembro de 1973, a China fechou as (DINUCCI, 1975, p.175 et seq .) Apesar portas de suas legações diplomáticas em de Chou En-Lai se tornar o segundo na Santiago aos que procuravam se linha de sucessão, Mao Tsé-tung, refugiar do golpe militar, sequer envelhecido e com problemas de saúde, recebendo os poucos marxistas- entronizou Huo Guofeng, figura de leninistas chilenos e seguiu tendo as segundo plano, como seu sucessor, melhores relações com a ditadura antes de sua morte. Em 1976, após o pinochetista. (MAESTRI, setembro 4- falecimento de Mao, seguido pelo de 11, 2020.) Ao contrário, a URSS Chu Enlai, Huo Guofeng liquidou sem continuou apoiando a luta anti-colonial, maior dificuldades com o que restava da

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Revolução Cultural e ensaiou retorno à período” no processo revolucionário, via soviética, barrada pela consolidação devido aqueles dois movimentos, “se anterior do bloco político-social pró- impõe na China” a reorientação que mercantil. (MENDE, 1968, p. 8.) levou a “retomar e reconfirmar o pacto social de 1949”. Ou seja, a “defesa da Liu Shao-chi morrera maltratado integridade territorial” e do durante a Revolução Cultural. Deng “renascimento da nação chinesa” como Xiaoping, reabilitado, assumiu o objetivos fundamentais da revolução, comando do país, retomando a sem preocupações socialistas. Abrindo- orientação de seus antigos mentores. se logicamente espaço à “burguesia (LOSURDO, 2012, p. 83.) Ele nacional” e ao capital mundial. expressava a marcha inexorável da (LOSURDO, 2013, p. 168, 173. 184.) acumulação mercantil com destaque para o mundo rural chinês, que conhecera aceleração com o fim do Portanto, sob a direção de Deng planejamento central e dos planos Xiaoping, teria iniciado uma “segunda quinquenais, quando do Grande Salto e revolução”, na qual se realizou, como da Revolução Cultural. Lênin definira a política oficial, abertura estratégica ao NEP como “retirada” provisória “em grande capital internacional, com a vista de um posterior ataque”. Em conformação de uma burguesia chinesa dezembro de 1978, no Terceiro Pleno cada vez mais poderosa. No 15º do 11° Comitê Central do Partido Congresso do PCC, em 12 de setembro Comunista Chinês, oficializou-se de 1997, decretou-se a canonização da “gigantesca e prolongada NEP”, uma “teoria” de Deng Xiaoping, como o “via chinesa para o socialismo” apoiada “marxismo da China” atual, ao lado do no mercado e no grande, médio e “pensamento” de Mao Tsé-Tung. pequena capital nacional e (ZEMIN, 2000, p. 3 et seq .) A internacional, sob controle rígido do restauração do capitalismo na China não PCC.(BUCHARIN; colocaria, segundo o autor, perigo ao PREOBRAZENSKIJ, 1973, p. IX.) Era socialismo chinês, já que se manteria a o fim da Era Maoísta ou Socialista “expropriação política da burguesia”, Burocrática (1949-1978). sob o domínio exclusivo do autoritarismo vigente — propõe O fim da longa marcha Losurdo, repetindo como sempre a Para Losurdo, praticamente não há ladainha justificativa oficial do PCC. confronto de classes, contra-revolução (LOSURDO, 2012, p. 175; ZEMIN, ou ruptura de orientação na revolução 2000, p. 16.) Como se na URSS, não chinesa, de 1949 até hoje. Há, quanto tivesse sido facção do partido PCUS, muito, breves desvios e retomada da sob a direção de Gorbachov, a dirigir a orientação original. A abertura para a restauração capitalista! A nova ordem economia capitalista teria sido retomada nascente, o “socialismo de mercado”, quando se perdeu a “ilusão” em constituiria, segundo Deng Xiaoping, desenvolver as forças produtivas uma “real contribuição à humanidade” e apoiando-se sobre o “permanente encorajaria o resto do Terceiro Mundo a entusiasmo revolucionário de massa”. livrar-se do peso da miséria e do (LOSURDO,2013, p. 152.) Portanto, subdesenvolvimento, ao adotar o depois dos fracassos do Grande Salto e exemplo chinês: muito capitalismo e da Revolução Cultural. Em verdade, muito mercado! ( LOSURDO, 2012, p. para o italiano, após “ruptura de breve 189.)

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Em 1979, foram definidas Zonas acompanhar a visita histórica. Em 18 de Econômicas Especiais, no litoral, maio, o primeiro ministro Li Peng escancaradas aos capitais participou de negociações com a internacionais, às quais se seguiram direção dos estudantes, apesar de pouco outras e, mais tarde, a abertura de todo simpático ao movimento, à o país à acumulação capitalista. Pôs-se descentralização e à aceleração das fim ao planejamento central efetivo, privatizações. (BERGERE, 2000. procedeu-se a privatizações de milhares p. 212-221.) de empresas públicas, ensejando que milhões de trabalhadores estatais e suas A burocracia dirigente chinesa dividiu- famílias perdessem direitos à pensão, se entre a manutenção da centralização moradia, saúde e educação. Na nova do poder e o fim do monopólio político ordem, esses serviços e bens passaram a do PCC, com a introdução de formas de multipartidarismo. Temendo a serem pagos, em instituições privadas e desordem, a facção centrista apoiou públicas. O movimento de restauração Deng Xiaoping que propunha, contra capitalista gradual prosseguiu sem Zhao Ziyang, a repressão ao movimento percalços, sob controle, causando e o prosseguimento da restauração importantes estragos sociais, até os capitalista sob a direção centralizada e sucessos da praça de Tiananmen, em autoritária do PCC. (MOTTOSI, 1989. novembre de 2020. p. 15; Novembre Não há paz na Praça da Paz Celestial 2020, p. 13; luglio-agosto 2020. p. 19.) Em 18 de maio, o comitê central No contexto do processo de contra- decidiu-se pela Lei Marcial e, semanas revolução na Alemanha Democrática, mais tarde, procedeu-se ao desalojo da na URSS e nas Repúblicas praça, com a morte de cinquenta Democráticas, em 1989, na Praça da soldados e de quatrocentos a oitocentos Paz Celestial, em Pequim, grande manifestantes. Os dez mil mortos mobilização, de sobretudo estudantes, chorados pelo imperialismo não professores e intelectuais, passou a encontram comprovação em fotos, exigir a “quinta modernização”, além filmes, nomes, etc. (Massacre de das quatro proposta por Chu Enlai e Tiananmen, 23/12/2017.) Com a retomadas por Deng Xiao-Ping. Isto é, repressão do movimento, os reformistas democratização da sociedade e do políticos foram defenestrados, a governo em um viés ocidental, em concentração do poder nas mãos do correspondência ao avanço da economia PCC se fortaleceu e, muito logo, capitalista. Facções do PCC, muito acelerou-se a abertura ao capitalismo. fortes nas regiões em que o processo de Desrespeito à independência nacional restauração capitalista se adiantara, incentivaram, financiaram e apoiaram o Losurdo propôs como objetivo da movimento. Em Tiananmen, uma greve Revolução de 1949 o desenvolvimento geral de “fome comunitária” foi das forças produtivas e a reconstrução coordenada para ocorrer quando da da unidade nacional chinesa, como visita, em 15 de maio, a Pequim, de M. proposto. “(…) por fim para sempre ao Gorbachov, defensor da “glasnost”, da desmembramento do território “perestroika” e da restauração nacional”, ocorrido durante o “século da capitalista na URSS. Multidões de humilhação”. (LOSURDO, 2012. p. jornalistas de todo o mundo 172.) Ao abordar a luta do PCC pela encontravam-se na capital chinesa para restauração territorial chinesa, criticou a

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falta de política e de habilidade da da autonomia de fato das minorias direção da URSS para com as minorias nacionais da China, com destaque para nacionais, pecado no qual, para ele, o as comunidades muçulmanas e de PCC jamais incorrera, como assinalado. línguas próprias uigure e mongol. O “Mao soube criticar os graves erros italiano defende o direito da China ocorridos na URSS na relação ao sobre o Tibete. “(…) o imperialismo mesmo tempo com os camponeses e as procura promover a secessão também minorias nacionais”. (LOSURDO, do Tibete. (…) Qualquer simpatizante e 2012. p. 68.) militante da causa do anti- imperialismo” sabia “bem que a Não precisamos retornar aos erros soberania chinesa (sic) sobre o Tibete monstruosos de Mao Tsé-tung em tinha séculos de história pelas costas relação aos camponeses, quando do (…).” (LOSURDO, 2012, p. 201.) Ao proposto Grande Salto, esquecidos pelo igual que o pretenso direito da Coroa italiano. E folga dizer que não são inglesa sobre a Escócia, ou de Madrid comparáveis os níveis de dificuldade sobre a Catalunha e o País Basco — postos pelos problemas de autonomia lembraríamos. Em derrapagem nacional, respectivamente, à direção discursiva, o autor registra a existência soviética, em 1917, e à direção chinesa, nacional do Tibete como nação e o em 1949. Herdeiros do Império avanço chinês sobre ela no passado, ao Czarista, os bolcheviques defrontaram- contrário do que pretende, ao abraçar a se com mais de cem nacionalidades, em proposta de que o Dalai Lama “exige a uma população geral com apenas 45% criação de um Grande Tibete, que de russos étnicos. Em 1949, o PCC pôs- incluiria não apenas o território que se à frente de uma população com mais constitui o Tibete político na idade de 94% de chineses da etnia han . contemporânea , mas também a área (MANLIO, 1975, p. 27.) tibetana na China Ocidental, em Após propor o marxismo-leninismo larguíssima parte perdida pelo Tibete (maoísmo) como arma fundamental na já no século dezoito ”. (Destacamos) luta pela independência nacional e (LOSURDO, 2012, p. 211.) denunciar a violência do imperialismo ocidental contra a China, Losurdo defende ferozmente o programa do PCC Losurdo propõe o direito histórico da de restauração das fronteiras chineses, China de recuperar o território perdido após 1949. A questão de Hong Kong e para o imperialismo no “século da mesmo da ilha de Formosa, ainda hoje humilhação” e nega ao povo tibetano o independente, não lhe colocam maiores direito de recuperar os territórios e problemas. As duas regiões foram populações perdidos para o império sempre partes do território nacional, chinês no passado! E apoia o direto povoadas majoritariamente por chineses chinês sobre o “Tibete político”, na étnicos. Ainda que a população de opinião de, entre outros, Sun Yat-sen e Taiwan deseje hoje a independência, em Mao Tsé-Tung! Não “apenas Mao Tsé- maioria. tung”, mas também “Sun Yat-sen”, o primeiro presidente da República Losurdo embrenha-se em uma defesa chinesa, consideram o “Tibete parte miserável do imperialismo, do integrante do território nacional nacionalismo e do chauvinismo chinês chinês”.(LOSURDO, 2012, p. 201-2.) han ao justificar o desrespeito do PCC Sancta simplicitas. Qualquer coisa da independência nacional do Tibete e como comprovar a soberania inglesa

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sobre as Malvinas apoiado na opinião sendo apresentado em opúsculo de da rainha da Inglaterra! J.Stálin, que teria sido escrito sob a supervisão de V. Lênin e N. Bukharin, O Tibete é região de povo, etnia, língua em 1913.(STALIN, 1913.) e cultura singular, não chinesa, que conheceu a independência nacional por Apenas a Região Autônoma tibetana longo séculos, até cair sob o protetorado possui 1.228.400 mil quilômetros do Império Mongol, no século 13 e, quadrados, com pouco mais de três mais tarde, do Império chinês, tendo milhões de habitantes. Mais três porém gozado longos períodos de milhões de tibetanos viveriam nas autonomia e independência. Em 1911, regiões incorporadas diretamente a quando do estabelecimento da frágil províncias chinesas. Sobretudo essas república chinesa, o Tibete proclamou a últimas regiões e populações sofrem independência, que manteve até 1950. forte pressão assimilacionista, por parte Após 1951, a ocupação militar e política da população han , política chinesa sobre o país tornou-se total, governamental com a fuga do Dalai Lama, expressão chinesa.(GUILLERMAZ, 1973, p. 278- conservadora dos direitos nacionais 283.) É certo que o imperialismo se tibetanos, apoiada pelo imperialismo. sirva do Dalai Lama, da antiga ordem Grande parte do país foi incorporada às político-religiosa e do sentimento províncias chinesas vizinhas e o restante nacional para impulsionar movimentos deu origem a uma Região Autônoma conservadores pela independência formal, igualmente sob política tibetana e propaganda anti-chinesa. O assimilacionista. que não justifica a anexação do Tibete e a política integracionista chinesa, como A nova ordem propiciou a extinção de propõe Losurdo. As minorias uigures, regime semi-feudal, reforma moderada mongóis, etc. não conhecem igualmente da propriedade da terra, escassa autonomia efetiva e são também objeto modernização econômica, que se de políticas assimilacionistas. acelerou nos últimos anos com a Como conclusão restauração capitalista. Repetindo a retórica tradicional do colonialismo, Fuga da História? A revolução russa e Losurdo justifica o domínio colonial a revolução chinesa hoje , de sobre uma região com a civilização que Domenico Losurdo, tem como tese ele traria, ao igual que os ingleses que central a defesa do futuro radioso que se justificaram com a repressão do tráfico abriu para a China, sob a orientação de escravos a invasão e o terrível máxima de Deng Xiaoping, em 1978, escorcho de enormes regiões da África quando o país se escancarou para a . “(…) não há dúvidas que hoje a produção e acumulação capitalistas, situação do Tibete melhorou claramente impulsionadas por capitais no que se refere ao desenvolvimento internacionais e nacionais. No ensaio, econômico, à liberdade religiosa, e aos Domenico Losurdo defende a estranha direitos culturais e nacionais dos tese que o “socialismo” na China não habitantes daquela região.” correria perigo pois o monopólio (LOSURDO, 2012, p. 214.) O direito à político mantêm-se nas mãos do PCC, plena autonomia das nacionalidades do precisamente o partido que comandou, império czarista, caso fosse a vontade após a derrota do maoísmo, a marcha de sua população, foi defendido pelos em direção ao capitalismo! Destaque-se bolcheviques, antes da Revolução, que, em fins dos anos 1920, o

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fortalecimento da produção capitalista essência capitalista e imperialista da na URSS era defendido pela facção China já se materializara plenamente, direitista de N. Bukharin, um dos mais diante dos olhos dos mais incrédulos, conhecidos teóricos bolcheviques. E quando Losurdo publicou seu último que Gorbachov e sua clique ensaio no Brasil — O marxismo restauracionista eram comunistas ocidental : como nasceu, como literalmente de “carteirinha”. O italiano morreu, como pode renascer , toda não dá qualquer importância ao uma apologia à restauração capitalista defenestramento com a Revolução da China, através do “socialismo de Cultural de enorme parte da velha mercado”. guarda do PCC. Mesmo lusordistas irredutíveis Desde a última edição revista do citado abandonam a defesa do socialismo ensaio, em 2013, não há como fugir do chinês, aceitam com reticências ou não avanço inexorável da acumulação o novo caráter capitalista do país, capitalista na China, com a regressão propondo comumente a influência relativa da economia ainda em mãos do positiva chinesa na política Estado. (CARVALHO, 2016) Hoje, o internacional, ao se confrontar com o “Império do Meio” conta apenas com imperialismo estadunidense. A uma fortíssima burguesia chinesa. necessária defesa do Estado e da nação (FOLHA DE SÃO PAULO, 12 de abril chinesa, diante do ataque atual do de 2019.) Mais ainda, dotou-se de um imperialismo estadunidense, não deve dinâmico capital monopólico público e servir de argumenta para a defesa da privado, que elevou a China ao status ação do capitalismo e do capital de nação imperialista, na acepção monopólico chinês, dentro e fora do leninista da categoria. Ou seja, um país país. Os trabalhadores não podem onde já domina o capital monopólico escolher uma “bandeira estrangeira”. caracterizado e dependente da (MAESTRI, 21/06/2019; KKE, Artigo, exportação de capitais. E, diante da 19.02.2021.) Entretanto, o “socialismo crise mundial ensejada pelo Covid-19 e chinês de mercado” é peça central na da ofensiva anti-chinesa dos USA, tentativa de impugnação perneta aceleram-se a abertura e a lusordiana do marxismo revolucionário. desregulamentação em favor do grande Ao ruir e ser descartado esse último, a capital na China. China perde sua singularidade e se apresenta apenas como mais um “tigre Um novo caráter daquele país que asiático”, ou seja, uma outra nação ensejou o inevitável confronto em oriental que se desenvolveu desenvolvimento entre o imperialismo aceleradamente apoiada, em sua enorme estadunidense, hegemônico militar, população e mercado, na duríssima financeira e diplomaticamente, mas em exploração dos trabalhadores e, estagnação econômica, e o imperialismo condição imprescindível, em um chinês, em diversas áreas ainda enorme afluxo do capital. subordinado, que luta por conquistar espaço, apoiado no seu dinamismo A China se distingue de Hong Kong, manufatureiro. Mesmo nos seus Taiwan, Coréia do Sul, Singapura, etc. momentos de maior desenvolvimento, a sobretudo por sua enorme população. URSS jamais assumiu um caráter Registre-se que aqueles países imperialista ao exteriorizar sua conheceram igualmente governos economia e seus capitais. Essa nova autoritários e centralizados,

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