UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE – UFF INSTITUTO DE ARTES E COMUNICAÇÃO SOCIAL – IACS PROGRAMA DE PÓS-GRUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL – PPGCOM VITOR GURGEL DE MEDEIROS AMORES INTERESSANTES: PROCESSO, FORMA E AFETO NO CINEMA DE HONG SANG-SOO Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para a obtenção do Grau de Mestre. Linha de Pesquisa: Estudos do Cinema e do Audiovisual. ORIENTADORA: Profa. Dra. Mariana Baltar Niterói, RJ 2018 Ficha catalográfica automática - SDC/BCG M488a Medeiros, Vitor Gurgel de Amores interessantes: processo, forma e afeto no cinema de Hong Sang-soo / Vitor Gurgel de Medeiros ; Mariana Baltar, orientadora. Niterói, 2018. 153 f. : il. Dissertação (mestrado)-Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2018. DOI: http://dx.doi.org/10.22409/PPGCOM.2018.m.13905890720 1. Linguagem cinematográfica . 2. Coréia do Sul . 3. Narrativa . 4. Direção de cinema. 5. Produção intelectual. I. Título II. Baltar,Mariana, orientadora. III. Universidade Federal Fluminense. Instituto de Arte e Comunicação Social. CDD - Bibliotecária responsável: Angela Albuquerque de Insfrán - CRB7/2318 VITOR GURGEL DE MEDEIROS AMORES INTERESSANTES: PROCESSO, FORMA E AFETO NO CINEMA DE HONG SANG-SOO Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para a obtenção do Grau de Mestre. Linha de Pesquisa: Estudos do Cinema e do Audiovisual. Aprovada em 22 de maio de 2018. BANCA EXAMINADORA Profa. Dra. Mariana Baltar (orientadora) Universidade Federal Fluminense Prof. Dr. Fernando Morais da Costa Universidade Federal Fluminense Prof. Dr. Denilson Lopes Universidade Federal do Rio de Janeiro Niterói, 2018 DEDICATÓRIA À memória dos colegas UFFianos Luiz Giban e Marielle Franco, cujas vidas foram interrompidas durante o processo de escrita desta dissertação. Foi difícil prosseguir. Contudo, suas dolorosas partidas fortaleceram redes de afeto e esperança que muito me inspiraram e me fizeram perceber o quanto nossas existências ultrapassam aquilo que entendemos como vida. Sigamos juntos e presentes. 1 AGRADECIMENTOS A Laurita e Jeziel Medeiros, as duas pessoas mais incríveis que já conheci neste planeta e que me deram o suporte necessário para a realização deste trabalho. A André Antônio, Jocimar Dias Jr., Paulo Faltay e Elianne Ivo, pela ajuda nas etapas iniciais. A Mariana Baltar, por ter acreditado no projeto, pela parceria e pela condução ao longo de toda a trajetória. A Laís Ferreira, pelo encontro que se estendeu da academia à vida. A Camila Suzuki e todos os colaboradores da Revista Moventes, pelas partilhas de ideias. Aos frequentadores do Cineclube Hong Sang-soo (em especial, Caio Tavares, o mais assíduo), a Samuel Brasileiro, Isabel Veiga e Luíza Alvim, pelas conversas que enriqueceram meu olhar sobre esta filmografia. A Maíra Maranhão, Viviane Luz e Soleil Lee, por me aproximarem da cultura coreana. A Carolina Amaral pelo apoio com as comédias românticas. A Ruy Gardnier, pela digitalização das Cahiers. Aos alunos que cursaram a disciplina Tópicos de Crítica do Cinema e Audiovisual, pelas trocas e discussões. A Denilson Lopes e Fernando Morais, pela generosidade nas críticas e ponderações desde a qualificação. A Luciana e Nilson pelo atendimento sempre gentil na secretaria do PPGCOM. À CAPES, pelo financiamento da pesquisa. Às plataformas de compartilhamento virtual Making Off, Library Genesis e Sci-hub, por contribuírem para a democratização do acesso às ciências e às artes. E a todos os amigos e familiares que me apoiaram nesta jornada. 2 RESUMO Esta dissertação se propõe a verificar como a obra do cineasta Hong Sang-soo retoma gestos identificáveis em diversos momentos da história do cinema, atualizando-os a partir do contexto específico da indústria de entretenimento sul-coreana e consolidando-se no circuito "de arte" do cinema contemporâneo mundial. A perspectiva trabalhada é a de que o realizador em questão logrou sistematizar um processo de produção bastante rígido e, paradoxalmente, com ênfase em fatores contingenciais, atrelado a uma forma fílmica singular que, por sua vez, convoca o espectador a uma experiência marcada pelo afeto "interessante". Nossa análise é direcionada a três aspectos dessa forma fílmica: a serialidade como elemento estrutural; a teatralidade da encenação; e o tensionamento de convenções das comédias românticas. Palavras-chave: Cinema contemporâneo. Cinema coreano. Mise en scène. Estudos da narrativa. Gêneros cinematográficos. 3 ABSTRACT This research proposes to verify how the work of filmmaker Hong Sang-soo retakes identifiable gestures from various moments in the history of cinema, updating them from the specific context of the South Korean entertainment industry and consolidates itself in the worldwide arthouse circuit of contemporary cinema. The perspective worked here is that the director in question managed to systematize a rather rigid production process with, paradoxically, an emphasis on contingency factors, linked to a singular film form that, therefore, invites the viewer to an experience marked by the "interesting" affection. Our analysis is focused on three aspects of this film form: seriality as a structural element; the theatricality of staging; and the tensioning of romantic comedy conventions. Keywords: Contemporary cinema. Korean cinema. Mise en scène. Narrative studies. Film genre. 4 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 6 O CARROSSEL DE HONG 7 SENTIMENTOS À DERIVA EM UM PAÍS FRATURADO 8 UM MÉTODO PROCESSUAL 14 ENTRE O TÉDIO E O INTERESSE 22 ESTRUTURA DO TRABALHO 26 1 - REPETIÇÕES DIFERENTES, ACASOS PROVOCADOS 29 1.1 - GEOMETRIA E FRAGMENTAÇÃO 30 1.2 - VARIANDO PARÂMETROS 40 1.3 - A MATÉRIA ABSTRATA DO TEMPO 52 1.4 - DISPOSITIVO AUTORAL 58 2 - A QUARTA PAREDE PERFORMATIVA 69 2.1 - PARADOXOS DO TEATRO FILMADO CONTEMPORÂNEO 70 2.2 - APONTAR E PONTUAR 83 2.3 - A MÚSICA QUE APARECE 98 3 - A BANALIDADE DO AMOR 105 3.1 - CONVENÇÕES DO DESEJO 106 3.2 - CONFLITOS DE GÊNERO 118 3.3 - O SISTEMA E AS ESTRELAS 125 CONSIDERAÇÕES FINAIS 136 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 141 ENTREVISTAS TRANSCRITAS 151 FILMOGRAFIA 152 5 INTRODUÇÃO Imagem 1: Hong Sang-soo Hong Sang-soo faria parte dessa família de artistas que "assinam sempre a mesma obra"? (Joachim Lepastier)1 Depois de ver os seu filmes, eu disse: "este é um gênio que atingiu a grandeza com apenas três filmes." (Gong Hyeon-hee, personagem de Como Você Sabe Tudo) Quem você pensa que é, um diretor de cinema? (Kim Kyung-soo, personagem de Turning Gate) 1 In: LEPASTIER, 2012, p. 20. 6 O CARROSSEL DE HONG Lançando, em média, um longa-metragem novo a cada ano, o sul-coreano Hong Sang-soo se consolidou, nas duas últimas décadas, como um dos principais diretores no circuito de festivais internacionais e no mercado interno de seu país. Em 2017, Hong bateu um recorde pessoal e estreou três longas (um no Festival de Berlim e dois em Cannes, totalizando dez filmes exibidos neste festival ao longo de sua carreira), dos quais assina o roteiro, a produção e a direção. Sua obra se insere no meio cinematográfico mundial colocando em xeque diversas balizas de um certo bom gosto estético e qualidade técnica em filmes ficcionais. Esse enorme volume de produtos é realizado com baixíssimos orçamentos, as histórias são banais, muito parecidas umas com as outras - geralmente sobre artistas vivendo momentos de bebedeira, encontros fortuitos, triângulos (ou quadriláteros) amorosos - e encenadas de uma maneira bastante simples, com câmera predominantemente fixa e ênfase nos longos diálogos. Todavia, tais filmes circulam ao lado de produções e coproduções multimilionárias, gerando repercussão crítica e, eventualmente, a conquista de prêmios em festivais com grande cobertura midiática. O presente projeto de pesquisa nasceu de uma dificuldade de identificar os filmes de Hong em uma linhagem no cinema contemporâneo mundial, devido à sua especificidade. O nome de Hong Sang-soo aparece fortuitamente em certos livros, artigos, dissertações e teses, mas é uma tarefa difícil rotular seu cinema, associá-lo a alguma tendência ou conjunto de procedimentos formais pré-determinados e adotados por outros cineastas. Como afirma Ruy Gardnier em um artigo publicado na revista eletrônica Contracampo: Hong conseguiu criar um cinema que não parece com nenhum outro no cinema contemporâneo e parece bastante consigo mesmo: não uma identidade reiterativa e autocomplacente, mas um verdadeiro estilo que brota da exploração sistemática de um mesmo universo, sabendo de forma impressionante se reinventar a cada filme e manter seu carrossel rodando. (GARDNIER, 2005) O curioso é que Gardnier escreveu esse texto depois do lançamento do sexto longa de Hong (Conto de Cinema) e, mais de uma década depois, o realizador fez outras 16 obras - entre longas e curtas - e essa afirmação continua pertinente. Hong seguiu com as mesmas obsessões estéticas, radicalizou seu processo de produção rumo a uma estrutura mínima e seu carrossel continua rodando. Não nos interessa, aqui, atestar se seu estilo é "verdadeiro" (como afirma Gardnier) ou falso, mas observar como esses filmes habitam uma zona limítrofe entre o cinema "de arte" e 7 um cinema mais popular, conforme escreve o crítico Gary Shannon sobre um dos filmes mais recentes de Hong: "Ainda que consistentemente engraçado, A Câmera de Claire nunca chega à farsa, e mesmo que seja formalmente preciso, nunca alcança verdadeiramente a alta arte" (SHANNON, 2018)2 Engraçado, mas não farsesco; formalmente preciso, mas sem conseguir atender
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