Análise da concentração de flúor em águas minerais na região de Araraquara, Brasil Ioneide Maria Gomes Brandão1 e Aylton Valsecki Junior1 RESUMO Está comprovado que indivíduos de todas as idades podem ser beneficiados pelos efeitos tópicos e sistêmicos da fluoretação da água de consumo. Entretanto, o aumento no consumo de água mineral comercial, em substituição ou em adição à água de abastecimento público, pode trazer implicações para a suplementação segura deste íon. Partindo-se disto, em 1995 analisamos a concentração de íon flúor presente em 31 marcas comerciais de água mineral na região de Ara- raquara, estado de São Paulo, Brasil. O resultado desta análise foi comparado à concentração deste íon especificada no rótulo do respectivo produto. Apenas 25% dos produtos especificavam em seus rótulos o teor de flúor. Além disso, o estudo revelou que, dentre as 31 marcas de água mineral analisadas, 26 especificaram a data da análise em seus rótulos. Destas, 20 não haviam realizado uma análise química anual da água, embora isto seja exigido por lei. Considerando os resultados obtidos e considerando o produto em questão como única fonte de água consumida, em 69% das amostras analisadas deveria haver suplementação de íon flúor. No caso das crian- ças até 6 anos que utilizam produtos contendo flúor, como géis para aplicação tópica, soluções para bochechos ou dentifrícios, a suplementação deveria ser sugerida apenas quando a água industrializada fosse a única fonte de água utilizada inclusive para o preparo de alimentos. A fluoretação da água de abasteci- zir a prevalência de cárie dental, sendo apresentam maior número de dentes mento público é o método coletivo tal fato atribuído 1) à ingestão pré- naturais. Além disso, a prevalência de mais eficaz de prevenção da cárie, de eruptiva de flúor, que possivelmente desdentados totais e de lesões de cárie melhor relação custo-benefício, por ser altera a estrutura cristalina do dente, de raiz é menor entre estes adultos, capaz de atingir todos os segmentos tornando o esmalte mais resistente aos quando comparados a adultos resi- da população, independentemente da ácidos; 2) à presença de flúor na cavi- dentes em regiões não abastecidas por idade e do nível socioeconômico ou dade bucal no período pós-erupção, água fluoretada (4). Outros estudos sa- cultural. Tal fato tem sido compro- reduzindo a solubilidade do esmalte lientam que o consumo de água fluo- vado por inúmeros estudos desenvol- dental, tornando-o mais resistente aos retada contribui para o controle da vidos em diferentes partes do mundo ácidos, favorecendo a remineralização doença periodontal, tanto indireta- nos últimos 50 anos (1). e interferindo na formação e no meca- mente, interferindo na prevalência de Pequenas quantidades de flúor na nismo da placa bacteriana e 3) à com- cárie, como diretamente, por modifi- água de consumo são capazes de redu- binação dos fatores anteriores (2, 3). car a qualidade da placa bacteriana e Cabe ressaltar a importância do mé- reduzir a energia superficial do es- todo de fluoretação da água para a malte (5–7). Ou seja, indivíduos de saúde bucal como um todo. Diversos todas as idades podem ser beneficia- 1 Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Odontologia de Araraquara, São Paulo, Brasil. estudos têm demonstrado que adultos dos pelos efeitos tópicos e sistêmicos Correspondência e pedidos de separatas devem residentes desde o nascimento, ou por da fluoretação da água de consumo. ser enviados a Ioneide M. Gomes Brandão no seguinte endereço: Avenida Monteiro Lobato um período superior a 25 anos, em re- Vários estudos também têm demons- 1797, CEP 14801-220, Araraquara, SP, Brasil. giões abastecidas por água fluoretada, trado que a suplementação diária de 238 Rev Panam Salud Publica/Pan Am J Public Health 4(4), 1998 flúor, em regiões onde a concentração se comparam marcas distintas de água As soluções utilizadas foram TISAB natural deste íon na água é inferior à mineral. Diversos estudos (11, 18, 19) (total ionic strength adjustment buffer) e concentração ótima, produz os mes- encontraram grandes variações ao soluções-padrão com concentrações de mos benefícios (8). Tal informação comparar o conteúdo de flúor de dife- 0,1 e 1,0 mgF –/L. As soluções foram torna-se de relevada importância frente rentes marcas de águas minerais; o mantidas em frascos de polietileno ao fato de que apenas cerca de 45% dos destaque fica por conta de um estudo (21). Os produtos a serem analisados municípios do estado de São Paulo no qual as concentrações variaram foram mantidos em seus recipientes têm seu sistema de abastecimento entre 0,74 e 8,96 ppmF (15). No Brasil, originais e abertos somente no dia da público com fluoretação controlada a Empresa de Apoio Tecnológico e análise. (9), embora isto esteja regulamentado Consultoria Ambiental (20) analisou a As amostras carbogasosas, imedia- em lei federal (10). concentração de íon flúor em 10 mar- tamente após a abertura do recipiente, Outro fato a ser analisado é o au- cas de água mineral e encontrou uma foram agitadas com um bastão magné- mento substancial do consumo de variação de 0 a 1,42 ppmF. tico durante 15 minutos, para que o água mineral engarrafada industrial- Face à importância do flúor nas gás carbônico fosse eliminado, antes mente (11–13), talvez em razão da águas de consumo, associada ao au- de serem preparadas para a leitura da degustação mais agradável, menor mento progressivo do consumo de concentração de íon flúor (19). quantidade de impurezas e menor águas minerais industrializadas, o O equipamento foi calibrado antes possibilidade de contaminação por objetivo da presente pesquisa foi das análises com as soluções-padrão doenças de veiculação hídrica, como 1) analisar a concentração de íon flúor preparadas (0,1 e 1,0 mgF –/L) em o cólera, e pelo status que confere ao presente em águas industrializadas; e volume de 5 mL, diluídas com TISAB consumidor (11). Partindo do princí- 2) avaliar a concordância entre os na proporção de 1:1. A cada 10 leitu- pio de que as fontes de água são inú- resultados da análise e as informações ras, nova calibração era realizada. meras, torna-se essencial conhecer o presentes nos respectivos rótulos. Todas as soluções, assim como as teor de flúor na água que está sendo amostras envolvidas, se apresenta- ingerida previamente à prescrição da vam, no momento da análise, à tempe- suplementação, assegurando os bene- MATERIAIS E MÉTODOS ratura de 25 oC. fícios do método sem o risco de fluo- Foram obtidas duas amostras de rose dental. Analisou-se a concentração de íon cada produto (5 mL), utilizando-se Com tal objetivo, alguns autores ana- flúor em 31 marcas de água industria- para isto pipetas volumétricas de 5 lisaram a concentração de íon flúor em lizadas, adquiridas em estabelecimen- mL. Tais amostras foram preparadas águas minerais e observaram que ape- tos comerciais na cidade de Arara- para análise através de diluição na nas uma parcela dos produtos analisa- quara no ano de 1995 e provenientes proporção de 1:1 com o TISAB. Uma dos continha tal informação no respec- de 27 fontes distintas, totalizando 32 média aritmética foi obtida a partir das tivo rótulo: em dois estudos realizados amostras. Destas, nove marcas apre- duas análises realizadas para cada na Inglaterra (12, 14), o teor de flúor era sentavam como característica particu- produto. Nos casos em que o produto indicado em apenas 58% e 25% das lar o fato de serem carbogasosas. Um trazia informação sobre o teor de flúor marcas analisadas, respectivamente; já recipiente de cada produto foi adqui- no rótulo, esta informação foi compa- em estudo realizado na França (15), o rido em supermercados (n = 20), distri- rada ao resultado da média aritmética. teor de flúor estava indicado no rótulo buidores de água mineral (n = 11) ou de 33% das marcas de água mineral revendedores de produtos importados analisadas; e, em um estudo nos Esta- (n = 1). O tipo e capacidade de cada RESULTADOS dos Unidos, encontrouse informação recipiente (mL), data da análise quí- sobre o teor de flúor nos rótulos de mica realizada pelo fabricante, data de As concentrações médias de íon águas minerais em 37,5% das marcas engarrafamento e validade dos produ- flúor obtidas, assim como as especifi- analisadas (16). Dentre as marcas que tos são apresentados no quadro 1. cadas no rótulo (quando presentes), de informavam o teor de flúor, este dado O equipamento que utilizamos para acordo com a denominação comercial, nem sempre esteve em concordância nossa análise química constou de ana- nome e local da fonte são apresentadas com os resultados obtidos por análise lisador específico de íons (SA-720 — no quadro 2. As concentrações obtidas química. Foram constatadas variações PROCYON); eletrodo seletivo para íon por análise química variaram entre consideráveis entre a informação do flúor (94-09 — ORION); eletrodo de 0,02 e 1,38 mgF –/L. rótulo e o resultado das análises, sendo referência Ag/AgCl de junção simples Neste estudo, dois produtos analisa- tais variações compreendidas entre (90-01 — ORION); agitador magné- dos (6,25%) apresentaram valores para 0,01 e 0,37 ppmF (12); 0,01 e 0,96 ppmF tico; bastões magnéticos; pipetas volu- a concentração de fluoretos que esta- (16); 0 e 0,2 ppmF (14); e 0,01 e 0,5 métricas de 5 mL (amostras); bureta vam acima do limite máximo permi- ppmF (17) (1 ppmF = 1 mgF –/L). com torneira esmerilhada de 25 mL e tido por lei (>1,0 mg/L) (22). Deve-se destacar a grande variação béqueres plásticos para o preparo das Oito marcas traziam informação na concentração de íon flúor quando amostras para análise. sobre a concentração de flúor. Dentre Rev Panam Salud Publica/Pan Am J Public Health 4(4), 1998 239 QUADRO 1.
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