Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP CARLA MIRANDA B. DE FREITAS A COLABORAÇÃO NO JORNALISMO: do Arizona Project aos Panama Papers DOUTORADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA São Paulo 2016 Carla Miranda B. de Freitas A COLABORAÇÃO NO JORNALISMO: do Arizona Project aos Panama Papers DOUTORADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Comunicação e Semiótica, sob a orientação da Prof.ª Dr.ª Cecilia Salles. São Paulo 2016 Banca Examinadora ______________________________________ ______________________________________ ______________________________________ ______________________________________ ______________________________________ Dedicado ao meu marido, Hugo, e às minhas filhas, Beatrice e Luísa, que fazem todas as jornadas da vida valerem a pena. Aos meus pais, Miranete e Laterça, que me ensinaram a ser como sou, por todo o apoio de sempre. A Mariângela e Rangner, meus mestres na busca pelas virtudes da paciência e da persistência. E a todos os familiares e os amigos queridos, em especial a meus sogros Célia e Lutegarde, pela compreensão nos momentos de ausência. AGRADECIMENTOS À minha orientadora, Cecilia Almeida Salles, que me acompanha desde o mestrado com sua generosidade, seu ânimo e seu olhar sempre atento. Sem ela esta tese não seria possível. A todos os meus colegas jornalistas, por sua companhia nas redações da vida ou por terem compartilhado comigo seu olhar sobre a colaboração jornalística. RESUMO Do Arizona Project, desenvolvido ainda nos anos 1970 e considerado o primeiro trabalho de atuação jornalística conjunta em grande escala, aos Panama Papers, investigação que reuniu quase 400 profissionais, de 76 países, em torno do maior vazamento de dados até então. Passando pelos casos WikiLeaks e Snowden, e pelo surgimento de organizações como a americana ProPublica. Apesar de ainda ser exceção na prática cotidiana das redações, a colaboração entre jornalistas de diferentes veículos vem se tornando cada vez mais presente, a ponto de ser descrita atualmente como uma das principais tendências no setor. Esse impulso é fruto de diferentes fenômenos. Por um lado existe a necessidade crescente de lidar com assuntos globais e complexos, como corrupção e meio ambiente, em um cenário de severas restrições de recursos para investigação, provocado pela crise dos modelos de negócios das empresas. Por outro, tem-se uma disponibilidade maior de informações agrupadas em grandes bancos de dados, criados pelo fortalecimento da cultura da transparência em inúmeros países, e jornalistas treinados em extrair deles notícias relevantes. Também é preciso levar em conta o aprendizado do trabalho conjunto, desenvolvido com o apoio de associações de jornalistas ao longo do tempo, que vem sendo chave para criar uma cultura de mais colaboração no jornalismo. Para dar conta de tal objeto, serão utilizadas fundamentalmente as teorias de rede e de processo de criação desenvolvidas por Cecilia Salles, além da conceituação de sistemas e complexidade, conforme Edgard Morin. Palavras-chave: Colaboração Jornalística. Jornalismo Investigativo. Jornalismo de Banco de Dados. ABSTRACT From the Arizona Project, developed during the 1970s and considered the first large-scale collaborative journalistic work, to the Panama Papers, an investigation that involved almost 400 professionals, from 76 countries, around the largest data leakage ever since. Going through WikiLeaks and Snowden cases, and the emergence of organizations such as the American ProPublica. Although still an exception in the daily practices of newsrooms, the collaboration between journalists from different news organizations has become more and more present, to the point of being considered today one of the main trends in the media industry. This impulse is the result of different phenomena. On the one hand, there is a growing need to deal with global and complex issues such as corruption and the environment, in a scenario of severe resource constraints for investigation caused by the crisis in the news organizations’ business models. On the other hand, there is a greater availability of information consolidated in large databases, created by the increasing strength of the culture of transparency in several countries, and journalists trained in extracting relevant news from these databases. It is also necessary to take into account the learning process of the collaborative work, developed with the support of journalist associations over time, which has been key to creating a culture of more collaboration in journalism. In order to account for such an object, this study will use the network and creative process theories developed by Cecilia Salles, as well as the concept of systems and complexity, according to Edgard Morin. Keywords: Journalistic Collaboration. Investigative Journalism. Database Journalism. SUMÁRIO INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 8 1 A COLABORAÇÃO NO JORNALISMO ................................................................. 16 2 O FIM DO LOBO SOLITÁRIO?............................................................................... 25 3 AMBIENTE DE MUDANÇAS ................................................................................... 30 4 O PAPEL DAS ASSOCIAÇÕES DE JORNALISTAS ............................................. 35 4.1 ARIZONA PROJECT E O PIONEIRISMO DA IRE .................................................... 36 4.2 ICIJ, DOS CIGARROS ÀS OFFSHORES ................................................................ 39 4.3 OCCRP E O KHADIJA PROJECT ........................................................................... 46 4.4 PROPUBLICA E AS RECEITAS DE REPORTAGEM ............................................ 50 4.5 CONNECTAS: AMÉRICA LATINA EM DESTAQUE ............................................ 52 5 WIKILEAKS: A UNIÃO NASCE DO EMBATE ..................................................... 61 6 CASO SNOWDEN: A SOLUÇÃO FOI COLABORAR .......................................... 87 7 PANAMA PAPERS, COLABORAÇÃO RADICAL ................................................ 117 7.1 PANAMA PAPERS NO BRASIL ............................................................................ 139 8 CONCLUSÃO ............................................................................................................ 144 REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 148 APÊNDICES .................................................................................................................. 156 8 INTRODUÇÃO Do primeiro-ministro da Islândia ao cartola suíço que assumiu a Fifa. De políticos brasileiros investigados pela operação Lava Jato a amigos íntimos do presidente da Rússia. A variedade de personalidades envolvidas e sua distribuição geográfica dão indícios do tamanho da investigação em questão. Apenas indícios. Com cerca de 11,5 milhões de arquivos, os chamados Panama Papers se transformaram no maior caso de vazamento de informações da história até então. Saíram do banco de dados do escritório de advocacia panamenho Mossack Fonseca nada menos que 2,6 terabytes de documentos sobre empresas offshore montadas, muitas vezes, para esconder recursos escusos. Na investigação, 376 repórteres de 76 países, liderados pelo Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, na sigla em inglês), ONG que recentemente vem ganhando os holofotes ao revelar escândalos mundiais como o Swiss e o Luxembourg Leaks. Em Anatomy of a Global Investigation: Collaborative, Data-Driven, Without Borders, o jornalista e pesquisador William Buzenberg ressalta o fato de que criminosos de todos os tipos e hackers atuam sem fronteiras — e sugere que os jornalistas façam o mesmo. Na época dos Offshore Leaks, ele era diretor-executivo do Centro para Integridade Pública, entidade que deu origem ao ICIJ. “Nós precisamos criar um jornalismo com escala suficiente para fazer frente ao crime”, diz Buzenberg (2015, p. 2). Discutida como uma das principais tendências no jornalismo atual, a colaboração internacional em torno de assuntos complexos existe há pelo menos quatro décadas, embora sempre tenha sido praticada como exceção. O cenário recente, no entanto, é visto por profissionais e pesquisadores como propício para promover modificações na cultura da imprensa, marcada pela concorrência e pelo trabalho individual. O que mudou nesse período? A tecnologia é a resposta mais fácil. Computadores capazes de processar volumes crescentes de informação estão disponíveis em associações de jornalistas e em algumas das principais redações para os jornalistas. Redes de comunicação criptografada permitem trocar dados sigilosos com fontes e discutir, em segurança, o trabalho com colegas em qualquer lugar do globo. 9 Por outro lado, vários países desenvolveram ao longo desse tempo leis de transparência, que obrigam a divulgação de informações públicas. Rico material para a investigação jornalística. Mesmo informações individuais estão gravadas em enormes bancos de dados de governos. Mas ter tecnologia não é suficiente. Nem dispor de um grande volume de informações. É necessário contar com apoio de especialistas em tratar esses dados brutos e trabalhar com programação, desenvolvendo ferramentas que facilitem a busca por dados relevantes. E esses experts, repórteres ou não, já atuam em redações e consórcios de jornalistas investigativos.
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