CDD 574.524811 '616.9883811 CDU 576.8 :616 (213) (81 1936/1986"

MINISTÉRIO DA SAÚDE FUNDAÇÃO SERViÇOS DE SAÜDE PÜBLICA

INSTITUTO EV ANDRO CHAGAS

SOANOS DE CONTRIBUIÇÃO ÀS CIF-NCIAS BIOLóGICAS E À MEDICINA TROPICAL

VOLUME 1

BELÉM 1986 Capa: BenedictoMello

EVANDRO CHAGAS; 50 anos de contribuiça:oàs ciências biológicas e à medicina tropical. Delém, Fundaça:o Serviçosde SaúdePública, 1986. 2v 1. Parasitologia.Virologia 3. Bacteriologia 4. Micologia. 5. Entomologia 6. Epidemiologia 7. Imunologia 8. Biotérios. Instituto EvandroChagas. CDD 574.524811 616.9883811I CDU 576.8:616 (213) (811) "1936/1986"

INSTITUTO OScoccimos (COCCImA:EUCOCCIDIIDA)

Lainson, Jeffrey J: Shaw & [rene Landau *

INTRODUÇÃO

A fauna,extraordinariamente rica, da Região Amazônica do Brasil, tem sido muito pouco estudadaem relação aos parasitasda Sub-Classe . Por esta razão,fizemos questão de examinar uma grandevarieda- de de vertebradospara este grupo de parasitasnos últimos vinte anos -in- cluindo peixes,anfloios, répteis,aves e mamíferos. No conteúdo deste capítulo, encontram-se os principais achados registradosdurante o período de 1965 -data da fundação da Unidadede Parasitologia Wellcome, deste Instituto -até o momento da preparação do mesmo,em dezembrode 1985.Nele estãoincluídas apenas as observações já publicadas.Em primeira instância,entretanto, uma breveclassificação dos coccídios,e a definição dasFamüias da Sub-OrdemHaemosporina, irá servir para uma melhor orientaçãoao leitor sobrea posiçãotaxonômica dos vários parasitasmencionados na seguintediscussão.

* laboratoire de Zoologie (Vers), Muséum National d'Histoire Naturelle, Paris.

243 -

Ralph TABELA I

CLASSIFICAÇÃO* DOS COCCIDIOSEM RELAÇÃO À POSIÇÃO T AXONOMICA DE ALGUMAS ESPÉCIESNOVAS DESCRITAS POR PESQUISADORESDO INSTITUTO EVANDRO CHAGAS DURANTE OS ANOS 1965-1985.

Filum: APICOMPLEXALevine, 1970 Classe:SPOROZOEA Leuckart, 1879 Sub-Classe:COCCillIA Leuckart, 1879 Ordem: EUCOCCillIillA Léger & Duboscq,1910 Sub-Ordem:ADELEINA Léger,1911 Faml1ia: HAEMOGREGARINillAE Neveu-Lemaire,1901 Gênero: Danilewsky, 1885 Cyrilia Lainson,1981 Faml1ia: HEPATOZOIDAEWenyon, 1926 Gênero: Miller, 1908 Famüia: Wenyon, 1926 etc. Sub-Ordem:EIMERlINA Léger,1911 Famüia: EIMERlillAE Minchin, 1903 Gênero: Schneider,1875 lsosporaSchneider, 1881 CaryosporaLéger, 1904 Tyzzeria Allen, 1936 SarcocystisLankester, 1882 etc. Famüia: LANKESTERELUDAE Noller, 1920 Gênero: LankesterellaLabbé, 1899 Schellackia Reichenow,1919 Lainsonia Landau,1973 Sub-Ordem:HAEMOSPORINA Danilewsky, 1885 Familia: PLASMODlIDAE Mesnil, 1903 Fasesexuada do ciclo evolutivo ocorrendo em espéciesde mosqui- tos (anofelinos e culicídeos), e a faseassexuada em célulasdo san- gue ou de outros tecidos do vertebrado; gametócitosrestritos aos glóbulos vermelhosmaduros; os parasitasproduzem pigmento deri- vado da hemogIobinadas hemácias. Gênero: PlasmodiumMarchiafava & Celli, 1885 * A classificaçãoaté Sub-Ordem,segundo Levine et ai., 1980

-244 - Famüia: Dotlein, 1916 Fase sexuada ocorrendo em insetos que não sã'o nem anofelinos nem culicídeos; fase assexuadarestrita às células dos tecidos de vários ór- gãos do hospedeiro vertebrado, mas não dentro dos glóbulos ver- melhos do sangue periférico; gametócitos restritos aos glóbulos ver- melhos, com a produção de pigmento malárico.

Gênero: HepatocystisLevaditi & Schoen,1932, emend Garnham, 1951 Nycteria Garnham& Heisch,1953 PolychromophilusDionisi, 1899 HaemoproteusKruse, 1890 ParahaemoproteusBennett, Garnham& Fallis, 1965 Haemocystidium Castellani& Willey, 1904 Simondia Garnham,1966

FamI1ia:LEUCOCYTOZOillAE Fallis & Bennett, 1961 Parasitascom esporogoniaem insetos que não são nem anofelinos nem culicídeos; esquizogoniaem célulasdos tecidos de vários ór- gãosdos hospedeirosvertebrados; gametócitosem glóbulosverme- lhos imaturosle nas células brancasdo sangue.Ausência total de pigmentomalárico. Gênero: Berestnev,1904 Akiba Bennett,Garnham & Fallis, 1965 Saurocytozoon Lainson & Shaw,1969

FamI1ia:GARNIillAE Lainson,Landa~ & Shaw,1971 Vetor e fase de esporogoniadesconhecidos; esquizogonia e game- togonia nos glóbulosvermelhos e/ou nascélulas brancas,e nos trom- bócitos; ausênciatotal de pigmentomalárico nos parasitasque ocu- pamos glóbulosvermelhos.

Gênero: lainson, landau & Shaw, 1971 Com as características da Faml1ia. A gametogonia e esquizogonia nos glóbulos vermelhos; os esquizontes exoeritrocitários nos linfó- citas, monócitos e trombócitos

Gênero: Fallisia Lainson,Landau & Shaw,1974 Com as característicasda Famüia. Esquizogoniae gametogoniares- tritas aostrombócitos e às células brancasdo sangue.

-245 PESQUISASSOBRE OS COCCÍDlOSNO INSTITUTO EVANDROCHAGAS

Sub-Ordem: ADELEINA Famllia: HAEMOGREGARINIDAE ("hemogregarinas")

Traballiandono Estadodo Rio de Janeiro,em 1926,Neiva e Pinto encon- traram uma hemogregarinano sanguedo peixe Synbranchusmarmoratus ("muçum"). Combase somentenas formas localizadasnos glóbulos verme- llios do sangueperiférico, o parasita foi consideradocomo uma espéciedo gênero Haemogregarina.ao qual foi dado o nomede H. gomesi. Em 1981, Lainson448 estudouo ciclo evolutivo (Fig. 1) do mesmo parasitado muçum, em Belém,verificando que os gametócitos circulamden- tro dos glóbulos vermellios do sangue,acompanhados por escassosesqui- zontes eritrocitários: foi descoberto,entretanto, que a maturaçãodos esqui- zontes ocorre principalmente nos capilaresdos rins. O vetor natural do pa- rasita é a sanguessugaHaementeria lutzi Pinto, 1920,freqüentemente encon- trada alimentando-seem muçuns recém-capturados.Os gametó-citos maduros são libertados dos glóbulos vermellios na cavidade cecal do intestino da sanguessuga,ocorrendo a associaçãodo macrogametócitoe do rnicrogametá- cito na superfíciedo epitélio intestinal.O microgamet(>citoproduz quatro gametas,com o macrogametócitofertilizado gerando,fmalmente, um oocisto que contém20-30 esporozoítos. A Haemogregarina,por defmição,tem oocistosque apresentamso- mente 8 esporozoítose, assimsendo, o parasitado muçum não pode, clara- mente, ser incluído nessegênero. Por esta razão,o autor propõeo novo nome genéricode Cyrilia para a hemogregarinadesse peixe. A transmissã'oexperi- mental de C. gomesifoi obtida atravésda alimentaçã'ode váriassanguessugas infectadasnum muçum limpo, tendo-severificado o aparecimentodos esporo- zoítos no sangueperiférico do peixe, 12 diasapós a experiência. O primeiro estudosobre uma hemogregarinada Sub-OrdemAdeleina atravésda microscopiaeletrônica, foi feito por Bakere Lainson190 em 1967, que examinarama ultra-estruturade uma espéciedo gêneroHaemogregarina encontradana rã,Rana montezumae(Amphibia: Anura: Ranidae),provenien- te do México.

Faml1ia: HEPATOZOIDAE ("hemogregarinas")

Lainson et ai. 401, encontraram uma espécie de Hepatozoon nos gló- bulos vermelhos de vários espécimesde "mucuras", Didelphis marsupialis e de Philander opossum (Marsupialia), provenientes da floresta do Utinga, Belém,

-246 - e de várias localidades da rodovia Transamazônica,Pará: esquizontes do para- sita foram mostrados em esfregaçose cortes histológicos do fígado dessesani- mais. Outras hemogregarinas,que provavelmentetambém eram espécies de Hepatozoon,foram detectadaspelos mesmosautores, nos glóbulos ver- melhos do roedor Oryzomys capito (Cricetidae),capturado na floresta do Utinga, e nos glóbulosbrancos de um outro roedor, Holochilus brasilien- sis(Cricetidae), proveniente de florestasna fronteira Pará-Suriname.

Sub-Ordem: EIMERIINA

Famllia: (coccídiosintestinais)

Três trabalhos foram publicadossobre material parasitológicoprove- niente de Belize, America Central. Em 1.968, Lainson209,210descreveu dez espéciesnovas de coccídios intestinaisencontradas numa variedadede répteise mamíferos,incluindo-se, entre asmesmas, os seguintesparasitas:

Eimeria bothropis -da cobra (Reptilia: Ophidia) Bothrops atrox. Eimeria pseudemydis -da tartaruga (Reptilia: Chelo{lia) Pseudemysornata Eimeria ameivae -do lagarto (Reptilia : Lacertilia) Ameiva unduIata. Eimeria crocodyli -do jacaré (Reptilia: Crocodilia) Crocodylus acutus wilkiei -do jacaré C. acutus Isospora basilisci -do lagarto, Basiliscus vittatus Eimeria orthogeomyos -do roedor (Mammalia: Rodentia) Orthogeomys grandis scalops. Eimeria poti -da jupará (Mammalia: Procyonidae) Patos flavus Eimeria tamanduae -do tamanduái (Mammalia: Edentata) Tamandua tetra- dactyIa Eimeria rhynchonycteridis -do morcego (Mammalia:' Chiroptera) Rhyn- chonycterns naso

Em adição ao registro dessesnovos coccídios, foram descritas209, pela primeira vez, a esquizogonia e a gametogonia da Eimeria sciurornm Galli- Valerio, 1912, no epitélio do intestino delgado do "serelepe" Sciurus aureo- gaster (Mammalia: Rodentia). Numa terceira publicação 264 sobre material proveniente do Belize, o mesmo autor registrou suas observaçõesa respeito de estágios esquizo- gônicos de um protozoário, não identificado, no fígado e cérebro de um "tatu", Dasypusnovemcinctus (Mammalia: Edentata). Um parasita bem semelhante àquele do tatu, também foi encontrado nos pulmões e no fígado

247- de um bezerro (Bos tauros)proveniente da Inglaterra.Embora os esquizon- tes fossem claramente de um coccídio, a identificação completade ambos os organismosnão foi possível naquela ocasião.Todavia, após a subse- qüente descobertado ciclo evolutivo do gêneroSarcocystis, ficou quasecer- to que o autor estavaobservando os estágiosesquizogônicos deste último parasita.Tanto o tatu, como o gado em geral, são comumentehospedeiros de espéciesde . Foram registradaspor Shaw e Lainson239,em 1969, quatro novas espéciesde Sarcocystisde roedorese de um marsupial,capturados na flores- ta de Utinga, Belém,Pará: Sarcocystis oryzomyose S. azevedoi,do roedor Oryzomys capito; S. proechimyosdo roedor Proechimysguyannensis; e S. marmosaeda "quica", Marmosamurina (Marsupialia).Todos essesparasitas foram descritos atravésde seusestágios císticos, encontrados, em grande nú- mero, nos músculosesqueléticos. Mais uma nova espéciede Sarcocystisfoi descoberta256no mús- culo esquelético do "muçuã", Kinosternonscorpioides (Reptilia: Chelonia), por Lainson e Shaw (1971, 1972), representandoo primeiro registro de Sarcocystisem quelônios (tartarugase cágados),e a quinta espéciedesse gênero descrita em répteis. A esseparasita foi dado o nome de Sarcocystis kinosterni 266. O primeiro isolamentode Isospora gondii (sin. Toxop/asmagondii):;: em Belém,.Pará,foi assinalado,em 1968, por Noura et a/. 215, apósa ino- culação intraperitonial de camundongoscom sangue periférico de um pa- ciente acometido de uma febre de etiologia desconhecida.Em 1973, Shaw e Lainson 287 também registraramtoxoplasmose, aguda e fatal, numa pre- guiça,Ch%epus didacry/us(Mammalia: Edentata), que havia morrido no bio- tério do Instituto EvandroChagas. É mais provávelque a infecção tenhasido adquiridano cativeiro, representandoeste o primeiro registro do parasita numa preguiça,e a terceira ocasiãoem que I. gondii foi isoladode um mem- bro da OrdemEdentata. Várias outras novas espéciesde coccídios intestinais foram descri- tas 280 em répteis e mamíferos examinadosno Instituto Evandro Chagas, incluindo-se,entre as mesmas,os seguintesparasitas: Isospora decipiens,Ei- meria micruri, Eimeria liophi e Eimeria /eimadophiLainson e Shaw1973, nas cobras(Reptilia: Ophidia) Phi/odryasoifersi, Microros filiformis, Liophis co- bellae Leimadophispoecilogyros, respectivamente. Foram feitas, pelos mesmosautores 280, redescriçõesde Caryospora brasiliensisCarini, 1932 na cobra Phi/odryas oifersi (um novo hospedeiro

o gênero ToxoplasmaNicolle e Manceaux,1908 é consideradocomo sinônimo de Isospora(ver Tadrose laarman 1976,1982).

-248 - para esseparasita), e de Eimeriapoecilogyri Carini, 1933em L. poecilogyrns, fornecendo-se,assim, novos detalhesa respeitoda esquizogoniae da esporo- goniadesses parasitas nas células epiteliais do üeo. Dois novos coccídios de desdentados,Eimeria cyclopei e Eimeria choloepi Lainsone Shaw 1982, foram descobertosno "tamanduaí"(Cyclo- pes didactylus) e na "preguiça real" (Choloepus didactylus), respectivamen- te 494. Estes foram os primeiros registrosfeitos sobre infecçãodo gênero Eimeria nessesanimais. Finalmente,outra nova espéciede coccídio, Eimeria trichechi Lain- son, Naiff, Best e Shaw 1983, foi encontradano "peixe-boi"S38Trichechus inunguis (Mammalia: Sirenia),capturado no Estado do Amazonas.O índice de infecção foi de 72% em 22 animaisexaminados, sendo este o primeiro e único coccídio até então descritoentre os membrosda OrdemSirenia.

Famüia: LANKESTERELLillAE ("hemogregarinas")

Em 1974, undau et aI. 299, descreverama esquizogoniae a esporo- gonia de uma nova hemogregarina,Lainsonia legeri,detectada nos monó- citose linfócitos do lagarto, Tupinambusnigropunctatus (ucertilia: Teiidae): ambosos ciclos de desenvolvimentodesse parasita processam-senas células do sistema retículo~ndotelial. Os autores propõem a inclusã:odos três gêne- ros Lankesterella,Lainsonia e Schellackiadentro da mesmaFamüia, unkes- terellidae. O ciclo evolutivo de uma nova hemogregarina,Schellackia landauae uinson, Shawe Ward 1976, foi estudado 327 no lagarto Polychrusmarmo- ratus (ucertilia: Iguanidae)(Fig. 2). Os esporozoítoslocalizam-se, de prefe- rência, nos glóbulos vermelhos e, menos freqüentemente,nos linfócitos e nos monócitos. A transmissãoexperimental do parasita foi feita a três P. marmoratus,nã:o infectados, através da alimentaç'ão desseslagartos com mosquitos (Culex pipiens, criados no laboratório) que haviam feito, 14 dias antes, um repasto sangüíneonum lagarto infectado. ,A esquizogonia, gametogonia,e fertilizaç'ão dos macrogametócitosocorrem nascélulas epiteliais dessesrépteis, com os zigotos penetrandoativamente na lâmina própria, onde os oocistosamadurecem. Outras espéciesde Schellackiaforam comparadascom a S. landauae: os autores ilustraram uma gradaçã:ode preferênciapelo epitélio intestinal entre as espéciesconhecidas, consolidando a hipóteseda evoluçã:odos coccí- dios "mais elevados"(como Eimeria e Isospora)através de um parasitaocto- zóico, e fecalrnentetransmitido, como o gêneroTyzzeria.

-249 - Sub-Ordem: HAEMOSPORINA (Os "parasitas maláricos")

(a) Faml1ia: PLASMODlIDAE

Estudos sobre espéciesde lagartosamazbnicos revelaram novos hos- pedeirosde Plasmodiumdiploglossi e tropiduri Aragaoe Neiva, 1909; e dePlasmodium cnemidophoriCarini,1941. O P. diploglossifoi registrado,pela primeira vez,por Aragáoe Neiva, no lagarto Diploglossusfasciatus (Anguidae)no Estadode Río de Janeiro. Embora esseplasmódio tenha tido a distinyáo de sera primeira espéciedo genero Plasmodium descrita num lagarto do Novo Mundo,o mesmonao foi visto novamentepor 59 anos,até ser redescoberto231 em outra espécie de lagarto,Mabuya mabouya (Scincidae),por Lainson e Shaw,em 1968. A mesilla espéciede calango foi também encontradaapresentando infecyáo por P.tropiduri: este parasitasó havia sido observadoanteriormente em Tropidurns torquatus(Iguanidae) 231. P. cnemidophorifoi descritopela primeira vez por Carini, em Cnemi- dophorns lemniscatus(Teüdae), no Estadode Goiás,tendo sido subseqüen- temente encontrado por Lainson e Shaw 231 no calangocomum, Ameiva ameiva(Teüdae), no Pará,em 1968. Finalmente, urna nova espéciede Plasmodium.P. vacuolatumLain- son, Shawe Landau 1975, foi descrita316, no lagartoPlica umbra (Iguani- dae), proveniente da floresta do Utinga,Belém" Pará (Pranchaa coresA. Figs,1-10).

(b) Famt1ia: HAEMOPROTEIDAE

Em 1938,o ProfessorLeonidas Deane e a Dra. Maria Deane,en contra- ram dais morcegos,Glossophaga soricina soricina PalIas, 1766 -captu. rados num banana1em Piratuba, Município de Abaetetuba,Pará -infecta- dos com um parasita ma1árico.Foram feitas ilustra90esdos gametócitosdes- se parasita dentro dos glóbulos vermelhos,mas os esfrega90sde sangue foram subseqüentementeperdidos, e a descri9ao137 do mesmosó foi pu- blicada 13 anos depois, em 1961. A única referenciafeita anteriormente na literatura a um parasita maláricode morcegosno Novo Mundo haviasido por Wood (1952), que descreveu parasitassemelhantes em espécimesde Antrozous pallidas e Pipistrellushesperus. na Californiae no Texas,E.U.A., respectivamente. Em outubro de 1969 -acompanhados pelo ProfessorP.C.C. Gar- nham F.R.S., da Escolade Higienee MedicinaTropical de Londres -visita- mos no Município de Abaetetuba,redescobrindo, fmalmente, o mesmopara-

250- sita em outra espéciede morcego,Myotis nigricans nigricans Schinz1821. Um único exemplar desta espécie foi examinado,mostrando escassos gametócitos(maduros e imaturos)nos glóbulos vermelhos.Não foi encon- trada evidência de esquizogoniaexoeritrocítica em cortes histológicos do baço, fígado, rim e coração. Por outro lado,no entanto, cortes histológicos de espécimesda mosca ectoparasítica, Basilia esp., retirados do morcego em questão,revelaram oocistos maduros,contendo centenasde esporozoí- tos. o novo parasitafoi nomeado254Po/ychromophi/us deanei Garnham, lainson e Shaw 1971, em homenagemaos nossosvelhos amigose colegas,Leônidas e Maria Deane.

(c) Famüia: LEUCOCYTOZOIDAE

Até 1969 haviam sido reconhecidosapenas dois gênerosna Famüia Leucocytozoidae;ou seja,Leucocytozoon e Akiba. Ambos sãoparasitas de aves, e caracterizadospor gametócitosvolumosos, sem pigmento malárico, ocorrendo nos glóbulosvermelhos imaturos e nos glóbulosbrancos do sangue periférico. Em 1969, entretanto, examesdo sanguede vários espécimesdo la- garto Tupinambus nigropunctatus(Teiidae), o "jacuruaru" ou "jacuraru", revelaram229 a presençade um terceiro parasita da Faml1iaLeucocytO- zoidae,ao qual foi dado o nome de Saurocytozoon tupinambi Lainsone Shaw1969. Os gametócitos,desenvolvem-se nos linfócitos e nos glóbulos vermelhos imaturos: o ciclo esquizogôniconão foi, porém, encontrado até o momento. Apesar do vetor natural do novo gênero ainda ser desconhecido, o seuciclo esporogônicofoi estudado,por Landau et aI., 283, em exempla- res do mosquito, Culexpipiens,. criados no laboratório e alimentadosnum lagartoinfectado. Os oocistos desenvolvem-sedentro das células epiteliais do estômagodo inseto: são volumosos,e contêm esporozoítos em grande número. Essescaracteres separam o gêneroSaurocytozoon de Akiba e de Leucocytozoon, ambos os quais possuemoocistos pequenos,que encer- rampoucos esporozoítos. Uma segunda espéciede Saurocytozoonfoi também descrita 296 em outro tipo de lagarto, Mabuya mabouya. O parasita, Saurocytozoon mabuyi Lainson, Landau e Shaw 1974, distingue-sede S. tupinambi pe- los seusgametócitos, que são consideravelmentemenores: embora o desen- volvilhento de S. mabuyi -até a produção de oocinetos -tenha sido obtida em CUlexpipiens experimentalmenteinfectado, o vetor natural do parasita permanecedesconhecido.

-

-251 (d) Familia:

o achado mais empolgante sobre os coccídios de lagartos, obtidos durante as pesquisas acima mencionadas, foi, sem dúvida, a descoberta de um novo grupo de hemoprotozoários, pertencentes a uma nova FamI1ia que designamos 255 de Gamiidae, em homenagem ao Professor P.C.C. Gar- nham, que tanto tem contribuído para o campo da malariologia. A definição da Faml1ia Garniidae, e os critérios que a separam das FamI1ias Plasmodüdae, Haemoproteidae e Leucocytozoidae, encontram-se na Tabela I. A FamI1ia contém somente dois gêneros -Garnia e Falli- sia: até recentemente, todas as espécies descritas eram parasitas de lagartos (Lacertilia) neotropicais. Em 1985, entretanto, uma representante da Faml1ia Garniidae (uma espéciede Fallisia) foi encontrada pela primeira vez em aves,na Venezuela, por Gabaldon et ai. As espécies do gênero Garnia têm seus ciclos de esquizogonia e ga- metogonia nos glóbulos vermelhos, e não produzem pigmento em qualquer fase de seu desenvolvimento (Prancha a cores A. Figs. 11-19). Ê possível encontrar-se um número variável de grânulos azurofl1icos no cÍtoplasma dos organismos em questão; mas, ao contrário do pigmento malárico, essasin- clusões são completamente invisíveis à luz polarizada. O gênero Fallisia desenvolve ambos os ciclos de esquizogonia e de ga- metogonia nos trombócitos e nos glóbulos brancos do sangue perIférico, não apresentando qualquer evolução nos glóbulos vermelhos (Prancha a cores B. Figs. 20-34). Por esta característica essesparasitas são facilmente distinguidos daqueles do gênero Garnia. Além da descrição de várias espécies dessesdois gêneros 255, 295, 296,316 em 'lãgartos brasileiros, os autores transferiram alguns hemospo- rozoários -erradamente descritos como espéciesde Plasmodium -para o gê- nero Garnia. Tais parasitas foram previamente considerados como membros do gênero Plasmodium, devido a impressão errônea de que as inclusões azuro- fílicas, presentes no citoplasma dos mesmos, eram pigmento malárico. O uso de luz polarizada no microscópio comum e os estudos feitos através do mi- croscópio eletrônico, já confirmaram conclusivamente, entretanto, a ausência total de pigmento nos parasitas da FamI1ia Garnüdae. As espécies deste interessante grupo, já descritas por nosso laborató- rio, incluem os seguintes parasitas:

Garnia gonatodi (Te1ford, 1970). novo comb., Lainson, Landau e Shaw, 1971, no lagarto Gonatodes humeralis (Sphaerodactylidae). Garnia morula (Te1ford, 1970) novo comb. Lainson, Landau e Shaw, 1971, em Mabuya mabouya (Scincidae ).,

-252 - Garnia telfordi Lainson, Landau e Shaw 1971, em Ameiva ameivaameiva (Teiidae). Garnia utingensisLainson, Landau e Shaw 1971, em Anolis punctatus(Igua- nidae). Garnia multiformis Lainson, Shaw e Landau 1975, em Plica umbra (Iguani- dae). Garniauranoscodoni Lainson, Shawe Landau 1975, em Uranoscodonsuper- ciliosa (Iguanidae)(Ver Pranchaa coresA Figs. 11-19).

Fallisia effusa Lainson, Landau e Shaw 1974, em Neusticurus bicarinatus (Teüdae). Fallisia modesta Lainson, Landau e Shaw 1974, em Tropidurus torquatus hispidus(Iguanidae). Fallisia audaciosa Lainson, Shawe Landau 1975, em Plica umbra (Iguani- dae)(ver Pranchaa coresB. Figs. 20-26). Fallisia simplex Lainson, Shawe Landau 1975,em Plica umbra (Ver Prancha a coresB. Figs. 27-34).

Novos estudos em andamento irão, possivelmente, esclarecer, de ma- neira mais nítida, as afmidades taxonômicas dessesparasitas da Faml1ia Garniidae; especificamente no que diz respeito às observações sobre seus vetores e detalhes de seu ciclo esporogônico.

AGRADECIMENTOS

Essaspesquisas foram realizadasatravés dos auspíciosda Wellcome Trust, Londres e do Instituto EvandroChagas da FundaçãoSESP. Somosmuito gratospela assistênciatécnica de: Sra. ConstânciaMaia Franco, Sr. Roberto Daibes Naiff e Sr_.Antonio Julio de Oliveira Montei-ro. Queremos agradecer,também, à Srta. SimoneRosa de Oliveirapela parte de datilografia do manuscrito deste capítulo, e aos seguinteseditores pela permissãodada para o uso do material ilustrativo: Society of Protozoolo- gists (Fig. 1), e Cambridge UniversityPress (Fig. 2 e Pranchasa cores A eB).

-253 - REFERENOAS

GABALDON, A.; ULLOA, G.; ZERPA, N. Fallisia (Plasmodioides)neo- tropicalis subgen. novo sp. novo from Venezuela.Parasitology 90; 217-225,1985. LEVINE, N.D.; CORLISS,J.O.; COX, F.E.G.; DEROU:X:,G.; GRAIN, J.; HONIGBERG, B.M.; LEEDALE, G.F.; LOEBilCH, A.R.; LOM, J.; LYNN, D.; MERINFELD, E.G.; PAGE, F.C.; POUANS- KY, G.; SPRAGUE,V.; VAVRA, J.; WALLACE, F.G.; Anewly- revised classification of the Protozoa. 1: Protozool, 27, 37-58. 1980. NEIV A A. & PINTO C Contribuição para estudo doshematozoários do Brasil An. Fac. Med.S. Paulo. 1,79-82, 1926. T ADROS,W. & LAARMAN, J.J. Sarcocystisand related coccidianparasi- tes: a brief generalreview, together with a discussionon somebiolo- gical aspectsof their life cyclesand a new proposalfor their clas- sification.Acta Leidensia,44, 1-107,1976. TADROS, W. & LAARMAN, J,J. Current .concepts on the biology,evolu- tion, and of tissue cyst-forming Eimerüd coccidia. Adv. inParasitol.. 20, 293-468,1982. WOOD, S.R. Mammal blood parasiterecords from S. W. United Statesand Mexico. 1: Parasitol.. 38,85-86,1952.

-254 - LEGENDAS

Fig. 1. Ciclo evolutivo da hemogregarina Cyrilia gomesi (Neiva e Pinto, 1926), no peixe Synbranchus marmoratus e na sanguessugaHaementeria lutzi (segun- do Lainson, 1981448). A. Esporozoítos, injetados pela sanguessuga,pene- trando nos glóbulos vermelhos do peixe. B-H. Geraçõessucessivas de esquizon- tes em glóbulos vermelhos, predominantemente nos capilares do rim. I e J. Desenvolvimento dos gametócitos dentro dos glóbulos vermelhos. K. Micro- gametócito, maduro, no sangue periférico. L. Macrogametócito, maduro, no sangue periférico. Me N. Microgametócitos e macrogametócitos libertados dos glóbulos vermelhos, na cavidade cecal do intestino da sanguessuga.O. Associação do macrogametócito e do microgametócito na superfície do epité- lio intestinal da sanguessuga.P. Microgametócito, produzindo 4 gametas. Q. Macrogametócito fertilizado, mostrando os gametas residuais presos à super- fície. R-V. Divisão do núcleo do zigoto, produzindo 20-30 esporozoítos dentro do oocisto. V. Esporozoítos, de oocistos rompidos, migrando para a proboscide da sanguessuga,de onde serão inoculados no próximo peixe.

Fig. 2. Ciclo evolutivo da hemogregarinaSchellackia landauae. no lagarto Polychrus marmorafl.Js,e no mosquito Culex pipiens (segundo Lainson et ai., 1976 327). A. Esporozoíto dentro de uma célula epitelial do estô- mago do mosquito, 14 dias após um repastosangüíneo num lagarto infec- tado. B. Esporozoítospenetrando nas célulasepiteliais do intestino delga- do do P. marmoratus, após a alimentaçãodo animal com mosquitos infectados, C e D. Desenvolvimentodos microesquizontese micromerozoí- tos. E e F. Crescimentodos macroesquizontese macromerozoítos.G. Divi- são assexuadanos monócitos e linfócitos do baço e do fígado; aparente- mente por endodiogenia,produzindo grupos de taquizoítos. H e I. Cres- cimento dos microgametócitose fertilização dos macrogametócitosdentro das célulasepiteliais do intestino delgado. J e K. Entradados macrogametó- citos fertilizados (zigotos) na lâmina própria do intestíno: desenvolvimento dos oocistos que contêm 8 esporozoítos. L. Liberaçãodos esporozoítos de oocistos rompidos: penetraçãode esporozoítosnas células retículo- endoteliais,e invasão dos ,capilares.Me N. Penetraçãonos glóbulos bran- cos e vermelhosdo sangueperiférico. O. Esporozoítos,em diapausa,nas células retículoendoteliaisdo fígado,pulmão e outros órgãos.

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~')"!-,.~ Fig. 2.. Ciclo evolutivo da hemogregarina Sche//ackia /andauae. no lagarto Po/ychrns marmoratus.

257 Prancha a Cores A Figs. 1 -10. Plasmodiumvacuo/atum Lainson, Shaw e Landau 1975316, nos glóbulosvermelhos do lagarto Plica umbra. 1 e 2. Trofozoítos jovens, mostrando um vacúolo conspícuo. 3-5. Esquizontesem desenvolvimento, com abundante pigmento no vacúolo. 6. Esquizonte,quase maduro, em forma de leque. 7 e 8. Microgametócitoe macrogametócitojovens. 9 elO. Macrogametócitoe microgametócitomaduros.

Figs.11-19. Garnia uranoscodoniLainson, Shawe Landau 1975 316, nos glóbulos vermelhos do lagarto Uranoscodonsuperei/iDoSa. 11. Trofozoí- tojovem; 12.Dois. esquizontes desenvolvendono mesmoglóbulo vermelho. 13. Esquizonte" quasemaduro. 14 e 15. Esquizontes exoeritrocíticos, dentro de um linfócito e de um trombócito, respectivamente.16. Esquizon- te, maduro, em forma de leque; e um microgametócitojovem. 17. Macro- gametócito jovem. 18. Microgametócitomaduro. 19. Macrogametócitoma. duro. Notar a ausência total de pigmento malárico em todas as fasesde de- senvolvimentodo parasitanos glóbulos vermelhos.

Pranchaa CoresB. Figs.20-26. Fallisia audaciosa Lainson, Shaw e Landau1975 316, nos neutrófllos do lagarto Plica umbra. 20. Tro[ozoíto jovem. 21-23. Esqui- zontes -em desenvolvimento e maduros. 24. macrogametócito:maduro, mostrando os grânulos azurofüicos bem conspícuos. 25. Microgametóci- to maduro.26. Dois gametócitosmaduros e um esquizontejovem, no mesmo neutrófilo.

Figs, 27-34 Fallisia simplex Lainson, Shaw e Landau 1975316,nos trom- bócitos do calangoPlica umbra. 27. Trofozoíto jovem. 28 -30. Esquizon- tes em desenvolvimento.31, 32 -Microgametócito e macrogametócito,ma- duros.33,34. Infecçõesde trombócitos com um único gametócitoe com dois gametócitos,respectivamente, mostrando deformação das células hospedeiros.

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